Vontade de Persuasão: Uma aproximação entre o Barroco na Europa e o Barroco no Brasil

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Dissertação sobre proximidades entre o Barroco como aconteceu na Europa (mediterrânea, principalmente) e como aconteceu no Brasil (em Minas Gerais).

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Vontade de Persuaso: Uma aproximao entre o Barroco na Europa e o Barroco no Brasil

Texto de Caio Bonifcio, graduando de Artes Visuais pelo CAP-USP, a ser usado de avaliao final da disciplina Barroco no Brasil, ministrada no primeiro semestre de 2015 por Carlos Eduardo Riccioppo.

Mesmo o Barroco europeu (principalmente o italiano) sendo muito diferente do Barroco mineiro, os dois podem ser aproximados quando vemos a forma em suas diferentes representaes como estando em funo da persuaso. Tomaremos persuaso como a qualidade de dissolver a esfera simblica, a artstica, a religiosa e a civil, em uma nica que tipicamente barroca. Enfim, quando elementos transitam por esses diferentes mbitos e a diferenciao entre eles se torna quase imperceptvel ou inexiste, teremos uma persuaso efetiva e a criao de uma sociedade barroca. Essa forma de organizao social to presente na Europa quanto no Brasil por este estar inserido no mesmo cenrio social que os pases europeus, mesmo que com posio e funes muito diferentes. inevitvel que o Barroco mineiro tenha uma vontade de persuaso como tem o Barroco europeu. Uma vez que o Barroco no apenas um estilo nas artes plsticas e na arquitetura, mas uma ideologia que pensa todos os mbitos da vida como um s, todos na esfera da cultura. Assim sendo, tambm eram barrocas as manifestaes religiosas, as relaes sociais, a poltica, as guerras, as artes dramticas, a literatura, a indumentaria, a decorao e etc. Seria errado pensar na religio como definidora das tendncias das artes, pois tanto a contra reforma catlica quando a persuaso so tipicamente Barroco e surgiram de um mesmo contexto, no uma como consequncia da outra. A persuaso na arte e na arquitetura Barroca alcanada tambm (mas no somente) pela dissoluo da barreira que coloca a arte em um lado e a vida civil em outro, como coisas separadas. Para que a persuaso seja efetiva necessrio que a obra de arte e o observador da obra dividam o mesmo mundo. Assim acontece com a escultura, diferentemente da escultura do Renascimento em que as linhas que a delineavam eram contnuas, havia uma viso especfica de onde se ver a obra e o espao reivindicado por esta era aquele ocupado fisicamente, a escultura no Barroco no tem uma linha contnua que contorna a obra inteira, no tem uma vista nica (mesmo que o campo de viso seja restringido) e o espao reivindicado para si vai alm do espao ocupado fisicamente. Como exemplo podemos ver o So Jac de Sansovino, uma nica linha a contorna por inteiro e para ver essa silhueta bem demarcada exigido do observador um certo posicionamento diante da escultura, a questo do espao melhor vista quando coloca-se em comparao com uma escultura do Barroco, como a Beata Ludovica Albertoni de Bernini, nesta obra tambm h um espao que no ocupado fisicamente pela escultura, mas que sugerido, essa inteno no est presente na escultura de Sansovino, o espao da obra no vai alm do que esta ocupa fisicamente. Na escultura de Bernini tambm no h uma nica linha que faa a silhueta e sim linhas que se encontram e desencontram, deixando a percepo do contorno mais difcil e, portanto, dificultando tambm a limitao de um espao onde finda a obra. Parte da escultura estando fora desta faz com que a obra de arte reivindique para si uma esfera imaginria que no nem do observador nem da obra, mas que os dois tm acesso.Essa tentativa de dissoluo da diviso entre o mundo criado pela obra de arte e o mundo do espectador ainda mais visvel na pintura de interior dos edifcios, principalmente de igrejas. A pintura se alia a arquitetura e a escultura a fim de possibilitar uma transio para que o espectador entre no mundo da obra de arte. Um exemplo o Triunfo do Nome de Jesus pintado no teto da Igreja de Gsu em Roma por Giovanni Batista Gaulli; a pintura tem uma espcie de moldura que falsa arquitetura e sustentada por esculturas de anjos, mas as figuras da prpria pintura transpassam o espao da moldura e se misturam s esculturas, essas por sua vez arquitetura, assim o observador persuadido ao ver a criao de um novo mundo onde arte e realidade se combinam. A pintura imita a arquitetura, confunde e mescla a esfera da arte e a civil.O Barroco no Brasil no possui a mesma grandeza que o Barroco europeu. A arquitetura de Alejadinho no monumental como a de Borromini, nem suas esculturas so como as de Bernini, Atade no pintou o teto das igrejas com a mesma majestade que Pietro da Cortona o fez. Mas, ainda assim, a arte do sculo XVII no Brasil chamada Barroca, assim como na Europa, isso pelas vontades que compartilham.A pintura de teto do mestre Atade usa artifcios semelhantes ao de Pietro da Cortona, por exemplo. O teto da Igreja de So Francisco de Assis em Ouro Preto a pintura de uma imagem sacra, imaginada e apresentada como sendo pertencente a um plano diferente do em que est o observador, mas a cpia da arquitetura demonstra uma certa vontade de persuaso. As colunas pintadas no correspondem ao resto da arquitetura interna da igreja, assim pode-se tambm entender que estas sejam usadas como elementos meramente decorativos. Tem a um apelo decorativo e ainda assim no excluda a vontade persuasiva, ainda mais pelo valor simblico que representam, o artista coloca ali as colunas no por serem apenas continuao do edifcio, mas por serem uma parte da igreja que pertence tanto a dimenso do observador quanto a dimenso da cena apresentada. O escoro aplicado ao desenho remete a realidade do que observa, mas os elementos decorativos das colunas se referem ao mundo novo apresentado.A vontade de persuaso e mescla das esferas da vida tambm presente no planejamento das cidades. O urbanismo do Barroco italiano bem exemplificado pela colunata da praa de So Pedro, desenhada por Bernini, a colunata repensa a relao de escala entre o observador e a baslica de So Pedro. Assim consegue manter a monumentalidade e grandiosidade simblica da Igreja e ainda fazer a transio entre a escala das construes civis e da baslica, dissolvendo as esferas religiosa, simblica e civil em uma s. Isso tambm acontece no Barroco brasileiro, em Salvador o edifcio da igreja se diferencia do edifcio do colgio pela adio de uma fachada simblica, mas a continuidade dos prdios no permite a diferenciao entre religioso e civil. Em Minas Gerais o planejamento urbano acontece de maneira peculiar, os edificios no se colocam lado a lado em relao direta de escala, as igrejas mineiras se destacam na paisagem, se afirmam como formas plsticas no espao. Assim como mostra os desenhos de Tarsila do Amaral de Ouro Preto ou algumas pinturas de Guignard das paisagens mineiras como Noite de So Joo, os prdios aparecem sozinhos na paisagem, a percepo diferente da que se tem na Praa de So Pedro, o prdio se destaca em tamanho do resto das construes. No caso do Barroco mineiro a transio feita pelos elementos decorativos, a esfera religiosa diluda na esfera cultural, as decoraes externas e internas das igrejas so semelhantes as usadas nas fachadas das casas e nas festas populares.