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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ
WALTER DE BRITO FERREIRA
INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA NO CRIME ORGANIZADO
CURITIBA
2012
WALTER DE BRITO FERREIRA
INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA NO CRIME ORGANIZADO
Monografia apresentada ao Curso de Direito da Faculdade de Ciências Jurídicas da Universidade Tuiuti do Paraná, como requisito parcial para a obtenção do grau de Bacharel em Direito. Orientador: Professor Dr. Nefi Cordeiro
CURITIBA
2012
TERMO DE APROVAÇÃO
Walter de Brito Ferreira
INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA NO CRIME ORGANIZADO Esta Monografia foi julgada e aprovada para a obtenção de grau de Bacharel no Curso de Direito da
Universidade TUIUTI do Paraná.
_________________________
Prof. Dr. PhD Eduardo de Oliveira Leite Universidade TUIUTI do Paraná
Curso de Direito
Orientador: Prof. Dr. Nefi Cordeiro
Universidade TUIUTI do Paraná Curso de Direito
_________________________
Universidade TUIUTI do Paraná Curso de Direito
_________________________ Universidade TUIUTI do Paraná
Curso de Direito
DEDICATÓRIA
À minha amada esposa Juliana, que sempre acreditou em mim, me inspirando na realização de um sonho.
AGRADECIMENTOS
Ao meu Orientador, Professor Nefi Cordeiro, por ter acreditado e confiado em mim, durante o período de elaboração deste trabalho, ao mestre, meu profundo agradecimento e admiração. Ao Juiz Pedro Luís Sanson Corat, pela preciosa colaboração com esta pesquisa. Ao Promotor de Justiça Claudio Franco Felix, pela paciência e ajuda para elaboração do presente trabalho. Ao Delegado de Policia Kleudson Moreira Tavares, pelas orientações para conclusão deste trabalho.
RESUMO
A realização do presente trabalho tem por finalidade analisar e demonstrar a
importância da medida de interceptação telefônica como instrumento auxiliar no
combate ao crime organizado. A pesquisa indicará os requisitos a serem cumpridos
para o deferimento da medida, quais os meios utilizados para execução,
pressupostos e limites. Objetiva também esclarecer que apesar de atingir direitos e
garantias individuais, a interceptação telefônica apresenta-se como sendo um eficaz
instrumento de investigação e persecução penal, principalmente no combate ao
crime organizado e trafico de drogas, uma vez que estas atividades criminosas tem-
se utilizado de tecnologias para o cometimento de ilícitos penais. Tem por finalidade
ainda, demonstrar que medida tão eficaz no combate ao crime organizado não é
utilizada com a frequência que deveria ser utilizada em relação ao crescimento,
evolução e dinamismo do crime organizado em nosso território.
Palavras-chave: Interceptação Telefônica, Crime Organizado, Instrumento de
Investigação.
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ............................................................................................... 8
2 INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA................................................................. 9
2.1 CONCEITO GERAL ....................................................................................... 9
2.2 CONCEITO JURIDICO .................................................................................. 9
2.3 DA INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA ........................................................... 9
2.4 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA ................ 11
3 REQUISITOS PARA A INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA ......................... 13
3.1 ART 1º DA LEI FEDERAL Nº 9.296, DE 24 DE JULHO DE 1996 ................ 13
3.2 ART 2º DA LEI FEDERAL Nº 9.296, DE 24 DE JULHO DE 1996 ................ 14
3.3 ART 3º DA LEI FEDERAL Nº 9.296, DE 24 DE JULHO DE 1996 ................ 15
3.4 ART 4º DA LEI FEDERAL Nº 9.296, DE 24 DE JULHO DE 1996 ................ 16
3.5 ART 5º DA LEI FEDERAL Nº 9.296, DE 24 DE JULHO DE 1996 ................ 17
4 PROCEDIMENTOS DA INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA ........................ 19
4.1 ART 6º DA LEI FEDERAL Nº 9.296, DE 24 DE JULHO DE 1996 ................ 19
4.2 ART 7º DA LEI FEDERAL Nº 9.296, DE 24 DE JULHO DE 1996 ................ 20
4.3 ART 8º DA LEI FEDERAL Nº 9.296, DE 24 DE JULHO DE 1996 ................ 20
4.4 ART 9º DA LEI FEDERAL Nº 9.296, DE 24 DE JULHO DE 1996 ................ 22
4.5 ART 10º DA LEI FEDERAL Nº 9.296, DE 24 DE JULHO DE 1996 .............. 22
4.6 ART 11º DA LEI FEDERAL Nº 9.296, DE 24 DE JULHO DE 1996 .............. 23
4.7 ART 12º DA LEI FEDERAL Nº 9.296, DE 24 DE JULHO DE 1996 .............. 24
5 CRIME ORGANIZADO ................................................................................ 25
5.1 CONCEITO .................................................................................................. 25
5.2 HISTÓRICO DO CRIME ORGANIZADO ..................................................... 26
5.3 TERRORISMO ............................................................................................. 26
5.4 NARCOTRÁFICO NA AMÉRICA DO SUL ................................................... 26
5.5 HISTÓRICO DO CRIME ORGANIZADO NO BRASIL ................................. 27
5.5.1 O cangaço .................................................................................................... 27
5.5.2 Jogo do bicho ............................................................................................... 27
5.5.3 Facções criminosas...................................................................................... 27
5.5.4 O desvio de dinheiro .................................................................................... 28
6 IMPORTÂNCIA DA PROVA NO CRIME ORGANIZADO ............................ 31
7 ESTUDO DE CASO – INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA NA VISÃO DE
SEUS OPERADORES........................................................................................... 33
7.1 QUESTIONÁRIO No 1 .................................................................................. 33
7.2 QUESTIONÁRIO No 2 .................................................................................. 34
7.3 QUESTIONÁRIO No 3 .................................................................................. 35
8 CONSIDERAÇÕES FINAIS ......................................................................... 39
REFERÊNCIAS ..................................................................................................... 41
8
1 INTRODUÇÃO
O presente trabalho visa demonstrar que a medida de interceptação
telefônica, embora não se trate no Brasil de meio exclusivo para combate a
criminalidade organizada mostra-se eficiente para a apuração dessa modalidade de
crime, bem como o substancial proveito trazido para a eficácia probatória da
investigação criminal e da instrução processual penal com o advento da Lei nº.
9296/96, que regulamentou o inciso XII, parte final do artigo 5º da Constituição
Federal e que cuidou da medida de interceptação telefônica. Inicialmente será feita
uma exposição histórica da medida de interceptação telefônica desde sua origem na
França, seu desenvolvimento no Brasil Império até a atualidade, passando pelas
Constituições do Brasil.
Será realizada uma análise dos principais requisitos, tendo em vista a
necessidade do correto manuseio da Lei 9.296/96, de 24 de Julho de 1996, com a
intenção de obter a prova lícita tendente a um justo pronunciamento judicial.
Também se fará um breve relato histórico do crime organizado no Brasil,
desde o final do século XIX com o movimento conhecido como cangaço até os dias
de hoje com o advento das facções criminosas e os grupos criminosos compostos
por agentes dos três Poderes do Estado.
Para finalizar pretende-se demonstrar que o mecanismo da interceptação
telefônica é o dispositivo mais apropriado para afrontar o crescimento do crime
organizado no Brasil, tendo em vista a dinamicidade de tal modalidade criminosa.
9
2 INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA
2.1 CONCEITO GERAL
A interceptação, ato ou efeito de interceptar (de inter e captio), tem,
etimologicamente, entre outros, os sentidos de: “1.interromper no seu curso; deter
ou impedir na passagem; 2. Cortar, interromper: interceptar comunicações
telefônicas”. (FERREIRA, 2010, p. 433)
Nas palavras de Conserino:
Trata-se de excelente recurso de investigação através do sistema de vigilância eletrônica. Monitoram-se redes e organizações criminosas, identificam-se os agentes responsáveis pelos crimes, identificam-se contas bancárias através de diálogos interceptados, detectam-se as ações de cada integrante da organização criminosa; enfim, descobre-se o modus operandi com todas as ramificações e articulações do crime organizado (CONSERINO, 2011, p. 15).
Resumindo interceptação telefônica é a captação de conversa telefônica por
um terceiro, sem conhecimento dos interlocutores.
2.2 CONCEITO JURIDICO
No entendimento de Grinover (2001, p. 146), juridicamente, a interceptação,
“lato sensu”, pode ser entendida como ato de interferência nas comunicações
telefônicas, quer para impedi-la com conseqüências penais – quer para delas
apenas tomar conhecimento – nesse caso, também com reflexos no processo.
Para Conserino (2011, p. 145), o instituto jurídico da interceptação das
comunicações telefônicas substancia-se na possibilidade de captação e apreensão
de conversa telefônica, por um terceiro, sem o conhecimento dos interlocutores,
visando única e exclusivamente às investigações criminais e instrução processual
penal.
2.3 DA INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA
Essencial à interceptação, além do fato de a operação ter sido realizada por
alguém estranho à conversa, é que esse terceiro estivesse investido do intuito de
10
tomar conhecimento de circunstâncias, que, de outra forma, lhe permaneceriam
desconhecidas. Se for pelo ato de terceiro que se concretiza a interceptação
telefônica, a hipótese de um dos interlocutores gravar a própria conversa, limitando-
se, assim, a documentar fatos conhecidos, não se caracteriza como tal, nem se
sujeita a mesma disciplina, sendo denominada de gravação clandestina.
A gravação da conversa interceptada não é, necessariamente, elemento
integrante do conceito de interceptação. A simples escuta, desacompanhada de
gravação, pode ser objeto de prova no processo penal, desde que não configure
violação à intimidade. Assim tanto as interceptações como as gravações poderão
ser lícitas ou ilícitas, na medida em que obedecerem ou não aos preceitos
constitucionais e legais que regem a matéria. E, a revelarem-se ilícitas, os seus
resultados devem ser considerados inadmissíveis no processo, e ineficazes
enquanto provas.
Conclui-se que a interceptação telefônica de forma geral é a captação da
comunicação entre duas pessoas, executada por terceiro, a partir da qual cumpre
estabelecer algumas distinções tendo em vista as diversas modalidades de captação
eletrônica de provas, sendo elas: interceptação telefônica conhecida por um dos
interlocutores, ou escuta telefônica; interceptação de conversa entre presentes, ou
interceptação ambiental; interceptação da conversa entre presentes conhecida por
um dos interlocutores, ou escuta ambiental; gravação da própria conversa telefônica,
ou gravação clandestina; e gravação de conversa pessoal e direta, entre presentes,
ou gravação clandestina ambiental; e por fim a interceptação telefônica em sentido
estrito, ou seja, a captação da conversa telefônica por um terceiro, sem o
conhecimento dos interlocutores.
De acordo com Grinover (2001, p. 94):
Interceptação telefônica em sentido estrito é aquela que se efetiva pelo “grampeamento”, ou seja, pelo ato de “interferir numa central telefônica, nas ligações da linha do telefone que se quer controlar, a fim de ouvir e/ou gravar conversações” (GRINOVER, 2001, p. 94).
A interceptação telefônica é fruto da necessidade, percebida pelo legislador, de se equipar a sociedade com instrumentos que possibilitem a contenção do crescente crime organizado (VASCONCELOS, 2011, p. 4).
11
Assim nos ensina Bechara (Crime organizado e interceptação telefônica,
Revista de Direito Penal e Ciências Afins. Disponível no site:
www.direitopenal.adv.br>.Revista nº 36):
Os crimes praticados por associações criminosas geram grau de perturbação acentuado e diferenciado da criminalidade comum. Essa percepção faz com que se exija não somente uma punição mais rigorosa dos criminosos, mas principalmente a adoção de tratamento processual especial e particularizado. A legislação brasileira, em que pesem as inúmeras contradições e eventuais incoerências técnicas é sensível a essa situação anunciada, de fato, contempla um procedimento diferenciado ao dito crime organizado. Tais diferenciações evidenciam-se pela presunção de maior necessidade de determinados instrumentos como a prisão cautelar, a interceptação telefônica, a busca domiciliar, a quebra de sigilo bancário e fiscal, o seqüestro de bens e, ainda, a gravação ambiental e a infiltração de agentes na forma da Lei Federal nº 9.034/95. Em todas essas hipóteses, verifica-se maior restrição às liberdades individuais, justificada pela imperatividade de se tutelar o interesse coletivo, cuja gravidade, medida pelo comprometimento social gerado, exige maior rigor por parte do Estado (BECHARA, Crime organizado e interceptação telefônica, Revista de Direito Penal e Ciências Afins. Disponível no site: www.direitopenal.adv.br>.Revista nº 36).
2.4 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA
Com o objetivo de evitar o que havia ocorrido na França no século XVII e
XVIII, onde correspondências eram violadas assim como seus conteúdos eram lidos
nas chamadas “cabines negras”, a Carta Imperial Brasileira de 1824, através de seu
título 8°, art. 179, inciso XXVII, garantiu a inviolabilidade do chamado “Segredo das
Cartas”.
A Constituição Republicana de 1891, bem como as Cartas Magnas de 1937,
1943 e 1946, seguindo a forte influência do direito estrangeiro mantiveram a
inviolabilidade de correspondência.
Somente com o advento da Carta Magna de 1967, com algumas décadas de
atraso em relação aos ordenamentos estrangeiros, é que se incluiu o direito
fundamental de sigilo das comunicações na legislação brasileira, previsto no artigo
150, § 9º, da Constituição do Brasil, e mantida com a Emenda nº 1 de 1969.
Ocorre que naquela época a Lei 4.117 de 1962, Código Brasileiro de
Telecomunicações, permitia a violação das comunicações telefônicas com a
finalidade de investigação criminal ou instrução em processo penal, devidamente
autorizada pelo juiz competente.
12
Em nossa Carta Magna atual, também é garantido o direito ao sigilo da
correspondência das comunicações, porém o legislador através do artigo 5º, inciso
XII da supracitada Carta, condicionou uma exceção do direito de sigilo da
correspondência das comunicações à apreciação judicial com a finalidade de
investigação criminal ou instrução processual penal. O que gerou nova polêmica em
relação à recepção ou não do artigo 57 da Lei 4.117/1962 se haveria ou não
necessidade de nova norma infraconstitucional.
Com o advento da Lei Federal nº 9.296, de 24 de julho de 1996, resolveu-se a
exigência constitucional do inciso XII, do artigo 5º da Constituição da República de
1988, tornando possível o emprego da interceptação telefônica para fins de
investigação criminal ou instrução processual penal.
13
3 REQUISITOS PARA A INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA
A edição da Lei 9.296 de 24 de julho de 1996 trouxe a regulamentação da
matéria. Cabe observar que a interceptação telefônica mesmo autorizada pela
Constituição Federal, continua sendo vedada, sendo a única exceção prevista,
conforme prescreve a supracitada lei infraconstitucional, ou seja, quando a
interceptação servir de prova em investigação criminal e em instrução processual
penal.
Desta forma, tem por objetivo o presente capítulo a análise dos requisitos
para que a interceptação telefônica seja manejada à luz da Lei, refletindo na
produção e valoração da prova.
3.1 ART 1º DA LEI FEDERAL Nº 9.296, DE 24 DE JULHO DE 1996
A interceptação de comunicações telefônicas, de qualquer natureza, para prova em investigação criminal e em instrução processual penal, observará o disposto nesta lei e dependerá de ordem do Juiz de Direito competente da ação principal, sob segredo de justiça. Parágrafo único. O disposto nesta Lei aplica-se à interceptação do fluxo de comunicações em sistemas de informática e telemática (BRASIL, Lei Federal nº 9.296, de 24 de julho de 1996, 2011, p. 1565).
A interceptação telefônica continua sendo vedada entre particulares,
independentemente do objetivo da gravação, ficando exclusivamente permitida para
ser utilizada como prova em investigação criminal e em instrução processual penal.
O supracitado artigo deixa claro que a interceptação telefônica dependerá de
ordem, do juiz competente da ação principal (CPP, artigos 70 e seguintes), sob
segredo de justiça.
Com referência ao parágrafo único do artigo comentado sobre a aplicação da
interceptação do fluxo de comunicações em sistemas de informática e telemática
gera discussões acerca de sua constitucionalidade.
No entendimento de Greco Filho (2008, p. 16) existem duas interpretações
possíveis acerca da redação do artigo 5º, inciso XII da Carta Magna de 1988: de um
lado a que considera que a expressão “no último caso” se aplica às comunicações
telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas e de outro que considera que
a expressão se aplica apenas às comunicações telefônicas. A posição do Autor é de
14
que a norma citada é inconstitucional, sustentando que a expressão se aplica
apenas às comunicações telefônicas. Argumenta também que se a Constituição
Federal de 1988 quisesse entender que a interceptação fosse possível nas
comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, a ressalva
estaria redigida como “no segundo caso” e não como “no último caso”.
3.2 ART 2º DA LEI FEDERAL Nº 9.296, DE 24 DE JULHO DE 1996
Não será admitida a interceptação de comunicações telefônicas quando ocorrer qualquer das seguintes hipóteses: I – não houver indícios razoáveis da autoria ou participação em infração penal; II – a prova puder ser feita por outros meios disponíveis; III – o fato investigado constituir infração penal punida, no máximo, com pena de detenção. Parágrafo único. Em qualquer hipótese deve ser descrita com clareza a situação objeto da investigação, inclusive com a indicação e qualificação dos investigados, salvo impossibilidade manifesta, devidamente justificada (BRASIL, Lei Federal nº 9.296, de 24 de julho de 1996, 2011, p. 1565).
A exigência de indícios razoáveis de autoria ou participação em
infração penal demonstra a existência do “fumus boni iuris” como primeiro
pressuposto da medida, somada a inexistência de outros meios de prova disponíveis
para a obtenção das informações necessárias, representando, assim, o “periculum in
mora”, neste caso a necessidade e urgência da medida.
Logo a natureza jurídica da medida de interceptação telefônica é
cautelar, portanto, de índole normativa processual.
Tratando-se de providência cautelar, não há que se questionar a
submissão da interceptação aos requisitos básicos de toda medida desta natureza,
quais sejam: “fumus boni iuris” (aparência do bom direito) e “periculum in mora”
(perigo ou risco na demora). Resta claro que da medida não poderá ter
conhecimento prévio o investigado, por isso, deve ser determinada “inaudita altera
pars ” (VASCONCELOS, 2011, p. 4).
Conforme Gomes (1997, p. 178), o “fumus boni iuris” no processo
penal exprime duas exigências: a primeira referente à probabilidade de autoria ou
participação numa infração penal e a segunda à probabilidade de existência de uma
infração penal (materialidade).
15
O texto legal fala ainda em indícios que se refiram à autoria ou
participação em infração penal, pressupondo a existência de uma investigação
criminal em curso ou um processo em andamento, entretanto, não é necessário um
inquérito, mas a existência de notícias fundadas sobre um delito.
O segundo pressuposto se refere à obtenção da prova, não se
admitindo a medida de interceptação telefônica, quando tal prova puder ser feita por
outros meios disponíveis. Tem-se que a interceptação é uma medida de “ultima
ratio”, de exceção, extremada, se legitima somente na medida da sua necessidade.
3.3 ART 3º DA LEI FEDERAL Nº 9.296, DE 24 DE JULHO DE 1996
A interceptação das comunicações telefônicas poderá ser determinada pelo juiz, de ofício ou a requerimento: I – da autoridade policial, na investigação criminal; II – do representante do Ministério Público, na investigação criminal e na instrução processual penal (BRASIL, Lei Federal nº 9.296, de 24 de julho de 1996, 2011, p.1566).
A Lei 9.296 em seu artigo 3º estabelece os legitimados a requerer a
interceptação telefônica. Primeiramente têm-se a hipótese de que a medida poderá
ser ordenada “ex officio” pelo juiz, possibilidade que gera divergência na doutrina.
De acordo com Parizatto (1996, p. 37):
A nosso ver, o juiz só poderá determinar ex officio a interceptação das comunicações telefônicas durante o curso da instrução processual, pois que no caso de investigação criminal, tal providência deverá ser requerida pela autoridade policial ou pelo órgão do Ministério Público, presumindo-se que o juiz não tem conhecimento das atividades policiais e se fosse necessária a comunicação da autoridade para que o juiz determinasse tal meio de prova, à evidência, caberia à própria autoridade requerê-la (PARIZATTO, 1996, p. 37).
Para Gomes (1997, p. 199, 201, 202), o artigo 3º, da Lei 9.296/96, é
flagrantemente inconstitucional. O legislador ordinário brasileiro, muitas vezes sem
consciência dos seus limites legiferantes, vem insistindo, nos últimos anos
(principalmente na Lei 9.034/95, art. 3º), na criação da figura do “Juiz inquisidor”, o
que é absolutamente conflitante com a Magna Carta.
16
Afirma ainda que é inconstitucional a interceptação telefônica “de ofício”, em
conseqüência, porque vulnera o modelo acusatório de processo, processo de partes,
instituído pela Constituição de 1988, quando considera os ofícios de acusação e da
defesa como funções essenciais ao exercício da jurisdição, atribuindo esta aos
juízes, que têm competência para processar e julgar, mas não para investigar,
principalmente no âmbito extraprocessual.
3.4 ART 4º DA LEI FEDERAL Nº 9.296, DE 24 DE JULHO DE 1996
O pedido de interceptação de comunicação telefônica conterá a demonstração de que a sua realização é necessária à apuração de infração penal, com indicação dos meios a serem empregados. Parágrafo 1º Excepcionalmente, o juiz poderá admitir que o pedido seja formulado verbalmente, desde que estejam presentes os pressupostos que autorizem a interceptação, caso em que a concessão será condicionada à sua redução a termo. Parágrafo 2º O juiz, no prazo máximo de vinte e quatro horas decidirá sobre o pedido (BRASIL, Lei Federal nº 9.296, de 24 de julho de 1996, 201, p.1566).
O supracitado artigo descreve que o pedido de interceptação telefônica
demonstre a necessidade de sua efetivação quanto à apuração de infração penal,
com indicação de meios a serem empregados.
A autoridade policial deverá demonstrar através de seu pedido de
interceptação de comunicação telefônica do suspeito ou indiciado, que a medida é
cabível e imprescindível, uma vez que servirá de prova de um ilícito penal, cuja
obtenção não se conseguirá por outro meio.
A autoridade requerente, seja a autoridade policial, seja o Ministério Público,
deverá informar a forma como será realizada a interceptação, indicando as linhas
telefônicas que se fará a interceptação, a quem pertencem às linhas, quais
aparelhos serão utilizados para a interceptação e conseqüente gravação das
conversas grampeadas.
O termo “excepcionalmente” contido no parágrafo 1º indica que somente em
casos excepcionais, ou seja, de extrema urgência, o juiz poderá admitir que o pedido
de interceptação de comunicação telefônica possa ser feito verbalmente, mesmo
assim a concessão ficará condicionada à sua redução a termo.
17
Sendo admitida a petição verbal da interceptação telefônica, em sua
exposição a autoridade deverá demonstrar a presença dos pressupostos que
autorizem a medida.
O artigo 4º em seu parágrafo 2º impõe que será de vinte e quatro horas o
prazo para o juiz decidir sobre o pedido de interceptação de comunicação telefônica,
podendo inclusive haver decisão imediata.
A imposição do prazo de vinte e quatro horas é igual ao constante do art. 800,
III, do Código de Processo Penal, concedido ao juiz, para os despachos de
expediente.
3.5 ART 5º DA LEI FEDERAL Nº 9.296, DE 24 DE JULHO DE 1996
A decisão será fundamentada, sob pena de nulidade, indicando também a forma de execução da diligência, que não poderá exceder o prazo de quinze dias, renovável por igual tempo uma vez comprovada a indispensabilidade do meio de prova (BRASIL, Lei Federal nº 9.296, de 24 de julho de 1996, 2011, p. 1566).
A decisão deverá esclarecer que elementos serviram de amparo à convicção
do juiz na apreciação do pedido. A fundamentação das decisões é medida contida
no artigo 93, IX, da Constituição da República de 1988, sob pena de nulidade.
Para Streck (1997, p. 68):
Não há dúvida de que a (necessidade da) fundamentação, além de estar prevista na Constituição na parte relativa ao Poder Judiciário, é, também, um direito fundamental do cidadão. É a garantia que o cidadão tem de que não sofrerá restrição de direitos sem a devida justificação/fundamentação. Disso decorre que o Juiz, na apreciação do pedido de interceptação de comunicação telefônica, deverá, de forma (bem) fundamentada, considerar o princípio da proporcionalidade, e, mais precisamente, realizar um sopesamento entre o interesse público, por um lado, e a esfera da intimidade protegida pelos direitos fundamentais do outro. Ao Juiz é que caberá dizer, pois, no caso concreto, o que é razoável, confrontando o direito à intimidade – garantido pela Constituição – com o interesse público (STRECK, 1997, p. 68).
Quanto à forma de execução da diligência, ensina Parizatto (1996, p. 45),
poderá o juiz acatar aquela indicada pela autoridade policial ou pelo Ministério
Público, ou determinar outra forma para tal realização.
18
A captação das comunicações telefônicas e telemáticas, que poderá ser
utilizada como prova na investigação criminal ou na instrução processual penal, não
poderá exceder o prazo de quinze dias, conforme determina o artigo 5º. Podendo o
Juiz, prorrogar por mais quinze dias, desde que novo pedido demonstre a
indispensabilidade da prova, a sua necessidade e a inexistência de outros meios
disponíveis. Tendo ainda o Juiz que fundamentar essa indispensabilidade com base
nos fatos e no direito.
Com relação à renovação da autorização judicial, nos ensina Gomes (1997, p.
219) que a interceptação telefônica é medida excepcional e tem por fundamento a
sua necessidade para a obtenção de uma prova. O fundamental, assim, não é tanto
a duração da medida, senão a demonstração inequívoca da sua indispensabilidade.
Enquanto indispensável, enquanto necessária, pode ser autorizada. A lei não limitou
o número de vezes, apenas exige a evidenciação da indispensabilidade. È o
prudente arbítrio do Juiz que está em jogo. Mais tecnicamente falando: é a
proporcionalidade. No instante em que se perceber que a interceptação já não tem
sentido, desaparece a proporcionalidade. Logo, já não pode ser renovada. E se o
for, é nula.
19
4 PROCEDIMENTOS DA INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA
4.1 ART 6º DA LEI FEDERAL Nº 9.296, DE 24 DE JULHO DE 1996
Deferido o pedido, a autoridade policial conduzirá os procedimentos de interceptação, dando ciência ao Ministério Público que poderá acompanhar a sua realização. Parágrafo 1º No caso de a diligência possibilitar a gravação da comunicação interceptada, será determinada a sua transcrição. Parágrafo 2º Cumprida a diligência, a autoridade policial encaminhará o resultado da interceptação ao juiz, acompanhando de auto circunstanciado, que deverá conter o resumo das operações realizadas. Parágrafo 3º Recebidos esses elementos, o juiz determinará a providência do art. 8º, ciente o Ministério Público (BRASIL, Lei Federal nº 9.296, de 24 de julho de 1996, 2011, p. 1566).
Com o deferimento da medida de interceptação telefônica pelo juiz
competente, a autoridade policial conduzirá, executará o procedimento
interceptativo, independentemente se o pedido foi feito pelo Ministério Público, pois,
só à polícia, cuja investigação, muitas vezes, não é indispensável ao oferecimento
da denúncia, é conferido o poder de conduzi-la
O parágrafo primeiro do artigo comentado determina que se possível a
gravação da comunicação interceptada, será realizada sua transcrição, ou seja,
reproduzir para o papel, os diálogos do telefone, indicando a quem pertence as
vozes utilizadas nas comunicações telefônicas.
E em seu parágrafo 2º, ao término da diligência, deve a autoridade policial
determinar a transcrição de interceptação, e encaminhar ao juiz juntamente de laudo
circunstanciado.
Para Vasconcelos (2011, p. 64) a obrigatoriedade do procedimento de
transcrição e degravação devem-se em respeito ao devido processo legal, ao
contraditório e à ampla defesa, já que as partes e os interessados têm o direito de
conhecer todas as circunstâncias, fatos e provas sobre a qual se fundamenta a
denúncia.
O Supremo Tribunal Federal firmou entendimento no sentido de que a
transcrição integral dos diálogos interceptados é desnecessária:
STJ – HABEAS CORPUS HC 135049 MS 2009/0080228-9 STJ Data da Publicação; 03/02/2012
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Ementa: HABEAS CORPUS. CORRUPÇÃO PASSIVA. TRANSCRIÇÃO INTEGRAL DAS INTERCEPTAÇÕES TELEFÔNICAS. DESNECESSIDADE. PRECEDENTES DESTA CORTE E SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO CONFIGURADO. ORDEM DENEGADA. 1. Consoante reiterada jurisprudência desta Corte, é prescindível a transcrição integral das interceptações telefônicas, sendo imperioso, tão somente, a fim de assegurar o amplo exercício da defesa, que se permita às partes o acesso aos diálogos captados, o que ocorreu na hipótese dos autos... (JUSBRASIL. Disponível em: http://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia. Acesso em 23 ago. 2012).
4.2 ART 7º DA LEI FEDERAL Nº 9.296, DE 24 DE JULHO DE 1996
Para os procedimentos de interceptação de que trata esta Lei, a autoridade policial poderá requisitar serviços e técnicos especializados às concessionárias de serviço público (BRASIL, Lei Federal nº 9.296, de 24 de julho de 1996, 2011, p. 1566).
A autoridade policial poderá requisitar por escrito, quando julgar necessário os
serviços das concessionárias para viabilizar a medida cautelar, não sendo permitida
a recusa e cobrança dos serviços, uma vez que as concessionárias de serviços
públicos funcionam mediante concessão da União.
Comenta Avolio (2003, p. 192) que a amplitude do dispositivo é vasta,
podendo a autoridade policial, tanto na fase do requerimento quanto na da execução
da interceptação telefônica requisitar das concessionárias não apenas os serviços,
mas a orientação técnica necessária.
Explica Parizatto (1996, p. 53):
Os serviços a serem requisitados, referem-se àqueles indispensáveis à interceptação de comunicação telefônica, pelo que competirá à autoridade policial, esclarecer em seu ofício requisitório, quais os terminais telefônicos que deverão ser “grampeados” e as demais providências que deverão ser adotadas para tanto, ainda que com referência aos serviços técnicos, esses ficarão a cargo da concessionária de serviços públicos (PARIZATTO, 1996, p. 53).
4.3 ART 8º DA LEI FEDERAL Nº 9.296, DE 24 DE JULHO DE 1996
A interceptação de comunicação telefônica, de qualquer natureza ocorrerá em autos apartados, apensados aos autos do inquérito policial ou do processo criminal, preservando-se o sigilo das diligências, gravações e transcrições respectivas. Parágrafo único. A apensação somente poderá ser realizada imediatamente antes do relatório da autoridade, quando se tratar de
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inquérito policial (Código de Processo Penal, art. 10, parágrafo 1º) ou na conclusão do processo ao juiz para o despacho decorrente do disposto nos arts. 407, 502 ou 538 do Código de Processo Penal (BRASIL, Lei Federal nº 9.296, de 24 de julho de 1996, 2011, p. 1566).
O presente dispositivo legal determina que a interceptação telefônica ocorra
em autos apartados, apensados aos autos do inquérito policial ou do processo
criminal. No primeiro caso, antes da juntada do relatório da autoridade policial. No
segundo caso, quando da conclusão do processo ao Juiz, para os fins preconizados
nos arts. 407, 502 ou 538, do Código de Processo Penal. Preservando o sigilo
absoluto da interceptação telefônica, mantendo o sigilo das diligências, gravações e
transcrições respectivas.
O artigo 407 prescreve que, nos crimes de competência do Tribunal do Júri,
os autos serão enviados do Presidente ao mesmo, para que este ordene as
diligências necessárias para sanar qualquer nulidade ou suprir falta que prejudique o
esclarecimento da verdade, inclusive com inquirição de testemunhas, deliberando,
após, no sentido da pronúncia, da impronúncia ou da absolvição sumária.
Quando se tratar de crimes de competência do Juiz singular, o artigo 502
determina que, depois das alegações finais, a ação criminal será submetida ao
julgador, para que ele ordene as diligências que entender necessárias.
O artigo 538 estabelece que o chamado “Processo Sumário”, também diz
respeito à possibilidade do Magistrado determinar a realização de diligências
complementares ou que sejam sanados vícios identificados nos autos, antes de
designar a sessão de audiência em que haverá o julgamento.
Explica Avolio (2003, p. 193):
Quando se fala em medida cautelar inaudita altera parte e em contraditório diferido, tem-se em mente razões de sigilo e absoluta inconveniência de que o réu ou seu defensor tomem conhecimento da mera circunstância de estar se desenvolvendo uma interceptação telefônica. Obviamente. Após a concretização da medida, “cessa tudo que a antiga musa canta”, abrindo-se lugar ao contraditório (ciência dos atos e termos do processo) e à ampla defesa com todos os recursos a ela inerentes (impugnações e direito à prova, v.g., perícias fonéticas etc.) (AVOLIO, 2003, P. 193).
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4.4 ART 9º DA LEI FEDERAL Nº 9.296, DE 24 DE JULHO DE 1996
A gravação que não interessar à prova será inutilizada por decisão judicial, durante o inquérito, a instrução processual ou após esta, em virtude de requerimento do Ministério Publico ou da parte interessada. Parágrafo único. O incidente de inutilização será assistido pelo Ministério Público, sendo facultada a presença do acusado ou de seu representante legal (BRASIL, Lei Federal nº 9.296, de 24 de julho de 1996, 2011, p. 1566).
A obtenção de elementos probatórios para a demonstração da materialidade
e autoria de crimes é o objetivo da interceptação telefônica, porém, além do material
que servirá de prova na investigação criminal ou no processo penal, existirão muitos
diálogos que não terão importância processual, portanto, deverão ser destruídos.
Assim, o artigo 9º da Lei 9.296, determina a sua inutilização, por decisão
judicial, durante o trâmite do inquérito policial ou da ação penal, ou após a sua
conclusão, a requerimento do Ministério Público ou da parte interessada.
A inutilização será assistida pelo representante do Ministério Publico, para se
evitar que sejam destruídos trechos que possam ser importantes como prova da
infração penal, é facultada ainda a presença do acusado ou de seu representante
legal, os quais deverão ser intimados para tal prerrogativa.
Dessa decisão caberá apelação, da mesma forma que aquelas proferidas nos
incidentes de apensamento e de inutilização, que são apeláveis (art. 593, II, CPP).
Ainda que não lançasse mão dessa interpretação analógica, a decisão está a por fim
a um processo (medida cautelar de interceptação) sendo, segundo a tradição
doutrinária (princípio processual da singularidade) apelável (AVOLIO, 2003, p. 194).
4.5 ART 10º DA LEI FEDERAL Nº 9.296, DE 24 DE JULHO DE 1996
Constitui crime realizar interceptação de comunicações telefônicas, de informática ou telemática, ou quebrar segredo de Justiça, sem autorização judicial ou com objetivos não autorizados em lei. Pena: reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos e multa (BRASIL, Lei Federal nº 9296, de 24 de julho de 1996, 2011, p. 1566).
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O dispositivo legal em exame prevê dois crimes: realizar interceptação
indevidamente, ou seja, sem autorização judicial; e quebrar o segredo da Justiça,
fazendo com que se tornem públicas informações sigilosas.
Devemos ressaltar que realizar uma interceptação autorizada judicialmente
por um juiz, mas com objetivos não autorizados em lei, também é crime. Só é
admitida a medida de interceptação telefônica para fins de investigação criminal ou
instrução processual penal, se direcionada a outra finalidade, mesmo que com
autorização judicial é crime.
Quanto a quebra do segredo de Justiça, aquele que tiver acesso às
informações e emprestar-lhe a publicidade indevida, comunicando o seu conteúdo a
outrem ou à coletividade.
Para Vasconcelos (2011, p. 80) a primeira conduta criminosa pode ser
classificada como crime de dano, permanente e comum, passível tanto de coautoria
quanto da participação. O segundo delito pode ser classificado como próprio e
instantâneo, sendo admitidas tanto a coautoria quanto a participação.
4.6 ART 11º DA LEI FEDERAL Nº 9.296, DE 24 DE JULHO DE 1996
“Esta lei entra em vigor na data de sua publicação (BRASIL, Lei Federal nº 9.296, de 24 de julho de 1996, 2011, p. 1566).”
O Diploma Legal em estudo, através do seu artigo 11, estabeleceu que o
mesmo entraria em vigor na data de sua publicação.Em relação aos artigos 1º ao 9º,
da Lei em tela, como se tratam, de normas processuais penais, aplicam-se de
imediato.
Observa Gomes (1997, p. 248 e 249):
De modo algum, no entanto, a lei convalida interceptações autorizadas antes da lei. Ainda que a interceptação tenha sido realizada depois da lei. Se autorizada antes, não vale. Tudo por causa do princípio do tempus regit actum. O ato deve ser regido pela lei do seu tempo (GOMES, 1997, p. 248 e 249).
Em relação ao art. 10, as ações enquadradas no seu texto perpetradas antes
da vigência da Lei 9.296, não se caracterizam crimes, considerando o princípio do
direito penal brasileiro, explícito no artigo 1º do Código Penal Brasileiro, segundo o
qual não há crime sem lei anterior que o preveja. No entendimento dos
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doutrinadores Delmanto (2010, p. 76), o Código Penal inicia-se enunciando o mais
importante de seus postulados: não pode haver crime nem pena sem lei anterior que
os defina (nullum crimen, nulla poena sine previa lege). Em razão da garantia
expressa neste artigo, nenhum comportamento pode ser considerado crime sem que
uma lei anterior à sua prática (e não apenas ao seu julgamento) o defina como tal;
igualmente nenhuma pena poderá ser aplicada sem prévia cominação.
4.7 ART 12º DA LEI FEDERAL Nº 9.296, DE 24 DE JULHO DE 1996
“Revogam-se as disposições em contrário (BRASIL, Lei Federal nº 9.296, de 24 de julho de 1996, 2011, p. 1566)”.
O legislador criou o supracitado Diploma Legal, regulamentando o inciso XII
do artigo 5º da Carta Magna do Brasil, disciplinando a interceptação das
comunicações telefônicas para prova em investigação criminal e em instrução
processual penal. Em seu artigo 12, revogou as disposições que estavam em
sentido contrário, assim revogou parcialmente o artigo 151, parágrafo 1º, inciso II do
Código Penal Brasileiro, e também, parcialmente o artigo 56 do Código Brasileiro de
Telecomunicações.
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5 CRIME ORGANIZADO
5.1 CONCEITO
Ao criar a Lei 9.034 de 3 de maio de 1995, o legislador discorreu sobre os
métodos de combate a macrocriminalidade, deixando de conceituar o que seria uma
organização criminosa.
Com a Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado
Transnacional, realizada em 2004 e conhecida como Convenção de Palermo,
ratificada pelo /decreto Legislativo 231, de 29 de maio de 2003, e promulgada pelo
Decreto 5.015, de 12 de março de 2004, adotada na cidade de Nova York, em 15 de
novembro de 2000, o instituto jurídico organização criminosa passou a integrar o
ordenamento jurídico vigente com a seguinte conceituação: grupo estruturado de
três ou mais pessoas, existente há algum tempo e atuando concertadamente com o
propósito de cometer uma ou mais infrações graves ou enunciadas na Convenção,
com a intenção de obter, direta ou indiretamente, um benefício econômico ou outro
benefício material.
Dentre as posições doutrinárias criadas Cassio Roberto Conserino, 2011, p.
2) adotou que organização criminosa e quadrilha e bando seriam, efetivamente,
expressões sinônimas. Entendeu-se que a lei 9.034/95 objetivou equiparar a figura
da organização criminosa à figura da quadrilha ou bando, pouco importando a maior
sofisticação de uma em relação à outra.
No entendimento do Supremo Tribunal Federal: a lei 9.034/95, ao se referir à
organização criminosa, não instituiu novo tipo penal, e sim dispôs sobre a
possibilidade de utilização de meios operacionais com vista na prevenção e
repressão de ações delitivas praticadas por organizações criminosas, consideradas
estas na modalidade do Direito Penal comum – Código Penal, art. 288 – ou na
modalidade do Direito Penal Especial – Lei 6.368/76, art. 14, ou atualmente, Lei
11.343, art. 35 (STF, HC 90768) (CONSERINO, 2011, p. 15).
O Supremo Tribunal Federal não desconhece o fenômeno da criminalidade
organizada, mas entende ser necessário que o legislador dê um conceito legal para
organização criminosa, afim de que os meios repressivos legais possam ser
aplicados no combate ao crime organizado de forma efetiva.
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5.2 HISTÓRICO DO CRIME ORGANIZADO
Conforme pesquisa realizada, podemos verificar que é difícil identificar a
origem da criminalidade organizada, pelo fato da variedade de comportamentos em
diversos países, característicos nas organizações criminosas até hoje. Os
estudiosos afirmam que a raiz histórica, é o que há em comum entre algumas
organizações, em especial as Máfias italianas, a Yakuza japonesa e as Tríades
chinesas. Essas associações tiveram início no século XVI como movimentos de
proteção contra arbitrariedades praticadas pelos poderosos e pelo Estado, em
relação a pessoas que geralmente residiam em localidades rurais, menos
desenvolvidas e desamparadas de assistência dos serviços públicos. Para o
crescimento de suas atividades, esses movimentos contaram com a conivência de
autoridades corruptas das regiões onde ocorriam os movimentos político-sociais.
Hoje o fenômeno da criminalidade organizada está presente, na Rússia, nos
Estados Unidos e em países do Oriente Médio.
5.3 TERRORISMO
Apesar de sua forte conotação ideológica, o terrorismo é considerado como
uma vertente do crime organizado, tendo seu primeiro registro datado de 1855,
quando militantes anarquistas franceses realizaram um violento atentado contra
Napoleão III. Hoje a atividade terrorista tem forte conotação religiosa.
5.4 NARCOTRÁFICO NA AMÉRICA DO SUL
Na América do Sul, a criminalidade organizada iniciou-se com o cultivo e a
exploração da coca no século XVI, época em que os colonizadores espanhóis
monopolizavam o seu comércio em regiões do Peru e da Bolívia, utilizando-se para
tanto da mão de obra indígena. Posteriormente, agricultores locais dominaram o
cultivo da planta e sua transformação em pasta base para o refinamento da cocaína,
expandindo suas atividades para a Colômbia. A comercialização ilegal dessa
substância excitante para os Estados Unidos da América e para a Europa passou a
ser comandada por diversos grupos organizados da região, que deram origem aos
poderosos e violentos cartéis do narcotráfico, sediados principalmente nas cidades
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colombianas de Cali e Medellín, os quais hoje também se dedicam ao cultivo e à
comercialização do ópio. Atualmente, calcula-se que metade da economia nacional
desse país, direta ou indiretamente, seja gerenciada por narcotraficantes.
5.5 HISTÓRICO DO CRIME ORGANIZADO NO BRASIL
5.5.1 O cangaço
No Brasil, é possível identificar como antecedente da criminalidade
organizada o movimento conhecido como cangaço, que atuou no sertão nordestino
entre o final do século XIX e o começo do século XX, tendo como origem as
condutas dos jagunços e dos capangas dos grandes fazendeiros e a atuação do
coronelismo, resultantes da própria história de colonização da região pelos
portugueses. Personificados na lendária figura de Virgulino Ferreira da Silva, o
Lampião (1897-1938), os cangaceiros tinham organização hierárquica e com o
tempo passaram a atuar em várias frentes ao mesmo tempo, dedicando-se a
saquear vilas, fazendas e pequenas cidades, extorquir dinheiro mediante ameaça de
ataque ou pilhagem ou seqüestrar pessoas importantes e influentes para depois
exigir resgates. Para tanto, relacionavam-se com fazendeiros e chefes políticos
influentes e contavam com a colaboração de policiais corruptos, que lhes forneciam
armas e munições.
5.5.2 Jogo do bicho
Todavia, a prática contravencional do denominado “jogo do bicho” (sorteio de
prêmios a apostadores, mediante recolhimentos de apostas), iniciada no limiar do
século XX, é identificada como primeira infração penal organizada no Brasil.
Atualmente, a maioria das organizações criminosas que se dedicavam a essa
prática contravencional migraram para a exploração ilegal de máquinas eletrônicas
programáveis, através da corrupção de setores da polícia e de alguns políticos.
5.5.3 Facções criminosas
Organizações violentas emergiram nas penitenciárias da cidade do Rio de
Janeiro a partir da década de 70: a “Falange Vermelha”, formada por chefes de
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quadrilhas especializadas em roubos a bancos, nasceu no presídio da Ilha Grande,
entre 1967 e 1975; o “Comando Vermelho”, uma evolução da “Falange Vermelha”,
comandado por líderes do tráfico de entorpecentes, surgiu no presídio Bangu I em
meados da década de 70; o “Terceiro Comando”, uma dissidência do “Comando
Vermelho”, foi idealizado no mesmo presídio, em 1988, por presos que não
concordavam com a prática de seqüestros e com a prática de crimes comuns nas
áreas de atuação da organização, a ADA (“Amigos dos Amigos”) surgiu durante os
anos 90, aliando-se ao “Terceiro Comando” em 1998, na tentativa de minimizar a
influência do Comando Vermelho”, o “Terceiro Comando Puro”, criado no Complexo
da Maré no ano de 2002, resultou da extinção do “Terceiro Comando”, após o
assassinato do seu líder. A partir dos anos 90 grupos parapoliciais (milícias),
igualmente com perfil de organizações criminosas, passaram a atuar nas favelas
cariocas, com a suposta finalidade de expulsar as facções organizadas que
controlam o tráfico de entorpecentes local (SILVA. E., 2009, p. 10).
Atualmente, a principal e mais bem estruturada
organização criminosa é a facção criminosa Primeiro Comando da Capital - PCC,
que teve sua origem na década de 90 em um presídio de segurança máxima no
Estado de São Paulo, hoje com atuação em todo o Brasil. Esta organização nasceu
dentro do sistema carcerário e continua atuando dentro dele, de onde os líderes da
facção determinam as ações ilícitas que serão praticadas em todo território
brasileiro, seguindo a um “estatuto próprio”, dentre as principais atividades estão o
tráfico de drogas, roubos a instituições financeiras e a carros de transportes de
valores, seqüestros e ainda homicídios.
5.5.4 O desvio de dinheiro
Outra modalidade de criminalidade organizada, praticada sem recurso à
violência e por isso menos visível aos olhos da opinião pública, desenvolveu-se na
realidade brasileira. Trata-se do desvio de vultuosas quantias de dinheiro dos cofres
públicos para contas particulares abertas em paraísos fiscais localizados no exterior,
envolvendo quase todos os escalões dos três Poderes do Estado, do qual resultou a
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cassação de um Presidente da República, em 1992, a renúncia anos depois de
alguns Deputados da Câmara Federal que manipulavam verbas públicas,
conhecidos como “anões do orçamento”, a cassação de um Senador da República e
a prisão do presidente do Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo, condenado
por superfaturamento na construção da obra do prédio sede desse Tribunal.
Atualmente, figuram como réus no Supremo Tribunal Federal 40 (quarenta) pessoas
acusadas de participação no chamado esquema do “mensalão”, dentre elas o ex-
presidente da Câmara Federal, o ex-secretário, o ex-tesoureiro e o ex-presidente do
partido do governo, o ex-ministro da Secretaria de Comunicação e o ex-ministro
Chefe da Casa Civil da Presidência da República.
Nas palavras de Conserino (2011, p. 15):
O crime organizado possui implacável desejo de perseguição do lucro, ele é transnacional – não respeita as fronteiras de cada país – provoca grande dano social, às vezes econômico (lavagem de dinheiro), tem vítimas difusas, se vale de irrestrita tecnologia para produzir seus fins, possui apêndices de corrupção nas esferas governamentais, é extremamente ameaçador e violento; enfim, é especializado e aproveita as fraquezas estatais para emergir e se desenvolver.
Portanto, algumas características comuns entre as diversas origens das
organizações criminosas nos diferentes países: a maioria teve como nascedouro
movimentos populares, o que facilitou sobremaneira sua aceitação na comunidade
local, assim como o recrutamento de voluntários para o exercício de suas
posteriores atividades ilícitas; muitas delas passaram a atuar no vácuo de algumas
proibições estatais (exploração da prostituição, jogos de azar, venda de
entorpecentes e de armas sofisticadas), contaram com a conivência de agentes do
Estado para o desenvolvimento de suas atividades ilícitas; e impuseram sua lei pelo
emprego da ameaça e violência, voltada sobretudo para delatores e integrantes de
grupos concorrentes.
Para a presente pesquisa cabe destaque às atividades criminosas praticadas
pelas organizações criminosas que comandam de dentro dos presídios brasileiros os
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crimes mais violentos, e as organizações criminosas que têm como principais
integrantes políticos e agentes públicos.
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6 IMPORTÂNCIA DA PROVA NO CRIME ORGANIZADO
O emprego da medida de interceptação telefônica, mesmo não sendo meio
exclusivo de busca de prova para aplicação no crime organizado, é considerado
instrumento eficiente para apuração dos crimes praticados por organizações
criminosas.
Como ressaltam Ada Pellegrini Grinover, Antonio Scarance Fernandes e
Antonio Magalhães Gomes Filho, (2001, p. 151)
“a inadmissibilidade e ineficácia processuais das provas obtidas por meios ilícitos, de um lado, e a necessidade, de outro, de não privar o Estado, dos instrumentos necessários à luta contra a criminalidade organizada, ocasionaram, no mundo todo, legislações que disciplinam rigorosamente a utilização de meios eletrônicos de captação de prova”.
Para todos os integrantes de uma investigação criminal, bem como de
uma instrução processual penal, torna-se evidente que os resultados obtidos são
significativos para a investigação com a implementação da interceptação telefônica,
instrumento fundamental de prospecção de prova na luta contra as organizações
criminosas, o motivo pelo qual deve ser então aperfeiçoado e, sobretudo
preservado.
Sendo a interceptação uma operação técnica que visa acolher coativamente
uma prova, esta será direta ou indireta, conforme verse sobre um indício ou não;
conforme a fonte (a conversação) apresente diretamente o fato a ser provado ou só
o indique.
De acordo com Vasconcelos (2011, p. 4) “a interceptação telefônica é
instrumento processual de coleta de provas de âmbito restrito, cuja legitimidade
passa, irrefutavelmente, pelo crivo do judiciário”.
A interceptação constitui fonte de prova, quando tal prova recair diretamente
sobre o fato a ser provado, a prova será direta; quando recair sobre fato diverso, do
qual se poderá chegar ao fato a ser provado, a prova será indiciária. Só o indício é
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sempre indireto, mas as demais provas serão diretas ou indiretas, consoantes
incidam imediata ou mediatamente sobre o fato a ser provado.
A prova tem importância fundamental no processo, pois constitui o elemento
integrador do convencimento do juiz com os fatos da causa. Hoje, a melhor opção se
afigura a liberdade probatória, cujo limite está a dignidade da pessoa humana e no
respeito aos seus valores fundamentais. Há necessidade, pois, de se interpor limites
à utilização, no processo, dos meios de prova que atentem contra esses princípios.
O direito à prova constitui um desdobramento do princípio do contraditório, não se
produzindo ao direito de propor ou ver produzidos os meios de prova, mas,
efetivamente, na possibilidade de influir no convencimento do juiz. As vedações
probatórias sempre limitam o direito à prova. Embora seja de boa técnica a previsão
em nível legislativo do direito à prova, como se faz no ordenamento italiano, não se
pode excluir a sua existência no direito brasileiro como desdobramento do
contraditório (AVOLIO, 2003, p. 146 e 147).
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7 ESTUDO DE CASO – INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA NA VISÃO DE SEUS OPERADORES
Para a conclusão da presente pesquisa realizou-se um estudo de caso, com
perguntas sobre a medida em estudo, respondidas pelos seus operadores do
Judiciário, do Ministério Público e da Polícia Civil do Estado do Paraná.
7.1 QUESTIONÁRIO Nº 1
Respostas: Dr. Pedro Sanson Corat – Juiz de Direito da Vara de Inquéritos Policiais
da Comarca de Curitiba e Região Metropolitana
1. A interceptação telefônica tem sido utilizada com freqüência como meio de
prova?
R. Tem sido utilizada, porém em relação à cerca dos 100.000 I.P desta Vara de
Inquéritos Policiais seria utilizada em apenas 1% dos casos. Exemplo é que no
momento temos apenas 20 autos de interceptação em andamento.
1.2 Em que espécies de crimes?
R. Basicamente nos crimes de tráfico de entorpecentes, seqüestro e crime
organizado, eventualmente nos crimes de homicídio.
2. O procedimento da interceptação telefônica é suficientemente célere,
simples e seguro?
R. Na VIP, é célere e seguro, devido ao controle rigoroso, cumprindo rigorosamente
o que determina a Resolução nº 59 do Conselho Nacional de Justiça.
2.1 Como poderia ser melhorado?
R. Tendo um controle efetivo das interceptações em relação aos ofícios e
funcionários capacitados para a matéria.
3. Como tem sido judicialmente valorada essa prova de interceptação
telefônica?
R. Nos dez anos a frente da VIP, a prova de interceptação telefônica é plena, porque
é produzida de forma lícita.
4. São fatos os vazamentos de interceptação telefônica?
R. Não por parte do judiciário, principalmente nesta Vara de Inquéritos Policiais.
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4.1 Isto é causa de preocupação oficial?
R. Se houver é preocupante, uma vez que poucas pessoas devem ter acesso as
informações, o juiz, o promotor de justiça, a autoridade policial e o funcionário do
judiciário encarregado dos autos de I.T. (cadastrado no CNJ – resolução 59/2008).
7.2 QUESTIONÁRIO Nº 2
Respostas: Dr. Cláudio Franco Félix – Promotor de Justiça, responsável pela
Promotoria de Inquéritos Policiais da Comarca de Curitiba e Região Metropolitana
1. A interceptação telefônica tem sido utilizada com freqüência como meio
de prova?
R. Comparativamente ao número de crimes ocorridos, a utilização da interceptação
telefônica não é significativa. Entretanto, desde o surgimento da Lei que
regulamentou a realização interceptação das comunicações telefônicas, verificou-se
um sensível aumento na utilização do monitoramento telefônico como meio de
prova.
1.2 Em que espécies de crimes?
R. Em crimes praticados por organizações criminosas, mas especialmente nas
investigações relacionadas ao crime de tráfico de drogas. Em alguns outros crimes,
em menor escala, onde verificado que eventual utilização da interceptação telefônica
possa produzir o resultado almejado, não se verificando outra forma de elucidação
dos fatos.
2. O procedimento da interceptação telefônica é suficientemente célere,
simples e seguro?
R. Sim
2.1 Como poderia ser melhorado?
R. Dando mais agilidade ao processo de envio de dados por parte das companhias
telefônicas. Note-se que deveria ser pensado num sistema que evitasse a
interferência de terceiros (funcionários das companhias telefônicas) na
operacionalização da medida judicialmente deferida.
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Outra questão técnica a ser discutida seria a diferenciação entre quebra do sigilo
constitucionalmente protegido e a quebra de meros dados cadastrais, que por vezes
atrasa as investigações.
3. Como tem sido judicialmente valorada essa prova de interceptação
telefônica?
R. Após a degravação das conversas monitoradas a interceptação é utilizada como
qualquer outra prova material, já que realizada mediante autorização judicial. Não
tem peso maior ou menor. É avaliada em conjunto com as demais provas constantes
do processo e pode, assim como as demais espécies de prova, levar a um juízo
condenatório.
4. São fatos os vazamentos de interceptação telefônica?
R. Não há notícias deste tipo de incidente no âmbito das investigações realizadas
nesta Comarca.
4.1. Isto é causa de preocupação oficial?
R. Não, até o presente momento. Uma vez que, o sigilo sobre a investigação, bem
como sobre as informações obtidas durante o monitoramento telefônico é mantido
enquanto perdurar a medida, havendo regras sobre manuseio de tais procedimentos
ditadas pelo Conselho Nacional de Justiça, através de resolução.
7.3 QUESTIONÁRIO Nº 3
Respostas: Kleudson Moreira Tavares – Delegado de Polícia, Chefe do
Grupo de Diligências Especiais/COPE
1. A interceptação telefônica tem sido utilizada com freqüência como meio
de prova?
R. A Constituição Federal de 1988, em seu Art. 5º, inciso XII, assegurou a
inviolabilidade das “comunicações telefônicas, salvo por ordem judicial, nas
hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou
instrução processual penal”. A lei que regulamenta a intercepção telefônica só foi
sancionada em 24 de julho de 1996 (Lei 9.296/1996). Somente depois da entra em
vigor desta lei, conforme entendimento do STF, é que passou a ser possível a
interceptação telefônica, sendo ilegais as obtidas sem seu embasamento. No
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entanto, no Estado do Paraná, no âmbito da Polícia Civil, somente a partir de 2005 é
que as Autoridades Policiais passaram a utilizar esse importante meio de
investigação, sobretudo nas investigações de organizações criminosas, tráfico de
drogas ilícitas e crimes contra a administração pública. Hoje, sem sobra de dúvidas,
pode-se afirmar que a interceptação telefônica tem sido utilizada com razoável
freqüência como meio de prova e, principalmente, como meio de obtenção de
provas.
1.2 Em que espécies de crimes?
R. A interceptação telefônica tem sido usada como meio de investigação
principalmente nos crimes de tráfico de drogas ilícitas, crimes contra a administração
pública e nos crimes que são praticados por organizações criminosas.
2. O procedimento da interceptação telefônica é suficientemente célere,
simples e seguro?
R. O procedimento da intercepção telefônica previsto na Lei 9.296/96, teoricamente,
é bem célere e simples. No entanto, pouco seguro, sobretudo por não regular
procedimentos de segurança e sigilo para seu trâmite. Essa lacuna foi suprida pela
Resolução 59 do CNJ. Já, na prática, as Autoridades Policiais tem encontrado
grandes dificuldades em realizar investigações por meio de interceptações
telefônicas pela grande demora dos Juízos Criminais em analisar os pedidos, salvo
raras exceções, não conseguindo cumprir o prazo determinado pelo § 2º do Art. 4º
da Lei. 9.296/1996. Principalmente levando-se em conta o alto grau de
complexidade e dinamicidade em que atuam as organizações criminosas, com
constante troca de terminais telefônicos, sempre com o intuído de dificultar os
trabalhos de investigação da polícia judiciária.
2.1 Como poderia ser melhorado?
R. Com a estruturação das Varas Criminais e criação de setores específicos para o
recebimento e trâmite dos procedimentos de interceptações telefônicas, ante o alto
grau de sigilo que devem ser norteados e imprescindível celeridade. Outro fator
muito indispensável, é a conscientização dos Juízes de que esse é um dos meios
mais importantes e eficazes de produção e coleta de provas.
3. Como tem sido judicialmente valorada essa prova de interceptação
telefônica?
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R. As provas coletadas pela intercepção telefônica ou delas decorrentes,
principalmente nos crimes praticados por organizações criminosas, tem sido
utilizadas como fundamento para sentenças condenatórias, com grande lastro
probatório.
4. São fatos os vazamentos de interceptação telefônica?
Embora não tenha me deparado com caso de vazamento de interceptação telefônica
realizadas nas Unidades Policiais que trabalhei, sabemos que ocorrem com certa
frequência em nosso País. Para que vazamentos não ocorram os profissionais que
lidam com esse trabalho, no âmbito da Polícia, Poder Judiciário e Ministérios
Públicos, devem ser previamente selecionados e feito um acompanhamento rigoroso
do exercício de suas atividades, sempre com o objetivo de assegurar o absoluto
sigilo das interceptações telefônicas.
4.1 Isto é causa de preocupação oficial?
R. Com a ausência de regulamentação legislativa eficaz quanto ao trâmite das
interceptações telefônicas, possibilitando a ocorrência de inúmeras irregularidades,
dentre elas o vazamentos de interceptação telefônica, objetivando seu
disciplinamento é que foi editada pelo Conselho Nacional de Justiça a Resolução nº
59, pois, até então os Poderes da República, se mostravam apáticos a esse
problema.
As Autoridades entrevistadas foram objetivas e precisas em suas respostas,
devido ao longo período que trabalham como operadores deste mecanismo de
investigação criminal e persecução penal, no Estado do Paraná são considerados
especialistas no assunto.
O Magistrado, o Promotor de Justiça e o Delegado de Polícia, concordam que
a interceptação das comunicações telefônicas é utilizada como meio de prova em
crimes praticados por organizações criminosas, dentre outros crimes correlatos. Esta
prova de interceptação telefônica produzida de forma lícita é plena, e tem sido
empregada em sentenças, podendo levar a um juízo condenatório.
Afirmaram ainda que a medida é segura, tendo em vista não terem
conhecimento de vazamentos de informações referentes ao assunto, porém quanto
a celeridade poderia melhorar, levando-se em conta o dinamismo da criminalidade,
para isso seria necessário mudanças junto às companhias telefônicas, estruturação
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das varas criminais bem como controle efetivo em relação a documentos e
funcionários qualificados.
As respostas dos entrevistados comprovam a importância desta técnica de
investigação utilizada para auxiliar na produção de provas para os processos contra
criminosos integrantes ou não do crime organizado.
39
8 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Conforme demonstrado no presente trabalho, a atuação da criminalidade
organizada no Brasil é crescente e preocupante, tendo em vista o aperfeiçoamento
para o cometimento dos crimes com maior retorno financeiro para a organização
criminosa, como o narcotráfico, seqüestro, roubos a instituições financeiras e crimes
contra a administração pública. Mesmo assim, a legislação brasileira não instituiu
novo tipo penal, somente dispôs sobre a legalidade da utilização de meios
operacionais para prevenção e repressão, Lei 9.034 de 3 de Maio de 1995; também
dispôs sobre o processo e o julgamento de crimes praticados por organizações
criminosas, inclusive com um conceito do que seria organização criminosa para
aplicação da norma, Lei 12.694 de 24 de Julho de 2012, encontrando-se no
momento em vacatio legis.
Verificou-se também que o crime organizado dispõe de estrutura empresarial
para a prática das atividades criminosas, contando com assessoria jurídica
permanente, treinamento com técnicas policiais e integrantes do poder público,
dificultando a resposta e obrigando o Estado a utilizar-se de medidas cautelares que
podem atingir garantias fundamentais, para assim obter resultados positivos, ou
seja, prisões e a condenação dos criminosos.
Assim, a medida de interceptação telefônica torna-se o instrumento legítimo
mais eficiente no combate a esta modalidade de crime, uma vez que atualmente no
Brasil temos a atuação de grupos bem equipados, estruturados e organizados,
frente a esta sofisticação e profissionalismo é muito difícil a obtenção de provas,
tornando-se necessária a aplicação deste mecanismo de investigação criminal.
Na pesquisa de campo realizada junto ao Judiciário, Ministério Público e a
uma Autoridade Policial podemos observar que apesar da importância da
interceptação telefônica como eficaz instrumento de investigação policial e
persecução penal, ela não tem sido utilizada como meio de prova como deveria ser
utilizada, uma vez que para as autoridades envolvidas com a autorização e
utilização desta medida, é empregada com pouca a razoável freqüência,
principalmente em crimes praticados por organizações criminosas, como o tráfico de
entorpecentes, seqüestros, roubos e homicídios.
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Para as autoridades as provas produzidas ou decorrentes da interceptação
telefônica são plenas, porque são produzidas de forma lícita (mediante autorização
judicial). Para a Autoridade Policial as provas têm sido utilizadas como fundamento
para sentenças condenatórias, principalmente nos crimes praticados por
organizações criminosas.
Quanto à segurança e celeridade o Judiciário e o Ministério Público concordam
que a medida em questão é célere e segura, porém a Autoridade Policial discorda
quanto à celeridade, afirmando que com a edição da Resolução nº 59 do Conselho
Nacional de Justiça, a qual foi editada para assegurar segurança e sigilo no trâmite
da interceptação telefônica, na prática retardou os procedimentos de implantação da
medida cautelar em relação ao dinamismo das organizações criminosas.
Com relação ao vazamento de informações referentes à interceptação
telefônica, as autoridades afirmam categoricamente que no âmbito de suas
competências não ocorre este tipo de ilícito, enfatizando que para segurança dos
procedimentos, são adotadas medidas de segurança, bem como a aplicação da Lei
9.296/1996 e Resolução 59 do Conselho Nacional de Justiça. Comprovando mais
uma vez se tratar de dispositivo eficiente e seguro.
Do que foi afirmado pelas autoridades colaboradoras da presente pesquisa, a
única discordância é em relação à questão “vazamento de informações”, uma vez
que acompanhamos vários casos na mídia em que mesmo com investigações em
andamento e processos que não tiveram sequer audiência de instrução e
julgamento, a imprensa tem em seu poder trechos e degravações de diálogos entre
criminosos (presos ou não), o que caracteriza crime próprio e instantâneo, previsto
na segunda parte do artigo 10 da Lei 9.296 de 24 de Julho de 2006, cabendo pena
de reclusão de 2 a 4 anos e multa.
Por fim, de tudo exposto, conclui-se que a medida de interceptação telefônica
é sem dúvida um mecanismo legítimo importantíssimo para que o Estado consiga
um resultado positivo no combate a criminalidade organizada, que se caracteriza
pela hierarquia em uma estrutura complexa e articulada, praticando crimes
hediondos contra o cidadão brasileiro, impondo o medo através da violência,
impedindo a obtenção de provas, impossibilitando aquela investigação policial que
faz uso apenas de meios convencionais.
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REFERÊNCIAS
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