FACULDADE DE MINAS - FAMINAS
Stéfannie Goretti Lopes de Paula
ANÁLISE DA MEDIDA SÓCIO-EDUCATIVA DE LIBERDADE ASSISTIDA NO
MUNICÍPIO DE MURIAÉ-MG.
Muriaé
2010
Stéfannie Goretti Lopes de Paula
ANÁLISE DA MEDIDA SÓCIO-EDUCATIVA DE LIBERDADE ASSISTIDA NO
MUNICÍPIO DE MURIAÉ-MG.
Monografia de Conclusão de Curso apresentado à Faculdade de Minas - FAMINAS como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Serviço Social.
Orientadora: Prof. Ms. Joseane Nadir da Mata Paiva.
Muriaé
2010
(...)Perante a indiferença caminhas… Mal agasalhado, mal nutrido, com frio, O teu olhar triste, sentido, doentio, Que amargura no semblante trespassa. Injusta a vida tua; sem culpa formada, Foste julgado, condenado e isolado, Pela sociedade sem regras nem valores, Onde vingam malandros e mal feitores.
Estela de Belém
Ao meu querido pai que, através das
estradas brasileiras, dias e noites adentro, não mediu esforços financeiros para que eu pudesse alcançar o sucesso em minha vida.
A minha mãe, que com dedicação e esforço fez o possível, colocando até mesmo a sua saúde em segundo plano, para que eu pudesse ter uma educação de qualidade.
Dedico
AGRADECIMENTOS
Em primeiro lugar, agradeço a Deus, pelas oportunidades que me foram
dadas na vida, e principalmente, por ter vivido fases difíceis, que foram matérias-
primas de aprendizado.
Aos meus familiares pela força, compreensão e, principalmente a meus
pais que me ensinaram a não temer desafios e a superar os obstáculos com
humildade.
Ao meu irmão Felipe por seu companheirismo e por estar sempre ao meu
lado nos momentos difíceis de nossa vida.
À minha querida tia e madrinha Olga, minha eterna “Inha” por seu apoio e
pelo grande incentivo à minha frequência acadêmica.
Aos meus avós falecidos, que em vida me deram carinho, atenção e
muito amor.
À minha querida vó Nely que me ajudou e apoiou para que eu pudesse
realizar este sonho.
À todos os meus tios e tias, primos e primas e a todos que direta ou
indiretamente me ajudaram.
Ao Pedro, meu namorado pelo incentivo e apoio.
À FAMINAS e aos professores do Curso de Serviço Social pelos
conhecimentos adquiridos ao longo de minha caminhada acadêmica.
À minha orientadora professora Mestre Joseane Nadir da Mata Paiva pela
dedicação na realização deste trabalho, que sem sua importante ajuda não teria sido
concretizado.
À Professora Mestre Carla Barrigio, que com grande satisfação aceitou o
convite para participar da banca examinadora, meu muito obrigada.
À professora especialista Luciene Mª Ribeiro Muglia Thomaz que me
acompanhou nos meus estudos desde a Educação Infantil até a conclusão do
Ensino Médio, embasando-me de conhecimentos, colaborando para que eu me
tornasse uma cidadã crítica, conhecedora de seus direitos e deveres e por agora
fazer parte da banca examinadora, completando assim, este ciclo acadêmico.
Aos colegas de curso um grande abraço.
SUMÁRIO
LISTA DE SIGLAS ............................................................................................... VI
RESUMO .............................................................................................................. VII
ABSTRACT .......................................................................................................... VIII
INTRODUÇÃO ..................................................................................................... 09
1. ADOLESCÊNCIA E ATO INFRACIONAL ....................................................... 11
1.1 Conceito de adolescência. ......................................................................... 11
1.2 A Puberdade: começo das mudanças físicas e emocionais. ..................... 12
1.3 O adolescente e a busca da Identidade ..................................................... 14
1.4 O adolescente e a convivência familiar ...................................................... 15
1.5. O adolescente e o grupo de pares ............................................................. 17
1.6 O ato infracional ......................................................................................... 19
2. A POLÍTICA DE ATENDIMENTO A CRIANÇA E AO ADOLESCENTE
NO BRASIL .................................................................................................... 21
2.1 O início da Política de atendimento a criança e ao adolescente no Brasil . 21
2.2 O Serviço de Assistência a Menores (SAM) .............................................. 24
2.3 A Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor (FUNABEM) ..................... 26
2.4 O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) ......................................... 27
2.5 Medida Sócioeducativa de Liberdade Assistida: aplicação e eficácia ........ 29
2.5.1 Aplicação da Medida Sócioeducativa de Liberdade Assistida no
município de Muriaé – MG ...................................................................... 30
3. MEDIDA SÓCIOEDUCATIVA DE LIBERDADE ASSISTIDA:
ATUAÇÃO DO ASSISTENTE SOCIAL ........................................................... 32
3.1 Breve contexto da pesquisa ....................................................................... 32
3.2 Transcrição da entrevista com a Assistente Social do CREAS –
Muriaé – MG .............................................................................................. 32
CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................. 37
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................................... 38
ANEXOS .............................................................................................................. 42
LISTA DE SIGLAS
CREAS – Centro de Referência Especializado em Assistência Social
ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente
FUNABEM – Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor
ONG‟S – Organizações não governamentais
SAM – Serviço de Assistência a Menores
SEDS – Secretaria Estadual de Desenvolvimento Social
SINASE – Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo
RESUMO
O presente trabalho é fruto das informações e inquietações obtidas durante os anos
da nossa formação acadêmica. O interesse pelo tema se deu através do alto índice
de atos infracionais e drogadição no município de Muriaé – MG, e a consequente
repercussão que o mesmo vem tomando no município, onde crianças e
adolescentes estão vulneráveis a essas expressões da questão social, pois, são
maioria das vítimas dessa violência, e muitas vezes atores de ato infracional, que os
levam a cumprir medidas sócio-educativas, onde abordamos em especial a medida
sócio educativa de liberdade assistida. E em especial o trabalho realizado pela
Assistente Social com estes adolescentes. Para que esta análise seja relevante, foi
realizada uma revisão da literatura com o objetivo de embasarmos de conteúdos
significativos e conhecer a realidade do adolescente ator de ato infracional,
desenvolvendo assim um trabalho informativo e efetivo. Adotamos a metodologia da
pesquisa qualitativa sustentada por uma abordagem descritiva, numa perspectiva
compreensiva, visando a análise da atuação da Assistente Social do Centro de
Referência Especializado de Assistência Social(CREAS) que atua com os
adolescentes que cumprem a medida em análise. Concluímos com esta pesquisa
que o trabalho do Assistente Social é realizado com eficácia dentro das
possibilidades que o mesmo possui, obtendo assim resultados significativos junto
aos adolescentes atores de atos infracionais.
PALAVRAS-CHAVE: Adolescência. Ato Infracional. Drogas.
ABSTRACT
This work is the result of the information and concerns gathered during the years of
our academic background. Interest in the subject was through the high rate of illegal
acts and drug addiction in the city of Muriaé - MG, and the consequent impact that it
is taking in the city, where children and teens are vulnerable to these expressions of
social issues, as are most the victims of such violence, and often the actors of an
offense, which leads them to meet social and educational measures, where we
discuss in particular the extent of social educative parole. And in particular the work
done by the Social Worker with these adolescents. For this analysis is relevant, we
performed a literature review with the objective of sustaining a meaningful content
and know the reality of teenage actor in an offense, thus developing an effective and
informative work. We adopted a qualitative research methodology supported by a
descriptive approach, a comprehensive perspective, in order to evaluate the
performance of Social Work at the Center for Social Assistance Specialized
Reference (CREAS) who works with adolescents that meet this measure. We
conclude with this research that the work of the Social Worker is done effectively
within the possibilities that it presents, thus obtaining significant results with
adolescents actors of infractions.
KEYWORDS: Adolescence. Offensive. Drugs.
9
INTRODUÇÃO
Em Muriaé, como em todo o Brasil, cresce assustadoramente o índice de ato
infracional praticada por adolescentes. Segundo Cordeiro (2010), ultimamente o que
podemos ver constantemente na cidade é o envolvimento de adolescentes em furtos
constantes a residências, veículos, e pessoas pelas ruas. Tal fato nos leva a
reflexão e análise da Medida Sócio-educativa de Liberdade Assistida e a atuação do
Assistente Social com os adolescentes atores de ato infracional no município de
Muriaé – MG.
Colpani (2003) alerta que devemos “compreender a responsabilização penal
do adolescente infrator, que ocorre através das medidas sócio-educativas, e a
sensação da ilusão de impunidade”, pois, muitas das vezes, a sociedade civil pensa
que o adolescente pode cometer qualquer violência que não será punido, pois, em
geral não possuem o conhecimento das medidas sócio-educativas que o
adolescente deverá cumprir, em caso de ter cometido um ato infracional.
Na verdade, a opinião pública é baseada nas informações passadas pela
mídia, que com freqüência alerta para o aumento da violência, tentando fazer crer
que os adolescentes atores de ato infracional são os responsáveis pelo aumento
desses índices, bem como que nada acontece para os adolescentes que cometem
ato infracional, formando uma visão preconceituosa e reacionária contra o
adolescente em confronto com a lei. (Ibdi)
A partir da análise fundamentada das medidas sócio-educativas aplicadas aos
adolescentes atores de ato infracional, encontramos uma de especial relevância: a
medida sócio educativa de liberdade assistida. Diante disso, questionamos: o que
levaria o adolescente a cometer um ato infracional? E, qual seria o papel do
Assistente Social no acompanhamento do adolescente cumpridor desta medida
sócio-educativa?
A adolescência trata-se do período no qual uma criança se transforma em
adulto, e esta mudança não acontece apenas na altura e no peso, nas capacidades
mentais e na força física, mas, também, na forma de ser, de uma evolução da
personalidade.
No primeiro capítulo faremos uma análise da adolescência por considerar que
devemos compreender as transformações pelas quais o adolescente passa e a
10
consequente influência que a mesma terá em sua possível inserção no ato
infracional.
No segundo capítulo trataremos do resgate histórico da Política de
Atendimento à Criança e ao Adolescente no Brasil, objetivando suas transformações
desde o período do Império até o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)
enfatizando o ponto crucial do estudo, ou seja, a atuação do Assistente Social no
CREAS – Muriaé – MG, frente à medida sócio-educativa de liberdade assistida.
No terceiro capítulo transcreveremos a entrevista com a Assistente Social
acerca de sua atuação frente ao adolescente ator de ato infracional juntamente com
explanação sobre esta atuação com uma abordagem teórica.
Concluindo o estudo, as minhas considerações finais a respeito da atuação
do Assistente Social frente à questão da medida sócio-educativa de liberdade
assistida.
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1. ADOLESCÊNCIA E O ATO INFRACIONAL
Neste capítulo abordamos as transformações ocorridas na adolescência para
que possamos entender o envolvimento dos adolescentes com o ato infracional,
focalizando as drogas. Inicialmente conceituaremos a adolescência, a seguir o
desenvolvimento físico e psicológico, comportamento anti-social dando ênfase à
crise da identidade e ao grupo de pares e logo após discorremos sobre a
problemática das drogas suas causas e consequências.
1.1 Conceito de adolescência
Segundo Housaiss (2001), a palavra adolescência tem origem no verbo latim
adolescere, que significa crescer, ou crescer até a maturidade, resultando em
transformações de ordem social, psicológica e fisiológica.
Na concepção de Amorim (2008) a adolescência é, sobretudo, um fenômeno
psicológico e social, com diferentes características, marcadas de acordo com o
ambiente social, econômico e cultural no qual o adolescente convive e se
desenvolve. Na análise da autora “a adolescência assume diferentes características,
dependendo do contexto e do momento histórico. As manifestações da conduta
variam em cada sociedade, classes sociais e sistemas sociopolíticos” (Ibid, p. 3).
Este fato nos impossibilita dissociar os processos biológicos dos psicológicos e/ou
dos aspectos históricos, sociais, ambientais e culturais ao se estudar sobre os
adolescentes, especialmente os que são autores de ato infracional.
Não se pode, assim, falar em adolescência, mas “adolescências”. Isso também significa que mesmo os adolescentes categorizados em um determinado grupo em um certo momento histórico, como aqueles em conflito com a lei, não podem ser “homogeneizados”. Não existe um “perfil” único de adolescentes infratores. Todos nascem com possibilidades e potencialidades que podem ser canalizadas para aspectos construtivos ou destrutivos, dependendo da história de vida.(Ibid, p.3)
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1.2 A Puberdade: começo das mudanças físicas e emocionais.
A puberdade é considerada como o começo da adolescência, é o período
onde o adolescente adquire uma maturidade sexual tornando-se apto a reprodução.
Seu início dá-se mais ou menos aos 11 ou 12 anos e dura aproximadamente por 10
anos. O aumento de hormônios, consequência do início da puberdade, pode levar a
um aumento considerável de emoções e instabilidade de humor na adolescência
que está associado à agressividade nos garotos e agressividade e depressão nas
adolescentes (PAPALIA, 2006).
O início da adolescência (aproximadamente dos 11 ou 12 aos 14anos de idade), a transição de saída da infância, oferece oportunidades de crescimento - não apenas em dimensões físicas, mas também em competência cognitiva e social, em autonomia, em auto-estima e em intimidade. Esse período também possui grandes riscos. Alguns jovens têm dificuldade para lidar com tantas mudanças de uma só vez e podem precisar de auxílio para superar os perigos ao longo do caminho. A adolescência é uma época de aumento da diferença entre a maioria dos jovens: alguns estão direcionados a urna idade adulta satisfatória e produtiva, enquanto uma minoria considerável (de aproximadamente 20%) terá que enfrentar muitos problemas (Ibid, 2006 p. 441).
A adolescência é considerada como um período importante no qual
desenrola-se o processo de crescimento e desenvolvimento, é quando as mudanças
físicas (biológicas) da puberdade integram-se àquelas de âmbito emocional.
(FERRIANI, 2001)
Ferriani (2001) afirma que o “fenômeno puberdade/adolescência não pode ser
estudado isoladamente”. Osório e Chipkevitch (apud FERRIANI, 2001), ressaltam
que as modificações biológicas estão relacionadas à puberdade, e as mudanças
emocionais e sociais estão inseridas na adolescência, portanto, o conceito de
puberdade está ligado aos aspectos físicos e biológicos do indivíduo, começando
por volta dos 9 ou 10 anos de idade. É quando a criança perde as maneiras infantis
e começa a sentir as primeiras transformações no seu corpo. (TIBA apud FERRIANI,
2001).
É característica desta fase o surto de crescimento adolescente, que é o rápido
crescimento em estatura e peso que geralmente dura dois anos, sendo que nas
meninas inicia-se em torno dos 10 anos e nos meninos aos 12 ou 13 anos. Nos
meninos ele é caracterizado pelo alargamento dos ombros; pernas mais longas em
13
relação ao peito; e os antebraços mais longos em relação aos braços e à altura. Nas
meninas, a pélvis é alargada para facilitar o parto e é formada camadas de gordura
abaixo da pele, dando-lhes forma arredondada. Assim que o estirão termina, a
maturidade sexual é alcançada. (PAPALIA, 2006)
Os sinais de puberdade aparecem através dos caracteres sexuais primários e
secundários. Os primários tratam-se dos órgãos reprodutivos que na adolescência
crescem e amadurecem. Na adolescente estes sinais não são visíveis, pois estes
órgãos são internos: os ovários, as trompas, o útero e a vagina; já no adolescente os
órgãos são: os testículos, o pênis, o escroto, as vesículas seminais e a próstata,
sendo que aparece como sinais da puberdade o crescimento dos testículos e do
escroto. Os caracteres secundários são os sinais da puberdade que não estão
diretamente ligados aos órgãos reprodutivos, tais como os seios das mulheres, o
alargamento dos ombros nos homens, o crescimento dos pelos no corpo, púbis e
axilas, a alteração na voz, o desenvolvimento muscular, a textura da pele, que fica
mais áspera e gordurosa e pode provocar espinhas e cravos. (Ibid, 2006)
Nas moças, o aparecimento da primeira menstruação é significativo, pois
trata-se do sinal da maturação sexual, o qual indica fisiologicamente que a
adolescente está apta a ter filhos, nesta ocasião a hipófise secreta vários hormônios
que são responsáveis por uma série de transformações que a faz aspirar a ser
mulher, antes de desejar se mãe. Nos rapazes, a maturação sexual se através de
sinais, tais como, o aparecimento dos pelos e a presença da ejaculação que ocorre
normalmente durante os períodos de ereção. Ocorre, então, as poluções noturnas
durante o sono que retratam os sonhos e fantasias eróticas de seu dia-a-dia, devido
à sensualidade despertada no namoro, e ao clima de excitação, comum na
maturação sexual (COSTA, 1986).
Todas essas rápidas mudanças físicas, pelas quais passam os adolescentes,
possuem raízes emocionais, visto que a maioria deles preocupa-se com a aparência
e não costumam gostar do que avistam nos espelhos. De início, sem bem saber o
significado de sua sexualidade e de como dispor dela, pouco a pouco, o adolescente
vai descobrindo os mistérios e os devaneios que esta situação encantadora e aflitiva
lhe desperta. O corpo, as emoções, os interesses sofrem profundas alterações,
dando novas conotações à sua personalidade o que faz com que ele agora inicie a
busca de sua própria identidade (ROSA, 2000).
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1.3 O adolescente e a busca da Identidade
Na adolescência ressalta-se a busca de identidade definida por Erickson
(apud PAPALIA, 2006, P. 477) “como a confiança em nossa continuidade interior em
meio à mudança”, que faz parte do esforço do adolescente em procurar desenvolver
um senso coerente de identidade, na qual faz parte o papel que ele irá desempenhar
na sociedade. E esta busca não se faz tomando outras pessoas como exemplo, mas
sim “modificando e sintetizando identificações anteriores para formar uma nova
estrutura psicológica, maior do que a soma de suas partes” (KROGER apud
PAPALIA, 2006, p. 477). Para poder se expressar socialmente, o adolescente deve
se firmar e estabelecer quais são os seus anseios, interesses, suas necessidades e
habilidades formando assim a sua identidade. (Ibid, 2006).
Papalia (2006) afirma que a busca da identidade é calcada resolvendo-se em
três importantes questionamentos: a escolha de uma profissão, quais valores deverá
adotar e acreditar, e a definição de uma identidade sexual satisfatória. Os
adolescentes podem apresentar comportamentos de risco, que terão resultados
negativos, tais como, o ato infracional e a gravidez precoce, quando não conseguem
se firmar profissionalmente, ou quando as oportunidades lhes são negadas
artificialmente.
A busca de identidade dos adolescentes faz com que eles procurem definir
suas diferenças e, aliando-se a isso, a importância dos pares no seu controle
emocional, fazem com que os jovens procurem construir suas identidades grupais
baseados em símbolos bem marcantes, para que assim possam ser rapidamente
reconhecidos, por outro lado, este fato torna os estilos adolescentes facilmente
comercializados, com o visual adolescente podendo ser espalhado facilmente e
consumido por eles e por quem mais desejar (ABECHE, 2005).
(...) esse processo se constitui a partir do conhecimento da individualidade biológica, social e do ser psicofísico. A identidade é caracterizada como: “[...] a criação de um sentimento interno de semelhança e continuidade, uma unidade da personalidade sentida pelo indivíduo e reconhecida por outro, que é o „saber quem‟”. (Sorenson apud Aberastury e Knobel, 1981; aspas do autor), e, vai
se estabelecendo através de movimentos dinâmicos, permitindo o conhecimento do mundo interno e do mundo externo. Na busca de si, o adolescente procura novas identificações para a construção de sua identidade (Ibid, 2005, p.6).
15
Portanto, na busca de uma identidade os adolescentes passam mais tempo
com os seus pares do que com a família, porém os valores embutidos neles os
tornam mais parecidos com seus pais do que geralmente eles supõem. Mesmo
quando estão nos grupos, procuram sempre nos pais “uma base segura da qual
possam experimentar suas asas” (PAPALIA, 2006, p. 493). A criação dos pais
também influencia, visto que os adolescentes ajustados tendem a procurar a
companhia de adolescentes ajustados como amigos, sendo assim o grupo de pares
reforçam os resultados de uma boa criação familiar. (ibid, 2006)
1.4 O adolescente e a convivência familiar.
É na adolescência que o ser humano passa a lidar com problemas da vida,
vivenciando dificuldades, as quais irão variar de pessoa a pessoa, conforme a
percepção de cada um da realidade, formando assim a personalidade do
adolescente. Nesta fase da vida humana, a assistência familiar é de fundamental
importância, a base para a formação do indivíduo maduro, adulto. É a partir da
educação recebida dos pais que o adolescente irá progredir rumo à maturidade.
(Ibid, 2006).
Erikson (apud BRASIL, 2006a) enfatiza que a adolescência é menos
conflituosa entre os jovens que se encontram em meio ao progresso tecnológico.
A perspectiva ideológica de progresso tecnológico estaria substituindo, em grande parte, o poder da tradição e estariam surgindo universos de exclusão para os jovens que se vêem sem perspectiva em uma sociedade com crescente racionalização e tecnificação. Assim “a crise da juventude é também a crise de uma geração e da solidez de uma sociedade” uma vez que “também existe uma complementaridade entre identidade e ideologia.” (BRASIL, 2006a, p. 42).
Portanto, para a solução deste conflito, “mais uma vez, dividem
responsabilidades a família, o Estado e a sociedade, encontrando aí um lugar
central a questão da convivência familiar e comunitária. (Ibid, 2006a, p. 42)
Zagury (2001) alerta aos pais que os mesmos devem aproveitar as
oportunidades reais de formação e educação dos filhos, com seriedade e firmeza,
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intervindo sempre que for necessário para o bem dos adolescentes, da sociedade e
das futuras relações que eles irão vivenciar, fazendo assim, com que cresçam
saudáveis emocionalmente.
Os pais devem colaborar com os filhos fazendo com que os mesmos tenham
direitos e deveres; estabelecendo tarefas para que os mesmos assumam
responsabilidades; estabelecendo regras democráticas e justas de convivência,;
fixando limites sempre que necessário;tornando-os co-participantes de decisões e
medidas e ouvindo suas opiniões nas questões familiares; incentivando-os a
colaborarem e participarem em causas sociais, e finalmente, torná-los na medida do
possível independentes financeiramente (ZAGURY, 2001).
Para os adolescentes conviver em um lar cujos pais vivem juntos em
harmonia é uma vantagem em termos de se evitar comportamentos arriscados. Por
outro lado, não significa que filhos de pais separados ou solteiros venham a se
tornar adolescentes problemáticos (PAPALIA, 2006).
Entretanto, as diferenças geralmente são menores e podem nem existir quando outros fatores, como condição socioeconômica e conflito parental, são mantidos constantes. De modo semelhante as descobertas de baixa auto-estima e de diferenças nas atitudes em relação aos papeis dos gêneros são pequenos, inconsistentes ou incompletos. Além disso, a maioria desses estudos são transversais, portanto, não mostram mudança na mesma pessoa antes e depois do divórcio (Ibid, 2006, p. 498).
Quando um adolescente é criado num ambiente familiar dilacerado, sem base
de valores, perde o referencial mais importante que iria norteá-lo à sua maturidade,
levando-o a entrar em conflito ao tentar criar uma identidade (SCARELLI, 2008).
Esse meio pode ser tanto seu convívio familiar com carências
materiais e afetivas, como também o meio no qual passa a viver na busca em suprir essas carências: a rua, tentando adquiri-los por praticas ilícitas.
Normalmente quando ele “chega” á rua nem sempre é de fato um adolescente autor de ato infracional, entretanto, ao se envolver com aqueles que já se encontram nessa situação de marginalidade, influenciados começam a cometer delitos. (Ibid, 2008 p.4)
O adolescente, procura, então, se aproximar de pessoas ligadas ao mesmo
ideal, formados, justamente pela identificação comum, grupos, geralmente da
mesma faixa etária, que se unem em busca de identidade, e é esta busca de
identidade nas ruas, que às vezes pode levá-lo a principiar uma vida de atos
infracionais (Ibid, 2008).
17
1.5. O adolescente e o grupo de pares
De acordo com Lemos (2006) a adolescência trata de um curto espaço de
tempo na vida do ser humano na qual ele deixa a dependência da infância para
alcançar as responsabilidades do individuo adulto, portanto, deve-se considerar
que cada indivíduo possui características próprias, reagindo de maneiras
diferentes a um mesmo estímulo. Sendo assim, os fatores culturais são
primordiais nos critérios que podem definir a adolescência.
Percebe-se então, que a formação de grupos na adolescência tem funções primordiais para o desenvolvimento de seus membros, uma vez que o social está presente tanto no inicio quanto no fim desta fase. (...) Sofrer rejeição ou não ser levado em consideração pode resultar em efeitos negativos no desenvolvimento da criança, ou até mesmo perdurar pela adolescência. Na fase da adolescência, o fator mais importante é a forma como são percebidos pelos pares. Diversos adolescentes submetem-se a diferentes situações para serem aceitos em um determinado grupo, pois não participar de um grupo significa viver fora do universo. Um relacionamento positivo com pares tende a favorecer um ajustamento social positivo, evidenciando o companheirismo, a estimulação, o apoio do ego, a comparação social e intimidade/afeição. (LEMOS, 2006)
O imediatismo da atualidade, sua dinâmica e o aumento considerável da
população parecem ter dado maior relevância aos grupos de pares de
adolescentes e jovens, visto que os mesmos podem representar um grupo social
menos repressivo do que a família tornando-se fonte de referência social. Nos
grupos os adolescentes não são cobrados em relação às suas perspectivas e
encontram entre seus pares uma enorme compreensão em relação aos seus
próprios sentimentos e visões de mundo, tendo ampla aceitação dos mesmos.
(OLIVEIRA, 2003).
Sobretudo quando o adolescente busca tornar-se independente dos pais,
os grupos de pares surgem como modelos de referência comportamental e
identificação dos adolescentes. (op. cit. 2006)
Porém, o caráter inconstante das ligações internas dentro de um grupo, ao
mesmo tempo que enriquece a sua dinâmica social, compromete o seu
envolvimentos em projetos de longa duração, visto que enfraquece os vínculos
dos seus membros(OLIVEIRA, 2003).
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Maffesoli (apud OLIVEIRA, 2003) define tribos urbanas como grupos semi-
estruturados, compostos em sua maioria por “pessoas que se aproximam pela
identificação comum a rituais e elementos da cultura que expressam valores e
estilos de vida, moda, música e lazer típicos de um espaço-tempo”. Uma tribo é
determinada por instintos sociais indolentes, pela lógica do prazer e na
valorização do aqui-agora. Contudo, ao mesmo tempo, seu caráter dinâmico e
inconstante confere ao grupo um potencial criativo, inovador, que não pode ser
desprezado. Sendo assim, na sua busca pela identidade e diante do rigor da
realidade social, os adolescentes parecem buscar a sua individualidade numa
imagem idealizada e ilusória do outro.
Similarmente, Lemos (2006) ressalta que os adolescentes buscam no
grupo “uma experiência que promova bem estar e emoções, satisfação de
pertença e companheirismo, esperam também recompensas materiais ou
psicológicas”. O adolescente ao se engajar em um grupo “está à procura do “eu”
nos outros, na expectativa de obter uma identidade para o seu próprio ego”
(ERIKSON Apud LEMOS, 2006).
Há uma constante troca de informações, onde os “grupos satisfazem as necessidades pessoais dos adolescentes, recompensam-nos, proporcionam informações, elevam a auto-estima e confere uma identidade” em resposta à questionamentos dos adolescentes referentes a questões vivenciais tais como, relacionamento, sexualidade, namoro e outros. O fato de pertencerem a um grupo concede-lhes uma referência de identidade, como por exemplo: os inteligentes, os descolados, os rebeldes ou bady boys, os atletas, as patricinhas (Ibid, 2006).
Segundo Papalia (2006) os pais geralmente preocupam-se que o filho
adolescente entre no grupo errado, visto que “os jovens que tomam drogas,
abandonam a escola, e cometem atos delinquentes geralmente fazem tudo isso
na companhia de amigos” (ibid, 2006, p.505). Todavia, este temor é errôneo, o
adolescente não entre no grupo errado, eles tendem a buscar amigos iguais a
eles, então se um jovem é rebelde e se comporta mal perante a sociedade, esta
rebeldia e mal-comportamento só aumentará quando se agrupam a outros
adolescentes de comportamentos semelhantes. ( ibid, 2006).
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1.6 O ato infracional
O alto índice de atos infracionais cometidos por adolescentes vem crescendo
assustadoramente em nosso país. Este fato nos remete a reflexão e análise sobre o
adolescente autor de ato infracional e, consequentemente da medida sócio-
educativa de Liberdade Assistida a que os mesmos estão sujeitos.
O adolescente também é vitima das negligências com relação aos seus
direitos. Inclusive, “são estigmatizados, tanto pela sociedade civil, quanto pela mídia
que se referem aos mesmos como infratores, delinquentes, pivetes, trombadinhas, e
pequenos predadores importando esta nova expressão dos EUA” (VOLPI, 2006 p.
7).
O adolescente que teve seus direitos cerceados e cujo ambiente em que vive
não seja favorável ao seu desenvolvimento, e que sofre, inclusive com “carências
materiais e afetivas, visto que falta de amor, carinho, respeito, atenção, são itens de
grande importância para a formação psicológica e moral de um individuo,
provavelmente se envolverá com a ato infracional tornando-se um infrator”
(SCARELLI, 2008 p. 3-4).
Tal fato não significa que esta realidade não pode ser transformada, pois “a
prática do ato infracional não é incorporado como inerente a sua identidade, mas
vista como uma circunstância de vida que pode ser modificada” (VOLPI, 2006 p. 7),
portanto, o adolescente não nasce infrator, ele se produz infrator e assim sendo, há
possibilidade de modificação dessa realidade.
No Brasil também são fontes de produção de adolescentes infratores as
condições adversas de vida precarizadas, a exclusão social e a marginalização da
pobreza. (AMORIM, 2008)
Além dos padrões identificatórios frágeis de referências e de limites que a sociedade tem oferecido aos adolescentes, a falta de perspectivas de futuro também funciona como um incremento da violência, basilar para os atos infracionais. Entretanto, ressalta-se que, mesmo quando o adolescente apresenta expectativa de futuro positiva, em geral, os adultos que o rodeiam não têm nenhuma esperança de que eles vão “dar para alguma coisa” (Ibid, 2008)
Quanto ao uso de drogas, Schenker (2005) enfatiza que prazer obtido
com o uso de drogas pelo adolescente tem o seu lado negativo, visto que o
adolescente corre o risco de se tornar dependente, comprometendo assim, a
20
realização de tarefas normais do desenvolvimento; o cumprimento dos papéis
sociais esperados; a aquisição de habilidades essenciais; a realização de um
sentido de adequação e competência e a preparação apropriada para a transição ao
do seu próximo estágio na trajetória da vida: o adulto jovem.
Uma preocupação básica (...) seria, pois, discutir com os adolescentes os riscos associados aos comportamentos nos quais se engajam, mas tendo o cuidado de não desconhecer o lado prazeroso desse engajamento. A necessidade de se olhar os dois lados, o do desejo e o do dano, no caso do uso de drogas, leva a considerar alguns aspectos citados a seguir.
(1) Um deles diz respeito aos efeitos cumulativos das substâncias tóxicas e sua relação com a vulnerabilidade do indivíduo. De um lado sabe-se que a probabilidade de desenvolvimento de determinado distúrbio aumenta em função do número, da duração e da “toxicidade” dos fatores de risco envolvidos. Por isso, quanto mais intenso o uso de drogas, mais fatores de risco há.
(2) Um segundo aspecto importante a ser considerado é o que se refere ao risco que constitui a atitude positiva da família com relação ao uso de drogas, reforçando a iniciação dos jovens. Hoje se sabe que as relações familiares constituem um dos fatores mais relevantes a ser considerado, mas de forma combinada com outros. (SCHENKER, 2005, p.709).
Portanto, segundo Schenker (2005) ainda que os pais sejam usuários de
drogas, e este seja associado a um fator de risco elevado para os filhos se tornarem
usuários, uma vez que os comportamentos dos pais servem de modelos para os
adolescentes, é a atitude permissiva destes pais o que mais pesa nessa equação.
21
2. A POLÍTICA DE ATENDIMENTO A CRIANÇA E AO ADOLESCENTE NO
BRASIL
Neste capítulo abordamos o histórico da política de atendimento a criança e
ao adolescente no Brasil, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) ressaltando
a Medida Sócio Educativa de liberdade Assistida.
2.1 O início da Política de Atendimento à Criança e ao Adolescente no Brasil
A política de atendimento à criança e ao adolescente no Brasil inicia suas
primeiras atuações no início da colonização Brasileira, tendo um caráter
discriminatório, em que se separavam as crianças índias dos pais, pois acreditavam
que os mesmos eram “considerados bárbaros na visão da cultura e religião
portuguesa”. (PEREIRA, 1998, p. 10)
A separação de crianças índias e negras de seus pais foi a
forma mais eficiente encontrada pelos catequizadores para isolar estas crianças da influencia dos costumes e tradições de seus antepassados e assim levá-las a assimilar mais facilmente a cultura e a religião dos portugueses (Ibid, 1998, p. 10).
Em 1551 surgiu no Brasil, a primeira casa de recolhimento de crianças, tais
eram chamadas de “desvalidas”. Este recolhimento era realizado pela Igreja Católica
num movimento, o qual foi se alastrando no Brasil, e em 1585 já existiam 03
colégios e 05 casas de recolhimento às crianças desvalidas, que apresentava por
objetivo a educação dos filhos dos índios e mestiços, de acordo com seus princípios,
e eram todas administradas pela Igreja Católica. (ibid, 1998)
Com a preocupação da sociedade civil e das autoridades competentes, no
século XVIII, foi criado a Roda dos Expostos, a qual era utilizada para sanar o
abandono de recém nascidos, em diversos locais, onde ficavam vulneráveis à tudo e
a todos, eram em sua totalidades crianças “fruto de relações consideradas ilícitas
pela sociedade, ou seja nascidas de relações sexuais fora do casamento”
22
(PEREIRA, 1998, p.11), e ainda mesmo que tenha surgido de um desconforto da
sociedade civil, o atendimento à essas crianças continuava sendo realizado pela
Igreja Católica, não tendo, portanto, o Estado nenhuma responsabilidades por essas
crianças (Ibid, 1998).
Uma modalidade de atendimento a bebês abandonados de
longa duração foi o sistema das Rodas de Expostos, surgido no período colonial por iniciativa da Santa Casa de Misericórdia e somente extinto na República. No século XVIII, Salvador, Rio de Janeiro e Recife instalaram as suas Casas de Expostos, que recebiam bebês deixados na Roda, mantendo no anonimato o autor ou a autora do abandono. Até o século XIX, outras dez Rodas de Expostos surgiram no país, tendo o sistema persistido até meados do século XX .
O sistema das Rodas de Expostos surgiu na Europa católica, em países como França e Portugal, e atendeu a milhares de crianças abandonadas (MARCILIO apud RIZZINI, 2004, p. 23).
Com o passar dos anos e com a evolução da sociedade observou-se que a
Roda dos Expostos era uma alternativa paliativa, pois não possuía uma eficácia,
pelo contrário, causava mortes de crianças e amputações de seus membros, devido
ao seu movimento; contudo teve um aumento considerável à partir de 1871, devido
a lei do ventre livre; e mesmo com toda problemática na qual a roda causava, a
mesma ainda foi utilizada no Rio de Janeiro até 1935 e em São Paulo até 1948. (op
cit., 1998).
De acordo com Rizzini (2004, p. 24) “a criação das Rodas de Expostos evitou
que bebês fossem abandonados nas ruas e nas portas das igrejas por mães que
buscavam ocultar a desonra de gerar um filho ilegítimo, ou que não tinham
condições de criá-los”. Até então todo atendimento feito à criança e ao adolescente
no Brasil, era realizado pela Igreja Católica, somente na segunda metade do século
XIX aconteceram iniciativas que partiram do Estado.
Durante todo o período colonial e na maior parte do período
imperial as iniciativas de atendimento a criança e adolescentes partiram da igreja católica. Somente a partir de 1855, quando foi criado a instituto para surdos, é que se inicia uma intervenção estatal na questão. Seguindo-se a esta iniciativa ocorre a criação da Escola de Aprendizes de marinheiro, em 1873, que era um asilo para os meninos desvalidos e da Escola XV de Novembro em 1903, ambas no Rio de Janeiro. Em São Paulo essa intervenção inicia-se em 1869 com o Instituto de Educação de Artífices e com o Instituto Disciplinar, em 1902, e em Minas Gerais com o Instituto João Pinheiro em 1909. (op. cit, 1998 p. 13)
23
Nas últimas décadas do século XIX e início do século XX, o Brasil, passou por
várias transformações, sendo elas políticas, sociais, econômicas. Devido a estas
transformações, sendo a mais significante ocorrida em 1888 com o decreto do fim
do regime escravocrata, o qual contribuiu para que houvesse um elevado número de
crianças abandonadas nas ruas, uma vez que esta abolição não veio acompanhada
de reforma agrária que possibilitasse terra aos ex-escravos. Estes ex-escravos
juntamente com a importação de trabalhadores imigrantes europeus, ocasionaram
uma enorme migração, rumo aos grandes centros urbanos. (PEREIRA, 1998).
São nestes centros urbanos que acontecem as maiores situações de
abandono e miséria de crianças e adolescentes, visto que a demanda da oferta de
empregos não crescia na mesma proporção que a população. Cidades, tais como
Rio de Janeiro e São Paulo eram as que mais se desenvolviam, porém como não
possuíam infraestrutura para acolher a população que vinha para os grandes
centros, nem ao menos serviços públicos para o atendimento à questão da saúde e
educação, proliferam-se assim os males sociais, entre eles grandes epidemias,
como: febre amarela, peste, cólera, varíola e outras. (Ibid, 1998)
Os menores viciosos e desvalidos, ou seja, crianças e adolescentes que
faziam parte dos problemas sociais mais crescentes nesta época, foram tratados
pelas autoridades com medidas higiênicas, que eram baseadas num movimento
trazido da Europa, denominado Movimento Higienista. Era sustentado por noções de
eugenia1 e degenerescência2, e constituiu numa preocupação médica para se
prevenir a delinquência juvenil, pois se acreditava na possibilidade da criança ter
herdado os males dos pais, o que justificou um projeto de intervenção na família
pobre. (Ibid, 1998)
Esta intervenção se deu através das Instituições filantrópicas criadas pelos
higienistas para este fim. Eram baseadas na racionalidade e não na religião,
obtiveram bons resultados e conseguiram que entidades ligadas à igreja utilizassem
métodos científicos de educação, saúde e higiene. (Ibid, 1998).
O Período republicano se concentrou em salvar a infância brasileira no século
XX, “subsidiados pelas resoluções dos congressos internacionais sobre assistência
1 Purificação de raça, para se evitar os caracteres psíquicos, físicos e culturais nocivos, presentes nas
“raças inferiores” (PEREIRA, 1998). 2 “desvios patológicos do tipo normal da humanidade, transmitidos hereditariamente, originando-se
por intoxicações diversas (alcoolismo, cocainismo, morfinismo, etc), por moléstias adquiridas ou congênitas ou por influências do meio social ou da hereditariedade” (PORTOCARRERO, apud PEREIRA, 1998, P. 16).
24
social, médico-higienista e jurídica à já consolidada categoria dos menores”. Este é
um período no qual o Estado se fez presente na idealização e prática das políticas
de atendimento ao menor. (RIZZINI, 2004)
A partir deste período tem-se no senso comum a diferenciação entre criança e
menor, “passando o termo menor de uma utilização técnico-juridica, utilizada para
definir a culpabilidade ou não, para um significado que classifica a infância
empobrecida” (PEREIRA, 1998, p. 19).
É criado, no Rio de Janeiro, o Juizado de Menores, devido à intensa a
cobrança para a elaboração de leis para a proteção e assistência à infância, que
funcionava como um órgão centralizador do atendimento oficial ao menor, cujas
funções englobavam vigilância, regulamentação, intervenção e internação de
menores abandonados e delinquentes (op cit, 2004).
O Juizado de Menores, então, consolida um modelo de classificação e
intervenção sobre o menor, herdado da ação policial, pois através das delegacias,
identificava, encaminhava, transferia e desligava das instituições estes menores.
Estruturou, ampliou e aprimorou este modelo através de construção e reformas de
estabelecimentos de internação (RIZZINI, 2004).
A seguir, com o intuito de retirar o ranço policial do assistencialismo, funda-se
neste período as escolas de reformas especiais para menores delinquentes, que são
Instituições que passaram a integrar as políticas de segurança e assistência dos
estados nacionais, porém, a demanda é enorme e o Juizado de Menores não
consegue internar todos os casos que chegam às suas mãos, saturando-se assim
este sistema em poucos anos (Ibid, 2004).
Em 1941, em plena ditadura Vargas torna-se questão de defesa nacional
intervir junto à infância. É criado o Serviço de Assistência a Menores (SAM) que está
longe de ser o órgão idealizado pelos juízes, pois surge sem qualquer autonomia
financeira e é independente do Juizado de Menores (Ibid, 2004).
2.2 O Serviço de Assistência a Menores (SAM)
O SAM foi criado em 1941, através das novas estratégias de intervenção do
estado Novo, que visava a integração das instituições já existentes, sejam públicas
25
e/ou privadas para a criação de um sistema nacional para os menores, diferente do
sistema que predominava até então, pois o mesmo utilizava-se de uma atuação
assistencialista/paternalista. (PEREIRA, 1998).
Similarmente, neste período fizeram parte da ação do setor público a
Institucionalização dos seguintes órgãos: Conselho Nacional de Serviço Social
(1938), Departamento Nacional da Criança (1940) e Legião Brasileira de Assistência
– LBA (1942).(Ibid, 1998)
O SAM não veio como mudança de melhorias na assistência às crianças e
adolescentes que necessitavam deste serviço, mas veio como uma inquietação do
governo com a Instituição de uma nova ordem social. O mesmo continuou a
reproduzir a internação das crianças e adolescentes como uma de suas principais
características, quebrando assim os vínculos familiares, restando apenas aos
menores os vínculos com o mesmo, e a consequente institucionalização dos
internos (Ibid, 1998).
Na década de 60, houve várias denúncias envolvendo o SAM, entre as quais
destacamos: desvio de verbas, falta de higiene, instalações inadequadas,
superlotação, exploração do trabalho dos internos destas instituições, gerando assim
insatisfação na sociedade que exigia mudanças no SAM, visto que o mesmo passou
a ser conhecido como fábrica de delinquentes, escola do crime, lugares
inadequados. Sendo assim, torna-se alvo de várias críticas de diversas classes,
como o parlamento, a imprensa e até mesmo o judiciário que clamavam por
mudanças urgentes.
(...) foi em relação aos chamados transviados que o SAM fez fama, acusado de fabricar criminosos. No imaginário popular, o SAM acaba por ser transformar em uma instituição para prisão de menores transviados e em uma escola do crime. A passagem pelo SAM tornava o rapaz temido e indelevelmente marcado. A imprensa teve papel relevante na construção desta imagem, pois ao mesmo tempo em que denunciava os abusos contra os internados, ressaltava o grau de periculosidade dos “bandidos” que passaram por suas instituições de reforma. Sob o regime democrático, o órgão federal frequentou as páginas de jornais e revistas anunciando os escândalos que ocorriam por detrás dos muros de seus internatos (RIZZINI, 2004).
Devido a essas insatisfações, em 1963, através do ministro João Mangabeira,
foi nomeado uma comissão para a reestruturação do SAM. Foi elaborado então, um
projeto que propunha a extinção do SAM, e a constituição de uma Fundação que
possuiria autonomia administrativa, sendo aprovada somente em 20 de novembro
26
de 1964, após o Golpe Militar. Com isso foi extinto o SAM, e foi criado a Fundação
Nacional do Bem-estar do Menor (FUNABEM) (PEREIRA, 1998).
2.3 A Fundação Nacional do Bem-estar do Menor (FUNABEM)
A Fundação Nacional de Bem Estar do Menor (FUNABEM) e seus órgãos
executores (Fundação Estadual de Bem Estar do Menor, etc.), foram criados em
1964 com o intuito de escapar da situação criada pelo SAM, substituindo-o. As
atuações desenvolvidas por estas instituições eram diretamente subordinadas À
esfera federal. Os seus ideais iniciais eram bastante audaciosos: pesquisar
métodos, testar soluções, estudar técnicas que acarretassem à elaboração científica
dos princípios que deveriam presidir toda a ação que visasse à reintegração do
menor à família e à comunidade. Sua meta era a abordagem preventiva e sócio-
terapêutica .
Em 1º de dezembro de 1964, através da Lei nº 4513, extingue-se o SAM e cria-se a FUNABEM – Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor. A FUNABEM herdou do SAM péssimas condições de higiene, instalações precárias, ensino deficiente, nenhuma orientação pedagógica, alimentação insuficiente e muitos castigos físicos. No SAM, as crianças desapareciam dentro de um verdadeiro presídio (com muros altos, metralhadoras e holofotes). Eram violentadas e permaneciam, como acontece até os dias de hoje, inadaptadas (LUPPI, apud GIAQUETO, 2006 p. 7).
Oliveira (1999) enfatiza que a FUNABEM possuía características tecnocratas
e ao mesmo tempo autoritárias. Foram estas características que, juntamente com
os interesses dos juizes de menores, fizeram com que fosse promulgada, em 1979,
o novo Código de Menores que cria o menor "em situação irregular", desde o
abandonado ao autor de infração penal.
A FUNABEM implementou no país um sistema de internatos para menores através de Fundações Estaduais (FEBEM/Fundação Estadual do Bem-Estar do Menor). A política de bem-estar do menor foi criada pelo regime militar; atrelada à ideologia de segurança nacional, e não transformou a realidade vivida no antigo SAM, pois os internatos continuavam a funcionar como se fossem prisões de meninos e meninas. (GIAQUETO, 2006, p. 7)
27
Do mesmo modo ocorrido com o SAM, a FUNABEM precisou ser extinta visto
que em suas unidades oficiais, que possuíam condições físicas insalubres e
inadequadas e em seu interior ocorriam maus-tratos sofridos pelos menores
internos, que iam desde a violência física, estupros, uso de psicotrópicos e toda
sorte de ações que visavam fazer o menor perder a sua individualidade e sua
capacidade de pensar (OLIVEIRA, 1999)
Em ano de 1990, que foi crucial para a elaboração e aprovação do ECA, a
FUNABEM foi extinta e foi criada a Fundação Centro Brasileiro da Infância e
Adolescência (FCBIA), com a missão de coordenar, normatizar e formular políticas
(assessorando e repassando verbas), já que a execução seria feita por estados e
municípios, seguindo a estratégia de descentralização prevista no ECA (FALEIROS
apud OLIVEIRA, 1999).
2.4 O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).
Durante a década de 70 e 80 houve grandes transformações no cenário
político, econômico, cultural e social no país. Devido a estas transformações, as
instituições públicas obtiveram grandes avanços. Foi um período conturbado, com
acontecimentos decisivos a favor da democracia e dos direitos dos cidadãos. Trata-
se da época de uma forte mobilização da classe trabalhadora, reivindicações,
explosões dos movimentos populares, greves e várias manifestações, como o
“Diretas já!” (PEREIRA, 1998).
O amplo processo de mobilização social, sem paralelos na história da assistência no Brasil, constitui terreno necessário para a conjugação de forças que se criou em torno da causa da criança em geral, e da reformulação da legislação em particular. Nos anos [19]80, vivemos a experiência de ver expressa a indignação popular, aliada à visibilidade de exercer pressão para mudança. Em relação à criança, foi, porém, revelada pela primeira vez, de forma tão explícita, a opção de diversos segmentos da sociedade. Não se tinha noção, nem conhecimento, de que eram tantas as instituições públicas e privadas destinadas à assistência à infância no país e tantos os indivíduos predispostos a compor um movimento de pressão. (RIZZINI apud GIAQUETO, 2006, p. 9).
28
Estas inquietações da sociedade brasileira também ocasionaram uma maior
preocupação com a situação das crianças e adolescentes no país, pois os mesmos
viviam nas ruas, perdendo os vínculos familiares e eram rotuladas como menores
abandonados ou meninos de rua (PEREIRA, 1998).
Várias instituições colocaram os direitos da criança e do adolescente em
evidência, como por exemplo, o Movimento Nacional dos Meninos e Meninas de
Rua, ONG‟s, principalmente a de Defesa dos Direitos Humanos, que apresentaram
propostas de emendas de defesa dos direitos da criança e adolescentes, resultando
nos art. 227 e 228 da Constituição Federal, de 05 de outubro de 1988(Ibid, 1998)
Neles estão estabelecidos como dever do Estado, da sociedade
e da família a garantia, a todas crianças e adolescentes, com prioridade absoluta, o direito à vida, à saúde, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade, à convivência familiar e comunitária, além de colocá-Ios à salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração. Violência, crueldade e opressão; e ainda a manutenção da inimputabilidade penal até os 18 anos incompletos. Além destes capítulos, os direitos infanto-juvenis também perpassam outros capítulos, como, por exemplo, a proibição do trabalho até os 14 anos, salvo na condição de aprendiz, assegurada no artigo 7º, do capítulo dos direitos sociais (Ibid, 1998, p. 33).
Com a regulamentação destes artigos, em 1990, é sancionado o Estatuto da
Criança e do Adolescente (ECA), que reconhece a criança e o adolescente como
cidadãos, criação de conselhos de direitos e fundos, visa à descentralização política
e como órgão zelador dos direitos, instituiu-se o Conselho Tutelar .
O ECA considera que são penalmente inimputáveis os menores de dezoito
anos que cometem ato infracional. Conforme o Art. 112 do ECA a estes
adolescentes não podem ser aplicadas penas, somente medidas sócio-educativas
de advertência, obrigação de reparar o dano, prestação de serviços à comunidade,
liberdade assistida, inserção em regime de semi-liberdade, internação em
estabelecimento educacional, além de outras medidas que objetivam ao
acompanhamento do adolescente ator de ato infracional na família, escola,
comunidade, serviços de saúde, etc (BRASIL, 1990).
29
2.5 Medida sócio-educativa da liberdade assistida: aplicação e eficácia
Segundo Volpi (2006, p. 14) “é responsabilidade do Estado, da sociedade e
da família garantir o desenvolvimento integral da criança e do adolescente. As
medidas sócio-educativas constituem-se em condição especial de acesso a todos os
direitos sociais, políticos e civis”.
Colpani (2003) expõe o pensamento de Mayor para o qual a Liberdade
Assistida é a medida que se mostra com as melhores condições de êxito, nos
seguintes termos:
Nesta ótica, não temos dúvida em afirmar que, do elenco das
medidas sócio-educativas, que se mostra com as melhores condições de êxito é a da liberdade-assistida, porquanto se desenvolve direcionada a interferir na realidade familiar e social do adolescente, tencionando resgatar, mediante apoio técnico, as suas potencialidades. O acompanhamento, como a inserção no sistema educacional e do mercado de trabalho, certamente importarão o estabelecimento de projeto de vida capaz de produzir ruptura com a prática de delitos, reforçados que restarão os vínculos entre o adolescente, seu grupo de convivência e a comunidade.(MAYOR apud COLPANI, 2003, p. 2)
De acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente a Liberdade Assistida
se insere na categoria das medidas em meio aberto, não privativas de liberdade,
executadas através de programas de entidades governamentais ou não-
governamentais de atendimento e visa atuar junto aos adolescentes que praticaram
conduta descrita como crime ou contravenção penal, ou seja, ato infracional.
O cumprimento em meio aberto da medida socioeducativa de liberdade assistida tem como objetivo estabelecer um processo de acompanhamento, auxílio e orientação ao adolescente. Sua intervenção e ação socioeducativa deve estar estruturada com ênfase na vida social do adolescente (família, escola, trabalho, profissionalização e comunidade) possibilitando, assim, o estabelecimento de relações positivas que é base de sustentação do processo de inclusão social a qual se objetiva. Desta forma o programa deve ser o catalisador da integração e inclusão social desse adolescente. (BRASIL, 2006b, p. 44).
Convém ressaltar que a Medida de Liberdade Assistida consiste em
acompanhar e orientar o adolescente, objetivando a integração familiar e
comunitária, através do apoio de assistentes sociais e técnicos especializados, e
está prevista nos arts. 118 (58) e 119 (59), do ECA. Em outras palavras :
30
Constitui-se numa medida coercitiva quando se verifica a necessidade de acompanhamento da vida social do adolescente (escola, trabalho e família). Sua intervenção educativa manifesta-se no acompanhamento personalizado, garantindo-se os aspectos de: proteção, inserção comunitária, cotidiano, manutenção de vínculos familiares, freqüência à escola, e inserção no mercado de trabalho e/ou cursos profissionalizantes e formativos (VOLPI, 2006, p. 24).
Por conseguinte, esta medida é imposta aos adolescentes quando
considerados autores de ato infracional, destinando-se à formação do tratamento
tutelar empreendido buscando reestruturar o adolescente a fim de que o mesmo
alcance a normalidade da integração social, através de métodos pedagógicos,
sociais, psicológicos e psiquiátricos, visando além de tudo a integração do
adolescente em sua família e comunidade.
2.5.1. Aplicação da Medida sócio-educativa da liberdade assistida no município de
Muriaé – MG.
O Projeto Caminho do Bem foi elaborado pela Secretaria Municipal de
Desenvolvimento Social no Município de Muriaé – MG para o acompanhamento do
adolescente ator de ato infracional que cumpre a medida sócio-educativa da
liberdade assistida e prestação de serviço à comunidade visando o fortalecimento da
garantia dos direitos fundamentais do adolescente ator de ato infracional e a suas
famílias a partir de um conceito amplo de ressocialização que compreende a medida
não apenas em sua natureza jurisdicional como também em sua natureza educativa
visando uma autêntica experiência de reconstrução de seu projeto de vida.
Este projeto foi iniciado no município de Muriaé – MG no ano de 2008, para
realizar ações com os adolescentes atores de ato infracional, foi a partir de iniciativa
do Estado de Minas Gerais, através da Secretaria Estadual de Desenvolvimento
Social – SEDS, sendo também financiadora do projeto, onde a Prefeitura Municipal
de Muriaé tem um co-financiamento.
Sendo assim, passa para a esfera municipal, a aplicação das medidas
sócioeducativas, retirando-as da esfera jurídica.
É papel do Assistente Social no Projeto Caminho do Bem:
31
- Substituir o coordenador (desde que solicitado para isso), em quaisquer de suas funções e atribuições.
- Responder pela área de atendimento direto ao adolescente e sua família.
- Fornecer retaguarda permanente, além de subsídios teóricos e técnicos (de acordo com sua especialidade), aos demais orientadores, instrumentalizando-os.
Coordenar as discussões técnicas: estudo de caso (elaboração de Plano de Atendimento Individual, encaminhamentos, encerramento de caso), elaborando relatórios e oferecendo suporte às situações do cotidiano que envolvem algum tipo de dilema quanto ao procedimento adequado. A natureza da discussão técnica deverá indicar a especialidade do técnico (psicólogo ou assistente social) que deverá coordenar cada reunião.
- Realizar atividades definidas pelo Projeto de Liberdade Assistida, a partir da divisão interna de atribuições:
Fazer plantões de atendimento e atendimentos agendados; Coordenar trabalhos de grupos de recepção de adolescentes, de
grupos de Recepção de familiares e/ou responsáveis, de grupos de orientação de mães/apoiadores e de grupos de orientação de adolescentes;
Realizar visitas domiciliares; Consultar processos no Fórum; Fazer contatos com profissionais da rede de serviços e
parcerias; Discutir o Plano de Atendimento Individual (PAI) com
adolescente no Encontro de Compromisso. - Acompanhar as rotinas do Projeto de LA e participar delas, de
acordo com a definição de responsabilidades, de acordo com a especialidade e/ou habilidades específicas.
- Fazer visitas domiciliares e/ou qualquer outra atividade, em situações excepcionais (dificuldades do caso, situações emergenciais internas ou externas). (MURIAÉ, 2008, p. 11)
Cumprindo estas atribuições o Assistente Social contribui na divisão interna
de atividades, beneficiando cada um dos técnicos, embora a especialidade não
se defina pela atividade. Por exemplo: a coordenação do grupo de orientação de
familiares poderá ser responsabilidade do psicólogo ou do assistente social e, no
curso do trabalho, outro profissional poderá ser chamado a contribuir com
subsídios de sua especialidade (Ibid, 2008)
32
3. MEDIDA SÓCIO-EDUCATIVA DA LIBERDADE ASSISTIDA: ATUAÇÃO DO
ASSISTENTE SOCIAL.
Neste capítulo abordamos a questão da atuação do Assistente Social frente à
Medida sócio-educativa da liberdade assistida descrevendo em primeiro lugar o
contexto da pesquisa, e em seguida transcrevemos a mesma com o objetivo de
analisarmos esta atuação e os resultados alcançados.
3.1. Breve contexto da pesquisa
Com o objetivo de analisarmos a atuação do Assistente Social no CREAS –
Muriaé – MG foi adotada a metodologia da pesquisa qualitativa sustentada por uma
abordagem descritiva, numa perspectiva compreensiva, que visou a apreensão
desta atuação junto aos adolescentes que cumprem a Medida sócio-educativa da
liberdade assistida no município de Muriaé – MG.
A técnica utilizada para a coleta de dados foi a entrevista semi-estruturada
com a Assistente Social deste órgão que possui 8 anos de formação acadêmica e
está há 1 ano e 5 meses atuando na execução da Medida sócio-educativa de
Liberdade Assistida.
3.2 Transcrição da Entrevista com o Assistente Social do CREAS – Muriaé - MG
Para podermos analisar como se dá o cumprimento da Medida sócioeducativa
de Liberdade Assistida no CREAS – Muriaé – MG fizemos vários questionamentos à
Assistente Social deste órgão.
Sendo assim, questionamos à Assistente Social quais eram as atividades que
são de sua competência no CREAS – Muriaé – MG, quais eram as atividades
33
oferecidas aos adolescentes para a sua reintegralização, e se efetuavam trabalho
junto à família do adolescente ator de ato infracional, obtendo a seguinte resposta:
Atendimento individual e em grupo com adolescentes em conflito com a lei e seus familiares; inclusão em cursos profissionalizantes, visitas domiciliares, encaminhamentos diversos conforme as especificidades de cada caso, como educação e saúde. O envolvimento da família é fundamental no comportamento do adolescente, é necessário que se co-responsabilizem neste processo do cumprimento da medida. (Assistente Social)
Pela resposta obtida podemos concluir que a Assistente Social cumpre as
atividades que são de sua competência junto aos adolescentes atores de atos
infracionais e sua família, garantindo-lhes os direitos devidos e fazendo-os cumprir
os seus deveres.
O Atendimento individual ao adolescente é realizado na primeira etapa da
recepção do adolescente junto ao CREAS. Primeiramente ele é ouvido com o
objetivo de se evidenciar para o adolescente que o mesmo é o foco do trabalho.
Logo após atende-se a família/responsável que é ouvida, visto que a própria medida
foi atribuída judicialmente por conta da existência da família (artigo 119, inciso I),
sendo considerada um importante aliado do adolescente e, portanto do trabalho
junto ao mesmo. É importante para o coordenador ouvir a sua versão dos
acontecimentos e tentar estabelecer, pelo menos como hipótese, como e quanto
será possível contar com essa família/responsável para uma aliança em prol do
adolescente. Finalmente, na conversa com ambos, o coordenador realizará a
interpretação da medida (MURIAÉ, 2008).
Este é um momento de acolhida permitindo que o jovem possa expressar dúvidas, sua história de vida; é o inicio do estabelecimento de uma relação de confiança e não apenas de orientação sobre a medida que deverá ser cumprida ( LA ou PSC ). O adolescente começa a conhecer o projeto ficando esclarecido sobre como e com quem poderá contar para cumprir suas obrigações. É o estabelecimento do contrato de direitos e deveres de ambas as partes: a retaguarda e a ajuda que o adolescente poderá contar e a sua contrapartida – o que se espera dele. (MURIAÉ, 2008, p.3)
Uma das funções do Assistente Social no CREAS, conforme consta no Plano
de Trabalho do Projeto Caminho do Bem é a de orientador da Medida sócio-
educativa de Liberdade Assistida, portanto, foi perguntado ao Assistente Social
como funciona a Liberdade Assistida, obtendo como resposta que “após o
encaminhamento do adolescente realizado pelo judiciário, já com a medida fixada,
34
são realizados atendimentos semanais com o adolescente, buscando que o
adolescente compreenda suas atitudes, se responsabilize pelo ato” (Assistente
Social).
Apreendemos através da resposta obtida que a execução da Medida Sócio
educativa de liberdade Assistida se encontra em acordo com o Sistema Nacional de
Atendimento Socioeducativo (SINASE), visto que consta que o cumprimento em
meio aberto desta medida possui o objetivo de estabelecer um processo de
acompanhamento, auxílio e orientação ao adolescente.
Sua intervenção e ação socioeducativa devem estar
estruturadas com ênfase na vida social do adolescente (família, escola, trabalho, profissionalização e comunidade) possibilitando, assim, o estabelecimento de relações positivas que é base de sustentação do processo de inclusão social a qual se objetiva. Desta forma o programa deve ser o catalisador da integração e inclusão social desse adolescente (BRASIL, 2006b, p.44).
Quanto ao questionamento sobre o cumprimento das da Medida sócio-educativa
de Liberdade Assistida e a relação com a justiça, a Assistente Social nos informou que
esta relação é “estreita. Após o encaminhamento do adolescente pelo Juiz da Vara da
Infância e Juventude, a equipe técnica remete relatórios periódicos sobre cada caso
acompanhado, também são realizados reuniões quando necessárias” (Assistente
Social).
Consta no Sinase (BRASIL, 2006b) em seu item 6.2.6 , que são fundamentais as
parcerias e alianças estratégicas para a composição da rede de atendimento social, que
por sua vez é imprescindível para a inclusão dos adolescentes no convívio social. Estas
alianças podem ser realizadas através de diversos órgãos públicos ou privados.
As entidades e/ou programas de atendimento socioeducativo devem buscar articulação com as organizações não governamentais e governamentais, as universidades, os conselhos de direitos, os conselhos tutelares, a mídia, os demais programas socioeducativos, os órgãos das diferentes políticas públicas e das esferas governamentais (federal, estadual, distrital e municipal), com os movimentos sociais, o sistema de justiça e com a iniciativa privada, visando o desenvolvimento de suas ações. (BRASIL, 2006b, p. 54)
Finalmente, foi questionado como a Assistente Social avalia a Liberdade
Assistida, o que é necessário para alcançar a efetividade do cumprimento desta
medida e quais os resultados já alcançados pela equipe técnica. Segundo ela,
É a Medida sócio-educativa mais eficaz das especificadas no ECA, pela possibilidade de um acompanhamento mais próximo no
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cotidiano do adolescente. Para que se alcance a efetividade, entre outras coisas, considero fundamental a redução do tempo entre o ato e a aplicação da medida para que diminua a “sensação” de impunidade existente no que se refere ao adolescente em conflito com a lei, visto que a lentidão do judiciário causa na maioria das vezes, reincidências dos adolescentes com o ato infracional.
Aqui no CREAS – Muriaé (MG), conseguimos, na maioria dos casos, o cumprimento integral da Medida sócio-educativa de Liberdade Assistida (Assistente Social).
Pode-se perceber que através de conscientização dos adolescentes que
cumprem a medida sócio-educativa de liberdade e sua família, a equipe técnica
obtém uma importante eficácia da medida.
O êxito nas atividades desenvolvidas nos programas está diretamente relacionado com a qualidade de seus processos de gestão. O impacto social de seus serviços será maior ou menor conforme a capacidade de planejar com eficiência, de definir sua missão com clareza, de formatar seus serviços atendendo adequadamente a necessidade de seus destinatários (os adolescentes). Planejar, definir, formatar, organizar, monitorar e avaliar em conjunto asseguram ações mais consistentes. Diante disso, a gestão participativa configura-se como a mais aproximada para responder com eficiência, eficácia e efetividade às demandas do atendimento socioeducativo. (BRASIL, 2006b)
Segundo Carranza (2004), o conceito de liberdade assistida não é totalmente
novo. No entanto, os arts. 118 e 119 do ECA põem evidência na palavra “assistida”,
entendendo os adolescentes já não como objetos de vigilância e controle – caso da
liberdade vigiada – e sim como sujeitos livres e em desenvolvimento, que requerem
apoio ou assistência no exercício de sua liberdade, para se desenvolverem à
plenitude.
Trata-se de uma medida judicial de cumprimento obrigatório para o adolescente que dela é sujeito. No entanto, pela natureza da medida, considera-se importante que esta se realize com o maior grau possível de voluntariedade e ativo protagonismo do adolescente, tendo como objetivo não só evitar que este seja novamente objeto de ação do sistema de Justiça Penal mas, também, apoiá-lo primordialmente na construção de um projeto de vida. Neste sentido, o papel do orientador responsável é da maior importância e suas ações de apoio e assistência devem ser discutidas e acordadas com o adolescente, respeitando seu direito de escolher seu próprio projeto. Assim se procura que a liberdade, bem exercida, com o valor em si mesma, atue como principal elemento socializante (Ibid, 2004, .
Em Muriaé no Programa Caminho do Bem, do CREAS – Muriaé (MG), o
Assistente Social acompanha o adolescente autor de ato infracional com a
expectativa de que este adolescente cumpra a medida. Portanto, o Assistente Social
36
deve procurar trabalhar com o adolescente a relação do sujeito, mostrando-o que
existem outros caminhos, outras escolhas e que essas são o ponto principal
(MURIAÉ, 2008, p.9).
37
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com a revisão de literatura acerca dos adolescentes, podemos apreender que
esta fase no desenvolvimento do indivíduo provoca transformações de ordem social,
psicológica e fisiológica que fazem com que o adolescente procure buscar a sua
identidade, definindo suas diferenças, para tanto, ele se agrupa com amigos que
possuem os mesmos ideais, tentando-se assim, libertar do controle dos pais.
Percebemos também que a convivência familiar também influencia, pois um
ambiente familiar dilacerado, sem base de valores pode levá-lo a entrar em conflito
na busca de sua identidade, e é esta busca nas ruas, que às vezes pode levá-lo a
principiar uma vida de permeada de ato infracional.
Para compreender a Medida sócio educativa de Liberdade Assistida fizemos
uma histórico da política de atendimento à criança e ao adolescente no Brasil com a
qual podemos analisar os avanços ocorridos na política de atendimento à criança e
adolescente no Brasil que culminou no ECA, que por sua vez os reconhece como
cidadãos de direito.
Com a pesquisa junto à Assistente Social do CREAS – Muriaé – MG
apreendemos que a atuação do Assistente social na aplicação e cumprimento da
medida sócio-educativa de Liberdade Assistida é realizada através do Projeto
Caminho do Bem, e em conjunto com uma rede de atendimento social.
Este Projeto foi criado com o intuito de acompanhar o adolescente ator de ato
infracional que cumpre a medida sócioeducativa da liberdade assistida e prestação
de serviço à comunidade visando o fortalecimento da garantia dos direitos
fundamentais do adolescente ator de ato infracional, porém na execução do mesmo
são encontradas dificuldades, tais como a lentidão da justiça no encaminhamento
destes adolescentes ao CREAS o que acarreta reincidências nos atos infracionais.
Porém, torna-se necessária uma atitude de abertura e conhecimento da
adolescência, para se evitar atitudes inadequadas, tais como, o endurecimento da
autoridade e o não reconhecimento de qualquer tipo de direito do adolescente. Pois,
isto, unido à conduta do próprio adolescente, provoca choques violentos, visto que,
os adolescentes, de modo geral, estão vulneráveis a situações que se não forem
bem assistidas pela família, pelas políticas públicas, e pela sociedade, também
podem ocasionar insegurança, levando-os a cometer ato infracional.
38
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ANEXO
ROTEIRO DE ENTREVISTA – ASSISTENTE SOCIAL
1) Identificação:
Nome:
Tempo de formação:
Tempo na execução da Liberdade Assistida:
Formação (Especialização):
2) Sobre a Medida Sócio educativa de Liberdade Assistida:
Quais as atividades que realiza?
Como funciona a Liberdade Assistida?
Qual a relação com a justiça?
Quais as atividades oferecidas aos adolescentes?
Existe trabalho junto à família?
Como avalia a Liberdade Assistida?
O que precisa para alcançar a efetividade?
Quais os resultados já alcançados?
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FAMINAS-FACULDADE DE MINAS
Curso de Serviço Social
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Você está sendo convidado(a) para participar, como voluntário, de uma pesquisa.
Após ser esclarecido(a) sobre as informações a seguir, no caso de aceitar fazer parte do estudo, assine ao final deste documento, que está em duas vias. Uma delas é sua e a outra é do pesquisador responsável. Em caso de recusa, você não será penalizado de forma alguma.
INFORMAÇÕES SOBRE A PESQUISA
Título do Projeto: “ANÁLISE DA MEDIDA SÓCIO-EDUCATIVA DE LIBERDADE ASSISTIDA NO MUNICÍPIO DE MURIAÉ-MG.”
Pesquisador Responsável: Stéfannie Goretti Lopes de Paula - 8º Período A Serviço Social
Orientadora: MS. Joseane Nadir da Mata Paiva Telefone para contato :
Busco, analisar criticamente, neste estudo, a problemática que envolve o alto índice de criminalidade e drogadição no município de Muriaé – MG, onde crianças e adolescentes estão vulneráveis a essas expressões da questão social, pois, são maioria das vítimas dessa violência, e muitas vezes atores de ato infracional, que os levam a cumprir medidas sócio-educativas, em especial a Medida Socioeducativa de Liberdade Assistida, levando-os a perceber que suas opiniões são importantes de serem ouvidas através do diálogo,, possibilitando-os a enfrentar o preconceito e a discriminação da sociedade civil a que os mesmos estão submetidos, e assim desenvolver um trabalho informativo e efetivo. Temos, com este estudo, os seguintes objetivos: Geral
Analisar a medida socioeducativa da Liberdade Assistida e atuação do Assistente Social frente aos adolescentes autores de ato infracional no município de Muriaé - MG.
Específicos
Resgatar a política de atendimento ao adolescente autor de ato infracional no Brasil.
Conhecer a realidade da medida sócio-educativa da liberdade assistida no município de Muriaé – MG.
Analisar o papel do Assistente Social junto aos adolescentes autores de ato infracional.
A participação nesta pesquisa é voluntária e o anonimato é garantido. A entrevista será analisada mediante a devolução dos Termos de Consentimento Livre e Esclarecido.
Os recursos utilizados para a realização da pesquisa serão próprios do pesquisador, não onerando a instituição e os participantes.
A realização da coleta de dados não traz riscos nem desconfortos a entrevistada, uma vez que os objetivos do estudo serão explicitados, as questões abordadas não são de cunho pejorativo e, tão pouco, busca-se com o estudo fazer julgamento de valores que possa, em algum momento, denegrir ou prejudicar a entrevistada.
Stéfannie Goretti Lopes de Paula 8º Período A de Serviço Social-Turma 2007-2010