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UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
INSTITUTO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS
DEPARTAMENTO DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS
MARÍLIA MARINHO SOARES
POLÍTICA DE DEFESA BRASILEIRA PARA O ATLÂNTICO SUL:
O OCEANO COMO UM ESPAÇO ESTRATÉGICO
RIO DE JANEIRO
2017
MARÍLIA MARINHO SOARES
Política de Defesa Brasileira para o Atlântico Sul:
O oceano como um espaço estratégico
Relatório final, apresentado a Universidade do
Estado do Rio de Janeiro como parte das
exigências para a obtenção do título de
Bacharel no Curso de Relações Internacionais.
Orientador: Prof. Cláudio de Carvalho Silveira
Rio de Janeiro
2017
MARÍLIA MARINHO SOARES
Política de Defesa Brasileira para o Atlântico Sul:
O oceano como um espaço estratégico
Relatório final, apresentado a Universidade do
Estado do Rio de Janeiro como parte das
exigências para a obtenção do título de
Bacharel no Curso de Relações Internacionais.
Orientador: Prof. Cláudio de Carvalho Silveira
Local, __27__ de julho de 2017.
BANCA EXAMINADORA
________________________________________
Prof. Claudio de Carvalho Silveira
________________________________________
AGRADECIMENTOS
Primeiramente, agradeço a Deus por ter me dado saúde, força, alegria e determinação
para seguir e superar todas as dificuldades encontradas ao longo desses anos. À Universidade
do Estado do Rio de Janeiro e a todos os meus professores, sou grata por viabilizarem a minha
formação como bacharel em Relações Internacionais. Em especial, sou grata ao meu
orientador, o professor Cláudio de Carvalho Silveira, pela orientação e por toda atenção ao
meu trabalho de conclusão de curso.
A toda minha família pelo apoio cedido em todos esses anos de graduação. Aos meus
pais, pelo carinho, pelo amor e por todo incentivo durante essa trajetória. Agradeço, em
especial, a minha irmã Amanda, por ser um grande exemplo de força e determinação. Aos
meus tios e avós, por partilharem comigo mais uma vitória. À secretária da minha casa, por
me proporcionar momentos de descontração em meio a toda tensão.
As minhas grandes amigas, Isadora, Luana, Lorena e Fernanda, por partilharem toda
minhas alegrias e angústias. Agradeço por vocês terem sempre acreditado em mim e na minha
capacidade em ser bem sucedida em todas as coisas dessa vida. Aos meus colegas de classe,
deixo meu sincero sorriso de alegria por termos compartilhado inúmeros momentos juntos,
dando-me a certeza de não estar sozinha nessa caminhada.
Obrigada a todos que partilharam comigo momentos, fazendo com que esse trajeto até
minha formação fosse mais leve. Mais um ciclo da minha vida se encerrou e essa vitória
pertence a todos nós.
RESUMO
Até o final do século XX e o início do século XXI, o Atlântico Sul não ocupava um lugar de
destaque na dinâmica das relações internacionais. No entanto, as diversas mudanças ocorridas
no sistema internacional no pós-Guerra Fria somadas a atenção mundial para as diversas
potencialidades do Atlântico Sul refletiram na inclusão desse espaço na agenda política
internacional. Visto como uma rota alternativa de comunicação, uma importante via marítima
comercial e uma enorme fonte de riquezas, o Atlântico Sul se tornou uma região cobiçada
tanto por Estados ao seu entorno como por potências extrarregionais. O Brasil, então, detentor
de uma enorme extensão territorial margeada por esse oceano, começou a fazer frente a esses
novos desafios. Diante da crescente importância estratégica dessas águas, pode-se dizer que a
política externa brasileira têm se utilizado de diversas táticas, sobretudo, as de soft power
como forma de consolidar seu interesse na região e defendê-la de potenciais ameaças. Sendo
assim, considerou-se interessante analisar como os líderes brasileiros, Fernando Henrique
Cardoso, Lula da Silva e Dilma Rousseff, a partir da percepção do Atlântico Sul como um
espaço estratégico e de projeção do poder, conduziram a política de defesa brasileira para essa
região.
Palavras-chave: Atlântico Sul, Brasil, Política Externa, Defesa, Estratégia.
ABSTRACT
Until the end of the 20th century and the beginning of the 21st century, the South Atlantic did
not occupy a prominent place in the dynamics of international relations. However, the great
changes in the post-Cold War international system combined with worldwide attention to the
diverse potentialities of the South Atlantic reflected in the inclusion of this space in the
international political agenda. Seen as an alternative communications route, an important
commercial sea route and a huge source of natural resource, the South Atlantic has become a
region coveted both by surroundings states and by extra-regional powers. Brazil, with a huge
territorial extension bordered by this ocean, began to face these new challenges. Given the
growing strategic importance of these waters, it can be said that Brazilian foreign policy has
been used various tactics, especially soft power, as a way to consolidate its interest in the
region and defend it against potential threats. Therefore, it was considered interesting to
analyze how the Brazilian leaders, Fernando Henrique Cardoso, Lula da Silva and Dilma
Rousseff, from the perception of the South Atlantic as a strategic space and power projection,
led the Brazilian defense policy for this area.
Keywords: South Atlantic, Brazil, Foreign Policy, Defense, Strategy.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 - Estrutura Dorsal Meso-Atlântica ............................................................................. 26
Figura 2 – Amazônia Azul ....................................................................................................... 28
Figura 3 – Recursos Minerais na Amazônia Azul .................................................................... 32
Figura 4 - Mercado Brasileiro de Agronegócio ........................................................................ 35
Figura 5 - Limites marítimos .................................................................................................... 39
Figura 6 - Direito do Estado sobre os espaços marítimos ........................................................ 41
Figura 7 - Limites Marítimos Brasileiros ................................................................................. 45
Figura 8 - Triângulos Estratégicos............................................................................................ 48
Figura 9 - Presença de Potências Extrarregionais no Atlântico Sul ......................................... 49
Figura 10 - Entorno Estratégico................................................................................................ 60
Figura 11 - Cooperação em defesa Brasil-África ..................................................................... 62
Figura 12 - Espaço marítimo de jurisdição brasileira ............................................................... 92
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 – Reservas e produção dos principais países petrolíferos da América do Sul e da
África. ....................................................................................................................................... 30
Tabela 2 – Importações chinesas .............................................................................................. 34
Tabela 3 – Comércio Chinês no Atlântico Sul (2011).............................................................. 56
Tabela 4 - Comércio Intrabloco e Extrabloco .......................................................................... 64
Tabela 5 - Viagens de Lula da Silva para América do Sul ....................................................... 80
Tabela 6 - Viagens de Dilma Rousseff para América do Sul ................................................... 80
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1 - Distribuição Anual de Projetos de Cooperação Técnica nos Governos Lula da
Silva e Dilma Rousseff ............................................................................................................. 81
Gráfico 2 - Projetos de Cooperação em defesa no continente africano .................................... 93
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 - Cooperação em defesa - exercícios militares 2010/2011 ....................................... 99
Quadro 2 - Comparação Política de defesa e Atlântico Sul como espaço estratégico ........... 102
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ABC – Agência Brasileira de Cooperação
ALCA – Área de Livre Comércio das Américas
ANP – Agência Nacional de Petróleo
ASA – Cúpula América do Sul-África
LBDN – Livro Branco de Defesa Nacional
CASA – Comunidade Sul-Americana de Nações
CEDEAO – Comunidade Econômica dos Estados da África Ocidental
CDS – Conselho de Defesa Sul-Americano
CELAC – Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos
CNUDM – Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar
CIJ – Corte Internacional de Justiça
CIRM – Comissão Interministerial para os Recursos do Mar
CLPC – Comissão de Limites da Plataforma Continental
CPLP – Comunidade dos Países de Língua Portuguesa
END – Estratégia Nacional de Defesa
IBAS – Fórum de Diálogo Índia-Brasil-África do Sul
MERCOSUL – Mercado Comum do Sul
MRE – Ministério das Relações Exteriores
OMC – Organização Mundial do Comércio
ONU – Organização das Nações Unidas
OTAN – Organização do Tratado do Atlântico Norte
OTAS – Organização do Tratado do Atlântico Sul
PDN – Política de Defesa Nacional
PND – Política Nacional de Defesa
PNRN – Política Nacional para os Recursos do Mar
PROAREA – Programa de Prospecção e Exploração de Recursos Minerais da Área
Internacional do Atlântico Sul e Equatorial
PROARQUIPELAGO – Programa Arquipélago de São Pedro de São Paulo
PROCAP – Programa de Capacitação Tecnológica em Águas Profundas
PROTRINDADE – Programa de Pesquisas Científicas na Ilha da Trindade
REMPLAC – Programa de Avaliação da Potencialidade Mineral da Plataforma Continental
Jurídica Brasileira
REVIZEE – Programa de Avaliação do Potencial Sustentável de Recursos Vivos na Zona
Econômica Exclusiva
SADC - Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral
SisGAAz - Sistema de Gerenciamento da Amazônia Azul
SIPAM – Sistema de Proteção da Amazônia
SIPRI – Sistema de Promoção de Investimentos e Transferência de Tecnologia para Empresas
SIVAM – Sistema de Vigilância da Amazônia
TIAR – Tratado Interamericano de Assistência Recíproca
TNP – Tratado de Não-Proliferação Nuclear
TSC-BR – Programa Train-Sea-Coast Brasil
UNASUL – União de Nações Sul-americanas
ZEE – Zona Econômica Exclusiva
ZOPACAS – Zona de Paz e Cooperação do Atlântico-Sul
SUMÁRIO
1. INTRUDUÇÃO ............................................................................................................... 15
1.1. Problema de Pesquisa .............................................................................................. 15
1.2. Justificativa do Estudo ............................................................................................ 16
1.3. Marco Teórico .......................................................................................................... 17
1.4. Contribuições para o Tema ..................................................................................... 20
1.5. Hipótese e Metodologia da Pesquisa ...................................................................... 22
1.6. Sistematização .......................................................................................................... 23
2. CAPÍTULO I: A GEOGRAFIA E AS POTENCIALIDADES DO ATLÂNTICO
SUL .......................................................................................................................................... 25
2.1. A geografia e a geologia ............................................................................................... 25
2.2. Recursos energéticos .................................................................................................... 27
2.3. Via comercial e de comunicação ................................................................................. 32
2.4. Histórico, Princípios e Delimitações do Direito do Mar ........................................... 35
2.5. O Brasil e o Direito do Mar ......................................................................................... 43
3. CAPÍTULO II: CONFLUÊNCIA E DIVERGÊNCIA DE INTERESSES NO
ATLÂNTICO SUL ................................................................................................................. 46
3.1. Atlântico Sul como Espaço Estratégico ..................................................................... 46
3.2. Atuação e esforços extrarregionais no Atlântico Sul ................................................ 49
3.2.1. Os Estados Unidos no Atlântico Sul ....................................................................... 50
3.2.2. O Reino Unido no Atlântico Sul ............................................................................. 53
3.2.3. A França no Atlântico Sul ....................................................................................... 54
3.2.4. A China no Atlântico Sul ........................................................................................ 55
3.3. Atuação e esforços brasileiros no Atlântico Sul ........................................................ 57
4. CAPÍTULO III: POLÍTICA EXTERNA BRASILEIRA E A DEFESA PARA O
ATLÂNTICO SUL ................................................................................................................. 67
4.1. Política Externa nos governos Fernando Henrique Cardoso, Lula da Silva e Dilma
Rousseff ................................................................................................................................ 67
4.1.1. O governo Fernando Henrique Cardoso.................................................................. 69
4.1.2. O governo Lula da Silva ......................................................................................... 73
4.1.3. O governo Dilma Rousseff ...................................................................................... 77
4.2. Política de Defesa nos governos Fernando Henrique Cardoso, Lula da Silva e
Dilma Rousseff .................................................................................................................... 81
4.2.1. Política de Defesa no governo Fernando Henrique Cardoso .................................. 83
4.2.2. Política de Defesa no governo Lula da Silva .......................................................... 85
4.2.3. Política de Defesa no governo Dilma Rousseff ...................................................... 89
4.3. Análise Comparativa das Políticas de Defesa nos governos Fernando Henrique
Cardoso, Lula da Silva e Dilma Rousseff ......................................................................... 95
5. CONCLUSÃO ................................................................................................................... 105
6. BIBLIOGRAFIA .............................................................................................................. 107
15
1. INTRUDUÇÃO
O objetivo desse estudo é analisar a gradativa inserção do Atlântico Sul nas Políticas
de Defesa e de Segurança brasileiras, partindo da percepção de que essa área marítima seria
estratégica para o país. Serão analisados os períodos de mandato dos presidentes Fernando
Henrique Cardoso, Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Roussef, evidenciando os projetos
implementados por esses governos a fim de defender os interesses brasileiros nesse mar.
1.1. Problema de Pesquisa
Tanto para o Mundo quanto para o Brasil, os anos 1990 foram marcantes para os
rumos da política e dinâmica internacionais. O colapso da União Soviética e o fim da Guerra
Fria deram início a uma nova ordem internacional multipolar, caracterizada pela emergência
de novas potências, consolidação da democracia, da globalização e do capitalismo. O
esfacelamento de um dos polos de poder reorganizou a distribuição de capacidades, assim
como redefiniu as ideologias disseminadas no mundo. No entanto, o fim de uma ordem
bipolar proliferou dúvidas sobre qual caminho racional a se seguir, pois não tinham uma
ameaça a qual combater ou uma política específica a ser adotada. Sendo assim, a década de 90
passa a apresentar o mundo sobre uma lógica de polaridades indefinidas, ou seja,
[...] evoluímos de uma situação de polaridades definidas (a Guerra Fria), para outra
em que as polaridades pareciam ser desimportantes diante da capacidade de valores
racionalmente e universalmente aceitos, para alcançarmos uma última, em que as
polaridades estão indefinidas. Ou melhor: conhecemos os polos de poder, tanto
político quanto econômico; o que não sabemos é como vão evoluir (se os polos
econômicos ganharão dimensão política e estratégica) e de que maneira vão lidar
com suas relações mútuas (FONSECA Jr.; LAFER, 1997, p.61-62).
Pode-se dizer que as mudanças na ordem sistêmica produziram efeitos internos no
Brasil. Desse modo, destaca-se que a postura brasileira frente à Defesa Nacional e às Forças
Armadas teve uma mudança em 1996, quando foi lançado a Política de Defesa Nacional1
(PDN). Desde então, o Brasil têm se esforçado constantemente em estabelecer diretrizes de
segurança e de defesa, produzindo documentos que funcionem como um instrumento gerador
de confiança, tanto na região da América do Sul quanto no continente e no sistema
internacional.
1Documento que estabelece os objetivos e as diretrizes do país para a defesa nacional, com envolvimento do
setor militar e civil. Foi revisado em 2005 e em 2012, rebatizado de Política Nacional de Defesa.
16
No decorrer desse estudo, entende-se segurança como uma condição que permite o
país preservar sua soberania e integridade territorial, seguindo seus interesses nacionais. De
acordo com a PND, “a segurança, em linhas gerais, é a condição em que o Estado, a sociedade
ou os indivíduos se sentem livres de riscos, pressões ou ameaças, inclusive de necessidades
extremas” (BRASIL, 2012b, p.15).
Gradualmente, o campo da segurança passou a compreender os campos da política, do
ambiente, da cultura, etc. No entanto, esse trabalho irá abordar o campo da segurança sob a
lógica do Estado. Logo, a segurança deve ser vista sob um ângulo de confrontação entre
Estados; o mesmo deve se sentir livre de pressões ou ameaças. Já por defesa nacional,
compreende-se um conjunto de ações e medidas do Estado para defender seu território,
soberania e seus interesses nacionais, sob uma ótica militar (BRASIL, 2012b). Sendo assim, a
política de segurança e defesa de um país nada mais é do que uma política pública voltada
para a garantia da preservação do país e de seus objetivos.
No caso, destaca-se que é de interesse brasileiro dirigir uma política de segurança e
defesa para o Atlântico Sul uma vez que o mesmo possui uma gigantesca importância
estratégica para o país. Cabe mencionar que se define, segundo Therezinha de Castro2, o
Atlântico Sul como
Espaço marítimo compreendido entre: três frentes continentais, América, África e
Antártica; e três corredores, o do norte – constituído pela zona de estrangulamento
Natal-Dakar – e dois no sul – respectivamente entre a Antártica e as frentes
continentais americana/africana, comandada pelo Estreito de Drake e Passagem do
Cabo. É assim considerado o mais internacional dos oceanos (CASTRO, 1999,
p.19).
Tanto como via de comunicação como uma área rica em recursos naturais e
energéticos, o Atlântico Sul têm atraído, gradativamente, olhares de potências extrarregionais
para o entorno estratégico, sendo necessário, de acordo com autoridades brasileiras, uma
posição assertiva e dissuasória do Brasil com o intuito de garantir a preservação de seus
interesses na zona e soberania sobre as águas sul-atlânticas. Desse modo, esse projeto tem
como objetivo responder a seguinte pergunta: Como variou a percepção do Atlântico Sul
como espaço estratégico pelas políticas de segurança e defesa brasileiras a partir da década de
1990?
1.2. Justificativa do Estudo
2Historiadora, geógrafa e pesquisadora que se destacou no campo da Geopolítica no Brasil.
17
Vale salientar que o ambiente físico é um elemento essencial para se compreender as
relações políticas e até mesmo as relações internacionais. A partir disso, destaca-se que os
oceanos exerceram papel fundamental na história das civilizações não só na dimensão de
comunicação, como também importante fonte de recursos minerais e energéticos. Essa
importância só tende a crescer na medida em que novas pesquisas e tecnologias surgem e
viabilizam novas explorações.
Desse modo, é essencial para o país estudar e analisar as políticas de defesa e
segurança para essa área marítima a fim de assegurar seus interesses econômicos, estratégicos
e políticos. Primeiramente, para o país, essa região funciona como via de transporte de
commodities3, como fonte de exploração de petróleo e demais riquezas e até um meio para sua
projeção marítima internacional. Como se percebe no fragmento abaixo:
Atualmente, cerca de 95% do comércio exterior do Brasil transita por rotas
marítimas que passam pelo Atlântico Sul. Além disso, as descobertas recentes de
reservas offshore e as perspectivas de exploração do petróleo no pré-sal elevam a
preocupação com a segurança destes recursos e rotas, alçando a proteção de tais
recursos ao mesmo grau de prioridade que a Amazônia, conforme mencionado em
discurso da presidente Dilma Rousseff em 2011 (ABDENUR; NETO, 2014, p. 221).
Além disso, pelo fato de esse ser um tema que afeta a própria segurança do país,
demonstra que é um assunto que precisa estar em constante análise dada sua complexidade e
as mudanças ocorridas ao longo do tempo.
Esse projeto também é relevante para os estudos de Relações Internacionais. A
pesquisa irá contribuir para a área de estudos de segurança e defesa. Será necessário entender
um fenômeno que passou a entrar na agenda internacional, compreender como mudou a
percepção dos líderes sobre o Atlântico Sul e as consequentes políticas de defesa para região,
abrangendo pesquisas a respeito de uma construção de identidade sul-americana, de
complexos regionais de segurança4, de projetos de cooperação militar, de Soft Power
5 à luz de
teorias como o realismo neoclássico, por exemplo.
1.3. Marco Teórico
3 Termo que designa produtos cuja demanda não se influencia por questões de qualidade, fornecedores ou
marcas. A grande maioria das commodities são produtos extraídos da terra e que possuem preço universal. 4 A teoria dos CRS causou grande impacto, ao trazer a análise do nível regional para os estudos de segurança,
fazendo um diálogo entre teorias construtivista e o realismo ofensivo. Segundo Regions and Powers, de Buzan e
Waever (2003), os problemas de segurança estão mais associados à região, ainda que continuem sofrendo a
interferência do sistema internacional.Contudo, o que está ameaçado não é a região, mas sim o próprio Estado
naquela zona. A análise é regional porque a ameaça incide sobre aqueles atores dentro do âmbito regional
BUZAN; WAEVER, 2003). 5Nesse trabalho, será utilizado o conceito de Soft Power descrito na obra The Means to Success in World Politics
do ano de 2004 de Joseph Nye.
18
Ao longo de décadas, o realismo se impõe como teoria dominante tanto nos estudos de
Relações Internacionais como nos Estudos de Segurança. Pode-se dizer que por mais que,
atualmente, existam realismos diversos, algumas premissas podem ser consideradas comuns a
todos os teóricos realistas: a centralidade do Estado, sua necessidade de sobreviver no sistema
internacional, a necessidade de obter poder para garantir tal sobrevivência, a anarquia
internacional e o conceito de autoajuda6.
No entanto, para entender a variação da percepção do Atlântico Sul como um espaço
estratégico pela Política de Defesa Brasileira, a partir da década de 1990, o arcabouço teórico
que servirá de base para essa análise será o realismo neoclássico. Entende-se que os principais
conceitos dessa teoria culminam numa melhor análise para esse problema de pesquisa.
Como se sabe, o realismo neoclássico, uma combinação das teorias do realismo
clássico com o neorrealismo, sustenta que as ações de um Estado no sistema internacional
podem ser explicadas por variáveis sistêmicas, por variáveis cognitivas – como a percepção –
bem como por variáveis domésticas (como as instituições e os atores sociais dentro da
sociedade que afetam o poder e a liberdade de ação dos tomadores de decisão na política
externa). Como comenta o autor Schweller:
states assess and adapt to changes in their external environment partly as a result of
their peculiar domestic structures and political situations. More specifically,
complex domestic political processes act as transmission belts that channel, mediate,
and (re)direct policy outputs in response to external forces (primarily changes in
relative power). Hence states often react differently to similar systemic pressures
and opportunities, and their responses may be less motivated by systemic level
factors than domestic ones. (SCHWELLER, 2006, p.6 apud WILLIAMS 2008, p.
26).
Segundo Guideon Rose (1998), a forma como o Estado conduz sua política externa
depende do seu lugar no sistema internacional e da sua capacidade de poder material relativo,
ou seja, o que o Estado pode conseguir e agir perante os demais. Ademais, ao invés de
presumir que os Estados buscam sempre segurança, assume-se que eles buscam responder as
incertezas da anarquia, procurando controlar o ambiente externo.
Outro ponto importante do realismo neoclássico está relacionado ao papel das
percepções dos formuladores de decisão. Como são os indivíduos que atuam em nome do
Estado; a forma como o Estado vai se projetar depende de como os indivíduos percebem a
capacidade que o mesmo possui (WOHLFORTH, 1994).
A partir dos conceitos explicados, depreende-se que a forma com que o Brasil vai
conduzir suas políticas de segurança e defesa para o Atlântico Sul está relacionado a
6 Noção de que os Estados só podem contar com a sua própria capacidade no que diz respeito às relações
internacionais de acordo com a teoria realista clássica.
19
distribuição de poder no sistema internacional e a sua posição relativa nele. Somado a isso, as
escolhas dos líderes também são influenciadas pelos recursos disponíveis e pelo ambiente
político-institucional, econômico e cultural do país.
É inegável que o Atlântico Sul corresponde a um espaço estratégico para o Brasil. Nas
últimas décadas, o mesmo passou a ganhar destaque na Política Externa Brasileira uma vez
que se fez necessário assegurar direitos e interesses do país nesse entorno estratégico. Logo,
para compreender como o Atlântico Sul passou a gradativamente ganhar espaço nas políticas
de segurança e defesa brasileira devemos analisar os documentos oficiais do país e as
constantes iniciativas brasileiras voltadas para essas águas marítimas sejam de cooperação ou
dissuasão.
Além disso, visualizar a percepção dos formuladores de decisão e os constrangimentos
internos e externos que os mesmos sofreram para o estabelecimento de certas políticas,
demonstra como o país se projetou para o Atlântico Sul num determinado período. Pode-se
dizer ainda que as capacidades materiais e não materiais que o país detinha para determinar
suas ações também influíram na condução das políticas. Em outras palavras, o poder relativo
do Brasil, em um determinado momento, determina os parâmetros da sua política externa e a
distribuição internacional de poder pode guiar as atitudes e comportamento dos países. Sendo
assim, faz-se necessário analisar se o desenvolvimento de uma política de defesa e segurança
voltada para o Atlântico Sul baseada em estratégias de cooperação e dissuasão foi coerente
com o poder relativo material que o país possuía no momento vigente, visualizando se
posturas mais assertivas posteriores ocorreram em virtude de um aumento de poder relativo
seja material ou não material7.
Ainda que se tenha escolhido o realismo como base da análise, é importante considerar
outras teorias das relações internacionais que criticam alguns pressupostos realistas e que, por
vezes, também explicam a atuação brasileira no Atlântico Sul. O institucionalismo neoliberal,
por exemplo, apresenta uma abordagem menos pessimista das relações entre os Estados,
argumentando que não se deve desconsiderar o grande potencial existente para a cooperação
entre os Estados concretizada no âmbito de regimes e instituições. A partir da teoria dos
jogos, Keohane, precursor da teoria institucionalista neoliberal nas Relações Internacionais,
pretendeu demonstrar que os Estados enfrentam uma lógica da ação coletiva na busca de seus
interesses individuais e bem-estar próprio. Mesmo os Estados sendo reconhecidos como
7Entende-se que como poder não material, os mecanismos e as estratégias adotadas pelo país sem a adoção do
uso da força ou da capacidade bélica como a cooperação bilateral, a integração como forma estratégica, criação
de acordos de benefício mútuo, dentre outras iniciativas.
20
entidades egoístas e racionais, eles abdicariam desses ganhos no presente e reconheceriam as
instituições como meios para alcançar seus objetivos em longo prazo (KEOHANE, 1984).
Outra corrente que critica a análise realista nas relações internacionais é o
construtivismo. Analisar o processo de construção do discurso e da identidade é fundamental
para se entender a política de um país, segundo as perspectivas construtivistas. A autoimagem
de um país construída historicamente, politicamente e culturalmente representa um importante
elemento para se entender como o país irá formular sua política externa. Além disso, na
formação da política externa, o processo de construção da ameaça determina limites regionais
de segurança e até mesmo um espaço de identidade. Ao identificar-se com seus vizinhos
regionais, um país pode excluir a ideia de ameaças regionais ou estabelecer uma ameaça
comum a todos (JEPPERSON; WENDT; KATZENSTEIN, 1996).
Ainda assim, o trabalho terá como grande fundamento teórico o realismo neoclássico
reconhecendo que, em alguns momentos, outras correntes das relações internacionais podem
fornecer explicações diferentes sobre a política de defesa brasileira para o Atlântico Sul.
Desse modo, não podemos esquecer que a cooperação internacional, no realismo, funciona
como uma ferramenta de ampliação de poder ou manutenção do equilíbrio de poder no
sistema internacional.
Há mais de um século já se pensava na importância da defesa do mar, entretanto, nos
últimos anos, o mar começou a ganhar relevância na política externa brasileira e, até então, o
Brasil tem logrado sucesso em alargar sua presença no Atlântico Sul. Por outro lado, como
um país em desenvolvimento num sistema internacional sem governança global, é
compreensível que se faça necessário à construção de uma autonomia estratégica nacional,
com capacidade militar suficiente para fazer frente aos desafios e ameaças do mundo vigente.
1.4. Contribuições para o Tema
Diversos autores brasileiros já escreveram sobre a importância do Atlântico Sul para o
Brasil e os esforços estratégicos brasileiros voltados para a região.
Desse modo, cabe destacar algumas obras como A Fronteira Oriental Brasileira e os
Desafios da Segurança Regional no Atlântico Sul de Eli Alves Penha de 2012. O objetivo
principal do texto é discutir a importância crescente do Atlântico Sul como um espaço
estratégico para o Brasil e para os demais países costeiros, analisando concepções como a
21
‘fronteira oriental’ 8 e sua aplicação na política externa brasileira. Esse autor reforça a ideia de
que é fundamental que o Brasil estabeleça políticas direcionadas para a África.
A África seria a continuidade da própria fronteira Brasileira e, como ponto mais
vulnerável da região, deveria merecer maior atenção política por parte do governo
brasileira, em termos de segurança mútua. Segundo ele, por conta dessa
vulnerabilidade caberia ao Brasil, no contexto da guerra fria, ‘cooperar na
imunização também dos jovens países africanos à infecção fatal do comunismo,
estar vigilante e atento a qualquer propensão soviética na direção dessa África
Atlântica onde se situa a fronteira avançada e decisiva da própria segurança nacional
(SILVA, 1967 apud PENHA, 2012, p.118-119).
Também podemos destacar a obra O Atlântico Sul na perspectiva da segurança
regional e da defesa de Antonio Ruy de Almeida Silva a qual texto tem como objetivo
principal destacar a importância estratégica do Atlântico Sul para o Brasil e,
consequentemente, os desafios que o Brasil enfrentará para consolidar, nesse espaço
marítimo, uma zona de paz e cooperação, construindo uma “identidade atlântica” 9. O autor
fala da forte presença de atores extrarregionais na região como os Estados Unidos e, em
contrapartida, de alguns esforços brasileiros para a região como a criação da Zona de Paz e
Cooperação do Atlântico-Sul (ZOPACAS).
A obra O Brasil e a cooperação em defesa: a construção de uma identidade regional
no Atlântico Sul, de 2014, de Adriana Erthal Abdenur e Danilo Marcondes de Souza Neto
ressalta a necessidade brasileira em estabelecer programas de cooperação com países no
perímetro do Atlântico Sul, utilizando-se dessa estratégia para promover a construção de uma
identidade regional que começa a alterar as relações de poder nesse espaço. Segundo esses
autores:
Assim como o Estado, a região pode, portanto, ser pensada como comunidade
imaginada, com dimensões espaciais (Anderson 1983). A rotulação e reificação da
região traz consequências concretas, pois o próprio processo de construção afeta a
distribuição de poder. Por exemplo, ao assumirem um papel de protagonismo, certos
Estados se tornam, efetivamente, os principais construtores da região (region-
builders) – influenciando os padrões de amizade e rivalidade entre os Estados que
passam a constituir a região. (ABDENUR; NETO, 2014, p.6-7)
Vale lembrar-se de Wanderley Messias em Projeção do Brasil no Atlântico Sul:
geopolítica e estratégia do ano de 2012, o qual escreve sobre a projeção do Brasil sobre o
Atlântico Sul e a importância do país se estabelecer soberano sobre seu território marítimo.
Ademais, pode-se citar Lucas Oliveira, Marco Cepik e Pedro Vinicius Brites, na obra O Pré-
Sal e a Segurança no Atlântico Sul: A Defesa em Camadas e o Papel da Integração Sul-
8É uma ideia, utilizada desde o governo Castello Branco na qual o Atlântico Sul passou a representar a “fronteira
oriental” para o país, com base na formulação geopolítica de Meira Mattos (PENHA, 2012). 9Ideia de que esses países sul-atlânticos se sentem pertencentes a uma mesma comunidade, realçando laços de
fraternidade e amizade. Além disso, essa identidade está centrada em preocupações com novas ameaças nesse
entorno estratégico, enfatizando a responsabilidade de defesa desse território marítimo por cada país da região.
22
Americana de 2014, os quais vão tratar da questão do pré-sal no Atlântico Sul. O artigo
mostra possíveis desafios que o país terá de enfrentar para se estabelecer soberano sobre suas
riquezas sul-atlânticas.
Por último, não se pode esquecer grandes nomes da geopolítica brasileira como
Golbery do Couto e Silva, em Geopolítica do Brasil de 1967, Therezinha de Castro, em
Geopolítica. Princípios, meios e fins de 1999, e Meira Mattos, em Geopolítica e Modernidade
de 2002. Ainda que do século passado, esses grandes geopolíticos lançaram bases essenciais
para discussões de questões no século XXI como a defesa e segurança no Atlântico Sul. Eles
já falavam da necessidade brasileira em se lançar à África já que fazia parte do entorno
estratégico do Brasil.
Golbery do Couto e Silva (1967) afirma que o ‘Continente Negro’ seria a continuação
da fronteira brasileira e, consequentemente, o ponto mais vulnerável para o Brasil em termos
de segurança. Enquanto isso, Therezinha de Castro (1999) caracteriza a posição geográfica
brasileira como uma área ‘pivot’ para a defesa ocidental. Desse modo, o Brasil seria um
‘ponto chave’ entre as passagens marítimas caribenhas e austrais por conta da sua extensão
costeira. Por fim, Meira Mattos (2002) ressalta que nenhuma Marinha sozinha será capaz de
dissuadir potências ou resolver problemas no Atlântico Sul. Ademais, ressalta as
potencialidades brasileiras e sua capacidade em se tornar uma potência.
1.5. Hipótese e Metodologia da Pesquisa
Partindo de que foi explicado, essa pesquisa se baseia na hipótese de que a medida em
que inúmeras riquezas econômicas e estratégicas foram descobertas no Atlântico Sul, houve
uma mudança na percepção das lideranças brasileiras de que era necessário proteger a região,
em parte do século XX e no início do século XXI, sobretudo nas últimas três décadas.
Sabe-se que, desde meados do século XIX, o Atlântico Norte captou maiores atenções
globais, com clímaces durante a 1.ª e 2.ª Guerra Mundial e durante a Guerra Fria, enquanto, o
Atlântico Sul foi praticamente passivo, sendo caracterizado pela literatura internacional, de
uma forma geral, como uma região periférica. Pode-se dizer que essa situação começou a
mudar a partir da década de 90, e principalmente, no início do século XXI com a descoberta
de novas e importantes jazidas de petróleo e de gás natural em ambas as suas margens e a
crescente valorização de outros recursos naturais, fazendo com que a região fosse percebida
como alvo de várias ameaças externas. Desse modo, depreende-se que o Atlântico Sul passou
a ganhar um grande destaque na Política Externa Brasileira, sendo evidentes grandes esforços
23
em cooperação – seja militar, econômica, política e até mesmo social – com países africanos,
uma vez que se fez necessário assegurar direitos e interesses do país nesse entorno estratégico.
Dessa forma, o método de abordagem a ser utilizado neste estudo é um método
dedutivo, ou seja, utiliza-se uma teoria geral (as Políticas Externas dos presidentes em
questão) para tratar de um evento específico (as políticas de Segurança e Defesa adotadas
pelos mesmos) e, por fim, as estratégias adotadas por cada líder será visualizada com base nos
pressupostos do realismo neoclássico.
1.6. Sistematização
Essa monografia será estruturada em cinco partes principais, sendo estas a introdução,
três capítulos dedicados ao desenvolvimento da tese e a conclusão da pesquisa. Dessa forma,
acredita-se que com tais componentes este projeto contempla todos os elementos necessários
para alcançar o objetivo do estudo e chegar a uma conclusão.
Viu-se que, na introdução, um breve resumo foi apresentado de forma a demonstrar o
que será analisado nessa monografia. Essa primeira parte descreveu o problema de pesquisa, a
hipótese de pesquisa, a metodologia a ser adotada e obras que servirão de contribuição para o
tema discutido. Além disso, fomos capazes de perceber que, num primeiro momento, a década
de 1990 foi marcante para os rumos da política externa dos países e, no caso brasileiro, o país
buscou estabelecer diretrizes mais concretas para as políticas de defesa e segurança brasileira.
Diante da evidencia do Atlântico Sul como um espaço estratégico, fez-se necessário pensar
nesse oceano como uma questão principal no âmbito da segurança e da defesa.
Ao longo da análise serão abordados três eixos principais, correspondendo aos
seguintes capítulos: 1) A geografia e as potencialidades do Atlântico Sul; 2) A confluência e a
divergência de interesses no Atlântico Sul; e por fim, 3) A evolução das políticas de
segurança e defesa para o Atlântico Sul.
O primeiro capítulo do desenvolvimento da pesquisa consiste em, sobretudo,
caracterizar e delimitar a área tratada pela análise: o Atlântico Sul. Dessa forma, entende-se
que seria de extrema importância demonstrar algumas características geográficas desse
oceano e uma breve exposição acerca de sua delimitação. Além disso, fez-se necessário
enumerar as diversas riquezas naturais e energéticas presentes no Atlântico Sul, motivo de
interesses de países regionais e extrarregionais. Logo, detalhou-se também o fluxo comercial
presente essas águas, entendendo-se a razão de ponderar o Atlântico Sul como uma via
significação de comunicação marítima. E para completar essa primeira seção da análise, foi
24
considerado essencial narrar questões a respeito do Direito do Mar o qual vai dar respaldo
jurídico sobre a responsabilidade brasileira e a autorização desse país em atuar diante do
Atlântico Sul.
Para dar respaldo aos argumentos e fatos descritos, utilizaram-se diversos autores e
profissionais que já fizeram análises sobre essas questões como mapas, tabelas e figuras de
forma a ilustrar e comprovar o que estará sendo analisado. Acredita-se que, dentre outros
pontos, esse capítulo será capaz de demonstrar as potencialidades existentes no Atlântico Sul
e, devido a isso, servir de base para se compreender o motivo de confluências de interesses
nesse espaço estratégico e a necessidade brasileira em promover uma política de defesa e
segurança para a área.
O capítulo 2 irá se concentrar em descrever o Atlântico Sul como um espaço
estratégico onde potências regionais e não-regionais se esforçam para exercer influência sobre
a região. Será analisada a atuação dos principais Estados extrarregionais no Atlântico Sul,
visualizando não só o local onde eles se fazem presentes como a posição estratégica desses
países no entorno sul-atlântico. Também coube analisar a atuação brasileira frente a essas
águas, destacando os seus principais feitos e ações diante de um cenário de consolidação de
uma liderança regional a partir dos anos 1970.
Já o capítulo 3 do desenvolvimento tem por objetivo principal mostrar como os três
ex-presidentes, Fernando Henrique Cardoso, Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Roussef,
conduziram sua política externa e a política de defesa brasileira, sobretudo, para o Atlântico
Sul. A partir disso, foi realizada uma análise comparativa entre os três presidentes com base
nos documentos oficiais de defesa do Brasil e nos discursos oficiais proferidos por
representantes oficiais do governo brasileiro na qual se procurou entender se na medida em
que o Atlântico Sul foi sendo visto como um espaço estratégico e de extrema importância para
o Brasil houve uma preocupação com política de defesa nacional para a área.
25
2. CAPÍTULO I: A GEOGRAFIA E AS POTENCIALIDADES DO ATLÂNTICO
SUL
A ideia principal do capítulo é demonstrar os diversos potenciais econômicos e
energéticos no Atlântico Sul assim como o direito soberano do Brasil em se fazer presente
nessas águas. Dessa forma, o capítulo contemplará elementos explicativos sobre a geografia
do local, os recursos econômicos e energéticos presentes nessas águas, a importância desse
espaço como via de comunicação e uma explicação a respeito de uma parte do Direito
Internacional Público dedicada ao uso do mar.
2.1. A geografia e a geologia
Entende-se que a porção Sul do Atlântico possui particularidades geográficas que
sejam interessantes para o decorrer do estudo. Entretanto, vale salientar que alguns desses
pontos serão mais bem explicados em outras partes do estudo.
Para começar, a região chamada de Atlântico Sul está localizada entre a costa leste
sul-americana e a costa oeste africana. Limitado ao norte pelo eixo Natal-Decar e ao sul pelo
Oceano Glacial Antártico, o Atlântico Sul se encontra numa posição estratégica, o que lhe
permite a conexão interoceânica, tanto com o Oceano Pacífico quanto com o Índico
(GONÇALVES Jr, 2014). Ainda que não esteja no cerne das grandes rotas comercias,
revelou-se de extrema importância por ser uma rota alternativa aos canais de Suez e do
Panamá.
Tanto o mundo como o Atlântico Sul foram formados pela movimentação das placas
tectônicas10
. No caso, esse oceano passou a existir devido ao afastamento dessas estruturas
sobre as quais se encontram o continente da América do Sul e da África. Desse mesmo
processo, originou-se o maior grupamento de montanhas oceânicas do mundo, constituindo o
que podemos chamar de Dorsal Meso-Atlântica11
(WEGENER, 1966). Atualmente, as massas
continentais da África e da América do Sul continuam se afastando em virtude da contínua
movimentação das placas, e a dorsal aumentando com a constante injeção de magma. Cabe
lembrar que ao longo dessa estrutura, podem-se enxergar diversos arquipélagos como
Islândia, Açores, Jan Mayen, Kolbeinsey, Bermuda, Ascensão, Santa Helena, dentre outros.
10
De acordo com o IBGE, são porções da crosta terrestre limitados por zonas de convergência ou divergência.
Essas estruturas se movimentam, ocasionando atividades geológicas. 11
Relevo submarino formado pelo afastamento de placas tectônicas que se que se estende sob o Oceano Atlântico
e o Oceano Ártico, desde a latitude 87ºN até à ilha subantártica de Bouvet, à latitude 54ºS (BROZOSKI, 2013).
26
Fonte: http://vitingeo.wikispaces.com
A partir do final do século XIX, a topografia marinha começou a ser conhecida, com
pesquisas de HMS Challenger12
. Logo após a Segunda Guerra Mundial, ocorreu uma
sistematização do fundo dos oceanos com a finalidade de se conhecer os fundos marinhos
para melhor posicionar navios e embarcações. Partindo desse mapeamento, definiram-se três
partes oceânicas principais: as margens continentais, as bacias dos fundos oceânicos e as
cordilheiras meso-oceânicas (VIDIGAL et al., 2006, p.56).
É necessário falar sobre a variedade de relevos nos fundos oceânicos para
compreender a presença de recursos econômicos no Atlântico Sul. Assim como a parte
terrestre, os fundos oceânicos apresentam diferentes formas, cabendo destacar dentro das
margens continentais a plataforma continental, o talude continental, e a elevação continental.
Verificam-se também, em outras partes do oceano, planícies abissais, cordilheiras oceânicas e
fossas oceânicas.
Prolongamento da área continental, com profundidade de até 200 metros, a plataforma
continental é a área mais importante do relevo submarino. Nessa região, encontram-se
diversas formas de vida marinha uma vez que a luz solar atinge essa profundidade. Além do
12
Grande excursão realizada no período de 1872 a 1876 a qual foi responsável por diversas descobertas
oceanográficas (VIDIGAL et al., 2006).
Figura 1 - Estrutura Dorsal Meso-Atlântica
27
mais, é nela que são encontradas grandes de poços de petróleo e de gás procedentes das
rochas submersas (MACHADO, 2015).
O talude continental, localizado logo após a plataforma continental, inclina-se até o
fundo oceânico, atingindo entre 3.000 e 4.000 metros de profundidade. Ao contrário da
plataforma, seu relevo não é regular, podendo ser encontrado cânions e vales submersos.
Ainda que pouca, a luz ainda alcança áreas do talude. Enquanto isso, a planície abissal é uma
área extremamente profunda, com mais de 5.000 metros de profundidade, nas quais não há
incidência de luz e as temperaturas são baixíssimas (MACHADO, 2015).
Também são encontradas cordilheiras ou fossas oceânicas. Enquanto as cordilheiras
funcionam como uma cadeia de montanhas, geralmente, pelo afastamento das placas
tectônicas, as fossas representam grandes depressões estreitas e compridas, com
profundidades que chegam a 11.000 metros (VIDIGAL et al., 2006).
O Atlântico Sul, para o Brasil, representa uma grande fonte de riquezas. Dentre tantas,
localiza-se, na plataforma continental, as principais reservas petrolíferas do Brasil. Além
disso, a importância econômica e estratégica da região cresceu na medida em que foram
descobertos novos poços petrolíferos nas águas profundas sob jurisdição brasileira. As novas
reservas petrolíferas encontradas nas águas profundas que vai do Espírito Santo a Santa
Catarina repercutiram sobre as reservas do país. O desafio da exploração do pré-sal, assim
denominado esses grandes poços, pode ultrapassar os limites no âmbito das tecnologias
tradicionalmente utilizadas. Nesse sentido, ressalta-se a atuação da Petrobras em pesquisas e
desenvolvimento aplicado em atividades de extração de petróleo e gás em águas profundas
(COSTA, 2012).
2.2. Recursos energéticos
Pode-se afirmar que a oceanografia, no Brasil, teve início com o descobrimento do
país uma vez que já existiam valiosas informações sobre a costa brasileira. No entanto, o
grande impulso para a sua evolução foi a criação da Comissão Interministerial para os
Recursos do Mar (CIRM) em 1974. Essa comissão tinha por finalidade coordenar assuntos
referentes a consecução de uma Política Nacional para os Recursos do Mar13
(PNRN) e, dessa
13
Promulgada em 1980, visa estabelecer planos de ação e objetivos no campo de desenvolvimento de pesquisa,
ciência e tecnologia marinha, utilizando os recursos do mar de forma sustentável para o desenvolvimento
socioeconômico do país (VIDIGAL et al., 2006).
28
forma, ao longo dos anos, implementar programas importantíssimos visando a gestão e o uso
sustentável dos recursos marinhos (VIDIGAL et al., 2006, p.59-60).
Dente esses programas, cabe destacar o Programa de Avaliação do Potencial
Sustentável de Recursos Vivos na Zona Econômica Exclusiva14
(Revizee), Programa
Antártico Brasileiro15
, Programa Train-Sea-Coast Brasil16
(TSC-BR), Programa Arquipélago
de São Pedro e São Paulo17
, Programa de Avaliação da Potencialidade Mineral da Plataforma
Continental Jurídica Brasileira18
(Remplac) e até um Programa de Mentalidade
Marítima19
(VIDIGAL et al., 2006).
Partindo do pressuposto de que é interesse vital a garantia da sua própria segurança
estratégica, o Brasil ratificou, em 1988, a Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do
Mar (ONU, 1982). Por essa atitude, foi-se capaz de delimitar a fronteira marítima brasileira.
Hoje, consagrada como Amazônia Azul, pela PND e END, a área possui elevada importância
geopolítica e geoestratégica uma vez considerada a gama de recursos econômicos presentes
nesse oceano.
Fonte: http://www.defesa.gov.br/20
14
Coordenado pelo Ministério do Meio Ambiente, tem como finalidade principal realizar levantamento do
potencial sustentável da captura de recursos vivos na zona econômica exclusiva (VIDIGAL et al., 2006). 15
Programa que garantiu ao Brasil a capacidade de membro consultivo e, em 2012, de membro pleno no Tratado
da Antártica, apoiando a execução de pesquisas na região (VIDIGAL et al., 2006). 16
Sediado na Furg, tem por objetivo capacitar recursos humanos atuantes nas áreas costeiras e oceânicas. 17
Programa desenvolvido a fim de consolidar o direito de 200 milhas náuticas do país (VIDIGAL et al., 2006). 18
Programa Desenvolvido para efetuar análise e levantamento geológico-geofísico da plataforma continental
brasileira (VIDIGAL et al., 2006). 19
Programa dedicado a consolidar a compreensão pelo povo brasileiro da essencialidade do mar para a
sobrevivência do país (VIDIGAL et al., 2006). 20
Disponível em:
<http://www.defesa.gov.br/arquivos/ensino_e_pesquisa/defesa_academia/cedn/viii_cedn/altemonteiroviiicedn.pd
f >
Figura 2 – Amazônia Azul
29
A figura 2 ilustra o que seria a Amazônia Azul, como visto uma parte do Atlântico
Sul. Pode-se dizer que se trata de uma área estratégica do entorno brasileiro uma vez que
circula toda a vastidão do litoral do país somada a gama de recursos minerais e econômicos
presentes na região.
A expressão “Amazônia Azul”, vista pela primeira vez num artigo elaborado pelo
Almirante Roberto de Guimarães Carvalho, surgiu como apelo à sociedade brasileira para
atentar-se sobre a importância do imenso mar que nos cerca e da necessidade de existir uma
marinha capaz de defender os interesses brasileiros no Atlântico Sul (NETO et al., 2004).
Ainda sobre esse termo e a regulamentação dos espaços marítimos, Marianne
Wiesebron prosseguiu:
O termo Amazônia Azul foi lançado para chamar a atenção quanto às imensas
riquezas da área oceânica sob a jurisdição brasileira. Essa área abrange a ZEE de
200 milhas náuticas, com uma superfície de 3.539.919 km², enquanto a PC, até 350
milhas náuticas, correspondendo a 960 mil km². Somadas, elas abrangem 4.499.919
km², ou praticamente 4,5 milhões km², o que acrescenta uma área marítima
equivalente a mais de 50% da extensão territorial brasileira (WIESEBRON, 2013,
p.109).
O Atlântico Sul, de uma forma geral, é um área extremamente rica em petróleo e gás.
De acordo com a Energy Information Administration (2011), na África, encontram-se cerca
de 8% das reservas mundiais de petróleo e 7% das reservas de gás. Países como Angola e
Nigéria se destacam como os cinco maiores produtores de petróleo no continente. É de se
imaginar, portanto, que o Brasil, detentor de uma grande vastidão territorial marítima no
Atlântico Sul, tenha sob sua posse uma grande zona econômica.
Historicamente, desde a década de 1970, o Atlântico Sul representou uma fonte de
recursos energéticos para o Brasil. No entanto, somente no início do século XXI, um novo
cenário regional se abre para o país. Além da exploração petrolífera que já existia nas águas
sob domínio brasileiro, as novas jazidas na Bacia de Campos e, principalmente, os
promissores poços nas águas profundas da Bacia de Santos (pré-sal) reordenaram as diretrizes
e os objetivos brasileiros para a região (COSTA, 2012).
O Estado brasileiro usufrui de uma posição estratégica tanto no âmbito continental
quanto no âmbito marítimo. As descobertas de petróleo offshore21
deu destaque a esse oceano
até então com pouco peso no cenário global (RUCKS, 2014). Valem salientar que essas
bacias petrolíferas podem ser encontradas em ambas as partes do Atlântico. Além disso,
registra-se que a maior parte dos poços conhecidos se encontra dentro das 350 milhas da
plataforma continental preconizadas pela Convenção do Direito do Mar (CNUDM) de 1982.
21
São aquelas reservas que se encontram em área marítima.
30
A maior parte das reservas de petróleo e gás do Brasil encontra-se na plataforma
continental. Segundo a ANP (2011), a exploração dessas reservas corresponde a,
aproximadamente, 90% da produção atual do petróleo do Brasil e 75% da produção de gás
(BRITISH PETROLEUM, 2011). Analisando a tabela abaixo, percebe-se o processo histórico
de evolução das reservas e da produção petrolífera de alguns países, sendo cinco deles
pertencentes à ZOPACAS.
Fonte: BP Statistical Review of World Energy (2013)22
.
Nessa tabela, pode-se distinguir a Nigéria, a Líbia e a Venezuela como grandes
produtores de petróleo. Sabendo que a Nigéria é um país banhado pelo Atlântico Sul e, ao
mesmo tempo, extremamente instável e problemático, faz-se necessário um esforço em
cooperação pelos países banhados por esse oceano a fim de proteger e defender esses recursos
no Atlântico Sul. Na África, pode-se destacar o Golfo da Guiné – vai do Senegal ao Congo,
estendido a Angola – como um grande produtor petrolífero.
Diante desse cenário, no Brasil a Petrobras decidiu criar um programa, chamado
Programa de Capacitação Tecnológica em Águas Profundas (Procap), voltado para a extensão
e inovação em tecnologia no sistema de produção do petróleo. O Procap foi organizado em
quatro grandes temas: poço, elevação, escoamento, casco e ancoragem. Por outro lado, deve-
22
Disponível em: < http://large.stanford.edu/courses/2013/ph240/lim1/docs/bpreview.pdf >.
Tabela 1 – Reservas e produção dos principais países petrolíferos da América do Sul e da África.
31
se ressaltar que esse processo de mobilização e logística de Petrobras não é exclusivo da
empresa, ou seja, outras empresas e outros centros de pesquisa no exterior se interessam em
investir recursos para a exploração do petróleo no Atlântico Sul (VIDIGAL et al., 2006).
Segundo Fiore (2013), na região do Golfo da Guiné, no Gabão, no Congo, no Brasil e
em São Tomé e Príncipe são encontrados diversos recursos minerais. Ele afirma que
Também existem na Bacia Atlântica crostas cobaltíferas, nódulos poli metálicos
(contendo níquel, cobalto, cobre e manganês), sulfetos poli metálicos (contendo
zinco, prata, cobre e ouro), além de depósitos de diamante, ouro, e fósforo, entre
outros minerais relevantes, e já forma identificados grandes fontes energéticas e
mineiras na região da Antártida. Encontram-se na região grandes reservas de gás e
carvão, respectivamente na Namíbia e na África do Sul (FIORI, 2013, p. 8).
Como se sabe, o carvão pode ser utilizado como fonte alternativa ao petróleo. Logo,
esse mineral possui uma relativa importância no mercado intencional. Dessa forma, mais uma
vez, o Atlântico Sul chama atenção já que esse recurso energético pode ser detectado em
vários pontos da costa brasileira e da África do Sul. Agora, no que tange os minerais pesados,
as principais reservas no Atlântico Sul são de diamante na Namíbia e de ouro e diamante na
África do Sul (BROZOSKI, 2013).
Quanto ao Brasil, existe uma determinada expectativa em se encontrar metais
preciosos. Como se vê na figura 3, no litoral do Nordeste as pesquisas concentram-se nos
calcários marinhos. Muitos desconhecem, mas esse tipo de produção e exploração (areia,
cascalho, fosforita e calcário marinho) é de alta demanda e prioridade assim como
economicamente viável. O país também se dedica a pesquisar os sulfetos polimetálicos. O
arquipélago de São Pedro e São Paulo é um dos raros pontos em que a cordilheira atlântica
está sob jurisdição nacional e, onde o país pode desenvolver tais pesquisas e explorações. Por
fim, cabe destacar a elevação do Rio Grande, um monte marinho na altura dos Estados de
Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Segundo Luciana Christante, “pesquisadores estrangeiros
já estudaram a região no passado e obtiveram indícios da existência de crostas cobaltíferas,
ricas em manganês, níquel, platina, tálio e telúrio, além de cobalto” (CHRISTANTE, 2010,
p.25).
32
Fonte: CHRISTANTE, 2010.
Viu-se, então, que esse oceano contabiliza uma imensidão de reservas dispostas tanto
na costa sul-americana quanto na costa africana. Cabe, portanto, a esses países protegerem
suas riquezas marinhas uma vez que as mesmas têm atraído olhares de potências
extrarregionais (PENHA, 2012).
2.3. Via comercial e de comunicação
O Atlântico Sul é assim compreendido como um espaço marítimo geográfico que
abarca três frentes continentais – América, África e Antártida – e três corredores
estratégicos – ao norte, a zona Natal-Dakar, e, ao sul, entre a Antártida e o
continente africano, a Rota do Cabo, e entre a Antártida e a América do Sul, a
Passagem de Drake –, onde, historicamente, ocorreram importantes fluxos
econômicos e culturais e cujos contornos políticos dependem sempre do
relacionamento entre os países que compõem suas margens africana e sul-americana
(HORING; WEBER; CROSS, 2014, p. 487).
Figura 3 – Recursos Minerais na Amazônia Azul
33
Podemos dizer que o Atlântico Sul teve sua importância geopolítica gradualmente
acentuada desde a expansão ultramarinha europeia do século XV. Sabe-se que, durante esse
período, motivado pelo desejo de contornar a África e alcançar as Índias, as ilhas meso-
oceânicas desse espaço marítimo tiveram um papel logístico importante, abastecendo os
navios (HORING; WEBER; CROSS, 2014).
Com o descobrimento do Brasil, o Atlântico Sul passa a funcionar como uma rota para
o tráfego de escravos vindos da África. Ademais, o estreitamento econômico e político entre o
Brasil e África decorreram-se da transposição da corte portuguesa para o Rio de Janeiro, no
século XIX, e, com isso, as relações entre esses continentes se tornaram mais autônomas
(HORING; WEBER; CROSS, 2014).
Entretanto, o avanço europeu no continente africano, no século XIX, marginalizou o
peso do Atlântico Sul como uma rota marítima comercial. Além do mais, a construção do
Canal do Suez (1869) e do Panamá (1914) contribuiu para a diminuição da importância dessa
passagem.
Ainda que no contexto da Segunda Guerra Mundial o Atlântico Sul tenha
desempenhado um relevante papel logístico, essa revalorização foi passageira, deixando para
o fim do século XIX e início do século XX o seu ressurgimento como um espaço estratégico
no cenário político-econômico internacional. No início do século XXI torna-se visível o
aumento das relações entre os países que compõe o Atlântico Sul em razão da necessidade de
defesa dos interesses desses Estados sobre a gama de recursos naturais e energéticos sobre as
duas margens sul-atlânticas (HORING; WEBER; CROSS, 2014).
Com relação à África,
Em 2011, a Nigéria exportou mais de 2 milhões de barris de petróleo por dia, sendo
33% para os EUA (9% das importações estadunidenses), 28% para a Europa, 12%
para a Índia e 8% para o Brasil. Para a África do Sul as exportações foram de 3% do
total e para o Sudeste da Ásia (incluindo China) 5% do total exportado. Angola
exporta quase toda sua produção, cerca de 75 mil barris diários, sendo 45% de suas
exportações para a China, 23% para os EUA e 9% para a Índia. A Guiné Equatorial
exporta quase toda sua produção petroleira, destinando 30% de suas exportações
para os EUA, 41% para a Europa (sendo os principais destinos 14% para Espanha e
13% para Itália), 10% para o Canadá e 7% para a China (ainda 6% para o Brasil). O
Congo (Brazzaville) exporta 90% de sua produção, sendo 49% de suas exportações
para os EUA, 31% para a China e 10% para a França. O Gabão exporta 90% de sua
produção e tem como principais destinos EUA e Europa (FIORI; VATER;
PADULA, 2012, 139-140).
Sabendo que o Atlântico Sul é uma rota marítima capaz de interligar a África,
América, Europa e Antártica, pode-se dizer que a região entre o Atlântico e o Pacífico foi a
que tem demonstrado maior crescimento em comércio marítimo desde o fim do século XX.
34
Correspondendo a uma saída de utilização do Canal do Suez e do Panamá, o Atlântico Sul
serve como uma via de comunicação interoceânica (RICHARDSON et al., 2012).
Therezinha de Castro (1999) já apontava quatro rotas fundamentais no Atlântico Sul
para o desenvolvimento e a projeção do Brasil. Sem contar com a rota sul-americana,
passando pelo Rio da Prata até Trinidad, chegando à passagem de Drake, cabe destacar a rota
europeia23
, a rota africana24
e a própria rota do Cabo da Boa Esperança25
.
Por mais que s países pertencentes a região do Atlântico Sul não sejam os maiores
fornecedores de petróleo às potências extrarregionais, esse espaço se apresenta como uma via
substituta para países como os Estado Unidos, o qual depende em grande parte de importações
petrolíferas oriundas do Oriente Médio. O mesmo acontece com a União Europeia, ou seja,
segundo a Eurostat26
, ainda que seus principais fornecedores de petróleo sejam a Rússia, a
Noruega e a Líbia, não dependendo do Atlântico Sul como rota marítima, os europeus detém
relações comercias com a África do Sul (3º maior produtor de carvão para a União Europeia)
e com a Nigéria (7º maior exportador de petróleo e 6º exportador de gás para a União
Europeia). Sendo assim, esse oceano ganha determinada importância como via comercial.
Com respeito à China, dentre os países costeados pelo Atlântico Sul, os seus maiores
exportadores de petróleo são Angola, Brasil e Gabão como se pode observar na tabela 2.
Além do mais, o Atlântico Sul serve como espaço estratégico por conectar potência chinesa a
grandes fornecedores de minérios e alimentos.
Fonte: Comtrade27
23
Compreendida pela conexão entre o continente europeu e a América do Sul/África, através do estreitamento
do Atlântico, entre o Nordeste Brasileiro e Cabo Verde (CASTRO, 1999). 24
No sentido leste-oeste, conecta a África e a América do Sul (CASTRO, 1999). 25
Enquadrada na conexão interoceânica da África do Sul, congrega três continentes, sendo passagem de recursos
do Oriente Médio para a Europa e Estados Unidos (CASTRO, 1999). 26
Gabinete de Estatísticas da União Europeia disponível em: <http://ec.europa.eu/eurostat/>. 27
Disponível em <https://comtrade.un.org/>.
Tabela 2 – Importações chinesas
Tabela 2 - Importações Chinesas
35
Com relação ao Brasil, o fluxo comercial no Atlântico Sul constitui um fator
indispensável para se pensar na economia brasileira já que, atualmente, cerca de 90% das
importações e exportações brasileiras passam por essas águas (PENHA, 2011). Como grande
exportador de commodities, a figura 4 evidencia a importância estratégica do Atlântico Sul
para os interesses brasileiros.
Fonte: MILANI, 2014, p.28.
2.4. Histórico, Princípios e Delimitações do Direito do Mar
Há tempos as nações ambicionam dominar os mares, usá-los como via de
comunicação, como fonte de alimento e, muitas vezes, como palco de guerras para suas
conquistas. No entanto, a concreta normatização do mar só foi possível graças à liderança e
perseverança da Organização das Nações Unidas (ONU) e das conferências realizadas até se
alcançar a Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar (CNUDM) a qual, de uma
forma geral, concretizou a percepção da utilização dos oceanos como res communes28
da
sociedade internacional.
Desse modo, o Direito do Mar se consolidou como um novo ramo do Direito, dentro
do estudo do Direito Internacional Público, essencial para a proteção dos interesses dos
28“são bens insuscetível de apropriação, os que pertencem a todos Ex. ar, a água corrente, a luz do sol”
(AMARAL, 2006, p.336).
Figura 4 - Mercado Brasileiro de Agronegócio
36
Estados, delimitando os espaços marítimos e traçando as prerrogativas de soberania nessas
águas.
Pode-se falar que boa parte da compreensão normativa sobre o Direito do Mar
originou-se no costume, assim como acontece com outras áreas no Direito Internacional.
Como já mencionado, as relações estabelecidas sobre a utilização dos mares já era se pensado
antes mesmo da própria consolidação do Estado, por uma visão particular da Igreja Católica.
Assim, o mar, sendo obra do criador, seria um bem comum a todos, sendo livre a sua
utilização para a navegação ou até a sua exploração (MENEZES, 2015).
Contrastando a essa ideia e atendendo aos interesses dos reinos protestantes, Hugo
Grotius (1609) passa a defender o principio do mare liberum, ou seja, ainda que os todos
tenham o mar como propriedade comum à navegação, o mesmo não pode ser apropriado por
um Estado. Por outro lado, contrapondo essa ideia, o inglês John Selden (1635), defendendo
os interesses marítimos ingleses, passou a invocar o principio do mare clausum o qual alegava
que existia um direito de propriedade do mar nas proximidades do território da Inglaterra sob
domínio inglês, tratando o mar como objeto de apropriação (MENEZES, 2015).
Como consequência, essa discussão se manteve em pauta por anos e sendo assim, por
conveniência econômica e política, o principio da liberdade dos mares foi considerado na
relação interestatal perante o mar. Entretanto, os Estados se mostravam receosos quanto a
possíveis invasões e ataques aos seus territórios e passaram a considerar desde a Idade Média
o entendimento de uma norma costumeira, mais tarde formalizada, sobre a dimensão do mar
territorial. Essas nações entendiam que um espaço de três milhas náuticas, o que seria o mar
territorial, ficaria no alcance da soberania do Estado como forma de proteção estratégica de
diversas possíveis ameaças. Logo, ambas as perceptivas – mare liberum e mare clausum –
passaram a reger a relação dos Estados para com o mar (MENEZES, 2015).
Antes da codificação do Direito do Mar em meados do século XX, a sua primeira
tentativa de sistematização ocorreu em 1856, com a realização do Congresso de Paris29
e,
posteriormente, com a Convenção de Genebra30
de 1864. Como nesse contexto as relações
entre os Estados ainda ocorriam por meio de alianças estratégicas, não existia uma noção de
regras e de uma sociedade internacional consolidada. Subsequentes, as Conferências da Paz
de Haia (1889 -1907) e a criação da Sociedade das Nações (1919) estimularam a discussão da
necessidade de regras para coordenar o uso comum do mar. Não obstante, as discordâncias
entre os Estados acabaram por paralisar as discussões sobre o tema (MENEZES, 2015).
29
Regime do uso dos navios durante conflito. 30
Regime sobre as condições dos feridos em mar.
37
O desencadeamento da Segunda Guerra Mundial combinado ao processo de
descolonização contribuiu para o estacionamento do processo de regulamentação
internacional sobre o uso do mar. Alguns Estados passaram a alegar que a plataforma
continental poderia ser fonte de exploração dos países uma vez que a mesma representa a
continuidade do próprio território estatal. Desse modo, era necessário retornar as discussões
sobre o desenvolvimento do Direito do Mar de forma a regulamentar o seu uso (MENEZES,
2015).
Sendo assim, a criação da ONU representou uma retomada na busca dessa
regulamentação, englobando outros aspectos ainda não abordados como a exploração de
riquezas na área marinha. Então, em 1958, a Assembleia das Nações Unidas convocou a
Primeira Conferência das Nações Unidas sobre Direito do Mar a qual resultou em quatro
convenções sobre o Direito do Mar: 1) mar territorial e zona contígua; 2) plataforma
continental; 3) alto-mar; e 4) pesca e conservação dos recursos vivos do alto-mar. Entretanto,
a constante dificuldade em estabelecer a extensão do mar territorial influenciou a realização
da Segunda Conferência das Nações Unidas sobre Direito do Mar, em 1960, a qual terminou
sem o resultado esperado. Por fim, em 1973, a Terceira Conferência das Nações Unidas sobre
o Direito do Mar, que se desenvolveu em onze seções ao longo de nove anos, foi aprovada,
entrando, efetivamente, em vigor em 1994 (MENEZES, 2015).
A CNUDM, assinada em Montego Bay em 1982 e desde sua entrada em vigor em
1994, tem normatizado assuntos quanto aos usos dos espaços marítimos, inclusive aqueles
relacionados à explotação e exploração dos recursos naturais. Dotada de uma ampla aceitação
na comunidade internacional, contando com 167 Estados (ONU, 2016) é voltada para um
reconhecimento legal e formal da Ordem Pública dos Oceanos. Elaborada de forma a
estabelecer diretrizes de regulamentação da relação da humanidade com o mar, a CNUDM
tem funcionado como uma via de “promoção de uma real cooperação marítima internacional
dos Estados no plano mundial e regional” (RIBEIRO, 2015, p.91).
Pode-se dizer que existiram diversas razões para os Estados voluntariamente
firmassem essa convenção. Era imprescindível que os Estados formalizassem mecanismos de
controle da utilização dos oceanos em função do seu caráter transnacional. Já que não
existiam fronteiras, as áreas marítimas poderiam servir como zona de tensão mediante
interesses diversos dos Estados nessas áreas. Assim, como já explicado, o espírito norteador
dessas normas é o de cooperação mútua para a manutenção da paz e do progresso da
comunidade internacional (MENEZES, 2015).
38
Também podemos destacar outras razões como o controle do transito marítimo já que
o avanço tecnológico permitiu um crescente deslocamento de pessoas e mercadorias pelo
mundo ou até o reconhecimento de zonas marítimas como direito soberano de países.
Assentado pela ideia de justiça e de respeito ao Direito, segundo Wagner Menezes:
A boa-fé, a igualdade soberana, a não intervenção, a autodeterminação dos povos, o
respeito aos direitos humanos, a solução pacífica de controvérsias e a não agressão
ou uso da força são princípios do Direito Internacional que orientam a compreensão
do Direito do Mar (MENEZES, 2015, p.50).
A partir disso, cabe explicar sobre um principio fundamental do Direito do Mar: a
igualdade. Esse, por sua vez, não só justifica o pressuposto de que o mar para além da zona de
jurisdição do Estado corresponde a patrimônio comum da humanidade, como também elucida
que a igualdade não é e não pode ser absoluta uma vez que existem Estados com limitações
geográficas ou que, em razão ao seu pouco desenvolvimento econômico, não possuem
capacidade de explorar seus recursos marinhos. Essa mesma ideia envolve a lógica de
responsabilidade igualitária pela proteção e preservação do meio marítimo (MENEZES,
2015).
Quanto aos sujeitos no Direito do Mar, por excelência, são os Estados que se
submeteram à CNUDM. Considera-se também, as organizações internacionais como um ator
especial na construção de mecanismos de cooperação nesse Direito, no entanto, cabe lembrar
que esses mecanismos intergovernamentais são regidos e compostos por Estados. A CNUDM
inova ao permitir que empresas privadas ou pessoas físicas que explorem atividades nas áreas
marítimas sejam capazes de propor ações e demandas perante o Tribunal Internacional sobre o
Direito do Mar. Em resumo, os países, indivíduos, organização internacionais ou até empresas
privadas podem se engajar de forma a retirar algum tipo de benefício do mar, considerando
todos aqueles que se utilizam do mar para esse fim nos processos inerentes à Ordem Pública
nos Oceanos (McDOUGAL; BURKE, 1965).
A CNUDM fixou os seguintes limites a partir da lista de base: 12 milhas náuticas31
para o Mar Territorial e para a Zona Contínua32
; e 200 milhas para a Zona Econômica
Exclusiva (ZEE). A plataforma Continental também ficou delimitada a 200 milhas, podendo
ser revindicada perante a Comissão de Limites da Plataforma Continental (CLPC) da ONU a
sua extensão até o máximo de 350 milhas náuticas (MENEZES, 2015).
31
Unidade de medida, equivalente a 1 852 metros, utilizada quase exclusivamente para a área marítima e aérea. 32
Faixa compreendida logo após o mar territorial, juridicamente pertencente a área de alto-mar, fixada entre 12 e
24 milhas, na qual o Estado exerce sua jurisdição sobre a área, podendo fiscalizar e regular atividades marítimas
compreendidas na zona (VIDIGAL et al., 2006).
39
No que tange ao Mar Territorial, a CNUDM reconhece a jurisdição absoluta do Estado
sobre essa área, cabendo às embarcações particulares ou comerciais dos demais Estados
adentrar nessas águas em casos de passagem33
, mediante aviso. Por outro lado, a ZEE seria
uma área a qual o Estado costeiro possui direitos de soberania voltados exclusivamente para
propósitos de exploração e explotação, conservação e gerenciamento dos recursos naturais –
vivos ou não vivos – e dos leitos e subsolos marinhos (SCHRIJVER, 1997). Como já
mencionado, a exploração é permitida numa expansão marítima contada a partir da linha de
base até o limite de 200 milhas. Ainda que exista essa denominação “exclusiva”, a CNUDM
prevê que, em alguns casos particulares, esse espaço deve ser compartilhado com outros
países. Isso ocorre porque, diferentemente do Mar Territorial, a ZEE possui um regime
jurídico de sui generis34
de modo a limitar a atuação do Estado costeiro no seu interior
(JUDICE; PINON, 2016).
Fonte: MENEZES, 2015.
33
Deve ser uma travessia continua e rápida de forma a não produzir ameaças à paz, a segurança e a ordem do
Estado costeiro. 34
Entende-se que a ZEE, ao ser introduzida a CNUDM, não faz parte do alto-mar uma vez que os Estados
possuíam direitos soberanos sobre essa área, no entanto, esses direitos se limitam à exploração econômica da
área (VIDIGAL et al., 2006).
Figura 5 - Limites marítimos
40
Como se vê na Figura 5, além do Mar Territorial, da Zona Contínua e da ZEE, tem-se
o alto-mar. Assim, por exclusão, chamou-se alto-mar partes do mar o qual Estado algum pode
exercer qualquer tipo de soberania, conforme o artigo 1º da Convenção sobre o Alto-Mar
aprovada no contexto da Primeira Conferência das Nações Unidas sobre o Direito do Mar,
realizada em Genebra, 1958. No século XVIII, Emmer de Vattel já delimitava a natureza
jurídica do que seria o alto-mar:
O alto-mar não é de natureza a ser ocupado, e ninguém pode nele se estabelecer de
maneira a impedir outros de transitar por ele. [...] Ninguém tem o direito de
apropriar-se do uso do alto-mar. [...] Nenhuma nação tem, pois, o direito de tomar
posse do alto-mar, ou de atribuir-se o direito de usá-lo, com a exclusão de outros
(VATTEL, 2004, p. 179-183).
Portanto, o alto-mar é um espaço comum aos Estados onde todos possuem direitos
iguais, não podendo revindicar qualquer tipo de direito preferencial que não esteja
mencionado na CNUDM. Dentre os direitos que os Estados possuem nessa área marítima,
cabe enumerar alguns como: a) liberdade de instalação de cabos e oleodutos; b) liberdade de
construção de ilhas artificiais e outras instalações; c) liberdade de sobrevoo; d) liberdade de
pesca; e) liberdade de pesquisa científica; f) liberdade de navegação (MENEZES, 2015).
Ainda sobre esse assunto, convenhou-se chamar de Área35
a parte do solo e subsolo
marinho situados além da jurisdição de algum Estado, sendo reconhecida como patrimônio
comum da humanidade. Como nenhum Estado pode exercer ou reivindicar soberania sobre
esses recursos, coube a Autoridade Internacional dos Fundos Marinhos atuar e legislar sobre
esse espaço (VIDIGAL et al., 2006).
Vê-se também na Figura 5 o que se chama de Plataforma Continental. De acordo com
o artigo 76° da CNUDM, essa área representa o leito e o subsolo das áreas submarinhas que
compreende toda a extensão do prolongamento natural de seu território terrestre até o bordo
exterior da margem continental, ou até a distância de duzentas milhas marítimas das linhas de
base. Diante disso, é necessário entender que existem diferenças entre a Plataforma
Continental e a ZEE relacionadas a delimitações quanto aos direitos concedidos ao Estado
(VIDIGAL et al., 2006).
Primeiramente, a definição de plataforma continental na CDUM abarca um conceito
jurídico, o qual teve existência com o Direito Internacional. Enquanto a ZEE compreende uma
área entre o fim do mar territorial até um limite de 200 milhas, a Plataforma Continental pode
atingir até 350 milhas náuticas a partir da linha de base. Por vezes, a Plataforma Continental
pode coincidir com a ZEE, no entanto o direito dos Estados sobre elas se diferem
(MENEZES, 2015).
35
Conceito jurídico que compreende os espaços marinhos que não estejam sob o domínio de nenhum Estado.
41
Como é visível na figura 6, no espaço da Plataforma Continental, os Estados possuem
soberania para exploração do leito e do subsolo marinho. Entender essa questão é
extremamente importante para a defesa dos interesses nacionais do Estado. Nesse contexto,
julga-se oportuno ressaltar um episódio que ocorreu com o Brasil em 1962-1963, levando-o a
guerra 36
com a França. O conflito, que ficou conhecido como a Guerra da Lagosta, ocorreu
por conta do apresamento de navios de pesca franceses por embarcações de guerra brasileiras.
O conflito ocorreu devido à interpretação da Convenção sobre a Plataforma Continental de
1958 a qual afirmava que os Estados costeiros exercem direitos soberanos sobre a mesma no
caso de exploração e aproveitamento de recursos naturais. A França, alegando que a lagosta
se movimentava em massa líquida, não poderia ser considerada recurso da plataforma
continental brasileira. Entretanto, o Brasil alegava que poderia apreender os navios franceses
que estavam praticando a pesca porque a lagosta é um animal que se locomove em solo
marinho, deslocando-se por saltos. Por fim, a tese brasileira foi validada e o conflito acabou.
Além do mais, esse conflito contribui para estabelecer bases mais concretas para a Convenção
de 1994 (VIDIGAL et al., 2006).
Fonte: EMEPC (2009) 37
.
36
Não ocorreu a guerra entre os dois países uma vez que ficou comprovado que a tese brasileira estava correta. 37
Disponível em: <http://www.ordemengenheiros.pt/fotos/editor2/eng.naval/9projecto_emepc.pdf>.
Figura 6 - Direito do Estado sobre os espaços marítimos
42
Outro princípio que permeia o Direito do Mar ligado diretamente à divisão e
delimitação das ZEE e da Plataforma Continental é o da equidistância. Entende-se pela
CNUDM que
Quando as costas de dois Estados são adjacentes ou se encontram situadas frente a
frente, nenhum desses Estados tem o direito, salvo acordo de ambos em contrário, de
estender o seu mar territorial além da linha mediana cujos pontos são eqüidistantes
dos pontos mais próximos das linhas de base, a partir das quais se mede a largura do
mar territorial de cada um desses Estados. Contudo, este artigo não se aplica quando,
por motivo da existência de títulos históricos ou de outras circunstâncias especiais,
for necessário delimitar o mar territorial dos dois Estados de forma diferente
(BRASIL, Decreto nº 1.530, de 22 de junho de 1995). Visto isso, muitos países não entram em acordo com as delimitações de sua fronteira
marinha, cabendo a Corte Internacional de Justiça (CIJ) julgar e solucionar casos de
controvérsias.
Quanto ao regime de ilhas, pode-se dizer que o mar territorial, a zona contínua, a ZEE
e a plataforma continental desse espaço serão determinadas de acordo com a CNUDM. No
entanto, os rochedos que não se apresentam à habitação humana ou à vida econômica não
devem possuir ZEE ou plataforma continental. Essa distinção entre o que seriam rochedos e o
que seriam ilhas é um pouco problemática na medida em que a CNDUM não detalha o que
seria ao certo uma habitação humana e uma vida econômica para que esses pedaços de terra
sejam considerados ilhas ou rochedos. O Brasil, por exemplo, ao final dos anos 1990, adotou
algumas providências em relação aos rochedos de São Pedro e São Paulo para se
caracterizarem como ilhas, cabendo obter ZEE e plataforma continental sobre esses espaços:
mudou-lhes o nome de “rochedos” para arquipélagos; construiu e instalou um farol; e
construiu uma estação científica permanente composta por quatro pesquisadores (VIDIGAL
et al., 2006).
Por último, cabe mencionar a respeito da proteção do meio marinho e da investigação
científica marinha. Todos os Estados têm por obrigação proteger e preservar o meio marinho
ainda que na área sob sua jurisdição. Todos devem, igualmente, adotar leis e regulamentos a
fim de prevenir e controlar a poluição do espaço marítimo. Já na investigação científica
marinha, os Estados possuem direitos de realizar investigações exclusivamente com fins
pacíficos. No caso, sob a área de jurisdição de outro Estado, a pesquisa deve ser realizada com
o consentimento do Estado costeiro e o mesmo pode exigir suspensão de qualquer atividade
desde que não esteja sendo conduzida de acordo com a CNUDM e com os termos acordados
com o Estado costeiro (VIDIGAL et al., 2006).
43
2.5. O Brasil e o Direito do Mar
É importante entender a aplicabilidade da III CNUDM na soberania brasileira frente às
águas no Atlântico Sul, buscando demonstrar que o Brasil possui autonomia e soberania para
além de seu território e das suas águas interiores. A utilização da CNUDM, adotada em
Montego Bay, pelo país corresponde a uma nova realidade para a exploração dos mares,
respeitando o princípio do res communis para áreas marítimas fora da jurisdição de um
Estado. Pode-se dizer que o Brasil se empenhou em elaborar um regime jurídico que
protegesse e salvaguardasse seus interesses nacionais.
Nos últimos anos, o país desenvolveu algumas ações, voltadas ao Atlântico do Sul, as
quais exemplificam seu interesse pelo Direito do Mar: a extensão da plataforma continental
para além das 200 milhas (projeto passou a ser chamado nos documentos oficiais brasileiros
de Amazônia Azul), o Programa Arquipélago de São Pedro de São Paulo
(PROARQUIPELAGO), o Programa de Pesquisas Científicas na Ilha da Trindade
(PROTRINDADE) e o Programa de Prospecção e Exploração de Recursos Minerais da Área
Internacional do Atlântico Sul e Equatorial (PROAREA) (SILVA, 2015).
Posteriormente a Guerra da Lagosta, vivenciada pelo Brasil e a França, um fato que
repercutiu internacionalmente ligado à esfera do Direito do Mar foi o alargamento do mar
territorial brasileiro para 200 milhas por meio do Decreto-lei n. 1098 de 1970. Nessa época,
diversos países latinos já haviam adotado essa medida, sendo que o Brasil se mostrava
relutante a expandir a esse limite. Aos poucos o país foi aumentando essa medida e as razões
pelas quais o Brasil expandiu de 12 milhas para 200 milhas tiveram razões tanto internas
como externas (SILVA, 2015).
No entanto, houve um rebuliço por parte dos Estados desenvolvidos em torno do
debate a cerca da expansão do mar territorial em 200 milhas, ficando determinada pela III
Conferência das Nações Unidas sobre o Direito do Mar a definição da largura máxima de 12
milhas marítimas contadas a partir da linha de base para o mar territorial dos Estados. Para
abrandar o assunto e chegar a uma solução conciliatória, criou-se o conceito de ZEE a qual
teria um limite máximo de 200 milhas náuticas (SILVA, 2015).
Já era de se imaginar que, inicialmente, essa proposta tenha sido mal recebida pelo
governo brasileiro o qual tentou, por anos, se opor ao consenso. No entanto, como a adoção
da CNUDM só ocorreu 12 anos depois da sua elaboração, o Brasil pertencia a outro tipo de
regime interno, entendendo que a CDUDM corresponde a um mecanismo importante de
44
controle sobre os mares. Em 1993, o país elabora o Decreto-lei 8.617, revogando o antigo
Decreto-lei. Diante disso, tem-se
Art.1° O mar territorial brasileiro compreende uma faixa de doze milhas marítima de
largura, medidas a partir da linha de baixa-mar do litoral continental e insular, tal
como indicada nas cartas náuticas de grande escala, reconhecidas oficialmente no
Brasil.
[...]Art.6° A zona econômica exclusiva brasileira compreende uma faixa que se
estende das doze às duzentas milhas marítimas, contadas a partir das linhas de base
que servem para medir a largura do mar territorial (BRASIL, 1993).
A partir da entrada em vigor da CNUDM, em 1994, o Decreto n. 1530 passou a dar
efeitos dessa convenção dentro do Brasil. Uma das principais novidades da CNUDM foi a
nova definição de plataforma continental. Dotada de um conceito jurídico e não geológico, o
Estado pode utilizar-se de um limite de 200 milhas náuticas, cabendo sua expansão até 350
milhas, para a exploração do solo e subsolo marinho. Submetida à CLPC em 2004, o Brasil
foi um dos primeiros Estados a pleitear a extensão da sua plataforma de acordo com o artigo
76 da CNUDM. O Brasil, detentor de uma extensa margem continental, fez um pleito o qual
abrangeria as principais províncias e interesses brasileiros. Entretanto, a proposta foi
recusada, cabendo ao Brasil à apresentação de uma nova proposta à CLPC. Diante desse
cenário, após uma nova proposta à CLPC, o governo brasileiro declarou que
[...] independentemente de o limite exterior da Plataforma Continental (PC) além das
200 MN não ter sido definitivamente estabelecido, o Brasil tem o direito de avaliar
previamente os pedidos de autorização para a realização de pesquisa na sua PC além
das 200 MN, tendo como base a proposta de limite exterior encaminhada à
Comissão de Limites da Plataforma Continental (CLPC), em 2004 (CIRM, 2010).
Com vistas em aumentar sua presença no Atlântico Sul, o Brasil criou o
PROARQUIPELAGO, em 1996, em que seu objetivo principal era uma implementação de
uma Estação Científica permanente na área. Criou também o PROTRINDADE, em 2007, que
tem por objetivo promover e gerenciar o desenvolvimento de pesquisas científicas nessas
ilhas e na área marítima adjacente. Por último, em 2009, o Brasil criou um projeto
interessante chamado PROAREA. Diferente dos demais, esse projeto não ocorre dentro dos
limites nacionais e, sim no que a CNUDM estabeleceu como Área. A Convenção criou um
órgão denominado de Autoridade Internacional dos Fundos Marinhos que tem por finalidade
cuidar da Área e dos recursos presentes nela. Como essa Área é patrimônio comum da
humanidade, o Brasil por meio de um contrato com a Autoridade começou a realizar
pesquisas nesse espaço marítimo. É de se imaginar que o programa tenha por objetivo geral
identificar áreas de valor econômico e de importância político-estratégico para o Brasil, ainda
que sob os moldes da CNUDM.
Na figura 7 ficam visíveis as limitações brasileiras no Atlântico Sul e o aumento de
sua presença com a posse dessas ilhas marítimas.
45
Figura 7 - Limites Marítimos Brasileiros
Fonte: NÁUTICO (2015) 38
.
38
Disponível em: <http://salvador-nautico.blogspot.com.br/2015/05/amazonia-azul.html#!/2015/05/amazonia-
azul.html>.
46
3. CAPÍTULO II: CONFLUÊNCIA E DIVERGÊNCIA DE INTERESSES NO
ATLÂNTICO SUL
Diante do enorme potencial energético, econômico e de comunicação, o Atlântico Sul
tem sido alvo de crescente atenção no cenário internacional. O potencial da área resultou em
convergências e divergências de interesses estratégicos dos estados costeiros e até mesmo de
outros fora da região. Sendo assim, esse capítulo tem por objetivo demonstrar como o essa
zona estratégica despertou o interesse dos Estados e como eles têm atuado na região (COSTA,
2012).
3.1. Atlântico Sul como Espaço Estratégico
Os mares e os oceanos possuem um papel importante na história da humanidade.
Desde a obra de The Influence of Sea Power Upon History de 1890, de Alfred Mahan, a qual
realçava a relevância da utilização do mar pelas grandes potências, os oceanos passaram a
dotar de uma crescente valorização. Dessa forma, pode-se dizer que as percepções e
avaliações a respeito da importância estratégica do Atlântico Sul vêm se alterando nos últimos
anos em razão às grandes descobertas econômicas e à intensificação dos fluxos comerciais na
área, principalmente (RUCKS, 2014).
Em primeiro lugar, os recursos energéticos ocupam papel de destaque no mundo.
Como já visto, quer na costa da América do Sul, em especial o Brasil, quer na costa ocidental
africana, em especial a Nigéria, Angola, Costa do Marfim, Camarões, Congo e Gabão, a
existência de jazidas de minérios como as grandes áreas de exploração de petróleo e gás
natural atraem interesses para a região. Vale lembrar que essa relevância não resulta apenas
do volume de riquezas existentes em ambos os lados do Atlântico Sul, mas também da visão
estratégica de grandes potências em diversificar suas fontes de abastecimento energético e
reduzirem sua dependência do petróleo vindo do Oriente Médio (NEVES, 2013).
Somado a isso, o crescimento das economias margeadas por esse oceano gerou uma
expansão das exportações e, por consequência, um aumento do fluxo comercial sobre as águas
do Atlântico Sul. Além disso, vimos que o Atlântico Sul funciona como uma rota alternativa
de ligação entre o Pacífico e o Atlântico, atraindo foco de potencias extrarregionais. Também
se pode sublinhar a importância do Atlântico Sul como base de projeção para a Antártida,
uma área na qual as principais potências se posicionam para uma corrida em busca dos
recursos energéticos e minerais existentes, ainda que não explorados (NEVES, 2013).
47
Dessa forma, vê-se o Atlântico Sul como cenário de competição por influências e
obtenção de poder. Tanto os Estados Unidos, como a Índia, a China, a França e Inglaterra
buscam projeção e posição geoestratégica nessas águas como forma de expansão de poder. A
emergência do Brasil como poder regional, preocupado em garantir a segurança da Amazônia
Azul, conflita com interesses de potências extrarregionais já que o veem como uma ameaça
(NEVES, 2013).
É necessário considerar outro geoestrategista que pondera sobre a teoria do
Heartland39
, formulando a teoria do Rimland40
: Nicholas Spykman. A visão desse geógrafo
sugere uma atuação dos Estados Unidos para a América Latina de forma a se manter como
potência de supremacia mundial. Para Fiori; Padula; Vater,
Uma questão importante a ser considerada é a posição relativa da América do Sul
em área geoestratégica, de interesse e ação (direta e indireta) permanente por parte
dos Estados Unidos. Sua postura intervencionista e imperialista na região se respalda
na sua estratégia geopolítica de se tornar árbitro político e exercer controle sobre a
massa de recursos do hemisfério ocidental, não deixando que nenhuma potência do
hemisfério oriental, ou a emergência de uma potência ou coligação de países no
continente americano, venha contestar ou ameaçar seu predomínio hemisférico. Esta
concepção geopolítica foi formulada por Nicholas Spykman (1942), para quem o
predomínio estadunidense no continente deve ser incontestável e irrevogável para a
sua segurança (FIORI; PADULA; VATER, 2012, p.109).
A visão de Spykman levou os Estados Unidos a incorporar uma postura em relação à
America do Sul. Com as descobertas das grandes reservas energéticas brasileiras, sobretudo o
pré-sal, os Estados Unidos reativaram a IV Frota naval, alegando que era necessário patrulhar
as águas do Atlântico Sul. No entanto, sabe-se que essa posição norte-americana denuncia
uma linha de ação mais realista e imperial a fim de delimitar sua zona de influência
(BROZOSKI, 2013).
Em vista disso, surge a necessidade a garantir o controle das linhas de comunicação
como exercer soberania, de acordo com os princípios do Direito do Mar, sobre as enormes
reservas naturais existentes no Atlântico Sul. Sendo assim, ainda que o Brasil esteja inserido
numa região que apresenta poucos conflitos, fazem-se necessárias iniciativas direcionadas a
defesa e segurança da região.
A PND contempla a América do Sul, o Atlântico Sul, a Antártida e os países lindeiros
africanos como parte do entorno estratégico brasileiro, tratando a América do Sul e o
Atlântico Sul como áreas prioritárias. Logo, considerado como uma área estratégica existe
39
Teoria desenvolvida por Mackinder na qual defendia que o controle político e militar dc oração da terra,
localizado na Rússia, representaria o domínio dos recursos demográficos e naturais da eurásia e, por conseguinte,
a chance de controlar o mundo (MACKINDER, 1996). 40
Reformulando a teoria de Makinder, sugere que quem tem o poder mundial não é quem controla diretamente o
‘coração do mundo’, mas sim quem é capaz de cercá-lo.
48
uma preocupação constante pelos países margeados pelo Atlântico Sul com questões de
segurança tradicionais e não tradicionais41
.
Vale destacar que o Atlântico Sul dispõe de um conjunto de ilhas as quais lhe
conferem caráter estratégico para se projetar sobre a África, a América do Sul e a Antártica. A
existência dessas porções de terra no meio do oceano permite que os Estados instalem bases
militares, facilitando a circulação de meios navais como aéreos. Ainda sobre essas ilhas,
Therezinha de Castro formula a tese dos triângulos geoestratégicos do Atlântico Sul. Segundo
a geógrafa, nesse espaço marítimo estão dispostos três triângulos cujos vértices correspondem
às ilhas presentes como se pode ver na figura 8. Dessa forma, o primeiro triângulo representa
as Ilhas Ascensão, Santa Helena e Tristão da Cunha servindo de projeção tanto para a
América do Sul como base de apoio para o controle da Rota do Cabo. Já o segundo triângulo
corresponde ao Arquipélago de Fernando de Noronha, na ilha de Trindade e no arquipélago
das Malvinas, permitindo, sobretudo, o controle da passagem Atlântico-Pacífico. Quanto o
último triângulo, formado pelos arquipélagos subantárticos de Shetlands do Sul, Orcadas do
Sul e Gough, Geórgias do Sul e Sanduíches do Sul, representa uma rota alternativa para
projeções sobre o continente americano e a África (HORING; WEBER; CLOSS; 2014).
A presença desse cinturão de ilhas no Atlântico Sul condiz a um alto valor estratégico
à região uma vez que, além de servir de projeção e passagem, “a soberania sobre estas ilhas
implica o direito à exploração de suas respectivas zonas econômicas exclusivas, muitas das
quais apresentando reservas minerais e energéticas” (HORING; WEBER; CLOSS; 2014,
p.492).
Fonte: CASTRO, 1999, p.309.
41
A pirataria e o tráfico de drogas e pessoas na região estão causando alarde nos países que detêm interesses na
região, principalmente no Golfo da Guiné (GUIMARÃES, 2015).
Figura 8 - Triângulos Estratégicos
49
Diante das inúmeras potencialidades do Atlântico Sul, tornando-o um espaço
estratégico é essencial avaliar o equilíbrio de forças presentes nessas águas e, particularmente,
a atuação brasileira em incrementar sua capacidade de integração regional.
3.2. Atuação e esforços extrarregionais no Atlântico Sul
O Sistema Internacional mais uma vez tem se mostrado progressivamente instável,
na medida em que as grandes potências continuam dispostas a defender seus
interesses, se necessário, por meio da força contra os mais fracos. A instabilidade
política tornou-se crescente no mundo, especialmente em regiões disputadas entre as
grandes potências. (...). Tornaram-se ainda mais claras as novas disputas
internacionais pelo controle de reservas de recursos petrolíferos ou gasíferos, ao
ponto de se estabelecer uma clara disputa estratégica pelo controle das rotas de
passagem ou escoamento destes recursos através de oleodutos ou gasodutos
(OLIVEIRA, 2010, s/p).
Nos últimos anos, o Atlântico Sul têm captado atenções em virtude de seu grande
potencial estratégico. Sendo assim, diversas potências externas a região e até mesmo a
Organização do Tratado do Atlântico Norte 42
(OTAN), sob liderança norte-americana, têm
procurado se fazer presente no Atlântico Sul. A figura 9 ilustra a dimensão da presença das
principais potências externas no entorno do Atlântico Sul. Diante disso, faz-se necessário
analisar a atuação e os esforços dos principais países nessa região a fim de projetar influência
e fazer valer seus interesses econômicos, estratégicos e até militares.
Fonte: Ministério da Defesa43
42
Organização Militar Intergovernamental de Defesa criada no contexto da Guerra-Fria a qual permaneceu
mesmo após a queda da URSS. 43
Disponível em:
<http://www.defesa.gov.br/arquivos/ensino_e_pesquisa/defesa_academia/cedn/viii_cedn/altemonteiroviiicedn.pd
f>.
Figura 9 - Presença de Potências Extrarregionais no Atlântico Sul
50
3.2.1. Os Estados Unidos no Atlântico Sul
Após dominar Cuba, Porto Rico e as Ilhas Virgens, já se via uma intenção norte-
americana em controlar as rotas do Golfo do México e o que viria a ser o Canal do Panamá. A
partir daí, os Estados Unidos começou a se firmar como uma grande potência marítima no
Oceano Atlântico, estabelecendo somente no final do século XX e início do século XXI, uma
estratégia um pouco diferenciada para o Atlântico Sul (HORING; WEBER; CLOSS, 2014).
Desde a Guerra Fria, os Estados Unidos detinham de mecanismos militares de controle
sobre o Atlântico Sul ainda que o mesmo ocupasse uma posição marginal na geoestratégia das
superpotências. A importância do Atlântico Sul se restringia a servir como uma rota marítima
e como fonte de recursos energéticos, controlada por potências Ocidentais. Sabe-se que a
criação desses mecanismos foi resultado de uma sequência de eventos relacionados à
bipolaridade que se formou após a Segunda Guerra Mundial, os quais tinham por objetivo
defender essa área da ameaça soviética (HORING; WEBER; CLOSS; 2014).
Dentre os principais eixos de ação voltados para o Atlântico Sul, cabe destacar o
Tratado Interamericano de Assistência Recíproca (TIAR). Celebrado em 1947, o TIAR tinha
como princípio central a ideia da “doutrina de defesa hemisférica”, ou seja, um ataque contra
um membro do tratado consistiria em um ataque a todos. No entanto, esse tratado tinha uma
funcionalidade precária uma vez que, além de seu caráter bilateral44
, não envolvia comandos
militares combinados e planificados como acontecia com a OTAN (OLIVEIRA; NETTO,
2016). Sob a ótica do realismo neoclássico de que a política externa de um Estado vai
depender do seu lugar no sistema internacional, da sua capacidade de poder material e a
necessidade de responder as incertezas da anarquia, presume-se que isso já era esperado
porque o objetivo principal norte-americano, ocupando uma posição de superpotência, estava
centrado em combater a ameaça comunista, voltando a maior parte de sua atenção para a
Europa (ROSE, 1998).
Com o fim da Guerra Fria, o Atlântico Sul não ocupava uma posição de destaque na
pauta política norte-americana. Pode-se dizer que a falta de uma ameaça aparente nessas
águas fez com que esse país reduzisse seu orçamento militar para a região. No entanto, as
turbulências ocorridas no sistema internacional em razão dos atentados terroristas contra as
embaixadas estadunidenses em Nairobi e em Dar El Salaam, em 1998, e do ataque de 11 de
44
Os Acordos estabelecidos não tinham um caráter multilateral, ou seja, os Estados Unidos tratava de cooperar
militarmente com cada país sul-americano.
51
Setembro, em 2001, no próprio território dos Estados Unidos, fez com que o Estado adotasse
uma doutrina significante para o Atlântico Sul (HORING; WEBER; CLOSS, 2014).
Compreende-se, então, que os Estados Unidos passaram a ver o terrorismo como a
principal ameaça a sua liderança global. Partindo da visão de Battaglino (2009), sendo o
terrorismo de caráter transnacional, sem Estado soberano responsável, sem um território fixo,
sem uma delimitação fixa de prática dos atos, cabia aos Estados Unidos executar um plano de
ação de infraestrutura militar para todo o globo.
Soma-se a isso o fato de que, com o Fim da Guerra Fria, novos polos de poder global e
regional começam a emergir. Sendo assim, os Estados Unidos passaram a investir num
projeto chamado de Integrated Global Presence o qual tem por característica aumentar o
número de bases estadunidenses no exterior por meio da expansão dos Comandos Unificados
Combatentes45
(HORING; WEBER; CLOSS, 2014).
Diante desse cenário, podem-se destacar o restabelecimento da IV Frota dos EUA46
,
em julho de 2008, o fortalecimento do Southcom e a criação do Africom, em outubro de 2008
como três frentes de ação norte-americana para o Atlântico Sul.
A IV Frota é responsável pela segurança no Atlântico Sul, abrangendo navios,
aeronaves e submarinos para a defesa da área. Como o Southcom é responsável pela América
Latina, consequentemente, a IV Frota trabalha juntamente com o Southcom (HORING;
WEBER; CLOSS, 2014). O governo estadunidense alegou que a reativação desta força naval,
desabilitada desde 1950, significava somente uma decisão de cunho administrativo com fins
pacíficos e, sobretudo, para apoiar o combate ao terrorismo. Oficialmente, o objetivo
declarado da IV Frota é aproximar os países na região por meio da cooperação, baseando-se
em cinco missões: apoio a operações de manutenção de paz, exercícios marítimos
tradicionais, assistência humanitária, auxílio a desastres e apoio a operações antidroga
(MACLAY et al., 2009). No entanto, esses objetivos declarados são, por vezes, questionados
como uma forma estratégica dos Estados Unidos de controlar a região do Atlântico Sul
(BATTAGLINO, 2009). Nos documentos oficiais norte-americanos sobre essa Frota é
explicito que a emergência da China e do Brasil no Atlântico Sul como desafios aos interesses
estadunidenses. Ademais, alguns autores como Posen (2003) salientam que, pela sua
45
São estruturas militares estadunidenses que se responsabilizam por regiões específicas do globo. De acordo
com o Departamento de Defesa dos Estados Unidos, em 2011, existem seis Comandos Unificados Combatentes:
o Northcom, responsável pela América do Norte; o Southcom, responsável pela América Latina; o Africom,
responsável pela África; Centcom, responsável pelo Oriente Médio e Ásia Central; Eucom, responsável pela
Europa; e Pacom, responsável pela Ásia-Pacífico (HORING; WEBER; CLOSS; 2014). 46
Frota militar norte-americana, fundada para atuar na Segunda Guerra Mundial com o objetivo de caçar
submarinos nazistas nas águas do Atlântico Sul. Em 1950, a IV Frota foi desmontada.
52
capacidade militar, econômica e política, os Estados Unidos têm capacidade de projeção de
forças para eventuais conflitos em qualquer lugar do globo, podendo se firmar no Atlântico
Sul o que já fazem uma vez que arrendam a ilha de Ascensão – de posse inglesa.
Quanto à projeção norte americano no continente africano, pode-se afirmar que o
comércio dos Estados Unidos com a África Subsaariana, em 2011, foi de US$ 95 bilhões,
com previsão de aumento de 20% em 2012. Desde o início do século XXI, o montante
aumentou aproximadamente 300% o que comprova a crescente importância da região para
esse país (MAKENZIE, 2012). Além disso, a região é de extrema importância para a obtenção
de petróleo, gás e outros recursos naturais, ganhando destaque o Golfo da Guiné e Angola, o
que acaba de se tornar uma alternativa aos Estados Unidos a reduzir sua dependência do
Oriente Médio (PAIVA, 2015).
Outra zona importante para os propósitos de projeção dos Estados Unidos é o corredor
Nigéria-Chade-Sudão-Etiópia-Eritreia-Somália-Djibouti, por onde está localizado um
oleoduto desde o Golfo Pérsico até o Golfo da Guiné. Sabendo que o terrorismo internacional
procura expandir suas redes em diversas partes no mundo, os Estados Unidos estabeleceu
mecanismos de cooperação militar com países africanos de forma a reprimir e prevenir
qualquer tipo de ameaça de grupos radicais islâmicos de forma a atingir seus interesses na
região (PAIVA, 2015).
Como clara demonstração da crescente importância da África para os Estados Unidos,
o Africom, em 2008, foi elevado à condição de Comando Unificado Independente.
Diferentemente de alguns comandos independentes, o Africom está dedicado à prevenção da
guerra e não ao seu combate. Segundo seu próprio documento47
, sua missão consiste
em conjunto com agências e parceiros internacionais, neutraliza as ameaças
transnacionais, protege o pessoal e as instalações dos Estados Unidos, evitar e
mitigar o conflito e criar capacidade de defesa dos parceiros africanos a fim de
promover a segurança, a estabilidade e a prosperidade (UNITED STATES AFRICA
COMMAND, s.d., s/p).
Enquanto que os Estados Unidos procuram atingir um nível de engajamento constante
com os países africanos de forma a estabelecer programas de prevenção ao conflito e
promoção ao diálogo, há muita desconfiança por parte dos países africanos com relação aos
objetivos do Comando, vendo-o como uma projeção imperialista norte-americana (PAIVA,
2015). Esse receio dos países africanos pode ser interpretado segundo pressupostos do
realismo neoclássico de Wehlforth (1994), o presidente da época, Barack Obama, junto com
os formuladores de decisão perceberam que a cooperação militar com a África através do
47
Disponível em: <http://www.africom.mil/about-the-command>. Acesso em: 02 jun. 2017.
53
Africom traria ganhos positivos ao país uma vez que garantiria a proteção dos seus interesses e
uma alternativa viável a sua sobrevivência energética.
3.2.2. O Reino Unido no Atlântico Sul
A Grã-Bretanha estabeleceu uma presença destacada ao longo do Atlântico Sul o que,
atualmente, lhe confere uma capacidade estratégica singular. Com uma das Marinhas mais
bem equipadas do mundo, o Reino Unido faz-se presente nos três triângulos estratégicos na
região. Dentre as ilhas ocupadas, pode-se dizer que às ilhas das Malvinas aparecem como uma
problemática constante porque representam uma disputa territorial entre o Reino Unido e a
Argentina (HORING; WEBER; CLOSS, 2014).
A briga pela dominação das Malvinas por ambos os países é de longa data e causa
transtornos no debate internacional até os dias atuais. As tensões latentes entre o Reino Unido
e a Argentina se agravaram durante a metade do século XX, no momento em que o presidente
da Argentina declara soberania sobre o arquipélago. O embate militar, por sua vez, entre os
dois países pela dominação da ilha só ocorreu em 1982, com a Guerra das Malvinas
(OLIVEIRA; NETTO, 2016).
Durante anos, a Argentina manteve as ilhas abandonadas, deixando existir em vários
momentos, assentamentos franceses, britânicos e espanhóis. O questionamento sob a posse
das ilhas só ocorreu no período em que a Argentina estava vivendo uma ditadura militar e o
regime já estava desgastado em razão da crise econômica que assolava o país. Nesse sentido,
o governo Argentino decide atacar às ilhas, até então sob domínio inglês, como forma de
estimular o nacionalismo argentino. No entanto, os militares argentinos não esperavam uma
resposta ofensiva do Reino Unido, o qual também vivenciava uma crise econômica e social.
Por fim, o Reino Unido saiu vitorioso da Guerra (HORING; WEBER; CLOSS, 2014).
Ficou caracterizado, portanto, às ilhas como território britânico com governo próprio.
De acordo com a Carta das Nações Unidas, os ilhéus possuem direito a autodeterminação,
porém a Argentina discorda, alegando que as autoridades britânicas, sob o uso da ‘força’,
expulsaram os argentinos residentes da ilha. Em 2013, diante das insatisfações argentinas, um
referendo foi realizado sobre a soberania das ilhas, ficando decidido, por quase 100% dos
eleitores, a manutenção das ilhas Malvinas, chamadas e reconhecidas internacionalmente
como Falklands Islands, sob controle britânico (MALLMANN, 2016).
A partir do realismo neoclássico, pode-se entender a disputa inglesa e argentina pelas
Falklands. Ambos os Estados influenciados por variáveis de ordem interna, no caso a crise
54
econômica, política e social, visualizaram a tomada de posse das ilhas como uma forma de
retomar a coesão interna. No entanto, governo argentino não percebeu que a invasão às
Falklands ocasionaria uma guerra e, por outro lado, a potência inglesa, mediante cálculos de
poder, decidiu pelo conflito armado do que abdicar por esse território. Entende-se que,
influenciados por constrangimentos internos, Margaret Thatcher48
via que os custos pela
disputa das ilhas não seriam maiores que os benefícios advindos da vitória da guerra.
Vê-se que, para o Reino Unido, a posse das Falklands é de estrema importância
estratégica. Além de seguir como base para a projeção inglesa à Antártica, a Inglaterra possui
o direito de exploração dos recursos naturais existentes nas águas territoriais das ilhas. Além
disso, somam-se às ilhas Malvinas, as Geórgias e Sandwich do Sul, e as ilhas de Santa
Helena, Tristão da Cunha e Ascensão, permitindo a potência britânica ser presente no
Atlântico Sul desde a costa da Argentina até o sudoeste africano.
3.2.3. A França no Atlântico Sul
Ainda que em menor proporção, a França também se faz presente no Atlântico Sul
tanto no lado da costa sul-americana como na costa africana. Desde o processo de
independência dos países africanos, a França, antiga metrópole de alguns países, busca de
alguma forma estabelecer influência sobre os países nascentes. Pode-se deduzir que o
principal objetivo francês na África é a aquisição de matérias-primas e a obtenção de Estados
consumidores. De certa forma, as ex-colônias francesas possuem relativa dependência da
antiga metrópole, constatando como exemplo a Comunidade Financeira Africana (CFA) que
adota o Franco como moeda local (HORING; WEBER; CLOSS, 2014).
Ainda que com o Fim da Guerra Fria essa dependência tenha se reduzido, vê-se a
manutenção de relações assimétricas e vínculos de dependência econômica. Aliás, o Livro
Branco de Defesa da França, de 2008, caracteriza a África como zona de interesse francês,
sendo-o fundamental estabelecer influencia na área para a manutenção do status da França
como grande potência. Dentre tantos, destaca-se o interesse francês em petróleo e metais,
especialmente o urânio do Niger.
A partir de 2002, o país realizou intervenções na Costa do Marfim, no Chade, na
Líbia, e no Mali. Ainda hoje, a França atua em missões de paz lideradas pela ONU na Costa
48
Primeira-Ministra do Reino Unido no período da Guerra das Malvinas.
55
do Marfim e na República Democrática do Congo. Além disso, cabe dizer que a França possui
bases militares tanto no Gabão como no Senegal (HORING; WEBER; CLOSS, 2014).
Por último, a França se faz presente também no Atlântico Sul em função da posse da
Guiana Francesa. Para França, esse território é de extrema importância por, sobretudo, dois
motivos: a existência do centro de lançamentos da Agência Espacial Europeia, em Kourou e o
direito de exploração dos recursos marítimos na região em função da CNUDM. Detentora de
uma grande força aérea, é essencial para a França uma base no Atlântico Sul como forma
estratégica de controle de suas esferas de influencia e de suprimento aos aviões (HORING;
WEBER; CLOSS, 2014).
3.2.4. A China no Atlântico Sul
Detentora de uma grande extensão territorial e de um enorme poder econômico, a
China tem vindo reforçar sua presença em ambos os lados do Atlântico Sul. Desse modo,
desde o final dos anos 1990, a China vêm implementando uma estratégia chamada de Going
Out a qual tem por objetivos o controle de recursos naturais, em especial, os energéticos. Essa
estratégia utilizou, em grande parte, exercícios de soft power, articulando com o hard power49
e o investimento significativo na modernização. Esse tipo de estratégica levou a China a se
direcionar para áreas fora da Ásia, em especial a África e a América Latina, procurando
garantir o controle sobre recursos estratégicos fundamentais para sua segurança energética
assim como uma diversificação de mercados (NEVES, 2013).
Dentre seus principais parceiros, cabe destacar países centrados na orla do Atlântico
Sul como a Nigéria, a Angola e a África do Sul, na costa africana, e o Brasil e a Argentina, na
costa da América do Sul. Diferentemente das outras potências como Estados Unidos e Grã-
Bretanha, a presença chinesa no Atlântico Sul não está relacionada à possessão de ilhas nesse
espaço marítimo, mas a atuação desse país, tanto num âmbito comercial, financeiro e de
investimento, nesses países margeados pelo Atlântico Sul (NEVES, 2013).
Destaca-se a China como grande importador de petróleo de países africanos, cabendo
mencionar Angola como o segundo maior fornecedor da China com 12% do total de
importações chinesas em 2012. Ainda que a dependência ao Oriente Médio seja grande, a
China têm se esforçado em diversificar seus países fornecedores voltando sua atenção à
África e à América do Sul, como visível na tabela 3.
49
Exercer influência sobre o comportamento do outro mediante o uso de meios militares e coercitivos, de acordo
com Joseph Nye.
56
Tabela 3 – Comércio Chinês no Atlântico Sul (2011)
Fonte: NEVES, 2013.
Como mencionado, outra estratégia chinesa como forma de projeção e influência diz
respeito ao seu investimento nesses países. A China, como forma de controle da exploração
dos recursos energéticos, participa na exploração direta do petróleo tanto na Angola como no
Brasil. O investimento nas indústrias de extração de minérios é também significativo,
correspondendo em investimentos na África do Sul, por exemplo (NEVES, 2013).
Ainda sobre o aspecto do investimento, a questão da insegurança alimentar na China,
agravada nos anos de 2007-2009, resultou numa preocupação do país em adquirir terras
agrícolas em países com disponibilidade para a produção de alimentos. Logo, a China destaca
o potencial brasileiro em contornar a situação vivida pelo país. Outro ponto que tange a
questão da insegurança alimentar é o fato de que os países costeiros do Atlântico Sul possuem
direitos à pesca, um dos fatores centrais nas disputas territoriais (Mar do Sul da China) em
que a China tem estado envolvida. Dessa forma, juntamente com a Noruega e a Coréia do Sul,
a China é um dos principais atores na pesca do krill nas águas do Atlântico Sul (NEVES,
2013).
Além do instrumento de investir como forma de adentrar e reforçar a posição da China
nos mercados sul-americanos e africanos, o financiamento também tem sido utilizado como
forma de influência econômica ainda que com menos expressão (NEVES, 2013).
No que tange o Atlântico Sul, esse país também visualiza uma dimensão de hard
power, relacionada a consolidação do poder naval chinês. Sabendo que a maior parte das
trocas comerciais da China ocorre por meio marítimo, é essencial para a sua prosperidade uma
marinha organizada, respondendo, caso necessário, às ameaças como a pirataria e o crime
organizado transnacional. Além disso, diante da presença chinesa em ambos os lados do
Atlântico Sul e a proteção do seu acesso aos recursos energéticos, é de interesse do país uma
57
capacidade naval capaz de garantir a segurança tanto da exploração como do transporte desses
recursos. Cabe mencionar que a China também vem dando apoio a investimentos na
capacidade naval dos Estados do Atlântico Sul, como nos casos da Nigéria e da Namíbia,
representando, mais uma vez, um reforço para sua influencia na área (NEVES, 2013).
Sabendo que a premissa do realismo neoclássico tem por objetivo identificar o
comportamento das unidades no sistema internacional e as interações entre os mesmos na
estrutura mediante as suas percepções de ameaças, entendemos que a China, buscando
contornar problemas internos de cunho energético e social, vê o Atlântico Sul como um
espaço de afirmação de interesses e construção de alianças. Diante de um mundo multipolar e
do acelerado crescimento chinês, o governo desse país ponderou que os custos com
investimentos e financiamentos em países margeados pelo Atlântico Sul seriam menores que
os benefícios adquiridos com as alianças no continente africano e sul-americano. É essencial
para o contínuo desenvolvimento chinês o aumento de sua margem de manobra no mundo.
Já se pode imaginar que essa estratégia diplomática chinesa a qual vêm alargando sua
presença no Atlântico Sul pode gerar um cenário de potencial tensão com os Estados Unidos
que vêm se esforçando em consolidar sua posição na região com a reativação da IV Frota e a
criação do Africom.
3.3. Atuação e esforços brasileiros no Atlântico Sul
O mar teve importante papel na história do Brasil. No entanto, durante séculos o
Atlântico era visto somente como uma via comercial e de comunicação para o país. Na
medida em que o país começou a se desenvolver, esse espaço marítimo, sobretudo o Atlântico
Sul, passou a ser relevante para a economia brasileira, sobretudo com as importantes
descobertas de petróleo, de gás e de minérios.
Durante o período da Guerra Fria, na década de 1970, a disputa por polos de poder
levou, por parte dos Estados Unidos, uma tentativa de militarização do espaço do Atlântico
Sul que foi malsucedida. Em contrapartida, foi proposta a criação da Organização do Tratado
do Atlântico Sul (OTAS) a qual substituiria as prerrogativas da OTAN em patrulhar o
Atlântico. Entretanto, por medo de que essa organização levasse a uma espécie de corrida
armamentista na região do Cone Sul, o Brasil a refutou.
Será no fim da Guerra Fria, mediante a existência de ameaças, que o Brasil sentiu a
necessidade de criar ações para a proteção desse espaço marítimo. Pode-se dizer que desde a
década de 1970, já existia, no Brasil, uma política externa mais independente do centro
58
hegemônico onde o Atlântico Sul passou a representar a “fronteira oriental” para o país.
Como já visto, o Estado começou a dar maior importância ao mar, resultando numa expansão
sobre o “mar territorial” de 200 milhas (PENHA, 2012).
A partir dessa data, diversos mecanismos de cooperação foram criados a fim de
proteger os interesses dos países margeados no Atlântico Sul nas áreas sob sua soberania.
Entende-se que o desenvolvimento de uma política exterior direcionada ao Atlântico Sul e ao
continente africano representavam um eixo estratégico para o país. A sua proximidade com a
África reforça a concepção de uma nova vizinhança, uma “fronteira ocidental”. O General
Golbery do Couto e Silva apud Ely Alves Penha já afirmava que
A África seria a continuidade da própria fronteira Brasileira e, como ponto mais
vulnerável da região, deveria merecer maior atenção política por parte do governo
brasileira, em termos de segurança mútua. Segundo ele, por conta dessa
vulnerabilidade caberia ao Brasil, no contexto da guerra fria, ‘cooperar na
imunização também dos jovens países africanos à infecção fatal do comunismo,
estar vigilante e atento a qualquer propensão soviética na direção dessa África
Atlântica onde se situa a fronteira avançada e decisiva da própria segurança
nacional. (PENHA, 2012, p.118-119)
Dentre as diversas iniciativas, cabe destacar a tentativa bem sucedida brasileira em
promover o Atlântico Sul numa Zona de Paz e Cooperação, em meados dos anos 1980, em
contraposição à proposta da OTAS e a tentativa de controle dessa área pela OTAN. Aprovada
pela ONU em 1986, tinha como objetivo principal combater a militarização e nuclearização
do Atlântico Sul por países não pertencentes à região. Sob o ponto de vista político, era
fundamental afirmar a identidade própria da região e o papel primordial dos Estados
margeados no Atlântico Sul de conduzir os assuntos relacionados a esse oceano.
Diferentemente da OTAN a qual se caracteriza por ser uma aliança militar voltada para
combater um inimigo, a ZOPACAS está calcada na ideia de promoção da paz e cooperação
entre os países do entorno estratégico (ABDENUR; NETO, 2014).
Cabe falar que a ZOPACAS não se limitou somente a tratar questões de segurança. No
seu texto, submetido a ONU, havia o interesse em fomentar as relações econômicas, políticas
e sociais entre os países da costa sul-americana e da costa africana. O documento postulou
sobre questões como a Guerra das Malvinas, o repúdio ao apartheid, a ocupação na Namíbia e
a guerra civil em Angola (COUTINHO, 2014).
Com base no realismo neoclássico, entendemos que a ZOPACAS tinha uma
importância particular para o Brasil em garantir o reconhecimento dos seus direitos em torno
das ZEE e da sua plataforma continental. O governo brasileiro utilizou-se desse mecanismo
59
para responder uma incerteza do sistema internacional já que, até então, o Atlântico Sul era
caracterizado por um ‘vazio de poder’50
.
A década de 1980 foi caracterizada por um amplo diálogo com a África. Assim como
no governo Geisel e Figueiredo, Sarney manteve contato com o continente seguindo os
posicionamentos de defesa da independência das colônias luso-africanas, condenação do
apartheid e da ocupação do território da Namíbia. Tanto África do Sul, como Angola e
Nigéria representavam importantes parceiros comercias para o Brasil (COUTINHO, 2014).
Pode-se dizer que, de modo geral, a política africana, nesse momento, foi uma clara
demonstração da capacidade governamental brasileira de inserção internacional, tornando-se
uma das principais lideranças do Terceiro Mundo. O Atlântico Sul representou um ganho
diplomático do país na medida em que o transformou em uma zona de paz e cooperação, em
substituição à perspectiva de militarização dessas águas. A ZOPACAS, em resumo,
representou a materialização desse início de cooperação sul-atlântica.
Contudo, o novo reordenamento internacional que começou a ser definido com o fim
da Guerra Fria, provocou certa inflexão nas ações da ZOPACAS já que, num primeiro
momento, não existia uma ameaça à militarização da região. A agenda internacional foi
ocupada por novos temas como direitos humanos, narcotráfico, meio ambiente,
marginalizando a necessidade de tratar de questões de segurança (COUTINHO, 2014).
A aceleração do processo de globalização somado a um novo sistema internacional
multipolar cobrou ao Brasil um novo direcionamento da sua política externa, uma política em
que o país poderia se mover e se projetar estrategicamente no sistema internacional. Percebe-
se, dessa forma, certa dispersão do interesse brasileiro, no final do século XX, para com a
África e, consequentemente, com o projeto das ZOPACAS (COUTINHO, 2014).
Com o aumento da percepção do Atlântico Sul como um espaço estratégico, nos
primeiros anos do século XXI, tornou-o uma área de prioridade para a política externa
brasileira. Durante os dois governos de Lula da Silva (2003-2011), os laços econômicos,
políticos e de segurança com os países africanos foram aprofundados de forma significativa.
A cooperação aparecia de forma diversificada abarcando áreas como a agricultura com
empresas como a Embrapa até áreas de cooperação militar (COUTINHO, 2014).
A aproximação com os países africanos esteve ligada a diversas razões como a
necessidade de diversificar os parceiros econômicos num mundo multipolar, a busca por
50
Área na qual não se percebe a presença de Estados.
60
apoio em organismos multinacionais, o aumento da importância de recursos naturais
existentes no Atlântico Sul e a necessidade de defender os interesses locais, dentre outros.
Para manter o controle e a defesa do Atlântico Sul, o Brasil aumentou significativamente sua
cooperação internacional ao longo da última década. Utilizando-se de mecanismos de soft
power, o país visava ampliar sua influencia na região, defendendo seus interesses no entorno
estratégico brasileiro.
A expressão ‘entorno estratégico’ surge pela primeira vez no documento oficial da
PND de 2005. Pode-se dizer que a área abrangida por esse entorno nacional é considerada
como prioridade estratégica, a partir de então, para a política externa do Brasil, cabendo as
estratégias de defesa e segurança aproveitar as oportunidades para projetarem seu poder e
neutralizar ameaças nessa região (PAIVA, 2015).
De acordo com a figura 10, vê-se que o entorno abrange a Bacia do Atlântico Sul, que
vai da linha Foz do Rio Amazonas – Guiné Equatorial (África) – até a Antártida; a costa
ocidental da África; e a América do Sul, cuja área setentrional é banhada pelo Atlântico
Norte. Nas áreas delimitadas pela cor vermelha, o país é responsável por direcionar estratégias
de defesa enquanto que nas áreas em amarelo, o Brasil não possui o dever de proteger a área,
mas tem a intenção de projetar seu poder na região. Além do Atlântico Sul, o Atlântico Norte
também é uma área de interesse para a defesa nacional. Estados brasileiros como Amapá e
Roraima podem ser afetados por tomadas de decisões bélicas oriundas do Mar do Caribe em
virtude da forte presença da OTAN nessas águas (PAIVA, 2015).
Figura 10 - Entorno Estratégico
Fonte: PAIVA, 2015.
61
A área englobada pelo entorno detém de elevada importância geopolítica e
geoestratégica para o Brasil em razão dos diversos recursos econômicos na região. Tanto a
costa ocidental da África como o Atlântico e a Antártica correspondem a áreas de interesse
brasileiro. A costa ocidental da África, por exemplo, é uma região rica em recursos
energéticos e com grande potencial de investimento. Países como África do Sul, Namíbia,
Angola, Congo, São Tomé e Príncipe, Nigéria, Guiné Bissau, Senegal e Cabo Verde são
importantes geopoliticamente tanto no âmbito da exploração quanto na questão da segurança
da Bacia Atlântica. Enquanto o Atlântico Sul funciona como uma região econômica, enérgica
e comercial para o país, a Antártica é detentora das maiores reservas de gelo, de água doce do
Planeta e de recursos minerais e energéticos (PAIVA, 2015).
Mais especificamente, com relação à Antártica, os interesses brasileiros possuem
cunho tanto político (possível instabilidade da região em razão de problemas reivindicatórios
sobre o território) como científico (grande laboratório natural) e estratégico (sua posição em
relação a confluência de três oceanos de três oceanos, mais os Estreitos de Drake, de
Magalhães e o Cabo da Boa Esperança). Assinando o Tratado da Antártica em 1975, o Brasil
pode se fazer presença numa região de extrema cobiça internacional (SILVEIRA, 2014).
O Brasil reúne algumas condições favoráveis para se fazer presente na Antártica tais
como “a proximidade com a Antártida, a continuidade desta com a América do Sul, as linhas
de comunicação marítima (Rota do Cabo), a influência sobre o clima do país e a capacidade
do país de atuar fora das fronteiras nacionais” (SILVEIRA, 2014, p.353). Sabendo que a
manutenção da paz, proteção e controle do tráfego marítimo, a estabilidade da região e a
defesa da soberania dos países costeiros constituem objetivos político-estratégicos
perseguidos pelo Brasil no Atlântico Sul, a Antártica possui extrema importância estratégica
para o Brasil não só pelas suas riquezas naturais como também pela sua posição em relação a
esse oceano (margeada pelas águas do Oceano Pacífico, Oceano Atlântico e Oceano
Índico)(SILVEIRA, 2014).
Diante da relevância geoestratégica do entorno, a política externa brasileira confere
prioridade ao entorno, cabendo ao país traçar estratégicas de cooperação bilateral e
multilateral com países banhados pelo Atlântico Sul assim como mecanismos nacionais de
controle e proteção dos recursos presentes no entorno estratégico (PAIVA, 2015). No âmbito
da cooperação bilateral, destacam-se acordos com a África do Sul, com a Guiné Bissau, com
Moçambique, com a Namíbia, com a Nigéria, com Senegal, com a Angola, com a Guiné
Equatorial, dentre vários. A partir da figura 11, fica visível a grandeza da atuação brasileira no
continente africano no campo de defesa (AGUILAR, 2013).
62
Fonte: THOMPSON; MUGGAH, 2015.
No caso da África do Sul, a cooperação em defesa está vinculada à iniciativa do
Fórum IBAS, iniciado em 2003. Nessa iniciativa, foram estabelecidos diversos exercícios
militares navais no litoral sul-africano. Dentre as outras formas de cooperação que existem
entre ambos os países, destaca-se a parceria estratégica firmada entre a África do Sul e o
Brasil, em 2010, com o objetivo de estimular a cooperação e o intercâmbio em segurança e
defesa. O documento firmado nesse acordo reconhece o interesse bilateral em se desenvolver
um programa sobre o fundo e os recursos no Atlântico Sul, reconhecendo essa zona como
estratégica a qual necessita proteção (ABDENUR; NETO, 2014).
Um dos parceiros brasileiros mais antigos na África é a Namíbia. Desde 1992, a
Marinha do Brasil vem cooperando com o país africano. Um dos maiores responsáveis pela
criação da Marinha da Namíbia, o Brasil participou em grande parte da formação do pessoal e
da força naval do país. Desde cooperação de apoio técnico a doação de embarcações não mais
utilizadas pelo Brasil para a Namíbia, a Namíbia ilustra o bom funcionamento da cooperação
brasileira no continente africano (ABDENUR; NETO, 2014).
Angola, com quem o Brasil assinou uma grande parceria estratégica em 2010, possui
muitos laços com o país. Ambas ex-colônias de Portugal, constata-se a presença de brasileiros
na Angola e de angolanos no Brasil. Somado a isso, o Brasil se faz presente em Angola de
diversas formas como a instalação de multinacionais em território angolano, a participação do
Figura 11 - Cooperação em defesa Brasil-África
63
Brasil no levantamento da plataforma continental da Angola, o auxílio à industria nacional de
defesa angolana, dentre outros (ABDENUR; NETO, 2014).
Atualmente, a Nigéria é um importante ator no âmbito da cooperação Brasil-África.
Desde 2010, ambos os países discutem uma posição de coordenação quanto à mineração no
Atlântico Sul. Além do mais, o Brasil e a Nigéria assinaram um acordo de cooperação em
defesa com destaque na área naval (ABDENUR; NETO, 2014).
Outro exemplo recente de cooperação entre o Brasil e os países africanos é com a
Guiné Equatorial e com Cabo Verde. Com relação ao primeiro país, mesmo iniciado em
1974, o relacionamento entre o Brasil e a Guiné Equatorial só ganhou importância a partir de
2006 quando o Brasil se comprometeu em fornecer assistência técnica na área de treinamento
militar conjunto. Ademais do crescimento do comércio entre os dois países, o Brasil apoia a
candidatura da Guiné Equatorial como membro pleno da Comunidade dos Países de Língua
Portuguesa (CPLP)51
. Em relação a Cabo Verde, a Marinha brasileira se comprometeu em
auxiliar o país a mapear sua Plataforma Continental. Além disso, o Brasil possui a intenção
em doar algumas aeronaves brasileiras para as Forças Armadas cabo-verdenses para que esse
país patrulhe o seu litoral (ABDENUR; NETO, 2014).
No âmbito de iniciativas multilaterais, as descobertas de petróleo e a valorização das
potencialidades do Atlântico Sul contribuíram para a revitalização da importância da
ZOPACAS para seus países membros. Composta hoje por 24 países52
, é de grande interesse
brasileiro fortalecer esse mecanismo de cooperação (PAIVA, 2015).
Sem dúvida, a ZOPACAS é um foro político e ajuda a reforçar as relações bilaterais
entre seus países membros como se pode perceber com o aumento do comércio intrabloco na
tabela 4. No entanto, ainda que exista a convergência de entendimento de que o Atlântico Sul
é um espaço estratégico o qual necessita de proteção, alguns países africanos veem com bons
olhos o apoio norte-americano no combate de crimes existentes no litoral sul-atlântico
(PENNA FILHO, 2015).
51
Organização internacional integrada, atualmente, por Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-
Bissau, Moçambique, Portugal, Timor-Leste e São Tomé e Príncipe (GUIMARÃES, 2015). 52
África do Sul, Angola, Argentina, Benin, Brasil, Cabo Verde, Camarões, Congo, Costa do Marfim, Gabão,
Gâmbia, Gana, Guiné, Guiné Bissau, Guiné Equatorial, Libéria, Namíbia, Nigéria, República Democrática do
Congo, São Tomé e Príncipe, Senegal, Serra Leoa, Togo e Uruguai (PAIVA, 2015).
64
Tabela 4 - Comércio Intrabloco e Extrabloco
Fonte: Divisão de Inteligência Comercial/MRE53
.
Nesse cenário, reforça-se a ideia da criação de uma identidade regional sul-atlântica.
Sob a liderança brasileira, a estratégia de construção de um ‘cinturão de boa vontade’ não está
centrada apenas na manutenção e proteção dos interesses dos países no Atlântico Sul, mas na
tentativa de afastar a atuação de países externos na área. O discurso brasileiro das ZOPACAS
não destaca apenas os interesses comuns entre os países atlânticos da África e América do
Sul, ressalta que há uma necessidade de minimizar a presença de atores extrarregionais nessa
área (ABDENUR; NETO, 2014).
Outros fóruns inter-regionais que aprofundaram o diálogo e a cooperação com os
países sul-atlânticos foram a CPLP, a cúpula América do Sul-África (ASA) e o Fórum de
Diálogo Índia-Brasil-África do Sul (IBAS). Com o objetivo de ampliar sua inserção
internacional e reafirmar seu compromisso com a estabilidade do Atlântico Sul, o Brasil vê
essas iniciativas como uma forma de assegurar sua posição e seus interesses na região sul-
atlântica (LIMA, 2015).
A ASA é uma das muitas iniciativas que refletem a aproximação do Brasil com os
países africanos. Com 66 países participantes, a participação brasileira na ASA reflete a
retomada de visão da África como uma região importante, compartilhando problemas e
desafios comuns com esse continente. A cooperação sul-sul desse organismo multilateral
destina-se a assegurar o crescimento econômico das duas regiões, baseados numa perspectiva
de inclusão social (LIMA, 2015).
Formada por países lusófonos, a CPLP, criada em 1996, tinha como missão
aprofundar a amizade mútua e a cooperação entre os seus membros No campo da segurança e
da defesa, a CPLP se tornou um fórum internacional bastante atuante. Foram criadas diversas
reuniões como a Reunião de Ministros da Defesa Nacional, a Reunião dos Chefes de Estado-
Maior de Defesa, e o Centro de Análise Estratégica com o objetivo de discutir a profissão do
militar, a profissionalização das forças armadas e a sua ética. Ainda relacionado à CPLP, o
53
Disponível em:< www.mre.gov.br>.
65
Brasil participa, desde 2000, das Operações Felino as quais representam exercícios
multinacionais de treinamento conjunto de Operações de Paz e de Ajuda Humanitária. Em
2013, o país sediou a Operação Felino, tendo realizado exercícios militares no litoral do
Espírito Santo, contando com a participação de, aproximadamente, 1.000 militares da CPLP
(LIMA, 2015).
Quanto ao foro IBAS – que reúne Índia, Brasil e África do Sul – são realizados, desde
2008, exercícios navais bianuais os quais foram denominados de IBSAMAR. Além disso, a
parceria entre Brasil e África do Sul possibilitou, ainda em 2006, o desenvolvimento em
conjunto do míssil A-Darter, de curto alcance, com sistema de detecção infravermelho
(LIMA, 2015).
Percebe-se que as diversas iniciativas de cooperação do Brasil, no âmbito de defesa,
com os países margeados pelo Atlântico Sul não refletem uma intenção de criar um grande
mecanismo coletivo de defesa, atuando de forma a constranger ameaças no Atlântico Sul, mas
sim um mecanismo para que esses países africanos possam construir forças armadas e de
segurança pública capazes de garantir a paz interna e, consequentemente, regional. Partindo
de princípios do realismo neoclássico de que os Estados necessitam sobreviver e reagir as
ameaças no meio internacional dispondo de capacidades matérias e não-materiais, conhecido
por ser um país pacífico, o Brasil utiliza-se de estratégicas de cooperação como forma de não
só estabelecer a paz e a segurança no seu entorno estratégico, como também aumentar sua
influencia dentro e fora dessa zona estratégica.
Cabe analisar criticamente, no entanto, que mesmo sendo capaz de presumir o
comportamento brasileiro através do realismo neoclássico, outras correntes das relações
internacionais poderiam criticar essa forma de análise entendendo que, para países como a
Inglaterra, os Estados Unidos e a China, detentores de um grande arsenal militar e/ou grandes
investidores desse setor, é lógico se pensar num sistema realista onde a inexistência de um
órgão supranacional que garanta garantindo a sobrevivência dos Estados culmina numa
competição entre os Estados em que o interesse maior do Estado deve ser o de possuir mais
poder frente aos outros para garantir sua posição no sistema e atingir seu objetivo. No entanto,
o Brasil, sendo uma potência média no sistema internacional e possuidor de um relativo poder
militar, não faria sentido analisar suas estratégias no Atlântico Sul dentro dos pressupostos
realistas.
Talvez pensar o comportamento brasileiro por um viés institucionalista neoliberal
explique melhor a atuação brasileira no Atlântico Sul e na América do Sul. Entendendo o
conflito como não necessariamente eminente, a criação de instituições e de mecanismos de
66
integração contribui para desenvolver um ambiente propício para a cooperação, gerando
resultados positivos. Entendendo os interesses dos Estados não só restritos à segurança, as
instituições funcionam como uma forma de mitigar os efeitos da anarquia internacional. A
criação da Unasul54
, das ZOPACAS, da CPLP e das iniciativas de cooperação com os países
da África, então, poderiam ser explicados através da visão do neoinstitucionalismo liberal
como uma forma de promover ganhos mútuos aos países sem dispor necessariamente do uso
da força militar.
54
Bloco regional o qual reúne doze países da América Latina com o intuito de promover a integração entre seus
países membros.
67
4. CAPÍTULO III: POLÍTICA EXTERNA BRASILEIRA E A DEFESA PARA O
ATLÂNTICO SUL
Esse capítulo tem por objetivo demonstrar quais foram as principais diretrizes da
política externa brasileira, observando como sucedeu a política de defesa do país. A partir da
análise dos principais documentos de defesa – o Livro Branco de Defesa Nacional (LBDN), a
END e a PND – e das diversas iniciativas internas e externas voltadas para o Atlântico Sul,
será realisado um estudo comparativo nos governos de Fernando Henrique Cardoso, Lula da
Silva e Dilma Rousseff com o intuito de entender como foram dadas as políticas de defesa
nesses governos mediante a percepção do Atlântico Sul como um espaço estratégico.
4.1. Política Externa nos governos Fernando Henrique Cardoso, Lula da Silva e Dilma
Rousseff
Tendo considerado o realismo neoclássico como marco teórico, podemos aqui partir
do pensamento de Causewitz de que a guerra seria a continuação da política por outros meios,
Reymond Aron retoma esse pensamento, acrescentando por a guerra ser um instrumento
político gera um consequente diálogo entre as partes em conflito, ou seja, o soldado e o
diplomata representam canais de diálogo pelos quais os Estados promovem seus interesses
conforme também foi especificado e exemplificado por Camila Luis (2012).
Muitos acreditam que a diplomacia e a estratégica representam expressões
excludentes, no entanto, ambas as ações não passam de modalidades complementares do
diálogo político porque, ainda que em um determinado momento predomine uma ou outra
modalidade, as ações não se retiram completamente. Como se pode visualizar
Tanto a estratégia quanto a diplomacia estão subordinadas à política, isto é, a
concepção que a coletividade, ou aqueles que assumem a responsabilidade pela vida
coletiva, fazem do interesse nacional. Em tempo de paz, a política se utiliza de
meios diplomáticos, sem excluir o recurso às armas, pelo menos a título de ameaça.
Durante a guerra, a política não afasta a diplomacia, que continua a conduzir o
relacionamento com os aliados e os neutros (...). Neste sentido, a diplomacia pode
ser definida como a arte de convencer sem usar a força, e a estratégia como a arte de
vencer de um modo mais direto. Mas impor-se também é uma forma de convencer.
(...). O Estado que adquire uma reputação de equidade e moderação tem maior
probabilidade de alcançar seus objetivos sem precisar para isto da vitória militar
(ARON, 2002, p. 72-73).
Pode-se dizer que cabe aos tomadores de decisão determinar os meios para se atingir
os fins desejados.
Partindo disso, entende-se que o contexto político brasileiro responde à uma
determinada configuração do Sistema Internacional onde a dinâmica política e os possíveis
68
conflitos influenciam diretamente na Política Externa brasileira. Por outro lado, os interesses
dos Estados não necessariamente devem ser definidos de acordo com sua posição relativa no
sistema internacional, a localização geográfica, a experiência histórica e o código da língua e
da cultura também podem construir interesses (LUIS, 2012).
No que se refere ao Brasil, alguns fatores passaram a definir tanto sua identidade como
seus interesses, cabendo destaque a sua localização geográfica, a qual lhe conferiu não só
maior afastamento dos principais focos de conflitos internacionais, o seu bom relacionamento
com os países vizinhos, a sua unidade linguística e o fato de estar situado na área periférica do
globo (LUIS, 2012).
Como o Brasil não ocupa uma posição de grande destaque no jogo político mundial, a
Política Externa brasileira tem como objetivo garantir a independência e a soberania do país,
contribuir para a paz e a estabilidade no seu entorno regional de modo a captar atenções dos
grandes decisores da política internacional. Não obstante, a consecução dos objetivos da
política externa brasileira depara-se, na década de 1990, com um cenário tão complexo que
acaba por impor diversos desafios políticos ao país para a sua inserção como um ator influente
na dinâmica política internacional. O mundo se deparava com o fim de uma ordem bipolar e a
ascensão de um período multipolar apesar da preponderância político-militar dos Estados
Unidos. A aceleração do processo de globalização econômica acentuou as diferenças entre os
países desenvolvidos e aqueles em via do desenvolvimento. Além disso, no fim do século XX
e no início do século XXI, o mundo passou a lidar com novos tipos de ameaças55
as quais
colocavam em risco a soberania e a integridade dos Estados (LUIS, 2012).
Mais um problema é o risco de que essas ‘novas ameaças’ sejam securitizadas, ou seja,
que esses problemas em especial saíam do âmbito político e se tornarem questão de segurança
porque, dessa forma, seria legítimo o uso de medidas excepcionais ou ações emergenciais,
legitimando intervenções militares, o uso da força e atividades que em outros contextos
seriam ilegais. Como já analisaram Buzan e Weaver (1998), a securitização não é um ato
exclusivo da linguagem, envolvem gestos, manobras, demonstrações de força. Quem tem
capacidade de securitizar são atores em posição de autoridade na sociedade internacional.
Portanto, para compreender esse processo é necessário se atentar para as relações de poder
dentro da esfera social nacional e internacional (BUZAN; WAEVER, 1998).
55
As ameaças deixam de ser inter-estatal e passam a ser intra-estratal. Dentre as diversas ‘novas ameaças’,
podem ser identificadas o terrorismo, o crime organizado transnacional, problema mundial das drogas, a
corrupção, o tráfico ilícito de armas, a pobreza extrema, os desastres naturais, o tráfico de seres humanos, os
ataques à segurança cibernética, dentre outras (LUIS, 2012).
69
Assim, na América Latina ou em qualquer outra região do globo, as ‘novas ameaças’
internacionais podem ser evocadas para justificar potenciais intervenções externas. Como já
se sabe, em razão das diversas riquezas existentes no Atlântico Sul, a região pode ser
entendida como uma área ameaçada, justificando a atuação da OTAN. Sendo assim, é
necessário analisar como se caracterizaram as políticas externas brasileiras a partir do governo
Fernando Henrique Cardoso até o governo Dilma Rousseff para se entender as diretrizes das
políticas de defesa e segurança desses presidentes para o Atlântico Sul (LUIS, 2012).
4.1.1. O governo Fernando Henrique Cardoso
Primeiramente, a política externa é uma política pública, adotada pelo Estado, a qual
deve promover e salvaguardar os interesses nacionais nos ambientes interno e externo.
Sabendo que todos os Estados se relacionam num sistema anárquico, é de se imaginar que
eles estabelecem certos objetivos que dizem a respeito da sua própria sobrevivência. Através
da política externa, o país tende a assegurar o máximo de influência e projeção internacional
de modo a garantir, sobretudo, as condições ideais de desenvolvimento e afirmação do seu
território.
Como já visto, na década de 1990, uma nova ordem internacional configurava-se no
mundo, sendo percebidas três linhas de ação da política externa brasileira nesse período: a
afirmação da democracia no Brasil, a tentativa de inserção competitiva do Brasil na economia
mundial e a reinteração do respeito brasileiro a ética cosmopolita no que tange aos direitos
humanos, à preservação do meio ambiente, ao combate ao crime internacional, dentre outros.
O sistema internacional passava por mudanças as quais refletiram no contexto doméstico. No
plano comercial, houve uma mudança na percepção do processo da globalização com o
fracasso da Conferência Ministerial da Organização Mundial do Comércio, em Seattle, no
momento em que diversas nações caracterizaram as normas vigentes na Organização Mundial
do Comércio (OMC) como injustas e protecionistas aos países ricos. Percebeu-se, na área
política, um crescente esvaziamento da ONU diante da reestruturação do sistema
internacional. Visto isso, é num contexto internacional complexo que transitará a política
externa de Fernando Henrique Cardoso (VIGEVANI; OLIVEIRA; CINTRA, 2003).
Pode-se dizer que a política externa brasileira não sofreu grandes rupturas ao longo da
presidência de Fernando Collor, estendendo-se ao governo de Fernando Henrique Cardoso.
Até o fim da década de 1980, a política externa brasileira seguia a ideia de ‘autonomia pela
70
distância’ a qual passou a ser substituída no início do governo Collor pela ‘autonomia pela
integração’ (VIGEVANI; OLIVEIRA; CINTRA, 2003). Como fica esclarecido:
[...]o acervo de uma participação positiva, sempre apoiada em critérios de
legitimidade, nos abre a porta para uma série de atitudes que tem dado uma nova
feição ao trabalho diplomático brasileiro. A autonomia, hoje, não significa mais
“distância” dos temas polêmicos para resguardar o país de alinhamentos
indesejáveis. Ao contrário, a autonomia se traduz por “participação”, por um desejo
de influenciar a agenda aberta com valores que exprimem tradição diplomática e
capacidade de ver os rumos da ordem internacional com olhos próprios, com
perspectivas originais. Perspectivas que correspondam à nossa complexidade
nacional (FONSECA Jr., 1998, p. 368).
Essa nova perspectiva, a qual permeou os dois mandatos do governo Fernando
Henrique Cardoso, defendia uma participação ativa do Brasil na elaboração das normas e das
pautas para o sistema internacional. Acreditava-se que estando ativo no cenário internacional,
o país garantiria um ambiente favorável ao seu desenvolvimento econômico. Na perspectiva
de Fernando Henrique Cardoso, diante de um ambiente desfavorável, a visão do futuro é de
extrema importância, cabendo a diplomacia atuar em longo prazo de acordo com as mudanças
(VIGEVANI; OLIVEIRA; CINTRA, 2003).
De acordo com Lampreia, a política externa brasileira no período de 1995-2002 seguiu
[...] uma linha que eu chamaria de ‘convergência crítica’ em relação ao conjunto dos
valores, compromissos e práticas que hoje orientam a vida internacional [...].
“Convergência”, porque as transformações ocorridas no Brasil nos aproximaram,
por decisão própria, desse curso central da história mundial, em uma era na qual a
democracia política e a liberdade econômica são as referências fundamentais
(LAMPREIA, 2001, p. 2).
As gestões de Luiz Felipe Lampreia (1995-2000) e a de Celso Lafer (2001- 2002) no
Ministério das Relações Exteriores (MRE) foram caracterizadas por uma desdramatização da
agenda política, ou seja, a busca por uma redução em crises, conflitos e entraves no âmbito
diplomático, objetivando resolver as diferenças por um meio pacífico. Percebe-se que, nesse
período, prevaleceu uma perceptiva de cooperação, cabendo alertar que a busca pela
convergência em lugar do isolamento não significava colocar-se numa posição de
subordinação. Acreditava-se que esse era o caminho para se fortalecer a posição relativa do
país no sistema internacional (VIGEVANI; OLIVEIRA; CINTRA, 2003).
Não que o universalismo não se fazia presente na política externa do Brasil. A questão
é que essa característica passa a agregar um valor regionalista. A incorporação do conceito de
global trader traduzia que o Brasil possuía interesses globais, assumindo posições e agendas
diversificadas as quais refletiam uma vertente regionalista. Como se pode ver, pelas palavras
de Lafer, “para nós, [o Mercosul é] destino, parte das nossas circunstâncias. A Alca não é
destino, é opção” (LAFER, 2001, p.A7). O Mercosul serviria como um instrumento de poder
e de inserção internacional (VIGEVANI; OLIVEIRA; CINTRA, 2003).
71
Caracterizado por uma diplomacia presidencial, o governo de Fernando Henrique
Cardoso logrou mudanças positivas para o país como a confiabilidade no exterior, a qual
atraiu investimentos externos diretos e o apoio de organismos multilaterais e de governos de
países desenvolvidos em momentos de crise como ocorreu na crise cambial de 1999. Pode-se
dizer que o governo Fernando Henrique Cardoso melhorou a imagem do Brasil no cenário
internacional (VIGEVANI; OLIVEIRA; CINTRA, 2003).
Quanto à relação Estados Unidos-Brasil, a opção da ‘autonomia pela integração’
permitiu com que o país mantivesse boas relações com os Estados Unidos, sem a necessidade
de excluir outros parceiros comerciais. Mesmo confirmando que os Estados Unidos
representavam um grande parceiro para o país, a prioridade do Brasil seria a consolidação do
Mercosul, prevalecendo à estratégia do regionalismo aberto. Segundo o presidente, a América
do Sul corresponderia ao nosso espaço histórico-geográfico e a opção de integração sul-
americana poderia ser útil para o país barganhar no exterior um assento permanente no
Conselho de Segurança da ONU (VIGEVANI; OLIVEIRA; CINTRA, 2003).
Com relação à Alca, o presidente afirmou que
[...] a Alca será bem-vinda se sua criação for um passo para dar acesso aos mercados
mais dinâmicos; se efetivamente for o caminho para regras compartilhadas sobre
antidumping; se reduzir as barreiras não tarifárias; se evitar a distorção protecionista
das boas regras sanitárias; se, ao proteger a propriedade intelectual, promover, ao
mesmo tempo, a capacidade tecnológica dos nossos povos; e, ademais, se for além
da Rodada Uruguai e corrigir as assimetrias então cristalizadas, sobretudo na área
agrícola. Não sendo assim, seria irrelevante ou, na pior das hipóteses, indesejável
(CARDOSO, 2001, p. 3).
Percebe-se no governo Fernando Henrique Cardoso a consolidação do Mercosul como
centralidade para a política externa brasileira. Ocorreu um redirecionamento da matriz
energética do país, até então muito dependente das exportações do Golfo Pérsico, para à
Argentina e a Venezuela. Enfim, na percepção desse governo, o crescimento do papel do
Brasil na América do Sul aumentava a sua projeção internacional e o seu poder de barganha
extrarregional (VIGEVANI; OLIVEIRA; CINTRA, 2003).
Sendo guiadas pelo universalismo, as negociações comerciais multilaterais,
principalmente desenvolvidas no quadro da OMC, foram consideradas importantes para
atender os interesses nacionais uma vez que protegeria o país contra abusos ou qualquer
questão que tende a ser resolvidas pela lei do mais forte. Já com relação à União Europeia, o
governo Fernando Henrique Cardoso não logrou sucesso em estabelecer relações entre esse
bloco e o Mercosul porque, ainda que esses blocos sejam compostos por países que
compartilham valores, não existia uma compatibilidade de interesses o que inviabilizou o
estreitamento das relações (VIGEVANI; OLIVEIRA; CINTRA, 2003).
72
Com relação ao Atlântico Sul, o Brasil perdeu parte de sua influência no espaço sul-
atlântico com o fim da Guerra Fria. Um dos projetos onde o país se manteve influente foi na
ZOPACAS. Ainda que esse projeto tenha perdido sentido com a reorientação internacional, o
Itamaraty decidiu adaptá-lo ao novo cenário político em 1992. No governo Fernando
Henrique Cardoso, novas áreas de cooperação foram adicionadas na pauta do grupo,
sobretudo, a econômica. Como visto, a política externa brasileira nesse período dava ênfase
ao projeto de integração o que não ocorreu de forma distinta para com o Atlântico Sul
(GUIMARÃES, 2015).
No escopo das ZOPACAS, o Brasil normatizou suas relações com a África do Sul no
período pós-apartheid. As relações com a África, no entanto, foram reduzidas drasticamente.
Pode-se dizer que a política brasileira no governo Fernando Henrique Cardoso focou sua
atenção em quatro países africanos: África do Sul, Nigéria, Namíbia e Angola. Sabe-se que o
Brasil se tornou um grande parceiro comercial da África do Sul. Com relação à Nigéria, o
governo brasileiro voltou-se para seu interesse em importar petróleo no país que contava com
a participação da Petrobrás. Já a Namíbia, a cooperação deu-se num âmbito da defesa com o
intuito de se criar a Marinha namibiana. Por fim, o Brasil participou da missão de paz da
ONU (1995-1997) em Angola, sendo o principal contribuidor de tropas (GUIMARÃES,
2015).
Criada em 1996, a CPLP esboçou outra iniciativa no governo Fernando Henrique
Cardoso direcionada para o continente africano a qual envolve o espaço do Atlântico Sul.
Segundo alguns autores como Ely Penha, o Itamaraty enxergava esse grupo como uma forma
de integrar o Mercosul à Comunidade Econômica dos Estados da África Ocidental56
(CEDEAO) e à Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral57
(SADC)
(GUIMARÃES, 2015).
Ainda que percebidas algumas iniciativas, a política externa na era Cardoso em
direção ao Atlântico Sul foi bastante limitada. Além das relações com a África terem sido
reduzidas a um número mínimo de países, houve uma limitação de qualquer tipo de projeto
naval vinculado ao oceano, levando a obsolescência de frotas militares e o abandono da
Marinha. Somente no fim do segundo mandato do governo Fernando Henrique Cardoso que
56
Organização de integração regional a qual engloba quinze países da África Ocidental: Benim, Burkina Faso,
Cabo Verde, Costa do Marfim, Gâmbia, Gana, Guiné, Guiné-Bissau, Libéria, Mali, Níger, Nigéria, Senegal,
Serra Leoa e Togo. 57
Organização intergovernamental, criada em 1992, com o intuito de cooperar e integrar socioeconomicamente
os países da África Austral.
73
impulsos foram dados a fim de aumentar o papel do Brasil no oceano os quais foram
aprofundados no governo de Luiz Inácio Lula da Silva (GUIMARÃES, 2015).
4.1.2. O governo Lula da Silva
O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva deu um novo rumo à política
externa do país. Assim como Fernando Henrique Cardoso, ele buscou adotar uma política
universalista e de diversificação de parceiros, no entanto, o governo Lula da Silva se esforçou
em caracterizar o Brasil como potência média58
e nação emergente, destacando a capacidade
de defesa dos interesses do país no cenário internacional. Pode-se afirmar que a ideia de o
Brasil ser caracterizado como país fraco e sem capacidade de poder que procurava projeção
internacional por meio do respeito às regras do sistema, as determinações da ONU e o
alinhamento com os Estados Unidos foi abandonada no governo Lula da Silva (RIEDIGER,
2010).
Diferentemente da estratégia da credibilidade utilizado no governo de Fernando
Henrique Cardoso, o governo de Lula da Silva utilizou-se de uma estratégia autonomista para
orientar a política externa. Essa estratégia preconizava a junção do interesse em se projetar
internacionalmente com uma política ativa de desenvolvimento. Com relação aos Estados
Unidos, o novo governo reconhece a importância política, militar e econômica desse país, mas
busca atenuar o predomínio indiscutível do mesmo (RIEDIGER, 2010). Como se observa
Em um mundo menos homogêneo e mais competitivo, haveria espaço para um
movimento contrahegemônico cujos eixos estariam na Europa ampliada, com a
inclusão da Rússia, e na Ásia, onde potências como China e índia podem vir a
representar um contraponto aos Estados Unidos na região (LIMA, 2003, p.98).
Diversos fatores levaram essa nova postura da política externa brasileira, cabendo
destacar o atentado do 11 de setembro de 2001 que evidenciaram um viés unilateralista da
política externa americana e as dificuldades da Rodada Doha da OMC. Os novos rumos da
política internacional levaram uma reformulação de atitudes pelo governo brasileiro. O
presidente Lula da Silva passa a dar ênfase à ideia de que a globalização funciona de forma
assimétrica, cabendo ao país prover recursos ao seu desenvolvimento (RIEDIGER, 2010).
Dando continuidade à prioridade dada a América do Sul no governo Fernando
Henrique Cardoso, a política externa na era Lula da Silva procura sustentar um projeto do
Brasil como liderança regional. Desde 2003, o Brasil utiliza-se da diplomacia em crises
58
Partindo da concepção de Wayne Selcher, potência média é um “Estado cujas capacidades e compromissos
internos permitem-lhe desempenhar apenas papéis restritos e cuidadosamente escolhidos, e assumir iniciativas
modestas fora de sua própria região” (SELCHER, 1983 apud SENNES, 1998, p. 387).
74
políticas na região sul-americana como na Venezuela, Bolívia e Equador. O princípio da não-
intervenção já defendido pelo Brasil passa a somar-se ao da não-indiferença, ou seja,
Ciente de sua posição geográfica e do peso de sua economia nas transações intra-
regionais, o Brasil reconhece que seu papel nesse processo de integração comporta
custos e supõe uma visão ‘generosa’, para que possamos compensar os
desequilíbrios nos diferentes graus de desenvolvimento dos países da região.
Generosidade, neste caso, nada mais é do que a capacidade de colocar os interesses
do longo prazo acima de objetivos imediatistas (AMORIM, 2005, s/p).
O multilateralismo e o terceiro-mundismo mantêm-se como elementos centrais no
discurso diplomático do país uma vez que se acreditava que esses elementos colaboram para a
manutenção de um ambiente pacífico propício ao desenvolvimento. Desse modo, cabe
mencionar que os organismos internacionais passaram a ser vistos como fóruns essenciais
para a diplomacia brasileira. Fóruns como IBAS (Índia, Brasil e África do Sul), o G4, o G20,
a ONU representam algumas opções da estratégia brasileira porque esses ambientes servem
como forma do país articular seus interesses, compartilhar preocupações e buscar igualdade
no jogo político-comercial (RIEDIGER, 2010).
Uma das metas estabelecidas no governo Lula da Silva foi a criação de uma ‘nova
geografia comercial’. Seria errado comentar que a Cooperação Sul-Sul não caracterizava o
governo de Fernando Henrique Cardoso, entretanto, a grande expansão do comércio nesse
eixo ocorre no governo Luiz Inácio Lula da Silva. Normalmente, as relações entre os países se
orientavam por uma lógica vertical, uma lógica Norte/Sul, ou seja, os intercâmbios entre os
países ocorriam entre aqueles denominados desenvolvidos com aqueles em desenvolvimento.
Percebe-se, no entanto, uma clara assimetria de poder nessas parcerias o que o governo Lula
da Silva passa a criticar. Logo, a política externa do governo Lula da Silva irá priorizar uma
Cooperação Sul-Sul, ou seja, um regime de parcerias, sobretudo, com países em
desenvolvimento. Não que esse eixo horizontal substitua o relacionamento com os Estados
Unidos e a União Europeia, mas esse nova geografia representa a ampliação do
relacionamento brasileiro num sistema internacional anárquico (RIEDIGER, 2010).
Desse modo, a ‘autonomia pela integração’ (ou ‘autonomia pela participação’)
presente no governo Fernando Henrique Cardoso deu lugar a uma ‘autonomia pela
diversificação’. Acreditava-se que as diversas alianças regionais e extrarregonais
estabelecidas serviriam como uma forma de reduzir as assimetrias entre os países e aumentar,
consequentemente, a capacidade de barganha do Brasil no cenário internacional. Sob uma
análise crítica com base nos fundamentos do realismo neoclássico, entende-se que a
‘autonomia pela diversificação’ foi uma estratégia utilizada pelo governo brasileiro de forma
a responder à falta de proeminência do Brasil na distribuição de poder internacional. Logo, o
75
presidencialismo de Lula da Silva foi caracterizado por uma postura ativa e altiva frente ao
sistema internacional, problematizando a dinâmica do mundo globalizado
(VIGEVANI; CEPALUNI, 2007).
Um caso que serve perfeitamente para problematizar o significado da ‘autonomia pela
diversificação’ é o do Haiti. A diversificação no governo Lula da Silva não se restringe
apenas em alargar as alternativas nas relações com outros Estados, mas também na
capacidade brasileira de intervir em questões que nem sempre representam seu interesse
imediato. A presença brasileira no Haiti desde 2003 vincula-se a concepção da diplomacia
brasileira de cooperação em prol da paz nacional e internacional. Além disso, frente ao
interesse do país em ocupar um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU,
mostrar o engajamento e a vontade brasileira na pacificação do Haiti constituía uma estratégia
da política externa brasileira (VIGEVANI; CEPALUNI, 2007).
Como já é de se imaginar, o critério que passou a reger as relações Brasil-Estados
Unidos no governo Lula da Silva foi o da não-exclusividade. Ainda que a relação com esse
país fosse importante, não representa a melhor alternativa para o Brasil atingir suas metas
diplomáticas e econômicas. Com o objetivo de se consolidar como um global trader, o Brasil
aumentou seu comércio com mercados não-tradicionais como a China, a África, a Europa
Oriental, o Oriente Médio e a Ásia (VIGEVANI; CEPALUNI, 2007). De acordo com
Daniela Prates (2006), no período de 1998 até 2005, o peso desses mercados na economia
brasileira aumentou de 19,7% para 31%.
Com relação a Alca, enquanto Fernando Henrique Cardoso demonstrava a
possibilidade de aprovação desse projeto caso servisse ao desenvolvimento do Brasil, Lula da
Silva se opunha ao projeto, temendo representar uma forma de anexação da América Latina
aos Estados Unidos. Além disso, os interesses brasileiros não condiziam com a liberalização
de serviços e investimentos proposta pelos Estados Unidos uma vez que a posição brasileira
ansiava o acesso a mercados e acordos sobre o comércio agrícola. Vale destacar que a política
externa do governo Lula da Silva via a União Europeia como um bom parceiro para o
Mercosul como contraponto à Alca (VIGEVANI; CEPALUNI, 2007).
Assim como no governo Fernando Henrique Cardoso, o governo de Luiz Inácio Lula
da Silva estabeleceu como prioritária as relações com a América do Sul. Lula deu
continuidade tanto às negociações entre o Mercosul e a Comunidade Andina como ao projeto
de se criar uma Comunidade Sul-Americana de Nações (CASA). O Mercosul, para o Brasil,
atuaria como um instrumento político-estratégico na medida em que funciona como base para
76
a união dos países na América do Sul, livrando a região de influências externas
(VIGEVANI; CEPALUNI, 2007).
Com a ascensão de Lula da Silva à presidência do Brasil, houve uma mudança na
política externa brasileira em relação ao Atlântico Sul direcionada ao resgate da política
africana e a necessidade de se investir em ações conjuntas como forma de controlar e defender
a região. As relações com os países africanos se intensificaram em diversos níveis. Pelo
discurso de Celso Amorim é possível depreender que a África vai ocupar um lugar especial na
Política Externa brasileira neste período (FERREIRA; CORRÊA, 2016).
A África ocupa um lugar muito especial na diplomacia brasileira. Desde a sua posse,
o Presidente Lula foi à África onze vezes. Visitou mais de duas dezenas de países.
Implantamos um escritório de pesquisas agrícolas em Gana; uma fazenda-modelo
de algodão no Mali; uma fábrica de medicamentos anti-retrovirais em
Moçambique; centros de formação profissional em cinco países africanos
(AMORIM, 2010, p.1).
A aproximação com o continente africano possui um viés estratégico na medida em
que ele representa uma fonte de riquezas, de negócios, uma forma de obter novos mercados,
um meio de promover alianças, dentre outros. Nesse caso, a relação com os países africanos
foi traduzida pela política externa do governo Lula da Silva como um elemento essencial e de
interesse brasileiro.
Dentre as diversas iniciativas multilaterais nesse período, cabe destaque ao IBAS, a
CPLP e a ZOPACAS. Quanto ao exemplo do IBAS, um fórum de diálogo entre três países, a
saída vitoriosa da Índia, do Brasil e da África do Sul, que lutavam para a quebra de patentes
dos medicamentos para tratamento da Aids acabou por demonstrar as potencialidades das
Cooperações Sul-Sul. Já referente à CPLP, o Brasil desenvolveu fortes programas de
coordenação bilateral, destacando a abertura de centros de ensino técnicos no Timor e em
Angola e a instalação de uma fábrica de medicamentos antirretrovirais em Moçambique. As
relações comerciais com a Angola foram ampliadas enquanto que em São Tomé e Príncipe, o
Brasil contribuiu para que o país retomasse seu regime democrático. A ZOPACAS, por sua
vez, representa um espaço capaz de combinar diversos processos de integração, sobretudo, na
região do Atlântico Sul. O seu relançamento no governo Lula da Silva traduz o esforço
brasileiro em estreitar os laços com os países africanos.
No âmbito dessas relações com a África, cabe destacar os diversos intercâmbios
comerciais e as iniciativas de cooperação técnica fomentados pelo Brasil. No campo
comercial, cabe destacar um grande parceiro do país que é Angola. O interesse brasileiro com
Angola se concentra, na maior parte, na grande presença de biocombustíveis em seu território.
Já refrente aos projetos de cooperação técnica, o governo Lula aumentou de forma
77
significativa a atenção para esse continente. Aliás, o orçamento da Agência Brasileira de
Cooperação59
(ABC), nesse período, foi ampliado (COSTA, 2015).
Pode-se afirmar, portanto, que a política externa de Lula da Silva representa uma
‘mudança dentro da continuidade’, ou seja, não ocorreu um afastamento dos princípios que
caracterizam a diplomacia brasileira, porém, há uma divergência de ideias e ações estratégicas
para guiar a política externa do país. O período entre 2003-2010 foi caracterizado por um
equilíbrio relacional com os países, onde uma ‘estratégia de diversificação’ foi empregada
como forma de reduzir as assimetrias de poder no sistema internacional. Em termos políticos-
diplomáticos, a África representou um grande parceiro ao Brasil, garantindo ao mesmo acesso
a novos mercados, a sua influência nesses países como forma de preservação dos seus
interesses e, consequentemente, uma estratégia para aumentar o seu protagonismo no cenário
internacional.
4.1.3. O governo Dilma Rousseff
O crescimento econômico, reflexos das políticas implementadas nos oito anos do
governo Lula da Silva, gerou uma série de otimismo para o governo Dilma Rousseff. Pode-se
falar, então, que a política externa no Governo Dilma Rousseff segue a linha da política
externa desenvolvida no governo Lula da Silva, porém com algumas diferenças. O mandato
de Dilma Rousseff continuava a sustentar a aspiração por um protagonismo internacional do
Brasil, mas combinando medida de retração e de reorientação. Para alguns autores como
Andrés Malamud (2011), a política externa de Dilma Rousseff conteria o que ele chamou de
‘menos do mesmo’, ou seja, a política externa não sofreria mudanças drásticas, mas a
intensidade nos temas de diplomacia presencial seria menor (OLIVEIRA; SILVEIRA, 2015).
A sociedade, de uma forma geral, se pergunta a razão da mudança da política externa
uma vez que tanto o ex-presidente Lula da Silva como a ex-presidente Dilma Rousseff
pertenciam ao mesmo partido político. Dessa forma, assim como foi descrito por Rose (1998),
cabe mencionar que diversas causas, sejam de ordem interna como externa, podem influenciar
na tomada de decisão do líder. Reestruturações domésticas, choques externos, reivindicação
de burocratas e a própria percepção do líder sobre o cenário internacional podem impactar de
modo incisivo ou mais brando nos ajustes de política externa (OLIVEIRA; SILVEIRA,
2015).
59
Criada em 1987 para coordenar os projetos brasileiros em cooperação.
78
Pode-se dizer que diversos acontecimentos no sistema internacional influenciaram na
mudança da política externa brasileira. Dilma Rousseff iniciou seu mandato durante a
Primavera Árabe60
que, num primeiro momento, representava um otimismo quanto à vitória
da democracia, sendo substituído gradativamente por crises em várias regiões. Para além da
Tunísia, esse movimento culminou numa nova ditadura no Egito, na intervenção armada na
Líbia, na intervenção de Israel em Gaza e numa guerra declarada pelos Estados Unidos e seus
aliados ao Estado Islâmico. A Aliança do Pacífico61
surge como uma forma de contrapor a
integração sul-americana. As crises político-econômica na Argentina, Venezuela e Paraguai
fizeram com que o Mercosul e a Unasul perdessem força. Além disso, a crise econômica
mundial de 2008 repercutiu no país, sobretudo, em grande parte do governo Dilma Rousseff,
fazendo com que essa governante enfrentasse um cenário internacional diferente de seu
antecessor. Sabe-se, então, que a margem de ação da política externa de Dilma Rousseff ficou
limitada e o não protagonismo global do Brasil apareceu de forma mais velada (GAMA,
2014).
Diante de um cenário nada favorável, a presidente teve de diversificar suas estratégias.
Após uma relutância do G-8 em reformar as instituições financeiras mundiais, o Brasil passou
a pensar conjuntamente com os países pertencentes ao BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e
África do Sul) a criação de um Banco dos BRICS. Outra estratégia utilizada pela política
externa brasileira nesse período, seguindo a mesma lógica do governo anterior, foi a redução
da importância dos Estados Unidos para o Brasil. Afetados mais que o Brasil na crise de
2008, o comércio bilateral com os Estados Unidos foi reduzido em razão da emergência de
outros Estados como grandes parceiros para o Brasil, como a China (GAMA, 2014).
A política externa brasileira conquistou um relativo espaço nos debates internacionais
por se posicionar ativamente com relação às questões do meio ambiente. Sediando a
conferência Rio+2062
, o Brasil passou a questionar pontos fundamentais no Protocolo de
Quioto63
. Além disso, o país começou a associar temas de meio ambiente ao do combate à
pobreza através de programas como o PAA África64
(GAMA, 2014).
Por outro lado, se comparado ao governo anterior, é visível uma drástica redução na
quantidade de viagens internacionais realizada por Dilma Rousseff. De acordo com os dados
60
Série de protestos e revoltas, deflagradas em 2011, contra os governos locais por conta do descontentamento
da população com a crise econômica e a falta de democracia. 61
Bloco comercial latino-americano formado para promover a integração econômica e o livre coércio entre os
países membros. 62
Conferência realizada no Rio de Janeiro, em 2015, com o objetivo de renovar o compromisso dos países com o
desenvolvimento sustentável. 63
Tratado Internacional que se compromete com a redução da emissão dos gases que agravam o efeito estufa. 64
Programa de iniciativa conjunta com o intuito de superar a pobreza rural e erradicar a insegurança alimentar.
79
divulgados no site da Presidência da República, Lula da Silva passou mais de 400 dias no seu
mandato fora do país enquanto Dilma Rousseff passou menos do que 200 dias. Sabe-se
também que a presidente viajou menos até que o presidente Fernando Henrique Cardoso. Essa
redução no número de viagens internacionais acaba por impactar em longo prazo a relação
Brasil-Mundo na medida em que as decisões tomadas em uma determinada reunião podem
refletir negativamente nos interesses brasileiros (OLIVEIRA; SILVEIRA, 2015).
Quanto a América do Sul, as ações e políticas voltadas para o bloco seguiram a mesma
linha traçada pelo ex-presidente Lula da Silva. Destaca-se que coube a Dilma Rousseff não só
um esforço para consolidar a Unasul e fortalecer o Mercosul, mas também dar continuidade à
Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (CELAC), criada em 2010. Para
tal, houve um esforço brasileiro em retomar a noção de uma identidade sul-americana,
procurando atingir também a retomada de uma identidade latino-americana (OLIVEIRA;
SILVEIRA, 2015).
Estaremos empenhados nos próximos anos na consolidação da América do Sul
como um espaço de crescente paz e prosperidade. [...] Trabalharemos pelo
fortalecimento do MERCOSUL e pela construção de uma UNASUL robusta, sem
deixarmos de dedicar uma atenção diferenciada a cada país sul-americano. A
integração da América do Sul permanecerá o ponto de partida para uma diplomacia
latino-americana e caribenha em sentido mais amplo (PATRIOTA, 2011, s/p).
Quando mencionada a questão de integração regional, os diversos discursos proferidos
por Celso Amorim na Assembleia Geral da ONU deixa clara a intenção brasileira em se
projetar num nível regional, assumindo um papel de líder, articulando com os diversos
Estados da América do Sul. Além disso, como fica visível no discurso de Antônio Patriota,
Primeiro Ministro das Relações Exteriores no governo Dilma Rousseff, acreditava-se que a
retomada de uma identidade sul-america funcionaria como uma estratégia de inserção
internacional no Brasil (OLIVEIRA; SILVEIRA, 2015).
[...] em certo sentido podemos nos situar no mesmo espírito que inspirou Rio
Branco: precisamos ser cada vez mais sul-americanos e cada vez mais sintonizados
com o momento vivido pelo conjunto da comunidade das nações. Como às vezes
afirmo, mais ancorados em nossa região e, ao mesmo tempo, mais multipolares
(PATRIOTA, 2013, p. 72).
No entanto, comparado ao governo Lula da Silva, é perceptível a perda de espaço da
América do Sul no governo Dilma Rousseff em função das preferências da presidente pela
resolução dos problemas domésticos existentes no seu governo. As tabelas 5 e 6 mostram as
viagens desses presidentes para países na América do Sul (LEÃO, 2016).
80
Tabela 5 - Viagens de Lula da Silva para América do Sul
Fonte: LEÃO, 2016.
Tabela 6 - Viagens de Dilma Rousseff para América do Sul
Fonte: LEÃO, 2016.
Pelos discursos brasileiros no período Dilma Rousseff, fica evidente também a
declaração de compromisso do Brasil com o continente africano em questões econômicas,
sociais, políticas e de segurança. Na área de segurança, detentor da maior extensão territorial
margeada pelo Atlântico Sul e, consequentemente, estando na vanguarda de exercer maior
influência, é de extrema importância que o Brasil coopere com países africanos para a defesa
do entorno estratégico (FERREIRA; CORRÊA, 2016).
Assim como no governo Lula, no governo Dilma Rousseff iniciaram-se inúmeros
projetos de cooperação técnica para com a África. No entanto, essas iniciativas foram
acompanhadas de uma gradativa redução de acordo com o gráfico 1. Houve progressivos
cortes orçamentários para os projetos de cooperação, dando prioridade aqueles que já estavam
em execução. Como se vê, mais uma vez as diversas turbulências ocorridas no cenário
internacional afetaram o ambiente interno e impactaram na retração da política externa
brasileira (COSTA, 2015).
81
Gráfico 1 - Distribuição Anual de Projetos de Cooperação Técnica nos Governos Lula da
Silva e Dilma Rousseff
Fonte: PENHA FILHO, 2015.
A partir dos princípios fundamentais do realismo neoclássico de que a política externa
do Brasil pode ser explicada tanto por variáveis internacionais como variáveis domésticas, é
possível concluir que a relativa mudança do posicionamento brasileiro frente ao mundo
ocorreu em virtude de um cenário externo turbulento o qual influiu no âmbito doméstico.
Ainda que tenha sido contínuo o projeto de cooperação baseado na relação sul-sul, viu-se uma
retração da presença brasileira tanto na África como na América do Sul e uma política de
projeção do país no jogo de poder internacional de forma mais contida. Buscando satisfazer as
pressões internas e minimizar as consequências externas, a política externa do governo Dilma
Rousseff se caracterizou por uma ‘contenção na continuidade’ (COSTA, 2015).
4.2. Política de Defesa nos governos Fernando Henrique Cardoso, Lula da Silva e Dilma
Rousseff
Nos últimos anos, o Brasil tem se tornado um ator internacional de crescente
relevância. Pode-se dizer que no contexto atual em que o país procura se afirmar como
potência regional e se projetar num cenário de constantes lutas pelo controle de poder reforça-
se a importância de se pensar na Defesa nacional como forma de proteção. Assim, considera-
se a Defesa como uma atividade de responsabilidade do Estado uma vez que sua missão é
constituí-lo e preservá-lo. A política de defesa, levando em consideração essa característica,
constitui uma política pública (ALMEIDA, 2010).
A sua dimensão 'pública' é dada não pelo tamanho do agregado social sobre o qual
incidem, mas pelo seu caráter 'imperativo'. Isto significa que uma das suas
características centrais é o fato de que são decisões e ações revestidas da autoridade
soberana do poder público (RUA, 1998, p. 2).
82
Além disso, sob o ponto de vista político, a defesa nacional não deve constituir uma
política de governo, mas sim de Estado. Isso significa dizer que independente do líder ou do
arranjo governamental do momento, deve haver um arranjo político à estrutura da defesa
nacional o qual permita sua condução apesar das percepções distintas dos líderes de Estado
(ALMEIDA, 2010).
Como a política de defesa se caracteriza por uma política pública, diversos atores
políticos são envolvidos no processo de sua formulação. Dentre os atores públicos, "aqueles
que se distinguem por exercer funções públicas e por mobilizar os recursos associados a estas
funções” (RUA, 1998, p.4), cabe destacar na política de defesa brasileira o Presidente da
República, as comissões parlamentares, o Congresso Nacional, os políticos profissionais, o
Ministério da Defesa, as Forças Armadas, os partidos políticos, os órgãos governamentais da
área orçamentária, os servidores públicos desses órgãos, entre outros. Além desses, atores
privados não são menos importantes na implementação das políticas públicas como é o caso
das organizações não governamentais (ALMEIDA, 2010).
Quase uma década após o fim dos governos militares, o Brasil ainda não possuía uma
política de defesa integrada e que representasse os anseios da sociedade. Desse modo, o
governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso vai representar um grande ponto de
inflexão. Foi o primeiro momento na história do Brasil em que se procurou tornar o tema da
defesa em um assunto da sociedade e não apenas dos militares. Em 1996, cria-se um
documento ainda vago e abrangente, mas que se revelou um grande passo dessa nova
orientação estratégica (CORRÊA, 2014).
Com a criação do Ministério da Defesa em 1999, um esforço foi dado em direção a
uma redefinição da política de defesa nacional sustentável e mais abrangente. No entanto,
somente em 2005, durante o governo Lula da Silva, a PDN foi renovada. Em 2008, lançou-se
a END como uma tentativa de traçar as pretensões brasileiras e as formas de atuação do país
na área de defesa. Apesar desses avanços, o Brasil ainda não possuía um documento principal
capaz de oferecer a visão do governo a respeito da defesa (CORRÊA, 2014).
Nesse contexto, no governo Dilma Rousseff surge um documento que ficou conhecido
como o LBDN. Lançado em 2012, percebe-se que o LBDN visa esclarecer a sociedade
brasileira e a comunidade internacional sobre as políticas e ações que coordenam os
movimentos de segurança e proteção à soberania brasileira (CORRÊA, 2014).
Depreende-se, então, que o LBDN, a PND (anteriormente chamada de PDN) e a END
são os documentos basilares da Política de Defesa do Brasil. Sendo a END o documento que
vai definir os meios para se traçar os alvos da Política de Defesa, o LBDN um documento do
83
governo o qual as perspectivas no longo prazo para a defesa nacional e o PND responsável
por elaborar os objetivos e as diretrizes que devem ser seguidas para equiparar as forças
armadas, a aprovação desses três documentos é de extrema importância para a política de
segurança nacional já que mostram o compromisso com os valores democráticos e
caracterizando os debates sobre a segurança e a defesa não restrita à área militar (CORRÊA,
2014).
A partir disso, faz-se necessário uma análise das políticas de defesa brasileira nos
governos Fernando Henrique Cardoso, Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff,
destacando os pontos chaves e, sobretudo, como ela foi direcionada ao Atlântico Sul.
4.2.1. Política de Defesa no governo Fernando Henrique Cardoso
Como já visto, uma das características mais evidentes do governo de Fernando
Henrique Cardoso é o seu enquadramento num aspecto mais liberal da esfera política. Desta
forma, a economia, muitas vezes, era responsável por conduzir a política externa do país,
deixando para segundo plano temas como segurança e defesa. Ainda assim, foi nesse governo
que avanços significativos ocorreram nessa área (PRATES et al., 2016).
Condizente com as diretrizes da política externa, a atuação brasileira em questões de
segurança internacional, na era Cardoso, reflete a vontade de obter maior prestígio e
reconhecimento na Comunidade Internacional. Desse modo, é de se imaginar que o Brasil
queira se fazer presente no principal fórum multilateral de segurança coletiva: a ONU. Pode-
se falar que o país se manteve atuante nas operações de paz da ONU, enviando contingente
militar tanto para Angola como para o Timor Leste (PRATES et al., 2016).
Quanto aos regimes internacionais, o Tratado de Não-Proliferação de Armas
Nucleares (TNP) foi assinado e ratificado na gestão de Fernando Henrique Cardoso. Ainda
que muitos critiquem a posição tomada pelo ex-presidente uma vez que essa atitude foi
responsável por restringir toda a geração de armas nucleares no território nacional, para o
governo brasileiro essa decisão culminou num amadurecimento e na colaboração do país no
tocante a não-proliferação de armas nucleares. Essa medida representava o desejo do
presidente em aderir aos acordos internacionais e garantir prestígio ao Brasil (PRATES et al,
2016).
Herdada por Fernando Henrique Cardoso a intenção do Brasil em manter a cooperação
política com seus vizinhos, as Negociações com o Mercosul e a desconfiança com a Argentina
não estava mais em pauta como ameaças a segurança. Nesse modo, a única região que seria
84
um possível foco de instabilidade era a região amazônica porque incitava o interesse de
diversos países por conta da potencialidade da área. Sendo assim, visando o monitoramento e
o processamento de informações dessa zona, foram criadas iniciativas de sistema de
vigilância, o SIVAM, e de proteção, o SIPAM (FERNANDES, 2006).
Em 1996, foi formulada a PDN a qual representou os primeiros passos para a se pensar
na defesa nacional não limitada ao setor militar. Nas palavras do ministro da Defesa, Geraldo
Magela Quintão:
Foi primeira vez que se colocou em um texto, em um ato declaratório uma
orientação estratégica brasileira que até então não havia. E tudo foi feito centrado
naqueles princípios da constituição. Vejo isso como o maior avanço que se fez nesse
país em termos de Defesa neste país, fruto do Estado Democrático de Direito, que
passamos a viver a partir da Constituição de 1988, e da liderança inconteste do
Presidente (Fernando Henrique Cardoso) (QUINTÃO 2002 apud SANTOS, 2002, p.
464). Analisando o documento, percebe-se que ele é de caráter muito preliminar devido a
sua não profundidade. Aparentemente não existe nenhum conceito novo fixado ou algum tipo
de projeto proposto; ficam declaradas apenas as intenções brasileiras para com uma política
de defesa nacional, ressaltando alguns princípios básicos que serviriam de parâmetro para a
formulação das estratégias (soberania, autodeterminação, identidade nacional) e os objetivos
brasileiros com a defesa nacional (FERNANDES, 2006).
3.3. São objetivos da Defesa Nacional:
a. a garantia da soberania, com a preservação da integridade territorial, do
patrimônio e dos interesses nacionais;
b. a garantia do Estado de Direito e das instituições democráticas;
c. a preservação da coesão e da unidade da Naação;
d. a salvaguarda das pessoas, dos bens e dos recursos brasileiros ou sob
jurisdição brasileira;
e. a consecução e a manutenção dos interesses brasileiros no exterior;
f. a projeção do Brasil no concerto das nações e sai maior inserção no processo
decisório internacional; e
g. a contribuição para a manutenção da paz e da segurança internacionais.
(BRASIL, 1996, p.7).
Vale destacar que, com o fim da Guerra Fria, não só conflitos entre Estados passam a
ser foco de insegurança. Movimentos religiosos, nacionalistas, éticos podem influir
negativamente na segurança do país. Nesse contexto, a orientação estratégica do Brasil era de
dissuasão defensiva, ou seja, uma tentativa de impedir que o adversário promova alguma ação
que possa vir a ameaçar ou que ameace a segurança do país por meio da demonstração que os
objetivos iniciais traçados não serão atingidos. Tira-se, então, qualquer conotação agressiva
do termo dissuasão não significando necessariamente que o caráter defensivo resulta na
aplicação de medidas estritamente defensivas. Em casos de conflito, as Forças Armadas
podem se utilizar de medidas ofensivas com a finalidade de assegurar sua integridade e
soberania (PRATES et al., 2016).
85
Também é relevante mencionar que a PDN previa, então, a modernização das Forças
Armadas, assegurando-lhes condições para o cumprimento das suas tarefas. Nas suas
diretrizes, vê-se um desejo de aprimorar a organização, o aparelhamento e a articulação entre
as Forças Armadas assim como melhorar o sistema de vigilância e o controle das fronteiras,
das águas jurisdicionais, da plataforma continental e do espaço aéreo brasileiro (BRASIL,
1996).
Sem sombra de dúvidas, o marco institucional relevante para a área de defesa do
Brasil foi a criação do Ministério da Defesa em 1999. Essa atitude submeteu o poder militar
ao controle civil, culminando na extinção do Estado Maior das Forças Armadas. Além de
melhorar o diálogo entre os civis e os militares, essa medida melhorou a imagem do país no
sistema internacional e permitiu maior transparência nos assuntos relacionados à defesa
(PRATES et al., 2016).
Ainda muito recente, percebe-se que esse documento é extremamente vago, não
estabelecendo diretrizes concretas para a defesa do Brasil. Partindo da afirmação de que “para
o Brasil, país de diferentes regiões internas e de diversificado perfil, ao mesmo tempo
amazônico, atlântico, platino e do Cone Sul, a concepção do espaço regional extrapola a
massa continental sul-americana e inclui, também, o Atlântico Sul” (BRASIL, 1996, p.5)
percebe-se que o documento ressalta à América do Sul e o Atlântico Sul como parte do
entorno territorial do Brasil, no entanto não se percebe interesse político por essas imediações
e, consequentemente, uma estratégia de defesa específica para esse espaço. A PDN limitava-
se a mencionar sobre a utilização da cooperação no entorno regional como forma de viabilizar
a paz e repelir uma possível ameaça (GONÇALVES; CORBELLINI, 2014).
Essa configuração da política de defesa do Brasil começa a mudar no início do século
XXI por conta de uma série de acontecimentos. Com os ataques terroristas do 11 de setembro
de 2001 fez com que a agenda de segurança se tornasse um pouco mais realista,
marginalizando visões mais liberais sobre evitar o conflito com cooperação, interdependência
e equilíbrio de poder. Somasse a essas mudanças, o fato de que o Atlântico Sul passa a
assumir uma nova posição no pensamento estratégico brasileiro em virtude das importantes
descobertas energéticas nessas águas. Dessa forma, com a eleição de Lula da Silva para
presidente, o país começa a reconsiderar as pautas de defesa brasileira (PRATES et al., 2016).
4.2.2. Política de Defesa no governo Lula da Silva
86
Oficialmente, a política de defesa no governo Lula da Silva teve como base três
documentos – a PDN, a END e a LBDN –, sendo que o último só foi concluído no governo
Dilma Rousseff. É necessário atentar-se que, no governo Lula da Silva, houve uma
reformulação da PDN não correspondendo à mesma que baseou a política de defesa no
governo Fernando Henrique Cardoso.
A Política de Defesa Nacional (PDN), aprovada em 2005, é o principal documento
de planejamento da defesa do Brasil. A Estratégia Nacional de Defesa (END),
elaborada no ano de 2008, por sua vez, busca definir como operacionalizar aquilo
que se determinou na PDN. Finalmente, o Livro Branco de Defesa Nacional,
lançado em 2012, é um documento público que tem por objetivo permitir o acesso à
informação sobre o setor de defesa brasileiro. (SILVA, 2014, p.72)
Pode-se dizer que a institucionalização das políticas de defesa no governo Lula da
Silva ganhou uma nova configuração com a publicação da PDN em 2005. Condizente com
uma política externa ativa e altiva, a nova orientação da política de defesa, durante oito anos,
refletiu as alterações que estavam ocorrendo no sistema internacional. Definido como o mais
alto nível do planejamento de ações destinadas à defesa nacional, esse documento interligava
a noção de desenvolvimento nacional com a necessidade de defesa.
A PDN buscou reiterar o comprometimento brasileiro de conduzir a resolução de
conflitos através da ação diplomática. Desse modo, vê-se a necessidade de articulação entre a
diplomacia e a defesa, condicionando às estratégias brasileiras a forma preventiva e a reativa.
A diplomacia, ferramenta principal, seria utilizada para fins de persuasão enquanto o emprego
do uso da força militar se limitaria ao exercício de legítima defesa (GONÇALVES;
CORBELLINI, 2014).
No que diz respeito ao entorno regional, o documento pondera que “é importante para
o Brasil que se aprofunde o processo de desenvolvimento harmônico e integrado da América
do Sul, o que se estende naturalmente, à área de defesa e segurança regionais” (BRASIL,
2005, p.23). Segundo o documento, “a segurança de um país é afetada pelo grau de
instabilidade da região onde está inserido” (BRASIL, 2005, p.23). Dessa forma, além de
considerar a América do Sul uma área onde a harmonia deve permanecer, o país passa a
visualizar um entorno estratégico o qual vai além da massa continental, incluindo o Atlântico
Sul e os países lindeiros da África. Acreditava-se que o fortalecimento do processo de
integração, o estreito relacionamento entre os países amazônicos, a intensificação da
cooperação e do comércio com países africanos e a consolidação da Zona de Paz e de
Cooperação do Atlântico Sul contribuem para a redução da possibilidade de conflitos no
entorno estratégico (BRASIL, 2005).
87
Sabe-se que, no início do século XXI, o Atlântico Sul passa a receber maior atenção
da comunidade internacional em virtude das grandes descobertas energéticas na região, em
especial, as descobertas das jazidas do Pré-Sal, em 2006. Dessa forma, o novo documento
produzido na gestão de Lula da Silva contempla e apresenta a importância estratégica do
Atlântico Sul para o Brasil, vendo-o como prioridade no assunto da defesa nacional
(GONÇALVES; CORBELLINI, 2014).
4.5 O mar sempre esteve relacionado com o progresso do Brasil, desde o
seu descobrimento. A natural vocação marítima brasileira é respaldada pelo seu
extenso litoral e pela importância estratégica que representa o Atlântico Sul.
A Convenção das Nações Unidas sobre Direito do Mar permitiu ao Brasil
estender os limites da sua Plataforma Continental e exercer o direito de jurisdição
sobre os recursos econômicos em uma área de cerca de 4,5 milhões de quilômetros
quadrados, região de vital importância para o País, uma verdadeira "Amazônia
Azul".
Nessa imensa área estão as maiores reservas de petróleo e gás, fontes de
energia imprescindíveis para o desenvolvimento do País, além da existência de
potencial pesqueiro.
A globalização aumentou a interdependência econômica dos países e,
consequentemente, o fluxo de cargas. No Brasil, o transporte marítimo é responsável
por movimentar a quase totalidade do comércio exterior (BRASIL, 2005, s/p).
A partir de 2007, o Ministério da Defesa passa a agir de forma mais atuante na agenda
de política externa. A nova participação do Brasil como uma das principais economias
mundiais demandava uma política de defesa mais consistente do que já havia sendo
demonstrado. Sendo assim, a END, elaborada em 2008, contempla aspectos que não foram
suficientemente comentados no documento de defesa anterior no que tange à estratégia
nacional de defesa (CASTRO, 2015). A END trouxe mais clareza sobre os reais objetivos e o
planejamento das Forças Armadas brasileiras. Segundo o documento:
2. A Estratégia Nacional de Defesa organiza-se em torno de três eixos estruturantes.
O primeiro eixo estruturante diz respeito a como as Forças Armadas devem-se
organizar e orientar para melhor desempenharem sua destinação constitucional e
suas atribuições na paz e na guerra. Enumeram-se diretrizes estratégicas relativas a
cada uma das Forças e especifica-se a relação que deve prevalecer entre elas.
Descreve-se a maneira de transformar tais diretrizes em práticas e capacitações
operacionais e propõe-se a linha de evolução tecnológica necessária para assegurar
que se concretizem.
A análise das hipóteses de emprego das Forças Armadas - para resguardar o espaço
aéreo, o território e as águas jurisdicionais brasileiras - permite dar foco mais preciso
às diretrizes estratégicas. Nenhuma análise de hipóteses de emprego pode, porém,
desconsiderar as ameaças do futuro. Por isso mesmo, as diretrizes estratégicas e as
capacitações operacionais precisam transcender o horizonte imediato que a
experiência e o entendimento de hoje permitem descortinar.
Ao lado da destinação constitucional, das atribuições, da cultura, dos costumes e das
competências próprias de cada Força e da maneira de sistematizá-las em estratégia
de defesa integrada, aborda-se o papel de três setores decisivos para a defesa
nacional: o espacial, o cibernético e o nuclear. Descreve-se como as três Forças
devem operar em rede - entre si e em ligação com o monitoramento do território, do
espaço aéreo e das águas jurisdicionais brasileiras.
O segundo eixo estruturante refere-se à reorganização da indústria nacional de
material de defesa, para assegurar que o atendimento das necessidades de
equipamento das Forças Armadas apoie-se em tecnologias sob domínio nacional.
88
O terceiro eixo estruturante versa sobre a composição dos efetivos das Forças
Armadas e, consequentemente, sobre o futuro do Serviço Militar Obrigatório. Seu
propósito é zelar para que as Forças Armadas reproduzam, em sua composição, a
própria Nação - para que elas não sejam uma parte da Nação, pagas para lutar por
conta e em benefício das outras partes. O Serviço Militar Obrigatório deve, pois,
funcionar como espaço republicano, no qual possa a Nação encontrar-se acima das
classes sociais (BRASIL, 2008, s/p).
Essa nova orientação estratégica entende que a estratégia nacional de defesa é
inseparável da estratégia nacional de desenvolvimento. Uma reforça a razão da existência da
outra na medida em que “defendido, o Brasil terá como dizer não, quando tiver que dizer não.
Terá capacidade para construir seu próprio modelo de desenvolvimento” (BRASIL, 2008,
s/p).
Pode-se dizer que a EDN e, mais tarde, o LBDN foi crucial para entender o papel do
Ministério da Defesa e das Forças Armadas na formulação da estratégia de defesa nacional.
Entende-se como prioritária não só a defesa terrestre como também a defesa aérea e, em
especial, a marítima. Para tal, conceitos de controle e monitoramento são apontados em todo
documento como fundamentais para o exercício da soberania. Aliás, entende-se que as áreas
marítimas de maior importância para o poder marítimo brasileiro de acordo com a EDN são a
área vital, chamada de Amazônia Azul seguida do Atlântico Sul (GONÇALVES;
CORBELLINI, 2014).
Essa posição mais assertiva da política de defesa brasileira se relaciona com a nova
reorientação da política externa no governo Lula da Silva em que a prioridade não seria só
uma integração regional, mas sim uma inserção internacional de forma independente baseada
na diversificação das relações com o mundo. Não coincide com o interesse brasileiro,
portanto, a entrada em conflitos, no entanto, vale mencionar que em caso da falha das ações
diplomáticas, é de extrema importância que o país esteja preparado militarmente e
estrategicamente para defender o território brasileiro (GONÇALVES; CORBELLINI, 2014).
No contexto de estímulo de integração regional e da elaboração de uma política de
defesa com diretrizes traçadas, o Conselho de Defesa Sul-Americano (CDS) foi uma
importante iniciativa brasileira no âmbito da cooperação em segurança e defesa. Estabelecido
no âmbito da Unasul, Bettaglino (2009) aponta três funções principais do CDS: construir um
pensamento coletivo regional para as questões de defesa, desenvolver uma indústria regional
de defesa e atuar como gerenciador de crises e tensões. Com suas negociações iniciadas em
2008, o CDS é essencial para o processo de integração sul-americana como a própria END faz
menção (CASTRO, 2015).
Assim, podem-se compreender as atitudes tomadas no governo Lula da Silva mediante
o realismo neoclássico. Diante de um cenário onde vários Estados passam a emergir na
89
dinâmica de poder internacional, a política exterior de Lula da Silva busca uma autonomia
brasileira através da diversificação de parcerias – ou seja, uma variável externa passou a
influenciar a percepção do líder. Devendo reafirmar o interesse nacional e o protagonismo do
país no cenário internacional, o modelo adotado por Fernando Henrique Cardoso é
abandonado, dando espaço a uma postura mais crítica que fosse capaz de promover o
desenvolvimento nacional. Assim, era necessário estabelecer diretrizes concretas para a
defesa nacional uma vez que defesa e desenvolvimento, segundo a própria END, estavam
atrelados.
Não tirando o foco da análise realista neoclássica para se pensar na atuação da política
externa brasileira, é importante aportarmos que as análises construtivistas também podem
fornecer explicações em relação às diversas iniciativas multilaterais no governo Lula da Silva.
Partindo da ideia de que a ameaça é um ato de fala, a baixa securitização de ameaças na
região culmina numa visão de segurança que privilegia o desenvolvimento da região. Desse
modo, faz-se presente mecanismos de cooperação e diálogo com os países no entorno
estratégico brasileiro como forma de mecanismos de defesa. A criação da Unasul, do
Conselho de Defesa Sul-Americano e a reinteração da importância da ZOPACAS, por
exemplo, reforça o reconhecimento de identidades, valores e aspectos culturais comuns,
aprofundando os laços de diálogo e confiança mútua entre os países regionais ao Atlântico
Sul.
4.2.3. Política de Defesa no governo Dilma Rousseff
Em relação ao período de gestão de Dilma Rousseff, cabe considerar que as
dificuldades externas e internas enfrentadas nessa época acabaram por configurar
constrangimentos as Políticas Externa e de Defesa ativas, formuladas no governo Lula da
Silva. Por mais que essas políticas tenham seguido a mesma linha do governo Lula da Silva,
percebeu-se um perfil mais retraído de diplomacia presidencial se comparado ao governo
anterior. Ainda assim, considera-se importante analisar a política de defesa a qual permeou o
governo Dilma Rousseff uma vez que, mesmo diante de um cenário internacional conturbado,
importantes projetos firmados nesse período demonstram o reconhecimento da importância da
Defesa para o país.
Em 2012, destaca-se o lançamento do LBDN conjuntamente com a publicação do
documento PND – END. Pode-se dizer que esses documentos pautam as ações, projetos,
estrutura e os desafios brasileiros no campo de defesa. O LBDN, somando-se ao PND – END
90
possuem um caráter esclarecedor não só para o meio internacional como para o doméstico.
Realizada pela primeira vez de forma conjunta, a atualização da PND e da END procura
atender um objetivo até então não visto nos governos anteriores: a conscientização da
sociedade sobre a importância dos temas de defesa para o país. Parte-se do princípio de que a
defesa não deve ser assunto só do setor militar, ela deve ser uma preocupação de toda
sociedade (BRASIL, 2012b).
A PND – END inicia mostrando que a nova configuração da ordem internacional,
marcada por assimetrias de poder, gera um cenário de possíveis tensões e instabilidades para a
paz. Desse modo, a prevalência do multilateralismo e o fortalecimento de princípios como a
soberania, não-intervenção e a igualdades entre os Estados colabora para um mundo mais
estável, cabendo ao Brasil colaborar com tais preceitos a fim de promover uma boa imagem
do país no sistema internacional (BRASIL, 2012b).
Esse documento prossegue enfatizando que o país visualiza seu entorno estratégico
para além da América do Sul, incluindo as regiões do Atlântico Sul, os países lindeiros da
África e até mesmo a Antártica. Assim como o documento anterior produzido na gestão Lula
da Silva, a PND – END destaca que a segurança de um país depende do grau de estabilidade
da região onde ele está inserido, ou seja, isso implica dizer que a defesa do Brasil não se
limita apenas as suas fronteiras, mas sim a todo seu entorno estratégico (BRASIL, 2012b).
É importante mencionar os principais objetivos nacionais de defesa, que de acordo
com o documento,
O primeiro deles é a garantia da soberania, do patrimônio nacional e da integridade
territorial. Outros objetivos incluem a estruturação de Forças Armadas com
adequadas capacidades organizacionais e operacionais e a criação de condições
sociais e econômicas de apoio à Defesa Nacional no Brasil, assim como a
contribuição para a paz e a segurança internacionais e a proteção dos interesses
brasileiros nos diferentes níveis de projeção externa do País (BRASIL, 2012b, p.
41).
O planejamento de defesa do governo Dilma Rousseff presume que uma política de
defesa ativa necessariamente contém uma dimensão de dissuasão e outra de cooperação. A
dissuasão não implica obrigatoriamente o uso da força militar; ela é vista, nesse caso, como
uma forma de persuadir o outro ao seu interesse. Vendo como prioridade a região da
Amazônia e do Atlântico Sul, áreas sobre eventuais ameaças externas em virtude das riquezas
existentes, o país reconhece a cooperação com países da América do Sul e da África
Ocidental como forma de estratégia de defesa. Por mais que pareça contraditório alinhar a
cooperação como uma política de defesa, a verdade é que a cooperação se torna uma maneira
de se evitar o conflito e produzir ganhos comuns (AMORIM, 2013).
91
No governo Dilma Rousseff, reforça-se a importância do CDS, iniciado no governo
Lula da Silva, como uma forma de desenvolver um pensamento de defesa sul-americana.
Outro fórum de destaque para o planejamento estratégico da defesa brasileira é a ZOPACAS.
Sabendo que o Atlântico Sul se tornou uma área vital para o poder econômico e político
brasileiro, é interesse brasileiro eliminar qualquer tipo de ameaça nessa zona. O Brasil, então,
deve reinterar e reforçar esse fórum de cooperação, a ZOPACAS, de modo a assumir suas
responsabilidades por esse mar. Segundo as próprias palavras de Celso Amorim, “se não o
fizermos, outros países a farão em nosso lugar, às custas de nossa autonomia e de nossa
soberania. São os países ribeirinhos do Atlântico Sul podem tomar as melhores decisões para
proteger seu oceano comum” (AMORIM, 2013, p.14).
Com a vocação por uma tendência universalista e de país pacífico, a política de defesa
brasileira atua conforma a política externa do país por uma estratégia de inserção
internacional. Como o Brasil não possui inimigos no presente, as Forças Armadas brasileiras
devem se estruturar em termos de capacidades, de modernização. E, “para não tê-los no
futuro, é preciso preservar a paz e preparar-se para a guerra” (BRASIL, 2012b, p. 59) levando
em conta o sentido ‘preparar’ como estar pronto para a eventualidade de uma guerra e até
contribuir para evitá-la (AMORIM, 2013).
O LBND, lançado em 2012, representa o pensamento nacional voltado para a área de
defesa. Tendo como objetivo promover a transparência entre o Estado e a sociedade nos
assuntos de defesa, esse documento é dividido em seis partes: 1. O Estado Brasileiro e a
Defesa Nacional; 2. O Ambiente Estratégico do Século XXI; 3. A Defesa e o Instrumento
Militar; 4. Defesa e Sociedade; 5. Transformação da Defesa; 6. Economia da Defesa. Mais
uma vez, fica destacada a ideia de o país ser um amante da paz, porém atentando-se para o
fato que, ainda assim, o Brasil não pode abdicar da sua capacidade de dissuasão (militar ou
não) e do preparo da defesa contra ameaças externas (BRASIL, 2012a).
Como forma de inserção internacional, esclarece-se que a vocação brasileira para o
diálogo constitui um elemento fundamental para a inserção do país no cenário internacional.
Logo, o Estado brasileiro deve trabalhar em prol de uma ‘multipolaridade cooperativa’,
contribuindo para a criação de uma sociedade global participativa e inclusiva. Como já
divulgado em documentos anteriores, a política de defesa brasileira se utiliza da cooperação
como forma de estratégia de defesa (BRASIL, 2012a).
O LBDN dedica um capítulo somente para a contextualização do ambiente estratégico
do Brasil. Diante de um contexto de aceleração da globalização e de crises internacionais
políticas, econômicas e sociais, é necessário que o país delimite seu entorno estratégico a fim
92
de defendê-lo. Dessa forma, o LBDN destaca a América do Sul e o Atlântico Sul como área
de interesse vital para o país. Com relação ao Atlântico Sul, é dever brasileiro estabelecer
mecanismos de controle e proteção dessas águas em razão do seu caráter estratégico
(BRASIL, 2012a).
Esse oceano possui áreas estratégicas relevantes como a ‘Garganta Atlântica’, entre
a costa do nordeste brasileiro e a África ocidental, espaço intercontinental de vital
importância para o comércio mundial. As passagens ao sul, que ligam o Atlântico ao
Pacífico, constituem uma via alternativa ao canal do Panamá, principalmente para os
navios de grande porte. A rota do cabo da Boa Esperança, conectando o Atlântico
Sul ao oceano Índico, é uma alternativa ao canal de Suez e oferece também o melhor
acesso marítimo à Antártica. Para além do pré--sal, boa parte do petróleo que o
Brasil importa vem de países na faixa equatorial do Atlântico (BRASIL, 2012a,
p.35).
A figura, presente no próprio LBDN, ilustra a presença do pré-sal nas águas de
jurisdição brasileira de acordo com a CNUDM.
.
Figura 12 - Espaço marítimo de jurisdição brasileira
Fonte: BRASIL, 2012a.
No que diz respeito à cooperação em defesa, nos países africanos, nota-se uma
continuidade dos projetos do governo Lula da Silva, firmados pela ABC, no mandato do
governo de Dilma Rousseff. Os países que receberam o maior envio de missões de
treinamento militar são os membros da ZOPACAS. Isso evidencia o interesse brasileiro em
93
assegurar a segurança e a estabilidade da Costa Atlântica. O gráfico 2 demonstra o aumento
significativo dos projetos em defesa do Brasil na África (OLIVEIRA et al., s.d.).
Gráfico 2 - Projetos de Cooperação em defesa no continente africano
Fonte: OLIVEIRA et al, s.d.
Viu-se que a política de defesa do governo Dilma Rousseff adequou-se, da melhor
forma possível, ainda que muito desacordado, as dificuldades impostas pelo sistema
internacional. Viu-se uma continuidade da política do governo anterior, cabendo destacar a
elaboração de documentos importantíssimos para o âmbito da defesa nacional. Houve uma
preocupação maior em inserir a sociedade nas questões de defesa nacional. Os esforços em
cooperação, utilizados como estratégia de defesa, continuaram assim como o reforço da ideia
de necessidade de se proteger o entorno estratégico brasileiro.
Quanto ao que foi visto, até então, faz-se necessário uma análise crítica a configuração
da ação brasileira se levarmos em conta os aspectos do realismo neoclássico. È passível de
questionamento o estabelecimento de uma estratégia de dissuasão e cooperação como forma
de política de defesa. Por mais que os líderes atuem de acordo com seus constrangimentos
internos e externos, o principal objetivo de um Estado é garantir sua sobrevivência. Os
Estados, atores racionais no sistema internacional, para fazerem valer seus interesses devem
investir nas suas capacidades militares porque, em última instância a guerra é o cenário mais
provável num sistema anárquico. Sendo assim, seria o mais vantajoso uma postura brasileira
de investimento em cooperação e dissuasão como estratégia de defesa numa área como o
Atlântico Sul em que grandes potências visam garantir influência?
94
Sabe-se que os esforços em modernização do setor militar brasileiro estão previstos
nos documentos oficiais, incluindo projetos como a construção de um submarino nuclear.
Com a retomada do crescimento do Brasil no início do século XXI, o país passou a dispor de
recursos e vontade política num projeto de reaparelhamento militar. De acordo com o Sistema
de Promoção de Investimentos e Transferência de Tecnologia para Empresas (SIPRI), entre
2001 e 2010, houve sim um aumento nos gastos militares brasileiros, principalmente em razão
das descobertas do Pré-Sal no Atlântico Sul. No entanto, encontra-se um grande vácuo entre o
discurso proferido e o que se pretende nos documentos oficiais e o que de fato está em
andamento. Será que uma potência média como o Brasil pode concretizar e defender seus
interesses no Atlântico Sul utilizando-se somente de estratégias de soft power sem a
combinação com um hard power eficiente e moderno?
Tendo em vista que o Brasil utiliza-se de mecanismos dissuasivos e cooperativos
como estratégia de defesa e de projeção internacional, sob um olhar do realismo neoclássico
faz-se importante uma análise quanto a isso. Ainda que essa corrente entenda que a
capacidade de atuação de um Estado sofre influência de limitações internas, a defesa de um
Estado está intrinsecamente ligada ao uso dos meios militares. Como fica reconhecido no
próprio LBDN:
Projeção de poder sobre terra — Tarefa básica do poder naval que abrange um
amplo espectro de atividades, que podem incluir o bombardeio naval, o bombardeio
aeronaval e operações anfíbias. Nessa tarefa também estão enquadrados os ataques a
terra com mísseis, a partir de unidades navais e aeronavais. As ações podem ter um
ou mais dos seguintes propósitos: reduzir o poder inimigo pela destruição ou
neutralização de objetivos importantes; conquistar área estratégica para a conduta da
guerra naval ou aérea, ou para propiciar o início de uma campanha terrestre; negar
ao inimigo o uso de uma área capturada; apoiar operações em terra; e salvaguardar a
vida humana ou resgatar pessoas e materiais de interesse (BRASIL, 2012a).
Por outro lado, o que se vê ao longo dos discursos e da realidade brasileira é falar de
projeção de poder através de cooperação e dissuasão. Como um país pretende se projetar
sobre uma determinada área e assegurar seus interesses regionais numa área extremamente
estratégica sem estar preparado militarmente e, inclusive, considerando a guerra uma
eventualidade? Um país que evoca a necessidade de fazer frente às ameaças potenciais ao seu
entorno estratégico, investindo em mecanismos de cooperação em defesa, precisa atentar-se
para o fato principal da premissa realista que é a necessidade de garantir sua sobrevivência
num ambiente anárquico. Portanto, sob um ponto de vista crítico, ainda que o país estabeleça
como estratégias de defesa o binômio dissuasão e cooperação, é importante um investimento
no setor militar diante da perspectiva brasileira de defesa do Atlântico Sul.
95
4.3. Análise Comparativa das Políticas de Defesa nos governos Fernando Henrique
Cardoso, Lula da Silva e Dilma Rousseff
A palavra ‘Estratégia’ passou por um processo de transformação, dotando um
significado atual diferente da sua origem. Nascida nos campos de batalha, sendo refrente à
conduta dos chefes militares, a estratégia hoje pode ser substituída pela palavra
‘planejamento’ uma vez que trata de todos os casos de um conjunto de ações, desencadeadas
por princípios julgados como racionais, que visam o cumprimento de objetivos específicos.
(MARTINS; OLIVEIRA, 2015). Outra diferenciação daquela estratégia militar do conceito de
estratégia dos dias atuais, também chamada de Grande Estratégia, pode ser visualizada por
Lidell Hart:
Enquanto o horizonte da estratégia é limitado pela guerra, a grande estratégia olha
mais para frente, preocupando-se com os problemas da paz subseqüente. Utiliza os
instrumentos necessários à conduta da guerra e procura evitar os danos, tendo em
vista a paz, preocupando-se com a segurança e a prosperidade (HART, 1982, p.
407).
É no âmbito da Grande Estratégia que se discute questões próprias aos tempos de paz
como: a prática da dissuasão, a política de alianças e relacionamentos e o dimensionamento
dos orçamentos militares. Partindo dessa perspectiva, toda escolha ou construção de um
grande sistema de armas é produto de um complexo processo decisório o qual inclui tanto
fatores de ordem interna como as capacidades econômicas e tecnológicas como fatores de
ordem externa como a configuração do sistema internacional. (MARTINS; OLIVEIRA,
2015). Esse princípio organizador que está intrinsecamente ligado à aplicação da Grande
Estratégia é chamado de Conceito Estratégico Nacional que, segundo Golbery do Couto e
Silva pode ser definido como:
[...] a diretriz fundamental que, em dado período, deve nortear toda a estratégia da
Nação, com vistas da consecução ou salvaguardados Objetivos Nacionais a despeito
dos antagonismos que se manifestem ou possam a vir manifestar-se, tanto no campo
internacional, como até mesmo no âmbito interno do país (SILVA, 1981, p. 251).
O Conceito Estratégico Nacional, podendo ser montado por uma análise conjuntural
do sistema, percepção de ameaças e capacidade de mobilização de poder, é o responsável por
estabelecer as diretrizes para a aplicação de uma estratégia em um dado momento. Sendo
assim, essa parte do trabalho irá comparar os principais documentos de defesa nacional,
sobretudo a PDN do governo Fernando Henrique Cardoso e a END do governo Lula da Silva,
com o objetivo de analisar a mentalidade governamental brasileira sobre a defesa, procurando
identificar a existência de algum tipo de relação entre os acontecimentos no sistema
internacional somados ao aumento de relevância do Atlântico Sul e sua inclusão ao entorno
estratégico brasileiro (MARTINS; OLIVEIRA, 2015).
96
A análise comparativa terá como base a PDN do governo Fernando Henrique Cardoso
e a END do governo Lula da Silva em razão da clara evolução da construção de um conceito
estratégico nacional. Com relação ao LBDN e a atualização das PND e END, publicado no
governo Dilma Rousseff, viu-se que esse documento representou um desdobramento das
ideias contidas na estratégia apresentada pelo governo Lula da Silva. Ainda que seja
importante diplomaticamente e represente uma ligação entre o Estado e a sociedade, em
termos estratégicos, os documentos seguem as premissas já alcançadas pela Estratégia
Nacional de Defesa (MARTINS; OLIVEIRA, 2015).
Pode-se dizer que tanto a PDN do governo de Fernando Henrique Cardoso como do
governo Lula da Silva apresentam estruturas semelhantes. Ambos os documentos são
parecidos no que se refere a menções quanto a pouca probabilidade de conflitos bélicos no
sistema internacional, as incertezas e a redução de cálculos probabilísticos e à caracterização
de conflitos não mais de caráter interestatal. No entanto, a PDN de 2005 acrescenta novos
subtítulos: o Estado, a segurança e a defesa, o ambiente regional e o entorno estratégico e o
Brasil (MARTINS; OLIVEIRA, 2015).
O governo Fernando Henrique Cardoso, diante de um cenário de desconstrução de
uma ideologia bipolar e da exacerbação de nacionalismo e fragmentação de Estados, entendeu
como necessário a criação de um Ministério da Defesa e a elaboração de um documento que
norteasse a política de defesa brasileira. Contudo, a preferência por temas econômicos e uma
política externa voltada por uma ‘autonomia pela integração’, por vezes, marginalizou temas
como a defesa e a segurança. Dessa forma, ainda que a PDN no seu governo tenha
representado um grande avanço para a defesa brasileira, as premissas nesse documento
dotaram um caráter vago e bastante genérico para o estabelecimento de uma estratégia de
defesa (MARTINS; OLIVEIRA, 2015).
Uma grande mudança presente na II PND é a definição de segurança e de defesa.
Entendendo a defesa como a efetividade da ação para se manter seguro e a segurança como a
condição em que o Estado e a sociedade se vê protegido pela sociedade, o documento define
os conceitos básicos para se entender numa política de defesa nacional (BRASIL, 2005).
Outra grande diferença presente no documento de 2005 é o entendimento do quadro
internacional o qual influenciou nas orientações estratégicas da PDN. A partir do
entendimento de que as relações internacionais são pautadas por um jogo de atores, interesses
e normas as quais estimulam e limitam o poder e a atuação dos Estados, as questões de
segurança e de defesa não estão somente ligadas à confrontação entre os Estados, mas as
possíveis vulnerabilidades de um país que podem ser exploradas por outro. Caracterizado por
97
uma aceleração do processo de globalização e um grande avanço tecnológico, o mundo do
século XXI se encontra diante de desafios mais complexos. A crise internacional no âmbito de
segurança com o 11 de setembro, a expansão do comércio internacional e do fluxo de capitais,
a criação de blocos mais competitivos, os avanços no sistema de informação reduziram o grau
de previsibilidade nas relações internacionais (BRASIL, 2005). De acordo com a II PND:
Neste século, poderão ser intensificadas disputas por áreas marítimas, pelo domínio
aeroespacial e por fontes de água doce e de energia, cada vez mais escassas. Tais
questões poderão levar a ingerências em assuntos internos, configurando quadros de
conflito (BRASIL, 2005, s/p).
Diante disso, a II PDN, entende que a cooperação funciona como um mecanismo para
a superação das vulnerabilidades dos países porque “o aprofundamento da interdependência
dificulta a precisa delimitação dos ambientes externo e interno.” (BRASIL, 2005). Pode-se
dizer que ambos os documentos reconhecem a importância do processo de integração do
Mercosul e da consolidação das ZOPACAS. No entanto, a inclusão da América do Sul e do
Atlântico Sul no documento de 1996 está relacionada ao interesse de proteção dessas áreas já
que elas caracterizam o entorno regional brasileiro. A I PDN via a cooperação no entorno
regional como forma de viabilizar a paz. Por outro lado, a II PND e a END atribuem um
caráter estratégico à América do Sul e ao Atlântico Sul, caracterizando-os como entorno
estratégico brasileiro e não só um entorno regional. O LBDN, estabelecido no governo Dilma
Rousseff, segue a mesma linha de pensamento dos documentos elaborados no governo Lula
da Silva, estabelecendo a Amazônia e o Atlântico Sul como área de interesse vital ao país
(BRASIL, 1996; BRASIL, 2005; BRASIL, 2012a).
Isso pode ser interpretado pelo reconhecimento do Atlântico Sul como uma região
extremamente rica em recursos vivos e não-vivos. Tanto a II PND e o LBDN reconhecem a
existência de imensas camadas de petróleo e gás nessa área as quais necessitam de uma
política de defesa concreta e ativa. O LBDN, inclusive faz menção ao SisGAAz, já em curso e
com a implementação total prevista até 2024, que prevê o monitoramento e controle das
águas jurisdicionais brasileiras, proporcionando maior segurança, fiscalização e controle do
patrimônio brasileiro (BRASIL, 2012).
O reconhecimento de ameaças presentes na conjuntura atual é outro ponto que faz com
que a I PDN se diferencie dos documentos posteriores. A PDN do governo Lula da Silva
enfatiza a necessidade de fortalecer as atividades de inteligências e vigilância territorial como
forma de manutenção da segurança no espaço terrestre, aéreo e marítimo, alertando para
possibilidades não só de conflitos convencionais como não convencionais também. O Brasil
98
considera, segundo a II PDN e o LBDN, o terrorismo e o crime organizado como um risco à
paz e a segurança mundiais (BRASIL, 1996; BRASIL, 2005; BRASIL, 2012a).
Compreende-se que tanto a END como o LBDN representaram uma reconfiguração na
geopolítica e na estratégia brasileira diante dos desafios impostos pelo século XXI. A END
possui uma base geopolítica sólida na medida em que determina o entorno estratégico do
Brasil, avançando para um planejamento das forças armadas nacionais quanto à defesa
nacional. Verifica-se uma Grande Estratégia que vai além das grandes bacias fluviais do
território nacional, abrangendo áreas como a Amazônia Azul. Desse modo, o documento
aponta a necessidade de uma presença naval brasileira forte que obrigaria o suposto inimigo a
uma mobilização nacional mais potente para neutralizar a presença marítima brasileira
(MARTINS; OLIVEIRA, 2015).
Segundo os documentos elaborados a partir de 2005, os setores espacial, cibernético e
nuclear são estratégicos para a Defesa do País, cabendo fortalecê-los e modernizá-los. Além
disso, a II PND e a END introduz como estratégias de defesa a cooperação e a dissuasão. Com
relação à dissuasão, isso não implica na utilização efetiva da força militar, mas na capacidade
de persuadir o outro de que o ataque ao Brasil não produziria benefícios ao precursor da ação.
Contudo, a END alerta que para dissuadir, é preciso mostrar estar pronto para o combate.
Quanto à cooperação, ele consiste num meio de prevenir conflitos e integrar as bases
indústrias de defesa dos países na região sul-americana e sul-atlântica. No quadro 1, presente
no LBDN, vê-se os diversos esforços brasileiros em cooperação na área de defesa.
99
Quadro 1 - Cooperação em defesa - exercícios militares 2010/2011
100
101
Fonte: BRASIL, 2012a.
Diante da análise apresentada, foi possível a elaboração de um quadro comparativo
onde foram trabalhadas as variáveis: Sistema Internacional, Política Externa e Política de
Defesa, Documentos Oficiais e Atlântico Sul na Política de Defesa.
102
Quadro 2 - Comparação Política de defesa e Atlântico Sul como espaço estratégico
Governos Fernando
Henrique Cardoso Lula da Silva Dilma Rousseff
Sistema
Internacional
Nos anos 1990,
mudanças
sistêmicas,
marcadas pelo fim
de uma ordem
bipolar,
influenciaram de
forma significativa
a política externa
brasileira. Com o
fortalecimento da
hegemonia
americana, a
aceitação de novos
temas e valores
universais passa a
ser prioridade.
O início do século
XXI é caracterizado
por um sistema
multipolar, marcado
pela emergência de
países no jogo de
poder internacional.
As dificuldades da
Rodada Doha e o
atentado do 11 de
setembro cobraram
uma nova postura da
política externa
brasileira.
Diante de um canário
internacional o qual lidava
com as consequências da
crise econômica de 2008,
da relutância do G-8 em
reformar organismos
como o FMI e o Banco
Mundial e da insatisfação
de Estados com seus
regimes políticos
culminando na Primavera
Árabe, em 2011, a política
externa do governo Dilma
teve que diversificar suas
estratégias num sistema
desfavorável.
Política
Externa e
Política de
Defesa
A política externa
de Fernando
Henrique se
caracterizou por
uma “autonomia
pela integração” /
“autonomia pela
participação”. A
centralidade da
integração sul-
americana na
política externa
brasileira estava
relacionada como
uma forma de
buscar autonomia.
A busca pelo
universalismo nas
relações com os
países foi expressa
mais por um
regionalismo
(global trader).
Enquanto, buscava-
se o
estabelecimento de
uma autonomia em
relação aos Estados
Unidos, sem
A política externa de
Lula é definida como
realista, universalista
e pragmática. Esse
líder dá continuidade
às políticas
implementadas no
governo anterior,
porém se afirma de
forma mais ativa na
política externa.
Além de assumir a
liderança da região
tornando prioritários
os projetos de
integração regional,
a política externa de
Lula assumiu um
caráter de
“autonomia pela
diversificação”, ou
seja, o Brasil buscou
diversas parceiras
estratégicas no
mundo, priorizando
as relações sul-sul.
Com os Estados
Unidos, foram
mantidas as relações
A política externa do
governo Dilma seguiu as
mesmas diretrizes da
política anterior só que de
uma forma mais contida
em razão aos desafios
enfrentados no sistema
internacional. As relações
com a África foram
mantidas assim como a
priorização de uma
agenda para a integração
regional. A relação
bilateral com os Estados
Unidos foi reduzida em
razão da diversificação de
parcerias. Após uma
relutância do G-8 em
reformar as instituições
financeiras mundiais, o
Brasil passou a pensar
conjuntamente com os
países pertencentes ao
BRICS a criação de um
Banco dos BRICS.
103
excluir as relações
bilaterais com o
mesmo, as relações
com a África foram
drasticamente
reduzidas.
vistas como
estratégicas, mas de
uma forma não-
exclusiva. Houve
extrema
aproximação com a
África.
Documentos
Oficiais
Pela primeira vez
na história, em
1996, criou-se um
documento para a
se pensar na defesa
nacional não
limitada ao setor
militar: a PDN.
Documento ainda
vago e abrangente,
mas que se revelou
um grande passo
dessa nova
orientação
estratégica. Com a
criação do
Ministério da
Defesa em 1999,
um esforço foi
dado em direção a
uma redefinição da
política de defesa
nacional
sustentável. A
atuação brasileira
em questões de
segurança
internacional, na
era Cardoso, reflete
a vontade de obter
maior prestígio e
reconhecimento da
Comunidade
Internacional.
A política de defesa
no governo Lula teve
como base os
documentos: a PDN,
reformulação da I
PDN, e a END.
Ambos buscam
reafirmar o
compromisso
brasileiro em
conduzir a resolução
de conflitos através
da diplomacia. A
END foi
importantíssima para
esclarecer sobre os
reais objetivos
brasileiros no campo
da defesa e o
planejamento das
Forças Armadas
brasileiras. Soma-se
a isso o fato de que
essa nova orientação
estratégica entende
que a estratégia
nacional de defesa é
inseparável da
estratégia nacional
de desenvolvimento.
Por fim, esses
documentos inovam
ao caracterizar a
América do Sul, o
Atlântico Sul e os
países lindeiros da
África como
pertencentes ao
entorno estratégico
brasileiro.
Representando a
continuidade dos
documentos apresentados
no governo Lula, em
2012, destaca-se o
lançamento do LBDN
conjuntamente com a
publicação do documento
PND – END como
importantes documentos
da política de defesa
nacional. Tendo como
objetivo promover a
transparência entre o
Estado e a sociedade nos
assuntos de defesa, o
LBDN reforça que o país
visualiza seu entorno
estratégico para além da
América do Sul, incluindo
as regiões do Atlântico
Sul, os países lindeiros da
África e até mesmo a
Antártica.
104
Atlântico Sul
na Política de
Defesa
Nesse período, o
Atlântico Sul ainda
ocupava uma
posição marginal
nos assuntos da
agenda
internacional. Seria
errado afirmar que
o ele não estava
presente nas
diretrizes da defesa
nacional, entretanto
a menção de se
defender o
Atlântico Sul
ocorre pela
percepção desse
espaço no entorno
do território
brasileiro. Não
existia um interesse
político, econômico
e estratégico por
essa região para se
estabelecer uma
política de defesa
específica.
As descobertas de
petróleo offshore,
sobretudo o pré-sal
brasileiro, deram
destaque a esse
oceano até então
com um peso
relativo no cenário
global. Os
documentos de
defesa elaborados no
governo Lula
constantemente
chamam a atenção
para a necessidade
de defesa das
riquezas presentes
nessas águas. Visto
como parte do
entorno estratégico,
diversos mecanismos
no âmbito da
cooperação em
defesa iniciaram-se
no governo Lula.
A política de defesa em
direção ao Atlântico Sul
do governo Dilma
Rousseff adequou-se, da
melhor forma possível, as
dificuldades impostas pelo
sistema internacional. Os
próprios documentos de
defesa caracterizam o
Atlântico Sul como área
estratégica para o Brasil,
onde está localizado o
pré-sal além de
corresponder a uma
importante via comercial
e rota alternativa. Desse
modo, existe uma
continuidade dos projetos
do governo Lula, firmados
pela ABC, com os países
africanos assim como o
reforço da importância
das ZOPACAS para
assegurar a estabilidade
da região.
Fonte: Elaboração do autor.
105
5. CONCLUSÃO
As percepções e as avaliações sobre a importância estratégica do Atlântico Sul vem se
alterando nos últimos anos acompanhando grandes mudanças no sistema internacional.
Tradicionalmente caracterizado por ser uma região relativamente marginalizada pela agenda
internacional, esse oceano transformou-se em um espaço no qual se projetam interesses tanto
de países regionais como de potências extrarregionais.
Diante de um enorme potencial energético, econômico e de comunicação, no final do
século XX e início do século XXI, o Atlântico Sul passa a ser visto como uma zona
estratégica. Além dos diversos conjuntos de ilhas na região as quais funcionam como forma
de projeção sobre a África, América do Sul e a África, as recentes descobertas petrolíferas
encontradas nas águas profundas que vão do Espírito Santo a Santa Catarina repercutiram
internacionalmente.
Pode-se dizer que, para o Brasil, o mar teve importante papel na história do país.
Entretanto, até a década de 1970, o Atlântico Sul era visto só como uma importante via
comercial e de comunicação. Pode-se dizer que, durante esse período, a disputas por polos de
poder em razão da Guerra Fria, encadeou uma tentativa norte-americana malsucedida de
militarizar esse espaço marítimo. A partir de então, essa região começa a captar a atenção
brasileira a qual passou a representar a ‘fronteira oriental’ do país.
O alargamento da soberania brasileira sobre o Atlântico Sul envolveu movimentos
estratégicos tanto no âmbito externo como no âmbito interno. Primeiramente, cabe mencionar
o pleito do país à ONU em alargar seu “mar territorial” para 200 milhas. Dentre algumas
iniciativas da época, destaca-se o sucesso brasileiro em promover o Atlântico Sul em uma
área de Paz e Cooperação, culminando na criação das ZOPACAS. De uma forma geral, a
década de 1980 foi caracterizada por um amplo diálogo com a África, envolvendo esforços
para a criação de uma identidade sul-americana a qual, no século seguinte, será reforçada.
Ainda que as relações com a África tenham sido reduzidas no governo de Fernando
Henrique Cardoso (1995-2002) em nome de uma opção de ‘autonomia pela integração’, a
partir do governo Lula da Silva, o Atlântico Sul ganhou extrema importância na agenda da
política externa e de defesa brasileira. Isso pode ser em parte explicado, como visto ao longo
do trabalho, pelas recentes descobertas de recursos energéticos no litoral Atlântico do país que
agregaram uma visão desse espaço como estratégico Viu-se que a expressão ‘entorno
estratégico’, abrangendo a Bacia do Atlântico Sul até a Antártica, surgiu pela primeira vez na
PND de 2005. Desde então, a política externa brasileira confere prioridade ao entorno,
106
cabendo ao país traçar estratégias de cooperação bilateral e multilateral com países banhados
pelo Atlântico Sul assim como mecanismos nacionais de controle e proteção dos recursos
presentes nessas águas.
O governo Dilma Rousseff seguiu as mesmas orientações do governo Lula da Silva,
com uma postura menos ativa em razão de um contexto externo e interno adverso. O LBDN
reforça a ideia presente nos documentos anteriores de que o Atlântico Sul representa uma área
estratégica para o país onde está localizado o Pré-Sal além de corresponder como uma
importante via comercial e rota alternativa marítima. Além disso, viu-se o país utiliza-se de
da dissuasão e da cooperação como estratégias de defesa. É de se imaginar que o documento
previa a modernização das forças armadas brasileiras, mesmo destacando a posição brasileira
como um Estado pacífico.
Concluiu-se, então, que as descobertas de petróleo offshore, sobretudo o pré-sal
brasileiro, deram destaque a esse oceano até então com um peso relativo no cenário global.
Acredita-se que, diante do conteúdo todo exposto, fica evidente a gradativa inserção do
Atlântico Sul nas Políticas de Defesa brasileira graças à percepção dos líderes e dos
responsáveis pela elaboração da política externa dessa zona como estratégica. Com base nos
pressupostos do realismo neoclássico, entende-se que toda uma política de defesa voltada para
o Atlântico Sul atende as necessidades internas de proteger uma área de interesse vital ao país
tanto econômica como politicamente. A cooperação e a dissuasão como estratégias de defesa
respondem a um sistema internacional de crescentes instabilidades e emergências de países no
jogo de poder internacional, ainda que não condizentes num primeiro momento com uma
potência média que pretende projetar seu poder.
Como visto, portanto, esse estudo alcançou seu objetivo principal que era entender
como variou a percepção do Atlântico Sul como um espaço estratégico pelas políticas de
segurança e defesa brasileiras a partir da década de 1990. No decorrer da análise, ficou
comprovada a hipótese dessa pesquisa de que na medida em que as inúmeras riquezas foram
sendo descobertas nessas águas, houve uma mudança na percepção das lideranças brasileiras
de que era necessário proteger a região. No entanto, é importante lembrar que não somente o
aumento do potencial estratégico do Atlântico Sul acarretou numa mudança de percepção,
outros fatores como as novas ameaças, a presença de potências extrarregionais, a vontade de
se projetar internacionalmente fizeram com que o país se atentasse para o litoral.
107
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