01-05-2017
1.º DE MAIO
CGTP e UGT dão sinais de impaciência e exigem resultados ao GovernoCGTP quer mais resultados e a UGT sublinha que “ainda há muito por fazer”. Será que o clima de romance entre o Governo e os sindicatos está ameaçado? Função pública será um sector determinante
É certo que neste 1.º de Maio não
se erguerão cartazes a pedir
a demissão do Governo ou a
exigir o fi m da austeridade,
mas o clima de romance que
tem pautado a relação entre
o Executivo de António Costa e as
duas centrais sindicais pode estar
Raquel Martinscomprometido. Do lado da CGTP,
que até aqui tem valorizado a reposi-
ção de direitos em curso, começam a
surgir sinais de impaciência, exigem-
se resultados e há greves marcadas
em vários sectores. Na UGT, ganha
força a ideia de que “ainda há mui-
to por fazer” e o congresso aprovou
uma greve na função pública, caso o
Governo não abra uma mesa negocial
com os sindicatos do sector.
“Valorizamos a reposição de direi-
tos e as matérias que já foram sendo
resolvidas, mas estamos numa fase
em que se começa a verifi car que o
Governo está a patinar”, avisa Armé-
nio Carlos, secretário-geral da CGTP
que, nesta segunda-feira, estará na
Alameda, em Lisboa, para a tradi-
cional manifestação do 1.º de Maio
promovida pela central sindical.
Em alguns sectores, “há sinais cla-
Emprego retoma crescimento em 2016 e trava no último trimestre
População Empregada por duração do trabalhoEm milhares
Por idadeEm milhares, 4.º Trim. 2016
Em milhares
População empregada
4643,6
4250
4500
4750
2016 2011 20164.º Trim: 20152014201320122011
4.º Trim 2016
2377 2267
Homens Mulheres
14,4%Em 2014, as mulheresa trabalhar por conta
de outrem com horáriocompleto ganhavam
menos 14,4% doque os homens
Em 2016,os trabalhadores
a tempo completotrabalhavam em média
42 horas semanais.
12,7% trabalhavam maisde 50 horas e
15,7% menos de 40
41,3%Do total de
trabalhadores a tempoparcial gostaria
de trabalharmais horas
Tempocompleto
Tempoparcial
4001
631,5
4090
553,5
15 - 24
25 - 34
35 - 44
45 - 64
55 ou +265243,1
1905,1919,8
1310,6
Fonte: INE
Retrato do emprego em Portugal
Comemorações do 1.º de Maio da CGTP
ros de que o espaço de diálogo aberto
por esta solução governativa está a
ter uma lacuna signifi cativa”. “Fala-
se muito e resolve-se pouco”, atira,
dando como exemplo a greve anun-
ciada pela Sofl usa e pela Transtejo ou
a da função pública, marcada para 26
de Maio. No privado, “todas as hipó-
teses estão em cima da mesa”.
“A nossa paciência está condicio-
nada pela capacidade do Governo
ouvir e procurar resolver os proble-
mas”, desafi a.
Do lado da UGT, que este ano cele-
bra o Dia do Trabalhador em Viana
do Castelo, também surgem avisos de
que é preciso ir mais longe. “Foram
repostos um conjunto de direitos,
mas não todos”, diz Carlos Silva, lí-
der da central.
“A Administração Pública teve o
último aumento salarial em 2009, es-
Por qualificaçãoEm milhares, 4.º Trim. 2016
Por sectorEm milhares, 4.º Trim. 2016
Trabalhadores por conta deoutrem por tipo de contratoEm milhares, 4.º Trim. 2016
Taxa de pobrezaEm %
2003 2015
77%Trabalhadores porconta de outremabrangidos por
modalidades flexíveisde organização
do tempo detrabalho
63,1%Em 2015, a maioriados trabalhadores
afirmavam ter autonomiapara escolher as tarefas
que desempenham ea forma como as
organizam
51% ou +Trabalhadores que
diziam demorar menosde 15 minutos para
fazer o trajectoentre a casa e
o trabalho
Superior
Secundário epós-secundário
Até ao 3.º ciclodo básico
Empregados
2218
1192 1234
Serviços Indústria, construção,
energia e água
Agricultura, produçãoanimal e pesca
307,3
1159,2 3177,1
Contrato com termoe outras situações
Contratosem termo
765,4 2878
21% 79%
Desempregados
12,4
32,0
10,9
52,0
PÚBLICO
MIGUEL MANSO
no ano passado em Lisboa
tamos em 2017 e ouvimos o Governo
dizer que eventualmente só em 2020
ou em 2022 é que poderá haver au-
mentos. Isso é inaceitável”, destaca
em declarações ao PÚBLICO.
Sinais de impaciênciaO Governo do Partido Socialista,
apoiado no Parlamento pelo PCP e
pelo BE, “trouxe um espaço de aber-
tura completamente diferente do Go-
verno anterior e houve uma reposi-
ção de direitos”, reconhece Arménio
Carlos. “Agora entramos na segunda
fase. Há um conjunto de problemas
estruturais que ainda não tiveram
resposta e que precisam de respos-
ta, sob pena de sermos confrontados
com a manutenção de leis que esti-
veram associadas à acentuação das
desigualdades e da pobreza laboral”,
precisa, em declarações ao PÚBLICO.
CGTP em todo o país. UGT em Viana do Castelo
A CGTP assinala o Dia do Trabalhador com iniciativas festivas e de protesto em 40 localidades, em defesa
da “valorização do trabalho e dos trabalhadores”, enquanto a UGT escolheu Viana do Castelo para assinalar a data.
Em todas as capitais de distrito e muitas outras localidades do continente e das ilhas vão realizar-se iniciativas que evocam os 131 anos dos acontecimentos de Chicago, que levaram à criação do Dia do Trabalhador. A Intersindical salienta que a luta dos trabalhadores contribuiu para derrotar e afastar o Governo do PSD-CDS e para alcançar objectivos como o aumento do salário mínimo ou a recuperação dos quatro feriados. O ponto alto do dia será a manifestação de Lisboa
e do Porto. As comemorações em Lisboa, começam de manhã, com a Corrida Internacional do 1.º de Maio e para a tarde está marcado o desfile entre o Martim Moniz e a Alameda D. Afonso Henriques, onde Arménio Carlos, líder da CGTP, irá intervir. No Porto, durante a tarde, haverá um desfile pela Baixa que terminará na Avenida dos Aliados.
A UGT optou por comemorar o 1.º de Maio em Viana do Castelo sob o lema “Crescimento, Emprego, Mais Justiça Social”. As comemorações iniciam-se com uma marcha solidária durante a manhã. As intervenções do secretário-geral da UGT, Carlos Silva, e da presidente, Lucinda Dâmaso, estão agendadas para o início da tarde no centro cultural da cidade. Lusa
O ponto que está a criar maior fo-
co de tensão é a intransigência do
Governo em rever a legislação labo-
ral e em ceder a duas bandeiras que
para a CGTP são determinantes: o
fi m da caducidade dos contratos co-
lectivos e a reposição do tratamento
mais favorável.
A função pública é outro ponto
problemático que no último conse-
lho nacional da CGTP gerou um aceso
debate entre a tendência minoritária
ligada ao BE, que defende a impor-
tância de os sindicatos participarem
na solução para os trabalhadores
precários do Estado, e dirigentes da
tendência comunista que colocam
dúvidas quanto à participação nas
comissões que vão decidir quem
poderá aceder ao programa de re-
gularização extraordinária e onde os
sindicatos estão em minoria.
Função pública e legislação laboral são alguns dos pontos de confronto
c
1.º DE MAIO
A central acabou por não tomar qual-
quer decisão, remetendo-a para os
sindicatos da função pública congre-
gados na Frente Comum.
Esta situação exemplifi ca bem os
tempos que se vivem dentro da CG-
TP, central que tradicionalmente as-
sume uma posição de contestação e
que agora, perante um Governo com
o apoio do PCP e do BE, se vê impeli-
da a adoptar uma posição mais mo-
derada, “para evitar quebrar a base
social de apoio ao Executivo”. Quem
o diz é Carlos Trindade, líder da ten-
dência socialista da CGTP, que con-
sidera que a central sindical está nu-
ma posição delicada entre o apelo da
rua e a necessidade de assumir uma
acção “com conta-peso e medida”.
O próprio líder da CGTP que
reconhece que no actual contex-
to “o papel dos sindicatos é mais
desafi ante”.
Na UGT, o clima é de maior tran-
quilidade, principalmente depois de
ter percebido que o Governo conti-
nuava apostado em levar à concerta-
ção social — lugar onde a UGT capita-
liza a sua infl uência — temas laborais
como a contratação colectiva ou o
salário mínimo nacional, o que já deu
origem a dois acordos.
O problema, neste momento, re-
side na função pública. Foi este o
sector que criou alguma agitação no
congresso morno que decorreu em
Março, no Porto, com a aprovação
de uma moção que prevê uma greve,
caso o Governo não abra a porta a
um processo negocial para discutir o
descongelamento das carreiras.
Sem beliscar a “geringonça”Apesar da pressão, “nem a UGT, nem
a CGTP vão ser factores para abrir
uma crise política”, como alerta o
antigo presidente do Conselho Eco-
nómico e Social, Silva Peneda
“A prioridade do PCP, do BE e da
CGTP é garantir que a direita não vol-
ta ao poder. Vão protestando, mas
daí até abrirem uma crise política.
Não vejo que isso aconteça, o que di-
fi culta a vida à oposição”, sublinha.
Na verdade, acrescenta o sociólo-
go do ISCTE, Alan Stoleroff , as duas
centrais “têm actuado com bastan-
te cuidado”. Em particular a CGTP
que, embora continue a reivindicar,
adoptou uma postura mais cautelo-
sa, “para não estorvar o entendimen-
to político estabelecido entre o PS/
Governo e os partidos à esquerda”.
Silva Peneda usa como medida da
paz social que se vive, os pedidos de
arbitragem de serviços mínimos que
chegam ao Conselho Económico e
Social maioritariamente com origem
no sector dos transportes. Em 2012,
eram 83, em 2016 já só foram 13. Os
números mais recentes, até ao fi nal
de Abril dão conta de sete pedidos, o
últimos a dar entrada dizem respeito
às greves da Sofl usa e da Transtejo,
responsáveis pelo transporte fl uvial
entre as duas margens do Tejo.
Menos sindicalizadosSe por uma lado a solução governa-
mental condiciona a actuação das
centrais sindicais, há outros facto-
res a ter em conta e que não são de
agora, como a desmobilização da
sociedade. Os sindicatos têm vindo
a perder fi liados e a crise da contra-
tação colectiva também lhes retira
capacidade de intervenção.
Os números mais recentes mos-
tram que nenhuma das duas centrais
sindicais pode cantar vitória. Entre
2012 e 2016, período que coincidiu
parcialmente com a permanência da
troika em Portugal e com taxas
de desemprego nunca antes
registadas, os que saíram
dos sindicatos foram me-
nos do que os que entraram.
Os dados mais recentes
mostram que em quatro
Fim da caducidade e tratamento mais favorávelÉ uma reivindicação das duas centrais, mas é na CGTP que o tema ganha maior relevância. Para a Intersindical não é suficiente o compromisso do Governo não publicar avisos de caducidade até meados do próximo ano e é determinante que a negociação colectiva fique nas mãos das empresas e dos representantes dos trabalhadores, sem que a “espada” da caducidade condicione o processo. UGT e CGTP Defendem ainda a reposição do princípio do tratamento mais favorável, para que as convenções não possam ter normas abaixo do que a lei prevê. O Governo reconhece que a caducidade é um problema, mas ainda não revelou até onde admite ir.
Revisão das normas laborais da troikaPara a CGTP é preciso rever as normas que facilitam os despedimentos e reduzem das indemnizações pagas aos trabalhadores, aprovadas durante o período da troika. O mesmo acontece com os instrumentos de flexibilização do tempo de trabalho (em particular os bancos de horas individuais), bandeira também da UGT. O Governo promete
rever o banco de horas, mas não será no imediato, propostas
de revisão da lei laboral só devem chegar em 2018. O Livro Verde sobre as Relações Laborais dá conta de que 77% dos trabalhadores por conta de outrem tinham modalidades flexíveis de organização do tempo de trabalho.Combate à precariedadeÉ outro tema que une as duas centrais sindicais: resolver o problema da precariedade na Administração Pública, onde existem mais de 100 mil precários, mas também no sector privado, onde mais de 30% dos trabalhadores têm contratos a termo, temporários ou outros vínculos precários.
Carreiras e salários da função públicaA UGT lembra que a Administração Pública teve o último aumento salarial em 2009 e considera inaceitável que o Governo atire para 2020 novos aumentos. O descongelamento das carreiras é uma reivindicação tanto da UGT como da CGTP, algo que acabará por se reflectir nos salários. As novidades nesta área só deverão chegar em 2018 e o Governo já disse que o descongelamento será progressivo e poderá não chegar a todos.Política fiscal mais progressivaA distribuição da riqueza, o aumento dos salários (uma das bandeiras da CGTP
para o 1.º de Maio é um aumento de 4%) e uma política fiscal mais progressiva também são comuns às duas centrais. “É inaceitável continuarmos com
uma carga fiscal tremenda”,
alerta a UGT.
As bandeiras das duas centrais sindicais anos a CGTP perdeu 63.588 sindi-
calizados. Em Janeiro de 2016, a
central representava 550.500 tra-
balhadores, menos 10,5% do que em
2012 e o número mais reduzido das
últimas décadas.
Os números, justifi ca a central,
refl ectem a perda de emprego, o
encerramento de empresas e o pico
de saídas de pessoas para o estran-
geiro vivido durante o período da
troika. Ainda assim, o líder da CG-
TP, garante que em 2016 já se notou
uma inversão, dando conta novas
sindicalizações.
A UGT, que no fi nal de 2016 re-
presentava 458.000 trabalhadores,
registou também uma perda de sindi-
calizados embora em menor escala.
De 2012 para 2016 verifi cou-se um
recuo de 20 mil pessoas. O relatório
do secretariado nacional, destaca
que apenas o sector da Administra-
ção Pública registou acréscimo de
fi liados, com as restantes áreas a so-
frerem reduções.
Novas causasPara a socióloga e investigadora,
Maria da Paz Campos Lima, “hou-
ve passos positivos [na reposição de
direitos] que justifi cam que não se
venha para a rua” e é isso que jus-
tifi ca a paz social que se vive. Isso
não signifi ca que “não haja questões
concretas e sectores com uma agen-
da reivindicativa”.
Alan Stoleroff vai mais longe e aler-
ta que num sentido mais lato não se
pode falar em paz social, numa al-
tura em que “as transformações no
mundo laboral são para muitos traba-
lhadores de uma violência constran-
gedora”. A questão é que as opor-
tunidades para a acção ainda não
surgiram ou, como alertam outros
especialistas, os trabalhadores ainda
não encontraram quem os possa re-
presentar nessas preocupações.
Elísio Estanque, sociólogo de
Coimbra, considera que “é funda-
mental” os sindicatos mostrarem
abertura para questionar a forma
como o campo laboral está a ser re-
formulado, assente no individualis-
mo, na fl exibilidade, na pluralidade
de vínculos.
“Os próprios sindicatos deviam
promover um grande debate públi-
co sobre a evolução tecnológica” e
não ter receio de abordar o tema sem
preconceitos.
A prioridade do PCP, do BE e da CGTP é garantir que a direita não volta ao poder. Vão protestando, mas daí até abrirem uma crise. Não vejo que isso aconteça, o que dificulta a vida à oposiçãoSilva PenedaAntigo presidente do Conselho Económico e Social
458A UGT representava 458 mil trabalhadores no final de 2016. Menos 20 mil sindicalizados que em 2012
550A CGTP tinha em Janeiro de 2016, pouco mais de 550 mil sindicalizados. Uma quebra de 10,5% face a 2012
há outros facto
que não são de
mobilização da
catos têm vindo
crise da contra-
bém lhes retira
venção.
recentes mos-
as duas centrais
ar vitória. Entre
o que coincidiu
permanência da
com taxas
nca antes
saíram
am me-
traram.
centes
quatro
individuais), bandeira tambémda UGT. O Governo promete
rever o banco dehoras, masnão será no imediato,propostas
1.º DE MAIO
O sociólogo Alan
Stoleroff , que há várias
décadas estuda o
movimento sindical
português, reconhece
que a actual solução
governativa obriga a CGTP e a UGT
a actuarem com cuidado para
não estorvarem o entendimento
político entre PS, BE e PCP. Mas,
refere numa entrevista por escrito
ao PÚBLICO, as duas centrais
estão condicionadas por outros
motivos, em particular as suas
capacidades reais de mobilização e
a descompressão que o país está
viver face ao período da troika.
Como vê a forma como a CGTP
e a UGT se têm posicionado
perante o Governo?
Actualmente, na medida em que
os sindicatos estão constrangidos
quanto às suas capacidades
reais de mobilização (quer nos
locais de trabalho, quer para
acções de protesto), torna-
se cada vez mais importante
o papel das confederações
enquanto representantes de
classe ao nível político. Ambas as
confederações têm confrontado
os jogos políticos com cuidado,
em função das suas orientações
ideológicas e programáticas.
A UGT tem sido consistente ao
apostar fundamentalmente na
concertação. A CGTP procura jogar
na dependência que o Governo
tem em relação aos arranjos com
a esquerda, mas procura esticar
as possibilidades na medida que
pode. Têm actuado com bastante
Solução de Governo “constrange a acção das confederações”
Alan Stoleroff , sociólogo do ISCTE, avisa que por trás da aparente paz social, o mundo laboral está a sofrer transformações que para muitos trabalhadores são de “uma violência constrangedora”
Entrevista Raquel Martins e Sónia Sapage
cuidado, mas estão constrangidas
pelas suas capacidades reais de
mobilização e pela descompressão
que o país ainda está a viver com o
alívio em comparação com os anos
de tensão terrível sob a troika e o
Governo PSD-CDS.
A CGTP está menos
reivindicativa?
Não diria menos reivindicativa,
mas muito cautelosa, como
tem de ser, para não estorvar o
entendimento político estabelecido
entre o PS-Governo e os partidos à
esquerda. Com cuidado, procura
esticar as possibilidades para
conseguir algo. Pela primeira vez
talvez desde 1975 não aparece a
palavra de ordem “Governo para
a rua.” As coisas estão melhores
agora (ou pelo menos, menos
mal) do que quando o PSD-CDS
estava no Governo. Mas a CGTP
está a lutar para conseguir repor
as medidas que eram as alavancas
para o modelo de contratação
colectiva que tínhamos. Basta
ver as suas reivindicações para
o 1.º de Maio. Por não avançar
com as palavras de ordem que
usou contra o Governo da troika,
não quer dizer que seja menos
reivindicativa. De maneira
nenhuma. As suas reivindicações
(talvez com excepção dos 4% de
aumento salarial) são realistas
dadas as possibilidades da
situação.
A UGT perdeu espaço na
concertação social a favor do
Parlamento?
Nesta conjuntura, a concertação é
que perdeu algum espaço em
relação aos processos
legislativos, mas a
concertação mantém
a sua importância
para os processos de legitimação
no domínio laboral. Simplesmente
já não é the only game in town.
Como é que avalia as estratégias
sindicais de cada central?
Não avalio tanto. Os
constrangimentos são reais
para ambas. Dados estes
constrangimentos relativos ao
poder negocial nas empresas
e na contratação colectiva e à
mobilização, a actuação “política”
das confederações quer em
relação ao Parlamento, quer em
relação à concertação tornou-
se fundamental. Se calhar, de
momento, temos que relativizar o
que entendemos por estratégias.
A actual solução de Governo
compromete ou neutraliza o
movimento sindical português?
Não neutraliza mas,
evidentemente, constrange a acção
das confederações.
O facto de os partidos com base
sindical (PCP e BE) se sentarem
à mesa com o Governo tem
servido melhor para atingirem
os seus objectivos do que a
pressão dos sindicatos?
Em primeiro lugar, o PS e mesmo o
PSD têm aderentes no movimento
sindical! Por outro lado, nesta
conjuntura a pressão dos sindicatos
está atenuada pelas perdas na
sindicalização e pela perda de
poder negocial na contratação
colectiva. Portanto, a actuação
política das confederações
em relação ao Parlamento
e à concertação tornou-se
fundamental. Desde a instauração
do Governo PS, os sindicatos têm
tido pequenas vitórias, mas este
Governo não está a ceder a todas
as reivindicações, nomeadamente
em relação à legislação laboral e à
Desde a instauração do Governo PS, os sindicatos têm tido pequenas vitórias, mas este Governo não está a ceder a todas as reivindicações, nomeadamente em relação à legislação laboral e à contratação colectiva
contratação colectiva.
Podemos dizer que vivemos
tempos de paz social em
Portugal? Ou estamos apenas a
ressacar dos tempos da troika e
de muita austeridade?
Por um lado, sim, estamos a
ressacar. O tempo da troika e do
Governo PSD-CDS foi traumático.
As feridas ainda não cicatrizaram.
Ninguém quer regressar
àquele tempo. Mas também há
constrangimentos à acção sindical
que derivam do enfraquecimento
que sofreu na crise e as
transformações subsequentes
da economia e do mercado de
d cações
o dos 4% de
o realistas
es da
ço na
a favor do
concertação é
paço em
s
m
RUI GAUDÊNCIOA UGT comemorou o 1.º de Maio de 2014 em Belém, Lisboa
trabalho. De toda a maneira, paz
não há num sentido profundo. As
transformações no mundo laboral
são para muitos trabalhadores de
uma violência constrangedora.
Mas as oportunidades para acção
colectiva destes trabalhadores
ainda não apareceram.
A “geringonça” está a travar
outros movimentos sociais?
A “geringonça” não está a travar
a emergência de movimentos
sociais. Com o aumento de
representação do BE, em
particular, no Parlamento, certos
movimentos até conseguiram
obter uma voz no Parlamento. O
que está a descansar de momento,
em parte devido à “geringonça”,
é o protesto político popular. A
reposição de algum rendimento, a
aparência de reposição de alguns
direitos, a percepção de algum
alívio em relação ao que foi uma
ofensiva brutal contra a classe
trabalhadora estão a condicionar
o protesto político; isso sim.
Mas não se deve confundir
movimentos sociais com o
protesto político que se exprime
em nome da classe trabalhadora.
[email protected]@publico.pt
Prevalece na opinião
pública um sentimento
de menor atenção ou
mesmo de descrédito em
relação aos sindicatos.
Existiria um divórcio
entre trabalhadores e sindicatos
que conduziria à morte lenta
do movimento sindical. A taxa
de sindicalização nas empresas
privadas teria baixado muito,
só se aguentando em empresas
de capital público. As portarias
de extensão tornariam rígido o
mercado laboral e levariam ao
encerramento de empresas e ao
desemprego. Tudo conduzindo a
uma perda de popularidade dos
sindicatos, em comparação com as
confederações patronais.
Desmontemos este maniqueís-
mo: o “divórcio” entre trabalhado-
res e sindicatos não se deve a qual-
quer comportamento unilateral;
tem como razão de ser o Estado
Social ter universalizado benefícios
pelos quais se batiam os sindicatos
há cem anos — condições de tra-
balho dignas, carreiras, reformas,
apoio no desemprego, saúde e
apoios sociais.
A diminuição das taxas de
sindicalização é acentuada
pelo número de trabalhadores
precários, relutantes em se
sindicalizar para não serem
vistos como agentes de intenção
reivindicativa. A validade da
negociação coletiva para cada setor
não foi uma criação constitucional,
vem de sempre. É justo tratar
como igual tudo o que seja igual. A
suposta rigidez da contratualização
coletiva está hoje atenuada:
comissões de trabalhadores já
celebram contratos coletivos ou
“acordos de empresa”, associando
salário e emprego numa base de
massa salarial e não de apenas
salário.
As portarias de extensão,
vistas como o principal fator
de rigidez, foram severamente
restringidas nos seus efeitos em
2012, mas foi atenuado o efeito
em 2014. O mercado de trabalho
desregulou-se de forma abusiva,
segmentando-se ainda mais.
Salários mais baixos, gerados pela
caducidade dos antigos acordos
e difícil extensão dos seguintes,
levaram a precarização e pobreza
e também a concorrência desleal
entre empresas. O repúdio
foi bilateral: não apenas dos
sindicatos, também das empresas,
perturbadas pelo desaparecimento
das regras de jogo e pelos riscos de
desagregação associativa. Signifi ca
isto que se deve voltar ao antigo
regime? Não. O papel do Estado
será essencial, ao acelerar prazos
para aprovação das portarias de
extensão.
Foi divulgada uma sondagem
demonstrando que as
confederações empresariais seriam
mais populares que as sindicais.
Não há motivo para admiração. Se
a sondagem foi representativa, o
eleitor médio tende a considerar a
classe dominante com olhos mais
Mitos urbanos sobre sindicalismo
OpiniãoAntónio Correia de Campos
tolerantes. Temos menos paciência
para os erros dos que estão ao
nosso nível e falta de caridade para
aceitar os mais dependentes. É da
natureza humana.
Estará então tudo bem?
Certamente que não. Os sindicatos
que menos aderentes perdem,
ou mais ganham, são os que
prestam serviços diretos aos seus
associados: saúde, incluindo
saúde ocupacional, seguros
complementares de desemprego,
complementos de reforma,
sistemas de poupança-reforma,
escolas profi ssionais e educação
permanente de boa qualidade,
bem como apoio na procura de
emprego.
Os sindicatos ganham em se
aproximarem das comissões de
trabalhadores. Será essencial
para passarem a contratos e
convenções que associam salário
e emprego, em vez de se baterem
exclusivamente por salários. Os
sindicatos têm que prestar mais
atenção real, não apenas retórica,
a desempregados e precários.
Têm os sindicatos que moderar
a sua presença nacional, na rua,
em manifestações, em protestos?
Toda agente respeita o esforço
que mobiliza os trabalhadores
retirando-os ao descanso. A
confraternização pública é
indissociável do sentido de
pertença. No 1.º de Maio, muitos
trabalhadores desvinculados de
sindicatos e muitos outros que
nunca pensaram em se sindicalizar
sentem simpatia pela descida à rua
dos que militam.
O diálogo social aproxima as
partes. Abre-as à compreensão
das posições antagónicas, permite
um entendimento pessoal que
facilita o negocial. É um fenómeno
de aprendizagem mútua. Os
sindicatos são parceiros adultos,
bem preparados e responsáveis.
O autor escreve segundo as normas do novo Acordo Ortográfico
Presidente do Conselho Económico e Social
“O ‘divórcio’ entre trabalhadores e sindicatos não se deve a qualquer comportamento unilateral; tem como razão de ser o Estado Social ter universalizado benefícios pelos quais se batiam os sindicatos há cem anos”
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Cáritas mais do que duplicou assuas poupanças nos anos da criseCáritas de Lisboa amealhou quase 1,3 milhões de euros, mais do que duplicando as poupanças entre 2007 e 2015 • Comprou loja em Setembro por 320 mil euros sem pedir espaço à Câmara de Lisboa • Cáritas recusou esclarecer as questões colocadas pelo PÚBLICO • Investigação de José António Cerejo Sociedade, 12/13
Marcado novo protesto parahoje, mas também haverá apoio ao regime nas ruas p20
Do Bloco ao CDS, nem o PS deixou de enviar questões ao ministro das Finanças p10
Nem o Papa faz recuar oposição a Maduro na Venezuela
Mário Centeno inundado com perguntas sobre balcões da CGD
Rui Rio “Há sorte, há criatividade e há mérito neste Governo” p8
1.º de Maio CGTP e UGT exigem resultados ao GovernoCorreia de Campos desmonta os “Mitos urbanos sobre sindicalismo”Destaque, 2 a 7
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Edição Lisboa • Ano XXVIII • n.º 9874 • 1,20€ • Segunda-feira, 1 de Maio de 2017 • Director: David Dinis Adjuntos: Diogo Queiroz de Andrade, Tiago Luz Pedro, Vítor Costa Directora de Arte: Sónia Matos
Investigação O que descobriu a portuguesa que foi estudar o lado negro do poderCiência, 26/27
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ISNN-0872-1548
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Concerto comOrquestra Sinfónica
do Porto Casa da Música Maestro Martin André
06 Maio · 21h30