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A AUTORREGULAÇÃO DA APRENDIZAGEM EM MATEMÁTICA: UM
ESTADO DA QUESTÃO
Paulo Gonçalo Farias Gonçalves Universidade Federal do Cariri, [email protected]
Isauro Beltrán Núñez Universidade Federal do Rio Grande do Norte, [email protected]
Resumo: Com o aumento das pesquisas na área de Ensino de Ciências e Matemática no Brasil, estudos que
visam inventariar e discutir o que foi já produzido sobre temas específicos são fundamentais para que
pesquisadores tenham maior facilidade de acesso aos avanços e lacunas do campo em que atuam. Diante
disso, esta pesquisa tem como objetivo elaborar um Estado da Questão do tema “autorregulação da
aprendizagem em matemática” a partir de repositórios digitais brasileiros. Empreendendo um levantamento
em três repositórios de artigos, dissertações e teses, obtivemos 19 trabalhos sobre o tema, que foram
discutidos em função: da recorrência ao longo dos anos, dos fundamentos teóricos e dos níveis de ensino.
Verificamos que não há uma continuidade nem crescimento das pesquisas sobre o tema no país. Além disso,
tem ocorrido a adoção tanto de modelos teóricos específicos da autorregulação da aprendizagem quanto de
teorias que discutem essa habilidade de maneira indireta. Acerca dos níveis de ensino, a distribuição dos
trabalhos entre Educação Básica e Ensino Superior contribui para diversificar e enriquecer o debate sobre o
tema. Portanto, é fundamental que novas investigações sobre a autorregulação da aprendizagem em
matemática sejam empreendidas no país, de modo a contribuir com a proposição de propostas para a
formação de aprendizes autônomos.
Palavras-chave: Autorregulação da Aprendizagem; Educação Matemática; Estado da Questão.
INTRODUÇÃO
Nos últimos anos, tem havido um aumento das pesquisas em Ensino de Ciências e
Matemática no Brasil. Conforme dados Relatório de Avaliação da área de Ensino1 da Coordenação
de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), há em todo o país: 157 programas de
pós-graduação, 2.452 periódicos classificados e 1.842 eventos nessa área (CAPES, 2017). O atual
patamar que a pesquisa em Ensino de Ciências e Matemática alcançou remete a um considerável
volume de produções que, por sua vez, estão distribuídas por inúmeros repositórios.
É nesse quadro que estudos que visem inventariar e discutir o que foi já produzido em uma
temática específica são fundamentais para que pesquisadores tenham maior facilidade de acesso aos
avanços e lacunas do campo sobre o qual debruçam suas investigações. Assim, adentramos ao tema
“autorregulação da aprendizagem em matemática”.
As investigações sobre a autorregulação da aprendizagem tem ganhado relevância, dentre
outros aspectos, pois tem apontando que maior desenvolvimento da habilidade de autorregular a
1 A partir de 2011, esta área incorporou todos os Programas de Pós-graduação da antiga área de Ensino de Ciências e
Matemática.
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aprendizagem pelos estudantes pode ocasionar em melhor desempenho acadêmico (ZIMMERMAN,
2002; PAIVA; LORENÇO, 2012; MARTÍN, 2012; ROSÁRIO et al., 2014; BARRIOS; URIBE,
2017).
No ensino de matemática, em particular, autorregular a aprendizagem contribui ainda para o
processo de resolução de problemas (FERNÁNDEZ, 2015; SANTOS, 2015; GARCÍA et al. 2016).
Diante desse quadro, esta pesquisa tem como objetivo elaborar um estado da questão do
tema “autorregulação da aprendizagem em matemática” a partir de repositórios digitais brasileiros.
Em particular, buscamos responder as seguintes questões específicas:
Qual a recorrência das pesquisas sobre o tema ao longo dos anos?
Quais os principais fundamentos teóricos adotados?
Quais níveis de ensino são tomados como enfoque pelas investigações?
O presente artigo é dividido em cinco seções, a saber: introdução, que traz um panorama
geral da problemática, a relevância do objeto de estudo e o objetivo dessa pesquisa; fundamentação
teórica, que aborda os elementos gerais da autorregulação da aprendizagem em matemática;
metodologia, que discute o percurso trilhado pela investigação; os resultados, que traz uma
discussão e análise dos dados coletados em função das questões previamente postas; e as
considerações finais, que apresenta as conclusões do estudo, suas limitações e possibilidades de
novos estudos afins ao tema.
A AUTORREGULAÇÃO DA APRENDIZAGEM
Desde o seu surgimento na década de 1980, o interesse pela investigação da autorregulação
a aprendizagem (AA) no contexto educacional vem aumentado em diversas partes do mundo
(SILVA; VEIGA SIMÃO; SÁ, 2004; ROSÁRIO et al., 2014; BARRIOS; URIBE, 2017).
De maneira geral, a autorregulação da aprendizagem pode ser compreendida como a
habilidade de autocontrole do indivíduo sobre sua atividade de aprendizagem. Dada sua estrutura
multifacetada, esse autocontrole se refere tanto a aspectos internos (emocionais, cognitivos,
comportamentais, entre outros) quanto externos (ambientais, por exemplo) do aprendiz. Além disso,
considerando as diferentes perspectivas teóricas que se debruçam sobre o tema, a ênfase a cada um
desses elementos internos e externos varia em função do fundamento teórico adotado.
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Empreendendo uma análise de alguns modelos teóricos, Pintrich (2000) aponta
convergências entre as propostas de discussão sobre a autorregulação da aprendizagem, a saber:
O discente é visto como participante ativo do processo de aprendizagem, o que inclui prepará-lo
para que possa estabelecer metas e usar estratégias diversas frente aos conhecimentos a serem
estudados;
O aluno deve ser capaz, em alguns momentos, de monitorar, controlar e ajustar elementos de sua
cognição, motivação, comportamento e do contexto em que ocorre a aprendizagem.
As diferentes perspectivas que discutem a autorregulação adotam um modelo de ação como
referência para regulação da ação executada.
Parte dos modelos de autorregulação compreendem as atividades de autorregulação como
mediadoras entre aspectos pessoais, proveniente do contexto e desempenho. Isso implica que a
autorregulação da cognição, da motivação e do comportamento executam importante papel na
mediação entre indivíduo, contexto e resultados alcançados durante o processo de aprendizagem.
Esses pontos de congruência entre os modelos teóricos evidenciam o intuito da
autorregulação da aprendizagem que consiste em de auxiliar os estudantes na construção e na
melhoria progressiva de seu sistema pessoal de aprendizagem (JORBA; SANMARTÍ, 1994).
METODOLOGIA
A presente pesquisa é do tipo Estado da Questão. Para Nóbrega-Therrien e Therrien (2004),
o Estado da Questão consiste em um levantamento seletivo de trabalhos (artigos, dissertações, teses,
etc.) que visa situar o objeto de uma determinada investigação em relação a parte da produção
científica da área em que se insere. Esse tipo de investigação visa compreender, por meio do
levantamento de pesquisas, qual o estado das pesquisas já empreendidas sobre determinado tema.
Para busca das pesquisas já desenvolvidas sobre o tema “autorregulação da aprendizagem
em matemática” definimos os seguintes repositórios:
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Quadro 1: Repositórios consultados
Fonte: Elaborado pelos autores
Considerando que os repositórios acima reúnem tanto trabalhos oriundos de pós-graduações
stricto sensu brasileiras quanto artigos científicos de outros países, a combinação da pesquisa nos
três buscou construir um quadro mais completo do atual nível de desenvolvimento das
investigações sobre o tema.
Definidos os bancos de dados, inserimos no mecanismo de busca de cada site os termos
“autorregulação” e “matemática” utilizando o operador booleano “AND” entre eles (autorregulação
AND matemática). O processo foi repetido utilizando a grafia da palavra “autorregulação” anterior
ao último Acordo Ortográfico de Língua Portuguesa (isto é, auto-regulação).
Sem restrição ao ano de publicação, delimitamos as investigações que formaram o corpus de
dados da pesquisa por meio de uma leitura do título e do resumo de cada trabalho. A partir daí,
selecionamos os trabalhos que apresentaram convergência com a temática “autorregulação da
aprendizagem em matemática”.
Após o refinamento das pesquisas a partir do critério estabelecido e da exclusão de
investigações obtidas em mais de um dos repositórios, foram selecionados 19 trabalhos entre
artigos, dissertações e teses. Partindo das questões específicas propostas nessa pesquisa, na próxima
seção serão discutidas: a recorrência das pesquisas, os fundamentos teóricos e os níveis de ensino.
RESULTADOS E DISCUSSÕES
REPOSITÓRIO SITE INSTITUÇÃO RESPONSÁVEL
Catálogo de
Teses e
Dissertações
(CTD)
www.catalogodeteses.capes.gov.br Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal
de Nível Superior (CAPES)
Portal
Periódicos
www.periodicos.capes.gov.br Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal
de Nível Superior (CAPES)
Biblioteca
Digital
Brasileira de
Teses e
Dissertações
www.bdtd.ibict.br Instituto Brasileiro de
Informação em Ciência e
Tecnologia (IBICT)
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O primeiro aspecto a ser discutido corresponde a recorrência dos trabalhos ao longo dos
anos. Desse modo, apresentamos no Gráfico 1 a distribuindo dos artigos, dissertações e teses em
função do ano em que foram concluídos:
Gráfico 1: Distribuição dos trabalhos ao longo dos anos
Fonte: Elaborado pelos autores
A partir do Gráfico 1 é possível observar que 63,2% dos trabalhos publicados sobre o tema
são dissertações, 26,3% artigos e apenas 10,5% teses. Esse acontecimento, somado ao fato de que
houve um intervalo de 8 anos entre as teses catalogadas, evidencia a necessidade de que haja um
aumento no número de pesquisas de doutorado que se debrucem sobre a autorregulação da
aprendizagem em matemática.
No que se refere aos fundamentos teóricos relativos a autorregulação da aprendizagem que
nortearam os trabalhos selecionados, o Gráfico 2 os autores mais recorrentes:
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Gráfico 2: Fundamentos teóricos sobre a autorregulação adotados pelos trabalhos
Fonte: Elaborado pelos autores
Notamos a prevalência de pesquisas (57,9%) que se norteiam em autores da Teoria Social
Cognitiva (A. Bandura, B. J. Zimmerman, P. R. Pintrich, P. S. L. de F. Rosário), comungando com
os resultados apresentados em Joly et al. (2016). Outro fundamento para discussão da
autorregulação da aprendizagem utilizado pelos trabalhos foi a Teoria Histórico-Cultural, de L. S.
Vygotsky, recorrente em pouco mais de 21% deles.
Levando em consideração agora o nível de ensino em que cada uma das pesquisas foi
empreendida, elaboramos o Gráfico 3 que classifica as investigações em Ensino Fundamental,
Ensino Médio, Curso Técnico, Ensino Superior (Matemática), Ensino Superior (outros cursos).
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Gráfico 3: Níveis de ensino investigados
Fonte: Elaborado pelos autores
Observamos que os estudos com enfoque na Educação Básica (Ensino Fundamental e
Ensino Médio) corresponderam a 57,8% dos trabalhos. De maneira geral, o enfoque dos trabalhos
pode ser subdividido em três grandes blocos.
O primeiro reúne as pesquisas que utilizaram-se de recursos didáticos diversos como meios
para a autorregulação da aprendizagem, tais como: diários de estudo (OLIVEIRA, M., 2015),
portfólio (DIAS; SANTOS, 2015), caderno de atividades (SANTOS, 2015) ou projetos
(OLIVEIRA, S., 2015).
Num segundo grupo, o enfoque foi o desenvolvimento de intervenções educativas que
integraram a autorregulação a aprendizagem de conteúdos ou públicos específicos como: Estatística
(BARIZON, 2011; CONTINI NETO, 2012) Matemática Financeira (BECKER, 2016), pessoas com
deficiências (MARTINS, 2011).
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Um terceiro conjunto de trabalhos investigou a relação entre a autorregulação da
aprendizagem (AA) e outras variáveis. Em Souza (2007), o enfoque foi investigar a relação entre
estratégias autorregulatórias, crenças de auto-eficácia e utilidade da matemática. Na pesquisa de
Azevedo et al (2012), a busca foi pela relação entre percepção dos estudantes acerca do
comportamento do docente e a AA. Já em Romero, Lugo e Villa (2013), o objetivo foi mensurar as
variáveis autorregulação, resiliência e metas educativas e suas relações com o desempenho escolar
dos discentes.
Dentre as pesquisas que atuaram Ensino Superior (31,6%), seis tiveram como participantes
alunos de cursos de Licenciatura em Matemática.
Na investigação de Peres (2009), o enfoque foi apresentar as potencialidades de um Objeto
de Aprendizagem (OA) usado na resolução de problemas de máximos e mínimos por meio de
conceitos geométricos para a autorregulação da aprendizagem. Os resultados do estudo mostraram
que a utilização do OA pelos participantes estimulou a utilização de diferentes estratégias de
autorregulação.
Zocolloti (2010) investiga as contribuições de uma intervenção realizada no âmbito de uma
disciplina de Educação Matemática com enfoque o desenvolvimento da autorregulação e da
reflexão. Segundo o autor, na maioria dos estudantes o estímulo a reflexão nas atividades propostas
na pesquisa possibilitou a autorregulação da aprendizagem.
Nos trabalhos de Pranke (2012) e Pranke e Frison (2015) são relatadas as análises de
oficinas de matemática desenvolvidas no âmbito de um Projeto Institucional de Bolsa de Iniciação à
Docência (PIBID) para verificar a promoção da autorregulação da aprendizagem. Os resultados
apresentados mostraram que o Projeto “[...] parece ter possibilitado e estimulado nas bolsistas o
desenvolvimento de competências autorregulatórias, enriquecidas por um processo reflexivo e
formativo, presente na realização das oficinas de matemática” (PRANKE, 2012, p. 108).
Desenvolvendo uma intervenção com enfoque no exercício da autorregulação da
aprendizagem, Fantinel (2015) investigou os impactos dessa experiência de ensino no conhecimento
pedagógico dos participantes relacionado ao conteúdo de equação do segundo grau. Dentre os
resultados apresentados pelo estudo, a autora aponta que o ensino da autorregulação possibilitou
uma “[...] mudança significativa no conhecimento declarativo das estratégias de aprendizagem e do
conhecimento pedagógico do conteúdo matemático do futuro professor” (FANTINEL, 2015,
p.198).
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Em Oliveira (2016), foi desenvolvida uma experiência de avaliação formativa no âmbito de
um ambiente virtual de aprendizagem e investigadas as contribuições dessa proposta para a
regulação e autorregulação da aprendizagem dos estudantes participantes. Por meio do uso de
diferentes recursos tecnológicos (fóruns, software matemático, plataforma de mensagens e chats de
vídeo), o autor encontrou evidências de favorecimento da regulação da autorregulação da
aprendizagem dos participantes e de uma maior reflexão desses a partir de práticas de
autoavaliação.
As pesquisas relatas apresentam em comum o uso de estratégias de aprendizagem diversas e
de subprocessos inerentes a autorregulação da aprendizagem (como a metacognição e a reflexão,
por exemplo) como um caminho para melhoria da formação do conhecimento profissional dos
futuros professores.
CONCLUSÃO
A busca pelo status quo das pesquisas desenvolvidas sobre um determinado tema é algo
importante para que os investigadores tenham ciência dos avanços e pontos inexplorados em suas
linhas de atuação. Nesse sentido, apresentamos uma pesquisa Estado da Questão relacionada ao
tema “autorregulação da aprendizagem em matemática”, buscando compreender a recorrência
dessas pesquisas, seus fundamentos teóricos e níveis de ensino que trabalharam.
Sobre a recorrência das pesquisas, verificamos que não há uma continuidade nem
crescimento das pesquisas ao longo dos anos. Associado ao escasso número de teses encontradas
(apenas duas), é necessária uma maior exploração do tema pelos investigadores que estudam os
processos de ensino e aprendizagem em Matemática.
No que se refere aos fundamentos teóricos relativos a autorregulação da aprendizagem,
observamos a prevalência de modelos teóricos construídos para o estudo da autorregulação da
aprendizagem, todos fundamentados na Teoria Social Cognitiva. Por outro lado, há trabalhos que se
norteiam em teorias que não surgiram para discutir essa habilidade de forma direta, como os estudos
a Teoria Histórico-Cultural ou ainda discussões sobre Avaliação educacional.
Acerca dos níveis de ensino, a distribuição dos trabalhos entre Educação Básica e Ensino
Superior, em particular na formação de professores de matemática, evidencia a preocupação dos
pesquisadores em atuar com diferentes públicos, o que contribui para diversificar e enriquecer o
debate sobre o tema.
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Dentre as limitações dessa pesquisa podemos pontuar a exclusão de buscas por livros ou
textos publicados em eventos científicos da área. Outra limitação importante se refere a opção por
não empregar descritores afins a autorregulação durante a pesquisa, como a metacognição, por
exemplo. A exploração dessas lacunas possibilitam que novas investigações sejam realizadas a fim
de complementar o presente estudo na construção de um recorte ainda mais próximo do que se tem
produzido sobre a temática.
Portanto, é fundamental que novas investigações sobre a autorregulação da aprendizagem
em matemática sejam empreendidas no país, de modo a contribuir com a proposição de propostas
para a formação de aprendizes autônomos.
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