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UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA UNEB PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E ENSINO DE PÓS-GRADUAÇÃO PPG DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO DEDC/CAMPUS I PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO E CONTEMPORANEIDADE PPGedC A GESTÃO EDUCATIVA NA PERSPECTIVA GOVERNAMENTAL: UMA LEITURA ANTROPOLÓGICA PEDAGÓGICA RICARDO CASTAÑO GAVIRIA SALVADOR- BAHIA 2016

UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA UNEB PRÓ-REITORIA DE ... · FICHA CATALOGRÁFICA Sistema de Bibliotecas da UNEB ... 3.7.1 O conceito de organização ... impondo um modelo geral

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UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA UNEB

PR-REITORIA DE PESQUISA E ENSINO DE PS-GRADUAO PPG

DEPARTAMENTO DE EDUCAO DEDC/CAMPUS I

PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM EDUCAO E CONTEMPORANEIDADE

PPGedC

A GESTO EDUCATIVA NA PERSPECTIVA GOVERNAMENTAL: UMA LEITURA

ANTROPOLGICA PEDAGGICA

RICARDO CASTAO GAVIRIA

SALVADOR- BAHIA

2016

RICARDO ANTONIO CASTAO GAVIRIA

A GESTO EDUCATIVA NA PERSPECTIVA GOVERNAMENTAL: UMA LEITURA

ANTROPOLGICA PEDAGGICA

Tese apresentada ao Programa de Ps-Graduao em

Educao e Contemporaneidade da Universidade do Estado

da Bahia, no mbito da Linha de Pesquisa III Gesto e

Desenvolvimento Local Sustentvel, vinculado ao Grupo

Teoria social e projeto poltico pedaggico, como requisito

parcial para a obteno do ttulo de Doutor em Educao e

Contemporaneidade.

Orientador: Prof. Dr. Eduardo Jos Fernandes Nunes

SALVADOR- BAHIA

2016

FICHA CATALOGRFICA

Sistema de Bibliotecas da UNEB

Bibliotecria: Ivonilda Brito Silva Peixoto CRB: 5/626

Ricardo Castao Gaviria

C346 Castao Gaviria, Ricardo

A gesto educativa na perspectiva governamental: uma leitura

Antropolgica pedaggica / Ricardo Castao Gaviria. Salvador, 2016.

241f.

Orientador: Eduardo Jos Fernandes Nunes

Tese (Doutorado) Universidade do Estado da Bahia. Departamento

de Educao. Campus I. Programa de Ps-Graduao em Educao e

Contemporaneidade - PPGEDUC, 2016.

Contm referncias

1. Antropologia educacional. 2. Ensino superior. 3. Gesto. I. Nunes, Eduardo Jos Fernandes. II. Universidade do Estado da

Bahia. Departamento de Educao. Campus I.

II.

CDD: 306.43

Dedicatria.

A mi madre doa Oli y a mi abuela quienes siempre me han llenado de

fuerza y coraje para seguir adelante Mi abuela de su mano me llevaba

a mi primera escuela y nos haca gorritos de papel peridico.

AGRADECIMENTOS

Ao professor Eliseu Clementino que sem me conhecer acreditou em mim e na importncia de ter

estrangeiros no programa de doutoramento da PPGedC

Agradeo ao professor Eduardo Jos Fernandes Nunes, meu orientador, que depositou em mim

segurana e confiana para que meu processo fosse de mltiplas aprendizagens aqui no Brasil e

tivesse mais sentido.

Ao professor Antnio Dias quem me deu o primeiro abrao naquela manha que tmido entrei na

sala de aula pela primeira vez.

Ao professor Jaume Martinez Bonaf a quem conheci em Valencia-Espanha durante o perodo de

meu doutorado sanduche. Agradeo sua amizade e o fato de me inspirar novos olhares sobre o

meu problema de pesquisa e a Educao nestes tempos.

Coordenao de Aperfeioamento do Pessoal de Ensino Superior (CAPES) pelo financiamento

da pesquisa, atravs da bolsa de doutoramento.

Ao meu amigo e professor da Colmbia, Andrs Klaus Runge, quem me acercou ao campo da

reflexo antropolgico pedaggica.

Ao meu amigo e colega Rodrigo Mattos, um cara sado da literatura e com que travei uma

amizade que acredito que ser por muitos anos.

A todos os colegas e professores da minha turma de doutorado por me aceitar e respeitar

A Minha colega e grande amiga Eunice Rosa por me ajudar e me cuidar tanto...

A minha amiga Laurinda Julio e sua famlia por ser a primeira famlia minha no territrio

Brasileiro

A Tuka por um dia me dar o seu sorriso como uma bno

A Todos aqueles com quem me topei l nas ruas do bairro de Brotas, com eles aprendi o

significado e as contradies de ser e no ser um Baiano

A minha famlia e amigos na Colmbia, por vocs foi possvel tudo isto...

SUMRIO

RESUMO

RESUMEN

ABSTRACT

INTRODUO...............................................................................................................16

PRIMEIRA PARTE: CONTEXTO TERICO: FUNDAMENTOS CONCEPTUAIS E

REFLEXO ANTROPOLGICA PREDAGGICA.............................................................24

CAPTULO I: TRAJETRIAS GOVERNAMENTAIS, LIBERALISMO E

NEOLIBERALISMO NA PERSPECTIVA DE UMA ANTROPOLOGIA

PEDAGGICA....................................................................................................................25

1.1 Um ponto de partida: O pensamento antropolgico pedaggico...................................31

1.1.1 O antropolgico no governamental................................................................35

1.2.Noes e imagens de homem: Trajetrias do Liberalismo ao Neoliberalismo.................42

1.2.1 Ideias na concepo antropolgica liberal.......................................................51

1.2.2 A concepo de homem de valer: Uma imagem de homem na antropologia

industrial de incios sculo XX...............................................................................58

1.3.Trajetrias governamentais e Educao........................................................................63

1.3.1 Uma antropologia neoliberal e o discurso da Gesto como governamentalidade

contempornea......................................................................................................71

1.3.2 O paradigma da Gesto e a Cultura Escolar....................................................75

CAPTULO II: FORMAO, SUBJETIVIDADE E SENTIDO DE VIDA: ANALTICA

EXISTENCIAL...............................................................................................................86

2.1. Um ponto de referncia: humanizao e formao como processo scio antropolgico e

histrico..........................................................................................................................88

2.1.1 A formao e a pergunta pelo Ser..................................................................90

2.2. Perguntar-se pelo Ser na sociedade ps-fordista...........................................................94

2.2.1 Sujeito afirmativo na retrica do xito............................................................101

2.3.Sujeitos interinos e itinerantes: a incerteza instalada como experincia de

formao........................................................................................................................105

2.4.Identidade, sentido de vida e auto emancipao.........................................................109

2.4.1. Identidade profissional do sujeito contemporneo........................................113

2.4.2. Perguntar-nos como atitude de uma pedagogia crtica..................................116

SEGUNDA PARTE: CONTEXTO EMPRICO DA INVESTIGAO: DESCRIO

METODOLGICA. A GESTO EDUCATIVA EM CONTEXTO

UNIVERSITRIO..........................................................................................................121

CAPTULO III: GESTO EDUCATIVA E GOVERNAMENTALIDADE: O PROGRAMA DE

REGIONALIZAO DA UNIVERSIDADE DE ANTIOQUIA NA SEDE DE

URAB........................................................................................................................122

3.1. Estratgias metodolgicas: manejo documental e trabalho de campo. A Universidade de

Antioquia e a sede de Urab...........................................................................................123

3.2. Categorias de anlises numa analtica existencial do campo educativo.......................127

3.3. Contextualizao e alcances.....................................................................................130

3.4. Outras questes importantes do enfoque...................................................................133

3.5.Resenha Histrica do Programa de Regionalizao da Universidade de Antioquia. A sede de

Urab, um olhar Gesto educativa................................................................................137

3.5.1. O contexto sub-regional.............................................................................142

3.5.2. O Plano de Ao da Universidade de Antioquia. Relao com o modelo

governamental da educao.................................................................................145

3.6. Imagens de Organizao. O projeto universitrio de Regionalizao, contexto desde a sede

de Urab........................................................................................................................147

3.7. Mudanas antropolgicas da cultura organizacional..................................................167

3.7.1 O conceito de organizao educativa universitria, campo da Gesto educativa:

transformaes em contexto ................................................................................170

3.8. A faculdade de Educao da Universidade de Antioquia e sua participao na estratgia de

Regionalizao...............................................................................................................172

3.8.1 Acertos e desacertos: A gesto do programa de Mestrado em Educao para as sub-

regies.................................................................................................................176

CAPTULO IV: A FORMAO DA IDENTIDADE PROFISSIONAL DOCENTE NA

GESTO EDUCATIVA UNIVERSITRIA. UMA PERSPECTIVA BIOGRFICA

NARRATIVA..................................................................................................................183

4.1. Busca e construo de uma identidade profissional do docente universitrio..............185

4.2. Identidade profissional: ensinar e aprender desde um contexto.................................187

4.3. Imagens e prticas pedaggicas do professor itinerante nas sub-regies......................190

4.4. O professor no projeto da Regionalizao da Universidade de Antioquia: Trajetria

pessoal...........................................................................................................................192

CAPTULO V: O PAPEL DA UNIVERSIDADE PBLICA: MODELO DE GESTO E

PRTICAS DE FORMAO EM CONTEXTO..............................................................206

5.1.Introduo...............................................................................................................206

5.2. A universidade descentralizada: Desafios de Formao e Educao............................209

5.3. Projeto universitrio regionalizado. Imagens de sujeito e identidade do

professor........................................................................................................................211

5.3.1. Sobre os eixos missionais: Docncia, Pesquisa e Extenso............................215

5.4. Uma proposta de gesto educativa desde as caractersticas do contexto......................219

5.4.1. A pesquisa como parte fundamental da Gesto da educao

universitria.........................................................................................................223

5.5. Horizontes de possibilidades.....................................................................................227

REFERNCIAS.............................................................................................................232

RESUMO

A GESTO EDUCATIVA NA PERSPECTIVA GOVERNAMENTAL: UMA

LEITURA ANTROPOLOGICO PEDAGGICA

A tese intitulada, Gesto educativa na perspectiva governamental: Uma leitura antropolgica e

pedaggica um estudo que tem o propsito de apresentar uma aproximao terica e emprica

ao processo e trajetrias que levaram ao discurso da gesto a consolidarse no campo educativo.

O estudo apresenta as trajetrias de modelao e controle da formao do sujeito moderno em

chave antropolgica e pedaggica, isto , enxergando nas mudanas do modelo liberal e

neoliberal as variaes na concepo e nas prticas de formao [bildung] dos sujeitos e como

desde l se constitui um paradigma de governo nas instituies de educao superior. A

universidade pblica aparece como um dos espaos sociais onde se consolidam todas essas

mudanas na contemporaneidade, sobre seus processos administrativos e curriculares acabase

impondo um modelo geral de educao para que ela mude seu carter e estratgia e seja colocada

no patamar da qualidade e a avaliao permanente, homologando desta forma as estruturas e

funes da corporao empresarial, este procedimento discursivo e de novas prticas constitui

para ns o fundamento crtico de nossa tese, a gesto educativa como uma forma governamental

contempornea que se bem afastando da reflexo pedaggica e da funo social da educao.

Estas questes que so abordadas na primeira parte do texto em perspectiva terica, logo

tomaram a forma de crtica imanente, pois so levadas como pergunta no contexto do programa

de Regionalizao da Universidade de Antioquia, Colmbia; nesse contexto se estudou o

processo de reorganizao da Universidade, suas formas de gesto e suas dificuldades,

colocando o aparato conceitual a trabalhar na anlise. Achamos que o processo da

Regionalizao se mostra consistente como uma estratgia de reorganizao territorial, que o

papel da Universidade nas regies no consiste s em levar oferta educativa, mas tambm em ser

um ator poltico importante e um vetor governamental e de desenvolvimento. A perspectiva da

investigao narrativa das trajetrias dos professores nos ajuda a compreender os efeitos e

complexidades dessas mudanas no plano da formao da identidade profissional docente, eixo

que constata o carter antropolgico pedaggico da transformao governamental contempornea

na dimenso educativa mais tambm das possibilidades de reinterpretao e apropriao

conceitual necessrias.

Palavras-chave: Governamentalidade, Gestao, Formao, Antropologia pedagogica, Educao

superior.

ABSTRACT

EDUCATION MANAGEMENT FROM A GOVERNMENTAL PERSPECTIVE: A

TEACHING READING ANTHOPOLOGICAL

This study aims to present a theoretical and empirical approximation to the process and trajectory

that led the management discourse to strengthen the educational field. This study presents the

trajectory of molding and control forming the modern subject in educational anthropologial

terms, that is, observing the changes of the liberal and neoliberal model variations in the creation

and practice of forming [bildung] subjects and how, from there, a government paradigms

constituted in Higher Education Institutions. The public university appears as one of the social

spaces where the exchanges are currently consolidated; a general model of education is finally

imposed in the administrative and curricular processes for the university to change its strategy

and be placed at quality levels and undergo continuous assessment, standardizing the structures

and functions of the corporate enterprise. This discourse as procedures and new practices become

the critical basis of our thesis, educational management as a contemporary government way

which has been set aside from the pedagogical reflection and the social role of education. These

issues are addressed in the first part of the text from a theoretical perspective, then, they take an

imminent criticism, then they are contextually posed as questions in the Regionalization Program

at the University of Antioquia, Colombia; and within this context, we study the reorganization of

the University, its management methods and difficulties, placing the conceptual apparatus into

analysis. We found that the process of regionalization reveals a strategy of territorial

reorganization. The role of the University in the regions is not only to deliver education, but it is

also an important political actor and a government and development segment. The perspective of

narrative investigation, in the trajectory of the teachers, help us have a better understanding of the

effects and complexity of these changes in the training level of educators and their professional

identity; which confirms the anthropological and pedagogical character of the contemporary

transformation of the government in the educational dimension, also the possibilities of

reinterpretation and a need for conceptual appropriation.

Keywords: Governability, Management, Education, Pedagogical Anthropology, Higher

Education

RESUMEN

LA GESTIN EDUCATIVA DESDE UNA PERSPECTIVA GUBERNAMENTAL: UNA

LECTURA ANTROPOLGICO PEDAGGICA

La tesis titulada Gestin educativa desde una perspectiva gubernamental: Una lectura

antropolgico pedaggica es un estudio que tiene el propsito de presentar una aproximacin

terica y emprica al proceso y trayectorias que llevaron al discurso de la gestin a consolidarse

en el campo educativo. El estudio presenta las trayectorias de modelacin y control de la

formacin del sujeto moderno en clave antropolgico pedaggica, esto es, observando en los

cambios del modelo liberal y neoliberal las variaciones en la concepcin y en las prcticas de la

formacin [bildung]de los sujetos y cmo desde all se constituye un paradigma de gobierno para

las instituciones de educacin superior. La Universidad pblica aparece como uno de los espacios

sociales donde se consolidan todos esos cambios en la contemporaneidad; sobre sus procesos

administrativos y curriculares se acaba imponiendo un modelo general de educacin para que la

universidad cambie su estrategia y sea colocada al nivel de la calidad y la evaluacin permanente,

homologando las estructuras y funciones de la corporacin empresarial, este procedimiento

discursivo y de nuevas prcticas constituye para nosotros el fundamento critico de nuestra tesis,

la gestin educativa como forma gubernamental contempornea, la cual se viene apartando de la

reflexin pedaggica y de la funcin social de la educacin. Estas cuestiones que son abordadas

en la primera parte del texto en perspectiva terica, luego toman la forma de crtica inmanente,

pues son llevadas como preguntas al contexto del programa de Regionalizacin de la Universidad

de Antioquia, Colombia; en este contexto se estudio el proceso de reorganizacin de la

Universidad, sus formas de gestin y dificultades, colocando el aparato conceptual en anlisis.

Encontramos que el proceso de Regionalizacin se muestra como una estrategia de

reorganizacin territorial, que el papel de la Universidad en las regiones no consiste solamente en

llevar oferta educativa, tambin es un actor poltico importante y un vector de gobierno y de

desarrollo. La perspectiva de investigacin narrativa en las trayectorias de los profesores nos

ayuda a comprender mejor los efectos y complejidades de estos cambios en el plano de la

formacin de la identidad profesional docente, lo cual constata el carcter antropolgico y

pedaggico de la transformacin gubernamental contempornea en la dimensin educativa, ms

tambin de las posibilidades de reinterpretacin y apropiacin conceptual necesaria.

Palabras claves:Gubernamentalidad, Gestin, Formacin, Antropologa pedaggica, Educacin

superior.

INTRODUO

A GESTO EDUCATIVA NA PERSPECTIVA GOVERNAMENTAL: UMA LEITURA

ANTROPOLGICA PEDAGGICA

O trabalho, A gesto educativa desde uma perspectiva governamental: uma leitura

antropolgica pedaggica um estudo que tem o propsito de explorar terica e empiricamente

as trajetrias, discursos e prticas que consolidaram a Gesto como uma formula governamental

contempornea e seus efeitos no contexto da instituio educativa universitria. Poderamos

Para este propsito se indaga na perspectiva da pergunta pela formao (bildung) a

maneira como foi se consolidando um projeto e imagem de homem (Sujeito) nas trajetrias do

Liberalismo ao Neoliberalismo, aprofundando nos efeitos desta lgica antropolgica na

construo do sentido de vida do sujeito contemporneo, como uma forma de governo,

autocontrole. Na segunda parte deste trabalho, estas reflexes so levadas ao plano da

investigao emprica, para reconhecer num contexto pontual (Universidade de Antioquia,

Medelln, Colmbia) como se traduzem estes processos gerais nas dinmicas de Gesto educativa

do projeto de Regionalizao da Educao Superior.

Devemos mencionar que o conceito de formao (bildung) em sua tradio alem chega a

este trabalho a partir das leituras, tradues, reflexes e conversas, com o professor Dr. Andrs

Klaus Runge, coordenador do grupo de investigao Antropologia pedaggica e histrica

(Formaph) da Universidade de Antioquia e complementada desde outras leituras e referncias

conceptuais no campo antropolgico pedaggico. Inserimo-nos nessa perspectiva para dar-lhe um

sentido crtico e alternativo anlise do modelo de gesto educativa contempornea colocando-o

como um problema antropolgico pedaggico, como um problema de formao de sujeitos que

est em estreita relao com as formas como hoje se fundamenta a subjetividade, o controle e se

dirige a ao governamental na educao.

Mediante o estudo do conceito de formao em seu sentido crtico, vinculamos com maior

clareza o problema de Governar com o de Educar. No possvel pensar um projeto educativo

margem de um projeto de homem e de sociedade (Freire), o que sinaliza a anlise governamental

como aqui o tentou colocar, so as explicitas e implcitas formas de controle e prescrio

antropolgica pedaggica (formativas) que regulam a produo da subjetividade e a cultura

contempornea.

Como emerge e se desenvolve nossa pergunta?

Alguns anos e depois de atuar como professor de Fundamentos do pensamento

administrativo eu comecei a interrogar-me pela origem do discurso e as prticas da Gesto, sua

emergncia e vigor no campo educativo, seus antecedentes e efeitos no plano pedaggico. A

dvida de que este no poderia ser um discurso natural, como foi apresentada, uma soluo

prtica a todos os problemas das organizaes e um discurso prprio da evoluo nas tendncias

administrativas contemporneas, esconde de fundo todo um projeto formativo de redefinio

comportamental realizado desde a educao.

Ao chegar ao doutorado em Educao e contemporaneidade da Universidade do Estado

de Bahia (Brasil) a seu a linha de pesquisa em Gesto e desenvolvimento local sustentvel, estas

inquietudes foram tomando a forma de projeto de tese doutoral. Reunindo trajetrias da formao

pessoal como professor universitrio nas reas de gesto educativa e cultura escolar e apelando

ao estudo das questes de formao de sujeitos, chegamos a formular a tese de que a Gesto

educativa funciona como um dispositivo de governo contemporneo desde o qual indispensvel

promover o projeto formativo da atual sociedade posfordista.

O leitor vai encontrar-se com um trabalho que tem um carter terico e emprico, pois se

propem por um lado: tericas reflexes resultadas de leituras e revises conceptuais que no s

descansa em questes claramente educativas e pedaggicas, mas tambm em interpretaes

sociolgicas, antropolgicas, filosficas e histricas, que impedem traar uma nica tradio

epistemolgica, autor ou escola de pensamento em cincias sociais, como a fonte explicativa da

teoria que utilizamos para abordar o problema; no entanto, sim podemos dizer que em termos

tericos este trabalho uma tentativa por pensar em chave antropolgica e pedaggica, um

discurso com fundamentos marcadamente governamentais, a Gesto educativa.

Referindo ao contexto emprico da investigao, o trabalho aborda o estudo de um

contexto educativo pontual, a Universidade de Antioquia em seu processo denominado

Regionalizao, para colocar em contexto a reflexo contextual do problema assinalado: A

relao da Gesto educativa com formula governamental e uma perspectiva de anlise desde o

antropolgico pedaggico. Em razo deste objetivo no desenvolvimento da investigao se fez

necessrio identificar um contexto territorial especfico para pensar as questes abordadas desde

seus aspectos relativos e desde a construo de uns atores pontuais.

As mudanas na poltica em Educao Superior pblica em Amrica latina poderiam

considerar-se o fundo das transformaes do modelo, tendo em conta seu desenvolvimento

regular na regio, veremos como as formas sugeridas para a Gesto educativa desde a poltica

pblica em educao, vo tomando forma no projeto da Regionalizao da Universidade de

Antioquia, um processo de redesenho organizativo e institucional com muitos desafios.

importante alertar ao leitor, pois antes de chegar anlise contextualizada, poder

percorrer dos captulos que do para este trabalho, a estrutura conceptual para compreender a

Gesto como o resultado das trajetrias governamentais (liberalismos-neoliberalismo) e dentro

desse processo o problema da formao para situar-nos no campo da Educao.

Propsitos do texto e estrutura dos captulos

Em termos gerais esta tese procura articular perspectivas conceptuais e tericas retomados

das cincias sociais numa orientao fundamentalmente crtica, repensar o discurso e as prticas

da Gesto no campo educativo, entendendo este movimento como um processo complexo de

governo e formao de sujeitos. Para este propsito se faz necessrio reconstruir as trajetrias de

formao que nos permitam compreender a ordem social, poltico e cultural que definem o

projeto do capitalismo industrial e ps-industrial. Entender em perspectiva antropolgica e

pedaggica o processo atual de governamentalidade e o lugar que ocupa a Educao; se nos faz

fundamental para esta tese um contexto concreto onde se vivem estas mudanas, sendo nosso

interesse particular repensar e colocar em discusso esses processos de mudana.

A escritura desde texto oscila entre o ensaio terico e o relatrio de trabalho de campo,

revises conceptuais nas cincias sociais (primeira parte do texto), tambm se articula escritura,

fragmentos de entrevistas realizadas a professores e professoras junto narrativa da prpria

trajetria de formao como professor do programa de Regionalizao (segunda parte). O

capitulo de encerramento, capitulo cinco, deixa sentada as bases para um roteiro alternativo da

gesto educativa universitria y continuar o debate.

Descrio dos captulos

Este trabalho esta dividido em duas partes assim: parte um, Contexto terico:

fundamentos conceptuais e reflexo antropolgica pedaggica.

E parte dois: Contexto emprico da investigao: descrio metodolgica e a gesto

educativa em contexto universitrio

No captulo um deste trabalho: Trajetrias governamentais, liberalismo e neoliberalismo

na perspectiva de uma antropologia pedaggica, o leitor poder encontrar a fundamentao do

conceito de governamentalidade apresentado desde uma anlise social e histrica com respeito

formao do ideal de homem e de cultura moderna. Este captulo contm chaves antropolgicas e

pedaggicas para compreender como se define o projeto educativo da sociedade liberal que

continuando com seus desenvolvimentos e transformaes ao longo do sculo XX, vai se

ajustando s mudanas do projeto poltico e social a partir do que chamaremos uma antropologia

neoliberal.

O captulo dois: Formao, subjetividade e sentido de vida: uma analtica existencial

explora a dimenso subjetiva da mudana antropolgica pedaggica associada ao panorama

governamental contemporneo. Perguntamo-nos pela atualizao da pergunta existencial e o

sentido de vida no meio das atuais formas de controle e governo, regulamentaes que no so s

externas, tambm operam de forma interna e scio emocional. Este captulo serve de base para

pensar as encruzilhadas que se encontram nos processos individuais e de grupo com respeito

formao da identidade. Desde este apartado deixam-se bases filosficas para repensar as

questes da identidade profissional no campo da educao superior.

Captulo trs: Gesto educativa e governamentalidade: o programa de regionalizao da

universidade de Antioquia na sede de Urab prope-se como transio e ponte, entre uma

abordagem terica da temtica e o desenvolvimento emprico deste estudo, o leitor poder

encontrar a contextualizao da pergunta pela gesto educativa as perspectivas metodolgicas e

tcnicas de trabalho que orientaram o processo de pesquisa num marco de referncia social

especfico. Toma-se a Universidade de Antioquia e seu processo de Regionalizao como um

exemplo de um processo de Gesto educativa universitria, este um captulo que explora e

combina estratgias metodolgicas desde um enfoque qualitativo compreensivo, se faz aqui

relevante a construo do conhecimento desde uma relao indutivodedutiva onde o proposta

em termos tericos nos primeiros captulos, se contrasta e se contextualiza numa instituio

educativa real e desde as vozes de seus atores.

O captulo quatro: A formao da identidade profissional docente na gesto educativa

universitria. Uma perspectiva biogrfica narrativa trabalha desde a perspectiva narrativa o tema

da formao da identidade profissional do maestro n o marco da experincia da Regionalizao

universitria. Pergunta-se pela experincia dos docentes em chave pedaggica, tratando de

mostrar como a complexidade da itinerancia e outras caractersticas prprias do exerccio

profissional, do encontro com outros contextos geogrficos y culturais constituem para os

professores um campo de referncia e ressignificao de suas prticas de identidade profissional.

Trabalha-se a partir da voz dos protagonistas destas mudanas numa aproximao biogrfica

narrativa que permitiu colocar a experincia como um elemento constitutivo da formao da

subjetividade e saberes vlidos para repensar o pedaggico. A investigao narrativa na

perspectiva de uma hermenutica de si (Clementino, 2015) constitui a forma metodolgica como

procedemos neste captulo, onde o Sujeito neste caso o professor, se coloca como o autor na

constituio de si mesmo.

Tambm apelamos autobiografia e a tematizao de si (Ricoeur, 1996) como forma por

mdio da qual o autor desta tese, coloca em reflexo sua prpria trajetria e experincia

formativa como professor universitrio em contextos sub-regionais reconhecendo que o ato da

escritura e a coleta dessa memria tambm constituem parte fundamental da elaborao da

identidade profissional.

A reflexo territorial, cultural e scio-poltica que emerge destas narrativas, coloca visvel

o papel da Educao Superior como agente governamental, mas tambm nos permite analisar

como as mudanas nos modelos e estratgias de poltica educativa, modificam os docentes e

constituem parte de sua dimenso existencial e profissional de vrias formas precrias. Em

sntese, este captulo tenta construir um fundamento antropolgico pedaggico, assim que se

interroga pelo processo de formao do sujeito docente, colocando-o como um ator para

compreender a lgica que se vem instaurando.

O captulo cinco: Modelo de gesto educativa e prticas de formao em contexto: O

papel da Universidade pblica fecha este trabalho com a inteno de colocar concluses e novos

pontos de partida, mas, sobretudo, colocar na discusso alguns elementos que consideramos

vlidos para pensar numa rota crtica para a Gesto da organizao educativa universitria, no se

trata como explicaremos ali, de negar a necessidade da gesto nas organizaes educativas

contemporneas, a alternativa voltar a pens-las desde o perfil antropolgico e pedaggico,

desde a inter subjetividade e a cultura, desde a acumulao de saberes e desde os processos de

formao de seus atores, tambm de destacar a necessidade de um projeto poltico pedaggico

crtico e de formas relevantes de consegui-lo em cada contexto.

Estes captulos constituem em conjunto um exerccio terico e prtico que tenta mostrar

como a Gesto educativa universitria no deve ser tratada s como um discurso e prtica geral

(corporativa), em alternativa deveriam ser adaptados s diferentes condies da cada instituio

educativa. A Universidade de Antioquia como universidade pblica de reconhecida trajetria no

pode ser alheia de seu processo e funo poltica, a pensar a maneira como funciona em cada

contexto a Educao. Com as mudanas do processo da Regionalizao universitria elaboram-se

no s novas idias e prticas do territrio, tambm aparecem novas prticas scias, culturais e

econmicas, que devem contar nas condies especficas de formao dos sujeitos, seus saberes e

histrias.

Este trabalho pretende constituir-se numa reflexo terica de aplicao prtica, com

respeito s realidades da gesto educativa hoje como discurso e prtica geral, mas tambm como

oportunidade para repensar o que fazer e o papel da Universidade pblica em nosso contexto de

desenvolvimento local e global.

Notas metodolgicas

Abordar um contexto terico e um contexto emprico para nossa pergunta dando-lhe

forma metodolgica a esta investigao, fundamentalmente um exerccio de explorao

qualitativa (Vlez, O; E Galeano, E. 2002) Se tenta compreender como se desenvolve um

problema desde sua matriz epistemolgica e prtica. Nossos propsitos movem-se nestas duas

dimenses, revisando o referencial terico desde as cincias sociais contemporneas, a pedagogia

e a educao, para interpretar a evoluo do discurso da gesto e sua chegada ao campo educativo

universitrio.

A perspectiva terica da antropologia pedaggica e sua pergunta pela formao cobrem

em boa medida estas intenes, mas se conjugam tambm abordagens sociolgicas crticos para

dar uma melhor explicao do processo social e histrico levado a cabo. No partimos de um

objeto de estudo totalmente ntido, todo o contrrio, este se foi perfilando e ganhando clareza na

medida em que a investigao se desenvolvia; este carter de emergncia (SANDIN, 2003), de

assimilao de novos elementos importantssimo para compreender nossa forma de construo

metodolgica. O desenho de uma investigao qualitativa exige que o pesquisador se posicione e

adote uma srie de decises no s durante a elaborao do projeto de investigao e ao incio do

processo investigador, mas tambm durante e ao finalizar o estudo (SANDIN, 2003, pg.138-

139).1

Alertamos ao leitor para no esperar um desenho metodolgico puro e rgido que

oriente esta tese de maneira definitiva, este um trabalho de carter emergente, como j se

mencionava, onde se combina as tcnicas da reviso documentria o trabalho de carter

etnogrfico num contexto especfico. Tambm se trabalho com entrevistas semi-estruturadas num

1 Traduo nossa do texto original. Todas as citaes neste texto originais da lngua espanhola so traduzidas pelo

autor desta tese.

enfoque de investigao narrativa, para mostrar uma aproximao ao contexto universitrio

assinalado, aos sujeitos atores e em general ao processo de mudana organizativa.

Metodologicamente a combinao do terico e o emprico levam-nos a reposicionar

nossos pontos de vista e tentar realizar uma apropriao crtica da temtica escolhida.

Exploramos os conceitos de imagem de homem, de formao, de gesto, de governamentalidade,

de organizao educativa, experincia e trajetria de vida e identidade profissional docente,

tentando construir uma rede analtica e interpretativa para o problema que propomos. O trabalho

de campo que marcou a segunda etapa do estudo lhe aposta a uma localizao direta do cenrio

educativo, ns apoiamos para essa explorao mais subjetiva nas formas da investigao

narrativa, tomando como referncias s experincias de professores, professoras e diretores que

se viram envolvidas com os processos de gesto e suas mudanas dentro do contexto do projeto

de Regionalizao da seccional de Urab da Universidade de Antioquia.

Os documentos narrativos foram recolhidos diretamente em campo num processo de

entrevistas a um grupo de dez professores e trs diretivos na seccional e na sede central

(Medelln), procuramos contrastar pontos de vista de conversa com respeito s dinmicas

acadmicas, organizativas e culturais da seccional, que nos permitissem identificar novas agendas

de conversa. Tambm se elaborou a estratgia de tematizao de si como uma maneira de incluir

a prpria narrativa como uma fonte de referncia vlida, como uma maneira de aproximar o

biogrfico narrativo anlise social (ROBERTI, 2012); estes exerccios de hermenutica de sim

constituem um valor importante para contrastar a investigao educativa e pedaggica e seus

fundamentos epistmicos em torno do problema da gesto no campo educativo.

PRIMERA PARTE

CONTEXTO TERICO: FUNDAMENTOS CONCEPTUAIS E REFLEXO

ANTROPOLGICA PEDAGGICA.

CAPTULO 1

TRAJETRIAS GOVERNAMENTAIS, LIBERALISMO E NEOLIBERALISMO

NA PERSPECTIVA DE UMA ANTROPLOGIA PEDAGGICA.

Como se governar, como ser governado, como governar aos demais, por quem se deve aceitar ser

governado, que fazer para ser o melhor governante possvel. (Foucault, 1989) 2

Este captulo expe a discusso central deste estudo, constitui-se como seu referente

terico-conceptual e tem como objetivo fundamental, traar uma trajetria social histrica e

antropolgica pedaggica, que nos permita compreender: Como vai mudando o projeto de

formao dos sujeitos e os sistemas de controle com o desenvolvimento do capitalismo dos

sculos XX-XXI? Como se vo gerando prticas e discursos no campo educativo que funcionam

como sistemas de produo de subjetividade e cultura? Esses processos de formao (bildung)

em sentido crtico propem-se em termos de trajetrias que vo desde uma antropologia liberal

ilustrada, para uma antropologia neoliberal, modelaes antropolgicas que produzem imagens

de homem3 e efeitos em seu plano governamental.

Exploramos os processos formativos e discursos educativos constituintes de subjetividade,

as formas de governo em suas concepes antropolgicas de ser humano, unidas a umas

imagens4 despregadas com as propostas de regulao e controle da populao

governamentalidade (Foucault) que se veem expressadas na transio de um contexto histrico

2 Traduo nossa do texto original. Todas as tradues originais da lngua espanhola so nossas.

3 Durante o texto utilizaremos a expresso imagens de homem num sentido amplo e em perspectiva antropolgico

pedaggica, sem estender-nos especificamente ao debate de gnero, outro ponto importante. Reconhecemos primeiramente que tanto o ideal feminino como o masculino, se encontra diferencialmente codificados a partir das mudanas que aqui analisaremos. Em sntese referimo-nos condio de emergncia do Sujeito moderno regulado pela produo de uns referentes antropolgicos e modelos idealizados e no especificamente ao problema contemporneo sobre governamentalidade e gnero. 4 Entenderemos aqui por imagens s projees e as representaes que se fazem do ideal de ser humano num

contexto social e histrico, as quais expressam contedos valorativos e de orientao comportamental com respeito

ao devir do sujeito.

que articula as maneiras como se direcionam estes processos atravs da Educao e suas prticas

de formao de sujeitos.

Uma delimitao conceitual general deste captulo, compreende o conceito de

humanidade como uma produo histrico-cultural e no estritamente como o resultado de um

processo evolutivo natural. No se refere somente ao percurso que nossa espcie realiza na

transformao de suas condies ambientais (filogneses), sina a como atravs da Cultura em

todos seus aspectos, se leva a cabo um processo de modelao antropolgica. O que

compreendemos como humanizado aqui em sentido crtico faz parte de uma modelao

antropolgica e histrica, que as sociedades e o poder em sua condio de produtor (Foucault)

fazem dos sujeitos e de suas relaes sociais e culturais. Modelaes que produzem

simultaneamente representaes do humano e formas de olhar e dar sentido s coisas, discursos

despregados pela Educao que servem de faro para fundar e regular aquelas formas subjetivas

de comportamento que no esto includas no projeto scio-poltico.

Ao invs do animal e a planta, cuja natureza j est fixada quando surge, a natureza

humana em grande parte flexvel e dinmica (). A natureza humana o resultado de uma

inter-relao de condies fsicas de um lado, e condies modificveis, de outro. No possvel

a compreender apenas observando seu lado biolgico nem sequer se limitando a considerar os

elementos de sua variabilidade social e cultural. A natureza o resultado de um complexo

emaranhado de processos biolgicos, sociais e culturais, nos quais a Educao e a socializao

desempenham um papel central. Pode-se falar, simplificando de uma natureza cultural do

homem. (WULF, 2013, p. 65)

Exposto este fundamento, pretendemos um percurso crtico pelos processos socioculturais

e polticos que levaram concepo e configurao da imagem de homem moderno (sujeito

moderno), referindo como antecedente o chamado pensamento ilustrado e a constituio do

liberalismo como modelo. Estudam-se as maneiras como estas representaes, prescries

discursivas e prticas, no s econmicas, foram delineadas a partir das mudanas nas economias

do poder, as formas da direo e as concepes de sujeito produtivo, das relaes possveis entre

as pessoas no mundo do mercado, um modelo de sociedade desejvel na consolidao do projeto

poltico dos sculos XIX e XX.

Avanando no captulo, analisam-se aqui as variaes, desenvolvimentos e

transformaes na maneira de produzir e estruturar a conduta dentro do projeto poltico-

econmico ao longo do sculo XX e incios do XXI, no contexto da consolidao do projeto

Neoliberal. Estas trajetrias atravessadas pela dimenso Governamental e a formao (bildung)

da subjetividade. Traamo-nos a tarefa de descrever, reflexionar e questionar as trajetrias

antropolgicas que configuram as imagens de homem significativas para a modernizao

institucional. esta, a inteno de compreender como se regulamenta, se identifica e se nega uma

imagem, concepo de homem com seu valor sociocultural particular, desde um sistema de idias

e prticas que reproduzem seus valores atravs da Educao, fixando o projeto de um modelo de

sujeito e de cultura nicos.

importante colocar em questo as formas de modelao cultural como processos no s

de reproduo tcnica, pois o sujeito participa ativamente, com um projeto que tambm se auto-

define e pode apropriar-se de forma criativa. Imagens esquemas e movimentos so aprendidos em

processos mimticos e permitem ao indivduo capacidade de atuar. Desde que os processos

mimticos envolvem produtos de histria e cultura, cenrio e performance, esses processos esto

entre os mais importantes modos de transmisso cultural de uma gerao para a prxima.

() Como processos mimticos no so somente mtodos de copiar mundos

que foram interpretados simbolicamente, mas tambm consistem em nossa ao

de incorporar impresses desses mundos, essas relaes mimticas sempre

contm aspectos criativos que modificam seus mundos originais. (WULF, 2013,

p. 53)

Para no ter um maior dimensionamento dos alcances deste trabalho, sinalizamos as

limitaes que podem encontrasse: no um trabalho estritamente histrico e detalhado do macro

processo e os fatores de mudana do liberalismo ao neoliberalismo, si no, uma abordagem

crtica e general dos pontos que consideramos chaves para definir essas trajetrias em termos do

projeto de modelao antropolgico pedaggica, que a partir da concepo de um novo projeto de

homem se desenvolve para reordenar as ideias de controle e governo do territrio

(Governamentalidade), e assim, os vnculos e estruturas sociais produtoras de uma nova

sociabilidade, dentro da qual a Educao cumprir um papel importante formando ao Sujeito

adequado. A particularidade desta abordagem est em poder apresentar uma leitura compreensiva

destes processos em outro ngulo, como problemas propostos desde uma Antropologia

pedaggica e histrica, a qual indaga pelas ideias e prticas da formao (bildung)

problematizando-as em seus contextos.

Quem tenha pensado em sua profundidade e visto com lupa aguda as

problemticas relacionadas com a educao e a formao humanas, no pode

passar de longo em frente ao fato de que tanto a teoria como a prxis

pedaggicas sempre se apoiam, bem seja implcita ou explicitamente, em

propostas, conhecimentos, conceptualizaes e pontos de vista antropolgicos.

Isto algo inevitvel, na medida em que a pedagogia reflexiona sobre a

educao e a formao humana. Ademais, quando a pedagogia analisa o

fenmeno educativo e o devir humano formao, pessoa gnesis,

individuao, fala geralmente com o propsito e muitas vezes com o

ideal de fazer dos seres humanos seres mais humanos isto significa,

necessariamente, que sempre se est ancorado a um marco de entendimento

determinado do que ou dever-se-ia entender por humano. Por conseguinte,

quando se v como tarefa da educao o educar aos homens e mulheres para que

se humanizem, para que se formem, isso supe como algo presente tambm a

problemtica antropolgica. (RUNGE, 2005, p. 48)

Relacionando produo de sujeitos e cultura como problemas histricos, ds

naturalizando os contedos ideolgicos e os modelos scio-polticos, bem como as prticas e

discursos da educao e a formao que se vo dando. Abordagem desde o qual a pedagogia no

se concebe como um campo disciplinar neutro, todo o contrrio est configurado por foras em

tenso que estabelecem sua episteme e seus mtodos de trabalho, que contm como fundamento

concepes antropolgicas.

A antropologia pedaggica passa por uma reflexo analtica sobre o ser humano, dado que

um ser que se pode formar e educar. Parte do princpio de formabilidade humana (BENNER,

1998) e do fato que precisamente os seres humanos no nascem feitos, si no que se fazem no

transcurso de suas vidas, isto , que se formam e se veem remetidos a prticas educativas num

sentido amplo. H diferentes posturas do que se entende por antropologia pedaggica, no entanto,

a antropologia pedaggica numa perspectiva crtica no pode ser vista mais que como uma

antropologia histrico-pedaggica e como uma antropologia que se pergunta pelas imagens e

narrativas que configuram o humano em contextos educativos amplos. A antropologia histrica

pedaggica a diferena da antropologia pedaggica tradicional, no lhe interessa se constituir

como disciplina nica, tambm no lhe interessa definir uma espcie de objeto particular, em

mudana trabalha precisamente sobre as formas em que histrica e socialmente aparece e se

especifica um devir humano, com base aos problemas nos que aparece definido o conceito de

humanidade.

Desde ali a Escola como elemento essencial do projeto de formao de sujeitos

na modernidade entra em tenso com outras possveis frentes de anlises, que

mediados pela histria podem nos dar a entender como se configura um projeto

de sociedade, por isto para uma antropologia pedaggica e especialmente

histrica pedaggica o problema a formao (bildung) e a formao no s se

d no contexto exclusivo da escolaridade. (CASTAO, 2012, p 13)

Propomos um percurso por essas trajetrias de formao de sujeitos, no em sentido

linear, sina tentando mostrar como levam consolidao de um modelo de ser humano

codificado pelos princpios que marcam filosoficamente e antropologicamente o projeto

moderno capitalista, o que implica pensar em chave governamental o papel poltico da Educao.

Realamos deste processo sua variabilidade de acordo com os contextos do sistema econmico e

as relaes de produo no desenvolvimento do capitalismo; sem que este seja o nico fator para

explicar a produo de subjetividades uma caracterstica chave para compreender a maneira

como se dirigem as condutas e os diferentes mecanismos que para isso se utilizaram.

Identificando estas mudanas sociopolticas, apresentamos um percurso geral pelas linhas

que definem o pensamento antropolgico ilustrado como um ponto de referncia de nossa

abordagem e depois suas reconfiguraes, reordenamento luz do projeto neoliberal,

especificamente sua relao com as concepes de Educao e a formao que se d desde ali, as

quais se dispem transversalmente desde umas prticas de governo das populaes e da

produo de formas mais complexas de disposio do poder em relao aos sujeitos e sua

conduta, permitindo que na contemporaneidade assistamos a novos processos de

governamentalizao como os chamasse Foucault (1980), os quais descrevem trajetrias de

poder que vo desde o disciplinamento at o autocontrole, com seus matizes especiais na atual

sociedade de gerenciamento, ou sociedade ps - disciplinar (Grinberg)

De maneira que, longe de se ter produzido uma des-governamentalidade do

social se transformaram os regimes de prticas e lgicas de governo, mas isso

no deveria se confundir com falta de governo; sina com a d ds-governamental

do Estado e a transferncia de muitas de suas funes para a comunidade e a

sociedade civil (GRINBERG, 2006, p.2).

Assim, as mudanas que se podem analisar no desenvolvimento do modelo

governamental atual, so os que permitem que novos discursos e prticas cheguem a justificar a

reestruturao institucional e administrativa do projeto da Educao Superior em Latino

Amrica5. Mudanas que regem as novas lgicas de governo da organizao escolar para

conseguir os objetivos derivados desta nova concepo de governo das populaes e o territrio,

de tal maneira que se configuram o papel da Educao e o papel mesmo do sujeito na sociedade e

ns so apresentados por esta via uma nova imagem de ser humano. No caso destas mudanas no

contexto de Amrica Latina e no espao da Educao, tornam-se muito importante para ns os

direcionamentos propostos desde o processo de Bolonha. (TELLO, 2015)

O governamental contemporneo tem que ver com uma particular mistura entre coeso

externa e coeso interna, corpo e mente, vontade e desejo, formas alternadas e interligadas para

produzir as condutas. No entanto deve-se diferenciar na perspectiva de Foucault, um conceito de

governamentalidade mais referido a uma histria das formas de governo: governo dos meninos,

da casa, da famlia, da empresa e atualizando o conceito, uma forma de governamentalidade

liberal e especialmente neoliberal, que se d no marco de um biopoder, ou seja, poder sobre a

vida individual Esta ltima a caracterstica de nossas atuais sociedades e d-se no marco do que

Deleuze denominasse sociedades do controle.

Foucault (1975) analisa uma forma particular de governo, a tecnologia

disciplinaria que surge em XVIII e XIX e atinge seu apogeu a princpios do XX.

No entanto, as sociedades disciplinares, j fazem parte de nosso passado

imediato, o que estamos a deixar de ser. As disciplinas entraram em crises aps

a segunda guerra mundial, crise que deu passo lentamente gestao de uma

organizao do poder diferente (Deleuze, 1996). Por isso, retomando o fio das

propostas foucaultianas e, de alguma maneira, as continuando, diversos autores

(Barry, Osborne& Rose, 1996; Burchell, Gordon & Miller, 1991; Dean, 1999;

Gane & Johnson, 1993; Rose, 1989, 1996b, 1999; Rose & Miller, 1992)

examinam a instalao progressiva e dispersa de um novo regime de governo

5 Neste estudo apresentaremos no captulo trs, uma reflexo em contexto e apoiada em estudo de campo, com

respeito ao impacto destas transformaes na poltica da Universidade pblica. As transformaes da Universidade

de Antioquia- Colmbia, em seu processo de reestruturao institucional a partir de seu projeto de Regionalizao,

funciona como exemplo para analisar o papel governamental que a Universidade gera nos territrios e seus

povoadores e as tenses que representam estas mudanas organizacionais.

caracterstico do que denominam sociedades neoliberais que est a substituir s

sociedades disciplinarias analisadas por Foucault (SNCHEZ 2006, p. 2).

Localizando estes percursos no que chamaremos uma antropologia ilustrada, no marco de

uma reflexo governamental dos sujeitos; importante ter em conta que a tarefa de identificar e

explicar historicamente os traos das trajetrias antropolgicas pedaggicas e as idias

recorrentes de formao e educao deve-nos permitir situar-nos de maneira crtica com respeito

aos discursos e prticas que tm acompanhado estes processos de modelao e seus efeitos nas

tecnologias de governo e ordem das populaes, caracterstica da regulao e o controle no

desenvolvimento do projeto de modernizao, em frente ao qual como novo elemento a chamada

Gesto educativa explica-se e dirige-se desde ali como um processo de governamentalidade

contempornea, uma tecnologia para conseguir os resultados que se planejam desde este

paradigma.

Trata-se de identificar a maneira como as mudanas no modelo organizador e de direo

(Gesto) da vida organizativa, social e poltica das populaes, nos trajetos do liberalismo ao

neoliberalismo, valem-se, ou melhor, acompanham-se, de uns ideais de formao e educao dos

sujeitos, as quais so assumidas pela Escola moderna e posteriormente pela Organizao

educativa e a cultura escolar, como um de seus fundamentos missionais, para levar a cabo uma

renovada proposta de governamentalidade, a que depois replicada e reforada por outras

dimenses institucionais da vida quotidiana de outras organizaes. Veremos aqui, sobre que

fundamentos descansam esta remodelagem da vida governamental e social, o como vai variando

na medida em que o projeto ilustrado vai tomando outros matizes polticos com a consolidao e

o desenvolvimento do sistema econmico do particular capitalismo contemporneo com seu forte

componente geopoltico (MIGNOLO, 2001).

1.1 Um ponto de partida: O pensamento antropolgico pedaggico.

Para abordar a tarefa que nos propusemos nos orientamos conceitualmente desde a

perspectiva da antropologia pedaggica e histrica, est num sentido amplo, se entende como

desconstruo de fundamentos, j que no se reconhece como um campo disciplinar exclusivo

em seu episteme e seus mtodos uma reflexo que se dirige ao entendimento dos processos que

modelam ao ser humano em tanto educvel, formabilidad6, imerso no meio de umas condies

histricas de possibilidade e emergncia, onde a doutrina de homem antropologia- aparece

atravessada pela tenso permanente entre natureza e cultura, relaes de saber e poder que

modificam a experincia subjetiva.

No existe uma nica e generalizada definio ao respeito, pelo qual convergimos na

opo crtica com respeito pergunta pela formao humana e suas circunstncias de

aparecimento. Ademais dever recordar o leitor, que em nossa focalizao potencializamos a

abordagem com um pensamento marcadamente histrico, como complemento da anlise

antropolgico, pelo qual nos permitimos dizer seguindo a Scheuerl que:

Dentro do amplo marco dos problemas antropolgicos pode-se considerar como

antropologia pedaggica numa primeira tentativa de aproximao, o estudo

especialmente elaborado sobre o fato de que o homem comea sua vida como

menino e assim que extremamente capaz de aprender e precisado de formao

depende por longo tempo de ajudas pedaggicas. () E o interesse da

antropologia pedaggica dirige-se tanto aos elementos comuns como s

diferenas caractersticas das correspondentes normas prvias e expectativas

culturais e sociais que acompanham ao desenvolvimento e ao processo de

formao. (SCHEUERL. 1986, p 13-14)

Parte-se do oramento da formabilidade7 humana, os seres humanos no nascem fatos e

dispostos, sina que se fazem em decorrncia das experincias e da prxis de suas vidas, com o

qual aparece com maior clareza o carter circunstancial, mas tambm poltico, do devir humano

como um processo inacabado e de contradies.

A prxis (a vida humana) no ento um fenmeno biolgico, sina

antropolgica. A prxis um fazer humano a partir do qual se v transformado o

humano mesmo. S os seres humanos so seres da prxis j que nelas e com

elas, se pode e tem que decidir ou tomar decises (Runge e Muoz, 2013, p.3).

6 Ao respeito desta concepo diz Runge e Muoz: formabilidad (plasticidade, maleabilidade) e imperfeio em

tanto seres socioculturais (como seres precisados de uma atualizao cultural) que os pe numa condio carente e precisada de educao. (Runge, 2013) 7 A formabilidad, conceito finque da pedagogia, entendida como capacidade de, ao nos formar, formar, dar sentido a

nossa vida como projeto, que se encontra paradoxalmente num marco de possibilidades que entende na modernidade

o formativo numa perspectiva positiva que extirpa e substitui todo aquilo que no se veja como positivamente

humano. A formabilidad permite, pois um projeto de homem que pode se dirigir para melhoras, dada sua

indeterminao e imperfectivilidad (Rousseau), isto est no pensamento de Kant e de vrios dos Ilustrados, baixo a

idia de transcendncia do humano e numa perspectiva de teorias afirmativas do sujeito.

A formao do sujeito, questo central nesta abordagem, configura-se no processo de

confrontao dos seres humanos com seu marcos sociais, histricos, culturais e institucionais.

Desde esta perspectiva ampla da pedagogia, os seres humanos formam-se e vm remetidas a

prticas educativas e discursos do comportamento num sentido amplo, prescries com respeito

ao que so e devero ser e fazer, esses processos de orientao, modelao no sentido de umas

prticas de identidades individuais e coletivas que se constroem historicamente, nos permitem um

sentido crtico de aproximao dimenso antropolgica da vida sociocultural dos seres humanos

e o lugar que tem a Educao. Sem que estes processos possam ser reduzidos a encher um espao

vazio na categoria de sujeito, enquanto a cada experincia prxis singular de tornar-se um

sujeito, implica tenses, resistncias e mudanas a nvel geral e particular. Como o prope Wulf,

(2013) a mimesis cultural no um mero processo de reproduo tcnica, uma apropriao,

uma aprendizagem, uma recreao que resulta em novos enfoques e sentidos.

Localizando estas referncias conceituais como ponto de partida, reconhecemos que se

podem distinguir diferenciados perfis sobre o que se enfatiza em Antropologia pedaggica,

limitados para lhes desenvolver aqui, o que interessa e orienta este trabalho remete ao estudo dos

processos de consolidao de um projeto de homem moderno, uma imagem e modelo de

sociedade como um problema de formao, no contexto da organizao educativa

contempornea, estendido a mltiplas dimenses da vida social dos sujeitos. nesta perspectiva

onde o antropolgico pedaggico passa pelo filtro da questo governamental, onde o educativo-

formativo tem uma estreita relao como as formas de governo e da produo do Sujeito.

Interrogar a idia e as prticas de formao (bildung) dos sujeitos, identificando os

fundamentos que atravessam os oramentos que constitutivamente definem o humano como

projeto histrico, localiza Antropologia pedaggica numa perspectiva necessariamente crtica e

contextualizada, perfilando-se como uma antropologia histrico-pedaggica, isto , como uma

antropologia de reviso e anlise, de desnaturalizao de prticas e enunciados, que se pergunta e

procura identificar as imagens e narrativas de formao em contextos scio educativos8

8 Entendem-se esses contextos como espaos onde tambm de maneira formal, no formal e informal, o sujeito

vivncia processos educativos e formativos, como o : a famlia, os centros escoares, os centros universitrios, a

cidade, o espao de trabalho, as associaes, os meios de comunicao entre outros espaos de interao social

amplos; o qual a compromete a identificar coordenadas que no s passam pelos projetos

educativos escolarizados,mas que se adentra nas formas sociais mais subtis e quotidianas de

modulao e regulao da conduta individual e coletiva.

A concepo crtica sobre a Educao que se posiciona desde esta perspectiva parte de

uma abordagem analtica aos discursos e prticas educativas e pedaggicas, entendendo nelas seu

sentido poltico e como se expressam fundamentos de um modelo de modelao antropolgica.

A Educao como prxis resulta ento do fato que o ser humano, em tanto ser

imperfeito, a nica criatura precisada e capaz de educao. Nem os animais

nem as plantas precisam da educao para ser ou devir tais, mas, ademais, eles

mesmos no se educam. A diferena, o ser humano ou devm em humano a

partir do que faz (prxis) de si. No obstante, com esse fazer no se supera a

imperfeio, pelo que o humano se apresenta sempre como tarefa, como projeto,

como histria. (Runge e Muoz, 2012. p 3)

A Antropologia histrica pedaggica9, a diferena da antropologia pedaggica tradicional

e geral, no lhe interessa tanto se - constituir como disciplina auto-suficientes, com uma estrutura

epistemolgica central, tambm no enftica ao definir uma sorte de objeto de estudo nico e

particular, em mudana, trabalha precisamente sobre o entendimento de formas emergentes

histrica e socialmente em que aparece e se concretiza um devir humano, uma trajetria, tanto

nas prticas como nos enfoques tericos e conceptuais que do explicao a um processo de

formao e a um modelo de Educao.Reflexiona a respeito de como e por que se educam os

homens numa cultura concreta.

Levando este posicionamento um pouco mais a fundo, o pensar antropolgico sobre a

formao (bildung) dos sujeitos, mais complexo na medida em que trabalhamos historicamente

com base a problemas e formas de interveno dos sujeitos nos que aparece definido o conceito

de humanidade e suas maneiras de representao numa poca, claramente estes processo de

que comunicam um iderio de pessoa e de vnculo social. A antropologia pedagogia abre a outros entendimentos

do lugar da pedagogia e dos processos educativos ds-escolarizados.

9No contexto de Amrica Latina a antropologia pedaggica vai ter uma grande fora intelectual enquanto identifica-

se com as correntes crticas da Educao e as pedagogias da libertao. Reconhecem-se vrios autores na tradio

pedaggica crtica que de uma ou outra forma lhe fizeram contribuas significativos este campo em nosso contexto:

Freire, Dussel, Quijano, Mignolo, entre outros.

formao em sentido geral do-se dentro de um contexto poltico especfico e portanto dentro de

um jogo de relaes de poder e saber.

1.1.1 O antropolgico no governamental

As concepes e prticas de governo do Sujeito abordadas como polticas de vida ou

biopoltica, para utilizar o termo na tradio Foucaultiana, tm seus fundamentos em bases

antropolgicas, as quais orientam mudanas e fazem nfases nas idias e prticas da formao

que se difundem numa sociedade. Assim, os processos formativos se regem por propsitos e

relaes de interesse, produzindo modelaes sociais e culturais onde o poder entra em contato

com a regulao da vida das pessoas e as populaes de vrias maneiras, de forma dinmica e

diversificada, como o explicou Foucault em suas classes intituladas, defender a sociedade,

Colgio do Frana 1975-1976. A este respeito analisa e comenta o professor Santiago Castro.

No curso segurana, territrio, populao, alm do que j foi dito, h ainda um

movimento que merece especial ateno para se melhorar o entendimento da

genealogia foucaultiana e sua abordagem da biopoltica. Esse movimento refere-

se maior ateno dada ao tema do Estado, tema este que aparece expresso, num

primeiro momento, na preocupao de Foucault em evidenciar o tipo de

racionalidade governamental que, em nossa modernidade, particularmente a

partir do sculo XVIII, procurou conhecer e intensificar as foras estatais,

atravs da gesto biopoltica de par populao-riqueza. Sobre a ptica de uma

poltica de governo copiada numa razo de Estado, atividade de governar, no

sentido de dirigir a conduta dos homens em quadros e com instrumentos

estatais (FOUCAULT, 1997, p. 90), (GADELHA, S. 2009, p. 136-137)10

Ao anterior complementa o professor Santiago Castro:

Pelo contrrio a partir do sculo XVIII a vida instala-se no centro da poltica

estatal e j no depende de uma deciso pessoal do soberano. Agora se trata j

no tanto de subtrair a potncia de vida, sina de produzi-la e lhe dar forma.

Gere-se a potncia de vida para faz-la mais produtiva, mais eficiente, mais

segura, mais regulada, menos submetida s contingncias. Foucault caracteriza

este novo mecanismo de poder com formula-a fazer viver deixar morrer

Temos ento que no primeiro caso (o poder soberano) a vida subtrair enquanto

no segundo (o biopoder) a vida potenciada e maximizada. (Castro, 2010, p.56)

Em citaes acima vemos com mais clareza a lgica que se quer analisar nas trajetrias do

capitalismo, onde o antropolgico entra no governamental como um princpio de base, se trata de

10

Traduo nossa do texto original.

uma mudana de perspectiva: Como estas mudanas na formula, fazer viver, vinculam-se de

maneira pontual s mudanas estabelecidas para o projeto de sociedade e o papel da Educao?

Subtrair a vida j no a medida da frmula do controle e a modelao, sina a produzir e lhe

dar forma de maneira institucional; aspecto que tem efeitos individuais e coletivos nos quais o

projeto Educativo se faz essencial para o lucro destes propsitos. Esse subtrair a vida

caracterstica das sociedades disciplinares e do controle total, o pode interpretar em princpio

como a base da ao de governo que antecede modernidade, mas isto o que vai ir mudando

durante o desenvolvimento do sculo XX e XXI; j no se tratar somente de alinhar pela fora

ou eliminar sujeitos indesejveis, sina de promover seu auto- realizao e sua auto-explorao.

Colocando na dimenso de nosso objeto de estudo em particular, esta lgica no campo

educativo ditasse que no se trata somente de impor a Educao institucionalmente e organizar a

Escola, se no de promover a Organizao escolar auto regulada e eficiente, promover sua auto-

realizao, o que implica designao flexvel de tarefas e promoo das autonomias

responsveis. Em definitiva outra ordem de governo que reflete um formato de produo

antropolgica, tanto dos sujeitos como do modelo de Educao, assunto que aprofundaremos

mais adiante.

Na direo conceptual que vimos assinalando, a tarefa compreensiva no estaria s em

identificar o impacto dessas transformaes na vida social produtiva com a consolidao do

projeto modernizador capitalista, sina tambm poder delinear e reconhecer essa imagem de ser

humano, que subjaz em relao a uma proposta organizativa do projeto educativo e das formas

como desde ali se perfilam polticas administrativas de disciplina e de controle, isto , de formas

de governamentalidade contemporneas. Aqui a questo governamental entendida como

implantao de formas de controle antropo- polticas11

, mercantis e estticas, dispostas para

dirigir e formar no s de maneira direta aos sujeitos, via represso e disciplinamento, tambm

11

Antropologia poltica, como doutrina do ser humano em estreita relao com a poltica e o poder, o que indica que

o projeto de vida pblica difundido, com suas regulamentaes que modelam valores e atributos, coloca os limites do

comportamento que devem dar sentido objetivo vida social dos seres humanos. Pelo qual, a poltica sempre est em

contexto de cultura e de ali sua dimenso antropolgica, uma postura poltica sempre implica a uma viso de homem.

Neste sentido concordamos com o trabalho do Ncleo de Antropologia d Poltica (NuAP), da UFRJ. Brasil. Ver:

Suposio bsica de que a categoria poltica sempre etnogrfica. (1998)

intervindo de maneira mais subtil e profunda sobre as condies que daro a forma

determinao- s possveis condutas e valores que podem ser esperados por parte dos sujeitos.

O problema da formao (bildung) na dimenso governamental, de acordo com Klaus e

Muoz, para colocar um referente, tem que ver com as diferentes configuraes do poder e suas

formas de circulao na vida individual e coletiva na consolidao da sociedade industrial e

depois com o avano do neoliberalismo, as sociedades ps-industriais em suas divergncias

geopolticas. Para autores como Michel Foucault (1999) e Norbert Elas (1994), a consolidao

das modernas sociedades industriais se baseia, a nvel sociocultural, na configurao de formas a

cada vez mais subtis de controle das condutas. O triunfo da civilizao se erige sobre a forma

mais complexa de controle: o controle da liberdade. Para Foucault, dita dinmica de controle

obedece a umas tcticas de governo prprias do que tem denominado como o problema da

governamentalidade (Foucault, 1999, p. 196)12

Recordemos que o conceito de governamentalidade (r.gouvernementalit) em

Foucault baseia-se na articulao de dois termos, a saber: governo

(fr.gouvernement) e mentalidade (r.mentalit); com dito conceito Foucault

compreende suas investigaes sobre a genealogia dos regimes de poder e de

saber poder soberano, poder disciplinar, sociedade da normalizao com seus

respectivos processos de subjetivao, formas de biopoder e tecnologias do sim

mesmo e as subsumir baixo dita categoria. Com o conceito de

governamentalidade faz-se referncia ento s tcnicas e artes do governo e

direcionamento exercidas sobre aqueles que, a sua vez, tm influo e ingerncia

sobre suas prprias aes (KLAUS, A. MUOZ, D. 2013)

Um percurso pelas formas prticas dessas dinmicas de poder e controle, prescrio de

comportamento, produo de si mesmo e ajuste de condutas, na lgica da que temos chamado

uma Antropologia liberal, nos mostra as imagens e idealizaes que definem o humano no

contexto ocidental moderno, caracterizado como projeto afirmativo e de superao das

contradies entre Natureza e Cultura, marcando com clareza em onde dever fazer nfase o

processo formativo, a modelao dos sujeitos, o projeto de ser humano ao qual se devem ajustar

os esforos da Educao. Essas maneiras de focar o problema da formao e os mecanismos de

adaptao dos sujeitos adequados ordem poltica e econmica liberal o que ir mudando

12

Traduo nossa do texto original.

substancialmente quando se avana durante os sculos XX, XXI para o que temos denominado

uma antropologia neoliberal, uma nova definio de imagem de homem, a qual redefine a

questo antropolgica pedaggica por um lado, mas tambm o carter organizativo que o projeto

educativo dever encarar.

na sociedade atual onde encontramos de maneira legvel Gesto13

como discurso e

prxis, desenvolvendo novas transformaes na formula fazer viver deixar morrer (Foucault,

1975) Isto o que constitui a nova ao governamental e seu matiz de transformao

antropolgica e o que mostra a importncia desta perspectiva em razo de compreender o papel

poltico da Educao nas grandes transformaes.

O papel ideolgico da Gesto na contemporaneidade e seu papel poltico, o de produzir

outras formas de poder, outras economias do poder, trata-se no s de distribuir o poder, como na

proposta de governo estruturalmente estvel da administrao cientfica (Taylor e Fayol) A

mudana consiste em que o poder na Organizao de hoje no se distribui s como agente

portador de um controle burocrtico (WEBER), esttico, estrutural, delegado e hierrquico, sina

que deve fluir de maneira dinmica, flexvel e com as caractersticas de que se possa acrescentar

material e simbolicamente. por isto que se lhe exige ao gestor que seja o mesmo um

protagonista da mudana (Coaching) e gere a cada vez mais nveis de independncia e autonomia

para ele e seus colaboradores.

Temos com o que se vem propondo, que o percurso e as formas tcnicas que assume o

poder, como conceito finque do estudo governamental, requer do entendimento de seus

fundamentos e combinaes, identificando as rotas que este segue como configurador das

sociedades do disciplinamento para as sociedades do controle. Seu estudo compe tambm as

trajetrias das prticas da punio s da autopunio, da vigilncia s do autocontrole, da

13

Neste trabalho abordaremos em forma crtica a categoria Gesto que hoje aparece como orientao geral da

vertente administrativa contempornea, para evidenciar como desde ali se configura uma nova tecnologia de

governo. A Gesto no s uma nova onda administrativa para fazer mais eficientes os processos das organizaes,

mas a nosso entender, uma atualizao das formas do poder nas sociedades do controle autnomo, mas com a

diferena de que se pretende de que ela por si mesma, seja um dispositivo gerador de poder, de ao independente,

descentralizada, de ali que aparecem enunciados como: gerir fazer que as coisas sucedessem (Blejmar, 2005)

Assim no s esperar pela resposta e solues dirigidas desde uma centralidade, sina da tomada de decises e da

auto-responsabilizao.

prescrio externa do comportamento pela lei e a norma valorizao interiorizada da boa

conduta e a cooperao, responsabilizao individual, que em ltima instncia o que o ideal de

sujeito neoliberal preconiza para a imagem de um bom cidado.

Realando outro elemento, precisamente essa relao com o poder, com suas prticas e

discursos, a que gera saberes disciplinares especficos, como o caso da Administrao como

teoria e prtica; desde ali, configura-se um tipo e um lugar de humanizao, uma dimenso

antropolgica e pedaggica, para projetar a imagem do ser humano positivo que se precisa para

validar o modelo social. De tal maneira que o surgimento da teoria administrativa como campo

terico sobre o Trabalho e as relaes produtivas organizadas na sociedade capitalista, um

bom exemplo das formas como o poder se materializa em saberes, desde os quais se estabelecem

novos parmetros que do sentido a uma imagem produtiva de homem para o sculo XX.

Homem econmico, homem de Valer em palavras de Taylor

A administrao uma narrativa na qual a empresa se interpreta como uma

entidade que deve maximizar a utilidade e tentar de maneira prevalente a criao

de valor econmico para os proprietrios, inclusive acima da dignidade do ser

humano, j que este se considera um mdio e no um fim em si mesmo.

(BARREIRA, E; SANCLEMENTE, J. 2008, p. 12)

Imagem de homem, materializada no operrio de princpios de sculo XX, a que mostra a

idia formativa de maximizar a utilidade, a razo instrumental, que se vai desenvolvendo com

os processos de modernizao e crescimento econmico, esse dispositivo de modelao

antropolgica disposto na ideologia racional do trabalho d p a umas idias e imagens de

formao do Sujeito que aparecem nos discursos e prticas transversais nas tecnologias de

governo: Famlia, Escola, Trabalho e Consumo, como delimitaes prescritivas da ao e do

comportamento da pessoa, isto , so tecnologias para a produo de sujeitos, no plano de um

poder que j no est s afora na disciplina, sina que comea a re-fundar ao sujeito desde

adentro, circula em sua privacidade14

e na relao que ele estabelece consigo mesmo.

14

Dedicamo-nos a examinar este aspecto mais subjetivo e pessoal no captulo dois, onde trabalharemos os efeitos da

ao governamental na constituio da prpria experincia e o sentido de vida.

Essas transformaes nas tecnologias de governo15

so as que vm a se reformular e

tomar forma prtica, na Fbrica e a Escola de finais do sculo XIX e incios do XX, com os

incios de um projeto liberal econmico j consolidado, como manifestao de uma nova

racionalidade que rompe com o modelo de poder dado pelas decises pessoais do soberano,

poder pastoral. Mudana que inaugura a nova frmula finque uma idia de disciplinamento

combinado com controle, que apela aos fundamentos de ordem, clculo e razo cientfica para

formar ao sujeito produtivo, desde ali deve produzir uma nova moralizao do sujeito e sua

conduta, refundindo-o desde adentro e no s manter a punio como o mecanismo da sociedade

do castigo e a represso direta.

A mudana e as variaes das trajetrias liberalismo e neoliberalismo, consiste nas formas

como o poder entra a produzir de outras maneiras ao sujeito e a cultura, sem desistir em algumas

de suas prticas de sua tradio histrica, a mudana se centra no sujeito e seus vnculos sociais,

as regras com as que se deve adentrar nessa lgica da reproduo social e para que isto suceda o

lugar que o projeto educativo deve ter. Neste panorama o sujeito j no estar somente

amedrontado, apartado, castigado, adestrado, mas incentivada, moralizado e recompensado para

ser ele mesmo um regulador de sua conduta e um reprovador dos outros. Se na ordem da

disciplina a promessa o castigo, a frmula do controle promete a recompensa.

No entanto, chave reconhecer genealogicamente como o poder em vez de ser um

assunto reduzvel ao negativo, ou somente macroestrutural (molar)16

das relaes sociais mais

superficiais, vai bem mais l como prope em vrios momentos de sua genealogia Foucault, este

tambm um grande gerador, um suporte dinmico das relaes sociais moleculares e das

maneiras como estas foras estruturam a vida quotidiana; em tal medida que o poder

codificador da proposta de ordem dentro da qual se desenvolve,participa ou no, a cada indivduo

e sua comunidade de um projeto poltico-cultural, o poder assim, tem mais a qualidade de

15

Desta maneira denomina Foucault s diferentes maneiras em que o poder assume uma funo para materializar na

produo dos sujeitos. So discursos, prtica e saberes que atravessam as relaes sociais e as que estabelecem o

Sujeito consigo mesmo. 16

A perspectiva da convergncia entre o molar e o molecular, define as geometrias do poder, tomando a postura de

Deleuze desde ali que os processos se distinguem por sua diferena nos termos e as mesmas relaes (macro micro),

mas so inseparveis por que coexistem, pelo qual, Em resumo, tudo poltica, mas toda poltica ao mesmo tempo

macro poltica e micropoltica. (Deleuze e Guatarri, 2004)

fundante que de fundado; no um fenmeno, nem homogneo como recorda Foucault (1975-

1976)

O exerccio do poder consiste em conduzir condutas" e em arranjar as

probabilidades. No fundo, o poder menos uma confrontao entre dois

adversrios ou a vinculao de um com outro, que uma questo de governo.

Deve ser dado a esta palavra o amplo significado que possua no sculo XVI.

"Governo" no se referia unicamente s estruturas polticas ou gesto dos

estados; mais bem designava o modo de dirigir a conduta de indivduos ou

grupos: o governo dos meninos, das almas, das comunidades, das famlias, dos

doentes. No s cobria as formas institudas e legitimas de fixao econmica ou

poltica, sina tambm modos de ao, mais ou menos pensados e calculados,

destinados a atuar sobre as possibilidades de ao de outros indivduos.

Governar, neste sentido, estruturar o possvel campo de ao dos outros.

(MICHEL FOUCAULT, 1988, p.14)17

O poder como categoria central no entendimento das trajetrias de governamental, precisa

ser tambm compreendido em sua maneira vascular e desde uma perspectiva hierrquica18

deste,

como o prope o professor Castro Gmez em sua conferncia: Michel Foucault e a colonialidad

do poder (2007); no se trata de compreender s sua dimenso hierrquica rgida e estruturante,

deixando de lado as complexas dinmicas de micro poderes e emergncias que se apresentam nas

diversas localizaes da variabilidade etnogrfica de um sistema social. Este aspecto de soma

importncia para pensar nas dinmicas das relaes de poder na Escola como assunto pontual.

Um enfoque atualizado destas questes particulariza no poder, enquanto pode ser

localizado, este dinmico e em contexto dos saberes e as redes locais de conhecimento que o

esmaecem na cotidianidade, o que mostra a tenso entre o molar e o molecular, o global e o local;

assim no o um ou o outro, o que comporta sua lgica, no a dualidade dos estruturalismos

rgidos, se no precisamente essa complexa inter-relao que deve ser considerada a todo o

momento da anlise das dinmicas governamentais. Dentro da anlise de um modelo de governo

da instituio educativa fundamental reconhecer estas dinmicas, dedicaremos a colocar em

17

Traduo nossa do texto original.

18

Heterarquia (do grego heteros = do outro e archein = prevalncia, como prevalncia dos outros),

sistema onde no h um controle centralizado vertical, mas predomina uma ordem consensual. diferente d

anarquia, ausncia de centralizao e de ordem, e d hierarquia, ordem centralizada e verticalizada. Ou conceito de

heterarquia foi primeiramente usado num contexto moderno, pelo cientista Warren McCulloch em 1945, num estudo

sobre redes neurais. (Wikipedia. http://pt.wikipedia.org/wiki/heterarquia)

contexto esta reflexo terica no captulo trs e quatro, onde analisamos uma instituio de

educao superior luz destas mudanas de enfoque.

A governamentalidade tomada como problema antropolgico, nos mostra que no

estamos a falar de uma poltica pura, quer dizer que, ao abordar as questes do governo, no

sentido amplo que nos recorda Foucault, enfrentamos a necessidade de reconhecer a imagem de

homem que ali subjaz e as maneiras como esta alimentada e recreada pelos princpios e valores

que do sentido histrico a uma poca. O que deriva em problemas pedaggicos, na medida em

que estes procedimentos de modelao produzem umas indicaes tericas, conceptuais e

prticas com respeito a que tipo de Educao devem receber os sujeitos para ser ajustados aos

parmetros de determinada poltica da vida.

1.2 Noes e imagens de homem: Trajetrias do Liberalismo ao Neoliberalismo.

A cultura apresenta-se como compensao s incertezas e limitaes prprias de nossa

condio natural, este fundamento antropolgico um elemento essencial para o entendimento do

substrato filosfico que acompanha o pensamento moderno e, portanto, a projeo de imagens

que dele se desprendem. A noo de homem que configura uma antropologia ilustrada como

fundamento do projeto de liberalismo poltico e econmico, est marcada pela renovao dos

contedos ideolgicos que lhe do passo ao projeto de sociedade moderna capitalista; o papel da

Reforma, a renovao dos mecanismo de conteno social e direo do poder, desenvolvem-se

desde a construo da democracia como novo fundamento, o qual permitiu dar outros sentidos ao

devir social das pessoas e ao lugar que a Educao, como instituio finque, deveria cumprir em

relao a tais propsitos.

A reforma no significa unicamente a eliminao do poder eclesistico sobre a

vida, tambm a substituio da forma ento atual, por uma forma mais diferente.

Mais ainda: a substituio de um poder extremamente suave, na prtica mal

perceptvel, de fato quase puramente formal, por outro que abria de intervir de

modo infinitamente maior em todas as esferas da vida pblica e privada,

submetendo regulao onerosa e minuciosa a conduta individual. (WEBER,

1985, p. 28-29)

As caractersticas deste processo mostram uma completa renovao de sujeito social,

transformao poltica e econmica, mas, sobretudo, uma renovao da idia de ser humano da

maneira como dever orientar seu comportamento, tudo isto corresponde com a renovao da

doutrina antropolgica que acompanha s origens do capitalismo; dos tipos de vnculos materiais

e simblicos que se constroem, dos papis sociais que se promoveram nos sculos XVIII, XIX e

XX. Este um antecedente bsico para reconhecer qual a lgica que subjaz e que determina a

trajetria que procuramos analisar, a da formao de uma imagem de homem correspondente

com essa lgica racional da vida. Nas trajetrias que definem os percursos entre o liberalismo e

neoliberalismo como modelos sociais e econmicos produtores de subjetividade, nos interessa

destacar dois aspectos bsicos, o primeiro: no se trata de uma trajetria linear ou universal, nem

estritamente progressiva, onde um sistema supera totalmente ao outro, todo o contrrio a anlise

scio histrico19

mostra toda uma srie de contradies, de retrocessos e combinaes, portanto o

contexto espacial e as diferentes situaes sero fundamentais para compreender as

transformaes e seus alcances.

Um segundo aspecto tem que ver com os impactos deste sistema de pensamento liberal na

concepo de homem moderno, em suas imagens e representaes, nas idias sobre sua formao

e as ideologias que ordenaram o projeto de Educao moderno, colocando o Progresso, a

Liberdade e a Autodeterminao, como doutrinas dentro do programa modernizador. Essa

renovao da imagem de homem, de sua representao individual e coletiva, ter como

essncia e efeito, a mudana na relao com o trabalho20

(HOPENHAYN, M, 2002) e a esfera da

produo; manifestaes da mudana social, antropolgico e filosfico que ser tomado como

imperativo categrico no espao da reproduo social e cultural.

Recordemos, por exemplo, (para no citar sina o caso mais saliente), a notvel

diferena que se observa no tipo de ensino que do a seus filhos os pais catlicos

por relao com os protestantes, fenmeno que o mesmo se observa em Baden