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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ
CENTRO DE CIÊNCIA E TECNOLOGIA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GEOGRAFIA
DOUTORADO EM GEOGRAFIA
CLESLEY MARIA TAVARES DO NASCIMENTO
RESÍDUOS SÓLIDOS INDUSTRIAIS EM MARACANAÚ-CE: RISCOS
SOCIOAMBIENTAIS E SUAS VULNERABILIDADES
FORTALEZA – CEARÁ
2017
CLESLEY MARIA TAVARES DO NASCIMENTO
RESÍDUOS SÓLIDOS INDUSTRIAIS EM MARACANAÚ-CE: RISCOS
SOCIOAMBIENTAIS E SUAS VULNERABILIDADES
Tese apresentada ao Curso de Doutorado em Geografia do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Estadual do Ceará, como requisito parcial à obtenção do título de doutora em Geografia. Área de Concentração: Análise Geoambiental e Ordenação do Território nas Regiões Semiáridas e Litorâneas. Orientadora: Prof.ª. Drª. Maria Lúcia Brito da Cruz
FORTALEZA – CEARÁ
2017
CLESLEY MARIA TAVARES DO NASCIMENTO
RESÍDUOS SÓLIDOS INDUSTRIAIS EM MARACANAÚ-CE: RISCOS
SOCIOAMBIENTAIS E SUAS VULNERABILIDADES
Tese apresentada ao Curso de Doutorado em Geografia do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Estadual do Ceará, como requisito parcial à obtenção do título de doutora em Geografia. Área de Concentração: Análise Geoambiental e Ordenação do Território nas Regiões Semiáridas e Litorâneas.
AGRADECIMENTOS
Esse é o espaço onde a teoria sistêmica se confirma, onde nossa condição de seres
interdependentes é manifestada, mostrando o quanto dependemos uns dos outros.
Quando queremos realizar algum trabalho mais substancial. Há um provérbio
africano que diz: “Se quer ir rápido, vá sozinho. Se quer ir longe,vá em grupo.” A
tecitura de uma tese é longa, por isso precisamos de um grupo de pessoas para nos
auxiliar, uma vez que é impossível tecê-la sozinha.
A presente pesquisa versa sobre risco e vulnerabilidade.Não seio porquêdasupresa
quando me deparei com a minha própria vulnerabilidade. Pensara eu que sairia
imune? Foi essa pergunta que minha orientadora me fez, com sua inata capacidade
de instigar aqueles e aquelas que a rodeiam. Então foi aí que entendi que para falar
sobre vulnerabilidade e risco com propriedade, não poderia escapar desse encontro
fatídico, e nem tão pouco não me arriscar. Quando somos expostas a situações de
riscos, nossa capacidade de resistência e de adaptação é colocada à prova e só
então percebemos o quanto vulneráveis somos e/ou estamos.Na tentativa de
mensurar os níveis dessa vulnerabilidade recorremos a algumas variáveis, e são
nelas que me apoio para tecer a trama da gratidão àqueles e àquelas que dividiram
comigo a trama desta tese.
O índice de vulnerabilidade social foi desenvolvido a partir de três dimensões
básicas: i) infraestrutura; ii) capital humano; iii) trabalho e renda. Devido aos
resquícios de rebeldia, não seguirei a ordem descrita e começo os agradecimentos
pela terceira variável.
Trabalho e renda - Meu agradecimento sincero a Coordenação de Aperfeiçoamento
de Nível Superior – Capes, que durante 30 meses me disponibilizou uma bolsa de
estudo.
Ao trabalho de geoprocessamento realizado, pacientemente, por Iggor Uchôa,
Washington Alves e Gledson Santos.
Infraestrutura - Meus agradecimentos pela oportunidade de usufruir dos
equipamentos do Programa de Pós-Graduação em Geografia – PROPGEO e do
Laboratório de Geoprocessamento da UECE – LABGEO.Ao apoio logístico da
UECE, através do empréstimo do seu micronibus para realização da pesquisa de
campo. À SEMACE, por permitir a coleta dos dados secundários, à colaboração
deDenise Guilherme e Maria da Glória Alves.Ao IBGE – Fortaleza, na pessoa de
Marcelo Gondim pelos esclarecimentos técnicos referentes aos setores censitários.
Capital Humano - Meu agradecimento em especial à minha orientadora e parceira,
dos momentos de baixa e alta vulnerabilidade, Prof.ªDrª Lúcia Brito.Às professoras
doutoras, Cláudia Grangeiro (in memorian) e Lúcia Mendes (pelas dúvidas sanadas
em relação à metodologia) e ao prof.Dr. Humberto Carvalho.À Adriana Lívio e
Julinha Ribeiro, pela competência e disponibilidade em responder com imediatismo
meus e-mails.À equipe do LABGEO, alunos e alunas de graduação e pós-
graduação,Epaminondes Machado Neto, Lucíola Matos, Rafael Reis, Pedro
Henrique, Níveo Rocha, Ramona Pinheiro, Bruna Franklin, Larissa Lima, Felipe
Xavier e Rebeca Rodrigues.Aos colegas de trabalho do Departamento de
Geociências da Universidade Regional do Cariri – URCA, pela compreensão e
solidariedade.Às professoras do Instituto Cearense de Educação de Surdos, Águeda
Leão e Júlia Feitosa.Aos colegas da turma de doutorado, Emanoel Lindemberg,
Fábio Ricardo, Gerardo Neto, Iapony Galvão, Leila Sousa, Luciana Lourenço e
Priscila Romcy.Por último e nem por isso menos importante, agradeço aos meus
ancestrais, à vida e a tudo que há de sagrado nela.
“Ainda que eu falasse as línguas dos
homens e dos anjos, e não tivesse amor,
seria como o metal que soa ou como o
sino que tine.
E ainda que tivesse o dom de profecia, e
conhecesse todos os mistérios e toda a
ciência, e ainda que tivesse toda a fé, de
maneira tal que transportasse os montes,
e não tivesse amor, nada seria[...]”
(Coríntios 13:1,2)
RESUMO
As indústrias durante a produção de suas mercadorias geram uma quantidade
significativa de resíduos, denominados resíduos industriais. Por apresentarem
propriedades físicas, químicas ou infectocontagiosas, muitos desses resíduos,
quando gerenciados de forma inadequada, podem acarretar riscos à saúde pública
e/ou ao meio ambiente, por isso são considerados perigosos, classificados pela NBR
10.004/2004 como resíduos Classe I. Dado o exposto, a tese se propôs analisar os
riscos e as vulnerabilidades socioambientais decorrentes dos resíduos sólidos
Classe I, gerados no processo produtivo das indústrias do Distrito Industrial I de
Maracanaú-CE.Para tal utilizou-se de uma gama de instrumentos investigativos,
técnicas de geoprocessamento, base de dados cartográficos; imagens de satélite;
fotografias aéreas; levantamento de dados censitários e do IPEA e aplicação de
questionários nos domicílios próximos às indústrias inventariadas.O processamento
das informações levantadas produziu os índices de vulnerabilidade ambiental (IVA);
índice de vulnerabilidade socioambiental (IVSA) e o índice de vulnerabilidade de
resíduos perigosos (IVRP). Os resultados mostraram que os resíduos Classe I
gerados pelas indústrias do DIF I são gerenciados inadequadamente, do
armazenamento à disposição final, expondo a população residente do entorno a
situações de risco e vulnerabilidade socioambiental.
Palavras-chave: Resíduos Classe I. Distrito Industrial. Resíduos Industriais. Risco
Socio ambiental.
ABSTRACT
Industries during the production of their goods generate a significant amount of
waste, called industrial waste. Because of their physical, chemical or infectious-
contagious properties, many of these wastes, when improperly managed, may pose
a risk to public health and / or the environment, and are considered hazardous,
classified by NBR 10.004 / 2004 as Class I waste Given the above, the thesis
proposed to analyze the socioenvironmental risks and vulnerabilities arising from
Class I solid waste generated in the industrial process of the Industrial District I of
Maracanaú - CE. For this purpose a range of investigative tools, geoprocessing
techniques, cartographic database were used; satellite images; aerial photographs;
survey of census data and IPEA and application of questionnaires in households
close to the inventoried industries. The processing of de information collected
produced the indices of environmental vulnerability (EVI); socio-environmental
vulnerability index (SEVI) and the hazardous waste vulnerability index (HWVI). The
results showed that the class I waste generated by the DIF I industries is
inadequately managed from storage to final disposal, exposing the resident
population to situations of risk and socioenvironmental vulnerability.
Keywords: Class IWaste. Industrial District. Industrial Waste. Socio-
environmentalRisk.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 –
Figura 2 –
Figura 3–
Figura 4 –
Figura 5 –
Figura 6 –
Figura7 –
Figura 8 –
Figura 9 –
Figura 10 –
Figura 11 –
Figura 12 –
Figura 13 –
Figura 14 –
Figura 15 –
Figura 16 –
Figura 17 –
Figura 18 –
Figura 19 –
Figura 20 –
Figura 21 –
Destinação final dos resíduos sólidos urbanos coletados no
Brasil –2014..................................................................................
Caracterização e classificação dos resíduos sólidos..............
Gestão de resíduos sólidos ambientalmente adequada.........
Fluxograma das etapas de construção da Tese.......................
Mapa de localização da área de estudo....................................
Fluxograma dos procedimentos operacionais realizados
para a geração do IVA.................................................................
Fluxograma dos procedimentos operacionais realizados
para a geração do IVSA..............................................................
Sambaqui no Litoral de Santa Catarina – BR...........................
Cloaca Máxima da Roma Antiga................................................
Lixão de Eletrônicos em Gana – África.....................................
Mapa Municipal de Maracanaú-CE.............................................
Gráfico Distribuição das Indústrias por Distrito Industrial
emMaracanaú............................................................................
Localização dos Aterros para Resíduos Classe I....................
Mapa de vulnerabilidade Ambiental..........................................
Mapa da área de estudo por UDHs......................................................
Mapa IVS Infraestrutura Urbana.................................................
Mapa IVS Capital Humano por UDHs.........................................
Mapa IVS Trabalho e renda por UDHs.......................................
Mapa de vulnerabilidade socioambiental (IVSA)......................
Gráfico você acredita que as indústrias dão uma destinação
correta aos resíduos que elas geram?......................................
Distribuição Espacial dos ResíduosClasse I por Indústria...
20
24
25
33
43
44
53
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87
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96
106
109
113
119
124
126
128
139
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 –
Tabela 2 –
Tabela 3 –
Tabela 4 –
Tabela 5 –
Tabela 6 –
Tabela 7 –
Tabela 8 –
Tabela 9 –
Tabela 10 –
Tabela 11 –
Tabela 12 –
Tabela 13 –
Tabela 14 –
Tabela 15 –
Tabela 16 –
Tabela 17 –
Tabela 18 –
Tabela 19 –
Grau de vulnerabilidade da modelagem e seus respectivos
pesos..........................................................................................
Distância dos recursos hídricos superficiais e seus
respectivos pesos.....................................................................
Matriz de avaliação do índice de vulnerabilidade..................
Produto Interno Bruto por Setor Econômico – 2010.............
Os cinco maiores municípios quanto à participação do
produto interno bruto (PIB) do Ceará – 2011..........................
Esgotamento sanitário 2012.....................................................
Domicílios particulares segundo tipos de esgotamentos–
2000/2010....................................................................................
Consumo e consumidores de energia elétrica – 2012...........
Os cinco principais casos confirmados das doenças de
notificação compulsória em Maracanaú.................................
Indicadores educacionais de Maracanaú no ensino
fundamental e médio..............................................................
Cobertura vegetal da área de estudo por setores
censitários..................................................................................
IVS infraestrutura urbana por UDHs........................................
IVS capital humano por UDHs..................................................
IVS trabalho e renda por UDHs................................................
Síntese dos índices de vulnerabilidade social das UDHs....
Estado físico dos resíduos Classe I das indústrias
inventariadas.............................................................................
Quantidade de resíduos Classe I inventariados.....................
Valores do tratamento de resíduos Classe I no Ceará..........
Quantidade de resíduos Classe I por indústria......................
42
44
63
91
92
94
94
97
98
100
104
110
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121
125
130
137
147
149
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ABETRE Associação Brasileira de Empresas de Tratamento de Resíduos
e Efluentes
ABNT Associação Brasileira de Normas Técnicas
ADH Atlas de Desenvolvimento Humano
AIDS Síndrome da Imunodeficiência Adquirida
ANA Agência Nacional de Águas
APR Análise Preliminar de Riscos
ARCE Agência Reguladora de Serviços Públicos Delegados do Estado
do Ceará
BID Banco Internacional de Desenvolvimento
BNB Banco do Nordeste do Brasil
CAGEGE Companhia de Água e Esgoto do Ceará
CETESB Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental
COHAB Companhia deHabitação
COELCE Companhia Energética do Ceará
DI Distrito Industrial
DI 2000 Distrito Industrial 2000
DIF I Distrito Industrial de Maracanaú I
DIF III Distrito Industrial de Maracanaú III
ETE Estação de Tratamento de Esgoto
FIEC Federação das Indústrias do Estado do Ceará
FUNASA Fundação Nacional de Saúde
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IFCE Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará
IPECE Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica do Ceará
IPEA Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
ISS Imposto Sobre Serviços
IPT Instituto de Pesquisas Tecnológicas
IPTU Imposto Predial e Territorial Urbano
IVA Índice de Vulnerabilidade Ambiental
IVRP Índice de Vulnerabilidade de Resíduos Perigosos
IVS Índice de Vulnerabilidade Social
IVSA Índice de Vulnerabilidade Socioambiental
LDB Lei de Diretrizes e Base da Educação Nacional
NBR Norma da Associação Brasileira de Normas Técnicas
PEA População Economicamente Ativa
PEV Posto de Entrega Voluntária
PERS Plano Estadual de Resíduos Sólidos
PGRS Plano de Gerenciamento de Resíduos Sólidos
PIB Produto Interno Bruto
PLAMEG Plano de Metas Governamentais
PMSB Plano Municipal de Saneamento Básico
PMRS Política Municipal de Resíduos Sólidos
PNRS Política Nacional de Resíduos Sólidos
RMF Região Metropolitana de Fortaleza
RSU Resíduos Sólidos Urbanos
SEMACE Superintendência Estadual do Meio Ambiente
SEMAM Secretaria de Meio Ambiente de Maracanaú
SESA Secretaria de Saúde do Estado do Ceará
SUDENE Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste
SESI PR Serviço Social da Indústria do Paraná
UDH Unidade de Desenvolvimento Humano
SUMÁRIO
1
2
2.1
2.2
2.3
3
3.1
3.2
3.3
4
4.1
4.2
4.3
4.4
4.5
5
5.1
5.2
5.3
5.4
5.5
6
6.1
6.2
6.3
6.4
7
INTRODUÇÃO...........................................................................................
FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA METODOLÓGICA.................................
DESAFIOS DA GESTÃO DE RESÍDUOS.................................................
RESÍDUOS SÓLIDOS E SUAS FACETAS...............................................
RESÍDUOS INDUSTRIAIS FOMENTAM ÁREAS DE RISCO...................
TRAJETÓRIA METODOLÓGICA.............................................................
ÍNDICE DE VULNERABILIDADE AMBIENTAL.........................................
ÍNDICE DE VULNERABILIDADE SOCIAL................................................
ÍNDICE DE VULNERABILIDADE SOCIOAMBIENTAL (IVSA).................
RESÍDUOS SÓLIDOS: PRESENÇA E AMEAÇA NO ESPAÇO
GEOGRÁFICO..........................................................................................
RESÍDUOS DO TEMPO DEIXAM MARCAS NO ESPAÇO......................
OS RESÍDUOS NO ESPAÇO MEDIEVAL: AMEAÇA À VISTA................
OS RESÍDUOS NA MODERNIDADE........................................................
RASPAS E RESTOS ME INTERESSAM..................................................
RESÍDUOS SÓLIDOS NA MODERNIDADE LÍQUIDA..............................
UNIVERSO DA PESQUISA: PANORAMA HISTÓRICO
SOCIOAMBIENTAL...................................................................................
UMA OUTRA REVOLUÇÃO INDUSTRIAL................................................
ASPECTOS FÍSICOS................................................................................
INFRAESTRUTURA...................................................................................
SAÚDE.......................................................................................................
EDUCAÇÃO...............................................................................................
TRESULADOS E DISCUSSÕES..............................................................
ÍNDICE DE VULNERABILIDADE AMBIENTAL (IVA)................................
ÍNDICE DE VULNERABILIDADE SOCIAL (IVS).......................................
ÍNDICE DE VULNERABILIDADE SOCIOAMBIENTAL (IVSA)..................
ÍNDICE DE VULNERABILIDADE DE RESÍDUOS PERIGOSOS (IVRP)..
CONCLUSÃO............................................................................................
REFERÊNCIAS....................................................................................................
APÊNDICES..........................................................................................................
16
18
19
22
26
33
44
50
57
64
64
68
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75
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93
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98
102
102
107
126
127
154
157
164
APÊNDICE A -QUESTIONÁRIO DOS INDICADORES DE
VULNERABILIDADE E RISCO SOCIAL...................................................
APÊNDICE B – QUESTIONÁRIO DOS INDICADORES DE
VULNERABILIDADE E RISCOS – RESÍDUOS SÓLIDOS.........................
165
168
16
1 INTRODUÇÃO
A convivência, praticamente obrigatória, entre os resíduos sólidos e os
espaços sociais nos quais estão circunscritos é resultante do modo de vida
capitalista, fundado no processo de produção industrial que produz alterações
substanciais na natureza, tanto no tempo quanto no espaço. Destarte, os resíduos
sólidos tornam-se elementos atuantes na dinâmica de construção do espaço
geográfico, deixando um rastro de sérios problemas socioambientais que afetam
comunidades inteiras e as expõem a situações de vulnerabilidade e risco.
A tipologia dos riscos é vasta (risco natural, risco alimentar, risco
econômico, risco geopolítico, risco social e outros), no entanto este estudo irá deter-
se aos riscos ocasionados pelos resíduos industriais Classe I, considerados
perigosos devido às suas propriedades físicas, químicas ou infecto-químicas
poderem vir ocasionar riscos à saúde pública ou ao meio ambiente quando
gerenciados de forma inadequada.
As indústrias são diretamente afetadas pela gestão do risco, pois a
legislação e as normas técnicas as obrigam. Assim, o trabalho desenvolvido no
interior destas é organizado visando garantir o máximo de segurança, não apenas
para seus funcionários e moradores que circundam a área fabril, mas também para
o meio ambiente de maneira restrita e ampla. Cabe ressaltar que o significado do
risco industrial não é o mesmo para os gestores, os funcionários e a vizinhança, uma
vez que a relação cotidiana com a indústria e com o risco é específica de cada um
desses grupos, assim, as ameaças não são necessariamente vistas como tais,
embora estejam presentes. (VEYRET, 2007)
Diante do exposto, pode-se aferir que o teor de periculosidade destes
resíduos per si, já criam uma situação de vulnerabilidade e risco,
independentemente da existência ou não de acidentes.A presença de domicílios nas
proximidades de áreas industriais enfatiza a exposição ao perigo que os moradores
se encontram, seja devido a possíveis danoscausados a saúde; a propriedade ou a
capacidade de resposta diante de um acidente.
Seguindo os argumentos supracitados, algumas reflexões sobre a
situação dos resíduos sólidos industriais foram levantadas: Que tipo de tratamento é
dado aos resíduos sólidos perigosos produzidos nas indústrias? Qual a sua
17
destinação final? Qual a intensidade e nível de exposição às situações riscos estão
expostos os moradores dos domicílios localizados no entorno de áreas industriais?
Buscando dar concretude a estas reflexões, o recorte espacial para o
desenvolvimento da pesquisa restringe-se ao distrito industrial I de Maracanaú-
Ceará-Brasil. Dentre os motivos que justificam a escolha desse local, estão à
variedade e concentração de indústrias em sua área urbana, densamente
populosa;o principal rendimento do seu produto interno bruto (PIB) municipal ser
proveniente do setor industrial, grande gerador de resíduos Classe I; e ser este o
primeiro distrito industrial do estado do Ceará.
Vale expor que o objetivo maior, da pesquisa em questão, é analisar os
riscos e as vulnerabilidades socioambientais decorrentesdos resíduos sólidos Classe
I, gerados no processo produtivo das indústrias do Distrito Industrial I de Maracanaú-
CE. A ineficácia de uma fiscalização efetiva e a inexistência de um aterro industrial
no estado do Ceará dificulta o gerenciamento adequado deste tipo de resíduos. Esta
realidade corrobora com o levantamento dahipótese de que os resíduos sólidos
industriais,Classe I, gerados no Distrito Industrial de Maracanaú-CE expõem os
moradores a situações conjunturais de risco ambiental e vulnerabilidade social, e
que os mesmos desconhecem a condição de risco a qual se encontram.
Na busca investigativado objetivo explicitado, alguns procedimentos foram
realizados:identificaçãodas principais indústrias geradoras de resíduos sólidos
Classe I, em Maracanaú-CE; levantamentode variáveis socioambientais que afetam
as condições de vida da população autóctone e mapeamentoda área de
vulnerabilidade e risco, através de técnicas de geoprocessamento.
Deste modo, o presente estudo, procuroudesvelar a questão
ambiental dos resíduos sólidos Classe I e seus impactos, abordando tanto os
aspectos objetivos (quantitativos), quanto subjetivos (qualitativos) imbricados na
temática. Pois,acredita-se que a sobreposição desses dois atributos pode fornecer
conhecimentos relevantes para a definiçãode açõesdirecionadas a gestão dos
resíduos industriais, comprometidas com a segurança da população e do meio
ambiente.
18
2 MARCO TEÓRICO
É do conhecimento de estudiosos sobre o assunto, que a temática aqui
abordada requer um aporte multidimensional e interdisciplinar. No entanto vale frisar
que, esta pesquisa em particular, propõe um enfoque teórico centrado,
principalmente, nas postulações da ciência geográfica, o que não impede um diálogo
plurifacetado com outras ciências, como o Direito (no caso da legislação), a
Engenharia, a Saúde e a Gestão Ambiental.
Diante de tais colocações, com relação à abordagem geográfica conferida
à questão dos resíduos sólidos em geral, cumpre destacar os trabalhos de Alerte
MoisésRodrigues (1998), Luciana Ziglio (2005) e Maurício Waldman (2010). Suas
pesquisas discutem questões essenciais sobre a temática aqui abordada, a partir do
olhar horizontal da ciência supracitada; por isso, aqui utilizadas como base teórica.
Na visão de Rodrigues (1998), nas análises referentes à problemática
ambiental, categoria espaço é de suma importância. Deste modo, compreende-se
que sendo os resíduos sólidos per si um problema ambiental, é por essência um
tema, dentre outros, de caráter geográfico.
Corroborando com Rodrigues, mas adicionando outros aspectos,
Waldman (2010) pondera:
Engendrando formas nem sempre reconhecidas pelo nosso olhar, os
resíduos marcaram indelevelmente a paisagem. Primeiramente, pelo fato de
integrarem o processo mais amplo de transformação dos recursos naturais,
seriam, nesta linha de argumentação, inseparáveis do dinamismo de
construção do espaço. Em segundo lugar, concentrando-se ou
dispersando-se em áreas circunscritas, os resíduos se associam à gênese
de formas espaciais inéditas. (p. 12-13)
Mesmo não se tratando em si de um campo especificamente geográfico, a
riqueza da análise das interações espaciais entre os resíduos e outros fenômenos
ou agentes socioeconômicos do meio ambiente, constitui um tema instigante para
esta ciência, que devido a sua horizontalidade que lhe é característica, mostra-se
apta a compreender a complexidade envolvida nesta problemática, fato que legitima
a pretensa abordagem.
19
2.1 DESAFIOS DA GESTÃO DE RESÍDUOS
A problemática ambiental intensificou-se com a revolução industrial, as
pesquisas tecnológicas ocorridas nesse período contribuíram para modernizar o
modo de produção fabril elevando a extração de recursos naturais a níveis
comprometedores ao equilíbrio natural. A ampliação da expectativa de vida, através
dos avanços da medicina preventiva e sanitária, acarretou, por conseguinte o
crescimento demográfico, o qual gerou a necessidade de investimentos em novas
técnicas de produção em massa, visando atender a demanda cada vez mais
crescente de consumo.
A incorporação de novos hábitos de consumo e o aprimoramento de
técnicas cada vez mais modernas de industrializaçãoacarretaram um aumento
significativo no volume de resíduos gerados e dos impactos ambientais adversos,
decorrentes da produção destes.
Destarte, cerca de dois séculos após o advento da revolução industrial, a
gestão dos resíduos sólidos permanece como um dos grandes desafios da
sociedade contemporânea. Segundo Jacobi (2011) desde a Rio92, a gestão
sustentável de resíduos sólidos representa uma mudança paradigmática, que tem
direcionado a atuação dos governos, da sociedade e da indústria.
No caso do Brasil o desafio da gestão dos resíduos sólidos é hercúleo,
pois são raros os casos de destinação final adequada de resíduos, seja por não
possuírem o conjunto de técnicas necessárias à preservação ambiental ou pelo
descaso à proteção da saúde pública.
20
Figura 1 - Destinação final dos resíduos sólidos urbanos
coletados no Brasil -2014
Fonte: Abrelpe - 2014
Cumpre observar que os percentuais apresentados na figura 1, referem-
se ao total de resíduos sólidos urbanos (RSU) coletados, que corresponde cerca de
90% do lixo gerado, os 10% restantes (29. 659.170 t/ano) seguiram para lixões ou
aterros controlados, que do ponto de vista ambiental pouco se diferenciam dos
lixões, uma vez que não possuem sistemas de proteção do meio ambiente e da
saúde pública. (ABRELPE, 2014)
A pressão da opinião pública, de grupos ambientalistas e associações de
catadores, vem exigindo crescentes cuidados com esses impactos sobre o meio
ambiente. A promulgação da Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) em
2010, Lei 12.305, foi uma das conquistas obtidas e trouxe vários avanços no que se
refere à gestão dos resíduos sólidos no Brasil. Entre estes se destacam: a
abordagem sistêmica, logística reversa, responsabilidade compartilhada, ênfase na
redução e reutilização dos resíduos, educação ambiental, o reconhecimento e
inclusão do catador com ator social.
É inegável a importância da PNRS, considera-se até que demorou demais
a sair, entretanto as metas propostas geraram certa tensão entre sociedade civil,
21
governos municipais, estaduais e governo federal. Principalmente a da erradicação
dos lixões até agosto 2014, os quais deveriam ser substituídos por aterros
sanitários, para onde os resíduos recicláveis não poderão mais ser enviados.
Com a proximidade do fim do prazo legal, prefeitos e entidades
representativas, como a Confederação Nacional dos Municípios (CNM) alegaram
não possuírem condições econômicas e técnicas para atingir a meta estabelecida, e
solicitaram junto ao governo federal uma prorrogação,só para se ter uma ideia, em
2013, havia 1.196 lixões e apenas 652 aterros sanitários em todo território nacional.
Assim, frente a esta realidade, em 2014, ao invés da extinção, houve uma
prorrogação escalonada do prazo de fechamento dos lixões.
Através do projeto 425/2014 ficou determinado que capitais e municípios
de região metropolitana terão até 31 de julho de 2018 para erradicarem seus lixões,
sendo essa data acrescida de um ano (31/07/2019) para os municípios de fronteira e
os que contam com mais de 100 mil habitantes. Já aqueles que têm entre 50 e 100
mil habitantes terão prazo até 31de julho de 2020 e os com menos de 50 mil
habitantes até a mesma data de 2021.(TORRES, 2015).
Vale frisar que o acesso aos recursos financeiros destinados às
mudanças estabelecidas pela lei é de âmbito federal e está atrelado à apresentação
de planos de gerenciamento de resíduos sólidos (PGRS) por parte das três esferas
governamentais – municipal, estadual e federal. No tocante ao estado do Ceará, o
Plano Estadual de Resíduos Sólidos (PERS) foi finalizado em 2015, entretanto,
grande parte de seus municípios ainda estejam tentando cumprir uma legislação
anterior ao PNRS, a Lei do Saneamento Básico (Lei nº 11. 445/2007).
Em relação aos Planos Municipais de Saneamento Básico - PMSB,
segundo a Fundação Nacional de Saúde - FUNASA e a Agência Reguladora de
Serviços Públicos Delegados do Estado do Ceará - ARCE, em 2012 existiam cinco
planos elaborados (Morada Nova, Limoeiro do Norte, Iguatu, Cariús e Quixelô),
correspondente a 3% dos 184 municípios cearenses. 65 planos estão em
andamento (35% da demanda); 18 municípios estão em análise pela FUNASA para
financiamento (10% da demanda); 52% do total de municípios não possuem planos
encaminhados, ou seja, 96 deles. O contexto revela que as prefeituras estão tendo
dificuldade de fazer o PMSB e já se veem cobradas a elaborarem o Plano Municipal
de Resíduos Sólidos (PMRS).
22
2.2 RESÍDUOS SÓLIDOS E SUAS FACETAS
Em grande medida, as legislações e regulamentações brasileiras
propostas para o gerenciamento de resíduos são caracterizadas por uma definição
geral de resíduos sólidos, o que amiúde, confunde o entendimento conceitual e
evidencia a diversidade e complexidade da temática.
Como se pode ver no Art. 3° da Política Nacional de Resíduos Sólidos,
que os define como:
XVI - resíduos sólidos: material, substância, objeto ou bem descartado
resultante de atividades humanas em sociedade, a cuja destinação final se
procede, se propõe proceder ou se está obrigado a proceder, nos estados
sólido ou semissólido, bem como gases contidos em recipientes e líquidos
cujas particularidades tornem inviável o seu lançamento em rede pública de
esgotos ou de corpos d’água, ou exijam para isso soluções técnicas ou
economicamente inviáveis em face da melhor tecnologia disponível. (2010,
p.03)
Nesse mesmo viés, a ABNT NBR 10004/04, que classifica os resíduos
sólidos quanto aos riscos potenciais ao meio ambiente e à saúde pública considera,
[...]resíduos sólidos:Resíduos nos estados sólido e semissólido, que
resultam de atividades de origem industrial, doméstica, hospitalar,
comercial, agrícola, de serviços e de varrição. Ficam incluídos nesta
definição os lodos provenientes de sistemas de tratamento de água,
aqueles gerados em equipamentos e instalações de controle de poluição
[...]. (2014, p.07)
Observa-se que ambas as definições de resíduos sólidos, comporta os
estados semissólido, líquido e até mesmo gasoso, fato que dificulta, muitas vezes,
sua compreensão por parte dos leigos e de algumas pessoas que sobrevivem do
manejo desse material descartado. Sem falar que para maioria da população o
vocábulo resíduo é usualmente utilizado como sinônimo de lixo, “coisa que se varre
da casa, da rua, e se joga fora” (FERREIRA, 2001, p.462).
Há outras situações em que a conceituação destes resíduos é equivalente
à de rejeitos, “resíduos sólidos que, depois de esgotadas todas as possibilidades de
23
tratamento e recuperação por processos tecnológicos disponíveis e
economicamente viáveis, não apresentem outra possibilidade que não a disposição
final ambientalmente adequada1”. (PNRS, 2010, p.02)
Para uma melhor compreensão das análises e discussões realizadas no
corpo do presente trabalho, é pertinente esclarecer que o termo resíduo sólido será
aqui entendido como, todo material sólido e semissólido resultante de atividades
humanas (industrial, doméstica, hospitalar, comercial, agrícola, de serviços e de
varrição) descartados no meio ambiente devido sua prévia inutilidade.
No que concerne à classificação, os resíduos se diferem conforme sua
natureza física (seco,molhado); composição química (orgânico, inorgânico); riscos
potenciais ao meio ambiente e à saúde pública (perigosos, não perigosos) e a
origem (domiciliar, urbano, comercial, público, industrial, serviços de saúde,
construção civil, agrossilvipastoril, serviços de transporte e mineração).
Decerto, a classificação multifacetária de resíduos transcende o objetivo
desta pesquisa, deste modo, é oportuno elucidar que a explicitação pormenorizada,
a seguir, dos resíduos que oferecem riscos potenciais ao meio ambiente e à saúde
pública e dos resíduos industriais, deve-se à sua condição de categoria basilar do
presente estudo.
Considerando a crescente preocupação da sociedade com relação às
questões ambientais e a gestão dos resíduos, a Associação Brasileira de Normas
Técnicas – ABNT - criou em 1987 uma norma específica para classificá-los, a NBR
10004 (atualizada em 2004), visando fornecer subsídios para o gerenciamento
adequado dos mesmos.
Nesse sentido, a classificação dos resíduos sólidos, trazida nesta Norma,
envolve uma identificação criteriosa do processo ou atividade que lhes deu origem e
de seus constituintes e características e a comparação destes constituintes com
listagens de resíduos e substâncias cujo impacto à saúde e ao meio ambiente é
conhecido. A segregação dos resíduos na fonte geradora é parte integrante dos
laudos de classificação, onde a descrição de matérias-primas, de insumos e do
processo no qual o resíduo foi gerado devem ser explicitados. (NBR 10004)
1De acordo com a Lei 12.305, disposição final ambientalmente adequada é a distribuição de rejeitos em aterros
observando normas operacionais específicas de modo a evitar danos ou riscos à saúde pública e à segurança e a
minimizar os impactos ambientais adversos.
24
Segundo a NBR 10004:04, quanto à periculosidade os resíduos são
assim classificados:
1) Resíduos Classe I, considerados perigosos em função de suas
propriedades físicas, químicas ou infectocontagiosas, pode apresentar: a) risco à
saúde pública, provocando mortalidade, incidência de doenças ou acentuando seus
índices; b) riscos ao meio ambiente, quando o resíduo for gerenciado de forma
inadequada.
2) Resíduos Classe II, considerados não perigosos em função de não
apresentar riscos à saúde pública e ao meio ambiente. São divididos em:
a) Resíduos Classe II A – Não inertes, aqueles que não se enquadram
nas classificações de resíduos classe I ou resíduos classe II B, podendo ter
propriedades como biodegradabilidade, combustibilidade ou solubilidade em água.
b) Resíduos Classe II B – Inertes, aqueles que quando submetidos a um
contato com água destilada ou desionizada, à temperatura ambiente, não tem
nenhum de seus constituintes solubilizados a concentrações superiores aos padrões
de potabilidade de água, excetuando-se aspecto, cor, turbidez, dureza e sabor.
A figura 2 ilustra a classificação dos resíduos sólidos quanto ao risco à
saúde pública e ao meio ambiente, de acordo com a NBR 10004:04.
Figura 2 – Caracterização e classificação dos resíduos sólidos 2
Fonte: Extraído da ABNT NBR 10004:04
2Os anexos A e B da NBR10004 constituem-se de uma lista contendo o nome dosresíduos perigosos de fontes
não específicas e resíduos perigosos de fontes específicas, respectivamente e o anexo G contém os padrões para
o ensaio de solubilização.
25
A identificação e classificação é parte integrante da etapa inicial do
gerenciamento de resíduos sólidos, composto pelas etapas de coleta, transporte,
transbordo, tratamento e destinação final ambientalmente adequada. Por sua vez, o
gerenciamento corresponde a uma parte da gestão integrada dos resíduos sólidos, a
qual engloba as dimensões política, econômica, ambiental, cultural e social da
questão, sob a premissa do desenvolvimento sustentável. (PNRS, 2010) (Ver Figura
3)
Figura 3– Gestão de resíduos sólidos ambientalmente adequada
Desenvolvimento Sustentável
Gestão Integrada de
Resíduos
Gerenciamento de
Resíduos
Fonte: Elaboração da autor a partir de PNRS – 2013
Na forma da Lei 12.305, o gerenciamento e a gestão integrada dos
resíduos sólidos devem seguir à ordem de prioridade: não geração, redução,
reutilização, reciclagem, tratamento dos resíduos sólidos e destinação final
ambientalmente adequada dos rejeitos.
No tocante à definição dos resíduos industriais, a Política Nacional de
Resíduos Sólidos, os define, resumidamente, como os “gerados nos processos
produtivos e instalações industriais.”(2010, p.7).
Já o Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT) os conceitua de forma
mais específica:
26
Aquele originado nas atividades dos diversos ramos da indústria, tais como
metalurgia, química, petroquímica, papeleira, alimentícia, etc. O lixo
industrial é bastante variado, podendo ser representado por cinzas, lodos,
óleos, resíduos alcalinos ou ácidos, plásticos, papéis, madeiras, fibras,
borrachas, metais, escórias, vidros e cerâmicas. Nesta categoria, inclui-se a
grande maioria do lixo considerado tóxico (Classe I). (2000, p.30)
Em contribuição mais recente Waldman (2010) complementa, os
resíduos industriais são produzidos na extração e transformação de matérias primas,
abrangendo às atividades mineradoras e de obtenção de energia, inclusive a
nuclear. Devido sua singularidade, exigem descarte específico, não apenas o
volume, mas a periculosidade é outro fator de risco.
2.3 RESÍDUOS INDUSTRIAIS FOMENTAM ÁREAS DE RISCO
Com base no exposto, pode-se afirmar que a grande maioria dos resíduos
industriais contém substâncias tóxicas. Diversos produtos utilizados no processo
produtivo industrial possuem metais pesados, nocivos tanto ao meio ambiente
quanto à saúde pública. Estes diferem de outros agentes tóxicos porque não são
sintetizados nem destruídos pelo homem, ou seja, acumulam-se no organismo que é
incapaz de eliminá-los, se ligam às paredes celulares dificultando o transporte de
nutrientes o que pode ocasionar até à morte.
A presença desses metais, muitas vezes, está associada à localização
geográfica de regiões agrícolas e industriais. Os despejos de resíduos industriais na
natureza são as principais fontes de contaminação e poluição ambiental. Quando
lançados como resíduos, na água, no solo ou no ar,podem ser absorvidos por
vegetais e animais, provocando graves intoxicações ao longo da cadeia alimentar.
Cabe ressaltar que todas as formas de vida do planeta podem ser afetadas pela
presença desses metais, dependendo da dosagem e da forma química. (CAMPOS
et al., 2014).
Metais pesados estão presentes na linha de produção de várias
indústrias, tais como indústrias extrativistas de metais, de tintas e pigmentos,
beneficiamento de couro, indústrias de ferro e aço, lavanderias, indústria de
petróleo, e, especialmente, as galvanoplastias, que se espalham em grande número
27
nas periferias das grandes cidades, constituindo-se em verdadeiras áreas de
vulnerabilidadesocioambiental. Por se tratarem de áreas desvalorizadas, existe uma
tendênciados grupos de baixa renda residirnasperiferias, geralmente, lugares com
forte concentração de problemas e riscos sociais e ambientais. (ALVES, 2006)
Outra fonte importante de contaminação do ambiente por metais pesados
são os incineradores de resíduo urbano e industrial, que provocam a sua volatização
e formam cinzas ricas em metais, principalmente mercúrio, chumbo e cádmio.
De acordo com a Associação Brasileira de Empresas de Tratamento,
Recuperação e Disposição de Resíduos Especiais (ABETRE), dos 2,9 milhões de
toneladas de resíduos industriais perigosos gerados anualmente no Brasil, somente
600 mil toneladas recebem tratamento adequado (coprocessamento, incineração,
aterro classe I). Os 78% restantes são depositados indevidamente em lixões, sem
qualquer tipo de tratamento. (apud CAMPOS, 2014).
A legislação promulga que a responsabilidade pelo armazenamento,
transporte, tratamento e destinação adequada dos resíduos industriais, é do
gerador. A explicitação dessa competência permite dirimir qualquer dúvida sobre o
responsável no caso de ocorrência de acidentes, obrigando-o assumir os custos de
recuperação ou de medidas mitigadoras, referentes a um ato prejudicial ao meio
ambiente e/ou à saúde da população. Entretanto, o desconhecimento e a falta de
divulgação dessa informação, faz com que muitas vezes não seja exigido dos
verdadeiros responsáveis arcarem com as devidas providências diante de um
acidente, restando à população o ônus de um dano que ela não causou.
Pode-se observar no quadro 1 os principais efeitos dos metais
pesados na saúde e no meio ambiente.
28
Quadro 1 - Principais efeitos dos metais pesados na saúde e no meio ambiente
Metal Chumbo
(Pb)
Mercúri
o (Hg)
Cádmio (Cd)
Efeito na saúde
Provoca alterações
no sangue e na
urina, ocasionando
doenças graves e
em alguns casos,
invalidez total e
irreversível.
Ocasiona problemas
respiratórios.
Provoca
alterações renais e
neurológicas. As
principais alterações
são no
desenvolvimento
cerebral das
crianças, podendo
provocar o idiotismo.
Apesar de
menos agressivo na
água do que no ar,
depositado nos
ossos, musculaturas,
nervos e rins,
provoca estado de
agitação, epilepsia,
tremores, perda da
capacidade
intelectual e anemia.
Afeta o sistema
nervoso central,
provocando lesões
no córtex e na
capa granular do
cérebro.
Alteraçõ
es em órgãos do
sistema
cardiovascular.
Acumula
-se no sistema
nervoso,
principalmente no
cérebro, medula e
rins.
Provoca
perda de
coordenação dos
movimentos,
dificuldade no falar,
comer e ouvir,
além de atrofia e
lesões renais,
urogenital e
endócrino.
Provoca alterações no
sistema nervoso central e
no sistema respiratório.
Compromete
ossos e rins.
Ocasionaedem
a pulmonar, câncer
pulmonar e irritação no
trato respiratório.
Analogamente
ao mercúrio afeta o
sistema nervoso e os rins.
Provoca perda
de olfato, formação de um
anel amarelo no colo dos
dentes, redução na
produção de glóbulos
vermelhos e remoção de
cálcio dos ossos.
Polui o É Contamina o
(Continua)
29
Efeito
no meio
ambiente
solo, a água e o ar e
desta forma
contamina os
organismos vivos,
devido ao seu efeito
bioacumulativo,
em toda a cadeia
alimentar (trófica).
absorvido pelos
organismos vivos e
vai-se acumulando
de forma contínua
durante toda a
vida. Pela
contaminação da
água ou do solo,
entra com
facilidade na
cadeia alimentar,
representando um
perigo para o
homem que se
alimenta de peixes
ou aves dessas
áreas.
solo, o ar, a água e o
lençol freático.
É
bioacumulativo em toda a
cadeia alimentar (trófica),
provocando intoxicação
nos seres
humanosquandoingerirem
peixes contaminados com
cádmio.
Fonte: <http://www.fernandosantiago.com.br/met90.html>
Esta preocupação legal em definir o responsável por um dano causado ao
meio ambiente ou a população, é decorrente de um processo de luta da sociedade
civil frente aos grandes desastres ambientais ocorridos no século XX, entre os mais
conhecidos, Minamata–Japão (1956), Seveso - Itália (1976), Bophal-Índia (1984).
De origem industrial, esses acidentes chamaram atenção aos riscos reais
da poluição ambiental na qualidade de vida e na sobrevivência da espécie humana,
mostrando a necessidade de se prevenir quanto a sua ocorrência e seus efeitos de
curto e longo prazo. Abordando a questão com uma maior amplitude,Beck (2010)
postula que os riscos fabris são produtos da modernidade, que se revelam sob a
forma de ameaças à vida de plantas, animais e seres humanos.
De maneira geral, o risco sempre transitou na história da humanidade, se
fez e faz presente nos momentos de perigo e nas sensações de ameaça e incerteza,
podendo ser vinculado às ações naturais ou humanas. Entretanto, com a
industrialização e seus efeitos, contrários ao equilíbrio ambiental, as situações de
continuação
(Conclusão)
30
riscos tomaram proporções gigantescas, onde muitas vezes, ações de defesa e
prevenção são ineficazes.
Beck ilustra bem a ideia aqui apresentada:
Contra as ameaças da natureza externa, aprendemos a construir cabanas e
a acumular conhecimentos. Diante das ameaças da segunda natureza,
absorvida no sistema industrial, vemo-nos praticamente indefesos.
Perigosvêm a reboque do consumo cotidiano. (2005, p.9).
Considera-se que a citação do autor “abre caminho” para a discussão de
dois elementos fundamentais do presente trabalho, risco industrial, e os perigos
resultantes do consumo. Nas palavras de Jacobi (2006), o atendimento das
necessidades de consumo exige uma diversidade cada vez maior de produtos, que
acabam gerando resíduos, seja no processo de produção ou após o seu consumo e
com diferentes graus de periculosidade.
Conforme Veyret (2007), diferente do risco natural, familiar aos geógrafos,
o risco industrial foi inicialmente estudado por engenheiros, a partir de uma análise
matemática entre probabilidade/consequência ou frequência/gravidade, que permitiu
quantificar o risco e definir os níveis de aceitabilidade. Entretanto, uma avaliação
profunda da questão não deve se restringir à abordagem puramente tecnicista, a
incerteza que há numa situação de risco advém de fatores geográficos ou humanos,
dificilmente modeláveis.
Fica patente que, “o risco é certamente, um objeto geográfico. É preciso,
portanto, tratá-lo em termos espaciais. Ele se situa na interface entre um espaço
industrial e espaços urbanos (ou rurais) que o englobam.” (VEYRET, 2007, p. 180).
A avaliação normativa de risco industrial o distingue em dois tipos: risco
individual e risco social. O risco individual tem caráter cumulativo e geográfico, ou
seja, leva-se em consideração o risco existente para um indivíduo na vizinhança de
um perigo, em período de tempo definido. O risco social é considerado para um
agrupamento de pessoas presente na vizinhança de um perigo, em período de
tempodefinido. (CETESB, 2011).
Em ambas as definições, tanto o indivíduo quanto o grupo estão expostos
à situação de risco em determinado espaço (vizinhança) e período temporal, esta
realidade os coloca numa posição de vulnerabilidade. Para Hewitt (1997, apud
31
CASTRO, 2005), as situações de risco (risk) e de segurança (safety) são
decorrentes de uma tríade de elementos: os perigos (hazards), a vulnerabilidade e a
intervenção e adaptação às condições de perigo.
Apresentando posição similar, Moser (1998, apud ALVES, 2006)
reconhece que, a exposição ao risco é um dos componentes presentes em
situações de vulnerabilidade, assim como, a incapacidade de reação, e a dificuldade
de adaptação diante da materialização do risco.
A capacidade de resposta e dificuldade de adaptação diante da
concretude do risco está diretamente relacionada a uma gama de recursos:
ambientais, técnicos, humanos, econômicos, sociais e políticos. Entretanto, vale
advertir que, os “fatores socioeconômicos frequentemente aumentam a
vulnerabilidade das populações ameaçadas” (VEYRET, 2007, p.40).
Considera-se que a adaptação às condições de risco, aprioristicamente
passa pela aceitação, que por sua vez só é possível existir se houver confiança.
Para Castro (2005), no caso dos riscos naturais, a relação confiança e risco é
menor; a menos que esteja envolvida nesta relação alguma forma de controle
humano (trabalho/tecnologia) sobre os perigos, fato que demanda confiança da
sociedade (leiga) ao sistema de controle implementado tendo ou não consciência do
perigo ao qual se encontra exposto. Presume-se então que no caso dos riscos
relacionados às ações humanas, a relação confiança e risco seja maior.
Segundo Slovic (1998, apud, CASTRO, 2005), a falta de confiança é cada
vez mais apontada como um fator crítico e implícito nas discussões que envolvem a
gestão de resíduos, principalmente os tecnológicos. Talvez, devido ser tão
comumente utilizada no cotidiano, sua importância para a gestão de riscos ainda
não tenha sido devidamente valorizada.
Balizado nas colocações supracitadas, o termo confiança adentra nos
questionamentos aqui levantados. Qual o nível de risco existente nos resíduos
industriais? Há confiança de que as indústrias estão fazendo o manejo dos resíduos
perigosos de forma adequada? Quais medidas de segurança estão sendo tomadas?
Até que ponto se pode confiar nas precauções tomadas pelas indústrias quanto ao
risco advindo do manejo dos resíduos Classe I?
32
A complexidade existente nos estudos de análise de risco é algo notório,
pois compreender a natureza e determinar o nível de risco envolve não apenas
elementos pragmáticos, mas também subjetivos que varia de indivíduo para
indivíduo. Entretanto, são fundamentais na análise de instalações industriais já em
operação, de modo que o risco residual possa ser avaliado e gerenciado
satisfatoriamente. (CETESB, 2001).
33
3 PERCURSO METODOLÓGICO
A trajetória metodológica para a investigação da situação de
vulnerabilidade e riscos socioambientais referentes aos resíduos sólidos perigosos,
gerados no Distrito Industrial I do município de Maracanaú, em linhas gerais, pode
ser sintetizada em três etapas, sendo a primeira o pré-campo, consistindo no
levantamento bibliográfico, cronograma de atividades e elaboração de questionários;
o trabalho de campo, aplicação de questionários, entrevistas e visitasàs instituições.
Na terceira etapa (pós–campo) houve a sistematização dos dados levantados no
campo, sua análise e registro. (Figura 4)
Buscou-se fazer uma análise entre a situação de vulnerabilidade
socioambiental do Distrito Industrial I e o índice de vulnerabilidade quanto aos
resíduos perigosos gerados pelas indústrias ali localizadas.
Figura 4 – Fluxograma dasetapas de construção da Tese
Fonte: Elaboração da autor (2017)
Pré-campo
O levantamento das indústrias instaladas no Distrito Industrial I, de
Maracanaú, baseou-se no Guia Industrial do Ceará 2012-1013, documento
produzido pela Federação das Indústrias do Estado do Ceará (FIEC). Foram
selecionadas, previamente, 20 indústrias, tendo como critérios, o processo
TESE
Pré-campo
-Levantamento bibliográfico
- Cronograma de trabalho
- Elaboração de questionários
Campo- Visitas a instituições públicas e privadas
- Aplicação de questionários
- Entrevistas
- Levantamento bibliográfico
Pós-campo
- Levantamento bibliográfico
- Sistematização dos dados
- Análise dos dados
- Escrita da tese
- Apresentação
34
produtivo, a grande geração de resíduos Classe I e o número de funcionários (≥ de
30 funcionários).
Sendo assim, foram identificadas as seguintes atividades industriais:
a) Indústria de beneficiamento de couro
b) Fabricação de produtos químicos
c) Indústrias metalúrgicas, máquinas e equipamentos
d) Indústrias têxteis
e) Indústrias de alimentos
f) Indústria de bebidas
g) Indústrias de beneficiamento de celulose
h) Indústria de plásticos
i) Indústria de tintas
j) Coleta e tratamento de resíduos
Após esta prévia definição, as indústrias foram contatadas através de
telefonemas, esclarecendo o objetivo da pesquisa, e também via correio eletrônico,
por onde foi enviada uma carta de apresentação solicitando o agendamento de uma
possível visita para a coleta de dados e um questionário (caso preferissem) a ser
preenchido pelo setor ambiental da empresa, contendo perguntas referentes à
gestão dos resíduos industriais por elas gerados. Nenhuma delas preencheu o
questionário ou deu qualquer retorno, fato que demonstra a falta de transparência
das mesmas com relação ao manejo de seus resíduos, entre estes, resíduos de alta
periculosidade, que muitas vezes podem não estar sendo gerenciados como a lei
determina, para que a segurança socioambiental seja contemplada e os riscos de
acidentes suprimidos.
Deste modo, as informações da quantificação do volume dos resíduos
industriais, classe I, gerados no município de Maracanaú, foram obtidas a partir de
dados secundários, por consultas dos Planos de Gerenciamento de Resíduos
Sólidos (PGRS), enviados pelas indústrias à Superintendência de Meio Ambiente do
Ceará – SEMACE. Vale destacar que a permissão para o levantamento dos dados
teve como premissa a condição de manter em sigilo o nome das indústrias
inventariadas.
35
O trabalho de campo
Consistiu-se em visitas a órgãos de instâncias públicas e
privadas:Superintendência Estadual do Meio Ambiente (SEMACE); Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE); Secretaria de Meio Ambiente de
Maracanaú (SEMAM), Federação das Indústrias do Estado do Ceará (FIEC) e
domicílios particulares.
O levantamento de dados, a partir dos PGRS enviados à SEMACE, deu
origem a uma nova listagem de indústrias, essa segunda configuração foi
apresentada à banca de qualificação a qual sugeriu que fossem inventariadas às
indústrias que gerassem uma quantidade significativa de resíduos perigosos em
detrimento das demais, cuja quantidade era incipiente, como por exemplo, as
indústrias de alimentos e bebidas. Acatando a opinião dos especialistas e
“pressupondo-se que o julgamento coletivo, quando organizado adequadamente, é
melhor que a opinião de um só indivíduo” (SANTIAGO; DIAS, 2012, p. 205), o rol de
indústrias foi mais uma vez reconfigurado, balizado nos seguintes critérios,
quantidade de resíduos Classe I gerados (acima de 5 t/mês), o nível de
periculosidade dos resíduos e sua localização no Distrito Industrial I. (Quadro 2)
Quadro 2 – Indústrias inventariadas do Distrito Industrial I – Maracanaú
N
º
O
rdem
Indústri
as3
Atividade
0
1
A
Beneficiamento de
couro
0
2
B
Beneficiamento de
celulose
3Indústrias – estão sigilosamente representadas por letras do alfabeto romano.
(Continua)
36
0
3
C
Metalurgia
0
4
D
Fabricação de
máquinas e equipamentos
0
5
E
Tinta
0
6
F
Coleta e tratamento
de resíduos
0
7
G
Têxtil
Fonte: Elaboração pelo autora partir de dados da SEMACE (2013)
É pertinente destacar que, embora o Distrito Industrial I seja rodeado
por 43 setores censitários, composto por residências e comércio, a área deste
estudo se restringiu a 12 setores censitários, contando com o Distrito Industrial I.O
recorte teve como referência a localização das indústrias inventariadas e a
proximidade dos domicílios com as mesmas, resultando na coordenada geográfica
do centroide da área 3°51'34” S e 38°36'9”O.
A localização espacial das indústrias determinou a área de aplicação
dos questionários, domicílios próximos ao entorno das mesmas e, por conseguinte a
delimitação espacial da pesquisa, a qual ultrapassa, então, os limites do Distrito
Industrial I ao agregar ao seu contorno as áreas residenciais onde foram aplicados
os questionários. (Figura 5)
A definição da quantidade de questionários a serem aplicados, resultou
da seguinte fórmula matemática:
(Conclusão)
37
Fórmula para o cálculo do tamanho da amostra
n0 =1
(E0)²
n = N . n0
N + n0
n0 = Amostra inicial
E0 = Erro amostral
n = Amostra corrigida
N = Número de domicílios
Os questionários (Ver Apêndice) foram aplicados em
domicíliosdistribuídos no quarteirãomais próximo às indústrias inventariadas, com o
intuito de conhecer e identificar as percepções dos moradores e moradoras, face ao
problema ambiental aqui estudado. Uma vez que, frequentemente, os riscos
existentes no meio ambiente são determinados pelos riscos percebidos, ou seja,
pelo o que a população identifica ou não identifica como um problema ambiental,
tendo como referência aspectos da subjetividade dos moradores urbanos. (JACOBI,
2000).
38
Figura 5 – Mapa de localização da área de estudo
Fonte: Elaborado por Iggor Torres (2017)
Fonte:elaborado pela autora
39
Pós-campo
Constituiu-se na sistematização dos dados levantados na etapa anterior,
os quais nortearam de sobremaneira a elaboraçãodos índices de vulnerabilidade
ambiental, vulnerabilidade social, vulnerabilidade socioambiental e de
vulnerabilidade quanto aos resíduos perigosos.
3.1 ÍNDICEDE VULNERABILIDADE AMBIENTAL
De acordo com seu Plano Diretor (Lei 731/00), toda área territorial de
Maracanaú é considerada de ocupação urbana, sendo assim, é oportuno frisar que o
termo vulnerabilidade ambiental, aqui utilizado, refere-se ao estado de
suscetibilidade que determinada população encontra-se, diante das alterações
ambientais (retirada da vegetação nativa, impermeabilização do solo, poluição e
assoreamento dos recursos hídricos, poluição atmosférica), decorrentes do processo
de urbanização. Para Veyret (2007), é patente que:
O sistema urbano traz os germes da vulnerabilidade. Os efeitos da
concentração e da densidade urbanas, a desigual mobilidade dos cidadãos,
[...], e o impacto das práticas de urbanismo desregrado induzem as
interações entre os agentes destruidores e as construções. (p.86)
As situações de vulnerabilidade e risco surgem à medida que a cidade
se expande espacialmente, aumentando a pressão sobre os recursos naturais,
através da construção de prédios residenciais e comerciais, casas, hospitais,
viadutos, indústrias e demais equipamentos de atração demográfica. Como
apontado por Foucher (1982, apud CASTRO et al 2005, p.22-23), “os riscos naturais
aumentam com o crescimento demográfico e, em uma escala local, aumentam a
partir da urbanização dos sítios, frequentemente vulneráveis (planícies aluviais,
regiões baixas, sopés de encostas etc.) principalmente em países
subdesenvolvidos.”
Em face do exposto, visando operacionalizar o Índice de
Vulnerabilidade Ambiental buscou-se fundamentação metodológica em Alves (2006)
e Rezende (2016), que utilizam a técnica de sobreposição de carta digitais
40
resultantes do geoprocessamento com a malha digital dos setores censitários, de
municípios urbanizados. Mesmos assim, foi necessário realizar algumas adaptações,
no intuito de contemplar as especificidades encontradas durante o trajeto
investigativo.
Para tal, inicialmente foi elaborado um banco de dados utilizado
aplicações de geoprocessamento, processamento digital de imagem, contendo as
bases geocartográficas necessárias para o desenvolvimento da pesquisa. O
software utilizado foi o ArcGIS® 10.4.1 versão trialfree disponibilizado gratuitamente
no link < http://www.esri.com/software/arcgis/arcgis-for-desktop/free-trial >. Esse
Sistema de Informação Geográfica – SIG permitiu o armazenamento, a integração, a
gestão e a derivação dos dados espaciais.
Chegou-se ao Índice de Vulnerabilidade Ambiental – IVA, através da
análise geoespacial multicritério com abordagem por média ponderada. Foram
escolhidas duas variáveis de análise pertinente à modelagem da vulnerabilidade
ambiental que são: a cobertura vegetal e a distância aos recursos hídricos. Desta
forma, fez-se necessário elaborar os mapas (planos de informações) concebidos
como modelos conceituais de campo contínuo.
A variável cobertura vegetal foi escolhida, por considerá-la fundamental
ao equilíbrio da dinâmica ambiental, contribuindo tanto na manutenção de aspectos
físicos (temperatura, solo, recursos hídricos, biodiversidade), quanto sociais
(recreação, lazer, contemplação), fato que demonstra a correlação existente entre
cobertura vegetal e vulnerabilidade. Aprofundando a afirmativa em questão, Crepani
(2001) considera a densidade da cobertura vegetal de uma determinada área,
paisagem natural ou terreno, fator de proteção contra os processos morfogenéticos
erosivos, e correlaciona o grau de densidade de cobertura com o nível de
vulnerabilidade, ou seja, quanto mais alto o adensamento vegetal maior a
estabilidade ambiental e, por conseguinte menor o nível de vulnerabilidade. Por
outro lado, as áreas de baixa densidade de cobertura vegetal apresentam maior
vulnerabilidade.
Visando identificar a densidade da cobertura vegetal da área em análise
foi realizado um mapeamento da cobertura vegetal, com recursos de Processamento
Digital de Imagem PDI. Convém ressaltar que as imagens de satélite utilizadas, por
possuírem alta resolução espacial, validam a escala de mapeamento que é na
grandeza de 1:10.000. A partir das imagens de satélite RapidEye (REIS) foi gerado
41
uma matriz de Índice de Vegetação por Diferença Normalizada – IVDN através da
técnica de aritmética de banda. A data da imagem utilizada foi do dia 11/07/2014,
apesar de existirem outras de datas de aquisição mais recentes do mesmo sensor, a
presença de nebulosidade na área de estudo não possibilitou o uso.
Com esses dados em matriz foi possível categorizar, a partir da
assinatura espectral dos elementos que se encontram na superfície, quatro grupos,
que são:
1- Corpos hídricos,
2- Edificações em geral (foi inserido nessa classe as
informações pertinentes ao solo desnudo e as áreas de pavimentação),
3- Vegetação rasteira,
4- Vegetação arbustiva e arbórea.
Cada grupo representa para a modelagem um grau de vulnerabilidade.
Logo, foi categorizada uma escala de cinco classes que vão de muito baixa
vulnerabilidade a muito alta vulnerabilidade conforme tabela1.
Tabela1 – Grau de vulnerabilidade da modelagem e seus respectivos pesos
GRAU DE
VULNERABILIDADE
PESO
Muito Alta Vulnerabilidade 5
Alta Vulnerabilidade 4
Média Vulnerabilidade 3
Baixa Vulnerabilidade 2
Muito Baixa Vulnerabilidade 1
Fonte: Elaborado pela autora (2017)
Na modelagem os dois primeiros grupos (corpos hídricos e edificações)
ficaram com peso 5; o grupo da vegetação rasteira, por apresentar menor porte,
recebeu peso 2; ao grupo da vegetação arbustiva e arbórea, de maior porte, foi
42
auferido peso 1. Deste modo, ficou determinado que os setores sem cobertura
vegetal sejam de muito alta vulnerabilidade; aqueles com vegetação rasteira, baixa
vulnerabilidade e os com vegetação arbustiva e arbórea, muito baixa
vulnerabilidade. Cabe ainda mencionar que, esse plano de informação obteve um
valor de influência de 40% na derivação da matriz de vulnerabilidade final.
Segundo a Agência Nacional de Águas – ANA (2013), a perda da
cobertura vegetal interfere diretamente na manutenção dos recursos hídricos,
reduzindo a infiltração da água no solo e consequentemente o abastecimento dos
lençóis freáticos, aumentando o escoamento superficial e afetando a dinâmica
fluvial. Deste modo, o desmatamento aumenta a probabilidade de ocorrência de
eventos e acidentes extremos, com intensidade superior à suportável, fato que
amplia a condição de vulnerabilidade ambiental, principalmente nos locais próximo
aos corpos d’água. Como apontado por Rezende (2016), a ocupação irregular
próxima aos cursos d’água desencadeia processos erosivos, muitas vezes
irreversíveis, colocando as pessoas residentes nesses locais em situação de risco,
uma vez que as mesmas ficam expostas a enchentes e às doenças de veiculação
hídrica.
Dito isto, vale enfatizar que, a presente análise da variável proximidade
dos recursos hídricos está pautada em três aspectos principais: o risco de
enchentes, a suscetibilidade às doenças de veiculação hídrica e o potencial de
contaminação dos recursos hídricos.
No que diz respeito ao mapeamento de distância dos recursos hídricos
foram utilizadas, novamente, o potencial das geotecnologias. Os dados foram
construídos através do processamento no Modelo Digital de Elevação – MDE,
oriundo de um levantamento de radar interferométrico da missão SRTM (Shuttle
Radar TopographyMission) que ocorreu entre 11 e 22 de fevereiro de 2000.
No ArcGIS, a partir da caixa de ferramentas Hidrology, foram derivadas
diversas superfícies contínuas intermediárias como a superfície com depressões
preenchidas, superfície de direção de fluxo, superfície de acumulação de fluxo e
superfície condicionante. Dessa forma, foi possível gerar uma rede de drenagem
superficial, a partir da ferramenta Stream Network As Feature, que representam as
áreas de escoamento preferencial numa abordagem automatizada.
Na sequência com intuito de tornar a rede hidrográfica mais próxima
possível da realidade foi utilizada a base cartográfica de hidrografia disponibilizada
43
pela Secretária de Recursos Hídricos do Ceará – SRH e Companhia de Gestão de
Recursos Hídricos – COGERH. Ressalta-se que a escala dos mapeamentos cedidos
não estavam condizentes com a do mapeamento dessa pesquisa, mas serviram
como estrutura norteadora da rede hidrográfica da área, além de fornecer a
toponímia dos recursos hídricos. Desta forma, para refinar o mapeamento de cursos
hídricos, foi necessário associar às técnicas de interpretação de elementos visuais
da imagem RapidEyeaos resultados da rede hidrográfica elaborada de forma
automatizada.
Destaca-se que a imagem de satélite foi utilizada em dois momentos,
tanto para refinar o mapa de cursos hídricos, como também para mapear os corpos
hídricos através de análise visual. Seguidamente, a geração da drenagem dos
recursos hídricos superficiais da área de estudo foi derivada uma superfície de
distância dos mesmos por meio da aplicação Distância Euclidiana.Assim, como no
mapeamento anterior, foi possível a partir dos dados da matriz de distância
categorizar em 5 classes as faixas de distâncias aos recursos hídricos (Ver
Tabela2). Esse plano de informação recebeu um valor de influência de 60% na
derivação da matriz de vulnerabilidade final.
Tabela 2 - Distância dos recursos hídricos superficiais e
seus respectivos pesos
DISTÂNCIA DOS RECURSOS
HÍDRICOS
P
ESO
0 – 50 m 5
50 m – 150 m 4
150m – 250 m 3
250m – 350 m 2
> 350 m 1
Fonte:Elaboração da autora (2017)
Para a integração desses dois planos de informação foi necessário
transformar os dados em números reais (float) para números inteiros (integer) com a
ferramenta Reclass. Em vista disso, a superfície de vulnerabilidade ambiental foi
derivada pela função Weighted Overlay. A figura 6 sumariza os procedimentos
realizados nessa pesquisa que fundamentaram a geração da modelagem da
vulnerabilidade ambiental.
44
Figura 6 - Fluxograma dosprocedimentos operacionais realizados para a geração do IVA
Fonte: Elaborada pela autora (2017)
45
3.2 ÍNDICE DE VULNERABILIDADE SOCIAL
No tocante ao Índice de Vulnerabilidade Social (IVS), este foi
desenvolvido a partir da metodologia do IPEA (2015), mais precisamente do
Mapeamento da Vulnerabilidade Social das Regiões Metropolitanas brasileiras.
Constituído por dezesseis indicadores, relativos a 16 regiões metropolitanas (RMs):
Belém, Belo Horizonte, Curitiba, Fortaleza, Goiânia, Grande São Luís, Grande
Vitória, Manaus, Natal, Porto Alegre, Recife, RIDE do Distrito Federal, Rio de
Janeiro, Salvador, São Paulo e Vale do Rio Cuiabá.
Dentre as 16 RMs, encontra-se a de Fortaleza, da qual o município de
Maracanaú faz parte. Além do recorte municipal existem, também, recortes
intramunicipais, conhecidos como Unidades de Desenvolvimento Humano (UDHs),
que são agrupamentos de setores censitários do IBGE localizados dentro de áreas
metropolitanas, podendo ser um bairro inteiro, parte dele, ou até um município
pequeno, os limites são definidos a partir da homogeneidade de aspectos sociais e
econômicos. (IPEA, 2015)
No processo de delimitação das UDHs, foi necessário contar com o
conhecimento e a colaboração técnica de instituições e pesquisadores de
todas as RMs abrangidas pelo ADH para que eles pudessem, a partir de
uma base de informações socioeconômicas em nível de setores censitários,
propor a configuração de recortes espaciais intrametropolitanos mais
homogêneos que atendessem às exigências técnicas do IBGE. [...]
A construção das UDHs, portanto, foi um trabalho que exigiu a articulação
de um conjunto expressivo de parceiros (articulados por meio da Plataforma
Ipea de Pesquisa em Rede – Rede Ipea), que propuseram a configuração
desses espaços intrametropolitanos, respeitando os critérios e as
exigências do IBGE, os quais deveriam ser os mais homogêneos possíveis,
em termos socioeconômicos (homogeneidade), contíguos (contiguidade), e
que fossem reconhecidos por parte da população residente (identidade).
(IPEA, 2015, p. 13)
Através das UDHs, é possível identificar as desigualdades
socioeconômicas intramunicipais, decorrentes da ausência ou insuficiência de
serviços públicos que deveriam estar à disposição dos cidadãos e cidadãs
brasileiras, proporcionando melhores condições de vida, garantido a inserção social.
46
Quanto ao reconhecimento identitário, o nome de uma UDH pode corresponder,
integralmente ou quase integralmente, ao nome de um bairro popularmente
conhecido. Quando ocorre de dois ou mais bairros corresponderem a uma única
UDH, o nome da UDH é composto do nome de todos eles. (IPEA4, 2015)
Considerando os aspectos expostos utilizaram-se as UDHs como
pilares na construção do IVS desta pesquisa. Destarte, foi realizada uma
sobreposição cartográfica entre a delimitação dos 12 setores censitários (onde foram
aplicados os questionários do trabalho de campo) e as UDHs correspondentes,
resultando em um recorte intramunicipal, identificado por nomes de bairros de
Maracanaú (Conjunto Timbó, Distrito Industrial, Novo Maracanaú,
Acaracuzinho/Novo Oriente ePajuçara II), todos localizados na franja urbana
residencial do Distrito Industrial I.
Infraestrutura estrutura urbana; capital humano; trabalho e renda são
as três dimensões bases do IVS. Cada uma é composta por um grupo de
indicadores (Quadro 3), que mostram o acesso, a ausência ou a insuficiência de
serviços, recursos ou estruturas sanitárias básicas que uma determinada população
usufrui.(IPEA, 2015)
Quadro 3 – Subíndices e indicadores de vulnerabilidade social
(continua)
SUBÍNDICE
INDICADOR
IVS
Infraestrutura
Urbana
a) Percentual de pessoas em domicílios com
abastecimento de água e esgotamento sanitário
inadequados
b) Percentual da população que vive em domicílios
urbanos sem serviço de coleta de lixo
c) Percentual de pessoas que vivem em domicílios com
renda per capita inferior a meio salário mínimo e que
gastam mais de uma hora até o trabalho no total de
4 Informações retiradas de http://ivs.ipea.gov.br/ivs/pt/o_atlas/perguntas_frequentes/#33, Acesso em:
20.fev.2017.
47
pessoas ocupadas, vulneráveis e que retornam
diariamente do trabalho.
IVS
Capital Humano
a) Mortalidade até 1 ano de idade
b) Percentual de crianças de 0 a 5 anos que não
frequentam a escola
c) Percentual de pessoas de 6 a 14 anos que não
frequentam a escola
d) Percentual de mulheres de 10 a 17 anos de idade que
tiveram filhos
e) Percentual de mães chefes de família, sem fundamental
completo e com pelo menos um filho menor de 15 anos de
idade, no total de mães chefes de família.
f) Taxa de analfabetismo da população de 15 anos ou mais
de idade
g) Percentual de crianças que vivem em domicílios em que
nenhum dos moradores tem o ensino fundamental
completo
h) Percentual de pessoas de 15 a 24 anos que não
estudam, não trabalham e possuem renda domiciliar per
capita igual ou inferior a meio salário mínimo (2010), na
população total dessa faixa etária.
IVS
Renda e Trabalho
a) Proporção de pessoas com renda domiciliar per capita
igual ou inferior a meio salário mínimo (2010)
b) Taxa de desocupação da população de 18 anos ou mais
de idade
c) Percentual de pessoas de 18 anos ou mais sem
fundamental completo e em ocupação informal
d) Percentual de pessoas em domicílios com renda per
capita inferior a meio salário mínimo (de 2010) e
dependentes de idosos
e) Taxa de atividade das pessoas de 10 a 14 anos de
idade
Fonte: Adaptado pela autora de<http://ivs.ipea.gov.br/ivs/pt/o_atlas/perguntas_frequentes/#33>
(Conclusão)
48
O acesso aos serviços de saneamento básico e mobilidade urbana
compõe a dimensão da Infraestrutura Urbana, cada indicador possui um peso
referente à estruturação deste subíndice de vulnerabilidade, ficando os indicadores
de saneamento básico com uma representatividade maior em detrimento ao de
mobilidade urbana.(Ver Quadro 4)
Quadro 4 – Descrição e peso dos indicadores do IVS Infraestrutura Urbana
(continua)
Indicador Descrição Peso
a) Percentual de pessoas
em domicílios com
abastecimento de água e
esgotamento sanitário
inadequados
Razão entre o número de pessoas que
vivem em domicílios cujo abastecimento
de água não provém de rede geral e cujo
esgotamento sanitário não é realizado por
rede coletora de esgoto ou fossa séptica, e
a população total residente em domicílios
particulares permanentes, multiplicada por
100. São considerados apenas os
domicílios particulares permanentes.
0,300
b) Percentual da
população que vive em
domicílios urbanos sem
serviço de coleta de lixo
Razão entre a população que vive em
domicílios sem coleta de lixo e a
população total residente em domicílios
particulares permanentes, multiplicada por
100. Estão incluídas as situações em que
a coleta de lixo é realizada diretamente por
empresa pública ou privada, ou o lixo é
depositado em caçamba, tanque ou
depósito fora do domicílio, para posterior
coleta pela prestadora do serviço. São
considerados apenas os domicílios
particulares
permanentes, localizados em área urbana.
0,300
c) Percentual de pessoas
que vivem em domicílios
com renda per capita
Razão entre o número de pessoas
ocupadas, de 10 anos ou mais de idade,
que vivem em domicílios vulneráveis à
0,400
49
inferior a meio salário
mínimo e que gastam
mais de uma hora até o
trabalho no total de
pessoas ocupadas,
vulneráveis e que
retornam diariamente do
trabalho
pobreza (com renda per capita inferior a
meio salário mínimo, de agosto de 2010) e
que gastam mais de uma hora em
deslocamento até o local de trabalho, e o
total de pessoas ocupadas nessa faixa
etária que vivem em domicílios vulneráveis
à pobreza e que retornam diariamente do
trabalho, multiplicado por 100.
Fonte: IPEA (2015)
Compõem a dimensão Capital Humano, indicadores tradicionais de inclusão
social (saúde e educação). Considerando heterogeneidade do mosaico territorial
brasileiro, os oito indicadores possuem o mesmo peso. (Ver Quadro 5)
Quadro 5 – Descrição e peso dos indicadores do IVS Capital Humano
(continua)
Indicador Descrição Peso
a) Mortalidade até 1 ano
de idade
Número de crianças que não deverão
sobreviver ao primeiro ano de vida, em
cada mil crianças nascidas vivas.
0,125
b) Percentual de crianças
de 0 a 5 anos que não
frequentam a escola
Razão entre o número de crianças de 0 a 5
anos de idade que não frequentam creche
ou escola, e o total de crianças nesta faixa
etária (multiplicada por 100).
0,125
c) Percentual de pessoas
de 6 a 14 anos que não
frequentam a escola
Razão entre o número de crianças de 6 a
14 anos que não frequentam a escola, e o
total de crianças nesta faixa etária
(multiplicada por 100).
0,125
d) Percentual de mulheres
de 10 a 17 anos de idade
que tiveram filhos
Razão entre o número de mulheres de 10
a 17 anos de idade que tiveram filhos, e o
total de mulheres nesta faixa etária
(multiplicada por 100).
0,125
e) Percentual de mães
chefes de família, sem
Razão entre o número de mulheres que
são responsáveis pelo domicílio, que não
(Conclusão)
50
fundamental completo e
com pelo menos um filho
menor de 15 anos de
idade, no total de mães
chefes de família
têm o ensino fundamental completo e têm
pelo menos um filho de idade inferior a 15
anos morando no domicílio, e o número
total de mulheres chefes de família
(multiplicada por 100). São considerados
apenas os domicílios particulares
permanentes.
0,125
f) Taxa de analfabetismo
da população de 15 anos
ou mais de idade
Razão entre a população de 15 anos ou
mais de idade que não sabe ler nem
escrever um bilhete simples, e o total de
pessoas nesta faixa etária (multiplicada por
100).
0,125
g) Percentual de crianças
que vivem em domicílios
em que nenhum dos
moradores tem o ensino
fundamental completo
Razão entre o número de crianças de até
14 anos que vivem em domicílios em que
nenhum dos moradores tem o ensino
fundamental completo, e a população total
nesta faixa etária residente em domicílios
particulares permanentes (multiplicada por
100).
0,125
h) Percentual de pessoas
de 15 a 24 anos que não
estudam, não trabalham e
possuem renda domiciliar
per capita igual ou inferior
a meio salário mínimo
(2010), na população total
dessa faixa etária
Razão entre as pessoas de 15 a 24 anos
que não estudam, não trabalham e são
vulneráveis à pobreza, e a população total
nesta faixa etária (multiplicada por 100).
Definem-se como vulneráveis à pobreza as
pessoas que moram em domicílios com
renda percapita inferior a meio salário
mínimo de agosto de 2010. São
considerados apenas os domicílios
particulares permanentes.
0,125
Fonte: IPEA (2015)
O IVS Renda e Trabalho é constituído por 8 indicadores que retratam
insuficiência e condição de insegurança de renda, balizado no salário mínimo de
2010. (Quadro 6)
(Conclusão)
51
Quadro 6 – Descrição e peso dos indicadores do IVS Renda e Trabalho
Indicador Descrição Peso
a) Proporção de pessoas
com renda domiciliar per
capita igual ou inferior a
meio salário mínimo
(2010)
Proporção dos indivíduos com renda
domiciliar per capita igual ou inferior a R$
255,00 mensais (em reais de agosto de
2010), equivalente a meio salário mínimo
nessa data. O universo de indivíduos é
limitado àqueles que vivem em domicílios
particularespermanentes.
0,200
b) Taxa de desocupação
da população de 18 anos
ou mais de idade
Percentual da população economicamente
ativa (PEA) nessa faixa etária que estava
desocupada, ou seja, que não estava
ocupada na semana anterior à data do censo,
mas havia procurado trabalho ao longo do
mês anterior à data dessa pesquisa.
0,200
c) Percentual de pessoas
de 18 anos ou mais sem
fundamental completo e
em ocupação informal
Razão entre as pessoas de 18 anos ou mais
sem fundamental completo, em ocupação
informal, e a população total nesta faixa
etária, multiplicada por 100. Ocupação
informal implica que trabalham, mas não são:
empregados com carteira de trabalho
assinada, militares do exército, da marinha,
da aeronáutica, da polícia militar ou do corpo
de bombeiros, empregados pelo regime
jurídico dos funcionários públicos ou
empregadores e trabalhadores por conta
própria com contribuição a instituto de
previdência oficial.
0,200
d) Percentual de pessoas
em domicílios com renda
per capita inferior a meio
salário mínimo (de 2010)
e dependentes de idosos
Razão entre as pessoas que vivem em
domicílios vulneráveis à pobreza (com renda
per capita inferior a meio salário mínimo de
agosto de 2010) e nos quais a renda de
moradores com 65 anos ou mais de idade
0,200
(Continua)
52
(idosos) corresponde a mais da metade do
total da renda domiciliar, e a população total
residente em domicílios particulares
permanentes (multiplicada por 100).
e)Taxa de atividade das
pessoas de 10 a 14 anos
de idade
Razão das pessoas de 10 a 14 anos de idade
que eram economicamente ativas, ou seja,
que estavam ocupadas ou desocupadas na
semana de referência do censo entre o total
de pessoas nesta faixa etária (multiplicada
por 100). Considera-se desocupada a pessoa
que, não estando ocupada na semana de
referência, haviaprocuradotrabalho no mês
anterior a essa pesquisa.
0,200
Fonte: IPEA (2015)
Considerando os indicadores e pesos correspondentes, oIPEA
disponibiliza o IVS das UDHs que compõem os municípios das regiões
metropolitanas brasileiras.A partir dessas informações, foi possível obter os índices
de vulnerabilidade social,do Conjunto Timbó, Distrito Industrial, Novo Maracanaú,
Acaracuzinho/Novo Oriente e Pajuçara II.
Visando a espacialização e identificaçãodos setores de vulnerabilidade,
os índices obtidos foram lançados no programa de geoprocessamento ArcGIS®
10.4.1, o qual produziu um mapa de vulnerabilidade social para cada dimensão, ou
seja, os mapas IVS Infraestrutura Urbana, IVS Capital Humano e IVS Renda e
Trabalho.
3.3 ÍNDICE DE VULNERABILIDADE SOCIOAMBIENTAL (IVSA)
A vulnerabilidade socioambiental, como o próprio nome aponta, refere-
se à condição de coexistência de duas vulnerabilidades, sociale ambiental, que se
retroalimentam. O entrelaçamento dessas duas dificulta ainda mais a capacidade de
um grupo social reagir diante de um acidente, uma vez que este se encontraem uma
situação “duplamente” vulnerável. Reforçando essa ideia, Alves (2006) considera a
vulnerabilidade socioambiental uma categoria analítica que expressa ainteração
(Conclusão)
53
Arctoolbox Spatial Analyst Map Algebra Raster Calculator
cumulativa, entre situações de degradação ambiental e situações de privação social.
Sendo possível captar e interpretar os fenômenos de sobreposição espacial e a
interação entre os problemas sociais e ambientais.
No que se refere à operacionalização do IVSA, recorreu-se às
informações contidas nos mapas dos índices de vulnerabilidade ambiental e
vulnerabilidade social, transformadas em formato raster. Entretanto, para
possibilitarocruzamento das variáveis ambientais (proximidade dos corpos hídricos,
cobertura vegetal) com as variáveis sociais (infraestrutura urbana, capital humano,
renda e trabalho), foi realizada uma média das três dimensões sociais, com intuito
de obter um IVS geral, no qual as três variáveis estão agregadas.
Dando continuidade ao processo de sistematização, os dados do IVA e
IVS, foram “lançados” no programa ArcGIS® 10.4.1, especificamente utilizando-se
da ferramenta rastercalculator, capaz de executar operações que fazem uso de
expressões comuns e complexas, dependendo de cada caso.Dentro da interface da
ferramenta do rastercalculator foi utilizado uma aritmética simples entre os dois
planos de informações, onde se obteve o Índice de Vulnerabilidade Socioambiental,
através do seguinte fluxograma: (Ver Figura 7)
Figura 7 - Fluxograma dos procedimentos operacionais realizados para a
geração do IVSA
Fonte: Elaboração da autora (2017)
3.4ÍNDICE DE VULNERABILIDADE DECORRENTE DA EXPOSIÇÃO AOS
RESÍDUOS PERIGOSOS
No que concerne à avaliação referente à situação de vulnerabilidade e
risco, decorrentes da potencial exposição da comunidade em relação aos resíduos
gerados pelas indústrias do Distrito Industrial I, esta,se baseou na metodologia do
Índice de Vulnerabilidade Social do IPEA (2015), que reporta ao acesso, ausência
ou insuficiência de bens e serviços públicos no território nacional. Desta forma,
54
elencaram-se três dimensões ou macro variáveis, I) Política/Institucional; II)
Ambiental e III) Conhecimento (educação ambiental e mobilização social). Cada uma
delas é constituída por um conjunto de diversos indicadores, que visam caracterizar
a situação de vulnerabilidade que estão expostas as famílias que vivem no
entornodas indústrias do DIF I, a partir da existência, ausência ou insuficiência de
ações direcionadas à gestão integrada dos resíduos sólidos industriais. O quadro 7
descreve as três dimensões selecionadas baseadas na pesquisa de Santiago e Dias
(2012).
Quadro 7 – Caracterização das três dimensões/variáveis
DIMENSÃO
DESCRIÇÃO
Política/Institucional
Refere-seà observância de ações
referendadas na Política Nacional de
Resíduos Sólidos e, outras ferramentas
legais regulatórias e normativas
relacionadas à gestão integrada de resíduos
sólidos. Em conformidade com as
orientações nacionais e internacionais que
norteiam a prática de instituições públicas e
privadas.
Ambiental
Envolve aspectos diretamente relacionados
à adequada disposição final dos resíduos
sólidos e seu armazenamento. No intuito de
mitigar os impactos adversos causados ao
meio ambiente e garantir a saúde da
população.
Conhecimento
(Educação ambiental e
mobilização social)
Consiste na divulgação de informações
sobre a problemática dos resíduos junto à
comunidade. Primando pela transparência e
pelo diálogo, como base para
estabelecimento de tomadas de decisões
participativas.
Fonte: Adaptado pela autora de: Santiago e Dias (2012) e IPEA(2015)
55
Os indicadores foram elaborados com base, tanto nos estudos de
Santiago e Dias (2012), Ramos (2013), quanto nas respostas dos questionários da
pesquisa de campo aplicados nos domicílios localizados no entorno das indústrias
inventariadas. Sobre o papel dos indicadores como ferramentas representativas da
realidade investigada, Ramos (2013) comenta:
A mensuração e/ou qualificação da realidade, em seus diferentes aspectos,
nos oferece um cenário da mesma, permitindo que sejamos capazes de
melhor compreendê-la, entendendo as múltiplas relações existentes entre
suas diferentes características. Nesse sentido, os indicadores são
ferramentas que instrumentalizam as análises da realidade, fornecendo
subsídios à formulação de estratégias e ações, que nos permitam
transformá-la. (p.27)
Contribuem ainda para o aprofundamento de pesquisas acadêmicas
direcionadas a investigar as mudanças e os mais diversos fenômenos sociais. A
relevância dos indicadores amplifica-se ao possibilitar não só apenas uma maior
compreensão da realidade, mas também ao fortalecer os processos de
transparência e de participação efetiva na melhoria das condições de vida e bem-
estar da população, identificando as prioridades e alertando sobre os riscos. (SESI
PR, 2010)
Partindo das premissas supracitadas, foi elaborada uma matriz
contendo 9 indicadores, com 3 descritores cada e seus respectivos pesos,
distribuídos nas três dimensões, anteriormente mencionadas. Os pesos dados aos
descritores visou auferir um valor quantitativo aos indicadores, permitindo uma
avaliação prévia do nível de vulnerabilidade, variando de 0 a 1, onde: Alta=1;
Média=0,5 e Baixa=0, adaptado da proposta de Bensen (2001), para construção de
indicadores de sustentabilidade de programas de coleta seletiva, embora que
diferente da mensuração de sustentabilidade, aqui quanto mais próximo de 1, mais
vulnerável e quanto mais próximo de 0 menos vulnerável. (Quadro 8, Quadro 9,
Quadro 10)
56
Quadro 8 – Matriz da variável política/institucional, indicadores e pesos
V
ARIÁVEL
I
NDICADOR
DESCRITOR P
ESO
P
olítica/
In
stitucional
C
umpre a
Política
Nacional
de
Resíduos
Sólidos
Sim 0
Parcialmente
0
,5
Não
1
P
ossui
Política
Municipal de
Resíduos
Sólidos
Sim 0
Em processo de
elaboração
0
,5
Não possui
1
A
indústria
possui um
plano de
gerenciame
nto de
resíduos
sólidos
Possui e segue totalmente
as normas técnicas
0
Possui, mas é parcialmente
implementado
0
,5
Não Possui
1
Fonte: Adaptado pela autora de: Santiago e Dias (2012), Ramos (2013) e IPEA(2015). Alta=1;
Média = 0,5; Baixa=0 (BESEN, 2011).
57
Quadro 9 – Matriz da variável ambiental, indicadores e pesos
DIMENSÃO INDICADOR DESCRITOR PESO
A
mbiental
Existência
de
a
terro
sanitário
no
m
unicípio
Sim 0
Em processo de
licenciamento
0
,5
Não
licenciado ou lixão
1
Existência de
aterro para
resíduos
industriais
(Classe I) no
município
Sim 0
Em processo de
construção
0
,5
Não possui
1
Armazename
nto
do
s resíduos
cla
sse I no
interior da
indústria
De acordo com a
CONAMA 313
0
Parcialmente de acordo
com a CONAMA 313
0
,5
Fora da norma CONAMA
313
1
Fonte: Adaptado pela autora de: Santiago e Dias (2012), Ramos (2013) e IPEA(2015). Alta=1;
Média = 0,5; Baixa=0 (BESEN, 2011).
58
Quadro 10 – Matriz da variável conhecimento, indicadores e pesos
DI
MENSÃO
INDI
CADOR
DESCRITOR P
ESO
Co
nhecimento
(educação
ambiental e
mobilização
social)
Infor
mações sobre
a gestão de
resíduos
Classe I
sistematizadas
e
disponibilizadas
para a
população
As informações
são sistematizadas e
divulgadas de forma
proativa para a população.
0
As informações
são sistematizadas,
porém não estão
acessíveis à população.
0
,5
As informações
não são sistematizadas.
1
Mate
rial informativo
sobre os
resíduos
sólidos
Construído
com a comunidade
local.
0
Constr
uído pela equipe
técnica
0
,5
Não tem 1
R
ealização
de
eventos/
temática
ambiental
F
requentes
0
Esporádicos
0,5
I
nexistentes
1
Fonte: Adaptado pela autora de: Santiago e Dias (2012), Ramos (2013) e IPEA(2015). Alta=1;Média =
0,5; Baixa=0 (BESEN, 2011).
Contribuindo também para mensuração da vulnerabilidade decorrente
da exposição aos resíduos perigosos, foram descritas as características de cada um
59
dos indicadores e o grau de vulnerabilidade (mais, menos e moderadamente
vulnerável). No quadro 11 é possível perceber a relação entre indicador/grau de
vulnerabilidade e identificar a condição de vulnerabilidade que as pessoas estão
expostas por residirem na proximidade de uma área industrial, onde
consequentemente são gerados resíduos perigosos.
Quadro 11 – Indicadores e Mensuração do Grau de Vulnerabilidade
(continua)
INDI
CADOR
DESCRIÇÃO
Grau de
Vulnerabilidade
Menos
vulnerável(-);
moderadamente
vulnerável (±) e
mais vulnerável(+).
Políti
ca Nacional de
Resíduos
Sólidos (PNRS)
Estabelece, dentre outras
determinações, a responsabilidade
compartilhada quanto à geração de
resíduos, considerando que todos são
responsáveis pela redução dos impactos
adversos causados à saúde e ao meio
ambiente, decorrentes do ciclo de vida dos
produtos. Aponta um conjunto de ações
destinadas à coleta e restituição dos
resíduos sólidos ao setor empresarial,
logística reversa.
Existência
de PNRS (-)
Inexistênci
a de PNRS (+)
Políti
ca Municipal de
Resíduos
Sólidos (PMRS)
Compete aos municípios
investir em políticas de prestação de
serviços públicos de interesse local, dentre
os quais a gestão de resíduos sólidos,
fundamentais para promover um meio
ambiente mais saudável e com menores
riscos à saúde de seus habitantes.
Existência
de PMRS (-)
Inexistênci
a de PMRS (+)
60
Plano
de
Gerenciamento
de Resíduos
Sólidos
(PGR
S)
A implantação de um PGRS é
fundamental na redução de riscos de
contaminação do meio ambiente, do
trabalhador e da comunidade. É
certamente menos oneroso manusear e
acondicionar resíduos de forma adequada
do que a recuperação de recursos naturais
contaminados, bem como o tratamento de
saúde do pessoal envolvido com os
resíduos. (FIRJAN, 2006)
Existência
de PGRS (-)
Inexistênci
a de PGRS (+)
Aterr
o sanitário
Muni
cipal
Local de destinação final
ambientalmente adequada ao descarte de
resíduos sólidos urbanos. Projetado com
base em estudos de engenharia, visa
evitar riscos à saúde pública e minimizar
impactos ambientais adversos.
Possui(-)
Não
possui (+)
Aterr
o Classe I
Muni
cipal
Local apto a receber com
segurança os resíduos industriais
perigosos, caracterizados por serem
inflamáveis, tóxicos, reativos, corrosivos
e/ou patogênicos.
Possui(-)
Não
possui (+)
Arma
zenamento
Contenção temporária de
resíduos, em área autorizada pelo órgão
de controle ambiental, à espera de
reciclagem, recuperação, tratamento ou
disposição final adequada, desde que
atenda às condições básicas de
segurança. (NBR 12235)
Conforme
a Norma (-)
Parcialme
nte dentro daNorma
(±)
Fora da
Norma (+)
Siste As informações referentes às Sistematiz
(Continuação)
61
matização e
divulgação de
infor
mações da
gestão de
resíduos Classe
I
questões ambientais devem estar à
disposição de todos, inclusive informações
acerca de materiais e atividades perigosas
em suas comunidades. (PRINCÍPIO 10,
DECLARAÇÃO DO RIO)
adas e divulgadas (-)
Sistematiz
adas e não
divulgadas (±)
Não
sistematizadas(+)
Mater
ial informativo
A produção de material
informativo permite a um maior número de
pessoas o acesso à informação sobre os
resíduos. Será mais eficiente se for
construído participativamente com a
comunidade, tornando-se mais uma
ferramenta de mobilização e controle
social.
Construíd
o com a comunidade
(-)
Construíd
o pela equipe técnica
(±)
Inexistent
e (+)
Reali
zação de
eventos/
temática
ambiental
Os eventos são momentos
democráticos de participação, importantes
para o fortalecimento do controle social.
Onde é possível estabelecer o diálogo
entre a comunidade, setores econômicos e
governamentais.
Frequ
entes (-)
Esporádicos (±)
Inexistentes (+)
Fonte: Elaborado pela autora, adaptado de Almeida (2009).
O índice é um indicador sintético, resultante da combinação de
diferentes variáveis, que busca representar um conceito abstrato, simples ou
complexo, em um valor numérico, utilizando em seu cálculo, bases científicas
eprincípios matemáticos básicos. Comumente é empregado como um instrumento
de tomada de decisão. (SICHET et al, 2007), (SESI PR, 2010). Sendo assim, na
tentativa de sintetizar, de maneira simples, as variáveis trabalhadas em relação aos
resíduos industriais perigosos, a presentes pesquisa traz uma proposta de índice de
(Conclusão)
62
vulnerabilidade quanto aos resíduos perigosos (IVRP), a partir do cálculo da média
aritmética entre o somatório da avaliação de cada uma das variáveis e o somatório
da máxima situação de vulnerabilidade em cada variável. Um dos desafios
encontrados na construção desse índice foi encontrar uma fórmula que fosse capaz
de traduzir com a maior fidelidade possível o conceito desejado.
Cálculo do IVRP
IVRP = ∑ dospesos obtidos na avaliação de cada variável
∑ da máxima situação de vulnerabilidade em cada variável
IVRP = ∑ VP + VA + VC
9
VP - variável política/institucional
VA – variável ambiental
VC – variável conhecimento
∑ da máxima situação de vulnerabilidade em cada variável = 9
Cabe destacar que, os pesos auferidos no processo de avaliação estão
pautados principalmente nas respostas dos questionários aplicados nos domicílios,
considerando desta forma, a diversidade dos contextos socioespaciais
testemunhados no decorrer da pesquisa de campo, e nos dados secundários
coletados na SEMACE.
A somatória da máxima situação de vulnerabilidade de cada variável,
corresponde ao peso 1 dado cada um dos 3 indicadores que compõem as 3
variáveis mestras. Para interpretar o IVRP, o valor resultante foi então reconhecido
através de uma matriz de avaliação do índice de vulnerabilidade do IPEA.(Ver
Tabela3)
63
Tabela 3 – Matriz de avaliação do índice de vulnerabilidade
INTERVALOS VULNERABILIDADE
0,501 - 1 Muito alta
0,401 – 0,500 Alta
0,301 – 0,400 Média
0,201 – 0,300 Baixa
0 – 0,200 Muito baixa
Fonte: Adaptado IPEA (2015)
64
4 RESÍDUOS SÓLIDOS: PRESENÇA E AMEAÇA NO ESPAÇO GEOGRÁFICO
Desde tempos mais remotos os resíduos sólidos vêm configurando-se
elementos de construção do espaço geográfico. Há registros deles em diversos
momentos históricos, sendo possível identificá-los no desenrolar da linha
cronológica alusiva a existência humana.
Na visão de Burke (2001) tudo tem uma história, uma vez que tudo sofre mudanças
ao longo dos séculos, seja o clima, a maneira de sociabilidade, os sonhos, os ideais
de limpeza e até o lixo. Para que haja uma compreensão melhor dessas mudanças
é necessário relacioná-las com os acontecimentos da época. Deste modo, este
capítulo se propõe percorrer a trajetória espaço-temporal dos resíduos sólidos,
buscando um entendimento maior sobre essa questão.
4.1 RESÍDUOS DO TEMPO DEIXAM MARCAS NO ESPAÇO
O espaço geográfico resulta da intervenção do ser humano sobre a
natureza, possui caráter social e histórico, por isso dinâmico. Por não se tratar de
um espaço permanente, apresenta-se continuamente inacabado, ou seja, em
constante processo de transformação e reinvenção. Pode também ser considerado
como um amplo acervo natural das mais diversas temporalidades, provenientes de
ações subjetivas e técnicas, alteradoras do meio ambiente.
É pertinente destacar que, as transformações ocorridas na natureza não
se restringem apenas àquelas visivelmente detectadas, possuidoras de uma
exterioridade imediata. Sua capacidade de alcance é bem mais ampla e complexa,
chega a atingir a existência dos seres orgânicos e inorgânicos que a compõe.
Amiúde, o modo como essas alterações acontecem terminam definindo a qualidade
de vida dos elementos que a constitui, não só no plano social, mas também no
planetário.
Conforme relatado por Corrêa (1986), as primeiras intervenções humanas
na natureza foram impulsionadas pelas necessidades básicas, de fome, sede e frio,
desta forma, gradualmente a natureza foi sendo incorporada ao cotidiano do homem
como meio de subsistência, através da produção de alimentos, tecidos, móveis,
cerâmicas e ferramentas, transformando a natureza primitiva em segunda natureza
por meio do trabalho. Para Santos (1997, p.88) “toda ação humana é trabalho e todo
65
trabalho é geográfico”, considera-se, portanto, que tudo que resulta do trabalho é
também objeto de estudo da geografia.
Balizada nessa premissa, convém lembrar que, nem todos os recursos
envolvidos no processo de construção do espaço a partir do trabalho são
aproveitados ou absorvidos, e findam gerando resíduos que se acumulam no
ambiente, tornando-se elementos da paisagem artificial5. Os sambaquis são
evidências irrefutáveis do acúmulo de resíduos incorporados à paisagem. (Ver
Figura 8)
Esses amontoados de conchas (daí a origem do nome), ossos humanos,
utensílios pré-históricos, equipamentos rudimentares de caça e pesca como ponta
de flechas e arpões podem ser encontrados nas áreas costeiras, em todo o mundo,
principalmente no litoral do Atlântico, assim como na foz de grandes rios. Configura-
se em uma espécie de depósito de resíduos a céu aberto que sofreu fossilização
química, petrificando os detritos e ossadas ali existentes.
De formato cônico ou semiesférico, os sambaquis6 chegam atingir 30
metros de altura, o equivalente a um prédio de 10 andares. No Brasil podem ser
encontrados no litoral brasileiro, no baixo Amazonas e no Xingu, e datam cerca de
5.000 anos. Pesquisas sobre estas construções ajudaram a montar um retrato sobre
o modo de vida dos homens pré-históricos do litoral brasileiro, entretanto não há
uma unanimidade entre os pesquisadores quanto à finalidade dos sambaquis,
podendo ser diversas: depósitos de restos de alimentos, de carcaças e ossadas de
animais, cemitério e até moradias. Apesar de serem patrimônio da União, os
sambaquis continuam sendo destruídos, através da extração de cal, construção de
casas de veraneio e estradas.
5 Paisagem artificial – A paisagem artificial é a paisagem transformada pelo homem. Milton Santos em
Metamorfose do Espaço Habitado – 1997. 6 Fonte:<http://mundoestranho.abril.com.br/materia/o-que-sao-sambaquis>,
<http://www.infoescola.com/arqueologia/sambaqui/ Fonte: http://www.panoramio.com/photo/76669694>
66
Figura 8 - Sambaqui no Litoral de Santa Catarina – BR
A relação entre o trabalho e a produção do espaço acontece
simultaneamente, assim, como também a relação entre os meios de produção e a
geração de resíduos.
Em princípio, deve-se esclarecer que as atividades humanas sempre
geraram lixo, na verdade, diz-se que a arqueologia trabalha com restos e
rastros deixados pelas atividades do homem, a partir destes resíduos são
feitas interpretações sobre a vida de um passado distante.7 (LARA, 2003,
p.70, tradução nossa).
Waldman (2010) segue a mesma linha de pensamento quando considera
que, a geração de resíduos é indissociável das atividades humanas, tanto no tempo
quanto no espaço, ou seja, é um fenômeno que permeia a trama histórica das
sociedades, associado à origem de novas formas espaciais. Estudos arqueológicos
revelaram que na pré-história já se queimavam resíduos, supostamente para
eliminar o mau odor, e destinavam as cinzas e ossos em locais próprios, distantes
da área de convívio (EIGENHEER, 2009).
Cabe lembrar que, apesar de acompanhar a trajetória da humanidade,
nem sempre a destinação final dos resíduos na natureza foi vista como um
7Enprincipio se tiene que aclarar que las actividades del ser humano siempre han generado basura, de hecho, se
dice que la arqueología trabaja con los restos y los rastros que dejaron las actividades del hombre, a partir de
estos residuos se hacen interpretaciones sobre la vida en un pasado lejano.
67
imbróglio. Quando o ser humano vivia de forma nômade sua permanência em um
mesmo local era fugaz, não dava tempo de produzir grandes quantidades ou
acumular resíduos, caracterizados por uma constituição orgânica. Os problemas
começaram a surgir a partir da fixação dos grupos em aldeias, e se agravaram com
a tecnificação dos meios de produção e o surgimento das cidades.
Apresentando uma perspectiva mais aprofundada, Barles(2014) postula
que “a história dos resíduos reflete as sociedades que os produziram, e sua relação
com o meio ambiente e os recursos que mobilizaram.”8 (p.199, tradução nossa).
Destarte, pode-se concluir que o espaço sempre reflete o nível de desenvolvimento
das forças produtivas que o forjaram, quanto mais simples sua organização,
menores são as necessidades de vida da população, menor o consumo, menos
recursos são extraídos da natureza e menos resíduos são gerados.
Burke (2001) considera os resíduos uma espécie de indicador cultural, por
isso varia de uma cultura para outra, revelando os valores locais e temporais. Na
China antiga, por exemplo, qualquer pedaço de papel contendo algum escrito era
considerado valioso, de modo que não deveria ser descartado levianamente, mas
sim ritualisticamente queimado com todo respeito.
Conforme pesquisa histórica realizada por Eigenheer (2009), na
Mesopotâmia os resíduos eram basicamente de constituição orgânica,
biodegradáveis, sendo absorvidos facilmente pela natureza. Os povos da
Mesopotâmia, sumérios, babilônios e assírios, já demonstravam cuidados com os
efluentes, possuíam um sistema de duto, feito de barro, usados para escoamento de
águas servidas, enviadas para canais maiores.
Cabe ainda mencionar a Cloaca Máxima (Ver Figura 9), considerada o
mais antigo sistema de esgoto do mundo. Inserida na paisagem urbana da Roma
antiga, originalmente era um dreno aberto que levava os dejetos da cidade romana
até o rio Tíber, onde eram lançados sem nenhum tipo de tratamento. Com o passar
dos anos foi sendo gradualmente coberto, à medida que o espaço urbano foi se
valorizando, tinha ainda a função de recolher as águas que desciam das colinas e
drenar a área pantanosa de Roma.
8 The history of waste mirrors that of the societies that produced it, and their relationship with the environment
and the resources they mobilized
68
Figura 9 - Cloaca Máxima da Roma Antiga
Fonte:http://romantigua.webnode.es/historia-de-roma-desde-su-fundacion/los-reyes-
tradicionales/lamonarquia-etrusca/ICloaca Máxima da Roma Antiga
Atualmente, após algumas reformas, a cloaca máxima (o grande esgoto)
ainda integra o sistema de drenagem da cidade de Roma, e tornou-se um espaço
subterrâneo de pesquisas arqueológicas referentes à história da sociedade ocidental
antiga.
Diante das colocações expostas, cabe ainda outra, referenciada nas
postulações teóricas dos autores supracitados. A indelével presença dos resíduos
na construção do espaço geográfico, seja in natura como no caso dos sambaquis,
seja cultural ou através das edificações urbanas construídas com a função de dar a
estes uma disposição adequada, que prime pela saúde da população e a
preservação do meio ambiente.
4.2 OS RESÍDUOS NO ESPAÇO MEDIEVAL: AMEAÇA À VISTA
A forma de organização econômica, social, política e espacial que
caracterizou a idade média foi o feudalismo. Porém cabe destacar que este período
histórico não foi estanque, as mudanças econômicas, religiosas, políticas e culturais
69
decorrentes da dinâmica temporal caracterizou-o,categoricamente, em duas fases:
alta idade média e baixa idade média.
O período conhecido como alta idade média foi marcado pelas relações
de suserania e vassalagem, que se davam através do trabalho agrícola, sendo o
suserano o proprietário de terras (senhor feudal) e o vassalo (servo). A paisagem
rural era predominante, e o espaço agrícola era “esculpido” por rudimentares
técnicas agrícolas, proporcionando uma baixa produtividade. Os gêneros agrícolas
produzidos eram utilizados para abastecer os feudos e mantê-los praticamente
autossuficientes; as relações comerciais eram incipientes e aconteciam
principalmente nos burgos. Quanto aos resíduos, as práticas de higiene se
restringiam à eliminação de águas servidas e fezes arremessadas por cima das
muralhas para as áreas limítrofes dos burgos, ficando os resíduos dispostos a céu
aberto.
Na baixa idade média, os avanços tecnológicos na agricultura, o arado de
ferro com rodas, o moinho hidráulico, o carro de boi, promoveram um aumento
significativo na produção agrícola, os excedentes passaram a ser comercializados, e
os servos começaram a migrar para os burgos, onde havia um grande fluxo de
pessoas para consumirem suas mercadorias e uma certa segurança contra os
salteadores. Esta gama de mudanças não passou despercebida, materializou-se no
espaço vivido. A paisagem rural que “reinava” na alta idade média foi perdendo seu
posto para a paisagem urbana alavancada pelo ressurgimento do comércio e o
surgimento de uma nova classe social, a burguesia, constituída por pequenos
mercadores, artesãos, banqueiros e donos de companhias de comércio.
Com o advento da urbanização, o adensamento populacional aumentou
consideravelmente, entretanto não foi acompanhado dos cuidados sanitários
existentes na antiguidade, que foram deixados para trás. Esse retrocesso
caracterizou-se pela inexistência de canalização da água e de preocupação com as
águas servidas, não havia coleta de lixo, nem destinação adequada para as
carcaças de animais e cadáveres. De acordo com Burke (2001), no medievo, na
cidade francesa de Bordeaux, as pilhas de resíduos fora dos portões da cidade eram
tão altas que facilitavam escalar as muralharas, colocando em risco a segurança da
cidade, isso sem falar no perigo à saúde da população.
Os resíduos que se acumularam ao redor das muralhas dos burgos atraíram vetores
transmissores de doenças e causaram grandes epidemias, a mais conhecida delas
70
foi a Peste Negra, que entre 1347 a 1351 dizimou um terço da população europeia.
Existem registros literários do século XVI, que falam da estreita relação entre a
inadequada disposição dos resíduos e a Peste Negra, e podem ser encontrados na
seção de obras raras da Biblioteca Geral de Coimbra, nas obras de Ursino e
Dessenius. (VELLOSO, 2008)
Na análise de Pereira (2005), a urbanização medieval procedeu com
pessoas recém-saídas do campo, acostumadas a uma economia de
autossubsistência, a um cotidiano rural, onde geralmente os rejeitos eram
reaproveitados como adubos, forragens ou lavagens para animais. Por sua utilidade
imediata, os dejetos não eram vistos como perigosos ou nocivos à saúde. Os outros
resíduos que não tinham essa destinação, eram produzidos e descartados em
quantidade e velocidade que lhes permitiamser incorporados pela natureza, fato que
refreava os acúmulos. Deste modo, formou-se uma categoria de citadinos preso
ainda a hábitos rurais, que reproduziam nos espaços urbanos comportamentos
equivalentes aos do campo, principalmente no que se refere à destinação dos
resíduos, que passam a ser depositados nas ruas, praças e demais locais públicos
sem qualquer tipo de constrangimento. Entretanto, o espaço urbano evidentemente
não tinha a capacidade de digerir os detritos produzidos pelos moradores, e assim
foi se instalando na cidade medieval o reino da peste.
Porém, cabe ainda reconhecer que, a experiência traumática resultante
da falta de cuidados sanitários, vivenciada na idade média, terminou contribuindo
para o surgimento de serviços públicos referentes à limpeza urbana, criando
inclusive segmentos especificamente voltados para o gerenciamento dos resíduos
sólidos urbanos, serviços de armazenamento, coleta e disposição final. Como
mostram os estudos feitos por Burke (2001),
Na Itália, uma das partes mais urbanizadas da Europa no final da Idade
Média, o controle do lixo era levado especialmente a sério. Em Siena, por
exemplo, a municipalidade contratava porcos para manter as ruas mais ou
menos limpas, enquanto em Bolonha a disposição do lixo foi regulamentada
por uma série de leis, desde o século 13 até o 16. (p. 2)
Ainda sobre a situação dos resíduos na idade média, Eigenheer (2009)
declara que, nas cidades europeias, as reformas na limpeza urbana aconteceram
paulatinamente, e, na maioria delas não tiveram continuidade. Somente a partir de
71
16669 foi organizado em Londres um sistema de limpeza urbano, que consistia em
sortear alguns cidadãos (scarvagens) com intuito de responsabilizá-los pela limpeza
de determinadas áreas das cidades; como a tarefa não era aceita de bom grado este
sistema não teve continuidade. As dificuldades financeiras, logísticas, educacionais
e sociopolíticas dificultavam a implantação de um sistema de limpeza eficiente,
restringindo-o a pequenas áreas urbanas.
As pesquisas dos autores supracitados se complementam, propiciando
uma visão mais abrangente sobre a temática abordada, ajudando a compreender
como os resíduos foram configurando-se em presença ameaçadora do e no espaço
urbano medieval. Fazendo com que obrigatoriamente sua existência não fosse mais
negligenciada, seja como elemento de construção ou de destruição do espaço
geográfico.
4.3 OS RESÍDUOS NA MODERNIDADE
Diante da gama de elucidações referentes à modernidade, é possível
destacar dois aspectos característicos, o primeiro é de cunho ideológico, suas raízes
estão arraigadas no pensamento iluminista. Na ideia de utilizar o acúmulo de
conhecimento para dominar a natureza, uma vez que “o domínio científico da
natureza prometia liberdade da escassez, da necessidade e da arbitrariedade das
calamidades naturais” (HARVEY, 2004, p. 23).
O segundo é de cunho socioeconômico, a sensação de prosperidade e
progresso fomentada pela revolução industrial ocorrida no século XVIII na Inglaterra
e na França, trouxe transformações significativas não apenas na forma de ver o
mundo, mas também no modo de vida societário. A partir de então, nunca mais a
Terra e a humanidade foram as mesmas, “a noção de um universo orgânico, vivo e
espiritual foi substituída pela noção do mundo como máquina, e a máquina do
mundo tornou-se a metáfora dominante da era moderna” (CAPRA, 2003, p.34).
Seguindo essa mesma linha do pensamento, Santos (1994) complementa:
9Período de transição entre a idade média e moderna.
72
A história do homem sobre a Terra é a história de uma rotura progressiva
entre o homem e o entorno. Esse processo se acelera quando,
praticamente ao mesmo tempo, o homem se descobre como indivíduo e
inicia a mecanização do Planeta, armando-se de novos instrumentos para
tentar dominá-lo. A natureza artificializada marca uma grande mudança na
história humana da natureza. ( p.5)
As novas descobertas científicas e tecnológicas foram responsáveis
por essa mudança radical. Embora tenham facilitado a sobrevivência humana em
seus “espaços de vida”10, cada vez mais urbanos, contribuíram também para uma
desenfreada degradação dos recursos naturais, paradoxalmente colocando em risco
diversas formas de vida do planeta. Ao desconsiderar o limite dos recursos naturais
e seu delicado equilíbrio ecológico, as inovações técnico-científicas aceleraram o
processo de rotura entre o homem e o entorno, gerando um descompasso, não
somente na relação espaço-tempo como também nas relações sociais.
O vertiginoso crescimento urbano decorrente da Revolução Industrial
acarretou sérios problemas ambientais e sanitários, que atingiram tanto os bairros
operários quanto os bairros nobres. Segundo Eigenheer (2009), na metade do
século XIX ocorreram modificações significativas na limpeza urbana, inclusive em
aspectos técnicos, passou-se a dar maior importância à qualidade da água, e foi
estabelecida a necessidade de se separar esgoto de resíduos sólidos. Houve um
aperfeiçoamento referente ao tratamento de resíduos sólidos, que passaram a ser
incinerados e reaproveitados através do trabalho de catadores e usinas de triagem.
Contudo, vale destacar que apesar destas inovações, a situação da destinação final
dos resíduos continuou precária, a maioria quando coletada era jogada nos rios, no
mar ou a céu aberto, quando não, incinerada.
O primeiro incinerador foi projetado por Alfred Fryer em 1874, na
Inglaterra, consistia em um forno extremamente simples, que funcionava à base de
carvão mineral, onde tanto a disposição dos resíduos, quanto o controle da emissão
de gases eram feitas manualmente. No tocante ao aspecto espacial, o uso dessa
tecnologia não passou despercebido, muito pelo contrário, além das chaminés das
fábricas, as chaminés dos incineradores passaram a compor a paisagem da cidade
moderna, de modo que “em 1900 a Inglaterra já dispunha de 121 incineradores”
10Milton Santos: Técnica espaço tempo – Globalização e meio técnico-científico-informacional.
73
(HÖSEL, 1990, apud EIGENHEER, 2009, p.71) distribuídos entorno das áreas
urbanas.
A presença dos incineradores, não se restringiu a paisagem dos países
europeus, segundo Calderoni (2003), em 1896 foi instalado na cidade de Manaus, o
primeiro incinerador do Brasil, com capacidade de processar 60t/dia de lixo
doméstico, sendo o mesmo desativado em 1958, pouco mais de meio século depois
de instalado, devido problemas de manutenção.
Ao se considerar os efeitos da incineração no meio ambiente, pode-se
identificar tanto aspectos positivos quanto negativos. Waldman (2010) coloca que
este tipo de tratamento térmico vem sendo defendido por estudos que exaltam suas
vantagens, como por exemplo, esterilização, destoxicação, a redução de 75% da
massa e de 90% do volume de resíduos. Contudo, o mesmo autor apresenta
também estudos que se contrapõem à utilização dos incineradores:
Entretanto, contrapondo-se aos aspectos considerados positivos existem
objeções sérias quanto à operação dos incineradores. [...] assinale-se que
os compêndios admitem ser a incineração responsável por componentes
tóxicos presentes nos gases e cinzas da combustão do lixo. Dentre os
poluentes em estado gasoso, constatam-se dioxinas e furanos, poluentes
persistentes de natureza tóxica e carcinogênica. A estes, somam-se
compostos clorados, metais pesados, gases sulfurosos, monóxido de
carbono e óxidos de nitrogênio. (2010, p.163-164).
Na realidade, o processo de industrialização além de ampliar o volume de
resíduos gerados, também alterou a composição físico-química dos mesmos,
tornando-os cada vez mais artificializados, inorgânicos e, por conseguinte de difícil
degradação e com alto teor tóxico, bem diferentes daqueles gerados nos períodos
históricos anteriores, caracterizados em sua maioria por sua constituição orgânica.
Deste modo, pode-se observar que a inversão na composição e o aumento na
quantidade de resíduos ampliaram os problemas já existentes quanto a uma
destinação final adequada desses materiais.
Cumpre ainda assinalar que a preocupação dos países europeus, na
segunda metade do século XIX, com a saúde pública e com a higiene nos espaços
urbanos, promoveu uma mudança radical nas formas de manejo dos resíduos, tendo
74
inclusive influenciado o modelo de limpeza urbana no resto do mundo, pelo menos
no que se refere ao hemisfério ocidental.
A partir de então, no decorrer do século XX, as técnicas de limpeza
urbana foram se aperfeiçoando cada vez mais. De acordo com Eigenheer (2009),
era comum na Alemanha a cobrança de taxas pelos serviços de saneamento e já
em 1901, aproximadamente 75% das casas em Berlim separavam os resíduos
domésticos em vasilhames padronizados, próprios para o acondicionamento do lixo.
Ainda na primeira metade do século supracitado, nos Estados Unidos,
aproveitavam-se as depressões de terrenos para depositar os resíduos e depois
aterrá-los, a intenção era evitar a proliferação de insetos, a fumaça oriunda da
queima do lixo e o mau cheiro. Esses terrenos foram denominados de
“sanitarylandfills”.
O aterramento de resíduos é uma prática antiga, utilizada por diversas
sociedades em diferentes momentos históricos e que foi sendo aperfeiçoada no
decorrer do tempo, através do desenvolvimento de técnicas, máquinas (tratores,
escavadeiras, etc) e projetos de engenharia. Inicialmente os resíduos eram apenas
cobertos por camadas de areia, não existia uma preocupação com os “produtos”
derivados, como por exemplo, chorume e gás metano, poluentes altamente tóxicos
ao meio ambiente. Sem as medidas sanitárias cabíveis, esses locais de deposição
findaram e ainda terminam tornando-se verdadeiros lixões, que passam a compor e
a destruir a estética paisagística.
Os maiores lixões do mundo estão localizados nos países
subdesenvolvidos, esta realidade deve-se a algumas práticas, não apenas locais,
mas também globais. A inexistência de um sistema regular de coleta de lixo perdura
no cotidiano da população dos continentes asiático, africano e latino americano, fato
que demostra a falta, quando não, a precariedade de políticas públicas de
saneamento básico, que garantam a saúde da população e a conservação do meio
ambiente. Esses depósitos a céu aberto, além de acumularem os detritos gerados
nacionalmente, “recebem” anualmente milhares de toneladas de resíduos oriundos
dos países desenvolvidos europeus, Estados Unidos, Canadá e Japão,
considerados referências mundiais no tratamento de seus resíduos.
Contrapondo-se aos lixões, os aterros sanitários são locais onde o
processo de aterramento de resíduos é acompanhado por técnicas de engenharia
como, impermeabilização do solo, sistema de drenagem de lixiviados e de gases,
75
monitoramento ambiental e geotécnico. Todo esse cuidado visa minimizar os
impactos ambientais decorrentes dos resíduos; garantir a segurança e a saúde
pública; principalmente da população do entorno.
Por outro lado, embora seja considerada a destinação final mais
adequada para os resíduos sólidos, por permitir um controle seguro e eficiente de
seu manejo, a instalação de aterros sanitários requer espaços, e isso se torna um
problema para os países de pequenas dimensões territoriais, como o Japão e a
Suíça, que encontram na incineração a melhor alternativa de destinação final,
incinerando respectivamente o montante de 72% e 88% de seus resíduos.
É pertinente destacar que, incineradores, usinas de triagem e aterros
sanitários são formas espaciais visíveis, criadas com a função de tornarem-se locais
de destinação adequada dos resíduos sólidos, resultantes da estrutura
socioeconômica capitalista. Segundo Corrêa (1986) no processo de organização
espacial a relação entre forma e função é direta, uma vez que a primeira é criada
para desempenhar uma ou mais funções, enquanto a segunda tem sempre uma
forma correspondente, daí a impossibilidade de dissociar uma da outra.
Em conformidade com o pensamento exposto, o que se pretende
ressaltar é que a inter-relações entre as categorias espaciais de forma, função,
estrutura e processo é um caminho que pode permitir desvelar e compreender as
mudanças ocorridas na espacialização dos resíduos ao longo da história,
fomentando condições de debates sobre esta problemática, que ultrapassem a
tautologia e o olhar míope que lhe é outorgado.
4.4 RASPAS E RESTOS ME INTERESSAM
Muitas das conquistas dos sistemas de limpeza urbana europeu foram
arruinadas com a Segunda Guerra Mundial e a problemática da destinação final dos
resíduos sólidos se agravou significativamente, de modo que até hoje ainda há
registros de poluentes químicos em áreas anteriormente utilizadas como vazadouros
pela indústria da guerra. (EIGENHEER, 2009).
Com o fim do conflito bélico mundial, os países industrializados sentiram a
necessidade de aquecer sua economia devastada pela guerra. O consumo em
massa passou então a ser estimulado, principalmente a partir da década de 1950,
76
acarretando, em contrapartida, um aumento exacerbado na quantidade de resíduos
gerados, além de uma concentração espacial dos mesmos na natureza.
Nesta época, como as fontes de energia eram baratas e os recursos
naturais aparentemente abundantes acreditavam-se não haver limites para
o desenvolvimento. Todavia não existiam preocupações sobre o meio
ambiente, quanto à origem da matéria-prima nem sobre o destino dos
resíduos gerados. (CARVALHO, 2011, p.17)
Velloso (2008)postula:
Somente a partir da década de 1970, o lixo começa a ser considerado uma
questão ambiental. A preservação do meio ambiente foi assumindo caráter
global, com as conferências de Estocolmo, em 1972, a ECO 92, no Rio de
Janeiro e a de Tibilisi, em 1997. A crescente participação da mídia também
contribuiu significativamente para esse processo, devido à rapidez com que
as informações são transmitidas, de um lugar a outro do mundo. (p.1962).
Em 1998, uma reportagem de televisão comoveu o Brasil quando
mostrou o caso de crianças intoxicadas e hospitalizadas, após comerem carne de
um lixão de Pernambuco, suspeitava-se que era carne humana de restos de lixo
hospitalar, depositados de forma inadequada. A notícia deu visibilidade a um
segmento de trabalhadores esquecidos, mas que já lutavam por melhores condições
de trabalho e de vida, os catadores de materiais recicláveis. (PINHEL; AMORIM,
2013)
Esta não foi a primeira vez que a falta de uma fiscalização mais
rigorosa referente à destinação inadequada de resíduos perigosos deixou vítimas e
ganhou espaço na mídia. Em 1987, o acidente com Césio-137 foi transmitido em
rede nacional como um dos maiores acidentes radioativos ocorridos no mundo,
classificado como nível 5, segundo a Escala Internacional de Acidentes Nucleares
que varia de zero a sete. Na cidade de Goiânia, dois catadores encontraram um
aparelho de radioterapia no prédio onde funcionava o Instituto Goiano de
Radioterapia, após desmontá-lo levaram algumas partes do aparelho para suas
casas e outras venderam para um depósito de ferro velho, o qual repassou para
77
outros sucateiros, promovendo uma reação em cadeia onde centenas de pessoas
foram contaminadas e outras vieram a óbito.
As pessoas que morreram foram enterradas em caixões
de chumbo extremamente robustos para que não contaminassem o solo
ainda mais. Este fato deixa-nos inclusive uma reflexão a respeito do
descarte do lixo que até hoje não vem sendo tratado com a importância que
deveria tornando o trabalho dos catadores ainda mais perigoso, além de
colocar em risco a sociedade como um todo. (PEDROLO, 2016, p.1)
O agravo ou o conhecimento da problemática ambiental decorrente dos
resíduos da sociedade do descartável findou incorporando-se às preocupações
cotidianas, trazendo o ‘monstro’ do lixo para mais perto das pessoas. A partir daí
encontrar soluções para seu acúmulo tornou-se uma necessidade, fosse através da
incineração, do reaproveitamento ou da reciclagem. (RODRIGUES, 1998).
Na reciclagem, o produto que iria ser descartado é reintegrado ao ciclo
produtivo com suas características físicas alteradas, ocorrendo nesse processo uma
economia significativa de matéria prima, de energia e recursos hídricos. Isso sem
falar na redução de controle ambiental e no prolongamento do tempo de vida útil dos
aterros sanitários. Papel, metal, vidro, plástico e orgânico são os principais materiais
reciclados.
Nos países desenvolvidos os cidadãos estão inseridos no ciclo da
reciclagem dos resíduos, ficando responsáveis por sua separação prévia nos
domicílios (coleta seletiva) e levá-los para locais ou pontos de entrega voluntária
(LEV ou PEV). Na análise de Calderoni (2003), a efetivação da prática da coleta
seletiva nesses países é decorrente, em grande medida, das dificuldades ocorridas
na2ª Guerra, que resultou numa conscientização social, no tocante ao
reaproveitamento dos materiais pretensamente descartados, iniciada nas escolas,
mas que atualmente permeia o cotidiano da população, ou seja, é praticada nas
residências, nas lojas, supermercados e até em centros de lazer.
Apresentando uma realidade oposta a esta, o tratamento dispensando
aos resíduos, nos países do sul, encontram-se há anos luz de distância da realidade
acima descrita. Só para ter uma ideia, a erradicação dos lixões na Europa data do
ano de 1972, enquanto que no Brasil, ainda hoje eles são uma realidade espacial
incontestável, mesmo que a Política Nacional de Resíduos Sólidos - Lei 12.305/2010
78
tenha decretado o extermínio destes, até agosto 2014 e depois prorrogado para
201711. Além do que só deverão ser destinados aos aterros sanitários os rejeitos, ou
seja, aqueles resíduos que não podem ser recuperados por processos tecnológicos
disponíveis e/ou financeiramente inviáveis, fato que torna a coleta seletiva
praticamente obrigatória.
Cabe ressaltar que a coleta seletiva não é um hábito ainda internalizado
pela maioria do povo brasileiro. Os materiais reciclados continuam sendo destinados
aos aterros sanitários, que parecem mais verdadeiros lixões, e a segregação dos
resíduos é feita principalmente por catadores e catadoras, figuras emblemáticas,
presentes nas ruas, nos aterros e lixões do país.
Segundo a Pesquisa Nacional de Saneamento Básico (PNSB, 2008),
existem aproximadamente 70,5 mil catadores informais atuando em ruas e
lixões, e 30.390 organizados em cooperativas ou associações. As entidades
do setor acreditam, porém que esses números não condizem com a
realidade, pois a PNSB se baseia nas informações geradas pelas
prefeituras municipais, que, na grande maioria dos casos, não têm um
cadastro dos catadores da cidade. (PINHEL, 2013, p.18).
Atualmente os catadores e catadoras de resíduos são os principais
agentes responsáveis pela segregação dos materiais socialmente descartados,
contribuindo na gestão dos resíduos sólidos urbanos. Geralmente, trabalham em
ambientes altamente insalubres, na maioria das vezes sem qualquer tipo de
equipamento de proteção individual (EPI), em condições não muito diferentes
daquelas dos scarvagensdo medievo. Entretanto, quando conseguem se organizar
em cooperativas, sua situação de vulnerabilidade e semiclandestinidade tende a ser
superada, juntamente com o crescimento do mercado da reciclagem e da
consciência social. (CALDERONI, 2003).
Vale esclarecer que as cooperativas brasileiras são formadas por
quatro principais grupos de catadores/as: pessoas desempregadas, que acreditam
estar exercendo a atividade temporariamente; catadores/as que trabalham em lixões
11Diante das dificuldades dos municípios de cumprirem em tempo hábil o que a lei determinava, esse prazo foi
prorrogado para 2017, agora restando um ano para o encerramento deste novo prazo, as condições da realidade
atual não difere muito da data inicialmente determinada.
79
ou aterros; catadores/as que percorrem as ruas das cidades com carroças puxadas
por tração animal (carroceiros) e por aqueles que puxam seus próprios carrinhos.
Cooperativas de catadores/as, centros de triagem, depósitos ou
sucatas, indústrias recicladoras, áreas de transbordo, aterros sanitários, lixões e
incineradores configuram-se uma organização espacial criada especificamente para
atender a demanda dos resíduos. De acordo com Corrêa (1986), a organização
espacial é uma expressão material humana, resultante do trabalho social e como tal
refletirá as características do grupo que a criou, assim como a natureza classista da
produção e do consumo de bens materiais. Com efeito, não se pode deixar de
reconhecer que o descarte de resíduos integra a dinâmica da formação espacial,
considerando que nos mais diversos processos de produção capitalista sempre
algum tipo de resíduo será gerado e o mesmo terá que ser disposto, mais cedo ou
mais tarde, na superfície terrestre.
As indústrias em geral, o comércio, as residências, as escolas, os
hospitais e demais equipamentos urbanos, assim como as pessoas que vivem e/ou
transitam por esses locais, estão todas imbricadas na teia do espaço capitalista, seja
através do trabalho, do consumo e da geração de resíduos. “Aparecem então
padrões locacionais relativos às operações econômicas e ao sistema de controle e
decisão.” (CORRÊA,1986, p. 56).
Cabe lembrar que os lixões são em geral, distantes das áreas residenciais
denominadas “nobres”, pois ocasionam problemas de contaminação por
doenças, por causa do mau cheiro, dos gases, etc. Mas na segregação
socioespacial urbana considera-se que os moradores pobres podem
conviver com estes problemas (afinal é uma sociedade descartável). Ou
seja, as áreas menos nobres, as que têm menor preço de mercado, podem
ser objeto de depósito de lixo e, portanto, de problemas. São também muito
os indivíduos que vivem do “lixo”. (RODRIGUES, 1998, p.156).
Diante do exposto, algumas reflexões são levantadas, por que os
depósitos de lixo se localizam forçosamente nos bairros onde reside a população de
baixa renda? Onde e quem decide que os moradores “pobres” podem conviver com
o lixo e os problemas ocasionados por este?
É possível perceber o teor classista da organização espacial, no controle
que as classes dominantes (proprietárias dos meios de produção) exercem sobre as
80
classes menos favorecidas, desenvolvendo padrões de segregação espacialmente
cristalizados. Expondo os habitantes das periferias urbanas aos efeitos nocivos dos
impactos ambientais oriundos dos resíduos descartados, enquanto resguardam os já
privilegiados moradores dos bairros “nobres” dessa dura convivência, mesmo sendo
estes últimos os que mais consomem e, por conseguinte que geram resíduos.
Penna (1999) é categórico ao afirmar que apesar do significativo
crescimento da reciclagem dos resíduos sólidos ocorrida nas duas últimas décadas
do século XX nos países desenvolvidos, um dos maiores desafios que os centros
urbanos tiveram e ainda tem que enfrentarem é onde depositar, de forma adequada,
os resíduos gerados pela sociedade de consumo e do desperdício. A avidez em
obter um número cada vez maior de produtos diversos (carro, celular, aparelho de
som, etc), produz resultados tão espantosos que parecem ficção para a grande
maioria das pessoas.
4.5 RESÍDUOS SÓLIDOS NA MODERNIDADE LÍQUIDA
Nunca em nenhum outro período histórico se produziu tantos resíduos
quanto na contemporaneidade, longe de ser uma eventualidade, trata-se de um
efeito colateral dos valores que regem a modernidade. Segundo Baudrillard (1995),
“encontramo-nos em pleno foco de consumo enquanto organização total da vida
quotidiana.” (p.20). Ou seja, as relações sociais estabelecidas no trabalho, na
família, no lazer e no mundo estão pautadas na aquisição de objetos, produzidos
massivamente, deixando como rastro, uma natureza dilapidada. As relações
passaram a ser mediadas por mercadorias, assim, os objetos tornam-se a “ponte” de
ligação entre eu e o outro, entre eu e o mundo, desprovidos de sentido e de
sentimentos, eles coisificam as relações, tornando-as superficiais e fugidias. Na
concepção de Penna (1999):
A profunda necessidade humana de valorizar-se e ser respeitado pelos
seus semelhantes manifesta-se, de forma crescente, através do consumo. A
simples compra de bens seria uma prova de autoestima e um meio de
aceitação social. Esse aspecto psicossocial [...] estimula as pessoas a
comprarem sempre mais. Como alguém já observou, comentando sobre a
cultura do consumo, as pessoas gastam um dinheiro que não possuem,
81
para comprar coisas de que não necessitam, para impressionar pessoas
que não conhecem. (p.52).
A lógica do consumo mascara as relações sociais, e simultaneamente dá
ênfase a artificialidade, o efêmero, a fluidez, a volatilidade, a liquidez, que
caracterizam a contemporaneidade, em detrimento das certezas, dos princípios
morais, dos dogmas e da lógica linear da modernidade de outrora, denominada por
Bauman como modernidade sólida. Distinguindo sólido e líquido, o autor profere:
Enquanto os sólidos têm dimensões espaciais claras, mas neutralizam o
impacto e, portanto, diminuem a significação do tempo (resistem
efetivamente ao seu fluxo ou o tornam irrelevante), os fluidos não se atem
muito a qualquer forma e estão constantemente prontos (e propensos) a
mudá-la; assim para ele o que conta é o tempo, mais do que o espaço que
lhes toca a ocupar, espaço que, afinal, preenchem ‘por apenas um
momento’. Em certo sentido, os sólidos suprimem o tempo; para os líquidos,
ao contrário, o tempo é que importa. (2001, p.08).
Diante do exposto, pode-se afirmar que, na atualidade, vive-se um
período de mutação, onde o que antes era sólido, hoje “escorre” entre os dedos da
mão do tempo. Ou seja, o estado de solidez que constituía as certezas do período
moderno dissolveu-se no espaço, e surge polimorfamente nas e das incertezas da
Modernidade Líquida,12 conhecida mais amplamente como Pós-modernismo.
Entretanto, cabe mencionar que, mudou-se a forma mas não o conteúdo, pois não
houve um rompimento com o sistema econômico capitalista, uma vez que o intuito
do,
[...] efeito líquido é moldar a trajetória e a forma do desenvolvimento
capitalista de modos cuja compreensão vai além da análise das transações
de mercado. Além disso, as propensões sociais e psicológicas, como o
individualismo e o impulso de realização pessoal por meio da
autoexpressão, a busca de segurança e identidade coletiva, a necessidade
de adquirir respeito próprio, posição ou alguma outra marca de identidade
individual, têm um papel na plasmação de modos de consumo e estilos de
vida. (HARVEY, 2004, p.118).
12BAUMAN, Zygmunt. Modernidade Líquida. São Paulo: Zahar, 2001.
82
Na opinião de Baudrillard (1995),
Quando se fala de Produção e Consumo – trata-se de um só e idêntico
processo lógico de reprodução amplificada das forças produtivas e do
respectivo controlo. Tal imperativo, que pertence ao sistema, passa para a
mentalidade, para a ética e ideologia quotidiana – eis a grande astúcia – na
forma inversa: sob a capa de libertação das necessidades, do
desabrochamento do indivíduo, de prazer e abundância, etc. (p. 82).
Deste modo, observa-se, no cotidiano, cada vez mais uma legitimação
ideológica do consumo, através da utilização exacerbada de eletros eletrônicos, TV,
computadores, aparelhos celulares, notebooks, tablets, videogames, micro-ondas,
filmadoras e demais produtos da microinformática que são praticamente
descartáveis devido à obsolescência programada e perceptiva. Em geral esses
produtos são compostos por cabos, placas de circuito, equipamentos de
visualização (telas de tubos catódicos, telas de cristais líquidos) disjuntores, pilhas,
baterias e etc. Trazem em sua constituição metais pesados como mercúrio, chumbo,
cádmio, cromo, amianto, arsênio, substâncias halogenadas, gases de efeito estufa,
dentre outros componentes tóxicos prejudiciais à segurança e saúde dos
ecossistemas terrestres. Essa realidade remete a seguinte reflexão, qual o destino
desses resíduos? Pela lógica seriam os locais onde foram gerados, entretanto, a
resposta é bem mais complexa do que lógica.
Grande parte do lixo eletrônico (e-lixo, como é conhecido), símbolo da
sociedade pós-moderna e do consumo inconsequente da população dos países do
norte são descartados, nos países do sul, outorgando-lhes por assim dizer, mais
uma função espacial, a de “lixeira” mundial. China e Índia são os maiores receptores
dos resíduos eletrônicos do continente asiático, enquanto Gana abriga o maior
“lixão” de eletrônicos europeu (Ver Figura 10). A superprodução desse tipo de
resíduos está diretamente ligada ao lançamento de novos produtos eletrônicos no
mercado global.
83
Figura 10 – Lixão de Eletrônicos em Gana – África
Fonte: <http://www.recicladoraurbana.com.br/images/imagens/ghana-lixo-capa.jpg>. (Acesso
em 23/02/2017)
As “montanhas” de carcaças eletrônicas erguidas sob o “altruísmo”
europeu da inclusão digital da população pobre de Gana (esmagadoramente negra)
no mundo digital, viraram uma “cartão postal”, às avessas, do bairro periférico de
Agbogbloshie, juntamente com suas casas, “estilo” ficção científica, construídas com
restos de madeira, plástico e metais oriundos dos eletroeletrônicos descartados pelo
mundo rico em solo africano, apesar de veementemente condenado pela Convenção
da Basileia de 198913. (LOPES, 2015)
Sobre o fenômeno da destinação de resíduos localizarem-se em bairros
pobres, Waldman (2010) revela que esses detritos representam fator de perecimento
das condições de vida das minorias excluídas, imensamente desprotegidas e
negligenciadas quanto às mazelas da coabitação com os resíduos. Reforçando
políticas de “punição da pobreza”, deslocando as áreas e os equipamentos de
deposição como lixões, preferencialmente para locais habitados pelas pessoas de
baixa renda.
O Brasil aderiu à Convenção da Basiléia em 1993, através do Decreto
875 que regulamenta o trânsito desses materiais com base no consentimento prévio
para a importação de resíduos perigosos e coibi o tráfico ilícito desses refugos.
13 Convenção de Basiléia tratado Controle de Movimentos Transfronteiriços de Resíduos Perigosos e seu
Depósito.Foi concluída em Basiléia, Suíça, em 22 de março de 1989.
84
Entretanto, a promulgação do decreto constitui-se apenas o primeiro passo nas
negociações transfronteiriças da movimentação de resíduos, é necessário ainda que
o governo introduza normas em sua legislação interna que sejam observadas em
todo o território nacional. (ZIGLIO, 2005)
Enfim, após o exposto, referente às peculiaridades geográficas e
temporais, pode-se dizer que a espacialidade dos resíduos na superfície terrestre é
um fenômeno inegável, constituído de robusta materialidade. A compreensão e
soluções dos problemas que os mesmos acarretam, requer uma visão
multidimensional, que perpassa pelo conhecimento multi-interdisciplinar dos
aspectos físicos, sociais, ambientais, políticos, culturais e até mesmo psicológicos. O
fluxo de navios que cruzam os oceanos transportando resíduos perigosos, na
maioria das vezes, dos países ricos aos países pobres, retrata a dinâmica de
“globalização” dos resíduos, além de ser um indicador da permanência da
subjugação do colonialismo mercantil através de suas naus.
85
5 UNIVERSO DA PESQUISA: PANORAMA HISTÓRICO SOCIOAMBIENTAL
Maracanaú traz em sua etimologia a herança do passado
indígena,maraka´nã (maracanã) e´y(rio) “lagoa onde bebe as maracanãs”, haja visto
que originalmente era habitado pelas etnias Pitaguary, Jaçanaú, Mucunã e Cágado
(IBGE, 2010). Em meados doséculo XVII passa a categoria de aldeamento,
configurada no povoamento lagoa de Maracanaú. Conforme pesquisa histórica
realizada por Farias (2009), os aldeamentos (missões jesuítas) eram espécies de
aldeias artificiais onde era imposta uma organização socioespacial, de origem
europeia era imposta, vinculada ao capitalismo nascente, bastante diferentes das
aldeias originais dos nativos.
As mudanças ocorridas na organização espacial e política tem
continuidade, e no final do século XIX, especificamente no ano de 1882, o povoado
supracitado torna-se Vila do Santo Antônio do Pitaguary. Em 1906, início do século
XX, é criado o distrito de Maracanaú, subordinado ao município de Maranguape.
Ainda neste mesmo século, Maracanaú emancipa-se de Maranguape através da lei
estadual nº 10811, de 04 de julho de 1983. (IBGE, 2010).
Atualmente, integra a Região Metropolitana de Fortaleza (RMF),
localizado a 22 km de distância da capital cearense, situado mais precisamente a 3º
52' 36" latitude Sul e 38º 37' 32" longitude Oeste. Limita-se com os seguintes
municípios: Fortaleza e Caucaia ao norte, Maranguape e Pacatuba ao sul, Fortaleza
e Pacatuba ao leste, Maranguape e Caucaia a oeste. (Ver Figura 11).
Com uma área de 105,70 km², essencialmente urbana, com um dos
maiores índices do estado 99,31%, Maracanaú é uma cidade de 209.057 mil
habitantes, caracterizada por uma substancial densidade demográfica, 1.877,75
hab/km², espacialmente distribuídas em 02 distritos: Maracanaú (sede) e Pajuçara.
(IPECE, 2013).
Em face do exposto cabe ressaltar que a densa concentração
demográfica de Maracanaú é decorrente da instalação de distritos industriais, e dos
megaconjuntos habitacionais implantados em seu território na década de 1970
(MOURÃO; CAVALCANTE, 2006). Entre as décadas de 1970 e 1980, foram
construídos na cercania do primeiro distrito industrial de Fortaleza - DIF I (sediado
em Maracanaú), seis conjuntos habitacionais custeados pela Companhia de
Habitação - COHAB e pelo Banco Nacional de Habitação (BNH).Os conjuntos
86
COHABs terminaram sendo resultado da política de “barramento” da migração rural,
marcada principalmente por retirantes da seca que saiam do interior para a capital
em busca de melhores condições de vida. Os do BNH tiveram como fonte de
financiamento o Fundo de Garantia por Tempo de Serviços (FGTS), ou seja, o fundo
de poupança dos trabalhadores. (GOMES, 2015).
88
Seguindo um modelo indicado pelas políticas públicas voltadas para a
criação de parques industriais, esta intervenção espacial agravou os problemas
socioambientais decorrentes da falta de um planejamento urbano, como por
exemplo, mobilidade urbana deficiente, especulação imobiliária, concentração de
renda, pressão sobre os recursos naturais, dentre outros. Desta forma, em virtude
dos fatos mencionados, observa-se que uma política industrial possui grande
capacidade de afetar a qualidade de vida dos habitantes de um lugar, tanto de
maneira positiva, quanto de maneira negativa, seja através de transformações
sociais ou espaciais. Torna-se, assim, evidente que Maracanaú é hoje um lugar
“completamente diverso do que fora na aurora dos tempos históricos” (SANTOS,
1988, p.44).
5.1 UMA OUTRA REVOLUÇÃO INDUSTRIAL
O processo de industrialização do Ceará é recente, remonta aos
investimentos efetuados pela Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste –
SUDENE, nas décadas de 1960 e 1970. Como apontado por estudos históricos
realizados por Farias (2009), foi no governo de Virgílio Távora (1963 a 1966) que
pela primeira vez no Ceará foi organizado um plano de ação governamental
baseado nos planos de metas desenvolvimentistas nacionais do governo
Kubistcheck e no Plano Trienal de João Goulart.
Nesse contexto foi criado primeiro Plano de Metas Governamentais
(PLAMEG I) do Ceará, constituído por uma série de medidas econômicas e
administrativas a serem aplicadas pelo governo, visando, prioritariamente,a
industrialização cearense e a ascendência no cenário industrial nacional.
Para tal empreitada, foram realizadas diversas obras de infraestrutura
(redes de energia, transporte e comunicação), financiadas com recursos de
instituições internacionais como o Banco Internacional de Desenvolvimento (BID) e a
Aliança Para o Progresso (programa governamental norte americano contrário às
esquerdas latinas), e de órgãos federais como a SUDENE e o Banco do Nordeste do
Brasil - BNB. Datam deste governo, a criação da Companhia Docas do Ceará; a
Fábrica de Asfalto do Mucuripe; uma linha de transmissão de energia da usina de
Paulo Afonso e a criação do I Distrito Industrial em Maracanaú - DI (FARIAS, 2009).
A inauguração do DI de Maracanaú ocorrida em março de 1966 contou com a
89
presença de seu cearense mais ilustre, o então presidente da república, Humberto
Castelo Branco.
Conforme pesquisa geográfica realizada por Carvalho (2009), a criação
do I Distrito Industrial de Maracanaú, beneficiado por incentivos fiscais, surge
visando cumprir um plano político com um aporte estrutural capaz de sustentar um
grande contingente industrial. Entretanto, inicialmente, não atraiu o quantitativo de
indústrias esperado, pelo fato de apresentar, naquele momento, uma gama de
deficiências estruturais não condizentes com os padrões exigidos pelas indústrias de
grande porte, para sua implantação, apesar dos benefícios fiscais oferecidos.
A otimização do polo industrial só veio ocorrer duas décadas após sua
criação, mas nem por isso pode ser considerada menos avassaladora. Como
apontado por Mourão e Cavalcante (2006), no curto intervalo que vai de 1970 a
1990, Maracanaú passou de uma cidadezinha com características rurais para uma
cidade eminentemente industrial.
Por conseguinte, é possível considerar que a complexidade característica
do processo produtivo industrial foi incorporada ao espaço maracanauense até
então existente. Entretanto, vale advertir, apresentando argumento de Santos
(1988), que uma variável externa só é capaz de se integrar a um local, se este
possuir internamente as condições para poder aceitá-la, ou seja, a internalização do
externo não se dá à revelia, mas a partir da combinação entre variáveis externas e
internas que darão origem a outro arranjo espacial.
A política de incentivos governamentais proporcionou a Maracanaú as
condições internas necessárias à implantação de um polo industrial em seu território.
Em sua página da internet14 a prefeitura expõe uma série de incentivos direcionados
às indústrias que desejam ali instalar-se, como por exemplo: redução de impostos
municipais (ISS e IPTU), doação de terrenos e subvenção de locação de galpões,
além de mencionar a parceria com o Governo do Estado para disponibilização de
infraestrutura adequada até o limite do terreno do empreendimento.
Atualmente, o município de Maracanaú possui três distritos industriais15
(DIF I, DIF III e DI 2000) os quais concentram 100 indústrias16 atuando em diversas
14www.maracanaú.ce.gov.br .(Acesso em fevereiro de 2016) 15 A prefeitura de Maracanaú consideratambém a existência de mais dois DIs, o distrito industrial do Alto Alegre
II com 02 indústrias instaladas e o distrito industrial de Piratininga sem indústrias instaladas, até o momento.
Devido a incipiente quantidade de indústrias instaladas, não irão compor o universo da pesquisa.
90
atividades produtivas, como têxtil, beneficiamento de couro, metalurgia e mecânica,
papel e papelão, alimento, elétrico, químico e de tintas.
Figura 12 – Gráfico Distribuição das Indústrias por Distrito Industrial em
Maracanaú
Fonte: Elaboração da autora a partir de dados da PMM – 2013
O DIF I possui 73 indústrias instaladas numa área de 1.013 hectares, a
maior área industrial do estado do Ceará. Entre os três distritos é o que apresenta
melhor infraestrutura, sistema de abastecimento de água e energia (elétrica e de gás
natural), transporte público rodoviário e metrô, rede de esgoto, contendo uma das
maiores estações de tratamento de efluentes (ETE) da América do Sul, com 70 ha
de área, além de uma moderna rede de comunicação.
As indústrias intaladas nos outros dois distritos somam um total de 27,
sendo 19 delas pertencentes ao DIF III e 8 ao DI 2000, distribuídas respectivamente
numa área de 164ha e 40,5ha. O DIF III, apesar de ter sido criado há quase duas
décadas(1998) e ser o segundo em número de indústrias, apresenta ainda uma
infraestrutura elementar, composta por sistema de tratamento de água e esgoto,
comlagoa de estabilização, energia elétrica e uma malha de transporte público
precária, ou seja, condições pouco atrativas para potenciais investidores. De acordo
com Carvalho (2009), além dos problemas de infraestrutura, esse Distrito é palco de
conflitosreferentes ao uso e ocupação do solo, resultantes de questões jurídicas que
16O conceito de indústria refere-se à atividade de produção de mercadorias, desconsiderando assim os
estabelecimentos que se restringe à comercialização dos produtos manufaturados.
73%
19%8%
DIF I DIF III DI 2000
INDÚSTRIAS POR DISTRITO
INDUSTRIAL(%)
91
envolvemo não pagamento dos terrenos, aos antigos donos, pelos
empreendimentos privados. Com a inadimplência, as indústrias, não possuem o
direto de propriedade dos terrenos, acarretando o desinteresse de novos
investidores.Possuidor da mesma infraestrutura, o DI 2000, caracteriza-se por
possuir uma área industrial pouco significativa, formada principalmente por
empresas do setor têxtil e da construção civil.
Estes dados revelam as disparidades socioespaciais e econômicas
existentes entre os distritos industriais mais recentes (DIF III e DI 2000)17 e o mais
antigo (D I). Convém destacar que os problemas de uso e ocupação do solo e
infraestuturais, principalmente no que se refere ao sistema público de transporte,
terminam por obstacularizar a implantação de mais equipamentoa fabris nos distritos
industriais menores.
Entretanto, o fato de seus distritos não operarema todo vapor, não impede
que Maracanaú seja considerado o maior centro industrial do Ceará, sendo seu
Produto Interno Bruto (PIB) balizado, fundamentalmente, no setor industrial com um
percentual de 52,20%, quase o dobro de todo o Estado 23,70% (Ver Tabela 4). O
setor de serviço também é um grande gerador de divisas (47,71%) e a agropecuária,
atividade característica do setor primário, tradicionalmente rural, representa menos
de 1% do PIB.
Tabela 4 – Produto Interno Bruto por Setor Econômico – 2010
DISCRIMINAÇÃO
MUNICÍPIO
ESTA
DO
PIB a preços de mercado
(R$ mil)
4.100.336
77.86
5.415
PIB per capita (R$ 1,00) 19.549 9.217
PIB por setor (%)
Agropecuária 0,09 4,20
Indústria 52,20 23,70
Serviço 47,71 72,10
Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) / Instituto de Pesquisa e Estratégia
Econômica do Ceará (IPECE).
17DI F III foi criado no ano de 1998 e o DI 2000 foi criado em 1993.
92
Ainda com relação ao PIB, Maracanaú detém a maior participação
(5,45%) no Produto Interno Bruto estadual ficando atrás apenas da capital, Fortaleza
(Ver Tabela 5). Cumpre observar que esta colocação de destaque no ranking da
economia cearense é decorrente das atividades industriais desenvolvidas no
município.
Tabela 5 – Os cinco maiores municípios quanto à participação do produto
interno bruto (PIB) do Ceará – 2011
MUNICÍPIO PIB 2011
(R$ Mil)
(%)
Fortaleza
42.010.111
47,75
Maracanaú 4.797.82
4
5,45
Caucaia 3.239.40
3
3,68
Sobral 2.436.46
3
2,77
Juazeiro do Norte 2.249.64
5
2,56
Fonte: Elaborada pela autora a partir de dados do IPECE e IBGE.
5.2 ASPECTOS FÍSICOS
Maracanaú está edificada sobre unidade geomorfológica de Tabuleiro
Pré-litorâneo constituído por sedimentos areno-argilosos do Grupo Barreiras
assentado diretamente sobre o embasamento cristalino, datado do Terciário-
Quaternário. Apresenta topografia modesta (48m de altitude), devido ao fraco poder
de entalhamento da drenagem.
Quanto ao aspecto pedológico é constituída de planossolonátricos e
argissolo vermelho-amarelo, o primeiro caracteriza-se por apresentar elevados
teores de sódio nos horizontes superficiais, restrições ao uso de atividades
93
agrícolas, seja pela deficiência de água no período seco e excesso de água no
período chuvoso, além da grande suscetibilidade à erosão. O segundo, são solos
fortemente ácidos e de baixa fertilidade natural, contém argila de atividade baixa,
quartzo e outros materiais resistentes ao intemperismo. (IPECE, 2013)
No tocante à questão climática, devido sua proximidade a linha do
Equador, a área em estudo, apresenta intensa insolação durante a maior parte do
ano, caracterizando-a como uma área típica de climas tropicais, quente,subúmido,
com temperatura média variando entre 26º a 28º C. (Ibidem)
Com pluviosidade anual de 1.399,9 mm existe em Maracanaú uma
irregularidade pluviométrica acentuada. A maior parte das precipitações ocorre nos
meses de janeiro, fevereiro, março e abril (quadra chuvosa), os demais meses do
ano apresentam baixos índices pluviométricos, cuja consequência local é uma
significativa redução do volume de água nas lagoas e rios.
A vegetação embora bastante descaracterizada, em grande medida pela
instalação dos distritos industriais e construção dos conjuntos habitacionais como o
Conjunto Jereissati, um dos maiores da América Latina, comporta uma variada
cobertura vegetal, com espécies da zona litorânea, floresta subcaducifólia tropical
pluvial, floresta subperenifóliaplúvio-nebular e caatinga arbustiva densa. (IPECE,
2013)
Quanto à hidrografia, o município é cortado por dois dos principais rios da
RMF, rio Maranguapinho e rio Cocó, além do rio Maranguape. Os riachos: Santo
Antônio, Timbó, Taboqueira e Urucutuba; e as lagoas: Maracanaú, Jaçanaú, Jupaba
e do Mingau, terminam de compor a rede hidrográfica de Maracanaú, pertencente à
bacia metropolitana do estado do Ceará. A exclusão social de parte da população
tem acentuado o uso e a ocupação desordenada do solo, criado áreas de risco nas
margens dos rios e das lagoas da cidade.
5.3 INFRAESTRUTURA
É inegável a importante contribuição que teve a implantação do DIF I
para a melhoria da infraestrutura de Maracanaú, que era antes desse advento,
praticamente inexistente. Segundo dados da Companhia de Água e Esgoto do
Ceará – CAGECE, em 2011, a taxa de cobertura urbana foi de 77,52%, ou seja, a
maioria da população e acesso à água tratada. No que se refere ao esgotamento
94
sanitário observa-se, na tabela 6, que a cobertura da rede de esgoto segue o baixo
padrão estadual de atendimento deste serviço sanitário, apenas 32,13% de todo o
esgoto produzido no município é coletado.
Tabela 6 – Esgotamento Sanitário 2012
DISCRIMINAÇÃO Esgotamento Sanitário
M
unicípio
E
stado
%
sobre o total do
Estado
Ligações reais 1.991 493.930
0,40
Ligações ativas 1.897 468.501
0,40
Taxa de cobertura urbana de esgoto (%) (1)32,13 34,62
-
Fonte: Companhia de Água e Esgoto do Ceará (CAGECE).Dados referentes a 2011.
Tabela 7–Domicílios particulares segundo tipos de esgotamentos– 2000/2010
Tipos de
Esgotamentos
Sanitário
s
Município
2
000
% 2
010
%
Total(1) 42.263 100 57.890
100,00
Rede geral ou pluvial 19.385 45,87 29.527
51,01
Fossa séptica 2.728 6,45 10.694
18,4
Outra 17.656 41,78 17.295
(Continua)
95
29,88
Não tinham banheiros 2.494 5,90 374
0,65
Fonte: Elaborada pela autora a partir de dados do IPECE. Incluídosos domicílios sem
declaração da existência de banheiro ou sanitário.
Diante das informações trazidas nas tabelas 6 e 7, pode-se presumir que
a ineficácia da rede coletora de esgotos, pode acarretar ligações clandestinas
vinculadas à rede pluvial e o lançamento de efluentes, sem tratamento, nos rios e
lagoas, além do despejo de resíduo a céu aberto.
Quanto aos resíduos sólidos, cerca de96% dos domicílios de Maracanaú
são atendidos pelo serviço de coleta de lixo (CENSO, 2010), e tem sua disposição
final no Aterro Metropolitano Sul. De acordo com a Coordenação de Limpeza
Pública, a coleta é realizada em duas a três vezes por semana, dependendo do
bairro, com exceção do Centro da cidade, onde é realizada diariamente.
A legislação brasileira estabelece que seja de responsabilidade da
prefeitura a gestão do lixo doméstico, cabendo-lhe a missão de garantir sua coleta e
disposição final. Por outro lado, no que concernem os resíduos industriais, objeto
deste estudo, o transporte e disposição final é de responsabilidade do gerador, o
qual fica sujeito aos regulamentos e à fiscalização do poder público.
Vale advertir que, não existe em Maracanaú, apesar de seu significativo
polo industrial, um aterro para resíduos Classe I, nem tampouco incinerador18 ou
empresa de coprocessamento19, locais ambientalmente adequados para disposição
final deste tipo de resíduo. Então, grande parte do resíduo industrial gerado é
remetida para fora do município, e os resíduos que não são coprocessados ou
incinerados dentro do estado, vão para outros estados do nordeste, como
Pernambuco e Bahia, haja vista também a inexistência de aterro Classe I no Ceará
(Ver Figura 13).
18 Incinerador – equipamento projetado para o tratamento térmico de resíduos sólidos com temperaturas acima de
800° C. (IPT, 2000) 19Coprocessamento -tecnologia de destruição térmica de resíduos e passivos ambientaisem fornos de cimento.
(Conclusão)
96
Figura 13 – Localização dos Aterros para Resíduos Classe I
Observa-se na figura 13, através da espacialização geográfica das
unidades receptoras de resíduos industriais no Brasil, que a quantidade de aterros
Classe I está muito aquém da necessidade nacional, concentrando-se mais nas
regiões sul e sudeste. Para as pequenas e médias empresas localizadas nas
regiões norte e centro-oeste, o custo do transporte consiste em um grande obstáculo
para o tratamento e disponibilização de seus resíduos.
Em relação ao fornecimento de energia elétrica, a tabela 8 apresenta o
consumo e consumidores de energia elétrica de Maracanaú, de forma a identificar o
atendimento deste serviço por classes: residencial, industrial, comercial, rural,
serviço público e próprio. Nota-se o intervalo gritante que há entre o setor industrial e
os demais. O primeiro consome 710.040 mwh, o que corresponde a 73,97%,
acompanhado, com uma distância considerável, pelo consumo de energia pública
(11,42%); as demais classes respondem por 14,61% do total de energia elétrica
consumida. Esta realidade confirma o protagonismo do setor industrial neste
município.
97
Tabela8 – Consumo e consumidores de energia elétrica – 2012
Classes de Consumo Consumo
(mWh)
Cons
umidores
Total 959.839 69.65
4
Residencial 83.163 65.27
6
Industrial 710.040 219
Comercial 54.536 3.125
Rural 2.079 187
Público 109.537 840
Próprio 485 7
Fonte: Companhia Energética do Ceará (COELCE).
5.4 SAÚDE
Segundo a Secretaria de Saúde do Estado do Ceará (SESA -2012), em
Maracanaú, o número de unidades de saúde/1000 hab. é 0,27, sendo que 82,46%
das unidades de saúde ligadas ao Sistema Único de Saúde (SUS) são da rede
pública, enquanto 17,54% são da rede privada, o que demonstra uma sobrecarga
nos atendimentos em hospitais e postos de saúde públicos. O número de leitos
confirma a precariedade deste serviço, 1,21 leitos para cada 1000 habitantes.
Tabela 9 - Os cinco principais casos confirmados das doenças de notificação
compulsória em Maracanaú – 2012
98
Discriminação Casos Confirmados das
Doenças
de Notificação
Compulsória
Dengue 2.282
Tuberculose 84
Hanseníase 72
AIDS 53
Leishmaniose Visceral 15
Fonte: Elaborada pela autora a partir de dados da SESA.
Analisando os dados da tabela 9 como um todo, observa-se que há uma
diferença exorbitante entre a 1º colocação(dengue) e as demais. Deste modo, é
pertinente lembrar que a melhor forma de evitá-la é combatendo os focos de
acúmulo de água, em latas, pneus velhos, vasinhos de plantas e lixeiras, entre
outros. Ou seja, sua prevenção está intrinsecamente associada aos aspectos de
saneamento básico (tratamento de água, esgoto, drenagem e coleta de lixo).
Inicialmente a Leishmaniose Viral (5ª colocada), conhecida popularmente
como calazar, barriga d’água, entre outras denominações, era caracterizada como
uma doença eminentemente rural; entretanto as transformações ocorridas no
ambiente, desmatamento, urbanização, processo migratório, esvaziamento rural,
acarretaram uma redução do espaço ecológico da doença, facilitando a ocorrência
de epidemias, principalmente nas periferias dos grandes centros urbanos.
A proliferação de todas as doenças acima listadas, com exceção da AIDS,
Síndrome da Imunodeficiência Adquirida, está fortemente associada aos altos
indicadores de pobreza e precárias condições de higiene. O conjunto de doenças e
agravos mencionados reflete as condições de saúde da população, isso permite
concluir que tanto a atenção curativa (hospitalar) quanto a preventiva (saneamento
básico) estão muito aquém das necessidades dos munícipes.
5.5 EDUCAÇÃO
99
A gestão do sistema de educação de Maracanaú é realizada através de
diversos órgãos públicos, Secretaria de Educação (órgão executivo); Conselho
Municipal de Educação – CME (órgão normativo), Conselhos do FUNDEB e
Alimentação Escolar (órgãos de controle social), Núcleo de Tecnologia Educacional
de Maracanaú – NUTEM (oferece formação continuada em informática educativa) e
o Departamento de Treinamento – DETRE (destinado ao desenvolvimento dos
profissionais do magistério). (CAMURÇA, 2013)
No tocante as unidades de ensino, há um total de 108 da rede pública,
sendo 90 escolas municipais, 17 estaduais e 1 Instituto Federal de Educação,
Ciência e Tecnologia do Ceará (IFCE).Quanto à rede particular há 70 unidades,
contemplando os três níveis de ensino (fundamental, médio e superior). Porém,
para autora supracitada, no que concerne à educação básica municipal,
[...] não existem, ainda, escolas suficientes para um pleno atendimento,
com qualidade, à demanda por atendimento educacional no município.
Embora universalizado, 57 ocorre, em grande parte, em prédios locados
e/ou cedidos que, em muitos casos, não foram projetados para esse fim. É
importante salientar ainda que, em geral, os prédios alugados não dispõem
de uma estrutura adequada ao atendimento escolar. Muitos deles
encontram-se bastante distanciados, em termos estruturais, do atendimento
aos padrões básicos de funcionamento do ensino. Podemos afirmar que
cerca de 43% dos alunos do total da rede municipal são subatendidos em
prédios com condições precárias, que não oferecem condições físicas e
ambientais estimulantes à educação de crianças. Os sujeitos do processo
educacional em Maracanaú reclamam das condições objetivas de trabalho a
que estão submetidos, tanto os trabalhadores quanto os estudantes.
(CAMURÇA, 2013, p. 56-57)
A diferença que há entreas informações referentes à realidade
representada por dados quantitativos e qualitativos é nítida. Pois é comum que
dados numéricos “camuflem” muitas das necessidades da população residente,
principalmente a de baixa renda. Quando não, visam apenas alcançar metas
destinadas à obtenção de subsídios de bancos internacionais.
Tabela 10 – Indicadores educacionais de Maracanaú no ensino
fundamental e médio
100
Discriminaçã
o
Ensino
Fundamental (%)
Ensino Médio
(%)
Escolarização Líquida 100,00
54,01
Aprovação 92,03
73,97
Reprovação 6,16
10,18
Abandono 1,81
15,86
Alunos por Sala de Aula 31,41
52,20
Fonte: Elaborada pela autora a partir de dados da Secretaria de Educação Básica (SEDUC 2012).
A partir dos indicadores educacionais (Ver Tabela 10), é possível verificar
a discrepância entre as taxas de escolarização líquida20do ensino fundamental e do
médio. Na primeira modalidade de ensino, a taxa é de 100%, entretanto cai quase
pela metade no ensino médio 54,01%, o que demostra um percentual de evasão de
46% do ensino fundamental para o ensino médio. Muitas vezes, esses jovens não
dão continuidade a seus estudos, por se verem pressionados a contribuírem na
renda familiar e não conseguirem conciliar a jornada de trabalho com a escola. A
taxa de aprovação do ensino médio é inferior ao do ensino fundamental, enquanto
que as demais, reprovação, abandono e aluno por sala de aula são todas superiores
ao do ensino fundamental. Isso dá uma dimensão das adversidades
socioeconômicas existentes, que impedem os jovens em idade escolar de
participarem plenamente do processo educacional ou nele permanecerem.
Convém mencionar, queos aspectos físicos e os indicadores
socioeconômicos (PIB, infraestrutura, educação), apresentados neste capítulo
20 Taxa de escolarização líquida é a percentagem de estudantes de um determinado grupo etário em relação ao
total de pessoas do mesmo grupo etário. Trata-se de um indicador que tem como objetivo verificar o acesso ao
sistema educacional daqueles que se encontram na idade recomendada para cada um dos três níveis
(fundamental, médio e superior). Indica a porcentagem da população que está matriculada no nível adequado à
sua faixa etária. (IBGE)
continuação
101
permeiam a discussão referente às situações de vulnerabilidade e riscos
socioambientais, que se encontram a população circunvizinha do Distrito Industrial
I.A correlação desses indicadores com as condições de vulnerabilidade e risco foi
examinada com mais ênfase e aporte teórico no capítulo 6.
102
6 RESULTADOSE DISCUSSÕES
6.1 ÍNDICE DE VULNERABILIDADE AMBIENTAL (IVA)
Ao observar o mapa de vulnerabilidade ambiental (Ver Figura 14) é lícito
identificar um mosaico espacial composto de 5(cinco) níveis de vulnerabilidade:
muito alta, alta, moderada, baixa e muito baixa, distribuído assimetricamente nos
setores censitários pesquisados. A miscelânea de padrões representados por cores
traduz uma condição de vulnerabilidade própria, uma espécie de “digital do risco”,
construída a partir da sobreposição binária das variáveis, cobertura vegetal e
proximidade dos recursos hídricos.
As áreas de vulnerabilidade muito alta correspondem aos locais que
margeiam os corpos hídricos, fato revelado através de imagem de satélite Rapideye
e confirmado na pesquisa de campo. As áreas de alta vulnerabilidade encontram-se
principalmente no interior do Distrito Industrial I, mais especificamente no entorno
das lagoas do Acaracuzinho, da Pajuçara,do riacho Maracanaú e do afluente do rio
Timbó.
Segundo a Agência Nacional de Águas – ANA (2013), o setor industrial
brasileiro ocupa o terceiro lugar, em termos de vazão e retirada de água e, o quarto
em consumo. As indústrias de celulose (fabricação de papel e seus derivados) e de
metalurgia básica apresentam maior vazão hídrica, ou seja, tem grande rapidez no
volume de escoamento d’água, respondendo respectivamente por 24% e 19% do
uso desse recurso. Para termos uma ideia, são necessários 21,67 a 216,0 m³ de
água para produzir uma tonelada de celulose e 26,73m³/t para produtos
metalúrgicos.Como alerta Castro, “a apropriação e uso dos recursos naturais através
de processos produtivos e a própria dinâmica dos processos da natureza e dos
processos sociais tendem a gerar riscos [...].”(CASTRO, 2005, p.27).
Dado o exposto, considera-se pertinente mencionar que, dentro do
conjuntode indústrias pesquisadas, existe uma de fabricação de celulosee outra de
metalurgia, ambas instaladas no DIF I, fato que se apresenta como uma ameaça
potencial à conservação dos recursos hídricos seja pelo uso ou por seu teor
poluidor.
Nos setores censitários localizados nas adjacências do Distrito Industrial
Ipredominam áreas de vulnerabilidade alta e moderada.O adensamento
103
urbanodecorrente dos conjuntos habitacionais ali existentes indicam uma densa
impermeabilização do solo e um baixo índice de cobertura vegetal. O excesso de
impermeabilização interfere negativamente no ciclo hidrológico, ao impossibilitar a
infiltração da água no solo sobrecarrega o sistema de drenagem pluvial,
aumentando o volume de escoamento das águas superficiais, o que pode ocasionar
o transporte de resíduos e sedimentos para as margens de corpos hídricos
dispostos em locais de baixa declividade, comprometendo a saúde da população,
que fica mais exposta a contrair doenças de veiculação hídrica, além de
potencializar a ocorrência de alagamento e enchentes. Com o solo impermeabilizado
os lençóis freáticos não são alimentados, fato que compromete o reabastecimento
da água na natureza e o abastecimento da população.
O baixo índice de cobertura vegetal também impacta adversamente o
solo, ao deixá-lo desnudo, facilita a erosão causada pelas águas da chuva,
fomentando o processo de assoreamento de rios e lagoas urbanas. Áreas combaixa
cobertura vegetal tendem a absorver mais calor, por isso apresentam temperaturas
mais altas e maior sensação de desconforto térmico. Durante apesquisa de campo
foi identificada uma substancialperda de vegetação nos setores censitários
localizados ao norte, ao sul e ao leste do DIF I, sendo estas áreas consideradas
duplamente vulneráveis, por se encontrarem mais próximas a cursos d’água
.
104
Tabela 11 - Setores Censitarios
Fonte: Elaborada pela autora a partir de dados do IBGE (2010)*Sem dados de população
Observando atabela 11 acima, contendo dados do IBGE (2010) referentes
à cobertura vegetal por setor censitário da área de estudo, é possível verificar a
similitude existente entre o levantamento das informações percebidas no“campo” e
as informações governamentais. Os setores censitários com ausência de vegetação
Setores
Censitários
População
(hab)
Área(m²)
Cobertura
Vegetal/Habitante
(m²/hab)
%
Cobertura
Vegetal
230765005000022 1 566 2 775,00 1,77 0,06
230765005000028 744
65
616,50 88,19
1,55
230765005000132 738 8 782,92 11,90 0,21
230765005000129 316 425,00 1,34 0,01
230765005000130 777 4 380,82 5,64 0,10
230765005000017 13
3 755
230,00 288 863,85
89,05
230765005000009 513
265
871,00 518,27
6,30
230765005000014 1 070 257,70 0,24 0,00
230765030000006 706 5 854,55 8,29 0,14
230765030000007 927
21
346,10 23,03
0,50
230765030000031 542 7 691,74 14,19 0,18
230765005000172 *
78
514,10 *
1,86
TOTAL *
4 216
745,43 *
100
105
correspondem,justamente, aos locais onde estão instalados os conjuntos
habitacionais. Nota-se que na maioriados setores (sete deles) o índice de cobertura
vegetal por habitante não chega a 15m².
Em termo de porcentagem, considerando a cobertura vegetal total por
setor, verifica-se uma discrepância significativa entre os mesmos, pois a soma de
oito deles não atinge 10% da área pesquisada, enquanto que,cerca de 89% do total
de vegetaçãoexistente (rasteira, arbustiva e arbórea) encontra-se no
setor230765005000017, outro fato que merece atenção, é que em dez setores
censitários este percentual encontra-se abaixo de 5%. De acordo com Oke (1973,
apud NUCCI,1999), o índice de cobertura vegetal capaz de proporcionar um balanço
térmico adequado em áreas urbanas é de 30%, sendo as áreas, com índice de
arborização inferior a 5%, consideradas semelhantes a de um deserto.Dado o
exposto, percebe-se o quão distante de uma realidade ambientalmente satisfatória,
encontra-se a área investigada e quão vulnerável às consequências resultantes
desse desmatamento está a população residente no perímetro do distrito industrial.
Como bem afirmaNucci (1999), a cobertura vegetal é um fator
determinante da qualidade ambiental e de vida, desempenha uma gama de funções
na malha urbana, entre elas, a estabilização de determinadas superfícies, obstáculo
contra o vento, minimização da poeira em suspensão e de material particulado,
equilibra o índice de umidade, protege a qualidade da água, além de minimizaros
ruídos.
No tocante a vulnerabilidade ambiental como um todo, observa-se no
mapa do IVA, que os locais de baixa e muito baixa vulnerabilidade estão restritos a
pequenas “manchas” esverdeadas, pulverizadas em partes dos setores
230765005000017,230765005000009 e 230765005000014. Nos demais setores
aparecem de forma extremamente incipientes, quando não, totalmente ausentes,
como por exemplo, no de número 230765005000014.
107
6.2 ÍNDICE DE VULNERABILIDADE SOCIAL (IVS)
Para iniciar esta análise é essencial destacar que a mesma,
aprioristicamente, fundamenta-se na percepção de risco de Veyret (2007), quando
esta o considera, antes de tudo, um objeto social, visto que “não há risco sem uma
população ou indivíduo que o perceba e que poderia sofrer seus efeitos. [...] O risco
é a tradução de uma ameaça, de um perigo para aquele que está sujeitoa ele e o
perceba como tal.” (p. 11)
O fato acima mencionado, nãodesconsidera a percepção de autores,
como Egler (1996, apud CASTRO et al, 2005)que particularizam o elemento social,
apresentando-o como um segmento dos estudos sobre risco, neste caso, risco
social. Definido como o risco resultante das carências sociais, ou seja, da
defasagem das condições mínimas de habitabilidade; do não acesso aos serviços
básicos de saneamento, água tratada, rede de esgoto e coleta de lixo; condições de
emprego, renda, educação, dentre outros.É interessante destacar que, as variáveis
trazidas pelo autor, na definição de risco social, são semelhantes as do IPEA, base
do IVS desta pesquisa.
Dito isto, no que concerne a espacialização dos dados do IPEA referentes
ao índice de vulnerabilidade social da área de estudo, cabe novamente mencionar
que os mesmos são apresentados em recortes espaciais denominados Unidades de
Desenvolvimento Humano – UDHs, configuração criada a partir dos setores
censitários com o intuito de captar as situações de desigualdades encontradas no
interior das regiões metropolitanas, relacionadas ao desenvolvimento humano de
forma mais incisiva, atendendo os critérios e as exigências técnicas do IBGE. (IPEA,
2015)
Visando um melhor entendimento das análises feitas sobre os níveis de
vulnerabilidade das áreas pesquisadas, foi elaborado um mapa ilustrando a
correlação entre os setores censitários e as UDHs (Ver Figura 15). Pode-se observar
que o recorte espacial da área de estudo permanece o mesmo, e os 12 setores
censitários codificados numericamente, passaram a compor as cincoUDHs,
representando recortes espaciais próprios do IPEA. Deste modo temos:
Acaracuzinho/Novo Oriente (1 setor censitário); Distrito Industrial21 (3 setores
21Distrito Industrial do IPEA corresponde ao bairro Conjunto Industrial.
108
censitários correspondente ao bairro Conjunto Industrial); Novo Maracanaú (2
setores censitários); Pajuçara II (3 setores censitários); Conjunto Timbó22 (3 setores
censitários).
Infraestrutura urbana, capital humano, trabalho e renda, são as três
dimensões que compõem o IVS.A medição do índice de vulnerabilidade vai de 0 a 1
(Ver Tabela 12), quanto mais próximo de 1 maior a situação de vulnerabilidade, e a
necessidade de intervenções do poder público.Os municípios que apresentam IVS
entre 0,501 e 1 possui vulnerabilidade muito alta; entre 0,401 e 0,500 são
considerados de alta; entre 0,301 e 0,400 são de média vulnerabilidade; valores
entre 0,201 e 0,300 indicam baixa e entre 0 e 0,200 são considerados de muito
baixa vulnerabilidade.
22Conjunto Timbó do IPEA engloba o DIF I.
110
Tabela 12 - IVS infraestrutura urbana por UDHs
Fonte: Elaborado pela autora, IPEA
(2015)http://ivs.ipea.gov.br/ivs/pt/o_atlas/perguntas_frequentes/#33
*UDHs com indicadores idênticos correspondem a recortes espaciais que
foram agregados para fins de extração de dados.
Espa
cialidades
(UDH
s)
% de
pessoas em
domi
cílios com
abas
tecimento de
água
e esgotamento
sanit
ário
inadequados
2010
% de
vulneráveis
que
gastam mais de
uma hora
até o trabalho
na
população
ocupada
vulnerável.
2010
%
da
população
em
do
micílios sem
coleta de
lixo
20
10
IVS
–
Infraestrutura
Urb
ana
2010
Acar
acuzinho / Novo
Oriente
0,67 11,64 0,8
4
0,27
1*
Conj
unto Timbó 0,67 11,64
0,8
4
0,27
1*
Distri
to Industrial 0,97 15,92
1,5
9
0,37
4*
Novo
Maracanaú 0,97 15,92
1,5
9
0,37
4*
Pajuç
ara II 0,46 4,38
4,1
3
0,12
6
111
Quanto ao IVS infraestrutura urbana por UDHs (Ver Tabela 12) é
possível verificar três situações de vulnerabilidade distintas: muito baixa; baixa e
média; neste IVS não foram encontrados índices de vulnerabilidade alta e muito alta
(Ver Figura 16). Distrito Industrial e Novo Maracanaú são áreas com situação de
vulnerabilidade média, ambas com índice de 0,374.Os indicadores que mais
contribuíram para esse resultado foram o da mobilidade urbana e da coleta de lixo.
Acaracuzinho/Novo Oriente e o Conjunto Timbóapresentaram um
índice de baixa vulnerabilidade (0,271), sendo a mobilidade urbana o único indicador
com percentual acima de 1%. O referido indicador aparece também como o maior
nas demais UDHs, isso aponta para a necessidade de políticas públicas destinadas
à melhoria da acessibilidade de pessoas no espaço urbano, através de
investimentos em transportes públicos coletivos eficientes, com tempo de viagem
reduzido e sem superlotação.
Pajuçara II apresenta vulnerabilidade muito baixa, isto se deve aos
baixos percentuais dos indicadores, principalmente no que se refere ao
abastecimento de água e esgotamento sanitário inadequados (0,46%). Cabe lembrar
que a função dos indicadores é sinalizar o acesso, a ausência ou a insuficiência de
alguns serviços que proporcionam o bem estar da população e garantem seu direito
à cidadania. Porém, apesar da condição de menos vulnerável, Pajuçara II tem o
maior percentual da população em domicílios sem coleta de lixo.
Para Moser (1998, apud ALVES, 2006) a vulnerabilidade ocorre quando
estão presentes três elementos: i) exposição ao risco; ii) incapacidade de reação; iii)
dificuldade de adaptação diante da materialização do risco. Deste modo, considera-
se que para identificar o nível de vulnerabilidade de um grupo social é imprescindível
conhecer a percepção, que o mesmo tem, sobre a situação de vulnerabilidade a qual
se encontra. Partindo dessa premissa serão apresentados a seguir os dados da
pesquisa de campo.
Do total de domicílios pesquisados,100% têm acesso à rede pública de
água, cuja fonte hídrica é o conjunto de reservatórios dos Açudes Gavião, Riachão,
Pacoti, Pacajus e Canal do Trabalhador (Rio Jaguaribe). No tocante a cobertura da
rede de esgoto, 74% das residências lançam seu esgoto diretamente na rede
pública. Nos casos de insuficiência da rede de esgoto (26%), os efluentes são
destinados às fossas sépticas.
112
Quanto ao serviço de coleta de lixo, 97% das residências dispõem desse
serviço, sendo os resíduos domésticos, em sua maioria (63%), coletados três vezes
por semana; em outros locais, duas vezes na semana (30%) e todos os dias em 7%
dos domicílios. Apenas um entrevistado declarou não existir em sua rua o serviço de
coleta, o que o levava a queimar o resíduo por ele gerado.
Os dados primários mostram discrepânciasem relação aos dados
secundários, entretanto, estas não chegam a ser significativas, no que se refere ao
abastecimento de água e à cobertura de esgoto. No que diz respeito à coleta de
resíduos sólidos urbanos, a diferença é maior, ocorreu com os dados do
Acaracuzinho/Novo Oriente e Conjunto Timbó, cujo percentual da população em
domicílio sem coleta de lixo é menor do que 1% contra os 3% da encontrados no
campo.
No caso da mobilidade urbana, no questionário aplicado, não havia
nenhuma pergunta sobre o tempo gasto no deslocamento do percurso casa-
trabalho. Por outro lado, ao responderem sobre o local onde trabalhavam, 26%
afirmaram desenvolver sua atividade laboral dentro de casa, 19% correspondem aos
aposentados e desempregados, enquanto 55% trabalham fora de casa. Estes
últimos participam do tráfego urbano com maior frequência que os demais,
dependendo, portanto da eficiência da mobilidade urbana, seja através do transporte
individual (carros, motos, bicicletas.), seja através do uso de transportes coletivos
(ônibus, metrôs, trem).
Segundo Scaliotti (2016), a prefeitura de Maracanaú conseguiu junto ao
Banco Interamericano de Desenvolvimento – BID um financiamento para a
implantação do Programa de Transporte e Logística – Translog, destinado a
melhorias no sistema de transporte intra e intermunicipal. As obras serão realizadas
nas principais ruas e avenidas da cidade, dentro da proposta está a interligaçãodos
bairros periféricos com a região central do município, através da integração das
diversas modalidades de transportes (ônibus, metrôs, bicicletas); a construção de
ciclovias e ciclofaixas; o alargamento do entorno do Distrito Industrial, otimizando a
logística para o escoamento da produção industrial.
114
Tabela 13 - IVS Capital Humano por UDHs
Espacialidades
(UDHs)
% de
mulheres
de 10 a 17
anos que
tiveram
filhos
2010
% de mães
chefes
de família sem
fundamental e
com filho
menor
no total de
mães
chefes de
família
2010
% de crianças
em
domicílios em
que
ninguém tem
fundamental
completo
2010
% de
crianças
de 0 a 5
anos
fora da
escola
2010
% de
crianças
de 6 a 14
fora da
escola
2010
% de pessoas
de
15 a 24 anos
que não
estudam,
não trabalham
e
são
vulneráveis,
na população
dessa faixa
2010
Mortalidade
infantil
2010
Taxa de
Analfabetismo
15 anos ou
mais
2010
IVS
Capital
Humano
2010
Acaracuzinho
/ Novo Oriente 2,97* 35,71* 12,68* 56,82* 0,41* 16,31* 18* 4,46
0,382
Conjunto Timbó 2,97* 35,71* 12,68* 56,82* 0,41* 16,31* 18* 7,93 0,393
Distrito 0,67* 11,04* 4,69* 36,90* 1,89* 10,27* 16* 4,13 0,206
(Continua)
115
Fonte: Elaborada pela autora a partir, IPEA (2015)<http://ivs.ipea.gov.br/ivs/pt/o_atlas/perguntas_frequentes/#33>*UDHs com indicadores idênticos
correspondem a recortes espaciais que foram agregados para fins de extração de dados.
Industrial
Novo
Maracanaú 0,67* 11,04* 4,69* 36,90* 1,89* 10,27* 16* 4,60
0,208
Pajuçara II 2,11 44,78 23,45 48,27 2,15 25,42 30 12,43 0,473
(Conclusão)
116
Assim como na dimensão anterior, foram encontrados três níveis de
vulnerabilidade no IVS capital humano, porém, com um intervalo diferente. Na
variável capital humano, os níveis detectados foram: baixa, média e alta
vulnerabilidade. (Ver Figura 17)
Pajuçara II, que na dimensão infraestrutura aparecia com o menor índice
de vulnerabilidade, aqui é a única UDH com vulnerabilidade alta, fato diretamente
relacionado à baixa escolaridade da população deste bairro, caracterizada pelo
significativo percentual de pessoas sem o ensino fundamental completo e uma taxa
de analfabetismo superior àtaxa nacional de 9,6% (IBGE, 2010). O alto índice de
analfabetismo apresentado (12,43%) reflete a diferença na qualidade do ensino, e a
necessidade de intervenções para modificar este cenário emerge como um
importante desafio. (Ver Tabela 13)
Dentro da faixa de alta vulnerabilidade, cabe ainda destacar o percentual
de pessoas de 15 a 24 anos que não estudam e não trabalham (25,42%), estas se
encontram duplamente vulneráveis, sem o exercício de ocupações que possam lhes
proporcionar uma expectativa de futuro melhor. Os indicadores de escolaridade além
de sinalizarem acesso, qualidade, tempo de permanência, repetência e evasão
escolar, remetem a diferentes relações entre a escolaridade e outros desfechos do
indivíduo, como por exemplo, a dependência química, outro fator de risco, que
embora não tenha sido comtemplado pelo IVS do IPEA, foi averiguado na pesquisa
de campo. Dentre o total de entrevistados, 26% afirmaram ter dependentes químicos
em casa.Um dado essencial a mencionar é que a maioria destes pertenceàs
residências localizadas na Pajuçara II.
Estudos realizados sobre o perfil sociodemográficos de dependentes
químicos, revelaram que a maioria apresenta baixa escolaridade (ensino
fundamental incompleto).Quanto à situação empregatícia é significativo o número de
desempregados ou com profissão indefinida. Resultados como estes explicam a
estreita relação existente entre a baixa escolaridade dos dependentes químicos e o
desenvolvimento da dependência, que se torna preocupante à medida que a
carência escolar ocasiona uma baixa qualificação profissional e, consequentemente,
uma baixa expectativa de vida(CAPISTRANO et al, 2013). Para Frei Betto, membro
117
do programa Todos Pela Educação23, “a descolaridade provoca na criança e no
adolescente baixa autoestima, tornando-os vulneráveis a propostas ilusórias de
enriquecimento e consumismo fáceis através do tráfico de drogas e outras práticas
criminosas.” (2017, p. 1)
Espaços de alta vulnerabilidade tendem à insegurança, não foi por acaso
que nos questionários aplicados na Pajuçara II, os depoentes apontaram o
poloesportivo, a praça e a quadra como locais de lazer, mas 60% afirmaram que não
deixam as crianças brincarem neles devido à falta de segurança. As escolas ali
situadas terminam sendo o principal equipamento social de referência daquela
comunidade, como consequência, as mesmas fortalecem o isolamento sociocultural
da vizinhança, reproduzindo no seu interior padrões de segregação urbana,
restringindo desta maneira, as possibilidades de interação com outros grupos sociais
(CENPEC, 2011)24.
No que concerne à condição de vulnerabilidade mediana, estase encontra
nas UDHsAcaracuzinho/Novo Oriente e Conjunto Timbó. A porcentagem de crianças
de 0 a 5 anos fora da escola é algo que merece atenção(56,82%).De acordo com a
Lei de Diretrizes e Base da Educação Nacional - LDB (2004) é dever do Estado
assegurar o atendimento de crianças de 0 a 6 anos em creches e pré-escola,
período correspondente à educação infantil, que tem como objetivodesenvolvimento
integral da criança, em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social,
complementando a ação da família e da comunidade. Considerando a importância
do desenvolvimentodesses atributos para o indivíduo, onão acessoà educação
infantil termina comprometendo o desempenho da criança em toda sua trajetória
escolar, levando-a muitas vezes a abandonar seus estudos no ensino fundamental,
acentuando assim, as desigualdades.
Vale colocar que a insuficiência de creches e pré-escolas é uma realidade
presente, não apenas em Maracanaú, mas na maioria dos municípios que integram
as grandes regiões metropolitanas brasileiras, potencializando situações deexclusão
social e, por conseguinte de vulnerabilidade. Principalmente nas zonasperiféricas,
23Fundado em 2006, o Todos Pela Educação é um movimento da sociedade brasileira que tem como
missão engajar o poder público e a sociedade brasileira no compromisso pela efetivação do direito das crianças e
jovens a uma Educação Básica de qualidade.https://www.todospelaeducacao.org.br/
24CENPEC - Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária. Educação em
territórios de alta vulnerabilidade social na metrópole. 2011.
118
caracterizadas pelo adensamento de pessoas de baixa renda e pelas dificuldades de
acesso a bens de serviços.
Prosseguindo a análise dos indicadores de média vulnerabilidade, outro
aspecto que merece reflexão é o alto índice de mães chefes de família sem ensino
fundamental e com filho menor (35,71%). Segundo Costa e Marra (2013) muitos são
os fatores de riscos que permeiam as mulheres chefes de família. A condição de
chefia as obriga a se responsabilizarem pela manutenção, proteção e sobrevivência
da casa e da família, afastando-as de seus lares por longas horas diárias e de
grande parte do tempo de vida de seus filhos. Essa sobrecarga de função familiar e
a limitação financeira, agravada pelas extensivas horas de trabalho geralmente mal
remuneradas, as colocam em situação de vulnerabilidade social, pois diminui sua
capacidade de empoderamento.
Partindo da premissa que o gênero estabelece o grau de vulnerabilidade
diante do risco, uma vez que as dificuldades de superação para homens e
mulheresnão se assemelham, buscou-se conhecer o gênero do chefe das famílias
domiciliadas na área de estudo. Do total pesquisado45% declararam que o
responsável pela família é do sexo masculino, 32% do sexo feminino e 23%
declararam que a responsabilidade é do casal.
Além da similitude no percentual de mulheres chefe de família, entre os
dados secundários e primários, um fato que chamou à atenção foi os entrevistados
salientarema responsabilidade compartilhada, demonstrandouma nova forma de
perceber a contribuição do trabalho feminino no orçamento doméstico, outrora
considerado apenas como complemento.É uma recognição do papel da mulher, uma
vez que, “o ‘dinheiro ganho por conta própria’ não tem unicamente seu valor
material, senão também valor social e simbólico. Ele altera as relações de poder no
casamento e na família.” (BECK, 2010, p.118)
O Distrito Industrial e o Novo Maracanaú foram identificados como
espaços de baixa vulnerabilidade, 0,206 e 0,208 respectivamente. Percebe-se na
tabela 14 que as áreas de menor vulnerabilidade social mostram um nível de
escolaridade maior.O fato demonstra que locais com nível socioeconômico
semelhante, apresentando dificuldades comuns para atingir uma educação de
qualidade dentro de uma realidade de segregação espacial, distante de
equipamentos culturais urbanos, podem apresentar níveis de vulnerabilidade social
diferentes, conforme o acesso e a qualidade dos serviços de educação ofertados.
120
Trabalho e Renda
Sendo a capacidade de resposta frente a um desastre ou exposição ao
risco, um dos atributos definidores de vulnerabilidade, torna-se impossível
desconsiderar trabalho e renda como um de seus indicadores sociais. A renda,
provável resultado do trabalho, é fator imprescindível na capacidade de resolução
e/ou adaptação do indivíduo diante de um dano, a relação aqui existente é
diretamente proporcional. Ou seja, quanto maior a renda, maior a possibilidade de
superação do “desastre” sofrido e à medida que essa renda diminui, as chances de
adaptação vão se reduzindo também.Abordando a questão com uma maior
amplitude, Barcellos e Oliveira postulam que“em geral, mais do que a intensidade de
furacões, tufões e ciclones, a diferença está nos recursos que uma população tem
para enfrentar um evento de grande magnitude.” (2008, p.10)
A insegurança econômica amplifica assituações de vulnerabilidade, “as tentativas de
responder a essas situações de insegurança remetem a políticas públicas urbanas
(social, econômica, cultural, urbanística...), cuja eficácia se revela desigual
(VEYRET, 2007, p. 244)”. Fazendo um contraponto com a presente pesquisa, a
tabela 14 retrata duas situações desiguais, uma de média e outra de alta
vulnerabilidade referente ao trabalho e renda por UDHs.
121
Tabela 14 - IVStrabalho e renda por UDHs
Espacialida
des
(UDHs)
Taxa
de
ativida
de
10 a
14
anos
2010
Taxa de
desocupaç
ão
18 anos ou
mais
2010
%
pessoas
de
18 anos
ou
mais sem
fundamen
tal
completo
e em
ocupação
informal
2010
% de
vulnerávei
s
e
dependent
es
de idosos
2010
Renda
domicili
ar
per
capita
igual
ou
inferior
a
R$255,0
0
2010
IVS
Renda
e
Trabal
ho
2010
Acaracuzinh
o / Novo
Oriente
3,89* 10,02* 30,71* 1,86* 161,86*
0,323*
Conjunto
Timbó 3,89* 10,02* 30,71* 1,86* 161,86*
0,323*
Distrito
Industrial 3,72* 13,01* 22,81* 2,40* 173,92*
0,322*
Novo
Maracanaú 3,72* 13,01* 22,81* 2,40* 173,92*
0,322*
Pajuçara II 4,92 10,63 36,81 4,18 155,04 0,427
Fonte: Elaborada pela autora a partir, IPEA (2015) --
<http://ivs.ipea.gov.br/ivs/pt/o_atlas/perguntas_frequentes/#33>*UDHs com indicadores idênticos
correspondem a recortes espaciais que foram agregados para fins de extração de dados.
Observa-se que Pajuçara II corresponde à área de alta vulnerabilidade
(0,427) do IVS trabalho e renda. Apresenta a maior taxa de atividade de 10 a 14
anos (4,92), esse indicador social revela a existência de trabalho infantil, uma vez
que de acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/1990) no
122
seu Art. 2º considera criança, a pessoa até 12 anos incompletos; e no Art. 60 proíbe
qualquer tipo de trabalho para menores de 14 anos, salvo na condição de aprendiz.
O percentual de dependentes de idosos (4,18%) é bem superior às
demais UDHs, quase o dobro. Segundo IBGE (2010) o número de famílias que
sobrevivem da aposentadoria de idosos vem crescendo no Brasil. Em grande
medida, ocrescimento do número de domicílios onde o idoso é o provedor, decorre
de vários fatores, o envelhecimento da população, o aumento das taxas de
desemprego, o aumentodo número de divórcio, que traz entre outras
consequências,o retorno dos filhos à casa dos pais, com o acréscimo dos netos.
Deste modo, a aposentadoria do idoso, direito adquirido por anos de trabalho e que
deveria ser gasto para suprir as necessidades básicas de uma única pessoa
(alimentação, mobilidade, remédios, etc), é destinada a manutenção financeira de
um grupo, a família. Essa situação se agrava nas famílias de baixo poder aquisitivo,
onde o salário do idoso (geralmente o mínimo) é muitas vezes a única fonte de
renda.
Do total de entrevistados, na pesquisa de campo, 13% dos chefes de
família são aposentados. Quando questionados sobre quem ficava responsável pela
casa na ausência do chefe de família, 6% responderam que eram os avós.Quando
consultados a respeito da idade da pessoa responsável, na ausência do chefe da
família, 15% têm acima de 60 anos. O cruzamento desses dados faz senão
confirmar a dinâmica de dependência dos membros da família em relação aos
idosos.As situações descritas demostrama participação financeira destes no
orçamento familiar, principalmente nas famílias de baixa renda, pois além do salário
da aposentadoria, ao ficarem responsável pela casa, os idosos terminampoupando o
dinheiro que seria gasto com o pagamento de uma empregada doméstica.
Os setoresde vulnerabilidade média se estendem por quase toda área
pesquisada (Ver Figura 18), apresentam uma receita inferior a meio salário
mínimo25, circunstância determinante do estado de pobreza e, por conseguinte, de
exclusão social. A condição de pobreza, quase sempre, ergue uma barreira que
obstaculariza o acesso aos serviços de educação, saúde, mobilidade urbana e ao
mercado de trabalho, gerando um círculo vicioso difícil de ser rompido.
25R$ 510,00 era o valor do salário mínimo brasileiro em 2010 (ano da pesquisa do IPEA).
123
Em face do exposto, é possível concluir que o IVS trabalho e renda não
se restringem apenas à insuficiência de recursos financeiros e às atividades
diretamente atreladas (ocupação informal, taxa de desocupação e renda per capita),
mas também a composição familiar e o nível de escolaridade, fundamental para a
obtenção de um trabalho que possibilite uma remuneração digna.
125
Em resumo, no tocante ao índice de vulnerabilidade social em questão, os
dados contidos na tabela 15 mostram que em termo de estrutura urbana, a
população encontra-se numa situação de baixa vulnerabilidade, diferente do IVS
capital humano e IVS trabalho e renda, ambos na faixa de média vulnerabilidade,
assim com também o IVS geral, resultado da médiaaritmética do IVS das três
dimensões.O conhecimento dessas informações é fundamental para identificar a
diversidade dosníveis de vulnerabilidade em áreas intrametropolitanas, em termos
de infraestrutura, capital humano e trabalho e renda.O mapeamento dos locais onde
se concentram parcelas da população mais vulnerável facilita a implementaçãode
intervenções governamentais destinadas a reduzir as desigualdadessocioespaciais.
Tabela 15–Síntese dos índices de vulnerabilidade social das UDHs
Espacialidade
(UHHs)
IVS
Infraestrutura
Urbana 2010
IVS
Capital
Humano
2010
IVS
Trabalho e
Renda
2010
IVS
2010
Conjunto Timbó 0,271* 0,393 0,323* 0,329
Distrito Industrial 0,374* 0,206 0,322* 0,301*
Novo Maracanaú 0,374* 0,208 0,322* 0,301*
Acaracuzinho/Novo
Oriente
0,271* 0,382 0,323* 0,325
Pajuçara II 0,126 0,473 0,427 0,342
Total 0,283 0,332 0,343 0,319
Fonte: Elaborado pela autora a partir http://ivs.ipea.gov.br/
*UDHs com indicadores idênticos correspondem a recortes espaciais que foram agregados para fins
de extração de dados.
126
6.3 ÍNDICE DE VULNERABILIDADE SOCIOAMBIENTAL (IVSA)
Figura 19 – Mapade vulnerabilidade socioambiental (IVSA)
Fonte: elaborado pela autora
127
A figura 19 ilustra um gradiente multifacetado, de cinco níveis de
vulnerabilidade socioambiental: muito baixa, baixa, média, alta e muito alta,
pulverizados nos setores censitários que compõem a área de estudo. Com
exceção do setor 230765005000172 situado a noroeste, que apresenta dois
níveis de vulnerabilidade (alta e muito alta), todos os outros, são compostos por
pelo menos três faixas de vulnerabilidade coexistindo dentro de um mesmo
espaço, fato revelador da complexidade vivenciada cotidianamente pela
população local.
As áreas com vulnerabilidade muito alta são
identificadasprincipalmente nas proximidades dos cursos d’água. As
instalações de indústrias (dentro do DIF I) e de conjuntos residenciais no
entorno do DIF I, acarretaram vários impactos ambientais adversos, como por
exemplo, a retirada da vegetação ea poluição dos recursos hídricos, decorrente
do despejo de efluentes nos leitos de rios e lagoas, sem qualquer tipo de
tratamento. Sobre a poluição industrial de Maracanaú, Almeida (2005)
comenta:
[...] não é raro encontrarem-se depósitos clandestinos de resíduos sólidos
provenientes das indústrias do DIF I, por exemplo, às margens dos
principais corpos d’água de Maracanaú, como é recorrente na lagoa de
Pajuçara, que se localiza inteiramente dentro do DIF I. Além disso, nota-se
uma forte relação entre poluição do solo e a da água, através da disposição
de efluentes líquidos industriais (provenientes de resíduos sólidos ou
líquidos) sobre o solo sem que haja qualquer tipo de impermeabilização,
acarretando também a poluição do aquífero e dos mananciais superficiais.
(p.123)
De acordo com a CETESB (2006), as principais fontes de
contaminação das águas subterrâneas advêm da disposição inadequada de
resíduos: lixões; acidentes com substâncias tóxicas; manuseio e
armazenamento impróprio de produtos, efluentes e resíduos de atividades
industriais. Avulnerabilidade de um aquífero está estritamente relacionada o
quanto ele pode ser afetado pela carga de poluentes que são despejados nele,
considerado a tipologia do aquífero (livre a confinado), profundidade do nível
d’água e as características dos estratos, em termos de consolidação e litologia
128
(argila e cascalho). A despoluição das águas subterrâneas é dispendiosa e
necessita de um tempo considerável para se renovar por isso as medidas
preventivas são as melhores opções de conservação.
Com base nas citações trazidas, comprova-se o protagonismo dos
resíduos industriais na poluição de recursos hídricos, promovendo, desta
maneira, vulnerabilidade e risco nos locais e nas populações por eles
afetadas.Vale enfatizar que, muitas vezes, a população não tem conhecimento
do risco que corre, pois acredita que as indústrias deem destinação adequada
aos resíduos que geram. Buscando conhecer o nível de confiança dos
moradores em relação às indústrias, foi perguntado a estes se acreditavam que
as mesmas davam destino correto aos resíduos por elas gerados (Ver Figura
20).
Figura 20–Gráfico você acredita que as indústrias dão uma destinação
correta aos resíduos que elas geram?
Fonte: Elaborado pela autora a partir da pesquisa de campo (2016)
Quanto à percepção dos moradores, 45% não acreditam que as
indústrias destinem corretamente seus resíduos; 39% acreditam que as
indústrias destinam adequadamente os resíduos que geram, entre os principais
motivos apontados estão:devido à fiscalização, por que o governo obriga,
porque as indústrias onde trabalham dão destinação correta, por não ver
39%
45%
16%
Sim
Não
Não sei
129
resíduos jogados na rua e pessoas reclamando, destinado ao aterro de
Maracanaú, porque as indústrias são responsáveis. Já 16% declararam não
saberem a destinação dada pelas indústrias aos resíduos gerados.
Embora a maiorianão acredite na destinação adequada, dada pelas
indústrias aos seus resíduos, considera-se 39% um percentual significativo de
confiança, pois desconsiderando àqueles que disseram não saber responder,
essa proporção passa a ser de 44,4%. Aprofundando a reflexão sobre
confiança X vulnerabilidade, Castro (2005) esclarece que, geralmente, a não
percepção ou identificação do risco deve ser creditada ao fator confiança,
entretanto, se a confiança pressupõe a falta de conhecimento referente aos
procedimentos dos sistemas de segurança, a sociedade ou parte dela está
vulnerável aos riscos derivados da falha nos sistemas em questão.
Grande parte da população desconhece que a responsabilidade
pelos resíduos industriais (na maioria perigosa) é do gerador, sendo exigido
deste, a elaboração de um plano de gerenciamento de resíduos sólidos,
contendo os procedimentos relativos às etapas do gerenciamento, baseados
no diagnóstico dos resíduos gerados. Este diagnóstico deve conter a origem, o
volume e a caracterização dos resíduos, incluindo os passivos ambientais,
além de ações preventivas e corretivas a serem executadas em situações de
gerenciamento incorreto ou acidentes. (PNRS, 2010).
Como parte componente do levantamento do estado físico dos
resíduos industriais Classe I foram encontrados três padrões: sólido, pastoso e
líquido (Ver Tabela 16) e três grandezas de medidas diferentes (toneladas,
unidades e litros). Considerando que, na presente pesquisa o termo resíduo
sólido refere-se tanto aos materiais sólidos, quanto aos semissólidos.Os
resíduos em estado pastoso foram inseridos nas análises aqui desenvolvidas,
ficando de fora, os resíduos líquidos e os sólidos mensurados por unidade, pois
a escassez de dados referentes à densidade dos mesmos impossibilitou
transformá-los em única grandeza.
130
Tabela 16 – Estado físico dos resíduos Classe I das indústrias
inventariadas
Código (Conama
313)
Estado Físico Quantidade/Mês
S
Sólido
119,989 t
1.178 uni
P Pastoso 23,147 t
L Líquido 22.907,623 L
Fonte: Elaborado pela autora a partir da pesquisa de campo – 2013
No que concerne à tipificação dos resíduos Classe I, de maneira
geral, foram identificados nas indústrias inventariadas, 15 tipos de resíduos
perigosos, o detalhamento da tipificação destes resíduos pode ser verificado
noquadro12, onde é possível também observar seus constituintes perigosos e
o teor da periculosidade, a serem avaliados com a finalidade de estabelecer
seu potencial de risco à saúde humana e ao meio ambiente. É pertinente
colocar que os resíduos líquidos (F130, F230) foram listados apenas a título de
identificação, não constando nas tabelas posteriores, devido seu estado físico.
Quadro 12-Resíduos Classe I Inventariados por Código do
Conama 313
Nº
Cód.
Resíduo
Classe I
Descrição do Resíduo Constituinte
Perigoso
Periculosida
de
01 D099
Outros resíduos perigosos -
especificar Não aplicável Tóxico
02 F044
Lâmpada com vapor de mercúrio
após o uso Mercúrio Tóxico
03 F104
Embalagens vazias contaminadas
não especificadas na Norma NBR
10.004
Não aplicável* Tóxico
(Continua)
131
04 F105
Solventes contaminados (especificar
o solvente e o principal
contaminante)
Solvente Inflamável
Tóxico
05 F130
Óleo lubrificante usado ou
contaminado Não aplicável* Tóxico
06 F230 Fluído e óleo hidráulico usado Não aplicável* Tóxico
07 K053 Restos e borras de tintas e
pigmentos
Cromo,
chumbo
hexavalente
Tóxico
08 K193
Aparas de couro provenientes de
couros curtidos ao cromo
Cromo
hexavalente
Tóxico
09 K194
Serragem e pós de couro
provenientes de couros curtidos ao
cromo
Cromo
hexavalente
Tóxico
10
K195
Lodos provenientes do tratamento de
efluentes líquidos originados no
processo de curtimento de couros ao
cromo
Cromo
hexavalente
Tóxico
11 K207
Borra do re-refino de óleos usados
(borra ácida) Não aplicável* Tóxico
12 K209
Poeiras provenientes do sistema de
controle de emissão de gases
empregado nos fornos Cubilot
empregados na fundição de ferro
Cromo,
chumbo,
arsênio
Tóxico
13 K213 Estopas contaminadas com óleos
e/ou graxas Não aplicável*
Inflamável
tóxico
14 K214 Pilhas e Baterias em geral
Chumbo,
cádmio,
mercúrio
Tóxico
15 CONAMA
358
Tratamento e a disposição final dos
resíduos dos serviços de saúde Não aplicável*
Contaminant
e
Infectante
Fonte: Elaboração da autora a partir do CONAMA 313 e NBR 10004
(Conclusão)
132
*Não aplicável – termo empregado quando o resíduo enquadra-se
como perigoso pela presença de um grande número de constituintes perigosos
ou pelo efeito conjunto destes.
Vale destacar que, os resíduos industriais são fontes potenciais de
contaminação dos recursos hídricos superficiais e subterrâneos, não só quando
são despejados nos leitos de rios e lagoas, mas também quando dispostos em
lixões e aterros impróprios ou até mesmo armazenados inadequadamente. Isto
decorre do fato, em termos normativos, destes resíduos serem depositados em
aterros com critérios não condizentes com a NBR 10.157/8726 a qual “fixa as
condições mínimas exigíveis para projeto e operação de aterros de resíduos
perigosos, de formaa proteger adequadamente as coleções hídricas
superficiais e subterrâneas próximas, bem como os operadores destas
instalações e populações vizinhas”.Assim, como também, o descumprimentoda
NBR 12.235/9227, que trata do armazenamento apropriado de resíduos sólidos
perigosos de forma a proteger a saúde pública e o meio ambiente.
Na avaliação da ANA (2013), a falta de coleta e a disposição
inadequada dos resíduos sólidos são fatores potenciais da poluição hídrica.
Tanto diretamente, quando são dispostos em áreas alagadas ou carreados por
falta de coleta, como indiretamente, disposição feita sem o controle adequado,
podendo, assim, contaminar o solo e, por conseguinte, as águas subterrâneas
e demais corpos hídricos em suas proximidades.
Quanto às condições de armazenamento destes resíduos no interior
das indústrias inventariadas e a destinação dada a estes, foram verificadas
irregularidades em ambos os procedimentos. (Ver Quadro 13)
26NBR 10157/87 Aterros de resíduos perigosos - Critérios para projeto, construção e operação. Disponível em:
http://licenciadorambiental.com.br/wp-content/uploads/2015/01/NBR-10.157-ARIP-Construção-Operação.pdf 27NBR 12235/92 Armazenamento de resíduos sólidos perigosos. Disponível em:
http://wp.ufpel.edu.br/residuos/files/2014/04/nbr-12235-1992-armazenamento-de-resíduos-perigosos.pdf.
133
Quadro 13 – Armazenamento e Destinação Final dos Resíduos Classe I
(continua)
RESÍDUOS ARMAZENAMENTO DESTINAÇÃO FINAL
D099
Tambor c/ tampa
Área coberta c/ piso impermeável
Baias cobertas
A granel
Coprocessamento
Reciclagem
F044 Caixas de madeira
Galpão coberto c/ piso
impermeável
Descontaminação
F104
Área coberta
Baias
A granel em galpão coberto c/
piso impermeável
Galpão coberto
Conteiner
A granel
Reciclagem
ASMOC
Coprocessamento
F105 Conteiner plástico Destilação
K053
Conteiner coberto
Galpão coberto
Baias
Baldes
Aterro Classe I – PE
Coprocessamento
Reaproveitamento
K193
Área coberta c/ piso impermeável
Sacos de ráfia
Baias cobertas
Aterro Classe I – PE
Coprocessamento
K194 Área coberta c/ piso impermeável Aterro Classe I – PE
K195 Caçamba c/ cobertura ASMOC
K207 Galpão coberto c/ piso
impermeável
Coprocessamento
K209 Big Bag - galpão coberto c/ piso Coprocessamento
134
impermeável
K213
Tambor c/ tampa – área externa
Galpão coberto c/ piso
impermeável
Tambor de plástico
Coprocessamento
K214
Galpão coberto c/ piso
impermeável
Caixa de madeira
Devolvido ao fabricante
Conama
358
Galpão coberto c/ piso
impermeável
Coletor específico
Conteiner
Incineração
Fonte: Elaboração da autora a partir de dados da – FIEC/SEMACE -2013
* ASMOC – Aterro Sanitário Metropolitano Oeste de Caucaia
Quantoà disposição final,o envio dos resíduos K104 e K195para
o Aterro Sanitário Metropolitano Oeste de Caucaia - ASMOC é
incontestavelmente inapropriado, uma vez que este aterro foi construído
visando receber resíduos sólidos urbanos (RSU) Classe II, ou seja, não
perigosos. O mesmo acontece com o resíduo F104, embalagens vazias
contaminadas, que algumas indústrias declararam à SEMACE, através de seus
PGRS, que reciclavam as embalagens, quando a destinação correta é o
coprocessamento. Este fato mostra a falta de conhecimento e o despreparo
dos profissionais responsáveis pelo gerenciamento deresíduos Classe I.
Observa-se ainda que, o aterro Classe I citado, está localizado no
estado de Pernambuco, pois como anteriormente mencionado, no Ceará não
há aterros especificamente destinados aos resíduos dessa classe, com
exceção dos particulares (2)28, construídos para atender à demanda interna
própria.
28As duas organizações que possuem aterro industrial próprio estão localizadas no município de Cascavel – CE,
ambas são do segmento de beneficiamento de couro.
(Conclusão)
135
Quanto ao armazenamento, percebe-se que não há uma
homogeneidade entre as indústrias para o armazenamento de um mesmo
resíduo; além de quecontêineres e tambores devem ser acondicionados em
áreas cobertas, bem ventiladas e colocados sobre base de concreto ou outro
material que impossibilite a lixiviação e percolação de substâncias para o solo e
águas subterrâneas. Quando os resíduos são armazenados a granel, devem
ser guardados em locais cobertos com piso impermeável, devido às
características de corrosividade de determinados resíduos (NBR 12.235/92,
1992). Com efeito, constata-se que a maioria das informações referentes ao
armazenamento dos resíduos são incompletas, quando não indicam que vem
sendo realizado de maneira inadequada, comopor exemplo, em sacos de ráfia
e baldes.
O conhecimento dessas informações evidencia a necessidade
e urgência de uma fiscalização mais incisiva junto às indústrias do DIF I, pois
diante do apresentado, é notória a condição de vulnerabilidade e risco industrial
que a população se encontra exposta, sejam os moradores dos bairros
adjacentes ou os operários. Sobre riscos industriais é preciso entender que:
[...] riscos industriais estão associadas às atividades de armazenagem de
produtos tóxicos, à produção e ao transporte de materiais perigosos. Em
muitos casos, essas atividades estão inseridas no tecido urbano, o que
causa apreensão em virtude dos efeitos em cadeia, uma série de
acontecimentos dificilmente previsíveis e domináveis. (VEYRET, 2007, p.70)
O fato de essas atividades estarem inseridas no tecido
urbanoaumenta o grau de exposição a acidentes como, explosão, vazamento
de produto tóxico e incêndio, considerados pela autora supracitada, as maiores
fontes de riscos industriais.
Alta vulnerabilidade
Quanto à identificação das áreas de alta vulnerabilidade,
estasse concentram,sobretudo,nas zonas limítrofes do DIF I e dos conjuntos
habitacionais;caracterizadas, neste caso em particular, pela presença de
136
edificações residenciais e industriais. As transformações decorrentes do
adensamento urbano e das atividades industriais comprometem a qualidade de
vidanão só das pessoas, mas também da fauna e da flora local.
Nos países do norte, os espaços de forte concentração urbana e as
regiões metropolitanas, geralmente, possuem uma alta vulnerabilidade, devido
entre outros fatores, ao não acesso, quando não, a ineficiência dos serviços de
infraestrutura, educação e saúde.Entretanto, vale enfatizar quea espacialização
da vulnerabilidade dentro de uma mesma região metropolitana é heterogênea,
não uniforme, está vinculada aos estratos sociais urbanos.
Ou seja, são as populações menos favorecidas, por características derenda,
escolaridade, cor, gênero, que residem ou utilizam os territórios de maior
vulnerabilidade ambiental, o que as coloca numa situação de risco ao
desastre ambiental, já que se sobrepõem vulnerabilidades sociais à
exposição a riscos ambientais. (BARCELLOS; OLIVEIRA, 2008, p.10)
E ainda,
Ora, é sabido que uma grande parcela da população urbana pobre só
consegue acesso a terra e habitação invadindo áreas não valorizadas pelo
mercado imobiliário, como encostas íngremes,margens de rios sujeitas a
inundações, ecossistemas frágeis, áreas de represas ou áreas sujeitas a
riscos industriais. (BARCELLOS; OLIVEIRA, 2008, p.10)
Em relação à construção de habitação em áreas sujeitas a riscos
industriais, cabe mencionar que a construção dos conjuntos habitacionais em
Maracanaú, na década de 1970, está atrelada às políticas de industrialização e
consolidação do Distrito Industrial I. A localização desses conjuntos nos
arredores do DIF I foi amaneira que o governo encontrou de solucionar o
problema de proximidade de mão de obra, apontada pelos empresários, como
um empecilho para a instalação de suas indústrias naquele local (CARVALHO,
2009).
A circunstânciahistórica apresentada mostra o descaso do poder
público em relação à segurança da população de baixa renda,poispara atender
uma demanda da classe empresarial, ogoverno estimulou, através de
137
financiamentos do BNH e da COHAB, a construção de conjuntos residenciais
na circunvizinhança do distrito industrial, mesmo ciente de ser ali, uma área de
risco.
Além dos riscos oriundos da poluição atmosférica, causada pela
fumaça emitida das chaminés das indústrias, do referido distrito, vale destacar
as toneladas de resíduos perigosos que são gerados mensalmente pelos
processos produtivos das mesmas e são potenciais poluidores do solo e dos
recursos hídricos (Ver Tabela 17)
Tabela 17 – Quantidade de resíduos Classe I inventariados
Ordem Resíduo
Conama 313
t/mês %
01 D099 7,891 5,512
02 F044 0,007 0,004
03 F104 10,620 7,419
04 F105 1,871 1,307
05 K053 27,92 19,505
06 K193 11,391 7,958
07 K194 5,16 3,604
08 K195 56,265 39,308
09 K207 0,58 0,405
10 K209 14,49 10,123
11 K213 6,88 4,806
12 K214 0,013 0,009
13 CONAMA 358 0,048 0,033
TOTAL 143,136 100
Fonte: Elaboração da autora a partir de dados da SEMACE -2013
Respondendo por aproximadamente39% do total de resíduos
gerados, o K195 - Lodos provenientes do tratamento de efluentes líquidos,
originados no processo de curtimento de couros ao cromo são os resíduos
138
mais gerados.Vale registrar que apenas uma indústria é geradora desse tipo de
resíduo,seguido pelo K053 - Restos e borras de tintas e pigmentos – com
19,5%, encontrado em cinco das sete indústrias investigadas. Cabe destacar
que o K053 e K195 têm em comum o constituinte cromo hexavalente,
reconhecido por colocar em risco a estabilidade de ecossistemas e como um
carcinogênico humano. O K209 - Poeiras provenientes do sistema de controle
de emissão de gases empregado nos fornos Cubilot empregados na fundição
de ferro - aparece em terceiro lugar com 10%, seguido pelo K193 - aparas de
couro proveniente de couros curtidos ao cromo, com praticamente 8% e o F104
- embalagens vazias contaminadas não especificadas (7,4%).
Com o percentual inferior a uma tonelada/mês aparecem os
resíduos F044, K207, K214, (todos tóxicos) e o CONAMA 358 (contaminante e
infectante), que devido ao grave nível de risco à saúde e ao meio ambiente,
não puderam ser desconsiderados. O D099 é composto, neste caso específico,
aos cartuchos de impressoras; resíduos contendo cola utilizada na fabricação
de papel ondulado; equipamentos de proteção individual usados (EPIs) ;
contêineres e tambores metálicos contaminados, respondendo ao todo, por
5,5%. Os demais resíduos (F105, K194 e K213) somam 9,7%.
A Figura 21 proporciona uma visão panorâmica da distribuição
espacial desses resíduos e da proximidade das indústrias com as áreas
domiciliares, onde foram aplicados os questionários. Nota-se que grande parte
das indústrias inventariadas está localizada próximaaos corpos hídricos, o que
potencializa a contaminação destes no caso de um acidente causado por uma
destinação ou armazenamento inadequado.
139
Figura 21 – Distribuição Espacial dos Resíduos Classe I por Indústria
Fonte: Elaborado por Iggor Uchôa Torres (2017), a partir de dados da SEMACE (2013)
140
No tocante à localização das indústrias, a lei 6.803/8029, no seu
Art 2°, regula que as zonas de uso estritamente industrial destinam-se,
preferencialmente, à instalação de indústrias cujos resíduos sólidos, líquidos e
gasosos, ruídos, vibrações, emanações e radiações possam causar perigo à
saúde, ao bem-estar e à segurança das populações, mesmo após a utilização
de métodos adequados de controle e tratamento de efluentes. Entretanto, ela
não determina a distância preventiva que essas zonas industriais devem
manter de áreas residenciais e/ou comerciais, para que a segurança da
população e do meio ambiente seja minimamente garantida.
No percurso empírico da pesquisa foram encontradas três situações
distintas: i) núcleos residenciais, comerciais e educacionais (IFCE) a menos de
100m de distância das indústrias; ii) domicílios construídos no interior do DIF I
e iii)a ausência total de residências e de comércio no entorno das fábricas,
motivo da não aplicação de questionários nesses locais.
Diante do exposto, pode-se declarar que dessas três situações, as
duas primeiras não estão em conformidade com a lei. Outrasinobservâncias
foram detectadas, entre elas a do inciso III, ainda do art. 2º, o qual determina
que no contorno das zonas industriais devam ser mantidos anéis verdes de
isolamento capazes de proteger as áreas circunvizinhas contra possíveis
efeitos residuais e acidentes.
O contorno do Distrito Industrial I de Maracanaú tem a seguinte
configuração, ao norte – Anel Viário; ao sul – Av. do Contorno Norte; ao leste –
CE 060 e oeste – Rua 20, são rodovias com um fluxo substancial de veículos
de grande porte(carretas, caminhões) carregados de produtos e mercadorias
produzidas no próprio distrito.Diferente do que rege a lei, caracteriza-se por ser
um perímetro não vegetado e fortemente asfaltado, consequências do
processo de urbanização e da logística do escoamento da produção industrial.
A pavimentação do solo impermeabiliza-o, impedindo a infiltração das águas
pluviais e a manutenção dos aquíferos e intensifica a drenagem superficial,
contribuindo para a ocorrência de enchentes. Com aausênciados anéis verdes
de isolamento, ou seja, da barreira vegetal,as pessoas ficam mais expostasaos
29 Lei 6.803/80- Dispõe sobre as diretrizes básicas para o zoneamento industrial nas áreas críticas de poluição, e
dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L6803.htm.
141
ruídos externos;às doenças alérgicas e respiratórias; e aos demais problemas
referentes à ocupação de áreas socioambientalmentes vulneráveis.
Na pesquisa de campo, quando consultados sobre o tempo que ali
residiam, 81% declararam que moram no bairro há mais de 10 anos, fato que
mostra um forte vínculo dos moradores com o lugar, e19% residem entre 1 e
10 anos. A maioria destes domicílios (87%) são próprios; 6,5% alugados e
6,5% cedidos.
Ao responderem sobre o que os levaram a residir naquele bairro,os
principais motivos apontados pelos entrevistados foram o fato das casas terem
sido construídas através de mutirão, considerado como uma oportunidade de
realizarem o “sonho” da casa própria, independentemente do local. Outro
motivo bastante mencionado está relacionado ao fator de consanguinidade, ou
seja, ficar próximo a parentes e familiares.
O cruzamento das respostas, descritas, permite perceber a baixa
renda dos depoentes, porém visando traçar um perfil mais detalhadosobre a
condição socioeconômica daquela comunidade, buscou-se conhecer sua
média salarial mensal.Deste modo, os dados coletados identificaram que 42%
dos moradores sobrevivem com uma renda mensal de até um salário mínimo30;
29% vivem com até 2 salários mínimos; seguido por 22,5% com renda acima
de 2 salários. O percentual de domicílios com renda entre 1 e 2 salários
mínimos foi de 6%.
O resultado do estudo mostrou que a população dos domicílios
situadosnos arredores do DIF I é, preponderantemente, de baixa renda. Fato
que confirma a estreita relação que há entre baixa condição econômica e a
presença da alta vulnerabilidade.
Em virtude dos fatos mencionados, entende-se que a situação
da desigualdade na distribuição dos riscos pode ser atribuída a dois fatores: em
primeiro lugar, a precariedade da renda das populações, que lhes permite o
acesso à moradia somente em áreas mais desvalorizadas, caracterizadas pela
fragilidade ambiental; em segundo lugar, a baixa posição ocupada por estas
populações na escala social, faz com que as mesmas não consigam resistir a
processos antrópicos de fragilização do ambiente. (BARCELLOS;OLIVEIRA,
30Salário mínimo brasileiro em 2016 (ano que os questionários foram aplicados) – R$ 880,00 -Decreto
8.618/2015
142
2008). Deste modo, pode-se considerar que “[...]a própria dinâmica dos
processos da natureza e dos processos sociais tendem a gerar riscos à
sociedade, relacionando-se à sua dinâmica sócio espacial.” (CASTRO et al,
2005, p.27)
Média, baixa e muito baixa vulnerabilidade.
Os setores caracterizados com média vulnerabilidade estão
localizados em grande medida dentro do DIF I, assim, possuem uma baixa
densidade demográficaresidente e correspondemmajoritariamente, às áreas de
proteção ambientais pertencentesàs indústrias, previstas pela lei de
zoneamento industrial.
Percebe-se que os espaços de média vulnerabilidade são
mesclados por pequenas áreas, de baixa e muito baixa vulnerabilidade, que
correspondem aos segmentos da malha urbana não consolidados;onde ainda
há a presença de espécies arbóreas e vegetação rasteira, de modo que esses
setores tendem a apresentar uma maior estabilidade socioambiental, como por
exemplo, grande parte do conjunto Novo Maracanaú, localizado na parte
sudoeste.
Outro fato observado (Ver Figura 19) e que chama atenção, é o
quantoas áreas de baixa e muito baixa vulnerabilidade são reduzidas,
tornando-se cada vez mais difícil encontrá-las nas regiões metropolitanas.Por
isso devem ser conservadas, através da manutenção de seus aspectos
ambientais e da observância dos instrumentos legais referentes ao uso e
ocupação do solo urbano.
Ao final dessa análise foi possível constatar que, no espaço
correspondente ao objeto de estudo do presente trabalho, as áreas de média e
alta vulnerabilidade socioambiental predominam em detrimento aos demais
níveis identificados. Considera-se que a baixa renda e escolaridade da
população residente, nas adjacências do Distrito Industrial I, são as principais
variáveis que potencializam a condição de vulnerabilidade social que se
encontram. A baixa renda por reduzir as possibilidades de ocuparem locais
com uma melhor infraestrutura urbana e a baixa escolaridade por fomentar a
falta de conhecimento diante do risco a qual estão expostas.
143
6.4Índice de Vulnerabilidadedos Resíduos Perigosos (IVRP)
O índice referente à situação de vulnerabilidade e risco daspessoas
residentes no entorno do DIF I, em relação aos resíduosClasse I gerados pelas
indústrias, mostrou que as mesmas encontram-se em um nível de muito alta
vulnerabilidade (0,722), resultante da média aritmética de três variáveis: i)
Política/institucional; ii) Ambiental e iii) Conhecimento.
IVRP = ∑ VP + VA + VC
9
IVRP = 2,0 + 2,5 + 2,0
9
IVRP = 0,722
Através desses indicadores foi possível perceber os pontos
nevrálgicos da gestão dos resíduos Classe I que vem sendo desenvolvida tanto
pelas indústrias quanto pela prefeitura deMaracanaú.Aspectos básicos do
gerenciamento integrado estão sendo negligenciados, e não é por falta de
regulamentação, pois a Política Nacional de Resíduos Sólidos prevêas
diretrizes relativas à gestão integrada dos resíduos sólidos, inclusive os
perigosos, às responsabilidades dos geradores e do poder público. (PNRS,
2010)
144
Quadro 14 – Matriz da variável política/institucional, indicadores e pesos
VARIÁVEL
INDICADOR DESCRITOR PESO
Política/
Institucional
Cumpre a
Política
Nacional
de
Resíduos
Sólidos
Sim 0
Parcialmente
0,5
Não
0
Possui
Plano
Municipal de
Resíduos
Sólidos
Sim 0
Em processo de elaboração
0
Não possui
1
A indústria
possui um
plano de
gerenciame
nto de
resíduos
sólidos
(PGRS)
Possui e segue totalmente as normas
técnicas
0
Possui,mas parcialmente
implementado
0,5
Não Possui
0
Total 2,0
Fonte: Adaptado pela autora de: Santiago e Dias (2012), Ramos (2013) e IPEA(2015). Alta=1; Média=
0,5; Baixa=0 (BESEN, 2011). Dados pesquisa de campo.
Percebe-se no quadro 14 a omissão, senão a inobservânciada
PNRS pelos gestores públicos e privados. A começar pela inexistência de um
plano municipal de resíduos sólidos, previsto na seção IV da PNRS, como
condição para os municípios terem acessoaos recursos da União, destinados
145
ao gerenciamento integrado dos resíduos sólidos, da limpeza pública a
financiamentos de créditos de entidades federais.
Paradoxalmente, os gestores municipais alegam a falta de recursos
financeiros como o principal motivo da gestão inadequada dos resíduos
gerados nos municípios, entretanto, como já mencionado no capítulo II, a
maioria dos municípios cearenses ainda não possui este instrumento de
gerenciamento de resíduos, mesmo sabendo que ele é a “chave” que abre as
portas para o financiamento. Diante do exposto, vale colocar alguns
questionamentos: por que as prefeituras não elaboram seus planos municipais
de gestão integrada de resíduos sólidos? Quem são os maiores prejudicados
com o manejo inadequado desses resíduos? Em que medida o poder público
municipal está comprometido com a saúde esegurança da população e do
meio ambiente?
Outro dado que cabe enfatizar é que, apesar das indústrias
inventariadas possuírem um PGRS, este é implementado parcialmente. Em
outras palavras, isso quer dizer que os procedimentos estabelecidos no plano
em questão, não estão sendo realizados com a excelência que deveria, e que a
lei 12.305/2010 determina em seu capítulo IV, específico para resíduos
perigosos.
No período em que a pesquisa estava sendo realizada haviam 07
empresas, licenciadas na SEMACE, que fazem o tratamento de resíduos
Classe I no estado do Ceará (Ver Quadro 15). A Votorantim Cimentos
localizada no município de Sobral- CE, além de fabricar o cimento Poty,
oferece o serviço de coprocessamento de resíduos. As indústrias que utilizam o
tratamento de coprocessamento, consideram que não deveriam pagar por ele,
uma vez que os resíduos, por elas destinados, são utilizados como combustível
na produção de cimento, e assim a cimenteira estaria ganhando
duplamente.Isso sem contabilizar os ganhos oriundos domarketing de empresa
comprometida com a sustentabilidade ambiental.
Por outro lado, em contraste com a ideia da sustentabilidade do
coprocessamento, Santi e Sevá (1999) asseguram que,
Na realidade, essa “alternativa energética”, co-queimar resíduos perigosos,
passa a carregar um passivo não desprezível de custos ambientais e
146
sociais, o que põe novamente a indústria do cimento, e junto com ela as
indústrias geradoras desses tipos de resíduos, no alvo da dúvida quanto à
sustentabilidade. (p.10)
Percebe-se que o compromisso com a sustentabilidade ambiental
deve transcender o tratamento considerado adequado, pois este também gera
resíduos, assim se faz necessária uma fiscalização maior da gestão de
resíduos, tanto no setor produtivo, quanto junto às empresas de tratamento dos
mesmos.
Quadro15 - Empresas de tratamento de resíduos Classe I
licenciadas na SEMACE
Nº EMPRESA TRATAMENTO MUNICÍPIO
1 Votorantim N/NE S.A. Coprocessamento/
incineração
Sobral
2 Flamax Soluções
Ambientais
Incineração Juazeiro do
Norte
3 Incinerador Marquise Incineração Fortaleza
4 INK Flex Ind. de Tintas e
Serviços Ltda
Recuperação de
Solvente
Fortaleza
5 Transágua Transporte de
água Ltda
Descontaminação de
Lâmpada
Fortaleza
6 Biolight Reciclagens Descontaminação de
Lâmpada
Fortaleza
7 Climatech Solução Descontaminação de
Lâmpada
Fortaleza
Fonte: Elaboração da autora a partir de dados da SEMACE – 2013
Segundo a Abetre31 o setor de tratamento de resíduos industriais
brasileiro deve crescer 26% nos próximos cinco anos. A necessidade das
indústrias se adequarem às direstrizes estabelecidas na Política Nacional de
31Abetre – Associação brasileira de empresas detratamento de resíduos e efluentes. Disponível
em:http://www.abetre.org.br/imprensa/noticias-do-setor/
147
Resíduos Sólidos impulsionou o mercado das empresas de proteção ambiental,
de modo que o tratamento de resíduos tornou-se um negócio rentável. No
Ceará, algumas empresas deste segmento vem se destacando, os valores
cobrados por algumas delas estão organizados na tabela 18.
Tabela 18 - Valores do tratamento de resíduos Classe I no Ceará
Nº EMPRESA Valor(R$)
1. Votorantim N/NE S.A. 0,32kg
2. Flamax Soluções
Ambientai
300,00até 180kg
500,00até 300kg
1.000,00 até 600kg
1.500,00 até 1.000kg
3. Incinerador Marquise Não informado
4. INK Flex Ind. de Tintas
e Serviços Ltda
0,10L
Fonte: Elaborado pela autora a partir da pesquisa de campo – 2014.
Cabe esclarecer que o valor cobrado pela Votorantim é referente ao
coprocessamento, não estão incluídos os serviço de transporte e blendagem32.
O da Flamax inclui os serviços de coleta, transporte e icineração. O preço da
INK Flex refere-se, apenas,à recuperação de solvente, já a Marquise recusou-
sefornecerinformação.
32Blendagem – tecnologia utilizada para misturar resíduos compatíveis, transformando-os em matriz energética
para a indústria cimenteira.
148
Quadro 16 – Matriz da variável ambiental, indicadores e pesos
DIMENSÃO INDICADOR DESCRITOR PESO
Ambiental
Existência
de
aterro
sanitário
no
município
Sim 0
Em processo de
licenciamento
0
Não licenciado ou
lixão
1
Existência de
aterro para
resíduos industriais
(Classe I) no
município
Sim 0
Em processo de construção
0
Não possui
1
Armazenamento
dos resíduos
Classe I no interior
da indústria
De acordo com a CONAMA 313 0
Parcialmente de acordo com a
CONAMA 313
0,5
Fora da norma CONAMA 313 0
Total 2,5
Fonte: Adaptado pela autora de: Santiago e Dias (2012), Ramos (2013) e IPEA(2015). Alta=1; Média
= 0,5; Baixa=0 (BESEN, 2011). Dados pesquisa de campo.
Os resultados referentes ao aspecto ambiental contidos no quadro
16, demostram a gravidade da situação de risco originada diretamente do
manejo inadequadodos resíduosClasse I. Deve-se lembrar de que, consta no
PGRS das indústrias inventariadas (entregues à SEMACE) o tipo de resíduos
gerados; a quantidade; a forma de armazenamento e a sua disposição final.
Então é do conhecimento do órgão ambiental responsável, que essas
indústrias geram mais de 6 t/mês de resíduos classe I (Ver Tabela 19) e que
esses resíduos não vêm sendo gerenciados de acordo com as normas técnicas
e a legislação vigente.
149
Tabela 19 – Quantidade de resíduos Classe I por indústria
IND. D099 F044 F104 F105 K053 K193 K194 K195 K207 K209 K213 K214
Conama
358 TOTAL
A 0 0 0 1,871 9,935 5,895 5,16 56,265 0 0 0 0 0 79,126
B 3 0 0 0 4,89 0 0 0 0 0 0 0 0 7,89
C 0,58 0,007 0,313 0 0,733 0 0 0 0,58 14,49 0,58 0,013 0,002 17,298
D 0 0 0 0 6,08 0 0 0 0 0 6,3 0 0 12,38
E 0 0 0 0 6,282 0 0 0 0 0 0 0 0 6,282
F 3 0 0 0 0 5,496 0 0 0 0 0 0 0 8,496
G 1,311 0 10,307 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0,046 11,664
Total 7,891 0,007 10,62 1,871 27,92 11,391 5,16 56,265 0,58 14,49 6,88 0,013 0,048 143,136
Fonte:Elaborado pela autora a partir de dados da SEMACE (2013).
150
O descompromisso dos setores públicos e privados frente à questão dos
resíduos é gritante. Como explicar um município que tem seu PIB balizado,
sobretudo, no setor industrial não possuir um aterro industrial? E ainda, encontrar-se
com o único “aterro sanitário”, instalado em seu território, com a licença de operação
vencida33. Não foi por acaso que a variável ambiental apresentou o maior somatório
dentre os indicadores de vulnerabilidade avaliados.
Sabe-se que diversidade de condições de vulnerabilidade assumem
significados variados entre os sujeitos envolvidos. Por isso considerou-se
importante, conhecer a percepção que a população circunvizinha do DIF I tem em
relação aos resíduos que são gerados pelas indústrias instaladas próximas às suas
residências.
Primeiramente questionou-sese as pessoas tinham conhecimento do que
era um resíduo perigoso; 55% afirmaram saber o que era um resíduo perigoso e
todos utilizaram de exemplos para defini-los, sendo a toxicidade e a patogenicidade
desses resíduos (coisa tóxica, comida estragada, aqueles que causam doença, lixo
hospitalar) as características mais apontadas para identificá-los como perigosas. As
respostas dadas através de uma definição simplória em detrimento de uma definição
conceitual mais científica podem ser justificadas pelo grau de escolaridade dos
depoentes, pois do total (54,83%) que cursaram o ensino fundamental, 41% não
chegaram a concluí-lo.
Quanto ao desconhecimento do que seria um resíduo perigoso, 45%
responderam não saber ou responderam erroneamente. Vale lembrar que, a baixa
escolaridade acentua a condição de vulnerabilidade das pessoas que vivem em
situação de risco, uma vez que as mesmas tornam-se menos capazes de reivindicar
seus direitos e, por conseguinte melhorar às condições de suas vidas.
Do total de entrevistados que responderam saber o que era resíduo
perigoso 65% disseram ter conhecimento de que as indústrias próximas às
residências deles produzem resíduo perigoso e 35% desconhecem o fato. Dentre
aqueles que têm conhecimento sobre as indústrias gerarem resíduos perigosos,
45% não têm ideia para onde esses resíduos são destinados, enquanto 55%
indicaram diversos locais de destinação, entre eles, lançados na rede de esgoto;
33De 2013, ano de início desta pesquisa, até o primeiro trimestre de 2017, ano de finalização da pesquisa, o
Aterro Sanitário de Maracanaúpermanecia com sua licença de operação não renovada, segundo a SEMACE.
151
jogados no canal; lançados no ar; levados por carros apropriados e levados para o
aterro de Maracanaú, ou seja, todos, destinos inadequados.Contudo, os
entrevistados não demonstraram qualquer preocupação ou se sentiram ameaçados
com as possíveis consequências decorrentes desta disposição imprópria, como por
exemplo, a contaminação ambiental e/ou humana por substâncias carcinogênicas.
Correlacionando os dados secundários aos primários, decorrentes dos
questionários aplicados na pesquisa de campo, foi possível registrar o expressivo
nível de desinformação e imprecisão das respostas dos moradores, quanto ao
gerencimento dos resíduos oriundos das indústrias circunvizinhas.
Isso se deve, em grande parte, a não socialização dessas informações e
a parca mobilização comunitária (Ver Quadro 17), seja pela falta de eventos
socioeducativos ou de material informativo.Sabe-se que as indústrias inventariadas
têm essas informações sistematizadas, visto que enviam seus PGRS’s para
aSEMACE, porém a população não tem acesso aos mesmos, permanecendo no
estado de ignorância diante do risco ao qual está exposta.O não entrelaçamento do
fluxo dessas informações contribui significativamente para a condição de altíssima
vulnerabilidade que esse grupo social se encontra, “à ameaça propriamente dita,
soma-se a perda de soberania sobre a avaliação dos perigos, aos quais se está
irremediavelmente entregue.” (BECK, 2010, p.65)
O poder público, o setor empresarial e a coletividade são responsáveis
por garantir a implementação da PNRS, sendo assim, a transparência das ações
destinadas ao manejo dos resíduos perigososé fundamental, de tal forma a
possibilitar não apenas o acesso às informações, mas, sobretudo, a soberania das
comunidades menos favorecidas.
152
Quadro 17 – Matriz da variável conhecimento, indicadores e pesos
DIMENSÃO INDICADOR DESCRITOR PESO
Conhecimento
(educação
ambiental e
mobilização
social)
Informações
sobre a gestão
de resíduos
Classe I
sistematizadas
e
disponibilizadas
para a
população
As informações são sistematizadas e
divulgadas de forma proativa para a
população
0
As informações são sistematizadas,
porém não estão acessíveis à
população
0,5
As informações não são
sistematizadas
0
Material
informativo
sobre os
resíduos
sólidos
Construído com a comunidade local
0
Construído pela equipe técnica
0
Não tem 1
Realização
de eventos/
temática
ambiental
Frequentes
0
Esporádicos 0,5
Inexistentes
0
Total 2,0
Fonte: Adaptado pela autora de: Santiago e Dias (2012), Ramos (2013) e IPEA(2015). Alta=1; Média
= 0,5; Baixa=0 (BESEN, 2011). Dados pesquisa de campo.
No tocante ao material informativo, o ideal seria que fosse construído
com a comunidade local, no intuito de aumentar significativamente as possibilidades
de alcance dos objetivos propostos. No entanto, as respostas dos questionários e
entrevistas revelaram a inexistência de qualquer material informativo em relação aos
resíduos sólidos, sobretudo aos perigosos.
153
Os eventos ambientais, em geral, visamsensibilizar as populações sobre
a urgência da mudança de atitudes diante da problemática ambiental vigente. Os
conteúdos teóricos socializados estão direcionados para uma prática reflexiva e
transformadora da realidade, assim, contempla o caráter interdisciplinar,
interinstitucional e Inter setorial dos participantes. Nesse sentido, visando verificar os
aspectos relacionados à educação ambiental, mobilização social e vulnerabilidade,
os entrevistados foram questionados sobre a existência de campanhas/eventos
ambientais.
Do total, 74% afirmaram que nunca houve uma campanha educativa com
o tema lixo; 19% disseram que já ocorreu campanha com esse tema e 6% não
souberam informar.Dos que declararam que houve campanha educativa 67%
participaram da campanha e 33% não participaram;o que revela que há interesse da
população em adquirir informações sobre a gestão de resíduos, já que a maioria dos
que foram informados sobre o curso, participaram do evento.
Segundo os depoentes, essas campanhas foram patrocinadas pela
prefeitura municipal e/ou pela associação do bairro, cabe enfatizar que o setor
empresarial privado não foi citado por nenhum dos entrevistados. Isto éreflexodo
descompromisso empresarial, com ações educativas e de informação junto às
comunidades do entorno.
Enfim, no geral, o nível de desinformação e imprecisão das respostas dos
entrevistados, a inobservância da PNRS e das ferramentas normativas, por parte
dos gestores públicos e privados, demonstram a altíssima vulnerabilidade existente
na área de estudo, decorrente da exposição aos riscos oriundos dos resíduos
Classe I gerados nos processos produtivos das indústrias do DIF I.Entende-se que a
administração desses riscos é conjuntamente um assunto político, técnico,
socioeconômico e de educação ambiental, e que as soluções perpassam,
indubitavelmente, por umaredistribuição de renda mais justa.
154
7 CONCLUSÃO
Assim como os riscos, os resíduos sólidos tem origem natural (cinzas de
vulcão, restos de animais, etc) e sociais, logo sempre estiveram presentes na
paisagem do planeta Terra, muitas vezes, ajudando a elucidar fatos históricos de um
passado remoto. Os resíduosresultam de ações naturais e/ou sociais, configuram-
se, portanto,indubitavelmente, em objeto de estudo da geografia.
Sabe-se que no decorrer do tempo, a intervenção humana na natureza foi
espacialmente se expandindo e gerando cada vez mais resíduos, principalmente
com o advento da industrialização. Deste modo, as indústrias foram tornando-se um
vórtice gerador de resíduos de um alcance inimaginável. Entretanto, a presente
pesquisa se propôs analisar os riscos e as vulnerabilidades socioambientais
decorrentes dos resíduos sólidos Classe I, gerados no processo produtivo das
indústrias do Distrito Industrial I de Maracanaú-CE.
Inicialmente,constatou-se que o aporte teórico alusivo aos resíduos
industriais é escasso quando se fala em Brasil, e mais diminuto quando serefereao
estado do Ceará. Deste modo, pode-se afirmar que falar sobre os resíduos gerados
no intramuro fabril não é uma tarefa fácil, pois as informações são insuficientes e
translúcidas quando deveriam ser transparentes, sobretudo, por se tratar de uma
questão de risco.
A postura do poder público municipal e estadual com relação à situação
de vulnerabilidade socioambiental estabelecida é de ausência e omissão. Os
motivos da inércia do governo podem estar relacionados à falta de capacitação
técnica; à insuficiência quantitativa de fiscais; às dificuldades de aparelhamento
administrativo e, ainda, aos acordos políticos firmados com os empresários, poucos
comprometidos com a sustentabilidade socioambiental.
Haja vista que a construção de residências na circunvizinhança do Distrito
Industrial I ocorreu para solucionar o problema de proximidade de mão de obra,
apontada pelos proprietários, como um empecilho para a instalação de suas
indústrias. Mesmo sabendo que as áreas industriais são de risco, o governo
subsidiou, através de financiamentos do BNH e da COHAB, a construção dos
icônicos conjuntos habitacionais de Maracanaú.
Do ponto de vista legal, no que se refere à proximidade entre áreas
residenciais e industriais, apesar de constar em leis e normas que as áreas
155
industriais requeiram uma distância indispensávelao bem-estar e a segurança das
populações quanto aos resíduos sólidos, líquidos e gasosos, nenhuma delas
especifica, através de metragem, o distanciamentonecessário para garantir, pelo
menos minimamente, a segurança da população e a preservação do meio ambiente.
Através dos questionários constatou-se que a população do entorno, por
sua vez não tem noção do real nível de periculosidade dos resíduos industriais que a
cerca,confia na gestão dada pelos donos das indústrias aos resíduos, e no
governoque autoriza a instalação das mesmas. Cabe enfatizar que quando a
confiança decorre da falta de conhecimento quanto aos procedimentos que devem
ser concedidos ao gerenciamento integrado dos resíduos sólidos, o grupo social se
encontra vulnerável aos riscos derivados de qualquer falha no gerenciamento, que
venha ocorrer.
Os resultados da pesquisa mostraram ainda que a população domiciliada
no entorno do DIF I é preponderantemente de baixa renda e com pouca
escolaridade, confirmando a estreita relação existente entre condição
socioeconômica e a desigual distribuição de riscos no espaço geográfico.Diante das
restrições impostas pelo adensamento urbano, os menos favorecidos vão ocupando
locais onde a sobrevivência é possível, e morar próximo a áreas industriais, muitas
vezes é considerada uma dupla oportunidade, de moradia e trabalho, então acabam
convivendo, passivamente, com o risco em detrimento a um olhar mais crítico
perante a situação.
Para alterar essa passividade é preciso que informações referentes aos
resíduos sólidos industriais sejam divulgadas às pessoas, proporcionando-lhes a
oportunidade de se tornarem protagonistas dentro do espaço urbano. Isto significa a
possibilidade de mudança de comportamento frente à omissão e ao descaso do
poder público; representa uma compreensão mais aprofundada dos direitos e
deveres societários, baseada na defesa do interesse coletivo.
Com a aplicação da metodologia proposta foi possível identificar e
quantificar os resíduos industriais Classe I. Verificou-se então, que são geradas
143,136 t/mês de resíduos, que trazem em sua constituição substâncias altamente
tóxicas, como por exemplo, cromo hexavalente, cádmio, mercúrio, arsênio e
chumbo. A maneira como esses resíduos vêm sendo armazenados e destinados
põem em risco a conservação dos recursos ambientais (solo, água, ar, vegetação) e,
por conseguinte a qualidade de vida da população. Confirmando a hipótese central
156
de que os resíduos perigosos, gerados no processo produtivo industrial, expõem a
população residente na cercania do DIF Iàs situações de risco e vulnerabilidade
socioambiental.
Considera-se que a vulnerabilidade socioambiental promovida pela
gestão inadequada dos resíduos é potencializada pela falta de socialização de
informações a respeito dos mesmos. Pois o acesso a esses dados são
indispensáveis para definir ações de políticas públicas destinadas à superação das
desigualdades sociais.
A metodologia utilizada neste estudo demostrou que pode contribuir
significativamente para a localização espacial de áreas concentradoras dos
segmentos sociais mais vulneráveis, considerados alvos prioritários de políticas
públicas e intervenções do Estado.
157
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165
APÊNDICE A -Questionário dos Indicadores de Vulnerabilidade e Risco Social
QUESTIONÁRIO – INDICADORES DE VULNERABILIDADE E RISCO SOCIAL
Data______/_______/2016Pesquisador/a_______________________Nº Quest.___
Área________________Indústria_________________________________________
___
Coordenada:
____________________________________________________________
IDENTIFICAÇÃO PESSOAL ENTEVISTADO/A
Sexo:( ) Masculino ( ) Feminino
Idade: |___|___| anos
Estado civil: ( )Casado/a ( )Solteiro/a ( ) Divorciado/a ( )
Outros___________________
Escolaridade: ( ) Analfabeto/a ( )Fundamental I ( ) Fundamental II
( ) Ensino médio ( ) Superior ( ) Pós-graduação
1) Você mora em casa: ( )própria ( )alugada ( )cedida (
)Outros____________________
2) Há quanto tempo reside neste bairro? |___|___|
3) Por que escolheu morar neste
bairro?____________________________________________
4) Quantos cômodos (compartimentos) tem na casa? |___|___|
5) A casa tem água encanada? ( )SIM ( ) NÃO
6) A casa tem esgoto? ( )SIM ( ) NÃO
7) Somente se respondeu SIM na questão 06. Para onde vai o esgoto?
( ) Rede de esgoto ( ) Lançado a céu aberto
8) Na sua rua tem coleta de lixo? ( )SIM ( ) NÃO
8.1)Somente se respondeu SIM na questão 08. Quantos dias por semana o lixo é
coletado? |___|___|
8.2)Somente se respondeu NÃO na questão 08. Qual o destino?
( ) queimado ( )jogado na rua ( )incinerado (
)Outros:_________________________
9) Você utiliza material reciclado? ( )SIM ( ) NÃO
166
9.1) Somente se respondeu SIM na questão 09. Que
tipo______________________________
Onde conseguiu?
_______________________________________________________________
9.2)Somente se respondeu Não na questão 09. Conhece alguém que utiliza? (
)SIM ( ) NÃO
10) Existe alguma Unidade Básica de Saúde -UBS, no bairro? ( )SIM ( ) NÃO
Se sim,
qual?_______________________________________________________________
__
11) Quantas pessoas moram no domicílio? |___|___|
12) Quantas são homens? |___|___|
13) Quantas são mulheres? |___|___|
14) Qual a idade deles/as?
Idade – H Idade - M
|___|___|menos de 1 ano |___|___|menos de 1 ano
|___|___|anos de idade |___|___|anos de idade
|___|___| anos de idade |___|___|anos de idade
|___|___| anos de idade |___|___|anos de idade
15) Chefe da família (pessoa que mantém) – Sexo: Masculino ( ) Feminino ( )
16) O chefe da família trabalha onde? ( )Fora de casa ( ) Dentro de casa ( )
Desempregado
17) Média salarial mensal:
( )menos de 1 salário mínimo ( ) 1 salário mínimo ( ) 2 salários mínimos
( ) 3 salários mínimos ( )acima de 3 salários mínimos
18) Quem fica responsável pela casa quando o chefe da família está fora?
( )pai ( )mãe ( )irmão ( )avós (
)Outros____________________________________
19) Qual a idade da pessoa que fica responsável pela casa? |___|___| anos
20) Existem pessoas com algum tipo de limitação/deficiência física ou mental que
tenha dificuldade de andar? ( )NÃO ( )SIM.
Qual?______________________________________
21)Tem pessoas na família que mora na rua? ( )SIM ( ) NÃO
22) Tem pessoas na família que mora em abrigo? ( )SIM ( ) NÃO
167
23)Tem pessoas na família com dependência química? ( )SIM ( ) NÃO
24) Existem áreas de lazer no bairro? ( ) NÃO ( )SIM.
Qual?__________________________
Somente se respondeu SIM na questão 24.
24.2) As Crianças costumam brincar na
rua?________________________________________
24.3) A Comunidade tem acesso às áreas de lazer do distrito
industrial?_________________
APÊNDICE B – Questionário dos Indicadores de Vulnerabilidade e Riscos –
Resíduos Sólidos
168
INDICADORES DE VULNERABILIDADE E RISCOS – RESÍDUOS SÓLIDOS
1) Você sabe o que é um resíduos perigoso? ( )SIM ( ) NÃO
2) Somente se respondeu SIM na questão 01. O que você entende por resíduo
perigoso?
___________________________________________________________________
__________
3) Sabe dizer se as indústrias próximas a sua casa geram resíduos perigosos?
( )SIM ( ) NÃO
4) Somente se respondeu SIM na questão 03. Você sabe para onde vão esses
resíduos?
( )SIM ( ) NÃO
5) Somente se respondeu SIM na pergunta 04. Destinação dada aos resíduos
perigosos.
( ) Reciclados ( ) Queimados (Incinerados) ( ) Coprocessados
( ) Reutilizados ( ) Enviado para aterro sanitário.
Qual?___________________________
( )
Outros______________________________________________________________
______
6) Você já viu algum desses resíduos perigosos serem jogados em locais
inadequados (rua, terreno baldio, dentro de rio e/ou lagoa, etc.)? ( )SIM ( )
NÃO
7) Somente se respondeu SIM na pergunta 06. Onde?
( ) Rua ( ) Terreno baldio ( ) Rio ( )Lagoa ( )
Outros__________________________
169
8) Já houve no bairro alguma campanha educativa com o tema lixo?
( )SIM ( ) NÃO
9) Somente se respondeu SIM na questão 08. Quem foi que patrocinou a
campanha?
( )Prefeitura ( )Associação de bairro ( )Indústrias do bairro ( )Não sei
11)Somente se respondeu SIM na questão 08. Você participou?
( )SIM ( ) NÃO
12)Você acredita que as indústrias dão uma destinação correta para os resíduos
sólidos que elas geram? ( )Não ( )Sim. Por quê?
___________________________________________