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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE - UFRN
CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DO SERIDÓ - CERES
DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA DO CERES - DHC
RAFAEL JEFFERSON DOS SANTOS FERREIRA
“VOCÊ NÃO GOSTA DE MIM MAS SUA FILHA GOSTA”: AS AMBUIGUIDADES
CONTIDAS NAS CANÇÕES DE CHICO BUARQUE DE HOLANDA. (1964-1967)
CAICÓ,
2015
RAFAEL JEFFERSON DOS SANTOS FERREIRA
“VOCÊ NÃO GOSTA DE MIM MAS SUA FILHA GOSTA”: AS AMBUIGUIDADES
CONTIDAS NAS CANÇÕES DE CHICO BUARQUE DE HOLANDA. (1964-1967)
Monografia apresentada ao Curso de
História Bacharelado, da Universidade Federal
do Rio Grande do Norte-CERES, para obtenção
do título de Bacharel em História.
Orientador: Prof. Dr. Antônio Manoel
Elíbio Júnior.
CAICÓ,
2015
RAFAEL JEFFERSON DOS SANTOS FERREIRA
“VOCÊ NÃO GOSTA DE MIM MAS SUA FILHA GOSTA”: AS AMBUIGUIDADES
CONTIDAS NAS CANÇÕES DE CHICO BUARQUE DE HOLANDA. (1964-1967)
Aprovada em: _____/_____/_______
BANCA DE DEFESA
Professor Dr. Antônio Manoel Elíbio Júnior.
Departamento de História do CERES- UFRN
(Professor Orientador)
_____________________________________________________________________
_
Professor Elton John da Silva Farias
Departamento de História do CERES- UFRN
(Professor Coorientador)
_____________________________________________________________________
_
Professor Rosenilson da Silva Santos
Departamento de História do CERES- UFRN
CAICÓ,
2015
Dedico este trabalho inteiramente à Francineide
dos Santos e a Antônia Severina da Silva, minhas mães, que
desde o começo acreditaram na minha capacidade e que
sempre me apoiaram em todas as minhas decisões.
AGRADECIMENTOS
“Agradeço todas as dificuldades que enfrentei; não fosse por
elas, eu não teria saído do lugar. As facilidades nos impedem de
caminhar. Mesmo as críticas nos auxiliam muito.” (Chico Xavier)
É citando esse grande homem que começo os meus agradecimentos.
A minha família, em especial a minha mãe Francineide dos Santos, meu exemplo
maior de força e de superação, minha primeira professora, que desde de criança me ensinou a
trilhar pelo caminho do bem, fazendo da educação a minha maior arma.
Aos meus avós/pais, Dona Antônia Severina da Silva e seu Damião Ferreira da
Silva, que me apoiaram em tudo, sempre me mostrando qual seria o melhor caminho e sempre
torcendo por mim.
Aos amigos que fiz nesse curso, Francicleide, Antônio, Cristiano, Nara, Lucélia,
saibam que vocês sempre farão parte da minha história, e que me sinto honrado em tê-los como
amigos, e que essa amizade siga para o resto de nossas vidas.
Gostaria de agradecer também a uma das pessoas que mais amo nessa vida, uma
irmã, não de sangue, mas sim de coração. Luana Barros, saiba que sou muito grato por ter você
na minha vida, que você é muito especial para mim, quero carregar nosso elo de amizade para
onde for e por toda minha vida.
Gostaria de agradecer aos amigos que fiz no decorrer desses anos nas viagens de
ônibus, a duas pessoas em especial, Joyciana Medeiros, amiga e futura historiadora, por todas
as conversas que tivemos (que não foram poucas). Como também queria agradecer a Gabi
Lúcio, uma grande amiga, que ao decorrer do tempo ganhou um lugar muito especial no meu
coração, muito obrigado pelas noites de conversas e conselhos, saiba que você me ajudou na
superação de um dos momentos mais turbulentos da minha vida.
Agradeço imensamente aos meus professores, em especial ao meu orientador
Professor Antônio Manoel Elíbio Júnior, como também ao meu coorientador Professor Elton
John da Silva Farias, saibam que sem a ajuda de vocês nada disto seria possível.
Agradeço a Helder Macedo, grande historiador o qual tive a honra de ter como professor,
que sempre foi solícito, e que sempre esteve pronto a me ajudar.
Agradeço também a todos os professores que ao longo desse curso me ensinaram, os
que ainda se encontram no CERES, os que partiram para outras cidades, como as professoras
Kyara Almeida e Manuela Aguiar, grandes pessoas e professoras, que mesmo tendo passado
pouco tempo nos ensinado, esse tempo foi suficiente para marcar minha vida.
Enfim, gostaria de agradecer a todos que fizeram e fazem parte da minha vida, saibam
que este trabalho é uma vitória que eu quero compartilhar com todo vocês.
RESUMO
O presente trabalho tem como por objetivo principal realizar uma discursão sobre a obra
musical de Chico Buarque de Holanda em relação ao Brasil pós golpe de 1964 até o ano de
1967, analisando a visão que o compositor tinha sobre o país, e como ele a demostrava em suas
canções. Para isso, faremos a análise de duas composições “Marcha para um dia de sol” e “A
Banda”. Utilizaremos seis livros, sendo três de teor biográfico (ZAPPA 2011, HOMEM 2009
e SILVA 2004), como também dez trabalhos (PIMENTEL 2011, DEL VECCHIO 2013,
NAPOLITANO 2001, SOUSA 2012, MENDES 2003, MARTINS 2005, MATOS 2011, ROSA
2008, PINA 2008 e CAVALCANTI 2003), para fundamentarmos nossa pesquisa. Falaremos
sobre os trabalhos já publicados sobre Chico Buarque, faremos um resumo de sua biografia até
meados de 1967, como também das ambiguidades contidas nas duas canções analisadas.
Palavras-chave: Chico Buarque – Ditadura – Ambiguidades.
ABSTRACT
The present work has as main objective to perform a for reflexion on the musical work of Chico
Buarque de Holanda in relation to Brazil after coup of 1964, analyzing the vision that the
composer had on the country, and as he was already arguing in their songs. For this reason, we
will do the analysis of two compositions "Marcha para um dia de sol" and "A Banda". We will
use six books, three of biographical (ZAPPA, HOMEM e SILVA) content, as also four theses
for footing our research. We will use six books, three of biographical content (ZAPPA 2011,
HOMEM 2009 and SILVA 2004), as also ten jobs (PIMENTEL 2011, DEL VECCHIO 2013,
NAPOLITANO 2001, SOUSA 2012, MENDES 2003, MARTINS 2005, MATOS 2011, ROSA
2008, PINA 2008 and CAVALCANTI 2003), footing for our research. We will talk about the
work that has already been published on Chico Buarque, we will have a summary of his
biography by mid-1967, as well as the ambiguities contained in the two songs analyzed.
Key words: Chico Buarque - Dictatorship - Ambiguities.
“A liberdade é um dos dons mais preciosos que o céu deu aos
homens. Nada a iguala, nem os tesouros que a terra encerra no seu seio,
nem os que o mar guarda nos seus abismos. Pela liberdade, tanto quanto
pela honra, pode e deve aventurar-se a nossa vida.”
(Miguel de Cervantes, Dom Quixote, 1605)
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 11
1. “VAI PASSAR NESSA AVENIDA UM SAMBA POPULAR”: AS INTERPRETAÇÕES
SEOBRE A OBRA DE CHICO BUARQUE DE HOLANDA................................................15
2. “PRA VER A BANDA PASSAR”: DE FRANCISCO A CHICO, O INÍCIO DE SUA
JORNADA................................................................................................................................28
3. “SE TODO MUNDO SAMBASSE SERIA TÃO FÁCIL VIVER”: AS
AMBIGUIDADES NAS CANÇÕES DE CHICO BUARQUE................................................50
CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................................................77
REFERÊNCIAS......................................................................................................................80
11
INTRODUÇÃO
“A música tem sido no Brasil a intérprete de dilemas
nacionais e veículos de utopias sociais. Para completar, ela
conseguiu, ao menos nos últimos quarenta anos, atingir um grau de
reconhecimento cultural que encontra poucos paralelos no mundo
ocidental. O Brasil é, sem dúvida, uma das grandes usinas sonoras do
planeta e um lugar privilegiado não apenas para ouvir música mas
também para pensar a música. A música, sobretudo a chamada
“música popular”, ocupa o lugar das mediações, fusões, encontro de
diversas etnias, classes e regiões que formam o nosso grande mosaico
nacional.” (NAPOLITANO, 2005).
Em rememoração aos cinquenta anos do Golpe Civil-Militar de 1963, ocorrido em
2014, e em comemoração aos setenta anos de vida completos também no mesmo ano, do cantor,
compositor e escritor Francisco Buarque de Holanda - ou como ficou conhecido no Brasil e
fora dele Chico Buarque; um dos símbolos da MPB, grande nome da Bossa Nova, criador de
clássicos da música nacional como, “Construção”, “Apesar de você”, “Cálice”, como também
de “A Banda”, possivelmente sua composição mais conhecida, é que o presente trabalho
pretende falar.
É interessante notar como certas canções nos fazem ter emoções as mais diversas
possíveis, e de como muitas delas condizem com a nossa situação. Por vezes nos vemos nas
letras de certas composições, seja por ela tratar de um situação que vivemos no nosso cotidiano,
ou por falar de um amor findo ou não correspondido. Qualquer que seja a situação, sempre
existirá uma trilha sonora que acompanhará esses momentos.
Chico Buarque domina como poucos o ato de compor canções que falam
diretamente com quem as ouvem. Suas letras são carregadas dos mais variados sentidos e
sentimentos, seja o da dor da perda como em “Bastidores”:
“Não me troquei
Voltei correndo ao nosso lar
Voltei pra me certificar
Que tu nunca mais vais voltar
Vais voltar, vais voltar”
Ou como a alegria do boêmio carioca em “A volta do Malandro”:
12
Eis o malandro na praça outra vez
Caminhando na ponta dos pés
Como quem pisa nos corações
Que rolaram dos cabarés
Ele, com a maestria de grande compositor, interprete, cantor, artista popular, e
escritor que é, consegue passar sua mensagem em suas canções.
É sobre essas mensagens que trataremos nesse trabalho. Mais precisamente das
quais traziam suas composições durante o início dos anos 1960, até de depois do golpe de 1964.
Esse período ficou conhecido como os “anos de chumbo” onde o direito de livre expressão foi
cerceado pelo governo civil-militar, anos em que mostrar seus ideais e pensamentos, em que se
opor ao governo militar poderia incorrer na morte. Mas foi durante essa época tão turbulenta da
história recente do Brasil, que Chico Buarque compôs seus maiores trabalhos, onde ficou
conhecido por suas “canções de protesto”, cheias de duplicidades em suas letras, que
conseguiam passar desapercebidas aos olhos dos censores do governo militar.
A escolha das canções de Chico Buarque se deu por além de ser um dos maiores
compositores do país como já foi dito antes, foi também pelo fato de que ele é filho de Sergio
Buarque de Holanda, um dos maiores historiadores do Brasil. O que nos levou a indagar qual
seria o posicionamento do filho de um historiador tão importante sobre o momento que vivia o
país. Qual a influência que os trabalhos de seu pai exerciam sobre ele, e o que ele, como artista,
poderia fazer para contestar o governo militar sem sofrer as consequências desse ato.
Outro fator que levou a composição desse trabalho, foi a leitura de “O Falso
Observador de Pássaros”, de Luiz Maria Veiga, lançado em 1988 pela editora Atual, que narra
a história do jovem Ernesto que, no final da década de 1960, descobre uma base subterrânea do
governo, e que consegue explodi-la, desarticulando assim um esquema de espionagem dos
militares. Em uma das passagens do livro, Ernesto ouve uma mensagem de resistência ao
regime militar contida na letra de uma canção. Essa passagem do livro chamou a atenção para
esse fato, mensagens escondidas em letras de canções que faziam oposição ao governo militar.
É sabido que a composição “Cálice” fora censurada por trazer uma mensagem de
contestação ao governo militar, por esse fato, surgiu a curiosidade de saber quais outras canções
tinham também essas letras de oposição, se tinha sido censuradas ou não, quais mensagens
passavam, e que sentimentos poderiam evocar em quem as ouvia.
Seria essa a verdadeira natureza do historiador, a curiosidade, a necessidade de saber
mais, de não se contentar com explicações superficiais, de sempre querer saber “Porquês” das
13
coisas terem sido assim, de estar sempre pesquisado, procurando por respostas que não estavam
a vista dos outros.
É isso que essa pesquisa pretende mostrar. Trazer à tona as mensagens contidas nas
canções de Chico Buarque que passaram desapercebias, tanto dos censores quanto de muitos
que as ouviam, sem dar a atenção aos seus detalhes, pois como diz o professor Dr. Lourival
Andrade Júnior nas suas saudosas aulas de história da arte: “O diabo se esconde nos detalhes”,
e é nesses detalhes escondidos que a nossa pesquisa trabalha, lendo nas estrelinhas o que essas
canções queriam dizer, escutando os silêncios para saber o que ele falam.
Nossa monografia é composta por três capítulos:
O primeiro capítulo do nosso trabalho é uma revisão bibliográfica de artigos de
âmbito acadêmico que tratam da mesma temática que a nossa, ou seja, essas publicações falam
das músicas de protesto de Chico Buarque, neles podemos ter uma gama de informações sobre
tais canções como também as opiniões que pesquisadores tem sobre esse assunto, afim de nos
dar um norte para seguir nossa pesquisa.
Já o segundo capítulo é uma pequena biografia sobre Chico Buarque, nele veremos
a sua trajetória, desde sua infância até o momento em que ele surge para o país como cantor e
compositor da Bossa Nova, é importante relatar que esse capítulo mostra a vida do compositor
até os anos de 1967, quando ele lança “A Banda”, isso acontece pois é até esse ano que nossa
pesquisa se concentra. Mostraremos quem foram suas influências na vida pessoal e profissional,
suas primeiras composições, e como ele se tornou um dos maiores nomes da música popular
brasileira. Essa passagem pela vida de Chico Buarque se torna de suma importância, já que
antes de conhecer as suas criações, temos que conhecer um pouco sobre seu criador.
O terceiro e último capítulo desse trabalho é a análise das letras escolhidas na
composição da nossa pesquisa, trabalhamos com as canções “Marcha para um dia de Sol”
(1964), como também com “A Banda” (1967). Essas duas canções foram escolhidas por serem
de épocas diferentes da vida de Chico Buarque, mas mesmo tendo alguns anos de diferença
entre as composições, ambas tratam de uma mesma temática, e é sobre essa temática que
trataremos neste capítulo.
A música nos leva ao contexto histórico e a época em que foram escritas. Podemos
ver nos elementos das canções passagem da história que mesmo que não tenhamos
testemunhado, apenas em ouvi-las identificamos o momento o qual se passava quando foram
compostas. Pesquisar sobre música por mais difícil que seja - e é muito difícil, se torna
prazeroso; pois no leva a uma viagem pela história através dos sons.
14
Esse trabalho pretende fazer uma viagem pelas canções de Chico Buarque, trazendo
nelas a história recente do Brasil. Mostrando como é possível protestar usando da arte, sem
recorrer a violência. Reafirmando a importância da música na vida das pessoas, pois como disse
o filósofo alemão Arthur Schopenhaue: “A música exprime a mais alta filosofia numa
linguagem que a razão não compreende”
15
Capítulo I
“Vai passar nessa avenida um samba popular”: As
interpretações sobre a obra de Chico Buarque de Holanda
“Eu falava através de personagens, enxergava através de outros olhos”
(Chico Buarque de Holanda, 1976)
O leque de trabalhos publicados sobre a obra de Chico Buarque é muito grande, já
que como é um dos grandes artistas da MPB e pessoa de alto nível cultural e intelectual, ele se
torna um formador de opinião, onde tudo que escreve ou compõe de uma forma ou de outra
abre oportunidade para discussão.
Nesse capítulo iremos apresentar algumas publicações que envolvem a obra de
Chico Buarque. Mostraremos quais são, quem as escreveu, e a sua finalidade, afim de
entendemos o pensamento que outros pesquisadores tem sobre esse cantor, compositor, poeta,
escritor, ator, figura tão importante no cenário artístico brasileiro. Elencamos aqui apenas os
trabalhos usados na composição da nossa pesquisa, trabalhamos com quatro artigos e um livro
que foram dedicados a analisar as obras de Chico Buarque, sejam elas na música, teatro ou
literatura.
Ao pesquisarmos sobre os trabalhos publicados sobre Chico Buarque e suas canções,
não reduzimos nossa busca apenas as publicações de âmbito acadêmico, mas também as de
contexto mais popular, procuramos por essa visão mais popularizada do compositor, já que ele
era a voz dos “excluídos” durante a época da ditadura militar, agora, tivemos a necessidade de
saber o que o povo de um modo geral pensava sobre essa figura tão importante da música
brasileira. E como a maioria de suas canções é ritmada pelo samba, utilizamos justamente um
samba-enredo para ter essa ideia do “Chico Buarque popular”.
No carnaval do Rio de Janeiro de 1998, o G.R.E.S. Estação Primeira de Mangueira1
canta o samba-enredo: “Chico Buarque da Mangueira”, composto por Nelson Dalla Rosa, Vila
1 “O Grêmio Recreativo Escola de Samba Estação Primeira de Mangueira é uma das mais tradicionais
escolas de samba do Rio de Janeiro e uma das mais populares do Brasil. Foi fundada em 28 de abril de 1928, no
Morro da Mangueira, próximo à região do Maracanã, pelos sambistas Carlos Cachaça, Cartola, Zé Espinguela,
16
Boas, Carlinhos das Camisas e Nelson Csipai, deu a escola de samba o título de campeã do
carnaval daquele ano.
Figura 1 - Carnaval de 1998, desfile da Mangueira em homenagem a Chico Buarque.
Fonte: Ouro de Tolo Blog spot2
Figura 2- Em 1998, a Mangueira foi campeã do carnaval do Rio de Janeiro.
Fonte: O mundo maia Blog spot3
entre outros. Sua quadra está sediada na Rua Visconde de Niterói, no bairro do mesmo nome. Biografia:
Mangueira. Em: mangueira website. Disponível em: (http://www.mangueira.com.br/a-
mangueira/historia/historia-da-mangueira/). Acesso em 27/05/2015.
2 (http://www.pedromigao.com.br/ourodetolo/wpcontent/uploads/2013/11/sambodromo_08.jpg). Acesso
em 20/05/2015.
3
(http://4.bp.blogspot.com/cX6ELZA7CMg/TmvhlJmVKkI/AAAAAAAAAvA/zXw2zlZ_3KE/s1600/desfile+ma
ngueira+1998.jpg ). Acesso em 20/05/2015.
17
Chico Buarque da Mangueira
Nelson Dalla Rosa, Vila Boas, Carlinhos das Camisas e Nelson Csipai/1998
Mangueira despontando na avenida
Ecoa como canta um sabiá
Lira de um anjo em verso e prosa
De um querubim que em verde e rosa
Faz toda a galera balançar
"Hoje o samba saiu"
Pra falar de você
Grande Chico iluminado
E na Sapucaí eu faço a festa
E a minha escola chega dando o seu recado
É o Chico das artes.... O gênio
Poeta Buarque... Boêmio
A vida no palco, teatro, cinema
Malandro sambista, carioca da gema
Marcando feito "tatuagem"
Acordes do seu violão
Chico abraça a verdade
Com dignidade contra a opressão
Reluz o seu nome na história
A luz que ficou na memória
E hoje o seu canto de fé (de fé)
Vai "buarqueando" com muito axé
Ô iaiá... vem pra avenida
Ver "meu guri" desfilar
Ô iaiá... é a Mangueira
Fazendo o povo sambar
18
Figura 3- Homenagem ao malandro, tão cantado por Chico Buarque
Fonte: Aqui é só Samba website4
Figura 4- Carro alegórico homenageando o malandro, referência ao espetáculo de 1978,
escrito por Chico Buarque “Opera do Malando”.
Fonte: Estadão Website5
4 (http://robsoncotta.orgfree.com/carnaval/imagens/005.jpg). Acesso em 20/05/2015.
5 (http://img.estadao.com.br/fotos/D9/DB/F9/D9DBF9D61BEA4FF6ACF50930233AB884.jpg).
Acesso em 20/05/2015.
19
O primeiro trabalho analisado é o livro de Fernando de Barros e Silva intitulado
“Chico Buarque” da coleção “A folha explica” lançado em 2004 pela editora Publifolha. Nesse
livro, Silva faz uma viagem por parte da obra buarquiana, indo desde suas primeiras
composições ainda no início dos anos 60 até os dias mais atuais. Nesse livro, o autor faz essa
análise juntamente com uma pequena biografia de Chico Buarque, pois como ele mesmo cita
na apresentação do livro:
Estas páginas não pretendem ser uma biografia, embora contenham
elementos da vida do autor e se fixem em algumas passagens marcantes de
sua trajetória. (SILVA,2004, p-9).
Fica evidente nesse trabalho de Silva, a sua intenção de desassociar a figura de Chico
Buarque e de sua obra da fragmentação que muitos pesquisadores fazem. Ele tenta tirar o foco
dos “vários Chicos” que são publicados, tanto em trabalhos acadêmicos, quanto em publicações
para fora dos muros da academia:
“É curioso, aliás, notar como a universidade, no caso de Chico, tende
a mimetizar as clivagens do mercado e a tratar sua obra de forma
fragmentada – ou melhor, fatiada. Fala-se muito em “Chico e a política”,
“Chico e o Feminismo”, “Chico e a malandragem”. (SILVA, 2004)
Mas por ter uma obra tão grande no âmbito musical, fica muito difícil não
fragmentar Chico Buarque em vários “Chicos”. Em 1994 em comemoração aos 50 anos de
idade do compositor, foi lançado pela Polygram Philips uma coletânea de cinco discos que faz
essa separação dos vários “Chicos”.
A divisão foi feita em “O amante”, que traz as canções românticas do compositor
dando destaque a visão dele sobre a alma feminina, já que ele via o mundo “pelo olhos dos
outros”, como conta em entrevista à Revista 365 em 1976. Podemos destacar canções como
“Tatuagem” (1973) que foi composta por ele para fazer parte da trilha sonora de sua peça
Calabar6, que estrearia em 1974, mas que devido a censura, passou cerca de seis anos impedida
de ser apresentada.
6 Calabar foi escrita no final de 1973, em parceria com o cineasta Ruy Guerra e dirigida por Fernando
Peixoto. A peça relativiza a posição de Domingos Fernandes Calabar no episódio histórico em que ele preferiu
tomar partido ao lado dos holandeses contra a coroa portuguesa. Era uma das mais caras produções teatrais da
época, custou cerca de 30 mil dólares e empregava mais de 80 pessoas. Como sempre, a censura do regime militar
deveria aprovar e liberar a obra em um ensaio especialmente dedicado a isso. Depois de toda a montagem pronta
e da primeira liberação do texto, veio a espera pela aprovação final. Foram três meses de expectativa e, em 20 de
outubro de 1974, o general Antônio Bandeira, da Polícia Federal, sem motivo aparente, proibiu a peça, proibiu o
nome Calabar e, como se não bastasse, ainda proibiu que a proibição fosse divulgada. O prejuízo para os autores
20
Outro disco que faz parte dessa coletânea, é “O cronista”, onde podemos dar destaque
a “Bye, Bye, Brasil” (1979). Essa canção foi composta para fazer parte da trilha sonora do filme
dirigido por Cacá Diegues7 que tem o mesmo título que a canção. Essa composição foi feita em
um momento muito especial para o Brasil, pois, mesmo sobre a sombra do regime militar, em
15 de março do mesmo ano, o General Figueiredo assina a lei da anistia, mesmo sendo generosa
com os torturadores da Ditadura, ela permite a volta dos exilados do regime, como ex-
governador do Rio Grande do Sul Leonel Brizola.
Outra parte dessa coletânea é o disco “O Malandro”, onde entre outras canções está
a tão famosa “A Banda” que é objeto de discursão da nossa pesquisa. Mas esse disco também
pode ser uma homenagem a um dos muitos personagens criados por ele, o malandro da Favela
da Rocinha Julinho da Adelaide, que surge como uma forma de Chico Buarque promover suas
composições sem ser censurado pelo regime. Essa personagem inventada por Chico Buarque
foi tão real que em 1974 o jornalista Silvio Lancellotti fala dessa “descoberta” feita pelo
compositor:
Na festa de inauguração do novo Teatro Bandeirantes, dia 12, em
São Paulo, [...] o próprio Chico, acuado por uma terrível síndrome de
infecundidade, estava sendo obrigado, pela primeira vez em sua carreira, a
recorrer a trabalhos de outro autores. Paradoxalmente, no entanto, sua
descoberta, um certo Julinho da Adelaide, originário da favela da Rocinha,
no Rio, demostrou que pode tranquilamente preencher os vazios deixados
pelo autor de “Fado tropical” e outras coisas. Seus estilos musicais são
irmão. (HOMEM, 2009)
Julinho da Adelaide não enganou só esse jornalista, como também os censores.
Responsável por canções como “Acorda Amor” (1974), “Jorge Maravilha” (1974) e “Milagre
Brasileiro” (1975), teve sua verdadeira identidade revelada no ano de 1975, devido a uma
reportagem publicada no Jornal do Brasil. Após esse acontecimento, a polícia federal passou a
exigir CPF e RG dos autores.
O quarto disco se chama “O político”, nesse disco podemos dar destaque as mais
emblemáticas canções de Chico Buarque, nele estão contidas todas as “canções de protesto”
que durante o regime militar foram impedidas de tocar nas rádios ou tiveram os discos
recolhidos das lojas como o caso de “Cálice” (1973) por exemplo.
e para o ator Fernando Torres, produtores da montagem, foi enorme. Seis anos mais tarde, uma nova montagem
estrearia, desta vez, liberada pela censura. Obra: Calabar. Em: chicobuarque website. Disponível
em(http://www.chicobuarque.com.br/construcao/mestre_cin.asp?pg=tea_calabar.htm). Acesse em 29/05/2015. 7 Carlos Diegues, mais conhecido como Cacá Diegues, (Maceió, 19 de maio de 1940) é um premiado
cineasta brasileiro. Foi um dos fundadores do Cinema Novo. Biografia: Cacá Diegues. Em: carlosdiegues website.
Disponível em:( http://www.carlosdiegues.com.br/avida_biografia.asp). Acesso em 29/05/2015
21
O quinto e último disco dessa coletânea é intitulado “O Trovador”, onde contém
canções como “Eu te Amo” (1980), composta com outro grande nome da MPB, Tom Jobim.
Com uma gama tão grande de composições, fica impossível não fragmentar Chico
Buarque em vários “Chicos”, pois para uma análise minimamente bem feita de sua obra, é
impreterível essa divisão.
Podemos notar na letra do samba enredo da Mangueira, elementos presentes nos
artigos acadêmicos acima citados. Do livro de Fernando de Barros e Silva, podemos retirar
dessa letra os vários “Chicos” como Silva destaca em seu texto. No samba da Mangueira
podemos ver “o gênio”, “o iluminado”, “o malandro”, como também “o boêmio”, variações de
uma mesma pessoa. Essa fragmentação da figura de Chico Buarque aos olhos do povo vem das
várias intepretações que esse público dava as suas canções, das verdades contidas nas letras e
que eles tomavam para si como parte do seu cotidiano.
Para Foucault:
A verdade a mais elevada já não residia mais no que era o discurso,
ou no que ele fazia, mas residia no que ele dizia. (FOUCAULT,1970)
Sendo assim, essa população mais humilde poderia interpretar essas canções como
uma descrição das suas vidas. Ao se verem nas letras de Chico Buarque, eles deixavam de ser
“pacientes”, e passavam a ser “sujeitos da história”, fazendo dessas composições suas verdades.
Usando do trabalho de Nalva Lopes de Sousa, bacharelanda pela UFVJM (Universidade
Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri): “Afasta de mim esse cálice! Chico Buarque e a
censura no Brasil pós 1964”, publicado em 2012, para compor nossa pesquisa, observamos que
nesse artigo ela trabalha com duas canções icônicas de Chico Buarque, “Cálice” (1973) e
“Apesar de Você” (1973), tidas como “canções de protesto”, a autora analisa essas canções,
explicando como ele conseguiu tornar-se uma pessoa formadora de opinião na sociedade
brasileira pós golpe de 1964, e as influências que ele teve na sua trajetória, tanto como cantor
quanto como pessoa:
Notamos também que Chico foi influenciado pelo seu pai Sérgio
Buarque de Holanda (1902- 1982) em relação à história do Brasil, pois ele
cresceu em um ambiente familiar onde se discutia muito essas questões, ele
também foi influenciando por alguns compositores como por exemplo Noel
Rosa (1910- 1937), cantor e compositor, o qual Chico ouviu desde pequeno.
Esses fatores despertaram o interesse em Chico Buarque cada vez mais pela
história do Brasil de tal modo que passou a apresentar a realidade do Brasil
no período da Ditadura militar em suas canções, o que também resultou na
perseguição do compositor por parte dos censores. (SOUSA, 2012).
22
Essa análise, mostra uma posição mais incisiva de Chico Buarque em oposição ao
regime militar vigente, podemos perceber que as canções por ela analisadas foram compostas
após 1968, quando entrou em vigor o Ato Institucional de Número 5 (AI-5), esse artigo nos
serviu para comparar as mudanças ou o redirecionamento das composições de Chico Buarque,
antes e depois do AI-5.
Uma outra parte do samba mangueirense, temos as frases: “Acordes do seu violão/
Chico abraça a verdade”, essas duas frases nos remete a outro estudo usado na
composição da nossa pesquisa, o trabalho de Nalva Lopes de Sousa: “Afasta de mim esse cálice!
Chico Buarque e a censura no Brasil pós 1964”, nesse artigo, a autora aborda as ditas “canções
de protesto” de Chico Buarque. Usando de suas canções para se opor ao governo militar e se
tornando formador de opinião, já que no contexto histórico da época, suas composições
possuíam verdades que não podiam ser ditas abertamente sem que as quem dissesse sofresse
represálias por parte do governo vigente.
Sendo assim, Chico Buarque com seu violão, abraçaria a verdade em forma de
canção. Essa era mais uma visão do povo em torno da obra buarquiana, como se ele fosse um
porta-voz das verdades escondidas dos olhos de muitos. Assim com Sousa explica em seu
trabalho.
Utilizamos também na composição da nossa pesquisa, “O Inconformismo Social no
Discurso de Chico Buarque”, escrito por Christian Alves Martins, na UFU (Universidade
Federal de Uberlândia), publicado em Junho de 2005 na Fênix – Revista de História e Estudos
Culturais.
Martins analisa as entrevistas dadas por Chico Buarque durante o regime militar,
mostrando a indignação social em seu discurso. Ele se propõe a discutir, o ponto de vista de
Chico Buarque como artista, e qual o papel do artista durante a Ditadura. Mostrando de certa
forma que mesmo falando que não, Chico Buarque estava ativo na contestação ao governo
militar:
A leitura de suas entrevistas deixa clara a tentativa de Chico Buarque
em negar esta imagem de artista militante. Concordamos com o cantor, pois,
como já dissemos alhures, isto seria uma leitura reducionista do artista.
Porém, como defendemos neste artigo, não há como negar que a tônica de
seu discurso e de sua obra seja a de indignação social. (MARTINS,2005, p-
14)
A leitura do artigo de Martins, foi de grande ajuda para a composição de nossa
pesquisa, já que contribuiu para o nosso entendimento da visão de Chico Buarque como artista
engajado na oposição ao regime militar, podemos ter uma noção do seu papel como artista, e
23
como ele via a sociedade brasileira durante a ditadura. E de como através da sua arte, ele expos
sua indignação como o momento pelo qual o Brasil passava.
Utilizamos também o trabalho de Alessandro A. Fagundes Matos intitulada:
“Ditadura, MPB e Sociedade: A música de resistência em Chico Buarque de Holanda”,
publicado pela UEMS (Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul) em 2001.
Nesse artigo Matos, assim como Sousa, faz uma análise da canção da canção
“Apesar de Você” (1973), mas ao contrário do caminho traçado por Sousa, Matos busca mostrar
a dualidade que continha essa canção, e como ela fora usada na visão do autor para se opor ao
governo militar, ou como ele mesmo ressalta “interpretações consideradas anti-governo”
(MATOS, p -01).
Na continuidade do artigo, Matos tenta estabelecer um contexto entre a canção e o
momento histórico pelo qual o Brasil passava, tendo a composição de Chico Buarque como
fonte histórica, como se a literatura contida na canção fosse um reflexo da sociedade da época:
A arte em questão é a música. A música que é um discurso
materializado em sons, palavras harmonizadas com o papel de transmitir
críticas, ideologias, persuadir o seu receptor, a manifestação daquilo que o
sujeito carrega consigo e conseqüência de toda a sua formação. (MATOS,
2011, p-18)
Matos aborda um ponto de vista interessante em sua pesquisa, ele interpreta a canção
pelo ângulo do excluído, do povo, que não tinha vez nem voz, mas que fazia dessa composição
sua chance de manifestar-se contra o regime militar, usando da duplicidade da letra como
ferramenta de contestação:
O verbo “abafar” toma o sentido de silenciar. Essa prática de
silenciar é direcionada a todos os esquerdistas, ao proletariado, enfim, todos
que sofreram com a dor do silêncio, que são indicados na palavra “coro”,
que representa a união de várias vozes. Além dessa junção de vozes cantando
uma só canção, a da liberdade de expressão e opinião, mais uma vez o
antagonista da obra é ridicularizado. Tal argumento pode ser compreendido
quando lido o verso “Na sua frente”. Independente de apreciar, ou não, a
manifestação realizada pelos oprimidos – e tudo indica que não seria algo
que traria satisfação ao opressor, pois aponta para um tempo já libertado –
mais uma vez o adversário da massa seria posto à impotência de reagir.
(MATOS, 2011, p-17)
Com isso, Matos deixa aberta mais uma via de pesquisa para a canção. Essa visão
apresentada do excluído foi de grande valia para a nossa pesquisa, já que foi assim que
analisamos “A Banda”, mostrando a visão de cada um dos personagens contidos nessa canção.
E assim como Matos, analisamos esse engajamento meio que escondido de Chico Buarque ao
compor a marchinha, já que ele quebra o silencio provocado pelo medo que o regime impunha,
dando voz aos excluídos.
24
“Com dignidade contra a opressão”, assim é cantado mais um dos versos do samba-
enredo da escola de samba carioca, isso nos leva ao trabalho de Alessandro A. Fagundes Matos
“Ditadura, MPB e Sociedade: A música de resistência em Chico Buarque de Holanda”, que
faz uma abordagem das canções de Chico Buarque na visão dos excluídos, dos marginalizados
pelo regime militar, essa “opressão” a qual fala a letra, seria a vivida por pessoas comuns, fora
dos grandes círculos políticos ou de intelectuais. Os oprimidos com mais força pelo regime, já
que se desaparecessem não seriam notados de imediato pela grande mídia, por se tratarem de
pessoas comuns, na sua maioria estudantes. Eram excluídos, fantasmas de uma época que ficou
conhecida como “anos de chumbo”. Eram essas pessoas que se agarravam as esperanças
trazidas pela voz de Chico Buarque. Quando ele canta em “Apesar de Você” (1970) que
“Amanhã há de ser Outro dia” ele não só faz uma crítica ao governo, como também dá
esperanças ao povo de que mesmo o Brasil esteja vivendo uma ditadura, o amanhã sempre
chega, dando ao povo algo pra sonhar, com um país livre do governo autoritário militar.
Essa é mais uma visão popular que se tinha sobre Chico Buarque nessa época
turbulenta, a de “um anjo” de “um querubim”, como cita a o samba, e que trazia a boa nova, a
mensagem de esperança de um Brasil livre nas letras de suas canções.
Usando também da dissertação de pós-graduação escrita por Ligia Vieira Cesar: “Poesia
e Política nas canções de Bob Dylan e Chico Buarque”, feita UFPR (Universidade Federal do
Paraná) publicada em 1990. Essa pesquisa já se torna interessante pelo ano de sua composição,
que se deu apenas cinco anos após o fim da ditadura militar no Brasil, isso torna esse trabalho
um relato quase que ao vivo da história recente do país.
Em seu trabalho, Cesar aborda a “canção de protesto” como elemento fundamental
nas ideologias de Bob Dylan e de Chico Buarque, que mesmos separados por momentos
históricos diferentes - já que Bob Dylan protestava contra o racismo nos Estados Unidos e a
guerra no Vietnã, e Chico Buarque contra a ditadura no Brasil; ainda assim estavam unidos pela
mesma ideologia, ambos faziam de sua poesia ferramentas de reivindicação, como destaca a
autora:
Dylan, rompendo com a linguagem oficial, revela seu
desajustamento à realidade ideológica que o envolve, transformando sua
poesia no instrumento de reivindicações- sociais. E sua poética, centrada em
propósitos políticos, apresenta assim, um discurso social evidente, refletindo
a imagem do poeta-político preocupado com o panorama histórico de seu
país. (CESAR, 1990)
Nota-se aqui uma semelhança entre eles, Bob Dylan com sua folk music, era
contrário à política do establishment, um conceito utilizado para denominar um grupo
25
sociopolítico que exercia sua autoridade para o controle da sociedade, usando desse poder para
servir apenas a seu próprio interesse e segundo suas próprias concepções. Já Chico Buarque usa
da Bossa Nova para contestar o governo militar, que ao assumir o controle do país revogou
direitos políticos e de expressão dos que lhe eram contrário.
No decorrer de sua dissertação, Costa faz uma viagem as raízes da música de
protesto no Brasil, que segundo ela, teriam nascido junto com o samba:
Ao abordar, as canções políticas de Chico. Buarque, faz-se
necessário historiarmos primeiramente sobre a origem do samba, sua
evolução, sua interpretação com a música estrangeira – o jazz - e
conseqüente criação de um ritmo genuinamente nosso – a Bossa Nova - que,
engajando-se no contexto histórico pré e pós 64, toma a forma e a estrutura
das canções de protesto. (CESAR, 1990)
Segundo a autora, o primeiro samba com ar de protesto foi “pelo telefone”,
composto por Ernesto dos Santos “Donga”, que era um dos cantores favoritos de Chico
Buarque. Esse samba fazia críticas a polícia da época que combatia os jogos de azar. E é desse
samba que surge a Bossa Nova no início dos anos de 1960, tendo Chico Buarque como um dos
seus maiores expoentes. Para Cesar:
Após o período inicial (1958-1962) as músicas da Bossa Nova - de
letras que se prendiam a temas intimistas falando do "mar, amor e luar" -
passaram a acompanhar a evolução do problema político brasileiro, tendo
uma conotação mais popular e participativa no período pré-64, para
finalmente desempenhar uma fase de politização explícita quase militante,
nos anos de repressão militar. (CESAR,1990)
O trabalho de Ligia Vieira Cesar foi de grande utilidade para a nossa pesquisa, já
que ela aborda a temática da “canção de protesto” de um ângulo bastante interessante, fazendo
uma comparação entre Chico Buarque e Bob Dylan, dois grandes compositores e que
compunham para o público da “Intelligentsia” (CESAR, p- 65), essa expressão é designada ao
um grupo de pessoas que estão envolvidas com trabalhos intelectuais, afim de disseminar a
cultura. No caso de Chico Buarque, as canções do contestação ao regime militar. Esse trabalho
de Cesar nos serviu para entendemos o posicionamento ideológico do compositor, de como ele
usava dos desvios de linguagem em suas canções para torná-las um veículo de denúncia.
Usando de sua arte para contar a história dos vencidos e não dos vencedores, usando de sua
escrita para criar um futuro utópico, ou apenas fazendo uma perspectiva do que ainda estava
por vir.
26
Em outro trecho dessa canção, tem a seguinte frase: “Ver ‘meu guri’ desfilar”,
essa parte nos remete ao trabalho de Ligia Vieira Cesar: “Poesia e Política nas canções de Bob
Dylan e Chico Buarque”, que fala justamente dos desvios de linguagem, da duplicidade contida
nas composições de Chico Buarque. Isso nos leva ao trecho do samba-enredo, já que “Meu
Guri” (1981) é uma das composições em que ele faz críticas a situação de miséria que muitas
famílias brasileiras estavam vivendo.
A duplicidade de sentido na letra do samba-enredo da Mangueira é uma clara alusão
aos sentidos duplos que Chico Buarque põe nessa canção. Quando a letra do samba diz que
“Ver "meu guri" desfilar”, vai no sentido contrário da composição buarquiana, já que ele na
letra original, diz que: “Chega estampado, manchete, retrato/Com venda nos olhos, legenda e
as iniciais”. Essa são ambíguas, duas letras que se antagonizam. Bem como Ligia Vieira Cesar
fala em seu artigo, se na letra da escola de samba ele veem “O guri” desfilar na avenida, Chico
Buarque o traz a realidade do país nos anos de comando dos militares.
Essa visão popular de Chico Buarque foi de grande ajuda na composição de nosso
trabalho, visto que no âmbito acadêmico ele é tido como grande intelectual, formador de
opinião, de contestador, adjetivos dado também as suas composições, sejam elas na música,
literatura, teatro como também no cinema. Mas para nós foi de grande interesse ver o que o
povo achava das suas canções, de como eles a interpretavam, se elas faziam algum sentido, e
se faziam, qual era.
Percebemos ao analisar a letra do samba-enredo da mangueira que as canções de
Chico Buarque ajudaram a compor um sentido para a vida da população mais humilde que as
ouviam, claro que em sua grande maioria, as duplicidades, as ambiguidades, os sofismas
passam por muitas vezes desapercebidos, mas como Cesar deixa claro em seu texto, Chico
Buarque não estava compondo apenas para um público “Intelligentsia”, mas sim para a “grande
massa”.
Esse primeiro capítulo foi uma revisão dos principais textos usados na composição
da nossa pesquisa. Foi relevante essa breve discursão, visto que precisamos entender o que já
tinha sido publicado sobre esse assunto, para que pudéssemos alicerçar bem nosso trabalho sem
que o mesmo fosse apenas um conjunto de dados sem trazer nada a acrescentar junto aos
demais, já que falar de Chico Buarque abre espaço para um grande campo de pesquisa.
O próximo capítulo será uma breve biografia do compositor, já que para que
possamos entender sua obra, antes de tudo devemos entender quem era Chico Buarque tirando
o olhar de grande cantor da MPB, precisamos entender quais foram suas influências tanto na
27
vida privada quanto na carreira como cantor e compositor. Afim, iremos explorar um pouco
sobre a pessoa de Chico Buarque de Holanda.
28
Capítulo II
“Pra ver a banda passar”: De Francisco a Chico, o início
de sua jornada
A certa altura da vida, vai ficando possível dar balanço no passado
sem cair em autocomplacência, pois o nosso testemunho se torna registro da
experiência de muitos, de todos que, pertencendo ao que se denomina uma geração,
julgam-se a princípio diferentes uns dos outros e vão, aos poucos, ficando tão iguais
que acabam desaparecendo como indivíduos para se dissolveram nas
características gerais de uma época. (Antônio Candido, 1967)
É com essa citação feita para o livro Raízes do Brasil, que começamos este capítulo.
Nele, falamos de uma figura que se torna “atemporal”, devido à sua importância para a história
recente do Brasil. Cantor, compositor e escritor, Francisco Buarque de Holanda é um dos
grandes nomes do seu tempo.
Chico Buarque, autor consagrado de canções como “A Banda”, por exemplo, foi de
grande importância na luta contra o Regime Militar. Através de suas obras, conseguia
comunicar mensagens que contestavam o atual momento em que se encontrava o país. Mas
antes de conhecer quais obras eram essas e qual a importância das mesmas na oposição ao modo
como o Brasil estava sendo gerido por um ditadura civil-militar, antes de tudo temos que
conhecer a pessoa por trás do mito Chico Buarque de Holanda, sua trajetória da infância ao seu
surgimento como cantor e compositor que marcou uma geração que esse capítulo irá tratar.
Nascido no Rio de Janeiro em 19 de Junho de 1944, Francisco Buarque de Holanda,
foi o quarto filho dos sete de um dos maiores intelectuais brasileiros do século XX, Sérgio
Buarque de Holanda8 e dona Maria Amélia Cesário Alvim de Holanda. Na infância, Chico
8 Juntamente com Gilberto Freyre e Caio Prado Júnior, Sérgio Buarque de Holanda, nascido em São Paulo
em 11 de julho de 1902, foi um dos “explicadores do Brasil”, isto é, alguém que, por meio de uma respeitável
obra, procurou tornar o país mais inteligível aos próprios brasileiros. Seu interesse oscilou entre a literatura e a
história, sempre abordadas pelo viés da sociologia, especialmente a da escola alemã, mais precisamente a de Max
Weber. Hoje, Sérgio Buarque de Holanda, falecido em 1982, é considerado um dos mais eminentes intelectuais
29
Buarque morava no Rio de Janeiro, até os oito anos de idade, quando foi junto com a família
morar na Itália, devido ao trabalho de seu pai, que foi lecionar na Universidade de Roma.
Sua iniciação musical vem desde seus primeiros dias de vida. Na casa dos Buarque
de Holanda, a música era quase que uma regra. Chico Buarque ouvia cantores como: Ataulfo
Alves, Mário Lago, Lupicínio Rodrigues, Lamartine Babo, Pixinguinha, Benedito Lacerda,
Herivelto Martins, Ary Barroso, Donga, Ismael Silva, Dorival Caymmi e muitos outros bambas
que, em meados dos anos 1940, povoaram as rádios com belos sambas e alegres marchinhas,
nas vozes de Orlando Silva, Dalva de Oliveira, Francisco Alves, Sílvio Caldas. Vários desses
músicos tiveram influência marcante na obra de Chico. (ZAPPA, 2011,p-43)
Isso, aliado aos livros de Guimarães Rosa9, Dostoiévki10, Tolstoi 11 e Kafka12, seus
autores preferidos durante a juventude, moldaram sua intelectualidade. Claro que os trabalhos
de seu pai também o influenciaram bastante. Já que em Raízes do Brasil (1936) Sérgio Buarque,
brasileiros do século XX. Texto Sérgio Buarque, o explicador do Brasil, em: educaterra web site. Disponível em:
(http://educaterra.terra.com.br/voltaire/brasil/2002/07/03/001.htm). Acesso em 10/10/2014
9 João Guimarães Rosa (Cordisburgo, 27 de junho de 1908 — Rio de Janeiro, 19 de novembro de 1967)
foi um dos mais importantes escritores brasileiros de todos os tempos. Foi também médico e diplomata.
Os contos e romances escritos por Guimarães Rosa ambientam-se quase todos no chamado sertão brasileiro. A sua
obra destaca-se, sobretudo, pelas inovações de linguagem, sendo marcada pela influência de falares populares e
regionais que, somados à erudição do autor, permitiu a criação de inúmeros vocábulos a partir de arcaísmos e
palavras populares, invenções e intervenções semânticas e sintáticas. Biografia: Guimarães Rosa. Em: Academia
Brasileira de Letras web site. Disponível em:
(http://www.academia.org.br/abl/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?infoid=681&sid=96). Acesso em 10/10/2014
10 Fiódor Mikhailovich Dostoiévski (Moscou em 11 de novembro de 1821 - 9 de fevereiro de 1881)
foi um escritor russo do século XIX. É considerado um dos maiores romancistas de todos os tempos. É
um dos pais do existencialismo (escola literária e filosófica que defende da liberdade individual,
subjetividade e responsabilidade do ser humano). Escreveu novelas, contos e romances que são lidos por
pessoas do mundo todo. Biografia: Dostoiévski. Em: Sua pesquisa web site. Disponível em:
(http://www.suapesquisa.com/quemfoi/dostoievski.htm). Acesso em 10/10/2014.
11 O Conde Liev Tolstói nasceu em 1828. Participou da Guerra da Crimeia e casou-se com Sofia
Andrêievna Berhs em 1862. Enquanto Tolstói administrava suas vastas propriedades nas estepes do Volga, dava
continuidade a projetos educacionais, cuidava dos servos e escrevia Guerra e paz (1869) eAnna
Kariênina (1877). Uma confissão (1882) marcou uma crise espiritual em sua vida; ele se tornou um moralista
extremista e, em uma série de panfletos, a partir de 1880, expressou sua rejeição em relação ao Estado e à
Igreja. Morreu em 1910, em meio a uma dramática fuga de casa, na pequena estação de trem de Astápovo.
Biografia: Liev Tolstói. Em: Companhia das letras web site. Disponível em:
(http://www.companhiadasletras.com.br/autor.php?codigo=02524). Acesso em 10/10/2014.
12 Franz Kafka (Praga, 3 de julho de 1883 — Klosterneuburg, 3 de junho de 1924)1 2 foi um escritor
tcheco, autor de romances e contos, considerado pelos críticos como um dos escritores mais influentes do século
XX. A maior parte de sua obra, como A Metamorfose, O Processo e O Castelo, está repleta de temas e arquétipos
de alienação e brutalidade física e psicológica, conflito entre pais e filhos, personagens com missões aterrorizantes,
labirintos burocráticos e transformações místicas. Biografia: Franz Kafka. Em: Companhia das letras web site.
Disponível em: (http://www.companhiadasletras.com.br/autor.php?codigo=00250). Acesso em 10/10/2014.
30
traz uma macro interpretação da formação do povo brasileiro, mostrando a multiplicidade da
nossa população, assim como Chico Buarque mostra vários Brasis em suas canções.
Figura 5- Chico Buarque jovem.
Fonte: Correio website13
13 (http://www.correio24horas.com.br/detalhe/noticia/coluna-vip-chico-buarque-acervo- digital-com-
1044-fotos/). Acesso em 20/05/2015.
31
Mas na questão poética de suas obras pode-se notar a influência de Guimarães Rosa,
pois assim como o escritor mineiro, Chico Buarque também gostava de “inventar” palavras.
Isso pode ser visto na canção “Pedro Pedreiro (1966)”, onde ele cria a palavra “penseiro”:
Pedro Pedreiro Chico Buarque/1965
“Pedro pedreiro penseiro esperando o trem
Manhã parece, carece de esperar também
Para o bem de quem tem bem de quem não tem vintém
Pedro pedreiro espera o carnaval”
Em 1966, em uma entrevista para a revista Manchete, Sérgio Buarque fala da paixão
do filho pelos livros:
Chico andava sempre com um livro de Guimarães Rosa. Numa de
suas músicas, aliás, ele usou palavras inventadas tiradas da linguagem
popular, como faz o Guimarães. Lê em inglês e Francês às vezes em italiano.
Em política, tem pensamentos próprios, e me disse certa vez que não dá às
suas composições, intencionalmente, um conteúdo político, pois o resultado
final surge mais de sua criação e de sua formação. Quando as músicas ficam
prontas, geralmente têm significado social ou político. Mas Chico não está
preso a um só tipo de influência. (Revista Manchete 1966).
Em 1959, um fato surge na vida Chico Buarque, é lançado o LP Chega de Saudade14,
do cantor baiano João Gilberto15. Isso muda drasticamente a vida do Jovem, que até então tinha
14 Chega de Saudade é o primeiro álbum do cantor e compositor brasileiro João Gilberto.
O disco foi lançado em LP em 1959 pela Odeon, este é um grande disco, tanto por suas canções quanto por sua
importância na história da música popular brasileira, tendo sido mantido em catálogo desde o seu lançamento até
1990, por 31 anos consecutivos. Em 2007, foi eleito em uma lista da versão brasileira da revista Rolling
Stone como o quarto melhor disco brasileiro de todos os tempos. Espaço da Música. Em: Espaço da Música web
site. Disponível em: (http://espacodamusicadownload.blogspot.com.br/2012/09/download-1959-chega-de-
saudade-joao_14.html). Acesso em 10/10/2014
15 João Gilberto Prado Pereira de Oliveira (Juazeiro, Bahia, 10 de junho de 1931), conhecido como João
Gilberto, é um cantor, violonista e compositor brasileiro. Tido como o pioneiro criador da bossa nova, é
considerado um gênio e uma lenda viva da música popular brasileira.
Desde o lançamento do compacto que continha Chega de Saudade e Bim Bom, munido apenas da voz e
do violão, começou uma revolução na música brasileira e na música mundial. Dono de uma sonoridade original e
moderna até hoje, João Gilberto foi o artista que levou a música popular brasileira ao mundo, principalmente para
os Estados Unidos, Europa e Japão. Tido como um dos maiores influentes do jazz americano no século XX ganhou
prêmios importantes nos Estados Unidos e na Europa, como o Grammy, em meio à beatlemania. Espaço da
Música. Em: Espaço da Música web site. Disponível em:
(http://espacodamusicadownload.blogspot.com.br/2012/09/download-1959-chega-de-saudade-joao_14.html).
Acesso em 10/10/2014
32
o sonho de ser escritor, pois tinha crônicas escritas no jornal verbâmidas, jornal do colégio
Santa Cruz em São Paulo onde estudava. Essa “descoberta” para a música aconteceu quando
ele tinha 14 anos.
Nesse mesmo ano de 1963, Chico Buarque ingressa na FAU (Faculdade de
Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo). Sua entrada nesse curso se deu mais
por falta de alternativa do que por escolha. Em entrevista à revista Manchete, em Outubro de
1966, Chico Buarque reconhece seu engano em relação ao curso de Arquitetura:
Resolvi estudar arquitetura por engano, e estou meio desanimado
por isso. Não é por causa da música. Tenho a intenção de estudar depois
alguma coisa, mas ainda não descobri o que é. Sou forte em matemática, mas
fraco em desenho. Em física, prefiro não falar: é fogo. Para resumir a minha
situação: gosto muito de arquitetura, mas como leigo, olhando de fora os
edifícios, coisa que sempre me atraiu. Prefiro desconhecer os mistérios de
sua construção. (Revista Manchete 1966).
Em 1º de Abril de 1964, o até então presidente João Goulart é deposto pelo golpe
Civil-Militar16. Nesse tempo, os movimentos estudantis foram ganhando força e as
universidades passaram a ser um dos focos de resistência contra o Regime. Chico Buarque que
se considerava de “esquerda”, se juntava assim a grupos como o JUC (Juventude Universitária
Católica) como também ao DCE (Diretório Central de Estudantes).
Com o Presidente Goulart sendo deposto nove dias após o Golpe, um ato
institucional cassou quarenta mandatos de parlamentares17. A censura começava a mostrar suas
16 “A Ditadura militar no Brasil teve seu início com o golpe militar de 31 de março de 1964, resultando
no afastamento do Presidente da República, João Goulart, e tomando o poder o Marechal Castelo Branco. Este
golpe de estado, caracterizado por personagens afinados como uma revolução instituiu no país uma ditadura
militar, que durou até a eleição de Tancredo Neves em 1985. Os militares na época justificaram o golpe, sob a
alegação de que havia uma ameaça comunista no país.” Fico, Carlos. Em: “Versões e controvérsias sobre 1964 e
a ditadura militar”. UFRJ,2004. Revista Brasileira de História, Vol.24 Nº 47. Disponível em:
(http://www.scielo.br/cgi-
bin/wxis.exe/iah/?IsisScript=iah/iah.xis&base=article%5Edlibrary&format=iso.pft&lang=i&nextAction=lnk&in
dexSearch=AU&exprSearch=FICO,+CARLOS). Acesso em 30/05/2015.
17 Durante o período dos governos militares, foram cassados e suspensos cerca de 4.700 direitos políticos.
Só no primeiro ato institucional, de 10 de abril de 1964, são cassados, entre outros, quarenta parlamentares e dois
ex-presidentes, Jânio Quadros e João Goulart. Em 8 de junho, o senador Juscelino Kubitscheck tem seu mandato
eletivo cassado e os seus direitos políticos suspensos pelo prazo de dez anos. A história da Câmara dos Deputados.
Em: Portal da Câmara dos Deputados web site. Disponível em: (http://www2.camara.leg.br/a-
camara/conheca/historia/historia/a4republica.html). Acesso em 10/10/2014.
33
garras, proibindo, depois liberando a exibição do filme de Glauber Rocha: Deus e o Diabo na
terra do Sol18 de 1963.
Sobre o golpe, Chico Buarque fala em entrevista à Folha de São Paulo em 1999:
Nos anos 50 havia um projeto coletivo, ainda que difuso, de um
Brasil possível, antes mesmo de haver a radicalização de esquerda dos anos
60. [...] Ela [Brasília] foi construída sustentada numa ideia daquele Brasil
que era visível para todos nós. Inclusive nós, que estávamos fazendo música,
teatro etc. Aquele Brasil foi cortado evidentemente em 64. Além de tortura,
de todos os horrores de que eu poderia falar, houve um emburrecimento do
país. A perspectiva do país foi dissipada pelo Golpe. (Folha de São Paulo,
1999).
Em 1965, o Ato institucional nº 2 dissolve os partidos políticos e estabelece o
bipartidarismo, no qual a ARENA (Aliança Renovadora Nacional) apoia o Regime, e o MDB
(Movimento Democrático Brasileiro), reúne uma raquítica oposição. Nesse mesmo ano é
inaugurada a TV Globo, que viria a se transformar na maior emissora do Brasil.
Nesse clima e durante sua época como universitário, Chico Buarque ajudava nas
vigílias, se revezando com outros, para evitar que a faculdade fosse tomada. No mesmo ano de
1965, ele participa de um show no teatro Arena19, intitulado de “Um quadro negro”. Nesse
show, ele e Taiguara20 tiveram sua “estreia” por assim dizer ao público paulista. Chico Buarque
18 Manuel (Geraldo Del Rey) é um vaqueiro que se revolta contra a exploração imposta pelo coronel
Moraes (Mílton Roda) e acaba matando-o numa briga. Ele passa a ser perseguido por jagunços, o que faz com que
fuja com sua esposa Rosa (Yoná Magalhães). O casal se junta aos seguidores do beato Sebastião (Lídio Silva), que
promete o fim do sofrimento através do retorno a um catolicismo místico e ritual. Porém ao presenciar a morte de
uma criança Rosa mata o beato. Simultaneamente Antônio das Mortes (Maurício do Valle), um matador de aluguel
a serviço da Igreja Católica e dos latifundiários da região, extermina os seguidores do beato. Filmes. Em: Adoro
Cinema web site. Disponível em: (http://www.adorocinema.com/filmes/filme-91057/). Acesso em 10/10/2014.
19 O Teatro de Arena de São Paulo (ou somente Teatro de Arena) foi um dos mais importantes
grupos teatrais brasileiros das décadas de 50 e 60. Inicia-se em 1953 tendo promovido uma renovação e
nacionalização do teatro brasileiro, sua existência termina em 1972. Em seu palco, de cerca de 90 lugares,
hoje Teatro de Arena Eugênio Kusnet apresentaram-se espetáculos de importantes diretores e dramaturgos
brasileiros comoJosé Renato Pécora, Augusto Boal e Gianfrancesco Guarnieri. Teatro Arena-SP. Em:
Enciclopédia Itaú Cultural web site. Disponível em: (http://enciclopedia.itaucultural.org.br/grupo399339/Teatro-
de-Arena-(S%C3%A3o-Paulo,-SP). Acesso em 11/10/2014.
20 Taiguara Chalar da Silva (Montevidéu, 9 de outubro de 1945 — São Paulo, 14 de fevereiro de 1996)
foi um cantor e compositor brasileiro, emobora nascido no Uruguai durante uma temporada de espetáculos de seu
pai, o bandoneonista e maestro Ubirajara Silva.
Mudou-se para o Rio de Janeiro em 1949 e para São Paulo, posteriormente, em 1960. Largou a faculdade
de Direito para se dedicar à música. Participou de vários festivais e programas da TV. Fez bastante sucesso nas
décadas de 60 e 70. Autor de vários clássicos da MPB, como Hoje, Universo do teu corpo, Piano e
viola, Amanda,Tributo a Jacob do Bandolim, Viagem, Berço de Marcela, Teu sonho não acabou, Geração
70 e Que as Crianças Cantem Livres; entre outros.
Considerado um dos símbolos da resistência à censura durante a ditadura militar brasileira, Taiguara foi
um dos compositores mais censurados na história da MPB, tendo 68 canções censuradas e escreveu uma, Cavaleiro
34
canta “Marcha para um dia de sol”, uma das suas primeiras composições. Era uma canção
ingênua e pacifista, mas que ele nunca gravou.
Marcha para um dia de sol Chico Buarque/1964
Gravada por Maricenne Costa
Eu quero ver um dia
Nascer sorrindo
E toda a gente
Sorrir com o dia
Com alegria
Do sol do mar
Criança brincando
Mulher a cantar
Eu quero ver um dia
Numa só canção
O pobre e rico
Andando mão e mão
Que nada falte
Que nada sobre
O pão do rico
E o pão do pobre
Eu quero ver um dia
Todos trabalhar
E ao fim do dia
Ter onde voltar
E ter amor
Eu quero ver a paz
Tristeza nunca mais
Eu quero tanto um dia
O pobre ver sem frio
E o rico com coração
Eu quero ver um dia
Numa só canção
O pobre e rico
Andando mão e mão
Que nada falte
Que nada sobre
da Esperança, em homenagem a Luís Carlos Prestes1 . Os problemas com a censura eventualmente levaram
Taiguara a se auto-exilar na Inglaterra em meados de 1973. Em Londres, estudou no Guildhall School of Music
and Drama e gravou o Let the Children Hear the Music, que nunca chegou ao mercado, tornando-se o primeiro
disco estrangeiro de um brasileiro censurado no Brasil. Taiguara O cancioneiro da esperança. Em: Flávio Tiné
web site. Disponivel em: (http://flaviotine.blogspot.com.br/2008/08/taiguara.html). Acesso em 11/10/2014.
35
O pão do rico
E o pão do pobre
Eu quero ver um dia
Todos trabalhar
E ao fim do dia
Ter onde voltar
E ter amor
Eu quero ver a paz
Tristeza nunca mais
Eu quero tanto um dia
O pobre ver sem frio
E o rico com coração
No mesmo ano, no colégio Santa Cruz onde havia estudado, ele canta o que seria
considerando o “marco zero” da sua carreira. “Tem mais Samba ai”, é considerada por ele sua
canção de número Um. Essa obra além de ser a primeira inaugura uma das constantes no
trabalho de Chico Buarque como compositor: a criação por encomenda. Essa canção foi feita
para o show Balanço de Orfeu, produzida por Luiz Vergueiro, estreando no teatro Maria Della
Costa em 7 de Dezembro de 1964 em São Paulo.
Figura 6- Gravação de Show no teatro da TV Record em 1964
Fonte: Estadão Website21
21 (http://acervo.estadao.com.br/noticias/personalidades,chico-buarque,915,0.htm). Acesso em
20/05/205.
36
No cenário internacional, o tempo era de cantores como Bob Dylan22, Ella
Fitzgerald23, Frank Sinatra24, e os Beach Boys25. O filósofo francês Jean-Paul Sartre26recusa o
prêmio Nobel de literatura. Os Beatles, o fenômeno musical da época, desembarcam nos
Estados Unidos, com o seu sucesso “I want to hold your hand”27. Mas os sons harmoniosos
da banda inglesa não impressionavam Chico Buarque, que nesse tempo já fazia canções, ele
preferia as imperfeições das composições dissonantes de João Gilberto.
Em 1965, ele faz um show ainda na faculdade, intitulado de “Avanço”, cantando
para um grande público no Teatro Paramount em São Paulo. Nesse show também participam
22 Bob Dylan (1941) é um cantor e compositor norte-americano de folk. Um dos ícones da contracultura.
É considerado um dos maiores compositores do século XX. Biografia - Bob Dylan. Em: E-Biografias web site.
Disponível em: (http://www.e-biografias.net/bob_dylan/). Acesso em 11/10/2014.
23 Ella Jane Fitzgerald (Newport News, 25 de abril de 1917 — Beverly Hills, 15 de junho de 1996)
também conhecida como a "Primeira Dama da Canção" (em inglês: First Lady of Song) e "Lady Ella", foi uma
popular cantora de jazz estadunidense Com uma extensão vocal que abrangia três oitavas, era notória pela pureza
de sua tonalidade, sua dicção, fraseado e entonação impecáveis, bem como uma habilidade de improviso
"semelhante a um instrumento de sopro", particularmente no scat. Considerada uma das intérpretes supremas do
chamado Great American Songbook,3 teve uma carreira que durou 59 anos, venceu 14 prêmios Grammy e recebeu
a Medalha Nacional das Artes do presidente americano Ronald Reagan, bem como a Medalha Presidencial da
Liberdade, do sucessor de Reagan, George H. W. Bush. Biografia – Ella Fitzgerald. Em: Clube de Jazz web site.
Disponível em: (http://clubedejazz.com.br/ojazz/jazzista_exibir.php?jazzista_id=11). Acesso em 11/10/2014.
24 Francis Albert "Frank" Sinatra (Hoboken, 12 de dezembro de 1915 — Los Angeles, 14 de maio de
1998) foi um cantor e ator norte-americano.
25 The Beach Boys é uma banda de rock dos Estados Unidos formada em Hawthorne, Califórnia, em
1961, e é tida como uma das mais influentes da história do rock e do pop. Emplacou dúzias de canções nas paradas
de sucesso (também emplacou quatro compactos no primeiro lugar entre os mais vendidos nos Estados Unidos),
além de álbuns recordistas de venda. Foi incluída no Hall da Fama do Rock and Roll em 1988. Seu álbum Pet
Sounds, de 1966, que contêm clássicos como "Wouldn't It Be Nice", "Sloop John B", e "God Only Knows", e é
considerada uma das maiores obras primas da história da música pop. Biografia – The Beach Boys. Em:
Almanaque da Folha web site. Disponível em: (http://almanaque.folha.uol.com.br/quizes/biobboys.shtml). Acesso
em 11/10/2014.
26 Jean-Paul Sartre (1905-1980) foi filósofo e escritor francês. "O Ser e o Nada" foi o seu principal
trabalho filosófico. Foi um dos maiores integrantes do pensamento existencialista na França, juntamente com
Albert Camus e Simone de Beauvoir. Biografia: Jean-Paul Sartre. Em: E-Biografias web site. Disponível em:
(http://www.e-biografias.net/jean_paul_sartre/). Acesso em 11/10/2014.
27 I Want To Hold Your Hand é o nome de uma música lançada pelo grupo de rock inglês The Beatles
em 1963. É uma das músicas de maior sucesso dos Beatles. Composta pela dupla Lennon/McCartney pode ser
considerada o marco inicial da Beatlemania nos Estados Unidos, pois foi a primeira música do Beatles a fazer
sucesso nos EUA, alcançando a primeira posição na Billboard no dia 1º de fevereiro de 1964 como a mais tocada
nas rádios por sete semanas (Billboard 1) e esteve entre as cem mais tocadas por quinze semanas (Hot 100). No
Reino Unido, o single havia alcançado o primeiro lugar nas paradas no dia 12 de dezembro de 1963, permanecendo
no topo por cinco semanas. Biografia – Beatles. Em: Beatlemania web site. Disponível em:
(http://www.beatlemania.com.br/). Acesso em 11/10/2014.
37
Gilberto Gil28, até então um desconhecido do grande público, como também Maria Bethânia29.
1965 é um ano de mudanças na vida de Chico Buarque, nesse ano, ele inscreve sua canção
“Sonho de um Carnaval”, para o festival de música da TV Excelsior30. A composição foi
defendida no festival por Geraldo Vandré31. A canção foi para a final, mas não ficou entre as
primeiras.
Essa ideia de concurso surgiu nas universidades, tendo como o Teatro da
Universidade Católica de São Paulo (TUCA)32, seu marco inicial. Vendo o sucesso do festival
28 Gilberto Gil (1942) é um músico brasileiro e um dos criadores do movimento tropicalista nos anos 60.
Biografia – Gilberto Gil. Em: E-Biografias web site. Disponível em: (http://www.e-biografias.net/gilberto_gil/).
Acesso em 12/10/2014.
29 Maria Bethânia Viana Teles Velloso1 (Santo Amaro, 18 de Junho de 1946 é uma cantora e compositora
brasileira). Nascida em Santo Amaro da Purificação, Bahia, ela participou, na juventude, de peças teatrais ao lado
de seu irmão, o cantor Caetano Veloso e de outros cantores proeminentes da época. Em 1965, mudou-se para o
Rio de Janeiro onde começou sua carreira musical substituindo a cantora Nara Leão no espetáculo Opinião.
Biografia – Maria Bethania. Em: Infoescola web site. Disponível em:
(http://www.infoescola.com/biografias/maria-bethania/). Acesso em 12/10/2014.
30 Rede Excelsior foi uma rede de televisão brasileira cuja primeira emissora, a TV Excelsior de São
Paulo, entrou no ar em 9 de julho de 1960. Fechou as portas em definitivo em 30 de setembro de 1970. A rede de
televisão pertencia ao empresário Mário Wallace Simonsen. TV Excelsior. Em: Tudosobretv web site. Disponível
em: (http://www.tudosobretv.com.br/histortv/tv50.htm). Acesso em 12/10/2014.
31 Geraldo Vandré, nome artístico de Geraldo Pedrosa de Araújo Dias, paraibano, (João Pessoa, 12 de
setembro de 1935) é um cantor e compositor brasileiro. Mudou-se para o Rio de Janeiro em 1951, tendo ingressado
na Faculdade Nacional de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Militante estudantil participou
ativamente do Centro Popular de Cultura da União Nacional dos Estudantes (UNE). Em 1966, chegou à final do
Festival de Música Popular Brasileira da TV Record com o sucesso “Disparada”, interpretada por Jair Rodrigues.
A canção arrebatou o primeiro lugar ao lado de A Banda, de Chico Buarque. Em 1968, participou do III Festival
Internacional da Canção com Pra não dizer que não falei de flores ou Caminhando. Biografia – Geraldo Vandré.
Em: Vandretempoderepouso web site. Disponível em:
(http://vandretempoderepouso.blogspot.com.br/p/biografia.html). Acesso em 12/10/2014.
32 O Teatro da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, mais conhecido como TUCA (Teatro da
Universidade Católica), é um teatro brasileiro inaugurado em 1965. Sua inauguração se deu com a peça Morte e
Vida Severina, escrita por João Cabral de Melo Neto. Tornou-se famoso pelas manifestações políticas durante a
ditadura militar. O teatro conta com duas salas: o Auditório Tibiriçá e o Tucarena. O teatro sofreu dois incêndios
em 1984, que causou sérios danos em sua estrutura. Foi reaberto em 1986, com as obras de reconstrução
incompletas. Tombado pelo Patrimônio Histórico do município de São Paulo, retomou as obras de reforma em
2002, tendo sido reinaugurado em agosto de 2003. História – TUCA. Em: Teatrotuca web site. Disponível em:
(http://www.teatrotuca.com.br/historia.html). Acesso em 12/10/2014.
38
promovido pela Excelsior, emissoras como a Record, em São Paulo, e Globo no Rio de Janeiro,
fizeram também seus festivais. A música agora era a bola da vez33.
Ainda de 1965 acontece uma transição no mundo da música brasileira, que mexe
com Chico Buarque. A bem-comportada Bossa Nova começa a abrir espaço para um novo tipo
de música: O Afro-samba34 surge, e com ele traz nomes consagrados da música, como Vinicius
de Moraes e o violonista Baden Powell. Atento a esse novo estilo de música, Chico Buarque
sente a necessidade de voltar às fontes que o inspiraram, aos cantores que o inspiraram, tornou
a ouvir os sambas de sua infância. Sambistas como: Noel Rosa, Ismael Silva, Ataulfo Alves,
Donga, como também Pixinguinha, fizeram sua cabeça borbulhar com novas ideias.
Em entrevista à revista Intervalo, Chico Buarque fala desse novo tempo na música:
Fazer música popular brasileira é procurar falar como o povo.
Fazendo samba numa linguagem que o povo não entende é somente ser
festivo, e isso não existe em música. (Revista Intervalo, 1965).
Nesse mesmo ano, Roberto Freire35, que era amigo de Miúcha irmã de Chico
Buarque, e que estava no júri do festival da Excelsior, faz um convite ao Jovem compositor
para se juntar ao TUCA do qual Roberto Freire era o diretor. Seu primeiro trabalho era musicar
o poema de João Cabral de Melo Neto: Morte e Vida Severina36, para uma apresentação teatral.
33 Realizado em 1960, 1º Festival da Record assinalou o início de um dos períodos mais criativos da
Música Popular Brasileira e que seria conhecido na crônica musical como ´a era dos festivais´. Foi nessa época
em que a bossa nova convivia com o samba e o iê-iê-iê, a Tropicália se afirmava ao lado da canção de protesto,
que surgiram os talentos de Chico Buarque, Gilberto Gil, Caetano Veloso, os Mutantes e dezenas de outros
cantores e compositores. MELLO, Zuza Homem de. A era dos Festivais. Editora 34 –SP, Vol. 5, 2010.
34 Considerado por muitos críticos como um divisor de águas na MPB por fundir vários elementos da
sonoridade africana ao samba, "Os Afro-sambas" é o segundo LP lançado pela parceria Baden Powell / Vínicius
de Moraes. Segundo relata Vinicius, numa crônica escrita em 1965 e disponível no livro "Samba Falado" (Editora
Beco do Azougue), o poeta recebera de Coqueijo Costa um disco com sambas-de-roda da Bahia, pontos de
candomblé e toques de berimbau que encantaram Vinicius de Moraes. Baden Powell também fora à Bahia e
conferira pessoalmente os cantos do candomblé baiano. Desse mútuo encantamento pelo samba e religiosidade
encontrada na Bahia, surgiu o projeto dos Afro-sambas, que se tornou um álbum gravado em 1966. 100 discos
fundamentais da MPB. Em: Luizamerico web site. Disponível em: (http://www.luizamerico.com.br/fundamentais-
baden-vinicius.php). Acesso em 12/10/2014.
35 Joaquim Roberto Corrêa Freire (São Paulo, 18 de janeiro de 1927 — São Paulo, 23 de maio de 2008)1
foi um médico psiquiatra e escritor brasileiro, conhecido por ser o criador de uma nova e heterodoxa técnica
terapêutica denominada Soma (somaterapia), baseada no anarquismo e nas ideias de Wilhelm Reich. Foi também
diretor de cinema e teatro, autor de telenovela, letrista e pesquisador científico. Biografia – Roberto Freire. Em:
L&PM editores web site. Disponível em:
(http://www.lpm.com.br/site/default.asp?TroncoID=805134&SecaoID=948848&SubsecaoID=0&Template=../li
vros/layout_autor.asp&AutorID=827193). Acesso em 12/10/2014.
36 Morte e Vida Severina é um livro do escritor brasileiro João Cabral de Melo Neto, escrito entre 1954 e
1955 e publicado em 1955. O nome do livro é uma alusão ao sofrimento enfrentado pela personagem. O livro
apresenta um poema dramático, que relata a dura trajetória de um migrante nordestino (retirante) em busca de uma
39
E assim foi feito. O resultado do trabalho foi tão bom que muitos críticos consideraram que ele
havia “extraído” os versos do poema, e não composto para ele. A peça foi apresentada no 4º
Festival em Nancy na França em Maio de 1966, com a presença de Chico Buarque. A peça foi
de um sucesso tão grande que até o poeta João Cabral de Melo Neto, que era contra a montagem
do espetáculo, ficou encantado com as composições feitas para sua obra, que viajou com o
grupo para Portugal onde foram feitas outras apresentações. O espetáculo foi tão bem sucedido,
que em 1966 a gravadora Philips lança o LP Morte e vida Severina, gravando ao vivo no TUCA.
Mas para Chico Buarque, o ano prometia. Nara Leão, a grande voz da época, e
tida como descobridora de talentos, grava três canções de Chico Buarque em seu LP “Nara
pede Passagem” (“Olê, Olâ”, “Pedro Pedreiro” e “Madalena foi pro Mar”). Isso era o mesmo
que um selo de garantia da boa qualidade de suas obras.
Em 1966 ele já tinha músicas suficientes para fazer um show completo, então, surge
o espetáculo “Meu Refrão”, idealizado por Hugo Carvana37 e Antônio Carlos Fontoura. O
primeiro encontro entre Chico Buarque e Hugo Carvana foi em São Paulo na TV Record:
Carvana não conhecia o jovem cantor, que após uma hora de atraso, finalmente chega para o
encontro com seu produtor, com uma tremenda ressaca. Apesar disso, seguiram para um boteco
para conversar, e resultado, outro porre monumental.
Chico Buarque estreia no final de 1966 na Boate Arpège no Rio de Janeiro. O show
continha dezesseis canções interpretadas por ele e por Odete Lara38 e pelo grupo MPB-439. Mas
vida mais fácil e favorável no litoral. Educação e Literatura. Em: educaçãoglobo web site. Disponível em:
(http://educacao.globo.com/literatura/assunto/resumos-de-livros/morte-e-vida-severina.html). Acesso em
12/10/2014
37 Hugo Carvana de Hollanda (Rio de Janeiro, 4 de junho de 1937 — Rio de Janeiro, 4 de outubro de
2014) foi um ator e diretor de cinema e televisão brasileiro. O ator tornou-se conhecido do grande público na
televisão interpretando personagens notáveis, como o jornalista do seriado Plantão de Polícia, "Valdomiro Pena",
nos anos 80, embora não escondesse sua paixão pelo cinema. Biografia – Hugo Carvana. Em: HugoCarvana web
site. Disponivel em: (http://hugocarvana.com.br/hugo-carvana/biografia/). Acesso em: 12/10/2014.
38 Atriz, cantora e escritora, Odete Lara nasceu em São Paulo, capital, em 17 de abril de 1929. Seu nome
de nascimento é Odete Righi. Filha única de imigrantes do norte da Itália. A beleza de Odete deslumbrou Otomar
dos Santos, que a indicou para a então recém-inaugurada TV Tupi de Assis Chateaubriand. Na televisão, Odete
Lara começou como garota-propaganda. Em seguida participou da versão televisiva de Luz de Gás, com Tônia
Carrero e Paulo Autran, depois Branca Neve e os sete anões, onde interpretou a Rainha Má.Odete Lara se tornou
estrela do “TV de Vanguarda”, uma das maiores atrações da TV Tupi. Algumas telenovelas em que atuou nessa
emissora foram: As Bruxas, A volta de Beto Rockefeller e Em busca da felicidade. Biografia – Odete Lara. Em:
Lastfm web site. Disponível em: (http://www.lastfm.com.br/music/Odette+Lara). Acesso em 12/10/2014.
39 O histórico do grupo remonta a 1962, inicialmente com formação de trio, integrado por Ruy, Aquiles
e Miltinho, responsáveis pelo suporte musical do Centro Popular de Cultura, da Universidade Federal Fluminense
(filiado ao CPC da UNE), em Niterói. História MPB-4. Em: MPB4 web site. Disponível em:
(http://www.mpb4.com.br/historia). Acesso em 12/10/2014.
40
dentre os espectadores, havia um que não tinha sido convidado: a censura. Que pela primeira
vez bate à porta de Chico Buarque.
Uma das canções do show era “Tamandaré”, na qual ele comentava a desvalorização
da moeda, brincado com a figura do Almirante Joaquim Marques de Lisboa, Marquês de
Tamandaré, patrono da Marinha, que tinha seu rosto estampado nas notas de um cruzeiro.
Assim, a Marinha proíbe a execução de tal canção.
Tamandaré Chico Buarque/1965
Zé qualquer tava sem samba, sem dinheiro
Sem Maria sequer
Sem qualquer paradeiro
Quando encontrou um samba
Inútil e derradeiro
Numa inútil e derradeira
Velha nota de um cruzeiro
“Seu” Marquês, "seu" Almirante
Do semblante meio contrariado
Que fazes parado
No meio dessa nota de um cruzeiro rasgado
"Seu” Marquês, "seu" Almirante
Sei que antigamente era bem diferente
Desculpe a liberdade
E o samba sem maldade
Deste Zé qualquer
Perdão Marquês de Tamandaré
Perdão Marquês de Tamandaré
Pois é, Tamandaré
A maré não tá boa
Vai virar a canoa
E este mar não dá pé, Tamandaré
Cadê as batalhas
Cadê as medalhas
Cadê a nobreza
Cadê a marquesa, cadê.
Não diga que o vento levou
Teu amor até
Pois é, Tamandaré
A maré não tá boa
Vai virar a canoa
E este mar não dá pé, Tamandaré
Meu marquês de papel
Cadê teu troféu
Cadê teu valor
Meu caro almirante
O tempo inconstante roubou
Zé qualquer tornou-se amigo do marquês
41
Solidário na dor
Que eu contei a vocês
Menos que queira ou mais que faça
É o fim do samba, é o fim da raça
Zé qualquer tá caducando
Desvalorizando
Como o tempo passa, passando
Virando fumaça, virando
Caindo em desgraça, caindo
Sumindo, saindo da praça
Passando, sumindo
Saindo da praça
Mas nessa época, Chico Buarque não era de levar desaforo para casa. Levando com
bom humor a proibição, durante a execução de “Meu Refrão”, ele insere estes versos na melodia
da canção durante algumas apresentações:
“ Você me procura
Pede explicação
Depois me censura
O que é de coração
Mesmo assim não brigo
Não me importo não
Pois quem canta comigo
Canta meu refrão
Meu melhor amigo
É o meu violão”
A canção Tamandaré permaneceu proibida por muito tempo, só foi gravada em 1991
pelo Quarteto em CY40, no CD Chico em CY.
Para substituir a canção que fora censurada, nasce “Noite dos Mascarados”. Nessa
mesma época, Vinicius de Moraes41 organizava a trilha sonora do filme “Garota de Ipanema”
40 O Quarteto em Cy foi originalmente formado pelas irmãs Cylene, Cynara, Cybele e Cyva, nascidas em
Ibirataia (BA). Ainda em seu estado natal, as quatro irmãs Sá Leite iniciaram sua relação com a música através do
projeto sociocultural “Hora da Criança”, que visava introduzir os jovens no fascinante mundo das artes. No início
dos anos 60, de passagem pelo Rio de Janeiro, Cyva, a irmã mais velha, conhece o poeta Vinícius de Moraes, que
incentiva as quatro irmãs a formar um conjunto vocal. Com o auxílio de Carlos Lyra, o grupo foi batizado como
Quarteto em Cy, em referência às iniciais dos nomes das integrantes. Anos 60 – O início. Em: Quarteto em Cy
web site. Disponível em: (http://www.quartetoemcy.com.br/historia.html). Acesso em 14/10/2014.
41 Vinicius de Moraes, nascido Marcus Vinicius de Moraes1 (Rio de Janeiro, 19 de outubro de 1913 —
Rio de Janeiro, 9 de julho de 1980) foi um diplomata, dramaturgo, jornalista, poeta e compositor brasileiro. Poeta
essencialmente lírico, o que lhe renderia a alcunha "poetinha", que lhe teria atribuído Tom Jobim, notabilizou-se
pelos seus sonetos. Conhecido como um boêmio inveterado, fumante e apreciador do uísque, era também
conhecido por ser um grande conquistador. O poetinha casou-se por nove vezes ao longo de sua vida e suas esposas
foram, respectivamente: Beatriz Azevedo de Melo (mais conhecida como Tati de Moraes), Regina Pederneiras,
Lila Bôscoli, Maria Lúcia Proença, Nelita de Abreu, Cristina Gurjão, Gesse Gessy, Marta Rodrigues Santamaria
(a Martita) e Gilda de Queirós Mattoso. Sua obra é vasta, passando pela literatura, teatro, cinema e música. Ainda
assim, sempre considerou que a poesia foi sua primeira e maior vocação, e que toda sua atividade artística deriva
42
(1967), e sugeriu que Chico Buarque juntamente com Elis Regina42 gravasse o dueto para ser
introduzida na trilha sonora. Essa canção se torna mais um marco na carreira do compositor,
pois é interpretando ele mesmo, que Chico Buarque inicia sua carreira no cinema, fazendo o
papel dele mesmo, ao lado de nomes como Tom Jobim, Vinicius de Moraes e Nara Leão. Esse
foi seu primeiro trabalho no cinema, outras encenações viriam posteriormente.
Noite dos Mascarados Chico Buarque 1966
Para o musical Meu refrão
Quem é você?
Adivinhe, se gosta de mim
Hoje os dois mascarados
Procuram os seus namorados
Perguntando assim:
Quem é você, diga logo
Que eu quero saber o seu jogo
Que eu quero morrer no seu bloco
Que eu quero me arder no seu fogo
Eu sou seresteiro
Poeta e cantor
O meu tempo inteiro
Só zombo do amor
Eu tenho um pandeiro
Só quero um violão
Eu nado em dinheiro
Não tenho um tostão
Fui porta-estandarte
Não sei mais dançar
Eu, modéstia à parte
Nasci pra sambar
Eu sou tão menina
Meu tempo passou
Eu sou Colombina
Eu sou Pierrot
Mas é carnaval
Não me diga mais quem é você
Amanhã, tudo volta ao normal
Deixe a festa acabar
Deixe o barco correr
do fato de ser poeta. No campo musical, o poetinha teve como principais parceiros Tom Jobim, Toquinho, Baden
Powell, João Gilberto, Chico Buarque e Carlos Lyra. Vida e Obra. Em: Viniciusdemoraes web site. Disponível
em: (http://www.viniciusdemoraes.com.br/pt-br/vida). Acesso em 14/10/2014.
42 Elis Regina (1945-1982) foi uma cantora brasileira. Por sua performance versátil, foi considerada a
maior cantora do Brasil. É Também reconhecida pelas sua forma de expressão altamente emotiva, tanto na
interpretação musical quanto em seus gestos. Biografia – Elis Regina. Em: E-Biografias web site. Disponível em:
(http://www.e-biografias.net/elis_regina/). Acesso em 14/10/2014.
43
Deixe o dia raiar
Que hoje eu sou
Da maneira que você me quer
O que você pedir
Eu lhe dou
Seja você quem for
Seja o que Deus quiser
Seja você quem for
Seja o que Deus quiser
Essa canção consiste em um diálogo entre duas pessoas que se encontram em um
baile de carnaval. Durante a conversa, eles vão se descrevendo e se descobrindo, é ai que
começam a aparecer às diferenças entre eles: “Eu nado em dinheiro/ Não tenho um tostão”.
Mas, mesmo com diferenças econômicas, eles não se importam, pois “é carnaval” tudo é
permitido.
Há também, a construção de um “mundo utópico”, onde todos pelo menos por uma
noite convivem de forma pacífica e harmônica, e que o autoritarismo do Regime não podia
chegar: “Mas é carnaval/Não me diga mais quem é você/Amanhã tudo volta ao normal/Deixa
a festa acabar”. Noite dos mascarados era quase uma fuga da realidade séria e oficializada
imposta pelo Regime.
Em 1966, Chico Buarque compôs a canção que daria uma guinada na sua vida como
cantor e compositor. Composta em um momento de tensão vivida no país após o golpe de 1964,
e com cerca de 300.000 copias vendidas no país e 1.200,00 no exterior (EUA e Itália), “A
Banda”, traria fama e reconhecimento para o jovem que com apenas 23 anos se tornaria um
fenômeno quase que unânime no Brasil. Trazendo para Chico Buarque status de celebridade.
A Banda Chico Buarque/1966
Estava à toa na vida
O meu amor me chamou
Pra ver a banda passar
Cantando coisas de amor
A minha gente sofrida
Despediu-se da dor
Pra ver a banda passar
Cantando coisas de amor
O homem sério que contava dinheiro parou
O faroleiro que contava vantagem parou
A namorada que contava as estrelas parou
Para ver, ouvir e dar passagem
44
A moça triste que vivia calada sorriu
A rosa triste que vivia fechada se abriu
E a meninada toda se assanhou
Pra ver a banda passar
Cantando coisas de amor
O velho fraco se esqueceu do cansaço e pensou
Que ainda era moço pra sair no terraço e dançou
A moça feia debruçou na janela
Pensando que a banda tocava pra ela
A marcha alegre se espalhou na avenida e insistiu
A lua cheia que vivia escondida surgiu
Minha cidade toda se enfeitou
Pra ver a banda passar cantando coisas de amor
Mas para meu desencanto
O que era doce acabou
Tudo tomou seu lugar
Depois que a banda passou
E cada qual no seu canto
Em cada canto uma dor
Depois da banda passar
Cantando coisas de amor
Em 1967, acontecem grandes mudanças no Brasil. No início do ano, uma nova
constituição é outorgada. O Ato constitucional nº 4 ou AI-4 que atribuiu função de poder
constituinte originário ("ilimitado e soberano"). Com o congresso nacional transformado em
Assembleia Nacional Constituinte, e com os membros de oposição ao Regime afastados do
congresso, foi elaborada mediante pressão dos militares, uma Carta Constitucional semi-
outorgada que buscava legalizar e institucionalizar o Regime Militar consequente do golpe de
1964. Essa seria a sexta constituição do Brasil, e nela, o poder Executivo teve sua influência
aumentada sobre os poderes Legislativo e Judiciário, criando assim uma hierarquia
constitucional centralizadora. As emendas constitucionais que antes eram atribuídas ao poder
Legislativo, com o aval do Poder Executivo e Judiciário, agora passam a ser de exclusividade
de quem estivesse à frente do poder Executivo, deixando os demais poderes reduzidos a meros
expectadores das aprovações de emendas e legislações baixadas pelo Presidente da República43.
O presidente Castelo Branco sai do poder, e em Março, o Marechal Arthur da Costa
e Silva assume. Com a crescente dos grupos armados de oposição ao governo, é criado o CIE
43 Disponível em: (http://www.acervoditadura.rs.gov.br/legislacao_5.htm). Acesso em 20/05/2015.
45
(Centro de Informação do Exército), para investigar esses grupos. Aumentam as denúncias de
tortura a presos políticos. No cenário da música, surge o movimento Tropicalista44.
Figura 7- Apresentação no II Festival de Música Popular Brasileira, realizado no Teatro
Record, em São Paulo
Fonte: Estadão website45
44 O Tropicalismo foi um movimento de ruptura que sacudiu o ambiente da música popular e da cultura
brasileira entre 1967 e 1968. Seus participantes formaram um grande coletivo, cujos destaques foram os cantores-
compositores Caetano Veloso e Gilberto Gil, além das participações da cantora Gal Costa e do cantor-compositor
Tom Zé, da banda Mutantes, e do maestro Rogério Duprat. A cantora Nara Leão e os letristas José Carlos Capinan
e Torquato Neto completaram o grupo, que teve também o artista gráfico, compositor e poeta Rogério Duarte
como um de seus principais mentores intelectual. Os tropicalistas deram um histórico passo à frente no meio
musical brasileiro. A música brasileira pós-Bossa Nova e a definição da “qualidade musical” no País estavam cada
vez mais dominadas pelas posições tradicionais ou nacionalistas de movimentos ligados à esquerda. Contra essas
tendências, o grupo baiano e seus colaboradores procuram universalizar a linguagem da MPB, incorporando
elementos da cultura jovem mundial, como o rock, a psicodelia e a guitarra elétrica. Identisignificados. Em:
Tropicália web site. Disponível em:
(http://tropicalia.com.br/identifisignificados/movimento#sthash.uUXjfoKk.dpuf). Acesso em 16/10/2014.
45 (http://acervo.estadao.com.br/noticias/personalidades,chico-buarque,915,0.htm). Acesso em
20/05/2015.
46
Nesse ano, Chico Buarque já era um cantor de fama reconhecida nacionalmente.
Com o estrondoso sucesso de “A banda”, ele fazia shows por todo país. E nessas idas e vindas,
entre apresentações, que surge outro grande sucesso: “Roda Viva”.
Essa canção foi composta para o III Festival de Música da TV Record, pode-se dizer
que esse festival reuniu a “nata da MPB”. Além de Chico Buarque com “Roda Viva”, Edu Lobo
inscreve “Ponteiro”, interpretada por Marília Medalha, Gilberto Gil com “Domingo no Parque”,
como também Caetano Veloso com “Alegria, Alegria”. Porém, a campeã desse festival foi à
composição de Edu Lobo46.
Surpresas ocorreram nesse festival. Na segunda eliminatória, Gilberto Gil faz sua
apresentação, incorporando a guitarra elétrica – novidade na época – como também faz
apresentações com o grupo paulista “Os Mutantes47”. Já Caetano Veloso, conta com a
participação dos Beat Boys48, que eram vinculados a Jovem Guarda. No ano de 1967 pode-se
dizer que foi o início do Rock n’ Roll no Brasil.
46 Carioca, filho do compositor Fernando Lobo, começou na música tocando acordeom. Depois se
interessou pelo violão e dedicou-se ao instrumento, contra a vontade do pai. Passou a frequentar shows em bares
de Copacabana e formou um conjunto com Dori Caymmi e Marcos Valle, que chegou a se apresentar algumas
vezes. Em 1962 compôs sua primeira parceria com Vinicius de Moraes, "Só Me Fez Bem". Gravou no mesmo ano
seu primeiro compacto, com canções tipicamente de bossa nova. Mais tarde desviou-se um pouco dessa tendência,
adotando uma linha mais combativa de cultura popular, graças à parceria com Ruy Guerra, que resultou em
composições como "Canção da Terra", "Reza" e "Aleluia". Fez trilha para teatro, participou do evento "Arena
Conta Zumbi" em 1965 em São Paulo, onde estreou um de seus maiores sucessos, "Upa, Neguinho", em parceria
com Gianfrancesco Guarnieri, mais tarde gravada por Elis Regina. Participou dos festivais de música popular,
obtendo o primeiro prêmio em 1965 como "Arrastão" (com Vinicius de Moraes) e em 1967 com "Ponteio", parceria
com Capinam. Entre 1969 e 1971 morou nos Estados Unidos, onde aprofundou seus estudos musicais. Por essa
época trabalhou com Sergio Mendes e Paul Desmond. De volta ao Brasil, lançou discos solo e em parcerias ilustres,
como "Edu e Tom", em 1981, e "O Grande Circo Místico", de 1983, com composições suas e de Chico Buarque
interpretadas por outros artistas. Nos anos 90 lançou discos com músicas inéditas e compôs trilhas para filmes
como "Canudos", de Sergio Resende. Seu CD "Meia-noite" (1995) recebeu o prêmio Sharp de melhor disco de
música popular brasileira do ano. Biografia: Edu Lobo. Em Edulobo web site. Disponível em:
(http://www.edulobo.com.br/site/). Acesso em 21/04/2015.
47 Esta banda paulista foi formada inicialmente em 1966 pelo baixista, pianista, cantor e compositor
Arnaldo Baptista (1948); por seu irmão, o guitarrista, violonista e compositor Sérgio Dias (1951); e pela cantora e
compositora Rita Lee Jones (1947). Após os nomes The Wooden Faces e O Conjunto, a banda foi finalmente
batizada de Mutantes (1966). Biografia: Os Mutantes. Em: Tropicália web site. Disponível em:
(http://tropicalia.com.br/ilumencarnados-seres/biografias/mutantes). Acesso em 16/10/2014.
48 Beat Boys foi um grupo brasileiro de rock, surgido em São Paulo (SP) em meados da década de 1960,
formado pelos músicos argentinos Tony Osanah (guitarra e voz), Cacho Valdez (guitarra), Toyo (órgão
(instrumento), Willie Verdager (baixo) e Marcelo Frias (bateria). Surgiu com o movimento da Jovem Guarda,
porém o marco principal da carreira foi a participação tanto na gravação, como na apresentação de "Alegria,
alegria", de Caetano Veloso, no "III Festival de Música Popular Brasileira", da TV Record, em 1967. Biografia:
Beat Boys. Em: Lastfm web site. Disponível em: (http://www.lastfm.com.br/music/Beat+Boys). Acesso em
16/10/2014.
47
Mesmo com sua canção ficando em terceiro lugar no festival. “Roda Viva” iria
render no ano seguinte, a entrada de Chico Buarque no teatro, agora não mais como compositor,
e sim, como escritor.
Roda Viva Chico Buarque / 1967
Tem dias que a gente se sente
Como quem partiu ou morreu
A gente estancou de repente
Ou foi o mundo então que cresceu
A gente quer ter voz ativa
No nosso destino mandar
Mas eis que chega a roda-viva
E carrega o destino pra lá
Roda mundo, roda-gigante
Rodamoinho, roda pião
O tempo rodou num instante
Nas voltas do meu coração
A gente vai contra a corrente
Até não poder resistir
Na volta do barco é que sente
O quanto deixou de cumprir
Faz tempo que a gente cultiva
A mais linda roseira que há
Mas eis que chega a roda-viva
E carrega a roseira pra lá
Roda mundo, roda-gigante
Rodamoinho, roda pião
O tempo rodou num instante
Nas voltas do meu coração
A roda da saia, a mulata
Não quer mais rodar, não senhor
Não posso fazer serenata
A roda de samba acabou
A gente toma a iniciativa
Viola na rua, a cantar
Mas eis que chega a roda-viva
E carrega a viola pra lá
Roda mundo, roda-gigante
Rodamoinho, roda pião
O tempo rodou num instante
Nas voltas do meu coração
O samba, a viola, a roseira
Um dia a fogueira queimou
Foi tudo ilusão passageira
48
Que a brisa primeira levou
No peito a saudade cativa
Faz força pro tempo parar
Mas eis que chega a roda-viva
E carrega a saudade pra lá
Roda mundo, roda-gigante
Rodamoinho, roda pião
O tempo rodou num instante
Nas voltas do meu coração
Roda mundo, roda-gigante
Rodamoinho, roda pião
O tempo rodou num instante
Nas voltas do meu coração
Roda mundo, roda-gigante
Rodamoinho, roda pião
O tempo rodou num instante
Nas voltas do meu coração
A partir do ano de 1968, acontecem mudanças que irão aterrorizar o Brasil. A partir
desse ano, a Ditadura mostra de vez suas garras. A repressão à liberdade de imprensa se torna
mais incisiva, a caça dos opositores ao Regime é mais dura e por vezes mortal. Manifestações
antigoverno eclodem pelo país, surge o CCC49 (Comando de Caça aos Comunistas). O Brasil
agora irá viver um dos piores momentos de sua história. Os “anos de chumbo” vem com muita
força, com a promessa de calar todo aquele que se opusesse ao Regime. E é nesse contexto que
Chico Buarque compôs uma de suas mais emblemáticas canções, “Cálice”, que foi censurada,
pois fazia de um jogo de palavras, para fazer uma crítica direta ao Regime e que por isso teve
sua divulgação proibida. Cálice tornaria uma canção de protesto, de contestação ao período que
o país estava enfrentado. Mas como ela já foi por vezes estudada e discutida, nossa pesquisa
mostra duas composições que também contestavam o Regime, mas que diferente de Cálice, não
sofreram com a censura.
Analisamos duas canções compostas antes da instauração do Ato Institucional
número cinco (AI-5). Foram feitas as análises de “Marcha para um dia de Sol” (1961) e de “A
Banda’ (1966), onde mostramos as ambiguidades contidas nas letras dessas duas canções, quais
49 Comando de Caça aos Comunistas (CCC) foi uma organização paramilitar anticomunista brasileira de
extrema direita, atuante sobretudo nos anos 1960 e composta por estudantes, policiais e intelectuais favoráveis ao
regime militar então vigente. O Comando de Caça aos Comunistas (CCC) era chefiado pelo advogado João Marcos
Monteiro Flaquer e recebia treinamento do Exército Brasileiro. CCC. Em Infoescola web site. Disponível em:
(http://www.infoescola.com/historia/comando-de-caca-aos-comunistas/). Acesso em 21/04/15.
49
as denúncias que elas faziam, e quais as mensagens Chico Buarque queria passar quando as
compôs. Para isso, fizemos um capitulo a parte para a análise e discursão dessas canções.
Figura 8- Em 2015, Chico Buarque lança mais um livro, “O irmão Alemão”, que já vendeu
cerca de 70 mil exemplares.
Fonte: Livraria Saraiva website50
50 Fonte: (http://img.estadao.com.br/thumbs/550/resources/jpg/4/0/1417675756604.jpg). Acesso em
20/05/2015.
50
Capitulo III
“Se todo mundo sambasse seria tão fácil viver”: As
ambiguidades nas canções de Chico Buarque
O discurso humano é assim mesmo, um composto de partes excessivas e
partes diminutas, que se compensam ajustando-se.
(Dom Casmurro, Machado de Assim, 1899)
Neste capitulo, explicaremos quais eram as mensagens contidas em duas canções de
Chico Buarque. Escolhemos como material de análise as composições “Marcha para um dia
de Sol” de 1964, e a tão consagrada “A Banda” de 1966.
Nelas, tentaremos mostrar as mensagens de inconformismo e as denúncias feitas
pelo compositor, mesmo que usando de ambiguidades para fazê-las.
Para Foucault:
O discurso não é simplesmente aquilo que traduz lutas ou os
sistemas de dominação, mas aquilo por que, pelo que se luta, o poder do qual
nos queremos apoderar. (1970, p-9)
E é sobre esse discurso envolto nas canções de Chico Buarque que dedicaremos esse
capitulo. De como mesmo em tempos de censura imposta pelo regime militar que governava o
Brasil, ele conseguia comunicar sua mensagem de insatisfação, denunciando a situação que
estavam passando os brasileiros.
Marcha para um dia de sol Chico Buarque/1964
Gravada por Maricenne Costa
Eu quero ver um dia
Nascer sorrindo
E toda a gente
Sorrir com o dia
51
Com alegria
Do sol do mar
Criança brincando
Mulher a cantar
Eu quero ver um dia
Numa só canção
O pobre e rico
Andando mão e mão
Que nada falte
Que nada sobre
O pão do rico
E o pão do pobre
Eu quero ver um dia
Todos trabalhar
E ao fim do dia
Ter onde voltar
E ter amor
Eu quero ver a paz
Tristeza nunca mais
Eu quero tanto um dia
O pobre ver sem frio
E o rico com coração
Eu quero ver um dia
Numa só canção
O pobre e rico
Andando mão e mão
Que nada falte
Que nada sobre
O pão do rico
E o pão do pobre
Eu quero ver um dia
Todos trabalhar
E ao fim do dia
Ter onde voltar
E ter amor
Eu quero ver a paz
Tristeza nunca mais
Eu quero tanto um dia
O pobre ver sem frio
E o rico com coração
52
Figura 9- Disco de Maricene Costa, com a primeira gravação de uma composição de
Chico Buarque.
Fonte: Instituto Antonio Carlos Jobim website51
Essa canção tratava de temas inovadores para a época, as questões sociais como o
desemprego e a moradia, por exemplo, como também, da divisão de classes. Nela Chico
Buarque enfatiza bem essa temática em versos como:
“Eu quero ver um dia
Numa só canção
O pobre e rico
Andando mão e mão
Que nada falte
Que nada sobre
O pão do rico
E o pão do pobre”
51 (http://www.jobim.org/chico/bitstream/handle/2010.2/431/CB3%20PrR%20053-60%202-2.jpg?sequence=1).
Acesso em 20/05/2015.
53
Essa estrofe evidencia a desigualdade social e econômica que existia no país. Já que
na década de 1960, segundo o IBGE52, havia cerca de 22,7 milhões de brasileiros
economicamente ativos, em uma população de pouco mais de 70 milhões de habitantes, ou seja,
menos de um terço da população do Brasil estava apto para o mercado de trabalho, mercado
esse que estava em um momento de transição, saindo do meio rural para o industrial.
Em uma tentativa de conter a inflação que chegou a 40,1%, o governo provoca a
diminuição dos salários (arrocho salarial) que acarreta no fechamento de centenas de pequenas
empresas, aumentando o número de desempregados. Em longo prazo, essa política econômica,
favoreceu apenas as classes e grupos que eram ou faziam parte da aliança golpista como a
burguesia industrial e as elites rurais.
Em outra estrofe da canção, Chico Buarque aborda outro problema que afetava e
ainda afeta o Brasil, a falta de moradia:
Eu quero ver um dia
Todos trabalhar
E ao fim do dia
Ter onde voltar
E ter amor
Eu quero ver a paz
Tristeza nunca mais
Eu quero tanto um dia
O pobre ver sem frio
E o rico com coração
Com o aumento das exportações e a implantação da indústria de produção de bens
duráveis (imóveis, carros e eletrodomésticos) na região Sudeste, principalmente no estado de
São Paulo, o Brasil começa a experimentar um leve crescimento econômico, o que gera uma
expectativa de melhora de vida para muitos cidadãos, que abandonam o campo e migram para
as cidades na tentativa de melhorar suas condições financeiras, gerando assim um aumento das
populações urbanas e trazendo vários problemas de infraestrutura. Na década de 1960 cerca de
treze milhões de pessoas migraram do campo para a cidade, o equivalente a 33% da população
rural da época. Isso trauxe vários problemas, já que muitas dessas pessoas não estavam
preparadas para trabalhar na indústria, pois na sua grande maioria esses migrantes vinham de
regiões pouco desenvolvidas na época como o Nordeste, e como grande parte não possuía
escolaridade para conseguir uma colocação na indústria ficavam desempregados e sem ter para
onde ir. Muitos partiram para trabalhos informais e moravam em habitações inapropriadas, as
52 Anuário estatístico do Brasil, 1964.
54
favelas tiveram um grande crescimento populacional nesse período. Temos como exemplo a
expansão das favelas na cidade do Rio de Janeiro da década de 1960:
Com o regime instaurado a partir do golpe ocorrido de 31 de março
para 1 de abril de 1964, a ideia da remoção de favelas ganharia um ímpeto
nunca tido antes. O “problema-favela” clamava, segundo autoridades e
setores da sociedade, por uma solução urgente, tendo o número de habitante
destas praticamente dobrado entre 1950 e 1960, passando de cerca de 170
mil moradores, correspondendo a 7,2% do total da população da cidade, para
335 mil, 10% da população total. (Ribeiro e Lago, 1991)
Marcha para um dia de sol explorava bem esses problemas. Chico Buarque não a
gravou porque não “acreditava” na canção, por se tratar de uma temática nova e que gerava
algum desconforto para os consumidores de música da época, pessoas que em sua maioria eram
de classes mais abastadas da sociedade. Outro empecilho para a não gravação foi o golpe de
1964. Com os militares no poder, o país era gerido por um regime político autoritário, o qual
agia muitas vezes de forma bruta contra os que se opunham a ele.
Os militares tomaram o poder para combater a “ameaça comunista” que segundo
eles, pairava pelo Brasil. Influenciados pela imprensa, uma parte da população passa a acreditar
que a tomada do poder pelos militares seria um modo de impedir que o país fosse tomado por
ideias e ideais comunistas:
As classes médias bombardeadas pelos discursos anticomunistas
da imprensa e de várias entidades civis e religiosas reacionárias acreditaram
piamente que Moscou tramava para conquistar o Brasil, ameaçando a
civilização cristã, as hierarquias “naturais” da sociedade e a liberdade
individual. (NAPOLITANO, 2014, p-55).
Em 1966, com 22 anos e com pouco mais de 30 músicas compostas, Chico Buarque,
que nesse ano havia ganhado o II Festival de Música Popular Brasileira da TV Record com “A
Banda”, tornava-se também o artista mais jovem a prestar depoimento ao MIS (Museu da
Imagem e do Som), que fundado em 1965, tinha como objetivo ser um qualificado centro de
documentação de música e imagem, foi também um centro cultural de vanguarda nas décadas
de 1960 e 1970. Lugar de encontros e de lançamento de ideias e novos cantores e compositores,
tendo as composições de Chico Buarque ainda que muito jovem como parte de seu acervo53.
53 Diposnivel em: (http://www.mis.rj.gov.br/acervo/). Acesso em 30/05/2015.
55
Em uma entrevista54 para os membros do conselho superior de música popular
brasileira, ele fala dos motivos pelos quais não gravou essa canção:
E - Dentro de todas as suas composições, qual foi a primeira gravada,
imortalizada?
C - Foi essa marchinha.
E - Você poderia exemplificá-la, rapidamente?
E - Letra e música sua? Qual o título?
C - É, Marcha para um dia de sol. (canta) Naquele tempo era novidade
falar de pobre e de rico, para mim era bom ... Depois ninguém queria
gravar. E quando veio a revolução foi pior, porque acharam que eu era
comunista, então não gravaram de vez mesmo.
Chico Buarque ainda estava no começo de sua jornada como cantor e compositor, e
não podia ser tachado de “comunista”, o que seria provavelmente o fim de sua tentativa de
ingressar no mundo artístico, dessa maneira, não gravou a canção.
O receio em fazer essa gravação não era tanto por medo de uma eventual perseguição
por parte de censores do Regime, já que pelo menos no seu início, o Brasil experimentou uma
ditadura “mais tolerante” - mesmo que por pouco tempo - essa em relação às manifestações
artísticas:
Os quatro primeiros anos dos militares no poder foram marcados
pela combinação de repressão seletiva e construção de uma ordem
institucional autoritária e centralista. Em outras palavras, a ordem autoritária
dos primeiros anos do regime militar brasileiro estava mais interessada na
blindagem do Estado diante das pressões da sociedade civil e na
despolitização dos setores populares (operários e camponeses) do que em
impedir completamente a manifestação da opinião pública ou silenciar as
manifestações culturais da esquerda. (NAPOLITANO, 2014, p-66)
Sendo assim, uma das razões da não gravação dessa canção foi mais “por não
querer”, do que “por não poder”. Ser tachado de comunista pela população poderia ser o fim
da carreira de qualquer um naquela época. Já que para muitos, devido à propaganda negativa
feita pelo Regime que fazia do comunismo uma ameaça ao estado brasileiro:
54 Entrevista. Em: Chicobuarque web site. Disponível em:(
http://www.chicobuarque.com.br/texto/mestre.asp?pg=entrevistas/entre_11_11_66.htm). Acesso em 10/03/2015.
56
O comunismo apresentava-se como uma implementação de
ditadura, como ameaça a religião e aos princípios ocidentais da civilização,
que vinculavam a sociedade brasileira à democracia. Afirma-se que a
doutrina comunista era, ao mesmo tempo, uma estratégia e “uma religião
cuja à máxima ambição é a de se opor às religiões clássicas, especialmente
a cristã, tendo em vista destruí-la e em seguida substituí-la. (MENDES,
2003, p-83).
Seria esse a questão do “não querer” citado acima, já que a grande maioria da
população tinha uma ideia tão negativa a respeito do comunismo, Chico Buarque não poderia
ser visto como comunista. Mas esse não seria o único motivo para ela não ter sido gravada.
Por abordar essa temática social com certa “ingenuidade”, Marcha para um dia de
sol foi apelidada de “João XXIII55”, que em 1961 e 1963 havia publicados as encíclicas56 Mater
et magistra e Pacem in terris, que continham mensagens de reflexão sobre os direitos e deveres
das pessoas, pregando a Paz de todos os povos na base da Verdade, Justiça, Caridade e
Liberdade. Esse deboche deixou Chico Buarque com certo desgosto, já essa era umas de suas
primeiras composições.
Pode ser que o tom conciliatório dessa canção seja derivado da participação de Chico
Buarque como membro da OAF (Organização de Auxílio Fraterno) quando estudou no colégio
Santa Cruz, pois nessa época, ele ia com frequência a Estação da Luz entregar comida e
cobertores aos moradores de rua. Em uma entrevista57 para o jornalista Tarso de Castro do
Jornal Folha de São Paulo em 1977, Chico Buarque faz uma menção ao trabalho que fazia com
essas pessoas:
Tarso - É, porque o Sérgio parece que mandava todo o mundo pra
Europa, não é? (risos), quando se irritava.
Chico - Aí, foi isso. Fui pro colégio interno e tal e passou. Agora,
isso de dizer que foi TFP é um pouquinho puxado. E se tivesse sido, também,
não teria preocupado de negar, entende? Agora, voltando ao negócio, estudei
em escola de padre e tudo. Também não tenho vergonha de dizer isso,
porque, inclusive, encontrei lá nessa escola um padre que me marcou muito
em termos de conhecer miséria mesmo, entende? Era um negócio que hoje
a gente olha de outro ponto-de-vista e tal e até acha muito ingênuo. Mas pra
formação de um cara, assim, de um garoto, achei até que foi um negócio
muito importante. Então, tinha um negócio chamado OAF - não sei se existe
ainda - Organização de Auxílio Fraterno. A gente ia de noite, assim um
grupo pequeno, com umas Kombis, à Estação da Luz, levar cobertor. A gente
55 O Papa João XXIII, ou São João XXIII pp, OFS, nascido Angelo Giuseppe Roncalli (Sotto Il Monte,
25 de novembro de 1881 — Vaticano, 3 de junho de 1963) foi Papa de 28 de outubro de 1958 até à data da sua
morte. Pertencia à Ordem Franciscana Secular (OFS) e escolheu como lema papal: Obediência e Paz. Em vatican
web site. Disponível em: (http://www.vatican.va/news_services/liturgy/saints/ns_lit_doc_20000903_john-
xxiii_po.html). Acesso em 16/04/2015. 56 Carta solene, dogmática ou doutrinária, dirigida pelo papa ao clero do mundo católico, ou somente aos
bispos de uma mesma nação. (Dicionário Aurélio) 57 Entrevista. Em: Chicobuarque web site. Disponível em
(http://www.chicobuarque.com.br/texto/mestre.asp?pg=entrevistas/entre_11_09_77.htm). Acesso em 12/03/2015.
57
olha hoje, e pode achar até uma bobagem. Mas pra um cara como eu que
morava ali no que seria Zona Sul de São Paulo, aliás, por coincidência
também zona sul, e que estudou em colégio de menino rico, de repente ter
essa missão, duas vezes por semana, era muito importante. Então a gente ia,
chegava com aqueles cobertores e o pessoal, os mendigos, fugiam
apavorados. (Folha de S. Paulo- 1977)
Marcha para um dia de Sol não era uma simples canção, foi composta mediante
experiências vividas pelo próprio compositor, que assim como os trabalhos de seu pai Sergio
Buarque de Holanda, Chico Buarque também descrevia as realidades do país. Pegando como
base “Raízes do Brasil”, ele faz uma macrointerpretação do cenário que vivenciava o país no
início da década de 1960. Já que como o próprio havia dito em entrevista para os membros do
MIS: “Naquele tempo era novidade falar de pobre e de rico”. Visto que as canções do fim da
década de 1950 eram composições que falavam de amor. Podemos dizer que Marcha para um
dia de Sol foi a primeira canção de Chico Buarque que denunciava uma realidade que não era
divulgada pelo governo do país.
Acompanhado por sua irmã Miúcha para o João Sebastião Bar, Chico Buarque canta
para os presentes a marcha. Esse bar na época era reduto de boa música, onde muitos artistas
se encontravam. Dentre eles estava Claudette Soares58, que ao ouvir a canção, prometeu que
iria gravá-la; aquilo deixou o jovem compositor muito feliz, pois ela era uma cantora de grande
fama na cidade, e ter uma música gravada por alguém assim iria impulsionar a sua carreira.
Mas para seu dissabor a gravação ficou só na promessa.
A essa altura ele já havia perdido o interesse por essa composição:
58 Começou sua carreira muito cedo: foi revelada no programa “A raia miúda”, de Renato Murce, na
Rádio Nacional. Apresentou-se no programa da Rádio Mauá chamado Clube do Guri, de Silveira Lima. Depois
também se apresentou no programa Papel Carbono, de Renato Murce. Na Rádio Tupi participou do programa
“Salve o Baião!”, conhecendo Luiz Gonzaga, o Rei do Baião. Ele a apelidou de Princesinha do baião. Ainda na
década de 1950, na Rádio Tamoio, ela apresentou ao lado de Ademilde Fonseca o programa “No mundo do baião”
(programa de Zé Gonzaga, irmão do Luís)
Silvinha Telles chamou-a para substituí-la como cantora na boate do Plaza, no final da década de 1950.
Dividiu o palco com Luiz Eça, João Donato, Baden Powell e Milton Banana e outros músicos. Participou do
programa de TV - Brasil 60, da apresentadora de TV e atriz Bibi Ferreira, pela TV Excelsior - canal 9, de São
Paulo. Divulgou as canções da Bossa Nova em São Paulo, nas casas noturnas Baiúca, Cambridge e João Sebastião
Bar. Inaugurou a boate Ela, Cravo e Canela, junto com o pianista Pedrinho Mattar, apresentando o espetáculo Um
show de show. Em 1967, compareceu ao programa de “TV Jovem Guarda” da TV Record, (Rede Record), canal
7 de São Paulo, ocasião em que interpretou Como é grande o meu amor por você (Roberto Carlos/Erasmo Carlos).
Casou-se com o músico Júlio César Figueiredo, em 1972. Seu grande sucesso, De tanto amor, foi um presente de
casamento dado por Roberto Carlos, que foi seu padrinho. Veio a se divorciar na década de 1990. Tinha um projeto
junto com Dick Farney de gravar uma série de músicas brasileiras, mas, com a morte do amigo, isso foi
abandonado. Claudette retomou à sua carreira artística, depois do seu divórcio. Fez turnês por Paris e Lisboa.
Biografia: Claudette Soares. Em: vanderproduções web site. Disponível em:
(http://www.vanderproducoes.com.br/claudettesoares/biografia.htm). Acesso em 18/03/2015.
58
Na última hora, saía o disco, eu procurava e não tinha a música, e eu
morria de triste [...] Ela foi gravada quando eu já não acreditava nela.
Quando eu acreditava nela, ninguém acreditava em mim, porque eu era
muito moleque. Quando parei de acreditar nela, eu já estava mais crescido,
então resolveram gravar — mas aí a música já não tinha mais sentido
nenhum... (HOMEM, 2009, p-15).
Marcha para um dia de sol foi composta em 1961, mas só foi gravada em 1964 na
voz de Maricene Costa59, porém Chico Buarque devido à frustração da promessa não cumprida,
não gostava mais dessa canção:
Nem João XXIII concorda com aquele tipo de ecumenismo social.
Não adianta conciliar rico e pobre, o negócio é não haver distinção.
(HOMEM, 2009, p-15).
Mesmo sem gostar, essa foi sua primeira canção a ser gravada, mesmo que na voz
de outra pessoa.
Marcha para um dia de Sol pode à primeira vista parecer uma canção simplória,
uma marchinha até um tanto infantil, como as bandas que o compositor via passar na rua de sua
casa, tocando a simplicidade da vida das pequenas cidades. Ela não possui a complexidade do
jogo de palavras de Construção, tão pouco as palavras de ordem cantadas em Cálice, compostas
numa fase mais madura. Ela trata de problemas vividos pela população brasileira, que estava
vendo o início de uma ditadura, sem saber que o pior estava por vir. E mesmo com mensagens
de igualdade entre classes, o que poderia ser vista como uma canção que incentivava o
comunismo.
Essa canção era imbuída do que seria uma recorrente em seus trabalhos: canções de
protesto. Por ainda estar no início de sua trajetória como cantor e compositor, e sendo mais
conhecido como o filho de Sérgio Buarque de Holanda do que como Chico Buarque, ele
arriscou-se compondo essa canção, visto que mesmo com uma ditadura ainda um pouco mais
59 Cantora paulista, natural de Cruzeiro, estreou na carreira artística em 1958, quando venceu o concurso
A Voz de Ouro, que lhe rendeu um contrato com a TV Tupi. No início da década de 60 atuou em casas noturnas
de São Paulo cantando repertório de bossa nova. Foi a primeira a gravar uma composição de Chico Buarque, a
"Marcha para um Dia de Sol", pela Philips em 1964. Depois disso foi para os Estados Unidos, onde foi ouvida por
nomes como Tony Bennett, Judy Garland e Eddie Fischer. Na volta ao Brasil chegou a vencer um festival da TV
Excelsior (com a música "Até Mais Ver", de Vitor Martins e C. Castilho) antes de trabalhar em teatro, na montagem
de peças como "Morte e Vida Severina" (João Cabral de Melo Neto) e "Adeus Fadas e Bruxas". Atuou também
em um projeto experimental baseado na obra do poeta francês Mallarmé. Em 1992 lançou "Correntes Alternadas",
com repertório eclético que incluía, entre outros, o grupo punk Inocentes, Tom Zé e Paulo Vanzolini. Neste mesmo
ano começou a elaborar o projeto que resultou no CD "Como Tem Passado!!", lançado em 1999 pela CPC-Umes,
que, com o auxílio do pesquisador José Ramos Tinhorão, reuniu doze músicas que representam as primeiras
gravações de doze estilos musicais brasileiros diferentes. Outro projeto de destaque foi o show "Sábios Costumam
Mentir" (1998), cujo repertório era constituído pelas parcerias do poeta e letrista Waly Salomão ao lado de
compositores como Caetano Veloso, Jards Macalé, João Bosco, Gilberto Gil, Lulu Santos e outros. Biografia:
Maricene Costa. Em: dicionariompb web site. Disponível em: (http://www.dicionariompb.com.br/maricene-
costa). Acesso em 18/03/2015
59
tolerante, corria-se o risco mesmo que mínimo de sofrer uma censura, que na maioria das vezes
não era imposta pelo regime e sim pela própria população que com medo, rejeitada tudo o que
parecia seguir ideias comunistas.
Marcha para um dia de sol mostra um Chico Buarque pouco conhecido. Ela não é
composta pelo cantor de fama nacional, que já havia ganho prêmios por suas composições, e
nem foi feita em meio do caos que enfrentava o Brasil com uma ditadura ríspida, que levava
seus opositores de encontro a morte ou ao desaparecimento. Essa canção foi feita por um Chico
Buarque, que guiado pelos trabalhos de seu pai, sonhava com um país mais igualitário para
todos os brasileiros.
A Banda Chico Buarque/1966
Estava à toa na vida
O meu amor me chamou
Pra ver a banda passar
Cantando coisas de amor
A minha gente sofrida
Despediu-se da dor
Pra ver a banda passar
Cantando coisas de amor
O homem sério que contava dinheiro parou
O faroleiro que contava vantagem parou
A namorada que contava as estrelas parou
Para ver, ouvir e dar passagem
A moça triste que vivia calada sorriu
A rosa triste que vivia fechada se abriu
E a meninada toda se assanhou
Pra ver a banda passar
Cantando coisas de amor
O velho fraco se esqueceu do cansaço e pensou
Que ainda era moço pra sair no terraço e dançou
A moça feia debruçou na janela
Pensando que a banda tocava pra ela
A marcha alegre se espalhou na avenida e insistiu
A lua cheia que vivia escondida surgiu
Minha cidade toda se enfeitou
Pra ver a banda passar cantando coisas de amor
Mas para meu desencanto
O que era doce acabou
Tudo tomou seu lugar
Depois que a banda passou
E cada qual no seu canto
Em cada canto uma dor
Depois da banda passar
Cantando coisas de amor
60
Era julho de 1966. Chico esperava o almoço, em casa, quando escutou
(ou imaginou ter escutado) o som de uma banda nos fundos de sua casa em São
Paulo. Imediatamente veio à sua cabeça a imagem de uma banda passando e várias
coisas acontecendo. Tinha visto bandas na infância, perto de sua casa, em São
Paulo, ou da pequena cidade de Cataguases, onde ficou seis meses no internato,
aos 17 anos. Viu banda também na troca da guarda do palácio de Buckingham,
quando visitou Londres. Sua memória era povoada de bandas. Esqueceu o almoço
e a fome, pegou o violão, papel na mesa e, assim, de uma vez só, escreveu quase
toda a letra da canção que o consagraria: “A Banda”. (ZAPPA P-119)
Figura 10- Em 1967, Chico Buarque lança um dos seus maiores sucessos, “A Banda”.
Fonte: Jornal O Globo website60
Animado com sua composição, Chico Buarque vai para o Sandchurra, um bar da Galeria
Metrópole no centro de São Paulo, reduto de encontro de jovens artistas da época. Lá, encontra-
se com Torquato Neto61, Gilberto Gil e Caetano Veloso, que mostraram a canção “Ensaio
Geral” a Chico Buarque. Mais que empolgado com sua criação, canta a marchinha mesmo que
incompleta.
Mesmo achando a composição do amigo uma forte candidata, Chico Buarque
inscreve sua canção no II Festival de Música Popular Brasileira, que aconteceria em Setembro
60 (http://og.infg.com.br/in/6901342-036-103/FT1500A/550/2004-037507-_19661023.jpg). Acesso em
20/05/2015.
61 Torquato Pereira de Araújo Neto (Teresina, 9 de novembro de 1944 — Rio de Janeiro, 10 de novembro
de 1972) foi um poeta, jornalista, letrista de música popular, experimentador da contracultura brasileiro. Biografia
– Torquato Neto. Em: dicionáriodampb web site. Disponível em: (http://www.dicionariompb.com.br/torquato-
neto/biografia). Acesso em: 16/10/2014.
61
e Outubro na TV Record. Ele terminou sua composição em uma semana, pois, segundo o
próprio compositor “Não queria deixar a banda tocando para sempre na rua” (HOMEM, P-41).
O que o jovem compositor, que na época tinha apenas 23 anos, não imaginava, seria
o sucesso estrondoso que “A banda” faria. No festival, ela foi defendida na voz de Nara Leão.
A canção chegou à final, tendo como concorrente a composição de Theo de Barros e Geraldo
Vandré “Disparada62”, interpretada por Jair Rodrigues:
“A polarização entre “A banda” e “Disparada”, defendida por Jair
Rodrigues, ganharam uma dimensão inimaginável, a ponto de o jornal O
Estado de S. Paulo escrever: “desde o finzinho de Setembro, só duas torcidas
contam: a da Associação Atlética Disparada e a da Banda Futebol Clube”.
A expectativa era tão grande que alguns teatros e cinemas chegaram a
suspender suas sessões.” (HOMEM, 2009, p-42).
A final do festival acontece no dia 10 de Outubro de 1966, no Teatro Record. A
plateia estava dividida entre as duas composições. A tensão era tanta que Chico Buarque sugeriu
que o prêmio fosse dividido entre as duas canções. Esse seu pedido foi atendido, pois havia um
receio dos produtores em que ele não fosse receber o troféu sozinho, e como aquele festival era
transmitido pela tevê, eles não podiam deixar que terminasse em confusão.
Em apenas três dias, o compacto com a música lançado por Nara vendeu cerca de
50 mil cópias; uma semana depois já eram mais de 100 mil. A agenda de Chico ficou cheia de
shows e por diversas vezes ele se viu obrigado a desfilar em carros de bombeiro nas cidades
por onde passava. Ele se tornara a própria banda encarnada. Rubem Braga saudou a canção e
Carlos Drummond de Andrade lhe dedicou uma crônica entusiasmada. Eis um trecho: “A
felicidade geral com que foi recebida essa banda tão simples, tão brasileira e tão antiga na sua
tradição lírica, que um rapaz de pouco mais de vinte anos botou na rua, alvoroçando novos e
velhos, dá bem a ideia de como andávamos precisando de amor [...] Não de ARENA nem do
MDB, sou desse partido congregacional e superior às classificações de emergência, que
encontram na banda o remédio, a angra, o roteiro, a solução”. (SILVA, 2004, p-39).
62 As músicas de Geraldo Vandré fazem parte de um Brasil marcado pela contracultura juvenil num
contexto de contestação política, perseguições, anseios de mudança, num mix de medo e esperança. É impossível
desvincular a música Disparada (1966) ao contexto do golpe civil-militar daquele período. Analise: Disparada.
Em: Cafecomsociologia web site. Disponível em: (http://www.cafecomsociologia.com/2014/05/analise-da-
musica-disparada-1966.html). Acesso em 16/10/2014.
62
Figura 11 - Chico Buarque e Quarteto CY em 1967, 4º Festival da Canção.
Fonte: 50 e mais Blogspot63
Mesmo em tom de deboche, Nelson Rodrigues faz uma “exaltação” à canção em sua
coluna no jornal O Globo:
“Imaginem vocês que, um dia desses, entro em casa e encontro
minha mulher, Lúcia, e a minha filhinha Daniela, com olhos marejados.
Acabavam de ouvir “A banda”, ou seja, a mais doce música da Terra. Dias
depois, eu próprio ouvi a marchinha genial. E a minha vontade foi sair de
casa, me sentar no meio-fio e começar a chorar. Com “A banda”, começa
uma nova época da música popular no Brasil”. (HOMEM, 2009, p-45).
Mesmo sendo saudada por figuras tão opostas como Nelson Rodrigues e Carlos
Drummond de Andrade, a canção “A banda” não se tornou um unanimidade nacional como
parecia. Havia quem visse no lirismo e na singeleza da canção um “retrocesso”, pois na época,
exigia-se um engajamento político dos artistas e “A banda”, não estava nessa linha de
pensamento, por isso, foi julgada por alguns como “alienada”.
O próprio Chico Buarque, em entrevista à rádio do centro de cultura de São Paulo
esclarece que foi de caso pensado a composição de “A banda”:
63 (http://www.50emais.com.br/artigos/chico-buarque-e-o-mpb-4-cantando-roda-viva-1967/). Acesso em
20/05/2015.
63
Quando compus “A banda” eu me lembro que – pra não dizer que
havia unanimidade – havia, sim, uma discreta condenação por parte da
esquerda que ainda insistia em ouvir o grito do Opinião, o grito de um
“carcará” e tal. A Nara Leão, aliás, me acompanhou nesse movimento,
porque ele também já estava um pouco cansada dessa tal música de protesto
que se fazia então, que não passava das portas do teatro e que, no fim das
contas era ineficaz. “A banda” era uma retomada do lirismo, proposital
mesmo, porque eu não era tão inocente assim quanto parecia. Eu tinha um
passado – também discreto, porque eu era muito garoto – de luta estudantil.
(HOMEM, 2009, p-46).
Essa canção ainda lhe rendeu um programa na TV Record, ao lado de Nara Leão,
Chico Buarque estrela “Pra ver a banda passar” (1967), mas sua performance tímida fez com
que sua carreira como apresentador não fosse longe.
Figura 12- Lp “Chico Buarque de Holanda” 1966.
Fonte: Instituto Antonio Carlos Jobim website64
64(http://www.jobim.org/chico/bitstream/handle/2010.2/1129/chico%20buarque%20de%20hollanda%2
0vol1.capaCD.jpg?sequence=2). Acesso em 20/05/2015.
64
Uma surpresa nada agradável que também envolveu essa canção foi seu uso em
propaganda do governo, que convocava os jovens para o alistamento militar. Ao ver isso, Chico
Buarque protesta, fazendo com que a propaganda fosse retirada do ar. Esse fora um dos embates
com o Regime Militar que o cantor travou, mas outros ainda haveriam de vir.
Mesmo dizendo que tinha “cansado” dessas canções de protesto, e que “A Banda”
tinha sido feita propositalmente para sair um pouco dessas questões políticas, podemos perceber
que mesmo em tom simplista, a marchinha buarquiana é sim cheia de duplicidade,
características de suas canções. Podemos destacar na letra dessa canção várias frases ou
palavras que de certa forma traziam essas ambiguidades.
Na primeira estrofe da canção:
“Estava à toa na vida
O meu amor me chamou
Pra ver a banda passar
Cantando coisas de amor”
Podemos destacar a frase: “Cantando coisas de amor”. Por que a banda precisaria
cantar coisas de amor no Brasil dos anos de 1960?
Com o poder dado pela nova constituição que fora aprovada no fim de 1966 e início
de 1967, o governo militar opera com dureza e sem piedade – diferentemente dos primeiros
anos do golpe - contra aqueles de dele discordavam. Dois casos ocorridos no ano de 1966
deixam claro que agora começariam o que viria a ser conhecido como os “anos de chumbo”
vividos no Brasil.
O primeiro caso se dá no Rio de Janeiro. O “Massacre da praia vermelha” como
ficou conhecido, foi a invasão por forças policiais do regime ao prédio da Universidade Federal
do Rio de Janeiro (UFRJ). No interior do prédio haviam cerca de seiscentos estudantes, que
foram brutalmente espancados no intuito de evacuarem as instalações. O motivo de tamanha
hostilidade por parte da polícia, teria sido pelo fato de os estudantes “ousarem” se rebelar
pedindo a autonomia da universidade e em favor de uma sociedade justa e solidária.
Um dos fatores para essa rebelião seria o acordo MEC-USAID. Assinado em 1966,
que foi um acordo do governo brasileiro com a USAID (Agency for International Development)
65
uma agência americana criada durante o período da Guerra Fria para auxiliar países
subdesenvolvidos:
O pano de fundo da contribuição técnica para o ensino superior se
transformar em prioridade da USAID foi o conflito EUA versus URSS, pois
a chave para que o Brasil permanecesse uma sociedade livre e um país amigo
próximo dos EUA estava no ensino superior. (PINA, 2008, p-01).
No início da Ditadura, o Brasil estava em péssima situação econômica, recebendo
assim ajuda dos EUA que temiam que o país se transformasse como ocorrera em Cuba e se
tornasse comunista. Esse auxilio dado pelos norte-americanos se deu devido à falta de dinheiro
dos países subdesenvolvidos possuíam, e isso implicava na não compra de produtos
industrializados americanos:
Agência norte-americana para o desenvolvimento internacional,
agência bilateral responsável pelas reações estabelecidas entre os EUA e os
países periféricos, que contribuiu decisivamente na ordenação, regulação e
concretização de parte da retórica da aliança para o progresso, construindo
as decisões quanto às doações e empréstimos em favor dos países periféricos
e realizando um novo ajuste entre os países capitalistas. (PINA apud
SOLANGE, 2008, p-01).
Assim, o “Acordo MEC-USAID de Assessoria do Planejamento do Ensino Superior”
como ficou conhecido, seria uma maneira dos EUA de manter a vigência do regime capitalista
nesses países e transferir as concepções de organização social, econômica e política que
prevalecia nos Estados Unidos.
O discurso do Presidente Humberto de Alencar Castelo Branco, no V fórum
universitário em Outubro de 1964, foi usado como pretexto para justificar esse acordo, para ele
a universidade:
Deveria preparar cidadãos de alto nível cultural que teriam a missão
de impulsionar o desenvolvimento do país. O estudante deveria, antes de
desejar um simples diploma, alcançar amplos conhecimentos que lhe
permitiriam ser elemento útil ao progresso e à prosperidade da sociedade.
Em contrapartida, na Universidade não se poderia permitir o fortalecimento
das ideologias. Era necessário um aperfeiçoamento da comunidade
universitária. (PINA, 2008, p-02).
Essa modernização da sociedade brasileira era um dos principais objetivos do
governo, e para alcança-la, o sistema educacional deveria caminhar neste sentido.
Mas esse acordo não agradou a UNE, que desde Abril de 1964 já operava na
clandestinidade, muito antes da aprovação de Lei n. 4.464 que ficou conhecida como Lei
66
Suplicy de Lacerda, a qual visava o controle, o esvaziamento ou a extinção do movimento
estudantil. Com isso a UNE segue na clandestinidade até 1968. No XXVIII Fórum ocorrido em
Junho de 1966 em Belo Horizonte – MG, os estudantes afirmaram que “o governo militar
propõe para a universidade, uma universidade e um universitário inteiramente distantes e
alienados dos problemas do seu país e do seu povo”. Segundo eles, o governo não queria formar
cidadãos pensantes e sim uma sociedade empresarialista, onde as cursos como engenharia,
medicina e treinamento empresarial, se sobressaíssem aos demais.
GOERTZEL em seu livro: MEC-USAID: Ideologia de desenvolvimento americano
aplicado à educação superior brasileira” (1967), deixa claro o porquê dessa preferência pelo
empresarialíssimo:
Quando os empresários recomendam, com empenho, que as
universidades sirvam à sociedade, querem dizer servir aos grupos dirigentes
da sociedade. (GOERTZEL, 1967, p-126).
Na concepção dos estudantes, esse convênio levaria as universidades uma estrutura
arcaica e empresarial, e não era isso que eles queriam, assim como os estudantes vítimas do
“Massacre da praia vermelha”, o restante dos universitários queriam: “Uma universidade
crítica, autônoma, queriam a democratização do ensino, a gratuidade de todos os níveis,
vestibulares de habilitação e não de seleção e a expansão dos cursos noturnos” (PINA, 2008, p-
06).
Em 1968 Carlos Marighella65 escreveu “Chamamento ao povo brasileiro”, no qual
faz uma citação a esse acordo, o qual ele acreditava que levaria a uma privatização do ensino
no Brasil:
O acordo MEC-USAID vem sendo posto em prática pela ditadura,
com o propósito de aplicar em nosso país o sistema norte-americano de
ensino e de transformar nossa Universidade em uma instituição de capital
privado, onde somente os ricos posam estudar. (PINA apud MARIGELLA,
2008, p-06).
Por fim, o acordo MEC-USAID foi um retrocesso na educação brasileira, visando
priorizar o ensino de informações factuais em detrimento de reflexão e análise, esse novo
modelo de ensino não permitia ao aluno questionar, ao contrário, matérias que estimulavam o
65 Carlos Marighella (Salvador, 5 de dezembro de 1911 – São Paulo, 4 de novembro de 1969) foi um
político e guerrilheiro, um dos principais organizadores da luta durante a ditadura militar a partir de 19641 tendo
em vista a implantação de um regime comunista. Chegou a ser considerado o inimigo "número um" da ditadura.
Biografia: Carlos Marighella. Em: PCB.ORG web site. Disponível em:
(http://pcb.org.br/fdr/index.php?option=com_content&view=article&id=327:breve-biografia-de-
marighella&catid=6:memoria-pcb). Acesso em 04/05/2015.
s
67
senso crítico foram reduzidas como no caso da disciplina de história, e outras foram retiradas
do currículo, como filosofia e sociologia.
O outro fato que ocorrera no mesmo ano, e que também mostra a crueldade cometida
contra os que se opunham ao regime, foi “O caso das mãos amarradas”, como ficou conhecido
o crime cometido contra o Sargento Manoel Raimundo Soares, morto na Ilha Presídio, no Rio
Guaíba. Seu corpo fora achado boiando nas margens do rio Jacuí com os pês e mãos atadas em
24 de Agosto de 1966.
No ano de 1953 o jovem Manoel Raimundo Soares, ingressa no exército, antes de
completar um ano de corporação, já ocupava a patente de Terceiro Sargento.
No ano de 1963, ele já respondia a um inquérito militar pelo acusado de desviar
armas e de agregar sargentos a sua causa. Defensor das reformas de base, foi transferido do Rio
de Janeiro para o Mato Grosso. Assim que o golpe militar foi dado, ele teve sua prisão
decretada, mas fugira antes que ela fosse cumprida.
Entre 1964 e 1966, Raimundo Soares viveu na clandestinidade. Envolvido com a
militância política e na luta pela redemocratização, ele fugiu do Mato Grasso para Porto Alegre-
RS, onde teve seus passos rastreados por agentes do DOPS, quem em uma emboscada em março
de 1966 o prenderam:
Preso, ou melhor, sequestrado - já que a prisão de Manoel Raimundo
foi negada pelos responsáveis até sua morte - foi conduzido à Polícia do
Exército e depois ao DOPS/RS. Na 6ª Cia. de Polícia do Exército, teve início
o suplício físico: foi duramente espancado por um tenente e um sargento,
chegando ao DOPS, horas mais tarde, com a visão do olho esquerdo
comprometida em função do tratamento recebido. (ROSA, 2008, p-02).
No dia 19 de março ele é transferido para a ilha presídio, localizado na ilha de Pedras
Brancas. Retornou ao DOPS em 13 de agosto, onde na mesma noite fora transferido para o
DOPS do Rio Guaíba, seria a última vez que o Sargento Raimundo era visto, até o aparecimento
do seu corpo no dia 24 do mesmo mês.
Companheiro do Sargento durante seus dias no DOPS, o estudante de agronomia da
UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul) Luís Renato Pires de Almeida, que
passou cerca de 19 dias sem ver a luz do sol, tomar banho ou comer direito, havia sido preso
por “ligações com o esquema subversivo de Leonel Brizola66” e levado a ilha presidio, onde
66 O “esquema organizado por Leonel Brizola” era a Rede de Legalidade, que unia uma cadeia de rádios
à resistência do 3º Exercito, para garantir a posse de João Goulart na Presidência da República em agosto/setembro
de 1961. (Aguiar, Flavio, Crônicas do mundo ao revés / Flavio Aguiar – São Paulo: Biotempo, 2011, p 107)
68
conheceu o Raimundo Soares, que por algum tempo dividiram o cárcere e sofrimento juntos.
Deitado em um colchão nos corredores do DOPS, estava o Sargento, com marcas de
espancamento nítidas, as duas da manhã ele foi levado para mais um sessão de tortura, essa
tática era comum dos torturadores:
Esses intervalos são premeditados pelos algozes no intuito de deixar
ao supliciado “um tempo aparentemente vazio que deve lhe permitir
recuperar-se fisicamente e ‘refletir’ sobre as vantagens da capitulação.
(Viñar, 1992, p.-77).
As marcas da tortura já eram abundantes no corpo de Raimundo Soares, e as dores
não o deixavam esquecer que a tortura logo se reiniciara:
“Às 8h da manhã, Manoel Raimundo Soares ainda sofria violência.
Era queimado a ponta de cigarro, que os policiais apagavam lentamente
sobre as suas carnes. Recebia pontapés e pauladas (...) foi posto no pau-de-
arara. Recomeçaram as torturas do cigarro aceso. O Delegado Itamar passa
a bater com os fios. Findo o tratamento, Soares parece um trapo. Ele ainda
está só de cuecas, as costas a sangrar e uma das vistas fechada...Levam-no
então para a sala do fiscal Olinto, chefe da guarda do DOPS. Está semi-
inconsciente. O fiscal Olinto passa a chutá-lo com violência e exibe
ameaçadoramente um facão. Faz uma advertência:
- Como é? Já melhorou? Estás pronto para outra?
Luís Renato é o preso mais antigo. Por isso é incumbido pelo
delegado José Morsch de servir um cafezinho a Soares. Luís Renato
estocado ao rever Soares após a sessão de torturas. Morsch explica por que
deseja dar café ao preso:
- Quero que esse homem recuperado logo. Hoje à noite ele vai contar
o que sabe.
Ao chegar à sala para servir o café, Luís Renato depara com Soares
deitado no chão e com uma poça de água em volta. Ao lado ainda está o
balde. Os policiais jogaram água para reanimá-lo.
(...)
As torturas prosseguem nos dias seguintes. Os policiais insistem em
saber o endereço do tal sargento Leony. A cada negativa a violência é
intensificada. Pedaços de tijolos e pedras são amarrados a tiras de pano, para
golpes mais fortes.
No reencontro com Luís Renato, Soares desabafa:
- Esses caras querem a.. de um endereço que eu não sei. Se eu for
torturado novamente vou morrer. Não aguento mais.” (ROSA, 2008).
Já em liberdade, Luís Renato Pires de Almeida escreve a um parente. Nessa carta,
ele faz um pedido de dinheiro a família, pois estava com vontade de cursar jornalismo. Mas ao
saber da morte do amigo de prisão ele relata:
Os filhos da puta desses traidores da Pátria mataram, afogado e com
as mãos amarradas atrás, o sargento Soares, que tanto tempo esteve preso
69
comigo, e ao qual deixei roupas, aparelho de barba e outras coisas. O
assassinato foi aí em Porto Alegre e mais ou menos sei quem deu esta ordem.
Esses são os homens bons que estão no governo, que vão à missa aos
domingos e que durante as madrugadas torturam seus semelhantes como se
fossem animais, para depois matar da maneira mais covarde possível.
Quanto mais sacrifício passarem os companheiros, mais disposição nós
temos para enfrentar os traidores fascistas. (Jornal “Última hora” setembro
de 1966).
Esse relato de Luís Renato era um resumo de como os agentes da repressão
conseguiam obter confissões dos presos, por meio de torturas muitas vezes levada ao extremo
como no caso de Raimundo Soares que veio a falecer devido aos maus tratos ao qual era sujeito
dentro da prisão.
Para Foucault: “a confissão constitui uma prova tão forte que praticamente
“desobriga o acusador do cuidado de fornecer outras provas” Foucault (2002, p-34). E é por
uma confissão que o Sargento Raimundo Soares é espancado até a morte. E tem seu corpo
jogado no rio Jacuí.
O “caso das mãos amarradas”, foi o um dos primeiros caso de tortura e morte por
parte dos órgãos de repreensão de que se teve notícia. A repercussão da morte de Raimundo
Soares foi tão grande, que em 12 de Abril de 1967, foi criada na Assembleia Legislativa gaúcha
uma Comissão Parlamentar de Inquérito para investigar a morte do Sargento. Tendo como
principais acusados pelo crime, os delegados José Morsch e Itamar Fernandes de Souza, que
foram denunciados por Luiz Renato, e que ao fim do inquérito, foram responsabilizados pela
morte do Sargento Raimundo Soares.
Durante o tempo em que estiveram presos, Luiz Renato conta a CPI que seu colega
de cárcere tinha plena ciência de que os que eles estavam passando seria apenas o início, como
se o Sargento previsse o período mais duro vivido na história recente do Brasil:
No fim de tudo, nós vamos nos encontrar. Não somos os primeiros
a sofrer torturas nem seremos os últimos. Se morrermos não seremos os
primeiros nem os últimos. Isso faz parte da nossa luta. (Manoel Raimundo
Soares, 1966).
O “Massacre da praia vermelha”, o “Caso das mãos amarradas”, todos eles se
deram no mesmo ano em que Chico Buarque compôs “A Banda”, quando ele na primeira estrofe
fala que a bandinha passa cantando coisas de amor, seria uma forma do compositor de alertar
aos ouvintes a violência que estava acontecendo no país, torturas e perseguições eram
constantes, e cabia a população tomar alguma atitude contra isso, para que os gritos de dor
70
vindos dos porões da ditadura, fossem trocados com por gritos de amor. Para que assim como
na segunda estrofe da canção:
A minha gente sofrida
Despediu-se da dor
Pra ver a banda passar
Cantando coisas de amor
No decorrer da canção, Chico Buarque lista uma série de personagens que a primeira
vista apenas compõe o cenário por onde a sua bandinha passa, mas será mesmo que esses
personagens descritos por ele são apenas coadjuvantes na marchinha, ou eles são mais
ambiguidades buarquianas?
Podemos destacar nas estrofes que se seguem alguns personagens como: “O homem
sério que contava dinheiro”, “A namorada que contava estrelas”, “A moça triste”, “O velho
fraco” e a “Moça feia”, todos esses personagens foram introduzidos nas canção com algum
proposito, faremos uma análise de cada um deles, e o que eles representavam.
O homem sério que contava dinheiro:
Com o país expandindo sua indústria de produção de bens de consumo, era de se
esperar que a renda da população acompanhasse essa expansão, mas o que se nota é que houve
um declínio na renda do trabalhador, muito devido ao arrocho salarial promovido pelo governo
militar, sem falar no aumento de desempregados. Isso como foi explicado no início deste
capitulo, gerou um crescimento desordenado das favelas.
O estudo de Barros, acerca da desigualdade de rendimentos, observa
que os 20% mais ricos da População Economicamente Ativa (PEA)
brasileira aumentaram sua fração na apropriação da renda de 54% para 62%,
de 1960 a 1970, enquanto a fração apropriada pelos 50% mais pobres
declinou de 18% para 15% nesse mesmo período. (CÔRREA E CASTRO,
2000, p-66).
Com isso, Chico Buarque mostra que a figura do homem que contava dinheiro, nada
mais era que as elites que apoiavam o governo militar e que desse apoio tiravam proveito, como
no caso das elites rurais, que se sentiram ameaçadas pelo governo de João Goulart que queria
implantar a reforma agrária no Brasil, o que acarretaria numa perca de rendimentos e terras dos
grandes latifundiários. Com medo que essa reforma fosse feita, essa elite na sua grande maioria
apoiava o regime. Então, esse homem rico poderia ser um grande proprietário de terras que
enriquecera com o golpe, e que ao ver a banda percebera que algo novo estava por vir.
71
A namorada que contava estrelas e A moça triste:
Podemos identificar esses dois personagens como o antes e o depois da
mesma pessoa. A namorada que contava estrelas seria uma alusão as pessoas que tinham
seus filhos, maridos ou outros parentes presos pelos agentes do regime, e aos que
ficavam só bastava “contar estrelas”, esperar que eles voltassem para seus lares, o que
por vezes não acontecia. No relatório final da Comissão da Verdade67, estimasse que
cerca de 210 pessoas desapareceram durante a ditadura militar.
Esse “contar estrelas” seria uma forma de mostrar a espera por vezes desesperadora
dos parentes de presos do regime militar. Um relato dessas pessoas que esperavam pela volta
de familiares, pode ser visto no livro do jornalista e historiador Claudio Blanc: “Ex-Presos
Políticos: Memórias e Conquistas” (2014). Nele destaca-se o depoimento da professora Rosa
Maria, filha do preso político, o advogado Raphael Martinelli. Em seu relato, Rosa Maria
conta como era seus encontros com seu pai durante o período em que ele esteve preso:
Nós sofremos muito na época do golpe, quando ele foi preso. Eu era
ainda muito menina, tinha 8 anos. Tenho memórias daquele período, em que
o visitava na prisão e não o reconhecia. Ele estava machucado, magro,
barbudo. Era uma pessoa irreconhecível para mim. Como menina, não sabia
do que se tratava, apenas cresci com uma infância silenciosa. Eu era filha de
comunista, e isso era palavrão na época. Essas coisas que a ditadura promove
se estendem aos filhos e familiares. (BLANC, 2014, p-56).
Percebe-se que o impacto dessas prisões afetava toda a família. E que como fala a
letra de “A banda”, só restava contar estrelas.
O outro lado dessa personagem seria a “A moça triste”. Essa moça representava
uma faceta recorrente durante o período em que o país esteve sobre a égide do governo militar.
Essa moça trazia um semblante de tristeza em seu rosto pois diferente da que contava estrelas,
ela não tinha mais por quem esperar.
67 A Comissão Nacional da Verdade foi criada pela Lei 12528/2011 e instituída em 16 de maio de 2012.
A CNV tem por finalidade apurar graves violações de Direitos Humanos ocorridas entre 18 de setembro de 1946
e 5 de outubro de 1988. Conheça abaixo a lei que criou a Comissão da Verdade e outros documentos-base sobre o
colegiado. Em dezembro de 2013, o mandato da CNV foi prorrogado até dezembro de 2014 pela medida provisória
nº 632. Comissão da verdade. Em: cnv web site. Disponível em: (http://www.cnv.gov.br/index.php/institucional-
acesso-informacao/a-cnv). Acesso e, 09/05/2015.
72
Ela era o retrato de muitas pessoas que perderam seus parentes durante o regime
militar, “A moça triste” era uma mãe, irmã, esposa ou namorada de alguém que fora preso e
que nunca mais voltou para casa, ou que teve sua vida tirada pelo regime. Voltando ao caso
anterior, da morte do Sargento Manoel Raimundo Soares, podemos identificar na figura da
moça triste a própria esposa do sargento, Maria Elisabeth Challup Soares ou apenas “Betinha”,
que sofrera por meses com a prisão do marido “contando estrelas”, até que no dia 24 de agosto
de 1966 torna-se “a moça triste”, pois o corpo do seu marido é encontrado boiando no rio Jacuí.
Não podemos afirmar que esses dois personagens compostos por Chico Buarque
tenham sido inspirados na história do Sargento Manoel Raimundo Soares, que seriam um misto
de homenagem e denúncia que o compositor fizera referente ao “caso das mãos amarradas”,
mas podemos sim destacar essas duas figuras como uma triste e dura realidade que o país
começaria a enfrentar.
Nessas personagens Chico Buarque exprime sua indignação mesmo que em forma
de poesia com as mortes e os desaparecimentos comandados pelo governo militar. E deixa uma
mensagem de esperança para os parentes desses presos políticos:
A moça triste que vivia calada sorriu
A rosa triste que vivia fechada se abriu
E a meninada toda se assanhou
Pra ver a banda passar
Cantando coisas de amor
Chico Buarque dá a entender nessa estrofe, que por mais que demore, “A banda” vai
passar trazendo alegria e paz, cantado suas coisas de amor.
O velho fraco:
Podemos presumir que este personagem representava a política nacional, que estava
“fraca” de lutar contra o governo militar que assumira as rédeas do país.
Decretado em 5 de fevereiro de 1966, pelo então presidente Castelo Branco, o Ato
Institucional de nº3 (AI 3) como ficou conhecido, estabelecia eleições indiretas para
governadores, vice-governadores e prefeitos. Essa medida foi tomada devido a derrotas sofridas
pelo regime nas campanhas para o governo de Minas Gerais e Guanabara, que foi uma cidade-
estado brasileira que existiu de 1960 a 1975, e que ficava localizada no território da atual cidade
do Rio de Janeiro. Outro fator que motivou a instauração do AI 3, foi a derrota em 1965 do
regime nas eleições para prefeito da cidade de São Paulo; a perca da prefeitura da capital
paulistana foi mais dura para o governo militar, pois eles haviam perdido a cidade mais rica do
país para políticos ligados a Jânio Quadros e Juscelino Kubitschek, que eram seus opositores,
73
e seria justamente o antigo presidente, um dos responsáveis por fazer com que “o velho fraco
se esquecesse do seu cansaço” como canta Chico Buarque.
No mesmo ano de 1966, juntamente com Carlos Lacerda e João Goulart, nascia um
movimento de ordem civil que pretendia combater a centralização do poder que estava nas mãos
do poder executivo, que assumido pelos militares, o mantinha por uma política bipartidária
artificial. A “Frente Ampla” como ficou conhecido esse movimento, trazia um proposta
conciliadora, era como uma ponte entre o governo militar e a sociedade civil. Na sua criação já
trazia uma novidade, pois unira antigos adversários políticos como Kubitschek e Carlos
Lacerda, que no início apoiava o golpe de 1964, mas que agora estava descontente com o jeito
que o país estava sendo regido. Líderes dos três maiores partidos do Brasil antes do golpe e
sem ainda terem seus direitos políticos cassados pelo governo militar, Juscelino (PSD), Lacerda
(UDN) e Jango (PTB), agora se uniam para ser oposição ao regime68.
No manifesto da Frente Ampla, divulgado em 27 de Outubro de 1966, eles
anunciavam que a partir daquele momento, esses antigos adversários juntariam suas forças para
forçar ou pelo menos tentar forçar a redemocratização do país:
Com propostas que contemplavam os interesses de seu principal
representante, mas que também se apresentavam com uma difusa conotação
democrática, este movimento inicialmente tornou públicos, no dia 23 de
março de 1967, os elementos de seu “programa mínimo”, a saber:
a) restauração do poder civil
b) elaboração de uma constituição democrática, que contemple o direito de
greve e a pluralidade partidária e,
c) o reestabelecimento das eleições diretas para presidente, vice, governo do
Estado e prefeituras das capitais. (DEL VECCHIO, 2013, p-03)
O movimento da Frente Ampla, foi tentativa de trazer ao “velho fraco” (a política
nacional), seus áureos tempos de juventude, fazendo-o “subir ao terraço e dançar. Como numa
tentativa mesmo que frustrada, pois após a implantação do AI5, esse movimento teve suas
atividades encerradas, já que com as prisões, cassações de direitos políticos e exilio, os líderes
desse movimento tiveram que se ausentar da vida política nacional. A tão desejada democracia
teria que esperar mais um pouco.
68 Disponível em: (http://cpdoc.fgv.br/producao/dossies/Jango/artigos/Exilio/Articulacao_da_oposicao).
Acesso em 30/05/2015.
74
A moça feia:
Essa personagem era a principal, pois “A moça feia” poderia ser comparada ao
próprio Brasil, que tomado por um regime autoritário via-se “feio” devido as mudanças
provocadas pela ditadura.
A beleza tão cantada por Tom Jobim da “Garota de Ipanema” (1962), não era vista
no Brasil comandado pelo regime militar. Nem tão pouco o país descrito por Martinho da Vila
em “Aquarela Brasileira” (1964):
“Tudo é belo e tem lindo matiz.
No Rio dos sambas e batucadas,
Dos malandros e mulatas
De requebros febris.
Brasil, essas nossas verdes matas,
Cachoeiras e cascatas de colorido sutil
E este lindo céu azul de anil
Emoldura em aquarela o meu Brasil.”
O país pós golpe de 1964 passa por mudanças tão drásticas que perde um pouco da
sua beleza descrita em canções como essas. Com o aumento do número de pessoas
desempregadas, com sua economia abalada onde os índices de inflação chegariam a 40%, com
perseguições, mortes, desaparecimentos, direitos cassados, o Brasil torna-se “a moça feia” da
marchinha de Chico Buarque, o país fica na espera, “debruçada na janela” vendo a bandinha
passar.
A Banda:
Por fim, explicaremos quem ou o que seria essa “banda” tão citada na canção.
Usando de poesia, ele faz da bandinha que passa por toda a cidade, “cantando coisas de amor”,
um sonho quase que utópico pra época que o país vivia. Sobre o comando de um regime militar
autoritário, que usava muitas vezes de força para combater os que a ele se opunham, Chico
Buarque mostra a figura da banda como um sentido de esperança, como se ela fosse a liberdade
tão desejada por ele e por todos que eram contrários ao governo militar. Ele nessa canção usa
de sofismas para exprimir seu inconformismo com a atual situação que o Brasil vivia, como ele
conta em entrevista à Rádio Eldorado em 1989:
Toda uma criação condicionada ao país em que eu vivi. Tem
referências a isso o tempo todo. Existe alguma coisa de abafado, pode ser
chamado de protesto... Eu nem acho que eu faça música de protesto... mas
existem músicas aqui que se referem imediatamente à realidade que eu
estava vivendo, à realidade política do país. (MARTINS, 2005, p-07).
75
Nessa entrevista podemos notar que ele quando compôs “a banda” não estava tão
alheio assim a atual situação do país. Possivelmente inspirado em “Visão do Paraíso” (1959)
um dos livros de seu pai, Chico Buarque quer mostrar o Brasil idealizado por ele, como se cada
um dos personagens citados fosse um pouco de cada brasileiro, que assim como ele tinham
vontade de ver essa banda (liberdade) passar. Esquecendo-se por alguns instantes de todos os
males que passavam durante essa privação de direitos imposta pelo regime militar.
Quando ele compôs “a banda”, deve ter usado de sua vivencia obtida em todos os
lugares onde morou ou viajou, seja na Itália, seja na casa de sua avó no Rio de Janeiro, Chico
Buarque usa de sua música para tentar mudar o meio onde vivia, como ele mesmo explica em
entrevista à Revista 365 em 197669:
Eu acho que o homem vai ter que se modificar, pelo próprio instinto
de sobrevivência. Não acredito que isso vá acontecer por influência de um
indivíduo, muito menos por ordens superiores. A sociedade é que deve se
aperfeiçoar por uma dinâmica própria, de baixo pra cima, com a participação
da grande massa de indivíduos, certo? Quer dizer, o homem modificando a
sociedade para a sociedade modificar o homem. Isso pode parecer utópico,
mas, como eu já lhe disse, eu sou artista e não político; nem sociólogo. É
nessa utopia que entra a contribuição da arte que não só testemunha o seu
tempo, como tem licença poética pra imaginar tempos melhores. (Revista
365, 1976).
Esses lugares por onde ele passou estão embutidos mesmo que sutilmente em sua
canção. Esse lugar de onde se escreve, afeta o conteúdo do que se escreve, essa questão é
abordada em “A escrita da História” (1982) de Michel de Certeau. Nela Certeau explica a
importância de compreender o espaço social de onde se compõe a obra:
Toda pesquisa historiográfica se articula com um lugar de produção
sócio-econômico, político e cultural. Implica um meio de elaboração que
circunscrito por determinações próprias: uma profissão liberal, um posto de
observação ou de ensino, uma categoria de letrados, etc. Ela está, pois,
submetida a imposições, ligada a privilégios, enraizada em uma
particularidade. (CERTEAU, 1982, p-77).
Partindo dessa explicação, podemos presumir que quando compôs “a banda”, Chico
Buarque queria mesmo passar uma mensagem de inconformismo e de esperança ao mesmo
tempo. Mesmo correndo o risco de “exclusão” ou de “interdição” de seu discurso, como explica
Michel Foucault em “A ordem do Discurso” (1970):
Sabe-se bem que não se tem o direito de dizer tudo, que não se pode
falar de tudo em qualquer circunstância, que qualquer um, enfim, não pode
falar de qualquer coisa. (FOUCAULT, 1970, p-09).
69 Revista 365, 1976. Em: chicobuarque web site. Disponível em:
(http://www.chicobuarque.com.br/texto/entrevistas/entre_365_76.htm). Acesso em 18/05/2015.
76
Sendo assim, Chico Buarque usa da ambiguidade em sua canção. Ao mesmo tempo
que ele denuncia o momento pelo qual está passando o país, ele também traz a esperança de
dias melhores
77
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao término dessa pesquisa, podemos notar que as composições de Chico Buarque
mesmo antes do golpe de 1964 como no caso de “Marcha para um dia de Sol” ou após o golpe
como “A Banda”, traziam à tona personagens excluídos pela sociedade, mas que ganharam
notoriedade nas suas canções.
Em “Marcha para um dia de Sol” podemos ver que ele revela um Brasil desigual
como sua gente, seja pela falta de emprego, de moradia ou pela divisão de classes. Como
também em “A Banda” onde ele denuncia a violência, traz aos olhos do povo casos de torturas,
sequestros e até mortes cometidas durante o início do regime militar.
Mesmo antes da “canção de protesto” ser quase que uma obrigatoriedade para os
artistas do Brasil pós 1964, já que muitos reivindicavam o engajamento de todos das artes nos
protestos contra o governo militar, Chico Buarque já denunciava as mazelas pelas quais o povo
brasileiro passava, como ele mesmo disse em entrevista à Revista 365:
“Eu falava através de personagens, enxergava através de outros
olhos” (Revista 365,1976).
E era através dessa visão do outro, que em suas canções ele introduzia
propositalmente ou não mensagens de insatisfação, de contestação ao governo militar. Assim
como seu pai Sérgio Buarque de Holanda descreveu o país em seu livro “Raízes do Brasil”,
mostrando o Brasil de um ponto de vista sociológico, Chico Buarque também o descreve em
suas composições. É notório como sua arte traz à superfície problemas que estavam afastados
dos olhos da grande maioria da população, e como artista que era, sabia da importância de sua
opinião no contexto do pós 1964:
A ordem é uma palavra que não rima com a arte, nem nunca vai
rimar. Os artistas estão aí justamente para perturbar a ordem e nisso sempre
estiveram - não adianta agora querer mudar a História. De alguma maneira,
nós, os artistas, sempre vamos perturbar a ordem, e note que não estou
falando nem da arte diretamente política, do tipo “canção de protesto.
(MARTINS,2005, p-06)
Fica evidente na análise de “A Banda” que Chico Buarque se antecipou a alguns fatos
que só ocorreriam meses depois do lançamento da canção. Lógico que não tem nada de
78
sobrenatural nisso, pois por mais que suas canções tenham uma certa magia, de bruxo ele não
tinha nada.
Essa antecipação de fatos pode ser explicado no trabalho do historiador alemão
Reinhart Koselleck70, em seu livro “Futuro passado: contribuição à semântica dos tempos
70 “Reinhart Koselleck nasceu em Gorlitz na Alemanha, em 23 de abril de 1923. Doutor em 1954, teve
sua tese publicada em 1959, com o título Kritik und Krise (há traduções para o francês e o italiano). Seu campo de
investigação diz respeito à teoria da história e a aspectos da história moderna e contemporânea. Foi professor nas
universidades de Bochum (1966), Heidelberg (a partir de 1968) e Bielefeld (de 1973 até hoje). É autor de Presussen
zwischen Reform und Revolution (1967) e Vergangene Zukunft (1979), e co-autor de Das Zeitalter der
europaischen Revolution (1969), Geschichte-Ereignis und Erzahlung (1973), Objektivitat und Parteilichkeit in der
Geschichtswissenschaft (1977), Geschichtfche Grundbegriffe. Historische Lexikon zur politisch-sozialen Sprache
in Deutschland (desde 1972), Sprache und Geschichte (desde 1978). É ainda colaborador da revista Geschichte
und Gesellschaft.” Em: Estudos Históricos, Rio de Janeiro, vol. 5, n. 10, 1992, p. 134-146.
79
históricos” (1979), onde o autor explica que por meio do conceito de Horizonte de Expectativa
pode-se minimamente prever fatos que poderão ocorrer em um futuro próximo ou como
conceitua Koselleck, um “Futuro Presente”:
Podemos citar um exemplo simples: a experiência da execução de
Carlos I abriu, mais de um século depois, o horizonte de expectativas de
Turgot, quando ele insistiu com Luís XVI que realizasse as reformas que o
haveriam de preservar de um destino semelhante. O alerta de Turgot ao rei
não encontrou eco. Mas entre a Revolução Inglesa Passada e a Revolução
Francesa futura foi possível descobrir e experimentar uma relação temporal
que ia além da mera cronologia. A história concreta amadurece em meio a
determinadas experiências e determinadas expectativas. (KOSELLECK,
2006, p. 308-309).
Sendo assim, a antecipação de fatos que ocorreram após a composição de “A Banda”,
partiriam apenas da visão que Chico Buarque tinha de outros golpes que aconteceram na
América Latina, como por exemplo no país vizinho, a Argentina que sofrera seis golpes
militares: 1930, 1943, 1955, 1962, 1966, 1976.
Tendo a Argentina como exemplo, Chico Buarque podia presumir que a mesma
violência ocorrida durante os governos militares no país vizinho, podia acontecer no Brasil, e
como de fato ocorreram. E essa visão que ele tinha do futuro foi posta em suas canções.
Por fim, vemos que mesmo que não querendo se engajar diretamente na oposição ao
governo militar, Chico Buarque usa de sua arte para fazê-lo. Denunciando fatos ou apenas
expondo a situação do Brasil antes de depois do golpe de 1964, ele revela um país que muitos
não queriam ou não podiam enxergar devido a censura imposta pelo governo.
Foi com essas ações, usando da ambiguidade na composição de suas canções, de
pseudônimos para escapar da censura – como ocorreu com Julinho da Adelaide; que Chico
Buarque conseguiu passar a mensagem de que dias melhores ainda estavam por vir. Ele
consegue trazer na figura de uma simples banda a esperança para todo um país.
E é por usar de sua inteligência na escrita e de esperteza para se desviar da censura
que Chico Buarque de Holanda se dúvida alguma se torna um dos maiores compositores e
cantores da música brasileira de todos os tempos.
80
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