Upload
phungnga
View
214
Download
0
Embed Size (px)
Citation preview
A ATUAL REGIÃO SERRANA FLUMINENSE E SEUS ESPAÇOSi
-economias perdedoras, institucionalidades desarticuladas e realidades sociais perversas-ii
Resumo:Este artigo se propõe a examinar três aspectos: a região serrana como perdedora no
contexto do Estado Rio de Janeiro (ERJ) - aliás, como vem ocorrendo desde meados dos
anos 1990; a sua desarticulação política e político-institucional; e o fato dessa região se
mostrar socialmente perversa com as suas maiorias populacionais, o que, em parte, é
expressão do seu baixo dinamismo econômico e das apontadas desarticulações. Por fim,
seguem duas reflexões: a do desenvolvimento dessa região no contexto estadual e a do
lugar da massa de trabalhadores e dos destituídos em geral em seu próprio âmbito.
Abstract:This article aims to examine three aspects: the mountain region as a loser in the context of
the state Rio de Janeiro (RJ) - indeed, as it has since the mid-1990s; its political and political-
institutional disarticulation; and the fact that Rio de Janeiro mountain region show up socially
perverse with its majority population, which, in part, is an expression of its low economic
dynamism and pointed dislocations. Finally, here are two thoughts: the development of the
region in the context state and the place of the mass of workers and destitute in general in its
own sphere.
Foot-note: the word fluminense refers to natives, places and
institutions of the Rio de Janeiro State.
APRESENTAÇÃO
Este artigo, como indicado, tem como recorte geográfico a região serrana (RS) do estado do
Rio de Janeiro (ERJ) e como recorte cronológico o tempo presente iii; assim sendo, resta
assinalar a pergunta que orienta o escrito (o recorte lógico) iv. Com base nas experiências
vivenciais e leituras prévias dos autores no e sobre o lugar em tela há quatro démarches a
examinar, além das referências positivas que a ela são associadas e ilustradas pelo seu
clima ameno, sua vegetação exuberante, etc., a saber: o porquê de ser ela historicamente
perdedora no contexto estadual; o porquê de ser ela desarticulada em termos políticos e
político-institucionais; o porquê de ser ela socialmente perversa com suas maiorias
populacionais; e, por fim, o porquê de seu problemático desenvolvimento, sublinhando-se aí
o papel dessas mesmas maiorias populacionais e, em especial, o da classe trabalhadora.
Isto posto, afora esta Apresentação, o artigo está organizado em mais quatro seções: na
Seção I, examina-se o fato de a RS ser historicamente perdedora no contexto estadual,
graças ao relativo dinamismo econômico vigente em outras regiões fluminenses, como mais
uma vez vem ocorrendo desde meados dos anos 1990,; na Seção II, o que corrobora para o
analisado na primeira seção, examina-se a desarticulação política e político-institucional da
região em exame – apesar do “label”v região; c) na Seção III, mostra-se que a realidade
social serrana é socialmente perversa com as suas maiorias populacionais - o que, pelo
menos em parte, é uma das expressões do seu baixo dinamismo econômico e das
apontadas desarticulações; e d) na Última Seção, de Considerações Finais, são elaboradas
breves reflexões sobre dois temas chaves da questão regional em exame: a do seu
desenvolvimento vis a vis o âmbito estadual e a do lugar da massa de trabalhadores e dos
destituídos em geral em seus próprios domínios.
SEÇÃO I – ´LOCALIZANDO´ O ESPAÇO-OBJETOvi: traços gerais
É fato comum associar ao espaço em questão as cidades de Nova Friburgo, Teresópolis e
Petrópolis. Todavia, por suposto, outros municípios menos destacados poderiam ser aqui
também arrolados. Porém, pelo menos no momento, esse não é o caso. Por que? Porque
tal listagem depende da regionalização a ser adotada. Sendo assim, resolveu-se de início
escolher a fornecida pelo IBGE (Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). E
por duas razões: uma, pelo fato dessa instituição ser a mais importante produtora de dados
no/do país e, a outra, pelo que se explicará logo adiante. Então, agora sim, segue a
supramencionada listagem: Bom Jardim, Cantagalo, Carmo, Cordeiro, Duas Barras,
Macuco, Nova Friburgo, Petrópolis, São José do Vale do Rio Preto, São Sebastião do Alto,
Santa Maria Madalena, Sumidouro, Teresópolis e Trajano de Morais.
Como se pode verificar, dada essa listagem, o espaço-objeto abarcaria 14 (quatorze)
municípios. Vencida essa etapa de definição dos municípios com que trabalhar impõe-se um
novo desafio: seriam eles considerados em bloco ou seriam dispostos conforme as
microrregiões do IBGE? Neste caso, os autores resolveram seguir à segunda alternativa,
tendo como referência as anotadas experiências vivenciais e leituras prévias na e sobre a
realidade serrana dos autores. Os municípios anotados foram então organizados, por
Microrregiões, como segue: N. FRIBURGO (Bom Jardim, Duas Barras, Sumidouro e N.
Friburgo), SERRANA (N. Friburgo, Petrópolis, Teresópolis e S.J. do Vale do Rio Preto),
Santa Maria Madalena (S. Sebastião do Alto, Trajano de Morais e Santa Maria Madalena) e
CANTAGALO-CORDEIRO (Carmo, Macuco, Cantagalo e Cordeiro).
Assim sendo, poder-se-ia então levantar os argumentos alinhados pelo IBGE de modo a
explicar o porquê da sua escolha. Mas se entendeu ser isso desnecessário; explicando:
2
mais uma vez com base nas mencionadas experiências e leituras prévias, resolveu-se
redefinir essa regionalização (apoiada na anterior, a do mesmo IBGE). Como segue:
QUADRO I: NOVA REGIONALIZAÇAO DOS MUNICÍPIOS SERRANOSSUBREG. SUBREG. SUBREG. SUBREG. SUBREG.
NOVA FRIBURG
O
SANTA MARIA
MADALENA
CANTAGALO-CORDEIRO
PETRÓPOLIS
TERESÓPOLIS
Bom Jardim
São Sebastião
do AltoCarmo Petrópolis Teresópolis
Duas Barras
Trajano de Morais Macuco
São José do Vale do Rio
Preto-
SumidouroSanta Maria
MadalenaCantagalo -
Nova Friburgo - Cordeiro -
Fonte: IBGE/Censo 2010.
O Quadro I, com base nas listagens anteriores, traz consigo três mudanças: a criação de
duas novas subregiões (as de Petrópolis e Teresópolis), a eliminação da microrregião
serrana e a inscrição do município de S. José do Vale do Rio Preto na subregião de
Petrópolis. As explicações desses rearranjos são as seguintes: a relação mais proeminente
de Nova Friburgo ocorre com os municípios mencionados na primeira coluna do quadro
anterior pelo fato dele ser, como já indicado, uma espécie de ´capital regional´; a relação de
Nova Friburgo com os municípios de Teresópolis e, destacadamente, com o de Petrópolis é
quase inexistente; o município de São José do Vale do Rio Preto, antes fração territorial de
Petrópolis, tem nesse município, dada à sua fragilidade econômica, etc., sua ´capital
regional´; Teresópolis, pela sua geografia e vínculos econômicos, etc., guarda relações mais
estreitas com a Baixada Fluminense, via Guapimirim, que propriamente com seu entorno
regional serrano; e, por último, conquanto a Microrregião Serrana reúna os três municípios
mais conhecidos da chamada RS, é mais ou menos evidente que eles possuem nexos
irrisórios.
Para melhor visualização da região serrana redefinida, com seus municípios e subregiões,
procedidas às escolhas e definições efetuadas, na linha da aproximação do desvelamento
da região-objeto, vide o Quadro a seguir.
QUADRO II: POPULAÇÃO MUNICIPAL POR SUAS RESPECTIVAS SUBREGIÕES, 2010SUBREG.
NOVA FRIBURGO
SUBREG.SANTA MARIA
MADALENA
SUBREG.CANTAGALO-
CORDEIRO
SUBREG.PETRÓPOLIS
SUBREG.TERESÓPOLIS
MUNIC./POP. MUNIC./POP. MUNIC./POPP. MUNIC./POP. MUNIC./POP.
3
Bom Jardim/25.333
São Sebastião do Alto/8.895
Carmo/17.434
Petrópolis/295.917
Teresópolis/163.746
Duas Barras/10.930
Trajano de Morais/10.289
Macuco/5.269
São José do Vale do Rio
Preto/20.251
-
Sumidouro/14.900
Santa Maria Madalena/
10.321
Cantagalo/19.830
- -
Nova Friburgo/182.082
- Cordeiro/20.430
- -
POP. TOTAL =233.245
POP. TOTAL =29.505
POP. TOTAL =62.963
POP. TOTAL =
316.168
POP. TOTAL =163.746
FONTE: Censo IBGE, 2010.
Resulta do quadro anterior que em um total de 805.627 habitantes (a soma dos números
registrados em sua última linha), há subregiões mais adensadas, como é o caso da de
Petrópolis, secundada pela de Nova Friburgo e, passo seguinte, pela de Teresópolis, graças
aos seus ´municípios capitais´, como também subregiões relativamente esvaziadas em
termos populacionais, como avultadamente expresso na de Santa Maria Madalena, mas
também, em menor grau, na de Cordeiro-Cantagalo. Ademais, se de um lado pontificam os
´municípios capitais´, com destaque para o de Petrópolis, há os casos daqueles situados na
faixa dos 10 mil habitantes (Macuco, S. Sebastião do Alto, Duas Barras, Trajano de Morais e
Santa Maria Madalena). Partindo-se do princípio realista de que na sociedade do capital
para onde ele se dirige a população vai atrás, pode-se afirmar que esse espaço-objeto é
bastante desigual do ponto de vista (estrito) da geração de riqueza, uma vez recortada à
reflexão município a município e mesmo em termos subregionais. E esse fato, ainda que
ocioso, pode ser apreendido na consideração dos municípios mais populosos vis a vis os
menos...
Evidentemente outros aspectos poderiam aqui ser adicionados à localização da região
serrana como, por exemplo: sua importante proximidade com a região metropolitana
fluminense; sua ligação rodoviária quer com essa última região através da BR-040, quer
também por conta da mesma BR-040 com a de Belo Horizonte; etc. Enfim: entende-se que
o que já se anotou é suficiente para os propósitos desta seção – quando mais não fosse
porque, conquanto sob ângulos diversos e complementares, desse temário se continuará a
tratar no restante do artigo.
SEÇÃO II – REALIDADE ECONÔMICA PERDEDORA NO CONTEXTO ESTADUAL: uma primeira aproximação analítica
Inescapável desde logo, ainda que sucintamente, examinar a expressão realidade
econômica perdedora. Sabem os que militam no campo do planejamento urbano e regional
4
e os estudiosos das ciências territoriais que essa referência é aqui usada em contraposição
ao termo “regiões que ganham” de George Benko e Alain Lipietz (1992). Nesse trabalho, no
ambiente da crise do chamado fordismo (1970-80), os autores mostram que nem todos os
lugares dos países centrais estavam na mesma situação de desalento (de crise econômica
e com elevada taxas de desemprego). Antes pelo contrário...Foi assim, enfim, que foi aqui
apropriada a supramencionada referência.
Por conseguinte, para dizer perdedora a região serrana é preciso ter em conta que o estado
do Rio de Janeiro experimentou a partir de meados dos anos 1990 certa dinamização da
sua vida econômica – com especial destaque para alguns dos seus espaços, a saber: os
das regiõesvii Norte, Baixadas Litorâneas e Costa Verdeviii. A esse respeito os dados que
seguem são bem ilustrativos:
QUADRO III: VARIAÇÃO DO EMPREGO FORMAL EM REGIÕES DE GOVERNO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 1995-2008
REGIÕES DE GOVERNO TOTAL DA VARIAÇÃO DO EMPREGO FORMAL
Região Serrana 39,9%Norte 169,1%
Costa Verde 148,1%Baixadas Litorâneas 144,0%
Noroeste 68,0%Centro-Sul 56,5%
Médio Vale do Paraíba 37,7%Metropolitana 28,3%
Estado do Rio de Janeiro 38,1% Fonte: RAIS/MTE.
Deriva do Quadro III que três regiões apresentaram desempenho inferior ao da região de
governo serrana: o Médio Vale do Paraíba, a Metropolitana e o conjunto do estado ix. No
entanto, tal fato não surpreende; e pelas seguintes razões: a região metropolitana, no limite,
era então uma região saturada economicamente e, além disso, os investimentos verificados
em seus domínios eram marcadamente “capital intensive” (e não “labor intensive”); o Médio
Vale do Paraíba, em que pese o seu dinamismo, assentado no que se poderia grosso modo
denominar de Complexo Metal-Mecânico, mostrava-se largamente poupador de mão de
obra; e, por fim, a dinâmica do estado resultava da reduzida capacidade de geração de
postos de trabalho das suas regiões economicamente menos dinâmicas e dos investimentos
assentados em tecnologias que dispensam trabalhadores, tudo isso, é trivial, puxando sua
média para baixo. Por conseguinte, os 39,9% da região serrana comprovavam que no
quesito em tela seu desempenho ao nível estadual era mesmo preocupante quando
considerada outras regiões de governo no longo período de análise aqui recortado. Em
reforço ao que veio de ser exposto, veja-se o quadro que segue:
5
QUADRO IV: PIB A PREÇO DE MERCADO POR REGIÕES DE GOVERNO 2010
REGIÕES DE GOVERNO PIB A PREÇO DE MERCADOPOR REGIÕES DE GOVERNO (R$)
Região Serrana 15.583.078Metropolitana 215.183.465
Norte 45.646.937Médio Vale do Paraíba 29.368.835
Baixadas Litorâneas 21.336.446Costa Verde 11.743.068Centro-Sul 4.329.429Noroeste 3.853.536
Estado do Rio de Janeiro 407.122.794 Fonte: CEPERJ, 2010.
Neste caso, o da comparação dos Produtos Internos Brutos (a preços de mercado),
excluindo-se a região metropolitana com seus 19 (dezenove) municípios, dado seu inegável
peso econômico, poder-se-ia dizer que a situação da região serrana (RS) não seria das
piores; tanto que ela, no “ranking” em exame, superaria a região Noroeste, e mesmo a do
Centro-Sul e a da Costa Verde. Ora, superar a região Noroeste não surpreende na medida
em que ela é histórica e longevamente fragilíssima em termos econômicos. Tampouco
surpreende que a RS supere a produção de riqueza da região Centro-Sul, posto que ela, no
que trata da produção de riqueza social, também histórica e longevamente, aproxima-se em
termos de desempenho da região Noroeste. Quanto à Costa Verde, superá-la igualmente
não surpreende, posto que embora ali estejam ocorrendo importantes investimentos - como
indicado -, em termos econômicos essa região se resume, no limite, ao município de Angra
dos Reis.
Logo, mais uma vez excluindo a região metropolitana fluminense, é razoável afirmar que a
região serrana não soube ou não pode acompanhar o dinamismo econômico vigente no
estado nas últimas décadas. Tanto que ficou atrás até mesmo de regiões outrora débeis,
como o eram a Baixada Litorânea e a Norte. Mais: também continuou atrás do Médio Vale
do Paraíba, com seu passado industrial atualizado a partir de meados dos anos 1990,
dados, dentre outros, os investimentos automobilísticos que ali foram realizados. E, por fim,
mesmo tendo superado à região da Costa Verde, parece razoável não valorizar esse
desempenho pela razão já aludida.
O descompasso econômico entre a região serrana no âmbito do estado, mormente com
parcela não desprezível dele, fica mais flagrante quando se considera a Receita Corrente
Líquida “Per-Capita”. A esse respeito, vide o quadro seguinte:
6
QUADRO V: RECEITA CORRENTE LÍQUIDA PER CAPITA POR REGIÕES DE GOVERNO 2010
REGIÕES DE GOVERNO RECEITA CORRENTE LÍQUIDA PER CAPITA (R$)
Região Serrana (RS) 1.573,12Norte 3.989,85
Costa Verde 3.506,81Baixadas Litorâneas 2.338,77
Médio Vale do Paraíba 1.767,42Noroeste 1.684,21
Centro-Sul 1.638,20Metropolitana (RM) 1.369,21
Fonte: CEPERJ, 2010.
Os valores anteriores são acachapantes. Afinal, a RS fica situada apenas acima da RM, e
por uma simples razão: tal região possui valores baixos pelo evidente gigantismo da sua
população – e com baixíssimo poder de compra.
Certamente outros dados poderiam ser aqui argüidos de modo a sustentar a tese em
questão, a de ser ela, a RS, perdedora no contexto estadual. Mas isso parece
desnecessário. Até porque não é de hoje que ela desse modo se apresenta. Vale assim
relembrar que quando da passagem do café pelo seu espaço, na segunda metade do século
XIX, tal produto nunca se mostrou um “tradeable” e nem, tampouco, soube realizar, no
limite, qualquer “take off” econômico quando da industrialização do século XX. Ou seja, o
histórico dessa região como economicamente perdedora é antigo.
Concluindo: a região em questão nunca se mostrou capaz de fazer frente às transformações
econômicas dos últimos e aproximados 150 anos. No entanto, a novidade das duas últimas
décadas é que com o relativo soerguimento da economia fluminense até mesmo regiões
antes frágeis lograram acompanhar ou mesmo contribuir para essa nova dinamicidade - mas
esse não foi o caso da região serrana. É verdade que essa dinamicidade em parte assim se
deu por desígnios da natureza, como acontece com a cadeia de petróleo e gás. Porém,
nada disso deveria servir de desculpa para o ´atraso´ que se foi ao longo do tempo
acumulando, inclusive o dessa última conjuntura. Nesses termos, como toda e qualquer
região economicamente fragilizada, resulta que ela deveria ser objeto de ações públicas
urgentes – todavia, infelizmente, isso está longe de acontecer. Mas não apenas: certamente
há aspectos relativos à sua história e às suas forças sociais, ambos carentes de estudos de
modo a desvelar os porquês mais profundos do fato dessa região ser secularmente
perdedora em termos econômicos...
7
SEÇÃO III – REALIDADE POLÍTICA E POLÍTICO-INSTITUCIONAL DESARTICULADA: uma segunda aproximação analítica
É razoável afirmar que os lugares possuem representatividade política em função de três
critérios isolados ou combinados, a saber: importância econômica, existência de político(s)
que fale(m) por eles e contingente populacional traduzível em voto.
No que concerne ao primeiro critério, os apontamentos efetuados na Seção II indicam que a
região serrana é frágil para daí retirar uma base que a catapulte no cenário estadual e,
menos ainda, no nacional (e.g., ao nível das lutas federativas). Poder-se-ia pensar, é trivial,
em municípios isolados capazes de ´falar´, senão em nome da região, pelo menos em seus
próprios nomes em vista de seus ´pesos´ econômicos. Logo, cabe a pergunta: existe na
região algum município (ou existem municípios) com essa força? Pela sua importância na
região, preliminarmente, o único que poderia desempenhar esse papel seria o de Petrópolis
- esse temário será retomado adiante.
No que concerne ao segundo critério, o da voz política que fale pelo município e/ou região,
ela é praticamente inexistente. É fato que o estado do Rio de Janeiro, como todos os
estados da federação, possui três senadores (atualmente, Lindberg Farias, Francisco
Dornelles e Marcelo Crivella) e que eles detêm boa expressão política no cenário nacional.
No entanto, é razoavelmente consensual que nenhum deles tem a representatividade
necessária junto aos governos estadual e federal para fazer frente às necessidades
regionais, seja da serrana ou de qualquer outra do estado – isso sem contar que seus
domicílios eleitorais e suas bases de apoio/voto estão concentrados no município do Rio de
Janeiro e em seu entorno metropolitano. Quanto aos deputados federais, esse conjunto de
14 (quatorze) municípios e 805.627 habitantes identifica, formalmente, somente dois
deputados federais - Hugo Leal e Glauber Braga – como ´seus´. O primeiro é em parte
vinculado ao município de Petrópolis, embora com votos distribuídos na região (embora não
apenas), ao passo que o segundo é um claro filho de Nova Friburgo e com votos na área de
influência desta mesma subregião. Em resumo: há evidentes dificuldades neste quesito no
que tange à atração de recursos para o espaço-objeto, bem como em termos de suas
capacidades políticas de efetivamente contribuir para a definição de algum projeto regional
de desenvolvimento.
No que concerne ao terceiro critério, o da existência de contingente populacional traduzível
em voto, ele tampouco existe. Veja-se em seguida o quadro que segue:
QUADRO VI: DISTRIBUIÇÃO POPULACIONAL PELAS REGIÕES DE GOVERNO 2010REGIÕES DE GOVERNO POPULAÇÃO
Serrana 805.627Metropolitana 11.835.708
Médio Vale do Paraíba 855.193Norte 849.515
8
Baixadas Litorâneas 810.666Noroeste 317.493
Centro-Sul 272.227Costa Verde 243.500
TOTAL 15.989.929 Fonte: Informações Socioeconômicas do Estado do Rio de Janeiro/SEBRAE-RJ.
Os dados anteriores confirmam o óbvio: a avultada participação da região metropolitana em
termos populacionais no conjunto do estado, tanto que ela abarca 74% desse total; a
participação diminuta das regiões Centro-Sul e Costa Verde no total em tela; e a
participação relativamente equilibrada das demais (Serrana, Baixadas Litorâneas, Médio
Vale do Paraíba e Norte). Daí resulta que com a exceção da RM as demais possuem
populações relativamente limitadas para efeito da contagem de voto; o que equivale a dizer
que se desse mal não padece apenas a RS, evidentemente, embora não sozinha, à
fragilidade econômica dessa última adiciona-se outra, a da dificuldade em eleger número
expressivo de parlamentares, sejam eles estaduais e, principalmente, federais. A esse
respeito, vide o Quadro VII:
QUADRO VII: PARTICIPAÇÃO DO ELEITORADO PELAS REGIÕES DE GOVERNO 2010REGIÕES DE GOVERNO PARTICIPAÇÃO DO ELEITORADO
NO TOTAL DO ESTADO (%)Serrana 5,5
Metropolitana 72,7Baixadas Litorâneas 5,6
Médio Vale do Paraíba 5,6Noroeste 2,1
Centro-Sul 1,9Costa Verde 1,4
Fonte: Municípios em Dados/Secretaria de Planejamento do Governo do Estado do Rio de Janeiro.
Entretanto, não é apenas (sic) sua população relativamente limitada que dificulta o
soerguimento da economia da RS, dadas às suas dificuldades estruturais (como examinado
antes): há também o fato dessa região ser historicamente desarticulada em termos político-
institucionais. Ou seja: os termos região ou de governo serranos, como algumas vezes aqui
já se escreveu, foram empregados - e também o são por outros autores e diversas
instituições - mais por força do hábito que por efetivo rigor conceitual e, claro, por conta das
bases de dados existentes seguirem esses recortes. De outra forma: essa ´região´ é um
mosaico desarticulado e, assim sendo, quase uma ficção (o que, para ser justo, não é
exclusividade da RS no âmbito estadual fluminense...).
Possivelmente a evidência mais marcante do que veio de ser anotado diga respeito aos
seus três principais municípios (Petrópolis, Teresópolis e N. Friburgo) que, ao fim e ao cabo,
são estranhos uns aos outros. Petrópolis, por exemplo, interage com centralidade apenas
em relação a S.J do Vale do Rio Preto; por outro lado, embora ele seja relativamente auto-
9
suficiente, em especial no que trata dos chamados serviços, também interage, até de
maneira expressiva, com o município do Rio de Janeiro – mas esse, como se sabe, não
pertence legalmente à sua região. Além desses dois municípios, Petrópolis também se
relaciona com Areal e Três Rios, municípios não pertencentes à sua subregião, e até
mesmo com Juiz de Fora, do estado de Minas Gerais. É dizer: sendo essas suas interações
principais, resulta evidente seu ´afastamento´ regional. O município de Teresópolis, por sua
vez, parece mais próximo da capital do estado, via Guapimirim (e, depois, Duque de
Caxias), que de seu entorno regional serrano. N. Friburgo é o caso mais ´dissonante´ no que
concerne ao referido entorno. Como já se anotou, ele desempenha o papel de ´capital
regional´ para os municípios de Bom Jardim, Duas Barras e Sumidouro; e, ´esticando um
pouco a corda´, também para os municípios da sub-região de Sta. Maria Madalena. Porém,
nesse último caso, vale reter que ela, melhor, seus municípios, vem crescentemente se
aproximando do município de Macaé, pertencente à Microrregião Norte, por conta de seu
crescimento econômico recente e do fator proximidade geográfica. E por aí vai...qual seja,
essa região, a serrana, é praticamente uma ficção se a análise avança para além do campo
da chamada geografia física e do político-administrativo. O pouco de história em comum,
especialmente à época da passagem do café pelos seus domínios no século XIX e parcela
da entrada do XX, em definitivo não sedimentou qualquer identidade que os levasse a
alguma práxis de sonhos/projetos compartilhados. Talvez um dos exemplos mais dramáticos
do que veio de ser exarado seja a da extrema raridade de foros de discussão, incluindo aí
suas mais evidentes comunalidades (face o exposto até este momento da análise): a de ser
de longa data uma região econômica, política e político-institucionalmente perdedora.
Em resumo: nem importância política nem capacidade ou vontade político-institucional de
fazer frente aos seus óbices estruturais como é flagrante no que trata da geração de postos
de trabalho, etc., inclusive quando a economia de algumas das regiões do estado, até
mesmo parcela das antes degradadas, logram apropriar-se do dinamismo econômico em
curso – como acontece desde meados dos anos 1990 (Natal, 2005).
SEÇÃO IV – REALIDADE SOCIAL DRAMÁTICA: uma terceira aproximação analítica
Nesta terceira aproximação analítica à RS fluminense foram selecionados alguns aspectos
de sorte a examinar sua realidade social; eles foram organizados em quatro grupos: os
relativos à relação entre Cor e Raça e apropriação da riqueza gerada, à escolaridade, ao
acesso aos chamados serviços de consumo coletivos e à saúde.
No que concerne à relação entre a dimensão Cor e Raça vis a vis à apropriação da riqueza
social, vide os Quadros e análises seguintes:
10
QUADRO VIII: POPULAÇÃO RESIDENTE NAS SUBREGIÕES, POR COR E RAÇAx 2010SUBREG.
CORE RAÇA
SUBREG.1
(Nova Friburgo)
SUBREG.2
(Petrópolis)
SUBREG.3
(Teresópolis)
SUBREG.4
(Cantagalo-Cordeiro)
SUBREG.5
(Santa Maria
Madalena)
TOTAL
Branca 164.726 201.251 83.120 32.660 14.829 496.586Preta 21.262 34.264 14.120 12.535 4.822 87.003Parda 45.334 79.273 43.964 17.364 9.647 195.582
Amarela 1.743 1.145 701 378 181 4.183TOTAL 233.065 315.933 141.905 62.937 29.479 783.319
Fonte: IBGE, Censo 2010.
Esses dados atestam a face prevalentemente branca da região serrana, como segue (pelas
subregiões anteriores): Nova Friburgo, 70,7%; Petrópolis, 63,7%; Teresópolis, 58,6%;
Cantagalo-Cordeiro, 51,9%; e Santa Maria Madalena, 50,3%. Como o item Cor e Raça é
registrado pelo IBGE através da autodeclaração do entrevistado e que se mostra comum
parcela de pardos dizer-se branca, isso tende a superestimar o verdadeiro total de brancos
e a subestimar o de pardos. Não obstante, resulta claro o que veio de ser assinalado; qual
seja: que a população serrana em termos das Cores e Raças se aproxima mais
percentualmente do sul do país que propriamente da região sudeste da qual faz parte.
Por outro lado, conforme os dados que seguem, ratifica-se no espaço-objeto o que é
sistematicamente presente na sociedade brasileira, a saber: a marcada discriminação da
população preta e parda vis a vis à branca. A esse respeito, vide o quadro IX que segue:
QUADRO IX: VALOR SOMADO DO RENDIMENTO MÉDIO MENSAL DAS PESSOAS DE 10 ANOS OU MAIS DE IDADE COM RENDIMENTOS (EM REAIS) DAS SUBREGIÕES, POR COR E RAÇA 2010SUBREG.
CORE RAÇA
SUBREG.1
(Nova Friburgo)
SUBREG.2
(Petrópolis)
SUBREG.3
(Teresópolis)
SUBREG.4
(Cantagalo-Cordeiro)
SUBREG.5
(Santa Maria
Madalena)
TOTAL
Branca 3.991,06 2.327,25 1.452,51 4.643,68 2.853,14 15.267,64Preta 2.694,13 1.319,14 736,95 2.493,93 1.649,97 8.849,12Parda 2.853,37 1.455,38 825,37 2.928,75 1.901,86 9.964,73
Amarela 3.178,09 3.120,06 1.343,00 3.185,95 1.709,93 12.537,03TOTAL 12.716,65 8.221,83 4.357,83 13.252,31 8.114,90 46.618,52
Fonte: IBGE, Censo 2010.
Este quadro revela que os brancos, na média, auferem cerca de 30% do total percebido pelo
conjunto da população, segundo as Cores e Raças antes alinhadas, percentual esse que
certamente seria ainda maior caso fossem desconsiderados os Amarelos que, em geral, se
11
inscrevem de maneira muito particular nas lutas travadas no país no que trata da
apropriação da riqueza nele gerada...
No que concerne à educação dois foram os indicadores considerados; a saber: pessoas de
cinco anos ou mais de idade alfabetizadas e taxa de alfabetização das pessoas de cinco
anos ou mais de idade (percentual); e pessoas de vinte e cinco anos ou mais de idade por
nível de instrução. Para esse fim, veja-se o quadro que segue:
QUADRO X: INDICADORES EDUCACIONAIS SELECIONADOS, POR SUBREGIÕES 2010
MUNICÍPIOS POR
SUBREG.*
ALFABETIZAÇÃO – 5 ANOS OU
MAIS
ALFABETIZAÇÃO – 25 ANOS OU MAIS
XXXXXXXX PES-SOAS
TAXA (%)
S/INSTR. E FUNDAM.INCOM-PLETO
FUND.COMPL.
E MÉDIOINCOM-PLETO
MEDIO.COMPL. E SUPE-
RIOR.INCOMPL
.
SUPE-RIOR.
COMPL.
Nova Friburgo 161.972 94,31 57.332 20.245 26.804 13.943Bom Jardim 21.264 89,46 10.608 1.956 2.203 1.057Duas Barras 9.036 88,64 4.368 692 1.154 338Sumidouro 11.763 84,50 7.203 739 742 280
Petrópolis** 266.036 95,41 88.778 31.992 44.712 22.792S.J. do Vale do
Rio Preto17.052 90,06 8.374 1.423 1.678 583
Teresópolis 142.581 92,73 51.430 15.597 21.216 12.394S. Maria
Madalena8.460 87,44 4.071 825 1.232 279
S.S. do Alto 7.159 85,96 3.833 568 1.080 170Trajano de
Moraes8.222 85,40 4.374 759 1.076 219
Cantagalo 16.758 90,46 6.755 1.671 2.982 872Cordeiro 17.944 93,47 5.838 2.042 3.628 1.253
Carmo 14.650 89,81 5.948 1.619 2.620 723Macuco 4.449 91,51 1.765 302 937 194
Fonte: IBGE, Censo 2010. Obs.: * os municípios em negrito são os que emprestam seus nomes às microrregiões; ** no caso desse município, aparecem números referidos a Não Determinado, perfazendo um total de 338 pessoas; idem para S.J. do Vale do Rio Preto, com 11 pessoas; idem para Teresópolis, com 141 pessoas; idem para Cantagalo, com 42 pessoas; idem para Cordeiro, com 23 pessoas; para Carmo, com 18 pessoas; e idem para Macuco, com 3 pessoas.
Na segunda coluna, referida à alfabetização das pessoas de 5 anos ou mais, observa-se
que metade dos municípios da região em exame alcança percentual superior a 90%, sendo
que desses, com as exceções de São José do Vale do Rio Preto e Macuco, cinco
emprestam seus nomes para as subregiões nas quais estão inscritos. Por outro lado, dos
sete municípios com percentuais inferiores a 90%, três deles registram taxas no entorno de
85% - Sumidouro, S.S. do Alto e Trajano de Morais -, dois deles da subregião de Santa
Maria Madalena, a mais problemática em termos de dinamismo econômico na sua região.
12
Mas, no geral, até se poderia dizer que pelo menos nesse quesito a situação serrana é boa,
porém, veja-se o que segue.
Na terceira coluna, referida às pessoas com 25 anos ou mais em termos de instrução, vale a
pena relê-la em termos percentuais. Vide Quadro XI:
QUADRO XI: PESSOAS COM 25 ANOS OU MAIS, POR NÍVEL DE ESCOLARIDADE*, POR SUBREGIÕES (em termos percentuais)
MUNICÍPIOS POR
SUBREG.*
S/INSTR. E FUNDAM.INCOMPL.
FUND.COMPL. E
MÉDIOINCOMPL.
MEDIO.COMPL. E
SUPERIOR.INCOMPL.
SUPERIOR.COMPL.
Nova Friburgo 35 12 16 09Bom Jardim 50 09 10 05Duas Barras 48 08 13 04Sumidouro 61 06 06 02
Petrópolis** 33 12 17 09S.J. do Vale do
Rio Preto49 08 10 03
Teresópolis 36 11 15 09S. Maria
Madalena48 10 15 03
S.S. do Alto 54 08 15 02Trajano de
Moraes53 09 13 03
Cantagalo 40 10 18 05Cordeiro 33 11 20 07
Carmo 41 11 18 05Macuco 40 07 21 04
Fonte: IBGE, Censo 2010. Obs. Este quadro, por suposto, foi elaborado a partir do quadro anterior. Obs, * os percentuais acima foram calculados em relação à população total conforme a coluna primeira, razão pela qual as somas dos percentuais, por linha, não alcançam os 100%.
Resulta daí que as taxas de alfabetização relativamente altas do Quadro X mascaram a
realidade social da região na medida em que com base no Quadro anterior se constata que,
na média, aproximadamente 45% da população com vinte e cinco anos ou mais não
possuem qualquer grau de instrução ou somente possuem o ensino fundamental
incompletoxi. Ou seja: possuem menos que oito anos de escolaridade. Caso somados os
percentuais constantes da terceira coluna deste Quadro XI, que considera o ensino
fundamental completo e o médio incompleto, verifica-se que o percentual precedente sobe
para quase 55% (45% + 9,43%). De outra forma: pouco mais da metade da população
serrana possui no máximo 11 anos de escolaridade, sendo que desses, como anotado, mais
ou menos 45%, quando muito, alcançou oito anos de presença nos bancos escolares. Por
outro lado, no que concerne ao superior completo, com as exceções de Nova Friburgo,
Petrópolis, Teresópolis, que alcançam o percentual de 9%, e de Cordeiro, com seus 7%, os
demais possuem no máximo 5% da sua população com essa escolaridade. Mas para não
pairar qualquer dúvida, em prol de uma leitura otimista, vale lembrar que anos de
13
escolaridade, especialmente nas primeiras séries, não equivale sempre a efetivo
conhecimento consoante a elas.
Assim sendo, o que veio de ser analisado revela de “per se” mais um constrangimento ao
desenvolvimento em geral da região e, em particular, da qualificação da sua economia
relativamente à gestão propriamente dita e à realização de operações exigentes de maior
grau de escolaridade.
No que concerne aos chamados serviços de consumo coletivos por domicílios, os
indicadores utilizados são os que seguem: existência de energia elétrica, tipo de
esgotamento sanitário, forma de abastecimento de água e destino do lixo. A esse respeito,
vide o Quadro XII.
QUADRO XII: INDICADORES DE ACESSO AOS SERVIÇOS DE CONSUMO COLETIVO SELECIONADOS, POR DOMICÍLIOS E SUBREGIÕES, 2010MUNICÍPIOS
POR SUBREG.*
EXISTÊNCIA DE ENERGIA
ELÉTRICA
TIPO DE ESGOTAMENTO
SANITÁRIO
FORMA DE ABASTECIM.
DE ÁGUA
DESTINO DO LIXO
XXXXXXXX TI-NHAM
NÃO TINH.
REDE GERA
L**
OUTRAS
FORMAS***
REDE GERA
L
OUTRAS
FORMAS
****
COLET.
SERV.DE
LIMP.
OU-TRAS*****
Nova Friburgo
63.440 90 42.140 16.178 47.994 15.536 53.956 9.574
Bom Jardim 8.448 15 3.820 1.711 4.918 3.545 7.158 1.305Duas Barras 3.536 15 854 1.041 1.920 1.631 952 2.599Sumidouro 5.050 23 953 1.724 1.471 3.602 2.784 2.289
Petrópolis** 96.208 111 69.204 27.115 55.183 41.136 47.343 48.976S.J. do Vale do Rio Preto
6.495 6 1.299 5.202 3.138 3.363 895 5.606
Teresópolis 53.736 46 18.671 35.111 37.789 15.993 41.484 12.298S. Maria
Madalena3.448 14 1.676 691 1.694 1.768 1.675 1.787
S.S. do Alto 2.729 28 1.113 524 1.409 1.348 1.586 1.171Trajano de
Moraes3.250 33 831 858 1.220 2.063 1.367 1.916
Cantagalo 6.405 18 4.223 2.200 4.940 1.483 4.943 1.480Cordeiro 6.599 4 5.264 1.339 6.106 497 6.338 265
Carmo 5.733 8 3.824 1.17 5.151 590 5.311 430Macuco 1.649 3 1.507 145 1.533 119 1.546 106
Fonte: IBGE, Censo 2010. Obs.: * os municípios em negrito são os que emprestam seus nomes às microrregiões; ** leia-se: rede geral de esgoto ou pluvial; ***; leia-se: fossa séptica ou rudimentar; **** leia-se: poço ou nascente na propriedade, poço ou nascente fora da propriedade, carro-pipa ou água da chuva, rio, açude ou igarapé, poço ou nascente na aldeia, poço ou nascente fora da aldeia e outras; e, ***** leia-se: coletado em caçamba de serviço de limpeza, queimado (na propriedade), enterrado (na propriedade), jogado em terreno baldio ou logradouro, jogado em rio (ou mar ou lago) e outro destino.
Os números constantes da segunda coluna, sobre a existência ou não de energia elétrica,
falam por si mesmos. Em uma frase: este não é um problema da região em análise. Já no
que diz respeito aos demais aspectos (conforme as colunas 3, 4 e 5), há problemas, e eles
14
são graves. Veja-se o caso tipo de esgotamento sanitário: em Nova Friburgo, por exemplo,
as formas inadequadas, apesar das suas variações, chegam a cerca de 1/3 da considerada
adequada (rede geral de esgoto). Mas há casos em que as percentagens das formas
inadequadas são até mesmo superiores às adequadas (exemplo: São José do Vale do Rio
Preto, Teresópolis, etc.). No que concerne ao abastecimento de água, a situação é um
pouco menos grave que o esgotamento sanitário, mas ela não pode ser tida sequer
razoável. Ela também é ruim: dentre outros casos, vide São José do Vale do Rio Preto e
Santa Maria Madalena. Idem no caso de destino do lixo – como ilustrado por Duas Barras e
Petrópolisxii.
No que trata da saúde, muitos indicadores poderiam ser aqui alinhados e, a partir deles,
mostrar-se-ia que a situação da RS apresenta desde aspectos positivos, passando pelos
razoáveis, até os mais dramáticos. Face o exposto, buscando formar uma apreciação mais
ampla, ainda que o que segue seja relativamente antigo - mas não muito -, o Plano Estadual
da Saúde/Ministério da Saúde (2007) assinala o seguinte:
QUADRO XIII: PRINCIPAIS PROBLEMAS DE SAÚDE DA REGIÃO SERRANAMACROPROBLEMA DESCRITORES
1. Insuficiente cobertura do PSF Cobertura de 23,87%2. Deficiência nas ações de saúde da área materno-infantil
Insuficiência de leitos em UTI neonatal; elevada taxa de morbimortalidade infantil; e baixa cobertura de pré-natal
3. Dificuldade de acesso aos serviços de média e alta complexidade, e dificuldades para implementação da Noas e da microrregionalização
Demora ma marcação de consultas; uma parcela considerável da população fica sem acesso a esses tipos de serviços; e demora no atendimento, existência de longas filas de espera
4. Deficiência no sistema de informação Inexistência de banco de dados para monitorar uma fração dos indicadores da PPI-ECD; escassez e dificuldade na análise dos dados; e não utilização dos dados para o planejamento
5. Dificuldades na regulação dos sistemas municipais de saúde por parte dos gestores municipais
Prefeituras de alguns municípios não alocam seus recursos diretamente no FMS; baixa capacidade de negociação com o setor privado conveniado, devido à forma de financiamento (centralizado na SES/RJ).
Fonte: Plano Estadual de Saúde (SES), 2001.
Evidentemente, em que pese esse diagnóstico datar de 2001, o fato de a reunião de 2007
se basear no quadro anterior sugere que o que nele constava era ainda tido como válido. De
qualquer maneira, esse problema, o da sua validade, em vista dos anos transcorridos desde
ali até os dias correntes, sempre levanta a fundada suspeita que ele, o diagnóstico, estaria
desatualizado. Não obstante, em vista das dificuldades regionais já alinhadas, etc., a carta-
compromisso da região serrana fluminense constante do mesmo documento de 2007 (pág.
15
65) parece não deixar margem à dúvida quanto à realidade da saúde na região em exame,
ainda que mais seis anos tenham se passado, como consta do quadro seguinte:
QUADRO XIV: CARTA-COMPROMISSO DA REGIÃO SERRANA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO, 2007
Falta de investimento no setor público nos municípios que a compõemRede hospitalar hegemonizada pelo setor privadoModelo assistencial pautado na doençaTerceirização de recursos humanosConsórcio da região sem controle socialExistência de conselhos de saúde não-paritários e sem autonomiaAusência de plano de cargos, carreiras e salários.
Fonte: Brasil, Ministério da Saúde, 2007.*
Em resumo: seja pelo critério Cor e Raça em sua relação com a apropriação da riqueza
social seja no que diz respeito aos educacionais, como no que trata do acesso aos
chamados serviços de consumo coletivo e dos de saúde, as análises e/ou dados revelam
quão dramática é a situação da RS e o quanto precisa ser feito.
CONSIDERAÇÕES FINAIS: o desenvolvimento regional e o lugar das maiorias populacionais. O que fazer?
A análise até aqui elaborada mostrou, centralmente: que a região serrana é longevamente
perdedora em termos econômicos; que ela é desarticulada seja em termos políticos seja em
termos político-institucionais; e, ainda, que é socialmente perversa. Evidentemente
expressões como essas não podem ser entendidas sem uma análise que aprofunde a
história de suas formações sociais e, portanto, em que pese às diferenças existentes entre
elas, de seu padrão ou padrões de desenvolvimento.
Essas tarefas não são evidentemente simples; em verdade, elas são impossíveis de serem
enfrentadas nos limites deste artigo. No entanto, parece razoável afirmar que seu
soerguimento exige a redefinição das suas relações econômicas, políticas (e político-
institucionais) e sociais rumo ao estabelecimento de um novo padrão ou, dadas às suas
relativas diferenças internas, padrões conseqüentes de desenvolvimento face o que veio de
ser anotado.
Como se sabe, as chamadas vias do desenvolvimento são várias. Há atores sociais que
imaginam que a questão se resuma à atração de grandes empresas, à montagem de
distritos industriais, à definição de políticas favoráveis à estruturação de pólos tecnológicos,
idem de formação de mão de obra qualificada, etc. Nesses termos, mesmo supondo bem
sucedida essas tentativas, isoladas ou combinadamente, nada disso garante a construção
de um padrão de desenvolvimento que dê voz efetiva e democrática à região, que gere reais
efeitos encadeados de desenvolvimento e muito menos justiça sócio-distributiva. Afinal,
16
crescimento econômico, ainda mais se socialmente concentrado, está longe de poder ser
identificado com construção societária, espacial e economicamente ´equilibrada´.
Dessa perspectiva, o fosso social, melhor classial, existente na região serrana fluminense é
o primeiro passo a ser considerado; como segue:
QUADRO XV: PESSOAS DE 10 ANOS OU MAIS, SEGUNDO A POSIÇÃO NA OCUPAÇÃO POR SUBREGIÕES, 2010
POS. OCUP.
EMPREGAD
OR
EMPRE-
GADOS
EMPRE-
GADOS COM CART. ASSIN.
EMPRE-GADOS
S/ CART. ASSIN.
MILITAR.E
FUNCIO-
NÁRIOS PÚBLIC
OS
CONTA PRÓPR.
OUTROS (NÃO REMUNE-RADO+ TRABALHADORES PARA O PRÓ-PRIO COM-SUMO)
TOTAL
SUBRG. 1
Nova FriburgoBom JardimDuas BarrasSumidouroSUB-TOTAL 1
3.364
166
34
95
3.659
66.460
8.942
4.225
4.568
84.195
49.188
5.462
1.912
1.185
57.747
14.372
2.739
1.895
2.894
21.900
2.900
741
418
489
4.548
23.798
3.091
1.349
4.016
32.254
2.012
495
143
169
2.819
95.634
12.694
5.751
8.848
122.927
SUBRG. 2
S. S. do Alto
Trajano de
MoraesS.
Maria Madale
naSUB-
32
31
69
132
2.537
3.047
3.507
9.091
1.209
1.251
1.642
4.102
1.106
1.465
1.207
3.778
223
331
658
1.212
1.101
1.023
866
2.990
153
461
83
697
3.823
4.562
4.525
12.910
17
TOTAL 2SUBRG
. 3
Cantaga-lo
Cordeiro
CarmoMacucoSUB-TOTAL 3
196
2106061
527
7.176
7.4465.8391.721
22.182
4.584
4.9093.4011.185
14.079
1.946
1.6071.789316
5.658
646
930650220
2.446
1.826
1.8911.379265
5.361
697
15915962
1.077
9.895
9.7067.4372.109
29.147
SUBRG. 4
Petróp.
S. J. do V. do Rio
PretoSUB-TOTAL 4
4.025
255
4.280
103.170
6.636
109.806
75.210
2.999
78.209
23.164
3.052
26.216
4.796
585
5.381
32.241
2.806
35.047
1.556
540
2.096
140.992
10.237
151.229
SUBRG. 5
Teresó-polis
SUB-TOTAL 5
2.036
2.036
52.818
52.818
33.676
33.676
15.769
15.769
3.373
3.373
20.492
20.492
1.106
1.106
76.452
76.452
TOTAL 10.634 278.092
187.813
73.321 16.960 96.144 7.795 392.665
Fonte: IBGE, Censo 2010.
No quadro acima, dentre outras coisas, é bastante claro que menos de 3% das pessoas de
10 anos ou mais, segundo a posição na ocupação, são empregadores. Por regiões, esses
percentuais são os seguintes: Nova Friburgo, 2,9%; Petrópolis, 2,8%; Teresópolis, 2,7%;
Cantagalo-Cordeiro, 1,8%; e Santa Maria Madalena, 1,0%. É verdade que entre os por
Conta Própria alguns são empregadores; todavia, certamente os percentuais em questão e,
em especial, o médio, de 3%, seriam pouco alterados (para cima). Também é assustador o
fato de quase 20% (73.321) do mesmo contingente populacional (392.665) ser constituído
de Trabalhadores Sem Carteira Assinada; ou seja, sem qualquer tipo de proteção social.
Vale acrescentar aí os cerca de 2% de pessoas Não Remuneradas e os que Produzem para
seu Consumo Próprio – é dizer: os que estão à margem de uma sociedade que, como se
sabe, é generalizadamente mercantil (a capitalista). Tais problemas, também por suposto,
18
indicam algo que lhe é inerente, mas que em sociedades periféricas, ainda mais de frágil
dinamismo econômico, como é o caso da RS, se mostram mais agravados.
Nesses termos, não há como negar: há uma questão primeira, de classe, a revelar quão
iníqua, logo, ética, política e ideologicamente inaceitável é a estruturação social que veio de
ser analisada. E.g.: essa estruturação é inaceitável porque, em sendo uma construção
humana, ela pode sê-la de maneira diversa.
Sendo assim, erige-se uma pergunta chave: quais são os donos da região serrana? Quem
são os sujeitos sociais que integram os referidos 3%? Embora essa questão vá ficar para
um próximo momento e estudo, não resta dúvida que essa é uma pergunta chave. Afinal,
não há processo social sem sujeitos sociais; não há processo social sem beneficiários.
Assim sendo, será preciso identificá-los e avançar na discussão dos três temas
apontados/examinados nas seções II, III e IV.
Concluindo, será necessário no bojo da discussão anterior ter em conta, também, as
articulações de tais sujeitos nas escalas externas ao lugar região serrana, como o são as
estaduais, etc.; e, não fora bastante, reconhecer que o processo de desenvolvimento,
notadamente de regiões como essa, com populações em alto grau de fragilidade social,
exige urgentes políticas públicas estaduais e nacionais em feição territorializada.
Ah, e Petrópolis (conforme questionamento formulado em página anterior)? Como município
mais populoso e economicamente mais importante da região em exame nada pode ele fazer
em termos mais substantivo para o soerguimento societário serrano? Essa é uma bela
questão; porém, estudo, outro, também realizado neste ano pelos autores que subscrevem
este artigo (Natal, Costa e Miranda), não os deixa animados quanto a esse propósito, tal seu
descolamento da região e, principalmente, o conservadorismo e a miséria intelectual de
grande parte da sua elite e a limitada participação social das suas maiorias populacionais
(largamente ´ganhas´ por idealizações mistificadores construídas no entorno/síntese do
“label” Cidade Imperial, Cidade Aprazível e Turística, etc.)!
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BENKO, G. e LIPIETZ, A. “Les regions que gagnent: districts e reseaux. Les noveaux paradigmes de la geographie economique”. Paris/França, PUF, 1992. BRASIL. MINISTÉRIO DA SAÚDE. SECRETARIA DE GESTÃO ESTRATÉGICA E PARTICIPATIVA. 1º seminário de gestão participativa em saúde da região serrana do Rio de Janeiro/Ministério da Saúde, Secretaria de Gestão Estratégica e Participativa. Brasília: Editora do Ministério da Saúde, 2007. FUNDAÇÃO CENTRO ESTADUAL DE ESTATÍSTICAS, PESQUISAS E FORMAÇÃO DE SERVIDORES PÚBLICOS DO RIO DE JANEIRO (CEPERJ)/Governo do Estado do Rio de Janeiro. PIB Estadual e Municipal. Rio de Janeiro, 2010.FUNDAÇÃO INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). Censo demográfico 2010. Rio de Janeiro, 2010. NATAL, J. Rede urbana, dinâmica econômica e questão social: o estado do Rio de Janeiro pós-1995. Rio de Janeiro, FAPERJ/Pubblicati Editora, 2005.
19
NATAL, J. Desenvolvimento e políticas públicas na região serrana fluminense: uma região perdedora. Rio de Janeiro, Memória Visual, 2013. NATAL, J., COSTA, D. e MIRANDA, D. Discursos hegemônicos e o desenvolvimento contemporâneo de Petrópolis, Rio de Janeiro, Brasil - uma contribuição à crítica da sua formação social. Petrópolis/RJ, Palácio Itaboraí/Fundação Oswaldo Cruz, 2013 (mimeo).SUBSECRETARIA DE PLANEJAMENTO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO/Claudia U. Cavalcanti - Equipe da dimensão territorial do planejamento: Heidine da S.B. Duarte, Franscisco F. A. Neto, Paulo C. Figueiredo e Victor Acselrad - Municípios em dados. Rio de Janeiro, S/d.
20
ii. Serrano porque sito na serra dos Órgãos (pertencente à chamada serra do Mar); e Fluminense porque são assim denominados os espaços e os nascidos no atual ERJ - melhor, seus espaços e os nele nascidos a partir da fusão do antigo estado da Guanabara com o também antigo ERJ. ii. Este artigo é parte de uma pesquisa intitulada Expressões territoriais e determinação social da saúde no município serrano de Petrópolis/ERJ. Ela foi coordenada pelo primeiro autor e desenvolvida no âmbito do Palácio Itaboraí: Fórum Política, Ciência e Cultura em Saúde/Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). Esta versão foi elaborada em Dezembro de 2014.iii. Embora remissões ao passado não estejam descartadas, elas serão realizadas apenas quando absolutamente indispensáveis ao seu bom desenvolvimento. iv. Este parágrafo é inteiramente devedor da perspectiva metodológica de Novais (1986).v. O uso de aspas duplas diz respeito ao uso de palavras ou expressões em línguas estrangeiras, aspas inglesas (simples) ao emprego delas em sentido figurado, em itálico para destacá-las e, em negrito, para demarcar seções, mapa e quadros. vi. Há uma discussão subjacente a esse termo que é o de região tão cara especialmente aos geógrafos, a qual, no entanto, para efeito deste artigo, os autores entendem desnecessária. vii. Nesta seção e na próxima utilizar-se-á apenas a categoria regiões de governo do governo do ERJ presente em muitas das suas análises e publicações que, por sua vez, têm no IBGE suas bases de dados (e não mais a regionalização anterior, porém sem perdas analíticas).viii. Nas duas primeiras regiões avulta a importância da chamada cadeia de petróleo e gás, e, na terceira, a reativação da indústria naval. No caso das Baixadas Litorâneas, sublinhe-se a melhoria das finanças públicas de seus municípios - consultar Município em Dados, da Secretaria de Planejamento do ERJ. ix
x. O termo Cor e Raça será aqui empregado em conformidade com o IBGE. xi. Tais 45% resultam da soma dos percentuais constantes da segunda coluna divida por 14 (o número de municípios da região-objeto). xiixv. A esse respeito, embora com regionalização diferente da aqui utilizada e com referência ao ano de 2007, vide Brasil, Ministério da Saúde, 2007.