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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ
Deise Vieira Pinto
TERCEIRIZAÇÃO E RESPONSABILIDADE DO ESTADO:
ANÁLISE DOS CRÉDITOS TRABALHISTAS.
CURITIBA
2011
TERCEIRIZAÇÃO E RESPONSABILIDADE DO ESTADO:
ANÁLISE DOS CRÉDITOS TRABALHISTAS.
CURITIBA
2011
Deise Vieira Pinto
TERCEIRIZAÇÃO E RESPONSABILIDADE DO ESTADO:
ANÁLISE DOS CRÉDITOS TRABALHISTAS.
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Direito da Faculdade de Ciências Jurídicas da Universidade Tuiuti do Paraná, como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Direito.
Orientador: Rodrigo Pironti Aguirre de Castro.
CURITIBA
2011
TERMO DE APROVAÇÃO
Deise Vieira Pinto
TERCEIRIZAÇÃO E RESPONSABILIDADE DO ESTADO:ANÁLISE DOS CRÉDITOS TRABALHISTAS.
Esta monografia foi julgada e aprovada para a obtenção do grau de Bacharel no Curso de Direito da Universidade Tuiuti do Paraná.
Curitiba, ___ de _____________ de 2011.
____________________________________________Prof. Dr. Eduardo de Oliveira Leite
Coordenador do Núcleo de MonografiaUniversidade Tuiuti do Paraná
Orientador: ____________________________________________Prof. Prof. Rodrigo Pironti Aguirre de Castro
Universidade Tuiuti do ParanáCurso de Direito
Supervisor: _____________________________________________Prof. Dr.
Universidade Tuiuti do ParanáCurso de Direito
Supervisor:______________________________________________Prof. Dr.
Universidade Tuiuti do ParanáCurso de Direito
AGRADECIMENTOS
Dedico este trabalho à Sônia Maria Vieira Pinto e Osni Pinto, meus pais, que não me
deram apenas a vida. Deram-me a oportunidade de crescer em um lar, me
proporcionaram a melhor educação, me ensinaram a ser uma pessoa ética,
responsável, humilde e bondosa, pois assim que sempre os enxerguei. Vocês são
os maiores e melhores exemplos a seguir. Amo vocês com todo meu coração.
Dedico à minha família, em especial, às minhas irmãs. Denise, obrigada por me
ensinar a ler e escrever mesmo antes de entrar na escola... Minhas primeiras
palavrinhas me trouxeram até aqui. Daniela, obrigada por cuidar de mim quando
pequena você é minha segunda mãe. Sem esquecer do pequeno Luiz Henrique.
Amo infinitamente vocês.
Ao meu amado, Ronaldo Junior, por tudo que fez por mim. Obrigada pelas palavras
de incentivo, por me oferecer ombro nas horas difíceis e por entender minha
ausência quando necessitei estudar. Amo você.
À minha melhor amiga, uma das responsáveis por eu estar aqui: Caroline Adamski.
Você é minha irmã de coração. Aos meus colegas da Tuiuti, em especial, à Iaran
Goiz de Moraes e Marsol Melanski Hanzel, que tornaram-se verdadeiras amigas.
Ao meu orientador, ao Mestre Rodrigo Pironti Aguirre de Castro, o qual escolhi em
razão de sua competência.
Por fim, dedico à Deus, que me deu oportunidade de ter uma vida maravilhosa até
aqui. Obrigada por tudo.
RESUMO
O objeto deste trabalho é definir a responsabilidade da Administração Pública em relação aos créditos trabalhistas, advindos dos trabalhadores contratados pela empresas terceirizadas, que por sua vez, prestam serviço ao tomador, chamada de terceirização. Faz um sucinto traço histórico da terceirização no Brasil, na Administração Pública, socialmente e legalmente, bem como o tratamento da doutrina e jurisprudência nacional. Como fontes utiliza livros e artigos jurídicos, bem assim, decisões dos pretórios brasileiros. É relevante o estudo à medida que implica em normas de direito administrativo e direito do trabalho, que neste caso, divergem na proporção da tutela de seu objeto jurídico.
Palavras-chave: terceirização; responsabilidade do Estado; créditos trabalhistas
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO .......................................................................................................062TERCEIRIZAÇÃO....................................................................................................102.1 NOÇÕES INTRODUTÓRIAS...............................................................................102.1.1 Terceirização em atividade-meio e atividade-fim..............................................163 TERCEIRIZAÇÃO NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA............................................213.1 A TERCEIRIZAÇÃO E A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA.......................................213.2 A DESCENTRALIZAÇÃO DA ATIVIDADE...........................................................233.3 TERCEIRIZAÇÃO NA LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL...........................304 A RESPONSABILIDADE DO ESTADO E O PODER JUDICIÁRIO.......................344.1 CONCEITOS FUNDAMENTAIS...........................................................................344.1.1 Responsabilidade objetiva e subjetiva..............................................................354.1.2 Responsabilidade solidária e subsidiária..........................................................374.2 O ENUNCIADO DO TST......................................................................................384.2.1 Aspectos gerais da licitação..............................................................................424.2.1.1 O reflexo nas licitações públicas....................................................................444.2.1.2 Conduta culposa.............................................................................................464.2.1.3 Responsabilidade do Estado nos contratos de Terceirização.......................504.2.1.4 Consequências da responsabilização............................................................515 A DECISÃO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL..............................................545.1 A AÇÃO DECLARATÓRIA DE CONSTITUCIONALIDADE N°16/2007...............545.2 A DECISÃO DO STF E O ENUNCIADO DO TST SOBRE A TERCEIRIZAÇÃO E A RESPONSABILIZAÇÃO DO ESTADO................................................................576 CONCLUSÃO ........................................................................................................61REFERÊNCIAS..........................................................................................................65
1 INTRODUÇÃO
O ordenamento jurídico brasileiro, com o intuito de assegurar a paz social,
regulamenta as relações em sociedade, quais sejam, direitos de cunho coletivo ou
individual. Neste diapasão, impõe-se uma hierarquização de normas, em razão do
bem jurídico tutelado. O conflito normativo reside quando há a proteção de dois
interesses de importâncias fundamentais, no mesmo nível de hierarquia, que ao
mesmo tempo, contrapõe-se.
Assim, o presente trabalha busca expor a responsabilidade subsidiária do
Estado em relação aos créditos trabalhistas em contratos de terceirização firmados
com a administração pública. O embate entre dois interesses legítimos de dois
ramos jurídicos de importância visceral.
No Brasil, o advento da terceirização surge como consequência da
globalização, na década de 80, fruto de uma nova ordem econômica, que revelava-
se mais competitiva, necessitando assim, de mais celeridade para a produção, como
o resto dos países capitalistas no mundo já haviam adotado. Socialmente, a
terceirização possibilita o progresso de um país de forma mais rápida, haja vista que
desde a Revolução Industrial, aprendeu-se que a divisão de tarefas possibilita um
resultado rápido, em maior quantidade e com menor custo.
Na mesma esteira, observou-se que a terceirização não acrescentaria
somente a empreendimentos particulares, mas sim, poderia otimizar as atividades
do Estado. Como bem pontua Maria Sylvia Zanella Di Pietro, ao explicar sobre ela:
A terceirização, bastante utilizada no âmbito da iniciativa privada, aparece hoje entre os institutos pelos quais a Administração Pública moderna busca
a parceria com o setor privado para a realização de suas atividades. Pode-se dizer que a terceirização constitui uma das formas de privatização (em sentido amplo) de que vem se socorrendo a administração pública.1
Desta forma, a terceirização de serviço foi acolhida pelo Estado, para a
prestação de alguns serviços que auxiliariam na prestação dos serviços público fins
da Administração. Desta razão, o Estado necessita de empresas que auxiliem em
serviços que não se destinam a sua atividade final, mas que auxiliam o Estado,
como “atividade-meio”, como limpeza e conservação de suas instalações. Neste
contexto, surge a terceirização de serviços, contratada mediante licitação. A
empresa que cumpre com os requisitos da lei 8.666/93, é contratada pela
Administração. Esta empresa terceirizada, por sua vez, contrata seus empregados,
regidos pelo sistema celetista, compondo no campo subjetivo do contrato de
trabalho o empregado (pessoa física) e empregador (pessoa jurídica de direito
privado).
No âmbito jurídico, sob os obreiros, pairam dois entendimentos: o direito do
trabalho, que fez uma construção jurídica para proteção destes trabalhadores, e o
Direito Público, que vê a terceirização como trabalho específico de qualidade, com
custeio reduzido e mais célere, em prol do coletivo, sendo regulamentado pela lei de
licitações.
Desta feita, a lei n° 8.666/93 (Lei de Licitações) desobriga a administração a
arcar com eventuais débitos trabalhistas advindos de contratos desta natureza, pois
o Art. 71, 1°, dispõe esta prerrogativa. Sendo assim, seria responsável somente a
empresa terceirizada pelo eventual passivo trabalhista.
De toda sorte, o judiciário brasileiro buscou proteger aludidos trabalhadores,
editando o Enunciado 256, a princípio, que com o passar dos anos, culminou no
1 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Parcerias na administração Pública: concessão, permissão, franquia, terceirização, parceria público-privada e outras formas. São Paulo: Atlas, 2009. p. 212.
Enunciado 331, onde prevê em seu inciso IV a responsabilização estatal nestas
relações, de forma subsidiária, caso ocorra o inadimplemento por parte da empresa
contratada pela administração pública. Assim, ineficaz seria o disposto na lei de
licitações em relação à responsabilidade do Estado.
O conflito normativo instaurou-se. Ganhou maiores proporções, chegando ao
Supremo Tribunal Federal, através de Ação Declaratória de Constitucionalidade,
proposta pelo governador de Brasília, no ano de 2007 (ADC nº 16). O Supremo deu
fim a ADC em novembro de 2009. Salienta Leonardo de Oliveira Sirotheau:
Após longas batalhas entre a Administração Pública e a Justiça do Trabalho, no dia 24 de novembro de 2010 (publicado no DJE e DOU de 03/12/2010) parecia que Supremo Tribunal Federal tinha colocado um ponto final na briga: foi declarada a constitucionalidade do Art. 71, §1º da lei nº 8.666/93, mais conhecida como Lei de Licitações, por meio da Ação Direta de Constitucionalidade nº. 16.2
Assim, o Judiciário Trabalhista, viu-se diante da necessidade de reformular
seu enunciado. Desta feita, reuniram-se em meados de maio de 2011 e
reformularam aludido comando segundo a interpretação do Min. Cezar Peluso, isto
é, ‘não impedirá o Tribunal Superior do Trabalho de reconhecer a responsabilidade
com base nos fatos de cada causa’3. Assim, novas condicionantes de
responsabilização subsidiária foram estabelecidas, o que para alguns, nada foi
alterado, tendo em vista que o reconhecimento da constitucionalidade do Art. 71,
§1º, da lei de licitações continua a ser ignorado pela justiça trabalhista, o que traz
desconforto aos administrativistas positivistas.
Entendeu-se que, partindo da interpretação dos votos do Supremo Tribunal
Federal, as novas condicionantes poderiam ser caracterizadas através da culpa in
2 SIROTHEAU, Leonardo de Oliveira. Nova redação da Súmula 331 do TST e sua aplicabilidade contra os entes públicos. Disponível na internet: http://jus.uol.com.br/revista/texto/19317/nova-redacao-da-sumula-331-do-tst-e-sua-aplicabilidade-contra-os-entes-publicos.3 Disponível na internet: http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=166785.
eligendo ou culpa in vigilando do Estado, isso porque os arts. 58, III, e 67, ambos da
Lei nº 8.666/93, impõem à administração pública o dever de fiscalizar a execução
dos contratos administrativos de prestação de serviços por ela celebrado. O que
vem sendo criticado por alguns doutrinadores.
Assim, o presente estudo que segue busca demonstrar de maneira sucinta a
terceirização de serviços públicos no Brasil, bem assim, o tratamento jurídico de
referido fenômeno, que possui não só espaço na Doutrina de ambos os ramos
jurídicos, mas sim, uma explícita construção jurisprudencial, merecendo atenção
pelos estudiosos do Direito.
2. TERCEIRIZAÇÃO
2.1 NOÇÕES INTRODUTÓRIAS
A terceirização do trabalho é um fenômeno não tão atual, no entanto,
contemporâneo. Segundo Rubens Ferreira de Castro, tem sua origem em razão da
Segunda Guerra Mundial, na primeira metade do século XX.4 A necessidade de
suprir a excessiva demanda de itens bélicos, fez com que se tornasse necessário o
aprimoramento de técnicas de produção, e consequentemente, a terceirização de
mão-de-obra. Explica ainda que
é certo que anteriormente a segunda guerra mundial existiam atividades prestadas por terceiros, porém não poderíamos conceituá-las como terceirização, pois somente a partir deste marco histórico é que temos a terceirização interferindo na sociedade e na economia, autorizando seu estudo pelo Direito social, valendo lembrar que este também sofre grande aprimoramento deste então.5
A partir da década de 70, uma nova forma de estrutura organizacional passou
a ser adotada na ordem mundial, trazendo diversas mudanças, desde a organização
do trabalho até uma nova forma de relacionamento com as empresas e firmas.
Segundo Rubens de Castro, assim, a produção em massa, passou a ser uma
produção flexível e enxuta. Neste sentido, a terceirização sai do campo da indústria
e expande-se para novas áreas.
No Brasil, a terceirização surge ao final da década de 1980, com um
chamamento a competitividade aos nacionais, como ingrediente para alcançar a
modernidade, em que se enquadravam confortavelmente as Nações desenvolvidas.
Foi introduzida pelas marcas de automóveis, e assim como aconteceu no exterior,
aqui a terceirização também evoluiu para outras searas. Pode-se dizer, então, que
inédita mesmo é a importância que terceirização adquiriu nos panoramas social,
4 CASTRO, Rubens Ferreira de. A terceirização no Direito do Trabalho. São Paulo: Malheiros, 2000. p. 76.5 CASTRO, Rubens Ferreira de. op. cit. p. 76.
cultural e econômico do mundo todo e, no Brasil, em especial, nos campos jurídicos,
trabalhista e empresarial.6
A terceirização, conceitualmente, segundo os ensinamentos de Vantuil
Abdala, seria uma moderna técnica administrativa e competitiva que consiste no
repasse de atividades secundárias a empresas especializadas, concentrando-se a
contratante em sua atividade principal.7 Já para Arion Sayão Romita, a terceirização
consiste na contratação de empresas prestadoras de serviços.8
Ainda, na acepção e significado da atividade, explica Mauro Cesar Martins de
Souza, que a terceirização nada mais é que atribuir a terceiros – daí a vulgarização
da nomenclatura – serviços e afazeres ligada a atividade meio da empresa.9
Nesta mesma esteira, explica Sérgio Pinto, em sua obra sobre terceirização e
direito do trabalho:
Terceirização deriva do latim tertius, que seria o estranho a uma relação entre duas pessoas. Terceiro é o intermediário, o interveniente. No caso, a relação entre duas pessoas poderia ser entendida como a realizada entre o terceirizante e o seu cliente, sendo que o terceirizado ficaria fora dessa relação, daí, portanto, ser terceiro. A terceirização, entretanto, não fica restrita a serviços, podendo ser feita também em relação a bens ou produtos.10
Destaca-se também a conceituação de Rubens Ferreira de Castro que define
a terceirização como:
Uma moderna técnica de administração de empresas que visa ao fomento da competitividade empresarial através da distribuição de atividades
6 LEIRIA, Jerônimo Souto; SOUTO, Carlos Fernando; SARATT, Newton Dorneles. Terceirização Passo a Passo: O caminho para a administração pública e privada. Porto Alegre: Sagra-DC Luzzato, 1993. p. 23.7 ABDALLA, Vantuil. Terceirização: atividade-fim e atividade-meio – responsabilidade subsidiária do tomador de serviço. Revista LTr, São Paulo, v.60, n.5, p.587-590, maio 1996.8 ROMITA, Arion Sayão. Sindicalismo, economia, estado democrático: estudos. São Paulo:LTr, 1993, p.32-33.9 MARTINS, Sérgio Pinto. A terceirização e o Direito do Trabalho. 7 ed., São Paulo, Atlas, 2005. p. 19.10 MARTINS, Sérgio Pinto. op.cit. p. 19.
acessórias a empresas especializadas nessas atividades, a fim de que possam concentrar-se no planejamento, na organização, no controle, na coordenação e na direção da atividade principal.11
Há ainda, por fim, na acepção do termo, que se destacar o doutrinador
Maurício Godinho Delgado, que assevera em sua obra o tema em estudo:
Para o direito do trabalho terceirização é o fenômeno pelo qual se dissocia a relação econômica de trabalho da relação justrabalhista que lhe seria correspondente. Por tal fenômeno insere-se o trabalhador no processo produtivo do tomador de serviços sem que se estendam a este os laços justrabalhistas, que se preservam fixados com uma entidade interveniente.12
O presente trabalho, busca demonstrar a terceirização de serviços na
administração pública, tais como os de limpeza e conservação, dentre outros, e seus
efeitos na esfera jurídica.
A terceirização surge no contexto de que o Estado pode se valer para a
melhoria da gestão do interesse público. Explica a autora Cristiana Fortini:
A terceirização costuma ser definida como projeto de gestão empresarial que consiste na transferência para terceiros de serviços que, originalmente, seriam executados dentro da própria empresa. Com a terceirização, libera-se a empresa da realização de atividades, permitindo a concentração de esforços em segmentos mais relevantes. A terceirização equipara-se na idéia de eficiência, permitindo, ainda, em tese, a redução de custos.13
Cristiana Fortini ressalta que os administradores públicos, seduzidos pela
agilidade do setor privado, têm se valido da terceirização. Notadamente segue em
descompasso com o ordenamento jurídico, no tocante aos direitos trabalhistas e a
normativa administrativa.
11 CASTRO, Rubens Ferreira de Castro. op. cit. p. 75.12 DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 2 ed., São Paulo, Ltr, 2003, p. 429-430.13 FORTINI, Cristiana. O perfil do Direito Administrativo Atual e o emprego da terceirização pela administração pública. Revista eletrônica sobre a reforma do estado. Disponível na internet: http://migre.me/5FCfz p. 03.
De acordo com Maria Sylvia Zanella Di Pietro, existe um certo consenso entre
os doutrinadores do direito do trabalho em definir a terceirização como a
contratação, por determinada empresa, de serviço de terceiro para o desempenho
de atividade-meio.14
Segundo a supracitada doutrinadora, a terceirização é inseparável da idéia de
parceria.15 Nesta modalidade ocorre a transferência da execução das atividades
acessórias a parceiros especializados.
Clóvis Rodrigues Filho lembra que no diploma celetista, como denotado no
art. 455, encontramos sinais de terceirização16, in verbis:
Art. 455: Nos contratos de subempreitada responderá o subempreiteiro pelas obrigações derivadas do contrato de trabalho que celebrar, cabendo, todavia, aos empregados, o direito de reclamação contra o empreiteiro principal pelo inadimplemento daquelas obrigações por parte do primeiro.
Parágrafo único. Ao empreiteiro principal fica ressalvada, nos termos da lei civil, ação regressiva contra o subempreiteiro e a retenção de importâncias a estes devidas, para a garantia das obrigações previstas neste artigo.17
Na terceirização sob a forma de empreitada se diferencia da terceirização que
tratamos aqui. De acordo com Maria Sylvia Zanella Di Pietro:
Na terceirização sob a forma de empreitada, o objeto do contrato é a realização de certa atividade pela empreiteira, visando a determinado resultado, que pode ser uma obra, um serviço ou mesmo o fornecimento de bens. Na locação de serviços por meio de interposta pessoa, o objeto de fornecimento é a mão-de-obra.18
Em 1974, a Lei 6.019, inspirada na legislação francesa, veio a regulamentar o
serviço terceirizado no mercado privado, autorizando o trabalho temporário não só
14 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Parcerias na administração Pública: concessão, permissão, franquia, terceirização, parceria público-privada e outras formas. São Paulo: Atlas, 2009. P. 213.15 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. op. cit. p. 214.16 RODRIGUES FILHO, Clóvis. Disponível na internet: http://migre.me/5MSWH17 BRASIL. Consolidação das leis trabalhistas. Disponível em: http://tinyurl.com/3vo8w4y18 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Parcerias na administração Pública: concessão, permissão, franquia, terceirização, parceria público-privada e outras formas. São Paulo: Atlas, 2009. p. 214.
na atividade meio da empresa, mas também na atividade fim, permitindo ao
empregado terceirizado substituir o trabalhador regular ou permanente nos casos de
necessidade transitória ou acréscimo extraordinário de serviço.19
Em 1983, a Lei 7.102, dispunha sobre Segurança para Estabelecimentos
Financeiros, estabelecendo normas para constituição e funcionamento das
empresas particulares que exploram serviços de vigilância e de transporte de
valores, sendo alterada mais tarde pela lei nº 8.863, de 28 de março de 1994.20
Com exceção dos casos de que tratam a lei 6.019/74 e 7.102/83, que prevêm
o trabalho temporário e os serviços de vigilância e transporte de valores, a
terceirização ainda era um tema mal interpretado no Brasil. Desta feita, o intuito de
apenas reduzir custos, não prestando a devida atenção a categoria que surgia, que
o Judiciário consolidou posicionamento jurisprudencial para condenar a contratação
de aludidos serviços. Explica Jerônimo Souto Leiria:
O problema é que a terceirização nestes casos muitas vezes não passam de um mascaramento de contrabando de mão de obra, com empresário inescrupulosos utilizando-se da fachada de empreiteiras que se eximem das responsabilidades legais (férias, 13° salário, fundo de garantia, etc) para com seus empregados. Dentro deste quadro, é óbvio que o Judiciário trabalhista considere ilegal a prática que não pode ser confundida com a verdadeira terceirização.21
Nessa esteira, a magistratura laboral assistindo a estes fenômenos sociais, no
ano de 1986, editou o enunciado número 256, que trazia em seu texto que, “salvo
nos casos previstos nas leis nº. 6.019/74 e 7.102/83 é ilegal a contratação de
trabalhadores por empresa interposta, formando-se o vínculo empregatício
19 RODRIGUES FILHO, Clóvis. op. cit. p. 0120 RODRIGUES FILHO, Clóvis. op. cit. p. 0121 LEIRIA, Jerônimo Souto; SOUTO, Carlos Fernando; SARATT, Newton Dorneles. Terceirização Passo a Passo: O caminho para a administração pública e privada. Porto Alegre: Sagra-DC Luzzato, 1993. p. 105.
diretamente com o tomador de serviços”.22 Ilustra Sérgio Pinto Martins que, os
precedentes que deram origem a consolidação deste entendimento seriam os
empregados de limpeza que possuíam vínculo com o tomador de serviços.23 Até
então, permitia-se apenas o trabalho temporário e o serviço de vigilância. Conclui
dizendo que mais tarde, após o Ministério Público do Trabalho ajuizar inquéritos
civis, especialmente contra o Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal, foi
requerida a revisão do enunciado 256, como será explicado ainda neste estudo.
Surge assim o Enunciado 331, hoje, súmula, por força da Resolução
129/2005 do Tribunal Pleno do TST, o qual será tratado de forma mais específica
adiante.
Pedro Vital Neto explica que o procedimento atenta contra a moral e contra a
dignidade do trabalho, ‘procurando ladear a aplicação das normas e proteção. Em
tais hipóteses e a luz do disposto no art. 9° da CLT, é natural que se reconheça a
responsabilidade do tomador de trabalho’.24
Desta ordem, podemos verificar que no Brasil existem os seguintes
regulamentos jurídicos para a terceirização, a saber: a Lei 6.019/74, de Trabalho
Temporário, a Lei 7.102/83, de Serviço de Vigilância, a Súmula 256, hoje cancelada,
mas que ainda se aplica às situações anteriores à Constituição de 1988 e a Súmula
331. Por outro lado, no âmbito administrativo, a lei de licitações traz em seu bojo a
um tratamento diferenciado em relação à terceirização, incompatível com o
entendimento da Súmula 331. Para isso, precisamos entender que tipos de
atividades são objeto de terceirização lícita na administração pública e suas
conseqüências na seara trabalhista.
22 BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. Disponível em: http://migre.me/5LGiQ.23 MARTINS, Sérgio Pinto. Op. cit. p.130.24 VITAL NETO, Pedro. Revista de Direito do Trabalho, n°80, pág. 20-33.
2.1.1 Terceirização em atividade-meio e atividade-fim
Como se depreende do entendimento do TST em relação à terceirização
lícita, a Súmula 331, só aceita como válida a terceirização de atividade-meio.25 A
eficiência é um princípio e objetivo da máquina estatal na prestação de um serviço
público, mas sua leitura há de ser feita em consonância com os demais valores
preconizados na Constituição. No entanto, a Administração Pública, para alcançar
suas finalidades com eficiência, deve observar as normas estabelecidas, sobretudo,
na Constituição Federal. Conforme se denota da leitura do art. 37 da Carta Magna,
se estabelece que, para preencher um cargo na administração, é necessária a
“aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo
com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei,
ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre
nomeação e exoneração”.26
Neste sentido, o Tribunal de Contas da União editou a súmula 231, acerca da
exigência de concurso público para referidos cargos:
Súmula 231. A exigência de concurso público para admissão de pessoal se estende a toda a Administração Indireta, nela compreendidas as Autarquias, as Fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público, as Sociedades de Economia Mista, as Empresas Públicas e, ainda, as demais entidades controladas direta ou indiretamente pela União, mesmo que visem a objetivos estritamente econômicos, em regime de competitividade com a iniciativa privada.27
A respeito da eficiência almejada pelo poder público, salienta Rafael Soares
de Souza:
Se de um lado há o princípio da eficiência, de outro, há de se notar que a eficiência administrativa é apenas um dentre os diversos princípios
25 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. ibid. 216.26 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Art. 37, II. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm27 BRASIL. Tribunal de Contas da União. Disponível na internet: http://migre.me/5Fn46.
constitucionais. A eficiência "a todo custo", não é um fim em si mesma e não pode ser admitida, sob pena de subverter todo o sistema constitucional. É de se lembrar do direito de acesso aos cargos públicos. A prática de transmitir a terceiros, estranhos aos quadros do serviço público, funções finalísticas do aparelho estatal grassou por quase toda a Administração Federal Direta e Indireta e hoje tem proporções tão extensas que nem o próprio Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, incumbido da política de recrutamento de pessoal, consegue determinar seus números com a precisão necessária.28
O autor relembra que para realizar a eficiência dos serviços públicos, deve-se
respeitar, como citado, a investidura de cargos na administração através de
concurso público, ao contrário do que já ocorreu, de transmitir a terceiros qualquer
tipo de atividade estatal, sem observar os parâmetros legais. Desta forma, a doutrina
e a jurisprudência criaram um ficção jurídica, para determinar que tipos de atividade
poderiam ser terceirizadas na administração pública. Criaram então a distinção entre
atividade-meio e atividade-fim.
Para a maioria da doutrina a terceirização só se concretiza quando há
intermediação de mão de obra ligada a atividade meio da empresa.29 Explica Cesar
Martins de Souza que atividade-fim é aquela ligada diretamente ao núcleo da
atividade. Já nas atividades-meio não se concentra no núcleo da atividade, é apenas
caminho para alcançar seu objetivo final.
O magistrado Vantuil Abdalla, do Tribunal Superior do Trabalho, diz não haver
parâmetros definidos para diferenciação das atividades-fim e atividades-meio,
correspondendo a uma zona cinzenta de aproximação entre uma e outra, sendo a
diferenciação calcada na especialização, na concentração de esforços naquilo que é
28 SOUZA, Rafael Soares. A administração pública e a terceirização da atividade-fim. Disponível na internet:http://jus.uol.com.br/revista/texto/17523/a-administracao-publica-e-a-terceirizacao-da-atividade-fim p. 01.29 SOUZA, Mauro Cesar Martins de. Síntese trabalhista. Porto Alegre. Editora Síntese. V.1, n. 1, jul. 1989.
a vocação principal da empresa, na busca de maior eficiência na sua finalidade
original, e não apenas a diminuição de custos.30
A súmula 331 do TST admite a terceirização na atividade-meio e não na
atividade-fim. Há diferentes entendimentos, especialmente na doutrina mais
vanguardista.
Desta sorte, destaca-se Amauri Mascaro Nascimento, justifica em sua obra
que
As empresas têm terceirizado em hipóteses mais amplas e em alguns casos assumem riscos extrapolando a área em que é possível terceirizar, que é a das atividades-meio, o que é inevitável dada à insuficiência do referido critério. É que há atividades coincidentes com os fins principais da empresa que são altamente especializadas e, como tal, justificar-se-ia plenamente, nas mesmas também, a terceirização. O processo mundial de terceirização desenvolveu-se em função da necessidade de empresas maiores contarem com a parceria de empresas menores especializadas em determinado processo tecnológico.31
Com efeito, Sérgio Pinto Martins relembra que
A terceirização não está definida em lei, nem há norma jurídica tratando até o momento, do tema. Trata-se, na verdade, de uma estratégia na forma de administração das empresas, que tem por objetivo organizá-la e estabelecer métodos da atividade empresarial.32
Para Sérgio Pinto Martins não há ilegalidade quando o empresário terceiriza
sua atividade, seja ela meio ou fim, pois cabe a ele a conveniência de adotar um
planejamento estratégico dentro da sua própria empresa, com vistas a reduzir seu
custo de produção, gerando assim emprego e renda.
O Decreto nº 2.271, de sete de julho de 1997, dispõe sobre a contratação no
âmbito da Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional. Em seu
artigo primeiro, autoriza a contratação da terceirização, a saber:
30 ABDALLA, Vantuil. Terceirização: atividade-fim e atividade-meio – responsabilidade subsidiária do tomador de serviço. Revista LTr, São Paulo, v.60, n.5, maio 1996, p.587-590.31 NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Alcance da responsabilidade laboral nas diversas formas deprestação de serviços por terceiros. Genesis, Curitiba, v.6, n.31, jul. 1995, p.7-11.32 MARTINS, Sérgio Pinto. Op. cit. p.19.
Art. 1º No âmbito da Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional poderão ser objeto de execução indireta as atividades materiais acessórias, instrumentais ou complementares aos assuntos que constituem área de competência legal do órgão ou entidade.§1º As atividades de conservação, limpeza, segurança, vigilância, transportes, informática, copeiragem, recepção, reprografia, telecomunicações e manutenção de prédios, equipamentos e instalações serão, de preferência, objeto de execução indireta.33
Este decreto é exceção e foi elaborado para o Poder Executivo. Os demais
poderes continuam sem regulamentação, recorrendo, quando necessário, aos
Termos de Ajuste de Conduta.34
Destaca-se Sérgio Pinto Martins ao fazer a distinção entre a Terceirização
lícita da ilícita, em relação à administração pública, para melhor compreender a
súmula 331. Primeiramente, diz o doutrinador que a terceirização é lícita, nos termos
da lei 7.102/83 e 6.019/74, como já falamos, entre outras formas, podendo destacar
o contrato de subempreitada e a prestação de serviços prevista no diploma civil
brasileiro, dos arts. 610 a 626. No entanto relembra o autor que
A administração pública está adstrita ao princípio da legalidade, só podendo fazer aquilo que a lei determina. Assim as forma de terceirização na Administração Pública deverão estar respaldadas na lei, sob pena de ilegalidade do ato e responsabilidade do servidor que o praticou.35
Complementando a mesma idéia, Maria Sylvia Zanella Di Pietro ressalta que
a inexistência de pessoalidade e subordinação é importante para distinção da
terceirização lícita - sob a forma de prestação de serviço - da ilícita, sob a forma de
fornecimento de mão-de-obra. Neste sentido explica:
O que e possível, como forma de terceirização válida é o contrato que tenha por objeto a prestação de serviço, a semelhança do que ocorre com a empreitada em que o contratante quer o resultado, por exemplo, o serviço
33 BRASIL. Decreto nº 2.271/1997. Disponível em: http://migre.me/5MTQs34 ALVES, Osvaldo Nunes. Terceirização de Serviços na Administração Pública. Disponível na internet: https://acessoseguro.tcu.gov.br/portal/pls/portal/docs/769538.PDF p. 01.35 MARTINS, Sérgio Pinto. op. cit. p.158.
de limpeza, de transportes, de vigilância, de contabilidade e outros que não constituam atividade-fim da empresa tomadora de serviço.36
Na ausência de regulamentação legal, a magistratura trabalhista firma seu
entendimento e estabelece que a administração pública somente terceirizará
serviços quando estes forem atividade-meio, sendo inadmissível a atividade-fim ser
terceirizada, nos ditames da Súmula 331. Ainda, nesta esteira, a opinião de Maria
Sylvia Zanella Di Pietro, quanto a pessoalidade na terceirização licita, que não
representa mera intermediação de mão-de-obra, pois ao tomador de serviço é
irrelevante a identidade do agente que desempenha a atividade, pois seu objetivo e
apenas e tão somente o alcance do fim pactuado. Se o tomador escolhe o
trabalhador, dá ordens diretas a ele e exerce os poderes do empregador, estará
presente a pessoalidade e subordinação, o que irá descaracterizar a terceirização
lícita.
Assim, as atividades-meio classicamente terceirizadas, seriam os serviços de
limpeza, de segurança, mensageiro e a manutenção patrimonial e conservação.37
Esta modalidade é autorizada, não gerando vínculo empregatício com o tomador, de
acordo com o III, da súmula 331.
36 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Parcerias na administração Pública: concessão, permissão, franquia, terceirização, parceria público-privada e outras formas. São Paulo: Atlas, 2009. p. 216.37 SOUZA, Mauro Cesar Martins de. Síntese trabalhista. Porto Alegre. Editora Síntese. V.1, n. 1, jul. 1989: editora síntese. p. 134.
3 TERCEIRIZAÇÃO NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
3.1 A terceirização e a administração pública
Como dito alhures, a terceirização é uma forma de estruturação em termos de
organização estratégica. Desta feita, resta saber a razão pela qual a administração
pública se utiliza deste expediente.
Conforme pondera Diogo Palau Flores dos Santos:
Os recursos empregados pela administração advêm dos cofres públicos, que por sua vez, são mantidos pela sociedade. O numerário disponível à administração pública para a consecução dos objetivos advém dos tributos pagos pela sociedade, da mesma forma que a manutenção do aparelhamento necessário para esses objetivos. Ocorre que esses recursos são limitados, pois também é limitada a disponibilidade financeira da sociedade.38
Neste diapasão, considerando a escassez dos recursos públicos de que
dispõe a sociedade e, muitas vezes, a técnica a ser destinada pelo serviço
pretendido, é que se torna indispensável à utilização eficiente desses recursos
públicos, em homenagem ao princípio da eficiência.
Segundo ensina o eminente doutrinador José Afonso da Silva:
Eficiência não é um conceito jurídico, mas econômico, não qualifica normas, qualifica atividades. Assim, o princípio da eficiência orienta a atividade administrativa no sentido de conseguir os melhores resultados com os meios escassos que se dispões e a menor custo.39
Destarte, a eficiência administrativa se dá pela melhor aplicação de meios e
recursos, sejam humanos ou materiais, para melhor satisfazer as necessidades
coletivas.
Portanto, face tais análises, a administração pública decide terceirizar
determinada atividade em inteligência ao princípio da eficiência, considerando que
38 SANTOS, Diogo Palau Flores dos. Terceirização pela Administração Pública: Estudo da Responsabilidade Subsidiária. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 44.39 SILVA, José Afonso da. Comentário contextual a Constituição. 2 ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 377.
os recursos disponíveis não são infinitos. Da análise de tais premissas, chegamos a
conclusão de que a terceirização é utilizada como instrumento de emprego de
recursos de forma eficiente.
Rodolfo Pamplona Filho, tecendo comentários sobre a terceirização e a
responsabilidade patrimonial da administração pública, relembra ainda, que o
contexto da terceirização na administração advém da idéia de Estado Mínimo, sendo
esta a solução para a Administração Pública Moderna.40 Ainda, Pamplona relembra
que para entendermos, é necessário fazer um panorama histórico, onde surgem o
princípio da eficiência e estado mínimo em nosso país. No Brasil, com Getúlio
Vargas, na década de 50, o início do chamado “Estado Social”, onde houve a
intervenção do Estado em todos os setores da sociedade e na economia, bem como
o aumento de prestação de serviços públicos como resposta a demanda social. 41
Nesse contexto, dissociou-se a Administração Pública em Direta e Indireta.
Neste mesmo sentido, explica Priscila Gil Silva, que neste período, com a
crescente adoção pelo mundo das técnicas de terceirização, como dito no início do
capítulo anterior, e a crise do Estado Brasileiro, como depreendeu-se o período de
contração de dívidas do período ditatorial e Collor, abriu-se espaço para os agentes
privados suprirem as necessidades, tendo-se em vista a ineficiência estatal.
Nitidamente ‘vemos então o Estado abrir mão daquilo que antes era de sua
competência para que terceiros a administrem’.42
Comungando desta mesma opinião, ressalta-se Carolina Pereira Mercante:
40 PAMPLONA FILHO, Rodolfo.Terceirização e Responsabilidade Patrimonial da Administração Pública. Disponível na internet: http://migre.me/5MU5Y p. 06.41 SILVA, Priscila Gil. Administração Pública: breve panorama sobre modelos de gestão. Disponível na internet: http://www.migalhas.com.br/mostra_noticia_articuladas.aspx?cod=62378.42 SILVA, Priscila Gil. Administração Pública: breve panorama sobre modelos de gestão. Disponível na internet: http://www.migalhas.com.br/mostra_noticia_articuladas.aspx?cod=62378.
O Estado do Bem-Estar Social foi tido como inviável. Tal modelo de Estado tornou-se caro e ineficiente. No Brasil, a corrupção, o nepotismo e o desperdício de verbas públicas favoreceram o sentimento pró-privatização. Optou-se pela redução do aparelho estatal. Iniciou-se o processo de desestatização. No Brasil, as privatizações começaram na era "Collor", intensificando-se no governo de Fernando Henrique Cardoso. Nesse período, elaborou-se o Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado. Falava-se em Administração Pública gerencial, onde a atenção estava voltada à qualidade e à produtividade. O princípio da eficiência ganhou ares constitucionais. A reforma administrativa retirou do Estado a responsabilidade pela execução direta do papel de produtor de bens e serviços, preservando e ressaltando a função de regulação e promoção do desenvolvimento. Institutos como a concessão, a permissão e a terceirização de serviços públicos ganham monta.43
Assim é que a adoção da terceirização na administração pública ganha
espaço no nosso cenário social, em inteligência ao princípio da eficiência, como
demonstrado pelos autores citados. E assim, como o Direito acompanha as
mudanças e avanços sociais, não havia mais como ignorar o tema. A doutrina e a
jurisprudência brasileira vêm adequando-se ao fenômeno, tendo em vista que
legislação específica quanto a terceirização na administração pública não existe,
especificamente.
De outro lado, a lei de licitações, n. 8.666/93, veio a regular de que forma
seriam feitas estas delegações, tendo em vista que a administração deve respeitar o
princípio da legalidade, isto é, apenas poderá agir dentro do que a lei determina.
Desta feita, precisamos rever outros conceitos fundamentais, para retomarmos o
nosso tema de estudo.
3.2 A descentralização da atividade
Serviço público é oferecido pelo Estado ou por quem lhe faça às vezes,
conforme conceitua Celso Antônio Bandeira de Mello. Pois bem, as formas de
43 MERCANTE, Carolina Pereira. A responsabilidade subsidiária do Estado pelos encargos trabalhistas decorrentes da contratação de serviços terceirizados. Disponível na internet: http://jus.uol.com.br/revista/texto/6209/a-responsabilidade-subsidiaria-do-estado-pelos-encargos-trabalhistas-decorrentes-da-contratacao-de-servicos-terceirizados.
prestação destes serviços são os diferentes métodos que o Estado adota para
cumpri-los, conforme atribui a lei.
Por comportar peculiaridades adiante exploradas, para melhor entendimento
da descentralização e a terceirização de serviços públicos, é necessário um breve
estudo acerca dos elementos formadores da tradicional concepção da prestação
destes. Desta sorte, o poder público, com o intuito de desempenhá-las em sua
integralidade, biparte-se, criando dois tipos de prestação de serviços: a prestação
centralizada e a prestação descentralizada.
Quando os serviços se acham integrados no aparelho administrativo
burocrático do Estado, desempenhado pela administração central, estamos diante
da prestação centralizada. Desta feita, a atividade se realiza mediante órgãos
componentes da pessoa jurídica Estado, isto é, órgãos que lhe são interiores, cujo
consórcio unitário lhe forma a intimidade estrutural44.
Já a prestação descentralizada, que nos importa dentro do presente tema, é
quando o serviço precípuo do Estado transfere-se a outra pessoa jurídica. Explica
Bandeira de Mello:
A descentralização supõe, desengadanamente, duas pessoas pelo menos: uma, o Estado, titular último do serviço público e que o desempenharia diretamente se não o houver descentralizado; outra, a pessoa descentralizadora que vai assumir o serviço como próprio ou, então, simplesmente desempenhá-lo em nome do Estado.45
No mesmo sentido, e de forma sucinta, Maria Sylvia Zanella Di Pietro explica
descentralização sendo “distribuição de competência de uma para outra pessoa,
física ou jurídica”.
44 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Prestação de Serviços Públicos e administração indireta. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 1975. p. 03.45 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. op. cit. p. 03.
Não pode se confundir descentralização com desconcentração. Segundo
aludida autora, “desconcentração é uma distribuição interna de competências, ou
seja, uma distribuição de competências dentro de uma mesma pessoa jurídica.”46
Seguindo tais preceitos, devemos lembrar que a Administração centralizada,
os serviços se encontram relacionados por um liame denominado hierarquia, que
nada mais seria que o vínculo de autoridade que une escalonadamente, em graus
sucessivos, órgão e agentes numa relação de subordinação, conforme conceitua
Celso de Mello. Pois bem, na administração centralizada, os serviços são
distribuídos, repartidos, dentro dos vários órgãos da pessoa jurídica Estado. A esta
divisão, dá-se o nome de desconcentração, totalmente diferente de
descentralização. Para referido autor, desconcentração é pois, a distribuição interna
de competências decisórias no interior de uma mesma pessoa jurídica. No entanto,
poderá haver desconcentração dentro da descentralização47.
Segundo nos ensina o eminente doutrinador Celso Antonio Bandeira de Mello,
“haverá de existir dois requisitos para configurar a descentralização estatal48”, a
saber: transferência da atividade administrativa para uma pessoa diferente do
próprio Estado, bem assim, que a atividade transferida seja administrativa.
Importante destacar que, como bem lembra o mestre Celso Antônio, que pode
haver tanto descentralização de atividade política, bem como de atividade
administrativa. Assim, sintetiza em sua obra que
A descentralização política tem lugar quando, entro de um mesmo sistema jurídico, há uma pluralidade de pessoas jurídicas investidas de funções políticas. São exemplos de organização política descentralizada os Estados Federais, em geral, porque compostos por Estados Federados. No Brasil, os
46 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 22. Ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 40347 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Prestação de Serviços Públicos e administração indireta. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 1975. p. 04.48 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. op. cit. p. 06.
Municípios também se incluem como descentralização política, conquanto este não tenha nada a ver com organização federativa.49
O mencionado doutrinador comunga da mesma opinião de Maria Sylvia
Zanella Di Pietro – de que a descentralização política ocorre quando o ente
descentralizado exerce atribuições próprias que não decorrem do ente central.
Ambos entendem que é a situação dos Estados-membros da federação, bem como
dos municípios, são titulares de maneira originária.
A descentralização administrativa ocorre quando atividade meramente
administrativa (não política, portanto), ou o exercício dela, se desloca do corpo
orgânico central da administração para outra pessoa. Nas palavras de Maria Sylvia
Zanella Di Pietro, alguns doutrinadores subdividem a descentralização administrativa
em territorial e por serviços.
Na modalidade de descentralização administrativa territorial, é a que se
verifica quando uma entidade local, geograficamente delimitada, é dotada de
personalidade jurídica própria, de direito público50. Já a descentralização por
serviços, ainda nos ensinamentos da doutrinadora, ocorre quando, seja por serviço,
funcional ou técnica, o poder público, seja a União, Estado ou Município, cria uma
pessoa jurídica, seja de direito público ou privado, a e esta atribui a titularidade e a
execução de um serviço público, criada por lei, seja a autarquia, fundações
governamentais, sociedade de economia mista e empresas públicas.
A Carta de 1988 estabelece no artigo 175 que incumbe ao poder público na
forma da lei, diretamente ou sob o regime de concessão ou permissão, sempre
através da licitação, a prestação de serviços públicos. Desta feita, os serviços
públicos serão prestados pela Administração Pública de forma Direta ou Indireta51,
ou na forma de concessão e permissão. A terceirização difere-se destes institutos, 49 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Prestação de Serviços Públicos e administração indireta. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 1975. p. 08.50 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 22. Ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 410.
haja vista que, a grosso modo, a terceirização destina-se a prestar atividade-meio,
enquanto a permissão e a concessão, servem para prestar a atividade-fim.
Permissão de serviço público, segundo Maria Sylvia Zanella Di Pietro
é, tradicionalmente, considerada ato unilateral, discricionário e precário, pelo qual o Poder Público transfere a outrem a execução de um serviço público, para que o exerça em seu próprio nome e por sua conta e risco, mediante tarifa paga pelo usuário. São características marcantes da permissão: depende sempre de licitação, seu objeto é a execução de serviço público, o serviço é executado em nome do permissionário, por sua conta e risco, sujeição as condições estabelecidas pela Administração e a sua fiscalização, pode ser alterado ou revogado a qualquer momento pela Administração, por motivo de interesse público e não possui prazo definido.52
Como exemplo de permissão, podemos citar o serviço de transporte coletivo,
facultada precariamente, que permite que a Administração promova alterações sem
necessidade de indenizar o permissionário.
Já concessão, nas palavras de Celso Antônio Bandeira de Mello:
Concessão é o instituto através do qual o Estado atribui o exercício de um serviço público a alguém que aceite prestá-lo em nome próprio, por sua conta e risco, nas condições fixadas e alteráveis unilateralmente pelo Poder Público, mas sob garantia contratual de um equilíbrio econômico-financeiro, remunerando-se pela própria exploração do serviço, em geral e basicamente mediante tarifas cobradas diretamente dos usuários do serviço.53
Ainda, Mello salienta a diferença da terceirização e este instituto, pois na
terceirização o executante presta serviços remunerados pelo Poder Público.
Enquanto que, na concessão, o contratado executa os serviços em nome próprio,
sendo remunerado pelo usuário. O objeto do contrato é o serviço público em sua
51 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Parcerias na administração Pública: concessão, permissão, franquia, terceirização, parceria público-privada e outras formas. São Paulo: Atlas, 2009. p. 223.52 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 22. Ed. São Paulo: Atlas, 2009. p.411.53 MELLO, Celso Antônio Bandeira. Prestação de Serviços Públicos e administração indireta. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 1975. p. 35.
inteireza, tendo em vista que na terceirização não terceiriza o serviço fim, apenas
um serviço auxiliar da administração.54
Com efeito, a prestação destas atividades-meio tem sido feito por contratos
de prestação de serviços técnicos especializados. Explica Maria Sylvia:
Não há de se confundir a terceirização que tenha por objeto um serviço público como um todo. Isso porque não se confunde a locação de serviços, disciplinada pela lei 8.666/93, com a concessão, seja na forma tradicional, regida pela lei n 8987/93, seja na forma de parceria público privada, de que trata a lei n 11079/24.55
Segundo a doutrinadora Maria Sylvia Zanella Di Pietro, a terceirização do
presente estudo se difere da concessão e da permissão em vários aspectos.
Primeiramente quanto ao objeto:
A concessão tem por objeto um serviço público; não uma determinada atividade ligada ao serviço público, mas todo o complexo de atividades indispensáveis à realização de um específico serviço público, envolvendo a gestão e execução material.56
Desta razão, na concessão e na permissão, há a transferência de gestão
operacional e gestão material do serviço público, cabendo ao concessionário, ou
permissionário, prestar o serviço público em sua inteireza. Diferentemente da
terceirização, que se liga apenas a gestão material da atividade. Maria Sylvia explica
a gestão operacional:
54 MERCANTE, Carolina Pereira. op. cit. p. 01.55 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Parcerias na administração Pública: concessão, permissão, franquia, terceirização, parceria público-privada e outras formas. São Paulo: Atlas, 2009. p. 223.56 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. op. cit. p. 223.
No caso de permissão e concessão, no exercício da gestão operacional do serviço público, desenvolve pelo menos três competências: a competência de regular os laços dos usuários dos serviços com seus clientes, a competência para regulamentar os laços com os agentes do serviço público, que são seus empregados e a competência de direção do trabalho de instalação do serviço público, ou pelo menos, a disposição destas instalações. 57
A autora também distingue a concessão e a permissão da terceirização
quanto à forma de remuneração, quanto às prerrogativas públicas e quanto ao poder
de intervenção.
A remuneração se aplica especificamente à concessão, pois sua
remuneração se faz pelos usuários do serviço e na terceirização é paga inteiramente
pelo poder público.
Quanto à prerrogativa pública, explica a autora que o concessionário assume
algumas prerrogativas da Administração Pública58, o que não ocorre na
terceirização, em que a empresa é mera executora de serviço destinado à
Administração, não para os usuários do serviço público. Quanto a intervenção, a
Administração pode intervir na empresa concessionária em caso de descumprimento
contratual.
Portanto, mesmo representando formas de atividade estatal realizada por
outros, não há de se confundir terceirização com referidos institutos.
Contrata-se uma empresa terceirizada, especializada em determinado
serviço, a fim de que o Estado concentre-se em suas atividades principais, para que
esta desempenhe uma atividade meio, como limpeza, conservação e vigilância,
57 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. op. cit. p. 225.58 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. op. cit. p. 226.
diferente da concessão ou permissão, que acabam por realizar uma atividade
inerente ao poder público.59
3.3 Terceirização na lei de responsabilidade fiscal
Antes de adrentarmos a tercerirização na lei de responsabilidade fiscal, traça-
se um retrospecto de autorizações legais da terceirização na administração pública.
Como dito inicialmente no estudo da presente, o amparo jurídico da terceirização na
administração pública, inicialmente, deu-se no Decreto n° 200/67, no art. 10, § 7º, no
qual encontra-se a seguinte redação:
Art. 10. A execução das atividades da Administração Federal deverá ser amplamente descentralizada.§ 7º. Para melhor desincumbir-se das tarefas de planejamento, coordenação, supervisão e controle e com o objetivo de impedir o crescimento desmensurado da máquina administrativa, a Administração procurará desobrigar-se da realização material de tarefas executivas, recorrendo, sempre que possível à execução indireta, mediante contrato desde que exista, na área, iniciativa privada suficientemente desenvolvida e capacitada a desempenhar os encargos da execução.60
Assim, como dito alhures, aludido decreto permitiu ao Estado contratar
serviços de particulares especializados em determinadas atividades. A evolução
legislativa, já elucidada no começo do presente, começou a ser produzida.
Como citado anteriormente, o Decreto 2.271/97, que dispõe sobre a
contratação de serviços pela Administração Pública Federal Direta, autárquica e
fundacional, comungando com o entendimento do Tribunal de Contas da União, que
59 MERCANTE, Carolina Pereira. A responsabilidade subsidiária do Estado pelos encargos trabalhistas decorrentes da contratação de serviços terceirizados. Disponível na internet: http://jus.uol.com.br/revista/texto/6209/a-responsabilidade-subsidiaria-do-estado-pelos-encargos-trabalhistas-decorrentes-da-contratacao-de-servicos-terceirizados p. 01.60 BRASIL. Decreto lei nº 200, de 25 de fevereiro de 1967. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del0200.htm
estabelece as atividades a serem executadas pela execução indireta, quais sejam,
as de conservação, limpeza, copeiragem, vigilância, manutenção de equipamentos,
instalações, etc, como dispõe o artigo 1°.
Nessa esteira de possível conflito entre os ramos jurídicos, a terceirização
vem a ser citada no art. 18, §1°, da lei de responsabilidade fiscal (lei complementar
n°101, de 4-5-2000), com o intuito de coibir a utilização do instituto como burla ao
limite de despesa com o pessoal, previsto no artigo 169 da Constituição61. Conforme
explica Diogo Palau, referido artigo determina, literalmente, que “os valores dos
contratos de terceirização e mão-de-obra que se referem à substituição de
servidores e empregados públicos serão contabilizados como despesa de pessoal”.
Notadamente o dispositivo admite contratos de terceirização de mão-de-obra.
Elucida Diogo Palau Flores dos Santos, que na tentativa de corrigir a falha, a Lei de
Diretrizes Orçamentárias (n° 11.768/2008), repetiu as normas anteriores, apenas
mencionando em seu art. 89, que diz que a lei de responsabilidade fiscal não
afirmou que a terceirização é legal, apenas entra no limite de despesa com o
pessoal.
Insiste-se na idéia, portanto, de que a terceirização só é válida em atividade-
meio, repetindo a norma contida no Decreto 2.271/97, assumindo sempre a forma de
prestação de serviços, e não, de fornecimento de mão-de-obra.
Diogo Palau Flores do Santos relembra que não se pode deixar de ressaltar a
Instrução Normativa n°02, de 30 de abril de 2008, da Secretaria de Logística e
Tecnologia da Informação do Ministério do Planejamento. Desta forma, de acordo
com a regra, pode-se admitir a terceirização de funções que possam dar suporte a
outras funções, que seriam típicas do órgão ou entidade da Administração Pública.
61 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 22. Ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 343.
Desta razão, o art. 9°, de referida, complementa e informa quais atividades não
podem ser contratadas via terceirização:
Art. 9º É vedada a contratação de atividades que:
I - sejam inerentes às categorias funcionais abrangidas pelo plano de cargos do órgão ou entidade, assim definidas no seu plano de cargos e salários, salvo expressa disposição legal em contrário ou quando se tratar de cargo extinto, total ou parcialmente, no âmbito do quadro geral de pessoal;
II - constituam a missão institucional do órgão ou entidade;
III - impliquem limitação do exercício dos direitos individuais em benefício do interesse público, exercício do poder de polícia, ou manifestação da vontade do Estado pela emanação de atos administrativos, tais como:
a) aplicação de multas ou outras sanções administrativas;
b) a concessão de autorizações, licenças, certidões ou declarações;
c) atos de inscrição, registro ou certificação; e
d) atos de decisão ou homologação em processos administrativos.
Portanto, considerando o que foi demonstrado até aqui, não há como se
impedir a terceirização haja vista o demonstrado acima. Certifica Diogo Palau Flores
do Santos:
Não se pode impedir a terceirização, tendo em vista que se trata apenas de uma forma de a Administração se posicionar estrategicamente diante da escassez de recursos na sociedade. Entretanto, independentemente da confirmação teórica a respeito das possibilidades de se efetivar a terceirização no âmbito da administração pública, o que se deve perquirir, é como os regimes de responsabilidade afetam o comportamento das partes envolvidas no processo decisório de terceirizar.62
Com efeito, passaremos a tratar da responsabilidade do estado nos contratos
de terceirização, bem como seus efeitos jurídicos.
62 SANTOS, Diogo Palau Flores dos. Terceirização pela Administração Pública: Estudo da Responsabilidade Subsidiária. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 53.
4 A RESPONSABILIDADE DO ESTADO E O PODER JUDICIÁRIO
O problema que tem surgido nos pretórios trabalhistas reside no tocante da
responsabilidade da administração quanto aos créditos trabalhistas, dos
trabalhadores vinculados às empresas terceirizadas. A questão ficou em voga com a
propositura da Ação Declaratória de Constitucionalidade n°16 em 2007, a qual
falaremos adiante, em relação ao Art. 71, §1°, da lei de licitações. Referido artigo
afasta a responsabilidade do Estado por débitos do contratante, dentre eles, os
trabalhistas. Desta razão, faz-se necessário retomar alguns conceitos operacionais
acerca da responsabilidade do Estado, para melhor entender a Súmula 331 do
Tribunal Superior do Trabalho, que condena o Estado nestas situações.
Recorreremos ao Direito Civil para melhor análise de questão, ainda que de forma
superficial.
4.1 CONCEITOS FUNDAMENTAIS
Como bem ensina Washington de Barros Monteiro, em sua obra sobre Direito
das Obrigações, a obrigação pode ser visualizada sobre dois enfoques: o débito e a
responsabilidade. Assevera referido autor:
Obrigação é a relação jurídica, de caráter transitório, estabelecida entre devedor e credor e cujo objeto consiste numa prestação pessoal econômica, positiva ou negativa, devida pelo primeiro ao segundo, garantindo-lhe o adimplemento através de seu patrimônio.63
Desta forma, o débito e a responsabilidade64 participam conjuntamente de
todas as obrigações. Explica Monteiro que a responsabilidade se relaciona com a
63 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil. Direito das obrigações. São Paulo: saraiva, 1994. p. 13.64 Correspondendo, respectivamente ao Schuld e Haftung, sendo o primeiro uma relação de puro débito e o segundo, responsabilidade.
violação da obrigação. Todavia, a obrigação pode ser solidária ou subsidiária. De
igual sorte será a responsabilidade, respectivamente.
A obrigação de reparar pode surgir de maneira contratual ou extracontratual.
Diogo Palau Flores do Santos, na análise da responsabilidade do Estado, caberia
tanto a contratual, como a extracontratual. No entanto, no estudo da terceirização de
serviços, como explicado acima, nos valeremos da responsabilidade contratual, pois
há um contrato firmado entre a empresa, que passou devidamente pelos
procedimentos licitatórios, com administração pública. Por fim, poderá ser uma
responsabilidade objetiva ou subjetiva, bem assim, solidária ou subsidiária. Não
cabe aqui fazer maiores e profundas explanações sobre a matéria, mas
relembraremos os institutos de maneira sucinta para prosseguir o presente estudo e
entender seus efeitos jurídicos, partindo da responsabilidade que é atribuída ao
Estado nas terceirizações.
4.1.1 Responsabilidade objetiva e subjetiva
Para permitir a aferição da responsabilidade há necessidade de considerar a
existência de uma conduta dolosa ou culposa, causando um dano, com nexo de
causalidade.
Explica Diogo Palau Flores dos Santos que a diferença entre
responsabilidade subjetiva e objetiva vai se verificar quando se focalizar o elemento
conduta: quando ordenamento exige a investigação de culpa (dolo ou culpa) para
efeitos de responsabilidade subjetiva, ao contrário, será a responsabilidade
objetiva.65
65 SANTOS, Diogo Palau Flores dos. Terceirização pela Administração Pública: Estudo da Responsabilidade Subsidiária. São Paulo: Saraiva, 2000. p. 61.
A doutrina civilista apóia esta idéia na chamada Teoria do Risco, que segundo
Silvio de Salvo Venosa, “o que se leva em conta é a potencialidade de causar
danos; a atividade ou conduta do agente que resulta por si só na exposição a um
perigo”.66
Desta feita, dentre tantas teoria, surgiu a teoria do risco administrativo. A
Administração Pública, por gerar risco para os administrados, entendendo-se como
tal a possibilidade de danos que os membros da sociedade podem sofrer em
decorrência da normal ou anormal atividade estatal.
Esclarece Celso Antonio Bandeira de Mello:
Quando o dano foi possível em decorrência de uma omissão do Estado (o serviço não funcionou, funcionou tardia ou ineficientemente) é de aplicar-se a teoria da responsabilidade subjetiva. Com efeito, se o Estado não agiu, não pode, logicamente, ser o autor do dano. E se não foi o autor, só cabe responsabilizá-lo caso esteja obrigado a impedir o dano. Isto é: só faz sentido responsabilizá-lo se descumpriu dever legal que lhe impunha obstar o evento lesivo. Deveras, caso o poder Público não estivesse obrigado a impedir o acontecimento danoso, faltaria razão para impor-lhe o encargo de suportar patrimonialmente as conseqüências da lesão. Logo, a responsabilidade estatal por ato omissivo é sempre responsabilidade por comportamento ilícito. E sendo responsabilidade por ilícito é necessariamente responsabilidade subjetiva, pois não há conduta ilícita do estado que não seja proveniente de negligência, imprudência ou imperícia (culpa) ou, então, deliberado propósito de violar a norma que o constituía em dada obrigação (dolo). Culpa e dolo são justamente modalidades de responsabilidade subjetiva.67”
Sob esse prisma, em suma, Celso Antonio Bandeira de Melo ensina que a
responsabilidade é objetiva quando resultante de atos comissivos, bem assim, será
subjetiva quando decorrente de atos omissivos (geralmente caso de culpa anônima).
Ressalte-se que a responsabilidade objetiva da administração é interpretada a partir
da redação do art. 37, §6º da Constituição Federal.
66 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: Responsabilidade Civil. 9ª Ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 09.67 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 26ª edição. São Paulo: Malheiros, 2009. P. 1002-1003.
4.1.2 Responsabilidade solidária e subsidiária
Conforme delimitado, a responsabilidade se relaciona com a violação da
obrigação. Segundo o diploma civilista brasileiro, está disposto na parte especial,
dos artigos 264 a 285. Com efeito, com razão da etimologia da
palavra, subsidiário vem do latim subsidiarius, que designa o que é secundário, que
é de reforço, auxiliar ou supletivo, pressupondo o principal, a que vem suplementar
ou reforçar.68 Não tem previsão legal, porém tem extensa aplicação judicial.
Assevera Rodolfo Pamplona Filho e Pablo Stolze Gagliano:
Vale lembrar que a expressão ‘subsidiária’ se refere a tudo que vem ‘em reforço de...’ ou ‘em substituição de...’, ou seja, não sendo possível executar o efetivo devedor sujeito passivo direto da relação jurídica obrigacional devem ser executados os demais responsáveis pela dívida contraída.69
Exemplo clássico de responsabilidade subsidiária é a do fiador, que só haverá
responsabilidade patrimonial deste, só será acionado, se o devedor principal não for
solvente.
A responsabilidade solidária está disposta no art. 264, de referido diploma,
dizendo que ‘há solidariedade, quando na mesma obrigação concorre mais de um
credor, ou mais de um devedor, cada um com direito, ou obrigado, à dívida toda.’
70Assim, a obrigação solidária é espécie de obrigação múltipla, onde pode haver
pluralidade em qualquer dos pólos desta relação.
68 REIS, Filipe de Abreu. A Responsabilidade Civil. Disponível na internet: http://www.viajus.com.br/viajus.php?pagina=artigos&id=1227&idAreaSel=2&seeArt=yes.69 PAMPLONA FILHO, Rodolfo; GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo curso de Direito Civil: Responsabilidade Civil. 2.ed. rev. amp.e atual.v.III. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 168.70 BRASIL. Art. 264, da lei n°. 10.406/2002. Disponível em: http://migre.me/5MUqF
Nas palavras de Cláudio Alcântara Meirelles, podemos distinguir
responsabilidade subsidiária e solidária no sentido de que nesta haverá uma
correspondência horizontal e naquela vertical. 71
Quer dizer que na responsabilidade solidária o credor pode exigir a satisfação
do seu débito de qualquer dos devedores, enquanto na subsidiária, o credor deve
exigir do devedor principal, para só então, exigir do devedor subsidiário.
Evocados os conceitos de responsabilidade, meramente elucidativos,
passamos adiante para o estudo da responsabilidade do estado em relação a
créditos trabalhistas advindos de contratos de terceirização.
4.2 O ENUNCIADO DO TST
Conforme visto no início do presente estudo, a justiça laboral tratou de
regularizar inicialmente a terceirização editando a súmula 256, a qual dispunha da
ilegalidade de contratação de trabalhadores por empresa interposta, exceto nos
caso de vigilância e trabalhos temporários, legalmente autorizados pela lei n°
6.019/74 e n° 7.102/83, respectivamente, formando-se assim naqueles outros casos,
vínculo empregatício diretamente com o tomador, e por consequência, a
responsabilização do Estado.
Era válida apenas e tão somente a contratação de serviços terceirizados em
relação ao contrato de trabalho temporário e vigilância. No entanto, menciona Sérgio
Pinto Martins, que muitas pessoas mantinham vínculo desenvolvendo outras
71 MEIRELLES, Claudio Alcantara. A Responsabilidade Solidária e Subsidiária no Direito do Trabalho, Revista da Procuradoria Regional do Trabalho da 21ª Região, n. 03: Brasília, 2000. Disponível em http://www.prt21.mpt.gov.br em 20 de março de 2008. p. 05.
atividades, por exemplo, como empregado de empresas de limpeza. Neste diapasão
explica:
O que se observa, contudo, do texto do enunciado 256 do TST e das propostas de sua redação é que não foi proibido a uma empresa contratar serviços de outras; contudo, pela redação do referido verbete, a terceirização de limpeza e conservação estaria proibida.72
O Recurso de Revista n° 3.442/84 que deu origem ao referido enunciado,
admitia apenas que a contratação de empresa interposta só poderia ser admitida em
casos excepcionais, pois locação de força de trabalho seria uma conduta ilícita,
tendo em vista que “os homens não podem ser objeto deste tipo de contratação, só
coisas”.73
Segundo o doutrinador Sérgio Pinto Martins, o MPT ajuizou uma série de
inquéritos civis contra o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal à época, em
razão da massa de estagiários contratadas para realizar o serviço de concursados,
nitidamente, realizando a atividade-fim das instituições, que também integram a
Administração Pública.
No caso da Caixa, houve interposição de Ação Civil Pública, julgada
parcialmente procedente, reconhecendo irregularidades de contratação. No caso do
Banco do Brasil, firmou-se um Termo de Ajustamento, para efetuar a contratação de
ascensoristas, telefonistas, copa, gráfica, estiva, digitação e limpeza. Desta feita, a
Procuradoria-Geral do Trabalho requereu a revisão do enunciado 256, pois não
abarcava todas as situações sociais.
Entrementes, elucida Diogo Palau Flores do Santos, que diante deste
cenário, o TST editou a o Enunciado 331, que hoje, tem força de Súmula, em razão
72 MARTINS, Sérgio Pinto. A terceirização e o Direito do Trabalho. 7 ed., São Paulo, Atlas, 2003. p. 130.73 MARTINS, Sérgio Pinto. op. cit. p. 109.
da Resolução 129/2005 do Tribunal Pleno do TST. A publicação de referido operou-
se no Diário da Justiça da União em 21 de dezembro de 1993, com a seguinte
redação:
Súmula 331. Contrato de prestação de serviços - legalidade - revisão do enunciado n° 256.I - a contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário (lei n° 6.019, de 3 de janeiro de 1974).II - a contratação irregular de trabalhador, através de empresa interposta, não gera vínculo de emprego com os órgãos da Administração Pública direta, Indireta ou Fundacional ( art. 37, inc. II, da Constituição da República).III - não forma vínculo de emprego com o tomador a contratação de serviços de vigilância (Lei n° 7.102, de 20 de junho de 1983), de conservação e limpeza, bem como a de serviços especializados ligados - atividades-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta.IV - o inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica na responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços quanto aquelas obrigações, desde que este tenha participado da relação processual e conste também do título executivo judicial.
Por esta clara redação, emergia a responsabilização tanto dos contratantes
privados, como da administração pública, decorrente da mera inadimplência do
devedor originário da dívida. Explica Gustavo Cauduro Hermes:
Bastava contratar serviços para atrair a responsabilidade subsidiária sobre as obrigações trabalhistas - se o empregador não pagasse, pagaria o tomador. Uma clara inspiração na responsabilidade objetiva e teoria do risco, inadmissível no âmbito jurídico.74
Notadamente, a parte final da súmula, faz alusão ao artigo 71 da lei de
licitações, § 1°, in verbis:
Art. 71. O contratado é responsável pelos encargos trabalhistas, previdenciários, fiscais e comerciais resultantes da execução do contrato.§1o A inadimplência do contratado, com referência aos encargos trabalhistas, fiscais e comerciais não transfere à Administração Pública a responsabilidade por seu pagamento, nem poderá onerar o objeto do contrato ou restringir a regularização e o uso das obras e edificações, inclusive perante o Registro de Imóveis.
74 HERMES, Gustavo Cauduro. Subsídios para contratação administrativa / coordenação de Jamyle Sayd. 2 ed. Ver. E ampl. Porto alegre: INGEP, 2011. p. 122.
A última parte de aludida súmula, incluída pela Resolução n° 63, de 11-9-
200075, traz claramente a responsabilização subsidiária da administração no
eventual inadimplemento dos créditos trabalhistas, devendo o tomador de serviços
fazer parte do processo, para que conste no título executivo, como garantia à
execução do credor. Este entendimento têm origem no acórdão proferido no
incidente de uniformização de jurisprudência (IUJ) n. 297751/2000, que contém
informações elucidativas sobre o assunto, a saber:
Embora o artigo 71 da Lei nº 8.666/93 contemple a ausência de responsabilidade da Administração Pública pelo pagamento dos encargos trabalhistas, previdenciários, fiscais e comerciais resultantes da execução do contrato, é de se consignar que a aplicação do referido dispositivo somente se verifica na hipótese em que o contratado agiu dentro de regras e procedimentos normais de desenvolvimento de suas atividades, assim como de que o próprio órgão da administração que o contratou pautou-se nos estritos limites e padrões da normatividade pertinente. Com efeito, evidenciado, posteriormente, o descumprimento de obrigações, por parte do contratado, entre elas as relativas aos encargos trabalhistas, deve ser imposta à contratante a responsabilidade subsidiária. Realmente, nessa hipótese, não se pode deixar de lhe imputar, em decorrência desse seu comportamento omisso ou irregular, ao não fiscalizar o cumprimento das obrigações contratuais assumidas pelo contratado, em típica culpa in vigilando, a responsabilidade subsidiária e, conseqüentemente, seu dever de responder, igualmente, pelas conseqüências do inadimplemento do contrato. Admitir-se o contrário, seria menosprezar todo um arcabouço jurídico de proteção ao empregado e, mais do que isso, olvidar que a Administração Pública deve pautar seus atos não apenas atenta aos princípios da legalidade, da impessoalidade, mas sobretudo, pelo da moralidade pública, que não aceita e não pode aceitar, num contexto de evidente ação omissiva ou comissiva, geradora de prejuízos a terceiro, que possa estar ao largo de qualquer co-responsabilidade do ato administrativo que pratica. Registre-se, por outro lado, que o art. 37, § 6º, da Constituição Federal consagra a responsabilidade objetiva da Administração, sob a modalidade de risco administrativo, estabelecendo, portanto, sua obrigação de indenizar sempre que cause danos a terceiro. Pouco importa que esse dano se origine diretamente da Administração, ou, indiretamente, de terceiro que com ela contratou e executou a obra ou serviço, por força ou decorrência de ato administrativo.
Desta forma, conforme o que se extrai do texto acima, quando ocorrer o
inadimplemento do prestador de serviços terceirizados, haverá a responsabilidade
75 SANTOS, Diogo Palau Flores dos. Terceirização pela Administração Pública: Estudo da Responsabilidade Subsidiária. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 74
do tomador, no caso, a Administração Pública. Ressalta Diogo Palau Flores do
Santos:
Outro argumento ventilado expressamente no mesmo julgado é o comportamento omisso ou irregular em não fiscalizar os contratos de trabalhos do prestador de serviço terceirizados. Dessa forma, a responsabilidade se originaria do que se denomina culpa in vigilando, por não obrigar o cumprimento das obrigações trabalhistas.76
Conforme explicitado, tal entendimento vai de encontro com a lei de licitações.
No entanto, faz-se mister relembrar aspectos importantes das licitações, bem assim
o reflexo do enunciado na lei citada.
4.2.1. Aspectos gerais da licitação
Importante esclarecer, de forma sucinta, o que é a licitação, pois a
terceirização se processa em termos de contratação pública.77
Explica Diogo Palau Flores dos Santos que licitação, do latim licitatio, isto é,
"venda por lances", é uma exigência constitucional que estabelece um procedimento
administrativo prévio à contratação de obras ou serviços por parte da Administração
Pública. Celso Antônio Bandeira de Mello ensina o que é licitação:
Licitação é um certame que as entidades governamentais devem promover no qual abrem disputa entre os interessados em com elas travar determinadas relações de conteúdo patrimonial, para escolher a proposta mais vantajosa à convivência pública. Estriba-se na idéia de competição, a ser travada isonomicamente entre os que preenchamos atributos e aptidões necessários ao bom cumprimento das obrigações que se propõem assumir.78
Destarte, os órgãos integrantes da administração Direta, os fundos especiais,
as autarquias, as fundações públicas, as empresas públicas, as sociedades de
76 SANTOS, Diogo Palau Flores dos. Terceirização pela Administração Pública: Estudo da Responsabilidade Subsidiária. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 77.77 SANTOS, Diogo Palau Flores dos. op. cit. p. 67.78 MELLO, Celso Antônio Bandeira. Curso de Direito Administrativo. 26ª edição. São Paulo: Malheiros, 2009. p. 517.
economia mista e demais entidades controladas direta e indiretamente pela União,
Estados, Distrito Federal e Municípios, caso pretendam obter uma obra ou contratar
a execução de um serviço, estão obrigados a licitar, explica Marçal Justen Filho.
De acordo com os ensinamentos do Mestre Marçal Justen Filho esse
procedimento tem como objetivo “proporcionar às entidades governamentais
possibilidades de realizarem o negócio mais vantajoso” e explana:
A licitação é um procedimento administrativo disciplinado por lei e por um ato administrativo prévio, que determina critérios objetivos de seleção de proposta de contratação mais vantajosa, com observância do principio da isonomia, conduzido por um órgão dotado de competência específica.79
Todo contrato administrativo exige licitação prévia, só dispensada,
dispensável, ou inexigível nos casos expressamente previstos em lei, conforme
situações arroladas nos arts. 24 e 25 de aludida lei.
Nesta esteira, a lei n° 8.666 de 21.06.1993, deve respeitar os princípios
estabelecidos no art. 3°, quais sejam, da legalidade, impessoalidade, moralidade,
igualdade, publicidade, probidade administrativa, vinculação ao instrumento
convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhe são correlatos.80
Nesse diapasão, deve-se respeitar as modalidades elencadas no art. 22 do
diploma, bem assim, é vedada a combinação delas ou adoção de outras, a exceção
do pregão, previsto na lei 10.520, de 17.07.2002. Pode-se decompô-la nas seguintes
fases81, todas previstas na lei 8.666/93, a grosso modo, seguiriam: edital, habilitação,
79 JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de Direito Administrativo – 1. ed. – São Paulo: Saraiva, 2005. p. 309.80 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. op. cit. p. 252.81 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 26ª edição. São Paulo: Malheiros, 2009. p. 573.
julgamento, homologação, adjudicação.82 Contra atos do procedimento licitatório
cabem recursos administrativos, nos moldes da lei.
Assim sendo, findo este procedimento a Administração Pública realiza a
contratação com quem venceu a licitação. Com a terceirização de serviços
delegáveis da administração pública não é diferente. A título de ilustração, se a
Administração Pública contrata uma empresa para que faça a conservação de
limpeza, isto é, a terceirizada, ela deverá passar por este procedimento, e estará
vinculada a esta lei em todos seus efeitos jurídicos.
4.2.1.1 O reflexo nas licitações públicas
O teor do item IV, no enunciado 331, do TST, conflitua com a Lei de
Licitações e Contratos (Lei n° 8.666/93), em seu artigo 71, §1°. Assim dispõe:
Art. 71 - O contratado é responsável pelos encargos trabalhistas, previdenciários, fiscais e comerciais da execução do contrato.§ 1º - A inadimplência do contrato com referência aos encargos trabalhistas, fiscais e comerciais não transfere à Administração Pública a responsabilidade por seu pagamento, nem poderá onerar o objeto do contrato ou restringir a regularização e o uso das obras e edificações, inclusive perante o registro de imóveis.
Com efeito, da interpretação do artigo, entendemos que uma vez
inadimplidos os encargos trabalhistas por parte da empresa contratada pela
administração pública, tais débitos não poderiam ser imputados a esta, mas sim ao
próprio prestador de serviços, que é o real empregador. Comungando com esta
idéia, Marçal explica:
82 Edital: ato pelo qual são convocados os interessados e estabelecidas as condições que irão reger oi certame; Habilitação: ato pelo qual são admitidos os proponentes aptos; Julgamento: com a classificação, é o ato pela qual são ordenadas as propostas admitidas; Homologação: ato pelo qual se examina a regularidade do desenvolvimento do procedimento anterior; Adjudicação: ato pelo qual é selecionado o proponente que haja apresentado proposta havida como satisfatória.
Também fica expressamente ressalvada a inexistência de responsabilidade da Administração Pública por encargos e dívidas pessoais do contratante. A Administração Pública não se transforma em devedora solidária ou subsidiariamente frente aos credores do contratante. Mesmo quando as dívidas se originarem de operação necessária á execução do contrato, o contratado permanecerá como único devedor perante os terceiros83.
Entrementes, o conteúdo do item IV de referido enunciado, contraria o
disposto no parágrafo 1º do mencionado artigo 71, responsabilizando
subsidiariamente tanto a Administração Direta quanto a Indireta, em relação aos
débitos trabalhistas, quando atua como contratante de qualquer serviço terceirizado.
Willian de Almeida Brito Junior vai além e faz ponderações minuciosas, a
saber:
Primeiramente, porque se trata de lei em sentido estrito, ou seja, em sentido formal e material, que passou pelo crivo dos Poderes Legislativo e Executivo que, todavia, não pode ser derrogada por um mero entendimento jurisprudencial. Do contrário, os membros do Poder Judiciário estariam imiscuindo-se indevidamente na atividade legislativa84”.
Tal comentário foi elaborado em inteligência a competência exclusiva as
União, no art. 22, da Constituição Federal, estabelecido no inciso XXVII, o qual
preceitua que
compete exclusivamente à União legislar sobre normas gerais de licitação e contratação, em todas as modalidades, para as administrações públicas diretas, autárquicas e fundacionais da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, obedecido o disposto no art. 37, XXI, e para as empresas públicas e sociedades de economia mista, nos termos do art. 173, § 1°, III.
A priori, seria este, o artigo 71, afrontado pelo Enunciado. Desta razão, sua
larga aplicação, deixando a lei de lado, ensejou a propositura da Ação Declaratória
83 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 13ª ed., 2009. p.783.84 BRITO JUNIOR, Willian de Almeida. A Súmula nº 331, IV, do Tribunal Superior do Trabalho frente à Lei de Licitações e Contratos. Disponível na internet: http://jus.com.br/revista/texto/6591/a-sumula-no-331-iv-do-tribunal-superior-do-trabalho-frente-a-lei-de-licitacoes-e-contratos.
de Constitucionalidade n°16, da qual falaremos adiante, que buscava a afirmação de
constitucionalidade deste artigo, e por conseqüência, afastar a responsabilização
subsidiária do Estado.
Via de conseqüência, a justiça dos obreiros aplicou novo argumento para
sustentar sua posição. Baseada na redação do art. 67 da lei 8.666/93, o argumento
da responsabilidade subsidiária sob a ótica do TST advém do dever de fiscalização
do contrato, argumento também usado no julgamento da ADC no STF.
4.2.1.2 Conduta culposa
Como dito alhures, a conduta culposa vem sendo o argumento utilizado nos
pretórios trabalhistas para caracterizar a responsabilidade subsidiária. Referida tese
ganhou mais força, haja vista o reconhecimento pelo STF da constitucionalidade do
art. 71, §1º, da lei de licitações.
Assim dispõe o artigo 67 do diploma das licitações:
Art. 67. A execução do contrato deverá ser acompanhada e fiscalizada por um representante da Administração especialmente designado, permitida a contratação de terceiros para assisti-lo e subsidiá-lo de informações pertinentes a essa atribuição.§ 1o O representante da Administração anotará em registro próprio todas as ocorrências relacionadas com a execução do contrato, determinando o que for necessário à regularização das faltas ou defeitos observados.§ 2o As decisões e providências que ultrapassarem a competência do representante deverão ser solicitadas a seus superiores em tempo hábil para a adoção das medidas convenientes.
Neste sentido é que a justiça do trabalho extrai de seu texto a noção de
responsabilidade subsidiária por culpa in vigilando e culpa in eligendo. Desta razão,
os tribunais trabalhistas vêm caracterizando a responsabilidade subsidiária com
base na culpa de fiscalizar ou de eleger do Estado.
Para relembrar, a culpa in eligendo se daria pela má escolha do contratante.
Já a culpa in vigilando configura-se quando há má fiscalização do cumprimento das
obrigações contratuais.
Primeiramente, vamos tratar da culpa in eligendo. Esta modalidade traz o
entendimento de que a administração pública escolheu mal o prestador de serviços.
A escolha recairia de forma errônea em empresa insolvente, incapaz de responder
suas obrigações trabalhistas85. No entanto, adota-se o processo licitatório, o qual
possuiria teoricamente o condão de afastar essa modalidade culposa. Ainda neste
mesmo sentido, Diogo Palau ensina que a menos que a licitação tenha sido
considerada irregular ou fraudulenta, não há de se admitir a má escolha do
contratante, pois há uma série de regramentos na própria lei, exigências legais,
relacionadas a habilitação jurídica, qualificação técnica, qualificação econômico-
financeira e regularidade fiscal, arrolados no art. 27 de aludida lei. Comungando da
mesma opinião, Willian de Almeida Brito Junior diz:
Além do mais, em regra geral, a administração pública, ao contratar, já realiza o processo de licitação, de acordo com as diretrizes previstas na Lei n° 8.666/93, o que inclui a exigência de farta documentação, a fim de aferir a idoneidade da empresa contratada. Durante a fase pré-contratual o Estado utiliza de toda diligência para escolher a empresa com a qual irá celebrar o contrato. Destarte, resta afastada qualquer alegação de culpa in eligendo por parte do Estado, pois o processo administrativo de licitação teve como objetivo escolher a melhor proposta e aferir a idoneidade econômica, financeira e jurídica da empresa para que seja celebrado o contrato de prestação de serviços com a administração pública.86
Se não verificada a fraude no procedimento licitatório e, a empresa
contratada, não cumprir suas obrigações trabalhistas, segundo a opinião dos
referidos doutrinadores, não deve responsabilizar a administração, pois 85 SANTOS, Diogo Palau Flores dos. Terceirização pela Administração Pública: Estudo da Responsabilidade Subsidiária. São Paulo: Saraiva, 2000. p. 82.86 BRITO JUNIOR, Willian de Almeida. A Súmula nº 331, IV, do Tribunal Superior do Trabalho frente à Lei de Licitações e Contratos. Disponível na internet: http://jus.uol.com.br/revista/texto/6591/a-sumula-no-331-iv-do-tribunal-superior-do-trabalho-frente-a-lei-de-licitacoes-e-contratos.
juridicamente, cumpriu com todos os parâmetros legais. Por fim, citamos Willian de
Almeida novamente, que conclui sobre a possível solução para a pecha:
E, se por acaso a empresa não tiver patrimônio para honrar as suas dívidas trabalhistas, o reclamante deve requerer a desconsideração da personalidade jurídica a fim de atingir o patrimônio dos sócios da empresa. O inadimplemento das obrigações trabalhistas implica em fraude à lei, o que autoriza a aludida desconsideração da pessoa jurídica.87
Por outra via, se não utilizam do argumento supracitado, aquilatam a culpa in
vigilando como elemento justificador da responsabilidade subsidiária do estado.
A título de ilustração, demonstramos a seguir um julgado do Tribunal Regional
do Trabalho da 9ª Região, de uma pessoa física contra o Banco do Brasil, sociedade
de economia mista, que traz em sua fundamentação:
No presente caso, não se controverte quanto à regularidade do processo licitatório, tendo sido observados todos os seus requisitos formais (fls.152/171) não se cogitando, pois, de culpa "in eligendo". Por outro lado, incontroverso também que o ente público descuidou de seu dever de fiscalização quanto ao cumprimento do contrato firmado com a prestadora dos serviços, incorrendo, assim, em culpa "in vigilando”. Não basta juridicidade da contratação entre os Réus. O ente público (assim considerados, conforme o art. 1.º, parágrafo único, da Lei n.º8.666/93, os órgãos da administração direta, os fundos especiais, as autarquias, as fundações e empresas públicas, as sociedades de economia mista e demais entidades controladas direta ou indiretamente pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios) quando firma esse tipo de pacto, deve servir-se de rigoroso e constante acompanhamento da idoneidade da empresa frente aos meios utilizados por esta para a satisfação do objeto contratual.Nesse sentido o art. 58, III, e o art. 67, § 1º, da Lei nº8.666/93:"Art. 58. O regime jurídico dos contratos administrativos instituídopor esta Lei confere à Administração, em relação a eles, a prerrogativa de:(...)III - fiscalizar-lhes a execução;(...)Art. 67. A execução do contrato deverá ser acompanhada e fiscalizada por um representante da Administração especialmente designado, permitida a contratação de terceiros para assisti-lo e subsidiá-lo de informações pertinentes a essa atribuição.§ 1º. O representante da Administração anotará em registro próprio todas as ocorrências relacionadas com a execução do contrato, determinando o que for necessário à regularização das faltas ou defeitos observados.88
87 BRITO JUNIOR, Willian de Almeida. op. cit. p. 0188 PARANÁ. Tribunal Regional do Trabalho. RO - 29114-2009-009-09-00-6.
A desconsiderar este entendimento, destaca-se Palau, que faz análise
minuciosa do tema, quanto a hipótese de comportamento omisso da administração,
que a única obrigação no tocante aos créditos trabalhistas que faz-se obrigatória é a
fiscalização quanto as contribuições do FGTS e contribuições previdenciárias,
previstos na lei de licitações nos arts. 29, IV e 71, §2º. Importante ressaltar que a
Medida Provisória 447, de 2008, condiciona o pagamento dos serviços prestados a
retenção prévia das contribuições previdenciárias. Neste sentido ainda explica que:
Assim, a hipótese da responsabilidade do tomador de serviços somente poderia decorrer destas duas obrigações, não se admitindo a responsabilidade de forma genérica como fez o TST. Ocorre que o tomador de serviços não pode interferir no contrato de trabalho do prestador de serviços, considerando as próprias razões que levam a Administração a terceirizar.89
No estudo realizado por Willian Almeida Brito Junior, cita o entendimento da
procuradora do Estado de São Paulo, Dora Maria de Oliveira Ramos, que ensina
que “não há que se falar em culpa in vigilando e/ou culpa in eligendo, uma vez
ausente o dever de fiscalização do tomador do serviço, quanto ao cumprimento das
obrigações sociais do prestador, fora das hipóteses previstas no ordenamento
jurídico”. Neste diapasão, Willian de Almeida conclui:
Conforme a explanação da douta procuradora, não existe qualquer lei que obrigue os entes da administração pública a fiscalizar o adimplemento das obrigações trabalhistas por parte das empresas prestadoras de serviço terceirizado. Pelo contrário, existe é um dispositivo legal que afasta por completo a responsabilidade do Estado-contratante perante as dívidas trabalhistas assumidas pela empresa-contratada. Assim, incabível se cogitar de culpa in vigilando por parte do Estado, para imputar a este a responsabilidade pelas dívidas trabalhistas.90
89 DOS SANTOS, Diogo Palau Flores. Terceirização pela Administração Pública: Estudo da Responsabilidade Subsidiária. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 77-78.90 BRITO JUNIOR, Willian de Almeida. A Súmula nº 331, IV, do Tribunal Superior do Trabalho frente à Lei de Licitações e Contratos. Disponível na internet: http://jus.uol.com.br/revista/texto/6591/a-sumula-no-331-iv-do-tribunal-superior-do-trabalho-frente-a-lei-de-licitacoes-e-contratos.
Desta feita, temos mais estes dois entendimentos doutrinários de
responsabilização do Estado, fundamentados na própria lei de licitações, quando se
fala em dever de “escolha e fiscalização”, embora combatido este entendimento,
conforme demonstrado. Corroborando, Diogo Palau Flores dos Santos diz:
Assim, não há responsabilidade que se verifique através das culpas “in vigilando” ou “in eligendo”, seja porque inexistentes, seja por ausência de previsão legal que exija a fiscalização. Da mesma forma, não há de se falar em responsabilidade objetiva, tendo em vista a inexistência do nexo causal entre o que se alega a Administração omitir e o inadimplemento do prestador dos serviços terceirizados91.
Entretanto, a justiça laboral repassa a responsabilidade à Administração.
Revisados os conceitos operacionais, passamos a apuração da responsabilidade do
tomador.
4.2.1.3 Responsabilidade do Estado nos contratos de Terceirização
Como já demonstrado, bem como elucidados alguns institutos jurídicos
essenciais para entender o próximo tema, a responsabilidade do estado nos
contratos de terceirização acarretam o tipo de responsabilidade subsidiária, isto é,
figura como devedor, e no caso de inadimplemento da empresa, fica a administração
responsável pelo pagamento dos encargos trabalhistas. Quanto a responsabilidade
objetiva e subjetiva, prevalece o enquadramento da responsabilidade subjetiva, com
a caracterização da culpa in eligendo ou culpa in vigilando.
Introduzida pelo item IV do enunciado 331, a responsabilidade passa à
Administração de forma subsidiária. Assim, o tomador de serviço responde pelas
dívidas, caso a terceirizada não pague, o que traz à tona outros questionamentos,
como passa a expor.
91 SANTOS, Diogo Palau Flores dos. Terceirização pela Administração Pública: Estudo da Responsabilidade Subsidiária. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 89.
4.2.1.4 Consequências da responsabilização
A teor do contido no item IV do enunciado, a responsabilidade passa ao
Estado, e a partir de então, denotamos outras discussões, vendo o surgimento de
outra corrente. De forma sucinta, demonstrar-se-á algumas consequências. Como
bem pontua Willian de Almeida Brito Junior, ao aplicar-se o enunciado,
desconsiderando o preceituado na lei de licitações:
Do contrário, estaremos dando prevalência a um entendimento jurisprudencial em detrimento da legislação que rege a matéria. E, conforme dito anteriormente, é inconcebível que uma mera orientação jurisprudencial tenha o condão de revogar a legislação que passou por todo o processo legislativo.92
Primeiramente, conflitua o enunciado com as construções legislativas. Bem
sabemos também, que em matéria de Direito Administrativo, o interesse público
suplanta o interesse privado. Nas palavras de Celso Antônio Bandeira de Mello
o Estado, concebido que é para a realização de interesses públicos (situação, pois, inteiramente diversa da dos particulares), só poderá defender seus próprios interesses privados quando, sobre não se chocarem com os interesses públicos propriamente ditos, coincidam com a realização deles.93
Pois bem, ensina Willian de Almeida, não deveria prevalecer o entendimento
que favoreça o interesse particular do empregado em detrimento do Poder Público
como um todo, sob pena da Justiça Trabalhista causar danos indevidos ao erário e
ao interesses público.
Temos ainda outro questionamento, suscitado por Diogo Palau Flores dos
Santos, questionando quais seriam os créditos realmente devidos pela
92 BRITO JUNIOR, Willian de Almeida. A Súmula nº 331, IV, do Tribunal Superior do Trabalho frente à Lei de Licitações e Contratos. Disponível na internet: http://jus.uol.com.br/revista/texto/6591/a-sumula-no-331-iv-do-tribunal-superior-do-trabalho-frente-a-lei-de-licitacoes-e-contratos.93 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 19º edição. Editora Malheiros. São Paulo, 2005, p. 66.
administração, na hipótese em que ela seja acionada pela ordem de devedores.
Traz o enunciado 363, do TST, que reza:
TST Enunciado nº 363- Res. 97/2000, DJ 18.09.2000 - Republicação - DJ 13.10.2000 - Republicação DJ 10.11.2000 - Nova Redação - Res. 111/2002, DJ 11.04.2002 -Nova redação- Res. 121/2003, DJ 21.11.2003Contratação de Servidor Público sem Concurso - Efeitos e DireitosA contratação de servidor público, após a CF/1988, sem prévia aprovação em concurso público, encontra óbice no respectivo art. 37, II e § 2º, somente lhe conferindo direito ao pagamento da contraprestação pactuada, em relação ao número de horas trabalhadas, respeitado o valor da hora do salário mínimo, e dos valores referentes aos depósitos do FGTS.
Trata-se de um contrato nulo, em que a administração contratou sem o
procedimento licitatório, sem observância das exigências legais. Nesta situação
responderia apenas e tão somente pelos salários não pagos e FGTS não
depositados. Já no caso da terceirização, que passou por todo um processo
licitatório, a responsabilidade é total, abrangendo todos os créditos trabalhistas.
Tratamentos díspares para uma situação comum: prestação de serviço.94
Assim, a Administração acaba pagando duas vezes o mesmo contrato,
atingindo o erário público, enquanto existem outras saídas jurídicas para garantir os
créditos do obreiro, como a citada despersonalização da pessoa jurídica, de Willian
de Almeida. Como bem explica Maria Sylvia Zanella Di Pietro:
Portanto, o que é perfeitamente possível no âmbito da Administração Pública é a terceirização como contrato de prestação de serviços. Na realidade, isto sempre foi feito, sem que se empregasse o termo terceirização, o que permite reafirmar que o direito administrativo moderno foi invadido por termos novos para designar institutos antigos, apenas com a diferença de que hoje vêm carregados de nova ideologia.95
A nova ideologia refere-se também ao papel da Justiça do Trabalho, que nas
palavras de Willian de Almeida Brito Junior, seria ela uma “instância independente e
94 SANTOS, Diogo Palau Flores dos. Terceirização pela Administração Pública: Estudo da Responsabilidade Subsidiária. São Paulo: Saraiva, 2000. p. 119.95 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Parcerias na administração pública: concessão, permissão, franquia, terceirização e outras formas. 3ª ed. São Paulo: Atlas, 1999.
imparcial que é, tem o dever de perceber que o patrimônio público não é remédio
para todos os males, não devendo o Estado ser responsabilizado indevidamente por
obrigações devidas por terceiros”.96
Percebe-se pelas opiniões mencionadas, que existe um cenário jurídico
conflituoso quanto a responsabilização do Estado. Assim, foi ajuizada a Ação
Declaratória de Constitucionalidade no Supremo Tribunal Federal, buscando a
reafirmação do Art. 71, §1°, da lei de licitações, para afastar a responsabilidade
elencada no enunciado 331, IV, do TST, em aludidas lides.
96 BRITO JUNIOR, Willian de Almeida. op. cit. p. 01.
5 A DECISÃO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
5.1 A Ação declaratória de Constitucionalidade n°16/2007
Buscando uma compatibilização das normas pátrias, bem como a
desresponsabilização do poder público no tocante às parcelas trabalhistas advindas
dos empregados de empresas terceirizadas, é que foi ajuizada a Ação Declaratória
de Constitucionalidade, de número 16, que deu entrada no Supremo Tribunal
Federal em 07 de março de 2007. Ajuizada pelo governador do Distrito Federal, com
pedido de liminar, buscava-se o reconhecimento e a declaração de que o art. 71, §
1º, da Lei nº 8.666/93, válido segundo a ordem constitucional, e por via de
conseqüência, a ineficácia do enunciado da justiça laboral.
De acordo com as explanações aduzidas na petição, o artigo 71, §1º, da lei de
licitações “tem sofrido ampla retaliação por parte de órgãos do Poder Judiciário, em
especial o Tribunal Superior do Trabalho, que diuturnamente nega vigência ao
comando normativo expresso no artigo 71, § 1º, da Lei Federal nº 8.666/93”.97
Nesta esteira, complementa a petição, o Tribunal Superior do Trabalho editou
enunciado de súmula da jurisprudência dominante, em entendimento
diametralmente oposto ao da norma transcrita, responsabilizando subsidiariamente
tanto a Administração Direta quanto a Indireta em relação aos débitos trabalhistas,
quando atuar como contratante de qualquer serviço de terceiro especializado. 98
Com efeito, ainda ressaltam que o enunciado nº 331, perpetraria ofensa “aos
princípios da legalidade, da liberdade, o princípio da ampla acessibilidade nas
licitações públicas e o princípio da responsabilidade do Estado por meio do risco
97 Disponível na internet: http://migre.me/5FC9O p. 03.98 Disponível na internet: http://migre.me/5FC9O p. 03.
administrativo, nos arts. 5º, inciso II, e 37, caput, inciso XXI, e § 6º, da Carta de
1988”.
Desta maneira, pediu a concessão de medida liminar. O pedido
cautelar, ispsis literis:
Determinar que os juízes e Tribunais suspendam imediatamente todos os processos que envolvam a aplicação do inciso IV, do Enunciado nº 331, do TST, até o julgamento definitivo da presente ação, ficando impedidos de proferir qualquer nova decisão, a qualquer título, que impeça ou afaste a eficácia do artigo 71, § 1º, da Lei Federal nº 8.666/93; e suspender, com eficácia ex tunc, os efeitos de quaisquer decisões, proferidas a qualquer título, que tenham afastado a aplicação do artigo 71, § 1º, da Lei Federal nº 8.666/93 ou que tenham aplicado o inciso IV, do Enunciado nº 331, da Súmula de jurisprudência dominante do Tribunal Superior do Trabalho.99
Em 10 de maio de 2007, o ministro Cezar Peluso, relator, decidiu acerca da
liminar, indeferindo-a no que concerne ao mérito, conforme justifica em seu voto, a
saber:
A complexidade da causa de pedir em que se lastreia a pretensão impede, nesse juízo prévio e sumário, que se configure a verossimilhança necessária à concessão da medida urgente. Com efeito, seria por demais precipitado deferir, nesse momento, liminar destinada a suspender o julgamento de todos os processos que envolvam a aplicação do art. 71, § 1º, da Lei nº 8.666/93, antes que se dote o processo de outros elementos instrutórios aptos a melhor moldar o convencimento judicial. A gravidade de tal medida, obstrutora do andamento de grande massa de processos pendentes nos vários órgãos judiciais, desaconselha seu deferimento, mormente em face de seu caráter precário.
De forma sucinta, após o voto do Ministro Cezar Peluso, que não conhecia da
ação declaratória de constitucionalidade por não ver o requisito da controvérsia
judicial, e o voto do Ministro Marco Aurélio, que a reconhecia e dava seguimento à
ação. Pediu-se vista dos autos o Ministro Menezes Direito. Ausentes,
justificadamente, o Ministro Celso de Mello e a Ministra Ellen Gracie.
Por fim, em decisão do Plenário em 24 de novembro de 2010, por maioria e
nos termos do voto do Relator, Ministro Cezar Peluso, o Tribunal julgou procedente
99 Disponível na internet: http://migre.me/5FC9O p. 22-23.
a ação, contra o voto do Ministro Ayres Britto. Impedido o Senhor Ministro Dias
Toffoli, que na época, figurou no processo como Advogado Geral da União.
Noticiou o site oficial do STF:
Por votação majoritária, o Plenário do Supremo Tribunal Federal declarou, nesta quarta-feira (24), a constitucionalidade do artigo 71, parágrafo 1º, da Lei 8.666, de 1993, a chamada Lei de Licitações. O dispositivo prevê que a inadimplência de contratado pelo Poder Público em relação a encargos trabalhistas, fiscais e comerciais não transfere à Administração Pública a responsabilidade por seu pagamento, nem pode onerar o objeto do contrato ou restringir a regularização e o uso das obras e edificações, inclusive perante o Registro de Imóveis. Segundo o presidente do STF, isso “não impedirá o TST de reconhecer a responsabilidade, com base nos fatos de cada causa”. “O STF não pode impedir o TST de, à base de outras normas, dependendo das causas, reconhecer a responsabilidade do poder público”, observou o presidente do Supremo. Ainda conforme o ministro, o que o TST tem reconhecido é que a omissão culposa da administração em relação à fiscalização - se a empresa contratada é ou não idônea, se paga ou não encargos sociais - gera responsabilidade da União.100
No que concerne ao tema de estudo, a maioria dos ministros se pronunciou
pela constitucionalidade do artigo 71 e seu parágrafo único, e houve consenso no
sentido de que o TST não poderá generalizar os casos e terá de investigar com mais
rigor se a inadimplência tem como causa principal a falha ou falta de fiscalização
pelo órgão público contratante. No tocante a terceirização, o ministro Ayres Britto,
lembrou que só há três formas constitucionais de contratar pessoal: por concurso,
por nomeação para cargo em comissão e por contratação por tempo determinado,
para suprir necessidade temporária.
Assim, segundo o Ministro Ayres Brito, a terceirização, embora amplamente
praticada, não tem previsão constitucional. Por isso, no entender dele, nessa
modalidade, havendo inadimplência de obrigações trabalhistas do contratado, o
poder público tem de responsabilizar-se por elas.
Pela redação anterior do Enunciado 331, IV, do TST, claramente, emergia a
responsabilidade dos contratantes e do poder público, decorrente da mera
100 Disponível na internet: http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=166785.
inadimplência do devedor originário da dívida. Ao passo que o STF reconheceu a
constitucionalidade do Art. 71, da lei n. 8.666/93, os magistrados trabalhistas viram-
se na obrigação de rever o enunciado e adequá-lo à decisão da Corte. Desta razão,
atentos ao desfecho deste julgamento, reuniram-se em meados de maio de 2011
para reformular o enunciado.
5.2 A decisão do STF e o enunciado do TST sobre a terceirização e
responsabilização do Estado
Ao reconhecer a Constitucionalidade do Art. 71 da Lei de licitações, o STF
não afirmou que a Administração Pública está eximida das dívidas trabalhistas de
empregados de terceiros, apenas confirmou a regra do artigo legal, que afasta a
responsabilização direta pelo simples motivo de inadimplemento. Como explanado
pelo Ministro Cezar Peluso: “O TST reconhece a responsabilidade da administração
com base em fatos, no descumprimento das obrigações trabalhistas, não com base
na inconstitucionalidade do art. 71”.
Ressalta Gustavo Cauduro Hermes que nesse contexto, restou mantida a
possível co-responsabilidade do ente público no caso omissão culposa da
administração em relação à fiscalização de seus contratados.101
O TST reuniu-se em meados deste ano, promovendo uma ampliação de
incisos, a saber:
IV- O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador de serviços quanto àquelas obrigações, desde que haja participado da relação processual e conste também do título executivo judicial.V- Os entes integrantes da administração pública direta e indireta respondem subsidiariamente, nas mesmas condições do item IV, caso
101 HERMES, Gustavo Cauduro. Subsídios para contratação administrativa / coordenação de Jamyle Sayd. 2 ed. rev. e ampl. Porto alegre: INGEP, 2011. P.124.
evidenciada a sua conduta culposa no cumprimento das obrigações da Lei nº 8.666/93, especialmente na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora. A aludida responsabilidade não decorre de mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada.VI – A responsabilidade subsidiária do tomador de serviços abrange todas as verbas decorrentes da condenação referentes ao período da prestação laboral.102
Esta nova redação, traz a responsabilidade subsidiária em caso de
inadimplemento por parte da empresa, se evidenciada a conduta culposa da
Administração Pública, como há pouco falamos, seja na modalidade culpa in
vigilando ou in eligendo, como cumprimento de obrigações estabelecidas na lei de
licitações no art. 67, bem como estabelece que abrange todos os créditos
trabalhistas, o que não mudou, apenas foi reafirmado.
Nesta esteira, ressaltamos um recente julgado, da 4ª turma do TST, aplicando
este novo entendimento. Segue a ementa:
Processo: RR - 355900-63.2009.5.09.0660 Data de Julgamento: 17/08/2011, Relatora Ministra: Maria de Assis Calsing, 4ª Turma, Data de Publicação: DEJT 26/08/2011.
AGRAVO DE INSTRUMENTO. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. EMPRESA INTEGRANTE DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. NÃO CONFIGURAÇÃO. NECESSIDADE DE FISCALIZAÇÃO DO CUMPRIMENTO DAS OBRIGAÇÕES CONTRATUAIS. CULPA IN VIGILANDO. Diante da ofensa ao art. 71, § 1.º, da Lei n.º 8.666/93, determina-se o processamento do Recurso de Revista. Agravo de Instrumento a que se dá provimento. RECURSO DE REVISTA. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. EMPRESA INTEGRANTE DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. NÃO CONFIGURAÇÃO.NECESSIDADE DE FISCALIZAÇÃO DO CUMPRIMENTO DAS OBRIGAÇÕES CONTRATUAIS. CULPA IN VIGILANDO. De acordo com a nova redação conferida à Súmula n.º 331 do TST, os entes integrantes da administração pública direta e indireta respondem subsidiariamente, nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada ação e omissão culposa no cumprimento das obrigações legais e contratuais. A aludida responsabilidade não decorre de mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada. Não tendo o Regional identificado expressamente
102 BRASIL. Súmula 331, do Tribunal Superior do Trabalho. Disponível em: http://migre.me/5MUJ8
que o segundo Reclamado foi omisso quanto ao seu dever de fiscalizar o cumprimento do contrato por parte da prestadora de serviços, incorrendo em culpa in vigilando, não há de se falar em responsabilidade subsidiária. Recurso de Revista conhecido e provido.103
Por outro lado, diante do novo entendimento, há o lado discordante. Neste
diapasão, ressalta-se a opinião de Gustavo Cauduro Hermes:
Ocorre que esta dedução é inaceitável, porque o surgimento da dívida trabalhista não necessariamente decorre de falta ou falha de fiscalização. Este controle não é viável, ao menos que fossem colocados fiscais individuais sobre cada empregado de terceiro sobre toda sua vida, no trabalho, nas férias, além de contínua auditoria sobre documentos gerados na relação de trabalho.104
Referido autor vai além e explica:
É bom lembrar que o Brasil existe na forma de Estado Democrático de Direito e possui instituições públicas com atribuições formais de fiscalização trabalhista e previdenciária, estas sim com autoridade e rotina para execução de tal mister. Na verdade o que tem se visto, é o quão diminuto e mal instrumentalizados são estes organismos.105
Destarte, o Supremo Tribunal Federal, nesta seara, pouco elucidou o
horizonte sobre a responsabilização trabalhista dos entes públicos, pois não afastou
a responsabilização, e sim, consagrou a regra da culpa para atrair a obrigação.
Desta razão, entende-se que a Administração Pública torna-se responsável pelos
débitos trabalhistas, mesmo com o reconhecimento de constitucionalidade de
referido artigo.
103 BRASIL. Recurso Ordinário. RO TRT-PR-29114-2009-009-09-00-6. 104 HERMES, Gustavo Cauduro. Subsídios para contratação administrativa / coordenação de Jamyle Sayd. 2 ed. rev. e ampl. Porto alegre: INGEP, 2011. p. 124.105 HERMES, Gustavo Cauduro. op. cit. p. 125.
Por fim, conclui-se a exposição dos argumentos citando-se a visão de Abdala
Vantuil sobre a temática, considerando a ordem econômica e social de nosso país,
afirma que a terceirização não vai acabar. Afirma ele, que ninguém razoavelmente
imagina uma economia saudável no Brasil se a contratação de empresas
especializadas na execução de serviços determinados fosse impossibilitada. Assim,
relembra a frase de George Ripert, que diz que ‘estamos pois diante da advertência
de: quando o direito ignora a realidade, a realidade se vinga, ignorando o direito’.106
106 ABDALA, Vantuil. Terceirização: Anomia Inadmissível. Disponível na internet: http://www.jusbrasil.com.br/noticias/148889/artigo-terceirizacao-anomia-inadmissivel.
6 CONCLUSÃO
A terceirização, vista como meio de proporcionar de forma célere, a prestação
de serviços à órgãos da administração pública, que por sua vez prestam os serviços
públicos à sociedade, foi largamente adotada em nosso país. Assim, tornaria
possível a otimização da máquina estatal, que se concentraria em sua “atividade-
fim”, enquanto os terceirizados prestariam serviços de “atividade-meio”, como
vigilância e conservação de limpeza, dentre outros citados no decreto nº 2.271, de
sete de julho de 1997, mencionando quais as atividades que podem ser
terceirizadas. Para isto, empresas especializadas nestas “atividades-meio” são
contratadas, mediante as observações e exigências feitas na lei 8.666/93, isto é, a
lei de licitações. Por sua vez, as empresas necessitam de mão-de-obra para realizar
suas atividades. Então começa a divergência.
Aludidos obreiros são regidos pela CLT, contraindo direitos e deveres para
com a empresa terceirizada. Ocorrendo algum inadimplemento no tocante aos
créditos trabalhistas, nasce o direito para o trabalhador acionar a justiça para
receber seus créditos. No pólo passivo da lide, coloca-se a empresa terceirizada, e
por força do artigo 71, §1°, da lei de licitações, o Estado estaria isento de arcar com
qualquer débito que decorra destes contratos.
Os pretórios trabalhistas, no intuito de proteger e garantir os créditos dos
trabalhadores criam inicialmente o enunciado 256, que após evolui para o enunciado
331, de toda maneira, responsabilizando a administração pública subsidiariamente
por esta dívida, conforme dispõe seu item IV, exceto nos casos previstos
legalmente, como a lei 6.019 e 7.102.
Assim, ignorou-se o comando da lei de licitações, responsabilizando a
administração quando ocorria o inadimplemento. Surgiu então questionamentos
doutrinários, dentre eles, a supremacia do interesse privado sobre o público,
teoricamente impossível em nosso ordenamento jurídico. No entanto, tal enunciado
faz isso, colocando o interesse dos trabalhadores a frente do interesse público.
Levantam também a tese de que o Enunciado seria uma afronta a legislação, que
passou por um rigoroso processo legislativo, no entanto perde eficácia em prol de
uma ideologia criada em aludidos tribunais. Por fim, a Administração acabava por
pagar duas vezes pelo mesmo contrato, indo contra os conceitos de eficácia dos
serviços públicos e mais vantajoso para a Administração.
Destarte, culminou na Ação Declaratória de Constitucionalidade n° 16/2007,
ajuizada pelo governo do Distrito Federal, com o intuito de reafirmar o artigo 71 da
lei de licitações, afastando a responsabilidade subsidiária da administração.
Tramitou durante dois anos na Corte, sendo decidida em novembro de 2009, o qual
se curvou no sentido de reconhecer sua constitucionalidade, no entanto, não afastou
a responsabilidade da administração, amoldando a súmula com novas
condicionantes.
Desta feita, com fulcro no entendimento da Corte, o TST reformulou o
enunciado neste ano, trazendo outros argumentos para a configuração da
responsabilidade do estado nos contratos de terceirização: culpa in vigilando e culpa
in eligendo.
A culpa in eligendo decorreria da má escolha da empresa no procedimento
licitatório. Já a culpa in vigilando, caracterizaria pela não fiscalização do contrato,
pela não verificação por parte da administração se as obrigações trabalhistas vêm
sendo adimplidas. Também ressalta que a Administração responde por todos os
créditos trabalhistas, sem exceção de nenhum.
Pois bem, diante do novo posicionamento, rebatem alguns estudiosos do
direito que não resiste a configuração por culpa in eligendo, por tratar-se de
contratação feita mediante regular processo licitatório, que obedeceu a todos os
parâmetros estabelecidos na lei. Bem assim, não resistiria a tese de culpa in
vigilando, haja vista que não há nenhuma previsão legal que obriga a administração
a fiscalizar quanto ao pagamento dos trabalhadores em suas prestadoras de
serviços, bem como não há possibilidade de fazê-lo, tendo em vista a precária
instrumentalização da administração pública no Brasil, como ressaltou Hermes
Cauduro.
Assim, segue o Estado a responder pelas dívidas trabalhistas, sem ao menos
buscar-se outras medidas jurídicas ante a empresa terceirizada, como a
despersonalização da pessoa jurídica, amplamente aceita em nosso ordenamento,
se assim declarar-se insolvente em processo de execução trabalhista, haja vista a
explanação de Willian de Almeida Brito Junior.
Portanto, concluo, que embora não seja autorizado o repasse de débitos à
administração pública, legalmente, está será responsabilizada por conta de sua
conduta em não fiscalizar o contrato, em respeito à proteção dos trabalhadores. No
entanto, parece-me um pouco perigosa estas novas condicionantes se observada da
expectativa do obreiro, pois o seu crédito trabalhista, de caráter alimentar, fica à
mercê da análise da fiscalização ou não da Administração, o que notadamente é
complexo tendo em vista a celeridade almejada nos pretórios trabalhistas.
Entrementes, entre a total desreponsabilização do Estado e a possibilidade de
responsabilização deste, é preferível a segunda proposição para os trabalhadores,
que terão mais segurança em receber os créditos se reconhecida a responsabilidade
do Estado, bem como para a Administração Pública, que diferente de anteriormente
não será responsabilizada de pronto, mas sim, dependerá da comprovação de seu
comportamento omissivo. Ainda não está comprovada se foi a melhor decisão para
os rumos deste tema, tanto para o Estado quanto para os trabalhadores. De toda
sorte, notamos que a construção dos juízes e doutrinadores brasileiros conversam e
caminham em busca do bem comum, da segurança jurídica e justiça social, mesmo
que de lados opostos.
REFERÊNCIAS
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