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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS FACULDADE DE EDUCAÇÃO ÉRIKA KANETA FERRI POLÍTICAS PÚBLICAS DE AÇÕES AFIRMATIVAS NA EDUCAÇÃO SUPERIOR PARA INDÍGENAS: ESTUDO DE CASO DA UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MATO GROSSO DO SUL CAMPINAS 2015

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

FACULDADE DE EDUCAÇÃO

ÉRIKA KANETA FERRI

POLÍTICAS PÚBLICAS DE AÇÕES AFIRMATIVAS NA EDUCAÇÃO SUPERIOR PARA INDÍGENAS: ESTUDO DE CASO DA UNIVERSIDADE ESTADUAL DE

MATO GROSSO DO SUL

CAMPINAS 2015

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ÉRIKA KANETA FERRI

POLÍTICAS PÚBLICAS DE AÇÕES AFIRMATIVAS NA EDUCAÇÃO SUPERIOR PARA INDÍGENAS: ESTUDO DE CASO DA UNIVERSIDADE

ESTADUAL DE MATO GROSSO DO SUL

Tese de Doutorado apresentada ao Programa de Pós- Graduação em Educação da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas para obtenção do título de Doutora em Educação, na área de concentração de Ensino e Práticas Culturais.

Orientador(a):Prof. Dra. Maria Helena Salgado Bagnato

O ARQUIVO CORRESPONDE À VERSÃO FINAL DA TESE DEFENDIDA PELA ALUNA ÉRIKA KANETA FERRI E ORIENTADA PELA PROF. DRA. MARIA HELENA SALGADO BAGNATO

CAMPINAS 2015

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

FACULDADE DE EDUCAÇÃO

TESE DE DOUTORADO

POLÍTICAS PÚBLICAS DE AÇÕES AFIRMATIVAS NA EDUCAÇÃO SUPERIOR PARA INDÍGENAS: ESTUDO DE CASO DA UNIVERSIDADE

ESTADUAL DE MATO GROSSO DO SUL

Autor: ÉRIKA KANETA FERRI

COMISSÃO JULGADORA:

Orientadora Profa Dra MARIA HELENA SALGADO BAGNATO

Profa Dra EUNICE ALMEIDA DASILVA

Profa Dra DÉBORA CRISTINA JEFFREY

Prof Dr GERSEM JOSÉ DOS SANTOS LUCIANO

Profa Dra MARIA BEATRIZ ROCHA FERREIRA

A Ata da Defesa assinada pelos membros da Comissão Examinadora, consta no processo de vida acadêmica do aluno.

CAMPINAS 2015

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Dedico esta pesquisa à população indígena

do estado de Mato Grosso do Sul e em especial aos acadêmicos indígenas, os quais

tive o privilégio de conhecer e conviver.

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AGRADECIMENTOS

A Deus !

À Maria Helena, minha orientadora, pela amizade, pela lição de vida, pela gentileza e

doçura. Com sabedoria e discernimento me conduziu nesta trajetória.

À minha família pelo apoio incondicional, pela compreensão da árdua e prazerosa

trajetória de vida do pesquisador. Em especial ao meu marido Alencar e meus filhos Barbara e

Victor.

Às professoras Gisele, Débora, Maria Beatriz pelas contribuições e sugestões durante

a banca de qualificação contribuindo com a trajetória de construção da finalização tese.

Aos professores Eunice, Gersem, Heloisa Helena e Marta por aceitarem a compor a

banca de defesa desta tese.

Aos professores do Programa de Pós-Graduação Doutorado em Educação da

Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), que muito colaboram para a construção/

reconstrução da tese.

Aos amigos do grupo de Pesquisa PRAESA, pelo aprendizado contínuo e eterna

amizade. Em especial aos amigos Eunice, Lúcia, Maria Carolina e Marcia pelas colaborações

e acolhimento.

Aos colegas estudantes do Programa de Pós-Graduação Doutorado em Educação da

Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) pela convivência e amizade.

Aos amigos Jair, Fátima e Silvana pelo apoio em todos os momentos de cansaço,

angústias e desânimo.

À Fundação de Apoio ao Desenvolvimento do Ensino, Ciência e Tecnologia do Estado

de Mato Grosso do Sul (FUNDECT) pelo apoio financeiro para o desenvolvimento da

pesquisa.

À Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul e aos participantes da pesquisa, pela

contribuição e colaboração na coleta de dados.

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À minha amiga Eunice, pela contribuição, pela amizade e pelo apoio.

E a todos aqueles que de alguma forma ou outra colaboraram para a conclusão desta

pesquisa.

Minha Gratidão a todos e todas!

... A universidade é pública, não é lugar de quem? Não é lugar de índio?

Não é lugar de negro? Não é lugar de gay e lésbica?

É lugar de quem? (Àgata)

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LISTA DE GRÁFICOS

GRÁFICO 1 Revisão Bibliográfica – Base de dados: Periódicos

Capes – Ano e quantidade de publicações – 1992 a 2014 (n. 149)

34

GRÁFICO 2 Revisão Bibliográfica – Base de dados: Periódicos Capes – Gênero dos textos e Quantidade – 1992 a 2015 (n. 149)

35

GRÁFICO 3 Revisão Bibliográfica – Base de dados: Periódicos Capes – Áreas de Conhecimento – 1992 a 2015 (n. 149)

36

GRÁFICO 4 Revisão Bibliográfica – Base de dados: Scielo – Gênero e Natureza – Ação Afirmativa – Janeiro 2015

40

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LISTA DE QUADROS

QUADRO 1 Revisão bibliográfica Periódicos CAPES -Fontes e revistas-janeiro de 2015

37

QUADRO 2 Revisão bibliográfica na base de dados Scielo: descritores Ação Afirmativa, Cotas e Cotas Raciais, janeiro de 2015

38

QUADRO 3 Periódicos na base de dados Scielo: descritor Ação Afirmativa, janeiro de 2015

39

QUADRO 4 Cursos com maior número de acadêmicos indígenas matriculados e da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul – Ano 2013

50

QUADRO 4A Instituições de Educação Superior no Mato Grosso do Sul, por organização acadêmica e categoria – Ano base 2013

103

QUAD

RO 5

Instituições de Educação Superior – Federais e Estaduais – vagas suplementares e cotas para indígenas

109

QUADRO 6 Número total de estudantes matriculados e de cotas nas Universidades Federais-- Ano 2013 -2014

113

QUADRO 7 Número de matriculas na Educação indígena por modalidade e etapa de ensino – Brasil: 2007-2012

118

QUADRO 8 Pessoas indígenas de 10 anos ou mais e de 15 anos ou mais de idade, por localização do domicílio, segundo algumas características educacionais e o sexo Brasil – 2010.

119

QUADRO 9 Proporção das pessoas indígenas de 10 anos ou mais de idade com até 1 (um) salário mínimo e sem rendimento nominal mensal, por localização do domicílio, segundo as Grandes Regiões - Brasil – 2010.

120

QUADRO 10 População Indígena - 2012 cadastrada no SIASI por região, UF, Região e Município – Mato Grosso do Sul

121

QUADRO 11 Distribuição da população indígena do estado de Mato Grosso do Sul, por faixa etária – ano 2012

124

QUADRO 12 População indígena por etnia cadastrada no SIASI – Mato Grosso do Sul -2012

125

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

FIGURA 1 Modelo do processo de implementação das políticas

61

FIGURA 2 Distribuição do Tipo de Reserva de Vagas – Ingressos por Processo Seletivo das IES Públicas – Graduação Presencial – Brasil – 2010

73

FIGURA 3 Taxa de analfabetismo para pessoas indígenas de 10 ou mais anos de idade, segundo Unidade de Federação – 2010

126

FIGURA 4 Mapa do estado de Mato Grosso do Sul

131

FIGURA 5 Localização das Unidades Universitárias da UEMS no estado

132

FIGURA 6 Sede Administrativa Dourados – Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul

133

FIGURA 7 Organograma da Estrutura Organizacional da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul

135

FIGURA 8 Número de Acadêmicos matriculados por etnia no ano de 2008 – Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul.

139

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LISTA DE TABELAS

TABELA 1 Evolução do Número de Instituições de Educação Superior por categoria Administrativa- Brasil: 2001-201

72

TABELA 2 Crescimento das instituições de educação superior - Brasil, Região Centro-Oeste e Mato Grosso do Sul - 1991-2004

98

TABELA 3 Crescimento das Instituições de Educação Superior, por categoria administrativa - Mato Grosso do Sul 1991-2004

98

TABELA 4 Vagas oferecidas, ingressantes e percentual de ociosidade nas instituições privadas - Região Centro-Oeste 2004

100

TABELA 5 Número de jovens que poderiam pagar mensalidades nas escolas privadas e número de estudantes matriculados nas IES privadas, em 2004

100

TABELA 6 Presença da cor/raça na sociedade e no campus - Mato Grosso do Sul 2005

101

TABELA 7 População Indígena E Distribuição Percentual Por Localização de Domicílio e Condição de Indígena, segundo as grandes regiões, 2010 – Brasil

116

TABELA 8 Progressão na Oferta de Vagas - UEMS relativo ao ano de ingresso - 2005 a 2013

136

TABELA 9 Número de Ingressantes e Concluintes Negros e Indígenas cotistas da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul entre os anos de 2004 a 2014

137

TABELA 10 Número de bolsas por programas oferecidos na Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul, de 2010 a 2013

185

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LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS AGRAER Agência de Desenvolvimento Agrário e Extensão Rural APIRR Associação dos Povos Indígenas de Roraima ANAI Associação Nacional de Apoio ao Índio BID Banco Interamericano de Desenvolvimento CAFI Centro Amazônico de Formação Indígena CAPES Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior CEDI Centro Ecumênico de Documentação e Informação CE Câmara de Ensino CEE/MT Conselho Estadual de Educação de Mato Grosso CEPE/UEMS Conselho de Ensino Pesquisa e Extensão UEMS CEPPIR/MS Coordenadoria de Políticas Para a Promoção da Igualdade Racial CPI/SP Comissão Pró-Índio de São Paulo CERA Centro de Educação Rural de Aquidauana CIMI Conselho Indigenista Missionário CINEP Centro Indígena de Estudos e Pesquisas CIR Conselho Indígena de Roraima CNPq Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e

Tecnológico CNEEI Comissão Nacional de Educação Escolar Indígena COAB Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia

Brasileira COES Comissão de Estágio COUNI Conselho Universitário CTI Centro de Trabalho Indigenista CUIA Comissão Universidade para os Índios DID Divisão de Inclusão e Diversidade DPs Dependências DRA/UEMS Diretoria de Registro Acadêmico/ UEMS EEOC Comissão para a Igualdade de Oportunidade no Emprego EMBRAPA Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária EUA Estados Unidos da América FIES Fundo de Financiamento estudantil FLASCO Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais FUNAI Fundação Nacional do Índio

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FUNASA Fundação Nacional de Saúde FUNDECT Fundação de Apoio ao Desenvolvimento do Ensino, Ciência e

Tecnologia do Estado de Mato Grosso do Sul IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística ICMS Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação ee

Serviços IES Instituições de Ensino Superior IESPs Instituições de Ensino Superior Públicas IESALC Intercultural e Diversidade Cultural no Ensino Superior na

América Latina e Caribe INCRA Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária ISA Instituto Socioambiental LACED Laboratório de Pesquisa em Etnicidade, Cultura e

Desenvolvimento LI Licenciatura Intercultural MEC Ministério da Educação NEI-SECD Núcleo de Educação Indígena da Secretaria Estadual de

Educação, Cultura e Desportos NI Núcleo Insikiran de Formação Superior Indígena NEAB Núcleo de estudos Afro-Brasileiros OAB Ordem dos Advogados do Brasil ODIN Observatório de Direitos Indígenas CINEP Centro Indígena de Estudos e Pesquisas OMIR Organização das Mulheres Indígenas de Roraima ONGs Organizações Não Governamentais ONU Organização das Nações Unidas OPAN Operação Anchieta OPIR Organização dos Professores Indígenas de Roraima OUI. Organização Universitária Interamericana PAE Programa de Apoio estudantil PPP Projeto Político Pedagógico PIBIC Programa de Bolsas de Iniciação Científica PIBIC -AF Programa Institucional de Iniciação Científica - PIBIC nas Ações

Afirmativas PIBID Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência PROEC/UEMS Pró-Reitoria de Extensão, Cultura e Assuntos

Comunitários UEMS PROEIB-Andes Programa de Formación em Educación Intercultural Bilingue

para los Países Andinos

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PROUNI Programa Universidade para Todos PUC-São Paulo Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC-Goiás Pontifícia Universidade Católica de Goiás PUMC Programa Universitário Nacional e Multicultural PVUI Programa Vale Universidade Indígena, RIF-FOEI Rede Interamericana de Formação de Formadores em Educação

Indígena SECAD Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e

Inclusão SAU Sistema Acadêmico da UEMS SEPPIR Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial SENAR Serviço Nacional de Aprendizagem Rural SPI Serviço de Proteção ao Índio SETAS Secretaria de Estado de Trabalho e Assistência Social SISU Sistema de Seleção Unificada TCC Trabalho de Conclusão de Curso TI Terra Indígena UCDB Universidade Católica Dom Bosco UEL Universidade Estadual de Londrina UEMS Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul UERJ Universidade Estadual do Rio de Janeiro UFAM Universidade Federal do Amazonas UFGD Universidade Federal da Grande Dourados UFMG Universidade Federal de Minas Gerais UFMS Universidade Federal de Mato Grosso do Sul UFSCAR Universidade Federal de São Carlos UNB Universidade de Brasilia UFPR Universidade Federal do Paraná UFRN Universidade Federal do Rio Grande do Norte UFRR Universidade Federal de Roraima UFT Universidade Federal do Tocantins UNAM Universidade Autônoma do México UNESP Universidade Estadual Paulista “Júlio Mesquita Filho” UNESCO Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a

Cultura UNI União das Nações Indígenas UNIGRAN Centro Universitário da Grande Dourados UNICAMP Universidade Estadual de Campinas

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URACCA Universidad de las Regiones Autonomas de la Costa Caribe Nicaraguense

USP Universidade de São Paulo

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RESUMO

POLÍTICAS PÚBLICAS DE AÇÕES AFIRMATIVAS NA EDUCAÇÃO SUPERIOR PARA INDÍGENAS: ESTUDO DE CASO DA UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MATO GROSSO DO SUL

O estudo teve como objetivo analisar a implementação de política públicas de

Ação Afirmativa para indígenas na Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul.

Caracterizou-se como estudo qualitativo, estudo de caso político histórico

organizacional. Para coleta dos dados empíricos, utilizou-se de entrevistas, as quais

foram analisadas numa perspectiva da educação crítica e nos estudos de implementação

de políticas públicas. Os sujeitos da pesquisa foram: Pró-Reitores, Membros da

Comissão de Acompanhamento dos alunos cotistas e coordenadores de cursos com o

maior número de alunos indígenas. Os resultados apontam que os participantes da

pesquisa buscam saídas e alternativas, com ações e atividades, mesmo que pontuais,

como por exemplo: as monitorias, as atividades em grupo, disciplinas e optativa que

contemplem a temática indígena, criação Centro de Estudos, Pesquisa e Extensão em

Educação, Gênero, Raça e Etnia – CEPEGRE, somados as atividades de apoio

desenvolvidas no Projeto de extensão Rede de Saberes. Bem como na projeção de

inseri-los em programas de pós–graduação. Discorrem sobre as dificuldades e desafios

enfrentados, ora afirmando que entre os indígenas há dificuldades de aprendizagem, ora

reiterando que existem barreiras na compreensão do português, especialmente entre

aqueles que têm a língua materna como princípio. Conclui-se que a Política de Ação

Afirmativa na referida IES é inédita, mesmo diante das adversidades, movimentos

contra hegemônicos têm ocorrido na busca por uma educação híbrida e multicultural.

Palavras-chave: Ações afirmativas, Indígenas, Educação superior.

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ABSTRACT

PUBLIC POLICIES OF AFFIRMATIVE ACTION IN HIGHER EDUCATION:

THE INCLUSION OF INDIGENOUS PEOPLES IN THE SOUTH MATO

GROSSO STATE UNIVERSITY

The study aimed to analyze the implementation of public policy of affirmative action

for indigenous peoples at the State University of Mato Grosso do Sul. It was

characterized as a qualitative study, study of organizational historic political event. For

collection of empirical data, we used interviews, which were analyzed from the

perspective of critical education and implementation of public policy studies. The

subjects of the research were: Pro-Rectors, members of the Monitoring Committee of

quota students and course coordinators with the largest number of indigenous students.

The results indicate that the survey participants seek outlets and alternatives, actions and

activities, even though point, for example, the tutoring, group activities, disciplines and

elective that address indigenous issues, creation Studies Center, Research and extension

Education, Gender, Race and Ethnicity - CEPEGRE, added support activities developed

in the extension project Knowledge Network. As well as on the projection insert them

into graduate programs. Discuss about the difficulties and challenges faced, sometimes

stating that among the natives there learning difficulties, now reiterating that there are

barriers in understanding the Portuguese, especially among those who have a mother

tongue as a principle. We conclude that the Affirmative Action Policy in that IES is

unprecedented, even in the face of adversity, against hegemonic movements have

occurred in the search for a hybrid and multicultural education.

Keywords: Affirmative action, Indigenous, Higher Education.

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SUMÁRIO

CAMINHOS E ESCOLHAS

INTRODUÇÃO.............................................................................................................26

CAPÍTULO I – .............................................................................................................. 31

TRAJETÓRIA METODOLÓGICA DA PESQUISA ............................................... 31

CAPÍTULO I – TRAJETÓRIA METODOLÓGICA DA PESQUISA ................... 32

1.1 APRESENTAÇÃO ...................................................................................................... 32

1.1.1 Trajetória metodológica da revisão bibliográfica .......................................... 32

1.1.2 Revisão Bibliográfica Portal Periódicos Capes ............................................. 33

1.1.3 Revisão bibliográfica periódicos Scielo ......................................................... 38

1.1.4 Apontamentos sobre os achados da revisão bibliográfica ............................. 40

1.2 POR ONDE CAMINHAMOS? ...................................................................................... 44

1.3 O CENÁRIO E OS SUJEITOS DA PESQUISA ................................................................. 48

FONTE: ELABORADO PELA AUTORA A PARTIR DOS DADOS DA PRÓ –

REITORIA DE EXTENSÃO E ASSUNTOS COMUNITÁRIOS (UEMS, 2013). . 50

CAPÍTULO II ............................................................................................................... 51

MARCO DE ANÁLISE DE IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS 51

CAPÍTULO II – MARCO DE ANÁLISE DE IMPLEMENTAÇÃO DE

POLÍTICAS PÚBLICAS ............................................................................................. 52

2.1 APRESENTAÇÃO ...................................................................................................... 52

2.2ANÁLISE DE POLÍTICAS PÚBLICAS ........................................................................... 52

2.3ANÁLISE DE IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS .......................................... 57

CAPÍTULO III – .......................................................................................................... 63

EDUCAÇÃO SUPERIOR: POLÍTICAS PÚBLICAS DE DEMOCRATIZAÇÃO E

ACESSO ........................................................................................................................ 63

CAPÍTULO III – EDUCAÇÃO SUPERIOR: POLÍTICAS PÚBLICAS DE

DEMOCRATIZAÇÃO E ACESSO ............................................................................ 64

3.1 APRESENTAÇÃO ...................................................................................................... 64

3.2 APROXIMAÇÕES: POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO SUPERIOR, DEMOCRATIZAÇÃO

E ACESSO ...................................................................................................................... 65

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3.3 AÇÃO AFIRMATIVA: ASPECTOS HISTÓRICOS E CONCEITUAIS ................................. 74

3.4 EDUCAÇÃO ESCOLAR INDÍGENA NO CENÁRIO BRASILEIRO ...................................... 85

3.5 EDUCAÇÃO SUPERIOR NO ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL ............................... 94

3.6 INDÍGENAS NAS UNIVERSIDADES BRASILEIRAS ..................................................... 105

CAPÍTULO IV ............................................................................................................ 114

POPULAÇÕES INDÍGENAS DO BRASIL E DO ESTADO DE MATO GROSSO

DO SUL: ASPECTOS SOCIOECONOMICOS, DEMOGRÁFICOS E

EDUCACIONAIS ....................................................................................................... 114

CAPÍTULO IV – POPULAÇÕES INDÍGENAS DO BRASIL E DO ESTADO DE

MATO GROSSO DO SUL: ASPECTOS SOCIOECONOMICOS,

DEMOGRÁFICOS E EDUCACIONAIS ................................................................. 115

4.1 APRESENTAÇÃO .................................................................................................... 115

4.2 A REALIDADE DAS POPULAÇÕES INDÍGENAS DO BRASIL ....................................... 115

4.3 A REALIDADE DAS POPULAÇÕES INDÍGENAS DO ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL

................................................................................................................................... 121

CAPÍTULO V ............................................................................................................. 128

UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MATO GROSSO DO SUL: A

IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS DE AÇÃO AFIRMATIVA

PARA INDÍGENAS ................................................................................................... 128

CAPÍTULO V – UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MATO GROSSO DO SUL: A

IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS DE AÇÃO AFIRMATIVA

PARA INDÍGENAS ................................................................................................... 129

5.1APRESENTAÇÃO .................................................................................................... 129

5.2 UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MATO GROSSO DO SUL: O LÓCUS ......................... 129

5.3 IMPLEMENTADORES: PERFIL E CONSIDERAÇÕES .................................................. 140

5.4 MARCO MOBILIZADOR: LEI ESTADUAL Nº 2.589, DE 26 DE DEZEMBRO DE 2002, A

UEMS ........................................................................................................................ 144

5.4.1 A dualidade: Visível e Invisível – Igual e Diferente ..................................... 154

5.4.2 Parcas ações e/ou inexistência de discussões sistemáticas nos cursos ........ 157

5.4.3 Adversidades ................................................................................................. 158

5.4.4 Intolerância e Resistências ........................................................................... 162

5.4.5 Povos que possuem a língua falada como princípio .................................... 165

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5.4.6 Os interstícios.... os entre lugares ................................................................. 166

5.4.7 Desafios apontados ....................................................................................... 169

5.4.8 Avaliando a política de Ação Afirmativa ...................................................... 171

5.4.9 Reconhecimento de uma formação elitista ................................................... 172

5.5 PROJETO DE EXTENSÃO REDE DE SABERES: ......................................................... 174

5.6 PROGRAMAS DE APOIO ESTUDANTIL .................................................................... 177

5.6.1 Programa Nacional de Assistência Estudantil (PNAES) .............................. 179

5.6.2 Programa Vale Universidade Indígena (PVUI) ........................................... 180

5.6.3 Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (PIBIC) ............. 184

5.6.4 Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID) .......... 185

5.6.5 Programa Ciência Sem Fronteiras ............................................................... 186

5.6.6 Serviço de Atendimento Psicológico (SAP) .................................................. 186

CONSIDERAÇÕES FINAIS ..................................................................................... 187

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS* .................................................................... 191

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO .......................... 217

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO ................................ 218

ROTEIRO DE ENTREVISTA E CARACTERIZAÇÃO DOS SUJEITOS DA

PESQUISA ............................................................................................................... 220

ROTEIRO DE ENTREVISTA E CARACTERIZAÇÃO DOS SUJEITOS DA

PESQUISA ................................................................................................................ 221

Entrevista 1 – MCAAC 1/ OCPR ........................................................................... 223

Entrevista 2 – OCPR / CC .................................................................................... 232

Entrevista 3 – OCPR2 ........................................................................................... 238

Entrevista 4 – CC 1 ............................................................................................... 248

Entrevista 5 – PR .................................................................................................. 256

Entrevista 6 – OCC 1r ........................................................................................... 269

Entrevista 7 – OCC 2 ............................................................................................. 274

Entrevista 8 – CC 3 ................................................................................................ 279

Entrevista 9 – CC 4 ................................................................................................ 288

Entrevista 10 – CC 2 .............................................................................................. 291

Entrevista 11 – CC ................................................................................................. 300

Entrevista 12 - MCAAC 2 ...................................................................................... 305

ANEXO 1: ................................................................................................................ 315

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LEI ESTADUAL Nº 2.589 DE 26 DE DEZEMBRO DE 2002, COTAS PARA

INDÍGENAS NA UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MATO GROSSO DO SUL

................................................................................................................................... 315

ANEXO 2: ................................................................................................................ 317

LEI ESTADUAL Nº 2.605, DE 6 DE JANEIRO DE 2003, COTAS PARA

NEGROS NA UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MATO GROSSO DO SUL . 317

ANEXO 3: ................................................................................................................ 319

RESOLUÇÃO COUNI-UEMS Nº 241, DE 17 DE JULHO DE 2003 ................... 319

ANEXO 4: ................................................................................................................ 322

RESOLUÇÃO COUNI-UEMS Nº 250, DE 31 DE JULHO DE 2003 ................... 322

ANEXO 5: ................................................................................................................ 324

RESOLUÇÃO CEPE-UEMS Nº 430, DE 30 DE JULHO DE 2004 ..................... 324

ANEXO 6: ................................................................................................................ 336

RESOLUÇÃO COUNI-UEMS Nº 437, DE 11 DE JUNHO DE 2014. ........................ 336

ANEXO 7 – PARECER COMITÊ DE ÉTICA EM PESQUISA DA

UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO DO SUL NÚMERO 814.869/

2014 ........................................................................................................................... 338

ANEXO 8: ................................................................................................................ 342

PORTARIA NORMATIVA NO 18, DE 11 DE OUTUBRO DE 2012 .................. 342

ANEXO 9: ................................................................................................................ 356

LEI Nº 12.711, DE 29 DE AGOSTO DE 2012 ....................................................... 356

ANEXO 10: .............................................................................................................. 359

RESOLUÇÃO CEB Nº 3, DE 10 DE NOVEMBRO DE 1999(*) .......................... 359

ANEXO 11: .............................................................................................................. 363

ESTATUTO DO ÍNDIO .......................................................................................... 363

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CAMINHOS E ESCOLHAS

...que a importância de uma coisa não se mede com fita métrica, nem com balanças, nem barômetros, etc.

Que a importância de uma coisa há que ser medida pelo encantamento que a coisa produza em nós.

(Manoel de Barros)

Venho do estado de Mato Grosso do Sul, terra de Manoel de Barros, sua poesia

aborda sobre a importância e o encantamento que os fatos de nossa história nos provoca.

O poeta enfoca sobre as “coisas miúdas”, sobre a terra, nos convidando a mergulhar e

nos introjetar nos pequenos espaços, nos entrelaçarmos nas fissuras.... Nos convida a

“desver”.

A partir das leituras e reflexões a cerca da poesia de Manoel de Barros, ao iniciar

uma escrita de uma tese considerei importante que na produção textual sejam

contempladas questões como: de que lugar estou falando? Em que contexto produzo

este texto? Minha trajetória pessoal está intimamente imbricada na minha forma de

pensamento, produção de sentidos e subjetivações.

Procurar memórias e explicações lógicas para minhas escolhas profissionais não

somente é uma viagem ao passado, como também uma passagem melancólica por

minha infância com algumas tribulações e um pensamento já divergente da sociedade

contemporânea. Penso ser válido ressaltar que apareceram várias perguntas em minha

cabeça quando me dispus a recordar, tais como: De onde vim? Por que fiz estas escolhas

e trilhei estes caminhos?

A escolha pelo curso de Pedagogia, no vestibular do ano de 1988, se deu por

conta do encantamento que tenho pelo ensino e pelas possibilidades de atuação no

mercado de trabalho, mas não atuei imediatamente.

Já a escolha pela Enfermagem foi um sonho guardado na gaveta do tempo por

alguns anos. Trabalhando na atenção especializada na dispensação de medicamentos de

alto custo, vivenciei por inúmeras vezes o descaso no trato com os pacientes, o que me

levou à decisão de pedir demissão e cursar Enfermagem.

Fui aprovada no vestibular em 1997; naquele mesmo ano, num projeto de

extensão, fui desenvolver trabalhos nas aldeias de Dourados e me encantei com o que

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vi. Lembro-me que em visita ao Hospital Porta da Esperança, na reserva Indígena

Francisco Horta Barbosa, falei ao diretor: vou trabalhar com índios.

Em 2001, após a conclusão da graduação em Enfermagem fui selecionada e

ingressei na FUNASA, hoje SESAI, e passei a trabalhar nas Aldeias de Caarapó, no sul

do estado de Mato Grosso do Sul.

Essa experiência profissional foi deveras marcante e permitiu que eu conhecesse

e reconhecesse as dificuldades que os povos indígenas vivenciavam. Encontrei um

espaço de crescimento profissional e pessoal, e alguns fatos foram extremamente

importantes: o acolhimento da equipe e dos agentes indígenas de saúde, a forma como

fui recebida pelas comunidades, a amizade estabelecida, especialmente com os povos

indígenas.

Como enfermeira, esta convivência me impactou muito, especialmente quando

fui atuar nas comunidades indígenas de Dourados, na Aldeia Bororó, no ano de 2002.

Deparei-me com um quadro de mortalidade infantil considerado um dos mais altos entre

crianças indígenas de 0 a 5 anos da época, se aproximava de 140 por 1.000 nascidos

vivos.

As causas de mortalidade infantil eram: pneumonia, diarreia e desnutrição, ou

seja, doenças evitáveis e relacionadas aos determinantes sociais. O quadro social que

assolava tais comunidades era marcado por condições de moradia precárias, ausência de

saneamento básico e, ainda, pela falta de alimentos. O que fazer diante deste cenário? O

conhecimento adquirido na universidade ajudaria a mudá-lo?

Apesar dos meus questionamentos, nesta equipe de trabalho encontrei um

grande amigo Dr. Zelik Trajber, pediatra de formação e indigenista de coração. Sua

história de vida já revela bastante do seu compromisso com a causa indígena. Quando

ainda era estudante, foi deportado do país, perseguido e torturado, e ficou exilado em

Cuba. Retornou ao Brasil após o fim da ditadura, concluiu a graduação em medicina na

USP e, em 2001, foi convidado a trabalhar em comunidades indígenas do Mato Grosso

do Sul. Esse colega foi extremamente importante para as mudanças de paradigmas em

mim construídas.

Nosso trabalho não se limitou a ações assistenciais, mas incluiu articulações com

diversos setores. Foram inúmeras as vezes que atendi crianças em estágio terminal de

desnutrição severa e, em alguns casos, já em óbito. Era, portanto, necessário pensar em

outros caminhos!

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A preocupação maior era garantir que as crianças em risco ou em desnutrição

severa pudessem ser acompanhadas semanalmente e tivessem acesso a alimentos

adequados para a sua idade. Foi assim que, depois de uma reunião exaustiva, nossa

equipe criou o que chamávamos de sopão e pesagem das crianças, que eram grandes

encontros com mulheres e crianças indígenas, acompanhados de uma equipe

multiprofissional (formada por agentes comunitários indígenas, auxiliares de

enfermagem, médico, nutricionista, dentista e vacinadores).

A ideia principal não era oferecer alimentos, mas identificar o que elas

produziam e poderiam incluir na alimentação dos filhos, e dessa forma, conhecermos

quais eram os alimentos que faziam parte da dieta dos guaranis e a forma de preparo dos

mesmos. E a partir disso, junto com as mães produzir a sopa e trabalhar os conceitos dos

alimentos e suas propriedades.

Lembrando que nem todas as famílias indígenas têm a possibilidade de produzir

alimentos, pois, especialmente entre os guaranis, as condições socioeconômicas e de

acesso à terra são muito precárias. É uma reserva de cerca de 14.000 indígenas para uma

área de aproximadamente 3.5000 hectares, na qual existe ainda uma disputa interna

entre as famílias de maior poder.

Diante da necessidade de buscar parcerias, mobilizamos o comércio do

município de Dourados para arrecadar alimentos. Nessa situação, pude perceber e sentir

a discriminação e o preconceito presente nos discursos. Recebemos “não” e “passa

amanhã” por diversas vezes, mas isso não nos desanimava. Depois de muitas discussões

e reivindicações, conseguimos que a administração municipal efetuasse a compra dos

alimentos para o sopão.

Paralelamente a isso, comecei, também, a vivenciar o preconceito dos colegas,

que me dirigiam perguntas como: Por que está fazendo isso? Por que quer trabalhar com

índios? Enfrentei muitos outros estereótipos, que prefiro não descrever.

Posso dizer que essa experiência marcou profundamente minha vida, pois uma

coisa é conhecer a realidade dos povos indígenas por meio dos livros e artigos, outra é

vivenciar a negligência e o descaso com esses povos. Após esta experiência

profissional, tinha uma convicção pessoal e um compromisso de estar nessa luta,

contribuindo nesse embate.

Já enquanto pesquisadora, essa aproximação se deu pela possibilidade de

conhecer a realidade das mulheres da Aldeia Bororó. Os momentos do tereré, das trocas

e conversas informais me tocaram profundamente, pois apesar das dificuldades

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relatadas, todas as mulheres indígenas são enfáticas ao afirmarem que priorizam a busca

de um futuro melhor para seus filhos.

A pesquisa também me oportunizou algumas aproximações aos aspectos

antropológicos e conceituais, aspectos estes necessários para melhor entendimento das

formas de vida e de organização social dos povos indígenas.

Mas algumas inquietações ainda estavam presentes: porque só existem não

índios nas equipes de saúde profissionais? E me perguntei: Se somos iguais, por que não

temos as mesmas oportunidades?

Posteriormente, em 2004, ingressei como docente do curso de Enfermagem no

Centro Universitário da Grande Dourados, e em 2007, na Universidade Estadual de

Mato Grosso do Sul (UEMS), onde tenho contato com os acadêmicos indígenas.

Já como docente na universidade, a convivência com os acadêmicos indígenas

permitiu-me acompanhar suas histórias e testemunhar as dificuldades, os sofrimentos, as

desistências, os “silêncios” e o preconceito que eles enfrentam. Tais inquietações e

observações somam-se às discussões pedagógicas e ao acompanhamento da

reformulação do projeto pedagógico do curso, em que temas como a interculturalidade

ou a diversidade étnica sequer são mencionados, especialmente no que diz respeito à

proposta institucional de Ação Afirmativa.

Portanto, minhas inquietações acerca da temática deste estudo se construíram a

partir da minha atuação como enfermeira nas comunidades indígenas do sul do estado

de Mato Grosso do Sul e a minha inserção como docente na Universidade e o convívio

com acadêmicos indígenas nas atividades de ensino, pesquisa e extensão (nas Aldeias

Bororó e Jaguapiru) reafirmaram estas inquietações.

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INTRODUÇÃO

As inquietações tornaram-se mal-estar, neste sentido, utilizo as palavras da

autora Rolnik (1995):

“É o mal-estar que nos invade quando forças do ambiente em que vivemos (e que são a própria consistência de nossa subjetividade), formam novas combinações, promovendo diferenças de estado sensível em relação aos estados que conhecíamos e nos quais nos situávamos“(p.1).

Minhas inquietações acerca da temática deste estudo se constroem a partir da

atuação enquanto enfermeira nas comunidades indígenas do sul do Estado de Mato

Grosso do Sul e na Universidade através do convívio com acadêmicos indígenas nas

atividades de ensino, extensão (nas Aldeias Bororó e Jaguapiru) e também como

pesquisadora a partir de 2001. Posteriormente, em 2004, iniciei como docente do curso

de Enfermagem do Centro Universitário da Grande Dourados e, em 2007, na

Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS), onde tenho contato com os

acadêmicos indígenas1.

O desempenho dos papéis de enfermeira e pesquisadora nas reservas indígenas

de Dourados e Caarapó permitiram que eu me aproximasse do modo de vida, de

produção de saúde, da cultura e da forma de organização social de povos indígenas, em

especial dos Guaranis Kaiowás. Povos de uma riqueza cultural2 singular.

A Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul e o estado de Mato Grosso do

Sul são pioneiros na oferta de cotas para negros e índios, com a proposta institucional de

política de Ação Afirmativa. A política de Ação Afirmativa vai ao encontro das

reivindicações dos movimentos da liderança indígena, indigenistas, movimentos de

1

Optou-se na tese por utilizar o termo indígena, termo aceito por diversos pesquisadores e antropólogos. Indígena: (lat indigena). Pessoa natural de um país em que habita; aborígine; originário ou próprio de um país ou de uma localidade (MICHAELIS, 2008, p. 467). 2 O conceito utilizado de cultura no texto se apoia em Giroux (1992, p. 65), considerada uma forma de produção, especificamente como formas nas quais os seres humanos compreendem suas formas de vida, sentimentos, crenças, pensamento e a sociedade mais ampla.

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27

professores indígenas, Organizações Não Governamentais (ONGs) e instituições de

ensino em prol da causa indígena. Em relação aos estudantes indígenas, a política inclui

o desenvolvimento de programas para apoia-los na trajetória acadêmica.

Segundo dados da Secretaria Especial de Saúde Indígena (2012), o estado de

Mato Grosso do Sul concentra a segunda maior população de indígenas do Brasil, de

aproximadamente 70.383 mil pessoas, que enfrentam precárias condições de vida e

possuem indicadores sociais alarmantes. Essa situação possui uma longa trajetória

histórica, que tem como pano de fundo a luta fundiária, pois o estado tem como

principal fonte de renda e desenvolvimento a agricultura e a pecuária, o que provoca

inúmeras tensões entre indígenas e parte da sociedade envolvida.

Nas palavras de Gersem dos Santos Luciano, índio Baniwa, a educação tornou-

se uma das condições e uma das causas da formação da consciência de cidadania. Ela

pode possibilitar o domínio dos códigos básicos estruturantes da sociedade não

indígena, a consequente capacidade de reformulação de estratégias de resistência e de

promoção de culturas, valores e conhecimentos, e a apropriação de outros saberes úteis

e necessários à melhoria das condições de vida (LUCIANO, 2006, p. 165). Nesse

sentido, a educação superior tem sido um dos caminhos que os indígenas procuram para

se apropriarem de outros conhecimentos e saberes e, dessa maneira, viabilizarem a

ocupação de espaços na formulação de estratégias contra hegemônicas.

A educação superior é um espaço de discurso e, como tal, detém o poder porque

produz conhecimento, detendo também parte do controle simbólico, pois controla o

texto, a produção e comercializa esse mesmo conhecimento. Ter acesso à educação,

principalmente a superior, é adquirir formas de empoderamento, é assumir poder, é ter a

possibilidade de ocupar novas posições na divisão social do trabalho, de classes. Saber é

Poder. Discurso é, então, objeto de poder porque o realiza, constrói o poder, conforme

nos aponta Boaventura de Sousa Santos (2009).

Ao longo e a cada momento da história, as instituições, as forças e os processos

estruturados constrangem e interferem todo o tempo nas relações e ações dos sujeitos,

mas, aquelas, simultaneamente, são produzidas, instituídas e estruturadas pela práxis

desses mesmos sujeitos. Dessa forma, os sujeitos são, ao mesmo tempo, produtores e

produtos de relações e instituições que eles mesmos engendram e pelas quais são

engendrados. Cabe, neste caso, estudar profundamente, em toda a complexidade, as

dimensões micro e as suas relações com a estruturada macropolítica.

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Referindo-me ao autor Dias Sobrinho (2010), instituições e estado são

construídos por seres humanos, carregam as contradições sociais e os diferentes

projetos existenciais e coletivos. Portanto, na implementação e na implantação de uma

política institucional é necessário identificar: que lugares os atores das políticas

ocupam; quais os compromissos numa dada formação social; quais as concepções de

mundo e; o papel que atribuem às políticas referidas.

Um problema de pesquisa supõe a possibilidade de buscar informações a fim de

esclarecê-lo e compreendê-lo. Portanto, não deve ser tratado pelo senso comum ou pela

simples especulação.

Pois,

A fase de formulação, de explicitação do problema de pesquisa, é uma fase crucial em qualquer pesquisa, pois dela dependerão todas as demais decisões, o que significa dizer que a busca de clareza em relação ao problema é fundamental não apenas na elaboração do projeto, mas em todo o processo da pesquisa (LEAL, 2002, p. 237).

Nessa perspectiva, a presente pesquisa permeou as seguintes indagações:

Como a política de Ações Afirmativas está sendo implementada na UEMS?

Quais ações/atividades afirmativas e discussões sistemáticas ou ações

programadas são desenvolvidas nos cursos e IES?

Quais são as concepções dos coordenadores, pró-reitores e membros da

Comissão de Acompanhamento de alunos cotistas sobre a implementação da política de

Ação Afirmativa na IES.

A partir dessas questões a presente tese de doutoramento aborda sobre a

implementação das Políticas de Ações Afirmativas para populações indígenas, numa

indagação de que forma se dá e se deu o processo histórico dos 10 anos de

implementação de tal política sob o olhar dos diversos membros da Universidade

Estadual de Mato Grosso do Sul. Dessa forma, buscou-se identificar e compreender

como circulam os discursos, a compreensão de gestores, pró-reitores, membros de

comissões de acompanhamento de Ações Afirmativas e coordenadores sobre a referida

política. Portanto, o interesse desta tese é investigar sob quais condições tais políticas

funcionam e como estão sendo implementadas.

Destarte, mergulhando na micropolítica proposta pela pesquisa, buscou-se

compreender o movimento dialético e as razões que, em alguns casos usam, globalizam

e, em outros se colocam em oposição.

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A presente tese tem como objetivo geral analisar a implementação das políticas

públicas de Ações Afirmativas direcionadas aos povos indígenas na Universidade

Estadual de Mato Grosso do Sul, considerando:

O período entre os anos de 2003 a 2014;

Graus e formas da implementação;

Comportamentos dos agentes envolvidos na implementação;

A estrutura de operação envolvendo as dimensões organizacionais, jurídicas,

financeiras e apoio logístico.

Os objetivos específicos são:

Situar as políticas de Ações Afirmativas para indígenas presentes no Brasil e no

estado de Mato Grosso do Sul;

Compreender de que maneira as políticas de Ações Afirmativas são

implementadas pelos diversos segmentos da Universidade (Pró-Reitorias, Membros da

Comissão de acompanhamento dos alunos cotistas, Coordenadores de Curso,

Conselhos);

Identificar as dificuldades e facilidades no processo de implementação das

políticas de ações afirmativas;

Mapear as Ações/atividades Afirmativas, discussões sistemáticas ou ações

programadas desenvolvidas nos cursos e da IES.

Na abordagem da implementação de políticas educacionais, partimos da

concepção que a educação é entendida como prática social, envolvendo diversos atores:

o educando, o educador e a política institucional. Neste universo é que se tecem as

articulações políticas permeadas e definidas por condições objetivas e subjetivas

Os estudos sobre o processo de implementação de Políticas Públicas são parcos

e na grande maioria se centram nos resultados, ou seja, nas consequências. Os

resultados destes estudos têm demonstrado hiatos entre o que é formulado e o que é

implementado, sendo que, os efeitos alcançados são totalmente distintos dos objetivos e

metas previamente almejados. Nesta assertiva, o estudo da implementação a partir do

“olhar” dos implementadores3 acrescenta uma nova dimensão na análise de Políticas

Públicas, oferece-nos um “ponto de vista”. Colaborando dessa forma, com o debate e o

intercâmbio por meio da análise de dados e informações da experiência da Instituição de

Ensino Superior (IES) pesquisada, que se destaca pelo fato de ser uma das primeiras

IES com a iniciativa da implantação de cotas e da Política de Ação Afirmativa.

3 Implementadores são todos os envolvidos no processo de implementação.

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Para esse movimento de aproximação e com o intuito de atender aos objetivos

propostos pelo estudo, a tese foi organizada em cinco capítulos.

O primeiro capítulo trata do Percurso Metodológico da Pesquisa, iniciando

com revisão bibliográfica sobre a temática, delineamento metodológico e percurso do

estudo, bem como os sujeitos e o cenário da pesquisa.

O segundo capítulo intitulado Marco Teórico de Análise de Implementação

de Políticas Públicas discorre sobre os principais marcos teóricos de análise de

implementação de políticas públicas que nortearam o pensamento epistemológico da

tese.

O terceiro capítulo trata das Ações Afirmativas: Políticas Públicas para

Inclusão de Indígenas na Educação Superior, buscando elementos para

contextualizar os aspectos históricos conceituais de Ação Afirmativa e a relação com as

políticas públicas de democratização e inclusão de indígenas na educação superior.

O quarto capítulo, aborda as Populações Indígenas do Brasil e do Estado de

Mato Grosso do Sul: Aspectos Socioeconômicos, Demográficos e Escolarização,

contextualiza os aspectos socioeconômicos, demográficos e a escolarização das

populações indígenas do Brasil e, em especial, as idiossincrasias dos povos de Mato

Grosso do Sul,

Já o quinto capítulo Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul: A

Implementação de Políticas Públicas de Ação Afirmativa para Indígenas, aborda o

processo de implementação, a partir da descrição e detalhamento das características da

IES pesquisada, bem como as percepções e narrativas dos implementadores que

permeiam e entrelaçam o processo histórico da implantação das políticas de Ações

Afirmativas da referida política na Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul.

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CAPÍTULO I –

TRAJETÓRIA METODOLÓGICA DA PESQUISA

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CAPÍTULO I – TRAJETÓRIA METODOLÓGICA DA PESQUISA

1.1 Apresentação

Para atender aos objetivos propostos da pesquisa, organizou-se o presente

capítulo a partir de uma revisão bibliográfica e da definição do marco teórico e

metodológico da pesquisa.

No intuito de subsidiar esta tese, foi realizada uma revisão bibliográfica com o

objetivo de mapear as publicações sobre a temática. Dessa forma, buscou-se identificar

o número de textos encontrados na base de dados eleita, o número de publicações por

ano, gênero, áreas de conhecimento, principais revistas e periódicos.

1.1.1 Trajetória metodológica da revisão bibliográfica

A referida revisão bibliográfica foi realizada em janeiro de 2013 e

revisada/atualizada em janeiro de 2015. Foi feita busca no Portal CAPES – Periódicos

CAPES – e Scielo, e incluíram-se todas as publicações do tipo textos completos e

resumos disponíveis virtualmente, opção esta devido ao acesso à recente publicação

sobre a temática pesquisada.

A busca deu-se por meio de descritores e por assunto; após leitura detalhada, os

resumos foram lançados em planilha Excel e os resultados, descritos em gráficos e

tabelas.

O período escolhido para a busca foi entre os anos de janeiro de 1999 a janeiro

de 2015, período onde começam a se despontar no país as primeiras iniciativas de cotas

e ampliação das políticas de Ações Afirmativas na educação superior no Brasil.

Os descritores utilizados por assunto foram:

“Ação Afirmativa”;

“Indígenas” and “Educação Superior”;

“Indígenas” “Ensino Superior”;

“Indígenas” “Universidade”

“Cotas Raciais”;

“Cotas Sociais”;

“Affirmative actions” “Indigenous”.

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Foram incluídas na revisão todos os artigos disponíveis com os descritores

“Ação Afirmativa” por se considerar uma temática ainda recente em nosso país e com

escassas publicações.

Para a análise foram considerados os seguintes elementos dos artigos: ano de

publicação, título, palavras-chave e gênero. Considerou-se a abrangência das áreas de

conhecimento, como ciências sociais, educação, psicologia, sociologia, administração,

entre outras, bem como a natureza das pesquisas, como qualitativa, quantitativa e

qualitativa/quantitativa.

1.1.2 Revisão Bibliográfica Portal Periódicos Capes

Na revisão bibliográfica no Portal Periódicos Capes foram encontrados na

primeira busca 221 títulos. Após leitura detalhada dos resumos, selecionaram-se 149

textos. Consideraram-se os textos que tratavam em seus resumos da temática das Ações

Afirmativas no contexto da educação superior com o foco nas cotas raciais e

especificamente indígenas.

Dos 149 textos selecionados entre os anos de 1999 a 2015, identificou-se entre

os anos de 2007 e 2012 um aumento de produção, como ilustra o Gráfico 1 a seguir.

Esse aumento pode estar relacionado à adoção das primeiras experiências de políticas de

cotas e outras formas de inclusão, aumentando o interesse de pesquisadores pela

temática.

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Grafico 1. Revisão Bibliográfica – Base de dados: Periódicos Capes – Ano e quantidade de publicações – 1992 a 2014 (n. 149)

Quanto ao gênero, após a leitura dos resumos e seleção dos textos, encontraram-

se: 58 artigos, 39 teses, 31 dissertações, 15 ensaios teóricos, três que não continham

registro, dois dossiês, uma resenha e uma revisão de literatura, como se observa no

Gráfico 2 a seguir.

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Grafico 2. Revisão Bibliográfica – Base de dados: Periódicos Capes – Gênero dos textos

e Quantidade - 1992 a 2015 (n. 149)

Há variedade entre as áreas do conhecimento com o maior número de textos,

sendo que a Educação apresentou 69 textos; Ciências Sociais 28; Direito: dez;

Sociologia: nove: Psicologia e a Antropologia oito; Filosofia: três; História e

Administração: dois; Comunicação, Economia, Relações Internacionais e Bioética: um;

e; seis não declararam, conforme se observa no Gráfico 3 a seguir.

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Gráfico 3. Revisão Bibliográfica – Base de dados: Periódicos Capes – Áreas de Conhecimento – 1992 a 2015 (n. 149)

*Optou-se por manter separado as áreas filosofia e sociologia.

A partir das áreas de conhecimento se observam as possibilidades e diversidade

de integração e perspectivas nos estudos selecionados, o que pode contribuir para uma

visão mais ampla e significativa da temática.

Entre as fontes também havia diversidade de revistas, como podemos observar

no quadro 1, abaixo. Na fonte Banco de Teses e Dissertações foram encontrados 70

textos; a Revista Estudo Feministas e Cadernos de Pesquisa possuía seis artigos;

Educação e Pesquisa, Práxis Educativa e Revista Brasileira de Educação, quatro artigos;

as revistas Australian Aboriginal Studies, Ensaio, Horizontes Antropológicos,

Universitas Humanística e Vértices, possuíam dois artigos, e as demais apresentaram

um artigo cada.

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Quadro 1: Revisão bibliográfica Periódicos CAPES -Fontes e revistas-janeiro de 2015.

Revistas / Fonte Quantidade Australian Aboriginal Studies 2 Australian Journal of Indigenous Education 1 Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações 70 Cadernos de Pesquisa 6 Cadernos de Saúde Pública 1 Cadernos Pagu 1 Ciências Sociais Unisinos 1 Civitas 1 Desenvolvimento em Questão 1 Educação 1 Educação e Pesquisa 4 Educação Temática Digital 1 Educar em Revista 1 Ensaio 2 Espacio Abierto: Cuaderno Venezolano de Sociología 1 Estudos Avançados 1 Estudos de Sociologia 1 Estudos Econômicos 1 Exame 1 Horizontes Antropológicos 2 Journal of Latin American Studies 1 Latin American Perspectives 1 Latin American Research Review 1 Motricidade 1 Nuances: Estudos sobre Educação, 1 Organizações & Sociedade 1 Práxis Educativa 4 Psicologia & Sociedade 1 Psicologia: Ciência e Profissão, 1 Reflexão & Ação 1 Revista Antípoda 1 Revista Brasileira de Educação 4 Revista Brasileira de Estudos de População 1 Revista Brasileira de Política Internacional 1 Revista de AdministraçãoContemporânea 1 Revista de Cultura e Política: Lua Nova 1 Revista do Centro de Educação UFSM 1 Revista de Estudios Sociales 1 Revista de Filosofia do Direito, do Estado e da Sociedade 1 Revista de História da África e de Estudos da Diáspora Africana: Sankofa 1 Revista Direito e Práxis 1 Revista Espaço do Currículo 1 Revista Estudo Feministas 6 Revista Gestão Universitária na América Latina 1 Revista do Departamento de História e Ciências Sociais- OPSIS 1 Revista Latinoamericana de Ciencias Sociales 1 Revista Psicología Política 1 Revista Thema 1 Roteiro 1 Semina 1 Tempo Social 1 Tribal College Journal of American Indian Higher Education 1 Universitas Humanística 2 Varia História 1 Vértices 2 World Journal of Education 1

Total 149 Fonte: Periódicos da Capes, atualizado em janeiro de 2015.

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Elaborado pela autora.

1.1.3 Revisão bibliográfica periódicos Scielo

Encontraram-se 79 artigos que continham as palavras–chave: Ação Afirmativa,

cotas e cotas raciais. Após leitura minuciosa, foram selecionados 26 artigos que

tratavam especificamente sobre o tema das ações afirmativas, e entre os 26 encontrados,

um foi excluído por tratar de tema contrário ao interesse desta pesquisa, como podemos

observar no Quadro 2 a seguir. Entre os 25 incluídos, o ano de publicação variou do ano

de 2002 ao ano de 2014.

Quadro 2: Revisão bibliográfica na base de dados Scielo: descritores Ação Afirmativa, Cotas e Cotas Raciais, janeiro de 2015.

Base de Dados/ Descritores Base de Dados Scielo: Artigos completos

Ação Afirmativa 26

Cotas 46

Cotas Raciais 07

Total 79

Elaborado pela autora

Como se observa no Quadro 3 a seguir, a variedade de periódicos totalizou 17,

entre os quais o mais frequente foi a revista Cadernos de Pesquisa (periódico da

Fundação Carlos Chagas), com cinco textos. Possuíam dois textos as revistas Ensaio:

Avaliação de Políticas Públicas em Educação, Estudos Afro-Asiáticos, Revista

Brasileira de Ciências Sociais e a Revista de Estudos Feministas, e um, Cadernos Pagu,

Educação & Sociedade, Educação e Pesquisa, Estudos Econômicos, Psicologia &

Sociedade, Revista Brasileira de Ciência Política, Revista Brasileira de Educação,

Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, Revista Brasileira de Política Internacional,

Revista de Administração Mackenzie, Revista de Sociologia e Política, e a Revista

Tempo Social.

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Quadro 3: Periódicos na base de dados Scielo: descritor Ação Afirmativa, janeiro de 2015.

Periódicos Número de artigos

Cadernos de Pesquisa 05 Cadernos Pagu 01 Educação & Sociedade 01 Educação e Pesquisa 01 Ensaio: Avaliação de Políticas Públicas em Educação 02 Estudos Afro-Asiáticos 02 Estudos Econômicos 01 Psicologia & Sociedade 01 Revista Brasileira de Ciência Política 01 Revista Brasileira de Ciências Sociais 02 Revista Brasileira de Educação 01 Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos 01 Revista Brasileira de Política Internacional 01 Revista de Administração Mackenzie 01 Revista de Estudos Feministas 02 Revista de Sociologia e Política 01 Tempo Social 01 Total 25

Em relação ao gênero e à natureza, conforme se observa no Gráfico 4 a seguir,

foram identificados entre os 25 textos: 11 artigos, nove ensaios, um estudo de caso, uma

interpretação textual, um relato, uma revisão de literatura e uma análise documental

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1.1.4 Apontamentos sobre os achados da revisão bibliográfica

Realizar uma revisão bibliográfica exige do leitor vários movimentos: leituras,

releituras, aproximações, afastamentos. Tais movimentos são permeados por

questionamentos, comparações, inquietações e refutações.

Foi possível identificar vários pesquisadores que se destacam na temática e

trazem contribuições com suas pesquisas, mas aqui citaremos apenas alguns estudos, os

quais foram considerados relevantes e com relação direta a temática proposta. Os

demais estudos levantados permeiam e se entrelaçam na tese, ora no aporte teórico, ora

no aporte metodológico, ora nas definições epistemológicas e ora nas discussões dos

achados da pesquisa.

Entre os estudos destaco a autora Moehlecke, que ano de 2000 mapeou as

propostas de Ações Afirmativas voltadas à população negra no Brasil, levantou questões

sobre os embates e conquistas do movimento negro e realizou levantamento dos

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aspectos conceituais e históricos no cenário americano e brasileiro. Em 2002 publicou o

artigo “Ação Afirmativa: história e debates no Brasil”, no qual abordou a legalidade e

abrangência das Ações Afirmativas, a discriminação e a garantia de direito. Já em sua

tese de doutoramento, em 2004, apresentou as teorias norte-americanas e brasileiras

sobre políticas de Ações Afirmativas e confrontou com as percepções observadas entre

estudantes da Universidade de São Paulo (USP).

Silvério (2002), por sua vez, faz uma abordagem sobre racismo e os

fundamentos jurídicos da igualdade de oportunidades.

Entre os textos encontrados há aqueles que tratam das experiências das IES

pioneiras nas Ações Afirmativas, por exemplo, o caso da Universidade de Brasília

(UNB), abordado em artigo do autor Sansone (2005).

No que se refere ao estado de Mato Grosso do Sul, destaca-se o artigo produzido

por Valente (2005), que realizou atividade de pesquisa em Campo Grande (MS) e Belo

Horizonte (MG), com o foco nas relações entre Ação Afirmativa, relações raciais e

educação básica.

Ainda sobre o estado de Mato Grosso do Sul, no ano 2006 as autoras Bittar e

Almeida publicaram o artigo intitulado “Mitos e controvérsias sobre a política de cotas

para negros na educação superior”, cujo objetivo foi analisar o processo de implantação

das cotas na referida IES a partir das perspectivas dos acadêmicos negros da

Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul.

Em relação a outras experiências, o estudo da autora Silva (2006) consistiu em

uma descrição e comparação de Ações Afirmativas na educação superior no Brasil e na

África. Participaram da pesquisa IES brasileiras e africanas que na época haviam

implantado cotas, e funcionários do governo federal e estadual.

Guarnieri e Melo-Silva em 2007, abordaram as produções brasileiras sobre a

temática das Ações Afirmativas entre os anos de 2002 a 2007 e identificaram três

características: (a) dicotomia entre artigos a favor ou contra as medidas; (b)

enriquecimento do debate sobre “diversidade”; e (c) visualização dialética, mais

integrada e reflexiva.

Outro estudo comparativo entre Estados Unidos e Brasil sobre Ações

Afirmativas foi realizado por Oliven (2007). O autor comparou a sociedade brasileira e

a norte-americana no que diz respeito a relações raciais e formação da elite. Apresentou

também argumentos a favor e contra cotas na seleção para universidades nos dois países

(p. 29).

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A mesma autora em 2009 no artigo intitulado “Ações Afirmativas na

Universidade Federal do Rio Grande do Sul e o seu significado simbólico” trouxe a

experiência e o significado simbólico da implementação das Ações Afirmativas na

Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).

Naquele mesmo ano a autora Moehlecke publicou o artigo “As políticas de

diversidade na educação no governo Lula”, no qual analisou como o Ministério da

Educação durante o governo Lula, em sua primeira gestão (2003-2006), se posicionou

diante da questão da diversidade. Apontando que:

[...] apesar de as chamadas “políticas de diversidade” terem alcançado maior grau de institucionalização no governo Lula, as concepções que norteiam suas ações ainda são muito díspares e apropriadas de forma fragmentada pelas secretarias (MOEHLECKE, 2009,p.461)

Já o artigo de autoria de Oliveira (2009) traz o enfoque da Ação Afirmativa

como medida de justiça corretiva, de reconhecimento e auto respeito.

Com o foco nas desigualdades sociais e na relação com a desigualdade racial,

Teixeira (2008) faz uma discussão em torno das políticas de Ações Afirmativas como

forma de combater a desigualdade racial.

No ano de 2010, o artigo de Matta fez uma análise da implantação de cotas para

negros na Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro, comparando com

um estudo realizado na Universidade Federal Fluminense.

Com o mesmo enfoque as autoras Winther e Golgher (2010) realizaram

investigação sobre a aplicação de bônus adicional como política de Ação Afirmativa na

Universidade Federal de Minas Gerais.

Sobre experiências de outras IES, o autor Tragtenberg (2011) descreve o

Programa de Ações Afirmativas da Universidade Federal de Santa Catarina implantado

no ano de 2007. O que se destaca no texto é a abordagem do indígena, mas de forma

bastante breve e sem maiores detalhamentos, fazendo alusão somente ao número de

inscritos no vestibular e matriculados.

Na pesquisa de doutoramento a autora Furtado (2011) descreveu a representação

de professores e discentes sobre a inclusão de negros na Universidade Federal do Rio de

Janeiro por meio das cotas.

Cruz (2011) desenvolveu pesquisa de doutorado cujo objetivo foi investigar

como a Universidade Federal do Maranhão utilizam sistema de cotas para negros, bem

como identificar as concepções sobre políticas de Ação Afirmativa por parte dos

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gestores, apreender o sentido político do sistema de cotas e averiguar se a ideologia da

meritocracia tem ressonância nos rendimentos acadêmicos.

Orientado por Munanga, precursor no Brasil nas publicações sobre relações

raciais e ações afirmativas, a pesquisa de Cruz (2011) enfocou a igualdade e a Ação

Afirmativa a partir dos princípios jurídicos.

No que se refere à implementação, no ano de 2011 a autora Melo realizou um

estudo cujo objetivo foi analisar o processo de implementação das cotas raciais nos

cursos de graduação da Universidade Federal do Pará.

No ano de 2012, Santos discutiu o conjunto de relações políticas institucionais

entre movimentos negros no Brasil e Colômbia entre os anos de 1991-2006 numa

perspectiva comparada.

Naquele mesmo ano Aranha et al fizeram uma análise do impacto da adoção do

programa de bônus no processo de seleção da Universidade Federal de Minas Gerais

(UFMG) sob a perspectiva da inclusão racial, da educação pregressa e da faixa de renda.

Ainda no ano de 2012, autora Silva realizou pesquisa com o objetivo de analisar

as dissertações defendidas em Universidades Federais de 2001 a 2011 com o foco nas

ações afirmativas. Tendo analisado 22 dissertações, os resultados apontaram que:

[...] foram identificados os conceitos de Ações Afirmativas presentes nas dissertações, o argumento da justiça social conjugado com o argumento da reparação ocorreu em mais da metade das dissertações e também foi identificado temas como “Ações Afirmativas e democratização do acesso”, “comparações entre cotistas e não cotistas”, “contexto das ações afirmativas” e “trajetória de vida”(SILVA, 2012, p.7).

Em relação à UEMS, em 2013 o artigo “Ações Afirmativas na Universidade

Estadual do Mato Grosso do Sul: uma análise dos efeitos para as identidades negras”, de

autoria de Santana e Backes, analisou os efeitos da educação superior nas identidades

dos negros da referida IES.

No que se refere à inserção de indígenas na educação superior, a pesquisa de Paz

(2013) analisa os aspectos significativos das itinerâncias do grupo multiétnico de

estudantes indígenas ingressos nos cursos de graduação da Universidade de Brasília por

meio do Convênio de Cooperação FUB/FUNAI 001/2004.

Na temática das Ações Afirmativas o autor Sito (2014) analisa dois manifestos

que foram entregues ao Congresso Nacional, no ano de 2006, por intelectuais brasileiros

que se posicionaram publicamente em relação à política de cotas. Na análise, o autor

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mostra que o conceito de “ações afirmativas” se mostrou em disputa: de um lado, é

tomado como uma medida racialista e desigual; de outro, é entendido como uma medida

de desconstrução do racismo.

Após a revisão e exaustiva leitura dos artigos, observa-se que a grande maioria

das publicações está centrada na temática do negro, cota racial para negros, racismo e

preconceito. Dentro da temática das políticas públicas de Ações Afirmativas no ensino

superior a maioria dos estudos se centram nos negros.

As leituras nos apontam que ainda são parcas as publicações específicas sobre

Ações Afirmativas para indígenas na educação superior. No entanto, mesmo com uma

visão em alguns momentos periférica e específica de algumas IES e grupos indígenas do

país, os estudos me permitiram aproximações significativas com a temática.

1.2 Por onde caminhamos?

O presente estudo se configura como descritivo e analítico, aplicando-se a

análise documental e bibliográfica de um caso concreto. Assume uma perspectiva

político-cultural e possui caráter qualitativo. Caracteriza-se como um estudo de caso,

numa perspectiva político organizacional, ou seja, o interesse do pesquisador recai

sobre a vida de uma instituição (GIL, 2006).

Um estudo de caso consiste na triangulação de pessoas, eventos e circunstâncias. Apresentando em forma de história um tema relacionado a uma política pública acompanhada por informações contextuais e de fundo. É uma forma estruturada para compartilhar experiências, revelar desafios e oportunidades com as quais uma organização se depara e comunica lições aprendidas e práticas pioneiras que podem auxiliar outras em situações similares (GRAHAM, 2010, p. 27).

Os princípios éticos atenderam às exigências da Resolução 196/1996 e da

Resolução nº 304/2000 (BRASIL, 2002). Esta resolução incorpora:

Sob a ótica do indivíduo e das coletividades os quatro referenciais básicos da bioética: autonomia, não maleficência, beneficência e justiça, entre outros, e visa assegurar os direitos e deveres que dizem respeito à comunidade científica, aos sujeitos da pesquisa e ao Estado (BRASIL, 2002, p. 1).

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A pesquisa somente ocorreu após autorização da Universidade Estadual de Mato

Grosso do Sul, consubstanciado no parecer favorável do Comitê de Ética em Pesquisa

da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul sob número 814.869/ 2014 (ANEXO

7), bem como do consentimento e assinatura do entrevistado do Termo de

Consentimento Livre Esclarecido (APÊNDICE 1).

Inicialmente foi realizada busca dos textos e legislações institucionais que

contemplassem a política de Ações Afirmativas da Universidade Estadual de Mato

Grosso do Sul, com o intuito de nos aproximarmos dos documentos oficiais que

abordassem a temática. A análise documental favorece a observação do processo de

maturação ou de evolução de indivíduos, grupos, conceitos, conhecimentos,

comportamentos, mentalidades, práticas, entre outros (CELLARD, 2008).

Dessa forma, a análise documental apoiou-se em documentos tais como:

Ø Lei Estadual Nº 2.589, de 26 de dezembro de 2002 (ANEXO 1);

Ø Lei Estadual nº 2.605, de 6 de janeiro de 2003 (ANEXO 2);

Ø Resolução COUNI-UEMS nº 241, de 17 de julho de 2003 (ANEXO 3);

Ø Resolução COUNI-UEMS nº 250, de 31 de julho de 2003 (ANEXO 4);

Ø Resolução CEPE-UEMS nº 430, de 30 de julho de 2004 (ANEXO 5);

Ø Resolução COUNI-UEMS nº 437, de 11 de Junho de 2014 (ANEXO 6);

Ø Relatório Físico Financeiro ano 2014-2018;

Ø Projeto de Desenvolvimento Institucional (PDI) 2012- 2014.

Optou-se por analisar a implementação de políticas de Ações Afirmativas para

indígenas na UEMS por meio do modelo empírico utilizado pela equipe do Núcleo de

Estudos em Políticas Públicas da Unicamp (NEEP/Unicamp) (1995) apud Rus Perez

(2010, p. 71), que inclui as seguintes dimensões:

Primeira dimensão: Trata das relações entre o desenho ou a formulação da política, de um lado, e o formato que os programas adquirem no final do processo, de outro;

Segunda dimensão: A dimensão temporal do processo e seus efeitos diferenciados no tempo sobre a organização em que se processam, sobre os atores que implementam (resistências e adesões) e as modificações das condições iniciais;

Terceira dimensão: Refere-se às condições que propiciam ou entravam o processo de implementação.

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Utilizaram-se como descrição de “implementadores” da política de Ação

Afirmativa os funcionários da IES que cumprem ou cumpriram funções administrativas

e pedagógicas. Entre eles: coordenador de curso no momento, membros da Comissão de

Acompanhamento dos acadêmicos indígenas e Pró-Reitores de ensino e extensão.

Para nos aproximarmos das percepções dos implementadores, optou-se pela

entrevista e utilizou-se como instrumento de coleta de informações o roteiro

semiestruturado (APÊNDICE 2). Segundo Minayo, a entrevista (2010)

[...] é utilizada como fonte de informação, fornece dados secundários e primários, referentes a fatos, ideias, crenças, maneira de pensar, opiniões, sentimentos, maneiras de sentir, maneiras de atuar, conduta ou comportamento presente ou futuro, razões conscientes ou inconscientes de determinadas crenças, sentimentos, maneira de atuar ou comportamentos (p.262).

Após contato pessoal e explanação dos objetivos da pesquisa, as entrevistas

foram agendadas, gravadas e transcritas na íntegra, com a utilização de gravador iPad e

armazenadas em Drive.

Os discursos produzidos a partir das entrevistas foram analisados à luz da

Educação Crítica, utilizando como referência autores como Henry Giroux (1992, 1997,

2003), Luis Armando Gandin (2002), Michael Apple (2006, 2008, 2011) e João

Paraskeva (2001, 2002, 2005). Dentro da perspectiva da educação como prática social,

foram realizadas aproximações e buscou-se compreender a maneira como as políticas de

Ações Afirmativas foram implementadas na IES, a partir do olhar dos coordenadores,

professores, membros da comissão de acompanhamento de alunos cotistas e Pró-

Reitores.

A Educação Crítica, na corrente do pensamento crítico, traz à tona a reflexão sobre o caráter político da educação, desvelando referenciais epistemológicos, filosóficos, políticos e pedagógicos que orientam as práticas sociais e que, por isso, não são referenciais neutros e, consequentemente, tais práticas também não são neutras (SILVA, 2011, p.8)

Apple et al (2011) em sua obra “Educação crítica: análise internacional”

afirmam que estudos educacionais críticos envolvem muito mais do que a

problematização das relações de poder e das desigualdades sociais, pressupõem um

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enfrentamento radical dessas questões, o que estabelece um compromisso individual

(político) com a transformação social.

Nessa ótica, ao desenvolver estudos sobre instituições de ensino, Apple (2006)

reitera que “as escolas têm uma história e estão conectadas, por meio de suas práticas

diárias, a outras instituições poderosas de um modo frequentemente oculto e complexo

(p.102)”. Portanto, “[...] a história e essas conexões precisam ser entendidas para que

saibamos das reais possibilidades de nossas ações sobre as escolas (p.102)”.

As escolas, nesse sentido, são esferas democráticas, portanto, é imperativo

entender os papéis contraditórios que os intelectuais transformadores (os educadores)

ocupam nos vários níveis do sistema escolar (GIROUX, 1992, p. 39).

Enquanto intelectual transformador, os pesquisadores podem desvelar as formas

tanto positivas quanto negativas, do funcionamento do poder na escola; nesse sentido o

poder é

[...] considerado como uma força dialética, cujo modo de operação não são apenas repressivos. Em outras palavras, a dominação nunca é tão complexa que o poder seja experienciado exclusivamente como uma força negativa. Ao contrário, o poder é a base de todas as formas de comportamento, por meio das quais as pessoas resistem e lutam por sua concepção de um mundo melhor (GIROUX, 1992, p. 39).

Dessa forma, Giroux nos recomenda que é essencial compreender as formas

contraditórias que o poder assume ao se manifestar na escola.

Nos primeiros momentos de agendamento e contatos nos diversos setores da

universidade para a realização das entrevistas, algumas resistências e conflitos

apareceram, esbarrei em questionamentos sobre as mudanças ocorridas no setor de

apoio ao estudante da atual administração. Além de dificuldades de agendar horários

para as entrevistas devido agenda de compromissos dos entrevistados.

Também é importante esclarecer que, mesmo com todos os cuidados no que se

refere aos aspectos éticos, há sempre que se considerar e se reconhecer que nenhuma

pesquisa é neutra. Minhas inquietações permearam os cenários e questionamentos,

imbricados pela minha experiência e vivência pessoal. Os paradigmas do pesquisador se

mesclam na pesquisa, sempre guiada por seu conjunto de pensamentos, crenças em

relação ao “outro” e ao “mundo”.

O período do estudo compreendeu os anos de 2003 a 2014, período posterior à

data da publicação da Lei de cotas para negros e índios na IES estudada e também

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período do governo no qual se dá a ampliação das políticas de Ações Afirmativas na

educação superior no Brasil.

1.3 O cenário e os sujeitos da pesquisa

A pesquisa foi realizada na Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul, com

sede administrativa no município de Dourados, localizada à rodovia Dourados-Itahum,

Km 12, Cidade Universitária de Dourados, Caixa Postal 351 e nas unidades

universitárias localizadas nas cidades de Aquidauana, Amambai, Campo Grande e

Maracaju.

Inicialmente, os questionamentos sobre os sujeitos da pesquisa centraram-se em

identificar quais foram e são os sujeitos que participaram ou participam da

implementação das políticas de Ações Afirmativas na UEMS e também quais os cursos

que agregam o maior número de acadêmicos indígenas.

A partir da estrutura administrativa e também do processo histórico da UEMS no

decorrer da última década, foi considerado relevante incluir sujeitos com mais de 10

anos na IES, que estiveram ou estão no cargo de Pró-Reitor de Extensão e Assuntos

Comunitários, Pró-Reitor de Ensino, Membros da Comissão de Acompanhamento das

Ações Afirmativas e também coordenadores de cursos com maior número de

acadêmicos indígenas.

Conforme verificado junto à Secretaria Acadêmica da IES, a Universidade

Estadual de Mato Grosso do Sul conta com 56 cursos de graduação, sendo 39 com

presença de acadêmicos indígenas, conforme se observa no Quadro 4, a seguir.Do total

de 39 cursos com presença de acadêmicos indígenas, foram incluídos na pesquisa os

respectivos coordenadores de cursos com 10 alunos ou mais regularmente matriculados:

• Direito - Município sede Dourados;

• Letras, habilitação português/espanhol e suas literaturas - Município sede

Campo Grande;

• Enfermagem- Município sede Dourados;

• Engenharia Florestal - Município sede Aquidauana;

• Geografia - Município sede Campo Grande;

• História - Município sede Amambai;

• Licenciatura em Letras - Município sede Dourados;

• Pedagogia - Município sede Campo Grande;

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• Pedagogia - Município sede Maracaju;

• Pedagogia - Município sede Dourados;

• Zootecnia - Município sede Aquidauana.

Além dos Coordenadores de Cursos, foram incluídos na pesquisa membros da

comissão de acompanhamento de alunos indígenas, bem como professores que se

encontravam e se encontram nos cargos de Pró-Reitor de Ensino e Extensão e Assuntos

Comunitários.

Para preservar a identidade dos sujeitos da pesquisa foram utilizados codinomes,

cujo critério de escolha foram cargos e funções ocupadas durante o processo de

implementação das Ações Afirmativas na IES pesquisada, bem como os cargos e

funções ocupadas durante a fase da coleta de dados. Assim, foram descritos como:

Membro da Comissão de Acompanhamento de Alunos Cotistas: MCAAC 1; Ocupou

cargos de Pró-Reitorias (OCPR); Coordenadores de Curso (CC); Pró- Reitor (PR) PR;

Ocupou cargo de Coordenador (OCC).

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Quadro 4: Cursos com maior número de acadêmicos indígenas matriculados e da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul – Ano 2013.

Curso / Sede do Curso Quantidade de Alunos indígenas

Administração (Maracaju) 8 Agronomia (Aquidauana) 8 Artes Cênicas e Dança (Campo Grande) 8 Ciências Biológicas (Dourados) 8 Ciências Sociais (Amambai) 9 Direito(Dourados) 17 Letras, habilitação português/espanhol e suas literaturas (Campo Grande) 14 Enfermagem (Dourados) 11 Engenharia Florestal (Aquidauana) 11 Geografia (Campo Grande) 10 História (Amambai) 16 Letras, habilitação português/inglês e suas literaturas (Campo Grande) 9 Licenciatura em Letras (Dourados) 23 Licenciatura em Letras (Jardim) 6 Pedagogia (Campo Grande) 10 Pedagogia (Maracaju) 17 Pedagogia (Dourados) 10 Sistema de informação (Dourados) 8 Tecnologia em Agroecologia (Glória deDourados) 6 Tecnologia em Produção Sucroalcooleira (Glória deDourados) 6 Turismo (Campo Grande) 6 Zootecnia (Aquidauana) 10

Fonte: Elaborado pela autora a partir dos dados da pró – reitoria de extensão e assuntos comunitários (UEMS, 2013).

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CAPÍTULO II MARCO DE ANÁLISE DE IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS

PÚBLICAS

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CAPÍTULO II – MARCO DE ANÁLISE DE IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS

2.1 Apresentação “Notei que descobrir novos lados de uma palavra era o mesmo que descobrir novos lados do Ser.”

(BAKHTINE, 1970, p. 263)

Deleuze recomenda-nos a não mais adotar o pensamento de um filósofo e/ou

cientista como doutrina, mas tomá-lo como uma máquina conceitual construída para

resolver problemas que enfrentamos e façam sentido aos pesquisadores

(FEUERWERKER, 2014, p. 18).

Neste aspecto, nos apoiaremos em marcos teóricos selecionados descritos a

seguir, considerando que os mesmos são importantes para uma análise das políticas de

ações afirmativas, pois permitem uma reflexão sobre a própria lei e os dispositivos que

esta tem para o alcance de seus objetivos, bem como os desdobramentos que se dão

junto ao processo político, correlacionando aspectos da macropolítica com a

micropolítica.

Nessa perspectiva, para este estudo de análise de políticas públicas nos

ampararemos em pesquisadores brasileiros das ciências políticas e educacionais que

dialogam com teóricos internacionais e, em suas pesquisas, fazem a conexão com a

realidade brasileira. Entre eles destacamos: Azevedo (1997), Marques (1997), Frey

(2000), Muller & Surel (2002), Silva e Melo (2006), Souza (2006), Arretche (2007),

Costa e Alves (2009), Rus Perez (2007, 2010), Gomes (2012).Também nos apoiaremos

em pesquisadores internacionais como: Bobbio, Matteucci & Pasquino (1992), Van

Meter e Van Horn (1996), Sabatier & Mazmanian (1996), Aguilar Villanueva (1996 a e

b), Berman (1996), Elder e Cobb (1996), Dror (2003), Garson (2003).

2.2Análise de Políticas Públicas

Partimos do conceito de que a análise de políticas públicas pode ser definida

como “exame da engenharia institucional e dos traços constitutivos de um programa.

Busca reconstituir suas diversas características, apreendê-las de forma coerente e

compreensível”(ARRETCHE, 2007, p. 30).

Para iniciarmos essa discussão, é necessário nos aproximarmos dos conceitos

teóricos de política pública, definida como “tudo o que o governo decide fazer ou não

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fazer”, sendo um constructo social (conjunto de medidas a se atingir), mas também um

constructo de pesquisa (trabalho de análise e reconstrução dos objetivos da ação

pública) (MULLER & SUREL, 2002).

Nas palavras de Azevedo (1997), política pública corresponde ao “Estado em

ação”, e pode ser determinada a partir de uma situação expressa pela sociedade, ao qual

exige atuação do Estado. Configurando dessa forma, a articulação entre estado e

sociedade.

As aproximações da definição de política na literatura são de dois tipos:

descritiva e teórica:

Na construção da definição descritiva, o debate centra-se em saber se a política é só nem sobretudo a decisão (do governo) ou implica algo mais. Na construção teórica, as posições variam de acordo com a teoria de ciência política maior que adere ou como pressupostos básicos com os quais as ocorrências da política são explicadas (AGUILAR VILLANUEVA, 1996a, p. 21)4.

Apoiamo-nos nas contribuições de pesquisadores como Wildavsky, que propõe

que “a análise deve ser um esforço sistemático para encontrar um equilíbrio entre o

mundo rigoroso e pensativo de teoria [...] e o mundo mais desordenado e espontâneo da

ação social e do processo político”5. Dessa forma, entende-se a política como um curso

de ação integrada por decisões interdependentes e complementares (AGUILAR

VILLANUEVA, 1996b, p.78, p.18).

Neste sentido,

Há que se elaborar uma análise que pode ser convincente para aqueles que estão interessados em resolver um problema, mas não porque ela foi feita para atender os desejos, preconceitos e gostos dos autores ou dos governantes. É uma atividade de educação pública convincente, que contraria erros e desvios de decisões públicas passadas induz mudanças nos desejos e percepções, expectativas e instrumentos de cidadania e governo. Portanto, uma análise que pode transformar as relações sociais, instituições, padrões culturais (AGUILAR VILLANUEVA, 1996a, p. 83)6.

4 Tradução da autora. 5 Tradução da autora. 6 Tradução da autora.

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Com o objetivo de promover aproximações teóricas entre as análises de políticas

públicas, a seguir serão apresentados de forma sintética a contextualização dos

principais conceitos, primeiros estudos e os pesquisadores da temática.

O termo política deriva do adjetivo grego polis (politikos) e diz respeito a tudo o

que se refere à cidade, ao público, ao civil e, inclusive, ao que é sociável e social

(BOBBIO, MATTEUCCI & PASQUINO, 1992). Os verbetes trazidos pelo dicionário

online Aurélio esclarecem que a política é “Ciência do governo dos povos”, “Direção de

um Estado e determinação das formas de sua organização”, “Conjunto dos negócios de

Estado”, maneira de os “conduzir”, “Maneira hábil de agir; astúcia; civilidade”,

“Ciência política, ramo das ciências sociais que trata do governo e da organização dos

Estados” .

Muller e Surel (2002) definem política pública como “tudo o que o governo

decide fazer ou não fazer”, sendo um constructo social (conjunto de medidas a se

atingir), mas também um constructo de pesquisa (trabalho de análise e reconstrução dos

objetivos da ação pública). Nas palavras de Azevedo (1997), trata-se do “Estado em

ação”, e pode ser determinada a partir de uma situação expressa pela sociedade, a qual

exige atuação do Estado. Configurando dessa forma a articulação entre Estado e

sociedade.

O autor Aguilar Villanueva (1996a) afirma que as aproximações da definição de

política na literatura são de dois tipos, descritiva e teórica:

Na construção da definição descritiva, o debate centra-se em saber se a política é só nem sobretudo a decisão (do governo) ou implica algo mais. Na construção teórica, as posições variam de acordo com a teoria de ciência política maior que adere ou como pressupostos básicos com os quais a ocorrência da política explicada (p. 21)7.

No que se refere aos aspectos históricos, os primeiros estudos sistemáticos de

análise de políticas públicas se deram nos Estados Unidos, por volta dos anos 1950, e

posteriormente nos anos 1970, na Europa. São considerados como fundadores os

autores H. Lasswell, H. Simon, C. Lindblom e D. Easton (SOUZA, 2006).

Já no Brasil, os estudos são mais recentes, a partir da década de 90, e voltados

para a implementação das políticas. Rus Perez (2010, p. 2) afirma que os fatores que

contribuíram para esse cenário podem estar relacionados:

7 Tradução da autora.

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A consolidação democrática, o ajuste econômico e consequente redução dos recursos para a área social, as maiores exigências impostas pelos órgãos financiadores, especialmente internacionais, em relação ao controle de gastos e resultados etc. Uma dinâmica de racionalização, que incluiu a observância dos critérios de eficácia, efetividade e eficiência na utilização dos recursos financeiros, e uma preocupação crescente com ccountability passaram a envolver a gestão pública brasileira (RUS PEREZ, 2010, p. 2).

Harold D. Lasswell, considerado fundador da ciência política, afirma que as

ciências políticas devem tratar dos problemas fundamentais do homem em sociedade,

numa perspectiva global, enfatizava o contexto histórico da política, o estudo das

mudanças, difusão, invenção e revolução. Em sua obra The Policy Sciences (1951) o

autor inseriu problemas e conflitos sociais, e se preocupou com as dificuldades

metodológicas sobre políticas, sem descuidar dos fatores contextuais. Trouxe inovações

paradigmáticas como a ruptura das fronteiras tradicionais entre ciências sociais e as

ciências administrativas, a dimensão histórica das ciências políticas e o compromisso

com o conhecimento tácito e da experiência vivida (DROR, 2003; GARSON, 2003).

Frey (2000) afirma que a ciência política diferencia políticas em três dimensões,

observando que tais dimensões são entrelaçadas e mutuamente influenciadas, aspectos

importantes para a policy analysis:

• A dimensão institucional – polity (sistema jurídico e estrutura

institucional);

• No quadro processual – politics (processo político);

• A dimensão material – policy (conteúdos concretos, ou seja, o conteúdo

material das decisões políticas).

Nesse enfoque o autor reforça que é importante que as policy analysis sejam

inovadoras e incluam dimensões do conteúdo, do processo e da estrutura, com

abordagens combinadas com categorias de abordagens que atendam às especificidades

do Brasil.

Em relação à formação de agenda, Elder e Cobb, em Aguilar Villanueva (1996b,

p. 77), definem que é “O processo através do qual determinados problemas ou questões

chamam a atenção séria e ativa do governo como potenciais questões de política

pública”8. O autor Aguilar Villanueva (1996b, p. 24) indaga: “O que realmente faz uma

questão social e emissão pública circunscrita torna-se temas da agenda do governo?”9.

8 Tradução da autora. 9 Tradução da autora.

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Os autores chamam a atenção para o papel dos atores nesse processo: “A arena

pública não é um campo em que todo o jogo tem as mesmas regras; alguns têm mais

acesso do que os outros e também exercem maior poder de moldar a definição de

problemas públicos”10 (GUSFIELD, 1981 apud ELDER; COBB, 1996, p. 84).

A perspectiva neoinstitucionalista11reconhece que o Estado, assim como as

demais instituições, “influenciam diretamente a cultura política, a estratégia dos atores e

a produção da própria agenda de questões a ser objeto de políticas, enquadrando a luta

política através das suas instituições” (MARQUES, 1997, p. 81).

O aumento de demanda por este ou aquele tema, ou seja, o fato de um tema ou

uma questão entrar na pauta da agenda de governo é determinado por vários fatores,

entre eles o impacto na sociedade envolvida no tema e os movimentos sociais

envolvidos. A presença de certos atores em posições estratégicas parece ser, de fato,

essencial para influenciar a definição da agenda e mesmo apontar tendências de ação do

governo.

Desta forma, a formação da agenda determina ou permite compreender que as

tomadas de decisão dependem de uma conjuntura política que dê subsídio para que as

políticas sejam elaboradas (COSTA; ALVES, 2009, p. 2).

O início de toda e qualquer política pública atravessa um momento inaugural,

uma etapa de representação de uma perspectiva que se abre à sociedade, denominada

implantação. Depois dessa etapa inaugural, ganha destaque a capacidade política de

execução de um plano, a estruturação de um projeto que leve à sua prática por meio de

providências concretas; essa etapa é denominada implementação (GOMES, 2012, p.

26).

10 Tradução da autora. 11 Para Frey (2000), o neoinstitucionalismo remete não somente às limitações de racionalidade do processo de decisão como consequência de uma falta ou de um excesso de informações , mas salienta a existência de regras gerais e entendimentos fundamentais que prevalecem em cada sociedade e que exerceriam uma influência decisiva sobre as interpretações e o próprio agir das pessoas. Isso significa que os atores políticos e sociais agem não somente de acordo com os seus interesses pessoais.

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2.3Análise de implementação de políticas públicas

A implementação de políticas públicas apresenta várias definições na literatura,

entre elas:

“[...] A implementação de políticas que abrange as ações realizadas por indivíduos (ou grupos), públicas e privadas, com vista a atingir os objetivos previamente determinados”12 (VAN METER e VAN HORN, 1996, p. 99).

“[...] A implementação está em conformidade com a decisão da autoridade .... A análise de implementação é o estudo das condições em que as decisões da autoridade efetivamente levar aos resultados desejados13” (BERMAN, 1996, p.285-286).

Nesse enfoque, o estudo da implementação tem como objetivo investigar como

as organizações/empresas/serviços públicos ou uma política combinam recursos

humanos e materiais, como são envolvidos e motivados os implementadores e a

capacidade de os objetivos propostos serem executados.

Ou seja, “o estudo de implementação examina os fatores que contribuem para

que se realizem ou não os objetivos da política” (VAN METER e VAN HORN, 1996, p.

100)14:

De forma geral, uma investigação sobre a implementação [...] pretende estabelecer se uma organização é capaz de conjuntar recursos humanos e materiais em uma unidade organizativa coerente e se pode motivar os operadores de maneira tal, que sejam capazes de levar a cabo os objetivos explícitos de uma organização (WILIANS, 1971, apud VAN METER e HORN, 1996,p. 100).

A fase de implementação não começa até depois que as decisões prévias tenham

sido estabelecidas (ou identificadas), bem como os objetivos e as metas. Ainda citando

os autores acima, afirma-se que há uma clara distinção entre a implementação da

política, a execução ou desempenho, e o que geralmente se denomina impacto da

política. De um lado, o estudo do impacto se ocupa das consequências das decisões

políticas, de outro, o estudo da implementação destaca as forças que vão determinar o

impacto das políticas.

12 Tradução da autora. 13 Tradução da autora. 14 Tradução da autora.

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Portanto, analisar a implementação da política tem a perspectiva de dar subsídios

para promover as modificações necessárias para que o problema desencadeador da ação

governamental seja de fato solucionado na sua totalidade ou parcialmente, como é mais

provável de acontecer. Como mecanismos dessa análise são propostos esquemas

teóricos, marcos conceituais que balizem ou mesmo conduzam o olhar do avaliador.

Em relação às pesquisas na área de implementação de políticas públicas, na

atualidade ainda são escassas as pesquisas que tratam dessa temática. Alguns dos fatores

que podem contribuir com este cenário são a ingenuidade de alguns legisladores em

considerar que uma vez estabelecida uma lei os membros e instituições irão acatá-la; o

fato de que a maioria dos analistas políticos da década de 1960 ignoravam os problemas

da implementação, concentrando os estudos na análise das decisões da cúpula do

governo; e a dificuldade de se estabelecer um marco teórico de análise da

implementação (VAN METER e VAN HORN, 1996).

Na década de 1960, os estudos de implementação de políticas se centravam em

programas específicos de educação, planejamento urbano, criação de empregos, direitos

civis, qualidade ambiental e serviços de saúde (SABATIER & MAZMANIAN, 1996).

Os estudos sobre implementação de políticas públicas abarcam várias áreas de

conhecimento, entre elas as ciências sociais, a administração pública, a psicologia social

e a ciência política. Com a influência dessas áreas, os estudos se apresentam dentro das

seguintes categorias:

i) Na teoria da organização: mais especificamente em trabalhos sobre o controle

e as mudanças das organizações (enfocando a inovação);

ii) No impacto das políticas públicas, particularmente nas decisões judiciais;

iii) Em estudos seletos sobre relações intergovernamentais (VAN METER &

VAN HORN, 1996).

Van Meter e Van Horn (1996) destacam publicações importantes que abordam a

implementação de políticas: Kaufman (1960) desenvolveu pesquisa sobre o serviço

florestal nos Estados Unidos, Bailey e Mosher (1968) examinaram a administração da

Lei de Educação elementar e secundária, Derthick (1970) analisou os programas

federais de subvenção de fundos, Gross et al (1971) investigaram a inovação planejada

das organizações, Berke e Kirst (1972) investigaram o apoio federal aos programas

educativos, Derthick (1972) pesquisou sobre a intenção da administração Johnson de

criar terrenos em áreas metropolitanas na cidade de Oakland. Apesar das grandes

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contribuições dos estudos citados, estes ainda são limitados, pois há uma carência de

uma perspectiva teórica mais consistente.

Sabatier & Mazmanian (1996) afirmam que a função da análise da

implementação consiste na identificação dos fatores que levam ao alcance dos objetivos

normativos ao longo do processo. Tais fatores podem se dividir em três categorias de

variáveis independentes:

Tratabilidade do ou dos problemas aos quais se dirige uma lei - cada problema

tem soluções possíveis diferentes que podem ser mais ou menos complexas do que

outras;

Capacidade da lei para estruturar o processo de implementação da política – a

estruturação se dá por meio da seleção das instituições responsáveis, da influência sobre

funcionários e mediante a regulação das oportunidades de participação dos atores.

Efeito das diversas variáveis políticas no apoio aos objetivos legais – os

resultados da implementação são efeitos da interação entre a estrutura legal e o processo

político.

Sabatier & Mazmanian (1996) apontam algumas pesquisas desenvolvidas que se

aproximam da integração conceitual descrita anteriormente, entre eles os autores Rein e

Rabinovitz, que examinaram o processo de implementação colocando em prática os

imperativos de respeito à intenção da lei, a preocupação com os empregados e a

expectativa com a ação. Abordaram a implementação na perspectiva do comportamento

estratégico dos diversos autores: Berman enfatiza os ajustes que exigem os programas à

medida que se abrem às organizações locais de prestação de serviços; Bardach já

oferece uma perspectiva diferente ao enfocar os obstáculos que o programa pode

enfrentar na realização dos objetivos normativos; Van Meter e Van Horn oferecem um

modelo sistêmico do processo de implementação, atentando aos fatores que

condicionam o desempenho do programa, entre eles os critérios que regem as políticas e

os recursos, o apoio político, as condições econômicas e sociais, as características das

agências encarregadas da implementação, a comunicação entre as agências e as decisões

políticas dos funcionários responsáveis pela implementação.

Sabatier & Mazmanian (1996) consideram que os estudos acima citados trazem

suas contribuições, contudo, destacam três pontos importantes de crítica: primeiro, é

preciso haver esforços adicionais para contextualizar e explorar empiricamente a

vinculação entre o comportamento individual e o contexto político, econômico e legal

da ação; segundo, destacam que os estudos subestimam a capacidade da lei de estruturar

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o processo de implementação; e terceiro, que nenhum deles trata da tractability

(tratabilidade) dos problemas. No que se refere à tratabilidade, os autores questionam

por que algumas políticas são mais fáceis de se implementar e outras não, especialmente

aquelas relacionadas a direitos civis.

Destaca-se que na análise empírica de políticas públicas, o cenário é carregado

de incertezas que se manifestam em vários níveis, entre elas, a dificuldade cognitiva

sobre os fenômenos os quais se intervém, a ausência de controle dos formuladores e a

impossibilidade de prever os desdobramentos da proposta, o amplo espaço de

discricionariedade dos agentes implementadores e as influências políticas que podem

minar a racionalidade técnica dos planos e programas (SILVA & MELO, 2006).

Rus Perez (2010), em seu artigo “Por que pesquisar implementação de políticas

educacionais atualmente?”, distingue as fases da política em agenda, formulação,

implementação e avaliação, e afirma também que os estudos de implementação se

tornaram ferramentas imprescindíveis para governos elaborarem políticas públicas.

Ainda nas palavras de Rus Perez (2007, p. 65), pesquisador do Núcleo de

Estudos de Políticas Públicas da Universidade Estadual de Campinas (NEPP/Unicamp),

o estudo da avaliação do processo de implementação é uma subárea específica de

pesquisa de avaliação de política que, dentre outras, inclui a avaliação de processo.

A eficiência da implementação de uma política pública está relacionada à

comunicação entre as organizações e as atividades de indução, às características da

entidade responsável pela execução, às condições sociais, políticas e econômicas, bem

como ao padrão e aos objetivos propostos pela política e aos recursos financeiros e

humanos necessários. Essas relações podem ser observadas no modelo sugerido por Van

Meter e Van Horn (1996, p. 118), conforme se observa na Figura 1 a seguir:

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Figura 1: Modelo do processo de implementação das políticas

Fonte: Van Meter e Van Horn, 1996, p.

Portanto, a partir dessa multiplicidade de fatores, é importante que no estudo do

processo de implementação se esteja atento a essas características, que a análise seja

feita por um período de tempo significativo, bem como que se estabeleçam claramente

quais atores são importantes para compreendê-lo.

No Brasil, o Núcleo de Estudos em Políticas Públicas da Unicamp

(NEEP/Unicamp), coordenado pelo pesquisador Rus Perez (2010, p. 71), tem focado

nos estudos de implementação, especialmente no que se refere às:

Relações entre o desenho ou a formulação da política, de um lado, e o formato que os programas adquirem no final do processo, de outro;

Dimensão temporal do processo e seus efeitos diferenciados no tempo sobre a organização em que se processam, sobre os atores que implementam (resistências e adesões) e as modificações das condições iniciais;

Condições que propiciam ou entravam o processo de implementação.

O modelo desenvolvido pela equipe do NEPP baseou-se em obras literárias,

pesquisa e insights envolvendo o processo de implementação. Esse modelo especifica as

relações entre o desenho da política e o formato que os programas adquirem no final do

processo, levando em consideração a dimensão temporal e as condições que propiciam

ou entravam o processo de implementação (RUS PEREZ, 2010).

Os autores Sabatier & Mazmanian (1996) afirmam que é no âmbito da

implementação que se manifestam as concepções pessoais e profissionais dos

funcionários sobre o deve ser a política pública. Consideram que a função central da

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análise da implementação consiste em identificar os fatores que condiciona, a efetivação

dos objetivos normativos ao longo de todo o processo.

Nesta pesquisa, interessou-nos enfocar o plano da micropolítica e a produção dos

sentidos pelos atores envolvidos nesse processo, ou seja, como se processam as

subjetivações relacionadas à temática estudada, considerando o contexto político e

econômico a partir dos cenários de exclusão racial.

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CAPÍTULO III –

EDUCAÇÃO SUPERIOR: POLÍTICAS PÚBLICAS DE

DEMOCRATIZAÇÃO E ACESSO

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CAPÍTULO III – EDUCAÇÃO SUPERIOR: POLÍTICAS PÚBLICAS DE DEMOCRATIZAÇÃO E ACESSO

3.1 Apresentação

Neste capítulo trataremos inicialmente dos aspectos conceituais e históricos

sobre Ações Afirmativas e a relação com as políticas públicas para a educação superior,

com o foco na democratização e acesso de indígenas, identificando a mobilização dos

movimentos indígenas na luta por uma educação diferenciada e específica, as

interlocuções entre o desenho/formulação e o formato que adquiriram até os dias atuais

no Brasil.

Para realizar estudo sobre a implementação de uma política pública para

educação consideraremos que ela se expressa nos programas governamentais, nos

projetos, nos planos, tanto para a área econômica como social, e estabelecem

determinadas relações entre Estado e sociedade.

Consideramos que,

As políticas sociais se referem a ações que determinam o padrão de proteção social implementado pelo Estado, voltadas, em princípio, para a redistribuição dos benefícios sociais visando à diminuição das desigualdades estruturais produzidas pelo desenvolvimento socioeconômico (HOFLING, 2001, p. 1).

A política educacional, definida como policy – programa de ação –, se produz no

contexto das relações de poder expressas nas politics – política no sentido de

dominação. Educação, nesse sentido, entendida como uma política pública social, uma

política pública de corte social, de responsabilidade do Estado, mas não pensada

somente por seus organismos (AZEVEDO, 1997; HOFLING, 2001).

Nessa mesma lógica, Dias Sobrinho (2010) acrescenta que a educação é um bem

público, direito social e dever do Estado. A sociedade democrática é fundada no

princípio ético da equidade e, portanto, deve assegurar o direito de todos à educação. Na

mesma linha, os autores Jeffrey e Aguilar (2013, p.10) afirmam que políticas

educacionais de Ação Afirmativa não devem, para o caso específico brasileiro, ser

dissociadas das discussões acerca do papel da sociedade civil.

Com base na afirmação que a educação é um bem público, e, portanto, direito de

todos e dever do Estado, é que se pauta a política de Ação Afirmativa, como forma de

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assegurar e garantir que grupos minoritários tenham acesso a bens e serviços até então

não acessados.

3.2 Aproximações: políticas públicas de educação superior, democratização e acesso

As políticas públicas de Ações Afirmativas para a educação superior são aquelas

ações que visam a promover o acesso e a permanência de estratos sociais menos

privilegiados (COSTA & ALVES, 2009).

Para retratar a temática da democratização da educação superior brasileira serão

realizadas abordadas as principais políticas educacionais implementadas no Brasil a

partir dos anos de 1990 até os dias atuais, no contexto das políticas neoliberais.

A escolha desse período está diretamente relacionada à necessidade de

estabelecer de onde partiremos, de delimitarmos o objeto de estudo e compreendermos

os fatores que marcaram o processo de construção histórica e política da temática sob

análise. Para tanto, utilizamos como base teórica os estudos realizados pelos autores

Torres (1995), Oliveira (1999), Dourado (2002), Sguissardi (2002), Luciano (2006),

Michelotto et al (2006), Trevisol et al (2009), Dias Sobrinho (2010), Santos (2010),

Ferreira e Oliveira (2010), Cordeiro (2010), Silva e Real (2011) e Lima (2011).

A década de 1980 foi marcada por uma intensa crise econômica decorrente de

altos índices de inflação e da desestabilização da moeda nacional. Esse cenário

alavancou mobilização intensa dos movimentos sociais reivindicando melhorias em

vários setores, entre eles a educação e a saúde.

Especificamente no caso do Brasil, a eclosão da crise do endividamento nos

anos 1980 criou um espaço para uma ampla transformação do papel do Banco Mundial

(BM) e outros organismos internacionais na regularização da educação brasileira

(DOURADO, 2002). Além do BM, as orientações nas publicações dos organismos

internacionais como a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a

Cultura (UNESCO) e a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico

(OCDE) têm balizado as reformas e transformações na educação e no papel do Estado,

especialmente nos países chamados “em desenvolvimento” (FERREIRA e OLIVEIRA,

2010).

Esse quadro, associado à globalização do capitalismo e sua repercussão nos

países em desenvolvimento, deu início à passagem do modelo de Estado

intervencionista e de Bem Estar para o neoliberal, que atua como “regulador” do

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mercado. A busca pela capacidade tecnológica e domínio do mercado de trabalho

implicou na obtenção de novos espaços e meios de acesso ao conhecimento, e também

em uma nova determinação dos seus objetivos/fins. Como ‘porta de acesso’ ao

conhecimento tecnológico e base da Revolução Industrial, a educação tornou-se

primordial para o capitalismo contemporâneo demandante de um novo tipo de

profissional: “a nova economia reclama por trabalhadores com grande capacidade de

aprender a aprender, capazes de trabalhar em equipe não só de maneira disciplinada,

mas criativa” (TORRES, 1995).

No Brasil, pode-se afirmar que as bases legais e políticas para a expansão da

educação foram a Constituição Federal de 1988 e a lei nº 9.394/1996, a Lei de Diretrizes

e Bases da Educação Nacional (LDB). A Constituição Federal de 1988 é um marco

importante na garantia do direito à educação, que está previsto no Capítulo II, dos

Direitos Sociais, no Art. 6º, que afirma que: “São direitos sociais a educação”. Já o

artigo 205, inserido no Título VII, Capítulo III, Seção I, prevê que:

A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.

A gratuidade da educação está prevista em seu artigo 206, inciso IV, que

estabelece a gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais como um dos

princípios do ensino.

Como se pode observar, a Carta Magna, nas palavras de Oliveira (1999, p.61),

representa um salto qualitativo com relação à legislação anterior, mas temáticas como

acesso e permanência ainda ficaram no plano das promessas.

A Constituição Federal de 1988 refere-se à privatização do ensino em seus

artigos 209 e 213: “O ensino é livre à iniciativa privada, atendidas as seguintes

condições: cumprimento das normas gerais da educação nacional; autorização e

avaliação de qualidade pelo Poder Público”.

E, em seu artigo 213, a Constituição abre a possibilidade de destinar recursos

públicos:

[...] às escolas públicas, podendo ser dirigidos a escolas comunitárias, confessionais ou filantrópicas, definidas em lei, que: comprovem finalidade não lucrativa e apliquem seus excedentes financeiros em educação; assegurem a destinação de seu patrimônio a outra escola

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comunitária, filantrópica ou confessional, ou ao Poder Público, no caso de encerramento de suas atividades (BRASIL, 1988, p. 125).

Portanto, podemos afirmar que no Brasil, as bases legais e políticas para a

expansão da educação foram a Constituição Federal de 1988 e a lei nº 9.394/1996, a Lei

de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB).

O processo de indução de expansão e democratização da educação superior no

país se dá por dois movimentos:

Um promovido pelas políticas públicas que vem contribuindo para a expansão tanto das instituições públicas, e o outro que é o próprio mercado, que vem induzindo a expansão das instituições privadas por meio de processo de “oligopolização” (SILVA & REAL, 2011, p. 152).

A democratização da educação superior entrou fortemente na agenda dos

governos nas últimas décadas, porém, não escondeu seus fundamentos marcadamente

mercantilistas, restringindo a educação em função da economia (DIAS SOBRINHO,

2010, p. 1231).

Portanto, as políticas educacionais devem ser entendidas à luz dos

acontecimentos históricos no país e as influências internacionais. O processo de

mundialização, acumulação de capital e a reconfiguração do papel dos Estados e das

políticas públicas vêm impactando, nas últimas décadas, fortemente as universidades

públicas. Trata-se de uma reconfiguração do papel do Estado ou, como afirmam

Trevisol et al (2009), de uma nova articulação entre o princípio do Estado e do

mercado, conferindo ao Estado outros papéis, ajustados aos interesses globais.

Nas palavras de Boaventura de Sousa Santos (2010), a universidade entrou em

crise, apesar de que a crise já se instalava há cerca de duas décadas, mas se evidenciou

na década de 1990, movida por inúmeros fatores. Nesse sentido, a globalização e o

neoliberalismo, modelo global do capitalismo, induziram à perda de prioridade das

políticas sociais de educação, saúde e previdência.

A globalização e o neoliberalismo são fatores e acontecimentos que podem ser

considerados desencadeadores da mudança do conceito de Estado e de suas funções,

chamada por alguns autores de reforma do Estado.

A defesa ideológica dessa reforma é implementada pelo discurso de modernização e racionalização do Estado, objetivando, desse modo, a superação das mazelas do mundo contemporâneo (desemprego,

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hiperinflação, redução do crescimento econômico, entre outros) e a adaptação às demandas pelo processo de globalização em curso (DOURADO, 2002, p. 235).

Gramsci (2004) afirma que o Estado, em sentido amplo, comporta duas esferas

principais, a primeira, o Estado em sentido estrito, formada pelo conjunto dos

mecanismos por meio dos quais a classe dominante detém o monopólio legal do

controle e da execução das leis (burocracia executiva, polícia, forças militares). A

segunda esfera é formada pela sociedade civil e organizações responsáveis pela

elaboração e difusão de concepções de mundo e ideologias.

A década de 1990 foi marcada pela chamada modernização conservadora e

também pela inserção subalterna do país na economia global, iniciadas pelo governo de

Fernando Collor de Mello (1990-1991) e seguidas por Itamar Franco (1992-1994)

(SGUISSARDI, 2002).

Nessa mesma lógica no discurso e na defesa ideológica de reforma, de

modernização e racionalização do Estado, o governo de Fernando Henrique Cardoso

(FHC) (de 1995 a 2002) reforça e propõe o enxugamento da máquina estatal e a

privatização de bens e serviços. Na lógica do Estado moderno, os serviços como a

saúde, educação e a cultura fazem parte dos serviços não exclusivos, ou seja, o Estado

provê, mas também podem ser executados pelo setor privado (DOURADO, 2002).

Para Dourado (2002), é particularmente notável a condição do Brasil como “fiel

depositário” das prescrições internacionais.

As recomendações do Banco Mundial (BM) para a educação superior, contidas

no documento La enseñanza superior: Las lecciones derivadas de la experiencia

(publicado em 1994),destacam: a privatização da educação superior, estímulo à

implementação de novas formas de regulação e gestão, aplicação de recursos públicos

nas instituições privadas, eliminação de gasto com políticas compensatórias e

diversificação (DOURADO, 2002).

Após extenso debate, em 1996, foi aprovada a lei nº 9.394/1996, de Diretrizes e

Bases da Educação Nacional (LDB), na qual se detalharam as atribuições de autonomia

para as universidades. Porém, a lei não explicitava a origem dos recursos para expansão,

somente anunciava: “a estas fica garantida a decisão de criar cursos, aumentar suas

vagas e estruturar-se em mais de uma unidade ou campus, além de elaborar seus

orçamentos anuais e plurianuais” (SILVA & REAL, 2011).

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No que se refere à educação superior privada, o art. 45 da LDB traz a seguinte

redação: “A educação superior será ministrada em Instituições de Ensino Superior,

públicas ou privadas, com variados graus de abrangência ou especialização”.

O § 2º do art. 54 da lei nº 9.394/1996 abriu a possibilidade de autonomia para

outras instituições que comprovassem qualificação para o ensino ou para a pesquisa.

Tal autonomia foi afirmada por meio do decreto nº 2.306 de 19 de agosto de

1997, que estabelece liberdade na forma de organização das entidades mantenedoras

privadas de ensino superior, propiciando, dessa forma, condições facilitadoras para a

implantação dessas instituições. Seu artigo 8º estabelece:

Quanto à sua organização acadêmica, as Instituições de Ensino Superior do

Sistema Federal de Ensino classificam-se em:

I - Universidades;

II - Centros universitários;

III - Faculdades integradas;

IV - Faculdades;

V - Institutos superiores ou escolas superiores.

O Decreto estabelece que obrigatoriamente as universidades se caracterizem

pela indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão. Enquanto que, aos Centros

Universitários, é dada autonomia para criar, organizar e extinguir cursos e programas.

O Relatório sobre o Desenvolvimento Mundial, lançado em 1997 pelo BM,

tratava especificamente da reformulação do papel do Estado: “O Estado é fundamental

para o processo de desenvolvimento econômico e social, porém não enquanto agente

direto do crescimento, mas sim como um sócio, elemento catalisador e impulsionador

desse processo” (BANCO MUNDIAL, 1997).

Em relação à educação superior, a Conferência Mundial sobre a Educação

Superior, em 1998, da UNESCO, em Paris, resultou em uma tese que estimulava a

abertura do mercado de educação superior no Brasil à iniciativa privada ou à livre

iniciativa empresarial, ou seja, com características de um bem privado (WORLD

BANK, 1998).

Em 1999, foi lançado outro documento pelo BM: “Estratégia para o setor

educacional – documento estratégico do Banco Mundial: A educação na América Latina

e Caribe”. Tal documento trazia em seu conteúdo avaliações da educação durante a

década de 1990 e recomendações a serem implementadas no século 21, reforçando a

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ideia do papel da educação para “alívio da pobreza”, ampliação do setor privado e

atualização da força de trabalho (LIMA, 2011).

O documento lançado pelo BM em 2002, intitulado “Construir sociedades de

conocimiento: nuevos desafíos para la educación terciaria”, intensifica a

mercantilização e diversificação da educação superior e desloca a educação superior

para educação terciária:

Aumentar a diversificação institucional (aumento do número de instituições não-universitárias e privadas) para expandir a cobertura em uma base financeiramente viável e estabelecer um quadro da formação contínua com vários pontos de acesso e uma variedade de rotas de treinamento (BANCO MUNDIAL, 2002, p. 27).

Em 2002 foi lançado o Programa Diversidade na Universidade, por meio da lei

nº 10.558, de 13 de novembro de 2002.

Já no governo de Luiz Inácio Lula da Silva, de 2003 a 2010, ao contrário do que

muitos esperavam, mesmo com intenso foco nos programas sociais, as reformas na

educação superior deram-se de forma incipiente, vistas por alguns autores como

continuidade às orientações dos organismos internacionais. Neste governo, podemos

citar algumas ações e projetos:

Houve expansão de vagas nas universidades federais, através da criação do Programa de Apoio aos Planos de Reestruturação e Expansão Universidades Federais (Reuni); contratação de professores e funcionários; criação da Universidade Aberta do Brasil; implementação de bolsas para estudantes em IES privadas por meio do Programa Universidade para Todos (ProUni) e do Programa de Financiamento Estudantil (Fies); criação e expansão dos Institutos Federais de Educação, Ciências e Tecnologia (IFs); criação de programa e ações voltadas para as Ações Afirmativas (FERREIRA & OLIVEIRA,2010, p. 61).

Segundo resultados do estudo da autora Michelotto et al (2006), no período

1991-2004, o número de instituições privadas cresceu 267% no território nacional. Em

relação ao número de matrículas, a diferença é bem maior. A média brasileira nesse

quesito apresenta uma variação positiva de 311% no período de 1991 a 2004.

Após sucessivas normas revogadas, o Decreto nº. 5.773/2006, o último que

regulamenta essas instituições, manteve a possibilidade de as Instituições de Ensino

Superior se organizarem como faculdades, centros universitários e universidades.

Apesar desses avanços, direitos igualitários no Brasil ainda são um bem a ser

conquistado, principalmente no que se refere ao direito à educação superior de forma

gratuita, que ainda é profundamente excludente, discriminadora e colonizadora.

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A cultura política e acadêmica sempre foi o baluarte do processo dominador e colonizador das sociedades ocidentais europeias, razão pela qual sempre mantiveram as portas das universidades cerradas para os povos colonizados. Basta olhar à volta para perceber o quanto o sistema atual que abrange oportunidades e condições é injusto, desigual e excludente, mesmo com a vigência da famigerada lei de direitos iguais que aparentemente fundamenta os princípios de seletividade universal dos vestibulares universitários (LUCIANO, 2006, p. 164).

Dessa forma, o vestibular é uma forma de promover um afunilamento pautado

na meritocracia, sob a alegação da falta de vagas. O vestibular pode ser uma maneira de

manter a reprodução social marcada pela hierarquia de classes (CORDEIRO, 2010).

Um dos caminhos apontados seria disponibilizar vagas suficientes aos

interessados. Dessa forma, seriam superadas as desigualdades de condições e

oportunidades por um serviço educacional de qualidade, sem privilégios, ao alcance de

todo cidadão brasileiro e, sobretudo e fundamentalmente, intercultural e interétnico em

todos os níveis de ensino.

Para os povos indígenas a educação tornou-se uma das condições e uma das

causas da formação da consciência de cidadania, na medida em que pode possibilitar o

domínio dos códigos básicos estruturantes da sociedade não-indígena, a consequente

capacidade de reformulação de estratégias de resistência e de promoção de culturas,

valores e conhecimentos, e a apropriação de outros saberes úteis e necessários à

melhoria das condições de vida. Isto prova que a escola pode ser um instrumento

poderoso de afirmação de identidades, de valores e de conhecimentos indígenas

(LUCIANO, 2006, p. 165).

Dias Sobrinho (2010) afirma que democratização, qualidade e crise são núcleos

temáticos que ocupam a agenda da educação superior em todo o mundo. Nesse sentido,

democratizar a educação superior remete à expansão de matrículas e à inclusão social de

jovens até então desassistidos, seja por condições econômicas ou preconceitos. No

entanto, democratizar não se limita à ampliação, é necessário garantir a permanência.

Podemos observar, na Tabela 1 a seguir, que a evolução do número de IES se

deu de forma crescente; o total de instituições passa de 1.391, em 2001, para 2.378, em

2010. Em 2010, desse total 88,3% é de instituições privadas, 4,5%, estaduais, 4,2%,

federais e 3,0%, municipais. Dessa forma, pode-se concluir que a educação superior

brasileira é privada.

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Tabela 1: Evolução do Número de Instituições de Educação Superior por categoria Administrativa- Brasil: 2001-2010.

Ano

Total

Pública Privada

% Tota

l %

Feder

al %

Estadua

l %

Munic

ipal %

2001 1.391 183 13,2 67 4,8 63 4,5 53 3,8 1.20

8 86,8

2002 1.637 195 11,9 73 4,5 65 4,0 57 3,5 1.44

2 88,1

2003 1.859 207 11,1 83 4,5 65 3,5 59 3,2 1.65

2 88,9

2004 2.013 224 11,1 87 4,3 75 3,7 62 3,1 1.78

9 88,9

2005 2.165 231 10,7 97 4,5 75 3,5 59 2,7 1.93

4 89,3

2006 2.270 248 10,9 105 4,6 83 3,7 60 2,6 2.02

2 89,1

2007 2.281 249 10,9 106 4,6 82 3,6 61 2,7 2.03

2 89,1

2008 2.252 236 10,5 93 4,1 82 3,6 61 2,7 2.01

6 89,5

2009 2.314 245 10,6 94 4,1 84 3,6 67 2,9 2.06

9 89,4

2010 2.378 278 11,7 99 4,2 108 4,5 71 3,0 2.10

0 88,3

Fonte: Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), 2012.

O número de matrículas em cursos de graduação atingiu, em 2010, o total de

6.379.299 matrículas, o dobro das registradas em 2001. A expansão se dá, notadamente,

pela via privada, e também por um crescimento do setor público por meio das categorias

federal e estadual (INEP, 2012).

No entanto, apesar da significativa expansão do atendimento na educação

superior entre 2001 e 2009, a taxa de escolarização líquida da população de 18 a 24

anos correspondeu a 14,4%, segundo o estudo desenvolvido pelo IBGE em 2010.

(IBGE, 2010).

Conforme o relatório do INEP (2012) no ano de 2010 foram registrados 51.494

ingressos em IES públicas, considerando-se o universo de ingressos por processo

seletivo na graduação presencial por meio de programa de reserva de vagas; esse total

representa um aumento de 41,9% em relação ao ano anterior.

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Os dados da Figura 2 abaixo apresentam os percentuais coletados em 2010

correspondentes aos diferentes tipos de programas de reserva de vagas: 64% são

procedentes do ensino público, 27% étnico, 6% social/renda familiar e 3% restantes por

outros programas. Além disso, há que se destacar que o estudo apontou que a

porcentagem de pessoas com deficiência na educação superior é de 0%, conforme

observamos na Figura 2. Esse dado indica que ainda há muito a ser feito para a inclusão

deste grupo populacional. Em relação ao grupo étnico, o estudo do INEP não traz

informações detalhadas sobre os grupos étnicos.

Figura 2: Distribuição do Tipo de Reserva de Vagas – Ingressos por Processo

Seletivo das IES Públicas – Graduação Presencial – Brasil – 2010.

Fonte: INEP (2012)15.

Considerando o referido relatório, apesar de haver avanços no acesso

considerando o critério raça, ainda são necessários maiores aprofundamentos nesses

dados, pois eles revelam informações generalizadas, não levando em consideração as

diferenças e lacunas regionais, pois existe no país uma grande diversidade de 15

Oalunopodeingressarpormaisdeumtipodereservadevagas.

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necessidades e oportunidades quando comparamos, por exemplo, a Região Sudeste e

Norte do país.

A temática sobre o número de acadêmicos na educação superior será explorada

quando discorrermos sobre as primeiras experiências nas políticas de Ações Afirmativas

educacionais para indígenas.

Lei nº 12.711, de 29 de agosto de 2012 (ANEXO 10), regulamenta o sistema de

ingresso de alunos de escolas públicas em seu artigo primeiro:

Art. 1o. As instituições federais de educação superior vinculadas ao Ministério da Educação reservarão, em cada concurso seletivo para ingresso nos cursos de graduação, por curso e turno, no mínimo 50% (cinquenta por cento) de suas vagas para estudantes que tenham cursado integralmente o ensino médio em escolas públicas.

Em relação à temática da inserção indígena no ensino superior, estabelece seu

artigo 7º:

Art. 7o O Poder Executivo promoverá, no prazo de 10 (dez) anos, a contar da publicação desta Lei, a revisão do programa especial para o acesso de estudantes pretos, pardos e indígenas, bem como daqueles que tenham cursado integralmente o ensino médio em escolas públicas, às instituições de educação superior.

Como observamos, o programa de reserva de vagas é uma das formas de Ação

Afirmativa, promovendo a grupos minoritários o acesso a bens e serviços, nesse caso a

educação.

3.3 Ação Afirmativa: Aspectos Históricos e Conceituais

Ao iniciar uma discussão acerca da temática das Ações Afirmativas na

educação, é necessário identificarmos historicamente a origem desse conceito, bem

como o entrelaçamento da educação com os direitos humanos por meio da Declaração

Universal dos Direitos Humanos, de 1948, e da Constituição Federal de 1988.

O termo Ação Afirmativa tem origem americana, mas, dependendo do lugar e do

idioma, as denominações variam entre políticas de Ação Afirmativa, equal opportunity

policies e affirmative action, derivadas da língua inglesa; e discriminação positiva

(denominação adotada na Europa), positive discrimination, ação positiva, políticas

inclusivas, dentre outras (GOMES, 2000; SANTIAGO et al, 2008, p. 138).

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O país pioneiro a adotar o termo Ação Afirmativa foram os Estados Unidos da

América (EUA), por meio do Decreto Presidencial de 6 de março de 1961, que fazia

referência a contratos de trabalho com o Governo Federal daquele país e discorria que

“o contratante [...] adotará uma Ação Afirmativa para assegurar que os candidatos sejam

empregados, como também tratados durante o emprego sem consideração a sua raça,

credo, cor ou nacionalidade” (TEIXEIRA, 2008).

A segregação racial contra negros marcou os EUA e mobilizou a sociedade

negra americana, lideranças políticas, liberais e brancos progressistas. Os conflitos

raciais eclodiram nas grandes cidades norte-americanas após o assassinato de Martin

Luther King, resultando em um forte movimento por melhores condições de vida para

populações negras e busca de soluções que minimizassem as desigualdades entre

brancos e negros. A autora afirma que:

Esta expressão ganha força no fim desta mesma década quando a National Commission on Civil Disorders – Comissão Nacional sobre Distúrbios Civis, passa a examinar as razões dos conflitos raciais. As conclusões deste estudo evidenciavam a urgência de se elaborar estímulos especiais que, de alguma forma, respondessem às demandas da população negra. Mais tarde, estes estímulos se estenderam a minorias como as mulheres, os asiáticos, os hispânicos e os indígenas (TEIXEIRA, 2008, p. 221).

Nos EUA, esse movimento se fortalece após a promulgação das leis dos direitos

civis em 1964, como tentativa de garantir o welfare state16, isto é, o estado como o

agente de proteção e promoção social.

Já a Índia, marcada por um histórico de discriminação e diferenças sociais, a

partir da Constituição de 1950, reservou um percentual de vagas em suas universidades

públicas a castas consideradas inferiores, os dalits17, ou “intocáveis”. Para a Índia, as

políticas de Ação Afirmativa se justificam por quatro princípios: a) compensação ou

reparação por injustiças cometidas no passado; b) proteção aos segmentos sociais

16 Welfare state pode ser definido como um conjunto de serviços e benefícios sociais de alcance universal promovidos pelo Estado com a finalidade de garantir uma certa "harmonia" entre o avanço das forças de mercado e uma relativa estabilidade social, suprindo a sociedade de benefícios sociais que significam segurança aos indivíduos para manterem um mínimo de base material e níveis de padrão de vida, que possam enfrentar os efeitos deletérios de uma estrutura de produção capitalista desenvolvida e excludente (GOMES, 2006, p.1) 17 Dalits são uma categoria de pessoas cujo toque é considerado ritualmente poluidor, cujas ocupações são tidas como impuras e degradantes e que tradicionalmente foram proibidas de residir nas mesmas áreas que os demais indianos, usar as mesmas fontes de água e frequentar os mesmos templos (DAFLON, 2008,p. 4).

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minoritários; c) igualdade; e d) justiça social a partir da constatação de desigualdade

social (FERES JÚNIOR; ZONINSEIN, 2005).

Outro país a adotar as ações afirmativas foi a Malásia, a partir de 1971, por meio

de um sistema de cotas similar a adotada na Índia, voltado para os malaios e membros

de determinadas tribos, como os bamiputras ou bumiputeras, que se encontravam em

situação de desigualdade socioeconômica (SANTOS, 2012b).

Ainda podemos citar outros países que adotaram tais políticas:

Bósnia – em cargos políticos, as mulheres devem estar representadas com um percentual mínimo de 29%; China – cotas para representação de minorias na Assembleia Nacional em Pequim e cotas para minorias ingressarem nas universidades; Macedônia – minorias, como os albaneses, têm cotas para acesso a universidades do Estado e no serviço público; Nova Zelândia – indivíduos descendentes de grupos polinésios e indígenas maori têm acesso preferencial a cursos universitários e bolsas; Indonésia – programa de Ação Afirmativa dirigido a grupos nativos que migraram para o país; Eslováquia – Ação Afirmativa para indivíduos de grupos raciais ou minorias; Reino Unido – lei indica recrutamento igual de católicos e não católicos no serviço policial na Irlanda do Norte; África do Sul – cotas e metas para promover equidade no mercado de trabalho entre brancos e negros (SANTOS, 2012b, p. 403).

Portanto a expressão Ação Afirmativa deriva de um conjunto de recomendações,

normas e leis com o intuito de proteção aos direitos de grupos em situação de exclusão

social ou grupos minoritários.

O Brasil está entre os signatários da Declaração Universal dos Direitos

Humanos, elaborada após o término da Segunda Guerra Mundial, em 1948, e que

contempla a proteção e promoção do direito de todos os seres humanos, expressando em

seu Art. 1º: “todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos”.

Outros seis instrumentos fundamentais de defesa dos direitos humanos podem

ser citados:

• Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial (1965); • Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (1966); • Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (1966); • Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (1979); • Convenção contra a Tortura e outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanas ou Degradantes (1984); • Convenção sobre os Direitos da Criança (1989) (FISCHMANN, 2009, p.156).

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Mesmo com tais tratados, os direitos fundamentais ainda são um bem a ser

conquistado. No Brasil, ainda está presente a desigualdade de renda, de oportunidades

de trabalho, de acesso à saúde, à justiça, à escola, à cultura, ao lazer, à segurança, à

escolha e à cidadania.

Na assertiva dos direitos fundamentais, Bobbio (2004, p. 1) afirma “que o

problema fundamental em relação aos direitos do homem, hoje, não é tanto o de

justificá-los, mas o de protegê-los. Trata-se de um problema não filosófico, mas

político”.

Ainda nos referindo à Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948,

garantir a igualdade não é mecanismo suficiente para assegurar condições de vida digna,

pois as minorias e camadas sociais menos favorecidas economicamente continuam à

margem da sociedade, sem acesso aos bens e serviços essenciais.

Dessa forma, Bobbio (2004) nos aponta que,

[...] os indivíduos são iguais genericamente, mas não especificamente. Com relação aos direitos políticos e aos direitos sociais, existem diferenças de indivíduo para indivíduo, ou melhor, de grupos de indivíduos para grupos de indivíduos, diferenças que são até agora (e o são intrinsicamente) relevantes [...]. Isso quer dizer que, na afirmação e no reconhecimento dos direitos políticos, não se podem deixar de levar em conta determinadas diferenças, que justificam um tratamento não igual (p.35).

Nesse sentido, é necessário um olhar diferenciado ao conceito estabelecido,

designado como igualdade dinâmica e militante, na busca de se garantir igualdade de

oportunidades e condições.

Gomes (2003, p.19) afirma que

[…] em lugar da concepção «estática» da igualdade extraída das revoluções francesa e americana, cuida-se nos dias atuais de se consolidar a noção de igualdade material ou substancial, que, longe de se apegar ao formalismo e à abstração da concepção igualitária do pensamento liberal oitocentista, recomenda, inversamente, uma noção «dinâmica», «militante» de igualdade, na qual necessariamente são devidamente pesadas e avaliadas as desigualdades concretas existentes na sociedade, de sorte que as situações desiguais sejam tratadas de maneira dessemelhante, evitando-se assim o aprofundamento e a perpetuação de desigualdades engendradas pela própria sociedade.

Desse modo, as políticas de ações afirmativas, em uma perspectiva complexa de

igualdade, são baseadas nos direitos individuais, propõem uma redefinição da igualdade

de oportunidades liberal, introduzindo a utilização de particularidades grupais e dando

uma ênfase positiva à construção de identidades raciais. Visam à democratização do

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acesso a meios fundamentais – como emprego e educação– por parte da população em

geral. O principal objetivo dessas medidas consiste em promover condições para que

todos na sociedade possam competir igualmente pela conquista de tais meios

(MOEHLECKE, 2004; GUARNIERI &MELO-SILVA, 2007, p.1).

Acrescenta-se também, que as Ações Afirmativas podem ser definidas como

políticas públicas e também privadas, com o objetivo de concretizar o princípio

constitucional da igualdade material e garantir a neutralização dos efeitos da

discriminação racial, de gênero, de idade, de origem nacional e de compleição física. Ou

seja, correspondem a uma forma jurídica para se superar o isolamento ou a diminuição

social a que se acham sujeitas as minorias (GOMES, 2003; CORDEIRO, 2005).

Com relação à questão indígena, o retrato de exclusão e discriminação é fruto do

passado colonial, trazendo consigo os legados institucionais da monarquia, da

escravidão, e da fusão entre a Igreja e o Estado. Nesse sentido, a exclusão, obviamente,

não é natural, e sim reflexo de uma construção histórica (POCHAMANN et al, 2006;

LIMA, 2007).

No ano de 1971, em Barbados, ocorreu o Simpósio de Fricção Interétnica na

América do Sul não andina, que resultou no documento “Declaração de Barbados”, no

qual se denunciavam as condições de dominação dos índios sul-americanos,

responsabilizando os Estados pela visão distorcida da sociedade não índia que os

considerava indivíduos inabilitados (ALBUQUERQUE, 2007).

Outro fato também em destaque foi a Reunião de Peritos sobre

Etnodesenvolvimento e Etnocídio na América Latina, promovida pela UNESCO e

FLACSO, em dezembro de 1981, na Costa Rica, trazendo em seu bojo projetos de

futuro de etnodosenvolvimento (LIMA, 2007).

A Organização Internacional do Trabalho (OIT), em 7 de junho de 1989,

aprovou a Convenção número 169 sobre Povos Indígenas e Tribais em Países

Independentes, que assegura os direitos indígenas em âmbito internacional. Em 20 de

junho de 2002, no Brasil, o texto da Convenção 169 foi aprovado pelo Congresso

Nacional e incorporado ao conjunto de leis vigentes no país.

A referida Convenção refere-se à educação em seu artigo 23: 1. Será ministrado às crianças pertencentes às populações interessadas ensino para capacitá-las a ler e escrever em sua língua materna, ou, em caso de impossibilidade, na língua mais comumente empregada pelo grupo a que pertençam. 2. Deverá ser assegurada a transição progressiva da língua materna ou vernacular para a língua nacional ou para uma das línguas oficiais do país.

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3. Serão tomadas, na medida do possível, as devidas providências para salvaguardar a língua materna ou vernacular.

Assim como no Brasil, na América Latina as políticas afirmativas

intensificaram-se a partir da década de 90, impulsionadas pelos movimentos dos

organismos internacionais em favor da discussão sobre a oportunidade de acesso das

camadas sociais de baixa renda. Entre esses organismos podem ser citados o Banco

Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD) e a UNESCO (COSTA &

ALVES, 2009).

No Brasil, a ditadura militar que se instalou em 1964 criou obstáculos para as

lutas democráticas, e a Constituição Federal de 1988 (que veremos a seguir) representa

um momento fundador da reconstrução democrática no Brasil (FISCHMANN, 2009)

Numa visão retrospectiva, podem-se elencar alguns instrumentos normativos,

mais especificamente a Constituição Federal de 1988, que tratam de ações afirmativas.

Entre eles destacamos:

• Carta do Rio, derivada da III Conferência Mundial contra o Racismo,

Discriminação Racial, Xenofobia e Intolerância Correlata, realizada na

África do Sul, em setembro de 2001;

• Lei n. 7.668, de 22 de agosto de 1988, instituiu a Fundação Cultural

Palmares;

• Lei n. 649, de 27 de maio de 1998, criou o Conselho Nacional de

Combate à Discriminação, CNCD, no âmbito do Ministério da Justiça;

• Decreto-Lei n. 5.452/43 (CLT), que prevê, em seu art. 354, cota de dois

terços de brasileiros para empregados de empresas individuais ou

coletivas;

• Decreto-Lei n. 5.452/43 (CLT), que prevê, em seu art. 373-A, a adoção

de políticas destinadas a corrigir distorções pela desigualdade de direitos

entre homens e mulheres;

• Lei n. 8.112/90, que estabelece, em seu art. 5º, § 2º, cotas de 20% para os

portadores de deficiência no serviço público civil da União;

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• Lei n. 8.213/91, que estabelece, em seu art. 93, cotas para os portadores

de deficiência no setor privado;

• Lei 9.504/97, que estabelece, em seu art. 10, § 2º, cotas para mulheres

nas candidaturas partidárias;

• Lei n. 10.172, de9 de janeiro de 2001, que institui o Plano Nacional de

Educação, o qual estabelece a necessidade de políticas de inclusão de

minorias étnicas (RICHTER & TERRA, 2007).

Como podemos observar a partir desse elenco de leis e decretos, a temática das

Ações Afirmativas só se fortalece no Brasil por volta dos anos 1990, alavancada pelos

movimentos sociais, impulsionados pelos organismos internacionais de defesa dos

Direitos Humanos e combate à discriminação racial e social. Essas estratégias podem

ser percebidas, sobretudo, em momentos específicos, como a mobilização em torno da

comemoração do centenário da abolição (1988) e do tricentenário de Zumbi dos

Palmares (1995) (VERISSIMO, 2003).

No que se refere à questão indígena, dentre as Ações Afirmativas nas

Instituições de Ensino Superior brasileiras cita-se o sistema de cotas, o qual, mesmo

sendo considerado uma medida compensatória, ainda é, neste momento da educação

superior do Brasil, uma forma de mitigar as mazelas produzidas há mais de 500 anos

aos povos indígenas.

É importante destacar que o sistema de cotas é apenas uma das formas de Ação

Afirmativa; existem outros instrumentos e mecanismos que podem garantir o acesso e

permanência das minorias nas Instituições de Educação Superior, como, por exemplo: a

reserva de vagas para alunos oriundos de escolas públicas, pontos adicionais no

processo seletivo para alunos oriundos de escola pública, bolsas de extensão e bolsas de

pesquisa.

Sob a ótica da igualdade, o Brasil é o país que amarga há décadas os piores

índices de desigualdade social, econômica e racial. Portanto, a desigualdade social está

intimamente ligada à desigualdade econômica e étnica.Como se refere Freyre (2005, p.

157), “com a intrusão europeia, desorganiza-se entre os indígenas da América a vida

social e econômica; desfaz-se o equilíbrio nas relações do homem com o meio físico”.

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Em relação às desigualdades sociais, o Relatório do Desenvolvimento Humano

(2005), elaborado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, indicou

que em 2000 a população branca do Brasil apresentava um Índice de Desenvolvimento

Humano - Municipal (IDH-M) de 0,814, enquanto o IDH-M da população negra era de

0,703, destacando que:

Caso formassem uma nação à parte, os brancos, com um nível de desenvolvimento humano alto (acima de 0,800), ficariam na 44ª posição no ranking do IDH das nações, entre Costa Rica e Kuwait, segundo o Relatório do Desenvolvimento Humano global de 2002. A população negra, com um nível de desenvolvimento humano médio (entre 0,500 e 0,799), teria IDH-M compatível com a 105ª posição – entre El Salvador e Moldávia. A distância entre brancos e negros, portanto, seria enorme: 61 posições no ranking do IDH mundial (p.59).

Apesar de esforços para minimizar as mazelas da discriminação e da exclusão

históricas a tais povos, muito ainda deve ser feito. Carvalho (2002, p.122) afirma que os

direitos sociais estão sob ameaça, apontando que:

A democracia política no país não resolveu os problemas econômicos mais sérios, como a desigualdade e o desemprego. Continuam os problemas da área social, sobretudo na educação, nos serviços de saúde e saneamento.

A desigualdade é, sobretudo de natureza regional e racial [...]

A escandalosa desigualdade que concentra nas mãos de poucos a riqueza nacional tem como consequência níveis dolorosos de pobreza e miséria.

Impulsionado pelos organismos internacionais e forte pressão dos grupos

especialmente relacionados ao movimento negro brasileiro, por ocasião de uma

manifestação em homenagem aos 300 anos de Zumbi dos Palmares, o tema da

discriminação entrou na agenda política do governo Fernando Henrique Cardoso, que

instituiu o Grupo de Trabalho Interministerial para a Valorização da População Negra,

no dia 20 de novembro de 1995 (TELLES, 2003 apud MAIO & SANTOS, 2005, p. 3).

Naquele mesmo ano foi lançado Programa Nacional de Direitos Humanos

(PNDH), pelo Governo Federal. Ao anunciar o Programa o então Presidente da

República, Fernando Henrique Cardoso, destacou:

E agora, que nós estamos nos aproximando do século XXI, essa luta pela liberdade e pela democracia tem um nome específico: chamam-se direitos humanos. Esse é o novo nome da luta pela liberdade e pela democracia. E nesta data simbólica do Brasil, nós estamos assistindo também a esta vontade do

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nosso povo, de não apenas falar de direitos humanos, mas também de garantir a sua proteção (MESQUITA NETO, 1997, p.1).

Além do aparato legal, é importante destacar, a realização de eventos,

alavancados pelos movimentos sociais, ligados à temática, como o encontro em

Durban18, no qual o então Presidente do Brasil, Fernando Henrique Cardoso, declarou:

[...] todas essas lutas que universalizam a oportunidade do acesso e do tratamento ao conjunto da população são louváveis. Mas também é inegável que algumas ações especiais têm que ser tomadas para que, na questão de gênero, na questão da raça, haja um movimento efetivo de maior igualdade. (VERISSÍMO, 2003, p. 12).

Munanga (2001) enfoca que o relatório do Comitê Nacional para a Preparação

Brasileira na III Conferência Mundial das Nações Unidas contra o Racismo,

Discriminação Racial, Xenofobia e Intolerância Correlata, realizada em Durban, África

do Sul, abordava medidas governamentais que deveriam ser tomadas em favor dos

índios:

• Criação, no âmbito do Ministério da Educação, da Coordenação Geral de Educação Escolar Indígena;

• Estabelecimento de 1666 escolas indígenas, que contam com 3041 professores indígenas;

• Realização do projeto Tucum, de formação e capacitação de professores indígenas em nível de magistério, para as comunidades de Mato Grosso (Xavante, Paresi, Apiaká, Irantxe, Nambikwara, Umotina, Rikbaktsa, Munduruku, Kayabi, Borôro e Bakairi, entre outras). É coordenado pela Secretaria de Estado da Educação – MT, além da Funai, e tem convênio com a Universidade Federal do Mato Grosso e prefeituras municipais do Estado;

• Realização do Projeto 3o Grau Indígena, visando à implantação de três cursos de Licenciatura Plena na Universidade do Estado de Mato Grosso (Unemat) [...] (MUNANGA, 2001, p.39).

A Conferência de Durban ocorrida em 2001 foi um marco importante no

combate à discriminação racial, devido aos acordos firmados entre os países presentes;

o discurso do Presidente conseguia expressar a amplitude do problema, porém não

refletia a opinião do conjunto do governo. Havia no governo posições contrárias às

cotas, entre elas a do próprio Ministro da Educação, que se declarou publicamente

18 III Conferência Mundial contra o Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e Intolerância Correlata, realizada na África do Sul, em setembro de 2001.

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contrário às cotas para negros nas universidades, alegando que seria necessário focar no

problema da base do ensino público (ALMEIDA, 2008).

Destaca-se que o governo brasileiro, no evento, assumiu que o Brasil é um país

em que, certamente, a discriminação encontrava-se escondida dentro de um discurso de

“paz” entre as raças. Neste sentido, Ação Afirmativa pode ser entendida também como

uma política de afirmação étnica e racial.

O documento originado da Conferência, denominado Carta do Rio (2001),

elenca treze eixos temáticos, sendo que a questão indígena só é mencionada em quatro

deles: “questão indígena”, obviamente; “raça e etnia”; “acesso à justiça e defesa dos

direitos humanos”; e “gênero”.

No referido documento os povos indígenas parecem constituir mais uma espécie

de adendo ao debate mais amplo, que não contemplou as especificidades de tais povos.

Temáticas como “cultura e comunicação”, “religião”, “educação”, “saúde e trabalho”,

“juventude”, temas tão caros aos povos indígenas e às suas organizações, não são

mencionados.

Em relação à temática do direito à igualdade e combate a todas as formas de

discriminação, o movimento negro brasileiro tem importância crucial, e entre as

conquistas deste movimento foi criação da Secretaria de Políticas de Promoção da

Igualdade Racial (SEPPIR) da Presidência da República, através da Medida Provisória

n° 111, de 21 de março de 2003, convertida na Lei 10.678. A Secretaria nasce do

reconhecimento das lutas históricas do Movimento Negro brasileiro. A data é

emblemática, pois celebra-se em todo o mundo o Dia Internacional pela Eliminação da

Discriminação Racial, instituído pela Organização das Nações Unidas (ONU), em

memória do Massacre de Shaperville19 (SEPPIR, 2015).

Entre as diversas ações do SEPPIR está a criação da Secretaria de Políticas de

Ações Afirmativas, cujo objetivo é coordenar e articular a formulação e o

acompanhamento de políticas públicas com vistas à inclusão da perspectiva racial no

conjunto das ações do governo, destacando-se ações de enfrentamento ao racismo e

Ações Afirmativas (SEPPIR, 2015).

19 Em 1960 o Congresso Nacional Africano (CNA) organizou uma campanha antipasses - o negro que era pego sem o seu passe, um livrinho de quase cem páginas, era preso e punido. Em 21 de março, uma multidão de voluntários foi arregimentada para se apresentar sem seus passes em frente a delegacia de polícia de Sharperville, em uma demonstração pacífica de resistência. A manifestação foi reprimida com extrema violência, gerando 67 mortos. Desde então chamado de massacre de Sharperville (PINTO, 2007, p. 398).

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A inclusão social e as diversidades étnica e cultural começaram a fazer parte da

agenda governamental, como sugere a autora Moehlecke (2009, p.470):

[...] o MEC instituiu ainda, por meio de portarias, duas comissões relacionadas à questão da diversidade: a Comissão Assessora de Diversidade para Assuntos Relacionados aos Afrodescendentes – Cadara –, criada em 2003, e a Comissão Nacional de Educação Escolar Indígena – CNEEI –, em 2004, ambas com as funções de assessorar a Secretaria e o Ministério na formulação de políticas de inclusão social e combate à discriminação étnica e racial nos sistemas de ensino, e de subsidiar ações que envolvam a adoção de procedimentos relacionados à educação para afrodescendentes e indígenas.

Mesmo fazendo parte da agenda do governo e fruto de lutas e entraves dos

movimentos organizados, o sistema de cotas no Brasil foi e ainda é questionado por

alguns grupos como “inconstitucional”, caso este de repercussão nacional, onde o

Partido Político Democratas (DEM), propos junto ao Supremo Tribunal Federal (STF),

Ação de Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental contra atos

administrativos da Universidade de Brasília que instituíram o programa de cotas raciais

para ingresso naquela universidade, onde se invoca ofensa aos artigos 1º, caput e inciso

III; 3º, inciso IV; 4º, inciso VIII; 5º, incisos I, II, XXXIII, XLII, LIV; 37, caput; 205;

207, caput; e 208, inciso V, da Constituição de 1988, a qual teve indeferido pedido de

medida cautelar (ADPF 186 MC / DF) e foi julgada totalmente improcedente

(BAYMA, 2012).

Entre os argumentos apontados pelos ministros podemos citar o de Ricardo

Lewandowski argumentando que o princípio da igualdade descrito na Constituição

Federal de 1988, deve ser visto sob dois pontos: o formal e o material.

Para possibilitar que a igualdade material entre as pessoas seja levada a efeito, o Estado pode lançar mão seja de políticas de cunho universalista, que abrangem um número indeterminado de indivíduos, mediante ações de natureza estrutural, seja de ações afirmativas, que atingem grupos sociais determinados, de maneira pontual, atribuindo a estas certas vantagens, por um tempo limitado, de modo a permitir-lhes a superação de desigualdades decorrentes de situações históricas particulares (LEWANDOWSKI, 2012, p.5)

A Constituição de 1988, ao mesmo tempo em que consigna a meritocracia para o

acesso aos níveis mais elevados do ensino, pesquisa e criação artística, efetivados

segundo a capacidade de cada um; também acolhe a igualdade de acesso e o pluralismo

de ideias.

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Desse modo, o constituinte teria almejado “temperar o rigor da aferição do

mérito dos candidatos que pretendem acesso às universidades com o princípio da

igualdade material que permeia todo o Texto Magno” (LEWANDOWSKI, 2012, p. 13).

3.4 Educação escolar Indígena no cenário brasileiro

Inicialmente, ao se discutir a questão das políticas de Ações Afirmativas no

contexto da inclusão de indígenas nas universidades brasileiras, é necessário considerar

os aspectos históricos envolvidos na questão das políticas públicas e da escolarização

dos povos indígenas do país. Pois a intensa mobilização no cenário brasileiro

influenciou na luta e nas reivindicações para a inclusão dos povos indígenas na

educação superior.

A autora Ferreira (2001), em seu artigo “A educação escolar indígena: um

diagnóstico crítico da situação no Brasil”, divide a história da educação escolar entre

indígenas em quatro fases:

A primeira, o Brasil Colônia, através dos missionários católicos e jesuítas. A segunda, a criação do Serviço de Proteção aos Índios (SPI), em 1910, que se estende à política de ensino da FUNAI e à articulação com o Summer Institute of Linguistics (SIL) e outras missões religiosas. A terceira, entre os anos 60 e 70, do período da ditadura militar. A quarta fase, da iniciativa dos próprios povos indígenas, a partir da década de 80, que decidem definir e autogerir os processos de educação formal (p.72).

O período colonial é o mais longo da história da educação escolar para índios no

Brasil, marcado por práticas de negação da identidade e diversidade, com o objetivo de

assimilar o índio à civilização cristã pela ação dos jesuítas, que desorganizavam a

estrutura social e a cultura em geral dos índios (SCHADEN, 1972).

Para os europeus colonizadores, os índios eram desprovidos de “língua”,

“pacíficos” e “medrosos”, viviam sem lei e sem religião, privados de características

distintivamente humanas. Essa interpretação dos europeus, em relação aos indígenas,

possui um forte conteúdo etnocêntrico20.

20 Etnocentrismo é uma visão do mundo em que o nosso próprio grupo é tomado como centro de tudo e todos; os outros são pensados e sentidos mediante nossos valores, nossos modelos e nossas definições do que é a existência. Nesse sentido, a cultura adquire seu próprio sentido, dependendo dos olhos de quem a vê, a partir do momento em que se opõe à natureza, ou seja, é um contexto construído. Construído com identidade própria, instituído internamente em repúdio ao que lhe é estranho, em contraste, é a atitude que traduz e identifica ingenuamente a diversidade cultural (WILLIAMS,1969). Ou

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“Após o período colonial, emerge o Brasil republicano (1899) trazendo consigo

os legados institucionais e simbólicos da monarquia, da escravidão, e da fusão entre

Igreja e o Estado” (LIMA, 2007, p. 3). O país, à época, contava com um contingente

humano composto de imigrantes vindos da Europa do norte, negros de origem africana,

negros crioulos, populações indígenas e uma massa de mestiços.

Em 1908, o Brasil fora publicamente acusado de massacre aos índios no XVI

Congresso dos Americanistas ocorrido em Viena, devido às formas de extermínio por

meio das guerras contra os índios e pelo processo de expansão para o interior do país

invadindo os territórios tradicionais (RIBEIRO, 1970; CUNHA, 1992).

A partir de 1910, a responsabilidade das ações educativas junto às comunidades

indígenas passou para o Serviço de Proteção ao Índio (SPI), órgão vinculado ao

Ministério da Agricultura, cuja a finalidade era de proteger as comunidades indígenas e

transformá-las em comunidades de pequenos produtores (ALBUQUERQUE, 2004).

Essa política, pautada numa lógica positivista, entendia as comunidades

indígenas como um grupo de pessoas atrasadas e distantes do padrão de civilização,

cabendo às sociedades mais adiantadas dirigir os povos indígenas rumo ao progresso.

Mesmo com esse pensamento integracionista, os índios continuaram excluídos e a

assistência a eles prestada permanecia esporádica, desorganizada e ineficiente.

Em 1928 foi aprovada a lei nº 5.484, que atribuiu ao SPI “a tarefa de executar a

tutela de Estado sobre o status jurídico genérico de índio, sem deixar claros os critérios

que definiam a categoria sobre a qual incidia”. A partir dessas ideias assimilacionistas,

inaugurou-se então o regime tutelar sobre os povos indígenas (LIMA, 2007).

A função educativa, sob responsabilidade do SPI, em 1936, era a incorporação

do indígena ao território brasileiro, sob duas bases de formação: como pequeno produtor

rural, por meio do ensino primário com iniciação para o trabalho agrícola ou pecuário, e

a de defesa nacional, na ênfase da disciplina militar, por meio do ensino moral e cívico,

e da educação física (COSTA, 2001, p.236).

Este processo de escolarização provocou desinteresse nas comunidades

indígenas e, a partir de 1953, foi criado um programa de reestruturação das escolas de

acordo com as necessidades de cada grupo étnico. Em 1956, o SPI permitiu que o

seja, a visão sobre culturas diversas é constituída a partir de contrastes e diferenças que se estabelecem a partir de referenciais exteriores ao contexto cultural originário dos indivíduos.

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Summer Institute of Linguistics21 (SIL) desenvolvesse um programa de educação

indígena, com um modelo de educação bilíngüe (ALBUQUERQUE, 2004).

Em 1967, o SPI foi extinto e foi criada a Fundação Nacional do Índio (FUNAI),

a qual também considerou importante o ensino bilíngue; foi criado o Estatuto do Índio,

por meio da lei n º 6.001 de 1973, que tornou obrigatório o ensino de línguas nativas nas

escolas indígenas, iniciando-se o incentivo para a capacitação de professores indígenas

para assumir tal responsabilidade.

O Estatuto do Índio, em seu artigo 49, estabelece que “a alfabetização dos índios

far-se-á na língua do grupo a que pertençam, e em português, salvaguardando o uso da

primeira”.

É necessário também recordar que o país estava em um regime autoritário

extremamente centralizador e necessitava mostrar à opinião pública internacional a sua

preocupação com os indígenas, assim como a existência de uma política indigenista

(LEITÃO, 1993; LIMA, 2002).

Também é importante destacar que tais iniciativas governamentais eram

impulsionadas por pressões de organismos internacionais; por exemplo, as diretrizes

básicas da FUNAI, legalmente fundamentadas no Estatuto do Índio, respeitavam a

Convenção 107 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) de 1957. O artigo nº

23 dessa convenção estabelece que:

1. Será ministrado às crianças pertencentes às populações interessadas ensino para capacitá-las a ler e escrever em sua língua materna, ou, em caso de impossibilidade, na língua mais comumente empregada pelo grupo a que pertençam.

2. Deverá ser assegurada a transição progressiva da língua materna ou vernacular para a língua nacional ou para uma das línguas oficiais do país.

3. Serão tomadas, na medida do possível, as devidas providências para salvaguardar a língua materna ou vernacular.

A FUNAI, porém, não possuía linguistas e pedagogos para lidar com a imensa

variedade linguística brasileira, tendo repassado, na década de 70, esse dever

21 Organização missionária que implantou a educação bilíngue nas Américas, usando um método de descrição de línguas indígenas muito eficaz para traduzir a Bíblia pretensamente para todos os idiomas do planeta (LIMA, 2007, p.9).

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governamental ao Summer Institute of Linguistics (SIL)22, por meio de convênio.Essa

instituição enfrentou várias críticas, devido, sobretudo, ao fato de os professores não

serem índios e não haver materiais didáticos bilíngues, como cartilhas e livros. O

objetivo maior dessa instituição era a conversão ao protestantismo, por meio de leituras

bíblicas. Devido a tais críticas, o convênio com a FUNAI foi rompido em 1977.

No final dos anos 70, durante o período do regime militar, surgiram, no cenário

nacional, as Organizações Não Governamentais (ONGs) voltadas especialmente para a

defesa das causas indígenas. Entre elas, destacam-se: Comissão Pró-Índio de São Paulo

(CPI/SP), o Centro Ecumênico de Documentação e Informação (CEDI), a Associação

Nacional de Apoio ao Índio (ANAI) e o Centro de Trabalho Indigenista (CTI).

Também foram criados, pela Igreja Católica, a Operação Anchieta (OPAN), em

1969, e o Conselho Indigenista Missionário (CIMI), em 1972, ambos com o objetivo de

prestar serviços de educação escolar aos índios (FERREIRA, 2001, p. 87).

No Brasil, durante a década de 70, ocorreram no país assembleias que resultaram

na criação de organizações indígenas, entre elas, destaca-se a União das Nações

Indígenas (UNI), fundada no ano de 1980.

No âmbito internacional, os países da América Latina, entre eles o Brasil, foram

palco da ação intensas críticas, notadamente do Banco Mundial, especialmente por

conta da inação desses países na defesa dos povos indígenas, com isso também

mobilizando forçadamente o governo a promover ações nas questões relacionadas a tais

povos.

No âmbito latino-americano, a anteceder este momento, as críticas dos efeitos etnocidas das políticas desenvolvimentistas encontraram na Reunião de Barbados, em 1971, e depois na “Reunião de Peritos sobre Etnodesenvolvimento e Etnocídio na América Latina”, promovida pela articulação entre UNESCO e FLACSO, em dezembro de 1981, em San José de Costa Rica, momentos especiais na formulação de propostas para um “desenvolvimento alternativo”, marcado pelos projetos de futuro próprios aos povos indígenas, o etnodesenvolvimento, proposta da qual o antropólogo mexicano Rodolfo Stavenhagen foi um dos principais formuladores (LIMA, 2007, p. 7).

22 Summer Institute of Linguistics (SIL) é uma instituição indigenista evangélica norte-americana, criada no México na década de 1930. Depois da experiência no México, tornou-se padrão de atuação do SIL nos demais países o de se apresentar publicamente como linguista e o de procurar atuar na área da educação pública indígena por meio de convênios com os órgãos indigenistas estatais. Exemplos desse modelo de atuação ocorreram na entrada do SIL no Peru e no Brasil. As características da atuação do SIL nesses dois países foram: (a) o papel facilitador do movimento indigenista na entrada da missão; (b) a secularização do programa de escola da missão através da inserção da linguística; e (c) o uso do instrumento do convênio entre missão e governo como forma atualizada de concordata (BARROS, 2004, p. 3).

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As articulações e mobilizações, tanto da sociedade indígena quanto das ONGs

pró-índio, bem como os mecanismos de pressão internacional promoveram no país um

movimento político paralelo favorável aos direitos indígenas no que se refere à terra,

educação e saúde. Esse movimento contou com a assessoria e participação de

instituições de ensino do país de renome, como a Universidade de São Paulo (USP),

Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e Universidade Estadual de Campinas

(UNICAMP). Também é importante destacar a criação da educação indígena no Mato

Grosso e Núcleos de Estudos Indígenas (NEIs) nas Universidades Federais de

Pernambuco, Roraima e Rio de Janeiro.

No ano de 1987, ocorreu, na cidade do Rio de Janeiro, o “Encontro Nacional de

Educação Indígena”, ao qual estiveram presentes vinte e sete representantes de ONGs e

instituições nacionais. Tal encontro resultou em um documento dirigido às autoridades

educacionais, no qual foi solicitada a “criação de organismos próprios de educação

indígena para executar, acompanhar e avaliar a implementação de uma política

educacional indígena [...]”.

Conjuntamente a essas atividades, foi criado o grupo de trabalho “Mecanismos

de Ação Coordenada” (BONDE), composto por membros de organizações e

instituições nacionais, tendo como motivação a necessidade de incorporar a educação

indígena à Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) e de se encaminhar

com urgência uma proposta de educação escolar para índios à Assembleia Constituinte.

No dia 19 de abril de 1980, foi criada a União das Nações Indígenas (UNI) e, no

ano de 1981, o indígena Marcos Terena foi eleito presidente, sendo apoiado por 32

líderes indígenas de todo o país.

A partir dessa data, vários encontros foram acontecendo no país, entre eles, os

organizados pelo Movimento dos Estudantes Indígenas do Amazonas (MEIAM),

professores do povo indígena MURA (OPIM) (SILVA, 2007). Tais encontros foram

marcados por discussões acerca do direito à terra, denúncias e reivindicações por

melhor assistência à saúde e educação, além de fortes críticas à administração da

FUNAI. Esses movimentos foram iniciados no norte do país, e de forma geral

impulsionaram os professores indígenas a iniciarem articulações e formarem

associações, comissões em prol de melhorias na educação escolar indígena e também

comissões para a discussão ao acesso à educação superior.

As organizações indígenas buscavam formação específica para professores

indígenas, como forma de atender às necessidades das comunidades e também capacitá-

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los para gerenciar seus territórios, manejar instrumentos para a construção de

autonomia, promover a sustentabilidade e a construção de novos quadros de

interlocução com o Estado brasileiro, sem a mediação de outros profissionais (SOUZA

LIMA & HOFFMAN, 2004; BROSTOLIN & CRUZ, 2010).

Paralelo a este movimento, os organismos internacionais (BIRD, ONU, entre

outros) em prol dos direitos humanos, da diversidade cultural e do princípio da

alteridade, pressionava o Estado para que garantisse tais direitos por meio de

mecanismos regulatórios, como leis e decretos.

Um marco regulatório importante neste aspecto é sem dúvida, a Constituição

Federal de 1988, a qual definiu princípios que reconhecem a diversidade sociocultural e

asseguram a manutenção linguística dessas sociedades, cabendo ao Estado proteger:

“As manifestações das culturas populares indígenas e afro-brasileiras, e as de outros

grupos participantes do processo civilizatório nacional” (art. 215). Nesse processo de

mudança na concepção da educação indígena, a Constituição Federal de 05 de outubro

de1988 estabeleceu que: “[...] é assegurada às comunidades indígenas também a

utilização de suas línguas maternas e processos próprios de aprendizagem”

(BROSTOLIN, 2007).

A referida Constituição Federal, conhecida, inclusive, como Constituição

Cidadã, estabeleceu alguns princípios fundamentais que se refletem no campo

educacional:

Art. 3º, IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação[...];

Art. 5º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade [...];

Art. 23, V - é competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, proporcionar os meios de acesso à cultura, à educação e à ciência [...];

Art. 205 - A educação é direito de todos e dever do Estado [...];

Art. 206 - O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:

I – igualdade de condições para o acesso e permanência na escola; [...];

III – pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas, e coexistência de instituições públicas e privadas de ensino [...];

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Art. 210 - Serão fixados conteúdos mínimos para o ensino fundamental, de maneira a assegurar formação básica comum e respeito aos valores culturais e artísticos, nacionais e regionais [...];

Art. 215 - O Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização e a difusão das manifestações culturais [...];

Art. 216 - Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira [...];

Art. 227 - É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão [...];

Art. 242, § 1º - O ensino da História do Brasil levará em conta as contribuições das diferentes culturas e etnias para a formação do povo brasileiro. (BRASIL, 1988).

A partir da Constituição Federal de 1988, houve mudanças na legislação

educacional, impulsionadas por pressões dos organismos internacionais, pelas forças do

movimento das organizações não governamentais, das entidades em defesa da causa

indígena e lideranças indígenas (ALBUQUERQUE, 2004).

De acordo com o Decreto Presidencial n. 26 de 4 de fevereiro de 1991, o

Governo Federal passou a responsabilidade pela educação indígena da Fundação

Nacional do Índio (FUNAI) para o Ministério da Educação (MEC) e, de acordo com o

artigo 1º, “Ao Ministério da Educação com a competência para coordenar as ações

referentes à educação indígena, em todos os níveis e modalidades de ensino, ouvida a

FUNAI” (BRASIL, 1991).

No sentido de regulamentar a competência do Ministério da Educação para

coordenar ações referentes à educação indígena foi criada a Portaria Interministerial

número 559, de 16 de abril de 1991. Tal dispositivo permite que os índios tenham

garantidas características específicas de educação no que se refere à formação de

professores, currículos, calendários, metodologias, avaliação e materiais didáticos. O

documento garante às “comunidades indígenas uma educação escolar básica de

qualidade, laica e diferenciada, que respeite e fortaleça seus costumes, tradições, língua,

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processos próprios de aprendizagem e reconheça suas organizações sociais” (BRASIL,

1991).

Fortalecendo o movimento indígena e sua relação com as conquistas

internacionais na área da educação, foi realizada, em paralelo à Conferência Mundial

das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, a “Rio-92”, a

Conferência Mundial dos Povos Indígenas, liderada por Marcos Terena, indígena

(FISCHMANN, 2009).

A Conferência resultou na “Carta da Terra”, que incorporou 109 recomendações

feitas por 700 indígenas de todo o mundo, e a “Declaração da Kari-Oca”, assim

denominada por ter sido realizada na denominada “Aldeia Kari-Oca”, na cidade do Rio

de Janeiro (TERENA, 2008)

Dessa forma, a referida Conferência:

[...] se afirmou como marco internacional, fortaleceu a emergência de novos participantes indígenas e de novas relações políticas na arena social, sendo que alguns dos protagonistas têm gradativamente sido reconhecidos como interlocutores na arena educacional, assumindo cada vez mais significado e espaço nos debates sobre a educação nacional (FISCHMANN, 2009, p.160).

Em 1993, o MEC lançou as Diretrizes para a Política Nacional de Educação

Escolar Indígena, pela qual o Estado tem a responsabilidade de fornecer subsídios para a

implantação de escolas indígenas, respeitando as particularidades de cada grupo

(BARÃO, 2003).

Nessa ótica, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) reafirma,

nos artigos 78 e 79, que tratam especificamente da educação escolar indígena, que

“deve ser assegurada às comunidades indígenas a utilização da língua materna no ensino

fundamental regular e a valorização das culturas e etnias”. Ressalta também a

importância da participação das comunidades no planejamento dos programas

educacionais (BROSTOLIN, 2003; ALBUQUERQUE, 2004).

A autora Fischmann (2009, p. 161) considera um avanço a conquista da

participação indígena no contexto das decisões políticas:

[...] por meio de representação indígena no Conselho Nacional de Educação, sendo a primeira representante indígena a professora Francisca Novantino D'Angelo, a Chiquinha Pareci, no mesmo momento em que pela primeira vez o Conselho Nacional de Educação passava a ter representação afrodescendente, na pessoa da professora Petronilha Beatriz Gonçalves e Silva; inclusão dos Referenciais Curriculares Indígenas como parte das diretrizes curriculares

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nacionais; cursos de formação de professores indígenas, além de outras medidas correlatas.

Fischmann considera que “este é um dos impactos mais evidentes de integração

das garantias jurídicas internacionais com as conquistas nacionais” (2009, p.161).

O Plano Nacional de Educação (PNE), lei n. 10.172 de 9 de janeiro de 2001,

destina um capítulo específico à Educação Indígena. Entre os 21 objetivos e metas do

referido documento, destacamos:

6. Criar, dentro de um ano, a categoria oficial de “escola indígena” para que a especificidade do modelo intercultural e bilíngue seja assegurada.

15. Instituir e regulamentar, nos sistemas estaduais de ensino, a profissionalização e o reconhecimento público do magistério indígena, com a criação da categoria de professores indígenas como carreira específica do magistério.

17. Formular, em dois anos, um plano para a implementação de programas especiais para a formação de professores indígenas em nível superior, através da colaboração das universidades e de instituições de nível equivalente.

No escopo da formação de professores indígenas e das propostas de educação

superior, destaca-se a I Conferência Nacional de Educação Escolar Indígena, I

CONEEI, realizada em Luziânia, Goiás, em 2009, sob a responsabilidade do MEC, em

parceria com a Fundação Nacional do Índio, FUNAI, e o Conselho Nacional de

Secretários de Educação, CONSED. No documento “Das Modalidades de Ensino na

Educação Escolar Indígena”, foram feitas 10 recomendações relativas ao tema da

educação superior (BRAND & CALDERONI, 2012, p.87).

Destaca-se entre elas:

O MEC e a FUNAI devem garantir recurso orçamentário e financeiro para o acesso, permanência e acompanhamento do estudante indígena durante todo o curso superior, através de programas de apoio pedagógico e bolsas de estudo condizentes com a realidade das cidades.

E, em especial, o estado de Mato Grosso do Sul é citado entre as

recomendações:

O MEC e CNE devem iniciar processo de elaboração das diretrizes para educação superior indígena, contando com ampla participação dos povos e associações indígenas, assegurando, na educação superior, o diálogo entre os saberes científicos e saberes tradicionais indígenas (Dourados, Nordeste I,

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Roraima) (I Conferência Nacional de Educação Escolar Indígena – I CONEEI, 2009).

3.5 Educação Superior no Estado do Mato Grosso do Sul

A seguir destacaremos os principais fatos e acontecimentos históricos e políticos

que marcam a expansão e ampliação da educação superior no estado de Mato Grosso do

Sul.

Abordar a história de Mato Grosso do Sul implica, de pronto, um olhar de alcance mais largo que deve ir às fronteiras onde o Brasil foi Paraguai, mas impõe também estender a vista até Mato Grosso que abrigou, desde a Colônia, as terras e povos hoje divididos em duas unidades federativas distintas (BITTAR, 1997, p. 12).

A expansão e a interiorização da educação superior no estado de Mato Grosso

do Sul foram fortemente influenciadas pelas questões políticas em nosso país. O

movimento expansionista e a interiorização já eram intenções governamentais desde

1900, conforme afirmam Villas Boas e Villas Boas (1994).

A necessidade de controle do território nacional foi balizada pelo autoritarismo,

a partir do capitalismo, que inicia na década de 1930 e se consolida na necessidade de

expansão e ocupação territorial. No estado do Mato Grosso, essa ideia foi lançada por

Getúlio Vargas na década de 1940, com o objetivo de implementar o imperialismo

brasileiro, baseado na expansão demográfica e econômica (BITTAR, 1997).

Já na gestão do general Ernesto Geisel, entre os anos de 1974 a 1979, o projeto

separatista tinha somente a finalidade de redividir o território, com o propósito de

otimizar áreas com potencial de desenvolvimento.

O movimento divisionista no sul do então estado do Mato Grosso era liderado

pela classe dominante sul-mato-grossense.Os fatores socioeconômicos e políticos

determinantes para o nascimento das ideias autonomistas do sul foram:

[...] distanciamento do sul em relação ao centro decisório; falta de comunicação eficiente entre as duas porções do estado, bem como favorecimento de municípios e políticos nortistas pela proximidade a Cuiabá; além do controle da burocracia pelo norte, foram fatores que propiciaram o nascimento de ideias autonomistas no sul. Na verdade, tão logo consolidou-se o seu povoamento iniciaram-se os conflitos, de tal forma que as raízes históricas da divisão aí se encontram (BITTAR, 1997, p. 32).

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Os estudos realizados por Bittar (1997) revelam que, no que se refere à

educação, os municípios do sul do Estado, mesmo com superioridade demográfica,

contavam com poucas unidades escolares.

Outro fator que a autora destaca é a representatividade de Deputados Estaduais

no ano de 1959: das 30 vagas existentes, 21 foram preenchidas por candidatos do sul do

Estado. Portanto, a história da educação superior no Mato Grosso do Sul foi marcada

pela acirrada disputa política, econômica e geográfica. O antigo estado do Mato Grosso

estava marcado por disputas acirradas pela hegemonia de poder político e econômico,

entre o sul e o norte, representados, respectivamente, pelas cidades de Campo Grande e

Cuiabá. Sendo comum Campo Grande aparecer em reportagens encabeçando as

arrecadações do Estado, superando a capital Cuiabá (BITTAR, 2006).

Em meados da década de 1950, padres salesianos fizeram tentativas de iniciar o

ensino superior no Estado (ainda Mato Grosso); no entanto, somente em 1961 foi

autorizada a instalação dos cursos de Pedagogia e Letras, na recém-criada Faculdade

Dom Aquino de Filosofia, Ciências e Letras, na cidade de Campo Grande (FEDAFI)

(BITTAR et al, 2003).

Em 1965, o estado do Mato Grosso, governado por Pedro Pedrossian, foi

condecorada como “capital do ensino” pelo Presidente Fernando Corrêa da Costa.

No ano de 1966, foi fundada em Campo Grande a faculdade de Direito pelos

salesianos.

Em fins de 1969, foi criada a Universidade Federal de Mato Grosso, com sede

em Cuiabá. Com isso, contrariava-se a vontade do então governador Pedro Pedrossian,

que era sulista e defendia que Campo Grande se encontrava em pleno desenvolvimento

e expansão econômica. Fato esse que gerou grande insatisfação.

As características geográficas do Estado dificultavam o acesso dos estudantes à

educação superior. O estudo realizado por Pistori (2004) aponta que:

A maioria da população estudantil estava localizada na zona rural, o que dificultava a frequência aos centros urbanos para estudar, além de possuir instituições apenas em Cuiabá e em Campo Grande. Assim, esse número de 23.808 matriculados não corresponde à total demanda pelo ensino superior (p. 80).

Na tentativa de promover a interiorização da educação superior a Missão

Salesiana de Mato Grosso criou mais três faculdades na região sul: Faculdade de Direito

de Campo Grande, (FADIR) criada em 1965, a Faculdade de Ciências Econômicas,

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Contábeis e Administração (FACECA), criada em 1970, e a Faculdade de Serviço

Social (FASSO), criada em 1972.

Na década de 1970, foram criadas outras Instituições de Ensino Superior no sul

do Mato Grosso, entre elas a Sociedade Civil de Educação da Grande Dourados

(SOCIGRAN), na região da Grande Dourados (BITTAR et al, 2006).

Em janeiro de 1970, ainda no governo de Pedro Pedrossian, foi criada a

Universidade Estadual do Mato Grosso em Campo Grande (atualmente Universidade

Federal de Mato Grosso do Sul).

Segundo Vieira (1995)

Um fator importante que impulsionou a expansão da Educação Superior no estado foi na presidência de Emilio Garrastazu Médici (1969-1974). Sua política visava a aceleração do desenvolvimento e contenção da inflação. As medidas tendiam a fortalecer empresas privadas nacionais e estrangeiras; estimulavam o desenvolvimento social, valorizando a educação e ampliando as oportunidades de emprego (p.204).

Em 11 de outubro de 1977, por meio da Lei Complementar nº 31, foi assinada a

divisão do Estado pelo presidente Ernesto Geisel, criando o estado de Mato Grosso do

Sul. Harry Amorim Costa foi nomeado como governador.

A década de 1980 foi marcada pela expansão quantitativa no ensino superior no

novo estado da federação. Mas foi nos anos 1990 que as características da expansão e da

privatização mais se acentuaram, como destacam as autoras Bittar et al (2006):

• Em 27 de outubro de 1993 a FUCMT transformou-se em Universidade

Católica Dom Bosco, por meio da Portaria MEC nº 1.547;

• Em 1994 iniciava suas atividades a União da Associação de Educação

Sul Mato-Grossense (UNAES), mantenedora da Faculdade de Campo

Grande (FIC), com os cursos de Ciências Contábeis, Direito, Ciências

Econômicas e Pedagogia;

• A Universidade Estadual do Mato Grosso do Sul, instituída pela Lei

Estadual n° 1461, de 20 de dezembro de 1993, iniciou suas atividades no

ano de 1994, sendo oficialmente credenciada em 1997;

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• No ano de 1996, o CESUP transformou-se em Universidade para o

Desenvolvimento do Estado e da Região do Pantanal (UNIDERP), por

meio do Parecer nº 153, de 2 de dezembro de 1996;

• Em 1999 a Sociedade da Grande Dourados (SOCIGRAN) transformou-

se em Centro Universitário da Grande Dourados (UNIGRAN), nos

moldes do Decreto nº 2.306, de 19 de agosto de 1997.

E na última década

• Em 2005 - transformação da FIC em Centro Universitário de Campo

Grande (UNAES);

• Em 2006 – criada a Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD).

Como se pode observar, o contexto histórico da educação superior no estado de

Mato Grosso do Sul se inicia concomitantemente tanto pela iniciativa pública quanto

pela privada.

Conforme estudo realizado por Bittar et al (2006) “Educação Superior Brasileira

1991 - 2004: Mato Grosso do Sul”, organizado pelo INEP, no ano de 1991, o estado de

Mato Grosso do Sul possuía 11 IES e, no ano de 2004, chegou a 41, ou seja, um

crescimento de 86,4%. Esse crescimento foi menor do que o conjunto da região Centro-

oeste – de 128,7% -e do Brasil, que apresentou um crescimento de 118,3%, como se

observa na Tabelas 2 e 3 a seguir.

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Tabela 2: Crescimento das instituições de educação superior - Brasil, Região Centro-Oeste e Mato Grosso do Sul - 1991-2004.

Fonte: MEC/Inep/Deaes in Bittar et al (2006).

Tabela 3: Crescimento das Instituições de Educação Superior, por categoria administrativa - Mato Grosso do Sul 1991-200423

Fonte: MEC/Inep/Deaes 2005, in Bittar et al (2006).

23 Embora a UEMS tenha iniciado suas atividades em 1994, somente em 1997 passa a constar nos dados do INEP.

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No que se refere ao número de IES por categoria administrativa, o estado de

Mato Grosso do Sul, no ano de 1991, contava com 11 IES, das quais uma era pública e

dez eram privadas. Em 1996, esse número dobrou, chegando a 22 IES, permanecendo

com uma IES pública e 21 IES privadas. No ano de 1997 foi autorizado o

funcionamento da UEMS e o estado passou a ter duas IES públicas e duas IES

particulares foram fundidas, adquiridas por um grupo educacional do estado de São

Paulo.

Sobre a fusão do estado de Mato Grosso do Sul, o autor Sguissard (2008, p.

1006) apud Almeida(2008) enfoca

[...]a rede Anhanguera, fundada e presidida pelo professor Antonio Carbonari Netto. Com ações na BOVESPA, onde teria captado em um ano quase um bilhão de reais. Entre suas últimas aquisições está a UNIDERP, universidade de Campo Grande (MS).

Entre as IES privadas, nos anos de 1991 a 1996, o Estado contava com uma

universidade privada, a Universidade Católica Dom Bosco, reconhecida pelo MEC em

1993, e, no período de 1996 a 2004, passou a contar com a Universidade para o

Desenvolvimento do Estado e da Região do Pantanal (BITTAR et al, 2006).

Outro fato que também é destacado pelo estudo é o que o processo de

interiorização da educação superior, desencadeado tanto pelo setor público, que

registrou no ano de 2004 a instalação de 18 campi no interior e dois na capital, quanto –

principalmente – pelo setor privado, com 60 campi no interior e oito na capital. No setor

público, esse resultado está relacionado ao início das atividades da Universidade

Estadual de Mato Grosso do Sul, por sua característica multicampi, ofertando cursos de

graduação em vários municípios do interior do Estado, como veremos no capítulo V, no

qual nos deteremos na análise do processo de implementação da política de Ação

Afirmativa, abarcando aspectos da descrição histórica da referida IES.

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Em relação às vagas ociosas entre as IES públicas do estado de Mato Grosso do

Sul, esse número é praticamente nulo entre os anos de 1991 a 2004. Já entre as privadas,

das 23.319 vagas oferecidas, 14.787 ingressaram na educação superior, representando

um percentual de ociosidade de 36,6%, conforme se observa na Tabela 4.

Tabela 4: Vagas oferecidas, ingressantes e percentual de ociosidade nas instituições privadas - Região Centro-Oeste 2004

Fonte: MEC/Inep/Deaes, in Bittar et al (2006).

No estudo, os autores levantam duas hipóteses para esse cenário: a primeira

considera a criação da UEMS e sua característica multicampi, que atendia e atende os

municípios do interior do Estado; e a segunda, que a renda per capta dos sul mato-

grossenses era incompatível com a condição de pagar uma IES particular, conforme

dados do IBGE-Pnad(2004), em relação ao número de jovens com idade entre 18 e 24

anos, pertencentes às classes mais elevadas de renda e que poderiam pagar

mensalidades nas escolas privadas, conforme se observa na Tabela 5.

Tabela 5: Número de jovens que poderiam pagar mensalidades nas escolas privadas e número de estudantes matriculados nas IES privadas, em 2004

Fonte: MEC/Inep/Deaes, in Bittar et al (2006).

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Portanto, o desafio do Estado está não só em expandir o número de vagas em

instituições públicas, é também garantir condições de permanência e acesso.

No que se refere à presença do critério raça/cor nas IES do Mato Grosso do Sul,

assim como a situação verificada no Brasil, as universidades do Estado têm realizado

parcerias, especialmente no que diz respeito ao oferecimento de cursos voltados para a

formação de professores índios. No ano de 2003, a Universidade Estadual do Mato

Grosso do Sul (UEMS) realizou o primeiro vestibular com o sistema de cotas para

negros e índios em uma universidade pública do Estado (BITTAR et al, 2006).

O primeiro impacto da política de inclusão da UEMS se expressa no percentual

de indígenas presentes nos campi, 1,7%, maior que sua presença na sociedade, de 0,2%,

conforme se observa na Tabela 6. Esse percentual positivo é significativo e está

relacionado à implantação de cotas para indígenas na Universidade Estadual de Mato

Grosso do Sul. No entanto, os dados do estudo são gerais e não revelam, por exemplo,

qual a representatividade de etnias nesse universo ou qual o percentual dos que

concluem a graduação.

Tabela 6: Presença da cor/raça na sociedade e no campus - Mato Grosso do Sul 2005

Fonte: Inep/Deaes, 2005 in Bittar et al (2006).

Uma das formas de ingresso dos acadêmicos indígenas nas Instituições de

Educação Superior (IES) particulares foi, especialmente na década de 1990, por meio do

convênio firmado entre a Fundação Nacional do Índio (FUNAI) e as instituições que

tivessem interesse, garantindo a isenção de pagamento de 50% do valor da mensalidade.

O acesso de estudantes indígenas a programas como o ProUni e Enem não tem

funcionado bem, por uma série de motivos, em especial devido às dificuldades de se

obter informações sobre os programas mencionados, assim como de acesso à Internet,

conforme afirmação do estudo desenvolvido por Brand e Calderoni (2012).

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O referido estudo dos autores acima citados também revela que a busca pelas

IES particulares decorre das dificuldades dos acadêmicos em ingressarem nas IES

públicas, somadas à opção pelo horário noturno de alguns cursos e/ou à proximidade

dos campi.

Levantamento realizado pelo Projeto Rede de Saberes, em 2008, relata que a

Universidade Católica Dom Bosco (UCDB) oferecia bolsa de 50% na mensalidade para

todos os alunos indígenas, e a FUNAI arcava com bolsa de 25% da mensalidade para 25

acadêmicos dessa universidade. Já o Centro Universitário da Grande Dourados –

UNIGRAN, no ano de 2007, oferecia bolsa de 50% para os seus 46 alunos indígenas

matriculados. A Universidade para o Desenvolvimento do Estado e da Região do

Pantanal – UNIDERP – contava com bolsas de 25% de desconto na mensalidade pela

FUNAI, oferecidas para 15 acadêmicos indígenas, dos 19 matriculados, em 2007.

Estudo realizado por Brand e Calderoni (2012) constatou que, no Estado, a

UCDB e a UNIGRAN, no ano de 2011, contavam com 130 acadêmicos indígenas em

cursos regulares, que recebiam descontos especiais de 50% nas mensalidades. E a

UEMS, naquele mesmo ano, possuía 284 acadêmicos indígenas inseridos em diversos

cursos regulares de graduação.

Inicialmente esses números podem representar um aumento na quantidade de

ingressantes, mas ainda nos questionamos sobre alguns aspectos do acesso à educação

superior. Entre eles, a necessidade de estudos mais aprofundados que possam nos

apontar alguns caminhos para a seguinte questão: dos alunos indígenas concluintes do

ensino médio, quantos ingressam na educação superior?

De acordo com o último levantamento realizado pelo INEP (2013), o estado de

Mato Grosso do Sul conta com 44 Instituições de Educação Superior (IES) do Estado,

das quais, 40 são privadas e quatro públicas. Das 40 IES privadas, na classificação por

organização acadêmica há duas universidades, dois centros universitários e 36

faculdades. Das quatro IES públicas, três são universidades e um, instituto tecnológico.

Em relação à categoria, das 40 IES privadas, sete são privadas com fins lucrativos e 33

privadas sem fins lucrativos. Das quatro IES públicas, três são públicas federais e uma,

pública estadual, conforme se observa no Quadro 4a.

Como se observou o acesso à educação superior de indígenas no Estado tem se

dado tanto através da IES públicas e privadas.

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103

Quadro 4a: Instituições de Educação Superior no Mato Grosso do Sul, por organização acadêmica e categoria – Ano base 2013 INSTITUIÇÃO (IES) ORGANIZAÇÃO

ACADÊMICA CATEGORIA

CENTRO UNIVERSITÁRIO ANHANGUERA DE CAMPO GRANDE

Centro Universitário Privada com fins lucrativos

CENTRO UNIVERSITÁRIO DA GRANDE DOURADOS (UNIGRAN)

Centro Universitário Privada Sem fins lucrativos

FACULDADE ANHANGÜERA DE DOURADOS (FAD)

Faculdade Privada com fins Lucrativos

FACULDADE CAMPO GRANDE (FCG) Faculdade Privada Sem fins lucrativos

FACULDADE DE ADMINISTRAÇÃO DE CHAPADÃO DO SUL (FACHASUL)

Faculdade Privada Sem fins lucrativos

FACULDADE DE ADMINISTRAÇÃO DE FÁTIMA DO SUL (FAFS)

Faculdade Privada Sem fins lucrativos

FACULDADE DE ADMINISTRAÇÃO DE NOVA ANDRADINA (FANA)

Faculdade Privada Sem fins lucrativos

FACULDADE DE ADMINISTRAÇÃO DE NOVA ANDRADINA - FANOVA (FANOVA)

Faculdade Privada Sem fins lucrativos

FACULDADE DE AMAMBAI (FIAMA) Faculdade Privada Sem fins lucrativos

FACULDADE DE CIÊNCIAS CONTÁBEIS DE NAVIRAI (FACINAV)

Faculdade Privada Sem fins lucrativos

FACULDADE DE CIÊNCIAS CONTÁBEIS DE NOVA ANDRADINA - FACINAN (FACINAN)

Faculdade Privada Sem fins lucrativos

FACULDADE DE EDUCAÇÃO DE COSTA RICA (FECRA)

Faculdade Privada com fins lucrativos

FACULDADE DE EDUCAÇÃO DE NOVA ANDRADINA (FENA)

Faculdade Privada Sem fins lucrativos

FACULDADE DE EDUCAÇÃO, TECNOLOGIA E ADMINISTRAÇÃO DE CAÇÕES AFIRMATIVASRAPÓ (FETAC)

Faculdade Privada Sem fins lucrativos

FACULDADE DE LETRAS DE NOVA ANDRADINA (FALENA)

Faculdade Privada Sem fins lucrativos

FACULDADE DE PEDAGOGIA (ANAEC) Faculdade Privada Sem fins lucrativos

FACULDADE DE PONTA PORÃ (FAP) Faculdade Privada Sem fins lucrativos

FACULDADE DE SELVÍRIA (FAS) Faculdade Privada Sem fins lucrativos

FACULDADE DE TECNOLOGIA DE NOVA ANDRADINA

Faculdade Privada Sem fins lucrativos

FACULDADE DE TECNOLOGIA DE PONTA PORÃ (FATEP)

Faculdade Privada Sem fins lucrativos

FACULDADE DE TECNOLOGIA SENAI CAMPO GRANDE

Faculdade Privada Sem fins lucrativos

FACULDADE DE TURISMO DE NOVA ANDRADINA (FATUR)

Faculdade Privada Sem fins lucrativos

FACULDADE ESTÁCIO DE SÁ DE CAMPO GRANDE (FESCG)

Faculdade Privada Sem fins lucrativos

FACULDADE MATO GROSSO DO SUL (FACSUL)

Faculdade Privada Sem fins lucrativos

FACULDADE SALESIANA DE SANTA TERESA (FSST)

Faculdade Privada Sem fins lucrativos

FACULDADES INTEGRADAS DE CASSILÂNDIA (FIC)

Faculdade Privada com fins lucrativos

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INSTITUIÇÃO (IES) ORGANIZAÇÃO ACADÊMICA

CATEGORIA

FACULDADES INTEGRADAS DE FÁTIMA DO SUL (FIFASUL)

Faculdade Privada Sem fins lucrativos

FACULDADES INTEGRADAS DE NAVIRAÍ (FINAV)

Faculdade Privada Sem fins lucrativos

FACULDADES INTEGRADAS DE PARANAÍBA - FIPAR (FIPAR)

Faculdade Privada Sem fins lucrativos

FACULDADES INTEGRADAS DE PONTA PORÃ (FIP)

Faculdade Privada Sem fins lucrativos

FACULDADES INTEGRADAS DE RIO VERDE (FIRVE)

Faculdade Privada com fins Lucrativos

FACULDADES INTEGRADAS DE TRÊS LAGOAS (AEMS)

Faculdade Privada Sem fins lucrativos

FACULDADES MAGSUL (FAMAG) Faculdade Privada Sem fins lucrativos

FACULDADE SUPERIOR DE RIBAS DO RIO PARDO (FASURP)

Faculdade Privada com fins Lucrativos

FACULDADE TEOLÓGICA BATISTA ANA WOLLERMAN (FTBAW)

Faculdade Privada Sem fins lucrativos

FACULDADE UNIGRAN CAPITAL (UNIGRAN CAPITAL)

Faculdade Privada Sem fins lucrativos

FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DA GRANDE DOURADOS (UFGD)

Universidade Pública Federal

INSTITUTO DE ENSINO SUPERIOR DA FUNLEC (IESF)

Faculdade Privada Sem fins lucrativos

INSTITUTO DE ENSINO SUPERIOR DA FUNLEC DE BONITO (IESF)

Faculdade Privada Sem fins lucrativos

INSTITUTO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA DE MATO GROSSO DO SUL (IFMS)

Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia

Pública Federal

UNIVERSIDADE CATÓLICA DOM BOSCO (UCDB)

Universidade Privada Sem fins lucrativos

UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MATO GROSSO DO SUL (UEMS)

Universidade Pública Estadual

UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO DO SUL (UFMS)

Universidade Pública Federal

UNIVERSIDADE ANHANGUERA UNIDERP Universidade Privada Com fins lucrativos

Elaborado pela autora Fonte:NEP (2013) http://emec.mec.gov.br/

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105

3.6 Indígenas nas universidades brasileiras

A seguir discorreremos sobre as primeiras iniciativas de políticas de Ações

Afirmativas como o foco na educação para indígenas presentes na Federação e no

estado do Mato Grosso do Sul.

A Constituição Federal de 1988 é um marco importante no reconhecimento das

diversidades culturais e étnicas, pois assegura aos povos indígenas o respeito às

diferenças. Conforme afirma Januário (2002):

A educação intercultural valoriza o desenvolvimento de estratégias que promovem a construção das identidades particulares e o reconhecimento das diferenças. Trabalha na perspectiva de que as instituições educativas reconheçam o papel ativo do educando na elaboração, escolha e atuação das estratégias pedagógicas. Essa prática educacional está constantemente repensando as funções, os conteúdos e os métodos escolares, de modo a afastar-se do caráter monocultural presente no universo escolar (p. 18).

Para assegurar essa educação intercultural, iniciou-se a formação superior de

professores indígenas, abrindo um leque para as questões relacionadas ao ensino

superior. No Brasil, várias universidades iniciaram com o curso Normal Superior, que

normalmente ainda é oferecido durante as férias escolares.

Como vimos anteriormente, os movimentos e encontros organizados pelos

professores indígenas somaram-se às forças das ONGs e associações que impulsionaram

e obrigaram o país a discutir o estabelecimento de uma política de inclusão e de

permanência de indígenas nas universidades.

Os povos indígenas buscam a formação superior para o fortalecimento dos

conhecimentos indígenas, reelaboração de mecanismos de produção e negociação de

conhecimentos para que possam gerir seus territórios, planejar e desenvolver projetos

em proveito de suas comunidades.

No que se refere à formação de professores indígenas, a Resolução nº 3 de 10 de

novembro de 1999 do Conselho Nacional de Educação estabeleceu, naquela data, o

prazo de 10 anos para que todos os professores indígenas possuam o ensino superior .

É nesse cenário que foi criado pelo Ministério da Educação o Programa

Diversidade na Universidade (PDU), instituído por meio da lei n. 10.558, de 13 de

novembro de 2002, por meio de recursos internacionais do Banco Interamericano de

Desenvolvimento. O objetivo primordial do Programa Diversidade na Universidade

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106

era“promover la equidad educativa y la diversidad en la enseñanza superior para los

afro descendientes y indígenas y otros grupo socialmente desfavorecidos del país” (BID,

2002, p. 1) e também pretendia:

[...] dar contar das pressões internacionais sobre apolítica de cotas, a Diversidade na Universidade, ao atuar nos cursos preparatórios para o vestibular, entre o ensino médio e o superior, pretendia dar conta também das demandas provenientes de setores do movimento negro que estavam mobilizados com a construção desses cursos pré-vestibulares (ALMEIDA, 2008, p 62).

A proposta do PDU destinava-se, inicialmente, a afrodescendentes, mas

pressões dos movimentos indígenas e indigenistas ligados especialmente à educação

questionaram que a diversidade sugerida pelo Programa não incluísse os povos

indígenas, de modo que os atores envolvidos na elaboração das propostas passaram a

inclui-los.

A autora acima citada aponta:

Algumas experiências importantes, que se constituíram como marcos para esse tipo de movimento, são os cursos do Instituto Cultural Steve Biko que vêm sendo realizados desde 1992 em Salvador/BA, o Movimento Pré-Vestibular para Negros e Carentes (PVNC), no Rio de Janeiro, e o Movimento dos Sem-Universidade (MSU) (ALMEIDA, 2008, p 62).

O Programa previa auxílio financeiro para bolsas de estudo para alunos

indígenas, e em alguns casos, para professores e coordenadores. As instituições

interessadas deveriam concorrer ao programa via editais públicos.

Com o objetivo de atender aos princípios de igualdade, mas, principalmente

,atentar ao contexto da equidade e diversidade sociocultural, assim como tentar

responder aos desafios da inclusão, foi criada no Brasil, no ano de 2004, no Ministério

da Educação e Cultura (MEC), a Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e

Diversidade (SECAD).

O objetivo institucional do SECAD era contribuir para a redução das

desigualdades educacionais com políticas públicas que assegurassem a ampliação do

acesso e da educação continuada, valorizando a diversidade social, cultural e étnico-

racial da população.

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107

Naquele mesmo ano foi realizado, no Distrito Federal, o seminário “Desafios

para uma Educação Superior para os Povos Indígenas”, reafirmando que as políticas de

Ações Afirmativas que objetivam a inclusão social do indígena no ensino superior

devem conjugar uma perspectiva pluricultural, que respeite a diversidade e as

perspectivas indígenas diferenciadas, sob pena de tornarem-se expediente de controle e

regulação burocrática das demandas de cidadania indígena (RELATÓRIO

SEMINÁRIO, 2004).

Em 2004, o projeto de lei nº 3627/04, aprovado em novembro de 2008, no dia

em que se comemora a Consciência Negra, assegurava que as instituições públicas

Federais de educação superior deveriam reservar, no mínimo, 50% de vagas para alunos

que cursaram integralmente o ensino médio em escolas públicas, incluindo, nessa cota,

os afrodescendentes e indígenas, de acordo com a proporção de negros, pardos e índios

na população do estado, conforme os dados do censo do IBGE.

Mesmo sendo considerada uma medida compensatória, o sistema de cotas ainda

é a única forma de acesso dos indígenas aos cursos superiores, principalmente aos

cursos mais prestigiados, como Direito, Medicina e outros, nos quais a concorrência no

vestibular é mais desigual do que em qualquer outro grupo social.

Destacam-se iniciativas como

Em julho de 2001, foi implantada a primeira licenciatura indígena do país pela Universidade do Estado do Mato Grosso (UNEMAT), de forma intervalar. Em dezembro do mesmo ano, a Universidade Federal de Roraima (UFRR) também implantou cursos específicos para formar professores índios, com a criação do Núcleo Insikiran (DAVID, 2013, p. 114).

Naquele mesmo ano a UEMS criou o Curso Normal Superior, inicialmente para

professores indígenas das etnias Terena e Kadwéu e, a partir de 2003, para os

professores Guaranis Kaiowás. Nesse mesmo movimento foi criada a licenciatura

Guarani Teko Arandu, uma parceria entre a Universidade Católica Dom Bosco e a

Universidade da Grande Dourados, construída a partir de encontros com professores

indígenas das etnias Guaranis Kaiowás.

Também nessa perspectiva, o Projeto Trilhas do Conhecimento, implantado

desde o ano de 2004, com o apoio da Fundação Ford e Pathways to Higher Education,

tem contribuído para o estímulo ao ingresso e permanência de estudantes indígenas nas

universidades brasileiras. O Programa realiza encontros, produz materiais didáticos e

pesquisas. Apoia também o projeto de extensão Rede de Saberes da Universidade

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108

Estadual de Mato Grosso do Sul, que será discutido detalhadamente no capítulo 4

(LÁZARO et al, 2013).

A Declaração Universal sobre os Direitos dos Povos Indígenas, aprovada na

Assembleia Geral da ONU, no dia 13 de setembro de 2007, é considerada uma das mais

importantes medidas sobre a questão étnica e racial no âmbito do direito internacional

(ALMEIDA, 2008) (ANEXO 5). Entre os vários aspectos de garantia dos direitos

humanos universais, a referida Declaração aborda a educação indígena no seu artigo 14:

1. Os povos indígenas têm direito de estabelecer e controlar seus sistemas e instituições docentes que os eduquem em seus próprios idiomas, em consonância com seus métodos culturais de ensino e aprendizagem.

2. As pessoas indígenas, em particular as crianças indígenas, têm direito a todos os níveis e formas de educação do Estado sem discriminação.

O estudo realizado por Cajueiro (2008) entre os anos de 2001 e 2007 constatou

que existiam no país 30 IES estaduais e federais que contemplavam populações

indígenas com alguma forma de Ação Afirmativa. Entre as modalidades de Ação

Afirmativa estavam inclusos o sistema de cotas para vestibular e pontos adicionais,

conforme se observa no Quadro 5.

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109

Quadro 5: Instituições de Educação Superior – federais e estaduais – vagas suplementares e cotas para indígenas.

INSTITUIÇÃO

ESTADO DESCRIÇÃO SELEÇÃO

UFPR Resolução n. 37/2004

Paraná 07 vagas suplementares aos Indígenas residentes no Paraná

Vestibular Específico

UEL Lei Estadual 14.995/2006

Paraná 06 vagas suplementares aos indígenas residentes no Paraná Vestibular Específico

UEM Lei Estadual 14.995/2006

Paraná 06 vagas suplementares aos indígenas residentes no Paraná Vestibular Específico

UEPG Lei Estadual 14.995/2006

Paraná 06 vagas suplementares aos indígenas residentes no Paraná Vestibular Específico

UNICENTRO Lei Estadual 14.995/2006

Paraná 06 vagas suplementares aos indígenas residentes no Paraná Vestibular Específico

UNESPAR Lei Estadual 14.995/2006

Paraná 06 vagas suplementares aos indígenas residentes no Paraná Vestibular Específico

UENP Lei Estadual 14.995/2006

Paraná 06 vagas suplementares aos indígenas residentes no Paraná Vestibular Específico

UFSC Resolução n. 37/2004

Santa Catarina

Para candidatos pertencentes aos povos indígenas, serão criadas 5 vagas suplementares que serão preenchidas pelos candidatos melhor classificados no vestibular

Vestibular geral

UFSM Resolução 011/2007 de 03/08/2007

Rio Grande do Sul

Sistema cidadão presente: para candidatos indígenas; serão criadas até 5 novas vagas, distribuídas nos cursos de graduação em que houver procura

Vestibular geral

UFRGS Decisão do CEPE n. 039/2007

Rio Grande do Sul

Oferta de 10 vagas suplementares àquelas ofertadas no concurso vestibular 2008, a serem disputadas pelos estudantes indígenas do território nacional

Vestibular específico

UNIMONTES Lei n. 15.259 de 27/07/2004

Minas Gerais

Portadores de deficiência e indígenas: 5% de reserva em cada curso

Vestibular geral

UEMG Lei n. 15.259 de 27/07/2004

Minas Gerais

Portadores de deficiência e indígena: 5% de reserva em cada curso

Vestibular geral

UFSCar Resolução CEPE n. 563 de 05/11/2007

São Paulo 01 vaga suplementar em cada curso de graduação para candidatos indígenas

Vestibular geral

UNIFESP Resolução 42 de 12/07/2007

São Paulo Para candidatos que optarem pelo sistema de cotas e que se autodeclararem com cor de pele preta, parda ou indígena e tenham cursado o Ensino Médio integralmente em escolas públicas, são oferecidas mais 10% de vagas em cada curso

Vestibular geral

UFABC Resolução UFABC n. 02 de 28/04/2006

São Paulo Em cada entrada de 500 vagas, serão reservadas 250 como cotas para egressos de escola pública e negros, sendo 01 para indígena

Vestibular geral

UNICAMP Deliberação A12-04 de 28/04/2004

São Paulo Após a 2ª fase do vestibular, acréscimo de 30 pontos à Nota Padronizada se forem egressos da escola pública, para os indígenas ainda mais 10 pontos

Vestibular geral

UFT Tocantins 5% das vagas de cada curso, são disponibilizados para indígenas

Vestibular geral

UFRR Resolução n. 08/07 do CEPE de 16/10/2007

Roraima Reserva de 23 vagas para indígenas Vestibular específico

UEA Art. 5º caput da lei 2.894 de 31/05/2004

Amazonas Reserva de 170 vagas para candidatos indígenas do estado Vestibular geral

UNEB Resolução n. 468/2007 do CONSU de 16/08/2007

Bahia 5% de vagas para candidatos indígenas Vestibular geral

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INSTITUIÇÃO

ESTADO DESCRIÇÃO SELEÇÃO

UEFS Resolução do CONSU 034/2006

Bahia 02 vagas por curso para indígenas Vestibular geral

UESC 63ª Reunião Ordinária do CONSEPE, realizada no dia 20/12/2006

Bahia Admitidas o acréscimo de até 02 vagas em cada curso, para indígenas reconhecidos pela FUNAI

Vestibular geral

UFBA Resolução CONSEPE n. 01/04 de 2004

Bahia

Abertura de até 02 vagas extras para indígenas aldeados e egressos da escola pública; além de 2% das vagas para os que se declararem descendentes de índios e forem egressos de escola pública

Vestibular geral

UFRB Resolução Consepe n. 01/04

Bahia

6,45 das vagas para candidatos de escola pública que se declararem de qualquer etnia ou cor; e, acréscimo de até 02 vagas para os que se declararem descendentes de índio

Vestibular geral

CEFET-BA Resolução n. 10 de 01/06/2006 do Conselho Diretor

Bahia Reserva de 5% para estudantes que se declararem índios ou seus descendentes

Vestibular geral

UFMA Resoluções 568 e 569 do CONSEPE de 24/10/2007 e Resoluções n. 48/2005 e 69/2006 do CONSAD

Maranhão 01 vaga adicional para índio por curso, a partir de 2008 Vestibular geral

UFMT Resolução CONSEPE n. 083 de 12/09/2007

Mato Grosso

Reserva de vagas nos cursos de agronomia (02); engenharia sanitária e ambiental (03); engenharia florestal (03) e nutrição (02)

Vestibular específico

UEG Lei n. 14.832 de 12/07/2004

Goiás

Reserva de 5% de vagas para indígenas e portadores de deficiência

Vestibular geral

UnB Convênio firmado em 13/05/2004 entre a Fundação Nacional do Índio (FUNAI) e a Fundação Universidade

Distrito Federal

Criação de vagas suplementares nos cursos de agronomia (02); enfermagem e obstetrícia (02); engenharia florestal (02); medicina (02) e nutrição (02)

Vestibular específico

UEMS Lei estadual n. 2.589 de 26/12/2002

Mato Grosso do

Sul

Cotas de 10% das vagas para indígenas Vestibular geral

Fonte: Cajueiro (2008).

Destaca-se que entre as IES do país, em 2002, a Universidade Estadual do Rio

de Janeiro (UERJ) foi a primeira instituição estadual a determinar cotas universitárias

para o ingresso diferenciado de negros e pardos.Em seguida, em 2003, a Universidade

Estadual da Bahia (UNEB), as estaduais do Paraná e a Universidade Estadual de Mato

Grosso do Sul (UEMS) adotaram o mesmo sistema.

A UEMS, no entanto, é pioneira, pois destina à população indígena 10% das

vagas. Já a Universidade Estadual da Bahia (UNEB)reserva 5% para estudantes que se

declararem índios ou seus descendentes, conforme se observa no quadro acima.

A Universidade de Brasília (UnB), em 2004, foi a primeira universidade federal

a adotar uma política de Ação Afirmativa, destinando uma reserva de cotas para negros

e de vagas suplementares para acadêmicos indígenas (BRAND & ATHAYDE, 2009).

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Em relação ao apoio estudantil, no dia 23 de dezembro do ano de 2009, com o

apoio do SECAD, foi aprovada a Lei 12.155, regulamentada pelo Decreto 7.416 de

dezembro de 2010, cujos artigos 9º a 13 dispõem:

Art. 9o Fica o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação – FNDE – autorizado a conceder bolsas para alunos e professores vinculados a projetos e programas de ensino e extensão voltados a populações indígenas, quilombolas e do campo.

Art. 10.Ficam as instituições federais de educação superior autorizadas a conceder bolsas a estudantes matriculados em cursos de graduação, para o desenvolvimento de atividades de ensino e extensão, que visem (Regulamento):

I - à promoção do acesso e permanência de estudantes em condições de vulnerabilidade social e econômica; e

II - ao desenvolvimento de atividades de extensão universitária destinadas a ampliar a interação das instituições federais de educação superior com a sociedade.

E no:

Art. 12.As bolsas previstas nos arts. 10 e 11 adotarão como referência os valores das bolsas correspondentes pagas pelas agências oficiais de fomento à pesquisa, bem como as condições fixadas em regulamento do Poder Executivo, que disporá, no mínimo, sobre (Regulamento):

I - os direitos e obrigações dos beneficiários das bolsas;

II - as normas para renovação e cancelamento dos benefícios;

III - a periodicidade mensal para recebimento das bolsas;

IV - as condições de aprovação e acompanhamento das atividades, programas e projetos no âmbito das instituições de educação superior ou pesquisa;

V - a avaliação das instituições educacionais responsáveis pelos cursos;

VI - a avaliação dos bolsistas; e

VII - a avaliação dos cursos e tutorias.

Parágrafo único. O quantitativo de bolsas concedidas anualmente observará o limite financeiro fixado pelas dotações consignadas nos créditos orçamentários específicos existentes na respectiva lei orçamentária anual.

Art. 13.As despesas com a execução das ações previstas nos arts. 9oe 10 desta Lei correrão à conta de dotação orçamentária consignada anualmente aos respectivos órgãos e entidades, considerando os recursos próprios captados, observados os limites de movimentação, empenho e pagamento da programação orçamentária e financeira anual.

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Em relação ao número de estudantes indígenas na educação superior os dados

ainda são escassos. Os estudos encontrados apontam que levantamento realizado pelo

Ministério da Educação em 2003 revelou um percentual de 1.300 indígenas que

ingressaram na educação superior. Desses, 60 a 70% estavam em Instituições de

Educação Superior privadas (SANTIAGO et al, 2008; PALADINO,2012).

Já no ano de 2011 havia cerca de 7.000 indígenas nas universidades brasileiras

frequentando os cursos de licenciatura específicos e os cursos regulares em

universidades públicas e particulares. Naquele mesmo ano, o estudo realizado pelo

Grupo de Estudos Multidisciplinares da Ação Afirmativa (GEMAA)24 registrou que 70

das 98 Universidades públicas estaduais e federais adotavam políticas de Ação

Afirmativa e, entre elas, 36 especificamente para indígenas (FERES JÚNIOR et al,

2011; PALADINO, 2012).

Outro estudo desenvolvido em 2013 pelos autores David et al (2013) apontam

que:

Segundo dados fornecidos pela Coordenação Geral de Educação Escolar Indígena da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão (CGEEI/ SECADI/MEC), há 6.336 alunos indígenas em instituições de ensino superior, o que corresponde a 0,1% dos 6,3 milhões de matrículas em cursos de graduação no país (p.113).

O que nos chama atenção nessas informações é a presença indígena na educação

superior, que é de 0,1%, número pequeno quando comparado ao percentual de índios no

Brasil que é de 0,5%. Portanto, há ainda um número importante de jovens e

adolescentes fora das universidades.

Estudo divulgado pela Secretaria de Ensino Superior (Sesu/MEC) em novembro

de 2014 aponta que, em 2013, o total de estudante nas universidades federais era de

221.650, sendo 70.849 estudantes cotistas. Já no ano de 2014, o número total cresceu

cerca de 10%, ou seja, chegou a 243.383, e o número de cotistas subiu cerca de 30%,

num total de 98.121 estudantes negros e indígenas, conforme se observa no Quadro 6 a

seguir.

24 Vinculado Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade Estadual de Rio de Janeiro. Importante Grupo nos estudos com o enfoque em Ação Afirmativa voltada para negros e indígenas.

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113

Quadro 6: Número total de estudantes matriculados e de cotas nas Universidades Federais - Ano 2013 -2014

ANO NAS UNIVERSIDADES

TOTAL COTAS

2013 221.650 70.849

2014 243.383 98.121

TOTAL 465.033 168.970

Fonte: Secretaria de Ensino Superior (Sesu/MEC). Novembro 2014.

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114

CAPÍTULO IV

POPULAÇÕES INDÍGENAS DO BRASIL E DO ESTADO DE MATO GROSSO

DO SUL: ASPECTOS SOCIOECONOMICOS, DEMOGRÁFICOS E

EDUCACIONAIS

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115

CAPÍTULO IV – POPULAÇÕES INDÍGENAS DO BRASIL E DO ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL: ASPECTOS SOCIOECONOMICOS, DEMOGRÁFICOS E EDUCACIONAIS

4.1 Apresentação

Diante da diversidade e complexidade das populações indígenas no território

nacional, considerou-se importante contextualizar aspectos sobre os povos que habitam

o Brasil e, em especial, aqueles localizados no estado de Mato Grosso do Sul.

Nesse sentido, serão descritas, a seguir, aspectos gerais relacionados à temática

de escolarização, condições sociodemográficas e econômicas das populações indígenas

localizadas no Brasil e, em especial, do estado de Mato Grosso do Sul, na tentativa de

aproximações ao panorama atual de exclusão social que assola tais povos. Ressalto que

não se objetiva, neste capítulo, a aprofundamentos sobre as especificidades de cada uma

das etnias presentes no Estado, uma vez que não se trata do objetivo deste estudo.

4.2 A realidade das populações indígenas do Brasil

De acordo com os resultados do Censo Demográfico realizado pelo Instituto

Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2012), 817,9 mil pessoas se declararam, no

quesito cor ou raça, indígenas, representando 0,4% da população total do Brasil.

Agregando-se àquelas pessoas que não se declararam, no quesito cor ou raça, indígenas,

mas se consideraram indígenas, captadas dentro das terras indígenas, o total de

população indígena residente no território nacional passou a 896,9 mil pessoas, o que

corresponde a um acréscimo de 78,9 mil indígenas, conforme se observa na Tabela 7 a

seguir.

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Tabela 7: População indígena e distribuição percentual por localização de domicílio e condição de indígena, segundo as grandes regiões, 2010 – Brasil.

Proporção das pessoas indígenas de 10 anos ou mais de idade com até 1 salário mínimo e sem rendimento nominal mensal, por localização do domicílio

Grandes Até 1 salário mínimo Sem rendimento nominal mensal Regiões

Nas Terras Indígenas

Fora das Terras

Indígenas

Nas Terras Indígenas

Fora das Terras Indígen

Brasil 27,9 32,8 65,8 39,5 Norte 22,6 32,2 72,6 53,2 Nordeste 36,5 40,3 58 40 Sudeste 30,7 25,3 59,1 31,3 Sul 35,7 28,4 53,7 31,8 Centro-Oeste 27,3 31,3 64,1 36,6 Fonte: IBGE, 2012.

Outro dado igualmente expressivo é o número de pessoas que se declararam

indígenas e estão fora de seus territórios: 379.534. Muitos grupos vêm se organizando

fora dos territórios indígenas em busca de trabalho e educação, fatores estes associados

à perda de espaço para a produção e conflitos territoriais.

Há também 82 referências de grupos indígenas não contatados, das quais 32

foram confirmadas. Na região da Amazônia Legal, habitam 60% dos indígenas do

Brasil, sendo cerca de 15% nas cidades. Existem, ainda, grupos em fase de

reconhecimento de sua condição indígena junto ao órgão federal indigenista.

Os povos indígenas do Brasil possuem uma grande diversidade, não somente em

termos de distribuição geográfica, mas também no que se refere à diversidade

linguística, configurações particulares de costumes, crenças, formas de inserção no meio

ambiente, de história de interação com os colonizadores e de relação com o Estado

nacional brasileiro.

A diferença étnica provém do reconhecimento étnico, que se pauta em critérios

definidos pela consciência da identidade indígena e de pertencimento a um grupo

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diferenciado dos demais segmentos populacionais do Brasil e também por parte dos

membros do próprio grupo25.

Além da diversidade, outro ponto que merece destaque que muitas informações

sobre os indígenas no país ainda são inconsistentes, especialmente quando comparamos

as informações fornecidas por órgãos oficiais, como a FUNAI, SESAI e o IBGE. Neste

estudo optou-se pelos dados trazidos pelo IBGE.

Em relação aos níveis educacionais das populações indígenas do Brasil, o estudo

realizado pelo IBGE aponta que:

[…] com informações mais gerais provenientes do Questionário Básico, investigada para todas as pessoas, que conceitualmente consiste em considerar como alfabetizada a pessoa capaz de ler e escrever pelo menos um bilhete simples no idioma que conhece, é possível identificar os primeiros aspectos. É importante ressaltar que a educação indígena envolve aspectos específicos que os procedimentos de captação de informações nos Censos Demográficos não permitem aprofundamentos, com destaque para os currículos diferenciados, o conhecimento dos saberes tradicionais e, principalmente, o uso das línguas indígenas, entre outros (IBGE, 2012, p. 69).

No cenário da desigualdade ao acesso à educação, o Fundo das Nações Unidas

para a Infância (UNICEF, 2012) aponta que 500 mil crianças e adolescentes de 7 a 14

anos estão fora da sala de aula. Desse total, os povos indígenas constituem um dos

contingentes mais atingidos.

Outro fato que se configura como um desafio é a continuidade do processo de

escolarização. Estudo desenvolvido pelo Anuário Brasileiro da Educação Básica (2014)

demonstra esta realidade: em 2012, um total de 167.338 jovens estavam matriculados

nos anos iniciais do ensino fundamentais; este número caí para uma proporção bem

menor nos anos finais nesta etapa de ensino (53.843), conforme observarmos no Quadro

7 abaixo. Entre os matriculados no ensino médio, este número se reduz drasticamente

para 17.586. Representando, desta forma, a grande lacuna de oportunidades escolares,

muitos jovens e adolescentes indígenas são obrigados a abandonar a escola para

trabalhar e garantir a sua subsistência (VEIGA & D’ANGELIS, 2010).

25 Lei nº. 6.001, de 19 de dezembro de 1973 (Estatuto do Índio); Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988; e Convenção no 169 da Organização Internacional do Trabalho – OIT (Convenção sobre os Povos Indígenas e Tribais), adotada em Genebra, em 27 de junho de 1989.

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Quadro 7: Número de matriculas na Educação indígena por modalidade e etapa de ensino – Brasil: 2007-2012

Fonte: Anuário Brasileiro da Educação Básica (2014)

O levantamento do IBGE também apontou, conforme Quadro 8 abaixo, que a

taxa de alfabetização entre pessoas de 10 anos em terras indígenas é de 69,7%, e, fora

dessas terras, de 86,2%. Para as pessoas de 15 anos ou mais, o total é de 67,7% dentro

das terras indígenas e 86,5% fora. Em relação à taxa de analfabetismo, entre aqueles de

10 anos ou mais, esta é de 30,3% nas terras indígenas, e de 13,8% fora das aldeias; entre

aqueles de 15 anos ou mais, é de32,3% dentro e de 14,5% fora das aldeias.

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Quadro 8: Pessoas indígenas de 10 anos ou mais e de 15 anos ou mais de idade, por localização do domicílio, segundo algumas características educacionais e o sexo Brasil – 2010.

Características Pessoas indígenas de 10 anos ou mais de idade e de 15 anos ou mais

de idade por localização do domicílio Educacionais e sexo 10 anos ou mais 15 anos ou mais

Total

Nas Terras indígenas

Fora das Terras indígenas

Total

Nas Terras indígenas

Fora das Terras indígenas

Pessoas

indígenas 677 570 356 164 321 406 573 349 286 789 286 560

Homens 340 881 185 455 155 426 287 832 149 956 137 876

Mulheres 336 689 170 709 165 980 285 517 136 833 148 684

Taxa de alfabetização 77,5 69,7 86,2 76,6 67,7 85,5 Homens 78,5 71,5 86,8 78 70,3 86,4 Mulheres 76,5 67,7 85,6 75,2 64,9 84,7 Taxa de analfabetismo 22,5 30,3 13,8 23,4 32,3 14,5 Homens 21,5 28,4 13,2 22 29,7 13,6 Mulheres 23,5 32,3 14,4 24,8 35,1 15,3 Fonte: IBGE, 2012.

Dessa forma, observa-se que a taxa de analfabetismo é maior nas terras

indígenas. Esse fato está associado a inúmeros fatores questões como, por exemplo:

dificuldades de acesso às escolas dentro das reservas, falta de documentos para efetivar

matrículas, migração constante das famílias, entre outros

As dificuldades encontradas pelas populações indígenas brasileiras de manter

sua subsistência por meio da produção da terra, em algumas aldeias em que estão

extintas práticas culturais, como a caça e a pesca, têm acarretado, em algumas

comunidades, a busca por trabalhos remunerados, alguns dentro das próprias aldeias,

como professores, funcionários da FUNAI, Secretaria Especial de Saúde Indígena

(SESAI) e outros órgãos públicos localizados nas reservas indígenas, atuando como

agentes comunitários de saúde, agentes de saneamento, enfermeiros, assistentes sociais,

psicólogos, cozinheiras, merendeiras, faxineiras. E muitos outros fora da aldeia, como,

por exemplo, nas usinas, nas fazendas, na construção civil, entre outros.

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A forma de subsistência tem configurado um cenário de pobreza em algumas

comunidades, conforme afirmação do estudo do IBGE (2012):

[…] comparados à população brasileira em geral, os resultados revelados pelo Censo Demográfico 2010 indicam distribuições de rendimentos muito desfavoráveis aos indígenas. Metade das pessoas indígenas de 10 anos ou mais de idade não possuem qualquer tipo de rendimento, sendo a proporção para os residentes na área rural bastante expressiva. No Brasil, como um todo, 83,0% das pessoas indígenas de 10 anos ou mais de idade recebem até 1 salário mínimo ou não possuem rendimentos (p.101).

Ainda em relação às questões de subsistência, o referido estudo do IBGE aponta

a proporção de pessoas indígenas de 10 anos ou mais de idade, com até um salário

mínimo e sem rendimento nominal mensal, por localização do domicílio, segundo as

Grandes Regiões. Na região Centro-Oeste, 27,3% recebiam até um salário mínimo nas

terras indígenas e 31,3% fora delas; sem nenhum rendimento, 64,1% nas terras

indígenas e 36,6% fora (Quadro 9). Este dado pode revelar a busca por outras formas de

sobrevivência de tais povos fora dos espaços territoriais das reservas indígenas.

Quadro 9: Proporção das pessoas indígenas de 10 anos ou mais de idade com até 1 (um) salário mínimo e sem rendimento nominal mensal, por localização do domicílio, segundo as Grandes Regiões - Brasil – 2010.

Grandes Proporção das pessoas indígenas de 10 anos ou mais de idade com até

Regiões 1 salário mínimo e sem rendimento nominal mensal, por localização do domicílio

Até 1 salário mínimo Sem rendimento nominal mensal

Nas Terras indígenas

Fora das Terras indígenas

Nas Terras indígenas

Foras das Terras indígenas

Brasil 27,9 32,8 65,8 39,5 Norte 22,6 32,2 72,6 53,2 Nordeste 36,5 40,3 58 40 Sudeste 30,7 25,3 59,1 31,3 Sul 35,7 28,4 53,7 31,8 Centro-Oeste 27,3 31,3 64,1 36,6 Fonte: IBGE, 2012.

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121

4.3 A realidade das populações indígenas do estado de Mato Grosso do Sul

Discorreremos a seguir sobre as populações indígenas do estado de Mato Grosso

do Sul, para tanto foi realizado levantamento de publicações cujo tema central tratava

das condições de vida e a escolarização de tais povos.

O estado de Mato Grosso do Sul, segundo informações da Secretaria Especial de

Saúde Indígena (2012), possui a segunda população indígena do Brasil,

aproximadamente 70.383 pessoas, conforme o Quadro 10 abaixo, das etnias Guarani

Ñandeva, Guarani Kaiowá, Terena, Kadiwéu, Kinikinau, Guató, Kamba e Ofaié.

Quadro 10: População Indígena de 2012 cadastrada no SIASI por região, UF, Região e Município – Mato Grosso do Sul.

REGIÃO BRASIL UF

REGIÃO SAÚDE MUNICÍPIO

TOTAL DE INDÍGENAS

Aquidauana 6.890 Bodoquena 877 Bonito 892 Macrorregião Campo Grande 2.874 de Campo Grande Corumbá 152 Miranda 7.072 Sidrolândia 3.521 CENTRO MS Três Lagoas Brasilândia 103 OESTE Amambai 12.810 Antônio João 1.954 Caarapó 6.197 Dourados Dourados 14.246 Iguatemi 4.679 Paranhos 4.726 Tacuru 3.390 Total 70.383 Fonte: Sistema de Informação de Saúde Indígena, SESAI, 2012.

Tal qual no plano nacional, o processo histórico de integração monocultural e o

confinamento e imposto pelo estado nacional e a perda territorial trouxeram

consequências nefastas aos povos indígenas do estado de Mato Grosso do Sul.

Terras que, para esses povos, são:

... sagradas, um patrimônio étnico em cujas dimensões espaciais se traduzem formas de viver e de se organizar diferenciadas da sociedade envolvente. São áreas onde o exercício da posse da terra não corresponde à lógica de produção capitalista, a ser utilizada como um mero instrumento de mercado, mas sim

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onde se verificam significados culturais peculiares no usufruto de seus recursos, bem como nas dinâmicas de organização social, permanência e trânsito de seus habitantes e suas relações de poder, sendo marcante a necessidade de preservação da biodiversidade existente e a recomposição de áreas que foram desmatadas. Por fim, são os locais onde se reproduzem a diversidade linguística e os conhecimentos tradicionais destes povos (HECK & MACHADO, 2011, p.48).

No estado de Mato Grosso do Sul, os indígenas, em sua maioria, vivem um

contexto marcado pela expropriação territorial e correspondente confinamento em terras

indígenas exíguas, com recursos naturais profundamente comprometidos. Este cenário

obriga a uma dependência externa por meio de novas formas de sobrevivência como

assalariados, especialmente nos canaviais e usinas de produção de açúcar e álcool, nas

fazendas, e, dentro das próprias aldeias, como professores, serviços gerais em escolas,

postos da FUNAI, agentes de saúde, agentes de saneamento, entre outros (BRAND,

2003).

A escassez de território e o confinamento dos indígenas, geram condições

insuficientes para suprir as suas necessidades socioeconômicas, gerando desorganização

social, desconstrução dos laços familiares, perda da mata nativa, da riqueza dos rios e

dos solos, afetando as formas tradicionais de subsistência e impactando diretamente na

cultura, na língua, na religião, enfim, no modo de ser de cada povo.Com a saída dos

homens para o trabalho fora do território indígena cabe à mulher a responsabilidade da

educação dos filhos e cuidado das famílias, comprometendo, desta forma, as práticas

culturais, assim como a organização social e política (BRAND, 2007; LÁZARO &

TAVARES, 2013).

O estudo da situação dos indígenas do Estado organizado por Sauer (2014)

aponta que:

A difícil situação dos indígenas no Mato Grosso do Sul se insere num cenário nacional de expropriação territorial. Inclusive é um processo que percorre toda a América Latina, numa disputa por recursos naturais. O que alarda no caso investigado é a dimensão do problema e o grau de acirramento que a questão assume no Estado com a segunda maior população indígena do país (p.11).

O referido relatório aponta que a população indígena de Mato Grosso do Sul tem

enfrentado uma grave situação de violação de seus direitos fundamentais, que se iniciam

com a negação de seus territórios, de exclusão social até a negação de seus direitos

básicos, como o direito à água e à alimentação. No Estado, os Guaranis Kaiowás – a

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maioria residente nas reservas indígenas de Amambai e Dourados – registram os

maiores índices de pobreza.

O relatório do Conselho Indigenista Missionário (2014, p. 17) aborda as

condições de vida e violação dos direitos dos povos indígenas do estado de Mato Grosso

do Sul:

O reflexo mais perverso desse contexto está na realidade dos povos indígenas do Mato Grosso do Sul, onde a maioria das comunidades vive em situação de conflito com os fazendeiros – como é o caso das terras do povo Terena e de grande parte das áreas reivindicadas pelos Guarani-Kaiowá –, em acampamentos improvisados nas margens das rodovias, nas áreas de preservação obrigatória – faixa de domínio – dentro das fazendas, ou confinados em reservas criadas pelo Serviço de Proteção aos Índios (SPI), no início do século passado.

Em relação às condições sociais, o relatório citado acima também enfoca que

somente no ano de 2013 registrou-se 33 vítimas de assassinatos, 16 casos de tentativas

de assassinatos, 50 vítimas de suicídios e 90 vítimas de mortalidade na infância no

estado de Mato Grosso do Sul.

Boa parte dessa população é dependente de programas assistenciais, como o

Bolsa Família, Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI), aposentadoria e o

programa de cesta básica do Governo do Estado, entre outros. No entanto, tais

programas, apesar de necessários e emergenciais, contribuem para uma dependência e

não avançam para discussões visando superar os problemas. Somando-se à dependência,

também há incoerências na gestão de tais programas, que nem sempre levam em

consideração as realidades indígenas. Por exemplo, cestas básicas com alimentos que

não fazem parte de hábitos e costumes das comunidades indígenas.

O perfil de morbimortalidade de tais comunidades está estritamente relacionado

às condições de vida, sendo acometidos por doenças e agravos, como a pneumonia,

tuberculose, desnutrição infantil, alcoolismo, drogas e a violência. Além de outras como

as Doenças Sexualmente Transmissíveis, hipertensão e Diabetes (PICOLI et al, 2006;

GUIMARÃES & GRUBITS, 2007; FÁVARO et al, 2007; MARQUES et al, 2010;

FERREIRA et al, 2010a; FERRI & GOMES, 2011).

Em relação às condições sociais, o relatório do CIMI (2014) citado acima

também enfoca que somente no ano de 2013 registrou-se 33 vítimas de assassinatos, 16

casos de tentativas de assassinatos, 50 vítimas de suicídios e 90 vítimas de mortalidade

na infância no estado de Mato Grosso do Sul.

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Em relação à demografia, o que nos chama atenção no estado de Mato Grosso

do Sul, ao contrário da pirâmide populacional não indígena brasileira, conforme se

observa no Quadro 12 a seguir, é o fato da população indígena ser constituída

predominantemente de crianças em idade escolar, jovens e adultos jovens. Dados que

merecem estudos ao se considerar a expectativa de vida e também as necessidades

diferenciadas para cada faixa etária.

Quadro 11: Distribuição da população indígena do estado de Mato Grosso do Sul, por faixa etária – ano 2012.

Sexo Feminino Masculino 75 + 776 835 70 a 74 anos 513 419 65 a 69 anos 467 417 60 a 64 anos 436 464 55 a 59 anos 576 645 50 a 54 anos 719 860 45 a 49 anos 1.003 1.034 40 a 44 anos 1.339 1.416 35 a 39 anos 1.758 1.878 30 a 34 anos 2.311 2.336 25 a 29 anos 2.723 2.469 20 a 24 anos 3.387 3.282 15 a 19 anos 4.252 4.128 10 a 14 anos 5.093 5.205 05 a 09 anos 5.046 5.244 0 a 4 anos 4.633 4.719

Fonte: Sistema de Informação de Saúde Indígena, SESAI, 2012.

Ao compararmos com as populações indígenas no Brasil, 45% da população estão

na faixa etária de 0 a 14 anos, o dobro da área urbana (22,1%). Em 93,6% das terras

indígenas, mais da metade da população tem até 24 anos de idade. O perfil etário das

sociedades indígenas é de uma pirâmide de base larga que vai se reduzindo com a idade

(LÁZARO & TAVARES, 2013).

Portanto, este perfil também indica a importância da educação escolar indígena,

utilizado também como mecanismo de preservação da cultura, no preparo de jovens

para se inserir em postos de decisão política sobre a causa indígena e também para lidar

com a sociedade envolvente.

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No estudo desenvolvido por Brostolin e Cruz (2010) aponta que, no ano de

2010, havia no estado de Mato Grosso do Sul, cerca de 300 escolas de Ensino

Fundamental e 12 escolas de Ensino Médio.Conforme se observa Quadro 11 a seguir, as

etnias presentes no estado são: Guarani Ñandeva, Guarani Kaiowá, Terena, Kadiwéu,

Kinikinau, Guató, Kamba e Ofaié.

Quadro 12: População Indígena por etnia cadastrada no SIASI - Mato Grosso do Sul – 2012.

ETNIA TOTAL DE

INDÍGENAS Kaiowá 34.500 Terena 22.979 Guarani 11.043 Kadiwéu 1.350 Guato 175 Kinikinawa 137 Ofaie 60 Bororo 53 Guarani Kaiowá 48 Atokum 30 Xavante 6 Cinta Larga 2 Total 70.383

Fonte: Sistema de Informação de Saúde Indígena, SESAI, 2012.

O censo do IBGE (2012) apontou que, no estado de Mato Grosso do Sul, a taxa

de analfabetismo entre as pessoas indígenas de 10 anos ou mais é de 18,9% nas terras

indígenas e 12,6% fora delas, conforme se observa na Figura 3. O que pode revelar a

preocupação ou valorização da escolarização fora dos territórios indígenas.

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Figura 3: Taxa de analfabetismo para pessoas indígenas de 10 ou mais anos de idade,

segundo Unidade de Federação – 2010.

Fonte IBGE, 2012.

O estudo desenvolvido pelo Grupo Internacional de Trabalho sobre Assuntos

Indígenas (IWGIA/FMUSP) aponta que:

[...] enquanto no ano 2000 os indígenas com 10 anos ou mais tinham em média de 3,9 anos de escolaridade, as crianças da mesma idade da população em geral, alcançavam em média de 5,9 anos. A baixa qualidade do ensino proporcionado a crianças indígenas pode ser explicada pelo fato de que somente 13% dos professores de escolas indígenas possuíam ensino superior (AYWIN, 2009, p.10).

Outros fatores também podem estar relacionados à baixa escolaridade entre

indígenas, como, por exemplo, locais improvisados das escolas (como galpões, casas de

rezas, somando-se a falta de pertinência cultural), além dos fatores relacionados às

questões socioeconômicas (AYWIN, 2009). Dentre as consequências desse cenário

estão a procura de trabalho fora da aldeia, a busca por novos territórios e a falta de

documentos (como o registro de nascimento) que impedem a matrícula mesmo em

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escolas dentro das aldeias. Este último acesso vem, recentemente, sendo regularizado

pela FUNAI.

Mesmo diante deste cenário adverso, as comunidades indígenas vêm buscando

formas de resistência e de luta por seus direitos. No estado de Mato Grosso do Sul

podemos citar o movimento das comunidades indígenas em prol de melhorias na

educação e na saúde. Com a organização dos movimentos promovidos pelos professores

e lideranças, além do envolvimento de jovens nas questões políticas relacionadas aos

direitos humanos.

Outro exemplo: em 2012 foi eleito pela primeira vez na história do Município de

Dourados um vereador indígena guarani, Aguilera de Souza, professor e residente da

Reserva Francisco Horta Barbosa, Aldeia Jaguapiru (ARAUJO, 2012). No estado de

Mato Grosso do Sul e em todo o Brasil a comunidade indígena vem elegendo

representantes indígenas, especialmente vereadores.

Por esta e por outras razões éticas, sociais e econômicas, como a situação de

pobreza extrema em que se encontram a maioria dos povos indígenas do estado de Mato

Grosso do Sul, a política de Ação Afirmativa é uma das formas de combater, em parte,

o quadro de iniquidade em que vivem tais comunidades.

As comunidades indígenas têm buscado a Educação Superior para adquirir

conhecimentos que eles consideram fundamentais para a melhoria de suas condições de

vida e de suas comunidades. No atendimento às necessidades sociais do Estado, a

Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul é pioneira entre as IES estaduais na

política de cotas para indígenas, atendendo, em parte, a missão social junto a estes

povos.

No entanto, diante do quadro alarmante em que se encontra a grande maioria dos

povos indígenas do estado de Mato Grosso do Sul, podemos nos indagar que ações

efetivas estão sendo desenvolvidas em outros âmbitos, como, por exemplo, na

segurança, na saúde, na demarcação de terras, entre outros.

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Capítulo V

UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MATO GROSSO DO SUL: A

IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS DE AÇÃO

AFIRMATIVA PARA INDÍGENAS

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129

Capítulo V – UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MATO GROSSO DO SUL: A IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS DE AÇÃO AFIRMATIVA PARA INDÍGENAS

5.1Apresentação

Os resultados da pesquisa foram ancorados pelo autor Aguilar Villanueva

(1993,1996), compondo um conjunto de obras dos autores: Elmore, Berman, Van Meter

e Van Horn, Sabatier e Mazmanian, Rein e Rabinovitz, Elmore, Stocker e O. Toole Jr.

Além de estudos brasileiros desenvolvidos por Rus Perez (2007, 2010).

Apoiar-nos-emos também na perspectiva dos estudos da Educação Crítica,

especialmente nos autores Giroux (1992, 1997), Gandin (2002), Apple (2006, 2008,

2011, 2013) e Paraskeva (2002, 2005). Optou-se igualmente para a discussão das

relações de poder, conhecimento e direito e a relação com a Universidade os estudos

desenvolvidos por Boaventura de Souza Santos (2003, 2009, 2010, 2014).

A apresentação dos resultados a seguir expostos foram organizados a partir da

descrição e detalhamento das características da IES pesquisada, bem como as

percepções e narrativas dos implementadores que permeiam e entrelaçam o processo

histórico da implantação e implementação das políticas de ações afirmativas.

As entrevistas foram organizadas a partir de dimensões temáticas: a) O Lócus; b)

Implementadores: Perfil e Considerações; c) Marco mobilizador: Lei Estadual Nº 2.589,

de 26 de dezembro de 2002; d) A dualidade: Visível e Invisível – Igual e Diferente; e)

Fixidez e Fragmentos; f) Adversidades; g) Intolerância e Resistência; h) Povos que

possuem a língua falada como princípio; i) Os interstícios e os “entre lugares”; J)

Avaliando a Política de Ação Afirmativa; k) Reconhecimento de uma formação elitista;

l) Projeto de Extensão Rede de Saberes e; m) Programas de Apoio Estudantil.

5.2 Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul: O lócus

Desde sua criação e ao longo de sua trajetória histórica e política a UEMS tem

enfrentado muitos desafios, é pioneira em muitos sentidos, entre eles pode-se destacar a

sua característica multicampi, denominada na IES como Unidades, além de ser uma das

primeiras IES estaduais do país a implantar a Política de Ações Afirmativas.

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A UEMS está localizada no estado de Mato Grosso do Sul. Esse estado foi

criado em outubro de 1977, após a divisão do antigo estado do Mato Grosso, tendo seu

governo instalado em 1º de janeiro de 1979.

Localizado na região Centro-Oeste do Brasil, o estado de Mato Grosso do Sul

possui uma área total de 358.159 Km2, correspondendo a 18% da região Centro-Oeste e

4,19% do território brasileiro, sendo o sexto maior estado do país.O Pantanal sul-mato-

grossense corresponde a cerca de 25% da área do estado, com 89.319 Km2. O estado

limita-se ao norte com o estado de Mato Grosso, a nordeste com os estados de Goiás e

Minas Gerais, a leste com o estado de São Paulo, a sudeste com o estado do Paraná, ao

sul e sudeste com o Paraguai e a oeste com a Bolívia, conforme se observa na Figura 4 a

seguir (MS, 2015).

Além das características geográficas, o Estado guarda suas especificidades. Sua

economia é baseada na pecuária, na agricultura e também ocupa uma importante parte

do seu território com plantio de cana-de-açúcar, com presença de usinas canavieiras e de

álcool (TEIXEIRA, 2010).

Em relação à população indígena, o Estado possui o segundo maior contingente

do Brasil, conforme discutido no capítulo anterior, embora seja a Unidade da Federação

com a menor proporção de terra para os mesmos. O Mato Grosso do Sul possui

aproximadamente 600 acadêmicos indígenas nas várias IES, sendo que o maior grupo

frequenta a UEMS, situando-se como um dos estados brasileiros com a maior

quantidade de indígenas no Ensino Superior (URQUIZA et al, 2011).

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Figura 4: Mapa do estado de Mato Grosso do Sul

Fonte: <http://www.guianet.com.br/ms/mapams.htm>.

A Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul, com sede e foro na cidade de

Dourados, foi criada pela Constituição Estadual de 1979, ratificada pela Constituição

Federal de 1989 (conforme disposto no artigo 48 do Ato das Disposições

Constitucionais)e instituída pela Lei nº 1.461, de 20 de dezembro de 1993 (UEMS,

2013).

Em 1993, o governo do Mato Grosso do Sul nomeou a Comissão de Implantação

da UEMS para que “se delineasse uma proposta de Universidade voltada para as

necessidades regionais objetivando superá-las e contribuir por meio do ensino, da

pesquisa e da extensão para o desenvolvimento científico, tecnológico e social do

estado”.26

O Conselho Estadual de Educação de Mato Grosso do Sul, em fevereiro de

1994, deu parecer favorável à concessão da autorização para implantação do Projeto da

Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul e aprovação de seu Estatuto e Regimento

Geral.

26 Mais informações em http://www.uems.br/portal/historia.php

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Após aproximadamente dois anos de trâmites no Ministério de Educação e

Desporto, em 27 de Agosto de 1997, foi publicada pelo Conselho Estadual de Educação

a Deliberação CEE/MS Nº 4.787 de 20/08/97, conforme a Lei de Diretrizes e Bases da

Educação, Lei nº 9394/96.

As Unidades Universitárias estão localizadas em outros 14 municípios,

distribuídas nos seguintes Municípios: Aquidauana, Amambai, Cassilândia, Coxim,

Glória de Dourados, Ivinhema, Jardim, Maracaju, Mundo Novo, Naviraí, Nova

Andradina, Paranaíba, Ponta Porã e Três Lagoas (Figura 5). Em 2001, por meio da

Resolução COUNI-UEMS n. 184, de 10 de outubro de 2001, foi criada a Unidade

Universitária de Campo Grande, inicialmente, com a finalidade de atender à demanda

do curso de graduação Normal Superior (UEMS, 2014).

Figura 5: Localização das Unidades Universitárias da UEMS no estado.

Fonte: <http://www.uems.br/portal/mapa.php>.

Esta característica multicampi apresenta muitas vantagens, pois oportuniza o

ingresso a universidade a pessoas residentes de cidades do interior do Estado. Cabe

destacar também, que a sede da IES se localiza no interior do estado, ou seja, a UEMS

se configura como uma IES do interior para o interior (MELLO e REAL, 2009).No

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entanto, mesmo se considerando os mecanismos de gestão e administração baseadas na

democracia, acesso, participação e transparência, é possível levantar a hipótese que esta

característica tende a promover realidades e necessidades diferenciadas em cada

campus.

A UEMS foi implantada, com sede em Dourados, conforme Figura 6 a seguir.

Ao observarmos a figura do prédio sede da UEMS disponível no site oficial da IES, nos

deparamos como uma imagem de estudantes caminhando para o prédio principal da

reitoria e alguns poucos saindo. Observa-se que a escolha por esta imagem é

representada não somente por uma imagem de um prédio frio e inerte, mas sim, por

estudantes. Fato este que nos convida a refletir e a nos indagar: Quem são estes

estudantes? Quais deles são indígenas? Quais deles são negros?

Figura 6 : Sede Administrativa Dourados – Universidade Estadual de Mato Grosso do

Sul

Fonte: UEMS, 2015 (http://www.portal.uems.br/historia)

Durante a pesquisa de campo e coleta das entrevistas, este fator foi impactante.

A cada unidade que visitávamos nos deparávamos com um universo diversificado. Estas

diferenças não se referiam exclusivamente ao plano das edificações e da estrutura

organizacional da IES, mas no plano de das subjetivações, das relações, da organização

local.

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No que se refere a estrutura organizacional, a entidade mantenedora da UEMS,

em conformidade com a legislação vigente, é o governo do estado de Mato Grosso do

Sul. Em relação à autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e

patrimonial da UEMS, ela está amparada no art. 207 da Constituição brasileira:

Art. 207 da Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988. Na esfera estadual, a autonomia encontra respaldo no art. 2o da Lei no 1.461 de 20 de dezembro de 1993, que autoriza o Poder Executivo a instituir a Fundação Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul. Em relação aos recursos financeiros, o Art. 8o, inciso I, determina que estes serão provenientes de dotação consignada, anualmente, no Orçamento do Estado de Mato Grosso do Sul. (UEMS, PDI 2008-2013, 2008, p. 76).

A lei nº 2.583, de 23 de dezembro de 2002, estabelece a regulamentação da

autonomia da UEMS. Entretanto:

[…] os parágrafos 1º, 2º e 3º do art. 3o desta Lei, que dispõem sobre o percentual assegurado anualmente, a partir de 2003, de forma gradativa, partindo de dois por cento até alcançar três por cento da receita tributária estadual até o ano de 2008, e garantindo um repasse nunca inferior para o ano subsequente, foram revogados pela Lei no 3.485, de 21 de dezembro de 2007 - art. 13 (UEMS, PDI 2008-2013, 2008, p. 76).

Dessa forma, o repasse financeiro para a UEMS passou a ser mensal e pré-

definido anualmente. Fato esse que tem gerado até então inúmeras insatisfações,

especialmente nos meios acadêmicos e organizações sindicais de professores e técnicos

administrativos, principalmente no tocante autonomia e isonomia universitária.

Quanto à estrutura organizacional da IES pesquisada, conforme se observa na

Figura 6 a seguir, as instâncias colegiadas são compostas pelo Conselho Universitário

(COUNI)27 e Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão (CEPE)28. Por meio da

configuração e da representação nas Instâncias a IES busca a democratização por meio

de decisões colegiadas. Como podemos observar há uma forma de organização

complexa e democrática. Neste aspecto, a dimensão da IES e sua rede de interlocuções

27 14O COUNI é o órgão colegiado de instância superior da UEMS, de caráter normativo e deliberativo, composto por 60 membros, entre eles: Reitoria; Vice-Reitoria, Pró-Reitorias, órgãos da Administração Central e Órgãos da Administração Setorial (RESOLUÇÃO COUNI-UEMS Nº 392, de 29 de setembro de 2011). 15O CEPE é composto por 79 membros. Composto pela Reitoria, Pró-Reitorias de Extensão, de Pesquisa e de Pós Graduação. Bem como dos Coordenadores de Curso. 28

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entre os diversos setores e atores a configuram como complexa, engendradas de tensões,

interesses pessoais e políticos. Aspectos estes presentes em outras instituições.

Figura 7: Organograma da Estrutura Organizacional da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul

Fonte: Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI) 2014-2018

De acordo com o Plano de Desenvolvimento Institucional Projeto Pedagógico

Institucional 2014 – 2018, a UEMS em 2014, considerando as 15 Unidades

Universitárias, conta com 61 cursos de graduação, sendo que são 31 licenciaturas, 26

bacharelados e 4 (quatro) tecnológicos. Num total de 8.224 alunos regularmente

matriculados (UEMS, 2013, p. 27).

Uma das características destacadas da UEMS refere-se à responsabilidade social,

assim entendida como:

Inclusão Social diz respeito à implementação das Leis Estaduais no 2.589, de 26 de dezembro de 2002 e 2.605, de 06 de janeiro de 2003, que dispõem sobre a reserva de vagas para indígenas e negros respectivamente, e as Resoluções COUNI-UEMS que normatizaram o ingresso nos cursos de graduação da UEMS por meio do Sistema de Cotas. Esta ação visou atender grupos étnicos historicamente excluídos do contexto educacional do Brasil (UEMS, 2012, p. 9). Destaca-se também que dos alunos matriculados na UEMS, 82% destes alunos são oriundos de escolas públicas (UEMS, 2013, p. 23).

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A UEMS já vem tentando promover a interlocução com os povos indígenas

desde 2001, quando criou o Curso Normal Superior, inicialmente para professores

indígenas das etnias Terena e Kadwéu e a partir de 2003 para os professores Guaranis

Kaiowás. No ano de 2004 formaram-se 26 indígenas Terena na Unidade Universitária

de Aquidauana, e em 2006 27 Guaranis na Unidade Universitária de Amambai

(CORDEIRO, 2005).

Ao analisarmos o Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI) 2014-2018

(UEMS, 2013) a respeito da Política de Ação Afirmativa destinada a indígenas, o

referido documento cita que após 10 anos da instituição da mesma, constatou-se que

ingressaram 3.071 negros e 856 indígenas, e entre os concluintes 637 negros e 93

indígenas, como se observa na tabela 8, abaixo.

Tabela 8: Progressão na Oferta de Vagas - UEMS relativo ao ano de ingresso - 2005 a 2013. Variáveis

2005

2006

2007

2008

2009

2010

2011

2012

2013

Vagas Gerais 1.078 1.148 1.169 1.239 1.295 1.645 1.680 1.659

1.643

Negros 308 328 334 354 370 480 480 474 470

Indígenas 154 164 167 177 185 240 240 237 237

TOTAL 1.540 1.640 1.670 1.770 1.850 2.400 2.400 2.370 2.3 Fonte: Relatório Anual de atividades físicos financeiros da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul– janeiro a outubro de 2013.

O referido documento também faz ressalvas às devidas condições que envolvem

o acesso e a permanência no ensino superior. No entanto, não explicita quais são os

mecanismos utilizados e planejados para minimizar tais dificuldades.

Boaventura de Sousa Santos (2010, p.69) enfoca que:

Talvez seja correto designar a área do acesso como acesso/permanência ou mesmo acesso/permanência/sucesso, uma vez que o que está em causa é garantir, não só o acesso, mas também a permanência e o sucesso dos estudantes oriundos de classes ou grupos sociais discriminados.

Em relação à oferta de vagas, podemos observar na Tabela 9, a seguir, que

houve um aumento considerável na oferta de vagas, recorte entre os anos 2005 e 2012.

Entende-se que a oferta de vagas se dá na UEMS, pela criação de novos cursos,

portanto, aumentaram-se as possibilidades de escolhas dos vestibulandos indígenas e

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também de novos cursos em campus diferentes. Por exemplo, o curso de História no

município de Amambai que se iniciou em 2008, Engenharia Florestal em Aquidauana

em 2006, Geografia na unidade de Campo Grande no ano de 2010, municípios estes que

concentram povos e aldeias indígenas29.

Tabela 9: Número de Ingressantes e Concluintes Negros e Indígenas cotistas da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul entre os anos de 2004 a 2014 Cotistas Ingressantes Concluintes % de Concluintes

Negros 3.071 637 20,74%

Indígenas 856 93 10,86%

Total 3.927 730 31.60 %

Fonte: Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI) 2014-2018 Elaborado pela autora

Após a Lei de Cotas para indígenas em 2004, 186 se inscreveram para o

vestibular, 116 foram classificados e 67 efetuaram a matricula, dos 67 matriculados, 37

eram do sexo masculino e 30 do sexo feminino, e apenas oito concluíram os cursos em

2007, Zarpelon e Cordeiro (2011) afirmam “que este índice em grande parte é devido ao

fator econômico e a relação com os professores no não entendimento as especificidades

culturais indígenas”.

Corroboram com esse pensamento os estudos desenvolvidos por Giroux (1992)

sobre evasão, afirmando que, embora as origens deste quadro estejam na sociedade em

geral, há no universo escolar práticas materiais e ideológicas que colaboram para

produzir diferenças de classes, raça e sexo. Nos ateremos sobre esta temática nas

próximas páginas.

Em relação ao número de ingressantes e concluintes negros e indígenas cotistas

entre os anos 2004 a 2014, observa-se na tabela a seguir que entre dos 856 indígenas

ingressantes 93 concluíram a graduação, ou seja, 10,86 %. E entre negros dos 3.071 que

ingressaram na IES, 637, ou 20,74%, concluíram os cursos de graduação. Neste

enfoque, é preciso considerar que ao se analisar os grupos minoritários sejam

considerados os contextos sociais nos quais cada grupo está inserido. Demonstrando que

29 Os povos indígenas destes municípios podem estar residindo fora dos territórios tradicionais (Reservas Indígenas).

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mesmo com implementação da Política de Ação Afirmativa na IES estudada, avanços

ainda são necessários para garantir a permanência dos mesmos.

Levantamento realizado pelo Centro Indígena de Estudos e Pesquisas (CINEP)

em 2009 já apontava para esta situação, revelando que pelo menos 20% (1,2 mil) dos

cerca de seis mil estudantes indígenas de cursos de graduação de todo o país não

conseguiam terminar seus estudos, a entidade aponta

[...] como fatores determinantes de evasão indígena nas universidades, o preconceito, a língua, a ausência de conteúdo básico das etapas iniciais da atividade escolar, além do baixo valor das bolsas. Na tentativa de conter esta evasão, as etnias reivindicam a criação de universidades indígenas, bem como, a inserção de disciplinas com temáticas específicas para eles (COUTO, 2009,p.1)

Outra questão que nos chama atenção é a representação dos grupos étnicos entre

os acadêmicos indígenas, o relatório do Rede de Saberes (2009) aponta que há ainda

diferenças significativas, onde estavam presentes 243 Terenas, 89 Kaiowás, 68

Guaranis, 12 Kadwéu, sete não informados, e 3 Xavantes, dois Kaingang e um

Kinikinau, conforme se observa na Figura 8. Ao compararmos com os dados

demográficos das etnias do estado (discorrido no capítulo IV) observa-se uma sub-

representatividade de alguns grupos étnicos, que pode estar relacionada à dificuldade de

acesso e a baixa escolaridade, conforme nos aponta os estudos desenvolvidos por Bittar

et al (2006) e Brand e Calderoni (2012).

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Figura 8: Número de Acadêmicos matriculados por etnia no ano de 2008 – Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul.

Fonte: Relatório Rede de Saberes, 2009.

Diante da complexidade que envolve a temática, permeados e imbricados por

este cenário complexo e desafiador no contexto das características organizacionais e

políticas, discorremos nas próximas páginas sobre o processo de implementação da

política de ação afirmativa a partir do “olhar” dos implementadores.

Sob essa ótica, objetiva-se buscar o que estes sujeitos são, fazem e sabem

realmente. Bem como, que significados subjetivos que atribuem as suas atividades e

ambientes de trabalho (FLICK, 2004, p.33; DENZIN, 2007, p.116).

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140

5.3 Implementadores: Perfil e Considerações

A partir da estrutura administrativa e também do histórico da implementação da

Política de Ação Afirmativa na UEMS no decorrer da última década, foi considerado

relevante incluir sujeitos com mais de 10 anos na IES, que estiveram ou estão no cargo

de Pró-Reitor de Extensão e Assuntos Comunitários, Pró-Reitor de Ensino, Membros da

Comissão de Acompanhamento das Ações Afirmativas e também coordenadores de

cursos com maior número de acadêmicos indígenas. Participaram da pesquisa 12

sujeitos, entre eles seis pessoas do sexo masculino e seis do sexo feminino.

A idade variou entre 32 a 62 anos, com uma média de idade de 48,08 anos. Em

relação ao período de tempo de atuação na UEMS variando entre 02 (dois) anos a 20

anos, numa média de anos de 13 anos de atuação. Os cargos de Pró-Reitor são

designados pelo Reitor, como cargos de confiança. Tempo no cargo de Coordenador

variou entre três meses a 14 anos. Na UEMS, os cargos os coordenadores de curso são

escolhidos por votação pelo corpo docente e representantes discentes dos cursos, com

período de atuação de 2 anos. Podendo ser renovados.

Em relação à pós-graduação, entre os entrevistados oito são doutores, cinco com

mestrado e um está cursando doutorado.

Em relação à formação dos profissionais participantes da pesquisa foi

representada pela diversidade, entre eles: História (2), Psicologia (1), Engenharia Física

(1), Agronomia (2), Ciências Sociais (1), Pedagogia (2), Administração de Empresas

(1), Enfermagem (1), Direito (1).

O perfil dos implementadores revelam a diversidade das áreas de formação e

tempo de atuação na UEMS, um indicativo importante para a compreensão da

implementação da política de Ação Afirmativa na UEMS em diferentes fases do

processo. Os participantes da pesquisa possuem formação diversa, e esta característica

pode de certa forma ter contribuído a estruturar a política e promover o debate de Ação

Afirmativa num enfoque racial e social na IES pesquisada. Somando-se a fato de três

deles serem negros. Mesmo que relatam não efetivamente participarem de movimentos

negros, promovem a discussão e se engajam em enfrentamentos de discussões e/ou

pesquisas de cunho racial.

Considerando a afirmação de Elmore (1996), a partir da abordagem de análise

de implementação o modelo Retrospectivo (backward mapping), os “fazedores” de

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políticas não controlam a implementação e que a mesma não se define no topo da

administração, mas no ponto em que as ações administrativas interceptam escolhas

privadas. Portanto, é no âmbito da implementação que se manifestam as concepções

pessoais e profissionais dos funcionários a respeito do que deve ser a política pública. E

neste sentido, buscou-se identificar as percepções dos atores que a implementam, suas

dificuldades, adesões e as modificações das condições iniciais.

Pois, a implementação das políticas de Ações Afirmativas na UEMS abarca

aquelas ações efetuadas por indivíduos (ou grupos de indivíduos) que tem como foco a

realização dos objetivos previamente decididos (VAN METER & VAN HORN in

AGUILAR VILLANUEVA, 1996, p.99).

Há três elementos do comportamento dos atores envolvidos que podem afetar a

sua capacidade e a vontade de implementar uma política: o conhecimento (compreensão

e discernimento), a sua aceitação, neutralidade ou rejeição e; a intensidade de sua

resposta (VAN METER & VAN HORN, 1996, p. 128).

É importante destacar que, quanto maior o número de pessoas envolvidas no

processo de implementação, maior o número de possibilidades de dificuldades durante o

processo. No entanto, a complexidade também pode ser uma forma de mecanismo de

proteção e negação ao programa ou a uma política proposta.

Os analistas implementação compreendem e afirmam que a instalação uma

tecnologia, a realização de um plano ou a imposição de uma lei não são automáticos,

não possuem um futuro seguro e são imprevisíveis. Portanto, é neste cenário que

investigação se foca, procurando compreender a multiplicidade de fatores e decisões,

que limitam e explicam a incerteza que caracteriza os resultados (BERMAN, 1993)

O autor também enfoca que no processo de implementação há duas vertentes a

serem consideradas: a macroimplementação e a microimplementação.

Sendo que as principais diferenças entre os processos de microimplementação e macroimplementação se referem aos os seus contextos institucionais. Enquanto o contexto institucional microimplementação é uma organização local e prestador de serviços, o contexto institucional da macroimplementação é todo um setor da política, que vão desde a federal para os níveis locais30(BERMAN, 1993, p.292).

Ainda nos referindo ao autor acima, a microimplementação de uma política

geralmente envolve a necessidade de mudança organizacional no nível local. A

execução dos programas de governo requer mudanças, que há vezes não ocorrerem

30 Tradução nossa.

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facilmente. Os membros das organizações podem se adaptar às novas exigências em

formas inesperadas, e este é o cerne do problema de microimplementação e é

caracterizada por uma interação mútua.

Desse modo, a implementação a nível local depende da relação entre o projeto e

as características adotadas pela organização responsável pela execução.

Ao nos projetarmos para o mundo do trabalho dos sujeitos da pesquisa da

Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul, nos deparamos com sujeitos que

transitam neste espaço, que ora são coletivos e ora são individuais. Que estabelecem

relações e modos de agir de acordo com seus pensamentos e mundos internos. Trazem

também para os cenários de suas práticas profissionais suas crenças, valores, percepções

e concepções. Suas formas de pensar e agir são oriundas de um modo complexo, frutos

de uma construção histórica e social, permeadas por suas histórias de vida,

espiritualidade, formação profissional e cultural.

Portanto, o universo das instituições de ensino é composto por sujeitos, ou seja:

[...] o sujeito (o ser humano) não é um dado e sim o resultado de uma construção (teórica, social, cultural). De novo, descentrar o sujeito não significa afastar qualquer possibilidade de fazer política, mas apenas daquele tipo de política que tem como pressuposto justamente tal noção de sujeito. A política não se faz no terreno do dado, do fixo, do absoluto, do transcendental, mas justamente no terreno do questionável, do variável, do ordinário, do imanente (GANDIN, 2002, p.11).

Corrobora com este pensamento o autor Guerra (2012) afirmando que “nothing

in the workplace is culturally neutral. Culture influences how we think, communicate,

relate to each other, and so much more”.

Nesta assertiva a autora Bagnato (2012) nos aponta que:

A universidade existe e tem vida através de pessoas e para pessoas que possuem histórias de vida concretas, biografias, com origens sociais, culturais diversificadas, com variados interesses e necessidades, condicionadas por um contexto. Há imbricados elementos do passado e do presente da história, dos sujeitos e da instituição delineando permanências e rupturas (p.181).

Além de suas construções e percepções próprias, os ambientes de trabalho

podem produzir ou serem carregados por tensões, relações de poder e interesses

pessoais. Na perspectiva do poder, conhecimento e direito, Santos (2009) refere que:

[...] nas sociedades, há uma pluralidade de ordens jurídicas, de formas de poder e de formas de conhecimentos. Mas apenas reconhecê-las somente é uma

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falácia, é preciso reconstruir teoricamente o reconhecimento, uma construção que deve ser reflexiva.

Instituições de ensino representam e fazem parte de outras instituições:

políticas, culturais e de maior poder, também desiguais. Os espaços escolares, assim

como qualquer organização, são lócus de bases conflitivas, frutos de processos

históricos, que conformam o terreno político e organizativo que se movem cada

comunidade escolar concreta (APPLE, 2006; MOLINA, et al 2011).

Neste mesmo pensamento Dias Sobrinho (2010, p. 1228) refere que instituições

e Estado são constituídos e construídos por seres humanos e carregam contradições

sociais e diferentes projetos existenciais e coletivos.

A implicação dos envolvidos nos processos de implementação de uma política

numa referida IES, sejam eles autoritários ou democráticos, manifesta uma

característica sociológica desses atores sociais, própria dos momentos nos quais se

consolidam estratégias de poder (MOLINA et al, 2011).

Portanto, a implementação de políticas públicas envolve uma complexidade de

fatores. Pois, nas palavras de Berman (1993, p. 307):

É certamente apropriado considerar sistemas de prestação de serviços públicos, precisamente como sistemas, como a organização responsável pela execução (ou escola, hospital ou dependência de bem-estar social) é inserido em um contexto local que fornece serviços (os estudantes, pacientes ou beneficiários) e com o qual interage. Uma vez que, o contexto local está imerso em um ambiente mais amplo e composto, entre outros, pelas condições sociais e econômicas [...].

Neste sentido, Berman (1993) menciona à microimplementação, sobre a qual os

estudiosos apontam e sugerem a importância de uma observação empírica em três

momentos: “mobilização”, “implementação por parte dos prestadores de serviços ” e a

“institucionalização”. Nas próximas páginas nos deteremos em cada uma delas.

Utilizaremos como marco mobilizador do processo de implementação da

política de ação na UEMS a promulgação da Lei Estadual Nº 2.589, de 26 de dezembro

de 2002.

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5.4 Marco mobilizador: Lei Estadual Nº 2.589, de 26 de dezembro de 2002, a UEMS

O uso do termo "mobilização" se propõe como uma imagem e mistura complexa

de atividades políticas e burocráticas, que constituem o núcleo real do início de uma

nova política pública, sendo particularmente relevante para a descrição da rota de um

projeto (BERMAN, 1993).

Por intermédio da Lei Estadual nº 2.589, de 26 de dezembro de 2002, a UEMS

(ANEXO 3) passa a oferecer reserva de vagas em seus cursos para indígenas. A

proposta parlamentar foi sugerida pelo Deputado Estadual Murilo Zauith, que fazia

parte da Comissão de Inclusão de Negros e Índios nas Instituições de Educação

Superior na Câmara de Deputados em Brasília, compondo com Deputados como Nice

Lobão, que defendia a inclusão das minorias raciais nas IES públicas do país.

A regulamentação para cotizar estudantes negros se deu por meio da Lei nº

2.605 (ANEXO 4), de 6 de janeiro de 2003, projeto de lei do Deputado Estadual Pedro

Kemp.

No estudo desenvolvido por Cordeiro (2010) a autora afirma que esta ação

política foi resultado de reivindicações dos povos indígenas e também do movimento

negro de Mato Grosso do Sul, e outras instituições de defesa dos direitos do negro, em

parceria com a Coordenadoria Estadual de Políticas Para a Igualdade Racial (CEPPIR)

do governo do estado (na época, do Partido dos Trabalhadores).

Esse movimento no estado também é fruto das pressões e influências das fortes

discussões no país sobre acesso e democratização da Educação Superior, especialmente

dos movimentos de grupos em defesa a causa indígena.

Nessa ótica, acrescenta-se que uma lei específica é aquela decisão política

fundamental que se deve implementar, no entanto, indica um problema a enfrentar e

estipula os objetivos a alcançar (SABATIER & MAZMANIAM, 1996). Neste caso, o

propósito de implantar cotas na UEMS visa reduzir as mazelas de ordem

socioeconômicas, promovendo a inclusão de minorias com o enfoque racial.

A partir da sanção da lei pelo Governador do estado, a UEMS passa a reservar

cotas a negros e indígenas, e, em relação à Lei Estadual nº 2.589, se referindo à

população indígena, aborda:

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Art. 1º: Fica a Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS) obrigada a cotizar vagas destinadas ao ingresso de vestibulandos índios31.

E em seu artigo segundo:

Art.2º: A UEMS deverá divulgar, a partir do próximo vestibular, o número de vagas que serão oferecidas em cada um de seus cursos.

Sancionada a lei, a política de cotas é instituída na UEMS, trazendo consigo o

desafio de promover no âmbito institucional e também com a comunidade externa dos

mecanismos para o processo de implementação das referidas leis.

No entanto, na implementação de uma lei, as resistências e as polêmicas podem

ser geradas por inúmeros fatores, por exemplo, quando uma decisão não foi amplamente

discutida com aqueles diretamente envolvidos. Ou quando há situações onde as normas

são incompatíveis com a visão dos responsáveis.

Conforme nos revelam os relatos abaixo, a UEMS não participou das discussões

e não foi consultada pelos parlamentares da Assembleia Legislativa do estado de Mato

Grosso do Sul sobre a proposta de criação de cotas para negros e índios.

Eu lembro que a grande polêmica que surgiu da Legislação. É que ambas as leis, tanto as leis tanto a dos indígenas quanto a do negro, elas vieram sem consulta prévia da Universidade.

A grande questão é que toda vez que vem uma coisa que de cima pra baixo, mesmo que ela seja boa, é a questão da discussão da autonomia da universidade.

O corpo docente que estava envolvido se sentiu menosprezado no princípio da autonomia da universidade, esta era a grande discussão (OCPR/ CC).

Sabia da discussão que estava ocorrendo, mas muito brevemente (MCAAC 1 / OCPR).

Houve a discussão após a promulgação da lei e que estaríamos recebendo estes alunos, não houve esta discussão sobre o que a gente achava, isto foi imposto para nós (OCC 1).

Pode ser que alguns grupos podem ter discutido, mas conosco não teve uma discussão muito grande sobre isso (OCC 2).

[...] foi recebida “ goela abaixo”, veio de cima pra baixo(CC).

31 Grifosnossos.

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Gross et al (1971, p. 24) apud Van Meter e Van Horn (1993, p. 113-114) ao

realizarem revisão bibliográfica sobre mudanças previstas, identificaram que nas

organizações:

[...] Vários dos fatores que influenciam um consenso sobre as metas e, desta forma, afetam a própria implementação. Um desses fatores é a medida em que os subordinados ou tomadores de implementação têm participado na preparação da decisão política. O estudo bibliográfico considerou que existem motivos para apoiar as seguintes afirmações:

1) participação fomenta o surgimento de um bom espírito de equipe entre os funcionários, e um bom espírito é uma condição necessária para a implementação bem-sucedida;

2) A participação permite um maior compromisso, e um alto grau de comprometimento é necessário para fazer a mudança;

3) a participação pode compreender melhor as razões para a introdução de uma determinada inovação, requisito claramente essenciais para a implementação;

4) tendo em conta o postulado básico da resistência à mudança, pode-se argumentar que a participação vai reduzir a resistência inicial e, consequentemente, facilitar a implementação bem-sucedida; e

5) subordinados tendem a se opor a qualquer inovação, quando foi lançado por iniciativa exclusiva dos superiores32.

Também os autores apontam que nem sempre o consenso em torno dos objetivos

e a participação dos subordinados nas decisões resultam em um consenso sobre as metas

ou que os problemas serão minimizados. Temas polêmicos tendem a provocar maiores

resistências se comparados àqueles que requerem menos mudanças e impactos.

O que se observa nos relatos dos participantes da pesquisa é que a implantação

das cotas, marco da implantação das políticas de Ações Afirmativas para indígenas na

UEMS provocou inúmeras discussões e tensões nos espaços da universidade.

Também destaca-se que o texto da referida lei é bastante breve e não explicita de

que forma ocorreria a sua regulamentação, quais seriam os critérios de inserção de

alunos indígenas e principalmente os objetivos propostos. Ficando a cargo da UEMS a

função de regulamentar a lei e discutir tais pontos. Conforme se observa no relato de um

membro das Pró-Reitorias na época:

Nós teríamos que regulamentar, fui buscar as instituições que já faziam isso, por exemplo: a UERJ, eu verifiquei que não havia do ponto de vista da

32 Tradução nossa.

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regulamentação da lei nada muito claro. Nós tínhamos que regulamentar (MCAAC 1/ OCPR).

A regulamentação da lei ocasionou diversas reuniões: com lideranças indígenas

locais, regionais e estaduais. Bem como, com os movimentos de professores indígenas

do estado, conforme o relato a seguir:

Neste momento busquei as lideranças do movimento negro, indígenas, principalmente os terenas e os guaranis, porque eram eles que mais se aproximaram da universidade, por conta do normal superior e iniciamos um processo de discussão (MCAAC 1 / OCPR).

Como se pode observar no discurso acima houve uma preocupação em discutir

amplamente as ações e também de envolver os movimentos representativos da

sociedade indígena na discussão.

Nesse sentido, é fundamental incorporar os grupos envolvidos nas políticas e

nelas interessados ao processo de formulação e implementação de políticas.

Promovendo mecanismos de envolvimento na política por setores estratégicos e que

lhes deem sustentação política e legitimidade. Incluindo a identificação dos atores que

dão sustentação à política e mecanismos de negociação entre tais atores.

Também foi criada comissão com o propósito de discutir a regulamentação:

No mês de fevereiro criamos uma comissão dentro do Conselho (CEPE), para trabalhar essa questão. A gente se reunia, mas as pessoas não sabiam, não havia estudos científicos, na época tinha a professora M.L.F., era militante do movimento negro, mas não tinha estudos, trabalhos intelectuais na área, era mais na área da militância (MCAAC 1 / OCPR).

Encontrando dificuldades de discutir a temática no âmbito da UEMS:

A Comissão que foi montada no CEPE, somente com professores e internos da universidade, aquelas reuniões intermináveis e um dia disse: Não dou conta de discutir isso, a comissão um dia ‘jogou a toalha ‘e disse não temos condições de discutir isso. Vamos fazer audiências públicas (MCAAC 1 / OCPR).

Eu participei da comissão de implantação das cotas dentro da universidade, foram momentos de muitos debates, pois tínhamos muitos grupos dentro da universidade que não era a favor, então a gente tinha que apresentar e fazer o debate antropológico, histórico e também educativo para a formação destes grupos, com estes professores, para a gente fazer esta implementação (CC 1).

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A Comissão promoveu e organizou audiências públicas que ocorreram nas

cidades de Dourados, Ponta Porã e Aquidauana. Nas audiências públicas foram

convidados os representantes dos movimentos negros e indígenas (CORDEIRO, 2012,

p. 21). Estiveram presentes Dr. Aleixo Paraguassu, ativista social, Presidente do

Instituto Luther King em Campo Grande-MS e lideranças indígenas.

Nas audiências públicas os alunos compareciam, segundo o relato:

Os alunos iam para brigar, porque na concepção dos alunos, que já estavam matriculados estavam tirando as vagas deles, eles diziam que estavam tirando a vaga deles. E naquele dia, quando ouvi isso, eu disse: como tirar a sua vaga? Se você já está matriculado (MCAAC 1 / OCPR).

Encontrando dificuldades para promover discussão com as comunidades e

lideranças indígenas:

Tive que fazer reuniões, buscar recursos, quantas vezes com dinheiro do próprio bolso, para pagar o lanche dos indígenas e o almoço.

Por exemplo, a prefeitura deu a Combi ao pessoal de Caarapó, e eles diziam: mas, não temos como almoçar, quem custearia a alimentação?

Tínhamos que resolver as coisas de forma pessoal, eu e outras pessoas que estavam envolvidas. Conseguimos parceiros da UCDB.

Tínhamos apoio muitas vezes mais de fora do que de dentro da IES (MCAAC 1 / OCPR).

As resistências existiam e ainda existem e com o objetivo de promover este

debate entre professores, acadêmicos, gestores e técnicos administrativos da referida

IES foram realizados seminários e Fóruns de Discussão: Reserva de Vagas para

indígenas e negros na UEMS: vencendo preconceitos, entre os anos de 2003 e 2004,

cujo objetivo se centrou em esclarecer, divulgar e construir coletivamente os critérios de

inscrição nas cotas e também discutir a preocupação institucional quanto à permanência.

Os Fóruns e seminários foram realizados em todas as 15 unidades da UEMS do

estado. Entre os convidados para os fóruns e seminários estavam os principais

estudiosos do país sobre a temática:

[...] José Jorge de Carvalho (Universidade de Brasília), Prof.ª Dr.ª Petronilha Beatriz Gonçalves e Silva (Universidade Federal de São Carlos e na época Membro do Conselho Nacional de Educação), Prof. Dr.Wilson Roberto de Mattos (UNEB e ABPN), Prof. Dr. Antônio Carlos de Souza Lima (Museu Nacional – LACED e Trilhas de Conhecimentos), Dr. Ivair Augusto dos Santos (SEDH) e outros que estiveram na UEMS (CORDEIRO, 2012, p.31).

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No dia 8 de julho de 2003 reuniu-se no Conselho de Ensino, Pesquisa e

Extensão (CEPE) representantes do Movimento Negro Estadual, o Conselho Estadual

de Direito do Negro, Lideranças Indígenas e a Coordenadoria de Políticas para a

Promoção da Igualdade racial (CEPPIR/MS) com o objetivo de discutir e definir os

critérios para inscrição nas cotas da UEMS.

Entre as falas das lideranças indígenas:

[...] alegaram que não se poderia identificar o índio somente pelo documento de identificação indígena (RG), uma vez que se sabia que havia não-indígenas que possuíam documento emitido pela Fundação Nacional do Índio – FUNAI. Era importante, mas não o único. Propunham ainda, a autodeclaração em uma das etnias e que, pai e mãe fossem indígenas, bem como morar na aldeia, porque havia entre seu povo muita descrença com aqueles que moravam fora da aldeia, ou com os que saiam para estudar, porque não mais voltavam para ajudar a comunidade. Também mostraram preocupação com os mestiços que recorreriam da decisão (CORDEIRO, 2012, p. 22).

Após intenso debate, representantes indígenas resolveram retirar o critério de

morar na aldeia, porque muitos indígenas viviam e vivem na periferia da cidade de

Dourados e de outros municípios.

Expressaram também preocupações quanto ao:

[...] número de escolas nas aldeias e a possibilidade de haver ou não candidatos indígenas para preencher o percentual estabelecido; a distância das aldeias até as unidades universitárias da UEMS; a sobrevivência destes fora da aldeia; as diferenças culturais, entre outros (CORDEIRO, 2012, p. 22).

Como podemos observar as lideranças indígenas manifestavam suas

preocupações quanto à permanência dos acadêmicos indígenas na universidade e os

principais desafios a serem enfrentados por este grupo.

O autor Lima (2007) também aponta que em termos de diferenças culturais, é

preciso reconhecer que os indígenas possuem um sistema de valores, de pensamento,

conhecimentos, redes de parentesco, relacionamento e visões de mundo extremamente

diversos. E as suas identidades, na maioria dos grupos, são apoiadas em direitos

coletivos.

No dia 17 de julho por meio de reunião ordinária o Conselho Universitário

(COUNI) se reúne, estiveram presentes cerca de 300 pessoas, entre eles: conselheiros,

representantes discentes, representantes de organizações do movimento negro e

lideranças indígenas.

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Foi um dia, uma reunião conjunta entre CEPE e COUNI. Uma reunião diferenciada. A plateia do auditório estava cheia, com as lideranças indígenas e os movimentos dos negros (MCAAC 1 / OCPR).

Nenhum conselheiro votou contra, tinha conselheiro que a gente sabia que era contra, mas na hora do voto, todos votaram a favor, pois a votação foi aberta, eu solicitei a reitora e ela atendeu. Porque a gente precisava saber quem era contra e saber com quem estávamos trabalhando. Aconteceu o contrário (MCAAC 1 / OCPR).

Mesmo com raiva eles votaram a favor. E isso foi muito interessante (MCAAC 1 / OCPR).

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A lei foi regulamentada na IES pelos seguintes documentos:

Resolução COUNI-UEMS nº 241, de 17 de julho de 2003

Art. 1º As vagas ofertadas para o ingresso aos cursos de graduação da Fundação Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul, pelo processo de seleção, serão aprovadas e normatizadas pelo Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão, distribuídas por curso, obedecendo a seguinte proporção:

a) setenta por cento aos aprovados que concorreram de forma geral;

b) vinte por cento aos aprovados que concorreram às vagas ofertadas no regime de cotas para negros;

c) dez por cento aos aprovados que concorreram às vagas ofertadas no regime de cotas para índios.

Resolução COUNI-UEMS nº 250, de 31 de julho de 2003, o referido documento altera a redação da alínea “b” do art. 1º da Resolução COUNI-UEMS Nº 241, de 17 de julho de 2003

b) vinte por cento aos aprovados que concorreram às vagas ofertadas no regime de cotas para negros, oriundos de escolas da rede pública de ensino ou bolsistas da rede privada de ensino.

Resolução CEPE-UEMS nº 430, de 30 de julho de 2004

Art. 10. Aos candidatos que optarem por concorrer no regime de cotas de 10% (dez por cento) para indígenas, além dos incisos II, III, e IV do art. 8º, serão exigidos:

I - fotocópia da cédula de identidade indígena (frente e verso);

II - declaração de descendência indígena e etnia, fornecida pela Fundação Nacional do Índio – FUNAI, em conjunto com uma Comissão Étnica, constituída em cada comunidade.

Resolução CEPE-UEMS nº 431, de 30 de julho de 2004.

Aprova as normas para a realização do Processo Seletivo de ingresso de candidatos às vagas do Curso de graduação Normal Superior – Habilitação em Magistério na Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental, da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul.

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A IES transforma uma decisão política em um programa específico que passa a

ser nomeado como política de Ação Afirmativa.

Como relatado pelos entrevistados, as discussões promovidas na IES foram

marcadas por um intenso debate em torno da temática, tanto professores quanto a

comunidade acadêmica se manifestavam a favor e outros contra as cotas para negros e

indígenas.

No grupo de professores e da IES de forma geral as manifestações se deram,

conforme relato dos entrevistados:

Tinha e tem muitos grupos ferrenhos que são contra as cotas (CC 1).

O grupo a favor defendia a inclusão, os contras diziam que retirariam vagas regulares que seriam distribuídas para todas as pessoas e que o critério raça ou cor definiria a capacidade do indivíduo para ingressar no curso (OCC 1).

Entre os alunos:

Eu percebia que havia certa resistência por parte de parte dos acadêmicos, principalmente acadêmicos do primeiro ano, eles questionavam a questão da sua legalidade, questionavam a questão das cotas para negros e indígenas. Até algumas situações constrangedoras, questionamentos, da legalidade, coisas assim (CC 2).

O objetivo aqui não é aprofundarmos nas discussões de posições contra e a favor

a cotas e sim identificarmos os pontos de tensão gerados em detrimento da

implementação de Políticas de Ações Afirmativas na referida IES. Tais discursos

refletem posições ideológicas dos grupos presentes nas Instituições e as formas de poder

instituídas nos espaços acadêmicos, fruto de um pensamento hegemônico eurocêntrico e

meritocrático.

Estas discussões também ocorrem em outros espaços da sociedade brasileira e

também em outras IES pelo país afora. Além de ter sido também, no referido período de

implantação das cotas na UEMS, alvo de notícias nos principais veículos de

comunicação no país. Podemos citar a pesquisa desenvolvida por Campos et al (2013)

em que os autores analisam como o jornal “O Globo” traz em seus textos a abordagem

em torno das cotas raciais. Destacam que no ano 2003 o índice de títulos de reportagens

favoráveis às cotas era maior e a partir do ano de 2004 este número se inverte. Afirmam

também que a escolha pela temática polêmica já induz o leitor a conclusões

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tendenciosas. Os autores nos chamam atenção para o cuidado de serem criados dois

grupos antagônicos: aqueles que são contrários e aqueles que são favoráveis, este fator

pode ser um impeditivo de se promoverem discussões mais profundas sobre a temática.

As discussões em torno das cotas são a “ponta do iceberg”. Mesmo sem assumir

que o país ainda dá sinais de ser um país racista e preconceituoso, o que se observa é a

resistência para discussões sobre raça, etnia, classe e gênero. Relações até então forjadas

pela harmonia, harmonia esta até então velada. Nesta ótica, trazer a discussão de raça

para dentro de universidade vem se constituindo como um desafio.

Outra questão também importante é que ao se considerar políticas de Ações

Afirmativas como políticas redistributivas, levanta-se questões agudíssimas das relações

de propriedade, poder e prestígio social; relações estas historicamente estabelecidas no

âmbito das IES. Portanto, tendem a ser a arena mais tensa e frontalmente conflitiva

(AGUILAR VILLANUEVA,1996).

A política de cotas para indígenas não causou tanta polêmica quanto a que se baseou no recorte racial, que beneficiou pardos, negros ou afrodescendentes provavelmente por serem percebidos como um segmento numericamente insignificante da população brasileira, a não ser nas universidades localizadas em regiões onde as relações indígenas e não indígenas são muito conflitantes, como acontece nos estados do Mato Grosso do Sul e Roraima (PALADINO, 2012 apud SOUZA LIMA, 2009).

Além de se considerar que além da manifestação de posicionamentos binários

entre contrários ou favoráveis ao acesso diferenciado das populações indígenas nas

universidades brasileiras, é preciso também estar atento às modulações ou modos como

tal inserção diferenciada está concebida e praticada.

Em 2008 foi criada a Comissão de Acompanhamento de cotistas na UEMS, esta

comissão contou com representantes das 15 unidades, em Dourados houve um número

maior de representantes devido ao maior número de cursos instalados. O principal

objetivo da Comissão era realizar estudos e análise da política, por meio do

acompanhamento dos alunos cotistas indígenas, realizando uma avaliação.

Em relação à comissão de acompanhamento de cotistas, a entrevistada a seguir

enfoca:

Não funcionou, pois a comissão tinha que fazer os levantamentos, buscar e verificar juntos aos cotistas, ou seja, tinham que levar trabalho para casa. Também não conseguia se reunir. Não se conseguiu e a comissão encerrou os trabalhos e nem executou o que se propôs. Muitas vezes os representantes não tinham nenhuma afinidade pela temática (OCPR2).

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O acompanhamento dos alunos indígenas é extremamente importante, pois os

mesmos ao adentrarem uma universidade se deparam com um ambiente novo, e dessa

forma, podem encontrar dificuldades e barreiras de diversas ordens.

Além dos aspectos de ser contra ou a favor das cotas, havia também

preocupações entre os professores:

Logo de início me posicionei favorável as cotas, porque o entendimento que a gente tinha era que era insuficiente você criar cotas. Enquanto para muita gente o debate era só: cotas, sim ou não? As discussões pouco avançavam para outras questões (PR).

Como garantir a permanência? (PR).

Havia a preocupação entre os professores do grau de compreensão, será que o nível de compreensão seria o mesmo para acompanhar o curso? (OCPR/ CC).

Nós recebemos a cota e tivemos uma grande dificuldade, porque a gente não sabia como tratar essa situação. Primeiro porque que vieram pessoas de outra cultura e de outra língua (OCC 1).

Essa preocupação também foi refletida em pesquisa realizada em 2010 pela

autora Emerich, intitulada: A percepção dos professores sobre o sistema de cotas para

negros da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul – Curso de Pedagogia de

Dourados (2004-2008), onde se constatou a preocupação dos docentes com o

despreparo da Instituição para acolher e promover a permanência dos negros cotistas.

Também havia e há a preocupação quanto à permanência do acadêmico na IES,

a permanência ser garantia além das necessidades materiais, pois, uma boa parte dos

acadêmicos indígenas deixam suas aldeias e possuem fortes laços culturais com seu

povo.

5.4.1 A dualidade: Visível e Invisível – Igual e Diferente

“Temos o direito a ser iguais quando a diferença nos inferioriza;

temos o direito a ser diferentes quando a igualdade

nos descaracteriza” (Boaventura de Sousa Santos, 2009).

O que se observa em alguns relatos dos entrevistados é a dualidade entre o

indígena como visível e invisível, igual e diferente. Ao mesmo tempo consideram

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importante a presença indígena no meio universitário, para “desnudar” as pessoas e

consideram que os acadêmicos indígenas são “porta vozes”:

No plano imediato, o projeto de cotas dentro da UEMS, vem dar conta de um problema imediato, desnudar as pessoas, desnudar um problema que estava visível (PR).

[...] Esses programas e Ações Afirmativas conseguem trazer essas pessoas, elas são os porta vozes [...] (PR).

O autor Lima (2007, p.21) afirma que é preciso ter muito claro que os

acadêmicos indígenas são jovens que podem ser fenotipicamente muito parecidos com

os habitantes regionais com que convivem. Chegam ao ponto de serem até mesmo

invisíveis enquanto integrantes de coletividades etnicamente diferenciadas para seus

professores e para a estrutura universitária em que se inserem.

A forma como eles foram se formando, eles me parecem acostumados, a serem invisíveis e também a ser tratados como invisíveis (CC 4).

É preciso considerar que a forma como eles (indígenas) foram se formando

invisíveis e ficando acostumados é fruto de uma longa trajetória histórica que os

colocou nesta condição e os obrigaram a permanecer submersos por meio do

silenciamento ou do esquecimento, mediante as diversas formas de supressão dos seus

direitos fundamentais (SANTOS, 2009).

Bourdieu (1997) nos afirma que ao tratar todos da mesma forma – inclusive o

“diferente” – a escola privilegia dissimuladamente quem já é privilegiado por sua

bagagem familiar.

Nesta ótica, a inércia ou o tratamento de todos como iguais podem carregar

representações previamente construídas, estereótipos e prejulgamentos de uma

sociedade impregnada pela imagem do índio de forma generalizada. Conforme se

observa no relato a seguir, existem professores que acolhem e outros que tratam os

acadêmicos como outro aluno qualquer.

Professores mais sensíveis acolhem e outros professores tratam de maneira normal, como outro aluno qualquer (OCPR/ CC).

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A normalização é um processo sutil no qual o poder se manifesta no campo da

identidade e na diferença. Normalizar significa eleger uma identidade para parâmetro

em relação às demais, e dessa forma, servindo para avaliações e hierarquizações

(SILVA, 2011).

Os acadêmicos, e em especial os acadêmicos indígenas, trazem a sua

diversidade, reflexos do seu desenvolvimento cognitivo, afetivo e social, na maioria das

vezes marcadas por experiências e relações sociais já excludentes ao longo de suas

trajetórias de vida. Um tratamento uniforme só vem a consagrar as desigualdades e as

injustiças das origens destes. Neste aspecto, o autor afirma:

Uma outra forma de compreender esses jovens que chegam à escola é apreendê-los como sujeitos socioculturais. Essa outra perspectiva implica em superar a visão homogeneizante e estereotipada da noção de aluno, dando-lhe um outro significado. Trata-se de compreendê-lo na sua diferença, enquanto indivíduo que possui uma historicidade, com visões de mundo, escalas de valores, sentimentos, emoções, desejos, projetos, com lógicas de comportamentos e hábitos que lhe são próprios (DAYREL, 1996, p.5).

Compreendê-lo, a partir da sua diferença, representa uma abordagem que

permite acolher o diverso, a diversidade promove na prática a troca de saberes. Neste

enfoque, não podemos dar prioridade ao reconhecimento somente da igualdade, há que

se buscar movimentos que se discutam as diferenças. Mas que possam: Qualquer luta

concebida sob a égide de um desses princípios deve ser organizada de maneira a abrir o

espaço ao outro princípio (SANTOS, 2009, p. 96).

Portanto, manter um diálogo baseado no respeito às diferenças é complexo,

exige movimentos e mecanismos como formas de conhecimento/reconhecimento deste

outro.

Numa sociedade onde impera a supremacia branca, por exemplo ser branco não é considerado uma identidade étnica e racial. Num mundo governado pela hegemonia cultural estadunidense, étnica é a música ou a comida dos outros países. A força homogeneizadora da identidade é diretamente proporcional à sua invisibilidade (SILVA, 2011, p. 83).

Nessa ótica, uma política de Ação Afirmativa versa no atendimento

constitucional do direito à diferença, tal direito ainda sendo questionado:

Devemos tratar todo mundo igual. Procurar fazer que a lei seja para todos. Porque os índios devem ser tratados diferentes? Porque o índio deve ter cota? (CC5).

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Como podemos observar, o discurso ideológico de igualdade denota uma

tentativa de diluir a noção de diferença, numa lógica de pluralismo conservador e

integrador.

5.4.2 Parcas ações e/ou inexistência de discussões sistemáticas nos cursos

A educação exerce um papel fundamental no combate e na ressignificação de

identidades que são marginalizadas por processos que levam à inferiorização e exclusão

do sujeito. Ainda que hajam esforços, uma parte das escolas não contemplam, em suas

práticas pedagógicas, questões que cercam os estudos relacionados à pluralidade

cultural.

Tal fato pode ser entendido considerando-se que a educação superior, por

diversas vezes, tem se tornado um “[...] veículo de projeção, de padrões e modelos que

impedem o verdadeiro conhecimento, privilegiando um conhecimento dado e

assimilado [...]” (GUSMÃO, 2003, p. 92), representando o colonizado sempre como

uma população de tipos degenerados (BHABHA, 1998).

Nessa ótica Giroux (1997, p.16) nos aponta:

[...] o que vale como conhecimento, o que é importante ensinar, a forma como se julga o objetivo e a natureza do ensino, da forma como se vê o papel da escola na sociedade e a compreensão dos interesses sociais e culturais que modelam todos os níveis da vida escolar.

Entre os entrevistados se observa a exígua discussão sistemática sobre a

temática:

No curso não há discussões sistemáticas para discutirmos isso, está se passando ano e ano e não houve e não há nada discutido sobre isso. Nunca houve uma discussão do que fazer, por exemplo... (OCC 1).

Não existem ação sistemáticas, fica a cargo de cada professor, como é hoje, no sentido de trabalhar com monitorias e com projetos de ensino (OCPR/ CC).

Os Projetos Políticos Pedagógicos (PPP) mantêm uma lógica da formação profissional, eles contemplam o que diz na legislação, não tem o cuidado a situação do negro e do índio no Brasil. O PPP não contempla absolutamente nada de Ações Afirmativas (OCPR/ CC).

Nos cursos na verdade, quando percebem estas dificuldades, não tem ações para isso, nada instituído (OCPR2).

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O que se observa a partir dos relatos dos entrevistados acima é que a presença

indígena não significou, nestes casos, a promoção de discussões sobre a situação do

índio e do negro no Brasil, abrindo espaços para um diálogo pautado na alteridade.

Neste enfoque,

Como se pode falar de uma ‘conquista do valor da diversidade’, quando estamos perante um currículo comum? Tal como tivemos ocasião de deixar dito num outro espaço, e como está mais do que demonstrado, “o currículo nacional, como documento, é um erro [uma vez que] coarcta a verdadeira essência dialética do processo de ensino aprendizagem”. Por outro lado, o triunfalismo de um currículo comum – ainda que besuntado com os eufemismos do flexível, da autonomia, entre outros-, é ele próprio, mais do que um obstáculo à valorização da diversidade, ou o comprovativo da desvalorização dessa mesma diversidade, ou ainda, pior do que a anterior, uma estratégia de valorização de um ‘determinado comum’ que perpetue determinados quadros econômicos e culturais em detrimento de outros (PARASKEVA, 2005, P.11).

Portanto, o desafio é a construção de um currículo que leve em conta as

características étnico-raciais e culturais dessas populações, rompendo com o modelo

hegemônico e repetitivo para uma população urbana, branca e de classe média.

Diversidade entendida como riqueza e não como um problema. “É imprescindível,

portanto, uma política educacional que reconheça que é no conjunto das diferenças que

encontramos nossa própria identidade de brasileiros”(SILVA & SOUZA, 2008, p.185).

Um currículo multicultural e diferenciado é baseado no respeito à diferença e na

tolerância, com capacidade de transcender os obstáculos epistemológicos e as ideologias

de poder fundados no preconceito e no etnocentrismo.

5.4.3 Adversidades

É recorrente a fala dos entrevistados quanto às dificuldades apresentadas pelos

estudantes indígenas e apontam como origem de tais dificuldades a qualidade do ensino

fundamental e médio:

Se as pessoas tivessem as mesmas condições para se entrar na universidade, então eles não precisariam das cotas. A atuação do governo deveria ser na base, na qualidade do ensino público. Se as escolas públicas fossem de qualidade, independentemente de ser índio, branco ou negro. Teriam as mesmas condições (OCPR/ CC).

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A autora Moehlecke (2002) nos chama atenção para os cuidados quanto a estas

afirmações que podem traduzir a defesa de políticas universalistas; é necessário olhar a

raiz do problema, no caso, entre eles a baixa qualidade do ensino básico na esfera

pública, saúde, moradia, saneamento básico, segurança, emprego e renda, por exemplo.

Portanto, as cotas e as políticas de Ações Afirmativas não excluem a

necessidade de discussões sobre o compromisso de se melhorar a educação em todos os

níveis. E também combinadas com outras políticas para de fato combater a exclusão

social presente em nosso país.

É preciso, no entanto, encarar as dificuldades e desafios a serem superadas na

educação básica nas comunidades indígenas, e neste aspecto, as dificuldades podem

estar relacionadas a fatores como: somente 13% dos professores de escolas indígenas

possuíam ensino superior; locais improvisados das escolas como galpões, casas de

rezas; somando-se a falta de pertinência cultural; além dos fatores relacionados às

questões socioeconômicas (AYWIN, 2009, p.10).

Também é necessário considerar que o conhecimento dos acadêmicos indígenas

é construído sobre arcabouços culturais distintos. Portanto, o desafio é como se pensar

uma aprendizagem significativa a partir de significados tão distintos?

Nesta ótica, Paraskeva (2002) apoiado por Apple enfoca que conhecimento é

poder, desta forma são necessários questionamentos sobre as formas de conhecimentos

hegemônicos e dominantes, levantando algumas indagações:

[...] De quem é esta cultura? A que grupo social pertence este conhecimento? E de acordo com o interesse de quem é que se transmite determinado conhecimento (fatos, destrezas, propensões e disposições) em instituições culturais como a escola? (PARASKEVA, 2002, p.113)

Portanto, é fundamental que no processo de formação de profissionais críticos

concebam o conhecimento como prática social, exercendo papéis políticos ideológicos

(SILVA, 2011).

Ainda sobre as dificuldades apontam:

[...] principalmente entre indígenas muitas dificuldades. Pois, os alunos indígenas têm muitas dificuldades, eles chegam à universidade com um nível de escolaridade muito baixo (OCC 1).

Alguns professores fazem correlação com as cotas, dizendo que eles são fracos, que não conseguem acompanhar, são preguiçosos (OCC 2).

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É comum nos discursos docentes o argumento de que muitos alunos apresentam

dificuldade em aprender, explicado por uma séria de fatores, estereótipos

preestabelecidos, como por exemplo: mal alimentadas, negras, imaturas, seus pais serem

analfabetos, alcoolistas, favelados, filho de prostituta, índios, dentre outros

(ATHAYDE, 2010).

É assim que a educação, não só das universidades, mas em âmbito geral tem sido “o veículo de projeção de padrões e modelos que impedem o verdadeiro conhecimento, privilegiando um conhecimento dado e assimilado pela ordem institucional” que nem sempre é percebido por aqueles que produzem os processos educativos (GUSMÃO, 2003, p. 92).

Esta percepção dos acadêmicos é expressa pelos indígenas, como se vê no

estudo desenvolvido por Brand e Calderoni (2012), que trazem relatos

Eliel Benitez, professor e acadêmico Kaiowá, da Terra Indígena Te`yikue, município de Caarapó, referindo-se à presença indígena nas IES, reconhece que “nossa maior dificuldade foi desestruturar aquilo que estava fixado”.

Na mesma perspectiva, segue outro professor e acadêmico, Joaquim Adiala, guarani da Terra Indígena de Porto Lindo, município de Japorã: “Muitas vezes as Universidades não querem aceitar o tipo de conhecimento, organização política, social e economia dos nossos povos (...). Os professores (das IES) não conhecem os nossos anseios e por isso não conseguem trabalhar com os acadêmicos indígenas” (p. 92).

O autor Oliveira filho (2004) apud Urquiza et al (2011, p. 87) aponta que “o

problema das populações indígenas não é a baixa escolaridade, mas sim o

reconhecimento e promoção de valores e visões de mundo diferenciados [...] e ao

empoderamento das sociedades”.

Os entrevistados também reconhecem que:

[...] indígenas e não indígenas apresentam dificuldades de aprendizagem:“tem outros alunos que não são cotistas e também têm dificuldades” (OCC 2).

Outro fato destacado pelos entrevistados se refere à evasão e desistência dos

acadêmicos indígenas:

[...] a gente precisa investigar a questão da evasão porque muitas vezes as pessoas assim,é o que sinto ouvindo pessoas que são especialistas. Às vezes o pessoal tem um certo temor dos dados da evasão, porque você investe em um programa e uma das coisas que se esperava é que ele obtivesse sucesso com o maior número de alunos que permanecessem (PR).

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[...] eles têm muitas dificuldades, eles reprovam e este é um ponto de muita desistência e de muita evasão. Passa o primeiro, passa o segundo e passa para o terceiro. Porque eles vão carregando as disciplinas, eles estão no terceiro ano e carregando disciplinas do segundo, do primeiro e aí eles desistem. É isto que está acontecendo (OCC 1).

Os alunos indígenas têm dificuldades e problemas, assim como os demais alunos, por exemplo, nos estágios, nos TCCs, a evasão é um pouco maior entre os indígenas, mas não tenho este número. Mas eles têm tempo pra isso, eles têm 7 anos para concluir o curso, uma parte dos alunos indígenas não conclui o curso no tempo regular. Não saberia em números quanto é a evasão (CC 4).

A gente faz um trabalho, gente faz um trabalho diuturno de acompanhamento com eles aqui. Mesmo assim não conseguimos formar muitos aqui. Entre as mulheres, tem a questão da gravidez, e elas amamentam por mais tempo que nós não indígenas. A mulher terena e a mulher indígena é muito maternal, ela muito doméstica e ela é da família, dá prioridade para a família, depois ela prioriza os estudos. Dependendo se é uma mulher casada ela vai dar prioridade à família e depois ela prioriza os estudos (CC2).

Alguns apontamentos sobre evasão e desistência são discutidos no estudo

desenvolvido pelos autores Veiga (2000, p. 45-47) apud Veiga e D’Angelis (2010)

relatando que “(...) a evasão escolar pode não ser um problema, mas uma forma de

resistência à escola”. No entanto, tal afirmação não pode ser generalizada levando em

consideração a diversidade e complexidade da temática. Portanto necessitam de estudos

aprofundados.

A questão da evasão é discutida na IES de forma geral, centradas na

culpabilização da qualidade da educação básica. Neste aspecto, considera-se que, são

necessários esforços para melhoria da qualidade da educação do ensino médio e básico,

no entanto, paralelamente a este movimento é preciso maiores discussões e ações

efetivas no combate à evasão.

Outro fator de destaque que os entrevistados apontam é um declínio do número

de alunos indígenas na UEMS

Hoje Campo Grande está com um grande número de alunos, mas a UEMS de Dourados continua tendo o maior número. Mas isso tende a equilibrar. Em função das bolsas das universidades federais que é de maior valor (OCPR2).

[...] hoje vejo que o número de alunos nos cursos aqui diminuiu, nós já tivemos muitos alunos e hoje já são menos [...] reduzindo a procura pelos cursos aqui pelos alunos indígenas (OCC 2).

Eu tenho notado assim, mas preciso me certificar disso no SAU, mas me parece que tem diminuído o número de indígenas que tem ingressado no nosso curso (CC 2).

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Este fato pode estar relacionado em parte à criação dos cursos de licenciatura

intercultural na Universidade Federal da Grande Dourados, somando-se também ao

valor da bolsa empregada pelo governo federal ser de R$ 900,00 reais, fator que pode

estar contribuindo para que os indígenas busquem cursos em universidade federais.Tal

afirmação é sustentada pelos relatos dos próprios indígenas em conversas informais.

O mesmo também foi observado pela entrevistada:

[...] com certeza terá um aumento na UFMS e UFGD. A bolsa lá é de 900,00 reais, não precisa fazer nada (OCPR2).

5.4.4 Intolerância e Resistências

No relato de uma das entrevistadas, emerge a situação do preconceito. Julgamos

importante inserir o relato completo, por considerarmos que não se trata somente de

uma situação explícita de preconceito e racismo, mas também de uma desqualificação

do saber do outro:

[...] vivi um preconceito na escola onde tinha o estágio em relação a uma aluna indígena. Era uma implicância exagera, porque eu tinha outras estagiárias, promovendo até aquém daquela da aluna indígena e não foi tão criticada.... Tem professores que pegam a ficha e preenche com os quesitos máximos. Mas tem outros que são criteriosos e preenchem com cuidado todos os campos. No caso da aluna indígena a professora sempre colocava, sempre ampliava alguma “falta”, algum esquecimento.

E no ano seguinte quando eu fui tentar renovar o vínculo com aquela escola para fazer o estágio uma das coisas que a coordenadora me disse: tivemos uma professora que se queixou muito da sua estagiária. E aí eu perguntei que queixa era aquela, porque a mim não chegou, porque se fosse uma queixa construtiva teria chegado a mim. Ela solicitou algumas coisas para a estagiária e ela não fez. E aí eu perguntei qual professora e ela me disse, então pensei: já sei. Porque se a professora solicita algumas coisas para a estagiária que estão na cabeça e ela não fez, é porque ela é indígena. Na realidade, se não fez do jeito que a professora fez, é porque a aluna é indígena.

O trabalho que esta aluna fez, foi um trabalho inédito. Elas estavam fazendo o período de regência do mês agosto. Esta aluna é terena e nós trabalhamos as lendas terenas. As crianças aprenderam cinco lendas inéditas e aprenderam também os nomes dos animais na língua terena. Ela qualificou aquele projeto de modo diferenciado. Ela qualificou aquele projeto de folclore. Eu senti que para a escola do que aqueles alunos trazem alguma coisa, um pedaço daqui e dali, mesmo da internet, muitas vezes já foram desenvolvidas e não fazem parte do

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nosso meio. E aquele aluno que trabalhou coisas da sua própria cultura e que levou algo que é do nosso meio.

Eu sinto uma resistência das escolas em receber o estagiário indígena. Um olhar diferente, será que ele vai dar conta? Esta professora chegou a insinuar isto para mim, me dizendo assim: esta aluna vai dar conta? Será que ela vai dar aula aqui ou na comunidade dela. Será que ele vai dar conta? (CC 2).

Mas o que vejo é a questão do preconceito, da resistência e do preconceito, porque este movimento de deslocamento de sair da aldeia e vir para a universidade tem que aprender com isto, dialogar, se aceitar também porque esta identidade étnica deles é muito viva, porque ele tem uma ligação muito forte com este espaço territorial, com a família, com a cultura e com os rituais, ele tem laços consanguíneos muito fortes (CC 1).

O esperado ingresso na universidade dá lugar a novos desafios referentes à

permanência e inserção na universidade. É importante destacar que os desafios nesse

momento não se restringem aos aspectos relativos exclusivamente à diferença de classe,

mas a um escopo de marcação de diferenças que passam pela raça, gênero e história de

vida. A limitação da utilização do conceito de classe já foi identificada como um

problema nos estudos sobre as desigualdades escolares, campo em que o economicismo,

criticado por Bourdieu (1997), reduzia a multidimensionalidade do campo social às

questões econômicas. Surgem também diferenças e preconceitos fundamentados na

origem periférica, no modo de falar e na diferença de cor/raça (MAYORGA & SOUZA,

2012).

Em relação às situações vivenciadas de preconceito, a marcação da exclusão de

pode ser dada pela via do modelo hegemônico branco e rico, pobre discriminado por ser

pobre, índio ser discriminado por ser índio, negro discriminado por ser negro, e entre

outros grupos minoritários e excluídos.

Na pesquisa intitulada “Ações Afirmativas, Cotas e a Inserção de acadêmicos

indígenas na Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS)”, desenvolvida por

Athayde (2010), os acadêmicos indígenas são enfáticos ao relatarem as situações de

preconceitos vivenciado na ambiência universitária.

Alertam-nos Lázaro e Tavares (2013, p. 9), organizadores do livro intitulado

“Rede de Saberes: Políticas de Ação Afirmativa no Ensino Superior para indígenas no

Mato Grosso do Sul”, que o acolhimento:

[...] dos acadêmicos indígenas deveria considerar não apenas suas urgentes demandas materiais, mas, também, especialmente, sua visão de mundo, sua visão de mundo, sua cosmologia e os desafios subjetivos que esses jovens indígenas experimentam quando adentram instituições universitárias.

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Há nitidamente uma desqualificação do saber indígena, nas palavras de Antonio

J. Brand “os cursos não estão abertos para dialogarem com saberes locais ou também

tão pouco incluir essas questões nos currículos”(LÁZARO & TAVARES, 2013, p. 15).

A inclusão de novos saberes nos espaços universitários tem sido um desafio

eminente, ainda pouco valorizado e explorado pelos professores, como uma

possibilidade de integrar um conjunto de novos conhecimentos indígenas, entre ele

pode-se destacar: os conhecimentos e tecnologias de manejo ambiental, de cuidado a

saúde e agricultura, entre outros (ATHAYDE, 2010).

Os entrevistados também apontam para as situações de resistência nas atitudes,

na fala dos colegas professores e também situações com os alunos:

Temos professores que tem resistência ao acadêmico indígena e toda vez que você toca nesta questão ele diz: eu não oriento TCC, não oriento Iniciação Cientifica e eu não sou obrigado (CC 2).

Nesta semana mesmo recebi duas alunas para falar de uma aluna indígena que está se sentindo excluída dentro da sala de aula [... ] (CC 2).

Como se observa na situação descrita acima o preconceito e discriminação são

evidenciados pela entrevistada. Este fato pode estar relacionado a crenças, visões

distorcidas e estereótipos construídos a partir de contexto de uma sociedade envolvente,

preconceituosa e racista.

Silva (2011) nos aponta que uma estratégia pedagógica para estas situações seria

tratar essas atitudes como desvio de conduta e proporcionar atividades, dinâmicas de

grupo, exercícios corporais e dramatizações que promovam processos de

conscientização que permitissem que os estudantes mudem suas atitudes. O autor aponta

que, ao tratar o tema da diversidade por meio do currículo e ações pedagógicas, as

instituições de ensino o discutem como categorias de exotismo e curiosidade.

Além de não questionar as relações de poder envolvidas na produção da identidade. Em geral, a apresentação do outro, nessas abordagens, é sempre o suficiente distante, tanto no espaço quanto no tempo, para não apresentar nenhum risco de confronto e dissonância (SILVA, 2011, p.99).

Nesta ótica, o argumento do autor se centra na defesa de uma pedagogia e um

currículo baseados na identidade e diferença como uma questão política e na discussão

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aprofundada de como ela foi produzida. No entendimento de que as relações sociais

entre índios e não-índios no Brasil vêm ocorrendo historicamente em contextos

assimétricos de distribuição de poder (SILVA & SOUZA, 2008).

Portanto, propor discussões sobre diferenças culturais é reconhecê-las e também

assumir que o país traz um ranço da retórica desenvolvimentista. Reconhecer a

discriminação é sempre confuso, difícil e sutil (LIMA, 2007, p. 23)

Munanga (2007) aponta que nos espaços universitários, em alguns casos pela

primeira vez em sua vida, alguns alunos negros, índios e brancos terão a oportunidade

de conviver, ao frequentarem a mesma faculdade. Esta aproximação das diferenças ou de convivência das diversidades pode desarmar os preconceitos recebidos na educação familiar e escolar, penso eu. Os preconceitos estão no tecido social, na cultura, nos livros didáticos, em nossos imaginários e representações coletivas, em nossa psicologia do relacionamento independentemente da classe social à qual pertencemos. É nesses terrenos privilegiados que devemos lutar para transformar as mentes e as consciências individuais e coletivas (MUNANGA,2007, p.8).

Nesta assertiva, as IESs no seu trabalho cotidiano podem influir decisivamente

sobre a consciência da sociedade brasileira, de modo a que ela seja provocada,

subvertida em seus valores etnocêntricos.

5.4.5 Povos que possuem a língua falada como princípio

Apoiando-nos no pensamento de Silva (2011), identidade e diferença são

resultados de atos de criação linguística, por meio de atos de linguagem e são

ativamente produzidas nos contextos de relações sociais e culturais. Portanto, identidade

e diferença são criações sociais e culturais.

Giroux (1997, p.26) afirma que “longe de ser neutra, a cultura dominante na

escola é caracterizada por um ordenamento e legitimação seletivos de formas

privilegiadas de linguagem, modos de raciocínio sociais e experiências vividas”.

Nesta afirmação os entrevistados abaixo relatam que

[...] o mesmo fenômeno pode ser interpretado de maneiras diferentes dependendo de quais são os códigos até os linguísticos, para aqueles que gostam dessa parte de linguística ( PR).

Embora eles falem o português, mas falar é uma coisa e entender a língua é outra, mas compreender no sentido amplo, conseguir contextualizar num

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sentido mais amplo. Muitas vezes os alunos tinham e tem estas dificuldades (OCC 1).

[...] tem a questão da língua, o português que ele vai ter que se adequar em textos que já são difíceis em outra língua (CC 3).

Se questionando

[...] eu sinto falta, e nós já discutimos isto dentro do curso, de algo, primeiro que se leve em consideração a necessidade de olhar para a diferença para aquele aluno que não tem o português como língua materna (CC 2).

Estava dando aula e uma delas (das estudantes indígenas) era muito simpática e muito falante. E uma vez ela ficou me olhando e quando terminei a aula perguntei para ela o que ela não tinha entendido. E ela me falou que não entendeu uma palavra. Então eu disse: você, por favor, me interrompa. E ai, comecei a ter cuidado do que eu falava na aula e sempre que acabava a aula eu perguntava pra ela se ela entendeu, ela me explicou como ela estudava: Ela copiava tudo, colocava tudo no guarani, ela estudava e depois passava tudo para o português para saber responder na prova. E aí eu fiquei pensando: todo este trabalho e eu não sei nenhuma palavra em guarani (OCPR/ CC).

Os povos indígenas possuem uma cosmovisão diferenciada, de aprendizagem

predominantemente de base oral, aprender significa e envolve sentimento,

espiritualidade, pensamento e concretização, ou seja, que têm seus processos próprios

de aprendizagem (PAZ, 2013).

No entanto, estas dificuldades com a língua portuguesa não se centram somente

nos espaços acadêmicos, mas também o encontram no âmbito das provas do vestibular

ou do Exame do Ensino Médio (ENEM). Em pesquisa realizada na UFSC pelo autor

Tragtenberg (2011), constatou que em relação a prova do vestibular, o aumento da nota

de corte ligada ao Português contribuiu para a exclusão dos candidatos indígenas. Se as

notas de corte fossem as de 2008 e os indígenas pudessem zerar na soma das questões

discursivas, haveria mais indígenas na UFSC em 2008 e 2009 (p. 11).

5.4.6 Os interstícios.... os entre lugares33

O trabalho fronteiriço da cultura exige um encontro com “o novo” que não seja parte do continuum de passado e presente. Ele cria uma idéia do novo como ato insurgente de tradução cultural. Essa arte não apenas retoma o passado como causa social ou precedente estético; ele renova o passado, refigurando-o como um “entre-lugar” contingente,

33 Utilizaremos o conceito de entre- lugar proposto por Bhabha (1998).

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que inova e interrompe a atuação do presente (BHABHA, 1998, p. 27).

Lynch et al (2013), afirma que ao realizar uma mudança, e neste caso a

implantação da política na referida IES pesquisada, nos recomenda da necessidade de

compreender e identificar os interstícios (citando Habermas), ou seja, aqueles lugares

entre os espaços que permitem mudanças e resistências ocorram em momentos

diferentes.

Diante das dificuldades relatadas pelos entrevistados, alguns cursos buscam

saídas, ora ofertando projetos de ensino ou monitorias. No entanto, essas ações e

projetos não são lineares e na maioria dos casos não contam com recursos financeiros.

[...] tem um projeto, que está com o apoio de um professor [...] que presta atendimento aos alunos do primeiro ano, não especificamente com cotista, alunos que são indicados pela professora. Principalmente para a leitura e interpretação de texto (CC 2).

Não existem ação sistemáticas, fica a cargo de cada professor, como é hoje, no sentido de trabalhar com monitorias e com projetos de ensino (OCPR/ CC).

Na IES não tem incentivos, mas nós precisamos desenvolver as atividades, então é a hora que a gente senta para ver os editais, tantos os editais nacionais quanto os do Fundect. E nós vamos procurando (CC 1).

Na Agronomia, em 2006 e 2007, onde recebemos um número maior de alunos indígenas, tivemos uma experiência boa, e tivemos que separar os alunos. Eu dava aula no primeiro ano, na aula de Botânica. Pois eles tinham muitas dificuldades, dificuldades de entender, mas percebi que era porque eles tinham vergonha de perguntar. E este foi o jeito que achei para resolver esta situação e que eles pudessem acompanhar a turma.

E às vezes eles ficavam retraídos, aí eu decidi fazer aulas práticas só pra eles, fazia aulas com toda turma de manhã e fiz aulas práticas à tarde, era só pra eles, aí era como se fosse outra turma. E foi muito bom, eles conversavam e tiravam dúvidas. Eu tinha cinco alunos indígenas. A discussão se iniciou como os alunos trabalhavam os nomes das plantas e na língua, o que eles enxergavam e isto foi interessante. E este foi o jeito que encontrei pra resolver as dificuldades deles (OCC2).

Os avanços não são rápidos, com já apontado pelos pesquisadores

(BROSTOLIN & CRUZ, 2010). Mas alguns já percebidos, como os descritos pelos

entrevistados e também pelas tentativas dos cursos, na busca se alternativas e

possibilidades:

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Outro exemplo que podemos destacar, durante a fase de coleta de dados o Curso

de Enfermagem em vias de discussão de reestruturação do Projeto Político Pedagógico

do Curso propõe a inclusão de uma disciplina de Antropologia da Saúde, fazendo um

intenso debate em torno das questões da diversidade e cultura, com a participação de um

grupo de docentes com formação na área de antropologia e também pesquisadores da

temática.

Também no sentido de atender a esta crescente demanda e necessidade de

discussões foi inserida na estrutura curricular como optativa uma disciplina que

permeasse o etnocuidado34.

No processo de discussão da mesma fui convidada a participar e solicitei que

fossem ouvidos os acadêmicos indígenas, bem como os profissionais enfermeiros

egressos indígenas do Curso de Enfermagem da UEMS que atuavam nas aldeias

indígenas de Dourados35, para que pudessem opinar e construir junto com os

professores os temas propostos.

Esta experiência foi bastante intensa, os discursos dos indígenas era uma

retórica: estavam surpresos, pois, pela primeira vez alguém queria saber o que eles

julgavam importante se saber e se conhecer sobre etnocuidado. Foram realizadas

também reuniões com os acadêmicos e da mesma forma enfatizavam que raramente

havia interesse dos professores de se conhecer formas de produzir cuidado em seus

territórios.

|Julgou-se importante a presença dos indígenas nesta discussão, para que os

mesmos pudessem nos auxiliar na construção e elaboração da disciplina, considerando

que qualquer que seja a iniciativa junto aos povos indígenas, ela deve ser, nas palavras

de Brand et al (2008), cercada de muito respeito a sua organização social e visão de

mundo

34 Madeleine Leininger cunhou o termo enfermagem transcultural e o termo etnocuidado, focalizada em diferentes culturas, no cuidado cultural, nos fenômenos da saúde e da enfermagem. Foi Leininger também quem cunhou o termo cuidado culturalmente congruente (nos idos de 1960). Leininger ha tomado a la antropología el concepto de cultura, como ya se indicó y que define: «La cultura son los valores, las creencias, las normas y los modos de vivir compartidos, aprendidos y transmitidos que guían los pensamientos, las decisiones y las acciones de un grupo de manera específica». La cultura caracteriza a cada grupo cultural y para respetar y reconocer una cultura es necesario estudiar y comprender como se expresa el cuidado (Leininger, 1991: 47 apud ROHRBACH-VIADAS, 1998). 35 A escolha pelo município de Dourados se deu pelo maior número de egressos enfermeiros da UEMS atuando em aldeias indígenas.

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Entre os entrevistados há preocupação em conhecer e se aprofundar na temática

indígena:

Atualmente estou fazendo um curso de Educação intercultural Indígena, mas são coisas que eu fui atrás. Porque eu fui atrás? Embora a gente tenha no curso que aborde a questão indígena, que trazem estas discussões sobre a escola indígena. Nós formamos dentro do curso de Pedagogia formamos professores que vão atuar em escolas da área urbana e nas comunidades indígenas (CC 2).

Na busca de se promover o debate sobre a temática da inclusão na perspectiva de

raça, etnia e gênero foi em criado em 11 de junho de 2014, por meio da RESOLUÇÃO

COUNI-UEMS Nº 437, o Centro de Estudos, Pesquisa e Extensão em Educação,

Gênero, Raça e Etnia – CEPEGRE. De acordo com a referida Resolução, o objetivo do

centro é:

Art. 2º O CEPEGRE tem como objetivo propor, subsidiar, articular monitorar e avaliar as políticas públicas de Ação Afirmativa na UEMS, ligadas às questões de educação, gênero e sexualidade, raça e etnia, com foco no processo de inclusão para o acesso, permanência e conclusão na Educação Superior, por meio do diálogo e participação efetiva, junto aos demais sistemas de educação, órgãos governamentais, não governamentais e Movimentos Sociais, na luta contra os processos de discriminação, racismo, homofobia, violência doméstica e contra a mulher.

Portanto, se observa iniciativas, caminhos e propostas na busca de responder as

demandas e necessidades de cada curso.

5.4.7 Desafios apontados

Os entrevistados apontam os principais desafios:

[...]acho que os programas que a nossa universidade tem neste momento ainda estão muito aquém a dar acesso aos sujeitos (PR).

Chegou à universidade, entrou por cota ou não, mas tem deficiência, o curso tem que discutir, a comissão estruturante do curso tem que discutir isso. Os professores têm que discutir isso. Deveriam dizer: esse é o nosso cenário, e o que a gente vai fazer? (OCPR2).

Teria que preparar os professores para compreender essa lei (10.639 e 11.645), que torna obrigatório este enfoque lá na educação básica, e entender esta caminhada histórica desses grupos índios, negros e LGBT e deficientes ao longo do século XX (OCPR2).

No que se refere ao preparo dos professores, a líder indígena Kaingang Azelene

afirma: “Não somos nós os únicos que devemos nos preparar para entrar na

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universidade; ela também tem que se preparar para nos receber e nos entender”

(DAVID et al, 2013, p. 118).

Portanto, avanços são necessários na relação entre os saberes escolares e a

diversidade étnica e racial, sendo imprescindível que os educadores que o processo

pedagógico é mediado por diversas dimensões, entre elas a identidade, a ética, a

sexualidade e as relações étnico-raciais. A partir desta compreensão é possível construir

relações humanas e políticas educacionais pautadas no respeito e na tolerância.

Precisamos integrar estes alunos. Principalmente com os professores, pois nós fizemos assim, trabalhando com erro e acerto. Primeiro entender como são e quem são estas pessoas, o que passa com eles, o que eles pensam (OCC 1).

[...] temos uma luta por reconhecimento em uma esfera cultural, mas nós precisamos abrir uma luta por reconhecimento da esfera econômica também, você formar e propor uma abertura para o mercado de trabalho [...] (CC 3).

Chegou na universidade, entrou por cota ou não, mas tem deficiência, o curso tem que discutir, a comissão estruturante do curso tem que discutir isso. Os professores têm que discutir isso (OCPR2).

Neste âmbito, a universidade começa a ser questionada:

Que discussão está fazendo a Universidade para juntar os conhecimentos que estas pessoas trazem (índios, negros, etc.)? (OCPR2).

Se questionar e se mobilizar, mesmo que sejam movimentos pequenos, são

avanços para se repensar o papel da universidade a partir do conceito de

multiculturalismo emancipatório trazido por Boaventura de Souza Santos, em entrevista

a Gandin e Hipolito (2003, p.1).

Um dos grandes objetivos das universidades é estabelecer um diálogo

intercultural, um espaço intercultural onde acontecem os encontros e as relações entre as

pessoas, seres da natureza, seres do mundo não visível. O espaço acadêmico deve

permitir o debate público e a politização, por meio do respeito à diferença.

Um espaço que promova o hibridismo, a mistura, a junção, a conjunção, o

intercurso entre as diferentes nacionalidades, entre diferentes etnias, entre diferentes

raças (SILVA, 2011, p. 97). Nas palavras de Bhabha (1998) chamada como terceiro

espaço, introduzindo a diferença como possibilidade de questionamento. Pois, uma das

grandes riquezas de nosso país é a sua cultura e a diversidade, porém ainda pouco

reconhecida e valorizada e, em algumas IES, ignorada.

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Portanto, emerge ainda a necessidade de uma universidade que abra espaços

para o diálogo e perceba a realidades dos povos indígenas.

5.4.8 Avaliando a política de Ação Afirmativa

Na avaliação da política de Ações Afirmativas desenvolvida na IES referida nesta

pesquisa, os entrevistados consideram relevante apontar:

[...] se não fosse as cotas eles não teriam como chegar na universidade. Já está cumprindo seu papel. Mesmo que não tenha atingido as nossas expectativas em termos de quantidade. Estes poucos que estão conseguindo se formar, transformar a vida dele e também retornar a sua comunidade, eu acho que está excelente, já é válido (OCC 1).

Eu acho que as cotas contribuem para que uma fatia significativa da sociedade comece a participar disso que é a democracia, começa a entender quais são seus direitos e poder usufruir do espaço de voz da arena política (CC 3).

Passados dez/onze, passado este tempo, todos estes anos, acho que os resultados são excelentes, embora, os resultados não sejam tão expressivos quanto se esperava [...] (OCC 1).

A presença dos indígenas ocupa um espaço de luta política, pressionando as

ações políticas, curriculares e as relações pedagógicas. Portanto, repercute para a

formação de todos e todas.

Nesse sentido, para além de se verificar somente quantitativamente o número de

acadêmicos indígenas que concluíram a graduação, é importante a avaliação dos

impactos de uma política, o processo que deve ser amplamente discutido com os atores

envolvidos, embasado em objetivos claros e específicos.

Nesta ótica, a identificação de indicadores adequados de desempenho é uma

etapa decisiva nas análises, permitindo determinar o grau de cumprimento das normas e

objetivos. As normas e os objetivos estão contidos nas metas gerais enunciadas na

decisão política. E, sem dúvida, transcendem as generalidades do documento legislativo,

como proporcionam regras concretas e mais específicas para a evolução da execução do

programa (VAN METER & VAN HORN, 1996).

Ainda citando os autores acima, se as normas e objetivos não estão claramente

estipuladas é muito mais difícil identificar e medir o desempenho. Portanto, a

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implementação de uma política não pode ter êxito nem fracassar se não existe alguma

meta em relação com a qual pode ser avaliada (VAN METER & VAN HORN, 1996).

5.4.9 Reconhecimento de uma formação elitista

A educação superior tem enfrentado uma dualidade, por um lado tem sido

mobilizadora da luta por uma educação de qualidade e para todos, e de outro ainda

conserva ranços de uma formação conservadora e elitista.

Mesmo que o objetivo da presente tese não seja comparar, agrupar e classificar

os relatos dos entrevistados, há nítidas posições ideológicas, frutos da formação

universitária.

Paz (2013) afirma que algumas instituições educativas se organizam sob uma

lógica capitalista e com um discurso neoliberal, onde o conhecimento válido é o que é

produzido pela ciência hegemônica.

Boaventura de Sousa Santos aponta:

[...] que as estruturas (nelas aqui incluímos a Universidade) não são incompatíveis com uma concepção retórica do conhecimento [...]. Sem serem necessariamente, as estruturas locais de produção de lugares comuns e de senso comum. Uma vez construídas retoricamente, as estruturas tanto podem constituir premissas a argumentação, zonas de forte consenso sobre possibilidades de ação, como argumentos sobre a solidez e a resistência na prática social...(SANTOS, 2009, p. 263).

Neste mesmo pensamento para Luciano (2006), indígena e pesquisador na área

de educação dos povos indígenas, essa resistência já era esperada, se considerarmos o

secular sistema educacional brasileiro profundamente excludente, discriminador e

colonizador.

A cultura política e acadêmica sempre foi o baluarte do processo dominador e colonizador das sociedades ocidentais europeias, razão pela qual sempre mantiveram as portas das universidades cerradas para os povos colonizados (p. 163).

Há, entre os entrevistados, o reconhecimento que as IES são carregadas de

marcas de uma formação para a elite:

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A Universidade não entendeu que tinha gente lá fora se mobilizando. Não se deram conta, é muito difícil, de que grupo você vem? (OCPR2).

Muitos professores vieram de grupos historicamente excluídos. Mas ascendem e omitem, não fazem mais parte desse grupo. Quando este grupo chega à universidade e se depara com estes grupos até se chocam (OCPR2).

Eu lembro que quando levantaram as cotas, uma das preocupações que eu tinha era o discurso de onde estava impregnado do lugar da onde eu vinha, ou seja, o que era importante era investir na educação básica de todos, independente do recorte social, assim de renda, de cor, aliás o importante era que todos tivessem uma escola de qualidade na base (PR).

A universidade é uma instituição social, ou seja, o papel da universidade vai

além das necessidades técnicas, científicas e formação de recursos humanos para o

mercado de trabalho; inclui essencialmente o compromisso com os direitos humanos,

entrelaçados pelas questões de qualidade de vida, qualidade ambiental, democracia,

respeito, inclusão, solidariedade, num contexto globalizado e de paz mundial.

Neste sentido, Santos (1999) nos aponta que

….a universidade está sendo duplamente desafiada pela sociedade e pelo estado, e não parece estar preparada para se defrontar com os desafios, muito menos com as transformações profundas necessárias e também não para simples reformas parcelares. Este cenário, em parte, é originário da rigidez funcional organizacional e estrutural das IESs públicas do Brasil.

Portanto, enquanto instituição social, é um lugar composto de uma estrutura do

espaço social onde estão as rigorosas estruturas do espaço físico. Segundo Bourdieu

(1997, p. 167),

Os agentes sociais que são constituídos como tais em e pela relação com um espaço social (ou melhor, com campos) e também as coisas na medida que são apropriadas pelos agentes, portanto, constituídas como propriedades, estão situadas num lugar do espaço social que se pode caracterizar por sua posição relativa pela relação com os outros lugares (acima, abaixo, entre, etc.) e pela distância que os separa deles [...] também pode ser definido pela exclusão mútua, isto é, como uma justaposição de posições sociais (p. 167).

A estrutura do espaço manifesta e exprime as hierarquias e as distâncias sociais,

e o poder sobre o espaço, de certa forma, tem relação com a posição social. As

universidades públicas, durante décadas e ainda até os dias atuais, continuam sendo um

espaço ocupado pelas elites e burguesia.

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Para romper com este modelo hegemônico, Lima (2007, p.20) afirma que:

Ao incluir os indígenas nas universidades há que se repensar as carreiras universitárias, as disciplinas, abrir novas (e inovadoras) áreas de pesquisa, selecionar e repensar os conteúdos curriculares que têm sido ministrados, e testar o quanto estruturas, que acabaram se tornando tão burocratizadas e centralizadoras, podem suportar se colocar ao serviço de coletividades vivas, histórica e culturalmente diferenciadas.

Nesta ótica, a reforma da universidade deveria estar centrada no combate a todas

as formas de discriminação racial, com ações específicas e abrangentes, no sentido de

romper ao tradicional elitismo social presentes nas IES.

5.5 Projeto de Extensão Rede de Saberes:

O Programa Rede de Saberes foi criado com o objetivo de desenvolver ações de

apoio aos alunos indígenas em sua trajetória acadêmica, com atividades desde o final de

2005, em conjunto com o Núcleo de Estudos e Pesquisas das Populações Indígenas–

NEPPI, vinculado à Universidade Católica Dom Bosco (UCDB) e UEMS e que incluiu,

a partir de 2008, a Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD) e a Universidade

Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS) – Campus de Aquidauana.

Nas palavras de Boaventura Souza Santos (2010), a rede visa fortalecer a

universidade e criar mais polivalência e descentralização, implica na solidariedade, na

cooperação e na partilha.

Esse programa contou com financiamento da Fundação Ford e do Programa

Pathways to Higher Education, e integrava, até o ano de 2007, o programa Trilhas de

Conhecimentos, vinculado ao Laboratório de Pesquisas em Etnicidade, Cultura e

Desenvolvimento do Departamento de Antropologia do Museu Nacional da

Universidade Federal do Rio de Janeiro (RELATÓRIO REDE DE SABERES, 2007;

LÁZARO e TAVARES, 2013).

O Projeto de Extensão Rede de Saberes vem sendo acompanhado por um grupo

de pesquisadores na área de educação, nela inclusos pesquisadores da Universidade

Católica Dom Bosco, da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul e da

Universidade Federal da Grande Dourados, gerando discussões sistemáticas,

seminários, bem como a produção de estudos com o envolvimento dos acadêmicos

indígenas.

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Segundo a entrevistada o Rede se inicia a partir de uma proposta:

[...] em 2004, a discussão do Rede começou Antonio Carlos Lima do Museu Nacional veio com esta proposta, pois ele tinha um projeto aprovado junto a Fundação Ford, com a implantação de núcleos para atender esta questão indígena. Um era em Roraima, outro era no estado de Mato Grosso do Sul, por conta desses conflitos e também em função das cotas, que a UEMS já tinha aprovado, que foi implantado em 2003 e os indígenas efetivamente começaram a cursar em 2004 (OCPR2).

O Projeto Rede de Saberes foi recebido com certo descrédito pelos acadêmicos

indígenas, comportamento que pode estar relacionado à vivência de parcos projetos e

ações para atendimento de suas necessidades, como observamos no relato a seguir.

O Rede começou efetivamente suas ações em 2006, nosso primeiro secretário foi um indígena, o Tonico Benites, só ficou 4 ou 5 meses, depois veio a Antônia de Souza. Começou esta execução, toda a proposta que foi feita para a Fundação Ford com a UCBD, foi muito discutida com os alunos. Eu tenho até um depoimento de uma aluna que dizia: Professora, quando a senhora veio, uma desconhecida, chegou falando sobre o projeto, um projeto de apoio ao indígena. E eles diziam: Isso ai não vai acontecer, mais um projeto. Nós não acreditávamos. Nós discutíamos, dizendo isso não vai dar em nada (OCPR2).

Ainda segundo o relatório Rede de Saberes (2007, p. 7), as principais ações

desenvolvidas são “o apoio à participação dos acadêmicos em atividades de pesquisa,

capacitação de docentes, estudantes e pessoal administrativo das IES, apoio à

participação e/ou organização de eventos acadêmicos voltados para a temática

indígena”.

Para a entrevistada, o objetivo do Rede é:

[...] apoiar. Monitoria e tutoria devem ser institucionalizadas por pessoas que tenham sensibilizadas pela causa. Nossos tutores são sensibilizados para as questões indígenas, são professores da rede (OCPR2).

Além destas ações, o Projeto também realiza levantamento sobre a situação dos

acadêmicos, situação esta que era desconhecida pela sociedade e órgãos públicos.

Conforme afirmação de Urquiza e Nascimento (2008), as atividades

desenvolvidas pela UEMS por meio do Programa Rede de Saberes “têm ajudado a

articular relações interétnicas, baseadas no respeito à diversidade cultural e no dinâmico

processo de se tomar consciência sobre a necessidade de se estabelecer maior equidade

e justiça em uma sociedade multiétnica como a nossa”.

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É importante destacar que o Rede de Saberes também promove uma visibilidade

do acadêmico indígena dentro da IES. Além de ser um espaço que promove o

acolhimento dos mesmos.

Pois, diziam: a gente fica pelos cantos, a gente se reúne e fica pelos cantos. A gente não tem um lugar Uma vez eu vi escrito na parede do Rede: A oca dos índios (OCPR2)

No início de suas atividades, o Rede contava com cerca de 150 acadêmicos

indígenas (LAZARO & TÁVARES, 2013). Um projeto, nas palavras da entrevistada,

ousado:

[...] essa proposta era muito ousada. Criar uma estrutura. Tem um acompanhamento efetivo, permitir que os alunos pudessem ser apoiados em projetos de ensino, pesquisa e extensão, e criar um laboratório para que eles se sentissem no lugar deles (OCPR2).

Também enfrentou e enfrenta muitas críticas:

Porque a UEMS tem computadores para índios? Os alunos indígenas nos diziam que os outros alunos diziam assim: Por que só vocês têm acesso? (OCPR2).

O Projeto Rede de Saberes também enfrenta dificuldades. O programa, mesmo

com amplo apoio da IES, enfrenta problemas para a sua manutenção e também para se

estender para todos os campi. Trata-se de um projeto de extensão, não um programa

institucional, ou seja, dependente de financiamento externo.

Neste sentido, aponta o entrevistado:

O Rede de Saberes funcionou bem aqui, mas agora nem sei. Tinha aulas extras, hoje que eu saiba não tem nada do Rede funcionando. Funcionava bem melhor. Acho que hoje está tudo parado (OCC 2).

Na defesa que o Programa poderia ser institucionalizado:

Algumas coisas deram muito certo, outras nem tanto. Porque é um trabalho que deveria ser institucional [...] vamos e estamos tentando fazer uma rede (OCPR2).

Mesmo com as dificuldades o Rede de Saberes se configura como um espaço

importante e indica uma forma concreta de acolhimento e apoio fora dos contornos

limitadores dos programas institucionalizados de apoio ao estudante, conduzido por

pessoas que são conhecedoras da questão indígena. E também considerado um espaço

de afirmação de identidade e valorização cultural.

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No entanto, Berman (1993, p. 313) afirma que a prática não implementada, pode

gerar um fluxo contínuo de resultados, a menos que se torne uma operação de rotina

sistemática de prestação de serviços locais, ou seja, é necessário que seja

institucionalizado.

5.6 Programas de Apoio Estudantil

A UEMS hoje conta com programas de apoio destinados aos alunos de forma

geral. Os programas visam democratizar as informações e o acesso a projetos que

permitam a permanência do aluno na Universidade.

A IES estudada conta com Programa de Assistência Estudantil (PAE), que oferta

bolsas e apoio estudantil. As bolsas estão distribuídas nas modalidades: Bolsa

Permanência, Auxílio-Alimentação e Auxílio-Moradia. No Brasil, nas IES públicas

estaduais e federais, de forma geral, os programas e ações de apoio estudantil se

sustentam no tripé: Bolsa Permanência, Auxílio-Alimentação e Auxílio-Moradia

Observou-se que, entre os entrevistados, há uma dualidade daqueles que

conhecem e aqueles que alegam que conhecem parcialmente os programas, ações para o

apoio estudantil e o projeto de extensão Rede de Saberes.

Fica difícil dizer que o coordenador esteja amparado para orientar o acadêmico indígena em todas as possibilidades e ofertas que a Instituição traz [...] Às vezes os professores não conhecem os programas (CC 1).

Apontando que pode estar relacionado a:

A função de Coordenação está sempre em rotatividade, tem pessoas que entram na universidade e em seis meses ele é coordenador, e nem sempre é porque ele quer. Porque a UEMS está crescendo e chegando muitos professores, sinto falta dessa circulação de informações e de comunicação dentro da instituição. Nisso somos falhos (CC 1).

Na estrutura organizacional da UEMS, o Programa de Apoio estudantil está

vinculado à Pró-reitora de Extensão e Assuntos Comunitários (PROEC). Na estrutura

organizacional da PROEC está o departamento Divisão de Inclusão e Diversidade

(DID), cujo objetivo é orientar, coordenar, controlar, avaliar e executar as atividades

desenvolvidas na UEMS com a finalidade de implementar as políticas institucionais

para a inclusão social. Suas atividades também visam à prevenção e ao combate a toda

forma de discriminação de gênero, classe, raça, etnia, orientação sexual, pessoas com

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necessidades especiais e respeitando as especificidades de cada Unidade Universitária

(Relatório do Projeto de Desenvolvimento Institucional /UEMS, 2014).

Em relação às atividades e funções da DID, os participantes da pesquisa

consideram que:

[...] a DID (Divisão de Inclusão e Diversidade) foi criada para dar conta disso, por um bom tempo deu conta disso, mas hoje não está cumprindo sua função, por falta de funcionário, por uma outra visão. Tem uma política interessante, muitas vezes não tem continuidade, precisa criar, não digo em todos os lugares, mas deve ter acompanhamento pari passo desses acadêmicos. Se nós temos cotas, devemos acompanhar isso ( OCPR2).

A responsável pela Divisão afirma:

Esse acompanhamento deveria ser de uma forma que não está sendo feito (MCAAC 2)

Há um reconhecimento que

[...] deveria ter uma comissão própria de acompanhamento, multidisciplinar da área da assistência, para assessorar e fazer essas discussões. Não é uma coisa formalizada (MCAAC 2).

Tem que ter esse acompanhamento, essa assistência, que é essencial, tem que alguém acompanhando do ponto de visto pedagógico para mexer em currículo (MCAAC 2).

A entrevista ainda enfoca as dificuldades do convênio com a FUNAI:

Tem uma comissão que mexe só com esse auxílio da FUNAI existe um termo de colaboração FUNAI e UEMS que ela bancaria o translado do aluno casa faculdade. Faculdade casa e toda a UEMS, em todas as unidades, mas a FUNAI disse que não há recursos financeiros pra isso. Eles não pagam […], não é algo sistemático […] (MCAAC 2).

Esse termo é assinado desde 2010, eles nunca pagaram, eles têm mil e umas ligações que você bem imagina (MCAAC 2).

Segundo informações da Pró-Reitoria de Extensão e Assuntos Comunitários,

responsável pelo programa, em 2014 foram oferecidas 100 Bolsas Permanência, 32

Bolsas Auxílios Alimentação e 32 Bolsas Auxílios Moradia.

Os programas de apoio estudantil oferecidos na IES são: Programa Nacional de

Assistência Estudantil (PNAES), Programa Vale Universidade Indígena (PVUI),

Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (PIBIC); Programa

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Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID); Programa Ciência Sem

Fronteiras e Serviço de Atendimento Psicológico (SAP).

Sobre os programas de apoio estudantil, nos deteremos com maior detalhe sobre

o PVUI, por se tratar de programa específico a acadêmicos indígenas.

5.6.1 Programa Nacional de Assistência Estudantil (PNAES)

O Programa Nacional de Assistência Estudantil (PNAEST) para as

Universidades Estaduais é uma ação do Governo Federal, administrado pelo Ministério

da Educação, e tem como finalidade ampliar as condições de acesso, permanência e

sucesso dos jovens na educação superior pública estadual (PDI, 2014-2018).

A referida IES é inserida no Programa PNAEST a partir da adesão ao SISU e

segundo o relatório de 2013, o objeto do convênio atendeu e executou:

[...] ações nas quinze unidades universitárias (Aquidauana, Amambai, Campo Grande, Cassilândia, Coxim, Dourados, Glória de Dourados, Ivinhema, Jardim, Maracaju, Mundo Novo, Naviraí, Nova Andradina, Paranaíba, Ponta Porã) que promovam e ampliem a permanência e sucesso dos alunos, e diminuam as taxas de retenção e evasão nos cursos de graduação da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (RELATÓRIO PARCIAL DE CUMPRIMENTO DE OBJETO, 2013, p. 2)

Segundo o referido relatório as ações desenvolvidas se incluem aquisição de

materiais e equipamentos, livros, auxílio para compra de passagens para eventos,

diárias, hospedagens, material e equipamentos para inclusão digital, cultura, esporte,

apoio pedagógico e acessibilidade.

Em relação à temática acessibilidade, foram desenvolvidas, conforme relatório,

duas oficinas para a Comunidade Acadêmica, referentes a deficiências e inclusão no

Ensino Superior.

O referido documento destaca a inclusão de acadêmicos indígenas e negros na

IES, porém não menciona ações específicas direcionadas a estes grupos minoritários no

planejamento e na execução orçamentária do respectivo convênio.

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5.6.2 Programa Vale Universidade Indígena (PVUI)

O Programa Vale Universidade Indígena (PVUI), criado a partir do Decreto n°.

11.856, de maio de 2005, apoiado pela Secretaria de Estado de Trabalho e Assistência

Social do Estado de Mato Grosso do Sul, beneficia acadêmicos de baixa renda. O

Governo do Estado executa o repasse da bolsa em forma de benefício social, que é

depositado em espécie na conta bancária do acadêmico de Universidade Pública (PDI,

2014-2018).

O acadêmico indígena também recebe auxílio referente ao transporte, como

ajuda para se deslocar até a universidade.

Os critérios para o ingresso no programa:

• Comprovar sua condição indígena por meio do Registro Administrativo

(RANI), da Fundação Nacional do Índio (FUNAI);

• Estar matriculado em curso presencial de bacharelado ou licenciatura

autorizado pelo Ministério da Educação (MEC), na UEMS (PDI, 2014-

2018, p. 43).

São oferecidas 120 bolsas, 54 acadêmicos indígenas foram beneficiados pelo

programa em 2014.

A bolsa é um avanço, mas tem estes fatores que impedem. Anualmente um número de 120 bolsas, começou sendo preenchido, mas depois nunca mais foi preenchido ( OCPR2).

As pessoas podem olhar as bolsas e ver só os números e dizer que os índios não querem. Não é que eles não querem, o programa é excludente de início ( PR).

O PVUI hoje tem enfrentado muitas críticas, pois no entendimento da

comunidade acadêmica não supre as necessidades de manutenção do aluno na

universidade e é agravado por seu caráter excludente e meritocrático, onde o aluno é

excluído do Programa se não atender os critérios do Programa no decorrer dos anos da

graduação: não acumular mais de três disciplinas em regime de dependência e cumprir

carga horária em locais que nem sempre atendem e complementam a formação

acadêmica.

Santos (2010, p. 69), recomenda que as bolsas devem concedidas:

[...] mediante contrapartidas de trabalho nas atividades universitárias no campus ou fora do campus. Por exemplo, estudantes de licenciaturas poderiam

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oferecer algumas horas semanais em escolas públicas, como tutores, ajudando alunos com dificuldades de aprendizagem.

As atividades extramuros e atividades relacionadas/ligadas à área de atuação são

formas diversas e oportunas de aprendizagem, propiciando trocas de saberes e vivências

que auxiliaram na formação cidadã e profissional.

Em relação ao valor da Bolsa, a entrevistada refere que:

[...] a bolsa foi criada com um valor e não houve aumento, ainda são R$ 300 reais e R$ 46 reais para se deslocar [...] (OCPR2).

Os entrevistados expuseram críticas e posições contrárias aos critérios

estabelecidos pela bolsa, bem como quanto aos valores mensais repassados aos alunos,

conforme se observa a seguir:

Os alunos dizem: Olha professora, nós não vamos ficar com essa bolsa, “eles” vão lá pra ver se tu está lá, e se você não está lá eles nem perguntam: por quê? É uma burocracia. A gente ganha mais fazendo qualquer outra coisa, por exemplo: como ajudante de pedreiro [...]. Esta é uma opção nossa (OCPR2).

[...] não encaixava nos nossos cursos: nosso curso tem 28 horas e a semana tem 40, como é que os alunos vão cumprir 20 horas? Então precisamos adequar horários. Ajustar, ajustar os sábados. Porque não pode trabalhar a noite. Conseguimos adequar, mas precisou alguns anos. E faço isso, porque entendo, porque é uma forma de manter o aluno carente na universidade, pois eu fiz universidade com muita dificuldade e por isso eu faço isso. Hoje tem 34 com vale e 9 no Vale Universidade Indígena. Mas tem alguns alunos que acabam perdendo a bolsa. Por exemplo, tem uma aluna que perdeu, que teve a terceira reprovação, e nós vamos fazer um trabalho com ela. Para que ela possa concorrer novamente o ano que vem (OCC 2).

Além da efetividade do Programa:

[...] os programas que a nossa universidade tem nesse momento agora eles ainda estão muito aquém a dar acesso ao sujeito para alcançar esse mérito. Então hoje a gente muitos alunos perdendo bolsa no vale universidade indígena do estado, por quê? Porque tem três reprovações e ele é convidado a se retirar (PR).

[...] o programa é excludente (OCPR2).

Os alunos utilizam a bolsa para custear as despesas pessoais e

[...] ele pegava uma bolsa e tinha que sair quatro ou cinco horas da manhã passar o dia todo, não comer, ficar suado, chegar meia noite na casa dele pegar uma bicicleta. É óbvio que esse menino não vai sobreviver por muito tempo, ai até que um dia esse menino some e ele foi trabalhar com o tio dele de auxiliar

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de pedreiro, porque ele trabalhar na cidade ele estará próximo da comunidade da sua casa, aquilo faz sentido para a vida dele.

E a universidade? Não conseguiu dar conta. Porque o programa da política ela não pode ser de uma maneira generalista que olha as pessoas e é difícil fazer isso, mas ela não pode olhar a massa, o amorfo (PR).

Os autores Van Meter e Horn (1996) apontam que as políticas contêm outros

elementos além das normas e dos objetivos para promover a implementação. É

igualmente necessário a provisão de recursos para administrá-las. Estes recursos podem

ser fundos ou outros incentivos para estimular ou facilitar a implementação efetiva. A

escassez de recursos financeiros podem se somar aos obstáculos para o processo de

implementação de uma lei, e também promover grandes dificuldades de coordenar

ações dentro de uma dependência governamental.

Corroborando com esta afirmação, Kaufman (1971) aponta impedimentos para

inovações nas estruturas das organizações como, por exemplo, as limitações de

recursos, custos irrecuperáveis, benefícios coletivos, custos psíquicos e acumulo de

restrições oficiais e não oficiais no comportamento dos envolvidos.

A dependência governamental e programas de apoio que não atendem às

demandas e especificidades dos grupos eleitos como foco das ações propostas, podem

representar um grave obstáculo na implementação de uma política. Especialmente no

Programa de Bolsas específico para indígenas, o que se observa é um descompasso no

propósito do governo estadual, impondo obstáculos e dificuldades de toda ordem para a

permanência dos acadêmicos nos programas de apoio estudantil.

Neste mesmo pensamento, Lima (2007, p.25) afirma que:

Algumas dessas universidades, por vias variadas (governo estadual, Funai, fundos próprios) concedem bolsas aos alunos indígenas. No caso da Universidade Estadual do Mato Grosso do Sul (UEMS), a IES que abriga o maior número de alunos indígenas cotistas, eles ficam obrigados a trabalhar em atividades administrativas, funcionando como mão de obra remunerada por “bolsas de trabalho”, tendo parte de seu tempo roubado da possibilidade de superar dificuldades de adaptação. A administração superior da universidade não tem sido sensível aos pedidos de docentes envolvidos com o acompanhamento dos alunos indígenas de que estes tenham a carga horária das bolsas voltadas para a sua própria formação e para trabalhos de Ação Afirmativa.

Sem questionarmos os benefícios trazidos pela variedade de possibilidades de

apoio estudantil, há de se considerar que tais programas apresentam lacunas. São

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necessárias estratégias e avanços para promoção de inclusão e garantia da permanência

dos acadêmicos na universidade.

Sustenta-se que essas ações diretas para os estudantes exigem uma mudança de

referência qualitativa e quantitativa quando se considera a existência de modalidades de

Ação Afirmativa no ingresso de estudantes à universidade.

[...] a assistência estudantil não pode se resumir a uma ação direta para o estudante, como o repasse de verba, por exemplo, mas precisa se constituir como um conjunto de ações ampliadas que considere a especificidade do estudante indígena que acessa a universidade e uma leitura sobre as dinâmicas de inclusão e exclusão dentro dessa instituição (MAYORGA & SOUZA, 2012,p. 273).

Ao se considerar o indígena e uma parcela importante de jovens pobres que

fazem parte da IES estudada, é preciso discussões que problematizem o acesso e

permanência nestes programas, pois ao contrário, ainda serão excludentes. O programa

se torna excludente quando cria critérios de não acúmulo de uma ou mais bolsas, dois

irmãos não podem ser beneficiados, incompatibilidade de cumprimento de carga horária

com cursos de graduação em horário integral e excesso de burocracia.

Situação similar não é um caso isolado, problemas e queixas semelhantes têm

ocorrido em outras IES, como por exemplo, no estudo por David et al (2013),

analisando a experiência de inclusão de indígenas na Universidade Federal do Pará,

constatou que os programas de apoio ao estudante ainda são pouco eficientes.

O cumprimento da carga horária pode ser feito em locais destinados pela Pró-

Reitoria de Extensão ou o aluno estar vinculado a alguma atividade de extensão ou

pesquisa com professores da IES. E quando encontra professores que os acolhem em

seus projetos de extensão e de pesquisa, se deparam com a desconfiança, situação esta

relatada pela entrevistada:

Tem uma desconfiança muito grande do mau uso do recurso público, que índio protege índio, ou que professor da universidade protege os índios (OCPR2).

Por muitos anos na IES fui orientadora de bolsistas PVUI e recebia ligações dos

responsáveis pelo setor para se certificarem se os alunos estavam presentes nas ações

propostas. Como se o fato de ser um acadêmico índio fosse razão suficiente para

desconfiança. Ou seja, é persistente o ranço do discurso hegemônico do índio

preguiçoso e que não gosta de trabalhar.

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Diante destas questões, vários questionamentos podem ser apontados: Quais são

os movimentos políticos verdadeiros que o governo do estado de Mato Grosso do Sul

faz em defesa aos povos indígenas? Levantando hipóteses que o cenário político do

Estado é desfavorável a uma discussão e proposição para as questões indígenas, a

bancada “ruralista” e as pressões tendem a manter na inércia boa parte dos

representantes legislativos no estado de Mato Grosso do Sul.

Neste sentido, é necessário repensar os programas de apoio estudantil e adaptá-

lo aos novos sujeitos que ingressam na universidade, considerando as suas

particularidades. Pois apoio político externo a política de Ações Afirmativas

desenvolvida pela IES fica centrada em discursos, propostas e ações efetivas não

ocorrem e quando ocorrem são extremamente tímidas e não promovem discussões que

possam auxiliar em estratégias que garantam a permanência dos acadêmicos indígenas

na universidade.

Nas palavras de Paraskeva (2005), o que se observa é um “desinvestimento

intencional no campo da escolarização”:

[...] a sociedade contemporânea pautada pelos ritmos e compassos do frenesim neoliberal ao diminuir o protagonismo do Estado e do bem público e comum ‘empurrou’ também as escolas para uma posição ingrata. O desinvestimento intencional no campo da escolarização (campo este crucial para a consubstanciação de uma sociedade verdadeiramente justa e igual) revela-se como um processo seletivo que de todo não é aleatório. Na verdade, pese embora a política de sistemático desinvestimento que temos vindo a assistir atravesse todos os quadrantes do fenomeno da escolarização, o facto é que há determinadas áreas que têm sido ‘cautelosamente’ privilegiadas (p.7).

5.6.3 Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (PIBIC)

O Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (PIBIC) visa, entre

outros objetivos, despertar a vocação científica, proporcionar aprendizagem de técnicas

e métodos científicos, estimular o desenvolvimento do pensamento científico e da

criatividade decorrentes das situações geradas pelo confronto direto com os problemas

de pesquisa e incentivar talentos potenciais entre alunos de graduação (UEMS, PDI,

2014-2018).

Na Tabela 10 podemos observar o número de bolsas por programas oferecidos

na Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul, de 2010 a 2013.

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Tabela 10: Número de bolsas por programas oferecidos na Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul, de 2010 a 2013

ANO 2010-2011 2011-2012 2012-2013 Bolsas

UEMS 178 178 178 Bolsas

CNPq 61 66 66 EIC-MA

(sem bolsa) * 51 62 51 Trabalhos

no ENIC** 245 262 328 Fonte: Relatório Anual de atividades físicos financeiros da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul– janeiro a outubro de 2013. *Encontro de Iniciação Científica **Estágio de Iniciação Científica – Modalidade Avançada

Em relação a orientações de bolsas de iniciação científica, a entrevistada relata:

Porque tem professores com muita resistência para orientar os alunos indígenas para a pesquisa. Tem muito aquela ideia de que eu vou levar meus alunos para uma atividade de extensão, porque se for pesquisa vai ter que produzir um artigo, um relatório, um resumo, seja lá o que for. Ainda vejo assim que o PIBIC AF tem uma procura inferior, tendo em vista ao número de alunos indígenas presentes na UEMS (CC 2)

Segundo o Ministério da Educação e Cultura (2015), o Programa Institucional de

Iniciação Científica - PIBIC nas Ações Afirmativas é dirigido às universidades públicas

que são beneficiárias de cotas Programa de Iniciação Científica e que têm programa de

ações afirmativas. Cujos objetivos são:

Ampliar a oportunidade de formação técnico-científica de estudantes, cuja inserção no ambiente acadêmico se deu por uma ação afirmativa para ingresso no Ensino Superior; Contribuir para a formação científica de recursos humanos entre os beneficiários de políticas de ações afirmativas de qualquer atividade profissional; Ampliar o acesso e a integração dos estudantes beneficiários de políticas de ações afirmativas à cultura científica, e Fortalecer a política de ação afirmativa existente nas instituições (p.1).

5.6.4 Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID)

O Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID), criado

pelo Ministério da Educação,é desenvolvido pela Coordenação e Aperfeiçoamento de

Pessoal de Nível Superior (CAPES). O programa insere os alunos no cotidiano de

escolas, com o objetivo de valorizar o magistério, fomentando a iniciação à docência de

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alunos dos cursos de licenciatura, promovendo integração entre educação superior e

educação básica.

São oferecidas bolsas em cinco modalidades:

a) Bolsistas de iniciação à docência;

b) Para alunos dos cursos de licenciatura;

c) Bolsistas de supervisão, para professores das escolas públicas;

d) Bolsas de coordenação de área de conhecimento, coordenação de gestão e;

e) Coordenação institucional para docentes das universidades (PDI/UEMS,

2014, p. 45).

5.6.5 Programa Ciência Sem Fronteiras

É um programa do Governo Federal com o objetivo de realizar a mobilidade

acadêmica de alunos de graduação das instituições de ensino superior no país. A meta

do programa é promover a consolidação, expansão e a internacionalização da ciência e

tecnologia.

A forma de concessão de bolsas do Programa foi realizada por meio da

Chamada Nacional e por Cotas das IES (PDI/UEMS, 2014-2018).

5.6.6 Serviço de Atendimento Psicológico (SAP)

O serviço de Atendimento Psicológico está vinculado à Pró-Reitoria de Extensão

e Assuntos Comunitários, que como objetivo:

[...] integrar o aluno à vida acadêmica, auxiliando-o na busca de soluções para questões problemáticas de ordem psíquica, social, educacional e profissional. As práticas utilizadas variam de acordo com cada caso e incluem psicoterapia breve, aconselhamento psicológico, psicoterapia individual e/ou em grupo (http://www.portal.uems.br/pro_reitoria/extensao/atendimento_psicologico).

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

A trajetória e elaboração desta pesquisa me permitiram a compreensão, a partir

do “olhar” dos implementadores, do processo histórico da implementação da Política de

Ação Afirmativa para indígenas na Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul,

tendo como marco a criação das cotas para negros e indígenas, que no ano de 2014

completou 10 anos.

Sem a pretensão de exaurir a discussão sobre a temática, considerou-se que as

universidades, como qualquer organização, é lócus de bases conflitivas e complexas,

frutos de processos históricos, que conformam o terreno político e organizativo e é

composta por sujeitos singulares, com formas de pensar e agir oriundos de um modo

complexo, frutos de uma construção histórica e social.

Neste cenário complexo e muitas vezes adverso é que se propõe configurar a

política de Ação Afirmativa para indígenas na referida IES, imbricada por um cenário

político local centrado num ranço histórico de negação aos direitos fundamentais da

população indígena do estado. Pois, no estado de Mato Grosso do Sul, local que

concentra a segunda população indígena do Brasil, os conflitos pela posse da terra

contribuí imensamente para criar imagens distorcidas dos mesmos.

Destaca-se que, a partir dos achados da pesquisa, os primeiros momentos da

promulgação da Lei de Cotas foram marcados por intensa discussão e embates.

Momento também importante para que se discutissem as questões de raça e etnia no

cenário acadêmico, por meio de seminários com a participação da comunidade

acadêmica, representantes dos movimentos negros, de representantes e lideranças

indígenas e pesquisadores da área.

Dessa forma, a presença dos indígenas na universidade já se configura como

representativo, pois parte da população como um todo desconhece por completo a

temática e os determinantes que envolvem todas as questões indígenas.

Observou-se também que, transcorrido o período inicial após a promulgação e

implantação das cotas, as discussões e ações tenderam a decair na IES. Este fato foi

ocasionado por alguns fatores que podem estar relacionados, entre eles as mudanças na

gestão estadual.

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Constata-se que em sua trajetória histórica, a Universidade Estadual de Mato

Grosso do Sul, num movimento contra-hegemônico, vem tentando promover mudanças

nesse cenário, mesmo com as dificuldades enfrentadas. Tentando minimizar a exclusão,

não somente no sentido de acesso, mas também com atividades e ações que possam

promover permanência e acompanhamento na trajetória universitária de alunos

indígenas. E também na projeção de inseri-los em programas de pós–graduação.

Os participantes relatam que buscam saídas, com ações e atividades, mesmo que

pontuais, e alternativas, como as monitorias, as atividades em grupo, disciplinas e

optativa que contemplem a temática indígena, criação Centro de Estudos, Pesquisa e

Extensão em Educação, Gênero, Raça e Etnia – CEPEGRE, somados as atividades de

apoio desenvolvidas no Projeto de extensão Rede de Saberes.

Discorrem sobre as dificuldades e desafios enfrentados, ora afirmando que entre

os indígenas há dificuldades de aprendizagem, ora reiterando que existem barreiras na

compreensão do português, especialmente entre aqueles que têm a língua materna como

princípio.

Parece-nos uma incoerência bastante acentuada, pois a Constituição Federal de

1988 assegura uma educação diferenciada, bilíngue, de acordo com as especificidades

de cada povo. No entanto, quando os estudantes indígenas ingressam no ensino

superior, não encontram profissionais preparados que conheçam as formas de aprender e

ensinar indígenas, bem como ações instituídas, por meio de um currículo multicultural,

que articule com os diversos saberes de tais povos.

Observa-se também que há uma dualidade/dissenso entre o indígena como

visível e invisível, igual e diferente. Ao mesmo tempo, consideram importante a

presença indígena no meio universitário, para “desnudar” as pessoas e consideram que

os acadêmicos indígenas são “porta vozes”.

Constata-se que a bolsa de permanência do governo do estado (PVUI) não supre

e não respeita as necessidades e as especificidades dos alunos indígenas, além de ter um

caráter excludente. Bem como os incentivos financeiros recebidos pela IES para fins de

implementação efetiva da política são insuficientes. Dessa forma, não se assegura a

inclusão, sendo necessária uma estrutura consolidada para que a universidade possa

desenvolver Ações Afirmativas consistentes e institucionalizadas. Portanto, é necessário

avanços e busca de mecanismos que garantam não somente a inclusão, mas também de

um aparato que possa assegurar condições minímas de permanência:

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[...] que a partir dela surjam campi universitários dotados, por exemplo, de alojamentos, bibliotecas, acesso à internet etc; e docentes equipados com treinamento intelectual – e formação cultural – capazes de reverter os preconceitos que e geral avultam em regiões interioranas ( LIMA, 2007, p. 26).

Relatam que avanços são necessários principalmente para inserção de discussões

sistemáticas nos cursos sobre interculturalidade. Neste aspecto, ressalta-se que política

de Ação Afirmativa não pode ser confundida com democratização, acesso, cotas ou

bolsas, engloba um leque de ações que permeiam o acesso e a permanência dos

indígenas nas universidades fundadas no respeito às diferenças desses povos.

O respeito à diferença perpassa as garantias dos direitos humanos, entre elas, por

exemplo, as políticas de assistência, habitação e trabalho, saúde, moradia, acesso a bens

e serviços e ao direito a terra, entre outras. Há que se pensar em estratégias que

garantam os princípios constitucionais de igualdade e respeito às diferenças de forma

articulada.

No caso das populações indígenas, especialmente as localizadas no sul do estado

de Mato Grosso do Sul, se encontram em um cenário de luta para garantias mínimas de

sobrevivência, situação que revela a violação de seus direitos humanos. Portanto, pode-

se afirmar que a política de Ação Afirmativa deve ser mais ampla, além de atender às

minorias no enfoque educacional a partir da perspectiva racial, deve se estender a

extinguir as mazelas de ordem socioeconômica que afetam o país. Portanto, muito ainda

há que ser feito para uma ação política emancipatória.

Nesse sentido, Apple (2006) afirma que

Mais do que analisarmos as influências da restauração conservadora é preciso criar alternativas para superá-las por meio de um projeto político de longo prazo e que se ambiente nas transformações locais, mas abrangentes. Olhar para o passado não basta. É preciso travar a disputa ideológica (senso comum). É preciso auxiliar na reconstrução da moralidade densa e a democracia plena, aquela que inclui todos.

Nesta ótica, os resultados da implementação são efeitos das interações entre a

estrutura legal e o processo político. Uma lei que possua um apoio financeiro adequado

somado às iniciativas de mobilização, consolidação e orientações das diretrizes políticas

bem desenhadas e suficientemente claras aos funcionários responsáveis pela

implementação pode representar um marco de resistência às pressões que se façam

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presentes da opinião pública, e mudanças desejadas, mesmo que pequenas, podem

ocorrer.

Destaco que a política da IES é inédita e enfrenta mecanismos e forças

opositoras, no entanto, é preciso criar caminhos e novas formas de superá-las.

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APÊNDICE 1:

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

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TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

Você está sendo convidado a participar em uma pesquisa. Este estudo está

sendo conduzido pela pesquisadora Érika Kaneta Ferri. - Participarão desta pesquisa, profissionais da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul, entre eles: Pró-Reitor de Extensão e Assuntos Comunitário, Pró – Reitor de Ensino, Membros da Comissão de acompanhamento dos alunos cotistas e Coordenadores de Curso que tenham maior número de acadêmicos indígenas.

A finalidade deste estudo é analisar as políticas públicas de Ações Afirmativas direcionadas a inclusão dos povos indígenas na Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul. Bem como, situar as políticas de Ações Afirmativas presentes na Federação e no estado de Mato Grosso do Sul; Compreender de que maneirAções Afirmativas s políticas de Ações Afirmativas estão sendo recebidas e implementadas pelos diversos segmentos da Universidade (Pró-Reitorias, Membros da Comissão de acompanhamento dos alunos cotistas, Coordenadores de Curso, Conselhos); Descrever as políticas de incentivo financeiro que a Instituição recebe do governo federal, do governo estadual e outras parcerias; Identificar o envolvimento dos diferentes atores na implantação e implementação da política institucional de Ações Afirmativas ; Identificar as dificuldades e facilidades no processo de implantação e implementação das políticas de Ações Afirmativas ; Mapear as ações/atividades afirmativas, discussões sistemáticas ou ações programadas desenvolvidas ao nível dos cursos e IES

Sua participação não é obrigatória. Sua recusa não trará nenhum prejuízo em sua relação com o pesquisador ou com a Instituição.

Você será entrevistado e todas as entrevistas serão gravadas e o que disser será registrado.

Você estará no estudo até que sejam colhidas todas as informações pertinentes ao mesmo, podendo acontecer em uma única entrevista ou em quantas se fizer necessário.

Você será informado periodicamente de qualquer nova informação que possa modificar a sua vontade em continuar participando do estudo.

Esta pesquisa não trará riscos de ordem física e/ou moral, relacionados à sua saúde, porém, você poderá experimentar constrangimento ao responder algumas perguntas.

Você será avisado/ informado previamente sobre o local e horário da entrevista.

Se você concordar em participar do estudo, seu nome e identidade serão mantidos em sigilo. A menos que requerido por lei, somente o pesquisador, o orientador e o Comitê de ética independente, terão acesso a suas informações para verificar as informações do estudo.

Os resultados do estudo promoverão subsídios para repensar as práticas e o papel da Universidade e do estado no contexto sócio político e cultural.Contribuindo dessa forma para análise das políticas de Ações Afirmativas e no fomento das discussões em um campo ainda pouco problematizado.

Para perguntas ou problemas referentes ao estudo ligue para Érika Kaneta Ferri, telefone 67-9971-8062. Para perguntas sobre seus direitos como participante no

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estudo chame o Comitê de ética em Pesquisa com Seres Humanos da UFMS, telefone 67-3387-3093-Ramal 2299.

Você poderá se recusar a participar ou pedir para sair da pesquisa a qualquer momento

Todas as informações colhidas neste estudo são sigilosas e sua participação é voluntária, ou seja, não receberá nenhuma remuneração para participar da mesma. Se você desistir do estudo, não será proibido de participar de novos estudos.

.Você receberá uma via assinada deste termo de consentimento. Declaro que li e entendi este formulário de consentimento e todas as minhas

dúvidas foram esclarecidas, e que sou voluntário a tomar parte neste estudo. Assinatura do voluntário__________________________________________ Data: ____/___/____ Assinatura do pesquisador________________________________________ Data: ____/___/____

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APÊNDICE 2:

ROTEIRO DE ENTREVISTA E CARACTERIZAÇÃO DOS SUJEITOS DA PESQUISA

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ROTEIRO DE ENTREVISTA E CARACTERIZAÇÃO DOS SUJEITOS DA PESQUISA

Caracterização dos sujeitos da pesquisa: Nome (iniciais): Idade: Função: Tempo na Função: Formação: Tempo de atuação na UEMS: Roteiro de Entrevista: (Pró-Reitorias, Presidente da comissão de acompanhamento dos alunos cotistas

e coordenadores de curso) 1. Na sua opinião, como está sendo implementadas as políticas de Ações Afirmativas

na UEMS? 2. De que maneira as políticas de Ações Afirmativas têm sido recebidas pelos diversos

segmentos da Universidade (Administrativos, Pró-Reitorias, Conselhos, entre outros)?

3. Que política de incentivo financeiro a Instituição recebe do governo federal, do governo estadual e de outras fontes?

4. De que maneira os diferentes profissionais (inclusive docentes) foram envolvidos na implementação nas políticas de Ações?

5. Que ações/atividades afirmativas são desenvolvidas no curso? 6. Existem discussões sistemáticas ou ações programadas no curso acerca desses

temas? 7. Quais as dificuldades, facilidades e desafios verificados no processo de

implementação das políticas de Ações Afirmativas ? 8. Como foi sua participação no processo de implementação das políticas de Ações

Afirmativas na UEMS? 9. Como você avalia as políticas de Ações Afirmativas na UEMS?

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APÊNDICE 3:

ENTREVISTAS

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Entrevista 1 – MCAAC 1/ OCPR

Dados de identificação

Nome (iniciais): M. J. A.C.

Idade: 51

Função: Docente

Tempo na Função: 08/11/1994

Formação: Pedagogia – Mestrado/Doutorado/Educ/Currículo

Tempo de atuação na UEMS: 19 anos

Ø Na sua opinião, como está sendo implementadas as políticas de Ações

Afirmativas na UEMS?

Erika, na verdade é bem assim, vou contar um pouco da minha história. Eu já

estava no estado desde 1980, era concursada como professora na rede municipal e

trabalhava na direção da maior escola estadual do Mato Grosso do Sul. E, na época

quando foi criada a UEMS, a L. me convidou para trabalhar com ela. Assumi o setor de

legislação e normas. Sou muito estudiosa, leio muito e talvez por isso tenha sido

convidada, e, no aspecto legal, dominava muito bem.

Passados alguns meses, em 1995, entrou a professora S.F, que imediatamente

me devolveu para o estado, porque ela e alguns achavam que eu era os “ olhos” da L.

Apesar de nossa relação ser apenas profissional. Essa atitude da S. me causou muitos

problemas, que ainda hoje estou resolvendo.S. era professora de educação especial no

CEUD36. Eu fui uma das primeiras professoras a se capacitar e a dar aula em uma sala

especial quando foi criado no Estado do Mato Grosso do Sul nos anos 1980. Tenho mais

de 400 horas de curso. Ou seja, quando ela foi procurar uma substituta, ela se deparou

com meu currículo, e quis que eu voltasse.

Enfim, voltei. Trabalhei na UEMS, porém depois de um tempo tive de trabalhar

no CEUD, o que atrapalhou muito minha vida funcional na época. Trabalhei os anos de

95 e 96 no CEUD, porém quando S. foi deposta pela L., teve de voltar ao CEUD, e os

alunos não a quiseram. Ela foi para a Assembleia e eu continuei a trabalhar no CEUD

até 97, quando comecei meu mestrado na PUC-SP. Pedi demissão dos meus dois cargos

36 Centro Universitário de Dourados.

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na rede estadual, fiquei seis meses fora do estado. Fiz concurso na UEMS, e assumi a

primeira leva de professores, que dava aula em Amambai e Ivinhema. Fui chamada para

montar o Núcleo de Pesquisa e Educação, o que a gente chama hoje de Pró-Reitoria.

Assumi o Projeto Tereré, que era gerenciado por outra pessoa, logo depois a

UEMS foi convidada a participar do programa da reforma agrária no estado. A

Professora incumbida negou a participar do programa e eu acabei assumindo. Então eu

trabalhava com mais de 80 assentamentos, dava aula em Amambai, Ivinhema e fazia

mestrado. Em 1999 defendi meu mestrado e, no final do mesmo ano, a professora L. me

convidou para assumir a Pró-Reitoria de Ensino. Quando ela me convidou eu já havia

terminado meu mestrado e acabei saindo da unidade de Amambai.

Em relação à Legislação:

Lei dos nossos deputados, através da Assembleia Legislativa que cria a lei de

Cotas. Cotas para índios de autoria do nosso atual prefeito Murilo Zauith.

O deputado Pedro Kemp, também criou cotas para negros, tem um histórico de

envolvimento com as questões raciais, é um deputado do PT. Mas na lei não

especificava muito bem as questões de cor, sem esclarecer as questões de raça, que é um

conceito sociológico.

Uma lei foi sancionada no dia 26 de dezembro de 2002 e a outra, dia 6 de janeiro

de 2013, pelo governador da época.

O governador na época era José Orcírio Miranda dos Santos (vulgo Zeca do PT),

ele ligou no final do ano, no dia 6 de janeiro, para a reitoria, com o objetivo de falar

com a professora L. Ela recebe o telefonema do governador e ele diz: “Estou com duas

leis na minha mesa, para sancionar, já foi aprovado na Assembleia, eu quero saber de

vocês, assino ou não assino?”. Até aquela época não tinha muito envolvido nestas

discussões, pois estava muito envolvida com a Pró-Reitoria e com o mestrado.

Sabia da discussão que estava ocorrendo, mas muito brevemente, pois não tinha

muito envolvimento com o movimento negro. Que é algo que vem da formação. Por

exemplo, a minha mãe não trabalhou com a gente isso, ela chorava e sofria com a

discriminação mas não trabalhava isso com a gente.

E disse: “Lei é lei, devemos cumprir. Só não sei o que vai acontecer quando os

professores voltarem”

E ela falou: “O senhor é o governador, se os deputados aprovaram por

unanimidade, quem somos nós pra ir contra?”. A partir daí ele nos deu 90 dias, porém

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percebemos que precisávamos de mais de 90 dias. Usamos oito meses, fomos

regularizar lá pelo mês de agosto.

E quando ela desligou o telefone e ela olhou pra mim e disse: “Agora é com

você, você é a Pró-Reitora”.

A partir daí, tive que parar pra pensar, pois tudo é novo. Tudo começando.

Nós teríamos que regulamentar. Fui buscar as instituições que já faziam isso, por

exemplo, a UERJ. Eu verifiquei que não havia do ponto de vista da regulamentação da

lei nada muito claro. Nós tínhamos que regulamentar.

E foi aí que busquei as lideranças do movimento negro, as lideranças indígenas,

principalmente os terenas e os guaranis, porque eram eles que mais se aproximaram da

universidade, por conta do normal superior e iniciamos um processo de discussão.

Peguei o mês de janeiro para arquitetar, digamos assim, para pensar na forma

como faríamos isso, a metodologia de trabalho.

No mês de fevereiro criamos uma comissão dentro do CEPE37, para trabalhar

essa questão. A gente se reunia, mas as pessoas não sabiam, não havia estudos

científicos, na época tinha a professora M.L.F., era do militante do movimento negro,

mas, não tinha estudos, trabalhos intelectuais na área, era mais na área da militância.

Tive que estudar muita coisa. Tive que busca muitas coisas. Também tive que

fazer um processo pessoal, quanto mais você estuda, mais vai adquirindo a necessidade

de rever uma séria de conceitos. Desvestir as ideologias das quais te vestiram desde a

infância até a idade adulta, é como se eu ganhasse outro processo de autonomia, para

além da profissional e educadora, tinha alguma coisa que não estava combinando com o

resto.

Pois tinha uma luta enquanto diretora de escolas: eu criei o primeiro colegiado

de curso, criei a primeira APM38 de escola, criei o primeiro grêmio estudantil quando

não era permitido, bati de frente com os secretários. Fui punida várias vezes, com

demissão.

Então, quando chegou a hora das cotas, pensei que estava faltando alguma coisa,

eu ainda não estou completa. É a questão da identidade, estava faltando alguma coisa:

era uma questão étnica racial. Fui rever toda a minha infância, toda minha vida, toda

minha escola, meus professores e nunca tinha visto nada e nunca tinha ouvido nada

sobre isso. Fui fazer análises pessoais. E isso é muito sofrido porque, quando você faz

37 ConselhodeEnsino,PesquisaeExtensão. 38 AssociaçãodePaisMestres.

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isso de fora para dentro, machuca profundamente quando você não recebe tudo isso ao

contrário, por exemplo, os filhos, hoje escreve e está no doutorado, eles são diferentes,

eles não vão lidar com a questão do racismo como eu lidei: ter sido agredido e ter que

agredir de volta. De chorar e de sofrer. Aí você começa a fazer este retorno, como se

você tivesse que fazer um retorno, e é obrigada a se reconstituir.

Essa luta da implantação das Ações Afirmativas , as cotas da UEMS, agradeço

todos os dias por ter caído no meu colo quando eu era Pró-Reitora. Porque me

transformei em outra profissional. Em termos de luta e de militância. Mesmo não sendo

militante de bandeira, fui até homenageada. É uma luta diferenciada.

Foi aí que chamei para dentro da universidade os movimentos, tanto o negro

quanto os indígenas.

Tive que fazer reuniões, ia buscar recursos, quantas vezes com dinheiro do

próprio bolso, para pagar o lanche dos indígenas e o almoço. Por exemplo, a prefeitura

deu a Kombi ao pessoal de CAções Afirmativas rapó, e eles diziam: “Mas não temos

como almoçar, quem iria custear a alimentação?”. Tínhamos que resolver as coisas de

forma pessoal, eu e outras pessoas que estavam envolvidas. Conseguimos parceiros da

UCDB39.

Tínhamos apoio muitas vezes mais de fora do que de dentro. Contamos com as

pessoas da UCDB (Professores B e Adir) que lidavam muito com a questão indígena,

nos auxiliando nessas discussões.

A comissão que foi montada no CEPE, somente com professores e internos da

universidade, aquelas reuniões intermináveis e um dia disse: “Não dou conta de discutir

isso”. A comissão um dia “jogou a toalha “e disse: “Não temos condições de discutir

isso”. Então eu falei: “Vamos fazer audiências públicas”.

Foram feitas várias audiências públicas. Trouxe o Dr. Aleixo Paraguassú, trouxe

lideranças indígenas. Pessoas que tinham condições de estar no embate e no combate.

Os alunos iam para brigar, porque na concepção dos alunos, que jáestavam

matriculados estavam tirando as vagas deles, eles diziam que estavam tirando a vaga

deles. E naquele dia, quando ouvi isso, eu disse: “Como tirar a sua vaga, se você já está

matriculado”.

Uma defesa, que é ideológica, de manutenção do status quo, 2% de pretos nas

universidades, somando tudo isso com pardos dá cerca de 12%. Basta ver os censos.

39 Universidade Católica Dom Bosco.

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Fizemos audiência pública em Aquidauana, Campo Grande, Ponta Porã,

Dourados, entre outros lugares. Ainda aliada a isso fizemos vários seminários, 15

unidades ao mesmo tempo. Com uma mesa com pessoas que eram contra e os pró-cotas.

É claro que levei para estas mesas e reuniões os que eram pró e a favor das

cotas. Procurei pessoas dentro do meio acadêmico que tinham condições para enfrentar

o debate, em alguns lugares não consegui ninguém para falar contra. Tinha um contra

estabelecido. Foi bastante interessante, como apoio do deputado João Grandão.

Junto com a coordenadoria das questões raciais, Ana Cema, era coordenadora,

nós trabalhávamos juntos, muito organizados. Nós trabalhávamos juntos, consegui

muito apoio dos movimentos, e isto foi aprendizagem.

Foi uma aprendizagem pra mim. Eles não cobraram por eu não ser militante.

Mas eles enxergavam que na minha pessoa, que toda aquela luta que estava externa à

universidade, havia uma possibilidade de entrar para a universidade.

Pra isso o movimento conseguiu enxergar tudo isto, e me envolveu de tal forma

e até hoje eu trabalho com eles. Eles diziam que quando o pessoal da universidade

participa a academia acabava legitimando isso. Eles aproveitaram o movimento

Diziam também: “Agora a gente tem uma Pró-Reitora negra que está

encarregada de implementar as cotas para negros e índios, já tem trabalhos anteriores lá

com a questão dos indígenas e ela tem condições para isso. Ela tem condições de

implementar isso na universidade”. Então, eles compareceriam nas reuniões do

COUNI40 e CEPE.

E, em agosto de 2003, conseguimos aprovar a resolução, que até hoje continua a

mesma coisa, muda uma coisa ou outra, mas os fundamentos prevalecem:

A questão fenótipo;

A questão da escola pública, de ser bolsista; e

A questão da declaração para os indígenas.

Foi um dia, uma reunião conjunta entre CEPE e COUNI. Uma reunião

diferenciada. A plateia do auditório estava cheia, com as lideranças indígenas e os

movimentos negros.

Nenhum conselheiro votou contra, tinha conselheiro que a gente sabia que era

contra, mas, na hora do voto, todos votaram a favor, pois a votação foi aberta, eu

solicitei à reitora e ela atendeu. Porque a gente precisava saber quem era contra e saber

com quem estávamos trabalhando. Aconteceu o contrário.

40 Conselho Universitário.

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Mesmo com raiva eles votaram a favor. E isso foi muito interessante.

Neste mesmo ano criamos uma comissão. Essa comissão existe até hoje e ela

analisa as inscrições, com a presença do movimento negro, que existe até hoje.

Para indígenas a declaração dada pelas lideranças (cacique ou outro) e a

FUNAI41, declara que ele realmente é descendente. Muitas coisas eu aprendi. Por

exemplo: entre os guaranis, a descendência se dá pela maternidade; entre os terenas,

pela paternidade.

Hoje é a professora Bia e o professor Rogério que acompanham mais isso.

Mas havia a preocupação de como eles seriam recebidos aqui.

Ainda com os recursos da Fundação Palmares, com o apoio do deputado J. G.,

houve uma convocação pela Reitora para um seminário geral.

Eles ficaram bravos, quando há uma convocação, mas:

1. Era um dia de trabalho;

2. Foram pagas todas as despesas, diárias e deslocamentos; e

3. Era uma situação nova.

Teve uma preocupação de fazer uma capacitação, foram realizadas em 2004-

2005 com professores e administrativos. Para que ninguém alegasse ignorância no

futuro e você ter que responder por isso.

Cada vez que temos algo novo devemos divulgar e foram feitas as capacitações.

Trouxemos pessoas renomadas, por exemplo, em Dourados, o professor Jorge

Carvalho, que criou a Ação Afirmativa na UnB42.Trouxe o professor Wilson Matos, que

é da UNEB43, é conselheiro do CNE44. A professora Petrolinha, ícone do movimento

negro, é da UFSCAR45.Montamos um polo em Paranaíba, além de outros convidados da

UFG, em São Paulo. Fomos buscando parcerias.

Montamos outro polo em Campo Grande, agregando, nesses três locais, uma

capacitação de 3 dias com todos os administrativos e professores. Nós não trouxemos

intelectuais negros e também brancos. Nós trouxemos também intelectuais brancos que

discutiam e defendiam a cota. Não é só negros e indígenas.

41 Fundação Nacional do Índio. 42 Universidade de Brasília. 43 Universidade do Estado da Bahia. 44 Conselho Nacional de Educação. 45 Universidade Federal de São Carlos.

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Em 2005, a professora L. deixa a Reitoria e o professor L. A. assume e me

convida para permanecer, mas havia dito pra ele que iria para o doutorado, pois tinha

passado no doutorado. Saí em maio de 2005, com a pesquisa sobre a cotas, porque eu

precisava contar isso, pois tenho obrigação moral.

E me propus a estudar isso no doutorado, eu posso contar isso, com todo o pano

de fundo de tudo que aconteceu comigo dentro desse processo. Eu disse: “As cotas

foram criadas para que os índios e negros pudessem ser os protagonistas de sua própria

história”. Porque, até aquele momento, quem escrevia sobre os indígenas? Os

intelectuais brancos falando sobre os índios.

Os índios queriam cursos interculturais. E, quando surgiram as cotas, eles não

perderam a oportunidade. É uma oportunidade. Ninguém vai criar um curso só para

índios e sim vai criar sempre a interculturalidade, da Matemática, das Letras, da

Enfermagem.

Eles concorrem muito na Enfermagem e no Direito, eles tinham essa

necessidade. E diziam: “Nós precisamos ir para a universidade para nos apropriar das

mesmas ferramentas e conhecimentos que os brancos usam para tomar a nossa terra e

destituir os nossos direitos”.

Eles precisavam conhecer e formar também índios para dar aulas para índios,

pois ainda tem muitos brancos na reserva dando aulas nas reservas. E diziam que

estavam acabando com a cultura. Eles têm uma forma de ver a escola de forma

diferenciada.

Na tese trabalhei com todos os alunos que ingressaram, este levantamento eu fiz

manualmente. Por exemplo: curso de Direito, tinha que identificar quem era cotista,

imprimi tudo aquilo, trabalhei com as atas. Primeiro ano de Direito, olhei quem era

negro, quem era índio, quais eram as disciplinas e assim ano por ano. No segundo ano

precisava identificar, por exemplo, cadê o João, pra onde ele foi? Que disciplinas ele

ficou retido?

Para trabalhar com os não cotistas, alunos de vestibulares anteriores, deu

bastante trabalho.

Ø Você fez uma avaliação na sua tese naquele ano e, hoje, como você avalia as

Ações Afirmativas na UEMS?

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Dez anos se passaram de cotas. Pra mim um exemplo de pergunta interessante:

por que entre os indígenas há um grande número de evasão”

Na primeira turma entraram 63 e saíram oito. Mas, não importa, se nos primeiros

anos foi mais difícil, dos 63 que entraram, formamos só oito em 2007, mas se não

houvesse as cotas, nem esses oito teriam se formado, não haveria nem oito indígenas

com curso de graduação.

Dois ou três anos depois formamos três ou quatro no Direito. Eles estão todos

enfiados nos movimentos e brigando pela causa. Eles estão trabalhando, mesmo não

tendo passado na OAB46, eles estão auxiliando os colegas advogados que passaram.

Se formar um já é uma grande coisa. Pois não tinha nenhum. É uma diferença

imensa, já pensou? Imagina na Enfermagem.

É a mesma coisa entre os negros, porque, com o passar do tempo, começamos a

ver mais professores negros, por exemplo, nas escolas. Porque na minha época de aluna

só tive dois professores negros que eu me lembro. Ou seja, eu não tinha em quem me

espelhar para dizer:“É vantajoso ser professora”.

E o indígena? Dentro da aldeia ainda tem professores não indígena.

Naquela época, os números eram importantes, pois nós estávamos numa

discussão no Brasil de que negros e indígenas entravam pela porta dos fundos, eles nem

iam conseguir chegar até o final. Eles demostram que precisavam de oportunidades de

entrar.Mesmo que tenha toda a rejeição, perseguição e má vontade.

Ainda vejo dentro da UEMS, principalmente em relação aos indígenas. Existe

uma má vontade, principalmente entre os docentes, porque tem professor que age assim:

“deixa pra lá, aqui não é seu lugar”. Tem professor que diz assim: “Não sei o que estes

índios estão fazendo aqui. Lugar de índio na aldeia”.

Mas a universidade é pública, é para todo mundo. Quem sou eu para dizer que

não é lugar?Não é lugar de índio?Não é lugar de negro?Não é lugar de gay e lésbica?É

lugar de quem?O velho fenótipo da ideologia eurocêntrica, branco e a branca, de

preferência não pobre e heterossexual. Esta sempre foi a visão do intelectual.

Você está dando aulas no curso de Pedagogia, quais são as ações desenvolvidas

no curso.

Na verdade, dentro da UEMS, nós tivemos muitas discussões, por exemplo,

ampliar número de bolsas, principalmente para aqueles que vem das escolas públicas de

46 Ordem dos Advogados do Brasil.

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condição econômica muito baixa, nós nunca conseguimos isso, pois é rechaçado nos

conselhos até hoje.

O que temos são alguns programas, que, nós professores, não vamos atrás. Por

exemplo: O PNAES47, porque a UEMS tem cotas, porque se a UEMS não tivesse cotas,

não poderia entrar e acessar este recurso.

A Rede de Saberes também foi uma luta e financiada, pela Fundação Ford, o

Antonio Carlos Lima veio pra cá e fez toda a discussão, montou e inseriu.Ou seja, é

algo de um grupo. É uma ideia e uma luta de um grupo que tem isso como ideal.

47 Programa Nacional de Assistência Estudantil.

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Entrevista 2 – OCPR / CC

Dados de identificação

Nome (iniciais): M.A.

Idade: 54

Função: Docente

Tempo na Função: Coordenador de Curso: 2 meses e como docente 15 anos

Formação: Enfermeira

Tempo de atuação na UEMS: Desde 1999 (já foi coordenadora e Pró-Reitora de

Ensino)

Ø Na sua opinião, como está sendo implementada as políticas de Ações

Afirmativas na UEMS?

A gente não guarda as datas.Mas eu lembro que a grande polêmica que surgiu da

legislação. É que ambas as leis, tanto as leis dos indígenas quanto a do negro, elas

vieram sem consulta prévia da universidade.

Então houve uma sessão. O legislativo já estava trabalhando em relação a essa

legislação, para a instituição de cota. A Assembleia (os deputados) já estava fazendo

esta discussão, na Assembleia. E a universidade nunca foi chamada para fazer esta

discussão na Assembleia.

Então, quando a universidade ficou sabendo, pelo menos a maioria. Pode ser que

tenha tido alguma conversa. Se houve discussão o nível administrativo, entre reitor e

deputados outras instâncias. Mas com os professores, vamos dizer assim, na esfera dos

docentes esta conversa não aconteceu.

Quando a universidade ficou sabendo, pelo menos os professores, isto não

aconteceu.

Quando nós soubemos, ficamos sabendo quando a lei foi instituída, e assim

como a lei aí já estava instituída e ela tinha um prazo para que a UEMS se adequasse,

surgiram e aconteceram várias reuniões para saber como isso seria normatizado.

A grande questão é que toda vez que quando vem uma coisa que de cima pra

baixo, mesmo que ela seja boa, é a questão da discussão da autonomia da universidade

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Este foi o grande, vamos dizer assim, o grande entrave, isto foi muito discutido.

Eu me lembro da fala do Cleverson, ele fez uma fala, fez uma fala numa reunião,

acho que ele quando era coordenador de curso.

Dizendo assim: Os embates não estavam no posicionamento de cada um se era

favorável ou não e sim que todos tínhamos que cumprir a lei, sendo favorável ou não.

Mas acho que a grande questão não é questão de ser favorável ou não na

discussão da lei, é a questão de estar ferindo o princípio da autonomia da universidade,

ou seja, isto não ter sido discutido antes, e a gente se preparar.

Ou seja, a gente teria que se preparar num espaço curto. Na realidade a lei

chegou no início do ano, nós tínhamos que nos adequar num prazo máximo de seis

meses, a gente teria que adequar até o próximo vestibular. Para que isso estivesse

garantido. O que eu lembro, foi isso, que marcou muito foram estes debates.

O corpo docente que estava envolvido se sentiu menosprezado no princípio da

autonomia da universidade, esta era a grande discussão.

Passado esta etapa, vamos dizer assim de choque, uma lei que teríamos que

cumprir, passado este período, estas discussões todas que aconteceram.

Inclusive, inclusive reuniões não só interna, mas também com a presença de

movimentos instituídos, especialmente com presença dos movimentos negros, pois eles

são mais organizados que o dos movimentos que defendem a causa indígena.

Várias reuniões também aconteceram com estas pessoas, que representam estes

movimentos, justamente para que quando a Resolução, quando passasse pelo CEPE,

tivesse o aval desses movimentos.

Então passado este período de indignação em relação a não termos sido

comunicados antes. Surgiu a resolução de como isso seria, e como seria o processo do

vestibular a partir daí foi tranquilo.

Ø Como foi visto entre os professores e outras esferas da universidade?

A mesma coisa. A reação foi igual, nós tínhamos professores que ficaram

indignados por não terem sido consultados e depois teriam que se adequar a esta

questão. Sempre houve aquela discussão, no sentido...na questão assim, da pessoa entrar

pela cota e depois ela permanecer na universidade.

Outra questão é que foi levantada, como posso dizer, do grau de compreensão,

será que o nível, o nível de compreensão seria o mesmo para acompanhar o curso?

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Sempre teve aquele clima no sentido assim:

Entrar pela cota significa que tem um potencial menor de quem entrou pelas

vagas universais.

Quem era da ampla concorrência teria uma nota mais alta e quem entra pela cota

tem nota menor e teria maior dificuldade para acompanhar o curso.

Esta discussão com relação a entrada e acompanhar o curso não só aconteceu na

Enfermagem, mas aconteceu em todos os cursos. Todos os cursos tinham o mesmo

receio. O corpo docente tinha este receio. Ter pessoas com maior dificuldade e se

manter no curso com este grau de dificuldade.

Existia o discurso, daqueles: se entrou o curso tem se adequar. Quais seriam as

atividades que o curso estaria disponibilizando para atender, caso estes alunos

apresentavam dificuldades isto também aconteceu na Enfermagem.

Existiam aqueles que defendiam isso, ou seja, se adequar, ou seja, quais os

instrumentos que teríamos que disponibilizar. Isto também aconteceu

O preconceito existe não é relação ao indivíduo: existe preconceito em relação à

cota, no sentido assim.

Existe preconceito em relação à cota, para que a pessoa entrar na universidade é

no topo da pirâmide, quando se coloca que a ação do Estado seja na base.

Se as pessoas tivessem as mesmas condições para se entrar na universidade,

então elas não precisariam das cotas. A atuação do governo deveria ser na base, na

qualidade do ensino público. Se as escolas públicas fossem de qualidade,

independentemente de ser índio, branco ou negro. Teriam as mesmas condições.

O que se questionava também a qualidade da escola pública no estado. Esta

discussão é até hoje.

Então, eu diria que o preconceito, não é no sentido da pessoa, se está chegando

uma pessoa negra ou indígena. Mas, sim, se ela está chegando sem condições, pois com

dificuldades da escola pública ela vai entrar com dificuldades. Este era o receio que os

professores tinham.

Ø Existem ações sistemáticas no curso para atender estas dificuldades?

Não existem ação sistemáticas. Ficou a cargo de cada professor, como é hoje, no

sentido de trabalhar com monitorias e com projetos de ensino. Porque é o que tem

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instituído. Trabalhar com monitores com aqueles acadêmicos com maiores dificuldades.

Quando o professor identifica dificuldades.

Da mesma forma que o projeto de ensino, o professor pode propor um projeto

de ensino, para atender esta demanda. Fica a cargo de cada professor, não tem assim

uma norma instituída, por exemplo: aqueles acadêmicos que apresenta dificuldade, por

cota ou não, o curso deve atender. Não existe isto, porque já tem os projetos de ensino e

de monitoria, que tem duração de 3 meses, que tem dentro de seu escopo esta finalidade.

Ø Que política de incentivo financeiro a instituição recebe do Governo Federal,

do Governo Estadual e de outras fontes?

O que se tem instituído, tem projetos que atendem melhor a comunidade

indígena do que candidatos que entraram como negros.

Tem a rede de saberes, financiado por recurso externo, pela Fundação Ford,

programa de bolsa do governo do Estado: Vale Universidade Indígena e Vale

Universidade.

Por exemplo: A rede de saberes tem uma sala, com computadores, para fazer

consultas, tem um funcionário designado para orientação. Tem aqueles que criticam,

dizendo que a gente está segregando, defendem e apontam que eles ficam separados dos

demais, outros dizem que separe. Outros que defendem, dizendo que eles não têm

acesso a computadores e que precisam de uma estrutura e apoio. Enfim, eles têm este

recurso.

Além do Governo Estadual que é o programa Vale universidade Indígena. Não

tenho conhecimento a comunidade negra de ter este tipo de apoio. Entra como tudo,

pois as bolsas de permanência, moradia, alimentação ela é igual, não faz separação

diferença entre ampla concorrência, é igual.

Todos concorrem igualmente e somente os indígenas que têm, aí você observa

que a questão do recurso é fundamental para a manutenção do aluno carente, seja ele

índio e negro.

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Ø Como você avalia as políticas de Ações Afirmativas na UEMS?

Eu entro no rol, eu lembro que quando participava da discussão. Continuo com a

opinião que precisamos dar uma escola pública de qualidade, para que todos tenham as

mesmas oportunidades, essa questão e chegar no topo da pirâmide com dificuldades.

Hoje eu percebo que não é uma diferença tão grande. Hoje a gente consegue

fazer uma avaliação melhor, com o Sistema de Seleção Unificada (SISU). Hoje a gente

consegue comparar com as outras Instituições de Ensino Superior (IES), por conta do

SISU. Pois é a mesma prova.

Agente sempre se questiona, na Pró-Reitoria de ensino, aonde está os melhores

alunos do Mato Grosso do Sul?Porque quem entra na universidade, não é só na UEMS,

UFMS, Universidade de Goiás, eles têm a nota muito baixa. Não é só na UEMS, então

quando a gente compara as notas, quando a gente compara as notas, são notas baixas.

Cadê os melhores alunos do Mato Grosso do Sul? E quando você compara com

as cotas, você vê que não tem muita diferença. Todos terão dificuldades. A gente tem

observado no curso de Enfermagem que os alunos têm mais dificuldades que há 10 anos

atrás.

Antes a gente tinha turmas diferenciadas, hoje nós temos alunos diferenciados.

Hoje você tem alguns alunos que se sobressaem. Hoje está mais difícil de manter um

nível mais alto. Atribuo isto a uma conjuntura de fatores, não é somente à cota.

Entendo que a cota foi e é necessária, e entendo que ainda precisamos dela por

um bom tempo.

Ø Quanto ao curso que ações/atividades afirmativas são desenvolvidas?

O curso está sempre se modificando, mas, apesar de estar com esta estrutura a

mais de dez anos, a hora que pegamos o PPP48a gente percebe que não tem nada

O PPP não contempla absolutamente nada de Ações Afirmativas . Não é só

Enfermagem, o curso de Enfermagem, todos os cursos, quando estava em frente da Pró-

Reitoria, fui obrigada a ler todos os PPPs dos cursos da UEMS.

Os PPPs mantêm uma lógica de formação profissional, eles contemplam o que

diz na legislação, não têm o cuidado com a situação do negro e do índio no Brasil. Por

exemplo, nas licenciaturas, no caso da cultura afro.

48 Projeto Político Pedagógico.

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No nosso curso de Enfermagem, ele não trabalha estas questões importantes, por

exemplo, da questão indígena, ela está dentro da saúde coletiva, mas ela não trabalha

estas questões específicas.

Uma coisa que me chamou atenção quando voltei do doutorado. Quando voltei

do doutorado, entrei numa turma que tinha 4 indígenas. Estava dando aula e uma delas

era muito simpática e muito falante.

E, uma vez, ela ficou me olhando e quando terminei a aula perguntei pra ela o

que ela não tinha entendido. E ela me falou que não entendeu uma palavra, você, por

favor, me interrompa. E aí, comecei a ter cuidado do que eu falava na aula e sempre que

acabava a aula eu perguntava pra ela se ela entendeu.

Ela me explicou como ela estudava: ela copiava tudo, colocava tudo no guarani,

ela estudava e depois passava tudo para o português pra saber responder na prova. E aí

eu fiquei pensando: caramba, todo este trabalho e eu não sei nenhuma palavra em

guarani. Não temos isso na universidade. E a universidade não tem esta preocupação,

não tem nenhum incentivo, pelo menos poderíamos ter alguma coisa, por exemplo

aprender guarani. Não faz parte do projeto do curso.

A gente não tem no curso nada específico, nada voltado específico, para atender

uma sala diferenciada, que faça que a gente entenda melhor a população indígena, se

tiver algum projeto, mas é específico do curso. Não faz parte do PPP do curso. Como

não faz parte de nenhum curso da UEMS.

Isto faz com que quando entra um negro ou um índio na universidade, mas não

temos nada no nosso PPP que faça com que a gente entenda melhor estas questões. E

tão pouco a gente trabalha estas questões no curso. Professores mais sensíveis acolhem

e outros professores tratam de maneira normal, como outro aluno qualquer.

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Entrevista 3 – OCPR2

Dados de identificação

Nome (iniciais): B. L

Idade:56

Função: Docente

Tempo na Função: 15 anos

Formação: História

Tempo de atuação na UEMS: 15 anos

Ø Na sua opinião, como está sendo implementada as políticas de Ações

Afirmativas na UEMS?

Na verdade quando eu vim do Rio Grande do Sul, já trabalhava com a questão

indígena. Primeiramente eu sou arqueóloga também, meu primeiro contato com a

questão indígena foi na arqueologia, que é o índio morto, que a gente faz uma

construção do índio. Tem uma expressão que é o índio de papel.

E depois de certo tempo, eu participei de um projeto Mbya Guarani, Ong PMG,

lá do Rio Grande do Sul. Estive à frente um período PMG. Este projeto parou, porque as

pessoas foram fazer outras coisas e este projeto se extinguiu.

Quando eu vim morar no Mato Grosso do Sul em 1988, fui morar em Mundo

Novo, tem um município do lado que é Japorã. Mundo Novo não tem indígena hoje.

Mas o município de Japorã tem indígena, que congrega uma das reservas até 1928,

naquele período. Foi criada em 1915, hoje ela tem uma população indígena. Tem uma

população muito grande de indígenas. Tanto que 60% da população de Japorã é de

indígenas, e de Guarani Nhandeva, diferentes do que tem aqui, que fica na bacia do rio

Iguatemi.

Fiz contatos com a liderança, e comecei a trabalhar com índio vivo, passei a

trabalhar e depois eu fui para o doutorado. Devido aos conflitos territoriais, não pude

trabalhar com Arqueologia, mas não foi possível, tive que mudar de Arqueologia para

Etnoarqueologia.

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A partir de 2002 fiz orientações com alunos, orientei alunos. Não sou bióloga,

Sou historiadora. Uma forma de agregar alunos, trabalhei com Etnobiologia e

Etnobotânica e uso dos espaços e conhecimentos tradicionais na Porto Lindo.

Fiz o doutorado, a defesa foi em 2005.Acompanhei o primeiro grande conflito, a

retomada Ivykatu. Que hoje está bastante tenso, vez por outra aparece um conflito,

fecha a estrada, ora os índios, ora os produtores. Está bem complicado por lá.

Daí eu conheci o pessoal da UCDB, o Professor Brand do Rio Grande do Sul,

somente de vista e por conta de outros projetos a gente acabou ficando bastante amigos.

E quando em 2004 a discussão do Rede começou Antonio Carlos Lima do

Museu Nacional veio com esta proposta, pois ele tinha um projeto aprovado junto à

Fundação Ford, com a implantação de núcleos pra atender esta questão indígena. Um

era em Roraima, outra era no Mato Grosso do Sul, por conta desses conflitos e também

em função das cotas, que a UEMS já tinha aprovado, que foi implantado em 2003 e os

indígenas efetivamente começaram a cursar em 2004.

Aí ele me convidou. Na época, a gente não tinha um relacionamento estreito, a

partir disso a gente começou a elaborar e discutir o projeto durante o ano de 2005, o que

a gente queria dentro das propostas da trilha de conhecimentos.

Foi esse núcleo de Mato Grosso do Sul e o núcleo de Roraima. E o Roraima

extinguiu em 6 anos, porque foi institucionalizada.

Acho que assim, a rede de saberes permanece enquanto não se avançam nas

políticas institucionais. Roraima criou todo um sistema, avançou porque avançou nas

políticas institucionais, esses avanços ocorreram mais a nível federal. Já a nível estadual

temos avanços, mas são bastante complexos e complicados.

A rede começou efetivamente suas ações em 2006. Nosso primeiro secretário foi

um indígena, o Tonico Benites, só ficou 4 ou 5meses, depois veio a Antonia de Souza.

Começou esta execução, toda a proposta que foi feita para a Fundação Ford com

a UCBD, foi muito discutida com os alunos. Eu tenho até um depoimento de uma aluna

que dizia:“Professora, quando a senhora, veio uma desconhecida, chegou falando sobre

o projeto, um projeto de apoio ao indígena. E eles diziam: Isso aí não vai acontecer,

mais um projeto. Nós não acreditávamos. Nós discutíamos, dizendo isso não vai dar em

nada.”

Até porque essa proposta era muito ousada. Criar uma estrutura. Tem um

acompanhamento efetivo, permitir que os alunos pudessem ser apoiados em projetos de

ensino, pesquisa e extensão, e criar um laboratório para que eles se sentissem no lugar

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deles. Pois, diziam:“A gente fica pelos cantos, a gente se reúne e fica pelos cantos. A

gente não tem um lugar!”.

Pois naquela época eles eram os primeiros alunos. Foram os primeiros alunos,

nos anos 2004 e 2005, foram anos muito difíceis. Eram completamente invisíveis, e eles

estavam sofrendo muito por conta das cotas. Aquela efervescência! Para que criar essa

diferenciação de raça e etnia? Isso vai criar mais conflito na sala de aula. Aí tinha

aquela discussão que iria diminuir a qualidade da universidade, enfim uma discussão

muito ruim. E que, na verdade, nas universidades, passados 10 anos, ainda permeia de

maneira absurda.

Não consegui avançar, porque a educação básica. O aluno quando chega no

ensino superior e o professor que sai do ensino superior, é formado dentro dessa lógica

hegemônica. Todo mundo deve ser igual. Igualdade de direito de maneira forma, não é

uma igualdade material.

Então é assim, naquela época foi muito mais difícil. Uma vez eu vi escrito na

parede do Rede: A oca dos índios. Quando chegaram os computadores, eram os mais

modernos que tinha na universidade. Por que a UEMS tem computadores para índios?

Os alunos indígenas nos diziam que os outros alunos diziam assim: Por que só vocês

têm acesso?

Eu dizia para eles responderem: Está cheio de projetos na universidade, é

público, as pessoas se agregam conforme querem. Eu respondia: Não é proibido, todos

podem entrar desde que venham contribuir.

Por exemplo, já tivemos professores e que usaram a estrutura da rede de saberes,

até o ano passado os alunos de Enfermagem, eles chamaram de aldeinha, de não

indígenas, porque eles contribuíram para a formação dos indígenas.

A gente nunca disse: não pode. Mas perguntava: o que você vai trazer de

contribuição? O projeto foi muito conversado.

Na época tínhamos reuniões em vários locais: Dourados, Aquidauana, Amambai

e Maracaju, com gravações e assinaturas de todos os presentes.

Até mesmo dentro da UEMS, a diversidade é muito grande. Porque cada

realidade tem uma necessidade, uma especificidade, por exemplo, o horário dos cursos e

horário de atendimento do Rede. Amambai somente cursos noturnos, e os alunos só

vem para as aulas, que estrutura tem que ter? E em alguns locais não tem, por exemplo,

Maracaju não tem. Aquidauana foi estruturada, os alunos tinham computadores, foi

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garantido pela direção. O projeto foi caminhando. Depois a Fundação Ford, no segundo

financiamento disse: a estrutura a gente não dá mais.

No primeiro financiamento, foi um investimento muito grande, cerca de 700 mil

reais. Era muito dinheiro naquela época.Depois em 2008, entram a UFGD49 e a

UFMS50. A gente sempre acreditava que deveria ter esta relação com as outras IES que

tivessem indígenas.A UFGD tinha um número de alunos importante, em torno de 30 a

40 em Aquidauana. A UFGD sempre foi menos. Isto tudo é verba federal. A UFGD tem

uma faculdadeintercultural indígena e lá a rede se institucionalizou, sempre era essa a

chave.

Pois a Fundação Ford ela vem nos financiando pelo reconhecimento que ela teve

da ação. Em muitos momentos vamos aos encontros para dizer: O que vocês fizeram

para apoiar estes acadêmicos?

Algumas coisas deram muito certo, outras nem tanto. Ninguém quer ser super

herói, porque é um trabalho que deveria ser institucional. Porque este trabalho é um

trabalho, é um trabalho profissional, deveria ter mais gente, e a cada ano vamos e

estamos tentando fazer uma rede.

Hoje Campo Grande está com um grande número de alunos, mas a UEMS de

Dourados continua a sendo o maior número. Mas isso tende a equilibrar. Em função das

bolsas das universidades federais que é de maior valor.

A UEMS tem uma bolsa, foi criada como Programa Bolsa Universitária

Indígena criada na gestão do Zeca do PT (cerca de 7 anos), e quando o André

Puccinelli, do PMDB, assumiu ele dá uma nova roupagem ao nome de nome de Vale

Universidade Indígena, já tá completando 8 anos.

E o que a gente vê na implantação dessa bolsa, a bolsa foi criada com um valor e

não houve aumento, ainda são 300 reais e 46 reais para se deslocar até o local que ele

vai cumprir.

Uma discussão que a gente fez com o pessoal da SETAS51, que não colocasse

em serviços pesados e em locais que não tem nada a ver. Teve anos que a gente

conseguiu, mas hoje está muito difícil. Colocam eles em cargos burocráticos. Os alunos

dizem: Olha professora, nós não vamos ficar com essa bolsa, É uma enche... de saco,

eles vão lá pra ver se tu este lá, e se você não está, eles nem perguntam porquê? É uma

49 Universidade Federal da Grande Dourados. 50 Universidade Federal de Mato Grosso do Sul. 51 Secretaria de Estado de Trabalho e Assistência Social.

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burocracia A gente ganha mais fazendo qualquer outra coisa, por exemplo, como

ajudante de pedreiro.

Eles dizem: É uma burocracia. Esta é uma opção nossa. Ao mesmo tempo isto

não ajuda na formação. Por exemplo: um aluno de turismo, ficar na secretaria de

turismo. Um da Enfermagem num local da saúde, enfim.

Tem uma desconfiança muito grande do mau uso do recurso público, que índio

protege índio, ou que professor da universidade protege os índios.

Mas essa discussão muito... Mas ao mesmo tempo nós avançamos muito,

quando estive à frente da Pró-Reitoria foi o não encerramento da bolsa no final do ano.

Pois todos os anos, ele teria que se matricular e era desligado no final do ano e passar

por todo o processo. Deve ficar os 4 ou 5 anos que está no curso. Por exemplo: Ele

aluga, acumula dívidas, e não tem como pagar se não tem bolsa nas férias.

Outo fato também que é muito ruim, por exemplo: Se tem dois irmãos, que é um

fato comum, só pode um receber, impede que outro receba. É um critério excludente.

Isto é um fator que impede, tem fatores bastante complicadores.

A bolsa é um avanço, mas tem estes fatores que impedem. Anualmente um

número de 120 bolsas, começou sendo preenchido, mas depois nunca mais foi

preenchido. As pessoas podem olhar as bolsas e ver só os números e dizer que os índios

não querem. Não é que eles não querem, o programa é excludente de início. Nós

trabalhamos e tentamos discutir isso, mas não teve como entrar esta discussãona UEMS,

éo que teve em relação as bolsas para indígenas. Eles dizem que não pode mudar.

Outro fato que ocorreu foi a criação da Comissão de Acompanhamento de

cotistas. Esta comissão (acho que foi entre 2008 ou 2009), a ideia que teria

representantes das 15 unidades, mas em Dourados teria que ter mais. A ideia era que se

fizessem estudos, análises, que políticas deveriam ter em cada local e fazer a avaliação

de como estava tudo isso. Não funcionou, pois a comissão tinha que fazer os

levantamentos, buscar e verificar juntos aos cotistas, ou seja, tinham que levar trabalho

para casa. Também não conseguia se reunir. Não se conseguiu, a comissão encerrou,

com trabalhos e nem executou o que se propôs. Muitas vezes os representantes não

tinham nenhuma afinidade pela temática. Sabemos que as temáticas estão perpassando

as áreas.

Esses novos sujeitos de direitos, Hoje eles têm direitos, essa população, os

índios, negros, a população LGBT, enfim, foram direitos conquistados pelos

movimentos.

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A universidade não consegue se preparar para. Isso não é só na UEMS, quando a

gente vai em encontros, fui num encontro com várias universidades para discutir a

formação universitária indígena e, apesar de todos os avanços, são coisas individuais e

não são institucionalizadas.

Deve ser encarada, estamos tentando institucionalizar isso. Para que tenha um

funcionário. Por exemplo, Campo Grande está com um número grande de indígenas,

cerca de 70, poderia agregar cotista, porque são pessoas que precisam de um olhar

diferenciado. Temos que trabalhar com aqueles que foram excluídos historicamente.

Temos que torná-lo forte, e isso dá igualdade.

Isso o trabalho da Maju apresenta, eles entram com uma nota muito menor, não

são todos, por exemplo, tem aluno indígena e negro que não precisa de cota, o que é

importante, para mostrar que é fruto de uma luta. A gente trabalha com o indígena

dizendo que isso não é benesse e sim luta. A UEMS precisa começar a olhar pra isso

com um olhar diferenciado.

Tanto que foi criado a DID (Divisão de Inclusão e Diversidade) para dar conta

disso. Por um bom tempo deu conta disso, mas hoje não está cumprindo sua função, por

falta de funcionário, por uma outra visão. Tem uma política interessante, muitas vezes

não tem continuidade, precisa criar, não digo em todos os lugares, mas deve ter

acompanhando pari passo desses acadêmicos. Se nós temos cotas, devemos acompanhar

isso. Afinal de contas, para que foi implantado as cotas, só para dizer que tem cota?

Hoje, podemos dizer que um dos problemas é a educação básica, não tem

professores indígenas suficientes nas aldeias, mas hoje os indígenas estão se graduando.

Isso é importante. Esse movimento, esse resultado, vamos ver daqui a uns 20 anos e o

que os alunos indígenas estão fazendo.

A UEMS tem a cota, dentro das vagas regulares, que nunca foram supridas. Ter

cotas, não significa que tem acesso. O ingresso hoje não é o problema, e sim a

permanência. Até por conta do SISU, que democratizou o acesso. O problema continua

a ser a permanência.

As licenciaturas continuam a absorver todos que se formam, mas os

bacharelados, este é um estudo que estamos fazendo, levam dois anos para entrar no

mercado efetivamente.

Tem alunos indígenas da UEMS já no mestrado. É algo importante que se diga.

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Quando saí da Pró-Reitoria a gente deixou uma resolução que dentro das bolsas

de permanência, que contemplassem o que tinha dentro da legislação das cotas: 10%

para indígenas, 20% para negros e isso parou. Não avançaram as discussões.

Tem alunos que optam pela bolsa PAE (Programa de Apoio Estudantil), e a

gente pede pra eles que eles estudem, o tempo que eles estão aqui é para estudar. Eles

têm acesso à internet, têm espaços para estudo e aos livros. Para que eles possam suprir

as deficiências, muitos vêm com deficiência, principalmente na compreensão da língua

portuguesa, nas exatas, que a gente sabe que é um problema, mas isso é para todos.

Ø Como a política foi recebida?

Quando foi aprovado no COUNI, eu estava afastada para o doutorado, eu estava

em Mundo Novo e o que via era que ninguém se preocupava com as questões indígenas,

eles diziam: índios não vão entrar na universidade. A grande discussão era para os

negros, eles diziam que isso iria acirrar a discriminação e o preconceito. Eles diziam:

para que esta diferenciação, isso é preconceito. Como assim: ninguém é preconceituoso,

ninguém é racista, essa discussão era meio esquizofrênica, mas tudo isso virá à tona?

Houve uma discussão na UEMS de Mundo Novo, município pequeno com 15 mil

habitantes, com representantes negros e índios, mas ninguém questionou os índios.

E na UEMS, com a criação do Rede, foi essa discussão: criar um espaço só para

índios? Para quê? Por que não tem para os demais? Hoje só tem o DCE. Não tem um

centro de convivência.

A gente trabalha com os acadêmicos indígenas dizendo: Ações Afirmativas ,

cota é Ação Afirmativa, mas não é isso, é tu dar condições para que ele entre,

permaneça e ele saia capacitado.

Mas, tem outro discurso do coitadinho, que é pior. Teve um discurso de uma

professora que me disse: nós formamos esse aluno e ele não tem condição nenhuma. Eu

falei porque você fez isso, isto é um desfavor.

Por isso que existe o Rede, é para apoiar. Monitoria e tutoria deve ser

institucionalizada, por pessoas que tenham sensibilidade pela causa. Nossos tutores são

sensibilidades para as questões indígenas, são professores da rede. Isso nossos relatórios

demonstram.

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Por exemplo: se fizer uma tutoria e ele não aprova, mas se teve um ganho e vai

mais fortalecido para o outro ano, para que ele possa entender a disciplina. Esse ganho é

que nos importa, muitos conseguem. Isso deve ser institucionalizado na UEMS. O

grande número de evasão é por conta disso, pois tem uma deficiência da educação

básica.

Chegou à universidade, entrou por cota ou não, mas tem deficiência, o curso tem

que discutir, a comissão estruturante do curso tem que discutir isso. Os professores têm

que discutir isso. Deveriam dizer: esse é o nosso cenário, e o que a gente vai fazer?

Daqui a 4, 5 anos eles vão sair e devem sair com qualidade.

Senão não conseguimos dar o salto de qualidade que a universidade precisa, se a

gente formar o coitadinho, é preferível dizer ele não tem condições. Não está certo!

Ø Existem ações/ atividades sistemáticas – Ações Afirmativas em Pedagogia e

Biologia?

Nesses cursos na verdade quando percebem estas dificuldades, não tem ações

para isso, nada instituído. Na verdade os alunos indígenas procuram apoio na Rede. Os

demais, quem sabe a partir de agora, a partir a criação do CDE, ele ainda é novo e é

importante, a partir desses primeiros estudos, a partir do SISU, vai ajudar nisso.

O curso de Pedagogia discute estas questões, nas disciplinas de políticas

públicas também é discutido. Mas, vai depender de cada professor que ministra, tem um

despreparo geral, tanto na educação básica quanto no ensino superior.

Teria que preparar os professores para compreender essa lei (10.639, 11.645),

que torna obrigatório este enfoque lá na educação básica, e entender esta caminhada

histórica desses grupos índios, negros e LGBT e deficientes ao longo do século XX.

A universidade não entendeu que tinha gente lá fora se mobilizando. Não se

deram conta, é muito difícil, de que grupo você vem?

Isso também parte de uma formação do sujeito. Muitos professores vieram de

grupos historicamente excluídos. Mas ascendem e omitem, não fazem mais parte desse

grupo. Quando este grupo chega à universidade e se depara com estes grupos até se

chocam.

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Os dados demonstraram que aumentou o número de negros e índios na

universidade, o MEC52, SECADI53 e a FUNAI não têm estes dados.

Sabe que no Brasil tem cerca de 6 mil índios nas universidades. Mas não sabem

onde estão. Em Mato Grosso do Sul se calcula entre 800 e 900, nas públicas, nas

comunitárias, particulares e na EAD54.

Um exemplo de Ação Afirmativa, é o que está acontecendo hoje aqui, eles têm

essa bolsa PVUI55, a inscrição tem que ser no computador, tem que ser online e

imprimir, principalmente os que chegam aqui com 17-18 anos são bastantes perdidos.

Isso é uma Ação Afirmativa. Muitas vezes perde a bolsa, pois não sabe disso.

O Rede está fechado, pois não tem funcionário, e aí o pessoal da SETAS me

ligaram para abrir, pois não havia nenhuma inscrição. Aí eles dizem que os índios não

querem. “Como assim? Não tem como”. A gente trabalha com pessoas nas unidades,

para que eles possam ajudar os alunos, inclusive alunos que têm algum conhecimento de

informática, eles se apoiam, a gente cuida os prazos, períodos... A gente cuida da

questão da presença, quando eles estão doentes... Enfim, precisa de um olhar

diferenciado. Tem período de cumprimento de prazos, dar presença, enfim.

Ø Recursos financeiros

O governo federal hoje, em função da experiência do Rede de Saberes, a

discussão das bolsas federal começa em Mato Grosso do Sul, pelo grande número.

Em 2009 começamos a fazer uma mobilização, para pressionar o SECADI,

governo federal, em 2011 tivemos uma reunião com o secretário, iria montar uma

comissão e foi entregue na SECADI e no SISU um documento com esta reinvindicação.

Foi criado uma bolsa para indígenas/quilombolas que estão nas universidades

federais, ficando de fora as estaduais. Então a mobilização é para que seja universal.

Na UEMS, ainda não temos ainda os resultados, mas com certeza terá um

aumento na UFMS e a na UFGD. A bolsa lá é de 900reais, não precisa fazer nada. O

MEC achou que, na ansiedade de lançar a bolsa, não definiu critérios, basta receber e

não definiu critérios.

52 Ministério da Educação e Cultura 53 Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão. 54 Educação a Distância. 55 Programa Vale Universidade Indígena.

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Para os indígenas e quilombolas a bolsa é 900reais. Este valor não é desprezível.

PIBIC56 todas são menores.

Inclusive quando eles me perguntam eu digo: vai pra lá (para as federais).

Inclusive os professores das federais estão muito preocupados, porque é dinheiro

público, tem que ter critério, ou seja, estudar.

A UFMS, apesar de estar no Rede, além de Aquidauana, nunca se soube quantos

indígenas tem. Os alunos nessa instituição são invisíveis.

No Rede os alunos tornam-se visíveis. No momento que se torna visível, se

torna alvo, e nós trabalhamos isso: que isto foi uma luta, lá de 1988, quem lutou foram

os iletrados da aldeia, lutaram pra isso.

Para a UEMS, não tem nada de incentivo financeiro. Esta bolsa poderia ser para

as estaduais, talvez para aquelas que já vêm desenvolvendo ações a muitos anos, como

nós, a do Paraná, entre outras. Se ampliasse seria só para Mato Grosso do Sul seriam

800 bolsas.

Outra preocupação também são os cursos EAD, estamos fazendo estudos, que

estão sendo feitos por instituições que surgem que nunca ouvíamos falar. Que tipo de

formação é essa? E tem alunos indígenas nelas?

Então, o que se pergunta é: Que discussão está fazendo a universidade para

juntar os conhecimentos que estas pessoas trazem (índios, negros, etc.)? Que

contribuição a universidade está levando para estas comunidades?

Em nível de curso isso fica restrito ao número de horas, preocupados com o

mínimo, colocam, porque é uma obrigatoriedade. Perguntam: aonde vamos colocar?

Não há discussão da efetividade das ações. Isso não é só na UEMS. Lógico, se colocar

mais horas, o currículo ficaria inchado, deve ter então disciplinas optativas, pois em 34

horas não é possível compreender estes aspectos.

As federais partiram do zero para um mil, e as estaduais partiram de um zero e

agora estão num 40, o governo oferece essa bolsa e acha que é o suficiente. Como se a

bolsa resolvesse todos os problemas, e a gente sabe que só a bolsa não resolve.

56 Programa de Bolsas de Iniciação Científica.

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Entrevista 4 – CC 1

Dados de identificação:

Nome (iniciais): L. T. L.

Idade: 47

Função: Coordenadora e Docente do Curso de Pedagogia – Campo Grande

Tempo na Função: 4 anos e 8 meses

Formação: Graduação em Psicologia. Mestrado em História e Psicologia,

Doutorado em Educação

Tempo de atuação na UEMS: 14 anos e 8 meses

Ø Em sua opinião, como está sendo implementada a Política de Ações

Afirmativas na UEMS?

Estou na UEMS há 14 anos, trabalhei na região de Dourados, Ponta Porã,

Aquidauana e Mundo Novo.

Eu entrei para trabalhar no Normal Superior, ele era oferecido nas unidades e as

coordenações, uma em Dourados e a outra em Campo Grande. Campo Grande que

atendia Aquidauana e uma em Coxim. Nós formamos 42 indígenas, a maior parte deles

professores, que hoje estão em cargos de lideranças nas comunidades em que residem,

muitos deles estão em cargos de gestores, lideranças. Nós temos registro de dois

mestres, atuando na região de Aquidauana e Miranda.

Eu participei da comissão de implantação das cotas dentro da universidade,

foram momentos de muitos debates, pois tínhamos muitos grupos dentro da

universidade que não era a favor, então a gente tinha que apresentar e fazer o debate

antropológico, histórico e também educativa para a formação destes grupos com estes

professores para a gente fazer esta implementação. Ela é uma lei estadual do Pedro

Kemp, como seria esta seleção destes negros e destes indígenas. A maior preocupação

era como a gente iria fazer para a permanência deles.

Hoje gente tem algumas atividades e ações de implementação da permanência

destes alunos, mas a gente ainda precisa ainda avançar, especialmente os indígenas, pois

quando eles entram na universidade ficam longe da família, nós recebemos alunos

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indígenas da região de Sidrolândia e Aquidauana, mas a gente sabe hoje que em Campo

Grande tem 15 mil indígenas que residem em áreas urbanas, que temos por exemplo a

Marçal de Souza, um dos mais antigas, ele não tem uma escola indígena, ele tem uma

escola intercultural e sensível para recebê-los, porque tem uma demanda pelo

reconhecimento da categoria de escola indígena.

São alunos que chegam pra nós, principalmente nós temos muitos deles terenas,

a gente também faz o acompanhamento dos desistentes. Mas, do ano passado pra cá,

nós tivemos um índice muito grande com a aprovação das cotas nas federais, por conta

do valor que me aprece de 800e ele pode acumular com bolsas de extensão e de ensino,

chegando a 1.300, o que ajuda muito. Os nossos que permanecem hoje são alunos que já

estavam na metade do curso, hoje a gente precisa fazer o monitoramento dessa

implementação dessas políticas de Ações Afirmativas .

Porque o que a gente ainda vê, através de conversas com os alunos, a falta de

sensibilidade por parte dos professores que ministram os conteúdos universais.

No curso de Pedagogia, especialmente, nós temos reuniões periódicas a cada 15

dias, nós temos um movimento de sensibilidade muito grande, porque nós temos um

grupo de educação, cultura e diversidade que é um grupo de pesquisa, a gente tenta

fazer esta sensibilização e o que é liderado pela professora Maira Leda e tem produção

com todos os temas da diversidade.

Mas o que vejo é a questão do preconceito, da resistência e do preconceito,

porque este movimento de deslocamento de sair da aldeia e vir para a universidade tem

que aprender com isto, dialogar, se aceitar também porque esta identidade étnica deles é

muito viva, porque ele tem uma ligação muito forte com este espaço territorial, com a

família, com a cultura e com os rituais, ele tem laços consanguíneos muito fortes. A

gente faz um trabalho, gente faz um trabalho diuturno de acompanhamento com eles

aqui. Mesmo assim não conseguimos formar muitos aqui. Entre as mulheres, tem a

questão da gravidez, e elas amamentam por mais tempo que nós não indígenas.

A mulher terena e a mulher indígena é muito maternal, ela muito doméstica e ela

é da família, dá prioridade para a família, depois ela prioriza os estudos. Dependendo se

é uma mulher casada ela vai dar prioridade à família e depois ela prioriza os estudos.

Esta implementação ela deveria ser institucional, acho que nós deveríamos ter

algumas capacitações, nós temos este grupo aqui, o grupo da Professora Maju, da

professora Bartolina Ramalho Catalanti, e entender estes elementos que dificultam o

processo de aprendizagem e também principalmente chamar os nossos professores à

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responsabilidade. O que eu tenho visto é que tem alguns professores que não conhecem

a formação do povo brasileiro e origem da história brasileira, as suas próprias origens,

principalmente os professores da área das exatas.

Ø Como foi recebida?

Tinha e tem muitos grupos ferrenhos que são contra, primeiro que a

universidade não é pra todos, porque pensam que a universidade para um grupo, que é

para as elites e de intelectuais que vai constituir uma nova elite.

A UEMS tem estas caraterísticas de se trabalhar com populações e grupos

vulneráveis, não só no ponto de vista da vulnerabilidade da saúde, mas, do ponto de

vida da vulnerabilidade social e econômica, e estes grupos são antigos dentro da

universidade, tem um grupo grande de professores que trabalham da área que trabalha

com a questão étnico racial e diversidade, liderado pela professora Eliza Cesco, já se

aposentou, mas continua no escritório. Gradativamente nós fomos trabalhando isso no

cotidiano.

Eu vejo que a coisa do preconceito e da resistência desses professores que não

têm esta sensibilidade, a gente vai ganhando também à medida que nós nos

posicionamos.

Por exemplo, toda semana nos cursos, como na nossa semana e os demais

cursos, na nossa jornada acadêmica nós temos o grupo da diversidade, e o grupo vai

com tudo, aproveita para falar, para apresentar trabalho, para ministrar minicursos e

fazer oficinas pedagógicas.

Nós temos as leis antirracistas, temos todas as diretrizes curriculares, está dentro

de todas as diretrizes curricular a gente ainda vê que a discussão sobre temas como a

questão de gênero, que está em todas as diretrizes curriculares nacionais.

Mas ainda vê que esta discussão da formação e origem do povo brasileiro é

antiga, mas muito nova para a formação dos professores.

Então assim, as Pró-Reitorias, para acontecer alguma coisa dentro da

universidade tudo deve ser regulamentado por meio de resolução, dentro dos projetos

pedagógicos. Nós tivemos, por exemplo, no Normal Superior que já contemplava a

educação especial, que foi uma luta, pra pensar todos os currículos, posteriormente com

as diretrizes nacionais, hoje todos os currículos possuem um componente da

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diversidade, todos estas ações, educação no campo, étnico racial, libras, educação

especial no caso do pedagogo tem isto em três anos, com disciplinas anuais.

A gente também incentiva também os projetos de extensão, de ensino.PIBID

teve um avanço, como formato de política, pois contemplar o aluno que trabalha, desde

que este aluno contemple 16 horas dentro da escola.

A gente também tem corrido muito atrás dos editais, porque este trabalho não

dissocia da pesquisa e do ensino. Todo módulo da diversidade foi ampliado, sempre

articulando com a história destes grupos e do processo de escolarização deles.

O PINAEST, todo o recurso, nós recebemos agora no mês de agosto, mas se

puder prorrogar e der pra gente fazer as viagens técnicas. Eu trabalho com todos os

povos do Pantanal e a gente vê que os próprios índios não conhecem todos os povos do

Estado. O ensino não pode estar dissociado da pesquisa e da extensão, eu acredito que o

Pinaest é um recurso.

É lógico que tem uma série de questões que estão dentro da agenda que precisam

ser pensadas. Por exemplo: hoje no cenário, por exemplo, na televisão, todo mundo

falando. O ebola pode chegar a um caso como a AIDS, e a gente fica bastante

preocupada.

Quando a política é regulamentada, a gente tem como recorrer aos fóruns e aos

debates. Esta política de incentivo financeiro, que a gente e não tem, porque é muito

pequeno, é preciso começar com coisas pequenas, pequenas coisas, para que a gente

possa atrair maiores recursos. Que o hoje tudo circule em cima dos editais.

Nós aqui incentivamos continuamente os editais, pois nós temos dois grandes

projetos aqui, mas não são todos os professores que têm este perfil. E os grupos estão

vendo, nós incentivamos os professores.

Na IES não tem incentivos, mas nós precisamos desenvolver as atividades, então

é a hora que a gente senta para ver os editais, tantos os editais nacionais quanto os do

FUNDECT57. E nós vamos procurando.

O centro que foi criado pela Maju vai ajudar, vai fomentar muita coisa do ponto

de vista não só de Dourados, mas também com as outras unidades, pois trabalha com

negros e indígenas.

Quando eu entrei na UEMS a gente tinha recurso para compra de materiais e

para viagens e hoje não temos. Hoje se a gente precisa de material ele vem pra unidade

57 Fundação de Apoio ao Desenvolvimento do Ensino, Ciência e Tecnologia do Estado de Mato Grosso do Sul.

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e na medida que a gente precisa, os gerentes vão liberando. As xerox são licitadas para

todas as unidades e cada curso tem uma cota.

Nosso orçamento deveria retornar. Mas por exemplo para as viagens, no nosso

orçamento deveria voltar, porque recentemente fui a um evento e recebi 200 reais e não

pude ficar lá todos os dias, por conta do valor, fora de casa você tem muito gasto, todas

as despesas de passagem, hospedagem e alimentação ficaram sob minha

responsabilidade e eu estava lá representando dois cursos de pós-graduação e

apresentando dois trabalhos.

Quando entrei na UEMS, no tempo da Leocádia a gente tinha e depois, mas no

tempo do Luiz Antonio houve o corte geral e generalizado. As semanas acadêmicas a

gente recebia 2.500 e foi eliminado, hoje se você tem que fazer uma reunião científica

tem que ir atrás de patrocínio, não que isto seria ruim, mas nem todos os professores

possuem este perfil. Então a IES deveria dar sua contrapartida. Porque todo o material

de consumo, nós recebemos 800 reais do PINAES, por exemplo, se for comprar um

pendrive de 18 gigas custa 45 reais.

Os datashows, todos sucateados, com as luzes queimadas, os laboratórios

pedagógicos precisam ser pensados e implementados, não é só levar o aluno para a

escola, e muitas vezes, tem a contrapartida para a escola. A UEMS deve repor o

material para esta escola.

Nós colocamos no PDI e muitas coisas que nós colocamos foram retiradas, a

gente fez esta retomada coletiva com os coordenadores, porque a gente precisa deste

incentivo.

O professor precisa SIG projete entrar no FUNDECT, ele não quer e acha um

sofrimento. Aí ele não vai. Sempre fica o mesmo grupo captando recurso e não dá pra

captar tudo de uma vez, porque você deve desenvolver as ações.

A IES poderia prever, incentivar e pensar em algum produto, os cursos guardam

suas especificidades, por exemplo aqui no curso estamos utilizando recursos de um

projeto de autoria da professora Leda, a maior parte das jornadas é utilizado estes

recursos.

Por exemplo, na nossa jornada não é mercantilista, os alunos pagam 20 reais,

para incentivar os alunos a participar, uma parte é para pagar o pró-labore do convidado

e outra parte para comprar outras coisas para o funcionamento de algumas atividades do

curso e visitas, por exemplo.

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A gente tem em todas as salas da Pedagogia tem datashow, ele vem e dá sua

aula, estes equipamentos foram comprados por recursos de projetos e extensão. A IES

deve pensar nestas tecnologias, pois as tecnologias estão totalmente anacrônicas, porque

ninguém tem saúde para dar aulas no quadro-negro por horas, podendo até desenvolver

uma LER e tudo mais... A IES precisa pensar num incentivo financeiro em todas as

esferas, com outras fontes, para que possamos desenvolver da melhor maneira possível

atividades de ensino, pesquisa e extensão.

Ø De que maneira os diferentes profissionais (inclusive docentes) foram

envolvidos na implementação nas políticas de ações?

Eles são envolvidos por meio das ações dos projetos, ou por projetos de ensino,

extensão... nosso curso, por exemplo, aborda tanto a questão da diversidade sexual,

gênero da educação ambiental e hoje estamos em duas escolas, que é coordenado pelo

professor Airton, por exemplo, eu envolvi professores, um da área de Letras, e dois da

Educação e História, mensalmente eles vêm para as palestras, discutir textos nassessões

de estudos. Porque não têm bolsas para todos. A gente convida e todas as produções

eles são envolvidos.

A professora Leda também tem um projeto na área da obra de Manoel de Barros,

porque ela é estudiosa da análise do discurso do homem pantaneiro, desenvolvemos no

primeiro semestre para crianças da obra deste

Não é projeto de ensino, mas também extensão, trabalha em duas frentes.

Então é a mesma coisa, articulados na linha, envolvendo alunos e professores,

no mestrado temos duas linhas, seminários temáticos,cada linha coordena suas áreas,

nas temáticas da diversidade, articulado com a formação de professores, a Pedagogia

também faz seminário de pesquisa no início do ano, todas as defesas de TCC58 são

coordenados por este grupo de pesquisa, todos os alunos e professores vem assistir. A

agente tem todo um trabalho de estimulo e incentivo, porque com esta ausência de

recursos fica difícil.

58 Trabalho de Conclusão de Curso.

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Hoje os editais requerem que envolvam outras IES, hoje temos outras como, por

exemplo, a UCDB,UNIGRAN59, História da Educação. Estas IES estão envolvidas, este

ano envolvemos sete IES e convidamos nossos ex-orientadores... solicitamos para eles

venham trabalhar conosco, com as mesas redondas, fizemos/criamos a revista. Ela é

uma revista interdisciplinar, temos que fazer as parcerias com os nossos grupos internos,

por exemplo, o grupo de Letras, Educação, Geografia eLetras. Articulando as

discussões em grupo.

A gente também prima pela participação dos alunos nas reuniões de colegiado,

inclusive do primeiro, inclusive na COES60. Tanto nas avaliações, na elaboração dos

instrumentos. Nosso curso foi avaliado como muito bom. Foi recomendado pelo guia do

estudante com quatro estrelas.

A gente também estabelece algumas cotas para os diretores para participar das

nossas semanas acadêmicas, em algumas mesas redondas. Também aqueles alunos que

chegam pra gente e diz que não tem como pagar, a gente traz ele paranos ajudarna

semana, já que eles têm que cumprir 200 horas de atividades extra curriculares.

Existem reuniões periódicas e extraordinárias, estamos longe da sede e algumas

vezes precisamos convocar para discutirmos alguma questão urgente.

59 Centro Universitário da Grande Dourados. 60 Comissão de Estágio.

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Entrevista 5 – PR

Dados de identificação:

Nome (iniciais): E. S

Idade: 41

Função: Pró– Reitor de Extensão e Assuntos Comunitários

Tempo na Função: desde agosto de 2011

Formação: Graduado em Física, Mestrado e Doutorado em Engenharia

Mecânica

Tempo de atuação na UEMS: 15 anos

Bom, vou fazer por ordem cronológica. Primeiro que a UEMS quando eu entrei

na universalidade no primeiro ano em 1996, trabalhei em 1997 da UFMS. Na UEMS

entrei em 1999, no ano seguinte já estava trabalhando na Pró-Reitoria de Ensino, a

convite da Pró-Reitoria da época para trabalhar no setor de capacitação docente, depois

dos parâmetros curriculares. Setores que nem existem mais, quer dizer, capacitação

existe, mas em outra Pró-Reitoria. Estou dizendo isto porque em 1999 tudo era

incipiente na UEMS, por exemplo, a capacitação docente não tinha programa, as

pessoas ainda discutiam um programa para liberar professores e técnicos para poderem

se capacitar, nessa questão existem algumas lideranças.

A visão que eu tinha na época era trazida de faculdades que eu estudei na época,

eu fui uma pessoa ativa do movimento estudantil nas universidades, eu passei na

UNESP61 e na UEL62. Essas discussões lá na universidade paulista, as coisas eram mais

arrefecidas, a impressão que eu tenho até hoje, depois eu posso dizer um pouco da

vivência que eu tive recentemente na USP63 na época do doutorado, enquanto na UEL

essas discussões eram muito acaloradas, elas estavam adiantadas no Paraná, na unidade

paulista elas não aconteciam e eu fiquei curioso que na UEMS algumas pessoas já

debatiam isso, eu posso citar algumas pessoa como a professora Maria José, que foi uma

pessoa que eu fiz amizade aqui na universidade que a gente criou uma certa

identificação por conta de uma vez que eu passei pelo movimento estudantil.

61 Universidade Estadual Paulista “Júlio Mesquita Filho”. 62 Universidade Estadual de Londrina. 63 Universidade de São Paulo.

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O estudante de maneira geral, pelo menos na minha época, a gente sentia a

condição de sujeito dentro daquela cadeia de coisas, sentia que a gente era importante

porque na verdade a universidade tá ali pra formar profissionais, eu não gosto do termo,

mas, alguns usam "clientes".

A universidade existe para o estudante e parecia estranho que a universidade não

pensasse em algumas coisas que fizessem com que o estudante tivesse sucesso dentro da

empreitada. Por exemplo, enquanto na UEL, eu lembro algumas vezes eu viajei e a

universidade pagava para você ir, participar de eventos.

Dentro da universidade estadual, eu fui trabalhar em um setor que nem os

professores tinham isso. Isso estava começando, então isso era meio estranho, quanto

mais pensar em direitos dos estudantes para que pensassem em políticas para que eles

permanecessem na universidade. Então uma coisa é o seguinte, minha opinião naquele

momento era que era estranho não ver na universidade muitas pessoas negras, eu via

aqui em Dourados, por exemplo, eu vim pra cá e nunca tinha visto índios na cidade de

onde eu venho. Foi uma experiência nova e, apesar da população indígena grande na

cidade, na universidade não tinha índios, mas a questão que eu acho mais interessante é

que tinha gente na universidade interessada nisso, querendo discutir isso enquanto no

resto do Brasil isso ainda era incipiente. Mas na UEMStinha gente qualificada pra

discutir. Eu lembro que quando levantaram as cotas, uma das preocupações que eu tinha

era o discurso de onde estava impregnado do lugar da onde eu vinha, ou seja, o que era

importante era investir na educação básica de todos independente do recorte social,

assim de renda, de cor, aliás o importante era que todos tivessem uma escola de

qualidade na base.

Mas, aqui, as discussões que tínhamos na UEMS era que, embora as pessoas, e

eu fazia parte desse grupo, porque logo de início me posicionei favorável as cotas, por

exemplo, porque o entendimento que a gente tinha era que era insuficiente você criar

cotas. Enquanto pra muita gente o debate era só: cotas, sim ou não?

E assim, algo veio acontecer, agora no momento sou Pró-Reitor porque quando

eu vim como Pró-Reitor eu já entrei com esse discurso de que isso era insuficiente, que

a política abrange algo muito maior do que dar somente o acesso. A opinião que tinha

na época eu continuo. As discussões pouco avançavam para estas questões.

Era favorável às cotas porque não consegue enxergar na realidade brasileira,

independentemente de qualquer política é que o acesso à universidade simplesmente

não acontecia. E uma coisa que acho curiosa é que quando você olha filmes como, por

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exemplo, a escola francesa, de filmes que retratam a universidade francesa é comum

você ver, é um país que colonizou países da África, não é incomum você encontrar uma

quantidade razoável de gente negra nas universidades, enquanto aqui era um pouco mais

difícil.

Eu, por exemplo, nunca me dei conta que no curso que eu fiz de Física eu tive

dificuldade para me lembrar de um aluno que fosse negro. Eu nunca me identifiquei,

não me via negro, a família da minha mãe é negra, mas a família do meu pai é loira de

olhos azuis, então a gente criou nessa mistura, eu não consigo lembrar disso como uma

questão que a gente gastasse tempo pensando nisso, preconceito era uma coisa muito

estranha para nós. E esse debate na universidade embora já tivesse no movimento

estudantil.

Na UEMS foi o primeiro lugar na verdade aonde eu posso dizer assim: aqui

aconteceu pra valer pensar sobre isso, por mais que na Universidade Estadual de

Londrina houvesse discussões, era um incipiente, na UNESP também. Mas eu vi pela

primeira vez na UEMS mesmo, então quando as pessoas disseram a UEMS foi uma das

primeiras universidades, é pioneira, ela foi de fato porque eu estava vindo para um

Estado novo, passei por um experiência, não lembrava disso e não existia isso, e eu era

representante estudantil, não tinha essa discussão, simplesmente não acontecia, então

assim eu acho que é importante dizer isso que o discurso que eu vinha que era investir

na escola básica que é o caminho que é o discurso forte muitas vezes das universidades

paulistas, eu vi isso recentemente quando estava lá.

Para nós o que acontecia era que essas pessoas, elas simplesmente não chegam,

os alunos indígenas, por exemplo, em Dourados, os nossos alunos do processo de cotas

na Física, que é considerada uma ciência difícil, não é uma ciência simples porque a

linguagem dela é diferente. Primeiro que ela é mal ensinada, você não tem contato, os

alunos têm contato com os profissionais formados em Física mesmo, né,então são

profissionais muitas vezes leigos em Física, se você aprende Física com um bom sujeito

você acaba gostando de Física mas no geral não é isso que acontece. Os alunos que

escolheram Física nas cotas, eu tive a oportunidade de acompanhar alguns, e as

dificuldades de alguns eram imensas.

Não era a dificuldade de Física e sim a integração deles no ambiente novo, esse

lugar novo e uma das coisas que eu percebi no início do programa que eu acho que a

professora Maju estava atenta a isso, né. Mas poucas pessoas achavam, a luta era cotas

ou não cotas, contra ou a favor. E eu lembro que durante esse processo de discussão

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teve vários movimentos que trouxeram a voz deles então eu lembro de uma coisa assim

que era curiosa pra mim, existia uns movimentos, movimento negro que era contra as

cotas, e eu achava curioso isso porque para mim era evidente a segregação que tinha.

Essa palavra pode ser forte, mas, para mim, ela estava evidente que assim você tem um

percentual da população negra ou índio e essa população não reflete em todos os locais

porque a princípio das oportunidades não são criadas mesmo, não só oportunidades, a

oportunidade para poder concluir aquilo que você está se colocando e como isso não

acontecia estava claro que dentro da universidade, então as cotas é o primeiro ponto.

Agora, as cotas em si, e é essa opinião que eu tenho hoje, na época não resolvia.

As pessoas que estavam engajadas tinham consciência, a gente dizia isso, só que a luta

ficou muito no plano de conseguir aprovar as cotas dentro da universidade.

Tinha outras discussões, para nós sempre foi claro que isso não ia dar conta, mas

assim como as pessoas não se convenciam disso e, na minha opinião, a discussão ela é

uma discussão na minha opinião sobre a qualidade de ensino e uma discussão

totalmente irreal. Assim, porque mudar a qualidade de ensino é algo que você não muda

só investindo, a qualidade do professor é importante, a formação do professor. Mas

assim esse não é a item, você pode colocar mais um, por exemplo, a valorização do

professor, ganhar mais, infraestrutura da escola outro item. Mas se você começar a olhar

para outras coisas que permeiam a escola e a vida do aluno enquanto ele está na escola

aí vai começar a enumerar uma série de itens e a gente descobre que o assunto é mais

complexo do que você oferecer bolsa escola, que é importante em minha opinião, e

outros itens que você vai oferecendo para os alunos, mas que isso sozinho não resolve.

Então, por exemplo, têm pessoas que eu visitei, um caso no nordeste, na região

do Cariri, que assim, ali naquela região não tinha universidade, hoje tem, tem a

Universidade do Cariri, as pessoas que conseguiram bolsa e passaram dez anos, tiveram

dez anos de bolsa nunca tiveram acesso à universidade. Então, dos oito aos dezoito

anos, uma parte dessa população entrou na universidade, agora lá no Cariri o recorte é

praticamente esse, a sobrevivência então independentemente de cor ou não eu acho que

tem esse recorte mais detalhado, se a pessoa é negra, mas eu não tenho informação, mas

a situação que eu presenciei foi essa de que quando o sujeito recebeu aquela bolsa, a

família recebeu a obrigação da escola uma parcela daquele pessoal entrou na

universidade. Só que eles não teriam condições de ir para uma Fortaleza, por exemplo,

eu estou dando este exemplo porque eu conheço.

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No Mato Grosso do Sul, pra falar das cotas daqui, a gente tem alguns dados, mas

esses dados que inclusive da professora Maju e da professora Bia Landa sobre a evasão

que é um problema. Não vou dizer que está muito cedo para a gente avaliar, eu acho que

já tem dados suficientes para poder avaliar. Mas vou fazer, que não é bem uma crítica, a

gente tem um programa que chama Vale Universidade da Parte Indígena (PVPI) que o

Estado tem, que é um programa interessante, só que é um programa que pensa do ponto

de vista quase que exclusivamente do mérito. O aluno com três, eu assinei semana

passada aqui um documento três reprovações, um aluno é retirado do programa. Então

ele ganha um valor, um transporte e é retirado. Esses programas, assim como as cotas,

existem críticas muito fortes porque eles não conseguem reverter esses problemas. Eu

acho que aí os problemas não se revolvem só com isso mas sem isso eu acho que

haveria um recuo para o irreal.

Como você vai mudar a educação brasileira? Eu acho que a educação brasileira

na educação básica, você investe quando você tem um projeto para cinquenta anos, para

vinte, trinta anos, três décadas. Quando você tem um investimento forte. Daí eu acho

que uma coisa que eu acho que é bom seria pensarmos como brasileiro, né, e é o

pensamento que eu tenho aqui dentro da universidade como Pró-Reitor que eu posso

falar depois. Na universidade nós temos uma parcela de gente, gente que pensa e pensa

em um plano muito bem imediato.

As pessoas, então você vai construir uma política, a avaliação que eu tenho é que

uma política você não cria ela para dar resultado em um ou dois anos, porque os

fenômenos que vão acontecer de ordem social assim, que levam uma geração para

perceber. Acho que necessita de uma observação, um acompanhamento pelo menos,

uma década ou duas décadas. Por exemplo, os programas: o Bolsa Família e o Bolsa

Escola, todos esses programas se a gente olha os dados que o Ministério do

Desenvolvimento Social tem, eles têm dados lá que mostram claramente que, quando

você e essa que é a questão, quando você transfere uma renda para as pessoas talvez não

necessariamente em alguns lugares do estado de São Paulo, mas quando você vê em

regiões carentes quando você transfere uma renda para o sujeito com o compromisso

dele estudar e melhorar os conhecimentos dele e isso acaba refletindo na melhoria das

condições da vida dele, né.

No Brasil é curioso como a gente tem não como plano de fundo, mas quase uma

regra, como a gente tem um tensionamento dos programas políticos partidários, porque

cada vez mais a impressão que eu tenho que com o governo de esquerda, o projeto

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nacional de um governo de esquerda ele se firmou e está há mais de uma década quando

você tem um programa de curto prazo da minha opinião de dez anos, né, mas esse

programa já deu tempo de se consolidar.

Existe um discurso de que os governos de esquerda vão usar de uma política

populista que eles vão usar para poder se firmar, mas, assim, esses programas na

verdade e é a pergunta que eu sempre faço é que se essas pessoas elas se colocaram em

condições melhores na vida dela? Não na minha vida ou sua, porque eu costumo dizer,

nós professores de universidades, por mais que a gente possa ter tido uma carreira difícil

para poder chegar aqui, existem segmentos na população que são muito mais

complicados. O governo de esquerda já teve um tempo assim para poder firmar essa

política na minha opinião.

Não é uma questão de só um projeto só para se manter. Essa é uma leitura que a

direita faz, mas não é só um projeto para de manter é no poder mas é um projeto que se

ele tem resultado, porque se fosse um projeto de direita e tivesse resultado esse projeto

acaba de mantendo. Mas a questão é que ele só se mantém porque ele consegue

mobilizar uma parcela da população para poder ter mais renda. Mas que parcela da

população tem mais renda? Olha, as Ações Afirmativas é justamente quem está na

parte marginalizada justamente com as minorias uma grande parcela que forma a massa

que forma as minorias. Então quando esses programas e Ações Afirmativas conseguem

trazer essas pessoas elas são os porta-vozes e, assim, é isso que as vezes é difícil em um

pais onde a classe média ela cresceu menos do que essa massa, ela teve menos, e se nós

pudéssemos comparar com a classe média acessou bens, claro que o que a gente acessa

mesmo com a classe menos alto ou baixa, ela acessou proporcionalmente menos coisa

que transformou a vida deles do que a classe mais baixa, então a transformação é muito

grande coisas assim.

Eu lembro que eu fui professor do ensino fundamental no Paraná e uma das

coisas que mais me espantava era crianças da periferia que nunca que não sabiam como

era o centro da cidade, que não sabiam o que era um shopping center. Como as crianças

das escolas de periferia têm um certo anseio de entrar no shopping center e até acham

que há lugares proibidos de entrar para ela. Aquela loja ali eu fico acanhado de entrar

então esse tipo de sentimento que parece até uma coisa tola na leitura de outras pessoas,

da classe média que eu vou a hora que eu quiser, entro aonde eu quiser. As pessoas

usam uma linguagem comum, olha o sujeito vai “goiabar” em uma loja, né, essa coisa

simples e até bobinha, para uma parcela da população isso não é possível porque o

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sujeito internamente tem uma barreira, como se aquilo não fosse feito para você. Então

eu acho assim, as políticas afirmativas fizeram com que, e aí aonde que está o grande

apoio do governo de esquerda, que é muito difícil para a classe média entender qual é,

por que que essas pessoas permanecem ainda olhando e entendendo que por mais que a

gente, eu fico vendo, acompanho nas redes sociais, né, então assim eu mapeei, porque a

gente faz isso aqui na PROEC, olha os estudantes, o que as pessoas estão publicando e a

gente vê assim que quem reclama das políticas, porque tem lugares aonde as pessoas

falam: tem que acabar esse negócio de dar bolsa para essa povo, então essas pessoas

foram as que menos acessaram com essas políticas. No entanto ele percebe que teve

uma parcela da população, por exemplo, o programa de geladeira que o governo faz

isso, talvez para quem pode pagar e se programar ou tem mecanismos internos que

aprendeu a poupar, isso pode parecer besteira, mas essas coisas a gente tem que

aprender, culturalmente tem que aprender. Então se a gente não aprendeu a poupar, se

eu não sei, mas não porque eu não sei poupar talvez porque eu não tenha condições de

poupar nada, o que eu ganho é o mínimo para me manter vivo.

Então essa percepção que tem uma classe que na minha visão não percebe isso

com facilidade e infelizmente eu acho que dentro da universidade é uma parcela das

pessoas que não percebem isso, é justamente uma parcela que eu já fiz parte desse

grupo, né, justamente a parte que olha para a educação de uma maneira utópica de que

você tem que, utópico eu estou dizendo assim, não estou negando que investir na

educação básica é o que realmente precisa ser feito. Agora a questão é que dentro da

massa das minorias tem pequenas correções que podem ser feitas, eu lembro que na

época uma das preocupações que algumas pessoas tinham era que assim: o preconceito

no Brasil não existe e nós vamos inflamar as pessoas a perceberem isso, nós vamos

provocar isso. E isso era muito estranho porque as pessoas, essas pessoas que estavam

dizendo isso, elas nunca sofreram isso de verdade. E assim, olha, eu, por exemplo, tenho

um caso como professor da universidade, fui apresentar um trabalho em Joinville, eu

nunca tinha ido lá e fui apresentar um trabalho em um congresso de materiais fiquei em

um hotel onde, no hotel, lá o sujeito eu vi uma cena que não era comigo mas parecia ser

comigo né,depois o gerente, o rapaz foi falar comigo: “o senhor me desculpa, depois o

gerente vai falar com o senhor, talvez a gente compense isso que aconteceu e o rapaz do

lado falava; esse hotel caiu de nível, está aceitando qualquer um e eu não sei o que, esse

povinho que trabalha na cozinha”. E eu achei estranho, eu não sabia do que ele estava

falando, mas quando eu percebi que no lugar todo mundo era branquinho, só eu que era

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diferente, falei que não era possível, eu não podia acreditar nisso. Então foi a primeira

vez que um caso desse aconteceu assim comigo e eu fiquei estarrecido, a minha reação

ela foi de surpresa porque eu não conseguia entender a reação dele, né, e depois até falei

para o povo do hotel: “olha eu não quero isso não, eu tenho os dias para eu ficar só vim

a trabalho”.

Mas assim, quando a pessoa sofre isso, eu fico imaginando alguém que passou a

vida inteira sofrendo com isso, né, então assim para essas pessoas eu não sei se dá para

esperar tanto, então tem uma parcela. Então a gente precisa ter programas de imediato,

de médio prazo e de longo prazo. Eu acho que naquele momento na UEMS, eu acho que

o interessante não foi mais um problema porque eu via muito isso aqui na UEMS na

época, o pessoal falava: Edmilson não entra nessa porque na UEMS é assim passa

bonde e todo mundo quer entrar e depois não sabe aonde vai dar. Então eu falei assim,

isso realmente me parece uma coisa que mais que justificada e eu sempre usava esse

exemplo que eu falei para você.

Olha eu passei por uma situação assim e eu fiquei imaginando como seria se

uma pessoa tivesse que passar uma vida toda, uma juventude toda, alguém colocando

apelido, por exemplo, eu tive um apelido na universidade, e eu estudei em uma

universidade paranaense, né, e assim eu morava com o pessoal todo branquinho, né, e

meu apelido era, eu nunca me identifiquei como negro, né, por exemplo, meu avô nunca

teve esse tipo de problema esse negócio de aí, eu tenho primos negrinhos e primos

loirinhos nunca teve isso a gente cresceu junto e não era uma coisa que era importante

para nós. No Paraná meu apelido era bola oito, eu não entendia, eu ficava: gente por que

bola oito? Porque eu não jogava bilhar. Até o dia que eu descobri que a bola oito era a

preta do jogo. Que coisa.

Então assim, essas coisas que parecem piadas elas são extremamente agressivas

e o fato da gente olhar para elas e entender que elas não são hoje é isso que me

preocupa. Quando a gente olha para uma situação e entende que não tem nenhum

problema.

Eu tive um colega de trabalho aqui na UEMS que teve problemas, um professor

da área de Física que ele inclusive teve um processo em uns anos atrás por conta disso

na universidade e como era difícil e eu fiquei como um mau na história porque eu fui

uma das pessoas que disse que aquela piada era preconceito mesmo. Eu falei

assim:“aquele sujeito que se sentiu ofendido ele está olhando para isso e ele está

fazendo uma releitura da uma vida toda de pessoas dizendo que existia uma diferença

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entre eu e você pelo fato de você ter a pele de um jeito e a minha de outro”. E essas

coisas se davam no campo da competência mesmo, a diferença que a gente tem em

termos de competência está relacionada a isso. Essas coisas que pareciam veladas eu

acho que foi o grande ganho que a gente teve e, quando eu olhava para o movimento,

por exemplo, as opiniões dos movimentos negros que eram contrários, né, eu olhava

eles, o discurso relacionado com mérito, e esse discurso do mérito eu achava que era

bastante complicado porque a universidade de qualquer forma ela é uma construção de

competência de mérito, é pra isso. Mas não era isso que a gente estava discutindo, não é

isso, a questão é que você criou uma impossibilidade de alcançar o mérito. Por exemplo,

hoje, vou tentar trazer para hoje, hoje mesmo com cotas eu ainda acho que os programas

que a nossa universidade tem nesse momento agora eles ainda estão muito aquém a dar

acesso ao sujeito para alcançar esse mérito. Então hoje a gente tem muitos alunos

perdendo bolsa no Vale Universidade Indígena do Estado, por quê? Porque tem três

reprovações e ele é convidado a se retirar.

Agora, se a gente olhar para a história e quando eu olho para a história de

formação do sujeito e não somente a formação dentro da escola, mas a formação dele,

como ele lê o mundo, quais os elementos que permitiram com que ele olhasse para o

mundo e percebesse o mundo que vai me fazer assim, entrar dentro dessa universidade,

firmar um compromisso com as disciplinas com a dinâmica da escola onde ele fala: olha

eu vou, vale a pena eu gastar cinco, seis horas estudando essas coisas nesses cadernos

ouvindo aquele pessoa que está falando na frente para que de alguma forma segundo

eles como eu estou aprendendo, mudar a minha vida que é tão diferente desse povo.

Então o sujeito entra aqui e alguém começa a dizer, por exemplo, um sujeito que

faz Direito: eu vou trabalhar no Ministério Público, eu vou trabalhar. Esses alunos, os

não índios, por exemplo, estão dentro da cidade, eles têm uns códigos, eles aprenderam

a viver dentro de um lugar onde os valores são muito diferentes daqueles meninos.

Na Física uma vez um colega falou que eu estava insinuando que ele teria que

criar uma Física para o índio, uma Física pro negro e eu falei: não, não é isso. A Física,

a ciência, é a mesma, nós vamos ensinar a mesma coisa, mas, acontece que aquilo que

permiti o estudante enxergar.

Porque é o seguinte, as pessoas podem não concordar, mas, o mesmo fenômeno

pode ser interpretado de maneiras diferentes dependendo de quais são os códigos, até os

linguísticos, para aqueles de gostam dessa parte de linguística. Então esses códigos, para

quem domina esses códigos linguísticos e de jeito culturais, eles vão olhar, por exemplo,

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o garoto mesmo Ícaro Junior, um aluno indígena que eu tive, ele tinha dificuldade de

chegar até a universidade e ficar durante o dia aqui.

A universidade fica a doze ou dez quilômetros da cidade e assim ninguém acha

estranho que não tenha chuveiro aqui, eu lembro que teve uma discussão para colocar

chuveiros aqui e as pessoas e eu ouvi eles falarem: o que esses alunos querem?

Chuveiro para quê? E, mais uma vez, esses discursos fazem sentido, quando eu venho

eu não preciso de chuveiro, pois, venho da minha casa de carro, faltando quinze minutos

para estar aqui,fico aqui, almoço aqui, ou, de repente, saio para almoçar aqui ou lá.

Eu tive alunos que, por exemplo, esse menino que acordava muito cedo, ele

precisava ir para CAções Afirmativas rapó, ele ia de bicicleta e lá pegava o ônibus que

ele não conhecia ninguém, as pessoas eram diferentes, provavelmente as pessoas o

colocam em uma posição diferente das dela, eu sou da cidade e você é de outro lugar. O

aluno indígena vinha e ficava o dia inteiro aqui, ele tinha que comer alguma coisa, esse

aluno indígena e outros muitas vezes nem comiam ou às vezes, e aí sumiam na hora do

almoço porque não queriam ser vistos não comendo nada né. E ficavam, não tinha

banho, e tinham que ficar até a noite porque o curso era a noite e pronto, tinha que

cumprir o horário do programa que pagava um dinheiro e as vezes as pessoas falam: a

bolsa é a melhor. Mas quatrocentos reais? Assim, se você olhar na verdade esse dinheiro

é para ele ajudar na casa dele, na sobrevivência.

E aí é aonde tem um problema com mérito. Porque aí algumas pessoas vão usar

assim, olha a bolsa é para esse aluno comprar um livro pra ele, para pagar uma viagem

de algum congresso, o evento que anualmente tem da UEMS que é obrigatório ir e ele já

tem que se programar. Então eles sempre estiveram distantes de entender e de visualizar

o que realmente, assim do que realmente as Ações Afirmativas querem dar conta. Então

elas no plano imediato, o projeto de cotas dentro da UEMS, ele vem dar conta deum

problema imediato que ele era assim, desnudar as pessoas de um problema que ele

estava visível. Porque as pessoas não enxergavam isso, o aluno ficava o dia todo, estava

fedendo na sala de aula porque ele pegava uma bolsa e tinha que sair quatro ou cinco

horas da manhã passar o dia todo, não comer, ficar suado, chegar meia noite na casa

dele, pegar uma bicicleta. É óbvio que esse menino não vai sobreviver por muito tempo,

aí até que um dia esse menino some e ele foi trabalhar com o tio dele de auxiliar de

pedreiro, porque ele trabalhar na cidade ele estará próxima da comunidade próximo de

casa, aquilo faz sentido para a vida dele.

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E a universidade? Não conseguiu dar conta. Porque o programa da política ela

não pode ser de uma maneira generalista que olha as pessoas e é difícil fazer isso, mas

ela não pode olhar a massa, o amorfo.

Então, tem um monte de gente ali e isso não pode acontecer, a política tem que

olhar o sujeito, cara a cara mesmo, então mesmo que você tenha trezentos ou duzentos

alunos, o programa na universidade, eu sei que isso na prática é extremamente difícil de

ser feito, mas é o que a gente tenta fazer hoje.

Então nossa assistência social hoje, a gente tenha conhecer por mais difícil que

seja caso a caso. Então a gente tem um prontuário onde as pessoas conhecem o trabalho

deles, o trabalho deles é muito bonito, muito aquém a gente sabe disso. Por exemplo, o

próprio PVUI eu não sei exatamente, eu sei que o nosso era 120 vagas, mas a gente

nunca consegue atingir. Até o final do ano passado a gente estava efetivamente com

quarenta ou cinquenta, mas então assim essas pessoas conhecem o caso lá de mundo

novo do fulano, as pessoas sabem quem é aluno que está lá e tem alguém que cuida

dele, por mais que isso parece aos olhos de algumas pessoas, não é questão de direita

não, quase como um paternalismo, como você vai criar um programa.

Eu acho que é isso mesmo, eu acho que essa coisa de personalizar o plano é esse

que eu chamo de imediato. O plano imediato é que se você não mostra a cara das

pessoas, o restante não cria consciência sobre a existência disso porque hoje na

universidade se você vai na formatura dos alunos indígenas e eu fui por duas

oportunidades a convite da professora B.L, uma coisa que é recorrente no discurso de

todos é a discriminação que eles sofrem pelos outros alunos de curso.

Então, os colegas de curso, não digo que eles têm obrigação de saber, mas a

universidade precisa de um programa e por isso que a gente tem o Rede de Saberes mas

eu acho que ainda está aquém, né, onde ele traz para o meio de todo mundo quais são os

caras, não como uma mentira de expor os caras.

Mas assim, olha, essas pessoas existem, esses casos existem e na verdade o

sucesso disso depende de uma consciência nossa daqueles que não estão ai e que de

certa forma a gente ajuda muito a potencializar a exclusão dessas pessoas quando eu me

recuso, por exemplo, a entender o problema dele mesmo que seja pontual.

Eu tenho um colega da minha classe que é assim, ou ele é índio ou ele é negro,

ou esse cara entrou pelas cotas, esse cara a nota de corte dele era menor e às vezes nem

isso, às vezes e aí eu queria só assim falar um pouco do problema que muitas pessoas

não querem enfrentar porque eu trabalho aqui, a gente precisa investigar a questão, a

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evasão, porque muitas vezes as pessoas, assim, é o que sinto ouvindo pessoas que são

especialistas. Às vezes o pessoal tem um certo temor dos dados da evasão porque,

assim, você investe em um programa e uma das coisas que se esperava é que ele

obtivesse sucesso com o maior número de alunos que permanecessem. E aí, eu sou da

área e a gente da Física tem mania de desconfiar dessas hipóteses que simplesmente

deveriam ser sim, só para atender a um critério convencionado. Então esse negócio de

que o sucesso só seria se todo mundo, mas seria, pode ter fenômenos aí dentro que eu

estou desconsiderando, então a evasão ela acontece com quem? Então quando eu crio

um programa aí eu vou pensar em um programa a curto prazo para desnudar, tirar do

invisível. Então quando a UEMS cria um projeto, ela luta pela questão das cotas, e você

pode ver que as outras universidades as coisas são mais recentes, mas quando a UEMS

coloca essa questão a universidade estão dizendo, olha essas pessoas aqui existem e, na

minha opinião, sem muita avaliação a resistência que se tem, elas não são

necessariamente, olha, a resposta é assim: olha vão tirar nossas vagas, vão fazer reserva.

Mas a leitura que eu tenho é outra, é que isso é uma resistência, olha não pode mostra

isso, isso é o tipo de coisa que tem que tirar as crianças da sala para falar, nós não

vivemos em um Brasil que tem preconceito então na verdade o imediato era fazer isso.

Desnudar, colocar as pessoas aí, como elas são. E, agora, o outro momento era

pensar em uma política de, assim, já com médio prazo que é essa em que eu não posso

cair no imediato, isso seria um superficial, falar assim: olha o dado da evasão confirma

o insucesso do programa.

Mas, por quê? Primeiro, você tem um programa que é para corrigir um

problema histórico, mas a gente está falando isso, mas não é só isso. Eu acho a gente

tem uma sociedade que a gente diz, olha, o sujeito que é negro, que é a minoria, então

todos têm que acessar as mesmas coisas que a sociedade produz, a mesma riqueza, os

mesmos bens, ter o acesso que eles na verdade não acessam e eu acho que no médio

prazo a questão é que a evasão ela não representa outros fenômenos que estão

acontecendo e esses fenômenos são, justamente, e eu vou dizer que a gente precisa olhar

com carinho. Não é porque eu tive na minha formação o desenvolvimento de

mecanismos internos que me permitiram visualizar o mundo e reagir ao mundo de uma

maneira que eu tenho que atende como um dado que foi assim com os outros.

Então, as pessoas podem não ter desenvolvido esses mecanismos que faz eu ver

o mundo e reagir como eu reajo. Então, quando eu tenho um programa que vai dizer

assim: Edmilson, você tem aqui uma chance, você entrou na universidade, talvez por

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outra maneira fosse um pouco mais difícil de você entrar, mas, você entrou. Então eu

vou me agarrar naquilo e eu vou fazer de tudo para que tenha sucesso. A questão é que

esses mecanismos internos eu não posso e é isso que não posso entender como um dado

em todos as pessoas então por exemplo naquele aluno que eu citei o menino. O que é

que fez eu desenvolver esses mecanismos internos que me faz olhar para essas

oportunidades da maneira que eu olho.

Então aquele garoto, olha eu entendo que a universidade de alguma forma é algo

que traz algum benefício a ele, mas a que custo? Então eu às vezes topo sair da minha

casa, ir morar em uma cidade a quinhentos quilômetros de distância porque eu, na

minha formação, eu fui entendendo que era algo natural e que eu fui sendo preparado,

olha tem um curso que tem que ficar longe da família que vai ter que passar algumas

dificuldades e isso eu fui preparado. Mas o menino anda cinquenta quilômetros, né,

como eu vi, “olha professor esse menino olha, eu viajei trezentos quilômetros, minha

família não está aí, não tenho bolsa, o cara tem uma bolsa e mora a cinquenta

quilômetros e desiste” né, não pode aceitar isso. Mas as formas de visão são diferentes,

as formas de você ver de ter as oportunidades são diferentes da dele. Então que tipo de

mecanismos junto com aquela comunidade os valores que ele tem, como, por exemplo,

porque é que pra ele é tão importante voltar para a comunidade dele, trabalhar naquela

função e desistir da universidade. É, não é possível que ele diga: olha, eu não quero ter

sucesso na vida, entendendo que universidade é uma forma de atingir um certo sucesso

na vida aquele menino não vai dizer eu quero abrir mão ou não quero sucesso, eu acho

muito difícil acontecer isso. Mas tem coisas que naquele modo de vida que eu encontro

ali que me diz olha eu prefiro abrir mão disso.

Então eu acho que universidade não está se preocupando com esse tipo de coisa

que para alguns pode parecer um paternalismo, eu acho que não, aquilo que faz eu

culturalmente entender que a universidade me trata um certo sucesso dependendo da

minha formação eu posso enxergar isso.

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Entrevista 6 – OCC 1r

Dados de identificação

Nome (iniciais): F. E. T.

Idade: 50

Função: Docente já foi coordenador do Curso de Agronomia

Tempo na Função: 15 anos

Formação: Engenheiro agrônomo

Tempo de atuação na UEMS: 13 anos

Fui coordenador do Curso de Engenharia Agronômica da UEMS, dou aulas no

curso de agronomia e dava aula até o ano passado no curso de Zootecnia e Mestrado em

Agronomia. Estou na UEMS desde sua fundação, antes mesmo da sua fundação, do

tempo da CERA64 e SENAR65.

Ø Conte-me como foi a implementação das políticas de Ações Afirmativas na

UEMS?

Em 2003, foi instituída na UEMS a política de cotas. Houve a discussão após a

promulgação da lei e que estaríamos recebendo estes alunos, não houve esta discussão

sobre o que a gente achava, isto foi imposto pra nós. Houve a discussão no COUNI, eu

fazia parte do COUNI, pois era coordenador da Agronomia, lá sim a gente discutia na

sede em Dourados e trazia a discussão pra cá. Mas com os professores não houve

nenhuma discussão para o preparo.

O clima nas reuniões do COUNI era um pouco de tensão, algumas pessoas eram

contra e outras a favor. Os contra não era no sentido de ser contra, mas se centravam na

preocupação como isso iria acontecer. Outros defendiam veemente a cota. Enfim.

64 Centro de Educação Rural de Aquidauana. 65 Serviço Nacional de Aprendizagem Rural

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Mas como a UEMS já tinha aceitado, e todas as pessoas tiveram que aceitar,

mesmo contra ou favor. Todo mundo teve que se ajeitar, mesmo contra ou a favor. Teve

que aceitar.

O grupo a favor defendia a inclusão, os contras diziam que estariam retirando

vagas regulares que seriam distribuídas para todas as pessoas e que o critério raça ou cor

estaria definindo a capacidade do indivíduo para ingressar no curso. Outros defendiam

veementemente esta condição. Não contra as cotas, uns falavam que não era justo.

Havia muita preocupação. Foi uma coisa rápida e foi só naquele momento esta

discussão, depois já passou.

Aqui no campus também foi do mesmo jeito, tinha mais gente simplesmente

aceitando a situação e menos gente contra. Havia muita discussão, era uma discussão

sadia. É importante se discutir sim. A discussão foi bastante sadia e eu acho que é bom,

porque estamos numa universidade, para trocar ideias. Foi uma discussão sadia, porque

é importante. Até hoje ainda existem conversas que surgem de vez em quando, não é ao

nível de confrontação, e sim a nível de expor sentimentos, muitas vezes.

A gente tem tido, não no caso dos negros, principalmente entre indígenas muitas

dificuldades. Pois os alunos indígenas têm muitas dificuldades, eles chegam à

universidade com um nível de escolaridade muito baixo.

Você pega já de cara as disciplinas básicas, na Agronomia eles são muito fortes,

tem carga horária muito alta, elas que são pré-requisito para as demais das engenharias,

eles têm muitas dificuldades, eles reprovam e este é um ponto de muito desistência e de

muita evasão. Passa o primeiro, passa o segundo e passa para o terceiro. Porque eles vão

carregando as disciplinas, eles estão no terceiro ano e carregando disciplinas do

segundo, do primeiro e aí eles desistem. É isto que está acontecendo.

As dificuldades que eu vejo deles é isso, não é nenhum pouco relacionamento,

nada disso e sim destas dificuldades. Mais ao nível de conhecimentos destas disciplinas

que eles precisam para chegar até o final do curso.

Eu vejo que o problema é mais sério, é o que dá para enxergar é que a escola do

ensino fundamental e médio deles é muito fraca. A carga que eles trazem é pouca.

A gente vê professores de Matemática, de Física e de Química dizendo que eles

não conseguem desenvolver coisas muito simples, e isso eles, coitados, não fazer, por

exemplo, as contas básicas, não conseguem.

O que vamos fazer? Talvez um semestre, um nivelamento paralelo, um curso

paralelo ao primeiro semestre. Não só pra eles, também tem outros alunos chegando

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com estas dificuldades. Pode ser que entre todos, entre eles isto é nítido. Pois, entre eles

a maioria tem dificuldades, talvez todos. É o que a gente percebe.

No curso não há discussões sistemáticas para discutirmos isso, está se passando

ano e ano e não houve e não há nada discutido sobre isso. Nunca houve uma discussão

do que fazer, por exemplo, do que eu me lembro a gente nunca teve uma discussão para

discutir isso.

Não sei se o nivelamento daria conta destas dificuldades. É tão profunda a coisa.

Pois foi um tempo muito grande perdido, não perdido, mas mal aproveitado. Como nós

vamos voltar lá e trazer esses conceitos. Eles têm dificuldades com operações simples.

Eu trabalho com zootecnia, fitotecnia e pastagens e é uma coisa mais palpável. É

uma coisa mais palpável, a gente mexe com a planta. Mesmo assim, alguns não

conseguem escrever, não conseguem passar para o papel. Tenho vários alunos que não

conseguem escrever, não são todos...alguns vão pra frente, outros ficam pra trás.

Ø Como avalia a implementação destas políticas?

Eu, quando começaram as discussões, eu não tinha certeza se eu era a favor ou

contra, a gente tem um sentimento crítico frio, que percebe assim: este negócio corre o

risco de não dar certo. Ao mesmo tempo, tem um sentimento, uma percepção que

também é justo e seria uma oportunidade que estaria sendo dado a este grupo de

pessoas.

Passados dez, onze, passado este tempo, todos estes anos acho que os resultados

são excelentes, embora os resultados não sejam tão expressivos quanto se esperava, a

gente tem estas decepções que são a evasão e a reprovação, que é alta.

Eu vejo assim: se a gente tem a oportunidade de fazer um curso superior, estou

falando especificamente a Zootecnia e a Agronomia, se não fosse as cotas eles não

teriam como chegar na universidade. Já está cumprindo seu papel. Mesmo que não

tenha atingido as nossas expectativas em termos de quantidade. Acho que já se cumpriu

seu papel. Estes poucos que estão conseguindo se formar, transformar a vida dele e

também retornar a sua comunidade, eu acho que está excelente, já é válido. A bolsa é

válida, elas devem ser dadas, eles utilizem isso para se manter na universidade e se

manter na cidade.

Em Aquidauana tem o lar dos estudantes indígenas, ficam no centro da cidade,

com acesso fácil ao ônibus. Também é válido e necessário. O que facilita, pois senão

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não teria como eles se manterem na universidade. Necessário, senão eles não teriam

como se manter aqui.

Eu acredito que ele deve ser um projeto finito, ele não pode ser perpetuado, pois

se acredita que melhorando o ensino básico, fundamental e médio, que é um problema

não só deles, mas do Brasil inteiro, não precisa mais de cotas, pois eles terão condições

de igualdade para ingressar na universidade. Vejo que é um projeto importante, mas por

um tempo limitado. Não que eu seja contra a cota, mas que eles tenham condições de

igualdade de ingressar na universidade.

Por isso é necessário que se melhore o ensino básico, fundamental e médio,

porque é aí que está o problema. É um projeto importante, mas com um tempo limitado.

Ø Recursos financeiros?

Qualquer discussão sobre bolsas de uma forma geral, não existe nenhuma

discussão negativa em relação a bolsas para indígenas, pelo contrário, todos acham que

deve aumentar o número de bolsas para indígenas. E que ela é função do Estado, uma

universidade estadual, pública, deve favorecer a permanência dos estudantes na

universidade. É obrigação do Estado.

O Rede de Saberes funcionou por alguém tempo aqui na unidade deAquidauana,

mas agora parou e eu não sei nada sobre ele hoje, funcionou no tempo da professora

Beatriz Landa, não sei muita coisa sobre o Rede pois estava afastado para o doutorado

no período que estava funcionando.

Eu sempre penso nisso, a gente faz muitas coisas, eu acho que se tivesse um

curso paralelo desde a entrada deles aqui na universidade, um reforço ao longo dos anos

da universidade, isto seria muito bom para atender as necessidades destes alunos.

Estava falando com a minha esposa, que é professora de Matemática, Física. Ela

está para se aposentar, se ela ministrasse cursos voluntários, se reuníssemosdez, quinze,

e conseguíssemos ensinar alguns, salvar um ou dois, já seria muito bom. É a forma de se

ensinar Matemática.

O professor aqui não tem tempo pra isso, pra voltar para os conteúdos básicos,

porque tem que cumprir a carga horária e seus conteúdos, que é pesada e extensa. Ele

não pode parar, eu vejo assim, precisa muito disso aqui. É o ponto de estrangulamento

hoje.

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Estou orientando no mestrado uma aluna indígena, ela tem muitas dificuldades

na escrita e estamos tentando trabalhar com ela, para superar isso. Mas é um desafio

constante.

Por exemplo, ela tem disciplina estatística avançada, testes estatísticos, e o

professor já veio falar comigo: a.... está com muita dificuldade. Mas eu disse pra ele que

ela tá indo atrás, procurando, ela vai fazer e vai conseguir, mas será com muita

dificuldade. Porque não teve aquela base lá no início. Acho isto uma dificuldade.

Mas isto não é só com indígenas, minha mulher, como eu disse, é professora de

Matemática, e está dando aulas na periferia aqui do município e ela diz que tem

enfrentado coisas absurdas, ninguém sabe operações básicas de matemática, são os

analfabetos funcionais. E ela dá aulas numa escola particular e a diferença é muito

grande. Acho e acredito que na escola nas aldeias está muito pior. São lacunas que a

universidade não deu conta de resolver. Agora, não sei o porquê disso, já que todos os

professores estão trabalhando. O que fazer?

Eu acho que imediatamente o que se pensa é fazer um paralelo com os alunos

desde o primeiro para se tentar trabalhar estas questões!

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Entrevista 7 – OCC 2

Dados de identificação:

Nome (iniciais): N.H.R

Idade: 48

Função: Gerente da Unidade de Aquidauana

Tempo na Função: desde 2012

Formação: Graduado Agronomia

Tempo de atuação na UEMS: 13 anos

Estou na UEMS desde que não existia a UEMS. Desde a Fundação CERA.O

CERAexistiu até outubro de janeiro de 2000. A Fundação CERA começou em 1974 e

existiu até outubro de 2004. A UEMS inicia suas atividades aqui em 1994.

Em 2000, com a reforma administrativa do Estado, a Fundação CERAfoi extinta

e a UEMS incorporou-se com o CERA. De 1998 a 2000, foi a mudança. No início havia

dois prédios e duas instituições.

Extinguiu-se a fundação CERA e toda a estrutura foi incorporada para a UEMS.

A estrutura e os funcionários foram passados para a UEMS.

Enquanto professor coordenador e gerente durante todos estes anos como foi

recebida a política de Ações Afirmativas pelos diversos segmentos da universidade:

professores, coordenadores, administrativos?

Em relação às cotas, antes da Lei das Cotas não havia alunos indígenas, eu não

me recordo de ver índios na UEMS, a não ser alguns no CERA no curso técnico. Os

alunos indígenas vieram com as cotas.

Foi recebida com muito receio e um certo preconceito, a cota foi discutida e

muitas pessoas foram contra, a cota não foi discutida amplamente. Pode ser que alguns

grupos aí fora, grupos temáticos podem ter discutido, mas conosco não teve uma

discussão muito grande sobre isso. Nós recebemos a cota e tivemos uma grande

dificuldade, porque a gente não sabia como tratar essa situação. Primeiro porque que

vieram pessoas de outra cultura e de outra língua. Embora eles falem o português – mas

falar é uma coisa e entender a língua é outra, mas compreender no sentido amplo –

conseguir contextualizar num sentido mais amplo. Muitas vezes os alunos tinham e têm

estas dificuldades.

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Muitas vezes eles ficavam isolados, em grupo e ficavam isolados...

Os professores diziam que eles não estudavam, eram preguiçosos, ficavam

isolados e não se integravam. Porque também não foi feito um trabalho para se receber

as pessoas, simplesmente disseram: “teremos cotas”, e que a gente precisava fazer para

trabalhar com estes grupos. Era necessário um trabalho.

A cota de negros é diferente. Eles estavam à margem da universidade mas, o

negro está inserido nas escolas pública, estudavam juntos.

O indígena é diferente, estudava na aldeia, falam outra língua. Então havia uma

distância cultural muito grande. Tinham dificuldades imensas. Dificuldade, por

exemplo, de ir aos banheiros, porque não tinham costume de ir ao banheiro. Muitos não

entendiam o que você falava. São mais tímidos assim.

Mesmo depois de 10 anos ainda alguns professores continuam com o mesmo

discurso. As pessoas ainda não assimilam tanto assim, dizem que os indígenas não

passam, são fraquinhos, embora hoje vejo que o número de alunos nos cursos aqui

diminuiu, nós já tivemos muitos alunos e hoje já são menos... reduzindo a procura pelos

cursos aqui pelos alunos indígenas.

Os alunos indígenas procuram mais o curso de Agronomia, a Zootecnia é pouco

procurada. Não sei se tem algum aluno indígena que se formou na Zootecnia. Não me

recordo.

Da Agronomia formaram os primeiros alunos indígenas, já formamos alguns,

não tenho certeza de quantos. Mas lembro que formamos vários.

Na Engenharia Florestal tivemos uma experiência diferente, vários alunos

entraram e muitos desistiram. Porque a maioria eram meninas e eram casadas, tinham

filhos e moravam na aldeia, e isso levou a eles a desistirem no primeiro ano, não porque

tinham notas ruins, mas sim por estes motivos. E formaram três alunos, eram alunos

bons, liderança da nossa1ª turma da florestal e muito respeitado entre os alunos, hoje

está trabalhando numa grande empresa e está muito bem. Como vimos... para este grupo

foi bom e valeu a pena. Acho que já é valido, tirou da aldeia, veio pra universidade, se

destacou no curso, foi bolsista do Vale Universidade, que é a bolsa mais chata da pessoa

manter, mais difícil, pois não pode ter reprovação. Pode ter somente duas reprovações,

uma terceira já perde. Não há justificativa e não tem nada. Eles trabalharam sem

reprovação. Sempre com destaque e sempre com notas boas.

Mas tem que ter um trabalho a ser feito e tem que fazer. E aí que faltou um

trabalho, um treinamento com os professores, ou seja, o que fazer com estes alunos.

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Precisamos integrar estes alunos. Principalmente com os professores, pois nós fizemos

assim, trabalhando com erro e acerto...primeiro entender como são e quem são estas

pessoas, o que passa com eles, o que eles pensam.

Na Agronomia, em 2006 e 2007, onde recebemos um número maior de alunos

indígenas, tivemos uma experiência boa, e tivemos que separar os alunos. Eu dava aula

no primeiro ano, na aula de Botânica. Pois eles tinham muitas dificuldades, dificuldades

de entender, mas percebi que era porque eles tinham vergonha de perguntar. E este foi o

jeito que achei para resolver esta situação e que eles pudessem acompanhar a turma.

E às vezes eles ficavam retraídos, aí eu decidi fazer aulas práticas só pra eles,

fazia aulas com toda turma de manhã e fiz aulas práticas à tarde, era só pra eles, aí era

como se fosse outra turma. E foi muito bom, eles conversavam e tiravam duvidasse

tinha cinco alunos indígenas. A discussão se iniciou como os alunos trabalhavam os

nomes das plantas e na língua, o que eles enxergavam e isto foi interessante. E este foi o

jeito que encontrei pra resolver as dificuldades deles.

Ø Existem no cursoreuniões e discussões sistemáticas?

Nós não fizemos isso, a gente não fez um trabalho, foi colocado as cotas e

pronto, mas não foi trabalhado, não há uma orientação institucional pra se trabalhar com

isso. A gente fez aqui, conversava muito, uma vez veio aqui a Pró-Reitora a Beatriz,

mas foram conversas. Não havia/existia trabalho/ações institucionais que promovessem

discussões profundas de como trabalhar estas questões. Temos que trabalhar isto no

projeto pedagógico e formas de como trabalhar para receber estes alunos.

A gente trabalha de forma individual com os professores, em forma de conversa,

dizendo pra eles para trabalhar os grupos, tentar integrá-los com os demais, mesclando.

Não podemos tratar eles diferente, não vamos estratificar a sala. Fazer grupos.

Hoje os problemas são menores, antigamente eram grupos fechados, tinha as

castas, as lideranças, nos intervalos eles se isolavam. Isso foi se quebrando. Na florestal

isso se quebrou mais fácil, os próprios alunos foram trabalhando os outros que já

estavam aqui, quebrando isso.

O Rede de Saberes funcionou bem aqui, mas agora nem sei. Tinha aulas extras,

hoje que eu saiba não tem nada do Rede funcionando. Funcionava bem melhor. Acho

que hoje está tudo parado.

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A única coisa que trabalho com eles é a bolsa Vale Universidade Indígena, a

bolsa é do governo do Estado. Eles são muito criteriosos, não pode ter rasuras, não pode

ter reprovação, os horários devem ser certinhos.

Foram alguns anos, porque, por exemplo, não encaixava nos nossos cursos:

nosso curso tem 28 horas e a semana tem 40, como é que os alunos vão cumprir 20

horas? Então precisamos adequar horários. Ajustar, ajustar os sábados. Porque não pode

trabalhará noite. Conseguimos adequar, mas precisou alguns anos. E faço isso, porque

entendo, porque é uma forma de manter o aluno carente na universidade, pois eu fiz

universidade com muita dificuldade e por isso eu faço isso. Hoje tem 34 com vale e 9 no

Vale Universidade Indígena. Mas tem alguns alunos que acabam perdendo a bolsa. Por

exemplo, tem uma aluna que perdeu, que teve a terceira reprovação, e nós vamos fazer

um trabalho com ela. Para que ela possa concorrer novamente o ano que vem.

Eles pagam o ônibus, eles usam o recurso da bolsa para pagar o transporte. A

FUNAI também ajuda com algum recurso.

Em Aquidauana é mantida a casa do estudante indígena, uma casa onde eles

ficam, com vários quartos que eles ficam lá, um recurso da Prefeitura de Aquidauana,

somente para os universitários. No final do ano eles fizeram até uma festa de

confraternização. Eles se articulam para conseguir estas coisas.

Ø Tem conhecimento de incentivo financeiro/orçamento para esta temática?

Pouquíssima coisa foi feita na época da Beatriz, recurso para comprar

ferramentas. Recebiam bolsa PAE66para adquirir as ferramentas para que ele possa

desenvolver horas atividades da bolsa. Mas faz tempo.

Não existem ações continuas, que você vai fomentando, fomentando. Sempre

discutindo, as coisas vão acontecendo, e depois não tem recurso e para, não há

continuidade.

Em relação à unidade não há discussão para que se entre no nosso orçamento.

Nós entramos no sistema de cotas, estamos numa unidade, onde não temos esão

poucos professores com licenciaturas, ou seja da Zootecnia, da Agronomia, Veterinária.

Poucos passaram pelas licenciaturas. Discutir estas questões é bastante complicado.

66 Programa de Apoio estudantil.

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E se você falar: vamos discutir Filosofia e Sociologia? Ninguém quer! Vamos

discutir didática? Ninguém quer! Acham que o estágio docente que fez no doutorado

que já é suficiente. Mas outros acham que precisam.

Por exemplo, se chegar no final de ano e tiver 50 alunos reprovados, referem que

os alunos é que conseguem. Ou seja, não querem refletir. Alguns professores fazem

correlação com as cotas, dizendo que eles são fracos, que não conseguem acompanhar,

são preguiçosos. Mas isto também tem outros alunos que não são cotistas e também têm

dificuldades.

Ø Como você avalia as políticas de Ações Afirmativas na UEMS?

Primeiro a coisa que faltou e falta discussão como tratar esta questão, já que

temos esta questão das cotas como inclusão, porque tem gente que não aceita. Nós

precisamos estar melhor preparados. Isso foi uma falha muito grande porque as pessoas

não conseguiram entender. Não consegue enxergar de onde partiu.

Acho que o que pode ser implementado é ainda fazer uma discussão neste

sentido. Pois a cota vai continuar e é importante saber como receber estes alunos. Nós

temos alunos indígenas fazendo mestrado e doutorado. Você conseguiu despertar nas

comunidades e há interesse nas comunidades em vir para as universidades. A

universidade precisa discutir mais isso. As coisas não são tão lineares assim.

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Entrevista 8 – CC 3

Dados de identificação

Nome (iniciais): F. A. D.

Idade: 32

Função: – Coordenador do Curso de Ciências Sociais – Amambai / MS

Tempo na Função: 1 ano e meio

Formação: Ciências Sociais (graduação, mestrado e doutorado e Ciências

Sociais)

Tempo de atuação na UEMS: 2 anos e meio

As políticas aparecem no curso de Ciências Sociais como um avanço, essas

políticas reduziram não somente no tempo que eu estava aqui mas no tempo anterior dos

professores, elas reduziram o número de evasão e retenção do curso, são alunos que

podem dedicar maior tempo ao curso e ao mesmo tempo eles ficam mais próximo da

universidade uma vez que eles assumem responsabilidades nas iniciações científicas de

estágio tendo essa bolsa eles podem de dedicar a várias atividades.

Esse é um problema que a gente tem no curso e que ele se agrava bastante,

porque nós temos uma cobrança em relação à quantidade e nós somos obrigados a

responder essa cobrança.

O nosso perfil de alunos de Amambai é bem diferente dos que encontramos

aqui em Dourados, alunos que já tem uma estrutura familiar, estão casados, tem filhos,

estão inseridos de algum no mercado de trabalho e eles veem o curso pelo menos no

início como uma opção de transitar para a docência, apenas isso e chega um

determinado momento que eles desistem porque começam a perceber que a docência

não é para eles e isso gera uma evasão e baixa retenção dentro do curso.

Nós começamos paralelamente com o curso a criar mecanismos para diminuir

essa evasão e baixa retenção como, por exemplo, alimentar uma vontade de um

mestrado, então nós abrimos uma pós-graduação no incentivo de pensar numa

verticalização do curso e, agora, já estamos pensando em mestrado, pensamos em criar

uma mentalidade que seja para além da graduação numa formação continuada.

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O aluno tem um espaço maior quando ele consegue por meio do incentivo, com

maior disponibilidade de bolsa ele consegue já atuar na escola, né, já faz um ensaio

dentro da escola e isso motiva bastante na continuidade do estudo e também amadurece

alguns conceitos que ele viu na sala de aula e que depois ele leva pra escola fazendo um

movimento hermenêutico entre a escola e faculdade. Então nós temos essas estratégias

paralelas justo com as bolsas para evitar essa retenção de evasão.

A realidade indígena é algo inédito. Uma realidade acadêmica como São Paulo e

o próprio Paraná ou Santa Catarina. Então quando nós estamos falando de cota, falamos

de cotas para negros e, quando você chega a Mato Grosso do Sul, é algo diferente, se

fala das cotas para indígenas, e aí você tem um forte preconceito, um distanciamento,

pré-conceito é quando você não tem um conceito definido. Você tem a visão do

indígena como o bom selvagem, aquele que está lá na mata, fechado, isolado, então

você tem um preconceito com as cotas indígena por achar que ele está associado a uma

cultura da natureza e não a ummovimento da cultura ocidental, então tem um

distanciamento quanto a isso, quando você não tem essa aproximação do indígena como

em São Paulo e Santa Catarina.

Em relação às cotas para negros na universidade eu penso que hoje a uma

“coletivação”, uma militância muito grande que emana também de dentro da

universidade, ou seja, o movimento negro está muito próximo da universidade e ele

consegue fazer um trabalho de conscientização do que as cotas dentro de uma

perspectiva histórica cultural e política.

As cotas representam um mecanismo de equidade social em função de um

passado que nós tivemos no Brasil, marcado pela exclusão social. Eu acho que, em

relações às cotas em São Paulo, Paraná e Santa Catarina, já se tem uma politização de

modo a esclarecer essa compensação histórica, compensação eu acho que é um conceito

ruim, o melhor seria essa equidade.

Amambai é uma cidade bastante atravessada pelo ódio porque você está lidando

com propriedade privada, o grande conceito do mundo moderno é a propriedade privada

e quando a gente fala em demarcação de terras a gente traz o óbvio: o ódio. Então, antes

mesmo de ter uma percepção de cotas para indígenas dentro da universidade, eu sempre

tinha dentro da sociedade, da realidade de Amambai, um ódio de mão dupla, né, as

pessoas da cidade que assumem um discurso de agronegócio e os outros. Esse ódio vem

quando se fala da demarcação de terras, você tem duas mentalidades, forjadas,eu acho,

um processo de forjar essas duas mentalidades e o elemento central é a demarcação de

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terras, por um lado você tem a mentalidade indígena que gradativamente ela é forjada e

por outro lado uma mentalidade idealista do agronegócio que também é forjada, só que

há um poder de se forjar uma mentalidade por parte daqueles que têm a propriedade

privada.

Então, em diferentes momentos em Amambai, em audiências públicas na

Câmara, conversando com a população local, escutando o rádio você percebe que os

idealistas eles generalizam, eles como os que serão excluídos da sua vida social caso

percam as terras, eu falo todos e ele vai lá e pega o pequeno lavoureiro, o comerciante,

ele vai lá e pega o funcionário público, eles pega todos, engloba nessa mentalidade de

que todos teriam suas vidas estraçalhadas, o discurso do desastre social, é claro que ele

tem mais força social para fazer isso.

Agora, sem avaliar sem valorar esse discurso, apenas pensando na

consequências desse discurso, isso gera um ódio direcionado ao indígena, o indígena se

passa como aquele que não trabalha, não é dado ao trabalho e esse discurso está na

teoria social quando a temática é o indígena, logo o indígena não trabalha e quer destruir

a família, por outro lado você tem o indígena que está se revoltando com aquele que

odeia ele, então você tem um ambiente tenso, que não fica toda hora um discurso em

voga, mas o ambiente fica sempre tenso. E as cotas vão passar por esse ódio, porque a

sociedade vai começar a ver as cotas como algo absurdo por uma parcela significativa

da população porque são benefícios para os indígenas, não só as cotas, mas também as

políticas sociais voltadas para os indígenas.

Isso é curioso, que fica de um lado “entre linhas”, como algo não dito que o

comércio de Amambai é mantido pelos indígenas em função dessa transferência de

renda feita pelo Estado, o comércio local fica entre a ponte do abismo, ou você fica com

ódio do indígena ou contente que ele gasta ali. Mas eu acho que acaba sobressaindo esse

ódio que é constituído a partir da ideia branco.

Amambai a população de negros é pequena, o próprio IBGE mostra. Então eu

acho que as cotas para negros hoje eu penso que Amambai começa a discutir isso dentro

da universidade, hoje o movimento negro começa a se aproximar da realidade local e

isso começa a aparecer, por outro lado as cotas para indígenas estão bem presentes na

nossa agenda em Amambai, nós temos projetos de extensões, nós temos projetos de

pesquisa, nós temos não só na graduação como na pós-graduação, nós temos hoje 4

acadêmicos indígenas e temos professores que trabalham nas aldeias, então a UEMS se

aproxima por meio dessas ações, também por meio das semanas acadêmicas, nós temos

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espaços para debates onde aparece a questão das cotas. Nessa semana acadêmica do dia

20 de outubro uma noite será para juventude e educação nas aldeias, nós temos maior

proximidade com aldeia Amambai geograficamente e porque a maior parte dos alunos

vem dessa aldeia, mas eu acho que são várias as formas de aproximação que a UEMS

promove.

Nós temos um perfil de aluno cotista que tem mudado de uns anos pra cá, eu

lembro que, quando eu cheguei aqui, nós tínhamos alunos prestes a se formar que

tinham dificuldades principalmente na leitura e escrita. Nos cotistas indígenas essa

dificuldade há alguns anos atrás quando eu cheguei aqui ela aparecia com maior força,

eu acho que a gente está eliminando essa diferença porque não havia uma preparação

para o aluno indígena entrar na universidade, ele fazia uma passagem muito rápida.

Qual que era a dificuldade? É, eu lembro que o antropólogo Henrique de...,

quando foi, que ele era jesuíta, ele foi fazer duas lógicas de pensamentos, o indígena e o

ocidental que é quando ele vai ter que entrar, porque na universidade tem o pensamento

ocidental, os indígena vai chegar ali e ter que entra na Ciência Social, ficar analisando o

contratualismo político de como se formou o Estado na lógica de pensamento dele, a

princípio isso não faz sentido, essa formação burocrático legal como diz Weber, né,

daquele que é o Estado moderno e isso não pra ele não faz nenhum sentido. Então ele

tem que fazer essa passagem de uma lógica de pensamento para outra, como dizia Lima

Vaz, quando os jesuítas chegaram no Brasil começaram a ensinar o silogismo

aristotélico: todo homem é mortal, Sócrates é homem logo Sócrates é mortal,ok, todo

pajé é homem logo todo pajé é mortal? Não. Então essa lógica que pensamento do

indígena não é a mesma lógica do pensamento ocidental, que em grande parte das vezes

ele é forçado a entrar, então, qual era a maior dificuldade? Eram nestas duas lógicas

distintas que ele tinha que fazer a passagem, hoje eu acho que tem um processo de

inclusão ou de apresentação dessa lógica ocidental mais cedo pra ele.

Então quando ele chega na universidade, ele já sabe o que se passa aqui dentro,

tem a questão da língua, o português que ele vai ter que se adequar em textos que já são

difíceis em outra língua. Hoje eu acho que há um trabalho de transição para o aluno

indígena e a realidade é que existem já alunos indígenas melhores do que os não

indígenas, eu tenho alunos do primeiro aluno, três alunos indígenas que despontam na

turma. Então eu acho que há um trabalho.

Agora em relação aos não indígenas, nós temos uma grande dificuldade no nível

superior que não diz respeito a uma área somente, um lugar ou alguma universidade

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específica, temos um problema na ampliação em quantidade de alunos que chegam na

universidade e índices muitas vezes quantitativos no ensino fundamental e médio, então

nós temos em números uma realidade satisfatória mas em termos qualitativos não temos

uma avaliação eficaz. Eu falo para os meus colegas que nós fazemos no ensino superior

um trabalho que deveria ter sido feito lá no ensino médio, não deveria ter sido repassado

esse trabalho de alfabetização, nós temos muitos analfabetos funcionais que chegam na

universidade com dificuldades de ler e interpretar um texto. Nós temos, nas salas de

aula em Amambai, datashows que projetamos os textos na parede e aí você pede ao

aluno ler o texto e ele não consegue ler o texto e, se ele não consegue ler o texto, não

consegue interpretar o texto, ele não vai conseguir produzir um texto e isso é uma

situação de analfabetismo funcional que vai ter que ser corrigida na universidade porque

ele entrou na universidade. Porque há uma demanda por quantidade de demanda e a

quantidade não acompanha a qualidade.

Seriam vários caminhos, um deles é uma maior valorização do professor no

ensino médio. O professor passa por uma desvalorização muito grande, eu penso que às

vezes o governo paga um psicólogo para acompanhar professor, e não, o professor tem

que ter melhor qualidade de trabalho, maior salário, ele tem que se sentir valorizado na

profissão de ser professor.

Em Amambai eu percebo um fenômeno curioso. Ele deixa asala de aula para

prestar concurso para trabalhar na AGepen67, nós chegamos a um pontoem que seria

cômodo se não fosse trágico, chegamos em um ponto onde o professor prefere trabalhar

no presídio do que em sala de aula. Isso é um absurdo e isso é a desvalorização do

professor perante o Estado.

Nós precisaríamos ter um espaço maior na escola, onde o aluno ficaria mais

tempo na escola, educação integral seria uma saída, uma aproximação maior entre

universidade e escola, eu penso que hoje nós conseguimos isso com o Programa

Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência(PIBID), que tem uma participação

significativa dentro da escola. Mas eu penso que o primeiro passo seria a maior

valorização do profissional professor.

Ø Como você avalia as políticas de Ações Afirmativas na UEMS?

67 Agência Estadual de Administração do Sistema Penitenciário.

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Eu a avalio com uma crítica muito positiva porque você consegue apresentar de

maneira concreta uma equidade social. Nós falamos, nós vivemos em um país

democrático, o exercício da cidadania, mas a educação é a base para uma sociedade

melhor principalmente quando você já tem a democracia. Democracia é só um ponto de

partida onde você tem que colocar conteúdo nela e a democracia é um sistema que te dá

direitos e te dá voz mas tu não consegue entender os direitos que tem, apesar dessa voz

se tu não consegue receberessas informações e como diz Nietzsche: ruminar essas

informações. A democracia ela é apenas um vaso bonito na estante de casa, ela só vai

ser efetivada quando você tiver uma educação que proponha a crítica acerca dessas

informações, uma educação constante, uma educação permanente. Eu acho que as cotas

contribuem para que uma fatia significativa da sociedade comece a participar disso que

é a democracia, começa a entender quais são seus direitos e poder usufruir do espaço de

voz da arena política.

Tem um acadêmico do segundo ano de Ciências Sociais, indígena, nós temos

em Amambai um jornal que sai uma tiragem mensal que é caderno de Educação, nós

temos um espaço mensal desse jornal que é da UEMS e nós professores escrevemos

textos nesse caderno. Algum tempo nós chegamos à conclusão que seria legal abrir para

os alunos também esse espaço e agora a última tiragem desse caderno nós nos

deparamos com um texto dessa acadêmica indígena do segundo ano de Ciências

Sociais. E o texto dele coloca bem essa situação: como a educação pode contribuir para

o exercício dos direitos indígenas? Quais são os direitos dos indígenas? Como estar

dentro da universidade pode contribuir para o exercício da democracia? Então as cotas

eu penso que é mais que compensação, pagar uma dívida e sim você promover o

exercício da democracia, fato que nós temos hoje, fazer com que todos tenham acesso à

compreensão dos seus diretos e simultaneamente acesso à voz, ao espaço na arena

política.

Eu penso que nós temos na nossa sociedade atual uma grande luta por

reconhecimento. Uma luta por reconhecimento que é muito importante, mas eu penso

que nós temos um problema significativo, uma organização social neoliberal, temos

uma luta por reconhecimento em uma esfera cultural, mas nós precisamos abrir uma luta

por reconhecimento da esfera econômica também, você formar e você propor uma

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abertura para o mercado de trabalho, nós falamos de valores, de emancipação mas

temos que falar de um reconhecimento econômico.

O que hoje está vinculado às políticas sociais? As cotas? Falta você ampliar o

mercado de trabalho para a atuação desses profissionais que estão se formando, então

nesses casos específicos de cotas indígenas, falta a gente pensar em como esses

profissionais vão voltar para suas aldeias e ter condições de trabalho, condições ótimas

de trabalho ou, no caso deles, não quererem voltar para a aldeia, qual o mercado de

trabalho que eles podem atuar? Então falta pensar as políticas sociais de modo

integrado, nós pensamos nas políticas sociais muito separadas aqui no Brasil, nós

pensamos em políticas sociais para educação, uma para a saúde, uma para geração de

renda. Mas essas políticas não conversam entre elase uma vai para um caminho e outra

para outro e em longo prazo você não tem algo significativo emergindo dessas políticas

porque elas estão muito separadas umas das outras. Eu penso que as políticas sociais de

cotas deveriam dialogar com as demais políticas.

Eu penso que o próximo passo é a verticalização, acho que a graduação se

consolida com a verticalização, o mestrado. Nós temos que fazer o aluno pensar na

graduação como algo que não é o limite, há um além e sempre assim. Nós não podemos

pensar no modelo de educação onde eu estudo quatro anos e beleza e eu estudei pra

atuar a vida inteira ainda mais os cursos que tem licenciatura, nós estamos sempre

estudando e estudando, nos atualizando.

Eeu acho que nós podemos fazer pelo curso quando passa pela questão dos

investimentos e aí envolve a instituição onde nós sempre corremos atrás, mais

professores efetivos, manutenção da biblioteca, laboratórios, essas coisas tem mais a ver

com a instituição. Mas questões que tem a ver com o curso e de como nós pensamos o

próximo passo seria a verticalização. Consolidar, junto com a verticalização, centros de

pesquisas em Amambai. Amambai é uma realidade ótima para as ciências sociais, ótima

para ser observada pelas ciências sociais. Nós temos hoje recursos hídricos que então aí

na crista da onda, são os desafios ambientas e as ciências sociais é um curso

extremamente para pensar em recursos hídricos, nós temos lá, por exemplo, o rio

Amambai, nós não temos por exemplo um diagnóstico do rio Amambai: onde ele está

mais danificado, onde ele tem que ser recuperado, quais seriam as estratégias para tais

recuperações. Então um centro de pesquisa seria ideal para explorar os recursos

hídricos, as questões ambientais de Amambai e isso poderia estar vinculado a uma linha

de pesquisa de algum mestrado a própria temática indígena porque nós temos em

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Amambai, uma população que ultrapassa dez mil indígenas. O curso não tem números

de pesquisas para quantificar o número de indígenas.

Vamos voltar lá pro começo, primeiro UEMS Mato Grosso do Sul, aonde tem

singularidade desse Estado. Eu fiz um projeto de pesquisa quando eu cheguei aqui, eu

sempre fui muito encantado com a questão da modernidade, da modernização não me

considerado marxista, mas eu adoro aquela frase dele: a burguesia fez maravilhas que

nada tem a ver com as pirâmides do Egito. Então eu acho que a modernidade sempre me

fascinou e, quando eu cheguei aqui em Maro Grosso do Sul, a primeira coisa que eu

percebi que tinha uma modernidade diferente, uma modernização melhor dizendo

bastante diferente, você olha e tem mais cabeça de gado do que cabeça de pessoa, você

tem a partir do desmembramento da época de setenta, você tem um projeto que não é

muito claro de modernização, porque quando a gente pensa em modernização pelo

menos a partir da terceira revolução industrial você pensa em industrialização, vamos

industrializar esse negócio, mas você olha o ICMS68 do Estado, é um absurdo, as

estradas, você não tem um incentivo para que a modernização ocorra pela

industrialização mais você tem um incentivo para que a modernização ocorra pelo

agronegócio. Então Mato Grosso do Sul tem uma modernização muito singular e é claro

que a política sempre reflete os anseios da economia, a gente não pode achar que as

ideias são produzidas em um vazio atmosférico sem nenhuma relação com a economia,

não, a política ela é produzida a partir dos interesses econômicos. Então os interesses

econômicos associados ao agronegócio nem sempre são interesse econômicos daqui,

são de grupos que vem de fora.

E nessa singularidade do MS nós temos uma relação muito singular também

entre a política, a economia e a UEMS porque se entende que a UEMS é forte só

quando o curso atende ao agronegócio e quando na verdade não é isso, porque a UEMS

já nasce muito forte, a UEMS é a maior política social do Estado e isso é muita coisa,

ser a maior política e social do Estado já é muito coisa. A UEMS poderia hoje estar

apenas em Dourados e seria uma universidade muito grande se você juntasse todas suas

unidades, a estrutura se você pensar que cada polo tem seu auditório, você junta os

recursos que foram utilizados para fazer quatorze auditórios ou quinze, junta tudo e

você tem um auditório que uma universidade do país teria, mas qual o problema de você

fazer tudo junto? Porque daí ela não seria a maior política social de educação de Mato

Grosso do Sul, ela seria apenas uma outra universidade do país buscando ser um grande

68 Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços.

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centro de pesquisa, talvez no agronegócio, e não seria da população de Mato Grosso do

Sul sendo que essa é uma virtude da UEMS, de ser da população de Mato Grosso do Sul

e não tem como pensar diferente que a economia e política estão vinculados e a

economia decidida por grupos que não correspondem exatamente a população de Mato

Grosso do Sul, às vezes o interesse político não é a UEMS porque a UEMSrepresenta a

população de Mato Grosso do Sul e não aquilo que é a economia dos pequenos grupos.

Mas acho que medida que a gente começa, esse seria um diagnóstico, um prognóstico

seria em outra direção na medida em que a gente começa a formar um pensamento

crítico, uma ideia um tanto paradoxal de uma massa crítica no Mato Grosso do Sul, uma

vez que está espalhada em quinze unidades do Estado e essa é a força da UEMS, a gente

começa a formar essa massa crítica e ela começa a ver que essa massa tem direitos, e aí

começa a reivindicar mais ela UEMS.

No modo prático, o que vai acontecer nesse processo eleitoral nós começamos a

perceber que alguns candidatos começam a assumir a UEMS como causa porque a

imagem da UEMS pelo menos agora em quinze cidades está presente, então se eu quero

ser um candidatado a deputado estadual forte, eu posso assumir a UEMS como causa.

Então eu começo a pensar estrategicamente dentro dessa democracia competitiva,

começo a se pensar na UEMS como um elemento estratégico e talvez esse seja um

elemento positivo para a UEMS porque ai nós começamos a ampliar a UEMS para além

empenho dos funcionários, professores e o bem dos que são da casa. Porque esse

empenho é admirável também, nós temos professores que trabalham além das quarenta

horas no plano de atividades, e não são alguns professores, são a maioria que trabalha

além do proposto.

E o que é maravilhoso é que as vezes você vai em uma grande universidade e o

professor está ali sem entusiasmo de estar ali na universidade e isso é um fator muito

forte na UEMS, os professores e funcionários têm satisfação e entusiasmo de estar ali na

UEMS porque a veem como algo sendo construído ainda.

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Entrevista 9 – CC 4

Dados de identificação

Nome (iniciais): J.L.A.

Idade: 47

Função: Coordenador do curso de História da UEMS Amambai e Docente

Tempo na Função: março de 2014

Formação: História

Tempo de atuação na UEMS: 7 anos

Sou coordenador do curso de História desde março de 2014, portanto minha

atuação é muito recente.

A UEMS é pioneira nesta política, especialmente as cotas, na reserva de vagas

de escolas públicas, a cota racial para negros, adicionando a questão indígena.

No caso de Amambai é bastante significativo, pensando no contexto histórico e

social destas populações, porque praticamente um terço da população do município é

indígena. O município hoje tem 33 mil habitantes, destes 33 mil, 10 mil são indígenas.

Ø Como a política foi recebida?

O que eu percebo é que há um consenso em relação a quanto a política de cotas,

consenso de que é necessário, agora nem todos concordam, muitos são assim, alguns

pensam que é algo mais pontual e provisório e outros acham que pensam que deve ser

algo por maior tempo, fazer a inclusão de forma mais ampla precisa de maior tempo.

De fato ela é ainda, a gente pode perceber que ela ainda não faz a inclusão por

completo, precisam de mais ações ainda, mas de fato eles estão lá. Eles têm muitas

dificuldades, principalmente a língua, não podemos considerar que são maiores que os

demais, porque existem as dificuldades de terem vindo de escolas públicas, são

trabalhadores. As cotas são ações que podemos perceber que ao longo do tempo.

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Ø Como o curso tem pensado, discutido....

Existem discussões, mas elas não caminham para soluções, elas não caminham

para propostas mais elaboradas e sim algumas inquietações. A UEMS tinha o Rede de

Saberes, que tinha o objetivo de acompanhar estes alunos.

A instituição não tem estrutura para tanto, depende de verbas, nosso orçamento é

bastante limitado. Por outro lado, nós temos colegas que desenvolvem ações, fazem

pesquisas, alguns alunos indígenas desenvolvem/participam pesquisas, iniciação à

docência, algo que era inimaginável há bem pouco tempo atrás.

Uma dificuldade que eles têm é na escrita, trabalho eu acho que eles devem ter

um complemento. Eles devem ter um acompanhamento da produção da escrita do

português, porque eles escrevem em guarani.

Estágio supervisionado quando o aluno deu aula em guarani e foi bastante

interessante. Nós queremos trabalhar a interação dos professores com os alunos. O

nosso acadêmico indígena é bastante introspectivo, mas quando ele estava dando aula é

outra coisa.

Alguma pessoa que falasse bilíngue, que fosse acompanhando e monitorando,

acho que este acompanhamento deveria ser com um indígena, que falasse e escrevesse o

português. Eles são bilíngues e nós não somos, mas na escrita não.

A forma como eles foram se formando, eles me parecem acostumados, a serem

invisíveis e também a ser tratados como invisíveis. Não percebemos. Não todos, mas

alguns foram ficando no meio do caminho. Não percebo discriminação.

Mas, quando a discussão sobre as questões fundiárias, principalmente fora do

âmbito da universidade, por exemplo, nas redes sociais, a crítica é grande. Mas na sala

de aula e nos corredores a gente não percebe, explicitamente. Amambai é uma região da

agropecuáriae aí as questões fundiárias são fortes. A questão do confinamento deve ser

pensada.

Muitos deles são bolsistas, de forma variada tanto do PIBIC, do Vale

Universidade Indígena. As bolsas são importantes para mantê-los na universidade. Faz

um diferencial na vida deles. Temos alunos que estão já dando aulas na aldeia, esta

semana estava comentando com um aluno que vai fazer estágio na aldeia.

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Ø Se fosse fazer uma avaliação desta política

Além das cotas, mas também pensando nas bolsas, na quantidade de bolsas que

nós temos, pela primeira vez começamos a sonhar com algo que é o pensado.

O acadêmico trabalhador é difícil, devemos pensar nos valores das bolsas, mas

já é um alento. Por exemplo, em Amambai onde há uma carência de emprego, locais de

trabalho é precário. Por exemplo, o PIBID69, ele é flexível e que não faz reserva para o

aluno trabalhador, basta que ele cumpra as horas que o programa exige. Isto tudo é um

ganho. Refere um estado ampliado.

Precisamos pensar em ampliação desta política. Sem estas condições ficaria

difícil, por exemplo, o caso de Amambai e Sapucaia, sem as bolsas não teria como o

aluno se manter na universidade.

As cotas são muito importantes, de certa forma medidas paliativas, veio para

corrigir um fato, porque as oportunidades não são oferecidas de forma igualitária.

Quando as condições de formação estiverem mais aproximadas em diversos níveis da

população, talvez precisaríamos abolir as cotas, mas por enquanto não. Enquanto ainda

temos estas diferenças. A gente tem uma média de 3 a 4 alunos indígenas formados a

cada ano.

Os alunos indígenas têm dificuldades e problemas, assim como os demais

alunos, por exemplo, nos estágios, nos TCCs, a evasão é um pouco maior entre os

indígenas, mas não tenho este número. Mas eles têm tempo pra isso, eles têm 7 anos

para concluir o curso, uma parte dos alunos indígenas não conclui o curso no tempo

regular.Não saberia por número quanto é a evasão. Mas no TCC eles têm dificuldade de

produzir e de escrever.

69 Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência.

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Entrevista 10 – CC 2

Dados de identificação

Nome / Iniciais: Maria Eduardo Ferro /M. E. F.

Idade: 46

Função: coordenadora do Curso de Pedagogia – Dourados – MS Docente

Tempo na Função: 4 meses

Tempo de atuação na UEMS:10 anos

Ø Como foi implementada esta política na UEMS? Como foi esta trajetória na

UEMS desta política de Ações Afirmativas ? Como aconteceu este movimento? O

que se lembra?

Quando entrei na UEMS em 2004, eu vim do interior de São Paulo e foi a minha

primeira experiência no ensino superior. Então eu cheguei aqui, foi uma novidade, uma

realidade de uma universidade com cotas para negros e indígenas, uma novidade que

sempre considerei positiva.

Pelo menos na unidade em que eu fui, pelo menos no primeiro ano, eu fui

ministrar uma disciplina numa unidade no curso de Direito. Eu percebia que havia certa

resistência por parte de parte dos acadêmicos, acadêmicos do primeiro ano, eles

questionavam a questão da sua legalidade, questionavam a questão das cotas para

negros e indígenas. Não me recordo se nesta época havia indígenas, mas me recordo que

havia negros. Até algumas situações constrangedoras, questionamentos, da legalidade,

coisas assim...

Coisas que hoje, pelo menos explicitamente eles não ocorrem. Pelo menos não

ocorrem explicitamente.Não sei se por serem alunos do Direito, que traziam este tipo de

discussão.

Uma coisa que você falou que as duas leis foram implantadas em conjunto, na

mesma época. Mas, quando se fala em cotas, as pessoas colocam na mesma sacola,

negros e indígenas, como se não houvesses especificidades. Como se não houvesse

diferenças. Às vezes vejo que isto acontece, nos discursos, principalmente entre aqueles

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que querem desqualificar as cotas. Pra mim era uma novidade, mas não acho que era

uma novidade só pra mim. Mas também para a IES.

Em 2005 eu vim pra Dourados, comecei a ter mais contato com alunos

indígenas, pois onde estava era uma unidade pequena. Então, e percebo assim, que

embora nós tenhamos esta política há 10 anos na UEMS, eu acho que ainda há carência

de discussões sobre as condições de permanência destes acadêmicos dentro das

universidades.

A lei tem uma força de implementar uma situação, mas não basta somente

colocar eles pra dentro da universidade. E você não estar atento para as diferenças para

que as cotas fossem criadas.

Eu sinto falta como professora, eu estou na condição de coordenadora há seis

meses, mas como professora e como coordenadora de que nós tenhamos mais acesso e

mais respaldo para criar condições de permanência do acadêmico dentro da

universidade.

Aqui em Dourados, por exemplo, nós temos mais contato com 3 etnias, que

estão principalmente aqui, mas também temos outras, por exemplo, temos uma

acadêmica que veio do Amazonas.Então,nós não temos, não digo capacitação, mas algo

assim, que nos aproximasse da realidade dos acadêmicos indígenas.

Porque é aquela ideia da cosmovisão, eles têm uma diferente visão de mundo, e

mesmo aqueles professores, aquelas pessoas, que concordam com as cotas, que querem

que eles permaneçam na universidade, enfim. Muitas vezes a gente sente dificuldades,

sem querer você fere a cultura do outro.

Vou dar um exemplo. Uma vez estava falando na sala de aula sobre o folclore,

enfim, questão relacionada ao folclore e tocou-se no assunto do saci. Para uma aluna

indígena o saci é uma realidade, enquanto que para os alunos não indígenas é algo

alegórico, folclore e não existe. Eu senti assim, depois disso, eu procurei conhecer,

entender, depois que ela veio falar comigo em reservado, não na presença de outros

alunos, que falta agente conhecer um pouco mais sobre a cultura desses acadêmicos,

para que inclusive aproveite esta possibilidade interlocução de culturas.

O que seria para os não-indígenas, por exemplo, isso é lenda, isso não faz parte

do nosso universo, entre os indígenas também as especificidades, suas diferenças e seus

povos.É outra realidade, o professor pode falar: a vocês não acreditam, como assim... o

público é plural, não é homogêneo. Que bom que seja plural e homogêneo.

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Como a universidade de modo geral, vê e viu a presença do acadêmico indígena,

eu sei/conheço por conversas com professores e em reuniões do colegiado de cursos. Eu

não participei até ano corrente de órgãos colegiados superiores, participo do CEPE a

partir deste ano. Mas, participo do comitê de pesquisa há muitos anos, não me lembro.

Lembrei-me doPIBIC AF70, que podemos considerar como Ação Afirmativa,

que inclusive também demorou, pois tem pouca procura. Porque tem professores com

muita resistência para orientar os alunos indígenas para a pesquisa. Tem muito aquela

ideia de que eu vou levar meus alunos para uma atividade de extensão, porque se for

pesquisa vai ter que produzir um artigo, um relatório, um resumo, seja lá o que for.

Ainda vejo assim que PIBIC AF tem uma procura inferior, tendo em vista ao número de

alunos indígenas presentes na UEMS.

Ø Como a política foi recebida pelos diversos segmentos da universidade?

De modo geral grande parte dos professores percebe com bons olhos esta

política, mas não podemos ignorar que tem os casos de professores que questionam, que

dizem que porque eles estão aqui na UEMS. Principalmente quando temos uma

faculdade intercultural aqui do lado. Porque ele não vai para a faculdade deles, como se

a UEMS fosse de segmentos da sociedade. Mas é claro que a pessoa fala isso em rodas

pequenas, quando muito em reuniões de colegiado. Mas não podemos ignorar que

existem alguns professores que falam isso.

Eu tenho notado assim, mas preciso me certificar disso no SAU71, mas me

parece que tem diminuído o número de indígenas que tem ingressado no nosso curso.

Nós temos alguns exemplos, uma aluna que está devendo somente o TCC, ela

jubila senão entregar. Nós temos egressos indígenas no nosso curso, da região e de

Aquidauana. Também temos alunos que estão no curso, mas estão cumprindo

disciplinas em outras sérias. Costumo dizer que isto acontece também entre os não-

indígenas. Mas me parece para algumas pessoas que fica expressiva quando acontece

entre os indígenas, que ficou, que está pagando dependência, como se costuma dizer.

70 Programa Institucional de Iniciação Científica - nas Ações Afirmativas. 71 Sistema Acadêmico da UEMS.

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Ø Existem discussões sistemáticas...

Atualmente, nós temos a professora Marina que ela ministra uma disciplina no

primeiro ano, tem um projeto, que está com o apoio de um professor que está sendo

readaptado.Que presta atendimento aos alunos do primeiro ano, não especificamente

com cotista, alunos que são indicados pela professora. Principalmente para a leitura e

interpretação de texto, são momentos apóso horáriode aula, nosso curso é no horário

vespertino, que visa o atendimento individualizado não diria, com pequenos grupos.

Este projeto não está só vinculado ao curso de Pedagogia, mas presente nos cursos onde

esta professora está.

Mas, eu sinto falta, e nós já discutimos isto dentro do curso, de algo, primeiro

que se leve em consideração a necessidade deolhar para a diferença para aquele aluno

que não tem o português como língua materna. Existe um preconceito linguístico. Para

aqueles alunos que não utilizam o plural, não utilizam o artigo. Ele entrou e saiu assim.

E aí temos aqueles questionamentos: o que nos contribuímos para a formação deste

aluno? E não é este elemento.

Mas tem aqueles questionamentos: ele está sendo habilitado pela UEMS vai

poder dar aula na escola urbana. Como nós vamos certificar este aluno?

E uma experiência curta como professora de estágio, mas está sendo válida,

especialmente em relação aos alunos indígenas, porque vivi um preconceito na escola

onde tinha o estágio em relação à aluna indígena. Era uma implicância exagerada,

porque eu tinha outras estagiárias, promovendo até aquém daquela da aluna indígena e

não foi tão criticada. Sempre levamos uma ficha para que o professor da sala preencha

sobre aqueles estagiários. Eu sempre estou presente, já fecho com uma escola só para

que eu possa estar presente sempre. Têm professores que pegam aquela ficha e preenche

com os requisitos máximos. Mas têm outros que são criteriosos e preenchem com

cuidado todos os campos. No caso da aluna indígena a professora sempre colocava,

sempre ampliava alguma “falta”, algum esquecimento. Eu penso assim: a aluna está em

processo de formação, eu não posso esperar que ele chega para dar uma aula como uma

professora.

E no ano seguinte quando eu fui tentar renovar o vínculo com aquela escola para

fazer o estágio uma das coisas que a coordenadora me disse: tivemos uma professora

que se queixou muito da sua estagiária. E aí eu perguntei que queixa era aquela, porque

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a mim não chegou, porque se fosse uma queixa construtiva teria chegado a mim. Ela

solicitou algumas coisas para a estagiária e ela não fez. E aí eu perguntei qual professora

e ela me disse, então pensei: já sei. Porque se a professora solicita algumas coisas para a

estagiária que estão na cabeça e ela não fez, é porque ela é indígena. Na realidade, se

não fez do jeito que a professora fez, é porque a aluna é indígena.

O trabalho que esta aluna fez, foi um trabalho inédito. Elas estavam fazendo o

período de regência do mês agosto. Esta aluna é terena, e nós trabalhamos as lendas

terenas. As crianças aprenderam cinco lendas inéditas e aprenderam também os nomes

dos animais na língua terena. Ela qualificou aquele projeto de modo diferenciado. Ela

qualificou aquele projeto de folclore. Eu senti que para a escolado que aqueles alunos

traz alguma coisa, um pedaço daqui e dali, mesmo da internet, muitas vezes já foram

desenvolvidas e não fazem parte do nosso meio. E aquele aluno que trabalhou coisas da

sua própria cultura eque levou algo que é do nosso meio.

Eu sinto uma resistência das escolas em receber o estagiário indígena. Um olhar

diferente, será que ele vai dar conta? Esta professora chegou a insinuar isto para mim,

me dizendo assim: esta aluna vai dar conta? Será que ela vai dar aula aqui ou na

comunidade dela. Será que ele vai dar conta? Esta forma já demonstra isso.

Estas situações algumas vezes são trazidas ao curso como discussões que

tangenciam no curso, quando você traz estas questões, por exemplo para as reuniões de

colegiado. Elas não assumidas da forma como deveriam ser, você traz as dificuldades

dos alunos. Quando a gente faz avaliações, por exemplo, da aprendizagem dos alunos,

estas questões aparecem. Elas acontecem às vezes ou no meio e no final do ano. Elas

estão presentes.

Eu ainda sinto falta, que eu já falei, mesmo não sendo coordenadora, do curso

assumir mesmo, ter uma...talvez minha visão seja restrita, principalmente em relação à

língua. Nós temos dois profissionais do curso que são profissionais da área de Letras,

uma que há muito tempo está afastada do curso para se capacitar e quando voltou ela

está na área administrativa. Então todo ano no curso sempre temos um professor

convocado nesta área. E a outro profissional da área de Letras que tem uma disciplina,

mas vamos dizer assim não é o tronco da lotação.

Eu sinto falta, não que eu esteja atribuindo como função do outro, pois este

projeto deveria ser encabeçado por um professor da área de Letras, para se pensar com

as questões da línguado português, mas deve ser abraçado por todo o curso. Todo o

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curso teria que abraçar. Mesmo que se pese as especificidades, em relação à língua

portuguesa.

De certa forma, eu diria assim, que há assim, não sei se seria esta a palavra, um

conforto como se bom já temos algum projeto. Sinto falta que o curso precisa abraçar

estas questões. Temos professores que têm resistência ao acadêmico indígena e toda vez

que você toca nesta questão ele diz: eu não oriento TCC, não oriento iniciação científica

e eu não sou obrigado.

E você sabe que este professor é do curso, inevitavelmente este aluno vai passar

por aquele professor. Quando se tem disciplina com dois professores e tutores, por

exemplo, no caso do estágio há aquela preocupação: “será que eu vou fazer com este ou

aquele professor”. Se o aluno já chega com esta preocupação, ele tem medo de ser

reprovado. Esta aluna que eu te falei ela fez o estágio mais de uma vez. Curiosamente

também alunos não indígenas também reprovam. Mas será que ela precisou fazer três

vezes? Será que ela teria que fazer três vezes? São coisas que o grupo vê, tem ciência e

enxerga.

Nós não temos medidas permanentemente que amparam estas questões, projeto

longitudinal, que tivesse que avaliar, por exemplo: quais as contribuições. Para

avaliarmos isso, não temos, por ser um Curso de Pedagogia nós deveríamos ter. Nós

deveríamos ter pensado nisso. Nós temos este projeto, mas não é pensado

especificamente.

Ø Avaliando a política?

É difícil dizer, como eu te falo assim, eu acho que muita coisa poderia ser

melhorada, a comunicação dentro da universidade, por exemplo, o Rede nós sabemos

que existe, mas os alunos nãoindígenasnão sabem nem sequer a função. Eu, como

coordenadora, digo que sei parcialmente.

A função de coordenação está sempre em rotatividade, tem pessoas que entram

na universidade e em seis meses ele é coordenador, e nem sempre é porque ele quer.

Fica difícil dizer que o coordenador esteja amparado para orientar o

acadêmicoindígenaem todas as possibilidades e ofertas que a instituição traz.

Nós precisamos viver mais a cultura do indígena dentro da universidade, para

aqueles que tiverem interesse. Eu sei que podem estudar por conta própria. Mas, para

aqueles que tivessem interesse, um ponto de apoio para se buscar.

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Como eu faço: tudo que chega amim eu divulgo. Talvez chegasse a mim

informação de, por exemplo, abriu vagas para isso e para aquilo. Será que tudo que

chega a mim todas as atividades na extensão? Às vezes os professores não conhecem o

programa. Como há esta rotatividade? Porque a UEMS está crescendo e chegando

muitos professores, sinto falta dessa circulação de informações e de comunicação dentro

da instituição. Nisso somos falhos.

Eu sinto falta de se conhecer mais, de saber mais, porque quando você vai

buscar e entender mais os acadêmicos. Eu não sou conhecedora das etnias de Mato

Grosso do Sul.Eu vim fazer história em Mato Grosso do Sul, o que me colocou um

pouco mais em contato.

Atualmente estou fazendo um curso de Educação Intercultural Indígena, mas são

coisas que eu fui atrás. Porque eu fui atrás? Embora a gente tenha no curso que aborde a

questão indígena, que trazem estas discussões sobre a escola indígena. Nós formamos

dentro do curso de Pedagogia formamos professores que vão atuar em escolas da área

urbana e nas comunidades indígenas.

Nós temos como proposta de formar um profissional com competências

humanas, se você não faz uma interlocução ampla com a realidade local e com as

comunidades indígenas. Porque eu tenho pra mim. Você pega como local de estágio

uma escola urbana de Dourados, mesmo o aluno indígena, ele vai para a escola da

realidade urbana de Dourados, mas eu não acho que ele tem que fazer estágio só lá.

Todos tinham que conhecer a escola indígena e tem algumas coisas que às vezes, por

exemplo, o professor fala: eu avalio pela participação,pelo envolvimento,pelo isso e

pelo aquilo, e pelas provas. Mas de espera aí, como? Se você tem um pouco de

conhecimento sobre a cultura do outro não falar em público, pode ser da cultura dele. É

comum não se jogar quando não está entre os seus.

É comum você ouvir assim: aquele aluno não fala. Mas se você conhecer um

pouco e ver não é assim. Não que eu esteja rotulando, que todo indígena vai falar pouco,

para mim foi uma aprendizagem. Pra mim muito bom ter ido fazer este curso

intercultural, lá só tem indígena. E algumas coisas estou aprendendo:por exemplo, nós

falamos alto, pra eles isto é uma falta de educação, o desrespeito aos mais velhos, não

ficar interrompendo. Quer dizer, conhecendo um pouco o outro nos aproximaria mais.

Mas não pode ficar na dependência de alguns professores que querem fazer isso.

Muitos dizem: o que você está fazendo lá? Por exemplo, se você estivesse fazendo um

curso por exemplo, novas técnicas pedagógicas, as pessoas achariam chique, mas como

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estou fazendo um curso com o foco na escola intercultural, me perguntam o que estou

fazendo lá. Para pensar a escola indígena.

Eu sinto assim, não estou esperando sentada e acomodada, eu estou correndo

atrás. E eu estou correndo, mas ainda é pouco. Mas não adianta se orgulhar, falar que

tem cotas, falar de números, etc. Que bom que nós temos. Maseu volto a dizer,ainda é

um desafio sabermos o que fazer para garantir a permanência do acadêmico indígena

dentro da universidade.

Nós temos uma acadêmica, por exemplo, ela mora no Panambizinho e quando

chove ela diz que não tem como sair dela. Eu confesso que eu não conheço onde ela

mora, mas eu acredito, porque eu já morei em lugares na cidade de Dourados que

quando chove era difícil de sair de lá, eu penso que é incomparável.

Será que todos os professores estão sensíveis a esta realidade? Ele falta, por

exemplo, no dia da prova, e o professor dize marquei esta prova a dois meses atrás e ela

faltou e ponto. Não quero saber.

Quem conhece um pouco da educação escolar indígena? Já é difícilter um ensino

médio. Pra eles é difícil ter uma escola indígena com ensinomédio.Até eles conseguem

fazer o ensino fundamental. Se eles conseguiram fazer o ensino médio e eles já

venceram uma barreira. As pessoas têm a mentalidade que as escolas estão do lado de

suas casas, deve ser assim pra todo mundo e não é assim.

Eu vejo que há resistências, não nego que há resistências dentro do nosso corpo

docente. Inclusive as pessoas falam isso. Nesta semana mesmo recebi duas alunas pra

falar de uma aluna indígena que está se sentindo excluída dentro da sala de aula, e é

uma questão que será discutida na reunião de colegiado amanhã, pra ver qual será o

encaminhamento e o que nós vamos conversar e fazer com a turma. Me preocupa

bastante, é uma aluna que a gente acompanha pelos corredores, uma hora e outra por

conversas, pelas redes sociais, onde ela posta mensagens depressivas e eu me preocupo

bastante. Ela está matriculada no terceiro e cumprindo disciplinas do segundo, do

primeiro ano. Eu me preocupo e, às vezes, eu não sei se a palavra é, me culpo. Mas acho

que ainda a gente faz pouco.Teria que fazer mais.

Falta conhecer experiências de outras universidades, conhecer o que deu certo,

conhecer não para copiar, mas conhecer...as propostas de outros cursos, o que eles estão

fazendo. Porqueassim como coordenadores, que a PROE chama, aqui as reuniões

ocorrem duas reuniões por ano e é muito pouco. Gostaria de saber o que está

funcionando no outro curso, eu não me negoa fazer, muito pelo contrário, estou em

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busca de propostas e de novas ideias. Não porque somos da Pedagogia, nós não

sabemos de tudo e temos as respostas.

Sinto falta de sentar, de conversar. Por exemplo, aqui no nosso curso estamos

pensando assim, porque se você tem pelo menos entre os coordenadores mais sensíveis,

é triste seo coordenador, ou professor que coloca obstáculos, que é assim, enfim...

Acho que há coordenadores com vontade, não necessariamente o que pode

funcionar com um curso poderá funcionar com outro,eu sinto necessidade... mas com

dificuldades de saber o que fazer.Por exemplo, agora, como eu vou sensibilizar esta

turma? Na qual esta acadêmica está cumprindo estas disciplinas e ela não está sendo

bem aceita. Por exemplo: um professor pede um trabalho...

Como nós vamos sensibilizar estes alunos? Se ele faz esta diferença, amanhã

aqui ele fará isso dando aulas, porque temos crianças indígenas nas escolas urbanas de

Dourados.

Eu penso, por exemplo: a aluna,professor, pede um trabalho em grupo e a aluna

sempre sobra sempre. Não adianta fecharmos os olhos, está acontecendo uma

segregação. Mas, se a aluna pede pra fazer sozinha e o professor permite que ela faça, é

a naturalização da segregação, porque resolve o problema e o que estáde pano de fundo?

E a questão de base a ser discutida? Que é a presença desta pessoa que não se

sentecomo parte? Não se sente pertencente? Como isto está acontecendo em outros

cursos? É uma situação delicada. O que será que está acontecendo nos outros cursos?

Eu não sei, mas, emboraeu não tenha respostas, mas acho que não é de todo

ruim, mas significa que eu esteja pensando sobre esta questão. Mas eu não tenho

respostas a estas questões.

Porque mexe com a subjetividade do outro, o outro que se nega ao

envolvimento. Mas, quando nós estamos falando do professor, acho mais delicado

ainda, porque ele é um profissional. Em que pese se ele concorda ou não com a política

de cotas, a política de cotas está aí, ele é profissional com todos e elenão escolhe a quem

ele vai dar aulas, tem que ser professor e de todos.

Embora tudo me choca, quando a aluna se sente excluída pelos colegas, me

choca mais ainda quando o professor faz isso, me choca mais ainda, porque ele não tem

este direito, ele está ferindo duplamente a questão, porque naquele momento é

profissional, e o profissional não escolhe a quem ele vai dar aula, não pode fazer

diferença entre um aluno ou outro. São coisas muito complicadas e complexas, há que

se pensar caminhos.

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Entrevista 11 – CC

Dados de identificação

Nome (iniciais): A.M.B

Idade: 51

Função: Coordenador do curso de Direito – Unidade de Dourados /UEMS e

Docente

Tempo na Função: 3 anos

Formação: Pedagogia Direito/ Mestrado/ Doutorado

Tempo de atuação na UEMS: desde de 1997

O processo das cotas na UEMS, estou aqui desde 1997, foi uma integralização

de uma lei, houve uma discussão aqui na UEMS para a implementar esta lei com os

órgãos colegiados superiores e os professores foram dar a sua opinião.

Na minha fala eu disse que seria a favor da cota, mas não do jeito que estava

sendo proposto, eu tive um debate com a Maju, eu falava que a cota tinha que ser para

as crianças, dar cotas para as escolas, se fizesse um processo seletivo nas escolas de

primeiro grau e colocasse esses alunos nas melhores escolas, Bandeirantes, Imaculada

ou Salesiano. Ao invés de dar cotas para 4 anos eu daria a cota para 8 anos, estes alunos

entrariam para a universidade pela porta da frente. Começar o edifício da educação pelo

telhado. E aí tá ai o problema

Estão aí tapando o sol com a peneira, não do negro, pois o negro vem de boa

formação, de nível socioeconômico bom, classe média. Não é o hipossuficiente. Eu tive

duas alunas, irmãs gêmeas, as duas fizeram vestibular normalmente, e uma passou e a

outra não passou, então aquela que não passou entrou com uma liminar para entrar pela

cota.E uma entrou com uma liminar, e estudou na UEMS e até agora este processo não

foi julgado. Estas alunas são de classe social boa, abastada, têm carro, 3 ou 4 carros.

Outros são professorese tenho alunos negros de classe média, um doutor, vem

de carro para a universidade. E do negro, o problema é um indígena que não tem

formação adequada no ensino médio, temos que montar todo uma estrutura, aqui nós

temos uma forma de aprovação continuada. Não se fala, mas é uma realidade.

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Só que existe uma coisa que é um gargalo, que é mortal, que é o exame da

OAB72 e nenhum indígena não passou até agora. Creio que já se formaram entre dez e

quinze alunos. Alguns a gente incentiva dando bolsas em cursinhos para a prova da

OAB, dando livros e incentivando. Pra mim vai ser um troféu se um indígena passar na

OAB.

Como foi recebida, foi recebida “goela abaixo”, veio de cima pra baixo, os

professores neste nível aqui não discutem estas coisas. A partir do momento que foi

implantado a norma, a gente tem feito o que foi possível, se você vê no curso as evasões

ocorrem mais tarde.

Aqui no curso ingressa mais Kaiowá, porque aqui tem mais Kaiowá, tem

terenas, os Kaiowá desistem menos, mas deve ver a proporção da população no local.

Paradizer se entra mais este ou aquele.

Ø Recursos financeiros

Tem apoio financeiro através de bolsas, por exemplo a Fundação Ford, por

exemplo para ingressar nos programas de doutorado e mestrado, se for pesquisar isso

tem todo apoio. Sem este apoio até certo ponto, não entrava.

Principalmente para pesquisa, por exemplo, aqui temos dois professores loiros e

de olhos azuis que pesquisam índios. Como assim? Não sei. Por exemplo, existe uma

possibilidade de criar umaUnidade de Apoio Jurídicono Cachoeirinha, não terá

dificuldades, se fazer um projeto para um Núcleo aqui na UEMS, sem problemas.

Mas se for na Aldeia, dentro da comunidade indígena, com uma doação de um

espaço doado pela União, fizemos esta visita e entreguei aqui na UEMS e até agora

nada, é um apoio “intracorpore”, na polícia a gente chama de Operação H, conversa

fiada, que não tem efetividade que não leva a nada. Por exemplo, o curso de

Enfermagem não tem um posto de saúde para fazer estágio lá na aldeia, o curso de

Direito não tem um Núcleo Jurídico para fazer o atendimento ao índio.

Todo mundo quer pesquisar índio, mas, efetivamente fazer algo pelo índio

ninguém quer. Todo mundo ganhando em cima do coitado do índio. Fazendo uma

analogia, isto é uma porífera, na linguagem da biologia, um corpo que é oco e em volta

tem os nutrientes e todo mundo sugando.O índio tá lá abandonado e vai continuar

72 Ordem dos Advogados do Brasil.

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abandonado, é só conversa. Pelo discurso que se tem nós deveríamos ter índios numa

outra realidade.

Esta conversa é antiga, por exemplo, os primeiros doutorados e pesquisas, por

exemplo, na UCDB os primeiros programas se referiam a indígenas, e os indígenas

continuam com a mesma realidade e os pesquisadores ascenderam socialmente. Ao

nível de curso que ações/atividades afirmativas são desenvolvidas? Existem discussões

sistemáticas ou ações programadas no curso acerca desses temas?

O curso tem feito a aprovação continuada, isto não é discutido. Não temos no

curso o acompanhamento dos alunos. Mas a coisa é de forma informal, vou orientando

os professores de como auxiliar os alunos indígenas. E aí vai se fazendo.

No Núcleo Jurídico, por exemplo, nas ações trabalhistas, nós temos atendido, a

OAB não queria, não queria permitir, mas temos atendido. Fizemos um convênio com a

Procuradoria Jurídica e estamos atendendo. Porque na verdade nós temos que incluir os

pobres. Este é um diferencial. Pois se analisarmos mesmo não existem índios, se

analisarmos friamente, pobres que moram na periferia da cidade. Tem muitos indígenas

que sonham em sair da aldeia, ter um carro e uma casa na cidade de Dourados. Quando

eles podem, tenho uma aluna que mora no Cachoeirinha, é um bairro.

O indígena daqui – que é a maior aldeia urbana do Estado – é totalmente

diferente dos índios, por exemplo, do pirakua, de Antonio João, Limão Verde, são

situações completamente diferentes. Ainda ocultando os problemas da migração dos

índios do Paraguai, porque aqui tem assistência, estamos recebendo problemas de outras

nacionalidades, ninguém fala, aFUNAI e o governo não se manifestam. Porque está

dobrando o número de indígenas nesta aldeia? Fala-se muito dos haitianos, mas não se

fala dos paraguaios.

Como delegado da polícia também atendi muito índio. Nenhum ponto vai

resolver todo este problema. Porque esta política veio de cima pra baixo.Isto faz parte

do desmantelamento da universidade pública. O que mantém a universidade em pé: a

sua gratuidade e a sua excelência na formação.

A gratuidade vem sendo feita pelo financiamento das IES privadas, de alguma

forma a população está pagando e estudando. A excelência através de vários

mecanismos, facilitando os alunos que não têm boa formação, dessa forma prejudicando

a qualidade. Assim como as atividades de extensão, pesquisa e ensino que o professor

não em dado conta de atender nenhuma com qualidade. Isto não aparece nas pesquisas.

Pois temos que fazer o discurso que está dando certo.

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Ø Quais seriam os caminhos?

Creio que não há caminhos, é um beco sem saída. O caminho é privatizar, levar

para as universidades privadas darem conta disso e teriam que pagar, porque se pagar

eles fazem. É o modelo neoliberal. Quero implantar o apadrinhamento para cada aluno,

cada professor acompanhará este aluno.

Este negócio de reuniões demais nós evitamos, porque os professores devem

estar preparados para dar aulas. Tenho que fazer o professor preparar bem a aula e

passar conteúdo para o aluno. O que faz o aluno estar preparado para o mercado de

trabalho, ele fazendo, ele aprende criticar. Evitar disciplinas inúteis, que mais

atrapalham que ajudam.

Tem, por exemplo, um posto de atendimento, centro de atendimento caiuas, eles

têm estagiado lá. Fora isso, tem um indígena, que tem cara de índio, mas não é índio,

que mora na cidade, que entra na cota e faz estágio em outros locais. Tenho uma aluna

que me causa o maior problema e ela mora na cidade, não se comporta como índia, mas

quando encontra dificuldades ela quer ser índia.

Com relação à bolsa, aquela velha situação, se for dar400 reais é insuficiente, se

der 800 será insuficiente, se der 1.400 será insuficiente. A bolsa deve estar vinculada a

alguma atividade ou estágio, é trabalho, ele assina matrícula. Se vai cursar Enfermagem,

ele deve dar assistência lá na aldeia no posto de Enfermagem, por exemplo, pois o aluno

é pobre.E o aluno que veio, por exemplo, de Aral Moreira, que mora numa pocilga,

precisa da bolsa para sobreviver.

O que leva à evasão é um conjunto de fatores: ele não tem formação básica, não

teve acesso ao jornal, à televisão, à internet, o pai e a mãe são analfabetos, então ele não

tem ambiente. Eu tenho que inserir este cara aqui e dar uma bolsa, para ele trabalhar na

sua área específica, mas não é o suficiente. Deve ter uma casa, uma república. Este seria

o esqueleto, o que manteria ele na universidade, para dar condições para ele se manter

na universidade.

Os salesianos já faziam isso, porque pegaram eles na aldeia, colocavam para

estudar e formaram doutores. Portanto, não estamos inventando a roda. Foi assim que

eles conseguiram, nós também podemos.

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Ø Como você avalia a política de Ações Afirmativas ?

Primeiro não tem política, e sim politicagem, política é uma coisa mais séria.

Como é uma politicagem é um tiro no pé. O resultado é a universidade mancando. Por

exemplo, eu tenho uma porcentagem na prova da OAB de alunos que não fazem, não

passam. Dos doze alunos indígenas que fizeram não passaram.

Vai ter fazer a cota no serviço público? Cotas para promoção no serviço

público? Isto é uma política neoliberal! Todo mundo diz amém, pra não contrariar? Para

manter seus cargos? Tem uma política dentro da FUNAI que diz não se pode contatar

com os índios sem contato.As pessoas não dizem nada, pra manter seus cargos, seus

empregos.

Devemos tratar todo mundo igual? Procurar fazer que a lei seja para todos.

Porque os índios devem ser tratados diferentes? Porque o índio deve ter cota? Deve

tratar a causa do problema, que é a qualidade da escola fundamental e média. Devemos

resolver o problema. Vamos fortalecer a escola fundamental.

Esta é uma política neoliberal de rachar o país e dividir as pessoas. Não tem uma

unidade. Não tem meta. Politicagem para ocultar os problemas reais, as pesquisas não

são para mostrar isso, porque se eu mostrar isso eu não entro nos programas, por

exemplo, de doutorado que exigem recursos.

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Entrevista 12 - MCAAC 2

Dados de identificação

Nome (iniciais) M. B.S

Idade: 58

Função: Chefe de Departamento DID, Membro da Comissão de

Acompanhamento de alunos cotistas

Tempo na Função: 4 anos

Formação: Pedagogia

Tempo de atuação na UEMS: desde de 2001

Eu entrei no normal superior, aqui na DID, eu entrei outubro de 2011, só tem

esses três anos que eu estou aqui.

A função da Divisão de Inclusão e Diversidade (DID) é assessorar, acompanhar

e avaliar, eu repito isso é porque ela não é um órgão executor, ela não tem estrutura para

ser executor. Ela acabou colocando, na verdade a história da DID eu não sei se você

conhece, eu posso mandar um histórico pra você, a história da DID não é a DID, a

história da DID é o Núcleo de Educação Especial (NER), uma assessoria de educação

especial e aí modéstia nenhuma a parte, pioneira a ideia porque naquela época em que a

Amélia era a assessora ainda não se falava de atendimento educacional (AE), nem se

usava essa expressão, e não se falava em um núcleo de atendimento, tinham algumas

conversas aqui e ali e aí a UEMS fez, o núcleo acabou se transformando em uma

assessoria que a Amélia coordenava, mas da educação especial, para atender as pessoas

naquela época portadores de necessidades especiais.

Com as mudanças e uma concepção de gestão com a qual eu não concordo,

colocar todo mundo misturado, aí tinha a educação especial e o NER era específico para

a questão étnica racial, negros e pardos, aqui a gente usa pretos, é porque hoje eu estava

na federal e eles usam negros e pardos porque o IBGE usa, daí uns estavam repetindo,

eu tenho que olhar isso na comissão, sempre tem que olhar.

Essa expressão pretos para gente não é equivocada, é certa na UEMS, nos

documentos da UEMS. E esse núcleo não existe mais, quem gerenciava era a Lurdinha,

ela era professora só lá em Campo Grande e me parece, pelo o que eu entendi, que não

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foi exatamente extinto esse núcleo da estrutura, pelo o que eu sei a Maju tem reformado

porque ela já tem um grupo financiado pelo MEC, sei lá, então vai retomar esse núcleo

que é um grupo que vai fazer acompanhamento dos cotistas negros e etc.

E as cotas para indígenas ficava misturado, nunca teve um programa

especializado porque o Rede é um programa de extensão que pode acabar a qualquer

hora, um projeto dos professores, inclusive a Bia enfatiza essa questão, eu acho pouco

provável que o Rede vá acabar, até porque tem muitas universidades envolvidas no

Rede, já consolidadas tudo mais.

Quando eu entrei em 2001 tinha Aquidauana e nós (Dourados), porque era o

grupo de alunos indígenas e eu sei porque dava aulas pra eles lá em Aquidauana,

funcionava só lá. Foi por conta Normal superior indígena. Não nasceu só para ser

indígena, mas acabou sendo só para isso.

Ø Como foi recebida a política de cotas?

Olha eu cheguei e já estava estabelecida a cota em 2001, não vi nenhum

movimento, eu não participava desse movimento, eu era só docente do Normal

Superior, eu não tinha envolvimento com gestão, coordenação, erarecém-chegada.

A primeira turma havia chegado, o primeiro vestibular se eu não me engano foi

em 2004. Não participei, só participei agora como divisão porque a divisão, por uma

série de exigências, ela acaba pertencendo à função de cotas pela própria nomeação de

acompanhar as políticas afirmativas dentro da universidade, vamos dizer assim, as

ações.

Eu faço parte da comissão que acompanha os cotistas mais para os negros e

indígenas. A comissão de acompanhamento é feita pela DID pela Maju, na verdade pelo

movimento étnico racial, agora para ser bem sincera essa comissão ela trata da situação

do negro só, não deveria, teria que ter outra na minha opinião que tratasse dessa

questão. Mas porque essa comissão existe e a do indígena não? Porque a questão do

negro passa pelo fenótipo que é a avaliação e a do indígena não, porque ele tem a

documentação da FUNAI. Porém o papel da DID em uma estrutura qualquer deveria ter

que é previsto que nem tem para deficiente, deveria ter um acompanhamento emonitorar

os alunos e é isso que eu tento fazer na divisão.

Esse acompanhamento deveria ser de uma forma que não está sendo feito, o

único contato que eu tive com os alunos indígenas porque a gente tem um contato com a

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FUNAI para garantir o transporte diário, ou seja, o passe de ônibus e nesse processo tá,

eu tive como o termo na FUNAI para a garantia desse auxílio passa parava verificação

se ele teve um número x de DP73, se ele faltou ou não. Então eu selecionei porque eu

estou sozinha nessa divisão, estou sozinha faz dois anos nessa divisão, isso não existe.

Ontem mesmo eu comentei isso, a federal tem na estrutura dela duas psicólogas,duas

psicopedagogas, mas aDID? Quem é psicólogo, doutora e especialista na área e com o

curso de psicologia (na esquina) para acompanhar os alunos então ela tem um

monitoramento bem bom, ela sabe cada aluno indígena e nem é o foco dela porque ela

não é da educação especial mas para o indígena e o negro ela pegou nota por nota dos

meninos, ela sabe.

Então o que eu fiz aqui? Sentei com cada um e selecionei quem não tem DP eu

eliminei, não vou pegar, quem não reprovou não vou pegar e sentei cada um aqui só de

Dourados porque não dei conta disso em outros lugares, só aqui em Dourados. E

perguntei: por que você faltou? Fiz alguns combinados mas eu não tenho pernas para

cobrar ou auxiliar no combinado, por exemplo, em alguns eu falava: olha você vai

participar no grupo de estudo e um mês depois eu perguntava: e aí, você entrou no

grupo de estudo? Ele respondia: entrei professora. Mas daí é verificar isso, esse

nivelamento não há condições, o bom dessa situação com os alunos indígenas é que eu

pude conversar com eles, eu acho que esse papo com os alunos é extremamente

importante, mas tem que ter gente pra isso, um plano de trabalho, não pode ser uma

coisa assim: se der eu faço.

O aluno cotista ou qualquer aluno ou, sobretudo esses, porque não vamos ser

hipócritas que existe uma diferença cultural, alunos que vem da aldeia pro município e

ficam sozinhos aqui, enfim, uma série de diferencial que requer esse acompanhamento

para que o aluno não repita de ano entre outras coisas. E foi bom também, porque eu

observei que os alunos começam a acumular um monte de DP e isso eu cheguei a

comentar internamente aqui na DID, ele pega um ano e faz quinze disciplinas, é o

caminho inverso do que tem que ser. Se eu tenho condições de fazer oito disciplinas por

ano se espera que eu seja capaz disso, mas, por uma série de barreiras que eu tenho

passar eu acabo fazendo seis.

Nessa discussão sobre a educação especial a questão que a gente tem que

discutir é que a permanência desses alunos aqui não é só uma questão financeira, é

currículo, mexer em currículo, o que é mexer em currículo? E olha que a gente já está

73 Dependências.

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na periferia de mexer em currículo, agora como é que deixa um aluno indígena que tem

todas as dificuldades da barreira linguística e tudo mais, do ensino médio que a gente

tem que mexer no ensino médio se não vai ser uma loucura, e a gente também tem que

fazer nossa parte e o cara fazendo quinze disciplinas por ano? E nessa entrevista eu

falei: filho, você vai reprovar de novo, que tal a gente diminuir isso? Mas isso eu fiz, a

gente tem que ter um aconselhamento dentro do curso, quem tem que chegar e falar:

olha você quer fazer a faculdade em cinco anos? Olha, sinto muito, mas não vai dar.

Tem vários entraves, mas o fato é que esse aluno indígena de 2014 não vai fazer em

seis, vai fazer em oito, se não vai acumular DP, quinze matérias? Ele não dá conta nem

de decorar o nome do professor dele, não dá.

Então nessa trajetória que a DID faz e tem que fazer é esse acompanhamento

com o indígena, deveria ter uma comissão própria de acompanhamento, multidisciplinar

da área da assistência, para assessorar e fazer essas discussões. Não é uma coisa

formalizada, por exemplo.

Eu fiz uma entrevista com diversos alunos, detectei algumas dificuldades, mas

eles têm outra perspectiva, fazem acompanhamento burocrático, dão bolsa, tudo mais, é

lógico que a assistência social em alguns casos conversa. A Miriam, que é a única

assistente social, ela também atende os alunos, trava alguns diálogos, sabe de algumas

coisas, mas isso acaba sendo não sistemático e muito mais do perfil do profissional que

está sentado aqui na mesa e dela lá do que como uma ação que tem que ser

desenvolvida, uma ação que eu te falei que acontece na lá federal, em alguns aspectos,

eles foram lá e fizeram mesmo. Agora eles têm estrutura para fazer isso, mas também

não precisa disso tudo, eu acho que esse acompanhamento dá e que aos poucos e é por

isso que eu acho que isso deveria ser assessoria porque essa coisa que tem assumida lá

na ponta, lá na coordenação quem conhece o aluno é o coordenador, ele sabe até o

fulano que assim é etc., é mas o sicrano mora lá naquela aldeia que é um problema.

Não sei como funciona com a psicóloga. A princípio dentro do que está proposto

você encaminha para que ela faça a terapia, tem um caso que eu acho que eu vou

encaminhar porque o problema daqui do grupo, aqui do grupo psicológico, porque eu

sou uma psicóloga, e além do mais eu não sei, eu não sei a universidade quer discutir

atendimento psicológico dentro da universidade. Se tivesse por exemplo, eu trabalhei

muitos anos em uma faculdade no curso de Psicologia, fui tutora de um curso de

Psicologia. Psicologia tem que ser feita lá na clínica, que é mais adequado, tem uma sala

ali, igual essa aqui, na questão acústica e tudo mais. Eu acho quepsicologia dentro da

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faculdade tem que ser psicologia institucional, que tem uma outra forma de atuação,

mas isso aí quem sou eu?

Como está instituído atende só os alunos de Dourados, é uma ação pra atender a

todos.

Eu acho que ter a cotas, bom elas existem. E as cotas já são de entendimento

comum que dá um vasto acesso, aí a gente volta para a questão das bolsas, por exemplo,

esse convênio que a gente tem com a FUNAI, eu fiquei em uma reunião de três horas, e

até agora eu não consegui viabilizar esse?Na sua plenitude, pagou os meses só os alunos

de Dourados, nós temos alunos aqui de Aquidauana indígena que eu falei aqui na

reunião, são os alunos que mais carecem desse apoio.

Porque eles pagam do próprio bolso. Lá tem o campus e a prefeitura deu o

diesel e eles tinham o ônibus e eles pagavam cento e pouco por mês que pra eles é

diferente e em Amambai a prefeitura paga e coisa que semana passada eu tentei

telefonar e isso vai ser um problemão, dois irmãos de Buriti a prefeitura bancava esses

ônibus e segundo a informação que me passaram, que não é certa ainda, a prefeitura

deixou de pagar, mas o líder indígena lá ele tem bom trânsito, tem meu número, me liga

a qualquer hora.

Tem que ter esse acompanhamento, essa assistência que é essencial, tem que

alguém acompanhando do ponto de vista pedagógico para mexer em currículo, chegar

pro coordenador e falar: o cara está fazendo quinze, não vai dar conta.

Então quer dizer, um olhar multiprofissional, agora, a universidade tem isso,

mas precisa de mais bolsa, precisa desse olhar, precisa monitorar esse aluno, saber, por

exemplo, a questão da FUNAI como eu disse me deu oportunidade por conta dessas

reuniões, quem vai e quem fica, eu chegava pro aluno e falava: para saber essas

questões das disciplinas, por que você falou justamente quando você ia receber o

dinheiro da FUNAI? Agora explica aqui pra FUNAI. E agora, amigo, o que eu vou

dizer? Olha, amigo, a próxima vez eu não vou poder dar o seu nome, olho o histórico

dos meninos aqui que receberam e etc. Mas esse acompanhamento sendo ele pouco ou

muito pessoal tem que acontecer e ele não acontece.

Nós temos alunos que, por conta desse convênio, temos alunos de Manaus, e é

ótimo, então por conta do convênio financeiro, essas meninas de Manaus me procuram,

pedem ajuda, elas conseguiram, a FUNAI bancou a passagem delas de ida e volta, a

menina lá de glória de Dourados que manda e-mail perguntando como está e etc. e por

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conta desse intercâmbio eu fiz banca por acaso de uma menina negra que ela ia pra lá,

17 anos, São Luís do Maranhão que não conhece nada.

A professora falou: socorre essa aluna minha,17 anos, perdida, não tem onde

morar.Eu falei: pode deixar. Daí no final deu que elas moraram juntas. Então além desse

acompanhamento burocrático, nota e etc., tem esse acompanhamento nas reuniões, essa

aproximação do aluno.

A DID com a PROEC74 ela tem se aproximado mais, deveria ser mais, por isso

que eu acho que DID é acessória pra mim, ela está no lugar errado inclusive, ela não

deveria estar na Pró-Reitoria de Extensão. No encontro de ontem ficou isso meio

colocado entre as universidades, todo mundo tem a impressão que está no lugar errado,

que os setores das universidades, eles é, por exemplo, embora as federais tenham, a

divisão das Ações Afirmativas fica com tudo, é a mesma coisa aqui, a diferença deles é

que eles têm uma sala que é o núcleo de acessibilidade, a federal aqui, a UFGD, tem

essa sala de acessibilidade e o (NEAB75 no negro e como tem um grupo de pesquisa

forte do grupo indígena, está separado.

Agora tem até, bom, não sei, eu desconheço, tenho até que fazer uma visita, eu

desconheço se tem um grupo por exemplo uma DID para a questão indígena também.

Na educação especial não tem porque, é o núcleo que faz essa política, não tem uma

divisão porque eles têm um núcleo, então nós chegamos à conclusão lá, todo mundo,

inclusive das particulares, que essa divisão ela teria que ter, teria que estar em outro

lugar na gestão e que ela articule e essa foi minha fala lá, que ela articule essas políticas,

que essas políticas sejam incorporadas por cada Pró-Reitoria né.

A PROEC tem muito relacionamento com a lei que a gente troca com os alunos

das cotas na hora da banca, tudo mais, e muito no acompanhamento do aluno com

deficiência porque o aluno com deficiência tem uma especificidade que exige

acompanhamento, providências específicas, como provas diferenciadas, materiais

diferentes, diferente do aluno indígena e negro, talvez uma capacitação para ele lidar

com a questão linguística e isso deveria ser feito, uma orientação do professor. Então a

fala nas outras universidades é essa, a minha ideia, eu penso em resgatar, e essa vai ser

minha proposta para a próxima gestão, resgatar, não como foi no primeiro momento,

mas que isso seja uma assessoria, que a ideia seja exatamente essa, assessorar todo

mundo, eu não posso, ir em um lugar para me chamarem para ver piso, piso de

74 Pró-Reitoria de Extensão e Assuntos Comunitário. 75 Núcleo de estudos Afro-Brasileiros.

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acessibilidade, eu sou professora, eu não entendo nada da rua. Aí é que tá, se por um

lado você tem esse setores de política por outro lado você também divididos recursos,

eu já trabalhei na Secretaria de Educação, justamente quando fizeram essa bobagem e aí

você acaba não atendendo ninguém, né, e justamente essa coisa de você acabar

segregando fazendo uma universidade para segmentos, da visibilidade eu posso até

contestar filosoficamente a existência da universidade para indígenas, para surdos, para

negros – como a zumbi que nós temos aqui – mas dá visibilidade, concentra, Há a

contradição da coisa. Não tem recursos, tem recursos como qualquer setor da PROEC

recursos para DID, diárias e tudo mais. Para a questão indígena que é o seu foco nós

temos a PVUI, não sei se você teve a oportunidade de entrevistar o pessoal de lá, eles

têm uma equipe de umas quatro pessoas para acompanhar isso, eles têm uma estrada já

com essa questão indígena, nesses dois anos nós fizemos reuniões com eles para saber

como que evitar trocar, passaram informações pra nós e nós pra eles, vê a questão, e eu

fui à assistência, o pró-reitor fomos lá juntos pra conversar pra ver quem faz a gerência

do PVUI, que é a bolsado nosso aluno indígena o que tem de específico além do Rede,

apenas que tem o programa, está lá atendendo os alunos com os computadores, a

professora B.L. vira e mexe está conversando com a gente também mas eles não, não

posso dizer oRede faz parte da minha gestão em específico, lógico a professora é daqui,

a universidade autorizou que ela participasse com instalação aqui, mas não é

institucional. O que é institucional pro aluno é a bolsa, gestada por nós aqui, que acaba

abrigando os alunos indígenas aqui também, alimentação, moradia e aquela coisa toda,

tem agora as políticas PIBICAF que tem poucos alunos indígenas, eu não tenho os

números agora.

Não seria desinteresse, por exemplo, eu vou dizer a minha impressão porque eu

não fiz nenhuma levantamento, nenhuma sistemática, a bolsa alimentação, o valor é

muito baixo e o, por exemplo, o PIBID é mais alto, é federal e ai teve até uma aluna,

nesses atendimentos que eu fiz com os indígenas, ela tinha essa bolsa alimentação,

menina ótima essa, fazia Pedagogia, e até o C. ficou sabendo que tinha umas bolsas lá

na federal e eu disse corre, porque é quase o dobro, ele entrou no projeto e de vez em

quando eu encontro ela e ela diz: o professora não acontece nada lá, os equipamentos

estão quebrados, até agora eu só fico sentada lendo e eu disse: fica quieta lá, não sai de

lá.

Daí fui lá com ela, acompanhei e era para microfilmar documentos, daí vira e

mexe a máquina quebra, fica lá que você está aprendendo e é dois anos de bolsa. E os

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alunos, você não pode acumular bolsa, esse auxílio tinha que ter um mecanismo de

rever isso ai, eu lembro da nossa bolsa, a gente, ninguém cortou meu salário e eu ganhei

bolsa, agora por que que não pode sim trabalhar e ter essa bolsa? Esse dinheirinho do

vale aqui, esse pessoal da FUNAI me apertou: ah, mas esse dinheiro faz falta? Porque a

FUNAI e o MEC têm uma briga de quem paga a conta do indígena por conta da

mudança, mas eu acho que enquanto a FUNAI está no comando ela tem que arcar com

as responsabilidades para com o aluno aqui.

Eu não posso dizer se esse dinheiro está ou não fazendo falta pro aluno porque

são muitas variáveis que levam o indígena à evasão, mas com certeza pergunta pra mim

que se você me desse um auxílio de passagem, pagando minha passagem para trabalhar

se esse dinheiro não ia fazer falta. Eles queriam que eu tivesse uma análise para definir

de aqueles cento e poucos reais que o aluno recebe leva a evadir, eu disse: me poupe.

Tem vários alunos que vêm me procurar dizendo:me ajuda.E eu digo: senta aí

mas eu não prometo nada, os alunos não conseguem entender qual o papel da UEMS e

qual o papel da FUNAI, penso eu que eles já compreenderam bastante apesar da

confusão inicial, tem uma comissão que trata do tema da FUNAI, tem uma aluna

envolvida.

Tem uma comissão que mexe só com esse auxílio da FUNAI, existe um termo

de colaboração FUNAI e UEMS que ela bancaria o translado do aluno casa-faculdade.

Faculdade-casa e toda a UEMS, em todas as unidades, mas a FUNAI disse que não

recursos financeiros pra isso. Eles não pagam, eles pagaram a passagem de umas

meninas da Amazônia, de uns daqui, não é algo sistemático, nós estamos em junho e

semana passada eu fui em uma reunião para estudar isso que ouviu de mim aqui, quem

faz uma pergunta dessas quer pagar? Não, né.

Como que eu posso provar que os cento e poucos reais fazem falta pro menino

para ele pagar? Se a FUNAI tem dúvida disso, quem sou eu? Agora a FUNAI até me

ligou e eles vão ver passes com a medianeira, mas o termo é claro, é para todo mundo,

mas eles nunca pagaram. Esse termo é assinado desde 2010, eles nunca pagaram, eles

têm mil e umas ligações que você bem imagina. Eu mando relatórios de pedidos pela

primeira vez e eu disse: vocês querem mesmo que eu faça relatórios?

A primeira vez em uma reunião foi lá em Campo Grande no início de 2012,

sentamos com toda a FUNAI e tiramos o termo da gaveta e colocamos em cima da

mesa, esse foi o movimento e o que eles fizeram? Eles tiveram uma discussão danada

sobre jurisdição porque a questão deles é operacional também, por exemplo: o aluno de

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Ponta Porã é de quem? Quem vai fazer o serviço? Por quê? Porque existe um

monitoramento pela FUNAI também então eles não querem, está lá, a menina falou,

eles não têm nem pernas para fazer isso.Eu disse: pode deixar que a UEMS faz isso, é

só vocês pagarem. O que fazer? Monitorar os alunos? Acompanhar notas? Ver se ele

ainda é merecedor do benefício? Ponto. Lógico que isso não é o ideal. Os alunos

assinam um acordo de responsabilidade e etc. Inventaram mil e uma, não saiu e o

pessoal aqui de Dourados resolveu em setembro pagar através de auxílio financeiro

direto na conta do menino, aí eles só beneficiaram os alunos deles da jurisdição deles

entendeu? De Dourados.

O que eu consegui é que eles bancassem os alunos de fora do Amazonas e de

Glória para ir e voltar para casa, ano passado foi só ela. Daí como que a FUNAI quer

que eu faça avaliação? Se eu fizer avaliação, a avaliação que eu for fazer é que não foi

cumprido, né, não foi, os alunos não foram beneficiados, somente os de Dourados.

Daí eu quero ver como que a FUNAI vai explicar para Aquidauana porque que

o aluno daqui de Dourados pode e ele não pode, daí eu explico: porque tem uma

burocracia, diga que os alunos de Aquidauana não serão beneficiados porque existem

problemas burocráticos que nós não damos conta de solucionar, em Dourados nós só

solucionamos porque existe uma medianeira que eu faço uma solicitação e etc., e eu

coloquei isso no papel, pouco provável. Então essas ações dentro da universidade,

voltando porque eu acho que esse é o foco, as bolsas eu acho que, na minha opinião,

devem ser ampliadas, 10% a lógica até aonde eu sei é que a população negra e parda era

maior que a indígena, mas eu acho que merece outro número já que é o segundo Estado

com maior população indígena do Brasil, não só 10%, poderíamos rever isso com novos

estudos e segundo aumentar o número de bolsas e solucionar de alguma forma para que

o menino possa ter um trabalho, que ele trabalha tem outro tipo de auxílio, por que que

no caso da pós-graduação esse acúmulo é possível? A gente recebe bolsa de estudo e

continua com o salário, por que não? É uma coisa das universidades, com fóruns

maiores e é nesse esforço político que a DID deveria estar envolvida mais concentrada

do que conversar com o aluno, também a função do assessor nesses assuntos é fomentar

a discussão, fazer como política mesmo, ver as necessidades, fortalecer as políticas de

afirmação, não ficar no“fazer”, a execução é importante? É, mas você fazer essas

discussões aprofundadas para que as coisas tomem um rumo que você possa consolidar,

uma política de vida, você tem que ter debate, você tem conversar, cutucar, provocar e é

isso que o seminário vai fazer.

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Você não pode dar assistência se não monitorar direito, e é complicado essa

coisa toda e separar o que é assistência e o que não é assistência, monitorar não é ver se

está com nota boa ou não isso não é assistência. Nós somos educação, não somos

assistência, você está vendo a caixinha onde você está? Então essas ações da questão do

aluno indígena servem para o aluno com deficiência, para o aluno negro, talvez menos

por ter outras especificidades.

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ANEXO 1:

LEI ESTADUAL Nº 2.589 DE 26 DE DEZEMBRO DE 2002, COTAS PARA INDÍGENAS NA UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MATO GROSSO DO SUL

LEI Nº 2.589, DE 26 DE DEZEMBRO DE 2002.

Dispõe sobre a reserva de vagas aos

vestibulandos índios na Universidade Estadual

de Mato Grosso do Sul (UEMS).

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O GOVERNADOR DO ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL. Faço saber que a Assembleia Legislativa decreta e eu sanciono a seguinte

Lei:

Art. 1º Fica a Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS)

obrigada a cotizar vagas destinadas ao ingresso de vestibulandos índios.

Art. 2º A UEMS deverá divulgar, a partir do próximo vestibular, o

número de vagas que serão oferecidas em cada um de seus cursos. Art. 3º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação, revogadas as

disposições em contrário. Campo Grande, 26 de dezembro de 2002.

JOSÉ ORCÍRIO MIRANDA DOS SANTOS

Governador

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ANEXO 2:

LEI ESTADUAL Nº 2.605, DE 6 DE JANEIRO DE 2003, COTAS PARA NEGROS NA UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MATO GROSSO DO SUL

LEI Nº 2.605, DE 6 DE JANEIRO DE 2003.

Dispõe sobre a reserva de vagas para

negros nos cursos de graduação da Universidade

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Estadual de Mato Grosso do Sul, e dá outras

providências.

O GOVERNADOR DO ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL. Faço saber que a Assembleia Legislativa decreta e eu sanciono a seguinte

Lei:

Art. 1º A Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul deverá reservar uma

cota mínima de 20% de suas vagas nos cursos de graduação destinada ao ingresso de

alunos negros.

Art. 2º O Poder Executivo, por meio da Universidade Estadual de Mato

Grosso do Sul, regulamentará a matéria no prazo de noventa dias a contar da publicação desta Lei.

Art. 3º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. Art. 4º Revogam-se as disposições em contrário. Campo Grande, 6 de janeiro de 2003.

JOSÉ ORCÍRIO MIRANDA DOS SANTOS

Governador

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ANEXO 3:

RESOLUÇÃO COUNI-UEMS Nº 241, DE 17 DE JULHO DE 2003

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RESOLUÇÃO COUNI-UEMS Nº 241, de 17 de julho de 2003.

Dispõe sobre a oferta das vagas em regime de cotas dos cursos de graduação da UEMS.

O CONSELHO UNIVERSITÁRIO da FUNDAÇÃO

UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MATO GROSSO DO SUL, no uso de suas atribuições legais, em reunião ordinária realizada em 17 de julho de 2003 e,

CONSIDERANDO a Lei nº 2.589, de 26 de dezembro de 2002,

que dispõe sobre a reserva de vagas aos vestibulandos índios na UEMS; CONSIDERANDO a Lei nº 2.605, de 6 de janeiro de 2003, que

dispõe sobre a reserva de vagas para negros nos cursos de graduação da UEMS,

R E S O L V E Art. 1º As vagas ofertadas para o ingresso aos cursos de

graduação da Fundação Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul, pelo processo

de seleção, serão aprovadas e normatizadas pelo Conselho de Ensino, Pesquisa e

Extensão, distribuídas por curso, obedecendo a seguinte proporção:

a) setenta por cento aos aprovados que concorreram de forma

geral;

b) vinte por cento aos aprovados que concorreram às vagas

ofertadas no regime de cotas para negros;

c) dez por cento aos aprovados que concorreram às vagas

ofertadas no regime de cotas para índios.

Art. 2º Esta Resolução entrará em vigor na data de sua

publicação, revogadas as disposições em contrário.

Prof.ª LEOCÁDIA AGLAÉ PETRY LEME

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Presidente COUNI/UEMS

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ANEXO 4:

RESOLUÇÃO COUNI-UEMS Nº 250, DE 31 DE JULHO DE 2003

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RESOLUÇÃO COUNI-UEMS Nº 250, de 31 de julho de 2003.

Altera a redação da alínea “b” do art. 1º da Resolução COUNI-UEMS Nº 241, de 17 de julho de 2003, que dispõe sobre a oferta das vagas em regime de cotas dos cursos de graduação da UEMS.

A PRESIDENTE DO CONSELHO UNIVERSITÁRIO da FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MATO GROSSO DO SUL, no uso das atribuições conferidas pelo inciso XV do art. 55 do Regimento Geral,

R E S O L V E “ad referendum”:

Art. 1º Fica alterada a redação da alínea “b” do art. 1º da

Resolução COUNI-UEMS Nº 241, de 17 de julho de 2003, publicada no DO/MS Nº

6051, de 1 de agosto de 2003, p. 21, que dispõe sobre a oferta das vagas em regime

de cotas dos cursos de graduação da UEMS, que passa a vigorar como segue:

“Art. 1º

b) vinte por cento aos aprovados que concorreram às vagas

ofertadas no regime de cotas para negros, oriundos de escolas da rede pública de

ensino ou bolsistas da rede privada de ensino.

Art. 2º Esta Resolução entrará em vigor na data de sua

publicação, revogadas as disposições em contrário.

Prof.ª LEOCÁDIA AGLAÉ PETRY LEME Presidente COUNI/UEMS

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ANEXO 5:

RESOLUÇÃO CEPE-UEMS Nº 430, DE 30 DE JULHO DE 2004

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RESOLUÇÃO CEPE-UEMS Nº 430, de 30 de julho de 2004.

Aprova as normas para a realização do processo seletivo de candidatos às vagas nos cursos de graduação da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul.

A VICE-PRESIDENTE, EM EXERCÍCIO DA

PRESIDÊNCIA, DO CONSELHO DE ENSINO, PESQUISA E EXTENSÃO da UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MATO GROSSO DO SUL, no uso das atribuições legais conferidas pelo art. 55, inciso VIII e inciso XXVI, e,

CONSIDERANDO que a Reunião Extraordinária do Conselho

Pleno convocada para o dia 28 de julho de 2004 não se realizou por falta de quórum; CONSIDERANDO que os assuntos constantes da ordem do dia

caracterizam-se pela urgência de normas para a oferta de cursos e a realização do processo seletivo;

CONSIDERANDO que estas normas referente ao processo

seletivo de candidatos aos cursos pressupõe datas e cronograma de execução cujo cumprimento fora da época comprometem o Calendário Acadêmico do próximo ano;

CONSIDERANDO que os projetos de resoluções foram

publicizados na página da Secretaria dos Órgãos Colegiados e através de correspondência eletrônica à comunidade universitária;

CONSIDERANDO que não foi registrada nenhuma proposta de

emenda para os referidos projetos de resoluções;

R E S O L V E: Art. 1º Ficam aprovadas as normas para a realização do

Processo Seletivo de candidatos às vagas nos cursos de graduação da Universidade

Estadual de Mato Grosso do Sul, conforme anexo que integra esta Resolução.

Art. 2º Esta Resolução entrará em vigor na data de sua publicação. Art. 3º Revoga-se a Resolução CEPE-UEMS Nº 382, de 14 de

agosto de 2003, e demais disposições em contrário. Profª ELEUZA FERREIRA DUARTE Vice-Presidente - em exercício da presidência - CEPE/UEMS

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Anexo da RESOLUÇÃO/CEPE-UEMS Nº 430, de 30/7/2004 NORMAS PARA REALIZAÇÃO DO PROCESSO SELETIVO DE

CANDIDATOS ÀS VAGAS NOS CURSOS DE GRADUAÇÃO DA UEMS CAPÍTULO I DO PROCESSO SELETIVO

Art. 1º O ingresso aos cursos de graduação, oferecidos pela Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul, será feito mediante Processo Seletivo classificatório, com aproveitamento dos candidatos até o limite de vagas fixado no Edital de Abertura do Processo Seletivo.

Art. 2º O planejamento, a organização e a execução do Processo Seletivo de

candidatos para ingresso aos cursos de graduação da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul obedecerão às normas contidas nesta Resolução.

Art. 3º O Processo Seletivo de candidatos será planejado, executado e

coordenado pelo Núcleo de Processo Seletivo da Pró-Reitoria de Ensino da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul.

Art. 4º O número de vagas, por curso e turno, a ser oferecido na seleção de

candidatos, será proposto pela Pró-Reitoria de Ensino e aprovado pelo Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão.

Art. 5º A Universidade poderá firmar convênios com instituições que

disponham de agências de atendimento com abrangência nacional para a realização das inscrições.

Art. 6º No manual do candidato constará: I - o programa exigido para a seleção; II - os critérios de classificação dos candidatos; III - as normas para efetivação da matrícula; IV - a ficha de inscrição; V - o formulário socioeconômico.

CAPÍTULO II DAS INSCRIÇÕES

Art. 7º As inscrições serão realizadas nas datas, horários e locais fixados no

Edital de Abertura do Processo Seletivo. § 1º A publicação do edital a que se refere o caput deste artigo deverá ocorrer

com antecedência mínima de 15 (quinze) dias da realização das provas de seleção. § 2º No edital, além dos requisitos necessários à inscrição, constarão: a) locais de inscrição; b) número de vagas ofertadas por curso, turno, Unidade Universitária e a

respectiva distribuição no regime de cotas;

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(Fls. 02/09 do anexo da RESOLUÇÃO/CEPE-UEMS Nº 430, de 30/7/2004) c) especificação das provas, datas, horários e locais de realização; d) critérios de pontuação e classificação dos candidatos; e) período de matrícula para primeira e segunda chamadas. Art. 8º Para a efetivação da inscrição, serão exigidos do candidato: I - fotocópia de documento oficial de identificação com foto (frente e verso); II - comprovante do pagamento da taxa de inscrição ou comprovante de

isenção; III - ficha de inscrição, devidamente preenchida; IV - caso o candidato tenha participado do Exame Nacional do Ensino Médio –

ENEM, nos últimos 3 (três) anos, poderá aproveitar a pontuação do referido exame, desde que não tenha zerado na Prova de Redação, devendo, para tanto, requerer e apresentar no ato da inscrição uma fotocópia do comprovante de participação no referido exame, em que conste o número de sua inscrição e o ano de realização.

§ 1º Os candidatos de nacionalidade estrangeira, sem visto permanente no país,

deverão apresentar fotocópia do passaporte com visto temporário.

§ 2º A isenção que trata o inciso II refere-se somente à taxa de inscrição.

§ 3º Serão considerados documentos oficiais de identificação, conforme o

disposto no inciso I deste artigo, os seguintes documentos:

a) carteiras de identidade expedidas pelos Comandos Militares, pelos

Institutos de Identificação/Secretarias de Segurança Pública;

b) carteiras expedidas pelos órgãos fiscalizadores de exercício profissional

(ordens e conselhos);

c) carteira nacional de habilitação – CNH (somente o modelo aprovado pelo

art. 159 da Lei Nº 9.503, de 23 de setembro de 1997);

d) carteira de trabalho e previdência social – CTPS.

Art. 9º Aos candidatos que optarem por concorrer no regime de cotas de 20% (vinte por cento) para negros, além dos incisos I, II, III e IV do art. 8º, serão exigidos:

I - uma foto colorida recente 5x7 cm; II - autodeclaração constante na ficha de inscrição; III - fotocópia do histórico escolar do Ensino Médio ou atestado de matrícula

expedidos por escola da rede pública de ensino; IV - declaração da condição de aluno bolsista fornecida por instituição da rede

privada de ensino, quando for o caso. § 1º Os candidatos inscritos no percentual de vagas para negros terão suas

inscrições avaliadas por uma comissão instituída pela Pró-Reitoria de Ensino da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul, composta por representantes da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul e do Movimento Negro, indicados pelo

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Fórum Permanente de Entidades do Movimento Negro do Mato Grosso do Sul e pelo Conselho Estadual de Defesa dos Direitos do Negro, que as deferirá ou não, por decisão fundamentada, de acordo com o fenótipo do candidato.

§ 2º Os candidatos que tiverem suas inscrições indeferidas concorrerão

(Fls. 03/09 do anexo da RESOLUÇÃO/CEPE-UEMS Nº 430, de 30/7/2004)automaticamente nos 70% (setenta por cento) referentes às vagas gerais.

§ 3º No ato da inscrição, o histórico escolar de origem estrangeira, referente ao

Ensino Médio, deve estar convalidado pelo Conselho Estadual de Educação correspondente.

§ 4º Os candidatos com histórico escolar de origem estrangeira que lograrem

aprovação no processo seletivo deverão, no ato de matrícula, apresentar prova de conclusão de escolaridade do Ensino Médio no Brasil ou declaração de processo de equivalência de estudos realizados no exterior, concedida pelo Conselho Estadual de Educação competente.

Art. 10. Aos candidatos que optarem por concorrer no regime de cotas de 10%

(dez por cento) para indígenas, além dos incisos II, III, e IV do art. 8º, serão exigidos: I - fotocópia da cédula de identidade indígena (frente e verso); II - declaração de descendência indígena e etnia, fornecida pela Fundação

Nacional do Índio – FUNAI, em conjunto com uma Comissão Étnica, constituída em cada comunidade.

Art. 11. Os candidatos que não declararem concorrer, formalmente na ficha de

inscrição, ao regime de cotas para negros ou indígenas, concorrerão automaticamente nos 70% (setenta por cento) referentes às vagas gerais.

§ 1º Fica vedada a inscrição em mais de um regime de cota. § 2º Em caso de dupla opção, o candidato concorrerá automaticamente nos

70% (setenta por cento) referentes às vagas gerais. Art. 12. No ato da inscrição, o candidato optará pelo curso, turno, Unidade

Universitária e regime de cotas pretendidos, dentre os constantes do Edital de Abertura do Processo Seletivo, indicando seus códigos e uma língua estrangeira, dentre as ofertadas.

§ 1º Para o atendimento ao disposto neste artigo, serão oferecidos os seguintes

idiomas na prova de língua estrangeira: a) inglês; b) espanhol. § 2º O candidato que não indicar sua opção de língua estrangeira fará

obrigatoriamente a prova de inglês.

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CAPÍTULO III DAS PROVAS

Art. 13. Os candidatos querealizaram o Exame Nacional do Ensino Médio,

nos últimos 3 (três) anos, poderãoutilizar o resultado obtido, desde que requeiram, (Fls. 04/09 do anexo da RESOLUÇÃO/CEPE-UEMS Nº 430, de 30/7/2004)

Preenchendo o campo destinado a esse fim na ficha de inscrição, podendo optar por realizar a primeira prova e/ou aproveitar a pontuação do Exame Nacional do Ensino Médio.

§ 1º A maior pontuação obtida pelo candidato, seja na prova do Exame

Nacional do Ensino Médio (através da soma da nota de redação e dos acertos da

prova de conhecimento gerais) ou o resultado da primeira prova da Universidade

Estadual de Mato Grosso do Sul, terá efeito para contagem de pontos.

§ 2º A informação do número da inscrição do Exame Nacional do Ensino

Médio não desobrigará o candidato a realizar a segunda prova, correspondente ao

curso de sua inscrição

Art. 14. A seleção de candidatos consistirá na realização de 2 (duas) provas com o seguinte formato:

I - a primeira prova constituir-se-á de: a) Redação; b) Prova de Conhecimentos Gerais, composta de 63 (sessenta e três) questões,

divididas em 7 (sete) questões em cada disciplina, abrangendo os conteúdos das seguintes disciplinas:

1. Língua Portuguesa; 2. Literatura Brasileira; 3. Língua Estrangeira (inglês ou espanhol); 4. Matemática; 5. Biologia; 6. Química; 7. Física; 8. Geografia; 9. História. II - a segunda prova constituir-se-á de Conhecimentos Específicos por área: a) Área 1 – Ciências Agrárias, Biológicas e da Saúde para os inscritos nos

cursos de Ciências Biológicas, Enfermagem, Zootecnia e Agronomia, com a seguinte constituição:

1. Biologia - 25 (vinte e cinco) questões; 2. Química - 15 (quinze) questões; 3. Física - 10 (dez) questões. b) Área 2 – Ciências Exatas e Tecnológicas para os inscritos nos cursos de

Matemática, Física, Química e Ciência da Computação, com a seguinte constituição: 1. Física - 15 (quinze) questões; 2. Matemática - 20 (vinte) questões;

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3. Química - 15 (quinze) questões.

c) Área 3 – Ciências Humanas e Sociais para os inscritos nos cursos de

Letras – Habilitação Português/Espanhol, Letras – Habilitação Português/Inglês,

Pedagogia, Direito, Turismo, Administração – Habilitação Comércio Exterior,

Administração – Habilitação Administração Rural, História, Geografia e Ciências

Econômicas, com a

(Fls. 05/09 do anexo da RESOLUÇÃO/CEPE-UEMS Nº 430, de 30/7/2004) seguinte constituição:

1. Língua Portuguesa - 20 (vinte) questões; 2. Literatura Brasileira - 10 (dez) questões; 3. História - 10 (dez) questões; 4. Geografia - 10 (dez) questões. Art. 15. As provas serão elaboradas abrangendo os conteúdos do Ensino

Médio. Art. 16. Com exceção da Redação, as questões das provas de seleção de

candidatos serão de múltipla escolha, num total de 5 (cinco) proposições em cada questão.

Art. 17. O candidato à seleção nos cursos de graduação da Universidade

Estadual de Mato Grosso do Sul não poderá ausentar-se da sala onde esteja realizando a prova, antes de completados 60 (sessenta) minutos do início da prova.

Art. 18. Será eliminado do Processo Seletivo dos cursos de graduação da

Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul o candidato que obtiver índice menor que 20% (vinte por cento) na prova de Conhecimentos Gerais, nota 0 (zero) na Redação ou em qualquer uma das disciplinas constituintes da segunda prova.

Parágrafo único. Será atribuída nota 0 (zero) à prova que o candidato não

realizar. Art. 19. Caberá pedido de reconsideração do gabarito de respostas das provas

do Processo Seletivo, mediante requerimento do interessado protocolizado junto ao Núcleo de Processo Seletivo, devidamente justificado, até o prazo máximo de 24 (vinte e quatro) horas após a divulgação do mesmo.

Parágrafo único. O pedido de reconsideração será analisado por uma banca de

revisão designada pelo Núcleo de Processo Seletivo. Art. 20. Em nenhuma hipótese haverá revisão de prova do Processo Seletivo. Art. 21. O processo classificatório será realizado por cotas e constituído pela

soma do resultado obtido pelo candidato nas 2 (duas) provas, obedecendo a seguinte

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fórmula: PF = Pontuação Final = PP1+PP2

Prova 1 PP1 = NR x PR + NCg x PCg, onde: PP1 Pontos obtidos na Prova 1 (Redação e Conhecimentos Gerais) NR Nota da Redação PR Peso da Redação NCg Número de acertos das questões da Prova de Conhecimentos Gerais PCg Peso da Prova de Conhecimento Gerais

(Fls. 06/09 do anexo da RESOLUÇÃO/CEPE-UEMS Nº 430, de 30/7/2004)

Prova 2 PP2 = Sn(NEn x PEn), onde: n Número de provas PP2 Pontos obtidos na Prova 2 (Conhecimentos Específicos) Sn Somatório dos pontos obtidos nas n provas NEn Número de acertos das questões da Prova Específica por disciplina PEn Peso por disciplina da Prova Específica

Art. 22. Para o cálculo da pontuação final será aplicada a seguinte regra:

Tabela 1 DISCIPLINAS NÚMERO DE QUESTÕES PESO Redação -- 3,7 Conhecimentos Gerais 63 1

Tabela 2 (Área 1 – Ciências Agrárias, Biológicas e da Saúde) DISCIPLINAS NÚMERO DE QUESTÕES PESO Biologia 25 3 Química 15 1 Física 10 1

Tabela 3 (Área 2 – Ciências Exatas e Tecnológicas) DISCIPLINAS NÚMERO DE QUESTÕES PESO Física 15 2 Matemática 20 2 Química 15 2

Tabela 4 (Área 3 – Ciências Humanas e Sociais) DISCIPLINAS NÚMERO DE QUESTÕES PESO Língua Portuguesa 20 3 Literatura Brasileira 10 2 Geografia 10 1 História 10 1

§ 1º Para efeito do disposto neste artigo, observar-se-á que:

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a) a Redação será considerada como uma disciplina cuja pontuação será de 0 (zero) a 10 (dez);

b) a pontuação total da prova 1 será obtida através da soma da nota de redação e os acertos correspondentes à prova 1, perfazendo um total máximo de cem pontos;

c) a pontuação total obtida na prova 2 corresponderá a um total máximo de 100 (cem) pontos nas seguintes áreas:

1. Área 1 – Ciências Agrárias, Biológicas e da Saúde: 100 (cem) pontos; 2. Área 2 – Ciências Exatas e Tecnológicas: 100 (cem) pontos; 3. Área 3 – Ciências Humanas e Sociais: 100 (cem) pontos. § 2ºA classificação dos candidatos por curso, turno e regime de cotas far-se-á

(Fls. 07/09 do anexo da RESOLUÇÃO/CEPE-UEMS Nº 430, de 30/7/2004)

pela ordem decrescente do total de pontos padronizados pela soma das 2 (duas) provas. § 3º Havendo empate no total de pontos padronizados pela soma das 2 (duas)

provas por 2 (dois) ou mais candidatos a uma mesma vaga, curso, turno e regime de cotas, dar-se-á preferência, pela ordem, ao candidato que:

a) obtiver maior pontuação bruta nas disciplinas das áreas em ordem decrescente de peso;

b) obtiver maior pontuação bruta na Redação; c) obtiver maior pontuação bruta na Prova de Conhecimentos Gerais,

excluindo-se a nota da Redação; d) for o mais idoso. § 4ºNa hipótese de pesos iguais em 2 (duas) ou mais disciplinas, será

considerada, para efeito do que dispõe a alínea a do parágrafo anterior, a média aritmética da pontuação bruta obtida nessas disciplinas.

CAPÍTULO IV DA DIVULGAÇÃO DOS RESULTADOS

Art. 23. O resultado do Processo Seletivo dos cursos de graduação da

Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul será divulgado pelo Núcleo de Processo Seletivo, por ordem decrescente de pontuação dos classificados, dentro de cada regime de cota, especificando os períodos de matrícula de acordo com o estabelecido no Manual do Candidato.

Art. 24.Observada a ordem de classificação dos candidatos, a Universidade

Estadual de Mato Grosso do Sul reserva-se o direito de fazer tantas convocações quantas julgar necessárias, para o preenchimento das vagas dos cursos oferecidos.

Art. 25. O resultado do Processo Seletivo será válido apenas para o período a

que se refere.

CAPÍTULO V DAS CONVOCAÇÕES PARA MATRÍCULA

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Art. 26. As convocações para efetivação da matrícula dos candidatos

classificados no Processo Seletivo obedecerão ao disposto nesta Resolução e no Edital de Abertura do Processo Seletivo.

§ 1º Os classificados, no limite das vagas por cotas correspondentes, ficarão

automaticamente convocados em primeira chamada para a matrícula, com a publicação dos resultados do Processo Seletivo em data e horário conforme Calendário Acadêmico.

§ 2º Após a matrícula dos classificados em primeira chamada, será feita pela

Divisão de Assuntos Acadêmicos a publicação de uma convocação nominal, dos (Fls. 08/09 do anexo da RESOLUÇÃO/CEPE-UEMS Nº 430, de 30/7/2004) subseqüentes do mesmo curso, turno e regime de cotas, no limite das vagas ainda existentes.

§ 3º Após as convocações previstas nos §§ 1º e 2º deste artigo, as vagas

oriundas de cancelamento de matrícula, efetuadas no prazo estabelecido em Calendário Acadêmico, serão destinadas às chamadas extraordinárias de subseqüentes do mesmo curso, turno e regime de cotas.

§ 4º Entende-se por subseqüentes do mesmo curso, turno e regime de cotas, os

candidatos classificados que não tenham ainda sido convocados para a matrícula, na forma deste artigo.

§ 5º Ainda havendo vagas remanescentes dos regimes de cotas proceder-se-á

da seguinte maneira: a) as vagas remanescentes do regime de cotas para negros serão preenchidas

por candidatos das cotas para indígenas, obedecendo à ordem de classificação; b) as vagas remanescentes do regime de cotas para indígenas serão preenchidas

por candidatos da cota de negros, obedecendo à ordem de classificação; c) ainda havendo vagas remanescentes nos regimes de cotas, as mesmas serão

preenchidas pelos classificados nos 70% (setenta por cento) referentes às vagas gerais, obedecendo à ordem de classificação.

§ 6º Não havendo candidato aprovado no regime de cotas, as vagas destinadas

às cotas serão preenchidas conforme o parágrafo anterior, devendo as mesmas ser

publicadas em primeira chamada pelo Núcleo de Processo Seletivo.

§ 7º Havendo vagas remanescentes na oferta geral as mesmas serão

preenchidas por candidatos classificados nos regimes de cotas.

§ 8º Após as convocações previstas neste artigo, se ainda restarem vagas e não houver candidatos subseqüentes serão essas vagas publicadas pela Divisão de Assuntos Acadêmicos, para ingresso de portadores de diploma de curso superior, conforme legislação vigente.

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Art. 27. O candidato convocado para matrícula em qualquer etapa ou chamada

que deixar de efetuá-la no prazo estabelecido perderá o direito à vaga. Art. 28. Esgotadas todas as convocações, as vagas provenientes do

cancelamento de matrículas serão destinadas ao processo de transferência para o ano subseqüente, de acordo com as normas específicas estabelecidas pelo Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão.

CAPÍTULO VI DAS DISPOSIÇÕES GERAIS

Art. 29. Os candidatos que não concluírem o Ensino Médio até a data da

(Fls. 09/09 do anexo da RESOLUÇÃO/CEPE-UEMS Nº 430, de 30/7/2004)

matrícula farão o Processo Seletivo a título de experiência, na modalidade de “treineiros”, sem direito à classificação, podendo se inscrever em uma das seguintes áreas: a) Ciências Agrárias, Biológicas e da Saúde, b) Ciências Exatas e Tecnológicas, c) Ciências Humanas e Sociais, recebendo apenas a pontuação final de cada área.

§ 1º O candidato “treineiro”, que não se identificar como tal e for

classificado no curso da área inscrita e que não tiver concluído o Ensino Médio ou

equivalente (conforme inciso II do art. 44 da Lei nº 9394/96) até a data da matrícula,

não terá direito à efetivação da matrícula.

§ 2º O candidato “treineiro” não terá direito à isenção das taxas. Art. 30. Ao candidato portador de necessidades especiais será concedido o

recurso especial de que precisa, desde que requerido em conformidade com o estabelecido no Edital de Abertura do Processo Seletivo e no Manual do Candidato.

Art. 31. Os recursos só poderão ser interpostos nos casos de infringência às

disposições desta norma. § 1º O recurso a que se refere o caput do artigo anterior será interposto perante

o Núcleo de Processo Seletivo, no prazo de 3 (três) dias úteis, contados da data de divulgação dos resultados do Processo Seletivo.

§ 2º Recebido o recurso, será este remetido à decisão do Pró-Reitor de Ensino,

ouvida a Procuradoria Jurídica, acompanhado de parecer do Núcleo de Processo Seletivo.

§ 3º O Pró-Reitor de Ensino deverá decidir a respeito do recurso, no prazo de

dez dias contados da data do protocolo inicial. Art. 32. Independente de outras sanções aplicáveis, será excluído da

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Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul, em qualquer época, o candidato classificado e matriculado que tenha realizado o Processo Seletivo usando informações ou documentos falsos ou outros meios ilícitos.

Art. 33. Qualquer irregularidade cometida por pessoa envolvida com o

Processo Seletivo, em qualquer de suas etapas, será objeto de apuração nas esferas pertinentes.

Art. 34. O Manual do Candidato e os Editais referentes ao Processo Seletivo,

constituir-se-ão em normas complementares desta Resolução. Art. 35. Os casos omissos serão resolvidos pela Pró-Reitoria de Ensino, ouvido

o Núcleo de Processo Seletivo.

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ANEXO 6:

RESOLUÇÃO COUNI-UEMS Nº 437, de 11 de junho de 2014.

RESOLUÇÃO COUNI-UEMS Nº 437, de 11 de junho de 2014.

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Cria o Centro de Estudos, Pesquisa e Extensão em Educação, Gênero, Raça e

Etnia - CEPEGRE da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul. O CONSELHO UNIVERSITÁRIO da UNIVERSIDADE ESTADUAL DE

MATO GROSSO DO SUL, no uso de suas atribuições legais, em reunião ordinária realizada em 11 de junho de 2014 e,

CONSIDERANDO a Lei Estadual nº 2.589, de 26 de dezembro de 2002, que dispõe sobre aReservadas vagas aos vestibulandos índios na Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS);

CONSIDERANDO a Lei Federal nº10.639, de 9 de janeiro de 2003, que altera a Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira”;

CONSIDERANDO a Lei Estadual nº 2.605, de 6 de janeiro de 2003, que dispõe sobrea reserva de vagas para negros nos cursos de graduação da UEMS;

CONSIDERANDO a Lei Federal nº 11.645, de 10 de março de 2008, que altera a Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, modificada pela Lei nº 10.639, de 9 de janeiro de 2003, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena”;

CONSIDERANDO a Resolução CNE/CP nº 1, de 17 de junho de 2004, que institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana;

CONSIDERANDO o Plano Plurianual da União 2012-2015, instituído nos termos da Lei 12.593, de 18 de janeiro de 2012,

R E S O L V E: Art. 1º Criar o Centro de Estudos, Pesquisa e Extensão em Educação, Gênero,

Raça e Etnia (CEPEGRE), vinculado administrativamente à Reitoria, e didática, técnica e cientificamente às Pró-Reitorias da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS).

Art. 2º O CEPEGRE tem como objetivo propor, subsidiar, articular monitorar e avaliar as políticas públicas de Ação Afirmativa na UEMS, ligadas às questões de educação, gênero e sexualidade, raça e etnia, com foco no processo de inclusão para o acesso, permanência e conclusão na Educação Superior, por meio do diálogo e participação efetiva, junto aos demais sistemas de educação, órgãos governamentais, não governamentais e Movimentos Sociais, na luta contra os processos de discriminação, racismo, homofobia, violência doméstica e contra a mulher.

Art. 3º O CEPEGRE deverá obedecer às legislações vigentes específicas do Centro de Ensino, Pesquisa e Extensão (CEPEX) da UEMS, regulamentadas

pelos órgãos colegiados superiores. Art. 4º Esta Resolução entrará em vigor na data de sua publicação. Art. 5º Revogam-se as disposições em contrário. Dourados, 11 de junho de 2014. FABIO EDIR DOS SANTOS COSTA Presidente COUNI-UEMS

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ANEXO 7 – PARECER COMITÊ DE ÉTICA EM PESQUISA DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO DO SUL NÚMERO 814.869/

2014

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ANEXO 8:

PORTARIA NORMATIVA No 18, DE 11 DE OUTUBRO DE 2012

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PORTARIA NORMATIVA No 18, DE 11 DE OUTUBRO DE 2012 Dispõe sobre a implementação das reservas de vagas em instituições federais de ensino de que tratam a Lei no 12.711, de 29 de agosto de 2012, e o Decreto no 7.824, de 11 de outubro de 2012. O MINISTRO DE ESTADO DA EDUCAÇÃO, no uso da atribuição que lhe confere o art. 84, caput, inciso IV, da Constituição, e o art. 9º do Decreto no 7.824, de 11 de outubro de 2012, e tendo em vista o disposto na Lei no 12.711, de 29 de agosto de 2012, resolve: CAPÍTULO I DAS DISPOSIÇÕES GERAIS Art. 1o A implementação das reservas de vagas de que tratam a Lei no 12.711, de 29 de gosto de 2012, e o Decreto no 7.824, de 11 de outubro de 2012, por parte das instituições federais de ensino vinculadas ao Ministério da Educação que ofertam vagas de educação superior e pelas instituições federais de ensino que ofertam vagas em cursos técnicos de nível médio observará o disposto nesta Portaria. Art. 2o Para os efeitos do disposto na Lei no 12.711, de 2012, no Decreto nº 7.824, de 2012, e nesta Portaria, considera-se: I - concurso seletivo, o procedimento por meio do qual se selecionam os estudantes para ingresso no ensino médio ou superior, excluídas as transferências e os processos seletivos destinados a portadores de diploma de curso superior; II - escola pública, a instituição de ensino criada ou incorporada, mantida e administrada pelo Poder Público, nos termos do inciso I, do art. 19, da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996; III - família, a unidade nuclear composta por uma ou mais pessoas, eventualmente ampliada por outras pessoas que contribuam para o rendimento ou tenham suas despesas atendidas por aquela unidade familiar, todas moradoras em um mesmo domicílio; IV - morador, a pessoa que tem o domicílio como local habitual de residência e nele reside na data de inscrição do estudante no concurso seletivo da instituição federal de ensino; V - renda familiar bruta mensal, a soma dos rendimentos brutos auferidos por todas as pessoas da família, calculada na forma do disposto nesta Portaria. VI - renda familiar bruta mensal per capita, a razão entre a renda familiar bruta mensal e o total de pessoas da família, calculada na forma do art. 7o desta Portaria. CAPÍTULO II DAS MODALIDADES DE RESERVA DE VAGAS Art. 3o As instituições federais vinculadas ao Ministério da Educação - MEC que ofertam vagas de educação superior reservarão, em cada concurso seletivo para ingresso nos cursos de graduação, por curso e turno, no mínimo 50% (cinquenta por cento) de suas vagas para estudantes que tenham cursado integralmente o ensino médio em

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escolas públicas, inclusive em cursos de educação profissional técnica, observadas as seguintes condições: I - no mínimo 50% (cinquenta por cento) das vagas de que trata o caput serão reservadas aos estudantes com renda familiar bruta igual ou inferior a 1,5 (um vírgula cinco) salário-mínimo per capita; e II - proporção de vagas no mínimo igual à da soma de pretos, pardos e indígenas na população da unidade da Federação do local de oferta de vagas da instituição, segundo o último Censo Demográfico divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE, será reservada, por curso e turno, aos autodeclarados pretos, pardos e indígenas.

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Parágrafo único. Os resultados obtidos pelos estudantes no Exame Nacional do Ensino Médio - ENEM poderão ser utilizados como critério de seleção para as vagas mencionadas neste artigo. Art. 4o As instituições federais que ofertam vagas de ensino técnico de nível médio reservarão, em cada concurso seletivo para ingresso nos cursos de nível médio, por curso e turno, no mínimo 50% (cinquenta por cento) de suas vagas para estudantes que tenham cursado integralmente o ensino fundamental em escolas públicas, observadas as seguintes condições: I - no mínimo 50% (cinquenta por cento) das vagas de que trata o caput serão reservadas aos estudantes com renda familiar bruta igual ou inferior a 1,5 (um vírgula cinco) salário-mínimo per capita; e II - proporção de vagas no mínimo igual à da soma de pretos, pardos e indígenas na população da unidade da Federação do local de oferta de vagas da instituição, segundo o último Censo Demográfico divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE, será reservada, por curso e turno, aos autodeclarados pretos, pardos e indígenas. CAPÍTULO III DAS CONDIÇÕES PARA CONCORRER ÀS VAGAS RESERVADAS Seção I Da Condição de Egresso de Escola Pública Art. 5o Somente poderão concorrer às vagas reservadas de que tratam os arts. 3o e 4o: I - para os cursos de graduação, os estudantes que: a) tenham cursado integralmente o ensino médio em escolas públicas, em cursos regulares ou no âmbito da modalidade de Educação de Jovens e Adultos; ou b) tenham obtido certificado de conclusão com base no resultado do Exame Nacional do Ensino Médio - ENEM, do Exame Nacional para Certificação de Competências de Jovens e Adultos - ENCCEJA ou de exames de certificação de competência ou de avaliação de jovens e adultos realizados pelos sistemas estaduais de ensino; e II - para os cursos técnicos de nível médio, os estudantes que: a) tenham cursado integralmente o ensino fundamental em escolas públicas, em cursos regulares ou no âmbito da modalidade de Educação de Jovens e Adultos; ou b) tenham obtido certificado de conclusão com base no resultado do ENCCEJA ou de exames de certificação de competência ou de avaliação de jovens e adultos realizados pelos sistemas estaduais de ensino. § 1o Não poderão concorrer às vagas reservadas os estudantes que tenham, em algum momento, cursado em escolas particulares parte do ensino médio, no caso do inciso I do caput, ou parte do ensino fundamental, no caso do inciso II do caput. § 2o As instituições federais de ensino poderão, mediante regulamentação interna, exigir que o estudante comprove ter cursado integralmente o ensino médio em escolas públicas. Seção II Da Condição de Renda Art. 6o Somente poderão concorrer às vagas reservadas de que tratam o inciso I do art. 3º e o inciso I do art. 4º os estudantes que comprovarem a percepção de renda familiar bruta mensal igual ou inferior a 1,5 (um vírgula cinco) salário-mínimo per capita. Art. 7o Para os efeitos desta Portaria, a renda familiar bruta mensal per capita será apurada de acordo com o seguinte procedimento: I - calcula-se a soma dos rendimentos brutos auferidos por todas as pessoas da família a que pertence o estudante, levando-se em conta, no mínimo, os três meses anteriores à data de inscrição do estudante no concurso seletivo da instituição federal de ensino;

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II - calcula-se a média mensal dos rendimentos brutos apurados após a aplicação do disposto no inciso I do caput; e

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III - divide-se o valor apurado após a aplicação do disposto no inciso II do caput pelo número de pessoas da família do estudante. § 1o No cálculo referido no inciso I do caput serão computados os rendimentos de qualquer natureza percebidos pelas pessoas da família, a título regular ou eventual, inclusive aqueles provenientes de locação ou de arrendamento de bens móveis e imóveis. § 2o Estão excluídos do cálculo de que trata o §1o: I - os valores percebidos a título de: a) auxílios para alimentação e transporte; b) diárias e reembolsos de despesas; c) adiantamentos e antecipações; d) estornos e compensações referentes a períodos anteriores; e) indenizações decorrentes de contratos de seguros; f) indenizações por danos materiais e morais por força de decisão judicial; e II - os rendimentos percebidos no âmbito dos seguintes programas: a) Programa de Erradicação do Trabalho Infantil; b) Programa Agente Jovem de Desenvolvimento Social e Humano; c) Programa Bolsa Família e os programas remanescentes nele unificados; d) Programa Nacional de Inclusão do Jovem - Pró-Jovem; e) Auxílio Emergencial Financeiro e outros programas de transferência de renda destinados à população atingida por desastres, residente em Municípios em estado de calamidade pública ou situação de emergência; e f) demais programas de transferência condicionada de renda implementados por Estados, Distrito Federal ou Municípios; Art. 8o A apuração e a comprovação da renda familiar bruta mensal per capita tomarão por base as informações prestadas e os documentos fornecidos pelo estudante, em procedimento de avaliação sócio-econômica a ser disciplinado em edital próprio de cada instituição federal de ensino, observado o disposto nesta Portaria. § 1o O edital de que trata o caput estabelecerá, dentre outros: I - os prazos e formulários próprios para a prestação e a comprovação dos dados sócio-econômicos pelo estudante, após a confirmação de sua classificação dentro do número de vagas reservadas para o critério de renda; II - os documentos necessários à comprovação da renda familiar bruta mensal per capita, observado o rol mínimo de documentos recomendados que consta do Anexo II a esta Portaria. III - o prazo e a autoridade competente para interposição de recurso em face da decisão que reconhecer a inelegibilidade do estudante às vagas reservadas para o critério de renda; e IV - o prazo de arquivamento dos documentos apresentados pelos estudantes, que será no mínimo de cinco anos. § 2o O edital poderá prever a possibilidade de realização de entrevistas e de visitas ao local de domicílio do estudante, bem como de consultas a cadastros de informações sócio-econômicas. § 3o O Ministério da Educação poderá firmar acordos e convênios com órgãos e entidades públicas para viabilizar, às instituições federais de ensino, o acesso a bases de dados que permitam a avaliação da veracidade e da precisão das informações prestadas pelos estudantes. Art. 9o A prestação de informação falsa pelo estudante, apurada posteriormente à matrícula, em procedimento que lhe assegure o contraditório e a ampla defesa, ensejará

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o cancelamento de sua matrícula na instituição federal de ensino, sem prejuízo das sanções penais.

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CAPÍTULO IV DO CÁLCULO DAS VAGAS RESERVADAS Art. 10. O número mínimo de vagas reservadas em cada instituição federal de ensino que trata esta Portaria será fixado no edital de cada concurso seletivo e calculado de acordo com o seguinte procedimento: I - define-se o total de vagas por curso e turno a ser ofertado no concurso seletivo; II - reserva-se o percentual de 50% (cinquenta por cento) do total de vagas definido no inciso I, por curso e turno, para os estudantes que tenham cursado integralmente o ensino fundamental ou médio, conforme o caso, em escolas públicas; III - reserva-se o percentual de 50% (cinquenta por cento) do total de vagas apurado após a aplicação da regra do inciso II, por curso e turno, para os estudantes com renda familiar bruta igual ou inferior a 1,5 (um vírgula cinco) salário-mínimo per capita; IV - reservam-se as vagas aos estudantes autodeclarados pretos, pardos e indígenas com renda familiar bruta igual ou inferior a 1,5 (um vírgula cinco) salário-mínimo per capita, da seguinte forma: a) identifica-se, no último Censo Demográfico divulgado pelo IBGE, o percentual correspondente ao da soma de pretos, pardos e indígenas na população da unidade da Federação do local de oferta de vagas da instituição; b) aplica-se o percentual de que trata a alínea "a" deste inciso ao total de vagas apurado após a aplicação do disposto no inciso III; V - reservam-se as vagas destinadas aos estudantes autodeclarados pretos, pardos e indígenas com renda familiar bruta superior a 1,5 (um vírgula cinco) salário-mínimo per capita, da seguinte forma: a) apura-se a diferença entre os números de vagas encontrados após a aplicação do disposto nos incisos II e III; b) identifica-se, no último Censo Demográfico divulgado pelo IBGE, o percentual correspondente ao da soma de pretos, pardos e indígenas na população da unidade da Federação do local de oferta de vagas da instituição; c) aplica-se o percentual de que trata a alínea "b" deste inciso ao número de vagas apurado após a aplicação do disposto na alínea "a" deste inciso. § 1o Os cálculos de que tratam os incisos do caput serão efetuados a partir da aplicação das fórmulas constantes do Anexo I a esta Portaria. § 2o Diante das peculiaridades da população do local de oferta das vagas, e desde que assegurado o número mínimo de vagas reservadas à soma dos pretos, pardos e indígenas da unidade da Federação do local de oferta de vagas, apurado na forma deste artigo, as instituições federais de ensino, no exercício de sua autonomia, poderão, em seus editais, assegurar reserva de vagas separadas para os indígenas. Art. 11. Sempre que a aplicação dos percentuais para a apuração da reserva de vagas de que trata o art. 10 implicar resultados com decimais, será adotado, em cada etapa do cálculo, o número inteiro imediatamente superior. Parágrafo único. Deverá ser assegurada a reserva de, no mínimo, uma vaga em decorrência do disposto em cada um dos incisos IV e V do art. 10. Art. 12. As instituições federais de ensino poderão, por meio de políticas específicas de Ações Afirmativas , instituir reservas de vagas: I - suplementares, mediante o acréscimo de vagas reservadas aos números mínimos referidos no art. 10; e II - de outra modalidade, mediante a estipulação de vagas específicas para atender a outras Ações Afirmativas . Art. 13. Os editais dos concursos seletivos das instituições federais de ensino de que trata esta Portaria indicarão, de forma discriminada, por curso e turno, o número de

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vagas reservadas em decorrência do disposto na Lei nº 12.711, de 2012, e de políticas de Ações Afirmativas que eventualmente adotarem. CAPÍTULO V DO PREENCHIMENTO DAS VAGAS RESERVADAS

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Art. 14. As vagas reservadas serão preenchidas segundo a ordem de classificação, de acordo com as notas obtidas pelos estudantes, dentro de cada um dos seguintes grupos de inscritos: I - estudantes egressos de escola pública, com renda familiar bruta igual ou inferior a 1,5 (um vírgula cinco) salário-mínimo per capita: a) que se autodeclararam pretos, pardos e indígenas; b) que não se autodeclararam pretos, pardos e indígenas. II - estudantes egressos de escolas públicas, com renda familiar bruta superior a 1,5 (um vírgula cinco) salário-mínimo per capita: a) que se autodeclararam pretos, pardos e indígenas; b) que não se autodeclararam pretos, pardos e indígenas. III - demais estudantes. Parágrafo único. Assegurado o número mínimo de vagas de que trata o art. 10 e no exercício de sua autonomia, as instituições federais de ensino poderão, em seus concursos seletivos, adotar sistemática de preenchimento de vagas que contemple primeiramente a classificação geral por notas e, posteriormente, a classificação dentro de cada um dos grupos indicados nos incisos do caput. Art. 15. No caso de não preenchimento das vagas reservadas aos autodeclarados pretos, pardos e indígenas, aquelas remanescentes serão preenchidas pelos estudantes que tenham cursado integralmente o ensino fundamental ou médio, conforme o caso, em escolas públicas, da seguinte forma: I - as vagas reservadas para o grupo de estudantes indicado na alínea "a" do inciso I do art. 14 serão ofertadas, pela ordem: a) aos estudantes do grupo indicado na alínea "b", do inciso I do art. 14; e b) restando vagas, aos estudantes do grupo indicado no inciso II do art. 14, prioritariamente aos estudantes de que trata a alínea "a" do mesmo inciso; II - as vagas reservadas para o grupo de estudantes indicado na alínea "b", do inciso I do art. 14 serão ofertadas, pela ordem: a) aos estudantes do grupo indicado na alínea "a", do inciso I do art. 14; e b) restando vagas, aos estudantes do grupo indicado no inciso II do art. 14, prioritariamente aos estudantes de que trata a alínea "a" do mesmo inciso; III - as vagas reservadas para o grupo de estudantes indicado na alínea a, do inciso II do art. 14 serão ofertadas, pela ordem: a) aos estudantes do grupo indicado na alínea "b", do inciso II do art. 14; e b) restando vagas, aos estudantes do grupo indicado no inciso I do art. 14, prioritariamente aos estudantes de que trata a alínea "a" do mesmo inciso; IV - as vagas reservadas para o grupo de estudantes indicado na alínea "b", do inciso II do art. 14 serão ofertadas, pela ordem: a) aos estudantes do grupo indicado na alínea "a", do inciso II do art. 14; e b) restando vagas, aos estudantes do grupo indicado no inciso I do art. 14, prioritariamente aos estudantes de que trata a alínea a do mesmo inciso; Parágrafo único. As vagas que restarem após a aplicação do disposto nos incisos I a IV do caput serão ofertadas aos demais estudantes. CAPÍTULO VI DAS DISPOSIÇÕES FINAIS E TRANSITÓRIAS Art. 16. A classificação dos estudantes no âmbito do Sistema de Seleção Unificada - Sisu observará o disposto nas normas de regência daquele sistema. Art. 17. As instituições federais de ensino que ofertam vagas de educação superior implementarão, no mínimo, 25% (vinte e cinco por cento) da reserva de vagas a cada

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ano, e terão até 30 de agosto de 2016 para o cumprimento integral do disposto nesta Portaria.

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§ 1o Até que sejam integralmente implementadas as reservas de vagas de que trata esta Portaria, os estudantes que optarem por concorrer às vagas reservadas e que não forem selecionados terão assegurado o direito de concorrer às demais vagas. § 2o Após a integral implementação das reservas de vagas, as instituições federais de ensino poderão estabelecer regras específicas acerca do disposto no § 1º deste artigo. Art. 18. As instituições federais de ensino que, na data de publicação desta Portaria, já tiverem divulgado editais de concursos seletivos, promoverão a adaptação das regras desses concursos, no prazo de trinta dias, contado da data de sua publicação. Art. 19. Esta Portaria entra em vigor na data da sua publicação. ALOIZIO MERCADANTE OLIVA

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ANEXO I FÓRMULAS PARA CÁLCULO DAS VAGAS RESERVADAS 1.Cálculo do número mínimo de vagas reservadas para estudantes de escolas públicas (art. 10, inciso II) VR = VO * 0,5 onde: VR = vagas reservadas VO = vagas ofertadas no concurso seletivo 2.Cálculo do número mínimo de vagas reservadas para estudantes de escolas públicas com renda familiar bruta igual ou inferior a 1,5 (um vírgula cinco) salário-mínimo per capita (art. 10, inciso III) VRRI = onde: VRRI = vagas reservadas para estudantes com renda familiar bruta igual ou inferior a 1,5 (um vírgula cinco) salário-mínimo per capita VR = vagas reservadas 3.Cálculo do número de vagas para estudantes de escolas públicas com renda familiar bruta superior a 1,5 (um vírgula cinco) salário-mínimo per capita (art. 10, inciso III) VRRS = onde: VRRS = vagas reservadas para estudantes com renda familiar bruta superior a 1,5 (um vírgula cinco) salário-mínimo per capita VR = vagas reservadas VRRI = vagas reservadas para estudantes com renda familiar bruta igual ou inferior a 1,5 (um vírgula cinco) salário-mínimo per capita 4.Cálculo de número mínimo de vagas reservadas para estudantes de escolas públicas com renda familiar bruta igual ou inferior a 1,5 (um vírgula cinco) salário-mínimo per capita que se autodeclararem pretos, pardos e indígenas (art. 10, inciso IV) VRRI-PPI = onde: VRRI-PPI = vagas reservadas para os estudantes autodeclarados pretos, pardos e indígenas com renda familiar bruta igual ou inferior a 1,5 (um vírgula cinco) salário-mínimo per capita VRRI = vagas reservadas para estudantes com renda familiar bruta igual ou inferior a 1,5 (um vírgula cinco) salário-mínimo per capita PIBGE = proporção de pretos, pardos e indígenas no local de oferta de vagas da instituição federal de ensino 5.Cálculo de número mínimo de vagas reservadas para estudantes de escolas públicas com renda familiar bruta superior a 1,5 (um vírgula cinco) salário-mínimo per capita que se autodeclarem pretos, pardos e indígenas (art. 10, inciso V) VRRS-PPI = onde: VRRS-PPI = vagas reservadas para os estudantes autodeclarados pretos, pardos e indígenas com renda familiar superior a 1,5 salário-mínimo per capita VRRS = vagas reservadas para estudantes com renda familiar bruta superior a 1,5 (um vírgula cinco) salário-mínimo per capita PIBGE = proporção de pretos, pardos e indígenas no local de oferta de vagas da instituição federal de ensino

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ANEXO II ROL DE DOCUMENTOS MÍNIMOS RECOMENDADOS PARA COMPROVAÇÃO DA RENDA FAMILIAR BRUTA MENSAL 1. TRABALHADORES ASSALARIADOS 1.1 Contracheques; 1.2 Declaração de IRPF acompanhada do recibo de entrega à Receita Federal do Brasil e da respectiva notificação de restituição, quando houver; 1.3 CTPS registrada e atualizada; 1.4 CTPS registrada e atualizada ou carnê do INSS com recolhimento em dia, no caso de empregada doméstica; 1.5 Extrato atualizado da conta vinculada do trabalhador no FGTS; 1.6 Extratos bancários dos últimos três meses, pelo menos. 2. ATIVIDADE RURAL 2.1 Declaração de IRPF acompanhada do recibo de entrega à Receita Federal do Brasil e da respectiva notificação de restituição, quando houver; 2.2 Declaração de Imposto de Renda Pessoa Jurídica - IRPJ; 2.3 Quaisquer declarações tributárias referentes a pessoas jurídicas vinculadas ao candidato ou a membros da família, quando for o caso; 2.4 Extratos bancários dos últimos três meses, pelo menos, da pessoa física e das pessoas jurídicas vinculadas; 2.5 Notas fiscais de vendas. 3. APOSENTADOS E PENSIONISTAS 3.1 Extrato mais recente do pagamento de benefício; 3.2 Declaração de IRPF acompanhada do recibo de entrega à Receita Federal do Brasil e da respectiva notificação de restituição, quando houver; 3.3 Extratos bancários dos últimos três meses, pelo menos. 4. AUTÔNOMOS E PROFISSIONAIS LIBERAIS 4.1 Declaração de IRPF acompanhada do recibo de entrega à Receita Federal do Brasil e da respectiva notificação de restituição, quando houver; 4.2 Quaisquer declarações tributárias referentes a pessoas jurídicas vinculadas ao candidato ou a membros de sua família, quando for o caso; 4.3 Guias de recolhimento ao INSS com comprovante de pagamento do último mês, compatíveis com a renda declarada; 4.4 Extratos bancários dos últimos três meses. 5. RENDIMENTOS DE ALUGUEL OU ARRENDAMENTO DE BENS MÓVEIS E IMÓVEIS 5.1 Declaração de Imposto de Renda Pessoa Física - IRPF acompanhada do recibo de entrega à Receita Federal do Brasil e da respectiva notificação de restituição, quando houver. 5.2 Extratos bancários dos últimos três meses, pelo menos.

5.3 Contrato de locação ou arrendamento devidamente registrado em cartório acompanhado dos três últimos comprovantes de recebimentos.

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ANEXO 9:

LEI Nº 12.711, DE 29 DE AGOSTO DE 2012

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LEI Nº 12.711, DE 29 DE AGOSTO DE 2012.

Dispõe sobre o ingresso nas universidades federais e nas instituições federais de ensino técnico de nível médio e dá outras providências.

APRESIDENTA DA REPÚBLICA. Faço saber que o Congresso Nacional decreta

e eu sanciono a seguinte Lei: Art. 1o As instituições federais de educação superior vinculadas ao Ministério da

Educação reservarão, em cada concurso seletivo para ingresso nos cursos de graduação, por curso e turno, no mínimo 50% (cinquenta por cento) de suas vagas para estudantes que tenham cursado integralmente o ensino médio em escolas públicas.

Parágrafo único. No preenchimento das vagas de que trata o caput deste artigo, 50% (cinquenta por cento) deverão ser reservados aos estudantes oriundos de famílias com renda igual ou inferior a 1,5 salário-mínimo (um salário-mínimo e meio) per capita.

Art. 2o (VETADO). Art. 3o Em cada instituição federal de ensino superior, as vagas de que trata o art.

1o desta Lei serão preenchidas, por curso e turno, por autodeclarados pretos, pardos e indígenas, em proporção no mínimo igual à de pretos, pardos e indígenas na população da unidade da Federação onde está instalada a instituição, segundo o último censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Parágrafo único. No caso de não preenchimento das vagas segundo os critérios

estabelecidos no caput deste artigo, aquelas remanescentes deverão ser completadas por estudantes que tenham cursado integralmente o ensino médio em escolas públicas.

Art. 4o As instituições federais de ensino técnico de nível médio reservarão, em cada

concurso seletivo para ingresso em cada curso, por turno, no mínimo 50% (cinquenta por cento) de suas vagas para estudantes que cursaram integralmente o ensino fundamental em escolas públicas.

Parágrafo único. No preenchimento das vagas de que trata o caput deste artigo, 50%

(cinquenta por cento) deverão ser reservados aos estudantes oriundos de famílias com renda igual ou inferior a 1,5 salário-mínimo (um salário-mínimo e meio) per capita.

Art. 5o Em cada instituição federal de ensino técnico de nível médio, as vagas de que

trata o art. 4o desta Lei serão preenchidas, por curso e turno, por autodeclarados pretos, pardos e indígenas, em proporção no mínimo igual à de pretos, pardos e indígenas na população da unidade da Federação onde está instalada a instituição, segundo o último censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Parágrafo único. No caso de não preenchimento das vagas segundo os critérios

estabelecidos no caput deste artigo, aquelas remanescentes deverão ser preenchidas por estudantes que tenham cursado integralmente o ensino fundamental em escola pública.

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Art. 6o O Ministério da Educação e a Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, da Presidência da República, serão responsáveis pelo acompanhamento e avaliação do programa de que trata esta Lei, ouvida a Fundação Nacional do Índio (Funai).

Art. 7o O Poder Executivo promoverá, no prazo de 10 (dez) anos, a contar da

publicação desta Lei, a revisão do programa especial para o acesso de estudantes pretos, pardos e indígenas, bem como daqueles que tenham cursado integralmente o ensino médio em escolas públicas, às instituições de educação superior.

Art. 8o As instituições de que trata o art. 1o desta Lei deverão implementar, no

mínimo, 25% (vinte e cinco por cento) da reserva de vagas prevista nesta Lei, a cada ano, e terão o prazo máximo de 4 (quatro) anos, a partir da data de sua publicação, para o cumprimento integral do disposto nesta Lei.

Art. 9o Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. Brasília, 29 de agosto de 2012; 191o da Independência e 124o da República.

DILMA ROUSSEFF

Aloizio Mercadante Miriam Belchior Luís Inácio Lucena Adams Luiza Helena de Bairros Gilberto Carvalho

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ANEXO 10:

RESOLUÇÃO CEB Nº 3, DE 10 DE NOVEMBRO DE 1999(*)

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RESOLUÇÃO CEB Nº 3, DE 10 DE NOVEMBRO DE 1999(*) Fixa Diretrizes Nacionais para o funcionamento das escolas indígenas e dá

outras providências. O Presidente da Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de

Educação, no uso desuas atribuições regimentais e com base nos artigos 210, § 2º, e 231, caput, da Constituição Federal,nos arts. 78 e 79 da Lei 9.394, de 20 de dezembro de 1996, na Lei 9.131, de 25 de novembro de 1995,e ainda no Parecer CEB 14/99, homologado pelo Senhor Ministro de Estado da Educação, em 18 deoutubro de 1999,

RESOLVE: Art. 1º Estabelecer, no âmbito da educação básica, a estrutura e o funcionamento

das Escolas Indígenas, reconhecendo-lhes a condição de escolas com normas e ordenamento jurídico próprios, e fixando as diretrizes curriculares do ensino intercultural e bilíngüe, visando à valorização plena das culturas dos povos indígenas e à afirmação e manutenção de sua diversidade étnica.

Art.2º Constituirão elementos básicos para a organização, a estrutura e o funcionamento da escola indígena:

I - sua localização em terras habitadas por comunidades indígenas, ainda que se estendam

por territórios de diversos Estados ou Municípios contíguos; II – exclusividade de atendimento a comunidades indígenas; III – o ensino ministrado nas línguas maternas das comunidades atendidas, como

uma dasformas de preservação da realidade sociolingüística de cada povo; IV – a organização escolar própria. Parágrafo Único. A escola indígena será criada em atendimento à reivindicação

ou por iniciativade comunidade interessada, ou com a anuência da mesma, respeitadas suas formas de representação.

Art. 3º Na organização de escola indígena deverá ser considerada a participação da

comunidade, na definição do modelo de organização e gestão, bem como: I- suas estruturas sociais; II- suas práticas sócio-culturais e religiosas; III- suas formas de produção de conhecimento, processos próprios e métodos de

ensinoaprendizagem; IV- suas atividades econômicas; V- a necessidade de edificação de escolas que atendam aos interesses das

comunidadesindígenas; VI- o uso de materiais didático-pedagógicos produzidos de acordo com o

contexto sóciocultural de cada povo indígena. Art 4º As escolas indígenas, respeitados os preceitos constitucionais e legais que

fundamentama sua instituição e normas específicas de funcionamento, editadas pela União e pelos Estados,desenvolverão suas atividades de acordo com o proposto nos respectivos projetos pedagógicos eregimentos escolares com as seguintes prerrogativas:

I – organização das atividades escolares, independentes do ano civil, respeitado o fluxo dasatividades econômicas, sociais, culturais e religiosas;

II – duração diversificada dos períodos escolares, ajustando-a às condições e especificidadespróprias de cada comunidade.

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Art. 5º A formulação do projeto pedagógico próprio, por escola ou por povo indígena, terá porbase:

I – as Diretrizes Curriculares Nacionais referentes a cada etapa da educação básica;

II – as características próprias das escolas indígenas, em respeito à especificidade étnicoculturalde cada povo ou comunidade;

III - as realidades sociolíngüística, em cada situação; IV – os conteúdos curriculares especificamente indígenas e os modos próprios

de constituiçãodo saber e da cultura indígena; V – a participação da respectiva comunidade ou povo indígena. Art. 6º A formação dos professores das escolas indígena será específica,

orientar-se-á pelas Diretrizes Curriculares Nacionais e será desenvolvida no âmbito das instituições

formadoras de professores. Parágrafo único. Será garantida aos professores indígenas a sua formação em

serviço e,quando for o caso, concomitantemente com a sua própria escolarização. Art. 7º Os cursos de formação de professores indígenas darão ênfase à

constituição decompetências referenciadas em conhecimentos, valores, habilidades, e atitudes, na elaboração, nodesenvolvimento e na avaliação de currículos e programas próprios, na produção de material didático ena utilização de metodologias adequadas de ensino e pesquisa.

Art. 8º A atividade docente na escola indígena será exercida prioritariamente por professoresindígenas oriundos da respectiva etnia.

Art. 9º São definidas, no plano institucional, administrativo e organizacional, as seguintes esferasde competência, em regime de colaboração:

I – à União caberá legislar, em âmbito nacional, sobre as diretrizes e bases da educaçãonacional e, em especial:

a) legislar privativamente sobre a educação escolar indígena; b) definir diretrizes e políticas nacionais para a educação escolar indígena; c) apoiar técnica e financeiramente os sistemas de ensino no provimento dos

programas deeducação intercultural das comunidades indígenas, no desenvolvimento de programas integrados deensino e pesquisa, com a participação dessas comunidades para o acompanhamento e a avaliação

dos respectivos programas; d) apoiar técnica e financeiramente os sistemas de ensino na formação de

professoresindígenas e do pessoal técnico especializado; e) criar ou redefinir programas de auxílio ao desenvolvimento da educação, de

modo a atenderàs necessidades escolares indígenas; f) orientar, acompanhar e avaliar o desenvolvimento de ações na área da

formação inicial econtinuada de professores indígenas; g) elaborar e publicar, sistematicamente, material didático específico e

diferenciado, destinadoàs escolas indígenas. II - aos Estados competirá: a) responsabilizar-se pela oferta e execução da educação escolar indígena,

diretamente ou pormeio de regime de colaboração com seus municípios; b) regulamentar administrativamente as escolas indígenas, nos respectivos

Estados, integrandoascomo unidades próprias, autônomas e específicas no sistema estadual;

c) prover as escolas indígenas de recursos humanos, materiais e financeiros, para o seu plenofuncionamento;

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d) instituir e regulamentar a profissionalização e o reconhecimento público do magistérioindígena, a ser admitido mediante concurso público específico;

e) promover a formação inicial e continuada de professores indígenas. f) elaborar e publicar sistematicamente material didático, específico e

diferenciado, para uso nasescolas indígenas. III - aos Conselhos Estaduais de Educação competirá: a) estabelecer critérios específicos para criação e regularização das escolas

indígenas e doscursos de formação de professores indígenas; b) autorizar o funcionamento das escolas indígenas, bem como reconhecê-las; c) regularizar a vida escolar dos alunos indígenas, quando for o caso. § 1º Os Municípios poderão oferecer educação escolar indígena, em regime de

colaboração comos respectivos Estados, desde que se tenham constituído em sistemas de educação próprios,disponham de condições técnicas e financeiras adequadas e contem com a anuência das comunidadesindígenas interessadas.

§ 2º As escolas indígenas, atualmente mantidas por municípios que não satisfaçam asexigências do parágrafo anterior passarão, no prazo máximo de três anos, à responsabilidade dosEstados, ouvidas as comunidades interessadas.

Art.10 O planejamento da educação escolar indígena, em cada sistema de ensino, deve contarcom a participação de representantes de professores indígenas, de organizações indígenas e de apoioaos índios, de universidades e órgãos governamentais.

Art. 11 Aplicam-se às escolas indígenas os recursos destinados ao financiamento público daeducação.

Parágrafo Único. As necessidades específicas das escolas indígenas serão contempladas porcusteios diferenciados na alocação de recursos a que se referem os artigos 2º e 13º da Lei 9424/96.

Art. 12 Professor de escola indígena que não satisfaça as exigências desta Resolução terágarantida a continuidade do exercício do magistério pelo prazo de três anos, exceção feita ao professorindígena, até que possua a formação requerida.

Art. 13 A educação infantil será ofertada quando houver demanda da comunidade indígenainteressada.

Art. 14 Os casos omissos serão resolvidos: I - pelo Conselho Nacional de Educação, quando a matéria estiver vinculada à

competência daUnião; II - pelos Conselhos Estaduais de Educação. Art. 15 Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação. Art. 16 Ficam revogadas as disposições em contrário. ULYSSES DE OLIVEIRA PANISSET Presidente da Câmara de Educação Básica (*)CNE. Resolução CEB 3/99. Diário Oficial da União, Brasília, 17 de

novembro de 1999. Seção 1, p. 19.

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ANEXO 11:

ESTATUTO DO ÍNDIO

LEI Nº 6.001, DE 19 DE DEZEMBRO DE 1973.

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Dispõe sobre o Estatuto do Índio. O PRESIDENTE DA REPÚBLICA , faço saber que o Congresso Nacional

decreta e eu sanciono a seguinte Lei: TÍTULO I Dos Princípios e Definições Art. 1º Esta Lei regula a situação jurídica dos índios ou silvícolas e das

comunidades indígenas, com o propósito de preservar a sua cultura e integrá-los, progressiva e harmoniosamente, à comunhão nacional.

Parágrafo único. Aos índios e às comunidades indígenas se estende a proteção das leis do País, nos mesmos termos em que se aplicam aos demais brasileiros, resguardados os usos, costumes e tradições indígenas, bem como as condições peculiares reconhecidas nesta Lei.

Art. 2° Cumpre à União, aos Estados e aos Municípios, bem como aos órgãos das respectivas administrações indiretas, nos limites de sua competência, para a proteção das comunidades indígenas e a preservação dos seus direitos:

I - estender aos índios os benefícios da legislação comum, sempre que possível a sua aplicação;

II - prestar assistência aos índios e às comunidades indígenas ainda não integrados à comunhão nacional;

III - respeitar, ao proporcionar aos índios meios para o seu desenvolvimento, as peculiaridades inerentes à sua condição;

IV - assegurar aos índios a possibilidade de livre escolha dos seus meios de vida e subsistência;

V - garantir aos índios a permanência voluntária no seu habitat , proporcionando-lhes ali recursos para seu desenvolvimento e progresso;

VI - respeitar, no processo de integração do índio à comunhão nacional, a coesão das comunidades indígenas, os seus valores culturais, tradições, usos e costumes;

VII - executar, sempre que possível mediante a colaboração dos índios, os programas e projetos tendentes a beneficiar as comunidades indígenas;

VIII - utilizar a cooperação, o espírito de iniciativa e as qualidades pessoais do índio, tendo em vista a melhoria de suas condições de vida e a sua integração no processo de desenvolvimento;

IX - garantir aos índios e comunidades indígenas, nos termos da Constituição, a posse permanente das terras que habitam, reconhecendo-lhes o direito ao usufruto exclusivo das riquezas naturais e de todas as utilidades naquelas terras existentes;

X - garantir aos índios o pleno exercício dos direitos civis e políticos que em face da legislação lhes couberem.

Parágrafo único. (Vetado). Art. 3º Para os efeitos de lei, ficam estabelecidas as definições a seguir

discriminadas: I - Índio ou Silvícola - É todo indivíduo de origem e ascendência pré-

colombiana que se identifica e é identificado como pertencente a um grupo étnico cujas características culturais o distinguem da sociedade nacional;

II - Comunidade Indígena ou Grupo Tribal - É um conjunto de famílias ou comunidades índias, quer vivendo em estado de completo isolamento em relação aos outros setores da comunhão nacional, quer em contatos intermitentes ou permanentes, sem contudo estarem neles integrados.

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Art 4º Os índios são considerados: I - Isolados - Quando vivem em grupos desconhecidos ou de que se possuem

poucos e vagos informes através de contatos eventuais com elementos da comunhão nacional;

II - Em vias de integração - Quando, em contato intermitente ou permanente com grupos estranhos, conservam menor ou maior parte das condições de sua vida nativa, mas aceitam algumas práticas e modos de existência comuns aos demais setores da comunhão nacional, da qual vão necessitando cada vez mais para o próprio sustento;

III - Integrados - Quando incorporados à comunhão nacional e reconhecidos no

pleno exercício dos direitos civis, ainda que conservem usos, costumes e tradições característicos da sua cultura.

TÍTULO II Dos Direitos Civis e Políticos CAPÍTULO I Dos Princípios Art. 5º Aplicam-se aos índios ou silvícolas as normas dos artigos 145 e 146, da

Constituição Federal, relativas à nacionalidade e à cidadania. Parágrafo único. O exercício dos direitos civis e políticos pelo índio depende da

verificação das condições especiais estabelecidas nesta Lei e na legislação pertinente. Art. 6º Serão respeitados os usos, costumes e tradições das comunidades

indígenas e seus efeitos, nas relações de família, na ordem de sucessão, no regime de propriedade e nos atos ou negócios realizados entre índios, salvo se optarem pela aplicação do direito comum.

Parágrafo único. Aplicam-se as normas de direito comum às relações entre

índios não integrados e pessoas estranhas à comunidade indígena, excetuados os que forem menos favoráveis a eles e ressalvado o disposto nesta Lei.

CAPÍTULO II Da Assistência ou Tutela Art. 7º Os índios e as comunidades indígenas ainda não integrados à comunhão

nacional ficam sujeito ao regime tutelar estabelecido nesta Lei. § 1º Ao regime tutelar estabelecido nesta Lei aplicam-se no que couber, os

princípios e normas da tutela de direito comum, independendo, todavia, o exercício da tutela da especialização de bens imóveis em hipoteca legal, bem como da prestação de caução real ou fidejussória.

§ 2º Incumbe a tutela à União, que a exercerá através do competente órgão

federal de assistência aos silvícolas. Art. 8º São nulos os atos praticados entre o índio não integrado e qualquer

pessoa estranha à comunidade indígena quando não tenha havido assistência do órgão tutelar competente.

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Parágrafo único. Não se aplica a regra deste artigo no caso em que o índio revele consciência e conhecimento do ato praticado, desde que não lhe seja prejudicial, e da extensão dos seus efeitos.

Art. 9º Qualquer índio poderá requerer ao Juiz competente a sua liberação do

regime tutelar previsto nesta Lei, investindo-se na plenitude da capacidade civil, desde que preencha os requisitos seguintes:

I - idade mínima de 21 anos; II - conhecimento da língua portuguesa; III - habilitação para o exercício de atividade útil, na comunhão nacional; IV - razoável compreensão dos usos e costumes da comunhão nacional. Parágrafo único. O Juiz decidirá após instrução sumária, ouvidos o órgão de

assistência ao índio e o Ministério Público, transcrita a sentença concessiva no registro civil.

Art. 10. Satisfeitos os requisitos do artigo anterior e a pedido escrito do

interessado, o órgão de assistência poderá reconhecer ao índio, mediante declaração formal, a condição de integrado, cessando toda restrição à capacidade, desde que, homologado judicialmente o ato, seja inscrito no registro civil.

Art. 11. Mediante decreto do Presidente da República, poderá ser declarada a

emancipação da comunidade indígena e de seus membros, quanto ao regime tutelar estabelecido em lei, desde que requerida pela maioria dos membros do grupo e comprovada, em inquérito realizado pelo órgão federal competente, a sua plena integração na comunhão nacional.

Parágrafo único. Para os efeitos do disposto neste artigo, exigir-se-á o preenchimento, pelos requerentes, dos requisitos estabelecidos no artigo 9º.

CAPÍTULO III Do Registro Civil Art. 12. Os nascimentos e óbitos, e os casamentos civis dos índios não

integrados, serão registrados de acordo com a legislação comum, atendidas as peculiaridades de sua condição quanto à qualificação do nome, prenome e filiação.

Parágrafo único. O registro civil será feito a pedido do interessado ou da autoridade administrativa competente.

Art. 13. Haverá livros próprios, no órgão competente de assistência, para o registro administrativo de nascimentos e óbitos dos índios, da cessação de sua incapacidade e dos casamentos contraídos segundo os costumes tribais.

Parágrafo único. O registro administrativo constituirá, quando couber documento hábil para proceder ao registro civil do ato correspondente, admitido, na falta deste, como meio subsidiário de prova.

CAPÍTULO IV Das Condições de Trabalho

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Art. 14. Não haverá discriminação entre trabalhadores indígenas e os demais trabalhadores, aplicando-se-lhes todos os direitos e garantias das leis trabalhistas e de previdência social.

Parágrafo único. É permitida a adaptação de condições de trabalho aos usos e costumes da comunidade a que pertencer o índio.

Art. 15. Será nulo o contrato de trabalho ou de locação de serviços realizado

com os índios de que trata o artigo 4°, I. Art. 16. Os contratos de trabalho ou de locação de serviços realizados com

indígenas em processo de integração ou habitantes de parques ou colônias agrícolas dependerão de prévia aprovação do órgão de proteção ao índio, obedecendo, quando necessário, a normas próprias.

§ 1º Será estimulada a realização de contratos por equipe, ou a domicílio, sob a

orientação do órgão competente, de modo a favorecer a continuidade da via comunitária.

§ 2º Em qualquer caso de prestação de serviços por indígenas não integrados, o

órgão de proteção ao índio exercerá permanente fiscalização das condições de trabalho, denunciando os abusos e providenciando a aplicação das sanções cabíveis.

§ 3º O órgão de assistência ao indígena propiciará o acesso, aos seus quadros, de

índios integrados, estimulando a sua especialização indigenista. TÍTULO III Das Terras dos Índios CAPÍTULO I Das Disposições Gerais Art. 17. Reputam-se terras indígenas: I - as terras ocupadas ou habitadas pelos silvícolas, a que se referem os artigos

4º, IV, e 198, da Constituição; II - as áreas reservadas de que trata o Capítulo III deste Título; III - as terras de domínio das comunidades indígenas ou de silvícolas. Art. 18. As terras indígenas não poderão ser objeto de arrendamento ou de

qualquer ato ou negócio jurídico que restrinja o pleno exercício da posse direta pela comunidade indígena ou pelos silvícolas.

§ 1º Nessas áreas, é vedada a qualquer pessoa estranha aos grupos tribais ou

comunidades indígenas a prática da caça, pesca ou coleta de frutos, assim como de atividade agropecuária ou extrativa.

§ 2º (Vetado). Art. 19. As terras indígenas, por iniciativa e sob orientação do órgão federal de

assistência ao índio, serão administrativamente demarcadas, de acordo com o processo estabelecido em decreto do Poder Executivo.

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§ 1º A demarcação promovida nos termos deste artigo, homologada pelo Presidente da República, será registrada em livro próprio do Serviço do Patrimônio da União (SPU) e do registro imobiliário da comarca da situação das terras.

§ 2º Contra a demarcação processada nos termos deste artigo não caberá a

concessão de interdito possessório, facultado aos interessados contra ela recorrer à ação petitória ou à demarcatória.

Art. 20. Em caráter excepcional e por qualquer dos motivos adiante enumerados,

poderá a União intervir, se não houver solução alternativa, em área indígena, determinada a providência por decreto do Presidente da República.

1º A intervenção poderá ser decretada:

a) para pôr termo à luta entre grupos tribais; b) para combater graves surtos epidêmicos, que possam acarretar o extermínio

da comunidade indígena, ou qualquer mal que ponha em risco a integridade do silvícola ou do grupo tribal;

c) por imposição da segurança nacional; d) para a realização de obras públicas que interessem ao desenvolvimento

nacional; e) para reprimir a turbação ou esbulho em larga escala; f) para a exploração de riquezas do subsolo de relevante interesse para a

segurança e o desenvolvimento nacional. 2º A intervenção executar-se-á nas condições estipuladas no decreto e sempre

por meios suasórios, dela podendo resultar, segundo a gravidade do fato, uma ou algumas das medidas seguintes:

a) contenção de hostilidades, evitando-se o emprego de força contra os índios; b) deslocamento temporário de grupos tribais de uma para outra área; c) remoção de grupos tribais de uma para outra área. 3º Somente caberá a remoção de grupo tribal quando de todo impossível ou

desaconselhável a sua permanência na área sob intervenção, destinando-se à comunidade indígena removida área equivalente à anterior, inclusive quanto às condições ecológicas.

4º A comunidade indígena removida será integralmente ressarcida dos prejuízos

decorrentes da remoção. 5º O ato de intervenção terá a assistência direta do órgão federal que exercita a

tutela do índio. Art. 21. As terras espontânea e definitivamente abandonadas por comunidade

indígena ou grupo tribal reverterão, por proposta do órgão federal de assistência ao índio e mediante ato declaratório do Poder Executivo, à posse e ao domínio pleno da União.

CAPÍTULO II Das Terras Ocupadas

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Art. 22. Cabe aos índios ou silvícolas a posse permanente das terras que habitam e o direito ao usufruto exclusivo das riquezas naturais e de todas as utilidades naquelas terras existentes.

Parágrafo único. As terras ocupadas pelos índios, nos termos deste artigo, serão

bens inalienáveis da União (artigo 4º, IV, e 198, da Constituição Federal). Art. 23. Considera-se posse do índio ou silvícola a ocupação efetiva da terra que,

de acordo com os usos, costumes e tradições tribais, detém e onde habita ou exerce atividade indispensável à sua subsistência ou economicamente útil.

Art. 24. O usufruto assegurado aos índios ou silvícolas compreende o direito à

posse, uso e percepção das riquezas naturais e de todas as utilidades existentes nas terras ocupadas, bem assim ao produto da exploração econômica de tais riquezas naturais e utilidades.

§ 1° Incluem-se, no usufruto, que se estende aos acessórios e seus acrescidos, o

uso dos mananciais e das águas dos trechos das vias fluviais compreendidos nas terras ocupadas.

§ 2° É garantido ao índio o exclusivo exercício da caça e pesca nas áreas por ele

ocupadas, devendo ser executadas por forma suasória as medidas de polícia que em relação a ele eventualmente tiverem de ser aplicadas.

Art. 25. O reconhecimento do direito dos índios e grupos tribais à posse

permanente das terras por eles habitadas, nos termos do artigo 198, da Constituição Federal, independerá de sua demarcação, e será assegurado pelo órgão federal de assistência aos silvícolas, atendendo à situação atual e ao consenso histórico sobre a antigüidade da ocupação, sem prejuízo das medidas cabíveis que, na omissão ou erro do referido órgão, tomar qualquer dos Poderes da República.

CAPÍTULO III Das Áreas Reservadas Art. 26. A União poderá estabelecer, em qualquer parte do território nacional,

áreas destinadas à posse e ocupação pelos índios, onde possam viver e obter meios de subsistência, com direito ao usufruto e utilização das riquezas naturais e dos bens nelas existentes, respeitadas as restrições legais.

Parágrafo único. As áreas reservadas na forma deste artigo não se confundem

com as de posse imemorial das tribos indígenas, podendo organizar-se sob uma das seguintes modalidades:

a)Reserva indígena; b) parque indígena; c) colônia agrícola indígena. Art. 27.Reserva indígena é uma área destinada a servidor de habitat a grupo

indígena, com os meios suficientes à sua subsistência.

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Art. 28. Parque indígena é a área contida em terra na posse de índios, cujo grau de integração permita assistência econômica, educacional e sanitária dos órgãos da União, em que se preservem as RESERVAS de flora e fauna e as belezas naturais da região.

§ 1º Na administração dos parques serão respeitados a liberdade, usos, costumes

e tradições dos índios. § 2° As medidas de polícia, necessárias à ordem interna e à preservação das

riquezas existentes na área do parque, deverão ser tomadas por meios suasórios e de acordo com o interesse dos índios que nela habitem.

§ 3º O loteamento das terras dos parques indígenas obedecerá ao regime de propriedade, usos e costumes tribais, bem como às normas administrativas nacionais, que deverão ajustar-se aos interesses das comunidades indígenas.

Art. 29. Colônia agrícola indígena é a área destinada à exploração agropecuária,

administrada pelo órgão de assistência ao índio, onde convivam tribos aculturadas e membros da comunidade nacional.

Art. 30. Território federal indígena é a unidade administrativa subordinada à União, instituída em região na qual pelo menos um terço da população seja formado por índios.

Art. 31. As disposições deste Capítulo serão aplicadas, no que couber, às áreas em que a posse decorra da aplicação do artigo 198, da Constituição Federal.

CAPÍTULO IV Das Terras de Domínio Indígena Art. 32. São de propriedade plena do índio ou da comunidade indígena,

conforme o caso, as terras havidas por qualquer das formas de aquisição do domínio, nos termos da legislação civil.

Art. 33. O índio, integrado ou não, que ocupe como próprio, por dez anos

consecutivos, trecho de terra inferior a cinqüenta hectares, adquirir-lhe-á a propriedade plena.

Parágrafo único. O disposto neste artigo não se aplica às terras do domínio da

União, ocupadas por grupos tribais, às áreas reservadas de que trata esta Lei, nem às terras de propriedade coletiva de grupo tribal.

CAPÍTULO V Da Defesa das Terras Indígenas Art. 34. O órgão federal de assistência ao índio poderá solicitar a colaboração

das Forças Armadas e Auxiliares e da Polícia Federal, para assegurar a proteção das terras ocupadas pelos índios e pelas comunidades indígenas.

Art. 35. Cabe ao órgão federal de assistência ao índio a defesa judicial ou

extrajudicial dos direitos dos silvícolas e das comunidades indígenas.

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Art. 36. Sem prejuízo do disposto no artigo anterior, compete à União adotar as medidas administrativas ou propor, por intermédio do Ministério Público Federal, as medidas judiciais adequadas à proteção da posse dos silvícolas sobre as terras que habitem.

Parágrafo único. Quando as medidas judiciais previstas neste artigo forem propostas pelo órgão federal de assistência, ou contra ele, a União será litisconsorte ativa ou passiva.

Art. 37. Os grupos tribais ou comunidades indígenas são partes legítimas para a defesa dos seus direitos em juízo, cabendo-lhes, no caso, a assistência do Ministério Público Federal ou do órgão de proteção ao índio.

Art. 38. As terras indígenas são inusucapíveis e sobre elas não poderá recair

desapropriação, salvo o previsto no artigo 20. TÍTULO IV Dos Bens e Renda do Patrimônio Indígena Art 39. Constituem bens do Patrimônio Indígena: I - as terras pertencentes ao domínio dos grupos tribais ou comunidades

indígenas; II - o usufruto exclusivo das riquezas naturais e de todas as utilidades existentes

nas terras ocupadas por grupos tribais ou comunidades indígenas e nas áreas a eles reservadas;

III - os bens móveis ou imóveis, adquiridos a qualquer título. Art. 40. São titulares do Patrimônio Indígena: I - a população indígena do País, no tocante a bens ou rendas pertencentes ou

destinadas aos silvícolas, sem discriminação de pessoas ou grupos tribais; II - o grupo tribal ou comunidade indígena determinada, quanto à posse e

usufruto das terras por ele exclusivamente ocupadas, ou a ele reservadas; III - a comunidade indígena ou grupo tribal nomeado no título aquisitivo da

propriedade, em relação aos respectivos imóveis ou móveis. Art. 41. Não integram o Patrimônio Indígena: I - as terras de exclusiva posse ou domínio do índio ou silvícola, individualmente

considerado, e o usufruto das respectivas riquezas naturais e utilidades; II - a habitação, os móveis e utensílios domésticos, os objetos de uso pessoal, os

instrumentos de trabalho e os produtos da lavoura, caça, pesca e coleta ou do trabalho em geral dos silvícolas.

Art. 42. Cabe ao órgão de assistência a gestão do Patrimônio Indígena,

propiciando-se, porém, a participação dos silvícolas e dos grupos tribais na administração dos próprios bens, sendo-lhes totalmente confiado o encargo, quando demonstrem capacidade efetiva para o seu exercício.

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Parágrafo único. O arrolamento dos bens do Patrimônio Indígena será permanentemente atualizado, procedendo-se à fiscalização rigorosa de sua gestão, mediante controle interno e externo, a fim de tornar efetiva a responsabilidade dos seus administradores.

Art. 43. A renda indígena é a resultante da aplicação de bens e utilidades integrantes do Patrimônio Indígena, sob a responsabilidade do órgão de assistência ao índio.

§ 1º A renda indígena será preferencialmente reaplicada em atividades rentáveis ou utilizada em programas de assistência ao índio.

§ 2° A reaplicação prevista no parágrafo anterior reverterá principalmente em benefício da comunidade que produziu os primeiros resultados econômicos.

Art. 44. As riquezas do solo, nas áreas indígenas, somente pelos silvícolas

podem ser exploradas, cabendo-lhes com exclusividade o exercício da garimpagem, faiscação e cata das áreas referidas.

Art. 45. A exploração das riquezas do subsolo nas áreas pertencentes aos índios, ou do domínio da União, mas na posse de comunidades indígenas, far-se-á nos termos da legislação vigente, observado o disposto nesta Lei.

§ 1º O Ministério do Interior, através do órgão competente de assistência aos índios, representará os interesses da União, como proprietária do solo, mas a participação no resultado da exploração, as indenizações e a renda devida pela ocupação do terreno, reverterão em benefício dos índios e constituirão fontes de renda indígena.

§ 2º Na salvaguarda dos interesses do Patrimônio Indígena e do bem-estar dos silvícolas, a autorização de pesquisa ou lavra, a terceiros, nas posses tribais, estará condicionada a prévio entendimento com o órgão de assistência ao índio.

Art. 46. O corte de madeira nas florestas indígenas, consideradas em regime de

preservação permanente, de acordo com a letra g e§ 2º, do artigo 3°, do Código Florestal, está condicionado à existência de programas ou projetos para o aproveitamento das terras respectivas na exploração agropecuária, na indústria ou no reflorestamento.

TÍTULO V Da Educação, Cultura e Saúde Art. 47. É assegurado o respeito ao patrimônio cultural das comunidades

indígenas, seus valores artísticos e meios de expressão. Art. 48. Estende-se à população indígena, com as necessárias adaptações, o

sistema de ensino em vigor no País. Art. 49. A alfabetização dos índios far-se-á na língua do grupo a que pertençam,

e em português, salvaguardado o uso da primeira. Art. 50. A educação do índio será orientada para a integração na comunhão

nacional mediante processo de gradativa compreensão dos problemas gerais e valores da sociedade nacional, bem como do aproveitamento das suas aptidões individuais.

Art. 51. A assistência aos menores, para fins educacionais, será prestada, quanto possível, sem afastá-los do convívio familiar ou tribal.

Art. 52. Será proporcionada ao índio a formação profissional adequada, de acordo com o seu grau de aculturação.

Art. 53. O artesanato e as indústrias rurais serão estimulados, no sentido de elevar o padrão de vida do índio com a conveniente adaptação às condições técnicas modernas.

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Art. 54. Os índios têm direito aos meios de proteção à saúde facultados à comunhão nacional.

Parágrafo único. Na infância, na maternidade, na doença e na velhice, deve ser assegurada ao silvícola, especial assistência dos poderes públicos, em estabelecimentos a esse fim destinados.

Art. 55. O regime geral da previdência social será extensivo aos índios, atendidas as condições sociais, econômicas e culturais das comunidades beneficiadas.

TÍTULO VI Das Normas Penais CAPÍTULO I Dos Princípios Art. 56. No caso de condenação de índio por infração penal, a pena deverá ser

atenuada e na sua aplicação o Juiz atenderá também ao grau de integração do silvícola. Parágrafo único. As penas de reclusão e de detenção serão cumpridas, se

possível, em regime especial de semiliberdade, no local de funcionamento do órgão federal de assistência aos índios mais próximos da habitação do condenado.

Art. 57. Será tolerada a aplicação, pelos grupos tribais, de acordo com as instituições próprias, de sanções penais ou disciplinares contra os seus membros, desde que não revistam caráter cruel ou infamante, proibida em qualquer caso a pena de morte.

CAPÍTULO II Dos Crimes Contra os Índios Art. 58. Constituem crimes contra os índios e a cultura indígena: I - escarnecer de cerimônia, rito, uso, costume ou tradição culturais indígenas,

vilipendiá-los ou perturbar, de qualquer modo, a sua prática. Pena - detenção de um a três meses;

II - utilizar o índio ou comunidade indígena como objeto de propaganda turística ou de exibição para fins lucrativos. Pena - detenção de dois a seis meses;

III - propiciar, por qualquer meio, a aquisição, o uso e a disseminação de bebidas alcoólicas, nos grupos tribais ou entre índios não integrados. Pena - detenção de seis meses a dois anos.

Parágrafo único. As penas estatuídas neste artigo são agravadas de um terço, quando o crime for praticado por funcionário ou empregado do órgão de assistência ao índio.

Art. 59. No caso de crime contra a pessoa, o patrimônio ou os costumes, em que o ofendido seja índio não integrado ou comunidade indígena, a pena será agravada de um terço.

TÍTULO VII Disposições Gerais Art. 60. Os bens e rendas do Patrimônio Indígena gozam de plena isenção

tributária. Art. 61. São extensivos aos interesses do Patrimônio Indígena os privilégios da

Fazenda Pública, quanto à impenhorabilidade de bens, rendas e serviços, ações especiais, prazos processuais, juros e custas.

Art. 62. Ficam declaradas a nulidade e a extinção dos efeitos jurídicos dos atos de qualquer natureza que tenham por objeto o domínio, a posse ou a ocupação das terras habitadas pelos índios ou comunidades indígenas.

§ 1° Aplica-se o disposto deste artigo às terras que tenham sido desocupadas pelos índios ou comunidades indígenas em virtude de ato ilegítimo de autoridade e particular.

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§ 2º Ninguém terá direito a ação ou indenização contra a União, o órgão de assistência ao índio ou os silvícolas em virtude da nulidade e extinção de que trata este artigo, ou de suas conseqüências econômicas.

§ 3º Em caráter excepcional e a juízo exclusivo do dirigente do órgão de assistência ao índio, será permitida a continuação, por prazo razoável dos efeitos dos contratos de arrendamento em vigor na data desta Lei, desde que a sua extinção acarrete graves conseqüências sociais.

Art. 63. Nenhuma medida judicial será concedida liminarmente em causas que envolvam interesse de silvícolas ou do Patrimônio Indígena, sem prévia audiência da União e do órgão de proteção ao índio.

Art. 64 (Vetado). Parágrafo único. (Vetado). Art. 65. O Poder Executivo fará, no prazo de cinco anos, a demarcação das terras

indígenas, ainda não demarcadas. Art. 66. O órgão de proteção ao silvícola fará divulgar e respeitar as normas da

Convenção 107, promulgada pelo Decreto nº 58.824, de 14 julho de 1966. Art. 67. É mantida a Lei nº 5.371, de 5 de dezembro de 1967. Art. 68. Esta Lei entrará em vigor na data de sua publicação, revogadas as

disposições em contrário. EMÍLIO G. MEDICI

Alfredo Buzaid Antônio Delfim Netto José Costa Cavalcanti

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