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PAULO MAGNO DA MATTA O GARIMPO NA CHAPADA DIAMANTINA E SEUS IMPACTOS AMBIENTAIS: UMA VISÃO HISTÓRICA E SUAS PERSPECTIVAS FUTURAS Salvador 2006 UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA ESCOLA POLITÉCNICA MESTRADO EM ENGENHARIA AMBIENTAL URBANA

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PAULO MAGNO DA MATTA

O GARIMPO NA CHAPADA DIAMANTINA E SEUS IMPACTOS AMBIENTAIS:

UMA VISÃO HISTÓRICA E SUAS PERSPECTIVAS FUTURAS

Salvador 2006

UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA ESCOLA POLITÉCNICA

MESTRADO EM ENGENHARIA AMBIENTAL URBANA

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PAULO MAGNO DA MATTA

O GARIMPO NA CHAPADA DIAMANTINA E SEUS IMPACTOS AMBIENTAIS:

UMA VISÃO HISTÓRICA E SUAS PERSPECTIVAS FUTURAS

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação em Engenharia Ambiental Urbana da Escola Politécnica da Universidade Federal da Bahia, como requisito para obtenção de grau de Mestre.

Orientação: Prof. Dr. José Baptista de Oliveira Júnior Co-orientação: Prof. Dr. Teobaldo Rodrigues de Oliveira Júnior

Salvador 2006

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Ficha Catalográfica elaborada pela Biblioteca Bernadete Sinay Neves, Escola Politécnica da UFBA

Matta, Paulo Magno da M435g O garimpo na Chapada Diamantina e seus impactos ambientais: uma visão

histórica e suas perspectivas futuras / Paulo Magno da Matta – Salvador, 2006. 187 f. : il. Orientador: Prof. Dr. José Batista de Oliveira Junior. Co-orientador; Prof. Dr. Teobaldo Rodrigues de Oliveira Júnior. Dissertação (mestrado)–Universidade Federal da Bahia, Escola politécnica, 2006. 1. Impacto ambiental – Chapada Diamantina – Bahia. 2. Garimpo – Chapada Diamantina – Bahia. 1. Oliveira Júnior, José Batista. II. Oliveira Júnior, Teobaldo Rodrigues. III. Universidade federal da Bahia. Escola Politécnica.

III. Título.

CDD 20.ed. 333.728 142

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TERMO DE APROVAÇÃO

PAULO MAGNO DA MATTA

O GARIMPO NA CHAPADA DIAMANTINA E SEUS IMPACTOS AMBIENTAIS:

UMA VISÃO HISTÓRICA E SUAS PERSPECTIVAS FUTURAS

Dissertação aprovada como requisito para obtenção do grau de Mestre em Engenharia Ambiental Urbana da Escola Politécnica da Universidade Federal da Bahia – UFBA, pela

seguinte banca examinadora:

Prof. Dr. José Baptista de Oliveira Júnior – Orientador Universidade Federal da Bahia – UFBA Prof. Dr. Teobaldo Rodrigues de Oliveira Júnior – Co-orientador Unidade Baiana de Ensino Pesquisa e Extensão – UNIBAHIA Prof.a Dra; Cybele Celestino Santiago Universidade Federal da Bahia – UFBA Prof. Dr. Paulo Gustavo Cavalcante Lins Universidade Federal da Bahia – UFBA Prof.a Dra. Marjorie Cseko Nolasco Universidade Estadual de Feira de Santana – UEFS

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No ar, cheiros e sensações de coisas e seres que já

foram. E há, ainda, o terno encanto de uma infinda e

indefinida saudade, impregnada em cada canto, em

cada cor.

Maurício Simonetti

Dedico esta obra a meu pai, Paulo Joaquim

Bernardes da Matta (in memorian) e a meu irmão

Caçula, Lucas Daniel da Matta (in memorian).

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RESUMO

Esta dissertação procura fazer um diagnóstico dos impactos negativos sobre o ambiente natural causados pelos garimpos de diamante na Chapada Diamantina, bem como discutir os impactos sobre o ambiente antrópico provocados pelo fechamento da atividade mineira de diamante na região mencionada. Para isso, utilizaram-se dados e informações registradas durante várias visitas à Chapada Diamantina em um intervalo de oito anos (entre 1997 e 2004). O empirismo da pesquisa foi obtido também através de informações de relatórios oficiais do DNPM, alguns elaborados nas épocas (anos 80 do século XX) em que a mineração por dragas estava no seu auge. Oficialmente o garimpo começou em 1844, no lugar conhecido hoje como cidade de Mucugê, onde aconteceu o verdadeiro rush do diamante na Chapada. A partir de lá a região da Chapada Diamantina começou a ser delimitada, de acordo com as migrações dos garimpeiros em busca da gema cobiçada. Até meados dos anos 1970, após diversos momentos de crises e apogeus, imperava somente o garimpo rudimentar, conhecido como garimpo de serra ou artesanal, onde o cascalho diamantífero, derivado da erosão dos conglomerados da formação Tombador, era procurado entre sedimentos eluvionares e coluvionares existentes nos flancos dos relevos. Com a exaustão das jazidas das serras, o minerador lançou mão de equipamentos pesados para explotar os sedimentos aluvionares das bacias hidrográficas. Foram as chegadas das dragas que caracterizaram um maior volume de produção e, conseqüentemente, maior intensidade nos impactos sobre o meio natural. Os baixos teores de diamantes existentes nas aluviões da Chapada, principalmente na região deste estudo (bacia do rio São José), favoreciam sobremaneira o impacto ambiental negativo, haja vista a necessidade de removerem grandes quantidades de sedimentos para se extrair um quilate (0,2 g) de diamante. Entretanto, o alto valor do diamante (250 a 300 dólares/quilate) da Chapada estimulava a mineração, que era praticada de forma ilegal, clandestinamente. A condição clandestina da mineração causada também pela exagerada regulamentação constante nas entrelinhas da legislação mineral e ambiental será explicada em detalhes no texto. A ilegalidade na mineração teria agravado a degradação ambiental e chamado a atenção das instituições governamentais e não governamentais para adoção de medidas drásticas contra o garimpo, executadas entre 1996 e 1998. Após a aplicação de um formulário perante as populações de Andaraí e Lençóis, elaborado para se apreender a visão da população chapadense sobre a questão garimpeira e sua relação com o meio ambiente e o turismo, pôde-se compreender a impressão e o desejo de quem vivenciou o problema após as intervenções adotadas, sem o devido planejamento, pelos governos e seus órgãos fiscais. Os resultados desta pesquisa sugerem um quadro específico de queda na qualidade ambiental urbana das cidades de Lençóis e Andaraí, podendo estender-se às outras cidades das Lavras diamantinas, a saber: Palmeiras e Mucugê.

Palavras-chave: garimpo; garimpeiro; impacto ambiental; Chapada Diamantina; diamante;

sedimentos; aluvião; coluvião; fechamento.

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RÉSUMÉ

Cette dissertation a le but essentiel de diagnostiquer les impacts sur l’environnement naturel causés par les exploitations artisanales de diamant dans la Chapada Diamantina ainsi que ceux provoqués par la fermeture des exploitations sur l’environnement humain. Pour cela on a utilisé les donnés et informations registrées pendant divers visites à Chapada Diamantina par l’intervalle de huit ans (entre 1997 et 2004). Le coté empirique de cette recherche a été obtenu aussi par les informations registrées dans les documents officiels du DNPM écrit dans les époques (années 1980) quand les travaux miniers ont été très forts. Officiellement le garimpo à diamant a commencé le 1844, dans la place connue aujourd’hui comme la ville de Mucugê, où t’il est arrivé un véritable rush de milliers de chercheurs de diamant dans laquelle région minière. A partir de Mucugê la Chapada Diamantina a commencé à être formée d’après les migrations des garimpeiros en cherchant les précieuses pierres. Jusque les années soixante après divers moments de crises et apogée, seulement l’exploitation artisanale existaient dans la région, où les graviers a diamant issu des érosions de la Formation Tombador étaient cherché parmi les sédiments éluviaux et colluviales des flancs des reliefs. Avec l’épuisement des réserves des gisements du relief, les chercheurs ont utilisé, ver les années 1970, des équipements lourds pour exploiter les sédiments alluviaux dans les bassins hydrographiques de la Chapada. Cela a été le début des exploitations mécanisées avec dragues. Cette méthode a été caractérisée pour le remplacement de grande quantité de stérile et, par conséquent, par le fort impact sur le milieu naturel. Les gisements à basses teneurs existantes dans les alluvions de la Chapada, principalement dans le secteur de cette recherche (rivière São José), ont favorisé beaucoup les impacts négatifs sur les milieux, puis que pour extraire un caract de diamant (petit grain de 0,2 g) il faut retirer une grande quantité de sédiment alluvionnaire. Mais les bonnes valeurs (U$ 250,00 a U$ 300,00 par carat) des diamants de la Chapada ont encouragé l’exploitation minière qui était pratiquée de façon illégale. Toutefois, la condition clandestine de s’extraire le diamant peut être expliquer aussi par l’exagéré réglementation écrit par législation minière et l’environnementale. La condition clandestine d’exploiter diamant a augmenté les impacts sur l’environnement, ce qui fait les institutions gouvernementales et non gouvernementales fermer de façon brutale les garimpos à diamants entre les années 1996 et 1998. Après l’application d’un questionnaire auprès les populations des villes de Lençóis et Andaraí, fait-il pour comprendre les sentiments de ses peuples, sur les questions des exploitations de diamant par rapport au milieu naturel et le tourisme, après les actions d’intervention des organismes officiels. Les résultats de cette recherche montrent un cadre typique de chute dans la qualité de l’environnent urbain des villes de Lençóis et Andaraí, en pouvant étendre jusqu’aux autres villes des Lavras Diamintinas, connurent comment Palmeiras et Mucugê.

Mots–clés: garimpo ; Chapada Diamantina; impact; environnement; sédiment; éluviaux; colluviales; fermeture.

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AGRADECIMENTOS

Esta tarefa parece fácil, mas na verdade é difícil pela quantidade de colaboradores declarados e ocultos que de alguma maneira contribuíram para a conclusão deste trabalho. De qualquer forma tentaremos fazer justiça recordando de todos aqueles que ajudaram nesta empreitada, com os sinceros agradecimentos pelas orientações, contribuições e apoios importantes. Em primeiro lugar, devemos agradecer à Universidade Federal da Bahia (UFBA), Escola Politécnica, pelo curso que abriu todos os horizontes em direção a este desafio. Aos colegas da Politécnica que ajudaram com conselhos, orientações, fornecimento de materiais e apoio moral. Aos professores da Escola, que me passaram a preciosa experiência e orientação importante para esta pesquisa. Aos professores Luis Roberto Santos de Moraes (UFBA) e Patrícia Borja, que me deram o primeiro e essencial empurrão para iniciar a pesquisa, com seus apoios, experiências e valiosas orientações. Ao professor José Baptista de Oliveira Junior (UFBA), orientador desta pesquisa, que aceitou e acreditou neste trabalho, passando-me o ânimo e energia essenciais para enfrentar este desafio, sem os quais, talvez, o avanço da obra não tivesse sido o mesmo. Ao professor Paulo Lins Gustavo (UFBA), pela ajuda e também orientações muito importantes que complementaram a minha compreensão sobre a pesquisa realizada, fortalecendo a teoria de que é normal, na prática, um pesquisador possuir vários orientadores. Ao professor e colega Teobaldo Rodrigues de Oliveira Júnior, que ingressou no final desse desafio, como co-orientador, para definir a pesquisa com sua objetividade, experiência, conhecimento do assunto e apoio crucial para a conclusão do trabalho. Ao engenheiro e professor Francisco Brito que, com seu profundo conhecimento histórico e conjuntural da Chapada Diamantina, contribuiu com sua notável obra científica e estímulo para a conclusão desta tarefa. À professora Marjorie Cseko Nolasco (UEFS), por ter contribuído com as informações imprescindíveis de sua brilhante tese de doutorado, que envolveu, em detalhes, as questões inerentes ao garimpo da Chapada Diamantina. Ao Professor, conselheiro e sempre orientador Gérrard Verraes, idealizador desta pesquisa, francês amante do Brasil e da Bahia e grande incentivador internacional das pesquisas sobre mineração e meio ambiente. Ao professor (UFBA) e também conselheiro Irton Leão, pela sua dedicação e preocupação em contribuir com sua experiência e conhecimento indiscutíveis.

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A todos os colegas de trabalho que compreenderam o meu esforço em busca do conhecimento e me auxiliaram com apoio moral e material. Ao colega do DNPM geólogo Pedro Ricardo Silva Moreira que me ajudou com sua marcante obra, elaborada com o geólogo da CPRM, Pedro Couto, e suas diversas bibliografias disponibilizadas sobre o tema do garimpo da Chapada Diamantina. Ao também colega e geólogo, Arlindo Simões dos Santos Filho, pelo seu testemunho raro de momentos importantes registrados profissionalmente, junto ao garimpo dos anos oitenta na Chapada. Ao colega Edinaldo Luis Pereira dos Santos, que dividiu comigo a tarefa da entrevista nas ruas e vielas das cidades de Lençóis e Andaraí, representando, então, um dos pilares da conclusão deste trabalho. Ao companheiro e colega de curso geólogo Wagner Gheler, pelas suas contribuições importantes como grande conhecedor dos assuntos sobre diamante. Ao próprio Departamento Nacional de Produção Mineral – DNPM, que me proporcionou a oportunidade de trabalhar no tema da pesquisa, ajudando-me diretamente com a literatura disponível em sua biblioteca, e também indiretamente, ao permitir executá-la com a dedicação necessária para a sua conclusão, sem a qual seria muito difícil a finalização desta pesquisa. Ao Serviço Geológico do Brasil – CPRM/BA, pelo seu subsídio de caráter científico com as obras de sua rica biblioteca. A todos os garimpeiros da Chapada que ajudaram, em especial, Sr. Cícero, Sr. Anísio, ao ex-garimpeiro de draga, Sr. Roberto. Ao eterno defensor e pesquisador da Chapada, Roy Funch pelas suas contribuições, bem como a todos aqueles da Chapada Diamantina que me auxiliaram, a saber: IBAMA de Palmeiras, ao CRA e Corpo de Bombeiros de Lençóis, ao GAP – Grupo Ambientalista de Palmeiras, aos governos municipais de Palmeiras, Lençóis e Andaraí e à população destas duas últimas cidades, pela paciência na cooperação durante a aplicação do formulário de perguntas específicas. À minha mãe, Gilda Moreira da Matta, pelo simples fato de tê-la como mãe e pelo seu eterno apoio. E finalmente agradeço ao destino, que me colocou ao lado de uma maravilhosa família, destacando a minha esposa e sempre companheira, Ângela Menezes da Matta e filhos, Filipe e Jaqueline Menezes da Matta, que se sacrificaram e se privaram, com muita paciência, de vários momentos bons e de lazer, nos fins de semana e feriados, para se solidarizarem com o meu desafio, incentivando-me a seguir avante em busca do triunfo. Portanto, à minha família, o meu mais profundo agradecimento pelo apoio imprescindível e pelo carinho dignos de suas almas.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO 16

1.1 OBJETIVO 18

1.1.1 Objetivos específicos 18

1.2 PROBLEMA 18

1.3 JUSTIFICATIVA 19

1.4 HIPÓTESES

19

2 REFERENCIAL TEÓRICO CONCEITUAL 20

2.1 MEIO AMBIENTE E MINERAÇÃO 20

2.1.1 Indústria Mineral 23

2.2 ENTENDIMENTO DE QUALIDADE AMBIENTAL URBANA 39

2.3 LEGISLAÇÃO MINERAL E AMBIENTAL 43

2.3.1 Constituição Federal 43

2.3.2 Código de Mineração 44

2.3.3 Regimes de Autorização e Concessão 46

2.3.4 Regime de Permissão de Lavra Garimpeira 48

2.3.5 Dificuldades 50

2.3.6 Licenciamento Ambiental 54

3 CONSIDERAÇÕES METODOLÓGICAS 62

4 CARACTERÍSTICAS FISIOGRÁFICAS E GEOLÓGICAS 68

4.1 LOCALIZAÇÃO E ACESSO 68

4.2 CARACTERÍSTICAS GEOMORFOLÓGICAS 70

4.3 HIDROGRAFIA 72

4.4 VEGETAÇÃO 73

4.5 CLIMA 74

4.6 GEOLOGIA DESCRIÇÃO DOS DEPÓSITOS DIAMANTíFEROS 74

4.6.1 Descrição dos depósitos diamantíferos recentes 82

2.6.2 Descrição do perfil litológico das aluviões 82

4.7 RESERVAS DE DIAMANTES NO SETOR DE ESTUDO 85

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4.7.1 Dados sobre as dimensões das aluviões

87

5 HISTÓRIA DO GARIMPO E DESCOBERTAS DE DIAMANTES 91

5.1 A CHEGADA DAS DRAGAS

98

6 MÉTODOS DE EXPLOTAÇÃO DE DIAMANTES 106

6.1 GARIMPOS DE DIAMANTE DA BAHIA 110

6.1.1 Métodos de explotação Artesanal 111

6.1.2 Método mecanizado clandestino 118

6.1.3 Método mecanizado como atividade legal

125

7 IMPACTOS PROVOCADOS PELO GARIMPO NA CHAPADA 129

7.1 PRINCIPAIS IMPACTOS CAUSADOS 131

7.1.1 Impacto Sobre o Meio Natural 131

7.1.2 Impacto Cultural 148

7.1.3 Impacto Social 150

7.2 ALTERNATIVAS DO GOVERNO E OPINIÕES DA POPULAÇÃO

155

8 CONCLUSÕES 165

9 RECOMENDAÇÕES E ALTERNATIVAS DE REDUÇÃO DE

IMPACTOS

169

9.1 O GARIMPO COMO ATIVIDADE VOLTADA PARA O TURISMO 169

9.2 ALTERNATIVAS PARA O GARIMPO MANUAL COMO ATIVIDADE MINEIRA

173

9.3 EXPLOTAÇÃO POR DRAGAS 174

9.3.1 Técnicas de Lavra Sustentável

174

REFERÊNCIAS 179

TABELAS 186

ANEXOS 187

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FIGURAS

Figura 1: Fluxograma dos regimes de autorização/concessão

48

Figura 2: Fluxograma da Permissão de Lavra Garimpeira

50

Figura 3a: Fluxograma completo dos regimes de autorização/concessão

56

Figura 3b: Fluxograma completo da Permissão de Lavra Garimpeira

57

Figura 4: Fluxograma de Licenciamento ambiental

58

Figura 5: Mapa de caminhamento

65

Figura 6: Localização da área pesquisada

69

Figura 7: Vias de acesso à área de estudo

70

Figura 8: Falésias

71

Figura 9 : Conglomerado da Formação Tombador

77

Figura 10: Formação Caboclo

78

Figura 11: Formação Bebedouro

79

Figura 12: Mapa geológico

80

Figura 13: Coluna estratigráfica da área

81

Figura 14: Perfil do depósito aluvionar

82

Figura 15: Diamantes da Chapada

84

Figura 16: Mapa topográfico de Mucugê

93

Figura 17: Rio Mucugê

94

Figura 18: Um dia de feira de diamantes em Lençóis

95

Figura 19: Garimpo irregular com draga

100

Figura 20: Abordagem de policiais

101

Figura 21: Equipamentos apreendidos

102

Figura 22: Apreensão de trator 102

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Figura 23: Policial conduzindo garimpeiro

103

Figura 24: Policiais da COPPA detendo garimpeiros

103

Figura 25: Vestígios de acampamento garimpeiro

105

Figura 26: Equipamentos abandonados

105

Figura 27: Depósitos mineralizados de serra (grupiara e curuçá)

113

Figura 28: Garimpo de fratura e de gaveta

114

Figura 29: Garimpo sob rocha

115

Figura 30: Canal de desvio das águas

116

Figura 31: Canal de garimpo de barranco e despejo de estéril

117

Figura 32: Canal de despejo de estéril (atual)

117

Figura 33: Separador de diamantes

118

Figura 34: Garimpo de draga – cava

119

Figura 35: Flutuante com draga completa

120

Figura 36: Escoramento de taludes

120

Figura 37: Desmonte hidráulico do cascalho

121

Figura 38: Sucção do cascalho

121

Figura 39: Caixa de fervura ou sluice

122

Figura 40: Caixa de fervura (outro ângulo)

123

Figura 41: Garimpeiro catando pedras na calha

123

Figura 42: Esquema de produção por dragas

124

Figura 43: Esquema de produção regular por dragas

126

Figura 44: Motores utilizados para lavra experimental

127

Figura 45: Jigs abandonados

128

Figura 46: Cascalho como rejeito do garimpo artesanal

134

Figura 47: Desenho dos aqüíferos e nascentes derivadas das fraturas 136

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Figura 48: Alteração da topografia do terreno

141

Figura 49: Lago artificial

142

Figura 50: Assoreamento dos rios

143

Figura 51: Poluição dos rios com óleo combustível

144

Figura 52: Abandono de sucatas

145

Figura 53: Perda de vegetação 146

Figura 54 : Manifestação de garimpeiros

162

Figura 55 : Ruínas da vila de Rabudo

172

Figura 56: Antiga habitação de garimpeiros

172

Figura 57: Sistema de explotação sustentável

176

Figura 58: Ilustração de bermas com gradientes decrescentes

177

Figura 59: Ilustração de um sítio recuperado

178

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SIGLAS

ABNT – Associação Brasileira de Normas Técnicas

ACV – Análise do Ciclo de Vida

ART – Anotação de Responsabilidade Técnica

BNDES – Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social

CBPM – Companhia Baiana de Pesquisa Mineral

CEPRAM – Conselho Estadual do Meio Ambiente da Bahia

CIGB – ‘‘Comission Internationale de Grands Barrages’’

CGVAM – Coordenação Geral de Vigilância Ambiental em Saúde

CONAMA – Conselho Nacional do Meio Ambiente

CONDER – CIA de Desenvolvimento da Região Metropolitana de Salvador

COPPA – CIA de Polícia de Proteção Ambiental

CPRM – Serviço Geológico do Brasil (antiga Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais)

CRA – Centro de Recursos Ambientais da Bahia

CTGA – Comissão Técnica de Garantia Ambiental

DNPM – Departamento Nacional de Produção Mineral

DOU – Diário Oficial de União

DRT – Delegacia Regional do Trabalho

EIA – Estudo de Impacto Ambiental

GPS – “Global Position System”

IBAMA – Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis

IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

IPHAN – Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional

LA – Licença de Alteração

LI – Licença de Implantação

LL – Licença de Localização

LO – Licença de Operação

LOA – licença de Operação da Alteração

LS – Licença Simplificada

ONG – Organização Não Governamental

PARNA – Parque Nacional

PAE – Plano de Aproveitamento Econômico

PDM – Plano Diretor de Mineração

PLG – Permissão de Lavra Garimpeira

PNCD – Parque Nacional da Chapada Diamantina

PNMA – Política Nacional do Meio Ambiente

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RCE – Roteiro de Caracterização do Empreendimento

RIMA – Relatório de Impacto Ambiental

RMS – Região Metropolitana de Salvador

RMSP – Região Metropolitana de São Paulo

SUM – Sociedade União Mineira

SCPK – Sistema de Certificação do Processo de Kimberley

SEMA – Secretária Especial do Meio Ambiente

TAC – Termo de Ajustamento de Conduta

TR – Termo de Referência

UFBA – Universidade Federal da Bahia

UNIFACS – Universidade de Salvador

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16

1 - Introdução

A Chapada Diamantina apresenta um ecossistema singular, expondo notáveis paisagens,

esculpidas de acordo com as leis naturais da geologia, onde se destacam relevos montanhosos

tipo platôs, além de falésias, grutas, rios subterrâneos de águas límpidas que fluem para todos

os cantos, gerando inúmeras quedas d’água, em meio às matas virgens. Tudo isso,

testemunhando a vocação turística da região.

Para ratificar essa vocação, o clima ameno de altitude e a predominância de solos rasos

levaram à colonização dos campos altos por uma vegetação de beleza inigualável, altamente

adaptada e específica, composta por orquídeas, sempre-vivas e bromélias, de caráter ímpar na

Bahia e raro no Brasil.

Todavia, as ações antrópicas degradantes têm ameaçado o cenário especial acima descrito,

com agressões de toda sorte, a saber: garimpos clandestinos; desmatamentos para comércio

ilegal de madeira; técnicas de agricultura inadequadas; caça de animais silvestres; saque de

fósseis; turismo sem planejamento e, pesca predatória.

Porém, foi a exuberante presença do diamante na Chapada que estimulou a ação antrópica

mais importante da região: o garimpo – responsável pela fundação das cidades, pela formação

social e cultural da sua gente e pela delimitação da própria região da Chapada Diamantina.

As ações degradantes supracitadas estimularam o sentimento preservador da população local e

de grupos diversos envolvidos de alguma forma com a Chapada, para culminar com a criação

do Parque Nacional da Chapada Diamantina, em 1985, através do Decreto Federal N°

91.655/85.

Com o crescimento do turismo e da consciência ambiental na região de estudo, as instituições

governamentais interditaram o garimpo de forma brusca a partir de 1996, despontando com

ações mais violentas em 1997, sob a justificativa de sua incompatibilidade com a nova ordem

econômica e ambiental. Entretanto, essa intervenção não contemplou as questões relativas à

recuperação do ambiente natural degradado, nem previram as conseqüências sociais e

culturais negativas ocorridas à população local, após o fim do garimpo.

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17

Esse histórico estimulou o início de uma pesquisa mais detalhada, colocando as variáveis

sociais e culturais como parâmetros essenciais no entendimento do problema ocorrido.

A dissertação resultante dessa pesquisa discorrerá, de início, no capítulo 2, sobre o estado da

arte, através de conceitos e teorias, promovendo-se uma passagem genérica pelo começo da

consciência ambiental adquirida no mundo até os níveis de conscientização alcançados nos

dias atuais. Alguns conceitos e opiniões sobre a mineração e o meio ambiente serão

comentados com maior ênfase.

Nesse mesmo capítulo será discorrido o entendimento sobre qualidade ambiental urbana de

forma resumida e crítica.

Ainda no capítulo 2 (item 2.3) se procurará esclarecer de maneira sucinta a tramitação

processual necessária para se obter uma permissão garimpeira ou uma concessão para lavrar

diamantes no território brasileiro, efetuando uma rápida passagem pela legislação minerária e

ambiental, avaliadas no texto segundo uma visão crítica.

No capítulo 3, serão descritos os procedimentos metodológicos adotados e os instrumentos

utilizados na realização da pesquisa.

O capítulo 4 abordará resumidamente o desenvolvimento da pesquisa, dissertando sobre os

principais aspectos geográficos e geológicos da Chapada Diamantina, que atribuem um

caráter especial à região de estudo. Analisa a forma de ocorrência das jazidas e os seus teores

de diamantes, adquirindo caráter empírico através de dados de pesquisas registrados

oficialmente em 1983 e 1984, no setor do rio São José.

Já o capítulo 5 discorrerá sobre a história da Chapada Diamantina e a sua relação com o

garimpo de diamante, importantes para elucidar algumas hipóteses estabelecidas nesta

pesquisa.

Depois, o capítulo 6 procurará descrever os métodos mais notórios dos garimpos manual e

mecanizado, bem como seus respectivos impactos, com base na literatura específica, nas

experiências adquiridas, nos trabalhos de campo, entrevistas e observações diretas do autor.

Com base no capítulo 6, o capítulo 7 detalhará o diagnóstico dos impactos ambientais

percebidos durante o desenvolvimento da pesquisa.

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O capítulo 8 apresentará as conclusões finais e o 9, algumas sugestões para atenuar os

impactos diretos e indiretos provocados pelo garimpo da Chapada.

Logo após, serão discriminadas as diversas obras bibliográficas que auxiliaram a elaboração

do texto final.

1.1 Objetivo geral

Como objetivo geral, esta pesquisa apresentará um diagnóstico dos impactos diretos e

indiretos provocados pelo garimpo de diamante sobre os ambientes natural e antrópico da

Chapada Diamantina, em particular, das Lavras Diamantinas (municípios de Lençóis,

Andaraí/ Igatu, Mucugê e Palmeiras).

Considera-se, aqui, que ambiente antrópico abranja os aspectos sociais, econômicos e

culturais inerentes à comunidade da Chapada Diamantina.

1.1.1 Objetivos específicos

Já os objetivos específicos podem ser divididos em três:

- diagnóstico dos impactos causados pelos garimpos manual e mecanizado (por dragas) sobre

o meio natural;

- diagnóstico do impacto cultural gerado pela interdição do garimpo de diamante sobre as

comunidades das Lavras Diamantinas;

- avaliação qualitativa dos impactos sociais, provocados pelo fechamento do garimpo, nas

cidades das Lavras Diamantinas.

1.2 Problema

A pesquisa realizada procurou descobrir a real influência que os garimpos de diamante e a sua

interdição exerceram sobre o ambiente natural e humano, nas cidades das Lavras

Diamantinas.

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1.3 Justificativa

Pode-se justificar a pesquisa através das seguidas denúncias protocolizadas nos Órgãos

competentes (DNPM, CRA, IBAMA), por associações comunitárias e por outros órgãos

(federais, estaduais, municipais e Ministério Público), contra as ações degradantes provocadas

pela atividade mineral de diamante na região da Chapada Diamantina.

Por outro lado, as diversas solicitações oficializadas no DNPM, encaminhadas por órgãos

federais, por algumas administrações locais e entidades de classe dos garimpeiros, até os dias

atuais (ver anexos 10, 11, 13, 14, 16, e 17), contemplando uma solução harmônica, menos

radical e mais social para a comunidade da Chapada Diamantina, têm proposto a realização de

estudos direcionados, visando um dimensionamento mais detalhado dos reflexos negativos

que a atividade extrativista mineral tem promovido na região, bem como, a realização de

avaliações mais específicas, voltadas para a qualidade de vida das populações dos municípios

afetados pela interdição da atividade garimpeira.

1.4 Hipóteses

Durante a pesquisa perseguiram-se as seguintes hipóteses:

- a mineração executada por dragas apresentou maior intensidade de degradação ambiental

que os métodos artesanais de garimpo de diamante;

- a interdição brusca e sem planejamento do garimpo provocou impactos sócio-econômicos e

culturais negativos na região da Chapada Diamantina.

- a qualidade do ambiente urbano das cidades das Lavras Diamantinas caiu após a interdição

do garimpo de diamante.

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2 – Referencial Teórico-Conceitual

2.1 – Meio Ambiente e Mineração

No início dos anos sessenta (séc. XX), quando foram reveladas as primeiras fotos do planeta

Terra, através do projeto espacial soviético Vostok, atinou-se, enfim, que a Terra era um lugar

limitado, um ambiente finito, onde todos os seus habitantes sofreriam com a sua devastação

gradativa. Então, o choque da revelação das primeiras fotos do planeta azul, fez o homem

despertar e dar início à aceleração da conscientização ambientalista mundial.

As degradações ambientais crescentes, ocasionadas pelos processos de desenvolvimento

conduzidos pelo homem, incitaram a adoção das primeiras reações contra as posturas

unidirecionais da produção desenfreada que alterava negativamente o meio: produzir é sempre

importante, mas controlando os impactos e recuperando ambiente.

Assim começava a nova visão do desenvolvimento econômico, evidenciada nos

acontecimentos internacionais como a Conferência de Estocolmo, em 1972, ou nacionais,

com a criação da Secretaria Especial do Meio Ambiente-SEMA, ainda nos anos setenta

(30/10/1973).

Já no Brasil, essa nova ordem econômica-ambiental ganhara mais força nos anos oitenta do

século XX, quando se promulgou a Lei 6.938/1981, que criou a Política Nacional do Meio

Ambiente – PNMA – e a Resolução do CONAMA n.° 001/86, que obrigava a realização de

Estudo de Impacto Ambiental - EIA para certas atividades produtivas.

Ainda na década de oitenta, Andrade, Marinho & Kiperstok (2001), lembram que alguns

agentes econômicos como o Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social-

BNDES – passariam a analisar as implicações ambientais dos projetos submetidos à sua

carteira de financiamento, exigindo que fossem enquadrados de acordo com os instrumentos

de licenciamento ambiental. As Organizações Não-Governamentais (ONGs), atuando em

diversas ações em defesa do meio, exerceriam também um importante papel, influenciando

tanto nas ações dos governos como nas estratégias ambientais das empresas.

Nos anos noventa (século XX), mais precisamente no 20° aniversário da Conferência de

Estocolmo, no esforço para conciliar as interações entre o desenvolvimento humano e o meio

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ambiente, realizou-se a Conferência das Nações Unidas, em junho de 1992 denominada de

Rio-92. Esta teria continuidade já no século XXI, com a Cúpula Mundial sobre o

Desenvolvimento Sustentável, conhecida como Rio+10. Esta Cúpula Mundial dedicou-se a

analisar, em setembro de 2002, em Joanesburgo, África do Sul, o avanço sócio-econômico-

ambiental que teria acontecido desde 1992 com a Rio-92, destacando as mudanças positivas

ocorridas na década e os obstáculos contínuos para a conquista de um mundo mais

sustentável.

Neste mesmo século, em dezembro de 2001, acontece também a Convenção das Nações

Unidas sobre as alterações climáticas, denominada de Protocolo de Kioto, no Japão. O

objetivo dessa convenção foi estabelecer o controle e redução, por parte dos países

industrializados, até o período entre os anos 2008 e 2012, das emissões de gases que causam o

efeito estufa, para aproximadamente 5% abaixo dos níveis registrados em 1990.

Retornando à Conferência das Nações Unidas que aconteceu no Rio de Janeiro, em 1992,

novos rumos para a gestão ambiental foram apresentados, quando se discutiu sobre o

engajamento do setor produtivo nas soluções para o meio ambiente. Neste caso, a questão da

redução dos custos de produção passaria a ser avaliada nos processos de controle ambiental.

Assim, surgiram os conceitos de prevenção da poluição e produção limpa, onde a redução de

custos de produção, a otimização do uso dos recursos naturais, a minimização da geração de

resíduos, marketing de produtos e processos mais limpos, se tornariam a tônica do momento,

e o enfoque da gestão ambiental passaria para “além” do controle da poluição (ANDRADE,

MARINHO & KIPERSTOK, 2001).

Capitalismo Natural

Nesse período, discute-se também um novo modo de se fazer negócios, conferindo-se o

devido valor à natureza e ao homem. A idéia do Capitalismo Natural, defendida por Lovins

(2000) em entrevista à revista EXAME, aplica os princípios capitalistas, não apenas ao capital

financeiro e manufatureiro, mas também às duas outras formas muito importantes de capital: à

natureza e às pessoas; sem as quais não há vida nem, portanto, atividade econômica.

Para Lovins (2000), o capitalismo industrial é uma “aberração” temporária, porque desafia a

sua própria lógica ao destruir a sua principal fonte de capital: o capital natural. Essa fonte

fornece “serviços essenciais de ecossistemas”, como ciclos de alimentação, estabilidade

climática, reservas de água, composição e regulação da atmosfera, produtividade biológica,

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dentre outros. O planeta Terra fornece todos esses serviços diariamente a mais de 6 bilhões de

pessoas e gratuitamente. A matéria da revista supracitada menciona que tais serviços haviam

sido avaliados há pouco tempo pelo Jornal Nature em torno de, pelo menos, 33 trilhões de

dólares por ano.

Lovins (op cit) acredita também, que a razão pela qual uma parte considerável dos ativos

naturais do planeta continua a ser desperdiçada está na falta de contabilização desses recursos

nos balanços das empresas e dos governos. Lembra que as indústrias olham apenas para os

recursos exploráveis dos ecossistemas, esquecendo os serviços que a natureza fornece de

graça à humanidade.

Análise do Ciclo de Vida – Produção Limpa

Ainda nos anos noventa do século XX, até os dias de hoje, novas técnicas de avaliação de

impacto ambiental foram e são utilizadas com destaque, como a Análise do Ciclo de Vida –

ACV – que agora investiga os aspectos ambientais e os impactos potenciais associados aos

produtos, abrangendo as etapas existentes desde a retirada da natureza das matérias-primas

elementares (berço), à disposição do produto final (túmulo).

Cheheb (1998) considera a ACV como uma ferramenta técnica, de caráter gerencial,

importante para avaliações mais consistentes nas decisões de processos que envolvem

inclusive transferências de contaminação, visando procedimentos mais interessantes sob o

ponto de vista ecológico.

Para Cheheb (1998), todo produto, não importa de que material seja feito – madeira, vidro,

plástico, metal ou qualquer outro elemento – provoca um impacto no meio ambiente, seja em

função de seu processo produtivo, das matérias-primas que consome ou do seu uso e

disposição final.

Mas, apesar dos diversos enfoques e ferramentas de avaliações existentes para dimensionar e

também mitigar a degradação ambiental conduzida pelos processos produtivos, os impactos

ambientais aumentam à medida que o tempo passa e a população mundial cresce.

Observando esse aspecto, Kiperstok (2002) aplica uma equação mestra de impacto ambiental,

utilizada primeiramente em 1998, para estimar a ordem de grandeza do crescimento do

impacto global, nos próximos 30 anos, a partir do ano 2000, a saber:

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Impacto ambiental = (população) X (renda per capita) X (impacto ambiental/unidade de

produção).

Então, considerando que o crescimento populacional nos próximos 30 anos poderá apontar

para um quantitativo de 1,5 vezes ao de hoje e que a renda per capita em 2030 poderia

representar um aumento de 80% em relação à atual, os dois primeiros fatores da equação

mestra ficariam da seguinte forma: 1,5 X 1,8 = 2,7, após se passarem 30 anos. Logo, conclui-

se que o terceiro fator, impacto ambiental por unidade de produção, teria que ser reduzido em

quase um terço para que o nível de impacto permanecesse o mesmo do ano 2000, lembrando

que este nível de impacto é considerado insustentável por muitos pesquisadores.

Após essas simulações, o autor supracitado questiona a possibilidade de conseguir a redução

de um terço do impacto ambiental por unidade de produção promovendo-se apenas medidas

de fim de tubo(1). Defende, portanto, a racionalização do uso dos recursos naturais ao longo de

todo o ciclo de vida dos produtos e processos, além da adoção de medidas preventivas com

base no conceito da produção limpa.

2.1.1 Indústria mineral

Enquanto se discute a redução dos níveis de impacto ambiental no mundo, cresce a

preocupação com as alterações negativas sobre o meio físico, seja ele rural ou urbano, o que

tem direcionado as atenções para alguns setores produtivos da economia mundial, como, por

exemplo, o da indústria mineral.

Apesar dos impactos causados pela mineração serem, na sua maioria, pontuais, atingindo

pequenas áreas no meio físico, em comparação com outros setores, como a agricultura, por

exemplo, eles são intensivos e alteram negativamente o ambiente através de diversas formas

de impactos, a saber: impactos de origem física e química sobre as águas, sobre o solo, na

atmosfera, sobre a flora e fauna, na topografia original do terreno e sobre o ambiente urbano.

_________________________________________________________________________

(1) Princípio adotado na produção onde os resíduos são considerados como partes integrantes dos processos produtivos. Ao contrário da ação preventiva da produção limpa, o fim de tubo preocupa-se com o tratamento, disposição e ocultação dos resíduos oriundos dos processos produtivos.

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Acrescenta-se que a partir da era industrial, as atividades de mineração vêm aumentando

bastante, levando à ampliação das áreas afetadas e da grande carga de detritos despejados no

ambiente, que depois se transformam em sedimentos transportados em direção ao mar.

Bacoccoli & Gamboa (1992), confirmaram essa idéia ao fazerem a seguinte avaliação:

Retiramos da terra, a cada ano, 50 bilhões de toneladas de rochas, três vezes mais a quantidade de sedimentos transportada por ano por todos os rios do mundo. Ao fazermos isso estamos danificando seriamente a superfície do planeta e lançando uma fantástica quantidade de resíduos por toda à parte, dentro da nossa pequena casa.

Com relação ao Brasil, os mesmos autores registraram:

Somando-se aos bens minerais a movimentação de rochas estéreis ou de baixo teor, necessária para a extração desses, calcula-se em dois bilhões de toneladas ao ano o peso das rochas extraídas e/ou movimentadas no Brasil. Esse número pode mais que duplicar, levando-se em conta a extração de material de construção.

Uma noção melhor poderia se ter, observando as construções realizadas pelo homem, como

uma casa, por exemplo. Para se construir uma casa com grande freqüência utiliza-se tijolos,

telhas, cimento, pedra britada, aço, vidro, dentre outros itens. Todos esses são obtidos da

indústria mineral, em particular, do setor relacionado à construção civil. Pode-se, portanto,

imaginar a quantidade de material extraída da natureza para se construir uma cidade como

São Paulo, por exemplo.

Mesmo assim, Verraes (2001) registra que as previsões mais realistas apontam que em 2020

haverá necessidade de aumentar o consumo de areia, brita e cimento (construção civil) em

sete vezes; em quatro vezes a quantidade de ferro; e, em 2,5 vezes o consumo de não ferrosos

e de energia. Tudo isto reciclando ao máximo o rejeito :

Pourtant les prévisions les plus réalistes disent qu’en 2020 il faudra environ: 7 fois plus de sable – gravier – ciment ; 4 fois plus de fer ; 2,5 fois plus de non ferreux et d’énergie. Ceci en recyclant au maximum les rejets.

Porém, um dos maiores problemas ambientais inerentes à mineração encontra-se nas

atividades clandestinas de lavra mineral, normalmente conduzidas pela extração rudimentar

em nível de garimpo. Garimpo este que foi definido por Barreto & Damasceno (2000) como

sendo uma atividade de aproveitamento mineral simplificado de depósitos secundários e

primários a pequenas e médias profundidades, não excedendo 50m.

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Mas, Bacoccoli & Gamboa (op cit) analisando também esta situação, salientam que o garimpo

tradicional que utilizava equipamentos manuais simples, como a bateia, está agora sendo

substituído pela mineração clandestina ligada a grandes investimentos, possuidora de

equipamentos pesados tipo, dragas, tratores, balsas, escavadeiras, etc. Esta mudança de

característica da ação garimpeira, muitas vezes estimulada pela excessiva regulamentação

atualmente existente, aumenta a degradação do meio físico, haja vista o acréscimo do volume

de material removido com a extração mineral, através de equipamentos pesados para

produção em larga escala e sem controle.

Clandestinidade na mineração

ALMEIDA (1997), referindo-se à sua pesquisa sobre as conseqüências ambientais derivadas

da mineração em áreas urbanas, discute a importância da ilegalidade na mineração para o

controle ambiental, comentando o seguinte:

Outro fato de suma importância refere-se ao processo de “clandestinidade” que ocorre, de maneira generalizada, durante a exploração das diversas substâncias minerais, em todo o território brasileiro, evidenciando assim um problema de caráter global e não localizado, como a princípio, se poderia imaginar, quando do início desta pesquisa.

Depois a autora conclui, colocando seu ponto de vista em relação aos problemas do setor

mineral, que de certa forma estimularia a clandestinidade, da seguinte maneira:

Como não é possível viver sem mineração, a sua forma de ação deve ser, regulamentada de uma maneira mais clara e racional, haja vista que, ao todo existem, em nível federal, quase seiscentos diplomas legais relativos à proteção ambiental. Destes, aproximadamente cinqüenta aplicam-se à mineração, evidenciando-se o excesso de legislação. Outra circunstância agravante reside no fato de que a grande maioria desses diplomas legais apresenta conceitos vagos e imprecisos gerando, dessa forma, diversas interpretações a respeito do problema, ocasionando, conseqüentemente, a dificuldade para o seu controle real e efetivo.

A verdade é que a clandestinidade no setor mineral, relacionada, na maioria das vezes, com a

atividade garimpeira, deve ser enfrentada com bastante rigor e cuidado, já que a atividade

clandestina é totalmente desprovida de compromissos com o controle e recuperação

ambiental. O objetivo da atividade ilegal está exclusivamente ligado à exploração ambiciosa

dos recursos minerais, não importa como, não importa onde.

Estas características são confirmadas por VERRAES (2001), ao registrar o consumo, sem

reciclagem, de aproximadamente 6 Kg de mercúrio por Kg de ouro produzido no garimpo

(principalmente o clandestino) – uma pequena mina consome, normalmente, 0,3 a 0,4 Kg de

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mercúrio por Kg de ouro produzido: "On considère que le niveau artisanal consomme sans

recyclage environ 6 Kg de mercure par Kg d’or produit et que la petite mine équipée de

recyclage consomme 300 à 400g de mercure par Kg d’or".

Além dos problemas relativos à excessiva regulamentação, citadas anteriormente, as

dificuldades inerentes às questões sociais do País também funcionam como catalisadores da

mineração clandestina.

O desemprego alarmante, o subemprego crescente e a carência educacional, que subtrai da

mão-de-obra nacional qualquer chance de se qualificar tecnicamente para o mercado de

trabalho, impulsionam os homens, principalmente do interior brasileiro, a perseguirem seus

desatinos nas arriscadas galerias escavadas sem a técnica adequada e com métodos insalubres

utilizados para tratar os minérios capturados durante os garimpos clandestinos.

Concomitante a essa grande deficiência conjuntural, causada pelo modelo econômico dos

países ditos em desenvolvimento, possuidores de forte política de segregação social, o meio

físico é frontalmente atingido pela atividade clandestina de mineração, por intermédio das

seguintes práticas:

- Utilização de produtos tóxicos, tipo mercúrio e cianeto, na separação e purificação do ouro;

- Remoção de imensas áreas sedimentares, alterando totalmente a topografia original do

terreno, bem como os ecossistemas da região ocupada;

Degradação química e o fator tempo para a mineração

Outro ponto que enfatiza a culpa da mineração em relação às questões ambientais, encontra-se

na remota existência dessa atividade, pois ela é milenar e no Brasil data dos primórdios da era

colonial.

De fato, o processo de colonização do Brasil, conduzido pelos europeus, teve também sua

origem na atividade mineral, principalmente com as expedições organizadas pelos

bandeirantes que buscavam no interior do País, sobretudo, metais e pedras preciosas.

Analisando cronologicamente, o caráter histórico dessa atividade produtiva tem se revelado

um ponto negativo em relação à preservação do meio ambiente, já que a idéia de controle

ambiental e o princípio de desenvolvimento sustentável surgiram apenas recentemente. Isto

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quer dizer que as minas mais antigas não possuíam qualquer plano de recuperação e controle

de impacto ambiental.

Por este motivo, as civilizações atuais, sofrem até hoje com as conseqüências ambientais

negativas derivadas das atividades de mineração mais antigas, outrora conduzidas por técnicas

inadequadas de lavra, desprovidas de planos de controle e recuperação do ambiente.

A “Comission Internationale des Grands Barrages” – CIGB (1996), organismo internacional

localizado em Paris, responsável pelas construções de bacias e barragens, sejam elas de

origem da indústria mineral ou não, comenta a duração quase eterna dos prejuízos ambientais

provocados pelos depósitos de rejeitos e material estéril derivados de minérios sulfurosos

lavrados antigamente. Registra a provável persistência da contaminação por metais pesados,

ainda existente em alguns países, originada das lavras de minérios sulfurosos que iniciaram há

mais de mil anos, como segue abaixo:

(2)Dans de nombreux pays, l’exploitation de minerais sulfureux a commencé depuis plus de 1000 ans. Les dépôts de stériles de ces vieilles exploitations peuvent être encore actifs de nos jours et relâcher des métaux lourds polluants. Ceci montre que si les procédés générant un milieu acide ne peuvent pas être maîtrisés, il peut en résulter à long terme une véritable menace pour l’environnement.

Alguns exemplos de poluição ocasionada pelas pilhas de rejeito mineral foram citados por

Usui & Maeyama, em 1993, após um estudo de caso realizado no município de Criciúma,

Santa Catarina. Segundo os pesquisadores, a indústria de extração de carvão, que teve início

de suas atividades no fim do século XIX, é responsável pelo desequilíbrio ecológico causado

pela descarga diária de mais de 100 mil metros cúbicos de efluentes ácidos, gerados em todas

as fases do processo de mineração, comprometendo os rios, com os baixos índices de pH (2 a

3), altos valores de condutividade e grande concentração de metais pesados.

Essa situação colocou em risco a população de mais de seis cidades: Criciúma, Tubarão,

Imbituba, Urussanga, Siderópolis e Lauro Miller, podendo estender-se, em menor escala de

poluição, para outros 26 municípios que se localizam na região.

_________________________________________________________________________________________ (2)

“Em numerosos países, a explotação de minérios sulfurosos começou há mais de 1000 anos. Os depósitos de estéril e essas antigas explotações podem estar ainda ativos nos nossos dias, liberando metais pesados poluentes. Isto mostra que se os processos que geram um meio ácido não podem ser dominados, eles podem resultar, durante muito tempo, em uma verdadeira ameaça para o ambiente”. (tradução nossa)

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Decerto, as águas ácidas resultam essencialmente da oxidação dos sulfetos contidos na rocha

exposta ao ar e a água. Portanto, os principais ingredientes da reação, são: o sulfeto (neste

caso a pirita), o oxigênio e a água. Ademais, a reação de oxidação é normalmente acelerada

pelas atividades biológicas. As reações biológicas e químicas abaixam sobremaneira o pH da

água, o que favorece a mobilidade dos metais pesados presentes nas pilhas de rejeito, donde,

com a percolação das águas pluviais, ocorre a contaminação na drenagem local.

Mas, Andrade Ramos & Pereira Filho (1996), ao diagnosticarem os impactos do garimpo de

ouro de aluvião do rio Preto em Minas Gerais, paralisado em 1993, registraram que o

mercúrio elementar (Hg0), utilizado pelos garimpeiros para amalgamar o ouro pode, por sua

vez, ser solubilizado na presença de águas oxidantes e, principalmente, sob condições

alcalinas.

Nesta pesquisa, observou-se que a concentração do mercúrio na fração sedimentar silto-

argilosa era significativamente superior àquelas relacionadas à fração grosseira do sedimento

aluvial. Baseados nesta constatação, os autores afirmaram o seguinte:

Essa evidência explica o fato do mercúrio metálico emitido pelos garimpeiros encontrar-se disseminado ao longo da calha do rio, além de indicar que o metal está sendo adsorvido aos sedimentos finos. “(...)o mercúrio adsorvido ao material particulado estaria disponível aos processos de metilação, pois poderia corresponder à forma iônica do metal.”

É importante frisar que a metilação do mercúrio corresponde à introdução do grupo metila

(CH3-), monovalente, na molécula onde se encontra o mercúrio, atribuindo a este,

características orgânicas. Uma vez metilado, o mercúrio é facilmente incorporado na cadeia

alimentar, causando sérios riscos à saúde dos seres vivos. Desta forma os autores concluíram:

Na avaliação dos resultados das análises de peixes,(....), quando associado às concentrações de mercúrio encontrado nos sedimentos e nos testemunhos nas margens do rio Preto fica evidente seu potencial tóxico, assim como sua liberação sistemática para a cadeia alimentar.

As características do mercúrio preocupam mais quando se percebe que no mundo a sua

produção mineral gira em torno de 6.800t/ano, sendo que o dobro desta quantidade é emitido

anualmente no ambiente. No entanto, as emanações naturais (erosões de compostos que

contêm mercúrio, por exemplo) no ambiente representam a metade do total emitido

(VERRAES, 2001).

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Acrescenta-se ainda (VERRAES, 2001) que a quantidade mundial de mercúrio consumida

nos garimpos pode ser avaliada em 610 t/ano, ficando o garimpo do Brasil com o quantitativo

de 200 t/ano, ou seja, um terço do total.

Outra pesquisa de mestrado, realizada por Anjos (1998), avaliou a contaminação por chumbo

e cádmio em uma área piloto, localizada no sítio de deposição da escória produzida pela

fundição do minério de chumbo, conduzida pela Plumbum Mineração e Metalurgia Ltda, em

Santo Amaro da Purificação, estado da Bahia, durante o período de 33 anos (1960 a 1993).

A Plumbum produziu a escória, durante todo o seu tempo de funcionamento, a partir do

minério concentrado de chumbo, extraído das minas da cidade de Boquira, na Bahia. Os

processos metalúrgicos básicos foram a sintetização e redução do sínter.

A empresa citada teria depositado aleatoriamente até 1993, ano que encerrou suas atividades,

490.000 toneladas (este número está sendo atualmente contestado) de escória contaminada

por chumbo (Pb) e Cádmio (Cd) nos arredores de Santo Amaro da Purificação. O maior

problema é que esta escória foi utilizada pela população de Santo Amaro para pavimentar

jardins, pátios de casas, praças e áreas escolares e também pela prefeitura, na pavimentação de

ruas e aterros.

O estudo concluiu que a escória é, na verdade, um resíduo perigoso, tipo classe 1

(classificação da ABNT), representando uma fonte importante de poluição no local. Concluiu,

também, que as águas superficiais e subterrâneas, além do solo, estão contaminadas por

chumbo (Pb) e cádmio (Cd) em locais próximos aos depósitos de escória, incluindo as zonas

alagadiças, os aterros efetuados com a escória e nas áreas à jusante do seu barramento.

Nessa pesquisa, informou-se a existência de índices de Pb e Cd acima dos limites

estabelecidos pela regulamentação vigente, em pescadores, em animais que pastavam nos

locais contaminados, na vegetação dos arredores da cidade e nas amostras de sangue de

crianças até 10 anos de idade.

Além disso, na cidade de Boquira, oeste da Bahia, onde houve a extração do minério de

chumbo acima citado, o relatório técnico (março/2004) da Coordenação Geral de Vigilância

Ambiental em Saúde – CGVAM, do Ministério da Saúde, registrou a existência do depósito

de 3 a 4 milhões de toneladas de rejeito com 1,5 a 6% de Pb, caracterizando-o como potencial

contaminante.

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Esse relatório cita, dentre outras coisas, sinais importantes de erosão, escoamento e lixiviação,

levando os efluentes líquidos resultados da mineração a atingirem o riacho Riachão que

desemboca no rio Paramirim, afluente do São Francisco, colocando em risco o meio natural

que o envolve.

A exposição desse material põe em risco as pessoas (em torno de 200) que moram na Vila

Operária de Boquira, bem como, cinqüenta catadores de lixo da área do depósito de rejeitos,

que é utilizado também como depósito de lixo do município, e um grupo de trabalhadores

agrícolas, consumidores dos produtos agropecuários da região e da água do Riachão.

Mineração urbana e degradação física

Paralelo aos impactos de origem química provocados pelas atividades de mineração próximas

às cidades ocorre, com certa freqüência, principalmente nas metrópoles brasileiras, o impacto

com degradação física causado pela indústria mineral da construção civil. Seus principais

produtos explotados são: areia (impura ou quartzosa), argila, rocha granítica, quartzito,

calcário e ardósia.

Esses produtos são extraídos normalmente dentro dos limites ou, principalmente, na periferia

das zonas urbanas, onde a atividade mineral é estimulada pelo mercado próximo da

construção, já que distâncias maiores inviabilizam o empreendimento, pois, geralmente, dois

terços do preço do produto correspondem ao frete. São produtos que ocorrem com relativa

abundância, além de serem consumidos em quantidade, implicando em baixos preços de

mercado em relação às commodities minerais mais tradicionais.

A íntima relação da indústria mineral da construção civil com as áreas urbanas tem gerado

diversos transtornos às populações citadinas, revelados pelos procedimentos extrativistas e de

beneficiamento, tipo escavações, britagens, detonações e movimentações constantes de

veículos automotores pesados. São procedimentos que geram impactos como: vibração,

lançamento de particulados na atmosfera, ruído, sobrepressão atmosférica, poluição visual

(alteração intensiva da topografia local e desmatamentos), assoreamento de rios e lagos e

exposição do lençol freático a prováveis contaminantes.

Sobre a mineração urbana, como pode ser considerada, a extração de minerais utilizados na

indústria da construção civil, Almeida (1997) demonstra preocupação com as relações sociais:

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Quando as atividades de mineração encontram-se instaladas em áreas urbanas, pode-se dizer que o impacto que estas provocam sobre o meio ambiente tem seu aspecto mais dramático, já que, nestas áreas, concentram-se investimentos próprios do processo de urbanização e outras atividades econômicas associadas, gerando numerosos conflitos, exigindo, portanto, urgência nas soluções.

A autora mencionada cita inclusive exemplos para ilustrar os problemas ocorridos na capital

baiana, provocados pela mineração urbana:

Como exemplo típico de conflito entre a atividade de mineração e as populações vizinhas, pode-se citar, o caso do complexo habitacional Cajazeiras/Fazenda Grande, localizado no município de Salvador, cuja construção, bastante próxima às pedreiras, tem gerado conflitos preocupantes entre os dois setores, tais como: com as detonações freqüentemente ocorrem “rachaduras” nas paredes das casas, que pode colocar em risco, a depender de sua dimensão, a segurança das pessoas que estão no seu interior.

No Rio de Janeiro, os conflitos entre esses setores sucedem da mesma forma. A revista do

CREA/RJ tem criticado a produção mineral existente dentro dos limites urbanos da capital

carioca, comparando as pedreiras abandonadas a “Cicatrizes Urbanas da Cidade”. A

abordagem cita reclamações das comunidades sobre os riscos de desabamento,

assoreamentos, arremessos de projéteis, danos ao patrimônio, dentre outros, questionando o

desenvolvimento a qualquer preço (Revista do CREA/RJ, n° 28).

Silva & Silva (1999), pesquisando sobre as variáveis que interferem nos problemas

ambientais gerados durante os desmontes de rochas, alertaram para a aplicação de explosivos

durante o desmonte, afirmando ser este um dos principais problemas geradores de atrito entre

as comunidades vizinhas e a mineração.

Estes pesquisadores citam também a expansão das cidades como uma das causas dos conflitos

entre as atividades econômicas e as comunidades locais, da seguinte forma:

A expansão demográfica das cidades esbarra em explotações minerais dentro do perímetro urbano, convivendo as populações, muitas vezes, com problemas de vibrações das edificações, sobrepressão atmosférica, ruído, ultralançamento de fragmentos rochosos, emanações de poeira, gases, etc.

Já Verraes (2001), sobre esta questão, é enfático ao atribuir, em muitos casos, à própria

atividade mineral a responsabilidade pelo crescimento desordenado dos bairros vizinhos. Ele

lembra que as empresas de mineração e, sobretudo, as grandes empresas, criam vilas mineiras,

que por outro lado, atraem o crescimento demográfico local através da infra-estrutura

existente oferecida por essas vilas. Ele lembra que o desenvolvimento desordenado cria

rapidamente confrontos entre a atividade mineira e o urbanismo, citando 3 pontos principais:

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- a urbanização sobre antigas minas (subterrâneas);

- a urbanização nas bordas das minas;

- a urbanização sobre grandes pilhas de estéril e a jusante destas.

O primeiro caso estaria relacionado a problemas de estabilidade das obras (galerias)

subterrâneas, provocadas principalmente pela infiltração de águas usadas na lavra e das águas

pluviais. A perda de estabilidade das estruturas das minas subterrâneas pode fazer com que

essas não suportem o peso do próprio teto, adicionado à formação de eventuais cidades ou ao

crescimento urbano que ocorre logo acima, acontecendo em muitos casos, o abatimento do

terreno, fazendo com que bairros sejam notoriamente engolidos. Fato este muito comum na

Europa, embora Verraes cite como exemplo uma vila construída sobre uma mina equatoriana

que foi tragada pelo abatimento do terreno matando mais de 200 pessoas.

No segundo caso, o confronto entre a mineração e a comunidade urbana é provocado

preferencialmente pela produção de poeiras e vibração, afetando de forma notória o que

podemos chamar de Qualidade Ambiental Urbana. Ele cita o exemplo de Itabira/MG, onde

uma empresa de mineração, produtora de minério de ferro, tornou-se o alvo constante dos

ambientalistas, apesar do desenvolvimento urbano ter acontecido bem depois do início da

atividade mineral.

Itabira dans lequel la compagnie minière est souvent la cible des écologistes alors que le développement de la ville s’est fait bien postérieurement à la création de la mine et dans les terrains qui la bordent.

No terceiro caso, para Verraes, as populações urbanas correriam o risco com a falta de

estabilidade das pilhas de estéril provocadas pela introdução das águas usadas e escavações

aleatórias. Os escorregamentos das grandes pilhas de estéril representariam o principal

problema. O autor usa, entre alguns exemplos, o desaparecimento de uma vila no Chile,

construída de forma desordenada a jusante da barragem de estéril, quando mais de 200

pessoas foram categoricamente sepultadas pelo escorregamento de milhões de metros cúbicos

de sedimentos arenosos.

Os problemas referidos no segundo caso do autor supracitado ocorrem com mais freqüência

nas cidades do Brasil. Ao avaliar a recuperação de áreas degradadas pela mineração na região

metropolitana de São Paulo, Bitar & Chaves (1997), comentaram as relações continuadas que

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foram estabelecidas entre a atividade mineral e a dinâmica das metrópoles, gerando conflitos

no uso do solo e impactos ambientais, ressaltados pelo fato de poucas empresas terem

praticado suas atividades sem evitá-los.

Os mesmos autores também citam alguns dos principais efeitos negativos provocados pela

mineração em áreas urbanas, a saber: alterações ambientais de risco, conflitos de uso do solo,

depreciação de imóveis circunvizinhos, transtornos ao tráfego urbano, geração e ocupação

desordenada de áreas degradadas.

Em relação à ocupação desordenada de áreas degradadas na Região Metropolitana de São

Paulo (RMSP), esses autores registraram, em tese de doutorado, a seguinte constatação:

Entre os tipos de uso atual do solo, freqüentes em áreas degradadas por mineração de forma desordenada, ocorrem particularmente habitações de baixa renda e depósitos de resíduos a céu aberto ou em lagos remanescentes da atividade mineral. Os depósitos de resíduos apresentam um ligeiro predomínio quando comparados às habitações de baixa renda.

Eles acrescentaram a preocupação com as habitações nas áreas degradadas por mineração:

No caso de habitações em morros, são flagrantes os riscos a que estão sujeitas às populações moradoras, particularmente em face da alta suscetibilidade a erosão e escorregamentos existentes nestas situações, agravados localmente pela presença de blocos rochosos instáveis.

Mas foi sobre os depósitos de resíduos, como uso do solo pós-mineração, em cavas

abandonadas após a extração de areia na Região Metropolitana de São Paulo (RMSP), que

Lopez & Sanchez (2000), em dissertação de mestrado, apresentaram observações importantes

ao citarem os estudos realizados para avaliação dos impactos sobre o solo e a água

subterrânea. Eles utilizaram para isso a condutividade elétrica como indicador eficiente para

acusar a presença e movimentação da pluma de contaminantes. Esses autores ainda teceram o

seguinte comentário: “É muito comum, em áreas abandonadas de mineração, o seu

aproveitamento para a disposição irregular de lixo ou entulhos”.

Lopez, durante a sua pesquisa, também observou nos municípios de Mauá e Ribeirão dos

Pires (RMSP), que os processos naturais do meio físico, tipo, erosão, assoreamento,

escorregamentos, etc., são muitas vezes acelerados pelas intervenções antrópicas no terreno

relacionadas à atividade mineral:

Um outro impacto importante diagnosticado relaciona-se com o assoreamento da Represa Billings, tido como um manancial importante de cunho regional, onde

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pode ser constatado o imenso volume de sedimentos depositados, o que representa uma perda capital de água que poderia ser utilizada pelo manancial, como forma de abastecimento, sendo caracterizadas assim as principais conseqüências decorrentes da degradação física que está em curso na área de estudo, primordialmente relacionadas com as atividades extrativas de areia.

Sem dúvida, a Região Metropolitana de São Paulo, pelo seu extraordinário crescimento

urbano e, conseqüentemente, demográfico, observado principalmente no decorrer do século

XX, continuando até os dias atuais, apresenta os maiores problemas inerentes à

compatibilização das atividades minerais com a própria expansão urbana e industrial.

Contudo, outras várias Regiões Metropolitanas do País, passam pelo mesmo desconforto ao se

defrontarem constantemente com a falta de harmonia entre interesses privados e sociais.

Exatamente por isso, visando compatibilizar diretrizes de desenvolvimento e de uso do solo

da Região Metropolitana de Salvador (RMS) com as atividades minerais, foram elaborados os

Planos Diretores de Mineração para RMS de 1983 e 1992.

O Plano Diretor para RMS de 1992 reconhece que as atividades de mineração na RMS

ocorrem em espaço territorial de forte pressão demográfica e de considerável dinamismo

industrial, o que conduz inevitavelmente ao agravamento de conflitos entre interesses sociais

e privados, não só em relação à disputa do espaço urbano, mas em relação aos impactos

ambientais gerados. Logicamente, a degradação do meio físico provocada pela mineração na

periferia das cidades destaca-se bastante, dada sua maior sensibilidade em comparação às

zonas rurais, onde a densidade demográfica é bem menor.

O Plano Diretor citado registra que os impactos ambientais mais flagrantes estão relacionados,

naturalmente, ao setor de extração de insumos para a indústria da construção civil, cujas

lavras têm contribuído para o surgimento de problemas ambientais com repercussões diretas

sobre a água, ar, solo, flora e fauna e sobre o próprio homem.

O Plano Diretor de Mineração (PDM) da RMS ainda justifica a principal causa da existência

da extração mineral ligada à indústria de construção civil nas regiões metropolitanas do País:

“A proximidade do mercado consumidor, fator decisivo na composição dos custos desses

insumos, favorece a instalação, sobretudo de pedreiras e areais, nos arredores de zonas

urbanas e industriais.”

Mas Almeida (1997), comentando também sobre a mineração na RMS, registra:

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As atividades de mineração, de um modo geral e principalmente na RMS, não possuem um planejamento adequado para a ocupação da área de desenvolvimento da lavra, localização e ocupação das plantas de beneficiamento, contribuindo sensivelmente, para o aumento da degradação do meio ambiente.

Esta autora também menciona o Plano Diretor de Mineração da RMS ao registrar alguns

problemas de saúde ocorridos com a população urbana, provocados pela mineração:

De acordo com o PDM (1992), registros de pneumopatias ocupacionais e de doenças alérgicas nas populações das áreas periféricas às pedreiras comprovam que os padrões de qualidade do ar têm sido ultrapassados como decorrência dos seguintes fatores: formação e emissão de poeiras e gases no processo de detonação e desmonte de rochas; formação de poeiras pela desagregação mecânica, pela ação de perfuração, escavação, britagem e pontos de transferência; emissão de poeiras nas estradas de acesso às frentes de lavra.

Entretanto, a polêmica gerada pela mineração urbana demonstra alguns desfechos

contraditórios, como por exemplo, o estímulo extrativista derivado do próprio crescimento

urbano, cuja população é a adversária natural da mineração, quando esta altera negativamente

a qualidade ambiental urbana. Apesar dessa falta de compatibilização, a própria expansão

urbana impulsiona a produção mineral, quando seus produtos (insumos) são demandados pela

indústria de construção civil.

Outra contradição converge para o fato de que as populações carentes, que habitam

normalmente as periferias das cidades, são as que mais sofrem com os desconfortos

ambientais provocados pela indústria mineral, pois esta ocorre, com mais freqüência,

exatamente nas zonas periféricas das cidades. Mas, a mesma população carente também se

beneficia da proximidade das lavras minerais ao adquirir os insumos por elas produzidos a

preços menores. Este fato tem sugerido uma relação de dependência no mínimo paradoxal,

pois as populações das periferias necessitam dos bens minerais para construírem,

incentivando a manutenção do próprio algoz, que é a atividade mineral.

Todavia, nem sempre a mineração altera negativamente a qualidade ambiental das cidades. O

melhor exemplo são as cidades de pequeno porte que, ao contrário das grandes metrópoles,

onde o espaço urbano é bastante disputado, a mineração pode favorecer a qualidade do

ambiente urbano. No caso das pequenas cidades, a indústria mineral não está

preferencialmente relacionada à produção de insumos para a construção civil, pois nessas

cidades o setor da construção civil é relativamente modesto.

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É importante lembrar que a rigidez locacional dos jazimentos minerais, em conformidade com

os condicionamentos geológicos da crosta terrestre, estimula sobremaneira a interiorização do

País através da atividade mineral. Fato este benéfico, na maioria dos casos, para as pequenas

cidades localizadas em regiões interiores do Brasil, desprovidas da infra-estrutura urbana

mínima para a conservação de uma boa qualidade de vida.

A geração de empregos, normalmente raros nas cidades do interior brasileiro, principalmente

do nordeste, o incremento na economia local, com o fortalecimento do comércio urbano e de

outros setores produtivos (serviços, bancos, construção civil, administração pública, etc.), o

treinamento e capacitação da mão-de-obra local e os investimentos realizados na infra-

estrutura (rede viária, praças, escolas, hospitais) das pequenas cidades, patrocinados

freqüentemente pelas mineradoras, têm justificado a presença da mineração como fator

positivo ou, pelo menos, compensador, quando se fala em qualidade ambiental urbana.

Existem diversos exemplos de cidades de pequeno porte que se beneficiaram da atividade

mineral no seu processo de desenvolvimento. Algumas sendo inclusive dependentes desse

setor produtivo. Na Bahia, por exemplo, podem-se citar inúmeras cidades que se

desenvolveram graças à atividade mineral. Entre essas se destacam cidades como Jacobina

(produção de ouro), Rui Barbosa e Medeiros Neto (produção de rochas ornamentais),

Ourolândia (mármore), Caetité (produção de urânio, manganês, argila e granito), Brumado

(magnesita e granito), Campo Formoso (produção de cromo e esmeralda), Lençóis, Andaraí e

Mucugê com a produção de diamante (neste caso, em forma de garimpo).

Ademais, determinadas cidades chegaram a ser fundadas pela iniciativa da mineração, a

exemplo de Lençóis, Andaraí, Mucugê que passaram a existir subitamente, com as

descobertas dos diamantes da Chapada Diamantina, em 1844.

Isso foi registrado também por Nolasco (2002) em sua tese de doutorado, ao lembrar este fato,

como segue:

O garimpo de diamante é o responsável pelo surgimento destas cidades e por todas as trilhas turísticas “ecológicas” existentes na região, e envolveu das serras aos aluviões de rios. Em todas as áreas deixou registros da sua passagem, na forma de depósitos ou cicatrizes erosivas.

Outras cidades, na condição de vilas, foram planejadas para abrigar a população envolvida de

alguma forma com o projeto mineral existente. Entre elas pode-se citar Carajás, no estado do

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Pará e o Distrito de Pilar, da Caraíba Metais, na Bahia. Tais cidades possuem toda a infra-

estrutura urbana que pode influenciar consideravelmente na habitação com qualidade

satisfatória para a comunidade. De acordo com a empresa Caraíba Metais, o Distrito de Pilar,

que pertence ao município de Jaguarari, na Bahia, construído no final da década de 1970 para

abrigar os empregados da mineradora e seus familiares, possui ruas asfaltadas, estação de

tratamento de água e esgoto, iluminação pública, rede telefônica, drenagem pluvial,

calçamento completo, 1296 casas, 152 estabelecimentos comerciais, 700 lotes urbanizados, 6

edifícios centrais, 10 escolas conveniadas com o estado, 1 hospital com 50 leitos, 2 clubes

sociais, 1 estádio, 8 igrejas, 3 agências bancárias uma sub-prefeitura de Jaguararí, tudo isso

construído em meio à desértica caatinga do centro-oeste da Bahia.

Por outro lado, diante da forte dependência que pode ser criada entre as pequenas cidades e a

mineração, surge um problema: quando os jazimentos minerais se esgotarem, por quais

conseqüências passarão as cidades e suas respectivas populações? Como viverão as

populações dessas cidades sem a principal fonte de economia local? As áreas degradadas, por

lei devem ser recuperadas, mas e o destino sócio-econômico da comunidade, qual será?

Algumas dessas perguntas são discutidas por Oliveira Junior & Sanchez (2002) em tese de

doutorado, quando demonstraram preocupação com os passivos ambientais deixados pelas

minas fechadas, que ainda representam um dos maiores problemas proporcionados pelo setor

mineral. Infelizmente, não é ainda hábito executar planos de desativação de empreendimentos

mineiros envolvendo a recuperação de áreas degradadas durante a operação das minas e a

criação de alternativas de produção e ocupação para a comunidade local.

Segundo Oliveira Junior & Sanchez, (op cit), a falta de roteiros e normas na legislação

ambiental para a preparação da desativação ainda no início da mina, induz o empreendedor a

se preocupar com esta questão apenas quando a mina se encontrar em situação de iminente

fechamento. Neste momento, as empresas estão descapitalizadas e os custos de recuperação

são elevados, dificultando geralmente qualquer projeto de reabilitação das áreas degradadas.

Para esses autores, a desativação de um empreendimento mineiro deverá ser encarada como

mais uma fase ou etapa de um empreendimento mineral.

Também é importante salientar que os problemas com o fechamento das minas não se

concentram apenas na alteração negativa dos meios físico e biótico, mas, igualmente, no meio

antrópico.

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Os autores sobreditos confirmam essa tese, ao registrar o seguinte:

(...)a abertura de um empreendimento mineiro é uma fonte de emprego direto onde ela se instala e um apoio para a economia local (...)”. (...) Em muitos casos, a empresa assume o poder de governo construindo infra-estrutura e melhorando serviços que competem ao governo.

Eles tornam-se mais explícito ao lembrar o registro de outro autor (Sassoon (3), 2000):

Quando a mina é desativada, sem um cuidadoso planejamento, pode causar danos à comunidade local, que de repente se vê desprovida de seu maior apoio financeiro e sem ninguém para ocupar o seu lugar.

Os mesmos autores continuam logo após, recordando o que se segue: “Este tipo de

acontecimento é muito comum, principalmente com garimpeiros, onde cidades tornaram-se

fantasmas após o fechamento da mina por exaustão das jazidas”.

Assim ocorreu na Chapada Diamantina, região central do estado da Bahia, tema desta

dissertação, afetada pelo garimpo de diamante existente há mais de 150 anos, que apresentou

o problema supracitado após a redução drástica da produção de diamante com a queda do

preço internacional e o esgotamento das jazidas de mais fácil extração.

Em relação a essa região específica, Brito (2004) descreveu esta situação, demonstrando as

dificuldades por que passaram as cidades envolvidas com a atividade mineral:

Entra em decadência com a redução dos achamentos, a queda de preços no mercado internacional e a descoberta de novas áreas produtoras levando à saída de um significativo contingente populacional das cidades das Lavras Diamantinas que por não disporem de outra atividade econômica que não substituísse a mineração, passam a ter a aparência de cidades fantasmas, cujas características histórico-culturais evocam um passado recente consubstanciado numa atividade econômica que deixava de existir, ou melhor, continuava em reduzida escala como caricatura de si própria e como testemunho da inadaptação inicial e da teimosia sonhadora daqueles atores sociais historicamente envolvidos com a mineração.

Estas últimas considerações, que depõem contra a qualidade ambiental das cidades da

Chapada, serão tratadas nesta dissertação com destaque para os problemas ambientais, sociais

e culturais, proporcionados pela atividade garimpeira da Chapada Diamantina e as

conseqüências de seu súbito fechamento.

_________________________________________________________________________________ (3) SASSOON, M. Environmental aspects of mine closure. In: Workshop of Mine Closure and Sustainable Development, London, 2000. Mine Closure and Sustainable Development. London: Mining Journal Books, 2000, p. 116-123.

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2.2 - Entendimento de Qualidade Ambiental Urbana

Neste capítulo repetiu-se algumas vezes a expressão “qualidade ambiental urbana” quando se

referia à infra-estrutura de uma determinada cidade e sua relação com a atividade mineral.

Realmente, os aspectos estruturais (transporte, saneamento básico, serviços públicos em geral,

ruas, prédios, parques, escolas, comércio, etc.) influenciam sobremaneira na qualidade do

ambiente citadino, porém algo mais deve ser considerado e analisado, o que faz com que se

discorra, abaixo, através de alguns parágrafos, esse tema, na tentativa de melhor compreender

o que poderia ter ocorrido com o ambiente urbano das cidades chapadenses, após os eventos

que recentemente marcaram a região.

Deve-se lembrar, portanto, que as populações citadinas possuem qualidade de ambiente

peculiar, quando comparadas com as campesinas ou mesmo com as das vilas e povoados

localizados em meios essencialmente rurais. Isto se deve, entre outros itens, ao alto grau de

dependência que contém a Qualidade Ambiental Urbana (QAU) de fatores diversos inerentes

ao dinamismo sócio-econômico e político das cidades. Alguns desses fatores podem ser

citados, tipo: a distribuição de renda; política de gestão urbana; economia da cidade; cultura

local; o processo educacional; e a cidadania.

A complexidade da QAU aumenta quando se imagina que cada indivíduo a percebe conforme

a sua realidade pessoal. Ou seja, cada pessoa dispõe de um desejo particular relacionado à

qualidade do meio em que habita. E esse desejo encontra-se fortemente unido às suas

condições sócio-econômica e cultural. Mas, para falar em QAU, precisa-se refletir

coletivamente, o que implica na realização individual de concessões. Desta forma, torna-se

importante cada um obter, pelo menos, o mínimo, para garantir um ambiente de convivência

aceitável a todos. Estas considerações levam a crer que, em muitos casos, a QAU é, por

definição, auto-limitante.

O mais interessante é analisar as dimensões de qualidade para diferentes grupos sociais.

Poder-se-ia estudar, por exemplo, as necessidades de grupos localizados nos extremos de uma

escala sócio-econômica. Assim, observando aqueles indivíduos que procuram garantir, pelo

menos, um prato de comida todos os dias, certamente se encontrariam diferenças

exponenciais de desejos quando fossem defrontados com os interesses de indivíduos

pertencentes às classes mais favorecidas, que vivem em condomínios luxuosos. Afinal, qual a

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real opinião de um grupo, que se preocupa primeiro em matar a fome, sobre a qualidade do

ambiente em que vive? E qual a visão que a classe mais favorecida possui sobre a QAU?

Em uma análise subjetiva, a QAU poderá também ser mensurada pelo nível de

contentamento, ou mesmo, de incômodo, de um determinado grupo. Esse é um aspecto que

confirma a característica conceitual particular da QAU.

Determinadas pessoas podem conter particularidades bastante distintas na percepção da QAU.

Há indivíduos, para exemplificar, que apesar de morarem em ambientes satisfatórios, poderão

incomodar-se extremamente com a obscenidade social revelada nas ruas das cidades onde se

apresentam problemas sócio-econômicos como a presença de mendicância ou de crianças

famintas abandonadas pela família catando resto de alimento em latas de lixo para sobreviver

e bebendo água em poças acumuladas nas sarjetas das vias públicas. Outras pessoas podem,

contudo, defrontar-se com essa realidade com grande indiferença, não sendo abaladas,

portanto, as suas percepções de qualidade ambiental.

Desta forma, por esses exemplos, estaríamos conduzindo a definição de QAU para um

domínio altamente específico: o da sensibilidade de cada cidadão, que, por conseqüência,

depende de sua formação educacional e até, de sua própria personalidade.

Mas, se for atribuída a compreensão da QAU uma dimensão pessoal, estaríamos convergindo

a uma definição de grau tão subjetivo que praticamente impossibilitaria uma realização

coerente dessa definição. Ou seja, a definição da QAU pelo campo individual de cada ator,

deve ser prescindida.

Para Borja (1998), a QAU está, realmente, atrelada à subjetividade, ao registrar as

considerações, a saber:

A qualidade do ambiente na sua subjetividade remete, portanto, a sensação de conforto e bem-estar algo que não pode ser medido, mas sim sentido de forma diferenciada por indivíduos e grupos de indivíduos. Essa sensação varia ao longo do tempo e do espaço em função dos aspectos predominantemente culturais, além de econômicos físicos e sociais. Enfim, a questão da qualidade está impregnada de subjetividade – da qual por si só, os números e as estatísticas elaborados na perspectiva de técnicos e administradores não podem dar conta.

O parágrafo supracitado parece apresentar uma definição relacionada ao abstracionismo, em

busca de uma aproximação com o real, dos sentimentos dos indivíduos perante a qualidade

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ambiental e, assim, se alcançar uma avaliação da QAU dentro do que se poderia acreditar

como aceitável, já que essa não poderia ser medida, mas sim sentida.

No entanto, deve-se lembrar que ao se definir a QAU, é importante explicar o significado

dela, esclarecendo o que ela é e não o que ela deveria ser. O ato de definição não deverá

impor que a qualidade de um ambiente seja necessariamente boa, deverá contemplar também

os ambientes construídos de qualificações insatisfatórias, tipo Novos Alagados na enseada dos

Cabritos em Salvador; Bagdá, capital do Iraque, mergulhada na violência depois do processo

da ocupação militar americana; ou Cuito, cidade Angolana praticamente destruída após

dezenas de anos de guerra civil, a despeito do desejo de todos fluir para uma qualidade

ambiental no mínimo satisfatória, como é o caso de Curitiba/PR.

Em termos objetivos e técnicos, a conceituação pode até aproximar-se de um consenso para a

idealização da QAU. Mas, a verdade é que o conceito de QAU, que melhor se exprime com

uma dose considerável de subjetividade, é bastante dinâmico, até mesmo, volúvel e depende

de alguma forma, do estado de sensibilidade do seu definidor ou do ângulo por onde cada

autor procura visualizar as questões inerentes à QAU, o que pode justificar os diferentes

entendimentos encontrados na literatura e o número infinito dos que poderão ainda surgir.

Mas, a vantagem de uma análise racional é a aproximação de uma concordância de opiniões,

quando, praticamente, todos aceitam que os aspectos físicos do ambiente construído, a oferta

dos serviços públicos, as características do meio natural (clima, relevo, vegetação, localização

da cidade, etc.), as condições sociais e econômicas da comunidade, aliados a uma identidade

cultural existente, influenciam sobremaneira na qualidade ambiental das cidades.

Porém, como neste caso, a subjetividade não deve ser excluída das definições, entende-se que

a QAU é a combinação entre as características físicas ambientais genéricas, o quadro político-

econômico, social e cultural presente, e, o processo de impressão consciente que os grupos

podem adquirir, a partir de estímulos causados pelo meio em seu sentido amplo.

As características físicas ambientais sobreditas referem-se à dimensão biofísica em duas

formas: o meio natural, representado pela atmosfera, clima, relevo, localização, etc.; e o meio

construído, abrangendo, aí, toda a infra-estrutura urbana, qualidade de moradia, oferta de

serviços públicos, a paisagem urbana, a mineração nas cidades, ou seja, tudo que resulta da

interferência antropogênica no ambiente.

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O quadro político-econômico, social e cultural citado visa representar as questões peculiares

intrínsecas da população e a capacidade gestora das instituições oficiais.

O “processo de impressão” acima comentado interpreta a “sensação” de BORJA, quando

registra o caráter subjetivo inserido no seu entendimento sobre a QAU. A palavra

“consciente”, no entanto, busca o equilíbrio para uma apreensão dosada com sensibilidade, já

que o sensível é abstrato e possui compreensão difícil e vaga. Isso geralmente ocorre quando a

QAU é avaliada por grupos e não individualmente. A tendência dos grupos é atribuir maior

consciência às análises subjetivas das impressões coletivas. A intuição adquire aí uma certa

contaminação da racionalidade.

Essa “sensação”, representada aqui como uma “impressão consciente” é estimulada por tudo

que existe de ordem material, humana e de civilidade no “meio, em seu sentido amplo”, que

rodeia uma determinada população. Assim, a miséria, o luxo, a beleza, a violência, a

desordem, a ordem, a poluição, o desemprego, a natureza, a discórdia, a limpeza, a

acessibilidade de relacionamento na comunidade, a harmonia, etc., presentes em um

determinado ambiente, provocarão a impressão de cada grupo da Qualidade Ambiental

Urbana de um lugar. O meio, portanto, poderá gerar a sensação de bem-estar ou não de um

grupo de indivíduos, influenciando na visão de como poderia ser a QAU de um certo lugar.

Com esta definição pode-se concluir que para se obter um conhecimento mais próximo

possível da realidade sobre a qualidade ambiental das cidades chapadenses que envolvem a

região das lavras diamantinas seria necessário observar as opiniões dos grupos que lá viviam.

Esta seria, simplesmente, uma forma de enxergar a questão através dos olhos de quem

vivenciou o drama.

Portanto, optou-se por assimilar, pelo menos, a impressão dos moradores das cidades das

lavras diamantinas, através da aplicação de um formulário composto de questões específicas

inerentes à satisfação da população com relação ao garimpo, ao meio ambiente e ao turismo.

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43

2.3 Legislação mineral e ambiental

Com o objetivo de esclarecer algumas hipóteses relacionadas à questão legal, como a

excessiva regulamentação ventilada em capítulos anteriores, sendo utilizada como uma das

explicações para a clandestinidade na mineração discutir-se-á de maneira sucinta e objetiva, a

legislação mineral e sua relação com a legislação ambiental, dando ênfase para a tramitação

processual existente atualmente.

Antes, serão tecidos breves comentários sobre a Constituição Federal demonstrando o grau de

importância dos setores mineral e ambiental para a sociedade brasileira.

2.3.1 Constituição Federal

A Constituição Federal, no seu artigo 20, item IX, já inicia o tema apresentando como bens da

União os recursos minerais, incluindo aqueles do subsolo.

O artigo 21 coloca como uma das competências da União:

-Estabelecer as áreas e as condições para o exercício da atividade de garimpagem, em forma associativa.

O artigo 22 salienta que compete privativamente à União legislar sobre:

-Jazidas, minas, outros recursos minerais e metalurgia.

-Sistema estatístico, sistema cartográfico e de geologia nacionais.

No Artigo 49: é competência exclusiva do Congresso Nacional:

Autorizar em terras indígenas, a exploração e o aproveitamento de recursos hídricos e a pesquisa e lavra de riquezas minerais.

A Constituição também menciona no artigo 174, § 3°, o seguinte:

O Estado favorecerá a organização da atividade garimpeira em cooperativas, levando em conta a proteção do meio ambiente e a promoção econômico-social dos garimpeiros.

No artigo 176, a Constituição enfatiza que:

As jazidas, em lavra ou não, e demais recursos minerais e os potenciais de energia hidráulica constituem propriedade distinta da do solo, para efeito de exploração ou aproveitamento, e pertencem a União, garantida ao concessionário a propriedade do produto da lavra.

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Entrando agora na questão ambiental a Carta Magna registra (art.24), dentre outros itens, a

competência da união, estados e Distrito Federal em legislar concorrentemente sobre florestas,

caça, pesca, fauna, conservação da natureza, defesa do solo e dos recursos naturais, proteção

do meio ambiente e controle da poluição.

E no artigo 225, a Constituição assinala:

Todos têm o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

No § 2° desse artigo, salienta que:

Aquele que explorar recursos minerais fica obrigado a recuperar o meio ambiente degradado, de acordo com a solução técnica exigida pelo órgão público competente, na forma da Lei.

Portanto, pode-se observar o destaque que a Constituição atribui aos recursos minerais,

considerando-os como bens da União e mencionando a competência privativa desta em

legislar sobre jazidas minerais. Por outro lado, menciona que as áreas degradadas pela

mineração deverão ser recuperadas.

2.3.2 Código de Mineração (Decreto-Lei n° 227, de 28/02/1967)

O tema adquire caráter específico, no entanto, ao ser tratado como Lei pelo Código de

Mineração (PINTO, 2002), instituído pelo Decreto-Lei n° 227, de 28 de fevereiro de 1967,

assinado pelo Presidente de República para dar nova redação ao Código de Minas anterior.

Um dos objetivos do Código de Mineração era dar cumprimento à definição da política de

governo visando a adaptação legal às necessidades do desenvolvimento econômico e ao

equilíbrio do balanço de pagamentos da época.

Mais recentemente, este mesmo Código recebeu uma nova versão, por intermédio da Lei

9.314/96, publicada no Diário Oficial da União – DOU, de 18/11/1996, que o alterou,

adaptando-o à nova ordem política, econômica, social e ambiental.

A nova versão do código também ratifica os preceitos constitucionais, logo no seu artigo 1°,

mencionando a competência da União em administrar os recursos minerais, a indústria de

produção mineral, a distribuição, o comércio e o consumo de produtos minerais.

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Para o objetivo da pesquisa em pauta, entretanto, serão discutidos apenas os itens que dizem

respeito ao quadro observado e analisado da Chapada Diamantina, mais precisamente ligado à

extração de diamante.

Desta forma, cita-se inicialmente o artigo 2° do Código de Mineração, que versa sobre os

regimes jurídicos de aproveitamento mineral, a saber:

I – regime de Concessão, quando depender de portaria de concessão do Ministro de Minas e

Energia, liberando a jazida mineral para a atividade de lavra e produção comercial;

II – regime de autorização, quando depender da expedição de alvará de autorização do Diretor

Geral do Departamento Nacional de Produção Mineral – DNPM. Engloba a fase de pesquisa

mineral;

III – regime de licenciamento, quando depender de licença expedida em obediência a

regulamentos administrativos locais e de registro de licença no DNPM. Compreende a

efetivação da extração de substâncias minerais utilizadas “in natura” para a indústria de

construção, no preparo de agregados e argamassas, como areia, argila vermelha, rochas

usadas como paralelepípedo, ardósias, cascalhos, etc.

IV – regime de permissão de lavra garimpeira, quando depender de portaria de permissão do

Diretor Geral do DNPM;

V – regime de monopolização, quando, em virtude de lei especial, depender de execução

direta e indireta do Governo Federal, a exemplo dos minerais nucleares;

E o parágrafo único do artigo 2°, cita o registro de extração de substâncias minerais de

emprego imediato na construção civil, definidas em Portaria do Ministério de Minas e

Energia, para uso exclusivo em obras públicas executadas diretamente pelos órgãos da

administração direta e autárquica da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos

Municípios, sendo vedada, neste caso, à comercialização da produção mineral.

Os regimes de aproveitamento mineral apropriados para o tema em questão são o de

permissão de lavra garimpeira, por se tratar obviamente de garimpo e os regimes de

autorização e concessão, que possuem aspecto legal generalizado ao envolverem todas as

substâncias minerais regidas pelos preceitos do Código de Mineração, com exceção dos

minerais nucleares e petróleo.

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2.3.3 Regimes de autorização e concessão

Estes regimes de aproveitamento, que se complementam, são os mais adequados para as

formas de extração mecanizadas de diamantes, quando se utilizam equipamentos tipo dragas e

desmonte hidráulico do material estéril.

A tramitação processual inerente aos regimes de autorização e concessão pode ser resumida

basicamente nos seguintes passos:

a) requerimento do Alvará de pesquisa, diploma legal, outorgado pelo DNPM, que autoriza o

pretendente a, somente, pesquisar na área. O requerente abre um processo no DNPM,

solicitando o diploma de Alvará de Pesquisa, onde sugere um plano para a realização dos

trabalhos de pesquisa em uma área de interesse (ver anexo 1). Nesta fase, predomina o caráter

documental. Se o requerimento for indeferido, a área será declarada disponível por edital

publicado no DOU para novos interessados, conforme artigo quinto, da Portaria Ministerial n°

12, de 16/01/1997. A área máxima a ser requerida para diamante é de 2000 hectares;

b) Etapa de pesquisa mineral (Alvará de Pesquisa): após o deferimento do requerimento

supracitado, o empreendedor já como titular do Alvará de Pesquisa põe em prática o Plano de

Pesquisa proposto ao Departamento Nacional de Produção Mineral – DNPM. Nesta etapa,

ocorrerão os trabalhos de pesquisa mineral, planejados em escritório. O depósito mineral

deverá ser dimensionado e avaliada a sua viabilidade econômica para a futura lavra, através

dos trabalhos técnicos de prospecção e pesquisa geológica, no período máximo de três anos,

podendo ser prorrogado até igual período a critério do DNPM (art. 22, do Código de

Mineração). Ainda na etapa de pesquisa, antes de findar o prazo do alvará, o titular deverá

submeter à aprovação do DNPM, o relatório consubstanciado com a descrição dos serviços

exploratórios e seus resultados (art. 22, item V, do Código de Mineração – CM).

c) Após a apreciação do relatório final de pesquisa pelo DNPM, poderão ocorrer três

situações, a saber:

- Se os resultados do relatório apontarem a inexistência da jazida mineral (art. 30, item III, do

CM), o processo é arquivado e a área entra em disponibilidade para pesquisa, por edital;

- Caso seja negada a sua aprovação (art. 30, item II do CM), é dada baixa no processo

correspondente e a área será também declarada disponível para pesquisa através de edital

publicado no Diário Oficial da União;

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- mas, se o relatório for aprovado (art. 30, item I do CM), o titular terá o direito por um ano, a

partir da data da publicação no DOU da sua aprovação, a requerer a lavra da jazida

apresentando um Plano de Aproveitamento Econômico – PAE. Este requerimento precisará

ser efetuado por pessoa jurídica. Se a área não for requerida no prazo estipulado de um ano o

processo é arquivado e a área entra em disponibilidade para lavra;

d) requerimento de lavra: no prazo de um ano, após a aprovação do relatório de pesquisa, o

empreendedor requererá a lavra da jazida ao DNPM, submetendo a sua apreciação o PAE

acima mencionado. Sendo o requerimento deferido, o titular poderá obter a concessão de lavra

através de Portaria assinada pelo Ministério de Minas e Energia. O concessionário terá o

prazo de seis meses para iniciar os trabalhos de extração mineral, de acordo com as condições

técnicas constantes no PAE e exigidas pelo DNPM e pelo órgão ambiental competente.

O fluxograma a seguir, figura 1, apresenta resumidamente as etapas de tramitação processual

dos regimes de autorização e concessão. A partir da aprovação do relatório final de pesquisa o

regime de aproveitamento da jazida passa a ser o de concessão.

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Figura 1: Fluxograma da tramitação processual resumida do regime de autorização e concessão

Esses tipos de regimes são, em termos relativos, os de tramitação mais demorada,

normalmente aplicados a empreendimentos mineiros de maior porte e de natureza mais

complexa, onde se adota projetos mecanizados, como as lavras de diamante conduzidas por

dragas.

2.3.4 Regime de Permissão de Lavra Garimpeira – PLG

Este é o regime de aproveitamento mais apropriado para o garimpo artesanal ou manual,

segundo o seu porte (pequeno), a sua natureza (simples) e o tipo de substância explorada

economicamente – diamante, ou seja, mineral garimpável, de acordo com artigo 10, § 1°, da

Lei 7.805, de 18 de julho de 1989, que extinguiu o antigo regime de matrícula (4) utilizado

para as atividades garimpeiras no País.

(4) Antigo regime de extração voltado essencialmente para o garimpo, cuja regularização dependia apenas da emissão de um certificado de matrícula pela exatoria federal do município onde se localizava a jazida.

Requerimento de Pesquisa

Alvará de Pesquisa – execução da pesquisa máximo de 3 anos

Relatório de Pesquisa

Relatório Aprovado – um ano p/ requerer a lavra

Não aprovado – disponibilidade Inexistência da jazida disponibilidade

Requerimento de Lavra

Outorga da Lavra

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Na Permissão de Lavra Garimpeira – PLG – encontram-se menos etapas de tramitação

processual em comparação aos regimes de autorização e concessão. O título da PLG poderá

ser obtido se forem cumpridos os seguintes passos:

a) Processo de requerimento da PLG a ser protocolizado no Departamento Nacional de

Produção Mineral – DNPM, conforme Lei 7.805, de 18 de julho de 1989,

regulamentada pela Portaria n° 178, de 12/04/2004, DOU de 13/04/2004, do Diretor

geral do DNPM. A área máxima a ser requerida por pessoa física é de 50 hectares e,

por uma cooperativa, de 1000 hectares;

b) Análise do DNPM e Vistoria “in loco” com emissão de parecer quanto à sua

regularidade e desoneração da área requerida. O objetivo desta análise é a emissão de

uma declaração de aptidão do requerente para receber a PLG. Se o pedido de PLG for

indeferido será declarada sua disponibilidade por edital, conforme artigo quinto, da

Portaria Ministerial n° 12, de 16/01/1997;

c) Licença Ambiental: após a declaração de aptidão do requerente para receber a PLG,

ele terá noventa dias para apresentar a licença ambiental ao DNPM;

d) Outorga do título da PLG com a protocolização da licença ambiental: o título vigorará

por um prazo de cinco anos podendo ser renovado quando requerido pelo titular, a

critério do DNPM.

Em verdade, diferentemente dos regimes anteriores, o regime da PLG apresenta apenas três

fases básicas no processo de requerimento, com o objetivo de obter a PLG por outorga. A

licença ambiental, assim como em todos os regimes de aproveitamento mineral, faz parte dos

documentos necessários para instruir a tramitação do processo mineral.

O fluxograma básico (figura 2) mais fiel para a tramitação processual da PLG seria o

seguinte:

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Figura 2: Fluxograma resumido do requerimento de permissão de lavra garimpeira

Não é necessário, para este caso, a realização de pesquisa mineral nem de um projeto de lavra

mais complexo que exija um Plano de Aproveitamento econômico da Jazida, apesar de se

exigir o cumprimento das Normas Reguladoras da Mineração (Portaria do DNPM, n° 12, de

22/01/2002) no que couber, durante a execução da PLG (Lei 7.805, de 18 de julho de 1989,

regulamentada pela Portaria n° 178, de 12/04/2004, DOU de 13/04/2004, do Diretor geral do

DNPM). Essas normas são detalhistas na utilização da boa técnica de mineração, da

prevenção e recuperação ambiental e no que tange à segurança na mineração.

2.3.5 Dificuldades

As tramitações dos processos minerais são bem mais complexas do que aparentam. Essas

dificuldades são utilizadas como argumentos para a clandestinidade na mineração. Isto se

deve principalmente a dois fatos:

1) à grande quantidade de documentos e diplomas exigidos pelos órgãos da

administração pública federal, estadual e municipal; e,

2) à forte regulamentação de procedimentos alicerçada nas Leis, resoluções, portarias,

instruções, e memorandos circulares.

Os elementos de instrução e prova exigidos para instruir os processos relativos aos regimes de

aproveitamento mineral supramencionados serão resumidos abaixo.

Requerimento da PLG

Requerimento da PLG Análise do DNPM

Outorga do Título (5 anos)

Indeferido - disponibilidade

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Para os Regimes de Autorização e Concessão, que fazem parte de um mesmo processo

perante o DNPM, devem-se preencher formulários específicos e apresentar os seguintes

documentos e informações:

I – Dados completos do requerente;

II – Prova de recolhimento dos respectivos emolumentos;

III – Designação das substâncias a pesquisar;

IV – Indicação da extensão superficial da área objetivada e do Município em que se situa;

V – Memorial descritivo da área pretendida;

VI – Planta de situação;

VII – Plano dos trabalhos de pesquisa, acompanhado do orçamento e cronograma previstos

para a sua execução, elaborados por profissional legalmente habilitado;

VIII – Se o requerimento não for assinado pelo requerente, apresentar procuração original

com firma reconhecida;

IX – Prova de assentimento da Comissão Especial da Faixa de Fronteira, se a área encontrar-

se dentro de sua jurisdição;

X – Se a área requerida situar-se em leitos de rios navegáveis, lagos e na plataforma

continental, a pesquisa será autorizada com o assentimento dos organismos responsáveis pela

navegação;

XI – Se a área requerida situar-se na faixa de domínio das estradas de ferro, rodovias,

mananciais de água potável e áreas militares, dependerá de assentimento das autoridades

competentes;

XII – Após análise do DNPM, prova do pagamento da publicação do alvará no DOU;

Ainda inclui-se no período de vigência do alvará, até a apresentação do relatório final de

pesquisa:

a) - prova do acordo com o proprietário do solo, se o terreno for de terceiros;

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b) - prova do pagamento das taxas de ocupação das áreas;

c) - relatório consubstanciado dos trabalhos de pesquisa realizados na área, com seus

resultados.

Passando para o regime de Concessão, sendo este a continuação do regime anterior, são

necessários os seguintes documentos e informações:

I – Certidão de registro no Departamento Nacional de Registro do Comércio, da entidade

constituída;

II – Designação das substâncias minerais a lavrar, com indicação do Alvará de Pesquisa

outorgado, e de aprovação do respectivo Relatório;

III – Denominação e descrição da localização da área pretendida para a lavra e indicação do

Distrito, Município, Comarca e Estado, e, ainda, nome e residência dos proprietários do solo

ou posseiros;

IV – Definição gráfica da área pretendida. Configurar, ainda, as propriedades territoriais por

ela interessadas, com os nomes dos respectivos superficiários, além de planta de situação;

V – Servidões de que deverá gozar a mina;

VI – Plano de aproveitamento econômico da jazida, com descrição das instalações de

beneficiamento;

VII – Prova de disponibilidade de fundos ou da existência de compromissos de

financiamento, necessários para execução do plano de aproveitamento econômico e operação

da mina.

Quando tiver por objeto área situada na faixa de fronteira, a concessão de lavra fica sujeita aos

critérios e condições estabelecidas em lei.

Para o processo de requerimento do Regime de Permissão de Lavra Garimpeira são

necessários os seguintes elementos de prova e informação:

I – Dados do requerente;

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II – Sendo o requerente cooperativa de garimpeiros ou firma individual, indicação da razão

social e endereço e comprovação do número do registro de seus atos constitutivos no Órgão

de Registro de Comércio de sua sede e do número de inscrição no Cadastro Nacional da

Pessoa Jurídica do Ministério da Fazenda, bem como cópia dos estatutos ou contrato social ou

ainda da declaração de firma individual;

III – Designação da(s) substância(s) mineral (is), extensão da área em hectares e denominação

do(s) Município(s) e Estado(s) onde se situa a área objeto do requerimento;

IV – Memorial descritivo da área objetivada;

V – Planta de situação contendo a configuração gráfica da área e os principais elementos

cartográficos;

VI – Anotação de responsabilidade – ART do técnico responsável;

VII – Procuração, se o requerimento não for assinado pelo requerente;

VIII – Assentimento da autoridade administrativa do Município de situação do jazimento

mineral, em caso de lavra em área urbana;

IX – Prova de recolhimento dos respectivos emolumentos;

X – Localizando-se a área requerida em faixa de fronteira o requerente deverá, ainda, atender

às exigências do Decreto nº 85.064/80;

XI – Na hipótese de previsão de beneficiamento de minérios o requerente deverá apresentar

projeto de solução técnica a ser aprovado pelo DNPM e pelo órgão ambiental competente,

compatível com o racional aproveitamento do minério, da água e com a proteção ao meio

ambiente;

Comparando a legislação atual com a passada, antes de 1989 o garimpeiro precisava apenas

de um certificado de matrícula concedida pela Exatoria Federal do município onde seria

realizado o trabalho de garimpo.

Para obter esse certificado, bastava o garimpeiro requerer de forma verbal para ser registrado

no livro da Exatoria Federal do município, mediante a quitação do imposto sindical e o

pagamento da taxa remuneratória cobrada pela Exatoria. Esta matrícula era renovada

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anualmente na Exatoria Federal de cada município, com validade apenas para a região de sua

jurisdição (artigos 107 a 113 do Regulamento do Código de Mineração – Revogados pela Lei

7.805, de 18 de julho de 1989). Nesse certificado de matrícula constava somente o retrato, o

nome, a nacionalidade e o endereço do garimpeiro.

Salienta-se que os itens acima impostos pelos regimes de aproveitamento supracitados

representam apenas aqueles que são exigidos pela legislação minerária em vigor, constantes

no Código de Mineração. Entretanto, para a obtenção do direito à extração mineral, torna-se

também obrigatória a submissão à regulamentação ambiental para a aquisição das

LICENÇAS AMBIENTAIS correspondentes. Estas se encontram atreladas às legislações

federais, estaduais e municipais.

A tramitação processual relacionada à solicitação de uma licença ambiental corre

paralelamente ao andamento do processo mineral ligado ao DNPM, dependendo um processo

do outro. As instruções dos processos de licenciamento ambiental encontram-se subordinadas

às legislações estaduais, que por outro lado derivam principalmente das resoluções do

Conselho Nacional do Meio Ambiente – CONAMA.

2.3.6 Licenciamento Ambiental

Como exemplo, serão apresentados abaixo os documentos e informações necessárias para se

efetuar a instrução de um processo de autorização ou licenciamento ambiental de

empreendimentos mineiros do estado da Bahia, segundo a Lei Estadual n° 7.799, de

07/02/2001 e seu regulamento, o Decreto-Lei N° 7.967, de 05/06/2001. O órgão licenciador é

denominado de Centro de Recursos Ambientais – CRA. Os itens exigidos são os seguintes:

I – Certidão da Prefeitura Municipal;

II – Roteiro de Caracterização do Empreendimento – RCE;

III – Original da publicação do pedido da licença;

IV – Cópia da publicação da licença anterior se for o caso;

V – Auto-avaliação do cumprimento dos condicionamentos da licença anterior;

VI – Comprovante do pagamento de remuneração fixada pela legislação estadual;

VII – Dependendo de alguns casos, anuência da Companhia de Desenvolvimento da Região

Metropolitana de Salvador – CONDER;

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VIII – Outorga de uso da água expedida pelo órgão competente;

IX – Autorização de supressão de vegetação expedida pelo órgão florestal;

X – Certidão de averbação da reserva legal;

XI – Laudo do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN;

XII – Alvará de Pesquisa do DNPM;

XIII – Guia de Utilização (5) de Minério expedida pelo DNPM;

XIV – Portaria de Lavra do DNPM;

XV – Anuência prévia do Pólo, Distrito ou Centro Industrial, se for o caso;

XVI – Cópia da ATA da constituição da CTGA, acompanhada do ART do Coordenador,

quando couber;

XVII – Declaração da Política Ambiental da Empresa;

XVIII – Anuência prévia dos órgãos e entidades federais, estaduais e municipais pertinentes;

XIX – Outras informações e ou memoriais complementares exigidos pelo CRA.

Além disso, os processos de licenciamento ambiental estão sujeitos a audiências públicas,

quando couber, ou quando forem necessárias a realização dos Estudos de Impactos

Ambientais e seu respectivo Relatório de Impactos Ambientais (EIA/RIMA – art. 166, do

Decreto-Lei estadual da Bahia N° 7.967, de 05/06/2001). O EIA/RIMA são elaborados

quando a atividade é considerada causadora de significativa degradação. Para a realização

desses estudos, o órgão ambiental precisa preparar um Termo de Referência – TR – indicando

as diretrizes de sua elaboração (art. 170, do Decreto-Lei estadual da Bahia N° 7.967, de

05/06/2001).

Pode-se observar pela documentação e diplomas exigidos para a boa instrução dos processos

de licenciamento ambiental, a maior dependência do empreendedor de diversas outras

instituições que os processos de requerimento mineral.

(5) Guia de Utilização: termo utilizado para designar lavra experimental, temporária e de produção limitada, concedida pelo DNPM antes da Portaria de Lavra, ainda na fase de pesquisa, com a finalidade de custeá-la e realizar testes diversos, tipo: lavrabilidade, testes de mercado, pesquisa mineral, etc. E´ necessária a apresentação da licença ambiental.

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Desta maneira, os fluxogramas exibidos anteriormente passariam a adquirir as seguintes

formas, agora definitivas:

Regime de Autorização e Concessão

Figura 3(a): Fluxograma definitivo dos procedimentos do regime de autorização e concessão considerando o

licenciamento ambiental

Requerimento de Pesquisa

Alvará de Pesquisa – execução da pesquisa máximo de 3 anos

Relatório de Pesquisa

Relatório Aprovado – um ano p/ requerer a lavra

Não aprovado - disponibilidade Inexistência da jazida - disponibilidade

Requerimento de Lavra

Outorga da Lavra

Licenciamento Ambiental – Guia de Utilização

Licenciamento Ambiental

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Regime de Permissão de Lavra Garimpeira

Figura 3 (b): Fluxograma do regime de PLG considerando a Licença Ambiental

Os fluxogramas acima exibidos demonstram a necessidade de se adquirir a licença ambiental

sempre no momento em que se alcançam as etapas de extração mineral, a saber: requerimento

de lavra, requerimento da permissão de lavra garimpeira e requerimento de Guia de

Utilização. Esta ainda na fase de pesquisa.

A tramitação do processo de licenciamento ambiental do estado da Bahia, passo a passo,

pode ser analisada abaixo, na figura 4:

Requerimento da PLG

Requerimento da PLG Análise do DNPM

Outorga do Título (5 anos)

Indeferido - disponibilidade

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Figura 4: Fluxograma demonstrando o processo de licenciamento ambiental pelo órgão do estado – CRA.

SOUZA, 2002.

No caso específico em pauta, para se exportar diamantes, ainda é preciso adquirir junto ao

DNPM ou, dependendo de determinadas situações, junto à Secretaria da Receita Federal, a

Certificação do Processo de Kimberley (Lei Nº 10.743, de 09/10/2003), fundamentada no

sistema de certificação internacional de origem dos diamantes brutos destinados à exportação

e à importação.

Um dos principais objetivos dessa certificação é impedir a comercialização de diamantes

extraídos irregularmente (lavra clandestina) perante o DNPM, além de impedir o

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financiamento de conflitos no mundo com esse comércio. A Lei Nº 10.743, de 09/10/2003,

DOU de 10/10/2003, no seu artigo n° 4, destaca os objetivos da seguinte forma:

Art. 4o O Sistema de Certificação do Processo Kimberley (SCPK) tem por

objetivos:

I – Assegurar o acesso da produção brasileira de diamantes brutos ao mercado

internacional;

II – Impedir a entrada, no território nacional, de diamantes brutos originários de

países não-participantes do Processo de Kimberley, bem como daqueles

originários dos países participantes, mas que estejam desacompanhados de

documentação compatível com aquele Sistema; e

III - Impedir a saída do território nacional de diamantes brutos desacompanhados

do Certificado do Processo de Kimberley.

No caso supracitado, a regulamentação atinge a etapa de comercialização, mas influencia

indiretamente na fase de produção mineral.

Portanto, para se adquirir uma Portaria de Lavra, diploma final dos regimes de autorização e

concessão, é necessário apresentar em torno de cinqüenta elementos de informação e prova,

além dos licenciamentos e anuências diversas. Para o caso da Permissão de Lavra Garimpeira

é preciso protocolizar uma quantidade aproximada de trinta elementos de informações e

diplomas legais.

Esta situação demonstra que para pessoas simples, como os garimpeiros tradicionais, a

regularização de suas atividades mineiras torna-se, em muitos casos, um estágio difícil de ser

alcançado.

A outra dificuldade em manter a atividade mineira regularizada é a forte regulamentação

fundamentada em Leis, resoluções, portarias, instruções e memorandos circulares.

As leis e normas são criadas de forma aleatória e isoladamente por instituições diversas,

muitas vezes desconsiderando o setor produtivo. A falta de harmonia e conhecimento mais

profundo do tema resulta na criação de uma regulamentação fragmentada, obrigando ao

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60

empreendedor a realizar procedimentos repetidos em busca da legalização de sua atividade.

Esta situação tem penalizado principalmente aquele que busca uma atuação regularizada.

Alguns exemplos elucidativos dessa dessintonia institucional encontram-se nas Resoluções do

CONAMA, como a de N° 303, de 20/03/2002, que chegou a criar dificuldades para as

minerações nos topos de morro, consideradas como Áreas de Proteção Ambiental – APPs –

onde se encontram as principais atividades mineiras no Brasil. Pode-se citar também a

Resolução N° 005, de 06/08/1987, que apresenta uma definição altamente abrangente de

caverna, caracterizando-a como qualquer cavidade penetrável pelo homem. A

complementação desta resolução é feita pela Resolução N° 887, de 15 de junho de 1990, que

proíbe atividades que alterem, em qualquer nível, as cavernas (Rio Grande do Sul – Coletânea

de Legislação Ambiental, 2003).

Até mesmo as normas elaboradas pelo DNPM, órgão responsável em gerir e fiscalizar a

mineração no País, são desarmônicas em relação às outras instituições e não analisam

devidamente as conseqüências de suas aplicações. Percebe-se que não existiu e ainda não

existe um planejamento para a normatização a médio e longo prazo, que pondere a

conformidade de ações entre os diversos órgãos e os seus reflexos naturais existentes dentro

do próprio DNPM. Os resultados são conflitantes, com utilização de normas criadas para

situações imediatas, sem o conhecimento prático profundo da problemática mineral.

Um exemplo patente foi a criação das Normas Reguladoras de Mineração (Portarias do

DNPM N° 237, de 18/10/2001 e N° 12, de 22/01/2002) que se confundem com as leis

trabalhistas e ambientais, exigindo do empreendedor esforços repetidos perante o DNPM, os

órgãos do trabalho (federais e estaduais) e órgãos ambientais. De acordo com essas normas o

empreendedor é obrigado a apresentar e a defender projetos semelhantes entre todos esses

organismos ao perseguir a legalização de sua atividade, sobrecarregando o setor com forte

regulamentação.

A questão da excessiva regulamentação pode também ser explicada pela quantidade de

portarias e instruções publicadas nos últimos anos. Somente do ano 2000 a 2004 foram

publicadas, apenas pelo DNPM, cinqüenta e nove portarias, ou seja, mais de uma portaria a

cada mês, sem considerar aquelas que foram revogadas. Para comparar, na década de oitenta

(século XX), foram publicadas apenas vinte e seis portarias, contando com as que foram

revogadas (Brasil – www.dnpm.gov.br – Legislação Minerária).

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A supramencionada enxurrada de portarias comprova a dificuldade em que se encontra o

DNPM para a adaptação à nova ordem econômica e ambiental. O órgão procura reduzir o

descontrole normativo, herdado da década passada, legislando com portarias, ao invés de

planejar e organizar ações em conjunto com as instituições que de alguma forma influenciam

no setor produtivo mineral, visando à publicação mais consistente das normas relativas às

atividades mineiras.

Essa postura dificulta os investimentos na produção mineral, caracterizados como

investimentos de risco. A situação torna-se notória, como no caso da Portaria que extinguiu a

cobrança dos emolumentos no ato dos requerimentos minerais, o que acabou abarrotando os

órgãos competentes de processos minerais, onerando as diversas regiões do País com a

ocupação das áreas requeridas para mineração. Outro exemplo encontra-se na Portaria que

regulamentou a redução dos limites das áreas requeridas, de determinadas substâncias, de mil

para cinqüenta hectares (Portaria N° 16, de 13/01/1997), sendo revogada três anos após pela

Portaria N° 40, de 10/02/2000, quando houve retorno aos limites anteriores de mil hectares,

gerando conflitos e ações na justiça, por parte dos usuários que se consideraram prejudicados.

Diante dessas condições embaraçosas, o errante garimpeiro, habituado a posturas simples e

práticas, entrega-se ao esmorecimento e cai na clandestinidade para se manter enquanto pode,

seguindo seus instintos. Evidentemente, há também casos de falta de compromisso e pura

ambição entre aqueles que agiram durante os mais de cento e cinqüenta anos na Chapada

Diamantina. Por isso, torna-se imperativo um diagnóstico mais próximo possível do real, para

poder-se planejar medidas que promovam o bom convívio entre a cultura garimpeira, o meio

natural e o turismo, apontado como atual solução econômica da região.

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3 – Considerações Metodológicas

Foram utilizados para a realização desta pesquisa, informações e dados obtidos em

observações de campo efetuadas pelo próprio autor desde 1997 até 2005. Várias campanhas

de campo foram programadas durante esse período na Chapada Diamantina, mas as

campanhas correspondentes a setembro de 1997, outubro de 1998, Junho de 2001 e abril de

2004 foram essenciais para auxiliar os diagnósticos e avaliações constantes neste texto.

Para superar a ausência de um acompanhamento expedito de trabalhos práticos inerentes aos

processos produtivos de diamantes da Chapada lançou-se mão de dados obtidos de relatórios

oficiais elaborados por técnicos do DNPM, que na época do funcionamento normal dos

garimpos, avaliaram o sistema de produção de diamante pari passu.

Dentre eles destaca-se o trabalho realizado em 1984 pelo geólogo Arlindo Simões dos Santos

Filho (DNPM), que testemunhou o pleno auge do garimpo de draga, emprestando o seu olhar

como testemunho do que ocorreu naquela época. Destaca-se, também, o trabalho de avaliação

executado em 1993, em nível de projeto, pelos geólogos Pedro A. Couto (CPRM) e Pedro

Ricardo Moreira (DNPM), que detalharam os problemas gerados pelo garimpo de dragas na

Chapada.

Outros dados foram adquiridos da publicação patrocinada pelo DNPM e CPRM, denominada

“Principais Depósitos Minerais do Brasil”, onde foi descrito o projeto de pesquisa executado

pela Companhia Baiana de Pesquisa Mineral – CBPM, discriminando e dimensionando os

serviços exploratórios sobre as aluviões dos rios São José e Santo Antônio, além de fornecer

seus resultados. Neste caso, o estudo foi aproveitado para elucidar as formas de ocorrências

do diamante na Chapada e o seu potencial diamantífero.

Além dos trabalhos supracitados, várias dúvidas foram sanadas por intermédio de entrevistas

efetuadas junto a especialistas do tema e, in loco, com antigos garimpeiros.

Outro ponto importante aproveitado pelo autor para bem diagnosticar e avaliar, desta vez, os

impactos negativos sobre o ambiente humano causados pela interdição do garimpo, foi a

aplicação, perante a população das cidades de Andaraí e Lençóis, de um formulário com

questões específicas do tema. Diversos organismos governamentais e não governamentais

ligados aos problemas da Chapada Diamantina foram também consultados.

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A sistemática utilizada na pesquisa pode ser observada abaixo pelas seguintes etapas:

Etapa 1 – organização, planejamento e acompanhamento da pesquisa: envolveu um estudo

bibliográfico de caráter geral e específico. Neste caso, abrangeu trabalhos relacionados às

questões genéricas e científicas da Chapada Diamantina.

Um dos objetivos desta etapa foi apreender os conceitos voltados para o ramo da mineração e

meio ambiente, incluindo setores distintos como o turismo, que participou do contexto geral

ligado ao sistema produtivo da Chapada.

As informações iniciais assimiladas por intermédio de uma bibliografia genérica e específica,

de teses de doutorado e dissertações de mestrado, de relatórios técnicos oficiais, de projetos

voltados para a região, alguns periódicos, trabalhos anteriores apresentados, de mapas e

fotografias e de sítios da Internet, serviram também de guia inicial para a organização e

planejamento da pesquisa em pauta.

Contudo, salienta-se que os estudos bibliográficos prolongaram-se, sem pausa sistemática, até

as conclusões finais desta dissertação.

O dimensionamento dos impactos causados sobre o meio natural foi possível graças a relatos

oficiais de técnicos descritos em documentos DNPM, que testemunharam o quantitativo

removido durante o funcionamento pleno do garimpo. Estas informações podem ser avaliadas

no capítulo que discute a geologia de região e do jazimento de diamante.

Os mesmos documentos oficiais subsidiaram sobremaneira na avaliação do impacto social

causado após a interdição do garimpo, uma vez que foi possível dimensionar os quantitativos

de dragas, de pessoal e o percentual da produção percebida por aqueles agentes que

participaram diretamente da produção de diamante. Esses dados, combinados com outras

informações que complementaram a pesquisa, após serem tratados adequadamente,

forneceram, em parte, a dimensão da perda sofrida pelos garimpeiros, depois do fechamento

dos trabalhos de extração de diamante na Chapada.

Os fatos da pesquisa podem ser constatados através de cópias de ofícios, memorandos, cartas

e matérias de jornais da época, adquiridas da biblioteca central de Salvador, que testemunham

momentos específicos ocorridos na história do garimpo da Chapada.

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Etapa 2 – desenvolvimento da pesquisa em campo: o início planejado dos trabalhos de campo

aconteceu em 2001. Porém, os trabalhos de campo que foram executados pelo autor desde

1997 e 1998, quando houve a interdição do garimpo com a sua participação efetiva, sendo que

em 1998 o mesmo autor coordenou as ações do DNPM de complementação da interdição

mencionada, foram muito importantes como testemunho da história vivenciada pela

comunidade Chapadense.

Os dados colhidos em 1997 e 1998, as suas observações de campo, as fotografias registradas,

os documentos oficiais arquivados, as discussões técnicas e entrevistas realizadas com outros

agentes que participaram daqueles eventos, acabaram construindo a memória técnica e

experimental deste trabalho, embora tenha ocorrido sem o intuito de alimentá-lo, formam

parte integrante importante da dissertação.

Por outro lado, a visita de campo realizada em 2001 foi, de fato, planejada para avaliar a

situação pós-interdição do garimpo. Foram necessários 15 dias na Chapada Diamantina, entre

as cidades de Lençóis, Andaraí e Palmeiras. Os principais itens considerados para a pesquisa

foram: o diagnóstico do impacto sobre o meio físico e o diagnóstico do impacto causado sobre

o meio antrópico.

Para se avaliar os impactos causados ao ambiente natural organizaram-se visitas a alguns

locais específicos da Chapada, como, por exemplo, os rios Preto, Santo Antônio e

principalmente o São José, locais que foram fortemente garimpados. Neste rio foram

percorridos em torno de 15 quilômetros pelas suas margens (Figura 5), onde se puderam

observar os fortes vestígios de degradação ambiental provocada pelo garimpo de draga,

mesmo após três anos de interdição. Este percurso foi realizado com veículo apropriado

(Toyota modelo Bandeirante), pertencente ao corpo de Bombeiros de Lençóis, que

acompanhou esta campanha de campo. Utilizou-se uma máquina fotográfica e um GPS para

se rastrear, através dos satélites, as coordenadas geográficas e o conseqüente posicionamento

do caminhamento realizado.

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A avaliação dos impactos gerados sobre o meio antrópico foi possibilitada com o

planejamento da aplicação de um formulário, com questões específicas do tema, junto às

populações de Lençóis e Andaraí, além das entrevistas efetuadas perante os organismos

governamentais e não governamentais e de discussões realizadas com personagens que

vivenciaram a questão do garimpo na região. Visando a simplificação das respostas e a

aceitação dos agentes para a entrevista as questões do formulário previram apenas respostas

dicotômicas (sim ou não), oriundas de perguntas inerentes ao garimpo e sua relação com o

meio ambiente e o turismo.

O formulário mencionado, entretanto, foi elaborado antes da visita planejada ao campo em

2001. Na sua elaboração lançou-se mão da opinião de profissionais experientes (foram

consultados 07 profissionais) sobre as questões do garimpo. Inicialmente elaborou-se a

primeira redação das questões para depois serem distribuídas as suas cópias, via Internet ou

em mãos, aos profissionais especialistas no tema, que em alguma época, coordenaram missões

relativas a extração mineral rudimentar. A maior parte dos profissionais devolveu o

formulário com as devidas críticas, de modo que se pôde adequar o formulário final para ser

aplicado junto às populações das cidades da Chapada.

Primeiramente aplicou-se o formulário junto à população de Andaraí e depois à população de

Lençóis. As perguntas eram feitas diretamente aos transeuntes das ruas dessas cidades, onde

se colhia o sim ou o não de cada um, em entrevista particular. Procurava-se de toda forma

manter a mais total isenção para que as respostas não sofressem qualquer tipo de influência

possível, e assim representassem o sentimento real da população com os episódios

relacionados à atividade garimpeira da Chapada.

O método de amostragem foi dividido em duas fases: amostragem não probabilística, por

julgamento, utilizada na escolha das cidades onde seriam aplicados os formulários, e,

amostragem probabilística aleatória, no momento da aplicação do formulário junto às

populações respectivas. Estes métodos serão rapidamente comentados no capítulo relativo ao

impacto social.

Etapa 3 – análise e ratificação de dados: nesta etapa os dados e informações obtidas nas

etapas supramencionadas, principalmente aqueles adquiridos nas viagens anteriores, foram

analisados e trabalhados, para se formar uma visão dos episódios e problemas ocorridos na

Chapada Diamantina. A manipulação dessas informações foi importante para se preparar as

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primeiras opiniões sobre os problemas da Chapada. As dúvidas remanescentes foram sanadas

com a realização de outra viagem ao campo, em abril de 2004.

Etapa 4 – pesquisa final de campo: a viagem a campo, organizada em 2004, buscou apreender

as condições mais recentes existentes, além de atualizar e rever as avaliações realizadas nas

viagens anteriores, eliminar as últimas dúvidas e complementar a pesquisa em pauta. Utilizou-

se um veículo apropriado, máquinas fotográficas e um aparelho rastreador de satélite (GPS).

Durante a viagem foram efetuadas algumas entrevistas com garimpeiros, com os responsáveis

do IBAMA no município de Palmeiras e com representantes da Câmara de vereadores de

Andaraí, além de observações efetuadas em campo juntamente com um antigo garimpeiro de

Lençóis.

Conclui-se, então, que as viagens de campo favoreceram a caracterização de um quadro

evolutivo dos momentos diversos e adversos a que foram submetidos o meio natural e

antrópico da Chapada Diamantina. Entre os objetivos e hipóteses desta pesquisa o autor tenta

acompanhar a evolução desse quadro nas entrelinhas da dissertação e nos seus registros

fotográficos.

Etapa 5 – tratamento dos dados e redação final da dissertação: envolve a elaboração do texto

final segundo as normas registradas no Manual de Estilo Acadêmico, propostas pela

Universidade Federal da Bahia – UFBA – em parceria com a Universidade de Salvador –

UNIFACS. Este manual atende ás normas da ABNT.

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4 – Características fisiográficas e geológicas da área

pesquisada

A área de estudo situa-se na Serra do Sincorá, próxima ao Parque Nacional da Chapada

Diamantina. A serra mencionada faz parte de um conjunto maior de relevos serranos

denominados de Chapada Diamantina.

Já a Chapada Diamantina se estende a sul até o Vale do Rio de Contas (um pouco acima da

latitude 14°), a norte passando pela cidade de Morro do Chapéu (logo abaixo da Latitude 10°)

e a oeste bordejando o vale do rio São Francisco. Sua extensão, de sul a norte, se aproxima

dos 400 Km (figura 6).

4.1 Localização e acesso

A área da pesquisa localiza-se na região central do estado da Bahia. As cidades de Lençóis e

Andaraí, escolhidas para o estudo de caso, localizam-se no lado leste do Parque Nacional da

Chapada Diamantina (Figuras 6 e 7). No mapa da figura 1, encontram-se as localizações

aproximadas dos pontos de caminhamento realizado na área.

As rodovias asfaltadas BR-324, BR-116 e BR-242 dão o acesso rodoviário. Partindo-se de

Salvador à cidade de Lençóis percorre-se a distância de 409 quilômetros. (Figura 7).

O acesso também pode ser feito por avião, através do aeroporto de Lençóis, situado no distrito

de Tanquinho. Os vôos são regulares, de ida e volta, de Salvador a Lençóis, de segunda feira a

sexta feira, pela empresa aérea “OceanAir”. O preço total da passagem, ida e volta, gira em

torno de R$ 680,00.

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Localização da Chapada Diamantina – zona da pesquisa

Parque Nacional da Chapada Diamantina. Área: 154.000 hectares Delimitação aproximada da Chapada Diamantina. Área: 140.000 Km² - Distância média de Salvador: 430 Km Figura 6 : Localização da Chapada Diamantina. Fonte: Matta (2002)

ZONA DA PESQUISA

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Vias de acesso à zona de estudo

Figura 7: Vias de acesso ao local da pesquisa

4.2 Características geomorfológicas

A Serra do Sincorá representa um planalto constituído de formações geológicas fracamente

dobradas, em posição sub-horizontal. Este planalto foi esculpido fortemente pela erosão, o

que resultou em formas de relevo específicas e marcantes para a região. Entre elas destacam-

se os canyons e alvéolos, resultados de alargamento de vales com a erosão dos anticlinais

(dobras em camadas rochosas com a parte côncava voltada para baixo), assim como

importantes falésias, presentes em boa parte da extensão da serra sobredita (que gira em torno

de 150 quilômetros). As principais falésias situam-se no setor ocidental da Serra do Sincorá

(Figura 8).

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Segundo o Projeto Chapada Diamantina elaborado pela CPRM e IBAMA, as altitudes

médias da Chapada atingem 800m. Os seus vales são escavados até 400m de profundidade do

seu topo. As partes mais altas alcançam a 1.700m.

Figura 8 : Exemplo de falésia – Serra do Sincorá. Foto: 2001

A obra acima citada descreve também na região, além dos alvéolos, dos canyons e das

falésias, as superfícies semi-aplainadas do topo, como outra forma de relevo considerável.

Os vales, escavados em forma de canyons, seguem as fraturas mais importantes nas rochas,

até a profundidade de 400m, abaixo do nível médio da Serra do Sincorá. Como exemplo cita-

se o vale do Paty e o do rio Capivara.

Mas são os alvéolos (figura 8), formas evoluídas dos vales, cercados por encostas escarpadas,

que recebem destaque no projeto sobredito. É citada a existência de três principais alvéolos na

Chapada Diamantina:

- O alvéolo do Rio Mucugezinho, ao norte do Parque;

- Aquele denominado de Caeté-Açu, no trecho centro-norte, desembocando no lado oeste do

Parque;

- O alvéolo denominado Campo Redondo, na faixa sul do Parque.

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4.3 Hidrografia

A rede hidrográfica da região não apenas condiciona a fauna e flora da Chapada Diamantina,

mas proporciona as suas principais paisagens, com quedas d’água sublimes e estações

balneárias de águas limpas. São particularidades que justificam o potencial turístico da região.

A área da pesquisa localizada na Serra do Sincorá e próxima ao PNCD faz parte da bacia

hidrográfica do Rio Paraguaçu, que drena uma superfície de 56.300 km2, conforme menciona

o Projeto Chapada Diamantina – CPRM/IBAMA (1994).

Os principais rios do Estado da Bahia nascem na Chapada Diamantina. Mais de 50% dos rios

dessa região fornecem água ao Estado, como, por exemplo, os afluentes que perenizam o rio

Paraguaçu. O rio Paraguaçu sozinho fornece água à barragem da Pedra do Cavalo, situada a

mais de 200 km a jusante da citada serra. Esta barragem abastece a capital baiana com água.

A importância do rio Paraguaçu é tão considerada que foi realizada uma reportagem especial

no jornal À Tarde, em 05/06/2004, destacando a ocupação de sua bacia em 11% da área total

do estado e o abastecimento de 80 municípios, além de revelar as variadas histórias,

curiosidades e vida sócio-econômica conduzida pela comunidade ribeirinha.

A matéria desse jornal lembra que, apesar da importância do rio Paraguaçu para a Bahia, não

existe ainda um projeto de Área de Proteção Ambiental para a sua nascente. Ademais, narra

histórias de antigos e atuais garimpeiros, apesar de raros, que obtiveram momentos de

felicidades com as descobertas das preciosas pedras de diamantes nas margens do rio e de

seus afluentes. Desta forma, revela-se a íntima relação existente entre os rios, os garimpeiros

e, enfim, a história da região.

Sob o aspecto geomorfológico, as maiores altitudes da chapada possuem grande importância

para a dinâmica climática e perenização dos principais rios. O terreno local acidentado serve

de anteparo para as massas de ares úmidos que vêm do oceano atlântico. O fenômeno gera

chuvas orográficas no flanco oriental da Chapada que, juntamente com a boa densidade de

drenagem local, asseguram a alimentação constante do rio Paraguaçu.

O rio Paraguaçu atravessa o Parque na sua parte central. Segue seu curso até,

aproximadamente, 20 km, quando a altitude cai de 1000m para menos de 400m. O rio Santo

Antônio, em menos de 10Km, passa pelo Parque a leste, sem perder altitude considerável

antes de se juntar ao rio Paraguaçu.

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Vários afluentes dos rios Paraguaçu e Santo Antônio possuem suas nascentes no Parque

Nacional:

- O rio São José, que passa pela cidade de Lençóis e corre de norte a sul, recebendo um

grande número de afluentes, encontra o Paraguaçu pela sua margem direita;

- O rio Preto possui correnteza que desce de noroeste para sudeste, passando pela cidade

de Palmeiras ;

- O rio Mucugê, que nasce na parte sul do Parque ;

- O rio Una, que nasce no setor sul do Parque, deságua também no rio Paraguaçu.

A forte inclinação desses rios em direção às zonas mais baixas, favorece o carregamento de

sedimentos e a conseqüente acumulação das aluviões. Esses sedimentos são derivados

inclusive da erosão dos conglomerados diamantíferos da Chapada, resultando nos depósitos

recentes das camadas de interesse para os garimpeiros.

4.4 Vegetação

A diversidade dos tipos de vegetação do Parque Nacional e de seu entorno é o resultado de

um conjunto de diferentes fatores abióticos da região, como os solos, o clima, a topografia e a

altitude.

FUNCH (1986) apud MOREIRA & COUTO (1993), lançou mão do clima chuvoso (1200 a

2000mm/ano), comum nas serras da Chapada, como também do conseqüente escoamento

rápido das águas e dos tipos de rochas que dão origem ao solo ácido, para argumentar a

formação da vegetação rarefeita, composta de espécies endêmicas, típicas de serras úmidas, a

saber: orquídeas, bromélias, cactos, velosiáceas, filodendros e sempre-vivas.

Por outro lado, de acordo com o Projeto Chapada Diamantina CPRM/IBAMA, pode-se

encontrar, no setor de estudo desta pesquisa, a existência de algumas formas de vegetação

típica de floresta nos flancos do platô e nos seus vales. Vegetações típicas de cerrado, assim

como a vegetação rupestre e pioneira são também encontradas na região da Chapada.

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4.5 Clima

O clima da Chapada Diamantina é tropical úmido típico (Projeto Chapada Diamantina,

CPRM/IBAMA, 1994) com precipitações pluviométricas máximas de novembro a janeiro e

mínimas entre junho e setembro. Em geral, as precipitações situam-se entre 800mm à

1400mm/ano. A estação seca pode durar de 4 a 6 meses por ano.

Mas o clima da serra do Sincorá é diferente do clima das outras regiões da Chapada. Quando

o relevo oriental do planalto se situa acima dos alísios – ventos úmidos que vêm do oceano

Atlântico – ocorrem precipitações de chuvas orográficas, o que caracteriza as zonas de clima

tropical úmido. As chuvas começam a partir de novembro e diminuem em junho, início da

estação seca. A cidade de Lençóis é submetida a uma precipitação média anual de 1.363 mm,

com apenas 2 a 3 meses de estação seca.

Apesar de sua baixa latitude, a zona da pesquisa, localizada entre a cidade de Lençóis e

Andaraí, apresenta um clima agradável com uma temperatura média de 16,4°C, no mês de

junho. A temperatura média anual é de 20°C.

4.6 Geologia e descrição dos depósitos diamantíferos (placers (6))

Nesta seção será discutido, de maneira resumida, o quadro geral da geologia da região da

Chapada, tomando como exemplo o setor correspondente ao Parque Nacional (PARNA).

Para a realização deste estudo utilizaram-se quatro obras da literatura técnica e científica:

- Chapada Diamantina Oriental – Bahia – Geologia e depósitos – editada em 1996 pela

extinta Superintendência de Geologia e Recursos Minerais da Bahia – SGM e escrita por

MISI, A. & SILVA, M. G.;

- Projeto Chapada Diamantina – Informações Básicas para a Gestão Territorial – elaborado

pela CPRM em convênio com o IBAMA em 1994.

- Projeto Chapada Diamantina – Relatório da 2° Etapa (1993) – DNPM/CPRM. Elaborado por

MOREIRA, P. R. & COUTO, P.A.;

(6) Depósito natural de um mineral útil, normalmente de densidade elevada, por concentração mecânica, em cavidades e armadilhas diversas existentes principalmente nos leitos dos rios.

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- Folha de Lençóis – DNPM/CPRM, 1990, elaborada pelo Programa de Levantamentos

Geológicos Básicos do Brasil.

Tais obras podem ser consideradas suficientes na busca do objetivo de informar apenas o

quadro estratigráfico principal da Chapada, sem um aprofundamento nos pormenores

geológicos-científicos, prescindíveis para a proposta desta pesquisa.

Geologia da região pesquisada

Sob o plano regional a Chapada Diamantina está inserida na Província(7) São Francisco

(ALMEIDA, 1977, apud MOREIRA & COUTO), cujos limites coincidem com aqueles do

Crato(8) São Francisco.

O Crato São Francisco é constituído por um complexo de rochas cristalinas consolidadas,

apresentando idade mais antiga que 1,7 bilhões de anos. Este Crato corresponde a uma

seqüência tectônica inserida no Escudo (Crato) Atlântico.

Sobre esse Crato depositaram-se as formações sedimentares bem consolidadas

correspondentes às coberturas das plataformas do escudo Pré-cambriano. São formações de

idade Pré-Brasiliana (mais antigas que 958 milhões de anos – Super Grupo Espinhaço) e de

idade Brasiliana (entre 958 e 767 milhões de anos – Super Grupo São Francisco).

Como aconteceu a deposição dessas rochas pré-cambrianas? Segundo ALKMIM (1993) apud

MISI & SILVA (1996), a deposição dos sedimentos iniciou com a abertura de uma estrutura

fundamental semelhante a uma gigantesca ruptura (600 Km de comprimento) ocorrida no

embasamento cristalino (neste caso, o Crato S. Francisco) há 1,7 bilhões de anos na Chapada

Diamantina Ocidental. Esta ruptura teria sido preenchida por sedimentos proterozóicos da

Chapada. A leste originou-se uma plataforma relativamente estável até o proterozóico

superior. A cicatriz resultante da ruptura do tipo supracitado foi denominada por COSTA &

INDE (1982) apud MISI & SILVA, de Aulacógeno.

_____________________________________________________________________________________________________ (7) Província magmática: associação de rochas consangüíneas, diferenciadas ou não, situadas em uma área delimitada (LEINZ & LEONARDOS, 1977) (8) Crato: massas rochosas pré-pelaeozóicas que não sofreram ulteriores dobramentos orogenéticos, onde se depositaram as rochas sedimentares mais recentes (LEINZ & LEONARDOS, 1977).

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Grupo Paraguaçu

Localmente, as Formações mais antigas depositadas na zona do Parque Nacional e

proximidades, estão inseridas no contexto estratigráfico do Grupo Paraguaçu. Podem-se

encontrar Formações compostas de siltitos, argilitos, arenitos e conglomerados. De acordo

com a literatura utilizada neste capítulo, no início da história sedimentar (há 1,6 bilhões de

anos), estava presente sobre a parte oeste do PARNA, uma planície aluvial com rios

entrelaçados, associados lateralmente a uma região desértica, com dunas e várias lagos

temporários. Nesta época, foram depositados areias e cascalhos de origem fluvial,

intercalados com areias de origem eólica. A paisagem era composta por dunas típicas com

lamas nas zonas inter-dunares. Estes sedimentos foram em seguida cobertos por depósitos

transacionais marinhos, constituídos de lama silte-arenosa.

Formação Tombador

Sobre os sedimentos do Grupo Paraguaçu depositaram aqueles correspondentes à Formação

Tombador do Grupo Chapada Diamantina (Super Grupo Espinhaço). Esta Formação é

composta por arenitos e conglomerados diamantíferos. Estes últimos, por intermédio dos

processos erosivos, representam as rochas fontes dos depósitos recentes de diamante

(aluvionares e coluvionares). Os sedimentos da Formação Tombador (Figura 9), por outro

lado, são oriundos da erosão das cadeias montanhosas que se elevaram à leste do PARNA a

saber: serra da Jacobina e complexo geológico Contendas-Mirante. A erosão formou os

leques de cascalhos espraiados sobre os flancos das montanhas que deram origem,

posteriormente, aos conglomerados citados, rochas fonte dos diamantes da região.

Os conglomerados são encontrados principalmente próximos às cidades de Lençóis, Andaraí e

de Mucugê. Eles são formados por seixos variados de arenitos, quartzitos e quartzos. Todos

exibindo cores diversas, dos quais são derivadas as areias coloridas utilizadas pelos artesões

locais para confeccionar motivos artísticos em garrafas de vidro que fazem parte dos produtos

comercializados junto aos turistas.

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Figura 9 : Detalhe de um conglomerado da Formação Tombador. Podem-se observar as diferentes cores dos seus seixos. Foto: CPRM, 1994.

Formação Caboclo

Entre 1,3 e 1,2 bilhão de anos, a Formação Tombador foi invadida na parte norte do PARNA

pelo mar conhecido como Mar Caboclo. Este mar remanejou os sedimentos continentais sub-

jacentes. Os arenitos bem classificados da Formação Caboclo, do Grupo Chapada Diamantina

(Super Grupo Espinhaço), com seus elementos detríticos bem remanejados, exibem estruturas

típicas que testemunham atividades de maré: ripple-marks e estratificações oblíquas (tipo

espinha de peixe – Figura 10). Pode-se observá-las no lado leste da serra do Sincorá entre as

cidades de Lençóis e Andaraí. Os períodos das marés calmas alternadas com as marés

tempestuosas são caracterizados geologicamente pelos depósitos de camadas intercaladas de

sedimentos argilosos (lama) e arenosos. Os sedimentos finos, como as argilas, indicam

ambientes aquáticos calmos, já os sedimentos de granulometria grosseira apontam para

ambientes de maior energia.

Formação Morro do Chapéu

O Grupo Chapada Diamantina possui estratigraficamente, no seu topo, a Formação Morro do

Chapéu, derivada de ambientes continentais com sedimentos fluviais e eólicos e, localmente,

de ambiente marinho raso que retrabalhou sedimentos continentais de natureza eólica. Esta

formação é composta, portanto, de arenito esbranquiçado grosso a muito grosso, mal

selecionado, alternado com conglomerado. No seu topo passa a um quartzoarenito (arenito

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composto essencialmente de quartzo) fino, bem selecionado, róseo, com bimodalidade e

cruzadas tangenciais de muito baixo ângulo.

Figura 10 : Formação Caboclo. Estratificação oblíqua tipo espinha de peixe. Fonte: CPRM, 1994.

Formação Bebedouro

A história geológica do Parque e do seu entorno continua, agora com o largo episódio de

glaciação, responsável pela interrupção da grande acumulação sedimentar. Isto ocorreu há

cerca 970 milhões de anos. Este fenômeno foi responsável pelos depósitos dos conglomerados

e pelitos (rochas sedimentares de granulação fina) da Formação Bebedouro pertencente ao

Grupo Una (Super Grupo São Francisco) (Figura 11).

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Figura 11: Formação Bebedouro. Sedimentos glaciais bem representados pelo seixo ‘’pingado’’, oriundo de um provável iceberg, dentro de uma matriz composta por sedimentos finos. Fonte: CPRM, 1994.

Formação Salitre

Formação composta por rochas carbonáticas, típica de uma sedimentação epicontinental(9) de

plataforma. De acordo com o Projeto Chapada Diamantina CPRM/IBAMA, esta

sedimentação teria ocorrido devido a uma invasão marinha. Ela é caracterizada no campo pela

presença das rochas calcárias e dolomíticas à leste e sul do Parque.

Lacuna de formações paleozóicas e mesozóicas no setor da pesquisa

Conforme a literatura utilizada, no setor do Parque Nacional e arredores, não existem traços

de depósitos sedimentares das eras paleozóica e Mesozóica. As formações descritas acima

foram cobertas na parte leste do Parque por sedimentos de idade recente, derivados dos

depósitos de origem aluvial e coluvial do período quaternário. A superfície de separação entre

os sedimentos pré-cambrianos e os recentes corresponde a uma discordância do tipo erosiva.

Os sedimentos quaternários encontram-se principalmente ao longo do rio Paraguaçu e de seus

dois afluentes, Santo Antônio e São José. São os depósitos que contém os cobiçados

diamantes.

___________________________________________________________________________

(9) Epicontinental: mar raso que cobre uma área continental mais ou menos vasta. Exemplo: Mar Báltico.

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A figura 12 resume a geologia anteriormente descrita no mapa geológico simplificado, apenas

da região da pesquisa, adaptado da Folha Lençóis (DNPM/CPRM) de 1990. A seguir, na

figura 13, pode-se observar a coluna estratigráfica que também resume a geologia da área

estudada.

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Quadro Estratigráfico da Chapada Diamantina

Zona de Estudo - PARNA

Figura 13: Coluna estratigráfica da região de estudo

Ilustração 2005.

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4.6.1 Descrição dos depósitos diamantíferos recentes

Segundo a publicação ‘’Principais Depósitos Minerais do Brasil”, DNPM/CPRM (1991), o perfil

característico dos depósitos aluvionares é constituído de uma camada de estéril (areia ou argila) e de

uma camada de minério (cascalho diamantífero) (Figura 14). Às vezes se observa na camada de

estéril uma intercalação de areia fina com areia preta.

Figura 14: Perfil característico do depósito aluvionar

A existência de uma camada de matéria orgânica semidecomposta em contato com a parte

superior do cascalho constitui um guia na procura do cascalho rico em diamante. Este tipo de

perfil pode ser encontrado nas aluviões do rio Santo Antônio.

4.6.2 Descrição do perfil litológico das aluviões

De acordo com a publicação da obra supracitada, três tipos de depósitos foram identificados:

1) Depósitos de diques marginais:

Eles são compostos por areias de granulometria média a grosseira, quartzosa, de cores branca

e marrom, com presença de argila. Estes sedimentos compõem em sua maioria o estrato

estéril do depósito.

Espessura aproximada : 9 metros

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2) Depósitos residuais de canal:

Eles são constituídos de cascalhos médios a grosseiros com matriz areno-argilosa. Os grãos,

seixos e blocos são bem arredondados e formados de quartzito, meta-arenito, silexito, quartzo

e arenito, em proporções diferentes. Estes sedimentos foram depositados sobre o bedrock (10)

(siltito ou argilito). Eles estão cobertos por areia, argila e solos orgânicos. Sua espessura varia

entre 1,5 m à 0,10 m.

3) Depósitos de várzea e solos orgânicos:

Representam sedimentos essencialmente argilosos, orgânicos, pouco arenosos e escuros. Eles

possuem espessuras de até 10 m e ocupam zonas bem definidas ao longo dos prováveis cursos

simultâneos dos rios. Às vezes eles repousam sobre o cascalho diamantífero.

Concentração de diamantes

As concentrações de diamantes e de outros minerais pesados nas zonas mineralizadas

encontram-se sob a forma de Placers (nota rodapé n.° 6). A parte pesada se deposita

normalmente com os sedimentos grosseiros, o que indica a maior probabilidade de encontrar

diamantes nos depósitos residuais de canal. Os minerais acumulados são o diamante, o ouro, o

zircão, o coríndon, o diopsídio, a ilmenita, a turmalina e outros.

Na principal zona do estudo (rio São José), a camada de aluvião (estéril mais cascalho) tem

uma espessura média de 10,93 m, a camada de cascalho, que constitui o minério, possui a

espessura média de 1,03m. O resultado é a relação estéril/minério de 9,61:1.

Diamantes

Os diamantes existentes na Chapada Diamantina são principalmente do tipo pedra preciosa.

Não existe ainda um estudo que determine a sua quantidade em relação ao diamante

industrial. No entanto, de acordo com alguns estudiosos estima-se a relação de 6/1. Os pesos

mais comuns dos diamantes registrados foram de 0,3 a 0,4 quilate(11) (Principais depósitos

minerais do Brasil – 1991). Os diamantes apresentam cores variadas, podendo-se encontrar

pedras transparentes, vermelhas, marrons, verdes e amarelas (figura 15).

__________________________________________________________________________ (10) Bedrock : rocha sólida subjacente ao manto de intemperismo ou a depósitos pouco consistentes (11) O quilate (ct) é uma medida de peso padrão equivalente a 0,2g. O quilate também equivale a 4 grãos ou 20 pontos, medidas estas bastante utilizadas pelos garimpeiros da Chapada.

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Conforme SVISERO & CHAVES (1999) diamantes com essas características são

provavelmente oriundos de fontes distantes. Eles salientam que quanto mais impuro for o

mineral, maior será a sua tendência de pulverização em um meio de transporte ativo como o

fluvial e marinho. Portanto, a população de diamante, com características “perfeitas” deve

indicar em termos estatísticos, uma longa e complexa história de deposição, na qual o mineral

mais resistente fica preservado.

Os autores sobreditos lembram, então, que esse é o caso dos diamantes da Serra do Espinhaço

(que se prolonga do sul de Minas gerais ao Norte da Bahia), onde a fonte dos diamantes situa-

se em local distante.

Figura 15: Diamantes da Chapada Diamantina

Foto: Teixeira, 1998.

SVISERO & CHAVES (1999) ainda comentam que os diamantes produzidos diretamente das

fontes primárias (rochas vulcânicas tipo Kimberlito e Lamproíto) apresentam teores

expressivos, como o da jazida de Argyle, na Austrália. Esta jazida alcança o incrível teor de

18 ct/m3 (no rio São José o teor é 0,074 ct/ m3), colocando-a como a maior produtora do

mundo, mas apenas 5% dos diamantes apresentam qualidade gemológica, fazendo com que o

preço médio do quilate caia para US$ 10,00 (o diamante da Chapada, segundo alguns

garimpeiros, pode alcançar a média de 300 dólares/ct).

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Esses autores também definem o carbonado (diamante industrial) como pedra do tipo

policristalina, composta por um agregado de micro-cristais de diamantes, de cores cinza ou

preta, muito porosa e de aspecto irregular. Os micro-cristais de diamante que compõem o

agregado possuem dimensões reduzidas, da ordem de 0,01 a 0,001mm.

4.7 Reservas de diamantes do setor de estudo (rios São José e Santo

Antônio)

Ainda a publicação do DNPM/CPRM, ‘Principais Depósitos Minerais do Brasil’ (1991),

expõe alguns trabalhos de prospecção de diamantes realizados na bacia do Paraguaçu, que

compreende o próprio rio Paraguaçu e seus dois afluentes principais: rios Santo Antônio e São

José.

Adotando um método empírico, a pesquisa em pauta utiliza as informações desses trabalhos,

para que sejam realizadas as avaliações fidedignas necessárias, inerentes à produção de

diamantes na região.

Os mencionados trabalhos foram realizados pela Companhia Baiana de Pesquisa Mineral –

CBPM e suas filiais em 1979. Entre 1984 e 1985, a Companhia de Mineração Utinga Ltda,

filial da CBPM, efetuou pesquisas complementares para confirmar os resultados positivos dos

estudos de viabilidade econômica de 1979.

Os trabalhos estão relacionados ao requerimento mineral feito sobre o setor do rio São José,

de interesse desta pesquisa, e o outro sobre os rios Paraguaçu e Santo Antônio.

No campo, a metodologia dos trabalhos realizados por essas companhias para os estudos de

viabilidade comportou, principalmente:

- Sondagens banka de 2’’ a 4’’, à percussão, para reconhecimento das camadas do aluvião

recente;

- Sondagens (Bade) de grosso diâmetro (28”) e escavações tipo catas para amostragem de

grande volume e avaliação de teores de maneira a identificar as zonas de potencial

econômico;

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- Lavras experimentais com draga, a fim de definir a viabilidade do projeto e avaliar o melhor

método de explotação.

A seguir, encontram-se os resumos dos dados dos trabalhos executados:

Rio Santo Antônio :

- Sondagens banka: 380 furos, totalizando 3.984m;

- Sondagens de grosso diâmetro: 103 furos, totalizando 1.042m;

- Duas escavações (catas);

- Uma lavra experimental.

Rio Paraguaçu :

- Sondagens banka : 180 furos, totalizando 810m;

- 23 poços, perfazendo um total de 548m3.

Rio São José :

- Sondagens banka: 271 furos, totalizando 2.805m;

- Duas escavações (catas);

- Uma lavra experimental.

Os volumes das aluviões foram determinados utilizando-se a área de influência dos furos de

sonda e dos seus perfis com as espessuras médias do estéril e do cascalho. Os teores de

diamante foram determinados a partir das sondagens de grosso diâmetro (no rio Santo

Antônio), das escavações para abrir as catas, ou das lavras experimentais com dragas. Os

resultados dos teores foram dados em quilates por metro cúbico. Os volumes correspondentes

às escavações e às lavras por dragas foram dimensionados pelos perfis topográficos

detalhados (tabelas 1, 2, 3 e 4).

As análises foram feitas somente para os rios Santo Antônio e São José.

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4.7.1 Dados Sobre as Dimensões das Aluviões (Espessuras, Volumes, Teores e Reservas).

TABELA 1 – Espessura média das camadas de estéril e cascalho (em metros)

Fonte: Publicação Principais Depósitos Minerais do Brasil (1991) Obs. : Utiliza-se a média ponderada para o total das espessuras Obs. : Dados relativos às lavras experimentais de diamantes entre julho 84 e Dezembro 85

TABELA 2 – Volumes retirados durante as escavações e lavras experimentais (m3)

PARÄMETROS Valores médios registrados para cada rio

RIOS Santo Antônio (cata experimental)

Santo Antônio (escavação)

São José (lavra experimental)

Total

Camada de estéril (m3) 80.054,42 3.664,83 11.768,79 95.488,04

Camada econômica (cascalho) (m3)

10.686,39 313 1.227 12.226,39

Total 90.740,81 3.978,04 12.995,79 107.714,64

Fonte: Principais Depósitos Minerais do Brasil (1991)

PARÂMETROS

Valores médios registrados para cada rio

RIOS Santo Antônio (lavra experimental)

Santo Antônio (cata)

São José (lavra experimental)

Total

Camada de estéril (m) 7,95 5,23 9,9 7,98

Camada econômica (m) (cascalho)

1,06 0,44 1,03 1,02

Relação estéril/minério 7,50 :1 11,89 :1 9,61: 1 7,82 : 1

Área do bedrock exposta (m2)

10.068,8 700 1.188 11.956,8

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TABELA 3 – Teores em diamantes (quilates)

PARÄMETROS Valores médios registrados para cada rio

RIOS Santo Antônio (lavra experimental)

Santo Antônio (escavação – cata)

São José (lavra experimental)

Total

Diamantes achados (1) 1.037,19 6,78 90,95 1.134,92

Ct/m3 (total (2)) 0,0114 0,0017 0,0069 0,0105

Ct/m3 (cascalho(3)) 0,0970 0,0216 0,0741 0,0928

Fonte: Principais Depósitos Minerais do Brasil (1991) (1) Peso total encontrado no volume de sedimento retirado (estéril + minério) ; (2) Teores em diamante encontrados no volume de estéril mais minério; (3) Teores em diamante encontrados apenas na camada de cascalho.

TABELA 4 – Reservas aluvionares na bacia do rio Paraguaçu

Rios

Reserva aluvionar Total (m3)

Reserva de cascalho (m3)

Relação estéril/minério

Reservas de diamantes (ct)

Teores médios das aluviões

Alto Rio Santo Antônio

39.963.031 10.851.681 2,68/1 455.578 0,0114 ct/m3

Rio São José 45.655.750 3.183.890 13,34/1 315.025 0,0069 ct/m3

Fonte: Principais Depósitos Minerais do Brasil (1991)

Observações

- As avaliações serão direcionadas para o rio São José, afluente do rio Paraguaçu

- Em 1979, foi realizado um estudo na área das aluviões do rio São José pela Companhia

Baiana de Pesquisa Mineral – CBPM. O objetivo desse estudo era efetuar o primeiro

dimensionamento das reservas de diamantes e analisar a viabilidade econômica do projeto.

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Observações sobre os depósitos (placers) do rio São José

As observações a seguir referem-se ao rio São José, mas podem ser estendidas a outros

lugares da Chapada, o que permite a sua aplicação aos outros depósitos aluvionares da região.

O caso do rio São José poderia, então, servir como exemplo.

A área escolhida como exemplo possui 7.300m de comprimento sobre 100 a 540m de largura.

- Em 1979, concluiu-se que não havia uma espessura média para as aluviões do rio em

discussão; durante os trabalhos de prospecção com os furos de sondagens, o bedrock (nota de

rodapé n.° 10) foi encontrado a uma profundidade que variava de 3,5 m a 16,40 m. Observou-

se a presença de paleocanais (antigos canais fluviais);

- A camada de cascalho verificada apresentou uma granulometria entre 8cm e 80cm (seixos e

matacões acumulados no fundo dos canais); o estéril (areia e solo) mostrou aproximadamente

uma granulometria composta de 50% de areia fina, 30% de areia argilosa e 20% de areia

grossa;

- O bedrock era composto principalmente de siltito e arenito (rochas sedimentares);

- Em 1979, a avaliação das reservas foi estimada ao redor de 29.155.372 m3 de volume

aluvionar e de 1.922.876 m3 de volume de cascalho. Isto significa que a zona pesquisada foi

menor que aquela de 1984/1985 (ver tabela 4).

- Por outro lado, no decorrer do período 1984/1985, durante os trabalhos de pesquisa e de

lavra experimental, concluiu-se que o projeto de explotação por draga no rio São José não

seria viável. Esta conclusão deveu-se à má relação entre a camada de estéril e de minério, bem

como por causa das freqüentes invasões dos garimpeiros para extrair clandestinamente os

diamantes da área. O estudo de 1985 concluiu também que aproximadamente 50% da

reserva dimensionada foi lavrada pelos garimpeiros.

- Então, pode-se deduzir que para a região do rio São José, teriam sido explotadas

clandestinamente, pelo menos, 22.827.875m3 de aluvião até 1985 pelos garimpeiros,

considerando a última reserva de aluvião calculada de 45.655.750m3, constante na tabela n° 4

(quatro).

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Pode-se considerar também, a pequena lavra experimental executada em 1979, para se efetuar

os primeiros cálculos de reserva, onde se retirou o volume de 9.863m3 de aluvião, bem como a

lavra experimental de 1984/1985 que extraiu ao redor de 12.995,79 m3 de aluvião. Estes

volumes poderiam ser adicionados àqueles que teriam sido retirados pelos garimpeiros.

Assim, o total estimado das aluviões removidas até 1985 seria:

Total de aluvião = 22.827.875 + 12.995,79 + 9.863 = 22.850.733 m3.

Este total corresponde à remoção aproximada de 97.820m 3 por hectare ou a uma extração

equivalente a mais de 16.000 caminhões caçamba de 6 m3 de basculante, carregados de

sedimentos aluvionares, por hectare.

Depois de 1985, os garimpeiros continuaram a extrair diamantes da área em questão (rio São

José) e de outras regiões da Chapada Diamantina. Entretanto, não se dispõe desses

quantitativos relativos aos anos posteriores a 1985 para se avaliar os volumes excedentes

removidos, por se tratarem de atividades irregulares.

O que se acredita é que os garimpeiros que trabalharam com dragas continuaram a extrair de

forma semelhante em outras aluviões da região, provocando muito impacto e produzindo,

relativamente, pouco diamante. O único pensamento era extrair diamantes, não importando

como e não importando onde.

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5 – História do garimpo e das descobertas de diamantes na

Chapada Diamantina

As expedições espanholas, realizadas na América do Sul e Central, impulsionadas pelo sonho

dos bens minerais valiosos, já na era dos descobrimentos, rapidamente atingiram os seus

objetivos, considerando que os povos por elas conquistados mostravam-se conhecedores e

familiarizados com os metais preciosos existentes nos seus territórios.

Já no Brasil, ao contrário, o desconhecimento desses minerais pelos povos dominados

impediu que as tão cobiçadas descobertas de minerais nobres fossem facilitadas para as

expedições européias, adiando este feito para dois séculos após.

Estando as datas distribuídas entre os senhores de escravos – considerados aptos a sustentar

produções regulares e a arcar com o pagamento dos tributos respectivos – restava aos homens

livres, sem posses, embrenharem-se pelos lugares ermos, e então conduzirem suas lavras

distante das autoridades coloniais. Subiam as grimpas (12), daí a denominação de garimpos e

garimpeiros, e em seus serviços davam origem a novas descobertas.

As condições adversas de vida e trabalho, as dificuldades de obtenção de suprimentos e de

venda de produtos, sob forte repressão, favoreciam a coesão grupal e o desenvolvimento de

traços culturais próprios a essa gente marginalizada (Levantamento Nacional dos Garimpeiros

– DNPM, 1993).

Assim ocorreu com a ocupação do espaço na Chapada Diamantina que esteve sempre

vinculada à extração de seus recursos minerais. Em primeiro momento, a exploração do ouro

em Rio de Contas e em Jacobina, e, posteriormente, a dos diamantes, na região das lavras

diamantinas.

Desta forma, o garimpo tem sido uma tradição secular na Chapada, pois a ocupação do

território, a formação de sua gente, o patrimônio histórico cultural, o apogeu e a decadência,

estão intimamente ligados à atividade garimpeira. As realidades econômica, social e

ambiental, vivenciadas por alguns municípios integrantes da região, traz profundas marcas

decorrentes da extração mineral, em particular do diamante.

_________________________________________________________________________________

(12) Grimpa: segundo o dicionário Aurélio, ponto mais alto, cocuruto, crista.

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Embora alguns autores afirmarem ter sido desde início do século XVIII as primeiras

descobertas de diamantes no estado da Bahia, foi apenas um século mais tarde que se

registrou oficialmente essa descoberta.

A Carta Régia de 16 de março de 1731, emitida pelo governador da época, Vasco Fernandes

Cesar de Menezes, proibiu a extração de diamantes fora da região diamantífera do estado de

Minas Gerais. Segundo Couto & Moreira (1993) e Nolasco (2002) o principal objetivo desta

medida foi garantir o controle fiscal da atividade extrativista e evitar a queda do preço do

diamante no mercado europeu. Nesta época o Brasil já era o maior produtor de diamantes do

mundo.

Desde que a permissão para extração de diamantes foi acordada em 1832 nas terras baianas,

foram criadas as condições para a colonização da Chapada (Projeto Chapada Diamantina –

CPRM /1994) e a conseqüente formação das suas cidades.

Já em 1841, registros oficiais relatam a descoberta de diamantes na Bahia pelo sargento-mor

Francisco José da Rocha Medrado ou um dos seus serviçais, em sua propriedade localizada as

margens do rio Mucugê (Figura 16 e 17), em Santa Isabel do Paraguaçu, atual Mucugê

(COUTO & MOREIRA, 1993).

Entretanto, de acordo com os registros de outras obras - Projeto Chapada diamantina (1994),

A. Misi & M. G. Silva (1996), Teixeira (1998), Nolasco (2002), Brito (2004), Funch (2004) e

sítios da Internet (2004), foi em 1844 que se descobriu oficialmente cristais de diamante na

região, que ficou conhecida como Lavras Diamantinas. O primeiro a encontrar a preciosa

gema na Chapada se chamava de José Pereira Prado (TEIXEIRA, 1998), dito por alguns

como coronel da região, para outros como comerciante, conhecido também como Zeca Prado.

As pedras foram encontradas com o auxílio de seu afilhado Cristiano Pereira do Nascimento.

Eles teriam descoberto, acidentalmente, as primeiras pedras de diamante nos leitos dos rios

Cumbuca e Mucugê (há quem diga que foi neste ou naquele rio), enquanto lavavam as mãos,

no mês de junho do ano mencionado. Aproximadamente três meses depois, no mesmo lugar, o

garimpeiro conhecido como Venceslao encontrou 380 quilates (Projeto Chapada Diamantina,

1994).

A divulgação dessas descobertas provocou um verdadeiro rush do diamante que fez reunir no

pequeno povoado de Santa Isabel, em menos de seis meses, uma população de mais de 25.000

habitantes. A partir daí, a Chapada tornou-se famosa pelo garimpo da gema tão cobiçada.

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Pouco depois, a localidade de Santa Isabel passaria a ser chamada de vila de Santa Isabel do

Paraguaçu (1847) ou Paraguaçu Diamantino, e mais tarde, a sede municipal de Mucugê, como

é conhecida atualmente.

Figura 16: Mapa topográfico de Mucugê. Detalhe para o rio homônimo. Limites do Parque

Curvas de nível de 40m; Coordenadas UTM: 240000 – 250000 Leste e 8560000 – 8570000 Norte.

Altitude de Mucugê: 900m. Fonte: FUNCH (2004)

Portanto, o garimpo de diamante na Chapada teria iniciado em Mucugê, tornando esta cidade

o centro de tudo, de onde rapidamente expandiu-se para o sul até o vale do Rio de Contas e

Barra da Estiva e, para o norte, passando pelas localidades onde se situam atualmente as

cidades de Andaraí e Lençóis, até atingir a Cidade de Morro do Chapéu. Assim foram

definidos os limites atuais da região conhecida como Chapada Diamantina.

Nolasco (2002) salienta que a Chapada foi colonizada em dois momentos: o primeiro, antes

das descobertas do diamante, com os bandeirantes, criadores de gado e garimpeiros de ouro, e

o segundo, após as descobertas oficiais dos diamantes em 1844. Neste caso, a fundação das

cidades foi lembrada da seguinte forma pela autora:

Antes de 1842/1844, os povoamentos existentes na região eram Mucugê (Santa Isabel do Paraguaçu), Campestre (atual Seabra), Brotas de Macaúbas e Cocho do

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Malheiros. Com o início da corrida garimpeira, em menos de 5 anos, já se encontravam de pé os núcleos de Lençóis, Andaraí e Xique Xique de Andaraí, hoje Igatu e Campos de São João, o primeiro deles.

Nos primeiros 20 anos após as descobertas dos diamantes, o garimpo era tão intenso que a

possibilidade de troca da capital do governo provincial para a Chapada foi cogitada. Defende-

se, inclusive, que na mesma época, o governo francês instalou um vice-consulado em Lençóis

(Projeto Chapada Diamantina – CPRM/1994).

Mas Teixeira (1998) contra-argumenta a versão supracitada afirmando não haver vestígios

que abone essa representação diplomática (p. 108). O mesmo faz BRITO (2004) lembrando

que não existem registros de documentos na embaixada francesa que pudessem comprovar a

existência outrora de um vice-consulado francês na Chapada. O autor acrescenta que esta

versão, como foi repetida diversas vezes no passado e atualmente por entidades do turismo e

meios de comunicação, acabou, no entanto, adquirindo aspecto de verdade.

Figura 17 : Rio Mucugê – onde teriam sido achadas as primeiras pedras de diamante na Chapada

Fonte : Teixeira, 1998

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A cidade de Lençóis, situada ao lado da antiga rodovia, terminou adquirindo o papel da

capital do diamante graças à quantidade de diamantes lá encontrada e à facilidade de acesso,

característica que, aliás, não dispôs a cidade de Mucugê, onde tudo começou.

Lençóis foi o grande centro mineiro da região, onde eram realizadas a lapidação dos cristais e

as feiras do diamante (figura 18). Lá acontecia de tudo: os garimpeiros analfabetos, que mal

falavam o português, eram freqüentemente encontrados discutindo negócios com

compradores experimentados oriundos de Paris e Amsterdam (TEIXEIRA, 1998). Em

Lençóis desenvolveu-se um centro urbano com arquitetura de estilo colonial típico da riqueza

mineira característica de certas regiões dos séculos XIX e XX no estado da Bahia.

Figura 18: um dia de feira de diamantes na cidade de Lençóis – início do século XX, provavelmente anos 20. (fonte: Teixeira – 1998)

Um fato que deve ser registrado em qualquer obra que envolva a história da Chapada

Diamantina é a forte influência européia exercida sobre as classes dominantes da região.

BRITO (2004) salienta que as principais famílias da Chapada cultivavam hábitos e traços

culturais característicos do estilo de vida europeu. E essas famílias tinham capacidade de

formar opiniões e, conforme o autor citado, “...junto aos membros de mentalidade mais

arejada do próprio grupo dominante e de serem imitadas pelos demais segmentos sociais.”

O autor citado ainda acrescenta:

Realizando-se a procura de marcas desta influência, elas encontram-se presentes na fachada de casas nas sedes municipais, nas edificações em ruínas abandonadas nas fazendas e na existência de pianos que segundo informações do ex-prefeito Olimpio Barbosa – “nos anos 40, Lençóis tinha em torno de quinze pianos, hoje deve ter uns dois”.

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Andaraí, embora tenha desenvolvido sua história também sob a influência do garimpo de

diamantes, ao contrário de Lençóis e Mucugê, que possuíam suas terras praticamente

anexadas aos mesmos grupos familiares, não foi um município de grandes latifúndios. Em

Andaraí, o garimpeiro trabalhou em terras próprias, reduzindo as diferenças entre as classes

sociais e os níveis de fortuna existentes. O desmembramento da vila de Paraguaçu

Diamantino ou Santa Isabel do Paraguaçu (como sustentam alguns autores), atual Mucugê,

fez Andaraí adquirir a categoria de Distrito, depois, de Vila e, posteriormente, a condição de

cidade, alcançada em abril de 1891 (TEIXEIRA, 1998).

Porém, nem tudo representava encanto na Chapada Diamantina: a fase de prosperidade que

perdurou por 25 anos, começara a declinar a partir de 1871, por causa das seguintes situações:

- a concorrência das jazidas sul-africanas de maior teor e mais fácil produção, associadas aos

kimberlitos (13), descobertas seis anos antes;

- a aplicação de métodos rudimentares de extração não permitiu a produção competitiva de

diamantes em jazidas de médio a baixo teores, como era o caso da Chapada.

Esse problema só não aumentou por causa de uma melhora considerável no preço do

carbonado. Este tipo de diamante, de uso industrial, foi, sobretudo, muito procurado na

fabricação de brocas utilizadas nas sondagens para as obras de abertura do canal do Panamá,

em 1880.

Em 1895 foi descoberto em Lençóis o maior carbonado do mundo até hoje, conhecido como

Carbonado do Sérgio. Seu peso era de 3.167 quilates (COUTO & MOREIRA, 1993).

No início do século XX (1900 - 1920), a região da Chapada conheceu um novo período de

abundância. As reservas de diamante eram suficientes para abastecer o mercado internacional

e o preço do cristal voltou a ficar atraente.

__________________________________________________________________________

(13) Kimberlito: rocha vulcânica, matriz primária do diamante.

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Alguns proprietários de terrenos onde se localizavam os garimpos tendo obtido sucesso e

fortuna, conquistaram o papel de líderes da região. Estando distante da capital e dos centros

urbanos, eles dispuseram de importante poder econômico e social, reconhecido inclusive pelo

governo da província. Alguns nomes ficaram na história da extração de diamantes da Chapada

Diamantina. Entre eles pode-se citar Reginaldo Landulfo da Rocha Medrado e mais

recentemente (aproximadamente 1920), o mais influente de todos, Horácio Queirós de

Mattos. Segundo Teixeira (1998), o coronel Horácio de Mattos participou de um famoso

desacordo com o governador do Estado da Bahia da época, Antônio Moniz. A intervenção do

Governo Federal foi necessária para controlar a desavença.

Depois de 1920, iniciou outra etapa de decadência para as Lavras Diamantinas. De acordo

com “os Principais Depósitos Minerais do Brasil” (1991), os preços internacionais haviam

tombado, em parte, pelas oscilações do mercado causadas por vários conflitos de guerra no

mundo, e de outra parte, pela exaustão das reservas de extração mais fácil, que ocorriam

principalmente nas regiões serranas da Chapada. Além disso, os métodos rudimentares de

extração na Chapada tornaram-se inadequados para a manutenção da atividade extrativista de

forma intensa.

Por esse motivo, uma grande parte da população local migrou para o sul do País à procura de

serviços nas lavouras de café, enquanto outra parte, mais fiel ao ofício do garimpo, migrou

para o Estado de Mato Grosso em busca de outros garimpos de diamantes.

Embora tenha ocorrido essa forte crise nas lavras diamantinas e reduzidos bastante os

trabalhos de extração de diamantes, o vínculo com o garimpo parecia ser eterno para a

população remanescente da Chapada. As pessoas daquela região perderam o norte, ficaram

desanimadas e sem forças para assumirem outra atividade na Chapada, que não fosse o

garimpo.

Até mesmo quem procurava escrever sobre uma atividade substituta na região era traído

constantemente pelo inocultável elo existente até hoje entre a Chapada e o Garimpo, sendo os

parágrafos escritos contagiados freqüentemente com palavras relacionadas à atividade

mineral. BRITO (2004) assim comentava ao dissertar sobre a agricultura na Chapada:

A mentalidade de apego ao passado permeia todo o tecido social e também se reflete no âmbito produtivo. A dedicação quase total à agricultura e à pecuária, nunca esteve nas cogitações daqueles homens habituados a lidar com a exploração do diamante.

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O mesmo autor descreveu a reação dos técnicos do Instituto Brasileiro do Café – IBC, ao

apresentarem a proposta alternativa de cultura do café aos descendentes dos coronéis do

garimpo:

Os técnicos do IBC que viam a implantação da cultura do café como uma alternativa econômica e de melhoria das condições de vida, através da geração de empregos....., ficaram surpresos quando foram a Mucugê e fizeram a proposta para os proprietários de terras, herdeiros dos coronéis. Eles reagiram ‘logo pensando em vender as terras’ confirmando,...,a incapacidade destes elementos em gerenciar o processo agrícola... ”

5.1 A chegada das dragas

Uma das soluções encontradas para a exaustão dos diamantes de serra (os mais fáceis, capazes

de serem extraídos de forma artesanal) foram as reservas das aluviões, que fez os garimpeiros

desviarem suas atenções das serras. Neste caso, foi preciso utilizar um novo método de

extração que dera novo alento à exploração de diamante: o método mecanizado por dragas.

Acredita-se que essa nova técnica foi posta em prática já entre 1979 e 1980.

A região logo depois teria sido submetida a uma larga aplicação das dragas para extrair os

diamantes aluvionares. Entretanto, as dragas utilizadas da maneira como estava sendo feito,

possuíam como característica a intensa danificação do meio natural, apesar de registrar uma

maior produção de diamantes.

No início dos anos 80 poder-se-ia encontrar gente que, sozinha, possuía mais de 30 dragas em

atividade na Chapada.

A recuperação econômica das lavras de diamante, com a aplicação de métodos mecanizados,

é registrada por MOREIRA & COUTO (1993), em um projeto de avaliação técnica executado

para o DNPM. Esses autores salientaram que a queda histórica na produção quantitativa de

diamantes na Chapada não representava, em absoluto, o seu completo esgotamento. Esta

hipótese foi facilmente demonstrada com o seguinte destaque dos autores citados:

Ressalte-se que a empresa CINDAM S/A – Comercial Exportadora, comercializou oficialmente 1.833 quilates de diamantes e carbonados, no período de agosto a outubro de 1993, extraídos nos municípios de Lençóis e Andaraí, que corresponderam a valores aproximados de 1 milhão de dólares.

Ainda os mesmos autores revelam a potencialidade das aluviões em diamante e o interesse

interminável dos garimpeiros, da seguinte forma:

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A pesquisa desenvolvida pela CBPM, em trechos de aluviões do rio São José e Santo Antônio, municípios de Lençóis e Andaraí, comprovou a potencialidade de diamante da área – o que pode ser extrapolado para as outras áreas de idêntico condicionamento geológico da região. Em vista disso, pode-se prever que o interesse dos garimpeiros se manterá, ainda, por um prolongado período.

Mas, a Chegada das dragas, no final dos anos 70, teria acontecido em um momento em que

também iniciava a atividade do turismo, embora de forma ainda incipiente. Um pouco depois

da mesma época surgiram as primeiras reações ecológicas no Brasil e no resto do mundo.

Mais especificamente, foi criado o Parque Nacional da Chapada Diamantina, em 1985, pelo

Decreto federal n° 91.655/85, visando, sobretudo, proteger a região das ações antrópicas

degradantes. Considera-se este episódio como a primeira reação da sociedade contra a

degradação da Chapada provocada pelo homem.

Outro ponto que deve ser considerado foi a extinção do regime de matrícula (ver capítulo 2,

itens 2.3.4 e 2.3.5), em 1989, com promulgação da Lei 7.805, de 18 de julho desse mesmo

ano. Seria o momento em que o Governo Federal passava a regulamentar de maneira rígida a

atividade garimpeira, colocando, oficialmente, muitos garimpeiros na ilegalidade.

Através do antigo regime de matrícula bastava o garimpeiro adquirir, perante a exatoria

federal do município, seu certificado de matrícula, para ter direito a extrair, de forma

artesanal, substâncias minerais garimpáveis. A matrícula do garimpeiro era comprovada

através de uma documentação (carteira) específica. Com a extinção do regime de matrícula,

que facilitava em muito o ofício do garimpo, confirmou-se o início (1989) da clandestinidade

na Chapada Diamantina, porque praticamente ninguém se adequou à nova Lei. Quase toda

aquela atividade extrativista de diamante passou a ser comprovadamente irregular e

vulnerável às ações fiscais das instituições governamentais.

A partir daí surgiu a reação mais concreta e rigorosa que teria acontecido já em 1993, com o

fechamento de garimpos pela justiça local (Comarca de Andaraí), após ação civil do

Ministério Público contra danos ambientais causados pela atividade garimpeira (anexo 2).

Entretanto, outros atos da justiça local (Lençóis) suspenderam o embargo do garimpo

atendendo ao pedido da administração municipal, com base na argumentação relativa aos

aspectos sócio-econômicos inerentes à atividade garimpeira e no compromisso dos

garimpeiros em conduzir das lavras através da boa técnica de extração em respeito à

legislação mineral e ambiental, com recuperação das áreas degradadas.

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Mesmo assim, com o crescimento do turismo na região e a intensificação das reações

ambientalistas, as ações definitivas estavam por vir já na segunda metade dos anos 90. Os

governos federal e estadual decidiram parar todas as atividades mineiras clandestinas na

região da Chapada Diamantina.

As ações governamentais de fechamento dos garimpos de diamante começaram em março de

1996. A articulação ocorreu a partir de uma reunião em Brasília entre o Governador da Bahia,

o Ministro de Minas e Energia e o Ministro do Meio Ambiente, Recursos Renováveis e

Amazônia Legal. Estas ações foram denominadas de “Operação Chapada Diamantina”. O

DNPM assumiu a coordenação técnica da Operação. Vários órgãos participaram entre eles o

CRA, a COPPA (polícia ambiental), o IBAMA e a Polícia Federal.

O DNPM, por ser o órgão concessor do direito à lavra mineral, era também o órgão

incumbido de determinar a paralisação (por Auto de Paralisação) da atividade de extração

irregular (Figura 19). Os outros órgãos aplicariam multas, apreenderiam equipamentos e

deteriam pessoas, embora nesta operação esses tipos de ações não tenham ocorrido.

Figura 19: Garimpo irregular com 05 dragas em funcionamento – Lençóis

Fonte: DNPM – 1996

A estatística da operação resumiu-se em: 47 Autos de Paralisação lavrados pelo DNPM,

sendo 26 para os garimpos do rio São José e afluentes, 8 para os garimpos do rio Preto, no

município de Palmeiras e 13 para os garimpos do rio Paraguaçu (sendo 11 no município de

Andaraí e 2 no de Nova Redenção). O total foi de 100 dragas paralisadas, perfazendo em

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torno de 700 garimpeiros envolvidos. A operação abrangeu 48 pessoas, entre fiscais,

auxiliares e policiais.

Como pode ser observado, esta primeira ação governamental, em março de 1996 (Figura 20)

ateve-se, apenas, a paralisar as atividades, orientando os infratores a seguir as determinações

das instituições de fiscalização. Em troca, os garimpeiros desamparados com a perda de seus

ofícios receberiam do governo do estado uma cesta básica durante seis meses e a promessa de

alternativas de trabalho. A ação de fechamento do garimpo foi noticiada de maneira enfática

nos jornais (anexos 5 e 6) da época e em outros meios de comunicação.

Figura 20: Abordagem de policiais militares da COPPA a garimpeiros. Destaque para a presença da televisão, através do responsável pela filmagem. Fonte: DNPM – 1996.

Mas, nem todos os garimpeiros, de fato, paralisaram suas atividades. Além disso, as cestas

básicas só foram distribuídas no primeiro mês e o garimpo aos poucos retornou a Chapada,

funcionando normalmente, apesar de em menor número.

Assim, uma outra ação governamental começara a ser organizada em 1997. Desta vez, porém,

sem cunho político. Organizou-se nova investida com postura puramente fiscal. Planejara-se

contra os algozes da Chapada em silêncio, sem jornais e televisão (ver anexos 7 e 8). Os

garimpeiros remanescentes estariam prestes a sofrer o golpe fatal, principalmente aqueles que

utilizavam as vorazes dragas. O DNPM ficou de novo incumbido de coordenar esta operação

que envolveu 62 pessoas, entre policiais, fiscais e auxiliares. O plano foi executado friamente,

paralisando todas as atividades, confiscando todos os equipamentos e detendo todos os

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envolvidos que eram encontrados pela frente (Figuras 21, 22 e 23). Então, no final de 1997,

terminara definitivamente, pelo menos, o garimpo a draga, que naquela época era o mais

viável economicamente.

Figura 21: Detalhe para os equipamentos apreendidos – moto-bombas, tubos, etc. Foto: 1997.

Essa operação, denominada Operação Chapada Diamantina II, foi estrategicamente dividida

em vários grupos de 10 a 15 homens, que atuaram simultaneamente nos municípios da

Chapada atingidos pelo garimpo clandestino. Objetivou-se assim, implementar um artifício

que permitiu uma ação rápida, de sobressalto e abrangente, contra os garimpeiros.

Figura 22: Apreensão de um trator esteira utilizado pelos garimpeiros – Equipe da Polícia Ambiental posando para fotografia. Foto: 1997.

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Foram lavrados 06 Autos de Paralisação pelo DNPM, 26 peças, entre veículos, equipamentos

de lavra e ferramentas foram apreendidas, além de 08 Autos de Infração com multa de R$

6.000,00 e mais de 30 garimpeiros detidos naquele momento e conduzidos até as delegacias

da região.

Figura 23: Foto mostrando um garimpeiro sendo conduzido por um policial federal armado

Foto: 1997.

Todas as operações, inclusive a seguinte (de 1998), sucederam-se por terra e ar, neste

caso, através de um helicóptero.

Figura 24: Grupo de garimpeiros sendo detido por policiais militares da COPPA. Foto: 1997.

Em 1998, ainda houve outra ação das instituições governamentais contra o garimpo de

diamante, após novas denúncias de retorno às atividades. Ela foi denominada de Operação

Chapada Diamantina III. Os mesmos órgãos participaram com aproximadamente 30 pessoas,

desta vez sob a coordenação do Estado. O jornal À Tarde de 02 de outubro de 1998 noticiou a

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operação (ver anexo 12), mas o garimpo, já moribundo, justificou uma ação fiscal mais

discreta. Pouco foi encontrado. Apenas dois garimpeiros, que atuavam de forma artesanal

(sem dragas), foram flagrados nas encostas da Chapada. O Estado, então, percebeu que o

garimpo agonizava, depois de 150 anos de história e as ações parariam por aí.

Mas, na verdade, o problema ainda continua, como demonstram os documentos anexos e

fotos registradas recentemente. A extração por dragas, aparentemente, acabou (já existem

novas denúncias do retorno das dragas), mas o garimpo artesanal é apontado como atividade

crescente na Chapada por órgãos ambientais e de fiscalização, bem como por particulares e

sociedades organizadas.

Após a ação de 1998, os garimpeiros de serra de Lençóis, pertencentes à entidade de classe

conhecida como Sociedade União Mineira – SUM, praticantes do garimpo artesanal,

elaboraram uma Carta de Intenções (ver anexo 14) dirigida ao IBAMA, explicando toda a

situação problemática do grupo com as perdas sociais, econômicas e culturais após a

interdição do garimpo. Apresentaram sugestões para a manutenção do garimpo de serra,

limitado para os garimpeiros remanescentes de Lençóis, o qual seria conduzido de forma

sustentável e incluindo compensações por parte dos próprios garimpeiros, como a recuperação

das áreas impactadas e a fiscalização do Parque contra incêndios e novos serviços de

garimpos que porventura viessem a aparecer.

Hoje em dia os diamantes são muito difíceis de serem encontrados pelo método manual de

lavra, mas, segundo um antigo e experimentado garimpeiro da região entrevistado em 2001, o

garimpeiro necessita manter sua atividade para continuar tendo esperança. Este garimpeiro

emitiu a seguinte opinião:

“ ...o garimpeiro pode não achar diamante algum em seu serviço, mas não pode parar de garimpar porque a sua esperança é que mantém ele vivo e enquanto ele estiver garimpando ele vai ter esperança...”

O próprio garimpeiro entrevistado mantém seu serviço, com toda sua idade, ocultado entre as

serras e locas da Chapada. Ele não atua com a freqüência de antigamente, mas quando a

necessidade o toca, ele se dirige para seu garimpo, despeja sua angústia e renova sua vontade

de viver.

As fotos abaixo (Figura 25 e 26), efetuadas durante uma visita à Chapada em 2004, exibem

vestígios de garimpo manual recente, confirmado por um morador da área que acompanhou

os trabalhos de avaliação.

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Figura 25: Vestígios de acampamento recente de garimpeiro na Chapada

Foto: 2004

Figura 26: Equipamento utilizado recentemente pelos garimpeiros

Foto: 2004

A realidade do retorno gradual do garimpo artesanal, mesmo após as ações governamentais,

sugeriu a realização de estudos mais detalhados em busca de um diagnóstico mais completo

da problemática apresentada, considerando os seguintes passivos resultantes do histórico

acima descrito: o passivo ambiental, o passivo social e o passivo cultural.

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6 - Métodos de explotação de diamante na Chapada

Diamantina

Antes de se discutir as formas de garimpos de diamante na Chapada Diamantina, serão

resumidas abaixo, como introdução deste capítulo, algumas técnicas de garimpos de diamante

utilizadas no País, registradas na sua maioria pelo Projeto “Garimpos do Brasil”, do DNPM,

concluído em 1983, por nove estudiosos pertencentes aos quadros do DNPM e da CPRM.

Esse resumo proporcionará uma melhor visualização do ocorrido com a atividade de extração

de diamante na Chapada.

O projeto mencionado destacou os seguintes garimpos de diamante no Brasil: garimpo do

estado de Roraima; garimpos da região Monte Carmelo/ Estrela do Sul – Minas Gerais;

garimpo da região de Gilbués – Piauí; e, o garimpo de Poxoréo – Mato Grosso. Algo também

será comentado do garimpo de Juína (MT), hoje o maior produtor de diamante, em peso, do

Brasil.

Garimpo do Estado de Roraima

Santiago, Borges e Pinheiro (1983) registraram no Projeto “Garimpos do Brasil” (pág 64), a

ocorrência de diamante nos cascalhos das aluviões recentes, originadas dos processos de

erosão e deposição dos conglomerados do Grupo Roraima, na localidade denominada serra do

Tepequém, norte de Roraima.

O processo de garimpagem era praticamente restrito ao igarapé Cabo Sobral. Ele era realizado

por equipamentos de dragagem compostos por uma bomba de pressão e monitor (pistola)

utilizados para desmonte, e uma outra bomba, horizontal (conhecida como chupadora),

impulsionada por motores a diesel, além de um sistema de concentração acompanhado por

equipamento denominado de “resumidora”.

Assim, a polpa de cascalho derivada do desmonte era recalcada através da chupadora até a

resumidora para seleção do diamante. A resumidora realizava uma pré-seleção, por uma

peneira, no qual se gerava o primeiro rejeito (oversize), passando, a fração menor, por

gravidade, por um jigue (equipamento de concentração gravitacional) unicelular, com tela de

oitenta mesh, onde ficavam retidos as partículas pesadas (entre elas o ouro) e os diamantes.

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Esse material concentrado era colocado em jogo de três peneiras onde era feita a seleção do

diamante. O garimpo manual era realizado em pequena escala, sobre os rejeitos originados

produzidos pelo sistema acima descrito.

A análise supracitada registra que o processo semi-mecanizado com o emprego das máquinas

“resumidoras” foi introduzido na região só em 1977, embora o garimpo tenha iniciado desde

1937.

Garimpos de Minas Gerais

Já Carvalheas e Bruno (1983) descreveram também, no projeto supramencionado, as técnicas

rudimentares dos garimpos dos municípios de Monte Carmelo e Estrela do Sul, a sudoeste de

Minas Gerais. São garimpos de pedras grandes e famosas, como a conhecida Estrela do Sul,

de 261,38 quilates, obtida do rio Bagagem, próximo ao povoado de Santa Rita da Estrela.

O cascalho diamantífero, encontrado em sedimentos aluvionares e coluvionares foi originado

do retrabalhamento do conglomerado basal da Formação Uberaba (Cretáceo Superior).

Esses autores descreveram que o método empregado era bastante rudimentar, consistindo na

extração dos cascalhos dos leitos dos rios, e, por catas, quando os alvos eram os barrancos e

terraços.

A apuração do diamante era feita em peneiras parcialmente mergulhadas na água, às quais se

imprimiam movimentos de rotação e de oscilação vertical, a fim de se obter a concentração do

material pesado no fundo. Depois a peneira era virada e emborcada no solo, ficando o

material pesado por cima, permitindo que a apuração do diamante fosse realizada visualmente

com o auxílio de uma palheta.

A classificação era efetuada também por peneiras de malhas diferentes, sendo uma grossa e as

outras peneiras de seis, três e um e meio milímetros.

Garimpos do Piauí

Oliveira e Prazeres (1983) comentam sobre os garimpos rudimentares da região de Gilbués,

Sudoeste do estado do Piauí.

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Segundo esses autores, as mineralizações ocorrem em depósitos cretáceos, terciários e

quaternários. Os depósitos cretáceos e terciários derivados de arenitos, siltitos, folhelhos e

níveis de cascalho das Formações Areado e Piauí, eram preteridos em relação aos depósitos

quaternários, que concentravam os jazimentos mais significativos da região. Estes

apresentavam cascalhos situados em terraços elevados, fora da faixa de inundação dos rios, ou

só atingíveis em suas cheias máximas, bem como em aluviões recentes, da época holocênica.

Oliveira e Prazeres (op. Cit.) lembram que as atividades garimpeiras em Gilbués eram

desenvolvidas principalmente no verão. Os modelos rudimentares de garimpo eram

classificados da seguinte forma:

Extração tipo corrida: nas bacias hidrográficas onde se podiam encontrar conglomerados e

arenitos diamantíferos eram selecionadas previamente certas drenagens com vales em forma

de “V”, onde se adaptavam seções acumuladoras ou “entulhadeiras”, representadas por

escavações ou aprofundamentos da drenagem, com a finalidade de armazenar materiais brutos

desmontados dos barrancos das margens ou adjacências através de trabalhos braçais. Outra

adaptação da drenagem era a cascalheira ou “canoa”, que consistia em trincheiras abertas ao

longo da rede de drenagem, à jusante das acumuladoras (12 a 15 metros) para captar, como

armadilha de deposição sedimentar da drenagem, matacões, areia grossa, diamantes e

minerais satélites, complementando o modelo de explotação.

Assim, na época da estação chuvosa ou da “corrida d’água”, as torrentes pluviométricas

transportavam e selecionavam todo o material desmontado, concentrando a fração grossa e os

diamantes associados nas “canoas” supracitadas. A extração do diamante era depois feita por

peneiramento.

Já no início dos anos oitenta (século XX) os autores citados registram algumas tentativas de

mecanização do desmonte com base em jatos d’água sobre o solo durante o período seco do

verão.

Extração em poços ou trincheiras: consiste na escavação de poços duplos (em terrenos)

distanciados cinco metros entre si. O objetivo era atingir o cascalho, podendo alcançar até 18

metros de profundidade. O cascalho do poço era retirado para lavagem, peneiramento e

seleção dos diamantes, e depois as escavações continuavam em desenvolvimento de tal forma

a definir uma interligação subterrânea com o outro poço adjacente.

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109

Esse método possuía desvantagens claras como, por exemplo, o risco de desabamento das

galerias, provocando vítimas fatais, além da existência, não rara, do lençol freático acima do

nível de cascalho, prejudicando por completo todo o trabalho executado, visto que não se

utilizava bomba d’água nesse tipo de garimpo.

Modelo de extração aluvionar: era considerado como o método utilizado pelos garimpeiros

providos de maior estrutura, detentores de maior poder aquisitivo, pois o garimpo era

desenvolvido de forma semi-mecanizada, por dragas em aluviões recentes da região.

Garimpos do Mato Grosso

Garimpo de Poxoréu

Os garimpos de diamantes de Poxoréu foram descritos por Almeida e Alves (1983).

Esses autores apontaram três depósitos para a região: aluviões recentes, depósitos de terraço e

cascalheiras. As aluviões são basicamente constituídas de um capeamento de areia fina de

espessura variável seguido por um cascalho também fino. O cascalho diamantífero encontra-

se em um nível inferior, apresentando uma granulometria maior, podendo haver seixos que

ultrapassassem a 20 cm de diâmetro. Os depósitos de terraço exibem um nível intermediário

de cascalho, com uma cobertura de areia fina e média que varia de zero a oito metros, além

disso, possuem distribuição ampla na região. As cascalheiras formam um nível superior que

cobre grande parte das encostas, possuindo a camada de cascalho com espessura máxima de

um metro e a relação com o capeamento de 1:1.

Os autores citados salientam que 80% dos diamantes produzidos saíam dos leitos dos rios

onde o garimpo funcionava por dragas. Chagaram a contabilizar, em 1981, a quantidade de

1.950 garimpeiros, distribuídos em 230 dragas.

Já os garimpos localizados nas encostas das elevações ou nos interflúvios eram denominados

de “garimpos a seco”. Nestes locais, todo o desmonte do cascalho era manual, sendo

transportado a grandes distâncias para ser processado manualmente.

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Garimpos de Juína

O distrito diamantífero de Juína localiza-se a noroeste do estado de Mato Grosso. Segundo

Svisero (1991), este distrito, condicionado pelo lineamento de azimute 125° (SE–NW),

engloba mais de uma dezena de pipes kimberlíticos de idades de 95 a 92 milhões de anos.

Os depósitos lavrados encontram-se nas aluviões recentes, derivadas dos processos erosivos

que atuaram sobre aquelas rochas kimberlíticas (ver nota de rodapé n.°13). Conforme Lacerda

Filho e Abreu Filho (2004) são depósitos com teores médios de 4 ct/m3 e percentual de 85%

de qualidade industrial e 15% de gemas, com peso médio de 0,35ct.

A lavra nessa região foi iniciada em 1986, pela empresa Mineração Itapená S/A. Nesse ano a

produção de Juína foi de 300.202 ct, de acordo com Sumário Mineral (1987), periódico de

estatística mineral do DNPM. Mas, segundo os autores acima citados, a atividade tornou-se

insustentável por causa da invasão dos garimpeiros, que trabalhavam essencialmente por

dragas sobre os depósitos secundários aluvionares. Esse garimpo não sofreu interrupção, mas

a produção de diamantes caiu bastante, sendo retomada a partir de 1998, com a melhora do

preço da gema.

A estimativa, de acordo com Lacerda Filho e Abreu Filho (op. cit.), é que Juína já produziu

cerca de 10 milhões de quilates, e no ano de 2000 alcançou 1 milhão de quilates,

caracterizando-se como o maior produtor de diamante do Brasil, em peso. Ainda, no ano de

2000 foram contabilizadas 200 dragas em atividade na região, havendo pequena quantidade

de garimpo artesanal. Atualmente, boa parte desse garimpo encontra-se legalizada, com título

de portaria de Lavra e de permissão de lavra garimpeira para pessoa física, geralmente donos

de terra da região.

6.1 Garimpos de diamante da Bahia – Chapada Diamantina

Até meados dos anos 70, do século XX, encontravam-se apenas garimpos manuais,

aglomerados, em sua maioria, nas serras da região em estudo. No final dos anos setenta, as

dragas aos poucos chegaram à Chapada, surgindo como solução para extração dos minérios

de baixos teores, depositados nas aluviões dos rios e de suas margens. Durante os anos

oitenta, segundo os relatórios oficiais do governo federal (DNPM), os garimpeiros utilizaram

dragas em camadas de cascalho com teores que alcançavam 0,05 quilates/m3, com lucro.

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Não se pode dizer a mesma coisa para as explotações mecanizadas (com dragas)

regularizadas, através de diplomas do DNPM. A obrigação com os impostos, taxas,

documentações diversas, posteriormente, com os estudos de impacto ambiental, os custos

sociais, além dos custos diretos e indiretos, dificultavam sobremaneira a viabilidade

econômica da explotação de diamantes exigindo grandes produções naquelas condições. As

lavras legalizadas necessitavam de maior estrutura e tecnologia para sobreviverem ao maior

custo de produção e atenderem às exigências legais. Isto também poderia explicar, em parte, a

clandestinidade elevada presente na região, conduzida por aqueles que visavam o lucro fácil e

rápido, refratários aos investimentos em tecnologia.

Portanto, pode-se afirmar que houve na Chapada três tipos de explotação: a manual ou

artesanal, a mecanizada irregular e a mecanizada legal de duração efêmera. Esses tipos de

explotação serão analisados a seguir como métodos adotados na região.

6.1.1 Método de explotação artesanal

Este método, também conhecido como garimpo de serra, tradicional ou manual, começou

oficialmente a ser utilizado desde 1844, quando houve a descoberta dos primeiros diamantes

na Chapada. Os garimpeiros dirigiam-se aos leitos dos rios e, principalmente, aos flancos dos

relevos da Chapada em busca dos sedimentos coluvionares e eluvionares, resultados da

decomposição dos conglomerados diamantíferos da Formação Tombador. Nestes cascalhos,

poder-se-ia encontrar, pelo método manual, os minérios com maiores teores e,

conseqüentemente, de mais fácil localização das cobiçadas gemas.

O método artesanal exibiu ao longo do período da existência do garimpo várias técnicas

rudimentares de extração de diamantes, correlacionadas com cada local específico. Nolasco

(2002), em busca da caracterização, na Chapada Diamantina, dos registros tecnogênicos –

aqueles provocados ou acelerados pelo homem como agente geológico no meio natural –

aprofundou sua pesquisa entrevistando garimpeiros e citando diversos autores que foram

inclusive filhos da região, para descrever, com detalhes, as várias técnicas de garimpo

aplicadas na Chapada.

Não se dissertará neste texto com tais pormenores sobre o garimpo artesanal da Chapada,

apenas discriminar-se-á resumidamente, com base nas observações dessa autora e nos

testemunhos de alguns garimpeiros, coletados “in loco”, durante esta pesquisa, as formas de

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garimpos artesanais praticados até hoje na região de estudo, de maneira que facilite o

entendimento natural dos impactos ambientais causados.

Em praticamente todas as técnicas utilizavam-se basicamente os procedimentos de extração

(desmonte), lavagem, classificação, concentração e apuração das gemas, que podem ser

resumidos nos processos de desmonte e beneficiamento. A seguir, serão divididos os

garimpos em três modalidades, de acordo com os tipos de depósitos: garimpo de rio, de serra

e de barranco. Essas modalidades de garimpos e suas variedades serão comentadas a seguir:

Garimpo de rio

Entre os diversos tipos de garimpos artesanais aparecem como os pioneiros da região aqueles

praticados nos leitos dos rios. O exemplo tradicional foi a descoberta oficial dos primeiros

diamantes encontrados na Chapada, que aconteceu nos leitos dos rios Mucugê e Cumbuca.

Nolasco (op.cit.) registra ainda três modalidades de garimpo de rio, a saber: por faxina, de

mergulho e por catreamento manual.

O garimpo por faxina lembra a extração tipo corrida de Gilbués, no Piauí, descrita

anteriormente, quando se refere a serviços de escavações nos leitos dos rios utilizados para

favorecer a captação do cascalho diamantífero. No garimpo de faxina é feito também um

sulco transversal no leito do rio, neste caso para provocar aceleração do fluxo d’água e um

processo de turbilhonamento do sedimento, facilitando a liberação da fração mais fina. Um

gradeamento feito por estacas, implantado perpendicularmente ao fluxo d’água e a montante

do sulco escavado acima citado, aprisiona o cascalho que é retirado para o processo de

beneficiamento.

O garimpo de mergulho efetuava a retirada do cascalho contido nos leitos dos rios com

baldes, latas, carumbés (tipo de recipientes em madeira, parecidos com bateias), para

passarem pelo processo de beneficiamento e apuração do diamante. Esse cascalho era

normalmente aprisionado pelas armadilhas contidas no leito do rio, tipo: caldeirões, marmitas

(cavidades encontradas no leito dos rios), presença de blocos rochosos, mudanças de

gradiente do leito; tudo que possa alterar o regime de fluxo e seu processo gravitacional, e

proporcionar a deposição dos sedimentos mais grossos e densos.

O catreamento manual representa uma frente de garimpo escavada em forma de catra

(buraco) por equipamentos rudimentares, como: enxadas, pás, picaretas. Eram executados

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freqüentemente nas margens dos rios em busca de antigos leitos com níveis de cascalhos

mineralizados. Para isso era necessário decapear o estéril, representado pela camada de areia,

para depois retirar o cascalho.

Algumas vezes era necessário realizar desvio e represamento das drenagens, com a utilização

de explosivos para facilitar o serviço de garimpagem.

Garimpos de serra

Dos rios, os garimpos espalharam-se para as serras em busca do diamante mais fácil. As

encostas das serras teriam como vantagem menor quantidade de material estéril que os

sedimentos aluvionares.

Os depósitos de serra da Chapada eram denominados de grupiara e curuçás (Figura 27),

freqüentes objetivos dos garimpeiros. Nolasco os definiu como cascalhos rasos de origem

coluvionar. Os garimpos de serra englobam também depósitos de cascalho de maiores

espessuras, conhecidos como cascalhão, que podiam possuir blocos com dimensões de

matacão (Figura 27). Nas serras encontravam-se igualmente os depósitos de fraturas e gavetas

(“fraturas” horizontais). Estas estruturas rochosas são favoráveis à captura de material

coluvionar ou de depósito de tálus.

Figura 27: Ilustração dos depósitos de grupiara, curuçá e cascalhão nas encostas da serra – depósitos coluvionares. Fonte: Nolasco (2002). Adaptação do autor.

O desmonte do cascalho raso era normalmente realizado a seco, com o auxílio de pás e

picaretas, havendo em alguns casos o uso de explosivos. Depois o material coletado passava

pelo processo de lavagem, classificação (peneiramento) e apuração do diamante.

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O cascalhão era desmontado pelo sistema hidráulico, semelhante ao garimpo de barranco,

comentado adiante, onde o sedimento estéril (material arenoso) era lançado encosta abaixo,

formando pequenas corridas até os vales, sendo o cascalho mineralizado também beneficiado

com o uso da água.

Depósito de fratura

O desmonte dos depósitos de fraturas era efetuado a seco, com ferramentas rudimentares (pás,

picaretas, enxadas) e explosivos. Quando havia água no fundo daquelas estruturas,

utilizavam-se pequenas dragas para secá-las. O garimpo de fratura em alguns casos evoluía

para garimpo subterrâneo (Figura 28).

Figura 28: Ilustração dos garimpos de fratura vertical e de blocos rolados, caracterizando em alguns casos o garimpo de gaveta (fratura horizontal ou sub-horizontal). Observar a evolução para garimpo subterrâneo. Fonte: Nolasco (2002) – adaptação do autor.

Os blocos de dimensões decamétricas exibiam nas encostas muitas vezes estruturas

semelhantes a fraturas horizontais ou gavetas. Os garimpeiros procuravam esses locais, que

funcionavam como barreiras para o cascalho coluvionar mineralizado. Para retirar esse

sedimento, através de equipamentos manuais, os garimpeiros escoravam o bloco rochoso com

seixos menores (Figuras 28 e 29). Desta forma, procurava-se evitar acidentes durante a

atividade garimpeira.

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Figura 29: Local utilizado pelos garimpeiros na busca do cascalho diamantífero. Podem–se observar alguns

seixos colocados devidamente para escorar o bloco de rocha maior. Foto 2004.

Depósito Subterrâneo

Quando a fratura ou gaveta possuía dimensões maiores, obrigando o serviço a ser

aprofundado subsolo adentro, esse garimpo caracterizava-se como do tipo subterrâneo (Figura

28). Segundo Nolasco (2002), os depósitos subterrâneos envolviam sedimentos de origem

diversa, não havendo, entretanto, presença de solo.

Às vezes, a entrada de alguma fratura encontrava-se praticamente fechada, o que forçava os

garimpeiros a usarem explosivos (dinamite ou fogo) para ampliá-la. Utilizava-se também luz

para a iluminação da gruta formada, e bombas de sucção para a retirada da água acumulada no

subsolo. O minério era extraído e colocado na superfície, onde era estocado para posterior

beneficiamento, que era feito a seco, por peneiramento, ou com água, a depender do

percentual de argila contida.

Garimpo de barranco

Representa uma outra modalidade de garimpo muito utilizada na Chapada Diamantina. Eram

depósitos compostos de solos em avançado estágio de evolução, com presença de argila e

crosta laterítica (latossolo), normalmente acompanhada de vegetação densa. Este solo ocorria

em locais de topografia mais suave, nos vales e próximos aos rios. Quando essa crosta

apresentava fragmentos ou veios de quartzo indicava a presença provável de diamantes.

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O desmonte desse solo era exclusivamente hidráulico. A presença de argila e da crosta

laterítica denunciava a execução dessa atividade, já que os sedimentos mais finos e

avermelhados eram conduzidos encosta abaixo até o primeiro sistema fluvial existente,

colorindo as suas águas de forma notória.

A necessidade de trabalhar com água obrigava os garimpeiros a construírem estruturas tipo

barragens, pontes e canais, de maneira que garantissem o funcionamento do desmonte

hidráulico. Na verdade, a captação da água era feita com desvios de rios e riachos (Figura 30),

para suprir os locais mais secos onde existiam garimpos. O sistema de adução era formado

por uma rede de canais, utilizada para abastecer um número considerável de frentes de

garimpo.

Figura 30: canal construído para desviar as águas até os serviços de garimpo de diamante. Foto de 2001

O desmonte hidráulico promovia o escorregamento do barranco. O cascalho que

acompanhava essa corrida era retido em locais de rebaixo com quebras de declividade, onde

era escavado um perfil côncavo no leito, alterando o sistema gravitacional do fluxo

(fervedouro), para deposição do cascalho. Esse barranco era dirigido para as corridas,

elaborada por escavações em capeamento estéril, já lavrado, (Figura 31 e 32) ou antigos

canais de condução de água.

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Figura 31: Início do século XX. Garimpo manual de barranco administrado por uma companhia inglesa, em Lençóis. Detalhe para os canais de escoamento do material estéril serra abaixo. Foto de arquivo. Fonte: Teixeira, 1998.

Figura 32: Situação atual. Vestígios dos canais de corrida, construídos pelos garimpeiros no início do século XX, para despejar a polpa de estéril resultante das frentes de garimpo. Lençóis. Foto: 2001

A seqüência geral do garimpo manual na Chapada era a seguinte:

- Remoção da vegetação por queima controlada, quando era necessário;

- Se precisasse decapeamento do estéril por ferramentas rudimentares ou por desmonte

hidráulico;

- Escavação até atingir o minério para, em seguida, transportá-lo até o local de tratamento. O

transporte era efetuado com sacos, latas ou equipamentos rústicos conhecidos como calomis

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(recipientes de madeira que lembram gamelas), portados manualmente pelos próprios

garimpeiros;

- O cascalho era então classificado por separadores de diamantes (um tipo de calha) e por um

jogo de peneiras (Figura 33);

Figura 33 : Calha utilizada pelo garimpeiro para separar o diamante. Fonte: Teixeira, 1998

- Em seguida, o garimpeiro selecionava manualmente os diamantes visíveis.

6.1.2 Método mecanizado clandestino (por dragas)

Após mais de 130 anos de garimpo artesanal, os diamantes mais fáceis de encontrarem já não

existiam mais. Foi então a partir daí que se deu início à utilização das dragas (Figuras 34 e 35)

na Chapada, no final dos anos 70.do século XX. Já no início dos anos 80, poder-se-ia

encontrar gente que sozinha possuía mais de 30 dragas.

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Figura 34: Explotação clandestina mostrando os trabalhos das dragas. Fonte: COUTO & MOREIRA, 1993

As dragas eram aplicadas em áreas de sedimentos aluvionares de baixos teores de diamante,

nas margens dos rios, nas suas confluências e em barras fluviais próximas, onde a quantidade

de estéril (areia) era considerável. O teor baixo das jazidas locais podia, contudo, ser

viabilizado economicamente através da aplicação desses equipamentos.

As dragas utilizadas pelos garimpeiros (figura 35) eram basicamente compostas de:

- 2 flutuantes, usados para permitir o trabalho sobre lâmina d’água;

- um motor a diesel;

- uma bomba hidráulica; e,

- jogo de mangueiras.

A seqüência básica da extração por dragas era a seguinte:

- de início era feita a limpeza do terreno com o desmatamento da área, no caso de haver

vegetação;

- depois, providenciava-se a retirada da cobertura de estéril, que por sinal variava muito de

espessura, atingindo até 10m, conforme especifica o capítulo 4 (item 4.6), que descreve a

geologia do minério. Para decapear o estéril aplicava-se com freqüência o desmonte

hidráulico por intermédio de jatos d’água impulsionados por motores a diesel acoplados aos

flutuantes das dragas. Às vezes utilizavam-se tratores nesta etapa.

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Figura 35 : Draga completa utilizada no garimpo ilegal. “F” – Flutuantes; “B” – Bomba hidráulica; e “M” –

Motor diesel. Fonte: DNPM, 1996.

- durante os trabalhos de decapeamento, os garimpeiros precisavam sustentar os sedimentos

friáveis instáveis dos taludes e rampas criados pela escavação. Neste caso, lançava-se mão de

um tipo de escoramento elaborado de pau-a-pique em vários níveis do barranco (Figura 36).

Outro recurso utilizado para evitar acidentes com desmoronamentos dos barrancos era a

contenção destes com sacos de areia;

Figura 36: Escoramento de barrancos do garimpo feito de pau-a-pique. Foto 2001.

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- em seguida, com o cascalho exposto, efetuava-se a sua desagregação hidráulica. Os

garimpeiros também utilizavam equipamentos manuais (enxadas, picaretas) para subsidiar na

desagregação hidráulica do minério (Figura 37). Observa-se na figura ilustrativa abaixo a

contaminação do ambiente por óleo combustível, provocada possivelmente pela falta de

manutenção adequada dos equipamentos utilizados;

Figura 37: Desmonte hidráulico do cascalho diamantífero. Detalhe para a contaminação da água usada pelo óleo dos equipamentos. Fonte: COUTO & MOREIRA, 1993.

- depois que o cascalho era retirado e desagregado, ele era aspirado (figura 38) pela força da

bomba hidráulica impulsionada por um motor a diesel de 150 HP (Mercedes Bens), para, em

seguida, ser transportado através de mangotes (mangueiras) de seis polegadas até uma caixa,

conhecida como caixa de fervura. Esta caixa possuía um volume aproximado de 2,5m3 e

recebia cascalho de granulometria máxima de 10 cm de diâmetro. A presença da água

provocava uma turbulência responsável pela primeira classificação do minério, retendo os

sedimentos mais grossos na caixa;

Figura 38: processo de sucção do cascalho diamantífero. Fonte: COUTO & MOREIRA, 1993.

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- em seguida a parte mais leve do cascalho descia por uma espécie de calha ou bica,

conhecida também como sluice, que consiste em um equipamento classificador de sedimentos

de acordo com a sua granulometria, composto por grelhas transversais à corrida da polpa

mineralizada. A inclinação da bica era em torno de 10%. O cascalho e o diamante ficavam

retidos pelas paletas da grelha da bica, (Figuras 39 e 40);

Figura 39: caixa de fervura e sluice (bica) Fonte: DNPM, 1996

- enfim, os diamantes maiores eram selecionados manualmente (Figura 41) sobre a calha do

sluice. O cascalho restante era então classificado e concentrado por um conjunto de peneiras

(normalmente quatro). As peneiras mais grossas possuíam a dimensão de ¾ de polegada e a

mais fina, as dimensões aproximadas da granulometria da areia grossa.

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Figura 40: detalhe para a bica (sluice) em funcionamento

Foto: DNPM, 1996

Figura 41: Cascalho na bica (sluice) e um garimpeiro contando as gemas maiores que interessam. Fonte:

Couto & Moreira, 1993

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Figura 42: Esquema da produção de diamantes por dragas do garimpo ilegal.

Fonte: Matta, 2002

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6.1.3 Método mecanizado como atividade legal

Este método de lavra foi utilizado experimentalmente pela Companhia Baiana de Pesquisa

Mineral – CBPM, nas margens do rio São José, zona abrangida por esta pesquisa. O

fundamento básico de extração utilizado pelo método da atividade legalizada era o mesmo do

precedente, principalmente no que diz respeito à utilização das dragas. A diferença entre um

método e o outro estava na técnica aplicada que era mais complexa e mais importante, quando

utilizada para uma explotação legalizada e, essencialmente, na escala de produção.

Para exemplificar, no garimpo irregular a draga processava mensalmente entre 5.000 a

6.000m3 de material aluvionar, enquanto que a capacidade de processo da estrutura montada

para a atividade regular atingia 400.000m3 de material aluvionar por mês. Em nível

experimental, porém, registra-se, em 1980, nos relatórios de pesquisa da CBPM para as

aluviões do rio São José, uma produção planejada sobre 56.000 m3 mensais, sendo 52.400 m3

só de estéril (areia e argila).

Embora este tipo de extração tenha ocorrido de forma regularizada, ela apresentou sérias

alterações ambientais, uma vez que naquela época a preocupação, de fato, com os impactos

ambientais era ainda incipiente, não só por parte dos empreendedores como também das

instituições governamentais.

A seqüência da extração mecanizada legal de diamante na Chapada pode ser descrita da

seguinte forma (Figura 42):

- de início, era necessário desmatar a área, preparando-a para as etapas de desenvolvimento da

lavra. Em seguida, efetuava-se a abertura da cata começando pelo processo de decapeamento

hidráulico do material estéril. Tratores de esteira eram também usados nesta operação. Essas

escavações eram planejadas para aberturas de grandes dimensões (90m x 90m);

- enquanto uma moto-bomba fornecia água limpa para o processo de decapeamento, outra

realizava o desmonte do material estéril e do minério. Uma terceira moto-bomba aspirava o

cascalho diamantífero desmontado, conduzindo-o à estação de tratamento. Portanto,

utilizavam-se 3 moto-bombas de 8 polegadas de diâmetro. Os motores responsáveis por essa

dinâmica (Figura 44) possuíam a potência de 140 HP e a estação de tratamento tinha uma

capacidade de processar 12m3/h.

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- em seguida, o material sedimentar era lançado sobre uma peneira vibratória de crivo de ¾

polegada. O material retido acima desta granulometria, correspondente a 35% do minério

escavado, era descartado lateralmente;

- o material abaixo de ¾ polegadas era concentrado em um equipamento conhecido como

Jigue (14), do tipo Yuba. Este equipamento possuía forma retangular de 2m/1m (Figuras 43 e

44). O overflow (15) desse jigue era de aproximadamente 90% da quantidade do cascalho

classificado que alcançava esta etapa;

- o concentrado de minerais satélites e diamantes era então classificado por três peneiras de

malhas 1,5; 3,0 e 6,0mm. Os sedimentos de maiores granulometrias (acima de 1,5mm) ainda

passavam pelo processo de moagem a fim de eliminar os minerais satélites do diamante de

menor dureza e diminuir o volume do concentrado. Os moinhos utilizados neste processo

moíam somente os minerais satélites de dureza inferior à do diamante, deixando este intacto.

O material sedimentar mais fino era aproveitado para o tratamento de ouro e dos diamantes de

menores diâmetros através do sluice e da bateia.

Figura 43: Esquema de explotação por draga

__________________________________________________________________________ (14) Equipamento utilizado no processo gravitacional de concentração de minerais. (15) Escoamento do rejeito pela parte superior do equipamento.

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Entretanto, a explotação experimental permitida na época pelo DNPM representava menos

que 0,1% das explotações mecanizadas de diamantes na área de estudo. Por este motivo, as

avaliações que virão a seguir se aterão apenas aos garimpos ilegais executados com dragas

além daqueles executados manualmente (garimpos de serra).

Pode ser antecipado, portanto, que todos os métodos de extração de diamantes provocaram

danos ao meio ambiente. Até mesmo o método artesanal causou alterações negativas

consideráveis ao meio físico, apesar de individualmente causar impacto pouco significativo. A

densidade de impacto gerada pelo método artesanal era, individualmente, pequena, se

comparada com o método mecanizado. Mas, nas épocas mais intensas do garimpo, dos

séculos XIX e XX, trabalharam na Chapada dezenas de milhares de garimpeiros que,

somados, degradaram de forma extremamente significativa o meio natural.

Figuras 44: Motores utilizados pela lavra experimental legalizada. Fotos: 2004

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Figura 45: Sucatas de dois Jigues abandonados no local. Foto 2004

No capítulo seguinte serão discutidos os tipos de impactos que os métodos dos garimpos

artesanais e por dragas, ilegais, provocaram ao meio físico.

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7 - Impactos provocados pelo garimpo de diamante na

Chapada Diamantina

Após análise da literatura específica dos problemas causados pelos garimpos de diamantes na

Chapada Diamantina, junto aos organismos dos governos federal, estadual e municipais, com

especialistas, garimpeiros e suas associações e com a população local, e, depois de se ter

efetuado visitas às áreas impactadas através de caminhamentos organizados e acompanhados

por antigos garimpeiros da região, pôde-se constatar bem como caracterizar os principais

impactos herdados diretamente da atividade garimpeira e de sua interdição, os quais serão

tratados a seguir.

No entanto, antes de iniciar este tema, serão abordados aqui alguns conceitos sobre impacto

ambiental.

Reportando, portanto, à Resolução n° 01/86 do CONAMA, define-se impacto ambiental

como...

“...qualquer alteração das propriedades físicas, químicas e biológicas do meio ambiente, causada por qualquer forma de matéria ou energia resultante das atividades humanas, que direta ou indiretamente afeta: a saúde; a segurança e o bem-estar da população; as atividades sociais e econômicas; a biota; as condições estéticas do meio ambiente; e a qualidade dos recursos ambientais.”

A NBR ISO 14001, por sua vez, define impacto ambiental de maneira mais simples e

objetiva, como:

“...qualquer modificação do meio ambiente, adversa ou benéfica, que resulte, no todo ou em parte, das atividades, produtos ou serviços de uma organização.”

Braga (2003) apresenta outra forma de análise sobre impacto ambiental, embora na sua

essência demonstre as mesmas considerações anteriores. Ela, primeiro, salienta que o meio

ambiente consiste de interações entre os meios físico, biótico e antrópico e que essas

interações são dinâmicas. Neste caso, a dinâmica do meio ambiente é expressa pelos

processos ou fatores do meio. Mas, com a intervenção humana, esses processos ou fatores

podem ser acelerados ou retardados ou até suprimidos. Quando essa alteração é significativa,

tem-se o impacto ambiental, registra a autora citada.

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Sobre a mineração, a autora comenta:

As operações necessárias para a realização da mineração podem acarretar alterações em processos do meio ambiente, as quais, dependendo da sua significância, podem constituir impactos ambientais, negativos e positivos.

A mesma autora depois analisa os citados processos e fatores que caracterizam os meios

físico, biótico e antrópico. Para o meio físico foram discriminados os seguintes processos:

erosão pela água; deposição de sedimentos ou partículas; inundação; escorregamentos;

movimento de blocos; movimento das águas subterrâneas; escoamento das águas em

superfície; interações físico-químicas e bacterianas no solo e nas águas de superfície e

subterrâneas; erosão eólica; circulação de partículas sólidas e gases na atmosfera; propagação

de ondas sonoras; propagação de sismos. Para o meio biótico: desenvolvimento da vegetação

e desenvolvimento da fauna. Meio antrópico: trânsito e percepção ambiental.

São, de fato, processos e fatores que ocorrem naturalmente no ambiente, sem a intervenção

humana, principalmente nos casos dos meios físico e biótico. A alteração significativa desses

processos, portanto, caracteriza o impacto ambiental.

Os impactos positivos acima mencionados podem ser compreendidos como os diversos

benefícios sócio-econômicos gerados pelo empreendimento mineiro, entre eles a geração de

empregos, o desenvolvimento da região e a capacitação da população local.

Já que os chamados impactos ambientais foram discutidos e conceituados, seria oportuno

tecer algumas definições breves sobre os processos apresentados como solução para as áreas

atingidas por esses impactos. Para este tema três vocábulos são muito utilizados, a saber:

recuperação, reabilitação e restauração.

Portanto, entende-se por recuperação, segundo Bitar & Vasconcelos (2003), um processo que

compreende os procedimentos e medidas necessárias à rápida estabilização do ambiente e à

progressiva instalação do uso do solo previamente definido. O objetivo primordial deve ser a

estabilidade e o equilíbrio da área em relação ao meio circunvizinho. Logo, seria interessante

que o uso previsto de uma área estivesse em harmonia com as condições ambientais e

culturais da circunvizinhança.

Outro termo também utilizado é o da reabilitação de áreas degradadas. A reabilitação seria,

neste caso, uma forma específica de recuperação, onde a área degradada é preparada para um

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uso predeterminado, de acordo com um projeto prévio. Portanto a definição de reabilitação

estaria contida na de recuperação.

Já o vocábulo restauração se diferencia das duas definições supramencionadas, uma vez que

exige a recomposição da área às condições existentes anteriormente à sua degradação,

tornando muito difícil e, às vezes, impossível a sua real efetivação.

Assim, para a situação da Chapada, os vocábulos recuperação e reabilitação seriam os mais

apropriados.

7.1 Principais impactos causados na Chapada Diamantina

Para o caso específico deste estudo distinguem-se pelo menos três tipos de impactos derivados

de forma direta e indireta do garimpo, são eles:

1. Impacto sobre o meio natural;

2. Impacto cultural;

3. Impacto social.

A atividade clandestina de extração de diamante provocou diretamente vários tipos de

impactos sobre o meio natural. Este foi um dos principais motivos que fizeram os organismos

oficiais de fiscalização interditarem todas as atividades irregulares de garimpo na Chapada.

Entretanto, como esta ação governamental não ponderou as conseqüências sócio-econômicas

posteriores à interdição, ela terminou por gerar os impactos indicados aqui como social e

cultural, caracterizados acima como impactos sobre o meio antrópico.

7.1.1 Impacto sobre o meio natural

A seguir serão discutidos separadamente os impactos que teriam sido causados pela atividade

garimpeira manual e pela mecanizada, responsável pelos garimpos de draga.

Explotação artesanal – garimpo manual

O garimpo manual de diamante que ocorreu nos rios e nas encostas da Chapada poderá ser

considerado como garimpo artesanal ou de serra. São geralmente ocorrências com pequenas

quantidades de estéril a decapear, até atingir o cascalho diamantífero, onde geralmente o teor

de diamante é mais alto simplificando as operações de garimpo. Isto explica a grande atração

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dos garimpeiros ocorrida nos séculos XIX e XX pelos placers (ver nota de roda pé n.° 6)

existentes nos rios e encostas das serras. Estas condições, somadas à presença dos melhores

diamantes, favoreceram o verdadeiro rush do diamante na região, culminando com a presença

de dezenas de milhares de garimpeiros nas épocas da intensa atividade mineira chapadense.

Essa quantidade imensa de garimpeiros que atuou nos rios, em suas margens e,

principalmente, nas encostas da Chapada, operando durante mais de 130 anos, sem a

preocupação com ações mitigadoras e de recuperação ambiental, foram, efetivamente, as

maiores responsáveis pela degradação do meio natural, embora atualmente esse impacto

negativo tenha sido reduzido com a recuperação natural do ambiente.

Segundo depoimentos dos antigos moradores e dos estudiosos pelo tema, o quadro físico

natural da Chapada Diamantina era consideravelmente distinto do que se pode ver atualmente.

O maior responsável por essa modificação ou readaptação da natureza às novas condições, foi

o garimpeiro de serra.

Se comparar o método da extração artesanal com o mecanizado (dragas), este, realmente, se

destacou como causador da excessiva alteração nos vales da Chapada, mas esse método só

atuou com base em apenas três itens, que acabaram por lhe atribuir menor culpa pelo crime

ambiental cometido na Chapada Diamantina. São eles:

- espaço restrito, pois elas só funcionavam nos vales onde havia sedimentos aluvionares;

- período de duração curto, variando entre 17 e 18 anos. Os garimpos de serra duraram mais

de 130 anos;

- quantitativo reduzido, se comparado com os garimpos artesanais nas épocas de mais intensa

atividade.

Os garimpos tradicionais ocorreram de forma abrangente em quase toda a região da Chapada

com potencial mineralógico: nas serras, nos vales, nos rios, nas grutas, em qualquer lugar

onde se desconfiasse que pudesse haver diamantes.

A grande duração de sua atividade e a quantidade de garimpeiros existente, aliada aos

métodos utilizados em regiões de sensibilidade ambiental importante (como as nascentes, por

exemplo) apontam o garimpo artesanal como o principal algoz da Chapada. A seu favor, tem-

se o longo período, ocorrido após os momentos de maior intensidade da atividade garimpeira.

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A época em que o garimpo artesanal era forte remonta mais de 60 anos, tempo suficiente para

haver uma nova adequação do meio natural, com a revegetação camuflando o ocorrido.

Hoje, para se saber como era o ambiente natural há 100 anos é preciso recorrer a pesquisas

profundas e conversar com os poucos indivíduos que acumulam duas características:

antiguidade e conhecimento do assunto, podendo ser aí os velhos garimpeiros.

Com fundamento nos estudos registrados acima, serão discriminados a seguir os principais

impactos diagnosticados causados pelo garimpo artesanal que comprovam o grau de

responsabilidade das alterações negativas sobre o ambiente natural da Chapada.

Assoreamento da bacia hidrográfica

A grande quantidade de pessoas que trabalhou nas encostas das serras, durante um grande

período de tempo, executou o desmonte de barrancos e de sedimentos diversos, onde o

cascalho mineralizado podia ser encontrado. Essa atividade quando era executada a seco

acelerava a erosão e o carreamento dos sedimentos de menor granulometria serra abaixo nas

épocas das chuvas, provocando a deposição descontrolada nas redes fluviais mais próximas e

causando o seu assoreamento. O cascalho lavado durante o beneficiamento também contribuía

para tal ocorrência, embora em menor quantidade.

Quando o desmonte era realizado pelo sistema hidráulico, esse assoreamento acontecia em

tempo quase real e com mais notoriedade. Assim, uma grande quantidade de material estéril

era despejada encosta abaixo sem a menor preocupação com a modificação do regime de

fluxo original dos rios da região. Para isso foram construídos canais de corrida para despejo

dos sedimentos, visando, inclusive reduzir o entulhamento nos locais de serviço com o estéril

produzido. Isto era feito através de canais construídos pelos próprios garimpeiros (Figuras 30,

31 e 32), com as águas desviadas para o desmonte hidráulico do estéril existente.

Os sedimentos remanescentes, quando haviam, ainda eram carreados com a chegada das

chuvas de ocasião, complementando o assoreamento acima mencionado. Dessa forma, em

qualquer situação, os rios da região foram fortemente assoreados. Há depoimentos que antes

da atividade garimpeira, os rios possuíam grande energia e suas águas fluíam sobre a rocha

fresca, com aspecto límpido, apresentando sistema de cachoeira nos seus fluxos. Hoje, a

quantidade de sedimentos aluvionares é imensa, as águas apresentam maior índice de turbidez

e o seu fluxo é mais lento.

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Perda do solo

A pouca quantidade de solo presente nas serras era constatada pela sua fraca espessura,

resultante principalmente dos depósitos eluviais. Naturalmente estes depósitos levaram um

tempo correspondente a uma escala geológica para serem formados. Os solos resultantes dos

depósitos coluviais (grupiaras) foram, da mesma forma, removidos e perdidos com as

enxurradas que tombaram na região.

Os garimpeiros precisavam constantemente retirar ou remover, de forma desorganizada, esse

solo para extrair o diamante, sem preocupação em conservá-los para uso posterior nas áreas

atingidas. Da mesma forma citada acima, quando os garimpeiros não despejavam o solo

removido juntamente com o rejeito do minério, as chuvas encarregavam-se desse papel.

A recuperação natural do solo perdido em alguns setores da Chapada será difícil, haja vista a

necessidade de se dispor de um tempo considerável para a sua recomposição, destacando-o

como impacto negativo.

Em muitos locais pode ser observado um cenário característico desta ação, registrando um

exemplo típico dos depósitos tecnogênicos pesquisados por Nolasco (2002), pela presença de

montoeiras de cascalho de grosso diâmetro em grande quantidade, uma vez que a energia das

chuvas foi insuficiente para removê-lo serra abaixo (Figura 46).

Figura 46: Cascalho remanescente da atividade garimpeira manual. Foto: 2004.

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Desvio das redes de drenagem natural e dos rios

As redes de drenagem e os rios presentes nas serras eram desviados até as frentes de garimpo,

através dos canais construídos com esse objetivo específico ou eram represados em barragens

construídas para a utilização da água nessas mesmas frentes de serviço. Esses canais (Figura

30) possuíam como objetivo conduzir a água das chuvas ou dos rios e córregos até as frentes

de garimpo para possibilitar o desmonte hidráulico e o tratamento rudimentar do cascalho,

visando a separação e obtenção do diamante. O desvio dessas águas, além de consistir em

impacto ambiental, deve ter prejudicado as comunidades localizadas à jusante.

Nos vales, os rios eram também desviados para as operações de mergulho e catreamento na

busca do diamante. Havia ainda a necessidade de retirar a água contida no leito desviado para

facilitar a extração do cascalho. Essa secagem se fazia com baldes, latas ou ainda por bombas

de sucção. O fato é que houve obras de desvio e modificação dos leitos e isso possibilitou o

impacto no regime natural dos rios, atingindo o meio e prejudicando os seres vivos que

dependiam do regime original da rede hidrográfica.

Outro ponto que deve ser lembrado é o próprio assoreamento dos rios nas bacias

hidrográficas. Este assoreamento, nas épocas de estiagem, provocou represamento e desvios

dos fluxos dos rios, caracterizando-se igualmente como impacto ambiental (Figura 50).

Impacto sobre os aqüíferos e nascentes dos rios

Boa parte dos rios da Chapada possui nascentes oriundas de aqüíferos situados em pontos

elevados da Serra do Sincorá. Diversas nascentes tiveram origem justamente nas fraturas e em

rebaixos originados das quebras de declividade existentes nas encostas, onde eram

preenchidas por sedimentos e matacões que retinham e evitavam a evaporação das águas,

incluindo aí o cascalho coluvial com diamante (figura 47). Sobre essas estruturas ainda se

encontrava uma vegetação típica que ajudava a manter a umidade. Nos locais promissores, os

garimpeiros efetuavam a secagem do aqüífero, para facilitar o serviço de penetração e retirada

do cascalho objetivado. Assim, os garimpos que existiram nesses locais destruíram muitos

aqüíferos que alimentavam a rede de nascentes da Chapada.

Algumas vezes as fraturas eram ampliadas com explosivos, prejudicando ainda mais o papel

natural da nascente, assumido anteriormente por essas estruturas. Com a diminuição das

nascentes, houve a redução do fornecimento d’água à rede hidrográfica da região, impactando

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negativamente o meio. Esses impactos foram importantes, considerando que praticamente

todas as fraturas e locais mineralizados, que constituíam antigos aqüíferos, foram garimpados

antigamente.

Figura 47: Ilustração de aqüíferos e nascentes derivados das fraturas das serras na Chapada e dos serviços de garimpo destruindo essas nascentes. Fonte: Nolasco (2002) – Adaptação do autor.

Criação de boçorocas

O garimpo de barranco executado por várias frentes de serviço nas encostas e vales da

Chapada delimitava um quadro típico de uma boçoroca. O próprio objetivo dessa técnica era

retirar a capa de estéril existente com desmonte hidráulico, para expor ou capturar o cascalho

mineralizado. Dessa forma os horizontes B e C eram expostos claramente dificultando,

bastante a recomposição da vegetação no local atingido e provocando notório impacto visual.

Perda da vegetação

Para se extrair o minério em quase toda modalidade de garimpo, muitas vezes era necessário

retirar a vegetação local para limpar a frente de serviço de extração e assim permitir o seu

funcionamento adequado. A vegetação era retirada antigamente por ferramentas manuais

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quando se realizava o destocamento das árvores, depois se aderiu às queimadas, que mal

controladas provocavam incêndios generalizados nos campos da Chapada Diamantina.

Presença de sucatas e lixo nas frentes abandonadas de serviço.

Ainda podem ser constatados a existência de equipamentos, utensílios, tubos, mangotes e lixo

em geral, materiais estes utilizados tanto pelos garimpos manuais como pelas de draga, nas

áreas abandonadas de serviço. São sucatas de difícil desintegração, poluindo o ambiente local.

Impacto visual

Este impacto está direta e indiretamente relacionado aos impactos descritos anteriormente.

Como pode ser visto nas figuras 46 e 47, a remoção dos sedimentos responde por esse

impacto. A desfiguração do cenário natural pode ser ainda observada pela retirada da

vegetação, pelo assoreamento dos rios, pelas sucatas e lixo abandonados no terreno, pelos

incêndios nos campos provocados com as queimadas para limpar as frentes dos garimpos,

entre outras ações. Evidentemente esse tipo de impacto negativo foi o mais camuflado com o

tempo. Hoje é mais difícil diferenciar se um determinado aspecto de uma paisagem em um

local qualquer, teve ou não influência do garimpo.

Impactos sobre a fauna

Os garimpeiros caçavam com freqüência nos arredores do garimpo, apesar do fornecimento

de alimentos do meia–praça (sócio dos garimpeiros responsáveis pelo custo do garimpo).

Além disso, a remoção da vegetação local afetava sobremaneira o habitat dos animais que

dela dependiam, forçando-os à fuga, quando a queimada não os matava. Outro fator a

considerar foi o assoreamento dos rios, que também alterou bastante o habitat da flora, fauna

e microfauna aquática existente.

A tabela 5 procura fornecer o grau de importância dos impactos supramencionados com base

nas observações de campo do autor, nas suas informações coletadas no decorrer desta

pesquisa e em experiência própria adquirida pelas avaliações efetuadas na Chapada

Diamantina.

Considerando os depoimentos e testemunhos de que as águas do rio São José e de outros rios

da Chapada antigamente fluíam sobre um substrato rochoso, com maior velocidade de fluxo,

com águas mais límpidas e encachoeiradas, pode-se deduzir, por hipótese, que o regime

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fluvial antigo seria menos favorável que atualmente à implantação de técnicas de lavra por

desmonte e sucção hidráulica, ou seja, por dragas.

Tabela 5. Níveis de importância – garimpo artesanal

IMPACTOS GRAU DE IMPORTANCIA

Assoreamento da rede hidrográfica X X X

Impacto sobre os aqüíferos e nascentes dos rios X X X

Perda da vegetação X X X

Perda do solo X X X

Criação de boçorocas X X

Desvio da rede de hidrográfica X X

Impacto visual X X

Descarga de equipamentos e utensílios no local X

Impactos sobre a fauna X

Legenda: X � pouco importante; X X � importante; X X X � muito importante

O advento da atividade garimpeira tradicional, mesmo com técnicas de extração rudimentares,

teria modificado profundamente as características físicas das bacias hidrográficas da região. A

conseqüência estaria no assoreamento dos rios e dos seus vales, por intermédio do contínuo

fornecimento, por mais de cem anos, de material sedimentar resultante das atividades que

ocorreram a montante. Todo esse material sedimentar, acompanhado, talvez, de pequenas

pedras de diamante que teriam escapulido dos garimpos das serras, teria, portanto, alimentado

em demasia as camadas das aluviões situadas nos vales, a jusante, modificando de forma

notória os regimes fluviais e justificando a implantação das dragas.

Portanto, teria o garimpo artesanal secular, de fato, grande responsabilidade pela chegada das

dragas? Seria necessário conhecer com mais detalhe o ambiente existente na região, antes das

descobertas dos diamantes, para se poder efetuar uma avaliação mais precisa. Por enquanto,

pode-se dizer que, indiretamente, isso ocorreu. Pois foi a exaustão dos diamantes das serras

que induziu os homens mineiros a desviarem suas atenções para os sedimentos de baixos

teores, presentes nos vales da Chapada.

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Paralelamente, os garimpeiros da serra passavam por notável desestímulo, reduzindo

drasticamente, a cada ano, o seu contingente. Em 1971, um relatório do DNPM concernente

ao Projeto Garimpeiros e Garimpos na Bahia, contabilizou o quantitativo de apenas 77

garimpeiros no município de Lençóis. Os sedimentos das encostas da Chapada já não

interessavam tanto àqueles homens.

A alternativa da explotação de diamantes nas aluviões das bacias hidrográficas começou,

então, a ser analisada já em 1975, quando a Companhia Baiana de Pesquisa Mineral

direcionou seus investimentos para esses setores específicos. Vislumbrava-se, assim, a

mecanização da extração de diamantes na Chapada. Este método, com previsão de produção

em grande escala, compensaria as características de deficiência relativas ao baixo teor do

minério.

Contudo, a forte intensidade de impacto por unidade de área, causada pelos garimpos

mecanizados conduzidos na Chapada, arrebatava o título de algoz do meio ambiente que

poderia ter sido adquirido pelo garimpo artesanal.

O fato do garimpo de draga ter surgido e intensificado suas ações recentemente, em relação ao

garimpo artesanal, contribuiu bastante para a culpabilidade dessas atividades. As alterações

ambientais provocadas pelas dragas, além de serem por unidade de área mais impactantes que

o garimpo artesanal, aconteceram justamente quando o mundo aguçava suas percepções

contra as atividades agressoras do meio. Evidentemente, as dragas teriam que ser

responsabilizadas como as principais degradadoras da Chapada.

O meio físico que as dragas destruíram já estava totalmente modificado pelo garimpo

artesanal, mas era esse o quadro da natureza que a sociedade contemporânea conhecia. Uma

sociedade muito mais exigente ambientalmente que aquela que existiu há mais de 60 anos.

Pelo exposto, pode-se dizer que se os garimpos mecanizados, da forma como funcionaram na

região de estudo, alcançassem um contingente equivalente a um pequeno percentual da

quantidade de garimpeiros de serra existentes nas épocas áureas de extração de diamante,

provavelmente não existiriam mais rios na Chapada, apenas um cenário de lagoas artificiais

contaminadas com os poluentes utilizados na explotação por dragas.

Justamente esses impactos comentados acima é que serão discriminados a seguir, após

observações efetuadas in loco e testemunhos registrados na literatura específica.

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Lavra Mecanizada (com draga)

A exaustão dos diamantes das serras apontou os sedimentos aluvionares como a principal

opção para a atividade garimpeira. As aluviões tornaram-se assim, a solução para a produção

de diamantes na Chapada. As dragas assumiram um papel importante neste contexto,

viabilizando a extração de diamantes em sedimentos de baixos teores.

Exatamente a característica de baixos teores dos jazimentos das aluviões foi que destacou o

impacto exagerado causado pelas dragas. Efetivamente, para se extrair 1 (um) quilate (0,2g)

de diamante era necessário remover em torno de 145m3 de sedimentos na bacia do rio São

José. As dragas realizavam essa remoção com rapidez e muita intensidade, desfigurando por

completo o cenário natural contemporâneo, sob o plano visual e estrutural, das bacias

hidrográficas da Chapada Diamantina (MATTA, 2002).

Em termos quantitativos, pode-se demonstrar a força desse impacto com os dados

apresentados no capítulo 4, relativos às características fisiográficas e geológicas da área,

através dos volumes indicados pela remoção de sedimentos aluvionares do rio São José até

1984, a saber: 22.850.733 m3 de sedimentos de uma área aproximada de 233 hectares,

equivalente a remoção de 97.820 m3 de sedimentos por hectare, ou a 16.000 caminhões

caçamba de 6 m3 de basculante, carregados de areia, por hectare. Sendo esta degradação

mensurada, somente em 1984. Salienta-se que as lavras por dragas continuaram em atividade

naquele local até 1997. Isto confirma em parte a primeira hipótese desta dissertação.

Nolasco (op. cit.) descreveu assim as atividades de extração de diamante conduzidas por

dragas:

A paisagem resultante da ação destes garimpos apresenta rios interrompidos, canais transformados em lagoas em épocas mais secas, ou com seus canais extremamente alargados em épocas de enchentes. As dragas, ao tempo em que promovem desassoreamento pontual, favorecem o assoreamento para jusante e, a semelhança das minerações de areia (...), favorecem por ressuspensão, o aumento do percentual de minerais pesados dissolvidos na água.

A obra intitulada Informações Básicas para Gestão Territorial, da CPRM e IBAMA (1994),

também registra o efeito negativo causado pela atividade garimpeira mecanizada (dragas), da

seguinte forma:

O garimpo mecanizado foi introduzido nas lavras diamantinas alguns anos atrás, sendo instalado nos leitos dos rios dentro e fora da área do Parque, com grande impacto negativo. Além das crateras abertas nos leitos, cursos d’água desviados e assoreados, devastação da vegetação e detritos de equipamentos abandonados, as

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141

estradas abertas pelos garimpeiros para transportar as máquinas danificam trechos significativos do Parque.

Moreira e Couto (1994) detalharam mais ainda os impactos causados pelo garimpo de dragas,

discriminando os itens observados durante as avaliações efetuadas em campo, da seguinte

maneira:

Em geral, o “garimpo-de-draga” tem um impacto muito forte no ecossistema atingido, como por exemplo: (1) destruição total, ou parcial, da vegetação nas imediações da cata; (2) soterramento da vegetação por detritos sólidos retirados da cata; (3) desmatamento das áreas periféricas, devido à construção de vias-de-acesso, barragens de contenção, etc.; (4) remoção do solo e conseqüente perda da matéria orgânica; (5) formação de lagoas e barrancos, em áreas antes planas, e, (6) poluição com artefatos do garimpo, como ferro velho, pneus usados, lixo de acampamento e outros.

A exemplo destes últimos autores, visando compreender melhor as intervenções das dragas no

meio físico da Chapada, sob o ponto de vista ambiental, serão igualmente discriminados,

como segue abaixo, os impactos negativos causados.

Alteração da topografia original do terreno

A necessidade de atingir o cascalho obrigava os garimpeiros a escavarem grandes catas nas

margens dos rios. Quanto mais importante era a espessura dos sedimentos aluvionares, mais

extensas eram as escavações. O material estéril era depositado próximo às catas. Diante de

tudo isso a topografia original do terreno era intensamente alterada (figura 48). Quando a cata

era escavada nas margens dos rios, o impacto caracterizava-se como um fato complicador, já

que a recuperação ambiental destes locais sempre foi mais difícil e dispendiosa. A alteração

topográfica intensa favorece também a aceleração dos processos erosivos e deposição de

sedimentos.

Figura 48: Modificação da topografia do terreno

Foto: 1997.

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Desvio da rede hidrográfica original e criação de lagos artificiais

A quantidade e as dimensões das escavações supracitadas e o despejo desordenado do estéril

gerado modificaram os fluxos originais das águas, desviando rios e criando vários lagos

artificiais, como acontece ao longo do rio São José. Esses danos têm por conseqüência não só

a alteração dos cursos das águas dos rios, mas a modificação nos seus regimes de vazão

(figura 50). De outra forma, nas épocas das chuvas as águas avançam bastante, aumentando as

áreas de enchente, para posteriormente, na estação seca, o nível das águas abaixar, a ponto de

interromper o fluxo normal dos rios, criando também diversos lagos nas bacias hidrográficas

da região (figura 49).

Algumas catas que foram abertas um pouco mais distantes das margens dos rios

transformaram-se, igualmente, em lagos artificiais, devido a alimentação natural do lençol

freático e às redes de drenagens existentes nos vales.

Figura 49: Lago artificial criado pela da antiga cata aberta para lavra experimental da CBPM.

Foto: 2004

Assoreamento da rede hidrográfica

O Projeto Chapada Diamantina, da CPRM e IBAMA (1994), lembra dos problemas

específicos de assoreamento provocados pelas dragas, a saber:

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Além de transfigurar o meio ambiente, essas atividades executadas sem a mínima técnica e racionalização causam problemas graves de assoreamento e poluição dos cursos d’água minerados. Em maior ou menor escala, esses problemas já são observados no rio Preto (Palmeiras), riacho São João, rio São José e rio Paraguaçu.

Muitas vezes o material estéril, que era removido das catas localizadas próximas aos leitos

dos rios, eram despejados nos próprios rios. Além disso, como foi descrita no início do

capítulo, a remoção freqüente dos sedimentos aluvionares dos vales acelerava os processos

físicos de erosão e deposição.

Quando o trabalho era executado no leito ou na sua margem, os sedimentos eram postos em

suspensão, incluindo um percentual de metais pesados existentes nos sedimentos, gerando

assoreamento e poluindo à jusante da rede hidrográfica (Figura 50). Pode-se avaliar melhor

este processo de assoreamento com os dados dos volumes de sedimentos removidos,

estimados no capítulo 4.

Figura 50: Desvio e assoreamento do Rio Preto – Palmeiras. Foto: 2001

Aumento da turbulência nas águas dos rios

A remoção e o ato revolver o material estéril, constituído predominantemente de areia e

argila, causou fortes turbulência nas águas dos rios. Quando o estéril não era despejado nos

leitos dos rios, as chuvas encarregavam-se de realizar este processo, aumentando o índice de

turbidez das suas águas e prejudicando os seres vivos componentes do habitat fluvial.

Poluição da rede hidrográfica por combustível e óleos

Durante os trabalhos de desmonte hidráulico e sucção do cascalho diamantífero, havia

derramamento de óleos e combustíveis das máquinas e motores de forma descontrolada nas

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águas dos rios (Figura 51). Além da falta de manutenção e má utilização dos equipamentos,

outra fonte de poluição derivava-se das falhas de estocagem desses efluentes, onde não havia

qualquer cautela ou preocupação com as regras de precaução contra a possibilidade de

vazamento e a conseqüente contaminação das águas. A manutenção das máquinas, quando

havia, era realizada em qualquer lugar e sem cuidado com a poluição dos óleos combustíveis.

Estas são as principais marcas de uma atividade clandestina.

Figura 51: Poluição dos rios com óleos e combustíveis. Fonte: COUTO & MOREIRA, 1993.

Abandono no local de peças e sucatas

Da mesma maneira que o garimpo manual, os garimpos mecanizados abandonavam peças e

sucatas nas frentes de serviço, sem preocupação alguma com a descaracterização do local,

causando poluição visual (Figura 52).

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Figura 52: Abandono de sucatas. Ao fundo, o flutuante de uma draga. Foto: 2001.

Perda do solo

A remoção da cobertura aluvionar durante os trabalhos de escavação e o despejo do estéril

sem a preocupação de retirar e estocar a sua parte orgânica, expondo-a as intempéries locais,

favoreceram a perda do solo orgânico, embora em alguns locais os sedimentos aluvionares

não apresentassem uma camada expressiva de solo.

Perda de vegetação

Antes das instalações dos equipamentos e dragas, os garimpeiros providenciavam a limpeza

do terreno com a retirada da vegetação, caso houvesse no local (Figura 53). A limpeza era

efetuada por tratores ou mesmo queimada. A mudança nas características físicas das águas

dos rios, como o alto índice de turbidez das águas e o assoreamento das redes hidrográficas,

decerto comprometeu a flora e microflora aquática típica da região.

O Projeto Chapada Diamantina da CPRM e IBAMA (1994), apontou os resultados negativos

sobre o ambiente após a atividade antrópica executada na região, registrando o seguinte:

Também significativo é o assoreamento dos rios, notadamente o São José, e destruição da vegetação ribeirinha, por parte dos garimpeiros. O emprego sistemático do fogo é outro fator a ser lamentado, pois impede que a vegetação readquira suas formas originais.

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Figura 53: Perda de vegetação com desmatamento e o assoreamento da margem Fonte: COUTO & MOREIRA, 1993

Danos causados à fauna e microfauna

Como no caso dos garimpos artesanais, os garimpeiros de dragas também caçavam nos

arredores das frentes de lavra, matando indiscriminadamente os animais da região. Outro fato

que contribuía para este impacto eram os desmatamentos efetuados, que causavam fuga de

animais e até óbitos das espécies adaptadas àquela vegetação, principalmente quando a

vegetação era retirada por queimadas.

A mudança dos regimes hidrográficos supracitados após os trabalhos de extração foi

importante na perturbação da fauna e microfauna fluvial. Segundo François Beaux (1997), os

principais fatores que intervém no povoamento da fauna de um curso d’água seria a

velocidade da corrente, a temperatura, a natureza do fundo (rochoso ou não) e a concentração

de oxigênio. Os tipos de populações faunística e florística dependem, portanto, dessas

características. Além disso, influencia o índice de turbidez, que é representado pela

quantidade de matéria em suspensão na água. Isto quer dizer que o aumento do índice de

turbidez das águas, a poluição existente, a alteração na velocidade das correntezas dos rios e a

mudança dos seus regimes de vazão, foram alguns fatores que prejudicaram a população

faunística inerente ao habitat das bacias hidrográficas.

Portanto, pode-se supor que certas espécies fluviais, entre os peixes, as larvas de insetos e de

anfíbios e outras, outrora adaptadas àquele habitat, provavelmente hoje não existam mais.

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Maior exposição à erosão

O desmatamento, a remoção do material estéril e a alteração da topografia facilitam os

processos erosivos, eliminando a camada orgânica do solo e assoreando os rios.

Como no caso precedente, com base na impressão pessoal do autor, a tabela abaixo

relacionará os níveis de impactos de acordo com o grau de importância.

Tabela 6 : níveis de impactos do garimpo mecanizado

IMPACTOS GRAU DE IMPORTANCIA

Modificações na topografia X X X

Desvio da rede hidrográfica X X X

Assoreamento da rede hidrográfica X X X

Turbulência nas águas dos rios X X X

Poluição das águas com óleos e combustíveis X X X

Maior exposição à erosão X X

Perda do solo X X

Perda da vegetação X X

Danos à fauna e à microfauna X

Abandono de sucatas no local X

Legenda: X � pouco importante ; X X � importante ; X X X � muito importante

Durante as visitas ao campo, mais precisamente na bacia do rio São José, observou-se a

recuperação natural de certos sítios anteriormente degradados, que atualmente estão adaptados

às novas condições geográficas. Entretanto, ainda existem alguns locais que exibem notória

degradação do meio físico. Mas, nestes mesmos locais, já se percebe um processo de

recuperação natural para adaptação a um novo quadro, que remete à região estudada uma

segunda fase de adequação às mais recentes alterações fisiográficas, provocadas pelas dragas.

A seguir serão discriminadas, cronologicamente, as adequações fisiográficas por que

passaram os ambientes da Chapada, com o advento do garimpo:

a) Ambiente original (antes de 1844) � sobre este, ocorre alteração provocada pelo garimpo

artesanal e composição de novo cenário ambiental;

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b) Ambiente naturalmente recuperado (antes de 1980, 1ª adequação ambiental) � sobre este,

ocorre nova alteração, desta vez, provocada pelas dragas;

c) Neste momento, encontra-se em processo a recuperação das áreas degradadas pelas dragas

(2ª adequação ambiental – novo cenário, o atual).

Uma das características marcantes deste último cenário ambiental são as lagoas artificiais

escavadas nas margens dos rios para possibilitar a extração dos diamantes com a utilização

das dragas. É o novo quadro que passou a compor a natureza da Chapada a partir do final do

século XX, muito bem observado por sobre vôos na região.

Apesar de possuírem maior potencial de alteração do meio, boa parte dos impactos descritos

para o garimpo mecanizado é parecida com aqueles produzidos pelo método artesanal. O

impacto extremamente intenso causado por área, ao ser praticado recentemente pelas dragas,

evidenciou o forte poder de degradação da mineração, quando esta é conduzida

clandestinamente. A falta de tecnologia e de compromisso em mitigar os impactos ambientais

e de recuperar as áreas degradadas, bem como a contemporaneidade dessas ações que expôs à

sociedade atual o notório crime ambiental, obrigaram as instituições governamentais e a

sociedade civil a tomarem medidas drásticas contra o garimpo secular.

Entretanto, a intervenção do poder público foi realizada sem um planejamento voltado para as

conseqüências resultantes dessa ação institucional. Evidentemente, repercussões sócio-

econômicas e culturais iriam ocorrer, gerando impactos no ambiente humano. A seguir serão

discutidos os impactos relativos a essa situação.

7.1.2 Impacto cultural

A história do garimpo é indissociável da Chapada Diamantina e da fundação de suas cidades,

bem como das diversas etapas cíclicas de desenvolvimento e de crise que tocou a população

da região. A constituição do seu povo, o seu apogeu, as suas ruínas, o seu patrimônio histórico

cultural, estão intimamente ligados à atividade garimpeira de diamante. Existem outros fatos

que também descrevem a história da Chapada, como a extração de ouro e de madeira, as

atividades agropecuárias, mesmo que incipientes e os desenhos rupestres. Mas, a história do

garimpo de diamante pode ser vista impregnada nos olhos de cada pessoa, nos tijolos de cada

edificação, nas conversas das esquinas, na culinária da chapada, na sua religião e mesmo nos

momentos de lazer da população.

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Esta forte ligação que há entre a história da Chapada e seu povo com a extração de diamante

acabou por gerar uma cultura sui generis voltada para o garimpo de diamante na região. As

cidades da Chapada Diamantina e a população local teriam sido moldadas pela cultura do

garimpo de diamante. Esta atividade produtiva teria sido o epicentro de toda a vibração

cultural, social e econômica da região. Algo comparável à cultura cacaueira da cidade de

Ilhéus ou Itabuna, na Bahia.

Porém, os 150 anos de cultura criados na Chapada terminaram em apenas dois anos, com a

interdição do garimpo. A comunidade da região ressentiu-se duramente essas mudanças. Seria

preciso mudar subitamente de hábitos, condutas e pensamentos, o que ocasionou a saída de

muita gente da lavras diamantinas em direção aos outros garimpos de diamantes localizados

em outros estados do Brasil. Portanto, a interdição da atividade garimpeira, certamente

amordaçou as mais consistentes manifestações culturais do povo da Chapada, destruindo a

identidade da região, podendo, assim, ser caracterizado como um impacto cultural, que

abalou, certamente, a qualidade ambiental urbana das cidades mais ligadas ao garimpo, como

Lençóis, Andaraí (e Igatu), Palmeiras e Mucugê.

No caso em discussão, o impacto cultural estaria relacionado às questões históricas e

sentimentais que desenharam as características das cidades e da população da Chapada.

Quando se fala em questões históricas e sentimentais, fala-se do íntimo da população, o que

diferencia do aspecto social aqui discutido, que se refere à banda econômica e racional do

tema. Mas a qualidade ambiental de uma cidade está de fato atrelada à subjetividade do

sentimento, ao não racional. A impressão negativa adquirida pela população local caracterizou

o que se denomina de impacto cultural.

A moldagem cultural da comunidade da Chapada pode ser mais bem avaliada no capítulo que

discute a história do garimpo e das descobertas de diamante. Neste momento, apenas se

demonstra que a interdição das atividades garimpeiras trouxe como conseqüência um outro

tipo de impacto: o cultural.

Redução do impacto cultural através do turismo

Havendo de fato, essa modalidade de impacto, como fazer para reduzir os seus efeitos

negativos?

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Hoje, a atividade do turismo procura aos poucos substituir a ocupação histórica do garimpo,

colocando-se como principal alternativa para a Chapada, embora a maior parte da população

ainda resista a esta idéia de substituição. Afinal, não existem apenas os reflexos econômicos

negativos gerados pela paralisação da extração de diamantes, mas também, os reflexos

culturais.

Se o garimpo causou danos ao meio ambiente, constituindo-se em um obstáculo para o

turismo, uma vez que o turismo ecológico é o mais praticado na Chapada (BRITO, 2004), por

outro lado, o mesmo garimpo, bem conduzido e controlado, poderá sustentar esse turismo que

aparenta prejudicado pela degradação ambiental ocorrida com a produção de diamante, ao se

realizar uma boa gestão das ofertas culturais da região. Pois, a cultura de um povo representa

a mais autêntica oferta turística de um determinado núcleo receptor.

Para Lemos (2000), uma das grandes vantagens do turismo é a quantidade de oferta

naturalmente existente, por ser, geralmente, maior que os investimentos exigidos. Portanto, o

clima, as belezas naturais, a arquitetura típica de uma determinada cidade, a sua história e

outros atrativos culturais, são de origens diversas não concernentes aos investimentos do

turismo. No entanto, o turismo se beneficia de todos esses atrativos.

Logo, anular totalmente a atividade garimpeira de diamante significa tolher a oferta agregada

do turismo na chapada, comprometendo o produto turístico e impedindo este setor da

oportunidade de crescimento e diferenciação de seus produtos.

Desta forma, conclui-se que o impacto cultural causado pela interdição não planejada do

garimpo também atinge o próprio turismo, que, paradoxalmente, foi utilizado como um dos

argumentos para tal ação governamental.

7.1.3 Impacto social

Considera-se o impacto social, a exemplo do impacto cultural, como derivado indiretamente

da atividade garimpeira de diamante. Ambos os impactos atingem o meio antrópico. Este foi

gerado pelo fechamento do garimpo patrocinado pelos governos do estado e federal. O meio

antrópico, neste caso, foi atingido, de forma negativa, no que tange às questões sociais e

econômicas. Logo, isto quer dizer que a atividade garimpeira influenciava positivamente no

setor econômico-social da chapada, principalmente das cidades de Andaraí e Lençóis,

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ocasionando movimentação de dinheiro, estimulando o comércio, criando empregos dentre

outros itens que serão discutidos a seguir.

Para bem conhecer e sentir o problema ocasionado pela interdição da extração de diamantes

na Chapada, informações foram coletadas diretamente da comunidade local, incluindo a

população, as associações de garimpeiros, organismos dos governos municipais, estadual e

federal, entidades não governamentais da região, e, de profissionais experientes com as

questões do garimpo.

O objetivo principal foi registrar as opiniões diversas oriundas da comunidade da Chapada

Diamantina, para subsidiar o diagnóstico geral desta pesquisa, bem como auxiliar decisões

posteriores e outros trabalhos de pesquisa.

Um dos problemas provocados pelo fechamento do garimpo na Chapada derivou da falta de

planejamento nas ações governamentais. Não houve uma avaliação eficiente das

conseqüências derivadas da interdição da atividade garimpeira. Não houve análise competente

sobre as alternativas ao fim do garimpo. E as pessoas que sobreviviam do garimpo, como

ficariam depois do seu fechamento? O que aconteceria com a cultura e tradição da Chapada

após a interdição do garimpo? Será que não havia alternativa sustentável de atividade

garimpeira, evitando, assim, um desfecho drástico contra a situação sócio-econômica da

Chapada Diamantina?

Tipos de impactos observados

Após a coleta de informações perante a comunidade da Chapada, foram discriminados os

principais reflexos negativos diagnosticados nesta pesquisa, através de uma avaliação

qualitativa realizada pelo autor. Entre eles, os seguintes se destacam:

- Extinção dos negócios ligados direta e indiretamente ao garimpo;

- Aumento do desemprego;

- Redução do comércio;

- Redução do movimento bancário;

- Redução dos negócios em outros setores da economia local, como: construção civil; aluguéis

de imóveis; serviços de mecânica, serviços administrativos e de infra-estrutura;

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- Emigração considerável de parte da população;

- Problemas de saúde (alcoolismo, depressão);

- Redução da atividade administrativa local.

Esses impactos de caráter sócio-econômico, que certamente diminuíram a qualidade

ambiental das cidades da Chapada, foram observados principalmente nos quatro primeiros

anos após a interdição do garimpo.

Impactos positivos

O quadro negativo causado pelo fechamento do garimpo pode ser explicado com o exemplo

das cifras seguintes.

Um relatório oficial do DNPM de 1984 (SANTOS FILHO, 1984), elaborado sob cunho

fiscal, registrou, na zona específica desta pesquisa, apontada aqui como a bacia do rio São

José, a presença de 65 dragas em pleno funcionamento entre as cidades de Lençóis e Andaraí,

em uma distância aproximada de 30 km. Em cada draga trabalhavam em torno de 7 pessoas.

Portanto, o total se aproximava de 455 garimpeiros, que trabalhavam somente naquele

pequeno setor da Chapada, correspondente à bacia do rio São José. A remuneração do

trabalho era repartida da seguinte maneira:

Tabela 7: Repartição da remuneração total obtida com a produção de diamantes com as

dragas

Agentes do garimpo Quantidade Porcentagens (comissões) %

Proprietário da draga 1 53

Proprietário do terreno 1 10

Gerente da draga 1 7

Garimpeiro 6 5

E, considerando os itens abaixo para o exemplo da bacia do rio São José:

- O custo de produção englobando o combustível, alimentação para 7 homens, e outras

necessidades, era mais ou menos 10 ct/mês/draga (dados relatados por documento oficial de

1984 – DNPM) ;

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- O preço médio do quilate dos diamantes da Chapada era de US$ 75,00 em 1984 (Principais

Depósitos Minerais do Brasil – 1991). Hoje se calcula em torno de US$ 300.00;

- Quantidade de dragas: 65;

- Lucro estimado para o proprietário da draga: 20%.

Logo, se o custo de produção era de 10 quilates/mês/draga e considerando-se razoável estimar

um lucro de 20% para o dono da draga (20% sobre a sua parte na produção – 53%), pode-se

calcular, de forma bem modesta, uma produção média aproximada de 24 quilates por mês por

draga. Assim, a repartição da produção mensal de uma draga ficaria da seguinte forma:

7,2 ct � garimpeiros (6)

Produção mensal: 24 quilates 1,7 ct � gerente da draga

(produção média por draga) 2,4 ct � Proprietário do terreno

12,7 ct � proprietário da draga

Deve-se lembrar que o proprietário da draga arcaria com um custo de produção de 10

quilates/mês; logo, seu lucro ficaria em torno de 2,7 quilates/mês (20%).

Portanto, estima-se uma produção média mensal em 1984, considerando a quantidade de 65

dragas, para a pequena faixa do rio sobredito, de 1.560 quilates, ou seja, um montante de

117.000,00 dólares por mês, levando em conta o preço médio do quilate de US$ 75,00 para

1984. Do montante calculado, aproximadamente US$ 43.483,00 eram distribuídos aos 455

garimpeiros (garimpeiros e gerentes de dragas) que trabalharam na faixa específica do rio São

José, para gastar nas cidades de Lençóis ou Andaraí. Logo, em 1984, cada garimpeiro poderia

ter tido uma renda média de, pelo menos, US$ 95,50 por mês.

Destaca-se, ainda, que o custo de vida na região da Chapada Diamantina, para a década de

1980, era mais baixo que o da capital. Hoje essa diferença reduziu um pouco, uma vez que os

investimentos no turismo têm atraído uma relativa carestia para a região, embora ainda

continue mais baixo que a capital.

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Outro ponto importante que deve ser considerado é o valor do dólar para a década de 80.

Nesta época, o dólar valia mais que nos dias atuais por causa da sua própria desvalorização,

que em 20 anos deve ser considerada. Svisero & Chaves (1999) comprovam esta informação

ao registrar o preço médio de US$ 150,00/quilate em 1999, para os diamantes da região da

Serra do Espinhaço, que engloba a Chapada Diamantina. Neste caso, cada garimpeiro passaria

a receber não mais US$ 95,5/mês, mas, aproximadamente, US$ 190,00/mês. Documentos

oficiais do DNPM já mencionam para hoje o valor médio de US$ 300,00/ct, para os

diamantes da Chapada.

Pelo Censo de 2000 do IBGE, a cidade de Lençóis possuía uma população de 8.894 habitantes

e a cidade de Andaraí havia reduzido a sua população para 13.825 habitantes. Estimando-se

que em 1984 as duas cidades tivessem alcançado o contingente populacional de 25.000

habitantes, e que o trabalho de cada garimpeiro gerasse mais 5 outros empregos indiretos,

poder-se-ia avaliar a existência, em 1984, de aproximadamente 2.730 pessoas empregadas

entre a população de 25.000 habitantes das cidades mencionadas por causa do garimpo. Isto

representa um percentual próximo de 11% da população citada, gerados, somente, pelos

garimpos do rio São José.

A tabela abaixo resumirá os números acima discutidos:

Tabela 8: Aspectos sócio-econômicos gerados pela produção de diamante na bacia do rio

São José em 1984

Aspectos sócio-econômicos Bacia do rio

São José (65 dragas)

Valor em

Dólar

Produção por mês (estimativa p/ 1984) 1.560 ct 117.000,00

Custo da produção por mês 650 ct 48.750,00

Empregos diretos (garimpeiro) 455 43.483,00 (*)

Empregos indiretos 2.275 -

Empregos totais 2.730 -

Porcentual de empregos (**) 10,92% -

(*) Quantia mensal recebida por 455 garimpeiros em 1984

(**) porcentagem de empregos em relação à população estimada das cidades de Lençóis e Andaraí em 1984

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Ademais, conforme o testemunho do Sr. Carlos Formiga, antigo garimpeiro de diamante, até

então, funcionário municipal da prefeitura do município de Palmeiras, cada cidade localizada

ao redor do Parque Nacional possuía em torno de 500 garimpeiros trabalhando, antes da

interdição do garimpo. Esta informação pode fornecer uma idéia geral da importância sócio-

econômica do garimpo para a Chapada Diamantina e, conseqüentemente, do impacto causado

pela sua interdição brusca.

Outro item que precisa ser lembrado reporta-se à análise anteriormente efetuada, direcionada

apenas à entrada de dinheiro na região correspondente à quantia percebida pelos garimpeiros.

Portanto, salienta-se que esta quantia (US$ 43.483,00) equivale a menos da metade daquela

realmente percebida pelo garimpo do rio São José (U$ 117.000,00). A maior parte destes

recursos, ou seja, US$ 73.517,00, ficava com os donos das terras, onde se localizavam, às

vezes, mais de uma draga e, principalmente, para os donos das dragas, que também possuíam,

muitas vezes, mais de uma draga. Desses US$ 73.517,00, os donos das dragas aplicavam boa

parte na região para compra de mantimentos, combustíveis, itens de necessidade do garimpo,

como serviços de mecânica, entre outros, inerentes ao custo calculado acima, de US$

48.750,00, gerando, portanto, empregos e aquecendo o mercado local.

7.2 Alternativas do governo e opinião das populações de Andaraí e Lençóis

A alternativa apresentada pelo governo do Estado à interdição do garimpo foi a dos

investimentos direcionados ao setor de turismo, que já vinham sendo, inclusive, realizados

principalmente no município de Lençóis. Estes investimentos substituiriam os empregos

perdidos pelos garimpeiros e os negócios relativos à atividade mineira.

Portanto, com base na alternativa do governo para o fim da extração de diamante na Chapada

e na argumentação de que o garimpo degradava o meio físico, as cidades de Lençóis e

Andaraí foram selecionadas como alvos de uma avaliação qualitativa baseada na aplicação de

um formulário de questões específicas para o assunto, junto à população local. Seria

importante assimilar o sentimento de quem vivenciou o problema, neste caso, a própria

população da região. A aplicação do formulário mencionado objetivou avaliar os pontos de

vistas das populações das cidades citadas sobre o fechamento do garimpo e a sua relação com

o turismo e meio ambiente da Chapada.

A cidade de Lençóis foi escolhida por ter sido a que mais recebeu investimentos para o setor

de turismo na Chapada, além de ter sido, outrora, o maior centro comercial de diamante da

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Bahia, identificando, então, duas situações dicotômicas no que diz respeito ao tema da

pesquisa. A cidade de Andaraí, por outro lado, apresenta uma situação atual diferente da de

Lençóis, haja vista que é uma das cidades mais dependentes do garimpo na Chapada, embora

tenha recebido também algum investimento no turismo. Em resumo: Lençóis seria hoje,

teoricamente, mais turística e menos mineira e Andaraí, o contrário, menos turística e mais

mineira.

O formulário supramencionado foi aplicado em meados de 2001. A sua aplicação foi

efetivada de forma aleatória, sobre as populações das cidades sobreditas, e foi executada por

amostragem sobre pessoas que aparentavam adultas.

Abaixo se resumem os números da pesquisa de opinião e o método de amostragem utilizado:

Tabela 9 – números da enquete (2001) – pesquisa por amostragem

CIDADES ALVOS DA PESQUISA

ANDARAÍ LENÇÓIS

População – 2000 (*) 13.825 8.894

Quantidade Pessoas entrevistadas 92 99

% de entrevistados em relação a

população do município (**)

0,66 1,11

% de entrevistados em relação à

população urbana (**)

1,28

1,55

% de entrevistados em relação à

população urbana adulta (**)

1,38 2,20

(*) Fonte de dados para a população: IBGE – recenseamento do ano 2000

(**) percentuais aproximados

Métodos de amostragens utilizados

Os números acima demonstram que a pesquisa foi realizada por amostragem, considerando a

limitação de tempo e de recursos para a sua realização. Entretanto, utilizou-se um método de

amostragem que garantisse uma extrapolação de resultado confiável, com viés aceitável.

A amostragem representa uma coleta de dados relativos a alguns elementos da população e

sua análise, que pode proporcionar informações relevantes sobre toda a população (VELUDO

DE OLIVEIRA, 2001).

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Procurou-se trabalhar com a aplicação dos métodos de amostragem não probabilística e

amostragem probabilística.

Veludo de Oliveira (2001) define esses dois métodos da seguinte forma:

Amostragem probabilística é aquela em que cada elemento da população tem uma chance conhecida e diferente de zero de ser selecionado para compor a amostra. As amostragens probabilísticas geram amostras probabilísticas.

Amostragem não probabilística é aquela em que a seleção dos elementos da população para compor a amostra depende ao menos em parte do julgamento do pesquisador ou do entrevistador no campo.

Amostragem não probabilística

Utilizou-se o método de amostragem não probabilística, pelo formato de “Julgamento” (existe

ainda o formato por “conveniência” e por “cotas”), apenas no processo de escolha das cidades

de Lençóis e Andaraí. Na amostragem não probabilística por julgamento, o pesquisador usa o

seu julgamento para selecionar os membros da população que são boas fontes de informação

precisa. Desta forma, as cidades mencionadas forma selecionadas, pois, segundo a autora

citada, a abordagem da amostragem por julgamento pode ser útil quando é necessário incluir

um pequeno número de unidades de amostra.

Ela lembra ainda que o método de amostragem por julgamento é muito utilizado para a

escolha de uma localidade representativa de um país na qual serão realizadas outras pesquisas,

o que é exatamente o caso em discussão. Foram escolhidas, com base em parâmetros

específicos (julgamento), as cidades de Lençóis e Andaraí, para se realizar a pesquisa junto às

suas populações.

A amostragem não probabilística é limitada. Ela apresenta resultados enviesados, e não deve

ser usada para generalizar as informações adquiridas da amostra para a população total.

Portanto, as informações registradas com a pesquisa devem ser limitadas somente às

populações de Lençóis e Andaraí.

Este método é importante apenas para trabalhos exploratórios, em estágios de conhecimento e

compreensão do fenômeno por parte do pesquisador, também em pré-testes de questionários,

ou quando se trata de população homogênea, ou por questões de operacionalidade, ou, como

neste caso, na escolha de localidades objetivando a realização de outra pesquisa.

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Entretanto, no caso da escolha das cidades de Lençóis e Andaraí, o julgamento fundamentou-

se na forte relação que existiu e ainda existe entre essas cidades e o garimpo de diamante, bem

como, com o próprio turismo. Elas podem ser consideradas como as principais cidades da

região, outrora produtora de diamantes, o que as coloca como localidades representativas da

Chapada Diamantina (das Lavras Diamantinas) para esse tema específico. Entende-se,

portanto, que as populações dessas cidades são realmente representativas para a aplicação de

um formulário de questões sobre garimpo, meio ambiente e turismo na Chapada Diamantina.

Amostragem probabilística

O método de amostragem probabilística foi usado na pesquisa inerente à aplicação do

formulário citado. Esse método apresenta três formatos, a saber: aleatória simples,

estratificada e conglomerado (área).

O primeiro (aleatória simples) corresponde ao procedimento em que cada membro da

população tem uma chance conhecida e igual de ser escolhido. A amostragem probabilística

estratificada divide a população em grupos mutuamente excludentes (grupos de idade, por

exemplo) e amostras randômicas são sorteadas para cada grupo. E, no caso da amostragem

probabilística por área, a população é dividida em grupos mutuamente excludentes (como

quarteirões) e o pesquisador sorteia uma amostra de grupos para ser entrevistada.

Apesar de a pesquisa ter sido direcionada somente para a população adulta das cidades de

Lençóis e Andaraí, entendeu-se que o método mais próximo que deveria ser utilizado na

aplicação do formulário seria o da amostragem probabilística aleatória simples.

Isso porque não houve qualquer direcionamento ou planejamento para locais específicos das

cidades, nem houve qualquer julgamento pessoal do entrevistador na escolha do entrevistado,

ou seja, os entrevistados foram escolhidos aleatoriamente e tinham as mesmas chances de

escolha.

Assim, a pesquisa envolveu todos os tipos de pessoas, a saber: transeuntes em geral que

aparentavam maior idade; comerciantes; funcionários públicos; aposentados; estudantes

maiores de idade, donas de casa, etc., que foram entrevistados pelas ruas, becos, residências,

casas comerciais e públicas das cidades citadas. A decisão da seleção do entrevistado era

efetuada instantaneamente, podendo, assim, ser considerada como escolha aleatória simples.

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A vantagem da amostragem probabilística sobre a amostragem não probabilística está no grau

de confiança dos seus resultados; enquanto que na amostragem probabilística os resultados

podem ser projetáveis para a população total, no caso, a de Lençóis e Andaraí, a amostragem

não probabilística apresenta viés considerável, não devendo, portanto, seus resultados serem

generalizados (VELUDO DE OLIVEIRA, 2001).

Em resumo, esta pesquisa utilizou o método da amostragem não probabilística para a

escolha das cidades de Lençóis e Andaraí na pesquisa sobre a impressão da comunidade das

lavras diamantinas, após a interdição do garimpo, e o método da amostragem probabilística,

que é mais eficiente e preciso nos seus resultados, na aplicação dos formulários com questões

específicas perante as populações dessas cidades.

Aplicação do formulário

As questões aplicadas às populações de Andaraí e Lençóis foram preparadas para obterem

respostas dicotômicas, como “sim” ou “não”. Procurou-se elaborar questões diretas e de

simples compreensão. Oito quesitos relacionados com os problemas do garimpo de diamante,

o turismo e o meio ambiente foram colocados aos entrevistados. Os quesitos e o resultado do

questionário encontram-se a seguir:

FORMULÁRIO APLICADO EM LENÇÓIS E ANDARAÍ

1. Existe algum garimpeiro na sua família?

2. Você acha o garimpo é importante para a região?

3. Você acredita que o garimpo era ruim para o turismo?

4. Você acha que o garimpo é danoso ao meio ambiente?

5. Você acredita que possa existir um método ou técnica de garimpo que preserve o meio

ambiente e não prejudique o turismo?

6. Você acredita que a região era melhor na época do garimpo?

7. Você viveu melhor na época do garimpo?

8. Você deseja a continuação do garimpo?

Os resultados dessa pesquisa podem ser observados e avaliados na tabela abaixo.

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Tabela 10 - Resultados da pesquisa junto à comunidade

CIDADES

QUESTÕES

LENÇÓIS

(%)

ANDARAÍ

(%)

1 - garimpeiro na família? 67 74

2- importância do garimpo? 81 98

3- garimpo prejudica o turismo? 34 30

4- prejudica o meio ambiente? 73 49

5- existe outro método? 68 65

6- a região era melhor com o garimpo? 79 96

7- se vivia melhor com o garimpo? 67 91

8- continuação do garimpo? 83 89

Comentários

O índice de abstenção foi muito baixo; registrou-se alguma abstenção apenas na questão

cinco, que exigia conhecimento técnico. Constatou-se para esta questão uma abstenção de 2%

para a cidade de Lençóis e de 9% para a de Andaraí. Afinal, as pessoas entrevistadas foram

escolhidas aleatoriamente, o que deu margem à seleção de indivíduos leigos sobre os temas

técnicos relativos ao garimpo e à preservação ambiental.

Observa-se uma maior tendência favorável ao garimpo de diamante para a cidade de Andaraí.

Isto pode ser explicado não só pelo menor investimento ocorrido para o turismo nesta cidade,

como na maior dependência do garimpo em relação à cidade de Lençóis. Esta, como já foi

comentado acima, foi a cidade que mais recebeu investimentos no setor de turismo. Isso pode

ser explicado através dos números do município de Andaraí que possui, atualmente, 143

unidades de hospedagens e Lençóis 619 (BRITO, 2004).

Contudo, essas duas cidades, que foram tomadas como exemplo, mostraram claramente a

forte propensão (ainda) do povo pelo retorno do garimpo. Mesmo em Lençóis, que já possui

uma estrutura considerável para o turismo, observa-se a preferência notória de sua população

ao retorno à atividade mineira de diamante.

Destaca-se, igualmente, que 67% dos entrevistados de Lençóis disse que vivia melhor na

época do garimpo, sendo que 91% da população de Andaraí afirmaram a mesma coisa. Este

quesito apresenta respostas inerentes à impressão individual de cada um, que compõem uma

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amostra (ou grupo) da população das cidades citadas, e assim deve ser analisada,

correspondente a um fato passado, concreto, depois da interdição das atividades garimpeiras.

Isto demonstra uma queda na qualidade ambiental urbana dessas cidades, causada pela

interdição geral da atividade garimpeira, confirmando a terceira hipótese desta dissertação.

Esta queda, no entanto, foi mais enfática na cidade de Andaraí, como era de se esperar.

Os grupos de pessoas entrevistadas demonstram desta forma, as tendências de impressões

coletivas, comentadas no capítulo dois (item 2.2), sobre o entendimento da qualidade

ambiental urbana. Estas impressões avaliam a qualidade dos ambientes urbanos de Lençóis e

Andaraí, com utilização da subjetividade, mas, contaminada por certa dose de racionalidade

por ser avaliada coletivamente. Paradoxalmente, acredita-se, que este viés de análise (a

subjetividade) impõe maior realidade aos resultados de uma avaliação qualitativa do ambiente

urbano das localidades estudadas.

Na questão seis, os entrevistados afirmaram, de forma expressiva (79% dos entrevistados em

Lençóis e 96% em Andaraí), que a região era melhor com o garimpo em atividade. Este

quesito registra o olhar dos moradores dessas cidades sobre o ambiente urbano, anterior à

interdição do garimpo. Isto reflete como estavam as cidades e os cidadãos naquele momento,

se havia sensação relativa de conforto e bem-estar.

A questão 7 ingressa no campo individual de cada entrevistado, quando questiona se cada um

vivia melhor na época em que existia o garimpo. A população de Lençóis respondeu

positivamente com 67% dos entrevistados e a de Andaraí disparou com 91% respondendo

“sim”, no momento em que foi aplicado o questionário.

Um outro resultado muito importante, significativo e definidor foi aquele correspondente ao

quesito número oito, quando 83% das pessoas entrevistadas em Lençóis e 89% daquelas

entrevistadas em Andaraí foram favoráveis à continuação do garimpo na Chapada. Significa

dizer que as populações dessas cidades desejavam, em 2001, três anos após o fechamento do

garimpo, o retorno deste à Chapada. A figura 54 exibe o descontentamento da comunidade

com as ações de interdição do poder público, ainda em 1993, quando houve a paralisação de

apenas um garimpo.

Mas, por outro lado, 73% das pessoas entrevistadas na cidade de Lençóis acharam que a

atividade garimpeira de diamante era realmente prejudicial ao meio ambiente e pouco menos

que a metade da população entrevistada em Andaraí, achou a mesma coisa. Este, portanto, foi

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o único ponto em que o garimpo levou desvantagem nos resultados da pesquisa realizada.

Fica caracterizado também, que a população de Lençóis possui maior consciência ambiental

que a população de Andaraí, provavelmente porque possui maior quantidade de indivíduos

oriundos de outras regiões, possuidores de um olhar preservacionista, mais aguçado que a

média da população da Chapada, além, evidentemente, da influência considerável do maior

grau de investimento no turismo, que, na Chapada, é liderado pelo turismo ecológico.

O índice mais expressivo encontrado nos resultados da pesquisa, no entanto, foi aquele

correspondente à questão n° 2, que pergunta sobre a importância do garimpo para a Chapada.

Os resultados foram: 81% dos entrevistados de Lençóis afirmou que o garimpo era realmente

importante para a região e praticamente todos (98%) os entrevistados de Andaraí disse o

mesmo. No entanto, esta questão possibilita a resposta positiva para até quem era contra o

garimpo. Pois, qualquer um poderia acreditar que essa atividade foi importante para a região,

mesmo aquele que não concordava com ela. Mas, fica clara aí a influência da atividade

garimpeira na vida, nos hábitos e na história das Lavras Diamantinas.

Figura 54: Manifestação garimpeira em Andaraí ocorrida após a primeira paralisação de alguns garimpos na Chapada, em 1993. Fonte: COUTO & MOREIRA , 1993.

Ademais, a história e a cultura do garimpo na Chapada podem ser confirmadas com o

resultado da questão n° 1, quando 67% das pessoas entrevistadas em Lençóis possuía alguém

da família que originava do garimpo; em Andaraí, 74% das pessoas entrevistadas possuía

alguém na família que já tinha sido garimpeiro ou ainda era, demonstrando o forte elo que

existia entre a população da Chapada e o garimpo.

O quesito número três do formulário procurava relacionar o turismo e o garimpo na coleta da

impressão da população, perguntando se a atividade de extração realmente prejudicava o

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turismo. Afinal, o turismo mais praticado na Chapada era o ecológico, o que poderia justificar

a falta de compatibilidade com o garimpo. No entanto, apenas um pequeno percentual das

populações das cidades de Lençóis e Andaraí (34% de Lençóis e 30% de Andaraí) concordou

com essa afirmação, de onde se conclui que a maior parte da população acreditava que o

garimpo não prejudicava o turismo. Entende-se, portanto, ao contrário, que o garimpo pode

complementar as ofertas turísticas da Chapada.

Além da aplicação desse formulário perante as populações de Lençóis e Andaraí, realizaram-

se também entrevistas junto a determinados organismos ligados de alguma forma às principais

questões das Lavras Diamantinas. Esses organismos não emitiram oficialmente suas opiniões

sobre o tema, mas a maioria deixou claro que poderia haver integração entre o turismo e a

extração de diamante. Para eles, o fechamento praticamente súbito do garimpo de diamante

não foi bem planejado. Quase todos os organismos demonstraram sensibilidade com o

desemprego gerado pela interdição da extração de diamante.

Os organismos visitados foram os seguintes:

- Prefeitura municipal de Lençóis;

- Prefeitura municipal de Andaraí;

- Câmara de vereadores de Andaraí;

- Prefeitura municipal de Palmeiras;

- Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis, IBAMA;

- Centro de Recursos Ambientais do Estado da Bahia – CRA;

- Grupo Ambientalista de Palmeiras – GAP (ONG local);

- Sociedade Beneficente dos Garimpeiros de Andaraí – SBGA;

- Sociedade União Mineira – SUM;

- Corpo de Bombeiros de Lençóis.

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Os impactos causados sobre o meio natural foram evidentes, mas a interdição da atividade

garimpeira afetou frontalmente o meio antrópico, conforme pôde ser comprovado com a

opinião geral de quem vivenciou o problema: as populações de Lençóis e Andaraí.

Enfim, conclui-se que após a pesquisa realizada perante a população e os organismos oficiais,

a alternativa sugerida pelo governo (investimentos no turismo) não foi suficiente para resolver

os principais problemas da comunidade das Lavras Diamantinas: o desemprego e a fraca

economia da região.

Outra conclusão a que se chegou foi a constatação da ocorrência de impacto negativo sobre o

ambiente urbano das cidades de Lençóis e Andaraí, causado pelo fechamento do garimpo de

diamante. Este impacto, constatado em 2001, afetou a qualidade de vida das populações

citadinas, deixando-as menos tranqüilas e menos satisfeitas.

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8 - Conclusões

Abaixo serão relacionadas as principais conclusões obtidas em todo o texto desta dissertação,

iniciando com os temas do capítulo 2 (Referencial teórico-conceitual) e finalizando com as

hipóteses apresentadas no capítulo 1 (introdução do texto). Entre elas, destacam-se as

seguintes conclusões:

Analisando o referencial teórico-conceitual observou-se que a evolução das tendências

preservacionistas da sociedade mundial cresceu muito após os anos sessenta, alicerçadas

principalmente no apoio das pesquisas científicas e nas pressões das comunidades

organizadas.

Em geral, a mineração como atividade produtiva, apesar de não ser a de maior potencial

poluidor (como é o caso da agricultura e da indústria), está entre aquelas que mais impactam o

ambiente. No que tange apenas ao setor produtivo mineral, são as minerações clandestinas e

as antigas minas, que outrora utilizavam técnicas inadequadas e rudimentares,

desconsiderando os reflexos negativos ocorridos ao meio natural e urbano, as maiores

poluidoras do ambiente. Algumas dessas minas antigas, embora já estejam fechadas,

continuam poluindo o meio até os dias atuais.

As grandes cidades, ao contrário das pequenas, apresentam maiores problemas inerentes à

compatibilização entre a mineração e a própria expansão urbana e industrial (capítulo do

referencial teórico-conceitual).

Conclui-se também, após análises pormenorizadas, que as legislações mineral e ambiental

geram dificuldades ao setor mineral, principalmente para os empreendimentos de pequeno

porte, por causa da excessiva regulamentação. Essa forte regulamentação, que exige diversos

diplomas legais, dificulta efetivamente a regularização das atividades mineiras, influenciando

sobremaneira na adoção da clandestinidade como solução.

A região da Chapada Diamantina apresenta condições geográficas não muito favoráveis a

uma vegetação vasta, por causa do seu tipo de solo, que possui geralmente poucos nutrientes e

pouca espessura, provavelmente agravados pelos efeitos da atividade garimpeira secular. O

clima peculiar representa outra dificuldade para a flora, pois dispõe de uma estação seca entre

quatro a seis meses por ano. Estas características induzem a presença de uma flora endêmica e

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frágil quando submetida a agressões externas, dificultando uma recuperação natural mais

rápida.

Os dados extraídos dos estudos bibliográficos, no referencial teórico-conceitual, sugerem que

as configurações exuberantes dos relevos favorecem a formação da extensa rede hidrográfica

do estado da Bahia, tendo o rio Paraguaçu como o constituinte de sua principal bacia,

ocupando uma área correspondente a 11% do total do estado.

A história do garimpo de diamante iniciou justamente nos rios da região com a descoberta das

primeiras gemas de diamante, o que reforça a íntima relação existente entre os rios, o garimpo

e, conseqüentemente, a história da Chapada Diamantina.

Os depósitos aluvionares, onde se encontra o cascalho diamantífero, apresentam na área de

estudo do rio São José, uma grande relação de estéril/minério (de 9,6:1), o que o torna

ambientalmente vulnerável para a extração de diamantes, haja vista a necessidade de se

remover grande quantidade de estéril por unidade de minério.

A situação piora quando se avalia o teor de diamante nos sedimentos aluvionares do rio São

José, que apresenta a relação de 0,0069 quilate por metro cúbico de sedimento. Significa dizer

que para se extrair um quilate de diamante (um pequeno grão de 0,2 g) é necessário remover

aproximadamente 145 m3 de sedimentos ou 24 caminhões caçamba tipo basculante, com

capacidade de 6 m3. Esses baixos teores implicam, portanto, em grandes impactos na

topografia local durante a execução de uma lavra de diamante.

Calculou-se que até 1984 foram removidos em torno de 23.000.000 m3 de sedimentos durante

as explotações por dragas na bacia do rio São José, que correspondem à quantidade

aproximada de 97.820 m3 por hectare ou 16.000 caminhões caçamba por hectare. Isto

demonstra o poder degradador dos garimpos de draga, se forem conduzidos clandestinamente,

sem as devidas técnicas mitigadoras.

Os diamantes da região possuem altos preços devido às suas características gemológicas, os

quais podem compensar investimentos em certos projetos de mineração, direcionados para

determinadas zonas da Chapada.

O garimpo foi o evento que mais caracterizou a região da Chapada Diamantina. Toda a

história do povo chapadense, resumida em crises, apogeus e em acontecimentos marcantes,

está relacionada com a atividade garimpeira.

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Os garimpos, tanto o mecanizado como o artesanal, impactaram negativamente o meio

natural, com as significativas alterações ocorridas nos processos do meio ambiente,

influenciando a dinâmica natural da região.

A interdição da atividade garimpeira causou considerável impacto sobre o ambiente

antrópico, prejudicando a identidade cultural da Chapada. Logo, anular completamente a

atividade garimpeira de diamante significa tolher a oferta agregada do turismo na chapada,

comprometendo o produto turístico e impedindo este setor da oportunidade de crescimento e

segmentação do mercado com a diferenciação de seus produtos.

Desta forma, pode-se concluir que o impacto cultural causado pela interdição não planejada

do garimpo, também atinge o próprio turismo, que, paradoxalmente, foi utilizado como um

dos argumentos para tal ação governamental de interdição.

O fechamento do garimpo sem o devido planejamento também provocou consideráveis danos

sociais à população da região, uma vez que esta população perdeu umas das principais

alternativas de ocupação e renda da Chapada.

O exemplo de funcionamento do garimpo de 1984, descrito no texto (Capítulo 7, item 7.1.3),

provou de forma empírica a dinâmica sócio-econômica vivida pelas cidades de Lençóis e

Andaraí, com a injeção de pelo menos US$ 117.000,00 (considerando o preço médio da gema

em 1984) todo mês na renda dessas cidades. Esta situação pode ser considerada como impacto

positivo provocado pelo garimpo de diamante.

Depois da aplicação do formulário específico dirigido à população de Lençóis e Andaraí e

depois das entrevistas realizadas perante os organismos governamentais e não governamentais

da região, pôde-se constatar os efeitos negativos provocados pela interdição da atividade

garimpeira de diamante à comunidade das Lavras Diamantinas.

O descontentamento manifestado pela população citadina com o fechamento do garimpo

deixou claro a existência dos efeitos negativos refletidos nas cidades de Lençóis e Andaraí.

Este fato evidenciou a queda da qualidade ambiental urbana das cidades envolvidas nesse

processo.

A história do garimpo e da Chapada Diamantina está intimamente ligada à cultura de seu

povo. A interdição radical desta atividade dilapidou a cultura da Chapada, mas suas raízes

ainda continuam vivas. O impacto cultural, em compensação, pode ser atenuado através de

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ações que relacionam diretamente a extração artesanal à atividade de turismo. Portanto, o

retorno do garimpo manual com o objetivo de se associar ao turismo poderá reduzir os

impactos culturais, sociais e contribuir para o desenvolvimento do turismo na região.

Enfim, sobre as hipóteses apresentadas no capítulo 1, pode-se concluir o seguinte:

A primeira hipótese – a mineração executada por dragas apresentou maior intensidade de

degradação ambiental que os métodos artesanais de garimpo de diamante – pode ser

considerada verdadeira, uma vez que o garimpo mecanizado teria maior potencial degradador,

por unidade de área, que o garimpo manual, pois, as dragas precisavam remover muito

sedimento para obter poucos quilates de diamante, além de atuarem, freqüentemente, nas

proximidades dos rios, o que agravava a situação. Entretanto, cabe salientar que na história

das Lavras Diamantinas, em uma visão geral, o garimpo manual teria sido mais impactante,

por ter envolvido uma área muito maior que a das dragas, perdurado por mais de 150 anos e

com dezenas ou centenas de milhares de garimpeiros, diferentemente das dragas, que atuaram

em áreas restritas, por pouco tempo e com pouca gente, em relação à atividade artesanal.

A segunda hipótese – a interdição brusca e sem planejamento do garimpo provocou

impactos sócio-econômicos e culturais negativos na região da Chapada Diamantina – foi

comprovada com a pesquisa executada junto à população de Lençóis e Andaraí. Elas

ratificaram, nas respostas do formulário específico, que a interdição do garimpo gerou

problemas sócio-econômicos e culturais à comunidade chapadense, em particular, nas

comunidades das Lavras Diamantinas, que são bem representadas pelas cidades supracitadas.

A terceira hipótese – a qualidade do ambiente urbano das cidades das Lavras

Diamantinas caiu após a interdição do garimpo de diamante – foi comprovada em parte: o

resultado da pesquisa junto às populações das cidades de Lençóis e Andaraí ratifica a queda

da qualidade ambiental urbana dessas cidades. Porém, este resultado não deve ser estendido

para as outras cidades da Chapada, já que o método de pesquisa usado, por amostragem não

probabilística, na escolha daquelas cidades, não permite a generalização dos resultados para

as outras cidades da região.

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9 – Recomendações e alternativas de redução de impactos

Em certos locais da Chapada Diamantina observam-se, ainda, processos naturais de

recuperação ambiental dos impactos causados pelo garimpo. Estes processos de recuperação

estão hoje associados às novas condições geográficas de cada ambiente específico. Mas, por

outro lado, encontram-se ainda alguns sítios com vestígios de degradação ambiental

provocados pelo garimpo da época, que poderiam passar por obras de recuperação.

Mas, quando o assunto é impacto social e cultural, os problemas são ainda mais notórios. O

fechamento do garimpo gerou de forma imediata um forte impacto na qualidade de vida dos

cidadãos da Chapada. De maneira forçada, a população chapadense foi obrigada a se adaptar

às novas condições, sofrendo vários transtornos. Neste caso, dispõe-se das seguintes saídas:

ou se espera pela terceira ou quarta geração daqueles garimpeiros prejudicados, para que o

tempo se encarregue de ofuscar os danos sociais e culturais investidos contra as comunidades

das Lavras Diamantinas ou apresentam-se logo novas alternativas para atenuar a insatisfação

da geração atual, que vivenciou a interdição do garimpo e ainda padecem seus reflexos

negativos.

9.1 O garimpo como atividade voltada para o turismo

Assumindo a segunda saída supramencionada como a mais adequada para as soluções dos

problemas, visando abrandar os impactos acima expostos, descriminam-se abaixo algumas

recomendações. As propostas procurarão efetivamente mitigar os impactos causados no meio

antrópico após a interdição da, até então, atividade secular do garimpo, sem comprometer o

meio físico. Entende-se que os impactos causados ao meio antrópico podem ser considerados

como social e cultural. O impacto social diz respeito aos assuntos relativos ao nível de

emprego, renda da população e questões afins, enquanto o cultural refere-se à história, à

tradição e ao íntimo da comunidade chapadense.

Primeiramente, tratar-se-á de discutir os problemas relacionados ao impacto cultural. Como

este tipo de impacto está ligado à cultura, tradição e história da Chapada e estes itens são

diretamente ligados ao turismo, alguns pontos específicos podem ser considerados, como

segue abaixo:

- O garimpo artesanal criou a Chapada Diamantina e definiu seus limites a partir de 1844,

quando a primeira gema de diamante foi oficialmente encontrada;

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- Os garimpeiros em busca da riqueza mineral montaram as vilas e fundaram as cidades

atualmente existentes na Chapada;

- As comunidades da Chapada Diamantina se formaram e cresceram, pensando, agindo,

cultuando, festejando e executando o garimpo de diamante na região, durante 150 anos de

existência;

- Portanto, eliminar totalmente o garimpo da Chapada é extirpar a sua própria identidade;

- Os garimpeiros mais velhos sentem a perda dessa identidade e insistem no retorno à

atividade garimpeira, infiltrando-se pelos cantos mais ocultos da Chapada e do Parque

Nacional;

- O conflito se formou e para resolvê-lo, em parte, recomenda-se o retorno do garimpo

artesanal, porém, não como uma atividade mineira extrativista e sim como uma atividade

essencialmente turística, nos locais mais característicos da Chapada;

- Os garimpeiros mais velhos e seus seguidores, que defendem o garimpo artesanal,

tradicional de serra, atuariam em antigos serviços existentes na Chapada, apenas

demonstrando aos turistas as velhas técnicas, ferramentas e equipamentos utilizados outrora

por eles no ofício secular do garimpo;

- Portanto, o garimpeiro simularia a sua atividade, encenando o ofício com os equipamentos e

materiais disponíveis no local, utilizando uma quantidade limitada de cascalho ou sedimentos,

com o intuito de melhor explicar o serviço. Ele seria pago por isso diretamente pelos turistas

ou pelas operadoras de turismo;

- Logo, NÃO haveria, efetivamente, extração de minério e muito menos remoção de estéril,

ou desvio de cursos d’água, o que significa que esta atividade, voltada para o turismo, NÃO

degradaria o meio;

- Desta forma, poderia ser conduzida dentro do Parque Nacional, onde ainda persiste a maior

quantidade de garimpo artesanal;

- Não seria, igualmente, fiscalizada pelo DNPM, por não mais se tratar de uma atividade

mineira;

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- Para o caso do Parque Nacional, alguns locais seriam escolhidos em conjunto com os

garimpeiros, como atividade especial voltada para o turismo;

- Os locais escolhidos atenderiam ao Plano de Manejo do Parque no que diz respeito ao seu

zoneamento, podendo ser reservadas para a atividade garimpeira de turismo as Zonas de Uso

Intensivo e a Zona Histórico-cultural do Parque Nacional da Chapada Diamantina;

- O turismo na Chapada é predominantemente ecológico (70% dos turistas), o que o coloca

concorrendo com diversos outros mercados do País, que também atuam essencialmente no

ramo do ecoturismo;

- Mas, como a cultura, a história e a arquitetura da Chapada fazem parte dos seus atrativos

turísticos, esses recursos podem ser convertidos em ofertas turísticas, representando fatores

importantes para enriquecer e complementar o turismo da região;

Assim, nessas condições, o setor pode passar por um processo de diferenciação do produto

turístico. É uma forma de segmentar o mercado e concorrer com outros mais fortes que

monopolizam o ramo. É preciso, portanto, especializar o mercado da Chapada com um

turismo típico da história do diamante e de seus agentes principais, os garimpeiros.

Trilha do Garimpo

Seriam implantadas as trilhas do garimpo, onde o turista poderia apreciar a beleza cênica da

Chapada, além de compreender a sua história, a sua cultura e os costumes dos garimpeiros.

Antes do início das trilhas, seriam efetuadas explanações sobre a história do garimpo e da

Chapada Diamantina.

Museus específicos poderiam ser adequadamente viabilizados, em locais apropriados como

nas ruínas da Vila de Rabudo (Figura 55), que fariam parte da trilha do garimpo, onde

também seriam vendidos souvenirs e instalados ambientes adequados ecologicamente para

consumo de comidas típicas.

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Figura 55: Ruínas da Vila de Rabudo – antiga vila garimpeira Foto 2001

A gruna (Figura 56), habitação típica construída no interior das rochas que afloram na

Chapada, anteriormente utilizada pelo garimpeiro, seria adequadamente transformada em

quartos ou albergues para os turistas que praticarem a rota do garimpo, aproximando mais

ainda o turista da tradição secular das Lavras Diamantinas.

Figura 56: Gruna – antiga habitação do garimpeiro Fonte : Teixeira (1998)

Os garimpeiros que defendem o garimpo artesanal, como os da Sociedade União Mineira –

SUM, não mais precisariam abandonar totalmente o ofício que aprenderam a executar ao

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longo de suas vidas, bem como, não mais causariam os danos ambientais que até hoje

provocam na condução dos garimpos clandestinos ocultados na Chapada e teriam uma

alternativa de emprego dentro do ramo profissional que eles conhecem e gostam.

Para isso seria necessária a elaboração de um projeto específico direcionado para a área do

turismo com o apoio das instituições e do governo do Estado.

Portanto, entende-se que esta seria a melhor alternativa para os garimpeiros engajados nas

atividades do garimpo artesanal, tradicional de serra.

Outra proposta possível de ser avaliada encontra-se nas entrelinhas da Carta de Intenções dos

Garimpeiros de Serra de Lençóis (Anexo 14), encaminhada ao IBAMA em dezembro de

1998. Nesta carta os garimpeiros mais antigos da SUM se comprometem com vários itens

relativos ao meio ambiente, atuando, eles mesmos, como fiscais do PARNA além de

recuperarem os locais lavrados. Estes locais seriam os antigos serviços de garimpo, escolhidos

por eles, de comum acordo com o IBAMA e os outros órgãos fiscais co-responsáveis, não

havendo permissões de garimpos adicionais. Os garimpos durariam o período das vidas dos

garimpeiros e das vidas de seus filhos, se estes tiverem interesse.

Esse tipo de garimpo se encaixaria como comunidade tradicional, conforme o Plano de

Manejo do PARNA, se adaptando dentro do zoneamento histórico-cultural do PNCD.

9.2 Alternativas para o garimpo manual como atividade mineira

Para os garimpeiros que desejarem realizar, de fato, extração de diamante na região da

Chapada, sugere-se a execução de um zoneamento fora do parque nacional por parte dos

órgãos de governo com o acompanhamento dos próprios garimpeiros.

Portanto, os locais dos garimpos seriam analisados em conjunto com os garimpeiros e

observadas as conveniências legais, técnicas, ambientais, sociais e particulares dos próprios

garimpeiros interessados. Esses locais deveriam se transformar em reservas garimpeiras para

a efetivação de futuros pedidos de permissão de lavra garimpeira junto ao DNPM.

O zoneamento atenderia às restrições relativas ao meio ambiente (vulnerabilidade), a

possibilidade de recuperação do meio, às áreas de conservação ambiental, às áreas prioritárias

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de requerimento mineral, à viabilidade técnica de sua efetivação e aos interesses dos

garimpeiros.

Seria estimulada a criação de uma cooperativa para representar os garimpeiros interessados

perante os órgãos de fiscalização e de concessão. Esta cooperativa seria a responsável pelo

acompanhamento da tramitação legal das áreas garimpáveis, fornecendo o suporte técnico,

jurídico e instrumental, além de constituir um núcleo de assistência social, a fim de orientá-los

na organização de suas vidas e aplicação consciente do dinheiro arrecadado no garimpo. Esta

entidade poderia, igualmente, intermediar a inclusão da atividade garimpeira organizada nos

programas de apoio governamentais disponíveis, sob os pontos de vista técnico e financeiro.

9.3 Explotação por draga

Entende-se que as legislações mineral e ambiental como se encontram atualmente são

satisfatórias para o atendimento das demandas de quem queira investir em equipamentos e

tenha potencial para executar lavra de diamante pelo sistema de dragagem. O minerador

deverá, portanto, se submeter às exigências da legislação em vigor.

Ademais, existem técnicas de lavra pelo sistema de dragagem, que são sustentáveis,

mitigadoras, que produzem minério ao mesmo tempo em que recuperam o meio físico.

Entre elas, cita-se o modelo experimentado com sucesso desde 1983 pela empresa brasileira

Mineração Tijucana S.A., e descrito por Melo (1993), utilizado em nível experimental na

região nordeste de Minas Gerais, na bacia do rio Jequitinhonha. Esta região se assemelha à

região desta pesquisa tanto do ponto de vista geológico como geográfico e social.

9.3.1 Técnica de lavra sustentável

Trata-se de um processo mecanizado de explotação de aluviões diamantíferos, de baixo teor,

por intermédio da utilização de dragas nas operações de desmonte e sucção hidráulica, com

tratamento de minério a bordo.

Usam-se técnicas de manejo de equipamentos e máquinas de dragagem para recomposição

dos depósitos de estéril e, em seguida, se aplicar o repovoamento vegetal nas zonas afetadas e

recuperadas topograficamente.

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Os equipamentos aproveitados neste exemplo consistem em dragas “alcatruzes” com uma

cuba de seis pés cúbicos, antecipadas por dragas de sucção, com ajuda de tratores de esteira e

de pneus.

Um trator de esteira faz primeiro o decapeamento do solo com a matéria orgânica, sendo,

então, depositado sobre as partes mais elevadas do sítio, visando evitar que as enchentes o

espalhe.

A draga de sucção retira em seguida as camadas de estéril (areia e argila) expondo o cascalho

diamantífero. Logo depois, a draga alcatruz retira somente o cascalho diamantífero (Figura

57) ou minério.

Para reduzir os índices de turbidez nas águas dos rios, utiliza-se um circuito semi-fechado. À

montante da draga “alcatruz”, por intermédio de um trator de esteira, próximo às margens dos

rios, organizam-se as pilhas de cascalhos rejeitados por esta mesma draga (etapa 2 da Figura

57). Desta forma, elaboram-se pequenas barragens ou diques de retenção e pequenas

depressões para facilitar o processo de decantação do estéril (etapa 3 da Figura 57).

No interior desses diques e depressões depositam-se os estéreis extraídos pela draga de

sucção. Este material estéril, composto de areia e argila, irá sedimentar, formando a nova

estrutura do solo, após o processo de dragagem. Esta operação reduzirá consideravelmente o

processo de turbidez nos rios, uma vez que o material estéril em suspensão se depositará

naquelas depressões organizadas nas margens do rio ou em locais próximos.

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Figura 57: Sistema de lavra sustentável com dragas

Fonte: Melo (1993). Adaptação do autor

Depois da decantação do material estéril o trator de esteiras seria ainda utilizado para

remodelar a topografia local (etapa 4 da Figura 57).

Esta recomposição buscaria suavizar o gradiente do terreno, podendo ser constituída, se for o

caso, por um remodelamento composto de bermas de gradientes decrescentes, limitadas por

taludes intermediários, importantes para a manutenção da estabilidade geotécnica da

topografia (Figura 58). Esta conformação topográfica seria aplicada sobre um terreno de

gradiente máximo de 10° em direção ao leito do rio, evitando, assim, processos de

ravinamentos e reduzindo a erosão provocada pelas águas pluviais. O retaludamento também

permitiria que o solo carreado pelas águas pluviais seja depositado sobre a superfície da

berma subjacente.

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Figura 58: Bermas com gradientes decrescentes

Após esses trabalhos de remodelamento do terreno, o trator espalharia apropriadamente o solo

fértil, estocado no início de todo o processo, sobre a base de estéril recomposta.

Em seguida seria preparado e corrigido o solo implantado, visando os trabalhos de

repovoamento vegetal. Este procedimento seria adequado aos resultados das análises químicas

do solo realizadas antes do início dos trabalhos de extração.

Seria providenciada a fertilização do solo com adubos orgânicos e químicos (caso necessário)

sobre as zonas não ameaçadas pelas enchentes. Para as zonas expostas às enchentes,

localizadas sobre as cotas mais baixas e próximas ao rio, o processo de fertilização seria

efetuado apenas com fertilizantes orgânicos, para que o rio não seja contaminado por

substâncias oriundas dos produtos químicos.

Os trabalhos de revegetação seriam de início, orientados para fixar imediatamente o solo com

espécies de crescimento rápido, tipo as gramíneas. Posteriormente seriam avaliadas as

introduções de espécies nativas, exóticas e árvores frutíferas apropriadas para a região em

discussão. O repovoamento vegetal (Figura 59) reduziria a erosão do terreno causada pelas

águas das chuvas e das enchentes, reforçando a sua estabilidade geotécnica.

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Figura 59: Sítio recuperado Ilustração: Melo (1993). Adaptação do autor

Portanto, este modelo de extração de diamante, apresentado primeiramente pela Mineração

Tijucana S. A., já utilizado no Brasil e no exterior, comprova que existem formas possíveis de

lavra sustentável, com recuperação adequada do meio físico.

Sendo assim, os empreendimentos sugeridos com projetos adequados, sob os pontos de vista

ambiental, técnico e social, devem ser avaliados e discutidos pelas instituições de fiscalização

e concessão, antes de serem adotadas medidas impeditivas de sua aplicação, como

arquivamento e recusa preliminar da proposta.

A atividade de lavra, bem conduzida, assim como o turismo diferenciado e especializado com

a participação do garimpo tradicional, pode gerar maior quantidade de empregos e aumentar a

renda da população chapadense, afetando de maneira aceitável o meio físico e criando

melhores perspectivas para a comunidade local, sem aniquilar sua história e,

conseqüentemente, sua identidade cultural. É, pois, recomendado que se avaliem as

alternativas aqui apresentadas e sejam adotadas medidas neste sentido.

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MOREIRA, P. R. & COUTO, P. A. Projeto Chapada Diamantina. Departamento Nacional de

Produção Mineral (DNPM) / Serviço Geológico do Brasil (CPRM). Relatório da 2° Etapa,

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NOLASCO, M. C. Registros Geológicos Gerados Pelo Garimpo, Lavras Diamantinas –

Bahia. Tese de Doutorado da Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS. Pós

Graduação em Geociências, Porto Alegre – 2002;

PINTO, U. Reginaldo. Consolidação da Legislação Mineral e Ambiental. Brasília/DF.

Oitava Edição, Copyright – 2002;

OLIVEIRA, J. F. e PRAZERES W. V.. Garimpos de Diamantes da Região de Gilbués –

Piauí. Garimpos do Brasil, DNPM. Brasília – DF, 1983. p. 237 a 254;

OLIVEIRA JÚNIOR, J. B. & SANCHEZ, L. E. Desativação de Empreendimentos Mineiros:

Estratégia para Diminuir o Passivo Ambiental. Tese de doutorado da Universidade de São

Paulo – USP, sendo OLIVEIRA JÚNIOR o autor e SÁNCHEZ o orientador. Boletim Técnico

da Escola Politécnica da USP – Departamento de Engenharia de Minas (BT/PMI/158). São

Paulo – 2002;

RIO GRANDE DO SUL – Ministério Público do Estado & Centro de Apoio Operacional de

Defesa do Meio Ambiente. Coletânea de Legislação Ambiental. CDU – 2003;

SANTIAGO, Abdorman F., BORGES, F. R. e PINHEIRO, S. S.. Garimpos de Ouro e

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Gerados Durante os Desmontes de Rochas. Dissertação de Mestrado da Universidade de

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185

São Paulo – USP. Boletim Técnico da Escola Politécnica da USP – Departamento de

Engenharia de Minas (BT/PMI/089). São Paulo – 1999;

SOUZA, Maria L.,C. Licenciamento Ambiental Passo a Passo no Estado da Bahia – Normas

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SVISERO D. P. & CHAVES M. L. S. C. Diamantes de Minas Gerais – Qual terá sido o

caminho das pedras? Revista “ Ciência Hoje”. Junho/1999, p. 22 a 29;

TEIXEIRA, Cid. Diamante: beleza e eternidade. Mineração na Bahia: ciclos históricos e

panorama atual. Superintendência de Geologia e Recursos Minerais. Salvador, 1998, p. 78 –

110;

USUI, Y & MAEYAMA, O. Estudo da poluição na região carbonífera de Criciúma/SC –

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Mineral – DNPM/ Japan International Cooperation Agency – JICA. São Paulo/SP, 1993;

VELUDO de OLIVEIRA, Tânia M. Amostragem não probabilística : Adequação de

Situações para Uso e Limitações de Amostras por Conveniência, Julgamento e Quotas.

Revista da Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado – DECAP. Vol. 2 – nº 3.

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VERRAES, G. La Mine Propre ou Applications des Technologies Propres Dans le Domaine

l’Industrie Minière et des Industries de Transformation des Produits Miniers. Centre d’Études

Supérieures pour la Sécurité et l’Environnement Miniers. École des Mines de d’Alès.

Alès/France – 2001, 36 p. ;

VERRAES, G. Les Principaux Problèmes de l’Environnement Minier. Centre d’Études

Supérieures pour la Sécurité et l’Environnement Miniers. École des Mines de d’Alès.

Alès/France – 2001, 56 p. ;

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TABELAS

Páginas Tabela 1: Espessura média das camadas de estéril e cascalho

87

Tabela 2: Volumes retirados durante as escavações e lavras experimentais

87

Tabela 3: teores em diamantes

88

Tabela 4: Reservas aluvionares na bacia do rio Paraguaçu

88

Tabela 5: Níveis de importância – garimpo artesanal

138

Tabela 6: níveis de impactos do garimpo mecanizado

147

Tabela 7: Repartição da remuneração total obtida com a produção de diamantes com as dragas

152

Tabela 8: Aspectos sócio-econômicos gerados pela produção de diamante na bacia do rio São José em 1984

154

Tabela 9: números da enquete (2001) – pesquisa por amostragem

156

Tabela 10: Resultados da pesquisa junto à comunidade

160

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ANEXOS

1. Croqui contendo o PNCD, os municípios do seu entorno e as áreas requeridas para pesquisa e

lavra mineral;

2. Jornal À Tarde de 12/02/93, comentando sobre a suspensão do embargo do garimpo em 1993;

3. Ofício da prefeitura de Lençóis solicitando subsídio do DNPM para regularizar os garimpos de

diamantes em 1993;

4. Denúncia efetuada pelo Ministério Público Federal em 1995, de garimpos clandestinos na

região da Chapada Diamantina;

5. Matéria do Jornal Correio da Bahia comentando sobre o fechamento do garimpo em 1996;

6. Matéria do Jornal À Tarde comentando sobre o fechamento do garimpo em 1996;

7. Fax do Chefe do 7° Distrito do DNPM ao Major da COPPA, marcando o dia do início da

operação de fechamento do Garimpo em 1997;

8. Ofício do Comandante da COPPA apresentando o Plano de Operações para o fechamento do

garimpo.

9. Fax do Corpo de Bombeiros apresentando o “extrato diário de ocorrências na Chapada”,

denunciando ainda a prática de garimpo clandestino remanescente nos municípios de Andaraí

e Lençóis;

10. Documento intitulado “Sociedade e Garimpeiros Juntos”, direcionado ao governo do estado,

pedindo a reativação do garimpo de diamante;

11. Documento elaborado pela entidade denominada “Sociedade Beneficente dos Garimpeiros de

Andaraí” direcionada à administração municipal de Andaraí, solicitando uma Área de Reserva

Garimpeira;

12. Matéria do Jornal À Tarde informando sobre as ações de fechamento do garimpo em 1998;

13. Ofício da SUM ao IBAMA apresentando proposta para o garimpo de serra;

14. Carta de Intenções dos Garimpeiros de Serra de Lençóis – SUM

15. Ofício do Ministério Público Federal ao DNPM, em 2001, questionando sobre a situação do

garimpo clandestino na região da Chapada Diamantina;

16. Ofício da Câmara Municipal de Andaraí (17/11/2003), sugerindo reunião com o DNPM para

tratar de questões ligadas ao garimpo da região;

17. Ofício recente do IBAMA (31/01/2005), sugerindo reunião com o DNPM e demais órgãos,

para tratar sobre alternativas para o garimpo da região.

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A N E X O S

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ANEXO 2

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ANEXO 4

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194

ANEXO 5

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ANEXO 7

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ANEXO 8

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ANEXO 11

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ANEXO 13

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ANEXO 14

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ANEXO 15

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ANEXO 16

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ANEXO 17