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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE INSTITUTO DE CIÊNCIAS DA SOCIEDADE DE MACAÉ DEPARTAMENTO DO CURSO DE DIREITO SAMARA BENIGNO LUIZ DA SILVA INFLUENCIADORES DIGITAIS: UMA ANÁLISE DO SEU IMPACTO NAS RELAÇÕES DE CONSUMO SOB A VISÃO DO DIREITO DO CONSUMIDOR Macaé 2018

UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE INSTITUTO … Final...Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Direito)- Universidade Federal Fluminense, Instituto de Ciências da Sociedade,

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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

INSTITUTO DE CIÊNCIAS DA SOCIEDADE DE MACAÉ

DEPARTAMENTO DO CURSO DE DIREITO

SAMARA BENIGNO LUIZ DA SILVA

INFLUENCIADORES DIGITAIS: UMA ANÁLISE DO SEU IMPACTO NAS

RELAÇÕES DE CONSUMO SOB A VISÃO DO DIREITO DO CONSUMIDOR

Macaé

2018

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SAMARA BENIGNO LUIZ DA SILVA

INFLUENCIADORES DIGITAIS: UMA ANÁLISE DO SEU IMPACTO NAS

RELAÇÕES DE CONSUMO SOB A VISÃO DO DIREITO DO CONSUMIDOR

Trabalho de Conclusão de Curso

apresentado ao curso de graduação em

Direito do Instituto de Ciências da

Sociedade de Macaé, pertencente à

Universidade Federal Fluminense, como

requisito parcial para obtenção do grau de

Bacharel em Direito.

Orientador:

Prof. Me. Cândido Francisco Duarte dos Santos e Silva

Macaé

2018

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S586i Silva, Samara Benigno Luiz da INFLUENCIADORES DIGITAIS: UMA ANÁLISE DO SEU IMPACTO NAS

RELAÇÕES DE CONSUMO SOB A VISÃO DO DIREITO DO CONSUMIDOR /

Samara Benigno Luiz da Silva ; Cândido Francisco Duarte dos

Santos e Silva, orientador. Macaé, 2018.

62 f.

Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Direito)-

Universidade Federal Fluminense, Instituto de Ciências da

Sociedade, Macaé, 2018.

1. Influenciadores digitais. 2. Direito do consumidor. 3.

Publicidade. 4. Sociedade de consumo. 5. Produção

intelectual. I. Título II. Santos e Silva,Cândido Francisco

Duarte dos, orientador. III. Universidade Federal Fluminense.

Instituto de Ciências da Sociedade. Departamento de Direito.

CDD -

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SAMARA BENIGNO LUIZ DA SILVA

INFLUENCIADORES DIGITAIS: UMA ANÁLISE DO SEU IMPACTO NAS

RELAÇÕES DE CONSUMO SOB A VISÃO DO DIREITO DO CONSUMIDOR

Trabalho de Conclusão de Curso

apresentado ao curso de graduação em

Direito do Instituto de Ciências da

Sociedade de Macaé, pertencente à

Universidade Federal Fluminense, como

requisito parcial para obtenção do grau de

Bacharel em Direito.

Aprovada em 08 de dezembro de 2018.

BANCA EXAMINADORA

_____________________________________________

Prof. Dr. Cândido Francisco Duarte dos Santos e Silva

Universidade Federal Fluminense

Orientador

_____________________________________________

Prof. Dr. Daniel Arruda Nascimento

Universidade Federal Fluminense

_____________________________________________

Prof.ª. Isabela Bichara de Souza Neves

Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro

Macaé

2018

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Ao Eterno, pois sem ele não há sentido.

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AGRADECIMENTOS

Gratidão torna-se uma palavra um tanto quanto redundante a essa altura da jornada. Neste

momento de encerramento é quase que inevitável olhar para trás e sentir vontade de agradecer

por cada passo, por cada etapa concluída, por cada vitória alcançada.

De certo não farei diferente, por isso, agradeço acima de tudo ao Eterno. Agradeço porque me

guiou e fortaleceu ao longo de toda caminhada, se certificando de que eu sairia ilesa ao final de

todas as provações pelas quais tive de passar nesses anos de graduação. Agradeço ao seu

cuidado em cada detalhe, desde o primeiro dia em que eu estava tão insegura até o presente

momento onde me mostro como alguém tão diferente, tão mais segura e capaz. A ideia de um

Deus pode ser vazia e sem sentido para muitos, pode até mesmo não significar nada para outros,

mas para mim é a certeza do sentido, do motivo e do porquê dessa vida.

Agradeço aos meus pais que mesmo com pouca instrução e posses sempre me conduziram ao

caminho da educação e conhecimento. Sou grata por respeitarem meus momentos de

afastamento para conseguir desempenhar com êxito as tarefas da faculdade, por quando

precisaram ouvir várias e várias vezes sobre conceitos que pouco lhes fazia sentido para que eu

pudesse compreender a matéria e pelo amor e carinho com que lidaram com todas as minhas

aflições quanto aos problemas que, por vezes, a universidade nos trás. Hoje eu posso afirmar

com certeza que sem os meus dois pilares de nome Sidnei e Suzana eu não poderia estar aqui

escrevendo o agradecimento do meu trabalho de conclusão de curso.

Sou grata pela minha irmã Suama que sempre torceu por mim e me incentivou a continuar, que

nunca desrespeitou o silêncio do qual eu precisava para desempenhar meus estudos e que

mesmo sem saber me serviu de incentivo para que eu pudesse ser sempre o melhor exemplo

que ela poderia ter, assim como uma irmã mais velha deve fazer.

Agradeço aos meus queridos avós Ivanil e Nilza, pois sem eles o caminho seria intensamente

árduo e pesado. Por muitas vezes foram o meu norte e o meu porto seguro para que fosse

possível retornar firme novamente às aulas. Sou grata por todo apoio, amor, investimento e

incentivo que sempre puseram em minha graduação, a eles sempre serei profundamente grata

de coração.

Agradeço ao meu tio, tia e prima que mesmo de longe me apoiaram, cuidaram, incentivaram e

foram importantes para que eu chegasse até aqui.

Uma figura essencial nessa caminhada, pela qual sou extremamente grata é o meu namorado

Lucas. Faltariam-me palavras e páginas para expressar o quanto o seu apoio foi importante para

que hoje eu estivesse aqui concluindo esse ciclo. Sou grata por todas as vezes em que me ouviu,

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por todas as vezes em que me apoiou, por acreditar em mim mesmo quando eu não consegui.

Agradeço a ele por me ajudar sempre que precisei, por fazer muito mais do que eu lhe pedi,

agradeço por ser meu sim quando tudo em volta me dizia não, agradeço por se manter de pé e

aguentar as tempestades por mim, me segurando quando as forças me faltavam. Agradeço a sua

parceria e saiba que sou a mulher mais feliz do mundo em saber que um dia serei sua esposa e

dividirei a vida com você.

Sou grata aos meus amigos de faculdade que tornaram a graduação tão mais leve, tão mais feliz

e tão mais intensa. Com vocês vivi momentos inesquecíveis e sou grata por saber que não se

trata de amizade de faculdade, pois terei a cada um de vocês para o resto da vida.

Agradeço também aos meus professores que tanto me serviram de inspiração nessa trajetória,

em especial ao meu orientador Cândido que sempre esteve disposto a ajudar, ensinar e apoiar.

Mesmo quando os momentos em sua vida não eram nada fáceis, esteve sempre com sorriso no

rosto e pronto a orientar da maneira mais diligente possível, saiba que seu amor ao magistério

me inspira e sempre será minha referência.

Sou grata aos meus professores de ensino médio, que me mostraram do que eu era capaz, que

sempre acreditaram no meu potencial e através da educação, mesmo em condições

extremamente precárias de trabalho, desenvolveram asas em mim, dizendo para eu nunca deixar

de acreditar o quão alto eu poderia voar.

Agradeço, ainda, a todos os chefes de estágio com os quais tive o prazer de trabalhar ao longo

dessa caminhada, em especial a Eliane, alguém que se tornou alguém da família para mim,

alguém que me apoiou, me incentivou e me sustentou em um dos momentos mais difíceis em

minha graduação. Quando quase precisei abandonar meus estudos, ela não permitiu e com seu

coração generoso me abraçou e hoje é chave essencial para esta conquista que vivencio.

Agradeço a minha igreja local por me dar suporte sempre que precisei, por me cobrir de orações

que me deram forças para continuar e por me trazer palavras de ânimo sem que eu nem ao

menos precisasse pedir. Vocês de fato são o reflexo do amor de Jesus nessa terra.

Como eu disse, a gratidão torna-se redundante a essa altura da caminhada, mas ainda assim

merece ser expressa. Por isso, sou grata pela minha trajetória, que mesmo tortuosa, árdua, e um

tanto quanto espinhosa, me fez crescer, me fez encontrar a pessoa que de fato sou, me conduziu

a acreditar em mim e naquilo que sou capaz de fazer. E hoje, ao concluir mais essa etapa, posso

dizer com firmeza que é só o começo.

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RESUMO

Na presente pesquisa abordaremos a temática dos influenciadores digitais e a forma como o seu

surgimento impactou as relações de consumo. Buscaremos compreender como essa nova forma

de publicidade digital vem se coadunando com o código de defesa do consumidor no que tange

os limites das propagandas. Assim, o que se visa trabalhar nessa pesquisa é justamente o modo

como tal propaganda funciona, seus impactos na sociedade de consumo e principalmente, se as

premissas do Direito do consumidor são respeitadas nesses tipos de publicidade. Utilizaremos

o método de pesquisa não experimental, buscando a tipologia de pesquisa qualitativa,

bibliográfica, pesquisa de campo e documental. Abordaremos a temática em 4 capítulos que

trarão uma abordagem contextual a respeito da sociedade de consumo automatizada,

demonstraremos as formas de publicidade permitidas legalmente no sistema jurídico pátrio,

trazendo em contraponto a análise da publicidade ilícita e/ou abusiva que é bastante presente

entre as plataformas desses influenciadores.

Palavras-chave: Influenciadores digitais. Direito do consumidor. Publicidade. Sociedade de

consumo. Mídias sociais.

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ABSTRACT

In the present research we will address the theme of digital influencers and how their emergence

has impacted consumer relations. We will try to understand how this new form of digital

advertising comes in line with the consumer protection code regarding the limits of advertising.

Thus, what is intended to work in this research is precisely the way in which such advertising

works, its impacts on consumer society and especially, if the premises of consumer law are

respected in these types of advertising. We will use the method of non-experimental research,

searching the typology of qualitative research, bibliography, field research and documentary.

We will approach the theme in four chapters that will bring a contextual approach regarding the

automated consumer society, we will demonstrate the forms of advertising legally allowed in

the legal system of the country, bringing in counterpoint the analysis of the illicit or abusive

advertising that is quite present between the platforms of these influencers.

Keywords: Digital influencers. Consumer law. Publicity. Consumer society. Social media.

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

CBARP Código Brasileiro de Autorregulação Publicitária

CDC Código de Defesa do Consumidor

CF Constituição Federal

CONAR Conselho Nacional de Autorregulação Publicitária

Posts Postagens

Publi Publicidade

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ............................................................................................ 11

1 SOCIEDADE DE CONSUMO, CULTURA CONSUMISTA E O NOVO

MODO DE CONSUMO TRAZIDO PELAS REDES SOCIAIS ................ 13

1.1 Mídias Sociais: Aspectos Relevantes ............................................................ 15

1.2 Conceito de Influenciador Digital ................................................................. 18

1.3 Propaganda ou estilo de vida? Um olhar sobre o modus operandi dos

Influenciadores Digitais ................................................................................. 20

2 PUBLICIDADE E DIREITO ........................................................................ 25

2.1 Conceito de Publicidade e Propaganda ........................................................ 26

2.2 Publicidade virtual ........................................................................................ 28

2.2.1 Publicidade enganosa ....................................................................................... 29

2.2.2 Publicidade abusiva ......................................................................................... 30

2.2.3 Publicidade oculta ............................................................................................ 31

2.3 Publicidade Infantil e os Influenciadores Digitais Mirins ........................... 33

3 INFLUENCIADORES DIGITAIS E A PUBLICIDADE ILÍCITA .......... 36

3.1 Estudo de caso 01 ............................................................................................ 38

3.2 Estudo de caso 02 ............................................................................................ 39

3.3 Estudo de caso 03 ............................................................................................ 40

3.4 Estudo de caso 04 ............................................................................................ 41

3.5 Entrevista com Influenciador: como os negócios são firmados na prática 42

4 INFLUENCIADORES DIGITAIS E SUA RESPONSABILIZAÇÃO

JURÍDICA ...................................................................................................... 46

4.1 Influenciadores Digitais e o CDC .................................................................. 48

4.2 O Influenciador Digital como sujeito da Responsabilidade Civil ............... 50

4.3 A insuficiência do CDC: regulação, fiscalização e punição dos

Influenciadores Digitais ................................................................................. 54

CONCLUSÃO ................................................................................................ 58

REFERÊNCIAS ............................................................................................ 60

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INTRODUÇÃO

Ao analisar a história da sociedade, poderemos observar que as práticas consumeristas

estão presentes socialmente desde os primórdios de sua construção. Tais práticas se alteram,

mudam sua dinâmica, trocam seus objetivos, transformam sua moeda, no entanto, sempre se

mostram presentes.

Os anseios de consumo e os motivos que levam as pessoas a desejarem comprar se

alteram com o tempo e o âmago das vontades da sociedade de consumo também se modifica

simultaneamente às alterações sociais.

É patente que a internet é responsável pelas grandes revoluções contemporâneas nas

formas de consumo. As normas constitucionais e a legislação consumerista devem ser

respeitadas em todas as relações de consumo que se propagam pela sociedade, inclusive com

relação ao comércio eletrônico. Sendo importante ressaltar que no que tange o consumo e o

direito, as normas relacionadas à publicidade são muito importantes para que as relações de

consumo sigam de forma sadia e legal.

Ocorre que uma forma publicitária ainda mais recente possibilitou que as marcas e

empresas estivessem tão próximas de seu destinatário final como jamais ocorreu antes. Figuras

que possuem milhões de seguidores em suas redes sociais ditam moda, tendência e têm a

credibilidade de que precisam para divulgar em suas redes de forma a alcançar o objetivo de

influenciar os usuários a comprar produtos e serviços. A esses profissionais temos chamado de

Influenciadores Digitais.

Nessa pesquisa analisaremos como esses profissionais agem em suas plataformas

virtuais, divulgando marcas e fazendo propagandas de produtos e serviços. Verificaremos se as

normas constitucionais são aplicadas nessas relações e se os preceitos do Direito do

Consumidor relacionados à publicidade e propaganda são respeitados nessa forma tão recente

de relação de consumo. Afinal, tratando-se de comércio virtual que abrange um ambiente tão

vasto e dinâmico, as formas fiscalizatórias e regulatórias também assim deveriam o ser.

Trata-se de trabalho monográfico que tratará da publicidade no ambiente virtual, à luz

do direito do consumidor e mais precisamente enfocando nas parcerias feitas entre as marcas e

os influenciadores digitais. Adotaremos um método clássico, argumentativo e hermenêutico

utilizando a linha crítico-metodológica.

Daremos enfoque em artigos que apresentam pertinência temática com a pesquisa, bem

como, utilizaremos obras que complementarão a base histórica e teórica da pesquisa.

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No que tange a técnica desenvolveremos uma análise documental indireta por meio de

pesquisa bibliográfica e documental, como também, utilizaremos a pesquisa de campo de forma

a enriquecer a obra com o relato de profissional influenciador digital que contribuirá para a

proximidade entre o bloco teórico e fático da presente monografia.

Por fim, procederemos com a divisão dos capítulos de forma que o tema seja introduzido

pouco a pouco com o cuidado necessário para que essa temática tão recente seja trabalhada

cuidadosamente.

No primeiro capítulo trataremos da sociedade de consumo e das mídias sociais, com

recorte para as novas formas de consumo trazidas pela internet, conhecido como consumo

virtual.

No segundo capítulo abordaremos a temática da publicidade e do direito no tocante aos

tipos de publicidade permitidos e proibidos pelo nosso ordenamento jurídico.

O terceiro capítulo será destinado à análise de casos concretos que nos permitirão

vislumbrar como a publicidade dos influenciadores digitais vem ocorrendo na prática, mais

precisamente com relação a publicidade ilícita, onde observaremos as decisões tomadas pelo

Conselho Nacional de Autorregulação Publicitária – Conar. Inclusive, com a perspectiva de um

influenciador que trará informações relevantes sobre as negociações feitas com as marcas.

Por fim, no quinto capítulo iremos abordar as possíveis formas de responsabilização

jurídica que os influenciadores podem sofrer, no que se refere à publicidade ilícita propagada

em suas redes. Como também, verificaremos de que forma a temática aqui tratada se coaduna

com o código de defesa do consumidor e a incidência das normas cíveis ao tema.

Finalizando, assim, a análise crítica no que tange a presença eficaz ou não da

fiscalização no meio publicitário dos influenciadores digitais e da presente necessidade

regulatória que a forma de propaganda trazida por esses profissionais exige.

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1 SOCIEDADE DE CONSUMO, CULTURA CONSUMISTA E O NOVO MODO DE

CONSUMO TRAZIDO PELAS REDES SOCIAIS

As relações de consumo, as prioridades e formas de consumir têm se alterado ao longo

da história à medida que a sociedade, seus avanços e tecnologia também se alteram.

Notoriamente, as práticas de consumo estão presentes na sociedade em tempo coaduno

com o início de sua própria existência, pois “o fenômeno do consumo tem raízes tão antigas

quanto os seres vivos e com toda certeza é parte permanente e integral de todas as formas de

vida conhecidas a partir das narrativas históricas e relatos etnográficos1”, ou seja, o consumo

deu-se e ainda se dá de diferentes formas e através de inúmeras motivações sociais.

O consumo, ao longo da história humana, permeia entre objetivos que se diferenciam,

passando desde a necessidade de suprimento de matéria-prima, pela era dos excedentes e da

estocagem até finalmente chegar ao período em que era feito como propósito da existência dos

seres humanos, estabelecendo formas de vida e padrões nas relações inter-humanas que viam

na capacidade de consumo a medida para os seus padrões de vida.2

Porém, é também verdade que o consumo advém da necessidade de praticidade que as

nossas vidas têm demandado com o tempo. Os avanços tecnológicos trouxeram inovações e

facilidades para o nosso dia a dia e muitas vezes o consumo trata-se disso, em tornar as nossas

vidas mais práticas e em agilizar atividades do dia a dia que nos custavam muito tempo.

A publicidade está atrelada ao modo de consumirmos, a indústria publicitária utiliza os

anseios de aceitação do consumidor para que possa atrelar imagens, pessoas famosas,

modernidade, evolução e inteligência aos seus produtos e serviços.

Com efeito, Lucia Ancona Lopez de Magalhães Dias pontua que “toda publicidade,

portanto, é de algum modo tendenciosa, na medida em que informa com a finalidade específica

de vender, de fixar um marca ou até mesmo de criar estilos de vida (e não

desinteressadamente)”3. Fazendo com que o consumidor entenda que aquilo que consome o

torna possuidor de características positivas e do estilo de vida almejado.

Assim, a sociedade de consumidores representa um conjunto peculiar de condições

existenciais em que é elevada a probabilidade de que a maioria dos homens e das mulheres

1 BAUMAN, Zygmunt. Vida para consumo: A transformação das pessoas em mercadoria. Rio de Janeiro: Jorge

Zahar, 2008. p.37. 2 Ibidem. 3 DIAS, Luciana Ancona Lopez de Magalhães. Publicidade e direito. 3.ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2018.

p.33.

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venha a abraçar a cultura consumista em vez de qualquer outra, e de que na maior parte do

tempo obedeçam aos preceitos dela com máxima dedicação4.

Com o advento das redes sociais as formas de consumo também sofreram as suas

alterações e hoje o que entendemos como consumo é bem diferente das formas comuns de anos

atrás.

As pessoas atualmente passam a maior parte dos seus dias em suas redes sociais e estão

sempre conectadas de alguma forma. O que faz com que a todo instante estejam sujeitas às mais

variadas formas de anúncio e publicidade, inclusive as trazidas pelos influenciadores digitais

que desenvolvem um conteúdo crescente denominado de “publicidade patrocinada” que é

veiculado especificamente no âmbito das mídias sociais.5

Os influenciadores, que atualmente se enquadram como um tipo contemporâneo de

celebridade, nas palavras de Lucia Ancona Lopez de Magalhães Dias “emprestam a sua imagem

e voz para o anunciante promover os seus produtos” 6, bem como, utilizam seu estilo de vida

para promover as marcas em seu dia a dia. Assim, os milhões de seguidores que esses

influenciadores digitais possuem em suas redes faz com que as pessoas queiram ter o estilo de

vida parecido com o deles, o que inclui a utilização desses produtos.

Assim, os consumidores ficam expostos a todo o momento a propagandas que lhe

oferecem produtos que os aproxima dos seus ídolos, das pessoas tão relevantes que os

influenciam diariamente. E como nunca, os consumidores consomem para alimentar o desejo

de aceitação, de conformidade e para reforçar a ideia de poder e de dominação.

Dessa forma, o modo de consumo trazido pelas redes sociais transformou as práticas

consumistas, fazendo com que a sociedade de consumo enxergue nessa prática a única possível

e atrele as práticas consumistas a objetivos cada vez mais fúteis, subjetivos e irrelevantes.

Tão logo aprendam a ler, ou talvez bem antes, a “dependência das compras” se

estabelece nas crianças. Não há estratégias de treinamento distintas para menino e meninas – o

papel de consumidor, diferentemente do de produtor, não tem especificidade de gênero. Numa

sociedade de consumidores, todo mundo precisa ser, deve ser e tem que ser um consumidor por

vocação (ou seja, ver e tratar o consumo como vocação). Nessa sociedade, o consumo visto e

tratado como vocação é ao mesmo tempo um direito e um dever humano universal que não

conhece a exceção. A esse respeito a sociedade de consumo não reconhece diferença de idade

4 BAUMAN, Zygmunt. Vida para consumo: A transformação das pessoas em mercadoria. Rio de Janeiro: Jorge

Zahar, 2008. p. 70. 5 DIAS, Luciana Ancona Lopez de Magalhães. Publicidade e direito. 3.ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2018. 6 Ibidem, p. 432.

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ou gênero (embora de modo contrafactual) e não lhes faz concessões. Tampouco reconhece (de

modo gritante contrafactual) distinções de classe.7

Essa sociedade de consumo fica ainda mais convencionada ao consumo sugestivo

quando falamos sobre a influência das redes sociais e seus ali presentes influenciadores que

trabalham ditando tendências, concedendo dicas, mostrando o que é belo e o que não é, o que

é aceitável e o que não é, o que merece ser consumido e o que não merece, claro, oferecendo

aquelas marcas e serviços que lhes pagam para tal. Fazendo com que cada vez mais as pessoas

consumam para atingir um ideal, um parâmetro que os influenciadores detêm. Afinal, tornar-se

mais próximo do modo de vida por eles vivido é tornar-se mais aceito socialmente.

1.1 Mídias Sociais: Aspectos Relevantes

O desenvolvimento das mídias sociais está diretamente atrelado ao surgimento da

propaganda eletrônica, visto que, ao notarem que os consumidores passaram a migrar para o

espaço digital, as empresas e marcas também buscaram investir neste universo. Com isso, com

o intuito de fomentar o consumismo e influenciar as massas a publicidade eletrônica veio

alcançar o consumidor onde este passa a maior parte do seu tempo, nas mídias sociais.8

Atualmente a internet é cada dia mais acessível e portátil por meio de nossos aparelhos

celulares, tablets, notebooks e etc. Quanto a isso informa Lucia Ancona Lopez de Magalhães

Dias9:

Podemos afirmar com segurança que nos dias de hoje a internet se tornou uma

atividade cotidiana das pessoas. Anunciar nesse meio digital passou

igualmente a ser tarefa obrigatória das empresas que buscam diferenciar sua

marca, bem como promover produtos ou serviços com maior acuracidade,

direcionando-os para públicos-alvo específicos.

Nas mídias sociais nos relacionamos, criamos vínculos, fazemos amizades,

compartilhamos nossas vidas e participamos das vidas de outras pessoas, estejam elas próximas

ou não.

7 BAUMAN, Zygmunt. Vida para consumo: A transformação das pessoas em mercadoria. Rio de Janeiro: Jorge

Zahar, 2008. p. 73. 8 CENEVIVA, Walter. Publicidade e direito do consumidor. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1991. 9 DIAS, Luciana Ancona Lopez de Magalhães. Publicidade e direito. 3.ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2018.

p.322.

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Fato é que hoje as mídias sociais representam parte de quem nós somos, carregam parte

de nossa reputação, por meio delas podemos demonstrar nossa personalidade, objetivos, anseios

e estabelecer novas interações sejam elas pessoais ou profissionais.

Partindo do pressuposto de que passamos grande parte de nosso tempo em redes sociais

ou na internet de modo geral e com base na quantidade cada vez maior de pessoas conectadas

diariamente, as empresas observaram nessas mídias a oportunidade perfeita para disseminar sua

publicidade e propaganda.

Deste modo, temos que “a publicidade digital [...] pode ser definida como toda

comunicação que se utiliza de meios interativos digitais para promover a marca, os produtos ou

serviços e, de alguma forma, influenciar positivamente a conduta dos consumidores reais ou

potenciais10.” Conduzindo ao consumo através das minhas sociais e da interação em suas redes.

Vejamos, então, o caminho de crescimento frequente e constante adequação que as

mídias sociais cruzaram no Brasil.

A primeira rede social 11a de fato crescer consideravelmente no Brasil, sendo relevante

e utilizada por milhões de pessoas foi o chamado “Orkut”. Essa plataforma permitia que os

usuários adicionassem amigos, participassem de comunidades que se enquadrassem dentro de

seus temas de interesse e por isso é considerada de fato a primeira rede social propriamente dita

a fazer sucesso no Brasil, chegando a ser utilizada por 80 milhões de brasileiros. Essa rede fez

sucesso no Brasil nos anos 2000 com início no ano de 2004.

Em 2009 com a criação do “facebook”, ferramenta utilizada pelos brasileiros até os dias

de hoje, o Orkut foi perdendo cada vez mais o número de acessos e usuários conectados, até

que em 2014 a rede social foi definitivamente descontinuada.

No ano de 2012 o facebook já era utilizado por mais de 36 milhões de brasileiros e seu

crescimento foi constante de lá para cá, tornando-se uma das grandes redes sociais da

atualidade.

Outra rede social utilizada em larga escala no Brasil é o chamado “twitter”, que veio

trazer algumas inovações com relação ao Orkut e ao facebook. Pois, nesta rede a proposta é que

a pessoa escreva mensagens curtas de até 140 caracteres que podem ser vistas no seu perfil

público. Outro conceito inovador desta rede, é que diferente das outras que estabeleceram as

relações por amigos, essa rede vem trazer o conceito de “seguidores” que são pessoas que não

10 DIAS, Luciana Ancona Lopez de Magalhães. Publicidade e direito. 3.ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2018.

p.322. 11 GNIPPER, Patrícia. A evolução das redes sociais e seu impacto na sociedade. CanalTech, 2018. Disponível

em: <https://canaltech.com.br/redes-sociais/a-evolucao-das-redes-sociais-e-seu-impacto-na-sociedade-parte-2-

108116/>. Acesso em: 28 ago. 2018.

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querem necessariamente ser amigas do usuário daquela rede, mas sim tem interesse de segui-lo

por se interessar pelo conteúdo que este dissemina.

Nesse ponto, podemos adentrar a rede social atualmente mais utilizada no Brasil, com

o maior número de usuários e pessoas famosas, o instagram12. Criado em 2010, atualmente a

plataforma possui 800 milhões de usuários ao redor do mundo, também trás esse conceito de

seguidores em sua programação e ainda trás a ferramenta que permite que seus usuários façam

pequenos vídeos que podem ser vistos no perfil do usuário durante o período de 24h, a esses

vídeos chamamos de stories.

Esse serviço pode ser utilizado por pessoas famosas ou não. Essa ideia de vídeos curtos

foi retirada de outra rede social chamada snapchat que tem por objetivo apenas a produção

desses pequenos vídeos, possuindo alcance de 161 milhões de usuários em todo o mundo.

Contudo, pelo instagram é possível compartilhar fotos, vídeos e fixar stories de forma

permanente, demonstrando ser ferramenta mais abrangente do que o snapchat e portanto, sendo

mais utilizada hoje em dia.

Outra plataforma digital que funciona como rede social e não pode deixar de ser citada

é o youtube, plataforma unicamente destinada à publicação de vídeos por meio de canais que

propagam todo tipo de conteúdo. Sendo importante frisar que nesta plataforma as empresas

podem divulgar suas marcas por meio de comerciais que passam antes dos vídeos propriamente

ditos. Funcionando assim como uma espécie de “televisão do futuro”.

A utilização em massa dessas redes sociais alterou a forma como as relações são

estabelecidas no século XXI, modificou como os vínculos são estabelecidos na era moderna,

como as informações são compartilhadas e também como os laços são feitos, sendo atualmente

boa parte deles de forma digital.

Outro ponto importante a ser citado com relação a evolução das mídias sociais é

justamente a forma como atualmente se faz publicidade e propaganda. Hoje as propagandas são

feitas em nossas mídias sociais a todo instante em que estamos conectados, seja antes de um

vídeo no youtube, ou por meio de uma publicação no instagram.

Para que possamos perceber o número alarmante de que estamos tratando, atualmente o

instagram13 possui cerca de 500 milhões de usuários diariamente, 25 milhões de perfis

12 GNIPPER, Patrícia. A evolução das redes sociais e seu impacto na sociedade. CanalTech, 2018. Disponível

em: <https://canaltech.com.br/redes-sociais/a-evolucao-das-redes-sociais-e-seu-impacto-na-sociedade-parte-2-

108116/>. Acesso em: 28 ago. 2018. 13 Ibidem.

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corporativos ativos, mais de um milhão de anunciantes e seus stories hoje alcançam cerca de

200 milhões de usuários diariamente.

Portanto, o entendimento do avanço das mídias sociais mostra-se extremamente

importante para que possamos compreender quem somos como sociedade, visto que a

sociedade atual, independente de status, classe social, religião, sexo e idade está conectada às

redes sociais e suscetível às propostas de consumo.

1.2 Conceito de Influenciador Digital

A influência denota prestígio, autoridade e crédito que alguém possua com relação a

outrem ou perante a sociedade. Por vezes, a influência também está relacionada ao poder, visto

que por meio dela é possível produzir efeito sobre seres ou coisas, bem como lhes suscitar

modificações.

Através da influência, cargos podem ser adquiridos, alianças firmadas e até mesmo

guerras podem ser deflagradas ou evitadas. Pelo poder da influência leis podem ser aprovadas

ou vetadas dentro de parlamentos e objetivos podem ser alcançados por meio da predisposição

que outros têm de fazer o que lhes é proposto.

Nesse sentido passamos a compreender o conceito de influenciador digital, pois essas

pessoas possuem prestígio e por conta disso contam com um grande número de usuários

acompanhando suas redes sociais.

Os influenciadores “postam ou divulgam imagens ou textos em favor de certa marca ou

produto, em decorrência de uma contratação direta com o anunciante ou mesmo em virtude de

um interesse comercial mútuo14”. Nesse caso, os influenciadores firmam contratos com as

marcas porque as pessoas têm interesse em saber sobre os gostos, sobre o dia a dia e sobre os

hábitos desses influenciadores, ou seja, o seu público consome como entretenimento o simples

ato de acompanhar suas vidas.

Os influenciadores digitais, geralmente estão inseridos em algum tipo de nicho, seja pela

faixa etária do público que o acompanha ou pelo tipo de conteúdo que produz. Vejamos, o

influenciador pode divulgar conteúdo sobre o ramo da beleza como maquiagem, cuidados com

a pele e afins, assim por conta disso será seguido por um nicho de pessoas que se interesse por

esse tema.

14 DIAS, Luciana Ancona Lopez de Magalhães. Publicidade e direito. 3.ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2018.

p. 433.

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19

O influenciador digital também pode ser nativo que é aquele que criou a sua fama a

partir da produção de conteúdo para internet ou pode ser também uma celebridade que decorreu

de alguma área como a televisão, cinema, esporte, moda, jornalismo e etc.

Fato é que, o influenciador possui um número grande de seguidores em suas redes, que

o acompanha diariamente e considera aquilo que é dito, aprovado e utilizado por ele. Como dito

anteriormente, o influenciador exerce um certo tipo de autoridade entre seus seguidores, mesmo

que de forma indireta, pois as pessoas consideram a opinião deste até mesmo para realizar

algum tipo de compra15.

Além do número considerável de pessoas em suas redes, o influenciador também precisa

manter o engajamento com o seu público, seja através de comentários ou de likes em suas redes

sociais. Pois, o alcance e ressonância presentes em suas redes demonstram que de fato exerce

algum tipo de influência sobre o seu público.

O que diferencia um influenciador de alguém que apenas possua muitos seguidores em

suas redes sociais, é que o influenciador digital é alguém que exerce um impacto acima da

média em um seguimento, seja ele grande ou pequeno. É capaz de formar um público fiel e

engajado, exercendo influência sobre suas opiniões e atitudes. Em última análise, influencia a

tomada de decisão de compra das pessoas que o seguem. Os influenciadores digitais são

também chamados de creators pela alta capacidade de produção de conteúdo relevante para o

seu público16.

Partindo dessa premissa, torna-se mais fácil visualizar o tipo de poder de que esses

influenciadores dispõem. Eles têm o poder de lançar tendências, de influenciar diretamente nas

escolhas de consumo de seus seguidores, ditam aquilo que vale a pena ser comprado e aquilo

que não compensa, explanam quais as marcas merecem o investimento do seu público e quais

não.

Assim, iniciam-se as parcerias entre as marcas e os influenciadores, pois os fornecedores

de produtos e serviços procuram os influenciadores visando alcançar o seu nicho de atuação

para que o seu produto seja bem aceito e, portanto bem consumido naquela comunidade.

15 O marketing de influência é uma técnica que evolui junto com a ascensão das mídias sociais e da tecnologia

moderna. Envolve marcas engajadas com figuras populares em redes sociais como Youtube, facebook, twitter e

instagram, para discutir, fotografar, recomendar e às vezes apenas se inserir em conversas sobre um produto. Às

vezes, esses compromissos são autênticos por natureza e o “influenciador” pode estar postando apenas uma opinião

genuína. Nesses casos, essas postagens não são consideradas anúncios. No entanto, quando a marca tem controle

sobre o conteúdo da postagem e recompensa o influenciador com um pagamento, presente gratuito ou outra

vantagem, a postagem se torna um anúncio. Disponível em: < https://www.asa.org.uk/news/online-influencers-

is-it-an-ad.html>. Acesso em: 22 nov. 2017. 16 CORONADO, Raony. Influenciador Digital: O que é e como classificá-lo? Disponível em:

<https://www.influency.me/blog/influenciador-digital/>. Acesso em: 29 ago. 2018.

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As marcas de produtos e serviços firmam contratos com influenciadores e os patrocinam

para que os seus produtos estejam em constante contato com o público que diariamente interage

com o seu influenciador digital preferido.

Nesse diapasão podemos perceber os motivos pelos quais esses profissionais foram

intitulados de influenciadores, posto que, geram impacto sobre a sociedade ou um grupo

específico. Por meio do seu prestígio, tornam-se validadores daquilo que será consumido por

seus seguidores, disseminam, além de produtos e serviços, ideias, ideologias, opiniões,

posicionamentos e o alcance de todo esse conteúdo gera a influência que os intitula17.

Essas novas personalidades originadas da internet não se restringem a apenas uma rede

social, a união delas faz com que alcancem um público maior e assim consigam firmar o seu

espaço. O surgimento, no meio digital, desses novos formadores de opiniões também causa

uma mudança comportamental e de mentalidade em seus seguidores, que tendem a ser

facilmente influenciados18.

1.3 Propaganda ou estilo de vida? Um olhar sobre o modus operandi dos Influenciadores

Digitais

Algumas características da propaganda disseminada pelos influenciadores digitais

merecem ser analisadas criticamente. A forma como se conectam com seus seguidores para

fazer publicidade mostra-se um tanto quanto diferente da utilizada nos meios de comunicação

tradicionais.

De fato, conhecer o modus operandi 19do influenciador digital nos aproxima das

respostas sobre os anseios de consumo da sociedade moderna, haja vista o fato de que temos

observado algumas condutas semelhantes entre estes influenciadores no que se refere às

divulgações de serviços e produtos.

17 Um dos principais indicadores sobre a influência das redes sociais é o Klout, um algoritmo desenvolvido

justamente para avaliar o grau de influência gerado por um conjunto de canais nas mídias sociais. Então o klout é

o verdadeiro indicador quem é um influenciador digital? Claro que não. Em um universo onde temos que avaliar

sentimentos e intenções, como o das mídias sociais, um único indicador não pode expressar a verdadeira força de

um perfil. O klout é um dos parâmetros dos quais o analista de mídias sociais se vale na hora de avaliar uma

determinada presença nas mídias sociais, mas é claro que existem outros sinais que confirmam essa força do perfil

ou marca. Disponível em: <https://www.influency.me/blog/influenciador-digital/>. Acesso em: 22 nov. 2018. 18 GNIPPER, Patrícia. A evolução das redes sociais e seu impacto na sociedade. CanalTech, 2018. Disponível

em: <https://canaltech.com.br/redes-sociais/a-evolucao-das-redes-sociais-e-seu-impacto-na-sociedade-parte-2-

108116/>. Acesso em: 28 ago. 2018. 19 É uma expressão no idioma latim a qual significa “modo de operação”. A expressão denota uma forma de agir,

operar ou executar uma determinada atividade. Normalmente, ocorre quando se opera seguindo os mesmos

procedimentos, como se tais fossem códigos.

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No que tange a propaganda mais tradicional, disseminada nos veículos de comunicação

mais antigos como jornais, televisões e rádios, características comuns tornam claro o objetivo

de incentivo de consumo. Nesse sentido explica Walter Ceneviva20:

A contar de 1920 o rádio assumiu sua feição definitiva, com a captação em receptores

domésticos de baixo custo – depois ampliada com sistemas transistorizados. Desde o

início a instalação de novas emissoras dependeu de autorização do Poder Público. Sua

importância foi imediatamente percebida por industriais e comerciantes para a

propaganda comercial, como se evidencia com o uso intenso que persiste e se

desenvolve até o presente [...] Quando a possibilidade da difusão comercial da

televisão colorida se ampliou, sobretudo com os recursos técnicos gerados pela

gravação em fita e pelas trucagens geradas pelo sistema digital, as emissoras

televisivas se classificaram definitivamente como as grandes incentivadoras do

consumo como é hoje conhecido.

Essas características presentes no desenvolvimento histórico de comunicação

demonstram o evidente interesse ao incentivo do consumo, de forma a serem meios

fomentadores natos da mensagem de cunho publicitário.

Quando assistimos a um programa de televisão, temos o raciocínio cortado daquela

programação para que se inicie o momento das propagandas, assim, mesmo que de forma muito

rápida e muitas vezes confusa, nosso cérebro consegue identificar a mudança de raciocínio e

perceber que aquilo que se inicia trata-se de publicidade. Isto embora atualmente exista a

técnica publicitária denominada product placent que consiste na exibição do produto ou serviço

no conteúdo de um programa audiovisual como, por exemplo, durante a narrativa de um filme,

novela ou qualquer outro programa de entretenimento, diferindo-se da forma característica de

colocação da publicidade tradicional21.

Mesmo que as marcas utilizem pessoas famosas, ícones pop, cantores, jogadores de

futebol e afins em suas propagandas, ainda assim, continua claro para o telespectador que o

objetivo deste momento da propaganda comercial é a venda de produtos e serviços, ou seja, o

lucro.

No entanto, quando falamos da propaganda feita pelos influenciadores digitais estamos

tratando de uma publicidade muito mais sutil e por vezes mascarada.

Os influenciadores digitais recebem das marcas para que possam divulgar algum tipo

de produto em suas redes sociais (facebook, twitter, youtube, instagram, snapchat). Pois bem,

a diferença é que nessas mídias muitas vezes a publicidade vem disfarçada de “estilo de vida”,

o que não permite que os seguidores consigam verificar que se trata de propaganda.

20 CENEVIVA, Walter. Publicidade e direito do consumidor. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1991. 21 DIAS, Luciana Ancona Lopez de Magalhães. Publicidade e direito. 3.ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2018.

p. 298.

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22

O seguidor confia que o influenciador usa no seu dia a dia determinado produto e de

fato quer compartilhar com seus seguidores os benefícios que obteve ao utilizá-lo, mas na

verdade aquela publicação está sendo patrocinada pela marca de que se fala. E no caso dos

influenciadores “quando a marca possui controle sobre o conteúdo da postagem e recompensa

o influenciador com um pagamento, presente gratuito ou outra vantagem, a postagem se torna

um anúncio e deve ser rotulada como tal, de momo a não enganar o público consumidor22”.

Mas na prática a publicidade ocorre na forma de dicas, conselhos ou evidência do estilo de vida

do influenciador.

Aqui encontramos a linha tênue entre a propaganda disseminada pelos influenciadores

digitais e a exposição de sua vida pessoal, pois estes divulgam marcas por meio de redes sociais

próprias, pessoais. Assim como cada seguidor possui uma conta em alguma mídia social, o

influenciador também possui e ali naquele ambiente de certa aproximação e intimidade com

espectador fica mais difícil de identificar quando se trata de estilo de vida ou propaganda em

si.

Essa junção de fatores torna extremamente frágil para o fã, seguidor e admirador o

entendimento de que no momento em que visualiza esse tipo de publicação torna-se um

consumidor. No entanto, as regras quanto à publicidade digital são claras ao determinar que “os

anúncios em plataformas digitais, ainda que elaborados como marketing de conteúdo e

naturalmente integrados à plataforma, devem ser fácil e imediatamente identificados como

mensagem de natureza publicitária23”, mas sabemos que nem sempre esses comandos são

respeitados.

Uma característica muito peculiar da grande maioria dos influenciadores digitais

“nativos” é a de que estes não são reconhecidos por atuações em outras áreas que os tornem

famosos, como filmes, dramaturgia, música, jornalismo, esportes e afins. O influenciador

digital nativo é reconhecido e admirado pelos seus seguidores justamente pela pessoa que

aparenta ser, pela sua imagem e pelo estilo de vida que expõem em suas redes sociais e em seus

vídeos, quando possuem canal no youtube. Assim, os seguidores escolhem acompanhar a rotina

desse influenciador por se identificarem com a personalidade e o modo como os influenciadores

aparentam conduzir a sua vida.

22 DIAS, Luciana Ancona Lopez de Magalhães. Publicidade e direito. 3.ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2018.

p. 328. 23 Ibidem, p. 329.

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23

De forma bem simples e prática, podemos identificar a propaganda do influenciador

digital como a conversa de dois amigos que se encontram e um conta ao outro de algum produto

incrível que esteja utilizando e isto desperta interesse e curiosidade em seu amigo.

Isso ocorre pela relação de confiança e afetividade que existe entre esses dois amigos

hipotéticos, pois um sabe justamente que o outro não está sendo pago para que fale bem de um

produto e por isso confia de fato na efetividade dos resultados desse produto ou serviço.

Por esta razão a propaganda feita pelos influenciadores digitais torna-se tão certeira e

eficaz para as marcas e empresários, porque o consumidor em muitos casos não entende que é

parte de uma cadeia de consumo, acredita ter recebido uma preciosa dica de alguém em quem

confia. Desta maneira, aponta Lucia Ancona de Magalhães Dias24 para os perigos desses

anúncios:

[...] a publicidade oculta (encoberta, camuflada ou simplesmente clandestina), que

pode ser conceituada como a mensagem que se apresenta sob a aparência de uma

informação neutra e desinteressada sem revelar de modo suficiente – seja pela sua

forma, seja por seu conteúdo – seu caráter publicitário. Trata-se de publicidade que

viola diretamente o princípio da identificação da mensagem publicitária pelo

consumidor, o que significa dizer que se está diante de modalidade de publicidade, a

priori, rejeitada pelo nosso ordenamento jurídico. A publicidade oculta é uma

possibilidade enganosa nos termos dos arts. 36, caput, e 37 do CDC [...]

Mais ainda, o seguidor – aqui consumidor – acredita que consumindo os produtos e

serviços que o seu influenciador preferido consome, pode se aproximar do estilo de vida que

tanto admira e acompanha pelas redes sociais, como até mesmo pode se aproximar do seu ídolo

e isto traz grande sensação de satisfação e consequentemente aquece as relações de consumo.

Nesse prisma “não há dúvidas de que o fornecedor-anunciante responde sempre, e

objetivamente pelos danos provocados perante seus consumidores25”, no entanto se questiona

se além dos fornecedores, as plataformas digitais seriam responsáveis pelo conteúdo

publicitário propagado em suas redes. Questiona-se ainda, se este controle seria possível, visto

que muitas das propagandas não são ao menos identificadas como tais. Sendo, ainda, válido

ressaltar o papel das empresas no que tange as publicidades que patrocinam nas mídias sociais.

Como forma de resolver a situação, as principais plataformas digitais estabeleceram

algumas diretrizes para que os influenciadores digitais utilizem suas redes de forma a não

produzir publicidade enganosa, “a identificação da natureza publicitária da mensagem digital –

e, portanto, da ausência de seu potencial enganoso – poderá ser alcançada, tais como, design da

24 DIAS, Luciana Ancona Lopez de Magalhães. Publicidade e direito. 3.ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2018.

p. 283. 25 Ibidem, p. 423.

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mensagem, conteúdo do artigo, posição/local de sua exibição dentro de um site ou ainda através

de identificação própria26”, como o exemplo, a utilização da hashtag27 “publi” ou “publicidade”

no instagram.

No facebook e no youtube temos a palavra “patrocinado” fixada no topo das publicações

e/ou vídeos para que assim os espectadores percebam que trata de propaganda e que naquele

momento se transfiguram de fãs e seguidores de alguém, para consumidores em potencial.

Importante salientar que mesmo com a existência dessas medidas, ainda podemos

verificar algumas formas de má utilização das mídias digitais para a disseminação de

propaganda e publicidade. Este modus operandi específico do influenciador que por vezes

apresenta a mensagem publicitária de maneira “neutra e desinteressada28”, torna a identificação

da publicidade ainda mais complexa, bem como, influencia nas motivações de compra do

consumidor que por vezes pode desejar um produto ou serviço não por necessidade ou desejo

pessoal, mas sim pelo estilo de vida atrativo e convincente demonstrado pelos influenciadores

nas redes sociais.

Seguiremos analisando as questões aqui explanadas até chegarmos aos casos concretos

e situações que de fato, nos permitam vislumbrar a real incidência da propaganda enganosa ou

abusiva no que tange os influenciadores digitais e seus procedimentos nas redes sociais.

26 DIAS, Luciana Ancona Lopez de Magalhães. Publicidade e direito. 3.ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2018.

p. 330. 27 São palavras-chave ou um termo associado a algum tipo de informação, tópico ou discussão. Por meio dela é

possível indexar de forma fixa no twitter, facebook ou instagram para que o tópico do conteúdo seja identificado

pelo seu núcleo, título e objeto. Também é utilizada pra definir os temas das publicações ou informações

importantes como é o caso da publicação que contém publicidade. 28 Ibidem, p. 282.

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2 PUBLICIDADE E DIREITO

No que tange o direito, a publicidade compreenderá um conceito que abarca diversas

realidades jurídicas. A cada uma dessas realidades caberá tratamento legislativo diversificado,

ao qual o próprio CDC irá acrescentar importantes regras que estão relacionadas diretamente

com a divulgação comercial de produtos e serviços.29

A publicidade quando emitida provoca certo tipo de reação, ou seja, a publicidade gera

reflexos na sociedade a partir do conteúdo produzido. Nesse prisma, a publicidade aproxima-

se da própria norma legal no que tange suas características e efeitos. No entanto, é importante

ressaltar que o sistema jurídico faz diferenciação entre os tipos de publicidade, pois trata da

publicidade sistemática como aquela que garante a autenticidade dos atos, bem como a sua

segurança e eficácia como bem podemos observar nos atos administrativos praticados pelo

Estado. E, ainda, a publicidade que serve para a disseminação de fatos, serviços ou produtos de

interesse dos fornecedores, ou seja, aquele tipo de publicidade que não visa informar, mas sim

gerar repercussão no âmbito econômico-social.30

A publicidade, no ordenamento jurídico brasileiro possui proteção constitucional e

existem alguns aspectos relevantes que validam essa proteção e permitem que essa prática seja

disseminada.

No Brasil, a liberdade de fazer publicidade encontra a sua proteção no sistema

econômico que adotamos, qual seja, o capitalismo. No que tange a atividade econômica

praticada no país estamos resguardados por princípios constitucionais como a livre iniciativa

que representa notório fundamento da ordem econômica31, assim como a livre concorrência32.

Assim, com base nesses princípios a publicidade encontra a sua proteção constitucional,

pois representa ferramenta importante para a dinâmica de mercado e competição entre os

agentes econômicos, visto que a publicidade incentiva o consumo de bens e de serviços e gera

demandas novas. A partir da publicidade os agentes econômicos aperfeiçoam seus produtos e

práticas comerciais para que mantenham-se em boa posição no mercado e permaneçam

atrativos para os consumidores.33

29 CENEVIVA, Walter. Publicidade e direito do consumidor. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1991. 30 Ibidem. 31 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Organização de Alexandre

de Moraes. 16.ed. São Paulo: Atlas, 2000. art. 170, caput e parágrafo único. 32 Ibidem, art. 170, inciso IV. 33 DIAS, Luciana Ancona Lopez de Magalhães. Publicidade e direito. 3.ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2018.

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Um outro olhar pode ser dado à relação entre publicidade e direito por meio das

proteções legais constitucionais dadas a esta quando falamos sobre liberdade de expressão34.

Ora, é inegável que as campanhas publicitárias representam verdadeiras manifestações do

intelecto humano, estão permeadas de criatividade e por vezes descrevem o quadro cultural da

sociedade, fazem críticas, evidenciam os comportamentos contidos entre os consumidores e

dispõe até mesmo sobre o senso estético contido naquela determinada sociedade. Sendo, então,

a publicidade um importante retrato da liberdade de se expressar e por isso acaba por ser

protegida por preceitos constitucionais quanto à liberdade de expressão35.

Portanto, podemos inferir que a publicidade e o direito caminham lado a lado, pois como

dito anteriormente a prática publicitária encontra respaldo constitucional, no entanto, não é feita

de forma livre e indiscriminada, pois está sujeita ao controle estatal por meio da legislação

pátria que regulamenta o direito do consumidor. Haja vista que, por escolha, assim como na

maioria dos países, o Brasil adota o sistema misto de controle de publicidade que, portanto, se

sujeita tanto ao Estado quanto aos agentes privados por meio do Conselho Nacional de

Autorregulação Publicitária (CONAR) que controlam os eventuais abusos publicitários,

tomando como base a norma e a ética publicitária (DIAS, 2018).

2.1 Conceito de Publicidade e Propaganda

Importante salientar, em princípio, que existem diferenças quanto aos termos e

representações da propaganda e da publicidade. Embora no presente trabalho utilizemos ambos

os termos de forma a inferir a semelhança entre eles, é necessário que se estabeleça as

características presentes entre cada um deles e a forma como se perfazem na prática. Assim, é

importante que conceituemos a publicidade e propaganda para que a totalidade da ideia aduzida

na pesquisa possa ser bem compreendida e assimilada.

O significado da palavra “publicidade” por vezes está relacionado a sua origem do latin

publicus quando nos referimos a coisas que são próprias do Estado e assim as diferenciamos

daquelas que são particulares. No entanto, e principalmente para o tema em que abordamos

aqui, o significado que mais nos importa da palavra “publicidade” é aquele que está relacionado

a dar conhecimento geral sobre algo, de tornar alguma informação pública, de levar algo a

todos.36

34 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Organização de Alexandre

de Moraes. 16.ed. São Paulo: Atlas, 2000. art. 5º, inciso IX e art. 220. 35 DIAS, Luciana Ancona Lopez de Magalhães. Publicidade e direito. 3.ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2018. 36 Ibidem.

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E ainda, no que tange a perspectiva mercadológica a publicidade é o meio em que os

produtos, os bens e os serviços serão divulgados com o intuito de incentivar o seu consumo, ou

seja, é inerente ao conceito de publicidade a intenção de cunho econômico, qual seja de gerar

ânimo no consumidor e justamente por isso surge a necessidade de que essa prática seja

regulada a fim de não surgirem abusos praticados pelos fornecedores37.

Nesse ponto é importante ressaltar a diferenciação entre a publicidade e a propaganda,

pois embora sejam rotineiramente utilizadas como termos sinônimos na prática comercial, os

conceitos e objetivos se diferem. A publicidade, como já dito anteriormente, está relacionada a

um objetivo econômico que é desde o início bem traçado, já a propaganda inicialmente não

possui um interesse econômico, mas ainda é utilizada como uma técnica para persuadir o

consumidor. Haja vista que, a propaganda vem com o objetivo de disseminar ideias e conceitos,

de muitas vezes propagar ideologias políticas ou religiosas, a propaganda busca difundir alguma

ideia ou até mesmo alcançar adeptos a algum sistema ideológico.38

Portanto, a publicidade e a propaganda diferenciam-se não tanto por seus meios, que

demonstram-se de formas muito semelhantes, mas sim em seus fins que possuem objetivos

diferentes entre si. Pois, enquanto a publicidade visa tornar público e conhecido algum produto

ou serviço para o alcance de certo tipo de benefício econômico, a propaganda visa o

engajamento ideológico e/ou a propagação de ideias que exerçam alguma influência sobre o

homem no tocante aos aspectos políticos, religiosos, éticos dentre outros.

Nesse sentido, Walter Ceneviva39 em sua obra trás distinções que existem sobre os

termos propaganda e publicidade em outros idiomas, o que nos ajuda corroborando com as

definições já trabalhadas a priori:

Em outras línguas também se encontra os dois termos, referidos ou não a realidades

diversas. Em inglês, por exemplo, “publicy” diz respeito à condição ou ao estado

público, de conhecimento comum, de algo ou de alguém. “Propaganda”, em inglês, é

a difusão de ideias ou doutrinas ou, ainda, a difusão sistemática destinada a doutrinar

pessoas. Para publicidade, no sentido consumista aqui considerado, o inglês se serve

do termo “advertising”.

Nas línguas de origem latina pode-se encontrar a mesma disparidade. “Propagande”,

em francês, tem um primeiro significado de ato destinado a convencer a opinião

pública a respeito das vantagens ou qualidades de ideias políticas ou sociais, embora

também encontre acolhida como divulgação com interesse comercial. “Publicité”,

além de definir o caráter do que é público, corresponde ao termo reservado para

caracterizar a arte de influenciar as pessoas com finalidade comercial. É o mesmo em

espanhol na distinção entre “propaganda” e “publicidade”. Em italiano, embora

“propaganda” (grafado do mesmo modo que em português) também signifique a

transmissão de informações para dar a conhecer, para apreçar, a ação de difundir

37 DIAS, Luciana Ancona Lopez de Magalhães. Publicidade e direito. 3.ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2018.

p. 25. 38 Ibidem. 39 CENEVIVA, Walter. Publicidade e direito do consumidor. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1991.

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anúncios sobre bens ou serviços com a intenção de incrementar o consumo se

denomina “publicitá”.

Neste diapasão podemos concluir que, embora existam diferenças entre a publicidade e

propaganda quanto as suas definições, na prática, elas são utilizadas indistintamente como

termos semelhantes para designar o tipo de publicidade de cunho comercial. No entanto,

sabemos que a propaganda não está relacionada a um tipo de relação consumerista e sim ao

intuito de angariar adesões a algum tipo de ideia, sendo a publicidade a responsável em si pelo

aquecimento do mercado e alcance de lucratividade econômico-financeira.

2.2 Publicidade virtual

O ponto focal dessa pesquisa representa o tipo de publicidade que é realizada

virtualmente por meio dos influenciadores digitais, através de suas redes sociais e mídias em

geral. Para tanto, é importante salientar as especificações presentes na publicidade virtual e a

forma como a legislação pátria vem regulando sua disseminação.

Através de meios interativos digitais essa comunicação publicitária acontece e pode ser

feita de diversas maneiras incluindo blogs, sites ou até mesmo redes sociais já citadas

anteriormente (Facebook, Twitter, YouTube, Instagran, Snapchat). Essa publicidade digital

promove serviços, produtos e marcas por meio dessas vias interativas digitais, fazendo com que

os consumidores reais ou potenciais sejam influenciados positivamente quanto a esses serviços,

produtos e marcas promovidos40.

No entanto, é essencial esclarecer que independentemente do meio pelo qual a

publicidade se apresente ela deve estar sujeita a todas as regras inerentes a disseminação da

publicidade. Ou seja, a publicidade virtual deve respeitar todas as normas contidas no CDC a

respeito da publicidade oculta, ilícita e abusiva sobre as quais detalharemos posteriormente.

Ocorre que por diversos fatores, incluindo a rapidez com que as informações são

disseminadas na internet e a quantidade enorme de usuários das mídias sociais disseminando

comunicação publicitária a respeito de produtos, serviços e afins fica cada vez mais difícil a

fiscalização dessas propagandas que ocorrem a todo instante em nossas redes sociais.

A internet torna-se uma porta aberta para que a propaganda em várias formas, inclusive

enganosa, seja divulgada por meio das redes dos influenciadores. Ou seja, nem sempre as regras

determinadas pela legislação ou órgãos de autorregulação publicitária são cumpridas.

40 DIAS, Luciana Ancona Lopez de Magalhães. Publicidade e direito. 3.ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2018.

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A esse respeito Lucia Ancona Lopez de Magalhães Dias41, declara:

O conteúdo gerado por terceiros usuários da internet é geralmente reconhecido através

de críticas (reviews), artigos, blogs, posts com comentários, publicação de arquivos

em mídia digital (podcasting), fotos ou vídeos. Tais conteúdos quando espontâneos e

autênticos, como dito, estão fora do alcance das normas publicitárias. No entanto, se

intencionalmente solicitados, endossados, incorporados, distribuídos ou ativamente

promovidos pela empresa com propósitos publicitários devem então ser qualificados

como comunicações de marketing e a empresa anunciante passa a ser igualmente

responsável pelo material divulgado pelo influenciador de marketing. O problema se

mostra quando tal natureza publicitária não está suficientemente clara para os

consumidores, induzindo-os em erro quanto à verdadeira origem e natureza do post,

foto, comentário, link ou artigo “pagos”. É mandatório que tais mensagens, ditas

publicitárias, fiquem identificadas como “publicidade” pelos consumidores, evitando-

se sua confusão com editoriais, críticas ou depoimentos espontâneos de terceiros,

sempre que seu contexto forma ou conteúdo não se possa facilmente identificar tal

natureza publicitária.

Desta forma, resta claro que as regras quanto à publicidade são claras e devem ser

respeitadas independentemente das vias em que são propagadas, ou seja, mesmo a publicidade

digital deve respeitar os limites estabelecidos pelas normas legais e autorregulamentares.

Assim, a publicidade digital não deve ser mascarada e sim claramente identificável. Isso

significa que a propaganda não pode ficar oculta aos consumidores, pois estes precisam

identificar a relação existente entre o influenciador e a marca, produto ou serviço do qual está

tratando, do contrário, esse tipo de publicidade pode ser enquadrada como enganosa, mesmo

que as afirmações sobre o produto ou serviço sejam verdadeiras 42.

2.2.1 Publicidade enganosa

O §1º do artigo 37 trata desse tipo de publicidade ilícita determinando que “é enganosa

qualquer modalidade de informação ou comunicação de caráter publicitário, inteira ou

parcialmente falsa, ou, por qualquer ouro modo, mesmo por omissão, capaz de induzir em erro

o consumidor a respeito da natureza, características, qualidade, quantidade, propriedades,

origem, preço e quaisquer outros dados sobre produtos e serviços”. Sendo a publicidade

enganosa dividida entre duas formas de manifestação, por omissão ou por ação. A enganosidade

pode se dar, de acordo com o §3º, como aquela que deixar de informar sobre dado essencial do

produto ou serviço43.

41 DIAS, Luciana Ancona Lopez de Magalhães. Publicidade e direito. 3.ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2018.

p. 326. 42 Ibidem, p. 329. 43 Ibidem, p. 120.

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30

A verificação da publicidade enganosa é feita quando um tipo de propaganda é veiculada

visando induzir o consumidor a erro, seja informando algo que não seja verdade ou omitindo

algo que deveria ser informado na publicidade.

Determinar que a publicidade enganosa induza ao engano e ao erro não exclui o fato de

que a propagação desse tipo de publicidade está permeado de dolo, ou seja, uma atuação eivada

de malícia que tem o objetivo de enganar o consumidor.

Sendo a publicidade enganosa por ação aquela que age com dolo positivo do agente

quando, por exemplo, a campanha publicitária informa que o produto acompanha determinado

acessório que parece atraente ao consumidor e interessante atrelado ao produto principal, mas

na verdade o acessório não acompanha o produto, diferente do que foi sugerido pela

campanha44.

Já na publicidade enganosa por omissão o dolo é negativo e a atuação do agente é

omissiva, quando alguma informação extremamente importante e essencial é ocultada para que

a aquisição do serviço e/ou mercadoria seja feita pelo consumidor enganado.45

Deste modo, a publicidade enganosa é responsável pela veiculação de caráter

publicitário que induza o consumidor ao erro quanto às características deste determinado

produto ou serviço anunciado, ou seja, mostra de forma falsa ou por qualquer outro meio que

seja enganoso, cabível como a omissão, ambiguidade e inexatidão.

Assim, a escolha econômica desse consumidor vai sofrer influência deste tipo de

publicidade ilícita. De forma a fazer com que o consumidor seja atraído a algum produto ou

serviço que normalmente não o atrairia, mas que apenas lhe foi opção por conta das informações

enganosas que foram propagadas a repeito deste quanto às suas características como preço,

utilidades, acessórios ou até mesmo as condições de sua contratação46.

2.2.2 Publicidade abusiva

A publicidade abusiva está contida no artigo 37 §2º do CDC que informa “é abusiva, dentre

outras, a publicidade discriminatória de qualquer natureza, a que incite a violência, explore o

medo ou a superstição, se aproveite da deficiência de julgamento e experiência da criança,

44 TARTUCE, Flávio; NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de direito do consumidor: direito material

e processual. 6.ed. ver. atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2017. 45 Ibidem. 46 DIAS, Luciana Ancona Lopez de Magalhães. Publicidade e direito. 3.ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2018.

p. 121.

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desrespeite valores ambientais, ou que seja capaz de induzir o consumidor a se comportar de

forma prejudicial ou perigosa à saúde ou segurança”. Deste modo, é importante salientar que a

publicidade não pode induzir a comportamentos não aceitáveis moralmente ou que sejam

degradantes ao indivíduo, meio ambiente ou às relações traçadas em sociedade, pois desta

forma o seu objetivo de alcançar benefício econômico dá lugar ao alcance de resultados como

o preconceito, ódio a minorias, desrespeito, ofensas dentre outros.

Conforme Dias47, a respeito do conteúdo trazido pelo §2º do artigo 37 do CDC, “institui

para as relações de consumo o princípio geral da não abusividade ao vedar qualquer forma de

publicidade que atente contra os valores éticos e morais da sociedade, em desrespeito ao

consumidor, ou que possa induzi-lo a se comportar de forma prejudicial a sua saúde e

segurança”. Importante limitação e vedação deste tipo de publicidade ilícita visto que a

publicidade em regra colhe os seus efeitos por meio da repetitividade e por alcançar o

consumidor mesmo quando este não possui escolha, como é o caso da publicidade exibida antes

de algum vídeo disponibilizado na plataforma youtube.

Um exemplo de publicidade abusiva que costuma ser utilizado pelos fornecedores de

serviço e que por vezes é aceito como normalidade pelo consumidor em geral, é aquele tipo de

publicidade que utiliza o corpo da mulher (muitas vez nu) para venda de um produto que nem

mesmo é direcionado para o público feminino, pelo contrário, é destinado ao público masculino

que acaba por ser “atraído” por esse tipo de publicidade. Essa propaganda pode ser considerada

discriminatória contra a mulher no que tange os direitos de igualdade assegurados pelo artigo

5º da constituição federal48.

Portanto, é possível concluir que a punição da publicidade abusiva tem como escopo a

“garantia da segurança, da saúde, da paz social e do ambiente”49. Nesse sentido, não se quer

punir a publicidade que induz o consumidor a escolha de determinado bem ou serviços por meio

de falsidade como ocorre com a publicidade enganosa, mas sim o que se quer é reprimir o tipo

de publicidade que viola os bons costumes e os princípios norteadores da sociedade assegurados

constitucionalmente e nas leis50.

2.2.3 Publicidade oculta

47 DIAS, Luciana Ancona Lopez de Magalhães. Publicidade e direito. 3.ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2018.

p. 1.054. 48 CENEVIVA, Walter. Publicidade e direito do consumidor. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1991.

p. 128. 49 Ibidem. 50 DIAS, Luciana. op. cit.

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Neste ponto, trataremos do tipo de publicidade ilícita que se mostra mais relevante para

os temas tratados na presente pesquisa, falaremos da publicidade oculta. Alguns autores

também tratam esta publicidade com o nome de publicidade clandestina ou subliminar.

A vedação de publicidade tem como base o caput do artigo 36 do CDC que dispõe “a

publicidade deve ser veiculada de tal forma que o consumidor, fácil e imediatamente, a

identifique como tal”. Ou seja, os anúncios publicitários não devem ter o seu teor ocultado, o

consumidor precisa identificar facilmente que trata-se de publicidade como via de obtenção de

benefícios econômicos pelo fabricante.

Nas palavras de Nunes51, “a lei determina que, além de ostensivo, o anúncio publicitário

deve ser claro e passível de identificação imediata pelo consumidor. É a proibição da chamada

publicidade clandestina”.

Esse tipo de publicidade é comunmente identificada nas redes sociais de influenciadores

digitais, que dissertam sobre os benefícios de algum produto ou serviço sem que sinalize que

aquilo trata de um anúncio promocional patrocinado pelo fabricante ou fornecedor daquela

marca. Posteriormente, procederemos com estudos de casos que demonstram a presença da

publicidade oculta, e a forma como se perfaz nas mídias digitais que atualmente representam

um meio tão comum de disseminação publicitária.

A publicidade oculta não é admitida como um meio de publicidade lícita, pois esta faz

com que o consumidor credite que a apresentação das qualidades e benefícios daquele produto,

na verdade, trata-se de uma informação imparcial, neutra e despretensiosa quando na verdade

representa um conteúdo de caráter publicitário pago pela marca contratante daquele anúncio.

Ocorre que quando o consumidor acredita que aquela informação está distante de algum tipo

de atividade publicitária, encara o conteúdo com maior credibilidade e veracidade fazendo com

que ocorra um tipo enganoso e desleal de consumo do referido produto ou serviço52.

Ocorrendo essa camuflagem nos fins promocionais daquele anúncio, a publicidade

desse tipo acaba por induzir o consumidor a erro, tornando-se, também, um tipo mais ampliado

de publicidade enganosa definida pela doutrina. No entanto, o erro contido nessa publicidade

51 NUNES, Luis Antonio Rizzatto. Curso de direito do consumidor. 7. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2012.

p. 521. 52 DIAS, Luciana Ancona Lopez de Magalhães. Publicidade e direito. – 3.ed. – São Paulo: Saraiva Educação,

2018, p. 284.

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não está atrelado às informações do produto em si, mas sim a forma como a mensagem é

passada. Nesse sentido determina Lucia Ancona Lopez de Magalhães Dias53 em sua obra:

Note-se que na publicidade oculta o engano a que são levados os consumidores não

guarda necessariamente relação com o conteúdo material da publicidade, mas se

refere, prioritariamente, ao aspecto formal de sua apresentação. O consumidor é

induzido a erro não porque a publicidade contém informações falsas sobre as

características de certo produto ou serviço. Isso pode ocorrer ou não. O ponto

fundamental aqui está ligado ao fato de que a natureza promocional da mensagem não

resta manifestada de modo adequado e torna-se imperceptível ao destinatário médio.

Deste modo, identificado o conteúdo promocional, seja quando haja remuneração para

execução daquela publicidade ou algum meio indireto como troca de vantagens, ocultado na

publicidade, podemos estar diante de uma modalidade de publicidade ilícita e vedada pelo CDC

e punível com base nos princípios norteadores consumeristas. Ou seja, quando o influenciador

apenas elogia determinado produto por ter ficado satisfeito após o seu uso temos a livre

manifestação de pensamento deste, mas quando caracterizado o interesse mútuo entre o

influenciador digital e quem comercializou o produto para aferição de vantagens podemos ter

caracterizada a publicidade oculta54.

As possíveis consequências da manifestação de publicidade ilícita nas mídias dos

influenciadores digitais representam objeto específico de análise na presente pesquisa, onde

ainda abordaremos os seus desdobramentos e possíveis efeitos levando em consideração a

legislação fática e as normas traçadas pelos órgãos de autorregulação publicitária nacional.

2.3 Publicidade Infantil e os Influenciadores Digitais Mirins

Importante para análise dos influenciadores digitais nas relações de consumo atual, que

abordemos a temática da publicidade infantil veiculada nas mídias digitais, como também,

tratarmos de forma breve sobre os influenciadores digitais mirins. Não nos caberá aqui analisar

em aprofundamento o ofício desenvolvido por crianças e adolescentes nas redes sociais e sua

proibições e/ou limitações, mas trataremos do tema por ser característica importante da

publicidade digital atual, qual seja, a utilização de crianças para a persuasão de outras crianças,

através da execução de publicidade para o público mirim e adolescente que cada vez mais cedo

passa a usar com afinco as mídias sociais.

53 DIAS, Luciana Ancona Lopez de Magalhães. Publicidade e direito. 3.ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2018. 54 Ibidem.

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A publicidade infantil é enquadrada pela legislação pátria como um tipo de publicidade

abusiva, pois esta publicidade se aproveita da ingenuidade da criança e sua incapacidade de

julgamento do principio básico de identificação de uma publicidade para incentivar a venda de

determinado serviço ou produto55.

Ou seja, a publicidade infantil se aproveita do fato de que a criança não consegue

identificar o caráter publicitário da mensagem à qual está submetida e de que naquela situação

está sendo persuadida para que fins econômicos sejam alcançados, esta prática contraria as

determinações do art. 37, §2º, do CDC56.

Importante ressaltar que além das normas legais consumeristas deverem ser respeitadas,

a publicidade destinada ao público infantil deve obedecer a uma série de normas determinadas

pelo código brasileiro de autorregulação publicitária (CBARP) que reprova, como regra, o apelo

imperativo de consumo dirigido a menores de idade (art.37 do CBARP), fazendo com que essas

propagandas precisem se preocupar ainda mais com o tipo de conteúdo que disseminam que

devem coadunar com os princípios da ética publicitária.

As normas contidas no código brasileiro de autorrergulação publicitária (CBARP) vêm

para complementar a junção de direitos das crianças quanto ao tema da publicidade, visto que,

o artigo 37,§2º do CDC mostra-se insuficiente para tratar da questão por não delimitar com

precisão o conteúdo das campanhas publicitárias destinas a crianças. Por isso, o CBARP traça

os tipos de publicidade permitida e quando são verificados tipos de propaganda fora dos padrões

o CONAR abre representações para deliberar sobre a situação, bem como, pode receber

denúncias de consumidores.

Nesse sentido, temos decisão proferida pelo CONAR com base nos preceitos trazidos

pelo CBARP que em representação de nº 108/18 57datada de junho de 2018 decidiu sobre vídeo

feito por youtuber muito conhecido que produz conteúdo destinado ao público infantil. O

resumo da decisão trás as questões abordadas no caso, dentre elas a falta da identificação

publicitária, vejamos:

55 Resolução nº 163/2014 publicada em 4 de abril pelo Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente

(CONANDA), que dispõe a respeito da abusividade do direcionamento de publicidade e comunicação

mercadológica à criança e ao adolescente, assim considerada aquela cuja intenção é persuadir o público infanto-

juvenil ao consumo de qualquer produto ou serviço, usando para tanto de expedientes que explorem sua

vulnerabilidade, imaturidade, ingenuidade e/ou susceptibilidade à sugestão, decorrentes de sua condição de

pessoas em desenvolvimento. É considerada abusiva, dentre outras, a publicidade e/ou a comunicação

mercadológica no interior das instituições escolares de educação infantil.

<http://www.crianca.mppr.mp.br/pagina-1635.html> Acesso em: 24. nov. 2018. 56 DIAS, Luciana Ancona Lopez de Magalhães. Publicidade e direito. 3.ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2018. 57 CONAR. Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária. Representação 108/18. Nestlé Brasil;

Mondelez Brasil; Arcor do Brasil; Lojas Americanas e Luccas Neto, jun. 2018. Disponível em:

<http://www.conar.org.br/>. Acesso em: 03 nov. 2018..

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Vídeo veiculado em internet do influenciador Luccas Neto em proveito publicitário

da Nestlé, Mondelez, Arcor e Lojas Americanas foi denunciado ao Conar por dois

consumidores paulistanos. Eles entenderam haver no vídeo vários apelos imperativos

de consumo dirigidos a menores de idade - por exemplo: "você precisa correr para

comprar o livrão enquanto está na pré-venda" e "quando esgotar não vai ter como

comprar". Tal prática é reprovada pelo Código Brasileiro de Autorregulamentação

Publicitária. A defesa do influenciador negou tratar-se de publicidade, não havendo

negociação comercial com as empresas citadas, sendo o conteúdo opiniões próprias

de Luccas Neto. As quatro empresas enviaram manifestação ao Conar, negando

envolvimento com o vídeo. Em seu extenso voto, o conselheiro relator repassou a

história e as bases da autorregulamentação publicitária, rebatendo vários pontos da

defesa enviada pelo influenciador. A seguir, o relator discorreu sobre a questão da

identificação publicitária e os contornos que a questão ganhou a partir da proliferação

dos influenciadores em plataformas digitais, lembrando que há farta jurisprudência no

Conselho de Ética sobre situações como a descrita no processo, quando, mesmo com

as partes negando existir relações comerciais entre elas, é possível estabelecer algum

tipo de vínculo que resulte em proveito publicitário.

O relator dividiu as suas recomendações em duas partes. Na primeira delas,

abrangendo a divulgação do denominado "Livrão do Luccas Neto", propôs a

alteração, de forma a suprimir uma série de afirmações que visam, no entendimento

do relator, coagir o consumidor a tomar uma decisão imediata em função de

informação falsa. Ele recomendou também que sejam acrescentadas ao vídeo

sinalizações que não deixem dúvida de que se trata de publicidade. Na segunda parte

do voto, tratando das marcas, o relator considerou ter havido perda de objeto, pelo que

recomendou o arquivamento. Seu voto foi aceito por unanimidade.

Percebemos, então, que a matéria trabalhada com relação a publicidade infantil deve ser

diligentemente percebida e fiscalizada, pois mesmo em meio aos diversos interesses envolvidos

na questão, o público infantil deve ser protegido por ser pessoa ainda em desenvolvimento que

não possui sua capacidade de julgamento clara ou algum tipo de experiência nas relações sociais

que o permita compreender quando está sujeito a um tipo de persuasão publicitária voltada para

o consumo58.

Outra faceta da publicidade infantil é aquela que além de feita para crianças, até mesmo

é feita pelas próprias crianças. Falamos aqui dos influenciadores digitais mirins.

É cada vez mais comum que crianças e adolescentes tenham números grandiosos de

inscritos em seus canais do youtube ou seguidores em suas redes sociais e produzam conteúdo

destinado a outras crianças. Não adentraremos aqui, aos fatores preocupantes da exposição

precoce de crianças e adolescentes nas redes sociais, mas sim falaremos do tipo de publicidade

que por eles é produzida e que demonstra-se muito eficaz por alcançar as crianças de tal forma

que outra publicidade feita por adultos ou nos padrões normais jamais conseguiria.

Uma prática recente e bastante comum na internet entre os influenciadores mirins é o

que se nomeia nos Estados Unidos como unboxing que se traduzido livremente para o português

seria o ato de desempacotar produtos, em específico brinquedos. Os influenciadores mirins

58 DIAS, Luciana Ancona Lopez de Magalhães. Publicidade e direito. 3.ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2018.

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fazem vídeos em que abrem diversos presentes que ganham, sendo eles inúmeros tipos de

brinquedos, e mostram para o seu público as suas características, brincam com esses brinquedos

e demonstram repleta satisfação e felicidade em assim o fazer. Essa prática, por vezes, viola o

princípio da identificação publicitária, expões cada vez mais cedo as crianças ao marketing e

acaba por desrespeitar a menor capacidade do público-alvo, qual seja, a própria criança de

vulnerabilidade agravada.59

Em recente decisão60 proferida pela CONAR, após o envio de ofício pelo Ministério

Público do Estado de São Paulo que questionou a identificação publicitária de anúncio feito em

vídeo no canal de youtuber, blogueira e influenciadora mirim que divulgava uma marca de

brinquedos, o órgão de autorregulação por meio de seu relator decidiu que alterações fossem

feitas no anúncio para que se restasse claro de que se tratava de campanha publicitária

(Resolução 214/2017).

Deste modo, podemos perceber que embora os influenciadores mirins pareçam

inofensivos são utilizados como veiculação de publicidade infantil que atualmente não possui

qualquer restrição quanto a possibilidade de ser praticada por crianças e adolescentes enquanto

influenciadores digitais. Bem como, esses influenciadores aqui mencionados praticam diversos

tipos de conteúdos que se praticados como publicidade televisiva seriam rechaçados, mas que

são difundidos livremente em plataformas como o youtube e instagram (ALMEIDA, 2016).

59 DIAS, Luciana Ancona Lopez de Magalhães. Publicidade e direito. 3.ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2018. 60 CONAR. Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária. Representação 214/17. Mattel; Julia Silva.

abr. 2017. Disponível em: <http://www.conar.org.br/>. Acesso em: 03 nov. 2018.

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3 INFLUENCIADORES DIGITAIS E A PUBLICIDADE ILÍCITA

Até o presente momento, discorremos sobre a publicidade e as suas mais variadas

facetas. Trabalhamos os seus desdobramentos desde o conceito até perpassarmos pelas

publicidades ilícitas, tal como abusiva, enganosa e oculta.

Ocorre que para o estudo objetivo do presente trabalho, entendemos que os mais

variados tipos de publicidade ilícita vêm sendo cometidos pelos chamados influenciadores

digitais, no entanto, tal publicidade também pode ser executada pelos inúmeros meios

veiculadores de publicidade existentes que não objetos de nossa pesquisa. Porém, quando

tratamos dos influenciadores digitais, especificamente, temos um tipo de publicidade ilícita

mais comunmente presente, a publicidade que fere o princípio da identificação da mensagem

publicitária.

Ou seja, a publicidade que modifica as formas de consumo da atualidade e muitas vezes

torna inconsistente a identificação do caráter publicitário da mensagem por meio de dicas,

lifestyle ou até mesmo pela confiança que o público possui nesse influenciador. Essa

publicidade é ilícita por ser oculta, por ser disfarçada, clandestina e por notavelmente

descumprir o artigo 36 do CDC que determina que a publicidade deva ser veiculada de forma

que o próprio consumidor identifique de maneira fácil e imediata61.

O importante princípio da identificação da mensagem publicitária consagra que ao estar

exposto a algum tipo de mensagem de caráter publicitário, o consumidor deve conseguir

facilmente, sem esforço ou capacidade técnica identificar de que a mensagem passada é de

cunho publicitário.62

Quando a identificação clara da mensagem publicitária não acontece com facilidade,

então, o consumidor está exposto e vulnerável aos apelos consumistas sem que nem ao menos

tenha alternativa de fazer juízo de valor sobre aquilo que se pretende comprar.

Isso é facilmente verificável quando observamos a relação de proximidade com que os

influenciadores tratam os seus fãs, fazendo com que estes identifiquem a relação “fã versus

ídolo” como uma amizade, quando na verdade trata-se de um tipo de relação de consumo. Desta

forma, o consumidor fica suscetível à mensagem enviada pelo influenciador, identificando seu

conteúdo com credibilidade exagerada e maior aceitação do que faria caso estivesse frente a um

evidente anúncio publicitário.

61 DIAS, Luciana Ancona Lopez de Magalhães. Publicidade e direito. 3.ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2018. 62 Ibidem.

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Nesse sentido, Lucia Ancona Lopez de Magalhães Dias63, afirma que:

[...] existem mensagens nas quais a função de promover o consumo de certo bem ou

serviço não está tão claramente identificada, exibindo a aparência de uma mensagem

neutra ou não proveniente do fornecedor do produto sobre o qual discorre e, por isso,

pode tornar-se mais influente e eficaz sobre o seu receptor. Tais publicidades são

denominadas de ocultas, clandestinas ou camufladas e seu estudo pela doutrina

brasileira ainda se revela incipiente, embora o tema seja de extrema importância, em

face dos efeitos danosos que tais mensagens podem causar aos consumidores.

Tanto CDC quanto o Código brasileiro de autorregulação publicitária consagram o

princípio da identificação publicitária, trazendo dispositivos que têm como objetivo assegurar

a identificação da mensagem de caráter publicitário enviada aos consumidores. Haja vista que,

podemos inferir que a prática deste tipo de publicidade ilícita é recorrente entre os

influenciadores digitais quando analisamos o número de representações existentes perante o

CONAR, no que tange o tema da publicidade oculta disseminada pelos influenciadores.64

O CONAR65 trata-se de uma organização não-governamental que tem como objetivo

promover a liberdade de expressão publicitária e defender as prerrogativas constitucionais da

propaganda comercial. Também visa impedir que a publicidade enganosa ou abusiva cause

qualquer tipo de constrangimento ao consumidor ou a empresas.

A organização tem como missão, principalmente, o atendimento de denúncias de

consumidores, autoridades, associados ou integrantes da própria diretoria quanto a peças

publicitárias que possam estar em desacordo com o código brasileiro de autorregulação

publicitária. Essas denúncias são levadas a julgamento no Conselho de Ética, assegurando total

e plena garantia de direito de defesa aos responsáveis pela veiculação daquele anúncio. E se

comprovada a veracidade e procedência da denúncia, é sua responsabilidade recomendar a

alteração ou suspensão da veiculação do anúncio.

A seguir, procederemos com o estudo de alguns casos que envolveram influenciadores

digitais e que foram objeto de discussão perante o conselho de ética do CONAR.

63 DIAS, Luciana Ancona Lopez de Magalhães. Publicidade e direito. – 3.ed. – São Paulo: Saraiva Educação,

2018, p.79. 64 Ibidem. 65 CONAR. Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária. Disponível em: <http://www.conar.org.br/>.

Acesso em: 06 nov. 2018.

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3.1 Estudo de caso 01

O presente caso trata da representação de nº 158/2017 66que foi iniciada por queixa de

consumidora contra a influenciadora digital Emilly Araújo após postagem em sua rede social,

divulgando produto da marca Johnson & Johnson.

A influenciadora possui atualmente mais de 4 milhões de seguidores em seu instagram

e ganhou notoriedade após participar de um famoso programa do tipo reality no ano de 2017.

A partir de então Emilly aposta na carreira de influenciadora digital, negociando parcerias com

diversas marcas que são atraídas pelo expressivo número de seguidores que a influenciadora

possui em sua rede social.

Na representação em voga a consumidora que representou contra a publicação de Emilly

informa que considerou a postagem dúbia, não restando clara a identificação publicitária quanto

aos produtos da marca Johnson & Johnson.

Em resposta a representação o anunciante informou que apenas enviou o produto como

brinde, de forma espontânea e que não se tratava, portanto, de publicidade. À espoca dos fatos

a influenciadora não ofereceu defesa perante o CONAR.

Em sede de decisão, a relatora do caso Conselheira Letícia Lindenberg de Azevedo

67contrapôs a argumentação trazida pelo anunciante questionando se a marca teria enviado de

forma espontânea produtos a alguém que dispusesse de poucos seguidores em suas redes sociais

e não alguém como a influenciadora que à época dos fatos possuía cerca de 2,8 milhões de

seguidores. A relatora ressaltou, ainda, que o fato de não haver contrato entre as partes não

encobre a verdadeira intenção do anunciante de vincular o seu produto a um canal que disponha

de grande visibilidade, tal como as redes sociais de influenciadores tão relevantes.

A relatora do caso ainda alerta que esse tipo de prática dos anunciantes “São

subterfúgios que se valem dos tempos modernos para repetir uma prática condenada pelo

Conar: a propaganda disfarçada, que usa da ingenuidade dos consumidores para alcançar seus

objetivos”.

Deste modo, a relatora conclui seu voto decidindo pela alteração na publicação de forma que

deixasse claro de que se tratava de publicidade e seu voto foi acompanhado por maioria.

66 CONAR. Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária. Representação 158/17. Emilly Araújo;

Johnson & Johnson. set. 2017. Disponível em: <http://www.conar.org.br/>. Acesso em: 06 nov. 2018. 67 Ibidem.

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3.2 Estudo de caso 02

Esta representação, de nº 292/1768, foi iniciada por queixa de consumidora contra a

influenciadora digital Evelyn Regly onde questiona sobre publicações da blogueira sobre as

marcas Kibon, Unilever e Eurocolchões.

A influencer e blogueira possui mais de 3,2 milhões de seguidores em seu instagram,

bem como, 3,7 milhões de inscritos em seu canal do youtube. Evelyn é influenciadora muito

conhecida e relevante no ramo de moda e beleza e procurada constantemente por marcas destes

ramos para negociar parcerias, com intuito de divulgar essas marcas em suas redes sociais ou

em seu canal do youtube. A influenciadora até mesmo possui sua própria linha de produtos para

cabelos juntamente com uma marca reconhecida no mercado.

A representação contra a blogueira foi iniciada por meio de uma queixa de consumidora

de São Paulo que informava que as publicações de Evelyn para aquelas marcas não deixavam

claro o seu caráter ostensivo de natureza publicitária, assim como era recomendado pelo código

de autorregulação publicitária.

Em sede de defesa a influenciadora alegou que quanto a marca de sorvete não havia

qualquer cunho publicitário em sua publicação, visto que apenas estava agradecendo pelo

fornecimento do produto a uma festa na qual ela participou. Trouxe alegação semelhante quanto

a menção da Eurocolchões e concluiu argumentando que não houve negociação comercial em

nenhum dos casos mencionados na queixa.

A marca Unilever também apresentou resposta e afirmou que de fato existiu natureza

promocional na publicação e reconheceu o descuido de não explicitar este fato na mensagem

da postagem, informando que solicitaria a correção. A empresa Eurocolchões apresentou sua

defesa também reconhecendo ter havido parceria com a blogueira, no entanto, sem haver

pagamento pela postagem, mas sim o envio do presente.

Na explanação quanto a sua decisão, a relatora do caso Conselheira Cristina de Bonis

iniciou mencionando a contradição ocorrida quanto aos argumentos utilizados em sede de

defesa. A relatora reconheceu a presença de publicidade ocultada na postagem referente a

empresa Unilever e recomendou a alteração pela empresa, porém, com relação a blogueira na

publicidade para a marca Unilever a relatora agravou a decisão decidindo pela alteração do post

agravada de advertência por conta da ocultação de negociação publicitária que apresentou em

68 CONAR. Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária. Representação 292/17. Unilever; Casa

comércio e colchões; Evelyn Regly. mar. 2018. Disponível em: <http://www.conar.org.br/>. Acesso em: 06 nov.

2018.

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sua defesa. No que tange a postagem envolvendo a Eurocolchões, ela propôs o arquivamento.

O voto da relatora foi aceito por unanimidade no conselho de ética.

3.3 Estudo de caso 03

O presente caso trata da representação de número 300/17 69datada de julho de 2018 que

foi proposta pela própria diretoria do CONAR em iniciativa própria.

A representação foi proposta contra os atores televisivos e influenciadores digitais

Fernanda Paes Leme, Bruno Gissoni e Patricia de Jesus por terem feito anúncio em suas redes

sociais promovendo a cerveja da marca Heineken sem que trouxessem a advertência proposta

pelo código de autorregulação publicitária em seu anexo “P” onde se recomenda o consumo

responsável daquele produto. Além desse fato um dos posts não era facilmente identificado

como publicidade.

Em defesa perante a CONAR o anunciante do produto informou não possuir controle

sobre as publicações feitas pelos blogueiros e que assim que constatou os problemas apontados

pela CONAR solicitou que os influenciadores fizessem as modificações necessárias.

A relatora não acolheu os argumentos apresentados pelo anunciante, pois ressaltou que

é de responsabilidade da marca alertar previamente aos que divulgam as suas marcas e produtos.

Desta forma, propôs advertência para a Heineken tendo o seu voto sido complementado de

modo a recomendar a alteração dos anúncios originais que deram ensejo à demanda. O que se

visava ali era prevenir que voltassem a ser veiculados. As recomendações foram aceitas por

unanimidade.

A cervejaria recorreu da decisão alegando ser de caráter excessivamente rigoroso a

decisão, informando ainda, que houve perda do objeto visto que as publicações foram

devidamente corrigidas.

No entanto, os argumentos do anunciante não foram recebidos pela Primeira Câmara de

Especial de Recursos da CONAR, onde o relator confirmou o voto inicial, sendo acompanhado

por unanimidade.

69 CONAR. Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária. Representação 300/17. Heineken; Bruno

Gissoni; Fernanda Paes Leme; Patricia de Jesus. jul. 2018. Disponível em: <http://www.conar.org.br/>. Acesso

em: 07 nov. 2018.

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3.4 Estudo de caso 04

O quarto e último caso foi decorrente da representação de número 031/18 70que foi

iniciada a partir de iniciativa do Conselho Superior da CONAR.

O Ministério Público do Estado de São Paulo por meio de sua promotoria de justiça da

infância e juventude enviou ofício ao CONAR pedindo a sua manifestação com base na ética

publicitária a respeito de vídeos publicitários veiculados na plataforma youtube. Nesses vídeos,

influenciadores de diferentes faixas etárias divulgavam produtos destinados a crianças e

adolescentes. Neste ofício o Ministério Público questionava se o conteúdo dos vídeos apontados

estava de acordo com as recomendações do código de autorregulação publicitária com relação

aos anúncios de produtos e serviços destinados para menores de idade e sua identificação

publicitária nas peças.

O ofício do Ministério Público, movido por representação do Instituto Alana, chegou ao

Conar em janeiro, tendo se optado por desdobrá-lo em nove representações éticas, sendo esta a

primeira delas, sobre ações das lojas de brinquedo Ri-Happy e Long Jump, protagonizadas pelos

blogueiros Julia Silva, Marina Bombonato, Carol Santina, Felipe Calixto e Manoela Antelo,

todos menores de idade. O Google Brasil foi integrado ao processo por ser a plataforma na qual

as ações foram veiculadas.

As partes defenderam-se no Conar. A Ri-Happy argumentou que os vídeos não têm

caráter publicitário e não incorrem em apelo imperativo de consumo dirigido a menor de idade.

Já os blogueiros, de forma geral, informaram não terem recebido pagamento; apenas usufruíram

da estrutura e organização do evento e que o conteúdo aqui tratado tinha natureza editorial.

Alguns informaram não ter havido envolvimento do Google no evento. Não houve defesa por

parte do Google e da blogueira Marina Bombonato.

O relator do caso enumerou dezoito vídeos que foram objetos desta reclamação,

demonstrando que por conta da semelhança existente entre eles e a partir dos artigos 14 e 17 do

CBARP que determina que os anúncios devem ser avaliados tanto com relação a sua letra, mas

também de acordo com o seu espírito e o provável impacto que possa gerar sobre aqueles que

irão assisti-los.

Com base nesse entendimento, o relator concluiu que independentemente dos contratos

firmados entre os anunciantes e os influenciadores mirins, sem importar se as retribuições foram

70 CONAR. Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária. Representação 031/18. Ri Happy

brinquedos; Long Jump; Google Brasil; Julia Silva; Marina Bombonato; Carol Santina; Felipe Calixto; Manoela

Antelo. maio. 2018. Disponível em: <http://www.conar.org.br/>. Acesso em: 07 nov. 2018.

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feitas em dinheiro ou por meio de presentes e viagens, são suficientes para que se configure as

ações de marketing que são reconhecidas pela ética publicitária.

Deste modo, o relator do caso determinou advertência para as empresas Ri-Happy e

Long Jump determinando que em ações publicitárias futuras expressem de forma clara e

adequada aos influenciadores as orientações necessárias quanto a compreensão da

responsabilidade existente no conteúdo de cunho publicitário que é propagado em seus canais.

Essa mesma pena foi estendida aos blogueiros mirins. Propôs ainda o relator, a alteração dos

vídeos para que restasse clara a mensagem com cunho publicitário em cada um deles e os vídeos

não alcançados pela recomendação do relator foram discriminados por ele e considerados de

cunho meramente informativo.

Com relação ao Google o relator considerou que a natureza dessa ferramenta digital está

regulada pelo marco civil da internet e por isso não deveria ser caso de pronunciamento pelo

CONAR. Porém, ainda assim propôs advertência ao Google para que em eventos parecidos

com estes que geraram a representação, a empresa forneça claras orientações aos

influenciadores quanto às regras de ética e responsabilidade publicitária. O voto do relator

Conselheiro Vitor Morais de Andrade foi aceito por unanimidade.

3.5 Entrevista com Influenciador: como os negócios são firmados na prática

O material desenvolvido foi construído por meio de entrevista feita com influenciadora

digital de notoriedade de atuação na internet, mais especificamente nas redes sociais instagram

e youtube.

O objetivo da presente pesquisa é compreender como as parcerias e contratos entre os

influenciadores e marcas são firmados. Também visamos compreender qual é o nível de

conhecimento que os influenciadores possuem com relação às normas éticas e legais quanto à

publicidade propagada nas redes sociais e a existência dos órgãos privados de controle das

práticas publicitárias.

Com intuito de proteger a influenciadora que nos concedeu informações pessoais sobre

a dinâmica de negociação de seus trabalhos, manteremos oculta sua identidade para resguardar

as informações concedidas para a elaboração da presente pesquisa.

Vejamos, a influenciadora entrevistada possui atualmente 92 mil seguidores no

instagram e 460 mil inscritos no seu canal do youtube. Esses números são expressivos com

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relação à média dos influenciadores e já gera interesse de marcas e estabelecimentos que visam

a divulgação de seus produtos e/ou serviços.

Perguntamos sobre as formas de negociação utilizadas nas parcerias com os

fornecedores e sobre os tipos de parcerias existentes. A influenciadora nos afirmou que existem

duas formas principais com as quais trabalha para a divulgação em suas redes, a primeira é por

meio da permuta que significa que a marca oferece um produto para que o influenciador em

contrapartida lhe forneça um serviço de divulgação na forma de post por exemplo. E a segunda

forma é o post patrocinado, quando o influenciador recebe um valor para fazer a campanha e

divulgação.

Quanto aos tipos de parcerias existentes nas negociações de publicidade, nossa

entrevistada informou que existem diversas e as mais utilizadas por ela são presskit que ocorre

quando as marcas enviam produtos aleatórios para o influenciador para que este teste, use e

caso goste possa divulgar os resultados em suas redes sociais. Outra forma é a permuta que

significa a troca de um post por produto, o chamado publipost que ocorre quando o

influenciador recebe um valor da marca para fazer uma postagem sobre aquele determinado

produto, também existe a presença em evento que significa que o influenciador recebe um valor

para comparecer a um determinado evento trazendo visibilidade, credibilidade e interesse dos

seus seguidores, bem como, existem os vídeos patrocinados no youtube quando a marca paga

por um vídeo em que o influenciador divulgue determinado produto falando dos seus benefícios

e das impressões positivas sobre o mesmo.

Com relação às características técnicas da negociação, questionamos a nossa

entrevistada se ela possui algum tipo de contrato para determinar os direitos e deveres daquela

relação firmada e esta informou que possui um contrato básico que determina apenas algumas

cláusulas gerais.

Quanto às informações sobre a responsabilidade da publicidade, bem como, quanto à

importância de tornar clara a mensagem publicitária, informou que isto em regra vem

especificado no contrato firmado com a marca ou no briefing que representa uma espécie de

roteiro fornecido pela empresa onde sugere algumas ideias para a publicação e delimita

restrições para o post e/ou vídeo.

Haja vista ter informado que as condutas quanto às orientações dos posts e vídeos varia

de empresa para empresa, ou seja, algumas empresas são mais rigorosas no que tange o post do

influenciador fornecendo um roteiro informando as características e limites da publicação, mas

outras empresas não apresentam muitas restrições visando, nas palavras da entrevistada, que o

post soe mais “natural”.

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Foi questionado à influenciadora entrevistada se possui algum tipo de conhecimento

sobre os direitos e deveres básicos trazidos pelo CDC com relação à publicidade, bem como

questionamos se possui ciência sobre a existência e atividades do CONAR. Esta respondeu que

não possui conhecimento sobre as normas e princípios trazidos pelo CDC no que tange a

publicidade, como também, não conhece a atuação do CONAR, apenas sabe da existência de

uma recomendação de usar a hastag “publi” nos posts que forem patrocinados.

A entrevistada informou que já ouviu falar de casos em que colegas de profissão

sofreram representações e denúncias por conta da não identificação publicitária em suas

publicações.

Visando compreender como funcionam, na prática, as orientações por parte das

empresas quanto às diversas formas existentes de divulgação de produtos pelos influenciadores

digitais, questionamos sobre as exigências das marcas com relação às características de cada

vídeo ou publicação. A entrevistada informou que quanto às publicações pagas em regra

existem orientações da empresa na forma como querem que o conteúdo seja divulgado, no

entanto, quanto às práticas em que o influenciador divulga aqueles produtos que “ganha” das

marcas, não existe tanto controle do modo em que o divulgará.

Questionamos sobre a existência de algum tipo de retorno ao influenciador a respeito

do aumento das vendas ou da procura de serviços após a divulgação feita por este e a

entrevistada informa que sempre busca esse tipo de relacionamento com as marcas que divulga,

ou seja, procura saber se com sua propaganda existe de fato aumento na procura por aquele

produto ou serviço.

Com intuito de analisar o impacto da publicidade gerada pelos influenciadores digitais

e sua eficácia no contato com os consumidores questionamos se a aceitação daquela propaganda

está mais atrelada ao produto/serviço em si ou à credibilidade que o influenciador possua

perante o seu público. Nossa entrevistada informa que acredita que o fator mais relevante seja

a credibilidade existente entre o influenciador perante o seu público, pois geralmente antes das

marcas fecharem qualquer tipo de contrato com o influenciador pesquisam o seu engajamento

com seu público, os números de suas redes e o relacionamento com seus seguidores no geral.

Questionada sobre as diferenças que percebe entre a publicidade propagada pelos

influenciadores digitais e a divulgada em meios tradicionais como televisão e rádio, a

entrevistada informa que acredita que o ponto diferencial de maior relevância entre as

propagandas está na naturalidade com que o influenciador apresenta o produto por estar em

contato com seu público dia a dia mostrando a sua rotina. Acredita que nas propagandas

divulgadas na televisão, por exemplo, tudo parece muito perfeito se tornando distante do

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expectador, mas a publicidade feita pelo influenciador geralmente evidencia a rotina do mesmo

e acaba por passar maior credibilidade de que de fato esteja sempre usando aquele produto ou

serviço.

Ao responder sobre a existência de recomendações feitas pelas plataformas digitais no

que tange as publicidades divulgadas, a entrevistada informa que desconhece a existência de

qualquer tipo de recomendação de plataformas como instagram, youtube ou facebook sobre a

publicidade exercida em suas mídias. Informa ainda que conhece uma “lei” sobre a marcação

do termo “publi” nos posts patrocinados, mas que não sabe de nada além disso.

Por fim, questionamos se a entrevistada como influenciadora reconhece algum tipo de

diferença nas relações de consumo com o surgimento dos influenciadores digitais. Ela informa

que acredita que essas mudanças de fato ocorreram e atribui causa ao fato dos influenciadores

estarem em constante contato com seus seguidores, mostrando muitos produtos, utilizando

diversos tipos de serviços e que isso pode sim ter contribuído para o aumento do consumo

daqueles que assistem a toda essa exposição dos influenciadores a utilizar diversos tipos de

marcas e serviços, falando sobre os seus benefícios, malefícios e etc., no entanto, acredita que

isso possa variar de pessoa para pessoa.

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4 INFLUENCIADORES DIGITAIS E SUA RESPONSABILIZAÇÃO JURÍDICA

Neste ponto da pesquisa já trabalhamos os mais diversos aspectos da publicidade, como

os tipos de publicidade ilícita, as suas formas de manifestação e como é propagada nas redes

sociais e plataformas utilizadas pelos influenciadores digitais.

Percebemos até aqui, os diferentes modos de manifestação do caráter publicitário da

mensagem publicitária que hoje ocorre através dos influenciadores e as mudanças que estes

trouxeram no que tange as relações de consumo. Pois, os influenciadores digitais atualmente

representam importante ferramenta para que grandes e pequenas marcas divulguem seus

produtos e/ou serviço para os mais diferentes tipos de público alvo.

No entanto, também é válido ressaltarmos que ainda existe um caminho a ser percorrido

quanto às características da mensagem publicitária disseminada pelos influenciadores digitais.

Percebemos por meio dos casos estudados anteriormente que ainda existem publicações dotadas

de caráter ilícito quanto a identificação publicitária, ocultação e publicidade abusiva que por

vezes tornam-se características na publicidade feita por influenciadores. Percebemos que existe

a autorregulação publicitária como forma de controle por meio de órgãos como a CONAR que

fiscaliza a aplicação dos preceitos éticos trazidos pelo código nacional de autorregulação

publicitária.

Haja vista que, neste ponto de nosso trabalho gostaríamos de adentrar no tema da

responsabilização jurídica dos influenciadores. Seria possível o enquadramento da

responsabilidade civil perante a publicidade ilícita assim por eles propagada? Quais são os

instrumentos do CDC e da legislação civil que poderiam ser aplicados ao caso, para incorrer

em indenização e punição esse tipo de prática?

De acordo com as normas trazidas pelo CDC é claramente possível que haja a

caracterização da Responsabilidade Civil decorrente da publicidade ilícita, basta apenas que os

pressupostos desta estejam caracterizados. Ou seja, se ocorre ação ou omissão do agente, o dano

(seja individual ou coletivo) e o nexo causal entre o primeiro e o segundo critério. Haja vista

que, a simples veiculação da publicidade ilícita seja em sua forma abusiva ou enganosa não

caracteriza a presença da responsabilidade civil que gera o dever de indenizar, pois é necessária

a presença de uma junção de fatores como a ocorrência do dano ao consumidor decorrente

daquela prática publicitária especificamente71.

71 DIAS, Luciana Ancona Lopez de Magalhães. Publicidade e direito. 3.ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2018.

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O artigo 6º, VI, do CDC consagra como direito básico do consumidor “a efetiva

prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos”. Ou

seja, a publicidade ilícita irá de fato ensejar o dever de reparação dos eventuais danos causados

ao consumidor. Compreendemos que o dever de reparar não surge de forma automática, mas a

priori não pode ser descartado quando se trata da publicidade ilícita, pois caberá ao consumidor

a demonstração do dano individual decorrente da publicidade ilícita propagada, também deve

ser demonstrado o dano de cunho coletivo quando gerar prejuízos à coletividade no que tange

sua proteção, juízos e valores éticos, de forma que gera ao anunciante o dever de demonstrar

que a veiculação da publicidade não gerou tais efeitos nocivos ou que os fatos trazidos não dão

causa aos danos alegados72.

Ainda quanto ao tema da responsabilização, Rizzatto Nunes73 destaca em sua obra:

O fornecedor-anunciante é sempre responsável pelos danos que seu

anúncio causar, sendo que, no seu caso em particular, ainda responde por

inserção de cláusula contratual ou sua nulificação em função do anúncio.

A agência, como produtora do anúncio, responde solidariamente com

o anunciante, independentemente do tipo de contrato que com ele tenha

estabelecido. Suponhamos que no contrato de prestação de serviços firmado entre o

anunciante e a agência haja cláusula contratual que disponha que, uma

vez aprovado o anúncio pelo fornecedor, corre por conta dele o risco de

causar dano. Essa cláusula terá validade apenas perante eles, não afetando

a garantia legal conferida às pessoas atingidas pela publicidade. Havendo

dano, a pessoa lesada pode acionar um dos dois ou os dois simultaneamente (já que

são solidários), e, depois que eles pagarem a indenização pelos

danos, acertarão entre si os gastos, com base naquela cláusula contratual.

Nesse contexto surgem novos questionamentos, pois, os modos tradicionais de

veiculação de publicidade como rádios, jornais e emissoras de televisão trazem a figura de

agências publicitárias que são responsáveis pela preparação da publicidade encomendada pelo

anunciante, visando a propaganda de sua marca e/ ou serviço. Porém, com a figura recente da

publicidade decorrente do influenciador digital questionamos a respeito da responsabilidade

solidária nos casos do dever de indenizar na publicidade enganosa.

Pois bem, o influenciador é contratado por determinado anunciante e fica responsável

por publicar em suas redes sociais ou em sua plataforma do youtube, vídeos ou posts

publicitários sobre aquele determinado produto e/ou serviço, dessa forma, questionamos a

possibilidade do influenciador figurar nestes casos como uma espécie de “agência publicitária”

da publicidade via redes sociais.

72 DIAS, Luciana Ancona Lopez de Magalhães. Publicidade e direito. 3.ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2018. 73 NUNES, Luis Antonio Rizzatto. Curso de direito do consumidor. 7. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2012.

p. 566.

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Nestes casos, o influenciador é responsável pela produção do conteúdo publicitário, bem

como sua divulgação por meio de suas redes sociais, ou seja, o influenciador faz às vezes de

agência criadora de conteúdo publicitário e meio de veiculação daquela propaganda.

Essa nova forma de disseminar publicidade nos trás questionamentos sobre o

enquadramento do influenciador quanto à sua responsabilização jurídica, questionamos se

estaria ele juntamente responsável com o anunciante nos casos de responsabilização jurídica.

Desta forma, abordaremos neste capítulo a relação com influenciador digital e a legislação civil

e consumerista no que se refere aos danos gerados ao consumidor e sua responsabilidade junto

à marca anunciante do produto.

4.1 Influenciadores Digitais e o CDC

Partindo do pressuposto de que a modalidade publicitária disseminada pelos

influenciadores digitais é recente e inovadora, surgem diversos questionamentos quanto ao seu

enquadramento no que tange as normas consumeristas contidas na legislação pátria.

Deste modo, o que se precisa analisar é se todos os direitos e deveres contidos no CDC

quanto aos tipos de publicidades, as formas de sua aplicação, o modo como se propagam e a

responsabilização jurídica também estariam estendidos aos influenciadores digitais quando

estão no papel de canal veiculador de marketing publicitário.

Pois bem, para melhor e mais completo entendimento do enquadramento do

influenciador digital quanto ao código de defesa do consumidor partiremos da explicitação

trazida por Lucia Ancona Lopez de Magalhaes Dias74 que em sua obra constata que:

Em síntese, a lei de defesa do consumidor cuidou de controlar a publicidade

comercial, assim compreendida como a mensagem promovida por pessoa jurídica,

publica ou privada, difundida no exercício de uma atividade profissional, qualquer

seja o meio de comunicação de massa, com o escopo de promover a contratação de

bens e serviços, direta ou indiretamente (publicidade promocional ou institucional).

Assim sendo, podemos considerar que hoje os influenciadores digitais se enquadram

como um meio de comunicação de massa, visto que, suas redes e plataformas de vídeos

alcançam todos os dias milhões e milhões de consumidores ou consumidores em potencial.

Tornando claro que quando um influenciador propaga uma mensagem publicitária de

cunho comercial, está certamente encaixado no tipo de publicidade que o CDC visa regular, e,

74 DIAS, Luciana Ancona Lopez de Magalhães. Publicidade e direito. 3.ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2018.

p. 60.

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portanto, submete-se aos princípios, direitos e deveres que o código visa resguardar para a

promoção do consumo juridicamente sadio e correto.

Em linhas gerais, o CDC regula diversos aspectos da relação de consumo, porém, no

que se refere aos influenciadores digitais e com base nos temas já abordados na presente

pesquisa, os aspectos mais relevantes do CDC quanto aos influenciadores diz respeito a

publicidade ilícita.

Verificamos, a priori, casos que em sua maioria tratam da identificação publicitária e

publicidade infantil representados perante o CONAR que constitui órgão de autorregulação,

mas nesse ponto é válido também compreender a incidência das normas legais, ou seja, normas

do CDC para com a publicidade criada pelos influenciadores digitais.

O CDC regula de forma mais aberta e geral quanto ao tema da publicidade ilícita, no

seu artigo 37 ele proíbe a prática de duas modalidades, qual sejam a publicidade enganosa e

abusiva, das quais já trabalhamos de forma especifica em nossa pesquisa. No entanto, o que nos

parece importante salientar aqui é que independentemente da forma que a publicidade se

propague, sem importar o meio, veiculo ou canal, se possui as características de publicidade

comercial ela deve estar sujeita aos preceitos trazidos no CDC75.

Resta claro, então, que mesmo sendo meio inovador de veiculação publicitária, os

influenciadores digitais devem respeitar completamente as limitações e imposições trazidas

pelo código quando em suas redes fazem o papel de canal publicitário.

Assim, temos que a fiscalização publicitária proposta pelo estado ocorre, ainda que de

forma limitada, pois também visa preservar a livre iniciativa e a liberdade de concorrência de

mercado. E quando em sua incidência se dá por meio da legislação consumerista ou até mesmo

pela aplicação das leis cíveis ao tema, podendo o influenciador ser acionado juridicamente pela

prática em suas redes sociais de determinada postura publicitária não admitida, sendo punido

não apenas no âmbito nas leis de autorregulação publicitária, mas também no que se refere às

sanções previstas no código brasileiro de defesa do consumidor76.

Podemos aferir, então, que ainda que os influenciadores digitais sejam pessoas físicas

que não representam a regra de veiculadores de publicidade, podem representar a nova geração

da veiculação do marketing, pois os influenciadores são os beneficiados diretos da prática

publicitária acordada entre marca e veículo. Diferente do que ocorre na mídia tradicional como

televisão e rádio onde o canal de veiculação daquela mensagem recebe os valores decorrentes

do marketing (ex. emissora recebe pelos comerciais), com os influenciadores as plataformas

75 DIAS, Luciana Ancona Lopez de Magalhães. Publicidade e direito. 3.ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2018. 76 CENEVIVA, Walter. Publicidade e direito do consumidor. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1991.

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não lucram com as propagandas que estes disseminam, do contrário, apenas o influenciador

lucra com a publicidade que divulga e por isso nessa prática excepcionalmente o canal de

veiculação da mídia publicitária poderia consistir em pessoa física por meio de suas redes

sociais.

Portanto, é possível concluir que mesmo que o CDC tenha sido criado em época que as

práticas publicitárias desenvolvidas pelos influenciadores digitais ainda não existia, a sua

definição geral quanto a identificação publicitária no que tange as práticas de publicidades

ilícitas faz com que o código tenha caráter atemporal que consegue abarcar as novas formas de

disseminação publicitária, ainda que não afirmemos aqui que suas definições sejam suficientes

para atender um campo tão veloz e vasto como a internet representa hoje.

No entanto, é irrefutável o enquadramento dos influenciadores digitais nas normas

trazidas pelo CDC visto que suas redes representam inegável veiculo de divulgação publicitária,

assim como seus vídeos, posts, stories ou qualquer outro meio que utilizem para se comunicar

com seu público alvo apresentando marcas, serviços ou produtos com intuito de gerar o

consumo77.

4.2 O Influenciador Digital como sujeito da Responsabilidade Civil

Configurada a publicidade ilícita, seja na modalidade enganosa ou abusiva, surge o

dever de indenizar os danos que eventualmente possam ter decorrido desse tipo de publicidade.

No que tange os sujeitos que sofrem esse tipo de lesão, os danos podem ser individuais e/ou

coletivos, já com relação a natureza da própria lesão causada os danos podem ser de origem

material ou moral.

Esse direito a indenização, bem como, a possibilidade cumulação entre a natureza moral

e material do dano são assegurados pelo Código de Defesa do Consumidor que no seu artigo

6º, VI determina a reparação de danos patrimoniais ou morais sejam individuais, coletivos ou

difusos como direito básico do consumidor.78

Esse entendimento trazido no CDC que assegura como direito básico do consumidor a

indenização e/ou reparação no caso de danos sofridos decorrentes da publicidade ilícita, faz

surgir no tocante às relações de consumo, a figura da responsabilidade civil objetiva. Desta

77 DIAS, Luciana Ancona Lopez de Magalhães. Publicidade e direito. 3.ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2018. 78 Ibidem.

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responsabilidade decorre o entendimento de que gerado o dano, o fornecedor tem o dever de

indenizar não se exigindo a ocorrência de dolo ou culpa (DIAS, 2018).

Desta forma, o sistema que vai reger a responsabilidade civil que decorra de

publicidade ilícita será o mesmo que rege as demais relações de consumo, ou seja, o sistema

objetivo que tem como fundamento a teoria do risco do empreendimento, bastando apenas

provar a relação do nexo causal da ação ou omissão do agente no que se refere à mensagem

publicitária ilícita e o dano causado ao consumidor (DIAS, 2018).

Nesse sentido, Flávio Tartuce e Daniel Amorim Assumpção Neves79 em sua obra

destacam que:

[...] Código Brasileiro de Defesa do Consumidor consagra como regra a

responsabilidade objetiva e solidária dos fornecedores de produtos e prestadores de

serviços, frente aos consumidores. Tal opção

visa a facilitar a tutela dos direitos do consumidor, em prol da reparação integral dos

danos, constituindo um aspecto material do

acesso à justiça. Desse modo, não tem o consumidor o ônus de comprovar a culpa dos

réus nas hipóteses de vícios ou defeitos dos

produtos ou serviços. Trata-se de hipótese de responsabilidade independente de culpa,

prevista expressamente em lei, nos moldes

do que preceitua a primeira parte do art. 927 [...] Deve ficar bem claro que, como a

responsabilidade objetiva consumerista é especificada em lei, não se debate a

existência ou não de uma atividade de risco, nos termos da segunda parte do comando,

que consagra a chamada cláusula geral de responsabilidade objetiva. Na verdade, o

CDC adotou expressamente a ideia da teoria do risco-proveito, aquele que gera a

responsabilidade sem culpa justamente por trazer benefícios, ganhos ou vantagens.

Em outras palavras, aquele que expõe aos

riscos outras pessoas, determinadas ou não, por dele tirar um benefício, direto ou não,

deve arcar com as consequências da situação de agravamento. Uma dessas

decorrências é justamente a responsabilidade objetiva e solidária dos agentes

envolvidos com a prestação ou fornecimento.

Pois bem, parte da doutrina acredita que além da responsabilização atribuída ao

fornecedor de bem ou serviço que desenvolve a publicidade considerada ilícita, também caberia

atribuir responsabilidade para as agências publicitárias que produzirem certo tipo de

publicidade enganosa ou abusiva. Essas agências, como produtores do conteúdo publicitário

deveriam responder solidariamente pelos possíveis danos decorrentes da publicidade ilícita.

Assim como, os veículos que propagam a mensagem publicitária de cunho enganoso ou abusivo

também o deveriam responder aos possíveis danos ocasionados.80

Neste ponto, a figura do influenciador digital torna-se ao mesmo tempo tão peculiar

quanto relevante ao tema. Pois, o influenciador digital lucra a partir de parcerias fechadas com

79 TARTUCE, Flávio; NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de direito do consumidor: direito material

e processual. 6.ed. ver. atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2017. 80 NUNES, Luis Antonio Rizzatto. Curso de direito do consumidor. 7. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2012.

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empresas e marcas que visam alcançar o público presente nas redes sociais deste. O digital

influencer utiliza a sua imagem para que possam afirmar, indicar ou aconselhar o uso de

determinado produto, se valendo da credibilidade que possuem perante o seu público. Ou seja,

a própria figura e/ou imagem do influenciador digital é quem “garante” a qualidade de boa

procedência daquilo que está sendo anunciado.81

Faz-se importante salientar que são responsáveis pelo anúncio o anunciante, a agência

de publicidade que o produziu e/ou veiculou e o veículo de divulgação utilizado. De certo que

existem diferenciações entre a responsabilização com base nas normas de autorregulação.

Vejamos, o anunciante e as agências são responsáveis solidariamente por algum tipo de

infração que aquele anúncio possa gerar, já o veículo é solidariamente responsável quando o

anúncio disseminado contrariar as normas regulamentadoras do setor e as demais normas

aplicáveis ao tema. Sendo importante que os três participantes da relação – anunciante, agência

e veículo- tenham lucrado com essa publicidade.82

Ademais, é de extrema relevância questionar, nesse tipo de publicidade, o fato dos

influenciadores digitais, quando na execução da publicidade, poderem figurar tanto na figura

das agências como de veículo.

Vejamos, os influenciadores possuem liberdade para decidir como a publicidade que

divulgam em suas redes pode ser feita, escolhem se farão em forma de fotos ou vídeos, quais

cores e palavras utilizarão para chamar atenção do seu público, assim como diversas outras

estratégias para que o seu anúncio seja bem aceito e gere engajamento em suas redes sociais.

Outro ponto importante é o fato dos influenciadores utilizarem suas redes pessoais para

divulgar a mensagem publicitária, eles disseminam o conteúdo em suas redes sociais utilizando

plataformas que não são destinadas à prática publicitária e não aferem lucro com a divulgação,

ou seja, o veículo/canal utilizado pelos influenciadores também é por eles administrado. Os

influenciadores precisam fazer o crivo do conteúdo gerado em suas redes e, portanto, têm total

ciência daquilo que é disseminado visto que a publicação se dá por meio de suas próprias contas

nas redes sociais.

Sabemos que a figura do influenciador digital é nova e muito recente e justamente por

isso não possuímos enquadramento doutrinário definitivo e consensual quanto ao tema, visto

que os autores ainda divergem sobre o enquadramento da responsabilidade civil até mesmo

quanto às agências publicitárias.

81 GUIMARÃES, Paulo Jorge Scartezzini. A Publicidade Ilícita e a Responsabilidade Civil das Celebridades

que dela participam. 2. ed. rev., atual, e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. 82 NUNES, Luis Antonio Rizzatto. Curso de direito do consumidor. 7. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2012.

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No entanto, considerando o posicionamento de autores como Rizzato Nunes83 que

consideram que “o anunciante e a agência são solidariamente responsáveis pelas infrações que

o anúncio produzido possa gerar, bem como pelos danos que causar”, acreditamos que os

influenciadores possuem as características necessárias para que sejam responsabilizados de

forma solidária aos anunciantes pela publicidade ilícita que criam e disseminam em suas redes

sociais fazendo as vezes de agências publicitárias.

Porém, como figura atípica que é, o influenciador digital ainda que atue na criação do

conteúdo publicitário, tendo certa liberdade para determinar como a publicidade chegará ao seu

público não pode ser descaracterizado como pessoa física. Ou seja, o influenciador digital ainda

representa profissional liberal que como regra não pode responder objetivamente pelos danos

decorrentes do produto ou serviços que divulga.

Ou seja, acreditamos que o influenciador digital representa figura “sui generis” que

possui características de agência publicitária quando na “participação do processo de

planejamento, concepção e criação da mensagem publicitária” 84, exercendo controle sobre o

conteúdo da mensagem.

Porém o influenciador também apresenta características de veículo, pois é responsável

pela “difusão das mensagens publicitárias aos destinatários” 85através de suas redes sociais.

Como também, apresenta-se como profissional liberal que atua em coautoria com marcas e

anunciantes, lucrando com as publicidades disseminadas em suas redes sociais.

Nesse diapasão, não nos pareceria justo que o influenciador fosse excluído da

responsabilização assim como ocorre com as celebridades que apenas “emprestam a sua

imagem e voz para o anunciante promover os seus produtos”, visto que, participam do processo

de criação publicitária e lucram com o sucesso da divulgação. Entretanto, também não seria

razoável que fossem responsabilizados de forma idêntica ao fornecedor anunciante já que os

influenciadores são pessoas físicas, profissionais liberais que veiculam “publicidade de

conteúdo patrocinado” em suas mídias sociais86.

Parecendo-nos justo, assim, que o influenciador responda de forma subjetiva e

subsidiária quanto aos danos decorrentes de produtos e/ou serviços, isto é, sendo verificada a

ocorrência de dolo ou culpa grave nas situações em que seja verificado o engano ou

83 NUNES, Luis Antonio Rizzatto. Curso de direito do consumidor – 7. ed. rev. e atual. – São Paulo: Saraiva, 2012,

p.521. 84 DIAS, Luciana Ancona Lopez de Magalhães. Publicidade e direito. – 3.ed. – São Paulo: Saraiva Educação,

2018, p.428. 85 Ibidem, 2018, p.428. 86 DIAS, Luciana Ancona Lopez de Magalhães. Publicidade e direito. – 3.ed. – São Paulo: Saraiva Educação,

2018, p.432

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abusividade. Deste modo, é importante que os influenciadores tornem claro em suas

publicações patrocinadas de que se trata de publicidade. Nesse sentido, determina Lucia Ancona

Lopez Magalhães Dias87 em sua obra:

Parece razoável, portanto, assumir que as celebridades (assim como os chamados

“influenciadores de marketing”) apenas respondem de modo subsidiário e se agirem

com dolo ou culpa grave. Agem dolosamente se endossam características por elas

sabidamente enganosas e, mesmo assim, emprestam a sua imagem. Também se pode

esperar, em certos casos, que a celebridade tenha a diligência de verificar a exatidão

das informações prestadas antes de referendar o produto anunciado [...] Mesmo

quando não recebem um “texto escrito” ou “predefinido” pelo anunciante, gozando

de certa liberdade e “espontaneidade” em suas publicações, é importante que esses

terceiros revelem claramente a natureza publicitária de suas mensagens, sempre que

do seu próprio conteúdo ou forma utilizada não resulte evidente que de publicidade

se trata.

Assim, verificamos a existência de responsabilização civil objetiva solidária no que

tange o influenciador digital nos danos decorrentes única e exclusivamente da publicidade

ilícita por este propagada. Pois é o influenciador produtor do conteúdo publicitário e deve

observar os princípios e normas consumeristas relacionados à publicidade divulgada em suas

redes sociais, respondendo juntamente com os anunciantes pelas infrações advindas da

publicidade ilícita.

No entanto, desconsideramos o influenciador na responsabilidade civil objetiva

solidária junto ao fornecedor quando se tratar de dano decorrente do produto ou serviço

anunciado. Haja vista que, o influenciador figura como profissional liberal, porta-voz, que

precisa ter comprovado dolo ou culpa grave para que seja responsabilizado quanto aos danos

gerados por aquele produto e/ou serviço. Visto que, não responde objetivamente quando presta

informações ou recomendações de conteúdo publicitário já que a teoria do “risco da atividade”

é aplicada apenas aos fornecedores.

4.3 A insuficiência do CDC: regulação, fiscalização e punição dos Influenciadores

Digitais

Pudemos perceber até aqui, que a maior preocupação decorrente das ações dos

influenciadores digitais, tem a ver com a publicidade ilícita que disseminam nas redes sociais,

87 Ibidem, 2018, p.428.

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mais especificamente quanto à falta de identificação publicitária que ocorre em muitas das

vezes.

Esse tipo de propaganda coloca o consumidor em posição de vulnerabilidade maior do

que comunmente já está exposto, pois quando o influenciador não identifica a publicidade em

sua publicação faz com que o consumidor não tenha a opção de escolher se quer ou não investir

em algum produto de consumo, pois encara aquele tipo de publicidade disfarçada como um

conselho, uma dica de alguém em quem confia, não demonstrando propósito de cunho

econômico que existe por detrás da postagem.

Deste modo, faz-se necessária a regulação dos limites publicitários na propaganda pátria

e para isso o sistema de controle de publicidade escolhido no Brasil é o sistema misto, a partir

do qual tanto os agentes privados quanto o Estado controlam as eventuais práticas de abusos

publicitários.

Sendo o controle privado, chamado de autorregulamentar, exercido principalmente pelo

CONAR (Conselho Nacional de Autorregulação Publicitária) que criou o Código Brasileiro de

Autorregulação Publicitária (CBARP). Visando controlar e fiscalizar a ética da propaganda

comercial nestes 30 anos de atividade, foi de grande valia para comerciantes e consumidores,

pois embora não possua o caráter coercitivo da lei as suas decisões costumam ser acatadas pelos

profissionais da área.88

Ocorre que a publicidade disseminada nas redes sociais é recente, mais ainda aquela

exercida pelos influenciadores digitais, representando meio difícil e complexo de ser

fiscalizado, pois o conteúdo disseminado virtualmente é veloz e conta com milhões e milhões

de usuários. Deste modo, fazendo com que a regulação do conteúdo publicitário desenvolvido

pelos influenciadores seja cada vez mais árdua de ser feita, gerando diversas representações ao

CONAR a respeito da publicidade ilícita, já que este atualmente é o modo mais eficaz de conter

ou modificar a matéria publicitária irregular.

A autorregulação exercida pelo CONAR é necessária quando se fala em sistema misto,

visto que o controle unicamente estatal não seria suficiente para abarcar todas as questões

advindas da publicidade disseminada no Brasil. O sistema misto, com a inclusão do controle

privado é de suma importância no que tange a seleridade na resolução das questões, bem como,

seus regramentos apresentam absoluta harmonia com o texto do Código de Defesa do

Consumidor, sendo bem completo e extenso no que se refere às orientações quanto à matéria

publicitária.89

88 DIAS, Luciana Ancona Lopez de Magalhães. Publicidade e direito. 3.ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2018. 89 Ibidem.

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Nesse sentido, Lucia Ancona Lopez de Magalhães Dias90 atenta para o fato de que o

controle exercido pelo CONAR não vincula todos os agentes do mercado, mas suas decisões

obrigam os signatários desse sistema de controle:

[...] Suas normas éticas, como dissemos, não são normas jurídicas, faltando-lhe o

caráter de generalidade e coercitividade que somente a lei e os atos estatais possuem

[...] A despeito da inegável importância do CONAR, inclusive para a proteção dos

direitos dos consumidores, tendo em vista a agilidade de suas decisões, não podemos

ignorar que, como entidade privada, não exerce “poder de polícia” para multar os

anunciantes e/ou fiscalizar a colocação de produtos e serviços no mercado. O controle

exclusivamente autorregulamentar mostra-se, assim, insuficiente para a efetiva defesa

dos consumidores, verificando-se a melhor tutela no sistema misto, que no Brasil

somente se tornou eficaz com o controle estatal exercido a partir da promulgação do

Código de Defesa do Consumidor.

Como tema de importância para o presente trabalho e já mencionado de forma larga e

extensa na presente pesquisa, o CDC veda a prática da ocultação da publicidade, consagrando

assim o princípio da identificação publicitária em seu artigo 28º. Embora tenha recepcionado o

princípio da identificação da mensagem publicitária, o CDC não regulamentou de forma

específica qualquer das técnicas publicitárias, nem tão pouco recepcionou de forma especial

sobre a publicidade oculta como uma das modalidades de enganosidade da publicidade tida

como ilícita. Deste modo, é vedada pelo ordenamento jurídico a publicidade de natureza

camuflada, mas essa proibição se dá de forma geral sendo enquadrada como uma das

modalidades do gênero publicidade enganosa.91

Assim, podemos verificar que quando o CDC não regula de forma específica as técnicas

publicitárias existentes, se abre um lapso vago e extenso de atos de propaganda que por vezes

não são abarcados ou alcançados pela legislação, gerando impunidade e propagação da conduta

ilícita.

Vejamos, a autorregulamentação publicitária é considerada extensa e completa, sendo

suficientemente capaz de regular as situações de irregularidades quanto à publicidade, no

entanto, no que tange a punição de empresas e influenciadores digitais o controle privado

parece-nos incompleto, pois as espécies de punições existentes nesse sentido apenas propõe a

correção do conteúdo publicitário que não esteja de acordo com os parâmetros éticos. Haja vista

que punições em pecúnia ou decorrentes do poder de polícia apenas seriam possíveis de ser

eivadas por aquele que detém tal poder, o Estado.

90 DIAS, Luciana Ancona Lopez de Magalhães. Publicidade e direito. 3.ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2018.

p. 52. 91 Ibidem.

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Portanto, temos que tanto a regulação quanto a punição dos influenciadores digitais ou

marcas que utilizem essa forma de divulgação para seus serviços e produtos, apresentam-se

atualmente em um cenário propício à irregularidade, visto que as medidas punitivas aplicadas

pelo setor privado colaboram para modificar as campanhas denunciadas, mas não vem sendo

capazes de evitar que continuem sendo criadas.

A fiscalização torna-se árdua e complexa quando se trata do âmbito virtual onde a todo

instante milhões e milhões de informações são vinculadas, nos fazendo parecer que a

responsabilização das plataformas digitais seria uma razoável alternativa para que a publicidade

ilícita fosse inibida, pois quando estes usuários que utilizam as mídias sociais para exercer essas

atividades fossem punidos por essas plataformas, tendo seu trabalho de certa forma ameaçado,

faria com que cuidados mais específicos fossem tomados visando que os preceitos éticos do

código de autorregulação publicitária fossem respeitados.

No que tange a ocultação da mensagem publicitária, o maior prejudicado é o próprio

consumidor já que “a eventual camuflagem do caráter publicitário da peça veiculada retira de

seu destinatário a possibilidade de colocar em prática os naturais mecanismos contra a defesa

em relação a uma publicidade transparente” 92. Por isso, vemos como importante a instrução

clara e constante dos usuários quanto às ferramentas existentes para denunciar a publicidade

ilícita, tanto nas plataformas quanto por meio de denúncias perante o CONAR. Deste modo,

munindo o consumidor de conhecimento sobre as formas de denunciar a publicidade oculta, é

também o modo de permitir que se defenda do apelo de consumo.

Consideramos assim, como insuficiente a atuação do CDC quanto à publicidade oculta

gerada pelos influenciadores digitais. Essa prática propagandística tão recente e cada vez mais

presente nas mídias sociais, assim como outras modalidades publicitárias como merchandising,

merecem atenção especial da legislação pátria bem como atualização legislativa e do controle

quanto aos novos modos de propagação da publicitária. Parece-nos que a autorregulação com

o tempo se tornará cada vez mais defasada, por não poder aplicar correções mais severas,

exigindo assim que o controle estatal alcance influenciadores, marcas, agências e plataformas

disseminadoras de conteúdo digital.

92 DIAS, Luciana Ancona Lopez de Magalhães. Publicidade e direito. 3.ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2018.

p. 78.

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CONCLUSÃO

Os influenciadores digitais desenvolvem, atualmente, uma forma de publicidade ágil,

dinâmica e muito eficaz pera os anunciantes. Por meio do seu estilo de vida, apresentam

produtos e serviços com uma maior aproximação do público alvo, por estarem a todo instante

em contato com os seus seguidores nas redes sociais e plataformas digitais onde atuam.

Essa aproximação com o público alvo e o engajamento que possuem com os

consumidores em potencial faz com que as marcas invistam de forma prioritária nesse tipo de

publicidade, fomentando a divulgação de bens e serviços através dos veículos de mídias sociais.

No entanto, tal inovação trás algumas questões que precisam ser discutidas e resolvidas

no que se refere à publicidade propagada pelos influenciadores digitais. Haja vista que, por

atuarem na internet, tornam as mensagens publicitárias mais difíceis de serem fiscalizadas e

controladas em seu conteúdo e propagação.

A atuação dos influenciadores, por vezes, demonstra características que ferem a ética

publicitária quando disseminam propagandas sem identificar de forma explícita o cunho

publicitário da mensagem. É comum que ofereçam, mostrem ou recomendem produtos na

forma de dicas ou conselhos supostamente despretensiosos, não restando claro que aquela

prática visa o lucro e é advinda de negociação financeira entre influenciador e marca.

Esse tipo de atuação é considerada como publicidade ilícita, por ser oculta ou

clandestina. Faz com que o consumidor esteja em situação de vulnerabilidade perante a

campanha publicidade disfarçada, tendo o seu poder de ponderação de consumo comprometido.

Ocorre que a legislação pátria atual mostra-se insuficiente quanto às questões

demandadas por essa publicidade tão recente, as leis consumeristas tratam do tema de forma

geral e não especificada, gerando um grande lapso de impunidade quanto a esses tipos de

atuação publicitária nas redes sociais.

Como a legislação não comporta o tema e mostra-se desatualizada no que tange a

abarcar as novas práticas publicitárias, fica a cargo do controle privado por meio do CONAR e

do Código Brasileiro de Autorregulação Publicitária determinar as regras e limites quanto às

propagandas disseminadas nas redes sociais. No entanto, esse tipo de regulação, embora dotada

de importância e utilidade, por vezes não é capaz de coibir as práticas publicitárias ilícitas

propagadas pelos influenciadores, apenas alterando as publicidades já consumidas pelo público

alto e que após forem denunciadas.

Deve haver responsabilização dos influenciadores digitais quanto ao conteúdo

propagado em suas redes. Além de responder perante a publicidade clandestina, devem ter

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compromisso com os serviços e produtos que divulgam, demonstrando assim respeito aos

princípios éticos publicitários protegidos pelo CDC. Mostra-se imperiosa a responsabilização

quanto aos danos gerados pela publicidade ilícita em que participem e produzam direta ou

indiretamente em suas redes sociais.

Atualizar o regramento consumerista para os veículos atuais de publicidade é importante

para retirar o consumidor da posição de vulnerabilidade. Bem como, utilizar as próprias

plataformas digitais para alcançar o consumidor, instruindo-o sobre os riscos da disseminação

publicitária ilícita também representa palpável alternativa.

Portanto, a atualização legislativa atrelada à efetiva fiscalização quanto à contemporânea

via publicitária trazida pelos influenciadores digitais representa forma eficaz de proteção ao

consumidor e resguardo aos direitos consagrados no CDC. Pois, trazer responsabilização civil

e punição relevante poderá não apenas alterar as propagandas errôneas, mas também inibir

futuras formas ilícitas de manifestação publicitária produzidas nas mídias digitais.

É notória a importância dos influenciadores digitais para a dinamização da propaganda

publicitária e confiabilidade do consumidor quanto aos produtos e serviços testados, aprovados

e divulgados.

No entanto, há a necessidade de atualização da legislação consumerista para que atue

em parceria com o setor privado de autorregulação publicitária, de forma a inibir a publicidade

ilícita. É possível desmotivar essas práticas através de punições mais severas, alertas

informativos nas plataformas digitais e por meio de denúncias por parte dos consumidores, que

para isso, precisam estar esclarecidos quanto ao tema e munidos de poder de decisão frente ao

apelo de consumo do marketing de influência.

É patente o impacto trazido pelos influenciadores digitais nas relações de consumo, na

disseminação publicitária e nas motivações consumistas atuais de uma sociedade cada vez mais

conectada através da internet e mídias digitais. Assim, regulamentação e fiscalização por meio

de parcerias entre agentes estatais e privados são as saídas eficazes para que a publicidade ilícita

seja combatida e as inovações trazidas pelos influenciadores digitais produzam efeitos positivos

na sociedade de consumo constantemente influenciada.

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