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Vasco Graça Moura
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a puxar ao sentimento
trinta e um fadinhos de autor
QUETZAL | poesia
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a puxar ao sentimento
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quis ao fado dar meu nome I
com um travo de amarguraquis cantar o fado a sóse uma tristeza sem cura,mais negra que a noite escura,pôs sombras na minha voz.
fi z assim da minha vida,de quanto amei e sofri,uma inocência perdidapela culpa consentidade apenas te amar a ti
e nessa turva ansiedadeo destino atraiçoou-mea fi ngir que eras verdadee que de livre vontadeao fado eu dava o meu nome
mas estava tudo erradofoi a minha triste sina
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quis dar o meu nome ao fadoe quando olhei para o ladosó vi trevas e neblina
mas que nome lhe dariaa pensar em quem mais amose de dia para diaa viver esta agoniajá nem sei como me chamo
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quis ao fado dar meu nome II
quis ao fado dar meu nomecom um travo de amargurae ao cantar o fado a sóspor entre as sombras chamou-meuma tristeza sem cura,mais negra que a noite escura,que me pôs sombras na vozquando ao fado dei meu nome.
quis ao tango dar meu nomee nessa turva ansiedadede quanto amei e sofrio destino atraiçoou-mee ao fi ngir que eras verdadea verdade atrapalhou-mequando eu de livre vontadeao tango dava o meu nome
quis ao samba dar meu nomemas estava tudo errado
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tudo vinha mascaradoe esse carnaval marcou-mesambei tu sambaste eu vou-meentre as trevas e a neblinamal o sol se descortinae ao samba dou o meu nome
fado tango samba haviade fugir a cada passoenleada no embaraçoda própria melancoliaprefi ro dançar descalçae fazer o meu teatroao compasso de uma valsatrês por quatro três por quatro
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amar-te corpo a corpo
se é esta a doce lei que eu imaginodo amor que nos impõe o seu ditado,amar-te corpo a corpo é o meu fadoe amarrar-me a ti o meu destino
sentir a própria alma em carne vivarespirar boca a boca e nesse jogoatravessar-me em fogo no teu fogoe alimentá-lo a beijos e saliva
se mais atino quando desatinopor meus jeitos de amor alvoroçadoé no alto mar revolto e desvairadoque entre peripécias loucas me declino,
sendo cada carícia a mais lascivaa inventar seus rumos afi nalna pura escuridão, na mais carnal,que me cativa a mim e te cativa
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entre as línguas, os sorvos, as gargantas,doces gemidos, ternas resistênciase violências brandas, impaciências,e tantas mais carícias, tantas, tantas
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fado da cabra-cega
no dia triste em que te foste emboratoda a luz de lisboa escureceue nas águas do tejo anoiteceucom nuvens, vento e chuva, barra fora.
terá sido o destino, o mau olhado,a triste sina, o azar que nos destrói,o demónio interior que é também fadoe que nos dói na alma e a corrói,
fosse o que fosse, fosse como fosse,enredou-se no tempo o coraçãoe cada hora passada só me trouxepraias rasas de névoa e solidão
dei-te o meu corpo e era uma faluacortando ágil o rio à lua cheia,mas tu partiste e eu já não sou tua,fi co presa nas algas sobre a areia.
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se a alma que eu te dei era uma velae agora esfarrapada não navega,eu vou de olhos vendados atrás delae o fado joga assim à cabra-cega
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jogos de fado e destino I
jogos de fado e destinosão no fado o mais vulgarquando o fado faz o pinopara na letra expressarjogos de fado e destino
jogos de destino e fadonão lhe fi carão atrásanda o destino enfadadopor ser o fado que trazjogos de destino e fado
e amor, saudade e ciúme,e a vida, a boa-vai-ela...vem no fado esse perfume,e a névoa, o vinho, a viela,e amor, saudade e ciúme
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jogos de fado e destino II
jogos de fado e destino / já se sabesão no fado o mais vulgar / e bem se sentequando o fado faz o pino / mas não cabenas palavras que encontrar / quando não mente jogos de destino e fado / a nossa vidanão lhe fi carão atrás / mas que ironiaanda o destino enfadado / ah, despedidae anda o fado em horas más / melancolia
e amor, saudade e ciúme, / sentimentoe a vida, a boa-vai-ela... / isso era outroravem no fado esse perfume, / esse lamentoe a névoa, o vinho, a viela, / onde alguém chora
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mal te avistei percebi
meu amor, quando em lisboadei contigo a certa altura,se então era noite escura,teu olhar iluminou-a.
mal te avistei, percebiquanto te amava, porémnão é senhor de ninguémquem não é senhor de si.
só ouvi sinais de alarmepor entre as nuvens de fumo,fi quei sem norte e sem rumoe tive de conformar-me
já então o meu desejotinha o travo da saudadee em sombra e claridadeespelhava-se no tejo,
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e em cada noite perdidasei que vais amar-me a prazoeu porém não faço casoe hei-de amar-te toda a vida
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fado elitista
beijei-te a boca a tremer,depois apagou-se a luz,juntámos os corpos nuse eu senti que ia morrer.
nessa morte sem pudoras mãos eram indecentese dos gestos mais ardentesvinham gemidos de amor
dávamos beijos famintos,fomos dois vulcões de lava,e a vida ressuscitavadentro dos nossos instintos
e entre afagos e lençóisas salivas coruscantesdos prazeres mais lancinantesmodulavam-se em bemóis
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assim cortámos a amarra:no fadinho tudo é lícitoe eu quero mais sexo explícitona cama de uma guitarra
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fado triste
noite fechada, rua deserta, horas perdidas,luz apagada, a porta aberta, às escondidas,sombra que passa, lua sem rumo, águas do rio,viela baça, álcool e fumo, fado vadio
num sobressalto, em tempo incerto, o coraçãovoou tão alto e andou tão perto, e foi em vão,e de amarguras, do sofrimento, do negrume,só falsas juras, esquecimento, cinzas sem lume
tudo o que espero e oxalá eu nunca esqueçatudo o que quero embora já não aconteçanão que eu sentisse que para ti era uma afrontatudo o que disse e repeti vezes sem conta
mas o que sei, dentro de mim, desfaz-se em pranto,porque te amei, amei-te assim, e amei-te tantoque a dor ondula, e agora existe em vez de nós,e me estrangula, em fado triste, a própria voz
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