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DESASTRES NATURAIS E GEOTECONOLOGIAS:
Conceitos Bsicos
Emerson Vieira Marcelino
INPE-15208-PUD/193
INPE/CRSSanta Maria
2008
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SUMRIO
Pg.
1. INTRODUO.................................................................... 05
2. O QUE SO DESASTRES NATURAIS?.................................... 10
2.1 Tipologia e Caractersticas dos Desastres Naturais.................. 13
3. DESASTRES NATURAIS NO MUNDO...................................... 15
4. DESASTRES NATURAIS NO BRASIL...................................... 16
5. DESASTRES NATURAIS E MUDANAS CLIMTICAS................. 19
6. PREVENO DE DESASTRES NATURAIS................................ 22
6.1 Relao entre Perigo, Risco e Desastre.................................. 22
6.1.1 Perigo e desastre............................................................... 22
6.1.2 Perigo e risco.................................................................... 24
6.2 Tipos de Medidas Preventivas.............................................. 26
6.3 Gesto de Risco................................................................. 26
6.3.1 Avaliao de risco............................................................. 30
6.3.2 Percepo de risco............................................................ 31
7. O USO DE GEOTECNOLOGIAS NA GESTO DE RISCO............. 32
8. REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS.......................................... 36
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PREFCIO
A Regio Sul do Brasil e os pases do MERCOSUL, bem como a Amrica do Sul tmsido severamente impactados por desastres naturais, principalmente a partir da
dcada de 70, que resultou em grandes prejuzos scio-econmicos, assim comonum elevado nmero de vtimas fatais. A maioria dos desastres est associada sinstabilidades severas que causam entre outros, inundaes, escorregamentos,vendavais, tornados e aos perodos de dficit hdrico, caracterizados pelasestiagens. Alm dos fatores scio-econmicos, acredita-se que este aumento noregistro do nmero de desastres naturais, tambm pode estar diretamentevinculado s alteraes do clima por decorrncia das mudanas globais.
As geotecnologias, representadas principalmente pelas imagens de satlite,softwares de geoprocessamento e dados de GPS, esto disponveis a todos osusurios e progridem rapidamente. Atualmente j possvel obteno de imagensde satlite de vrias resolues espaciais, espectrais e temporais, e de softwares
para geoprocessamento, que, em alguns casos, podem ser encontradosgratuitamente na internet. A popularizao tambm do uso do GPS, utilizadoprincipalmente nos trabalhos de campos em eventos de desastres, juntamente comas imagens e os softwares constitui-se no importante tringulo de ferramentas dasgeotecnologias, que auxiliam de forma decisiva na identificao, monitoramento emapeamento de desastres naturais e eventos extremos, em todas as partes domundo.
Estes fatores mencionados acima, aumento do nmero de desastres e a facilidadede acesso e uso das geotecnologias, o que move as atividades do Ncleo dePesquisa e Aplicao de Geotecnologias em Desastres Naturais e Eventos Extremos(GEODESASTRES-SUL), do Centro Regional Sul de Pesquisas Espaciais (CRS), doInstituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), localizado em Santa Maria, noestado do Rio Grande do Sul.
A maioria dos rgos e instituies envolvidos com desastres naturais temobservado que o dano causado por estes fenmenos poderia ser prevenido,reduzido ou minimizado, se a populao em geral, os tomadores de deciso, osformadores de polticas e os formadores de opinio tivessem a correta noo doque so estes eventos. At mesmo em termos conceituais, a populao e ostomadores de deciso confundem furaco com tornado, alagamento com enchente,etc. Esta falta de informao e a falta da correta definio de cada um dosfenmenos em muitos casos atrapalha a ao das autoridades, dos rgos dedefesa civil e levam a populao a subdimensionar seus efeitos.
Muitos tomadores de deciso, planejadores e administradores tambmdesconhecem a potencialidade das geotecnologias para a gesto, preveno emitigao de desastres naturais e eventos extremos.
Neste contexto o GEODESASTRES-SUL, numa iniciativa pioneira, criou o ProjetoCadernos Didticos - Desastres Naturais e Geotecnologias, cujo objetivo elaborar material didtico sobre desastres naturais e geotecnologias visandoinformar e capacitar os tomadores de deciso e o pblico em geral acerca dascausas, conseqncias e medidas preventivas que devem ser adotadas em relaoaos principais tipos de desastres que ocorrem nesta regio da Amrica do Sul.
Tania Maria SausenCoordenadora GEODESATRES-SUL
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DESASTRES NATURAIS E GEOTECNOLOGIAS
CONCEITOS BSICOS
I. INTRODUO
Os desastres naturais esto diretamente vinculados histria do homem e
ao seu modo de apropriao e uso dos recursos naturais. Desde a formao
dos primeiros agrupamentos humanos at a concepo das cidades
modernas, os desastres tm gerado duros impactos na sociedade.
Logo que o homem comea a se estabelecer, em virtude do processo de
sedentarizao, d-se incio a formao das aldeias. Essa alterao
comportamental resultou numa maior produo de alimentos, que refletiu
diretamente no crescimento da populao. Com o passar dos sculos, o
adensamento populacional e o comrcio se intensificam dando origem s
primeiras cidades (BRUMES, 2001).
neste momento histrico que os grandes desastres comeam a aparecer.
O homem, outrora nmade, passa a se fixar e construir suas habitaes em
terras produtivas e abundantes de vveres. Na identificao desses locais
tambm era levado em considerao a possibilidade de transporte,
comunicao e comrcio com outros stios antropognicos. Assim, as
primeiras cidades foram consolidadas, geralmente, sobre as
plancies dos grandes rios, no litoral e nas encostas vulcnicas.
Como exemplo, na Figura 1 apresenta-se uma antiga pintura da cidade
primitiva de atalhyk (7.000 a.C.), que foi construda prxima ao vulco
Hasan Dag, situado na regio central da Turquia. Os solos prximos aos
vulces so ricos em minerais, essenciais para agricultura, que foramdepositados pelas cinzas vulcnicas e derrames de lava. Desta forma,
mesmo diante do perigo, a produtividade das terras fez com que os
moradores dessa cidade absorvessem o risco de um desastre iminente.
Mesmo nos dias atuais, as terras prximas ao vulco continuam sendo
amplamente utilizadas para fins agrcolas.
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Figura 1 Irrigao no plat prximo ao vulco Hasan Dag, Turquia, e, na imagemmenor, a cidade primitiva de atalhyk, construda por volta de 7.000a.C. nas proximidades do vulco.Fonte: www.wikipedia.org / www.catalhoyuk.com
As cidades localizadas nas margens dos rios Tigre e Eufrates, na
Mesopotmia, assim como do rio Nilo, no Egito, tiveram que desenvolver
tcnicas que lhes proporcionassem meios de controlar as cheias na estao
chuvosa, e a irrigao das terras cultivveis na estao seca (BRUMES,
2001). Esses agrupamentos, com as experincias passadas de gerao em
gerao, aprenderam a conviver com os desastres apesar do risco. Pode-se
at considerar como uma forma primitiva de risco aceitvel.
Com o passar dos sculos, principalmente a partir da Idade Mdia, novas
reas foram povoadas e as cidades se solidificaram, formando densos
aglomerados urbanos. Consequentemente, os danos provocados pelos
desastres passam a atingir propores catastrficas. Na China, em 1332,
uma devastadora inundao vitimou 7 milhes de pessoas por afogamento
e outras 10 milhes pereceram, subseqentemente, por fome e doenas
(BRYANT, 1997). Algumas dcadas depois (Figura 2), uma inundao na
Alemanha, em 1362, matou cerca de 100.000 pessoas. Na Jamaica, em1692, um terremoto destruiu a cidade de Porto Royal, matando milhares de
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pessoas. Em 1755, ocorreu o famoso terremoto de Lisboa, Portugal, que
atingiu 8,6 graus na escala Richter, vitimando mais de 30.000 pessoas, por
decorrncia dos tremores de terra, do tsunami e dos incndios que
devastaram a cidade. Na erupo do vulco Tambora na Indonsia em1815, aproximadamente 56.000 pessoas tambm vieram a falecer (MUNICH
RE GROUP, 1999). Por fim, ainda bem presente na memria coletiva, a
catstrofe ocasionada pelo tsunami ocorrido no dia 26 de dezembro de
2004 (Figura 3), que atingiu severamente diversos pases asiticos, com
destaque para a Indonsia, a ndia e o Sri Lanka. Esse tsunami deixou mais
de 170.000 mortos, 50.000 desaparecidos, 1.723.000 desalojados e
500.000 desabrigados (KOHL et al., 2005).
Figura 2 Exemplos de grandes desastres naturais ocorridos no mundo.Fonte: Munich Re Group (1999).
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Figura 3 Destruio provocada pelo tsunami de 2004 em Sumatra, Indonsia.Fonte: www.wikipedia.org
Entretanto, nas ltimas dcadas, as pesquisas tm demonstrado que
houve um aumento considervel no s na freqncia dos desastres
naturais, mas tambm na intensidade, o que resultou em srios danos
e prejuzos scio-econmicos. De acordo com alguns cientistas, este cenrio
pode estar vinculado ao aquecimento global, como uma das conseqncias
diretas das mudanas climticas (MUNICH RE GROUP, 1999; MARCELINO et
al., 2006; IPCC, 2007).
Apesar das controvrsias, fato que diversas reas do globo j esto sendo
seriamente impactadas pelos desastres naturais, principalmente aqueles
desencadeados por fenmenos atmosfricos extremos, causados em sua
maioria pelas tempestades severas (Figura 4).
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Figura 4 Tempestade severa ocorrida em fev. de 2002, prximo a Joinville (SC).Fonte: Prefeitura Municipal de Joinville, 2002.
O ltimo relatrio do Intergovernmental Panel on Climate Change (IPCC),
lanado em fevereiro de 2007, aponta um aumento das precipitaes nas
regies Sul e Sudeste do Brasil. A tendncia que essas precipitaes
fiquem a cada ano mais intensas, concentradas e mal distribudas. E este
um comportamento tpico de chuvas geradas por instabilidades severas.
As precipitaes intensas podem desencadear srios desastres naturais,
como as inundaes e os escorregamentos. Alm disso, das instabilidades
severas tambm so originados fenmenos altamente destrutivos, como os
vendavais, tornados e granizos.
Esses fenmenos so praticamente impossveis de serem erradicados.
Pode-se at mesmo afirmar que, por mais que a sociedade se
desenvolva, os desastres naturais sempre iro ocorrer. Os fenmenos
naturais extremos fazem parte da geodinmica terrestre e so
imprescindveis para a existncia humana, sendo diretamente responsveis
pela formao do relevo, manuteno de ecossistemas, abastecimento das
fontes hdricas, entre outros.
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Os esforos humanos devem ser direcionados para a elaborao e
adoo de medidas preventivas e mitigadoras que possam amenizar o
impacto causado pelos desastres naturais.
Neste contexto, nos prximos captulos, sero abordados alguns temas
sobre desastres, com o objetivo de fornecer uma base conceitual slida,
sem esgotar os assuntos, que permita que o leitor avance na leitura dos
demais cadernos didticos sobre Desastres Naturais e Geotecnologias.
2. O QUE SO DESASTRES NATURAIS?
Os desastres naturais podem ser conceituados, de forma simplificada, como
o resultado do impacto de um fenmeno natural extremo ou intenso sobre
um sistema social, causando srios danos e prejuzos que excede a
capacidade dos afetados em conviver com o impacto (TOBIN e MONTZ,
1997; UNDP, 2004).
Os desastres, como um todo, so distinguidos principalmente em funo de
sua origem, isto , da natureza do fenmeno que o desencadeou. De acordo
com as normativas da Poltica Nacional de Defesa
Civil, existem trs tipos de desastres: naturais,
humanos e mistos (CASTRO, 1998). Nessa
abordagem, a diferena est basicamente no nvel
de interveno humana. Entretanto, se
considerarmos somente este critrio, a grande
maioria dos desastres conhecidos como naturais,
seriam de fato desastres mistos.
Na verdade, o foco de anlise no deveria estar no processo e sim no
fenmeno desencadeador, ou seja, aquele que dispara (gatilho) o
processo. Por mais que um corte na encosta para a construo de uma
casa aumente o risco de escorregamento, ele s ocorrer quando disparado
por fortes chuvas. Caso for desencadeado por depsitos de lixo, aterros em
encostas e, principalmente, vazamentos dgua e/ou esgoto, este desastre
deveria ser classificado como humano. Foi a ao direta do homem que
resultou no disparo, apesar da susceptibilidade intrnseca da encosta.
Quando umfenmenogeofsico causasrios danos e
prejuzos aessoas e bens de
uma comunidade,configura-seassim, num
cenrio tpico dedesastre natural.
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Nessa mesma situao esto as inundaes, assim como os demais tipos de
desastres naturais. No caso das inundaes, se for desencadeada pela
chuva, pelo avano do mar ou a juno dessas (como as inundaes
costeiras), trata-se de um desastre natural, independente davulnerabilidade da rea afetada. Quem produziu as chuvas? O homem ou
uma instabilidade atmosfrica? J no caso do rompimento de uma barragem
(Figura 5), a inundao produzida tem como causa direta a m qualidade da
estrutura, resultando num tpico caso de desastre humano. Na fase de
projetos e simulao esta possibilidade deveria ter sido levada em
considerao. O que resultaria num dimensionamento estrutural capaz de
suportar at mesmo as intempries locais, como os abalos ssmicos.
Figura 5 Inundao provocada pelo rompimento de mineradora em Minas Gerais,que inundou as cidades de Muria e Mirai em janeiro de 2007.Fonte: O Globo Online, 2008.
No caso dos desastres mistos, difcil encontrar casos que poderiam
verdadeiramente se enquadrar nesta classificao. A desertificao e a
chuva cida so exemplos citados por Park (1991) e Castro (2002). Mas,
usando como exemplo o semi-rido nordestino, por mais que o
desmatamento e as prticas agrcolas no conservacionistas tenham
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agravado o problema da falta dgua, as condies semi-ridas tm como
gnese a dinmica climtica regional que foi moldada a milhares de anos.
Talvez um exemplo mais apropriado de desastre misto seja o processo de
arenizao que est ocorrendo na regio sudoeste do Rio Grande do Sul. Ascausas esto associadas principalmente ao tipo de solo, ao regime de chuva
e a atividades agropastoris.
At mesmo no caso da chuva cida, apesar de conceitualmente apropriado,
fica extremamente difcil enquadr-lo no conceito de desastre, ou seja, de
que forma este fenmeno ir causar impactos to substanciais que
ultrapassar a capacidade de convvio de uma comunidade? Como mensurar
os danos e prejuzos?
Tornar-se-ia mais prtico e menos conflituoso optar por classificar os
desastres, quanto origem, em naturais e humanos, tendo como
referencial o fenmeno que desencadeia o processo. Os naturais seriam
aqueles disparados por um fenmeno natural de grande intensidade e os
humanos pelas aes ou omisses de carter antrpico. Assim,
simplificando, temos:
Classificao dos desastres quanto origem
Naturais: so aqueles disparados pela interveno direta de umfenmeno natural de grande intensidade. Exemplo: fortes chuvas
inundao e escorregamentos, fortes ventos vendaval, tornado e
furaco, etc.
Humanos: so aqueles disparados pelas aes ou omisseshumanas. Exemplo: acidentes de trnsito, incndios industriais,
contaminao de rios, rompimento de barragens.
As intervenes antrpicas, quando mal planejadas, podero
intensificar e/ou agravar um desastre natural. Mas esses so fatores
que indicam o estado da vulnerabilidade local e no podem ser confundidos
com a gnese de um desastre.
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2.1 Tipologia e Caractersticas dos Desastres Naturais
Na literatura especializada, so apresentadas diversas propostas de
classificao de desastres naturais. Neste trabalho, sero utilizadas duas
propostas bsicas apresentadas por Tobin e Montz (1997). Os autores
comentam que enquanto uma visa detectar as semelhanas entre os
fenmenos, categorizando-os, a outra visa diferenci-los dentro de uma
mesma categoria. E essas so informaes imprescindveis numa gesto de
risco, o que leva a poupar tempo, dinheiro e vidas. A primeira, quanto a
tipologia, tem como premissa o evento geofsico que desencadeou o
desastre natural (Tabela 1). Estes eventos fazem parte da geodinmica
externa (meteorolgicos e hidrolgicos) e interna (geolgicos) da Terra.
Tabela 1 Classificao dos desastres naturais quanto tipologia.
Categoria Tipos de desastres
Furaes, ciclones e tufes
Vendaval
Granizos
TornadosNevascas
Geadas
Ondas de frio
Meteorolgicos
Ondas de calor
Inundaes
Seca/estiagemHidrolgicos
Incndio Florestal
Terremotos
Vulcanismo
Tsunami
Escorregamentos
Geolgicos
SubsidnciasFonte: adaptada de Tobin e Montz (1997).
A segunda classificao objetiva diferenciar os desastres em relao as suas
caractersticas comportamentais. Tendo como referncia os fenmenos que
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ocorrem na Regio Sul do Brasil, pode-se notar na Figura 6, que as
inundaes apresentam caractersticas bem distintas das estiagens, assim
como o tornado do Furaco. Com respeito freqncia, as inundaes
ocorrem praticamente em todos os meses do ano, enquanto que asestiagens esto vinculadas determinada estao ou perodo do ano. A
durao e a extenso das estiagens so bem maiores do que as inundaes,
em compensao a formao e a dissipao bem mais lenta. Alm disso,
enquanto as estiagens cobrem grandes reas de forma difusa, as
inundaes esto limitadas s terras planas que margeiam os rios.
Figura 6 Classificao dos desastres naturais quanto s caractersticas.Fonte: adaptada de Tobin e Montz (1997).
J os tornados e furaes se assemelham em relao freqncia e aocomportamento, ou seja, alm de relativamente raros, tambm so
aleatrios, o que dificulta na previsibilidade. Mas em termos de extenso, os
danos dos tornados so extremamente concentrados e intensos, restritos a
largura e comprimento do rastro, que no medem mais de centenas de
metros e dezenas de quilmetros, respectivamente. No caso dos furaces,
seu raio de destruio, apesar de menor intensidade, atinge centenas de
quilmetros e bem mais difuso do que os tornados. E, quanto velocidade,os tornados deslocam-se mais rpido do que os furaces.
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3. DESASTRES NATURAIS NO MUNDO
Os desastres naturais podem ocorrer em qualquer continente ou pas, visto
que os fenmenos naturais que o desencadeiam, como as tempestades, os
terremotos e os vulces existem em diversas partes do globo. Entretanto,
algumas regies so mais afetadas em funo da magnitude e
freqncia dos fenmenos e da vulnerabilidade do sistema social.
Utilizando os dados de desastres do banco global Emergency Events
Database (EM-DAT), perodo 1900-2006, o continente que apresentou o
maior nmero de registros foi o asitico (Figura 7), com 3.699 registros,
seguido pelo americano, com 2.416 registros (EM-DAT, 2007). Destaca-se
tambm que, em todo o mundo, os tipos de desastres que mais ocorreram
foram as inundaes (35%) e as tempestades (31%), que a soma dos
eventos associados a furaces, tornados e vendavais. Portanto,
aproximadamente 66% dos desastres naturais ocorridos no mundo esto
vinculados s instabilidades atmosfricas severas.
Figura 7 Distribuio por continente dos desastres naturais ocorridos no globo(1900-2006). Legenda: IN Inundao, ES Escorregamento, TE Tempestade, SE Seca, TX Temperatura Extrema, IF IncndioFlorestal, VU Vulcanismo, TR Terremoto e RE Ressaca.
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Alm disso, convm citar que a grande maioria dos desastres (mais de
70%) ocorreu em pases em desenvolvimento. Estes dados refletem as
prprias condies scio-econmicas desses pases, como o adensamento
populacional em reas de risco, a falta de planejamento urbano, os baixosinvestimentos na sade e educao, entre outros fatores, que aumentam
consideravelmente a vulnerabilidade das comunidades expostas aos perigos
naturais (ALEXANDER, 1997; ALCNTARA-AYALA, 2002).
E so estes fatores que tem contribudo para elevar o nmero de vtimas
fatais nos pases em desenvolvimento. Tanto que, do total de mortes por
decorrncia dos desastres naturais, mais de 95% ocorreram nos pases
considerados mais pobres (ALEXANDER, 1995; DEGG, 1992; TOBIN eMONTZ, 1997).
4. DESASTRES NATURAIS NO BRASIL
Conforme dados do EM-DAT (2007), ocorreram 150 registros de desastres
no perodo 1900-2006. Do total ocorrido, 84% foram computados a partir
dos anos 70, demonstrando um aumento considervel de desastres nas
ltimas dcadas. Como conseqncia, foram contabilizados 8.183 vtimasfatais e um prejuzo de aproximadamente 10 bilhes de dlares.
Os tipos de desastres mais freqentes foram as inundaes (Figura 8),
representadas pelas graduais e bruscas, com 59% dos registros, seguidas
pelos escorregamentos (14%). A maioria dos desastres no Brasil (mais
de 80%) est associada s instabilidades atmosfricas severas, que
so responsveis pelo desencadeamento de inundaes, vendavais,
tornados, granizos e escorregamentos. Com exceo das inundaesgraduais, esses fenmenos so sbitos e violentos, responsveis por grande
mortandade e destruio. Em virtude da velocidade, no h tempo para as
pessoas procurarem abrigos ou salvarem parte dos bens existentes em suas
casas.
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Figura 8 Tipos de desastres naturais ocorridos no Brasil (1900-2006).Legenda: IN Inundao, ES Escorregamento, TE Tempestades, SE Seca, TX Temperatura Extrema, IF Incndio Florestal e TR Terremoto.
Com relao distribuio espacial, mais de 60% dos casos ocorreram nas
regies Sudeste e Sul (Figura 9). No Brasil, essa distribuio est mais
associada s caractersticas geoambientais do que as scio-econmicas.
Uma vez que, as reas de favela, os bolses de pobreza e a falta de
planejamento urbano esto presentes na maioria das cidades
brasileiras. Nessas regies,as instabilidades atmosfricas so freqentes
devido passagem de frentes frias no inverno, da ocorrncia de complexos
convectivos de mesoescala na primavera e da formao dos sistemas
convectivos no vero, que desencadeiam as chuvas intensas e concentradas
para essa estao (MONTEIRO e FURTADO, 1995; SANTANNA NETO, 1995;
SILVA DIAS, 1996; MARCELINO, 2003; NASCIMENTO, 2005).
Ressalta-se que so computados no banco EM-DAT, somente os desastres
considerados de grande severidade, que resulta em dezenas de mortos e
centenas de desabrigados, levando geralmente os estados e pases a
buscarem auxlio externo (MARCELINO et al., 2006; EM-DAT, 2007). Assim,
o nmero de desastres ocorridos no Brasil bem mais elevado do
que os contabilizados no banco EM-DAT.
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Figura 9 Distribuio dos desastres naturais no Brasil (1900-2006).Legenda: N Norte, CO Centro Oeste, NE Nordeste,SE Sudeste, S Sul.
Utilizando dados da Defesa Civil, Marcelino et al. (2006) contabilizaram, no
perodo 1980-2003, 3.373 desastres naturais no Estado de Santa Catarina.
No Paran, de 1980 a 2006, j foram registrados 2.553 desastres (PARAN,
2007). Em ambos os estados, 85% dos desastres tambm foram causados
pelas instabilidades atmosfricas severas. importante frisar que os
desastres documentados na Defesa Civil so aqueles em que foram
decretados Situao de Emergncia (SE) e Estado de Calamidade Pblica
(ECP) pelos municpios afetados. A Defesa Civil considera estes desastres
como sendo nvel III e IV. Portanto, se forem contabilizados todos os nveis
de desastre a situao torna-se ainda mais problemtica.
Comparados aos desastres registrados pelo EM-DAT, os desastres nvel III eIV so considerados como desastres de pequeno porte (small disaster). No
entanto, em virtude de sua elevada freqncia, a somatria dos danos e
prejuzos pode ser to intensa quanto os de grande porte. Por exemplo, o
Furaco Catarina causou R$ 212 milhes de prejuzo, 2 mortes e 2,5 mil
desabrigados somente em Santa Catarina. Enquanto que, as inundaes
bruscas, no perodo 2000-2003, deixaram um prejuzo de R$176 milhes,
13 mortes e aproximadamente 6,5 mil desabrigados (MARCELINO et al,2004; 2005).
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5. DESASTRES NATURAIS E MUDANAS CLIMTICAS
Nas ltimas dcadas, tem ocorrido um aumento considervel na freqncia
anual de desastres naturais em todo o globo. Conforme dados do EM-DAT
(2007), a mdia de desastres ocorridos na dcada de 70 foi de 90 eventos
por ano, saltando para mais de 260 eventos na dcada de 90 (Figura 10).
Estes nmeros refletem diretamente a elevao na freqncia e intensidade
dos desastres causados pelas tempestades severas, como mostrado pela
linha azul na Figura 10.
Figura 10 Freqncia anual de desastres naturais para todo o globo (1900-2006).
Dentre os principais fatores responsveis pelo aumento dos desastres
naturais em todo o mundo cita-se: o crescimento populacional, a
segregao scio-espacial (aumento das favelas e bolses de pobreza), a
acumulao de capital em reas de risco (ocupao da zona costeira), o
avano das telecomunicaes (registro e disseminao de informaes) e as
mudanas climticas globais (MARCELINO et al., 2006).
A comunidade cientfica tem dado grande nfase s mudanas climticas,
como resultado do aquecimento global, principalmente a partir da
publicao do 4o Relatrio do IPCC (IPCC, 2007). Esse relatrio menciona
que no Brasil os desastres naturais de origem atmosfrica tendem a
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continuar aumentando, com destaque para as tempestades e os eventos de
precipitaes intensas sobre as regies Sul e Sudeste do Brasil e o
agravamento da seca no nordeste e avano sobre as regies norte e centro-
oeste (Figura 11).
Figura 11 Mudanas nos ndices de precipitao (em porcentagem) para o perodo2090-2099, baseado no cenrio SRES A1B. As siglas DJF e JJAcorrespondem aos meses de vero (Dezembro, Janeiro e Fevereiro) einverno (Junho, Julho e Agosto), respectivamente.Fonte: adaptada de IPCC (2007).
Na Figura 11, em azul esto representadas as reas onde os ndices de
precipitao estaro acima da mdia (at 20%) no final do sculo XXI. Em
amarelo as reas que estaro com deficincia de precipitao. Enquanto
que, em branco so as reas que estaro com ndices na mdia ou prximo
da mdia.
Nota-se que a tendncia que aumentem ainda mais os desastres
causados pelas tempestades no sul e sudeste do Brasil,nos meses de
vero (DJF), e as secas no norte, nordeste e centro-oeste nos meses de
inverno (JJA), como j demonstram os dados coletados at ento.
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O aumento da precipitao nas regies Sul e Sudeste no aponta
necessariamente para uma boa distribuio anual das chuvas. Pelo
contrrio, a tendncia que as precipitaes ficaro ainda mais
intensas e concentradas, ou seja, chuvas muito fortes e em poucosdias, como j vendo sendo observado (LIEBMANN et al., 2004;
BOULANGER et al., 2005; GROISMAN et al, 2005; MARENGO, 2006).
Em Campinas (SP), o nmero de dias de fortes chuvas (>50 mm/h) tem
aumentado consideravelmente, passando de aproximadamente 12 dias nas
dcadas de 60 e 70, para mais de 25 dias na dcada de 80 e 90 (VICENTE e
NUNES, 2004). Um padro similar tambm foi encontrado para a regio
metropolitana de Curitiba (PR). Nessa regio os ndices de precipitaodemonstram uma mudana comportamental a partir da dcada de 70, com
uma elevao significativa no nmero de dias com precipitaes acima de
40 mm/h (SILVA e GUETTER, 2003). Em Santa Catarina, tambm foi
observado um aumento considervel de inundaes bruscas (enxurradas) a
partir da dcada de 90, quando os registros ultrapassaram a mdia de 23
casos/ano para o perodo 1980-2003 (MARCELINO et al., 2004).
As inundaes bruscas (enxurradas) ocorremassociadas a elevados ndices de precipitao
(> 25 mm/h), e so altamente perigosas e
destrutivas (DOSWELL et al., 1996; MARCELINO
et al, 2004). Em virtude do aumento das
precipitaes intensas, somado aos
desmatamentos de encostas, a ocupao das plancies de inundao, ao
assoreamento dos rios e a impermeabilizao urbana (asfaltamento de
ruas, construes, etc.), as inundaes bruscas em reas urbanizadas se
tornaro um dos principais problemas ambientais que a regio Sul e
Sudeste do Brasil tero que enfrentar para as prximas dcadas.
Por isso, em carter de urgncia, necessrio estabelecer medidas
preventivas que minimizem as conseqncias deste fenmeno, visando
sempre diminuio do nmero de pessoas afetadas e vitimadas.
Nas prximasdcadas, a
inundao bruscaser o tipo dedesastre mais
freqente e danosonas regies Sul e
Sudeste do Brasil.
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6. PREVENO DE DESASTRES NATURAIS
6.1. Relao entre Perigo, Risco e Desastre
Atualmente, tanto nas publicaes especializadas quanto na mdia em geral,
h muita confuso terminolgica em relao preveno de desastres
naturais. Assim, visando padronizar termos e conceitos, buscou-se uma
conceitualizao simplificada que, ao mesmo tempo, obedece-se aos
padres internacionais e fossem tecnicamente aceitas pela comunidade
cientfica. Dentre as propostas analisadas, foi adotada a base conceitual
publicada pela Organizao das Naes Unidas (ONU), atravs dos
programas United Nations Development Programme (UNDP) e International
Strategy for Disaster Reduction (ISDR), intituladas: Living with Risk. Aglobal review of disaster reduction initiatives (ISDR, 2004) e Reducing
Disaster Risk: a Challenge for Development(UNDP, 2004).
6.1.1 Perigo e desastre
necessrio, inicialmente, tirar algumas dvidas sobre o uso dos termos
ameaa e perigo como sinnimos e/ou como traduo do termo ingls
hazard. Na lngua inglesa, ameaa traduzida como threat, que significa
expresso da inteno humana de punir ou prejudicar algum,
especialmente quando este no obedecer. J hazard traduzido como
alguma coisa que pode causar dano (OXFORD, 1990). Esta diferena
tambm pode ser observada na lngua portuguesa. Segundo Dicionrio
Aurlio (FERREIRA, 1979), o termo ameaa (do latim minacia) significa
palavra ou gesto intimidativo, promessa de castigo ou malefcio, ou seja,
um mal gerado de pessoa para pessoa. De forma contrria, o perigo (dolatimpericulu) uma circunstncia que prenuncia um mal para algum ou
alguma coisa.
Nesta anlise, verifica-se que a expresso perigo, alm de no ser
sinnimo de ameaa, a melhor traduo para o termo hazard. Alm
disso, o significado de perigo encaixa-se perfeitamente no conceito proposto
pela ONU, como sendo um fenmeno fsico ou um processo natural
potencialmente prejudicial, que pode causar srios danos scio-econmicosas comunidades expostas (ISDR, 2004; UNDP, 2004).
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Com respeito s relaes existentes entre perigo e desastre, Tobin e Montz
(1997) definem perigo como uma situao potencialmente prejudicial,
enquanto que, desastre a materializao do perigo (Figura 12).
Figura 12 Relao entre perigo e desastre.Fonte: adaptada de Tobin e Montz (1997).
Essa relao pode ser melhor assimilada atravs do esquema proposto na
Figura 13. Na natureza ocorrem diversos tipos de fenmenos que fazem
parte da prpria dinmica natural da Terra. Mas, se ocorrerem ou se
deslocarem sobre um sistema social, tem-se uma
situao potencial de danos a pessoas e bens
(perigo). Caso o impacto produza danos e
prejuzos extensivos e/ou de difcil superao
pelas comunidades afetadas ser ento
considerado como um desastre. Se as
conseqncias forem mnimas ou nulas ser considerado somente como um
evento natural. Para exemplificar, uma tempestade severa (evento natural)
produz fortes chuvas e ventos. Quando se desloca em direo a uma reaurbana, densamente ocupada, torna-se um perigo, principalmente para as
O desastre natural,
representado pelochoque de um
evento extremosobre uma rea
habitada, amaterializao do
perigo.
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reas consideradas de alto risco. Atingindo estas reas, casas so alagadas
e destrudas, pessoas morrem e outras tantas so obrigadas a procurar
locais seguros, como os abrigos temporrios. Dependendo da magnitude ou
intensidade, os danos podem acarretar num desequilbrio dos serviosessenciais vinculados ao fornecimento de gua, luz, comunicao e
transporte, caracterizando num cenrio tpico de desastre. Entretanto, na
continuao da trajetria, quando atinge reas no-ocupadas (campos e
matas), a tempestade volta a ser considerada como um evento natural.
Figura 13 Relao entre evento e desastres de origem natural.
6.1.2 Perigo e risco
O perigo muitas vezes associado erroneamente com o risco. Risco a
probabilidade de ocorrer conseqncias danosas ou perdas esperadas
(mortos, feridos, edificaes destrudas e danificadas, etc.), como resultado
de interaes entre um perigo natural e as condies de vulnerabilidade
local (UNDP, 2004). De forma simplificada, risco a probabilidade
(mensurvel) de um perigo transformar-se num desastre.
No entanto, a gravidade dos desastres tambm pode estar vinculada aos
elementos sociais expostos, ou seja, a fragilidade do ambiente socialmente
construdo (vulnerabilidade). Analisando a Figura 14, podese observar que
aumentando a freqncia do perigo e a intensidade da vulnerabilidade,
aumentar consequentemente o risco de um perigo transformar-se num
desastre.
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Figura 14 Relao entre perigo e risco.Fonte: adaptada de Tobin e Montz (1997).
Como ilustrao, duas pessoas esto fazendo uma viagem martima do
Brasil para a frica. S que uma viaja de navio e outra num pequeno barco
a vela. As grandes ondas so perigosas para ambas as embarcaes, mas o
risco de afundar muito maior para os que esto no barco. Neste exemplo,
a fragilidade das embarcaes (vulnerabilidade) que est influenciando na
intensidade do risco. Num outro cenrio, dois pequenos barcos esto
navegando: um numa enseada e outro longe da costa. A vulnerabilidade amesma, mas o risco de afundar completamente diferente. Aquela que
navega na enseada, protegida dos fortes ventos, dificilmente enfrentar as
grandes ondas. Mas, aquela distante da costa ter uma probabilidade muito
elevada de enfrentar ondas que podem afundar a embarcao. Podemos
concluir que o risco extremamente cambiante e apresenta uma
dinmica prpria, que varia em funo dos elementos naturais e sociais
envolvidos no processo. Alm disso, o risco no pode ser eliminado, mas
pode ser gerenciado a tal ponto que se torne aceitvel.
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6.2 Tipos de Medidas Preventivas
A reduo do impacto dos desastres naturais d-se atravs da adoo de
medidas preventivas que podem ser classificadas em estruturais e no
estruturais. As medidas estruturais so aquelas de cunho corretivo, como as
obras de engenharia. Apesar de minimizar o problema em curto prazo, as
medidas estruturais so caras, paliativas, freqentemente ocasionam outros
impactos ambientais e geram uma falsa sensao de segurana. Por
exemplo, o grande desastre desencadeado pelo Furaco Katrina em New
Orleans, USA, foi causado pelo rompimento dos diques que haviam sido
construdos para resistirem furaces at categoria 3. A inundao
provocada pelo Katrina, classificado como categoria 5, acarretou numprejuzo de 80 bilhes de dlares e matou mais de 1.800 pessoas (KNABB
et al., 2005).
As medidas no-estruturais, de carter educativo e de planejamento,
apesar dos resultados a mdio e longo prazo, so de baixo custo, de fcil
aplicao e permitem uma correta percepo do risco. Como
exemplo, destacam-se os mapeamentos, as anlises de vulnerabilidade, os
zoneamentos das reas de risco e a educao ambiental (NCEM, 1998;ANDJELKOVIC, 2001; ISDR, 2004).
No entanto, para ambos os casos, necessrio conhecer as causas e
conseqncias de um desastre, para ento definir as medidas preventivas
que sero adotadas. E uma das maneiras mais simples dividir o problema
em partes, para depois compor o todo. Esse processo de anlise
conhecido como gesto de risco.
6.3 Gesto de Risco
A gesto de risco um processo de gerenciamento de decises que
envolvem a definio de necessidades, o reconhecimento das opes
aceitveis e a escolha de estratgias apropriadas (TOBIN e MONTZ, 1997).
um processo social complexo que envolve aes de planejamento,
interveno e organizao, que devem ser avaliadas e conduzidas de forma
contnua e consistente em cada fase do desastre (LAVELL, 2003).
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Toda ocorrncia de desastres envolve basicamente trs fases distintas:
Antes, Durante e Depois (TOBIN e MONTZ, 1997):
Fases de um desastre
Antes: corresponde ao momento que antecede o desastre, sendoconstitudo pelas etapas de Preveno e Preparao,cujas aes
visam diminuir o risco e preparar a sociedade para o impacto.
Durante: corresponde ao desastre propriamente dito, sendorepresentado basicamente pelas aes de Resposta, como
assistncia as vtimas e reabilitao do cenrio a curto prazo;
Depois: correspondem as aes de Reconstruo de mdio elongo prazo, visando o restabelecimento da normalidade.
De forma mais detalhada (Figura 15), o Antes a fase que antecede a
chegada dos fenmenos extremos, conhecida como etapas de Preveno e
Preparao para o impacto. a fase mais importante, onde so adotadas
medidas para reduzir o impacto dos desastres, como as anlises de risco, a
execuo de projetos de engenharia (diques, pontes, muros de conteno,
etc.), a elaborao de polticas pblicas (plano diretor, zoneamentos
ambientais, legislao, etc.), a educao ambiental em escolas e
comunidades afetadas, etc. Nos momentos mais crticos que precedem o
impacto, destacam-se os sistemas de previso (meteorolgica e hidrolgica)
e de alerta. Quanto maior for o investimento nesta fase, menor ser a
probabilidade de danos, podendo at mesmo acarretar na diminuio dafreqncia e intensidade dos desastres (PARK, 1991; TOBIN e MONTZ,
1997; SMITH, 2000; MIN, 2007).
O Durante envolve a realizao de aes emergenciais de Resposta que
visam o salvamento (socorro e assistncia s vtimas), o auxlio (evacuao,
abrigo, alimentao, atendimento mdico, etc.) e a reabilitao do cenrio
do desastre, que corresponde ao incio das atividades de restaurao (curto
prazo), como limpeza, segurana, entre outros (PARK, 1991; TOBIN eMONTZ, 1997; SMITH, 2000; MIN, 2007).
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.
Figura 15 Ciclo de gerenciamento de um desastre.Fonte: Tobin e Montz (1997).
Enquanto que, o Depois representado pelas atividades de Reconstruo
necessrias para o restabelecimento das funes bsicas de uma
comunidade (bem-estar da populao) a mdio e longo prazo. Neste
momento, feito o restabelecimento dos servios essenciais (gua, luz,comunicao e transporte), a avaliao dos danos e, nas reas mais
afetadas, a reconstruo das estruturas danificadas ou destrudas (casas,
pontes, estradas, etc.). O objetivo na fase de Reconstruo, ampliado pela
fase de Preveno, retornar a normalidade, entendida como sinnimo de
funcionalidade, e no de retorno s condies que precederam o desastre.
Assim, almeja-se que a rea afetada retorne as suas funes scio-
econmicas primordiais, mas de forma compatvel com a realidadeambiental que a cerca, o que resultaria numa elevao da qualidade de vida
local. Dessa forma, a vulnerabilidade e o risco de desastres tenderiam a
diminuir de forma natural (PARK, 1991; TOBIN e MONTZ, 1997; SMITH,
2000; MIN, 2007).
No Brasil, os maiores investimentos tm sido realizado na fase de Resposta,
principalmente na capacitao e estruturao das defesas civis e corpos de
bombeiros. No entanto, poucas defesas civis tem realmente investido na
etapa de Preveno. No desmerecendo o trabalho j realizado, uma das
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principais causas est na falta de um corpo tcnico
civil, de carter permanente, com formao
superior adequada (geocincias, engenharias e
reas biomdicas) para a elaborao e gesto delongo prazo. Dessa forma,ser possvel atingir um
dos objetivos propostos pela Poltica Nacional de Defesa Civil, que ...
promover a defesa permanente contra desastres naturais ou provocados
pelo homem(MIN, 2007, p.5). Para tanto, necessrio considerar alguns
pressupostos indispensveis numa gesto de risco, como:
Pressupostos indispensveis na gesto de risco
Conhecer os fenmenos desencadeantes visando a reduo daintensidade e/ou freqncia (quando possvel);
Buscar reduzir a exposio e fragilidade scio-econmica dasreas potencialmente vulnerveis;
Valer-se de tcnicas e mtodos coerentes e eficazes queprezem pelo equilbrio na relao custo/benefcio;
Aumentar a capacidade adaptativa e de convvio dascomunidades frente aos desastres;
Zelar pela difuso e distribuio de dados e informaesvisando socializao do conhecimento;
Permear na sociedade uma cultura de desastres positivaeno vitimalista e sensacionalista;
Alcanar e conscientizar a esfera poltica em todas as fases doprocesso.
A caminhada longa, mas com boa vontade, investimento e
responsabilidade pode-se alcanar grandes resultados, mesmo a curto
prazo. Pensar em desastres, no quantificar razes e motivos, mas
sim defender e preservar a vida, principalmente dos menos afortunados
ou privados de oportunidades.
A etapa depreveno deveria
representar 75%de tempo e
investimentos, emum ciclo timo degesto de risco.
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6.3.1 Avaliao de risco
A identificao e avaliao de risco um dos principais passos que vai
nortear as demais etapas do processo de gesto. A avaliao de risco,
conforme Figura 16, envolve basicamente o inventrio dos perigos naturais
(P), o estudo da vulnerabilidade (V) e o mapeamento das reas de risco (R)
(PEARSON et al., 1991; SMITH, 2000; BALAJI et al., 2005).
Figura 16 Parmetros que envolvem uma anlise de risco.
Todos esses parmetros podem ser cruzados facilmente em ambiente SIG
(Sistema de Informao Geogrfica) para obteno do mapa de risco final.
Cada parmetro formado por um conjunto de dados de fontes diversas
(mapas, medies em campo, imagens de satlites, questionrios, etc.),
que permitem identificar as caractersticas do ambiente e o contexto scio-
econmico em que podem ocorrer os desastres.
Devido a grande complexidade de variveis e tipos de dados, assim como a
forma de mensurao, as avaliaes de risco geralmente envolvem muita
incerteza. De forma simplificada, os principais dados requeridos numa
avaliao de risco so (BALAJI et al., 2005):
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Dados usados numa avaliao de risco
Dados sobre o perigo: tipo, data, local de ocorrncia, freqncia,magnitude, etc;
Dados sobre o ambiente: geologia, geomorfologia, hidrologia,climatologia, uso da terra, etc;
Dados sobre a exposio local: infra-estrutura urbana,edificaes, populao, dados scio-econmicos, agropecurios, etc.
Alm disso, a incerteza pode aumentar com a combinao ou complexidadedo risco, principalmente quando envolve mltiplos perigos. Sempre que
possvel, deve-se utilizar dados quantitativos, de fontes oficiais ou
confiveis, longas sries histricas e mtodos de anlise que envolvam
modelos matemticos e fsicos. A inteno que essa avaliao torne-se
passvel de repetio e comparao, refletindo de forma mais transparente
a realidade local e no a percepo do especialista responsvel pela anlise.
Mas, isso no garante que um zoneamento de reas de risco venha a se
concretizar. Investirem reduo risco, acima de tudo investir em
desenvolvimento. Quando um municpio aplica recursos na educao,
sade, segurana, habitao, planejamento e meio-ambiente, mesmo que
de forma indireta, tambm estar investindo em preveno de desastres.
essa somatria de esforos que resultar numa boa gesto de risco.
6.3.2 Percepo de risco
Estudos tm demonstrado que as reaes das pessoas que vivem em reas
de risco podem ser super ou subdimensionada em virtude da idade, sexo,
ocupao, educao, renda, experincias passadas, entre outros. So esses
pressupostos presentes na histria do individuo que condicionaro sua
habilidade de entender e prever o risco em eventos futuros, e aceitar as
diretrizes estabelecidas numa gesto de risco.
Para se ter uma idia, os principais motivos associados permanncia dos
moradores nas reas de risco so (PARK, 2001):
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Motivos de permanncia em reas de risco
Incertezas associadas a ocorrncia do fenmeno: masquando e onde?;
Mudana do cenrio de risco: mas isso nunca aconteceu!; Roleta russa: vale a pena arriscar, o raio nunca cai duas vezes
no mesmo lugar;
Falta de alternativa de moradia, trabalho e segurana: notenho pra onde ir, meu trabalho to longe, gosto daqui,
seguro;
Custo versus benefcios: essa terra to boa pra plantar,daqui de cima da pra ver toda a cidade, quando falta gua, a
gente pega do rio.
Informar, conscientizar e discutir com a populao to importante quanto
investir num zoneamento de reas de risco. Muitos projetos acabam
fracassando devido a falta de transferncia de informao e discusso entre
prefeituras e comunidades. Alm disso, esse processo tem que ser realizado
numa linguagem acessvel a todos. Essa uma das etapas fundamentais
numa gesto de risco, caso contrrio, remar, remar, e morrer na praia.
7. O USO DE GEOTECNOLOGIAS NA GESTO DE RISCO
Uma das principais ferramentas para a gesto de risco so as
geotecnologias, representadas especialmente pelo Sistema de Informao
Geogrfica (SIG), o Sensoriamento Remoto (imagens de satlite) e oSistema de Posicionamento Global (GPS). As geotecnologias possibilitam a
coleta, armazenamento e anlise de grande quantidade de dados, que
devido a complexidade dos desastres naturais, seriam praticamente
inviveis de serem tratados utilizando mtodos analgicos e/ou tradicionais.
Com estas ferramentas produzem-se informaes em pouco tempo e com
baixo custo, combinando dados espaciais multi-fontes, a fim de analisar as
interaes existentes entre as variveis, elaborar modelos preventivos e darsuporte as tomadas de decises (BONHAM-CARTER, 1996).
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Com relao ao uso das geotecnologias na Preveno, como j
mencionado no item 6.3.1, concentra-se basicamente nas avaliaes de
risco. Os dados geoambientais, que podem ser obtidos com o auxlio das
imagens de satlite e GPS, so transformados em planos de informaes noSIG. Dependendo do software utilizado, so escolhidos modelos
matemticos que so aplicados no cruzamento das informaes, para
obteno dos planos resultantes, como os mapas de perigo, vulnerabilidade
e risco (ver Figura 16).
Na Preparao, momentos antes do impacto, as geotecnologias so
utilizadas na definio de rotas de evacuao, identificao de abrigos e
centros de operaes de emergncia, criao e gerenciamento de sistemasde alerta e elaborao de modelos meteorolgicos e hidrolgicos utilizados
na previso. Nesta fase, as imagens de satlites geralmente so usadas
para fornecer as informaes de base para a caracterizao das reas
afetadas, como tambm realizar o monitoramento dos desastres (Figura
17).
Figura 17 Imagens do sensor TM LANDSAT-5 dos escorregamentos ocorridos emdezembro de 1995 na Serra Geral (SC).
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Nas aes de Resposta, com um SIG possvel gerenciar de maneira
eficiente e rpida, as situaes mais problemticas, como as aes de
combate a sinistros (conter efeitos adversos) e de socorro s populaes
afetadas (busca e salvamento). No SIG, um banco de dados associados aum mapa da rea urbana, poder fornecer informaes completas sobre
abrigos, hospitais, polcia, bombeiro, entre outros. J o GPS
extremamente til nas operaes de busca e salvamento em reas que
foram devastadas. Essas reas ficam muitas vezes descaracterizadas
dificultando a orientao e a localizao de ruas e edificaes.
Na Reconstruo, as geotecnologias tambm so amplamente usadas na
realizao do inventrio, avaliao dos danos e na identificao de reasseguras para a relocao e reconstruo das comunidades afetadas (Figura
18). Informaes estas que posteriormente so inseridas em um banco de
dados para serem utilizadas novamente na fase de Preveno e Preparao.
Figura 18 Danos causados pelo Furaco Catarina no dia 28/03/2004 na regiosul catarinense. Fonte: Marcelino et al. (2005).
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Ressalta-se que os exemplos citados no limitam o uso das geotecnologias.
Pelo contrrio, novas aplicaes, mtodos e ferramentas surgem a cada dia.
A flexibilidade a uma das grandes vantagens das geotecnologias. Tudo
pode ser adaptado em funo dos projetos de preveno, do fenmeno aser analisado, da escala de trabalho e do oramento disponvel.
No Brasil as possibilidades de uso das geotecnologias so ainda
mais promissoras, visto que j existem iniciativas de sucesso nesta rea
(Figura 19). O governo brasileiro, por meio do Instituto Nacional de
Pesquisas Espaciais (INPE), disponibiliza a qualquer instituio ou
profissional os softwares SPRING e TerraView (http://www.dpi.inpe.br),
alm das imagens do satlite CBERS (http://www.cbers.inpe.br).Basicamente, o SPRING um SIG com funes de processamento digital de
imagens, mapeamento, anlise espacial, modelagem numrica de terreno e
consulta a banco de dados espaciais. O TerraView, apesar de no ser to
robusto quanto o SPRING, apresenta uma interface moderna e amigvel,
permitindo a fcil manipulao de dados vetoriais (pontos, linhas e
polgonos) e matriciais (grades e imagens). J o satlite CBERS (Satlite
Sino-Brasileiro de Recursos Terrestres) possui uma srie de sensores que o
tornam altamente capacitado para as aplicaes na rea de mapeamento e
monitoramento ambiental. So trs poderosas geotecnologias,
disponveis gratuitamente, que podem ser utilizadas na preveno e
mitigao de desastres naturais. Aproveite!
Figura 19 Geotecnologias desenvolvidas pelo INPE.
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