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Vanessa Bosso - Visionvox · pintado com uma tinta lavável e de fácil manutenção. O lance sobre a escolha da tinta não vem ao caso agora, concentremo-nos no tal tapa. E que tapão!

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Vanessa Bosso

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A Aposta

O jogo de sedução está prestes a começar

Edição Digital

2013

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Diagramaçãoletraimpressa.com.br

CapaEra Eclipse — http://www.eraeclipse.com/

Copyright (C) 2013 Vanessa Bosso

Todos os direitos reservados. É proibida adistribuição ou cópia de qualquer parte destaobra sem o consentimento escrito do autor.

Criado no Brasil

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Um: Ação e ReaçãoVia Láctea.Sistema Solar.Planeta Terra.América do Sul.Brasil.São Paulo.Zona Sul.Colégio Prisma.Segundo andar.Estão me acompanhando? Pois então, é

bem provável que o barulho do tapadesferido por Nina em Lex tenha feito ocaminho inverso, reverberando nas bordas dagaláxia, alcançando inclusive nossa vizinha,Andrômeda. O rosto do garoto queima comoa superfície do sol e não é apenas pela dor.Ele está enfurecido.

Seus olhos cor de mel encontram-se com osesverdeados de Nina. Estão estreitos,cortantes, flamejantes. Lex leva a mão aolocal estapeado, alisando a barba por fazer.

Ele não pode ver, mas Nina pode: quatrodos dedos dela estão marcados na pele deLex como um carimbo para que ele selembre, pelo menos pelas próximas horas, de

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com quem está lidando.Um uuuhhhhhh abafado surge de todos os

cantos do corredor em azul e branco, recém-pintado com uma tinta lavável e de fácilmanutenção. O lance sobre a escolha da tintanão vem ao caso agora, concentremo-nos notal tapa.

E que tapão!Lex foi pego desprevenido e quando seu

cérebro finalmente para de zunir, avança umpasso em direção a Nina, desconcertado. Elenão esperava por isso, ninguém imaginavaesse desfecho. Acredito que até Nina estejasurpresa com sua atitude. Mas como todaação leva a uma reação contrária na mesmaintensidade, podemos supor o que aconteceráa seguir.

— Você é louca? Qual o seu problema? –Lex dispara, ainda alisando o rosto emchamas.

— Meu problema é você, AlexandreHeinrich! – Nina cospe, exaltada. – Você,seus amigos e essas malditas apostas!

— Ah, saquei tudo. – Lex lança no ar umsorriso debochado. – Quer saber, Nina? Nemse o valor da aposta triplicasse, eu toparia

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beijar você.— Uuuuhhhhhhh. – outra comoção deixa a

atmosfera mais tensa.— Seu… seu… seu cretino! Está invertendo

as coisas a seu favor! E você me beijaria simou então, não teria aceito essa apostaridícula.

— Ri-dí-cu-la. Você tem toda a razão.Beijar você é absurdo e eu seria patético selevasse isso adiante. – o garoto não tem amenor noção do perigo.

Nina se aproxima e impulsionada por umafúria crescente, acerta uma joelhada nasbolas de Lex. O cara empalidece e urra dedor, caindo ao chão. Antes que algumengraçadinho se ajoelhe e conte até dez,como nos ringues de luta livre, uma voz mal-humorada surge dos confins do corredor:

— Chega dessa palhaçada! Voltando para asala de aula agora mesmo! – o professor deLiteratura aproxima-se a passos largos,enxotando a todos como se fossem mosquitosirritantes. – Menos vocês dois. – aponta paraLex e Nina. – Venham comigo. O diretor vaiadorar ouvir a empolgante narrativa queculminou nesse momento tão ímpar.

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Dois: Quem é Nina Albuquerque?Nina é a garota nova do Colégio Prisma. Foi

transferida no mês de agosto, para concluir oúltimo ano do ensino médio. Mas essa não foiuma transferência corriqueira e tranquila.Isso porque Nina foi expulsa do colégio ondeestudava após um surto de agressividade malcontrolada.

Com notas que variavam do nove e meio aodez, Nina ficou possessa ao receber a provade História que gritava, em vermelho vivo,um sonoro cinco. Cinco? Como esse professorteve a coragem?

Mas a garota sabia o porquê da nota tãobaixa. Estava óbvio que tinha tudo a ver coma festa de duas semanas atrás. Nina, dotadade um cinismo peculiar, deu o fora maisfenomenal de todos os tempos no filho do talprofessor, tanto que o garoto chorou a noitetoda, como um bebezinho.

É provável que a atitude dela, semqualquer tato ou delicadeza, tenha geradoum trauma profundo no rapaz, a ponto domesmo precisar de terapia por toda umavida. Nunca saberemos.

Quando Nina confrontou o professor de

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História, o mesmo foi irredutível com relaçãoà nota. A garota poderia ter se conformado,virado as costas e continuado com sua vida,afinal, essa avaliação em nada alteraria suaperformance no quadro geral. Mas não, elanão é do tipo que leva desaforos para casa.

Munida de uma chave tetra, dessas com osquatro cantos serrilhados, Nina nem piscouao riscar toda a lateral do Peugeot pretoreluzente, estacionado na vaga reservadaaos professores. A paixão por esse carro eratanta, que o catedrático vivia com umaflanela em mãos, sempre pronto para cuspire deixar a lataria mais brilhante ainda. Umnojo.

Após detonar com a pintura do automóvel,a adolescente não teve tempo paracomemorar o feito. No susto, o molho dechaves caiu no chão quando seus olhos seencontraram com os do diretor do colégio.Ela havia sido pega em flagrante.

A expulsão foi consumada no mês de junho,uma semana antes das férias escolares. Ospais de Nina não ficaram nada satisfeitos coma notícia e ela acabou sem mesada, semférias e sem sair de casa por um mês.

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Após camelar em busca de um novo colégiopara a filha, Laura, a mãe da garota, decidiu-se pelo Colégio Prisma. Bem, decidiu-se nãoé o termo, afinal, foi a única escola queaceitou matricular Nina após Laura contarsobre os motivos da expulsão.

Quando as aulas iniciaram no mês deagosto, a jovem pensou que enlouquecerianas primeiras semanas. Como toda garotanova, ela era a atração do colégio e issogerou ciúmes e inveja por parte das trêsmais populares do pedaço. Estamos falandode Bárbara, Suzana e Ana Paula, hoje maisconhecidas como Kibis. Mas o assunto “Kibis”fica para depois.

Vamos tentar entender o porquê dessastrês meninas desejarem tanto o sangue deNina, logo nos primeiros dias de aula:

No alto dos seus um metro e setenta e dois,Nina Albuquerque é o tipo de garota que nãopassa despercebida. Com um rosto de umabeleza precisa, seus grandes olhosesverdeados captam todos os detalhes de umambiente em segundos.

Os cílios negros e curvilíneos não precisamde máscara ou qualquer artifício para chamar

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atenção. As sobrancelhas escuras, bemdesenhadas por pinça, sofrem retoques acada quinze dias.

A boca volumosa já foi motivo de chacotaquando era criança. Hoje, após madameJolie, são os lábios mais desejados nasclínicas de estética. As bochechas, semprerosadas pelo efeito do sol, são resultado dascorridas matinais e dos jogos de tênis ao arlivre, durante as tardes enfadonhas.

O cabelo de Nina sempre foi curto, nomáximo chegando à altura do queixo. Masdepois que seu último e terrível namoradodisse que achava sexy o tal corte, ela deixouas madeixas crescerem, só para contrariar.São de um castanho médio liso e bemestruturado, que ultrapassam a linha dosutiã.

Falemos agora das curvas, adquiridas commuito suor e sorvete. Sim, a moça é capaz dematar um pote de Häagen-Dazs numasentada. Mas como é raro ter paciência paraficar quieta, o corpo de Nina não retém ascalorias extras dos momentos de gulodice.

Enfim, essa é Nina Albuquerque, a pessoacom uma tremenda direita que fez o cérebro

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de Lex quase sair pelo ouvido.E foi essa garota que ao saber da Grande

Aposta, fincou as unhas em sua própria carnee gritou no banheiro feminino do colégio:“Quem esse tal de Lex Heinrich pensa queé?”

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Três: Quem esse tal de Lex Heinrichpensa que é?

Ah, esse tal de Alexandre Heinrich é o tipode cara com a aura resplandecente. É o típicogaroto que consegue o que quer na hora quedesejar. Convenhamos, Lex é inteligente,perspicaz, inebriante, sedutor, misterioso,debochado e lindo, lindo de viver! Com umadescrição dessas, nem preciso dizer que ocara é o galinha do Colégio Prisma, preciso?

Certo, vocês querem maiores detalhes paraconstatar o que acabo de dizer, então lá vai:Lex completou dezoito anos em outubro. Jáultrapassou um metro e oitenta e cinco dealtura. É daqueles que malham com afinco,para que o punho da manga da camisetadeixe os músculos saltados, como uma bexigasendo apertada.

No currículo esportivo, além da musculaçãocom uma personal trainer gostosa, aindatemos: futebol, tênis, trilhas de bike, KravMagá, natação e tudo o mais que aparecerpela frente.

Dizer que o cara possui uma barrigatanquinho é meio redundante, não? Mas ofato é que ele possui e adora exibi-la por aí.

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Se Lex estiver vestindo uma camiseta, podeapostar: ou é proibido tirar a vestimenta ouele foi obrigado a recolocá-la.

Deixemos a barriga de lado, subindo umpouco mais, até atingir o peitoraldesenvolvido e depilado do rapaz. Achoestranho homens depilados, mas enfim, Lexfaz o tipo metrossexual.

A barba demorou a dar as caras, masagora, Lex não a tira nem por decreto. É umabarba dourada, ao estilo Indiana Joneslimpinho, bem charmosa e altamentesedutora.

Os olhos cor de mel são hiper claros,daqueles hipnóticos e cheios de rajadasdouradas. Os cabelos, também na cor do mel,são volumosos e caem em cachos até a alturada nuca. E que nuca cheirosa… desculpem,não pude deixar de citar o fato.

E respondendo a pergunta de Nina “Quemesse Lex Heinrich pensa que é?”, deixareique o próprio a responda:

— Eu sou o cara e não há como negar.

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Quatro: Um fruto cabeçudoPara entendermos o que está acontecendo

nessa história, precisaremos voltar umasemana no tempo. Prontos?

Em três, dois, um...Estamos agora no quarto de Alexandre

Heinrich e sempre que entro por aqui, tenhovontade de passar um aspirador de pó e daruma ajeitada nas roupas espalhadas. Mas sousó uma narradora, então, nada feito.

O quarto está uma zona, com CDs e DVDsespalhados por todos os lados, roupas usadasjogadas em qualquer lugar e um forte cheirode incenso. O que posso dizer? O garotocurte um incenso, de todos os tipos,tamanhos e aromas.

Um pacote de bolachas recheadas estáaberto e esquecido em um canto, bem aolado do iPad com a bateria zerada, plugadona tomada.

Nesse momento, Lex está com os olhosvidrados no Xbox, muito puto por ter tomadoquatro tiros de Gancho, seu melhor amigo emuito melhor jogador no que diz respeito agames.

— Azar no jogo, sorte no amor. É o que eu

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sempre digo. – Lex joga o controle sobre acama desarrumada, na maior indiferença.

— É o que você sempre diz quando perde,ou seja, sempre! – Gancho lança umagargalhada no ar, batendo firme no ombro doamigo.

— Vamos fazer outra coisa da vida, beleza?– Lex se levanta do puff, disperso, deixando-se cair na cadeira estofada em frente aocomputador. A tela acende e a página doFacebook é carregada.

— Já mandou a moto para o conserto? –Gancho desliga o vídeo-game e se atira nacama, como se o colchão fosse uma piscina.

— Meu pai disse que não dará nem um putode um centavo para arrumar o estrago damoto. – realmente o velho disse isso, aosgritos.

— Poxa, cara, você tá mesmo ferrado. Suamãe proibiu a Zulmira de arrumar o seuquarto, passar a sua roupa e o que maismesmo?

— Proibida de me acobertar. – Lex gira acadeira para encarar Gancho. – Cara, tôcheio disso.

— Calma, um problema de cada vez.

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Primeiro, precisamos conseguir uma granapara você arrumar a moto. Sem a suamotoca, somos dois otários de bicicleta.

— E como descolaremos uma grana? Seupai não o proibiu de vender bagulhos piratas?Não disse que mandaria prender você ou algopior?

— É, estou sem grana também. Minhamesada não dá para nada. – Gancho suspiraalto, entrelaçando as mãos atrás da cabeça.

— O que sugere, Cabeçudo?Nesse exato segundo, uma semente é

regada, começa a crescer e a frutificar nagigantesca cabeça de Gancho. Quando umfruto maduro cai do pé e chacoalha o cérebrodo cara, a ideia surge como uma trilhasonora perfeita, reproduzida no momentocrucial da trama.

— Já sei como conseguiremos a grana, Lex.Mas só me dê um soco depois que euterminar de contar.

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Cinco: A grande apostaAinda naquele mesmo quarto bagunçado,

Lex está boquiaberto e não tem certeza seGancho está de brincadeira ou não. Aperplexidade é tamanha, que o garoto alterao tom de voz:

— A Nina? Você bebeu e bateu com acabeça?

— Qual é cara!? A mina é uma gata. –Gancho incita, divertindo-se.

— A garota mais parece um cavaloselvagem! Ela é intocável, Gancho.

Não que Lex não esteja louco para beijaraquela boca de lábios volumosos, não é isso.O problema é que Nina é uma garota arredia,difícil e não deixa nenhum garoto seaproximar. Os que tentaram searrependeram amargamente.

— Qual é, Lex, nada é impossível paravocê. – Gancho inicia a persuasão.

— Não tenho tanta certeza disso. Viu o queela fez com o Edgard? Com o Hulk noHalloween? E as Kibis então? Cara, eu tôfora!

— O lance das Kibis foi bem maneiro. –Gancho balança o cabeção. – Lex, a questão

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é que se não for uma aposta impossível,nunca conseguiremos a grana para arrumar asua moto. De quanto precisa? Quatro paus?

— Seis mil. E quer saber? Logo o meuvelho voltará atrás e aí terei a grana paraarrumar a moto. – Lex mira o chão enquantoa incerteza reverbera pelas quatro paredes.

— E até lá?— Dois otários de bicicleta, fazer o quê? –

Lex suspira alto e acende outro incenso.Mas Gancho não se dá por vencido.Aliás, deixe-me contar um pouco sobre o

melhor amigo de Lex. O apelido não é dehoje, surgiu lá pelo oitavo ano do EnsinoFundamental. Desde aquele tempo, Arthur –o capitão Gancho – é um pirata da melhorcategoria.

O garoto pirateia tudo o que vê pela frente:de jogos a filmes que ainda estão noscinemas. Para ele, a informação é livre edeveria ser distribuída de graça. Como não oé, Gancho trata de faturar algum em cima depessoas que não estão a fim de pagar umafortuna por um jogo de Xbox, por exemplo.

Além disso, o cara também é umfalsificador dos bons. Quase levou a

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lanchonete do colégio a falência quandovendeu a um real, tickets de salgadinhos erefrigerantes falsificados por ele. Esse é umgaroto que vai longe.

Gancho, fisicamente, não é um carabonitão. Mas é charmoso ao extremo. Seuscabelos negros escorrem lisos até a altura dopescoço e a franja, sempre na lateral,costuma cair sobre os olhos escuros eindecifráveis.

A cabeça grande, motivo de zoação dosamigos, não incomoda Gancho. Para ele,quanto maior a cabeça, maior o cérebro. E ocara tem toda a razão.

Mas, voltando à história da tal aposta,Gancho não se deixa abalar pela resolução deLex. Soprando a franja para o alto, prepara-se para deixar o amigo sem alternativas.

Envia e-mails, mensagens instantâneas eDMs no Twitter para todos os machosapostadores do Colégio Prisma. E isso émuita coisa, só para constar. A mensagem ésucinta e marketeira ao extremo, como é oestilo de Gancho. Na íntegra, o texto diz:

“A Grande Aposta será lançada.Lex x Nina.

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Amanhã, no pátio do colégio.Venham com a carteira recheada de notas

altas.Gancho.”

Nem preciso dizer que a galera compareceem massa, preciso? Enfim, todos aparecem,até mesmo os que não foram chamados.Como grana é grana, nesses momentos nãofaz a menor diferença. Quanto maisapostadores, melhor.

Gancho se posiciona no meio da roda degarotos, expondo a Grande Apostamaquinada por ele. Quando termina de falar,encara um por um daqueles caras. SeGancho não vê, eu vejo: alguns garotossuam, outros se entreolham e uns poucosriem, abrindo as carteiras.

— Só tem um problema nessa história.Temos que convencer o Lex a entrar najogada. – Gancho solta a bomba no centro docírculo e sai andando.

— Como é? O Lex vai amarelar? – Nando, ogaroto dos cabelos espetados, pergunta,incrédulo.

— Pois é, meus caros. Só uma grana alta oseduzirá. – Gancho tomba a cabeça para

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trás, fitando as nuvens escuras através doseu Ray-Ban.

— Essa vai ser a Grande Aposta de todas asapostas! – um gorducho empolgado, compasta de dente na lateral da boca, gesticulacomo se fosse um líder de torcida. – Vamosgalera, abrindo as carteiras aí!

Gancho liberta um sorriso satisfeito quandonotas de cinquenta e cem reais começam apular para suas mãos. Lex não terá comorecusar.

— Temos que triplicar esse valor, rapazes.Precisamos deixar o Lex sem saída. – Ganchoconta o dinheiro, os olhos negros brilhandoem excitação.

— Temos que conseguir mais apostadores.Temos que espalhar a notícia! – o gordinhoempolgado grita.

E não é que a notícia se espalhou?

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Seis: Na sala do diretorLex e Nina estão sentados, lado a lado, nas

elegantes poltronas vitorianas da diretoria.Esse é um escritório rebuscado, repleto deobjetos de arte, livros, enciclopédias e umimenso globo que gira sem parar, plugadonuma tomada. A sala possui claridadenatural, provinda de duas imensas janelasque ficam localizadas atrás da altiva mesa dotodo poderoso diretor.

Mas não é isso o que a maioria dosestudantes vê quando entra aqui. Oh, não. Ecomo a versão deles é muito mais divertida,narrarei o que aquele garoto gorducho, compasta de dente na lateral da boca, viu certavez:

No quinto ano, Fabiano – o gorduchoapelidado de Bola – sem nada melhor parafazer da vida, resolveu roubar uma caixa degiz da sala dos professores. E, ainda sem tero que fazer, resolveu triturá-los,transformando o giz em pó.

Para que isso serviria?, eu lhes pergunto.Bem, quando não se tem nada melhor para

fazer da vida, ideias estranhas invadem amente. E um bizarro plano surgiu na cabeça

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de Bola.Horário do intervalo, ninguém na sala de

aula. Uma escada de quatro degrausesquecida em um canto do corredor. Ah, Bolanão teve dúvidas.

Com uma risada malévola estampada norosto e uma aura nada santa, o garoto pegoua escada, subiu os degraus e depositou,calmamente, todo o giz triturado sobre aspás do ventilador de teto. O dia estavaquente e Bola suava em bicas.

Terminado o serviço, guardou a caixa degiz dentro da mochila antes de devolver aescada. O resultado da brincadeira nãopoderia ter sido outro: quando a professorade matemática ligou o ventilador, foi merda…ops, quero dizer, foi giz para todo o lado.Estava literalmente nevando na sala trinta.

Não foi tão difícil descobrir o autor datraquinagem e a diretoria já aguardava porBola, ansiosamente.

Com passos incertos e as pernas bambas,Bola tocou a maçaneta da porta, sentindochoques elétricos percorrendo o corpo todo.Podia ouvir risadas macabras vindas de todoo lugar e de lugar algum.

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Quando a porta se abriu com um ruídoengasgado, Bola agitou-se, assombrado. Olugar era cavernoso e exalava um fortecheiro de enxofre. Nas prateleiras, várioslivros de poções e bruxaria se remexiam,inquietos. Um imenso globo terrestre girava,pegando fogo. O diretor possuía tentáculos edois cães do inferno mostravam os dentes ebabavam.

Uma semana de suspensão e Bola jurou depés juntos, que nunca mais pisaria na sala dodiretor.

Mas Lex e Nina não estão vendo nadadisso.

Reprimindo sua ira, Nina observa tudo emvermelho sangue, como se estivesse em umfilme de terror, daqueles com seríssimasrestrições orçamentárias. Já Lex vê o cenárioem preto e branco, talvez o tapa tenhaafetado os seus sentidos.

— Então é isso? Uma aposta? – o diretorendireita o polvo de cerâmica sobre a mesa.Com uma irritante mania de arrumação,também ajeita os dois cachorros de cerâmica,de modo que fiquem bem alinhados.

— É, é isso. – Nina cruza os braços em

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frente ao corpo, trincando o maxilar de tantaraiva.

— Alexandre? – o diretor tira os óculos dorosto, jogando-os sobre uma pilha de papéismuito bem arrumados.

— Eu não concordei com essa aposta. – Lexestá seguro de si e isso deixa Nina maisfuriosa ainda.

A garota apruma-se, desconfortável. Fincaos dentes no lábio, segurando-se para nãovoar no pescoço de Lex. Tenta parecerindiferente ao assunto, mas sabe que suaexpressão enfezada lhe escapa ao controle.

— Não é a primeira vez que você e seusamigos lançam uma aposta dessas. – odiretor recosta na cadeira estofada, girandode um lado para outro, pensativo.

— Dessa vez sou inocente. – Lex entrelaçaos dedos, numa estabilidade que deixa Ninaperturbada.

— Se eu souber que vocês continuam afazer apostas, a coisa vai ficar bem feia,Alexandre. Não me importam as notas,reprovarei todos vocês, ficou claro?

— Claríssimo. – Lex faz menção emlevantar-se, mas o diretor lança um olhar

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reprovador em sua direção.— Eu não terminei, garoto. – e então, seu

olhar recai sobre Nina. – O que quer fazer arespeito?

— Quero que ele mantenha distância demim. – ela responde, na lata.

O diretor pesa o pedido enquanto ajeita,pela milésima vez, os dois cachorros decerâmica. Com o mau humor que Nina está ébem capaz que pegue os enfeites e os joguepela janela. Mas ela se contém, contando atédez mentalmente.

— Feito. – o diretor recoloca os óculos. –Alexandre Heinrich, a partir de hoje, não seaproxime de Nina Albuquerque. Não lhe dirijaa palavra, não peça um lápis emprestado,não olhe para ela, estamos entendidos?

— Perfeitamente. – Lex concorda, doidopara se mandar dali.

— Voltem para a sala de aula. E parem decriar problemas ou serei obrigado a cancelara viagem de formatura. – o diretor lança,num tom tedioso.

— O quê? – Lex arregala os olhos,surpreso.

— Você ouviu.

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Sim, ele ouviu. Apesar do tapa de Nina tertirado o garoto de órbita, Lex ainda não ficousurdo.

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Sete: A viagem de formaturaDentro de uma semana, a tão sonhada

viagem de formatura para a Ilha Inamoratamexerá com os ânimos de trinta e quatroestudantes e dois professores.

Segundo o folheto publicitário que Ninacarrega na mochila, o lugar é simplesmenteparadisíaco. Mar e céu que se fundem numazul profundo. Cachoeiras e grutas de tirar ofôlego. Areia branquinha, daquelas queafundam até o calcanhar. Um hotel cincoestrelas repleto de atividades ao ar livre.Quadras de tênis, vôlei de praia, campo defutebol gramado e muita, muita natureza aoredor.

Para as meninas do Prisma essa é umaoportunidade única, talvez a última chancede engatarem um romance com algum dosgarotos do colégio. Para os meninos, essetambém é um momento ímpar,desesperadamente aguardado. Garotas debiquíni dando o maior mole? Juro para vocêsque apesar da Ilha Inamorata ser um localonde a natureza é preservada, a mentepoluída desses caras, fatalmente, poderágerar um desastre ambiental. E dos grandes.

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Nina não cogita a possibilidade de desistirda viagem, mesmo sabendo sobre a apostaque está rolando. E se por acaso ela pensasseem desistir, suas melhores amigas, Natháliae Lais, não permitiriam.

— Jura mesmo que não vai desistir? –Nathália anda em círculos em volta de Nina.Seus longos cabelos castanhos estão presospor um rabo de cavalo que chacoalha para láe para cá.

— Está me deixando tonta, Nathi. – Ninaestá dispersa.

— Sério mesmo, Nina, você não podedesistir. – Lais muda a mochila de ombro, otroço está pesando toneladas. – Promete? Porfavor?

— Prometo, já falei! – Nina estressa edispara, um tanto ríspida.

As três estão no estacionamento do ColégioPrisma. Nina, agora com dezoito anos, jápossui a tão sonhada habilitação e uma motonovinha em folha. Ela optou por umaKawasaki Concours 14, preta e prata, com1.352 cilindradas, 4 tempos, 4 cilindros emlinha com refrigeração líquida, 16 válvulasVVT, 155 cavalos de potência, com sistema

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de ignição digital, injeção eletrônica e partidaelétrica. Não que eu saiba o que isso querdizer, mas Nina sabe.

Antes que Nathi e Lais retomem o assunto“viagem de formatura”, eis que surgem Lex eGancho, caminhandodescompromissadamente rumo aobicicletário.

A garota lança um olhar fulminante nadireção de Lex. Ela estremece de raiva só dese lembrar da tal aposta e dos sorrisinhosabafados nos corredores do colégio. Se ogaroto se aproximar, é morte certa.

— Bela motoca. – Gancho assobia e Lex lhedá uma cotovelada nas costelas.

— Obrigada, Gancho. – Nina sorri,presunçosamente. – E suas bicicletastambém são bem bonitinhas… tiraram até asrodinhas laterais, que gracinha.

— Rá, rá. – Lex negligencia a própria vida.— Ei, não pode falar comigo, lembra-se? –

Nina brada, agressivamente.— Estamos fora do colégio, aqui é local

neutro. – Lex retruca, numa friezacongelante.

— Não abuse, Alexandre. – Nina monta

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sobre a moto e dá a partida. – Meninas, atémais tarde. – baixando o visor do capacete eacelerando ao máximo, ela deixa apenaspoeira para trás.

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Oito: Uma aposta perigosaLex observa Nina desaparecer do seu

campo de visão. Que garota intragável! Essaaposta está fora de cogitação, sem chance.Gancho interrompe os devaneios do amigoquando pergunta para Nathália e Lais:

— Como aguentam o mau humor dessagarota?

— A Nina? Qual é, Gancho, ela é legal. –Nathália parte em defesa da amiga.

— Sei. – Lex revira os olhos.— É verdade, a Nina é muito gente boa. –

Lais confirma. – Deveriam tentar conhecê-lamelhor.

— Qual o problema dela com pessoas dosexo masculino? – Gancho indaga,interessado.

— Longa história e, sinceramente, nãocontarei a nenhum de vocês dois. – Lais nãovacila. – Vamos, Nathi.

— Vamos. – Nathália concorda em ir, masnão se move. Essa paixão platônica porGancho já está tirando Lais do sério. Elaprecisa praticamente arrastar a amiga dali.

— Até mais. – Gancho se despede,indiferente ao fascínio que exerce sobre

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Nathália. A maioria dos homens é cego.Quando as meninas se afastam o bastante,

Lex fuzila o amigo com o olhar. Gancho dá deombros, sem saber o porquê do olharcortante.

— Certo, o que foi?— Você levou a aposta adiante sem o meu

consentimento. Cara, eu disse que estavafora.

— Man, consegui três mil reais. – Ganchogira o boné na cabeça, deixando a aba paratrás. – Três paus, cara! Qual é, vai amarelar?

— Não vai rolar, Cabeçudo. E outra, trêsmil é só a metade do que preciso. Mesmo seeu decidisse prosseguir com isso, aindateríamos que pagar aos apostadores.

— Lex, meu camarada, se você vencer essaaposta, os três mil são seus, limpinhos.

— O que está dizendo? – Lex confronta,franzindo o cenho.

— O que quero dizer é que todosapostaram na Nina, ou seja, se você ganhar,a grana é toda sua, sem divisões.

— Mas que merda! Ninguém apostou emmim? – Lex replica, pasmo. – Nem você,cara?

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— Só estou tentando ajudar. – Gancho dáum tapa no ombro de Lex.

— Gancho, é sério, devolva o dinheiro paraos apostadores e esqueça essa merda deGrande Aposta. O diretor está de olho emmim, cara!

— Era com vocês mesmos que eu queriafalar. – o tom arrogante não deixa dúvidasde quem se trata: Bárbara.

Ela se aproxima embalada numa calçajeans skinny, dessas que se agarram aocorpo de maneira impossível. Rebola sobre assapatilhas com padronagem de oncinha erequebra o quadril ao fitar Lex e Gancho.

A camiseta do colégio sofreutransformações significativas após umasessão de customização. Está tão curta quedeixa parte da barriga a mostra,desrespeitando a regra básica de etiqueta daescola.

— O que quer, Kibi? – Gancho suspiraantes de remedar: – Desculpe. O que quer,Babi?

Bárbara é a ex-namorada de Lex. Bem, ex-namorada é subjetivo, já que a coisa todanão passou de uma aposta. E como toda

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garota orgulhosa e vingativa, Bárbara aindanão se esqueceu do que aconteceu no anopassado, mas contarei os detalhes sórdidosmais tarde.

A loirona oxigenada gira a cabeçateatralmente, lançando os cabelosdesbotados para o ar. Apesar de nutrir umapaixão avassaladora por Lex, jamais admitiráo fato. Amor e ódio, uma combinaçãoexplosiva. E a garota é pura TNT.

— Gancho, vou relevar a piadinha, mas sóporque tenho uma proposta para o Lex. –Bárbara recosta na mureta azul, dirigindo-seao ex-namorado. – Soube que não vai levara aposta adiante, é verdade?

— Soube corretamente. – Lex admite, certode que algo bombástico sairá dos lábiosvermelhos de Bárbara.

— Que tipo de proposta é essa? – Ganchoestimula a garota a continuar.

— Soube que precisa de seis mil reais paraarrumar a sua moto. Bem, eu tenho odinheiro, Lex. – Bárbara verifica as unhas corde fogo, preguiçosamente.

— É como eu disse, não vou levar issoadiante. – Lex se mantém impassível.

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— O que quer do Lex, Babi? – Gancho aencara, desconfiado.

— Vocês dois sabem o que aquela vadia daNina aprontou comigo. Só estou querendodar o troco, nada de mais.

— E quer a minha ajuda? – Lex adivinha,acertadamente. – Esqueça de mim nesse seulance. Estou fora, qualquer que seja aproposta.

— É o seguinte, Alexandre: ou você meajuda nessa ou então, mostro para o seuvelho o vídeo que está no meu celular. – elaestressa e tira o aparelho do bolso traseiroda calça, balançando-o na altura dos olhos deLex. – E nem preciso dizer que fiz milhões decópias, certo?

— Você disse que não iria mostrar aninguém. – Lex se abala, sentindo o sangueferver.

— E não vou! – Bárbara se faz de rogada. –Mas veja bem, se não me ajudar, como possoajudá-lo, Lex?

— Você é uma Kibi filha da mãe. – Ganchovocifera, entredentes.

— Cale a boca, Gancho. – Lex nunca tinhasido chantageado antes. A boca seca e ele

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umedece os lábios, nervosamente.— O que me diz? – Bárbara finge não ouvir

o que Gancho acaba de dizer. Mira Lex e seusolhos castanhos se estreitam perigosamente.

— O que quer que eu faça? – Lex foiameaçado abertamente e não acredita queesteja cogitando a possibilidade de ajudarBárbara. Mas no momento, não encontraalternativa. Não pode permitir que seu paisaiba a verdade sobre o “acidente” com amoto.

— Deixe a Nina pensar que você desistiu daaposta, mas a verdade é que você nãodesistirá, entendeu?

— Não, não entendi. O que pretende comisso? – Lex tenta se manter calmo, apesar dasituação.

— Não interessa o que pretendo. É só fazera Nina acreditar que a aposta acabou.Aguarde novas instruções quando chegarmosna ilha. Assim que eu conseguir o que quero,você terá a sua grana. – Bárbara acaricia orosto de Lex com o celular. – Bom, é isso.Até mais, lindão. E tchau para você,Cabeçudo. – armada do melhor rebolado,Bárbara deixa dois amigos embasbacados

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para trás.

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Nove: A breve vida amorosa de NinaVamos tentar entender o porquê de Nina

ser tão avessa a garotos. Tudo está nopsicológico, Freud elucidaria. Talvez a garotaenlouquecesse o neurologista antes domesmo se explicar.

O fato é que ela, até hoje, teve apenas doisnamorados. O primeiro foi aos doze anos deidade...

Nina estava brincando com as amigas nacalçada de sua casa, num condomíniofechado de alto padrão na cidade de SãoPaulo. A Barbie Noiva estava a bordo dopossante cor-de-rosa, a caminho do salão debeleza. Após os cuidados com o visual, asBarbies fariam uma festa de arromba namansão de três andares e os Kens jáestavam convidados.

A garota não sabia, mas estava sendoobservada por Maurício, que morava a umadistância de oito casas da sua. Supertímido,deixou a bicicleta incrementada de lado einvadiu o jardim florido de Dona Estela,colhendo flores coloridas para que Ninapudesse enfeitar a festa das Barbies.

Timidez é uma droga.

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Maurício estava agitado, tenso e tremia dacabeça aos pés. Não conseguia se aproximardaquela linda menina com um corte Channel,de olhos grandes e esverdeados. O que elefez? Tocou a campainha do amigo Danilo eimplorou para que o garoto levasse as florespara Nina.

— Quer que eu leve as flores? – Daniloperguntou, maldizendo o momento queatendeu a campainha.

— Por favor? Leve as flores e peça a Ninaem namoro para mim? – Maurício suplicou,com olhos marejados.

— Não acredito nisso. – o amigo bufou erevirou os olhos. – Dê aqui, eu levo.

Danilo, um ano mais velho que Maurício,pegou as flores e respirou fundo, caminhandoa passos largos até a festa das Barbies. E quefestão! Tinha até jatinho cor-de-rosaestacionado na entrada da mansão.

O lance foi que, um nervoso Danilo,entregou as flores para Nina e a pediu emnamoro. A garota, com um risinho contido,olhou para as amigas buscando umaresposta. As três balançaram a cabeça,afirmativamente.

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A confusão estava armada. Nina acreditavaestar namorando Danilo. Danilo jurava terpedido Nina em namoro para seu amigo. Porsua vez, Maurício estava certo de que Ninaagora era sua namorada. Aff.

A menina de doze anos estava muito feliz.Contou para todos na escola que estavanamorando, apesar de nunca ter trocadomais de duas palavras com Danilo. Paradetonar de vez com a situação, o garotomudou-se de bairro três semanas depois,deixando Nina completamente arrasada.Poxa, nem um tchau?

Ali começava o problema de Nina comgarotos. Como poderia confiar neles?

Como toda pré-adolescente, Nina sofreupor Danilo, chorou por ele, arrancou oscabelos e disse para as amigas que nuncamais amaria ninguém como o amava. Adorodramas juvenis, são tão intensos!

Querem saber o que aconteceu comMaurício? Bem, hoje o garoto faz terapia enunca beijou uma garota. Depois que viu suanamorada Nina dando o maior amasso emoutro cara, o mundo ruiu para ele.

Esse outro cara chamava-se Bruno.

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Bruno foi o segundo namorado de Nina.Eles se conheceram no colégio e o garoto eradois anos mais velho do que ela. Nina tinhaquinze anos naquela época.

Como toda filha superprotegida por paismalucos, Nina era a inocência em pessoa.Não conhecia Bruno o suficiente, mas aindaassim era apaixonada pelo cara desde queDanilo a deixou, sem dizer um tchau.

O namoro durou exatos seis meses e, pelapouca idade de Nina, os pais resolveramcercar esse relacionamento, permitindo quesó acontecesse debaixo de seu teto. Ou seja,o namoro se dava em casa e os telefonemaseram supervisionados. Internet? Nempensar! Toda e qualquer comunicação com omundo externo era grampeada pela analistade tecnologia da família: Laura, a mãe deNina.

Bruno era o tipo de garoto experiente eestava doido para colocar suas mãoscalejadas sobre a garota virgem. Ela eratímida, estonteantemente linda e estavacompletamente apaixonada… droga, Ninaestava perdida! Era chantageadaemocionalmente sempre que estavam juntos

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e a garota começou a cogitar a possibilidadede finalmente se entregar a Bruno.

Quando o garoto, já com dezoito anos,pegou sua carteira de motorista, as coisassaíram do controle. Bruno aparecia na casade Nina sem avisar, sempre que os pais delae o irmão mais velho não estavam. Como elesabia? O vizinho da frente era seu amigo ecomparsa.

Nina já tinha completado dezesseis anosquando aconteceu o inevitável. O Mustangamarelo estacionou na porta de sua casa,reluzindo como um diamante. Brunocarregava um imenso buquê de rosasvermelhas, pronto para dar o bote. Elaestava sozinha naquela tarde.

Paixão e inocência. Essa é uma combinaçãoperigosa.

Nina se entregou no sofá da sala, após seismeses de tentativas infrutíferas por parte deBruno. Ele jurou amor eterno. Garantiu queela era única. Disse que se casariam. Afirmouaté que era virgem, por Deus!

Depois daquela tarde, Bruno não ligoumais.

Nina, agora sem medo de vasculhar a

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internet, logou-se num tal de Facebook.Através dessa ferramenta mais poderosa doque uma investigação policial, descobriutodas as mentiras de Bruno, inclusive quenão era a namorada oficial do cara. Naquelemomento nascia a nova Nina Albuquerque, agarota que seria temida por todos queusassem cuecas.

— Doc, preciso falar com você. – Ninaentrou no quarto do irmão mais velho,faiscando de tão puta da vida.

— Nina, cai fora. – Douglas, o irmão, nemse dignou a olhar para a garota.

— O Bruno me enganou e eu quero osangue dele. – Nina arrancou os fones dosouvidos de Doc.

Aquelas palavras surtiram efeito imediato.O irmão levantou-se da cama, pronto para abriga. Abriu o guarda-roupas e pegou o tacode beisebol que não usava desde aadolescência.

— Ele zoou você? O que ele fez, Nina?— Ele me usou. – ela estava constrangida,

mas queria a ajuda dele. Apesar de seremcomo cão e gato, Nina sabia que Doc fariaqualquer coisa por ela, a protegeria.

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— Como? Como ele usou você? – o olhar doirmão era colérico.

— Ele conseguiu o que queria e sumiu. –Nina se segurava para não chorar.

— Filho da puta! Ele machucou você? Nina,me diz! – Doc gritava, sacudindo a irmã pelosombros.

— Ele não me forçou, se é o que quersaber. – agora sim Nina chorava,copiosamente. Doc a abraçou, acariciandosuas costas. – Não acredito que deixeiacontecer, como pude ser tão burra?

Rangendo os dentes, Doc passou a mão nocelular e ligou para alguns amigos. Meia horadepois, quatro deles já estavam na porta dacasa de Nina, com seus tacos de beisebol atiracolo.

— Você fique aqui, está entendendo? – Docinstruiu.

— O que vai fazer? – Nina nunca tinhavisto o irmão tão alterado.

— Deixe comigo.Com todas as coordenadas passadas por

Nina, Doc sabia onde encontrar Bruno. Pelohorário, ele deveria estar na última aula docursinho.

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O Mustang amarelo, com uma faixa pretano capô, nem precisava gritar por atençãoem meio a carros comuns. Com um sorrisolateral e a mão pulsando de raiva, Docfechou os dedos em volta do taco de beisebole nem olhou para os lados.

Os quatro amigos fizeram o mesmo, semsaber ao certo o porquê de estarem metidosnaquilo. Doc explicou apenas que o donodaquele carro havia aprontado com a Nina equem mexe com a irmã de um deles, mexecom todos.

O carro foi destruído em minutos. A políciachegou pouco depois, antes que Bruno e Docse atracassem. O barraco estava armado eNina aguardava em casa, andando de umlado para o outro, embolando o tapete dasala sob os pés.

Ninguém, nunca mais, a faria de idiota.Doc e seus amigos foram presos, mas não

por muito tempo. O pai de Nina, umadvogado figurão, ameaçou Bruno, acusando-o de aliciamento de menores, o que naprática era a mais pura verdade. Bruno játinha dezoito anos e Nina apenas dezesseis.Nesses casos o veredito é um só: cadeia.

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O pai de Bruno acabou por convencer ofilho a retirar a queixa contra Doc e suaturma, afinal, um empresário do nível delenão poderia ter um filho na prisão. E assimfoi feito: os garotos foram soltos naquelamesma madrugada, numa noite insone paratodos da família Albuquerque.

Nina ouviu um sermão de mais de duashoras, tanto do pai, quanto da mãe. Docassistiu a tudo, com os braços cruzados e umolhar matador. Ninguém zoa a sua irmã e saiileso. Ele se imaginava com uma bazuca,estraçalhando o corpo de Bruno, o sangue seespalhando pela calçada, escoando para obueiro entupido mais próximo… desejo quenunca foi realizado.

Quanto a Nina? Bem, ela aprendeu a liçãoda pior maneira. E foi um ensinamento que amarcou fundo, redesenhou suapersonalidade, mudou sua visão de mundo eaniquilou qualquer ilusão encantada. Homensnão prestam, a voz interna gritava. Meuúnico foco serão os estudos, quero distânciade namorados, a cabeça latejava.

A única coisa bacana nessa história toda foique Nina e Doc, finalmente, estreitaram o

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laço familiar que os unia. Desde esse dia,nunca mais brigaram.

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Dez: A contra-apostaO pátio do Colégio Prisma é um espaço

como todos os outros. Quadraspoliesportivas, árvores frutíferas, bancos decimento, uma lanchonete que só vendetrash-food… um lugar bem comum.

Nina, Lais e Nathália estão debaixo de umaárvore, debatendo sobre o livro que estãolendo. Desde que se tornaram amigas, elasfazem isso: leem o mesmo livro, um capítulopor dia, para depois discutirem sobre aleitura. É como um Clube do Livro diário,sempre no intervalo das aulas.

Nathália é uma leitora compulsiva. Desdeque se entende por gente, gasta toda suamesada em livros. É claro que, no vestibularque se aproxima, prestará para a faculdadede Letras, um sonho desde criança.

Ela é alta, bem magra, com cabeloscastanhos longos que estão sempre presosem um rabo de cavalo volumoso. Os óculoscom aro vermelho são só para leitura, algoque lhe confere um ar cult.

Nina disse, certa vez, que ela deveriaaposentar os óculos de leitura, afinal, elesescondem os belíssimos olhos amendoados da

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amiga. Nathi nem cogita a possibilidade, elaadora parecer mais velha, mais inteligente.

Já Lais é o oposto. Baixinha, com curvasbem acentuadas, cabelos avermelhadoscurtos e um par de olhos azuis que são umaafronta. A garota faz um estilo hippie chique,é vegetariana e adora brincos e colaresgigantescos. E só para constar, está semprede chinelos. Ela possui de inúmeras cores, detodos os jeitos e marcas.

Lais demorou a escolher a faculdade quegostaria de cursar. Estava entre Moda eNutrição. Depois de pesar os prós e contras,Nutrição ganhou em disparada.

Nina, como já descrevi anteriormente, faz otipo esportista. Hoje ela está com umabermuda preta de lycra, camiseta branca eazul do Prisma e um par de tênis paracorrida. Pega na bolsa uma maçã, lustrando-a na camiseta antes de dar a primeiramordida. É quando avista Camila, correndo esaltando obstáculos, seus cabelos douradosesvoaçando como uma capa de superheroína. Aproxima-se, esbaforida, vomitandoas palavras:

— Nina, eu vi os caras na quadra de tênis.

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Estão falando sobre a Grande Aposta.— O que você ouviu? – Nina brada, jogando

a maçã mordida de volta na bolsa.— O Lex desistiu, está devolvendo o

dinheiro para a galera. Os caras estãotentando convencê-lo a manter a aposta.Parece que o Lex precisa de seis mil reaispara arrumar a moto dele. Bom, foi o queentendi.

— O Lex desistiu da aposta? Não acredito. –Nathi tira os óculos, erguendo assobrancelhas.

— O Lex não é cara de desistir. – Laisencara Nina, como se tivesse escutado algoabsurdo.

— Vou até lá. – Nina fecha a cara e o livro.— Acho que não deveria, vai acabar

rolando a maior confusão. – Nathi odeiabarracos, ainda mais quando suas amigas seenvolvem neles.

— Por que não? Se fosse comigo, eu iria. –Lais incentiva.

— Eu também iria. Sério, não aguento maisessas apostas. – Camila já caiu em três delase ainda não sabe, mas cairá uma quarta vez.

— Vou acabar com isso agora mesmo. –

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Nina se levanta num salto, estalando opescoço lateralmente. Seu olhar já diz tudo.Lex Heinrich está com os minutos contados.

As amigas a seguem até a quadra tênis.Lais jura ter visto faíscas saindo dos ouvidosde Nina. Ela está irada e com cara de quemvai socar alguém. Bem, não seria a primeiravez.

Nina avista os garotos numa imensa rodano centro da quadra. Abre a portinholalateral com um estalido e caminha sobre osaibro, deixando pegadas pesadas ao passar,sustentando uma expressão de dar medo.

A notícia se espalha como vírus de filmesde ficção científica. Não demora muito eparte do colégio se acotovela para assistir aogrande espetáculo. Ou grande barraco, comoqueiram chamar.

— Pensei que essa palhaçada já tinhaterminado. – Nina aponta o dedo na direçãode Lex, em tom de acusação.

— Gancho, diga para essa garota que estouproibido de falar com ela dentro do colégio. –Lex olha para o chão, traçando um círculocom a ponta gasta do tênis.

— Pare de ser otário, Lex. – Nina se

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aproxima e o cara, temendo outro tapa ouchute, recua instintivamente.

— Escute, eu não aceitei essa aposta, tálegal? E não vou levar isso adiante, pontofinal. – Lex faz uma pausa e finalmenteencara Nina. – Ou você está bravinha porquequer que eu tope?

Ele tinha mesmo que soltar uma dessas? Éo que basta para o circo pegar fogo. A galeraurra, pessoas gesticulam, um murmurinhoincessante toma conta do cenário.

Por um instante, Nina fica desconcertada.Mas é uma sensação tão breve que passadespercebida à plateia. O sorrisinhodebochado de Lex a deixa incrivelmenteirritada. Ah, ela não vai se deixar humilhar.

— Você curte apostar, não é, Lex? Gosta dese dar bem? – Nina leva as mãos à cintura,fuzilando o garoto.

— O cara é campeão de poker, apostar é avida dele. – Gancho passa o braço nosombros de Lex, provocando-a.

Se Gancho quer incitar a garota, eleconsegue. Algo se inflama dentro dela e osangue corre como ácido dentro das veias.Sente um gosto amargo no fundo da

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garganta e o raciocínio se perde quando oego explosivo assume o comando.

Mira Lex no fundo dos olhos, numa cólerainconsequente.

— Ah, é assim? Então eu vou lançar umaaposta de gente grande para você, seu ba-ba-ca. Já me disseram que precisa de granapara arrumar aquela sua porcaria de moto.Pois bem, se vencer essa aposta, eu dou odinheiro.

A galera grita, em polvorosa. Lex recuadois passos e Gancho o segura pelo braço,temendo que o amigo saia correndo dali naprimeira oportunidade. Essa situação já saiudo controle: Lex está sendo chantageado porBárbara, a Kibi; seus amigos não queremvoltar atrás na aposta, não aceitaram odinheiro de volta; e agora isso?

— Dê o seu lance, Nina. – Gancho gritaacima da multidão. Imediatamente todos secalam, aguardando o desfecho, ansiosos.

— Nina, o que está fazendo? – Natháliasussurra. – Não piore ainda mais a situação.

Nina e Lex se encaram como naquelesduelos da antiguidade. Uma folha de papelamassado rola pelo chão, sendo levada pelo

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vento. O silêncio é sepulcral e os estudantesprendem a respiração. Nina toma fôlego e seapruma, antes de soltar a bomba:

— Me conquiste, faça eu me apaixonar porvocê, Lex. Se conseguir essa proeza, terá odinheiro que precisa.

What? Vocês estão gritando aí? Porque euestou surtando por aqui. Essa sim é a GrandeAposta do ano, folks!

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Onze: Façam suas apostasParemos um instante para analisarmos o

porquê de Nina ter lançado uma apostadessas no ar.

Acredito que, inconscientemente, a garotaesteja tentando quebrar a carapaça criadapor ela própria após o episódio com Bruno.Talvez Nina realmente queira se apaixonar. Avida já é um mar de incertezas e sem amor,pode se tornar insuportável.

Analisando agora a parte consciente, agarota acredita que esteja humilhando Lexcom a tal aposta. Afinal, se o cara aceitar, écerto que perderá. E se recusar, será tachadode medroso e sua reputação de galinha nãosairá ilesa.

Lex recusaria essa aposta, sem ao menospensar. Mas não é isso o que acontece. Nomeio da balbúrdia, ninguém além de Lex eGancho veem quando Bárbara – a Kibi –levanta o polegar direito em sinal deaprovação. Os garotos entendem a deixaquando a garota, além do polegar, erguetambém o celular na altura dos olhos,sacudindo-o como se fosse uma passista deescola de samba. Lex está ferrado.

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Contrariando seu sexto sentido, o garotoprecisa aceitar a contra-aposta. A galera vaiao delírio e Lex resolve piorar um pouco maisa situação, cuspindo na palma da mão,estendendo-a para Nina.

— Como você é nojento! – ela recua emrepulsa.

— Para selar esse acordo, nada melhor doque nossas próprias salivas. – Lex solta umagargalhada debochada e muito arriscada. Seuolhar busca o de Bárbara e a Kibi pareceestar em êxtase. O que quer que estejaplanejando, a tal aposta de Nina só veio asomar em sua estratégia.

— Que seja. – Nina cospe em sua mão e oacordo é selado.

Nathália e Gancho são designados pararedigirem um contrato, com todas ascláusulas da aposta. Nesse documento, deveconstar tudo o que será permitido e proibidoassim que Nina e Lex pisarem à IlhaInamorata, o palco selecionado para o inícioda Grande Aposta do ano.

Gancho também será “o banqueiro”. Ele équem receberá e gerenciará todas as apostasda turma. Nathi acompanhará de perto o

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processo, já que Nina a nomeou como seubraço direito.

Faltando apenas dois dias para a tãoesperada viagem de formatura, Lex, Nina eBárbara estão recolhidos em seus quartéisgenerais, estudando o oponente, traçando asmelhores estratégias de ataque.

Sim, meus caros, a brincadeiratransformou-se numa guerra. Façam entãoas suas apostas, porque o jogo de seduçãoestá prestes a começar.

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Doze: As KibisLex é o tipo de cara que saca as pessoas

numa primeira olhada. E o que percebeu,quando Nina Albuquerque foi apresentada àsala pelo diretor, gritava aos quatro ventos:“Não se aproxime, eu mordo”.

Como todo garoto inteligente, Lexentendeu a mensagem. Apesar de estarbabando na carteira, Nina não era para o seubico. O fato se comprovou semanas depois,quando a garota, de saco cheio das Kibis,resolveu dar o troco.

Nesse ponto, Nina, Nathália e Lais já eramamigas inseparáveis. Lais possuía no celularuma foto comprometedora do acampamentopassado. Na imagem, Bárbara, Suzana e AnaPaula se fingiam de bêbadas e as trêslevantaram a camiseta até o pescoço, o querevelou que não usavam nada por baixo.Com os seios à mostra, as três posaram paraa câmera de Lais.

Nina sorriu ao ver a tal foto.Com o auxílio do Photoshop, a garota não

precisou de muito tempo para criar o layout.Gravou a imagem em CD e correu para agráfica expressa mais próxima de sua casa.

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Cem cartazes ao todo e várias mãosfemininas dispostas a ajudar na empreitada.Afinal, nenhuma garota do último ano vaicom a cara das Kibis. Elas roubamnamorados, beijam todos os garotos e aindadestroem a autoestima das meninas sempreque podem. Alguém precisava fazer algumacoisa e essa pessoa finalmente haviaaparecido: Nina.

A mulherada do último ano chegou maiscedo ao colégio naquela manhã nublada.Nathália havia desligado as câmeras desegurança e Nina distribuiu os cartazesautoadesivos. Cem cartazes foram coladosnas paredes do segundo andar do colégio evou dizer: era impossível arrancar aquilosem detonar com a pintura. Quando as Kibischegaram ao Prisma, o tempo fechou.

Os cartazes eram gigantescos e Nina não étão má quanto vocês imaginam. Ela poderiater usado a foto na íntegra, mas não o fez.Estrelinhas mínimas cobriam as partesíntimas das três garotas. A fotografia estavacentralizada num fundo preto, destacandobem a imagem. Acima, em letras garrafais, otítulo gritava: “KIBISCATES”. O termo foi

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inventado por Lais e Nina, numa dessastardes em que não há nada para se fazer.

— Sua vaca! Foi você, não foi? – Bárbaragritava, apontando o dedo de unhas douradasna direção de Nina, enquanto Susana e AnaPaula choravam, descompensadas.

— Prove. – Nina mantinha um sorrisodesafiador nos lábios.

— Eu sei que foi você! – Bárbaraaproximou-se, pronta para estrangular agarota.

— Nem pense nisso. – Lais tomou a frentede Nina. Foi o que bastou para as outrasmeninas fazerem o mesmo. – Para chegaraté ela, terá que passar por cima de todasnós.

Ops. A coisa ficou feia para as Kibis. Trezegarotas contra três? Quem compraria umabriga dessas?

Os garotos apenas riam, doidos para que oquebra-pau começasse. Mas não houve nadaalém de insultos e xingamentos. E issotambém acabou quando o diretor,acompanhado de vários professores, entrouno corredor do segundo andar.

— Se você não me deixar em paz, libero a

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foto original para todos os celulares docolégio, entendeu? – Nina sussurrava paraBárbara, entredentes.

Bárbara não respondeu. Suas bochechasestavam vermelhas e não era pelo excessode blush.

A passos largos e irritados, o diretor acaboulogo com a balbúrdia. Os professoresinterpelaram os estudantes, mas felizmente,não havia provas contra Nina e ninguém adedurou. Nem os garotos tiveram coragempara tanto.

Após um tempo longo demais, ficouacordado que os cartazes seriam retirados –com espátula – por todos os alunos do últimoano e o corredor seria repintado, também poreles. E assim foi feito, num fim de semanapara lá de divertido. Não para as Kibis,obviamente.

Bárbara poderia ter chamado os pais, masrecuou só de pensar na cara do seu velhotendo que encarar aquela foto. Como ela iriase explicar? Não, isso seria humilhantedemais. Mas essa história não terminarianaquele corredor cheio de cartazesautoadesivos. Oh não.

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E Bárbara, com a ajuda de Lex, dará otroco à altura.

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Treze: O quartel general de NinaEstamos no quartel general de Nina, ou

melhor, em seu quarto. Você pode até pensarque com a personalidade forte da garota, oquarto não seja um lugar feminino eaconchegante. Engano seu.

Esse é o reduto de uma garota de dezoitoanos que, apesar de ter se convencido de quefinais felizes não existem, lá no fundo do seuser acredita sim em príncipes encantados. Sónão contem que eu a dedurei, ok? Ou o meurostinho sofrerá as consequências.

O quarto não é rosa ou lilás. É azul, comlambris brancos até a metade da parede.Vários pôsteres de Romero Britto estãofinamente emoldurados, dispostos demaneira linear na imensa parede que leva aobanheiro.

O guarda-roupas possui portas de correrbrancas, vazadas em acrílico transparente.As roupas penduradas nos cabides dão umcolorido todo especial ao ambiente.

Do teto, pende um imenso lustre de ferro,daqueles rústicos com pintura em pátina.Pranchas de snowboarding fazem as vezes deprateleiras, pregadas uma sobre as outras,

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sustentando todos os livros já lidos por Nina.No lugar da cabeceira da cama, um nicho

de acrílico foi confeccionado para exibir aimensa coleção de óculos de sol e relógios depulso, duas paixões da garota. Sobre a camabox, uma colcha prateada está estendida,com várias almofadas em formato deinstrumentos musicais para decorar.

Numa outra parede, a guitarra e o violãoestão pendurados em ganchos sobre apoltrona de fuxicos multicoloridos. Nabancada da janela, o notebook está aberto ea foto de Lex berra em cores.

Nina, sentada em uma cadeira laranja derodízios, analisa detalhadamente a tal foto.Nathi e Lais estão jogadas sobre almofadascoloridas espalhadas pelo chão.

— Sério, qual foi o seu intuito ao lançaressa aposta? Ainda não me convenceu sobreo lance de humilhar o Lex. – Nathi ajeita osóculos de aro vermelho sobre o pequenonariz.

— Ah, qual é, Nathi. Não seja estragaprazeres. A diversão só está começando. –Lais brinca com as franjas da almofada.

— O cara precisa de uma lição. É um

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babaca com o ego inflado. – Nina recosta nacadeira, imaginando o rosto na tela comosendo um alvo. Ainda fantasiando, ela lançauma flecha invisível bem pontiaguda no meioda testa de Lex. – Certo, Nathi, releia ocontrato. – pede Nina, com o olhar glacialfixo na tela do computador.

— Vamos lá. – Nathi pega o papel e limpa agarganta, iniciando a leitura:

“Pelo presente contrato, fica acordado queNina Albuquerque e Alexandre Heinrich,

ambos maiores de idade, aceitaram participarda Grande Aposta do Colégio Prisma.

“Cláusula Primeira: Nina e Lex firmam opresente contrato, tendo como objeto a

aposta Jogo de Sedução, em que Lex fará detudo para conquistar Nina em um período de

sete dias, tendo como cenário a IlhaInamorata.

“Cláusula Segunda: É expressamenteproibido seduzir através de substâncias

ilícitas ou mesmo sob efeito de álcool. Emqualquer um dos casos, a aposta seráencerrada e Nina será a vencedora.

“Cláusula Terceira: A aposta estará valendo apartir do momento em que Nina e Lex

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pisarem as areias da Ilha Inamorata e seutérmino acontecerá quando a ilha for deixada

para trás.“Cláusula Quarta: Caso Lex vença a aposta,

receberá o valor de R$ 6.000,00 de NinaAlbuquerque. O cheque preenchido já está

com o banqueiro Arthur Gancho e seráentregue ao vencedor apenas quando

retornarem de viagem.“Cláusula Quinta: Caso Nina seja a

vencedora, a humilhação pública de Lex seráo seu pagamento.

“Sem mais, as assinaturas reconhecidas emcartório tornam o contrato válido.”

— Juro por Deus, ainda não acredito queisso está acontecendo. – Nathi finaliza aleitura, tirando os óculos.

— Isso vai ser tão divertido! – Lais batepalminhas afetadas. – Entre no clima, suachata! – ela bate no braço de Nathi, quemantém a expressão fechada e preocupada.

— Vencerei essa aposta, Nathi. Então, qualé o problema? – Nina coloca o computadorpara dormir e gira a cadeira para encarar asamigas.

— O Lex é um tipo irresistível, Nina. Acha

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mesmo que será fácil? Ele vai usar todas asarmas de sedução que conhece, o que nãosão poucas. – Nathi balança a cabeça, certade que a amiga está em apuros.

— Acha mesmo que eu posso me apaixonarpelo Lex? Enlouqueceu? – Nina se altera.

— Acho sim. Esse é um jogo perigoso evocê está brincando com fogo. – Nathidispara.

— Pare com isso, Nathi. Eu aposto todas asminhas fichas na Nina. E, sinceramente, achoque essa será uma viagem hilária. – Laissolta uma sonora gargalhada.

— Depois não diga que não avisei, tá legal?– Nathália se levanta, guardando o contratodentro de uma pasta transparente.

— Não vai acontecer, Nathi, eu juro. Depoisdo que passei com aquele cachorro do Bruno,estou imune. – Nina entrelaça as mãos atrásda cabeça.

— Será mesmo? – a dúvida de Nathireverbera no ar.

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Quatorze: O quartel general de LexEstamos no quartel general de Lex, aquele

mesmo quarto zoado com cheiro de incenso egarotos. Hoje Lex acendeu um bastão depimenta e Gancho não para de espirrar.

As duas janelas estão escancaradas e umabrisa fria sopra as cortinas, derrubando ocontrato no chão laminado.

Gancho está fuçando nas prateleiras feitascom shapes de skate. Notaram algumasemelhança com o quarto de Nina? Sinistro.Eu poderia dizer que se trata de uma meracoincidência, mas não me parece correto, atéporque não acredito em acaso. Algo me dizque esses dois combinam mais do que podemimaginar.

Lex se abaixa e recolhe o contrato,colocando-o sobre a bancada. Um peso depapel, no formato de guitarra, não deixa opapel sair voando novamente.

— O que está procurando? – Lex pergunta,jogando-se na cama e pegando o violão aolado. Começa a dedilhar um som do DeepPurple.

— Aquela sua caixa de alfinetes. – Ganchofaz uma pausa. – Ah, aqui está.

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— Para que você quer isso?Gancho não responde. Caminha até o

quadro de cortiça de Lex, com vários post itscolados. Arranca todos e deixa a cortiça nua.Em seguida, saca algo do bolso e alfineta noquadro. Quando se afasta, Lex dá um pulo nacama.

— Onde conseguiu essa foto?— O Bola me arrumou. – Gancho pega uma

cartela de adesivos sobre a bancada, descolaum alvo e fixa-o sobre o peito de Nina, naaltura do coração. – Precisamos descobrirtudo o que pudermos sobre ela. Esse é oúnico caminho para o coração da gata.

Gancho se afasta alguns centímetros,tombando a cabeça de lado. Deixa um sorrisoescapar ao analisar a foto. Foi tirada pelocelular do Bola, no Halloween. Na imagem,Nina empurra Hulk sobre um balde debebida. O cara, com quase dois metros dealtura, da largura de uma jamanta, estácongelado no ar, prestes a cair sobre pedrasde gelo. A expressão da garota é o retrato dairritação desmedida. Ao se lembrar da cenaem detalhes, um arrepio sobe pelas costas deGancho e ele se vira para encarar Lex, com

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cara de pânico.— Certo, essa é uma missão impossível.— Agora que você sacou isso? – Lex joga as

mãos para o ar. – É tudo culpa sua, só paraconstar. – ele mira o indicador na direção deGancho.

— Man, eu não queria estar na sua pele. –Gancho provoca.

— Vá se ferrar! Você me colocou nessaenrascada e vai me tirar dela, Cabeçudo.

— Precisamos arrancar da Nathi e da Laisqualquer coisa sobre a Nina. Eu já vasculheia internet e a garota não está em nenhumarede social, nem no Facebook. Nunca vi umagarota que não está no Face.

— Estamos falando de Nina Albuquerque,Gancho. Ela não é uma garota, é o diaboencarnado.

— É, pode crer. – Gancho observa asestrelas piscantes do lado de fora da janela.Bem que uma ideia poderia cair do céu nesseexato momento. – A Nathi e a Lais nuncacontarão nada sobre a Nina para nós.

— Cara, você é tão esperto para umascoisas e tão burro para outras.

— Do que está falando? – Gancho eleva o

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tom de voz.— A Nathi está caidinha por você, seu

otário. – Lex desliza para fora da cama ebate com a mão espalmada na testa deGancho. – Só você ainda não percebeu isso.

— Como é? – Gancho engasga, soltando umespirro quando Lex acende outro incenso. –Porra, apaga isso!

— Esse é de camomila, para acalmar. – Lexjoga o isqueiro sobre a bancada,displicentemente. – O fato é que a Nathi estáapaixonada por você e acho que ela contarátudo o que queremos saber, se você largar deser um trouxa, obviamente.

— Tem certeza disso? Man, como eu nãopercebi antes?

— É como eu disse: você é um otário.

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Quinze: O quartel general de BárbaraAs Kibis estão reunidas no quarto de

Bárbara, a Kibi Mor.Confesso, esse é um ambiente que eu não

imaginaria nem em mil anos. O quarto é cor-de-rosa, daqueles enjoativos eextremamente chatos. Barbies decolecionador estão em pé sobre pedestais naprateleira mais alta que, por uma escolhainfeliz na cartela de cores, é de um pinkberrante.

Eu diria que esse é um reduto de princesasmimadas, daquelas que se acham as maisbelas entre as mortais. O dossel balançaquando Bárbara deita na cama, abraçandouma almofada em formato de coração. Amala rosa chiclete está aberta ao seu lado.

— Acho que está fazendo besteira, Babi. Ese o Lex acabar se apaixonando pela Nina? –Suzana levanta a questão.

— Qual é. – Bárbara dá uma gargalhadagutural. – Isso é impossível!

— Hum, não sei não. – Ana Paula abre osaco de mini cenouras e puxa uma para fora,roendo-a.

— Fiquem tranquilas, sei o que estou

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fazendo. – Bárbara apanha algo na mala. Éuma câmera digital profissional, com o zoomóptico mais potente do mercado. Alisa amáquina com um olhar sombrio.

— Não vai nos contar qual é o plano? -Suzana está curiosíssima.

Essas três amigas são daquelas que sevestem da mesma forma, usam o mesmocorte de cabelo e já planejam a lipoaspiraçãoe o silicone assim que completarem dezoitoanos.

Das três, Ana Paula é a única que nãonasceu com a genética boa e, com qualqueralface a mais, costuma engordar. Por isso,mantém uma dieta rígida, à base de frutas,verduras e legumes. De vez em quando,escondida de todos, come uma caixa dechocolates sozinha.

Sempre que sofre de ataques decompulsão, Ana coloca tudo para foraminutos depois. Ninguém sabe sobre isso eela não contará, nem sob tortura. Seuscabelos ao natural são castanhos, mas nemmesmo ela se lembra da cor oficial. Hojeestão tão loiros quanto os de Bárbara eSuzana. Para que o contraste não seja

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gritante, costuma descolorir as sobrancelhastambém.

Suzana é a única loira natural dentre astrês. Ainda assim, costuma ir ao salão a cadaquinze dias para retocar as mechas maisclaras. Não é alta, mas também não é baixa.O corpo é esguio e apesar de não terfacilidade para ganhar peso, prefere seabster de comer. Coisa estranha.

Já Bárbara possui um corpo fenomenal. Ascurvas são bem desenhadas e não sustentamum buraco de celulite sequer. Malha duashoras por dia, sete dias na semana. Para ela,imagem é tudo.

Mas Bárbara não é o que chamaríamos demulher bonita. É um mulherão construído àbase de suor, truques de maquiagem eplásticas faciais. Sabe aquela figura que sedestaca no meio da multidão? Aquela paraquem os pedreiros assobiam e osmotoqueiros quase se matam no trânsito?Essa é Bárbara, a Kibi Mor.

— O plano é fotografar a vadia em cenascalientes protagonizadas com Lex Heinrich. –Bárbara sorri altiva, certa da vitória. – Dareio troco a altura, tenham certeza disso.

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— Como pensa em conseguir algo assim? –Ana pega só mais uma cenoura. Qualquercoisa, ela sempre pode vomitar.

— Teremos sete dias para isso na ilha e oLex está disposto a ajudar. – Bárbara alisa acâmera como se fosse um bichinho deestimação.

— Isso é demais até para o Lex. – Suzanamira Bárbara, com um tom preocupado. –Acha mesmo que ele levará isso adiante?

— Dará certo, vocês vão ver. – Bárbara selevanta e inicia a arrumação da imensanecessaire.

— Algo me diz que você nunca vai parar dechantagear o Lex, estou enganada? – Anafecha o pacote de mini cenouras e o jogapara Suzana. – Mantenha essas cenouraslonge de mim!

Com um sorriso maligno, Bárbara gira nosalto alto e encara as amigas. Seus olhoscastanhos se estreitam de formaassustadora:

— Esse vídeo do Lex surgiu no momentoperfeito. Nos vingaremos da vagaba da Ninae de quebra, conseguirei meu namorado devolta.

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Dezesseis: Um dia para a viagem deformatura

Nina está de malas prontas.Ajeita a bainha de tule do vestido preto e

calça as sapatilhas coloridas com strass.Nathália e Lais aguardam no andar de baixo,na companhia de Doc e sua turmabarulhenta.

A galera toda irá na inauguração doAquarium, uma boate na Vila Olímpia, emque um dos sócios é amigo de Doc. Osconvites para a ala VIP foram disputados àtapa e o irmão de Nina conseguiu dez deles,na faixa.

A garota borrifa o perfume nos pulsos etambém atrás das orelhas. Dá uma últimaolhada no espelho antes de descer paraencontrar as amigas.

Os pais de Nina foram ao cinema e a turmade Doc está espalhada nos sofás e sobre abancada de mármore travertino da cozinha.Várias latas de cerveja se empilham na pia esacos de amendoim e batatas fritas estãoabertos sobre as mesinhas de apoio.

Lais e Doc conversam num canto, próximosdemais. Nina os encara com curiosidade. Já

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tinha percebido um clima, mas não faz ideiado que esteja rolando entre esses dois.

— Pronta? – Nathi dá um pulinho ao verNina. – Uau, Nina, esse vestido é um arraso.

— O seu também. – Nathália está usandoum vestido azul de alça única, na altura dosjoelhos, de um tecido bem estruturado. Orabo de cavalo foi feito bem alto e algumasmechas castanhas escapam, emoldurandoseu rosto cheio de sardinhas fofas.

— Todo mundo por aqui? Podemos ir? – Docrecolhe os sacos de salgadinhos espalhados.

Nina observa Lais que permanece recostadana parede, no outro canto da sala. A amigaestá deslumbrante num vestido estiloindiano, com a cintura marcada por um cintode camurça. Um imenso colar prateado pendede seu pescoço e nos pés, chinelos commiçangas pretas. O cabelo avermelhado, bembatido na nuca, sustenta duas presilhaslaterais que prendem a franja. Nina nota queLais está usando o bracelete de níquelenvelhecido que compraram juntas, na feirade antiguidades da praça Benedito Calixto,na Vila Madalena.

— É impressão minha ou a Lais e o Doc

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estão…? – Nina se vira para Nathi e nãotermina a frase.

— É, eu também percebi um clima. –Nathália balança a cabeça em concordância.

— Hum. Acha que devemos perguntar?— Deixe ela nos contar. – Nathi tira um fio

de cabelo do vestido de Nina. –Não ficariachateada?

— Por que eu ficaria chateada? – Ninafranze o cenho, confusa.

— Sei lá, é seu irmão e sua amiga. – Nathidá de ombros. – Não que isso seja grandecoisa, não é traição nem nada.

— Eu acharia muito legal, de verdade.~~***~~

O quarteirão do Aquarium está tomado porcarros de todas as marcas e modelos. Comisso, é óbvio que o trânsito está um caos.Uma imensa fila se forma do lado de fora daboate e a maioria das pessoas não faz nemideia de que sem um convite, nada feito.

As três amigas caminham juntas, de braçosdados, vencendo os dois quarteirões queseparam o único estacionamento com vagasda entrada do Aquarium. Lais não toca noassunto Doc. Nina e Nathi fingem não terem

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visto nada.Doc e sua turma vem logo atrás e como

todo bando de garotos, começam a se bater eempurrar a caminho da danceteria. Nesseinterim, uma Pajero recheada de meninassurtadas para ao lado dos garotos. Doc dátrela e Lais fecha a cara no mesmo instante.Nina sente as unhas da amiga fincarem emseu braço com força.

— Ei, não precisa arrancar a minha pele. –Nina estremece e Lais se sobressalta.

— O quê?— O que está rolando entre você e meu

irmão? – droga, Nina tinha prometido a simesma não perguntar.

— Nada. – Lais olha de esguelha para trás.Seus olhos azuis ficam opacos quando veemDoc e sua turma se derretendo para cima dasmeninas da Pajero.

— Por sua causa ou por causa dele? – Nathise mete no assunto.

— Não está rolando nada, é sério. – Laissuspira tristemente.

— Se um dia rolar, saiba que dou todo oapoio. – Nina sente o aperto de Lais afrouxarde seu braço.

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— Obrigada, Nina. Mas é como eu disse:Não está rolando nada.

Finalmente chegam à entrada da boate eDoc e os caras se livram das garotasoferecidas, para alívio de Lais. Pepino saca osconvites do bolso e entrega ao segurança. Oengravatado confere a autenticidade dosmesmos e libera a entrada, carimbando ospulsos com uma tinta néon.

O Aquarium, como o próprio nome diz, éum imenso aquário, repleto de plantasaquáticas e animais marinhos diversificados.A danceteria é circular e cercada por paredesde vidro curvas, que tomam toda a extensãodo lugar.

Nina fica boquiaberta quando vê umaimensa arraia flutuando sobre sua cabeça,ainda não tinha percebido que o aquáriotambém se estende por todo o teto da boate.

As garotas seguem Doc por um corredorlargo, no ponto mais alto do Aquarium. É oúnico acesso para a ala VIP que não estácongestionado. A outra opção seria pelo meioda pista de dança que, no momento, estáabarrotada de cabeças saltitantes.

A música techno rola solta em meio aos

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efeitos especiais que vem de todos os cantosimagináveis. Uma névoa colorida sobe pelochão, abraçando as pessoas até a cintura.

A ala VIP está bem mais tranquila, comseus sofás imensos, mesas largas, um barprivativo e garçons circulando com bandejasrepletas de bebidas coloridas. Nina aproxima-se do parapeito de aço e dá uma sacada nolugar. O Aquarium é simplesmentefenomenal.

— Animada para a viagem de formatura? –Doc precisa falar alto para se fazer ouvir.

— Acho que será legal. – Nina responde, aopé do ouvido do irmão.

— Está finalmente deixando a adolescênciapara trás, Nina. É agora que a ralaçãocomeça e a vida adulta vai massacrar você detodas as formas.

— Ah, obrigada pelo incentivo! – Nina dáum tapa no ombro de Doc.

— Já sabe o que fazer caso algumengraçadinho resolva se meter a besta nessaviagem? – Doc pergunta, vincando a testa.

— Joelhada nas bolas, soco no nariz e… oque mais mesmo?

— Acerte no pomo de adão.

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— Ok, fique tranquilo, ninguém vai semeter a besta comigo.

— Ei, Nina, vamos para a pista? – Natháliachama. Nina percebe que Doc e Lais trocamolhares demorados e uma urgência emajudar inflama a garota.

— Vamos, Doc? – Nina convida, deixando abolsa sobre um dos sofás.

— Vamos para a pista, galeraaaaa?! – Docgrita e Nina revira os olhos, tapando osouvidos.

~~***~~Chegar à pista é uma maratona suada,

apertada e acotovelante. Com algunsempurrões, os amigos de Doc conseguemabrir espaço para dançar.

O olhar de Nina é atraído para cima a todoo momento, o colorido do aquário sobre suacabeça é inebriante.

Gente bonita e suada pula ao som do DJ.Nina corre os olhos pela pista, observandorostos descontraídos e maquiagensescorrendo. Não é do tipo que curte baladascomo essa, mas adora uma novidade. Ela nãoperderia essa inauguração por nada.

Quatro músicas depois e a garganta

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queima, ressequida. Voltar à ala VIP estáfora de cogitação. O bar mais próximo fica auns seis metros de onde estão. Grita nosouvidos de Nathália e Lais, doida porqualquer coisa líquida. As amigas concordam,seguindo na frente.

— Onde vão? – Doc pergunta.— Pegar água. Quer? – ela oferece, por

sobre o ombro.— Não, valeu. Já sabe, hein… pomo de

adão. – Doc recomenda.— Pode deixar. – Nina ri e segue para o

bar.Passar entre pessoas pulantes e bêbadas

não é tarefa das mais fáceis. Nina desvia, tirao pé do caminho, é empurrada e empurratambém. O lugar está claustrofóbico e a bocade Nina está tão seca que nem a língua écapaz de umedecer os lábios.

Uma mão toca em seu ombro e a puxa paratrás.

— Ei, pensei que sereias não existissem. –um garoto sardento e até bem bonitinhoexclama. Mas a cantada é tão demodê queNina dispara a rir.

— Sereias costumam afogar garotos como

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você, sabia? – ela rebate.— Faria isso comigo, sereia? Qual o seu

nome, hein?— Se eu disser o meu nome, terei que te

matar. – Nina tenta se desvencilhar, mas ogaroto sardento aperta seu braço com força.– Será que dá para me soltar?

— Pague o pedágio que eu solto. É só umbeijo, você vai gostar.

Quando o garoto sardento aproxima-seperigosamente, uma mão forte surge emcena, agarrando Nina pela cintura.

Ok, congelemos o momento para umaanálise mais profunda.

São Paulo é uma cidade gigantesca e aschances de encontrar alguém conhecidonuma balada são nulas, correto? Engano seu.Apesar de Sampa ser uma megalópole, asbaladas são sempre as mesmas, divididas embairros, classes sociais e estilos. As chancesde encontrar alguém conhecido numainauguração desse porte são imensas. Nemvou entrar nos méritos do destino em ação,porque sei lá, tem isso também.

Descongelemos o momento em 3, 2, 1…— Dá o fora, mané! – Lex empurra o

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sardento.— Não me disse que estava acompanhada,

sereia. – o garoto fecha a cara e solta Nina.— E não estou! – o tom dela é agressivo,

metralha Lex com um olhar irado.— Nesse caso, dê o fora você, manezão! –

o sardento vira homem, pega o braço de Ninae a puxa para si.

O sangue de Lex sobe nas alturas e eleempurra novamente o sardento, com maisforça dessa vez. Nina nota que Gancho seaproxima. O sardento quer briga e Lexparece querer o mesmo. Ela está entre eles eresolve apaziguar os ânimos.

— Pare com isso, Lex! – Nina precisa gritarao pé do ouvido do garoto, o que se mostrauma péssima ideia. O aroma dele é umamistura de mistério e sedução que faz suaspernas bambearem.

— Dê o fora, eu já falei! – Lex fecha opunho no colarinho do sardento.

— Ei, ei, ei! – Gancho finalmente chega. –Vamos deixar disso, beleza? – Gancho é daturma do “deixa disso”, mas, quandoprovocado, é da turma do “vamos matar todomundo”. – Leve a Nina daqui, Lex!

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— Não vou com você a lugar algum! – Ninatenta se livrar de Lex, mas o garoto é maisforte. E da forma como ele a está abraçandono momento, nem joelhada, nem soco, nempomo de adão surtirão efeito.

Nina procura as amigas no meio da muvucae as encontra. O bar fica um nível acima eambas estão acompanhando o que estáacontecendo na pista de dança, atônitas. Laislevanta as duas mãos para o teto, nãoentendendo nadinha do que está rolando.

— Ande logo, sem reclamar. – Lex passaNina à frente, prendendo-a como se fosse umescudo protetor, obrigando-a a andar emdireção ao bar.

— Me solte, Lex!— Quietinha, Nina, ou não ganha sorvete.

– Lex sussurra em seus ouvidos e ela sente ohálito de Mentos de frutas do garoto. Mentosde frutas é golpe baixo.

— Isso não vai ficar assim!— Já disse, fique quietinha.— Me larga! – ela grita e cerra os punhos.— Pronto, sã e salva. – Lex finalmente

afrouxa e Nina gira sobre as sapatilhas,pronta para socá-lo. Mas algo a detém. Os

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olhos dele, tão dourados quanto o sol. Tãobrilhantes como lavas de um vulcão emerupção.

— Eu sei me defender sozinha! – elaexclama, inflamada de ódio.

— Eu vi. – Lex debocha.— E aí, galera! – Gancho chega num pulo e

passa o braço sobre ombros de Lex.— Deu um jeito no sardento? – ele

pergunta, sem desviar os olhos de Nina.— O cara vai ficar sussa. – Gancho elucida,

soprando a franja para cima.— Oi, Gancho. – se Nathi fosse uma

geleira, já estaria derretida no chão.— Oi, Nathi, oi, Lais. – Gancho

cumprimenta.— Pegaram água? – Nina sustenta o olhar

de Lex com sua famosa expressão “vou matarvocê” impressa no rosto.

— Pegamos. – Lais responde. – Vamosvoltar para a pista?

— Fique longe de mim, Lex, eu estoufalando sério. – quando Nina tromba noombro dele ao abrir passagem, o garotosussurra em seu ouvido:

— Alguém já disse que você fica linda de

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preto?Nina não se dá ao trabalho de responder.

Range os dentes e continua a caminhar, semolhar para trás.

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Dezessete: O jogo começa no AquariumAs amigas estão dançando lado a lado,

embaladas pelo ritmo frenético da batidaeletrônica. O olhar de Nina se perde lá noteto, acompanhando um peixinho amarelo seesgueirar entre as folhagens. Como ele éfofinho.

— O que aconteceu lá atrás? – Nathipergunta, aos gritos.

— Um babaca queria me beijar. – Ninagrita em resposta, sem tirar os olhos dopeixinho.

— E o Lex chegou para salvar você? – aamiga surta.

— Menos, Nathi. Menos. – Nina revira osolhos, sacudindo a cabeça e voltando aatenção para o peixe que agora xereta umapedra lodosa.

Gancho chega sem aviso, tomando uma dasmãos de Nathália, puxando-a para dançarcom ele. Só então Nina percebe que do seulado direito, Doc e Lais estão dançandojuntos, tão colados que ela não sabe precisaronde começa um e termina o outro.

— Oi, Nina. – Lex chega por trás. Seusussurro aos ouvidos é quente e deixa

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rastros, arrepiando-a.— Tchau, Lex. – Nina dispara, sem parar de

dançar e sem olhar para trás.— Como tchau? Acabei de chegar. – Lex

acompanha Nina com o corpo, para lá e paracá, tomando o cuidado de não tocá-la. Elaprende a respiração por alguns segundosantes de dar o aviso:

— Não se aproxime mais ou vou soltar opitbull do meu irmão em cima de você.

— Quem é o seu irmão?— Bem ali. – ela aponta na direção de Doc

e Lais.— Hum, acho que seu irmão está ocupado

demais. – o nariz de Lex toca o pescoço deNina, inalando-a profundamente. – Cara, queperfume está usando?

— Lex, se manda. – Nina volta seu olharpara o aquário sob o teto. E o que acaba dever é o peixinho amarelinho fofinho sendodevorado por um peixe com o quíntuplo dotamanho. A natureza pode ser muito cruel.

— Me diga o nome do perfume e eu memando. – Lex, ainda às costas de Nina,encosta os lábios nos cabelos dela,prendendo-a pela cintura.

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Nina bufa, irritada. Sofrendo pelo peixeamarelo, gira nos calcanhares para encararLex. Aquele sorriso debochado está firme emseus lábios rosados e bem desenhados.

— Tire as patas de mim, a aposta sócomeça amanhã. – ela cerra os punhos esoca os braços de Lex. Ele a solta, mas nãorecua.

— Só quero saber o nome do perfume. –ele tomba a cabeça de lado, exalando seucharme característico.

— Hipnose. Está satisfeito? – os braços deNina tombam ao lado do corpo, vencidos. Seruma muralha o tempo inteiro cansa, é muitaenergia despendida.

O risinho debochado de Lex dá lugar a umsorriso lateral, desses em que apenas um doscantos do lábio se erguem. Aproxima-se,vagarosamente, seus olhos dentro dos deNina, os narizes quase se tocando.

A garota não se move, não ainda.Lex mira aquela boca volumosa e por um

momento, Nina sente vontade de fechar osolhos, as pálpebras custam a obedecer aosimples comando para permaneceremabertas.

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A barba por fazer de Lex pinica a pelelevemente e seus lábios roçam à orelhadireita dela. Nina estremece com aaproximação, mas não age impulsivamente.Aguarda.

Sente o calor de Lex envolvendo-a, inalaseu inebriante perfume, seus corpospróximos demais. Ele a inspira novamente edeixa um gemido escapar da garganta. Numsussurro melodioso, quente e destemido, Lexanuncia:

— Conseguiu o seu intento, Nina. Estoucompletamente hipnotizado por você.

Punhos cerrados.Sangue fervendo.Dentes trincados.Respiração alterada.Uma joelhada nas bolas.E, com passos para lá de decididos, Nina

caminha de volta para a ala VIP.

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Dezoito: No aviãoDepois da cena deprimente em que Nina

acerta Lex entre as pernas, de novo, os doisnão voltaram a se cruzar fisicamente noAquarium.

Ela o observou à distância e trocaramolhares durante a noite. Mas algo estranhoaconteceu quando Nina, dependurada noparapeito da ala VIP, viu duas garotas seaproximarem de Lex. Ele estava sozinho nobar.

Gancho e Nathi ainda dançavam no meioda pista. Lais e Doc estavam em um canto,agarrando-se no maior dos amassos. Elajurou ter visto a língua de seu irmão, mesmodaquela distância. Eca. Mil vezes eca.

Mas o lance é que Nina, ao se deparar coma cena em que Lex e as duas garotasengataram uma conversa animada, fincou osdentes no lábio, agarrando-se fortemente aoaço gelado que a separava da pista láembaixo. O que estava acontecendo com ela,afinal?

Foi então que dois garotos da turma de Lexchegaram e Nina sentiu um estranho alívio.Por que ela se importava? Por que seu

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coração batia de forma descompassada?Nina fingia estar olhando para outro lugar,

mas definitivamente ela não estava. Deesguelha, a garota acompanhava todos osmovimentos de Lex enquanto o tempo searrastava, cansado de correr.

Num determinado momento da noite, Lex amirou, descaradamente. Sorriu abertamentesacando algo do bolso da calça. Era umcelular.

Segundos depois, o iPhone de Nina queestava sobre a bolsa vibrou, saltitante. Ela opescou, deslizando o indicador sobre a tela.Uma mensagem de texto havia acabado dechegar. Quando a abriu, precisou segurar oriso. Uma carinha feliz piscava um dos olhospara ela, incansavelmente. Nathi tinha toda arazão sobre Lex: o cara é um sedutor deprimeira.

~~***~~O aeroporto de Congonhas já não

comporta, faz muito tempo, o fluxo depessoas que por ele passam. O check in estálotado e os estudantes fazem fila paradespacharem suas bagagens.

Nina, Lais e Nathália despedem-se dos pais,

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ouvem sermões e pedidos incessantes paraque tomem cuidado com tudo e com todos.Quem vive em cidades grandes costumatemer a própria sombra. E no caso de Nina,as preocupações dos pais não são nadainfundadas.

As garotas prometem mundos e fundos.Lais procura, por sobre os ombros de Nina,algum sinal de Doc. Mas ele não está ali, nãoveio se despedir.

— O Doc estava dormindo quando saímos.– Nina esclarece.

— Tudo bem. – Lais morde o lábio,entristecida. – Não pensei mesmo que elefosse aparecer.

— Meu irmão é um cara legal, Lais. Sevocês engatarem algo sério, juro que ele seráfiel até o fim.

— Bem, foram só uns beijos, nada demais.– Lais tenta se convencer disso, mas o fato éque a garota está de quatro.

— Não sofra por antecipação. – Ninaconforta a amiga.

— Olha quem fala!— Faça o que eu digo, mas não faça o que

eu faço. O ditado é válido. – Nina passa o

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braço sobre os ombros de Lais e as duas sejuntam a Nathália.

~~***~~Trinta e quatro estudantes e dois

professores acabam de completar o check in.O diretor está atento a tudo, enquantoresponde a mesma pergunta feita por quinzepais diferentes desde que chegou aoaeroporto.

Quando termina de atender a todos, voltaseu olhar para o encrenqueiro Fabiano, oBola. O garoto é mestre em armar confusõesnos locais mais inusitados. Os professores jáestão avisados e o diretor nem imagina doque ele será capaz em um local isolado comoa Ilha Inamorata. Se eu fosse esse diretor,teria dado uma de alfândega, revistando abagagem do garoto com cachorros,detectores de explosivos e tudo o mais.

Enfim, o diretor não pensou nisso. Pior paraele.

Nina caminha, de braços dados com os pais,até as portas que a levarão ao embarquedoméstico de Congonhas. Mais beijos eabraços e quando ela finalmente cruza oportal, a liberdade é uma promessa

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convidativa. Essa é a primeira vez que elaviaja sem os pais ou o irmão mais velho.

No colégio em que estudava, viagens assimforam proibidas quando um garoto explodiu obanheiro de um hotel. Nem posso dizer issoem voz alta, para não dar ideias ao Bola.

Uma voz metálica surge dos auto falantes,anunciando que o embarque do voo denúmero 711 terá início imediato. Trinta equatro estudantes sorriem. Dois professorestremem nas bases.

~~***~~O avião já está no ar há uma hora e meia.

Nina joga Mário no Nintendo 3DS. Laisquebra a cabeça com o sudoku no celular.Nathália lê um livro de novecentas e dozepáginas, avançando rapidamente na história.

Aviões são tão claustrofóbicos como latasde sardinha e o humor de Nina começa aoscilar. Não suporta ficar parada, é como seformigas mordessem a sua bunda. Desliga ovídeo-game e se levanta, doida para esticar ocorpo todo. As amigas nem percebem, de tãoentretidas que estão em seus afazeres.

— Se você se apaixonar por mim, saiba quenão poderei lhe dar filhos. – Lex tem essa

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irritante mania de chegar por trás,sussurrando no cangote.

Nina gira nos calcanhares e seus olhosesverdeados se encontram com os raiossolares de Lex. A garota sente umdesconforto no estômago e não é enjoo.

— Não bati tão forte assim. – ela franze oslábios, levando as mãos à cintura.

— Você não faz ideia da força que tem.— Se é assim, por que ainda está parado aí

na minha frente? – Nina estufa o peito elança seu melhor olhar fuzilante .

— Ops. Já estou indo. – Lex cruza as mãosà frente do corpo, como jogadores de futebolfazem ao montar uma barreira.

Nina não vê, mas eu vejo. Alguns bancosatrás, Bárbara imagina-se com uma granadaem mãos, prestes a tirar o pino e jogar abomba em direção à garota. A Kibi Mor rosnabaixo quando Lex passa por ela, sustentandoum sorriso debochado nos lábios. As palavrasde Suzana ecooam em sua mente: “E se oLex acabar se apaixonando pela Nina?”. Não,isso não pode acontecer. Não vai acontecer!

A caneta que Bárbara segura com as duasmãos se quebra ao meio, espalhando a tinta

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entre os dedos. Joga as duas metades nochão, desistindo de completar o testeamoroso da revista de fofocas. Suzana e AnaPaula se entreolham, assustadas. Vemchumbo grosso por aí.

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Dezenove: No ônibusDuas horas depois do desembarque,

finalmente o ônibus está pronto para deixar oaeroporto a caminho da balsa. Nathi e Laissentaram-se juntas e quando Nina ameaçousentar-se com Camila, Lex a empurrou parao banco de trás.

Ele praticamente a jogou em direção àjanela fechando a passagem. Para sair dali,Nina teria que pular por cima dele, o queestava fora de cogitação. Até pensou emgritar, mas os professores já estavamirritados demais com a zona, não seriaprudente.

— Você me paga, Lex. – Nina murmura,num rosnado selvagem.

— Relaxe e curta a paisagem. – Lexentrelaça os dedos atrás da cabeça, osorrisinho debochado já se desenhandonaquele rosto de traços perfeitos e perigosos.

Ela bufa e cruza os braços, deitando acabeça no vidro. Lex se esparrama ao lado,invadindo o seu espaço. Nina aperta amandíbula com força e tenta se afastar.Impossível. A perna do garoto roça na sua deforma irritante.

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Nina então cruza as pernas, colando-as nalateral do ônibus. Escuta a risadinha abafadade Lex e tem muita vontade de pular nopescoço do cara e asfixiá-lo.

— A aposta ainda não está valendo, seubabaca. – Nina insulta, furiosa.

— Eu sei. – Lex fecha os olhos e a inspira,como fez na boate. – Você me hipnotizou,agora aguente.

Nina sente um ardor subir pelas costas,mas não tem nada a ver com calor. O arcondicionado está bem acima de sua cabeça,lançando jatos gelados em sua direção. Lexse remexe, espalhando-se ainda mais. Estátentando provocá-la, mas ela não cairá nojogo.

Gancho se aproxima, com um violão emmãos. O ônibus dá uma sacudidela e o garotoprecisa se segurar para não cair.

— Ei, Lex, meu camarada, toque algo paranós. Ainda temos uma hora dentro dessebusão.

— Manda aí. – Lex estende a mão e Gancholhe passa o violão.

— Toque algo para agitar essa galera. Oque querem ouvir? – Gancho pergunta, aos

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gritos.— Heavy metal! – alguém dos fundos

responde.— Num violão? Tá chapado? – Gancho

revira os olhos.— Classic rock!— Aí já começa a melhorar. – Gancho

concorda, num meneio de cabeça.— Pagode!Nem preciso dizer que quem grita essa

barbaridade é o Bola, preciso? Gancho nemtem o trabalho de responder. Vários papéisamassados voam pelos ares, acertando ogordinho encrenqueiro.

Nina não tira os olhos da estrada. Árvorespassam, lagos passam, carros passam, oasfalto corre para lugar algum. De rabo deolho ela nota que Lex a encara,insistentemente.

— O que foi? – ela metralha.— O que quer ouvir? – Lex está afinando as

cordas do violão.— Quero ouvir você dizer que vai desistir

da aposta.— Hum… peça algo possível, Nina. – ele faz

uma pausa. – Qual sua banda preferida?

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— Não interessa.— Quero tocar algo para você. – Lex tomba

a cabeça de lado, falando de forma mansa, sópara irritá-la ainda mais. – Peça uma música,qualquer uma.

— Não quero ouvir você cantar. – elarosna, entredentes.

— Vai, Nina, qual sua banda preferida?Você deve ter uma.

Nathália, incrivelmente irritada com o bateboca entre Nina e Lex, tira os olhos do livro egrita, sem olhar para trás:

— Creedence! A Nina curte Creedence, pô!Agora será que dá para vocês dois calarem aboca?

— Valeu, Nathi! – Lex comemora. –Creedence Clearwater Revival. Quem diria,não? Você tem bom gosto.

— Seu tosco. – Nina gira a cabeça comraiva, seus cabelos acertando o rosto de Lex.

— Anda logo com isso, Lex, ou a galera vaidestruir o busão antes de chegarmos nabalsa. – a emergência no tom de Gancho fazo garoto se levantar. Apesar dos gritosinsistentes dos professores, Bola continua aser atacado por uma enxurrada de papéis

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amassados e chicletes mastigados.Lex coloca os pés no banco e se senta no

braço da poltrona, um tanto torto. Ajeita oviolão da melhor maneira, testando o som.

— Ok, pessoas, essa música eu dedico aNina, a garota selvagem. – quando Lexprofere essas palavras, a galera vai ao delírioe o ônibus sacode ameaçadoramente. Osprofessores voltam a gritar e a turma se cala,mas não por causa dos gritos professorais esim pelos acordes de Lex.

Nina engole lavas no lugar da saliva. Senteuma vontade imensa de pegar o violão dasmãos dele e quebrá-lo em sua linda cabeçade cabelos cacheados. Antes que possa darcabo de seu desejo inflamado, a voz de Lexinvade seus ouvidos, fazendo com que seucoração pare por um instante.

Meu Deus, a voz do cara é perfeita!Rouca, grave, sublime. Se Nina não

soubesse que era Lex quem cantava“Fortunate Son”, poderia jurar estar ouvindoo próprio John Fogerty. Ela não consegue seconter e olha para o cara.

Os dedos do garoto deslizam pelas cordas,tão suaves, envolvendo os fios como se

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estivessem acariciando o instrumento. Lexparece estar possuído por uma força mágica,mística, invisível. Se Nina pudesse ver auras,estaria vendo a de Lex se expandir nesseexato momento. Tão à vontade, inteiro,divino.

A forma como ele joga os cabelosencaracolados para trás, a maneira comosegura o violão, o jeito com que mexe oslábios…

Lex empolga a galera e quem conhece aletra, canta com ele, as vozes se fundindonuma só.

Os olhos de Nina não querem se desviar dacena, as pálpebras não estão a fim nem depiscar. Os ouvidos querem escutar mais emais e mais. Completamente hipnotizada, é oque ela está.

Que droga, pensa Nina. Vencer essa apostaserá mais difícil do que ela imaginava.

~~***~~Boa parte da turma já desceu do ônibus a

caminho da balsa. Nathália e Lais pegam asmalas de mão no bagageiro acima de suascabeças. Nina tenta fazer o mesmo e, aindaque na ponta dos pés, não consegue alcançar

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a raqueteira lá no fundo. Quando faz mençãoem subir no banco, Lex a breca.

— Deixe que eu pego. – com várioscentímetros a mais, ele pesca a alça da bolsafacilmente.

— Eu posso me virar. – ela rebate,visivelmente enfurecida pela ajuda.

— Largue de ser orgulhosa. – ele puxa araqueteira e comenta: – Hum, você jogatênis?

— Eu não jogo, eu humilho! – Nina, em suaarrogância típica, arranca a raqueteira dasmãos de Lex.

— É sério? Bom, nesse caso, eu desafiovocê para uma partida de gente grande.

Quem ainda está dentro do ônibus não secontém ao ouvir o desafio. Gancho, apóssoprar a franja para cima, solta o famosogrito de guerra:

— Apostaaaaaa!Se as pessoas pegassem fogo ao seu bel

prazer, o ônibus teria ido pelos ares nessemomento. Quem está do lado de fora, correpara dentro. Quem está dentro, não sairánem a pau dali.

— Está me desafiando, Lex? Perdeu a

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noção? – Nina o encara, destemida.— Você disse que humilha no tênis, então,

qual é o problema? – Lex escancara umsorriso debochado, sua marca registrada.

— Não sabe onde está se metendo. – elaestreita o olhar. – Vou acabar com você.

— Aposto que não. – Lex cruza os braços elança uma piscadela no ar.

— O que vão apostar? – Bola perguntaacima do murmurinho, limpando o resto dechocolate dos cantos da boca.

— É! O que vão apostar?— Tem que ser algo quente!— Aposta aí, Nina!— Vai mesmo se arriscar? – Nina empina o

nariz, numa superioridade intrépida.— Adoro me arriscar. – Lex revida, num

tom sedutor daqueles abrasadores.— Já que é assim, se eu vencer o jogo você

corta os pulsos, que tal? – Nina replica.— Poxa, peça algo que não envolva a

minha morte.— Ok, deixe eu pensar… hum, certo. Se eu

ganhar, você será meu escravo por um diainteirinho. O que acha disso? – Nina arrancagritos estimulantes da turma.

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— Seu escravo? Um dia inteiro? – Lex fingepesar a aposta. – Muito bem, se você vencer,serei seu escravo, farei tudo o que mandar.

— Aêêêêêêêêêêêêêêêê! – a manifestaçãodos estudantes arranha os ouvidos.

— E se o Lex vencer? – Gancho fixa Ninacom o olhar, por cima dos ombros do amigo.

— Ele pode pedir o que quiser, porque essejogo eu já ganhei. – Nina mantém umapostura triunfante.

Antes de responder, Lex umedece os lábios,deixando a expectativa no ar. O cérebro docara pensa rápido e seus lábios repuxam paraos lados com a brilhante ideia. Talvez eleleve um soco. Ou um chute. Ou as duascoisas.

— Se eu vencer, você vai me beijar. Delíngua. Por um minuto. Contados no relógio.

Ahhhhhhhhhhhhhhhhhhhh!É isso o que todos gritam ao ouvir a

proposta de Lex. Nathi e Lais se entreolham,perplexas. Gancho dá tapas no ombro doamigo, empolgadíssimo. Será que Ninaaceitará?

— Como você é babaca. – ela bufa eestende a mão. – Negócio fechado.

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Vinte: Na balsaÉ óbvio que o assunto em todas as

panelinhas formadas na balsa é a novaaposta do momento. Lex e Nina seenfrentarão amanhã, num jogo de tênis devida ou morte.

A garota está tranquila, certa da vitória.Nathi e Lais estão temerosas e cercam aamiga na proa, com os olhares arregalados.

— O que foi que você fez? Acha mesmo quepode vencer o Lex? – Nathi se enfeza com afrieza de Nina.

— Você cavou a sua sepultura. O Lex écampeão paulista de tênis. – Lais alisa afranja cor de fogo para trás, abalada com acalma da amiga.

— E daí? Sou campeã interestadual. – Ninadá de ombros, inclinando o corpo para afrente, apoiando os cotovelos no parapeito daembarcação. Seus cabelos castanhos voamcom o vento, emaranhando-se.

— Tá, mas o Lex é homem. Ele é mais fortee mais rápido. – Nathália pondera. –Caramba, Nina, essa aposta já está perdida.

— Ninguém é mais rápido do que a Nina naquadra. – Lais parte em defesa da amiga. –

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Quanto a ser mais forte, nisso você temrazão, Nathi. Ainda mais o Lex, com aquelesmúsculos saltados.

— Tênis não é nem força, nem velocidade.É estratégia. – Nina bate com o indicador natêmpora. – Eu vencerei, fiquem tranquilas.

— Droga, Nina, e se você perder? Jápensou na humilhação? Essa galera nãoperdoa. – Nathi recosta no parapeito,contrariada.

— Como não vou perder, nem pensareinisso. E fim de papo.

~~***~~Na popa da balsa, os garotos estão reunidos

em um círculo bem fechado. Até a brisa foiproibida de entrar. Gancho toma a palavra,inclinando-se para frente como se fossecontar um segredo:

— Galera, finalmente as apostas terãoinício. São quatro no total. – ele puxa ocelular do bolso e começa a leitura. – Nandoversus Camila. – Nando faz sinal de positivo.– Edgard versus Suzana. – Edgard assente. –Hulk versus Ana Paula. – Hulk solta umrugido contido. – E a grande aposta do ano:Lex versus Nina.

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Lex meneia a cabeça, negativamente.— O que foi, man? – Gancho une as

sobrancelhas.— São cinco apostas no total, Cabeção.— Ah, claro. O jogo de tênis. – Gancho bate

com a mão espalmada na testa.— Não é dessa aposta que o Lex está

falando. – Bola intervém.— E de qual aposta ele está falando? –

Gancho mira Lex, aguardando que o amigose manifeste.

— Gancho versus Nathália! – é Hulk quemelucida a questão.

— Vocês estão de sacanagem? – Ganchorecua dois passos, cambaleante. – Eu nãoapostei nada!

— Mas nós apostamos. – Bola dá umarisadinha irônica, balançando a cabeça comoum rapper em processo criativo. – E outra, aNathi está gamadona em você. Essa apostavai ser moleza.

— Seu bando de otários! – Gancho fecha acara, irritado. – Não vale!

— Já era, Cabeçudo, a aposta está valendo.~~***~~

Terra à vista!

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Uau. Mil vezes uau. O folheto publicitárionão fez jus a esse lugar. As três amigas estãoboquiabertas, assim como todos osestudantes do Prisma. Lex perde o ar eGancho tira o celular do bolso, fotografandotodos os ângulos de visão.

Deixe eu acotovelar essa galera para meposicionar melhor.

Ah, agora sim. Vamos começar com adescrição do mar: hoje as águas estãocalmas, de um azul tão claro e cristalino queé possível ver os peixes e as tartarugasabrindo espaço para a embarcação passar.

De uma ponta a outra, a praia Inamoratadeve ter em torno de dois quilômetros, ouseja, é praticamente um reduto particular. Asareias são brancas e fofas, num contrasteperfeito com os imensos coqueiros quearranham o céu.

Recifes de corais se espalham pelos cantose rochas gigantescas, talhadas pelas ondas,despontam para fora d’água.

Por detrás das árvores, é possível ver aentrada do Hotel Inamorata e sua absurda eestonteante piscina com duas cascatas. Ohotel cinco estrelas possui portas e janelas

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imensas, com os batentes pintados em umvermelho queimado. As paredes são brancascomo as areias e o colorido fica por conta dosdiversos jardins, que sustentam floresmulticoloridas.

Três elevações tomadas por um tapeteverde podem ser vistas da balsa e a naturezainspira uma única certeza nesses estudantes:essa será a melhor viagem de formatura deque o Colégio Prisma já teve notícia.

O píer se aproxima. Sobre ele, monitoresdo hotel acenam para a balsa, vestindocamisas floridas. Gancho puxa Lex para umcanto. O amigo o segue, a contragosto.

— O que é, Cabeçudo? – Lex pergunta,arrancando a camiseta e prendendo-a nabermuda.

— Sobre esse jogo de amanhã, é lógico quedeixará a Nina ganhar, certo? – Gancho sesenta sobre o parapeito da embarcação.

— É o lógico a fazer. – Lex concorda,jogando a cabeça para trás.

— Não é não. – de onde essa Kibi saiu?Bem, não faço a menor ideia, mas o fato éque ela está ali, com o celular em mãos, semconseguir tirar os olhos do peitoral

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desenvolvido e depilado de Lex.— Ah, meu Deus, era só o que faltava. –

Gancho eleva as mãos aos céus.— O que quer? – Lex pergunta, impaciente.

– E dá para tirar os olhos do meu material?Bárbara, desconcertada, desgruda os olhos

do tórax de Lex, mirando-o no fundo dosolhos.

— Quero que você ganhe o jogo, Lex.Quero ver a Nina humilhada. – Bárbaraestreita o olhar, franzindo os lábios etrincando o maxilar.

— Qual o seu intento, o que você ganhacom isso? Satisfação pessoal? Vingança? –Lex recosta na parede da embarcação,cruzando os pés e os braços.

— Não importa. Você cumpre a sua parte eeu cumpro a minha. – Bárbara ajeita o shortjeans que mais parece uma calcinha de tãocurto. E então, sacode o celular nas vistas deLex.

— Tá, já sei, vai mostrar o vídeo para omeu velho. – Lex revira os olhos, bufando. –Essa chantagem já está cansando, deverdade.

— Ganhe o jogo, Lex. – Bárbara avança

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para cima dele, como um cachorro raivoso.Ele não se move, aliás, nem estressa com aaproximação.

— E se a Nina ganhar de forma limpa? Elaparece jogar bem.

— Estarei assistindo e saberei se vocêentregou o jogo ou não. – Bárbara encosta amão num tonel sujo e faz cara de nojo. –Estamos entendidos? – ela limpa a mão nopeito de Lex.

— Ei, olhe mas não toque! – Lex se afasta eencara a Kibi com desdém. – É só isso o quequer? Que eu ganhe o jogo?

— No momento é só.— Então sai andando. – Gancho desce do

parapeito e começa a enxotar Bárbara, comose fosse um bicho asqueroso. – Vaza logo,anda!

— Não sabe com quem está mexendo,Gancho. – ela aponta o indicador para o narizdo cara, como se fosse uma arma.

— Sei sim, uma escrota de uma Kibi!Bárbara parte para cima de Gancho, mas

antes que algo aconteça, Suzana e Ana Paulaa seguram. De onde foi que elas surgirammesmo? Enfim, isso não importa. O que

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realmente tem importância é o fato deGancho ter entrado para a lista negra da KibiMor, o que o torna mais um alvo a serabatido.

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Vinte e um: A Ilha Inamorata— Bem-vindos a Ilha Inamorata! Serão

sete dias de praia, sol, aventuras e muitadiversão. Façam os seus check ins e vistamsuas roupas de banho para inaugurarmosessa estadia em grande estilo. Daqui meiahora, nos encontraremos à beira mar. – umdos monitores dá as boas vindas, munido deum megafone.

Nina, Lais e Nathália dividirão um mesmoquarto. As garotas estão em êxtase, semsaber para onde olhar. O quarto ésupercharmoso, com três camas boxrevestidas com colchas de retalhos coloridos.Há muita madeira, bambu e peças náuticasdecorativas.

Nina abre as portas duplas e descobre umavaranda fenomenal, com duas redes e umavista capaz de fazer o tempo parar. Estão nosegundo andar do hotel e possuem uma visãoprivilegiada da praia e da piscina.

Nina abre a mala e escolhe um biquínifrente única. A parte de cima é em tonspasteis, com formas geométricas. A parte debaixo é lisa, num verde pálido. A vestimentapossui uma espécie de cinto acoplado, com

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franjinhas arrematando o visual.Ela vasculha a bagagem em busca de uma

saída de banho e encontra uma perfeita. Foiconfeccionada em crochê, num tom de verdemais forte que o do biquíni. A peça foiadquirida há três meses, em sua última visitaao Embú das Artes.

Nathi escolhe um biquíni azul royal,supercomportado e de um tecido brilhante.Por cima, veste uma camisa de seda branca,com os botões parcialmente fechados.

Lais opta por um maiô preto bem diferente,todo aberto no abdômen e nas costas. Asfendas laterais são bem pronunciadas e elaestá um arraso. Uma canga indiana arrematao figurino.

— Querem chinelos para combinar? Eutrouxe uma mala cheinha. – Lais abre a malaazul sobre a cama e zilhões de chinelossaltam às vistas.

— Sério, Lais, você tem problemas. – Nathicomenta, procurando um chinelo paracombinar com seu biquíni.

— Eu também quero. – Nina encontra umchinelo verde, quase da mesma cor da saídade banho.

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Vestidas à caráter, as três seguem asinstruções do monitor-chefe e caminhamrumo a praia, descompromissadas. O passeio,todo de pedras brancas, é ladeado portulipas, jacintos, narcisos e várias outrasflores que Nina não reconhece. O aroma éinebriante e as garotas podem sentir a vidapulsando ao redor.

Lex está de costas e quando cutucado porGancho, se vira para olhar na direção em queo amigo aponta. Aos olhos do garoto, a cenatranscorre em câmera lenta:

três beldades caminham, graciosamente,pelo passeio de pedras brancas. Do ladodireito, Lais com seus cabelos cor de fogo eum maiô para lá de provocante. Do ladoesquerdo, Nathi com seu rabo de cavalo adançar e a camisa branca caída de lado,revelando um biquíni azul brilhante e sardaspara lá de sensuais. Caminhando ao meio, eisque vem Nina, trajando um biquíniincrivelmente sexy, que deixa à mostra abarriga extremamente lisa, as pernas bemtorneadas e um par de seios fartos, daquelescapazes de mandar um cara para a lona.

Gancho se apoia sobre o ombro de Lex,

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babando como um cão. Talvez o cara atéuivasse, se realmente fosse um cão.

As três estão sorrindo e conversando,totalmente alheias aos olhos que asacompanham até a praia. Quando finalmentealcançam as areias, arqueiam o corpo parafrente, tirando os chinelos.

A brisa do mar sopra com mais força e Lexpode ver maiores detalhes do corpaço deNina. Ela leva a mão aos cabelos, sacudindo-os. Quando retoma o caminho com o par dechinelos à mão, seus cabelos a seguem,esvoaçantes e altamente sugestivos. Lex seimagina tocando aqueles fios, embrenhando-se naquele pescoço, sentindo o aromadaquela pele que o atrai como um imãpoderoso.

— Caras, estamos no paraíso. – Bolacomenta e toma um tapão na nuca, desferidopor Gancho.

— Não ouse olhar para a Nathi, sacou?— E nem pense em colocar os olhos na

Nina, entendeu? – Lex arremata, sentindoum calor infernal subir pelas costas.

Bárbara está se mordendo de inveja,ciúmes e algo mais. Engole Nina com o olhar

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e não percebe quando arranca sangue dopróprio lábio ao fincá-lo com os dentes.Observa a reação de Lex à distância e o carasó falta cair de joelhos e rastejar. Patético.Isso não vai ficar assim, mas não vai mesmo!

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Vinte e dois: O mergulho de inauguraçãoNina desliza os óculos de sol para o alto da

cabeça. O olhar vagueia pela praia, detendo-se numa elevação distante, perfeita paraescalar. Talvez amanhã, em sua corridamatinal, dê uma olhada mais de perto nolocal.

Nathália não tira os óculos espelhados,somente assim consegue fitar Gancho semque o garoto perceba. Eles quase ficaramjuntos no Aquarium, mas não rolou. Lexprecisava voltar para casa mais cedo e osdois foram embora, deixando Nathi chupandodedo.

Lais não tem olhos para ninguém. Suamente está em São Paulo, relembrando osbeijos de Doc. Um suspiro saudoso escapa desua garganta. É quando Camila e as outrasgarotas se aproximam.

— Ei, Lais, viu aquilo? – Camila sussurra,apontando a cabeça para as Kibis.

— Fio dental? É sério mesmo? – Laiscomenta, boquiaberta.

— Essas três são completamente semnoção. – Nathi entra na conversa. – Elas nãopercebem que são ridículas? Que os caras

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tiram sarro e só querem aproveitar?— Não. Elas não percebem. – Nina julga,

acertadamente.— Muito bem, meninos e meninas! – o

megafone se faz ouvir. – Aqui temos bolas devôlei, óculos de mergulho e até boias debraços com formato de bichinhos. – omonitor aponta dois baús na areia. – Comesse mergulho inaugural, vocês estarãosendo batizados por Poseidon e as férias naIlha Inamorata oficialmente terão início.Aproveitem sem moderação!

Garotos arrancam as camisetas ebermudas, correndo desesperados para omar. As garotas são mais comedidas eprecisam de mais tempo para tirarem todosos acessórios e adentrar as águas cristalinas.

Nina deixa os chinelos na areia, dobra asaída de banho e verifica se tirou o par debrincos. Caminha ao lado das outrasmeninas, sem qualquer ansiedade aparente.

A água está morna e o sol começa a descerno horizonte. A cena é linda, digna de umOscar de melhor fotografia. Por um breveinstante, Nina se sente una com o todo. Maso momento passa e ela começa a se sentir

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incrivelmente só, apesar de estar cercada depessoas.

Os dois pés de Nina tocam a água. Elaobserva as pequenas ondas se formando,suaves e contínuas. A brisa sopra com força,acariciando a pele. É então que seus olhos seencontram com os de Lex.

Ele está de bermuda e sem camisa. Nadaque Nina ainda não tenha visto, já que Lexadora se exibir. Mas ver assim tão de perto éa primeira vez.

Os cabelos cor de mel estão molhados egotas salgadas escorrem pelo rosto, pescoço,tórax e braços. Lex chacoalha a cabeça egotículas brilhantes voam para todos oslados. Ele segura um par de óculos demergulho. Nina se detém, como se seus pésestivessem enraizados na areia.

— Não vai entrar? A água está ótima. – Lexse aproxima, vencendo a força das águas.

— Não com você. – ela se mantém nadefensiva, observando as amigas seafastarem.

— Qual é, eu entro com você.— Não. Fique longe, está bem?O olhar de Lex vai descendo pelo corpo de

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Nina. Ela nota que a respiração dele estáacelerada. As gotas de água o alisam demaneira fascinante e por um míserosegundo, ela gostaria de ser uma dessasgotas. Um arrepio lhe percorre a espinhaquando se dá conta desse pensamento.

— Tem medo de se apaixonar? – Lexmurmura, como se estivesse lendo a mentedela.

— Rá, rá! Vá sonhando. – Nina, resoluta, secoloca a caminhar. Ficar ali parada com Lexnão é uma boa opção.

O garoto não desgruda. Segue ao lado dela,provocando-a. Ele sabe exatamente comoirritá-la e ela está irritada por ele saber comoirritá-la. Conseguiram entender?

— Ali é um ótimo lugar para mergulhar. –ele aponta para algum local à esquerda. – Dápara ver uns peixinhos bem legais.

— Lex, me dê um tempo, tá legal? – a águajá bate na altura da cintura. Apesar do marestar calmo, Nina sente a correntezaempurrá-la para cima de Lex. Hum, seriamesmo a correnteza?

— Você é quem sabe. – ele suspira erecoloca os óculos. Grita qualquer coisa para

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Gancho e mergulha, nadando para longedela.

Novamente a sensação de solidão, deabandono. Nina fecha os olhos, buscandoentrar em foco. Lex não é nada para ela enunca será. Então por que está se sentindoassim? Por que essa vontade louca de que elevolte para encher o seu saco?

Lex não volta e ela se sente um lixo.

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Vinte e três: O jantar de boas-vindasEstamos agora à beira da piscina.

Candelabros presos nos galhos das árvores,criam uma atmosfera aconchegante eincrivelmente romântica. Uma grandiosamesa foi posta lindamente, com trinta e seislugares marcados.

O primeiro dia da viagem chega ao fim. Alua está alta no céu e a trilha sonora vem deum violão elétrico solitário e uma vozmelodiosa de um cara que não deve ter maisdo que vinte anos.

Nina senta-se entre Nathália e Lais. Comeuma salada de alface com tomates emorangos. A garota só percebe estar comfome quando leva a primeira garfada à boca.

Lex está do outro lado da mesa, apouquíssimos centímetros de distância. Vezou outra seus olhares se encontram, mas elenão parece ser o mesmo Lex. O que estáhavendo?

— Lançou mão da nossa estratégia do dia?– Gancho sussurra no ouvido do amigo.

— Fiz o que você disse. Não elogiei obiquíni nem o corpaço. Não foi nada fácil.

— E ela? – Gancho pergunta, um tanto

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afoito pela resposta.— Não sei dizer. Acho que ela ficou, tipo…— Decepcionada? – ele se apressa em

arrematar.— Essa é a palavra. Decepcionada.— Bom, muito bom, meu camarada! –

Gancho dá um tapa dolorido no ombro deLex. – Vamos levar essa estratégia adianteaté o jogo de amanhã.

O jantar transcorre sem incidentes e atéBola está tranquilo. A única traquinagem dodia foi jogar na piscina todas as cuecas deNando e Edgard, seus colegas de quarto. Maso garoto foi pego, como sempre. E foi elequem caiu na água, de roupa e tudo, pararesgatar as tais cuecas.

— Certo, pessoal. Depois do jantar,teremos torneios de poker e sinuca na salade jogos. Espero todos vocês por lá. – omonitor lança o convite.

Nina dispensa a sobremesa. Há umaurgência em ficar a sós para pensar na vida.Nathália e Lais se entreolham, preocupadas.Nina jura que está tudo bem e segue para apraia, sozinha.

— O que acha que está rolando? – Lais

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debate com Nathália, observando Ninacaminhar entre o passeio florido.

— Algo que eu já suspeitava. – Nathisustenta uma expressão endurecida.

— Acha que ela está, tipo, ela está…? – Laisse sobressalta com a possibilidade.

— Sim. Acho que ela está começando a seapaixonar.

— Não! Isso não pode acontecer! – Laisarregala os olhos, chacoalhando Natháliapelos ombros. – Não podemos deixar!

— O problema nessa história toda é que euacho que a Nina ainda não percebeu o queestá havendo.

Lex, sem camisa como sempre, observaNathi e Lais de longe. Procura por Nina entreos alunos do Prisma e não a encontra.Gancho também não a viu.

— Ela deve ter ido para o quarto. – o piratase apoia num taco de sinuca, aguardando avez de jogar.

— Vou procurar por ela, beleza? – Lexavisa.

— Man, lembre-se do que conversamos.Mantenha a estratégia. – Gancho aponta otaco para o nariz do amigo.

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— Beleza, Cabeçudo.O garoto demora um bocado para localizar

Nina. Quando a vê, sozinha, sentada na areiada praia, algo de muito ruim toma conta deseu peito. É um sentimento estranho, quasede infelicidade. Lex ignora a sensação e seencaminha para o local onde ela está.

Nina não percebe a aproximação. O uivo dabrisa é alto e contínuo. Seus cabelos estãopresos por um elástico colorido, esvoaçandocom o vento. Veste um short preto e umabata branca, caída na lateral do ombro,revelando parte do colo e das costas. O olharse perde em algum lugar do oceano.

Vazio.Nina nunca havia sentido o vazio antes.

Nem quando seu primeiro namorado partiusem dizer um tchau. Nem quando Bruno aenganou. Até o dia de hoje, ela não havia sedeparado com essa sensação.

Mas o vazio está ali e incomoda. Sufoca-ade forma intermitente. Um desespero tomaconta de Nina, uma ânsia que ela não sabede onde vem. Algo importante está faltando,algo essencial que preencha o vazio.

Lex senta-se ao seu lado, sem dizer

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palavra. Nina não se vira para ver quem é enem precisa. Já reconhece o cheiro dele adistância.

Abraçada aos joelhos, Nina permanececalada por um longo tempo. Além do ruído dabrisa do mar, pode ouvir a respiraçãocadenciada de Lex ao seu lado. Ela não temnada para dizer, está com preguiça até depensar. Mas, por incrível que pareça, osilêncio não incomoda. Ele é bem-vindo paraambas as partes envolvidas.

Após um tempo que não sei determinar,Lex corta o silêncio com sua voz rouca e umtanto preocupada:

— O que está havendo?— Hum? – Nina está perdida em seu vazio

interior, apenas existindo.— O que está acontecendo com você?

Nunca a vi assim. – Lex refaz a pergunta.— Não está acontecendo nada. – Nina

abraça as pernas com mais força.— Você está triste. – ele conclui.— É só… deve ser TPM.— TPM? Isso é um pleonasmo. – Lex ri da

própria piada, mas ao perceber que Nina nemse move, fica sério novamente. – Desculpe.

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— Você tem razão. Não precisa sedesculpar.

Ok, parem tudo. Estrelas: parem de piscar.Mundo: pare de girar. Tempo: pare de correragora mesmo!

— Está concordando comigo? Está doente?Com febre? – Lex leva a mão à testa de Nina.Antes de tocá-la, ela gira a cabeça paraencará-lo. O garoto recua, instintivamente,temendo um tapa, um soco, um cuspe, ouqualquer coisa que envolva violência física.Nada disso acontece.

— O que está fazendo aqui, Lex? Tem umtorneio de poker rolando lá dentro. Por quenão vai até lá? – o tom de Nina é um poçosem fundo.

— Escute, quer dar uma volta? – Lex fazuma pausa para pensar. – Acabo de me darconta de que não sei nada sobre você.Estudamos juntos há quanto tempo? Seismeses? – Nina confirma com a cabeça. –Pois, então, só sei que você curte Creedence,odeia pessoas que usem cuecas e é uma CDF.

— Lex, me poupe dos seus jogos essa noite,tá legal? Eu realmente não estou no clima,não estou a fim de me esforçar para

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humilhá-lo.— Pensei que era natural, que não

precisasse se esforçar para me humilhar. –Lex pega um punhado de areia, observando–a escapar por entre os dedos.

— Só essa noite, está bem? Prometo queamanhã voltarei a odiá-lo com todas asminhas forças.

Lex deixa o restante da areia se esvair.Bate uma mão na outra e se levanta numpulo. Encara Nina antes de lhe estender amão.

— Uma volta na praia, sem jogos, semaposta. – Lex aguarda, na mesma posição.

— Por que está fazendo isso? – ela hesita.— Venha.Contrariando todos os avisos mentais que

gritam “perigo extremo”, Nina aceita a mãode Lex. Enquanto levanta, livra-se da areiano short e nas pernas, seguindo-o até a beirado mar.

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Vinte e quatro: Um passeio à beira marA água vem e vai, molhando os pés de Nina

e Lex. Ela carrega os chinelos com uma dasmãos e a outra está no bolso. Os doiscaminham preguiçosamente, apenas ouvindosuas respirações. O ruído da brisa finalmentedá uma trégua.

Nina estranha suas sensações. Ao invés dese sentir tensa com a situação, está bem àvontade, como se caminhasse ao lado de umvelho amigo. Lex se abaixa e pega umaconcha fechada, jogando-a de volta ao mar.

— Qual faculdade vai fazer? – ele pergunta,limpando as mãos na bermuda.

— Medicina. – ela responde, um tantodispersa.

— Sério? Vai se especializar em quê?— Cardiologia.Lex não consegue segurar o riso. Nina

percebe, mas não se altera. Sabe em que eleestá pensando e torna isso público.

— Acha que não tenho coração. É isso, nãoé? – o tom de Nina soa um tanto deprê.

— É claro que você tem coração. Talvez elesó esteja meio congelado. – Lex tentaguardar o sorriso, mas é mais forte do que

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ele. O garoto aguarda uma reação de Nina,qualquer uma. Mas a reação não vem e elademora um pouco a falar.

— E você? O que vai fazer?— Música. Apesar do meu velho querer

muito que eu assuma seus negócios.— O que seu pai faz? – Nina tira o elástico

do cabelo, soltando as madeixas.— Ele compra e vende empresas. Falidas,

na maioria. Reestrutura o negócio e depoisvende por um preço exorbitante. Não queroisso para mim.

— Você é bom. Digo, tem uma voz incrívele manda muito bem no violão.

— Você acaba de me elogiar? Cadê ocinismo? – Lex toma a frente de Nina,encarando-a nos olhos. – Certo, você foiabduzida, só pode ser.

— Lex, estou sem forças para cinismo essanoite. Só isso, nada demais. E não, eu nãofui abduzida. Acha mesmo que eu deixariaum extraterrestre me zoar? Pense bem.

— O ET iria se dar bem mal.Nesse momento, cercados por um cenário

cinematográfico, com a lua e as estrelascomo testemunhas, Lex entreabre os lábios,

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deixando um suspiro escapar. Algo naquelagarota mexe com ele de uma maneiradiferente de todas as outras. Suas mãos sãotomadas por uma urgência em tocá-la, umapressa que ele não consegue controlar. Lextoma coragem, elevando uma das mãos emdireção ao rosto de Nina. Ela aguarda, semse mover.

— Ei, vocês dois!Observação 1: Sempre tem um mala para

atrapalhar momentos perfeitos.Observação 2: Poxa, é sério mesmo? Não

dá para voltar depois?Margareth, a troncuda professora de

educação física se aproxima, aos pulos. Amão de Lex recua, no susto.

— O que estão fazendo aqui sozinhos? –ela finalmente alcança os dois. – Nina! Vocêe o Lex juntos? Ele a obrigou a isso? – aprofessora une as sobrancelhas, segurandoNina pelo braço.

— Qual é, Mags, só estamos conversando. –Lex tem essa mania de dar apelidos a todasas pessoas.

— Garoto, você me irrita. – a professoravocifera, entredentes. – Nada de passeios

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noturnos, já conversamos sobre isso. Se nãoquerem ir para a sala de jogos, irão paraseus respectivos quartos, estamosentendidos? Não estou a fim de voltar comnenhuma adolescente grávida para casa.

— Não iria acontecer nada. É como o Lexdisse, só estávamos conversando. – QuemNina quer enganar? A si mesma, obviamente.Essa não era apenas uma conversa, Lexestava jogando o tempo todo. Ele iria beijá-lae a trouxa cairia, como uma pata manca. Aose dar conta da realidade, Nina finalmenteacorda do estranho sonho no qual estavametida.

— Que seja. – Margareth, com seu bafo decafé e dentes amarelados, mira bem o rostode Lex, apontando o dedo indicador como sefosse atirar. – Estou de olho em você, garoto.

— Mags, eu não fiz nada. – Lex levanta osbraços, desacreditando na reprimenda.

— Coloque uma camiseta, moleque, peloamor de Deus! Venha, Nina, eu a acompanhoaté o quarto.

E assim, Nina é escoltada até o seu quartoe um resignado Lex vai para a sala de jogos.Contrariando todas as projeções, o garoto

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perde todas as partidas no jogo de poker.

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Vinte e cinco: Antes do desafioBárbara confere as fotos que já conseguiu

de Nina e Lex. Suzana pluga o celular nocomputador, descarregando os vídeos.

Ana Paula está no banheiro, com ochuveiro ligado. Na verdade, ela estávomitando o café da manhã e não quer queninguém a ouça. Nem comentarei o fato detão absurdo que é.

— Droga, não temos nada realmentequente. – Bárbara deixa a câmera de lado.

— Escute, estou de saco cheio de ficarespionando por entre arbustos. Poxa, vamosaproveitar a viagem! – Suzana suspiratristemente, mirando o céu azul do lado defora do dormitório.

— Não viemos passear. Viemos para nosvingar. – Bárbara relembra. – E o nossoinformante? Alguma novidade?

— Nada ainda. Você vai mesmo cumprir oque prometeu a ele? Um beijo? – Suzana fazcara de nojo.

— É claro que não! Surtou? – Bárbara levao dedo à boca, como se fosse provocar ovômito. – Olhe, se não fosse a bafuda daMargareth, nós teríamos um bom material

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em mãos. O Lex estava prestes a beijar avagaba e então, a coisa poderia evoluir paraum tirar de roupas e tal.

— Babi, deixe essa vingança para lá.— Nem pensar! Se esqueceu da nossa

humilhação? Fala sério, Suze! – Bárbara selevanta num pulo, colérica.

— Não, eu não esqueci.— E tem outra: se não fosse o informante

que descolei, nós não saberíamos que você ea Ana são apostas. Eu salvei vocês duas, denovo. – Bárbara joga na cara de Suzana, deforma abrasadora.

— É, eu sei. – Suze abaixa a cabeça,submissa.

— Então, nada de desistir da vingança!— Tudo bem, você tem razão.— Eu sempre tenho razão!

~~***~~Nina, Lais e Nathália estão deitadas nas

espreguiçadeiras da piscina em companhiadas outras garotas. O sol queima a pele comviolência e Nina passa uma segunda camadade protetor solar.

Se vocês tivessem visto a garota na horaem que acordou, vislumbrariam olhos

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brilhantes em vermelho sangue e um sorrisoperigoso nos lábios. Sim, Nina Albuquerqueestá de volta! Adeus deprê!

— O que aconteceu ontem? – Nathipergunta, fechando o livro. – Quandovoltamos para o quarto, você já estavadormindo.

— Sei lá. – Nina dá de ombros.— Hormônios são uma merda. – Lais pega

um chapéu da bolsa, ajeitando-o sobre acabeça.

— Não são hormônios. – Nathália discorda.– Você está sucumbindo, Nina.

— Sucumbindo a quê? – o mau humor deNina dá as caras e uma sombra transpassaseu olhar. – O que acha que estáacontecendo, dona Sabe Tudo?

— Não me ataque, não sou sua inimiga. –Nathália, apesar de conhecer Nina há apenasseis meses, sabe lidar bem com o gênioexplosivo da amiga.

— Desculpe. – Nina relaxa os ombros e sedesarma. – Não sei o que aconteceu ontem.Eu fiquei um pouco triste, sem qualquermotivo.

— Tem a ver com o Lex, não tem? – Lais se

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levanta, sentando-se aos pés de Nina. – Podecontar para nós, somos suas amigas.

— Não tem nada a ver com o Lex. O cara éum babaca presunçoso e arrogante.

— Tome cuidado, está bem? Estamospreocupadas com você. – Lais franze oslábios, observando a reação de Nina.

— Eu sei, prometo me cuidar.Nesse momento, um bando de garotos sem

noção começa a correr em direção à piscina.Atiram-se como bombas para dentro da água.Apesar de terem se protegido, as garotasficam ensopadas.

— Seu bando de idiotas! – Nathi vocifera,segurando o livro molhado em mãos. – Vocêsnão tem nada melhor para fazer da vida,seus ridículos?

— Ei, Nathi, relaxa. – Gancho, com umabaita facilidade, ergue o corpo e sai dapiscina.

— Poxa, meu livro. – os olhos de Nathi seumedecem.

— Desculpe, Nathi. – Gancho se aproxima,arrependido pelo salto mortal. Joga a franjade lado no maior charme. Nathi deveria estarbabando na cena, mas a verdade é que está

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muito puta por causa do livro. – Escute,quando voltarmos para casa, lhe dou umnovinho.

— Não quero um livro novo, querocontinuar a leitura, pô. E olha só! – elasuspende o livro e as páginas pingam, comolágrimas.

— Que livro é esse? – Gancho o toma dasmãos da garota. – Caraca, ou você tem muitasorte ou estamos em sintonia. Peguei esseemprestado com o meu irmão, ainda nemcomecei a ler.

— Brincou? Você está com esse livro aí? –os olhos de Nathália brilham e um pequenosorriso surge em seus lábios retesados.

— Vamos lá no meu quarto que eu pego.— Sabe que não posso entrar na ala dos

meninos. – Nathi leva as mãos à cintura,batendo um dos pés no chão,cadenciadamente.

— Tudo bem, subo agora e pego para você.Só me descole uma toalha, beleza?

— Valeu, Gancho. – Nathi alcança a toalhae a coloca sobre os ombros do cara.

Nina e Lais estão abafando risadinhas.Nathália gira nos calcanhares, com cara de

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quem comeu e não gostou.— O que foi? – ela bufa.— Precisa de um babador? – Lais dá uma

gargalhada.— Humf! – Nathi se senta na

espreguiçadeira e finalmente descontrai,contagiada pelas amigas.

~~***~~Quando o almoço chega ao fim, o monitor

sobe em uma cadeira, limpa a garganta e faza pergunta, como um anúncio:

— Soube que hoje teremos um desafio detênis, é isso mesmo galeraaaaaa?

— Yeahhhhhhhhhhhhhh!!!! – a turma gritaem resposta.

— Nesse caso, a Caça ao Tesouro ficarápara amanhã. – o monitor busca Lex e Ninaentre os estudantes. – Vocês dois estãoprontos? O jogo começará às quatro da tarde.

Ambos fazem que sim com a cabeça. Seusolhos se cruzam e Nina, com o indicador,passa o dedo em seu próprio pescoço comoquem diz: “Vou degolar você”. Lex solta umagargalhada de deboche no ar, feliz por Ninater voltado ao seu estado normal.

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Vinte e seis: O jogo de tênisQuatro da tarde.Um dos monitores se aproxima de Gancho

e Lex, trazendo bolas de tênis e raquetessobressalentes. Despeja tudo sobre um bancolocalizado na lateral da quadra e dá asinstruções:

— Os monitores desafiaram os professorespara um jogo de vôlei de praia. E, comovocês estarão aqui, o jogo vai rolar agora.Ficarão de boa?

— Com certeza. – Gancho pega uma dasbolas e joga para o ar. – Fique tranquilo.

— Precisarão de um juiz, juízes de linha eboleiros. – o monitor continua.

— Já está tudo acertado e eu serei o juiz. –Gancho pega mais duas bolas e dá uma demalabarista.

— Certo. Qualquer quebra pau, você mechama. Bom jogo para vocês. – e batendonas costas de Lex, o monitor sai andando.

Nina, com a raqueteira pendendo doombro, cruza com o monitor que lhe desejaum bom jogo. Ela responde, afirmando queacabará com Lex e o monitor solta umasonora gargalhada, antes de retomar o seu

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caminho.Seguida pelas garotas do Prisma, com

exceção das Kibis, Nina traja um vestido lilásda Nike, desses bem curtinhos, especiais parajogar tênis. Por baixo, está usando umbiquíni rosa. Nos pés, os tênis desenvolvidospara saibro são tão brancos que chegam aferir os olhos. Nos pulsos, Nina sustenta duasmunhequeiras brancas e na cabeça, umatesteira também branca.

Conforme vai passando, os garotos lhebatem às costas, desejando sorte. Nina farámelhor, jogará como se sua vida dependessedisso. E depende, se pararmos para analisar.

Ela entra em quadra e não se digna a olharpara o adversário. Os estudantes tomamassento na pequena arquibancada, buscandoo melhor ângulo para assistirem ao confrontodo ano.

Nina abre o zíper da raqueteira, puxandoduas raquetes lá de dentro. Analisa ambas,pesando-as de forma impassível. Escolhe aBabolat por ser mais leve e guarda a outra.Confere as cordas e o overgrip. Tudo certo,aparentemente.

Nathi e Lais estão organizando o banco de

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Nina, deixando duas toalhas de rosto sobre abancada e conferindo o estoque de água noisopor.

Só então Nina se permite olhar para Lex.Ele está usando um short azul, meias

soquete e um Nike preto detonado parasaibro. Como não trouxe raquetes, confere astrazidas pelo monitor, optando por uma damarca Wilson. O cara está sem camisa, paravariar.

— Não vai jogar sem camiseta, vai? – Ninavence a distância que os separa e o encarade frente.

— Por que não? Ou meu tórax malhado vaidesconcentrar você?

— Rá! Seu tórax depilado vai me fazer rir,seu babaca. – Nina arranca risadas de Nathie Lais. Até Gancho curtiu a tirada da garota.

— Vá rindo. Lembre-se de que quem ri porúltimo, ri bem mais gostoso.

— Coloque a camiseta, Lex. – Gancho jogaa vestimenta por sobre o ombro do amigo.Ele a veste. É branca, cavada e deixa o caraincrivelmente sexy.

— Que vença o melhor. – Lex estende amão para Nina, lançando uma piscadela no

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ar.— Ou seja: eu. – Nina rebate com força e

olhem que o jogo ainda nem começou.Gancho assume posição. Nando e Edgard

seguem para a linha, serão os juízesassistentes. Bola e Hulk estão atrás dosjogadores, trabalharão como boleiros duranteo jogo.

Nina perde no cara ou coroa e a bola é doadversário. Ela então escolhe o lado daquadra. O sol está às suas costas, o quefacilitará muito a visão de jogo. Lex seposiciona, verificando as cordas da raqueteuma última vez.

— Certo. Terão dez minutos para seaquecerem. Competidores, batendo bola! –Gancho autoriza.

O bate e rebate é tranquilo, como deve ser.Na arquibancada, cabeças vão para lá e paracá, num movimento robotizado e hipnótico.As mãos de Nina suam mais do que o normale ela busca o autocontrole através darespiração abdominal, algo que aprendeu nasaulas de judô.

Nina não deveria desviar a atenção da bola,mas vez ou outra, ela se pega olhando para

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os olhos do adversário. Ele é bomestrategista? Será que possui alguma falhada qual ela possa se aproveitar? Bem, Ninaprecisará esperar o jogo começar paradetectar possíveis falhas no jogo de Lex.Aproveitar-se dos erros do adversário é umaótima estratégia. Ainda assim, ela acreditaque o ataque é sempre a melhor defesa.

Quando o aquecimento chega ao fim, Ninaprecisa urgentemente de um gole d’água.Tira o elástico do cabelo, prendendo-onovamente, bem firme dessa vez. Nathália eLais acenam da arquibancada e Ninapermanece inalterada, totalmenteconcentrada.

Gancho conversa com os jogadoresdeixando claro que as regras do tênis sãoválidas. Serão 3 sets de 6 games cada. Opirata jura a Nina que não vai roubar.

Lex respira fundo, batendo a bola no chão.Ele mira a adversária, lançando um beijo noar. Nina finge cuspir e esmagar o beijo com aponta do tênis. O cara não se aguenta e caina risada.

Nina arqueia as costas e ginga para lá epara cá, aguardando. Lex continua batendo a

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bolinha amarela no chão. Uma, duas, trêsbatidas. Seus olhos vagueiam pelaarquibancada e se detém em Bárbara. Elaacena com a cabeça e a máquina fotográficabalança em seu pescoço cheio de colares.

Concentração, Lex!Certo, o garoto volta sua atenção para a

bola. Esse movimento de vai e vem da pelotao mantém focado, desanuviando ospensamentos de qualquer outra coisa quenão seja o jogo que está prestes a seriniciado.

Lex está pronto. Agora é para valer.Ele lança a esfera amarela para cima e

respira fundo ao mesmo tempo. Quando abolinha começa a cair, o garoto solta o ar deuma só vez, batendo com força, colocando abola em jogo.

O primeiro set finalmente começa.Nina recebe e rebate de leve. Lex devolve.

Ela precisa correr, mas alcança a bola emanda uma cruzada. O garoto é pego nocontrapé e Nina vibra ao garantir o primeiroponto da partida.

Lex se posiciona e bate a bola no chãonovamente. Segundo saque. Preciso. Nina

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rebate mandando a bola para o fundo daquadra. Ele devolve. Ela rebate. Ele devolve.Ela rebate.

O ponto é disputado a raquetadas e Lexvira o jogo mandando uma bomba. Juro, nemvi a cor da bola. Mas Nina vê e com umavelocidade surpreendente, se estica toda erecupera, devolvendo uma bola alta para aquadra de Lex.

O garoto, juntando toda a sua força e fúria,dá uma cortada fenomenal, um smashperfeito que tira Nina da jogada. Ponto paraLex.

É nesse clima de disputa acirrada que ogame continua. Nina salva bolas incríveis eLex possui uma técnica apurada. Fica difícildefinir um vencedor, pois nesse ritmo, tudopode acontecer.

Nina joga a raquete longe quando Lexacerta um poderoso e cheio de efeito topspin.O garoto ri, deixando Nina desconcertada.Ela mostra o dedo do meio e recebe umaadvertência do árbitro por abuso deequipamento. Pela primeira vez na partida,Nina não tem certeza de que poderá vencerLex.

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Ele inicia o quarto round – sei que não éluta livre, mas estamos bem próximos disso –com um ace que desconcentra Nina. Antesque destrua uma nova raquete, ela trinca osdentes e cerra os punhos em torno daempunhadura, enfurecida. Ela precisa ganharesse jogo, custe o que custar.

A garota se concentra quando o segundoserviço de Lex chega, cheio de efeito. Ninanão consegue virar o jogo e faz um approachfora de hora. Por sorte, o voleio é perfeito eNina converte.

Não está nada fácil, vou dizer isso a vocês.Nina sua em bicas. A camiseta de Lex estácolada ao corpo e o sol começa a dizer“tchau, galera, até amanhã”. Mas o ocasoestá tão demorado que, sinceramente,acredito que o astro esteja doido para saberquem será o vencedor da partida.

O vôlei entre monitores e professores játerminou. Deram uma passada na quadra detênis antes de se dirigirem para os quartos.Esse jogo de vida ou morte promete avançaraté a noite.

Entre backhands, topspins, forehands,smashs, volleys, aces e quebras de serviço, o

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jogo se desenvolve ferozmente. Se Lexvencer o próximo game, será o vencedor.

A água desce queimando pela gargantaressequida de Nina. O restante da água, elajoga na nuca e molha a testa. Nathi estáfazendo um curativo no dedão da amiga, queestá bem esfolado. Lex, do outro lado daquadra, não está muito diferente. Ele lutapara respirar e se manter em pé. O desafio jádura quase duas horas e seus músculos estãogritando por descanso.

— É a hora da verdade. – Ganchomassageia os ombros tensos de Lex.

— Se eu não ganhar agora, não conseguireicontinuar jogando. Teremos que deixar paraamanhã, sério. – Lex geme quando Ganchoafunda os dedos em seu ombro direito.

— Essa partida termina hoje, beleza?Concentração, meu camaradinha!

Voltando ao outro lado da quadra, Nathiarremata o curativo no dedão de Nina. Agarota está um trapo, um lixo ambulante.

— Eu vou perder, não acredito. – ela leva amão à testeira, arrancando o acessório.

— Não perderá coisa nenhuma. Foco, Nina.Entre nessa quadra para ganhar! – Lais

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incentiva.— Lei da atração. Busque forças sei lá eu

onde e acabe com o Lex. – Nathália estendeuma toalha para Nina. – Você precisa vencer,entendeu? Diga que entendeu!

— Certo, entendi.Nina e Lex se encaram. Os holofotes da

quadra já estão acesos. As pessoas começama se inflamar nas arquibancadas com apossibilidade do fim do jogo. Para entreteressa turma, a cozinha do hotel descoloubaldes de pipoca e refris trincando de tãogelados.

Nina sacode os braços, passando a raquetede uma mão à outra. Ela precisa ganhar,precisa! O acordo foi que se Lex perdesse, aescravidão seria imediata. E se Lex ganhasse,bem, nesse caso, o beijo também seriaimediato, na frente de todos. Só de pensarnisso, Nina xinga baixinho.

O jogo recomeça.A cada bola que rebate, Nina sente que o

corpo vai se quebrar ao meio. A cabeçalateja, os braços estão queimando e o dedoesfolado incomoda muito.

Lex solta o braço e manda uma bola curva,

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daquelas indefensáveis. Nina não deixabarato. Se joga no chão e recupera, mas nãoé o suficiente. Quarenta a quarenta. Iguais.Nina precisa da vantagem a qualquer custo.

O jogo continua. O ar está tenso, úmido eraios riscam o céu. Vem chuva por aí. Ninamanda uma paralela veloz, mas Lex nãodeixa por menos, devolvendo de bate-pronto.

Bate............................RebateBate............................RebateBate............................RebateBate............................RebateBate............................Rebate

Ai, cansei. E não sou só eu. Nina hesitaquando a bola volta para sua quadra, aspernas não respondem. Lex está com avantagem e nem assim comemora, ele nãotem forças para isso.

E Gancho quer jogo!Os boleiros já foram trocados três vezes.

Os caras estão mortos, literalmente falando.A galera na arquibancada está tensa. Algunsestudantes já foram e voltaram e o jogodesenrola.

A possibilidade do match point deixa Lexdesperto. Nina respira de forma rápida e

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imprecisa. Ela está apavorada! Precisa tirar avantagem de Lex ou então, game over.

A pequena bolinha amarela apanha muito!De lá para cá, de cá para lá, de lá para cá.Lex bate colocado e Nina não deixa barato,virando o jogo a todo o momento. Vai e vem,vem e vai, vai e vem e então, Lex avança eao invés de dar uma porrada na bola, dá umadeixadinha, um drop shot.

Acabou, galeraaaaaa! Lex é o vencedor!

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Vinte e sete: Pagando a apostaFinalmente a chuva prometida despenca

dos céus, mas ninguém arreda o pé daquadra, todos aguardam ansiosos pelodesfecho do desafio. E que disputa meusamigos!

Lex luta em busca de ar. Não ousacomemorar a vitória para não piorar aindamais a situação. Imagina que Nina estejafuriosa e não quer acordar o furacão queexiste dentro dela.

Do outro lado da quadra, a garota olha parao nada, apática. Seus braços estão caídosrentes ao corpo, a cabeça da raquete tocandoo saibro. Inconformada, ela solta oequipamento e arranca as munhequeiras.

A chuva é fininha e morna, mas não lava aalma de Nina. Desconsolada, ela mira asmãos trêmulas após o vigoroso esforço. Nãose conforma por ter perdido o jogo.

A turma invade a quadra, cobrando opagamento da aposta. Nina ouve omurmurinho lá longe, como se estivesse aquilômetros de distância. Bem que elagostaria de estar.

Nathália estende uma garrafa d’água.

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— Não acredito que perdi. – Nina solta afrase num tom de desabafo.

— Você lutou até o fim, nunca vi um jogodesses na minha vida. – Lais toca o ombro daamiga, consolando-a.

— Beba essa água. É para dar coragem. –Nathi incentiva.

— Nathi! – Lais estressa. – Você não estáajudando!

— A Nathi tem razão. Agora terei quepagar a aposta. – sem parar para respirar,Nina mata todo o conteúdo da garrafa. Aindanão teve coragem de olhar para Lex. Sentecomo se o mundo estivesse em suspenso,aguardando. Bem, se o mundo estáaguardando eu não sei, mas eu e toda essagalera estamos!

— Acabe logo com isso. – Lais pega agarrafa vazia das mãos de Nina. – Vá lá epague logo essa aposta.

Vencida, destroçada e humilhada, Nina sepõe a caminhar, cabisbaixa. Lex do outrolado da rede, joga a cabeça para trás e deixaa água da chuva eliminar o excesso de suordo rosto. Ele sente como se tivesse sidoatropelado por um Hummer.

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Nina se aproxima e lhe estende a mão,como adversários costumam fazer. Ocumprimento de Lex é frouxo. Assim comoNina, ele também está com todos osmúsculos enfraquecidos.

— Nunca vi ninguém jogar como você. –Lex afirma, apoiando-se no ombro deGancho.

— Não foi o suficiente. – ela faz uma forçadescomunal para não sair correndo. Bem,como poderia? Suas pernas não obedeceriamao comando “corra, agora”.

— O que querem fazer? A aposta precisaser paga e a galera está impaciente. –Gancho limpa a garganta, temeroso com areação de Nina.

— Aposta é aposta. E eu costumo cumprirminha palavra. – Nina deseja que um raiolhe caia na cabeça nesse exato momento.

— Tem certeza disso? Olhe, se você nãoquiser, por mim tudo bem. – Lex se apressaem dizer.

— Eu tenho palavra, Lex. Fiz a besteira deapostar, não foi? Agora cumprirei minhaparte no acordo.

Nathália puxa Gancho de lado. A chuva

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pinica a pele e todos estão ensopados. Umraio abre o céu em duas partes, iluminando-ode maneira fantasmagórica. Logo o barulhodo trovão se faz ouvir, retumbando fundo esacudindo as estruturas.

— Dê espaço a eles. Mantenha essa galerafora da quadra. – Nathi sussurra no ouvidodo pirata.

— Concordo. – Gancho então providencia oque Nathália pediu.

Nina e Lex se encaram, demoradamente.Ela sente como se seus ossos tivessem setransmutado em gelatina. O rosto pega fogoe as mãos estão geladas, ainda trêmulas. Ocoração batuca acelerado e os joelhosbambeiam quando ela pensa no queacontecerá nos próximos minutos.

— Se não quiser pagar a aposta, nãoprecisa. – Lex reitera.

— Se eu tivesse ganhado o jogo, vocêpagaria a aposta, certo? E olhe que eu penseiem fazer barbaridades com você. – Ninaforça um sorriso.

— Sério mesmo? Bom – Lex faz uma pausa–, eu aguentaria a pressão.

— Também aguentarei. Não quebro fácil,

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Lex, acho que já provei isso.Após enxotar a turma para fora da quadra,

Gancho mira o relógio de pulso. Meninos emeninas permanecem de pé naarquibancada, num entusiasmo que não foivisto durante o jogo. Esse pessoal adora umbabado forte.

— Vai mesmo levar isso adiante? – Nathipergunta para uma abatida Nina.

— Não sou de fugir, você me conhece. – aamiga responde, tristemente.

— Um minuto, correto? – Gancho apertauma tecla no relógio de pulso, acendendo ocronômetro.

— Um minuto. – Nina confirma, sentindo-sefraquejar.

— Ok. Em suas marcas. – Gancho aguarda.Nina se aproxima de Lex o suficiente. –Preparar. – Lex abaixa a cabeça e sente umfrio esquisito na barriga. Os lábios estão tãopróximos que Nina inspira a expiração dele. –Já!

As bocas se tocam. No início, de maneiratímida, comportada. Os lábios de Lex aenvolvem com doçura e Nina sente choqueselétricos percorrerem toda a extensão da

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pele.A barba por fazer massageia o rosto de

Nina, sem arranhar. Passados algunssegundos, a garota é tomada por uma forçado além e ela deseja mais, anseia por tudo.

Lex sente o mesmo frenesi. As mãos queestavam ao lado do corpo, rasgam a chuva ese enlaçam à cintura dela, trazendo-a paramais perto. Nina envolve o pescoço dele,seus dedos se agarrando fortemente aoscabelos ensopados do garoto.

É para ser um beijo de língua, confere?Sim! As línguas invadem a cena num duelo

intenso e Nina vasculha cada centímetro daboca de Lex, sentindo-se preenchida,completa.

O cara está maluco, a ponto de entrar emcombustão espontânea. Arqueia o corpo parafrente e tomba a cabeça de lado, buscandoaplacar a sede intermitente. Ávido,selvagem, inflamado.

E os segundos vão passando.Nina se esquece por completo da plateia.

Neste momento só os dois existem. A chuvacontinua a cair, tão fininha que não chega aatrapalhar. Lex investe mais fundo e Nina

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sente o corpo em chamas. O coraçãoenlouquece dentro do peito e ela se dá contade que está frágil, entregue, completamenteperdida.

Lex a segura como se não fosse soltarnunca mais. Ele não quer que acabe, nãoquer que o minuto passe. Mas passará e tudovoltará a ser como era antes. Ou não?

— Ok. Aposta cumprida! – Gancho grita e agalera vaia, querendo mais, muito mais!

É difícil pararem de se beijar. Nina precisase afastar um pouquinho e Lex, ainda deolhos fechados, arfa em busca de ar. Elaouve um gemido? Sim, ele deixa um gemidoescapar da garganta.

Quando seus olhos finalmente se abrem,encara Nina, desconcertado. O melhor beijoda vida dele acaba de acontecer. E sefizermos uma continha básica, Nina está comtudo hein! O cara já beijou trinta e duasbocas até hoje.

Finalmente a ficha cai e a garota retornapara a Terra. Seus olhos se umedecem e elacambaleia, abalada. Ainda com os braçosentrelaçados ao pescoço de Lex, Ninaesconde o rosto no ombro dele. Ele a abraça

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mais forte quando a escuta soluçar.— Gancho, tire essa galera daqui. – Lex

cola os lábios à testa de Nina, cerrando aspálpebras.

— Considere feito, man. – Gancho partepara o alambrado, aos gritos. – Acabou oshow, moçada, todos voltando para osquartos! Tomem banho direitinho que já éhora do jantar, beleza? Bora, galera,mexendo esses traseiros aí. E, Bárbara, parede fotografar, o show acabou, não ouviu?

— Vá se ferrar, Cabeçudo!Nathália e Lais se entreolham, petrificadas.

Não sabem o que fazer para ajudar a amiga.Talvez não haja nada a ser feito.

Nina e Lex continuam abraçados, elasoluçando e ele apertando-a com mais forçacontra o peito, sentindo um nó na garganta.

— Me desculpe. – ele sussurra.— Eu fui humilhada. – ela diz para si

mesma, o som de sua voz abafado pelacamiseta dele.

— Não foi humilhada. – ele discorda.— Não acredito que deixei isso acontecer. –

Nina se afasta e soca o peito de Lex.— Pare com isso. – ele segura as mãos

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dela, delicadamente.— Você foi cruel, Lex. – Nina se

desvencilha daqueles braços fortes,enxugando as lágrimas com raiva. – Eu odeiovocê.

Nina assume uma postura endurecida, masa verdade é que está se sentindo vulnerável.Lex a prende com os olhos e ela precisa fazeruma tremenda força para se soltar.

Nathália se aproxima, enganchando-se nobraço da amiga, puxando-a para longe deLex:

— Venha, vamos sair daqui.— Foi uma aposta, Nina, mas você tinha

escolha. – desolado, ele afirma acima dobarulho da chuva.

— É, eu sei, sou uma idiota. – Nina fala porsobre os ombros, dirigindo-se para a saída daquadra.

O garoto pega a raquete do chão e encara oequipamento fixamente. O olhar matador docara já diz tudo e Gancho recua algunspassos, não quer correr o risco de tomar umaraquetada nas ideias.

— Lex?— Ela vai me odiar para o resto da vida. –

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ele divaga num balbucio.— É claro que não. Foi uma aposta, cara. E

você deu alternativas, ela beijou porque quis.— Não é bem assim, eu peguei pesado. –

Lex passa a raquete de uma mão para aoutra.

— Na boa, essa aposta não foi nada dooutro mundo. Amanhã isso já estaráesquecido, confie em mim. – Gancho tentaconfortar.

— Tudo isso é culpa dessa maldita Kibi dosinfernos. – trincando os dentes e reunindo apouca força que lhe resta, Lex lança araquete longe. O objeto gira no ar e aponteira finca como uma estaca noalambrado verde.

— Puta merda! Que tiro certeiro, meuirmão!

— Não serei mais chantageado, Cabeção.Essa história termina hoje mesmo!

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Vinte e oito: O contra-ataqueNina está de banho tomado, com o corpo

todo moído. Nathália traz um Dorflex e umcopo d’água. Nina joga o comprimido nofundo da garganta e sorve todo o conteúdodo copo.

Seus olhos estão inchados de tanto chorar,a humilhação foi demais para ela. Resolveunão descer para o jantar e não há Cristo quea faça mudar de ideia. A única coisa que queré se enfiar debaixo dos lençóis e hibernar,para só acordar no dia de ir embora.

Com exceção das Kibis, todas as garotas doPrisma estão atulhadas no quarto de Nina,consolando-a, dizendo palavras de incentivo.Nada parece adiantar, a garota estáirredutível: ela desistirá da Grande Aposta.

— Ah, Nina, não faça isso. – Camila ajeitauma mecha loira atrás da orelha.

— Concordo, você não pode desistir agora.– Nathália toma uma posição. – Eu disse quevocê não deveria ter feito essa aposta, masagora que fez, não pode simplesmente sairfora. Não pode deixar o Lex vencer.

— Você ainda não contou como foi o beijo.– Lais para de lixar as unhas e encara Nina.

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— Lais! – Camila bufa.— Quê? – Lais dá de ombros e interpela

Nina: – O beijo tirou você do eixo, não foi?A garota morde o lábio, pensativa. Só de se

lembrar da boca dele contra a sua, das mãosem seus cabelos, da conexão que surgiuentre os dois… Nina perde o chão, o eixocomo Lais disse.

— Nina? – Lais aguarda.— Foi incrível. – Nina revela para espanto

das meninas.— Eu sabia! – Nathália bate a mão

espalmada na própria perna, furiosa. – Ai,meu Deus, você está se apaixonando peloLex. Isso se já não estiver apaixonada.

— Eu não estou! – Nina dá um salto nacama. – Quer dizer, eu não sei, não façoideia do que está acontecendo comigo.

— O que isso quer dizer? Que o Lex venceua aposta? – Camila pergunta, tensa. – Elenão pode vencer. Esses caras já passaramdos limites e essas apostas me dão nosnervos.

— Sei de algo que poderia reverter o jogo aseu favor. – Lais toma a palavra, livrando-seda lixa de unha.

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— Você não está entendendo, Lais, eu nãoquero mais jogar. Vou desistir dessa aposta,preciso acabar com isso antes que… antesque eu…

— Antes que você se apaixone? – Laistermina a frase. – Ok, Nina, me parece tardedemais.

Tarde demais. Lais terá razão? Será que obeijo de Lex despertou o congelado coraçãode Nina? Não, não pode ser. Ela saberia, nãoé? Bem, a única coisa que sabe é que Lexmexe com ela de uma maneira que nemBruno conseguiu.

— Qual é o seu plano, Lais? – Natháliapergunta e o quarto mergulha num silênciocheio de expectativa.

— A Nina vai reverter o jogo dando emcima do Lex. Ela precisa deixar o cara tãodoido, que é ele quem vai se apaixonar. –Lais expõe seu plano, com uma expressãodiabólica no rosto.

— Como é? – Nina engasga. – Você ficoulouca?

— Ei, não é má ideia. – um sorriso sedesenha no rosto de Nathália. – Na verdade,essa é uma ideia genial! Lais, mandou muito

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bem!— Isso não pode ser sério. Vocês estão

mesmo cogitando essa possibilidade? – Ninaentreabre os lábios, incerta.

— Ao invés de ficar trancada no quarto orestante da viagem, você vai virar esse jogoe nós vamos ajudar. – Lais é a segurança empessoa.

— Nina, o plano é perfeito! Por favor,considere a possibilidade. Faça isso por todasas garotas que já foram apostas no Prisma. –Camila une as mãos, suplicante.

— Você não pode deixar o Lex levar amelhor. – Nathi ruge.

— Até você, Nathi? – Nina choraminga,sentindo-se acuada.

— Não pode desistir da aposta, não a essaaltura do campeonato. Essa é a minhaopinião. – Lais se senta na beirada da cama,mirando Nina.

— É a opinião de todas nós. – Camila dávoz ao que todas estão pensando.

— E se as coisas só piorarem? Eu fuihumilhada naquela quadra hoje. – Ninarebate, um tanto cansada de discutir.

— Por isso mesmo você precisa virar esse

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jogo. – Lais assume a voz de comando econtinua: – Lex Heinrich ficará de quatro porvocê, escute o que estou dizendo.

— Pense sobre o assunto, Nina. – Camila selevanta, seguida pelas outras meninas. –Amanhã você nos dá uma resposta.

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Vinte e nove: A Kibi morLex, assim como Nina, acaba de tomar um

Dorflex. O cara sente como se tivesse sidopreso em uma cama sadomasô e esticado deforma impossível. Não descerá para o jantar,não está em condições.

Gancho chega com Hulk, trazendo umsanduba de dois andares e refris. Lex gemede dor ao se levantar para comer.

Mata o sanduba em tempo recorde,sorvendo uma Coca gelada para arrematar.Ele precisava mesmo é de uma cerva, mas opessoal do hotel é incorruptível, segundoGancho.

— Tentarei de novo. Aquela loirinha dacozinha ficou me encarando… quem sabe eunão descolo umas três latinhas? – Hulk selevanta, pega a carteira e sai do quarto.

— E a Nina? – Lex pergunta, um tantodeprimido.

— Nem sinal dela, da Nathi ou da Lais.Tentei subir escondido até a ala das meninas,mas a Margareth barrou a minha passagem.– Gancho elucida.

— O que eu devo fazer, Cabeça? Meilumine aqui!

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— Se você encarar a Kibi, ela vai liberar ovídeo para o seu velho. E aí, meucamaradinha, vai feder para o seu lado.

— Meu pai só está esperando algo assimpara barrar a minha faculdade. Ele já avisou,cara, não vai pagar as mensalidades se euaprontar. E o acidente com a moto pode serchamado de aprontar, não pode?

— Se fosse meu filho naquela moto, euarrebentava a cara dele. – Gancho faz piada,mas o assunto é sério. Lex poderia termorrido naquela brincadeira insana. –Mantenha a aposta. Agora só faltam cincodias.

— Não posso continuar com isso sem saberqual o plano da Bárbara. – Lex geme ao seajeitar na cama. O pescoço e os braços estãoqueimando.

— Vamos descobrir. Amanhã cedo pegamosela de jeito.

~~***~~A manhã nasce nublada, com previsão de

chuva no final da tarde. Depois de tomar umcafé-da-manhã cheio de carboidratos,Bárbara segue para o quarto e descarrega asfotos e vídeos. Ana Paula está no banho, para

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variar. Bem, vocês sabem o que isso querdizer.

— Não temos material suficiente. Isso aquinão dá para nada! – Bárbara soca otravesseiro.

— Foi só o que conseguimos. – Suzanatenta colocar panos quentes na situação. Mascomo a coisa está fervendo, ela deveriacolocar panos congelantes.

— Que droga! – Bárbara explode.— Eu não queria tocar no assunto, mas… –

Suzana teme terminar a frase.— O que é?— Aquele beijo de ontem, não foi um mero

pagamento de aposta. Sei que não fui a únicaa notar isso. – Suzana engole em seco, mascontinua. – Eu realmente acho que você nãovai conseguir seu namorado de volta, nemcom chantagem. O que está rolando entre oLex e a Nina já ultrapassou a linha desegurança e você é a culpada disso. – mesmocom a possibilidade de um tapa na cara ouuma vingança desmedida, Suzana fala tudo oque pensa. Aguarda uma reação exacerbadapela parte da Kibi Mor, mas essa reação nãovem. Bárbara encara a parede branca por um

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longo tempo antes de responder.— Você tem razão, as coisas saíram do meu

controle. Eu sabia que isso poderiaacontecer. Enfim, terei que mudar deestratégia. Não que isso seja ruim, só não é oideal.

— O que pretende? – Suzana se aprumasobre os lençóis.

— Minha vingança contra a vagaba vaicontinuar. E quanto ao Lex, bem, vou fazer ocara sofrer como ele me fez sofrer. Se elerealmente se apaixonar pela Nina, nãodeixarei que fiquem juntos.

A história de Bárbara e Lex não é nada detão anormal. O problema foi que o caramexeu com a Kibi errada. Depois de ficaremjuntos numa festa, a Kibi Mor cercou o garotode todas as maneiras, seguindo-o em todasas baladas da cidade. Eles ficaram juntos pormais duas vezes depois disso.

Os amigos – entenda Gancho no topo dalista – desafiaram Lex a namorar a mesmagarota por mais de quinze dias. E o cara, quenão suporta ser desafiado, topou a aposta.

O alvo já estava marcado: Bárbara, a Kibi.Bem, nessa época o termo Kibi ainda nem

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existia. Uma pena, facilitaria muito o meutrabalho narrativo. Mas vamos em frente.

Bárbara sempre foi louca pelo Lex. Se nãome engano, desde o quinto ano dofundamental. O tempo passou e elafinalmente ficou com o cara, na tal festacitada. Babi realmente acreditava ter fisgadoLex, para todo o sempre.

Como se fazia antigamente, ele pediuBárbara em namoro. Foi uma situação tãoesdrúxula que prefiro não entrar emdetalhes. A garota aceitou, aos pulinhos. Oque ela não sabia é que esse namoro estavacom os dias contados. Ou sabia?

Enfim, nos quinze dias de namoro rolou:lanchonete, cinema, shopping, cinema,shopping, lanchonete, cinema, sorveteria…bem, vocês já entenderam. No décimo sextodia, Bárbara chegou na casa de Lex sem serconvidada. O dia estava chuvoso, escuro ecom trovões que faziam as janelas tremerem.Naquela tarde, Lex estava sozinho jogandovídeo-game.

A funcionária deixou Bárbara entrar eapontou a escada para o andar de cima. Ospais de Lex estavam no trabalho e a garota

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poderia colocar seu plano em prática.O rapaz nem imaginava o que estava para

acontecer.Atirando em aliens malvados na tela, Lex

se mantinha alheio ao que rolava do lado defora do quarto. Pensava em uma maneira determinar o namoro com Bárbara, sem causarqualquer trauma à menina. Ele já nãoaguentava mais o grude e os papos fúteisque ela gostava de dividir.

Lex ansiava por sua liberdade e a apostahavia sido cumprida.

Os beijos e amassos não eram de todosruins. O que Lex odiava era a garota no seupé, dia e noite, ligando de meia em meiahora para saber onde ele estava. E não sóisso. Ela começou a dar palpites em suasroupas, corrigir sua postura e a pentelharpara que ele a levasse a um restaurante deverdade, sem ser o McDonald’s ou o BurguerKing.

Lex estava a ponto de explodir. Precisavaterminar logo com esse namoro.

A porta do quarto foi aberta e o garotoquase teve um surto quando Bárbara,vestindo apenas um robe de seda

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transparente, cruzou o umbral e se segurouno batente, desenvolvendo uma performancea lá Pole Dance. Ela sustentava um olharesmagador, daqueles só vistos em filmesproibidos para menores de dezoito anos.

Vocês imaginam a cara embasbacada doLex?

Juro, o garoto não sabia onde se enfiar.Arrancou o lençol da cama e correu paracobrir Bárbara. Mas ela não aceitou sercoberta e muito menos deixou Lex falar.Pegou o cara pelo colarinho, jogando-o sobrea cama.

Bárbara caiu sobre ele que, mesmodesnorteado, tentou escapar. Bem, qualquerhomem numa situação dessas sucumbiriafacilmente. Mas não Lex. Ele não conseguiriaenganar Bárbara e conviver com isso depois.Lex apostava sim, até ludibriava, mas nadadesse porte.

Bárbara não parava de beijá-lo, de apertá-lo, de sei lá mais eu o quê. Lex rolou para olado e segurou os braços da garota acima dacabeça. Ela precisava ouvi-lo, por Deus! Oproblema é que ela não queria ouvir!

Ele até pensou em dar uns tapas na cara

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dela, quem sabe assim chamasse a atenção.Felizmente, não foi preciso dar umasbofetadas e ele conseguiu falar o queprecisava ser dito, inclusive sobre a aposta.

Bárbara implorava para que Lex nãoterminasse com ela. Suplicava por outrascoisas também. A cena foi deprimente. Agarota, nua, vestindo apenas um hobbytransparente, aos prantos. É claro que Lexficou comovido, mas foi irredutível. O namoroestava acabado e ponto final.

Não pensem vocês que Bárbara ficouchorando por Lex. Oh não. O chororô duroudois dias, no máximo. Depois disso, a garotavoltou a sua habitual rotina: beijar todos oscaras e infernizar a vida das meninas doPrisma.

Analisando o fato friamente, acredito queBárbara esteja se enganando quanto ao amorque sente por Lex. Ela pode até ser doentepelo cara, mas amor? Está bem longe disso.

~~***~~As Kibis descem para a piscina. Apesar do

dia estar nublado, um forte mormaço tomaconta da ilha. Ana Paula e Suzana estãodentro da água com um bando de garotos e

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quando Lex e Gancho se aproximam, a KibiMor está sozinha lendo uma revista, estiradana espreguiçadeira. Ela levanta a cabeça,olha para os garotos com desdém e retoma aleitura. Gancho arranca a revista das mãosdela, nada simpático.

— O que querem? – Bárbara interpela,deslizando os óculos de sol sobre a cabeça. –Aliás, excelente performance a sua ontem,Lex. Uau, fiquei sem fôlego. – ela se abanacom as mãos.

— Precisamos conversar. – o tom de Lex éindecifrável.

— Se é sobre o vídeo ou a aposta, esqueça,não voltarei atrás. – a Kibi recoloca os óculossobre os olhos. – Aliás, você está se saindomuito bem, nem precisei passar asinstruções.

— O que está pretendendo? Qual o seuplano diabólico? Se quer se vingar de mim,tudo bem, mas deixe a Nina fora dessa. – Lexse senta na espreguiçadeira ao lado.

— Veio defender a vagaba? Sério mesmo,Lex? – Bárbara se ajeita, numa frieza glacial.– Eu quero o sangue da Nina. Querohumilhar a garota, vê-la chorar como

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aconteceu ontem.— Pronto. Já conseguiu a sua vingança. O

que mais pretende? – Gancho joga a revistano colo de Bárbara.

— Cumpra a sua parte no acordo que eucumprirei a minha, Lex. Aliás, a internet aquido hotel funciona bem que é uma beleza. Dêum passo em falso e mando o vídeo para oseu pai.

— Não tem conversa com você, não é? –Lex retesa os lábios, irritado.

— Nope. E vão andando, estão estragandoo meu dia.

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Trinta: Virando o jogoNina olha para o próprio reflexo no

espelho. Precisou tomar outro Dorflex para ador. Finalmente o remédio começa a fazerefeito.

Lais entra no quarto, trazendo o café-da-manhã numa bandeja: uvas, pãezinhos e umcopo de suco de laranja. Nina se senta paracomer e já tem uma resposta para dar.

— O que decidiu? – Lais pergunta, abrindosua mala de chinelos.

— Vou virar o jogo, você tem razão.Desistir da aposta seria mais humilhanteainda. E como quero vencer, preciso mudar aminha estratégia.

— Grande garota! Agora sim é a Nina queeu conheço. – Lais comemora. – Sugirocomeçar a virar esse jogo já. Provoque e aomesmo tempo despreze o Lex. Pareça estarfeliz, sorria o tempo todo. Você vai pegar ocara no contrapé, como fez ontem na quadrade tênis.

— E o que mais?— Bem, precisamos dar um tapa no seu

visual. Tire essa roupa de ginástica. Darei umup em você agora mesmo.

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~~***~~Gancho dá um cutucão tão forte em Lex

que o cara se desequilibra. Nina e Laispassam pela piscina, arrancando assobios dosgarotos e olhares fuzilantes das Kibis.Nathália acena para as duas, que vão ao seuencontro.

— Uau, vocês duas estão um must. – Nathielogia, ajeitando os óculos de sol. NotaGancho e Lex com os olhos vidrados nelas. –As meninas estão na praia, nos esperando. Esó para constar, o Lex está olhando para cá.

— Ah, é? – Lais dá um sorrisinho divertido.– Ok, Nina, hora da ação.

— O que eu faço? – Nina congela, semreação.

— Tire a canga. Deixe a boca do Lex nochão. E então, vamos para a praia, como seesse fosse o dia mais feliz da sua vida.

Nathália e Lais se entreolham e desatam arir. Nina nunca fez algo assim antes, nuncaprovocou um cara. Talvez seja atéengraçado.

Ela age conforme as instruções de Lais.Nathália é a única que consegue ver osgarotos e quando meneia a cabeça

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positivamente, Nina e Lais sabem que o alvofoi atingido, num tiro certeiro, à queimaroupa.

— Vamos? – Nina, com a canga penduradano ombro, estende os dois braços para asamigas.

— Demorou! – Lais e Nathi se atrelam àNina e as três vão seguindo saltitantes, parao caminho que leva à praia.

~~***~~Gancho precisa fechar a boca de Lex, que

ainda está entreaberta. Como sempreacontece quando se trata de Nina, o garotoacompanhou cada detalhe em câmera lenta:ela desamarrando a canga da cintura deforma sensual, deixando o tecido escorregarpor sua pele vagarosamente, numaprovocação explícita. A cena foi como umsoco no estômago, deixando Lex sem ar.

— Aquilo foi golpe baixo. Ela estáprovocando na cara dura! – Gancho sependura no ombro de Lex. – E eu que penseique não veríamos a Nina tão cedo.

— Mudança de planos, Cabeça. Vamos paraa praia.

— Vai levar a aposta adiante? Não

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tínhamos combinado fingir para a Kibi? – otom de Gancho é incerto.

— Não é mais uma aposta, agora é questãode honra. – Lex tira a camiseta, enche opeito de ar e se arma do seu melhor sorrisosedutor.

~~***~~O mar, pós-chuva, está mais revolto do que

de costume. Nina e as garotas jogam vôlei,logo depois da zona de arrebentação. Asondas iniciam a formação onde elas estão,chegando a um metro de altura. Lex eGancho mergulham quando uma onda sequebra.

— Não olhe para trás, mas o Lex e oGancho estão se aproximando. Você vaiflertar com o cara e quando ele chegar junto,vai desprezá-lo, entendeu? – Lais dá asinstruções à Nina.

— E isso funciona? – Nathi pergunta, emdúvida.

— Funciona que é uma loucura. Vá pormim. – Lais confirma, já usou a técnicazilhões de vezes.

— É sério, preciso ter umas aulinhas comvocê. – Nathália vê a bola se aproximar e dá

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um toque para cima.~~***~~

Gancho e Lex vão vencendo as ondas,mergulhando. Finalmente alcançam asgarotas e entram no jogo. Lex se posicionaentre Nina e Lais.

— Pensei que estaria dolorida hoje. – elecomeça.

— E estou. – Nina confirma. – E você?— Estou quebrado. – Lex devolve a bola.— Vou querer uma revanche qualquer dia

desses. – Nina não olha para o lado, focatoda sua atenção na bola vôlei.

— Não me odeia mais? – ele pergunta, numtom divertido.

— Não.— Nesse caso, será um prazer. – Lex

arremata.O jogo vai rolando, sem incidentes. Os

monitores entram no mar e se juntam aobando, trazendo pranchas de surf eacessórios para mergulho. O jogo de vôleichega ao fim e a turma cai matando sobre osapetrechos trazidos para a água.

— Onde você disse que é um bom lugarpara mergulhar? – Nina fita Lex,

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descompromissadamente.— Quer mergulhar?— Está se oferecendo para me

acompanhar? – Nina entra no jogo propostopor Lais. E não é que a garota começa agostar?

— Fique aqui. Vou pegar as máscaras.Lais, que estava próxima dos dois, levanta

o dedo polegar em sinal de aprovação. Ninabate continência para a amiga: A operação“Virando o Jogo” tem início imediato.

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Trinta e um: O mergulho e a caça aotesouro

Nina e Lex nadam, lado a lado, até o localindicado pelo monitor. Eles até poderiam terapostado uma corrida, mas o corpo nãocorresponderia. As dores do jogo de ontemsão latentes.

Chegando ao local, Lex desliza a máscarade mergulho para o rosto. Nina faz o mesmo.Não estão em zona de perigo nem nada, maso local não dá pé para nenhum dos dois.

As ondas começam a se formar mais afrente, ainda assim, a correnteza os empurraem direção à praia. Para se manterem nolugar, é preciso bater as pernas e pés comvigor.

Os dois mergulham.No silêncio das águas do mar, Nina sente a

paz transbordar por todas as suas células. Éum silêncio que a aproxima do todo, que aconecta à Terra, que a lembra, por ummilionésimo de segundo, de que todos somosum só.

O recife de corais é surpreendente. Abiodiversidade naquele pedacinho de mar,deixa Nina boquiaberta. Ela precisa subir e

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respirar. Quando retorna, Lex estende amão, puxando-a mais para baixo.

Mesmo após a chuva, a visibilidade é boa.Apesar da água estar um tanto turva, épossível ver os mínimos detalhes, numamiscelânea de cores que se fundem de formasurreal.

Um cardume passa em frente aos olhos deNina. São peixinhos pequenos, rajados emulticoloridos. Lex aponta para uma rocha eela sorri quando reconhece uma estrela domar.

Nina precisa de ar novamente. Lex aacompanha para cima. Um monitor, que estána praia, aponta para o relógio de pulso e ogaroto entende o recado. O horário doalmoço se aproxima.

— Temos que voltar. – Lex desliza amáscara para o alto da cabeça.

— Mas já? – Nina soa decepcionada.— Podemos voltar amanhã. Topa?— Fechado.

~~***~~Os estudantes do Prisma estão espalhados

pelo restaurante do hotel, separados porníveis de afinidade.

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Nina, Lais e Nathália dividem uma mesa ejá estão na sobremesa. Lais deixa o talhersobre o prato e arqueia o corpo para a frente,em direção à Nina. Num sussurro, ela diz:

— Não sei o que você fez, mas conseguiu.O Lex não tira os olhos daqui.

— Mentira! – Nathi engasga, precisando deum gole de suco para desentalar.

— Eu não fiz nada, nós só mergulhamos norecife. – Nina leva uma colherada de moussede maracujá à boca.

— Bom, o que posso dizer? Você estávirando esse jogo bonito! – Lais ergue oguardanapo do colo e limpa os cantos daboca. – E quanto a caça ao tesouro…

— O que é? – Nina arregala os olhosquando nota que as duas amigas estãoabafando risinhos com as mãos. – O quevocês fizeram?

— Nós descobrimos que a caça serárealizada em duplas, previamente sorteadas.Nesse caso, eu e a Nathi aqui, convencemoso monitor a colocar você e o Lex juntos.

Agora é a vez de Nina engasgar. Ela cospea sobremesa de volta no prato e pega o copode suco, virando de uma só vez.

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— Vocês fizeram o quê? – Nina arfa,lutando para recuperar o ar.

— Qual é, vai ser divertido. E lembre-se:mantenha a estratégia. Dê em cima do Lex ena hora H, salte fora. Combinado?

— Lais, não acredito que isso vá dar certo.– Nina joga o guardanapo na mesa,descrente.

— Dará certo, confie em mim.~~***~~

Conforme instruções dos monitores, todosvestem roupas confortáveis e tênis nos pés.As três amigas estão sentadas na areia dapraia, aguardando.

O monitor explica como será a Caça aoTesouro. Passa das duas da tarde e um soltímido dá as caras por trás de nuvensescuras.

— A Caça ao Tesouro será realizada emduplas, sorteadas pela manhã. Na primeiraetapa, os competidores estarão atreladospelos pulsos, a essas algemas aqui. – omonitor levanta as algemas, o que já causaum murmurinho entre os estudantes.

“Um mapa será fornecido à dupla quedeverá adentrar à mata e procurar por uma

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caixa como essa aqui. – uma monitoralevanta uma pequena caixa de bambu. –Dentro da caixa, vocês encontrarão as chavesdas algemas e outro mapa.

“O segundo mapa os levará para outraparada, ainda dentro da mata. Vocêsencontrarão uma garrafa e um novo mapaque os levará ao tesouro. – a professora deeducação física levanta a garrafa. –Lembrem-se de que o xis marca o lugar.

“Caso alguém se perca ou algo aconteça namata, vocês estarão munidos de apitos elocalizadores. Só usem em caso deemergência, estamos entendidos?

“Monitores e professores estarãoaguardando por vocês no local onde está otesouro. A chegada dos vencedores é previstapara as quatro e meia da tarde. E nempreciso dizer que a dupla que chegarprimeiro, levará o prêmio, certo? Boa sorte atodos, tenham cuidado na mata e vamosdescobrir quem são as duplas!”

O monitor chama as equipes sorteadas pelamanhã. Nathi e Lais fazem um sanduíche deNina, chocando seus ombros contra os dela,esperando que a amiga dê uma risada ou

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esboce qualquer reação. Mas Nina está tensademais para isso. Ela e Lex sozinhos no meioda mata? Por duas horas inteiras?

— Nina e Alexandre. – o monitor lê em vozalta. Nina já sabia, mas finge espanto. Lex,ao contrário, está realmente surpreso.

Ambos seguem até a mesa de apoio. Ninaoferece a mão direita e Lex a esquerda eentão, os dois são algemados e recebem ummapa das mãos de Margareth.

— Certo, crianças, cuidem-se na mata. – aprofessora entrega um apito, um localizadore um cinturão para cada um. – Posicionem-seno ponto de partida. – ela aponta uma linhano chão, onde outros estudantes já seacotovelam.

— Alguém armou para nós? – Lex sussurraa pergunta. Com a cara mais cínica domundo, Nina responde:

— Não faço a menor ideia.

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Trinta e dois: A primeira etapa da caçaAlgemados. Sim, esses dois se embrenham

no meio da mata atrelados pelos pulsos, aspeles se tocando. Um perigo!

Lex está com os localizadores no bolso detrás da bermuda e Nina segura o mapaaberto em mãos. Os apitos balançampendurados ao pescoço, sustentados por umfio de nylon.

Ambos receberam um cinturão com algunsapetrechos e um cantil de água. Lex dá umaolhada rápida no bolso da pochete edescobre: uma mini lanterna, duas barrasenergéticas e um canivete suíço. Dá para ogasto.

Nina vai guiando Lex pela trilha aberta namata. Percebem que os mapas não são iguaisquando Nathi e Nando tomam outro caminho.Eles se mantém na mesma trilha que Ganchoe Lais, Bárbara e Bola, Camila e Edgard eoutras duplas que vem logo atrás.

— Temos que virar aqui. – Nina para eaponta algo no mapa.

— Certo.Os dois saem da pista principal, avançando

por um terreno um tanto inclinado, ladeado

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de árvores e plantas rasteiras. Estão porconta própria a partir de agora.

Estudando o mapa, Nina acredita que logoalcançarão a rocha demarcada com um xisvermelho. Quando chegarem a esse ponto,deverão pegar um caminho adjacente eseguir em frente, até cruzarem com o riacho.É lá que encontrarão a caixa com a chave e osegundo mapa.

Nina estaca de repente. Lex, desavisado,leva um tremendo puxão para trás. Vira-separa encarar a garota, irritado.

— Custa avisar que vai parar de andar?— Desculpe. – Nina pede silêncio, levando

o indicador aos lábios. – Acho que ouvialguma coisa.

— Fala sério. – Lex bufa. – Estamos nomeio da mata. É óbvio que você vai ouvircoisas.

— Não é isso. Tenho a estranha sensaçãode que estamos sendo seguidos. – Nina estáséria, compenetrada. Aguarda mais um poucoantes de retomar o caminho. – Devo estarenganada.

— Não somos os únicos nessa mata. – Lexrevira os olhos, doido para chegarem logo ao

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riacho.Eles voltam a caminhar. É Lex quem vê a

rocha com um xis marcado. Ao alcançarem olocal, viram à esquerda, numa trilha estreitae com o mato mais fechado.

— Tem cobras aqui? – Nina não tinhapensado sobre o assunto até então.

— Com certeza. Mas fique tranquila, elasnão vão se aproximar.

— Nem vou perguntar se o que acabou dedizer é uma ironia. – Nina acelera e Lextoma um tranco violento no pulso.

O mapa é preciso. Pouco tempo depois,escutam o barulho de água. Devem estarpróximos ao riacho. Nina segue em frente,segurando-se nos troncos das árvores. Nesseponto, o terreno está lamacento, resultadoda chuva de ontem.

— Estou ouvindo o barulho de água. – Lexfala o óbvio.

— Não estou surda.— Deus, que garota difícil! – ele chacoalha

as mãos e por consequência, uma das mãosde Nina balança junto.

— Se não quiser tomar uma joelhada, parede balançar a minha mão.

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— Se me der uma joelhada, vou cair e vocêvai precisar me arrastar. – Lex retruca,parando de andar. Nina sente o solavanco efuzila o garoto com o olhar.

— Não precisarei arrastá-lo. Quebro o seudedão e tiro a algema.

— Que coisa macabra. Você me dá medo àsvezes. – Lex a encara, recostando numtronco grosso e cheio de falhas. Pega o cantildo cinturão e dá uma golada. – Quer?

— Não. Só quero chegar logo nesse riachoe me livrar de você. – Nina ergue o braçoatrelado a Lex, com a cara amarrada.

— Por que quer se livrar de mim? – eleguarda o cantil e dá um puxão em Nina. Agarota bate contra o peito dele e usa a mãolivre para se afastar.

— Faça isso de novo e eu juro que quebro asua cara. – Nina resmunga, impaciente.

— Já disse que você fica extremamentesexy quando está brava? – o cara curtebrincar com fogo.

Nesse caso, a velha Nina daria um bomchute no meio das pernas dele, correto? Masa pedido de Lais, usará outra estratégia comLex.

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— Ah, é? Você acha isso mesmo? – Ninaentreabre os lábios e com o dedo indicador,traça um caminho perigoso que desliza pelopeito de Lex até o rosto. Ela se aproximamais, prendendo os olhos dele aos seus. Orapaz é pego no contrapé, a respiração falhae o coração bombeia o sangue num ritmoalucinante.

— O que está fazendo? – ele balbucia, avoz entrecortada.

A mão livre de Nina está na nuca de Lex.Os olhos não se desgrudam nem um instante.As bocas se aproximam, mas ela desvia nahora H, alisando a barba dele com os lábios,chegando até o lóbulo da orelha. Elamordiscou? Sim, ela mordicou a orelha dele!Lex solta um gemido abafado, fecha os olhose sente um arrepio cortante subir pelosbraços.

E então, para arrematar com chave de ouroesse momento, a garota murmura, com a vozmais provocante que consegue fazer:

— Se me irritar novamente, vou mostrar oquanto sua morte por afogamento pode sersexy. – dito isso, ela se afasta para o maislonge que as algemas permitem.

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Lex abre os olhos. No lugar daquelespontos luminosos que brilham como raiossolares, duas bolas de fogo faíscam nadireção de Nina. Um tanto violento, Lex ajoga contra outra árvore, prendendo-a pelosbraços.

— Se me provocar desse jeito de novo, nãorespondo por mim. – ele arfa.

— E o que vai fazer? – Nina mantém o tominsinuante.

— Está avisada!E arrancando o mapa das mãos da garota,

ele retoma a trilha, arrastando umatriunfante Nina que vem logo atrás.

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Trinta e três: A segunda etapa da caçaLex localiza a caixinha de bambu. Está

posicionada sobre uma rocha branca,próxima às margens do riacho. A corredeira éferoz e se os dois entrarem na água, poderãoser levados. A melhor opção é um deles seagarrar a uma árvore e o outro resgatar acaixa.

— Eu vou. – o tom alterado de Lex nãodeixa opção.

— Tudo bem, vá lá. – ela dá de ombros,analisando as árvores ao redor. Um galhogrosso e forte o bastante poderá ajudar naestratégia.

— Acha que consegue nos segurar? – elepergunta.

— Acho que sim.— Se for soltar, me avise. – Lex entra na

água.— Tá legal.A operação é executada com maestria. Lex

pega a caixa de bambu e volta para amargem, encharcado da cintura para baixo.Só então percebe que Nina morde o lábio,olhando para algum lugar próximo.

— O que foi? – ele olha para trás. – Que

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merda! Corremos risco à toa.Sobre um tonel cinza, uma corda foi

deixada pelos monitores, propositalmente.Realmente Lex estava achando aquelaoperação de resgate muito arriscada.

— Agora já foi. – ela diz, indiferente. – Porfavor, nos solte logo.

Lex abre a caixa e pega a chave. Semqualquer dificuldade, consegue livrá-los dasalgemas. A garota sacode o braço, avaliandose o pulso está ferido. Não está. Lexdesenrola o mapa envolto em um saquinhotransparente.

— Para onde agora? – Nina enche o cantilde água.

— Tem uma trilha mais à frente. – Lexaponta para algum lugar além das árvores.

— Ok, vamos lá.~~***~~

Eles caminham – na verdade se arrastam –pela nova trilha. Nina está cansada e nãoconsegue absorver a beleza da mata. Desviade folhas, arbustos, galhos e nem sequernota os micos que pulam acima de suascabeças.

Lex segue logo atrás, tomando o último

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gole de água do cantil. Abre uma barraenergética e manda para dentro em trêsdentadas. Já passa das três e meia da tarde.

— Esse tesouro tem que valer a pena. –Lex comenta para si mesmo.

— Se não valer a pena, vou socar alguém.– Nina rosna, enxugando o suor da testa.

O caminho ziguezagueia entre outrastrilhas. Mas o mapa é perfeito, cheio demarcações, impossível de se perderem. Ninaainda está com aquela forte sensação deestar sendo seguida e não é por Lex. Olhapara trás uma vez. Mais outra. E mais outra.

— O que foi? – ele finalmente pergunta,olhando também para trás.

— Juro, acho que estamos sendo seguidos.— Nina, você está paranoica.— Não estou não. Tenho quase certeza

disso.— Tudo bem, vou ficar atento. Agora anda,

ainda temos chão pela frente. – Lex mira omapa e confere se estão no caminho certo. –De acordo com as instruções, vamosencontrar a garrafa logo ali.

Ele aponta para um conjunto de árvoresque formam um semicírculo. Vasculham a

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área a procura do objeto. No mapa, umaárvore está marcada com um xis vermelho.Nina olha em volta, mas é Lex quemencontra o tronco pintado.

A garrafa está presa nos galhos mais altos,balançando com o vento. Nina olha para Lex.Lex olha para Nina. Alguém precisará subir.

— Certo, eu vou. – ele decide.— Nada disso. – ela interpõe. – Você

resgatou a caixa, nada mais justo que eupegue a garrafa.

— Está alto demais!— Está duvidando da minha capacidade?

Quer apostar? – Nina leva as mãos à cintura.— Pensei que nunca mais apostaria algo na

vida. Não depois de… bom, deixe para lá. –Lex está em dúvida se deve permitir ou nãoque Nina escale a árvore.

— Eu subo. Fique aqui – ela o posiciona –para o caso de eu despencar lá de cima.

— Por favor, não despenque, é sério.Nina analisa a árvore detalhadamente.

Possui ranhuras no tronco, o que facilitará aescalada. Lex une as duas mãos,entrelaçando os dedos. Ela se posiciona etoma impulso.

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Tranquilamente, Nina encontra pontos deapoio para os pés. Cautelosa, chega aosprimeiros galhos e tudo fica mais fácil ainda.Seus dedos já podem tocar a garrafa. Oobjeto está preso a um galho grosso epesado. Nina se segura e corta a corda, coma ajuda do canivete suíço. Olha para baixo evê quando Lex a pega ainda no ar.

— Agora desça daí, com cuidado.Uma brilhante ideia pisca no cérebro de

Nina como um painel de neon. Quando iniciaa descida, lembra-se das palavras de Lais eresolve colocar o plano em prática. Se algoder errado, ela poderá se machucar. Seráque os fins justificam os meios? Bem, sótestando para descobrir.

Engolindo em seco, Nina finge colocar o péem falso e despenca da árvore. Lex aalcança, mas não consegue se equilibrar. Osdois desabam no chão.

A antiga Nina teria levantado num pulo,afastando-se de Lex. A nova Nina, criada porLais, não faz nada disso. Permanece ondeestá, por cima do garoto. Os olhos estãocravados um no outro. Lex está arfando? Ohsim, ele está. Não consegue controlar a mão

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que rasga o ar, tocando os cabelos dela.A sensação é de que o tempo parou. Com

os polegares, ele traça o desenho dos lábiosde Nina, suavemente. Ela não se afastaquando a mão dele desliza para sua nuca,puxando-a para mais perto.

Ela sente o hálito quente de Lex. As bocasjá estão entreabertas e as pálpebrassemicerradas. Se a garota precisa agir, omomento é agora.

Tomada por uma urgência, Nina sedesvencilha das mãos de Lex. Levanta-sesobressaltada, sustentando uma expressãoque denota surpresa e algo mais. Lex nemimagina que a cena foi premeditada.

— É melhor irmos andando. – Nina bate asmãos na bermuda, livrando-se das folhassecas e da terra.

— Nina. – Lex se senta, tentando domar arespiração.

— Vamos, Lex. – ela pega a garrafa dochão, puxa o novo mapa para fora e retoma atrilha, sem olhar para trás.

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Trinta e quatro: A terceira e última etapada caça

— Não vai rolar. – Nina recua, balançandoa cabeça. – Minhas pernas não aguentarãonem a metade dessa subida.

— A escalada é bem punk mesmo. – Lexanalisa o mapa, buscando uma rotaalternativa.

O morro é um tanto íngreme, cheio derochas, pedras soltas e vegetação rasteira.Nina observa quatro cordas que vem do cumeaté o sopé.

— Estou podre, o efeito do Dorflex jápassou faz tempo. Acho melhor desistirmos.

— De jeito nenhum. Qual é, não sou carade desistir fácil. – Lex analisa as cordas e oterreno. – Mas você tem razão, tambémestou quebrado.

— Vamos voltar então. – Nina recosta emuma rocha, esvaziando o cantil de água nanuca.

— Podemos dar a volta e contornar omorro. Veja o mapa. Se caminharmos rente amontanha, não iremos nos perder.

— Má ideia. Não sabemos onde a trilha vainos levar. – Nina discorda.

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— Já disse, não vou desistir. Se quiservoltar, volte.

— O quê? E deixar você contar vantagemdepois? Nada disso! Começamos juntos evamos até o fim. – Nina se põe de pé, prontapara encarar o desafio. – O que estamosesperando?

Lex deixa um sorriso debochado emoldurarsua face, iluminando-o de maneiratranscendental. Dá uma olhadela no relógiode pulso e se sobressalta:

— Vamos andando, já são quatro da tarde.~~***~~

Quando Lex e Nina desaparecem na trilhasecundária, Bárbara e Bola finalmente saemde trás das árvores. Ainda estão algemados ea Kibi o puxa com brutalidade.

— Você é muito mole! – Bárbara estressa.— Chega disso. Você já conseguiu várias

fotos por hoje. Eu quero voltar.— Cale a boca e ande logo. – Bárbara dá

um tranco em Bola, colérica.— Pare! Não vou mais seguir você. Seu

plano é idiota, sabia? Você está tão cega deódio que nem se deu conta disso. – o garotoestaca.

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Notando que Bola não ajudará, Bárbararesolve mudar de estratégia. Com lábios demel, aproxima-se do cara, docilmente.

— Não quer ganhar um beijo meu? Não foiesse o nosso acordo? Se você for até o fimnisso comigo, é o que vai ganhar comoprêmio.

Bola, que nunca beijou uma garota na vida,começa a repensar. Mesmo sabendo que podeapanhar a qualquer instante, solta a bomba:

— Me dê um beijo agora ou nada feito.Trincando de raiva e com os punhos

cerrados, Bárbara se vê num beco sem saída.Na verdade, ela possui várias alternativas,mas opta por se manter no plano original.

— Você quer um beijo meu, Bolinha? Eentão fará tudo o que eu mandar? – a Kibivai se aproximando, gingando, levando asmãos aos braços de um Bola todo arrepiado.

— Me dê um beijo de verdade que eu sigovocê até o inferno.

Reunindo coragem e imaginando que Bolase trata de Lex, Bárbara sussurra no ouvidodo cara antes de lhe tascar um beijo:

— Que assim seja.~~***~~

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A mata é fechada e a trilha sumiu dasvistas. Lex e Nina estão caminhando háquase uma hora e nada de chegarem a lugaralgum.

— Já passamos por aqui, Lex. Estamosandando em círculos. – nesse momento, umraio risca o céu. – E está para cair umachuva daquelas! – Nina faz uma pausadramática, levando as mãos à cintura. – Quehoras são?

— Cinco da tarde. – Lex responde num fiode voz. Odeia a cara arrogante que Nina fazquando tem razão.

— Me dê os sinalizadores. – ela estende amão, batendo um dos pés no chão.

— Espere. – Lex fecha os olhos, buscandoescutar os sons da mata. – Está ouvindo?

— O quê? Só escuto a chuva se aproximar.— É barulho de água. – Lex abre o mapa. –

Se for o mesmo riacho, podemos seguir atrilha até chegarmos ao local ondeencontramos a caixa. Aí ficará fácil voltarpara a praia.

— Lex, estamos perdidos e já são cinco datarde. Os monitores e os professores devemestar preocupados.

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— Confie em mim. – Lex passa por Nina,seguindo o som da água.

— Mas que droga! – irritada, ela soca o ar enão vê alternativa a não ser seguir Lex.

~~***~~O garoto tinha razão, parece ser o mesmo

córrego. Existe uma trilha larga ladeando asmargens. Nina completa o cantil com águafresca e Lex faz o mesmo. A chuva começa acair, um tanto tímida ainda.

Relampeja e a escuridão se aproxima. Ninasegue Lex de cabeça baixa e não notaquando ele para abruptamente. A trombadadesconcentra-a.

— Ai, o que foi agora? – pergunta, olhandopor cima do ombro dele.

— A trilha acaba aqui. – Lex rosna.Uma imensa rocha interrompe a trilha e

não parece haver outro caminho. Ninaesbraveja e ataca Lex:

— Eu falei que deveríamos ter voltado, seucabeça dura! Agora está escuro, estamosperdidos e demorarão séculos para nosacharem! – ela bate a mão espalmada narocha, estressada. – Que droga, por que eufui ouvir você?

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— Quieta! Estou tentando pensar. – Lex sealtera.

— Quieta? Quieta? Está mandando eu ficarquieta? – Nina urra, mais alto que o barulhoda chuva.

— Eu mandei calar a boca!— Ah, é? Vem calar se você for homem,

seu babaca!Ai, ai, ai. Aí a garota mexeu com o brio do

cara. Num ímpeto, Lex parte para cima deNina, segurando firme os ombros dela contraa rocha lodosa. Gotas de chuva escorrempela face, levando o suor e a sujeira embora.

Lex não retruca. Seu peito – descamisadoobviamente – movimenta-se num ritmoinconstante, acompanhando as batidas docoração. Esses dois estão próximos demais.

Lex se esquece de onde está e para ondedeveria ir. Não se importa com a chuva, atrilha interrompida ou mesmo por estaremperdidos. A única coisa que ele quer é calaraquela boca.

E ele a cala, sentindo um choque térmicoao tocar os lábios de Nina. Tão sedosos,saborosos, sedutores. Ao invés de se afastar,ela corresponde, agarrando-se a ele,

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cravando as unhas em suas costas edescendo.

Lex fica louco quando ela apalpa sua bundaredonda e bem definida, demora a entendero que ela pretende com isso. Quando Lex sedá conta, não há mais tempo para impedi-la.Nina acaba de iluminar o céu com um dossinalizadores.

Ele se afasta, limpando a boca como setivesse pedido sorvete de chocolate e naverdade, a sobremesa fosse feita de jiló.

— Por que fez isso? – interpela, lançandoum olhar abrasador na direção de Nina. – Porum milionésimo de segundo, pensei queestávamos nos entendendo.

— Pensou errado. – Nina rebate. – Estoucom fome, com frio, debaixo dessa chuva eainda por cima perdida com você. O que eudeveria fazer?

Um farfalhar no meio da mata atrai aatenção dos dois. Entreolham-se, sem sabero que pensar. O barulho torna-se maisintenso, algo aproxima-se rapidamente.

Lex segura Nina contra a rocha, selandoseus lábios com o indicador. Tira o canivetedo bolso e com um aperto de botão, libera a

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faca.O farfalhar continua. O que mais pode dar

errado no dia de hoje? Nina está apreensiva,aguardando. Um instinto protetor desperta ohomem das cavernas que existe em Lex.Assume uma posição de ataque, protegendo-a com o próprio corpo e a lâmina em punho.

— Ah, são vocês. – uma cínica Bárbarafinge surpresa. – Não somos os únicosperdidos, viu Bolinha?

— Ei, Lex, vai nos matar? – Bola apontapara o canivete. Lex fecha a faca e guarda oacessório no bolso, relaxando.

— O que estão fazendo aqui? – Ninapergunta, por sobre o ombro de Lex.

— Estamos perdidos, como vocês. Vimos osinalizador e viemos para cá. – Bola,acostumado a mentiras, nem precisa seesforçar.

— Vocês ainda estão algemados. – Lexobserva, intrigado.

— Longa história. – Bárbara leva as mãosaos cabelos molhados, sacudindo-os a seguir.– Não deveríamos usar outro sinalizador?

— Eu solto, eu solto! – Bola empolga eaponta o cano vermelho para cima, liberando

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a luz a seguir. A noite se ilumina deimediato.

— Agora temos que esperar. – Lex se virapara Nina que, como ele, também sente amentira no ar.

Bárbara e Bola iniciam uma discussãoirritante sobre onde sentarão. Apesar deensopada, a Kibi não quer sujar o minúsculoshort. Enquanto eles brigam, Nina aproxima-se de Lex e sopra em seu ouvido:

— Não é mega estranho estaremalgemados ainda? Acha que estavam nosseguindo?

Lex suspira alto. Nina tinha razão, estavamsendo seguidos. A Kibi quer vingança e pelovisto, mantém algum plano diabólico emmente que envolve espionagem e sabe-se lámais o quê. Mas Lex descobrirá, afinal, Bolaestá metido nisso de alguma maneira.

— Nina, eu não faço ideia. – ele puxa osinalizador do bolso traseiro da bermuda,encarando o tubo por algum tempo. – Bola,vocês tem mais um aí, certo?

— Sinalizador? É, temos mais um.— Vamos disparar um a cada cinco

minutos, beleza?

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— Beleza, Lex. – Bola concorda,desequilibrando-se e caindo quando a Kibi opuxa para baixo.

Lex vai até o riacho e pega algumaspedrinhas no chão. Começa a jogá-las, uma auma, no meio da corredeira, na intenção defazer com que o tempo corra mais depressa.

Bola e Bárbara não param de discutir umsegundo. Lex olha para Nina de esguelha. Elaestá se abraçando, trêmula. A chuva épesada, fria e a sensação térmica cai algunsgraus.

Tomado por uma força maior, ele caminhaaté a rocha, arrancando a camiseta presa àbermuda, torcendo-a para tirar o excesso deágua. Aproxima-se de Nina, colocando acamiseta sobre os ombros dela. Os dois seencaram.

— Logo estaremos no hotel. – Lex ajeitauma mecha úmida do cabelo de Nina atrás daorelha.

— Preciso de um banho fervendo. – elafricciona as mãos contra os braços, tentandoem vão se aquecer.

— E depois, um cheeseburger duplo commaionese. – o estômago de Lex dá as caras

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quando pensa em comida.— Com batatas fritas. – ela sorri,

penetrando mais fundo nos olhos de Lex.— E milk shake de chocolate.— Com caramelo.Uma nuvem elétrica cerca esses dois,

prendendo-os de maneira sobrenatural. Lexsente uma vontade irresistível de tocá-la,mas é Nina quem diminui a distância,afundando o rosto em seu peito. Ela arfaquando se sente abraçada, seu corpo searrepia quando a temperatura começa asubir.

— Já devem estar chegando. – Lexpressupõe, tocando a testa de Nina com oslábios.

— Hum, hum. – ela já não sabe se quer serresgatada. Por um breve momento, asegurança que sente nos braços de Lexparece bastar.

— Não está na hora de soltarmos outrosinalizador? – Bola pergunta, acima dasreclamações de Bárbara.

— Manda lá, Bolota. – Lex responde, semolhar para trás.

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Trinta e cinco: Passeio de escunaDepois do resgate e de ouvirem um baita

sermão dos professores, os quatro estudantesensopados seguiram para seus respectivosquartos. Nina toma um banho fervendo, comNathi e Lais sentadas no chão, ouvindo todaa narrativa.

— Ainda não entendi o que a Bárbara e oBola estavam fazendo ali. Isso está muitoestranho. E você disse que teve a impressãode estarem sendo seguidos. – Nathiconjectura.

— Também achei muito estranho. E comoeu disse, eles estavam algemados. – Ninaabre a tampa do condicionador, espalhando oconteúdo nos cabelos. – Que eles estavamnos seguindo, disso eu tenho quase certeza.A pergunta é: por quê?

— A Kibi é louca pelo Lex, acho que elafaria qualquer coisa para tê-lo de volta. Ouentão, abriria as portas do inferno para queninguém pudesse ficar com ele. – Laisrecosta no azulejo frio do banheiro.

— Ela estava seguindo o Lex e a Nina paraver o que iria acontecer entre eles, é isso? –Nathi lança a pergunta em meio à névoa

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esbranquiçada.— É a única explicação. – resume Lais.— Eu sei lá e pouco me importa. A única

coisa que quero é comer, estou morta defome.

~~***~~O dia nasce com um sol brilhante, em meio

à nuvens esparsas. Camila e Edgard foram osvencedores da Caça ao Tesouro eacompanhados por dois instrutores,executam manobras radicais a bordo de jetskis, fazendo inveja para todos os estudantesdo Prisma.

Nina, Lais e Nathália já estão com suasbolsas de praia a tiracolo, aguardando aescuna chegar ao píer. O almoço da galeraacontecerá em uma ilha próxima, a meiahora da Ilha Inamorata.

Lex e Gancho estão posicionados,aguardando Bola chegar à praia. Quandofinalmente dá as caras, os garotos se jogamem cima dele, arrastando-o para um locallonge das vistas curiosas.

— O que está aprontando, Bolota? – Lexinterpela, impaciente.

— O quê? Do que você está falando?

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— Não se faça de besta. Ande logo, conte oque está aprontando com as Kibis. – Ganchoaperta o pescoço do garoto com força. – Estádando uma de agente duas caras, é isso?Leva e traz? Moleque de recados?

— Qual é, Gancho, eu nunca faria isso comvocês. – Bola está ficando vermelho e semar.

— Você e a Bárbara estavam nos seguindona trilha ontem, não estavam? – Lexpergunta, com cara de quem vai mataralguém. – Anda, responde!

— Estou sem ar. – a voz do garoto éapenas um sopro.

— Solte ele, Gancho. – Lex toca o braço doamigo, fazendo-o soltar o pescoço de Bola.

— Galera, juro, eu não fiz nada. – Bolachoraminga.

— Meu irmãozinho, desde que chegamos nailha você aprontou muito pouco. E isso sóquer dizer uma coisa: você está ocupado comalgo mais importante. – Gancho faz pausapara respirar. – Das duas uma: ou você virouum maricas ou está de conluio com as Kibis.

— Gancho, Lex, caras… eu não fiz nadaerrado, juro para vocês!

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— Resposta errada. Você sempre estáaprontando alguma. – Lex chega mais pertoe Bola recua dois passos. – Se eu souber quevocê está metido com as Kibis, juro por Deus,encho você de porrada!

— Caramba, Lex, pega leve. Tô falando,podem confiar em mim, juro por Deus. – Bolacruza os dedos às costas. Nem Lex, nemGancho percebem a manobra.

— Ei, vocês, a escuna chegou! – Hulk gritana direção dos três.

— Se tem algo para nos contar, que sejaagora. – Gancho ruge, enfurecido. – Estoudando uma chance a você, Bola.

— Já disse, sou inocente.Lex e Gancho se entreolham. Nenhum dos

dois acredita em Bola, mas a partir de agora,ficarão espertos com o garoto.

— Vai, vaza. – Gancho dá um tapa na nucade Bola e o garoto sai correndo.

— Não acreditei em uma palavra. – Lexlança um olhar matador para o nada.

— Nem eu, man. De agora em diante,ficaremos de olho nele.

~~***~~A bordo da escuna, as meninas fritam no

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sol e os garotos jogam truco. Nina estáafastada da turma, sentindo o vento noscabelos e uma liberdade gostosa, dessas quepoucas vezes sentimos.

Lex se aproxima, sem ser notado.— Um milhão pelos seus pensamentos.— Um milhão de quê? Me disseram que seu

pai cortou a sua mesada. – Nina ironiza, semolhar para trás.

— Que tal um milhão de beijos? É a únicamoeda de troca que tenho no momento.

Lex arranca uma gargalhada de Nina. Elagira nos calcanhares para encará-lo, jásabendo o que irá encontrar: um sorrisodebochado naqueles lábios altamentesugestivos.

Mesmo com os óculos de sol, Nina precisacolocar o braço à frente do rosto para fitarum Lex sem camisa. O mal tempo foi emborae a previsão afirma que é em definitivo, até ofinal da viagem.

— E então? Em que está pensando? – eleinsiste.

— Nos lugares que ainda não conheço, nasviagens que quero fazer. – Nina faz umapausa, olhando para os chinelos coloridos que

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Lais emprestou. – Por que isso importa?— Tudo o que diz respeito a você é

importante para mim.— Rá! Você realmente quer perder os

dentes, não é? Pare de me zoar, tá legal?— Não estou brincando. – Lex chega mais

perto e Nina dá um passo atrás, batendo comas costas no parapeito da embarcação. – Mediga, que lugar quer muito conhecer e aindanão conhece?

— Paris. – ela responde, com ar distraído.— Paris? La ville lumière?— Ah, não. Você fala francês. – Nina revira

os olhos, com desdém.— É a linguagem do amor, sabe como é.— Como você é óbvio, Lex. – ela rebate,

estalando a língua no alto da boca.— Je ne suis pas pardi. D’ailleurs, tu sais

que tu es très belle, aujourd’hui?— Acha que estou linda hoje? Sério

mesmo? – Nina manda muito bem nofrancês.

— Putz grila! – o cara é pego no contrapé.– Fala francês? Por que não me disse?

— Tu ne m’as pas demandé, con.— Hahahahaha. Nina, você é uma caixinha

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de surpresas.— E como eu disse, você é o cara mais

óbvio que conheço. – ela gira sobre oschinelos e suspira profundamente. Lexentende a deixa, mas não desiste deaporrinhar.

— Que lugar mais a atrai em Paris? – elepergunta, entre os cabelos esvoaçantes deNina.

— Podemos até conversar civilizadamentese você largar de ser um otário.

— Tudo bem. O otário sai e o legal entraem cena. Pronto, podemos conversar. – elefaz uma pausa. – E então? O que querconhecer em Paris?

Nina bufa alto antes de responder, numrugido:

— O Louvre.— Tantas coisas para conhecer em Paris e é

o Louvre que chama a sua atenção? – Lex seposiciona ao lado de Nina. Alisa os cachospara trás e aguarda uma resposta àprovocação.

— Quero ver a pirâmide de vidro de perto.Pode até ser que eu chore de emoção. – Ninaentra em devaneios, afastando os cabelos

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que teimam em voar para o rosto. – Algo mediz que o Louvre é um lugar mágico. – então,se dá conta de com quem está dialogando ecompleta: – Vai me zoar?

— É claro que não. Aliás, poderíamos irjuntos a esse lugar mágico. Prometo enxugarsuas lágrimas. – Lex sorri, acompanhando areação de Nina de rabo de olho.

— Poxa, não dá mesmo para manter umaconversa normal com você. – ela se inflamade raiva.

— Estamos tendo uma conversa normal. –ele retruca, indignado.

— Não estamos não. E quer saber? Dê ofora daqui antes que meu joelho de ferroentre em ação!

— Ei, Lex, venha tocar algo para nós! –Gancho grita, com o violão em mãos.

— Bem, fui salvo pelo gongo. – curvando-se perante Nina, finaliza de maneira teatral:- Ma chérie, enchantée de te parler. Aurevoir.

~~***~~A Ilha da Sereia é um lugar mágico,

cercado por uma atmosfera aconchegante erústica. As principais atividades da pequena

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ilha são a pesca, o artesanato e o turismo.Um dos únicos restaurantes do lugarejo

localiza-se à beira-mar. Esse é um local altoastral, bucólico e supercolorido. É o típicolugar em que você se sente abraçado aoentrar.

Após o almoço, Nina dá de cara com oviolão de Lex sobre uma mesa e tomada poruma urgência do além, toca as cordas com aponta dos dedos, sentindo-se arrepiar. Aenergia de Lex emana do instrumento. Lais eNathi se entreolham, aos pulinhos.

— Toque para nós, Nina. – Nathália pede,com olhos brilhando em excitação.

— Não na frente dessa galera. – Ninarecua.

— Podemos ir ali, naquele cantinho. – Laisaponta para um lugar mais distante, umaespécie de bangalô sobre um tablado demadeira.

— Ah, Nina, por favor! – Nathi implora.— Ei, Gancho! – Nina chama. – Posso pegar

o violão do Lex emprestado?— Vai quebrar na cabeça dele? – o pirata

arregala os olhos.— Não, Cabeçudo! Ela vai tocar para nós. –

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Nathi intervém. – Acha que o Lex ficarábravo?

— Bom, se a cabeça do cara ficar inteira,acho que não tem problema algum. – Gancholibera o violão e as amigas se encaram,sorrindo.

~~***~~Quando Lex sai do mar, leva as mãos aos

cabelos, livrando-se do excesso de água. Comos olhos cerrados, sente uma vibração chegaraos ouvidos: uma voz melodiosa acima deduas outras. São vozes femininas, ao som deum violão.

As pálpebras de Lex se abrem, procurando.Petrifica no lugar quando vê a cena, paravariar, em câmera lenta:

Nathi e Lais estão sentadas sobre futons,elevadas por um tablado. Seus corpos vem evão, acompanhando o ritmo ditado peloviolão. Nina, sentada ao meio, toca com umapalheta em punho, os acordes tomando vidaa cada batida.

E a voz, o que dizer da voz? Seria Ninauma sereia disfarçada? Lex está sentindo umchamado quase insuportável, um clamor quegrita para que ele se aproxime. Antes que

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comece a caminhar, quase flutuar em direçãoà voz, Gancho dá um tapa no ombro do cara,trazendo-o de volta à realidade.

— Tudo bem eu ter emprestado o violãopara as meninas? – é a segunda vez queGancho faz a pergunta.

— Oi?— Se liga, Lex! Está com a cabeça onde,

meu camarada?— Desculpe, Cabeçudo. O que foi?— Tudo bem eu ter emprestado o seu

violão? Quer que eu faça mímica?— Ah, isso. Sem problemas. – Lex

responde, de forma casual. Seus olhosretomam o caminho até o tablado e ali sefixam, vidrados.

— Lex? Você está de boa? – Gancho corta avisão do amigo com a palma da mão. – Ai,meu bom God! O que é isso que eu vejo?

— Hum? – Lex ouve a voz de Gancho lálonge.

— Meu irmão, você está gamadão! Cara,não acredito nisso! Como eu não percebiantes?

— O quê? – Lex se sobressalta. – Cale aboca, Cabeça, não é nada disso.

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— Alexandre Heinrich, você estáperdidamente apaixonado, meu camaradinha.Juro que não imaginei que viveria para veressa cena.

— Gancho, enlouqueceu? – Lex sussurra,olhando para os lados.

— Qual é, Lex, eu sou seu brother! Se nãocontar para mim, vai contar para quem?

— Não estou apaixonado, tá legal? – Lexsustenta uma expressão nervosa, quasedesesperada.

— Lex, sabe que pode me contar qualquercoisa, não sabe?

— Gancho, no dia em que eu me apaixonar,você será o primeiro a saber.

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Trinta e seis: Véu de NoivaLá pelas duas da tarde, os monitores

reuniram a turma num local chamado Cantoda Sereia. De lá partirá a comitiva a caminhoda Cachoeira Véu de Noiva. Antes da saída, omonitor-chefe dá as instruções:

— A trilha é de quinze minutos,supertranquila e plana. Aqueles quequiserem, poderão descer a cachoeira derapel ou tirolesa. Os que não forem adeptosdos esportes radicais, poderão seguir poroutra trilha. Permaneçam juntos e vamos embusca de aventuras!

O caminho é ladeado por árvores frondosasde copas largas, carregadas de um coloridosuntuoso. Apesar do forte calor, a sombradas árvores refresca os estudantes e o aromade natureza intocada é revigorante.

Nina, Lais e Nathi puxam a fila,caminhando logo atrás dos monitores. Umdeles vai nomeando as espécies nativas aoredor. Um passeio para lá de cultural, já queNina não conhece a metade da flora que lheé apresentada.

Numa bifurcação, os estudantes se dividemem dois grupos: os Pés no Chão e os

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Amantes de Adrenalina. Óbvio que Nathisegue entre os Pés no Chão e Nina e Laisoptam pelos Amantes de Adrenalina. Ambasescolheram a tirolesa e já se preparam parasaltar, numa queda de trinta e seis metros deadrenalina na veia.

Lais é a primeira da fila e dá um gritoquando salta. O monitor checa oequipamento de Nina, posicionando-a. Elaserá a próxima. O coração quer sair pelaboca, mas a garota é corajosa. Lex seaproxima, com um sorriso de deboche.

— Vai mesmo encarar?— Não conheço o medo, Lex.— Encontro com você lá embaixo. – o tom

dele muda, denotando apreensão. Lex estácom medo por ela? Pouco provável. Ou estouenganada?

— Está pronta? – o monitor termina achecagem do equipamento, atrelando-o àcorda.

— Prontíssima. – Nina fita Lex por umsegundo. Cadê o sorriso debochado? O queela vê é uma expressão receosa e um olharsério. – Ei, eu não quebro, lembra?

— Chegue inteira lá embaixo, está bem? –

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Lex testa o equipamento de Nina, dandopequenos trancos para verificar se ela estaráem segurança.

— Quer apostar?Lex morde o lábio e não responde a

provocação.— Ok, Lex, fique tranquilo. Vejo você lá

embaixo. – dito isso, ela se joga em direçãoao nada, sentindo tudo ao mesmo tempo. –Uhuuuuuuuuuuuuuuuu.

~~***~~Caramba, o que dizer sobre a cachoeira? O

lugar é um pedaço do paraíso na Terra, comum lago esverdeado e límpido, cercado porformações rochosas e muito verde. A águacai aos montes lá de cima, abrindo-se numvéu que bate com força no deck natural depedra calcária.

Nina e Lais nadam até a margem, ondeNathália está sentada com um livro em mãos.O mesmo livro que Gancho cedeu quando oseu ficou ensopado.

— Nathi, venha nadar! – Lais chama.— Ah, gente, vocês sabem que eu não

curto esse tipo de coisa. O fundo é lamacentoe tem bichos estranhos aí dentro. – Nathi

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marca a página do livro e o fecha. – Euprefiro ficar aqui, sendo comida pelosborrachudos.

— Você deve ter o sangue doce. Osborrachudos não ousam se aproximar demim. – Nina brinca, saindo da água.

— Certo, pessoal, para aqueles que seaguentam nas próprias pernas, atrás daqueda d’água existe uma gruta incrível. Sãoquatro câmaras desenhadas pela natureza.Quem estiver a fim, que me siga! – o monitormergulha e poucos o seguem. Nenhuma dasmeninas encara passar por debaixo da quedad’água.

— Lais? – Nina aponta com a cabeça para acachoeira.

— Ai, será? Não sei não. – Lais não estámuito disposta a encarar a fúria da natureza.

— Sozinha eu não vou. – Nina está muito afim de conhecer a tal gruta.

— Vou com você. – a voz de Lex se fazouvir quando ele sai da água.

— Não, obrigada. – Nina rebate, comdescaso.

— Qual é, vamos lá, será divertido. –Gancho se aproxima, colocando pilha nas

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garotas.Lais topa ir com Gancho, mas só depois de

Nathália dar um ok com a cabeça. Lex esperapor uma resposta de Nina.

— Vá lá, Nina. – Nathi incentiva.— Talvez não seja boa ideia. A força dessa

água vai arrancar o meu biquíni e eu deixei acamiseta na praia.

— Sinceramente, adoraria que a águaarrancasse o seu biquíni. Quanto à camiseta,pode usar a minha. – Lex tira a camisetaensopada da cintura, estendendo-a paraNina.

— Como você é engraçadinho. – elaestreita os olhos, metralhando-o.

— Vá logo, Nina. – Nathi empurra a amigapara cima de Lex.

— Dê logo essa camiseta aqui. – ela puxa avestimenta, analisando os prós e contras.

— Não pense, apenas vá. Ou depois, vai searrepender de não ter ido. – Nathi entãoretoma a leitura.

Vestindo a camiseta de Lex, ela o segue anado até a cachoeira. A força da água ésurpreendente e Nina tem dificuldades pararespirar. Lex sobe no deck com uma

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facilidade extrema e lhe estende a mão.A água pesa toneladas e massageia

ferozmente os ombros e a cabeça. Nina senteos joelhos arquearem e Lex a puxa de umasó vez para dentro da gruta.

O chão está escorregadio e ela se apoia noombro dele. Lex a enlaça pela cintura e osdois avançam com muito cuidado. Lais eGancho seguem mais a frente, umamparando o outro para não caírem.

— Está escorregando muito. – Ninacaminha com cautela.

— Enquanto estiver nos meus braços,estará segura. – ele solta a pérola.

— Rá, rá! Como você é presunçoso.— Olha quem fala.Avançando vagarosamente, finalmente

chegam a uma segunda câmara. O monitorexplica como aquela gruta foi formada e Ninanão consegue prestar atenção, sua mentenão processa as mais simples palavras.

Lex está próximo demais.O toque dele em sua cintura, o calor que

ele emana, as gotículas de água queescorrem pelo seu tórax, a forma como eletomba a cabeça de lado, os olhos da cor do

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sol, a barba dourada por fazer, os dentesbrancos que agora mordem o lábio.

Nina se pega relembrando o gosto que eletem, a forma como ele a segura ao beijá-la,aquele sorriso debochado nos lábios… elenem imagina, mas ela se derrete por dentroquando ele sorri.

O monitor leva a turma para outra câmarae ao invés de seguir o pessoal, Nina estaca,sentindo que precisa sair correndo dali agoramesmo. Há uma ânsia que abre caminho porsuas veias, uma vontade absurda eincontrolável de sentir os lábios de Lexcontra os seus.

— O que foi? – ele pergunta quandopercebe que há algo errado.

— Nada. – Nina acaba de corar, abaixandoa cabeça para que Lex não perceba.

— Está tudo bem?— Tudocerto. – ela responde tão rápido que

o “tudo certo” pareceu uma palavra só. –Eu… eu vou voltar.

— Por quê? – Lex suspende o queixo deNina com o polegar. – Não fiz nada errado,fiz?

— Não. – ela se apressa em responder. –

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Por incrível que pareça, você não fez nadaerrado.

— Então?— Não é nada, só quero voltar. – ela

desliza os pés pelo chão rochoso e vai searrastando, sem conseguir se firmar.

— Tudo bem, eu ajudo você. – ele a segurapela cintura e os dois seguem rumo à saídada gruta.

Avançando sem prudência, Nina dá umpasso maior do que deveria. O pé de apoionão a sustenta e Lex a ampara, usando aparede rochosa para escorá-la. Tão próximos,tão perigosamente próximos!

Eles se encaram por alguns segundos. Ninasente o coração pulsar mais rápido e temecometer uma loucura a qualquer momento. Enão é que ela comete?

Indo contra sua natureza congelante, Ninaagarra o rosto de Lex num ímpetodesenfreado, trazendo-o para si, para suaboca. A garota perde o controle, o chão, anoção. Lex não se afasta, pelo contrário. Elea gruda no paredão, num desesperocausticante.

A conexão entre os dois é imediata. Tudo

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ao redor perde a importância, o significado.Nina sabe que deveria se afastar, mas nãoconsegue, os sentimentos gritam e tomamespaço com uma força avassaladora.

As mãos de Lex ganham terreno, subindopelas curvas de Nina, levantando a camisetamolhada até o meio das costas. Ele tomba acabeça de lado e se agarra aos cabelos dela,completamente ensandecido.

Esses dois estão pegando fogo e Nina nãoconsegue apagar o incêndio. Uma de suaspernas se enlaça aos quadris de Lex e ogaroto está a ponto de entrar em ebulição.

Infelizmente eles não veem, mas eu vejo:Bola, escondido nas sombras, lança mão dacâmara a prova d’água de Bárbara e clicaesse momento tão íntimo. Com um sorrisinholateral, o cara se afasta, doido para ganharmais um beijinho.

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Trinta e sete: Voltando para a IlhaInamorata

Nina afasta Lex brutalmente. Ela arfa. Eletambém. Os dois se fitam por um períodoindeterminado e Nina está envergonhada.Em que diabos ela estava pensando aoagarrar o cara dessa maneira?

Bola já se mandou faz tempo, esgueirando-se para dentro da gruta, juntando-se aosoutros. Lex e Nina estão sozinhos, ao lado daqueda d’água. O sol incide de maneira aformar um lindo arco-íris, mas nenhum delesaprecia o espetáculo.

— Desculpe, não sei o que me deu. – elamira os pés, sentindo-se ruborizar.

— Quando um não quer, dois não beijam. –Lex se aproxima novamente, mas Nina obloqueia com a mão espalmada, mantendo-oà distância. – Precisamos conversar sobreisso.

— Não, Lex. Não há nada o que conversar.– segurando-se na parede rochosa, a garotavai se equilibrando, deslizando os pés parachegar a saída da gruta.

— Nina, por favor.— Não quero conversar. – ela balança a

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cabeça, sentindo-se ruir por dentro.— Espere, eu ajudo você.— Não. Eu me viro sozinha.Lex estaca. Observa Nina se afastar, passar

pela parede de água e sumir das vistas. Alisaa franja para trás e mira o teto cavernoso,com lábios trêmulos e a mente confusa.Tomado por uma fúria crescente, desfere umsoco no paredão rochoso. Lex está pego esabe disso, apesar de não querer acreditarem seus próprios sentimentos.

~~***~~Já passa das seis e o céu sustenta os

últimos raios do sol, numa aquarela belíssimade degradês. Nina, Nathália e Lais debatem,sentadas em um banco acolchoado na proada embarcação. Nina acaba de contar o queaconteceu na gruta e as amigas estãoboquiabertas, sem saber o que dizer.

— Eu acho que perdi a aposta. – Ninaprende o cabelo num rabo de cavaloimprovisado. Os olhos estão marejados e ossentimentos são confusos e intensos. – Vocêestava certa, Nathi. É impossível resistir aoLex.

— Odeio sempre estar certa. – Nathália

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tomba a cabeça para trás, fitando asprimeiras estrelas que surgem nofirmamento.

— Não é só atração? – Lais especula. – Derepente você está confundindo sensaçõescom sentimentos. Acontece com maisfrequência do que se imagina.

— Eu não sei. Nunca estive tão perdida naminha vida. – Nina confessa, desanimada.

Nathália suspira alto, tinha certeza de queisso aconteceria. Lex é um cara sedutor, dosmais gabaritados. Ninguém, em sãconsciência, resistiria aos seus encantos.

— O que eu posso dizer? – Lais segura asmãos de Nina entre as suas. – Antes dedecretar a vitória do Lex, tenha certeza dosseus sentimentos. Coloque-os à prova.Enquanto isso, mantenha a nossa estratégia.

— Não tenho mais forças para continuarcom isso. Estou cansada. – Nina revela, aoschoramingos.

— Faltam só três dias para voltarmos.Espere até lá antes de dar fim à aposta. –Nathi finaliza e deita sobre o bancoacolchoado, admirando os brilhos piscantesno céu.

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~~***~~Bola ganhou um beijo daqueles desferido

pela Kibi Mor. Mais um. A foto de Lex e Nina,aos amassos, atrelados como dois selvagens,ficou fantástica. A luminosidade, o cenário, oclima “homem das cavernas”… tudo ficouperfeito.

Mas Bárbara quer mais, algo realmentequente. Uma imagem que grite “Nina é umabiscate”. Essa foto, a Kibi ainda não obteve.Mas ela conseguirá, independente do queprecise fazer para isso.

~~***~~O clube do bolinha está reunido após o

jantar, conspirando na sala de jogos do hotele não parece haver ninguém a espreita.

As únicas apostas cumpridas até omomento foram o jogo de tênis, em que Lexvenceu, e Nando versus Camila. A garota,sem saber de nada, caiu na rede de Fernandolá na cachoeira. Deram uns amassos e Nandovenceu a aposta. Coitadinha da Camila, é aquarta vez que cai numa aposta. Mas, aocontrário das outras vezes, o garoto estáinteressado e resolve investir pesado. Pontopara Camila.

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A aposta Gancho versus Nathália não andamuito bem das pernas. O cara ficou puto enão quer levar isso adiante. Não que nãoesteja interessado em Nathi, longe disso. Oque ele não quer é que ela seja uma apostae, por isso, decide-se manter distante,preservando-a.

As apostas Edgard versus Suzana e Hulkversus Ana Paula não vingaram. As Kibisparecem saber que são apostas, como sealguém houvesse delatado. Sempre que osgarotos se aproximam, elas rugem, ferozes.Coisa estranha.

Bem, para nós não é nada estranho, afinal,Bola deu com a língua nos dentes, contandopara Bárbara sobre as apostas. Garoto mau,muito mau.

A única aposta sem um final definido é Lexversus Nina. Os garotos querem saberdetalhes e ele se limita a dizer que já perdeuessa. Não conta sobre os beijos nem sobreseus sentimentos com relação à garota.

Gancho abaixa a cabeça e dá umarisadinha. O Cabeçudo é o único que sabesobre os beijos roubados e tudo o que estárolando entre esses dois. Apesar do amigo

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jurar que não, Gancho tem certeza de queele está apaixonado.

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Trinta e oito: O início do quinto dia nailha

Lex e Nina não conversaram depois do querolou na gruta. Ela esquiva-se, não querconfrontá-lo de maneira alguma. Sente comose estivesse no olho de um furacão, semsaber para onde correr.

Nina teme enfrentar seus sentimentos, nãoconsidera a possibilidade de descortinar oque está por trás das sensações que invademseu corpo quando Lex está por perto. Nãoquer descobrir que Nathália estava certa, nãosuporta a ideia de estar apaixonada.Justamente ele?

Depois do café-da-manhã, os monitoresreúnem os estudantes na praia, com umadisputa para lá de divertida. Será umaespécie de Iron Man, onde as mesmas duplasda Caça ao Tesouro deverão cumprir váriastarefas, a fim de cruzarem no menor tempo alinha de chegada. O desafio inclui: caiaque,mergulho, corrida, escalada, arborismo eoutras coisinhas mais.

Nina olha para o céu, pedindo socorro.Agora não terá como escapar de Lex. Atépensa em não participar do desafio, mas por

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sorte, ela tem Nathi e Lais como amigas.Ambas não permitem que ela desista e Lais émais contundente ainda:

— Como saberá se está apaixonada se nãoencarar a situação de frente?

— Talvez seja melhor eu não saber. – Ninareflete.

— Ah, fala sério! Você é uma mulher ouuma barata? – Nathi incita. – Você não temmedo de nada, lembra? Cadê a sua coragem?Ou tudo não passa de encenação?

— Estou com a Nathi. Você vai participar dodesafio sim. Se fugir, juro que lhe dou umsoco. – Lais sacode Nina pelos ombros. –Esconder-se não ajudará em nada. Enfrentea situação, coloque seus sentimentos àprova, descubra o que está havendo entrevocês.

— Eu amo vocês duas, já disse isso algumavez? – Nina as puxa para um abraço grupal.

— Não, você nunca disse isso. – Nathiresponde, um tanto emocionada. – E, porfavor, pare de ter medo de ser feliz.

~~***~~A primeira parte do desafio é a seguinte: a

dupla pegará um caiaque e remará até o

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local indicado com uma imensa boiavermelha. Nesse ponto, um dos competidoresmergulhará para resgatar uma bandeira como logotipo do hotel. Feito isso, as duplasvoltam para as areias e a segunda parte dodesafio será liberada.

— Para deixá-los com água na boca, oprêmio será um almoço inesquecívelpreparado pelo Chef Louis, com direito àcamarões gigantes, lagosta, risoto de salmãoe tudo o mais que puderem imaginar.

“Um bangalô será montado na praia e osperdedores terão que comer a gororoba dorestaurante do hotel – ok, a parte dagororoba é uma mentira já que a comida dolugar é fantástica.

“Os vencedores também ganharão umpasseio em volta da ilha, a bordo da nossalancha super ultra mega veloz. – o monitorencara aqueles olhinhos brilhantes antes dearrematar. – Quem quer vencer?

Uma debandada de pássaros arranha osouvidos quando a galera se manifesta aosgritos de forma desordenada. Nina estáapática, não esboça qualquer reação. Aindanão teve coragem de olhar para Lex que está

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a alguns passos de distância.Vou dizer: Se esses dois trabalharem

juntos, podem vencer a disputa comfacilidade. São atletas bem preparados,possuem um fôlego invejável e ambos sãocompetitivos ao extremo. Eu aposto nessadupla, e vocês?

— Ok, crianças, procurem o seu par eestejam a postos em cinco minutos. O desafiojá vai começar! – quem grita é Margareth, aprofessora de educação física.

Lais e Nathi se despedem de Nina, que ficasozinha no meio da multidão. Lex seaproxima, um tanto temeroso, nunca sabe oque esperar. É possível que ela o enforque.Porventura o morda. Ou talvez ele leve outrochute no meio das pernas.

Nada disso acontece.— Está pronta? – ele pergunta.— Hum, hum.— O que acha de vencermos? Adoro

camarão. – Lex tenta quebrar o gelo.— E eu adoro lanchas. – Nina desvia o

olhar dos chinelos trançados para fitar osolhos dourados de Lex. – Acho quedeveríamos vencer.

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— Está comigo? – Lex estende a mão.— Estou com você. – ela bate na palma da

mão dele e o trato está feito.~~***~~

Já sabendo do desafio de antemão, Ninaoptou por um maiô preto, mais comportado efechado. Está usando uma saia de Tac Telbranca, daquelas que secam bem rápido.Passou uma generosa camada de protetorsolar na pele e da dúzia de óculos de sol quetrouxe, escolheu um esportivo da Mormaii,perfeito para o dia de hoje.

Lex está sem camisa – oh, que novidade! –,vestindo apenas uma bermuda pretaBillabong e um boné cinza. Ele e Nina estãoao lado do caiaque vermelho com lugar paraduas pessoas, aguardando o apito de largada.

Lex joga o boné na areia e no lugar,posiciona a máscara de mergulho. Os doiscombinaram que é ele quem vai para a águaquando chegarem ao local marcado.

O apito soa e a bagunça começa. Lex pegao caiaque pela frente e Nina empurra portrás. Quando a pequena embarcação flutuano mar, os dois se acomodam e remamjuntos.

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As remadas são sincronizadas e a canoadesliza suave sobre as águas cristalinas. Odia está quente, ensolarado e não há umanuvem sequer no céu. A boia vermelha seaproxima e Lex mergulha quando atingem oponto mais próximo.

Enquanto o garoto está debaixo d’água,Nina gira a embarcação em direção à praia.Por sorte, já navegou antes e sabe comomanejar os remos. Outros competidores seenrolam e uns poucos ainda nem saíram dasareias da praia.

Lex vem à tona com uma bandeiravermelha em mãos. Nina equilibra aembarcação para que ele suba sem derrubá-los. E então, são os primeiros a chegarem napraia, ao som de vociferações de quem aindanão conseguiu resgatar a bandeira.

Tiram o caiaque do mar e correm emdireção ao monitor-chefe. Ele lhes dá duasgarrafas d’água e um papel pardo, quecontém a explicação da próxima parte dodesafio. Nina lê em voz alta, enquanto Lexsorve metade da água:“Corram até as rochas e escalem até o cumeda montanha. Lá encontrarão um monitor e

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novas instruções. Apressem-se.”— Certo, vamos! – Lex se coloca a correr e

Nina emparelha com ele, tentando seguir oforte ritmo que ele impõe.

Correr na praia não é tão simples assim.Estão descalços e a areia é fofa, o que atorna um obstáculo natural, impedindo queaumentem a velocidade. Lex olha para trásalgumas vezes, certificando-se de que estãoabrindo vantagem sobre os outroscompetidores.

Lex alcança as rochas e inicia a subida. Eleprogride fácil e Nina tem maioresdificuldades, mas não pede ajuda, ela éorgulhosa demais para isso.

Nas pedras, o cuidado precisa serredobrado. As rochas estão revestidas delimo e escorregam um bocado. Um passo emfalso e a brincadeira poderá chegar ao fim.

Lex esbarra num ponto crítico e interrompea subida, estudando melhor o terreno. Asondas batem com força nas pedras, lançandoágua para todos os lados. Nina faz cara denojo ao detectar algumas baratas do mar.Eca!

Lex opta por fazer um desvio e se pendura

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em um rocha pontiaguda, erguendo o corpocom facilidade. Nina nota quando osmúsculos do cara se contraem, devido a forçaque ele emprega. As costas dele sãoperfeitas, para dizer o mínimo.

Lex estende a mão e Nina a aceita,relutante. Ele a puxa para cima como se elanão pesasse nada. De onde estão, ambosenxergam uma praia vizinha, praticamentedeserta. Um barco veleiro está ancorado epescadores trabalham em uma rede, à beira-mar.

A subida recomeça e Nina segue Lex deperto, pisando onde ele já pisou, só porgarantia. Uma gaivota passa voando por suascabeças e a garota se distrai,desequilibrando-se quando já estão quase noalto da montanha.

Ela bate as mãos para trás, como se tivesseasas, tentando se reequilibrar. Lex, numraciocínio rápido, consegue segurá-la pelocós da saia, trazendo-a para junto de si.

— Ei, onde pensa que vai? – ele debocha,atrelando-a pela cintura.

— Foi a gaivota! Ela tinha que gaivotarjustamente agora?

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— Hahahahaha. Gaivotar foi ótimo. – Lexumedece os lábios. – Você está bem?

— Estou. – Nina revira os olhos, tirando asmãos de Lex de sua cintura.

— Estamos chegando, hein, seus manés! –é Hulk quem grita, aproximando-serapidamente.

— Vamos em frente. – Lex deixa Ninapassar e segue atrás, vencendo os últimosmetros.

No topo da montanha, a garota engole umsuspiro. A paisagem é asfixiante de tãoincrível. Mas Lex não permite que Nina percao foco e a puxa pela mão, correndo emdireção ao monitor.

— Vocês são os primeiros, por enquanto. –o monitor aponta para o alto do farol. –Subam juntos até o topo e acenem para mim.Só então peguem a bandeira. Quandodescerem, eu lhes direi qual a próxima etapa.– o monitor dá uma risadinha e Lex e Nina seapressam.

O farol, pintado em vermelho e branco,possui uma única entrada. A porta estáaberta e eles entram, olhando para cima ebufando. Os degraus são estreitos e a escada

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vai até o alto, em forma de espiral. Ninafecha os olhos, maldizendo a própria sorte.

— Por que não colocam um elevador nesselugar? É sério, terei um troço na metade docaminho. – ela diz, arqueando o corpo para afrente.

— Pense na lancha. Estou pensando noscamarões.

Lex sobe os degraus de dois em dois. Ninavai logo atrás, sentindo que a qualquermomento os pulmões serão expelidos pelaboca ressequida. Na metade do caminho elacomeça a arfar e precisa de água,urgentemente. Lex, que está com as duasgarrafas nos bolsos laterais, passa uma paraNina.

Se precisam de motivação, o estímulochega. Quatro vozes sobem a escada e Lexagarra o pulso dela, vencendo os degraus tãorápido quanto possível.

Acenam para o monitor e Lex pega abandeira. Nina precisa de um tempo para serecuperar. As pernas queimam, latejando.Enxuga o suor da testa com o antebraço ebebe mais um gole d’água.

— Como faremos para descer? Só passa um

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por vez nessa escada. – Nina recosta nagrade, recuperando o fôlego.

— Podemos usar o corrimão. Só tenhacuidado, tá legal?

— Certo.Iniciam a descida e vou dizer: é muito mais

fácil do que subir. Hulk tenta atrasá-los, masNina ameaça jogá-lo lá de cima. O cara, quejá foi atirado num balde de gelo, recua,deixando que eles passem. E dá-lhe Nina!

Na saída do farol, esbarram com váriasduplas, mas ainda estão na frente quandoLex entrega a bandeira ao monitor. As novasinstruções revelam:“Pedalem pela trilha até alcançarem o Centrode Arborismo. Lá encontrarão um monitor e

uma nova instrução. Boa viagem.”Lex enxerga várias bicicletas ao longe. Os

dois correm em disparada, buscando mantera dianteira. As bikes estão equipadas compedaleiras de borracha, ou seja, nada de pédoendo.

A trilha é cheia de altos e baixos. Por sorte,a maior parte é descida e não precisamefetivamente pedalar. Nina aproveita pararelaxar, curtir a paisagem e tomar mais uns

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goles d’água.— Precisamos conversar. – Lex grita.— Estou focada na lancha. – Nina retruca.— Vamos vencer e teremos um almoço

inteiro para conversarmos.Nina congela sobre a bicicleta, não tinha

pensado sobre isso. Se vencerem, almoçarãojuntos e depois, farão um passeio de lancha,também juntos. Ela não terá mais como fugirde Lex.

— Estamos chegando. – Lex aponta para oCentro de Arborismo. – Preparada?

— Talvez. – Nina está em dúvida se deveou não vencer o desafio.

— Nina?— Ok, vamos vencer essa bagaça!

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Trinta e nove: Linha de chegadaJá passa do meio-dia. O Centro de

Arborismo, como o próprio nome diz, é umlocal repleto de árvores estrondosas, detroncos grossos e muito verde ao redor.Pouca luminosidade solar atravessa as copasdas árvores, o que torna o clima do lugarmais úmido e ameno.

Lex acaba de ler as instruções. Pelaprimeira vez no desafio, os dois irão paralados opostos.

Um monitor iça Nina até o topo de umaárvore. É bem alto. Ela se agarra as lateraisda primeira ponte, caminhando sobre umacorda grossa e inconstante. Conformeavança, a estrutura de cordas balança para láe para cá, para cima e para baixo.

Nina chega a primeira parada. Agoraprecisará passar por uma ponte de madeira,dessas assustadoras que rangem a cadapassada. Pode ouvir a voz de Lex motivando-a. Também escuta várias vozes vindas ládebaixo. Outras duplas já chegaram aoCentro de Arborismo.

Nina alcança o outro lado da ponte.Seguindo as instruções, pega uma bandeira

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vermelha e se dirige para o Grito do Tarzan.Lex está na outra árvore, gesticulando paraque ela ande rápido. Nina morde a haste dabandeira, atrelando-se aos nós da corda.Olha para baixo e vê uma imensa tela deproteção. Se cair, terá que engatinhar até ooutro lado, o que demorará o dobro dotempo.

Um, dois, três e já!Nina se joga no Grito do Tarzan,

segurando-se como pode. Lex está com umadas mãos estendidas e a outra segura firmenum pilar de madeira. Ele a puxa pelacintura e, como as leis da física são sempreválidas, os dois são atirados para trás. Abandeira cai no chão.

Ela engole em seco. Ele deixa um suspiroescapar. Novamente tão próximos! Os olhosde Lex percorrem o rosto de Nina, numaânsia abrasadora. Os olhos dela acompanhamos movimentos dele, sem perder um sódetalhe.

Lex entreabre os lábios, fixando-se na bocadela. Antes que algo possa acontecer, Hulkaparece para aguardar seu companheiro dedesafio.

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Nina pisca de forma incessante, como seassim pudesse cair na real. Lex arqueia ocorpo e pega a bandeira do chão. Os doisseguem para a escada de cordas e começama descida.

Um monitor já os aguarda, com a últimaparte da disputa em mãos. Entrega doisbroches para Nina e Lex com os dizeres:“Sobrevivi ao desafio Inamorata”.

Nina alfineta o seu broche à saia e Lex àbermuda. O monitor indica a trilha quedevem seguir de volta à praia. A linha dechegada deve ser cruzada e só então, serãoos vencedores.

Ambos retomam a corrida. Nina sorve aágua como se fosse ar. O restante, joga norosto e na nuca, sem parar de correr.

Já é possível vislumbrarem a praia e ohotel. Lex olha por sobre o ombro e vê duasduplas se aproximarem rapidamente.

— Certo, teremos que dar um sprint. Vocêaguenta? – Lex pergunta, num tom deesgotamento.

— Sprint é o meu nome do meio. – ela sevangloria.

— No três: um, dois, três.

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Quarenta: Almoço no bangalôApenas cinco duplas completaram o desafio.

O restante da turma desistiu em váriospontos do circuito.

Nina está sentada sobre a areia quente.Suas pernas queimam, os joelhos gritam e opulmão está dando uma de coitadinho,chiando quando o ar entra e sai.

Lex alonga o pescoço, os braços, os ombros.A cada movimento que faz, os músculossaltam às vistas de maneira ultrajante.

— Onde ele malha? No Olimpo? – uma dasmeninas comenta.

— Estou sem palavras. – outra reitera.Nina não deveria sentir-se assim, mas o

ciúmes chega sorrateiro, instalando-se naboca do estômago. Várias das garotas doúltimo ano estão babando em Lex e isso adeixa incrivelmente alterada.

Antes que fale alguma bobagem, o monitoranuncia os vencedores. Lex e Nina vencerampor muito pouco.

Nathália e Lais dão pulinhos e batempalmas. Suas duplas desistiram logo nocomeço da disputa. É Lais quem aponta parao bangalô montado na areia da praia.

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A estrutura consiste num tablado demadeira, com duas paredes laterais feitas embambu e cobertura de tecido tensionável.Nina observa uma mesa baixa em estilojaponês e futons cor de terra espalhados pelochão.

A mesa está posta, lindamente adornadacom flores e um candelabro no centro. Pelaforte brisa que vem do mar, Nina pensa queserá impossível acender as velas.

— Vencemos. – Lex se aproxima.— Tudo por um camarão, hein? – Nina

prende os cabelos no alto.— Talvez eu tenha feito isso pela lancha. –

o comentário de Lex pega a garota nocontrapé. Ela finge não ter ouvido e combinade se encontrarem no bangalô, em meiahora.

~~***~~Nina está nervosa com esse almoço. Não

consegue escolher uma roupa para vestir eLais resolve ajudar, escolhendo pela amiga.

O vestido de tecido fluido e floral é bemcurtinho, com mangas esvoaçantes e umdecote arrematado por um laço. Lais separatambém um biquíni para Nina usar por baixo.

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Nos pés, um dos chinelos da mega coleção.Nathália está jogada na cama quando Nina

gira nos calcanhares, fazendo o vestidoflutuar ao seu redor. As amigas batempalmas.

— Eu não sei nem o que conversar com ele.Sobre o que vou falar? Era muito mais fácilquando eu só precisava ser ácida e cruel. –Nina se senta numa cadeira para que Laispossa arrematar uma presilha na lateral doscabelos dela.

— Seja você mesma, fale o que der natelha. – Nathi aconselha.

— E se eu falar besteira?— Pare de sofrer por antecipação. – Lais

finaliza os cabelos de Nina. – Você vive medizendo isso.

— Não é tão fácil na prática. – ela selevanta, fitando o reflexo no espelho. Se nãose conhecesse o suficiente, diria se tratar deuma outra pessoa, alguém que nunca foienganada e que acredita em contos de fada.

~~***~~Lex está com o peitoral escondido, é isso

mesmo produção? O cara veste uma camisetaazul, bermuda branca e um chinelo desses de

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couro, bem moderninho.Lais tem um ataque de riso quando vê o

garoto recostado no bangalô, girando umaflor nas mãos. Será para Nina?

Ele e Gancho conversam… na verdade,parece que Gancho dá as instruções e Lexconcorda, meneando a cabeça.

— Agora é com você. – Lais ajeita umamecha do cabelo de Nina para trás da orelha.– Nada de ficar tensa, tá legal? Ajanaturalmente e tudo dará certo.

— Não acredito no que está acontecendo.Se me dissessem, uma semana atrás, euteria feito xixi nas calças de tanto rir. – Ninaestá desconfortável em sua própria pele.

— Na verdade, acho mais provável quevocê tivesse socado quem lhe contasse algoassim. – Nathi olha para Gancho e suspiraalto.

— É, tem razão. Eu teria socado o infeliz. –Nina concorda.

Os amigos param de conversar no instanteem que as garotas chegam. Lex engole Ninacom os olhos e ela se sente ruborizar. A brisasopra o vestido de maneira sensual e ogaroto não consegue disfarçar o fascínio que

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ela exerce sobre ele.— Seus sortudos do caramba! Bom almoço

para vocês. – Gancho se encaixa no meio deNathi e Lais, abraçando-as pela cintura. –Venham, meninas, vamos comer o grude dorestaurante. – e os três seguram risinhos,dando meia volta à caminho do hotel.

Lex gira a flor com uma expressão nervosa.Nina olha para os pés, sentindo algocrescente se formar em seu estômago, nãosabe como agir em situações como essa. Ou,se sabe, desaprendeu em algum lugar dopassado.

— Você está linda. Perfeita, eu acrescento.– o tom de Lex é formal.

— E você está vestido… uau. – ocomentário de Nina era para ter soado ácido,mas não foi assim que saiu.

— Bem-vindos ao nosso humilde bangalô,vencedores. Tomem seus assentos, porque aviagem gastronômica já vai começar. – oChef Louis de francês não tem nada. Osotaque é baiano, daqueles bem arretados.Nina morde o lábio, segurando o riso. Lexolha para o céu, respirando fundo para nãogargalhar. O Chef deposita duas casquinhas

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de siri na mesa e volta para a cozinha,seguido por um garçom.

— Primeiro as damas. – Lex curva o corpopara a frente, permitindo que Nina passe. Elafaz uma reverência e tira os chinelos naentrada do bangalô, sentando-se sobre umfuton.

Lex se ajoelha perante a garota antes detomar o seu lugar. Ela congela, não esperavapor isso. O garoto pede permissão com oolhar.

— Está brincando, não é? – Nina recua,desconfiada.

— É só uma flor. – ele a gira entre osdedos, pelo caule. – É a minha bandeira dapaz, uma trégua.

— Uma trégua? – ela pensa por umsegundo. – Tudo bem, acho que posso aceitarisso.

Numa situação para lá de romântica, Lexcoloca a flor nos cabelos de Nina, usando apresilha de Lais para prendê-la. Nina abaixaa cabeça, sentindo um calor sufocante derepente.

— Sem jogos, concorda? – eles se encarame Nina abafa os sentimentos que afloram,

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descontrolados. Engole em seco e concordacom os termos de Lex:

— Sem jogos. Entendido.Os dois brindam com os talheres e

começam a comer. Nina revira os olhos, emêxtase. Essa, definitivamente, é a melhorcasquinha de siri que já comeu na vida.

O Chef Louis volta da cozinha, trazendouma imensa porção de camarões graúdosempanados e fritos, com um molho tártaropara acompanhar.

O garçom recolhe os primeiros pratos eserve mais água e coquetel de frutas – semálcool, infelizmente. Não sou a favor debebidas alcoólicas, mas nesse caso até quepoderia ser bem útil.

Nina não está à vontade. Teme que Lexentre na conversa aposta e beijos roubados.É exatamente no que ele pensa, só estátentando encontrar uma brecha para falaremsobre o assunto.

Esse poderá ser um diálogo perigoso,envergando por terrenos desconhecidos. Ogaroto, após devorar quase um prato decamarões, resolve que o momento é agora.

— Temos que conversar sobre o que está

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havendo.— Você disse sem jogos. Então, será que

não poderíamos falar sobre outra coisa? –Nina se esquiva.

— Em algum momento, teremos que falarsobre isso.

— Não sendo agora, para mim está ótimo.– Nina tenta parecer descontraída, mas osmúsculos de sua face a entregam. Estãotensos e sua expressão denota apreensão.

O garçom retira o prato de camarões e oChef Louis coloca uma imensa lagosta nafrente dos garotos, explicando, em detalhes,a forma como foi feita. Quando a explanaçãotermina, Chef e garçom se retiram e Lexretoma o assunto, tomando um outrocaminho:

— Eu tenho uma curiosidade imensa sobrevocê. – ele a encara, perscrutando suasreações: – O que aconteceu para transformá-la em uma muralha? Por que parece ter tantomedo de se envolver? – Lex entrelaça osdedos sobre a mesa, aguardando.

— Quer mesmo falar sobre isso? – Ninalimpa as mãos em uma toalha úmida, trazidajuntamente com a lagosta. – Quer mesmo

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saber o que aconteceu no meu passado? –faz uma pausa dramática e arremata: –Talvez não goste do que ouvirá.

— Quero muito entendê-la, conhecê-lamelhor.

— Só quer isso porque faz parte da aposta.– Nina cruza as mãos à frente do corpo, nadefensiva.

— Não é isso. Não estou jogando. – asinceridade exala daqueles lábios sedutores.

Nina inspira profundamente. Poucaspessoas sabem o que aconteceu no passado,sua história com Bruno. Lais e Nathália sãoduas delas. Mas um impulso em abrir o jogoa assola de repente, como se esse fosse ocerto a fazer.

— Se é isso o que você quer, tudo bem.Vou contar.

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Quarenta e um: Abrindo o jogoA alguns metros dali, escondida entre

arbustos de folhagens esverdeadas, Bárbaraaproxima o zoom da câmera e tira mais umafoto. A Kibi Mor está fritando de raiva porainda não ter conseguido a fotografia queimaginou. Vingança é a única palavra queessa garota parece conhecer.

De todas as fotos, apenas duas sãorealmente boas: a de Lex e Nina na trilha daCaça ao Tesouro e a da gruta. A imagem dobeijo na quadra de tênis também éfenomenal, mas não terá o efeito desejado.Afinal, a sala inteira assistiu ao espetáculo decamarote. Não. Ela precisa de um materialinédito e caliente. Quer provar que Nina éuma biscate.

— Não acredito que esteja aí observando ospombinhos. – Bola chega por trás, sem aviso.

— Cale a boca e se abaixe! – Bárbara puxaBola para detrás dos arbustos. – Querentregar a minha localização, seu idiota?

— Quem você está chamando de idiota?— Bolinha, é sério, eu preciso muito de

uma foto quente. Então, se me der licença…— Eu tenho o que você precisa. – Bola a

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encara com uma expressão de superioridade.– Mas o preço vai dobrar.

— Como é? Está querendo me chantagear?Eu deveria rir, mas a situação é tensa.

Todo chantagista já passou ou passará porum momento como esse, afinal, colhemos oque plantamos.

Bola tem um trunfo ilícito na manga, algoque poderá mudar o rumo dosacontecimentos. Eu já disse que esse garotoé mau?

— O que você tem para me ajudar? Umafoto quente? A Nina nua? O que é? – Bárbaraé a ansiedade em pessoa ao chacoalhar osombros de Bola.

— Primeiro vamos determinar o preço, sóentão eu lhe mostro o produto. – Bolanegocia, preguiçosamente. O cara está porcima e sabe disso.

— Droga! – Bárbara se inflama. – Tudobem, qual o seu preço?

— No luau de hoje a noite, quero que fiquecomigo na frente de todos. – a expressão deBola não se altera.

— Como é? – a Kibi sibila e levanta numpulo.

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— É isso ou nada feito. Você é quem sabe.– Bola dá de ombros, indiferente.

— Qual é a jogada? O que você tem emmãos?

— Aceitará o meu preço?A garota se ajoelha na grama recém-

aparada, pensativa. Seus olhos se estreitam,ávidos por descobrir o plano de Bola.Sentindo certa repulsa por si mesma, elaresolve pagar para ver.

— Tudo bem, eu aceito. – Bárbara ruge. –Agora me diga, o que você tem para a minhavingança?

— Isso aqui. – Bola tira do bolso dabermuda um frasco sem rótulo.

— Em que isso vai me ajudar? – Bárbarafaz cara de quem conversa com um otário.Bem, ela realmente conversa com um otário.

— Eu roubei isso aqui do estoque do meuirmão, sabia que seria útil em algummomento. – ele rola o frasco entre os dedos.– Ele e os amigos da faculdade criaram essadroga. A batizaram de Droga da Coragem.Quem a ingere, fica totalmente desinibido efaz coisas que nunca faria, nem à base deálcool.

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— Isso é uma droga? – Bárbara se sentacom os olhos brilhando em excitação. – Tipo,uma droga, droga?

— É, quer que eu desenhe? Que parte vocênão entendeu?

— Bola, você é um gênio!— Eu sei, só que ninguém parece perceber

isso. – o garoto olha para o céu, distraindo-se. Bárbara pigarreia e então ele continua: –Enfim, apenas seis gotas disso aqui e a Ninavai fazer o que tem vontade. Sem medos,receios ou pudores. Você finalmenteconseguirá sua vingança.

Bárbara tenta pegar o frasco das mãos deBola, mas num impulso, ele fecha os dedos,meneando a cabeça em negativa.

— Nada disso. Primeiro pague, depoisreceba.

— Mas amanhã é o último dia na ilha.Temos que usar isso hoje mesmo! – a Kibi étomada por uma sensação de urgência, seuslábios tremem com as possibilidades.

— Pague o que me deve hoje e amanhã eugaranto que terá a sua foto quente.

— Esse troço é perigoso, tipo, a Nina podemorrer e tal? – não que Bárbara esteja

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preocupada com isso, a pergunta foi feita pordesencargo de consciência.

— Não é perigoso. Relaxe, vai sair tudocomo você quer. – Bola se levanta doesconderijo. – Estamos acertados?

Com um sorriso maquiavélico e olhosflamejantes, Bárbara chacoalha a cabeça emconcordância.

— Estamos acertados.~~***~~

Lex quer desvendar todos os segredosdessa linda garota de olhos esverdeados e aestimula a continuar. Nina não acredita queesteja a ponto de contar algo tão íntimo aele.

Ela se convence de que falar pode lhe fazerbem, expurgando todo o veneno que aindacorre em suas veias. Quem sabe o passadode Nina mostre a Lex que o terreno no qualpisa é perigoso e arriscado, cheio de minasenterradas e armadilhas mortais.

Nina suspira alto, sentindo algo se remexerdentro de si. Talvez seja a lagosta, ou seuespírito, quem sabe?

— Quando eu tinha quinze anos, comecei anamorar um cara dois anos mais velho. Nos

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conhecemos no colégio e ele estava prestes ase formar. Nós ficávamos naquele flerte àdistância e eu nunca tinha tido a coragem deme aproximar.“Alguns amigos me avisaram que ele era umtremendo galinha, mas eu achava que estava

apaixonada e nem liguei para oscomentários. Quando a oportunidade surgiu,

eu me agarrei a ela.“Namoramos por seis meses. Meus pais eram

contra e passaram a vigiar todos os meuspassos. Eu não podia usar a internet e ostelefonemas eram gravados. Meu pai é

advogado criminalista e minha mãe trabalhacom segurança da informação, ou seja, elesdesconfiam até da própria sombra. Hoje eu

os entendo perfeitamente.”Nina faz uma pausa. Rememorar o passado

nunca fez bem a ela. Mas de alguma forma,sente que quando terminar a narrativa, seráuma outra pessoa.

— O que aconteceu? – Lex reclina paratrás, escorando o corpo com as mãos.

— Durante seis meses, nós namoramos naminha casa e às escondidas, quando euconseguia enganar os meus velhos. O filho

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da mãe tinha uma lábia incrível e fez comque eu acreditasse que era especial. Ele diziaque me amava e que eu era única e perfeita.Hoje eu sei que ele só estava preparando oterreno para o ataque.

Os lábios de Lex se retesam. As pálpebrastremem e ele se inclina sobre a mesa com ospunhos cerrados. Uma sombra atravessaaquele olhar dourado e Nina continua:

— Todas as vezes que nos encontrávamos,era a mesma história. Ele me amava, eu oamava e nós tínhamos que elevar nossorelacionamento a um outro patamar. Eu eramuito nova, Lex, totalmente inexperiente e,de certa forma, inocente. Ele usou issocontra mim, da forma mais repugnante quese possa imaginar.“Numa tarde, o cara apareceu na minha casa

sem aviso. Eu estava sozinha e as coisascomeçaram a evoluir rápido demais... eu não

tive escapatória.”Nina faz outra pausa e, por incrível que

pareça, não está se debulhando em lágrimas.A expressão de Lex é matadora e o caratrinca os dentes, mas não diz nada. Não

ainda.

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— Eu não queria, juro para você. Eu só tinhadezesseis anos e não estava pronta. Mas eleforçou a barra, disse coisas que eu queria

ouvir. Parecia que ele podia ler meuspensamentos, minhas vontades.

“Eu sempre fui uma tola romântica. Queidiota. Nunca pensei que me entregaria

daquela forma, no sofá da sala, sem qualquerpreparação, sem… sem romance.

“Quando terminou e ele foi embora, eu nãome senti plena ou flutuando como dizem. Eume senti suja e com vontade de gritar. Nãoque ele tenha sido bruto, mas não foi feito

com amor.“Ele parou de me ligar depois disso. Eu

deixava recados no celular e nada de umretorno. Quando eu finalmente tive corageme liguei na casa dele, descobri que a mãe docara nem sabia quem eu era. Ela disse algo

mais ou menos assim: ‘Ah, não, outrapseudo-namorada? Esse garoto não temjeito. Quantos anos você tem, mocinha?’“Foi então que eu descobri tudo. Minhas

amigas ajudaram, vasculhando a internet,perguntando aos amigos dos amigos dos

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amigos. Tudo o que eu vivi durante seismeses, não passou de uma mentira, uma

farsa com o único intuito de me levar para acama. Bem, para o sofá da sala.

“Eu quis muito me vingar, eu queria osangue dele nas minhas mãos. Mas não foinada disso o que eu fiz. Eu me resignei, mefechei para o mundo, parei de confiar naspessoas e me transformei no que sou hoje.

Alguém que não consegue se relacionar, quetem medo de ser enganada e que está

permanentemente fechada para balanço.”

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Quarenta e dois: A carapaça se quebraChef Louis traz dois pratos fundos,

recheados com risoto de salmão e cebolinhaspicadas por cima. Nina já perdeu a fome eLex encara o prato, ainda com o maxilartrincado.

Quando se veem novamente sozinhos, Lexa fita com um olhar febril e uma expressãoque Nina nunca viu antes.

— Eu vou matar esse cara.— Não precisa. – Nina deixa um sorriso

escapar. – O Doc, meu irmão, acabou com oMustang novinho dele com um taco debeisebol e a ajuda de uns amigos. E há duassemanas eu soube que ele finalmente foipreso, por aliciamento de menores. Na época,meu pai até pensou em processar o cara,mas minha mãe o fez desistir da ideia. Eu eramuito nova e o escândalo poderia ter sidomuito pior para mim. Eu aprendi uma lição,da pior maneira, tenho que admitir. Mas hojeninguém me faz de idiota. Eu nunca mais voudeixar que alguém me use dessa forma. – seNina estava tranquila, isso muda quando elaprofere as duas últimas frases. Um brilhocortante surge em seus grandes olhos

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esverdeados. – Consegue me entendermelhor agora?

— Não me importa se ele foi preso, aindaquero matar esse desgraçado. – Lex sustentauma expressão a lá Chuck Norris. – Eu nãofaria isso com você, nunca a enganaria dessamaneira.

— Ah, Lex, qual é! – Nina zomba. – Você éo galinha do Prisma, um apostador, ummentiroso… conta outra, vai.

— Acha que eu chegaria a esse ponto? –Lex faz uma pausa com o cenho franzido.Quer provar que Nina não precisa temê-lo demaneira alguma e ele sabe como aconvencerá: – Quer ouvir uma história?

— É sobre uma aposta? – Nina empurra orisoto para o lado, apoiando os cotovelos namesa.

— É sobre uma aposta sim. E isso vaiprovar a você que eu tenho caráter.

— Por que quer me provar isso? Não estoucobrando nada.

— Ainda assim, quero contar. Vai ouvir?Nesse ponto, Chef Louis faz cara de quem

vai chorar. Quando entra no bangalô e vê osdois pratos intocados, o francês sai e o

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baiano arretado entra em cena.— Oxente! Vocês nem tocaram no risoto!— Desculpe, Chef, estamos realmente

satisfeitos. E aliás, estava tudo perfeito. –Lex não tira os olhos de Nina e vice-versa.

— Bom, nesse caso, vou trazer assobremesas. Vocês vão comer, certo?

— Pode trazer. – é Nina quem responde e oChef volta para a cozinha, choramingandocom o garçom.

Lex observa Nina com outros olhos. Apesardo ódio que está sentindo pela história queouviu, sente-se orgulhoso por ela não ter sedeixado abater, como era de se pressupor.Ela é forte e soube canalizar muito bem aamarga experiência que vivenciou.

— Não me olhe assim, não quero que sintapena. – Nina se remexe, um tantodesconfortável.

— Pena? O que sinto está bem longe disso.— Tenho que confessar que foi muito bom

colocar isso para fora. Talvez você tenhaconseguido o que ninguém mais conseguiu.

— Derrubar o muro que você construiupara se proteger? – Lex arrisca um palpite.

— É, algo assim. – ela faz uma pausa

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lacônica antes de passar a palavra para Lex:– Bem, sua vez de falar.

Lex se ajeita melhor, como se isso tornassea tarefa a seguir mais fácil. Esse é umsegredo bem guardado, que ele se senteimpelido a dividir com Nina. Assim comoagora ele a entende melhor, talvez ela ocompreenda também.

— Eu fiquei com a Bárbara no ano passado.Nunca tinha namorado ninguém antes e nãoestava interessado. Não por medo de meenvolver, entenda. Eu acho que não estavapronto, não tinha encontrado a pessoa certa.

Lex faz uma pausa e busca os olhos deNina. Se ela entendeu o recado eu não sei,mas nós entendemos!

— A galera vivia me zoando, dizendo queeu não era bom com essa coisa derelacionamentos. Até aí, tudo certo. Oproblema aconteceu no dia em que medesafiaram a namorar uma mesma garota,por quinze dias.

— Você não se conteve e quis provar queera capaz. – Nina adivinha, sabiamente. –Vocês garotos são tão estranhos.

— Gancho lançou a aposta e…

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— Sempre o Gancho. Ele é aquele diabinhode chifres que fica sobre o ombro esquerdo,não é? – Nina interrompe a narrativa.

— Para dizer a verdade, na maior parte dotempo ele é o anjinho de auréola sobre meuombro direito. – Lex morde o lábio e o Chefvolta da cozinha.

— Esse é o trio Inamorata. Mousse dechocolate branco, mousse de coco e moussede morango com calda de frutas vermelhas. –o Chef explica e o garçom coloca os pratosricamente enfeitados sobre a mesa. – Sevocês não comerem, juro que me afogo nomar.

Nina e Lex não se aguentam e desatam arir. Para que o Chef não cometa suicídio,Nina pega uma colherada e leva aos lábios. Omousse de morango derrete na boca e elasolta um suspiro de prazer. O Chef sorri,orgulhoso.

— Querem um café? Um chá? Umcappuccino? – ele oferece.

— Não, obrigada. – Nina recusa.— Estamos bem, valeu mesmo. – Lex

também recusa e quando ficam sozinhos,tenta retomar a linha de raciocínio: – Onde

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eu estava?— Na aposta de quinze dias lançada pelo

lado demo do Gancho. – Nina elucida e soltaoutro suspiro ao levar o mousse de coco àboca. – Cara, isso está muito bom!

— O lance foi que eu aceitei a aposta. ABárbara estava a fim e eu jurei levar onamoro à sério, como namorados costumamfazer.

— Você enganou a garota. – Nina alfineta.— Ela queria namorar e eu dei isso a ela,

por um breve período. – Lex dá de ombros,indiferente.

— Em que você é tão diferente do cara queme enganou? – Nina assume uma postura deataque.

— Chegarei lá. – Lex faz outra pausa. –Nós namoramos por quinze dias e eu tenhoconsciência de que fui um ótimo namorado.Eu a levava ao shopping, ao cinema, ao McDonald’s, ao Burguer King, à sorveteria eainda escutava aquela ladainha chata desempre, com a maior boa vontade.

— Hum, sei.— É sério, não foi fácil como você imagina.

No décimo sexto dia, eu já estava pronto

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para terminar o namoro. Tinha vencido odesafio e poderia ganhar minha liberdade devolta. E como eu ansiava por ela, você nãofaz ideia. A garota vivia no meu pé, meligando de cinco em cinco minutos, meproibindo disso e daquilo, palpitando emtudo, reclamando de todos os meus amigos…enfim, foi o inferno na Terra.

“Numa tarde, ela chegou na minha casasem avisar. Quando dei por mim, ela estavapraticamente nua, se oferecendodesesperadamente.”

Nina solta a colher no prato e engasga.Precisa de água para se recuperar do choque.Antes que possa fazer qualquer comentário,Lex continua.

— A Bárbara armou uma emboscada e tiveque terminar o namoro com ela deitada naminha cama, seminua, numa das situaçõesmais embaraçosas pelas quais já passei navida.

— Vocês… quero dizer… você e ela…?— Não! Eu jamais faria algo assim! Nina,

eu não conseguiria conviver com isso.— Lex, não me diga que é virgem?— Claro que não! Mas eu não poderia fazer

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isso com a Bárbara, você entende? Tudo nãopassava de uma aposta.

Só um detalhe: quando Lex praticamentegritou “claro que não”, Nina sentiu umapontada de ciúmes brotando em algum lugardo seu ser.

— E o que ela fez? – até o tom da garotamudou depois disso.

— Foi a cena mais deprimente que eu jáassisti. Juro que me senti um crápula, da piorespécie. Ela se ajoelhou e implorou para queeu voltasse atrás. Contei sobre a aposta,deixei tudo às claras, mas nada pareciaadiantar.

— Ela implorou para você não terminar onamoro? – Nina é pega de surpresa, nãoconsegue imaginar Bárbara suplicando pornada.

— Não! Implorou para que eu transassecom ela!

— Ai. Meu. Deus.— Está entendendo agora? Depois desse

lance com a Bárbara, eu jurei que nuncamais entraria em uma aposta.

— Nunca mais?— Envolvendo mulheres, depois da

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Bárbara, você foi a única. – ele a encara,com profundidade. – Eu não queria aceitaressa aposta, Nina.

— Por que aceitou?Hum, terreno perigoso! Será que Lex terá a

coragem de abrir o jogo e contar que estásendo chantageado pela Kibi Mor?

— Ei, vencedores! Como foi o almoço? – omonitor-chefe entra no bangalô, todosorridente.

— Foi excelente. – Lex responde aliviado,mais uma vez salvo pelo gongo.

— Nina?— Foi ótimo, valeu o desafio. – ela

responde, num tom de decepção. O monitortinha que aparecer justo agora?

— Bem, se já tiverem terminado, a lanchaos aguarda. Vamos?

— Esse papo não termina aqui. – Ninasussurra para Lex enquanto seguem omonitor em direção ao píer.

~~***~~A lancha não é grande como Nina

imaginou. É toda branca, com frisos lateraisazuis e poucos lugares à bordo. O monitor-chefe liga o motor e pede que os garotos se

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segurem, porque a embarcação vai voar.Lex e Nina se sentam no único banco de

dois lugares. Ela quer voltar no assunto daaposta, mas quando a lancha arranca, ficadifícil falar com o barulho do vento. Nessecaso, ela grita:

— Vai me contar, não vai? Sobre o porquêde ter aceitado a aposta?

— Não agora!— Lex, não me enrole.— Nina, eu não sou o filho da puta que

você imaginava. Isso já não basta?— Não!A lancha percorre todo o contorno da ilha,

numa velocidade surpreendente. Em algunspontos, é como se a embarcação realmenteplanasse sobre a água, criando ondas lateraise assustando os pássaros.

Lex e Nina estão divagando em suaspróprias mentes. As belezas naturais passamvoando e eles nem se dão conta.

Lex está ruminando sobre tudo o que Ninacontou no almoço. Imagina-se quebrando acara do sujeito que a enganou, arrancando-lhe todos os dentes da boca.

Nina está pensando em Bárbara e na cena

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que se desenrolou no quarto de Lex. Nem emmil anos ela se submeteria a implorar por umcara dessa maneira. Realmente Lex não é ofilho da puta que ela imaginava. Ao pensarnisso, dá uma olhada de esguelha para ele.Um sorriso tímido lhe escapa dos lábios, umgesto que finalmente, quebra a carapaça aomeio.

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Quarenta e três: LuauNina não consegue conversar com Lex

quando voltam do passeio de lancha. Ganchoos aguarda no píer, parecendo um tantoquanto desesperado. Antes que os doisamigos sumam de vista, Nina puxa Lex pelobraço.

— Nossa conversa não terminou.— Eu sei que não. Nós vamos retomar, eu

prometo. – Lex está sendo disputado comonum cabo de guerra, com Nina puxando deum lado e Gancho do outro.

— Depois vocês conversam. O que eu tenhopara tratar com o Lex é da mais altaprioridade. – Gancho puxa o amigo com maisforça e Nina o solta.

— No luau conversamos, está bem? – Lexgrita por sobre os ombros, sendo arrastadopor Gancho.

— Você não vai escapar. – ela balbuciapara si própria.

~~***~~No quarto, longe de ouvidos indiscretos,

Gancho anda de um lado para o outro,deixando Lex zonzo. O cara está tentandomontar o quebra-cabeças sozinho, mas está

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difícil pacas.— Se não me disser o que está havendo,

como poderei ajudar, Cabeça?— Man, tem treta nessa parada.— Fala logo, brow! – Lex se irrita.— Está rolando uma nova aposta no ar. E

juro, meu camarada, nesse angu tem umcaroção.

— Deus do céu, desembucha!— O Bola lançou uma nova aposta hoje. É

um desafio impossível, mas o cara jogou umagrana alta na roda, certo de que vai rolar. –Gancho leva o indicador ao queixo. – Comoele pode ter tanta certeza?

— Que aposta é essa?— Bola versus Bárbara.

~~***~~As meninas já estão prontas para o luau.

Desde que voltou do passeio de lancha, Ninanão viu Lex em lugar algum. Aliás, nemGancho.

Será que o sumiço deles tem algo a vercom a aposta? Estará Nina sendo manipuladae tudo não passa de uma farsa? Ela nãodivide esses temores com as amigas, preferese abster em seu próprio mundo cheio de

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dúvidas.Nathália está usando um vestido

comportado, desses com florzinhas e detalhesfofos nas mangas bufantes. O cabelo estápreso, para variar, em um rabo de cavalo.Nos pés, chinelinhos da coleção particular deLais.

A viciada em chinelos está usando uma saialonga, com estampa indiana e franjaslaterais. Por cima do biquíni, uma blusinhacanelada branca e sem mangas arremata ovisual.

Nina optou por um vestido acima dosjoelhos, com uma estampa indefinida emtons de verde e marrom, mangas fluidas quedescem até os cotovelos e um decote V dearrasar. Por baixo, o biquíni verde ficavisível, já que a vestimenta é um tantoquanto transparente. Se cuide, Lex!

Vestidas para matar, as garotas seguemrumo à praia.

São dez da noite. A lua cheia estáparticularmente mágica, cercada por um halobrilhante e azulado. O céu se completa deforma majestosa, com milhares de diamantesno firmamento. O mar está calmo e uma

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brisa leve acaricia a pele de quem está porali. O clima é perfeito para um luau.

Na praia, um imenso tablado de madeira foitransformado em pista de dança e uma bandajá está a postos, no aquecimento.

Uma fogueira foi construída no caminhopara o mar. As primeiras chamas já crepitam,um tanto disformes por culpa da brisa. Umamesa de apoio foi disposta, com palitinhos demarshmallow e queijo coalho. Nham.

Holofotes apontados para o mar estão emfuncionamento e candelabros foram dispostospor todos os lados, fechando o cenário commaestria.

Garçons circulam entre os estudantes combebidas coloridas arrematadas com canudospsicodélicos, daqueles que brilham no escuro.

Lex e Gancho conversam, um poucoafastados da multidão que se forma sobre otablado. A banda toca um reggae e a galeradança, no ritmo do Bob Marley.

— Que bom que eu não tive que arrancaressa informação da Nathi. – Gancho sebalança em uma rede de dois lugares, presanos coqueiros. – Cara, não acredito que aNina tenha passado por isso. Esse cara

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merecia umas porradas.Lex abriu o jogo com o melhor amigo,

contando tudo sobre Nina e o seu passadoamoroso. Ela não pediu segredo e o garotonão consegue esconder nada de Gancho.

— E você e a Nathi? – Lex se joga na redee Gancho sente o solavanco, quase caindopara trás.

— A aposta ainda está rolando, não vouchegar junto. Cara, se ela descobrir…

— Quem contará? – Lex se altera. –Ninguém vai contar, Cabeça, eu garanto.Aproveite o luau, as estrelas, a música… esseé o momento.

— Acha isso?— Um momento perfeito como esse, nunca

mais. – Lex dá uma geral ao redor, sentindoo clima. – Quando voltarmos para São Paulo,teremos apenas mais duas semanas de aula egame over.

— Eu tô afinzão dela, saca? Nóscombinamos em tudo, já percebeu? – Ganchosussurra para que ninguém os ouça.

— Já percebi sim. – Lex enforca Gancho, nabrincadeira.

— E a Nina? Investirá nela quando

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voltarmos para Sampa? – Gancho ajeita oboné e mira o amigo.

— As possibilidades são altas.— Eu sabia! – Gancho grita e logo abaixa a

voz. – Eu sabia, eu sabia!— Shhhhhhh. Ninguém deve saber sobre

isso, está me entendendo? Se a Bárbaradesconfiar, já era. – Lex, um tanto temeroso,olha para os lados, certificando-se de queninguém os ouve.

— E a aposta Bola versus Bárbara? –Gancho impulsiona a rede com um dos pés. –Eu tô preocupadão.

— Veremos no que vai dar. Conforme for,afogaremos o Bola para arrancar dele ahistória que originou isso tudo.

~~***~~O romance está no ar. Talvez seja a praia.

Porventura a lua. Acaso as estrelas. Osestudantes estão sentindo a vibração cor-de-rosa e um aroma apaixonado se espalhaentre eles, abraçando-os, incitando-os a irem frente.

É nesse clima que Nando e Camila estão.Os dois dançam juntinhos, sobre o tablado demadeira. Camila não sabe sobre a aposta e

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Nando jurou de morte quem resolvesse abriro bico.

Os monitores, que não são bestas nemnada, dispuseram um vaso sobre o tablado,repleto de lenços de seda. A garota quequiser tirar um cara para dançar, deverápegar um dos lenços e colocar no pescoço dodito cujo.

É o que Nathi fará nesse exato momento.— O que está esperando? – Lais está a

ponto de ela mesma tirar Gancho paradançar com Nathália. – Está com medo dequê?

— Não estou com medo! – Nathália tremenas bases nesse exato segundo. – É só que…e se ele disser não? Será que eu suportariaser rejeitada?

— Ah, fala sério! – Nina revira os olhos. –Por que ele a rejeitaria? Você é linda,inteligente, divertida e ainda por cima ri detodas as piadas dele. O que mais o Ganchopoderia querer?

— Mas, e se…— Cale a boca. Pegue esse lenço e vá lá

agora! – Lais pesca um lenço lilás de dentrodo vaso e entrega para Nathi. – Agora, Dona

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Nathália.— Mas, mas…— Nunca saberá se não for até lá. E outra,

se o Gancho tiver a coragem de rejeitar você,eu quebro a cara dele. – Nina rosna.

— Quebraria a cara dele? Por mim? – osemblante de Nathália é de pura admiração.– Jura mesmo?

— Ah, ela quebrará sim. E eu ajudarei. –Lais aperta os olhos e mostra os dentes.

— Respire fundo e vá até lá. Não deixe quenada a desvie do caminho. Não olhe para tráse nem para os lados. Apenas trace uma linhareta e vá. – Nina dá as coordenadas,empurrando Nathi na direção de Gancho.

Nathália vai.O coração aos pulos.O estômago retesado.Os olhos arregalados.O sangue congelado.As bochechas queimando.A respiração entrecortada.A garganta fechada.A boca seca.Os lábios trêmulos.As mãos frias.

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As pernas bambas.Com o lenço lilás em mãos, Nathi atravessa

o tablado um tanto cambaleante, mas não sedesvia do caminho. Seus olhos estãocravados em Gancho que, no momento,conversa com Lex e Hulk.

O cara, recostado num coqueiro, estáusando bermuda preta, camiseta branca eum boné surrado da Nike, com a aba paratrás. Nathália deixa um suspiro apaixonadoescapar da garganta.

Lex é o primeiro a notar a aproximação deNathi. Dá uma cutucada em Gancho para oamigo se ligar.

— Que foi, man?— Sabe dançar, Cabeçudo? – Lex lança um

sorriso debochado no ar.— Sei. Por quê?— Oi, gente. – Nathi finalmente alcança os

garotos. Engole algo que não lhe parecesaliva. Está mais para um pedregulhodaqueles cortantes. Engasga ao falar, aspalavras não saem de sua boca. Percebendoque Nathália está em apuros, Lex resolveajudar.

— O Gancho aqui estava doido para dançar

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com você, não é, Cabeça? – Lex o empurra,com o cotovelo.

— Verdade? – Nathi pergunta, um tantotímida, fazendo um círculo na areia com aponta do chinelo.

Ao notar que Gancho está mais perdido doque cego em tiroteio, mais perdido do quecachorro em dia de mudança e outros ditadospopulares, Lex dá um empurrão no cara:

— Não é, Gancho, meu amigão? – Lexmorde o lábio e faz um sinal com a cabeça.Finalmente o cara entende. Caraca, já nãoera sem tempo.

— É, Nathi, eu só não sabia se você… –Gancho se esquece do que iria dizer ao fitaros olhos de Nathália. Tomando coragem ealgo mais, o garoto declara solenemente: –Nathi, o negócio é o seguinte, eu adorariadançar com você. Me daria essa honra? – e ocara, com todo o seu charme, ajoelha-se aospés de Nathália lhe estendendo a mão.

— Eu adoraria. – Nathi, delicadamente,coloca sua mão sobre a dele. Quando o piratase levanta, com um sorriso que Lex nuncahavia visto antes, Nathália passa o lenço lilásem volta do pescoço do garoto, puxando-o

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como um cachorrinho para a pista de dança.Ah, o amor!

~~***~~Nina e Lais acompanham à distância,

enquanto Nathália puxa Gancho para o meiodo tablado. Ela está tão feliz que a alegriareverbera ao seu redor. Uma aura cor-de-rosa envolve aqueles dois de maneirasublime.

As amigas veem quando Gancho seaproxima de Nathi, passando uma mão emvolta de sua cintura. A outra mão está no ar,apenas aguardando que Nathália a pegue.Ela pega. E então, ele a puxa para si e oscorpos finalmente se tocam.

Nina olha para Lais. Lais olha para Nina. Asgarotas não se contém e começam a rir, semconseguir parar. Conhecem esses ataques deriso? Daqueles que nos arrancam lágrimas?Pois é exatamente isso o que acontece.

Quando o ataque passa, após váriastentativas para ficarem sérias, Lais tomba acabeça de lado e fixa seu olhar em Nina. Vembomba por aí.

— E você? O que ainda está fazendo aqui?— Não farei isso. – Nina sabe do que a

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amiga está falando. – Não vou tirar o Lexpara dançar.

— Por que não?— A aposta! – Nina estreita os olhos, com

uma expressão do tipo “alô?”. – Acha quevou dar esse gostinho para esses moleques?

— Ah, Nina, esqueça isso. Vá lá, tire o carapara dançar. Entre uma dança e outra, elepode finalmente revelar o porquê de teraceitado a aposta. – Lais puxa um lenço azulde dentro do vaso e estende para Nina. – Eudesafio você.

A ficha de Nina cai, como um soco noestômago. Assim como Lex, ela tambémodeia ser desafiada. Não consegue seesquivar, é mais forte do que ela. Comopodem ser tão iguais?

— Está jogando sujo. – Nina olha para oschinelos verdes.

— Claro que estou. Sei que não suporta serdesafiada. Eu conheço você, NinaAlbuquerque, ainda que há pouco tempo. –Lais bate um dos pés no chão, num ritmoconstante. – Sei que quer isso, eu vejo nosseus olhos.

— Está tão na cara assim?

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— Desculpe, mas está. Você não conseguemais esconder.

— E se tudo for mentira? E se o Lex estiverjogando? Como vou saber? – finalmente Ninadá voz as suas dúvidas.

— Os olhos não mentem, Nina. – Lais passao lenço em volta do pescoço da amiga. – OLex está olhando para cá nesse exatomomento. Aliás, ele está sempre olhandopara você, desde que chegamos à ilha. Vocêmexe com ele, é visível. Só não vê quem nãoquer.

— Estou com medo. – Nina jamais afirmouisso em voz alta. Medo é uma palavra quenão faz parte do seu vocabulário. Bem, nãofazia parte até agora.

— Eu sei que está. Esse jogo de seduçãobagunçou tudo, não foi? Essa confusãosentimental na qual está é resultado disso.Encare de frente o Lex, enfrente seu medo. –Lais sonda os olhos de Nina, segurando-apelos ombros. – Proteger-se para sempre nãoé a solução. O sofrimento existe, mas o amortambém existe. Você precisa arriscar.

— Uau, você foi profunda agora.— Vá lá e deixe acontecer. O que tiver que

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ser, será.

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Quarenta e quatro: Laçando Lex com umlenço de seda

Pensativa.Na beira do mar, Nina segura o lenço azul

entre as mãos. Ele se agita suavemente,dançando com a brisa que vem do oceano.Seus pés estão cravados na areia enquantoobserva, atenta, as pequenas ondas seformarem. A água chega, tocando seus pés erecua, para voltar logo a seguir.

Está pesando sobre o que Lais disse, essacoisa que envolve sofrimento e amor. Se forenganada novamente, será que suportará?Nina não tem certeza de que sim ou de quenão. Mas assim é a vida, não é? Recheada deincertezas.

Lais tirou Hulk para dançar. Não, ela não seesqueceu de Doc. Está triste, um tantosaudosa e também não tem certeza sobrenada. Ela e Hulk não têm nada em comum,são apenas amigos. Podemos dançar comamigos, não podemos? É o que ela estáfazendo nesse exato momento.

O ar fresco preenche os pulmões de Nina,relaxando-a. Não sente o vazio, não se sentesozinha no momento. E realmente ela não

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está.Lex está parado a uma curta distância,

apenas coexistindo. Observa os cabelos deNina esvoaçando para trás, juntamente comseu vestido semi-transparente. O perfumeque ela exala chega às suas narinas e eleinfla o peito, tomando coragem.

— Pensei que esse lenço me tiraria paradançar. – a voz grave e um tanto roucaatravessa o ar da noite.

Nina não se vira, mas sorri. É um sorriso delábios fechados, um tanto contido. Solta umadas mãos do lenço e, sentindo-se livre, otecido se agita para trás, alcançando Lex queo pega com a mão direita.

Nesse momento, ambos estão unidos porum lenço azul de seda, comprido demais,distante demais.

Lex vai enrolando o lenço na mão,diminuindo o espaço que os separa, chegandocada vez mais próximo. Nina sente aaproximação às suas costas.

— Me diga que não é apenas uma aposta. –as palavras dela são levadas pela brisa,carregadas de insegurança.

— Não é apenas uma aposta. – o hálito

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quente de Lex alcança seu pescoço. Estão tãopróximos que, talvez, nem o fino lenço deseda consiga ficar entre eles.

Nina gira sobre a areia e seus cabelos voampara o rosto, alcançando Lex. Com as duasmãos, ele os alisa para trás. Ela estremeceao simples toque, tombando a cabeça de ladoe cerrando as pálpebras. Lex sente umaurgência em beijá-la e dá voz a essavontade:

— Não sabe o quanto eu quero beijar você,aqui, agora. – Lex acaricia o rosto de Ninacom a ponta dos dedos. – Mas não possopermitir que todos vejam, não quero queperca a aposta.

— Eu não ligo em perder. Porque naverdade, acho que ganharei.

— Você já ganhou.Os olhos de Nina se abrem e se veem

orbitando os raios solares de Lex. Não, elenão está mentindo. Será que Nina deveconfiar em sua intuição?

Uma comoção vem do tablado. Os olharesde ambos são imediatamente atraídos paralá. E o que presenciam, eu descrevo agora,em detalhes:

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Gancho está com as costas arqueadas paraa frente, tombando Nathi em seus braços,como sempre acontece no final de umadança. Os olhos estão cravados um no outroe as respirações se fundem numa só.

Gancho sustenta uma expressão deadmiração e Nathi está com um ar sonhador.Os lábios se entreabrem, as pálpebras defecham. Num movimento sutil onde ossentimentos assumem o comando, a boca deGancho envolve a de Nathi, em um momentopara lá de perfeito.

Ahhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhh!É o que todos os observadores deixam

escapar, mesmo que o grito seja silencioso.Uma expressão incontida de felicidadedesagua no rosto de Nina. Quando Lex girapara encará-la, o semblante dele é o mesmo.

— Finalmente a Nathi tomou coragem. –Nina vai recolhendo o lenço enrolado na mãode Lex.

— Posso dizer a mesma coisa do Gancho. –Lex solta a ponta quando Nina o puxadelicadamente. – E então, esse lenço não vaimesmo me tirar para dançar?

— Quem disse isso? – Nina murmura e na

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ponta dos pés, passa o lenço em volta dopescoço de Lex. – Essa noite, você é meu.

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Quarenta e cinco: O jogo pega fogoHá um lenço azul no pescoço de Lex

Heinrich. De costas, Nina caminhaintuitivamente em direção ao tablado. Osolhos de ambos não se desgrudam umsegundo sequer.

Murmurinhos começam a se formar na pistade dança e conjecturas são atiradas paratodos os lados. Será que Nina perdeu aaposta? Se apaixonou por Lex? Que diabosestá acontecendo?

Nina engole a saliva que se forma em suaboca, está nervosa com essa demonstraçãopública. Não que ligue para o que as pessoaspensam, não é isso. Mas os olhares cravadosnela incomodam um bocado.

Nina dá um puxão no lenço, trazendo Lexpara mais perto. A trilha sonora não é lenta,mas dá para dançar juntinho. As mãos de Lexrasgam o ar, agarrando a cintura de Ninacom delicadeza. Ela solta as pontas do lençoe entrelaça os braços ao redor do pescoçodele.

O magnetismo entre esses dois gera umaaura grandiosa, capaz de protegê-los contraqualquer mal. Juntos, possuem uma força

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avassaladora, dessas que evocam o poderdivino. Mas eles não sabem sobre isso. Ainda.

Nina se deixa envolver pelos sentimentosque afloram, não se importando mais com oque acontece ao redor. O tempo e o espaçose fundem, deixando de existir. Arrepia-sequando Lex acaricia seu pescoço com oslábios úmidos.

— Está usando aquele perfume, não está? –ele pergunta, inalando-a, inebriando-se como aroma.

— Hipnose? – ela faz uma pausa. – Estousim.

Ela sente as batidas do coração dele contraseu próprio peito. Cerra as pálpebras quandoseu hálito quente deixa marcas por ondepassa. Nina não está mais no controle e ele aabraça com força, fazendo-a arfar.

Um novo murmurinho toma conta dotablado. É Lex quem percebe primeiro o queestá havendo. Troca olhares assustados comGancho. Bárbara acaba de tirar Bola paradançar, utilizando-se de um lenço vermelhosangue.

Lex para de dançar, afrouxando o abraçoem Nina. Ela percebe algo estranho e o fita,

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sem entender o que está havendo. Nota queos olhos do cara estão fixos em algum pontoalém e girando a cabeça, solta umaexclamação.

Bárbara acaba de desferir um beijo delíngua em Fabiano, o Bola.

~~***~~Lex está boquiaberto e uma de suas

pálpebras treme de raiva. Esse tempo todo oBola estava jogando contra eles, as coisasfinalmente começam a fazer algum sentido.

O cara é um agente duplo, está tão óbvioagora. O que ele contou para as Kibis? Seráque dedurou as apostas? Ah, claro que sim,Suzana e Ana Paula estavam agindo como sesoubessem do jogo.

E o que Bola terá contra a Kibi Mor? Porque ela está se humilhando a esse ponto?Terá algo a ver com Nina? Será que Bolaconseguiu algo para que Bárbara possafinalmente se vingar?

— Bola, seu lixo humano. – Lex murmura,entredentes.

— O que foi? – Nina escuta o lamento deLex. – Está com ciúmes?

— Como é? Enlouqueceu?

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— É o que está parecendo! – Nina empurraLex com as duas mãos.

— Não é nada disso.Gancho e Nathália, de mãos dadas, se

juntam a Lex e Nina. Os amigos se entendemsó com o olhar e Gancho está com o cenhofranzido e os olhos negros brilhando emfúria.

Nesse ponto, Bárbara e Bola estão dandoum show – de horrores – na pista de dança.Entre beijos e afagos, começam a dançar aoritmo da salsa. Agem como se nãopercebessem os olhares embasbacados e asbocas entreabertas ao redor.

— Lex, precisamos conversar. – Ganchodispara, um tanto afoito.

— Só se for agora. – Lex concorda,pegando Nina de surpresa.

— Como é? – ela encara Lex e Gancho. – Oque está acontecendo aqui?

— Nina, mais tarde. – Lex tira o lenço dopescoço e entrega a ela. – Prometo quedepois conto tudo a você, mas não agora.

E antes que Nina ou Nathália possam dizerqualquer coisa, os dois seguem em direção àsredes, distanciando-se ao máximo da muvuca

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na qual se transformou a pista de dança.Nina e Nathália se entreolham, confusas.

Logo Lais se junta a elas, tão absorta quantotodo o mundo.

— Gente, o que está rolando aqui? Omundo acabou e eu não estou sabendo? –Lais sacode a cabeça, sem conseguir desviaros olhos de Bola e Bárbara.

Confusa e com o humor oscilandodrasticamente, Nina finca as unhas naspalmas das mãos antes de concluir:

— Eu não faço ideia do que está rolando,mas vou descobrir.

~~***~~Os nervos de Lex pulsam em fúria. O

sangue borulha dentro das veias enquantocaminha em círculos na areia, tentandoentender o que está havendo.

Já está claro que Bola trabalha para asKibis. E o que mais? O que faria com queBárbara beijasse o cara na frente de todos?Ele a está chantageando? Terá algo que aKibi precisa para a vingança? Ou não é nadadisso e Lex está delirando?

— Conte tudo para a Nina, man. Abra ojogo antes que seja tarde. – Gancho

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aconselha.— Não posso fazer isso, não antes de me

entender com ela. – Lex leva as mãos àcabeça, incerto.

— Cara, você precisa contar. Estousentindo uma vibe estranha, acho que vai darmerda, meu camarada.

— Precisamos descobrir o que está rolando,Cabeçudo. Talvez não tenha nada a ver coma aposta e a vingança da Kibi.

— Duvido!— Ok, estou perdido. – Lex joga as mãos

para o céu. – Não sei o que fazer.— Vamos arrebentar a cara do Bola até ele

abrir o bico. Vamos torturar o cara! – Ganchoesmaga os dedos e soca o ar. – Que traírafilho da mãe!

— Ei, galera. – Hulk chega seguido portodos os garotos do Prisma. – O que estápegando naquela pista? Como o Bolaconseguiu vencer a aposta?

— Eu não faço a menor ideia, masprecisamos descobrir. Estão comigo? –Gancho estende o braço com a palma da mãovirada para baixo.

— Estamos com você. – Lex repete o gesto

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de Gancho, colocando a mão sobre a doamigo.

Logo todos repetem o gesto, uma mãosobre a outra. O que quer que Bola estejaescondendo, esses garotos irão descobrir.

~~***~~Nina corre atrás de Lex, que segue

apressado para a sala de jogos. Quando ouveseu nome, estaca no lugar, sem se virar.

— Lex, o que está acontecendo?— Nina, não posso falar sobre isso agora. –

ele não quer se virar, não pode deixar queseus olhos temerosos o entreguem.

— É isso então? Vai me deixar assim, novácuo? E será que dá para olhar para mim? –Nina avança agarrando o braço dele,puxando-o com violência.

Olhos nos olhos. Nina percebe que algoestá muito errado. Lex não conseguedisfarçar e sabe bem disso.

— Confia em mim? – Nina não responde eLex refaz a pergunta. – Confia em mim,Nina?

— Eu ainda não sei. – ela hesita.Lex toma o rosto dela entre as mãos. Antes

que ela o afaste, os lábios se colam com

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força, com vontade, com fúria. Mas não é umbeijo longo. Quando Lex abre os olhos,segura Nina pelos ombros.

— É só o que peço, que confie em mim. –ele então segue para a sala de jogos,deixando uma desnorteada Nina para trás.

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Quarenta e seis: Bola na miraNa sala de jogos, os garotos começam a

lançar especulações sobre a aposta Bolaversus Bárbara. Gancho e Lex estão em umcanto, se entreolhando a todo momento.

Ninguém além deles sabe sobre achantagem da Kibi e a vingança para cima deNina. Gancho é a favor de abrirem o jogo,mas Lex prefere deixar o restante da turmade fora. Envolvê-los pode piorar ainda mais asituação que já é tensa o bastante.

— Vamos pegar o Bola sozinho e prensá-locontra a parede. – Gancho sussurra.

— Ele não vai falar. – Lex soca o tampo deuma mesa, enfurecido.

— Conte para a Nina, Lex, ela precisasaber.

— Eu não faço ideia do que a Kibi estejaarmando. Antes de pegar o Bola de jeito, nãovou contar nada, não me aproximarei dela.Protegê-la é minha única prioridade nomomento.

~~***~~O luau chega ao fim. Os garotos não

voltaram para a praia e as garotas estãochupando o dedo, sozinhas em volta da

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fogueira. Na verdade não chupam o dedo,estão é devorando os espetos demarshmallow e queijo coalho, derretidos nocalor do fogo.

Nina está puta da vida. Não sabe o quepensar e muito menos o que dizer paraNathália e Lais.

Nathi também não está entendendo nada.Gancho a deixou naquela pista de dança, semao menos se explicar. E Hulk fez o mesmocom Lais. O que esses garotos estãoarmando? E por que parece ter tudo a vercom Bola e Bárbara?

Aliás, esses dois já sumiram das vistas.Bárbara voltou para o quarto e Bola idem. Nomomento, os professores fazem a contagemdos alunos, para se certificarem de que todosestão no hotel.

As garotas vão se levantando, sedespedindo, tristes pela viagem estarchegando ao fim. Nina não sabe seconseguirá pregar o olho. Uma voz internaafirma, categoricamente, que algo de muitoruim está para acontecer. Essa voz é vidente,só para constar.

As três amigas se levantam, sacodindo a

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areia. Caminham, pesadamente, até a aladas garotas. Nem sinal de Lex, Gancho ou osoutros garotos. Nina sente o peito sefechando, o coração ficando pequenino.Novamente o vazio, a sensação de perda.Mas que droga! Pelo jeito, não obteráqualquer resposta hoje. Mas, amanhã, o Lexnão lhe escapa.

~~***~~Lex e Gancho convenceram os garotos a

ficarem do lado de fora do quarto, caso osprofessores apareçam. Entram,sorrateiramente, caminhando pela escuridão.Se Bola não está dormindo, finge muito bem.E não é que esse é o caso?

Com uma chave de pescoço, Lex paralisaBola. O garoto tenta gritar, mas nãoconsegue. Gancho acende o abajur e ointerrogatório começa, à meia luz.

— Certo. Começaremos com essa apostaBola versus Bárbara. – Lex inicia, de formacasual, como se estivesse numa roda deamigos. – Como você conseguiu?

— Sem ar, sem ar. – a voz de Bola éapenas um sopro.

— Vou afrouxar a pegada. Se você gritar ou

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tentar qualquer gracinha, eu arrebento essasua cara, estamos entendidos? – Lex faz carade mal. E a cara de mal dele é tão linda!

Bola meneia a cabeça, em concordância.Lex afrouxa a chave de pescoço, o suficientepara que o cara possa responder asperguntas.

— Lex, não tem nada a ver com vocês,caras. Eu chantageei a Bárbara, só isso. –Bola choraminga.

— Você está trabalhando para as Kibis, nãoestá? – Gancho inclina o corpo, sondando osolhos de Bola.

— Eu só segui o Lex e a Nina no dia daCaça ao Tesouro. A Babi me pediu e euganhei um beijo em troca. Que mal há nisso?

— Com o que você chantageou a Bárbara?– Lex se altera. – Fala!

— Eu disse a ela que contaria sobre aqueledia na mata. Disse que falaria para você epara a Nina também. Foi isso, caras, vocêsprecisam acreditar em mim.

— A Bárbara não beijaria você na frente detodos só por isso. Tem algo grande aqui evocê está me escondendo os fatos, Bolota. –Lex aperta novamente a chave e Bola dá um

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pulo na cama, asfixiando.— Meu camarada, se eu fosse você, abriria

o bico. Eu não tenho forças para segurar oLex aqui, sacou? – Gancho dá dois tapas noombro de Lex e em seguida, levanta a mangada camisa do amigo. O bíceps e o trícepsdele são um espetáculo másculo. – Imaginetomar um soco desse cara? Você demorariaum ano para reencontrar o caminho de casa,acredite-me.

— Caras, eu juro que foi isso. Pelo amor deDeus, Lex, eu tô falando sério!

Toc, toc, toc.Ops, professores a caminho. Um toque:

tudo ok. Dois toques: monitores. Trêstoques: professores.

— Lex, temos que ir. – Gancho tenta movero braço do cara, mas não consegue. – Porra,man, quer se ferrar? Vamos sair daqui.

— Caras, eu tô falando a verdade, podemconfiar. – Bola está com as bochechasvermelhas, respirando com dificuldades.

— Vamos, Lex! – Gancho se levanta,encaminhando-se para a porta.

— Meu irmão, vou descobrir o que estáhavendo. E quando isso acontecer, é melhor

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você correr. – Lex dá o ultimato e segueGancho para fora do quarto.

Quando a porta se fecha atrás de Lex, Bolase senta na cama, ajeitando o colarinho dopijama. Respira fundo, colérico. Numsussurro, ele diz para si mesmo:

— Você vai cair, Lex. E quando acontecer,sou eu quem darei o golpe de misericórdia.

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Quarenta e sete: No quarto das KibisAntes de invadirmos o quarto das Kibis,

contarei uma historinha para vocês. É sobreum tal de Fabiano Bola e o ódio secreto queele nutre por Alexandre Heinrich.

Bola, desde que se entende por gente,possui um sentimento profundo em seuíntimo. Um amor sufocado e bem guardadopor sua musa inspiradora, aquela que invadeseus sonhos todas as noites. Essa garota sechama Bárbara, a Kibi.

Quando Bola descobriu que Babi e Lexhaviam ficado, sofreu como um cão semdono. Apesar de saber que nunca teria a Kibiem seus braços, Bola gostava de fantasiarcom o dia em que ela finalmente olharia paraele com outros olhos.

É claro que isso nunca aconteceu.Quando o garoto soube que o namoro não

passava de uma aposta, ficou completamentedoido. Na saída do colégio, puxou a Kibi paraum lugar mais tranquilo e lhe contou tudo oque sabia a respeito. Esse era o terceiro diado namoro Lex versus Bárbara.

Transcrevo agora o diálogo entre os dois,depois que o Bola contou tudinho para a Kibi

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Mor:— E daí? – Bárbara pergunta, impaciente.— Estou dizendo que você está sendo

enganada! – Bola é mais enfático.— Eu já sabia sobre a aposta, seu idiota. A

Suze ouviu os meninos conversando. –Bárbara mira as unhas cor de ameixa.

— E você vai aceitar isso? – Bola estáinconformado.

— É a minha única chance com o Lex. E euvou agarrá-la, com as unhas se for preciso.

— Babi, você não precisa disso. Nãoacredito que vá se humilhar desse jeito. –Bola tenta tocá-la, mas a Kibi recua, emrepulsa.

— O que eu faço ou deixo de fazer, não lheinteressa. – Bárbara diz, ríspida. – Me deixeem paz, tá legal?

— Mas, Babi…— Tchau, Bola.Já sabemos o que aconteceu depois: pole

dance, Kibi seminua, Lex em perigo, fim daaposta.

Bola assistiu a Kibi chorar na manhãseguinte do término do namoro. Viu Lex sercondecorado. E ouviu um papo que não

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deveria ter escutado.Lex não contou a ninguém sobre o que

realmente aconteceu naquele quarto. Mas,como não consegue esconder nada deGancho, acabou abrindo a verdade para omelhor amigo quando se viram sozinhos nolaboratório de química.

Eles não estavam realmente a sós.Bola, escondido debaixo do balcão, fugia

dos garotos do ano anterior. Ele haviaaprontado, de novo, e estava sendoperseguido por todo o colégio.

Encolhido e agachado no chão, Bolaacompanhou o relato detalhado de Lex sobrea tarde anterior em seu quarto. Escutou ocara reclamar e dizer o quanto havia sidoconstrangedor. Ouviu – quase chorando –quando Lex contou como ela havia imploradopara que transassem. A risada incrédula deGancho lhe arranhou os ouvidos,principalmente quando o pirata a chamou devagabunda.

Naquele dia surgia a lista negra de Bola. ELex e Gancho encabeçavam essa lista.

~~***~~Bárbara finge estar dormindo quando

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Suzana e Ana Paula voltam para o quarto.Ela é tão boa atriz que eu juraria estar vendoa garota em sono R.E.M.

Suzana e Ana Paula não se conformam como que aconteceu pouco antes, na pista dedança. Não entendem como Bárbara pôdebeijar Bola daquela maneira. O que a KibiMor estará tramando?

— Ela deve ter seus motivos. – Anasussurra, vestindo a camisola.

— Que motivos? Isso é loucura, essavingança a cegou completamente. – Suzanatira a colcha da cama e se enfia debaixo doslençóis.

— Do jeito que você fala, até parece quenão quer essa vingança. A Nina noshumilhou, Suze. Temos que nos vingar!

— Nós aprontamos muito com ela também.Lembra quando estouramos três tubos decola dentro da mochila dela? E quandoroubamos suas roupas depois da aula deeducação física?

— É, eu lembro. – Ana se recorda sim.Chegou a ficar com dó da garota naquele dia.

— Então! – Suzana ajeita o travesseiro. –Acho que estamos quites. Nós a humilhamos,

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ela nos humilhou. Acabou. Temos quecontinuar com nossas vidas.

— A Babi não pensa assim. E você sabe quese não ficarmos do lado dela…

— Sim, eu sei. Ela continuará noschantageando. – Suze revira os olhos,cansada de ser usada.

— É isso. – Ana puxa o lençol até opescoço. – Vamos dormir, amanhãperguntaremos o que está acontecendo, tábom? Boa noite.

— Boa noite, Ana.~~***~~

Os primeiros raios de sol atravessam aspersianas, iluminando o quarto das Kibis.Esse é o último dia na Ilha Inamorata eBárbara está excitada demais para continuarna cama.

Quando finalmente abre os olhos, Bárbaravê Suzana e Ana Paula ajeitando as coisas,vestindo biquínis mínimos. Ela ainda selembra do diálogo da noite anterior e precisasaber se pode ou não contar com suasamigas.

— Estão comigo ou contra mim? – Bárbarapergunta, num tom rouco.

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As duas levam um tremendo susto. Suzanae Ana Paula se entreolham nervosamente.Será que Bárbara ouviu a conversasussurrada?

— Estamos com você, mas antes terá quenos contar o que está acontecendo. Por quebeijou o Bola daquela maneira? – Anapenteia as madeixas oxigenadas para trás.

— O Bola tem algo para esquentar essavingança. – Bárbara respira fundo. – E euvou precisar da ajuda de vocês.

— O que teremos que fazer? – Suzanaamarra a canga em volta da cintura.

— O que fizeram até agora. Ficar àespreita, aguardando o momento chegar.Quero fotos e vídeos de tudo o que rolarhoje. – Bárbara se levanta num pulo,espreguiçando-se demoradamente.

— O que o Bola tem a ver com tudo isso? –Suzana interpela.

— Ele tem algo que pode mudar o rumodessa vingança. – Bárbara abre a mala rosachiclete e tira de lá um fio dental branco enão é de limpar os dentes.

— Explique para nós. – Suzana se sentaaos pés da cama, passando uma leve camada

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de protetor solar nos braços.— O Bola vai colocar algo na bebida da

Nina e se as coisas correrem como imagino,ela vai fazer tudo o que tiver vontade. Nósiremos fotografar e filmar cada passo davagaba.

— O que o Bola vai colocar na bebida dela?Ele vai drogá-la? – Ana sobressalta-se. –Babi, isso é absurdo!

— Absurdo, Ana? Absurdo foi o que avagaba fez com a gente! Já se esqueceram?– Bárbara vinca a testa, as pálpebraspulsando enraivecidas.

— Drogar a Nina é demais, Babi. É demaisaté para você! Isso já ultrapassou todos oslimites aceitáveis. – Suzana pega sua toalhade piscina e finaliza: – Eu tô fora.

— Não pode cair fora! Ou então vou contarpara os seus pais que…

— Pode contar! Já cansei de serchantageada por você. Cansei de sermanipulada, usada, humilhada! – Suzana fazuma pausa para respirar. – Isso não éamizade.

Pisando duro, Suzana vai para a piscina,batendo a porta do quarto com força ao sair.

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— E você, Ana? Vai me trair também? – aspupilas de Bárbara se dilatam de tanto ódio.

— Não, Babi. Estou com você até o fim.

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Quarenta e oito: O início do último dia nailha

Lex e os garotos acordaram cedo para ojogo de futebol masculino no campogramado. Estão todos por lá, menos Bola.

O jogo já dura vinte minutos e Lexarrumou duas brigas nesse meio tempo. Estánervoso, aéreo, um tremendo pé no saco. Agalera percebe e se junta ao redor do caraquando o garoto perde um gol feito.

— Certo, o que está rolando aqui? Abra ojogo, Lex. – Hulk é o primeiro a falar.

— Anda, Lex, fala. – Nando se pendura noombro de Hulk.

Gancho e Lex se entreolham. Será quepodem confiar nesses caras? Bola já semostrou um tremendo 171.

— Acho que deveríamos contar. – Ganchoguarda o apito no bolso, incitando o amigo.

— Tudo bem. Contarei o que está rolando.Lex conta tudo sobre a aposta, a

chantagem e a vingança da Kibi Mor. Agalera escuta atenta a todos os detalhes esuposições de Lex e Gancho.

— Que o Bola está do lado das Kibis, issoestá na cara. Ele é apaixonadão pela

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Bárbara. – é Hulk quem elucida. – Agora,quanto a essa vingança, não sei o quepensar. A Babi pega pesado e ela pode estararmando qualquer coisa.

— Entenderam o drama? – Gancho encaracada um dos amigos. – O Lex tá ferrado.

— Não tem jeito de conseguirmos essevídeo? – Edgard especula. – Talvez invadindoo computador dela, sei lá.

— Ela fez milhões de cópias, não é esse ocaminho. – Gancho gira o boné na cabeça,displicente.

— Vocês viram o vídeo? Dá para saber queé o Lex naquela moto? – Hulk pergunta, umtanto tenso. – É que, bem… é que eu filmeiaquela noite. E as imagens não são boas. –Hulk engole em seco e finaliza: – A Bárbaraficou comigo em troca do vídeo.

— Como é? – Lex fala em uníssono comGancho. – Deu o vídeo à ela?

— Todos demos. – é Nando quem revela. –Ela ficou com todo mundo em troca dosvídeos. Lex, eu não imaginei que ela iriachantageá-lo.

— Puta merda! Ela tem vários vídeos, devários ângulos do acidente? – Gancho joga o

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boné longe. – Caras, eu não acredito!— Eu tô ferrado, Cabeça. – Lex arqueia o

corpo para a frente, sentindo um tremendopeso nas costas. – Eu pensei que a Kibi sótivesse um vídeo, o que ela mesma filmounaquela maldita noite.

— Lex, o que podemos fazer? – Hulk toca oombro do amigo, sentindo-se o pior entre ospiores. – Cara, é só pedir.

— Fiquem de olho no Bola e nas Kibis.Relatem qualquer coisa anormal. Se algumdeles se aproximar da Nina, nos avisem. – éGancho quem dá as instruções.

— Ei, Gancho. – Edgard chama. – O Bolatem algo contra você?

— Não sei. Acho que não.— Foi ele quem lançou a aposta Gancho

versus Nathi. Acho bom você ficar esperto.— Puta que pariu.

~~***~~Hoje o dia será repleto de atividades na

Ilha Inamorata. Jogos de futebol, volei depraia, aulas de surf… e à noite, as portas daboate do hotel serão abertas aos estudantes.

As garotas estão na praia, curtindo o últimodia na ilha. Muitas já estão chorando e se

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abraçando, pois quando voltarem para casa,tudo irá mudar.

— Não acredito que isso vá acabar. Cadauma de nós vai tomar um rumo e vamosperder contato. – Camila chora no ombro deLais.

— Não deixaremos isso acontecer. – Laisacaricia os cabelos dourados de Camila.

— Ah gente, vou chorar também. – Nathitira os óculos de leitura, enxugando os olhosúmidos.

Nina pressente a aproximação de Lex. Girao corpo e o encontra sozinho, caminhando decabeça baixa em direção ao mar.

— Volto já. – ela diz, levantando-seapressada e sem dar maiores explicações.

Seus passos são rápidos e afundam naareia fofa. Desliza os óculos de sol para orosto e ajeita as bordas do biquíni cor de uva.Lex ainda não a viu. O garoto entra no mar emergulha quando uma onda se quebra sobreele.

Nina mergulha logo atrás. Hoje as ondasestão altas e fortes, perfeitas para aulas desurf. Ela grita o nome dele quando sobe àsuperfície. Lex mergulha novamente quando

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uma nova onda se quebra. Nina respira fundoe mergulha também.

— Lex!Ele se vira. Seus olhos estão baixos como

se a luz do sol tivesse sido extinta. Ninasente um arrepio rasgando suas costas.

Uma nova onda se quebra e os doismergulham. Lex estende a mão e Nina apega, deixando-se conduzir para a frente,ultrapassando a zona de arrebentação.

— Vai me dizer o que aconteceu ontem? –Nina pergunta, sem rodeios.

— Não agora.— Por que não?— Porque eu ainda não sei o que está

havendo. – Lex alisa os cachos para trás,com a cabeça fritando.

— Do que está falando?— Muitas coisas estão acontecendo nessa

ilha. Tem pessoas que adorariam ferrar coma gente. – Lex sustenta o olhar de Nina. –Você precisa manter distância de mim atéirmos embora.

— Não farei isso, a não ser que me diga oque está rolando aqui. – Nina fecha a cara.

— Nem eu sei o que está rolando. É por

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isso que estou pedindo: mantenha distância.Nina se vê num mar de dúvidas. Deve virar

as costas e deixar Lex sozinho? Ou tentaarrancar dele qualquer informação? Será queo jogo ainda está rolando e ela, burra, teimaem não acreditar? Lex lê todas essasincertezas nos olhos dela.

— Quando voltarmos para São Paulo,contarei tudo desde o início. Mas tem algoque você precisa saber e que eu não possomais esconder.

— E o que é?Lex toma o rosto dela entre as mãos. Algo

devastador a inunda nesse instante. É umasensação grandiosa demais para serdesprezada. Finalmente a névoa se dissipa eela tem plena clareza de seus sentimentospor ele. Por mais incrível que possa parecer,não está com medo, não se afasta.

— Eu estou apaixonado por você e nuncasenti isso antes, por ninguém.

As palavras que Nina tenta proferir seperdem dentro da boca. Todo o seu corporeage a declaração. A garota não conseguesegurar um sorriso, é mais forte do que ela.Seus poros se abrem, explodindo em êxtase

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de dentro para fora.— E é por isso que estou pedindo que

mantenha distância até voltarmos. Ninguémpode saber. – Lex está louco para beijá-la,abraçá-la. Mas não fará isso, não agora.

— Lex, eu não entendo… – Nina tenta seaproximar e ele recua.

— Entenderá quando eu contar.— Conte agora.— Não posso. Não enquanto eu não souber

de tudo. – ele olha para o horizonte, umtanto deprimido.

— Está jogando? É isso, não é? – os olhosde Nina se umedecem e não é água do mar.

— Não estou jogando!— Prove! – ela não queria, mas está

gritando.— O que quer que eu faça? – ele também

grita, perdendo o controle.— Me diga o que está havendo. Prove que

isso tudo não é só uma aposta!— Que droga! – ele soca a água, em fúria.— Prove, Lex.Ele joga a cabeça para trás, fitando o céu

azul. Está pesando os prós e contras,cogitando a possibilidade de contar tudo à

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Nina sobre a vingança e a chantagem. Temeque ela, de cabeça quente, acabeenfrentando Bárbara num duelo nadaamistoso. Não pode permitir que issoaconteça.

— Precisa prometer que não faráabsolutamente nada quando eu contar o queestá havendo.

— E o que está havendo? – Nina estimula,ansiosa.

— Prometa. – Lex insiste.— Está certo, eu prometo.— Me encontre daqui meia hora no Centro

de Arborismo. E se notar que está sendoseguida, volte para a praia, está bem?

— Quem iria me seguir? – Nina une assobrancelhas, confusa.

— Apenas faça isso. – Lex se põe acaminhar, lutando contra a correnteza.

Nina congela no lugar, perdida. Só começaa se mexer quando Lex finalmente alcança apraia, encaminhando-se para o Centro deArborismo.

A hora da verdade chegou.

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Quarenta e nove: A vingança é plenaNas nuvens.Flutuando.Em êxtase.Perdidamente apaixonada.Esse é o retrato de Nina, no momento

exato em que volta para as espreguiçadeirasdistribuídas na praia. As garotas estãoanimadas, conversando sobre vários assuntose apenas Nathália nota quando a amiga sesenta, em completo torpor.

— Seu suco chegou. – Nathi avisa. – O quevocê e o Lex conversaram?

— Nada ainda. Mas ele vai contar o queestá havendo daqui a pouco, lá no Centro deArborismo. – a garota, ainda com um aranestesiado, completa: – Ele disse que estáapaixonado por mim.

— Como é? – Nathi se inflama e as outrasgarotas param de falar, curiosas.

— Shhhhhh. – Nina pede com um sorrisosem graça. – Não diga a ninguém. Irei até láe depois conto como foi. – Nina pega o copode suco de maracujá ainda gelado e vira oconteúdo de uma só vez.

— Ai, meu Deus! Será que finalmente

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vocês dois vão se entender? – Nathisussurra.

— É o que eu espero.~~***~~

A vingança da Kibi não poderia ser maisperfeita. Nina acaba de tomar todo oconteúdo do copo de suco e Bola avisou queos efeitos começariam a ser notados emmenos de quinze minutos.

Nina se levanta, veste uma saída de banhoe flutua para o Centro de Arborismo. Aosseus olhos, tudo está mais colorido evibrante. Algo mudou em seu ser quando Lexse declarou. A garota se pega rindo, numafelicidade que nunca havia experimentado.

Antes de tomar a trilha, olha para tráscomo Lex instruiu. Ninguém parece estar àespreita. Aliás, quem a seguiria e por quefaria isso? Não importa, nada mais temimportância.

A droga se infiltra no sistema de Ninaconforme ela caminha. Alguns circuitoscerebrais são desligados sem que ela percebao que está havendo.

Durante a caminhada, ela tem algumassensações e pensamentos que não haviam

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lhe passado pela cabeça. Imagina-se sozinhacom Lex, no Centro de Arborismo, tendo todoo tempo do mundo. Um sorriso diferenteimprime-se em seus lábios, um sorriso dequem não está mais no controle da situação.

Um calor infernal toma conta do seu corpoe não é pela exposição ao sol. Não. Nina sesente em chamas e o incêndio precisa serapagado agora mesmo. E só uma pessoapode controlar esse fogo: Lex Heinrich.

Boca seca.Olhos ardendo.Arrepios cortantes.Calor extremo.Mãos trêmulas.Nem assim Nina se toca de que algo está

errado. Na última subida da trilha, tira asaída de banho, jogando-a ao chão. Oschinelos também já foram deixados pelocaminho, assim como o elástico que prendiaseus cabelos e o relógio de pulso.

~~***~~Bárbara, que segue por uma trilha

adjacente, dá as últimas instruções para AnaPaula e Bola. A garota sustenta um sorrisomacabro no rosto, um semblante vitorioso.

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Se tudo sair como planejado, a vingançafinalmente chegará ao fim.

~~***~~Lex está recostado no tronco de uma

árvore frondosa, repleta de frutos verdes.Sem camisa, veste apenas uma bermudacinza chumbo da QuikSilver. Ensaia,silenciosamente, a conversa difícil que terácom Nina. Poderá ela perdoá-lo por ser umcovarde?

Lex deixa um suspiro apaixonado escaparquando finalmente a vê. Absolutamentelinda. Os cabelos soltos ao vento, o biquínicor de uva realçando a pele levementebronzeada, as curvas asfixiantes... espere, háalgo errado.

Os lábios de Nina estão entreabertos e aspálpebras semicerradas, numa expressão quenão pertence a ela. A garota sustenta umolhar desses esmagadores e Lex entra emestado de alerta.

— Nina? – desconfiado, ele recua.A garota se aproxima, penetrando fundo

nos olhos de Lex, jogando-o contra o tronco.O garoto está acuado e confuso, sem saber oque pensar ou como agir.

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— O que está acontecendo? – ele pergunta,sabendo que Nina não está em seu juízoperfeito. Tenta, mas não consegue identificaro que está causando essa brusca mudança deatitude.

— Cale a boca. – ela balbucia, com umsorriso de satisfação.

As mãos dela rasgam o ar, trilhando umcaminho sem volta. Toma o rosto de Lex deassalto, deslizando a ponta dos dedos pelopescoço do cara, detendo-se demoradamenteem seu tórax salpicado por gotículas de suore tensão.

— Resolvi que contarei tudo desde o início.– as mãos de Lex se atiram para dentro dosbolsos da bermuda, aprisionando-se ali.

— Não quero conversar. – Nina agora traçadesenhos provocantes na barriga malhada deLex. Ele segura um gemido involuntário.

— Por que está agindo assim? – os olhosdele se fecham em êxtase quando ela cola oslábios em seu pescoço. Um arrepiosubsequente liberta as mãos dos bolsos,agarrando-se à cintura de Nina. – Você estájogando? O que está pretendendo?

Os lábios de Nina umedecem de beijos a

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pele pulsante e Lex joga a cabeça para trás,arfando. Suas mãos agora iniciam umasubida íngreme, através das curvas perfeitasde Nina, levantando os cabelos dela no alto,emaranhando-se nos sedosos fios.

— Por que está me provocando dessamaneira? – Lex pergunta entre sussurros egemidos.

— Eu quero você. – Nina lança, num tominsinuante.

Lex não responde, as palavras não saem desua boca. Não faz ideia do que Nina pretendee está sem forças para afastá-la. Tanto que,tomado por uma sede enlouquecedora, atira-se àqueles lábios quentes como umafornalha.

Nina se descontrola quando as mãos de Lexalisam suas costas, detendo-se em seusglúteos firmes e curvilíneos. Passa umarasteira precisa no cara, caindo por cimadele.

A garota exala sedução por todos os poros.Lex está perdido naquele pescoço, na peleque queima ao toque, nos sons abafados queela emite em espasmos.

Esses dois estão ardendo e Lex não

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desconfia que Bárbara já canta vitória, aalguns metros dali. E nem imagina que elaacaba de engolir um grito de prazer quandoNina desenlaça a parte de cima do biquíni.

Ah, Deus, agora a coisa vai esquentar.~~***~~

Enquanto isso, na praia…Garotos e garotas se espalham pelas

espreguiçadeiras na areia, batendo papo,beliscando batatas fritas e frutos do mar,despedindo-se do último dia na ilha.

Gancho está deitado com Nathi em umaespreguiçadeira, acariciando seu rabo decavalo volumoso. Contará à ela sobre aaposta quando estiverem sozinhos, nãocorrerá o risco de Bola dar com a língua nosdentes. Seus grandes olhos negros sãoatraídos para o outro lado, acompanhandoSuzana se aproximar correndo, em pânico.

— Gente, eu preciso contar! Alguém precisaimpedir!

— O que foi, Suze? – é Edgard quempergunta.

— A Bárbara e o Bola drogaram a Nina. Elaestá doidona!

— Como é? – Lais dá um pulo da

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espreguiçadeira, agarrando Suzana pelobraço. – O que você está dizendo?

— Não temos tempo agora, precisamosimpedir!

— Onde ela está? Onde está a Nina? –Camila está aos gritos.

— No Centro de Arborismo. – é Nathi quemrevela, se levantando num salto e disparandoa toda velocidade, de mãos dadas comGancho.

~~***~~O ponto de observação é fantástico. O

zoom óptico da câmera de Bárbara captatodos os detalhes. Bola e Ana Paula filmamtudo o que está rolando entre folhas e beijosescandalosos.

Bárbara já possui fotos e vídeos suficientespara uma excelente vingança. Mas ela quermais, quer que Nina protagonize cenaspornográficas com Lex. Se ela sente ciúmes?Pode até ser. Mas o sentimento de vingançaé mais forte e sobrepuja qualquer outracoisa. Vingança. Doce e perfeita vingança.

~~***~~Louco. Alucinado. Lex não consegue mais

raciocinar, está entregue as vontades de seu

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corpo.E Nina? Bem, a garota está ensandecida. A

droga atinge o ápice e ela desfere umamordida prazerosa no lábio inferior de Lex. Éo que basta para ele ser tomado por umaforça do além, rolando-os sobre o tapete deterra e folhas secas que estalam sob oscorpos em chamas.

Os cabelos dela se espalham revoltos pelochão e mesmo sem qualquer controle dasituação, Lex consegue se afastar, arqueandoas costas para trás:

— Nina, algo não está certo aqui. Nãoquero você assim, nesse lugar. Está metestando, é isso?

Com uma expressão provocante, o olhar deNina é vidrado e as pupilas estão dilatadas.

— Não me quer, Lex? – a voz dela oenvolve em nuvens escaldantes.

— Não faz ideia do quanto eu quero você. –ele responde, prendendo as mãos dela acimada cabeça. – Mas estou sentindo que há algoerrado.

— A única coisa errada aqui é você aindaestar vestido. – Nina semicerra as pálpebras,lançando um sorriso desafiador no ar.

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Entrelaça as pernas em torno da cintura deLex, desarmando-o.

A mente do garoto luta para assumir ocontrole do corpo e vice-versa. Ele é umbravo guerreiro, mas está vencido. Ondaselétricas atravessam esses dois e qualqueroutra coisa perde a razão de ser.

— Eu preciso de você e será agora. – aspalavras de Nina, ditas num sussurro quenteem seus ouvidos, libertam as amarrasinvisíveis que ainda prendiam Lex asanidade. Ele está possuído e agora tudopoderá acontecer.

Nina inicia uma luta ferrenha com abermuda dele, usando os pés para livrar-sedo tecido. Lex está entregue e dará qualquercoisa que ela pedir. E ela pede mais, arfando.

Ele a beija com mais intensidade, suasmãos vigorosas se agarram àquela pelefervendo, deixando rastros avermelhados poronde passam. O fogo consome esses dois eLex está por um fio, na verdade, por umcordão. Cordão esse que Nina acaba dedesatar, afrouxando o calção de banho docara, levando-o a loucura.

Oremos para que a ajuda chegue logo.

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— Nina! Lex! – Nathália leva as mãos àboca ao notar que Nina está sem a parte decima do biquíni.

— Cubra a Nina com a sua canga. – Ganchoarranca o tecido da cintura de Nathi. – Eucuido do Lex.

Os dois correm na direção dos amigos e Lexescuta a voz de Gancho e Nathi seaproximarem. Gancho e Nathi? Numsobressalto, ele se dá conta de que Nina estápraticamente nua.

— Deixe comigo, Lex. – Nathi passa acanga nas costas da amiga. – Venha, Nina,nós vamos resolver isso.

— Resolver o quê? Saiam daqui agora! –ela grita, tentando se desvencilhar deNathália e da canga colorida.

— O que está acontecendo? – Lexpergunta, atordoado.

— A Nina foi drogada. – Gancho se ajoelhae pega a bermuda do garoto entre as folhas.– Vista-se.

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Cinquenta: Completamente chapadaBárbara e Bola se encaram: ele em pânico,

ela tranquila e radiante. A Kibi desliga acâmara e sorri, sentindo o êxtase da vitóriacorrer por suas veias. A vingança está quasecompleta.

— Droga, como eles descobriram? – Bolasoca a própria perna com o punho fechado.

— Foi a Suzana, não é óbvio? – Bárbaranão estressa, Suze pagará caro pelaintromissão. A ex-amiga se arrependerá atéo último fio de cabelo descolorido.

— Acha mesmo que a Suze teria coragem?– Ana arregala os olhos, temendo pelo futurode Suzana.

— Bola, livre-se do conteúdo do frasco.Ana, vá para o quarto e descarregue asimagens e os vídeos. Mande para o meuemail e depois apague tudo, entendeu? – aKibi Mor dá as coordenadas, como umgeneral.

Ana Paula se apressa. Levanta doesconderijo e corre para o hotel o maisrápido consegue. Bola já se livrou do frasco eda droga. No momento, encara a Kibiabertamente, sem saber o que esperar.

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— E agora? O que faremos? – Bola temeserem descobertos.

— Você eu não sei. Mas eu estou pensandoem uma maneira de detonar de vez com oLex.

~~***~~Nina trava uma luta ferrenha com Nathália.

Não quer a canga, não quer ajuda, só quer oLex. E ela grita isso, em alto e bom som.

Lais e Hulk se aproximam, cautelosos. Ninaestá descontrolada e Nathália a segura comopode. Hulk tira a camiseta e estende paraLais.

— Vista isso nela.Nathália e Lais dominam Nina, vestindo a

camiseta praticamente a tapas. Nathi tentaconversar amigavelmente, mas Ninacantarola alto só para irritar, tirando Lais dosério:

— Olhe para mim. – Lais segura firme nosombros da amiga. – Você escutou o que eudisse? Está chapada, drogaram você!

— Não estou drogada! – Nina rebate,visivelmente alterada.

Não distante dali, Lex irrompe em lágrimasnervosas nos ombros de Gancho. Seus lábios

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se retesam quando escuta Nina gritar com asmeninas.

Monitores e professores finalmentealcançam o Centro de Arborismo. Margarethse aproxima das garotas, fitando Nina compreocupação.

— O que está acontecendo aqui, afinal? – aprofessora toma o pulso de Nina e nota que ocoração está acelerado. Um monitor checa osolhos da garota com uma pequena lanterna,confirmando a suposição. Nina está drogada,com direito a pupilas dilatadas e opacas.

Pelo rádio, outro monitor pede à recepçãodo hotel que encontre o único médicodisponível na ilha. Margareth toma o rosto deNina entre as mãos, encarando-a comseriedade.

— Acha que pode caminhar até o hotel?— Eu já disse que estou bem. Aliás, nunca

me senti tão bem na vida. – Nina desata arir, sem conseguir parar.

— O médico foi encontrado e já está acaminho do hotel. – o monitor avisa, com oolhar recaído sobre Nina. – Margareth, issonunca aconteceu aqui antes e olhe quetrabalho nesse ramo há anos.

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— Ainda não acredito que isso estejaacontecendo. – a professora concorda,pesarosa. – Venha, Nina, vamos para o hotel.

— Não vou a lugar algum sem o Lex. – elacambaleia e segue ao encontro do garoto.

Lex a toma nos braços quando Nina deixa ocorpo cair sobre ele. A garota não consegueparar de rir, mesmo quando escuta a vozembargada de Lex aos ouvidos:

— Nina, você ficará bem. Precisamos voltarao hotel.

Ela não responde. Agarra-se aos cachos deLex e lhe desfere um beijo arrebatador,daqueles que arrancam suspiros inclusive decoisas inanimadas. Ele se afasta comdificuldades, abraçando-a bem forte.

— Pare com isso, está bem?— Por quê? – Nina o encara com um olhar

torturante, umedecendo os lábios de formaprovocante. – Poderíamos ir para a praia,tenho altas fantasias que envolvem areia emar.

— Escute o que está dizendo, essa não évocê. – ele murmura, demolido por dentro.

— Nina, precisamos voltar ao hotel. –Margareth dá o ultimato, tomando um dos

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braços da garota.— Já disse, sem o Lex não vou a lugar

algum! – Nina estressa e se agarra aopescoço de Lex, sufocando-o.

— Precisamos voltar, o médico saberá oque fazer. – Lex conversa com calma, comose Nina fosse uma criança. Ela se afasta,trançando as pernas.

— Não quero voltar ao hotel, só queroretomar do ponto em que paramos. – Ninamorde o lábio, fitando Lex como se o garotofosse uma sobremesa irresistível.

Mas então, um sopro invisível a faz tremerda cabeça aos pés. Nina sente as pernasfraquejarem e os olhos saem de foco, comose a pressão sanguínea tivesse caído aos pés.O corpo perde as forças e Lex e Gancho aseguram no ar, antes que desabe no chão.

— Ai, meu Deus. – Nathi entrelaça os dedosacima da cabeça, enquanto todos corrempara ajudar.

— Nina, fale comigo. – Lex se desespera.— Hum. – ela balbucia, abrindo os olhos.— Olhe para mim. O que está sentindo? –

Margareth checa o pulso de Nina novamente.— Estou zonza. Acho que quero dormir.

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— Não durma, por favor. – Lex a pega nosbraços, juntando todas as forças que possui enão possui. O corpo dela está amolecido,entregue.

— Se não aguentar carregá-la, trocamos nocaminho. – Gancho oferece, desferindo umtapa no ombro de Lex.

Na trilha de volta para o hotel, Lexconversa com Nina para que ela não durma.Os garotos se oferecem para carregá-la, masLex não permite. Sente-se em dívida comNina por não ter percebido o que estavaacontecendo. Bem, ele sabia que havia algoerrado, mas não fez absolutamente nadapara contê-la.

— Já disse que você é lindo? – Ninasussurra preguiçosamente, como se estivessebêbada. – Não, é sério, você é um dos carasmais bonitos que já conheci.

— Não diga isso, pode se arrependerdepois. – Lex ensaia um sorriso, sem desviaros olhos da trilha.

— Não me arrependerei. – ela rebate,alisando a barba dourada do cara com aponta dos dedos. – Aliás, já disse que vocêmexeu comigo desde a primeira vez em que

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nos vimos?— Não, você nunca disse. Também acho

que se arrependerá disso mais tarde. – Lex aencara, com o ego transbordando. – Tenhoque confessar que você também mexeucomigo.

— Verdade?— Você nem imagina o quanto. – Lex

finalmente avista a entrada do hotel.~~***~~

Com as costas arqueadas e os joelhosgritando, Lex alcança o dormitório dasmeninas. Auxiliado por Lais, deita Nina sobrea cama, sentindo-se culpado pela situaçãoem que ela se encontra. Deveria ter previstoalgo assim, ainda mais em se tratando daKibi Mor.

Uma galera se amontoa no quarto, todosquerendo fazer algo para ajudar. Nada podeser feito no momento e Nina começa a seirritar com a algazarra.

— Mande todos embora e feche a porta. –ela puxa Lex pela nuca e balbucia,insinuante.

— Sabe que não posso fazer isso. – eleacaricia o rosto transfigurado de Nina.

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— Não pode ou não quer? – ela incita,traçando formas geométricas no peito dele.

— Não posso. – ele responde, sentindoarrepios por todo o corpo. – Pare com isso.

— Nina, você tem consciência do queaconteceu? Sabe que está drogada? – Lais sesenta aos pés da cama.

— Não estou drogada! Por que ficarepetindo isso? – Nina se apruma. – Gente,que calor infernal é esse? Ligue esse ar-condicionado, por favor.

— A Bárbara e o Bola armaram para você,colocaram algo no seu suco, entendeu? –Nathi liga o ar-condicionado, regulando atemperatura.

— Ok, crianças, o médico chegou. Todossaindo, circulando, vamos. – Margarethenxota os estudantes, afirmando que Ninaficará bem.

O médico alto, grisalho e um tanto bichogrilo, entra no quarto com uma maleta pretaà tiracolo. Margareth pede que Lex se retire,mas Nina inicia um escândalo, agarrando-sea ele como se o mundo fosse acabar.

— Tudo bem, deixe que ele fique. – omédico abre a maleta sobre a cama,

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retirando alguns instrumentos de lá. –Sabem qual substância foi ingerida?

— Não sabemos, a-i-n-d-a. – Margarethfrisa.

— Precisarei colher uma amostra de sanguepara análise. – o médico abre uma caixametálica, retirando de lá uma seringa.

— Eu estou ótima. – Nina bufa e cruza osbraços, fechando a cara.

— Deixe ele tirar o seu sangue, está bem?– o tom de Lex é manso, cuidadoso. – Estareicom você, não irei a lugar algum.

— Nesse caso. – Nina dá de ombros eestende o braço, finalmente disposta acolaborar.

~~***~~Médico, exames, testes, um banho bem

quente… as horas passam e o corpo de Ninasofre os efeitos ruins da droga que ingeriu.Um frio cortante a assola e Lex a abraçacomo um cobertor quente e seguro.

A garota passou a tarde toda dormindo eacordando, num sono agitado e repleto desonhos estranhos. Lex foi o único que nãoarredou o pé do quarto, nem para almoçar.

Nathi e Lais estão atônitas, olhando para o

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nada. Margareth está sentada sobre a camade Lais, balançando a cabeça em negativa. Orelógio de pulso marca cinco da tarde.

Ainda não encontraram Bárbara ou Bola.Ana Paula, que estava no quarto das Kibis,disse não saber nada sobre eles e desmentiuquando a acusaram de fazer parte do plano.

O professor de literatura e os monitoresestão reunindo a turma toda na sala dejogos. A verdade precisa vir à tona e odiretor do Prisma já foi informado sobre oacontecido na ilha, por telefone. Cabeças vãorolar.

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Cinquenta e um: A vingança nunca éplena

O dia correu como se estivesse em umamaratona. O sol já se esconde no horizonte eos últimos raios solares pintam o céu emvários tons alaranjados.

Duas batidas na porta e alguém enfia acabeça dentro do quarto. É o monitor-chefe:

— Margareth, a turma já está reunida nasala de jogos. Mas nem sinal do Fabiano e daBárbara.

— Onde esses dois se enfiaram? – aprofessora rosna a pergunta. – Em algummomento eles terão que aparecer.

— Estamos esperando por vocês para areunião começar. – o monitor avisa.

— Quero ir também. – Nina abre os olhos ese remexe, num despertar preguiçoso.

— Não. Você não está bem. – Lex nãopermite que ela se levante. – E outra, vocênão precisa passar por isso.

— Eu quero ir. – Nina esfrega os olhos e sesenta, tomando o cuidado de não encarar Lexnos olhos. Apesar das imagens serem umborrão, se lembra do suficiente para ficarcom vergonha pelo resto da vida.

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— Ela precisa estar presente. – Nathália vaiem favor de Nina.

— Concordo. – Lais está com os punhoscerrados desde que viu a amiga naquelasituação constrangedora.

— Que seja. – Margareth concorda.~~***~~

Um murmurinho incessante toma conta dosouvidos de Nina. São acusações, conjecturas,especulações das mais diversas. Quando elae Lex entram na sala de jogos, o silênciorecai como um meteoro.

— Não me olhem assim. – Nina pede,encarecidamente. – Não é uma droga que vaime derrubar. – os olhares são dos maisdiversos e Nina tenta não se fixar ninguémem especial, não está a fim de decifrar asexpressões de pena nos rostos da turma.

Gancho se levanta do sofá de dois lugares,dando lugar para Nina e Lex. Ela se sentacom dificuldades e ele toma lugar ao seulado, abraçando-a quando o corpo dela seagita, tremendo de frio.

Nathi estende a mão para Gancho e eles serecostam na parede, aguardando que areunião comece.

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— Se não se sentir bem, promete falar? –Lex sussurra, entrelaçando seus dedos aos deNina.

— Prometo. – ela deita a cabeça no ombrodele.

— Ok, pessoal, o negócio é o seguinte:Ninguém sairá dessa sala hoje até que averdade apareça. – o professor de Literaturatoma a palavra. – A amiga de vocês foidrogada. O sangue já seguiu para análise eos culpados terão que aparecer.

— Nós queremos a verdade e queremosagora! – Margareth ruge com voz altiva.

— Querem a verdade? Pois eu direi averdade. – teatralmente, Bárbara faz suaaparição, emoldurada pelo batente das portasduplas da sala de jogos. O show está prestesa começar.

~~***~~O quebra pau tem início. Acusações voam

como flechas pela sala de jogos. Osprofessores e monitores tem dificuldadespara colocar a casa em ordem. E o circo pegafogo quando Bola entra na sala. Aí a coisafica feia. Todos os garotos querem socar ocara e ele precisa ser protegido pelos

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professores.— Calem a boca todos vocês! – Margareth

grita, a plenos pulmões. – Ouviremos aBárbara primeiro.

— Vai ouvir essa vaca? – Nathi se joga nadireção da Kibi, querendo muito socar aquelacara de vadia. Mas Gancho a segura,abraçando-a por trás.

— Ora, ora, ora… a Nathália se revela, não?– Bárbara requebra o quadril, levando asmãos à cintura. – Sua idiota, você não fazideia, não é?

— Não faço ideia do que, sua biscate? – elaluta para se desvencilhar de Gancho, mas ocara é mais forte.

— Você é uma aposta, meu benzinho. Uma.Aposta. – Bárbara degusta cada palavra,vingando-se de Gancho. – Gancho versusNathi, uma das apostas do ano! – Bárbaragargalha alto, deliciando-se com o momento.

Nathi não consegue engolir. A garganta sefecha, arranhando. Está atordoada, nãoacredita que isso esteja acontecendo. Ela éuma aposta?

— Eu não concordei com isso, Nathi, vocêprecisa acreditar em mim. – Gancho sussurra

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em seu ouvido.— Eu sou uma aposta? – ela se vira para

encará-lo.— Sim, você é uma aposta! – Bárbara

desdenha. – Aliás, a Camila ali também éuma aposta, não é, Nando?

— O quê? – Camila se levanta numsobressalto. – De novo? – os olhos da garotase enchem de lágrimas. – Seu desgraçado!

Camila precisa ser contida pelas amigas.Nando tenta se explicar, mas as palavras sedissolvem no calor da discussão. Todosvoltam a falar ao mesmo tempo e Margarethdá um berro para conseguir silêncio.

— Parem já com isso!O professor de Literatura retoma a palavra,

com sua voz ensebada e um tantopresunçosa:

— A Suzana nos contou que você e oFabiano drogaram a Nina. Isso procede? – oprofessor se dirige à Kibi Mor.

— Suzana… ah, Suzana. Eu avisei que senão estava comigo, estava contra mim. –Bárbara mira as unhas violeta. – A Suzana étão boazinha, não é?

— Babi, por favor. – Suze sabe o que

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Bárbara pretende revelar. – Isso é umassunto meu.

— É seu, é? Pensei que era um assunto doEdgard também. – Bárbara aponta aquelasunhas compridas na direção do garoto.

— Vamos focar no assunto central dessareunião. – o professor tenta retomar asrédeas, sem sucesso.

— Espere, professor. Eu quero ouvir o queela tem a dizer. – Edgard se levanta do chão,já aguardando a bomba.

— A Suze aqui engravidou de você no anopassado. E eu, como uma boa amiga –Bárbara olha para Suzana e volta a encararEdgard –, a levei para fazer o aborto.

Posso falar um palavrão? Essa Kibi é umabiscate da pior categoria!

Pronto. É o que basta para a sala de jogosexplodir em mil pedaços. Mais gritos, maisacusações, muita choradeira…

Nathália desaba em lágrimas nos braços deLais. Hulk consola Gancho que acaba desocar a parede com toda a força. Camila bateem Nando toda a vez que ele tenta seaproximar. Suzana cai prostrada no chão,levando as mãos à cabeça. Edgard olha para

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o nada enquanto os amigos tentam confortá-lo.

Nina está com o rosto escondido no peitode Lex. O que virá agora? Qual a próximabomba que Bárbara jogará na turma? Comoela pode ser cruel a esse ponto?

Lex afaga os cabelos de Nina, beijando suatesta. O corpo dela ondula de frio e o garotoa enlaça de forma vigorosa, buscando mantê-la aquecida. Apesar do lugar estar ruindo, écomo se esses dois estivessem em uma outradimensão, em segurança.

— Parem! – Margareth sobe em umacadeira para se fazer ver e ouvir. – Nãochegaremos a lugar algum assim!

— Bárbara, conte logo por que você e oFabiano drogaram a Nina e que tipo desubstância utilizaram. – o professor pega agarota pelo braço, irritado. – Agora!

— Certo, eu já iria chegar lá. – a Kibi Morsustenta um sorriso perigoso nos lábios. Omomento máximo da vingança acaba dechegar.

— Quietos! – Margareth desfere o grito,como um golpe. Finalmente o silêncio éretomado, em meio aos soluços de três

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garotas: Nathi, Camila e Suzana.— Eu chantageei o Lex para que ele

aceitasse a aposta da Nina. – Bárbara fazuma pausa, aguardando a reação da principalinteressada. E a reação vem. Nina levanta orosto do peito de Lex e seus olhos trêmulosencaram os triunfantes da Kibi. – Eu ochantageei com um vídeo detalhado, emvários ângulos, mostrando a verdade sobre oacidente com a moto. Vocês se lembram doacidente, não é? Pois bem, o Lex mentiu parao pai dele, dizendo que um caminhão haviapassado por cima da motinho novinha. Nãodevemos mentir, não é Lex? Acho queaprendeu a lição.

— Continue, Bárbara! – Margareth cruza osbraços à frente do corpanzil. – E se atenhaapenas ao que lhe for perguntado.

— Bom, o fato foi que o Lex aceitou aaposta de Nina mediante a minhachantagem.

— O que você pretendia com isso? – oprofessor pergunta, intrigado.

— Vingança! – ela ruge, entredentes. –Todos vocês se lembram do que essa vagabaaprontou comigo, não se lembram? Eu só

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queria me vingar.— O lance dos cartazes. – o professor se

lembra. – E nessa vingança você fez uso desubstâncias ilícitas? Você drogou a Nina?

— Não fui eu. Foi o Bola ali. – Bárbara sorriao apontar o culpado.

— Como é? – Bola dá um pulo da cadeira. –Ei, eu não fiz isso sozinho!

Ai, meu Deus. O caos retoma a sala dejogos. Enquanto as acusações inflamam aindamais o ambiente, Nina e Lex se entreolham.

— Por que não me disse? – ela o encaratristemente.

— Eu iria contar, lá no Centro deArborismo. Mas então, deu tudo errado. – elese defende.

— Se o seu pai assistir a esse vídeo, o queacontecerá? – Nina pergunta e os doisconversam baixinho, como se o mundo nãoestivesse acabando ao redor.

— Ele não vai pagar a minha faculdade demúsica. Serei obrigado a trabalhar com ele edesistir da carreira. – Lex morde o lábio,fazendo força para não chorar.

— Então foi encenação. Tudo o queaconteceu aqui foi porque você estava sendo

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chantageado. – Nina afirma em voz alta,para si mesma.

— Eu realmente estou apaixonado porvocê, Nina.

— Desde quando? – ela engole o choro.— Eu não sei dizer. Talvez tenha

acontecido no jogo de tênis ou depois disso.Eu realmente não sei.

O silêncio recai após a tempestade deacusações. Bárbara então retoma a palavra:

— O Bola, achando que iria me ajudar coma vingança, dopou a Nina com umasubstância chamada Droga da Coragem. Elesó me contou que fez isso depois que elahavia ingerido o negócio, diluído no suco demaracujá.

— Mentira! – Bola e Suzana gritam emuníssono.

— Isso é mentira. A Bárbara ficou com oBola ontem no luau para que ele dopasse aNina hoje! – Suzana abre a verdade.

— Suzana, o que a Bárbara queria comtudo isso? – o professor pergunta, quando aturma finalmente faz silêncio.

— Ela passou a viagem inteira fotografandoe filmando a Nina e o Lex. Eu ainda não sei

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onde ela usará as imagens, mas ela tem fotosrealmente boas para destruir a reputação daNina. – Suzana faz uma pequena pausa pararespirar. – E não é só isso: Ela quer acabarcom o Lex também.

— Isso é caso de polícia. – o professorsussurra no ouvido de Margareth que meneiaa cabeça em confirmação. – O diretor vaienlouquecer.

— Nem me lembre disso. – Margarethsacode a cabeça e quando dá por si, umanova confusão está armada.

Gancho parte para cima de Bola. Suzana seagarra aos cabelos da Kibi Mor. Camila mordeNando, arrancando-lhe sangue. Nathi estáchorando, compulsivamente.

Nina olha para o nada. Lex olha para ela.A garota está imóvel, inconsolável. A

tristeza deságua sobre ela como um tsunami.Nina sente o brilho próprio se apagando,como uma estrela prestes a desaparecer.

Fazendo um tremendo esforço para seerguer, ela se desvencilha dos braços de Lex.

— Onde vai? – os lábios do garoto tremem.— Me deixe em paz. – ela lança um olhar

áspero em sua direção.

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— Nina...— Já disse, me deixe em paz.Nina busca o apoio de Lais que precisa se

dividir em duas, amparando as melhoresamigas. Bárbara percebe que Nina estáprestes a sair de cena e não perde tempo:

— Vai fugir, sua vagaba? Quem é a biscateagora, hein? Aquela droga só mostra quemvocê realmente é! – Bárbara brada,empurrando Suzana sobre uma mesa. – Ah,e só para você saber, fui eu que mandei oLex levar você para o Centro de Arborismo!Euzinha aqui! E ele cumpriu as minhasordens! – a Kibi está vermelha de tantogritar.

— É mentira! – Lex se desespera. – Nina,isso é mentira! – o garoto tenta conversar,mas Lais não permite.

— Vem, vamos sair logo daqui. – Laisenlaça as amigas pelos braços e as trêsdeixam a sala de jogos para trás.

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Cinquenta e dois: Antes da volta paracasa

Quando Lex faz menção em ir atrás deNina, Hulk bloqueia o caminho do cara. Nessacena, objetos voam por cima das cabeças,móveis são quebrados, rostos socados,cabelos puxados… e tudo isso em meio àhisteria coletiva.

— Deixe a Nina pensar, Lex. Falar com elaagora não vai ajudar. – Hulk desvia o rostode um vaso que vem em sua direção. Oobjeto se quebra em mil pedaços ao dar deencontro com a parede.

— Hulk, ela me odeia. – Lex leva as mãos àcabeça, alheio ao fato do vaso. – E se elaacreditou na Bárbara? Cara, a Kibi não memandou levar a Nina até o Centro deArborismo! Acredita em mim?

— É claro que eu acredito, Lex. – Hulkrespira fundo. – Deixe as coisas esfriarem eentão você procura a Nina. Ela vai ouvi-loquando estiver de cabeça fria.

Bola precisa ser carregado para fora da salade jogos. O nariz sangra como uma torneiraaberta e Lex se sente vingado pelas mãos deGancho. Ele mesmo gostaria de ter dado

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aquele soco, mas não está em condições deentrar numa briga agora. A tristeza omassacra como uma jamanta.

A gerência do hotel chamou a polícia. Commedo de serem processados pelo lance dadroga, acharam por bem fazer um boletim deocorrência dos fatos. Uma precaução mais doque válida.

Margareth está ao telefone com o diretor.Após contar tudo o que descobriram, escuta,com o aparelho a metros de distância doouvido, os gritos e vociferações cavernosasque vem de São Paulo. Como eu disse,cabeças vão rolar.

Camila acaba de desferir mais um tapa norosto já vermelho de Nando. Não é que ocara estava mesmo amarradão na garota?Kibi filha da mãe!

Suzana e Edgard conversam em um canto.Ele diz que não é um moleque e que eladeveria tê-lo procurado quando soube dagravidez. O papo está profundo, sombrio eincrivelmente adulto.

Gancho está sentado em um canto,recostado de qualquer maneira ao lado deum janelão de vidro estilhaçado. Lex se

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aproxima, arrastando os pés. Senta-se aolado do amigo, pesadamente.

— Acabou, man. As férias perfeitas caíramnum buraco negro. – Gancho desabafa.

— Você tinha razão, eu deveria ter contadopara a Nina quando tive oportunidade. – Lexse lamenta, enxugando uma lágrima teimosa.

— A Nathi nunca mais vai olhar para aminha cara. – Gancho afunda o rosto nasmãos. – Cara, eu vou matar aquela Kibi dosinfernos. Vou matar o Bola também. Edepois, farei necromancia para trazê-los devolta à vida. E aí, meu camarada, matarei osdois novamente, com requintes de crueldade.

— Se isso fizer você se sentir melhor… –Lex não tem forças nem para conversar.

O dia, que havia começado bem, já viroumadrugada. Poucos estudantes voltaram paraos quartos e a polícia interroga os indicadospelos professores e monitores. Apenas Nina,Nathi e Lais foram poupadas. O relatóriomédico fala por si só e em breve, terão oresultado do exame de sangue de Nina.

Margareth sobe as escadas enquanto apolícia ainda interroga os estudantes. Oestrago foi grande no hotel e alguém terá

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que arcar com os prejuízos. Isso Margarethnão contou ao diretor. A cobra vai fumar, sópara constar.

Nina finalmente pega no sono. Nathi e Laisestão com ela, observando se algo muda noquadro da amiga. Elas contam à professoraque Nina vomitou logo depois de tomar asopa preparada especialmente para ela.

— Vomitar é bom nesses casos. –Margareth faz uma pausa, certificando-se deque Nina está respirando. – Meninas, como asituação chegou a esse ponto? Eu nãoconsigo entender.

— A Bárbara é louca, só pode ser. – Lais équem responde. Nathi está quietinha,encolhida na cama, olhando para algum lugaralém de Lais.

— Olhe, eu nunca vi isso em toda a minhavida. E eu lido com estudantes há mais detrinta anos. – Margareth checa atemperatura de Nina, tocando sua testa.

— Foi uma sucessão de acontecimentos. Oque eu posso dizer? – Lais abraça os joelhos.– O que acontecerá agora?

— O Bola e a Bárbara serão expulsos, issojá está decidido.

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— De que isso vai adiantar? Só temos maisduas semanas de aula mesmo. – Lais rebate,incerta.

— Bem, isso manchará o currículo escolarde ambos.

— E quanto ao estrago no hotel? – Laisencara fixamente a professora.

— Teremos que arcar com as despesas,Lais. Ainda não sei como será feito. Será umasorte se o hotel não nos processar. Mas odiretor dará um jeito nisso, como ele semprefaz. Agora, viagens de formatura?Sinceramente, acho que nunca mais noPrisma.

— E a droga? Encontraram? – Lais coça oolho, sentindo o sono a abater.

— Nada ainda.— E a Ana Paula? Ela também ajudou no

tal plano.— A Ana é pau mandado da Bárbara. Ainda

não sei qual será o fim dela. Estoupreocupada é com essas imagens da Nina edo Lex. Você sabe de alguma coisa? –Margareth faz uma pausa. – Nósvasculhamos o quarto delas e nãoencontramos nada. A câmera fotográfica

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estava vazia e os celulares também.— Só sei o que a Suzana contou. Talvez a

Ana tenha enviado as imagens por email edepois deletado as pistas. Acho que aindateremos grandes surpresas quando voltarmospara casa.

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Cinquenta e três: A volta para casaA manhã chega, com cara de ressaca. Nina

está sendo examinada e aparentemente oquadro é bom. Como prescrição, o médico lhepede que faça refeições leves com muitasfrutas e sucos naturais. O estômago de Ninarevira quando ele faz menção à sucos.

O laudo do exame de sangue de Nina ficarápronto em dois dias. Somente com isso emmãos o médico poderá traçar um plano dedesintoxicação, se for esse o caso. Ele sedespede, deixando uma Margareth maistranquila para trás.

As garotas tomam o café-da-manhã noquarto, enquanto arrumam as malas. Ninaestá se sentindo debilitada e não sabe dizerqual é o motivo da fraqueza. Possivelmenteseja um dos efeitos da droga, talvez a faltade uma alimentação mais substanciosa ouquem sabe seja o estrago que Bárbara fezem sua vida. Acredito que as trêsalternativas anteriores sejam válidas.

Nathi enxuga as lágrimas, jurando que nãoderrubará mais nenhuma por Gancho. Lais aabraça forte, um abraço de urso, que faz comque a amiga se sinta amada e um pouco

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melhor.— Teremos uma viagem longa pela frente.

Nina, fique longe da Bárbara. Não entre naprovocação ou você perderá a razão,compreendido? – Margareth está à porta doquarto das meninas.

— Pode deixar. – a voz de Nina é só umfiapo.

— Lais, você fica responsável por cuidardessas duas, está bem? – a professora delegae Lais aceita prontamente a incumbência. –Darei uma passada nos outros quartos.Qualquer mudança no quadro da Nina, meavise.

~~***~~A balsa está ancorada no píer. Da sacada

do quarto, Nina acompanha os primeirosalunos se dirigindo para lá. Olha em volta,recapitulando tudo o que aconteceu nessesúltimos sete dias. E não foi pouca coisa.

Lais e Nathi se unem a Nina na sacada.Nenhuma das três diz palavra, afinal, o quehá para ser dito?

A brisa marítima acaricia o rosto dasgarotas, jogando seus cabelos para trás. Oaroma e o som que vem do mar trazem uma

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sensação de quietude e paz, tão necessáriasnesse momento.

Uma lágrima solitária escorre pelo rosto deNina. Não há um motivo específico. Por maisque as férias tenham terminado da formamais catastrófica possível, Nina sentirásaudades dos momentos fantásticos queviveu na ilha. Esses também foram muitos eserão memoráveis por toda a vida.

— Está na hora. – Lais avisa, já sentindosaudades do mar e da boa vida.

— Seremos amigas para sempre, nãoseremos? – é Nathi quem faz a pergunta.

— Depois de tudo o que vivemos? Seremosamigas pela eternidade. – Lais deixa umagargalhada gostosa escapar e Nina secontagia, sorrindo também.

— A única coisa boa do Prisma foi terconhecido vocês duas. – Nina revela,puxando as amigas para um abraço grupal.

~~***~~A balsa está silenciosa. Fora o barulho dos

motores e hélices, nenhum piu é ouvido. Asexpressões são sérias, tristes, perdidas. Se odia anterior pudesse ser apagado da linhatemporal, essa balsa seria uma festa e não

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um velório.Os professores circulam a todo o momento,

evitando que os alunos com rixas a resolverse encontrem e o pau volte a comer solto.

Desde que Suzana dedurou a Kibi Mor, agarota foi aceita no grupo das meninas e atédormiu no dormitório de Camila na noitepassada. Não havia clima para dividir oquarto com Ana Paula e Bárbara. E queremsaber? Suzana está se sentindo muito melhoragora.

Lex e Gancho estão na popa da balsa,observando a ilha se afastar lentamente.Sentem como se o dia anterior não tivessepassado de um sonho macabro e distante.Infelizmente, os dois sabem que foi bem real.

Nina está na proa com as meninas. Nãoquer olhar para trás, não quer ver a ilha seafastar. O negócio agora é olhar para afrente, para o futuro, para o desconhecido.

Bárbara, Bola e Ana Paula estão na parteinterna da balsa, sendo vigiados de perto porMargareth. Ela já avisou que se algum delessair da linha, os abandona onde quer queseja e sem remorsos.

E assim, a balsa viaja tranquila até

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finalmente aportar no continente.~~***~~

O ônibus está à espera quando a balsaancora. Os estudantes vão descendo um aum e se dirigindo para a condução numsilêncio mórbido. O motorista do ônibus – omesmo da vinda – não entende nada e dá deombros, feliz por, aparentemente, ter umaviagem tranquila pela frente até o aeroporto.

Quando Lex entra no ônibus, seguido porGancho, vai passando pelas fileiras deassentos e estaca quando vê Nina sentadasozinha. Antes que ele possa pensar em dizerou fazer qualquer coisa, Camila dá umempurrão de leve no cara e se senta ao ladode Nina, não deixando qualquer outra opçãoa Lex a não ser seguir em frente. Nina sabiaque ele estava olhando para ela, mas nemassim tirou os olhos do asfalto.

~~***~~O avião decola no horário, sem maiores

transtornos. Já estão voando há uma hora eBárbara pede para ir ao banheiro. Margareth,que está sentada ao seu lado na vigia, rugepara a Kibi Mor:

— Se abrir essa boca ou causar algum

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tumulto, juro que jogo você desse avião,compreendido?

— Já entendi. – a Kibi devolve, comdesdém. Tira o cinto e caminha para a partetraseira do avião.

Quando Bárbara cruza com Lex e Gancho,não resiste a soltar um sorriso de deboche.Uma lágrima escorre pelo rosto de Lex e elenão consegue enxugar a tempo. Nummovimento rápido, a Kibi Mor a toma deassalto, provando a lágrima com satisfação.

— Saborosa como a vitória. Ah, Lex, agorasim minha vingança está completa.

— Vaza! – Gancho rosna, entredentes.Bárbara solta uma sonora gargalhada,

jogando os cabelos oxigenados para trás.Retoma seu caminho e Gancho faz mençãoem se levantar, mas Lex não permite. Osamigos se entendem só com o olhar.

— Cara, o que eu posso dizer? – Ganchoquer muito confortar Lex.

— Não diga nada. Não vai adiantar.~~***~~

O avião finalmente pousa no aeroporto deCongonhas, em São Paulo. O clima é amenoe a temperatura está em vinte e cinco graus,

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com céu parcialmente nublado.Os estudantes desembarcam, seguindo por

um longo corredor até o acesso as escadasrolantes. As malas estarão disponíveis naesteira de número três.

Nina já está com suas bagagens sobre ocarrinho. Lais idem. Só falta chegar uma dasmalas de Nathi.

Lex a observa de longe, sentindo o coraçãoapertar. Será que a garota frequentará asúltimas semanas de aula? O que estará sepassando na cabeça dela nesse exatomomento? Por que Lex está sentindo essaforte sensação de perda? Não, ele não podeacreditar que perdeu Nina para sempre, issonão pode ser verdade.

De posse de suas bagagens, os estudantesseguem os professores em direção a saída doterminal de desembarque. Do lado de fora,ao invés de pais sorridentes, encontram paisdesolados, cabisbaixos, envergonhados. Odiretor fez a lição de casa direitinho, pelovisto.

— Nina. – a mãe a puxa para um abraço. –Minha filha, o que foi que aconteceu?

— Em casa eu conto, tá bom? O que o

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diretor já adiantou? – Nina engole em seco,procurando pelo pai. – Onde está o papai?

— Está em casa com o Doc. Nós soubemosdo que aconteceu na ilha hoje de manhã.Seu pai está preparando um processo contraa Bárbara e o Fabiano.

— Não, mãe. Eu não quero processarninguém. Essa história já causou problemasdemais e eu só quero esquecer. Eu precisoesquecer.

— Em casa conversaremos sobre isso.Os pais de Nathália e Lais se juntam a mãe

de Nina e um debate se inicia. Falam sobre otelefonema que receberam do colégio e areunião marcada para amanhã à noite.

As amigas aproveitam para se despedirem.Nesse momento, as três ouvem uma briga

no saguão. Reconhecem a voz de Lex eolham em volta, procurando. Ele e o paiestão discutindo, gesticulando, se atacando.Bárbara deve ter enviado o tal vídeo de Lexpara o velho.

— O Lex está ferrado. – Lais comenta.— É, ele está. – Nathi concorda.— Vocês viram esse vídeo? O que contém?

– Nina pergunta.

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— Lembra quando o Lex foi desafiado porum garoto do segundo ano? – Lais começa aexplicar.

— Um racha de motos. – Nina se recordado ocorrido.

— Isso. – Lais continua. – Todo o pessoaldo colégio foi lá para assistir, tá lembrada?Nós não fomos porque tínhamos aquela festana casa do Pepino e também porque nãosomos idiotas.

— É, eu tenho uma vaga lembrança disso.– Nina puxa pela memória.

— Lembra do acidente?Sim, Nina se lembra do acidente de Lex,

afinal, essa história foi contada e recontadamilhões de vezes nos corredores do Prisma.

Lex, a mais de cento e cinquentaquilômetros por hora, corria emparelhadocom um garoto do segundo ano do colégio.Algo foi jogado no asfalto e o garoto fez umamanobra evasiva que resultou no acidente.

O veículo capotou várias vezes e o corpo deLex deslizou pela avenida, por mais detrezentos metros.

— Sim, eu me lembro. – Nina meneia acabeça.

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— O Gancho achou que ele tinha morrido.– Lais confirma. – Todos acharam isso. E euvi um dos vídeos e foi realmenteimpressionante. Se Deus existe, ele estavaali naquele momento.

— A roupa especial o protegeu, não foi? –Nina sente um arrepio cortante ao pensarque Lex poderia ter morrido naquele racha.

— A roupa e Deus… não se esqueça deDeus nessa história. – Nathi toma a palavra erespira fundo. – O problema foi que o Lexmentiu sobre isso para o pai. Disse que umcaminhão havia passado por cima da moto,que estava estacionada no meio fio. Ospoliciais que fizeram o boletim de ocorrência,disseram ao pai de Lex que a história nãobatia com o estrago da moto. E foi por issoque ele perdeu a mesada e sei lá mais o quê.

— Como sabe disso? – Lais franze o cenho.— O tal que não quero dizer o nome me

contou. – Nathi revela, olhando para o chão.— Meninas, vamos? – os pais chamam.— Vejo vocês mais tarde? – Nina pergunta,

um tanto deprimida.— Com certeza.

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Cinquenta e quatro: Nina encara Doc eos pais

Quando Nina e a mãe estavam saindo doaeroporto, o olhar da garota não se conteve.Ela e Lex se entreolharam e, naquelemomento, Nina sentiu como se o mundoestivesse em suspenso, suspirando alto eprofundamente.

O olhar dele se jogou dentro do dela comouma âncora. Para Nina, foi difícil pacasconseguir se soltar e retomar o seu caminho,mas a garota conseguiu o impossível.

No caminho para casa, ouviu o sermão desempre: “As pessoas são más, devemos tercuidado com o que bebemos e blá, blá, blá”.Nina já nem estava mais ouvindo o que amãe dizia.

Agora, afundada no sofá da sala, sentecomo se tivesse voltado no tempo, naquelamadrugada insone em que ouviu um sermãode mais de duas horas dos pais. Aquelamesma noite em que Doc e os amigos foramsoltos da prisão.

Nina conta, parcialmente, o que aconteceudesde que chegaram à ilha, inclusive sobre acontra-aposta que lançou para Lex. Se Doc já

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estava puto, agora o irmão mais velho estáirado, querendo o sangue de Lex. O pai deNina quer justiça a qualquer custo, nãoarreda o pé quanto a processar Bárbara eBola.

— Você deveria fazer uma viagem. Nãoacho que esteja preparada para iniciar umafaculdade agora. – a mãe recosta no sofá,cruzando as pernas. – Eu liguei para a minhaprima em Paris e ela disse que será ótimo tercompanhia por algum tempo.

— Paris? – os olhos de Nina brilham, masseu coração se apaga.

— Você queria tanto passar algum tempoem Paris para treinar o seu francês. Omomento chegou. – o pai de Nina arqueia ocorpo para a frente, apoiando os cotovelosnos joelhos. – Essa é uma excelenteoportunidade. E depois de tudo o queaconteceu...

— Quando a faculdade começar, você ficarápresa por quanto tempo? Seis anos? Talvezmais? – Doc abre uma lata de Coca e se jogana poltrona. – Não terá outra oportunidadecomo essa por um bom tempo.

— Concorda com isso? – Nina fixa Doc com

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o olhar.— Acho uma ótima ideia, se quer saber.

Talvez em Paris você não arrume tantasconfusões. – Doc revira os olhos.

— Eu posso pensar ou já está decidido? –Nina pergunta, esmagando uma almofadacontra o peito.

— Não iremos impor nada a você, Nina. – amãe esclarece. – Essa é uma oportunidadeúnica e nós a bancaremos por seis meses, umano, quanto tempo desejar.

— Mê deem alguns dias para pensar nisso,está bem? – No momento, Nina só conseguepensar em Lex.

— Tudo bem, filha. O que decidir, nósapoiaremos. – os pais de Nina entrelaçam osdedos e fitam a garota, com ares depreocupação.

~~***~~Em seu quarto, Nina fita o teto branco.

Fragmentos de memória vão se encaixando eela assiste as cenas que protagonizou comAlexandre Heinrich. As imagens tornam-senítidas, o som da voz dele ecoa em seusouvidos, o aroma inebriante de seu pescoçoinvade o ambiente, impregnando suas

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narinas.— Posso entrar? – Doc enfia metade do

corpo pelo umbral da porta.— Claro. – Nina não desvia o olhar do teto.Doc se aproxima, sentando-se na cama. Ele

a encara por algum tempo, pensando no quedizer. Finalmente encontra algo inteligente:

— Eu ainda tenho aquele taco de beisebol.— Eu sei que tem. – Nina deixa um sorriso

escapar.— Se quiser…— Não será preciso. – Nina se senta,

cabisbaixa. – Não se preocupe, vou superar.— Está apaixonada pelo cara?— Não consigo disfarçar, não é? – Nina

pega a mão de Doc e começa a estalar osdedos dele, como fazia quando eramcrianças.

— Não.— E você e a Lais? – ela muda de assunto.— Acha que devo ligar para ela? Tipo, acha

que tenho alguma chance? – Doc franze ocenho, em dúvida.

— Ela não ficou com ninguém na ilha. Aliás,sempre que podia, tocava no seu nome. –Nina revela.

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— Isso quer dizer que tenho chances.— Todas as chances do mundo.— Vou ligar então. – Doc puxa o celular do

bolso e Nina toca o rosto do irmão.— Faça isso. Pelo menos uma de nós

precisa de um final feliz.

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Cinquenta e cinco: Volta às aulasApós a reunião com os pais dos alunos do

último ano, ficou acordado que Bárbara eBola estavam expulsos. Os pais dos garotos,extremamente envergonhados, pediramdesculpas aos presentes e resolveramassumir sozinhos os encargos da destruiçãodo hotel.

O pai de Nina, nessa mesma reunião,decidiu acatar o pedido da filha e desistiu doprocesso judicial. Em que esse processopoderia melhorar as coisas? Os pais deBárbara e Bola pareciam ser boas pessoas e,bem, que melhor escola do que a vida, não?Esses dois garotos tomariam muitasbordoadas se não mudassem de atitude.

Nina ainda não deu sua resposta comrelação a morar no exterior. Após deliberarcom Nathi e Lais, decidiu pensar um poucomais. Essa é uma oportunidade de ouro e nãose pode desprezar algo assim.

Nina também foi levada ao hospital parafazer novos exames de sangue. O que querque havia em seu sistema foi expelido, demaneira natural. Não há qualquer traço dasubstância que ingeriu e isso foi um

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tremendo alívio para os pais da garota. Olaudo do exame de sangue de Nina já saiu eestá nas mãos da polícia.

Hoje é segunda-feira, o primeiro dia dasduas últimas semanas no Prisma. O diretordeu um salvo-conduto para Nina. Se ela nãoquiser frequentar as aulas, estará dispensadasem maiores problemas. Mas esse seria umatestado de fraqueza e Nina não querparecer fraca.

Nathália e Lais prometeram não falar sobreParis com ninguém. Esse será um segredomuito bem guardado.

Nina chega ao colégio, estacionando a motona vaga de sempre. Tira o capacete e pega amochila e a bolsa, dirigindo-se para aentrada. No meio do caminho encontraNathália e outras garotas com o olharabismado, mirando algo ao longe. Os olhosde Nina são imediatamente atraídos para lá.Ela empalidece no mesmo instante.

Mas que merda!O outdoor, em frente ao colégio, sustenta

algo que faz com que Nina feche os olhos poralguns segundos. Quando torna a abri-los,descobre que é real.

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Nathi se aproxima, balançando a cabeça emnegativa. Isso é ruim, muito ruim. As duas seencaram por alguns segundos antes de Ninacomeçar a dizer:

— Nós sabíamos que algo assimaconteceria.

— É, nós sabíamos. – Nathi encara ooutdoor novamente, absorta.

— Até que a Bárbara tem talento, essa fotoestá ótima. – Nina brinca com a situação,tentando desanuviar.

— É, a imagem está ótima mesmo. –Nathália concorda. – É uma pena que vocêestá seminua.

— É uma pena mesmo. – Nina está comvontade de chorar, mas tenta dominar suasemoções.

— E o Lex está com as mãos nos seus…— É, ele está. – Nina admite, pesarosa.— Até que o layout do outdoor ficou legal.

– Nathi zomba, para que Nina não se sintatão mal.

— É, ficou interessante.O imenso outdoor na porta do colégio está

tomado por uma imagem de Nina e Lex,naquele Centro de Arborismo, no último dia

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na ilha.Sem a parte de cima do biquíni, Nina está

montada sobre o cara. Ele, por sua vez, estácom as duas mãos nos seios da garota,tapando-os de olhares indiscretos.

O título em negrito anuncia: “Lex, ovencedor da Grande Aposta.”

O subtítulo, também em negrito, arremata:“Nina Albuquerque, a biscate do ano.”

Camila chega correndo, esbaforida. Trazalgo em mãos e começa a gritar,completamente surtada:

— Aquela galinha, Nina! Se eu cruzar comela na rua, juro que atropelo!

— O que foi agora? – Nathi revira os olhos.— Ela pagou dois garotos para distribuírem

isso! – Camila estende um DVD na direçãodas meninas. É Nathália quem o pega dasmãos de Camila. Nina olha por cima dosombros da amiga e o que vê revira o seuestômago.

Na capa do DVD, a mesma imagem dooutdoor está impressa, com os dizeres: Lexversus Nina, o pornô mais quente do ano.Apreciem sem moderação.

— Certo, ela foi longe demais. – os olhos de

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Nina umedecem automaticamente.— O diretor precisa recolher esse material.

Temos que falar com ele agora! – Nathi fazmenção em quebrar a mídia ao meio, masNina não permite.

— Não! Deixe eu guardar esse. – ela pega oDVD com fúria e o joga dentro da bolsa.

— Nina, volte para casa, aceite a dispensaque o diretor lhe deu. – Nathi aconselha.

— Não farei isso. Esse é o teste para saberse sou mesmo inquebrável como penso.

— Não será fácil encarar essa galera. – aamiga salienta.

— Não, não será. – Nina enxuga umalágrima com as costas da mão.

— Estaremos ao seu lado. – Camila ajeitauma mecha do cabelo de Nina atrás daorelha. – Se alguém fizer uma piadinha, eujuro que mato!

— Deixe que façam piadas, eu não ligo. Nóssabemos o que realmente aconteceu na ilhae é isso o que importa.

O celular de Nathália toca, insistentemente.Ela o retira do bolso traseiro do jeans, deslizao indicador sobre a tela e há uma novamensagem.

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— É da Lais. – Nathi abre a mensagem. –SOS?

— SOS? – Nina olha para a mensagem,intrigada.

— Por que a Lais pediria socorro? – Camilavinca a testa.

— Ai. Meu. Deus. – a ficha de Nathália cai,ruidosamente. – O Doc iria passar na casa daLais hoje de manhã para trazê-la ao colégio!Nina, ele deve ter visto o outdoor! – Nathiestá aos gritos, com os olhos saltando dasórbitas.

Um nome escapa dos lábios trêmulos deNina:

— Lex.~~***~~

Nina corre, mas não é rápida o bastante.Quando chega à entrada do colégio, o

tumulto já está armado. Doc está sendocontido por Hulk, Edgard, Nando e um carado primeiro ano. Gancho está ajoelhado aolado de Lex, que aliás, sangra como um porcorecém-abatido.

Nina sente um nó se formar na garganta eseus olhos se encontram com os de Lais. Aamiga está aos prantos, tentando acalmar

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Doc a todo o custo.Deixando o orgulho ferido de lado, Nina

larga a bolsa e a mochila aos pés de Camila eNathália, abrindo espaço entre as pessoas,distribuindo cotoveladas para todos os lados.

Quando finalmente alcança a clareira,ajoelha-se ao lado de Lex, verificandovisualmente os ferimentos. O cara estáestendido no chão, com o nariz sangrando eGancho segura a cabeça do amigo com umadas mãos. Os olhos de Lex se encontram comos de Nina, prendendo-os como sempreacontece.

— Nina, se afaste desse cara! – Doc grita,tentando se desvencilhar das mãos que oseguram firme.

— Desculpe por isso, Lex. – Nina nãoconsegue desviar o olhar daqueles raiossolares hipnóticos. – Meu irmão é um pitbull.

— Eu mereci. – Lex geme baixinho.— Nina, eu tô falando sério, porra! – Doc

luta em vão enquanto é arrastado para forado colégio.

Os professores chegam trotando em direçãoa muvuca. O diretor leva as mãos à cabeça,pedindo que Nina e Gancho conduzam Lex à

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enfermaria.— Não precisa vir. – Lex passa o braço ao

redor do pescoço de Gancho, levantando-seum tanto quanto cambaleante. Quando ogaroto tomba para o lado oposto, Nina oescora com o próprio ombro.

Ela não responde quando Lex repete “nãoprecisa vir”. Apenas faz sinal para queGancho comece a andar em direção àenfermaria. Curiosos vão seguindo com oolhar, enquanto Nathi e Camila recolhem ospertences de Nina do chão.

Doc está gritando, mas Nina o ignora. Vãoganhando terreno, subindo os quatrodegraus, até chegarem à entrada principal docolégio.

~~***~~Uma multidão se forma no corredor da

enfermaria. Lex, Nina e Gancho aguardam achegada da enfermeira, que aliás, está presano congestionamento.

Nina abre um armário de vidro e pega umpacote de gaze e um spray antisséptico.Borrifa um pouco do conteúdo e começa alimpar o rosto de Lex, fugindo dos olhos docara.

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— Não precisa fazer isso. – Lex segura amão de Nina. O simples toque de peles a fazarrepiar da cabeça aos pés.

— Meu irmão não deveria ter descontadoem você. – Nina analisa os ferimentos. Onariz de Lex sangra e a boca está cortada pordentro. Dois socos, talvez três. Nina não sabedizer quantos foram e não quer perguntar.

— Você viu o DVD? – Gancho pergunta,contendo a multidão de curiosos que quereminvadir a enfermaria a todo custo.

— Estou com um na minha bolsa. – Ninarevela, umedecendo os lábios. – Se meu paisouber disso, a coisa vai ficar muito feia.

— A Kibi foi longe demais. – o tom deGancho denota fúria.

— O estrago já está feito. – Nina diz emtom de desabafo.

— Ai. – Lex reclama quando a gaze deslizapelo canto da boca.

— Desculpe. – ela alivia a pressão.— Temos que conversar. – Lex se perde

dentro dos olhos de Nina, mas a garota estáevitando encará-lo.

— Não estou pronta. – ela admite.— Me deixem passar. – a enfermeira

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finalmente alcança a porta e Ganchodesbloqueia a entrada.

— Está em boas mãos agora. – Nina, semolhar para Lex, atira a gaze suja de sangueem direção ao lixo. – Mais uma vez, desculpepelo meu irmão.

— Nina. – Lex a segura pelo braço.— Como eu disse, ainda não estou pronta

para essa conversa. – e então, Lex afrouxa apegada e Nina passa voando por Gancho,saindo porta afora.

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Cinquenta e seis: A maldade é inerenteao ser humano?

Quando sai da enfermaria, Nina mantémuma postura ereta, a cabeça erguida e um ardespreocupado. Conforme vai passando pelocorredor de risadinhas, piadinhas e olharesameaçadores, os ombros de Nina vãodespencando, assim como sua cabeça, queagora está tombada para baixo. Não pensouque seria tão difícil enfrentar aquele bandode fuxiqueiros.

Antes que seus joelhos fraquejem e ela caiamortinha frente àqueles olhares maldosos,Nina é salva por Camila e Nathi, que a levammais do que depressa para a diretoria.

~~***~~O diretor gira o DVD em mãos. Tira os

óculos, jogando-os sobre uma pilha de pastasmuito bem dispostas sobre a mesa de mogno.Levanta-se da cadeira e trinca os dentes aoobservar o outdoor em frente ao colégio.

— Já liguei para a empresa responsável.Essa barbaridade será retirada ainda hoje. –ele faz uma pausa. – E quanto aos DVDs,revistaremos todos os alunos. Infelizmentede nada adiantará, o vídeo já caiu no

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Youtube. – outra pausa, dessa vezpreocupada. – Seu pai precisará entrar comuma ação para tirar o vídeo do ar, Nina.

— Não queria envolver meus pais nisso. – avoz de Nina é só um fio fraco, prestes a separtir. – Mas meu irmão contará o que estáacontecendo, não conseguirei esconder ofato.

— Você deveria ir para casa. – Nathi alisa obraço da amiga. – Ficar aqui só vai piorar asua situação.

— Não quero fugir.— Não serão dias fáceis para você. Mas

compreendo o seu lado, entendo o que querprovar. – o diretor alinha quatro vasos deplantas no parapeito da janela, de modo quefiquem simétricos. – Falei com sua mãe hojecedo. Fique tranquila, não contei nada sobreo outdoor. – ele se apressa em dizer. – Suamãe me contou sobre a possibilidade de vocêestudar fora do país. Seria muito bom, Nina.Crescimento pessoal, cultural e emocionalsão sempre bem-vindos. Todas as pessoasdeveriam fazer isso algum dia. – o diretor sesenta novamente, ajeitando agora o polvo eos cachorros de cerâmica sobre a mesa.

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— Ainda não me decidi sobre isso, masestou pensando. – Não. Nina não estápensando sobre a viagem. A única coisa quenão lhe sai da cabeça tem nome esobrenome: Alexandre Heinrich.

— Pense bem, uma oportunidade comoessas pode não aparecer nunca mais. – odiretor recoloca os óculos e faz uma pausacom ar pensativo. – Nina, qualquer outroproblema que tiver aqui dentro dos muros docolégio, por favor, me comunique.

— Certo, obrigada.~~***~~

Rumo à sala vinte e dois, Camila perguntasobre a viagem. Nina pede discrição total eabsoluta antes de contar. A amiga assente eescuta o relato de Nina sobre a possibilidadede estudar em Paris por alguns meses. Uau,até eu queria uma oportunidade dessas!

O sinal já soou e os corredores estãovazios. Quando Nina e as garotas chegam aosegundo andar, uma nova surpresa se abatesobre as três.

Não, não são cartazes colados às paredes.A surpresa vem das caixas de som

espalhadas pela escola. O sistema de áudio

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do colégio é daqueles megamodernos, digitaise computadorizados. Alguém deve tê-loinvadido para reproduzir o que apenas ossurdos não podem ouvir.

As vozes que saem dos auto falantes são asde Bárbara e Lex. Na íntegra, o diálogo – quenós sabemos não ter ocorrido – desenrola daseguinte forma:

Lex:— O que quer que eu faça? (a voz de Lex

foi gravada pelo celular da Kibi, no dia emque Bárbara chantageou o garoto pelaprimeira vez).

Kibi Mor filha da mãe:— Leve a Nina para o Centro de Arborismo.

Deixe a vagaba fazer o que quiser com você.Filmarei tudinho e finalmente terei a minhavingança. Feito isso, prometo não mostrar ovídeo do acidente para o seu velho. (a Kibigravou essa parte no mesmo lugar, com omesmo celular, no fim de semana pós-viagem).

Lex:— É só isso o que quer? (essa parte foi

gravada na balsa, também com o celular daKibi. O material foi editado por Bola, os

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ruídos de fundo foram retirados e mixados).Kibi Mor dos diabos:— Sim, é só isso.

~~***~~Os joelhos de Nina não conseguem mais

sustentar a pressão. A garota cai, prostrada,vencida, arrasada, espezinhada, humilhada.Então o que Bárbara disse na ilha eraverdade? Ela realmente havia mandado Lexfazer o serviço sujo e o filho da mãe aceitou?

— Nina, eu não acredito que o Lex tenhafeito isso. Cara, isso está me cheirando amontagem! – Nathi despenca ao lado deNina, abraçando-a.

— Também não acho que o Lex faria algoassim, Nina. Ele está apaixonado por você,está tão na cara! – Camila, apesar de estarem dúvida sobre a veracidade do diálogo, nãocolocaria sua mão no fogo por Lex. Mas elanão pode deixar isso transparecer. Não podedeixar Nina pior do que já está.

— Como eu sou burra! – Nina deságua noombro de Nathi. O choro vem recheado desoluços, arrebentando qualquer esperançaque Nina ainda mantivesse com relação aLex.

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— Não, Nina. Isso é armação. – Nathi tentaapaziguar, sem sucesso.

— Nina? – Lex chama do final do corredor.– Não pode acreditar nisso, é mentira! Eunão sabia de nada! – Lex vai se aproximandocom Gancho logo atrás.

— Lex, não se aproxime. – Camila toma afrente.

— É mentira, Nina. O Lex nunca aceitariaalgo assim, pelo amor de Deus! – Ganchofala por cima do ombro de Camila.

— Eu quero ir para casa. – Nina murmurapara Nathi. – Me leve daqui, por favor.

— Venha, eu ajudo você.— Não pode acreditar nisso, por favor. –

Lex está com a camiseta do Prismaencharcada de sangue. Um tremendo olhoroxo se destaca naquele rosto de traçossensuais.

— Não se aproxime! – Nina ruge quandoLex faz menção em tocá-la. – Nunca mais seaproxime de mim, está entendendo?

— Não faça isso comigo. – Lex leva as duasmãos aos cabelos cacheados. Lágrimasirrompem de seus olhos cor de mel. Asrajadas douradas ficam opacas e sem vida ao

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acompanharem Nina e Nathi tomando o rumoda escada central. O que ele deve fazer?

Nem preciso dizer que, nesse momento, asportas das salas se abrem e umaaglomeração começa a se formar, não é?

Quando Lex respira fundo e toma coragempara ir atrás de Nina, Gancho e Camilabloqueiam a passagem do cara.

— Deixe a Nina em paz, Lex. – Camila éenfática.

— Não é a hora, man. – Gancho segura obraço do amigo.

— Aliás, acho que essa hora nunca vaichegar. Não depois do que acabamos deouvir. – Camila cruza os braços frente aocorpo.

— É mentira. A Kibi montou esse diálogo,eles nunca tiveram essa conversa. – Ganchodefende Lex.

— Como sabe? Nasceu grudado no seuamigo, Gancho? Como pode afirmar que essaconversa nunca existiu? – Camila ataca.

— Ele nunca faria algo assim. E outra: Se oLex realmente tivesse feito um pacto com aBárbara, ele estaria livre da chantagem,certo? – Gancho faz uma pausa. – Então

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como você explica o pai do cara ter recebidoos vídeos do acidente?

— A Bárbara resolveu ferrar com ele dequalquer maneira, oras! – Camila retruca. –Isso não prova nada.

Com um olhar glacial, Lex encara uma dascaixas de som do Prisma. Respira fundo e aslágrimas cessam:

— Temos que conseguir essa gravação. Sócom isso em mãos conseguirei provar aminha inocência.

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Cinquenta e sete: Gancho versus NathiLex e Gancho decidiram voltar para casa.

Não há clima para ficarem no Prisma nessasegunda-feira mais do que tumultuada. E Lexfoi instruído pela enfermeira a fazer váriascompressas no rosto para não inchar aindamais. Os socos de Doc não doeram tantoquanto o olhar de desprezo de Nina.

Os amigos param em frente ao outdoor.Lex não se contém e soca o ar, sentindo umaperto feroz dentro do peito. Enfurecido,rosna ao pensar na satisfação de Bárbara. Elavenceu.

Nina passa batido por eles, acelerando amoto e derrapando na curva. A garota estáirada e Lex teme que ela faça algumabesteira. O ronco do motor se distanciarapidamente e logo desaparece no ar.

Nathi se aproxima, cabisbaixa. A intençãodela era passar pelos dois e continuar seucaminho até a sala de aula. Mas não é isso oque acontece.

— Nathi, por favor, espere. – Gancho apuxa pelo braço.

— Eu vou indo, vocês dois precisamconversar. – Lex nem se despede e continua

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a caminhar até o bicicletário.— O que você quer? – Nathi cruza os

braços, a mochila pesando toneladas àscostas.

— Eu só soube da aposta lá na balsa. Quemlançou essa merda no ar foi o Bola, aqueledesgraçado filho da mãe, ele queria meferrar. Deve ter descoberto que eu estava afim de você, sei lá. Ou talvez ele tenhanotado que você estava a fim. Bom, issorealmente não importa agora. – Ganchotoma um pouco de ar para continuar. – Eutentei me manter afastado de você na ilha,eu queria protegê-la. Mas então você metirou para dançar e eu não consegui meconter. Nathi, eu queria muito ficar comvocê.

— Como posso acreditar nisso? Coloque-seno meu lugar. – Nathi leva as mãos aosbolsos da calça jeans, jogando o corpo para afrente e para trás.

— Eu gosto de você e é para valer. Nãofiquei com você para vencer aposta alguma.– Gancho encara Nathi e ela encara o AllStar preto do cara.

— Não sei se posso confiar em você. –

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Nathi não vai chorar, ela não quer chorar.— Me dê uma chance. – o tom de Gancho

beira a súplica. – Por favor, me deixe provaro quanto gosto de você.

— Eu não sei. – o rabo de cavalo de Nathibalança em dúvida.

— Uma chance, é só o que estou pedindo. –Gancho se aproxima, ultrapassando abarreira invisível criada por Nathi. – Eu estouapaixonado por você. – ele toma o rosto delaentre as mãos.

— Não sei se posso voltar a confiar emvocê. – Nathi fita aqueles olhos negros,brilhantes e cheios de sinceridade. – Aconfiança precisa ser reconstruída e podedemorar tempo demais.

— Por você, eu espero o tempo queprecisar.

A expressão de Nathi ameniza após aúltima declaração. Um pequeno sorrisocomeça a se formar naqueles lábios tensos. Arespiração acelera e o coração batuca nomaior sambão.

— Eu prometo não decepcioná-la. – Gancholevanta o queixo de Nathi e leva os doispolegares aos lábios da garota. – Se me der

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essa chance, prometo fazer de você a gatamais feliz desse mundo.

Nathália dá um passo a frente, olhandopara cima. Gancho é uns dez centímetrosmais alto do que ela. Ele sorri com os lábiosselados. Ela sustenta aquele olhar sonhadorque reluz em cor-de-rosa.

Gancho não a beija, apenas aguarda. Nathialisa o rosto bem barbeado do cara, loucapara sentir o gosto dele novamente. É elaquem toma a iniciativa.

Quando os lábios de Gancho e Nathi seencontram, fogos de artifício de um shoppingpróximo são disparados no ar,simultaneamente. O Papai Noel chegou!

— Se me enganar, juro que furo seus doisolhos. – Nathi abraça Gancho, na ponta dospés.

— Há, há, há, há… eu sei que sim.

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Cinquenta e oito: Lex busca ajudaLex e Bola estudam juntos desde o jardim

de infância. E assim como se conhecem hámuito tempo, Lex também conhece toda afamília de Bola, inclusive seu irmão maisvelho, Reinaldo: o Rei Trancinha.

Rei é um cara descolado, cheio de dreadsnos cabelos. É um tipo a la Bob Marley, superpaz e amor. Lex gosta muito do cara e vice-versa. Os contatos ficaram esporádicosquando Rei se formou no Prisma e entroupara a faculdade de Química.

— Lex? É você mesmo, brow? – Rei atendeo celular, expansivo como sempre.

— Sou eu, Rei. Como está?— Eu tô de boa. E você, cara? – Rei faz

uma pausa curta e continua: – Putz, eusoube o que o imbecil do meu irmãoaprontou com você na viagem, Lex. Aquelemané me roubou, cara. Dei umas porradasnele quando soube, mas não sei se adiantoualguma coisa.

— Rei, preciso da sua ajuda.— Meu, pode pedir o que quiser!— Alguém invadiu o sistema do colégio

hoje e uma gravação foi reproduzida. Acho

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que o Bola armou para mim, de novo. – Lexestá no sofá de sua sala, com os pés sobre amesa. – Rei, acha que consegue vasculhar ocomputador do seu irmão? Procurar por essagravação?

— Lex, conheço você desde que usavafraldas, brow, eu não o deixaria na mão. Mediga o que contém essa gravação e considereo trabalho feito.

— Rei, vou dever essa a você pelo resto daminha vida. – Lex desabafa.

— Não, Lex. Pelo que meu irmão fez comvocê, estaremos quites. Cara, não sei o quedeu na cabeça dele.

— Eu sei o que foi e acho que até entendo.Mas se eu não provar a minha inocência, vouperder a mulher da minha vida.

— Ah, tem calcinha na jogada! Agora estouentendendo tudo, brow. – Rei solta umagargalhada cômica. – Lex, fique tranquilo. Seo Bola estiver envolvido nisso, eu voudescobrir.

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Cinquenta e nove: Nina toma a decisãoPara conseguir entrar em casa, Nina

precisa desviar de um copo estilhaçado nohall. Descobre uma Lais aos gritos com Doc.O irmão está vermelho de raiva ecompletamente descontrolado. A garota sabeque está ferrada.

Lais tenta aplacar a fúria, dizendo que Ninanão é mais criança e pode assumir aresponsabilidade por seus atos. Nenhum dosdois percebe que ela está por ali.

— Parem de brigar por minha causa. – otom de Nina recai como um raio.

— Ah, você está aí. – Doc se inflama. – Emque você estava pensando, porra? Por queajudou o cara?

— Pare com isso, Doc! – Lais, ainda aosgritos, agarra o braço dele.

— Você viu isso aqui? Assistiu esse vídeo?– Doc chacoalha o DVD nas fuças de Nina.

— Não, eu ainda não assisti. – Nina abaixaa cabeça, envergonhada.

— Eu vou matar aquele cara! – Doc estáespumando.

— Eu já disse que o Lex não teve nada aver com isso, Doc. Que saco, me escute! –

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Lais se enfeza.— Não é bem assim. – Nina finca os dentes

no lábio, arrasada. – Algo aconteceu nocolégio. – ela sente as forças se esvaindo edespenca, pesadamente, sobre o degrau quesepara o hall de entrada da sala de estar. –Nós ouvimos a gravação de uma conversaentre a Bárbara e o Lex. O diálogo foitransmitido para o colégio inteiro, pelosistema de som.

— Como é? – Lais ajoelha-se em frente àNina. – Que gravação é essa?

— A Bárbara chantageou o Lex para queele me levasse até o Centro de Arborismo. AKibi pediu para que ele deixasse eu fazer oque quisesse, sem me impedir. Se cumprisseas ordens, Lex estaria livre da chantagem.

— O filho da mãe sabia? Porra, eu tôfalando! Vou matar esse desgraçado! – Docpega as chaves do carro, mas Lais bloqueia ocaminho, tirando as chaves da mão do cara.

— Você não vai matar ninguém! – Laisruge. – Nina, você tem certeza sobre isso?

— Eu escutei a gravação. Aliás, o colégiointeiro ouviu. – Nina afunda o rosto nasmãos. – Eu estava enganada sobre o Lex, ele

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estava jogando o tempo todo.— Pode ser uma montagem, Nina. – Lais

pondera.— Para mim acabou. – Nina lamenta, aos

soluços. – Eu preciso sumir daqui, queroesquecer o que aconteceu naquela ilha.

— Vai aceitar fazer a viagem? – Lais sesobressalta. – Vai fugir, Nina?

— Não é uma fuga. – Doc finalmente parade gritar. – É uma decisão inteligente, umrecuo estratégico.

— Eu nem sei o que dizer. – Lais tomaassento ao lado de Nina. – Eu concordo que aviagem será incrível para você, mas não achoque esteja tomando essa decisão pelosmotivos certos.

— Eu preciso me distanciar disso tudo,tenho que esquecer o Lex. – Nina tomba acabeça no ombro da amiga.

— Me deixe matar o cara? Só umpouquinho? – Doc cerra os punhos.

— Cale a boca, Doc! – Lais bufa e abraçaNina.

Depois de um tempo longo demais, ascoisas se acalmam na residência dosAlbuquerque. Doc está jogado no sofá,

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girando o DVD entre os dedos, pensativo.Lais e Nina ainda estão sentadas sobre odegrau de mármore, pensando em tudo e emnada ao mesmo tempo.

— Vou para o meu quarto separar asroupas da viagem. – Nina se levanta,enxugando o rosto na camiseta. – Não hámais o que esperar.

— Você deu alguma chance para o Lex seexplicar? – Lais pergunta, levantando-setambém.

— Não e nem darei. Não fará a menordiferença.

~~***~~Subindo as escadas, Nina viu Lais se jogar

no sofá ao lado de Doc. Ele a abraçou,acariciando seus cabelos cor de fogo. Ninasorriu quando se beijaram. Pelo visto, essesdois se entenderam. E apesar de destroçadapor dentro, a garota se sente muito feliz poreles.

Lais queria ajudar Nina com as roupas, masela prefere fazer isso sozinha. Precisa muitode um tempo a sós consigo mesma, com seuspróprios pensamentos e sentimentos. Querconfrontá-los e senti-los em toda a sua

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intensidade. O que não nos mata, nos tornamais fortes. E Nina está buscando forças paraencarar o que a vida lhe reserva.

Tira o DVD da bolsa, jogando-o sobre abancada. Não assistirá agora, talvez maistarde. Abre a porta do guarda-roupas e ficaolhando lá para dentro, por tempoindeterminado. Só então se toca de que nãotem uma mala grande o suficiente para fazeruma viagem tão longa.

Puxa o celular do bolso da calça e, atravésdo comando de voz, pede que o aparelholigue para sua mãe.

— Nina? Está tudo bem? – pelo barulho aofundo, Nina imagina que a mãe esteja notrânsito.

— Oi, mãe. Pode falar?— Posso sim. O que houve? – Laura

aguarda numa pausa tensa. – Não está nocolégio?

— Não. Aconteceram algumas coisas por láe eu resolvi voltar para casa. Mas não foi porisso que liguei. – Nina respira fundo,convencendo-se de que está tomando adecisão mais acertada.

— Estou ouvindo.

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— Vou para Paris. Seis meses. E depoisvolto para fazer o cursinho pré-vestibular.

— Tem certeza sobre isso?— Tenho, mãe. – Nina fuça nos cabides

enquanto conversa.— Está bem, pedirei para o seu pai agilizar

as coisas.~~***~~

As amigas acabam de assistir ao DVD.Do lado de fora, a noite já caiu faz algum

tempo. Uma brisa suave entra pela janelaentreaberta do quarto de Nina e as cortinasflutuam, numa dança esvoaçante.

O filme protagonizado por Lex e Ninaengloba diversas situações. O passeio napraia quando Nina se deparou com o vazioexistencial pela primeira vez. O pagamentoda aposta após o jogo de tênis. Várias cenasda Caça ao Tesouro. E a mais humilhante dasgravações: o Centro de Arborismo.

As imagens do que aconteceu por lá eramapenas flashes na memória fragmentada deNina. Após assistir ao DVD, as lacunasmentais foram preenchidas.

— Não acredito que protagonizei isso aí. –Nina tira o DVD de dentro do aparelho, um

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tanto envergonhada.— Você estava drogada. – Nathália

tranquiliza.— Eu agi como uma vagabunda, me

equiparei a Kibi. – Nina atira o DVD dentrode uma gaveta. – Meu pai vai acionar oYoutube e ver o que é possível fazer.

— A Kibi e o Bola mereciam se ferrar. – otom de Nathália é agressivo.

— Vamos mudar de assunto? – Ninaassume outra expressão, jogando osproblemas para o fundo de sua mente. –Contem-me tudo sobre o Gancho e o Doc.

— Tem certeza? – Lais não quer deixar aamiga mais infeliz ainda.

— Ei, eu estou muito feliz por vocês duas,de verdade.

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Sessenta: A mala da vingança – Parte INina optou por não ir mais ao colégio. Não

há sentido em se expor somente paramostrar que é forte e inquebrável. Isso estálonge da verdade, afinal, sente-se fraca equebrada em todos os sentidos.

Nathi e Lais acabaram de chegar, trazendonovidades do Prisma. Suzana e Edgard setornaram amigos e a garota agora faz parteda turma das meninas do último ano.

Ana Paula anda sozinha, de cabeça baixa,sem qualquer amigo para conversar. Com aexpulsão de Bárbara e o afastamento deSuzana, a garota vive pelos cantos, com umtremendo ar de tristeza.

Já Camila e Nando vivem quebrando o pau.Todos os dias ele deixa uma rosa na carteiradela, na vã tentativa de ganhar o perdão dagarota. Hoje, na maior TPM, Camila deuvárias “rosadas” na cabeça de Nando. Nathi eLais contam a cena rolando de rir. Ninaimagina a situação e por um momento sente-se excluída por não ter estado ali nummomento tão hilário.

Gancho e Nathália estão perdidamenteapaixonados. Ela mostra toda orgulhosa, um

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livro que ganhou do cara hoje cedo.— Podemos falar do Lex ou você não quer

ouvir? – Lais se senta na poltrona de fuxicos,colocando o violão sobre o colo.

— Não quero ouvir. – Nina termina deseparar as roupas para a viagem.

— O Gancho continua a dizer que o Lex éinocente e logo terão as provas disso. –Nathália fala rápido para que Nina não tenhatempo de mandá-la calar a boca.

— Nathi, não quero ouvir. – a amiga aencara, fechando a expressão.

— Desculpe.— Bem, vamos ao shopping? – Nina força

um sorriso. – Preciso de uma malagigantesca para enfiar isso tudo. – ela apontaas várias pilhas de roupas e sapatos.

— Adoro ir às compras! – Lais batepalminhas. – Eu vi um chinelinho tão lindonaquela loja de esquina, sabem?

— Outro chinelo? – Nathi se sobressalta. –Cara, você tem altos problemas mesmo.

— Vamos antes que o Doc desista de meemprestar o carro. – Nina pega a bolsa sobrea cama. – Aliás, desde que vocês começarama namorar, ele anda tão bonzinho. – a garota

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cutuca a barriga de Lais.— É o amor. – Nathi suspira alto, levando

as mãos ao coração.~~***~~

O shopping está abarrotado devido asfestividades de fim de ano. O natal seaproxima a passos largos e as pessoas sãotomadas por um ímpeto desenfreado emgastar, gastar, gastar.

Lais está toda feliz com seus quatro paresde chinelos dentro da sacola. Nina e Natháliareviram os olhos quando a amiga para emfrente a outra vitrine, apontandodesesperadamente para um chinelo douradocom fitas de cetim.

— Eu preciso desse! – Lais cola o rosto novidro da loja.

— Chega de chinelos! – Nina ruge.— Só mais esse, eu juro! – Lais

choraminga.— Ai, tá bom! – Nathália dá de ombros e

elas entram na loja.Com cinco pares de chinelos, agora Lais se

dá por satisfeita. As três caminham pelamultidão de pessoas e sacolas, a caminho daloja de departamentos. Nina precisará de

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uma mala tamanho extra mega supergrande.

As garotas procuram pela mala eencontram duas bem bacanas. Nina nãoconsegue se decidir e entra numa discussãocom Nathália, averiguando os prós e contrasdas duas malas. Por fim, Nina decide-se pelaroxa.

— Se abaixem! – Lais sussurra, puxando asamigas para o chão.

— O que foi? – Nina sussurra de volta, comum tremendo frio na barriga, temendo queLais tenha visto Lex na loja. O que poderiaser pior do que o Lex?

— A Kibi Mor está aqui. – Lais fita asamigas, em choque.

— Como é? – Nathália arqueia assobrancelhas, surpresa.

— Só pode ser brincadeira. – Nina bufa,inconformada.

— Realmente era só o que faltava. – o rabode cavalo de Nathi balança, irritado. A garotasente uma pontada de fúria queimando oestômago.

Lais coloca a mente para funcionar. Seuolhar se congela e as amigas reconhecem

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essa expressão: a garota está maquinandouma vingança, a todo vapor.

— Nem pense nisso. – Nina se apressa emdizer. – Sei o que está pensando e não voupermitir.

— Não pode me impedir – Lais liberta umsorriso desafiador, soltando as sacolas nochão. – Hoje a Kibi não me escapa.

— O que pensa em fazer? – Natháliaarregala os olhos, sentindo um medorepentino. Quando Lais se propõe a algo,ninguém a segura.

— Me vingarei por vocês duas. – Lais estalao pescoço lateralmente, como se estivesseprestes a entrar em um ringue de luta livre.– Fiquem aqui.

— Não! – Nina tenta impedir, puxando abarra da saia de Lais. A amiga se desvencilhafacilmente, resoluta.

Lais se detém em frente a uma gôndola deesmaltes, vasculhando apressadamente osprodutos. Sorri quando verifica os preços e osalarmes anti furto dos esmaltes franceses.

— Que droga, temos que fazer algumacoisa! – Nathália murmura, sacodindo Ninapelos ombros.

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De onde estão, ambas acompanham quandoLais se aproxima de Bárbara, sorrateira.Sustenta duas caixinhas de esmaltes àscostas e Nina já entendeu o que ela pretendecom isso.

Essa será uma manobra arriscada, mas Laisnão é besta. Checa as câmaras de segurançae sorri quando nota que Bárbara está em umponto aparentemente cego.

A Kibi Mor está de cócoras, analisando umcreme anti-envelhecimento para o rosto. Abolsa vermelha da garota, daquelas grandese cheia de compartimentos, está aberta nochão. Lais se mete entre Bárbara e sua bolsa,chutando-a discretamente a fim de posicioná-la melhor.

— E aí, Babi? Como anda a vida após aexpulsão? – Lais a encara, divertindo-se.

Bárbara, sobressaltada, faz cara de quemfoi pega roubando. Levanta-se num pulo eencara Lais com sua famosa expressãopresunçosa.

Quando a Kibi recoloca o creme naprateleira, Lais aproveita a brecha. Abre osdedos e as caixinhas de esmaltes caem diretono alvo. Torce para que Bárbara não perceba

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a artimanha e é exatamente assim queacontece. A Kibi nem imagina que carregaquase quatrocentos reais em esmaltes dentroda bolsa. Sim, duas caixinhas de esmaltesque custam em média duzentos reais cada.Um absurdo, não?

— O que quer? – a Kibi empurra Lais, pegaa bolsa vermelha do chão e fecha o zíper.Lais respira aliviada, assim como Nina eNathi, que acompanham o desenrolar dosacontecimentos ao longe.

— A expulsão foi muito pouco para você. –Lais requebra o quadril, tombando a cabeçade lado.

— Não me venha com essa. – as pálpebrasde Bárbara tremem de raiva. – Você deveriame agradecer, Lais.

— Surtou?— Você deu aquela foto para a Nina. – a

Kibi enfia o dedo no nariz de Lais. – Eudeveria ter me vingado de você também!

— Ninguém mandou ser uma biscate,Bárbara. – Lais passa a mãos nos cabelosavermelhados, dando uma boa gargalhada.

— Sua ridícula! – trincandos os dentes, aKibi Mor joga os cabelos oxigenados para o

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lado, tromba no ombro de Lais e seencaminha para a saída da loja.

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Sessenta e um: A mala da vingança –Parte II

Tóim, tóim, tóim, tóim, tóim, tóim… e assimberra o alarme da loja de departamentos. Asaída de Bárbara é bloqueada por doisseguranças engravatados, dessesgrandalhões e com cara de malvados.

Lais sorri em êxtase quando alcança Nina eNathália, ainda escondidas no departamentode malas. De onde estão, as três possuemuma visão perfeita de Bárbara e dosseguranças.

— Precisamos fazer uma verificação,senhorita. – um dos seguranças segue omanual de conduta da empresa, falandobaixo e na maior educação.

— O quê? Você sabe com quem estáfalando, seu idiota? – ai, a garota não temmesmo noção alguma.

— Do que me chamou, mocinha?— I-d-i-o-t-a.O outro segurança, já acostumado com

tipinhos como esse, arranca a bolsa do ombrode Bárbara, abrindo o zíper numa tacada edescobrindo não só os esmaltes, comotambém dois cremes desses caríssimos.

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— Idiota é quem rouba e se deixa pegar. –o segurança desdenha, com os produtosroubados em mãos.

— Eu não roubei isso aí! Não precisoroubar! – Bárbara brada, selvagem. – Vocênão sabe com quem está falando!

O segurança desata a rir quando pega odocumento de identidade de Bárbara nasmãos. A garota é tomada por uma fúriacrescente, mas reprime a vontade de voar nopescoço daqueles dois quando nota estarsendo observada por vários olhos curiosos.

A Kibi assume uma postura altiva eimpassível, perguntando:

— Vocês não deveriam me levar para umasalinha ou coisa assim?

— O quê? E perder a oportunidade dehumilhar uma patricinha filhinha de papaicomo você? De jeito algum!

— Viu só, Oswaldão? – o segurança balançao documento de Bárbara na altura dos olhos.– A mocinha aqui fez dezoito anos ontem.Responderá como gente grande por esseroubo. – os dois caem na risada.

— Como é? – Bárbara murcha, como umaplanta há dias sem água. – Do que estão

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falando?— Ligue para a polícia, Oswaldão. A

ladrazinha aqui vai passar a noite noxilindró.

~~***~~Nina tapa a boca com as duas mãos. Nathi

engasga. Lais só falta cair no chão de tantorir.

Bárbara vai sendo arrastada pelos doisarmários, para a tal “salinha”, a fim deesperar pela polícia. Olhares reprovadoresrecaem sobre ela, mas a garota não cala aboca:

— Eu não roubei esses esmaltes!— Ah, mas roubou os cremes, certo? – o

segurança afirma.— Não, eu não roubei nada! Deve ter sido

aquela desgraçada! – Bárbara gira a cabeça,procurando por Lais. Mas as três se abaixamno momento exato. – Eu mato aquela vadia!Eu vou me vingar!

Ai. As amigas se entreolham, apavoradascom a possibilidade. Outra vingança não,pelo amor de Deus!

— Vamos sair logo daqui. – Nina sussurra.— Temos que pagar pela mala. – Nathi

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relembra.— Que droga! – Nina tinha se esquecido de

que precisa da mala. – Lais, a polícia vaiverificar os vídeos de segurança da loja e aBárbara vai acusar você, parou para pensarnisso, sua maluca?

— Não acontecerá nada disso. Aliás, ajudeia polícia a prender uma ladra. Vocês viram oscremes, ela estava roubando. – Lais não seabala. – Eu vinguei vocês duas e estou megafeliz. Vejam isso como a minha boa ação dodia.

— Eu sou sua fã. – Nathi ri, nervosamente.– Vamos pagar logo essa mala e sumir daqui,por favor?

— Demorou.

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Sessenta e dois: Nina é dura na quedaDuas amigas sentadas sobre uma mala

gigante. Dois irmãos puxando os zíperes comdificuldades. Essa é a cena que se desenrolano quarto de Nina, quando a bagagemfinalmente é fechada e lacrada com umcadeado da Hello Kitty.

Nina suspira alto ao se dar conta de quepassará seis meses fora do Brasil, longe dafamília, do irmão estourado e de suasmelhores amigas. Uma vontade de chorarsurge do lugar mais profundo do seu ser. Osolhos ficam marejados, a boca seca e oslábios tremem. Doc a abraça e começa seudiscurso de irmão mais velho.

O celular de Nathália vibra no bolso dacalça. Ela pega o aparelho e lê umamensagem de Gancho que diz o seguinte:

Gancho: “Onde está?”Nathi: “Na casa da Nina.”Gancho: “O pitbull está em casa?”Nathi: “Sim e sem coleira.”Gancho: “Dá para tirar ele daí?”Nathi: “Estou copiando a Lais.”Lais: “O que pretende, Gancho?”Gancho: “O Lex quer falar com a Nina.”

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Nathi: “Onde vocês estão?”Gancho: “Chegando aí.”Lais: “Tudo bem, deixe comigo. Levarei o

pitbull para passear.”Lais e Nathália se entreolham. Precisam dar

tempo suficiente para Lex e Ninaconversarem.

— Doc, pode me levar em casa? – Laisguarda o celular e pega a bolsa. – Eu esquecique preciso resolver umas coisas para aminha mãe.

— Posso pegar uma carona? Não estou afim de andar debaixo desse sol. – Natháliatambém pega a bolsa, jogando-a sobre oombro.

— Vocês já vão? – Nina estranha,enxugando as lágrimas.

— Ei, amanhã estaremos de volta. – Nathise sente péssima ao mentir, mas é por umaboa causa.

~~***~~Nina acena da porta de casa. Estamos em

um condomínio fechado gigantesco, formadopor vários residenciais interligados por praçase passarelas. Aqui não existem portões ouportas trancadas.

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É nessa mini cidade onde mora a maioriados estudantes do Prisma. Doc dá dois toquesna buzina e acelera, sumindo numa curva àdireita. Antes de entrar, Nina vai até acalçada e verifica a caixa de correio. Pega asúnicas duas cartas e um folder publicitário deuma loja de bolsas e acessórios. Enquantofolheia o material descompromissadamente,alguém bloqueia o caminho. De onde elesaiu?

— O que está fazendo aqui? – Nina deveriagritar, chutar, socar, cuspir. Mas sua reaçãoé resignada.

Os olhos de Nina não se enganam: sedutore extremamente lindo. Apesar do rosto feridoe da expressão triste, Lex continua maislindo do que nunca. A luz do sol incide emseus cachos cor de mel, transfigurando-osnum halo dourado. Ela não consegue ver osolhos dele, devido à luminosidade, mas sabeque ali eles ardem como o próprio sol. Ninase sente queimar.

O cara está vestido, coisa rara de se ver. Apolo branca destaca o bronzeado adquiridona ilha e a calça cáqui, cheia de bolsos, lheconfere um ar estiloso.

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Lex se aproxima e quando atinge a sombrade uma árvore, Nina pode analisar melhor osestragos causados por Doc. Um corte nocanto da boca; um olho roxo; uma bochechaamarelada. Com certeza, o irmão desferiutrês socos e muito bem dados.

— Não se aproxime. – Nina estende o braçoem frente ao corpo. – Fique onde está.

— O que ouvimos no colégio foi umamontagem e eu provarei a minha inocência.– aquela voz rouca é de matar!

— Não se dê ao trabalho, não fará a menordiferença. – Nina sente o magnetismo de Lexpuxando-a, empurrando-a para cima dele.Resiste, mas não é nada fácil.

— Nina, está impossível viver sem você. –cabisbaixo, Lex coloca as mãos nos bolsos. –O que aconteceu entre nós é grande demaispara terminar assim.

— O que quer me ouvir dizer? Que vouperdoar tudo? Esquecer? – Nina meneia acabeça de um lado para outro. – Não direiisso.

Lex leva uma das mãos aos cabelos,alisando a franja encaracolada para trás. Ovazio que sente dentro do peito o sufoca,

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tragando toda a sua energia, sua alegria, avontade de viver.

Com um profundo suspiro, Lex a encara,olho no olho e a verdade vem a tona. Nãosão meras palavras ditas a esmo:

— Nina, eu amo você.Ai. Meu. Deus.Nina é pega totalmente desprevenida.

Assimila, vagarosamente, as palavras queainda reverberam em seus ouvidos. O corpodela reage como se um meteoro estivessevindo em sua direção. Precisa correr parasalvar a própria pele, mas quem disse que aspernas se movem?

— Por que está fazendo isso comigo? –tomada por um medo paralisante, Nina deixaas cartas e o folheto caírem ao chão, levandoas mãos ao rosto. As lágrimas chegam numatorrente de emoções conflitantes e sua únicavontade é a de sumir, de evaporar no ar.

— Eu amo você, Nina, e nada vai mudarisso.

Próximos demais. O aroma de Lex semistura ao ar de maneira desumana. Nina sesente como na ilha, completamente dopada esem qualquer controle de suas vontades.

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Os braços dela caem rentes ao corpo. Ninamorde o lábio para que ele pare de tremer.Mil coisas para dizer começam a se formarem sua boca. Nenhuma palavra sai.

Vencida, Nina se deixa cair nos braços deLex. Ele a toma num abraço quente, como sea vida de ambos dependesse disso. Ela oescuta arfar. Ouve as batidas de seu coração.Estremece quando ele sussurra em seusouvidos: “Eu te amo”.

Chantagem.Aposta.Sedução.Jogos.Centro de Arborismo.Humilhação.O cérebro de Nina vive o próprio

apocalipse. Os sentimentos e emoçõescontradizem a razão. A garota se sentedestruída, como um prédio recém demolido.

Ela deseja, mas não deve.Ela precisa, mas não pode ter.Ela ama, mas deve partir.Num arroubo enlouquecido, Nina toma os

lábios de Lex de assalto. É um beijo que dói,machuca, estraçalha o pouco que ainda resta

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de sua sanidade. É um beijo úmido, regado alágrimas de ambos os lados. Ele chora poracreditar em um final feliz. Ela chora porquesabe que finais felizes não existem.

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Sessenta e três: Um beijo de despedidaO beijo.Esse é um daqueles beijos demorados, em

que nenhum dos lados se sente disposto aparar. Nina quer morrer ali, naqueles lábiosmacios, naquele abraço necessário. Lex querrecuperar o tempo perdido, quer se afogar nosabor de Nina e não soltá-la nunca mais.

Mas como eu já disse nessa narrativa,sempre tem um mala para atrapalharmomentos perfeitos. E o mala chega,estacionando o carro na garagem dequalquer maneira.

— Largue já a minha irmã!Nesse instante, Gancho salta de trás de

uma árvore. O cara estava ali escondido,para uma situação de emergência como aque se apresenta.

Lais sai do carro, com uma expressão quegrita por desculpas. Depois que deixaramNathália em casa, Doc percebeu que haviaesquecido a carteira. Quando Lais sesobressaltou com a possibilidade de voltarempara buscar a tal carteira, Doc, que não ébesta, sacou que havia armação no ar.

— Doc, deixe eles conversarem! – Lais dá a

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volta no carro, pronta para segurar o cara sefor preciso.

— Não acredito que armou para mim. – Doclança um olhar esmagador na direção deLais. – E eles não estão conversando porranenhuma!

— Doc, o Lex é inocente, cara. Deixe eleexplicar o que aconteceu. – Gancho tentaapaziguar.

— Foi um beijo de despedida, Doc, nadamais. – Nina revela, afastando-se de Lex.

— Como é? – golpeado pelas palavras deNina, o garoto é tomado pela surpresa. –Despedida?

— Vou morar em Paris.Se Nina queria ferir o cara mortalmente,

ela consegue. Lex sente o chão sumir sobpés. O coração para de bater por um instantee o sangue entra em greve, não querendomais circular.

— Não pode estar falando sério. – ele aencara, numa tristeza insuportável.

— Desculpe. – Nina arqueia o corpo para afrente e recolhe os papéis do chão. –Qualquer coisa que tínhamos ou quepudéssemos ter, acabou aqui.

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Lex sente uma ânsia tomar forma, umdesespero crescente na boca do estômago.Será que Nina não ouviu o que ele disse?Não acreditou em suas palavras?

— Eu achei que… – a voz de Lex é um fiosolto no ar.

— Achou errado.— Posso provar a minha inocência e eu vou

provar! – Lex se altera e Doc parte para cimadele, mas é contido por Lais.

— Já disse, não perca o seu tempo. – Ninareúne os cacos e retoma o caminho paracasa.

— Não pode me deixar assim. – Lex asegura pelo braço e ela se sente fraquejar.

— Deixe ela em paz, cara. – Doc rosna.— Logo você vai embarcar numa nova

aposta e se esquecer disso tudo. – Nina puxao braço e seus pés a carregam para bemlonge de Lex.

~~***~~Do quarto, Nina pode ouvir a discussão que

se desenrola debaixo de sua janela. Lex querentrar de qualquer maneira e é dominado porGancho. Doc bloqueia a passagem e ameaçabater nos dois se não forem embora agora.

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Nina está sentada na cama, abraçando osjoelhos, com o olhar perdido no nada. Elanão quer chorar, mas as lágrimas saemfurtivas, sem qualquer controle.

— Nina? – Lais entra no quarto.— Você e a Nathi armaram para mim, hein?

– Nina ensaia um sorriso, entre lágrimas.— Desculpe, foi necessário.Mais gritos. Muitas acusações. Vários

rosnados de Doc. Panos quentes atirados porGancho. A discussão pega fogo no andar debaixo.

— O que acha de jogarmos um balde d’águana cabeça desses caras? – Lais se senta nacama, colocando as mãos sobre as de Nina.

— Não é má ideia.— Acho que o Lex está falando a verdade.

A aposta terminou, o pai dele já está com osvídeos… ele poderia estar tocando a vida,mas não está. – Lais faz uma pequena pausa,acariciando os joelhos de Nina. – Ele estácompletamente apaixonado por você. Eu nãocostumo me enganar com essas coisas.

— Diz isso porque não escutou o diálogoentre ele e a Kibi.

— Nem preciso ouvir para afirmar que é

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uma montagem. A Kibi armou isso tudo. –Lais suspira alto. – Nina, dê uma chance aoLex de provar sua inocência. Dê uma chancea vocês.

— Ele disse que me ama. – Nina revela.— Ele disse isso? – Lais se espanta. – Uau,

Nina, o que está esperando para se jogar nosbraços desse cara?

— Eu não confio nele. Algo se quebroudentro de mim naquele corredor do Prisma,quando ouvi a voz do Lex pelos auto falantes.

Lex grita por Nina lá debaixo. Doc continuarosnando, ferozmente. Gancho por sua veztenta apaziguar os ânimos.

— Precisamos acabar com isso ou osvizinhos chamarão a polícia. – Lais se levantae olha pela janela. – Posso dizer ao Lex quevocê vai ouvi-lo se ele conseguir as provas?

— Eu não estarei aqui de qualquermaneira. – Nina dá de ombros. – Faça o queachar melhor, só acabe com essa gritaria, porfavor.

— Deixe comigo.

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Sessenta e quatro: Jantar em famíliaPapelada: checadaPassaporte: checadoBagagem: checadaCartão de crédito e dinheiro: checadosSeguro viagem: checadoEndereço da prima Simone: checadoTelefones para contato: checadoTelefone da Embaixada Brasileira: checadoPassagem aérea: checadaFinalmente os pais de Nina se dão por

satisfeitos. Tudo foi checado duas vezes, sópara garantir. A família Albuquerque estáreunida na sala de jantar, comendo pizzas econversando sobre amenidades. Bem,falavam sobre amenidades até esse exatomomento.

— Finalmente conseguimos uma liminar etiramos o vídeo do Youtube. Sua mãe ligouhoje para o diretor do Prisma que garantiuter recolhido boa parte dos DVDs que foramdistribuídos aos alunos. Fui à empresa deoutdoor e consegui uma nota fiscal e umcheque, que liga Bárbara a essa confusãotoda. Também já estou com o laudo do seuexame de sangue, que comprova que você foi

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drogada na ilha. – o pai deixa os talheressobre o prato e limpa a garganta antes decontinuar. – A pergunta que faço é aseguinte: não vai mesmo permitir que euprocesse todos os envolvidos? Vai deixar quesaiam ilesos dessa história?

— Ninguém sairá ileso, pai. Todos estãoperdendo, de uma forma ou de outra. – Ninanão está com fome, mas se força a enfiarmais um pedaço de pizza de rúcula goelaabaixo.

— Você também está perdendo. – é Lauraquem fala o que a família está pensando. –Está fugindo para Paris, não é verdade?

— E se estiver? – Nina não consegue maiscomer e afasta o prato.

— Se não quiser ficar em Paris por seismeses, não há necessidade. Vá, fique algunsdias e então volte para iniciar o cursinho. – opai completa.

— Ela precisa ficar longe daquele babaca. –Doc cerra os punhos sobre a mesa. – Ou nãodou um mês para a Nina cair na dele denovo.

— Não cairei na dele. – ela se defende,num tom agressivo.

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— Deixe sua irmã em paz, Doc. – pedeLaura, fechando a cara.

— Será que dá para mudarmos de assunto?– Nina se irrita e cruza os braços.

— Certo, vamos mudar de assunto. Que talme dizer por que fez um saque, no valor deseis mil reais da sua conta-poupança? – o paide Nina acaba de pegá-la no pulo.

— É o pagamento da aposta. O Lex rasgouo cheque e eu resolvi tirar em dinheiro. –Nina revira os olhos, num mau-humorcrescente.

— Vai pagar o cara depois de tudo? – Docquer jogar o prato na parede. Ou talvez, nacabeça de Nina.

— Eu só quero passar a régua nessahistória. Será que não dá para entender, pô?– e uma irada Nina deixa a mesa e a famíliapara trás.

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Sessenta e cinco: Entre amigosHoje é o último dia de aula no Prisma. Lex,

Gancho, Lais e Nathália conversam no pátio,debaixo de um Caquizeiro, um dos locaispreferidos de Nina no colégio.

Lex conta como anda a investigação de ReiTrancinha e as notícias não são nadaanimadoras.

Bola não sai do quarto há dias. SegundoRei, ele já comeu todos os salgadinhos domundo e bebeu quinhentos litros derefrigerante. O cara está na maior depressãodesde que Bárbara foi presa na loja dedepartamentos. Ela responderá em liberdade,mas essa liberdade não inclui Bola.

Parece que a garota disse por telefone, comtodas as letras, que não o suporta. O chamoude gordo, ridículo, nojento, asqueroso,imbecil e por aí vai. O garoto realmentemerece tudo o que está acontecendo. Oproblema é que ele não sai do quarto e Reinão tem acesso ao computador do cara.

— Não dá para acessar remotamente? –Nathi pergunta para Gancho.

— Daria se o filho da mãe ligasse a merdado computador. – Gancho dá um soco no ar.

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— E se conversássemos com o Bola? – Laisespecula. – Quem sabe?

— O Hulk e o Edgard já tentaram, semsucesso. – Gancho elucida.

— Quando a Nina viaja? – Lex pergunta,sem olhar para ninguém em específico.

— Hoje a tarde. – Lais engole em seco. –Lex, ela está irredutível.

— Não sei o que fazer. – ele lamenta,chutando um caqui ao se levantar. – Sem asprovas, ela não vai me ouvir.

— Temos que conseguir essas provas omais rápido possível. – Nathi se levanta numsalto, como se estivesse pronta para umabriga.

— Mas como, bebê? – ok, ok, ok… paremtudo agora mesmo. Bebê???? Bem, é assimque Gancho trata Nathi desde que eles seentenderam. Ai, fala sério, não?

— Não sei, Ganchinho, mas temos queconseguir.

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Sessenta e seis: Embarcando para ParisQuatro da tarde.Check-in feito.Momento da despedida.Nina segura as lágrimas do jeito que dá.

Uma ou outra teima em cair e ela as enxugarapidamente. Já abraçou Nathi e Lais umasquinhentas vezes e parece não ser osuficiente.

Doc, que não é de se emocionar facilmente,está com os olhos marejados e a gargantaseca. Ele se aproxima de Nina e começa adizer:

— Eu amo você. Sabe disso, não é?— É claro que sei. – Nina dá um soquinho

de leve no estômago do irmão.— Não arrume confusões por lá. Fique

longe de caras que usem cuecas, tá bom?— Pode deixar, Doc.Os olhos de Nina percorrem o saguão do

aeroporto, desesperados por uma miragem,uma aparição do além. Para sua completasurpresa, Lex e Gancho estão bem próximos,recostados numa pilastra.

Lex está particularmente lindo hoje,vestindo calça branca, camiseta cinza e uma

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camisa xadrez por cima. É impressionante,mas toda a mulher que passa por ele, atémesmo garotinhas, giram o pescoço de formasobrenatural para admirá-lo. Lex possui essepoder, essa aura expandida que atrai aatenção sem precisar de qualquer esforço.

— O que esse palhaço está fazendo aqui? –Doc brada, irritadiço.

— Por que não vai até lá se despedir? – amãe de Nina sugere.

— O quê? Pirou, mãe? – Doc mostra osdentes, doido por uma confusão.

— Concordo com sua mãe. Vá até lá. – opai de Nina não é o máximo?

Debaixo das vociferações de Doc, Ninabusca os olhares de Nathália e Lais. Ambasmeneiam a cabeça, em concordância.

Nina respira fundo e toma coragem. Nãoconseguirá simplesmente ignorar a presençadele e partir. Coloca-se a caminho, mirandoas próprias mãos que agora tremem semcontrole. Nina sente como se tivesse sidoatirada de um avião, sem para-quedas.

Gancho os deixa a sós quando Nina alcançao seu destino.

— Ainda não consegui as provas. – Lex leva

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as mãos aos bolsos da calça, fitando o chão.— As meninas disseram que você está se

esforçando muito para isso. – Nina suspiratristemente. – Lex, não foi só a gravação, é otodo, você entende?

— Começou tudo errado, eu concordo comvocê. Mas precisa terminar errado?

Nina não consegue se segurar. Suas mãosrasgam o ar, tocando o rosto de Lex, alisandoa barba dourada por fazer. Ele fecha osolhos, sentindo a troca de energia entre eles.

Numa ânsia insuportável, as mãos de Lexsaem dos bolsos, envolvendo a cintura dela,puxando-a para si. Num sussurro embargado,ele declara:

— Eu amo você e esperarei para sempre sefor preciso.

— Não faça isso. – Nina fecha os olhos,afundando o rosto no peito dele.

— Diga que tenho uma chance.— Não posso dizer uma coisa dessas. – ela

abre os olhos e o encara. – Não posso lhe darfalsas esperanças.

— Nina, o que eu preciso fazer? Me diga eeu farei. – Lex implora, os olhos úmidos.

— Não há nada a ser feito, desculpe.

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Nos autofalantes do aeroporto, a chamadapara o embarque tem início. Nina sente umnó se formar na garganta, assim como Lex.Ele quer beijá-la, prendê-la, sequestrá-la.Uma urgência toma conta do cara e, mesmocom os pais e o irmão de Nina por perto, nãoconsegue se segurar.

Os lábios se encontram em desespero. Lexescuta quando Doc vocifera um palavrão,mas não se retrai. Nina se agarra a ele, semsaber se conseguirá soltá-lo, deixá-lo paratrás. Mas ela precisa muito se afastar. E porincrível que pareça, ela consegue.

Ambos arfam, sem ar. Olhos nos olhos. Elesse encaram por um curto período, até que avoz nos autofalantes retorna relembrandosobre o embarque.

— Eu tenho que ir. – Nina chacoalha acabeça e se põe a andar antes que desista devez da viagem. Ao passar por Gancho, sedespede do cara. – Cuide bem dele, tá bom?

— Eu não tenho esse poder, Nina. –Gancho a puxa para um abraço. – Boaviagem.

Nina se despede de todos uma última vez,antes de pegar sua coisas e finalmente entrar

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na área do embarque internacional. Já estavapreparada para ser repreendida pelos pais oupelo irmão. Contrariando todas asexpectativas, nenhum deles se pronunciacom relação ao beijo. Talvez tenhamentendido que as coisas são mais complicadasdo que aparentam ser.

Nina não queria, mas olha para trás quandoo funcionário do aeroporto lhe devolve apassagem e o passaporte. A imagem éterrível e a garota fraqueja.

Lex chora compulsivamente e está sendoamparado por Gancho e Nathália. A cena fazo coração de Nina se estraçalhar dentro dopeito. Não. Ela não desistirá da viagem.Mudar de ares vai lhe fazer bem e ela precisamuito pensar.

Engolindo suas vontades, sufocando todosos sentimento, abafando a voz interna quegrita para que ela fique, Nina junta os cacose caminha mais do que apressada para bemlonge dali.

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Sessenta e sete: Acesso remoto – Parte ILex está deitado na cama, de bruços,

jogado às traças. Gancho e Nathi tentamconfortá-lo da melhor maneira queconseguem, mas nada parece surtir efeito.

No chão do quarto, um envelope estáaberto e seis mil reais em dinheiro saltampara fora. Nina pediu que o pagamento daaposta fosse entregue quando ela nãoestivesse mais no Brasil.

O celular de Lex toca no bolso traseiro dacalça de forma insistente. Gancho o puxapara fora, já que o amigo parece estar emoutro mundo no momento. A foto de ReiTrancinha, fazendo o símbolo de paz e amor,aparece no visor.

— Cara, é o Rei! – Gancho dá um pulo eLex se remexe na cama, finalmente dandosinal de vida.

— Atende logo! – Nathi arregala os olhos,incentivando.

— Rei? É o Gancho, man!— E aí, Gancho, grande brother! Como

estão as coisas?— Depende, meu camarada. Diga que tem

algo quente para o Lex. – Gancho se senta

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na cadeira, colocando o celular no viva voz.— Estamos com uma janela de uma hora e

meia. Minha mãe levou a baleia do meuirmão para o psicólogo. Só tem um problema,brow.

— O que é, Rei? – Gancho pergunta, atentoà resposta.

— Essa merda desse computador pede umasenha. – Rei suspira. – O que eu devo fazer?

— Deixe comigo, meu camaradinha! –Gancho joga o celular para Nathi, que o pegano ar. – Vou acessar remotamente e quebrara senha.

— Consegue fazer isso? – Lex levanta-se dacama e olha por cima do ombro de Gancho,para a tela do notebook.

— A pergunta correta é: Gancho, o quevocê não consegue fazer? – o cara adora segabar. – Rei, fique na linha, beleza?

— Estarei aqui, brow.

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Sessenta e oito: A bordo do Air FranceA viagem já dura seis horas. Nina não

consegue se concentrar em nada e resolvetentar dormir um pouco. Não. Dormir nãoresolverá nada.

Ela se remexe, recoloca os fones e zapeia atela à sua frente. Já viu boa parte dos filmesdisponíveis e não está a fim de nenhuma dascomédias românticas apresentadas. Acabaoptando por um filme de terror, que nãopassou nos cinemas do Brasil.

O gosto de Lex ainda grita em suas papilas.Nina toca os lábios com o indicador, fechandoas pálpebras por alguns segundos. Não seránada fácil ficar longe dele.

E se ela não tivesse ouvido o tal diálogo?Teria perdoado Lex? A garota começa a fazeressas e outras perguntas para si mesma. Aresposta? Bem, ela tem a resposta na pontada língua.

Sim, Nina teria perdoado Lex.Mas aquela gravação bagunçou tudo em

sua cabeça. Seu ego, com sérios problemasde inferioridade, não consegue lidar com ofato de Lex estar envolvido no caso Centro deArborismo. Nina não sabe se acredita ou não

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na inocência dele. Talvez ela acredite,querendo desacreditar. E vice-versa.

Nina se pega sorrindo ao relembrar o jogode tênis. O primeiro beijo foi tão avassaladorque compensou quase tudo. E o beijoroubado no dia da Caça ao Tesouro? Ao selembrar da cara de Lex quando ela acionou osinalizador, Nina sufoca uma gargalhada. Nagruta, a garota já tinha quase certeza deseus sentimentos. Mas a ficha realmente caiupouco antes de Lex se declarar. Infelizmentea viagem terminou daquela forma, com Ninasendo humilhada para toda uma vida.

As pálpebras dela finalmente começam apesar. Vai fechando os olhos vagarosamentee o sono a carrega, para um sonho mais doque perfeito.

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Sessenta e nove: Acesso remoto – ParteII

Gancho digita com os dez dedos de formafrenética. O corpo do cara parece ter sidoinvadido por uma força demoníaca. Os olhosnegros do pirata estão cravados na tela eNathi e Lex tentam acompanhar o raciocíniodele.

Lex não manja bulhufas de computador. JáNathália entende praticamente tudo o queGancho está fazendo.

— É um programa para quebrar senhas. –ela explica para Lex. – O problema é quedemora um pouquinho.

— E então conseguiremos acessar osarquivos do Bola? – Lex conjectura, num tomderrotista.

— Torça para que ele não tenha umasegunda senha.

Vinte e oito minutos e dois segundosdepois, Gancho dá o grito da vitória. Ele estádentro do computador de Bola.

— O computador está liberado por aqui. –Rei anuncia.

— Certo, estamos procurando arquivos deáudio. – Gancho narra enquanto digita. –

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Vamos lá, se mostrem para o papai aqui.— Devo fazer alguma coisa? – Rei

pergunta.— Não, man. Apenas vigie. – Gancho vai

abrindo pastas e mais pastas de arquivos.— E se não encontrarmos nada? – Lex

despenca na cama, abatido. – E se não tiversido o Bola?

— Quem poderia ter sido? Não conheçomais ninguém além do Gancho queconseguiria entrar no sistema do colégio. –Nathi se senta ao lado de Lex. – Foi ele,tenho certeza.

— Galera, isso está demorando demais. –Rei começa a ficar tenso. – Por acaso o Bolavai saber que invadimos o sistema dele?

— Está falando com o maior pirata de todosos tempos, meu camarada. Acha mesmo queeu deixaria pistas? – Gancho solta umarisada incrédula. – Estou apagando minhaspegadas conforme passo, man.

— E se nem assim a Nina quiser me ouvir?— Nem pense nisso! – Nathália tem

vontade de dar uns tapas em Lex.— Aqui! Achei! – Gancho comemora,

lançando uma risada maquiavélica a seguir.

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— Abra logo! – Nathi chacoalha os ombrosdele.

— Deixe eu copiar primeiro. – na pasta como nome “vingançababi”, Gancho descobrevários arquivos de áudio.

— Droga, galera, eles chegaram! – Reientra em pânico. – O que eu faço, brow?

— Calma, Rei. Estou terminando de copiar.– Gancho dá um tapa no monitor. – Andalogo com isso!

Nathi rói as unhas. Lex arranha o violão.Gancho se ajoelha na cadeira. Rei, do outrolado da linha, morde o fio do mouse.

— Pronto! – Gancho volta a digitar,apagando o seu acesso do sistema de Bola. –Desligue o computador, Rei.

— Ok, feito. – quando Rei diz isso, Bolaentra no quarto. Nathi, Gancho e Lexmergulham num silêncio sepulcral.

— O que está fazendo no meu quarto? – otom de Bola é amargurado.

— Meu computador pifou e vim tentar usaro seu. Mas essa merda tem senha, não é? –Rei se levanta, pegando o celular. – Como foino psicólogo?

— Por que isso interessa? Você não me

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suporta.— Não pode deixar aquela Kibi arrasar com

você desse jeito. – Rei tenta motivar o irmão.— Não fale assim dela! – Bola brada.— Tudo bem. Não está mais aqui quem

falou.~~***~~

Lex e Rei conversam pelo celular, agora demaneira privada. Gancho está abrindo osarquivos, um a um, com Nathi no seucangote.

— Você é o melhor, Ganchinho. – a garotalhe dá um beijo no canto da boca.

— Obrigado, bebê. Eu sou foda!— E então? – Lex finalmente desliga com

Rei. – Tudo aí, Cabeça?— Tudo aqui. São vários arquivos de áudio,

provavelmente de conversas que a Kibigravou. Prontos para ouvir? – Ganchosustenta o indicador sobre a tecla,aguardando.

— Pode reproduzir. – Lex autoriza.

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Setenta: La ville lumièreParis. A cidade luz. A capital em formato de

caracol.É isso o que Nina vê a bordo do avião,

antes de pousar. Ela deveria estar extasiada,ansiosa e feliz por realizar um de seussonhos, mas não é assim que ela se sente.

De maneira automática, segue o fluxo depessoas. Passa pela imigração, pega asbagagens e se encaminha para a área dedesembarque, sentindo-se apenas mais umana multidão.

O aeroporto Charles de Gaulle é uma veiapulsante. Em um outro momento de sua vida,talvez tivesse olhado em volta, reparado naspessoas. Não hoje. Não agora.

Simone acena e vai se aproximando, felizpor ter companhia após quatro anos morandoem Paris, longe da família e dos amigos. Ninatenta sorrir, mas é um sorriso forçado e elanão precisa se explicar. Simone já conheceparte da história contada por Laura, a mãede Nina.

Simone é museóloga e trabalha nofuturístico Centre Georges Pompidou, nofamoso Museu de Arte Moderna. Mudou-se

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para Paris há quatro anos, após concluir osestudos na Inglaterra. Ela e Nina se veemapenas em datas comemorativas e tambémconversam muito pelo Skype.

Apesar da diferença de idade – quasequinze anos – Simone é como se fosse umairmã mais velha, sempre pronta a dar umconselho que realmente vale a pena ouvir.

Elas bem que poderiam ser irmãs. Simoneé alta, esbelta e possui olhos tão verdesquanto os de Nina. Mas o estilo écompletamente diferente. Enquanto Ninaprefere o conforto, Simone adora umavestimenta clássica, ao estilo AudreyHepburn.

— Que saudades, Nina! Como foi deviagem? – o abraço é caloroso e Nina sesente bem por alguns segundos.

— A viagem foi tranquila. E como vocêestá, Mone? – Simone não curte o próprionome. Em um determinado momento davida, optou pelo apelido Mone. Mais francêsdo que isso, impossível.

— Estou bem e muito feliz por você estaraqui. – Simone faz uma pausa, ajudandoNina com as bagagens. – Mas algo me diz

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que você não ficará por muito tempo.— Conversou com a minha mãe, não é? –

os lábios de Nina desenham um sorrisolacônico.

— Temos muito o que conversar, mocinha.Quero saber tudo sobre a viagem deformatura e principalmente: quero sabertodos os detalhes sobre esse tal de Lex.

~~***~~O táxi estaciona no bairro Saint-Germain-

des-Prés, lugar conhecido por suas livrarias,sebos, cafés e luxuosas lojas de grife. Osintelectuais de Paris são figurinha fácil nesseambiente acolhedor e extremamentecharmoso.

Nina pensou que sentiria uma tremendaemoção ao ver o Rio Sena e a Torre Eiffel.Infelizmente, ela não está no clima. Tanto orio como a torre passaram batidos, comomais um ponto turístico dentre tantos.

Nina segue Simone para a entrada doprédio e tudo ao redor suspira glamour. Amaioria das lojas já está aberta e o clima ébem frio. Nina passa o cachecol em torno dopescoço e seu corpo sente o choque damudança de temperatura.

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Assim como o bairro, o prédio exala charmee sofisticação. Passam por um portal echegam a um pátio interno, todo forrado comflores de uma beleza magnífica. E o aromaentão? Café fresco com flores do campo…uma mistura que ficará para sempre marcadana memória olfativa de Nina.

Sobem um lance de escadas e seguem porum corredor até o apartamento de númerovinte e oito. O lugar não é grande oupequeno. Eu diria que é perfeito para duaspessoas. Simone explica que morar em Parisé caro demais, mas ainda assim conseguiualugar esse apartamento com dois quartos.Como sempre recebe visitas vindas do Brasil,dois quartos eram mais do que necessários.

— Nina, sinta-se em casa. – Simone vaiabrindo as janelas. – Antes de desfazer amala, vou passar um café e quero ouvir a suahistória.

— Mone, eu não voltarei ao Brasil, isso estáfora dos meus planos no momento. – Ninarebate, sabendo exatamente onde Simonequer chegar.

— Ainda assim, deixe a mala como está.Venha, quero que me conte tudo, tim, tim,

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por tim, tim.

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Setenta e um: Confronto de gigantesOs pais de Lex estão na cozinha,

preparando sanduíches e uma salada para ojantar. Bebericam um vinho tinto e riem dealgo que parece ser bem engraçado.

Lex se aproxima, sem saber como iniciar aconversa. Senta-se em um banco alto e apoiaos cotovelos no mármore da bancada. O paicorta rodelas de tomate bem fininhas e amãe está lavando alfaces.

— Velho, preciso conversar com você. –Lex, cabisbaixo, entra na conversa.

— Não me chame de velho, moleque. –desde que o pai de Lex viu os vídeos doracha, os dois não se entendem.

— Desculpe. – Lex pigarreia. – Pai, precisomesmo conversar com você.

— Se for para pedir dinheiro… – nessemomento, a mãe de Lex fecha a torneira etoca o braço do marido.

— Deixe ele falar, Raul. – a mãe fita Lex,amorosamente. – O que é, filho?

— Eu fiz besteira e quero me desculpar. –Lex sabe que essa conversa pode não levar alugar algum, mas precisa tentar.

— Se está se desculpando é porque quer

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algo. Vá direto ao ponto. – Raul solta a facasobre a bancada e enxuga as mãos no panode prato, encarando o filho.

— Não sei em que eu estava pensando. Nãodá para conversar com vocês. – Lex fazmenção em se levantar, mas a mãe nãopermite.

— Diga o que está havendo, Lex.Orgulho é um sentimento que atrapalha a

vida, só digo isso a vocês. E Lex, orgulhosocomo ele só, precisa fazer uma tremendaforça para se sentar novamente e contartudo o que o aflige. E ele começa falandosobre o acidente.

~~***~~Raul e Alice, pais de Lex, estão atônitos. O

filho acaba de despejar sobre a bancada dacozinha, coisas que eles nem poderiamimaginar.

— Não acredito que esteja arrependido,Lex. – Raul puxa um banco e se senta.

— Eu mudei, velho… er, pai. Não sou maisaquele babaca.

— Acredito em você, filho. – Alice conheceLex como ninguém.

— Deixe eu ver se entendi: você quer a

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nossa autorização e dinheiro para ir à Paris,é isso? – o pai estala a língua no alto daboca. – O que me garante que você não secansará da garota? Você é o tipo de molequeque só quer o que não pode ter. E quandoconsegue, acaba enjoando.

— Eu não sou assim! – Lex rebate, irritado.– Você não me conhece mesmo, não é? –opa, agora estamos aos gritos. – Eu acabeide dizer que desisto da faculdade de música,desisto da banda, desisto do que você quiser!Me ouviu quando eu disse que vou trabalharcom você? O que mais você quer?

— Tudo isso por causa de um rabo de saia?– Raul repuxa o lábio lateralmente. – É típicode você, Alexandre!

— Eu amo a Nina, tá legal? E eu fareiqualquer coisa por ela! – Lex irrompe emlágrimas. E elas são tão reais quanto a dorque ele sente nesse momento.

Os pais de Lex finalmente encaram a faceda verdade. Não é mais um capricho do filhoadolescente. Isso está além de um merodesejo de se ter o que não pode. Está alémdo mundano. Está além até mesmo dopróprio Lex.

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— Filho, tem certeza do que está dizendo?– o tom de Alice, sempre delicado e gentil, éum bálsamo para os ouvidos de Lex.

— Tenho, mãe. – o garoto deita a cabeçano mármore, deixando a dor vir com tudo.Ele se sente definhar, como se o sanguetivesse se transformado em ácido, corroendotudo por onde passa. Sem a Nina nada fará omenor sentido. Lex será um zumbi, umamúmia, um largado.

Os pais deliberam por um longo tempo,mas ele não escuta. Lex está distante, bemlonge dali. Está na ilha, revivendo osmelhores momentos de sua vida.

— Lex. – o pai chama e o garoto levanta acabeça. – Daremos uma última chance avocê. Prove que é um homem de verdade,um homem de valor e então, não precisarádesistir da faculdade ou da banda.

— O que quer que eu faça? – Lex fungaalto.

— Vá até Paris e prove a sua inocência. Ese ainda assim a Nina não quiser ficar comvocê, volte para casa de cabeça erguida. Sejahomem, você me entendeu?

— Vai me deixar viajar? – Lex não se

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contém e sorri. – É sério?— Mas não pense que estou fraquejando.

Quando voltar de Paris, você vai trabalharcomigo, entendeu? Não quero um vagabundodentro de casa. E quanto a sua moto, vamosvendê-la ao ferro velho. Só quando meprovar que cresceu, poderá ter outra moto.

— Obrigado. – Lex se levanta e numrompante nunca antes visto nessa casa, ogaroto se atira nos braços do pai. – Não voudecepcioná-lo, cara, eu juro.

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Setenta e dois: Convencendo Doc a dar oendereço

Nina está em Paris há cinco dias. Cincolongos dias para Lex. A documentação para aviagem já está pronta e a passagemcomprada. Agora é convencer Doc a dar oendereço de Nina e torcer para não levar umoutro soco.

Gancho tentou convencer Lex a mandar ume-mail para Nina com as provas de suainocência. Não. Lex quer ter essa conversacara a cara, olho no olho.

Nathi e Lais poderiam ter conseguido oendereço de Nina através de outras fontes.Não. Lex também não quer isso. Precisa doconsentimento de Doc, quer se entender como cara.

Não é nada fácil convencer Doc a receberLex. Mas Lais, com jeitinho e uns beijinhos,consegue o impossível.

— Me convença a não acertá-lo com essetaco de beisebol e eu prometo pensar sobre oque está me pedindo. – afundado no sofá dasala, Doc passa o taco de uma mão a outra.

Lex engole o orgulho juntamente com umsapo de duas cabeças. Por Nina. Qualquer

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coisa por ela.Não posso dizer que essa foi uma conversa

calma e corriqueira, isso seria umainverdade. Lex precisa de jogo de cinturacom Doc e da ajuda de Lais em váriosmomentos. Nathália e Gancho também estãoali, para o caso de uma guerra nuclearestourar.

— Sabe que se fizer minha irmã sofrer,arrancarei sua cabeça, não sabe? – Docdispara, apontando o taco na direção de Lex.

— Sei bem disso. – Lex se mantém firme.— Não vou com a sua cara, mas a Nina

gosta de você. Acho que posso suportar a suapresença se vocês se entenderem. – Doc éuma muralha intransponível.

— Anda com isso, Doc. Dê logo o endereçopara o Lex! – Lais dá um tapa no ombro docara.

— Se eu não desse esse endereço, meuspais dariam. – Doc revela, pegando um papelno bolso da calça e entregando para Lex. – ANina não está feliz em Paris.

— Quero me entender com ela, provar aminha inocência. – Lex arqueia o corpo paraa frente e pega o papel, mesmo temendo o

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taco de beisebol que Doc segura com firmeza.— Se vocês se entenderem, traga ela de

volta, beleza? – Doc finalmente larga o tacoe estende a mão para Lex, num gesto de paz.

— Farei isso, pode confiar.

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Setenta e três: Final feliz?Dez dias se passaram.Nina sente o vazio tomando forma, como

um imenso buraco negro prestes a tragá-la.Ainda não enlouqueceu porque existe umacontrapartida, um sentimento poderoso que afaz abrir os olhos todas as manhãs.

Amor.É por esse amor que ela ainda não desistiu

de recomeçar sua vida. É por esse amor queela respira. É por esse sentimento que elaainda está ancorada, sem se deixar levarpela melancolia e pela dor.

Nina acaba de sair de uma escola defrancês, nos arredores de Madeleine. Estácom a inscrição para o curso debaixo dobraço, doida para rasgá-la em milpedacinhos. Mas se contém, dobrando ospapéis com cuidado, guardando-os dentro dabolsa.

Com um mapa de Paris aberto no celular,Nina verifica as anotações de Simone numacaderneta. Precisa aprender a andar pelacidade sozinha e hoje é o segundo dia quefaz isso.

O metrô está lotado e Nina volta para casa

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com um saquinho de croissants e uma lindarosa que ganhou próximo da Igreja de LaMadeleine. Simone está de folga e tirou o diapara dar um jeito no apartamento.

Ontem Nina esteve no Louvre. Quando viua pirâmide de vidro, não se conteve. Aslágrimas caíram como flocos de neve, já queo frio estava de lascar. Não, ela não seemocionou por conhecer o museu. Ninachorou por estar sozinha e por Lex não tercumprido a promessa. Ele havia prometidoestarem juntos, havia dito que enxugariasuas lágrimas. Ele não estava lá.

Nina abre a porta de casa e dá de cara comuma Simone completamente histérica. Elanão fala coisa com coisa e Nina precisa de umtempo para entender o que está havendo.

— Escutou alguma palavra do que eu disse?– Simone continua estendendo um envelopevermelho e um pen drive na direção de Nina.

— Como assim ele entregou isso a vocêpessoalmente? O Lex… o Lex… o Lex…?

— Está em Paris! Nina, ele está aqui! –Simone não se contém e começa a gargalhar.– E você não fez juz ao cara não. Menina, eleé lindo demais!

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— Mone, onde ele está? – Nina perde ochão e se senta.

— Disse que iria procurar um hotel. Eu oconvidei para ficar aqui, mas ele não aceitou.

Nina abre o envelope e descobre os seis milreais. Dinheiro da aposta. Pega o pen driveem mãos e seu olhar se perde naqueleminúsculo aparelho.

— Não vai ouvir os arquivos? – Simone seajoelha em frente à Nina.

— Não preciso. – a voz de Nina é um fiofraquinho, prestes a partir.

— Como assim não precisa? – Simone sesobressalta. – Nina, o cara veio lá do Brasilatrás de você!

— Ele falou mais alguma coisa?— Disse que vai esperar por você às duas

da tarde, no lugar marcado. – Simone revela,um tanto tensa com a situação. – Nina, vaiperdoar o cara, não vai?

— Que horas são?— Uma e quinze.— Eu preciso ir. – Nina pula da cadeira e

enfia o pen drive no bolso da calça. Pega ocasaco e o cachecol e sai às pressas, sem sedespedir de Simone.

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— Nina, não faça besteira! – Simone grita,incerta de que Nina tenha ouvido o recado.

~~***~~O metrô não é rápido o bastante.Nina chega com cinco minutos de atraso no

local marcado. A praça do Louvre estáabarrotada de turistas, apesar do frio e dotempo fechado. Semana que vem é natal eParis recebe pessoas do mundo todo nessaépoca.

Nina procura por Lex, desesperadamente.Vai caminhando, abraçando-se para

esquentar, até finalmente chegar a um doslados da pirâmide de vidro. De onde está,Nina consegue enxergar o hall de entrada domuseu lá embaixo, lotado de pessoasagasalhadas.

— Esqueci de trazer o lenço para enxugarsuas lágrimas. – a voz de Lex rasga o argélido.

Nina não se vira para encará-lo.— Chegou atrasado. Eu estive aqui ontem.

– seu tom não revela nada além disso.— Desculpe por isso, não pude vir antes. –

Lex leva as mãos aos bolsos e seu olhar estácravado nas costas de Nina. Estão bem

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próximos e ela pode sentir o aroma deMentos de frutas no ar. – Como posso meredimir?

— Ainda não sei.— Abriu o pen drive? – ele pergunta, um

tanto temeroso com a resposta.— Não, não abri. – Nina se mantém na

mesma posição e Lex não consegueacompanhar suas expressões.

— E o que isso quer dizer? – Lex sente ocoração apertar.

— Quer dizer que eu não preciso abrir umarquivo para tomar qualquer decisão. – elaengole em seco e ele percebe.

— Eu achei que…— Achou errado, de novo. – Nina

finalmente se vira para encará-lo. – Não éesse pen drive que vai mudar o que eu sintopor você. – ela sustenta o gadget na mão.

— E o que sente por mim?Nina suspira alto e profundamente. Sua

expressão relaxa quando ela tomba a cabeçae diz:

— Eu te amo e não consigo viver longe devocê.

Ai. Meu. Deus.

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O sol chega a Paris através daqueles olhoscor de mel com rajadas douradas. Atemperatura entre aqueles dois parece tersubido uns mil graus Célsius. Lex estásorrindo e não é de deboche. É um sorrisocom o qual Nina precisará se acostumar. Éum sorriso feito para ela e só para ela.

— Vai me perdoar por eu ter sido umcovarde, um idiota? Vai me perdoar mesmosem saber se sou inocente? – Lex nãoconsegue parar de sorrir.

— Você está aqui, não está? O que mais eupoderia querer? – Nina guarda o pen drive nobolso. – Promete não mentir, não meenganar? Promete que sempre seremoshonestos um com o outro?

— Eu prometo. – Lex se aproxima mais,tocando os cabelos soltos de Nina. – Euprometo fazer de você a mulher mais amadadesse mundo.

Eles se fitam por um tempo, estudando-se.Nina tira o cachecol do pescoço e, como fezna ilha, passa-o pelo pescoço de Lex,puxando o garoto para si, para sua boca.

O cara se entrega, cerrando as pálpebras.Os lábios se tocam e o frio dá lugar a uma

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sensação de completude, de calor, de êxtase.Um momento perfeito, no lugar perfeito.

E com esse beijo para lá de arrebatador,Lex e Nina selam um compromisso erecomeçam a sua história, tendo a verdade eo amor como únicos guias por toda a vida.

Se eles ficarão juntos por toda aeternidade? Oh, sim, definitivamente. Almasgêmeas possuem esse poder. Mas não possodizer que esse será um romance calmo e sembrigas. Oh, não. Mas essa é outra história.

E assim, vamos deixando esses doiscurtirem o momento, saindo bem de fininho,tomando o caminho inverso do início dessahistória.

Louvre.Paris.França.Europa.Planeta Terra.Sistema Solar.Via Láctea.FIM.

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Outras obras da autora:2012

ElementalO Imortal

Senhor do AmanhãPossuída

O Homem de Todas as Minhas Vidas

Conheça as obras da autora no Skoob:http://www.skoob.com.br/autor/1337-

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