CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DO CEARÁ
FACULDADE CEARENSE
CURSO DE SERVIÇO SOCIAL
CLAUDIO HENRIQUE DE LIMA CARNEIRO
AS ORGANIZAÇÕES JUVENIS NO BAIRRO PLANALTO DO PICI E SUAS
INTERVENÇÕES NO COMBATE À LETALIDADE JUVENIL
FORTALEZA
2013
CLAUDIO HENRIQUE DE LIMA CARNEIRO
AS ORGANIZAÇÕES JUVENIS NO BAIRRO PLANALTO DO PICI E SUAS
INTERVENÇÕES NO COMBATE À LETALIDADE JUVENIL
Monografia apresentada ao curso de
graduação em Serviço Social da Faculdade
Cearense – FAC, como requisito para
obtenção do titulo de bacharelado.
Orientadora: Ms. Roberta de Castro Cunha
FORTALEZA
2013
Bibliotecário Marksuel Mariz de Lima CRB-3/1274
C289o Carneiro, Claudio Henrique de Lima
As organizações juvenis no bairro Planalto do Pici e suas
intervenções no combate à letalidade juvenil / Claudio Henrique
de Lima Carneiro. Fortaleza – 2013.
68f. Orientador:Ms. Roberta de Castro Cunha.
Trabalho de Conclusão de curso (graduação) – Faculdade
Cearense, Curso de Serviço Social, 2013.
1. Juventude. 2. Violência. 3. Movimentos sociais. I. Cunha,
Roberta de Castro. II. Título
CDU 328-053.6
CLAUDIO HENRIQUE DE LIMA CARNEIRO
AS ORGANIZAÇÕES JUVENIS NO BAIRRO PLANALTO DO PICI E SUAS
INTERVENÇÕES NO COMBATE À LETALIDADE JUVENIL
Monografia apresentada como pré-requisito à obtenção do título de Bacharelado em Serviço Social, outorgado pela Faculdade Cearense – FAC, tendo sido aprovada pela banca examinadora abaixo relacionada. Data de aprovação: ____/____/_______
BANCA EXAMINADORA
____________________________________________ Ms. Roberta de Castro Cunha
Orientadora
____________________________________________ Profª. Ms. Kelma Luzia Nunes Otaviano
Faculdade Cearense – FAC
____________________________________________ Profª. Esp. Maria das Graças Rodrigues Mendes
Faculdade Terra Nordeste – FATENE
À minha tia avó, Maria Fontenele da Silva (in memorian), que me motivou a perseverar nos momentos difíceis vivenciados na graduação superior. Que no céu contempla minha produção acadêmica, primeira vitória de muitas.
AGRADECIMENTOS
A Deus – “eu creio naquele que me fortalece” - que me motiva a enfrentar os
momentos difíceis.
Aos meus pais, Maria José de Lima Carneiro e Francisco da Silva Carneiro, que
contribuíram na minha educação dando-me força e apoio em todos os momentos.
Aos meus irmãos, Marcelo, Marília e Márcia, elos de afeto e amizade.
Aos meus avós, Francisco, Raimunda, Pedro e Rosa, que sempre contribuíram para
a minha formação humana, repassando valores, que hoje influenciam a pessoa que
sou.
Aos meus tios e tias, que me direcionaram aos caminhos corretos.
À Roberta de Castro Cunha, pelas valorosas orientações, paciência e motivação
neste processo de elaboração da monografia. Amiga que sempre colaborou nas
minhas conquistas pessoais e profissionais.
À professora Kelma Luzia Nunes Otaviano, por ter aceitado o convite de participar
da banca examinadora deste estudo, com suas considerações e análises. Por ter
contribuído com a comunidade do Pici e, consequentemente, com minha trajetória.
À Maria das Graças Rodrigues Mendes, por ter aceitado o convite de participar da
banca examinadora deste estudo e por ter me motivado em minha trajetória
profissional e me incentivado a enfrentar o desafio de um curso superior.
À Ana Maria Cardoso, pelo exemplo de profissionalismo e motivação na escolha da
profissão de assistente social.
Aos representantes e jovens que integram o JUJA, o ESCUTA e o CCJ-Fortaleza,
sujeitos essenciais no processo de construção e efetivação do estudo investigativo.
Aos professores e colegas da Faculdade Cearense – FAC, aqui representados por
Jaqueline Moura, Greice Kelly, Tamires Bandeira, Raquel Aparecida, Eliane Almada,
Ana Paula Oliveira, Maria Noronha, Francisca Andréia Ribeiro, Marisa Albuquerque,
Isalenny Gonçalves e Evilene Negreiros, pessoas que comigo vivenciaram todo o
processo de formação em Serviço Social.
Aos meus amigos de trabalho dos diversos espaços em que atuei – escolas
municipais de Acaraú, farmácias Pague Menos, Coordenação das Raízes de
Cidadania/Fundação da Criança e da Família Cidadã (FUNCI), Programa Crescer
com Arte e Cidadania/Secretaria de Direitos Humanos de Fortaleza (SDH) e
Programa Cidadania em Rede/Secretaria de Cidadania e Direitos Humanos (SCDH).
Aos meus amigos de luta, companheiros dos processos formativos comunitários
desenvolvidos pelos grupos juvenis do bairro Planalto do Pici – Grupo de Vivências
Utopia, ESCUTA, Soltando a Voz, ONG Diaconia, banda musical Inesperados e CCJ
– Fortaleza.
Canto das Lágrimas
O companheiro visita A quem quer ser visitado
Choros e risos Será que o cara é palhaço?
Chove de noite Lágrimas cantam nas telhas
Cantam uma música branda. E uma única estrela aparece
Vejo seu riso no campo O assobio de descanso.
O vento a bater em seu corpo E seus olhos brilharem distanciosos.
Não vou te olhar Aí onde estás
Quero lembrar, começo e fim E ficará lembrando, lembranças especiais
Dentro de mim.
Claudio Henrique de Lima Carneiro (Henrique Lima)
RESUMO
Este trabalho monográfico versa sobre a importância dos movimentos sociais populares de juventude no enfrentamento ao fenômeno da violência que atinge às crianças, adolescentes e jovens na contemporaneidade. Escolhi como locus de realização do estudo as organizações juvenis Jovens Unidos do João Arruda (JUJA), Espaço Cultural Frei Tito de Alencar (ESCUTA) e Coletivo de Culturas Juvenis de Fortaleza (CCJ-Fortaleza), que estão situadas no bairro Planalto do Pici e que, além de atenderem crianças, adolescentes e jovens, desenvolvem ações de combate à violência que atinge o referido segmento populacional. Minha ideia foi buscar compreender as ações desenvolvidas por tais organizações e as intervenções dos jovens no combate à letalidade juvenil. A pesquisa foi realizada na cidade de Fortaleza, durante os meses de fevereiro a junho de 2013. Optei por uma pesquisa qualitativa, embasada pelo construcionismo social, método que visa produzir uma ferramenta útil para transformações da ordem social. Desse modo, a pesquisa apontou o caráter preventivo, educativo e socializador das ações desenvolvidas pelos grupos juvenis, os potenciais da juventude e da arte-educação nos processos de mobilização e ressignificação de vida, respectivamente, assim como identificou a fragilidade nas ações de combate à letalidade juvenil, devido às estruturas sociais construídas historicamente e às expressões da questão social que não devem ser ignoradas, mas encaradas como responsabilidade de diversos atores e não apenas dos movimentos sociais. Palavras-chaves: Juventude. Violência. Movimentos Sociais.
ABSTRACT
This monograph focuses on the importance of popular social movements of youth in addressing the phenomenon of violence affecting children, adolescents and young people in contemporary society. Chosen as the locus of the study youth organizations Jovens Unidos do João Arruda (JUJA), Espaço Cultural Frei Tito de Alencar (ESCUTA) and Coletivo de Culturas Juvenis de Fortaleza (CCJ-Fortaleza), which are situated in the district of Planalto do Pici that, in addition to meeting children and young people, develop actions to combat violence affecting the said population segment. My idea was to try to understand the actions taken by these organizations and the activities of the youth in combating juvenile lethality. The survey was conducted in the city of Fortaleza, in the months from february to june 2013. I chose a qualitative research, grounded by social constructionism, a method that aims to produce a useful tool for transformation of the social order. Thus, the survey indicated the preventive, educational and socialization of the actions developed by the youth groups, the potential of youth and art education in the processes of mobilization and redefinition of life, respectively, and identified the weakness in actions to combat juvenile lethality due to historically constructed social structures and expressions of social issue that should not be ignored, but regarded as the responsibility of various actors and not only social movements. Keywords: Youth. Violence. Social Movements.
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ABBEM – Associação Batista Beneficente Missionária
AMOCAP – Associação dos Moradores do Campos do Pici
CCB – Círculos de Cultura Brincantes
CCJ-Fortaleza – Coletivo de Culturas Juvenis de Fortaleza
CEB’S – Comunidades Eclesiais de Bases
CNPJ – Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica
CONANDA – Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente
CSU – Centro Social Urbano
ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente
ESCUTA – Espaço Cultural Frei Tito de Alencar
FAC – Faculdade Cearense
FATENE – Faculdade Terra Nordeste
FUNCI – Fundação da Criança e da Família Cidadã
GDFAM – Grupo de Desenvolvimento Familiar
IDHM – Índice de Desenvolvimento Humano Municipal
IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
IVJ – Índice de Vulnerabilidade Juvenil
JUJA – Grupo Jovens Unidos do João Arruda
OG – Organização Governamental
ONG – Organização Não Governamental
PECI – Post Comand – suposição de “p” e “c” em inglês
PPP – Projeto Político Pedagógico
SCDH – Secretaria de Cidadania e Direitos Humanos de Fortaleza
SDH – Secretaria de Direitos Humanos de Fortaleza
SEPLA – Secretaria Municipal de Planejamento e Orçamento
SER – Secretaria Executiva Regional
SINASE – Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Tabela 1 – Quantitativo dos jovens inseridos nos grupos juvenis (Fev-Abr/13) ........ 30
Tabela 2 – Perfil dos jovens sujeitos da pesquisa ..................................................... 31
Tabela 3 – História de vida dos jovens sujeitos da pesquisa .................................... 52
SUMÁRIO
SUMÁRIO DE ABREVIAÇÕES E SIGLAS ................................................................ 09
SUMÁRIO DE ILUSTRAÇÕES ................................................................................. 11
INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 14
CAPÍTULO 1 – OS CAMINHOS METODOLÓGICOS DA INVESTIGAÇÃO:
APRESENTANDO OS JOVENS SUJEITOS DA PESQUISA E OS ESPAÇOS DE
PARTICIPAÇÃO DO BAIRRO PLANALTO DO PICI ................................................. 18
1.1 O bairro Planalto do Pici: o território referencial da pesquisa .............................. 19
1.2 As organizações juvenis do bairro Planalto do Pici: a arte-educação como
ferramenta de mobilização ........................................................................................ 24
1.2.1 Grupo Jovens Unidos do João Arruda (JUJA): o potencial da quadrilha como
meio de integração entre “comunidades rivais” ..................................................... 26
1.2.2 Espaço Cultural Frei Tito de Alencar (ESCUTA): dançando, cantando e
interpretando a vida cotidiana da comunidade do Pici .......................................... 27
1.2.3 Coletivo de Culturas Juvenis de Fortaleza (CCJ-Fortaleza): as múltiplas
linguagens artísticas fortalecendo o empoderamento juvenil ................................ 28
1.3 O perfil dos sujeitos da pesquisa ......................................................................... 30
CAPÍTULO 2 – AS AÇÕES DAS ORGANIZAÇÕES E AS INTERVENÇÕES
JUVENIS NO COMBATE À LETALIDADE JUVENIL NO BAIRRO PLANALTO DO
PICI SOB A ÓTICA DOS SUJEITOS DA PESQUISA ............................................... 34
2.1 Contextualizando o fenômeno da violência sofrida e causada pelas crianças,
adolescentes e jovens ............................................................................................... 34
2.2 As disputas territoriais, as rivalidades das gangues e o tráfico de drogas: o lugar
da juventude nas facetas da violência vivenciada no bairro Planalto do Pici ............ 38
2.3 Ações das organizações e intervenções juvenis no combate à letalidade juvenil
no bairro Planalto do Pici: o olhar dos sujeitos da pesquisa ..................................... 42
CAPÍTULO 3 – A IMPORTÂNCIA DAS ORGANIZAÇÕES JUVENIS DO BAIRRO
PLANALTO DO PICI NA RESSIGNIFICAÇÃO DE VIDA DOS SUJEITOS DA
PESQUISA ................................................................................................................ 49
3.1 Movimentos sociais populares de juventude: o caso das organizações juvenis do
bairro Planalto do Pici ............................................................................................... 49
3.2 Um passeio pelas histórias e os processos de ressignificação de vida dos
sujeitos da pesquisa .................................................................................................. 52
CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................................... 57
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .......................................................................... 61
APÊNDICES .............................................................................................................. 64
14
INTRODUÇÃO
O presente estudo se propõe a analisar a importância dos movimentos
sociais populares de juventude no enfrentamento ao fenômeno da violência que
atinge às crianças, adolescentes e jovens na contemporaneidade, com enfoque para
as ações desenvolvidas pelas organizações juvenis existentes no bairro Planalto do
Pici – Grupo Jovens Unidos do João Arruda (JUJA), Espaço Cultural Frei Tito de
Alencar (ESCUTA) e Coletivo de Culturas Juvenis de Fortaleza (CCJ-Fortaleza) – e
as intervenções dos jovens inseridos em tais organizações no combate à letalidade
juvenil.
O interesse pela discussão advém do fato de ser morador do bairro
Planalto do Pici e vislumbrar a produção do conhecimento científico atrelada à sua
aplicação social, haja vista ter vivenciado, na condição de jovem, os processos de
aprendizado e participação1 oportunizados pelos grupos juvenis e querer contribuir,
na condição de pesquisador, com a transformação da realidade das juventudes
populares.
A relevância do tema está na possibilidade de promover o debate acerca
do fenômeno da violência – expressão da questão social que adentra o cotidiano da
sociedade brasileira, sobretudo da juventude, segmento populacional cada vez mais
atingido, conforme publica a teoria e pesquisas que analisam a questão – superando
a perspectiva midiática, que encara o fenômeno “quase que como um produto a ser
consumido” (COSTA, 2005, p. 24), sem levar em consideração as estruturas sociais
que o envolve.
No caso do bairro Planalto do Pici, o fenômeno da violência esteve
presente desde a sua origem, instituição e legitimação, manifestando-se de acordo
com as expressões da questão social em cada época, como os conflitos territoriais,
as disputas de gangues e o tráfico de drogas. Entretanto, independentemente de
sua forma de manifestação, a violência sempre esteve relacionada à juventude, seja
como vítima ou vitimizadora, levando a população e as organizações comunitárias a
implementarem ações de enfrentamento à questão, sobretudo no combate à
1 Sobretudo a minha participação nos Círculos de Cultura Brincantes: saberes e formações humanas
desvelando a ciranda da vida do ESCUTA – CCB, uma experiência de educação e arte, formação em trabalho e estudo, em animação cultural, protagonizada por jovens, que atuam grupalmente, como atores sociais multiplicadores.
15
letalidade juvenil. Mas, afinal, as organizações juvenis possuem ações capazes de
combater efetivamente a letalidade dos jovens residentes no bairro Planalto do Pici?
A partir de tal questionamento, defini como objeto do estudo investigativo
as ações das organizações e as intervenções dos jovens sujeitos da pesquisa –
jovens entre 15 a 29 anos de idade2, residentes do bairro Planalto do Pici e inseridos
nos grupos juvenis em análise – no combate à letalidade juvenil, tendo como locus
de realização do estudo os grupos JUJA, ESCUTA e CCJ-Fortaleza. Utilizei dois
critérios para definir os grupos a serem pesquisados, quais sejam: o
desenvolvimento de ações junto às crianças, adolescentes e jovens no bairro
Planalto do Pici, na atualidade e de enfrentamento à violência direcionada a este
segmento populacional.
Desta feita, o objetivo geral da pesquisa configurou-se em analisar a
importância do movimento juvenil do bairro Planalto do Pici frente ao combate à
violência contra adolescentes e jovens residentes no referido território, o que
resultou nos seguintes objetivos específicos: investigar o percurso histórico do
movimento juvenil no bairro Planalto do Pici; analisar como ocorrem a participação e
intervenção juvenis no enfrentamento à letalidade juvenil, por meio dos grupos
organizados existentes no bairro Planalto do Pici e identificar se a participação nos
grupos de adolescentes e jovens no bairro Planalto do Pici tem influenciado na
ressignificação da vida dos seus membros.
Para fundamentar as discussões propostas que envolvem o meu objeto
de estudo, defini como método de pesquisa o construcionismo social, descrito por
Spink e Medrado (2004), como o método que
“está interessado em identificar os processos pelos quais as pessoas descrevem, explicam e/ou compreendem o mundo em que vivem, incluindo elas próprias. Nesse sentido, o foco de estudos passam das estruturais sociais e mentais para a compreensão das ações e práticas sociais e, sobretudo, dos sistemas de significação que dão sentido ao mundo” (SPINK; MEDRADO, 2004, p. 60).
Ainda como fundamentação das discussões, realizei, ao longo de todo o
trabalho, o diálogo entre teoria e empiria acerca das categorias violência, juventude
e movimentos sociais, de modo que as discussões não fossem apresentadas de
forma estanque, mas sempre correlacionadas e com leveza, tendo como suporte 2 “É importante mencionar que o Plano Nacional de Juventude considera juventude a população
compreendida na faixa etária de 15 a 29 anos” (CUNHA, 2012, p. 15).
16
teórico os conceitos de Volpi (2001), Abramovay (2002), Saraiva (2005; 2006), Costa
(2005), em relação à violência; Groppo (2000), Baierl (2002), Pais (2003) e
Waiselfisz (2005; 2011), quanto à conceituação de juventude e Scherer-Warren
(1993) e Gohn (2009; 2011) acerca dos movimentos sociais.
Outros autores foram fundamentais para subsidiar a análise dos dados
produzidos, como Spink; Medrado (2004), Rey (2010) e Guattari; Rolnik (2011),
embasando-me acerca das questões relacionadas à pesquisa qualitativa e
subjetividade. A opção pela pesquisa qualitativa relaciona-se com a construção do
meu objeto de pesquisa e os objetivos propostos, considerando que “a pesquisa
qualitativa recupera a pessoa estudada em condição de sujeito ativo na construção
de sua experiência” (REY, 2010, p. 131).
Assim, para alcançar os objetivos propostos, tracei o seguinte caminho de
investigação: no capítulo 1, abordo o percurso metodológico do estudo investigativo,
iniciando com a história do bairro Planalto do Pici, lugar referencial da pesquisa,
seguindo com a apresentação do JUJA, ESCUTA e CCJ-Fortaleza, locus de
realização do estudo e espaços de participação dos jovens, para, finalmente,
apresentar o perfil dos sujeitos da pesquisa.
No capítulo 2, abordo a temática da letalidade juvenil no bairro Planalto do
Pici, a partir das ações desenvolvidas pelas organizações em análise e das
intervenções dos sujeitos da pesquisa, tendo como subsídio de análise seus
próprios depoimentos e percepções, fazendo um diálogo entre teoria e empiria
acerca das categorias violência e juventude. Desse modo, o primeiro momento
contém uma análise acerca do fenômeno da violência sofrida e causada pelas
crianças, adolescentes e jovens em um contexto geral, seguida de uma análise
envolvendo a especificidade do bairro Planalto do Pici no tocante ao binômio
violência e juventude. Posteriormente, analiso as percepções dos jovens sujeitos da
pesquisa acerca do enfrentamento ao fenômeno da violência e o fazer interventivo
das organizações no combate à letalidade juvenil.
No capítulo 3, problematizo acerca da possibilidade de ressignificação de
vida por parte dos sujeitos da pesquisa, a partir de suas inserções nas organizações
juvenis. Inicio a discussão dialogando com a teoria sobre os movimentos sociais,
com enfoque para as organizações do bairro Planalto do Pici, aqui consideradas
movimentos populares de juventude. Em seguida faço um passeio pelas histórias
17
dos sujeitos da pesquisa, para depois conhecer os seus processos de
ressignificação de vida.
Por fim, abordo as considerações construídas no decorrer do estudo
investigativo, considerações essas fundamentadas e sustentadas teoricamente na
bibliografia apresentada.
18
CAPÍTULO 1 – OS CAMINHOS METODOLÓGICOS DA INVESTIGAÇÃO:
APRESENTANDO OS JOVENS SUJEITOS DA PESQUISA E OS ESPAÇOS DE
PARTICIPAÇÃO DO BAIRRO PLANALTO DO PICI
À proposta de proceder uma análise acerca das organizações juvenis no
bairro Planalto do Pici e suas intervenções no combate à letalidade juvenil,
considerei importante situar o leitor acerca do referido bairro e suas organizações.
Desse modo, no primeiro momento, abordo o processo histórico de implementação
do bairro Planalto do Pici e suas lutas em busca de legitimação. Em seguida,
contextualizo três organizações juvenis existentes no bairro, de modo a situar os
espaços de participação dos jovens, para finalmente apresentar o perfil dos sujeitos
da pesquisa.
Destaco que existem inúmeras3 organizações juvenis no bairro Planalto
do Pici. Entretanto, defini como critério metodológico envolver apenas os grupos
que, na atualidade, além de desenvolverem ações junto às crianças, adolescentes e
jovens, atuam no enfrentamento à violência direcionada a este segmento
populacional, sobretudo ações que combatem a letalidade de adolescentes e jovens
residentes no bairro Planalto do Pici.
É importante salientar que, para a explanação acerca da contextualização
do bairro, tive como fonte de pesquisa secundária os relatos de moradores,
sistematizados em livro publicado pelo pesquisador popular Leonardo Sampaio4 e o
plano de ação da Associação de Moradores do Campos do Pici (AMOCAP)5. Em
relação à apresentação dos espaços de participação existentes, me utilizei de fontes
secundárias, a partir dos documentos institucionais que me foram disponibilizados e
de fontes primárias, advindas por meio das entrevistas aplicadas junto aos
coordenadores dos grupos e aos jovens sujeitos da pesquisa.
3 É importante salientar que as instituições aqui listadas foram catalogadas após pesquisa
exploratória, realizada em fevereiro de 2013. São elas: Escuta, Soltando a Voz, Maracatu Nação Pici, ABBEM, Raízes Nordestinas, Casa da Mãe Joana, Coletivo Muquifo, CCJ-Fortaleza, JUJA/Quadrilha TONGIL, As Ligas de Futebol, Oco do Mundo, GDFAM, Desbravadores Grupo da Igreja Evangélica, Balé Raio de Sol, AMOCAP, Maranata e Utopia. 4 SAMPAIO, L. F. Resgate histórico das CEB'S na comunidade Frei Tito de Alencar. Fortaleza:
Bangráfica, 1999. 5 Associação de Moradores do Campos do Pici (AMOCAP), situada na rua 23 de março, nº 10,
Planalto do Pici.
19
Assim, convido o leitor a conhecer um pouco da história do bairro Planalto
do Pici, que durante muito tempo carregou o estigma de “campo de desova6”,
mergulhando na saga dos primeiros moradores pelo reconhecimento do território e
no incansável enfrentamento às problemáticas ainda existentes, por meio da
mobilização juvenil.
1.1 O bairro Planalto do Pici: o território referencial da pesquisa
Entender como se deu o processo de ocupação e reconhecimento do
Planalto do Pici, enquanto bairro da cidade de Fortaleza, me remete a uma viagem
ao contexto histórico do Brasil e do Ceará, no período da Segunda Guerra Mundial,
contido nos livros, mas, sobretudo, no imaginário7 dos moradores, que ainda se
utilizam do enredo para enriquecer as contações de histórias de suas crianças.
Em alguns momentos, a cronologia dos acontecimentos, que foram
propiciando o reconhecimento do bairro, se apresenta de forma confusa, mas é
consenso a influência das Comunidades Eclesiais de Bases (CEB'S) nesse
processo, assim como a militância dos moradores, como “símbolo de resistência,
luta, esperança e organização” (SAMPAIO, 1999, p. 09).
Assim, relatos dos moradores mais antigos do bairro Planalto do Pici,
contidos na pesquisa-ação de Leonardo Sampaio e nos documentos oficiais da
Associação de Moradores (AMOCAP), revelam que os primórdios do processo de
surgimento do bairro originou-se das múltiplas ocupações realizadas no terreno
outrora conhecido como antiga base aérea americana e de seu entorno.
Segundo os moradores, o local era estratégico para os americanos, pois
de lá partiam os aviões para bombardearem a Alemanha, na Segunda Guerra
Mundial e que o espaço onde se instalou a base aérea havia sido concedido pelo
Brasil, na administração do presidente Getúlio Vargas. Relata os moradores que a
6 Para ilustrar o significado de “Campo de Desova”, contido na presente pesquisa, me utilizei da
referência descrita no dicionário da língua portuguesa acerca da palavra desovar. Assim, desovar é uma gíria que significa “pôr ou deixar num lugar (cadáver de pessoa assassinada em outro)”. In: FERREIRA, A. B. de H. Miniaurélio: o minidicionário da língua portuguesa. 7. ed. Curitiba: Editora Positivo, 2008. 7 Cresci ouvindo histórias acerca do descampado onde antes funcionava a antiga base aérea
americana, local que na atualidade é denominado Planalto do Pici. No imaginário dos moradores mais antigos, embaixo dos grandes campos de terra existia uma entrada secreta que dava acesso a uma grande sala de controle americano, que possuía objetos e dinheiros deixados pelos militares.
20
sigla de iniciais PECI8 teria sido nomeada pelos americanos e depois modificada
para PICI.
Segundo Sampaio (1999), com base nos depoimentos dos moradores, ao
longo dos anos, no local da antiga base aérea foi instalado o primeiro kartódromo de
Fortaleza, aproveitando as pistas existentes desde a época da base americana.
Acrescentou o pesquisador que, com a desativação do kartódromo, o local ficou
abandonado e tornou-se um grande descampado que passou a ser utilizado como
espaço de “desova”, onde eram jogados os corpos de pessoas assassinadas dos
bairros circunvizinhos.
A partir desse contexto de violência surgiram as primeiras mobilizações
dos moradores que residiam no entorno do grande descampado, na intenção de
transformar e dar um novo significado ao local. Assim, em parceria com alguns
órgãos públicos, adquiriram traves e conseguiram instalar inúmeros campos de
futebol, proporcionando lazer para as pessoas que residiam no entorno. Ainda de
acordo com Sampaio (1999), àquela época, às margens dos campos de futebol já
existiam as comunidades “Fumaça9”, “Entrada da Lua10” e “Feijão11”, que foram
sendo ocupadas de forma desordenada.
8 Saliento que não consegui identificar em fonte segura a origem de tal sigla, com seu respectivo
significado e se de fato teria sido instituída pelos americanos. Entretanto, em blog que versa acerca da história da cidade de Fortaleza consta a informação de que “ainda, hoje, existem controvérsias com relação ao nome Pici, que vem sendo mais alimentadas por mitos. Um desses, conforme ressalta o memorialista Miguel Ângelo de Azevedo, o Nirez, é de que seria abreviatura da expressão Post Command – presumidamente, sendo que as letras “p” e “c”, em inglês, são pronunciadas, respectivamente, como “pi” “ci” (fortalezanobre.blogsport.com/BR/2010/09/pici-e-ii-guerra-mundial-html, acesso em 31/05/2013). Salienta-se que o memorialista não confirma essa informação, apenas relata o mito. Em site de curiosidades disponível na rede mundial de informação, quando estava procurando o significado da sigla Pici, existe uma versão de que o significado é uma homenagem à escritora Raquel de Queiroz, conforme expresso no blog: “o nome Pici vem do centenário do sítio do Pici, às margens do riacho Cachoeirinha, que foi propriedade do pai da escritora Raquel de Queiroz” (pt.wikipedia.org/wikipici, acesso em 31/05/2013). 9 Consta na pesquisa de Sampaio (1999) que o processo de ocupação de terras da comunidade da
Fumaça teve início em 1963, quando as famílias chegaram na rua Noel Rosa, demarcaram seus terrenos e iniciaram as construções das casas. Ainda segundo o pesquisador, o nome Fumaça advém do fato de um dos moradores acender todas as noites um fogo para clarear o seu terreno e ali formaram grupos de pessoas para conversarem. “Nos finais de semana eles faziam festas dançantes. Quando havia qualquer confusão as pessoas davam parte na delegacia e o delegado para identificar o local dizia: “... é lá naquela fumaça...” E assim foi sempre se repetindo o nome Fumaça referindo a esse local, até que pegou e ficou sendo conhecido por Favela da Fumaça” (SAMPAIO, 1999, p. 21). 10
Segundo Sampaio (1999), em 1957 chegou a primeira família na área da comunidade Entrada da Lua. “Houve época de chegarem 10/15 famílias da noite para o dia” (SAMPAIO, 1999, p. 18). Ainda de acordo com Sampaio (1999), o nome Entrada da Lua advém do fato de um dos moradores, em meados da década de 60, ter afixado uma imagem de São Jorge na entrada da comunidade. 11
Os moradores mais antigos afirmaram que a comunidade do Feijão iniciou-se na década de 60 a 70 sendo a mais nova das antigas ocupações. O nome advém das ações assistencialistas desenvolvidas pelo Governo do Estado, que costumava distribuir quilos de feijão para os moradores hipossuficientes.
21
Em síntese, relataram os moradores que primeiro houve a ocupação no
entorno do descampado e que as famílias receberam informações da existência da
área desocupada das mais variadas formas e se apropriaram dos lotes, ainda no
período da Segunda Guerra Mundial, utilizando madeiras para a construção das
casas. “Iam trazendo suas famílias, gradativamente. Enfrentavam toda sorte de
adversidade, nenhum serviço de urbanização e frequentes ameaças de “tratores”
sobre as moradias” (Sampaio, 1999, p.18).
Após a instalação das primeiras comunidades foram surgindo os serviços
básicos destinados à coletividade, como fornecimento de energia elétrica,
abastecimento de água, transporte urbano, bem como instalação de equipamentos
sociais, tais como: escolas e centros sociais. “A primeira escola estadual chegou em
1973 naquela região” (SAMPAIO, 1999, p. 18).
Os moradores relataram que suas conquistas não foram marcadas por
um processo tranquilo, ao contrário, vivenciaram confrontos e muita resistência, pois
a cada dia “surgiam pretensos donos da área e fiscalização municipal” (SAMPAIO,
1999, p. 19), para os retirarem do local. Assim, numa condição de vulnerabilidade e
constante ameaça de destruição de suas moradias, os moradores viram surgir a
gênese da organização popular, tendo como base a catequese e ações
assistencialistas. “Por volta de 1971, com a inauguração do CSU12 surgiu a ideia de
se organizarem, através de associação dos moradores, no entanto a primeira
associação foi criada em 1978” (SAMPAIO, 1999, p. 18).
Posteriormente, iniciaram os trabalhos das CEB'S, por meio de
assessorias jurídicas, com o objetivo de orientação quanto à regularização fundiária,
através de processo de usucapião coletivo. Entretanto, segundo Sampaio (1999),
houve resistência por parte dos agentes do Estado na efetivação do referido
processo, compelindo os moradores a agirem individualmente.
Em relação ao processo de ocupação do grande descampado, os
moradores relataram que antes da chegada das primeiras famílias ao local, além
dos campos de futebol instalados, o espaço comportava os equipamentos das
concessionárias de serviços públicos locais (postes e anéis de grande porte), que
seriam utilizados na instalação das redes de esgoto e de iluminação pública da
cidade de Fortaleza.
12
Centro Social Urbano.
22
Segundo documento da AMOCAP, apenas no final dos anos de 1980 e
início de 1990, houve uma organização de ocupação, com o intuito de lotear e
construir casas no terreno descampado, com a participação dos movimentos sociais
e instituições que já tinham experiência em relação à questão. Assim como ocorreu
com as comunidades do seu entorno, o processo de ocupação deu-se de forma
conturbada, com grande pressão policial para retomada do terreno, com constantes
ameaças de tratores para a derrubada dos “barracos”.
Tais pressões e ameaças não foram suficientes para que a população
desistisse da luta por moradia. Nesse período, a organização comunitária, apoiada
pelas organizações dos movimentos civis organizados, fomentava a permanência e
resistência dos moradores, que despertaram o senso crítico e passaram a pensar o
coletivo, fatores essenciais para que a luta pudesse tornar-se viável.
Desta feita, quando o processo de ocupação acalmou, foram iniciadas a
divisão dos lotes e a organização das ruas. Entretanto, não houve um planejamento
adequado, gerando vários conflitos, tais como: terrenos com tamanhos diferentes,
ruas estreitas, não conservação e priorização de espaços de lazer, entre outras
intercorrências.
Definidos os lotes e as ruas, era necessário instituir um nome. Assim,
inicialmente, a comunidade foi denominada de “Pantanal”, por influência de uma
novela exibida àquela época. Posteriormente, surgiu a denominação “Planalto do
Pici”, em virtude da dificuldade de instalação do sistema de abastecimento de água.
Segundo os moradores, para que a água tratada pudesse chegar até as torneiras
das casas da comunidade foi necessária a instalação de um motor. Daí o nome
Planalto do Pici (Plano Alto do Pici).
Ao analisar os documentos institucionais que me foram disponibilizados e
os relatos dos moradores contidos na pesquisa-ação de Leonardo Sampaio, pude
observar que a comunidade do Planalto do Pici cresceu e se desenvolveu dentro de
uma lógica de ocupação desordenada do espaço urbano e que o seu processo de
instalação, reconhecimento e legitimação sofreu diversas interferências
governamentais e dos movimentos sociais.
O fato é que, inicialmente, os moradores organizados sofriam influência
direta de entes governamentais, que tinham como finalidade o apoio a projetos
políticos eleitoreiros e de assessorias de movimentos sociais vinculados à Igreja,
que, embora buscassem a construção de uma consciência crítica da população,
23
acabavam inviabilizando uma militância autêntica e autônoma em prol da cidadania.
Esta realidade me remete ao pensamento de Gohn (2009) quando afirma que:
“a cidadania não se constrói por decretos ou intervenções externas, programas ou agentes pré-configurados. Ela se constrói como um processo interno, no interior da prática social em curso, como fruto do acúmulo das experiências engendradas. A cidadania coletiva é constituidora de novos sujeitos históricos: as massas urbanas espoliadas e as camadas médias expropriadas. A cidadania coletiva se constrói no cotidiano através do processo de identidade político-cultural que as lutas cotidianas geram” (GOHN, 2009, p. 16-17).
Avançando na trajetória histórica, segundo documento da Associação de
Moradores (AMOCAP), atualmente, a comunidade do Planalto do Pici é ocupada por
cerca de 8.000 (oito mil) famílias e está situada no lado leste da cidade de Fortaleza,
tendo como limítrofes a área da Universidade Federal do Ceará (Campus do Pici) e
os bairros Henrique Jorge, Demócrito Rocha (pertencente à Secretaria Executiva
Regional IV), João Arruda e Pan-Americano. Os dois últimos ainda não são
reconhecidos pela Prefeitura de Fortaleza como bairros, mas conjuntos pertencentes
aos bairros Henrique Jorge e Planalto do Pici, no caso do João Arruda e ao bairro
Bela Vista, no caso do Pan-Americano.
Ainda quanto à localização, o bairro Planalto do Pici está situado na
Secretaria Executiva Regional III (SER13 III), que compreende 1714 (dezessete)
bairros, com Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM15) variando entre
médio e baixo, a depender de cada bairro. Quanto ao Planalto do Pici,
especificamente, o IDHM é considerado baixo (0,43416), tendo apenas a variável
social relativa à taxa de alfabetização considerada alta (0,83617).
13
A cidade de Fortaleza é dividida em Secretarias Executivas Regionais como forma de descentralização política e administrativa. Elas atendem as demandas de serviços dos bairros vinculados a cada região. Na atualidade existem sete: SER I, SER II, SER III, SER IV, SER V, SER VI e SER Centro. 14
De acordo com o sítio da Prefeitura Municipal de Fortaleza, a SER III possui 17 (dezessete) bairros, são eles: Amadeu Furtado, Antônio Bezerra, Autran Nunes, Bela Vista, Bonsucesso, Dom Lustosa, Henrique Jorge, João XXIII, Jóquei Clube, Olavo Oliveira, Padre Andrade, Parque Araxá, Parquelândia, Planalto do Pici, Presidente Kennedy, Quintino Cunha e Rodolfo Teófilo. In: www.fortaleza.ce.gov.br/regionais/regional III, acesso em 05/05/2013. 15
O Índice de Desenvolvimento Humano Municipal possui três variáveis sociais (anos de estudo – média de anos de estudo do chefe de família; população alfabetizada – taxa de alfabetização e rendimento – renda média do chefe de família em salários mínimos) e três índices: alto, médio e baixo. Informações retiradas do diagnóstico realizado pela Secretaria Municipal de Planejamento e Orçamento (SEPLA), extraído do “Fortaleza em Números”, com base no Censo 2000. 16
FONTE: Secretaria Municipal de Planejamento e Orçamento (SEPLA)/Fortaleza em números. 17
FONTE: Secretaria Municipal de Planejamento e Orçamento (SEPLA)/Fortaleza em números.
24
O bairro Planalto do Pici, apesar de todos os avanços, ainda vivencia
problemáticas, sobretudo situações características da questão social na
contemporaneidade, como é o caso da violência urbana e o tráfico de drogas,
compelindo a comunidade a se mobilizar e a pensar estratégias para o
enfrentamento das questões. Portanto, as organizações comunitárias que se
instituíram ao longo do processo de reconhecimento do território, que antes se
mobilizavam em prol de moradia e infraestrutura, hoje se deparam com a
necessidade de lutar pela efetivação de outros direitos.
A luta pela efetivação de outros direitos, por parte das organizações
comunitárias, é abordada por Gohn (2009) quando a referida autora analisa a
trajetória dos movimentos sociais no Brasil e, guardando as particularidades
históricas e sociais, se assemelha à realidade vivenciada pelos movimentos sociais
atuantes no bairro Planalto do Pici, cujos objetivos sociais “passaram a ser vistos
como o resgate de sua cidadania, definida como a obtenção de patamares
condignos de subsistência, direito à saúde, à educação, ao lazer, à moradia”
(GOHN, 2009, p. 48). Na realidade do Planalto do Pici, os jovens passaram a ser um
dos principais atores do processo de mobilização e participação pela efetivação dos
novos direitos negligenciados, bem como passaram a ser alvo das ações propostas
pelas organizações.
Portanto, levando em consideração os objetivos da investigação e seus
critérios metodológicos, no item a seguir, apresento ao leitor os espaços de
participação dos jovens sujeitos da pesquisa.
1.2 As organizações juvenis do bairro Planalto do Pici: a arte-educação como
ferramenta de mobilização
Como visto até aqui, esta pesquisa preza por uma abordagem contextual
e histórica de ações relacionadas ao enfrentamento à letalidade de adolescentes e
jovens do bairro Planalto do Pici desenvolvidas pelas organizações juvenis
existentes no referido bairro. Entretanto, para maior aproximação dos sujeitos
envolvidos no estudo – jovens entre 15 e 29 anos de idade, residentes do Planalto
do Pici e que estejam engajados nos grupos juvenis –, tive que delimitar um locus
25
de realização do estudo, visto a variedade de organizações juvenis atuando no
bairro.
Dessa forma, iniciei uma pesquisa exploratória junto às organizações, a
partir da aplicação de um questionário, para identificar os grupos que se
solidificaram ao longo do processo de legitimação do bairro e que atuam diretamente
junto ao segmento de crianças, adolescentes e jovens. Com essa metodologia,
identifiquei a existência de cinco organizações que atendiam aos dois critérios pré-
estabelecidos, quais sejam: Associação de Moradores do Campos do Pici
(AMOCAP), Grupo Jovens Unidos do João Arruda (JUJA), Espaço Cultural Frei Tito
de Alencar (ESCUTA), Grupo de Jovens Utopia e Coletivo de Culturas Juvenis de
Fortaleza (CCJ-Fortaleza).
Identificadas as organizações juvenis, o locus de realização da pesquisa
ainda não havia sido definido, haja vista o objetivo de analisar como ocorrem a
participação e intervenção juvenis no enfrentamento à letalidade juvenil. Sendo
assim, para envolver uma organização no estudo, além de atender crianças,
adolescentes e jovens, era necessário o desenvolvimento de ações voltadas ao
combate à violência. Portanto, das cinco organizações identificadas na pesquisa
exploratória, apenas três desenvolvem ações com enfoque ao enfrentamento à
violência, são elas: JUJA, ESCUTA e CCJ-Fortaleza. Convém ressaltar que as
referidas organizações se utilizam da arte-educação como ferramenta de
mobilização junto ao público-alvo que pretendem atingir, assim como prezam pelo
lúdico e a criatividade como meios de despertar o senso crítico e político.
Ressalto, ainda, que nesse momento interessa abordar aspectos gerais
que envolvem as três organizações, uma vez que a análise com maior profundidade
acerca das ações desenvolvidas para o enfrentamento à violência será abordada em
capítulo específico (Capítulo 2), a partir da percepção dos coordenadores das
organizações e dos jovens sujeitos da pesquisa.
Assim, passo a apresentar ao leitor, sucintamente, os espaços de
participação dos sujeitos da pesquisa, espaços esses definidos como locus do
presente estudo investigativo.
26
1.2.1 Grupo Jovens Unidos do João Arruda (JUJA): o potencial da quadrilha
como meio de integração entre “comunidades rivais”
É importante salientar que o JUJA não dispõe de um Projeto Político
Pedagógico. Desse modo, tive como fonte de pesquisa dois documentos
institucionais, denominados de “histórico” e “currículo”, que me foram
disponibilizados em março de 2013.
De forma resumida, os documentos descrevem aspectos relacionados à
fundação, objetivos, organização, perfil de atendimento e principais atividades
desenvolvidas. Porém, não existe indicativo de data de elaboração.
Assim, nos referidos documentos, consta que o grupo JUJA/Quadrilha
Tongil foi fundado em 18 de abril de 198418, na comunidade da Fumaça, com o
objetivo de formar uma quadrilha junina infantil. Nesse mesmo período foram
formados os grupos de quadrilha adulto e infantil, que serviram como meio de
integração entre os jovens das comunidades da Fumaça e Entrada da Lua, tidas
àquela época como comunidades rivais.
Atualmente, o grupo se denomina uma entidade sócio-cultural e esportiva,
sem fins lucrativos, que tem por objetivo promover uma integração geral entre os
jovens de todo o bairro Planalto do Pici, independentemente da comunidade que
pertençam, com enfoque no combate à violência entre os jovens.
Conforme registrado em seu histórico, o grupo passou a adotar uma
política de trabalho voltada ao lazer, esporte e cultura. Entretanto, a quadrilha junina
nunca perdeu o seu lugar de destaque, sendo considerada a principal atividade do
grupo.
Em relação ao público-alvo, o JUJA destina-se ao atendimento às
crianças, adolescentes e jovens do bairro Planalto do Pici, que vivenciam uma
condição de vulnerabilidade social, sobretudo vulnerabilidades advindas pelo uso e
abuso de drogas e o recrutamento para o tráfico.
18
Atualmente, o JUJA é considerado uma entidade de pessoa jurídica, datada de 10 de maio de 1998, com inscrição regulamentada no Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ) sob o nº 02513925/0001-61, tendo como presidente o senhor Gilmar Pereira Lima, mais conhecido como “meu tio” e vice-presidente o senhor Djalma Pereira Lima. Em 2013, o JUJA comemora 29 anos de existência, contando com cerca de 153 componentes, sendo 30 membros efetivos atuando nas áreas de teatro, dança popular, música regional, esporte e lazer.
27
O JUJA se consolidou ao longo do processo de legitimação do bairro
Planalto do Pici, participando ativamente dos principais movimentos sociais
existentes na comunidade, sempre em busca de alcançar melhorias para o bairro,
garantindo, sobretudo, os direitos das crianças, adolescentes e jovens.
1.2.2 Espaço Cultural Frei Tito de Alencar (ESCUTA): dançando, cantando e
interpretando a vida cotidiana da comunidade do Pici
Assim como o JUJA, o ESCUTA não possui Projeto Político Pedagógico.
Tive como fonte de pesquisa um release institucional (sem indicação de data de
elaboração), que descreve as principais informações acerca do grupo. O referido
documento me foi disponibilizado em abril de 2013.
Segundo consta no release, a história do ESCUTA confunde-se, em
muitos aspectos, com a história do bairro Planalto do Pici. Há 30 anos atrás, quando
iniciou-se o trabalho das Comunidades Eclesiais de Base, na Favela da Fumaça,
dava-se início a um processo de organização comunitária que deu origem às
inúmeras conquistas sociais, econômicas e culturais para a comunidade, dentre elas
o surgimento do ESCUTA.
Desde então, o ESCUTA realiza processos formativos com as crianças,
adolescentes e jovens residentes do bairro Planalto do Pici, desenvolvendo
metodologias participativas de formação em arte, educação popular, comunicação,
juventudes, inclusão digital e economia solidária.
O objetivo institucional centra-se na promoção de interlocução com o
poder público, visando a organização de espaços coletivos de participação,
integrando as discussões em redes, fóruns e conselhos, bem como organizando
grupos infanto-juvenis na comunidade, para discutir sobre as problemáticas sociais
presentes no cotidiano da comunidade, construindo caminhos de superação dos
problemas vivenciados e fortalecendo espaços de articulação, proposição e
monitoramento das políticas públicas.
A execução de projetos na área de educação, arte e fomento à geração
de trabalho e renda para a juventude tem sido o foco prioritário da ação do ESCUTA.
28
A gestão desses projetos ocorre de forma compartilhada e democrática, por meio de
instâncias de participação, discussão e deliberação19.
O ESCUTA dispõe de sede própria (Rua Noel Rosa, nº 150, Planalto do
Pici) e inscrição no Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ nº
05.440.291/0001-52); conta com a participação de 25 (vinte e cinco) membros
efetivos e, atualmente, está passando por um processo de reestruturação das
atividades pedagógicas desenvolvidas, com o objetivo de ampliar a participação
juvenil.
1.2.3 Coletivo de Culturas Juvenis de Fortaleza (CCJ-Fortaleza): as múltiplas
linguagens artísticas fortalecendo o empoderamento juvenil
O Projeto Político Pedagógico (PPP) do CCJ-Fortaleza configurou-se na
minha principal fonte de pesquisa documental acerca do referido grupo juvenil. De
acordo com o coordenador do grupo, o documento fora construído coletivamente,
tendo como subsídio para o processo de elaboração o método da sociopoética20. A
construção do PPP iniciou no ano de 2012 e foi finalizada no corrente ano.
Desse modo, segundo consta no documento, o CCJ-Fortaleza foi criado
na intenção de mudar as questões sociais relacionadas aos jovens das periferias,
tendo como ponta pé inicial um encontro organizado pela ONG Diaconia, realizado
na sede do ESCUTA em 2010, que reuniu jovens dos diversos grupos juvenis
existentes no bairro Planalto do Pici. A proposta do encontro era a construção de um
espaço onde os jovens pudessem ter um fortalecimento para suas formações
políticas, comunicativas, artístico-culturais e profissionalizantes.
Portanto, assim se configura o Coletivo de Culturas Juvenis de Fortaleza
19
Assim são formadas as instâncias do ESCUTA: Coordenação Colegiada – formada por cinco pessoas eleitas em Assembleia Geral de sócios; Conselho Fiscal – formado por três efetivos e um suplente, também eleitos em assembleias de sócios; Mandala de Gestão Compartilhada – é um formato de organograma circular que contempla participação igualitária entre coordenadores, representantes de grupos, sócios e colaboradores voluntários e Roda Pedagógica – é um espaço de socialização das metodologias desenvolvidas pelo ESCUTA nas suas atividades. É também um espaço de aprofundamento teórico-metodológico dessas atividades (vivências). FONTE: release do ESCUTA, sem data, acesso em abril de 2013. 20
Segundo Petit e Soares (s/d), “o método da sociopoética foi fundado pelo filósofo e pedagogo francês Jacques Guathier [...]. É então um método de pesquisa que tem o mérito de valorizar o prazer e a criatividade na construção coletiva do conhecimento. Em termos teórico-metodológicos, inspira-se na Pedagogia do Oprimido de Paulo Freire, na Análise Institucional, no Teatro do Oprimido de Augusto Boal e na escuta sensível mito-poética de René Barbier, que implica na multireferencialidade dos sentidos” (PETIT; SOARES, s/d, p. 1-2). Acesso em 31 de maio de 2013.
29
(CCJ-Fortaleza): um espaço itinerante de articulação, mobilização comunitária,
organização política autônoma e de formação de indivíduos e grupos juvenis
populares do Ceará, que atuam no campo da comunicação, da arte, da educação e
da cultura popular, contribuindo para a transformação da condição juvenil.
Salientou o coordenador do CCJ-Fortaleza que a junção de jovens dos
diversos grupos juvenis possibilitou o alcance de maior amadurecimento entre os
membros, que identificaram a necessidade de intervir na comunidade de maneira
mais organizada e sustentável com as juventudes, tendo como objetivos: (i)
desenvolver processos de formação no âmbito da cultura e educação popular e da
comunicação livre; (ii) fortalecer a produção da cultura popular e da comunicação
livre bem como a produção de seus meios e acessos; (iii) difundir as múltiplas
linguagens artísticas e manifestações da cultura popular; (iv) promover a incidência
política no campo e na cidade, a fim de propor e conquistar direitos referentes às
juventudes populares e (v) apoiar iniciativas de auto-sustentabilidade de jovens e/ou
grupos juvenis populares.
Atualmente o CCJ-Fortaleza realiza suas atividades em sede cedida pelo
Grupo de Desenvolvimento Familiar (GDFAM), no espaço Margarida Alves, situado à
Rua São Francisco, nº 111, Planalto do Pici. O grupo não possui CNPJ e conta com
a participação de 18 (dezoito) membros, que buscam consolidar e assegurar o
compromisso dos seus idealizadores em construir uma nova sociedade, pautada na
ressignificação e transformação da realidade da juventude popular.
Como demonstrado, assim como o CCJ-Fortaleza, o JUJA e o ESCUTA
primam pela participação e mobilização dos jovens, considerando-os como uma das
principais forças motrizes da transformação societária. Tal transformação, por sua
vez, inicia com o reconhecimento do coletivo e o despertar crítico e político por parte
dos jovens, que devem estar atentos ao esclarecimento de Gohn:
“o processo não é pré-codificado numa metodologia específica. Não há hábitos, comportamentos, rotinas ou procedimentos preestabelecidos. Há princípios norteadores, assimilados por todo o grupo, que constroem a metodologia da ação segundo as necessidades que a conjuntura lhes coloca. O importante é estar junto, a construção é coletiva” (GOHN, 2009, p. 19-20).
Desta feita, passo a apresentar o perfil dos jovens sujeitos da pesquisa,
que vivenciam o desafio contínuo de construir e reconstruir suas práticas
30
interventivas nos grupos juvenis onde estão inseridos, em busca da ressignificação
de suas vidas e da vida de outros jovens residentes do bairro Planalto do Pici.
1.3 O perfil dos sujeitos da pesquisa
Por meio de pesquisa exploratória, realizada entre os meses de fevereiro
a abril de 2013, junto aos três grupos juvenis (JUJA, ESCUTA e CCJ-Fortaleza), tive
acesso ao universo da pesquisa, para em seguida definir o quantitativo de jovens
que deveria envolver, levando em consideração “a legitimação do singular na
produção do conhecimento” (REY, 2010, p. 10). E, finalmente, após a aplicação dos
instrumentais da investigação, pude construir os dados relativos ao perfil dos
sujeitos da pesquisa, considerando que
“o conhecimento é um processo de construção que encontra sua legitimidade na capacidade de produzir, permanentemente, novas construções no curso da confrontação do pensamento do pesquisador com a multiplicidade de eventos empíricos coexistentes no processo investigativo” (REY, 2010, p. 07).
A tabela abaixo identifica o quantitativo geral dos jovens inseridos nos
grupos juvenis e o universo da investigação, ou seja, o quantitativo dos jovens no
perfil da pesquisa – jovens entre 15 a 29 anos de idade, residentes do bairro
Planalto do Pici e inseridos em um dos três grupos juvenis pesquisados.
Tabela 1 Quantitativo dos jovens inseridos nos grupos juvenis (Fev-Abr/13)
GRUPOS JUVENIS
TOTAL DE JOVENS INSERIDOS
TOTAL DE JOVENS NO PERFIL DA PESQUISA
JUJA 65 52
ESCUTA 25 16
CCJ-FORTALEZA 18 13
TOTAL GERAL 108 81
FONTE: Pesquisa direta. Elaboração do próprio autor.
Conforme expresso na tabela 1, de 108 (cento e oito) jovens engajados
nos três grupos, 81 (oitenta e um) encontram-se no perfil da pesquisa. Portanto,
partindo desse universo de 81 (oitenta e um) jovens, defini envolver dois de cada
grupo, respeitando o critério de gênero, ou seja, um jovem do sexo masculino e
outro do sexo feminino.
31
É importante ressaltar que dos 52 (cinquenta e dois) jovens inseridos no
JUJA, 30 (trinta) são do sexo masculino e 22 (vinte e dois) do sexo feminino; dos 16
(dezesseis) jovens inseridos no ESCUTA, sete são do sexo masculino e nove são do
sexo feminino e dos 13 (treze) jovens pertencentes ao CCJ-Fortaleza, nove são do
sexo masculino e quatro são do sexo feminino.
De posse dos nomes dos jovens de cada grupo que se encontravam nos
critérios pré-estabelecidos, e separando-os entre jovens do sexo masculino e jovens
do sexo feminino, realizei um sorteio aleatório. Em seguida, iniciei a mobilização dos
seis jovens para aplicação dos instrumentais de pesquisa, quais sejam: o
questionário de identificação e o roteiro de entrevista semi-estruturada, instrumentais
esses que me possibilitaram construir o perfil dos sujeitos e os dados para análise,
respectivamente. Saliento que além dos seis jovens, entrevistei o coordenador de
cada grupo, totalizando nove entrevistas.
Assim, passo a apresentar ao leitor o perfil de seis jovens protagonistas
de suas histórias de vida e das histórias de lutas do bairro Planalto do Pici, em
busca de superar a violência sofrida e causada pela juventude, bem como no
incansável desafio de contribuir com a ressignificação da realidade vivenciada pelas
crianças, adolescentes e jovens residentes no referido bairro.
Para preservar a identidade dos entrevistados, ao longo de todo o
trabalho denomino-os com nomes fictícios21, para evitar a identificação dos mesmos
por parte de outros jovens e demais pessoas que tenham acesso à pesquisa. Já os
coordenadores são identificados como coordenador de cada grupo envolvido.
Como já informado, as perguntas fechadas contidas no questionário de
identificação possibilitou-me traçar um perfil dos seis jovens sujeitos da pesquisa,
sintetizado na tabela abaixo:
Tabela 2 Perfil dos Jovens Sujeitos da Pesquisa
Referência (Identificação/Grupo
Juvenil)
Idade Sexo Estado Civil
Tempo no Grupo
Escolaridade
Rua Estrada do Pici22
28 M Solteiro 5 anos Ensino Fundamental
21
Utilizo o nome de ruas e travessas do bairro Planalto do Pici, que são consideradas pelos moradores de cunho histórico. Tal informação foi extraída de um levantamento documental (áudio-visual), realizado de 2002 a 2003, onde foram entrevistados os moradores mais antigos do bairro, com o objetivo de construir um texto teatral abordando a história do Pici. 22
A rua Estrada do Pici é uma referência dada à antiga estrada de passagem do comboio de gado na região, que vinha de Messejana, passando pela Parangaba até o Pici. Na referida estrada os gados
32
JUJA Completo
Rua Planalto do Pici23
JUJA
15 F Solteira 2 anos Ensino Fundamental Em curso (5º ano)
Rua Alagoas24
ESCUTA
27 M Solteiro 13 anos Ensino Superior Em curso (licenciatura em
Teatro)
Rua Pernambuco25
ESCUTA
19 F Solteira 09 anos Ensino Médio Em curso (3º ano)
Rua Iguatú26
CCJ-Fortaleza
21 M Solteiro 2 anos Ensino Médio Em curso (1º ano)
Travessa Sinuosa27
CCJ-Fortaleza
28 F Solteira 3 anos Ensino Superior Incompleto (Pedagogia)
FONTE: Pesquisa direta. Elaboração do próprio autor.
Dos seis jovens entrevistados, dois são vinculados ao JUJA, sendo um
homem e uma mulher; dois são vinculados ao ESCUTA, sendo um homem e uma
mulher e dois são vinculados ao CCJ-Fortaleza, também um do sexo masculino e
outro do sexo feminino. Em relação à faixa de idade, apenas uma jovem está
compreendida na faixa etária de 15 a 17 anos; uma está compreendida na faixa
etária de 18 a 20 anos; um corresponde à faixa etária de 21 a 23 anos e três estão
compreendidos na faixa etária de 27 a 29 anos.
Todos os entrevistados são solteiros e participam dos grupos por um
período de 2 anos ou mais. Quanto à escolaridade, dois possuem ensino superior,
sendo um em curso e outro incompleto; dois estão cursando o ensino médio; um
está cursando o ensino fundamental e um possui ensino fundamental completo.
Todos residem no bairro Planalto do Pici e estão inseridos em grupos
juvenis, que se utilizam da arte-educação como ferramenta de mobilização e
consideram os jovens atores primordiais no processo de participação e
transformação das problemáticas sociais existentes na comunidade. Todos buscam
enriquecer o processo de aprendizagem, compartilhando suas experiências de vida
com as crianças, adolescentes e jovens inseridos nos grupos.
pastavam, pois existia um grande número de sítios, para depois serem levados para o município de Caucaia e outras regiões ao oeste do Estado do Ceará. 23
A rua Planalto do Pici é uma homenagem ao bairro e dá ênfase à localização da "Casa Mata" (local de armazenamento das armas e munições da antiga base americana). A Casa Mata foi reutilizada por um dos moradores dessa rua e integra um cômodo de sua residência até hoje. 24
As ruas Alagoas e Pernambuco cortam o bairro Planalto do Pici, aproveitando as antigas pistas da base aérea americana e se originaram no bairro Demócrito Rocha (bairro circunvizinho ao Planalto do Pici). 25
Ver nota de nº 22. 26
A rua Iguatú é uma homenagem feita pelos moradores em alusão ao município do Estado do Ceará que possui a mesma denominação. A homenagem dar-se ao fato de alguns moradores serem oriundos de tal município. 27
A travessa Sinuosa tem este nome por ser uma travessa com muitas irregularidades, pois possui diversas curvas ao longo do seu percurso.
33
Na intenção de compartilhar com o leitor um pouco dessas experiências,
a partir das questões abertas contidas no questionário de identificação, elaborei uma
breve contextualização da história de vida dos jovens e de suas participações nos
grupos. Entretanto, tal contextualização será abordada em capítulo posterior
(Capítulo 3), cujo foco de análise é o processo de ressignificação dos sujeitos,
problematizando sobre o impacto das ações dos grupos juvenis em suas vidas.
Me cabe agora adiantar, tão somente, que os depoimentos trazem a
realidade de jovens que coadunam com o desejo de transformarem a comunidade,
sendo a responsabilidade coletiva fator preponderante para o alcance da
transformação e ressignificação. Desse modo, no capítulo seguinte, faço uma
análise acerca das ações desenvolvidas pelas organizações e pelos próprios jovens
em prol do combate à letalidade juvenil no bairro Planalto do Pici, a partir da
percepção dos sujeitos envolvidos na pesquisa (coordenadores e jovens).
34
CAPÍTULO 2 – AS AÇÕES DAS ORGANIZAÇÕES E AS INTERVENÇÕES
JUVENIS NO COMBATE À LETALIDADE JUVENIL NO BAIRRO PLANALTO DO
PICI SOB A ÓTICA DOS SUJEITOS DA PESQUISA
Abordar a temática da letalidade juvenil no bairro Planalto do Pici, a partir
das ações desenvolvidas pelas organizações e das intervenções dos jovens sujeitos
da pesquisa, tendo como subsídio de análise seus próprios depoimentos e
percepções, me remete ao imprescindível diálogo com a teoria acerca das
categorias violência e juventude.
Desse modo, no primeiro momento, teoria e empiria se entrelaçam na
análise acerca do fenômeno da violência sofrida e causada pelas crianças,
adolescentes e jovens em um contexto geral e, especificamente, na realidade do
território referencial da pesquisa, identificando o lugar da juventude neste cenário.
Em seguida, mas sem haver um hiato entre teoria e empiria, faço uma
análise das percepções dos sujeitos da pesquisa – coordenadores e jovens – acerca
do enfrentamento ao fenômeno da violência, problematizando o fazer interventivo
das organizações juvenis do bairro Planalto do Pici no combate à letalidade juvenil.
2.1 Contextualizando o fenômeno da violência sofrida e causada pelas
crianças, adolescentes e jovens
Não tenho a pretensão de discutir a categoria violência em suas múltiplas
dimensões e alcances, levando em consideração o pensamento de Abramovay
(2002, p. 17) de que “não é simples a tarefa de definir a violência”. Entretanto, torna-
se mister explanar o conceito em que me ancoro acerca da violência em geral, para
depois abordar a modalidade aqui em análise, ou seja, a violência sofrida e causada
pela juventude.
Desse modo, trago o conceito utilizado por Abramovay (2002), baseando-
se no pensamento de Chauí (1999), de que violência é:
“[...] 1) tudo o que age usando a força para ir contra a natureza de alguém (é desnaturar); 2) todo ato de força contra a espontaneidade, a vontade e a liberdade de alguém (é coagir, constranger, torturar, brutalizar); 3) todo ato de transgressão contra o que alguém ou uma sociedade define como justo e como direito. Consequentemente, violência é um ato de brutalidade, sevícia e abuso físico e/ou psíquico contra alguém e caracteriza relações
35
intersubjetivas e sociais definidas pela opressão e intimidação, pelo medo e o terror [...]” (CHAUÍ, 1999 apud ABRAMOVAY, 2002, p. 17).
Pude observar no depoimento do coordenador do CCJ-Fortaleza uma
definição de violência em concordância com a teoria, ainda que não elaborada, pois
quando indagado acerca do fenômeno da violência na comunidade, afirmou que
“existem diversos tipos de violências, tipos de violações que acontecem dentro da
comunidade e que não são tão percebidas e o CCJ tem aberto as portas para que
as pessoas possam perceber” (Coordenador do CCJ-Fortaleza).
Quanto à violência sofrida e causada pelos jovens, a teoria propaga que
este contingente populacional representa “a parcela mais exposta às violações de
direitos pela família, pelo Estado e pela sociedade” (VOLPI, 2001, p. 13) e que
tornaram-se corriqueiros os casos de maus-tratos e as diversas formas de
exploração. Tal afirmação pode ser ilustrada pelo depoimento da coordenadora do
ESCUTA, ao afirmar que “a violência está mais ligada ao tráfico de drogas, o que
atinge diretamente às crianças e adolescentes que são vítimas constantes diretas”.
(Coordenadora do ESCUTA).
Com efeito, para a violência sofrida pelas crianças, adolescentes e jovens
existe o apelo emocional e maior possibilidade de sensibilização por parte da
sociedade, já que o foco de mobilização gira em torno dos “indefesos”. Esse
fenômeno pode ser demonstrado pelos diversos movimentos sociais que atuam em
prol dos direitos das crianças, adolescentes e jovens com direitos sociais violados
e/ou ameaçados de violação.
Para a violência causada pelo mesmo contingente populacional, a teoria
aborda três mitos recorrentes, quais sejam: do hiperdimensionamento do problema,
da periculosidade e da irresponsabilidade dos jovens.
Segundo Volpi (2001, p. 14), “o primeiro mito é o do
hiperdimensionamento do problema” e está relacionado à opinião pública, sobretudo
da mídia, que propaga o crescimento da delinquência juvenil, sem se utilizar de
dados confiáveis que possam estabelecer uma análise do fenômeno.
Atrelado ao mito do hiperdimensionamento surge o mito da periculosidade
dos adolescentes. Segundo Volpi (2001), estudos revelam que “os delitos praticados
pelos adolescentes são em sua maioria crimes contra o patrimônio” (VOLPI, 2001, p.
15). Ou seja, é mito a propagação de que os adolescentes tendem a praticar delitos
cada vez mais graves. Ocorre que quando o adolescente está envolvido em algum
36
ato infracional grave há uma grande repercussão midiática, que leva a população a
disseminar o terceiro mito, qual seja: o da irresponsabilidade do adolescente.
De acordo com Volpi, o mito da irresponsabilidade sustenta a ideia de que
o adolescente “estaria mais propenso à prática de atos infracionais porque a
legislação é muito branda na sua punição. Nesse caso ocorre uma confusão entre
inimputabilidade penal e impunidade28” (VOLPI, 2001, p. 16).
Complementa o autor que
“o fato de um adolescente ser inimputável penalmente não o exime de ser responsabilizado com medidas socioeducativas, inclusive com a privação de liberdade por até três anos. A ideia de que o agravamento de penas reduziria a prática de delitos não foi comprovada por nenhuma sociedade, nem mesmo por aquelas que adotam a pena capital” (VOLPI, 2001, p. 16).
Os três mitos estão relacionados entre si e corroboram para a discussão
da redução da maioridade penal de 18 (dezoito) para 16 (dezesseis) anos de idade,
ou seja, a intenção de estender o Sistema Penal Adulto ao adolescente em conflito
com a lei. De acordo com Saraiva (2005),
“os proponentes desta ideia, destituída de fundamentação apta a legitimá-la e construída no desconhecimento do sistema terciário de prevenção esculpido no Estatuto, fundado no Direito Penal Juvenil, desprezam a natureza de cláusula pétrea desta disposição constitucional” (SARAIVA, 2005, p. 78).
O desconhecimento descrito por Saraiva (2005) também pode ser
identificado nas argumentações utilizadas pelo senso comum para defender a
redução da maioridade penal, tais como: o argumento de que cada vez mais os
adultos se utilizam de adolescentes para a prática de crimes29, o discurso do voto30
28
De acordo com Saraiva (2006, p. 46), “A inimputabilidade – causa de exclusão da responsabilidade penal – não significa, absolutamente, irresponsabilidade pessoal ou social. O Estatuto prevê e sanciona medidas socioeducativas e medidas de proteção eficazes. Reconhece a possibilidade de privação provisória de liberdade ao infrator, inclusive ao não sentenciado em caráter cautelar – em parâmetros semelhantes aos que o Código de Processo Penal destina aos imputáveis na prisão preventiva – e oferece uma gama larga de alternativas de responsabilização, cuja mais grave impõe o internamento sem atividades externas”. 29
Saraiva (2006, p. 50) esclarece que “o argumento de que cada vez mais os adultos se servem de adolescentes para a prática de crimes e que por isso faz-se necessária a redução da idade de imputabilidade penal, se faz curioso. Ora, pretende-se estender ao “mandado” o mesmo sistema que não alcança o “mandante”? Quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas penas a este cominadas, regra geral do concurso de agentes. Se a questão for de eficácia de sistema; porque o mandante (de regra “pior” que o executor direto) não é responsabilizado? Aliás, reprimido o mandante, exclui-se a demanda”.
37
aos 16 (dezesseis) anos, o discurso do discernimento31, entre outros discursos que
desconsideram que “a mesma lógica de transgressão de lei praticada pelo
adolescente é praticada pelas instituições que têm a função de promovê-los
socialmente” (VOLPI, 2001, p. 17).
Concomitante à lógica de transgressão praticada pelas instituições
ocorrem a vulgarização da violência das relações sociais, a naturalização do crime e
a propagação de que a solução encontra-se na ampliação do sistema punitivo “ou
mesmo da privatização das soluções através da autorização tácita da vingança
privada” (Costa 2005, p. 33). Ou seja, pouca importância se dá para os inúmeros
jovens que morrem diariamente nas periferias das grandes cidades, à falta de
políticas públicas de prevenção, educação e emprego, à efetivação do Estatuto da
Criança e do Adolescente32 (ECA) e do Sistema Nacional de Atendimento
Socioeducativo33 (SINASE).
Aqui não me cabe esmiuçar a discussão sobre a realidade da juventude
em conflito com a lei, pois estaria ampliando o foco e os meus objetivos de pesquisa.
Minha intenção era abordar o fenômeno da violência sofrida e causada pelas
crianças, adolescentes e jovens, levando em consideração que “convivemos em
uma sociedade onde a violência, em seu sentido mais abrangente, faz parte da vida
cotidiana dos indivíduos, acontece em todos os segmentos sociais e está em todas
as instituições como na família, no trabalho, na escola, [...], e legitimada
socialmente” (COSTA, 2005, p. 32).
30
Quanto à argumentação do voto aos 16 (dezesseis) anos, Saraiva (2006, p. 50) ressalta que “dizer-se que se o jovem de 16 anos pode votar e por isso pode ir para a cadeia é uma meia-verdade (ou uma inverdade completa). O voto aos 16 anos é facultativo, enquanto a imputabilidade é compulsória. De resto, a maioria esmagadora dos infratores nesta faixa de idade sequer sabem de sua potencial condição de eleitores; falta-lhes consciência e informação. A questão de fixação de idade determinada para o exercício de certos atos de cidadania decorre de uma decisão política e não guarda relações entre si, de forma que a capacidade eleitoral do jovem aos dezesseis anos – facultativa – se faz mitigada. [...]. Não há critério subjetivo de capacitação, e sim decisão política”. 31
Em relação ao discurso do discernimento, Saraiva (2006, p. 51-52) afirma que “ninguém discute a maior gama de informações ao alcance dos jovens. [...]. Considerando o desenvolvimento intelectual e o acesso médio à informação, é evidente que qualquer jovem, aos 16, 14 ou 12 anos de idade, é capaz de compreender a natureza ilícita de determinados atos. [...]. O que cabe aqui examinar é a modificabilidade do comportamento do adolescente, e sua potencialidade para beneficiar-se dos processos pedagógicos, dada sua condição de pessoa em desenvolvimento”. 32
Lei Federal nº 8.069, de 13 de julho de 1990, institui o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que dispõe sobre a proteção integral à criança e ao adolescente. 33
Lei Federal nº 12.594, de 18 de janeiro de 2012, institui o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE), que regulamenta a execução das medidas destinadas a adolescente que pratique ato infracional.
38
Também cabe explanar, baseando-me no pensamento de Costa (2005),
que
“por ser um fenômeno complexo, conforme refere Silva, é necessário considerar que a violência possui diferentes acepções para grupos sociais diferentes, vivendo em sociedades diferentes, e mesmo para os que vivem no interior de uma mesma sociedade, compartilhando os códigos da mesma cultura. Estas múltiplas interpretações, segundo Guindani, se agregam indissolúveis ao próprio problema, integrando a sua complexidade. Um comportamento considerado violento e repreensível por um grupo pode ser julgado necessário e legítimo por outro. As explicações sobre o real, ou as fantasias geradas a partir dele, agregam-se às explicações científicas e constituem o próprio fenômeno da violência” (COSTA, 2005, p. 32-33).
Portanto, considerando a complexidade do fenômeno da violência e suas
diferentes acepções para grupos sociais diferentes, no item a seguir passo a
analisar as especificidades de tal fenômeno vivenciadas no bairro Planalto do Pici,
identificando o lugar da juventude neste cenário.
2.2. As disputas territoriais, as rivalidades das gangues e o tráfico de drogas: o
lugar da juventude nas facetas da violência vivenciada no bairro Planalto do
Pici
É importante abrir um parêntese antes de abordar as questões propostas
neste item, para explicitar que as informações aqui contidas acerca da
contextualização do fenômeno da violência no bairro Planalto do Pici foram extraídas
de um levantamento documental (áudio-visual), realizado de 2002 a 2003, onde
foram entrevistados os moradores mais antigos do bairro, com o objetivo de
construir um texto teatral abordando a história do Pici.
O referido texto fora então escrito pela professora doutora Ângela
Linhares (teatróloga e compositora) – que na época era assessora do ESCUTA – e
culminou com a construção do espetáculo “Jogueiros: guerreiros novos”, escrito por
Ângela Linhares e dirigido por Graça Freitas, em 2008-2010. Àquela época, tive
oportunidade de participar como pesquisador, realizando as pesquisas documentais
e o registro dos depoimentos dos moradores.
Fechando o parêntese e adentrando no fenômeno da violência vivenciada
no bairro Planalto do Pici, pode-se dizer, com base nos relatos dos moradores mais
antigos e ratificados nos depoimentos dos coordenadores e jovens entrevistados na
presente pesquisa, que o fenômeno está intimamente ligado à história da
39
comunidade, já que no entorno do descampado, hoje Planalto do Pici, existia um
conflito de disputa territorial entre as comunidades da Fumaça e Entrada da Lua,
encabeçado por duas turmas juvenis.
A rivalidade entre as duas turmas fomentou a necessidade da primeira
intervenção realizada pelo grupo JUJA, já que a sede situava-se – e ainda situa-se –
no meio das duas comunidades (Fumaça e Entrada da Lua), ou seja, era preciso
desenvolver alternativas visando à diminuição do conflito existente entre os jovens.
Desse modo, o JUJA passou a envolver os jovens das duas comunidades
em peças teatrais, como, por exemplo, a encenação da Paixão de Cristo; torneios
esportivos (futebol principalmente) e a quadrilha junina. É interessante registrar que
o nome da quadrilha “TONGIL” é uma homenagem aos dois jovens que decidiram
unir forças para acabar com os conflitos entre as duas comunidades, a partir de tais
intervenções artísticas, esportivas e culturais, são eles: Antônio (morador da Entrada
da Lua) e Gilmar (morador da Fumaça), com a junção dos dois nomes surgiu a
denominação “TONGIL”.
Segundo o coordenador do JUJA, “naquela época, com a quadrilha, foi
possível acabar o conflito existente entre os jovens das duas comunidades”.
Entretanto, salientou o coordenador, que outras expressões da violência foram
sendo instituídas, conforme ilustra em seu depoimento:
“esse fenômeno da violência existe desde a nossa fundação e na nossa percepção vem crescendo a cada ano. Um dos fatores é o aumento da população, pois antigamente era só o bairro João Arruda. Com as ocupações e o crescimento da população, o índice de violência na nossa comunidade aumentou e passou a apresentar outras formas, não só a disputa territorial encabeçada pelos jovens” (Coordenador do JUJA).
Como visto no Capítulo 1, ratificado no depoimento acima, o fenômeno da
violência no bairro Planalto do Pici originou-se das disputas territoriais, diretamente
associadas aos jovens, mas sem esquecer a lógica de ocupação desordenada, o
aumento desproporcional do número de habitantes e o caldeirão sócio-cultural
estabelecido, já que o bairro foi sendo constituído por pessoas oriundas de diversos
bairros de Fortaleza e do interior do Estado, ou seja, os conflitos eram inevitáveis
com a mistura de ideologias, costumes e crenças.
Na década de 90, quando o bairro Planalto do Pici já estava instituído e
legitimado, mais uma vez à juventude é atribuída a causa da violência estabelecida,
40
caracterizada pelos conflitos violentos desproporcionais das gangues formadas nos
bailes funk – cultura oriunda das periferias do Rio de Janeiro, especificamente dos
morros da capital fluminense, que tinha o objetivo de propagar as coreografias
criadas pelos grupos, mas o que deveria ser uma diversão tornou-se disputa violenta
entre os grupos juvenis.
A realidade do Rio de Janeiro não foi diferente da realidade de Fortaleza,
guardadas as especificidades de cada local, ou seja, muitos jovens foram mortos
nos conflitos dos bailes funk, que se estendiam para além dos clubes onde eram
realizados, adentrando nas comunidades e alastrando o medo e o terror, obrigando
os moradores e as instituições a pensarem estratégias de enfrentamento à
problemática. Uma das ações governamentais instituída, àquela época, foi a
proibição da realização dos bailes, que não foi suficiente para acabar a mortalidade
dos jovens, pelo menos na realidade do bairro Planalto do Pici.
Nos dias atuais, a violência continua aterrorizando o bairro Planalto do
Pici e ainda traz a juventude como ator direto do fenômeno, por conviver no abismo
do consumo abusivo de entorpecentes, com o consequente endividamento e o
pagamento da dívida com sua própria vida. Afora o recrutamento para o tráfico,
traduzido por Costa (2005, p. 43) como consequência do “Estado ausente”. A autora
informa que
“autores como Zaluar têm abordado sobre ausência, da presença insuficiente, ou da presença clientelista do Estado nas periferias das grandes cidades como causas para a proliferação de formas de estado paralelo, que acabam por controlar a vida das pessoas, seja pela adesão às alternativas de trabalho propostas pelas organizações criminais, pela proteção que tais organizações oferecem, ou, ainda, pelo silêncio que é imposto como meio de sobrevivência” (COSTA, 2005, p. 43).
Assim como a teoria propaga, o “Estado ausente” apareceu nos
depoimentos dos jovens entrevistados, conforme se identifica na fala: “é triste. As
pessoas estão morrendo por estarem na rua, nem na nossa própria casa estamos
seguros. As autoridades não se dão conta. Eles prometem, mas nunca fazem o que
prometeram” ( jovem Rua Pernambuco).
Além da ausência do Estado, Costa (2005) elenca outros aspectos que
contribuem para o envolvimento da juventude com o fenômeno do tráfico de drogas,
41
quais sejam: (i) fonte de renda imediata34; (ii) a correlação uso de drogas, tráfico e
acesso a armas de fogo35; (iii) status, auto-estima e virilidade – vantagens
simbólicas36.
Os coordenadores dos grupos juvenis ilustram essa concorrência com o
tráfico de drogas, abordando indiretamente os aspectos elencados acima, conforme
se identifica nos depoimentos: “nossa maior dificuldade é exatamente essa questão
social, financeira, que atinge uma escala de 80% de nossa comunidade, que faz
com que os jovens procurem o tráfico como meio mais fácil de conseguir dinheiro”
(Coordenador do JUJA) e “o tráfico de drogas torna nosso trabalho muito mais difícil,
já que estamos competindo diretamente com as facções existentes na comunidade”
(Coordenadora do ESCUTA).
Mas afinal, que ações estão sendo desenvolvidas para conquistar os
jovens, em detrimento ao envolvimento com o tráfico de drogas e demais práticas
ilícitas? O que, efetivamente, vem sendo proporcionado pelos grupos juvenis para
combater a letalidade dos jovens residentes no bairro Planalto do Pici? Qual a
intervenção dos jovens no enfrentamento da violência? Tais questões são
problematizadas no item a seguir, sob a ótica dos sujeitos da pesquisa.
34
Quanto à oferta do mundo do tráfico como fonte de renda imediata, a autora esclarece que “levando-se em consideração as modificações no mundo do trabalho, os altos índices de desemprego, a baixa escolaridade, as alternativas de sobrevivência dos jovens das classes populares, muitas vezes, passam pela adesão ao mundo do tráfico. Fonte de renda imediata, que permite um padrão de consumo jamais acessado através do mundo do trabalho formal ou informal, a adesão à criminalidade não é uma atitude determinada aos jovens da periferia, [...]. No entanto, comparada às outras alternativas econômicas acessíveis, torna-se uma possibilidade” (COSTA, 2005, p. 44). 35
Em relação ao segundo aspecto, a autora informa que “ o tráfico não se restringe ao transporte e venda de drogas, [...]. O mundo das drogas relaciona, em primeiro lugar, o consumo com a atividade econômica do tráfico. Logo a seguir, a necessidade de obtenção das drogas para consumo, ou para ampliar o acesso a outros bens, faz com que os jovens envolvam-se em outras atividades ilícitas, as quais também vão evoluindo em gravidade na medida em que evolui seu envolvimento com a droga. Observa-se que a maioria dos atos infracionais de natureza grave, que envolvem o porte ou o uso de armas, está também relacionada ao tráfico de drogas, o que permite concluir que se tratam de trajetórias onde se correlacionam o uso de drogas, o tráfico, enquanto atividade econômica, o acesso a armas ilegais e a prática de atos infracionais violentos” (COSTA, 2005, p. 44). 36
Quanto às vantagens simbólicas, a autora afirma que “na escalada da violência, os jovens da periferia têm a possibilidade de ganhos subjetivos, que não são possíveis de outro modo na vida da sociedade contemporânea. [...] A força adquirida pelo porte de armas, o poder acessado por dentro da hierarquia do tráfico, o medo provocado nas pessoas acabam por fortalecer a auto-estima e a visibilidade destes jovens, constituído-se em ganhos incomparáveis a outras alternativas de sobrevivência ou aos ofertados pelas parcas possibilidades de projetos de vida fora da criminalidade” (COSTA, 2005, p. 44-45).
42
2.3. Ações das organizações e intervenções juvenis no combate à letalidade
juvenil no bairro Planalto do Pici: o olhar dos sujeitos da pesquisa
Ao longo de todo o capítulo é evidenciada a complexidade do fenômeno
da violência, as suas diversas facetas, de acordo com o contexto histórico e as
transformações da questão social em cada época, mas a juventude em nenhum
momento deixou o seu lugar de destaque na discussão, seja como vítima, seja como
vitimizadora.
Mas que juventude é essa? Trata-se de uma fase da vida homogênea, em
que todas as pessoas estão sujeitas a vivenciar? Não. Na presente pesquisa utilizo-
me da concepção de que não existe unanimidade acerca do conceito de juventude,
mas coaduno com a ideia de produção sócio-histórica-cultural, conforme salientou
Groppo: “a faixa etária juvenil, assim como os demais grupos de idade, são uma
criação sócio-cultural própria, marcante e fundamental dos processos de
modernização e da configuração das sociedades contemporâneas” (GROPPO,
2000, p. 27).
Baierl (2002), ao teorizar acerca da juventude, considera que
“o problema de grande parte dos teóricos que falaram sobre juventude consiste ou em vê-la de forma singular (como se houvesse uma única juventude) ou em não conseguir explicar como se dá a constituição/diferenciamento das várias identidades da juventude. Em síntese, a juventude sempre foi um problema para a sociedade moderna, especialmente para o capitalismo. Porque, no fundo, o que ela expõe são as mazelas, as contradições desse sistema. Não é à toa que Marcuse quis ver nela, por intermédio dos estudantes, o potencial de um novo sujeito revolucionário” (Baierl, 2002, p. 53-55).
Cunha (2012), afirma que “Pais destaca, no entanto, que a juventude só
começou a ser vulgarmente encarada como fase de vida quando, na segunda
metade do século XIX, os problemas e tensões a ela associados a tornaram objeto
de consciência social” (PAIS, 2003 apud CUNHA, 2012, p. 41).
Assim, levando em consideração que “a juventude deve ser olhada não
apenas na sua aparente unidade, mas também na sua diversidade” (PAIS, 2003, p.
37), passo a analisar como os jovens sujeitos da pesquisa se percebem enquanto
atores no processo de intervenção das problemáticas vivenciadas pela comunidade
e que ações são desenvolvidas pelos grupos juvenis em que estão inseridos no
tocante ao combate à letalidade juvenil, observando a afirmação de Baierl (2002, p.
43
53) de que “para se compreender a razão da presença da violência no meio da
juventude, é preciso primeiro compreender o modo de ser da própria juventude na
sociedade moderno-contemporânea (ou tardo-capitalista)”.
Portanto, inicio a discussão abordando o processo de socialização da
juventude na contemporaneidade, utilizando-me da concepção de Souza, quando
afirma que
“para a juventude contemporânea, o processo de socialização é composto de múltiplas interações, [...]. Tendo acesso a múltiplas referências culturais, os jovens criam sentidos para as experiências que vivenciam e se constituem como sujeitos a partir destes processos” (SOUZA, 2004, p. 48).
Na realidade dos jovens sujeitos da pesquisa, um dos processos de
socialização se dá por meio da participação nos grupos juvenis, cujo objetivo
principal, nos três grupos pesquisados, é promover espaços de socialização entre os
jovens e participação política, atuando numa perspectiva de prevenção, conforme
retratam os depoimentos:
“as intervenções que fazemos ao longo desses anos é exatamente a mobilização dos adolescentes e jovens para participarem dos trabalhos sociais, culturais e esportivos, visando a formação social e a cidadania de cada um, pois serão adultos e precisam de uma nova perspectiva de vida” (Coordenador do JUJA).
“a atuação do escuta é principalmente de prevenção, com a arte e a cultura, com foco na educação popular, a inserção de crianças, adolescentes e jovens em atividades artístico-culturais para a formação de pessoas mais conscientes de suas realidades e mais capazes de mudarem suas vidas” (Coordenadora do ESCUTA).
“a educação popular é uma das nossas armas. A arte por si só tem esse poder de interação, de criar vínculos, de aproximar as pessoas umas das outras. E a metodologia que o CCJ propõe é uma metodologia muito desafiadora, porque a socialização é uma coisa muito difícil de se fazer dentro da sociedade que vivemos, que prega o individualismo e destrói as nossas relações” (Coordenador do CCJ-Fortaleza).
Quando indagados acerca das intervenções realizadas pelos grupos, os
jovens ratificaram as informações prestadas pelos coordenadores, ao afirmarem:
“o JUJA busca o resgate dos jovens das ruas. Faz com que eles participem de alguma atividade, como os festivais de quadrilha” (jovem Rua Estrada do Pici).
44
“nós temos promovido alguns projetos. O último foi a montagem de um espetáculo, que não visava somente um espetáculo, mas uma aula espetáculo, buscando reforçar a linha da arte-educação. O espetáculo ainda hoje circula pelas escolas municipais e tem como foco o tema do “crack”. A gente tenta problematizar nas escolas a partir do “teatro fórum”, realizando o espetáculo e dialogando com os adolescentes sobre as problemáticas” (jovem Rua Alagoas).
Os depoimentos acima denotam o caráter formativo das ações
desenvolvidas, a discussão das problemáticas vivenciadas e a busca pela
transformação da realidade, de forma lúdica e criativa. Tal realidade também foi
mencionada pelos jovens quando indaguei-os acerca da contribuição que o grupo
traz para a comunidade, a saber:
“o grupo traz para a comunidade a visão de valores, sem deixar a cultura da comunidade morrer” (jovem Rua Pernambuco). “traz de contribuição as oficinas para crianças e adolescentes, com metodologia própria, propondo mudar a situação da comunidade” (jovem Rua Chaval).
“a contribuição é sempre num propósito formativo, para construir uma sociedade mais atuante, que reivindique os seus direitos, que possa repensar valores. Acreditando que a arte pode proporcionar uma reflexão de mundo, em busca de uma sociedade mais justa, mais igualitária, tudo isso a partir da mobilização dos jovens” (jovem Rua Alagoas).
Quanto ao fenômeno da violência, identifiquei fragilidade nas discussões
por parte dos sujeitos da pesquisa, inviabilizando o seu aprofundamento,
possivelmente em virtude do desconhecimento acerca da questão, não no tocante à
existência do fenômeno, pois há unanimidade nos depoimentos quanto ao
alastramento da violência no bairro, mas em relação à propriedade acerca da
discussão, ou seja, os jovens e coordenadores propagam discursos do senso
comum, sem um aporte estatístico, sem identificar as fontes das informações,
conforme se identifica nos depoimentos: “o assassinato de jovens é muito constante.
O tempo todo tem casos de morte, violência” (jovem Rua Chaval); “a comunidade
inteira é afetada pela violência, dentro da comunidade existe muito extermínio de
jovens pela violência do tráfico” (jovem Travessa Sinuosa) e “a violência é muito
grande, os jovens ficam ociosos e fácil de ser encantado pelo tráfico” (jovem Rua
Estrada do Pici).
45
Antes de abordar outra questão identificada na pesquisa empírica, quanto
ao fenômeno da violência, convém registrar alguns dados envolvendo a relação do
fenômeno da violência com a juventude. Segundo Waiselfisz (2005),
“esse violento crescimento da mortalidade juvenil por armas de fogo fez aumentar, de forma constante e progressiva, a participação dos jovens na macabra contabilidade das mortes matadas pelas armas de fogo. As 2.208 mortes juvenis por armas de fogo em 1979 representavam 31,6% do total de vítimas de armas de fogo. Já em 2003, os 16.345 jovens que morreram por balas de armas de fogo representaram 41,6% do total de vítimas”. (Waiselfisz, 2005, p. 07).
Segundo consta no portal Nopatio37, pesquisa aponta que Fortaleza é a
13ª capital mais violenta do mundo. No primeiro mês de 2013, 163 (cento e sessenta
e três) pessoas foram assassinadas na capital cearense. Os jovens estão entre as
maiores vitimas. Já o Índice de Vulnerabilidade Juvenil nos municípios (IVJ)
classificou a cidade como a 4ª capital do Nordeste e a 9ª do Brasil onde os jovens
estão mais expostos à violência.
Waiselfisz (2011) afirmou que o IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica
Aplicada da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República)
divulgou uma pesquisa realizada em 2010, com amostra nacional, que questionava
às pessoas acerca do medo de serem vítimas de assassinato. Segundo o autor, “o
resultado é altamente preocupante, um sério toque de alerta: 79% da população têm
muito medo de ser assassinada; 18,8% pouco medo e só 10,2% manifestou ter
nenhum medo” (Waiselfisz, 2011, p. 08).
Essa realidade contida na pesquisa do IPEA, me remete à outra questão
apreendida na pesquisa de campo, qual seja: o medo que os entrevistados têm de
sofrer algum tipo de represália ao se envolverem na discussão, muito embora eu
tenha esclarecido os objetivos da pesquisa.
Quanto à questão, Waiselfisz (2011) alerta para a dificuldade de intervir
diretamente no combate ao fenômeno da violência, já que as pessoas têm medo do
enfrentamento, não denunciam e adotam uma espécie de neutralidade com relação
ao combate à causa, ou seja, se resguardam ao máximo. Segundo o autor, o próprio
Plano Nacional de Segurança Pública, assim como o Plano Nacional do
Desarmamento não obtiveram êxitos na diminuição dos índices de violência, daí a
37
Fonte: Portal Nopatio: www.nopatio.com.br/...que-acontece/pesquisa-aponta. Acesso em 25/05/2013.
46
urgência do envolvimento do poder público, por meio de políticas públicas no
enfrentamento da questão.
Tal realidade compele outros atores a entrarem em cena, como a
sociedade civil organizada, os movimentos sociais, em busca de amenizar a
problemática, muitas vezes assumindo papeis e responsabilidades que não são
suas. No caso dos grupos juvenis pesquisados, embora pairem na comunidade o
medo e o pacto de silêncio, os jovens consideram que existem ações de intervenção
no combate à letalidade juvenil, como identificado nos depoimentos:
“os grupos reforçam bastante a luta contra essa letalidade. Porque participam muitos jovens e isso dificulta o acesso a lugares piores, que levam os jovens à violência. Os jovens que participam das ações culturais são bem engajados, mas infelizmente não conseguimos envolver a todos, que, além da violência, vivenciam outras dificuldades, como conflitos familiares, questões sociais” (jovem Rua Chaval).
“o nosso trabalho social resgata muitos jovens do tráfico, das drogas. Muitos jovens do grupo eram envolvidos e a partir do momento que se engajaram no grupo passaram a interagir com a comunidade e foram se afastando das drogas, do tráfico. Sempre realizamos atividades que os envolvem em ações positivas, distanciando-os das coisas negativas, fazendo com que repensem e reajam” (jovem Rua Estrada do Pici).
“quando o jovem se engaja no grupo, a mente dele se expande e ele passa a ver com outros olhos, o que está sendo vivido, as violências e tentam passar por elas, desviar o caminho. Então é assim que o grupo enfrenta a letalidade juvenil, fazendo com que o próprio jovem perceba a necessidade de mudança, através das atividades que são oferecidas” (jovem Rua Pernambuco).
Os jovens relataram, ainda, que existem potencialidades e dificuldades no
desenvolvimento das ações dos grupos quanto ao enfrentamento à letalidade
juvenil. Foram unânimes em relação à potencialidade, registrando as atividades
artísticas como fator positivo, por facilitarem o processo de discussão e
aprendizagem de forma descontraída e criativa. Como dificuldades, relataram a
precariedade das condições financeiras e a falta de apoio governamental para o
desenvolvimento das atividades; dificuldade de aproximação, mobilização e diálogo,
quando o jovem já está envolvido com a violência; a drogadição e falta de
envolvimento dos demais membros da comunidade.
É importante registrar que não houve menção direta às questões
estruturais como dificuldades concretas. Muitas vezes os depoimentos são imbuídos
de uma responsabilização individual, como se cada jovem envolvido no contexto de
47
violência pudesse alterar a sua condição com o simples engajamento no grupo. Ou
seja, os grupos existem, as atividades são oferecidas, os jovens engajados realizam
a mobilização – “fazem a sua parte” – então cabe ao jovem que está vivendo a
problemática aceitar tudo que está sendo proposto e mudar a sua condição.
É evidente que um processo de ressignificação e superação requer a
aceitação individual e, portanto, a capacidade de resiliência de cada um, mas o
jovem não deve ser culpabilizado e as questões estruturais esquecidas. As ações
desenvolvidas pelas organizações e a intervenção dos jovens como sujeitos ativos
são importantes, mas não substituem a efetivação dos direitos consagrados na
Carta Magna brasileira e nas legislações específicas.
Os jovens estão bem assistidos em relação ao ordenamento jurídico, mas
existe um descompasso entre as leis e a sua efetiva aplicação. Na prática, esse
contingente populacional continua em condição de vulnerabilidade social e a
população desacreditada quanto aos instrumentos normativos.
No bairro Planalto do Pici a realidade não é diferente, os jovens convivem
com a falta de políticas públicas de educação, profissionalização, emprego e saúde;
falta de infraestrutura; escassez de espaços públicos de lazer, entre outras
problemáticas. Entretanto, a não redução das problemáticas sociais existentes na
comunidade e a não alteração do cenário de mortalidade dos jovens não podem ser
encaradas, tão somente, como insucesso das organizações juvenis, fracasso dos
jovens e enfraquecimento das relações comunitárias (LINHARES, 2003), mas como
questões sociais históricas, agravadas pelo empobrecimento da população, difíceis
de transposição.
Por outro lado, é significativo o processo de participação da juventude no
enfrentamento das problemáticas sociais, pois como salientou Souza (2008),
“a participação é o próprio processo de criação do homem ao pensar a agir sobre os desafios da natureza e sobre os desafios sociais, nos quais ele próprio está situado. Como tal, é um processo dinâmico e contraditório. O homem é criador da natureza; no entanto, enquanto ser social nasce já num contexto historicamente dado [...]” (Souza, 2008, p. 81).
Na concepção da autora, estaremos constantemente em contato com
ações contraditórias, que devem ser vivenciadas e enfrentadas por meio de
intervenções críticas, reflexivas e criativas, visando a transformação da realidade.
Para ela, não somos sujeitos a - históricos, mas estamos diretamente envolvidos na
48
organização e na capacidade de sistematização do processo contínuo de
aprendizado em relação à participação.
Os jovens envolvidos na pesquisa, reconhecendo a condição de sujeitos
históricos, estão diretamente envolvidos nos processos de aprendizado, a partir de
suas inserções nos espaços de participação existentes no bairro e visam a
construção de uma sociabilidade entre os seus, de modo a alcançarem a
transformação da realidade e a ressignificação de suas vidas.
Portanto, no capítulo seguinte, convido o leitor a fazer um passeio pelas
histórias e pelos processos de ressignificação de vida dos sujeitos da pesquisa,
problematizando se tais processos são facilitados, efetivamente, por meio de suas
participações nos grupos juvenis.
49
CAPÍTULO 3 – A IMPORTÂNCIA DAS ORGANIZAÇÕES JUVENIS DO BAIRRO
PLANALTO DO PICI NA RESSIGNIFICAÇÃO DE VIDA DOS SUJEITOS DA
PESQUISA
Ao problematizar sobre a possibilidade de ressignificação de vida por
parte dos jovens sujeitos da pesquisa, a partir de suas inserções nas organizações
juvenis do bairro Planalto do Pici, considerei pertinente iniciar a discussão
explanando acerca dos conceitos que envolvem a categoria movimentos sociais, já
que, com exceção do JUJA, os grupos juvenis se intitulam representantes de tais
movimentos, para em seguida apresentar as histórias de vida e os processos de
ressignificação dos jovens sujeitos da pesquisa, tendo como subsídio de análise o
entrelaçamento da teoria sobre as práticas discursivas/produção de sentidos no
cotidiano e subjetividade, e os dados empíricos produzidos.
3.1. Movimentos sociais populares de juventude: o caso das organizações
juvenis do bairro Planalto do Pici
Segundo Gohn (2009),
“o desenvolvimento explorador e espoliativo do capitalismo, a massificação das relações sociais, o descompasso entre o alto desenvolvimento tecnológico e a miséria social de milhões de pessoas, as frustrações com os resultados do consumo insaciável de bens e produtos, o desrespeito à dignidade humana de categorias sociais tratadas como peças ou engrenagens de uma máquina, o desencanto com a destruição gerada pela febre de lucro capitalista etc., são todos elementos de um cenário que cria um novo ator histórico enquanto agente de mobilização e pressão por mudanças sociais: os movimentos sociais” (GOHN, 2009, p. 15-16).
Esse novo ator histórico, sinalizado por Gohn (2009), se apresentou de
diversos modos no bairro Planalto do Pici, através de suas organizações
comunitárias, acompanhando, grosso modo, as expressões das organizações
populares que se instituíram no Brasil ao longo do tempo, como as associações de
moradores38, que se mobilizavam principalmente em prol de moradia e
infraestrutura, sob forte influência governamental, sem o desenvolvimento de uma
consciência crítica, seguindo as regras preconizadas pelo “jogo clientelístico [...]. um
38
Ressalta Gohn que, nas décadas de 70-80, “as associações de moradores tornaram-se pré-requisitos obrigatórios para que um grupo se relacione com os órgãos públicos” (GOHN, 2009, p. 31).
50
certo grau de subordinação ou de “respeito” pelos velhos caciques. [...], que as
impedem de darem saltos qualitativos em termos de uma efetiva participação da
população” (GOHN, 2009, p. 31).
Posteriormente, com o reconhecimento da importância do agir coletivo,
partindo das lutas concretas da comunidade e da necessidade de superar os
conflitos com as instituições governamentais, as organizações comunitárias foram
tomando forma, sob influência das Comunidades Eclesiais de Base (CEB’S), que de
acordo com Gohn (2009) foram,
“impulsionadas inicialmente pelas práticas da Igreja Católica em sua ala denominada Teologia da Libertação. Tratam-se de organizações que adotaram certas características comuns, a saber: base social ampla e relativamente homogênea (classes populares); não se organizam em entidades bem demarcadas mas em coletivos unificados por regiões geográficas, usualmente sedes de paróquias ou zoneamentos eclesiais [...]; a composição interna dos participantes se diferencia pelos papeis: agentes pastorais, padres, freiras, líderes populares, várias assessorias [...]; as lutas envolvem os setores mais espoliados e miseráveis da sociedade; toda a argumentação das demandas se faz em torno da noção de direitos” (GOHN, 2009, p. 36-37).
Na realidade do Planalto do Pici, as CEB’S atuavam por meio de
assessorias, com a participação de representantes da igreja (guiados pela Teologia
da Libertação39), com o desafio de mobilizar e transformar a realidade da população
excluída. Realidade esta ratificada nos depoimentos contidos na pesquisa de
Leonardo Sampaio,
“o povo precisava andar com suas próprias pernas. Nós nos propomos apenas a assessorá-los, pois como missionários temos que semear em outras áreas [...]. Éramos oito pessoas, três religiosas, três seminaristas e dois leigos [...]. O projeto partiu do desafio sentido pelos agentes de enfrentar a realidade de Fortaleza e juntar-se a população excluída da sociedade que veio do campo expulsa pelo latifúndio e vão se amontoando na periferia da cidade, ocupando terrenos e construindo seus “lares” [...]. Essa realidade era de fome, miséria, falta de moradia, saneamento básico, educação e o próprio descaso das autoridades governamentais” (Relato da irmã Luzia In: SAMPAIO, 1999, p. 41).
O relato acima coaduna com o que Gohn propaga em sua teoria acerca
da influência da Igreja Católica junto às associações comunitárias e ilustra a
centralidade “no desenvolvimento do homem explorado em luta pela construção de
39
“A utopia da teologia da libertação, é de, através de sua opção preferencial pelos pobres e engajamento nas lutas contra as variadas formas de opressão, desencadear um processo histórico de libertação dos povos latino-americanos” (SCHERER-WARREN, 1993, p. 33).
51
uma sociedade mais igualitária” (GOHN, 2009, p. 40). Essa centralidade também
esteve presente no projeto comunitário das associações no bairro Planalto do Pici,
primeiro alcançando propósitos quantitativos, como construção das casas,
banheiros, equipamentos sociais, depois novas formas de relações sociais entre os
participantes, como organização da população, consciência coletiva, negação dos
modelos clientelísticos (GOHN, 2009).
No caso dos grupos juvenis existentes no Planalto do Pici, além da
influência das assessorias de grupos religiosos, identificou-se forte influência da
educação popular40, expressa nos depoimentos dos coordenadores e jovens:
“o Escuta se rege nos princípios de Paulo Freire, com a educação popular, o seu carro chefe de atuação é a arte, o teatro, a dança, a música regional e o incentivo à leitura” (coordenadora do ESCUTA).
“partindo e referenciado nos princípios da educação popular é que a gente entende que essa revolução, como dizia Paulo Freire, ela tem que acontecer de baixo para cima, as pessoas precisam reconhecer e resolver os seus problemas, protagonizando a ação” (Jovem Rua Alagoas).
A partir dos relatos dos coordenadores e jovens e do constante diálogo
com a teoria, foi possível identificar que o ESCUTA e CCJ-Fortaleza se configuram
movimentos sociais populares de juventude, com “manifestações concretas
produzidas por grupos organizados” (GOHN, 2009, p. 49), pois a partir do
desenvolvimento de suas ações “projetam em seus participantes sentimentos de
pertencimento social. Aqueles que eram excluídos de algo passam a sentir-se
incluídos em algum tipo de ação de um grupo ativo” (GOHN, 2011, p. 15).
O grupo JUJA, por sua vez, embora objetive o fim da violência entre os
jovens moradores do bairro Planalto do Pici, através da sociabilidade proporcionada
por meio da quadrilha junina, acaba não se caracterizando como um movimento
social, pois desenvolve ações pontuais, sem uma reflexão crítica acerca da
realidade dos jovens e da comunidade, ou seja, resume-se ao desenvolvimento da
quadrilha e não apresenta propostas de intervenção e transformação societária.
40
Gohn esclarece que “o princípio básico adotado da educação popular foi o do desenvolvimento de uma ação pedagógica conscientizadora, que deveria atuar sobre o nível cultural das camadas populares, em termos explícitos dos interesses delas. O ponto de partida deveria ser uma análise dos “determinantes do estado atual da cultura do povo” e da formulação de projetos populares de “atualização social””(GOHN, 2009, p. 48).
52
Assim, atendo-me às especificidades do JUJA, do ESCUTA e do CCJ-
Fortaleza, passo a problematizar, no item a seguir, se tais grupos são capazes de
criarem “identidades a grupos antes dispersos e desorganizados” (GOHN, 2011, p.
15) e se, efetivamente, influenciam no processo de ressignificação da vida dos
jovens inseridos.
3.2. Um passeio pelas histórias e os processos de ressignificação de vida dos
sujeitos da pesquisa
Na intenção de compartilhar com o leitor um pouco das histórias de vida
dos jovens sujeitos da pesquisa, para em seguida abordar os seus processos de
ressignificação e singularização, construídos ao longo de suas inserções nos grupos
juvenis, “levando em consideração as dinâmicas históricas e as produções culturais”
(CUNHA, 2012, p. 95), elaborei uma breve contextualização contendo questões
acerca dos seus engajamentos, das atividades desenvolvidas, suas habilidades,
motivações e aspirações.
Para tanto, utilizei-me das perguntas abertas contidas no questionário de
identificação, que permitiram a produção de informações sobre um grupo, bem como
sobre os sujeitos singulares que o representa. Assim, a partir dos relatos dos seis
jovens sujeitos da pesquisa, construí um mapa que apresenta a síntese das
questões analisadas, dada a inviabilidade de apresentar a íntegra de suas histórias
de vida. Com efeito, a tabela abaixo (mapa) ilustra os sentidos construídos por cada
jovem e suas representações simbólicas afirmativas, por meio de seus discursos e
práticas.
Tabela 3 Histórias de vida dos jovens sujeitos da pesquisa – trechos das entrevistas
Jovem Grupo Como se engajou
Atividades Habilidades Motivação O que almeja
Rua Estrada do Pici
JUJA “Me engajei no grupo através da influência de amigos e de uma namorada”.
“Danço e participo do casamento da quadrilha (peça de teatro)”.
“Danço”. Sente-se motivado a permanecer no grupo devido “o trabalho social diante a comunidade, que resgata muitos jovens das drogas”.
“Um futuro bem melhor que o de hoje, sem muita violência, sem tráfico e diminuição das mortes de jovens”.
Rua Planalto do Pici
JUJA “Fui convidada a participar da quadrilha como reserva”.
“Danço” “Nenhuma, ainda estou vendo”.
Sente-se motivado a permanecer no grupo “porque é bom, porque eu
“Dançar na quadrilha”.
53
gosto”.
Rua Alagoas
ESCUTA “Participei de outros grupos juvenis, como o JUJA e o Utopia, até ser convidado a participar do ESCUTA, fazendo espetáculos como figurante e pequenas falas”.
“Participo de espetáculo teatral, na função de ator e produtor”.
“Eu sou ator de teatro de rua. Teatro popular, que dialoga com a cultura popular”.
Sente-se motivado a permanecer no grupo por uma “necessidade pessoal de expressão. O teatro tem sido também um instrumento de reivindicação política, de formação. Isso me traz significados e valores e me faz continuar no grupo”.
“quero ter outra alternativa, fazer um concurso e ser funcionário público, mas sempre com o pensamento voltado ao trabalho com as pessoas da comunidade, num trabalho que vise transformar as relações de poder da sociedade, visando diminuir com a desigualdade social no nosso país”.
Rua Pernamb
uco
ESCUTA “Me integrei no grupo após participar de uma oficina de fantasias, realizada em 2002”.
“Participo das oficinas de dança e faço parte da música e do teatro”.
“Danço e canto”.
Sente-se motivada a permanecer no grupo “pela vontade das crianças quererem estar no espaço, pelos projetos que apresentamos e por mostrar um trabalho legal para a comunidade”.
“Crescer pessoalmente, é claro. Ter uma vida digna, ter meu próprio negócio e só. Ser feliz”.
Rua Iguatú
CCJ-Fortaleza
“Me engajei no grupo através do convite de outros jovens que conheci no bairro e que já eram engajados”.
“Realizo oficinas para crianças e jovens. Faço parte da construção metodológica do grupo e da produtora”.
“Eu toco instrumentos musicais e faço malabares”.
Sente-se motivado a permanecer no grupo “pela diversão, prazer em fazer o que eu faço”.
“Diversão, muita diversão”.
Travessa Sinuosa
CCJ-Fortaleza
“Me engajei no grupo a partir da participação em projetos organizados pela Diaconia e o ESCUTA”.
“Realizo atividades pedagógicas, oficinas de teatro e temas transversais. Também sou responsável pela divulgação das atividades na comunidade (caravana de comunicação) e no blog do projeto”.
“Teatro de rua, de bonecos, perna de pau, música e fanzine”.
Sente-se motivada a permanecer no grupo devido “os laços de amizade que fizemos antes do CCJ e durante os processos de construção da metodologia. As atividades de artes e temáticas políticas e o projeto de produzir uma produtora cultural na periferia”.
“Viver bem”.
FONTE: Pesquisa direta. Elaboração do próprio autor.
54
Interpretando os depoimentos contidos na tabela acima, levando em
consideração que “a comunicação é o espaço privilegiado em que o sujeito se
inspira em suas diferentes formas de expressão simbólica, todas as quais serão vias
para estudar sua subjetividade e a forma como o universo de suas condições sociais
aparece constituído nesse nível” (REY, 2010, p. 14), pude identificar algumas
questões relevantes que merecem destaque, quais sejam:
(1) o potencial de mobilização da juventude, aqui identificado pela
influência dos amigos no processo de engajamento nos grupos, uma vez que a
maioria passou a frequentar as organizações após convite de outros jovens já
engajados, conforme se identifica nos seguintes depoimentos: “me engajei no grupo
através da influência de amigos e de uma namorada” (Jovem Rua Estrada do Pici) e
“me engajei no grupo através do convite de outros jovens que conheci no bairro e
que já eram engajados” (Jovem Rua Iguatú).
(2) a polivalência das atividades desenvolvidas, pois com exceção da
jovem “Rua Planalto do Pici”, que assim se expressa: “danço”, todos desempenham
mais de uma atividade nos espaços, conforme os depoimentos: “participo de
espetáculo teatral, na função de ator e produtor” (Jovem Rua Alagoas), “participo
das oficinas de dança e faço parte da música e do teatro” (Jovem Rua Pernambuco)
e “realizo atividades pedagógicas, oficinas de teatro e temas transversais. Também
sou responsável pela divulgação das atividades na comunidade (caravana de
comunicação) e no blog do projeto” (Jovem Travessa Sinuosa).
(3) a forte influência das habilidades artísticas. Nessa questão é
importante registrar que indaguei acerca de qualquer habilidade, mas as respostas
foram unânimes quanto às artísticas, seguem os relatos: “eu sou ator de teatro de
rua. Teatro popular, que dialoga com a cultura popular” (Jovem Rua Alagoas) e “eu
toco instrumentos musicais e faço malabares” (Jovem Rua Iguatú).
(4) o nível elevado de motivação. Nesse aspecto, todos os jovens
mostram-se motivados, sendo que três associaram a motivação a questões de
cunho pessoal, conforme expresso nos depoimentos: “necessidade pessoal de
expressão. O teatro tem sido também um instrumento de reivindicação política, de
formação. Isso me traz significados e valores e me faz continuar no grupo” (Jovem
Rua Alagoas), “porque é bom, porque eu gosto” (Jovem Rua Planalto do Pici) e
“pela diversão, prazer em fazer o que eu faço” (Jovem Rua Iguatú), os outros três
jovens associam-na (a motivação) à importância das atividades desenvolvidas para
55
a comunidade, ou seja, demonstram o cunho coletivo, aspecto bem ilustrado no
depoimento da Jovem Rua Pernambuco: “pela vontade das crianças quererem estar
no espaço, pelos projetos que apresentamos e por mostrar um trabalho legal para a
comunidade”.
(5) o desejo de um futuro melhor. Com exceção de dois jovens (Jovem
Rua Planalto do Pici, que almeja dançar na quadrilha e Jovem Rua Iguatú, que
deseja diversão, muita diversão), que relataram almejar algo para o presente, os
demais jovens, ao serem indagados acerca de suas aspirações para a vida pessoal,
relataram o desejo de um futuro melhor, alcançando a transformação da
problemática vivenciada na comunidade, como expressou a Jovem Rua Estrada do
Pici: “um futuro bem melhor que o de hoje, sem muita violência, sem tráfico e
diminuição das mortes de jovens” ou em busca de postos de trabalho que
possibilitem uma atuação visando a transformação da sociedade, como ressaltou o
Jovem Rua Alagoas: “quero ter outra alternativa, fazer um concurso e ser funcionário
público, mas sempre com o pensamento voltado ao trabalho com as pessoas da
comunidade, num trabalho que vise transformar as relações de poder da sociedade,
visando diminuir com a desigualdade social no nosso país” e a realização pessoal
vinculada à estabilidade financeira, como relatou a Jovem Rua Pernambuco:
“crescer pessoalmente, é claro. Ter uma vida digna, ter meu próprio negócio e só.
Ser feliz”.
É importante mencionar que ao interpretar os dados produzidos a partir
dos relatos dos jovens, sempre estive atento à concepção de que “a subjetividade
não se situa no campo individual, seu campo é o de todos os processos de produção
social e material” (Guattari; Rolnik, 2011, p. 41). Complementa os autores que “a
subjetividade individual [...] resulta de um entrecruzamento de determinações
coletivas de várias espécies, não só sociais, mas econômicas, tecnológicas, de
mídia e tantas outras” (Guattari; Rolnik, 2011, p. 43).
No caso dos jovens sujeitos da pesquisa mostrou-se evidente o que
Guattari e Rolnik denominam de produção de subjetividade capitalística, pois
embora estejam inseridos em espaços de participação que dizem objetivar a
transformação societária, a derrubada da ordem imposta, acabam reproduzindo os
velhos desejos capitalísticos de ascensão profissional, estabilidade financeira, por
exemplo, ou seja, “aceitamos tudo isso porque partimos do pressuposto de que esta
56
é “a” ordem do mundo, ordem que não pode ser tocada sem que se comprometa a
própria ideia de vida social organizada” (Guattari; Rolnik, 2011, p. 51).
Apesar de todas as reproduções capitalísticas, imbuídas nas
subjetividades dos jovens sujeitos da pesquisa, não se pode deixar de reconhecer
os processos de singularizações41 vivenciados por eles, que corroboram para o
alcance da ressignificação de suas vidas, ressignificação essa atribuída às suas
participações nos grupos juvenis.
Para os jovens, suas vidas foram modificadas por influência de suas
inserções nos grupos, pois, além de vivenciarem as problemáticas sociais existentes
na comunidade, como pobreza, falta de infraestrutura, estavam sujeitos a
vivenciarem o mundo da criminalidade, do tráfico de drogas e da morte precoce.
Consideram, ainda, que as organizações juvenis efetivamente
contribuíram para a ressignificação de suas vidas, por terem possibilitado o
despertar da consciência crítica, o desenvolvimento de habilidades outrora
adormecidas, a socialização e a troca de experiências com outros jovens e,
sobretudo, por disseminarem o desafio de lutar por uma sociedade igualitária,
desconstruindo o que foi construído historicamente.
41
Para Guattari e Rolnik (2011, p. 42), “a subjetividade está em circulação nos conjuntos sociais de diferentes tamanhos: ela é essencialmente social, e assumida e vivida por indivíduos em suas existências particulares. O modo pelo qual os indivíduos vivem essa subjetividade oscila entre dois extremos: uma relação de alienação e opressão, na qual o indivíduo se submete à subjetividade tal como a recebe, ou uma relação de expressão e de criação, na qual o indivíduo se apropria dos componentes da subjetividade, produzindo um processo que eu chamaria de singularização”.
57
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O meu primeiro e grande desafio enquanto pesquisador foi conseguir
alcançar o distanciamento necessário para realizar as análises propostas. Tratou-se
da preocupação de manter certo distanciamento frente às minhas concepções
enquanto membro efetivo de uma das organizações juvenis envolvida na pesquisa,
visando alcançar novo olhar em relação às ações dos grupos e intervenções dos
jovens no combate à letalidade juvenil, agora no lugar de pesquisador. Freire (1996)
esclarece a importância de se alcançar esse distanciamento para superar a
ingenuidade em busca da rigorosidade.
Não raras vezes me deparei com discurso e texto apaixonados, mas o
distanciamento me possibilitou uma criticidade para melhor investigar as
experiências desenvolvidas e as percepções dos sujeitos da pesquisa, em relação
às suas práticas e intervenções frente ao fenômeno da violência. Assim, o constante
diálogo entre teoria e empiria me possibilitou, através do acervo bibliográfico, dos
documentos institucionais e dos depoimentos dos coordenadores e jovens, tecer
algumas considerações acerca do fenômeno estudado.
Desse modo, as primeiras considerações envolvem as categorias de
análise, quais sejam: juventude, violência e movimentos sociais. Teoria e empiria se
entrelaçam em suas conceituações, muito embora as construções empíricas não
sejam tão formuladas como as teóricas, haja vista a familiaridade das discussões e o
lugar de análise.
Em relação à juventude, nessa pesquisa ratifiquei a inexistência de
unanimidade acerca dessa conceituação, mas os sujeitos entrevistados percebem-
na como uma construção sócio-histórica-cultural, que considera existir juventudes e
não uma fase da vida em que todos estão sujeitos a vivenciar de forma homogênea.
Quanto à violência, tornou-se evidente a complexidade da conceituação,
uma vez que pode assumir diferentes acepções a depender do grupo social em
discussão. Entretanto, foram unânimes as percepções de que a violência faz parte
da vida cotidiana dos indivíduos e está presente em todos os segmentos sociais. No
caso do bairro Planalto do Pici, o fenômeno da violência existe desde a sua
instituição, assumindo inúmeras facetas, a depender das expressões da questão
social em cada época, mas a juventude sempre assumiu papel de destaque, seja
58
como vítima ou vitimizadora. Na atualidade, a violência é considerada sinônimo do
uso e abuso de drogas ilícitas e recrutamento para o tráfico, traduzindo-se em
letalidade para os jovens.
Acerca dos movimentos sociais, também foi possível identificar a relação
entre teoria e empiria. No bairro Planalto do Pici, esse “novo ator histórico enquanto
agente de mobilização e pressão por mudanças sociais” (GOHN, 2009, p. 16)
acompanhou, guardadas as especificidades, o desenrolar do percurso histórico dos
movimentos sociais no Brasil. Inicialmente, assumiu o papel de associação de
moradores, pré-requisito imprescindível para dialogar com as esferas
governamentais, dentro de uma lógica clientelística e perspectiva de benesse, para
conquistar demandas pontuais e individualistas. Em seguida, tomaram forma as
associações e movimentos comunitários, atuando em âmbito coletivo, resistindo às
imposições governamentais, sob influência das assessorias das CEB’S, dentro de
uma lógica atrelada à conquista de direitos e transformação societária.
Com as alterações das expressões da questão social em cada tempo
histórico, os movimentos comunitários do bairro Planalto do Pici passaram a atuar
no enfrentamento das problemáticas que surgiam, assumindo como bandeira
primordial, na atualidade, a luta pela efetivação dos direitos das crianças,
adolescentes e jovens, segmento populacional cada vez mais vulnerável e alvo da
violência.
Quanto às organizações juvenis JUJA, ESCUTA e CCJ-Fortaleza, com
exceção do JUJA – que possui como foco de atuação o fomento à sociabilidade dos
jovens, por meio da quadrilha junina, de forma pontual –, podem ser identificadas
como movimentos sociais populares de juventude, pois desenvolvem ações
concretas produzidas por grupos organizados, baseando-se nos princípios da
educação popular, em busca de uma participação cidadã, “no sentido de construir ou
apontar caminhos para uma nova realidade social – sem desigualdades, exclusões
de qualquer natureza” (GOHN, 2011, p. 18).
Quanto à letalidade juvenil no bairro Planalto do Pici, a pesquisa apontou
haver um conhecimento superficial acerca do fenômeno, por parte dos sujeitos
envolvidos no estudo investigativo, o que inviabilizou o aprofundamento das
discussões. Tal fato pode ser atribuído à falta de propriedade para tecer
considerações em relação à questão ou, simplesmente, pela cultura do silêncio,
devido o medo de exposição e/ou represálias, por parte dos grupos criminosos.
59
Em relação ao combate à letalidade, ficou evidenciado o caráter
preventivo das ações das organizações juvenis, sendo a arte-educação principal
ferramenta metodológica no desenvolvimento das atividades propostas. Outro
aspecto apontado pela pesquisa foi o potencial da juventude no processo de
mobilização de outros jovens, através da socialização de suas experiências de vida.
Também evidenciou-se a importância dos grupos juvenis para o despertar
de habilidades artísticas outrora adormecidas, despertar esse aliado à construção de
um senso crítico por parte dos jovens inseridos, possibilitando-lhes conhecer e
fortalecer as suas aptidões, de modo a transformá-las em potenciais interventivos
junto à comunidade. Essa importância dos grupos pôde ser identificada quando os
jovens relataram os seus percursos de vida antes da inserção nas organizações
juvenis, pois apenas cumpriam suas obrigações normativas, como ir para a escola,
fazer a tarefa de casa, ou seja, não tinham despertado para o coletivo e para a
necessidade de intervir frente às problemáticas existentes na comunidade.
Por outro lado, a pesquisa apontou a necessidade de fortalecimento dos
grupos juvenis, sobretudo amadurecimento teórico e metodológico, de modo a
alcançarem uma práxis social que efetivamente alcance a emancipação da
comunidade e, consequentemente, dos sujeitos que a integram. Portanto é
necessário que os grupos criem seus próprios modos de referência e modos de
práxis, ou seja, consigam se desvencilhar das interferências governamentais e das
organizações não-governamentais, que acabam minando a autonomia dos grupos,
que ficam presos a cronogramas pré-planejados, prazos e metas que não são seus,
mas das instituições que direcionam as suas ações.
Desse modo, são prementes as construções dos Projetos Políticos
Pedagógicos, que tracem “seus próprios tipos de referências práticas e teóricas,
sem ficar nessa posição constante de dependência em relação ao poder global, em
nível econômico, em nível do saber, em nível técnico [...]” (GUATTARI; ROLNIK,
2011, p. 55), para que os grupos possam adquirir a liberdade de viver seus
processos, possam ter a capacidade de ler sua própria situação. Para Guattari e
Rolnik (2011, p. 55), “essa capacidade é que vai lhes dar um mínimo de
possibilidade de criação e permitir preservar exatamente esse caráter de autonomia
tão importante”.
Quanto aos processos de ressignificação de vida dos jovens sujeitos da
pesquisa, todos consideram a influência dos grupos juvenis para o alcance das
60
transformações de suas vidas, pois estavam fadados ao “insucesso”, ao mundo do
crime e ao recrutamento para o tráfico. Na percepção dos jovens, não fossem as
possibilidades de socialização, o aguçar dos sensos crítico e político proporcionados
pelas atividades desenvolvidas nos grupos juvenis, provavelmente estariam em suas
casas, objetivando tão somente conquistas individuais.
Hoje, inseridos nos grupos, se reconhecem enquanto coletivo, em busca
de alcançar a transformação da comunidade, fazendo interlocuções com diversos
atores sociais, participando de discussões em redes, fóruns e conselhos, visando
alterar o cenário que envolve a juventude popular, despertando o olhar do próprio
jovem como ator primordial na luta pela efetivação de seus direitos, já
consubstanciados nos instrumentos normativos, mas negligenciados no dia a dia.
Finalmente, não poderia deixar de mencionar o quanto cresci e aprendi
com o desenvolvimento dessa pesquisa, tendo como grande desafio aliar o
conhecimento científico à sua aplicação social, através da socialização do estudo,
que apontou a existência de “subjetividades seriadas”, que ainda perpetuam os
princípios capitalistas, a ordem da sociedade do consumo, apesar de todos os
esforços das organizações e dos próprios jovens de buscarem a quebra de
paradigmas, ou seja, ainda estão inseridos na inevitável contradição.
61
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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APÊNDICES
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APÊNDICE A
Questionário de identificação (Jovens sujeitos da pesquisa):
1. Nome:
2. Sexo:
3. Estado civil:
4. Idade:
5. Escolaridade:
6. Qual grupo faz parte?
7. Como se engajou no grupo?
8. Tempo de grupo?
9. Qual atividade você faz parte?
10. Que habilidade você possui?
11. O que motiva a permanência no grupo?
12. O que você almeja no grupo e na vida pessoal?
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APÊNDICE B
Roteiro de entrevista (Jovens sujeitos da pesquisa):
Critérios de escolha dos jovens que serão envolvidos na pesquisa:
Idade: 15 a 29 anos;
Estar engajado ou ter participado dos grupos pesquisados;
Residir no bairro Planalto do Pici;
Sorteio aleatório de duas pessoas (adolescentes e jovens) de cada grupo
para serem entrevistados.
1. Quais os movimentos juvenis existentes no bairro Planalto do Pici?
2. Qual grupo você participa?
3. O que lhe motivou a participar?
4. Dentro das atividades que você participa, o quê você desenvolve?
5. Quais as intervenções realizadas pelos membros do grupo junto à
comunidade?
6. Que contribuição o grupo traz diretamente para a comunidade?
7. Como você percebe o fenômeno da violência no bairro Planalto do Pici?
8. Que ações você desenvolve em relação ao enfrentamento à letalidade
(mortalidade) juvenil na comunidade?
9. Quais as potencialidades e dificuldades vivenciadas no desenvolvimento de
ações de enfrentamento à letalidade juvenil na comunidade?
10. Como foi sua trajetória de vida antes do engajamento no grupo?
11. A participação no grupo influenciou ou influencia na sua vida pessoal?
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APÊNDICE C
Questionário de identificação (Coordenadores dos grupos):
1. Nome:
2. Sexo:
3. Estado civil:
4. Idade:
5. Escolaridade:
6. Qual grupo representa e o cargo?
7. Como se deu o processo de escolha para ocupar o cargo?
8. Tempo de coordenação?
9. Qual atividade você desenvolve enquanto coordenador?
10. O que motiva a permanência no cargo de coordenador?
11. O que você almeja para o grupo?
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APÊNDICE D
Roteiro de entrevista para os coordenadores dos grupos juvenis:
Critérios de escolha dos grupos:
Ter sede e atuar no bairro Planalto do Pici;
Ter ações voltadas à juventude (adolescentes e jovens);
Atuar efetivamente no combate à violência e letalidade juvenil.
Serão envolvidos três grupos existentes no bairro (apenas os grupos que
atualmente desenvolvem ações de combate à violência).
1. Quais os movimentos juvenis existentes no bairro Planalto do Pici?
2. Quais as ações desenvolvidas pelo grupo junto à comunidade?
3. Quais as parcerias realizadas no processo de caminhada do grupo?
4. Como a instituição percebe o fenômeno da violência na comunidade?
5. Quais as intervenções realizadas pela instituição para o enfrentamento à
letalidade juvenil?
6. Quais as potencialidades e dificuldades enfrentadas pela instituição junto ao
objetivo de combate à violência?
7. Como a instituição avalia o seu impacto na vida de cada um dos adolescentes
e jovens que participam ou participaram do grupo?
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