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UNIVERSIDADE DO SUL DE SANTA CATARINA CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA MILITAR ENIO CARNEIRO NEPOMUCENO A FORÇA EXPEDICIONÁRIA BRASILEIRA : A IMPORTÂNCIA DAS PEQUENAS FRAÇÕES NA CONQUISTA DE MONTESE TERESINA- PI AGOSTO/2010

UNIVERSIDADE DO SUL DE SANTA CATARINA CURSO DE … · comandantes das pequenas frações para o sucesso da campanha aliada na Itália. A pesquisa realizada foi de cunho eminentemente

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UNIVERSIDADE DO SUL DE SANTA CATARINA

CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA MILITAR

ENIO CARNEIRO NEPOMUCENO

A FORÇA EXPEDICIONÁRIA BRASILEIRA : A IMPORTÂNCIA DAS

PEQUENAS FRAÇÕES NA CONQUISTA DE MONTESE

TERESINA- PI

AGOSTO/2010

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ENIO CARNEIRO NEPOMUCENO

A FORÇA EXPEDICIONÁRIA BRASILEIRA: A IMPORTÂNCIA DAS PEQUENAS

FRAÇÕES NA CONQUISTA DE MONTESE

Trabalho de conclusão de curso

apresentado ao Curso de Especialização

em História Militar da Universidade do

Sul de Santa Catarina como parte dos

requisitos para a obtenção do título de

especialista em História Militar.

Orientador: Prof. Msc. Carlos Roberto

Carvalho Daróz.

Teresina

2010

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ENIO CARNEIRO NEPOMUCENO

TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO SUBMETIDO AO CORPO DOCENTE DA

UNIVERSIDADE DO SUL DE SANTA CATARINA – UNISUL, DE ACORDO COM

REGIMENTO INTERNO DESTA INSTITUIÇÃO, COMO PARTE DOS REQUISITOS

PARA A OBTENÇÃO DO TÍTULO DE ESPECIALISTA EM HISTÓRIA MILITAL.

APROVADO POR:

_____________________________________________

Prof. Msc. Carlos Roberto Carvalho Daróz.

(Professor / Orientador)

TERESINA - PI - BRASIL

Agosto de 2010

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RESUMO

O objetivo do presente trabalho é exploratório e consiste em dimensionar a importância da

atuação das pequenas frações nos combates da Força Expedicionária Brasileira (FEB),

durante a campanha da II Guerra Mundial. Foram utilizadas fontes primárias e secundárias

para solucionar o problema proposto para o trabalho que foi: qual o grau de importância da

atuação das pequenas frações na tomada de Montese? Os dados foram obtidos por meio de

pesquisa bibliográfica e documental com a consulta de livros, depoimentos de ex-

combatentes, artigos, revistas, da rede mundial de computadores e de documentários

cinematográficos. Foi feita uma rápida abordagem sobre a criação, preparação e sobre a

trajetória da FEB na Itália, com particular atenção à Batalha de Montese. Finalmente, na

conclusão do trabalho, foram apresentados os aspectos mais relevantes da campanha

brasileira em Montese e dimensionada a relevância da atuação das pequenas frações neste

embate.

PALAVRAS-CHAVE: Segunda Guerra Mundial. Força Expedicionária Brasileira.

Montese. Pequenas frações.

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ABSTRACT

The objective of the present work is exploratory and it consists of give dimension the

importance of the actuation of the small fractions in the combats of the Brazilian

Expeditionary Force (FEB), during the campaign of the II World War. Primary and

secondary sources were used to solve the problem proposed for the work that was: which

the degree of importance of the performance of the small fractions in the socket of

Montese? The data were obtained through bibliographical and documental research with

the consultation of books, former-combatants' depositions, goods, magazines, of the world

net of computers and of cinematographic documentaries. It was made a fast approach about

the creation, preparation and on the path of FEB in Italy, with matter attention to the Battle

of Montese. Finally, in the conclusion of the work, the most relevant aspects of the

Brazilian campaign were presented in Montese and was dimensioned the relevance of the

performance of the small fractions in this collision.

KEY WORDS: Second World War. Brazilian Expeditionary Force. Montese. Small

fractions.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ........................................................................................................... 6

2 A SEGUNDA GUERRA MUNDIAL E A PARTICIPAÇÃO BRASILEIRA ....... 9

2.1 A II GUERRA MUNDIAL NA EUROPA................................................................. 9

2.2 O BRASIL NA II GUERRA MUNDIAL................................................................... 10

2.2.1 O Brasil distante do Conflito ........................................................................................ 10

2.2.2 O Brasil, da neutralidade à guerra ................................................................................ 11

2.3 A FORÇA EXPEDICIONÁRIA BRASILEIRA .......................................................... 14

2.3.1 A FEB no Brasil ............................................................................................................ 14

2.3.2 A FEB na Itália ............................................................................................................. 19

2.3.3 O regresso da FEB e a sua desmobilização .................................................................. 28

2.4 A BATALHA DE MONTESE ..................................................................................... 30

2.4.1 Montese, o último bastião alemão ................................................................................ 31

2.4.2 O Regimento Tiradentes na tomada de Montese .......................................................... 32

2.4.3 A tomada de Montese (quatro jornadas de sangue) ...................................................... 34

2.4.4 Montese, uma conquista das pequenas frações ............................................................. 36

3 CONCLUSÃO .............................................................................................................. 41

REFERÊNCIAS ................................................................................................................... 45

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1. INTRODUÇÃO

A Segunda Guerra Mundial foi o conflito militar de maior relevância no

Século XX. Os motivos que levaram à guerra, o desenrolar da campanha bélica e o seu

desfecho selaram o destino da humanidade e nos apresentaram o mundo como nós o

conhecemos atualmente.

Os principais protagonistas da II Guerra Mundial capitanearam episódios

militares tão marcantes e dramáticos que as suas narrativas são repetidas e exploradas

diariamente, por meio de livros, periódico, revista e vídeos. Os países mais atingidos pela

guerra perderam milhões de vidas humanas, sofreram prejuízos materiais de toda a ordem e

concretizaram feitos que não serão esquecidos pela humanidade.

A participação do Brasil no conflito ocorreu por meio de uma Divisão

Expedicionária que compunha a Força Expedicionária Brasileira (FEB). Diante da

magnitude de meios e efetivos desprendidos pelas grandes potências no conflito, pode

parecer que a participação da FEB foi de reduzida importância histórica. No entanto, os

dias passados nos campos de batalha italianos, as vidas brasileiras lá perdidas e os feitos da

FEB, não obstante numericamente inferiores aos de países como a Alemanha, Rússia e

Estados Unidos, encerram um significado cuja importância, para o Brasil, é indiscutível.

A participação brasileira, por meio da FEB, foi a última oportunidade na

qual as nossas Forças Armadas estiveram em combate. Os feitos da FEB e os ensinamentos

militares por ela colhidos são uma importante referência para as Forças Armadas nos dias

atuais.

O tema da presente pesquisa é a atuação das pequenas frações¹ de combate

no episódio específico do combate em Montese. Nessa batalha, conhecida como a mais

dramática e sangrenta da campanha da FEB, os comandantes das pequenas frações atuaram

por meio de sua liderança e decidiram contundentemente o destino da contenda.

Quanto ao problema definido para a presente pesquisa, foi questionada

qual a relevância das ações desenvolvidas pelas pequenas frações na conquista de Montese.

1. Pequenas frações de infantaria são os efetivos militares operacionais organizados em níveis que podem

variar de um Grupo de Gombate (9 homens) comandado por um sargento até um Pelotão de Fuzileiros

(36homens) comandado por um tenente.

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O objetivo do presente trabalho é, depois de apresentar uma visão geral da

campanha da FEB na Itália, explorar, mais incisivamente, a Batalha de Montese e o

desempenho dos Pelotões de Infantaria durante este violento episódio histórico.

O estudo se justifica pela relevância da participação da FEB na II Guerra

Mundial para a história militar brasileira, pela contundência das jornadas que envolveram a

conquista de Montese e pela necessidade de que se apresente a relevância da atuação dos

comandantes das pequenas frações para o sucesso da campanha aliada na Itália.

A pesquisa realizada foi de cunho eminentemente bibliográfico e

documental, no que se refere aos procedimentos técnicos adotados. Foram utilizadas na

pesquisa fontes tais como livros, artigos, trabalhos monográficos e outros tipos de

documentos sem prévio tratamento analítico. Além disso, também foram usadas

fotografias, documentos da época, imagens cinematográficas e diversos depoimentos de

combatentes que presenciaram o conflito.

Por não haver utilizado procedimentos estatísticos e sim a interpretação de

fenômenos e atribuições de significados, o presente trabalho, quanto a sua abordagem, foi

do tipo qualitativo.

Finalmente, em relação aos objetivos do trabalho, a presente pesquisa foi

notadamente exploratória. Na realidade, o que se pretendeu foi, por meio da investigação

bibliográfica e documental e pelo estudo de situações concretas, determinar o grau de

relevância das pequenas frações para a conquista de Montese.

Todo o material colhido na pesquisa foi finalmente compilado e submetido

à leitura (tanto seletiva e crítica como reflexiva e analítica) para que, ao final, se obtivesse

o objetivo desejado. Merecem especial destaque as obras cinematográficas “Senta a Pua” e

“A Cobra Fumou”, o acervo fotográfico disponibilizado na palestra sofre a FEB,

ministrada pela Seção de História Militar da Academia Militar das Agulhas Negras, além

da brilhante compilação de testemunhos de guerra constantes nos Tomos do projeto

História Oral do Exército, da editora BIBLIEX.

No que tange à organização do presente relatório, verificaremos, na parte

do referencial teórico, um resumo dos primórdios da II Guerra Mundial na Europa seguido

do ingresso do Brasil no conflito mundial e, finalmente uma descrição da campanha

febiana na Itália, com ênfase no combate de Montese.

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Finalmente, na conclusão são apresentados os aspectos mais relevantes da

campanha da FEB e destacada a Batalha de Montese, notadamente no que tange à crucial

relevância do emprego das pequenas frações para a conquista deste importante objetivo da

Ofensiva da Primavera dos aliados na Itália.

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2 A SEGUNDA GUERRA MUNDIAL E A PARTICIPAÇÃO BRASILEIRA

2.1 A II GUERRA MUNDIAL NA EUROPA

O término da I Guerra mundial, segundo algumas interpretações, viria

marcar o início de um longo período de paz na Europa. A Alemanha recentemente

derrotada fora tão vilipendiada pelos termos dos acordos do pós-guerra que já não

representaria mais nenhuma ameaça.

Com o fim da guerra, a Alemanha perdeu um sétimo de seu território e todas as

suas colônias. Também foi proibida de se unir à Áustria. As suas forças armadas

foram desmanteladas: o exército só poderia contar com 100000 homens e não

haveria mais força aérea nem marinha. O artigo 232 do Tratado de Versalhes

ordenou ao país o pagamento de indenizações à França, à Grã-Bretanha, à Itália e

à Bélgica, no valor de 132 bilhões de marcos de ouro. A instabilidade política da

República de Weimar, aliada à crise econômica provocada pelo crash da bolsa de

Nova Iorque (1929), favoreceu o surgimento do nazismo. Adolf Hitler falava o

que o povo queria ouvir: acabar as imposições do tratado de Versalhes, combater

o comunismo e por fim à crise social, dando trabalho a todos e terra aos

camponeses. (SEGUNDA, 2007, v.1, p. 19)

O efeito da severidade do tratado de Versalhes, no entanto, acabou

surtindo um efeito totalmente contrário ao esperado. A rigidez e a inflexibilidade foram as

bigornas que forjaram a expansão nazista

Desde 1936, a preparação para a guerra tornou-se o objetivo principal do

nazismo. As forças armadas deveriam servir de instrumento para conseguir o

espaço vital tão sonhado por Hitler. Nesse contexto, a indústria teve papel

fundamental e se desenvolveu com apoio do Estado. O plano quadrienal de

crescimento ficou a cargo de Hermann Göring, criador da Gestapo. E logo

começou a dar frutos. (SEGUNDA, 2007, v.1, p. 28)

O período entre guerras foi marcado por turbulências econômicas e sociais

e pelo medo do crescimento da Máquina Comunista. Cada potência mundial, imersa em

seus problemas e seus receios, parecia querer ignorar os indícios do que ocorria na

Alemanha Nazista.

O mundo europeu não acreditava na possibilidade de guerra, porque não queria

acreditar na guerra. Em meados dos anos 30 foi praticada deliberadamente a

política de avestruz: os sinais de guerra eram latentes em todos os quadrantes da

Europa, mas ninguém queria aceitar a evidência dos fatos. No dia 12 de março

de 1938, a Alemanha anexou a Áustria; era uma nação inteira desaparecendo sob

o manto nazista. (SILVEIRA, 2001, p. 24).

No primeiro quadrimestre de 1939 os regimes nazifascistas deram as

primeiras mostras efetivas de suas intenções.

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Em 15 de março de 1939, após a ocupação dos Sudetos, em outubro de 1938,

Hitler invadiu a Tchecoslováquia. No dia 7 de abril, as tropas de Benito

Mussolini invadiram a Albânia, que já era um protetorado italiano desde 1927.

No dia 1º de setembro de 1939, os alemães invadem a Polônia e a Inglaterra

declara guerra à Alemanha, o que dá início à II Guerra Mundial. (SEGUNDA,

2007, v.1, p. 93)

Após várias tentativas de não encarar o problema nazista de frente, com a

invasão da Polônia, não houve mais como refugar diante da guerra. No entanto, a

Alemanha largara muito na frente. O preço da falta de preparação aliada seria cobrado.

Seriam necessários quatro anos para que se revertesse a superioridade militar germânica.

A Guerra Mundial de 1939-45 desenvolveu-se principalmente nos seguintes

Teatros de Operações (TO): da Europa Ocidental, da Europa Oriental, do

Mediterrâneo, da África Oriental, do Atlântico, Asiático e do Pacífico. Para fins

de estudos, podemos dividir, a grosso modo, o desenvolvimento estratégico da II

Guerra Mundial, em duas fases distintas: 1ª Fase: caracterizada pelo domínio da

Alemanha e seus aliados, que abrange o período compreendido desde a

Campanha da Polônia, até fins de 1942, início de 1943. 2ªFase: com o seu início

caracterizado pela virada dos ventos da guerra em favor dos aliados, balizado

pelas vitórias de El Alamain (norte da África), Stanligrado (na Rússia) e Batalha

Naval de Midway (no Pacífico), que, naturalmente, se estendeu até o fim do

conflito, com a rendição da Alemanha e do Japão em 1945. (VIDIGAL, 2009,

p.153)

A Europa e, brevemente, todo o mundo já estavam envoltos no conflito

que marcaria toda a história do Século XX.

2.2 O BRASIL NA II GUERRA MUNDIAL

2.2.1 O Brasil distante do conflito

A guerra, que começou como um problema europeu, não oferecia, até

1940, indícios que de que os seus reflexos atingiriam o continente americano. A América,

como um todo, embora demonstrasse antipatia pelos métodos de Hitler, não dava qualquer

mostra de ter intenção de abandonar a postura da neutralidade.

A Alemanha invadiu a Polônia no dia 1º de setembro de 1939. A estratégia

nazista ficou conhecida como blitzkrieg (guerra relâmpago): a aviação alemã

bombardeou cidades, destruiu equipamentos militares e inviabilizou qualquer

forma de resistência polonesa. A Inglaterra e a França declararam guerra à

Alemanha dois dias após a invasão da Polônia. Aos poucos o conflito se

expandiu. Podemos dividir a guerra em dois momentos principais, condizentes

com o local dos conflitos: a guerra dentro do continente europeu (1939-1940); e

a expansão mundial do conflito a partir de 1941, até o seu término em 1945.

(TASIFANO, 2006, p 683)

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O Brasil não se mostrava diferente dos demais países americanos. Era uma

nação pobre, imersa em um regime ditatorial e com vários problemas sociais que tornavam

distantes os conflitos na Europa.

O Brasil dos anos 30 ainda era uma nação agrícola. A maior parcela da

população vivia no campo e, politicamente, ressentia-se das revoluções e

pronunciamentos militares da década de 20. Os anos 30 iniciaram-se com a

revolução que colocou Getúlio Vargas no poder. Durante o seu mandato, ele

procurou amoldar a situação política, disposto a apoiar a indústria para tornar o

Brasil um país desenvolvido. Imersos em seus problemas internos, o governo e a

opinião pública davam pouca atenção aos acontecimentos que se desenrolavam

na Europa. (SILVEIRA, 2001, p. 25).

O Brasil, distante do conflito, já no dia seguinte da eclosão a guerra promulgava

o decreto-lei nº 1561, estabelecendo regras de estrita neutralidade com relação às

potências envolvidas. (SILVEIRA, 2001, p. 30).

De qualquer modo, a intensidade do conflito europeu motivou precauções

na América. Os países norte-americanos e latino-americanos declararam neutralidade no

conflito, no entanto, assumiram o compromisso de apoio mútuo diante de agressões dele

advindas.

Quando em setembro de 1939 a Alemanha iniciou a guerra, os Estados

americanos, através de reuniões de chanceleres, haviam consolidado o pan-

americanismo, o que possibilitou, já em outubro , a Declaração de Neutralidade

e, em julho de 1940, o compromisso, alcançado em uma das reuniões, de que

atentado de um país não americano a qualquer país americano seria considerado

uma agressão a todos os que assinassem a declaração. O Brasil assinou-a.

(MOTTA, 2001, t. 4, p. 24)

2.2.2 Brasil, da neutralidade à guerra

A neutralidade brasileira no conflito foi severamente abalada após a

contundente agressão japonesa aos Estados Unidos.

Mais tarde, em 7 de dezembro de 1941, explodiu a incrível ignomínia de Peal

Harbor. Em face desse nefando crime do Mikado, o Governo do Brasil, honrando

os seus compromissos no plano internacional e em justa solidariedade com os

Estados Unidos, anunciou, em data de 28 de janeiro de 1942, durante a terceira

reunião dos Chanceleres, o rompimento de suas relações com a Alemanha, o

Japão e a Itália. Os atos com que o Brasil efetivou essa ruptura de ligação com os

governos de Hitler, Hiroito e Mussolini revelaram, de maneira irrefragável e

desde as primeiras horas, a decisão deprevinir-se contra agressões eixistas em

iminência de serem desencadeadas neste hemisfério. (MORAES, 2005, p. 24)

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Diante do ingresso norte-americano na II Guerra Mundial e honrando os

compromissos de apoio mútuo firmados no cenário das Américas o país se posicionou,

repudiando a conduta sino-germânica diante dos Estados Unidos. Depois de assumir a sua

posição, o Brasil passou a ser alvo da máquina militar alemã.

A frota de submarinos alemães desenvolvia intensa campanha no Atlântico

Norte, causando pesadas baixas nos aliados. Aos poucos, a área de batalha foi se

ampliando até chegar ao Atlântico Sul. No dia 16 de fevereiro de 1942, o navio

brasileiro Buarque foi afundado. [...] No caso do Buarque, porém, os arquivos e

documentos compulsados comprovaram que o navio foi afundado pelo

submarino alemão U.432, sob o comando do Capitão Schultzer. O mesmo

submarino, com o mesmo capitão afundou o navio Olinda, em 18 de fevereiro de

1942. Não havia mais dúvidas: a guerra chegara ao Brasil. Durante o conflito,

foram afundados 32 navios brasileiros e houve 972 mortes [...]. (SILVEIRA,

2001, p. 39)

Depois dos ataques aos navios brasileiros não havia dúvida que a guerra

chegara ao Brasil. O que não se sabia ao certo era se o país chegaria a intervir diretamente

no conflito.

Multidões acorrem no Palácio do Catete, no Rio de Janeiro, exigindo a guerra.

No dia 22 de agosto, o presidente Getúlio Vargas reuniu o ministério, em um

ambiente tenso e cheio de expectativas. Na tarde do mesmo dia, o Departamento

de Imprensa e propaganda do Governo transmitia a seguinte nota à nação: “O

Senhor Presidente da República reuniu hoje o seu ministério, tendo comparecido

Figura 2.1 Ataque japonês à Base de Pearl Harbor

Fonte: US Naval History & Heritage Command, disponível em:

http://www.history.navy.mil/index.html

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todos os ministros. Diante da comprovação de atos de guerra contra a nossa

soberania, foi reconhecida a situação de Beligerância entre o Brasil e as nações

agressoras, Alemanha e Itália.” [...] Como a decisão do dia 22 provocou diversas

interpretações nos dias subseqüentes, o Governo resolveu, a 31 de agosto,

através do decreto nº10358, declarar guerra em todo o território Nacional.

(SILVEIRA, 2001, p. 43).

Para que passasse da proclamada neutralidade à ação bélica na Europa, a atitude

política do Brasil sofreu sucessivas modificações. Primeiro: neutralidade

absoluta de 1º de setembro de 1939, início do conflito, até 7 de dezembro de

1941, ataque a Pearl Harbour. Segundo: solidariedade aos Estados Unidos, de 8

de dezembro de 1941 a 28 de janeiro de 1942. Terceiro: rompimento das

relações diplomáticas com a Alemanha, Itália e Japão, em 28 de janeiro de 1942.

Quarto: estado de guerra com a Alemanha e Itália, em 22 de agosto de 1942.

Quinto: estado de guerra com o Japão a partir de 6 de junho de 1945.

(SILVEIRA, 2001, p. 44).

Na verdade, conforme podemos aferir da fotografia apresentada e das

transcrições acima, o ingresso do Brasil na II Guerra Mundial não foi um fato isolado.

Houve uma sequência de acontecimentos neste sentido, acontecimentos motivados pelas

circunstâncias e impulsionados pelo clamor popular.

Figura 2.2 – Manifestação no Palácio do Catete em prol da guerra

Fonte: Empresa Brasileira de Notícias, disponível em

http://www.marcillio.com/rio/hiregeno

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2.3 A FORÇA EXPEDICIONÁRIA BRASILEIRA

A declaração brasileira de guerra à Alemanha ocorreu em agosto de 1942,

daí em diante, houve uma série de encontros políticos e militares entre brasileiros e norte-

americanos para definir a postura do Brasil diante do conflito.

Após o encontro com Roosevelt, em janeiro de 1943, Vargas decide organizar

uma Força Expedicionária. A FEB foi criada pela Portaria Ministerial nº47-44,

de 9 de agosto de1943, compreendendo a 1ª Divisão de Infantaria Expedicionária

e mais os órgãos não divisionários, totalizando 24334 homens, sob o comando

do General João Baptista Mascarenhas de Moraes. Sua organização e instrução

foram difíceis. O deslocamento para a Itália foi realizado em quatro escalões, via

marítima, partindo do Rio de Janeiro, e mais 111 homens por via aérea.

(MOTTA, 2001, t. 2, p. 38)

No início de 1943, motivada pelos fatores acima expostos, houve a decisão

de que brasileiros lutariam ao lado dos aliados nos campos de batalha.

2.3.1 A FEB no Brasil

2.3.1.1 A criação, organização e o comando da FEB

A FEB, criada em março de 1943, começou os seus trabalhos de

organização. Os meses que se seguiram foram repletos de medidas administrativas e de

coordenação.

A criação da Força Expedicionária Brasileira tem como seu marco inicial a

Comissão Militar Mista Brasil - Estados Unidos (CMMBEU) e como ponto de

partida a autorização que o Presidente Getúlio Vargas deu diretamente ao

General Leitão de Carvalho, em 29 de março de 1943. (SILVEIRA, 2001, p. 51)

Depois de mais de quatro meses de trabalho, foi finalmente decidida a

composição da nossa Força Expedicionária. O Brasil se faria representar na guerra por um

efetivo valor Divisão de Infantaria. A composição é a que abaixo se segue:

No dia 9 de agosto de 1943, pela Portaria Ministerial nº47-44, publicada no

Boletim Reservado do dia 13 do mesmo mês, foi criada a FEB, constituída de

uma divisão de infantaria expedicionária (que passou a se chamar 1ª Divisão de

Infantaria Expedicionária - 1ª DIE) e órgãos não-divisionários. (DIE –

COMPOSIÇÃO: a) Comandante Geral de Divisão, b) Quartel Geral, Estado-

Maior Geral, Estado-Maior Especial e Tropa Especial, c) Infantaria Divisionária

– Comandante (General de Brigada) e 3 Regimentos de Infantaria. d) Artilharia

Divisionária – Comandante (General de Brigada) e 4 Grupos de Artilharia. e)

Esquadrilha de Aviação (ELO). f) Batalhão de Engenharia. g) Batalhão de

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Saúde. h) Esquadrão de Reconhecimento. i) Companhia de Transmissão

(Comunicação). UNIDADES NÃO DIVISIONÁRIAS – COMPOSIÇÃO:

Comandante da FEB, General de Divisão (acumulando o comando da DIE),

Inspetor Geral da FEB, Serviço de Saúde da FEB, Agencia do Banco do Brasil,

Pagadoria Fixa, Seção Brasileira de Base, Depósito de Intendência, Serviço

Postal, Serviço de Justiça, Depósito de pessoal. Esses organismos não

divisionários, sob a chefia do General Falconiere e comando geral do General

Mascarenhas, eram indispensáveis para manter a operacionalidade da FEB.

(SILVEIRA, 2001, p. 51 e 52).

Para comandar a FEB foi designado o General Mascarenhas de Moraes,

então comissionado em São Paulo. Este oficial seria o responsável por chefiar a Força

Expedicionária como um todo e, ao mesmo tempo, comandar a Divisão de Infantaria

Expedicionária.

A propósito da designação do General Mascarenhas de Moraes para organizar e

instruir a 1ªDIE, transcreve-se abaixo os telegramas trocados com o Ministro da

Guerra sobre o convite para comandar uma Divisão brasileira na guerra. “25/H.1

– URGENTE – 9 – VIII – 1943 – CIFRADO – General Mascarenhas – São

Paulo. Consulto prezado camarada se aceita comando de uma das Divisões que

constituirão o Corpo Expedicionário PT Impõe-se resposta urgente porque caso

afirmativo fará estágio Estados Unidos PT General Eurico Dutra – Ministro da

Guerra.”. “General Dutra – Rio – URGENTÍSSIMO – De São Paulo – 20-40 –

10 – VIII – 1943 – 17, 15 horas. 345 – Muito honrado e com satisfação\respondo

afirmativamente consulta de Vossa Excelência acaba fazer-me em rádio 25 – H –

1 PT General Mascarenhas de Moraes – comandante 2ª RM”. (MORAES, 2005,

p. 24)

Além do Comandante Militar das tropas divisionárias, foi escolhido um

General para coordenar todos os trabalhos de apoio não divisionário da FEB. O General

Falconieri recebeu esta importantíssima missão.

Natural de Itajaí (SC), Olympio Falconieri da Cunha Nasceu no dia 19 de junho

de 1891. [...] Foi designado para integrar a FEB no dia 17 de julho de 1944,

sendo inicialmente nomeado Inspetor Geral da FEB, destacado cargo

administrativo. Posteriormente, foi designado Comandante dos Órgãos não

divisionários, que tinham a missão de conduzir a logística das tropas brasileiras

na Europa. (PERSONAGENS, 2010, p. 66)

2.3.1.2 A preparação e a instrução das pequenas frações da FEB para a guerra

A missão de reunir, adestrar e colocar em condições de combate um

efetivo de mais de vinte mil homens, no início da década de 40, revestia-se de um caráter

hercúleo. Os óbices foram dos mais diversos. De acordo com Silveira (2001, p.57), os

obstáculos iniciais para organizar a FEB foram enormes, tanto no campo material como no

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político, neste houve eficiente passividade na colaboração, acompanhada por uma

campanha de descrédito.

As Organizações militares que comporiam a FEB estavam

geograficamente afastadas e possuíam graus heterogêneos de adestramento. Era preciso

padronizar a FEB.

A primeira medida importante e necessária era reunir para centralizar e

padronizar a instrução dos integrantes da FEB. A questão da instrução das tropas

já tinha sido objeto de decisão do Alto Comando do Exército, que, em 18 de

agosto, dera conhecimento da diretriz de instrução do quadro e da tropa

expedicionária. Para que o treinamento fosse completo, tornava-se necessária a

concentração de todas as unidades no Rio de Janeiro, na Vila Militar e arredores,

o que só ocorreu em março de 1943. (SILVEIRA, 2001, p. 58).

A FEB se defrontaria com os experientes soldados alemães, veteranos e

acirrados combates e cuja instrução era motivo de orgulho para a Alemanha. O programa

de treinamento, com poucos recursos, devia primar pela rapidez e objetividade.

Figura 2.3 – Parada da FEB, Rio de Janeiro (1944)

Fonte: Arquivo Diana Oliveira Maciel disponível em:

http://www.batalhaosuez.com.br/introducaoFEB1.htmisponível em

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17

A preparação tática da 1ª DIE foi encarada pelo chefe expedicionário em dois

ciclos bem diferentes: um treinamento inicial, modelado na instrução individual,

a ser concluído em dezembro de 1943; e um desenvolvimento geral da instrução,

abarcando dois períodos e objetivando o emprego de unidades constituídas.

(MORAES, 2005, p. 34)

A preparação de nossos pracinhas foi a primeira mostra efetiva da

capacidade, do comprometimento e da liderança de nossos jovens oficiais do Exército

Brasileiro, dentre tantas outras que seriam dadas.

Dada a carência de material colocado à disposição da tropa no Brasil, o treino era

em parte teórico, com a utilização de manuais traduzidos do inglês. [...] Nesta

fase da instrução é que o corpo de oficiais brasileiros deu a primeira

demonstração de sua capacidade de inovação e improvisação, além de

flexibilidade e imaginação criadora. Jovens oficiais, tenentes, capitães, com

conhecimentos teóricos de equipamentos novos, e às vezes tendo somente um

exemplar do material bélico que iriam receber, conseguiram dar um treino básico

aos seus comandados. (SILVEIRA, 2001, p. 59).

Outro problema era a escassez de fontes de consulta para a instrução. Os

oficiais precisavam traduzir e adequar os manuais norte-americanos. Segundo Moraes

(2005, p. 34), assim, enquanto os regulamentos norte-americanos ainda estavam sob a ação

de tradutores e editores, as unidades da 1ªDIE contaram com o auxílio precioso de

numerosos oficiais, os quais, por terem estagiado nos Estados Unidos, facilitaram bastante

a tarefa inicial de adestramento dos expedicionários.

2.3.1.3 O embarque e o deslocamento da FEB para a Itália

Vencida a difícil fase da organização, reunião e preparação prévia da FEB,

a partida do nosso contingente era iminente. Todas as previsões de que a FEB não entraria

em combate foram contrariadas. A cobra iria fumar.

O 1º escalão, com base no 6º Regimento de Infantaria, embarcou para a Itália, no

navio americano Gen Mann, com o efetivo de 5075 homens, partindo do Rio de

Janeiro, em 2 de julho de 1944. O 2º escalão embarcou no dia 22 de setembro de

1944, nos navios Gen Mann e Gen Meighs, composto do 1º e do 11º Regimentos

de Infantaria, com o total de 10375 homens. O 3º escalão embarcou no dia 23 de

novembro de 1944, no Gen Meighs, com o efetivo de 4691 homens, destinados

às substituições e preenchimento de claros. O 4º escalão embarcou no dia 8 de

fevereiro de 1945, também no Gen Meighs, com 5082 homens, para as mesmas

finalidades do pessoal anterior. Estes escalões, depois de 14 dias de viagem,

desembarcaram em Nápoles, na Itália, de onde seguiram para as áreas de

treinamento, na frente de batalha. (MOTTA, 2001, t. 2, p. 37)

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O clima da viagem, cujo destino que era ignorado pela maioria dos

pracinhas, era tenso. O desconforto e o receio dos temíveis submarinos alemães tornaram

os 14 dias de viagem dos contingentes ainda mais longos.

A viagem para a Itália foi penosa, pelo desconforto, em primeiro lugar, e perigo.

Os navios de transporte tinham o primeiro, o segundo, o terceiro e o quarto deck

e você ficava em um deles [...]. As camas eram macas e nós tínhamos que

permanecer o dia inteiro com salva-vidas – dormir... comer... – que era uma das

prescrições que o comandante do navio exigia com rigor. Durante o trajeto para a

Itália, houve vários exercícios de alarme de ataque de submarino e que nos

obrigava ao cumprimento de uma série de prescrições de salvamento. (MOTTA,

2001, t. 1, p. 73)

A proteção das marinhas brasileira, norte-americana e britânica foi crucial

para que a FEB aportasse na Itália em segurança.

Em razão da probabilidade de intervenção de submersíveis contrários,

destróieres brasileiros e belonaves norte-americanas acompanharam até o estreito

de Gibraltar os navios que transportavam as nossas tropas. A viagem no

Mediterrâneo realizou-se com a nova escolta de navios norte-americanos e

ingleses, contando com constante cobertura aérea. (MORAES, 2005, p. 40)

Figura 2.4 – Embarque do 1º escalão da FEB

Fonte: FEB, o embarque, disponível em

http://segundaguerra.org/feb-o-embarque

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Após uma arrojada operação naval a FEB estava em condições de

combater nos campos italianos. Segundo Silveira (2001, p. 65), o eficiente comboio

formado pelos navios aliados permitiu que todos chegassem ilesos ao seu destino. Com o

desembarque do último escalão para a Itália, situou-se em torno de 25000 homens.

2.3.2 A FEB na Itália

2.3.2.1 A chegada e a integração

Depois do desembarque da tropa brasileira, iniciaram-se as medidas de

adaptação, tudo com a finalidade de integrar os brasileiros, o mais rápido possível, ao V

Exército Aliado. Em sua chegada o 1º Escalão da FEB encontrou alguma dificuldade

logística que, no entanto, foi rapidamente suplantada.

Enorme era a curiosidade, e intensa a ânsia da tropa brasileira, quando, na manhã

de 16 de julho, o General Mann atracou no porto de Nápoles. [...] A tropa, a seu

turno, dirigiu-se para o estacionamento de Agnaro, próximo ao subúrbio

napolitano de Bagnoli [...] A área, infelizmente, não fora preparada para receber

a nossa tropa. Não havia barracas para praça, nem cozinhas, por isso a tropa

utilizou a ração americana tipo “c”, e teve de bivacar [...]. Cedo, porém a

situação se normalizou. (MORAES, 2005, p. 44)

Como era natural, a chegada dos demais escalões da FEB ocorreu de modo

bem mais ordenado. Os cuidados logísticos para a recepção já estavam em curso na Itália.

Quanto ao desembarque e estacionamento do restante da FEB, isso é, o grosso da

1ª DIE (2º e 3º escalões de embarque) e do Depósito de Pessoal da FEB (4º e 5º

escalões de embarque, os fatos se processaram de maneira diversa. [...]. Os 2º e

3º escalões de embarque, todavia, permaneceram dois dias a bordo desses

transportes, à espera de meios que os conduzissem à região de estacionamento.

Findo este prazo, deslocaram-se para a cidade de Livorno, servindo-se de uma

frotilha de 60 embarcações couraçadas ligeiras e consumindo 36 horas de viagem

em mar agitado. De Livorno, o grosso da 1ª DIE, transportado por caminhões,

movimentou-se para a área de quinta real de San Rossore, nas proximidades da

cidade de Pisa, onde encontrou um acampamento confortável e higiênico.

(MORAES, 2005, p. 45)

Quanto ao adestramento em solo italiano, o 1º Escalão foi beneficiado em

relação aos demais. Enquanto estes foram intempestivamente colocados em combate, com

treinamento bastante superficial, aquele recebeu o programa de adestramento norte-

americano em sua plenitude.

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Ao chegar à Itália, o primeiro escalão teve oportunidade de realizar treinos com

equipamentos completos, antes de entrar em combate. O mesmo não ocorreu

com o segundo escalão, porque a fase de treinamento foi muito abreviada pela

exigência de enviar logo a FEB para os combates, pois o V Corpo de Exército

tinha carência de soldados. Desta forma, os americanos optaram por usar o

método "on the job training", ou seja, o grosso da tropa brasileira aprenderia a

lutar na própria luta, [...]. (SILVEIRA, 2001, p. 60)

Em entrevista do Gen de Brigada Eryx Motta, a qual se encontra transcrita

no Tomo 6 da coleção Segunda Guerra Mundial do Projeto História Oral do Exército, este

oficial, que era então Capitão Comandante de Companhia do 1º Escalão, afirma que, na

Itália, a continuação dos exercícios de preparação foi normal, mas intensa, assistida pelos

americanos. Quanto à adaptação de nossa tropa, o militar reporta que também foi normal,

dentro do possível, em todos os aspectos.

Sobre a impressão causada aos aliados pela tropa brasileira, em um

primeiro momento, não foi das melhores, no entanto, após as primeiras jornadas de

campanha, o Sd brasileiro rapidamente granjeou o respeito de todos.

Em Bagnoli o comando americano teve oportunidade de conhecer melhor o

soldado brasileiro, seu estado de saúde, aptidão física e disciplina. O próprio

comandante da FEB, em suas memórias, assinala, que causou má impressão o

aspecto pouco saudável, más quanto ao vigor físico, aparentemente inferior ao

padrão americano, houve uma mudança de opinião quando o soldado brasileiro

começou a participar do combate. A imagem negativa que perdurou foi em

relação ao estado do equipamento e do fardamento, que eram realmente de baixa

qualidade. (SILVEIRA, 2001, p. 65).

A dedicação, o desprendimento, a criatividade e o valor do soldado

brasileiro, não obstante todas as dificuldades encontradas pela FEB, ficariam evidentes no

âmbito do V Exército Aliado.

2.3.2.2 A Campanha da FEB

As palavras do General Mascarenhas de Moraes em seu discurso por

término da campanha na Itália, retiradas do Site Oficial do Exército Brasileiro, sintetizam

bem o que foi a campanha da FEB.

Após oito meses de combates constantes, em que, como todos os exércitos,

sofremos pesados reveses e obtivemos brilhantes vitórias, o balanço de uns e

outras é ainda favorável às nossas armas. Desde o dia 16 de setembro de 1944, a

FEB percorreu, conquistando ao inimigo, às vezes palmo a palmo, cerca de 400

quilômetros, de Lucca a Alessandria, pelos vales dos rios Sercchio, Reno e

Panaro e pela planície do Pó; libertou quase meia centena de vilas e cidades;

sofreu mais de 2.000 baixas, entre mortos, feridos e desaparecidos; fez o

considerável número de mais de 20.000 prisioneiros, vencendo pelas armas e

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impondo a rendição incondicional a duas Divisões inimigas. É um registro

deveras honroso e de vulto para uma Divisão de Infantaria. Um dia se

reconhecerá que o seu esforço foi superior às suas possibilidades materiais,

porém plenamente consentâneo com a noção de dever e amor à responsabilidade,

revelados pelos nossos homens em todos os degraus e escalões da hierarquia, e

em todas as crises e circunstâncias da Campanha que neste instante acabamos de

encerrar. (EXÉRCITO, 2010)

2.3.2.2.1 O Destacamento FEB (os primeiros combates e a ação no Vale do Sercchio)

O comando do V Exército aliado ressentia-se de falta de efetivo e

necessitava lançar mão do efetivo da FEB imediatamente, no entanto, apenas o 1º Escalão

e alguns elementos de apoio encontravam-se aptos para entrar em combate. A solução

adotada foi constituir uma unidade operacional denominada Destacamento FEB.

Em razão de tão grave redução nos efetivos do V Exército, o General Mark

Clark, seu comandante, resolveu verificar pessoalmente as possibilidades de um

emprego imediato do contingente brasileiro, ainda em fase de treinamento, em

um dos setores de combate do IV Corpo de Exército. [...] Como acontecera a

todas as tropas que ainda não tinham recebido o batismo de fogo os brasileiros

foram destacados para um setor relativamente calmo, onde deveriam receber a

“inoculação do combate”, conforme se expressou o General Mark Clark.

(MORAES, 2005, p. 69)

Tal Destacamento, que tinha como base o 6º Regimento de Infantaria, foi a

primeira tropa brasileira a entrar em combate na II Guerra Mundial.

O Destacamento FEB, parte do grosso da divisão brasileira, treinado para entrar

em combate, era composto basicamente de: Infantaria 6ºRI; Artilharia II Grupo

do 1ºRO Auto-rebocado; a 1ª Cia do 9º Batalhão de Engenharia de combate;

tropa auxiliar; elementos da Companhia de transmissões; a Companhia de

evacuação do 1º Batalhão de Saúde e de apoio logístico. O comando do

Destacamento FEB coube ao General de Brigada Euclydes Zenóbio da Costa,

Comandante da Infantaria divisionária. (SILVEIRA, 2001, p. 147)

O Batismo de Fogo da FEB ocorreu por meio das ações do Destacamento

FEB. As tropas brasileiras obtiveram um excelente rendimento em suas primeiras ações na

Itália.

[...], na jornada de 16 de setembro, o Destacamento FEB com os batalhões dos

majores Gross e Abílio, a testa do dispositivo, progrediram para o norte, de tal

modo que, ao anoitecer, já estavam de posse da linha geral M. Comunale- Il

Monte. A progressão realizada nessa memorável jornada assinalou as primeiras

vitórias das Armas Brasileiras em território italiano e registrou a ocupação de

Massarosa e Bozzano. (MORAES, 2005, p. 61)

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Ainda, segundo Moraes (2005, p.79), as forças brasileiras fizeram 31

prisioneiros, em ações que duraram dez dias e que nos proporcionaram o avanço de 18

quilômetros. Constituiu a vitória de Monte Prano um feliz remate da primeira manobra das

armas brasileiras no teatro de guerra italiano, o autor ressalta que a estréia do

Destacamento FEB foi evidentemente auspiciosa.

O coroamento das primeiras ações das tropas brasileiras na Itália ocorreu

co a importante conquista de Camaiore, a partir de então o destacamento FEB passou a

atuar no vale do Serchio. Neste ponto a FEB já era tida como uma tropa detentora de

experiência em combate.

Já com boa experiência dos primeiros combates, a tropa devia buscar um

encontro mais decisivo com o inimigo. Os dados e as informações que chegavam

ao comando indicavam que o mais correto era o avanço em direção ao norte da

linha Cassione – Monte Prano – Monte Valinan – Monte Queto. Para isso seria

necessária a conquista de Camaiore. [...] A ocupação do monte serviu como final

das operações realizadas pelo destacamento FEB nesta região, antecedendo a

rocada para o Vale do Serchio. (SILVEIRA, 2001, p. 148).

Já no Vale do Serchio, no ataque à Castelnuovo de Garfagnana A FEB

conheceu o seu primeiro revés.

[...] Sua reação foi imediata, mas o Comandante do Destacamento, tal como

fizera com a 1ª Companhia, determinou a retirada para as posições anteriores, em

Sommocolonia, encerrando-se, de maneira imprevista e lamentável, uma jornada

que se afigurava brilhante e confortadora para as armas brasileiras. Com esse

combate, encerrou-se a campanha do Destacamento FEB no Vale do Serchio.

Alguns dados importantes destacados: a tropa brasileira conquistou mais de 40

quilômetros de território inimigo; ocupou várias localidades, inclusive uma

fábrica de acessórios para aviões; capturou 208 soldados alemães e italianos e

sofreu 290 baixas. (SILVEIRA, 2001, p. 155).

As tropas brasileiras, que já haviam obtido sucesso na conquista do citado

objetivo, receberam um possante contra-ataque e se viram obrigadas a abandonar o terreno

já conquistado. Não obstante o insucesso no final das jornadas no Vale do Serchio, o saldo

da atuação do Destacamento FEB era bastante positivo.

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23

2.3.2.2.2 De Monte Castello à conquista de Castelnuevo. (O Vale do Reno e o Vale do

Marano)

Já havendo demonstrado a sua capacidade de combate, chegara a hora da

FEB ser empregada não mais como Destacamento FEB e sim como a 1ª Divisão de

Infantaria Expedicionária. O emprego da tropa brasileira no vale do Reno traria episódios

inesquecíveis para a campanha da FEB na Itália.

O General Mark Clark declarou, na oportunidade, que a utilização das tropas

brasileiras no vale do Reno tinha promovido a FEB ao 1º time do V Exército. No

realinhamento, a 1ª DIE passaria a atuar com todo o seu efetivo. Este vale é uma

faixa de terreno que fica entre os rios Panaro e Reno. A topografia totalmente

favorável aos alemães. As montanhas, de grandes altitudes, permitiam a quem

ocupasse o seu cume ter o domínio total e completo do vale. [...] Com mais de 14

quilômetros de extensão, era uma linha fortificada que impedia o acesso ao vale

do Pó. Nessa área, de terreno áspero e clima frio, os brasileiros combateriam por

três longos e dolorosos meses. (SILVEIRA, 2001, p. 156 e 157)

O comando norte-americano tinha urgência em desenvolver uma operação

ofensiva no Vale do Reno antes da chegada completa do inverno. No entanto, não havia

precisão sobre a dimensão da importância dos objetivos ali pretendidos e da envergadura

dos meios alemães dispostos no terreno. Estava prestes a iniciar-se a sucessão de jornadas

para a conquista de Monte Castelo.

O comando do IV Corpo de Exército [...] decidiu realizar um ataque a Monte

Castelo, a fim de desafogar a ameaça permanente que pairava sobre a estrada 64,

seu eixo de comunicações e reabastecimento. Confiou a montagem e o comando

da operação a um grupamento tático da 45 DI norte-americana (Task Force 45),

[...]. A operação, levada a cabo no dia 24 de novembro, consistiu num ataque às

posições alemãs na área de Monte Castelo-Abetaia, o qual redundou em

completo insucesso. No dia seguinte, repetiu-se a mesma operação, [...]. Essas

duas malogradas tentativas da Task Force 45, além de terem concorrido para a

manutenção da moral da 232ª DI alemã, serviram para alertar o inimigo quanto

ao propósito aliado de conquistar o Monte Castelo. [...] E assim nasceu a lenda

de Monte Castelo, que passou a atrair sobre si o prestígio de posição

inexpugnável. (MORAES, 2005, p. 109)

Depois dos insucessos da Task Force 45, a FEB assumiu integralmente o

comando da investida sobre o Monte Castelo. Esta ação estava intrinsecamente relacionada

à manutenção da posse aliada do Monte Belvedere. O referido objetivo, que se encontrava

até então sob o domínio norte-americano, foi retomado pelos alemães. A conquista de

Monte Castelo estava mais uma vez fadada ao insucesso.

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No transcurso da noite de 28 de novembro, exatamente quando as nossas tropas

buscavam situar-se na base de partida, defrontando Monte Castelo, os alemães

contra-atacaram e expulsaram os norte-americanos do Monte Belvedere. [...] Não

obstante essas dificuldades, o ataque foi iniciado às 7h do dia 29 de novembro,

precedido de nutrida preparação de nossa artilharia. [...] Mais uma vez fora

malsucedida a tentativa aliada de apossar-se do baluarte germânico de Monte

Castelo. [...] as baixas dos dois batalhões (I/1º RI e III/11º RI) foram assaz

pesadas, porquanto em suas fileiras foram abertos os claros de 190 combatentes.

(MORAES, 2005, p. 114)

Em meados de dezembro, os efeitos do inverno, que seria extremamente

severo, já começavam a aparecer. Uma nova tentativa de investida contra o Monte Castelo

mostraria definitivamente que para a conquista daquele baluarte seria necessário um

emprego de meios bem superiores aos utilizados até então.

Raiara a jornada de 12 de dezembro sob uma chuva fina e irritante. O momento

de partir rumo a Monte Castelo se aproximava e aquele nevoeiro dava

esperanças bem fortes no bom êxito da surpresa. [...] A resposta inimiga foi

brutal e instantânea, desencadeando uma violenta e certeira barragem de fogos

sobre a unidade assaltante.[...] O revés que a tropa brasileira amargou nessa

dolorosa jornada, contudo, foi pródigo de ensinamentos. O ataque do dia 12,

como os anteriores, evidenciou o insucesso de ações isoladas, com meios

escassos, sobre Monte Castelo. Para calar a resistência desse baluarte, era preciso

atacar o conjunto Belvedere-Gorgolesco-Castelo-Torracia, empregando um

mínimo de duas divisões, bem apoiadas em artilharia e aviação. (MORAES,

2005, p. 117 a 119)

Calejada pelas lições aprendidas, a FEB prepara a investida da desforra

sobre o Monte Castelo. A tomada do objetivo passara a ser uma questão de honra para os

brasileiros.

O inverno escoava-se, as tropas tinham passado esse período em ações de

patrulha, lutando e sofrendo no sopé de Monte Castello [...]. Nos últimos dias de

janeiro, o General Mascarenhas encontrava-se em viagem de inspeção à unidade

de retaguarda, quando chegou à convocação do 4º corpo de Exército para uma

reunião em Luca, em 6 de fevereiro. [...] Nesta reunião foi exposto o novo plano

americano destinado a realizar a ruptura da Linha Gótica, o Plano Encore, que

previa uma ofensiva no início da primavera. [...] A missão de atacar Monte

Castello foi confirmada em ordem do 4º Corpo de Exército, expedida para o QG

brasileiro em 12 de fevereiro e recebida com grande júbilo pela oficialidade.[...]

O General Mascarenhas incumbiu o General Zenóbio de indicar a unidade de

infantaria que iria atacar o Monte Castelo. Na hora, o general Zenóbio escolheu o

Regimento Sampaio, o 1º RI. [...] O clima era diferente das outras ocasiões: a

tropa estava descansada e bem municiada, e já na base de partida [...] A hora “H”

fora determinada para 5h30min do dia 21, e nesse exato momento deu-se início

ao ataque – o quarto - contra o Monte Castel. Ao contrário das outras ocasiões,

era um dia de sol, temperatura amena, sem nuvens e sem frio excessivo [...].

graças às condições atmosféricas, pela primavera vez os brasileiros do 1º Grupo

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de Caça da FAB puderam dar apoio tático à infantaria; e a artilharia teve

condições de fazer fogo com precisão. (SILVEIRA, 2001, p. 169 a 171).

A conquista de Monte Castelo foi um importante triunfo tático e

estratégico que possibilitou os meios necessários para o desencadear da Ofensiva da

Primavera. Porém, a tomada do monte representou para FEB bem mais que isso, era o

pagamento de uma divida de sangue aos que ali haviam tombado.

As reações inimigas fizeram-se sentir enérgicas e crescentes, dando margens a

lances imprevistos e flutuações inevitáveis. [...] Finalmente, às 17h20min, a

defesa inimiga entrou em colapso. [...] E assim, Monte Castelo passou para as

mãos brasileiras. Dezenas de cadáveres, muitos deles contendo até máquinas

infernais de destruição, estavam ali a testemunhar o encarniçamento da luta

prolongada e a provar a requintada criminalidade das forças que guarneceram o

sinistro morro. [...] Sumidouro de centenas de vidas patrícias, a sua captura pelas

nossas forças constituiu um dever de consciência e um imperativo de dignidade

militar. Assinalou o início de uma série de vitórias esplêndidas para as nossas

armas, vitórias que elevaram o nome do Brasil e o prestígio do nosso Exército.

(MORAES, 2005, p. 135 e 136)

Figura 2.5 – Tropa brasileira após a Tomada de Monte Castelo

Fonte: Noticiário do Exército - Ano LII Nº 10.552, de 21 de fevereiro de 2009,

disponível em http://darozhistoriamilitar.blogspot.com/2010_02_01_archive.html

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Outra contundente passagem da FEB foi o combate de Castelnuovo. Ali a

já experiente FEB pôde aplicar todos os conhecimentos militares que possuía. Segundo

Silveira (2001, p. 176), Com a vitória em Monte Castello, a campanha do Vale do Reno

esgotara-se. As principais posições que dominavam o local estavam em poder das tropas

aliadas e o esforço deveria agora se dirigir para a região vizinha, o vale do Rio Marano.

O General Manuel Thomaz Castello Branco em sua obra O Brasil na II

Guerra Mundial sintetiza bem a campanha da FEB ao dizer: “A FEB realizou uma

operação de abertura: Camaiore; uma operação dignidade: Castelo; uma operação militar:

Castelnuovo; uma operação sacrifício: Montese; e uma operação coroamento: Fornovo.” O

General Adhemar da Costa Machado arremata a explicação:

Porque militar? Porque foi nesse ataque a Castelnuovo que se fez, talvez pela

única vez, um planejamento oportuno, atento, expediu-se uma Ordem de

Operações, os objetivos foram adequadamente marcados, o ataque se

desencadeou como previsto, o prosseguimento do ataque se deu sob

coordenação. Enfim, tudo que se aprende numa escola militar se aplicou nessa

operação. Essa operação não teve imprevisto de guerra. (MOTTA, 2001, t. 2, p.

24)

A conquista de Castelnouvo deu descanso às operações da FEB. Ocorreu uma

inversão de situação: os brasileiros passaram a desfrutar das privilegiadas

posições que conquistaram e da posse dos pontos altos das cadeias de montanhas

que circundavam os vales, começaram a ter oportunidade de descortinar todo o

movimento inimigo [...] A FEB ocupava posições dominantes naquela região.

Muito sacrifício, muitas mortes e muito sangue foram necessários para que essa

reversão ocorresse. (SILVEIRA, 2001, p. 177).

Após a Conquista de Castelnuovo, a FEB iniciaria a sua jornada final na

Itália. Chegava a Ofensiva da Primavera e os brasileiros estavam por enfrentar os piores

dias de combate que conheceriam no conflito.

2.3.2.2.3 A Ofensiva da Primavera

Em abril de 1945 as tropas aliadas na Itália iniciaram a ofensiva da

primavera. Para FEB a última etapa da campanha seria marcada pela tomada de Montese,

pela ocupação de Zocca, pelo combate em Collechio e pelo cerco em Fornovo. Os

brasileiros tiveram uma participação extremamente relevante nestas últimas jornadas do

conflito, culminando com a histórica rendição da 148ª Divisão alemã.

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A ofensiva da primavera seria feita por todas as tropas aliadas na Itália. Após o

rompimento da Linha Gótica, os alemães tinham instalado outra linha defensiva

nas montanhas que bordejavam o vale do pó, a linha Gengis Kã. A ofensiva

deveria romper essa linha, levar os aliados à planície do Pó e orientá-los o mais

rápido possível para as regiões fronteiriças como a França, Suíça, Áustria e

Iugoslávia, bloqueando assim a passagem das tropas alemãs que poderiam

chegar à Alemanha pelo Passo de Brenner. (SILVEIRA, 2001, p. 179).

O marco inicial da ofensiva da primavera foi a tomada de Montese, que

será explorada mais detidamente a seguir. Depois de tomadas as elevações que

circundavam Montese, a FEB ingressou no vale do Pó. A esta altura as resistências alemãs

estavam desorganizadas, a vitória era questão de pouco tempo.

As forças do IV Corpo de Exército iniciaram a fulminante Ofensiva de

Primavera na memorável jornada de 14 de abril. O Ataque brasileiro nesse dia

compreendeu duas fases bem distintas: a primeira constituiu no lançamento de

fortes patrulhas, constituídas de pelotões reforçados [...]; a segunda constou de

uma ação de ruptura que se propunha a conquistar a região de Montese- cota

888- Montello. (MORAES, 2005, p. 168)

O combate em Collechio proporcionou informações para que a FEB

desferisse o golpe final nas forças alemãs situadas em sua área de responsabilidade.

Realmente, a conquista de Montese foi uma operação duríssima. Após, ocorreu a

ocupação de Zocca, importante nó Rodoviário, com a posterior ocupação de

Vignola; no dia seguinte, em seguida à passagem do Rio Panaro, atingimos os

contrafortes dos Apeninos, em face do Rio Pó. De imediato, o Gen Mascarenhas

toma a decisão histórica: iniciar a perseguição, motorizando a sua infantaria com

parte das viaturas da artilharia; [...]. Foi uma decisão ousada que surpreendeu o

inimigo, provocando a sua desorganização. Assim prossegue na direção de

Collechio [...]. Em 27 de abril é conquistado Collechio, após desbaratar a 142ª

Figura 2.6 – Esboço da área de operações de Montese

Fonte: Livro A FEB por seu Comandante (MORAES, 2005)

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Divisão alemã. A rendição do inimigo era iminente; agora, torna-se fácil

compreender a importância da conquista de Monte Castelo e Montese. (MOTTA,

2001, t. 2, p. 43)

A captura da 148ª Divisão alemã em Fornovo marcou profundamente a

campanha da FEB. Além de capturar um enorme número de prisioneiros, os brasileiros

inviabilizaram o deslocamento de uma Divisão de infantaria que se dirigia para o território

alemão para reforçar as defesas nazistas naquela região. Os trechos a seguir oferecem uma

pequena amostra da dimensão dos trabalhos que envolveram a captura de Fornovo.

A vitória em Collechio trouxe uma leva de prisioneiros. O serviço de informação

militar pôde concluir que o contingente adversário era parte de uma grande

unidade alemã. Havia a necessidade de fazer um cerco imediato desse grupo,

evitando sua fuga. [...] A operação final, a ser realizada dia 28, colocava os três

batalhões do 6º RI em marcha convergente para Fornovo, e com o esquadrão de

reconhecimento no flanco oeste.[...] Coube ao II/6º RI iniciar a manobra,

marchando em direção a Nevino di Rossi. [...] Para evitar combate

desnecessário, o comandante do batalhão resolveu usar os bons ofícios do

vigário da cidade, Dom Alexandro Cavalli, que, na qualidade de emissário,

apresentaria à tropa alemã a proposta de rendição. [...] A resposta não tardou: às

11h45min os alemães informaram que aguardavam instruções superiores. Mas

eles tergiversaram: não havia aceitação da rendição incondicional, como

determinara o ultimato. O coronel Nelson de Melo resolveu então atacar. [...]

Furiosos ataques foram feitos até a madrugada de 29 [...] No dia seguinte o Maj

Kuhn finalmente comunicou que o comandante da divisão, General Otto Fretter

Pico, aceitava a rendição incondicional. (SILVEIRA, 2001, p. 188 e 189).

O Comandante da FEB arrematou acerca da importante rendição alemã

que marcou o fim dos confrontos para os brasileiros:

Encerrava-se assim, a rendição total da 148ª Divisão alemã, cumprindo-se

integralmente todos os entendimentos realizados por este magno ato militar. O

total apresentado nessas vinte horas de trabalho contínuo ascendeu a 14779

prisioneiros. [...] O aspecto geral era bom, senão excelente. Os uniformes, algo

sujos e em desalinho, demonstravam longo trabalho. [...] O episódio de Fornovo,

vivido vitoriosamente pela Divisão Brasileira, constituiu inegavelmente um

marco de transcendente significação nos anais de nossa história militar. Será

sempre motivo de justo orgulho para o Exército Brasileiro e, ao mesmo tempo,

um poderoso estímulo e uma perene fonte de confiança nas possibilidades de

nossos quadros e soldados. (MORAES, 2005, p. 206 e 207)

O episódio da rendição de Fornovo encerrou de modo brilhante as ações da

FEB na Itália. As conseqüências e a relevância operacional de tal ação são indiscutíveis.

Um possível regresso de consideráveis efetivos alemães até Berlim postergaria o final dos

combates e custaria inúmeras vidas humanas.

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2.3.3 O regresso da FEB e a sua desmobilização

Encerrados os combates na Itália a vitoriosa FEB se estruturava para

regressar ao Brasil. Os brasileiros carregavam no peito um misto de ansiedade e de

sentimento de dever cumprido.

Em virtude das ordens do V Exército, a 1ª DIE se deslocou de seu setor de

ocupação para a área de Francolise, onde estacionou aguardando o embarque de

regresso para o Brasil.[...] Finda a concentração em Francolise, o General

Mascarenhas de Moraes traçou diretrizes e fixou as normas gerais reguladoras do

deslocamento dos elementos da FEB para o Brasil, em escalões sucessivos.

(MORAES, 2005, p. 235)

A acolhida e as honras que esperavam pela FEB no Brasil corresponderam às

expectativas daqueles que haviam arriscado a sua vida representando o país na II Guerra

mundial.

O general Mascarenhas, comandante do primeiro escalão e da 1ª DIE, regressou

da Itália em avião norte-americano, acompanhado de quatro oficiais de seu

Estado-Maior, em 6 de julho de 1945,[...]. Jamais a metrópole brasileira viveu

momentos de maior exaltação patriótica. Para a chegada do Escalão nº1 ao Rio

de Janeiro, sob o comando do General Zenóbio da Costa, foi organizada a parada

da vitória. [...] E assim, na tarde de 18 de julho de 1945, entre delirantes

aclamações populares marcharam, ao longo das avenidas cariocas, algumas

tropas expedicionárias dos Estados unidos e do Brasil, irmanadas nas festas da

paz como o foram nas circunstâncias críticas da Guerra. (MORAES, 2005, p.

239)

Todos os escalões da FEB, indistintamente, receberam efusivas manifestações por

parte do povo brasileiro por ocasião da chegada no Brasil. Segundo Moraes (2005, p. 238),

todo o restante da tropa brasileira retornou ao Brasil integrando os escalões nº 2, 3, 4 e 5.

Todos os escalões foram recebidos pela população carioca, entre delirantes demonstrações

de júbilo e ao calor apoteótico das ovações.

Quanto à dissolução e à desmobilização da FEB existem questionamentos. O Brasil

passava, na época, por uma situação política envolta em totalitarismo. Houve uma pressa

exacerbada em, rapidamente, extinguir e espalhar a FEB. A Força Expedicionária foi

açodadamente desconstituída ainda na Itália. Esta pressa certamente trouxe conseqüências

negativas para o Exército e para os pracinhas.

Em aviso de 6 de julho de 1945, o Sr Ministro da Guerra determinou que as

unidades da FEB ficassem, desde a sua chegada ao Rio de Janeiro, subordinadas

ao general comandante da 1ª Região Militar. Consoante preceituava o documento

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ministerial acima aludido, na medida em que as unidades expedicionárias

desembarcassem no Rio de Janeiro, os seus elementos integrantes tomavam

novos destinos, retornando às atividades do tempo de paz. [...] Essa providências

abrangeram principalmente a desincorporação dos convocados e a adaptação de

algumas unidades a novas finalidades. A determinação ministerial significou, em

última análise, a formal dissolução da Força Expedicionária brasileira.

(MORAES, 2005, p. 237)

Em sua obra “A FEB por um Soldado”, Silveira (2001, p. 238) declara que o

quadro político vigente na época em que a FEB retornou foi o fator principal e talvez único

que determinou essa desastrada decisão de desmobilização. O autor lembra que concluiu o

major Sampaio em seu trabalho: “A dissolução da FEB” que a rápida dissolução foi um ato

de caráter essencialmente político, cujos efeitos foram desastrosos para o aprimoramento

do Exército.

Toda tropa desmobilizada após uma guerra tem dois problemas fundamentais: a

readaptação e o amparo psicossocial e material. Nada disso foi feito a tempo

quando da desmobilização da FEB. [...] Recepção triunfal, como ocorreu na

chegada da tropa, não significa que exista um preparo psicológico da

coletividade para receber em seu meio homens possivelmente portadores de

neuroses ou síndromes que evoluíram para uma inadaptação civil. [...] A ruptura

foi brusca. Esses homens passaram longo tempo no Exército, que os alimentava,

vestia e cuidava da saúde, tendo somente como dever e preocupação o

cumprimento da missão recebida. [...] O alarido que ocorreu por ocasião do

regresso acabou se tornando um eco distante. De heróis festejados, passaram a

ser homens comuns, tendo que concorrer com os demais, em pé de igualdade. Os

mais aptos e fortes prosseguiram, enquanto os mais fracos e inadaptados, sem

receberem qualquer ajuda, não conseguiram superar os obstáculos. (SILVEIRA,

2001, p. 236 e 237)

No entanto, o referido autor arremata lembrando que o Exército é uma corporação

baseada na honra, no cumprimento do dever e no respeito às tradições e problemas trazidos

com essa política de desmobilização foram superados. Para Silveira (2001), a corporação,

através do seu corpo de oficiais, febianos ou não, soube aperfeiçoar a Força Terrestre. O

espírito da FEB inegavelmente muito contribuiu.

Também há diversas críticas quanto ao tratamento conferido aos pracinhas nos anos

que se sucederam à guerra. A readaptação social foi difícil e contou com pouco apoio. Os

pracinhas só viriam a ter o problema corrigido décadas depois do conflito.

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2.4 A BATALHA DE MONTESE

O V Exército tinha como missão capturar o crucial centro urbano de

Bolonha. A FEB ficaria responsável pela flanco-guarda esquerda do dispositivo aliado. O

início da ofensiva da primavera demonstrou, em Montese, que aquelas posições

constituíam um limite que as forças alemãs não estavam dispostas a ceder.

Mal era findo o Plano Encore, o comandante do IV Corpo de Exército alertou à

1ª DIE sobre a próxima retomada ofensiva, no decurso da qual seriam

empenhadas todas as forças aliadas existentes na península italiana. [...] Tratava-

se de uma grande ofensiva, destinada a levar com rapidez a destruição e a derrota

final às linhas teuto-italianas. [...] O V Exército atacaria, em dia que seria

determinado oportunamente, com o IV Corpo de Exército à frente,[...] a fim de

desembocar no vale do pó,entre os rios Panaro e Reno, e capturar a importante

cidade de Bolonha.[...] À Divisão Brasileira coubera um lugar de relevo na

ordem de batalha do Exército[...]. Dada a situação de unidade-ala no dispositivo,

ficaria encarregada da segurança do flanco ocidental daquele Exército, através

dos contrafortes Apeninos da área Reno-panaresa. (MORAES, 2005, p. 155 e

156)

A 10ª Divisão de Montanha norte-americana, responsável pelo esforço

principal do IV Corpo de Exército, recebeu um grande número de missões. Não obstante o

fato de a Grande Unidade norte-americana ser uma tropa de elite, o Comandante da FEB

compreendeu que, diante da dureza que se esperava em Montese, a conquista de suas

alturas poderia onerar sobremaneira a 10ª de Montanha e comprometer o esforço do IV

Corpo de Exército.

No último encontro, em que eram discutidas as missões e objetivos, ocorreu um

episódio singular: O General Mascarenhas, ao perceber os pesados encargos

atribuídos à 10ª Divisão de Montanha, sugeriu ao General Crittenberger que a

conquista de Montese ficasse a cargo da tropa brasileira. O comandante da 10ª,

General Hays, surpreso pelo gesto de seu camarada, agradeceu e indagou se o

comandante da FEB tinha certeza de que tomaria Montese. A resposta veio

pronta: o General Mascarenhas perguntou se o General Hays tinha certeza de que

aproveitaria o sucesso brasileiro sobre Montese. O diálogo provocou aplausos

dos presentes e serviu para quebrar um pouco a tensão do ambiente. O General

Mascarenhas expôs como a tropa brasileira iria realizar a manobra programada:

conquistar Montese e avançar até o Rio Panaro; guarnecer o flanco da 10ª; seguir

na direção de Zocca-Vignola. (SILVEIRA, 2001, p. 178).

2.4.1 Montese, o último bastião alemão

Montese marcava o fim de um conjunto topotático que dominava os Vales

do Reno, de um lado e do Pó, de outro. Era uma posição militar privilegiada que oferecia

excelentes condições de defesa. As tropas da Alemanha sabiam que perder aquelas

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elevações significaria recuar para o Vale do Pó e passar a ser perseguidas em condições

bastante desfavoráveis.

O dia 14 foi marcado pelo início de um dos mais árduos e sangrentos combates

da FEB, o de Montese, que só terminou no fim do dia 17, após quatro dias de

contínuos bombardeios da artilharia de ambos os lados. A resistência alemã foi

desesperada: afinal, Montese era uma posição chave no vale do Panaro e se as

forças aliadas conquistassem-na, nada mais as deteria no prosseguimento de sua

marcha para o vale do Pó. A conquista do vale significaria o fim da guerra na

Itália. (SILVEIRA, 2001, p. 179).

A obstinação alemã em não ceder Montese, no entanto, só seria realmente

dimensionada a partir do momento em que os brasileiros empreenderam a sua conquista.

Para os alemães era claro que perder Montese era perder a Guerra na Itália. É o que mostra

o relato do Coronel Nestor da Silva, que esteve presente no combate. Segundo o

depoimento do oficial, compilado por Motta (2001, t.2, p.166).

Sobre a importância de Montese, resume-se:

Montese era uma localidade que o alemão decidiu, obstinadamente, defender.

Com muita sabedoria o comando aliado considerou Montese um problema a

parte. (MOTTA, 2001, t. 2, p. 129)

Montese é considerada a maior batalha da FEB na Itália, que exigiu os

maiores sacrifícios e onde o alemão, como se tratava do seu último baluarte, descarregou

toda a munição e violência possível sobre os atacantes.

2.4.2 O Regimento Tiradentes na tomada Montese

Dada a importância de Montese, o ataque às suas alturas ocorreu de um

modo um tanto atípico. A investida seria encabeçada pelo 11º RI, no entanto, o comando

da 1ª DIE coordenaria diretamente as ações.

Pretendia o comandante da 1ª DIE apossar-se do citado maciço, particularmente

do triangulo de alturas definido por Montese- cota 888- Montello, [...]. Para isso,

o grosso da tropa do coronel Delmiro (11º RI) e o Batalhão Syzeno (II/1º RI)

passariam ao ataque na jornada de 14 de abril, com o objetivo de capturar a linha

Riva di Biscia – Montese – cota 888 – Montello. [...] O ataque, portanto,

configurava-se como ação tipicamente regimental, embora concebida e dirigida

no âmbito da Divisão. A reserva, nas mãos do comandante da 1ª DIE e com o

valor de quatro batalhões [...] (MORAES, 2005, p. 164)

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No difícil período que circundou os ataques ao Monte Castelo ocorreu um

episódio que, embora isolado e sem repercussão tática, estigmatizou o 11º RI. Foi uma

retirada precipitada de uma posição defensiva sem ordem superior. O episódio já fora

superado plenamente e o 11º RI pôde mostrar o seu valor no combate mais terrível da FEB

na Itália. Coube a unidade conquistar Montese.

Segundo transcreve Motta (2001, t.2, p.129), Ao 11º RI, foi atribuída a

missão de cuidar dessa localidade. O 11º RI que tinha tido um problema na fase defensiva

ganhou, então, a oportunidade de mostrar que aquilo nada mais fora do que um acidente

durante a guerra, porque o Regimento atacou com uma bravura sem par.

Dada a sua importância, o ataque a Montese foi idealizado como um

ataque coordenado frontal precedido de reconhecimentos em força. Os Batalhões do 11º RI

receberam os seus objetivos. É interessante notar que o esforço principal do Regimento foi

direcionado para as alturas de 927 e Montello (posições mais dominantes).

Figura 2.7 – Visão do campo de batalha em Montese ( Área do 11 RI)

Fonte: Acervo do General Octavio da Costa. Disponível em:

http://www.exercito.gov.br/01inst/feb/octavio.htm

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O 11º RI atacou em primeiro escalão com dois batalhões (III e I batalhões). O

III/11º RI sob o comando do Major Cândido Alves da Silva, ficou incumbido do

esforço principal da operação. Atacou inclinando-se na direção Casone -

cemitério de Latorre - cota 927, coberto à esquerda pelo I/ 11º RI e à direita pelo

II batalhão do Regimento Sampaio. [...]. O 11º RI e o II/1º RI desembocaram da

base de partida exatamente na hora prescrita, isto é 13h30min. O apoio dos

carros de combate norte-americanos começou, então, com muito relevo. O I/11º

RI, conduzido pelo Maj Lisboa, com singular espírito ofensivo, por volta das

15h, conseguiu penetrar na própria vila de Montese, desorganizando e

envolvendo as resistências antagônicas.[...] Redobraram de ímpeto, em

conseqüência, as arremetidas do Batalhão Candido (III/11º RI) [...] este batalhão,

ás 18h completava o assalto das casamatas alemãs embutidas no ponto cotado

831. A Infantaria atacante, finalmente, enfrentou e superou obstinada resistência

inimiga [...] (MORAES, 2005, p. 168)

Na verdade acreditava-se que a resistência no interior das Localidades

seria de menor vulto.

O I/11º RI havia ficado numa situação de inferioridade por causa do insucesso

que tivemos- que não se deu por culpa da tropa nem dos oficiais subalternos- foi

um mal entendido, uma precipitação, porque, ao retrairmos, o alemão também se

retirou de suas linhas. Eles estavam apenas fustigando. Este foi o primeiro

insucesso. O I/11º RI estava, então, devendo uma revanche e a fomos obter

justamente no ataque à cidade de Montese. Coube ao I/ 11º RI atacar Montese.

Por sorte, Montese é considerada a maior batalha da FEB na Itália, que exigiu os

maiores sacrifícios e onde o alemão, como se tratava do seu último baluarte,

descarregou toda a munição e violência possível sobre os atacantes. (MOTTA,

2001, t. 2, p. 166)

Alguns acreditavam até que Montese pudesse estar vazia. Todos os

Batalhões que compunham o Regimento foram fustigados, mas nenhum como o I/11º RI

que atacou a cidade de Montese.

2.4.3 A tomada de Montese (quatro jornadas de sangue)

Tomar Montese foi um dos maiores feitos da FEB na Itália e demandou

um enorme sacrifício por parte dos brasileiros. Se o ataque à localidade foi penoso, não

menos fustigantes foram as jornadas que se sucederam. O alemão não queria ceder o

objetivo e entre contra-ataques e incontáveis concentrações de Artilharia e de morteiro a

FEB vivenciou dias sangrentos no início da ofensiva da primavera.

A notícia da ocupação de Montese foi recebida com alívio e aplauso no comando

superior, principalmente porque a 10ª Divisão de Montanha estava empenhada

em duro combate, com pesadas perdas e nenhum ganho apreciável. [...] A noite

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de 14 para 15 transcorreu sem contra-ataque, mas a artilharia, sobretudo, o fogo

de morteiro, incomodou a tropa brasileira. [...] a artilharia inimiga, durante a

madrugada de 15 para 16, provocara mais de 100 perdas nos atacantes.

Documentos posteriores demonstrariam que Montese, sozinha recebeu, naquela

noite, mais tiros de canhão que toda a frente do 4º Exército. [...] A Batalha de

Montese foi a etapa de maior importância para a ofensiva de primavera.

Objetivos foram alcançados e conquistados, e mais terreno não foi ocupado

porque perdera a significação [...]. foi uma luta muito dura. Os três dias de luta

causaram à tropa brasileira 426 perdas entre mortos e feridos, custo alto em vidas

humanas, acentuando a importância que o próprio inimigo deu à posse da

posição conquistada pelos brasileiros. O general Mascarenhas, em suas

memórias, afirmou que Montese foi palco da mais árdua e sangrenta vitória das

armas brasileiras na Itália. (SILVEIRA, 2001, p. 182 e 183).

A violência que resultou dos combates em Montese já foi relatada

inúmeras vezes. Todos os testemunhos são unânimes e externam impressões de extrema

destruição e enorme sacrifício. Segundo Motta (2001, t.2, p.77) a tomada de Montese foi

um dos combates mais violentos e, possivelmente, o pior deles, porque transcorreu em uma

única tarde. O autor relata que a cidade ficou completamente destruída; tanto é que

confirmam os jovens daquele tempo, bem como os que nasceram depois. (MOTTA, 2001,

t. 2, p. 77)

O jornalista brasileiro e correspondente de guerra, Egydio Squef esteve em

Montese logo depois de sua conquista. Em uma matéria para o jornal O Globo ele relata a

destruição da Cidade.

Montese já não existe. Nenhuma casa ficou intacta e só agora podemos avaliar o

efeito terrível causado pelos disparos de Artilharia. [...] Decorridas mais de 48

horas de sua captura, os alemães continuam a bombardea-la com artilharia e

granadas de Morteiro. [...] Procurei em vão encontrar habitantes em Montese.

(ALMEIDA, 1985, p. 158)

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No combate de Montese, a tropa brasileira foi mais bombardeada que todo o V

Exército americano e VIII exército inglês. Ataques maciços, tanto de artilharia

como de morteiro. [...]. Se fosse um terreno mais ou menos raso, limpo, o meu

grupo e até o pelotão inteiro teriam sido dizimados. Em Montese foi o nosso pior

combate, com muitas baixas, uma batalha reconhecida pelo V Exército

americano como das mais árduas, tanto da FEB quanto para quase toda a tropa

envolvida na ofensiva da primavera. (MOTTA, 2001, t. 3, p. 253)

Chamou a atenção de todos a violência e a intensidade dos bombardeios

sofridos pela tropa brasileira em Montese. Nenhuma tropa aliada conheceu tamanha

fustigação pelo fogo durante a ofensiva da primavera.

2.4.4 Montese, uma conquista das pequenas frações

Em uma campanha como a da Segunda Guerra Mundial, na qual

combateram centenas de Divisões de Exército, é natural que os grandes feitos e o desfecho

das grandes batalhas sejam atribuídos aos comandos dos Generais e às grandes unidades

operacionais. No entanto, especificamente no episódio de Montese, ficou muito evidente

que a vitória é resultado da sinergia produzida pelo emprego conjunto das pequenas

frações. Nada mais justo do que dizer que Montese foi tomada pelos tenentes.

Começava naquele 14 de abril o fim da guerra na Itália. [...]. Às 13:25 horas,

após forte preparação de artilharia e morteiros, a 2ª companhia partiu para o

ataque, com os pelotões dos tenentes Ary Rauen e Iporan Nunes de Oliveira em

busca de seus objetivos. O inimigo desencadeou então terrível barragem de fogos

de Infantaria e Artilharia entre as encostas S de Montese, suas orlas L e a base de

partida (Montaurígola), conseguindo deter a ação do Pelotão Ary Rauen, que

teve seu heróico comandante mortalmente ferido na cabeça [...]. [...]. Enquanto

os acontecimentos acima se sucediam, o Pelotão Iporan desaparecera de nossas

vistas.[...]. Logo após, informava o tenente Iporan ao seu magnífico comandante

de companhia, o bravo Capitão Sidney Teixeira Alves, que entrara em Montese

[...]. Às 18:00 horas Montese estava em nosso poder. (ALMEIDA, 1985, p. 145)

O ataque a Montese foi precedido por um importante reconhecimento em

força realizado por patrulhas nível pelotão. Já neste momento, a bravura das pequenas

frações se fez fundamental para que se dimensionasse o perigo que seria enfrentado em

Montese.

12 de abril. Era preciso medir a incerteza. Cada Batalhão deveria enviar, à luz do

dia, duas patrulhas fortes até onde a reação costumava ser cruenta. Fariam

prisioneiros, colheriam informações para o ataque do dia seguinte [...]. Estranho

que pareça, na guerra dos homens, melhor a intimidade do contato com o

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inimigo que o vazio da incerteza. O Major Lisboa determinou, em conseqüência,

o lançamento de patrulhas de reconhecimento sobre 747 SW de Lépore e 759 de

Montaurigola. Para comandar a primeiro foi cogitado, inicialmente, o 1º tenente

Oracy Ribeiro Granja, substituído para facilitar os acertos finais, pelo 3º sargento

Max Wolff Filho [...] onde aguardaria a promoção ao posto de tenente, já

solicitada. O comando da outra patrulha foi entregue a um outro bravo: o

Tenente Iporan Nunes Ribeiro. [...]. Wolff, apesar de estar consciente do perigo

que o aguardava, seguia resolutamente, como sempre, ao encontro do inimigo, à

frente de seus homens,[...] Quando os alemães sentiram que não tinham mais

como errar, fizeram com que a “lourdinha” despejasse todo o poder de fogo

sobre o nosso herói, o nosso “carinhoso” Wolff, que caiu sobre o ventre.[...] O

reconhecimento comandado pelo tenente Iporan, tendo podido ser conduzido

mais cautelosamente[...] conseguiu, depois de neutralizar 83 minas, entrar em

contato com o inimigo.[...] além das patrulhas do nosso batalhão, também as do

II/11º RI haviam encontrado forte reação inimiga, constatando-se deste modo

que os alemães continuavam a ocupar as mesmas posições com elementos da

232ª Divisão de Infantaria e 114ª Divisão Ligeira,[...] ficou definitivamente

marcada a data de 14 de abril para o desembocar da ofensiva da primavera.

(ALMEIDA, 1985, p. 142 e 143)

A importância das pequenas frações na tomada de Montese pode ser

compreendida no relato, obtido no Site oficial do exército Brasileiro, do Coronel Iporan,

então tenente Iporan que descreve com detalhes o episódio:

O 2º Pelotão ficou detido em frente a um campo minado, batido por fogos da

Infantaria. Nessa oportunidade, seu bravo comandante foi mortalmente ferido

com um tiro na cabeça. Esse pelotão sofreu mais baixas e não atingiu o objetivo.

Às 11:45h, o comandante da companhia confirmou a "hora H" do ataque

principal como sendo a prevista - 12h. Na hora aprazada, o pelotão do 1º escalão

transpôs, em linha, a crista, sob o espocar de foguetes de estrelas vermelhas,

anunciando o ataque. A tropa ultrapassou os pontos mais elevados com grande

rapidez, apesar do terreno íngreme. Após o pelotão ter vencido um terço do

percurso, sua retaguarda foi batida por densa e compacta barragem de artilharia,

que cortou o fio telefônico em vários pontos e colocou fora de combate um

soldado da equipe de minas e outro de Saúde. O grupo ponta, após pequeno

deslocamento, parou e assinalou a existência de minas. O comandante do

pelotão, ao chegar ao ponto assinalado pelo sargento, constatou, com satisfação,

que não se tratava de um campo minado e sim de armadilhas, feitas com fios de

arame ligados a minas antipessoal. Ao chegar ao topo das elevações de Montese,

o pelotão tinha perdido o contato com a companhia; o telefone não funcionava

por terem os cabos sido rompidos pelos tiros da artilharia inimiga; o rádio deixou

de captar e transmitir mensagens, por causa da distância e ondulações do terreno.

O segundo grupo empregado teve o seu avanço sustado por fogos vindos do

flanco direito, tendo de permeio um terreno limpo. Quando se preparava para

tomar o dispositivo de assalto, foi surpreendido por inesperado e denso

bombardeio da nossa Artilharia, que o envolveu e ao inimigo. Em seguida,

atingiu as posições inimigas, quando não havia ainda se dissipado a fumaça das

granadas. Os alemães permaneciam no fundo de seus abrigos, e já os nossos

ultrapassavam suas posições, perfeitamente camufladas. Os alemães tentaram,

então, reagir, mas foram postos fora de combate. Rompidas as defesas, os grupos

foram levados para a frente e empregados na consolidação da posição

conquistada e nos ataques aos flancos inimigos. O 2° Grupo de Combate, logo

após juntar-se ao 1°, foi empregado para dominar resistências que hostilizavam

nosso flanco direito. Postado em situação favorável e atirando de curta distância

sobre um abrigo onde havia sido localizada uma metralhadora inimiga, fez com

que os seus ocupantes levantassem um lenço, para logo em seguida se

entregarem e as resistências silenciarem. Depois de demorada luta, em que se

conquistou o terreno palmo a palmo, conseguiu-se, no final do dia, dominar as

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resistências inimigas, fazendo-as retrair após sofrerem algumas baixas. Ao cair

da noite de 14 de abril, estavam dominadas as encostas sudoeste da cidade e

quebrada a capacidade defensiva da infantaria alemã, que, desnorteada,

abandonou suas posições, deixando no campo de luta alguns mortos e oito

prisioneiros. Do nosso lado, houve quatro baixas, sendo um morto e três feridos.

Na noite de 14 para 15 de abril, Montese, não obstante encontrar-se sob domínio

das tropas brasileiras, abrigava ainda elevado número de soldados inimigos, o

que não impediu a artilharia alemã de desencadear sobre a cidade, naquela noite,

cerca de 2.800 tiros. Na manhã do dia 15, ainda debaixo de maciço fogo da

artilharia alemã, a tropa brasileira ultimou a limpeza da cidade. A conquista de

Montese repercutiu favoravelmente nos altos escalões e mereceu dos generais

americanos os mais efusivos elogios. Essa batalha ficará marcada para sempre na

memória dos soldados brasileiros, pelas lições de bravura e competência

operacional dos "pracinhas". (OLIVEIRA, 2010)

A liderança dos tenentes na FEB foi notória durante toda a campanha da

Itália. O líder das pequenas frações é a mente que conduz, diante da ação do inimigo, os

homens no combate.

O período da FEB permitiu um intenso e profícuo exercício de liderança militar,

sem dúvida em todos os escalões, principalmente tenente e capitão. Era uma voz

corrente entre nós, lá, que a guerra da FEB foi feita de “capitão para baixo”. Sem

desmerecer o major ou o coronel, foi quem, enfrentou “parada” mesmo. Mas é

porque o capitão e o tenente patrulhavam diariamente e ficavam o tempo todo

Figura 2.9 – Sgt Wollf e sua patrulha antes da partida

Fonte : Acervo fotográfico do livro “Montese, marco glorioso de

uma trajetória”, (ALMEIDA, 1985)

Figura 2.10 – Ten Iporan, 1945

Fonte: Acervo fotográfico do livro “Montese,

marco glorioso de uma trajetória”,

(ALMEIDA, 1985)

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dentro daqueles buracos. Foi guerra de capitão e tenente. (MOTTA, 2001, t. 2, p.

133)

Os relatos dos pracinhas não deixam dúvida quanto à importância do

comandante de pelotão nas operações da FEB. Em Montese, dada a dificuldade do terreno

e a violência da defesa inimiga, esta situação ficou ainda mais patente.

Enfrentei umas quatro situações de combate, mas a que me comoveu foi

Montese. Eu sentia aquele arrepio, mas depois Deus me deu coragem. [...] Fazia

parte do Pelotão comandado pelo tenente Iporan Nunes de Oliveira. Nós éramos

44 homens. Ele nos deu coragem e fomos para frente. [...] O comandante de

pelotão, o tenente, era a maior autoridade para o soldado. Em segundo lugar

vinham os dois sargentos e os cabos, mas eram todos amigos. [...] Como o

tenente tinha cuidado conosco, nós tínhamos cuidado com ele também e não

podíamos perder o líder. Nós, sem ele, estávamos perdidos, ficava tudo na mão

dele. (MOTTA, 2001, t. 2, p. 188)

Segundo o que foi transcrito por Motta (2001, t.2, p.189), houve 17 baixas

e o tenente esteve sempre junto a seus soldados. O sargento também. Havia uma grande

confiança e solidariedade entre todos. Confiança total. No front os soldados só conheciam

o tenente e os sargentos.

O espírito de um tenente de Infantaria e as ações de uma pequena fração se

impõe em combate por meio da ousadia e do correto emprego tático. As ações dos pelotões

do Ten. Iporan e do Sgt Wollf que antecederam o ataque à Montese, a investida destemida

do Pelotão do Ten Ary Rauen, que teve a sua vida ceifada na progressão para a localidade,

e à ousadia e obstinação do ataque solitário do Ten Iporan sobre a cidade marcaram a

conquista de Montese e transformaram o referido combate no que ficaria conhecido como

a Batalha dos Tenentes.

Ao pessoal do 11º RI cabia o maior desafio: o ataque frontal. Por volta das 15

horas, o Batalhão Lisboa conseguiu chegar à periferia de Montese, após árdua

luta, mas coube ao pelotão da 1ª Companhia, comandado pelo Tenente Iporan

Nunes de oliveira, a glória de penetrar na localidade, apesar da forte resistência

inimiga. O espírito ofensivo, a ousadia e a extrema bravura desse oficial fizeram-

no merecedor de alta condecoração americana, a "Silver Star", um dos poucos

brasileiros a ganhar esta medalha. (SILVEIRA, 2001, p. 180).

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Há um tenente- Iporan Nunes de Oliveira, contemporâneo meu de Minas Gerais-

que foi o símbolo da vitória de Montese. Foi um combate em localidade, rua a

rua, casa a casa, janela por janela. Conquistava-se o primeiro andar e depois se

subia para o segundo. Dizem que já havia um consenso de que não valia mais a

pena progredir; devíamos parar e sair da cidade, quando esse tenente Iporan

insistiu que o pelotão dele estava em condições de ir. Acreditaram no Iporan, ele

foi e Montese caiu. (MOTTA, 2001, t. 2, p. 131)

O tenente Iporan tornou-se símbolo da conquista de Montese. Na verdade,

todos os jovens oficiais e sargentos que comandavam as pequenas frações da FEB

merecem o mesmo destaque.

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3 CONCLUSÃO

Não há como negar que a II Guerra Mundial foi um conflito bélico diferente de

todos os que haviam ocorrido anteriormente. A Segunda Grande Guerra mostrou o porte da

fragilidade do equilíbrio que sustentava a relação de interesses das grandes potências do

Século XX. Além disso, a guerra expôs a nova dimensão de um conflito sustentado pelas

novas possibilidades tecnológicas que se descortinavam.

A humanidade mostrou, durante o conflito, a sua pior face. A capacidade de

autodestruição e a insensibilidade diante da tragédia humana, de parte a parte, marcaram a

humanidade de modo definitivo. Em contrapartida, como é natural diante de grandes

tragédias, os homens também mostraram que a coragem, a determinação, os sentimentos

de desprendimento, a nobreza de propósitos e a capacidade de reconstrução da raça

humana são bem maiores do que se poderia imaginar. O mundo jamais seria o mesmo

depois da Segunda Guerra Mundial.

Neste cenário, de conflito entre grandes potências, é que se deu a participação

na guerra de uma tropa composta por latino-americanos. A distância política e geográfica

que separava o Brasil dos anos 40 do conflito era tão grande que não havia como imaginar-

se que brasileiros iriam combater o Exército Nazista no Velho Continente. Os fatos

convergiram neste sentido e a Força Expedicionária Brasileira (FEB) se fez realidade,

mesmo diante das dificuldades e a da improbabilidade da participação no conflito, que

marcaram o surgimento e a campanha da FEB em todos os momentos. O Brasil entrou na

Guerra. Como disseram na época: “A cobra Fumou”.

Pautado pelos objetivos e problemas que foram traçados para a presente

pesquisa, o estudo realizado explorou uma vasta gama de documentos e bibliografia. O

resultado obtido foi o seguinte:

A Segunda Guerra Mundial originou-se de um cenário que conjugou uma forte

crise financeira a uma excessiva rigidez de tratamento dispensada aos alemães por ocasião

da I Guerra Mundial. Essas condições favoreceram o surgimento e domínio do regime

nazista e proporcionaram meios para que todo o povo germânico se irmanasse em torno de

objetivos que pareciam, a primeira vista, legítimos. Em curto espaço de tempo, a

Alemanha desafiou as potências européias, retomou territórios pretensamente seus,

desencadeou a “guerra relâmpago”, dominando o continente europeu, isolou a insular

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Inglaterra e tomou as colônias do norte africano. A campanha foi devastadora e o quadro

só seria revertido depois de quatro anos.

Em uma segunda fase da guerra, a Alemanha que se aliara ao Japão, se viu

diante de uma luta conta os norte-americanos, arrastados para o conflito pelo atentado de

Pearl Harbour. Concomitantemente, os russos também são chamados ao conflito por uma

investida nazista em seu território. A partir deste momento a Alemanha perdeu a

capacidade de se contrapor à inesgotável capacidade de meios das duas potências que

dominariam o mundo no pós-guerra.

Quanto ao Brasil, o país não compunha efetivamente o contexto da guerra em

seu início. No entanto, após o ataque japonês no arquipélago havaiano a posição brasileira

pendeu da neutralidade ao apoio aos norte-americanos. Com o abandono da posição neutra

o país passou a sofrer ataques dos u-boot da Kriegsmarine e o apelo popular por uma

resposta aos agravos germânicos colocou o Brasil no cenário do conflito.

Com a decisão de que o Brasil iria entrar em guerra foi necessário,

rapidamente, organizar a Força que entraria em combate. O General Mascarenhas de

Moraes foi escolhido comandante da FEB e deparou-se, de pronto com a primeira árdua

missão de mobilizar, organizar e equipar o efetivo de aproximadamente vinte e cinco mil

homens que iriam compor a tropa brasileira na Itália.

Depois de receber a instrução básica inicial a FEB tinha o novo desafio de

transpor as águas do Atlântico povoadas de submarinos alemães e se integrar às tropas

norte-americanas na Itália. Foram cinco Escalões distribuídos em quatro surtidas navais. O

destino, depois de quatorze jornadas, era o Porto de Nápoles na Itália.

A FEB, já em solo italiano, passou a integrar o IV Corpo de Exército,

integrante do V Exército aliado norte-americano. As tropas brasileiras participaram das

operações de guerra na Itália de julho de 1944 a maio de 1945, tendo como principais

conquistas as tomadas de Massarosa, Camaiore, Monte Prano, Monte Acuto, Galiano,

Barga, San Quirino, Monte Castelo, La Serra, Castelnuovo, Soprassasso, Montese,

Paravento, Zocca, Marano Su Parano, Collechio e Fornovo.

Do estudo realizado conclui-se, também, que os combates mais marcantes para

a FEB foram: a tomada de Monte Castelo, o combate em Montese e a captura da 148ª

Divisão Alemã em Fornovo. A Batalha de Monte Castelo foi marcada pelas sucessivas

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investidas que foram necessárias para a conquista do objetivo. O combate em Fornovo

marcou pela magnitude da captura de aproximadamente 25000 soldados alemães, no

entanto, nenhuma batalha da FEB foi assinalada com tamanha violência nem exigiu tanto

sacrifício como a tomada e manutenção das alturas de Montese.

Durante a ofensiva da primavera, manobra estratégica aliada que objetivava

por fim à campanha da II guerra Mundial mo Teatro de Operações da Itália, Montese foi o

primeiro ataque realizado pela FEB. A localidade e as elevações que a circundavam

constituíam um apêndice final do conjunto topotático dos Apeninos que descortinava o

Vale do Pó. A perda de Montese representava um sinônimo de derrota final para os

alemães na Itália. Dada esta importância, a defesa da localidade e de suas adjacências foi

marcada por uma obstinação inigualável por parte das forças nazistas. A conquista de

Montese custou um preço muito alto para a FEB.

Para a conquista do seu objetivo a Divisão brasileira escolheu o 11º RI para

conquistar o conjunto de objetivos de Montese, Morro cota888 e Montello. O 3º Batalhão

do regimento ficaria com o ataque principal para conquistar cota 888, enquanto o 1º

Batalhão atacaria Montese a oeste e o 2º Batalhão do 1º Regimento atacaria Montello a

leste. Não obstante o esforço principal haver sido destinado ao 3º Batalhão, a conquista de

Montese é sempre ligada ao heróico esforço do 1º Batalhão do 11º RI, que atacou,

conquistou e manteve a área urbana de Montese.

As jornadas passadas durante os combates em Montese ficaram célebres por

sua violência. O episódio é pródigo de relatos que atestam a ferocidade das contendas, a

intensidade dos ataques de artilharia e o grande número de baixas registradas. O 11º

Regimento e A FEB consolidaram, em Montese, a imagem de tenacidade, bravura e

sacrifício que marcaram o soldado brasileiro na campanha da Itália.

Nas guerras, de modo geral, e na II Guerra Mundial, em particular, as grandes

conquistas são sempre atribuídas aos comandantes de Grandes Unidades, aos Generais. No

entanto, em todos os episódios históricos da II Grande Guerra há inúmeros relatos da

bravura e da importância da atuação das pequenas frações e de seus comandantes. Com a

FEB não foi diferente. Embora nomes como o dos generais Mascarenhas, Zenóbio e

Ayrosa tenham marcado a campanha febiana, é unânime a opinião de que os jovens

oficiais, comandantes de pequenas frações, foram os responsáveis pela condução direta dos

destinos da tropa brasileira. Em Montese esse fato é ainda mais marcante.

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Tanto durante a fase do reconhecimento em força sobre as alturas de Montese,

quando patrulhas de combate foram lançadas para identificar as posições e o valor do

inimigo, como durante a investida propriamente dita sobre Montese, ficou bastante claro

que foram as pequenas frações, atuando com sinergia, que obtiveram o êxito nas jornadas

da célebre Batalha.

O destemor do Sargento Wollf, a bravura do Tenente Ary Rauen e a iniciativa

do Tenente Iporan foram apenas os exemplos mais emblemáticos de liderança e bravura

entre tantos outros que marcaram o combate em Montese.

Os jovens Sargentos e Oficiais, que estavam lado a lado com seus comandados,

lançaram-se diante de um inimigo forte, adestrado e que ocupava uma posição defensiva

privilegiada. O combate foi sangrento, a localidade, em particular, teve que ser tomada

casa a casa e as ações assumiram um caráter altamente descentralizado. Muitas vezes não

havia sequer comunicação com os comandos superiores. A liderança dos comandantes de

pequenas frações fez Montese passar às mãos dos aliados.

Portanto, findo o relatório, resta solucionado o problema proposto para o

presente trabalho e confirmada a hipótese da pesquisa: As ações de combate das pequenas

frações tiveram um papel primordial e definitivo para a conquista brasileira em Montese, a

batalha mais sangrenta e violenta vivida pela FEB em solo italiano

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