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AuRELiANO VIEIRA CAMPOS*™*-*"" N.° 188 ^v«íiA: PARALISIA GERAl/fe? E SÍFILIS (Estudo clínico de dois doentes) ■■ - , \ '•':■ \ : » i*. ; fe/ÍTi * v •' i ' $ . « . & : =:• TESE DE DOUTORAMENTO APRESENTADA A FACULDADE DE MEDICINA DO PORTO •:• ° 0. ° ":'o':" ÇLO ^/6T r<? Junho-1924 TIPOGRAFIA PORTO MEDICO, L.°» Praça da Batalha PORTO

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AuRELiANO V I E I R A C A M P O S * ™ * - * " "

N.° 188

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=:• TESE DE DOUTORAMENTO

APRESENTADA A FACULDADE

DE MEDICINA DO PORTO •:•

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Junho-1924

TIPOGRAFIA PORTO MEDICO, L.°» Praça da Batalha

PORTO

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PARALISIA GERAL E SÍFILIS

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AuRELiANO V I E I R A C A M P O S

PARALISIA GERAL E SÍFILIS

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Junho-1924 TIPOGRAFIA PORTO MEDICO, L.°«

P r a ç a da B a t a l h a PORTO

FACULDADE DE MEDICINA DO PORTO

UIRECTOR

Dr. José Alfredo Mendes de Magalhães

SECRETÁRIO

Dr. António de Almeida Garrett

C O R P O D O C E N T E

Professores ordinár ios

Anatomia descritiva Dr. Joaquim Alberto Pires de Lima Histologia e Embriologia Dr. Abel de Lima Salazar Fisiologia geral e especial Vaga Farmacologia Vaga Patologia geral Dr. Alberto Pereira Pinto de Aguiar Anatomia Patológica Dr. António Joaquim de Sousa Júnior Bacteriologia e Parasitologia Dr. Carlos Faria Moreira Ramalhão Higiene Dr. João Lopes da Silva Mirtins Júnior Medicina legal Dr. Manuel Lourenço Gomes Anatomia Cirúrgica Dr. Hernâni Bastos Monteiro Patologia cirúrgica Dr. Carlos Alberto de Lima Clínica cirúrgica Dr. Álvaro Teixeira Bastos Patologia médica Dr. Alfredo da Rocha Pereira Clínica médica Dr. Tiago Augusto de Almeida Terapêutica geral . Dr. José Alfredo Mendes de Magalhães Clínica obstétrica Vaga História de medicina e Deontologia. . . Vaga Dermatologia e Sifiligrafia Dr. Luís de Freitas Viegas Psiquiatria Dr. António de Sousa Magalhães Lemos Pediatria Dr. António de Almeida Garrett Professor com licença ilimitada . . . . Dr. José de Oliveira Lima

Professores Jubiladas

Dr. Pedro Augusto Dias

Dr. Augusto Henrique de Almeida Brandão

A Faculdade não responde pelas doutrinas expendidas na dissertação

Art. 15.° § 2.0 do Regulamento Privativo da Faculdade de Medicina do Porto, de 3 de Janeiro de 1920.

,'

A meus Pais

Tão pouco vos oferece quem tanto vos deve.

A minha Mulher e a meu Filho

S i n t o - v o s j u n t o s no c o r a ç ã o .

A minha Filha

óPara que te conheci, se tão cedo me havias de deixar?

A meu Sogro

Não esquecerei o bom acolhimento e as aten­ções que sempre me tem dispensado.

A MEUS IRMÃOS e CUNHADOS

A todos me prende uma sincera amizade.

A M I N H A T I A

Homenagem de sincero reconhecimento e estima

A M I N H A M A D R I N H A

D. Joana Rosa da Silva Moreira

S e r - l h e - h á g r a t o , no declinar da vida, ouvir dizer que a não esqueci.

AOS MEUS CONDISCÍPULOS e CONTEMPORÂNEOS

Em especial:

Dr. Aloísio Coelho Dr. José Luiz Dr. Laurindo Faria Dr. Ribeiro Braga Dr. Mendes Moreira

Custa-me dizer-vos adeus.

AO DOUTO CORPO DOCENTE

DA

FACULDADE DE MEDICINA DO PORTO

AO ILUSTRE PROFESSOR E MEU

EXCELENTÍSSIMO P R E S I D E N T E D E T E S E

D R . T I A G O D E A L M E I D A

Na hora actual ainda permanecem sem solu­ção certos problemas de patogenia e clínica que se apresentam na Paralisia Geral, a-pesar-de muito debatidos em todo o mundo scientífico por eminen­tes psiquiatras e neurologistas.

Longe de mim a pretensão de os resolver, embora o estudo de algumas dessas dificuldades em duas doentes constitua o assunto dominante da minha tese de doutoramento.

Trata-se de dois casos clínicos que passaram pelas salas de Clínica Médica, um dos quais me interessou sobremaneira pela associação pouco vulgar que os seus padecimentos constituíam.

Da observação clínica demorada das duas

doentes, resultou este modesto trabalho, escrito sob a acção de um único estímulo — o cumpri­mento da lei.

São tais e tantas as deficiências que se notam no decorrer deste estudo clínico, que peço ao Ex.mo Júri que o aprecie com benevolência.

Cumpre-me agora exprimir o meu profundo reconhecimento ao Excelentíssimo Professor Dr. Tiago de Almeida pela subida honra que me concede dignando-se presidir à minha defesa de tese.

OBSERVAÇÕES

1

J. G. O., de 40 anos de idade, viúva, domés­tica, entrou para a enfermaria n.° 7 do Hospital de Santo António no dia 1 de Dezembro de 1920.

Estado actual

É muito variada a série de alterações que a doente apresenta e é no sistema nervoso e no aparelho cárdio-vascular que predominam, como vamos ver.

Podem reunir-se as alterações nervosas desta doente em dois grandes grupos, abrangendo um as de carácter somático e o outro as de ordem psíquica.

As alterações somáticas são variadas : trémulo,

30

diminuição da força muscular, incoordenação mo­triz, perturbações da reflectividade, da sensibili­dade, visuais, da palavra —falada e escrita —e de algumas secreções.

O trémulo é generalizado, mas com predomí­nio manifesto nas mãos, língua, lábios e pál­pebras.

Todos estes trémulos são intencionais, pois quási não existem em repouso, tornando-se bem perceptíveis apenas quando a doente fala, quando ri, etc.

É um trémulo rápido de pequenas oscilações. O trémulo lingual apresenta-se sob dois aspec­

tos: trémulo fibrilar, quando a doente mostra a língua, conservando-a dentro da boca; um outro trémulo com o carácter de instabilidade, quando a doente a exterioriza e caracterizado por uma série de movimentos alternados de avanço e recuo, movimentos estes que são irregulares e que só desaparecem ao fim de alguns instantes.

A força muscular encontra-se notavelmente enfraquecida como o indica o dinamómetro: com­parando a força desenvolvida por esta doente com a de uma outra, visinha sua, aparentemente

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mais enfraquecida, encontrei os números seguin­tes: (*)

J. G. O. X.

Mão direita 25 51 Mão esquerda . . . . 30 42

A coordenação motriz não é perfeita e nota-se isso principalmente quando os actos a realizar exigem certa delicadeza de movimentos como acontece quando a doente procura abotoar-se; não é nítida a incoordenação quando se procura, como de hábito, mandando a doente, de olhos fechados, tocar com um dedo este ou aquele ponto do corpo.

A marcha não apresenta alterações dignas de menção.

Esboça-se o sinal de Romberg. A reflectividade — de difícil estudo porque a

doente é incapaz de relaxar convenientemente os músculos —não foi respeitada também aqui.

Os reflexos rotuleanos estão abolidos, bem como os aquileanos.

(*) Fiz esta comparação por suspeitar da exactidão das indica­ções fornecidas pelo aparelho.

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Estão consideravelmente diminuídos os refle­xos tendinosos dos membros superiores.

Existe o reflexo plantar de Babinski. A sensibilidade está pouco tocada; todavia ao

diapasão acusa a sensação de calor. As sensações gustativas são demoradas e imprecisas: com a antipirina tem a sensação de salgado.

Refere, de quando em quando, zumbidos nos ouvidos.

Merecem atenção as perturbações oculares e visuais. Existe um pequeno grau de exoftalmia. As pupilas estão em miose acentuada e perma­nente. As reacções à acomodação e à luz fazem-se, ainda que com lentidão: não existe, portanto, o sinal de Argyll.

Não existe, também, desigualdade pupilar. São consideráveis as alterações da palavra.

Existe um embaraço da palavra, urna disartria acentuada. Esta disartria afecta uma forma simul­taneamente atáxica e parética: atáxica, porque fazendo um esforço bem visível para associar os necessários movimentos, a doente hesita, tropeça, invertendo sons, sílabas; parética, porque reconhe­cendo e tentando corrigir a imperfeição da pala-

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vra, a doente fala lentamente, interrompe-se a cada momento, como que para recordar sons que tar­dam e que chegam por fim brusca e irregular­mente, lembrando uma creança que aprende a 1er.

É particularmente notável a disartria quando a doente tenta pronunciar palavras ricas em dentais ou labiais, como as conhecidas artilheiro de arti­lharia, inamobilidade, etc.

São também interessantes as perturbações da escrita, a disgrafia, como pode verificar-se na gra­vura que vai junta.

Notam-se ali perturbações psicográficas — má direcção das linhas, multiplicidade das correc­ções,...—e caligráfiças —escrita de traços grossos e repetidos, tremulados, bruscamente desviados, etc. Notam-se também erros de cálculo a traduzir o ataque da memória de que falarei.

As alterações psíquicas que nesta doente exis­tem traduzem no seu conjunto um grande enfra­quecimento intelectual em que é factor predomi­nante a perda de memória, a amnesia.

Se bem que incida de preferência sobre os factos recentes, esta amnesia não poupa, contudo,

3

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os factos mais antigos; estende-se mesmo a noções banais de tempo, ignorando a doente, por exem­plo, quantos meses tem o ano. Preguntando-lhe, no dia 9, a quantos do mês estamos, ela res­ponde, hesitando, que a 19, depois que a 8 e que faltam ainda mais de três semanas para que che­gue o dia 20. Contando os meses do ano enga-na-se constantemente na ordem a seguir. Diz que o mês de janeiro tem 28 dias, etc.

Sempre alheada de quanto a cerca, a doente responde às preguntas que lhe são feitas de maneira a deixar perceber uma diminuição global de todas as faculdades intelectuais, morais e afec-.tivas.

Nota-se um bem manifesto deficit de atenção, que se observa facilmente quando a interroga­mos.

A estas perturbações mentais vem ainda jun-tar-se palavras e actos delirantes vários que tradu­zem um certo grau de agitação. A doente levan-ta-se frequentemente durante a noite para compor a cama, pentear-se, etc., factos que nega invaria­velmente no dia seguinte, quando sobre eles cha­mamos a sua atenção.

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Espécime da escrita e erros de cálculo da doente J. G. O.

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Apontei já perturbações da escrita em relação com o seu estado psíquico.

Do lado do aparelho circulatório destacam-se perturbações de igual vulto.

É difuso o choque da ponta do coração. A área de macissês cardíaca, obtida por per­

cussão, excede muito os limites normais, nomea­damente na região dos grandes vasos.

Existe um ligeiro frémito à palpação e é dolo­rosa à pressão a região precordial.

Ouvem-se vários sopros cardíacos auscultando esta doente.

Um desses sopros, sistólico, com o máximo de intensidade na região da ponta, propaga-se para a axila.

Dois outros sopros se ouvem no foco aórtico, intensos, sistólico um, o outro diastólico. E impos­sível perceber o sentido de propagação destes últi­mos porque tão intensos são que parecem propa-gar-se em todos os sentidos.

Os ruídos cardíacos quási não podem ouvir-se, abafados como são pelos ruídos de sopro; per-cebe-se contudo o ruído sistólico do foco mitral.

36 /

O pulso, pequeno, taquicárdico (P. 86), é de baixa tensão, sendo a diferencial bastante elevada :

TM = 12 Tm = 5,5 Io = 2,5

São perfeitamente síncronos os pulsos radiais como se verificou pela palpação e pela aplicação simultânea de dois oscilómetros de Pachon, um em cada braço; mas difere muito em amplitude o pulso radial direito do esquerdo.

 direita temos o pulso característico de Cor-rigan ; é pequeno, semelhando o dos insuficientes mitrais, o pulso esquerdo. Junto os esfigmogra-mas das duas radiais, direita e esquerda, onde melhor se podem apreciar estas diferenças.

Existe na fosseta supra-esternal uma tumefac-ção alongada, obliquamente dirigida para cima e para a direita.

Esta tumefacção mede dois por cinco centí­metros nas suas maiores dimensões e parece per­corrida por ondas pulsáteis que do seu polo infe­rior e esquerdo se dirigem para o superior, direito.

Palpando simultaneamente esta tumefacção pulsátil e depressível e a ponta do coração, veri-

»-. .—_£Í.-í_^ J>V. tfCi. '■-Kf y 2-

?~te-

Esfigmograma da radial direita

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F-Sú '-T4Í-./Í~ 7Z~~r,r XsA^'r Esfigmograma da radial esquerda

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fica-se sincronismo perfeito das pulsações de uma e outro.

A auscultação revela a existência, a este nível, de dois sopros perfeitamente idênticos àqueles que se ouvem no foco aórtico.

A pressão exercida a este nível não é dolo­rosa, mas provoca, ás vezes, a tosse.

Quando a doente toma a posição vertical a tumefacção de que me ocupo diminue conside­ravelmente de volume; mas em nada mudam os ruídos de sôpro a que me referi.

Não há palpitações cardíacas nem edemas. As pulsações das carótidas são visíveis. A face está congestionada. Há gânglios inguinais múltiplos, duros e indo­

lores. Nota-se uma ligeira hipertrofia da tiroide à

inspecção e à palpação. Do lado do aparelho respiratório não se notam

alterações dignas de menção. Não há também alterações digestivas de im­

portância, salvo no que diz respeito ao apetite: Este está consideravelmente aumentado, comendo a doente com sofreguidão.

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As urinas são de côr carregada. Ha pola-quiúria e alguns outros sinais de pequeno brai-tismo: abalos musculares, criestesia, moscas volan­tes e zumbidos nos ouvidos.

Não há albuminúria. Foi menstruada aos 13 anos. Haverá meio ano que teve um período de

amenorreia bastante demorado. Voltou a deixar de ser menstruada há alguns

meses.

Reacções humorais

Sangue — Reacção de Wassermann fortemente positiva.

Líquido céfalo-raquidiano: a) Reacção de Wassermann fortemente posi­

tiva ; b) Exame químico : 1) Reacção de Noguchi (*)— positiva;

(*) O resultado da reacção de Noguchi traduz um aumento consjderável da globulina do liquido céfalo-raquidiano (hiperglobinor-raquia).

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2) Albumina (Sicard) — 0,gr95 % (hiperalbu-minose acentuada);

c) Exame citológico: Número de linfocitos por mm.3—10 (linfocitose acentuada);

d) Reacção de Lange (*) - 5555553000 (tipo paralítico).

História e evolução da doença

Atendendo ao estado mental em que a doente se encontra, e não sendo possível colher informes de outra origem, não merecem grande confiança algumas das informações obtidas pelo interroga­tório da doente.

(*) A reacção de Lange baseia-se na acção das albuminas do liquido raquidiano sobre as soluções do oiro coloidal.

Ao passo que o líquido normal não tem acção sobre essas solu­ções, os líquidos céfalo-raquidianos patológicos precipitam-nas, modi-ficando-lhes assim a coloração. Como estas mudanças de côr variam com as diluições do líquido, obtem-se resultados que podem traduzir-se ein curvas que são sempre as mesmas para cada afecção nervosa e características da mesma, portanto. Os resultados mais constantes são os que se obtém com o líquido céfalo-raquidiano dos paralíticos gerais (tipo paralítico).

40

No entanto creio que serão exactas algumas, poucas, das indicações fornecidas, visto que por várias vezes a doente as repetiu sem alteração apreciável.

Haverá vinte anos que, encontrando-se no Rio de Janeiro, onde viveu dezasseis, a doente começou a ser frequentemente atacada de cefaleia acompa­nhada de vertigens e de obnubilação intelectual.

Começou desde então a tornar-se muito ner­vosa e esse estado foi-se acentuando constante­mente até chegar àquele em que actualmente se encontra e que motivou a sua entrada no Hos­pital.

Há pouco mais de um ano que começou a notar as modificações da palavra e da escrita.

Haverá igual tempo que pela primeira vez no­tou as pulsações que actualmente apresenta no pescoço.

Desde que entrou para o Hospital pequenas foram as modificações que sofreu a sua doença.

Apenas sobre as alterações cárdio-vasculares parece ter influído o tratamento.

Diminuíram um tanto de intensidade alguns dos sopros cardíacos, o sistólico mitral sobretudo,

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e reduziu-se um pouco a tumefacção pulsátil do pescoço.

As perturbações mentais não sofreram modi­ficação favorável, se é que não se acentuaram mesmo alguma coisa.

No dia 11 de Janeiro, alguns minutos depois de uma injecção intra-muscular de sulfarsenol, a doente sentiu um passageiro mal estar, intensa congestão da face, cianose labial, turgescência dos vasos do pescoço.

A doente treme com frio e apresenta um pulso frequente e tenso.

Queixa-se também de obnubilação visual e de zumbidos.

Tudo isto desapareceu desde que se adminis­trou á doente um pouco de adrenalina (x gotas).

A 18 de Março sobreveio uma crise angus­tiosa com distensão dos membros, crispação dos dedos, trémulo vibratório dos masseteres, taqui­cardia (P = 110), pulso desigual, célere, arrítmico, de tensão máxima constantemente variável entre 13 e 16 (Pachon).

Sucederam-se três crises idênticas no decorrer de poucos minutos.

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Não se queixava de dores. Estas crises não voltaram depois a repetir-se

voltando a doente ao sossego habitual.

Antecedentes mórbidos

Teve, quando criança ainda, adenites cervicais que supuraram.

Tem tido frequentes anginas. Teve no Brazil, haverá 15 anos, um ataque de

reumatismo (?) bastante demorado, pouco tempo depois do seu casamento.

De há muito que sofre de cefaleias vespertinas, e nocturnas.

Cai-lhe bastante o cabelo. Teve um aborto. Do lado da família quási nada há digno de

nota. O marido e quatro irmãos deste morreram de

tuberculose pulmonar (?). Os pais são vivos e relativamente saudáveis,

sofrendo apenas a mãe de frequentes dores de ca­beça.

Tem oito irmãos todos saudáveis.

II

B. C. 0., de 33 anos, casada, doméstica, deu entrada no Hospital, enfermaria n.° 1, a 2 de Abril de 1921.

Estado actual

Mais do que uma semelhança vai notar-se en­tre a doente que agora vai ocupar-me e aquela que há pouco apresentei.

E é assim que, nesta como naquela, são as al­terações nervosas as de maior vulto, as que em primeiro lugar prendem a atenção.

Analogamente ao que fiz na primeira observa­ção, estudarei sucessivamente as alterações somá­ticas e psíquicas que a doente apresenta.

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São variadas e importantes as alterações somá­ticas que aqui existem.

O trémulo é generalizado, mas mais acentuado nas extremidades e sobretudo nos membros supe­riores.

Nas mãos o trémulo apresenta-se sob dois as­pectos : um é o trémulo fibrilar, trémulo intencio­nal de pequenas e rápidas oscilações; outro é o trémulo de instabilidade que facilmente se nota quando a doente coloca as mãos na atitude de juramento. Consiste este último em rápidos e am­plos deslocamentos dos dedos, irregulares por completo na sua aparição.

Existe também aqui o trémulo dos lábios, das pálpebras e da lingua, que, a-pesar-de menos acen­tuado que na primeira doente, oferece no entanto os mesmos caracteres.

A diminuição da força muscular é ainda mais considerável nesta doente do que naquela que em primeiro logar observei.

O dinamómetro indica os números 15 e 20 para as mãos direita e esquerda respectivamente.

Não existem contracturas, mas um certo grau de espasmo dificulta os movimentos.

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A marcha é incerta e irregular, desiquilibran-do-se a doente a cada momento. (Coxeia um pouco em virtude de uma antiga queda sobre a região coxo-femural esquerda).

Existe o sinal de Romberg. A reflectividade foi atingida de uma maneira

diferente nesta segunda doente. Os reflexos olecraneanos e radiais estão exa­

gerados e pouco modificados os cubitais. Estão muito exagerados os reflexos rotulianos

e aquiliano direito e abolido o aquiliano esquerdo. Também se encontram abolidos os reflexos

cutâneos abdominais. Não existe o sinal de Banbinski. São negativos os reflexos de Oordon e Oppe-

nheim. Esboça o trémulo epileptoide nos dois pés. Não é perfeito o funcionamento dos esfíncte-

res, havendo habitualmente incontinência de urina. O estado mental da doente não permite uma

observação correcta das alterações da sensibilidade geral, mas, no entanto, parece que estas, a existi­rem, não são de importância.

Do lado das sensibilidades especiais nota-se

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um certo grau de anosmia e perturbações da au­dição.

Estão consideravelmente atrofiadas as massas musculares, que são de uma notável flacidez. Eista atrofia e flacidez são generalizadas, predominando, no entanto, nos braços, pernas e coxas.

Esta doente apresenta também perturbações pupilares consideráveis. As pupilas estão retraídas, sendo esta miose mais considerável à direita, o que ocasiona uma desigualdade pupilar manifesta.

Existe o sinal de Argyll-Robertson. As alterações da escrita são bem manifestas. A

escrita apresenta alterações perfeitamente idênticas às da doente precedente, mas mais acentuadas neste caso.

A doente é mesmo incapaz de escrever, a não ser que se lhe forneça um modelo que ela quási desenhe. Foi por este processo que escreveu as linhas que na figura junta se vêem.

A disartria é perfeitamente semelhante à da doente que primeiro apresentei.

São análogas às da primeira doente as pertur­bações psíquicas que esta apresenta. Traduzem no

(/*j^£2^foùl ;£_ L-^C^A^i)

ã>vtí il o fou M Espécime da escrita da doente B- C. G.

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seu conjunto, como naquela acontecia, um pro­fundo enfraquecimento intelectual, resultado das alterações sofridas por todas as funções cere­brais.

A amnesia é bastante acentuada, mesmo mais do que a anterior, revestindo no entanto os mes­mos caracteres.

Apresenta um fácies inexpressivo, de traços apagados, mantendo-se completamente indiferente a tudo o que à sua volta se passa.

O seu aspecto é o de uma verdadeira demente, que, inconsciente do seu estado, acusa sempre melhoras.

Não sofrem comparação com as apresentadas pela primeira doente as leves modificações cardio­vasculares, que nesta existem.

O pulso, de regular frequência (80), é pequeno e hipotenso:

TM = 10.5 Tm = 5.5 Io = 3

A auscultação do coração não revela a existên­cia de quaisquer alterações dignas de nota.

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Os ruídos cardíacos estão um pouco ensurde­cidos ao nível do foco pulmonar.

Encontra-se muito apagado o 1.° aórtico, bem audível e vibrante o 2°

Existem gânglios cervicais e inguinais.

Não há sinais respiratórios de importância.

Do exame do aparelho digestivo nada resulta que mereça atenção, havendo a notar apenas que a doente é obstipada e que se queixa de falta de apetite.

A incontinência de urinas que referi não per­mite a medida da diurese, nem a colheita de um volume de urina suficiente para qualquer exame de laboratório.

Haverá oito meses que a doente deixou de ser menstruada e por essa ocasião sobreveio-lhe uma leucorreia que durou cêrca de dois.

Reacções humorais

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Sangue — Reacção de Wassermann fortemente positiva.

Líquido céfalo-raquidiano — R. W. fortemente positiva.

História e evolução da doença

Mais ainda do que na doente precedente, não é possivel estabelecer-se com rigor a história desta doença.

Parece que a doente foi sempre de tempera­mento nervoso.

Queixa-se de cefalalgias que a atacam muito frequentemente.

Depois que comecei a observá-la o trémulo parece um pouco diminuido e as cefalalgias vão também desaparecendo.

O estado geral não tem sofrido a mínima alte­ração.

4

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Antecedentes mórbidos

A doente é casada há 9 anos, tendo tido durante este largo período um aborto de seis meses e não voltando a gravidar.

Teve o sarampo. Do lado da familia da doente há apenas a refe­

rir uma tuberculose aguda que vitimou o pai aos 40 anos.

DIAGNÓSTICO

Paralisia geral e sífilis existem simultaneamente nas duas doentes que observei. Decorre esta afir­mação da análise dos múltiplos e variados sinto­mas que em uma e outra doente existem.

Procurando facilitar o problema, tentarei esta­belecer separadamente um e outro diagnóstico.

Diagnóstico da sífilis

Para demonstrar a importância deste diagnós­tico—se tal necessário fosse—, bastaria lembrar a gravidade do prognóstico que pode ter essa infec­ção que, no dizer de Landouzy, constitue um terço da patologia humana.

E no entanto tal diagnóstico é por vezes difí­cil, o que bem se compreende atento o conhecido

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polimorfismo clínico de que é susceptível esta infecção.

Se notarmos além disto que a sífilis é capaz de uma multiplicidade de localizações deveras sur­preendente, seremos levados a pensar nela a pro­pósito de cada caso duvidoso que se nos ofereça.

Mas a infecção sifilítica não tem uma predi­lecção igual por todos os nossos órgãos e é bem conhecida a que mostra por certas determinações.

E assim que o sistema nervoso e o aparelho cárdio-vascular, as artérias sobretudo, são dos mais frequentemente atingidos.

Acontece agora encontrar-me na presença de duas doentes que sofrem ambas do seu sistema nervoso e uma delas ainda do aparelho circula­tório.

As alterações cárdio-vasculares existem na doente da minha primeira observação e consti­tuem uma cárdio-aortite.

As lesões da aorta foram mesmo até à pro­dução de uma ectasia do vaso, uma das lesões predilectas da sífilis.

Traduzem-se estas lesões aórticas pela dor esternal, pelo aumento da zona de macissês dos

55

grandes vasos, pelos sinais que fornece a auscul­tação e pelos caracteres do pulso.

As alterações vasculares estendem-se ainda ao tronco bráquio-cefálico que se ectasiou também a ponto de constituir a tumefacção pulsátil que existe no pescoço e que ao apresentar a doente descrevi. Esta dilatação do tronco bráquio-cefálico explica facilmente as diferenças que se notam entre um e outro dos pulsos radiais.

Em presença de alterações desta natureza e ainda das alterações nervosas que nas duas doen­tes existem e de que em breve vou ocupar-me, era natural que a hipótese de sífilis se oferecesse ao meu espírito.

Não faltam factos a confirmar este diagnós­tico:

1.°) Os antecedentes mórbidos de uma e outra doente, os da primeira sobretudo.

2.°) A positividade da reacção de Wasser-mann no sangue e no líquido céfalo-raquidiano de uma e outra doente.

3.°) O resultado do exame químico e citoló-gico do líquido céfalo-raquidiano da primeira doente.

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4.°) A natureza das alterações nervosas que as duas doentes apresentam.

5.°) A existência nos dois casos clínicos de adenias cervicais e inguinais.

* * *

Em uma das minhas doentes existiam sinais de tiroidite: Exoftalmia e hipertrofia da tiroide.

Este facto chegou a lembrar a doença de Base­dow, cuja associação com a paralisia geral é muito rara.

Mais frequente é a coexistência da tiroidite e da paralisia geral, chegando alguns a dá-la como existente em 75% dos casos (Albertis e Marini).

Este facto não deve surpreender-nos porque a sífilis é um factor de tiroidite, frequente, ao que parece. E esta etiologia que explica alguns casos interessantes e raros de doença de Basedow con­jugal. Aparece o bócio também a acompanhar algu­mas heredo-sífilis.

Estes bócios são em geral frustes, atenuados. As associações de bócio com doenças consi-

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deradas específicas (paralisia geral, tabes, etc.) falam ainda a favor do papel de sífilis como causa pos­sível de tiroidite.

É de notar que há também quem considere raras estas associações mórbidas, o que poderá decerto explicar-se atendendo a que a tiroidite evoluciona silenciosamente em grande número de paralíticos.

Estas lesões tiroideias, que são provavelmente devidas a uma acção local do treponema, são con­sideradas por alguns como consequência das lesões cerebrais (Buscaino).

As alterações da tiroide parecem responsáveis de acessos epilaptiformes e de crises nitritoides post-salvarsânicas, que em alguns doentes se pro­duzem.

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Diagnóstico da paralisia geral

Elementos do diagnóstico

a) Exame clínico - Dos elementos que o exame clínico pode fornecer para o diagnóstico da para­lisia geral alguns existem de notável importância : A disartria, a demência e as perturbações ocula­res.

A disartria, sinal grave para Esquirol, é cer­tamente o mais valioso de todos os sintomas clí­nicos, considerado mesmo por muitos como pato-gnomónico. «Ce symptôme a une telle importance que, tant que l'on ne l'a pas constaté et quels que soient les autres symptômes, on peut soupçonner, on ne peut affirmer l'existence de la paralysie gene­ral» (Régis).

A disartria, em geral precoce, é característica da paralisia sendo porém de difícil descrição. As suas particularidades principais são aquelas que nas minhas doentes existiam e que oportunamente descrevi.

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A demência é um sintoma de valor perfeita­mente comparável ao da disartria; é global, pro­gressiva e não falta nunca seja qual for a forma clínica sob que se apresente a doença.

A maneira como são atingidas as diferentes faculdades do indivíduo varia em extremo de um para outro caso. Mas no período de estado ne­nhuma dessas .faculdades é poupada e a perda da memória, a amnesia, é então a mais notável de todas as perturbações psíquicas.

Esta amnesia pode revestir todos os tipos que tem sido descritos, mas é habitualmente progres­siva e global como a demência. Assim acontecia, como disse, nas doentes que estudei.

As perturbações oculares são muito variáveis, mas frequentes, quási constantes mesmo. De todas elas as mais valiosas são a desigualdade pupilar e o sinal de Argyll.

No entanto vai já distante a época em que um e outro eram considerados como sinais certos de paralisia geral, tantos são os estados mórbidos em que podem aparecer.

Os restantes sintomas que podem colher-se no decurso do exame clínico (perturbações da

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motilidade, da sensibilidade, etc.) são ainda dignos de procurar-se, mas o seu valor não sofre con­fronto com o destes outros a que acabo de refe-rir-me.

b) Reacções humorais—Tem despertado gran -de interesse, nos últimos anos, o estudo das alte­rações humorais dos dementes paralíticos e dos neuro-sifilíticos em geral.

É principalmente no líquido céfalo-raquidiano que estas alterações tem sido procuradas e o es­tudo da albuminose e da linfocitose do líquido, as reacções de Wassermann e de Lange, são já hoje considerados como elementos de indiscutível valor para o diagnóstico, sem que de cada um deles se possa dizer que excede notavelmente em importância a qualquer dos outros.

A reacção de linfocitose é em geral precoce e quási constante nos paralíticos gerais.

É insignificante o número de células (linfoci-tos quási exclusivamente) no líquido raquidiano normal. O Prof. Rocha Pereira encontrou 0,5 a 0,9 células por milímetro cúbico, 2 ao máximo.

Na paralisia geral o número de linfocitos é sempre considerável atingindo 100 por milímetro

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cúbico em alguns casos. Esta linfocitose é sobre­tudo notável por ocasião de ictos congestivos.

A linfocitose é um sinal de inegável impor­tância, mas, no entanto, tem-se notado a sua au­sência em alguns casos, raros, de paralisia geral confirmada.

A albuminose é considerada como um sinal constante da paralisia geral, motivo pelo qual alguns autores a teem em maior conta que a lin­focitose.

No líquido céfalo-raquidiano a quantidade de albumina oscila entre 0,1 e 0,3 gramas por litro; atinge 0,gr85 a l,gr45 na paralisia geral (Prof. Rocha Pereira), podendo mesmo ultrapassar muito estes números.

A albuminose raquidiana da demência paralí­tica é consequência do aumento de um dos ele­mentos da albumina normal, a globulina; nos estados meníngeos, ao contrário, dá-se um au­mento da quantidade de serina, conservando-se quási normal a taxa de globulina. Neste facto se baseia a R. de Noguchi.

A reacção de Wassermann, quando procurada no sangue, resulta positiva na maioria dos casos

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70 a 80 %)• No líquido raquidiano a positividade da reacção verifica-se com maior frequência ainda, (80 a 90 % dos casos), facto este que tem em parte a sua explicação em que aquele líquido é um meio "quási ideal para os fenómenos físicos da R. W.» (Dujardin), o que equivale a dizer que. ela é, por isso, mais sensível que no sangue.

Alguns autores (Sicard) consideram mesmo a reacção invariavelmente positiva no líquido raqui­diano dos paralíticos. Para estes, a constância desta reacção faz com que a sua negatividade, conve­nientemente verificada, seja razão suficiente para afastar o diagnóstico de paralisia geral, quaisquer que sejam os motivos que a ele tenham conduzido. Esta maneira de ver é demasiado absoluta e a reac­ção, que é um excelente meio de diagnóstico, é susceptível de falhar como todos os outros.

A desaparição da R. W. no líquido raquidiano seria o ideal da terapêutica. É diminuto, infeliz­mente, o número de casos em que tal resultado parece ter sido conseguido.

A reacção de Lange é também dotada de grande sensibilidade e importância e tanto assim que na' América o seu valor é reputado igual ao da reac-

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ção de Wassermann. A reacção deixa de ser valiosa durante as remissões da doença, pois pode então resultar negativa.

Quando esta reacção é frequentemente repetida durante o tratamento nota-se que a sua intensidade varia paralelamente com o estado do doente, cons­tituindo mesmo um elemento de valor para o prognóstico.

Já hoje ninguém discute o valor diagnóstico dos meios a que me venho referindo e o seu inte­resse é tanto maior quanto é quási certo que eles precedem sempre os sinais clínicos da demência paralítica. E sendo assim, afigura-se-me absoluta­mente legítima a pesquisa metódica destas reac­ções, antes que sinais clínicos apareçam, podendo assim descobrir-se a doença na sua fase preclínica (Ravaut). Será desnecessário insistir nas vantagens que daí poderiam advir para o prognóstico desta afecção.

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Diagnóstico diferencial

Completo como é o quadro mórbido que as minhas doentes apresentaram (*), seria quási des­necessária qualquer tentativa de diagnóstico dife­rencial; referir-me-hei contudo, rapidamente, ao diagnóstico possível com algumas outras afecções.

a) Bócio exoftâlmico — Sendo a primeira doente portadora de uma leve hipertrofia tiroide acompa­nhada de exoftalmia e trémulo, natural seria que a hipótese de doença de Basedow se oferecesse ao meu espírito. A ausência de um dos sintomas de maior valor, a taquicardia, punha em dúvida tal hipótese, que era definitivamente afastada ao aten­tar em outros dados que o exame ulterior revelou (reacções humorais, etc.) e na natureza das altera­ções psíquicas que a doente apresentava. Efectiva­mente as psicoses do bócio exoftâlmico revestem de preferência a forma de confusão mental, se bem que possam tomar outros aspectos. Na doente da

(*) Não me foi possível obter uma análise do líquido céfalo-raquidiano da doente da II observação.

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2.a observação nada há que justifique tal diagnós­tico diferencial.

b) Sífilis cerebral— É certamente a afecção que mais facilmente poderá ser confundida com a paralisia geral e isto sobretudo quando aquela se apresenta sob uma forma esclero-gomosa difusa.

Para isso concorre o facto de serem comuns às duas afecções a maior parte dos seus principais sintomas: a disartria, os trémulos, a demência, mesmo as reacções humorais, podem existir em uma e outra entidade mórbida.

A reacção de Lange, quando característica, po­derá constituir um bom elemento para o diagnós­tico diferencial.

Apontam-se particularidades a cada um dos sintomas clínicos que .facilitariam o diagnóstico; mas tão superficiais e discutíveis são as diferenças, que dificilmente poderá considerar-se como seguro um diagnóstico que assente em bases tão pouco sólidas.

A coexistência de localisações cerebrais, a evo­lução da doença, a prova terapêutica (irreductibili-dade da R. W. no líquido céfalo-raquidiano em

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caso de paralisia geral), são os elementos únicos que permitem resolyer a questão.

c) Tabes —O diagnóstico diferencial com o tabes é sobretudo interessante no período de iní­cio, quando aparecem os primeiros sintomas a despertar a atenção.

É frequente combinarem-se os sintomas de uma e outra afecção e assim acontece nas duas doentes que estudei.

Esta associação tem sido diversamente inter­pretada pelos autores: é, para alguns, um indício de que tabes e paralisia geral devem ser conside­rados como uma doença única; para outros o facto significa apenas a coexistência das duas afecções que evolucionam independentemente no mesmo indivíduo.

O síndromo humoral é idêntico no tabes e na paralisia.

É neste caso a clínica que permitirá a des­trinça e do predomínio dos sintomas cerebrais ou espinais deduzir-se-há o diagnóstico.

As mínimas perturbações demenciais serão de­vidamente apreciadas.

Nas minhas doentes não.é possível qualquer

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confusão: os sintomas paralíticos predominam de uma maneira tal que fácil é concluir.

d) Esclerose em placas Em algumas formas da paralisia geral em que há predomínio dos sin­tomas motores pode a doença revestir uma notá­vel semelhança com a esclerose em placas. Por outro lado a esclerose em placas pode também apresentar-se com sintomas da paralisia, o que não deve surpreender-nos, atendendo a que são cons­tantes as lesões do cortex nesta afecção.

Podem até as duas doenças coexistirem no mesmo indivíduo, o que raras vezes acontece.

O trémulo intencional, as contrácturas, o nis-tagmo, as crises apoplectiformes, o carácter gutu­ral da palavra, a quási insignificância das pertur­bações demenciais, são próprias da esclerose.

Os sinais humorais da paralisia geral não exis­tem na esclerose em placas.

e) Arterioesclerose cerebral — O início fre­quente desta afecção por perturbações neurasténi-cas faz muitas vezes lembrar a paralisia geral.

O síndromo humoral da paralisia, a diversi­dade de sinais físicos das duas afecções, a idade em geral menos avançada dos dementes paralíti-

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cos, são outros tantos elementos a levar em conta ao estabelecer o diagnóstico.

f) Eliminando todos os outros síndromos pa­ralíticos que não sejam neuro-sifilíticos, as reac­ções humorais próprias da paralisia geral permi­tem a distinção de um certo número de afecções que com ela poderiam confundir-se: tripanoso-míase, intoxicações, etc.

Estas teem, de resto, características especiais que na paralisia geral faltam.

Daquilo que deixo escrito relativamente ao diagnóstico, deduz-se que as minhas doentes eram portadoras de paralisia geral, encontrando-se a pri­meira no período de início, a segunda no período de estado da doença.

ETIOLOGIA

Há pouco mais de um século (Bayle, 1822) que a paralisia geral foi isolada da loucura e pas­sou a ser considerada como uma entidade nosoló-gica definida. Assim se realizou, no entender de Baillarger, o maior progresso que pode assina-lar-se na história das doenças mentais.

Os primeiros trabalhos, que depois de Bayle apareceram, incidiram sobre a parte clínica e aná-tomo-patológica da nova doença e só muito mais tarde o problema etiológico começou a despertar interesse.

Inúmeros são os trabalhos que sobre este assunto teem aparecido nos últimos anos e do seu estudo se conclue que na etiologia da parali­sia geral intervém um factor preponderante, a sífi­lis, favorecida a sua acção por alguns outros de importância mais limitada.

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a—k sífilis. — Afirmado pela primeira vez por Esmarch em 1857, o papel da sífilis na etio­logia da paralisia geral só começou a ser devida­mente apreciado depois dos célebres trabalhos de Fournier.

E a este propósito afigura-se-me interessante o episódio seguinte, referido por Sanguineti :

"No tempo em que Charcot e Fournier discu­tiam a etiologia sifilítica da paralisia geral, afir-mando-a este, negando-a aquele como todos os da sua época, estes dois grandes sábios fizeram entre si uma aposta: Fournier enviaria ao mestre da Salpêtrière todos os paralíticos gerais portado­res de sífilis que encontrasse e Charcot enviar--lhe-ia aqueles que encontrasse e que a não tives­sem tido. O primeiro apostava cem francos, o segundo vinte por cada caso. Ora os doentes mandados por Fournier foram tão numerosos que deixou de os enviar à Salpêtrière onde começava a fazer-se sentir a contrariedade por este ataque a uma convicção batida em brecha».

O papel da sífilis é actualmente inegável e, se é certo que não existe uma prova formal da •natureza específica da doença de Bayle, não fal-

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tam, no entanto, razões que a tal afirmação con­duzam :

a) A existência da sífilis no passado dos doentes é de tal maneira frequente, que quási se poderá dizer constante. É assim que a infecção sifilítica aparece em algumas estatísticas em 93 % dos casos de paralisia geral. Traduzem esta infecção no paralítico:

1) a existência anterior, mais raras vezes simultânea, de lesões averiguadamente sifilíticas;

2) a percentagem considerável de casos de aborto, nado-mortalidade e sinais de heredo-sífilis na sua descendência;

3) os resultados, quási invariavelmente posi­tivos, da reacção de Wassermann e de outras rea­cções humorais próprias da sífilis, às quais me referi em outro ponto deste trabalho.

4) o facto de serem extremamente raros, ne­gados mesmo por alguns, os casos de contágio de paralíticos, se bem que alguns destes cometam fre­quentes excessos venéreos. Esta noção colhida na clínica viu-se confirmada pelas célebres experiências de Krafft-Ebing que tentou inocular a sífilis em al­guns paralíticos gerais sem nunca o ter conseguido.

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Esta frequência extrema da sífilis não se nota somente nos casos de paralisia geral do adulto: na paralisia geral juvenil a heredo-sífilis aparece também na quási totalidade dos casos.

b) A comunidade de sintomas da sífilis e da paralisia geral testemunham igualmente as relações que entre uma e outra devem existir. O sinal de Argyll, os sinais humorais, etc... não são mais que sinais de sífilis nervosa.

c) A presença do treponema ao nível das lesões cerebrais é um dos mais valiosos argumen­tos que podem aduzir-se a favor da origem espe­cífica da paralisia geral. O treponema foi, pela pri­meira vez, visto no cérebro dos paralíticos por Noguchi em 1913. Os resultados obtidos por este autor foram positivos em 24% dos casos. As inves­tigações de Noguchi foram feitas no cadaver e o mesmo aconteceu com aquelas que imediatamente se lhe seguiram. Mais recentemente Forster e Toma-cszewski, seguindo uma técnica diferente, fizeram as suas pesquisas no vivo, servindo-se, para isso, da punção cerebral. Os resultados que assim con­seguiram foram mais felizes do que os dos inves­tigadores que os precederam. Em 1922 Pulido

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Valente, de Lisboa, publicava o resultado das suas investigações, feitas pelo mesmo processo que usara Forster, mas com maior êxito do que o que obtivera aquele: 70% de casos positivos.

Reproduzo do trabalho de Pulido Valente o resumo dos resultados de todas as investigações deste género :

Número de doen­tes examinados

Casos negativos

Casos positivos

Percentagem de casos posi­

tivos

200 152 48 2 4 « . o

Marinesco e Minea. . . . 27 25 2 7 » / o

Qeber, Benedek e Tatar. . . 22 21 1 4,5 »/o Levaditi, Marie e Bankowski 48 37 I I 270/0 Forster e Tomacszewski. . . 61 34 27 44 0/0

40 12 28 7 0 % 40 12 28

A comparação destes resultados traz-nos a es­perança de que, com o aperfeiçoamento da técnica, o espiroqueta de Shaudinn venha a ser encontrado na quási totalidade, senão na totalidade dos casos de paralisia geral, mesmo porque, como faz no­tar Pulido Valente, os resultados positivos só se obteem em alguns casos, depois de reiteradas ten­tativas.

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E não creio que deva ter-se em muita conta o argumento invocado por alguns de que podem ser casos de sífilis cerebral, e não de paralisia, aqueles em que se obtém resultado positivo.

Seria necessário admitir então uma bem ex­traordinária frequência de erros de diagnóstico, de diagnóstico histo-patológico inclusivamente.

d) A constância do tempo, que decorre desde a aquisição da sífilis até que se notam os primeiros sintomas de paralisia geral, é tal, que forçoso se torna admitir a influência de uma na aparição da outra.

Efectivamente a paralisia geral aparece quási invariavelmente 12 ou 14 anos depois da sifiliza-ção. E Régis está de tal maneira convicto desta regularidade, que diz começar a tranquilizar sifilí-ticos, quando passaram 15 anos depois da data da infecção luética.

é) A grande analogia da tripanosomíase com a sífilis vem ainda em apoio do papel desta na etiologia da paralisia geral :

O agente causal—o tripanosoma—pertence à mesma família que o treponema.

A transmissão da doença, que habitualmente

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se faz por intermédio da glossina, pode-se fazer, no entanto, algumas vezes pelo coito, como acon­tece usualmente com a sífilis.

As lesões primárias e secundárias da sífilis são perfeitamente análogas às da tripanosomíase.

Enfim é flagrante a semelhança entre a parali­sia geral e o episódio terminal da tripanosomíase, a doença do sono.

Esta semelhança não é apenas de ordem clínica, abrange também o aspecto das lesões anátomo--patológicas, a ponto de dificilmente se distin­guirem.

Havendo tão notável semelhança entre a sífi­lis e a tripanosomíase, entre a paralisia geral e a doença do sono, sabendo-se que esta é o termo último da tripanosomíase, inão será lícito supor que a paralisia geral seja a consequência final da sífilis?

f) O paralelismo entre a frequência da sífilis e a da paralisia geral em determinados países, raças, classes, profissões, é um outro argumento a favor da influência causal da sífilis.

É certo que existem países que constituem exce­pção e nos quais à frequência considerável da sífi-

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lis não corresponde uma frequência paralela da paralisia geral.

É o que acontece em algumas regiões da África, na Arábia, etc.

Direi em breve como isto poderá explicar-se, mas noto desde já que a contrapor a este argu­mento existe este outro de que se não conhecem países ou raças em que a paralisia geral seja fre­quente, sem que o seja igualmente a sífilis.

g) A eficácia da terapêutica anti-sifilítica está longe de ser constante, mas é nítida, no entanto, em alguns casos. íComo explicar o facto, não admitindo a origem específica da paralisia geral?

Mais argumentos poderiam ser invocados, que demonstrassem a importância da sífilis na etiolo­gia da paralisia geral; creio porém que poderão dispensar-se, pois aqueles que apontei bastam, por certo, para que essa conclusão se imponha ao nosso espírito.

A-pesar-de tudo isto, continuam alguns a admitir a concepção de Klippel, de que a paralisia geral é um síndroma clínico de etiologia variável: intoxicações, infecções (sífilis, tuberculose), artri­tismo, etc.

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Admitindo que a paralisia geral seja uma con­sequência afastada da sífilis, como poderá dedu-zir-se daquilo que deixo escrito, algumas questões surgem que muito importaria resolver. É assim que pode surpreender-nos seja relativamente rara, sendo a sífilis extraordinariamente frequente.

Não seria também para esperar que a paralisia geral resistisse ao tratamento com essa tenacidade que todos reconhecem.

Estas anomalias procuraram alguns explicá-las admitindo uma dualidade de germens sifilíticos. Para outros, a explicação deveria procurar-se na via seguida pelo agente infectante.

A dualidade dos germens sifilíticos

A ideia de que poderiam existir duas varieda­des de treponema, cada uma com atributos espe­ciais, foi recentemente sustentada por Marie e Levaditi.

Esta teoria dualista, que foi perfilhada por muitos autores, admitia um treponema neurotropo e um outro dermotropo.

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Esta maneira de ver tinha a apoiá-la alguns factos bem conhecidos:

1) São, em geral, extremamente discretos os acidentes secundários e terciários da sífilis nos indivíduos que mais tarde se tornam paralíticos gerais.

2) Tem sido apontados muitos casos de con­tágios similares.

3) Naqueles países em que predominam as sífilis com acidentes cutâneos e viscerais, são bem raros os casos de paralisia.

4) Alguns factos observados no campo da experiência (Marie e Levaditi) favorecem a hipó­tese do dualismo.

A teoria dualista tende no entanto a ser aban­donada porque numerosos são os argumentos a opor àqueles que apontei :

1) A sífilis nervosa e a paralisia geral deve­riam mostrar tendência a desaparecer, pois o redu­zido número de manifestações cutâneas deveria diminuir as probabilidades de contágio pela única variedade de treponema capaz de produzir aquelas afecções; ora a paralisia geral tende a aumentar de frequência.

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2) Os casos de contágio similar teriam valor se também no indivíduo que contagiou aparece­rem manifestações nervosas da sífilis. Isto não tem sido apontado e é provável que derivem de simples coincidência.

3) Na lepra existem também duas formas clínicas, com predomínio de lesões cutâneas em uma, nervosas na outra, i Deverá por isso admi-tir-se a existência de duas variedades de bacilo de Hansen?

4) São frequentes os casos em que são múl­tiplas as localizações da sífilis, umas nervosas, outras viscerais.

Uma das doentes que apresentei é disto um exemplo frisante.

Por tudo isto, creio que a ideia da unidade do agente da sífilis deve prevalecer.

Influência da via de acesso do treponema

Tentaram alguns explicar certas particulari­dades da sífilis nervosa pela maneira como se esta­belece a infecção dos centros (Sicard).

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Transportado aos centros nervosos pela via sanguínea, o treponema poderia comportar-se de duas maneiras diferentes:

1.° - f ixar-se nas paredes do vaso provocando concomitante reacção meníngea: vascularite e me­ningite primitiva (acidentes nervosos secundários e terciários) ;

2.°—atravessar a barreira vascular e penetrar no seio do tecido nervoso: sífilis parenquimatosa primitiva; meningite secundária (tabes, paralisia geral).

Esta interpretação patogénica da paralisia geral não tem sido, nem pode ser aceite, e basta para isso recordar a precocidade das manifestações me-níngeas da paralisia, que a punção raquidiana per­mite verificar.

Creio que será mais natural fazer intervir nes­tas questões de étio-patogenia da paralisia geral:

1.°— a deficiência de tratamento dá sífilis que, como já fazia notar Fournier, se observa de prefe­rência nos casos em que a sífilis evoluciona silen­ciosamente ; . 2.°— a coexistência com a sífilis de algumas causas predisponentes, a que vou referir-me.

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a) A civilização (Países, raças, profissões) — A paralisia geral não é igualmente frequente em todos os países, nem mesmo naqueles em que a sífilis se nota com um frequência igual. É nos países da Europa e da América que a paralisia geral causa o maior número de vítimas, ao passo que em outros (Arabes, Chineses, Egípcios, etc.) a paralisia geral é muito rara.

Em alguns destes últimos povos tem-se notado mesmo que os casos de demência paralítica se dão quási exclusivamente nos europeus, a-pesar-da sífilis ser frequente nos indivíduos indígenas e de serem as mesmas as fontes de contágio. (*)

Verifica-se, por outro lado, que nos países qne rapidamente se desenvolvem, a frequência da para­lisia geral sofre um acréscimo paralelo. Este facto dá-se, por exemplo, com a Japão em que os casos de paralisia geral teem aumentado consideravel­mente nos últimos anos como refere o professor

(*) A acção do sezonismo sobre a paralisia geral, revelada pelos trabalhos modernos de terapêutica, faz com que alguns expli­quem a raridade da demência paralítica em certos países pela acçã0

imunizante do sezonismo.

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Shuzo-Kure, de Tokio. Todavia este autor atribue o facto ao melhor conhecimento actual da doença no seu país.

Factos análogos se dão no que se refere a determinadas profissões em que, sendo a vida intelectual mais intensa, é também maior a per­centagem de paralíticos gerais. Em algumas pro­fissões a frequência da paralisia é condicionada apenas pela da sífilis.

De todos estes factos se conclue que a civiliza­ção ou a cerebralização, como prefere dizer Régis, predispõe manifestamente para a doença de Bayle.

b) Hereditariedade — A hereditariedade pode constituir uma predisposição para a paralisia geral por determinar uma maior vulnerabilidade do sis­tema nervoso.

Deve notar-se porém que não é a hereditarie­dade vesânica ou nevrósica, como antigamente se supunha, que assim predispõe para a paralisia: São as heranças congestivas, a hereditariedade cerebral, que tem essa qualidade. E' assim que é muito rara a paralisia geral nos descendentes dos alienados, nos alienados e nevrósicos mesmo.

c) Idade. Sexo —A paralisia geral não aparece

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indiferentemente em todas as idades e nos dois sexos.

E principalmente na idade adulta, dos 35 aos 45 anos, que a doença aparece. Mas além desta paralisia geral do adulto existem também paralisias gerais juvenis e paralisias gerais senis.

Pelo que respeita ao sexo, a doença é notavel­mente mais vulgar no homem que na mulher.

Estas particularidades relativas à idade e ao sexo explicam-se com facilidade porque é, afinal, a sífilis que indirectamente as motiva: a maior fre­quência desta no homem e a pequena variabilidade da época em que se faz a sua aquisição, são, efecti­vamente, bem conhecidas.

d) Intoxicações e infecções — A acção nociva que sobre o cérebro exercem algumas intoxicações crónicas (alcool, ópio, etc.) tem como consequência a predisposição para a paralisia geral. Estas intoxi­cações, o alcoolismo sobretudo, podem mesmo originar por si sós um verdadeiro síndroma para­lítico.

É menos importante o papel de outras intoxi­cações: chumbo, arsénico, mercúrio.

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É análoga a acção predisponente de algumas infecções crónicas: tuberculose, cancro.

e) Os traumatismos cranianos podem ter uma acção importante, mas até hoje mal definida, na etiologia da demência paralítica.

Conclusões

De todos os factores etiológicos que referi, só a sífilis pode invocar-se como causa da paralisia geral nas doentes que estudei. Deste facto e de tudo aquilo que deixo escrito, creio que poderá concluir-se que na etiologia da paralisia geral in­tervém :

1.° —Uma causa eficiente, constante, a sífilis. 2.° —Várias causas adjuvantes que preparam o

terreno (cerebralização, hereditariedade, intoxica­ções, etc.).

EVOLUÇÃO

A evolução da paralisia geral quasi sempre progressiva, quando apreciada em conjunto, apre­senta, no entanto, uma grande irregularidade na sua marcha pelos incidentes de que é habitual­mente entrecortada e que sobre ela exercem uma acção, ora favorável, ora prejudicial.

Clinicamente, a paralisia geral compreende quatro períodos, que não são nitidamente delimi­tados, como poderia prever-se.

a) Período preparalítico - Existem neste pe­ríodo perturbações físicas variadas, como parali­sias, alterações da sensibilidade geral e especial (anosmia), exagero de reflexos tendinosos, insónia, leve embaraço da palavra.

Quási imperceptíveis são em geral as pertur­bações psíquicas neste período e, melhor que pelo

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clínico, são às vezes notadas pelos doentes. Tradu­zem o enfraquecimento intelectual que começa e consistem em falhas de memória, de atenção, erros frequentes, inaptidão para o trabalho e modifica­ções de carácter. Estas perturbações psíquicas po­dem revestir duas formas: uma de depressão e outra de excitação.

Os sinais que existem neste período dificil­mente terão a justa interpretação e só o exame do líquido céfalo-raquidiano permitirá despistar a doença que começa (período preclínico de Ravaut).

b) Período de início — Neste período a doença começa a definir-se e vão aparecendo, por ordem variável, os diferentes sintomas que lhe são pró­prios e que já descrevi ao apresentar as minhas doentes.

c) Período de estado—A sintomatologia com-pleta-se sucessivamente e vão-se acentuando de uma maneira contínua aqueles sintomas que disso são susceptíveis, a disartria e as perturbações psí­quicas em particular.

Os sintomas próprios da paralisia geral acom-panham-se de outros que traduzem diferentes alte-

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rações orgânicas, que podem complicar a doença principal.

d) Período terminal— Neste período o doente antes vegeta do que vive, tal é o marasmo a que chega pelo grau que atingem as suas perturbações. As faculdades intelectuais estão em extremo redu­zidas, para não dizer abolidas por completo. Impos­sibilitado de deixar o leito, incapaz de alimen-tar-se, de fazer-se compreender, incontinente de esfíncteres, o doente inspira dó. A morte sobrevem então por caquexia ou por qualquer complicação incidental.

A primeira doente que apresentei encontrava-se no período de início, a segunda no período de estado da paralisia geral.

E' dificil avaliar o tempo que a doença gasta em percorrer os seus diferentes períodos, dizer qual seja a sua duração.

Por um lado, quando chega a estabelecer-se o diagnóstico, já a doença dura há um certo tempo, impossível de determinar; por outro lado, a dura­ção é extremamente variável de caso para caso. E' portanto uma média de aproximação muito rela­tiva a duração de 2 a 5 anos que á paralisia geral

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costuma atribuir-se. Existem formas rápidas, que duram um ano ou menos, e formas longas, arras­tadas, em que a doença se prolonga durante 10 e mais anos (caso clínico de Arnaud e Vallon de 22 anos); e entre estes dois extremos todos os intermédios são possíveis.

REMISSÕES E COMPLICAÇÕES.—A evolução da paralisia geral não é sempre contínua e podem, no seu decurso, aparecer remissões, isto é, uma ate­nuação ou mesmo desaparição completa de um ou de quási todos os sintomas mórbidos; um daque­les que raras vezes desaparecem é a R. W. do líquido céfalo-raquidiano.

As remissões podem aparecer em todos os períodos da doença, mais frequentes no início, con­tudo, e podem ser fugazes ou demoradas, podendo manter-se durante vários anos.

Além de doenças intercurrentes que podem manifestar-se no decurso da paralisia geral, esta complica-se com frequência de ictos congestivos de feição epileptiforme ou apoplectiforme, com­plicações estas que podem ter como consequência a morte do doente. Afora estes acidentes conges-

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tívos, é frequente.a febre nos paralíticos, indepen­dentemente de qualquer complicação. Esta febre resiste ao tratamento arsenical e parece devida a lesões nervosas. Alguns admitem mesmo um estado pirético contínuo na paralisia geral.

FORMAS EVOLUTIVAS — O aspecto clínico da pa­ralisia geral permitiu a descrição de duas formas clínicas especiais: a forma demencial e a forma delirante. Mas a evolução da doença pode ser con­dicionada por alguns factores que lhe imprimem em alguns casos uma feição especial.

a) Idade—A paralisia geral juvenil é em geral mais longa que a do adulto. Manifesta-se habitualmente sem delírio, revestindo a forma de­mencial simples.

A paralisia geral senil coexiste usualmente com afecções próprias da idade avançada. Mas esta não imprime caracteres especiais à doença a não ser, talvez, uma mais rápida evolução.

b) Sexo—A paralisia geral feminina reveste alguns caracteres especiais.

Aparece com frequência por ocasião da meno­pausa, a sua sintomatologia é menos acentuada, é

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mais demente que delirante. Os ictos congestivos parecem ser menos frequentes que no homem e a doença um pouco mais longa.

CONCLUSÃO—A paralisia geral tem sido consi­derada como uma doença invariavelmente progres­siva, de prognóstico fatal; todavia as remissões de que é susceptível, os resultados colhidos com novos métodos de tratamento e o facto de serem curáveis algumas afecções análogas, permitem-nos esperar que, ao menos em determinados casos e condições, a paralisia geral venha a tornar-se menos inflexível na sua marcha.

TRATAMENTO

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A—Métodos terapêuticos

MEDICAÇÃO ANTISIFILÍTICA—A medicação anti-sifilítica impõe-se como base do tratamento da paralisia geral uma vez admitida a natureza especí­fica desta doença. Por este motivo e ainda porque, quando posta em prática no início do mal, tem proporcionado resultados favoráveis, esta medica­ção é admitida e aconselhada por todos ou quási todos os neurologistas e sifilígrafos.

Surgem porém notáveis divergências de opi­nião quando se procura estabelecer a maneira-mais útil de pôr em prática a medicação específica.

Todos os elementos de que actualmente dis­pomos para tratar a sífilis teem sido experimen­tados na paralisia geral, mas nem todos parecem igualmente proveitosos.

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O uso do iodeto de potássio é condenado por alguns autores que o consideram ineficaz e mesmo perigoso, nas formas congestivas sobre­tudo.

Considerado ainda hoje como um excelente antisifilítico, a-pesar-das aquisições recentes da terapêutica, o mercúno parece dotado de poder muito restricto para com as formas variadas da sífilis nervosa e para com a paralisia geral muito particularmente.

É, contudo, um medicamento que creio não deverá abandonar-se e o seu uso afigura-se-me recomendável em alguns casos, nomeadamente naqueles em que o diagnóstico não tenha ainda sido estabelecido com segurança, casos estes em que poderá mesmo decidir esse diagnóstico. E, de resto, sendo pouco considerável o seu valor se empregado isoladamente, é por quási todos acon­selhada a sua associação com outros antisifilíticos: tradução prática da opinião de Ravaut que entende que a neurosífilis deve ser tratada por métodos idênticos àqueles que se usam no tratamento da sífilis em geral.

Se assim se pensa hoje com relação ao mercú-

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rio, são, em compensação, mais animadores os resultados obtidos com o emprego dos arsenicais que são hoje considerados, e com razão, ao que parece, os elementos mais valiosos do tratamento da doença de Bayle. Simplesmente o tratamento deve ser enérgico e precoce, sob pena de vermos baldados os nossos esforços, se a estas condições desobedecermos.

É principalmente no que respeita à maneira de conduzir o tratamento pelos arsenicais, pelo neo-salvarsan em particular, que são absolutamente contraditórios os resultados a que chegam os neu­rologistas e sifilígrafos mais eminentes: emquanto uns preconisam o método das doses fracionadas e frequentemente repetidas (Sicard), Milian defende e procura justificar o seu método das doses mas-siças e espaçadas. Sem poder de maneira alguma emitir em tal assunto uma opinião fundamentada, afiguram-se-me mais favoráveis os resultados que referem os que aconselham esta última maneira de proceder.

Além do neosalvarsan muitos outros produtos arsenicais teem sido propostos para o tratamento da sífilis, e da paralisia geral portanto. Dois deles,

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o silbersalvarsan e o sulfarsenol, foram usados nas minhas doentes.

O silbersalvarsan não parece oferecer vanta­gens sobre o 914. Alguns autores pretendem, no entanto, ter obtido resultados favoráveis empre­gando este medicamento em doses elevadas.

Mais favorável parece ser a opinião geral rela­tivamente ao sulfarsenol, que se recomenda por ser bastante estável, simples a técnica da sua admi­nistração e pequena a sua toxicidade. A-pesar-de esta última qualidade, provocou em uma das mi­nhas doentes um crise congestiva, que felizmente se dissipou com rapidez (*).

Os sais de bismuto foram também aconselha­dos na paralisia geral, mas será decerto prematura qualquer conclusão relativa ao seu valor.

Método de Marinesco—Os arsenicais teem sido empregados em injecções subcutâneas e intramus-

(*) Estas crises parecem produzir-se de preferência nos doen­tes portadores de lesõus endocrínicas, o que leva a ser prudente na administração dos arsenicais em tais casos. A doente apresentava lesões tiroideias que talvez não fossem estranhas à crise que se pro­duziu

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culares, mas a via endovenosa é actualmente a pre­ferida para a sua administração, afora em alguns casos especiais.

Em 1910 propoz Marinesco a administração do neosalvarsan pela via raquidiana sob a forma de soro salvarsanizado. Demorar-me-há um pouco este método, não só porque foi ensaiado em urna das minhas doentes, mas também porque é ainda hoje muito diversamente apreciado o seu valor. O método de Marinesco tem sido acusado de pe­rigoso e inútil. Efectivamente, após os primeiros entusiasmos, surgiram algumas decepções, porque começaram a registar-se acidentes provocados pela injecção. Com os aperfeiçoamentos que a técnica tem sofrido esses acidentes são já hoje raros e de mínima importância.

Por outro lado este método terapêutico tem proporcionado resultados tão lisongeiros em al­guns casos que não pode já ser considerado como inútil.

Foram mesmo rebatidas as afirmações que fi­zera Milian de que as doses introduzidas directa­mente no canal raquidiano eram inferiores às que lá chegam utilizando a via venosa e de que os

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medicamentos assim introduzidos eram eliminados pelos linfáticos antes de impregnarem os centros nervosos.

A salvarsanização do soro sanguíneo, que deve ser injectado no canal raquidiano, pode ser feita:

in vivo, por injecção endovenosa de neosal-varsan em dose elevada, 60 ou 70 centigramas ;

in vitro, por adição ao soro sanguíneo do doente da dose de neosalvarsan (2 a 5 miligra­mas) que pretende injectar-se.

Além deste autosoro, teem sido usados hete-rosoros, preparados identicamente, e até solutos aquosos de novarsenobenzol.

Parecem alguns acidentes ser devidos a estas últimas maneiras de proceder, razão porque ten­dem a ser abandonadas.

A preparação do doente com um tratamento arsenical por via venosa parece favorecer a ino­cuidade das injecções raquidianas.

E complexo o mecanismo pelo qual actuam as injecções intra-raquidianas e os resultados obtidos não podem atribuir-se a uma simples acção treponemicida do soro injectado. Em pri­meiro, lugar tende a admitir-se que os anticorpos

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que existem no sangue dos indivíduos sifilíticos, após um tratamento específico nomeadamente, tomam parte importante na acção das injecções intra-raquidianas.

Daqui a preferência que deve merecer o soro salvarsanizado in vivo.

De alguns trabalhos experimentais resulta, por outro lado, que à injecção intra-raquidiana se segue uma irritação meníngea que favorece a penetração nos centros nervosos dos medicamentos injecta­dos ulteriormente por via endovenosa. E daqui se deduz a vantagem de fazer seguir a injecção raqui-diana de uma série de injecções de mercúrio ou de novarsénico.

A acção terapêutica da injecção intra-raqui­diana é reforçada quando a fazem preceder de uma punção lombar, reforço este que deve atri-buir-se a uma maior permeabilidade dos plexos coroides determinada pela punção. Procurando ainda melhor resultado, chegam alguns a propor a dreinagem do líquido raquidiano (Barbat). Mas os resultados colhidos não excedem os que se obteem com uma simples punção de 15 ou 20 centímetros cúbicos de líquido.

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A mistura do soro salvarsanizado com uma quantidade notável de líquido raquidiano (40-60c c) favorece a absorção do medicamento injectado.

Alguns autores limitam-se a fazer a punção sem injecção intra-raquidiana consecutiva, intro­duzindo estes o medicamento pela via venosa.

Técnica — Tomando em conta os aperfeiçoa­mentos recentes do método Marinesco, a sua técnica pode resumir-se :

1) preparação do doente com uma série de injecções intravenosas;

2) injecção de neosalvarsam (60 a 70 cgr.) na véspera da injecção intra-raquidiana;

3) colheita do sangue e separação do soro; 4) punção lombar de 60 a 70 centímetros

cúbicos; 5) rejeição de 15 a 20 centímetros cúbicos

de líquido e adição do soro salvarsanizado ao res­tante.

6) injecção intra-raquidiana da mistura; 7) tratamento endovenoso consecutivo.

SEZONISMO PROVOCADO. —Não é nova a noção de que uma doença febril, uma supuração, podem

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ter uma acção favorável sobre as afecções nervosas e mentais.

Daqui resultaram inúmeras tentativas terapêu­ticas e parecem resultar particularmente felizes aque­las que nos últimos anos se teem feito no trata­mento dos paralíticos gerais.

Em 1918 assinalou W.-Jauregg a acção favo­rável do sezonismo sobre a evolução da paralisia geral.

Pouco depois, em 1920, apresentava Wey-gandt (*) os resultados que obtivera em alguns doentes em que tinha provocado o sezonismo.

Este eminente psiquiatra injecta subcutanea-mente no braço ou na espádua do doente 2 a 3 centímetros cúbicos de sangue, recolhido de um palúdico por punção venosa, ou, o que é prefe­rível, de um paralítico geral que esteja sendo submetido a esta vacinação pela malária.

(*) Há pouco ainda, 10 de Abri! de 1924, o Prof. Weygandt, de Hamburgo, realizou na Faculdade de Medicina do Porto uma bri­lhante conferência sob o tema: Tratamento da paralisia geral e sífilis cerebral.

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Os acessos palustres manifestam-se geralmente dentro de 12 a 18 dias, sendo esta incubação muito mais curta (4 a 5 dias), quando se recorre á injecção intravenosa. Deixam-se declarar até uns 8 a 12 acessos febris, se o estado geral do doente o permitir, e a seguir inicia-se um tratamento ade­quado pelo quinino.

Este tratamento deve ser seguido de uma cura pelo neosalvarsan ou silbersalvarsan.

Weygandt recorre à injecção endo-lombar de salvarsan, que Oennerichs aconselha fazer segundo uma técnica especial: injectar uma mistura de lí­quido raquidiano com salvarsan num determinado ponto do canal lombar e um pouco abaixo retirar uma certa quantidade do mesmo líquido.

Alguns autores aconselham a punção raqui-diana antes do tratamento novarsenical, que deve seguir a administração do quinino, maneira de ver que parece justificada pela acção de reforço que aquela exerce nos efeitos dos arsenicais introduzi­dos pelas vias ordinárias.

Os resultados assim obtidos parecem ser os mais favoráveis.

Todos aqueles que teem experimentado este

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método chegam à conclusão de que a forma terçã do sezonismo deve ser a preferida.

Alguns ensaios feitos com a febre récurrente não proporcionaram resultados apreciáveis.

Teem sido muito diversamente explicados os resultados obtidos por este método.

Admitem alguns uma acção quasi esterili-zante das temperaturas elevadas, afirmação que baseiam em alguns factos de ordem experimental. Mas às mais fortes ascenções térmicas, mesmo demoradas, não tem correspondido os melhores resultados.

Admitiram-se então reacções de defesa (leu-cocitose, formação de anticorpos) provocadas pela infecção.

Julgam alguns que a eliminação de toxinas, pelos suores profusos que a infecção provoca, toma parte importante na acção terapêutica do método.

A primeira estatística de Weygandt era já muito animadora: em 12 dos 33 casos clínicos em que aplicou o método obtivera remissões que se mantinham à data da publicação, ou sejam 36 % de resultados favoráveis.

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Na sua última estatística (400 observações) este autor refere bons resultados em 50 u/o dos casos, devendo notar-se que algumas observações datavam já de 3 e mais anos.

Muitos outros que ensaiaram o método (Wors-ter-Brought, Herzig, etc.) obtiveram resultados igualmente animadores. Alguns teriam obtido re­missões duradoiras em 70 % dos casos e até a negatividade da R. Wassermann no líquido céfalo--raquidiano, resultado este que até agora não foi possível obter com qualquer outra medicação.

É ainda muito cedo para que possa formar-se um juízo definitivo sobre o valor do método, mas os resultados até agora obtidos são em extremo favoráveis, justificam novas tentativas e deixam entrever a esperança de que a incurabilidade da paralisia geral não seja tão absoluta como até hoje tinha parecido.

Outros métodos terapêuticos—Além dos méto­dos a que me referi, inúmeras teem sido as tenta­tivas feitas para resolver o problema do tratamento da meningo-encefalite difusa. Porque não entraram na prática corrente, limitar-me-hei a mencionar alguns destes processos de tratamento.

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As injecções intra­cranianas de novarsenoben­

zol, propostas por Sicard, tendem a ser abandona­

das por completo. Propõem alguns as injecções subcutâneas de

nucleinato de sódio com o fim de excitar a fun­

ção fagocitária, mas o uso deste medicamento foi abandonado, porque em altas doses pode acarretar certos acidentes e em doses fracas actua apenas

■ como remineralizante. Outros esperavam obter com este medicamento ou com a tuberculina uma irri­tação meníngea, que favorecesse a penetração nos centros nervosos dos medicamentos administrados por via venosa, à semelhança do que parece acontecer com as injecções intra­raquidianas.

Mencionarei também, apenas de passagem, as tentativas de tratamento pela seroterâpia, radiote­

rapia, etc.

Tratamento geral e sintomático

Não me demorarei no estudo do tratamento geral e sintomático da paralisia geral, não porque seja destituído de importância, mas porque pouco tem de especial.

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As regras da higiene geral serão aconselhadas, devendo-se evitar sobretudo a fadiga intelectual e as intoxicações.

A terapêutica sintomática variará com cada caso clínico e será idêntica à que habitualmente se põe em prática em outros doentes.

B —O tratamento posto em prática

O tratamento aconselhado às doentes, que constituem as minhas observações clínicas, foi o seguinte:

I OBSERVAÇÃO—J. O. O.

12/11 a 1/12-- Benzoato de mercúrio — 1 cgr. Iodeto de po tássio — 2 gr.

7/12 -- Sulfarsenol -- 18 cgr (intra muscular) 13/12- » » » » 21/12 — » T> » » 27/12- » » » » 4/1 - » » » » 7/1 —Punção lombar.

11/1 —Sulfarsenol - 2 4 cgr. (intramuscular).

I l l

1/2 — Neosalvarsan — 15 cgr. 10/2 Inj. intra-raquidiana de soro neosalvarsa-

nisado. 18/2 — » » » » » > 26/2 — » » » » » >

1 a 10/3 —Iodeto de potássio — 2 gr. Il a 21/3 — Benzoato de mercúrio — 1 cgr.

21/3 —Poção polibromada.

II OBSERVAÇÃO — B. C. G.

14 a 19/2 — Cianeto de mercúrio— 1 cgr. 23/2 — Punção lombar. 24/2 — Silbersalvarsan — 10 cgr.

2/3 — > — 15 cgr. 10/3 (?) - — 15 cgr. 17/3 . — » — 15 cgr.

Medicação antisifilítica e sintomática, eis em suma o que se fez.

Existiam em uma das doentes lesões de natu­reza específica, independentes da afecção nervosa, e a essas aproveitou o tratamento. Mas, no que respeita à paralisia geral, o esforço terapêutico resultou estéril ou quási.

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O estado avançado em que a doença se en­contrava explica facilmente o insucesso.

Desnecessário é, já agora, afirmar que, para ter alguma probabilidade de ser eficaz, o tratamento deverá ser precoce e enérgico. Eis porque se me afigura da máxima importância a pesquisa de ele­mentos que permitam descobrir o mal na fase que Ravaut considera o período preclínico da doença. Se esta prática se generalizasse, é possível que menos vezes a civilização e a sifilização dos doen­tes os levassem à paralisia geral.

C— Conclusões

No estado actual da questão afigura-se-me justo concluir que:

1.° — a eficácia do tratamento da paralisia ge­ral depende da precocidade da sua instituição;

2° — a medicação anti-sifilítica é a única que deu as suas provas e aquela que deve ser posta em prática em todos os casos;

3.° — os métodos de Marinesco e Weygandt

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são métodos de excepção, que merecem ainda estudo, mas que nem por isso devem abando-nar-se, atentos os resultados brilhantes que em alguns casos parecem dar.

VISTO

Presidente.

PODE IMPRIMIR-SE

Director.

BIBLIOGRAFIA

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