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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES UCAM PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO DIRETORIA DE PROJETOS ESPECIAIS PROJETO “VEZ DO MESTRE” CARACTERÍSTICAS DA APRENDIZAGEM NA ALFABETIZAÇÃO INFANTIL Nilcéia Pereira Miranda Orientador: Antônio Fernando Vieira Ney FEVEREIRO/2003

UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES UCAM PRÓ … PEREIRA MIRANDA.pdf · desde então pesquisadora do GEEMPA, desenvolve um trabalho significativo dentro da história da educação brasileira

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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES

UCAM

PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO

DIRETORIA DE PROJETOS ESPECIAIS

PROJETO “VEZ DO MESTRE”

CARACTERÍSTICAS DA APRENDIZAGEM NA ALFABETIZAÇÃO INFANTIL

Nilcéia Pereira Miranda

Orientador: Antônio Fernando Vieira Ney

FEVEREIRO/2003

UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES

UCAM

PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO

DIRETORIA DE PROJETOS ESPECIAIS

PROJETO “VEZ DO MESTRE”

CARACTERÍSTICA DA APRENDIZAGEM NA ALFABETIZAÇÃO INFANTIL

Nicéia Pereira Miranda

Trabalho monográfico

Apresentado como requisito

parcial para a obtenção do

Grau de Especialista em

Educação Infantil.

Teresópolis/20 de fevereiro de 2003

AGRADECIMENTOS

A Deus, pelo presente da vida, velando por mim em todos os instantes desse meu caminho.

À minha família, em especial ao meu marido e minha mãe, pelo total empenho e apoio que

ofereceram e continuam a oferecer. Sem eles, eu não teria alcançado esta vitória.

A todos os professores que participaram desta empreitada, dando-me força e incentivo nos

momentos difíceis do curso.

E, em especial, à minha amiga e professora Cláudia Maia que, carinhosamente, aceitou ser

minha parceira nessa empreitada.

“Peço licença para termi-

nar soletrando a canção de

rebeldia que existe nos fo-

nemas da a1egria: canção

de amor geral que eu vi

crescer nos olhos do ho-

mem que aprendeu a ler.”

Thiago de Mello

RESUMO

O enfoque deste trabalho científico e de campo é puramente o reflexo de uma preo-

cupação de educadores que comprometem o seu trabalho com o trabalho de estudiosos e

pesquisadores como Piaget, Emília Ferreiro, Esther Pillar Grossi e muitos outros que ten-

tam desvendar a forma como a criança pensa a respeito do mundo que a cerca.

O processo de aprendizagem que aqui vai ser descrito revelam os níveis de aprendi-

zagem pelos quais a criança passa até atingir a maturidade alfabética, garantindo uma ava-

liação precisa das dificuldades e mostrando direções ao processo ensino-aprendizagem.

SUMÁRIO pág.

INTRODUÇÃO................................................................................................................9

CAPÍTULO I

HISTÓRICO DA EDUCAÇÃO INFANTIL...................................................................11

CAPÍTULO II

PROPOSTA PEDAGÓGICA DE ALFABETIZAÇÃO – CONSTRUTIVISTA.........14

CAPÍTULO III

NÍVEIS DE APRENDIZAGEM SEGUNDO ESTHER PILLAR GROSSI ................16

3.1 NÍVEL PRÉ-SILÁBICO ...............................................................................................17 3.2 NÍVEL SILÁBICO........................................................................................................20 3.3 NÍVEL ALFABÉTICO .................................................................................................24 CAPÍTULO IV

PROPOSTAS DE ATIVIDADES PARA A ALFABETIZAÇÃO.................................26 4.1 O ENSINO DA MATEMÁTICA NA ALFABETIZAÇÃO.........................................29

4.2 O JOGO E A BRINCADEIRA: PONTE PARA A ALFABETIZAÇÃO.....................30

4.3 SUGESTÕES DE ATIVIDADES..................................................................................32

CAPÍTULO V

EXPERIÊNCIAS DE EDUCADORES COMPROMETIDOS COM A EDUCAÇÃO INFANTIL 5.1 RELATÓRIO I ..............................................................................................................35 5.2 RELATÓRIO II.............................................................................................................38 5.3 RELATÓRIO III............................................................................................................41

CONCLUSÃO...................................................................................................................43

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...........................................................................44

9

INTRODUÇÃO

A pesquisa sobre a educação infantil direciona-se a uma busca constante de novos

caminhos, que vão de encontro com o objetivo maior da educação brasileira, na tentativa

de atingir de forma qualitativa a população carente com dificuldades em aprendizagem,

principalmente nas séries iniciais, nas quais inicia-se o processo de alfabetização.

A proposta pedagógica baseou-se em estudiosos com Piaget, Paulo Freire, Emília

Ferreiro, Esther Pillar Grossi e muitos outros que contribuíram com seus estudos sobre a

psicogênese da língua escrita e falada, e também sobre o comportamento da criança frente

ao processo de ensino-aprendizagem.

A abordagem do tema caracterizou-se pelos níveis de aprendizagem pelos quais as

crianças percorrem até atingir a maturidade alfabética, bem como a postura do profissional

como mediador deste processo de aprendizagem, de forma a ampliar o conhecimento de

muitos educadores que justificam as falhas da aprendizagem como despreparo para exercer

suas funções e desajuste social.

Tentando buscar uma forma de integração da teoria com a prática, este trabalho

científico e de campo realiza esta pesquisa com os teóricos, visando aplicação nas salas de

aula e aplicando nas turmas de alfabetização do CIEP 036, em Teresópolis - RJ, como con-

firma os anexos sobre a prática escolar.

OBJETIVO GERAL

Ampliar o campo de atuação do educador e educando.

10

OBJETIVO ESPECÍFICO

Orientar o educador na avaliação da aprendizagem para uma maior eficácia na

aplicação das atividades que serão direcionadas ao nível de aprendizagem al-

cançada pelo educando.

JUSTIFICATIVA

Esclarecer os níveis de aprendizagem pelos quais a criança passa até construir o

aprendizado, ampliando o universo do alfabetizador, tornando enriquecedor o

processo educacional e assim, aumentando as oportunidades para a aprendiza-

gem.

11

CAPÍTULO I

HISTÓRICO DA EDUCAÇÃO INFANTIL

A criança aparece socialmente na civilização bem vagarosamente. Através de estu-

dos de PHILIPE ARIÉS (1981), a criança do século XIII era uma figura angelical, e mais

tarde os retratos são de crianças da realeza. No século XVII aparecem as representações de

crianças vivas, porque até então a representação da infância era misturada à morte, santi-

dade, tempo, estrutura do mundo. Na verdade até o século XVIII, a família era um grande

espaço aberto, com função pública, que não dedicava nenhuma atenção especial às crian-

ças. E o pequeno ser era tirado do seio familiar e colocado em outro, estranho, para ser

educado.

No século XVIII, a família começou a fechar-se para a sociedade, dentro dos seus

próprios muros, com a preocupação de defender-se do mundo. Os pais começaram a preo-

cupar-se com a educação dos filhos. A criança assume seu lugar junto aos pais. Aquelas

famílias foram substituídas pelas escolas (escolas aonde somente iam os clérigos). Esta

transição foi lenta, visto que só os ricos, nobres, a burguesia, os lavradores e os artesãos

participaram dessa mudança. No século XIX, uma grande parte da população, a mais pobre

e a mais numerosa, viviam como as famílias medievais, com crianças afastadas das casas

dos pais.

A escolaridade para as meninas difundiu-se a partir do século XVIII e início do

século XIX, pois até então, com raras exceções, continuavam a ser educadas pela prática

da vivência de hábitos e costumes, muitas vezes em casa alheias. Quanto aos meninos, os

primeiros a ganhar escolarização foram os filhos da classe média, com a educação prática

sendo substituída por uma mais teórica, nas Academias. O que persistiu até hoje desse tipo

de educação diz respeito à educação artesanal e operária.

Com a divisão entre os espaços público e privado, a família assumindo a responsa-

bilidade pela educação de seus filhos, a criança começava a ser alguém. E com a era indus-

12

trial a escola começou a ser pública e tinha como meta preparar a criança para nova era que

nascia, com função realmente instrumental. Não há preocupação com a experiência vivida,

os horários são longos, os programas restritos ao ensino profissional.

A família restrita e monogâmica foi praticamente imposta pela classe média, porque

a era industrial precisava de um povo estável e uma família nestas condições seria mais

submissa às novas regras e ordens.

O momento atual da família e de seus membros é outro. A criança tem atenção es-

pecializada. Antes dependente agora busca autonomia. Ela encontrará pela frente especiali-

zações, como o playground, praças, quarto com TV, a creche, o pré-escolar, aulas de balé,

natação, inglês, ginástica olímpica, desfile de modas etc.

A partir do fim do século XIX, houve uma grande descoberta: a criança tinha uma

atividade biopsíquica, um conjunto funcional destinado ao registro dos afetos, emoções à

elaboração dos pensamentos a de atos. Este psiquismo ativo está voltado para todas as áre-

as da existência interna e externa da criança, numa vivência ativa de tudo o que ocorre en-

torno e dentro dela.

Numa instituição de Educação infantil, os adultos e crianças reúnem-se, a partir das

necessidades e desejos. A instituição tem rotinas, organização própria, leis, escolhas, vol-

tadas para proporcionar o bem-estar, segurança e orientação adequada ao período em que

adultos e crianças convivem na comunidade escolar e a qualificação do profissional para a

educação infantil torna-se necessariamente especializados.

Até a década de oitenta, no Brasil, convivíamos só com práticas de alfabetização

que privilegiavam a questão do método a ser utilizado no ensino da leitura e escrita como

objeto de uma instrução sistemática, na qual o alfabetizando só poderia ter acesso pela in-

formação dos outros, sem nunca ser participante ativo da construção desse conhecimento.

Há pouco mais de 10 anos, novos conhecimentos sobre alfabetização surgiram. Foi

graças aos estudos feito por Emília Ferreiro, psicopedagoga argentina e seus colaborado-

res, sobre a psicogênese da língua escrita que hoje sabemos como a criança aprende a ler e

13

a escrever, como caracteriza cada etapa de evolução e quais os processos cognitivos envol-

vidos.

Novas e bem-sucedidas descobertas científicas no campo pedagógico podem e de-

vem ser divulgadas e aplicadas. E no caso específico da psicogênese da educação – um

instrumento essencial de participação sócio-política – o êxito das pesquisas efetuadas por

ESTHER PILLAR GROSSI dentro do GEEMPA (grupo de estudos sobre educação e me-

todologia de Porto Alegre), que foram aplicadas com sucesso por professores de todo o

Brasil, surge como uma nova direção ao nosso trabalho de educadores.

Esther Pillar Grossi, matemática, psicopedagoga, escritora, fundadora em 1979 e

desde então pesquisadora do GEEMPA, desenvolve um trabalho significativo dentro da

história da educação brasileira.

Baseado no pensamento construtivista de JEAN PIAGET, nas descobertas de EMÍ-

LIA FERREIRO e sua teoria da construção léxica associada à antropologia pedagógica

eminentemente engajada de PAULO FREIRE, Esther lança a trilogia intitulada Didática da

Alfabetização, que abrange os três estágios decisivos durante a aquisição da linguagem

escrita, a saber: o estágio pré-silábico, o estágio silábico e o estágio alfabético.

Este histórico nos revela os rumos tomados pela educação no passado até o momen-

to atual, visto que o assunto da nossa realidade atual vai muito além do que pressupõe os

leitores do mesmo.

14

CAPÍTULO II

PROPOSTA PEDAGÓGICA DE ALFABETIZAÇÃO – CONSTRUTIVISTA

Na visão de MADALENA FREIRE, toda a atividade nasce da observação e

da leitura, que o educador faz da realidade significativa, inserida na história do

grupo. Através do que é significativo, o nível individual e coletivo, o educador lê,

diagnostica o que o educando sabe, e o que, ao mesmo tempo, ainda não conhe-

ce, para assim, partindo do que o educando sabe, instrumentalizar a busca do

que ainda não conhece. O desafio que se elabora é o de recriar, repensar as ati-

vidades a partir da realidade, da história de cada educador com seu grupo.

PIAGET fez distinção entre os estudos cognitivos e estudos didáticos referindo-se a

extrair as aplicações pedagógicas, especialmente didáticas, das pesquisas sobre o desen-

volvimento das operações intelectuais na criança. Esta proposta das descobertas cognitivas

não deve ser confundida com a elaboração de cartilhas ou de receitas a serem repetidas

mecanicamente. Trata-se de criar atividades didáticas que conduzem a uma atmosfera da

alfabetização, no qual o aluno é considerado como ser pensante que constrói os seus co-

nhecimentos.

ESTHER PILLAR GROSSI, pesquisadora do GEEMPA, no processo de alfabeti-

zação nos dá à oportunidade de avançar na compreensão do que se passa na cabeça de nos-

sos alunos enquanto aprendem a ler e escrever. Ela nos revela que entre os processos de

aquisição da leitura e da escrita não há simultaneidade, enquanto eles se dão. Justamente a

compreensão de que a leitura e escrita são duas ações inversas representa uma culminância

na caminhada da alfabetização. Por outro lado, mesmo considerando a escrita (ou a leitura

em separado), pode-se estar em níveis diferentes se tratar de unidades lingüísticas diferen-

tes. Acresce-se a esta realidade o fato de que a associação entre sons e letras, é uma pro-

blemática paralela à compreensão de como as letras se articulam para produzir a escrita e

propiciar a leitura de palavras, frases e textos.

15

Ela nos fornece um equipamento sólido para a aventura da alfabetização. Sua trilo-

gia didática procura dar conta de três estágios decisivos da criança durante a aquisição da

linguagem e escrita, a saber: o estágio pré-silábico, em que a criança ainda não estabelece

uma relação necessária entre a linguagem falada e as diferentes formas de sua representa-

ção, acreditando que se “escreve com desenhos”, o estágio silábico em que as incoerências

com as hipóteses do estágio anterior são percebidas, surgindo uma nova teoria, a de que

para cada sílaba é necessário ter pelo menos uma letra (em geral uma vogal); e finalmente,

o estágio alfabético, em que a hipótese anterior é novamente reformulada, surgindo agora a

hipótese coerente de uma correspondência relativa entre fonema e letras.

Esther e sua equipe observaram inclusive que a separação por estágios ou níveis

claramente definidos, é mais um instrumento teórico que uma realidade empírica. Nas cri-

anças examinadas verificou-se, confirmando os achados de Emília Ferreiro, que existem

vários estágios intermediários e ainda simultaneidade de dois ou três “estágios” por vezes

no pólo da leitura, por vezes no da escrita.

Conhecendo profundamente como se constrói a aprendizagem possibilita ao profes-

sor planejar e organizar melhor suas atividades e possibilita ao aluno construir seu aprendi-

zado diante da sua própria experiência avançando no processo à medida que se sente segu-

ro, confortável e começa a perceber o encaixe do quebra cabeça dos três eixos por onde se

dá a alfabetização (leitura, escrita e associação dos sons e letras). O ensino não deve ser

individualizado para ser eficiente, pois se aprende em interação com os outros, e a riqueza

da troca é fundamental para que a alfabetização vá além de ensinar a ler, uma vez que po-

demos aprender a desvendar o real dentro da possibilidade de interagir com o mundo que

nos cerca.

Na escola, na qual o ensino se faz de forma tradicional, a aprendizagem acontece de

fora para dentro, pela fixação do modelo correto vindo do exterior, através da informação

do professor. Essa situação é lamentável, por isso temos que estimular o processo de mu-

danças através da reflexão e encontrar uma maneira de abrir as portas da escola para reno-

vações visando sempre ampliar o que já conhecemos.

16

CAPÍTULO III

NÍVEIS DE APRENDIZAGEM SEGUNDO ESTHER PILLAR GROSSI

A partir de dois anos a criança poderá começar a “rabiscar”. É a fase das GARA-

TUJAS, na qual ela já dá nome aos seus rabiscos (“é o papai”; “é o caminhão”). Nesta fase

deve-se oferecer elementos que estimulam a criança a representar graficamente o seu pen-

samento.

A representação da escrita através de desenhos denominamos fase ICÔNICA, que a

princípio são apenas tentativas de desenhar com forma indefinida. Aos poucos a criança

vai aperfeiçoando a sua representação de objetos até alcançar uma forma bem definida. A

idade certa para cada fase não se pode definir, porque vai depender dos estímulos e das

oportunidades oferecidas a cada criança.

Quando a criança começa a ter contato com o mundo da escrita e da leitura inicia-se

o processo de alfabetização que pode acontecer dentro ou fora do contexto escolar, depen-

dendo do que a criança já vivenciou dentro do contexto familiar. É neste momento que fica

evidente as experiências vivenciadas pela criança, tornando-se essencial ao processo de

alfabetização, a observação atenta do professor-orientador para suprir eventuais dificulda-

des apresentadas neste início do processo, oferecendo as oportunidades que a criança não

pode vivenciar.

No sistema tradicional de alfabetização que considera a escrita como soma linear de

elementos isolados, cuja somatória levaria a avançar letra por letra, sílaba por sílaba, pala-

vra por palavra, até atingir a totalidade, ignorando os aspectos construtivos da escrita, valo-

rizando apenas os aspectos gráficos. Ao contrário, na psicogênese, as crianças têm contato

com toda as letras e com qualquer palavra simultaneamente, sem seleção e ordenação des-

tas para vivenciar. Neste início as crianças não vislumbram que a escrita tem a ver com a

pronúncia das partes de cada palavra. Pensando assim, vemos a alfabetização muito além

da correspondência entre sons e letras escritas. Aqui começa o nível pré-silábico, segundo

Esther Pillar Grossi dentro das pesquisas sobre a psicogênese da escrita e da leitura.

17

3.1 NÍVEL PRÉ-SILÁBICO

O nível pré-silábico caracteriza-se pela criação de um ambiente rico de materiais e

de atos de leitura e de escrita, a semelhança do ambiente que é vivenciado por crianças de

classes alta e média no seu meio familiar. É nesta fase que as crianças começam a construir

hipóteses em torno das questões proposta para a escrita e para a leitura. Fazem leitura nas

imagens (desenhos, figuras...) ou lê nas letras. As imagens gráficas expressam a realidade,

antes mesmo que as letras possam dizer algo; a criança ainda não suspeita que com um

conjunto de risquinhos se possa fazer o mesmo.

São muitas as questões que circulam no processo de aprendizagem, e algumas delas

dizem respeito a diversas conjecturas, tais como: para se ler algo deve haver bastante letra

(no mínimo três); para se ler não pode haver duas letras iguais, uma ao lado da outra. Satis-

feitas essas condições, surgem outras: lêem-se palavras. Quais palavras? ; lêem-se frases.

Letras e números são a mesma coisa. Escrevem-se coisas diferentes em suportes diferen-

tes?

A didática do nível pré-silábico se pauta pela ausência de análises silábicas. As pa-

lavras são analisadas de outros pontos de vista que não o silábico. Entre eles, o número de

letras, as letras iniciais ou finais, a ordem das letras, o tamanho e a posição da palavra etc.

O importante é que a criança memorize como se escreve algumas palavras, mesmo que ela

não entenda o mecanismo da pronúncia de suas partes. Isto servirá de conflito na fase silá-

bica, enriquecendo o processo.

Antes de saber ler no sentido escolar, uma criança de classe média ou alta já sabe

distinguir a natureza de um texto de acordo com seu suporte. Ela sabe reconhecer uma car-

ta, uma receita, os textos do livro de histórias etc. Uma criança que vê pessoas lendo e es-

crevendo questiona esses atos.

Emília Ferreiro define quatro níveis na psicogênese da alfabetização: o pré-silábico,

o silábico, o silábico alfabético e o alfabético. Mas dentro da proposta pedagógica do grupo

GEEMPA, devemos considerar três níveis (pré-silábico, silábico e alfabético) e dois níveis

intermediários que se caracterizam pela evidência de contradições nas hipóteses do alfabe-

18

tizando, as quais desestabilizam o nível anterior e ainda não se organizam para o próximo

nível. São momentos de conflitos e, ao mesmo tempo, momentos-chaves do processo de

aprendizagem. É quando o aluno percebe que seus esquemas são incapazes de fazer frente

ao problema que ele é capaz de formular nesse momento. Pode-se formar uma lacuna cog-

nitiva, e a tendência é que ele abandone a arena do seu conflito por um certo tempo. Neste

momento, é necessário dar incentivo de forma adequada para que ele possa superá-lo. E

também ter o cuidado de não julgá-lo aquém de suas possibilidades e não deixar transpare-

cer estes julgamentos para não desencorajá-lo a superar suas dificuldades, avançando assim

dentro do processo.

No nível intermediário I, a escrita começa a se desvincular da imagem e os números

podem se distinguir das letras. Suas concepções anteriores começam a ser questionadas à

luz da idéia da vinculação pronúncia x escrita. E as palavras começam a ter uma certa esta-

bilidade, e o sujeito avança na aprendizagem caminhando para o nível silábico.

19

Textos (frases)

ESQUEMA DA DIDÁTICA DO NÍVEL PRÉ-SILÁBICO SEGUNDO ESTHER GROSSI

(SOMENTE QUANTO À LEITURA E À ESCRITA)

Quadro-resumo

- associação palavra x objeto (imagem)

- memorização global de palavras significativas

- análise de constituição das palavras quanto à sua inicial, sua letra final,

número de letras, ordem das letras e natureza das letras.

- análise dos aspectos gráficos, topológicos, de forma, de posição em

dois tipos de letras, cujo objetivo é atingir a invariância de suas formas.

- introdução dos aspectos sonoros através das iniciais de palavras signifi-

cativas

- distinção entre letras e números.

- Vinculação discurso oral com texto escrito

- Distinção entre imagem e escrita

- reconhecimento dos suportes diferentes de

textos distintos

- reconhecimento das letras como consti-

tuintes do texto, análise da distribuição es-

pacial do texto e da orientação da frase.

Palavras

Letras

- aspectos semânticos

- aspectos gráficos

20

3.2 NÍVEL SILÁBICO

A passagem de um nível a outro se dá pela insuficiência das hipóteses até então for-

muladas sobre leitura e escrita, ou seja, quando a criança encontra um obstáculo.

O nível silábico caracteriza-se pela fonetização (descoberta dos sons da fala). Nesse

nível a criança chega à hipótese de que a escrita representa a fala. Descobre-se as partes da

escrita (letras) que representam outras partes da palavra (sílabas). Podem representar a pa-

lavra por consoantes ou só por vogais. Quando a criança é desafiada a escrever do jeito de

criança e não o convencional do adulto, ela pode escrever desta forma as palavras:

GATINHO - (A I O)

CAVALO - (A O)

CHINELO - (I E O)

Num grau de maturação da escrita as crianças podem usar vogais e até consoantes

tendo já o seu valor convencional, como no exemplo:

CASA (KEA)

BOLA (BONB)

A hipótese silábica permite regular as variações a quantidade das letras que devem

ser escritas e centra a atenção da criança nas variações sonoras entre as palavras. Elas só

vão avançar na aprendizagem através de jogos com o alfabeto e sílabas móveis que lhes

permitam construir e comparar palavras e sílabas, separar palavras e também atividades

que levem ao conflito. Por isso é importante que o professor coloquem juntos alunos que

utilizam só consoantes e outros que estejam utilizando vogais, para que ambos possam se

beneficiar das comparações que fazem com a escrita.

Para alunos que se utilizam só de consoantes ou só de vogais, o professor deve pro-

vocar o conflito para que ele possa criar suas hipóteses para sua escrita, ditando para ele

várias palavras, nas quais ele terá de utilizar as mesmas letras. Para BOLA ele utiliza BL,

21

então, o professor dita outras palavras como BOLO, BULE, BALA etc. Desta forma o pro-

fessor criará o conflito porque a criança perceberá que para todas as palavras utilizou as

mesmas letras e sentirá necessidade de comparar sua escrita com a dos seus colegas, e nes-

te momento formulará novas possibilidades de escrita.

Nesse nível é comum que as crianças consigam ler as sílabas, mas não as utilizem na

escrita porque a leitura é visual. Portanto é mais fácil ler do que escrever. Sendo assim,

compete ao professor trabalhar de forma simultânea a aquisição da leitura e escrita. Sendo

o momento propício à escrita porque a hipótese de que cada sílaba pode ser escrita por uma

letra é uma solução incompleta para explicar a escrita convencional da nossa língua, mas

que deixa a criança plenamente satisfeita neste momento de produção da escrita. Por este

motivo é que se deve dar oportunidades de escrita para que a criança livremente possa dar

conta de que sua produção não está completa e busque soluções para resolver o problema.

Ela vai se dar conta de que pode escrever tudo o que quer, mas que aquilo que foi escrito

não pode ser lido por ela, nem por outra pessoa porque faltam elementos, descobrindo há

seu tempo que suas hipóteses estão incompletas e sem a censura que a conotação do errado

pode produzir quando são apontados ou assinalados, o processo vai ganhando a dimensão

construtiva, uma vez que partem da experimentação da própria criança.

O importante é não bloqueá-la no seu momento de construção da aprendizagem,

deixando-a escrever livremente e com regularidade, pois a criança precisa esgotar por si

mesma o desejo de utilizar a hipótese silábica, sem imposição da autoridade do professor.

É indispensável como suporte para reflexão da escrita que a criança já tenha guar-

dado na memória uma série de palavras (que sejam significativas) que lhe propicie a idéia

de estabilidade da escrita. E o que leva a estabilidade da escrita é o enfrentamento com o

espaço de problemas que estejam a altura da sua capacidade de compreendê-los o que

acontece através da ação e não da percepção, pois a criança tem a necessidade de produzir

para que naturalmente ela possa vencer cada obstáculos que sua escrita lhe propicia e não

meramente o ato da reprodução da escrita que acontece no método tradicional de ensino.

Nesta fase ocorre a análise oral do número de sílabas (pedacinhos) que podem ser

exploradas pela pronúncia pausada das palavras, procurando sempre ressaltar o desmem-

bramento com atividades que explorem as partes no inteiro, como:

22

• Pintar as partes com cores diferentes, e repetir as cores para os pedacinhos e se

escrevem da mesma forma e que tenham o mesmo som..

• Comparar a escrita de palavras que tenham números diferentes de sílabas;

• Construir caixinhas com número x para todas as palavras e preenchê-las com as

sílabas, pintando as caixinhas que sobrarem (utilizando imagem x palavra);

• Recortando as palavras e trocando as sílabas de lugar para que através da pro-

núncia destas sílabas trocadas , haja a necessidade da reconstituição da palavra

por parte do aluno.

• Pode-se criar jogos que inspirem a necessidade de organização das sílabas para

formar palavras (imagem x sílabas recortadas).

O que se percebe quando as crianças atingem o nível silábico, é que elas são capa-

zes de contar as sílabas enquanto escrevem, independente de escrevê-las convencional-

mente. Quando são estimuladas a ler e revisar o que escreveram, muitas das vezes, são

capazes de perceber o que escreveram a mais ou a menos.

23

Esquema da didática do nível silábico segundo Esther Pillar Grossi

Quadro-resumo

- Ênfase sobre a análise na primeira letra no contexto da

primeira sílaba. Contraste entre palavras memorizadas

globalmente e a hipótese silábica: contagem do número de

letras, desmembramento oral de sílabas e hipóteses de

repartição de palavras escritas.

- Reconhecimento do som das letras pela análise da primeira

sílaba de palavras.

- Prosseguimento do estudo das formas e da posição das

letras em seus dois tipos – cursivo e maiúscula de imprensa.

- Uso preferencial de textos cujo conteúdo já está

memorizado de antemão, para leitura.

- Pesquisa de qualquer palavra no texto, incluindo verbos e

partículas pequenas, como artigos preposições etc.

Palavras

Letras

Textos

24

3.3 O NÍVEL ALFABÉTICO

Nesse nível, a criança é capaz de perceber o conjunto de letras que formam a palavra e

o subconjunto de letras que são as sílabas. Sendo assim, já é capaz de fazer a análise sono-

ra das palavras , porque já sabem os valores que correspondem a letras e sílabas. A evolu-

ção desse período será favorecida pelas oportunidades de escrita que lhe serão oferecidas.

A leitura de textos e sua reescrita , assim como as produções de textos relacionados ao

dia-a-dia das pessoas (receitas, bilhetes, cartinhas etc) servirão como suportes para a

estimulação do aprendizado.

Agora, nessa fase, fica mais evidente para criança a noção de estrutura da frase, na qual

as palavras passam a ser utilizadas de forma organizada para a produção do seu texto. Ca-

bendo ao professor estimular e orientar na sua construção sem a interferência na criativida-

de da criança, apenas levá-la à leitura e revisão do texto.

As crianças escrevem com algumas falhas ortográficas, com dificuldades em separar as

palavras ( não fazem os espaços necessários que separam as palavras uma das outras), e

também apresentam ausência de pontuação. Entretanto, mesmo escrevendo não-ortogra

ficamente como na escrita convencional, neste momento, elas são capazes de descrever

com riquezas de detalhes em suas produções com lógica e correspondência

fonética.

O importante, neste momento, é a orientação do professor sem sua interferência na hora

da produção de texto da criança, mas deve-se fazer uso de recursos pedagógicos que des-

pertem a atenção para o uso dos espaços, pontuações e da ortografia sem cobranças. Pode-

remos orientar as crianças, por exemplo, a usar o dedinho para representar os espaços entre

as palavras todas as vezes que terminarem de pronunciá-las.

Muitas outras atividades podem ser utilizadas, como contar o número de palavras exis-

tentes em cada frase, colocando-os em caixinhas, parêntesis, ou outra forma de representa-

ção ao lado de cada uma das frases que aparecem no texto, aproveitando para explorar a

leitura do mesmo. Poderemos utilizar a ordenação de palavras em montagens de frases,

com numerações ou não, dependendo da necessidade de cada grupo de alfabetizandos. O

25

objetivo destas atividades é o de fazer as crianças perceberem o conjunto de letras que

formam as palavras, ao mesmo tempo em que percebem o conjunto de palavras que for-

mam a frase e a estrutura do texto.

As questões ortográficas começam a ter significado mais expressivo para as crianças;

que não deve ser ignorado . No entanto, estas questões serão trabalhadas com mais ênfase

no período pós-alfabetização, todavia deve-se sanar as interrogações das crianças. Deve-se

ter o cuidado para satisfazê-las sem deixar dúvidas e, sobretudo, levá-las ao confronto, sem

ignorar a capacidade da criança de antecipar o aprendizado.

Considerando que a alfabetização não é um processo no qual se determina o fim da

aprendizagem, mas que se faz de forma contínua durante toda a vida escolar do indivíduo,

a busca deve ser constante oportunizando ao educando um tempo maior para que supram

as necessidades de cada um. Portanto o ciclo das três primeiras séries iniciais do ensino

fundamental permite que tanto o aluno quanto o professor tenham a oportunidade de des-

envolver um trabalho de qualidade e que atendam as necessidades das classes populares, na

qual muitas das vezes não obtiveram a sua disposição a educação pré-escolar.

26

CAPÍTULO IV

PROPOSTA DE ATIVIDADES PARA A ALFABETIZAÇÃO

A proposta de atividades lançada pelo educador deve buscar o que é significativo

dentro da história do grupo, o que os alunos sabem e o que eles ainda não sabem. Para isto

é necessário observar uma série de procedimentos: a diversificação de tarefas, a integração

das disciplinas, a inserção da realidade específica das experiências de uma turma e criar

atividades didáticas que conduzem a uma nova atmosfera da alfabetização, a simultaneida-

de de trabalho para alunos de diversos níveis de progresso cognitivo. É muito importante

salientar que cada grupo tem sua história única, e toda atividade pedagógica deverá ser

criada e produzida por cada educador de acordo com o seu grupo, e não meramente repro-

duzida, copiada, alienada do que é significativo da história do grupo.

Deve-se iniciar o processo pelo que é mais significativo, o nome da criança, que é a

sua identidade, e vem carregado de história e de muita afetividade. Os nomes mantêm uma

estabilidade, uma regularidade, que logo a criança descobre aos poucos que para cada no-

me existe uma ordem correta das letras e se pular algumas letras ou invertê-las, pode-se

escrever outros nomes. Aprender o próprio nome, o nome dos colegas ou professores, são

atividades prazerosas e plenas de significados.

O desafio é a diversificação das atividades que podem contar com aplicação de al-

guns procedimento:

• Valorizar a 1ª letra do nome e associá-las à objetos , pessoas e animais.

• Utilizar os nomes em telhadinhos, cartões, crachás, como marcadores do es-

paço de cada aluno (pode-se colorir por letras e numerá-las).

• Utilizar poemas, músicas, acrósticos, rimas e jogos nas atividades relacio-

nadas aos nomes que compõe o grupo.

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• Utilizar o nome das crianças nas atividades sempre que for possível (ativi-

dades orais ou escritas).

• Anotar sempre os nomes, em lugar bem visível, das crianças solicitadas para alguma tarefa.

• Memorização global de palavras, especialmente o próprio nome.

• A vinculação do objeto ou da figura com palavra escrita.

• Análises não-silábicas.

A associação de objetos e palavras não deve ser limitada a poucos objetos e nem

tão pouco repetitivas, pois são as múltiplas relações que geram o conhecimento. O impor-

tante neste processo é que a criança se sinta parte deste, e bem motivada a conquistar no-

vos caminhos.

As letras são os elementos básicos da escrita, que devem enriquecer o ambiente

escolar, portanto devem ser de diversos materiais e tamanhos (madeira, plástico, papelão,

lixa, feltro, arame...). E devem buscar a correspondência com sons, desenvolver o traçado,

a ordem espacial e variações de formas, independente de variações secundárias, como o

seu tamanho ou a posição nas palavras.

A distinção entre letras e números, será facilitada quando a criança avançar na con-

quista da quantidade e não na mera utilização dos algarismos, é o que vincula a alfabetiza-

ção e matemática.

O ato de leitura e da escrita deve acontecer pela observação de atos de adultos, prin-

cipalmente os do professor, e nesta etapa o aluno necessita de ouvir muita leitura e vê-lo

escrever bastante, bem como o contato com muitos materiais escritos. Oferecer textos com

ou sem imagens, perguntar onde o aluno está lendo imagens ou letras, onde começa a

leitura, em que lugar da página. Deve-se informar que a leitura começa pela esquerda e no

alto da folha e a da página, e ainda que se lê a página da esquerda antes da página da direi-

ta.

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Os textos deverão ser de vários tipos: histórias, músicas, trava-línguas, cartas, jor-

nais, rótulos de produtos, comerciais, placa de rua, prospectos de supermercados etc. Pode-

rão ser trabalhados de forma coletiva e individual, conhecidos ou produzidos através das

situações vivenciados na sala de aula, apresentados em cartazes, lido por inteiro, a classe

deverá repetir as frases, e nova leitura deve ser feita. É importante observar se os alunos

memorizaram algumas frases ou se conseguem ler o texto todo. Pediremos também que

identifiquem palavras, as quais iremos apresentá-las à classe em tiras de papel.

Nos textos individuais, deve-se explorar inicialmente a letra do nome do aluno,

palavras chaves, circundando-as ou sublinhando-as com lápis coloridos. Pode-se pedir que

pintem os espaços existentes no texto ou entre as palavras, pedir que escrevam palavras do

texto em caixinhas ou saquinhos, como preferir, e embaixo do mesmo copiar partes que

mais gostaram, pois o texto passa a ter um significado simbólico e prático para os alunos.

As atividades não devem ser as mesmas para os alunos silábicos ou alfabéticos.

Na escolha das histórias entram dois critérios básicos: o seu conteúdo e a estrutura

da narração. E determinar o momento de contar história, acomodar os alunos próximos ao

professor, além de explorá-la sobre vários aspectos, inclusive encadeando-a em outras

atividades didáticas, como a reescrita da história através de letras e desenhos, são ativida-

des recomendadas.

A criação de histórias pelas crianças é uma modalidade rica para vincular texto es-

crito e discurso oral. Podem ser sugeridas a partir de acontecimentos vivenciados e relata-

dos em sala de aula, como escrever e receber cartas que constituem experiências importan-

tes no nível pré-silábico, uma vez que serve de recursos gráficos para se comunicar com

alguém a distância, ajuda a compreender o significado da escrita como forma de transmitir

sentimentos e notícias. Devemos aproveitar algumas situações como escrever a algum co-

lega que vem faltando à aula, mandar recados etc. A transcrição de cantos e brincadeiras

também serão fonte de compreensão da vinculação escrita com o discurso oral.

A organização temporal das atividades em sala de aula se fará com a presença de

uma rotina básica, a seqüência dos dias da semana, estabilidade das horas de começar e

terminar a aula, que possibilitará além de bom hábito social, a organização da inteligência

da criança. Deverá acontecer na sala de aula um esquema de atividades vinculadas sempre

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no mesmo dia da semana e a uma determinada hora. Como exemplo poderemos nos referir

ao dia da aula de recreação, ao dia da aula de música, ao dia da aula de arte, ao horário da

merenda e outras. Estas atividades serão inseridas no contexto escolar conforme a organi-

zação curricular de cada escola, e ou a organização do planejamento de cada professor.

Podemos também citar como fator essencial ao processo de aprendizagem, a orga-

nização do espaço escolar, pois assim ficará estabelecido o tipo de relação que se espera

numa classe. Se colocarmos as crianças em grupos facilitaremos as trocas de conhecimento

entre elas, pois neste processo vale a cola de informações. A posição em círculo com ou

sem cadeiras, em alguns momentos, facilitará a concentração ao ouvir histórias.

É notório dentro do processo de ajuda aos alunos que ainda não conseguiram ultra-

passar as barreiras dos níveis de alfabetização, que a superação destes obstáculos depende-

rá de todo o conjunto de situações vivenciadas dentro da sala de aula e da estrutura escolar.

4.1 O ENSINO DA MATEMÁTICA NA ALFABETIZAÇÃO

A intencionalidade de ensino-aprendizagem da matemática na educação infantil

aponta para diversos caminhos que envolvem a agilidade de pensamento. As crianças já

fazem cálculos, mesmo antes de entrarem para a escola, contam pedrinhas, bolinhas de

gude, balas etc., quando estão jogando ou vivenciando situações de compra e venda.

Uma parte das atividades propostas de alguma maneira estão relacionadas com a

matemática. Entretanto, tais atividades estão sendo aplicadas de forma empiristas que le-

vam o aluno mecanicamente ao resultado sem que ele possa compreender a natureza das

ações matemáticas.

Não é necessário esperar pelo desenvolvimento do pensamento lógico-matemático

(desenvolvimento do cognitivo), pois se houver objetos externos instigantes sobre o qual a

criança possa pensar, o processo de construção do conhecimento se iniciará. O acesso ao

mundo dos números possibilitará a construção do conceito de número, da mesma forma em

que as letras propiciam a leitura e a escrita.

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Os números são, com as letras, formas de escrever. Representa enquanto símbolo

uma idéia, sendo que os números representam uma quantidade sem que o símbolo articule

pronúncia da palavra. Aprender a distinguir, a reconhecer e a escrever números, por ser

diferente de letras, é uma atividade enriquecedora da experiência escrita. Sendo assim,

deve-se trabalhá-los simultaneamente à alfabetização. No entanto, no trabalho com núme-

ros e a leitura e escrita, deve-se ter como o objetivo principal as operações mentais de clas-

sificação, de seriação, ordenação e de correspondência entre objetos.

O importante neste processo é que os alunos atinjam a conservação da quantidade

discreta, isto é, façam a síntese de classificações, seriações e correspondências que condu-

zem à associação de algarismo e quantidade de forma concreta .

4.2 O JOGO E A BRINCADEIRA: PONTE PARA A ALFABETIZAÇÃO

A brincadeira é a ação mais afetiva e globalizante realizada na vida da criança. O

jogo e a brincadeira tornam-se ponte para o mundo, para o contato social, para troca afeti-

va, para a atuação. A criança desenvolve a curiosa e importante noção de que “viver é

brincar”. A forma mais espontânea de pensamento é o brinquedo ou imaginação mágica,

que faz com que o desejável pareça possível de ser obtido. Até os sete anos ou oito anos, o

brinquedo predomina de forma tão absoluta o pensamento infantil, que se torna muito difí-

cil separar a invenção deliberada de fantasia que a criança acredita ser verdadeira.(

in:Vygostky, Pensamento e Linguagem, pg12)

O nível pré-silábico vence as barreiras com o teatro, a dança e a música. A expres-

são corporal ou jogos dramáticos, o faz-de-conta, o representar um personagem, oportuniza

à criança vivenciar a idéia de símbolo. São recursos poderosos, meios de comunicação e

vias ricas de captação e compreensão da realidade.

A linguagem da televisão (as imagens, seqüências, o sonoro, o escrito...) constitui–

se numa importante fonte de aprendizagem. Contudo, as coisas escritas que poderiam ser

fonte de reflexão para o desenvolvimento da alfabetização, seguem o mesmo ritmo veloz

de todo o texto televisivo. Enquanto imagem, pode-se explorar as atividades orais e de lei-

tura e escrita, desafiando a criança a uma participação ativa e crítica diante do que vê.

“Goodmam, mostra que as crianças desenham, escrevem e falam, indo e vindo entre varia-

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dos sistemas de símbolos” (Ana Marta Meira, “Televisão”, relatório da pesquisa do GE-

EMPA sobre alfabetização em classes populares, 1983).

As artes plásticas têm função relevante dentro do processo de alfabetização, porque

neste nível a criança não distingue texto ou palavra de imagem. É importante que a criança

possa manusear livros, revistas etc., em que o texto e imagem estão associados. Devem

centrar-se na prática regular do desenho e da pintura, oportunizando aos menos desenvol-

vidos, enriquecendo ao máximo as ofertas de material (tipos e tamanhos de papel, lápis de

cera, giz, carvão, hidrocor, tesoura etc), e estar atento às suas reações e manifestações.

Deve-se perguntar ou sugerir a troca ou permanência de um material, e pedir algumas ve-

zes que contem história do seu desenho.

O trabalho realizado pelos alunos deve de alguma forma vincular-se com atividades

familiares ou da comunidade, pois trata-se de uma tentativa de aproximar a leitura e a es-

crita de suas possibilidades de transformação da realidade.

A Educação Física disciplina o corpo, dá equilíbrio, força, resistência e velocidade.

Com funções corporais em forma, pode-se ter melhor desempenho cognitivo, apesar de

não haver uma relação de causa e efeito entre ambas. Mas alguns comportamentos, como a

compreensão de regras, estão ligados diretamente à aspectos cognitivos.

As atividades físicas, como as competições, levam a criança a ter que enfrentar a

perda e automaticamente a aceitar que uma hipótese não é válida, que é preciso abandoná-

la para criar uma nova; o que exige a superação da frustração.

A Educação Física reforça a auto-confiança, o que pode indiretamente vir em socor-

ro da alfabetização. E unindo a imaginação ao movimento poderemos concretizar a forma

mais primária e genuína de inteligência; movimento gera ação e ação gera desenvolvimento

do cognitivo.

Planejar é muito importante, a partir da caracterização da etapa de desenvolvimento

de cada aluno, a fim de propiciar seu progresso e a passagem para o próximo nível de a-

prendizagem. E o planejamento do dia-a-dia em sala de aula, pode ter a participação das

crianças, criando oportunidades de registros que podem ser acompanhados e avaliadas por

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elas, que podem participar de forma oral, com desenhos e/ou com suas escritas espontâ-

neas.

4.3 SUGESTÕES DE ATIVIDADES

O bingo de letras - O cartão pode ser o próprio nome do aluno. É importante que ao cantar

as letras, o professor mostre-as aos alunos.

O bingo de palavras – O cartão pode ter vários nomes (os dos colegas) e o professor canta

os nomes por inteiro.

O quebra-cabeça - Usar o nome dos alunos. Podem ser feitos somente com letra inicial ou

com numerais.

Baralhos - Formar pares de nomes ou de letras iniciais do nome, substantivos e imagens

etc. As regras para usá-los equivalem às convencionais para os jogos de memória ou mico-

preto.

Máquina - Concretização da idéia de transformação. Apresenta-se um desenho com má-

quina., explica-se como acontece numa máquina real (liquidificadores, geladeiras, máqui-

nas de costura ...). Pode-se usar na atividade de transformação:

a) Entra palavra e sai o número de letras desta.

b) Entra desenho e sai a palavra que o designa.

Tesouro - Pode-se fazer primeiramente o coletivo e depois o individual. Escrevem para os

alunos em fichas nomes de coisas, animais ou pessoas de que elas mais gostam. As fichas

com nomes e imagens podem ser usados em teclados de computadores para que os alunos

possam digitá-las (teclados que não são mais utilizados pelos usuários de computadores).

A pescaria - A pesca dos peixinhos com desenhos de objetos e a inicial do nome do nome

deste objeto enfatizam o som inicial das palavras. Colocar os peixinhos em uma geladeira

imaginária , na qual cada prateleira corresponde a uma letra do alfabeto.

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O jogo das tampinhas - Em um tabuleiro de madeira, papelão ou isopor encapado com pa-

pel colorido, colar figuras de coisas, animais, frutas etc., e em cada tampinha de refrigeran-

te colar na parte exterior a inicial do nome. Colar ao lado de cada figura um círculo de cor

diferente do tabuleiro para a colocação das tampinhas, fazendo assim a correspondência do

som inicial da palavra com a figura.

Supermercado - Usar caixinhas de leite (pode-se pintar ou encapá-las), cortá-las ao meio e

colocá-las na parede da sala de aula. Colocando acima de cada caixinha uma letra do alfa-

beto para assim dar impressão de prateleiras. Serão utilizados cartões com imagens de pro-

dutos dos encartes de supermercados. As crianças colocarão nas caixinhas os cartões cor-

respondentes às letras iniciais de cada produto.

Telefone - O uso de telefones na sala de aula, além de trabalhar a expressão oral da crian-

ça, trabalha os algarismo de 0 a 9 e a utilidade dos números .

O caracol - Pintar um caracol no chão (dê preferência ao pátio) e dividi-lo em partes e

numerá-las. Ensinar as crianças a pular os números como na amarelinha e a cada dois nú-

meros pulados deve-se cantar uma música ou rimá-los com palavras. Veja o exemplo:

Um, dois,

Feijão com arroz.

Três, quatro,

Tenho um pato.

Cinco, seis,

Pulo uma vez.

Sete, oito,

Como um biscoito.

Nove, dez,

Olho meus pés.

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Amarelinha - Com letras ou números. Pode-se cantar músicas como:

A de amor,

B de baixinho,

C de coração,

D de...

Dominó - Pode-se comprá-lo ou fabricá-lo com cartolina coladas em papelão e plastificar

com contact ou durex largo.

Pista de corrida - Desenhar números com curvas no chão utilizando durex colorido e colo-

car a divisão da pista com durex de cor amarelo (as faixas pontilhadas que encontramos

nas pista de auto-estradas). Podemos utilizar carrinhos e placas de trânsito.

Caixinhas de fósforo - Colar figuras na parte exterior e separar letras móveis formando

palavras.

Bandeja de isopor - Riscar a margem da bandeja e quadriculá-la. Dividir, dependendo do

tamanho da bandeja, em 7 colunas na horizontal e na vertical, vai depender da medida

que você utilizou na horizontal e do tamanho da bandeja que vai gerar a quantidade de

palavras a ser formada. Colar figura na 1ª coluna da esquerda e deixar as outras seis colu-

nas para a colocação das letras móveis.

Se quiser formar palavras com 4 letras, é só pintar ou colocar X nos quadrados

restantes, ou se preferir, deixar para que as crianças descubram na leitura das palavras que

têm letras sobrando.

Forca - O jogo é adivinhar a palavra pensada, indicando quantas letras tem a palavra, pro-

porcionando dicas como: é fruta, é nome de pessoa, objeto, animal etc. A criança diz uma

letra do alfabeto que vai completar os espaços no quadro-negro, e se errar o boneco vai

aparecer, por partes, para ser enforcado.

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CAPÍTULO V

EXPERIÊNCIAS DE EDUCADORES COMPROMETIDOS COM A EDUCAÇÃO

INFANTIL

5.1 RELATÓRIO I

A alfabetização sempre me atraiu pela magia, pela lógica das crianças, pelas descober-

tas e desafios.

Professora alfabetizadora desde de 1966, pude vivenciar , com meus alunos de zona

rural , o processo de alfabetização de crianças pelo método global com o pré-livro Os três

porquinhos,da grande mestra Lúcia Cassasanta, que era copiada por mim , com papel car-

bono para montagem dos livros dos alunos.

Não esqueço das reclamações dos pais e alunos quanto aos exercícios de coordenação

motora , indicados naquela época como um dos recursos para a criança se preparar para a

escrita, dentro de um período preparatório que durava pelo menos dois meses.

Os pais reclamavam porque para eles essas atividades gastavam , em vão , os cadernos

de seus filhos ; os alunos , por sua vez , achavam essas atividades cansativas, desinteres-

santes, por isso , não gostavam de fazê-las.

Vejam só: os pais e os alunos já percebiam a inutilidade dessas atividades!

Alguns pais mais esclarecidos , mandavam-me bilhetes dizendo que teria de ensinar aos

alunos que B+ A= BA . Indicavam, com isso, que era preciso trabalhar com a soletração .

Mesmo trabalhando com o método global, que vigorava na esfera educacional naquele

momento, consegui alfabetizar, em um ano, todos os alunos, o que nunca havia acontecido

naquela escola de zona rural até então. Graças a Deus , marquei positivamente a história

desses alunos e é isso que deve importar a qualquer educador.

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Fui durante muitos anos alfabetizadora e professora da 4ª série. Em 1976, formei-me

em Pedagogia e fui exercer a função de coordenadora de escola. De coordenadora passei a

diretora por 13 anos e mais tarde pude presenciar e vivenciar o Projeto Alfa da Secretaria

de Educação de Minas Gerais, que iniciava a alfabetização pelo som das letras conforme a

didática do método fônico.

Sempre procurei auxiliar os professores alfabetizadores, principalmente nas suas difi-

culdades, tentando descobrir com eles porquê alguns alunos não conseguiam se alfabetiza,

buscando as causas e as metodologias mais indicadas em cada caso.

Naquele tempo, os resultados dos diagnósticos feitos pelas escolas mineiras levaram a

Secretaria de Educação de Minas Gerais à institucionalizacão do ciclo básico de alfabeti-

zação , com o objetivo de aumentar o tempo para alfabetizar, tendo em vista a nossa clien-

tela escolar, em sua maioria proveniente de camadas sociais de baixa renda, desprovida

socioeconômica e culturalmente; o que, conseqüentemente , interferia no insucesso do

aluno no processo de alfabetização, devido à sua pouca ou nenhuma convivência com lá-

pis, papel , livros, revistas, jornais e outros materiais impressos . Criou-se então o Ciclo

Básico de Alfabetização, que atenderia a esses alunos em dois anos, sem retenção ou re-

provação no primeiro ano escolar.

A mudança que o Estado esperava não aconteceu com previam. A repetência foi masca-

rada , e os índices continuaram sendo alarmantes. A maioria das escolas mineiras optou

pela utilização do método silábico na alfabetização , e muitas continuam até hoje nessa

prática, fragmentando a língua Portuguesa em vogais , encontros vocálicos , sílabas sim-

ples e , por último, em sílabas de estrutura complexa (dígrafos e encontros consonantais).

Esse método didático não atingia a todos os alunos, pois dependia, para ter sucesso, da

maturação neurológica e cognitiva dos alunos para entender sílabas escritas e da leitura e

cultura de sua comunidade. Muitos alunos continuaram analfabetos por muitos anos, sub-

metidos à retenção, sendo levados à baixa auto-estima e ao estigma de alunos com proble-

mas de aprendizagem.

Já aposentada, em fevereiro de 1993, matriculei-me num curso de pós-graduação em

Psicopedagogia, e ao mesmo tempo trabalhando com reeducação pedagógica em consultó-

rio.

37

Alarmada com laudos psicológicos dos alunos, a inquietação tomou-me conta e queria

mais e mais auxiliar as escolas para que essas crianças aprendessem a ler, escrever e calcu-

lar. Enfrentando inúmeras barreiras administrativas, consegui convencer a diretoria da

DEC,hoje,DDAP (da 1ª Superintendência Regional de Ensino), na qual fui encarregada

de supervisionar as sete classes especiais da jurisdição, da necessidade de visitar escolas,

não para preencher relatórios, mas para diagnosticar os alunos ditos “especiais” e propor

projetos pedagógicos específicos para essas crianças. Assim, escolhi uma escola para fazer

o diagnóstico dos alunos da classe especial.

Nos primeiros diagnósticos que fiz com os alunos, ainda nos moldes dos testes projeti-

vos e outros , como desenho de família, HTP, testes de inteligência (Matrizes Progressivas

de Raven), testes de avaliação motora (Bender), descobri que era impossível um desempe-

nho satisfatório dessas crianças com história de fracasso escolar de quatro a seis anos de

escolaridade e , ainda, sem ao menos terem alcançado o estágio pré-silábico. Claro que os

resultados só poderiam mostrar que esses alunos eram deficientes cognitivos, imaturos ou

portadores de patologias que os impediam de aprender, pois não tinham alcançado ainda o

estágio cognitivo condizente.

Imediatamente, abandonei todos esses instrumentos de avaliação e passei a usar, nos

diagnósticos, entrevistas com os pais e os alunos, além do diagnóstico dos Níveis de Leitu-

ra e Escrita- tarefas de conceituação propostas por Emília Ferreiro (1979) e adaptadas por

Pimentel (1984). Então, pude conhecer em qual nível de escrita cada aluno estava, como

também pude perceber, nas entrevistas, que eles eram comunicativos, interessados e que

queriam ler e escrever de verdade.

Passei então a observar a prática pedagógica dos professores e suas relações com os

alunos em sala de aula, na classe especial e outras. Por Ter constatado que essas crianças

não estavam se desenvolvendo na alfabetização por questões, na maioria metodológicas,

iniciei um trabalho com as professoras em sessões de estudos semanais visando a instru-

mentação necessária para o diagnóstico pedagógico dos alunos e a devida intervenção para

que eles aprendessem o mais rápido possível . Nessas sessões de estudo , levava os conhe-

cimentos práticos e teóricos da teoria construtivista na alfabetização nas classes da terceira

e quarta séries, inclusive.

38

A cada sessão, surpresas e mais surpresas. As professoras faziam depoimentos fantásti-

cos sobre suas descobertas e os avanços que estavam conseguindo com os alunos.

Em junho de 1993 já estávamos remanejando alunos para classes de níveis mais avan-

çados. E os alunos que me foram apresentados, no início do trabalho , como os que não

aprendiam, começaram a mostrar a todos que, com outra prática pedagógica, eles aprendi-

am sim.

Tudo que venho fazendo, a partir desse ano, foi construído nessa escola, na qual acom-

panhei alunos e professores durante todo o ano. Aprendemos juntos a alfabetizar crianças

numa perspectiva construtivista!

Lourdes Eustáquio Pinto Ribeiro – Belo Horizonte-MG

(Psicopedagoga- Professora- consultora na Área Educacional- Capacitadora de Recursos

Humanos)

5.2 RELATÓRIO II

Retorno às séries iniciais do ensino fundamental depois de ter passado um longo perío-

do trabalhando com 5ª, 6ª e 7ª séries do ensino fundamental. Confesso que não foi uma

opção minha, mas me foi imposta uma oportunidade única, que a princípio soou como um

presente de grego.

O meu primeiro ano de retorno à alfabetização, 2001, foi como se um pesadelo rondas-

se os meus sonhos, uma vez que encontrei crianças já no 2º segmento da alfabetização, ou

seja na 1ª série , ainda no nível pré-silábico, com reflexos de uma convivência familiar

desestruturada, e de total desinteresse pela leitura e escrita. Mas, apesar das minhas incer-

tezas e descontentamento, fiquei indignada com a situação e procurei de todas as maneiras

tentar mudar aquela situação. Acredito ter feito um bom trabalho, conquistei alguns resul-

tados satisfatórios, mas não consegui revertê-la totalmente.

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No ano de 2002, me foi oferecida uma classe de alfabetização que abracei com muita

vontade de começar colocando o processo do jeito que eu sei fazer. As crianças se acostu-

mam com o jeito do professor e fica mais fácil para dar segmento ao processo de aprendi-

zagem.

Iniciei o ano letivo com trabalhos de artes, e ao mesmo tempo inseri as letras do alfabe-

to que logicamente iam de encontro com os nomes das crianças. Percebi que algumas cri-

anças já dominavam a escrita do nome e às vezes até outro nome de alguém da família,

enquanto outras nunca tiveram a oportunidade de sequer fazer um desenho. Logo a princí-

pio, já com a turma toda em sala, apareceu uma mãe com a filha que ainda não sabia a

turma em que ela estava matriculada, e neste instante verifiquei que ela pertencia a minha

lista. Pedi que a menina entrasse para conhecer os seus colegas de classe, e ela então , o-

lhou para mim e disse: “eu não vou entrar, porque ainda não sei escrever.”

A partir daquele instante eu percebi o medo que as crianças carregam para a escola,

pois levam consigo a responsabilidade de aprender a ler e a escrever. A insegurança é a

principal barreira que se coloca entre o ensino e a aprendizagem. Portanto, cabe aos educa-

dores conquistar primeiramente a confiança da criança. E assim, com um pouco de paciên-

cia fui conquistando as crianças e aos pais também.

Não usei nenhum método específico para a alfabetização das crianças, basicamente foi

uma história, uma música ou uma poesia que serviram de suporte para retirada de uma

palavra, ou de uma frase que fosse marcante para o grupo. Aproveitamos para estudar as

letras da escola (CIEP), da nossa turma (C) , da turma da Profª. Cláudia (D), e pintamos o

pátio com as letras para demarcar as filas; pintamos também o chão do pátio, na qual havia

um caracol desbotado e colocamos primeiramente números até 10.

Realizamos muitas atividades de recortes, colagem, e principalmente pinturas que eles

mais gostavam. Foi muito agradável e ao mesmo ajudou muito àquelas crianças que não

fizeram o pré-escolar e não obtiveram a oportunidade nem dentro da sua casa. Procurei,

também, estimular as atividades esportivas, mesmo a escola oferecendo este momento para

as crianças, achei que talvez fosse tão importante quanto praticar a leitura e escrita, uma

vez que as crianças interagem mais umas com as outras quando se sentem livres, a vonta-

40

de, sem a cobrança da sala de aula. Penso que acertei, na medida em que percebi o quanto

elas estavam mais participativas dentro da sala de aula e começaram a trocar suas vivên-

cias: novas brincadeiras, músicas, versinhos etc.

Não sei se posso considerar um mérito só meu, porque busquei sempre que tinha a

oportunidade da ajuda dos pais ou responsáveis, para a tarefa de ajudar as crianças. Não

gosto de passar atividades para casa, pois a família não está preparada para corresponder às

expectativas do professor, e assim, ao invés de ajudar acabam atrapalhando, mas procurei

orientar os pais que oferecessem aos seus filhos momentos em que eles livremente, pudes-

sem expressar a leitura e a escrita; momentos em os pais pudessem também demonstrar o

seu interesse pela aprendizagem do filho. Em alguns momentos, e com algumas crianças,

criei alguns jogos que eles pudessem jogar com a família.

Procurei, sempre que possível, levar para a sala de aula telefones com defeitos, celula-

res, teclados de computadores, máquinas de calcular com defeito, calculadoras velhas, tudo

o que eu considerasse que pudesse ser útil ao aprendizado das crianças.

Bem, penso que o resultado foi satisfatório, mas para isso acontecer foi preciso que

houvesse uma parceria contínua com a minha colega da outra turma. Foi este o momento

que eu considero mais importante dentro da minha caminhada na sala de aula, porque tro-

camos muitas informações, ao ponto de sermos capazes de fazer relatórios uma do aluno

da outra. Às vezes, ela me surpreendia com as informações que trazia a respeito de um

aluno, que tinha me passado despercebido.

O balanço final foi muito bom, diante de todas as dificuldades encontradas, e acredito

que naqueles momentos de aprendizagem dei o meu melhor; ou o que eu poderia dar. Te-

nho consciência que fiz um bom trabalho, acreditando que tive um amadurecimento profis-

sional durante este ano que passou e a certeza que vou buscar mais ainda, pois o tempo

torna as pessoas melhores e mais experientes.

Profª Nilcéia Pereira Miranda

CIEP Prof. Amaury Amaral dos Santos – Teresópolis

Graduação em Letras- FAFI –Além Paraíba MG

41

Cursando Pós-graduação em Educação Infantil e Especial. 2002/2003.

5.3 RELATÓRIO III

Sou professora-alfabetizadora do CIEP há seis anos, nos quais tive a oportunidade de

vivenciar as aplicações teóricas da Emília Ferreiro e outros estudiosos dentro dessa insti-

tuição. Nesse tempo como alfabetizadora busquei oportunizar crianças das classes popula-

res, as quais apresentavam dificuldades para serem alfabetizadas através dos métodos tra-

dicionais. Procurando desenvolver nessas crianças a motivação pelo ato de aprender, bus-

cando recursos pedagógicos que podem ser encontrados em livros de autores interessados a

desvendar e revelar como a criança aprende.

Ao longo do meu trabalho como alfabetizadora, venho acumulando novas experiências

que me deram maturidade profissional, e que vem me impulsionando a uma busca constan-

te de novas informações que podem e devem ser trocadas com as minhas colegas de traba-

lho.

Durante o ano letivo procuro observar o desenvolvimento de cada uma das crianças,

fazendo as anotações necessárias e aplico testes de níveis periódicos para avaliar o meu

trabalho e desempenho delas. Através desses testes posso direcionar o meu planejamento,

tornando o processo ensino-aprendizagem mais eficiente.

Acreditando na necessidade de revelar à criança a funcionalidade da língua, ofereço

aos meus alunos o máximo de contato com materiais escritos, permitindo que eles constru-

am o processo de ler e escrever dentro de seus próprios ritmos.

É muito importante construir na criança a autonomia, permitindo que ela seja agente do

seu próprio aprendizado. Portanto, fica evidente a necessidade do trabalho coletivo e diver-

sificado dentro da sala de aula para que as crianças troquem informações entre si.

42

O êxito de um trabalho que se revela bem sucedido, está no vínculo que escola cria

com a família e o seu grupo de profissionais, estabelecendo uma parceria de colaboração e

melhor entendimento das relações entre o que se está ensinando e para quem se está ensi-

nando.

Profª Cláudia Maia

CIEP Prof. Amaury Amaral dos Santos – Teresópolis

Cursando graduação em Educação Artística

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CONCLUSÃO

É notório as condições do ensino brasileiro, sobretudo ao que se refere à alfabetização

das crianças das camadas populares, e não podemos nos restringir apenas à formação de

professores e as condições do sistema escolar. Cabe a nós educadores direcionarmos o nos-

so olhar para as periferias e favelas, e perceber um mundo mais cinzento do que as classes

mais favorecidas tentam ignorar e criar condições pedagógicas para que essas modifica-

ções aconteçam.

Tentamos buscar muitas vezes respostas imediatas para os nossos problemas, ingenua-

mente procuramos soluções paliativas, as quais nos trazem uma harmonia aparente , porém

causam desencontros com os objetivos que almejamos. Surge a importância da conscienti-

zação dos nossos professores a favor de uma educação de qualidade para que o processo de

aprendizagem se desenvolva dentro do resgate da auto-estima do educando e valorizando

principalmente a postura de educador que cabe a todo aquele que abraça este propósito .

A proposta do grupo GEEMPA , vem se fortalecendo e ganhando campo pelo país, e

assim devemos acreditar que as nossas escolas superararão a problemática da alfabetização

com propostas pedagógicas construtivas que visam apoiar o corpo docente fortalecendo-o

e criando um vínculo entre ensino e aprendizagem.

E acreditando que o aprender não é exercitar o que foi proposto anteriormente e nem

repeti-lo como forma de decorar, mas um trabalho de construção contínua que testa resul-

tados sem medo de errar e que gera uma autonomia no educando, esperamos que este

trabalho seja fonte instrumentalizadora para ampliar as discussões sobre a prática alfabe-

tizadora e ao mesmo tempo influenciar àqueles que tem o desejo de realizar um trabalho

qualitativo que atenda às necessidades de cada escola e de cada aluno. Fica aqui depositado

todas as nossas esperanças de contribuir para diminuir a retenção e a repetência dentro das

escolas brasileiras, uma vez que primamos para que a educação possa refletir dentro de

nossa sociedade como veículo de ajuste social.

Esta pesquisa científica e de campo, é um trabalho dedicado ao enriquecimento da

nossa prática escolar , na qual esperamos contagiar outros educadores que vivem ou já

viveram a experiência de alfabetizar crianças que não foram estimuladas a aprender.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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