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USO DE FONTES PARA A PROBLEMATIZAÇÃO E CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO HISTÓRICO
Lusanira Feitosa Viana Moreno Sandra Regina Denipoti de Oliveira Universidade Estadual de Londrina
Resumo: O programa institucional de iniciação a docência (PIBID) tem como objetivo aprofundar os conhecimentos sobre a prática docente através de leituras, pesquisas, observações em sala de aula e a realização de oficinas. A pesquisa do PIBID realizada no Colégio Estadual José Aloísio Aragão e Colégio Estadual Hugo Simas, teve como objeto de estudo, as vozes silenciadas da cidade de Londrina, em específico para este trabalho de pessoas de origem africana, utilizando o Dr. Justiniano Clímaco da Silva, conhecido como Dr. Preto, primeiro médico negro da região ainda nos anos de ocupação da cidade e a figura de uma “pioneira” londrinense, a Doutora Severina Alho, que foi a primeira mulher a exercer a profissão de cirurgiã dentista em Londrina em meados da década de 1930. As mulheres sempre fizeram parte da sociedade, e fazem história a todo instante. Os estudos científicos, as produções historiográficas, muitas vezes “silenciaram” ou estereotiparam essas mulheres, deixando de lado suas experiências, ideias e papel social. Os Pibidianos iniciaram a pesquisa com um questionário, para identificar como os alunos viam a questão do negro na história de Londrina. A resposta dos alunos questionados tende a relacionar o negro apenas na sua condição de inferioridade. Por isso a importância de se estudar o papel social e cultural do negro na formação na cidade de Londrina. A história que os estudantes têm contato é de marginalidade do negro, os livros didáticos não tratam de sua ação, de seu papel ativo na sociedade. Os alunos precisam ter um contato mais abrangente com a História da África e da cultura afro-brasileira, para compreenderem o significado de uma cultura diferente que não deve ser vista como estranha, mas compreendida. No Hugo Simas os Pibidianos, se propuseram a perceber a visão que os alunos têm sobre a mulher e o pioneirismo, por meio dos questionários prévios, aplicados em duas turmas do 2º colegial do Colégio Estadual Hugo Simas, localizado na cidade de Londrina. Os resultados desses trabalhos, a participação dos alunos, as discussões realizadas, o impacto na visão de alguns alunos sobre as questões trabalhadas são o resultado de nosso trabalho que será apresentado.
Palavras-chave: Londrina; Pioneiro; Ensino de História; Aula Oficina
Financiamento: Capes - Pibid História UEL.
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O programa PIBID (Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência)
do programa do Ministério da Educação,foi criado com a finalidade de valorizar o
magistério e apoiar estudantes de licenciatura plena, das instituições municipais
públicas e comunitárias, sem fins econômicos, de educação superior. Tem como um
dos objetivos elevar a qualidade das ações acadêmicas voltadas à formação inicial
de professores nos cursos de licenciatura das instituições de educação superior,
promovendo a integração entre educação superior e educação básica por meio da
inserção dos licenciandos no cotidiano de escolas da rede pública de educação
básica. O programa visa também proporcionar aos futuros professores participação
em experiências metodológicas, tecnológicas e práticas docentes de caráter
inovador e interdisciplinar e que busquem a superação de problemas identificados
no processo de ensino-aprendizagem. Além de incentivar as escolas públicas de
educação básica a tornarem-se protagonistas nos processos formativos dos
estudantes das licenciaturas, mobilizando seus professores como co-formadores dos
futuros professores. Tanto os professores da escola básica como os licenciandos
recebem bolsas para a execução das atividades concernentes ao programa.
A proposta do PIBID / 2009-UEL, aplicado no Colégio Hugo Simas em
Londrina-PR, no ano de 2013, foi analisar a figura de uma “pioneira” londrinense, a
Doutora Severina Alho, que foi a primeira mulher a exercer a profissão de cirurgiã
dentista em Londrina em meados da década de 1930. Trata-se de (...) “uma
personagem que pode ser considerada “da elite, tratando-a não como heroína, mas como sujeito
histórico que se destacou na formação da cidade de Londrina”. ( PERETTI, Nara Kisser e
ROMEIRO,Kauana Candido, 2013, p.3).
Outra questão abordada é o conceito de “pioneiro”, onde as mulheres não
são citadas, nem mesmo no Museu Histórico da Cidade de Londrina e sim, são as
mulheres ou filhas de pioneiro, que é o caso da Dra. Severina que apesar de ser a
primeira dentista da cidade e bem sucedida, não é vista como pioneira.
Foram utilizadas como fontes, reportagens de jornais da época e uma
entrevista transcrita, concedida à pesquisa para dissertação de mestrado do Prof.
Dr. José Miguel Arias Neto pela Dra Severina em 1990.
Os trabalhos iniciaram com um questionário de conhecimentos prévios de
alunos do Ensino Médio, na faixa etária de 15-17 anos, conforme os pressupostos
do campo da Educação Histórica, para perceberem a visão que os alunos tem sobre
a mulher e o pioneiro.
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Após fazerem as tabulações das respostas as alunas Nara Kisser Piretti e
Kawana Candido Romeiro concluíram que :
“(...) nosso trabalho se insere na perspectiva de dar voz uma pioneira, uma mulher que na década de 30 veio para Londrina, sendo a primeira dentista da cidade. As respostas nos mostram como esta pesquisa será importante para mostrar e discutir o papel desta mulher na cidade, e aprofundarmos as questões em torno da mulher, e sua participação na história e na historiografia. Esperamos com a pesquisa, contribuir para modificar essa perspectiva unilateral e normativa que se tem a respeito do gênero feminino, demonstrando a importância de se resgatar na História, o papel e as contribuições da mulher, além de tocar os alunos para tal temática, repensando e revisando suas opiniões sobre a história.”
Depois de concluída esta etapa, foi ministrada uma aula-oficina na turma do
2ºB (2013), ocorrendo um debate sobre História local, mulher e pioneiro. Foi dado
enfoque na história da Dra Severina Alho, de onde vieram os dados, como foi
realizada a pesquisa e etc. O propósito foi despertar nos alunos a atitudes
investigativas e a história dos excluídos, no caso uma mulher, que apesar de ser
uma “pioneira” não é vista assim.
Na semana cultural, cujo o tema proposto pela escola foi “personalidades”, a
sala optou por pesquisar e contar a história da Dra Severina, uma personalidade
importante para a história local, porém quase não conhecida. Seguindo os passos
apresentados na aula-oficina pelos alunos do PIBID, eles se organizaram e iniciaram
as pesquisas. Neste ínterim, no dia 3 de agosto de 2013, ocorreu o assassinato da
Dona Vilma Santos de Oliveira (Yá Mukunby), uma liderança negra e religiosa da
cidade de Londrina, que naquele mesmo dia havia participado o dia inteiro da
Conferência Municipal de Igualdade Racial. Partindo do pressuposto da “história dos
esquecidos”, em especial as mulheres, a turma decidiu se dividir em dois grupos, um
para trabalhar com a pesquisa da Dra Severina e outro com a Dona Vilma.
Ao escolherem Yá Mukumby, eles pretendiam homenagear uma mulher negra
brasileira, que lutava pela intolerância racial e religiosa, que combatia preconceitos
de todas as ordens, sexismo, machismo e homofobia. Enfim, reconhecer o papel da
mulher, e neste caso da mulher negra, na construção da história da cidade.
A equipe convidou a professora Fátima Beraldo, professora da rede
municipal de educação de Londrina e integrante do movimento negro da cidade. A
professora Fátima foi até a sala de aula conversar e explicar quem foi Yá Mukumby,
sua importância na história de Londrina e de se resgatar a história dos negros que
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contribuíram para a existência da cidade. Foram apresentados dois vídeos
intitulados: “Tudo o que você gostaria de saber sobre macumba e nunca teve
coragem de perguntar” e “1 em 500: Yá Mukumby”. A principal fonte de pesquisa
apresentada para os alunos e utilizadas por eles foi o livro “Yá Mukumby : a vida de
Vilma Santos de Oliveira” e os vídeos já citados.
Faz parte desta turma a aluna Bruna Kohata de Aquino, surdocega devido a
sequelas da prematuridade, que perdeu a visão devido a retinopatia da
prematuridade e a audição ao excesso de antibióticos necessários após seu
nascimento. A aluna Bruna decidiu pesquisar e apresentar com o auxilio de sua
instrutora mediadora Meire Anne Teodoro, sobre a vida e obra da personagem
Cláudia Sofia Indalécio Pereira, surdocega a mais de 24 anos, portadora da
Síndrome de Usher, uma síndrome genética, autossômica recessiva, que o individuo
nasce surdo e no início da adolescência começa a perder a visão, até o final da fase
adulta fica sego ou apresenta baixa visão muito significativa devido a retinose
pigmentar. Esta personagem foi apresentada como um exemplo de superação, uma
mulher que superou os preconceitos e hoje é presidente da ABRASC (Associação
Brasileira de Surdocegueira). A aluna além de apresentar quem foi a personagem,
sua biografia, explicou sobre “Tadoma” que consiste na percepção da língua oral
emitida mediante o uso de uma ou duas mãos da pessoa surdocega; geralmente o
dedo polegar se coloca suavemente sobre os lábios e os outros dedos se mantém
sobre a bochecha, a mandíbula e a garganta do interlocutor, maneira da qual
Cláudia Sofia se comunica.
O resultado desses trabalhos foram apresentados na “Semana Cultural” de 26
a 30 de agosto de 2013. Em dois espaços, os grupos reproduziram cenários
distintos. Um consultório dentário em que o grupo explicou quem foi a Dra Severina,
em outro, a reprodução de um terreiro, onde o grupo explicou alguns elementos da
umbanda e sobre quem foi Yá Mukumby e sua importância na história da cidade. A
aluna Bruna, junto com sua instrutora mediadora, expôs sobre a vida e superação de
Cláudia Sofia Indalécio.
As fotos à seguir demonstram estes trabalhos:
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Trabalho sobre Yá Mukumby.
Também durante a semana cultural, foi realizada uma aula oficina pelas
alunas Maria de Fátima Fernandes Ferreira e Raquel Ester Luithardt orientadas pela
prof. Dra Márcia Elisa Teté Ramos com o seguinte tema “O papel das mulheres na
sociedade, do passado ao presente”. A aula-oficina tinha como objetivo dar
condições para o aluno refletir, a partir do uso escolar das fontes históricas.
Segunda Barca: “Lecantar e trabalhar de forma diferenciada as ideias iniciais que os
alunos manifestam tacitamente, tendo em atenção que estas ideias prévias podem
ser mais vagas ou mais precisas, mais alternativas à ciência ou mais consistentes
com esta.” Para isso, utilizaram algumas imagens de propagandas das décadas de
50 e 60, música e trechos de dois filmes que retratavam a vida das mulheres nas
décadas citadas acima. Além do trabalho com tais materiais, empreenderam uma
dinâmica de grupo para fomentar o debate, a argumentação a discussão, em um
trabalho de construção histórica:
“Queríamos, sobretudo, conceder aos alunos a oportunidade de refletirem sobre o papel da mulher no dia-a-dia deles, em casa, na escola, igreja e afins, tendo como ponto de partida para a análise um material que os situasse no tempo, fazendo-os enxergar e compreender algumas das mudanças ocorridas ao longo das décadas sobre o papel exercido pelas mulheres na sociedade e de que modo isso ainda reflete na imagem da
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mulher atual. Acima de tudo, proporcionar a eles a liberdade de serem os agentes sociais dessa reflexão.” (Ferreira, Maria de Fátima Fernandes e Luithardt, Raquel Ester. Pag 1 )
Um exemplo do material utilizado são as imagens a seguir:
Ao apresentarem as imagens, os alunos deram ênfase ao machismo, em
seguida as alunas apresentaram questões problematizadoras direcionando a
discussão para o que o grupo observou sobre as imagens. Sobre este trabalho,
concluíram:
“Interessante explicitar aqui que todos concordaram a partir da análise dos documentos que houve mudanças consideráveis no papel da mulher e que já obtiveram conquistas dos seus direitos, contudo, aquela visão tradicional por vezes patriarcal de que o homem é o chefe e a mulher deve ser submissa ainda existe, como é o caso da segunda imagem, a própria frase
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já define muito bem essa visão. Afirmando que o papel da mulher continua sendo o de dona de casa, ou seja, as panelas a acompanham nessa “missão”.” .” (Ferreira, Maria de Fátima Fernandes e Luithardt, Raquel Ester. Pag. 3 )
Seguindo com a aula-oficina apresentaram a música de Chico Buarque, “Com
açúcar, com afeto”, que narra a vida de uma mulher que aguarda o marido em casa.
Fizeram uso de dois trechos de filme, o primeiro foi do longa “ Dama de Ferro”, e o
segundo “ O sorriso de Monalisa”, ambos tratam da história de vida de mulheres
que agiam de um modo peculiar para a sua época.
O PIBID/ 2009- UEL, aplicada no Colégio Estadual José Aloísio Aragão-
Colégio de Aplicação no ano de 2013, teve como tema: “interpretações sobre a
história local: a presença do negro em londrina por alunos do ensino médio.”
O destaque da pesquisa foi sobre um personagem de Londrina o Dr.
Justiniano Clímaco da Silva conhecido popularmente por Dr. Preto, que chegou a
participar ativamente na formação da cidade de Londrina, mas que não é lembrado
pela historiografia da cidade como um dos “pioneiros”. A pesquisa do PIBID de
História (Ensino Médio), coordenado pela professora Dra. Márcia Elisa Teté Ramos
teve na sua proposta questionar a história oficial de Londrina, e repensar a figura do
pioneiro, não apenas mostrando a história dos vencedores, e de novos heróis, mas,
sobretudo mostrar o lado humano das pessoas que também fizeram parte da
construção e da história da cidade de Londrina, mas que não são citados como
“pioneiros”.
O início das atividades do PIBID teve como uma de suas ações, uma visita
ao Museu Histórico de Londrina Padre Carlos Weiss, com o objetivo de os
Pibidianos problematizarem a forma com que a exposição de longa duração estava
exposta. Constituída a partir de conceitos de trabalho e progresso, a exposição cria
uma narrativa que pretende contar uma história sobre a perspectiva da colonização
da cidade.
O instrumento de pesquisa de conhecimentos prévios dos alunos foi feito
através de um questionário sobre o que os alunos conheciam da história de Londrina
através da visita ao MHL, e como resultado mostrou que os alunos conheciam
somente a história oficial que privilegia a figura do “pioneiro”, a história dos
vencedores:
“Em Londrina memória oficial foi construída a partir da exaltação da imagem dos pioneiros. Essa ideia se reflete nas homenagens presentes nos
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monumentos, comemorações, nomes de logradouros entre outros suportes de memória espalhados pela cidade de Londrina. Esses personagens são tidos como exemplos da bravura e do empreendedorismo, pois são aqueles que chegaram primeiro e desbravaram as terras virgens. (SILVA;MORAES, 2010, P:321)”
Posteriormente a investigação dos conhecimentos prévios dos alunos, foram
realizadas aulas-oficina. A primeira oficina teve como discussão e reflexão junto aos
alunos do Ensino Médio, sobre a exposição do MHL, o modo como a história oficial
da cidade foi contada, refletindo que a história possui diversas interpretações,
olhares diferentes, e que há outras formas de ver o mundo historicamente. Neste
contexto historiográfico, a ausência do Dr. Justiniano Clímaco da Silva o Dr. Preto, é
possível observar que a história oficial enfatiza como integrante a história do
“pioneiro”, os homens vencedores e brancos. A história exclui negros, mulheres e
Indígenas e a população pobre em geral. Na segunda oficina foram utilizados
trechos do filme “Histórias Cruzadas” (diretor Tate Taylor, 2011), que mostra a
segregação racial nos Estados Unidos e teve como proposta problematizar a
situação das pessoas, como eram tratadas ou (des) tratadas. As atividades foram
encerradas com um amplo debate sobre segregação racial e preconceito.
Referências bibliográficas
BARCA, Isabel. Aula Oficina: do Projeto à Avaliação. In. Para uma educação de qualidade: Atas da Quarta Jornada de Educação Histórica. Braga, Centro de Investigação em Educação (CIED)/ Instituto de Educação e Psicologia, Universidade do Minho, 2004, p. 131 – 144.
FERREIRA, Maria de Fátima Fernandes e LUITHARDT, Raquel Ester . Aula-oficina: As mulheres na sociedade do passado ao presente. Londrina, 2013.
LANZA, Fábio. SOUZA, Alexansandro Eleotério Pereira. Merissi, Lais Celis. Diniz, Larissa Mattos. Yá Mukumby, a vida de Vilma Santos de Oliveira. Coleção Presença Negra em Londrina. 2ª Ed. Universidade Estadual de Londrina. 2013.
PERETTI, Nara Kisser e ROMEIRO, Kauana Candido. O papel da mulher pioneira em londrina a partir da figura da doutora severina alho na década de 1930 a 1950. Londrina, 2013.
SILVA, Bruno. M; Moraes, Daniela R. Um Novo Olhar Sobre a História de Londrina: Uma Experiência Extensionista. Seminário de Pesquisa em Ciências Humanas. Londrina: Eduel, 2010.