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44 FEEDFOOD.COM.BR ZANI Ariovaldo Zani médico veterinário, professor do MBA/PECEGE/ ESALQ/USP , mestrado profissional/FZEA/USP Gabriel Zani FFLCH/USP [email protected] / [email protected] VITRINE AGRO N o ano da eleição presi- dencial, o governo enga- vetou iniciativas voltadas para o fortalecimento da indústria e para a recuperação da produtividade e competitividade internacional, paradoxo que acelerou a deterioração dos indicadores e fez retroceder todos os segmentos (9,6% em bens de capital/máquinas e equi- pamentos, 2,7% em bens interme- diários/insumos e 2,5% nos bens de consumo, a saber: 9,2% nos duráveis e 0,3% nos semi e não duráveis). Nem sequer a injeção dos R$ 400 bilhões com juros subsidiados que o BNDES concedido aos "campeões nacionais" foi suficiente para conter o mergulho de 3,2% da produção geral, SE A ECONOMIA NÃO CRESCE, A INFLAÇÃO CAI? para estimular a criação de empregos (apenas 397 mil vagas formais, de acordo com Caged/MTE, Brasília/DF), para encurtar o abismo que se enfiou a construção civil e automobilística, ou mesmo mitigar o agravamento da condição financeira, principalmente das pequenas e médias empresas. Ao contrário, insistiu nas isenções pontuais dos impostos (folha de pa- gamentos, IPI em automóveis e ele- trodomésticos) que sorveram mais de R$ 100 bilhões do Tesouro, além do congelamento das tarifas dos transportes e energia, na tentativa de conter artificialmente a inflação crescente, que, no caso dos preços monitorados, resultou 5,7% (ante 6,7% dos preços livres), segundo o IBGE (Rio de Janeiro/RJ), embora a expectativa de mercado é de avanço superior à 9% em 2015, por causa dos reajustes nos preços e da retomada da cobrança da PIS/Cofins sobre gasolina/ diesel, aumento das passagens de ôni- bus, novas faixas e bandeiras tarifárias da energia e repasse da conta de de- senvolvimento energético/CDE. Em contrapartida, os preços livres devem sofrer algum alívio diante da fragilizada demanda do consumidor, que continua na defensiva, afligido pela escassez de crédito e aumento do cus- to dos financiamentos (Selic 12,5% e juros real superior a 5%), maior carga de impostos, taxas e contribuições di- retas e indiretas dos países emergentes e eliminação dos bons empregos com Fonte: IBGE DESMONTAGEM DA INDÚSTRIA (%) 0,3 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 8,4 2,8 2,7 6,0 3,1 10,2 0,4 -7,1 -2,3 -3,2 2,1 Fonte: CAGED/MTE DETERIORAÇÃO DAS VAGAS FORMAIS (MIL) 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 974 822 1747 1515 1486 1894 1670 1296 2543 1945 1302 1117 397 carteira assinada. Mes- mo assim, a expectati- va é que a inflação/ IPCA medida em 2015 permaneça além dos 7% (Boletim Focus/ Relatório de Mercado, 6/2/2015), bem acima da banda superior de variação da meta com- promissada. Já o Índice de Ati- vidade Econômica do Banco Central/ IBC-Br, medido em dezembro retrocedeu 0,55% em relação a novembro e contabi- lizou encolhimento anual da ordem de 1,5%, pressionando o PIB que, segundo esti- mativa, pode ter avan- çado apenas na casa "infinitesimal" em 2014 (meros 0,07%). Ninguém duvida, contudo, que algum efeito de arrasto já está comprometendo o desempenho em 2015, cuja perspectiva

ZANI - Sindirações

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Page 1: ZANI - Sindirações

44 FEEDFOOD.COM.BR

ZANIZANI

Ariovaldo Zanimédico veterinário,

professor doMBA/PECEGE/

ESALQ/USP, mestrado profissional/FZEA/USP

Gabriel Zani FFLCH/USP

[email protected] / [email protected]

VITRINEAGRO

N o ano da eleição presi-dencial, o governo enga-vetou iniciativas voltadas para o fortalecimento

da indústria e para a recuperação da produtividade e competitividade internacional, paradoxo que acelerou a deterioração dos indicadores e fez retroceder todos os segmentos (9,6% em bens de capital/máquinas e equi-pamentos, 2,7% em bens interme-diários/insumos e 2,5% nos bens de consumo, a saber: 9,2% nos duráveis e 0,3% nos semi e não duráveis).

Nem sequer a injeção dos R$ 400 bilhões com juros subsidiados que o BNDES concedido aos "campeões nacionais" foi suficiente para conter o mergulho de 3,2% da produção geral,

SE A ECONOMIA NÃO CRESCE, A INFLAÇÃO CAI?

para estimular a criação de empregos (apenas 397 mil vagas formais, de acordo com Caged/MTE, Brasília/DF), para encurtar o abismo que se enfiou a construção civil e automobilística, ou mesmo mitigar o agravamento da condição financeira, principalmente das pequenas e médias empresas.

Ao contrário, insistiu nas isenções pontuais dos impostos (folha de pa-gamentos, IPI em automóveis e ele-trodomésticos) que sorveram mais de R$ 100 bilhões do Tesouro, além do congelamento das tarifas dos transportes e energia, na tentativa de conter artificialmente a inflação crescente, que, no caso dos preços monitorados, resultou 5,7% (ante 6,7% dos preços livres), segundo o

IBGE (Rio de Janeiro/RJ), embora a expectativa de mercado é de avanço superior à 9% em 2015, por causa dos reajustes nos preços e da retomada da cobrança da PIS/Cofins sobre gasolina/diesel, aumento das passagens de ôni-bus, novas faixas e bandeiras tarifárias da energia e repasse da conta de de-senvolvimento energético/CDE.

Em contrapartida, os preços livres devem sofrer algum alívio diante da fragilizada demanda do consumidor, que continua na defensiva, afligido pela escassez de crédito e aumento do cus-to dos financiamentos (Selic 12,5% e juros real superior a 5%), maior carga de impostos, taxas e contribuições di-retas e indiretas dos países emergentes e eliminação dos bons empregos com

Font

e: IB

GE

DESMONTAGEM DA INDÚSTRIA (%)

0,3

2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014

8,4

2,8 2,7

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3,1

10,2

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-7,1

-2,3-3,2

2,1

Font

e: C

AG

ED/M

TE

DETERIORAÇÃO DAS VAGAS FORMAIS (MIL)

2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014

974822

17471515 1486

18941670

1296

2543

1945

13021117

397

carteira assinada. Mes-mo assim, a expectati-va é que a inflação/IPCA medida em 2015 permaneça além dos 7% (Boletim Focus/Relatório de Mercado, 6/2/2015), bem acima da banda superior de variação da meta com-promissada.

Já o Índice de Ati-vidade Econômica do Banco Central/IBC-Br, medido em dezembro retrocedeu 0,55% em relação a novembro e contabi-lizou encolhimento anual da ordem de 1,5%, pressionando o PIB que, segundo esti-mativa, pode ter avan-çado apenas na casa "infinitesimal" em 2014 (meros 0,07%). Ninguém duvida, contudo, que algum efeito de arrasto já está comprometendo o desempenho em 2015, cuja perspectiva

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FEEDFOOD.COM.BR 45

SELIC E INFLAÇÃO (%)

14

12

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6

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2

02007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014

Meta do Banco Central

Fonte: Thomson Reuters, adaptado Sindirações

de mercado registrada no Boletim Focus/Rela-tório de Mercado de 6 de fevereiro é de eco-nomia estagnada (PIB % crescimento igual à zero), embora alguns analistas independentes estejam convencidos do recuo entre 1 e 2%, a depender da magnitude do quase inevitável racionamento de água e eletricidade.

A tendência de deterioração das contas externas continua influenciada negativamen-te por causa da nossa diplomacia comercial de viés ideológico e ainda amarrada à âncora do Mercosul, do exagerado protecionismo comercial argentino aos manufaturados bra-sileiros, da concentração da pauta exporta-dora de commodities, principalmente para a China, que cresce menos (estimativa de 7,4% em 2014 e previsão de 7% para 2015, conforme o Departamento Nacional de Es-tatísticas do país), e também por conta do déficit em transações correntes da ordem de US$ 78 bilhões nesse ano corrente, confor-me previsão registrada em 6 de fevereiro no Boletim Focus do Banco Central.

Em 2014, o PIB da agropecuária avançou

1% e, apesar do fim dos saudosos superci-clos de bonança, pautou superávit de US$ 80 bilhões em 2014 (U$ 97 bi em exportações e U$ 17 bi em importações, segundo a Secre-taria de Relações Internacionais do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento –

MAPA, Brasília/DF), contribuição que limitou o déficit da balança comercial aos US$ 4 bi. A previsão para 2015 é a agropecuária adicionar mais 2% ao PIB e contabilizar saldo positivo de US$ 83 bi por meio das transações comer-ciais internacionais.

SELIC 12,25%

IPCA 7,15%

Page 3: ZANI - Sindirações

46 FEEDFOOD.COM.BR

Outros sim, emerge lá fora, como indutor do crescimento global, os Estados Unidos, com sua economia alavancada na exploração do gás/óleo de xisto e modulada pela esca-lada dos juros e enxugamento da liquidez. A retomada da União Europeia, ainda duvido-sa, estimulada pela expansão monetária que tenta combater a deflação e a desvaloriza-ção de ativos é desafiada pela nova oposição grega que discorda do plano de austeridade determinado pela troika (FMI, BCE, UE). Im-portante mencionar também a esperada aco-modação (soft landing) da economia Chinesa, que já não cresce com tanto vigor, e do ainda estagnado Japão, ancorado ao aumento do custo de energia e impostos. Ou ainda a Rús-sia (assim como os fornecedores do Oriente

Médio), que padece pressionada diante do baixo preço do petróleo, do conflito geopolí-tico particular com a Ucrânia e dos embargos comerciais. Finalmente, a crise da bolivariana Venezuela e da nossa vizinha Argentina, fina-da grande parceira comercial, afora a turbu-lência ininterrupta causada pelos massacres étnicos no Sudão do Sul, Nigéria, Somália, Congo, Líbia, Afeganistão, Síria e Israel.

É evidente que o desafio brasileiro de re-tomada ao crescimento determina flagrante aborto do fracassado modelo desenvolvi-mentista, da política anticíclica extemporâ-nea, dos truques contábeis, das "pedaladas" fiscais. Ao contrário, é mandatória a aproxi-mação comercial em direção aos players glo-bais de interesse e, sobretudo, seguir adiante

com o devido aperto fiscal, que apesar de impopular, traduz-se antídoto eficiente na recomposição das contas públicas (ao invés das indesejadas "equalizações" tributárias) e do restabelecimento da credibilidade nesse turbulento mundo globalizado.

O curso dessas iniciativas decerto vai corrigir esse ambiente distorcido de "infla-ção de oferta", por meio do incentivo à reto-mada do investimento privado, que além de revigorar a produtividade da indústria local para atendimento do consumo doméstico, devolverá competitividade aos exportado-res e interromperá a enxurrada de produtos importados que acabam por retroalimentar a "inflação de demanda" dos consumidores brasileiros. ■

ZANI VITRINEAGRO

IMPORTÂNCIA DO AGRONEGÓCIO NA PAUTA EXPORTADORA (U$ BILHÕES)NA PAUTA EXPORTADORA (U$ BILHÕES)

África do Sul

Arábia Saudita

Argentina Brasil China Índia Indonésia México Rússia Turquia

10

8

6

4

2

0

-2

2011201220132014

VARIAÇÃO % DO PIB DOS EMERGENTES DO G20

Fonte: Banco Central e FMI

*Previsão

Fonte: SRI/MAPA, adaptado Sindirações

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8 8 6 6 5 4 5 5 5 7 9 12 10 13 17 17 17 1716

60

23 22 20 21 24 2531 39 44 49 58

72 7695 96 97100 100

65

58 49 56 56 47 48 63 74 91121

173128

182226 223 240 229

51 48 55 58 60 7397 119 138

161198

153202

256 243 242 225

2002

2002

2001

2001

2000

2000

1999

1999

1998

1998

1997

1997

2003

2003

2004

2004

2005

2005

2006

2006

2007

2007

2008

2008

2009

2009

2010

2010

2011

2011

2012

2012

2013

2013

2014

2014 2015*

EXPORTAÇÃO AGRONEGÓCIO

IMPORTAÇÃO AGRONEGÓCIO