1. PESQUISA HISTÓRICA
Coordenadora: Profa Dra Myriam Bahia Lopes
Pesquisadores:
Luís Alberto Sales Oliveira
Kleverson Teodoro Lima
Introdução
“Em abril de 2003, a missão de técnicos do Centro de Patrimônio Mundial que a
Unesco enviou à Ouro Preto, identificou a preservação do sítio arqueológico do
Morro da Queimada como uma das medidas necessárias para deter a alarmante
deterioração do patrimônio cultural e ambiental da cidade. O Morro da Queimada
é um sítio dotado de rara beleza natural, de onde tem - se visão privilegiada do
centro histórico de Ouro Preto e do pico Itacolomi, que orientou os primeiros
bandeirantes e ainda hoje personaliza a cidade. Pode-se até mesmo dizer que o
Morro da Queimada está para Ouro Preto assim como a Acrópole está para
Atenas e o Palatino e os antigos foruns estão para Roma.
O Morro da Queimada abriga hoje um sítio arqueológico de inestimável valor,
sendo um testemunho material das primeiras tipologias arquitetônicas da cidade,
por guardar preciosos registros da exploração de ouro no início do século XVIII e
vestígios remanescentes de um dos mais dramáticos momentos da História do
Brasil Colônia.
Existem no local, além das ruínas das edificações da época, abrigos escavados
na rocha, grandes galerias, bocas das antigas minas de ouro e sarilhos para suas
ventilações. Existem ainda neste sítio histórico mundéus, construções feitas para
a lavagem do ouro, pequenos açudes, segmentos de canais de captação de água,
além de sistemas hidráulicos com canais utilizados para o transporte de água e de
lama aurífera.Nas últimas décadas, o Morro da Queimada vem passando por um
processo de dilapidação. Na ocupação desordenada da cidade de Ouro Preto por
um lado as ruínas vêm sendo desmontadas para aproveitamento das pedras
antigas como material de construção, e, por outro, as estruturas remanescentes
vem sendo utilizadas como bases das novas construções. O descuido com os
documentos arqueológicos do Morro da Queimada em Ouro Preto é o caso mais
grave de negligência do patrimônio cultural pelos poderes públicos nas suas
diversas esferas. Segundo o arqueólogo e professor da Universidade Federal de
Minas Gerais, Carlos Magno Guimarães não é exagero afirmar que hoje os
vestígios arqueológicos do Morro da Queimada não devem ultrapassar 10% de
seu conjunto original.
O Plano Diretor de Ouro Preto prevê para o local a implantação do Parque
Arqueológico do Morro da Queimada, antiga reivindicação das ONGs Projeto
Manuelzão e AMA Ouro Preto e tem o apoio de diversas instituições, dentre as
quais destacam-se: Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e
Cultura - Unesco, Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional - IPHAN,
Universidade Federal de Ouro Preto- UFOP, Instituto do Patrimônio Histórico e
Artístico Estadual - Iepha, Instituto Estadual de Florestas - IEF, Ministério Público
Estadual, Câmara Municipal de Vereadores, Prefeitura Municipal de Ouro Preto –
PMOP, Paróquia Nossa Senhora do Pilar, Paróquia de Santa Efigênia, Sociedade
Soto Zen do Brasil, Fundação Gorceix e ONGs e ONGs, Associação de Proteção
Ambiental de Ouro Preto (APAOP), Associação Amigos do Patrimônio Natural e
Cultural (AMO Ouro Preto) e Federação das Associações de Moradores de Ouro
Preto (FAMOP).”(Benedito,2007)
Objetivos gerais
A pesquisa histórica e arqueológica dará subsídios para o projeto de implantação do
Parque Arqueológico do Morro da Queimada em Ouro Preto/MG dando origem a
diversas ações de valorização do seu patrimônio cultural e ambiental, dentre as quais
destacam - se:
- ampliação das pesquisas históricas por meio da criação de programas de
escavações arqueológicas possibilitando um conhecimento amplo sobre a cultura
material e a história da mineração da época;
- proteção e ordenamento das ruínas das primeiras edificações construídas com
pedra e argamassa, detalhes em cantaria e os conjuntos de ruínas de currais e
pátios constituídos de muros de pedra em junta seca;
- ampliação dos conhecimentos sobre a atividade mineradora e dinâmica social dos
primórdios da colonização de Ouro Preto e das Minas Gerais;
- criação de um Museu Arqueológico das cidades surgidas durante o ciclo do ouro;
Critica bibliográfica e análise documental
Temas focadosHistoriografia do Morro da Queimada a partir da história da cidade de OuroPretoO espaço estudado não foi objeto de nenhum estudo histórico específico, iniciamos o
trabalho com um levantamento bibliográfico e documental que nos permitisse localizar
informações sobre a área em trabalhos sobre Ouro Preto.
Resultados parciais
Dividimos os resultados dessa fase em dois textos. O primeiro elaborado por Luís
Alberto Sales Vieira faz uma leitura critica do recorte da historiografia que privilegia e
constrói a representação dos heróis brasileiros, em especial a partir da narrativa da
sedição de 1720 e da Inconfidência Mineira. A seguir retoma a tese de Sylvio de
Vasconcellos que acena para a importância do estudo do comércio em Ouro Preto. Ao
final do texto há um amplo levantamento de bibliografia e de fontes relacionados a
temas e áreas de conhecimento que serão aprofundados nas próximas etapas do
projeto de pesquisa histórica.
O segundo texto elaborado por Kleverson Teodoro Lima busca a partir dos aspectos
materiais tais como geologia, materiais e técnicas usadas na mineração e nas
edificações reunir os dados que nos permitem esboçar um quadro da espaço do Morro
da Queimada ao longo de três séculos de história.
Além dos textos foi criada e publicada na web uma área de trabalho para os
integrantes do grupo registrar e organizar as informações coletadas.
(http://www.arq.umfg.br/nehcit/pamq)
Introdução
O presente relatório tem como objetivo apresentar os resultados do levantamento
histórico de fontes manuscritas, bibliográficas e iconográficas, sobre o Parque
Arqueológico Morro da Queimada. Como também os resultados do processamento
das informações coletadas pelo grupo de pesquisa histórica no decorrer do
quadrimestre fevereiro-maio de 2008.
Através do levantamento bibliográfico foi possível detectar alguns fatores importantes
para o entendimento do espaço em questão como lugar de memória. A partir do
contato com a historiografia sobre a Revolta de 1720, foi possível verificar a
incorporação de temas relacionais ao levante (pessoas e lugares) no campo simbólico
da memória nacional (ver texto: Historiografia e identidade nacional: o Morro da
Queimada como lugar de memória).
Em uma outra perspectiva, o levantamento primário possibilitou a detecção de
atividades econômicas paralelas à mineração, mas igualmente relevantes para o
entendimento da dinâmica histórica de Ouro Preto. Tendo a atividade mineradora
estimulado o desenvolvimento de um mercado interno na Colônia no decorrer do
século XVIII, é natural que Vila Rica, centro do poder secular e principal centro
minerador, ocupasse papel de destaque no interior desse grande complexo mercantil,
atuando como centro convergente de grande parte do comércio colonial no século
XVIII (ver texto: A importância de Minas na formação do mercado interno nacional).
A partir desta constatação, novas perspectivas se abrem para o estudo da ocupação e
desenvolvimento do núcleo urbano de Ouro Preto, uma vez que a atividade mercantil
demanda o estabelecimento de complexos viários para o escoamento dos gêneros
comerciáveis, estimulando a aglomeração dos apartados núcleos de povoamento
inicial.
Em termos de morfologia urbana tem-se a possibilidade de compreender a formação
do traçado original da atual cidade de Ouro Preto, e assim compreender o processo de
desenvolvimento urbano da cidade: o que é fundamental para o processo de gestão
da paisagem histórica do município.
Ao fim e ao cabo, um estudo sobre as atividades mercantis em Vila Rica contribuirá,
sem dúvida, para o entendimento da dinâmica histórica não só do Morro da Queimada,
mas da municipalidade em geral, apontando fatores fundamentais para a
compreensão das estruturas políticas, econômicas e sociais da antiga Vila Rica.
Finalmente, um levantamento inicial das fontes primárias revelou o grande potencial
dos registros fiscais para a compreensão da ocupação do Parque Arqueológicos Morro
da Queimada, seja a partir da atividade mineradora, seja em decorrência do comércio.
A análise dos registros fiscais (lançamento da capitação, entrada de ouro na Real
Casa de Fundição, receita do quinto do ouro e da capitação, etc.) possibilitaram traçar
a dinâmica da ocupação do espaço em questão e sua importância relativa aos
diversos centros mineradores e comerciais que constituíram a malha urbana de Ouro
Preto.
Historiografia e Identidade Nacional
O Morro da Queimada como Lugar de Memória
A memória de Ouro Preto (MG), desde há muito tempo, vem contribuindo para a
formação da identidade nacional brasileira e manutenção da unidade da extensa área
que coube à Coroa portuguesa o domínio e exploração durante mais de três séculos.
Mérito da administração Imperial, que em meio ao processo de fragmentação do
Império Espanhol na América, sustentou a unidade territorial da América Portuguesa,
legando aos Estados Unidos do Brasil um vasto território, cuja extensão abrange uma
diversidade de fauna e flora, culturas e raças.
Tal diversidade, vislumbrada no cenário histórico e cultural das diversas províncias da
outrora colônia portuguesa, foi superada no decorrer do período imperial apesar da
instabilidade social expressa em rebeliões.1 Nestes sucessos, além do recurso à força,
foram importantes as iniciativas no sentido de produzir uma identidade coletiva que
transcendesse as diferenças, cimentando a unidade territorial.
Nesse sentido foram fundamentais os estudos estimulados e publicados pelo Instituto
Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB), no interior do qual forjaram-se diversos
“mitos” sobre a nacionalidade brasileira, cujos ecos ainda se fazem sentir na
atualidade.
A partir de então Ouro Preto acumula um novo status, o de cenário dos fatos mais
importantes, simbolicamente, para o estabelecimento da identidade e unidade
nacional. A Inconfidência Mineira – como o mais valorado símbolo da resistência ao
poder metropolitano – é um exemplo clássico. Mas poderíamos também citar
importantes imagens relacionadas à história de Vila Rica: berço de manifestações
artísticas genuinamente nacionais (soluções arquitetônicas, manifestações literárias),
centro de convergência do nascente mercado interno brasileiro.
Surge, assim, a imagem de Ouro Preto como centro irradiador de liberdade, útero de
uma suposta nacionalidade brasileira, expressa tanto por suas manifestações
artísticas como pela malograda revolta eternizada com a denominação de
Inconfidência Mineira. Cria-se um “mito” em torno da figura de Tiradentes e da
Inconfidência. Joaquim José da Silva Xavier passa a ser representado como o grande
herói nacional, e a Inconfidência Mineira ganha status de movimento nacional. Quem
“pensaria em unidade nacional no início do século XVIII?!”.2
1. Cabanada – Pernambuco (1832-1835), Cabanagem – Pará (1835), Guerra dos Farrapos –Rio Grande do Sul (1835-1845), Balaiada – Maranhão (1838-1841).2. SOUZA, Laura de Mello e. “Estudo crítico”. In: Discurso histórico e político sobre asublevação que nas minas houve no ano de 1720. Estudo crítico, estabelecimento do texto enotas: Laura de Mello e Souza. Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro, Centro de EstudosHistóricos e Culturais, 1994, p. 13-56. Sobre a ausência da noção de nacionalidade no séculoXVIII ver: FURTADO, João Pinto. “Uma república entre dois mundos: Inconfidência Mineira,historiografia e temporalidade”. Revista brasileira de História, São Paulo, v. 21, n. 42, 2001.Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-01882001000300005&lng=en&nrm=iso; : FURTADO, João Pinto. O manto de Penélope:história, mito e memória da Inconfidência Mineira de 1788-9. São Paulo: Companhia dasLetras, 2002; MELLO, Evaldo Cabral de. A ferida de narciso: ensaio de história regional. SãoPaulo: Senac, 2001; HOBSBAWM, Eric J. Nações e nacionalismos desde 1780. 4. ed. Rio deJaneiro: Paz e Terra, 1990.
Recuando um pouco mais o espírito de nacionalidade, mas ainda na mesma temática
do espírito de liberdade e de insatisfação com o jugo metropolitano, surge como
cenário de um mito nacional o nosso objeto de estudo: o Morro da Queimada.
Estudos publicados pelo IHGB apontavam como “marco na oposição colonial à
metrópole e momento importante na construção da nacionalidade” o levante de Vila
Rica de 1720.3 Assim como Tiradentes, Felipe dos Santos é elevado a categoria de
herói nacional, precursor “das nossas reivindicações cívicas”.4 Nessa perspectiva, o
antigo Morro de Pascoal da Silva pode ter assumido o caráter de lugar de memória,
uma vez que importantes fatos dessa trama histórica desenvolveram-se nele.
Todavia, ao contrário de Tiradentes, a figura de Felipe dos Santos não foi uma
unanimidade nacional. Como também não foi o caráter nativista da sedição de 1720.
Segundo Calógeras, “quis e ainda tenta o romantismo histórico fazer de Felipe dos
Santos um precursor do patriotismo brasileiro e republicano. Não resiste tal devaneio
ao fato material de ser o herói muito mais reinol”.5
Feu de Carvalho, em um estudo sobre a revolta, expressa-se da seguinte maneira:
Imperam fatos de naturezas diversas e os que dizem patriotas,
não admitem que na apreciação dos mesmos, se emitam
opiniões contrárias às suas.
Entretanto com máxima franqueza, pesa-nos dizer, o nosso
conceito sobre tais acontecimentos, se afasta inteiramente da
geral e falsa opinião formada, sem completo conhecimento do
assunto.
A razão é natural e simples, não temos outro alvo senão
conhecer a verdade documentada dos fatos.
3. MAGALHÃES, J. V. Couto de. “Um episódio da história pátria (1720)”. Revista do InstitutoHistórico e Geográfico Brasileiro. Tomo 25, 1862, p. 515-543, Apud SOUZA, Laura de Mello e,op. cit., 1994, p. 18.4. OLYNTO, Antônio. “Revolta de Vila Rica de 1720”. Revista do Instituto Histórico eGeográfico Brasileiro. Tomo 85, v. 139, 1919, p. 443-497, Apud SOUZA, Laura de Mello e, op.cit., 1994, p. 20.5. CALÓGERAS, Pandiá. Formação histórica do Brasil. 4. ed. São Paulo; Rio de Janeiro, 1945,Apud OLIVEIRA, José Teixeira de. Dicionário brasileiro de datas históricas. 3. ed. BeloHorizonte: Itatiaia, s./d. Entre os autores que contestam o caráter nativista da Revolta de VilaRica (1720): BARBOSA, Waldemar de Almeida. História de Minas. Belo Horizonte:Comunicação, 1979; CARVALHO, Feu de. Ementário da história mineira – Felipe dos SantosFreire na sedição de Vila Rica em 1720. Belo Horizonte: Edições Históricas, 1933;VASCONCELOS, Diogo de. História antiga das Minas Gerais. Belo Horizonte: Imprensa Oficial,1904.
A nossa apreciação será livre, unicamente subordinada a
documentação.
Baseados em documentos, colocaremos os fatos nos seus
verdadeiros limites, reduzindo às justas proporções os
sucessos que tiveram por cenário Vila Rica.6
De qualquer modo, ao que parece, o “mito” de Felipe dos Santos e a Revolta de 1720
foram amplamente divulgados, contribuindo para os sucessos do projeto de
construção da identidade nacional brasileira.7
E, mesmo que hoje em dia o caráter de nacionalidade das diversas rebeliões e
revoltas ocorridas no Brasil nos séculos XVIII e XIX não faça mais parte do discurso de
nossa historiografia8, fato é que contribuiu de forma significativa para o
estabelecimento do Parque Arqueológico Morro da Queimada como lugar de memória.
A Importância de Minas na Formação do Mercado Interno Nacional
O povoamento e colonização do interior do Brasil a partir do descobrimento das minas
de ouro no território do atual Estado de Minas Gerais atraíram de várias partes da
colônia e da metrópole, um grande contingente populacional que demandou o
estabelecimento de uma complexa rede de abastecimento.
6. CARVALHO, Feu de. Ementário da história mineira – Felipe dos Santos Freire na sedição deVila Rica em 1720. Belo Horizonte: Edições Históricas, 1933, p. 13-14.7. “Leiam o extrato de um livrinho didático – Festas Nacionais – de grande cotação, entreoutros, dos muitos que circulam em nossas escolas: ‘Foi o primeiro mártir da independêncianacional atado vivo à cauda de quatro fogosos animais bravios, arrastado pelas ruasacidentadas de Vila Rica. Consumado o suplício, o corpo dilacerado foi esquartejado e atiradoem pedaços ao pasto das aves de rapina”. CARVALHO, Feu de. Ementário da história mineira– Felipe dos Santos Freire na sedição de Vila Rica em 1720. Belo Horizonte: EdiçõesHistóricas, 1933, Apud SOUZA, Laura de Mello e, op. cit., 1994, p. 18.7. OLYNTO, Antônio. “Revolta de Vila Rica de 1720”. Revista do Instituto Histórico eGeográfico Brasileiro. Tomo 85, v. 139, 1919, p. 443-497, Apud SOUZA, Laura de Mello e, op.cit., 1994, p. 21-22.8. Estudos recentes abordam a Revolta de 1720 em uma perspectiva social mais ampla,descartando completamente os objetos anteriormente pesquisados. Carla Anastásia, porexemplo, vê um “duplo caráter na sedição de 1720. “Por um lado, o levantamento apresentoureivindicações típicas das tax-rebellions ou food-riots, contidas nos parâmetros do jogo colonial,com a condenação do estabelecimento das Casas de Fundição, de contratos novos e dopagamento dos direitos de entrada no registro da Borda do Campo; a defesa do controle sobreo processo de aferição e sobre os abusos de poder do Senado da Câmara. Por outro lado,pode ser constatada uma situação de soberania fragmentada, exteriorizada pelocomportamento rebelde dos potentados, dos ouvidores de Vilas e Comarcas e dos oficiais dasCâmaras”. ANASTASIA, Carla Maria Junho. Vassalos rebeldes: violência coletiva nas Minas naprimeira metade do século XVIII. Belo Horizonte: C/Arte, 1998, p. 45-46.
Vila Rica, centro do poder secular e mais importante núcleo econômico das Gerais,
provavelmente atuou com centro de convergência de grande parte das atividades
mercantis levadas a cabo em Minas.
Desse modo, não só o comércio teve importante papel no seu desenvolvimento, como
também seu desenvolvimento contribuiu de forma significativa para o desenvolvimento
de um mercado interno nacional.
Antes de iniciarmos a análise da dinâmica da economia colonial brasileira no século
XVIII, é importante lembrar a difícil situação econômica em que se encontravam
Portugal e Brasil na segunda metade do século XVII.
A partir de 1650 observa-se uma crescente decadência nas exportações do açúcar
brasileiro. Este fato pode ser explicado tanto em decorrência da implantação da
indústria açucareira nas Antilhas, como em conseqüência da política adotada pelas
nações européias que, de consumidoras do produto brasileiro, passaram a produzi-lo
e a protegê-lo “por direitos de importação proibitivos”.9
Em Lisboa, por exemplo, em 1650, vendia-se a arroba do açúcar por 3$800 réis. Em
1659 conseguia-se por esta mesma arroba 3$600 réis. E, nove anos depois, ela
valeria apenas 2$400 réis, acumulando, assim, uma desvalorização de 33% no seu
valor relativo ao ano de 1659. Nos fim da década de 1680 ela valeria somente 1$300
ou 1$400 réis, apresentando uma queda de 61% em um período de mais ou menos
trinta anos.
Além disso, simultaneamente a decadência dos preços do açúcar no mercado
europeu, podemos observar um aumento nos custos da produção do açúcar brasileiro
devido a alta dos preços dos escravos em decorrência do “desenvolvimento das
culturas das Antilhas”, o que tornava “mais dura a concorrência para a compra de
negros nas costas africanas”.10
Tais fatos foram responsáveis pela acelerada decadência da industria açucareira no
Brasil no decorrer do século XVII. E esta decadência explica, em parte, a grande
imigração de pessoas da zona de produção do açúcar, em fins do século XVII e início
do século XVIII, para as recém descobertas minas de ouro e diamantes no interior do
continente. Segundo João Lúcio de Azevedo,
9. “Os produtos portugueses vêem-se expulsos dos mercados franceses, ingleses eholandeses. Assim, os portugueses não os vendem, ou os vendem por preços inferiores aocusto da produção”. COSTA, Iraci del Nero da. Populações mineiras: sobre a estruturapopulacional de alguns núcleos mineiros no alvorecer do século XIX. São Paulo: Instituto dePesquisas Econômicas, 1981, p. 29.10. COSTA, Iraci del Nero da, op. cit., 1981, 30.
Na borda marítima da colônia, o êxodo, motivado pela atração
das minas, teve conseqüências deploráveis. Despovoaram-se
as terras, não só da gente livre [...], mas principalmente de
escravos. [...] A cultura e fabricação do açúcar, que era a
riqueza essencial do país, cessavam em muitos lugares,
porque os lavradores partiam com seus negros, ou os vendiam
para serem levados às minas, por altos preços. [...] Com os
negros emigrava juntamente o pessoal da raça branca, a gente
hábil dos engenhos, feitores, mestres, purgadores, carpinteiros
das caixas, e outros, de ofício necessário à indústria.11
Essa característica, no entanto, não se apresentaria como uma peculiaridade da
região produtora de açúcar. A descoberta das minas no final do século XVII provocaria
também um grande movimento migratório do Reino em direção à região mineradora.
Explica-se, em parte, essa evasão populacional ocorrida em Portugal, pela difícil
situação econômica em que se encontravam os portugueses no decorrer dos
seiscentos. Os preços dos produtos portugueses no mercado europeu vinham
decaindo desde as primeiras décadas do século XVII. Além disso, a concorrência
estabelecida por outros países europeus na produção de gêneros tropicais12
ocasionava uma significativa baixa nas exportações portuguesas.
Um outro fator negativo que atuava sobre a economia portuguesa neste período era o
constante déficit na balança comercial. Em 1675 esse déficit representava um terço do
total das importações, e, em 1713, já assinado o Tratado de Methuen, esse déficit já
alcançava 50% do total das importações13. Em 1715 as exportações portuguesas
representavam certa de “333 mil libras, contra 625 mil de mercadorias recebidas”. De
1730 a 1740 as exportações alcançaram cerca de “400 mil libras anuais”, enquanto as
importações “um milhão”. Posteriormente as importações alcançariam cerca de
“1.200.000 libras”, sendo que as exportações nunca ultrapassaram a marca das “400
mil”. Assim, o “ouro das Minas, que através da Inglaterra se espalhava pela Europa,
preenchia a diferença”.14
11. AZEVEDO, João Lúcio de. Épocas de Portugal econômico: esboços de história. 3 ed.Lisboa: Livraria Clássica, 1973, p. 323.12. “Os holandeses [...] transplantaram as técnicas brasileiras [de produção do açúcar] para aspequenas Antilhas. Os franceses e ingleses também estabelecidos neste pequeno mundo dapirataria [...] juntamente aproveitaram desta transplantação de técnicas”. COSTA, Iraci del Neroda, op. cit., 1981, 29.13. COSTA, Iraci del Nero da, op. cit., 1981, 31.14. AZEVEDO, João Lúcio de, op. cit.
A economia mineira abriu “um ciclo migratório europeu totalmente novo para a
colônia”, sobretudo devido à possibilidade que ela oferecia de exploração do metal
precioso por pessoas de “recursos limitados”, uma vez que nas minas brasileiras, no
início da colonização do território mineiro, “não se exploravam grandes minas [...] e
sim o metal de aluvião que se encontrava depositado no fundo dos rios”.15 Desta
maneira, as correntes migratórias que deixaram o Reino em direção às minas
brasileiras, assim como as migrações verificadas nas diversas áreas da colônia, foram
impulsionadas tanto pela situação econômica em que se encontravam Portugal e
Brasil, como pela sede de riqueza “fácil” que as minas representavam.
Para finalizar podemos concluir, em concordância com Celso Furtado, que o “estado
de prostração e pobreza em que se encontravam a Metrópole e a Colônia”, assim
como o espírito aventureiro dos colonos reinos, animado pelas possibilidades abertas
com a mineração, “explica a extraordinária rapidez com que se desenvolveu a
economia do ouro nos primeiros decênios do século XVIII”.16
Formação e Desenvolvimento da Economia Mineira
Vimos anteriormente como a descoberta do ouro em Minas Gerais impulsionou várias
correntes migratórias em direção ao interior da colônia. Veremos agora, as
implicações destas correntes migratórias para a Colônia, sobretudo no que diz respeito
ao surgimento e desenvolvimento de uma economia colonial voltada para o
abastecimento interno.
O povoamento do interior da América Portuguesa, em decorrência da descoberta do
ouro, atraiu para uma área até então quase que completamente despovoada um
considerável contingente populacional. Este fato contribuiu para o rápido
desenvolvimento de importantes centros urbanos na região mineradora. Além disso,
promoveu consideráveis transformações nas estruturas política, econômica e
demográfica da Colônia.17
15. FURTADO, Celso. Formação econômica do Brasil. 10 ed. São Paulo: Ed. Nacional, 1970, p.73-76.16. FURTADO, Celso, op. cit., 73-76.17. No ano de 1700 a população brasileira girava em torno de mais ou menos 300.000habitantes. Cem anos mais tarde a população já ultrapassava os 3.000.000, o que representaum crescimento demográfico de mais de 1000% em apenas cem anos. Para se ter uma idéiado crescimento populacional na Colônia durante o século XVIII, basta comparar as taxas decrescimento demográfico dos dois primeiros séculos de colonização. No primeiro, a taxa decrescimento demográfico alcançou os 667%. Já no segundo ela apresentou um crescimento de300%. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Dados históricos dos censos. Disponívelem: http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/censohistorico/default_hist.shtm.
A intensa atividade mineradora levada a cabo em Minas Gerais, Mato Grosso e Goiás,
em poucos anos deslocaria o eixo econômico colonial da região açucareira – que tinha
seus principais centros localizados na região costeira do nordeste do Brasil, sobretudo
Pernambuco e Bahia – para o sudeste do Brasil. Pois, “as comunicações mais fáceis
das minas para o exterior se fazem” pelo porto do Rio de Janeiro, “que se tornará,
assim, o principal centro urbano da colônia”.18
Esse enorme contingente populacional atraído para o interior da Colônia em
decorrência da mineração, possibilitou uma interação, até então inédita, entre os
vários centros econômicos coloniais.19 Segundo Iraci del Nero da Costa, a “interligação
das áreas já ocupadas pelo colonizador europeu aparece como primeiro elemento da
integração econômico-social, ao mesmo tempo esboça-se o mercado consumidor
interno e intensifica-se o processo de urbanização, de divisão do trabalho e de
especialização regional”.20
“Os comerciantes faziam não só a ligação com o litoral, mas também entre este
mercado interno, produtor de artigos agropecuários, com a área urbana
consumidora”.21 Até o final do século XVII os centros econômicos coloniais mantinham
relações econômicas apenas com a metrópole. Não havia, antes do século XVIII, um
mercado interno que interligasse todas as regiões colonizadas. Com o
desenvolvimento da mineração surge na colônia um mercado consumidor de grandes
proporções, sobretudo no sudeste do país, tanto para os produtos da metrópole, ou
intermediados por ela, como para os produtos da florescente economia que se
desenvolvia na colônia, destinado a abastecer o atraente mercado consumidor que ia
se formando no interior do Brasil.22
A economia mineradora que se desenvolveu no Brasil no século XVIII, ao contrário da
economia baseada na produção do açúcar, permitia a participação de um grupo de
pessoas antes excluídas do sistema, ou se nele enquadrados, sem chances de
ascensão social. Segundo Júnia Ferreira Furtado, “a economia aurífera [...] permitia o
18. COSTA, Iraci del Nero da, op. cit., 1981, 24. Em 1763 a capital da colônia muda de sede,deixando a Bahia para se instalar no Rio de Janeiro.19. Sobre a questão do abastecimento da região mineradora e a convergência dos diversoscentros econômicos coloniais para as Minas, ver: ZAMELLA, Mafalda. O abastecimento dacapitania de Minas Gerais. São Paulo: HUCITEC; EDUSP, 1990.20. COSTA, Iraci del Nero da, op. cit., 1981, 23.21. FURTADO, Júnia Ferreira. Homens de negócio: a interiorização da metrópole e do comércionas Minas setecentistas. São Paulo: HUCITEC, 1999, p. 200.22. “Dos currais de Paranaguá, da Bahia e do Rio das Velhas, vinham as boiadas e ascavalgaduras, do porto do Rio de Janeiro vinham comestíveis, roupas, armas, bugigangas quechegavam do Reino e da Europa, e da África os escravos”. FURTADO, Júnia Ferreira, op. cit.,1981, 199.
crescimento dos setores médios e dos desclassificados”, que acabaram por se
constituir “em atrativo mercado consumidor”.23 Desta forma, a distribuição do produto
da exploração seria bem maior na região mineradora, motivando, assim, o
desenvolvimento de um enorme mercado consumidor nesta região.
Os mercados que se formavam na Colônia, sobretudo no sudeste, a partir do século
XVIII, “foram os mobilizadores de correntes comerciais que circulavam por vias de
comunicação terrestres e fluviais, por onde trafegavam tropeiros, comboieiros,
mercadores e boiadeiros vindos dos mais diferentes pontos do Brasil, tais como São
Paulo, Rio de Janeiro, Bahia e Pernambuco, os principais mercados abastecedores
das áreas de mineração”.24
O enorme mercado consumidor que ia se formando no sudeste do Brasil, por sua vez,
atraía uma enorme quantidade de comerciantes que se voltavam para esse mercado
em decorrência dos altos preços que se pagavam pelas mercadorias.
A alta lucratividade desse comércio com as Minas fez com que
rapidamente se estabelecessem as redes de abastecimento de
produtos, não só de primeira necessidade, como de luxo. [...]
Enquanto em 1789, o Rei determinava que, no Reino, um par
de sapatos seria vendido por 550 réis, Antonil listou que nas
Minas, no início do século XVIII, custavam cinco oitavas, ou
seja, por volta de 7$000 réis.25
Entre os fatores que podem explicar os altos preços praticados pelos comerciantes
nas regiões mineradores podemos citar: a distância que se encontravam estas
regiões, tanto dos portos, como das outras regiões colonizadas; as dificuldades
impostas pelos meios de transporte; as inúmeras intermediações por que passavam
as mercadorias antes de chegar às Minas; a multitributação que sofria os vários
gêneros que entravam nas Minas, etc.
No entanto, a alta dos preços não foi um fato particular das regiões mineradoras,
apesar desta se revelar bem maior nas regiões auríferas. Ela viria atingir várias
regiões da Colônia. Segundo Antonil, “os preços, tão altos e tão correntes nas minas,
foram causa de subirem tanto os preços de todas as coisas, como se experimenta nos
23. FURTADO, Júnia Ferreira, op. cit., 1981, 197.24. ELLIS, 1958, v. IX, p. 430, apud FURTADO, Júnia Ferreira, op. cit., 1981, 199.25. FURTADO, Júnia Ferreira, op. cit., 1981, 199.
portos das cidades e vilas do Brasil.26 Todavia, mesmo com todas essas dificuldades o
comércio de abastecimento das minas mantinha-se bastante atraente. Como nota
Mafalda Zemella, os “viandantes que entravam nas minas, em geral levavam pouco
valor em dinheiro, e muita mercadoria”, e quando voltavam “traziam bastante ouro em
pó, apurado na venda dos efeitos introduzidos nas Gerais”.27
Assim, a atividade mineradora que se desenvolveu no interior do Brasil no decorrer do
século XVIII possibilitou a formação de um atraente mercado consumidor que, por sua
vez, contribuiu para a formação de uma economia voltada para o abastecimento
interno da Colônia.28
Fontes Primárias
Relatórios dos Presidentes de Província: Minas Gerais (1837-1930). Disponível em:
http://www.crl.edu/content/brazil/mina.htm.
Arquivo Público Mineiro
Livro de lançamento da capitação, com registro de multas [1746]. Vila Rica. CC-2027,
microfilme 127(6/7).
Livro de registro de arrematações de ofícios e passagens, confiscos de escravos
vindos da Bahia, extrato de descobrimento das minas, datas de terras, quinto do ouro
e outros rendimentos de Sabará, Serro, Vila Rica, Vila do Carmo e Pitangui [17uu].
Vila Rica. CC-1001, microfilme 001(I/7).
Livro de registro de entrada de ouro de particulares da Real Casa de Fundição da
comarca de Ouro Preto [1755-1761]. Vila Rica. CC-1103, microfilme 016(3/4).
Livro de registro da entrada de ouro de particulares na Real Casa de Fundição da
comarca de Ouro Preto [1757-1760]. Vila Rica, CC-III, microfilme 017(7/12).
Livro de registro da entrada do ouro de particulares na Real Casa de Fundição da
comarca de Ouro Preto [1760-1761]. Vila Rica. CC-1123, microfilme 018(6/6) e
019(1/2).
26. ANTONIL, André João. Cultura e opulência do Brasil. São Paulo: Cia. Editora Nacional,1967, apud FURTADO, Júnia Ferreira, op. cit., 1981, 199.27. ZAMELLA, Mafalda, op. cit., p. 163.28. Sobre as unidades produtoras de gêneros de primeira necessidade para o abastecimentointerno, ver: FRAGOSO, João Luís Ribeiro. Homens de grossa aventura: acumulação ehierarquia na praça mercantil do Rio de Janeiro (1790-1830). 2 ed. Rio de Janeiro: CivilizaçãoBrasileira, 1998.
Livro de registro de entrada do ouro de particulares na Real Casa de Fundição da
comarca de Ouro Preto [1762-1780]. Vila Rica. CC-1134, microfilme 020(8/9).
Livro de registro da entrada do ouro de particulares e mapa geral de receita das quatro
comarcas da capitania pela Real Casa de Fundição em Vila Rica [1765-1766]. Vila
Rica. CC-1153, microfilme 022(6/11).
Livro de registro da receita do quinto do ouro e da capitação [1714-1716]. Vila rica.
CC-1010, microfilme 002(2/9).
Livro de registro da receita do quinto do ouro e da capitação [1718-1723]. Vila rica.
CC-1028, microfilme 004(5/5), 005(1/7).
Revista do Arquivo Público Mineiro
Atas da Câmara Municipal de Vila Rica (1711-1715). In: Revista do Arquivo Público
Mineiro. V. 25. Belo Horizonte: Imprensa Oficial de Minas Gerais, 1937, p. 3-166, CD
n. 5, pasta 25.
Referências Bibliográficas
Dicionários
OLIVEIRA, José Teixeira de. Dicionário brasileiro de datas históricas. 3. ed. Belo
Horizonte: Itatiaia, s./d.
VAINFAS, Ronaldo (org.). Dicionário do Brasil colonial (1500-1808). Rio de Janeiro:
Objetiva, 2001.
Inventários, catálogos e guias
Guia de fundos e coleções do Arquivo Público Mineiro. Belo Horizonte: Secretaria de
Estado da Cultura de Minas Gerais / Arquivo Público Mineiro, 2006.
BANDEIRA, Manuel. Guia de Ouro Preto. Rio de Janeiro: 1938.
BOSCHI, Caio César. Fontes primarias para a historia de Minas Gerais em Portugal. 2.
ed. Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro, 1998.
BOSCHI, Caio César, MORENO, Carmen e FIGUEIREDO, Luciano R. Inventário da
Coleção Casa dos Contos: livros, 1700-1891. Acervos do Arquivo Nacional, Arquivo
Público Mineiro e Biblioteca Nacional. Belo Horizonte: FAPEMIG; PUC Minas, 2006.
BOSCHI, Caio César; FURTADO, Júnia Ferreira. Inventario dos manuscritos avulsos
relativos a Minas Gerais existentes no Arquivo Histórico Ultramarino (Lisboa). Belo
Horizonte: Centro de Estudos Históricos e Culturais / Fundação João Pinheiro, 1998.
3v.
GRAVATA, Hélio. Resgate bibliográfico de Minas Gerais. Belo Horizonte: Centro de
Estudos Históricos e Culturais / Fundação João Pinheiro, 1998. 2v.
SOUZA, Wladimir Alves de (org.). Guia dos bens tombados: Minas Gerais. Rio de
Janeiro: Expressão e Cultura, 1985.
História Cultural
ALCIDES, Sérgio. Estes penhascos. Cláudio Manuel da Costa e a paisagem das
Minas (1753-1773). 1. ed. São Paulo: HUCITEC, 2003.
TRINDADE, Cônego Raymundo. Instituições de igrejas no Bispado de Mariana. 13. ed.
Rio de Janeiro: Serviço de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional: Ministério da
Educação e Saúde, 1945.
História Econômica e Demográfica
AZEVEDO, João Lúcio de. Épocas de Portugal econômico: esboços de história. 3. ed.
Lisboa: Livraria Clássica, 1973.
CANO, Wilson. “Economia do ouro em Minas Gerias”. In: Agricultura e capitalismo.
Petrópolis: Vozes, 1979.
COSTA, Iraci del Nero da. Brasil: história econômica e demográfica. São Paulo:
Instituto de Pesquisas Econômicas da Universidade de São Paulo (IPE-USP), 1986.
_____________________. Populações mineiras: sobre a estrutura populacional de
alguns núcleos mineiros no alvorecer do século XIX. São Paulo: Instituto de Pesquisas
Econômicas, 1981.
ELLIS, Myriam. Contribuição ao estado do abastecimento das áreas mineradoras do
Brasil no século XVII. Rio de Janeiro: Departamento de Imprensa Nacional / Serviço
de documentação / MEC, 1961.
FIGUEIREDO, Luciano Raposo de A. “Protestos, revoltas e fiscalidade no Brasil
colonial”. In: Revista de História. Ouro Preto: UFOP, n. 5, 1995, p. 56-87.
FRAGOSO, João Luís Ribeiro. Homens de grossa aventura: acumulação e hierarquia
na praça mercantil do Rio de Janeiro (1790-1830). 2. ed. Rio de Janeiro: Civilização
Brasileira, 1998.
FURTADO, Celso. Formação econômica do Brasil. 10. ed. São Paulo: Ed. Nacional,
1970.
FURTADO, Júnia Ferreira. Homens de negócio: a interiorização da metrópole e do
comércio nas minas setecentistas. São Paulo: Edusp. 1996.
ZEMELLA, Mafalda. O abastecimento da capitania de Minas Gerais. 2. ed. São Paulo:
HUCITEC / EDUSP, 1990.
História Política
SOUZA, Laura de Mello e. O sol e a sombra: política e administração na América
portuguesa do século XVIII. São Paulo: Companhia das Letras, 2006.
VEIGA, José Xavier da. “Governo de Minas Gerais”. In: Revista do Arquivo Público
Mineiro. Ouro Preto: Imprensa Oficial de Minas Gerais, I(1), 1896.
História Social
ANASTASIA, C. M. J. Vassalos rebeldes. Violência coletiva nas Minas na primeira
metade do século XVIII. Belo Horizonte: C/Arte, 1998.
_________________. A geografia do crime: violência nas Minas setecentistas. Belo
Horizonte: Editora UFMG, 2005.
BOSCHI, Caio César. Os leigos e o poder: irmandades leigas e política colonizadora
em Minas Gerais. São Paulo: Ática, 1986.
FURTADO, João Pinto. “Uma república entre dois mundos: Inconfidência Mineira,
historiografia e temporalidade”. Revista brasileira de História, São Paulo, v. 21, n. 42,
2001.
____________________. O manto de Penélope: história, mito e memória da
Inconfidência Mineira de 1788-9. São Paulo: Companhia das Letras, 2002.
HOBSBAWM, Eric J. Nações e nacionalismos desde 1780. 4. ed. Rio de Janeiro: Paz
e Terra, 1990.
MELLO, Evaldo Cabral de. A ferida de narciso: ensaio de história regional. São Paulo:
Senac, 2001.
SOUZA, Laura de Melo e. Desclassificados do ouro. 2. ed. São Paulo: Brasiliense,
1986.
Historiografia (Revolta de 1720)
BARBOSA, Waldemar de Almeida. História de Minas. Belo Horizonte: Comunicação,
1979.
CALÓGERAS, Pandiá. Formação histórica do Brasil. 4. ed. São Paulo; Rio de Janeiro,
1945.
CARVALHO, Feu de. Ementário da história mineira – Felipe dos Santos Freire na
sedição de Vila Rica em 1720. Belo Horizonte: Edições Históricas, 1933.
MAGALHÃES, J. V. Couto de. “Um episódio da história pátria (1720)”. Revista do
Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. Tomo 25, 1862, p. 515-543.
OLYNTO, Antônio. “Revolta de Vila Rica de 1720”. Revista do Instituto Histórico e
Geográfico Brasileiro. Tomo 85, v. 139, 1919, p. 443-497.
SOUZA, Laura de Mello e. “Estudo crítico”. In: Discurso histórico e político sobre a
sublevação que nas minas houve no ano de 1720. Estudo crítico, estabelecimento do
texto e notas: Laura de Mello e Souza. Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro,
Centro de Estudos Históricos e Culturais, 1994, p. 13-56.
VASCONCELOS, Diogo de. História antiga das Minas Gerais. Belo Horizonte:
Imprensa Oficial, 1904.
Tempo e Memória
DOSSE, Françoise. “Uma história social da memória”. In: A História. Bauru (SP):
Edusc, 2003, p. 261-298.
HALBWACHS, Maurice. La mémoire collective. Paris: Presses Universitaires de
France, 1950.
KOSELLECK, Reinhart. Futuro passado: contribuição à semântica dos tempos
históricos. Rio de Janeiro: Contraponto; Ed. PUC-Rio, 2006.
NORA, Pierre. Lês lieux de mémoire. Paris: Gallimard, 1984.
___________. “Entre memória e história: a problemática dos lugares”. In: Projeto
História. N.º 10. São Paulo: PUC-SP, 1993.
RICOEUR, Paul. La memória, la historia, el olvido. Buenos Aires: Fondo de Cultura
Econômica, 2000.
SCHAMA, Simon. Paisagem e memória. São Paulo: Companhia das Letras, 1996.
Morfologia Urbana
CONZEN, Michael & SAMUELS, Ivor. “Ouro Preto’s urban morphology from a
Conzenian perspective”. ISUF: Ouro Preto, 2007.
Obras de referência
ANTONIL, André João. Cultura e opulência do Brasil. 3. ed. Belo Horizonte: Itatiaia;
São Paulo: Edusp, 1982.
BLUTEAU, D. Raphael. Vocabulário portuguez e latino. Coimbra: Collegio das Artes da
Companhia de JESU, 1712.
CÓDICE COSTA MATOSO. Coleção das notícias dos primeiros descobrimentos das
minas na América que fez o doutor Caetano da Costa Matoso sendo ouvidor-geral das
do Ouro Preto, de que tomou posse em fevereiro de 1749, & vários papéis. Belo
Horizonte: Fundação João Pinheiro, Centro de Estudos Históricos e Culturais, 1999.
COELHO, José João Teixeira. “Instrução para o governo da capitania de Minas
Gerais”. In: Revista do Arquivo Público Mineiro. Belo Horizonte, 8 (1/2): 399-581, jan.-
jun. 1903.
COUTO, Jose Vieira. Memória sobre a capitania das Minas Gerais; seu território, clima
e produções metálicas. Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro, 1994.
Discurso histórico e político sobre a sublevação que nas minas houve no ano de 1720.
Estudo crítico, estabelecimento do texto e notas: Laura de Mello e Souza. Belo
Horizonte: Fundação João Pinheiro, Centro de Estudos Históricos e Culturais, 1994.
ESCHWEGE, Wilhelm Ludwig von. Brasil, novo mundo. Belo Horizonte: Fundação
João Pinheiro. Centro de Estudos Históricos e Culturais, 1996-2001. 2v.
_____________________________. Jornal do Brasil: 1811-1817 ou, Relatos diversos
do Brasil, coletados durante expedições científicas. Belo Horizonte: Fundação João
Pinheiro: FAPEMIG, 2002.
FERRAND, Paul M. O ouro em Minas Gerais. Belo Horizonte: Centro de Estudos
Históricos e Culturais / Fundação João Pinheiro, 1998.
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Dados históricos dos censos. Disponível
em:
http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/censohistorico/default_hist.shtm.
JACOB, Rodolpho. Notas geognósticas e montanísticas sobre as lavras de ouro de
Minas Gerais. Tradução do cap. 5º, parte 3º do Pluto Brasilienses, obra escrita em
alemão pelo Barão G. de Eschwege. In: Revista do Arquivo Público Mineiro. Ano II,
fascículo 4º. Ouro Preto, Imprensa Oficial de Minas Gerais, 1897, p. 611-631.
HALFELD, Henrique Guilherme Fernando; TSCHUDI, Johann Jakob von. A provincia
brasileira de Minas Gerais. Belo Horizonte: Centro de Estudos Históricos e Culturais /
Fundação João Pinheiro, 1998.
LISBOA, Joaquim Jose. Descrição curiosa das principais produções, rios e animais do
Brasil, principalmente da capitania de Minas Gerais. Belo Horizonte: Fundação João
Pinheiro, 2002.
“Memória Histórica da capitania de Minas Gerais”. In: Revista do Arquivo Público
Mineiro. Ano II, fascículo 3º. Belo Horizonte: Imprensa Oficial de Minas Gerais, 1937,
p. 425-517.
POHL, Johann Baptist Emanuel. Viagem no interior do Brasil empreendida nos anos
de 1817 a 1821 e publicada por ordem de sua majestade o imperador da Austria
Francisco Primeiro. Rio de Janeiro: Instituto Nacional do Livro, 1951. 2 v.
“População de Minas Gerais”. In: Revista do Arquivo Público Mineiro. V. 3. Ouro Preto:
Imprensa Oficial de Minas Gerais, 1898, p. 465-498.
“Primeiros descobridores das minas de ouro na Capitania de Minas Geraes: noticia
compilada pelo coronel Bento Fernandes Furtado de Mendonça e resumida por M. J.
P. da Silva Pontes, sócio correspondente do Instituto Histórico e Geográfico
Brasileiro”. In: Revista do Arquivo Público Mineiro. V. 4. Belo Horizonte: Imprensa
Oficial de Minas Gerais, 1899, p. 83-98.
Revista do Arquivo Público Mineiro [recurso eletrônico]. Belo Horizonte: Fundação
João Pinheiro: Centro de Estudos Históricos e Culturais / Arquivo Público Mineiro,
2005.
ROCHA, José Joaquim da. Geografia histórica da Capitania de Minas Gerais.
Descrição geográfica, topográfica, histórica e política da Capitania de Minas Gerais.
Memória histórica da Capitania de Minas Gerais. Estudo crítico: Maria Efigênia Lage
de Resende e Rita de Cássia Marques. Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro,
Centro de Estudos Históricos e Culturais, 1995.
RUGENDAS, Johann Mortz. Viagem pitoresca através do Brasil. 2. ed. São Paulo,
1940.
SAINT-ADOLPHE, J. C. R. Milliet. Dicionário geográfico, histórico e descritivo do
Império do Brasil, contendo a origem e história de cada província, cidade, vila e aldeia;
sua população, comércio, indústria, agricultura e produtos mineralógicos; nome e
descrição de seus rios, lagoas, serras e montes; estabelecimentos literários,
navegação e o mais que lhes é relativo. Tomo II. Paris: J. P. Aillaud, 1845.
SAINT-HILAIRE, Auguste de. Viagem pelas províncias do Rio de Janeiro e Minas
Gerais. Belo Horizonte: Itatiaia, 1975.
_______________________. Segunda viagem do Rio de Janeiro a Minas Gerais e a
São Paulo: (1822). 2. ed. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1938.
SILVA, Jose Joaquim da. Tratado de geografia descritiva especial da província de
Minas Gerais. Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro, 1997.
SPIX, Johann Baptist von. Viagem pelo Brasil: 1817-1820. Prefácio Mário Guimarães
Ferri; tradução Lúcia Furquim Lahmeyer; revisão B. F. Ramiz Galvão, Basílio de
Magalhães, Ernst Winkles; anotação Basílio de Magalhães. Belo Horizonte: Itatiaia;
São Paulo: Universidade de São Paulo, 1981.
VASCONCELOS, Diogo Pereira Ribeiro de. Breve descrição geográfica, física e
política da capitania de Minas Gerais. Estudo crítico por Carla Maria Junho Anastasia;
transcrição e pesquisa histórica por Carla Maria Junho Anastasia e Marcelo Cândido
da Silva. Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro, Centro de Estudos Históricos e
Culturais, 1994.
VEDRA, Basílio Teixeira de Sá. “Informação da capitania de Minas Gerais”. In: Revista
do Arquivo Público Mineiro. Ano II, fascículo 4º. Ouro Preto, Imprensa Oficial de Minas
Gerais, 1897, p. 673-683.
VEIGA, José Xavier da. Efemérides mineiras. Introdução: Edilane Maria de Almeida
Carneiro e Marta Eloísa Melgaço Neves; pesquisa histórica: Bruno Fagundes; leitura
paleográfica e atualização ortográfica: Cláudia Alves Melo. Belo Horizonte: Centro de
Estudos Históricos Culturais. Fundação João Pinheiro, 1988, v. 1-2 e 3-4.
Patrimônio
FONSECA, Maria Cecília Londres. O patrimônio em processo: trajetória da política
federal de preservação no Brasil. 2. ed. rev. ampl. Rio de Janeiro: Editora UFRJ; Minc
– Iphan, 2005.
OLIVEIRA, Benedito Tadeu e Myriam BAHIA LOPES Projeto PRONAC-MINC,
12/2005.
Urbanismo
REIS, Nestor Goulart. Imagens de vilas e cidades do Brasil colonial. CD-Rom, s./d.
1. Introdução.
E hoje, em Ouro Preto, austero e mudo nos seus negrumes,vemos ainda o esqueleto do bairro incendiado. Ali permanecerápara todo o sempre, a fim de que nenhum historiador vindouropossa dizer, algum dia, que não houve incêndio. Ninguém sabetudo que poderão dizer, um dia, os homens (Salles: 1982, p.89).
A epígrafe de Fritz Teixeira de Salles alimenta (e é alimentada) por representações
recorrentes no imaginário social de Ouro Preto sobre um de seus espaços ainda
pouco conhecidos: o Morro da Queimada. Duas idéias parecem recorrentes: 1) as
ruínas resultantes das ações de demolição e incêndio estão lá adormecidas desde
1720, como indica Fritz Salles; 2) as estruturas visíveis nesse morro são resultados de
diferentes ocupações no tempo. Incluído nesse segundo grupo, Diogo de
Vasconcelos, por exemplo, indica que um novo espaço se formou após o fim da
sedição de 1720, mas “este durou pouco, e dele só existem ruínas desoladas e ermas
(Vasconcelos: 1974, p.201).”
Até esse momento, as diferentes fontes consultadas em nossa pesquisa nos distancia
tanto da concepção romântica de que as ruínas presentes no Morro da Queimada
ainda evidenciam “o esqueleto do bairro incendiado” quanto da idéia de que essa área
tenha sido ocupada por tão pouco tempo, como nos diz Diogo de Vasconcelos.
Certamente estamos mais próximos de Sylvio de Vasconcelos que indica a
impossibilidade de se ter uma “absoluta segurança” quanto a época das estruturas de
pedra que “pontilham” o Morro da Queimada, já que “mesmo depois do incêndio de
1720, os moradores do local” não o abandonaram, “como demonstram características
arquitetônicas evidentemente posteriores à catástrofe” (Vasconcelos: 1977, p.124).
O censo realizado em 1804, organizado e divulgado por Henrique Mathias em 1969,
demonstra que no início do século XIX o Morro do Ouro Podre e o Morro da Queimada
ainda eram locais ocupados, como atesta a propriedade do Reverendo Lourenço Dias
de Almeida, classificado também como minerador, servido por 2 escravos: Miguel
Angola e Cláudio (p.190-208).29 É a partir da reunião de evidências como essas,
aspectos arquitetônicos e informações demográficas, que procuraremos indicar que o
povoamento no Morro da Queimada, apesar da importância do evento de 1720, não
deve ser reduzido a esse período, pois trata-se de um espaço que atravessou
diferentes contextos da vida em Ouro Preto. Valorizado, desvalorizado, objeto de
cobiça, de esquecimento, de invasões e depredações, as significações lançadas sobre
esse morro acompanharam a dinâmica da formação urbana ouropretana nos últimos
três séculos; dinâmica marcada por misturas, conflitos e superposições de matrizes e
práticas culturais. É essa, sem dúvida, a sua principal riqueza.
No decorrer desse relatório parcial, o leitor perceberá que procuramos enredar as informações
sobre o Morro da Queimada às da Serra de Ouro Preto. Esse procedimento deve-se a dois
29 É antiga e comum a idéia de que, após os eventos da sedição de 1720, as denominações Morro do OuroPodre ou Morro do Pascoal Silva (ou Morro do Pascoal) tenham sido substítuídas por Morro daQueimada. É o que nos informa Diogo Pereira Ribeiro de Vasconcelos no final do século XVIII: “fezlogo arder as casas de Pascoal da Silva e as dos outros réus no morro do Ouro Podre que, por isso, seficou chamando até hoje o morro da Queimada (Vasconcelos: 1994, p.118).” No entanto, a julgar pelocenso, a criação da denominação Morro da Queimada não apagou a anterior: Morro do Ouro Podre.
motivos: primeiro, suas histórias estão conectadas, já que o morro está contido na serra;
segundo, existe mais dados sobre a serra, o que nos aproxima (por semelhança) dos aspectos
experimentados no morro. Soma-se a esses motivos a dificuldade identificada nas fontes
quanto à definição do espaço físico do Morro da Queimada; a sua extensão, dependendo da
fonte, abarca diferentes áreas, como ratificam Frederico Sobreira e Marco Fonseca: “a
delimitação precisa da área originalmente ocupada pelo antigo Arraial de Ouro Podre
ou Morro da Queimada é tarefa das mais difíceis (1999, 14p).” Conforme a época e o
documento, as designações sobre as áreas da Serra de Ouro Preto se diferenciam e
criam certa confusão: na tributação do Quinto de 1719, por exemplo, aparecem
apenas 4 denominações (Ouro Bueno, Ouro Podre, Morro e Córrego Seco); no censo
de 1804, quase um século depois, no entanto, são indicadas 11 denominações
(incluindo o Morro do Ouro Podre e o Córrego Seco).30 Assim, é necessário o devido
cuidado quanto à recuperação dessa memória ligada às designações dos espaços na
Serra de Ouro Preto, pois são importantes pistas sobre a delimitação (mesmo que
vaga) do Morro da Queimada.
Centrada em arquivos e bibliotecas, essa pesquisa tem como principais objetivos:
“apontar os elos que foram sendo construídos no decorrer de séculos de ocupação
desse espaço”; e “subsidiar tanto os trabalhos de campo quanto a elaboração do
produto (relatório) final”. Esses objetivos encontram-se definidos no memorial
descritivo do projeto de implatação do Parque Arqueológico do Morro da Queimada.
Os arquivos consultados nessa primeira fase de investigação localizam-se nas sedes
de Ouro Preto e Mariana: Arquivo Público Municipal de Ouro Preto; Museu da
Inconfidência Casa do Pilar de Ouro Preto; Casa dos Contos / Centro de Estudo do
Ciclo do Ouro; Arquivo Eclesiástico da Paróquia de Nossa Senhora da Conceição de
Antônio Dias; Acervo fotográfico do Núcleo de Mentalidade e Memória do Instituto de
Filosofia e Arte Cênica / UFOP; Arquivo Eclesiástico da Arquidiocese de Mariana; e
Casa Setecentista de Mariana. Além desses acervos de fontes primárias, foram
consultados artigos, capítulos, livros e imagens disponíveis na internet e nas
bibliotecas do IFAC (Instituto de Filosofia e Arte Cênica) e do ICHS (Instituto de
Ciências Humanas e Socias), pertencentes à Universidade Federal de Ouro Preto.
Nesse relatório parcial apresentaremos alguns aspectos identificados sobre a
formação geológica, técnicas minerárias, técnicas construtivas e rede de caminhos de
Ouro Preto, temas que auxiliarão os próximos passos da pesquisa sobre a constituição
dos povoados nos morros na Serra de Ouro Preto, em especial o Morro da Queimada.
30 À medida que o povoamento intensificou-se na Serra de Ouro Preto tornou-se necessária a criação denovos nomes para os setores de ocupação.
2. Aspectos sobre a formação geológica, técnicas minerárias, técnicasconstrutivas e rede de caminhos de Ouro Preto.
Esse tópico será apresentado em sua maior parte pelo viés descritivo. Sua principal
função é organizar um conjunto de informações sobre os diferentes temas citados no
enunciado acima, a fim de subsidiar o planejamento da próxima fase de pesquisa.
2.1. Geologia.
A exposição de aspectos sobre a formação geológica de Ouro Preto auxilia a nossa
percepção sobre as motivações que estimularam o povoamento e as soluções
técnicas construtivas experimentadas nas unidades minerárias e residenciais da Serra
de Ouro Preto. Parte dos resultados produzidos a partir da oferta natural local e da
capacidade de leitura e transformação do espaço encontra-se mimetizada no cenário
urbano da Sede. Segundo Fabiano Silva (2005), a dificuldade de transportar as rochas
portuguesas, como o Lioz e Ançã, pelos nem sempre aprazíveis e montanhosos
caminhos das Gerais “forçou os construtores a localizarem e experimentarem as
rochas locais, como o quartzito, o quartzo-clorita-xito e o esteatito (pedra-sabão). O
que possivelmente gerou dificuldades para os pedreiros/canteiros portugueses,
levando-os a readaptações e recriações de práticas e modelos europeus.” Por isso,
adotamos a estratégia de apresentar algumas informações básicas sobre o tipo de
rocha e as regiões onde ocorrem em Ouro Preto.
FIG.1. Ouro Preto s/d.
Autor: Luiz Fontana
Fonte: Acervo fotográfico do Núcleo de Mentalidade e Memória - IFAC /UFOP.
Nessa fase da pesquisa identificamos algumas referências que apresentam diferentes
níveis de elaboração sobre esse tema, produzidas nos séculos XVIII, XIX e XX. Obras
como a Breve descrição geográfica, física e política da Capitania de Minas Gerais, de
Diogo Pereira Ribeiro de Vasconcelos, escrita no final dos setecentos, o Pluto
Brasiliensis, de Willhelm Eschwege, escrita na primeira metade dos oitocentos, A
geologia do município de Ouro Preto, escrita por Benedito José dos Santos durante as
comemorações do bicentenário do município em 1911, e Ação antrópica e processos
em encosta em Ouro Preto, de Frederico Sobreira e Marco Fonseca, produzida em
1999. A fim de evitar paráfrases pouco eficientes, devido às terminologias típicas
dessa área de conhecimento, optamos por apresentar, em geral, trechos do texto
original.
Segundo Sobreira e Fonseca (1999, 14p.), a “Serra de Ouro Preto representa o flanco
sul de uma grande estrutura regional conhecida como Anticlinal de Mariana. O
substrato é constituído por metassedimentos de idade paleoproterozóica - filitos,
quartzitos, xistos e formações ferríferas - profundamente afetados por eventos
tectônicos. A estrutura regional orienta-se na direção leste-oeste, possuindo as
camadas mergulhos gerais para sul, na ordem dos 30°. É comum a ocorrência, nos
topos e nas vertentes dos morros, de coberturas superficiais de crosta laterítica,
localmente denominadas de "canga". Os solos, quando ocorrem, são muito pouco
espessos, na ordem dos centímetros, exceto por algumas manchas maiores de
material coluvial.”
E acrescentam que as “condições geológicas e geomorfológicas são fatores
predisponentes à ocorrência de movimentos de massa e processos erosivos. As
condições climáticas, com períodos de chuvas intensas e prolongadas, complementam
o quadro de predisposição ao desenvolvimento de processos geodinâmicos de caráter
superficial, principalmente escorregamentos, erosão e movimentação de materiaisrochosos (grifo nosso), que se manifestam durante a estação chuvosa Sobreira e
Fonseca (1999, 14p.).”
Segundo Benedito Santos (1911, p.93-105) “Pode-se mesmo dizer que todas as
rochas encontradas no município pertencem à formação primária (séries azóica e
cambreana), exceto a canga, esse conglomerado argilo-ferruginoso que cobre grande
parte dos terrenos do município e que é de formação quaternária.” As rochas
encontradas em Ouro Preto são: a canga, “o granito, o gnaisse, os xistos argilosos e
micáceos, os micaxistos, o itacolomito, o calcáreo, os itabiritos, os xistos ferruginosos,
xistos carbonosos, xistos calcários e diques de rochas eruptivas, como diabases,
dioritos, anfibolitas, rochas serpentinosas etc.”31
Localidades onde encontramos tais rochas (Santos, 1911, p.93-105):
31 A divisão territorial municipal apresentada por Benedito Santos refere-se a existente em 1911. Algumaslocalidades, como Itabira do Campo (atual Sede de Itabirito) e São Caetano da Moeda, passaramposteriomente por processos de emancipação.
Canga - está presente em vários pontos do município e “costumaconter talco, clorita e itacolomito.” “É encontrada nascumiadas das Serras de Ouro Preto, Cachoeira doCampo, Serra de Antônio Pereira, Mesquista, Capanema,Paraopeba etc”;
Granito - encontrado na base oeste da Serra do Paraopeba, entreSão Caetano da Moeda e Boa Morte;
Gnaisse - é encontrado nas depressões, nos pontos mais baixos domunicípio;
Xistos micáceos - encontrados em quase todo o município, são ‘as rochasdos arredores de Ouro Preto, não se falando nositacolomitos e itabiritos que a eles se superpõem”;
Xistos - “são, em geral, xistos a sericita”, neles “encontram-seminas de topázios, como no Capão do Lana”, mineraiscomo o euclásio, ditênio, turmalinas, quartzo hiliano,oligisto etc”, são muitas vezes “carregados de óxidos deferro, passando a xistos ferríferos, como em Boa Morte”,às vezes são “atravessados por camadas de quartzoaurífero”;
Micaxistos - encontram-se em quase todo o município;
Itacolomito - o afloramento “composto de quartzo e talco ou clorita éuma variedade de grés encontrado apenas em OuroPreto”;
Calcário - “é encontrado formando a base de todo o depósito demaganez na Serra do Papa Cobras, que se estende deMiguel Burnier até Hargreaves, constituindo o divisor deáguas do Rio das velhas e do Paraopeba.” Encontra-seainda o calcário “em outros pontos nas proximidades deMiguel Burnier, no Rodeio, no Trino e em Antônio Pereiraonde forma os morros do Frazão e da Lapa.”;
Itabirito - “constitui a parte principal das serras de Ouro Preto, OuroBranco, Serra da Cachoeira, do Paraopeba, da Moeda,de Antônio Pereira etc.” “O itabirito forma a capa e a lapada camada manganezífera”, são formados de óxido deferro, quartzo e mica”. “Ele não é propriamente umminério de ferro”, e as “montanhas formadas por essarocha são sempre escarpadas, nuas e de aspectobizarro; ao contrário das formadas pelo granito ou pelogneiss que são de inclinação suave, abauladas, cobertasde vegetação”;
Xistos ferruginosos - “agregados de quartzo e oligisto micácio são muitoencontrados no município de Ouro Preto” e repousam“ordinariamente sobre o itacolomito e são em geralauríferos; às vezes estão sobre os xistos argilosos”;
Xistos carbonosos - são identificados em Cachoeira do Campo e MiguelBurnier;
Xistos calcários – “azulados, duros, encontram-se na estrada de Cachoeirado Campo, Estação de Hargreaves e Distrito de Cumbe,se dividem em lajes compondo “magnífico material para aconstrução de passeios.”;
Diques de rochas eruptivas - todas as rochas anteriormente citadas “sãofrequentemente cortadas por diques de rocha eruptiva,tais como diabases, diuritos, serpentina etc”. Oafloramento mais importante é do lugar chamado Pedrado Sino, que fica entre o Distrito de Casa Branca (atualGlaura) e o Mesquista. A rocha eruptiva serpentinosa,conhecida como pedra sabão, é identificada em quasetoda “zona compreendida entre as serras de Itaverava eItatiaia.”).
Principais minérios que se encontram no município (Santos: 1911, p.93-105):
Minério de ouro:
“O ouro em grande ou pequena quantidade encontra-se quase por toda parte em veios
de piritas de quartzo ou nos itabiritos. Os veios de piritas auríferas são os mais
frequentes e os mais ricos em ouro. Encontram-se encaixotados nops quartzitos ou
xistos, apresentando em seus afloramentos grandes massas de limonito, produto de
decomposição das piritas, sendo muito freqüente encontrarem-se nos veios cristais de
scorodita. Isso acontece nos arredores de Ouro Preto. Os veios de quartzo aurífero
atravessam quase sempre os xistos micáceos ou os quartzitos. Nos itabiritos o ouro
distribue-se irregularmente encontrando-se, em certos pontos de concentração do
metal, palhetas as vezes de grandes dimensões. Pertencem à primeira ou segunda
categorias as jazidas do Falcão, da Tapera, do Morro de São Vicente, Velloso, a das
Lages que é situada mesmo na cidade de Ouro Preto, Venda do Campo, Tassara etc.
Destas jazidas apenas está em exploração a do Morro de São Vicente, próximo ao
arraial do mesmo nome, no começo da Serra do Capanema.32 O ouro é encontrado
em areias, nos antigos depósitos feitos pelas águas. Procurando o ouro nos depósitos
de aluvião, os primeiros exploradores procuraram conhecer qual a rocha matriz do
precioso metal. Segundo Eschwege, o ouro deve a sua origem às formações
primárias, não existindo, porém, nas sedimentações mais antigas que o xisto argiloso
micácio, que se superpõe, como dissemos, ao gneiss. Os xistos micáceos, o
itacolomito e itabiritos são os andares da formação primitiva onde o ouro tem a sua
oigem. O ouro ocorre no xisto argiloso nos arredores de Ouro Preto, principalmente
quando o xisto é friável e carregado de óxido de ferro. (...) No itacolomito o ouro
aparece em veios, acompanhado de piritas arsenicais e de ferro, como nas Lages em
Ouro Preto. O ouro aparece também nos itabiritos, em jazidas, ou disseminados na
massa da rocha. (...) Finalmente ocorre o ouro em areias nos depósitos de aluvião e
na canga. O Palácio Velho, antiga morada dos governadores, foi em parte destruído
para que se extraísse o ouro contido na canga sobre a qual ele tinha sido construído
(Santos: 1911, p.93-105).”
Além do ouro, Benedito Santos fez menção aos seguintes minérios: manganez
(grande parte localiza-se entre Miguel Burnier e a Sede de Ouro Preto); minério de
mercúrio (encontrado no Córrego do Tripuí e em Antônio Pereira); cobre (localizado na
base do Itacolomi); zinco; chumbo; bismuto; e minério de ferro. Como é comum a
presença de pequenas forjas em parte das fazendas e lavras da região central mineira
(Costa Sena: 1881, p.106-177; Baeta et al: 2007, 272p.), apresentamos as
informações do autor sobre as jazidas de minério de ferro.
Minério de ferro:
32 Esse é um dado importante sobre a situação inativa das lavras existentes na Sede de Ouro Preto. Desdea década de 1930 o Morro de São Vicente, único serviço ativo, segundo o autor, tornou-se subdistrito deAcuruí (antiga Freguesia de Rio das Pedras), ambos pertencentes ao município de Itabirito.
“A região central do Estado de Minas, máxime a zona compreendida entre as cidades
de Queluz (atual Conselheiro Lafaiete) e Itabira do Mato Dentro, é muito rica em
minério de ferro. (...) O embasamento das rochas sobre o qual se assentam as
camadas no meio das quais se encontram os minérios de ferros, é constituído por um
complexo de xistos cristalinos e gneiss, com intrusões de granito. Nesta série de
rochas sedimentárias estão os xistos ferríferos denominados itabiritos. Os minérios se
referem a três tipos – minério de pedreira ou minério in situ; minério rolado pelas
encostas, e que provém da desagregação dos primeiros; e a canga. O primeiro
minério costuma conter até 70% de ferro metálico; o segundo 50%; e o terceiro
costuma ser também de 30 a 50%. Existem grandes jazidas de ferro em Miguel
Burnier, no Morro do Cruzeiro e Serra do Mutué, em Congonhas do Campo, na Serra
da Paraopeba, no Pires, no Trino, nos arredores de Ouro Preto, na Serra de Itabira
(atual Itabirito) etc. (...) A canga cobre grande parte dos terrenos do município. O Dr.
Gorceix avaliou em 40 milhões de metros cúbicos a massa de itabirito e canga dos
arredores de Ouro Preto, podendo produzir esse minério cerca de 400 milhões de
toneladas de ferro (Santos: 1911, p.93-105).”
Esse básico conhecimento sobre os terrenos geológicos nos prepara para
identificação das técnicas construtivas utilizadas nas unidades minerárias e
residenciais da Serra de Ouro Preto.
2.2. Técnicas de mineração aurífera.
O estudo sobre as técnicas de extração aurífera é imprescindível para o
reconhecimento e classificação das unidades de trabalho existentes na Serra de Ouro
Preto e no Morro da Queimada. Até o momento, identificamos diferentes fontes que
apresentam informações superficiais - como os relatos de alguns cronistas
estrangeiros do século XIX - quanto descrições pormenorizadas, como as anotações
do Cultura e opulência do Brasil pelas minas do ouro, publicado pelo Padre Antonil em
1711; o Modo e estilo que se tem observado e parece se deve observar no uso de
minerar nos morros de Vila Rica de Ouro Preto, aparentemente escrito pelo Ouvidor
Caetano da Costa Matoso em meados do século XVIII; o Pluto Brasiliensis, de
Willhelm Eschwege, escrito na primeira metade do século XIX; e O ouro em Minas
Gerais, escrito no final dos oitocentos pelo francês Paul Ferrand, professor da Escola
de Minas de Ouro Preto.
Como esse último livro apresenta uma boa síntese sobre as técnicas de mineração
aurífera, incluindo referências textuais e iconográficas de autores acima citados,
adotaremos a forma como o professor Paul Ferrand dividiu e organizou as suas
análises. Novamente, a fim de evitar paráfrases pouco eficientes, devido às
terminologias típicas dessa área de conhecimento, optamos por apresentar, em geral,
trechos do texto original.
Segundo Ferrand, as minas de ouro, em Minas Gerais, “estão concentradas em
grande parte nos flancos da Serra do Espinhaço. Essa grande cadeia de montanhas,
que forma o maciço central do Estado, tem uma direção N-S, seguindo uma linha
sensivelmente meridiana que passa pelo Rio de Janeiro, Ouro Preto e Diamantina, e
separa as águas da bacia do Rio Doce, a leste, das da bacia do Rio São Francisco, a
oeste. Na parte desse maciço que recebeu o nome de Serra de Ouro Preto, é quese encontram numerosos vestígios das antigas explotações (grifo nosso). Quando
se examina a constituição geológica da região, parece que podem ser distinguidos, na
ordem de superposição dos terrenos, três grandes períodos (geológicos) distintos: 1.
gnaisse, micaxistos; 2. xistos micáceos, quartzitos xistosos, xistos argilosos, itabiritos;
3. quartzitos compactos, arenitos (Ferrand, 1998, p.91-131).”
Ferrand divide os serviços minerários em 2 grupos: trabalhos realizados nos leitos e
margens dos rios; e trabalhos realizados nos flancos e interior das montanhas. Nesse
levantamento focalizremos o segundo grupo:
Trabalhos nos flancos das montanhas (serviços de grupiaras ou a talho aberto):33
“Esses trabalhos eram aplicados às rochas friáveis ou decompostas, atravessadas
pelos filões de quartzo aurífero; as rochas eram xistos argilosos vermelhos e moles
cortados por numersosos veios de quartzo, em geral, esburacado e contendo palhetas
de ouro ou itabiritos no estado de jacutinga, impregnados segundo os escravos por
quartzo aurífero de granulação fina, e mesmo, com mais freqüência, por simples
infiltrações de ouro que formavam verdadeiras linhas (Ferrand, 1998, p.91-131).”
“Os depósitos de aluviões auríferos situados acima dos fundos dos vales e encostados
nos flancos das montanhas, desginados como grupiaras, eram tratados de modo
diferente das jazidas precedentes (situadas nos leitos e margens dos rios); osmineradores utilizavam a diferença de nível para fazer passar correntes de águasobre toda a massa, que era arrastada e recolhida embaixo. Esses depósitos,formados por areias e seixos mais ou menos rolados, com uma camada de terrapor cima, tinham uma espessura variável que podia ir de 1,50 a 2,50m (grifo
nosso). Assim, para lhes aplicar o método empregado, verdadeiro método hidráulico,
era necessário que os mineradores tivessem à sua disposição uma grande quantidade
de água (Ferrand, 1998, p.91-131).”
“Começavam por construir, para essa finalidade, um longo canal de nível que seestendia pelas regiões superiores da serra, de modo a levar as águas acima dajazida que pretendiam explotar. Alguns desses canais tinham várias léguas decomprimento, em conseqüência da necessidade de captar água em quantidadesuficiente para seus trabalhos (grifo nosso). A partir da extremidade do canal, que
desembocava diretamente na jazida em seu ponto culminante, os escravos
escalovam-se em uma linha que seguia a inclinação do terreno e munidos de
cavadeira, a enfiavam verticalmente na terra; depois, inclinando-a como uma
alavanca, cavavam um rego que descia através do depósito aurífero, até o pé da
montanha. Abria-se em seguida a água do canal, que escapava como corrente
impetuosa pelo caminho que havia sido traçado, diluindo e levando em seu curso o
material escavado (Ferrand, 1998, p.91-131).”
A lama que trazia o material precioso era recebida num “canal mais largo, de pequena
inclinação, espécie de corredor que apresentava uma sucessão de barragens,
encostado na parte inferior da montanha.” Comum era o uso de tecidos entre as
barragens para “reter as partes mais pesadas das lamas arrastadas pelas águas; as
matérias retidas eram também levadas para os tanques de lavação.” “Esse corredor,
de 2 metros de largura aproximadamente, estendia-se por um comprimento que
dependia do local disponível e era cortado, a intervalor de 10 a 30 metros, por
pequenas barragens formadas de estacas que retinham ramagens e pedras
anteriormente acumuladas. À medida que as lamas se depositavam, elevava-se pouco
a pouco a altura das barragens, até que a espessura dos depósitos fosse considerada
suficiente; então se interrompia o trabalho de escavação para fazer a concentração
das lamas auríferas, análoga à praticada para os tabuleiros: os escravos,
escalonando-se ao longo do corredor, no compartimento situado acima da primeira
barragem, revolviam os depósitos com o almocrafre, sob uma forte corrente de água,
de modo que as lamas argilosas e as matérias leves fossem arrastadas, enquanto o
ouro afundava no meio das matérias pesadas. Para facilitar a saída das partes leves
abaixava-se o nível da barragem, retirando-se pouco a pouco a ramagem e as pedras
que a formavam, e continuava-se a concentração, até atingir o nível do segundo
compartimento, onde recomeçava-se a mesma operação, que era repetida
33 Para essa exposição, selecionamos partes do texto de Paul Ferrand, mas, sem dúvida, vale a penaconsultar o original, devido ao nível de descrição. Assim como indicamos também as descrições deWilhelm Eschwege no Pluto Brasiliensis (p.1979: 151-205).
sucessivamente nos diversos compartimentos até o último. Uma vez completada a
concentração, o escoamento da água era interrompido, e se recolhiam as areias
auríferas nos carumbés levando-as aos tanques de lavação. Com o corredor
desembaraçado, recomeçava-se de novo a acumulação das lamas, continuando a
cavar o terreno e a lavá-lo com as águas, e se repetiam essas diversas operações até
que a explotação tivesse esgotada a camada de aluviões (Ferrand, 1998, p.91-131).”
Nesses trabalhos nos flancos das montanhas também era comum a construção de um
reservatório superior para obter um efeito mais intenso da queda da água e controlar o
jato em diferentes momentos do dia. Na parte inferior também eram comuns os
mundéus, grandes reservatórios retangulares e semicirculares, que “mediam
internamente até 16 metros, e mesmo 24 metros de lados” e tinham de “3 a 6 metros
de profundidade, com paredes de quase dois metros de espessura, em alvenaria de
blocos de pedra simplesmente cimentados de argila e areia.” Segundo Ferrand, a
utilização dos mundéus eliminava a necessidade do corredor de barragens: a lama
carregada pela água descia por um canal lateral e era escoada para dentro de um ou
mais mundéus, e permanecia em estado de decantação. “Cheio um mundéu, suprimia-
se a comunicação com o canal lateral e, quando todos estavam cheios, interrompia-se
o trabalho de escavação para proceder à concentração das areias depositadas. Essa
concentração era feita no pé de cada reservatório, diante da fenda vertical (presente
no meio da parede da frente de cada mundéu), no caminho que as águas seguiam
para atingir o canal inferior (prolongamento do canal lateral) até serem lançadas no
vale.”34 Ferrand acrescenta que as águas “desempenhavam, portanto, um papel
importante nessa maneira de explotar as jazidas das montanhas; pareciam tão
necessárias, que se tornou um axioma, entre esses antigos mineradores, que ‘sem
água de nada valia uma serra de ouro’.
Trabalhos no interior das montanhas:
“Somente quando os mineradores depararam com jazidas completamente embutidas
nas montanhas ou cobertas por camadas espessas de rejeito, decidiram recorrer aos
procedimentos da arte das minas (...). Nesse caso, operavam nos pontos que
pareciam melhores, escavando uma galeria que seguia as linhas ricas, verdadeiros
buracos de toupeira, fazendo curvas inacreditáveis e cuja seção por vezes mal
permitia a passagem de um homem.
34 Segundo Ferrand certos “proprietários de minas construíram reservatórios de grandes dimensões, emnúmero suficiente para acumular o produto do trabalho de um ano. Os que podem ser vistos na mina doVeloso, em Ouro Preto, são um modelo desse tipo (...) (Ferrand, 1998, p.91-131).”
“Quando atingiam uma parte muito produtiva, alargavam à direita, à esquerda, acima,
embaixo, aleatoriamente, fazendo desse modo uma escavação que ia aumentando,
até o dia em que ocorriam desmoronamentos que fechavam a passagem, ou quando
eram detidos por falta de aeração ou pela presença de alguma água, que não podiam
controlar com os pequenos meios a sua disposição. Assim, explotavam uma jazida por
uma série de galerias que chegavam, cada uma, a uma câmara isolada, feita na parte
mais rica. Quando uma das razões precedentes obrigava a abandonar essa câmara,
recomeçavam mais adiante uma nova galeria. (...) Os antigos mineradores preferiam
fazer o desaguamento à mão. Empregavam vários escravos para transportar a água
nos carumbés (caixas de madeira), como faziam no caso do minério, em vez de abrir
uma galeria na rocha. Eram rebeldes à idéia de perder a jazida de vista, deixando de
ver as linhas onde se encontrava o ouro visível. (...) Ainda hoje se vêem vestígios
desses antigos salões, abertos no afloramento, e aos quais se chegava, nas partes
baixas, por pequenas galerias. Graças a sua abertura superior, essas escavações são
bem ventiladas e suficientemente iluminadas para permitir fácil inspeção (Ferrand,
1998, p.91-131).”
Tratamento das areias e minérios auríferos:
O tratamento que os antigos mineradores davam aos depósitos de aluvião e às rochas
friáveis auríferas se reduzia “a uma seqüência de lavações, de modo a obter areias
concentradas cuja apuração completavam na bateia. Retiravam ouro em pó contendo
ainda algumas parcelas estéries.” Esses serviços eram realizados nas canoas,
“espécie de fosso pouco profundo, feito na terra, no lugar onde se queira proceder à
lavação das areias”, e nos bolinetes, “espécie de caixa de madeira, cujas dimensões
permitiam a dois ou três homens trabalhar ao mesmo tempo; sua produção era
portanto superior à da canoa”. O fosso retangular da canoa media 1m a 1,50m de
comprimento por 0,50 a 0,70cm de largura e 0,10 a 0,60cm de profundidade; a caixa
do bolinete era feita de madeira grossa, com 1,50 a 3,0m de comprimento, com uma
largura aproximada de 1m na cabeceira, que ia diminuindo para baixo, onde não tinha
mais de 0,90cm. A apuração final era feita nas bateias e não raro eram utilizados
sucos de algumas plantas como as folhas de maracujá-açu, de jurubeba, de enxota e
de pegadeira que tinham a propriedade de fazer depositar o ouro flutuante. Ferrand
acrescenta que “os mineradores que tinham explotação de maior porte posicionavam,
de preferência, o fosso de apuração no interior de construções fechadas, com paredes
espessas. “O fosso ocupava o meio de uma sala lajeada, e o negro trabalhava sob os
olhos do senhor ou do feitor, encarregado de vigiar para que ele não roubasse
palhetas de ouro, escondendo-as habilmente na cabeleira crespa (Ferrand, 1998,
p.91-131).”
O tratamento dado às rochas duras previa uma trituração prévia antes da submissão à
lavação. “O sistema de trituração empregado na maioria das minas era executado
diretamente pela mão do homem. Os escravos sentados no chão ou em uma pedra
tinham diante de si, entre as pernas, uma pedra dura e compacta, pedaço de diabásio
ou quartzito, sobre o qual esmagavam o minério com a ajuda de uma marreta de cabo
curto, cuja cabeça pesava de 1 a 2 quilos. Davam pequenos golpes nos pedaços de
minério espalhados na bigorna de pedra, para os reduzir ao estado de areia mais ou
menos fina que punham, em seguida, de lado, pegando uma nova quantidade.” A fim
de otimizar a pulverização, podia ser utilizada ainda a trituração sobre uma laje
espessa de “itacolomito compacto, de 20 centímetros de lado, dando-lhe uma
inclinação de cerca de 30º”. Para isso era utilizada um pouco de água e uma pedra
dura, como o diabásio ou quartzito, para a moagem. Assim como no tratamento do
aluvião, o minério triturado era lavado nas canoas e nos bolinetes.
2.3. Técnicas de construção de moradias nos morros de Ouro Preto.
A apresentação de dados sobre as antigas unidades residenciais constituídas nos
morros de Ouro Preto, além de subsidiar os trabalhos arqueológicos, nos aproxima da
vida urbana vivenciada nesse espaço a partir da fase inicial de sua ocupação (FIG.2).
Seguindo o gancho descritivo desse tópico, interessa-nos, nesse momento, as
informações sobre a utilização de materiais e técnicas construtivas.
Como ainda não identificamos nenhum estudo sistematizado sobre a vida nos morros
de Ouro Preto, a nossa colheita de informações perpassa diferentes fontes e objetos
de pesquisas. Sem dúvida, quanto ao tópico aqui abordado, destacam-se os trabalhos
relacionados à Revolta de 1720, à arquitetura civil e religiosa e à formação urbana de
Ouro Preto, como o Discurso histórico e político sobre a sublevação que nas minas houve no
ano de 1720, de autoria desconhida, mas parcialmente atribuído ao Conde de Assumar, Vila
Rica. Formação e desenvolvimento: residências, escrito por Sylvio de Vasconcelos
(1977, 207p.), e duas recentes dissertações: Códigos e práticas: o processo de
constituição urbana de Vila Rica colonial (1702-1748), escrita por Maria Borrego
(1999); e A moradia em Vila Rica (1750-1810), de Taciana Tavares (2005).
FIG.2. Morro da Queimada – aspecto das ruínas. s/d.
Autor: Luiz Fontana Fonte: Acervo fotográfico do Núcleo de Mentalidade e Memória -IFAC / UFOP.
Em meio aos relatos do Discurso Histórico... (1994, p.136) há referências esparsas
sobre a tipologia das residências situadas nos morros de Ouro Preto, como no instante
em que o incêndio autorizado pelo Conde de Assumar alastrou-se pela cobertura de
palha das casas situadas no Morro do Ouro Podre:
(...) o fogo que livremente ao longe se comunicava em faíscas, achandopronta matéria nas palhas que muitas se cobriam, dilatava oincêndio, que causara maior dano se o capitão com os dragões eordenanças não se se empenhara, com muito trabalho, mais empreservar as casas livres que em destruir as culpadas, convocando, avozes e gritos, os moradores, que defendesse cada qual a sua: (....). Àscasas de Pascoal da Silva, que facilmente se não podiam demolirpela inteireza e resistência das grossas e sólidas madeiras de quese compunham (grifo nosso), mandou o Capitão atacar fogo, e nãocustaram muito a arder (...) (grifo nosso).”
Até o momento, sem dúvida, o texto de Sylvio de Vasconcelos sobre a formação e
desenvolvimento de Vila Rica apresenta as melhores sistematizações sobre os
materiais e as práticas construtivas utilizados nas moradias dos morros de Ouro Preto
(1977, 207p). A importância desse trabalho, que soma-se a outras obras, como
Arquitetura no Brasil: sistemas construtivos (Vasconcelos: 1979,186p.), amplia-se
quando levamos em consideração que Sylvio passou a estudar a Sede de Ouro Preto
desde a década de 1950, portanto, antes do fenômeno de reocupação dos morros,
ocorrido a partir de 1970. Assim, as estruturas das ruínas investigadas por ele em
meados do século XX, marcadas pelas experiências acumuladas por dois séculos de
povoamento e também pelo descaso, encontravam-se relativamente salvaguardadas
das práticas de depredação vistas posteriormente. Por isso, reproduziremos abaixo
algumas observações coletadas em seu texto.35
Técnicas construtivas
35 Alguns aspectos sobre a apropriação do solo na região, normas de regulamentação dasconstruções, a habitação como forma de distinção e os tipos de moradia existentes (ranchos,térreas, sobrados, térreas assobradadas, místicas e chácaras) serão abordadas no tópico Viverna Serra de Ouro Preto: 3 séculos de história..
“As primeiras moradias em Vila Rica, fruto de um povoamento súbito em sítio agreste,
distante dos recursos necessários a uma ordenação metódica de suas construções,
são, a princípio, simples abrigos provisórios, destinados à proteção precária de
seus habitantes, ainda inaptos ao estabelecimento de uma aglomeração humanta
estável.” Os ranchos resumiam-se em “uma área coberta, de piso de terra batida,comportando, no centro a trempe sobre o braseiro, enquanto pelos cantoscolocam-se os jiraus para o merecido descanso de ocupantes. Quando são
muitos (os moradores), espalham-se pelo chão, sobre couros ou esteiras, não sendo
muito difundido, nas Minas, o uso da rede. Arreios servem de assento e as mantas dos
animais de proteção contra o frio. Ranchos maiores se fazem de duas águas, comcumeeira apoiada em pontaletes sobre os frechais. Mais tarde, supletam-se compaus-a-pique no seu perímetro, revestidos ou não por vegetais, à feição dacobertura, ou completados por varas transversais e acabados a barro (grifo
nosso) (Vasconcelos: 1977, p.122).”
Em relação à primeira fase de ocupação em Vila Rica “as de madeira e barro serãode reconstituição mais difícil, em virtude do seu total desaparecimento nosmorros, em situação que pudesse atestar sua ancianidade, e das constantes e
sucessivas reformas que os exemplares sofreram pelo correr dos séculos. As depedra, porém, em ruínas, ainda pontilham o Morro da Queimada, apresentando-se em boas condições para uma razoável recomposição. Todavia, ainda aqui nãose pode haver absoluta segurança quanto à época exata de tais construções,porquanto, mesmo depois do incêndio de 1720, os moradores do local não oabandonaram, como demonstram características arquitetônicas evidentementeposteriores à catástrofe existente nas referidas ruínas e confirma, ainda, o
opúsculo do Triunfo Eucarístico, escrito mais de 10 anos após a sedição (grifo nosso)
(Vasconcelos: 1977, p.124).”
FIG.3. Morro da Queimada – aspecto das ruínas. s/d.
Autor: Luiz Fontana Fonte: Acervo fotográfico do Núcleo de Mentalidade e Memória -IFAC / UFOP.
“Entretanto, é possível que alguma das casas de pedra ali existentes datem dasprimeiras décadas do século XVIII, como atesta, também, a própria análise desua arquitetura. Suas plantas preferem sempre a figura do quadrado ou as figuraspor ele geradas como o retângulo de lado maior igual a duas vezes o menor ou à
diagonal da quadra dimensionada pelo mesmo lado menor. (...) É evidente que
acréscimos posteriores ou apêndices secundários podem determinar outras
conformações às plantas, porém muitas mostram claramente, pela ocorrência no
interior de paredes, antes externas, de pedra, o seu primitivo limite, depois ampliado
em construção mais leve (grifo nosso) (Vasconcelos: 1977, p.125).”
Segundo Sylvio, grande parte das casas dos morros “é, como os ranchos, de peçaúnica, com cerca de 15m2, aberta para o exterior por porta e janela na fachadaprincipal (FIG.4).
FIG.4. Casa dos Morros. 1977
Autor: Sylvio de Vasconcelos Fonte: Sylvio de Vasconcelos, 1977.
Muitas se fazem mestiças, em série, com cômodos mais ao retângulo, completamente
isolados uns dos outros, inclusive por empenas, talvez para a escravaria.
Assemelham-se às senzalas dos engenhos e às habitações dos silvícolas nas missões
jesuíticas, porém não há indícios claros, aqui, de varanda fronteira, comum aos
exemplos citados (FIG.5). Aparecem ainda nos morros, encostados às moradias,
pequenos cubículos com acesso externo, de área em torno de 6m2, cujo estado atual,
bastante ruinoso, torna difícil um estudo mais aprofundado de sua exata destinação e
seu acabamento. Em todo o caso, suas dimensões, a menor espessura de suas
paredes e seu mais reduzido pé-direito conduzem à hipótese de terem sido usados
para guarda de objetos, mantimentos, ferramentas, arreios ou mesmo material de
construção. (...) Mais complexas são as habitações de quatro peças, duas
maiores e duas menores, sala, cozinha, dormitórios do casal e dos filhosrespectivamente. A sala comunica-se diretamente com os demais cômodos e
aberturas já se notam em várias fachadas, menos freqüentes, porém, nas laterais
(grifo nosso) (Vasconcelos: 1977, p.127-128).”
FIG.5. Casa dos Morros. 1977 Autor: Sylvio de Vasconcelos
Fonte: Sylvio de Vasconcelos, 1977.
“Já na vila, propriamente, são encontradas casas que copiam as de morros, dequatro cômodos, porém delas diferenciadas por dividirem-se internamente emcruz, com dois cômodos menores em sucessão longitudinal de um lado, e os dois
maiores do outro. Enquanto as primeiras se agenciam por assim dizer, em função de
um centro comum, a sala, alternando-se em sua volta as demais peças, as segundas
distribuem-se em profundidade, em alas paralelas (grifo nosso) (Vasconcelos: 1977,
p.132-133).”
Clima
“Muitas das habitações dos primeiros mineradores, cujas ruínas ainda pontilham os
morros, abrem-se apenas por um vão ou dois. Quando estes aparecem em maior
número inserem-se, geralmente, na fachada principal, deixando cegas as laterais,
mesmo quando se afastam de construções vizinhas. Apenas óculos ou seteiras
podem, às vezes, interrompê-las e, se algumas aberturas são deixadas nos fundos,
neles, todavia, prevalecem francamente os cheios (Vasconcelos: 1977, p.65).”
Loteamento
“Nas encostas mineráveis, as casas localizam-se em terrenos de conformação
irregular, raramente configuradas em quadra, muitos dos quais cercados de muros de
pedra seca, que também estabelecem a separação de várias áreas internas. As
dimensões desses lotes e de suas subdivisões, talvez destinadas à confinação de
hortas alimárias e minerações, separadamente, são muito variadas, não dando
margem ao estabelecimento de médias razoáveis. Um deles, excepcionalmente
quadrado, mede 30m por lado, comportando quatro áreas internas iguais. Outros são
bem mais exíguos, abrangendo pouco terreno livre além do destinado à moradia, ao
passo que lotes também existem de áreas consideráveis. É provável, como indicam
confinações ainda vigentes, que arruamentos existiram nas encostas, embora mais
estreitos e não cordeados por casario contínuo. Essas ruas, em geral, irradiam-se das
capelas, como ainda aparecem na de Santana, logo perdendo-se, porém, em simples
caminhos (Vasconcelos: 1977, p.101).”
FIG.6. Capela de Nossa Senhora da Piedade. s/d.
Autor: Luiz Fontana
Fonte: Acervo fotográfico do Núcleo de Mentalidade e Memória - IFAC /UFOP.
Situação
“Nos morros, fazendas e arrabaldes, as residências situam-se no interior dos lotes,
raramente se encostando a uma de suas divisas (Vasconcelos: 1977, p.108).”
Materiais
“As primeiras moradias dos morros, excluídos os ranchos provisórios, ainda de vergas
retas, de poucos vãos, simples e rústicos, fazem-se de canga, como atestam suas
ruínas ainda hoje existentes (Vasconcelos: 1977, p.115).”
Sylvio indica que o itacolomito em forma de laje, misturado à canga, também
aparece nas ruínas dos morros (grifo nosso) (Vasconcelos: 1977, p.116). Entre as
rochas ele destaca para a Sede de Ouro Preto, além da canga, a importância dos
quartzitos em blocos ou em formação estratificada e as rochas talcosas e maciças
também conhecidas como pedra-sabão ou de panela (agalmatolitos e esteatitos)
(Vasconcelos: 1977, p.108-109).
A partir de diferentes documentos, ele elenca as madeiras mais comuns utilizadas nas
construção de Vila Rica: canela preta ou parda, braúna, candeia, upiúna,locorama, guapava, cangerana ou sucupira, jacarandá vermelho, bagre, peroba,
pombo, vinháticos, além de madeiras menos valiosas encontradas nas matas nos
arredores. Também eram aproveitadas o sapé e as folhas de palmeira na cobertura
das casas e as espécies fibrosas na amarração, como a canela-de-ema, coqueiros,
taquaras, samambaias arborescentes, cipós, embirra. Comum achar também o couro
para essa última função (grifo nosso) (Vasconcelos: 1977, p.111-114).
O autor indica ainda que Vila Rica não dispunha de boas terras para uso nas
construções “sendo preferidas as de coloração róseo-alaranjada, existentes nas
proximidades da Capela de Nossa Senhora do Rosário do Padre Faria”. Utilizada com
certa quantidade de areia, aglutinante, esterco de curral e palhas diversas nos
assentamentos das alvenarias, taipa de pilão (técnica paulista pouco empregada) e
preenchimento do pau-a-pique. A areia era obtida “em depósitos naturais formados
pela desagregação do itacolomito e encontrada, por exemplo, no areião do outeiro de
Nossa Senhora do Rosário do Alto da Cruz (Santa Efigênia). Esses depósitos são
freqüentes na região, possibilitando seu aproveitamento no próprio local das obras,
como ocorreu quando dos trabalhos da estabilização e conservação levados a efeito
na Igreja de Nossa Senhora do Rosário de Mariana (Vasconcelos: 1977, p.117-118).”
“A cal, por sua vez, não é a princípio fabricada na Vila, pela não ocorrência nela de
formações calcárias favoráveis.” A cal preta “solidifica bem as argamassas e, por isto,
é preferida em certos casos como nas construções destinadas a receber ou conduzir
água, sejam tanques de acumulação, nas minerações, ou telhados, tal o dos quartéis
de 1785, que devia ser emboçado ‘todo de cal preta para que fique com mais
segurança’. A cal branca vem, pois de longe, recomendando-se sempre que seja ‘da
melhor do país’ como rezam os documentos. Na falta delas podem as paredes ser
‘caiadas de tabatinga’ (argila brancacenta), conforme as especificações de 1728 para
as obras dos quartéis.” Acrescenta o autor que em Antônio Pereira, Distrito de Ouro
Preto, tornou-se um importante produto regional de cal preta (grifo nosso)
(Vasconcelos: 1977, p.118).
Durante o século XVIII, o ferro foi produzido a partir de forjas simples existentes nas
fazendas. “São, portanto, as forjas singelas ou os fornos de cuba que vão suprir o
intenso consumo desse material, não só para os trabalhos de mineração como
também para a arquitetura, compondo ‘fechaduras feitas na terra e não de carregação,
tudo na última perfeição, como em semelhante obra carece’, dobradiças, ferrolhos,
instrumentos de trabalho, pregos ‘todos feitos no país e de bom ferro’ etc
(Vasconcelos: 1977).”
Abastecimento de água.
“Nos morros, os tanques destinados aos trabalhos de mineração, sem dúvida
atenderiam também às necessidades domésticas. Aliás, a água foi razão de muita luta
entre os mineradores, até que D. Pedro de Almeida (Conde de Assumar) regulasse o
seu uso, em atenção a representações que o Guarda-Mor Garcia Rodrigues Pais
havia feito ao rei (Vasconcelos: 1977, p.164).”
2.4. Ouro Preto: rede de caminhos.
O estudo desse tema visa identificar parte dos caminhos internos e externos que
atravessaram a Sede de Ouro Preto a partir do final do século XVII. Acreditamos que
esse tópico nos auxiliará na compreensão das conexões terrestres tecidas entre a
Serra de Ouro Preto e as regiões situadas próximas ao Termo. Conexões que
viabilizaram o trânsito de mercadorias e saberes, participaram dos cenários dos motins
e estimularam a formação de núcleos urbanos e zonas rurais. Para esse fim
utilizaremos diferentes fontes manuscritas, impressas e cartográficas.
FIG.7. Planta Geral da Capitania de Minas Geraes – ca. 1800
Fonte: Costa et al, 2002.
A Planta Geral da Capitania de Minas Gerais elaborada em 1800 (Costa et al: 2002)
indica a amplitude da rede de estradas que sulcou o território mineiro durante os
setecentos, interligando as minas às Capitanias de São Paulo, Bahia, Pernambuco,
Rio de Janeiro, Goiás e Mato Grosso, segundo a divisão territorial adotada nessa
época (FIG.7). Em meio a essa extensa rede de estradas evidenciaremos, a partir de
Ouro Preto, dois ângulos: o primeiro é formado pela rede interna da Sede, onde ainda
sobressai o Caminho (ou Estrada) Tronco que liga a região das Cabeças ao Padre
Faria; o segundo, formado pelas rede externa, destaca as vias que se estendiam entre
a Serra de Ouro Preto e as localidades próximas, como Mariana e Sabará. O Caminho
Tronco guiará o nosso olhar pela espinha dorsal da Sede de Ouro Preto, bem como
apontará possibilidades de conexões com as áreas sitadas nos pontos elevados. As
outras vias evidenciarão os roteiros indicados em mapas setecentistas, pesquisas e
relatos dos cronistas estrangeiros do século XIX.
FIG.8. Rede de caminhos que atravessava Vila Rica –
detalhe da Planta Geral da Capitania de Minas Geraes – ca. 1800
Fonte: Costa et al, 2002.
2.4.1. Caminho Tronco.
Segundo Sylvio de Vasconcelos, dentre os vários caminhos existentes na Sede de
Ouro Preto o mais importante é o chamdo Caminho (ou Estrada) Tronco (FIG. 9 e 10).
Esse caminho “entra na vila e vai direto à Matriz do Pilar, de onde se endireita para a
Matriz de Antônio Dias, saindo por Santa Efigênia. Por isso mesmo, na entrada,
designa-se por Cabeças (princípio), entre as matrizes, Rua Direita e, na saída Vira e
Sai. Principia esta estrada no Passa-Dez, subindo para as Cabeças; desce para a
Matriz do Pilar, no fundo de Ouro Preto, de onde galga o morro de Santa Quitéria;
decai para Antônio Dias, novamente sobe para o Alto da Cruz, de onde vira e sai para
a Vila do Carmo, cidade de Mariana (Vasconcelos: 1977, p.71).”
FIG. 9 e 10. Caminho (ou Estrada) Tronco de Ouro Preto.
Autor: Sylvio de Vasconcelos Fonte: Vasconcelos, 1977.
“São essas três alturas, já figuradas na triunfal procissão de 1730 (Triunfo Eucarístico),
que aparecem também no brasão da cidade. As ruas em que, posteriormente, se
transforma, subdividindo-se, a estrada principal, tomam, com o correr do tempo,designações várias, a princípio explicativas, como a ‘rua que segue da ponte seca
até a ponte do Ouro Preto’ a que ‘vai da igreja do bairro do Ouro Preto para o arraial
dos Paulistas’, ‘direita da vila’. Depois tomam nome dos seus mais importantes
moradores: Rua do Vigário, dos paulistas, dos caldeireiros etc ou das construções
mais valiosas que nela se erguem: Rua da Ponte, da Cadeia, do Palácio etc (grifo
nosso) (Vasconcelos: 1977, p.71-72).
O Caminho (ou Estrada) Tronco, espinha dorsal da Sede de Ouro Preto, sofreu
modificações à medida em que o Morro de Santa Quitéria, atual Praça Tiradentes, se
configurou como o espaço de instalação das principais estruturas de poder a partir da
década de 1740. Antes desse período, a ligação entre as regiões das Cabeças e
Antônio Dias, via Pilar, era preferencialmente realizada pela parte baixa da antiga vila,
contornando o Morro da Forca. Contemporâneas ao Caminho Tronco, conforme as
FIG. 9 e 10, são as conexões abertas entre a parte baixa da Sede e as áreas elevadas
da Serra de Ouro Preto e entre os próprios morros, conhecidos posteriormente como
São Sebastião, Piedade, Santana e São João. A espinha dorsal da Sede está
marcada em vermelho claro; os morros da serra estão assinalados em laranja claro.
2.4.2. Caminhos na Serra de Ouro Preto.
Alguns estudos e os relatos dos cronistas estrangeiros que passaram pela Sede de
Ouro Preto ainda são as melhores pistas sobre os caminhos consagrados como as
principais rotas de entrada ou saída desse espaço.36 Devido ao foco desse trabalho,
indicaremos apenas as rotas citadas que conectavam a Serra de Ouro Preto às
localidades próximas, como Mariana e Sabará.
Ligação entre Ouro Preto e Sabará (via São Bartolomeu)
Esse roteiro foi aberto entre a última década do século XVII e a primeira da centúria
seguinte, interligando duas áreas que se destacaram em meio às descobertas dos
primeiros depósitos de ouro de aluvião na região central de Minas Gerais: Vila Rica e
Sabará (FIG.11).37 Por esse itinerário, sobretudo nas primeiras décadas do século
36 Certamente, além dos caminhos aqui identificados, existiam outras vias, como as trilhas que facilitavamo trânsito nas imediações da Sede, mas construir um mapeamento abrangente, inclusivo, requer um estudoespecífico que está além do propósito desse trabalho.37 A abertura desses caminhos avançou pelas matas fechadas sendo comum as práticas dederrubada das árvores, o ateamento de fogo e, em seguida, a retirada das raízes. Pronto, oscaminhos começavam a se desenhar para a passagem do crescente número de viajantes, tropas egados. Quando apareciam os cursos d’água rasos, eles eram atravessados a vau (que quer dizer a
XVIII, seguiu parte das mercadorias vindas das praças baianas que abasteciam o
crescente número de habitantes instalados na região.38 A esse movimento de
identificação de lavras auríferas e circuito comercial somou-se a instalação dos
roçados na região do Rio das Velhas para o abastecimento da demanda por produtos
agropecuários.39
Assim, saindo de Vila Rica através da Serra de Ouro Preto, os viajantes passavam
pelos distritos de São Bartolomeu, Glaura (antiga Casa Branca), Acuruí (antigo Rio
das Pedras, município de Itabirito), Rio Acima (antigo Santo Antônio), Raposos e
Sabará (FIG.11). Segundo Eduardo Barreiros (1984, p.73), que estudou a geografia
da chamada Guerra dos Emboadas, esse foi um importante roteiro utilizado pelos
informantes e parceiros de Manuel Nunes Viana em Ouro Preto. Parceiros
emboadas como Pascoal da Silva Guimarães, proprietário de datas minerais na
Serra de Ouro Preto e de roçados e engenhos na região do Rio das Velhas, onde
residia.
FIG.11. Rede de caminhos que atravessava Vila Rica –
Detalhe da Planta Geral da Capitania de Minas Geraes – ca. 1800
Fonte: Costa et al, 2002.
pé); nos cursos mais profundos ou com fortes correntezas, eram utilizadas canoas e balsas ouconstruídas as primeiras pinguelas e pontes (Santos: 2001, 180p; Costa: 2005))38 O Caminho da Bahia foi responsável por boa parte do abastecimento de mercadorias nasáreas de exploração do ouro até 1724, incluindo gado, escravos e produtos importador(Carrara, 2007; Santos, 2001).
39 André Gomes Ferreira foi um dos aventureitos que, após chegar às minas em 1698/99,passou a residir na região do Rios das Velhas. Segundo ele: “Em o mês de Dezembro de 1706anos, cheguei a estas minas do Rio das Velhas aonde estou vivendo até agora e não havia maisque três freguesias em todo o termo desta vila de Sabará: Roça Grande e Raposos e o mesmoSabará; (...) Depois se repartiram a de Raposos, se fizeram três freguesias: Santo Antônio Rio-acima, Rio das Pedras (grifo nosso), Congonhas do Sabará” (Códice Costa Matoso,1999).
Ligações entre Ouro Preto e Sabará (via Antônio Pereira, Mariana, Catas Altas e
Caeté).
Esse roteiro foi aberto no mesmo período do caminho anteriormente citado, a partir da
identificação de novos depósitos de aluvião, formação de arraiais, ocupações de
roçados e trânsito comercial. Durante as primeiras décadas, ele também serviu como
via de circulação para as mercadorias que seguiam entre Sabará e Vila Rica, incluindo
os produtos vindos da praça baiana.
O viajante que saia de Vila Rica podia optar pelo caminho que seguia pelo Padre Faria
e Taquaral (atravessando Passagem de Mariana e a Sede de Mariana) ou pela Serra
de Ouro Preto (passando por Antônio Pereira). A partir de Antônio Pereira ou da Sede
de Mariana, ele continuava por Bento Rodrigues, Inficcionado (atual Santa Rita
Durão), Catas Altas, Santa Bárbara, São João do Morro Grande, Cocais, Caeté e
Sabará (FIG.12). A partir de Cocais, em vez de virar para o oeste rumo a Sabará, ele
poderia também seguir para o norte até a região do Serro e Diamantina, pouco
habitada até meados da década de 1720.40
FIG.12. Rede de caminhos que atravessava Vila Rica –
detalhe da Planta Geral da Capitania de Minas Geraes – ca. 1800
Fonte: Costa et al, 2002.
Infelizmente, os relatos que registram a passagem de viajantes pelas rotas que
ligavam a Serra de Ouro Preto a Sabará (via São Bartolomeu ou Antônio Pereira) são
pouco descritivos, trazem mínimas informações sobre essas vias.41 Existem alguns
40 A descoberta das “pedras brilhantes” (ou diamantes) na região do Serro Frio, a partir de1714, aumentou o número de ocupações nessa região. No entanto, somente a partir de 1729,esses achados foram oficialmente divulgados. O que resultou na edição de diferentesregimentos para controlar esse tipo de extração, como a demarcação e a denominação dessaregião como Distrito Diamantino em 1734.
41 Até o momento, conforme as fontes primárias impressas identificadas na área de Relatos, memórias eestatística, pesquisamos 14 relatos de viajantes estrangeiros que passaram por Ouro Preto no século XIX,incluindo os estudos do geólogo alemão Wilhelm Eschwege.
motivos para justificar essa quase ausência. Em relação a São Bartolomeu: a ligação
entre Ouro Preto e Sabará (via Rio das Velhas) poderia ser realizada a partir de outras
localidades, como Cachoeira do Campo, e daí seguir por Casa Branca (atual Glaura)
até Sabará. Portanto, apesar de antiga, essa não era uma via exclusiva. Assim, é
possível supor que a passagem por São Bartolomeu, a partir da Serra de Ouro Preto,
tenha sido utilizada com maior frequência pelos habitantes dos morros ou de Antônio
Pereira, já que seguiam pela parte elevada da Sede. Em relação a Antônio Pereira:
tomando como referência os relatos dos cronistas estrangeiros percebe-se que o
deslocamento entre Ouro Preto e Mariana, e daí para Sabará ou Diamantina, era
preferencialmente realizado através de Passagem de Mariana. Dois motivos
corroboram essas impressões: primeiro, que evitava subir ao topo da Serra de Ouro
Preto, esforço necessário para atingir Antônio Pereira; segundo, que era o caminho
mais bem cuidado, como atesta o comerciante inglês John Mawe, que seguia de
Mariana para Ouro Preto no início do século XIX:
Depois de meia légua de caminho, alcançamos o pequeno Arraial dePassagem, onde outrora havia muitas lavras de ouro. Por uma ponte,construída inteiramente em itabirito, atravessamos o Ribeirão daPassagem. O arraial fica numa encosta bastante escarpada, passandopor dentro dele uma estrada calçada. (...) No alto passa a estrada, planae retilínea, de leste para oeste. A natureza da rocha, que aqui também éo tão espalhado itabirito, permite a pouca escavação da serra e aaparência de solidez e asseio da estrada que a atravessa (Mawe: 1976,p.385).
As poucas informações coletadas sobre os caminhos que cruzavam a Serra de Ouro
Preto demonstram um certo distanciamento dos cronistas estrangeiros sobre essa
parte da Sede. O comentário do comerciante inglês John Luccock, quando viajava de
Ouro Preto para Mariana entre 1817 e 1818, ilustra essa situação:
Antes de alcançarmos Passagem, aldeia de cerca de cento ecinquentas casas, com uma boa ponte por sobre uma torrente,indicaram-me um ponto bem no cume de um morro que ali se inclinapara o norte, que é tido por ter sido um dos mais ricos do Brasil(Luccock; l976, p.339).42
42 É preciso levar em consideração também os diferentes interesses dos viajantes estrangeiros quepassaram por Minas Gerais no século XIX. O que era prioridade para o campo de observação de um nãoera necessariamente para outro.
Visitada ou não, a Serra de Ouro Preto ainda era uma referência como se percebe
nesse comentário de Charles Banbury, enquanto transitava de Ouro Preto e Mariana
em meados dos oitocentos:
No Ribeirão do Carmo (ainda no perímetro de Ouro Preto) vê-se muitasvezes negros, com ancinhos e alguidares, lavando a areia em busca deouro, e ao longo de todo o lado da Serra de Ouro Preto existeminúmeras pequenas cavernas cavadas nas rochas, de ondeantigamente o precioso metal era extraído; mas nenhuma delas foilevada a uma profundidade de muitos pés (Banbury: 1981, p.67).
No entanto, há exceções, como em algumas passagens do estudo de Wilhelm
Eschwege denominado Observações geológicas sobre as minas de ouro. Segundo o
geólogo alemão, o viajante que percorresse a Serra de Ouro Preto em 1815
encontraria entre as numerosas explorações de pequenos proprietários, na maior
parte abandonadas, as seguintes lavras importantes: Lavra dos Pelúrios, no Morro de
São Sebastião; Lavra do Padre Viegas, no Morro de Santana; Lavra do Moreira, no
Morro da Piedade ou Água Limpa; Lavra do Padre Bernardo, no Sumaré; e Lavra do
Padre Bento, no Morro de Santo Antônio da Passagem, pertencente ao Tenente
Coronel Maximiano. Conforme Eschwege:
Os grandes proprietários, dos quais nenhum, porém, possui mais dedoze escravos em serviço, exploram suas lavras pelo método do talhoaberto, ao contrário dos pequenos, que o fazem por meio de galerias epoços. (...) Às vezes não se pode caminhar cinqüenta passos, semtopar com uma galeria e um poço, aberto no morro através da capa detapanhoacanga. Centenas de catas foram abertas junto ou sobre ospoderesos vieiros de quartzo aurífero, que, nesse lugar, atravessou oitacolomito em várias direções. (...) Na encosta da serra, entre blocosestilhaçados, se avistam as pobres cafuas esparsas dos faiscadores, oude negros forros, assentados no terreno profundamente esburacado. Onúmero desses negros forros, que arrastam uma vida miserável emvirtude de maus processos de apuração atingia, em 1815, a mais deduzentos e oitenta, só nas duas freguesias de Vila Rica (Eschwege:1979, p.8).
O francês Auguste Saint-Hilaire, ao lado de Eschwege, também pegou a estrada da
Serra de Ouro Preto em 1816 para observar os serviços minerários em Antônio
Pereira. Segue parte do seu relato:
Após sairmos da cidade, galgamos as elevações que a rodeiam. Portodos os lados, tínhamos sob os olhos os vestígios aflitivos daslavagens, vastas extensões de terra revolvida, e montes de cascalho;mas, ao mesmo tempo, dominávamos uma parte da cidade, e maisalém percebíamos o vale em que corre o Rio Ouro Preto. (...)
Continuando nossa rota, subimos e descemos várias vezes,segundo pelos caminhos mais horríveis, e chegamos finalmente aum vale de tal modo sombrio que, comparado a ele, a região queacábavamos de atravessar poderia passar por risonha (grifo nosso).Os morros que a rodeiam são cobertos de uma relva pardacenta, eexibem a imagem da esterelidade; em todos os lugares em que otrabalho dos mineradores despojou a terra da vegetação, ela apresentauma coloração vermelho escura; e as águas pouco abundantes doregato da Gualacha (Gualaxo), que corre pelo vale, deixam de ver seuleito de cor negra. É aí que está situada a povovação de Antônio Pereira(...) (Saint-Hilaire: 1975, p.75).
Entre 1817 e 1820, Johann Spix e Friedrich Martius também fizeram o mesmo
caminho:
Alguns dias após a excusão, pusemo-nos a caminho para a aldeia deAntônio Pereira, distante ao norte cinco léguas, para sabermos o queera feito de nossas mulas, que, durante a nossa estada em Vila Rica,tinham sido mandadas na maior parte aí para o pasto. Depois dehavermos vencido a crista pedregosa do Morro de Vila Rica (...)transpusemos, a uma légua da cidade, no Córrego de Andrada, oRio das Velhas, neste ponto ainda um riacho muito insignificante(...). Numa grande fazenda sita na estrada, construída a modo deconvento, era antigamente lavado muito ouro de vinte e doisquilates dos filões do minério de ferro (grifo nosso). Também, emgeral, toda a Serra de Antônio Pereira corresponde em seus elementose a posição das camadas ao aurífero Morro de Vila Rica; pois elaconsiste igualmente de xisto quartzítico branco, com jazidas demicaxisto, contendo oligisto e uma extensa camada de hematitasobreposta. Entre a vegetação dessa montanha, parecendo pertencerespecialmente à formação das jazidas de ferro, nota-se tambémabundância de capim melado (...) (Spix e Martius: 1976, p.246).
No final do século XIX, João Cândido da Costa Sena (1881, p.108), a pedido de Henri
Gorceix, Diretor da Escola de Minas, percorreu o roteiro entre Ouro Preto e a região do
Serro, a fim de estudar “cuidadosamente as minas de ouro e fabricas de ferro
existentes nesta parte da província, notando ao mesmo tempo o modo de exploração
das matas e do fabrico de carvão.” Sobre as lavras de ouro no caminho entre Ouro
Preto e Mariana, ele escreveu:
Seguindo a estrada que conduz de Ouro Preto a Mariana, nada direisobre as lavras de ouro que se encontram a cada momento, e quesendo em outro tempo trabalhadas sem ordem nem método, se achamhoje em estado de completo abandono.
Próximo a essa região, Costa Sena destacou apenas a Mina do Maquiné ou do Morro
de Santana, explorada pela empresa inglesa Don Pedro Gold Mining Company,
conforme anotou Paul Ferrand no final da década de 1880 (1998, p.90). Por fim, essa
ausência de informações sobre os caminhos ou a vida que transcorria na Serra de
Ouro Preto nos parece uma boa pista para pensarmos a sua situação no século XIX.
Primeiro, como os capitais estrangeiros começaram a propectar áreas de mineração a
partir de 1824 - após a liberação do Império – e, até o momento, não identificamos
nenhuma empresa estrangeira instalada nesse espaço, nos parece que se a Serra de
Ouro Preto chegou a despertar algum interesse, a relação custo/benefício não
justificou quaisquer investimentos. Esse é um sinal negativo sobre a vitalidade das
lavras nesse espaço desde o início do século XIX, corroborando as impressões
anteriormente citadas por Eschwege.43 Segundo, tanto no estudo de João Cândido da
Costa Sena como no de Paul Ferrand, ambos realizados no final dos oitocentos, não
houve destaque para nenhuma lavra que ainda estivesse ativa na Serra de Ouro
Preto. Caracterizando, portanto, uma situação de baixa produção ou, mais provável,
de um abondono quase generalizado.
Essa situação nos indica uma tendência de despovoamento dessas áreas elevadas,
situação certamente agravada a partir da década de 1890 quando Ouro Preto sofre um
significativo esvaziamento de sua população após a construção da nova capital: Belo
Horizonte.
Conclusão
Nesse relatório vimos a importância da formação geológica local nas escolhas dos
materiais e das técnicas utilizadas nas áreas minerárias e residenciais da Sede de
Ouro Preto. Identificamos as duas principais formas de extrair o ouro nesse espaço (a
talho aberto e a abertura de galerias) e as dificuldades que os arqueólogos
encontrarão para apontar com exatidão a época de construção das estruturas (hoje
em ruínas) que ainda “pontilham” o Morro da Queimada - apesar de existir a
43 Até 1850 seis empresas estrangeiras já estavam instaladas na zona mineradora desenhadaentre as Vilas de Sabará, Ouro Preto (como a The Brazilian Company, no Distrito de Itabira doCampo), Mariana, Tiradentes, São João Del Rey e Serro. Além dos recursos financeiros, essascompanhias trouxeram técnicas que contribuíram para a inovação da produção do ouro emMinas. Os veios cada vez mais profundos e a necessidade de melhorar a produtividadedeterminaram os investimentos em estruturas mecanizadas e grandes plantéis detrabalhadores livres e escravos (Hirashima: 2003, 70p.)
possibilidade de realizar atribuições a partir das características arquitetônicas
encontradas.
Por último, falamos sobre os caminhos antigos abertos na Sede municipal, as suas
ligações com a Serra de Ouro Preto e as conexões dessa com as localidades
próximas, como Mariana e Sabará. Através do estudo dessas estradas percebemos
traços da diminuição dos trabalhos nas lavras situadas na serra ao longo do século
XIX, que indicam uma tendência de decréscimo da população nessa área.
Na próxima fase da pesquisa acreditamos que devemos centrar a nossa atenção nas
informações demográficas, recolhidas a partir de lista de tributação, como o Quinto e a
Captação, e censos, como o de 1804 (Mathias: 1969, p.190-208), a fim de construir
um levantamento de parte dos nomes das pessoas que habitaram o Morro da
Queimada nos séculos XVIII, XIX e XX. A partir dessa lista de nomes,
poderemos pesquisar em inventários, testamentos e demais documentos
indícios sobre a vida urbana processada nesse espaço em diferentes tempos.
Referências bibliográficas
1. Fontes primárias.
1.1. Fonte Iconográfica.
1.1.1. Arquivo Público Municipal de Ouro Preto.
APMOP Relação de Plantas, nº001: plantas das lavras do Tassara e Arredores,07/06/1913, Engenheiros Francisco A. Lopes e Alcindo da Silva Vieira Gil Guatimosin.
APMOP Relação de Plantas, nº002: cópia da planta das lavras do Tassara eadjacentes na antiga Vila Rica de 1900, medição e cópia do original realizada porJoaquim José Guimarães Pinto, em 1912.
APMOP Relação de Plantas, nº003: planta de água, esgoto e luz – Ouro Preto,26/06/1903, Engenheiro Clodomiro de Oliveira.
APMOP Relação de Plantas, nº006: planta-esboço de uma parte da cidade de OuroPreto, 20/05/1913, Agrimensor Joaquim José Guimarães Pinto.
APMOP Relação de Plantas, nº007: plantas das lavras “Tassaras” e arredores,27/08/1903, Engenheiro Clodomiro de Oliveira e Mariano Ribeiro
APMOP Relação de Plantas, nº010, pasta 06, caixa 09, estante 26, sala 1, folhas 07,08 e 09: levantamento aerofotogramétrico e Projeto Áreas de Preservação na cidadede Ouro Preto, 1982.
APMOP Relação de Plantas, nº013: planta da sesmaria e cidade de Ouro Preto, 1898,autor(es) não identificado(s).
APMOP Relação de Plantas, nº018: mapa do município de Ouro Preto, 1980, autor(es)não identificado(s). (DESCARTADA).
APMOP Relação de Plantas, nº036: planta da cidade de Ouro Preto, s/d, autor(es) nãoidentificado(s).
1.1.2. IFAC / UFOP - Acervo fotográfico do Núcleo de Mentalidade e Memória.
1.1.2.1. Acervo 002 - Miscelânea. Ouro Preto, s/d, Fundo Diversos.
10 UNIDADES: 0161, 0182, 0204, 0205, 0236, 0259, 0272, 0389, 0467 e 0516.
1.1.2.2. Acervo 003 - FONTANA, Luiz. Ouro Preto, [décadas de 1920 e 1950], FundoJosé Góes.
54 UNIDADES: 0201, 0234, 0237, 0266, 0270, 0295, 0305, 0320, 0369, 0484, 0513,0517, 0539, 0545, 0607, 0635, 0638, 0647, 0659, 0664, 0706, 0721, 0729, 0731, 0733,0736, 0760, 0766, 0782, 0913, 0920, 0974, 0998, 1000, 1073, 1081, 1084, 1086, 1089,1098, 1100, 1102, 1105, 1112, 1165, 1231, 1242, 1244, 1253, 1265, 1270, 1271, 1283,1287.
1.1.2.3. Acervo 004 - MENEZES, Ivo Porto de. Ouro Preto, s/d, Fundo Ivo Porto deMenezes.
04 UNIDADES: 0005, 0006, 0017 e 0066.
1.1.2.4. Acervo 005 - LIBENEAU, Guilherme. Ouro Preto, [1881], Fundo BibliotecaNacional.
08 UNIDADES: 0007, 0011, 0012, 0014, 0015, 0017, 0018 e 0024
1.2. Fonte impressa.
1.3.1. Revista do Arquivo Público Mineiro.
Atas da Câmara Municipal de Vila Rica (1711-1715). RAPM, ano XXV, v.2, 1937.
Termo de ereção de Vila Rica. RAPM, ano II, jan./março, 1897, p.84.
Bando fixando os limites entre as Comarcas de Vila Rica, Sabará, Rio das Mortes eSerro Frio pela parte do Rio Doce. RAPM, v.VII, 1902, p.411-413.
Cartas de Sesmaria (1710-1713). RAPM, v.III, 1898, p.23-85.
Cartas de Sesmaria. RAPM, v.IV, 1899, p.155-214.
Cartas régias sobre o procedimento que se há de ter com os povos que se sublevarame outros assuntos. RAPM, v.VI, 1901, p.213-217.CARVALHO, Feu de. Reminiscências de Vila Rica. RAPM, ano XIX.
COELHO, J. J. Teixeira. Instrução para o governo na Capitania de Minas Gerais(1780). RAPM, ano VIII, 1903.
Correspondência do Conde de Assumar depois da Revolta de 1720. RAPM, v.VI,1901, p.203-211.
Fontes Históricas do Imposto de Capitação. RAPM, ano XIII.
LEME, Antônio Pires da Silva Pontes. Memórias sobre a extração de ouro naCapitania de Minas Gerais. RAPM, ano I, 1896.
LIMA, Augusto de. Um município do ouro – memória histórica. RAPM, v.VI, 1901.
LINHARES, Joaquim Nabuco. Mudança da capital. RAPM, ano X, 1905.
Memória sobre as Minas da Capitania de Minas Gerais. RAPM, ano II, p.511.
PONTES, Manuel José Pires da Silva. Manual do Guarda-Mor. RAPM, ANO VII, 1902.
Regimento Mineral de 1702. RAPM, ano I, nº12.
PINTO, Luís Maria da Silva. Relação das Cidades, Vilas e Povoações da Província deMinas Gerais. RAPM, ano II, 1897.
PINTO, Moreira. Ouro Preto. RAPM, ano XI, 1906.
PIRES, Antônio Olinto dos Santos. A Mineração, riquezas minerais. RAPM, ano VIII,1903.
População da Província de Minas Gerais. RAPM, ano IV, p.294.
Registros de diversas cartas-patentes concedidas por D. Braz Baltasar da Silveira.RAPM, v.III, 1898.
SANTOS, Afonso dos. Natureza jurídica dos quintos. RAPM, ano XXVI, 1938.
Sobre o levantamento de Vila Rica (1720) e o alvará confirmando o perdão (1721).RAPM, v.V, 1900.
Termos de Acordãos da Câmara Municipal de Ouro Preto (1716-1721) – Livro nº4.RAPM, nº25, v.II. p.3-166.
VASCONCELLOS, Diogo de. Linhas gerais da administração colonial – seu exercício –Capitães-Mores, Donatários, Governadores, Capitães-Generais, Vice-Rei, Capitães-Mores de Vilas e Cidades. RAPM, v. XIX, 1921.
1.3.2. Relatos, memórias e estatística.
Álbum dos Municípios do Estado de Minas Gerais, Ouro Preto, 2º volume, 1941.
Annuário Estatístico, anno I, 1921, v.2, Serviço de Estatística Geral, Belo Horizonte:Imprensa Oficial, 1925, p.776-779.
ANTONIL, André João (João Antônio Andreoni). Pelas minas de ouro. In: Cultura eopulência do Brasil. São Paulo: Cia. Editora Nacional, 1967. p.255-304.
BANDEIRA, Manuel. Guia de Ouro Preto. Revista do SPHAN, nº2, 1938.
BUNBURY, Charles James F. Viagem de um naturalista inglês ao Rio de Janeiro eMinas Gerais: 1833-1835. Belo Horizonte: Ed. Itatiaia; São Paulo: EDUSP, 1981.
BURMEISTER, Hermann. Mariana, o Itacolomi, Ouro Preto. In: Viagem ao Brasilatravés das províncias do Rio de Janeiro e Minas Gerais: visando especialmente ahistória natural dos distritos auríferos-diamantíferos. Trad. Manoel Salvaterra e HubertSchoenfeldt. Belo Horizonte: Ed. Itatiaia Ltda; São Paulo: EDUSP, 1980. p.212-235.
BURTON, Richard. Viagem do Rio de Janeiro a Morro Velho. Trad. David JardimJúnior. Belo Horizonte: Ed. Itatiaia; São Paulo: EDUSP. 1976.
CASTELNAU, Francis. Expedição às regiões centrais da América do Sul. Trad.Olivério M. de Oliveira Pinto. São Paulo: Companhia Editora Nacional. 1949.
Códice Costa Matoso. Coleção das notícias dos primeiros descobrimentos das minasna América que fez o doutor Caetano da Costa Matoso sendo ouvidor-geral das doOuro Preto, de que tomou posse em fevereiro de 1749, & vários papéis. Coordenaçãode Luciano Raposo de Almeida Figueiredo e Maria Verônica Campos. Belo Horizonte:Fundação João Pinheiro, Centro de Estudos Históricos e Culturais, 1999, 2v. (ColeçãoMineiriana).
COELHO, José João Teixeira. Instrução para o governo na Capitania de Minas Gerais.Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro, Centro de Estudos Históricos e Culturais,1994.
COUTO, José Vieira. Memória sobre a Capitania de Minas Gerais; seu território, climae produções metálicas. Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro, Centro de EstudosHistóricos e Culturais, 1994.
COURCY, Visconde Ernest de. Seis semanas nas minas de ouro do Brasil. Trad. JúlioC. Guimarães. Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro, 1997.
Diário da Jornada que fez o Sr. D. Pedro desde o Rio de Janeiro até a Cidade de São Paulo edesta até às Minas, ano 1717. Revista do SPHAN, nº3.
D’ORBIGNY, Alcide. Minas Gerais. In: Viagem pitoresca através do Brasil. Trad. David Jardim.Belo Horizonte: Ed. Itatiaia; São Paulo: EDUSP, 1976. p.143-165.
Discurso histórico e político sobre a sublevação que nas minas houve no ano de 1720. BeloHorizonte: Centro de Estudos Históricos e Culturais, Fundação João Pinheiro, 1994. 193p.
Enciclopédia dos Municípios Brasileiros. Jurandyr Pires Ferreira (org.). Rio de Janeiro:I.B.G.E., 1959. p.225-238.
LUCCOCK, John. Notas sobre o Rio de Janeiro e partes meridionais do Brasil. Trad.Milton da S. Rodrigues e Mário Guimarães Ferri. Belo Horizonte: Ed. Itatiaia; São Paulo:EDUSP, 1976.
MAWE, John. Viagens ao interior do Brasil. Trad. Selena Benevides Viana. BeloHorizonte: Ed. Itatiaia; São Paulo: EDUSP, 1976.
OLIVEIRA, Ronald Polito de e LIMA, José Arnaldo Coêlho de Aguiar (orgs.). VisitasPastorais de Dom Frei José da Santíssima Trindade (1821-1825). Belo Horizonte:Fundação João Pinheiro, 1998. p.359 e 367.
POHL, Johann Emanuel. Viagem no interior do Brasil. Trad. Milton Amado e EugênioAmado. Belo Horizonte: Ed. Itatiaia; São Paulo: EDUSP, 1976.
SAINT-HILAIRE, Auguste de. Viagem pelas províncias do Rio de Janeiro e Minas.Trad. Vivaldi Moreira. Belo Horizonte: Ed. Itatiaia; São Paulo: EDUSP, 1975.
SCHÜCH, Roch. Memória sobre algumas experiências e empenhos mineralógicos emetalúrgicos. Rio de Janeiro: Impresso da Tipografia de Laemmert, 1840. 53p.
SPIX, Johann & MARTIUS, Friedrich. Viagem pelo Brasil – 1817-1820. Belo Horizonte:Ed. Itatiaia; São Paulo: EDUSP, v.1, 1976.
SUZANNET, Conde de. (L. de Chavagnes). O Brasil em 1845. Trad. Márcia de MouraCastro. Rio de Janeiro: Ed. Casa do Estudante do Brasil. 1957.
TAUNAY, Afonso de E (org.). Relatos sertanistas. Belo Horizonte: Ed. Itatiaia; SãoPaulo: EDUSP, 1981.
VASCONCELOS, Diogo Pereira Ribeiro de. Breve descrição geográfica, física epolítica da Capitania de Minas Gerais. Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro, 1994.
1.3.3. Cartografia.
COSTA, Antônio Eduardo; RENNER, Friedrich Ewalde; FURTADO, Júnia Fereira;SANTOS, Márcia Maria Duarte dos. Cartografia das Minas Gerais: da Capitania àProvíncia. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2002. Atlas em Portifólio, 31 mapas em 29folhas, escala não determinada.
1.3. Fontes secundárias.
AIRES-BARROS, Luís. As rochas dos monumentos portugueses: tipologias epatologias. Lisboa: IPPAR, v.2, 2001.
ANASTASIA, Carla Maria Junho. Vassalos rebeldes: violência coletiva nas Minas naprimeira metade do século XVIII. Belo Horizonte: Editora C/Arte, 1998.______________________________ Entre Cila a Caribde: as desventuras tributáriasdos vassalos de Sua Majestade. In: Revista Varia História, Belo Horizonte, n.º1, 1985.
ANDRADE, Francisco Eduardo. A conversão do sertão: capelas e governamentalidadenas Minas Gerais. Revista Vária História, Belo Horizonte, v.23, nº37, p.151-166, 2007.
ÁVILA, Affonso. Resíduos seiscentistas em Minas. Belo Horizonte: Centro de EstudosMineiros, 1967.
BARREIROS, Eduardo Canabrava. Episódios da Guerra dos Emboabas e suageografia. Belo Horizonte: Editora Itatiaia Ltda; São Paulo: EDUSP, 1984. p.61-86.
BARBOSA, Waldemar de Almeida. Dicionário Histórico-Geográfico de Minas Gerais.Belo Horizonte: Editora Itatiaia Ltda,1995.
____________________________. Dos caminhos pré-históricos às rodoviasasfaltadas. In: História de Minas Gerais. 1979. p.469-495.
BARRETO, Paulo Thedim. Casas de Câmara e Cadeia. Revista do SPHAN, nº11,1947.
BARROSO, Gustavo. Mobiliário luso-brasileiro. In: Anais do Museu Histórico Nacional,v. I, nº5, 1940.__________________. Classificação geral de móveis antigos. In: Anais do MuseuHistórico Nacional, v. IV, 1943.__________________. O mobiliário no Brasil. Revista de Arquitetura, ano IV, nº12,1951.
BEDIAGA, Begonha (org.) Diário do Imperador D. Pedro II: 1840-1891. Petrópolis:Museu Imperial / IPHAN, 1999. 161p.
BENJAMIN, Walter. Coleção Grandes Cientistas Sociais. Trad. Flávio René Kothe.1985.
_________________. Pequena história da fotografia. Flávio R. Kothe (org.). EditoraÁtica, s/d. p.218-240.
BOLTSHAUSER, João. Noções de evolução urbana nas Américas. Belo Horizonte:UFMG, 1959.
BORREGO, Maria Aparecida de Menezes. Dissertação. 1999. Códigos e práticas: oprocesso de constituição urbana em Vila Rica colonial (1702-1748). São Paulo:Annablume, Fapesp, 1999.
BOTELHO, Tarcísio Rodrigues. População e escravidão nas Minas Gerais, c. 1720. In:12º Encontro da Associação Brasileira de Estudos da População – ABEP, GTPopulação e História, realizado em Caxambu (MG), outubro de 2000. Disponível em:http://www.abep.nepo.unicamp.br/docs/anais/pdf/2000/Todos/hist1_5.pdf. Acesso em15/11/2007.
BOXER, Charles R. A idade de ouro do Brasil: dores de crescimento de umasociedade colonial. Tradução de Nair de Lacerda. 3ª edição. Rio de Janeiro: NovaFronteira, 2000.
BLUTEAU, D. Raphael de. Vocabulário Português e Latino. Coimbra: Colégio dasArtes da Companhia de Jesus, 1712.
BOSCHI, Caio C. Os leigos e o poder: irmandades leigas e política colonizadora emMinas Gerais. São Paulo: Ed. Ática, 1988.
BURKE, Peter. História cultural: passado, presente e futuro: In: O mundo como teatro:estudos da antropologia histórica. Lisboa: Difel. 1992. p.15-25.
____________. Hibridismo cultural. Trad. Leila Souza Mendes. São Leopoldo: Editorada Universidade do Vale do Rio dos Sinos. 2003. 116p.
CARRARA, Ângelo A. Ocupação do solo e paisagens rurais. In: Minas e currais:produção rural e mercado interno em Minas Gerais - 1674-1807. Juiz de Fora: Ed.UFJF, 2007. p.149-215.
___________________. Antes das Minas Gerais: conquista e ocupação dos sertõesmineiros. Revista Vária História, Belo Horizonte, v.23, nº38, p.575-596, 2007.
CALÓGERAS, João Pandiá. As Minas do Brasil e sua legislação. Rio de Janeiro:Imprensa Nacional, 1904.
CARVALHO, Feu de. Pontes e chafarizes de Ouro Preto. Belo Horizonte: EdiçõesHistóricas, s/d.
CASAL, Manuel Aires de. Corografia brasílica ou Relação histórico-geográfica doReino do Brasil [pelo] Pe. Manuel Aires de Casal. Belo Horizonte: Ed. Itatiaia Ltda; SãoPaulo: EDUSP, 1976. p.163-182.
CHAVES, Cláudia Maria das Graças. Comerciantes das Minas Setecentistas: adiversidade de atuação no mercado colonial. Belo Horizonte: Caderno de Filosofia eCiências Humanas, n.º10, abril/1998, p. 135-143._________________________________. Perfeitos negociantes: Mercadores dasMinas Setecentistas. 1995. Dissertação – Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas,Universidade Federal de Minas Gerais, 1995.
CHOAY, Françoise. O Urbanismo: utopias e realidades - uma antologia. São Paulo:Perspectiva, 1992.________________. O Reino do urbano e a morte da cidade. In: Revista Projeto
História, espaço e cultura. São Paulo: PUC. 1999.
COSTA, Antônio Gilberto (org.). Os caminhos do ouro e a Estrada Real.Belo Horizonte: UFMG; Lisboa: Kapa Editor ial . 2005.
COSTA, Cláudio Manoel da. Vila Rica. Ouro Preto: Tipografia do Estado de MinasGerais, 1897.
COSTA, Iraci Del Nero. Vila Rica: População (1719-1826). 1977. 253p. Tese -Faculdade de Economia e Administração, Universidade de São Paulo. 1977.
COSTA, Joaquim Ribeiro da. Primeiros municípios. In: Toponímia de Minas Geraiscom Estudo Histórico da Divisão Territorial Administrativa. Belo Horizonte: ImprensaOficial do Estado, 1970. p.15-29.
COSTA, Lúcio. Notas sobre a evolução do mobiliário luso-brasileiro. Revista doSPHAN, nº4.
COSTA E SILVA, Alberto da. A enxada e a lança: a África antes dos portugueses. Riode Janeiro: Nova Fronteira; São Paulo: EDUSP, 1992.
CROSSI, Ramon Fernandes. A religiosidade nas minas setecentistas. Belo Horizonte:Varia História, n.º 24, janeiro/2001, p. 90-106.
D’ASSUMPÇÃO, Silvia Romanelli. Considerações sobre a formação do espaço urbanosetecentista nas minas. Revista do Departamento de História. Belo Horizonte, nº9,1989.
DELSON, Roberta Marx. Novas Vilas para o Brasil-colônia: Planejamento Espacial eSocial no século XVIII. Brasília: Ed. Alva-Ciord, 1997.
DENIS, Ferdinand. Brasil. Trad. João Etienne Filho e Malta Lima. Belo Horizonte: Ed.Itatiaia; São Paulo: EDUSP, 1980.
DIAS, Hélcia. O mobiliário dos Inconfidentes. Revista do SPHAN, nº3.
ESCHWEGE, Wilhelm Ludwig von. Pluto Brasiliensis. Trad. Domício de FigueiredoMurta. Belo Horizonte: Ed. Itatiaia Ltda; São Paulo: EDUSP, v.1 e 2. 1979.
FABRIS, Annateresa. Fragmentos urbanos: representações culturais. São Paulo:Studio Nobel, 2000.212p.
FALCON, Francisco J. C. A cidade colonial: algumas questões a propósito de suaimportância político-administrativa (XVII/XVIII). In: Anais do I Colóquio de EstudosHistórico Brasil/Portugal, PUC MG, agosto de 1993.
FARIA, Sheila Siqueira de Castro. A colônia em movimento: fortuna e família nocotidiano colonial. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1998.
FERRAND, Paul. Explotações antigas. In: O ouro em Minas Gerais. Trad. JúlioCastanõn Guimarães. Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro, 1998. p.91-131.
FIGUEIREDO, Luciano R. de A. Barrocas famílias: vida familiar em Minas Gerais noséculo XVIII. São Paulo: HUCITEC, 1997. (Coleção Estudos Históricos).____________________________ Narrativas das rebeliões: linguagem política eidéias radicais na América Portuguesa moderna. In: Revista USP/Coordenadoria deComunicação Social, Universidade de São Paulo. – n.º57 (mar./mai. 2003). São Paulo:USP / CCS, 2003, p. 6-27.
FONSECA, Alexandre Torres. A Revolta de Felipe dos Santos. In: As MinasSetecentistas. Maria Efigênia Lage de Resende e Luiz Carlos Villalta (org.). BeloHorizonte: Autêntica, Companhia do Tempo, v.1, 2007. p.549-566.
FONSECA, Cláudia Damasceno. Funções, hierarquias e privilégios urbanos. Aconcessão de títulos de vila e cidade na capitania de Minas Gerais. Belo Horizonte:Varia História, n.º 29, Janeiro, 2003, p. 39-51.
___________________________. O espaço urbano de Mariana: sua formação e suasrepresentações. In: Termo de Mariana. Ouro Preto: Editora da UFOP, 1998.p.27-65.
FONSECA, M. A. & SOBREIRA, F. G. O escorregamento do barro da Piedade, OuroPreto, Minas Gerais: Processos de instabilidade em antigas áreas de mineração. In:2nd Pan-American Symposium on Landslides, 1997, Rio de Janeiro. Anais...Associação Brasileira de Mecânica dos Solos e Engenharia Geotécnica,. pp 139-144.1997.
FOUCAULT, Michel. Microfísica do poder. 11ª ed. Rio de Janeiro: Graal, 1995.
FRAGOSO, João; BICALHO, Maria Fernanda Baptista; GOUVÊA, Maria de FátimaSilva (orgs.). O Antigo Regime nos Trópicos: a dinâmica imperial portuguesa (séculosXVI-XVIII). Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2001.
FRANCO, Afonso Arinos de Melo. Desenvolvimento da civilização material do Brasil.Revista do SPHAN, nº11, 1945.
FREIRE, Gilberto. Casas de residência no Brasil. Revista do SPHAN, nº7.
FURTADO, Júnia Ferreira. Homens de negócio: a interiorização da metrópole e docomércio nas Minas setecentistas. São Paulo: HUCITEC, 1999.
GAGNEBIN, Jeanne Marie. História e narração em W. Benjamin. São Paulo: EditoraPerspectiva, 1999. 114p.
GARCIA, Juliane Martins. Traços hispânicos no processo de latinidade da arquiteturacolonial em Minas Gerais. Arquitetura: caderno de produção discente do Núcleo dePós-graduação em Arquitetura e Urbanismo da Escola de Arquitetura da UFMG, BeloHorizonte, v.4, dez.2004, p.18-29.
GONÇALVES, Andréa Lisly. Algumas perspectivas da historiografia sobre MinasGerais nos séculos XVIII e XIX. In: Termo de Mariana: história e documentação. OuroPreto: Editora da UFOP. 1998. p.13-26.
_________________________ As técnicas de mineração nas Minas Gerais do séculoXVIII. In: As Minas Setecentistas. Maria Efigênia Lage de Resende e Luiz CarlosVillalta (org.). Belo Horizonte: Autêntica, Companhia do Tempo, v.2, 2007. p.187-204.
GOUVÊA, Maria de Fátima Silva. Dos poderes de Vila Rica do Ouro Preto: notaspreliminares sobre a organização político-administrativa na primeira metade do séculoXVIII. Revista Vária História, Belo Horizonte, nº31, p.120-140, 2004.
GUIMARÃES, Carlos Magno. Os Cabeças e as cabeças: quilombos, liderança edegola nas minas setecentistas. Belo Horizonte: Varia História, n.º 26, janeiro / 2002,p. 109-131.
HAROUEL, Jean-Louis. História do urbanismo. Campinas: Papirus, 1990.
HESPANHA, António Manuel. Poder e instituições na Europa do Antigo Regime.Coletânea de textos. Lisboa: F. C. Gulbenkian, 1984.
HIRASHIMA, Hayato. 2003. Monografia. Um dia em Cata Branca: subsídios daarqueologia histórica e do geoprocessamento para a elaboração de um modelo sócio-espacial. FAFICH, Belo Horizonte. 2003. 70p.
HOLANDA, Sérgio Buarque de. A mineração: antecedentes luso-brasileiros. In:História geral da civilização brasileira. São Paulo: Difel, t.1, v. 2, 1985. p.228-258._______________________________. Metais e pedras preciosas. In: História geralda civilização brasileira. São Paulo: Difel, t.1, v. 2, 1985. p.259-310.
KELMER MATHIAS, Carlos Leonardo. Jogos de interesses e redes clientelares narevolta mineira de Vila Rica (c.1709 - c.1736). 2005. Tese – PPGHIS / UniversidadeFederal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2005._________________________________.O perfil econômico da capitania de MinasGerais na segunda metade do século XVIII, notas de pesquisa – 1711-1720.Disponível em:http://cedeplar.ufmg.br/seminarios/seminario_diamantina/2006/D06A050.pdf. Acessoem 20/02/2008.
LATIF, Miran Monteiro de Barros. As Minas Gerais. Belo Horizonte: Editora Itatiaia,1991.
LEMOS, Carlos. Arquitetura Brasileira. São Paulo: Melhoramentos, 1979._____________. Cozinhas etc: um estudo sobre as zonas de serviço da casa paulista.São Paulo, 1978.
LIBBY, Douglas Cole. Transformação e trabalho em uma economia escravista. SãoPaulo: Brasiliense, 1988.
LIMA JÚNIOR, Augusto de. A capitania de Minas Gerais: origem e formação. 3ª ed.Belo Horizonte: Instituto de História, Letras e Arte, 1965._______________________. Vila Rica do Ouro Preto: síntese história e descritiva.Belo Horizonte: Gráfica Veloso, 1957.
LOPES, Francisco. História da construção da Igreja do Carmo de Ouro Preto. Revistado SPHAN, nº8.
LOTT, Mirian Moura. Casamento e relações de afetividade entre escravos: Vila Rica –séculos XVIII e XIX. In: Anais da V Jornada Setecentista, nov/2003, Curitiba.
LUNA, Francisco Vidal & COSTA, Iraci Del Nero da. Ocupação, povoamento edinâmica populacional. In: Minas colonial: economia & sociedade. São Paulo: LivrariaPioneira Editora, 1982. p.1-30.
MACHADO, Alcântara. Vida e morte do bandeirante. Belo Horizonte: Ed. Itatiaia Ltda;São Paulo: EDUSP, 1980. 247p.
MAGALHÃES, Beatriz Ricardina. A demanda do trivial: vestuário, alimentação ehabitação. Revista Brasileira de Estudos Políticos. Belo Horizonte, nº65, p.153-199,1987.
MANTOVANI, André L. Faça-se a luz: modernidades e demandas sociais naeletrificação da iluminação pública em Ouro Preto, 1880-1920. 2005.75p. Monografia -ICHS/UFOP. 2005.
MARX, Murilo. Arraiais mineiros: relendo Sylvio de Vasconcellos. Revista Barroco,Belo Horizonte, nº15, 1990/1992.
MARTINS, Marcos Lobato. Mineração, Agricultura e Degradação Ambiental em MinasGerais nos Séculos XVIII e XIX. Revista do LPH, nº4, p.107-119, 1993/1994.
MARTINS, Maria do Carmo S. Revisitando a Província: comarcas, termos, distritos epopulação de Minas Gerais em 1833-35. In: 20 anos do Seminário sobre a EconomiaMineira – 1982-2002: coletânea de trabalhos, 1982-2000. Belo Horizonte:UFMG/FACE/CEDEPLAR, 2002. p.51-89.
MASSARA et alii. Evolução urbana de Ouro Preto nas primeiras décadas do séculoXVIIII. Revista do Departamento de História, Belo Horizonte, nº9, 1989. p.141-148.
MATHIAS, Herculano Gomes. Distrito de Antônio Dias. In: Um recenseamento dacapitania de Minas Gerais: Vila Rica – 1804. Rio de Janeiro: Ministério da Justiça /Arquivo Nacional, 1969. p.190-208.
MATOS, Maria Izilda S. dos. Cotidiano e cidade. In: Cotidiano e Cultura: História,cidade e trabalho. São Paulo: EDUSC, 2002.p.13-43.
MATOS, Raimundo José da Cunha. Comarca de Ouro Preto. In: Corografia históricada Província de Minas Gerais (1837). São Paulo: EDUSP, v.1, 1981. p.89-100.
____________________________. Mapas de Luís Maria da Silva Pinto. In: Corografiahistórica da Província de Minas Gerais (1837). São Paulo: EDUSP, v.1, 1981. p.56-64.
MENESES, J. N. C. Artes fabris e serviços banais. Ofícios mecânicos e as Câmarasno final do Antigo Regime. Minas Gerais e Lisboa – 1750-1808. 2003. Tese dedoutorado - ICHF/UFF, 2003.
MENICONI, Rodrigo Otávio de Marco. A construção de uma cidade-monumento: ocaso de Ouro Preto. 1999. Dissertação - Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas,Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 1999.
MOL, Cláudia C. Mulheres forras: cotidiano e cultura material em Vila Rica (1750-1800). 2001. Dissertação - Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas, UniversidadeFederal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2001.
MOURÃO, Paulo Krüger C. As igrejas setecentistas de Minas. Belo Horizonte: Ed.Itatiaia Ltda, 1964.
MUMFORD, Lewis. A Cidade na História. 3ª ed. São Paulo:Martins Fontes, 1991.
OLIVEIRA, Benedito Tadeu de. O Parque Arqueológico do Morro da Queimada.Disponível em: www.ouropreto.com.br/impressao.asp?cod=2808. Acesso em10/11/2007.
OLIVEIRA, Patrícia Porto de. Vila Rica: dados urbanos dos assentos de batismos deescravos adultos – séc. XVIII. In: II Seminário de História Quantitativa e Serial, Centrode Pesquisa Histórica da Pontifícia Católica de Minas Gerais, XXXX, Belo Horizonte.
Disponível em: http://historia_demografica.tripod.com/bhds/bhd24/patri.pdf. Acesso em15/01/2008.
OMEGNA, Nelson. A cidade colonial. Rio de Janeiro: José Olympio, 1961.
OZZORI, Manoel (org.). Cidade de Ouro Preto. In: Almanack administrativo, mercantil,industrial, scientifico e litterario do Município de Ouro Preto, anno 1. Ouro Preto:Typographia d’A Ordem, 1890. p.75-97.
PAIVA, Eduardo F. Bateias, carumbés, tabuleiros: mineração africana e mestiçagemno Novo Mundo. In: O trabalho mestiço: maneiras de pensar e formas de viver –século XVI a XIX. PAIVA, Eduardo F. & ANASTASIA, Carla M. J. (org.). São Paulo:Annablume:PPGH/UFMG, 2002.
PAULA, Floriano Peixoto de. Vilas de Minas Gerais no período colonial. RevistaBrasileira de Estudos Políticos, nºXIX, junho de 1965.
PENA, Eduardo Spiller. Notas sobre a historiografia da arte do ferro nas ÁfricasCentral e Ocidental. In: Anais do XVII Encontro Regional de História – o lugar daHistória. Campinas, ANPUH/SP-UNICAMP, 2004, p.13-39.
PESAVENTO, Sandra Jatahy. História e História Cultural. 2 ed. Belo Horizonte:Autêntica, 2004. 132p.
PITTA, Sebastião da Rocha. Livro décimo e último. In: História da AméricaPortuguesa. Belo Horizonte: Ed. Itatiaia Ltda; São Paulo: EDUSP, 1976.p.267-293.
POLLAK, Michel. Memória, esquecimento, silêncio. Estudos históricos – Memória. Riode Janeiro: Vértice, v.2, n.3, 1989, pp.3-16.
PRIORE, Mary Del. História do cotidiano e da vida privada. In: Domínios da História:ensaios de teoria e metodologia. Ciro Flamarion Cardoso e Ronaldo Vainfas (org.). Riode Janeiro:Campus, 1997.p.259-274.
_______________. Ritos da vida privada In: História da vida privada no Brasil I:cotidiano e vida privada na América portuguesa, São Paulo: Cia das Letras, 1997.
RAMOS, Donald. A social history of Ouro Preto: stresses of dinamic urbanization incolonial Brazil, 1695-1726. 1972. Tese de Doutorado. Flórida: The University ofFlorida, 1972 (mimeo).
RAMINELLI, Ronald. Simbolismos do espaço urbano colonial. In: VAINFAS (org.)América em tempo de conquista. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1992.
REIS, Liana Maria. Mulheres de ouro: as negras de tabuleiro das Minas Gerais doséculo XVIII. Revista do Departamento de História, Belo Horizonte, nº8, jan/1989.
REIS FILHO, Nestor Goulart. Contribuição ao estudo da evolução urbana do Brasil(1500/1720). São Paulo: EDUSP, 1968.
ROCHA, José Joaquim da. Vila Rica. In: Geografia histórica da Capitania de MinasGerais. Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro, 1995. p.98-106.
RODARTE, Mário Marcos Sampaio. O caso das minas que não se esgotaram: apertinácia do antigo núcleo central minerador na expansão da malha urbana da MinasGerais oitocentista. 1999. 179p. Dissertação - FACE/UFMG. 1999.
RODRIGUES, J. Wasth. Móveis antigos de Minas Gerais. Revista do SPHAN, nº2.
ROMEIRO, Adriana. Conspiração política e cultura política. In: Um visionário na cortede D. João V: revolta e milenarismo nas Minas Gerais. Belo Horizonte: Ed. UFMG,2001.p.169-208._________________& BOTELHO, Ângela Vianna. Dicionário Histórico das MinasGerais: período colonial. 2ª edição. Belo Horizonte: Autêntica, 2004.
RUSSELL-WOOD, A. J. R. O governo local na América Portuguesa: um estudo dedivergência cultural. Revista de História, n.º 109. São Paulo: FFLCH/USP, V.55, nº109, 1977.
SALLES, Fritz Teixeira de. Vila Rica do Pilar. Belo Horizonte: Ed. Itatiaia Ltda; SãoPaulo: EDUSP, 1982.
SANTOS, Benedicto José dos. A Geologia do Município de Ouro Preto. In:Bicentenário de Ouro Preto: 1711-1911. Belo Horizonte: Impressa Oficial do Estado deMinas Gerais, 1911. p. 93-105.
SANTOS, José de Almeida. Estilo brasileiro D. Maria ou colonial brasileiro. Revista doSPHAN, nº6.
SANTOS, Márcio. Estradas Reais: Introdução ao estudo dos caminhos do ouro e dodiamante no Brasil. Belo Horizonte: Editora Estrada Real. 2001. 180p.
_______________. Novas perspectivas. Revista História Viva: Temas Brasileiros, SãoPaulo, Editora Duetto, nº4, 2006.
SANTOS, Paulo Ferreira. Subsídios para o estudo da arquitetura religiosa em OuroPreto. Rio de Janeiro: Kosmos, 1951.
SANTOS, Paulo. A arquitetura religiosa de Ouro Preto. Rio de Janeiro. 1951.
SCARANO, Julita. Cotidiano e solidariedade. Vida cotidiana da gente de cor nas MinasGerais – século XVIII. São Paulo: Editora Brasiliense, 1994.
SENNA, Nelson de. Origem da Cidade: installação da Municipalidade. In: Bicentenáriode Ouro Preto: 1711-1911. Belo Horizonte: Impressa Oficial do Estado de MinasGerais, 1911. p. 1-21.
SILVA, Célia Nonata da. Homens valentes: delimitação dos ‘territórios de mando’ nasMinas setecentistas. Revista Varia História, Belo Horizonte, n.º24, 2001.
SILVA, Fabiano G. da. Trabalho e escravidão nos canteiros de obras em Vila Rica noséculo XVIII. In: Encontro Brasil-Portugal: sociedades, culturas e formas de governarno mundo português – séculos XVI-XVIII. Belo Horizonte, FAFICH/UFMG, 2005.(mimeo).
SILVA, Flávio Marcus da. Roceiros, comissários e atravessadores – o abastecimentoalimentar em Vila Rica na primeira metade do século XVIII. Revista Varia História, BeloHorizonte, n.º29, p.98-114, 2003.
SILVA, José Joaquim da. 1º Município (Ouro Preto). In: Tratado de geografia descritivaespecial da província de Minas Gerais.Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro, 1997.
SILVEIRA, Marco Antonio. Guerra de usurpação, guerra de guerrilhas. Conquista eSoberania nas Minas Setecentistas. Revista Varia História, Belo Horizonte, n.º25,p.123-143, 2001.
SILVEIRA, Vitor. Minas Gerais em 1925. Belo Horizonte: Imprensa Oficial, 1926.
SOBREIRA, F. G. Riscos geológicos: definição de pontos críticos em Ouro Preto.Revista da Escola de Minas, Ouro Preto, v. 44, n. 3 e 4, jul/dez, p. 213 -223, 1991.
SOBREIRA, F. G ARAÚJO, L. G E BONUCCELLI, T. Levantamento de soluçõesestruturais para a contenção de encostas em Ouro Preto. Ouro Preto: Convênio UFOP- Ministério da Cultura/SPHAN. 91p, 1990.
SOUZA, Laura de Mello e. Desclassificados do ouro: a pobreza mineira no séculoXVIII. Rio de Janeiro: Edições Graal, 1982._______________________. Norma e conflito: aspectos da História de Minas noséculo XVIII. Belo Horizonte: UFMG. 1999.
TAVARES, Taciana B. A moradia em Vila Rica: 1750-1810. 2005. 199f. Dissertação -Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal de Minas Gerais,Belo Horizonte, 2005.
TELLES, A. C. A ocupação do território e a trama urbana. Barroco, nº10, 1978/1979.
TRINDADE, Cônego Raimundo. Instituições de igrejas no Bispado de Mariana. Rio deJaneiro: Ministério da Educação e Saúde. 1945.
TURAZZI, Maria Inez. Cultura fotográfica. Revista do Patrimônio Histórico e ArtísticoNacional. Brasília: IMNC, n.27, 1998. p.7-15.
VAINFAS, Ronaldo (org.). Dicionário de Brasil colonial. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001.
VAUTHIER, L. L. Casas de Residência no Brasil. Revista do SPHAN, nº7.
VASCONCELOS, Diogo de. História antiga das Minas Gerais. Belo Horizonte: EditoraItatiaia Ltda, 1974.
VASCONCELOS, Salomão. Os primeiros aforamentos e os primeiros ranchos de OuroPreto. Revista do SPHAN, nº5, p.241-257, 1941.
VASCONCELOS, Sylvio de. Vila Rica. Formação e desenvolvimento: residências. SãoPaulo: Editora Perspectiva, 1977._______________________. Arquitetura no Brasil: sistemas construtivos. BeloHorizonte: UFMG, 1979. 186p.
VELLOSO, Augusto. Dados legislativos concernentes a Villa Rica. In: Bicentenário deOuro Preto: 1711-1911. Belo Horizonte: Impressa Oficial do Estado de Minas Gerais,1911. p.119-131.
VILLALTA, Luís Carlos. O cenário urbano em Minas Gerais setecentista: outeiros dosagrado e do profano. In: Termo de Mariana: história e documentação. Mariana:Imprensa Universitária da UFOP, 1998.
VILLELA, Clarisse M. Critérios para seleção de rochas na restauração da cantaria.2003. Dissertação - Escola de Minas, Universidade Federal de Ouro Preto, 2003.
WASH P. Mobiliário, vestuário, jóias e alfaias dos tempos coloniais. Revista doSPHAN, nº4.
ZAMELLA, Mafalda. O abastecimento da Capitania de Minas Gerais. São Paulo:HUCITEC; EDUSP, 1990.
Kleverson Teodoro de Lima
2ª Relatório parcial - Grupo de Pesquisa Histórica doProjeto de Implantação do Parque Arqueológico Morro daQueimada.
Ouro Preto
Agosto / 2008
Sumário
1. Introdução: viver nos morros de Vila Rica..................................................... 03
2. Os morros enquanto refúgios e referências para caminhos.......................... 05
3. Os morros enquanto espaços de expectativas de
enriquecimento.................10
4. Os morros enquanto pontos de tensão e desordem........................................20
5. Morros de Vila Rica: declínio da produção do ouro –
2ª metade do século
XVIII................................................................................31
6. Século XIX: decadência das lavras nos morros de Vila Rica........................34
7. Referências bibliográficas.................................................................................48
1.Viver nos morros de Vila Rica.
Ninguém ignora que nos tempos coloniais foram os arredores da cidade de OuroPreto um dos centros em que atingiu um verdadeiro máximo, a indústria extrativa.Todos sabem que centenares de arrobas de ouro foram levadas da antiga Vila Ricaaos cofres do tesouro português, e as ruínas que ainda hoje circundam a legendáriacidade atestam ao viajante os esplendores do grande centro de mineração (CostaSena: 1897, p.143).
A epígrafe destaca parte do texto de João Cândido da Costa Sena, “Mineração dos arredores de
Ouro Preto”, publicado em 1897, e indica dois cenários vivenciados nos morros da Serra de
Ouro Preto entre os séculos XVIII e XIX: a riqueza e a ruína dos serviços de mineração do ouro.
O artigo do engenheiro da Escola de Minas, além de defender a aplicação de recursos na
reexploração dessas antigas lavras, sintonizava-se com os discursos de revalorização do
município em um delicado contexto: a mudança da capital de Minas Gerais para Belo Horizonte
(Costa Sena:1897, p.143; Magalhães & Andrade: 1989, p.34-36; Mantovani: 2005, 75p.).44
Em Costa Sena, as ruínas que circundavam “a legendária cidade” mimetizavam o esplendor do
passado e indicavam uma potencialidade para o futuro. Nesse período, Ouro Preto, assim
como outras localidades da região central mineira, enfrentava dificuldades para se
atualizar aos símbolos da remodelação urbana da belle époque brasileira: instalação
de grandes empórios industriais e comerciais, abertura de avenidas, construção ou
44 É nesse ambiente urbano em mudança, marcado pela arquitetura colonial mineira, mas permeado pelaapropriação de novos discursos, costumes e representações, que Ouro Preto preparava-se para ingressarno século XX.
reconfiguração de praças e edifícios, replanejamento do saneamento básico,
abastecimento de energia elétrica etc (Oliveira, 1982:148-160; Mantovani: 2005, 75p;
Sevcenko, 1998:7-48; Fabris, 2000:18). Quando Costa Sena escreveu esse texto, a virada
para o século XX estava próxima, parte da população de Ouro Preto estava migrando para Belo
Horizonte, a velha cidade preparava-se para completar o seu bicentenário e cada vez mais
ficavam distantes as lembranças dos tempos em que os morros da Serra de Ouro Preto,
incluindo o Morro da Queimada, transformaram-se em sua principal zona minerária.
Contrariando os desejos dos membros da Escola de Minas, o esplendor do “grande centro de
mineração” não se repetiu em Ouro Preto nos Novecentos, entrando em cena, aos poucos, a
depredação e o reaproveitamento dos materiais das antigas estruturas de moradia e extração de
ouro, culminando numa ocupação intensiva e desordenada dos morros no final do século XX
(Fonseca & Sobreira: 1999, 14p.)
Em meio às euforias, as incertezas e os arruinamentos dos serviços de mineração
experimentados nos séculos XVIII e XIX, os morros da Serra de Ouro Preto construíram uma
história singular no panorama da Sede municipal. História ainda pouco visitada, é verdade, pois
os trabalhos identificados em nossa pesquisa citam mas não evidenciam essa área: tendem a
privilegiar as partes baixas, como o Pilar e Antônio Dias.45 Mediante essa ausência, buscamos
sistematizar algumas informações a partir do estudo centrado nos seguintes arquivos e
bibliotecas: Arquivo Público Municipal de Ouro Preto; Museu da Inconfidência Casa do
Pilar de Ouro Preto; Arquivo Eclesiástico da Paróquia de Nossa Senhora da Conceição
de Antônio Dias; Casa dos Contos / Centro de Estudo do Ciclo do Ouro; Acervo
fotográfico do Núcleo de Mentalidade e Memória do Instituto de Filosofia e Arte
Cênica / UFOP. Além desses acervos de fontes primárias, foram consultados artigos,
capítulos, livros e imagens disponíveis na internet e nas bibliotecas do IFAC (Instituto
de Filosofia e Arte Cênica), do ICHS (Instituto de Ciências Humanas e Socias) e de
Obras Raras da Escola de Minas, pertencentes à Universidade Federal de Ouro Preto.
Nesse texto evidenciaremos as diferentes imagens construídas sobre a região dos morros da
Serra de Ouro Preto entre o final do século XVII e o início do XX. Se em boa parte dos
Setecentos, ela foi vista como espaço de refúgio, de referência geográfica para a abertura de
caminhos, de expectativa de enriquecimento, de tensão e desordem, nos Oitocentos e início dos
Novecentos, era percebida como uma área arruinada, mas com potencial tanto para um novo
“esplendor da mineração” quanto para a ampliação da mancha urbana da Sede de Ouro Preto.
Enfim, o estudo desse espaço nos sintoniza com os diferentes contextos vivenciados pelo
município nesses dois séculos.
2. Os morros enquanto refúgios e referências para abertura de caminhos.
No final do século XVII, as descobertas de ouro nas imediações de Sabará e Ouro Preto
provocaram um grande deslocamento de pessoas para a região central de Minas Gerais. Colonos
e imigrantes de vários lugares começaram a povoar essas terras que, em pouco tempo,
transformaram-se em arraiais, freguesias e vilas. Apesar da tendência inicial de ocupação das
áreas próximas aos ribeiros e córregos, focos principais do ouro de aluvião, parte dos
mineradores adotou a estratégia de construir abrigos improvisados nos pontos mais elevados das
serras. Em 1700, as “choupanas do São João”, como escreveu Diogo de Vasconcelos, eram
indícios dessa artifício na Serra de Ouro Preto, inauguravam, assim, um povoamento que se
estendeu pelos três séculos seguintes. Os morros enquanto refúgios e referências geográficas
para abertura de caminhos é o tema desse ponto.
Em diferentes textos, autobiográficos ou investigativos, existe uma unanimidade sobre os focos
iniciais de ocupação na Sede de Vila Rica durante a última década dos Seiscentos (Antonil:
1967, p.164); Taunay: 1981, p.23-62; Holanda: 1985, p.259-310; Vasconcelos: 1974, p.151-
189). Sérgio Buarque de Holanda assim a sitentiza:
As jazidas mais notáveis de Ouro Preto, que em 1698 se manifestam aotaubateano Antônio Dias de Oliveira, tornam-se logo um atrativo sem par dehomens de toda casta, procedentes de São Paulo e também de outras capitaniase da metrópole. No mesmo ano e nos imediatos são ali encontrados eregistrados importantes álveos auríferos pelo Padre João de Faria Fialho, nocórrego que recebeu seu nome; por Francisco e Antônio da Silva Bueno emum sítio, abaixo de Campo Grande, que ficará sendo o Ribeirão Bueno; por
45 A região dos morros da Serra de Ouro Preto, excetuando o Pau Doce, Ramos e São Sebastião,pertencia à Freguesia de Antônio Dias.
Tomás e João Lopes de Camargo no lugar do futuro arraial dos Paulistas, epor Félix de Gusmão Mendonça e Bueno, no Passa Dez (grifo nosso)(Holanda: 1985, p.266).
Informação semelhante é reproduzida por Sylvio de Vasconcelos (1977, p.15-16):
Espalhada a notícia das descobertas, consideráveis levas deaventureiros para elas se dirigem, cabendo a Antônio Dias de Oliveira,acompanhado pelo Pe. João de Faria Filho e pelos irmãos Camargos,fundar, por volta de 1698, o arraial que lhe toma o nome, origem deVila Rica (grifo nosso).
Em 1700, conforme Diogo de Vasconcelos (1974, p.174), o Coronel Salvador Fernandes,
investido do cargo de Guarda-Mor ad-hoc, “tratou de legalizar” essas datas:46
Ao descobridor Antônio Dias deu todo o trecho do antigo ribeiro no Tripuí,hoje Ouro Preto, ao Padre Faria o córrego que adquiriu o seu nome; a Félix deGusmão, o Passa-Dez; aos irmãos Tomás e João Lopes de Camargo, asvertentes da serra (arraial dos Paulistas mais tarde); e a Francisco da SilvaBueno, o córrego, abaixo do Campo Grande, que se chamou Ouro Bueno, dooutro lado da mesma serra (grifo nosso).47
46 Guarda-Mor: “Oficial auxiliar do superintendente de terras e águas minerais na administração dosdistritos mineradores. É responsável por dar licença aos descobnridores; distribuir datas; colocá-las empregão; controlar os descaminhos do ouro; controlar a entrada de pessoas e mercadorias; fazer justiça noscasos de descumprimento do regimento das terras minerais; e assentar os mineiros e seus escravos naslavras demarcadas. A partir de 1720 tem poder para distribuir águas aos mineradores (CódiceMatoso:1999, p.101-102).” O capítulo quinto do Regimento de 1702 regulariza a distribuição dessasdatas. Nos servimos novamente do texto de Sérgio Buarque de Holanda para observar a forma de divisãodos lotes: “achado um ribeiro de ouro, deve o guarda-mor, depois de interar-se da extensão da jazida,destinar ao seu descobridor duas datas diferentes: a primeira à guisa de mercê ou prêmio, e será ondeo dito descobridor tenha feito a escolha, e a outra em sua qualidade de mineiro ou, como está notexto, de ‘lavrador’. Além delas, reservará o mesmo guarda-mor ainda uma data para a RealFazenda, ‘no mais bem parado do dito ribeiro’. E serão estas três datas inteiras, quer dizer queterão trinta braças (66m) em quadra. O restante deve distribuir-se por sorteio àqueles que orequeiram ao superintendente, e constará de datas de tamanho proporcionado ao número deescravos que cada requerente tenha para a cata do ouro. Aquele que disponha de doze escravospara cima receberá uma data inteira, de trinta braças, como o próprio descobridor, e quem os tiverem menor número alcançará duas braças e meia, isto é, 5,5m, por escravo, a fim de que todosaproveitem da mercê que lhe faz el-rei. Nas datas de cada pessoa e também no que tocar à RealFazenda, serão colocados marcos, a fim de que não surjam dúvidas sobre a parte que lhe forassinada (grifo nosso). A data del-rei é posta em praça, obrigando-se quem a arremate a lavrá-la, omesmo devendo suceder com as mais repartições (Holanda: 1985, p.270-271).”47 Até o momento não conseguimos precisar a localização do Ouro Bueno. As menções “abaixo doCampo Grande” e “do outro lado serra”, escritas por Diogo de Vasconcelos, parecem se referir à face daSerra de Ouro Preto voltada para a nascente do Rio das Velhas. Antonil indica que o “ribeiro do Bueno”situava-se a mais de uma légua (cerca de 6km) do “ribeiro do Padre João de Faria” (1967, p.164).
Aspectos desse cenário inicial de descobertas podem ser recolhidos no relato de um dos
participantes da comitiva do Governador Artur de Sá e Menezes, que visitou a região das minas
por volta de 1700, transcrito pelo jesuíta André João Antonil (1967, p.67):
Primeiramente, em todas as minas que vi e em que assisti, notei que as terrassão montuosas, com cerros e montes e se vão às nuvens, por cujos centroscorrendo ribeiros de bastante água, ou córregos mais pequenos, cercadostodos de arvoredo grande e pequeno, em todos estes ribeiros pinta ouro commais ou menos abundância (grifo nosso). Os sinais por onde se conhecerá se otêm são não terem areias brancas à borda da água, serão uns seixos miúdos epedraria da mesma casta na margem de algumas pontas dos ribeiros, e estamesma formação de pedras leva por debaixo da terra.
Nessa fase primária de ocupação em Minas Gerais, as técnicas de mineração utilizadas
resumiam-se aos serviços nos leitos e margens dos córregos e rios, realizadas a partir de
diferentes métodos: 1) construção de pequenos diques transverssais “de modo a obrigar as
matérias arrastadas a se depositarem” - os mineradores esperavam que esse depósito atingisse
uma certa espessura, enfiavam a bateia no cascalho acumulado e separavam o ouro através da
utilização da água corrente e movimentos giratórios com a bateia; 2) desvio dos cursos de água
por barragem, a fim de expor e escavar o depósito de ouro de aluivão - após o desvio, os
trabalhadores conduziam o material recolhido até a área de tratamento, onde passavam pela
lavação e triagem na bateia; 3) escavação das margens dos cursos d’água em forma de funil -
depois da escavação o material recolhido seguia o processo de tratamento acima indicado. O
objetivo nesses dois últimos métodos era retirar o depósito de ouro de aluvião até atingir “a
piçarra ou a rocha dura”, momento em que o serviço era finalizado (Ferrand: 1998, p.91-131;
Antonil: 1967, p.255-304).48
FIG.1. Sede de Ouro Preto - 2008.
Fonte: Google Earth.
48 Os antigos mineradores davam “o nome de tabuleiros aos depósitos de aluviões que ocupavam asmargens dos rios em um nível um pouco superior aos que forma seu leito atual (Ferrand: 1998, p.91-131)”.
Campo Grande
Padre FariaAntônio Dias
Antonil, ainda reproduzindo o relato do acompanhante do Governador Artur de Sá e Menezes,
nos fala sobre as lavras situadas nos “outeiros acima”: “Posto que o comum do ouro é estar ao
nível da água, vi muitas lavras (e não das piores) que não guardam esta regra, senão que ao
ribeiro iam subindo pelos outeiros acima, com todas as disposições que temos dito, de
cascalho, etc, mas não é isto ordinário (grifo nosso) (1967, p.188).” Não é possível, a partir
desse relato, definir a altura dessas lavras nos outeiros, mas não deviam se distanciar muito dos
ribeiros, já que os depósitos nas áreas mais elevadas necessitavam de técnicas que apenas anos
depois seriam utilizadas em Minas Gerais.
FIG.2. Lavagem do mineral de ouro.1824-1825.
Autor: Johann M. Rugendas.
Fonte: O Brasil de Rugendas. 1976.
No entanto, se os pontos mais altos não foram minerados nos primeiros anos, eles formaram
importantes refúgios para os aventureiros que tentavam a sorte nos ribeiros. Segundo Diogo de
Vasconcelos, a Serra de Ouro Preto é um desses exemplos: fugindo das “brenhas (matas
espessas e emaranhadas), do frio, dos penhascos, bem como do terror que a natureza lhes
infundia nestes vales profundos e ásperos”, parte dos mineradores passava
as noites no alto da serra onde tinham o seu arraial, mais seguro contrasurpresas e assaltos de feras ou de índios, que de mais longe viessem. Ali serasgava a formosa clareira do Campo Grande, e se dominavam os horizontes(grifo nosso) (Vasconcelos: 1974, p.173).
Em 1700, período em que foram legalizadas as primeiras datas de Ouro Preto, o
Guarda-Mor ad-hoc Coronel Salvador Fernandes hospedou-se nas “choupanas do São
João”, visualizando desse ponto as “cabanas da sua colônia” no arraial do Carmo,
atual Sede de Mariana (Vasconcelos: 1974, p.174).49 Duas informações parecem
49 Em geral, os abrigos (ou ranchos) que serviam aos aventureiros nessas incipientesocupações eram compostos por “uma área coberta, de piso de terra batida, comportando, no
ratificar a formação dos ranchos no Morro de São João nesse período: a primeira é a
atribuição de 1698 para a construção da capela primitiva de São João; a segunda é a
abertura de uma trilha a partir desse ponto até o arraial do Carmo, empreendida
pelo próprio Coronel Salvador Fernandes. Segundo Fritz Salles, “A capela de S. João
passa como sendo a mais antiga (de Ouro Preto) e, dizem, aí exerceu suas funções
sacerdotais o Padre Faria. Foi erguida pelos bandeirantes (Salles: 1982,p.52).”50
Ainda, conforme Salles (1982, p.49), as primeiras capelas eram feitas de “taipa e
sapé, em quadrado, cumieira e duas águas. Não tinha torre nem janelas.” Quanto à
abertura da trilha, Diogo de Vasconcelos informa que o coronel, após a visita ao
Morro de São João, “abriu uma picada pela mata do Periquito, e desceu deixando
aberto este caminho, que foi por muito tempo a comunicação entre os dois povos
(Ouro Preto e Mariana) (Vasconcelos: 1974, p.174).” 51
Portanto, em meio aos primeiros movimentos de ocupação da futura Vila Rica, a
Serra de Ouro Preto inscrevia-se na paisagem como um espaço de refúgio e de
referência geográfica para a abertura de caminhos e ligação entre os arraiais
próximos.52
centro a trempe sobre o braseiro, enquanto pelos cantos colocam-se os jiraus para omerecido descanso de ocupantes. Quando são muitos, (os moradores) espalham-se pelo chão,sobre couros ou esteiras, não sendo muito difundido, nas Minas, o uso da rede. Arreios servemde assento e as mantas dos animais de proteção contra o frio. Ranchos maiores se fazem deduas águas, com cumeeira apoiada em pontaletes sobre os frechais. Mais tarde, supletam-secom paus-a-pique no seu perímetro, revestidos ou não por vegetais, à feição da cobertura, oucompletados por varas transversais e acabados a barro (Vasconcelos: 1977, p.122).”
50 Fritz Salles informa ainda que são contemporâneas à construção da Capela de São João a capelaprimitiva da matriz de N. Sra. da Conceição de Antônio Dias, de 1699, e a capela do Padre Faria quetambém “pode ser mesmo incluída no grupo das primeiras igrejas de Minas (Salles:1982.p.56).”51 A região do Periquito, conforme a Planta das lavras de “Tassaras” e arredores, elaboradaem 1903, situa-se entre os morro de São João e Santana. Ainda não foi possível precisar se a“picada pela mata do Periquito” era o roteiro primitivo da estrada que liga Ouro Preto àMariana (via Passagem ou via Morro de Santo Antônio) ou da estrada que liga o Morro de SãoJoão ao Distrito de Antônio Pereira. Renato Pinto Venâncio, ao repensar a importância dasantigas rotas indígenas no processo inicial da colonização de Minas Gerais, registra aimportância das vias desenhadas a partir dos pontos íngrimes (Venâncio: s/d, 11p.)
52 Segundo Eduardo Barreiros, que estudou a geografia da chamada Guerra dos Emboadas (1708-1709), aligação entre a Serra de Ouro Preto e Sabará, via São Bartolomeu, foi um importante roteiro utilizadopelos informantes e parceiros de Manuel Nunes Viana. Parceiros emboadas como Pascoal da SilvaGuimarães (Barreiros:1984, p.73).
3. Os morros enquanto espaços de expectativas de enriquecimento.
A utilização dos flancos das montanhas, não apenas como abrigos ou passagem de
caminhos, mas também como espaços de mineração, esbarrava nas técnicas usadas
nos primeiros anos em Minas Gerais. No entanto, o contato com novas práticas, como
o serviço a talho aberto importado da região da Nova Espanha, não demorou muito a
ocorrer, e a disseminação dessa técnica estimulou o rush dos mineradores e a
formação da vida urbana nos morros da Serra de Ouro Preto nas primeiras décadas do
século XVIII.
Os primeiros focos de ocupação e de produção do ouro na futura Vila Rica, assim como em
grande parte da região central mineira, sofreram com as crises de abastecimento de 1698-1699 e
1700-1701.53 Essas crises, que dispersaram os aglomerados mineradores, foram frutos da
diferença entre a crescente demanda por mercadorias, a capacidade de fornecimento através das
rotas conectadas aos portos baiano, paulista e carioca, e a ainda tímida presença dos roçados ao
longo dos caminhos que cortavam as localidades recém-descobertas. Sobre a crise de 1700-
1701, o relato de Bento Fernandes Furtado, testemunha desses episódos na região de Ouro Preto
e Mariana, informa que:
53 Augusto de Lima Júnior nos informa sobre a fome ocorrida em 1700/1701: “As comunicações com oRio de Janeiro muito difíceis e as com São Paulo despovoado não eram de molde a remediar quando asenchentes dos rios e as chuvas da estação própria impediram as comunicações com a Bahia. Foi o queaconteceu no período invernoso de 1700-1701, quando a impraticabilidade dos caminhos isolou o distritodas minas, impedindo o tráfego para o Norte. Repetiu-se, em maior escala, o que sucedera ao Ribeirão doCarmo no ano anterior, em que a fome devastara os incipientes estabelecimentos paulistas (1965, p.36).”
Deste lugar donde tiraram grosso cabedal (os aventureiros) se recolheram paraSão Paulo a suas casas, fugindo das graves fomes que padeciam por falta demantimentos, que chegou algum pouco que houve de milho (...) a 30 e 40oitavas o alqueire (...) e o do feijão a setenta e oitenta. (...) E no princípio doverão deste mesmo ano voltaram outra vez os retirados para São Paulo e osrefugiados nas montanhas a tempo que já os mantimentos plantados no de 99estavam capazes de socorrer no de 1700 (grifo nosso) (Taunay: 1981, p.30-31).
O abandono das lavras poderia acarretar a posse temporária ou definitiva das datas por
novos mineradores, criando impasses e conflitos que envolviam violência e a mediação
dos funcionários da administração, como os guarda-mores. As crises pontuais ou
generalizadas de abastecimento, no entanto, não eram as únicas responsáveis por tais
abandonos e pela invasão das datas: as dificuldades técnicas ou financeiras de
prosseguir com os serviços ou a aposta em um novo espaço de trabalho poderiam
desviar a atenção dos mineradores para novos pontos de extração. Interessa a esse
estudo o caso ocorrido com os sobrinhos do Alcaide-mor José de Camargo Pimentel,
que ao retornarem às suas áreas de mineração na Serra de Ouro Preto encontraram em
seus terrenos o português Pascoal da Silva Guimarães.54 Esse encontro é assim descrito
por Diogo de Vasconcelos:
O Alcaide-mor (José de Camargo Pimentel) no outono de 1703 regressou com seusobreiros a finalizar a exploração da data real do Bom Sucesso (região próxima ao PadreFaria), que lhe foi de resultados ótimos; e seus sobrinhos, depois querendo continuarna laboração de suas datas na serra, nelas encontraram de posse Pascoal da SilvaGuimarães (...) (grifo nosso) (Vasconcelos: 1974, p.178).
Pascoal da Silva Guimarães é assim descrito pelo Discurso Histórico e político sobre a
sublevação que nas minas houve no ano de 1720:55
Passando rapaz ao Rio de Janeiro, serviu aí alguns anos de caixeiro, depois começou avir às Minas com limitadas comissões, até que, enfadado das jornadas e aspereza doscaminhos, assaz dificultosos naquele tempo, se deixou ficar nelas, procurando logointroduzir-se com uns e outros, e principalmente com Francisco do Amaral Gurgel, dequem possuiu bastante fazenda, e bebeu toda a doutrina. (...) grangeou tanto crédito
54 Na segunda década do século XVIII, Pascoal tornou-se um dos homens mais ricos das Minas Gerais,possuindo cerca de trezentos escravos, dois engenhos no Rio das Velhas, onde residia, e lavras no Morrodo Ouro Podre (também conhecido como Morro do Pascoal e, posteriormente, Morro da Queimada)(Discurso Histórico: 1994, p.70).55 Segundo Laura de Souza e Mello, parte da elaboração desse texto é atribuída aoConde de Assumar, governador da Capitinia de São Paulo e Minas quedesarticulou o motim de 1720 ocorrido em Vila Rica.
no princípio, que não havia quem dele não fiasse a sua fazenda, com o quebrevemente engrossou à custa alheia, vindo a ser dos mais poderosos das Minas, e quenelas impunha muito pelo grande número de escravos, que o tinham constituído umdos primeiros no poder (....) (grifo nosso) (1994, p.69).
O sucesso de Pascoal da Silva Guimarães nas lavras que pertenciam aos sobrinhos do Alcaide-
mor deve-se à uma técnica importada da Nova Espanha, denominada como “serviços a talho
aberto”.56 Esclarece Diogo de Vasconcelos:
Ignorantes em matéria de mineração, os paulistas, logo que extraíam a flor deum ribeiro, passavam a outro, e assim em pouco tempo desanimavam. Osreinícolas, porém, que entraram depois dos descobrimentos, traziam consigo anotícia do método usado na Nova Espanha de conduzirem as águas em regospara se desbancar a terra vegetal e os montes a talho aberto. O primeiro queiniciou este modo de minerar em Ouro Preto foi Pascoal da SilvaGuimarães (grifo nosso) (Vasconcelos: 1974, p.240). 57
Segundo Paul Ferrand:
Os depósitos de aluviões auríferos situados acima dos fundos dos vales eencostados nos flancos das montanhas, desginados como grupiaras, eramtratados de modo diferente das jazidas precedentes (situadas nos leitos emargens dos rios); os mineradores utilizavam a diferença de nível para fazerpassar correntes de água sobre toda a massa, que era arrastada e recolhidaembaixo. Esses depósitos, formados por areias e seixos mais ou menosrolados, com uma camada de terra por cima, tinham uma espessuravariável que podia ir de 1,50 a 2,50m (grifo nosso). Assim, para lhes aplicar ométodo empregado, verdadeiro método hidráulico, era necessário que osmineradores tivessem à sua disposição uma grande quantidade de água(Ferrand, 1998, p.91-131).
A ação de desmonte provocada pela água, que empurrava através de um rego cavado a
lama misturada ao material precioso até os corredores, onde começava o processo de
tratamento e separação do ouro, contribuiu para a atração de novos mineradores e para a
denominação dessa área da Serra de Ouro Preto como Morro do Ouro Podre:
56 Detalhei essa técnica de mineração em meu primeiro relatório.57 Essa ignorância é relativa, pois foram as experiências com as lavras de São Paulo e Paranaguá quepermitiram aos paulistas detectarem os primeiros depósitos de ouro de aluvião nos ribeiros de MinasGerais (Holanda: 1985, p.263).
Senhor, portanto, das datas (Pascoal) prosseguia na exploração, quando pelo resultadoatraiu uma grande massa, que invadiu por completo a encosta superior da serra, edeu logo num depósito incompreensível de ouro, quase que solto, em vasta superfície,o qual foi logrado de todos em tumulto, derramando-se tão grande cópia dele, que deuà serra o nome de Ouro Podre, e foi para bem dizer o principal início do progresso edo esplendor do povoado, que tinha de ser a Vila Rica (1705) (grifo nosso)(Vasconcelos: 1974, p.178).
Assim, tomando como referência os textos de Bento Fernandes Furtado e de Diogo de
Vasconcelos, percebe-se que o espaço que passou a ser denominado como Morro do Ouro Podre
(também conhecido como Morro do Pascoal Silva ou Morro do Pascoal) começou a ser ocupado
entre 1700 e 1703, ainda no tempo dos sobrinhos do Alcaide-mor. A invasão de Pascoal e a
disseminação do método de talho aberto incentivaram a ocupação de novas áreas na
Serra de Ouro Preto, e como consequência ajudaram a estimular o povoamento nas
partes baixas (arraiais de Antônio Dias e Ouro Preto) e nos arredores (margens das
estradas e formação dos roçados). Bento Fernandes Furtado informa que com esse
“laborioso invento se fertilizaram novamente as Minas, crescendo as conveniências,
as povoações e concursos de negócios (Taunay: 1981, p.60).”
Na primeira década do século XVIIII, a paisagem urbana da Sede de Vila Rica, segundo
Maria Borrego, já era desenhada por
múltiplos espaços marcados, simultaneamente, pela existência de datas auríferas,regulamentadas pelo Regimento de 1702, já que os mineradores erguiam seus barracosjunto às catas; chãos de terra ao redor e doados pelas capelas, por meio de seuPatrimônio Religioso, erigidas em devoção a um santo; além das sesmarias, doadaspelo Governador Geral, por meio de seu loco-tenente, o Capitão General da capitania,que se localizariam ao longo dos caminhos, porém em área rural (1999, p.63-64).58
Alguns aspectos presentes no Termo de ereção de Vila Rica, de 1711, nos informam
sobre o crescimento do povoamento nesse período:
(...) e deseja se conservem todos os seus Vassalos nesta nova Conquista porquesupondo não achava o sítio muito acomodado, atendendo às riquezas que prometiamas minas, que há tantos anos se lavram nestes morros e ribeiras e ser a parteprincipal destas minas, aonde acode o comércio, e fazendas, que dele, emana para as
58 Maria Borrego acrescenta ainda o “apossamento espontâneo” como formade apropriação do solo, visível nos pedidos de aforamentos solicitadosà Câmara a partir de 1712.
mais minas (...) todos convieram em que neste dito Arraial (de Ouro Preto) juntocom o de Antônio Dias se fundasse a Vila pelas razões referidas, pois era sítio demaiores conveniências, que os Povos tinham achado para o Comércio (grifo nosso)(Borrego: 1999, p.55).59
Ao ato de criação da vila, conforme a prática portuguesa adotada após o período da
Reconquista, seguia-se a doação de um terreno para a constituição do seu patrimônio
– a Sesmaria: uma parte era destinada “a usos comunitários: pastos, roças, reservas
de lenha e de madeira de lei; a outra era dividida em lotes, e estes, concedidos aos
moradores por meio de contratos enfitêuticos – os aforamentos (Fonseca: 2006,
p.36).”60 No entanto, a emissão da carta de confirmação da Sesmaria de uma vila não
era instantânea, às vezes poderia demorar décadas. Vila Rica, por exemplo, apesar
de ter sido erigida em 1711 recebeu a sua carta de confirmação somente em 1736.
Esse documento foi publicado por Augusto Velloso no livro de comemoração do
Bicentenário de Ouro Preto (Velloso: 1911, 126-13) e, entre outras coisas,
determinava que o tributo do foro (espécie de IPTU moderno) fosse cobrado somente
das casas que já o pagavam ou que seriam edificadas, isentando as antigas “por
serem mais antigas que a mesma Câmara ou por outra alguma causa” e as “terras
minerais em que há ou possa haver lavras, minas ou buraco em que se tire ouro
(grifo nosso). 61
A determinação da carta de confirmação de isentar as terras minerais do pagamento
dos foros parece que apenas ratificou uma prática preexistente, já que os terrenos
situados nos morros da Serra de Ouro Preto não são citados nos pedidos de
aforamentos feitos ao Senado da Câmara entre 1712 e 1721 (Vasconcelos: 1941,
p.241-257). A ausência dos pedidos ou de pagamentos de foros para essa área nos
impede de verificar com alguma precisão a quantidade de lavras, residências,
59 Salomão Vasconcelos (1941, p.241-257) listou os topônimos indicados nos pedidos de aforamentossolicitados entre 1712 e 1721: bairro Antônio Dias; bairro ou arraial dos Paulistas; bairro ou arraial doPadre Faria; freguesia da Conceição; bairro ou arraial do Pilar; Ouro Preto; freguesia do Caquende;freguesia da Barra; e freguesia do Passa Dez.60 Denomina-se como Reconquista a expulsão dos mouros e a formação do território português no final daIdade Média.61 Os livros em que estão registrados os pedidos de aforamentos e os pagamentos anuais dosforos ao Senado da Câmara de Vila Rica, identificados no Arquivo Público Municipal de OuroPreto e no Arquivo Público Mineiro, atestam a determinação da carta de confirmação de1736. Neles encontramos apenas os nomes dos proprietários instalados no Caminho Tronco dacidade (entre o Cabeças e o Padre Faria).
comércio, capelas e vias abertas na região dos morros.62 Em relação aos bairros
recém-instalados nas partes baixas de Vila Rica, no entanto, os topônimos listados
por Salomão Vasconcelos a partir desses pedidos indicam que essas áreas já eram
cruzadas por ranchos, ruas, espaços públicos (como a Câmara, o pelourinho e a
praça) e espaços religiosos (como a Igreja de Ouro Preto): “bairro Antônio Dias”;
“bairro ou arraial dos Paulistas”; “bairro ou arraial do Padre Faria”; “freguesia da
Conceição”; “bairro ou arraial do Pilar”; “Ouro Preto”; “freguesia do Caquende”;
“freguesia da Barra”; “freguesia do Passa Dez”; “Rua da Igreja”; “Rua da fonte”;
“caminho novo que vai do Ouro Preto para as Casas da Câmara”; “Rua nova da
praça”; “subida do morro que vai do Ouro Preto para o pelourinho”; “na descida que
vem por detrás da igreja do Ouro Preto para o córrego que desce do Ouro Preto”;
“com calçada que vem para freguesia de Nossa Senhora da Conceição.”
A situação diferenciada dos terrenos minerais, sobretudo dos localizados nos morros da Serra de
Ouro Preto, principal zona de mineração de Vila Rica, não significava a ausência de
normatização e fiscalização. A vida urbana e os conflitos vivenciados nesses espaços eram
mediados pelo Senado da Câmara e pela Serintendência das Minas (a partir de 1735
transformada em Intendência do Ouro; após 1750, Intendências Gerais do Ouro; e depois de
1803, Junta Administrativa de Mineração e Moedagem). Conforme o caso, a Ouvidoria e o
Governo da Capitania (ou da Província) também participavam da deliberação sobre
assuntos relacionados à essa área, como ocorreu na Revolta de 1720.
Entre as duas primeiras décadas do século XVIII destacam-se nos morros as
demarcações dos terrenos minerais e a instalação dos ranchos, ruas, estradas, vendas
e a construção das capelas de São João, Santana e Nossa Senhora da Piedade (Salles:
1982, p.45-58; Mourão: 1964, p.87-89). Sylvio de Vasconcelos (1977, p.122) esclarece
que essas
(...) primeiras moradias em Vila Rica, fruto de um povoamento súbitoem sítio agreste, distante dos recursos necessários a uma ordenaçãometódica de suas construções, são, a princípio, simples abrigos
62 Pesquisamos no Arquivo Público Municipal de Ouro Preto os livros de pedido e pagamento dosforos dos séculos XVIII e XIX e identificamos a mesma ausência. Os tributos dos foros eramcobrados apenas das áreas situadas no Caminho Tronco de Ouro Preto, entre o Cabeças e oPadre Faria.
provisórios, destinados à proteção precária de seus habitantes, aindainaptos ao estabelecimento de uma aglomeração humana estável.”
FIG.3 Casa dos Morros. 1977
Autor: Sylvio de Vasconcelos
Fonte: Sylvio de Vasconcelos, 1977.
A partir das ruínas existentes na Serra de Ouro Preto, segundo esse autor, pode-se
sugerir que a tipologia das primeiras casas nos morros era
como os ranchos, de peça única, com cerca de 15m2, aberta para oexterior por porta e janela na fachada principal (FIG.3). Muitas sefazem mestiças, em série, com cômodos mais ao retângulo,completamente isolados uns dos outros, inclusive por empenas, talvezpara a escravaria. Assemelham-se às senzalas dos engenhos e àshabitações dos silvícolas nas missões jesuíticas, porém não há indíciosclaros, aqui, de varanda fronteira, comum aos exemplos citados(FIG.3). Aparecem ainda nos morros, encostados às moradias,pequenos cubículos com acesso externo, de área em torno de 6m2,cujo estado atual, bastante ruinoso, torna difícil um estudo maisaprofundado de sua exata destinação e seu acabamento. Em todo ocaso, suas dimensões, a menor espessura de suas paredes e seu maisreduzido pé-direito conduzem à hipótese de terem sido usados paraguarda de objetos, mantimentos, ferramentas, arreios ou mesmomaterial de construção (Vasconcelos: 1977, p.127-128).63
A impossibilidade de identificar os nomes dos habitantes dos morros a partir dos
registros dos foros nos levou a iniciar uma investigação nas listas de tributos do
63 Como a região dos morros da Serra de Ouro Preto sofreram diferentes ocupações no tempoé necessário ficar atento à observação que o próprio Sylvio de Vasconcelos faz sobre as ruínasexistentes na região do Morro da Queimada: “Todavia, ainda aqui não se pode haver absolutasegurança quanto à época exata de tais construções, porquanto, mesmo depois do incêndiode 1720, os moradors do local não o abandonaram, como demonstram característicasarquitetônicas evidentemente posteriores à catástrofe existente nas referidas ruínas (...)(Vasconcelos: 1977, p.124).”
Quinto. A potencialidade dessa documentação pode ser exemplificada pela
tributação de 1719, onde identificamos parte dos nomes dos proprietários e escravos
que residiam, mineravam e comercializavam na Serra de Ouro Preto nesse ano.64 O
quadro abaixo, que traz informações recolhidas nessa tributação, nos revela um
pouco sobre a amplitude do rápido povoamento que se deu nesse espaço após os
serviços iniciais de mineração de Pascoal da Silva Guimarães.65
VILA RICA - TRIBUTAÇÃO DO QUINTO DE 1719 LOCALIDADE
NOME DO PROPRIETÁRIO
1 Manoel Lourenço Morro do Ouro Podre
2 Francisco Martins Morro do Ouro Podre
3 Antônio da Silva Morro do Ouro Podre
4 Antônio Simões Pereira Morro do Ouro Podre
5 Manoel da Cunha Morro do Ouro Podre
6 Manoel Vieira de Souza Morro do Ouro Podre
7 Francisco Martins Morro do Ouro Podre
8 João Gomes Morro do Ouro Podre
9 Antônio da Silva Morro do Ouro Podre
10 Martinho Nunes Morro do Ouro Podre
11 Antônio Simões Morro do Ouro Podre
12 Domingos Coelho Morro
13 Joaquim de Medeiros da Costa Morro
14 João Antônio Porto Morro
15 Domingos Francisco de Brito Morro
16 Domingos Francisco de Brito Morro
17Josephe da Silva [Velho] e o Mestre de Campo Pascoal daSilva Morro
64 Conforme Tarcísio Rodrigues Botelho: “Apesar das profundas transformações demográficasprovocadas pela descoberta e exploração do ouro, poucos trabalhos têm se dedicado a este aspecto dasocidade mineradora do século XVIII. A ausência de levantamentos populacionais típicos, origem defontes tradicionalmente usadas pelos demógrafos historiadores, é um dos fatores que restringe taisestudos. Assim, alguns autores que têm abordado o tema procuram recorrer a fontes não propriamentedemográficas mas que podem se prestar ao estudo da população (Botelho: 2000, 20p.).”65 APM, Coleção Casa dos Contos: Lançamentos do Quinto (1718 a 1723), microfilme 4 / fotograma 509(folhas 1 a 128) e microfilme 5 / fotograma 001(folhas 129/216).
18 Josephe Machado Morro
19 Antônio Gonçalves de Araújo Córrego Seco
20 Domingos da Rocha [Ferreira] Córrego Seco
21 João Monteiro de Queiroz Córrego Seco
22 Sebastião Leite Córrego Seco
23 Manoel Francisco Córrego Seco
24 Domingos Martins Córrego Seco
25 Antônio Gonçalves Chaves Córrego Seco
26 João [Gonçalves] [Correa] Thais Córrego Seco
27 Antônio de Moura Córrego Seco
28 Domingos Francisco Córrego Seco
29 Leandro Moreira Córrego Seco
30 Bartholomeu [Alves] Córrego Seco
31 João Francisco Pimenta Córrego Seco
32 João Gracia Rodrigues Córrego Seco
33 João dos Reis Córrego Seco
34 João Lopes da [Costa] Córrego Seco
35 Heronimo Antunes [Vasques] Córrego Seco
36 Luiz Coelho dos Santos (sócio de Francisco Rodrigues Graça) Córrego Seco
37 Josephe Antunes Córrego Seco
38 Capitão Manoel de Souza (sócio com Custódio da Silva) Córrego Seco
39 Francisco Peixoto Pinto Córrego Seco
40 Francisco de Souza Leal Córrego Seco
41 Manoel Gonçalves Braga Córrego Seco
42 Ricardo Lopes Córrego Seco
43 Francisco Teixeira do Seichas Córrego Seco
44 Antônio Leite Córrego Seco
45 [Sebastião] Francisco [Maruas] Córrego Seco
46 Antônio da Silva Córrego Seco
47 Josephe Machado Pinto Córrego Seco
48 João Gomes Ribeiro Córrego Seco
49 Manoel Duarte da Silva Córrego Seco
50 Domingos Coelho da Silva Córrego Seco
51 Domingos João de Carvalho Córrego Seco
52 Domingos de Souza Raposo Córrego Seco
53 Antônio Rodrigues Córrego Seco
54 Gaspar de Rodrigues Ribeiro Córrego Seco
55 Jorge Pinto dos Santo Córrego Seco
56 Francisco Pinto Córrego Seco
57 Mathias Francisco Córrego Seco
58 Josephe de Morais Córrego Seco
59 Alexandre Nunes [Carneiro] Córrego Seco
60 Félix da Silva Costa Córrego Seco
61 Francisco [ ] [Costa] Córrego Seco
62 André Pereira de Carvalho Córrego Seco
Quadro 1. Proprietários tributados no Quinto – 1719.
Fonte: APM, Coleção Casa dos Contos: Lançamentos do Quinto (1718 a 1723),microfilme 4/ fotograma 509 (folhas 1 a 128) e microfilme 5 / fotograma 001(folhas129/216).
Conclui-se, a partir dessa lista, que entre os 62 registros coletados no tributo de
1719, 11 eram proprietários de serviços de mineração no Morro do Ouro Podre; 7 no
local denominado como “Morro”; e 44 no Córrego Seco. Quanto ao número de
escravos pertencentes a esses proprietários, identificamos 27 no Ouro Podre; 55 no
Morro; e 347 no Córrego Seco. Esses números indicam que apesar do povoamento na
Serra de Ouro Preto ter sido ampliado a partir dos serviços de Pascoal da Silva no
Morro de Ouro Podre, o Córrego Seco era (em 1719) a área com a maior densidade
populacional nessa parte da Sede de Vila Rica: 44 proprietários e 347 escravos.66 É
66 Considerando o censo de Ouro Preto de 1804 (Mathias: 1969, p.190-208) e as informações dos atuais moradores daSerra de Ouro Preto, o Córrego Seco é um espaço situado entre o Morro do Ouro Podre e os Morros de São João eSantana. Segundo o Censo de 1804, entre o Morro do Ouro Podre e os Morros de São João, Santana ePiedade haviam o Morro do Ouro Fino, Morro da Queimada, Morro das Lages, Caminho Novo e CórregoSeco (Mathias: 1969, p.190-208). É necessário pesquisar outras amostras tributárias do Quinto e daCapitação para ratificar (ou retificar) essa tendência de ocupação na primeira metade dos Setecentos.
interessante notar que a expressiva ocupação do Córrego Seco apresentada no tributo
de 1719 sintoniza-se com a fase de construção das Capelas de Santana e Piedade,
atribuídas a 1720 - o que nos parece um importante indício sobre o crescimento do
povoamento nessa área.
Um último indício importante nesse tributo é a ausência de Pascoal da Silva
Guimarães, que nesse período, segundo diferentes fontes, era proprietário de
aproximadamente 300 escravos (Discurso Histórico: 1994, p.69; Vasconcelos: 1974,
p.172-209). A comparação entre o Quinto de 1719 e uma lista de moradores dos Morros
de Ouro Podre, Ouro Fino e Córrego Seco, que compareceram ao Senado da Câmara em 1721,
também expõe a fragilidade das informações desses tributos. 67 Entre os 62 moradores
identificados no Quinto e os 58 listados na ata da Câmara apenas três se repetem:
Francisco Martins; Antônio da Silva e João Antônio Porto. Como os números de
moradores são próximos, podemos criar a seguinte situação: se mantivermos o
mesmo número de escravos listados no Quinto (429 cativos) para os 55 identificados
na ata da Câmara (subtraímos os 3 que repetem nos dois documentos) chegaríamos
ao total de 117 propriedades e 858 escravos trabalhando nos morros da Serra de Ouro
Preto entre 1719 e 1721. Comparando esse resultado com o estudo que Tarcísio
Rodrigues Botelho realizou sobre a população da Sede de Vila Rica em 1721, também
utilizando a lista do quintos reais, concluiríamos que: 1) dos 599 proprietários de
escravos identificados por Botelho, os 117 proprietários de terrenos minerais nos
morros corresponderiam a 19,5%; 2) dos 3.028 escravos identificados por Botelho, os
858 corresponderiam a 28,3%. Tomando como referência esses números cerca de 1/5
67 Em 14/08/1721 foram listados: Antônio da Costa Gouvea, Thomaz da Costa Soares, João Francisco deCarvalhaes, João Gomes Ribeiro, Antônio Dias Bicalho, Antônio Joseph Passos, [Cristhiam] MizRodriigues, Jozeph de Oliveira, Manoel de Macedo, João Ferreira Gomes, André Preyra de Carvalho,Bendo de Macedo, Francisco de Souza Lial, Ernesto Lamberto, João Simões Prata, Domingos João deCarvalho, Manoel de Souza Lima, Sebastião Leite, André Gonçalves, Liandro Mora, D. Antônio Tavares,Gonçalo Lopez, Francisco Mello, Manoel Gaspar, Antônio Rybeiro, Serafim Gonçalves, FranciscoRodrigues Gondim, Jozeph Alves de Campos, Francisco José da Silva, Lourenço de Almeida Costa,Ignácio Alves Dinis, Joaquim dos Reis Castro, Jozeph da Silva Oliveira, Caetano da Sylva, Thome deSouza Pereira, M. Gonçalvesl Miz, Diogo de Souza de Azevedo, Antônio da Silva, Manoel Lourenço,Domingos Vieira, Joaquim de Menezes, Domingos Rodrigues Chaves, Manuel Duarte, Manoel Ms.Meneses Pinheiro, Miguel Martinho, Balthezar de S. Pais Couto, João Gracia, Domingos de SouzaOliveira, Lourenço Pereira Neves, João Antônio Porto, Jozeph Pereira, João Teixeira e Silva, AntônoGomes, Antônio Miz de Carvalhais, Manoel Martins Machado e Antônio Gonçalves Bessa (RAPM, anoXXV, 2º volume, julho de 1937, p.140-141) .
dos proprietários de escravos da Sede de Vila Rica tinham lavras nos morros da Serra
de Ouro Preto; e 1/3 dos cativos da Sede atuavam nessas áreas elevadas.68
Parece nítido, a partir desses dados, que a imagem dos morros da Serra de Ouro Preto
migrou de espaço de refúgio para espaço de expectativas de enriquecimento, trazendo
em seu bojo o estreitamente dos interesses e o acirramento dos conflitos entre os diferentes
grupos sociais, como os potentados, os representantes do Senado da Câmara, o Governo da
Capitania e os comerciantes: ingredientes que alimentaram embates, como o motim de 1720.
68 Sem dúvida, é necessário pesquisar outros exemplos de tributos de Quintos e de Captação paraverificarmos se as cifras ratificam ou retificam os números encontrados.
4. Os morros enquanto pontos de tensão e desordem.
O recém-formado Senado da Câmara e a estrutura incipiente do governo da Capitania
tiveram como principais desafios o rápido crescimento da população na Sede de Vila
Rica e os diferentes interesses que guiavam as ações de particulares e dos grupos
sociais. A desobediência de algumas normas instituídas pela Câmara, a força de
potentados, como Pascoal da Silva Guimarães, e as contendas criadas entre os
mineradores exemplificam as quedas de braço vivenciadas na região dos morros de
Vila Rica durante a primeira metade do século XVIII.
Nas atas produzidas pelo Senado da Câmara entre 1716 e 1721 percebe-se o
perímetro dos problemas sociais e as respostas que os camaristas deliberaram a fim
de enquadrar o espaço social e gerenciar o cotidiano da vila: tentativas de
fiscalização das atividades profissionais, como dos boticários, carpinteiros e
ferreiros; de padronização dos pesos e medidas utilizados no comércio; de
acompanhamento da qualidade dos produtos que abasteciam a população, como os
grãos e as carnes; de gerenciamento da cobrança dos tributos; de policiamento dos
arruamentos; entre outros (Borrego: 1999; Tavares: 2005, 199f; Vasconcelos: 1977).
Nesse texto destacaremos, em especial, as notícias referentes aos problemas
verificados na região dos morros da Serra de Ouro Preto. 69
69 Esse é um dos temas clássicos da historiografia mineira: o rápido afluxo de brasileiros, reinóis eestrangeiros para a região central de Minas Gerais constituiu um cenário novo para a Coroa na AméricaPortuguesa. A Coroa teve que se adaptar e administrar impondo ou tecendo acordos com os diferentesgrupos sociais da nova capitania: a chamada “Guerra dos Emboadas” é um dos exemplos mais claros
Apesar da isenção dos foros, a zona de mineração nos morros estava sujeita às
deliberações dos camaristas, o que nos levou à pergunta: que tipo de intervenção os
representantes da Câmara provocaram nesse espaço e qual era a reação de parte dos
moradores (formados, sobretudo, por mineradores e comerciantes)? Segundo as atas
da Câmara produzidas entre 1716 e 1721 os maiores conflitos eram: 1) a estruturação
de vendas sem licença; 2) o comércio ambulante de negros e negras de tabuleiros nas
lavras; 3) o acolhimento de escravos fugitivos pelos moradores; 4) a comercialização
de comida, bebida e prostitutas para os escravos nas vendas, onde gastavam os
rendimentos dos jornais dos seus proprietários. As queixas dos habitantes, sobretudo
da Freguesia de Antônio Dias, levou à Câmara à análise e deliberação de editais sobre
esse caso.
Em 29/01/1716, por exemplo, “Mandarão sepassasse Idital paraque noOuro podre
senão levantaçe mais rancho nem reedificaçem os que estão feitos sem licença deste
Sennado.” 10 meses depois, em 21/11/1716, o procurador da Câmara apresentou
nessa sessão “infinitas queixas” dos moradores da Vila contra o comerciante Antônio
Leão e seus sócios, que desejavam instalar vendas no morro
“(...) e que asim porestes serem perjudiciais aeste povo por ser sertovenderem nos ditos ranchos couzas comestiveiz aos escravos de que sesegue descaminho aos jurnaes que devem dar aseus senhores fugindooutro sim depois de osgastarem (...). Oque sedeferio que de nenhumasorte se consentiçe fazer Ranchos nem reedificallos no morro, ouropodre ou outra qualquer parte aonde haja Lavras e que pª sefazeremseja com licença do Sennado como he estilo observado nesta Vª a qualLicença sedará só e aquelas pessoas que com seus negros quizeremasistir obrigandoçe porem anão ter notal Rancho venda com penna deque fazendo em tais partes osditos Ranchos (...) será prezo e da cadeianão sahirá sem primeiro pagar húma Libra de Ouro e tudo o que devenda lhe for achado será para os prezos e que outro sim senão passeLicença pª as vendaz ainda antigas do Ouro Podre e morro. E que o ditoAntonio Leam seja notificado e asine termo de despejar esta Vª notermo dedois mezes pelas queichas que delle tem fieto este povo einquietação comque se tem havido com seus vezinhos havendo notªsertã que por outra tal veyo retirado no Rio das mortes (RAPM, anoXXV, 2º volume, julho de 1937, p.1-166).
dessa situação. Sobre a dinâmica do poder dos Senados das Câmaras no sudeste da América Portuguesaler José Newton Meneses (2003:173-182).
No início do ano seguinte, em 28/01/1717, o problema persistia:
Mandarão por Iditaiz no ouro podre, morro ecorre(go) seco do Padre Faria paraque nenhuma pessoa podeçe ter vendas nos tais destritos nem se passassemlicenças pº ellas pello grande damno e perjuizo que se segue a todos estes povosasim por nas ditas vendas se lhe deterem os seus negros que minerão comopoque nella destroem os jornais deque se segue fogirem por o se acharem asditas vendas sobre asLavras e em que os ditos negros trabalhão. Com penna deque achando se algum vendendo nas partes nomeadas serem prezos e da Cadeapagarem uma lª de ouro e que disto se passasse editais logo que o porteiroapergoaria nos mesmos destritos (RAPM, ano XXV, 2º volume, julho de1937, p.1-166).
Em 17/03/1718, novamente os camaristas determinavam:
Acoradarão q. Logo, Logo sem demora se desse a execução hú Idital, q. emJanrº proximo paçado mandarão publicar, paraque as vendas que se achavão noouro fino, corgo seco, ouro podre, rio das pedras, e ouro bueno, que selevantassem e se viessem acituar nestavilla a pena nelle incluzivel, que se acha[registrado] a fls. do Lº do Reg.to desta Camara. (...) Acordarão mandar que oPorteiro fosce publicar no aRayal de ouro fino, e corgo seco, hu pregãoporescrito, paraq. dentro de 15 dias, Largassem os ranchos, em que vivem, evenhão cituarce nas partes queselhes consignarão pello Edital de 21 de janeiroproximo passado q. He do pe do morro para a Cazada Camª e da Cruz dasalmas, vindo deonde para Antº Diaz (RAPM, ano XXV, 2º volume, julho de1937, p.1-166).
Como a idéia de desinstalação das vendas dos morros não surtiu efeito, mesmo com as
penalidades previstas, em 07/09/1718 novos editais foram publicados retornando com a
estratégia de obrigar os proprietários a retirarem as licenças de funcionamento na Câmara:
“Acoradarão asignar editaes pª ouro fino, ouro Bueno eouro podre pª q venhão tirar Licença
para venderem com Logea, ou venda aberta.” A estratégia de retirada das vendas foi tentada
novamente em 23/01/1719:
Acordarão mandar fixar edital no ouro fino e Corego seco para que mudassemas Vendas dentro de 15 dias apenna de 200 8ª de ouro, eisto por respeito dosmuitos requerimentos dos moradores desta Vª pello perjuizo q. dão ditas vendase seseguia a elles d.tos [moradores] ehirce despovoando as fazendas afimdesehirem cituando emditas partes (RAPM, ano XXV, 2º volume, julho de1937, p.1-166).
Em 04/03/1719 a advertência da Câmara foi contra os moradores que acolhiam escravos de
outros em suas residências e vendas:
Acordarãomandar publicar hum edital aq’ os moradores do morro do ouro podredas Ave Marias para diante, não tenhão nem consintão negros de outrosvezinhos, ou de outras Coaisquer pessoas em suas Cazas, ouvendas, edo dittotempo para diante as terão fixadas, apenas de vinte outavas deouro, pagas daCadea (RAPM, ano XXV, 2º volume, julho de 1937, p.1-166).
Os editais proibindo as vendas e o comércio ambulante de negros e negras nos morros de Vila
Rica repetiram-se em 31/05/1719, 15/07/1719, 12/01/1720 e 17/01/1720, como o abaixo
descrito:
Acordarão mandar passar editais, pª que nenhuã negra ou negro andecomtaboleyro, oucouza comestivel avender pellas Lavras do morro compennasde 20 8ª atodo oque no dito Edital tiver incorrido, pagar da Cadeya, ametade,para quem oacuzar eaoutras pª obras do [Conselho] eque toda apessoa quelevantar Ranchos, cazas, cenzalas, nas parajes prohibidas será condenada em 508ª pagas da Cadeya, erancho demolido (RAPM, ano XXV, 2º volume, julhode 1937, p.1-166).
A recompensa pela delação, apesar de não resolver o problema, parece ter surtido algum efeito
já que em 03/02/1720 os camaristas enviaram uma ordem ao “carsereyro desta Villa, João
Ferreira Dinis” para que não recebesse “prezo pello delicto de vendas comtaboleyro porofficial
digo por Capitão do Mato, só por officiais dejustiça.” No entanto, as vendas e os ambulantes nos
morros tornaram-se um problema menor quando em junho e julho de 1720 estourou o motim em
Vila Rica que terminou com a deportação dos principais líderes, incluindo Pascoal da Silva
Guimarães, e a morte de Felipe dos Santos (Discurso Histórico:1994,193p.;
Fonseca:2007,p.549-566; Anastasia:1998; Vasconcelos: 1974, p.172-209). Aliás, conforme o
Discurso histórico e político sobre a sublevação que nas minas houve no ano de 1720,
eram estreitas as relações entre os donos das vendas nos morros e os líderes do motim,
sobretudo Pascoal da Silva Guimarães:
(...) que todos estes anos atrás houve um grande debate entre o povo e a Câmara de VilaRica sobre se consentir a Pascoal da Silva que no morro, em que morava (eminenteserra, que domina a dita Vila) só ele, ou os que punha de sua mão, tivessem lojas e
vendas, em dano de toda a Vila e seus comerciantes, que várias vezes representaram aoConde (de Assumar) esta sem-razão (Discurso Histórico: 1994, p.73).
Prossegue o relato do Discurso Histórico:
Queixavam-se também os moradores do bairro de Antonio Dias e do Padre Faria queaquelas vendas eram refúgio certo dos seus negros fugidos, os quais, tendo nelas quantolhes era necessário, não desciam abaixo muitos meses, e ocultando-se dos senhores, aquem não davam jornal, era pouco todo o ouro que adquiriam para fielmente deixar nasditas vendas, que pela maior parte lhes serviam também de lupanares, comércioabominável, trato vil e ganho ilícito dos brancos, que nelas punham, ou para melhordizer expunham, negras gentis para mais pronta saída, fácil consumo dos seus efeitos, esegura atração dos negros, que até as suas obscenidades ali achavam asseadas camas(1994:p.73).”
Ainda, conforme o Discurso Histórico, a ineficiência dos oficiais da Câmara na fiscalização das
vendas no Morro do Ouro Podre era fruto da impotência ante aos grupos armados dos
potentados locais, como o de Pascoal, também liderado pelo seu filho, João da Silva:
Serviam juntamente estas casas, ou povoação de Pascoal Silva, como decidadela ou baluarte contra os assaltos da justiça, que lá não podia entrar; ealgum oficial, que mais atrevido ou ambicioso pretendeu romper estadificuldade, lhe foi pouco todo o lucro e interesse da diligência, que nãoconseguiu para os gastos da cura, porque o filho de Pascoal da Silva, castigandocom os seus escravos a diligência nas alheias, ou nas que eram da proteção deseu pai, conciliava a temerosa atenção, que não deixava chegar as execuções,que temia, nem aos portais da sua casa, a qual tinha feita couto de ladrões, mauspagadores, e assassinos, com notável prejuízo do povo, que sem remédioclamava e muitas vezes quis ir, com mão armada, destruir aquelas vendas, esempre se lhe embaraçou e impediu (1994:p.73).
O diagrama do poder do motim de 1720 desenhava uma disputa de forças que envolvia
diferentes campos de interesses, como o desejo do Conde de Assumar em fortalecer a imagem
política e a estrutura do governo na capitania e a oposição dos líderes do movimento quanto à
instalação das Casas de Fundição nas Minas Gerais, o que ampliaria a eficiência e o poder do
fisco; à pressão para a expulsão dos frades das zonas de mineração; as atitudes do ouvidor de
Vila Rica, Martinho Vieira; à formação dos Dragões da Cavalaria, que acarretaria na perda das
patentes militares dos potentados. Em meio a esse embate os camaristas e a população dividiam-
se quanto aos seus posicionamentos (Fonseca:2007,p.549-566).70
Como produziremos um texto específico sobre o motim de 1720, nesse momento nos
concetraremos nas informações que evidenciam os morros como áreas de tensão e desordem
nesse período. Já destacamos os problemas relacionados ao funcionamento das vendas, ao
comércio ambulante de negros e negras de tabuleiros, ao acolhimento de escravos nas moradiras
dos habitantes e à rede de interesses que ligava os moradores, principalmente os comerciantes,
aos potentados locais, como Pascoal da Silva Guimarães. Se a partir dos morros da Serra de
Ouro Preto, sobretudo do Morro do Ouro Podre (ou Morro do Pascoal), os grupos envolvidos no
motim de 1720 articulavam-se com outras localidades, como a Vila de Sabará, ou desciam rumo
às partes baixas da Sede de Vila Rica fazendo barulho e arrombando moradias, não é certo
generalizar a participação de todos os moradores dos morros nesse evento. O texto do Discurso
Histórico destaca o esforço em vão dos guardas em poupar as casas dos não amotinados,
enquanto executavam a ordem do Conde de Assumar de incendiar e demolir as residências no
Morro do Ouro Podre, evento que inaugurou a designação “Morro da Queimada”:
(...) o fogo que livremente ao longe se comunicava em faíscas,achando pronta matéria nas palhas que muitas se cobriam, dilatava oincêndio, que causara maior dano se o capitão com os dragões eordenanças não se se empenhara, com muito trabalho, mais empreservar as casas livres que em destruir as culpadas, convocando, avozes e gritos, os moradores, que defendesse cada qual a sua: (....)(Discurso Histórico: 1994, p.136).
Após a desarticulação do movimento, que teve como desfecho final a morte e o esquartejamento
de Felipe dos Santos,71 o Conde Assumar enviou uma carta ao Senado da Câmara de Vila Rica
70 Entre os principais líderes estava Pascoal da Silva Guimarães, Dr. Manoel Mosqueira da Rosa,Sargento-Mor Sebastião da Veiga Cabral, Frei Vicente Botelho, Frade Bento e Frei Francisco de MonteAlverne Outros participantes são citados em diferentes textos, como o Frei Pedro de MonteSião (CódiceMatoso: 1994, p.208), João Ferreira Diniz (Pitta: 1976. p.275), Felipe dos Santos, José Carlos, Teodósioda Silva e Capitão Traquilha (Discurso Histórico: 1994, p.143-144) e Tomé Afonso (Feu de Carvalhoapud. Discurso Histórico: 1994, p.144). O Discurso Histórico, além de indicar os nomes de outrosparticipantes do motim, acrescenta um outro e importante ingrediente: o grupo que liderou a rebeliãoencontrava-se endividado: “Agora é de saber pois, para melhor inteligência deste caso, que assimPascoal da Silva como Sebastião da Veiga Cabral, Sebastião Carlos, Pedro da Rocha Gandavo,e trinta ou quarenta pessoas de menos nota, que entraram neste negócio, estavam de todorefundidos e arruinados.”71 Felipe dos Santos, segundo Alexandre Torres Fonseca (2007. p.549-566), era um tropeiroque transformou-se num eficiente agitador dentro dos grupos de mascarados que desciam dos morros paraespalhar pânico nas freguesias de Antônio Dias e Pilar.
solicitando um estudo sobre a conviniência de se ter ou não moradores nos morros do Ouro
Podre, Ouro Fino e Córrego Seco:
Acordaram abrir uma carta do Exmo. Sr. Conde General que consta de advertirnão ser conveniente moradores no morro e Ouro Fino pela desatenção e crimeem que incorreram na dita sublevação (...) (RAPM, ano XXV, 2º volume,julho de 1937, p.135).
Essa percepção drástica, a limitação dos morros da Serra de Ouro Preto em espaços de trabalho
e não mais em áreas de moradia e comércio, não encontrou ecos suficientes entre os
representantes da Câmara e os 58 moradores dos Morros de Ouro Podre, Ouro Fino e Córrego
Seco convidados para refletir sobre a situação.72 No entanto, na ata de 14/08/1721, os
participantes dessa reunião concordaram em assinar o Bando expedido pelo Conde de Assumar,
que decretava:
(...) tão somente ficarem aspessoas q’ minerão no(s) dito(s) morro(s) e maisparagens prohibindosce o poderem ter vendas publicas ou occultas nem terempretas ou escravos de Taboleiros pelas Lavras proprias ou alheias, apenna deperdimento de fazenda e quatro annos de degredo para Benguella aquelles quecontravierem ao seu Edital e Bando nem ficarem officiais de officios mecanicosem a dita paragem e as ditas pessoas q’ ordena o dito general fiquemminerando-lhes he emcarregado denunciem de qualquer pessoua ou pessoas dequalquer calidade q seja se virem que tem venda ou mandão por escrava ouescravo vender generos de comestivel bebidas ou fazendas secas, apenna deficarem incursos nas ditas pennas ordenando a esta Camara ponha todaaprecaução e cuidado com o disvello e vigilancia aque seobserve o ditomandodo seu Edital q tem o disignio da melhor conservação e aumento aestaVilla e socego de todos (...) (RAPM, ano XXV, 2º volume, julho de 1937,p.1-166).
A solicitação de Assumar e a análise dos camaristas evidenciam dois aspectos sobre a região
dos morros de Vila Rica nessa época: a sua importância econômica, enquanto principal zona de
produção aurífera na Sede; e as dificuldades de enquadrar esse espaço dentro de um conjunto de
regras. Essa fragilidade do Senado da Câmara quanto ao cumprimento de suas posturas não era
exclusiva dos morros de Vila Rica, alguns estudos apontam tal fragilidade também para as áreas
baixas, como em Antônio Dias e Pilar (Meniconi:1999, p.37; Tavares: 2005, p.85-86), bem
como para outras vilas mineiras (Meneses:2003, p.165-222). Segundo Rodrigo Meniconi: “Pelo
menos no trecho compreendido entre as matrizes, marcados pelas pontes de Antônio Dias e
72 Apresentamos os nomes desses 58 moradores no capítulo anterior.
Rosário, a vila se ajeita; fora desses limites, os controles são menos rígidos e a observância das
normas é relaxada.” Controle que esbarrava em algumas dificuldades: conflitos particulares ou
grupais, como no caso das vendas nos morros; quantidade de funcionários encarregados para
tais tarefas; e especificiades do mercado na “sociedade da escassez”, como muitos definem o
nível de produção e consumo no Antigo Regime (Meneses:2003, p.165-222).73 Taciana Botega
Tavares, por exemplo, ao estudar as normas de regulamentação das construções e as práticas dos
almotacés e arruadores na Vila Rica Setecentista, afirma que
(...) acompanhar de perto as construções se tornava uma tarefa difícil para aCâmara, a começar pela regulamentação dos ofícios de pedreiros e carpinteiros.Por não estarem estabelecidos em um local fixo, a fiscalização era quaseimpossível, e muitos desses artífices não tinha sequer licença expedida pelaCâmara para exercerem a profissão. A maioria das construções era planejadapelo próprios pedreiros e por quem os contratasse, e, na maioria das vezes, ascasas eram construídas sem seguir nenhuma das normas (...).
José Newton Meneses acrescenta que nem mesmo em Portugal o exame obrigatório para a
liberação da atividade mecânica, baseado no modelo de Lisboa, encaixou-se “de forma perfeita”
em outras regiões (2003, p.168).
A fragilidade do Senado da Câmara em fazer valer as suas normas nos morros ou nas partes
baixas de Vila Rica evidencia os pontos de tensão e de negociação que envolviam as relações
entre essa instituição e a sociedade local - o que tornava o jogo mais complexo
(Meneses:2003,p.173-182). A desarticulação do motim de 1720, por exemplo, não significou o
fim da queda de braço entre os camaristas e as práticas de comércio nos morros de Vila Rica.
Em 06/11/1720 os moradores do Ouro Bueno, Ouro Fino e Morro expuseram para o Senado da
Câmara as dificulades que encontravam para comprar carne, já que os seus escravos, devido ao
fechamento das vendas, tinham que se dirigir a outras partes da Sede, afetando no rendimento
diário dos trabalhos de mineração. 1 mês depois, em 14/12/1720, o Governador da capitania
despachou:
(...) concedão hum so corte de carne no morro emparagem que comodamentepossa servir para todos; eselhe torna a recomendar muy particular que outroofficio em genero algum de vendas, asim de comestivel como de outro qualquergenero não consitão no dito morro, ficando apra todos estes em seu vigor o
73 “Diante da pouca receptividade da população, o Senado da Câmara, para fiscalizar os moradores e suasconstruções, mantinha funcionários como os almotacés, capazes de embargar obras e prescrever o tipo depena; e os arruadores, destinados a arruar e medir foros, largos, becos, ruas e construções a seremlicenciadas pela Câmara (Tavares: 2005, p.85-86).”
Edital q’ sobre este particular se publicou (RAPM, ano XXV, 2º volume, julhode 1937, p.1-166) .
No início do ano seguinte, em 25/01/1721, o Senado também jogou pesado contra os
proprietários que haviam comercializado nos morros, solicitando aos oficiais da Câmara tirarem
“hua lista daz vendaz que havia outinha havido noouro podre e bueno no anno de setesentos e
dezanove emandarão se remetessem aoz cobradorez dos destritos ditos pª Examinar se ha algunz
desse tempo para cobrarem delles os Quintos.” No entanto, a quedra de braço entre os dois
lados permaneceu ativa nas décadas seguintes. Em 27/04/1722, Dom Lourenço de Almeida,
governador empossado no ano anterior, publicou um novo bando “para que não houvesse
vendas de coisa alguma no morro do Ouro [Preto], pelo prejuízo que causava na desinquietação
dos pretos com as pretas (Códice Matoso: 1999, p.368).” Uma década depois, em 29/03/1732, o
novo governador, André de Melo e Castro, o Conde de Galveias, publicou novamente um bando
“em que proibia as vendas do Morro, pelas desordens que delas se seguiam (Códice Matoso:
1999, p.368).” Em 1736, segundo Flávio Marcus da Silva (2003, p.100), o governador Gomes
Freire de Andrade proibia, mais uma vez,
(...) o estabelecimento de vendas e a presença de negras de tabuleiro nos morrosde Vila Rica, sendo que os desobedientes brancos seriam condenados a quarentaoitavas de ouro e a vinte dias de cadeia; e os negros, mulatos ou carijós, a oitodias de prisão, às mesmas quarenta oitavas, e a cinquenta açoites em praçapública.74
Enquanto os ambulantes e os comerciantes de vendas ilegais insistiam em atuar nos morros de
Vila Rica, a Câmara realizava prisões, a fim de coibir essas práticas. Foi o que ocorreu em 1732
com Pedro de Freitas Guimarães, preso
sob a acusação de ter venda oculta no morro de Vila Rica, onde estariacomercializando gêneros proibidos. Na busca dada em sua casa foi encontradoum barril e meio de aguardente de cana, um frasco da mesma bebidaembrulhado em um lenço pardo e uma carga de bacalhau, ‘com vários indíciosde com efeito ser venda’ (Silva: 2003, p.111).
74 Flávio Marcus da Silva indica que, diferente dos comerciantes e atravessadores, os lavradores de feijão,milho, arroz e farinha eram autorizados (e até estimulados) a comercializar os seus produtos nos morros enas partes baixas da Sede, “como costumavam fazer”. Segundo esse autor: “Além dos mantimentos maiscomuns, como farinha de milho e de mandioca, arroz, feijão, milho e azeite de mamona, um outro gêneroque podia ser comercializado nos morros de mineração era o pão de trigo. Nesses lugares, as autoridadesproibiam somente venda de alimentos que pudessem ser consumidos no local pelos negros mineradores.O pão de trigo, no entanto, não era considerado um gênero de consumo dos escravos e por isso a suacomercialização nos morros e outras áreas de mineração não era proibida (Silva: 2003, p.100).
Em 1733 foram detidos Maria, escrava de Alexandre Correia, morador no Padre Faria, presa por
vender broas de milho, e Francisco da Silva Ferreira, por vender aguardente, ambos para os
escravos mineradores (Silva: 2003, p.110).
Outros conflitos nos morros de Vila Rica eram mais específicos ao cotidiano dos
mineradores e às suas práticas de extração do ouro nos serviços de talho aberto,
buraco e mina.75 A resolução dessas querelas ficava a cargo da Superintendência das
Minas.76 O texto “Modo e estilo que se tem observado e parece se deve observar no
uso de minerar nos morros e distrito de Vila Rica do Ouro Preto”, escrito ou recolhido
em meados do século XVIII pelo Ouvidor Caetano da Costa Matoso, sintetiza os tipos
de contendas comuns nessa área (Códice Matoso: 1999, p.766-768). Aparentemente,
a maioria dos conflitos era formada pelos serviços nos subsolos, já que na superfície
ficava mais fácil visualizar a invasão de um trabalho sobre o outro, de uma
propriedade sobre outra. O texto acima citado enumerou 6 problemas envolvendo os
serviços de minas:
1. Os serviços de dois proprietários encontravam-se quando seguiam os braços (ou
contraminas) do veio de ouro que atravessavam as suas datas. A solução para esse
caso previa que o serviço adiantado devia “seguir o seu rumo em que vai ou para
onde lhe parecer ter melhor conta” e o que estava atrasado se mandava “desviar
para outra parte que não faça prejuízo ao que está adiantado”. Caso o atrasado
optasse por passar por baixo do curso do adiantado, ele ficaria obrigado a custear
todo o tipo de segurança, utilizando “fortaleza de madeira” e arcando com todo o
prejuízo que causar o outro. Caso o atrasado desista dos serviços, após ter avançado
por baixo, fica obrigado a “entupir com terras a tal passagem e dar parte ao de cima
para este melhor entulhar, e desta forma fica cessando a dita obrigação.”
2. Ocorria o mesmo problema acima citado, mas não era possível definir quem estava
adiantado. Nestes termos mandava os dois dividirem “para o lado contrário, deixando
um e outro terra entremeio que bem baste para a conservação de um e de outro
75 Em meu primeiro relatório detalhei essas técnicaa de mineração, por isso reproduzi o texto no campodos anexos.76 Denominada, a partir de 1735, como Intendência do Ouro; após 1750, Intendências Gerais do Ouro; edepois de 1803, Junta Administrativa de Mineração e Moedagem (Paula: 2007, p.289).
serviço, com pretexto de não consentirem faiscadores nem serviço algum para a
parte de entre ambos, ainda que tenha formação com ouro.”
3. Um serviço de mina avançava por baixo de uma ou mais catas a céu aberto.
“Nestes termos não podem os das catas impedir o serviço das minas nem também as
minas impedir a continuação das catas: que chegando o desmontar das catas às minas
fiquem as minas na tal parte sem vigor e as catas continuando o seu rumo.”
4. Um serviço de mina avançava por cima de um outro trabalho e para esse desviava
um veio d’água. Esse rocedimento era legal desde que não causasse prejuízo ao
proprietário da galeria inferior. Caso existisse a possibilidade de grandes danos, o
lançamento dessas águas era proibido. Caso um serviço inferior furasse os fundos de
um serviço superior e entrasse água em seus trabalhos, este a devia receber, ainda
que lhe causasse algum dano.”
5. Um serviço de mina encontrava um veio d’água em um de seus braços
(contraminas) e, ainda que sacrificasse esse braço, eles o fechavam; ocorrendo, às
vezes, que a mina de de um outro proprietário atravessasse esse braço, o que
acarretava sérios danos. A contenda era resolvida ordenando que o canal d’água foi
encaminhado pelo roteiro do primeiro possuidor.
6. O aprofundamento da mina comprometimenta ou desabava residências, tanques
de água, mundéus ou caminhos públicos. Como não era possível impedir a extração
do ouro, o proprietário do serviço da mina ficava obrigado a “pagar e ressacir todo o
dano” que causasse (Códice Matoso: 1999, p.766-768).
Existiam ainda os conflitos gerados pelos desvios clandestinos dos córregos. Apenas o
proprietário de um título de águas minerais podia desviar um curso d’água através de
regos até os seus tanques, como os mundéus. Caso um proprietário necessitasse
passar um desvio d’água autorizado por uma data mineral vizinha, tal passagem
deveria ser feita via áerea, através de “bicas levantadas do chão”, a fim de que um
rego não contaminasse o outro (Códice Matoso: 1999, p.766-768).
Portanto, percebe-se nessas fontes a condição sui generis do povoamento nos morros da Serra
de Ouro Preto, já que a ocupação do espaço estendeu-se tanto na superfície quanto na parte
subterrânea do solo, e não raro uma afetou a outra.77 À medida que as datas minerais foram
concedidas, constituindo terrenos, becos e ruas, ampliou-se a construção de vendas e o comércio
ambulante de lavradores e escravos de ganho. Durante a primeira metade do século XVIII,
enquanto o Senado da Câmara ainda se adaptava às demandas criadas pelo tipo de povoamento
na Sede de Vila Rica, a região da Serra de Ouro Preto transformou-se numa zona de difícil
fiscalização, quer seja pela sua dimensão, íngrime relevo, interesses de diferentes grupos de
proprietários ou número de fiscais. Sem dúvida, uma região que reunia um cenário apto a
tensões. Como parte integrante dessa vida urbana é possível que, ao longo do tempo, alguns
oficiais mecânicos, como alfaiates, sapateiros, ferreiros, pedreiros e carpinteiros, tenham se
instalado nessa área, pois, até o momento, não encontramos nenhum edital ou bando que
proibisse tais atividades nessa zona de mineração.78
No entanto, na virada para a segunda metade dos Setecentos, a produção do ouro (tomando
como referência os rendimentos dos tributos) começou a dar sinais de queda em Minas Gerais,
diminuindo sensivelmente a partir das décadas de 1760 e 1770 (Paula:2007, p.280-301).
77 Em 1731, algumas lavras, como as conhecidas como Novas (ou Tassaras), situadas entre os morros deSantana e Piedade, já atingiam 200m de profundidade (Oliveira & Ribeiro: 1903, p.7).78 Como veremos no decorrer do texto, esses oficiais aparecem como moradores dessa região no censo daSede de Ouro Preto de 1804.
5. Morros de Vila Rica: declínio da produção do ouro - 2ª metade do século XVIII.
A transição entre o auge e o declínio da produção nos morros da Serra de Ouro Preto
é um setor ainda lacunar em nossa pesquisa. Uma busca sistemática nos livros de
Atas de Sessão da Câmara ou de Registros de Ofícios e Portarias talvez nos aproxime
do cotidiano dessa zona de mineração nessa época. Poderíamos, por exemplo,
verificar se permaneceram os problemas típicos da primeira metade, como a
proibição de instalação das vendas, do comércio ambulante de negros e negras e do
abrigo de escravos nas propriedades. Ou mesmo verificar se o processo de
consolidação e estratificação do povoamento tendeu a arrefecer esses conflitos.
Diante dessa ausência, tentaremos focalizar alguns efeitos provocados pela crise da
mineração nos morros da Serra de Ouro Preto, a partir de informações sobre a
situação das lavras e a produção do ouro.
João Antônio de Paula, apesar de ressaltar as controvérsias sobre as estimativas e as
fontes relacionadas à produção do ouro mineiro no século XVIII, indica duas
importantes referências: os estudos de Virgílio Noya Pinto, de 1979, e de Michel
Morineu, de 1985.79 Virgílio divide essa produção em três fases:
(...) a primeira de 1700-1735, marcada pela descoberta, consolidaçãoe crescimento da produção até a introdução sistemática da capitação;a segunda etapa, que é de auge da produção, marcada pela vigênciada capitação, mas que também é o momento do incremento daprodução de Goiás e Mato Grosso, que vai de 1735 até 1755, já noperíodo pombalino, com o quinto restabelecido; finalmente a terceiraetapa, iniciada em 1755, será marcada por queda irreversível daprodução (...) (Paula: 2007, p.295).
Apesar de divergir quanto ao momento de pico da produção, as informações de
Michel Morineau também convergem quanto ao início da fase de declínio: “O período
de auge, segundo os dados de Morineau, seria de 25 anos, ou seja, de 1726 a 1750.
Para os dados de Noya Pinto, o auge seria de 20 anos, entre 1735 e 1755 (Paula:
2007, p.297). A Revista Industrial de Minas Gerais, de 1897, ao refletir sobre a
legislação da mineração do ouro, também aponta a década de 1760 como o momento
chave para a percepção da queda de produção nos Setecentos:
A verdade, entretanto, é que de 1765 a 70 as minas começaram adecair, até que se levantaram os clamores, as queixas, os vexames, eas dividas à Fazenda Real; subiram petições e súplicas como as quevimos registradas no último número da Revista do Arquivo PúblicoMineiro; tramaram-se mesmo conspirações; e até que, em resultado detudo isso, aqui veio este mundo de ruínas, veio o deserto e assentou-se a morte nos mais ricos e possantes centros de população (grifonosso).80
A crise da mineração do ouro em Minas Gerais, como vem sendo abordado pela historiografia
contemporânea, não deve ser observada através de uma ótica generalizante ou cíclica, já que
atingiu diferentemente as localidades da capitania. A partir das últimas décadas dos Setecentos,
momento em que a diminuição dos rendimentos com os Quintos tornou a crise evidente, três
79 Enquanto Virgílio constrói sua metodologia de cálculo “levando em conta a produção média de ouropor escravo, o número de escravos empregadas e as rendas dos ‘quintos’”, compensando “pela articulaçãode fontes e critérios, a ausência de séries completas e confiáveis”, Michel Morineau baseia-se “nos dadosdivulgados por jonais holandeses” (Paula: 2007,p.293-299).80 Revista Industrial de Minas Gerais. A Lei sobre Mineração. Ouro Preto, ano IV, 30 de marçode 1897, p.38-40.
cenários se misturavam na região mineradora: 1) datas que apresentavam o esgotamento dos
veios ou a impossibilidade de continuação dos serviços; 2) datas onde permaneciam pequenos e
médios serviços de extração e faiscação; 3) datas que demonstravam potencial e necessitavam
de técnicas de mineração mais sofisticadas.
Nos morros da Serra de Ouro Preto, a situação das lavras nessa época pode ser
captada a partir do texto de José Joaquim da Rocha, escrito no final do século XVIII:
Esta Serra de Ouro Preto é povoada de mineiros com diferentes nomesas suas povoações, como são: o Morro do Pau Doce, Morro dos Ramos,Morro do Ouro Podre, Morro do Ouro Fino, Morro da Queimada e Morrode Santana. Todos estes sítios adquiriram estes epítetos pelos serviçosde mineração que neles se fizeram em diligências da extração de ouro.O Morro dos Ramos abismou as suas faisqueiras e ainda hoje temcopioso ouro, mas com dificuldade a sua extração, assim como emtodas as mais terras que os mineiros, por falta de forças, as nãopodem lavrar, por causa da profundidade e durezas que com muitocusto se podem penetrar, para fazerem as necessárias cortaduras echegarem às últimas formações, onde se encontra o precioso metal,que sem água não se pode tirar; e a falta desta, nas serras de VilaRica, Paracatu, Pompeu, Piranga, Rio das Mortes, Minas Novas e outrasmuito mais, causa grave prejuízo aos mineiros que nela têmserviços, o que não aconteceria se aqueles se unissem eprocurassem modos de conduzir águas que lhes pudessem ser úteis;porém, como somente se valem das chuvas padecem todos infinitasfaltas (grifo nosso) (Rocha: 1995, p.104).81
Dois problemas parecem evidentes nesse texto: a idéia de que o ouro encontrava-se em maiores
profundidades necessitanto, portanto, de investimentos maiores em novas técnicas de extração e
plantéis de escravos; e a dependência das chuvas para a concentração das águas nos tanques e
uso nas fases de desmonte e tratamento do minério.82 Diogo Pereira Ribeiro de Vasconcelos, o
velho, na virada para o século XIX, além de concordar com as observações de José Joaquim da
Rocha, destacava a necessidade do Estado rever a sua atuação nesse segmento:
81 O Morro do Pau Doce e o Morro dos Ramos situavam-se na região do Veloso; e os morros do OuroPodre, Ouro Fino, Queimada e Santana situam-se na parte alta da Freguesia de Antônio Dias.82 No início do século XX, o estudo sobre as Lavras de Tassaras e Arredores, realizado pelos engenheirosClodorimo de Oliveira e Marciano Ribeiro, identificou os seguintes córregos entre os Morros da Piedade,Santana, São João e Taquaral: Córrego Saragosa (antigo Thalweg); Córrego da Água Limpa (ouTassaras); Córrego da Pedra Grande; e Córrego do Taquaral.
Não é tão fácil a remediar o pasmo em que os serviços minerais estão, uma vezque provém da dificuldade deles, o que, a meu ver, é causa principal dadiminuição do quinto. Deve-se talvez, começar pelo lealdamento dos gênerosque o mineiro há mister, como fiz ver nas observações com que fixei asmemórias que correm manuscritas dos reais direitos que os soberanos têmpercebido da capitania. A dificuldade procede menos da falta do ouro do que dairregularidade dos antigos serviços nas alturas dos montes, aonde a mineraçãoera mais cômoda: o que foi parte para que as riquezas das terras inferiores(internas) ainda intactas ficassem submergidas de modo a se não poderem, semgrande custo, extrair. Nem se duvide que a desabafar estes lugares dosdesmontes sejam fracas e insuficientes as forças dos particulares, se é que oEstado não vier em seu socorro com isenções, ao menos, e privilégios(Vasconcelos: 1994, p.121).
A certificação dos efeitos produzidos pela crise na rede econômica da Sede de Vila
Rica pode ser medida por um sintoma comum à região mineradora: o aumento do
número de habitantes alforriados e livres. Segundo o estudo de Iraci Del Nero Costa,
essa tendência é nítida nos registros de batismos, casamentos e óbitos da Freguesia
de Antônio Dias: a partir das últimas décadas dos Setecentos, o número de realização
desses rituais apresentam crescimentos semelhantes em meio à população livre ou
alforriada, resultado, sem dúvida, do aumento do número de cartas de libertação e
do nascimento de crianças não escravas.83
Na virada para o século XIX, a queda na produção do ouro, as dificuldades de manter
as lavras ativas e o crescimento da população livre desenharam um cenário de
decadência para as atividades minerarias na Serra de Ouro Preto. O século XVIII, que
iniciou trazendo expectativas de enriquecimento, terminou, sem dúvida,
contaminado pelas incertezas: a vida nos morros se rearticulou a essa nova realidade.
6. Século XIX: decadência das lavras nos morros de Vila Rica.
A mineração aurífera tornou-se a motivação central para a ocupação dos morros da Serra de
Ouro Preto no século XVIII, por isso as dificuldades encontradas para a continuação dessa
83 Os registros dos rituais realizados nas capelas da Piedade, Santana e São João, situadas próximas aoMorro do Ouro Podre e Morro da Queimada, eram feitos nos livros da Paróquia de Antônio Dias, eencontram-se no Arquivo Eclesiástico da Paróquia de Nossa Senhora da Conceição de Antônio Dias.Nesse arquivo, Iraci Del Nero Costa pesquisou, por exemplo, 13.183 registros de batismos de inocentesrealizados entre 1719 e 1818.
atividade ao longo dos Oitocentos provocou a previsível diminuição dos serviços de mineração
e do povoamento nessa área. Essa percepção é ratificada por cinco tipos de evidências: o censo
da Sede de Ouro Preto de 1804; os estudos do geólogo alemão Wilhelm Eschwege, que viveu
nessa localidade durante as primeiras décadas dos Oitocentos; a análise dos textos de 13
relatos de viajantes estrangeiros sobre Ouro Preto no século XIX; os estudos
realizados a partir de 1876 pelos pesquisadores da Escola de Minas; e documentos
produzidos pela Câmara de Ouro Preto do final do século XIX.
FIG.4. O espaço delimitado evidencia a área dos morros de São Sebastião,
São João, Santana e Piedade. Detalhe do “Mapa de Vila Rica”.
[Início do século XIX].
Autor: Não identificado.
Fonte: COSTA, Antônio Gilberto. 2004.
O Censo de 1804, conforme o Quadro 2, demonstra que em 1804 existiam 8.990
habitantes na Sede de Vila Rica (Mathias: 1969, p.191-202).84 Na freguesia de Nossa
Senhora do Pilar do Ouro Preto, composta também pela localidade de Cabeças,
residiam 4.272 pessoas (47,5%); e na freguesia de Antônio Dias, que englobava
também a região dos Morros, o Alto da Cruz e o Padre Faria, residiam 4.718 pessoas
(52,5%).
População de Vila Rica - 1804
Distrito Homens Mulheres TOTAL Livres Escravos TOTAL
Ouro Preto 1441 1430 2871 1819 1052 2871
Cabeças 720 681 1401 950 451 1401
84 Auguste Saint-Hilaire, francês que visitou a Sede de Vila Rica em 1816, apresenta um númerosemelhante: 8.000 habitantes (1976, p.70). O austríaco John Emanuel Pohl, que passou por Vila Ricaentre 1817 e 1821, registrou 8.600 habitantes. SPIX & MARTIUS registraram, entre 1817 e 1820, 8.500habitantes para a Sede de Vila Rica e 500.000 para a Capitania de Minas Gerais. A proximidade dosnúmeros sugere que eles tenham entrado em contato com dados do censo de 1804.
Antônio Dias 857 837 1694 1100 594 1694
Morros 685 624 1289 946 343 1289
Alto da Cruz 517 601 1118 824 294 1118
Padre Faria 286 331 617 458 159 617
TOTAL 4486 4504 8990 6097 2893 8990
Quadro 2. População de Vila Rica – 1804.
Fonte: MATHIAS, Herculano G. Um recenseamento da capitania de Minas Gerais: VilaRica – 1804. Rio de Janeiro: Ministério da Justiça / Arquivo Nacional, 1969. p.190-208.
Conforme o Quadro 3, nos morros (ou Distrito dos Morros, como foi desginado nesse
censo) moravam 14,3% da população da Sede de Vila Rica, concentrados em pontos
diferentes, onde destacavam-se o Morro de Santana, o Caminho Novo (região da atual
Rua 15 de Agosto), o Morro de São João, o Morro de São Sebastião e o Morro da
Queimada.85
Morros de Vila Rica - 1804
Morros Propriedades Habitantes
Morro dos Ramos 11 41
Morro de São Sebastião 24 57
Jacutinga 9 26
Ouro Podre 8 47
Ouro Fino 11 52
Queimada 22 113
Lages 7 54
Caminho Novo 49 325
85 A disposição dos morros apresentada no Quadro 2 é a mesma do censo. Ela corta a Sede de Vila Rica ea Serra de Ouro Preto no seu eixo Oeste-leste, entre o Veloso (Morro do Ramos) e os Morros de Piedade,Santana e São João.
Morro da Piedade 17 106
Morro de Santana 50 244
Córrego Seco 4 35
Morro de São João 40 189
TOTAL 252 1.289
Quadro 3. Morros de Vila Rica – 1804.
Fonte: MATHIAS, Herculano G. Um recenseamento da capitania de Minas Gerais: VilaRica – 1804. Rio de Janeiro: Ministério da Justiça / Arquivo Nacional, 1969. p.190-208.
Em relação às propriedades nota-se que a maior parte (241 das 252 listadas)
concentrava-se entre os morros de São Sebastião, São João, Santana e Piedade,
localidades que margeiam o espaço onde está sendo implantado o Parque
Arqueológico do Morro da Queimada. Entre os 1.289 habitantes listados, 1.248
(96,8%) moravam nesse setor, aglomeração ratificada pela existência das capelas.
Um outro indício sobre essa concentração está nas diferentes denominações lançadas
no censo para essa área: Morro de São Sebastião, Jacutinga, Ouro Podre, Ouro Fino,
Queimada, Lages, Caminho Novo, Morro da Piedade, Morro de Santana, Córrego Seco
e Morro de São João.86 Essas 11 designações demonstram o nível de ocupação da
Serra de Ouro Preto ao longo do século XVIII, reforçando a importância desse setor
enquanto zona de mineração e moradia. A partir dessas denominações podemos
ainda concluir que a idéia de uma substituição mecânica entre as designações Morro
do Ouro Podre (ou Morro do Pascoal) e Morro da Queimada, após a finalização do
motim de 1720, é equivocada, já que ambas são citadas nesse documento do início
do século XIX.
Esse equívoco nos leva a uma pergunta: é possível definir com alguma precisão os
espaços dos morros da Queimada e do Ouro Podre em 1804? A entrada mais eficiente
para responder essa questão seria identificar os limites naturais ou não (córregos,
86 Esse ponto pode ser observado a partir da comparação com dois documentos citados nessa pesquisa: otributo do Quinto de 1719; e o texto de José Joaquim da Rocha, produzido na segunda metade do XVIII.No primeiro aparecem 4 designações: Ouro Podre, Morro, Ouro Fino e Córrego Seco, compreensível portratar-se da fase inicial do povoamento de Vila Rica; no segundo aparecem 7 designações: Morro do Pau
morros, estradas, proprietários) que divisavam as propriedades indicadas no censo.
No entanto, entre os 30 proprietários listados nos morros da Queimada e do Ouro
Podre (sendo 22 do segundo) conseguimos identificar apenas o inventário do
Reverendo Padre Lourenço Dias de Almeida, de 1811, residente no Ouro Podre.87
FIG.4. Serra de Ouro Preto. Detalhe da prancha “Vila Rica”. [1817-1821].
Prancha 791. Aquarela sobre lápis. 340x534mm.
Autor: Thomas Ender
Fonte: Wagner & Bandeira: 2000.p.971.
Entre as posses do reverendo encontravam-se 2 escravos, poucos móveis, um sítio na
localidade de Rio das Pedras, uma chácara no Ouro Bueno e uma “morada de casas
coberta de telhas” e datas de terras minerais, minas e catas no Morro de São
Sebastião. Nenhum imóvel no Ouro Podre foi registrado no inventário, o que nos leva
à seguinte questão: ou o padre se desfez da propriedade do Morro do Ouro Podre,
entre 1804 e 1811, adquirindo uma nova posse no Morro de São Sebastião, ou houve
uma imprecisão quanto ao registro do mesmo imóvel no censo e no inventário. Nos
parece, portanto, que mesmo para os contemporâneos essa divisão não era clara.88
Doce e Morro dos Ramos (região do Passa-Dez e Veloso) e Morro do Ouro Podre, Morro do Ouro Fino,Morro da Queimada e Morro de Santana.87 As buscas foram realizadas no acervo de inventários e testamentos do Museu da Casa do Pilar de OuroPreto: códice 92, auto 1124, 1º ofício, 1811, inventário do Reverendo Padre Lourenço Dias de Almeida.88 A resposta para a questão acima colocada talvez possa ser respondida a partir de outras fontes, como osLivros de Tombo que reúnem num mesmo códice diferentes tipos de documentação - o que torna aprocura mais demorada e complexa.
Morro do Ouro Podre ouMorro da Queimada Lages Setor dos morros de São
João, Santana e
Morro de São Sebastião Setor dos morros de SãoJoão, Santana e
FIG.5. Parte dos morros da Serra de Ouro Preto. Detalhe da prancha 791
“Vila Rica”. [1817-1821]. Aquarela sobre lápis. 340x534mm.
Autor: Thomas Ender
Fonte: Wagner & Bandeira: 2000.p.971.
Nas 8 propriedades do Morro do Ouro Podre foram identificadas 47 habitantes, e nas
22 propriedades do Morro da Queimada foram identificados 113 habitantes. Entre
esses dois morros, o censo localizou o Morro do Ouro Fino, que apresentava em suas
11 propriedades 52 habitantes. Assim, entre o Morro do Ouro Podre e o Morro da
Queimada haviam 41 propriedades e 212 habitantes, semelhante à concentração
verificada no Morro de Santana (50 propriedades e 244 habitantes). Outra
concentração interessante encontra-se entre os morros de São João, Santana e
Piedade, que aparecem no censo com 107 (ou 42%) das 252 propriedades listadas,
sendo que neles habitavam 539 (41,8%) dos 1.289 habitantes. Conforme as FIG.4 e 5,
as pranchas criadas por Thomas Ender, que visitou Vila Rica entre 1817 e 1825,
também ratificam essas concentrações.
A partir do censo de 1804 percebe-se que dos 252 proprietários arrolados 77 (30%)
foram classificados como mineradores ou faiscadores nos morros da Serra de Ouro
Preto. Desses 77, 59 (76%) eram faiscadores, atividade comum à parte da população
pobre. O número de escravos desses 77 proprietários era de 146 (11,3% da população
dos morros), e apenas 4 plantéis tinham mais de 10 cativos: Dona Josefa M. De
Almeida com 12 (Morro dos Ramos); Capitão Alberto com 19 (Caminho Novo); e Dona
Anna da Silveira com 22 e Tenente [Manoel] Moreira com 31 (Morro de Santana). Quer
dizer, apenas 11% dos escravos dos morros estavam ligados a proprietários que ainda
exerciam atividades na mineração do ouro, proporção pouco expressiva para uma
zona que tinha nesses trabalhos a base de sua vida produtiva no século XVIII. Segundo
o censo, no Morro de São Sebastião, Jacutinga e Lages não residiam mineradores,
apenas faiscadores. No Morro da Queimada residiam 2 mineradores: o Alferes José de
Moura com 9 escravos; e Joana Teixeira com 9 escravos. No Morro do Ouro Podre
havia 1 minerador: o Reverendo Padre Lourenço Dias de Almeida, que tinha 2
escravos. Considerando esses dados, a Serra de Ouro Preto apresentava em 1804 um
cenário comum à região central mineira desde o final do século XVIII: a diminuição da
produção do ouro e a existência de poucas lavras ativas.
Quanto ao comércio nos morros de Vila Rica o censo identifica 12 proprietários: 10
donos de vendas (3 no Morro de São Sebastião e 7 no Caminho Novo); 1 mascate
(Morro de São João) e 1 tropeiro (Caminho Novo). Em relação a outros serviços foram
identificados nessa mesma área: 3 alfaiates, 2 pedreiros, 3 sapateiros, 8 carreiros, 4
carpinteiros, 2 marceneiros e 3 ferreiros.89 Sem dúvida, apesar de contar com apenas
14,3% da população da Sede de Vila Rica, a vida urbana persistia nos morros da Serra
de Ouro Preto na virada para os Oitocentos, como demonstra a representação dos
Morros de Santana e Piedade na FIG.6.
FIG.6. Morros de Santana e Piedade. Detalhe da prancha 780 (sem título)
[1817-1821]. Aquarela sobre lápis. 347x532mm.
Autor: Thomas Ender
Fonte: Wagner & Bandeira: 2000.p.960.
Mas é necessário indicar uma falha no censo de 1804: 99 (39,2%) dos 252
proprietários listados nos morros da Serra de Ouro Preto não tiveram as suas
ocupações identificadas, o que abre a possibilidade para a identificação de novas
propriedades com serviços ativos de mineração. Essa dúvida, no entanto, pode ser
aclarada a partir dos estudos do geólogo alemão Wilhelm Eschwege, que viveu nessa
localidade nas primeiras décadas dos Oitocentos e presenciou o impacto da crise mineratória
nesse setor de Vila Rica. Segundo Eschwege, o viajante que percorresse a Serra de Ouro Preto
em 1815 encontraria entre as numerosas explorações de pequenos proprietários, “na maior parte,
porém, abandonadas”, as seguintes lavras importantes: Lavra dos Pelúrios (Morro de São
Sebastião); Lavra do Padre Viegas (Morro de Santana); Lavra do Moreira (Morro da Piedade ou
Água Limpa); Lavra do Padre Bernardo (Sumaré); e Lavra do Padre Bento (Morro de Santo
Antônio da Passagem, pertencente ao Tenente Coronel Maximiano). Conforme o alemão:
89 Outras ocupações também foram arroladas, como pobre, cego, sacerdote, meirinho, pedestre da junta etecedeira. O conceito de ocupação era diferente de profissão, como se vê através desses exemplos.
Os grandes proprietários, dos quais nenhum, porém, possui mais de dozeescravos em serviço, exploram suas lavras pelo método do talho aberto, aocontrário dos pequenos, que o fazem por meio de galerias e poços (...) (grifonosso). Às vezes não se pode caminhar cinqüenta passos, sem topar com umagaleria e um poço, aberto no morro através da capa de tapanhoacanga. Centenasde catas foram abertas junto ou sobre os poderesos vieiros de quartzo aurífero,que, nesse lugar, atravessou o itacolomito em várias direções. (...)
Enquanto o censo de 1804 apontou Capitão Alberto, no Caminho Novo, e Dona Anna da
Silveira e o Tenente [Manoel] Moreira, no Morro de Santana, como proprietários
respectivos de 19, 22 e 31 escravos, Eschwege, 11 anos após o recenseamento,
indicou que nenhum dono de lavra possuía mais que 12 escravos na Serra de Ouro Preto.
Essa diminuição dos plantéis é um outro indício importante sobre a situação dos serviços de
mineração nessa área no início do século XIX. Com o desaquecimento das lavras, boa parte dos
trabalhadores que insistiam com a mineração investiou na faiscação. Em 1804, conforme o
censo, existiam 59 moradores dos morros da serra exercendo essa função; em 1815, segundo
Eschwege, existiam mais de 280 faiscadores na Sede de Vila Rica e, aparentemente, boa parte
vivia na região dos morros:
Na encosta da serra, entre blocos estilhaçados, se avistam as pobres cafuasesparsas dos faiscadores, ou de negros forros, assentados no terrenoprofundamente esburacado. O número desses negros forros, que arrastam umavida miserável em virtude de maus processos de apuração atingia, em 1815, amais de duzentos e oitenta, só nas duas freguesias de Vila Rica (Eschwege:1979, p.8).
E acrescenta o alemão:
É digna de admiração a paciência com que realizam o seu trabalho, munidos tãosomente de uma bateia quebrada e de um almocrafe inutilizado, tendo comorecompensa o suficiente para não morrer de fome. São ainda mais dignos de dóos negros que permaneceram dentro da água fria dos ribeiros até a cintura,enquanto o tronco e a cabeça suportam os ardores de um sol abrasador. Em1815, os que trabalhavam nessas condições atingiam a vinte, na região(Eschwege: 1979, p.8-9).
Se 20 dos mais de 280 faiscadores trabalhavam nos ribeiros, situados nas partes baixas, a
maioria, então, passava o dia tentando ganhar “o suficiente para não morrer de fome” nas áreas
mais altas, o que justifica a existência das cafuas nos morros, citadas por Eschwege. O relato do
alemão quanto aos serviços de mineração na Serra de Ouro Preto é claro: devido ao
esgotamento dos veios ou às técnicas utilizadas no século XVIII (ainda repetidas no início do
XIX) a maioria das lavras estava parada e poucas ainda apresentavam potencial para novos
investimentos. A fase de expectativa e euforia que marcou boa parte dos Setecentos havia se
transformado em um cenário de incertezas.
Essa impressão é corroborada pela análise dos relatos de 13 cronistas estrangeiros que
visitaram Ouro Preto ao longo do século XIX: poucos tiveram a curiosidade de excursionar
pelos morros da serra ou sobre esses espaços alguma linha escreveu.90 O comentário do
comerciante inglês John Luccock, quando viajava de Ouro Preto para Mariana entre 1817 e
1818, ilustra essa situação:
Antes de alcançarmos Passagem, aldeia de cerca de cento e cinquentas casas,com uma boa ponte por sobre uma torrente, indicaram-me um ponto bem nocume de um morro que ali se inclina para o norte, que é tido por ter sido umdos mais ricos do Brasil. Nesse local não somente a mineração foiconduzida em larga escala, como também por processos que, emboraimperfeitos, se colocam entre os melhores e mais geralmente adotados nestaparte do continente (grifo nosso) (Luccock; l976, p.339).91
O francês Auguste Saint-Hilaire, acompanhado por Eschwege, foi um dos que se aventurou
pelos morros da Serra de Ouro Preto em 1816, no entanto, o seu objetivo era observar os
serviços de mineração na freguesia de Antônio Pereira, próximo à Mariana. Segue parte do seu
relato:
Após sairmos da cidade (de Ouro Preto), galgamos as elevações que a rodeiam.Por todos os lados, tínhamos sob os olhos os vestígios aflitivos das lavagens,vastas extensões de terra revolvida, e montes de cascalho; mas, ao mesmotempo, dominávamos uma parte da cidade, e mais além percebíamos o vale emque corre o Rio Ouro Preto (grifo nosso) (Saint-Hilaire: 1975, p.75).
90 Textos pesquisados: John Mawe (1976), Conde de Suzannet (1957), Spix & Martius (1976), RochSchüch (1840), Saint-Hilaire (1976), Johann Pohl (1976), John Luccock (1976), Alcide D’Orbigny(1976), Visconde Ernest Courcy (1997), Francis Castelnau (1949), Richard Burton (1976), HermannBurmeister (1980), Charles Banbury (1981).91 É preciso levar em consideração também os diferentes interesses dos viajantes estrangeiros quepassaram por Minas Gerais no século XIX. O que era prioridade para o campo de observação de um nãoera necessariamente para outro.
Entre 1817 e 1821, John Emanuel Pohl, também aconpanhado por Eschwege, subiu a região dos
morros rumo a Antônio Pereira, a fim de visitar a fábrica de fundição de ferro construída pelo
geólogo alemão:
Subimos, a cavalo, a íngrime Serra de Ouro Preto (...). Em toda parteavistávamos terras revolvidas e escavadas por causa do ouro que aquicorre com abundância. (...) Passamos depois por uma casinha e pelapequena igreja de São João, ambas no pico mais alto da serra, e descemos aíngrime encosta setentrional, que é em parte coberta de mato (grifo nosso). Maisou menos na metade dessa encosta, chegamos à Mina do Oliveira, aurífera, umagaleria, de uns 90 passos, cavada no itabirito (Pohl: 1976, p.399-340).
Entre 1817 e 1820, Johann Spix e Friedrich Martius também fizeram o mesmo caminho:
Alguns dias após a excusão, pusemo-nos a caminho para a aldeia de AntônioPereira, distante ao norte cinco léguas, para sabermos o que era feito de nossasmulas, que, durante a nossa estada em Vila Rica, tinham sido mandadas namaior parte aí para o pasto. Depois de havermos vencido a crista pedregosado Morro de Vila Rica (...) transpusemos, a uma légua da cidade, noCórrego de Andrada, o Rio das Velhas, neste ponto ainda um riacho muitoinsignificante (...). Numa grande fazenda sita na estrada, construída amodo de convento, era antigamente lavado muito ouro de vinte e doisquilates dos filões do minério de ferro (grifo nosso). Também, em geral, todaa Serra de Antônio Pereira corresponde em seus elementos e a posição dascamadas ao aurífero Morro de Vila Rica; pois ela consiste igualmente de xistoquartzítico branco, com jazidas de micaxisto, contendo oligisto e uma extensacamada de hematita sobreposta (Spix e Martius: 1976, p.246).
Charles Banbury, entre 1833 e 1835, também fez menção rápida sobre a serra, enquanto
transitava, via Distrito de Passagem, entre Ouro Preto e Mariana:
No Ribeirão do Carmo (ainda no perímetro de Ouro Preto) vê-se muitas vezesnegros, com ancinhos e alguidares, lavando a areia em busca de ouro, e aolongo de todo o lado da Serra de Ouro Preto existem inúmeras pequenascavernas cavadas nas rochas, de onde antigamente o precioso metal eraextraído (grifo nosso); mas nenhuma delas foi levada a uma profundidade demuitos pés (Banbury: 1981, p.67).
Os cronistas estrangeiros que visitaram Ouro Preto a partir da segunda metade do século XIX,
como o alemão Hermann Burmeister, na década de 1850, e o inglês Richard Burton, na década
de 1860, também demonstraram pouco interesse pelas práticas de mineração e pela vida urbana
nos morros da Serra de Ouro Preto. Sobre as evidências de mineração, após atravessar os
Distritos de Passagem e Taquaral a caminho de Ouro Preto, Hemann apenas escreveu: “Em
certos lugares, pudemos observar algumas cavidades artificiais nas pedras, vestígios evidentes
de antigas tentativas de exploração de ouro (Burmeister: 1980, p.221).” Burton, após
permanecer 3 dias na Mina de Passagem, então Anglo-Brazilian Gold Mining Company
Limited, partiu para Ouro Preto e fez somente a seguinte menção às antigas minerações:
A tarde já estava muito avançada quando partimos para Ouro Preto, que ficadistante apenas uma légua curta. Toda a extensão é mais ou menos habitada.Lemos que, em 1801, era cheia de pequenos povoados e ranchos de mineirosnas elevações, perto da água. O caminho era, então, uma boa calçada, com umaalameda de árvores, que estavam, contudo, começando a faltar. Hoje, a situaçãomudou para pior; o caminho é uma espécie de socalco (Burton: 1976, p.286).
O desprezo dos cronistas estrangeiros pelos morros da Serra de Ouro Preto difere-se dos
interesses dos pesquisadores da Escola de Minas de Ouro Preto, que, a partir da década de 1870,
afinaram o discurso sobre a viabilidade de aplicação de novos recursos nessa área. Em 1878,
Henri Gorceix, diretor da Escola de Minas, publicou uma análise sobre os estudos geológicos e
mineralógicos em Minas Gerais num periódico do Arquivo Nacional. Segundo Gorceix:
Depois dos trabalhos de d’Eschwege e de Sellow, os quais datam do começodeste século, nenhum estudo sério foi ainda publicado sobre a geologia e amineralogia do Brasil. (...) Certamente não são perfeitas as produções com quese estreiam aqueles jovens engenheiros, mas tais quais são elas, julgo-as dignasda atenção de quantos se interessam pela prosperidade do Brasil, e acreditamcomigo na exploração das riquezas minerais, tão prodigalizadas pela natureza aprovíncia de Minas, poderão oferecer-se ao país novos recursos, que lhepermitam realizar os grandes cometimentos empreendidos (Gorceix: 1878, p.9-10).
Nesse periódico Leandro Dupré Júnior, aluno da Escola de Minas, apresentou um estudo sobre
os arredores de Ouro Preto, e entre as suas conclusões destaca-se uma, quando informa que “os
trabalhos antigos não esgotaram a riqueza desta região e que, segundo me parece, adaptando-se
um método de exploração californiana, com emprego de amalgamação direta, poderia ainda
haver probabilidade de feliz resultado (Júnior: 1878, p.16). Leandro Júnior esclareceu, porém
que
(...) tal exploração só será possível se se empregar grande capital, se houvera iniciação de trabalhos dirigidos por uma única idéia, como sabemos ser
praticado no Hartz, em Freyberg e na Califórnia, nas explorações auríferas.Uma mina só por si nunca poderia pagar as despezas de uma destas obrasgigantescas que assegurassem o escoamento das águas e a extração dominério. Semelhante trabalho só deveria ser empreendido se se destinasseao serviço de um número considerável de explorações que fizessem asdespezas em comum (grifo nosso). Muitos lugares, aonde é bem certo existirainda, ouro em quantidade notável, estão no mesmo caso, e só o espírito deassociação que com tão grande dificuldade começa a entrar em nossa vidaindustrial, poderá salvar da morte as minerações de ouro na província de MinasGerais (Júnior: 1878, p.16).
Em 1881, a pedido de Henri Gorceix, João Cândido da Costa Sena, Minas, percorreu um roteiro
entre Ouro Preto e a região do Serro, a fim de estudar “cuidadosamente as minas de ouro e
fabricas de ferro existentes nesta parte da província, notando ao mesmo tempo o modo de
exploração das matas e do fabrico de carvão.” Sobre as lavras de ouro no caminho entre Ouro
Preto e Mariana, ele escreveu:
Seguindo a estrada que conduz de Ouro Preto a Mariana, nada direi sobre aslavras de ouro que se encontram a cada momento, e que sendo em outro tempotrabalhadas sem ordem nem método, se acham hoje em estado de completoabandono (Costa Sena: 1881, p.108).92
No mesmo ano em que Costa Sena rumou para o norte mineiro, Dom Pedro II passou com sua
comitiva por Ouro Preto e, diferente do engenheiro de minas, deixou a seguinte impressão sobre
os morros de Vila Rica: “Antes de chegar a esta cidade passei pela antiga Vila Rica - muralhas
arruinadas que lembraram-me Pompéia.”93 No final da década de 1890, Costa Sena publicou um
artigo específico sobre a “Mineração nos arredores de Ouro Preto”, na Revista Industrial de
Minas Gerais, ratificando a potencialidade dessa antiga zona de mineração:
Ninguém ignora que nos tempos coloniais foram os arredores da cidade de OuroPreto um dos centros em que atingio um verdadeiro máximo, a indústriaextrativa. Todos sabem que centenares de arrobas de ouro foram levadas daantiga Vila Rica aos cofres do tesouro português, e as ruínas que ainda hojecircundam a legendária cidade atestam ao viajante os esplendores do grandecentro de mineração. (...) Para quem examina superficialmente as jazidas e as
92 Próximo a essa região, Costa Sena destacou apenas a Mina do Maquiné (ou Morro de Santana), situadaem Mariana, explorada pela empresa inglesa Don Pedro Gold Mining Company, conforme registrou PaulFerrand no final da década de 1880 (1998, p.90). Costa Sena deixou de fora de seu estudo as minas dePassagem que, segundo ele, “depois de exploradas durante algum tempo por uma companhia inglesa,foram também desprezadas (...) (1881, p.108).”93 Anuário do Museu Imperial. Diário da Viagem do Imperador à Minas. Vol. XVIII. Ministério daEducação e Cultura: Petrópolis, 1957.p.104.
condições em que se faziam os trabalhos parece, à primeira vista, que se trata deum campo liquidado debaixo do ponto de vista da indústria extrativa. Entretantoassim não é, porque a observação e o estudo das circunvizinhanças da antigacapital mineira mostram que o serviço de exploração era, sem ordem nemmétodo, executado apenas em depósitos superficiais, resultantes dosafloramentos de numerosos veeiros que, como o do lugar denominadoSaragoça, ainda hoje um pouco explorado, cortam os xistos e os quartzitos –rochas dominantes na região. (...) tudo isso torna patente e faz crer quecapitais ali inteligentemente empregados trarão ao capitalista compesaçãoaos seus esforços e uma nova era de prosperidade à cidade, que, por suasriquezas, continua a merecer ainda o seu antigo título de Vila Rica (grifonosso) (Costa Sena: 1897, p.143).
Como, até o momento, não identificamos nenhuma empresa estrangeira instalada nos morros de
Vila Rica durante os Oitocentos, nos parece que se a Serra de Ouro Preto chegou a despertar
algum interesse, a relação custo/benefício não justificou quaisquer investimentos.94 Sem dúvida,
os discursos da Escola de Minas expressavam tanto uma nova produção intelectual sobre a
geologia e a mineralogia local quanto o delicado contexto de mudança da capital de Minas
Gerais na década de 1890, quando Belo Horizonte começou a ser construída na região do antigo
Curral Del Rey. Momento em que afloraram discursos que depreciavam ou enalteciam Ouro
Preto, como o excerto do artigo “O Movimento, Ouro Preto”, disposto abaixo, publicado no
Jornal O Estado de Minas em 1892:
Ouro Preto está longe de ser uma cidade artística: suja, defeituosa, torta, comedificações miseráveis, sem higiêne, sem arte com todos os defeitos de umacidade antiga. Mesmo em dias esplêndidos prejudicam-na seu aspecto doentio.A geometria irregular dos seus prédios, a tristeza das casas, tornado-a, porconseguinte, de uma comunicabilidade doentia, atroz (O Estado de Minas, ano3, nº304, 20/04/1892 apud. Mantovani, 2005, p.21).
94 Os capitais estrangeiros, sobretudo ingleses, começaram a propectar áreas de mineração em MinasGerais a partir de 1824, após a liberação do recém-criado Império do Brasil. Até 1850 seis empresasestrangeiras já estavam instaladas na zona mineradora desenhada entre as Vilas de Sabará,Ouro Preto (como a The Brazilian Company, no Distrito de Itabira do Campo), Mariana,Tiradentes, São João Del Rey e Serro. Além dos recursos financeiros, essas companhiastrouxeram técnicas que contribuíram para a inovação da produção do ouro em Minas. Os veioscada vez mais profundos e a necessidade de melhorar a produtividade determinaram osinvestimentos em estruturas mecanizadas e grandes plantéis de trabalhadores livres eescravos (Hirashima: 2003, 70p.)
No contraponto dos mudancistas, os não-mudancistas, que defenderam a continuação da capital
em Ouro Preto, propuseram a modernização do espaço urbano da velha cidade através de
“intervenções que implicariam no alargamento das ruas, no alinhamento das casas, na
planificação dos morros, dentre outras medidas (Mantovani: 2005, p.22).” Dentre as ações
efetivas implementadas pelos não-mudancistas nos interessa o “Edital sobre terrenos foreiros”,
publicado pela Câmara Municiapl de Ouro Preto em 12/04/1892, e que incorporou os terrenos
abandonados situados na Serra de Ouro Preto, prevendo a sua utilização como zona futura de
expansão da cidade:
Considerando que dentro do perímetro da sesmaria Municipal não há terrenoque seja excluído do domínio porque as mesmas extensões isenta dopagamento de foros pela Carta Régia incorporam-se ao patrimônio seacaso abandonadas, e nenhuma prova existe mais concludente desseabandono que as ruínas e confusão em que se acham. Considerando quemesmo para os terrenos de sesmarias vizinhas prevalece aquele direito deincorporação nas partes que entravam pelas divisas da sesmaria Municipal,tanto assim que pela Carta Régia não se permite que se recite o domínio dosproprietários que as tenham uma vez abandonado. Considerando que o mesmodireito regia e rege as datas e outras concessões minerais cuja superfíciepelo abandono dos serviços reverte ao patrimônio da Câmara.Considerando ainda que tão vastos terrenos podem e devem serrepovoados, como é necessário e exigido ao grande desernvolvimento dacidade, cujos arrebaldes não podem continuar entregues à solidão e aesterilidade: Resolve: 1º Ficam incorporadas ao patrimônio municipal osterrenos devolutos e abandonados em toda a Serra de Ouro Preto; e bemassim toda superfície das antigas datas e concessões minerais que tenhamcaducado; e estejam dentro dos limites da sesmaria municipal. 2º Fica marcadoo prazo de 60 dias para quaisquer reclamações opostas a este Edital, indo osquais serão aforados os respectivos terrenos. Paço da Câmara Municipal deOuro Preto , 12 de julho de 1892. Diogo Luiz de Almeida Pereira deVasconcelos.95
Além de incorporar essas áreas, a Câmara, entre o final do século XIX e início do XX, solicitou
a produção de estudos cartográficos sobre a Sede de Ouro Preto, como a “Planta da
sesmaria e cidade de Ouro Preto”, de 1898; a “Planta de água, esgoto e luz - Ouro
Preto”, de 1903; a “Planta das lavras “Tassaras” e arredores”, de 1903; e a “Planta-
esboço de uma parte da cidade de Ouro Preto”, de 1913”.96 Essas plantas
95 APMOP. Edital sobre terrenos foreiros. Códice 0965. Livro de Registros e Portarias 1892-1893.96 APMOP. Relação de Plantas, nº013: planta da sesmaria e cidade de Ouro Preto, 1898,autor(es) não identificado(s). Relação de Plantas, nº003: planta de água, esgoto e luz – OuroPreto, 26/06/1903, Engenheiro Clodomiro de Oliveira. Relação de Plantas, nº007: plantas daslavras “Tassaras” e arredores, 27/08/1903, Engenheiro Clodomiro de Oliveira e Mariano
demonstram as preocupações da Câmara com os marcos da Sesmaria Municipal, a
potencialidade das lavras auríferas situadas na Serra de Ouro Preto e a incorporação
de ícones da belle époque brasileira, como a inserção dos serviços de energia elétrica
e o estudo do abastecimento de água e esgoto.97
FIG.7. Alto da Cruz. Ouro Preto (Antônio Dias) vista parcial da cidade. s/d.
Autor: Luiz Fontana
Fonte: Acervo fotográfico do Núcleo de Mentalidade e Memória IFAC/ UFOP.
No limiar do século XX parte da população de Ouro Preto estava migrando para Belo
Horizonte, a velha cidade preparava-se para completar o seu bicentenário e cada vez mais
ficavam distantes as lembranças dos tempos em que os morros da Serra de Ouro Preto
transformaram-se em sua principal zona minerária. Somando as informações presentes no
censo de 1804, nos estudos de Eschwege, no relatos dos cronistas estrangeiros, nos estudos dos
engenheiros da Escola de Minas e nas ações da Câmara Municipal percebe-se ao longo do
século XIX: 1) a decadência das lavras nos morros da Serra de Ouro Preto, restando poucos
serviços, como as Lavras de Saragoça, pesquisada por Leandro Dupré Júnior na década de 1870;
2) a tendência de diminuição do povoamento nessas áreas elevadas.98
Augusto Vellozo escreveu sobre a cidade em 1911: “Hoje, porem, não representa mais que o
passado; hoje é que ‘esta é a cidade das tradições poéticas, das lendas da liberdade, dos sonhos
Ribeiro. Relação de Plantas, nº006: planta-esboço de uma parte da cidade de Ouro Preto,20/05/1913, Agrimensor Joaquim José Guimarães Pinto.
97 As lavras pesquisadas pelos engenheiros Francisco Mariano Ribeiro e Clodomiro de Oliviera situam-seentre os morros da Piedade, Santana, São João e o Taquaral: Lavras Saragosa, Lavra das Tassaras, Lavrasda Pedra Grande e Lavras do Sumaré ou do Padre Bernardo.98No início do século XX, a disponibilidade de imóveis em Antônio Dias e Pilar, após a mudança de parteda população de Ouro Preto para Belo Horizonte, a nova capital, pode ter atraído uma parcela dosmoradores que ainda residia nos morros da Serra de Ouro Preto. Essa possível ocorrência certamenteaumentou a sensação de abandono das propriedades situadas nessa área da Sede.
phantasticos de Aladin...’ como ha trinta annos perorava Flanklin Tavora, no Instutito Historico
(Vellozo: 1911, p.131).” Contrariando os desejos dos membros da Escola de Minas, o esplendor
do “grande centro de mineração” não se repetiu em Ouro Preto no século XX, entrando em
cena, aos poucos, a depredação e o reaproveitamento dos materiais das antigas estruturas de
moradia e extração de ouro nos morros.
Referências bibliográficas
1. Fontes primárias.
1.4. Fonte Iconográfica.
1.1.1. Arquivo Público Municipal de Ouro Preto.
APMOP Relação de Plantas, nº001: plantas das lavras do Tassara e Arredores,07/06/1913, Engenheiros Francisco A. Lopes e Alcindo da Silva Vieira Gil Guatimosin.
APMOP Relação de Plantas, nº002: cópia da planta das lavras do Tassara e adjacentesna antiga Vila Rica de 1900, medição e cópia do original realizada por Joaquim JoséGuimarães Pinto, em 1912.
APMOP Relação de Plantas, nº003: planta de água, esgoto e luz – Ouro Preto,26/06/1903, Engenheiro Clodomiro de Oliveira.
APMOP Relação de Plantas, nº006: planta-esboço de uma parte da cidade de OuroPreto, 20/05/1913, Agrimensor Joaquim José Guimarães Pinto.
APMOP Relação de Plantas, nº007: plantas das lavras “Tassaras” e arredores,27/08/1903, Engenheiro Clodomiro de Oliveira e Mariano Ribeiro
APMOP Relação de Plantas, nº010, pasta 06, caixa 09, estante 26, sala 1, folhas 07,08 e 09: levantamento aerofotogramétrico e Projeto Áreas de Preservação na cidadede Ouro Preto, 1982.
APMOP Relação de Plantas, nº013: planta da sesmaria e cidade de Ouro Preto, 1898,autor(es) não identificado(s).
APMOP Relação de Plantas, nº018: mapa do município de Ouro Preto, 1980, autor(es)não identificado(s). (DESCARTADA).
APMOP Relação de Plantas, nº036: planta da cidade de Ouro Preto, s/d, autor(es) nãoidentificado(s).
1.1.2. IFAC / UFOP - Acervo fotográfico do Núcleo de Mentalidade e Memória.
1.1.2.1. Acervo 002 - Miscelânea. Ouro Preto, s/d, Fundo Diversos.
10 UNIDADES: 0161, 0182, 0204, 0205, 0236, 0259, 0272, 0389, 0467 e 0516.
1.1.2.2. Acervo 003 - FONTANA, Luiz. Ouro Preto, [décadas de 1920 e 1950], FundoJosé Góes.
54 UNIDADES: 0201, 0234, 0237, 0266, 0270, 0295, 0305, 0320, 0369, 0484, 0513,0517, 0539, 0545, 0607, 0635, 0638, 0647, 0659, 0664, 0706, 0721, 0729, 0731, 0733,0736, 0760, 0766, 0782, 0913, 0920, 0974, 0998, 1000, 1073, 1081, 1084, 1086, 1089,1098, 1100, 1102, 1105, 1112, 1165, 1231, 1242, 1244, 1253, 1265, 1270, 1271, 1283,1287.
1.1.2.3. Acervo 004 - MENEZES, Ivo Porto de. Ouro Preto, s/d, Fundo Ivo Porto deMenezes.
04 UNIDADES: 0005, 0006, 0017 e 0066.
1.1.2.4. Acervo 005 - LIBENEAU, Guilherme. Ouro Preto, [1881], Fundo BibliotecaNacional.
08 UNIDADES: 0007, 0011, 0012, 0014, 0015, 0017, 0018 e 0024
1.5. Fonte manuscrita.
APMOP. Edital sobre terrenos foreiros. Códice 0965. Livro de Registros e Portarias 1892-1893.
OLIVEIRA, Clodomiro de & RIBEIRO, Marciano. Memoria e planta sobre as lavrasauríferas das “Tassaras e arredores”. 1903, 40p.
1.6. Fonte impressa.
1.3.1. Revista do Arquivo Público Mineiro.
Atas da Câmara Municipal de Vila Rica (1711-1721). RAPM, ano XXV, v.2, 1937, p.1-166.
Termo de ereção de Vila Rica. RAPM, ano II, jan./março, 1897, p.84.
Bando fixando os limites entre as Comarcas de Vila Rica, Sabará, Rio das Mortes e Serro Friopela parte do Rio Doce. RAPM, v.VII, 1902, p.411-413.
Cartas de Sesmaria (1710-1713). RAPM, v.III, 1898, p.23-85.
Cartas de Sesmaria. RAPM, v.IV, 1899, p.155-214.
Cartas régias sobre o procedimento que se há de ter com os povos que se sublevaram e outrosassuntos. RAPM, v.VI, 1901, p.213-217.
CARVALHO, Feu de. Reminiscências de Vila Rica. RAPM, ano XIX.
COELHO, J. J. Teixeira. Instrução para o governo na Capitania de Minas Gerais (1780).RAPM, ano VIII, 1903.
Correspondência do Conde de Assumar depois da Revolta de 1720. RAPM, v.VI, 1901, p.203-211.
Fontes Históricas do Imposto de Capitação. RAPM, ano XIII.
LEME, Antônio Pires da Silva Pontes. Memórias sobre a extração de ouro na Capitania deMinas Gerais. RAPM, ano I, 1896.
LIMA, Augusto de. Um município do ouro – memória histórica. RAPM, v.VI, 1901.
LINHARES, Joaquim Nabuco. Mudança da capital. RAPM, ano X, 1905.
Memória sobre as Minas da Capitania de Minas Gerais. RAPM, ano II, p.511.
PONTES, Manuel José Pires da Silva. Manual do Guarda-Mor. RAPM, ANO VII, 1902.
Regimento Mineral de 1702. RAPM, ano I, nº12.
PINTO, Luís Maria da Silva. Relação das Cidades, Vilas e Povoações da Província deMinas Gerais. RAPM, ano II, 1897.
PINTO, Moreira. Ouro Preto. RAPM, ano XI, 1906.
PIRES, Antônio Olinto dos Santos. A Mineração, riquezas minerais. RAPM, ano VIII,1903.
População da Província de Minas Gerais. RAPM, ano IV, p.294.
Registros de diversas cartas-patentes concedidas por D. Braz Baltasar da Silveira.RAPM, v.III, 1898.
SANTOS, Afonso dos. Natureza jurídica dos quintos. RAPM, ano XXVI, 1938.
Sobre o levantamento de Vila Rica (1720) e o alvará confirmando o perdão (1721).RAPM, v.V, 1900.
VASCONCELLOS, Diogo de. Linhas gerais da administração colonial – seu exercício –Capitães-Mores, Donatários, Governadores, Capitães-Generais, Vice-Rei, Capitães-Mores de Vilas e Cidades. RAPM, v. XIX, 1921.
1.3.2. Outros periódicos.
Anuário do Museu Imperial. Diário da Viagem do Imperador à Minas. Vol. XVIII.Ministério da Educação e Cultura: Petrópolis, 1957.p.104.
GORCEIX, Henri. Estudos geológicos e mineralógicos sobre algumas localidades da provínciade Minas Gerais, Revista Archivos do Museu Nacional do Rio de Janeiro, volume III, 1878,p.9-10.
JÚNIOR, Leandro Dupré. Estudo geológico e mineralógico da região E. De Ouro Preto,comprehenida entre aquella cidade, a povoação do Taquaral e o rio do Carmo. Revista Archivosdo Museu Nacional do Rio de Janeiro, volume III, 1878, p.11-16.
1.3.3. Relatos, memórias e estatística.
Álbum dos Municípios do Estado de Minas Gerais, Ouro Preto, 2º volume, 1941.
Annuário Estatístico, anno I, 1921, v.2, Serviço de Estatística Geral, Belo Horizonte: ImprensaOficial, 1925, p.776-779.
ANTONIL, André João (João Antônio Andreoni). Pelas minas de ouro. In: Cultura e opulênciado Brasil. São Paulo: Cia. Editora Nacional, 1967. p.255-304.
BANDEIRA, Manuel. Guia de Ouro Preto. Revista do SPHAN, nº2, 1938.
BUNBURY, Charles James F. Viagem de um naturalista inglês ao Rio de Janeiro e MinasGerais: 1833-1835. Belo Horizonte: Ed. Itatiaia; São Paulo: EDUSP, 1981.
BURMEISTER, Hermann. Mariana, o Itacolomi, Ouro Preto. In: Viagem ao Brasil através dasprovíncias do Rio de Janeiro e Minas Gerais: visando especialmente a história natural dosdistritos auríferos-diamantíferos. Trad. Manoel Salvaterra e Hubert Schoenfeldt. BeloHorizonte: Ed. Itatiaia Ltda; São Paulo: EDUSP, 1980. p.212-235.
BURTON, Richard. Viagem do Rio de Janeiro a Morro Velho. Trad. David JardimJúnior. Belo Horizonte: Ed. Itatiaia; São Paulo: EDUSP. 1976.
CASTELNAU, Francis. Expedição às regiões centrais da América do Sul. Trad. OlivérioM. de Oliveira Pinto. São Paulo: Companhia Editora Nacional. 1949.
Códice Costa Matoso. Coleção das notícias dos primeiros descobrimentos das minas naAmérica que fez o doutor Caetano da Costa Matoso sendo ouvidor-geral das do Ouro Preto, deque tomou posse em fevereiro de 1749, & vários papéis. Coordenação de Luciano Raposo deAlmeida Figueiredo e Maria Verônica Campos. Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro,Centro de Estudos Históricos e Culturais, 1999, 2v. (Coleção Mineiriana).
COELHO, José João Teixeira. Instrução para o governo na Capitania de Minas Gerais. BeloHorizonte: Fundação João Pinheiro, Centro de Estudos Históricos e Culturais, 1994.
COUTO, José Vieira. Memória sobre a Capitania de Minas Gerais; seu território, clima eproduções metálicas. Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro, Centro de Estudos Históricos eCulturais, 1994.
COURCY, Visconde Ernest de. Seis semanas nas minas de ouro do Brasil. Trad. Júlio C.Guimarães. Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro, 1997.
Diário da Jornada que fez o Sr. D. Pedro desde o Rio de Janeiro até a Cidade de São Paulo e desta até àsMinas, ano 1717. Revista do SPHAN, nº3.
D’ORBIGNY, Alcide. Minas Gerais. In: Viagem pitoresca através do Brasil. Trad. David Jardim. BeloHorizonte: Ed. Itatiaia; São Paulo: EDUSP, 1976. p.143-165.
Discurso histórico e político sobre a sublevação que nas minas houve no ano de 1720. Belo Horizonte:Centro de Estudos Históricos e Culturais, Fundação João Pinheiro, 1994. 193p.
Enciclopédia dos Municípios Brasileiros. Jurandyr Pires Ferreira (org.). Rio de Janeiro:I.B.G.E., 1959. p.225-238.
LUCCOCK, John. Notas sobre o Rio de Janeiro e partes meridionais do Brasil. Trad.Milton da S. Rodrigues e Mário Guimarães Ferri. Belo Horizonte: Ed. Itatiaia; São Paulo:EDUSP, 1976.
MAWE, John. Viagens ao interior do Brasil. Trad. Selena Benevides Viana. BeloHorizonte: Ed. Itatiaia; São Paulo: EDUSP, 1976.
OLIVEIRA, Ronald Polito de e LIMA, José Arnaldo Coêlho de Aguiar (orgs.). VisitasPastorais de Dom Frei José da Santíssima Trindade (1821-1825). Belo Horizonte:Fundação João Pinheiro, 1998. p.359 e 367.
POHL, Johann Emanuel. Viagem no interior do Brasil. Trad. Milton Amado e EugênioAmado. Belo Horizonte: Ed. Itatiaia; São Paulo: EDUSP, 1976.
RUGENDAS, Johann M. O Brasil de Rugendas. Belo Horizonte: Ed. Itatiaia. 1976.
SAINT-HILAIRE, Auguste de. Viagem pelas províncias do Rio de Janeiro e Minas. Trad.Vivaldi Moreira. Belo Horizonte: Ed. Itatiaia; São Paulo: EDUSP, 1975.
SCHÜCH, Roch. Memória sobre algumas experiências e empenhos mineralógicos emetalúrgicos. Rio de Janeiro: Impresso da Tipografia de Laemmert, 1840. 53p.
SPIX, Johann & MARTIUS, Friedrich. Viagem pelo Brasil – 1817-1820. Belo Horizonte: Ed.Itatiaia; São Paulo: EDUSP, v.1, 1976.
SUZANNET, Conde de. (L. de Chavagnes). O Brasil em 1845. Trad. Márcia de MouraCastro. Rio de Janeiro: Ed. Casa do Estudante do Brasil. 1957.
TAUNAY, Afonso de E (org.). Relatos sertanistas. Belo Horizonte: Ed. Itatiaia; São Paulo:EDUSP, 1981.
VASCONCELOS, Diogo Pereira Ribeiro de. Breve descrição geográfica, física e política daCapitania de Minas Gerais. Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro, 1994.
1.3.3. Cartografia.
COSTA, Antônio Eduardo; RENNER, Friedrich Ewalde; FURTADO, Júnia Fereira;SANTOS, Márcia Maria Duarte dos. Cartografia das Minas Gerais: da Capitania àProvíncia. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2002. Atlas em Portifólio, 31 mapas em 29folhas, escala não determinada.
1.7. Fontes secundárias.
AIRES-BARROS, Luís. As rochas dos monumentos portugueses: tipologias e patologias.Lisboa: IPPAR, v.2, 2001.
ANASTASIA, Carla Maria Junho. Vassalos rebeldes: violência coletiva nas Minas na primeirametade do século XVIII. Belo Horizonte: Editora C/Arte, 1998.______________________________ Entre Cila a Caribde: as desventuras tributárias dosvassalos de Sua Majestade. In: Revista Varia História, Belo Horizonte, n.º1, 1985.
ANDRADE, Francisco Eduardo. A conversão do sertão: capelas e governamentalidade nasMinas Gerais. Revista Vária História, Belo Horizonte, v.23, nº37, p.151-166, 2007.ÁVILA, Affonso. Resíduos seiscentistas em Minas. Belo Horizonte: Centro de EstudosMineiros, 1967.
BARREIROS, Eduardo Canabrava. Episódios da Guerra dos Emboabas e sua geografia. BeloHorizonte: Editora Itatiaia Ltda; São Paulo: EDUSP, 1984. p.61-86.
BARBOSA, Waldemar de Almeida. Dicionário Histórico-Geográfico de Minas Gerais.Belo Horizonte: Editora Itatiaia Ltda,1995.
____________________________. Dos caminhos pré-históricos às rodovias asfaltadas.In: História de Minas Gerais. 1979. p.469-495.
BARRETO, Paulo Thedim. Casas de Câmara e Cadeia. Revista do SPHAN, nº11, 1947.
BARROSO, Gustavo. Mobiliário luso-brasileiro. In: Anais do Museu Histórico Nacional, v. I,nº5, 1940.__________________. Classificação geral de móveis antigos. In: Anais do Museu HistóricoNacional, v. IV, 1943.__________________. O mobiliário no Brasil. Revista de Arquitetura, ano IV, nº12, 1951.
BEDIAGA, Begonha (org.) Diário do Imperador D. Pedro II: 1840-1891. Petrópolis: MuseuImperial / IPHAN, 1999. 161p.
BENJAMIN, Walter. Coleção Grandes Cientistas Sociais. Trad. Flávio René Kothe. 1985.
_________________. Pequena história da fotografia. Flávio R. Kothe (org.). Editora Ática, s/d.p.218-240.
BOLTSHAUSER, João. Noções de evolução urbana nas Américas. Belo Horizonte: UFMG,1959.
BORREGO, Maria Aparecida de Menezes. Dissertação. 1999. Códigos e práticas: o processo deconstituição urbana em Vila Rica colonial (1702-1748). São Paulo: Annablume, Fapesp, 1999.
BOTELHO, Tarcísio Rodrigues. População e escravidão nas Minas Gerais, c. 1720. In: 12ºEncontro da Associação Brasileira de Estudos da População – ABEP, GT População e História,realizado em Caxambu (MG), outubro de 2000. Disponível em:http://www.abep.nepo.unicamp.br/docs/anais/pdf/2000/Todos/hist1_5.pdf. Acesso em15/11/2007.
BOXER, Charles R. A idade de ouro do Brasil: dores de crescimento de uma sociedadecolonial. Tradução de Nair de Lacerda. 3ª edição. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2000.
BLUTEAU, D. Raphael de. Vocabulário Português e Latino. Coimbra: Colégio das Artes daCompanhia de Jesus, 1712.
BOSCHI, Caio C. Os leigos e o poder: irmandades leigas e política colonizadora em MinasGerais. São Paulo: Ed. Ática, 1988.
BURKE, Peter. História cultural: passado, presente e futuro: In: O mundo comoteatro: estudos da antropologia histórica. Lisboa: Difel. 1992. p.15-25.
____________. Hibridismo cultural. Trad. Leila Souza Mendes. São Leopoldo: Editorada Universidade do Vale do Rio dos Sinos. 2003. 116p.
CARRARA, Ângelo A. Ocupação do solo e paisagens rurais. In: Minas e currais: produçãorural e mercado interno em Minas Gerais - 1674-1807. Juiz de Fora: Ed. UFJF, 2007. p.149-215.
___________________. Antes das Minas Gerais: conquista e ocupação dos sertões mineiros.Revista Vária História, Belo Horizonte, v.23, nº38, p.575-596, 2007.
CALÓGERAS, João Pandiá. As Minas do Brasil e sua legislação. Rio de Janeiro: ImprensaNacional, 1904.
CARVALHO, Feu de. Pontes e chafarizes de Ouro Preto. Belo Horizonte: Edições Históricas,s/d.
CASAL, Manuel Aires de. Corografia brasílica ou Relação histórico-geográfica do Reino doBrasil [pelo] Pe. Manuel Aires de Casal. Belo Horizonte: Ed. Itatiaia Ltda; São Paulo: EDUSP,1976. p.163-182.
CHAVES, Cláudia Maria das Graças. Comerciantes das Minas Setecentistas: a diversidade deatuação no mercado colonial. Belo Horizonte: Caderno de Filosofia e Ciências Humanas, n.º10,abril/1998, p. 135-143._________________________________. Perfeitos negociantes: Mercadores das MinasSetecentistas. 1995. Dissertação – Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas, UniversidadeFederal de Minas Gerais, 1995.
CHOAY, Françoise. O Urbanismo: utopias e realidades - uma antologia. São Paulo:Perspectiva, 1992.________________. O Reino do urbano e a morte da cidade. In: Revista Projeto
História, espaço e cultura. São Paulo: PUC. 1999.
COSTA, Antônio Gilberto (org.) . Os caminhos do ouro e a Estrada Real. BeloHorizonte: UFMG; Lisboa: Kapa Editorial . 2005.
_____________________________. Cartografia da conquista do território das Minas. BeloHorizonte: Editora UFMG. 2004, 245p.
COSTA, Cláudio Manoel da. Vila Rica. Ouro Preto: Tipografia do Estado de Minas Gerais,1897.
COSTA, Iraci Del Nero. Vila Rica: População (1719-1826). 1977. 253p. Tese - Faculdade deEconomia e Administração, Universidade de São Paulo. 1977.
COSTA, Joaquim Ribeiro da. Primeiros municípios. In: Toponímia de Minas Gerais comEstudo Histórico da Divisão Territorial Administrativa. Belo Horizonte: Imprensa Oficial doEstado, 1970. p.15-29.
COSTA, Lúcio. Notas sobre a evolução do mobiliário luso-brasileiro. Revista do SPHAN, nº4.
COSTA E SILVA, Alberto da. A enxada e a lança: a África antes dos portugueses. Rio deJaneiro: Nova Fronteira; São Paulo: EDUSP, 1992.
CROSSI, Ramon Fernandes. A religiosidade nas minas setecentistas. Belo Horizonte: VariaHistória, n.º 24, janeiro/2001, p. 90-106.
D’ASSUMPÇÃO, Silvia Romanelli. Considerações sobre a formação do espaço urbanosetecentista nas minas. Revista do Departamento de História. Belo Horizonte, nº9, 1989.
DELSON, Roberta Marx. Novas Vilas para o Brasil-colônia: Planejamento Espacial e Social noséculo XVIII. Brasília: Ed. Alva-Ciord, 1997.
DENIS, Ferdinand. Brasil. Trad. João Etienne Filho e Malta Lima. Belo Horizonte: Ed. Itatiaia;São Paulo: EDUSP, 1980.
DIAS, Hélcia. O mobiliário dos Inconfidentes. Revista do SPHAN, nº3.
ESCHWEGE, Wilhelm Ludwig von. Pluto Brasiliensis. Trad. Domício de Figueiredo Murta.Belo Horizonte: Ed. Itatiaia Ltda; São Paulo: EDUSP, v.1 e 2. 1979.
FABRIS, Annateresa. Fragmentos urbanos: representações culturais. São Paulo: StudioNobel, 2000.212p.
FALCON, Francisco J. C. A cidade colonial: algumas questões a propósito de sua importânciapolítico-administrativa (XVII/XVIII). In: Anais do I Colóquio de Estudos HistóricoBrasil/Portugal, PUC MG, agosto de 1993.
FARIA, Sheila Siqueira de Castro. A colônia em movimento: fortuna e família no cotidianocolonial. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1998.
FERRAND, Paul. Explotações antigas. In: O ouro em Minas Gerais. Trad. Júlio CastanõnGuimarães. Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro, 1998. p.91-131.
FIGUEIREDO, Luciano R. de A. Barrocas famílias: vida familiar em Minas Gerais no séculoXVIII. São Paulo: HUCITEC, 1997. (Coleção Estudos Históricos).____________________________ Narrativas das rebeliões: linguagem política e idéias radicaisna América Portuguesa moderna. In: Revista USP/Coordenadoria de Comunicação Social,Universidade de São Paulo. – n.º57 (mar./mai. 2003). São Paulo: USP / CCS, 2003, p. 6-27.
FONSECA, Alexandre Torres. A Revolta de Felipe dos Santos. In: As Minas Setecentistas.Maria Efigênia Lage de Resende e Luiz Carlos Villalta (org.). Belo Horizonte: Autêntica,Companhia do Tempo, v.1, 2007. p.549-566.
FONSECA, Cláudia Damasceno. Funções, hierarquias e privilégios urbanos. A concessão detítulos de vila e cidade na capitania de Minas Gerais. Belo Horizonte: Varia História, n.º 29,Janeiro, 2003, p. 39-51.___________________________. O espaço urbano de Mariana: sua formação e suasrepresentações. In: Termo de Mariana. Ouro Preto: Editora da UFOP, 1998.p.27-65.
FONSECA, M. A. & SOBREIRA, F. G. O escorregamento do barro da Piedade, OuroPreto, Minas Gerais: Processos de instabilidade em antigas áreas de mineração. In:2nd Pan-American Symposium on Landslides, 1997, Rio de Janeiro. Anais...Associação Brasileira de Mecânica dos Solos e Engenharia Geotécnica,. pp 139-144.1997.
_______________________________ Antigas Minas de Ouro Preto: Impactos Físicos e Sócio-Culturais Relatório Parcial de Pesquisa UFOP/FAPEMIG, Departamento de Geologia. 1999,14p.
FOUCAULT, Michel. Microfísica do poder. 11ª ed. Rio de Janeiro: Graal, 1995.
FRAGOSO, João; BICALHO, Maria Fernanda Baptista; GOUVÊA, Maria de Fátima Silva(orgs.). O Antigo Regime nos Trópicos: a dinâmica imperial portuguesa (séculos XVI-XVIII).Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2001.
FRANCO, Afonso Arinos de Melo. Desenvolvimento da civilização material do Brasil. Revistado SPHAN, nº11, 1945.
FREIRE, Gilberto. Casas de residência no Brasil. Revista do SPHAN, nº7.
FURTADO, Júnia Ferreira. Homens de negócio: a interiorização da metrópole e do comércionas Minas setecentistas. São Paulo: HUCITEC, 1999.
GAGNEBIN, Jeanne Marie. História e narração em W. Benjamin. São Paulo: EditoraPerspectiva, 1999. 114p.
GARCIA, Juliane Martins. Traços hispânicos no processo de latinidade da arquitetura colonialem Minas Gerais. Arquitetura: caderno de produção discente do Núcleo de Pós-graduação emArquitetura e Urbanismo da Escola de Arquitetura da UFMG, Belo Horizonte, v.4, dez.2004,p.18-29.
GONÇALVES, Andréa Lisly. Algumas perspectivas da historiografia sobre Minas Geraisnos séculos XVIII e XIX. In: Termo de Mariana: história e documentação. Ouro Preto:Editora da UFOP. 1998. p.13-26.
_________________________ As técnicas de mineração nas Minas Gerais do século XVIII. In:As Minas Setecentistas. Maria Efigênia Lage de Resende e Luiz Carlos Villalta (org.). BeloHorizonte: Autêntica, Companhia do Tempo, v.2, 2007. p.187-204.
GOUVÊA, Maria de Fátima Silva. Dos poderes de Vila Rica do Ouro Preto: notas preliminaressobre a organização político-administrativa na primeira metade do século XVIII. Revista VáriaHistória, Belo Horizonte, nº31, p.120-140, 2004.
GUIMARÃES, Carlos Magno. Os Cabeças e as cabeças: quilombos, liderança e degola nasminas setecentistas. Belo Horizonte: Varia História, n.º 26, janeiro / 2002, p. 109-131.
HAROUEL, Jean-Louis. História do urbanismo. Campinas: Papirus, 1990.
HESPANHA, António Manuel. Poder e instituições na Europa do Antigo Regime. Coletânea detextos. Lisboa: F. C. Gulbenkian, 1984.
HIRASHIMA, Hayato. 2003. Monografia. Um dia em Cata Branca: subsídios da arqueologiahistórica e do geoprocessamento para a elaboração de um modelo sócio-espacial. FAFICH, BeloHorizonte. 2003. 70p.
HOLANDA, Sérgio Buarque de. A mineração: antecedentes luso-brasileiros. In: História geralda civilização brasileira. São Paulo: Difel, t.1, v. 2, 1985. p.228-258._______________________________. Metais e pedras preciosas. In: História geral dacivilização brasileira. São Paulo: Difel, t.1, v. 2, 1985. p.259-310.
KELMER MATHIAS, Carlos Leonardo. Jogos de interesses e redes clientelares na revoltamineira de Vila Rica (c.1709 - c.1736). 2005. Tese – PPGHIS / Universidade Federal do Rio deJaneiro, Rio de Janeiro, 2005._________________________________.O perfil econômico da capitania de Minas Gerais nasegunda metade do século XVIII, notas de pesquisa – 1711-1720. Disponível em:http://cedeplar.ufmg.br/seminarios/seminario_diamantina/2006/D06A050.pdf. Acesso em20/02/2008.
LATIF, Miran Monteiro de Barros. As Minas Gerais. Belo Horizonte: Editora Itatiaia, 1991.
LEMOS, Carlos. Arquitetura Brasileira. São Paulo: Melhoramentos, 1979._____________. Cozinhas etc: um estudo sobre as zonas de serviço da casa paulista. São Paulo,1978.
LIBBY, Douglas Cole. Transformação e trabalho em uma economia escravista. SãoPaulo: Brasiliense, 1988.
LIMA JÚNIOR, Augusto de. A capitania de Minas Gerais: origem e formação. 3ª ed. BeloHorizonte: Instituto de História, Letras e Arte, 1965.
_______________________. Vila Rica do Ouro Preto: síntese história e descritiva. BeloHorizonte: Gráfica Veloso, 1957.
LOPES, Francisco. História da construção da Igreja do Carmo de Ouro Preto. Revista doSPHAN, nº8.
LOTT, Mirian Moura. Casamento e relações de afetividade entre escravos: Vila Rica – séculosXVIII e XIX. In: Anais da V Jornada Setecentista, nov/2003, Curitiba.
LUNA, Francisco Vidal & COSTA, Iraci Del Nero da. Ocupação, povoamento e dinâmicapopulacional. In: Minas colonial: economia & sociedade. São Paulo: Livraria Pioneira Editora,1982. p.1-30.
MACHADO, Alcântara. Vida e morte do bandeirante. Belo Horizonte: Ed. Itatiaia Ltda; SãoPaulo: EDUSP, 1980. 247p.
MAGALHÃES, Beatriz Ricardina. A demanda do trivial: vestuário, alimentação e habitação.Revista Brasileira de Estudos Políticos. Belo Horizonte, nº65, p.153-199, 1987.
MANTOVANI, André L. Faça-se a luz: modernidades e demandas sociais naeletrificação da iluminação pública em Ouro Preto, 1880-1920. 2005.75p. Monografia- ICHS/UFOP. 2005.
MARX, Murilo. Arraiais mineiros: relendo Sylvio de Vasconcellos. Revista Barroco, BeloHorizonte, nº15, 1990/1992.
MARTINS, Marcos Lobato. Mineração, Agricultura e Degradação Ambiental em Minas Geraisnos Séculos XVIII e XIX. Revista do LPH, nº4, p.107-119, 1993/1994.
MARTINS, Maria do Carmo S. Revisitando a Província: comarcas, termos, distritos epopulação de Minas Gerais em 1833-35. In: 20 anos do Seminário sobre a Economia Mineira –1982-2002: coletânea de trabalhos, 1982-2000. Belo Horizonte: UFMG/FACE/CEDEPLAR,2002. p.51-89.
MASSARA et alii. Evolução urbana de Ouro Preto nas primeiras décadas do século XVIIII.Revista do Departamento de História, Belo Horizonte, nº9, 1989. p.141-148.
MATHIAS, Herculano Gomes. Distrito de Antônio Dias. In: Um recenseamento da capitania deMinas Gerais: Vila Rica – 1804. Rio de Janeiro: Ministério da Justiça / Arquivo Nacional, 1969.p.190-208.
MATOS, Maria Izilda S. dos. Cotidiano e cidade. In: Cotidiano e Cultura: História,cidade e trabalho. São Paulo: EDUSC, 2002.p.13-43.
MATOS, Raimundo José da Cunha. Comarca de Ouro Preto. In: Corografia histórica daProvíncia de Minas Gerais (1837). São Paulo: EDUSP, v.1, 1981. p.89-100.
____________________________. Mapas de Luís Maria da Silva Pinto. In: Corografiahistórica da Província de Minas Gerais (1837). São Paulo: EDUSP, v.1, 1981. p.56-64.
MENESES, J. N. C. Artes fabris e serviços banais. Ofícios mecânicos e as Câmaras nofinal do Antigo Regime. Minas Gerais e Lisboa – 1750-1808. 2003. Tese de doutorado -ICHF/UFF, 2003.
MENICONI, Rodrigo Otávio de Marco. A construção de uma cidade-monumento: o caso deOuro Preto. 1999. Dissertação - Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas, UniversidadeFederal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 1999.
MOL, Cláudia C. Mulheres forras: cotidiano e cultura material em Vila Rica (1750-1800). 2001.Dissertação - Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal de MinasGerais, Belo Horizonte, 2001.
MOURÃO, Paulo Krüger C. As igrejas setecentistas de Minas. Belo Horizonte: Ed. ItatiaiaLtda, 1964.
MUMFORD, Lewis. A Cidade na História. 3ª ed. São Paulo:Martins Fontes, 1991.
OLIVEIRA, Benedito Tadeu de. O Parque Arqueológico do Morro da Queimada. Disponívelem: www.ouropreto.com.br/impressao.asp?cod=2808. Acesso em 10/11/2007.
OLIVEIRA, Myriam A Situação das artes plásticas em Minas no século XIX / Escultura ePintura. In: III Seminário sobre a cultura mineira – século XIX. Belo Horizonte:Conselho Estadual de Cultura de Minas Gerais. Imprensa Oficial do Estado de MinasGerais, 1982. p.148-160.
OLIVEIRA, Patrícia Porto de. Vila Rica: dados urbanos dos assentos de batismos de escravosadultos – séc. XVIII. In: II Seminário de História Quantitativa e Serial, Centro de PesquisaHistórica da Pontifícia Católica de Minas Gerais, XXXX, Belo Horizonte. Disponível em:http://historia_demografica.tripod.com/bhds/bhd24/patri.pdf. Acesso em 15/01/2008.
OMEGNA, Nelson. A cidade colonial. Rio de Janeiro: José Olympio, 1961.
OZZORI, Manoel (org.). Cidade de Ouro Preto. In: Almanack administrativo, mercantil,industrial, scientifico e litterario do Município de Ouro Preto, anno 1. Ouro Preto: Typographiad’A Ordem, 1890. p.75-97.
PAIVA, Eduardo F. Bateias, carumbés, tabuleiros: mineração africana e mestiçagem no NovoMundo. In: O trabalho mestiço: maneiras de pensar e formas de viver – século XVI a XIX.PAIVA, Eduardo F. & ANASTASIA, Carla M. J. (org.). São Paulo: Annablume:PPGH/UFMG,2002.
PAULA, Floriano Peixoto de. Vilas de Minas Gerais no período colonial. Revista Brasileira deEstudos Políticos, nºXIX, junho de 1965.
PAULA, João Antônio de. A mineração de ouro em Minas Gerais no século XVIII. In: Históriade Minas Gerais: as Minas Setecentistas. Belo Horizonte: Autêntica Editora. 2007, p.279-301.
PENA, Eduardo Spiller. Notas sobre a historiografia da arte do ferro nas Áfricas Central eOcidental. In: Anais do XVII Encontro Regional de História – o lugar da História. Campinas,ANPUH/SP-UNICAMP, 2004, p.13-39.
PESAVENTO, Sandra Jatahy. História e História Cultural. 2 ed. Belo Horizonte:Autêntica, 2004. 132p.
PITTA, Sebastião da Rocha. Livro décimo e último. In: História da América Portuguesa. BeloHorizonte: Ed. Itatiaia Ltda; São Paulo: EDUSP, 1976.p.267-293.
POLLAK, Michel. Memória, esquecimento, silêncio. Estudos históricos – Memória. Rio deJaneiro: Vértice, v.2, n.3, 1989, pp.3-16.
PRIORE, Mary Del. História do cotidiano e da vida privada. In: Domínios da História:ensaios de teoria e metodologia. Ciro Flamarion Cardoso e Ronaldo Vainfas (org.). Riode Janeiro:Campus, 1997.p.259-274.
_______________. Ritos da vida privada In: História da vida privada no Brasil I:cotidiano e vida privada na América portuguesa, São Paulo: Cia das Letras, 1997.
RAMOS, Donald. A social history of Ouro Preto: stresses of dinamic urbanization in colonialBrazil, 1695-1726. 1972. Tese de Doutorado. Flórida: The University of Florida, 1972 (mimeo).
RAMINELLI, Ronald. Simbolismos do espaço urbano colonial. In: VAINFAS (org.) Américaem tempo de conquista. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1992.
REIS, Liana Maria. Mulheres de ouro: as negras de tabuleiro das Minas Gerais do século XVIII.Revista do Departamento de História, Belo Horizonte, nº8, jan/1989.
REIS FILHO, Nestor Goulart. Contribuição ao estudo da evolução urbana do Brasil(1500/1720). São Paulo: EDUSP, 1968.
ROCHA, José Joaquim da. Vila Rica. In: Geografia histórica da Capitania de Minas Gerais.Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro, 1995. p.98-106.
RODARTE, Mário Marcos Sampaio. O caso das minas que não se esgotaram: apertinácia do antigo núcleo central minerador na expansão da malha urbana da MinasGerais oitocentista. 1999. 179p. Dissertação - FACE/UFMG. 1999.
RODRIGUES, J. Wasth. Móveis antigos de Minas Gerais. Revista do SPHAN, nº2.
ROMEIRO, Adriana. Conspiração política e cultura política. In: Um visionário na corte de D.João V: revolta e milenarismo nas Minas Gerais. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2001.p.169-208._________________& BOTELHO, Ângela Vianna. Dicionário Histórico das Minas Gerais:período colonial. 2ª edição. Belo Horizonte: Autêntica, 2004.
RUSSELL-WOOD, A. J. R. O governo local na América Portuguesa: um estudo de divergênciacultural. Revista de História, n.º 109. São Paulo: FFLCH/USP, V.55, nº 109, 1977.
SALLES, Fritz Teixeira de. Vila Rica do Pilar. Belo Horizonte: Ed. Itatiaia Ltda; São Paulo:EDUSP, 1982.
SANTOS, Benedicto José dos. A Geologia do Município de Ouro Preto. In: Bicentenário deOuro Preto: 1711-1911. Belo Horizonte: Impressa Oficial do Estado de Minas Gerais, 1911. p.93-105.
SANTOS, José de Almeida. Estilo brasileiro D. Maria ou colonial brasileiro. Revista doSPHAN, nº6.
SANTOS, Márcio. Estradas Reais: Introdução ao estudo dos caminhos do ouro e dodiamante no Brasil. Belo Horizonte: Editora Estrada Real. 2001. 180p.
_______________. Novas perspectivas. Revista História Viva: Temas Brasileiros, SãoPaulo, Editora Duetto, nº4, 2006.
SANTOS, Paulo Ferreira. Subsídios para o estudo da arquitetura religiosa em OuroPreto. Rio de Janeiro: Kosmos, 1951.
SANTOS, Paulo. A arquitetura religiosa de Ouro Preto. Rio de Janeiro. 1951.
SCARANO, Julita. Cotidiano e solidariedade. Vida cotidiana da gente de cor nas Minas Gerais– século XVIII. São Paulo: Editora Brasiliense, 1994.
SENNA, Nelson de. Origem da Cidade: installação da Municipalidade. In: Bicentenário deOuro Preto: 1711-1911. Belo Horizonte: Impressa Oficial do Estado de Minas Gerais, 1911. p.1-21.
SEVCENKO, Nicolau. O prelúdio republicano, astúcias da ordem e ilusões do progresso. In:História da Vida Privada no Brasil – República: da Belle Époque à Era do Rádio. v. II, org.Nicolau Sevcenko. São Paulo: Companhia das Letras, 1998. p.7-48.
SILVA, Célia Nonata da. Homens valentes: delimitação dos ‘territórios de mando’ nas Minassetecentistas. Revista Varia História, Belo Horizonte, n.º24, 2001.
SILVA, Fabiano G. da. Trabalho e escravidão nos canteiros de obras em Vila Rica no séculoXVIII. In: Encontro Brasil-Portugal: sociedades, culturas e formas de governar no mundoportuguês – séculos XVI-XVIII. Belo Horizonte, FAFICH/UFMG, 2005. (mimeo).
SILVA, Flávio Marcus da. Roceiros, comissários e atravessadores – o abastecimento alimentarem Vila Rica na primeira metade do século XVIII. Revista Varia História, Belo Horizonte,n.º29, p.98-114, 2003.
SILVA, José Joaquim da. 1º Município (Ouro Preto). In: Tratado de geografia descritivaespecial da província de Minas Gerais.Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro, 1997.
SILVEIRA, Marco Antonio. Guerra de usurpação, guerra de guerrilhas. Conquista e Soberanianas Minas Setecentistas. Revista Varia História, Belo Horizonte, n.º25, p.123-143, 2001.
SILVEIRA, Vitor. Minas Gerais em 1925. Belo Horizonte: Imprensa Oficial, 1926.
SOBREIRA, F. G. Riscos geológicos: definição de pontos críticos em Ouro Preto.Revista da Escola de Minas, Ouro Preto, v. 44, n. 3 e 4, jul/dez, p. 213 -223, 1991.
SOBREIRA, F. G ARAÚJO, L. G E BONUCCELLI, T. Levantamento de soluçõesestruturais para a contenção de encostas em Ouro Preto. Ouro Preto: Convênio UFOP- Ministério da Cultura/SPHAN. 91p, 1990.
SOUZA, Laura de Mello e. Desclassificados do ouro: a pobreza mineira no século XVIII. Riode Janeiro: Edições Graal, 1982._______________________. Norma e conflito: aspectos da História de Minas no século XVIII.Belo Horizonte: UFMG. 1999.
TAVARES, Taciana B. A moradia em Vila Rica: 1750-1810. 2005. 199f. Dissertação -Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal de Minas Gerais, BeloHorizonte, 2005.
TELLES, A. C. A ocupação do território e a trama urbana. Barroco, nº10, 1978/1979.
TRINDADE, Cônego Raimundo. Instituições de igrejas no Bispado de Mariana. Rio deJaneiro: Ministério da Educação e Saúde. 1945.
TURAZZI, Maria Inez. Cultura fotográfica. Revista do Patrimônio Histórico e ArtísticoNacional. Brasília: IMNC, n.27, 1998. p.7-15.
VAINFAS, Ronaldo (org.). Dicionário de Brasil colonial. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001.
VAUTHIER, L. L. Casas de Residência no Brasil. Revista do SPHAN, nº7.
VASCONCELOS, Diogo de. História antiga das Minas Gerais. Belo Horizonte: Editora ItatiaiaLtda, 1974.
VASCONCELOS, Salomão. Os primeiros aforamentos e os primeiros ranchos de Ouro Preto.Revista do SPHAN, nº5, p.241-257, 1941.
VASCONCELOS, Sylvio de. Vila Rica. Formação e desenvolvimento: residências. São Paulo:Editora Perspectiva, 1977._______________________. Arquitetura no Brasil: sistemas construtivos. Belo Horizonte:UFMG, 1979. 186p.
VELLOSO, Augusto. Dados legislativos concernentes a Villa Rica. In: Bicentenário de OuroPreto: 1711-1911. Belo Horizonte: Impressa Oficial do Estado de Minas Gerais, 1911. p.119-131.
VENÂNCIO, Renato Pinto. Caminho novo: a longa duração. s/d. 11p.
VILLALTA, Luís Carlos. O cenário urbano em Minas Gerais setecentista: outeiros dosagrado e do profano. In: Termo de Mariana: história e documentação. Mariana:Imprensa Universitária da UFOP, 1998.
VILLELA, Clarisse M. Critérios para seleção de rochas na restauração da cantaria.2003. Dissertação - Escola de Minas, Universidade Federal de Ouro Preto, 2003.
WAGNER, Robert & BANDEIRA, Júlio. Viagem ao Brasil nas aquarelas de ThomasEnder. Vol. 3. Petrópolis: Kapa Editorial e Petrobrás. 2000. 350p.
WASH P. Mobiliário, vestuário, jóias e alfaias dos tempos coloniais. Revista do SPHAN,nº4.
ZAMELLA, Mafalda. O abastecimento da Capitania de Minas Gerais. São Paulo:HUCITEC; EDUSP, 1990.
Kleverson Teodoro de Lima
SEDIÇÃO DE 1720: O DIAGRAMA DO
PODER E SUAS TENSÕES
3ª Relatório parcial - Grupo de Pesquisa Histórica doProjeto de Implantação do Parque Arqueológico Morro daQueimada.
Ouro Preto
Outubro / 2008
Sumário
1. Introdução.......................................................................................................... 03
2. O diagrama do poder e suas tensões............................................................... 04
3. A construção, desconstrução e reconstrução da memória: olhares
sobre a sedição de 1720.........................................................................................17
4. Considerações finais..........................................................................................22
5. Referências bibliográficas................................................................................24
1. Introdução.
(...) hemos de confessar que os montins são naturais das Minas, e que é propriedadee virtude do ouro tornar inquietos e buliçosos os ânimos dos que habitam as terrasonde ele se cria. Pelo menos, eu acho que, depois que se principiou a tirar ouro, seviram as primeiras dúvidas e contendas no mundo: retirou-se a justiça para o céu, eproduziu a terra gigantes e poderosos, que, atrevidos, rebeldes e insolentes,intentaram levantar-se contra o seu soberano (grifo nosso) (Discurso Histórico:1994, p.60).
A extinção das casas de fundição parece nada mais ser do que um pretexto. Havia jánessa luta uma aspiração muito pronunciada para a independência. Coitados!Nas longas e frias noites do cativeiro sonhavam já nesse tempo com o sol daliberdade, e foram incontestavelmente os precursores da aurora que mais tardeapareceu sob Tiradentes, e da qual surgiu este dia em que vivemos (grifo nosso)(Magalhães: 1862, p.323-324).
A sedição de 1720, não obstante a execução de Filipe dos Santos, é, sem dúvida, ocaso mais padigmático de um motim dentro das regras do jogo colonial e o maispróximo ritualmente dos food-riots e tax-rebellions europeus. (...) As 14 condiçõesapresentadas pelos amotinados ao Conde de Assumar, exigência para dar fim aomovimento, estavam contidas, todas elas, nos parâmetros delimitados pela políticametropolitana para as Minas (Anastasia: 1994, p.32).
Essa sedição, ocorrida entre 28 de junho e 16 de julho de 1720, foi um movimentodos potentados locais, todos portugueses, que procuravam manter seu poderdiante de um governador que tinha vindo a Minas para fazer exatamente ocontrário, ou seja, estabelecer o poder da Coroa Portuguesa (grifo nosso) (Fonseca:2007, p.551).
Distantes no tempo, esses 4 excertos, produzidos respectivamente nos séculos 18, 19, 20
e 21, indicam como a Sedição de 1720 foi apropriada ao longo do tempo, redesenhando
não apenas a memória local, mas também as idéias sobre a construção da identidade
brasileira. Nesse texto sintetizaremos, num primeiro instante, um conjunto de fatos que
marcaram o início e o fim da revolta; e, num segundo momento, a partir de alguns
estudos, ressaltaremos aspectos que nos ajudarão a perceber o lugar desse conflito na
historiografia contemporânea.
2. O diagrama do poder e suas tensões.
O texto basilar de quase todas as narrativas sobre a sedição de 1720 é o “Discurso
histórico e político sobre a sublevação que nas Minas houve no ano de 1720”, cuja a
autoria e a introdução no Brasil ainda permanecem em mistério.99 Ele é dividido em
duas partes. Conforme Laura de Mello e Souza:
A primeira narra os episódios que envolveram o levante de Vila Rica e a subseqüenteexecução do português Felipe dos Santos; a segunda justifica a necessidade deexecução, feita sem julgamento, e a fundamenta quase sempre nas ações e escritos deautores e personagens históricos do mundo antigo (Discurso Histórico: 1994, p.13).
Essa divisão, pensada e escrita como uma peça de defesa, alimenta as atribuições de
autoria ora ao Conde de Assumar, ora aos padres jesuítas Antônio Correa e José
Mascarenhas (que hospedaram-se por algum tempo na casa de Assumar), ora aos três.
Diferentes autores observam no “Discurso Histórico...” a mesma finalidade: construir
uma linha de argumentação ante à possibilidade de Assumar ser condenado em Portugal
pela execução sumária do português Felipe dos Santos. O texto de abertura do
“Discurso Histórico...” já imprime o tom de defesa e justificativa nele recorrente:
99 No final do século 19, esse texto foi publicado duas vezes: no Jornal Minas Gerais, órgão oficial doEstado, em 1898; e logo a seguir pela Imprensa Oficial do Estado de Minas Gerais, com introdução deJosé Pedro Xavier da Veiga, então diretor do Arquivo Público Mineiro.
Vários têm sido os motins e sublevações que em diversos tempos houve nas Minas, masnenhuma de tão perniciosas conseqüências, e tanto para temer, como o presente do anode mil setencentos e vinte, pelo temerário e inaudito fim a que se encaminhava e dirigia,qual era alçar a obediência ao seu príncipe, usupar ao patrimônio real esta ricaporção, e introduzirem-se nela despoticamente soberanos os mesmos que aindaeram indignamente vassalos (grifo nosso) (Discurso Histórico: 1994, p.59).
Podemos destacar duas idéias nessa fala: 1) a naturalização dos montins no imaginário e
no comportamento dos habitantes das Minas, pois “é propriedade e virtude do ouro
tornar inquietos e buliçosos os ânimos dos que habitam as terras onde ele se cria”; 2) a
necessidade de contê-los com pulso forte, já que a organização do aparelho
administrativo do governo poderia perder terreno em meio aos espaços conquistados
após a Guerra dos Emboabas, pois os grandes e poderosos ainda “fazem estrondos,
excitam tumuitos, movem bulhas, formam motins, solicitam liberdades.”100 A visão do
“Discurso Histórico...” sobre as primeiras décadas de colonização em Minas indicam
que as áreas de mineração do ouro eram esteios de conflitos onde os diferentes grupos
sociais, como os potentados, não se esquivavam de medir a intensidade de suas forças,
não apenas entre si, mas também com as esferas governamentais.
Não sei que outra coisa se possa dizer da fundação das Minas, pois a todos é bemnotório que a sua primeira criação foi de homens brutos e facinorosos, que para o seremlhes bastava ou ser paulistas, ou tratar com eles, sem mais cabedal que o que seprometiam das voltas de uma bateia, ou dos roubos de uma venda, que é faisqueira maissegura; e fazendo-as a grande distância couto de insolentes, foi tanta a afluência nãosó de portugueses, mas de muitas nações, que no limitado espaço de vinte e trêsanos, chegam hoje algumas de suas vilas a competir, reservando a Bahia, com as maiscidades da marinha (grifo nosso) (Discurso Histórico: 1994, p.62).
100 Ocorrida entre 1707 e 1709 na região central de Minas Gerais, a Guerra dos Emboabas recebeudiferentes interpretações. Conforme Adriana Romeiro, a mais comum “privilegia o conflito entre ospaulistas mineradores e os forasteiros comerciantes, enriquecidos com a participação do comércio entre aBahia e a região mineradora. (...) Outra versão corrente é a de que os paulistas, animados por umsentimento nativista, identificaram o emboaba ao inimigo reinol, o representante dos interesses dePortugal, que, dado o pacto colonial, se chocavam com os interesses nacionais (Romeiro: 2007, p.538-539).” Adriana Romeiro ressalta que três pontos devem ser destacados na construção da memória sobreesse evento: “primeiro, emboaba não era sinônimo de reinol; segundo, os paulistas dominavamsuficientemente o vocabulário das diferenças de local de nascimento para não incorrer em errosgrosseiros, e finalmente, a oposição dos reinóis não passava necessariamente pela condição deportugueses, mas pelo fato de serem diferentes.” E conclui: “O que estava em jogo no conflito, para alémdas diferenças culturais e políticas entre os grupos envolvidos, era um acirrada disputa pelo poder local,envolvendo questões muito concretas, como a concessão de cargos, a divisão das datas minerais, adistribuição das sesmarias, os privilégios junto à Coroa, etc. A hegemonia política dos paulistas, lastreadapelo direito de conquista, esbarrou nos interesses dos forasteiros, que souberam articular as suasdemandas políticas em torno da figura de Manoel Nunes Viana (Romeiro: 2007, p.538-539).
O Conde de Assumar, um dos supostos escritores do “Discurso Histórico...”, partiu para
Minas em 1717, dois anos após casar-se com D. Maria José Nazaré de Lencastre na
freguesia portuguesa de Santos-o-Velho. No período em que esteve em Minas
“queixou-se da distância, do clima, dos povos, da ausência da família e, com certa
freqüência, pediu para voltar. Não gostava das possessões coloniais e só se deixava ficar
por questões econômicas e de prestígio (Discurso Histórico: 1994, p.34).”101 Antes da
sedição de 1720, Dom Brás Balthazar da Silveira, antecessor de Assumar, já havia
enfrentado dois levantes: em 1713, na Vila do Carmo, envolvendo o Ouvidor Geral, que
“resolvera redistribuir as terras minerais, retirando alguns lavradores que ali mineravam,
alegando, de acordo com o Regimento de 1702, (...) pertecerem aquelas terras à data da
Real Fazenda”; e, em 1715, em Sabará e Vila Nova da Rainha, quanto ao pagamento
dos quintos por bateias, queixa que encontrou vozes concordantes em Vila Rica e Vila
do Carmo (Anastasia: 1994, p.31-32). Percebe-se, portanto, que apesar do acordo com
os cabeças dos “reinóis” em 1709, após o fim da Guerra dos Emboadas, e o início da
instalação das vilas e câmaras em 1711, o diagrama do poder nessas regiões recém-
colonizadas apresentava fortes tensões e um claro desiquilíbrio na mediação dos
diferentes interesses. Sem tropa militar regular, autônoma, e necessitando articular o
apoio dos poderosos locais quanto à solução das demandas criadas a partir do rápido e
singular processo de colonização de Minas, como a eclosão de motins, Assumar chegou
a Vila Rica e Vila do Carmo em primeiro de dezembro de 1717.
As tensões que o conde veio administrar ficaram ainda mais evidenciadas quando as
novas leis expedidas pela Coroa aportaram no Rio de Janeiro com a frota de meados de
1719: “(...) entrou nestas Minas a nova lei, que sobre os quintos foi Sua Majestade
servido mandar expender; chegaram as tropas dos dragões; fizeram-se públicas as
101 Dom Pedro Miguel Almeida Portugal, o Conde de Assumar, nasceu em 29 de setembro de 1688.Ainda rapaz foi para Catalunha e guerreou ao lado do pai contra Castela dos 16 aos 25 anos, “sempredando mostras de qualidades de comando nos vários postos que galgou, até o de General da Batalha. (...)Para os Assumar, como para Portugal, o resultado da Guerra foi desastroso. Os seus bens de morgadiotiveram de ser hipotecados a fim de honrar as dívidas contraídas durante oito anos de permanência noestrangeiro (Discurso Histórico: 1994, p.26).” “Quanto à expectativa demelhoria de suas finanças, isso se devia ao fato de que os principaisfuncionários do rei sempre conseguiam ganhos extras, além de seussalários normais. Isso era de conhecimento do rei, que tolerava o fatodesde que não houvesse exageros (Fonseca:2007, p.555).
ordens para dar baixa a todos os oficiais da ordenança que não tivessem corpo; também
se fez notória a expulsão dos religiosos (Discurso Histórico: 1994, p.64).”102 A
possibilidade de instalação das casas de fundição (que representaria um fortalecimento
da fiscalização tributária); da perda das patentes e dos “respectivos privilégios” (que
conferiam a alguns moradores das Minas nobreza e representação política); da formação
das tropas de dragões (que conferia ao governo da capitania uma polícia autônoma); e
da expulsão dos clérigos e “religiosos de diversos institutos (...) sem convento nem
casa”, aproximou os interesses dos cabeças dos amontinados de 1720 (Vasconcelos:
1974, p.173; Antonil: 1982, p.167 ).
Entre os principais líderes estavam os portugueses Pascoal da Silva Guimarães,
minerador,comerciante e mestre-de-campo, que tornou-se um dos homens mais ricos dessa
época; Dr. Manoel Mosqueira da Rosa, ex-ouvidor de Vila Rica; Sargento-Mor Sebastião da
Veiga Cabral, ex-governador da Colônia do Sacramento; Frei Vicente Botelho; Frade Bento; e
Frei Francisco de Monte Alverne. Outros participantes são citados em diferentes textos,
como Felipe dos Santos, José Carlos, Teodósio da Silva, Capitão Traquilha, Sebastião
Carlos e Pedro da Rocha Gandavo (Discurso Histórico: 1994, p.80-144), Frei Pedro de
MonteSião (Códice Matoso: 1994, p.208), Frei Vicente Boto e João Ferreira Diniz
(Pitta: 1976. p.275), e Tomé Afonso (Feu de Carvalho apud. Discurso Histórico: 1994,
p.144).103
Pascoal da Silva Guimarães é apontado pelo texto do “Discurso Histórico...” como o
mentor da revolta instalada em Vila Rica entre 28 de junho e 16 de julho de 1720:
Era Pascoal da Silva antigo nas Minas, onde, a peso de ouro, na balança de suastramóias, se soube fazer a fortuna que em Guimarães, sua pátria, lhe negou ahumildade de seu nascimento, e a vileza de seus pais. Passando rapaz ao Rio deJaneiro, serviu aí alguns anos de caixeiro, depois começou a vir às Minas com limitadas
102 Em 18 de juho de 1719, Assumar publicou um bando em Minas Gerais anulando a forma como osquintos eram cobrados e “ordenou se fizesse casa de moeda”. Em 01 de setembro de 1719 publicou outroinformando “que, dentro de dois meses, saíssem das Minas os religiosos e mais eclesiásticos que nãotivessem incumbência alguma, por julgar não ser conveniente às Minas (Códice Costa Matoso: 1999,p.367).”103 No livro “História da América Portuguesa”, escrito por Sebastião da Rocha Pita, no século XVIII, osprincipais envolvidos apontados foram Pascoal da Silva Guimarães, Manuel Mosqueira da Rosa, seu filhoFrei Vicente Boto, Frei Antônio de Monte Alverne e João Ferreira Diniz (Pitta: 1976, p.275). SegundoAlexandre Fonseca (2007, p.551): “Os principais líderes dessa rebelião eram reinóis, denominação querecebiam os portugueses do Reino ou nascidos nas ilhas. Eram também referidos como ‘emboabas’,alcunha comumente aplicada a todos ‘não-paulistas’.
comissões, até que, enfadado das jornadas e aspereza dos caminhos, assaz dificultososnaquele tempo, se deixou ficar nelas, procurando logo introduzir-se com uns e outros, eprincipalmente com Francisco do Amaral Gurgel, de quem possui bastante fazenda,e bebeu toda a doutrina (....) Achava-se este homem com perto de trezentos escravos,dois engenhos no Rio das Velhas, e lavras no morro chamado de seu nome, ou porquehavia muito que nele morava, ou porque sempre o tiranizava, querendo à força fazer-sesenhora da maior parte dele, com notório prejuízo de Vila Rica, de quem aquelemorro era faisqueira comum (...) (grifo nosso) (Discurso Histórico: 1994, p.68-70).
Para Alexandre Fonseca (2007, p.552):
Pascoal da Silva Guimarães foi, junto com Manuel Nunes Viana, um dos primeirosmascates que chegaram nas Minas entre 1701 e 1705. Pascoal da Silva veio dePortugal para o Rio, onde se estabeleceu como caixeiro de Francisco Amaral Gurgel.Tornou-se em seguida mascate nas Minas, enriquecendo-se rapidamente. Os mascateseram vendedores ambulantes, que, em razão de sua grande mobilidade, eramconsiderados pelas autoridades da Capitania como contrabandistas em potencial(grifo nosso). O contrabando era uma atividade comum na Colônia. O governo tinhaconhecimento dele e tentava contê-lo, mas ao mesmo tempo tinha certa tolerância, peladificuldade de combatê-lo.
Em Diogo de Vasconcelos (1974, p.174), Pascoal
(...) era então o mais rico e potentado morador das Minas. Possuía ele na serra de OuroPreto um arraial inteiro, o arraial de Ouro Podre, e as lavras mais férteis e bemtrabalhadas do distrito. Possuía mais entre outras propriedades, duas grandes fazendasde engenho no Rio das Velhas e a mais de dois mil homens calcula-se o poder queexercia direto sobre escravos e camaradas.
Entre as novas determinações da Coroa que chegaram com a frota de 1719, a instalação
das casas de fundição foi o principal mote utilizado pelos líderes da Sedição de 1720, já
que a expulsão dos clérigos ou o cancelamento das patentes eram vistos com bons olhos
por parte da população. A primeira porque poderia levar a leilão novas datas de
mineração, já que clérigos “sem convento nem casa” atuavam tanto na produção quanto
no contrabando do ouro; a segunda porque poderia levar a uma nova divisão e
configuração do poder, concentrado desde 1709 nas mãos de parte dos reinóis e de seus
partidários. Além da oposição às novas determinações, divergências pontuais também
alimentaram o início desse conflito, como as tensões entre o Doutor Martinho Vieira de
Freitas (ouvidor de Vila Rica), Pascoal da Silva, o ex-ouvidor Manuel Mosqueira Rosa
e o Sargento-mor Sebastião da Veiga Cabral.104 Nesse período, Pascoal estava sendo
acionado por credores e fora menosprezado pelo ouvidor “cujo gosto especial era
ridicularizar e trazer debaixo dos pés os homens poderosos da comarca”; Manuel
Mosqueira teve o seu filho preso e colocado na cadeia da câmara, “ofensa que o pai não
fazia mistério de só na morte achar-lhe o esquecimento”; Sebastião da Veiga Cabral,
que também não escondia o desejo de tornar-se governador da capitania, tentou burlar a
lei para adquirir uma fazenda, quando “o ouvidor Martinho recusou seu pedido,
Sebastião da Veiga armou-lhe uma cilada para provar que o ouvidor ‘peitava e vendia a
justiça’” (Vasconcelos: 1974, p.176-177; Fonseca: 2007, p.556-557). O texto do
“Discurso Histórico...” (1994, p.80) ainda acrescenta que:
Agora é de saber pois, para melhor inteligência deste caso, que assim Pascoal da Silvacomo Sebastião da Veiga Cabral, Sebastião Carlos, Pedro da Rocha Gandavo e trintaou quarenta pessoas de menos nota que entraram neste negócio estavam de todorefundidos e arruinados. (...) mas todos conservavam muita pompa, autoridade, erespeito adquirido com a violência dos motins que noutro tempo fizeram nestas Minas(grifo nosso) (...).
Pascoal Silva - que ocupou importantes postos sob as administrações dos governadores
Antônio de Albuquerque Coelho de Carvalho e D. Brás Bhaltasar da Silveira, incluindo
o cargo de juiz ordinário da câmara de Vila Rica - também vivenciou problemas diretos
com o Conde de Assumar. O governador, aos poucos, passou a testar a força política de
Pascoal: suspendeu a obra de construção da casa da Câmara até a resolução final de El-
Rei, já que o valor arrematado em praça por Pascoal para essa obra encontrava-se
superfaturado; publicou bandos ratificando a resolução da Câmara de Vila Rica de
regular, e depois proibir, a instalação de vendas nas áreas de mineração, como no
morros de Ouro Podre, Ouro Fino e Córrego Seco, interferindo numa zona liderada por
Pascoal; o conde também interferiu no problema de destituição e posse das datas
mineirais pertencentes a Silvestre Coutinho, convecendo a Pascoal, então juiz ordinário
104 O ouvidor era a autoridade administrativa posicionada imediatamente acimada câmara no interior da hierarquia político-administrativa vigente nacapitania. (...) Cabia ao ouvidor proceder as eleições dos juízes eoficiais da câmara, fiscalizar anualmente os oficiais de justiça,fiscalizar a cadeia, os forais, as rendas e as posturas camarárias,zelar pela ‘boa ordem’ e os ‘bons costumes’ – o que incluía verificaras licenças dos ofícios médios e mecânicos, dentre outras atribuições(Gouvêa: 2004, p.129).”
da Câmara, a ceder no caso; e, por último, talvez em uma de suas atitudes mais ousadas,
Assumar autorizou a prisão do brigadeiro João Lobo de Macedo, ex-juiz na Vila de
Pitangui, que encontrava-se escondido na casa de Pascoal, acusado pelo assassinato de
sua mulher.
As divergências dos sediciosos com o ouvidor de Vila Rica e o governador desenharam
as primeiras ações do plano do motim de 1720. No dia 25 de junho, João da Silva
Guimarães, filho de Pascoal e juiz ordinário da Câmara, entregou uma carta ao Conde
de Assumar avisando-lhe que fora convidado por um grupo de mascarados para ser
cabeça de um levante que expulsaria o ouvidor e o governador das Minas. A João da
Silva, o Conde dissimulou-se, passando a impressão de que o perigo não era eminente,
mas prontamente encaminhou uma carta ao ouvidor de Vila Rica, Doutor Martinho
Vieira de Freitas, a fim de que ficasse atento a um possível ataque. De posse da carta, o
ouvidor, que era famoso pelos rompantes, saiu pelas ruas furioso com a ameaça, e
encontrando João da Silva pelo caminho o insultou, prevendo que tal armação partia dos
potentados locais, como o seu pai Pascoal da Silva Guimarães (Vasconcelos: 1974,
p.179-181).
Três dias depois, em 28 de junho, o ouvidor foi avisado de que naquela noite seria
atacado e assassinado, o que lhe permitiu esconder-se no morro da Capela de Santa
Quitéria e observar de longe o movimento dos amotinados, assim narrado por Diogo de
Vasconcelos (1974, p.180-181):105
Às 11 horas, mais ou menos, haviam com efeito descido do Morro do Pascoal duasturmas cada uma de seis mascarados, acompanhados de 40 negros armados. Aprimeira dirigiu-se para o centro da vila, arrombando portas e obrigando osmoradores a segui-los sob pena de morrerem, tal qual era a forma de começar osmotins em qualquer povoação. A segunda desceu sobre o bairro do Padre Faria com omesmo procedimento para ajuntar gente e ambas se encontraram no alto, onde em frenteà casa do Ouvidor, meteram ombros à porta, e a invadiram mas não o acharam epor isso esfaquearam um criado por não lhes dizer aonde o apanhariam. Destruíram alitudo quanto encontraram, chegando o pandemônio ao auge de violentarem torpemente aconcubina do Ouvidor (grifo nosso).
105 Na noite de 28 para 29 de junho aconteciam os festejos de São Pedro, “assim não se reparariam muitoas movimentações no morro” (Fonseca:2007, p.560).
Em seguida, os mascarados dirigiram-se para uma residência próxima, onde o Conde de
Assumar permanecia quando hospedava-se em Vila Rica, acreditando que poderiam
encontrar o ouvidor: mas não estava. Estando para amanhecer eles retiraram-se para o
largo da casa da Câmara (que nessa época situava-se na freguesia de Antônio Dias),
tomaram as entradas e saídas e convocaram o letrado José Peixoto da Silva para
escrever a proposta que seria encaminhada ao Conde Assumar. Entre as
reinvindicações, os amotinados exigiam a não construção de “casas de fundição, cunhos
e moedas”; a não abertura de novos contratos, querendo ainda a destruição dos
“contratos de gado, fumo, sal e outras coisas mais desta natureza” ; a anulação do
registro da Borda do Campo, “diretamente pertencente aos comerciantes”; a moderação
das custas judiciais e os salários do foro (escrivães, tabeliães, meirinhos, alcaides e
assinaturas de ministros, oficiais maiores e menores); o não custeio dos gastos com a
companhia de dragões (alimentação dos soldados e cuidados com os cavalos); e queriam
o “perdão geral selado com as armas reais registrado na Secretaria deste governo,
Câmara e mais partes necessárias, publicado ao som de caixa pelos lugares públicos”
(Códice Costa Matoso: 1999, p.372-373; Discurso Histórico: 1994, p.94-95;
Alexandre:2007,p.559). De posse das reivindicações, José Peixoto da Silva, o emissário
dos sediciosos, partiu de Vila Rica e entrou em Vila do Carmo gritando que estavam as
“Gerais levantadas”.
Diante do início do motim, o Conde de Assumar tentou reunir os soldados da recém-
formada Companhia dos Dragões, no entanto, como ainda não havia quartel, eles
viviam dispersos por casas de particulares, sendo impossível agrupá-los imediatamente.
Dos 60 dragões, estavam presentes apenas 40. Mesmo assim, ele enviou um grupo para
retirar o ouvidor de Vila Rica, tratou de avisar aos ouvidores das Comarcas do Rio das
Velhas e Rio das Mortes sobre o levante e começou a articular junto aos principais
moradores da Vila do Carmo a composição de uma força de contra-ataque com
sequazes e negros. Apresentou também um despacho evasivo ao emissário dos
sediciosos, dizendo que a questão “estava ela em parte resolvida por ordens de Sua
Majestade, e em parte a resolveria depois de ouvir uma junta, que ia convocar
(Vasconcelos: 1974, p.182).” A resposta e as cartas enviadas posteriormente por
Assumar foram divulgadas pelos amotinados como estratégias para ganhar tempo e
reforçar o poder de contra-ataque. O objetivo dos sediciosos era claro: o importante não
negociar, mas, sim, desestabilizar o governo.
Como os revoltosos não receberam bem a resposta do conde, os tumultos continuaram.Isso levou Assumar a escrever para a Câmara e aos principais da Vila, dizendo queatenderia às reivindicações desde que se restabelecesse a ordem. Pascoal da Silva nemde longe ficou satisfeito com essa solução, já que pretendia, além das reivindicaçõesfeitas, substituir o ouvidor Martinho pelo Dr. Mosqueira, e o conde governador pelosargento-mor Sebastião da Veiga (Fonseca: 2007, p.561).
Uma comissão formada pelo Sargento-Mor Antônio Martins Lessa, juiz de Vila Rica, e
os letrados José Peixoto da Silva e José Ribeiro Dias foi ao encontro do Conde em Vila
do Carmo pedindo-lhe que fosse pessoalmente a Vila Rica pronunciar o seu perdão.
Assumar chegou a enviar emissários, como o tenente-general João Tavares e o padre
jesuíta José Mascarenhas, a fim de acalmar os ânimos e declarar o seu perdão. Também
escreveu para a Câmara determinando que se “fixasse o edital do perdão e que também
publicasse a portaria pela qual ele suspendia a lei de 11 de fevereiro por mais um
ano, e franqueava os registros dos caminhos do Rio (grifo nosso) (Vasconcelos: 1974,
p.184)”. Apesar do edital e da portaria, os amotinados esperavam que o Conde viesse
pessoalmente informar a sua posição à população de Vila Rica: sem dúvida, armavam
uma emboscada. Na madrugada do dia 02 de julho, devido à resistência de Assumar em
atender aos seus pedidos, os sediciosos “correram às lojas, e tomada toda a pólvora e
bala que nelas havia, armaram e municionaram o povo, e marcharam com perto de mil e
quinhentos homens à Vila do Carmo (Discurso Histórico: 1994, p.103).” A meta era
depor o governador e, se necessário, matá-lo. Até esse momento, os potentados da Vila
do Ribeirão do Carmo ainda estavam indecisos quanto à sedição, pois em parte
apoiavam as reivindicações, mas não as estratégias de ação dos amontinados. No
entanto, a decisão de tomar Vila do Carmo pela força pareceu-lhes uma situação de
risco, já que fortaleceria os grupos da vila vizinha:
Com essa notícia, se ajuntou a companhia de dragões apeada guarnecendo a loja depalácio, e uma varanda, que ficava no fundo da dita casa. As pessoas principais, que seachavam na Vila (do Carmo), acudiram logo com os seus negros armados, meteu-seem palácio pólvora e bala e munições de boca: guarneceram-se várias casas, que lheficavam a um e outro lado, de sorte que em breve tempo se pôs capaz de fazer granderesistência, no caso que o povo intentasse qualquer disputa (grifo nosso) (DiscursoHistórico: 1994, p.104).
Um cronista anônimo, morador da Vila do Carmo, escreveu que “(...) os cabeças faziam
tão certo o expulsá-lo do governo (o Conde de Assumar) que repartiam pelos
companheiros mais eficazes e mais orgulhosos as judicaturas das Minas e ofícios dela
(Códice Costa Matoso: 1999, p.209).” Assim, diante da possibilidade de vitória, os
líderes da sedição já estavam redefinindo os cargos e a organização política e
administrativa da capitania. O reforço do Conde, com o apoio dos moradores de Vila do
Carmo, e a ausência dos principais potentados no ato da batalha arrefeceram os ânimos
dos homens amotinados - é preciso lembrar que parte do grupo sedicioso não estava
inteiramente ali envolvido, mas obrigado. Felipe dos Santos, um dos agitadores centrais
do levante, discursava em prol do ataque à Câmara de Vila do Carmo, no que foi
dissuadido. Diante desse impasse, o sargento-mor Sebastião da Veiga Cabral elegeu-se
procurador do lado amotinado, dirigiu-se para ao palácio do governador e tentou
impressioná-lo dizendo que melhor seria o conde renunciar ao cargo, pois o povo queria
invadir e retirá-lo do poder. Segundo o “Discurso Histórico...”, o Conde não se deixou
persuadir. Ele dirigiu-se à sacada, foi saudado pelos aliados, recebeu os representantes
do movimento e “deferiu ponto por ponto o ‘Termo’ com as quinze reivindicações
(Fonseca: 2007, p.562)”.
O clima de batalha instalado encontrou um apaziguamento temporário após a leitura do
edital do conde concordando com as propostas dos amotinados e os perdoando.
Passados dois dias, porém, uma nova notícia começou a se espalhar por Vila Rica:
“dizia o Conde que as trinta arrobas de ouro, que, na proposta, se ofereciam a El-Rei, só
Vila Rica as devia pagar, porque as outras não tinham parte no motim. (...) foi preciso
ao Conde publicar novo edital com a ratificação do perdão e declarar que as trintas
arrobas eram comuns a todas as Minas (Discurso Histórico: 1994, p.111)”.
Nesse embate, os amotinados fizeram um novo motim em Vila Rica, no dia 6 de julho,
alegando que o ouvidor Dr. Martinho Vieira de Freitas “estava fazendo na Vila do
Carmo uma averiguação judicial do caso, e esta era a razão em que fundavam a suspeita
de que não se guardaria o perdão. Causando esta notícia tão geral revolução em todos
que rara era a pessoa daquela Vila que não trouxesse o ânimo inquieto e sobressaltado.”
E completava o boato: “de que o Conde determinava quintar os moradores da Vila para
fazer um exemplar castigo (Discurso Histórico: 1994, p.113)”. Diante dessa nova
instabilidade, o conde expediu ordem para o ouvidor Martinho retirar-se da Freguesia de
Antônio Pereira para Catas Altas, de onde partiu para o Rio de Janeiro. Nos dias
seguintes, conforme o “Discurso Histórico...”, o clima não tournou-se menos tenso: no
dia 13 de julho, Assumar recebeu a visita do escrivão Manuel José, espião do conde
infiltrado no motim, que informou sobre a organização de um novo levante que tentaria
expulsá-lo da capitania; nesse mesmo dia, o Frei de Monte Alverne, um dos líderes do
motim, também visitou o conde para lhe alertar (conforme orientado por Pascoal Silva)
de que “naquela noite infalivelmente se acabava o mundo e o iam depor e correr do
governo, e que assim tornasse lá bem as medidas (Discurso Histórico: 1994, p.126). A
estratégia de confundir o Conde parece não ter surtido efeito já que a essa altura os
cabeças do movimento não eram mais um mistério para o governo da capitania.106 Não
havia mais clima de espera: o contra-ataque tornou-se urgente.
Na noite de 13 para 14 de julho, dois dias antes do fim da sedição de 1720, o conde
expediu a tropa dos dragões para que “dessem nas casas do Mosqueira e de Pascoal da
Silva, e que prendessem juntamente a frei Vicente Botelho e a frei Francisco do Monte
Alverne, por lhe haver um confidente (que entre eles andava) segurado que estes eram
os autores de todo o negócio (Discurso Histórico: 1994, p.130).”
Presos os sobreditos (incluindo o sargento-mor Sebastiao da Veiga Cabral), econduzidos para a Vila do Carmo, não cessaram por isso as desordens em Vila Rica,antes foram tão excessivas na seguinte noite que cruelmente mataram a um homem, queao Conde presumira dava os avisos; e publicamente desceu do Morro de Pascoal daSilva a tropa dos mascarados com grosso número de negros armados, que atroaramos ares com repetidos e formidáveis tiros de horrendos bacamartes, arrombavam asportas das casas, que os moradores (por os não seguirem) tinham desamparado, gritandoem altas vozes que todo aquele que, no outro dia, não fosse tirar os presos, e a seu paiPascoal da Silva, se lhe poria fogo à casa, e ainda à mesma Vila (grifo nosso) (DiscursoHistórico: 1994, p.131).”
106 Seguindo essa estratégia, Pascoal da Silva escreveu ao Conde nesse mesmo dia se oferecendo paraorganizar um motim com os povos das freguesias de São Bartolomeu, Cachoeira do Campo e Itaubira afim de combater o motim que ele mesmo havia orquestrado.
Em acordo com os “principais” de Vila do Carmo, definiu-se a necessidade de um
guarnecimento maior de homens para conter a rebelião em Vila Rica e destruir o
restante dos sublevados. Diante dessa situação, Pascoal enviou uma carta ao filho, João
da Silva Guimarães, ordenando que retirasse logo os seus escravos e armas, “pelo dano
que lhes podia redundar (Discurso Histórico: 1994, p.132)”. O Conde dirigiu-se para
Vila Rica e lá ficou sabendo que parte dos sequazes de Pascoal da Silva tinha partido
para Cachoeira do Campo a fim de reunir novos amotinados: entre eles, Felipe dos
Santos. Conforme o texto do Discurso Histórico, a permanência dessa atmosfera de
“insurgência” foi o que levou o Conde de Assumar a tomar decisão de incendiar e
arrasar as casas dos sediciosos no Morro do Ouro Podre:
Assentado, finalmente, que o único remédio era o horror e a prontidão, ordenou oConde ao capitão de dragões João de Almeida e Vasconcelos que, com o tenente JoséMartins Felgueira, o alferes Manuel de Barros Guedes e quinze ou dezesseis dragões,subisse ao morro a demolir e arrasar as casas de Pascoal da Silva e outras maisdeterminadamente, cujos donos era público que, ou entravam em motins, oudavam favor e ajuda aos agentes em todas as noites antecedentes, concorrendo (emtanto dano da Vila) para desordens inauditas, matando homens, arrombando portas,roubando casas, profanando templos, insultando os altares, destruindo as leis domonarca, querendo por outras a seu arbítrio (...) (grifo nosso) (Discurso Histórico: 1994,p.135).
A cena do incêndio é assim narrada pelo texto do Discurso Histórico (1994, p.136):
A ordem foi esta, mas não foi possível observar-se inteiramente estaordem, porque por uma parte os negros, ambiciosos de roubar e beberas potagens de que todas aquelas vendas largamente abundavam, seintroduziram (sem que os soldados e os senhores, a que não atendiam,os pudessem refrear) na execução, com que absolutamente selevantaram, e fizeram autores à força, demolindo e queimando aomesmo tempo sem exceção; por outra parte, o fogo que livrementeao longe se comunicava em faíscas, achando pronta matéria naspalhas que muitas se cobriam, dilatava o incêndio, que causara maiordano se o capitão com os dragões e ordenanças não se se empenhara,com muito trabalho, mais em preservar as casas livres que emdestruir as culpadas, convocando, a vozes e gritos, os moradores,que defendesse cada qual a sua: (....) Às casas de Pascoal da Silva,que facilmente se não podiam demolir pela inteireza e resistênciadas grossas e sólidas madeiras de que se compunham, mandou oCapitão atear fogo, e não custaram muito a arder, porque parece que
o elemento apurou a voracidade, como deleitando-se em arruinar edestruir aquele escândalo de Vila Rica (grifo nosso) (...).
Em Cachoeira do Campo, enquanto tentava persuadir os habitantes, Felipe dos Santos
foi surpreendido e preso por Luís Soares e alguns ajudantes, sendo remetido para Vila
Rica.107
Felipe dos Santos Freire, aparentemente um analfabeto, era um almocreve oumuladeiro, aquele que conduzia um conjunto de bestas de carga. Essa profissão deconduzir uma tropa no transporte de mercadorias era também conhecida como tropeiro,o ‘agente por excelência do comércio com as Gerais’. Felipe trabalhava provavelmentea serviço de Pascoal da Silva, conduzindo as tropas dele. Além de tropeiro, era um‘mestre ferrador, que pagava 7 oitavas de quintos pelo seu ofício’. Nas horas vagasatuava como cômico, como se pode comprovar pelas pelas de roupa que estão listadasna relação de seus bens seqüestrados (Fonseca: 2007, p.551).108
Felipe dos Santos foi entregue ao governador, sendo sumariamente julgado, enforcado e
esquartejado:
(...) ele, que já na vida a morte tem bebido, vendo ser chegado o tempo em que eraforçoso lavar com seu sangue a mancha dos seus delitos, declarou que havia sete anosse não desobrigava da quaresma: confessou mais (não digo bem, porque nem naqueladerradeira hora o quis fazer), depôs de plano não só o motim, que na Cachoeira urdirapara sublevar aqueles povos, mas que por ordem de Pascoal da Silva e do Mosqueiracausara todos os de Vila Rica, trazendo-a por espaço de dezoito dias inquieta eperturbada. À vista da sua confissão, e de ser apanhado em flagrante, foi no mesmo dia,com aplauso dos moradores, enforcado e esquartejado (...) (Discurso Histórico: 1994,p.137).
Os líderes e outros participantes presos na sedição de 1720 foram enviados para o Rio
de Janeiro, de onde mantiveram contato com os seus nas Minas e ainda articularam
intrigas contra o conde. Em janeiro de 1721, Assumar solicitou ao governador do Rio
que remetesse logo os presos para Portugal e lhe enviasse cento e cinqüenta praças de 107 Pelo ato, Luís Soares recebeu o Hábito de Cristo - que implicava em privilégios como a isenção dodízimo, da portagem e da sisa, e o direito a foro privativo - e trinta mil réis de tença (pensão) (Fonseca:2007, p.550).108 Felipe dos Santos quando “deixou o Reino, por volta de 1713, e veio à Colônia em busca de riquezas,largou para trás uma esposa, de nome Teresa Maria Caetana. Morava em Antônio Dias, detrás da rua daMatriz. Entre seus bens constavam uma casa em Antônio Dias, um rancho coberto de telhas, atrás daigreja, uma negra, Francisca Mina, dois negros, João Benguela e Izeph Ambu, um negro muito velho,Manoel Mina, e um moleque de nome Thomé Crioulo, conforme os autos de arrematação de seus bens,ocorrido em julho de 1721, para pagamento do processo e das dívidas (Fonseca: 2007, p.552).”
infantaria. O sargento-mor Sebastião da Veiga Cabral foi encaminhado “para a Bahia e
esteve recluso na fortaleza de Santo Antônio Além do Carmo até desembarcar para
Lisboa (Pitta: 1976, p.276).” O Frei Vicente Botelho morreu ainda no Rio de Janeiro.
Pascoal da Silva faleceu tempos depois, após mover um processo em Portugal contra o
Conde de Assumar: “Em Lisboa, graças à sua enorme riqueza, não foi um criminoso,
senão um príncipe; e promovia bem advogado contra o Conde um processo de
responsabilidade, só atalhado pela morte do autor (Vasconcelos: 1974).
Assumar deixou a Capitania de Minas Gerais em 1721. Todo administrador colonial, ao
largar um cargo, deveria apresentar uma declaração de bens, a chamada “residência”, “e
tê-la julgada; tal não poderia acontecer, entretanto, caso houvesse devassa ou processo
contra o governante: a tradição reza e tal evidência corrobora que era este o caso de
Assumar (Discurso Histórico: 1994, p.32).” Essa situação não permitia, por exemplo,
que o conde participasse do concorrido ritual do beija-mão real. Ainda na década de
1720, Assumar envolveu-se num episódio em Lisboa que lhe custou, junto a outros
nobres, o exílio, ação articulada pelo Marquês de Abrantes, “todo-poderoso na Corte de
D. João V”. Entre 1721 e 1735, o conde caiu no ostracismo. Em 1733 “ingressou na
Academia Real de História e deu também um parecer ao Conselho Ultramarino acerca
da possibilidade de se aplicar a capitação em Minas.”109 Em 1735, após o rompimento
de Portugal com a Espanha, Assumar foi feito “mestre-de-campo-general da Cavalaria
do Alentejo e, a seguir, diretor-general da Cavalaria do Reino”, tornando-se, na mesma
época, censor da Real Academia e Familiar do Santo Ofício. Em 1744 tornou-se vice-rei
da Índia e Marquês de Castelo Novo; em 1748, Marquês de Alorna; e entre 1751 e
1752, retornou a Portugal, sendo promovido a mordomo-mor da rainha. Mas suas cartas
a D. José e D. Mariana Vitória, que assumiram a Coroa a partir de 1751, indicam que
ainda queixava-se do ostracismo que vivia na Corte, que sobre ele ainda pairava uma
‘pública excomunhão secular.’ Em 9 de novembro de 1756, Assumar faleceu em
Cascais (Discurso Histórico: 1994, p.34-36).
109 Capitação: “Denominação dada ao tributo semestral pago na casa de intendência do ouro ou dodiamante no valor de 2 oitavas e 12 vinténs sobre cada negro, forro ou oficial mecânico, de 24 oitavassobre loja grande, 16 sobre medianas e vendas, 8 sobre pequenas, pelo qual se comutou a cobrança do
Até o momento, nenhum pesquisador conseguiu identificar os autos do processo
movido por Pascoal contra Assumar, fonte fundamental para a contraposição da linha de
argumentação descrita do “Discurso Histórico...”, nem se sabe sobre o paradeiro dos
outros líderes do movimento.
3. A construção, desconstrução e reconstrução da memória: olhares sobre a
sedição de 1720.
Laura de Mello e Souza, em seu estudo crítico publicado na edição do “Discurso
histórico e político sobre a sublevação que nas Minas houve no ano de 1720” (1994,
196p.), informa que esse levante foi citado pela primeira vez no livro “História da
América Portuguesa”, de Sebastião Rocha Pita, escrito no século XVIII. A aura
nacionalista que passou a descrição desse evento, no entanto, conforme a autora, passou
a ser alimentada na segunda metade do século XIX:
(...) o episódio ocorrido em Vila Rica no ano de 1720 foi tido por marco na oposiçãocolonial à metrópole e momento importante na construção da nacionalidade. Cabiaencontrar um herói: era natural que este fosse Filipe dos Santos, dado o suplício horrívelque o governador Assumar lhe infligiu sem jugalmento. Cabia ainda estabelecer umarelação entre 1720 e 1789: dois levantes, dois supliciados, uma linha progressiva derebeldia e consciência ante à opressão metropolitana. Se Tiradentes era o mártir da
quinto do ouro nas casas de fundição na América portuguesa. Foi cobrado no período de 1735 a junho de
Independência, Filipe dos Santos, na mesma época, foi adquirindo os contornos doprotomártir (grifo nosso) (Discurso Histórico: 1994, p.18).
Em sua pesquisa, Laura de Mello e Souza indica que Couto de Magalhães
“desempenhou papel fundamental nesse processo”, pois o seu artigo “Um Episódio da
História Pátria”, escrito em 1860 para o Instituto Histórico e Geográfico, além de lhe
conseguir a condição de sócio do IHGB, semeou a idéia de que o episódio de 1720 já
manifestava o latente “desejo de independência dos colonos”. Couto de Magalhães, que
chegou a ler o “Discurso Histórico...”, “tirou os elementos que afinavam com idéias
preconcebidas, torcendo-os quando a harmonização não era total (Discurso Histórico:
1994, p.18):
A extinção das casas de fundição parece nada mais ser do que um pretexto. Havia jánessa luta uma aspiração muito pronunciada para a independência. Coitados! Naslongas e frias noites do cativeiro, sonhavam já nesse tempo com o sol da liberdade,e foram incontestavelmente os precursos da aurora que mais tarde apareceu sobTiradentes, e da qual surgiu este dia em que vivemos (grifo nosso) (Magalhães apud.Discurso Histórico: 1994, p.18).
No final do século 19, o texto do “Discurso Histórico...” foi publicado pela primeira vez
no Brasil em dois órgãos oficiais do Estado de Minas Gerais: no Jornal Minas Gerais,
em 1898; e, logo a seguir, na Imprensa Oficial do Estado de Minas Gerais, com
introdução de José Pedro Xavier da Veiga, então diretor do Arquivo Público Mineiro.
Indiferente aos apelos quanto ao heroismo de Felipe dos Santos, o historiador Teófilo
Feu de Carvalho criticou a falta de respaldo nos documentos para a construção de tal
imagem, pois o “levante não teve nem o caráter popular nem o republicano que se lhe
atribuiu: foi movimento de poderosos descontentes por motivos outros que o pagamento
do tributo (Carvalho apud. Discurso Histórico: 1994, p.22). Ressalta Laura de Mello e
Souza, que a crítica de Feu de Carvalho não é gratuita, pois tinha como pano de fundo a
“exaltação de Tiradentes, que, além de herói verdadeiro, nascera no Brasil (Discurso
Histórico: 1994, p.22).” Antes de Feu de Carvalho, em 1904, o historiador Diogo de
Vasconcelos também contestou “o caráter anticolonialista e republicano da sublevação,
assim como a importância de Felipe dos Santos no movimento, ressaltando, ao
contrário, o embate entre os poderes locais e a autoridade metropolitana - este sim, o
1751 (Códice Costa Matoso: 1999, p.82).
verdadeiro nervo do conflito (Discurso Histórico: 1994, p.22).” Afinal, como bem
sintetiza Laura de Mello e Souza: “quem pensaria em unidade nacional no início do
século XVIII?!”
Antônio Olyntho dos Santos Pires, em 1919, retornou aos contornos heróicos de Felipe
dos Santos, “frisando a base popular do levante e refutando os que o viam como ‘fruto
da ambição dos potentados e dos frades’”. Conforme esse autor, a proximidade de 1920,
quando a sedição completaria 200 anos, era o momento certo para ‘recordar os tristes
acontecimentos daquela tragédia” e “não só prestar as homenagens da posteridade aos
pioneiros das nossas reivindicações cívicas (...) como chamar a atenção dos estudiosos
para ela (Pires apud. Discurso Histórico: 1994, p.20). Apesar da celebração não ter
ocorrido no ano seguinte, o Conde de Afonso Celso, “presidente perpétuo” do IHGB
“exaltou o ‘protomártir’, criando assim um esteio favorável à divulgação do mito.
Discurso ainda sustentado por diversos livros didáticos, como o “Brasil, História e
Sociedade’, de Francisco M. P. Teixeira, adotado pelo Governo de Minas em 2007, que
informa no capítulo intitulado “Resistir na colônia”:
Em junho de 1720, a revolta eclodiu em Vila Rica. Sob a liderança de Felipe dosSantos, um pequeno minerador português, cerca de dois mil manifestantes marcharamsobre Ribeirão do Carmo (atual Mariana), onde se encontrava a sede do governo deMinas. Exigiam a suspensão das decisões anunciadas, redução dos quintos e dosregistros nas estradas e a concessão de anistia geral para todos os envolvidos (Teixeira:2005, p.128).
Como vimos, Felipe dos Santos era um dos cabeças das agitações promovidas durante a
Sedição de 1720, no entanto, ele não fazia parte do grupo dos mentores do movimento,
nem era “um pequeno minerador” (as profissões indicadas pelo historiador Alexandre
Fonseca são: tropeiro, mestre ferrador e cômico). Enfim, a revisão que a imagem
heróica criada em torno de Tiradentes vem sofrendo na última década nos livros
didáticos parece não ter chegado ao motin de 1720 - o que nos dá uma pista sobre a
lacuna que muitas vezes existe entre avanço historiográfico e a escrita dos livros que
chegam às salas de aula.
Contemporaneamente, podemos citar dois trabalhos no campo da história que retomam
tanto o discurso de desconstrução dessa revolta como um germe do “espírito nacional”
(Diogo de Vasconcelos, Feu de Carvalho, Cônego Raimundo Trindade: 1953, p.52)
quanto inserem novos dados que nos ajudam a reconstruir a memória desse evento:
“Vassalos rebeldes: motins em Minas Gerais no século XVIII”, de Carla Maria Junho
Anastasia (1994: p.26-43); e “A Revolta de Felipe dos Santos”, de Alexandre Torres
Fonseca (2007, p.549-565). Carla Anastasia inovou o olhar sobre esse e os levantes
contemporâneos em Minas Gerais ao aproximá-los das revoltas contra a fome e o
aumento de impostos ocorridas na Europa nessa época:
O ritual dos motins nas Minas não foi diferente do padrão geral do comportamento damultidão durante os food-riots e tax-rebellions europeus. Homens encapuzados, ao somde tambores, destruíam as propriedades de suas vítimas e os documentos oficiais quesimbolizavam sua sujeição; queimavam seus inimigos políticos em efígie, matando-ossimbolicamente. Assim, característica constante do comportamento do mundo pré-industrial, preservava-se a vida humana, no mais das vezes restringindo-se os levantes àdestruição da propriedade (Anastasia: 1994, p.29).
A historiadora classifica os movimentos setecentistas mineiros em dois tipos de atuação:
“a que consideramos dentro das regras do jogo colonial, na qual a tradição e a
legitimidade (...) tiveram papel significativo, e aquela referida às formas políticas
coloniais, que colocava em xeque as regras do jogo estipuladas para arbitrar as relações
entre Metrópole e colônia (1994: p.30). Nos motins do primeiro tipo enquadram-se as
sublevações originadas a partir de
(...) questões fiscais, abusos de poder pelas autoridades, problemas derivados daarrematação de contratos e comercialização de produtos de primeira necessidade, forammovimentos nos quais os atores lutaram pela manutenção de determinadosprocedimentos que, não obstante impostos pela Metrópole, eram considerados ‘justos’ e‘comedidos’ pela população colonial. (...) Nos motins do segunto tipo enquadram-se asrevoltas escravas, os movimentos contrários à implementação das determinações dePortugal e/ou de repúdio à ampliação do raio de atuação dos agentes metropolitanos(Anastasia: 1994, p.30).
A Sedição de 1720, segundo a autora, encaixa-se dentro do primeiro grupo, pois a
“população aceitava as regras do jogo colonial e lutava nos seus parâmetros, buscando
preservá-las como, de início, haviam sido acordadas.” De fato, é preciso levar em
consideração que o sargento-mor Sebastião da Veiga Cabral, nome cotado para ser o
novo governador da capitania após a destituição de Assumar, foi escolhido pelos
amotinados pela sua suposta íntima relação com El-Rei: “(...) seria quanto bastasse para
tirar ao levantamento o pior caráter de ofensivo à soberania do Rei e que este afinal (...)
não teria mais que indultar e satisfazer aos revoltosos, como já se tinha visto em tempo
de Manuel Nunes (Vasconcelos: 1974, p.178).” Ao relacionar o motim de Vila Rica aos
eventos semelhantes ocorridos na Europa, Anastasia distancia-se da visão retroativa,
que tendem a enfeixar os eventos numa escala progressista e artificial, como ocorreu
com os defensores da idéia romântica do “germe nacionalista”, e localiza a sedição em
seu próprio tempo, fruto do imaginário da sociedade que surgia em Minas, tributária de
diferentes matrizes culturais e da tradução que os habitantes e grupos faziam desse
contexto.
Alexandre Torres Fonseca (2007, p.549-565) escreveu recentemente sobre a sedição na
coletânea “História de Minas Gerais: as Minas Setecentistas”, onde ratifica a posição de
Diogo de Vasconcelos:
(...) foi um movimento dos potentados locais, todos portugueses, que procuravammanter seu poder diante de um governador que tinha vindo a Minas para fazerexatamente o contrário, ou seja, estabelecer o poder da Coroa Portuguesa. Esse era oprincipal intento do governador d. Pedro de Almeida. Esse poder, porém, não eraabsoluto, havendo quase sempre margem para negociações e mesmo algumaflexibilidade: as taxas a serem pagas poderiam ser discutidas, mas havia um limite. Oresultado deveria ficar claro: os vassalos tinham de obedecer às ordens do rei d. João V.
E quanto à participação de Felipe dos Santos conclui:
O fato de Felipe dos Santos ter atuado tão às claras durante todo o movimento pode tersido em virtude da confiança que tinha no poder do mestre-de-campo Pascoal da SilvaGuimarães (para quem provavelmente trabalhava). Ele também poderia estar apostandotudo na manutenção dos poderes locais contra a Coroa, em razão de que já havia contraele, desde trinta de janeiro de 1717, uma ordem de d. João ao Bispo da Capitania do Riode Janeiro que voltasse ao Reino, por causa de um precatório que se passou do JuízoEleciástico (...). Essa carta precatória era fruto da requisitória eclesiástica obtida porMaria Caetana, sua esposa. Para que ela não tivesse ainda sido cumprida em 1720,Felipe deve ter contado com a interferência tanto de Pascoal da Silva, quanto com aajuda do ex-ouvidor dr. Mosqueira (Fonseca: 2007, p.552).
As apostas de Pascoal da Silva e dos mentores e participantes do movimento, como
Felipe dos Santos, demonstram uma superestimação do poder e da capacidade de
articulação dos potentados e de setores da população das vilas e freguesias. A vitória da
aliança construída por Assumar, apesar dele ter desfrutado pouco tempo dessa
conquista, sendo substituído no ano seguinte, reconfigurou o diagrama do poder em
Minas, fortalecendo a imagem do governo da capitania frente aos potentados locais.110
Enfim, os embates e as negociações entre setores da população e as esferas de execução,
legislação e fiscalização (governo, câmaras, ouvidorias) transferiram-se para um novo
plano. Isso não significou, no entanto, uma verticalização do poder em Minas, e a
instalação das casas de fundição somente em 1725 exemplifica que o crescimento dos
poderes dessas esferas administrativas permaneceria, ao longo do século XVIII,
variando entre o uso da força e a necessidade do acordo e o uso da força (Gouvêa:
2004, p.120-140).
A chegada da frota de 1719 com as novas leis da Coroa, a realidade incipiente e instável
da estrutura governamental assumida por Assumar - que o levou em diferentes
momentos a negociar para além de sua vontade com os amotinados -, e as reações tanto
dos potentados quanto de parte da população indicam as diferentes leituras que cada
uma dessas partes fazia do processo de ocupação e distribuição do poder na ainda
recém-descoberta região aurífera mineira.
110 Após a sedição, ainda em 1720, a Capitania de Minas Gerais separou-se de SãoPaulo e foi decretada como independente.
4. Considerações finais.
O espectro das questões que participaram da eclosão da Sedição de 1720 era realmente
amplo. As reivindicações dos amotinados, encaminhadas a Assumar, espelham bem
essa amplitude: posicionamento contra a instalação das casas de fundição; anulação de
registro (alfândega); interferência nos preços pagos na arrematação de escravos em
praça pública; proposta de normatização dos salários e emolumentos dos oficiais;
solicitação de fiscalização da prática e dos gastos com os aferidores; exigência de
moderação nas condenações expedidas pela Câmara; posicionamento contrário aos
gastos particulares com a Companhia dos Dragões; sugestão de mudança na legislação
sobre a construção das calçadas nas ruas; redefinição do período de tirar licenças;
limitação do uso dos privilégios por parte dos contradores de dízimos; repartição dos
custos das diligências dos oficiais de justiça; limitação do comportamento dos ministros
para que não fizem “vexações ao povo com seus despachos violentos”; e exigência de
publicação do perdão geral dos sediciosos com “as armas reais” (Códice Costa Matoso:
1999, p.372-373).
A Sedição de 1720 nos apresenta o governo da capitania envolvido em conflitos com a
ouvidoria de Vila Rica, a Câmara, cujo o juiz ordinário era João da Silva Guimarães,
filho de Pascoal Guimarães, e os potentados; a ouvidoria também estava batendo de
frente com os potentados e os camaristas; e os potentados, além dos grupos sociais
partidários, desejavam as instâncias executivas e legislativas desde que estivessem
afinadas com as suas idéias e interesses. Enfim, diante da rápida, instável e recente
formação de Vila Rica (havia apenas duas décadas que se espalharam as notícias sobre o
ouro em Minas Gerais), o diagrama do poder nessa região trazia à tona as suas
diferentes tensões.
Nesse cenário - desenhado por “múltiplos espaços marcados, simultaneamente, pela
existência de datas auríferas, regulamentadas pelo Regimento de 1702, já que os
mineradores erguiam seus barracos junto às catas; chãos de terra ao redor e doados pelas
capelas, por meio de seu Patrimônio Religioso”, além das sesmarias, doadas pelo
Governador Geral, localizadas ao longo dos caminhos e nas áreas rurais (Borrego: 1999,
p.63-64) - os morros da Serra de Ouro Preto, como Ouro Podre, Ouro Fino e Córrego
Seco, tornaram-se, além da principal zona de mineração da Sede de Vila Rica, as
principais áreas de onde partiam as agitações da Sedição de 1720.111
Finalizando, recomendo, a leitura (ou releitura) dos capítulos 3 e 4 do segundo
relatório que escrevi “Os morros enquanto espaços de expectativas de
enriquecimento” e “Os morros enquanto pontos de tensão e desordem”, a fim de
ampliar a percepção sobre a vida urbana que surgia na época do levante de 1720.
111 Maria Borrego acrescenta ainda o “apossamento espontâneo” como formade apropriação do solo, visível nos pedidos de aforamentos solicitadosà Câmara a partir de 1712.
5. Referências bibliográficas
1. Fontes primárias.
ANTONIL, André João (João Antônio Andreoni). Pelas minas de ouro. In: Cultura e opulênciado Brasil. São Paulo: Cia. Editora Nacional, 1967. p.255-304.
Códice Costa Matoso. Coleção das notícias dos primeiros descobrimentos das minas naAmérica que fez o doutor Caetano da Costa Matoso sendo ouvidor-geral das do Ouro Preto, deque tomou posse em fevereiro de 1749, & vários papéis. Coordenação de Luciano Raposo deAlmeida Figueiredo e Maria Verônica Campos. Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro,Centro de Estudos Históricos e Culturais, 1999, 2v. (Coleção Mineiriana).
Discurso histórico e político sobre a sublevação que nas minas houve no ano de 1720. Belo Horizonte:Centro de Estudos Históricos e Culturais, Fundação João Pinheiro, 1994. 193p.
2. Fontes secundárias.
ANASTASIA, Carla Maria Junho. Vassalos rebeldes: violência coletiva nas Minas na primeirametade do século XVIII. Belo Horizonte: Editora C/Arte, 1998.
BARREIROS, Eduardo Canabrava. Episódios da Guerra dos Emboabas e sua geografia. BeloHorizonte: Editora Itatiaia Ltda; São Paulo: EDUSP, 1984. p.61-86.
CARVALHO, Teófilo Feu de. Ementário da história mineira – Filipe dos Santos Freire nasedição de Vila Rica em 1720. Belo Horizonte: Edições Históricas, s/d, p.190.
FONSECA, Alexandre Torres. A Revolta de Felipe dos Santos. In: As Minas Setecentistas.Maria Efigênia Lage de Resende e Luiz Carlos Villalta (org.). Belo Horizonte: Autêntica,Companhia do Tempo, v.1, 2007. p.549-566.
GOUVÊA, Maria de Fátima. Dos poderes de Vila Rica do Ouro Preto – Notas preliminaressobre a organização político-administrativa na primeira metade do século XVIII. Revista VariaHistória, Departamento de Pós Graduação em História, FAFICH/UFMG, Belo Horizonte, nº31,2004, 120-140.
MAGALHÃES, J. V. Couto de. Um episódio da história pátria (1720). Revista do InstitutoHistórico e Geográfico Brasileiro, t.25, 1862, p.515-543.
PIRES, Antônio Olyntho dos Santos. Revolta de Vila Rica de 1720. Revista do InstitutoHistórico e Geográfico Brasileiro, t.85, v.139, 1919, p.443-497.
PITTA, Sebastião da Rocha. Livro décimo e último. In: História da América Portuguesa. BeloHorizonte: Ed. Itatiaia Ltda; São Paulo: EDUSP, 1976.p.267-293.
ROMEIRO, Adriana. A Guerra dos Emboadas: novas abordagens e interpretações. In: As MinasSetecentistas. Maria Efigênia Lage de Resende e Luiz Carlos Villalta (org.). Belo Horizonte:Autêntica, Companhia do Tempo, v.1, 2007. p.529-547.
TEIXEIRA, Francisco Maria. Brasil: história e sociedade. 1 ed. São Paulo: Ática, 2005.351p.
TRINDADE, Cônego Raimundo. Arquidiocese de Mariana. 2 ed. Belo Horizonte: ImprensaOficial, 1953, v.1, p.52.
VASCONCELOS, Diogo de. História antiga das Minas Gerais. Belo Horizonte: Editora ItatiaiaLtda, 1974.
PONTOS PARA DISCUSSÃO
1. Códice Costa Matoso, 1999; 192) Os primeiro aglomerados não chegavam a
formar arraiais em face do nomadismo dos exploradores. As primeiras capelas
também ...