Voto Gilmar Mendes e

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    SEM REVISÃO

    RELATÓRIO

    O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES (Relator):

     Tr at a- se de r ecur so ext r aordi nár i o, i nt er post o

    pel o Mi ni st ér i o Públ i co Feder al e pel o Si ndi cat o dasEmpresas de Rádi o e Tel evi são no Est ado de São Paul o -

    SERTESP ( assi st ent e si mpl es) , com f undament o no ar t . 102,

    i nci so I I I , “a”, da Const i t ui ção Feder al , cont r a acór dão do

     Tr i bunal Regi onal Federal da 3ª Regi ão nos aut os da

    Apel ação Cí vel em Ação Ci vi l Públ i ca n° 2001. 61. 00. 025946-

    3.

    Na or i gem, o Mi ni st ér i o Públ i co Feder al aj ui zou

    ação ci vi l públ i ca – or i gi nada dos pr ocedi ment os

    admi ni st r at i vos n° 1. 34. 001. 002285/ 2001- 69 e n°

    1. 34. 001. 001683/ 2001- 68 – com pedi do de t ut el a ant eci pada,

    em f ace da Uni ão, na qual def endeu a não- r ecepção, pel a

    Const i t ui ção de 1988 ( ar t . 5º, I X e XI I I e ar t . 220, caput 

    e § 1º) , do ar t . 4º, i nci so V, do Decret o- Lei n° 972, de

    1969, o qual exi ge o di pl oma de cur so super i or de j or nal i smo, r egi st r ado pel o Mi ni st ér i o da Educação, para o

    exer cí ci o da pr of i ssão de j or nal i st a.

    Def endeu o Mi ni st ér i o Públ i co, em sí nt ese, que,

    se o ar t . 5º, i nci so XI I I , da Const i t ui ção, r emet e à

    l egi sl ação i nf r aconst i t uci onal o est abel eci ment o das

    condi ções par a o exer cí ci o da l i ber dade de exer cí ci o

    pr of i ssi onal , não pode o l egi sl ador i mpor r est r i ções

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    i ndevi das ou não r azoávei s, como ser i a o caso da exi gênci a

    de di pl oma do cur so super i or de j or nal i smo pr evi st a no ar t .

    4º, i nci so V, do Decr et o- Lei n° 972/ 1969. Ademai s, haver i a,

    no caso, vi ol ação ao ar t . 13 da Convenção Amer i cana de

    Di r ei t os Humanos, r at i f i cada pel o Br asi l em 1992.

    Ao f i nal , o Mi ni st ér i o Públ i co r equer eu que:

    1) sej a obr i gada a Uni ão a não mai s r egi st r ar ou

    f ornecer qual quer número de i nscr i ção no

    Mi ni st ér i o do Tr abal ho par a os di pl omados em

     j or nal i smo, i nf or mando aos i nt er essados a

    desnecessi dade do r egi st r o e i nscr i ção par a o

    exer cí ci o da pr of i ssão de j or nal i st a;

    2) sej a obr i gada a Uni ão a não mai s executar

    f i scal i zação sobr e o exer cí ci o da pr of i ssão de

     j or nal i st a por prof i ssi onai s despr ovi dos de grau

    de cur so uni ver si t ár i o de j or nal i smo, bem como

    não mai s exar ar os aut os de i nf r ação

    corr espondent es;

    3) sej am decl ar ados nul os t odos os aut os de

    i nf r ação l avr ados por audi t or es- f i scai s do

    t r abal ho, em f ase de execução ou não, cont r a

    i ndi ví duos em r azão da pr át i ca do j or nal i smo sem

    o cor r espondent e di pl oma;

    4) sej am r emet i dos of í ci os aos Tr i bunai s de

     J ust i ça de t odos os Est ados da Federação, dando

    ci ênci a da ant eci pação de tut el a, de f or ma a que

    se apr eci e a per t i nênci a de t r ancament o de

    event uai s i nquér i t os pol i ci ai s ou ações penai s,

    que por l á t r ami t em, t endo por obj eto a apur ação

    de pr át i ca de del i t o de exer cí ci o i l egal da

    pr of i ssão de j or nal i sta.

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    A Feder ação Naci onal dos J or nal i st as – FENAJ e o

    Si ndi cat o dos J or nal i st as Pr of i ssi onai s no Est ado de São

    Paul o i ngr essar am na l i de na qual i dade de assi st ent es

    si mpl es da Uni ão ( r é) ( f l . 747) , e o Si ndi cat o das Empr esas

    de Rádi o e Tel evi são no Est ado de São Paul o f oi admi t i do no

    pr ocesso como assi st ent e si mpl es do Mi ni st ér i o Públ i co

    Feder al ( aut or ) .

    A sent ença pr of er i da pel o J uí zo da 16ª Var a Cí vel

    Feder al de São Paul o ( f l s. 883- 930) j ul gou par ci al ment e

    pr ocedent e o pedi do para:

    1) determi nar que a Uni ão não mai s exi j a, em t odo

    o paí s, o di pl oma de cur so super i or de j or nal i smo

    par a o r egi st r o no Mi ni st ér i o do Tr abal ho par a o

    exer cí ci o da pr of i ssão de j or nal i st a, i nf or mando

    aos i nt eressados a desnecessi dade de apr esent ação

    de tal di pl oma, assi m como não mai s execut e

    f i scal i zação sobr e o exer cí ci o da pr of i ssão de

     j or nal i st a por prof i ssi onai s despr ovi dos de grauuni ver si t ár i o de j or nal i smo, e dei xe de exar ar os

    aut os de i nf r ação cor r espondent es;

    2) decl ar ar a nul i dade de todos os aut os de

    i nf r ação pendent es de execução l avr ados por

    Audi t or es- f i scai s do Tr abal ho cont r a i ndi ví duos

    em r azão da pr át i ca do j or nal i smo sem o

    corr espondent e di pl oma;

    3) que sej am r emet i dos of í ci os aos Tr i bunai s de

     J ust i ça dos Est ados, de f or ma a que se apreci e a

    per t i nênci a de t r ancament o de event uai s

    i nquér i t os pol i ci ai s ou ações penai s em t r âmi t e,

    t endo por obj et o a apur ação de pr át i ca do del i t o

    de exer cí ci o i l egal da pr of i ssão de j or nal i st a;

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    4) f i xar mul t a de R$ 10. 000, 00 ( dez mi l r eai s) , a

    ser r ever t i da em f avor do Fundo Feder al de

    Di r ei t os Di f usos, nos t er mos dos ar t s. 11 e 13 da

    Lei n° 7. 347/ 85, par a cada aut o de i nf r ação

    l avr ado em descumpr i ment o das obr i gações i mpost as

    na deci são.

    Os aut os f or am ent ão r emet i dos ao Tr i bunal

    Regi onal Feder al da 3ª Regi ão, em r azão do r eexame

    necessár i o e dos r ecur sos de apel ação da Uni ão, da

    Feder ação Naci onal dos J or nal i st as – FENAJ , do Si ndi cat o

    dos J or nal i st as Prof i ssi onai s no Est ado de São Paul o e doMi ni st ér i o Públ i co Feder al .

    O Tr i bunal Regi onal Feder al da 3ª Regi ão deu

    pr ovi ment o à r emessa of i ci al e aos r ecur sos da Uni ão, da

    FENAJ e do Si ndi cat o dos J or nal i st as e r ef or mou a sent ença

    em acór dão cuj a ement a possui o segui nt e t eor ( f l s. 1580-

    1613) :

    “CONSTI TUCI ONAL. PROCESSUAL CI VI L. AÇÃO CI VI LPÚBLI CA. REQUI SI TOS PARA O EXERCÍ CI O DA PROFI SSÃO DE

     J ORNALI STA. LEGI TI MI DADE ATI VA DO MI NI STÉRI O PÚBLI COFEDERAL. FENÔMENO DA RECEPÇÃO. VI A ADEQUADA. MATÉRI AEMI NENTEMENTE DE DI REI TO. J ULGAMENTO ANTECI PADO.POSSI BI LI DADE. I NEXI STÊNCI A DE LI TI SCONSÓRCI ONECESSÁRI O COM OUTROS SI NDI CATOS. DECRETO- LEI N.972/ 69. RECEPÇÃO FORMAL E MATERI AL PELA CARTAPOLÍ TI CA DE 1988. EXI GÊNCI A DE CURSO SUPERI OR DE

     J ORNALI SMO. AUSÊNCI A DE OFENSA À LI BERDADE DE TRABALHO E DE I MPRENSA E ACESSO À I NFORMAÇÃO.

    PROFI SSÃO DE GRANDE RELEVÂNCI A SOCI AL QUE EXI GEQUALI FI CAÇÃO TÉCNI CA E FORMAÇÃO ESPECI ALI ZADA.I NEXI STÊNCI A DE OFENSA À CONVENÇÃO AMERI CANA SOBREDI REI TOS HUMANOS.1. Legi t i mi dade do Mi ni st ér i o Públ i co Feder al par apr opor ação ci vi l públ i ca, ant e o i nt er esseemi nent ement e de or dem soci al e públ i ca, i ndo al émdos i nt er esses i ndi vi duai s homogêneos do exer cí ci o dapr of i ssão de j or nal i st a, al cançando di r ei t os di f usospr ot egi dos const i t uci onal ment e, como a l i ber dade deexpr essão e acesso à i nf ormação.2. Legí t i ma e adequada a vi a da ação ci vi l públ i ca,

    em que se di scute a ocor r ênci a ou não do f enômeno da

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    r ecepção, não se podendo f al ar em cont r ol e deconst i t uci onal i dade.3. Havendo pr ova document al suf i ci ent e para f ormar oconvenci ment o do j ul gador e sendo a matér i apr edomi nant ement e de di r ei t o, possí vel o j ul gament oant eci pado da l i de.

    4. Todos os Si ndi cat os da cat egor i a dos j or nal i st assão l egi t i mados a habi l i t ar - se como l i t i sconsor t esf acul t at i vos, nos t er mos do § 2º do ar t . 5º da Lei nº7. 347/ 85. Não conf i gur ação de l i t i sconsór ci onecessár i o.5. A vi gent e Const i t ui ção Feder al gar ant e a t odos,i ndi st i nt ament e e sem quai squer r est r i ções, o di r ei t oà l i vre mani f est ação do pensament o ( ar t . 5º , I V) e àl i berdade de expr essão, i ndependent ement e de censur aou l i cença ( ar t . 5º, I X) . São di r ei t os di f usos,assegurados a cada um e a todos, ao mesmo t empo, semqual quer bar r ei r a de or dem soci al , econômi ca,rel i gi osa, pol í t i ca, prof i ssi onal ou cul t ural .Cont udo, a quest ão que se col oca de f orma especí f i cadi z r espei t o à l i ber dade do exer cí ci o de qual quert r abal ho, of í ci o ou pr of i ssão, ou, si mpl esment e,l i ber dade de pr of i ssão. Não se pode conf undi rl i ber dade de mani f est ação do pensament o ou deexpr essão com l i ber dade de pr of i ssão. Quant o a est a,a Const i t ui ção assegur ou o seu l i vre exer cí ci o, desdeque at endi das as qual i f i cações pr of i ssi onai sestabel eci das em l ei ( ar t . 5º , XI I I ) . O t ext oconst i t uci onal não dei xa dúvi das, por t ant o, de que al ei or di nár i a pode est abel ecer as qual i f i caçõespr of i ssi onai s necessár i as par a o l i vr e exer cí ci o dedet er mi nada pr of i ssão.6. O Decret o- Lei n. 972/ 69, com suas sucessi vasal t er ações e r egul ament os, f oi r ecepci onado pel a novaor dem const i t uci onal . I nexi st ênci a de of ensa àsgar ant i as const i t uci onai s de l i ber dade de t r abal ho,l i berdade de expr essão e mani f est ação de pensament o.Li berdade de i nf ormação garant i da, bem como garant i doo acesso à i nf or mação. I nexi st ênci a de of ensa oui ncompat i bi l i dade com a Convenção Ameri cana Sobr eDi r ei t os Humanos.7. O i nci so XI I I do ar t . 5º da Const i t ui ção Feder alde 1988 at r i bui ao l egi sl ador or di nár i o ar egul ament ação de exi gênci a de qual i f i cação para oexer cí ci o de det er mi nadas prof i ssões de i nt er esse er el evânci a públ i ca e soci al , dent r e as quai s,not or i ament e, se enquadr a a de j or nal i st a, ant e osr ef l exos que seu exer cí ci o t r az à Nação, ao i ndi ví duoe à col et i vi dade.8. A l egi sl ação r ecepci onada pr evê as f i gur as dopr ovi si onado e do col abor ador , af ast ando as al egadasof ensas ao acesso à i nf ormação e mani f est ação depr of i ssi onai s especi al i zados em ár eas di ver sas.9. Pr ecedent es j ur i spr udenci ai s.10. Pr el i mi nar es r ej ei t adas.

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    11. Apel ações da Uni ão, da FENAJ e do Si ndi cato dos J ornal i st as provi das.12. Remessa of i ci al pr ovi da.13. Apel ação do Mi ni st ér i o Públ i co Feder alpr ej udi cada. ”

    No vot o condut or , o Rel at or t eceu as segui nt esconsi derações sobr e cada um dos temas cont r over t i dos no

    pr ocesso ( f l s. 1601- 1611) :

    “( . . . ) Não se pode i gnor ar a rel evant e f unção soci aldo j or nal i smo, daí r esul t ando a gr ander esponsabi l i dade do pr of i ssi onal e r i scos que o mauexer cí ci o da pr of i ssão of er ecem à col et i vi dade e aopaí s. Os danos ef et i vos, de or dem i ndi vi dual oucol et i va, que o exer cí ci o da pr of i ssão de j or nal i st a

    por pessoa desqual i f i cada ou de f or ma i r r esponsávelpode ger ar são i ncal cul ávei s. Os bens j ur í di cos quepodem ser af et ados são da mesma magni t ude que t antosout r os di r ei t os f undament ai s t ut el ados, como a vi da,a l i berdade, a saúde, e a educação. Os r i scos não seaf ast am nem se di f er enci am do exer cí ci o i r r egul ar daadvocaci a, da medi ci na, da vet er i nár i a, daodont ol ogi a, da engenhar i a, do magi st ér i o e out r ast ant as pr of i ssões. ( . . . ) Dent r o desse cont ext o, poi s,não se pode t er por i r r azoávei s os requi si t os daqual i f i cação pr of i ssi onal especí f i ca ( di pl oma decur so super i or ) e regi st r o no ór gão compet ent e

    est abel eci dos no Decr et o- Lei n° 972/ 69”.

    “( . . . ) Deve ser r essal t ada, ai nda, a l ouvávelpr eocupação do aut or com as popul ações de l ocal i dadesaf ast adas, onde não há j or nal i st a, nem possi bi l i dadede acesso à uni ver si dade. Cont udo, as nor masr egul ament ar es ci t adas não se ol vi dar am dessassi t uações ext r emas. Note- se que nos muni cí pi osdespr ovi dos de cur so super i or em j or nal i smo e depr of i ssi onal habi l i t ado, é per mi t i da a cont r at ação deprovi si onados para o desempenho da f unção de

     j ornal i st a sem a exi gênci a de di pl oma de j or nal i smo( ar t . 16 do Decr et o n. º 83. 284/ 79) . Também r est ougar ant i do o di r ei t o de r egi st r o def i ni t i vo aospr ovi si onados quando da nova exi gênci a para oexer cí ci o da pr of i ssão ( ar t . 16 e 17 do Decr et o n.83. 284/ 79 e ar t . 1º da Lei n. 7360/ 85) , bem comogar ant i do o exer cí ci o da pr of i ssão sem a f or maçãot écni ca par a as at i vi dades que del a não se necessi t e( i nci sos VI I I a XI do Decreto n. 83. 284/ 79) .I gual ment e r essal vado est á o permi ssi vo decont r atação e r emuneração de pr of i ssi onai s de áreasespecí f i cas para a pr odução de matér i a af eta à suaespeci al i dade ( r egi st r o especi al ao col abor ador -Ar t . 5º, I , do Decreto n. º 83. 284/ 79) ”.

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     “( . . . ) É cer t o que, com a edi ção do Decr et o nº 678/ 92( DJ U de 09. 11. 92) , a Convenção Amer i cana SobreDi r ei t os Humanos, t ambém conheci da como Pact o de São

     J osé da Cost a Ri ca, passou a i nt egr ar o si st ema j ur í di co naci onal . Contudo, com a devi da vêni a, não

    vi sl umbr o i ncompat i bi l i dades ent r e essa nor mai nt er naci onal e os di r ei t os e gar ant i as j áassegur ados em nossa Const i t ui ção Feder alr el aci onados com a l i ber dade de mani f est ação dopensament o ( ar t . 5º, I V) , com a l i ber dade deexpr essão ( ar t . 5º, I X) , bem assi m com a l i ber dade dei nf or mação ( ar t . 220, § 1º) , as quai s, r epi t o, não seconf undem com l i ber dade de pr of i ssão. De qual querf or ma, não se pode ol vi dar que, consoant e ref er i dopel o pr ópr i o aut or em sua i ni ci al ( f l s. 31) , o C.Supr emo Tr i bunal Feder al t em r ei t eradament e deci di dono sent i do de que essas nor mas são r ecebi das com ost atus de l ei ordi nár i a e como t al submetem- se àsupr emaci a da Const i t ui ção Feder al . Especi f i cament eno t ocant e à l i berdade de i nf or mação, a Const i t ui çãoFeder al , no § 1º do ar t . 220, não dei xa qual querdúvi da de que ‘ Nenhuma l ei cont erá di sposi t i vo quepossa const i t ui r embar aço à pl ena l i ber dade dei nf or mação j or nal í st i ca em qual quer veí cul o decomuni cação soci al , observado o di spost o no ar t . 5º ,I V, V, X, XI I I e XI V’ ( gr i f ei ) . Se o l egi s l adorconst i t ui nt e i nvocou expr essament e a necessi dade deobser vânci a ao pr ecei t o const ant e do i nci so XI I I doar t . 5º, const ando dest e a possi bi l i dade der egul ament ação de determi nadas pr of i ssões, evi denci a-se, sob pena de cont r adi ção ou mesmo de menção i nócuae repet i t i va, a i nt enção de ver r egul ament ada apr of i ssão vol t ada para a comuni cação soci al , det amanha rel evânci a na or dem soci al . ”

    “É cer t o, de i gual f or ma, que a i mpr ensa conf i gur a- secomo um i mport ant e i nst r ument o da soci edade para adef esa e a manut enção do Est ado Democr át i co deDi r ei t o. Por cor ol ár i o, i mpr ensa e l i ber dade sãot er mos i nsepar ávei s, sendo i nconcebí vel a exi st ênci ada i mpr ensa sem a garant i a da l i ber dade de expr essãoe mani f est ação de pensamento, quando somente por mei odel a a soci edade pode concr et i zar o di r ei t o ài nf or mação, t ut el ado no t ext o const i t uci onal vi gent e.É j ust ament e consi derando a r el evânci a da quest ão dai mprensa na f or mação de uma nação e na manut enção deum Est ado Democr át i co é que a pr of i ssão de j or nal i st acomport a regul ament ação e exi gênci a de qual i f i caçãopar a seu exer cí ci o, sem qual quer of ensa ao pr i ncí pi oda pr opor ci onal i dade e r azoabi l i dade. Ao cont r ár i o, al i mi t ação é per mi t i da no pr ópr i o t extoconst i t uci onal , el evando, i ncl usi ve, o pr i ncí pi o dadi gni dade humana como um de seus pr i nci pai sf undament os. Por t odo o expost o, i mpõe- se a concl usãoque todas as nor mas vei cul adas pel o Decreto- Lei nº

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    972/ 69 f or am i nt egr al ment e recepci onadas pel o si st emaconst i t uci onal vi gent e, sendo l egí t i ma a exi gênci a dopr eenchi ment o dos r equi si t os da exi st ênci a do pr évi or egi st r o no ór gão r egi onal competent e e do di pl oma decur so super i or de j or nal i smo par a o l i vr e exer cí ci oda pr of i ssão de j or nal i st a. Em conseqüênci a, é de

    r i gor o decr et o de t ot al i mpr ocedênci a da pr esent eação, com a cessação da ef i cáci a da t ut el a ant eci padaconcedi da par ci al ment e. ”

    Cont r a esse acórdão do TRF- 3ª Regi ão, o

    Mi ni st ér i o Públ i co Feder al e o Si ndi cat o das Empr esas de

    Rádi o e Tel evi são no Est ado de São Paul o – SERTESP

    i nt er puser am recursos ext raordi nár i os ( f l s . 1. 627-

    1. 642/ 1. 648- 1. 669) com f undament o no ar t . 102, i nci so I I I ,

    “a”, da Const i t ui ção, al egando vi ol ação ao ar t . 5º, i nci sos

    I X e XI I I , assi m como of ensa ao ar t . 220, da Const i t ui ção.

    Cont r a- r azões apr esent adas pel a Uni ão ( f l s.

    1. 713- 1. 724) , pel a Feder ação Naci onal dos J or nal i st as –

    FENAJ e pel o Si ndi cat o dos J or nal i st as Pr of i ssi onai s no

    Est ado de São Paul o ( f l s. 1. 736- 1. 769) , o r ecur so

    ext r aor di nár i o f oi obj et o de j uí zo posi t i vo de

    admi ssi bi l i dade em deci são da Vi ce- Pr esi dênci a do Tr i bunal

    Regi onal da 3ª Regi ão ( f l s. 1779- 1780) .

    Em deci são de 16 de novembr o de 2006, def er i

    medi da caut el ar na AC n° 1. 406/ SP para conceder ef ei t o

    suspensi vo ao pr esent e r ecur so ext r aor di nár i o, nos

    segui nt es t er mos:

    “O r ecur so ext r aor di nár i o ao qual se requer aconcessão de ef ei t o suspensi vo di scute mat ér i a dei ndubi t ável r el evânci a const i t uci onal ,especi f i cament e, a i nt er pr et ação do ar t . 5o, i nci soXI I I , da Const i t ui ção, o qual di spõe que ‘ é l i vr e oexer cí ci o de qual quer t r abal ho, of í ci o ou pr of i ssão,at endi das as qual i f i cações pr of i ssi onai s que a l eiest abel ecer ’ .

    Não se pode negar que o tema envol ve, i gual ment e, ai nt er pr et ação do ar t . 220 da Const i t ui ção, o qual

    di spõe que: ‘ A mani f est ação do pensament o, a cr i ação,a expr essão e a i nf ormação, sob qual quer f orma,

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    pr ocesso ou veí cul o, não sof r er ão qual quer r est r i ção,obser vado o di spost o nest a Const i t ui ção. § 1o  –Nenhuma l ei cont er á di sposi t i vo que possa const i t ui rembar aço à pl ena l i ber dade de i nf or mação j or nal í st i caem qual quer veí cul o de comuni cação soci al , observadoo di spost o no ar t . 5o, I V, V, X, XI I I e XI V’ .

    A quest ão const i t uci onal t ambém é obj eto do RMS n°24. 213/ DF, Rel . Mi n. Cel so de Mel l o, cuj o j ul gament of oi af et ado ao Pl enár i o dest a Cor t e.

    O t ema ref erent e ao âmbi t o de pr ot eção e asconf or mações e l i mi t ações l egai s do di r ei t of undament al à l i berdade de pr of i ssão e, dessa f or ma,a quest ão quanto à recepção ou não do Decreto- Lei n°972/ 69 pel a Const i t ui ção de 1988, f oram ampl ament edebat i dos nas i nst ânci as i nf er i or es.

    Ver i f i co que o r ecur so ext r aor di nár i o f oi admi t i do not r i bunal de or i gem ( f l . 8) ( Súmul a n° 634 do STF) .

    Quanto à ur gênci a da pr etensão caut el ar , ent endo comosuf i ci ent es as ponder ações do Procur ador - Ger al daRepúbl i ca no sent i do de que “um número el evado depessoas, que est avam a exercer ( e ai nda exercem) aat i vi dade j or nal í st i ca i ndependent ement e de r egi st r ono Mi ni st ér i o do Tr abal ho de cur so super i or , porf or ça da t ut el a ant eci pada ant er i or ment e concedi da epost er i or conf or mação pel a sent ença de pr i mei r o gr au,agora se acham t ol hi das em seus di rei t os ,

    i mpossi bi l i t adas de exer cer suas at i vi dades” ( f l s. 5-6 ) .

    Ant e o expost o, ad referendum  da Tur ma, def i r o amedi da caut el ar e concedo o ef ei t o suspensi vo aor ecur so ext r aor di nár i o, t al como pl ei t eado pel oProcur ador - Ger al da Repúbl i ca. ”

    A r ef er i da deci são f oi r ef er endada pel a 2ª Tur ma

    do Tr i bunal em 21 de novembr o de 2006 (DJ 19. 12. 2006) , em

    acór dão cuj a ement a t em o segui nt e t eor :

    “EMENTA: Ação caut el ar . 2. Ef ei t o suspensi vo ar ecur so ext r aor di nár i o. Deci são monocr át i caconcessi va. Referendum  da Turma. 3. Exi gênci a dedi pl oma de cur so super i or em J or nal i smo par a oexer cí ci o da pr of i ssão de j or nal i st a. 4. Li ber dade depr of i ssão e l i ber dade de i nf or mação. Ar t s. 5o, XI I I ,e 220, caput e § 1o, da Const i t ui ção Feder al . 5.Conf i gur ação da pl ausi bi l i dade j ur í di ca do pedi do( fumus boni iuris) e da urgênci a da pr etensãocaut el ar ( periculum in mora) . 6. Caut el ar , em quest ão

    de ordem, r ef erendada. ”

  • 8/15/2019 Voto Gilmar Mendes e

    10/91

    Em r esumo, a cont r ovér si a const i t uci onal est á

    del i mi t ada por duas t eses opost as.

    Por um l ado, def ende o Mi ni st ér i o Públ i co

    Feder al , assi m como o Si ndi cato das Empr esas de Rádi o e Tel evi são no Est ado de São Paul o - SERTESP ( r ecor r entes)

    que:

    a)   o ar t . 4º, i nci so V, do Decret o- Lei n° 972,

    de 1969, não f oi r ecepci onado pel a

    Const i t ui ção de 1988, poi s vi ol a o ar t . 5º,

    i nci sos I X e XI I I e o ar t . 220. Segundo o MPF,

    “a restr i ção f ei t a pel o ar t . 5º, i nci so XI I I

    da Const i t ui ção Feder al , r ef er e- se soment e a

    det er mi nadas prof i ssões, nas quai s se exi ge

    conheci ment os t écni cos especí f i cos par a o

    r egul ar desempenho na at i vi dade, sem acar r et ar

    qual quer dano à col et i vi dade, como os

    pr of i ssi onai s na área de Saúde, por exempl o”

    ( f l . 1657) . Af i r ma, ai nda, que “vi gor a noBr asi l a regul ament ação das prof i ssões por

    mei o dos Consel hos e Or dens Pr of i ssi onai s, que

    i nst aur a um ‘ monopól i o’ sobr e a at i vi dade

    pr of i ssi onal . A f unção de t ai s Consel hos –

    cont i nua o MPF – decorr e do poder de pol í ci a

    do Est ado, sendo seu obj et i vo pr i nci pal

    def ender a soci edade também do pont o de vi st aét i co, sendo i nser i das no Si st ema Naci onal de

    Or gani zação e Condi ções par a o Exer cí ci o de

    Pr of i ssões, como pessoas j ur í di cas de Di r ei t o

    Públ i co. ( . . . ) No ent ant o, t al r aci ocí ni o não

    se apl i ca à cl asse dos j or nal i st as, vez que

    i nexi st e, naquel e r amo, um Consel ho ou uma

    Or dem Pr of i ssi onal , j ust ament e pel o f at o de

    que tal at i vi dade pr esci nde de cont r ol e ét i co

  • 8/15/2019 Voto Gilmar Mendes e

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    por um ór gão públ i co, o que acaba sendo

    r eal i zado pel os pr ópr i os l ei t or es das mat ér i as

     j or nal í st i cas e ai nda por edi t or es e out r os

    r esponsávei s pel as empr esas j or nal í st i cas.

    ( . . . ) De f at o, a r egul ament ação de at i vi dades

    pr of i ssi onai s decor r e do poder de pol í ci a do

    Est ado, most r ando- se i r r azoável no caso da

    pr of i ssão de j or nal i st a, poi s o j or nal i smo

    const i t ui uma at i vi dade i nt el ect ual ,

    despr ovi da de especi f i ci dade que exi j a di pl oma

    par a seu exer cí ci o” ( f l . 1658) . Concl ui ent ão

    o MPF que “os r equi si t os pr i nci pai s par a ser

    um bom j or nal i sta, quai s sej am, bom car át er ,

    ét i ca e o conheci ment o sobr e o assunt o

    abordado, não são matér i as a ser em apr endi das

    na f acul dade, mas no cot i di ano de cada

    i ndi ví duo, nas suas r el ações i nt er subj et i vas,

    de f orma que o exer cí ci o da pr of i ssão em

    coment o presci nde de f ormação acadêmi caespecí f i ca” ( f l . 1663) .

    b)  O ar t . 4º, i nci so V, do Decr et o- Lei n° 972, de

    1969, f oi r evogado pel o ar t . 13 da Convenção

    Amer i cana sobr e Di r ei t os Humanos ( Pact o de San

     J osé da Cost a Ri ca) . Segundo o MPF, “qual quer

    posi ção que se adote – que o t r atado t enha

    f or ça de l ei or di nár i a ou de nor ma

    const i t uci onal – l eva à mesma concl usão: de

    que o ar t . 4º, i nci so V, do Decret o- Lei n°

    972/ 69, f oi r evogado pel o Pacto de San J osé da

    Cost a Ri ca” ( f l . 1669) .

    Por out r o l ado, a Uni ão, a FENAJ e o Si ndi cat o

    dos J or nal i st as Pr of i ssi onai s no Est ado de São Paul o

    ( r ecor r i dos) def endem o segui nt e:

  • 8/15/2019 Voto Gilmar Mendes e

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    a)  O Decr et o- Lei n° 972, de 1969, é pl enament e

    compat í vel com a Const i t ui ção de 1988.

    Sust ent a a Uni ão que “a Const i t ui ção Feder al

    pr et ér i t a, em seu ar t . 150, § 23, j á di spunha

    sobr e a l i ber dade de exer cí ci o pr of i ssi onal ,

    obser vadas as condi ções de capaci dade

    est abel eci das por l ei . Tai s condi ções de

    capaci dade f oram à época determi nadas pel o

    Decreto- Lei n° 972/ 69, que condi ci onou o

    exer cí ci o da pr of i ssão de j or nal i st a ao cur so

    super i or em j or nal i smo e o regi st r o no ór gão

    r egi onal compet ent e do Mi ni st ér i o do Tr abal ho

    e Pr evi dênci a Soci al . A Const i t ui ção de 1988

    t ambém t r ouxe em seu cor po o pr i ncí pi o da

    l i ber dade pr of i ssi onal , em mol des i dênt i cos à

    Const i t ui ção Feder al ant er i or , em seu ar t . 5º,

    XI I I , ( . . . ) . Port ant o, em t ermos dout r i nár i os ,

    ambas as di sposi ções const i t uci onai s

    caract er i zam- se como nor mas const i t uci onai sr est r i ngí vei s, ou sej a, passí vei s de

    r egul ament ação i nf r aconst i t uci onal , podendo a

    l ei del i mi t ar condi ções par a o exer cí ci o das

    pr of i ssões, de acor do com os i mper at i vos do

    bem comum e em obser vânci a dos demai s

    pr i ncí pi os const i t uci onai s” ( f l . 1719) . No

    mesmo sent i do, af i r ma a FENAJ e o Si ndi cat o

    dos J or nal i st as que, “por est ar o r ef er i do

    Decr et o- Lei apenas di sci pl i nando as quest ões

    r el aci onadas com os conheci ment os t écni cos e

    especí f i cos da ár ea de j or nal i smo, na est ei r a

    do que di sci pl i na o ar t . 5º, i nci so XI I I , da

    Const i t ui ção Feder al , r est a evi dent e a sua

    r ecepção pel o novo or denament o const i t uci onal

    vi gent e”.

  • 8/15/2019 Voto Gilmar Mendes e

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    b)  Ass i m, af i r ma a Uni ão que a al egação de que “a

    pr of i ssão de j or nal i st a não pr essupõe a

    exi st ênci a de qual i f i cação pr of i ssi onal

    especí f i ca é equi vocada, vez que est a

    pr of i ssão r equer não apenas l ei t ur a, mas

    i gual ment e o conheci ment o da l egi sl ação e

    pr ecei t os t écni cos especí f i cos. Com ef ei t o –

    af i r ma a Uni ão - , par a ser j or nal i st a é

    necessár i o mai s do que o ‘ hábi t o da l ei t ur a’

    ou o exer cí ci o da at i vi dade pr of i ssi onal ,

    conf orme al egado, o que é comprovado pel o

    número enor me de mat ér i as especí f i cas

    est udadas nas Facul dades de J or nal i smo, ent r e

    el as, a Redação e Edi ção J or nal í st i ca,

    Pesqui sa e Teor i a da Comuni cação, Ét i ca e

    Legi sl ação de Comuni cação, Rel ações Públ i cas e

    soci ol ogi a, dent r e mui t as out r as, t odas el as

    essenci ai s ao bom exer cí ci o da pr of i ssão de

     j or nal i st a” ( f l . 1720) . Segui ndo a mesma l i nhade r aci ocí ni o, a FENAJ e o Si ndi cat o dos

     J or nal i st as af i r mam que, “para ser j or nal i st a,

    é pr eci so bem mai s do que o si mpl es hábi t o de

    l ei t ur a e o exer cí ci o da pr át i ca pr of i ssi onal ,

    poi s, aci ma de t udo, est a pr of i ssão, al ém de

    exi gi r ampl o conheci ment o sobr e cul t ur a,

    l egi sl ação e economi a, r equer que o

    pr of i ssi onal j or nal i st a adqui r a pr ecei t os

    t écni cos e ét i cos, necessár i os par a

    ent r evi st ar , r epor t ar , edi t ar e pesqui sar . Ou

    sej a, conheci ment os especí f i cos à pr of i ssão é

    mui t o al ém da mer a cul t ur a e er udi ção”.

    d)  Al ega a Uni ão, ai nda, que “por ser o

     j or nal i smo prof i ssão umbi l i cal mente l i gada ài nf or mação e à expr essão de i déi as, não se

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    sust ent a também a i déi a de que seu exer cí ci o

    por pessoa i nept a não pr ej udi car i a t er cei r os,

    vez que o cont eúdo de i nf ormações i ncor r etas

    ou i nver í di cas poder i a causar l esões à or dem

    públ i ca, como j á compr ovaram i números casos

    not ór i os” ( f l . 1720) . Af i r mam a FENAJ e o

    Si ndi cat o dos J or nal i st as que “o papel do

     j or nal i st a no Br asi l não é o de qual quer

    ci dadão, ‘ i napt o’ , poi s par a o exer cí ci o da

    pr of i ssão é ai nda necessár i a a ref l exão sobr e

    a i nf or mação, a const i t ui ção e def i ni ção dos

    f enômenos soci ai s, t ar ef a di f í ci l no cot i di ano

    das r edações e cuj a apr endi zagem, de modo

    adequado e i nt r ansf er í vel , ai nda é adqui r i da

    no cur so super i or de j or nal i smo, do qual não

    se pode abr i r mão”.

    e)  Ressal t a- se que “não exi st e nenhum óbi ce na

    l egi sl ação i mpugnada que i mpeça a l i vre

    expr essão do pensament o e l i ber dade de

    i nf ormação, vez que a l ei não determi na que

    t odas as i nf or mações t enham necessar i ament e

    que ser expr essadas por j or nal i st as, mesmo

    porque a l i vr e expr essão das i nf ormações não

    est á r est r i t a ao di pl oma em j or nal i smo. Assi m,

    est ão pr evi st as na l egi sl ação si t uações nas

    quai s se di spensam a exi gênci a do di pl oma para

    o exer cí ci o da menci onada pr of i ssão. São os

    casos de col abor ador e pr ovi si onados,

    expr essament e pr evi st os como exceções que

    di spensam a exi gênci a do di pl oma par a o

    exer cí ci o da pr of i ssão de j or nal i st a, nos

    t ermos do ar t . 5º do Decreto n° 83. 284/ 79. O

    col abor ador , nos t er mos da l ei , pr oduzt r abal ho de nat ur eza t écni ca, ci ent í f i ca ou

  • 8/15/2019 Voto Gilmar Mendes e

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    cul t ur al , r el aci onado com sua especi al i zação,

    par a ser di vul gado com seu nome e

    qual i f i cação. Os pr ovi si onados são, por sua

    vez, os que exer cem as f unções de j or nal i smo

    em l ocal i dades nas quai s não exi st a o cur so de

     j or nal i smo r econheci do na f or ma da l ei . Assi m

    sendo – prossegue a Uni ão em sua argument ação

    - , não est ão excl uí dos dos mei os de

    comuni cação out r as pessoas que não t enham o

    di pl oma de j or nal i smo, t ai s como ci ent i st as,

    i nt el ectuai s, out r os pr of i ssi onai s e ci dadãos,

    na f i gur a de col aboradores que podem col abor ar

    com ar t i gos, ensai os e crí t i cas, mani f est ando

    l i vrement e suas opi ni ões. Também não descui dou

    a l ei das l ocal i dades nas quai s não exi st em

    f acul dades de j or nal i smo r econheci das,

    pr evendo nesses casos a f i gur a dos

    pr ovi si onados. Ao abr i r essas exceções, a l ei ,

    a um só t empo, r esguardou a necessi dade der equi si t os t écni cos par a o exer cí ci o

    prof i ss i onal , compat i bi l i zando- o com os

    pr i ncí pi os const i t uci onai s da l i vr e

    mani f est ação de pensament o e de i nf or mação”

    ( f l . 1721) .

    f )  Por f i m, sust ent a a Uni ão que “não exi st e

    qual quer i ncompat i bi l i dade f ace à Convenção

    Amer i cana de Di r ei t os Humanos, vez que nosso

    ordenament o j ur í di co não i mpõe qual quer

    obst ácul o ao exer cí ci o do di r ei t o à i nf or mação

    e a l egi sl ação r egul ador a da pr of i ssão de

     j or nal i st a não vai cont r a qual quer di r ei t o

    humano f undament al , mas si m a f avor del es,

    devendo ser i nt erpr etada de f or ma si st êmi caf ace a out r os di sposi t i vos const i t uci onai s e

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    l egai s. Assi m, a exi gênci a do di pl oma de

     j or nal i smo é um mei o de prot eção de t oda a

    soci edade, que necessi t a da i nf ormação de

    qual i dade e com r esponsabi l i dade, não

    r epr esent ando óbi ce, mas si m r esguar do a

    quai squer di r ei t os humanos pr evi st os na

    Convenção Amer i cana de Di r ei t os Humanos” ( f l .

    1721) . Em compl ement o, sust ent am a FENAJ e o

    Si ndi cat o dos J or nal i st as que “não há no nosso

    or denament o j ur í di co vi gent e qual quer

    di sposi t i vo que cause obst ácul o ao exer cí ci o

    do di r ei t o de i nf or mação, pel o cont r ár i o, o

    que exi st e é si mpl esment e uma l egi sl ação

    i nf r aconst i t uci onal que zel a pel o exer cí ci o

    r egul ar deste di r ei t o, a f i m de que a

    soci edade possa cont i nuar cami nhando de f orma

    segur a par a o f or t al eci ment o das i nst i t ui ções

    democr át i cas. A exi gênci a do cur so super i or de

     j or nal i smo j amai s pode ser i nt erpret ada comovi ol ação ao di r ei t o de i nf or mação. Na ver dade,

    por mei o dest a exi gênci a, o nosso si st ema

    i nf r aconst i t uci onal apenas assegur ou mai or

    ef i cáci a a est e di r ei t o e gar ant i a

    f undament al , na medi da em que vi sa gar ant i r

    que a i nf ormação sej a pr est ada à popul ação com

    mai s qual i dade e r espei t o aos pr i ncí pi os

    ét i cos e pr of i ssi onai s i ner ent es à pr of i ssão

    de j ornal i smo. Não se perca de vi st a que est a

    l egi sl ação t ambém gar ant e o ampl o acesso ao

    di r ei t o de i nf or mação ao pr ever em seus

    di sposi t i vos a par t i ci pação t ant o do

    pr ovi si onado, como do col aborador , que apesar

    de não possuí r em di pl oma super i or de

     j or nal i smo, ai nda ass i m poder ão cont r i bui r com

  • 8/15/2019 Voto Gilmar Mendes e

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    a qual i dade da i nf ormação e com a l i berdade de

    expr essão e de pensament o at r avés dos ór gãos

    de i mprensa. O advogado, o médi co, o

    engenhei r o, et c. , em r azão das t écni cas

    pecul i ares às at i vi dades que exer cem, devem,

    ant es, cur sar as r espect i vas f acul dades. E não

    é di f er ent e par a o j or nal i st a, o qual , al ém de

    operador da comuni cação, conhecedor não só da

    pal avra e da escr i t a, dever á, i nvar i avel ment e,

    ser t ambém detent or de uma macrovi são do

    pr ocesso de pr odução da not í ci a, r equi si t o

    est e que, i gual ment e, se adqui r e nos bancos

    das uni ver si dades”.

    O par ecer do Mi ni st ér i o Públ i co Feder al , da l avra

    da Subpr ocur adora- Geral da Repúbl i ca Sandr a Cur eau, é pel o

    provi ment o do r ecur so e est á r esumi do na segui nte ement a:

    RECURSOS EXTRAORDI NÁRI OS. CONSTI TUCI ONAL. AÇÃO CI VI LPÚBLI CA. J ORNALI STA. CURSO SUPERI OR EM J ORNALI SMO. I– PRELI MI NARES. LEGI TI MAÇÃO ATI VA DO MI NI STÉRI OPÚBLI CO. ADEQUAÇÃO DA VI A ELEI TA. I I – MÉRI TO. NÃO-RECEPÇÃO DO DECRETO- LEI N° 972/ 69 PELA CONSTI TUI ÇÃOFEDERAL DE 1988. EXERCÍ CI O DA PROFI SSÃO DE J ORNALI STAE REGI STRO NO ÓRGÃO COMPETENTE. EXI GÊNCI A DE CURSOSUPERI OR EM J ORNALI SMO. I MPOSSI BI LI DADE. I NEXI STÊNCI ADE RAZOABI LI DADE. LI BERDADE DE PROFI SSÃO, DEEXPRESSÃO E DE I NFORMAÇÃO. REVOGAÇÃO DO ART. 4º , V,DO DECRETO- LEI N° 972/ 69 PELO DECRETO N° 678/ 92( PACTO DE SAN J OSÉ DA COSTA RI CA) . I I I – PARECER PELOPROVI MENTO DOS RECURSOS.

    É o r el at ór i o.

  • 8/15/2019 Voto Gilmar Mendes e

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     VOTO

    O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES (Relator):

    I. Preliminares

    Os r ecur sos ext r aor di nár i os i nt er post os pel o

    Mi ni st ér i o Públ i co Feder al e pel o Si ndi cat o das Empr esas de

    Rádi o e Tel evi são no Est ado de São Paul o – SERTESP

    pr eenchem t odos os r equi si t os pr ocessuai s i nt r í nsecos e

    ext r í nsecos de admi ssi bi l i dade, t al como j á at est ado pel o

     j uí zo posi t i vo de admi ssi bi l i dade r ecur sal prof er i do pel a

    Vi ce- Pr esi dênci a do Tr i bunal Regi onal Feder al da 3ª Regi ão

    ( f l s . 1. 779- 1. 781) .

    Em pr i mei r o l ugar , os r ecur sos são t empest i vos. O

    acór dão i mpugnado f oi publ i cado no Di ár i o da J ust i ça da

    Uni ão – Seção 2, no di a 30. 11. 2005 ( f l . 1614) . O Si ndi cat o

    das Empr esas de Rádi o e Tel evi são no Est ado de São Paul o –

    SERTESP, na qual i dade de assi st ent e si mpl es do Mi ni st ér i o

    Públ i co Feder al , pr ot ocol ou seu r ecur so no di a 13. 12. 2005

    ( f l . 1627) , medi ant e o devi do pagament o do pr eparo e

    at endendo às f or mal i dades l egai s ( f l s. 1. 643- 1. 646) . O

    Mi ni st ér i o Públ i co Feder al apôs seu vi st o de ci ênci a do

    acór dão no di a 6. 2. 2006 e, val endo- se do pr azo f i xado em

    dobr o ( 30 di as) pel o ar t . 188 c/ c o ar t . 508 do Códi go de

    Pr ocesso Ci vi l , pr ot ocol ou seu r ecur so no di a 7. 3. 2006,

    r ecur so est e que t ambém atende às f ormal i dades l egai s.

  • 8/15/2019 Voto Gilmar Mendes e

    19/91

    I nt er post os os recur sos com base na al í nea “a” do

    i nci so I I I do ar t . 102 da Const i t ui ção, a mat ér i a

    const i t uci onal que del es é obj et o f oi ampl ament e debat i da

    nas i nst ânci as i nf er i or es, o que pr eenche o r equi si t o do

    pr equest i onament o.

    Recebi dos nest a Cor t e ant es do marco t empor al de

    3 de mai o de 2007 ( AI - QO n° 664. 567/ RS, Rel . Mi n. Sepúl veda

    Per t ence) , os r ecur sos ext r aor di nár i os não se submet em ao

    r egi me da repercussão ger al .

    Assi m, ver i f i cados os pr essupost os de

    admi ssi bi l i dade recur sal , o que per mi t e o pl eno

    conheci ment o dos r ecur sos, cabe anal i sar , pr el i mi nar ment e,

    as quest ões r el aci onadas à l egi t i mação at i va do Mi ni st ér i o

    Públ i co par a pr oposi t ur a da ação ci vi l públ i ca, assi m como

    o cabi ment o ou a adequação dest e t i po de ação, t emas est es

    que f or am susci t ados nas cont r a- r azões da Uni ão ( f l . 1718) .

    O Mi ni st ér i o Públ i co Feder al aj ui zou ação ci vi l

    públ i ca baseada no f undament o da não- r ecepção, pel a

    Const i t ui ção de 1988 ( ar t . 5º, I X e XI I I e ar t . 220, caput 

    e § 1º) , do ar t . 4º, i nci so V, do Decret o- Lei n° 972, de

    1969, o qual exi ge o di pl oma de cur so super i or de

     j or nal i smo, r egi st r ado pel o Mi ni st ér i o da Educação, para o

    exer cí ci o da pr of i ssão de j or nal i st a. Ao f i nal , o

    Mi ni st ér i o Públ i co r equer eu que:

    1) sej a obr i gada a Uni ão a não mai s r egi st r ar ou

    f ornecer qual quer número de i nscr i ção no

    Mi ni st ér i o do Tr abal ho par a os di pl omados em

     j or nal i smo, i nf or mando aos i nt er essados a

    desnecessi dade do r egi st r o e i nscr i ção par a o

    exer cí ci o da pr of i ssão de j or nal i st a;

  • 8/15/2019 Voto Gilmar Mendes e

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    2) sej a obr i gada a Uni ão a não mai s executar

    f i scal i zação sobr e o exer cí ci o da pr of i ssão de

     j or nal i st a por prof i ssi onai s despr ovi dos de grau

    de cur so uni ver si t ár i o de j or nal i smo, bem como

    não mai s exar ar os aut os de i nf r ação

    corr espondent es;

    3) sej am decl ar ados nul os t odos os aut os de

    i nf r ação l avr ados por audi t or es- f i scai s do

    t r abal ho, em f ase de execução ou não, cont r a

    i ndi ví duos em r azão da pr át i ca do j or nal i smo sem

    o cor r espondent e di pl oma;

    4) sej am r emet i dos of í ci os aos Tr i bunai s de

     J ust i ça de t odos os Est ados da Federação, dando

    ci ênci a da ant eci pação de tut el a, de f or ma a que

    se apr eci e a per t i nênci a de t r ancament o de

    event uai s i nquér i t os pol i ci ai s ou ação penai s,

    que por l á t r ami t em, t endo por obj eto a apur ação

    de pr át i ca de del i t o de exer cí ci o i l egal dapr of i ssão de j or nal i sta.

    A l egi t i mi dade at i va do Mi ni st ér i o Públ i co par a a

    pr oposi t ur a da ação ci vi l públ i ca é evi dent e. O Supr emo

     Tr i bunal Federal possui sól i da j ur i sprudênci a sobre o

    cabi ment o da ação ci vi l públ i ca par a pr ot eção de i nt er esses

    di f usos e col et i vos e a r espect i va l egi t i mação do

    Mi ni st ér i o Públ i co par a ut i l i zá- l a, nos t er mos dos ar t s.

    127, caput  e 129, I I I , da Const i t ui ção Feder al ( RE n°

    163. 231- 3/ SP, Rel . Mi n. Maur í ci o Cor r êa, DJ 29. 6. 2001; RE

    n° 195. 056- 1/ PR, Rel . Mi n. Car l os Vel l oso, DJ 30. 5. 2003; RE

    n° 213. 015- 0/ DF, Rel . Mi n. Nér i da Si l vei r a, DJ 24. 5. 2002;

    RE n° 208. 790- 4/ SP, Rel . Mi n. I l mar Gal vão, DJ 15. 12. 2000;

    RE n° 262. 134- 0/ MA, Rel . Mi n. Cel so de Mel l o, DJ 2. 2. 2007) .

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    Val e r ecor dar , em pr i mei r o l ugar , o pr ecedent e do

    RE n° 163. 231- 3/ SP. Na ocasi ão, o Mi ni st r o Nér i da Si l vei r a

    dei xou enf at i zado que aquel e j ul gament o abr i a a pr i mei r a

    oport uni dade ao Supr emo Tr i bunal Feder al de anal i sar a

    f undo a quest ão da l egi t i mi dade do Mi ni st ér i o Públ i co par a

    a pr oposi t ur a da ação ci vi l públ i ca. Di zi a o Mi ni st r o Nér i :

    “(...) esta, sem dúvida, é a primeira ação dessa natureza

    submetida a julgamento no Plenário. A questão relativa à

    legitimidade do Ministério Público para a propositura da

    ação civil pública está recém chegando ao Supremo

    Tribunal” .

    A ement a desse j ul gado cont ém a sí nt ese do

    ent endi ment o adotado pel o Tr i bunal :

    “EMENTA: RECURSO EXTRAORDI NÁRI O. CONSTI TUCI ONAL.LEGI TI MI DADE DO MI NI STÉRI O PÚBLI CO PARA PROMOVERAÇÃO CI VI L PÚBLI CA EM DEFESA DOS I NTERESSESDI FUSOS, COLETI VOS E HOMOGÊNEOS. MENSALI DADESESCOLARES: CAPACI DADE POSTULATÓRI A DO PARQUET  PARA DI SCUTI - LAS EM J UÍ ZO.

    1. A Const i t ui ção Feder al conf er e r el evo aoMi ni st ér i o Públ i co como i nst i t ui ção per manent e,essenci al à f unção j ur i sdi ci onal do Est ado,i ncumbi ndo- l he a def esa da or dem j ur í di ca, dor egi me democr át i co e dos i nt er esses soci ai s ei ndi vi duai s i ndi sponí vei s ( CF, ar t . 127) .

    2. Por i sso mesmo det ém o Mi ni st ér i o Públ i cocapaci dade post ul at ór i a, não só par a a aber t ur ado i nquér i t o ci vi l , da ação penal públ i ca e da

    ação ci vi l públ i ca par a a pr ot eção do pat r i môni opúbl i co e soci al , do mei o ambi ent e,  mas também deoutros interesses difusos e coletivos

    3. Interesses difusos  são aquel es que abr angemnúmero i ndet ermi nado de pessoas uni das pel asmesmas ci r cunst ânci as de f at o e col et i vos aquel esper t encent es a gr upos, cat egor i as ou cl asses depessoas det er mi návei s, l i gadas ent r e si ou com apar t e cont r ár i a por uma r el ação j ur í di ca base.

    ( CF, ar t .1 2 9 , I e I I I ) .

  • 8/15/2019 Voto Gilmar Mendes e

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    3. 1. A i ndet er mi ni dade é a car act er í st i caf undament al dos i nt er esses di f usos e adetermi ni dade a daquel es i nt eresses que envol vemos col et i vos.

    4. Direitos ou interesses homogêneos  são os quet êm a mesma or i gem comum ( ar t . 81, I I I , da Lei n8. 078, de 11 de set embr o de 1990) , const i t ui ndo-se em subespéci e de di r ei t os col et i vos.

    4. 1.

    5. As chamadas mensal i dades escol ares, quandoabusi vas ou i l egai s, podem ser i mpugnadas por vi ade ação ci vi l públ i ca, a r equer i ment o do Ór gão doMi ni st ér i o Públ i co, poi s ai nda que sej ami nt eresses homogêneos de or i gem comum, sãosubespéci es de i nt er esses col et i vos, t ut el adospel o Est ado por esse mei o pr ocessual como di spõeo ar t i go 129, i nci so I I I , da Const i t ui çãoFeder al .

    Quer se af i r me i nt er esses col et i vos oupart i cul ar ment e i nt eresses homogêneos, strictosensu, ambos est ão ci ngi dos a uma mesma base j ur í di ca, sendo col et i vos, expl i ci t amentedi zendo, por que são r el at i vos a gr upos,cat egor i as ou cl asses de pessoas, que conquant o

    di gam r espei t o às pessoas i sol adament e, não secl assi f i cam como di r ei t os i ndi vi duai s par a o f i mde ser vedada a sua def esa em ação ci vi l públ i ca,por que sua concepção f i nal í st i ca dest i na- se àpr ot eção desses gr upos, categor i as ou cl asse depessoas.

    5. 1. Cui dando- se de tema l i gado à educação,ampar ada const i t uci onal ment e como dever do Est adoe obr i gação de todos ( CF, ar t . 205) , est á oMi ni st ér i o Públ i co i nvest i do da capaci dadepost ul at ór i a, pat ent e a l egi t i mi dade ad causam,quando o bem que se busca resguardar se i nser e naór bi t a dos i nt er esses col et i vos, em segment o deext r ema del i cadeza e de cont eúdo soci al t al que,aci ma de tudo, r ecomenda- se o abr i go est atal .Recur so ext r aor di nár i o conheci do e pr ovi do par a,af ast ada a al egada i l egi t i mi dade do Mi ni st ér i oPúbl i co, com vi st as à def esa dos i nt er esses deuma col et i vi dade, determi nar a r emessa dos aut osao Tr i bunal de or i gem, para pr ossegui r no j ul gamento da ação. ”

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    Como se vê, o Tr i bunal ent endeu que é f unção

    i nst i t uci onal do Mi ni st ér i o Públ i co pr omover o i nquér i t o

    ci vi l e a ação ci vi l públ i ca par a a pr ot eção não apenas do

    pat r i môni o públ i co e soci al e do mei o ambi ent e, mas t ambém

    de “outros interesses difusos e coletivos” , nos t ermos do

    ar t . 129, i nci so I I I , da Const i t ui ção da Repúbl i ca.

    É cer t o que, como bem r essal t ou o Mi ni st r o

    Sepúl veda Per t ence na ocasi ão desse j ul gament o, “não é sem

    tormentos a demarcação precisa do âmbito de legitimação do

    Ministério Público para a ação civil pública” . Segundo

    Per t ence, “é certo que o art. 129, III, outorga aoMinistério Público a legitimação para a ‘ação civil

     pública’, na defesa, não apenas dos clássicos interesses

    difusos nominados, mas também a de outros interesses

    difusos e coletivos. E não demarca, nem dá critério de

    demarcação de quais seriam os interesses coletivos

    confiados à tutela do Ministério Público, ainda que em

    concorrência com outras entidades”.

    A l egi sl ação i nf r aconst i t uci onal def i ne al guns

    desses i nt er esses e di r ei t os di f usos e col et i vos.

    A Lei n° 7. 347/ 1985 especi f i ca a or dem

    ur baní st i ca, a or dem econômi ca e a economi a popul ar , os

    di r ei t os do consumi dor , os bens e di r ei t os de val or

    ar t í s t i co, es tét i co, hi st ór i co, t ur í st i co e pai sagí s t i co

    e tc . ( a r t . 1 º ) .

    A Lei Compl ement ar n° 75/ 93 di spõe, ai nda, que a

    ação ci vi l públ i ca poder á ser aj ui zada pel o Mi ni st ér i o

    Públ i co par a a pr ot eção dos i nt er esses i ndi vi duai s

    i ndi sponí vei s, di f usos e col et i vos, r el at i vos às

    comuni dades i ndí genas, à f amí l i a, à cr i ança, ao

    adol escent e, ao i doso, às mi nor i as ét ni cas e ao consumi dor ,

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    assi m como outros interesses individuais indisponíveis,

    homogêneos, sociais, difusos e coletivos  ( ar t . 6º , VI I ) .

    A Lei n° 8. 265/ 93, por sua vez, di spõe que a ação

    ci vi l públ i ca poder á ser ut i l i zada par a a anul ação oudecl ar ação de nul i dade de at os l esi vos ao pat r i môni o

    públ i co ou à moral i dade admi ni st r at i va do Est ado ou de

    Muni cí pi o, de suas admi ni st r ações i ndi r et as ou f undaci onai s

    ou de ent i dades pr i vadas de que par t i ci pem, assi m como para

    a pr ot eção de outros interesses difusos, coletivos e

    individuais indisponíveis e homogêneos  ( ar t . 25, I V) .

    Como se pode const atar , o or denament o j ur í di co

    não especi f i ca um r ol exaust i vo de i nt er esses di f usos e

    col et i vos passí vei s de pr ot eção pel a vi a da ação ci vi l

    públ i ca. E nem poder i a f azê- l o, poi s os di r ei t os e

    i nt er esses di f usos e col et i vos são a expr essão j ur í di ca de

    val or es hi st or i cament e si t uados, em per manent e evol ução

    conf orme novos ansei os da soci edade.

    Nesse sent i do, o Mi ni st r o Cel so de Mel l o, no

    ci t ado j ul gament o do RE n° 163. 231/ SP, t eceu consi derações

    di gnas de nota:

    “Os i nt er esses met ai ndi vi duai s, ou de car át ert r ansi ndi vi dual , const i tuem val ores cuj at i t ul ar i dade t r anscende a esf era merament esubj et i va, val e di zer , a di mensão pur ament ei ndi vi dual das pessoas e das i nst i t ui ções. Sãodi r ei t os que per t encem a t odos, consi der ados emper spect i va gl obal . Del es, ni nguém, i sol adament e,é o t i t ul ar excl usi vo. Não se concent r am numt i t ul ar úni co, si mpl esment e por que concer nem at odos, e a cada um de nós, enquant o membr osi nt egr ant es da col et i vi dade.

    Na real ver dade, a compl exi dade desses múl t i pl osi nt er esses não per mi t e sej am di scr i mi nados ei dent i f i cados na l ei . Os i nt er esses di f usos ecol et i vos não compor t am r ol exaust i vo. A cadamoment o, e em f unção de novas exi gênci as i mpost aspel a soci edade moder na e pós- i ndust r i al ,

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    evi denci am- se novos val or es, pert encent es a t odoo gr upo soci al , cuj a t ut el a se r evel a necessár i ae i naf ast ável . Os i nt er esses t r ansi ndi vi duai s,por i sso mesmo, são i nomi nados, embor a haj aal guns, mas evi dent es, como os r el aci onados aos

    di r ei t os do consumi dor ou concernent es aopat r i môni o ambi ent al , hi st ór i co, ar t í st i co,estét i co e cul t ur al .

     

    ” ( ênf ases acr esci das)

    Dest ar t e, a Const i t ui ção, ao t r at ar do Mi ni st ér i o

    Públ i co como i nst i t ui ção permanent e e essenci al à f unção

     j ur i sdi ci onal do Est ado, i ncumbi u- l he do i ndi sponí vel dever

    de def ender a or dem j ur í di ca, o r egi me democr át i co e osinteresses sociais e individuais indisponíveis  ( ar t . 127,

    caput) . E não há dúvi da de que o di sposi t i vo const i t uci onal

    do ar t . 127, caput, r emet e par a os val ores f undament ai s

    pr ot egi dos pel a Const i t ui ção, especi al ment e os expr essos em

    di r ei t os e i nt er esses decor r ent es da di gni dade da pessoa

    humana, a sober ani a, a ci dadani a, dos val or es soci ai s do

    t r abal ho, da l i vr e i ni ci at i va e do pl ur al i smo pol í t i co,

    como f undament os da Repúbl i ca, t al como def i ni do no ar t .

    1º.

    Esse ent endi ment o f oi bem esposado pel o Mi ni st r o

    Nér i da Si l vei r a no menci onado j ul gament o do RE n°

    163. 231/ SP:

    “Par ece, desde l ogo, ext r ai r - se desse enunci ado –

    o Mi ni st r o se r ef er i a ao ar t . 127, caput  – , semnecessi dade de uma di scussão quant o à par t e f i naldo i nci so I I I , do ar t . 129, da Const i t ui ção, quea r espost a ao r ecur so soment e poder i a se f azernos t er mos em que ef et i vament e concl ui u o i l ust r eMi ni str o- Rel at or .

    De f ato, os bens aqui t r azi dos a exame, e ar espei t o dos quai s se di scut e sobr e al egi t i mi dade da ação do Mi ni st ér i o Públ i co, di zemi medi atament e com quest ões da mai s pr of unda

    essenci al i dade da or dem const i t uci onal . O ar t .1º, da Const i t ui ção, ao def i ni r a Repúbl i ca

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    Feder at i va do Br asi l , assent a que t em est eEst ado, como f undament os: a soberani a, aci dadani a, a di gni dade da pessoa humana, osval or es soci ai s do t r abal ho e da l i vr e i ni ci at i vae o pl ur al i smo pol í t i co.

    Os i nt eresses vi ncul ados à manut enção dessesval or es essenci ai s de nossa or dem const i t uci onal ,que se compl etam com a enumeração do ar t . 3º, hãode ser compr eendi dos na cl áusul a f i nal do ar t .127, da Const i t ui ção, a l egi t i mar a ação doMi ni st ér i o Públ i co em sua def esa. Sempr e que sedi sser com a def esa de i nt er esses vi ncul ados àci dadani a, à di gni dade da pessoa humana, não sóquant o à or dem j ur í di ca, o ar t . 127 aut or i za,desde l ogo, a ação do Mi ni st ér i o Públ i co.

    E pr ossegui u o Mi ni st r o Nér i da Si l vei r a:

    ( ênf ases acresci das)

    “Só por t ai s f undament os – est r i t ament econst i t uci onai s e que decor r em da nat ur eza doMi ni st ér i o Públ i co como i nst i t ui ção per manent e eda f unção essenci al que a or dem const i t uci onall he qui s at r i bui r – par ece- me que essal egi t i mi dade r essal t a desde l ogo, por que se t r at ar eal ment e, aqui , de o Mi ni st ér i o Públ i co ut i l i zar

    um i nst r ument o pr ocessual - , no caso, pr ocessual -const i t uci onal , def i ni do no ar t . 129, i t em I I I ,da Lei Mai or – par a def ender val ores dessanat ur eza.  No âmbito infraconstitucional, não me parece possível, realmente, opor dificuldade de maior expressão quanto à definição dessesinteresses coletivos  ef et i vament e post os àconsi der ação da Cor t e nest e i nst ant e. ” ( ênf asesacresci das)

    Assi m, em j ul gado post er i or ( RE n° 213. 015- 0/ DF,

    Rel . Mi n. Nér i da Si l vei r a, DJ 24. 5. 2002) , o Tr i bunal

    dei xou assent ado que “independentemente da própria lei

    fixar o conceito de interesse coletivo, é conceito de

    Direito Constitucional, na medida em que a Carta Política

    dele faz uso para especificar as espécies de interesses que

    compete ao Ministério Público defender   ( CF, ar t . 129,

    I I I ) ”. Nas pal avr as do Rel at or , Mi ni st r o Nér i da Si l vei r a,

    “distorcer o conceito de interesse coletivo ou dar-lhe

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    conceito distinto do que pretendeu a Constituição é violar

    a Carta Magna de forma direta” .

    Nessa per spect i va, o Tr i bunal j á def i ni u como

    cabí vel a ação ci vi l públ i ca para i mpugnar o aument oabusi vo ou i l egal das mensal i dades escol ar es ( RE 163. 231,

    DJ 29. 6. 2001; RE 185. 360, DJ 20. 2. 1998; RE 190. 976, DJ

    6. 2. 1998) , ent endi ment o que acabou sumul ado no segui nte

    ver bet e: “Súmula 643 – O Ministério Público tem

    legitimidade para promover ação civil pública cujo

    fundamento seja a ilegalidade de reajuste de mensalidades

    escolares” .

    O Tr i bunal t ambém ent ende que “o Ministério

    Público dispõe de legitimidade ativa ‘ad causam’ para

    ajuizar ação civil pública, quando promovida com o objetivo

    de impedir que se consume lesão ao patrimônio público

    resultante de contratação direta de serviço hospitalar

     privado, celebrada sem a necessária observância de

     procedimento licitatório, que traduz exigência de caráter

    ético-jurídico destinada a conferir efetividade, dentre

    outros, aos postulados constitucionais da impessoalidade,

    da publicidade, da moralidade administrativa e da igualdade

    entre os licitantes, ressalvadas as hipóteses legais de

    dispensa e/ou de inexigibilidade de licitação”   ( RE- AgR n°

    262. 134- 0/ MA, Rel . Mi n. Cel so de Mel l o, DJ 2. 2. 2007) .

    Em out r o caso, ent endeu- se que é cabí vel a ação

    ci vi l públ i ca, aj ui zada pel o Mi ni st ér i o Públ i co, que t em

    por obj et o a pr ot eção de i nt eressados, na condi ção de

    consumi dor es, na aqui si ção de casa pr ópr i a, dos quai s f oi

    cobr ado pr eço pel a di st r i bui ção de i nf or mat i vos ou

    i nscr i ção em pr ogr ama habi t aci onal ( RE n° 247. 134/ MS, Rel .

    Mi n. Car l os Vel l oso, DJ 9. 12. 2005) .

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    Não se pense, por out r o l ado, que essa l ei t ur a da

    Const i t ui ção, especi al ment e dos ar t i gos 127, caput  e 129,

    i nci so I I I , conf er i r i a ao Mi ni st ér i o Públ i co uma ampl í ssi ma

    compet ênci a par a a ut i l i zação da ação ci vi l públ i ca, a

    pont o de conver t ê- l o em subst i t ut o pr ocessual uni ver sal

    par a a def esa j udi ci al de t odo e qual quer i nt er esse soci al .

    No j ul gament o do ci t ado RE n° 195. 056/ PR, o

    Mi ni st r o Per t ence t eceu consi derações sobr e a quest ão que

    mer ecem r egi st r o:

    “( . . . ) Daí não se pode ext r ai r , cont udo,como parece pr etender o r ecor r ent e, que qual quer

    f ei xe de pr etensões i ndi vi duai s homogêneas, sej aqual f or o seu obj et o, possa ser t ema de t ut el a j ur i sdi ci onal col et i va por i ni ci at i va do Mi ni st ér i oPúbl i co.

    Não t enho dúvi das em ader i r , como os vot osque me pr ecederam, ao vi r t ual consensodout r i nár i o f or mado no sent i do de não bast ar , àl egi t i mação ao MP no par t i cul ar, a homogenei dadede quai squer i nt er esses i ndi vi duai s de um númer osi gni f i cat i vo de suj ei t os

     

    ( e. g. , Razuo Watanabe,

    Demanda Col et i vas e os Pr obl emas Emer gentes daPr áxi s For ense, em Sál vi o F. Tei xei r a ( coor d. ) ,As Gar ant i as dos Ci dadãos na J ust i ça, Sar ai va,1993, 185, 186; J . C. Bar bosa Mor ei r a, Os NovosRumos do Pr oc. Ci vi l . Br asi l ei r o em Temas Di r .Pr ocessual , 6• sér i e, 1997, p. 63, 73; Teor i A.Zavasaki , o Mi ni st ér i o Públ i co e a Def esa dosDi r ei t os I udi vi duai s Homogêneos, Rev. I nf .Legi sl at i va, Senado, 1993, v. 117/ 173; Rodol f o c.Mancuso, op. l oc. ci t . ; Lúci a V. Fi guei r edo,Ação Ci vi l Públ i ca ( . . . ) A Posi ção do Mi ni st ér i oPúbl i co, RTr Di r . Públ , 16/ 15, 2399; Hugo N.Mazzi l i , As at r i bui ç8es do Mi ni st ér i o Públ i co naLC f eder al 75, de 20. 5. 93, RT 696/ 445) .

    Assi m, nessa extensão sem l i mi t es - e não coma gener al i dade com que f ei t a pel o j ur i st ai nsi gne - qui çá t enha pr ocedênci a a cáust i caobser vação cr í t i ca de Mi guel Real e ( Da AçãoCi vi l Públ i ca em Questões de Di r . Públ i co,Sar ai va, 1997, p. 130) , de que a l egi t i mação doMP par a a pr ot eção de di r ei t os i ndi vi duai shomogêneos "al berga o risco de t r ansf or mar acomunidade em umconglomerado de incapazes".

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    ( . . . )

    Nesse campo dos di r ei t os i ndi vi duai shomogêneos, - di versament e do que sucede com osi nt er esses di f usos e os col et i vos stricto sensu  -marcadas, como são, essas duas cat egor i as pel as

    not as de i ndi vi si bi l i dade e de i ndet er mi naçãoabsol ut a ou r el at i va de seus t i t ul ar es ( Teor i ,zavascki , op. l oc. ci t . ) - a pr et endi dal egi t i mação i r r est r i t a do MP não encont rar i af undament o convi ncent e, l i t er al ou si st emát i co,na ordem j ur í di ca post a.

    A di f i cul dade est á em encont r ar o cr i t ér i o dedemarcação da ár ea - consensual ment e l i mi t ada -em que se há de r econhecer a l egi t i mação do

    Mi ni stér i o Públ i co par a a t ut el a col et i va de t ai sdi r ei t os i ndi vi duai s der i vados de or i gem comum.

    Opt a o Mi ni st r o Maur í ci o Cor r êa por umadi ret i va que t em por s i a vant agem daobj et i vi dade: a f ont e const i t uci onal daquest i onada l egi t i mação do MP par a a def esados i nt er esses i ndi vi duai s homogêneos,mal gr ado cont i da na al usão genér i ca do ar t .129, I I I , aos i nt er esses col et i vos em geral ,ser i a uma norma de ef i cáci a l i mi tada, dependente de

    especí f i ca previ são l egal .

    A mi nha vi são do pr obl ema - que par ece mai saf i nada à dout r i na domi nant e - se del a perde emobj et i vi dade, é menos r est r i t i va que a pr opost ado Mi ni st r o Corr êa e não del ega no l egi sl adorordi nár i o o poder de dar mai or ou menor efeti vi dade auma nor ma da Const i t ui ção.

    Como S. Exa. , não ponho em dúvi da que a l ei possaconferi r t al l egi t i mi dade ao Mi ni st ér i o Públ i co:af i nal , sua qual i f i cação par a a ação ci vi lpúbl i ca em def esa de determi nada modal i dade dedi r ei t os subj et i vos i ndi vi duai s ser á umahi pót ese a mai s de l egi t i mação ext r aor di nár i ae subst i t ui ção pr ocessual , cuj a cri ação por l eior di nár i a, guar dados os l i mi t es da razoabi l i dade,não encont r a óbi ces const i t uci onai s ( assi m,i nci dent ement e, o af i r mei , não f az mui t o, com oapoi o do Tr i bunal , no AOr 152, 15. 9. 99, I nf .STF 162, a pr opósi t o da i nt el i gênci a do ar t . 5°,XXI , da Const i t ui ção) .

    ( . . . )

  • 8/15/2019 Voto Gilmar Mendes e

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    Não l he reduzo, porém, a admi ssi bi l i dade a tai sprevi sões l egai s expl í ci t as: est ou em que, dapr ópr i a Const i t ui ção, é possí vel der i var out r ashi pót eses.

    ( . . . )

    E par a i sso, j á nest e pont o com o Mi ni st r oVel l oso e a doutri na mai s af ei ta ao tema, consi deroadequado o apel o ao art . 127 da Const i t ui ção que,del i neando em gr andes t r aços o seu papel j unt oà f unção j ur i sdi ci onal do Est ado, conf i a aoMi ni st ér i o Públ i co "a defesa da ordem jurídica,do regime democrático e dos interesses soci ai se individuais indisponíveis". 

    E, par a or i ent ar a demar cação, a par t i r do

    ar t . 129, I I I , da ár ea de i nt er essesi ndi vi duai s homogêneos em que admi t i da ai ni ci at i va do MP, o que r eput o de mai or r el evo,no cont ext o do ar t . 127, não é o i ncumbi r ài nst i t ui ção a def esa dos i nt er esses i ndi vi duai si ndi sponí vei s mas, si m, a dos i nteresses soci ai s.

    ( . . . )

    ( . . . )

    O probl ema é saber quando a def esa dapr et ensão de di r ei t os i ndi vi duai s homogêneos,

    post o que di sponí vei s, se i dent i f i ca com oi nt er esse soci al ou se i nt egra no que o pr ópr i oar t . 129, I I I , da Const i t ui ção denomi napat r i môni o soci al . Não é f áci l , no pont o, adet er mi nação do cr i t ér i o da l egi t i mação doMi ni st ér i o Públ i co.

    ( . . . ) é pr eci s o t er em cont a que oi nt er esse soci al não é um concei t oaxi ol ogi cament e neut r o, mas, ao cont r ár i o - e

    dado o per manent e conf l i t o de i nt er essespar ci ai s i ner ent e à vi da em soci edade - é i déi acar r egada de i deol ogi a e val or , por i sso,rel at i va e condi ci onada ao tempo e ao espaço em quese deva af i rmar .

    Donde, de i gual modo, ser de repelir que oreconhecimento da presença de interesse socialna tutela de determinada pretensão de uma parcela da coletividade possa ser confiada àlivre avaliação subjetiva - inevitavelmente

    carregada de valores pessoais - quer de agentedo Ministério Público que a veicule em juízo,

  • 8/15/2019 Voto Gilmar Mendes e

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    quer do órgão jurisdicional a que toqueverificar-lhe a legitimação para a açãocoletiva; para obviar esse risco dearbitrariedade, a solução há de fundar-se emcritérios dotados de um mínimo de objetividade.

    Penso, como vi st o, que a adst r i ção dal egi t i mi dade do MP aos casos de pr evi são l egalexpr essa, embor a r azoavel ment e obj et i va, ser i aum cr i t ér i o i nsuf i c i ent e par a a i dent i f i caçãodo i nt er esse soci al na def esa de di r ei t oscol et i vos: dado que der i va da Const i t ui ção al egi t i mação do MP par a a hi pót ese, não sepode r eput ar exaust i vo o cr i t ér i o que del egaao l egi s l ador o poder de demarcar a f unção de umórgãá const i t uci onal essenci al à j ur i sdi ção.

    Creio, assim, que - afora o caso de previsãolegal expressa - a afirmação do interesse social para o fim cogitado há de partir da identificaçãodo seu assentamento nos pilares da ordem social projetada pela Constituição e na suacorrespondência à persecução dos objetivosfundamentais da República, nela consagrados.” ( ênf ases acresci das)

     No caso, como retratado, a ação civil pública foi

     proposta pelo Ministério Público com o objetivo de proteger

    não apenas os interesses individuais homogêneos dos

     profissionais do jornalismo que atuam sem diploma, mas dos

    direitos fundamentais de toda a sociedade (interesses

    difusos) à plena liberdade de expressão e de informação. É

     patente, portanto, a legitimidade ativa do Ministério

    Público.

    Quant o ao cabi ment o da ação ci vi l públ i ca, a

     j ur i sprudênci a dest a Cor t e t ambém nos dá a r espost a.

    A ação ci vi l públ i ca não se conf unde, pel a

    pr ópr i a f or ma e nat ur eza, com pr ocessos cognomi nados de

    “pr ocessos subj et i vos”. A par t e at i va nesse pr ocesso não

    atua na def esa de i nt er esse pr ópr i o, mas pr ocur a def ender

    i nt er esse públ i co devi dament e car act er i zado. Af i gur a- sedi f í ci l , se não i mpossí vel , sust ent ar que a deci são que,

  • 8/15/2019 Voto Gilmar Mendes e

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    event ual ment e, af ast e a i nci dênci a de uma l ei consi derada

    i nconst i t uci onal , em ação ci vi l públ i ca, t enha ef ei t o

    l i mi t ado às par t es pr ocessual ment e l egi t i madas.

    A ação ci vi l públ i ca apr oxi ma- se mui t o depr ocesso sem par t es ou de pr ocesso obj et i vo, no qual a

    par t e aut or a at ua não na def esa de si t uações subj et i vas,

    agi ndo, f undament al ment e, com o escopo de garant i r a t ut el a

    do i nt er esse públ i co1

    Assi m, j á o ent endi ment o do Supr emo Tr i bunal

    Feder al no sent i do de que essa espéci e de cont r ol e genér i co

    da const i t uci onal i dade das l ei s const i t ui r i a at i vi dade

    pol í t i ca de det er mi nadas Cor t es r eal ça a i mpossi bi l i dade de

    ut i l i zação da ação ci vi l públ i ca com esse obj et i vo. Ai nda

    que se pudesse acr escent ar al gum out r o desi der at o adi ci onal

    a uma ação ci vi l públ i ca dest i nada a af ast ar a i nci dênci ade dada nor ma i nf r aconst i t uci onal , é cer t o que o seu

    obj et i vo pr ecí puo haver i a de ser a i mpugnação di r et a e

    f r ont al da l egi t i mi dade de at o nor mat i vo. Não se t r at ar i a

    de di scussão sobr e apl i cação de l ei a caso concr et o, por que

    de caso concr et o não se cui da. Pel o cont r ár i o, a pr ópr i a

    par t e aut or a ou r equer ent e l egi t i ma- se não em r azão da

    . Não f oi por out r a r azão que o

    l egi sl ador , ao di sci pl i nar a ef i cáci a da deci são pr of er i da

    na ação ci vi l , vi u- se compel i do a est abel ecer que “a

    sent ença ci vi l f ar á coi sa j ul gada erga omnes” . I ssosi gni f i ca que, se ut i l i zada com o pr opósi t o de pr oceder ao

    cont r ol e de const i t uci onal i dade, a deci são que, em ação

    ci vi l públ i ca, af ast ar a i nci dênci a de dada nor ma por

    event ual i ncompat i bi l i dade com a or dem const i t uci onal ,

    acabar á por t er ef i cáci a semel hant e à das ações di r et as de

    i nconsti t uci onal i dade, i sto é, ef i cáci a ger al e

    i r r est r i t a.

    1

      Haral d Koch, Prozessführung im öffentlichen Interesse,  Fr ankf ur t amMai n, 1983, p. 1 e s.

  • 8/15/2019 Voto Gilmar Mendes e

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    necessi dade de pr ot eção de i nt er esse especí f i co, mas

    exatament e de i nt er esse genér i co ampl í ssi mo, de i nt er esse

    públ i co. Ter - se- i a, poi s, uma deci são ( di r et a) sobr e a

    l egi t i mi dade da norma.

    É cert o que, ai nda que se desenvol vam esf or ços no

    sent i do de f or mul ar pr et ensão di ver sa, t oda vez que na ação

    ci vi l públ i ca f i car evi dent e que a medi da ou pr ovi dênci a

    que se pr et ende quest i onar é a pr ópr i a l ei ou at o

    normat i vo, r est ará i nequí voco que se t r ata mesmo é de

    i mpugnação di r et a de l ei . Nessas condi ções, para que se não

    chegue a um r esul t ado que subver t a t odo o si st ema decont r ol e de const i t uci onal i dade adot ado no Br asi l , t em- se

    de admi t i r a compl et a i ni donei dade da ação ci vi l públ i ca

    como i nst r ument o de cont r ol e de const i t uci onal i dade, sej a

    por que el a acabar i a por i nst aur ar um cont r ol e di r et o e

    abst r at o no pl ano da j ur i sdi ção de pr i mei r o gr au, sej a

    por que a deci são haver i a de t er , necessar i ament e, ef i cáci a

    t r anscendent e das par t es f or mai s.

    Nesse sent i do, af i gur a- se di gno de r ef er ênci a

    acór dão no qual o Supr emo Tr i bunal Federal acol heu

    r ecl amação que l he f oi submet i da pel o Pr ocur ador- Ger al da

    Repúbl i ca, determi nando o arqui vament o de ações aj ui zadas

    nas 2ª e 3ª Varas da Fazenda Públ i ca da Comarca de São

    Paul o, por ent ender caracter i zada a usurpação de

    compet ênci a da Cor t e, uma vez que a pr et ensão nel asvei cul ada não vi sava ao j ul gament o de uma rel ação j ur í di ca

    concr et a, mas ao da val i dade de l ei em t ese2

    Essa or i ent ação da Supr ema Cor t e r ef orçava,

    aparent ement e, a i déi a desenvol vi da de que event ual esf or ço

    di ssi mul at ór i o por par t e do r equer ent e da ação ci vi l

    públ i ca f i car i a ai nda mai s evi dent e, por quant o,

    .

    2  Rcl . 434, Rel . Franci sco Rezek, DJ   de 9- 12- 1994.

  • 8/15/2019 Voto Gilmar Mendes e

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    di ver sament e da si t uação al udi da no pr ecedent e ref er i do, o

    aut or r equer t ut el a genér i ca do i nt er esse públ i co, devendo,

    por i sso, a deci são pr of er i da t er ef i cáci a erga omnes.

    Assi m, event ual pr onúnci a de i nconst i t uci onal i dade da l ei

    l evada a ef ei t o pel o j uí zo monocrát i co t er i a f or ça i dênt i ca

    à da deci são pr of er i da pel o Supr emo Tr i bunal Feder al no

    cont r ol e di r et o de i nconst i t uci onal i dade. Todavi a, o

    Supremo Tr i bunal Federal j ul gou i mprocedent e a Recl amação

    n. 602- 6/ SP, de que f oi r el at or o Mi ni st r o I l mar Gal vão, em

    dat a de 3- 9- 1997, cuj o acórdão est á assi m ement ado:

    “Recl amação. Deci são que, em Ação Ci vi l Públ i ca,condenou i nst i t ui ção bancár i a a compl ement ar osr endi ment os de cadernet a de poupança de seuscor r ent i st as, com base em í ndi ce at é ent ão vi gent e,após af ast ar a apl i cação da norma que o havi ar eduzi do, por consi der á- l a i ncompat í vel com aConst i t ui ção. Al egada usurpação da competênci a doSupr emo Tr i bunal Feder al , pr evi st a no ar t . 102, I , a,da CF. I mpr ocedênci a da al egação, t endo em vi st at r at ar - se de ação aj ui zada, ent r e par t es cont r at ant es,na per secução de bem j ur í di co concret o, i ndi vi dual eper f ei t ament e def i ni do, de or dem pat r i moni al , obj et i vo

    que j amai s poder i a ser al cançado pel o Recl amado emsede de cont r ol e in abstracto  de at o normat i vo. Quadroem que não sobr a espaço par a f al ar em i nvasão, pel acor t e r ecl amada, da j ur i sdi ção concent r ada pr i vat i vado Supr emo Tri bunal Federal . I mpr ocedênci a daRecl amação”.

    No mesmo di a ( 3- 9- 1997) e no mesmo sent i do, o

     j ul gamento da Recl amação n. 600- 0/ SP, r el at ada pel o

    Mi ni str o Nér i da Si l vei r a. Essa orientação do Supremo

    Tribunal Federal permite, aparentemente, distinguir a açãocivil pública que tenha por objeto, propriamente, a

    declaração de inconstitucionalidade da lei ou do ato

    normativo de outra na qual a questão constitucional

    configura simples prejudicial da postulação principal.  É o

    que f oi af i r mado na Rcl . 2. 224, da r el at or i a de Sepúl veda

    Per t ence, na qual se enf at i zou que “ação ci vi l públ i ca em

    que a decl ar ação de i nconst i t uci onal i dade com ef ei t os erga

    omnes  não é post a como causa de pedi r , mas, si m, como o

  • 8/15/2019 Voto Gilmar Mendes e

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    pr ópr i o obj et o do pedi do, conf i gur ando hi pót ese r eservada

    à ação di r et a de i nconst i t uci onal i dade”3

    Col ocado novamente di ante desse t ema no

     j ul gamento da Rcl . 2. 460/ RJ , o Tr i bunal ar r ost ou a quest ão

    da exi st ênci a, ou não, de usurpação de sua competênci aconsti t uci onal ( CF, ar t . 102, I , a) , em vi r t ude da

    pendênci a do j ul gament o da ADI 2. 950/ RJ e o def er i ment o de

    l i mi nar es em di ver sas ações ci vi s públ i cas aj ui zadas

    per ant e j uí zes f eder ai s e est aduai s das i nst ânci as

    or di nár i as, sob o f undament o de i nconst i t uci onal i dade da

    mesma norma i mpugnada em sede di r et a

    . Não se pode negar

    que a abrangênci a que se emprest a — e que se há de

    empr est ar à deci são pr of er i da em ação ci vi l públ i ca —

    per mi t e que com uma si mpl es deci são de car át er pr ej udi ci al

    se r et i r e qual quer ef ei t o út i l da l ei , o que acaba por se

    const i t ui r , i ndi r et ament e, numa absorção de f unções que a

    Const i t ui ção qui s def er i r ao Supr emo Tr i bunal Feder al .

    4. Ent endeu- se que,

    ai nda que se pr eservassem os at os acaut el at ór i os adot ados

    pel a j ust i ça l ocal , ser i a r ecomendável det er mi nar a

    suspensão de todas as ações ci vi s até a deci são def i ni t i va

    em sede da ação di r et a. Ressal t ou- se, no pont o, que a

    suspensão das ações decor r i a não da sust ent ada usur pação da

    compet ênci a5, mas si m do obj et i vo de coi bi r event ual

    t r ânsi t o em j ul gado nas r ef er i das ações, com o conseqüent e

    esvazi ament o da deci são a ser pr of er i da nos aut os da ação

    di ret a6

     3  Rcl . 2. 224, Rel . Sepúl veda Per t ence, DJ   de 10- 2- 2006, p. 76.

    .

    4  Cf . Decreto n. 25. 723/ 99- RJ , que r egul ament ou a expl oração daat i vi dade de l ot er i as pel o Est ado do Ri o de J anei r o.

     

    5  Rcl . - MC 2. 460, Rel . Marco Aur él i o, deci são de 21- 10- 2003, DJ   de 28-10- 2003.6  No j ul gament o da Rcl . - MC 2. 460, de 10- 3- 2004, DJ   de 6-8- 2004, o Tr i bunal , por mai or i a, negou r ef erendo à deci são concess i va de l i mi nar edet er mi nou a suspensão, com ef i cáci a ex nunc, das ações ci vi s públ i cas

    em cur so. Rest ou mant i da a t ut el a ant eci pada nel as def er i da, t endo emvi st a a exi st ênci a de tr ami t ação de ação di r et a de i nconst i t uci onal i dadeperante o STF.

  • 8/15/2019 Voto Gilmar Mendes e

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    Essa deci são r evel a a necessi dade de aber t ur a de

    um diálogo  ou de uma interlocução  ent r e os model os di f uso e

    abst r at o, especi al ment e nos casos em que a deci são no

    model o di f uso, como é o caso da deci são de cont r ol e de

    const i t uci onal i dade em ação ci vi l públ i ca, acaba por ser

    dot ada de ef i cáci a ampl a ou ger al . As especi f i ci dades desse

    model o de cont r ol e, o seu car át er excepci onal , o r est r i t o

    def er i ment o dessa pr er r ogat i va no que se ref er e à af er i ção

    de const i t uci onal i dade de l ei ou at o nor mat i vo est adual ou

    f eder al em f ace da Const i t ui ção Feder al apenas ao Supr emo,

    a l egi t i mação r est r i t a para pr ovocação do Supr emo — soment e

    os órgãos e ent es r ef er i dos no ar t . 103 da Const i t ui ção

    est ão aut or i zados a i nst aur ar o pr ocesso de cont r ol e —, a

    di mensão pol í t i ca i negável dessa modal i dade, enf i m, t udo

    l eva a não se admi t i r o cont r ol e de l egi t i mi dade de l ei ou

    at o nor mat i vo f eder al ou est adual em f ace da Const i t ui ção,

    no âmbi t o da ação ci vi l públ i ca.

    No quadr o nor mat i vo at ual , poder - se- i a cogi t ar ,

    nos casos de cont r ol e de const i t uci onal i dade em ação ci vi l

    públ i ca, de suspensão do pr ocesso e r emessa da quest ão

    const i t uci onal ao Supr emo Tr i bunal Feder al , vi a ar güi ção de

    descumpri ment o de pr ecei t o f undament al , medi ant e pr ovocação

    do j ui z ou t r i bunal compet ent e para a causa. Si mpl es

    al t er ação da Lei n. 9. 882/ 99 e da Lei n. 7. 347/ 85 poder i a

    per mi t i r a mudança pr opost a, el i di ndo a possi bi l i dade de

    deci sões conf l i t ant es, no âmbi t o das i nst ânci as or di nár i as

    e do Supr emo Tr i bunal Feder al , com sér i os pr ej uí zos par a a

    coer ênci a do si st ema e par a a segur ança j ur í di ca.

     No caso, está claro que a não-recepção do

    Decreto-Lei n° 972/1969 pela Constituição de 1988 constitui

    apenas a causa de pedir da ação civil pública e não o seu

     pedido principal, o que está plenamente de acordo com a

    jurisprudência desta Corte, j á paci f i cada, como apr esent ado

  • 8/15/2019 Voto Gilmar Mendes e

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    aci ma, no sent i do de que é l egí t i ma a ut i l i zação da ação

    ci vi l públ i ca como i nst r ument o de f i scal i zação i nci dent al

    de const i t uci onal i dade, desde que a cont r ovér si a

    const i t uci onal não sej a post a como pedi do úni co e pr i nci pal

    da ação, mas, ant es, const i t ua apenas quest ão pr ej udi ci al

    i ndi spensável à sol ução do l i t í gi o ( RCL n° 1. 733/ SP, Rel .

    Mi n. Cel so de Mel l o, DJ 1º . 12. 2000; RCL n° 554/ MG, Rel .

    Mi n. Maur í ci o Cor r êa; RCL n° 611/ PE, Rel . Mi n. Sydney

    Sanches; RE n° 424. 993/ DF, Rel . Mi n. J oaqui m Bar bosa, DJ

    19. 10. 2007) .

    Passo ent ão à anál i se do mér i t o dos r ecur sos.

    II. Mérito

    A quest ão const i t uci onal susci t ada na ação ci vi l

    públ i ca de aut or i a do Mi ni st ér i o Públ i co Feder al e agor a

    t r azi da à anál i se dest a Cor t e ci nge- se em saber se o

    Decr et o- Lei n° 972, de 1969, especi al ment e o seu ar t . 4º,

    i nci so V, é compat í vel com a or dem const i t uci onal de 1988.

    Em sí nt ese, quest i ona- se a const i t uci onal i dade da exi gênci a

    de di pl oma de cur so super i or de j or nal i smo, r egi st r ado pel o

    Mi ni st ér i o da Educação, par a o exer cí ci o da pr of i ssão de

     j or nal i st a.

    Desde que f oi post a no j uí zo de pr i mei r a

    i nst ânci a ( 16ª Var a Cí vel Feder al de São Paul o) , essa

    quest ão t em si do di scut i da de acor do com duas per spect i vasde anál i se. A pr i mei r a enf at i za o aspect o r el aci onal -

    comparat i vo ent r e o Decreto- Lei n° 972/ 1969 e a

    Const i t ui ção de 1988, especi f i cament e em r el ação às

    l i ber dades de pr of i ssão, de expr essão e de i nf ormação

    pr ot egi das pel os ar t i gos 5º, I X e XI I I , e 220. A segunda

    quest i ona o r ef er i do decret o- l ei em f ace do ar t . 13

    ( l i berdade de expr essão) da Convenção Amer i cana de Di r ei t os

  • 8/15/2019 Voto Gilmar Mendes e

    38/91

    Humanos, denomi nado Pact o de San J osé da Cost a Ri ca, ao

    qual o Br asi l ader i u em 1992.

    Segui r ei essas duas vi as de anál i se, não dei xando

    de r essal t ar que a pr i mei r a cont i nua uma l i nha j ur i sprudenci al del i mi t ada nest a Cor t e no j ul gamento da

    Repr esent ação n° 930/ DF, Rel . p/ o acórdão Mi n. Rodr i gues

    Al ckmi n (5. 5. 1976) e a segunda r epr esent a ent endi ment o

    consol i dado no âmbi t o do si st ema i nt eramer i cano de di r ei t os

    humanos.

    Ant es, por ém, de i ni ci ar a exposi ção do

    r aci ocí ni o que l evar á às concl usões a que cheguei após

    mui t o r ef l et i r sobr e o t ema, quer o dei xar enf at i zada a

    i mport ânci a desse j ul gament o e o seu pr of undo i mpact o

    soci al . É conheci do o f at o de que mi l har es de j or nal i st as,

    al guns f i gur as bast ant e conheci das do públ i co em ger al ,

    est ão a atuar em di ver sos mei os de comuni cação sem possui r

    di pl oma de cur so super i or especí f i co de j or nal i smo. Como

    exempl o, ci t o apenas o caso de Al on Feuerwerker , at ual ment eEdi t or de Pol í t i ca Econômi ca do J or nal Cor r ei o Br azi l i ense

    e que t em no cur r í cul o atuação como Edi t or de Economi a,

    Opi ni ão e Espor t es, Repór t er Especi al e Secr et ár i o de

    Redação da Fol ha de São Paul o; Di r etor da Agênci a Fol ha da

     Tarde; Chef e do Depto. de Comuni cação da Pr ef ei t ura de

    Sant os; Edi t or - execut i vo do Br asi l Onl i ne ( Gr upo Abr i l ) ;

    Di r et or de Desenvol vi ment o e At endi ment o, Di r et or e Vi ce-Presi dent e Comer ci al do Uni ver so Onl i ne (UOL) ; Prof essor de

     J or nal i smo Onl i ne da Escol a de Comuni cação Soci al Cásper

    Lí ber o – Tí t ul o de Not ór i o Saber ; Assessor de I mpr ensa da

    Pref ei t a Mar t a Supl i cy; Coor denador de I mprensa da campanha

    el ei t or al de J osé Ser r a à Pr esi dênci a da Repúbl i ca; Chef e

    de Comuni cação na l i derança do Governo Lul a na Câmar a dos

    Deput ados.

  • 8/15/2019 Voto Gilmar Mendes e

    39/91

    Al on Feuerwerker f ormul ou pedi do de i ngr esso no

    f ei t o na qual i dade de amicus curiae, o que f oi por mi m

    i ndef er i do, t endo em vi st a a r ecent e deci são dest a Cor t e no

     j ul gamento da ADI - AgR 4. 071, Rel . Mi n. Menezes Di r ei t o

    ( j ul g. 22. 4. 2009) , em que f i cou assent ado que os pedi dos de

    at uação como amicus curiae  não poderão mai s ser anal i sados

    após a i ncl usão do pr ocesso na paut a de j ul gament os.

    O caso do j or nal i st a Al on Feuer wer ker f oi ci t ado

    na pet i ção i ni ci al da ação ci vi l públ i ca aj ui zada pel o

    Mi ni st ér i o Públ i co Feder al na pr i mei r a i nst ânci a, nos

    segui nt es t er mos:

    “À t í t ul o de exempl o, t r azemos o dr amát i co e not ór i ocaso de doi s prof i ssi onai s que se vi r am ameaçados det er sua l i ber dade pr i vada, excl usi vament e em r azão doexer cí ci o, sem di pl oma, do j or nal i smo. Em 1992, oSi ndi cat o dos J or nal i st as do Est ado de São Paul odescobr i u que Al on Feuerwerker e Ri cardo Anderáos,r espect i vament e di r et or da Agênci a Fol ha e edi t or -assi st ent e do cader no ‘ I l ust r ada’ do j or nal Fol ha deSão Paul o, não possuí am di pl oma de j or nal i st a our egi st r o no Mi ni st ér i o do Tr abal ho. I nst aur ou- se,ent ão, i nquér i t o pol i ci al em r azão do al egadoexer cí ci o i l egal da pr of i ssão. Remet i dos os aut os aoMi ni st ér i o Públ i co do Est ado de São Paul o, o Promot orde J ust i ça Ri car do Di as Leme, após anál i se dopr ocedi ment o, mani f est ou- se pel o arqui vament o doi nquér i t o, ent endendo que o Decreto- Lei n° 972 nãof oi r ecepci onado pel a Const i t ui ção de 1988. A deci sãof oi acol hi da pel o j uí zo, encer r ando- se o pr ocedi ment opol i ci al . Como se pode perceber, nada obst ant e of el i z desf echo dest e caso par t i cul ar , o r i sco deocor r ênci a de pr i vações de l i ber dade é const ant e,r evel ando a necessi dade de i medi ata i ntervenção doPoder