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DIREITOS INFANTO–JUVENIS NO ENCONTRO
CAMPO/CIDADE: COMO COMPREENDER O DIREITO A
EDUCAÇÃO DO CAMPO COMO POLÍTICA DE ESTADO?
MOURA, Kethlen Leite de (UEM/Bolsista CAPES)
OLIVEIRA, Caroline Mari de Oliveira (UEM/Bolsista CAPES)
SILVA, Irizelda Martins de Souza e (Orientadora/UEM)
CECÍLIO, Maria Aparecida (Orientadora/UEM)
Introdução
A pesquisa “Direitos infanto-juvenis no encontro campo/cidade: como
compreender o direito à Educação do Campo como política de Estado?” teve como
principal objeto de estudo a Educação do Campo como direito infanto-juvenil que vive
em perímetro rural.
Objetivando a investigação de fontes que respondam à necessidade de
compreender a Educação no e do Campo como política de Estado no Brasil a partir da
década de 1990, constatamos que, no Brasil, existem ações na orientação legal que
visam, principalmente, agir sobre dificuldades de vivência plena de seus principais
direitos. Diante desse fato, direcionamos nosso estudo à compreensão dos sujeitos que
vivem no campo e na viabilização de políticas educacionais para a sociedade
campesina, prevista nas legislações que amparam a Educação do Campo no Brasil.
Partimos do pressuposto da ausência de políticas de Estado para essas
populações e compreendemos que a educação, enquanto direito, está intimamente ligada
à necessidade de políticas públicas que garantam o princípio da igualdade, defendido
por movimentos sociais organizados do campo. O direito às escolas no campo, que
compõe redes públicas e garante o acesso de todas as crianças e adolescentes à escola,
ao conhecimento, à cultura e aos demais direitos infanto-juvenis, funda-se no princípio
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constitucional da igualdade.
A partir do levantamento de bibliografias, de documentos legais e de estudos de
projetos de pesquisa concluídos, consideramos que há prevalência da necessidade de
estudarmos quais são os direitos infanto-juvenis previstos na Constituição Federal
Brasileira de 1988 e o Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, Lei nº 8.069/1990,
visando à compreensão das políticas de Estado diante dos direitos à infância e à
adolescência que vivem do e no campo brasileiro. Essa legislação constitui o
enraizamento do referencial do direito na formação docente ao ampliar as fontes de
estudo sobre a temática.
Analisamos os direitos infanto-juvenis das populações que moram no campo,
por meio de pesquisa documental e bibliográfica em relação à Educação no e do Campo
no Brasil e o debate nos espaços educativos como espaços de direitos e garantias à
educação integral e igualitária de todos os sujeitos brasileiros de acordo com o aparato
legal vigente no Brasil pós-1988.
Mediante o estudo e análise das Políticas Educacionais vinculadas ao meio
acadêmico, identificamos os traços que marcam a Educação do Campo, acoplada aos
conceitos de espaço urbano. A Educação do e no Campo, na visão do Estado, ainda é
objeto de ‘adaptação’ da escola urbana. Essa adaptação é apresentada como ‘remédio
genérico’ utilizado apenas para encobrir os sintomas das reais e principais necessidades
do homem que vive no campo. Para além da presença dessa organização escolar, a
escola campesina, pensada e praticada por camponeses politicamente organizados,
constrói um conceito de homem capaz de questionar e refletir sobre sua condição
humana.
A temática aqui apresentada como objeto de investigação tem conquistado o
espaço educacional público na discussão de políticas de Estado. Nesse processo, um dos
objetivos que nos conduz à sistematização de nossa compreensão sobre o movimento de
encontro entre campo e cidade, para garantia do direito à infância e à adolescência, é a
erradicação do trabalho precoce. Nesse caminho de análise, apreendemos que, para que
os espaços de discussões sejam abertos, é necessária uma ação coletiva para o combate
do trabalho penoso na efetivação dos direitos infanto-juvenis. A batalha política é
presidida intencionalmente por agências internacionais, como a Organização das Nações
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Unidas – ONU; Organização Internacional do Trabalho – OIT; Fundo das Nações
Unidas para a Infância – UNICEF; Organização das Nações Unidas para a Educação
Ciência e Cultura – UNESCO; e a Organização Mundial do Comércio – OMC. O
trabalho penoso é uma das maneiras mais bárbaras de exclusão social e envolve
complexas relações políticas, econômicas e sociais, consentindo com a falta de políticas
públicas, educação, cultura, com a manutenção da pobreza, com a deficiência no
sistema de saúde mantido pelo Estado, entre outras.
Podemos afirmar que a temática da presente pesquisa é contribuição ao meio
acadêmico, pois permanece marginalizada no conjunto de produção científica
(BESERRA; DAMASCENO, 2004; SOUZA, 2007).
A análise documental e bibliográfica do referencial teórico constituiu o
fundamento da pesquisa. O ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente; a legislação
brasileira no que se refere à educação, em especial, à Educação do Campo; documentos
de apoio para as políticas educacionais; diversos documentos sobre educação elaborados
pelas agências internacionais; e referenciais bibliográficos relacionados ao tema
subsidiaram a análise na potencialização da crítica das práticas educativas.
O Trabalho Precoce e a Educação no Brasil
O trabalho precoce no Brasil proliferou-se no final do século XX e início do
século XXI, tornando-se uma questão sócio-econômica e política, portanto, uma questão
que tem sido discutida não só no Brasil, mas no mundo, e que tem conquistado o espaço
político e educacional nas tentativas de combate ao trabalho precoce, abrindo
possibilidade de inserção do debate acadêmico sobre a ação do Estado brasileiro rumo a
um objeto comum: a erradicação da exploração infanto-juvenil. O trabalho precoce faz
parte das formas mais cruéis de exclusão social, compreendendo diversos aspectos que
envolvem complexas relações políticas entre Estado e Movimentos Sociais Organizados
em prol de políticas públicas, ancorados em determinantes sócio-econômicos e
culturais, destacando-se a pobreza econômica.
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De acordo com pesquisas realizadas1 pela Organização Internacional do
Trabalho – OIT juntamente com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios –
PNAD revelam que no século XXI, o Brasil possui cerca de 3 milhões de crianças de 5
a 15 anos de idade trabalhando2. Esse número alarmante de crianças trabalhadoras
revelou um dos maiores e principais desafios a serem enfrentados pela nação brasileira,
dos quais é resultado do descumprimento da Doutrina da Proteção Integral, prevista em
leis que asseguram os direitos de todos os cidadãos, como: vida digna, liberdade,
educação e saúde. O caput do art. 227 do texto constitucional dispõe de um amplo
conjunto de direitos sobre a Doutrina da Proteção Integral:
É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, crueldade e opressão.
No Art. 54 do Estatuto da Criança e do Adolescente – Lei 8.069/90, é estabelecido que
É dever do Estado assegurar à criança e ao adolescente: I – ensino fundamental, obrigatório e gratuito, inclusive para os que a ele não tiveram acesso na idade própria; II – progressiva extensão da obrigatoriedade e gratuidade ao ensino médio; IV – atendimento em creche e pré-escola às crianças de zero a seis anos de idade; V – acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um; VI – oferta de ensino noturno regular, adequado às condições do adolescente trabalhador; VIII – atendimento no ensino fundamental, através de programas suplementares de material didático-escolar, transporte, alimentação e assistência à saúde.
1 Pesquisa publicada em forma de relatório na obra KASSOUF, A. L. (Org.). O Brasil e o trabalho infantil no século XXI. Brasília: OIT, 2004.
2 A pesquisa referenciada acima considerou que a partir dos 16 anos de idade, o trabalho é permitido, salvo, o trabalho realizado em condições periculosas.
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Entendemos que a conquista dos bancos escolares e o acesso à escola é apenas o
primeiro passo para as famílias pobres conquistarem a cidadania. Para compreensão da
ampla temática que estamos analisando, abordamos quais são os direitos da criança
garantidos pela Doutrina da Proteção Integral e o porquê e como esses direitos estão
sendo desrespeitados. Na Declaração dos Direitos Humanos de 10 de dezembro de
1948, ratificada pelo Brasil - artigo 5º da Constituição de 1988 - denotamos no Art. VII:
Todos são iguais perante a lei e têm direito, sem qualquer distinção, à igual proteção da lei. Todos têm direito à igual proteção contra qualquer discriminação que viole a presente Declaração e contra qualquer incitamento a tal discriminação.
Compreendemos que o período mais importante da vida de uma pessoa é a
infância. É nesse período que o indivíduo tem as primeiras vivências e experiências de
sua vida, como: a linguagem; as relações afetivas; o reconhecimento de seus sucessos e
realizações; o encorajamento na realização de atividades como correr e saltar; a
interação com a natureza e sociedade; as amizades; as relações com o meio; o acesso à
cultura, entre outras, bem como precisam de limites e restrições para se sentir mais
seguro. Conforme o documento Referenciais Curriculares Nacionais para a Educação
Infantil - RCNEI3, é estabelecido como principais objetivos para a primeira infância: a
formação pessoal, social e o conhecimento de mundo por meio dos processos de
construção da identidade e autonomia das crianças.
Todo aprendizado ocorre tanto na escola quanto nas famílias. Em virtude disso,
o Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA 8.069/90, garante às crianças o direito à
vida, à saúde, à liberdade, o direito de brincar, praticar esportes e divertir-se. A
Declaração Universal dos Direitos da Criança4 assegura-lhes o direito à educação
3 RCNEI é um documento nacional integrante dos Parâmetros Curriculares Nacionais elaborados pelo Ministério da Educação e do Desporto. Este documento destina-se às creches, centros de educação infantil, entidades equivalentes e pré-escolas. O MEC recomenda para cada profissional da Educação Infantil que seja feita a utilização do material como instrumento de trabalho cotidiano para auxiliar nos processos de construção da identidade e autonomia das crianças. Este documento atende às determinações da Lei de Diretrizes e Bases da Educação – LDB – Lei nº 9.394/96 que estabelece pela primeira vez na história do Brasil a Educação Infantil como a primeira etapa da educação básica.
4 A Declaração dos Direitos da Criança foi criada por meio de uma votação unânime da Assembléia Geral das Nações Unidas, em 20 de novembro de 1959, e a aprovação do Documento complementa a Declaração Mundial dos Direitos
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gratuita e ao lazer, “art. 27. I – Os Estados Partes reconhecem o direito de toda criança a
um nível de vida adequado ao seu desenvolvimento físico, mental, espiritual, moral e
social”.
Em muitos lugares do mundo, a criança não brinca e não estuda, ao contrário
desse direito, a criança trabalha. Conforme o "Relatório do Desenvolvimento Humano
2009", promulgado por meio das Nações Unidas, 100 milhões de crianças vivem ou
trabalham nas ruas. No Brasil, existem cerca de 2,9 milhões de crianças de cinco a 14
anos que trabalham em regime penoso e braçal. Em conformidade à Pesquisa Nacional
por Amostra de Domicílios – PNAD, de 1999, realizada pelo Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística - IBGE, as crianças afetadas são de todas as regiões do país. Não
são casos isolados, ou seja, são muitas crianças que são afastadas da experiência de ter
uma vida digna, satisfazendo todos ou boa parte dos seus direitos. Por exemplo, as
crianças que vivem no campo, as quais têm a infância presa a atividades penosas e
nocivas para a saúde e ao desenvolvimento humano. Ademais, a Constituição Federal
do Brasil de 1988 também se faz presente no Art. 7º do ECA – Lei 8.069/90, que nos
traz:
A criança e o adolescente têm direito à proteção à vida e à saúde, mediante a efetivação de políticas que permitam o nascimento e o desenvolvimento sadio e harmonioso, em condições dignas de existência.
O direito à vida é fundamental e deve ser respeitado porque dele sucedem todos
os outros direitos, isto é, uma vez que a criança existe, todos os seus direitos devem ser
respeitados. A Constituição Federal do Brasil estabeleceu como direitos sociais a saúde;
a educação; o esporte; a cultura; o lazer; a proteção à maternidade e à infância. Sobre o
direito à saúde, a Constituição certifica o atendimento integral a todos os serviços.
Nesse âmbito, os municípios devem reunir condições para proporcionar a execução da
política de atendimento e dos programas de atenção integral. Os responsáveis em
assegurar a saúde pública são os poderes públicos, tanto federais, estaduais e municipais
Humanos, criada em 1948, a fim de estabelecer os direitos e as liberdades de que toda criança precisa para desfrutar de uma vida normal e saudável.
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(Art. 23, II, CF). Do direito à educação, à cultura, ao esporte e ao lazer o ECA – Lei
8.069/90, estabelece no Art. 58:
No processo educacional, respeitar-se-ão os valores culturais, artísticos e históricos próprios do contexto social da criança e do adolescente, garantindo-se a estes liberdade de criação e o acesso às fontes de cultura.
Os direitos sociais são fundamentais para a criança e para o adolescente, porém,
tornam-se ausentes em muitas localidades do país. Realçando a citação acima,
ratificamos que a educação de qualidade deve ser vista como dever do Estado e direito
de todos independentes de raça, credo ou classe social. É essa que habilita a criança, o
adolescente, o jovem e o adulto para o pleno desenvolvimento e para o exercício dos
seus direitos e para a qualificação futura para o trabalho.
O conceito de educação é extremamente amplo, pois abrange a educação infantil, o ensino fundamental, o ensino médio e ensino técnico e superior, além de incluir outras práticas extra-escola, como educativas (esporte, cultura e lazer). [...]. A escola é lugar de criança e adolescente e o trabalho precoce prejudica o desenvolvimento dos mesmos. Com respeito ainda à educação, não há lacunas ou desculpas financeiras suficientes que sustentem a realidade da ausência de vagas na escola e a falta de organização ou estrutura para abrigar dignamente os educandos. Essa responsabilidade cabe ao Poder Público e dele deve ser cobrado (SILVESTRE, CUSTÓDIO, 2004, p.58).
O direito à educação consiste, nos moldes dos Art. 53 a 59 do ECA – Lei
8.069/90, na igualdade de condições para o acesso e permanência na escola; no direito
de ser respeitado por seus educadores; no direito de contestar os critérios avaliativos,
podendo recorrer às instâncias superiores; no direito de organização e participação em
entidades estudantis; e no acesso à escola pública e gratuita, próxima das residências.
Consideramos algumas questões: se as orientações da UNESCO são tão bonitas
e claras, o que as impede de contemplar adolescentes e crianças “não contados” pelos
institutos de pesquisa - os brasiguaios, os indígenas, os faxinais, os assentados, os
acampados, entre outros? A infância está sendo cada vez mais roubada e onde se
encontram essas crianças?
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Essas questões tão intrigantes resultam em uma informação - a maior parte dos
2,9 milhões de crianças brasileiras “esquecidas” está trabalhando na agricultura, no
corte de cana-de-açúcar, na colheita de frutas cítricas, folhas de tabaco, café, drogas,
além da prostituição.
Nas cidades, uma parcela faz “bicos” – trabalho avulso - como lavar carros,
vender doces nos semáforos, ser empacotadores de supermercados; outra parcela
trabalha em indústrias, fábricas e nas ruas. Uma quantia considerável sofre os riscos
contra sua integridade, constantemente, por trabalhar em condições extremamente
perigosas e insalubres, como: nas carvoarias, manguezais, coleta de lixo e de restos de
comida, entre outras. O trabalhador precoce e os produtos que resultam do seu trabalho
beneficiam empresas como siderúrgicas, bancos, donos de terras, montadoras, a maioria
de capital estrangeiro, e o próprio Governo Federal.
O sistema de produção economicamente desenvolvido retém no setor primário a maioria de nossas crianças e adolescentes, trabalhadores sem escola, sem a proteção da família e do Estado, desempenhando atividades penosas, produzindo não apenas arroz, feijão, açúcar, matéria-prima para carros, laranja para suco, café, pedras, sisal, carvão (...) (CECÍLIO, 2004, p.27).
Compreendendo os indícios da exploração, a questão que levantamos é em
relação à quantidade de políticas e programas sociais no Brasil - por que, ainda, existem
milhões de crianças que continuam trabalhando ao invés de exercerem os seus direitos
básicos, como por exemplo, o de estar na escola? Essas crianças e adolescentes não
foram abandonados por suas famílias e nem tiveram de sobreviver sozinhas por
quaisquer motivos. A maioria trabalhava juntamente com os pais, ajudando-os em suas
atividades, contribuindo para a renda familiar. Predomina na sociedade o pensamento de
que as famílias que necessitam da força de trabalho dessas crianças perpetram a
crueldade para com elas, violando seus direitos e obrigando-as ao trabalho penoso,
furtando-lhes o direito de freqüentarem a escola.
Acostumada com essa prática, a maioria das crianças e adolescentes que
trabalham, defendem o trabalho precoce acreditando que este educa e gera a disciplina e
auxilia na garantia da sobrevivência de suas famílias. No Brasil, este ciclo vicioso
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reporta à pobreza e ao trabalho extemporâneo e penoso de crianças e adolescentes. Os
filhos, trabalhadores precoces, muitas vezes, não freqüentam a escola e, assim, perdem a
possibilidade de estudar e futuramente tornar seu trabalho qualificado, chegando até a
aumentar sua expectativa de vida. Quando essas crianças se tornarem adultos, mal
saberão ler e escrever e raras serão as chances de elas terem um emprego melhor e que
ofereça um salário que consiga suprir todas as necessidades de uma casa ou de uma
família. Assim, continuarão trabalhando, ganhando uma renda baixa e mantendo o ciclo
vicioso da miséria.
A partir do conceito abordado, concretizamos a idéia de que no campo e nas
periferias das cidades o trabalho é iniciado antecipadamente. Na consciência dessas
crianças e adolescentes, a infância e adolescência vividas com liberdade, como muitas
leis e documentos afirmam como direito, são sonhos impossíveis de serem realizados.
Vêem o trabalho como uma missão familiar e disciplinadora, justificando que, com ele,
não estarão nas ruas praticando atividades criminosas.
A freqüência à escola é algo ocasional devido ao trabalho que os deixa exaustos
para as competências escolares. Em conseqüência, os trabalhadores que chegam aos
bancos escolares costumam cursar somente os anos iniciais do ensino fundamental e
logo deixam os estudos. Aqueles que persistem nos estudos, quase sempre têm baixos
rendimentos devido ao cansaço do trabalho. É um fato lastimável, com o qual a
sociedade brasileira convive. O que nos causa profundo estranhamento é constatar que
os governos limitam suas ações e permanecem cientes diante de tantas pesquisas que
apontam os altos índices de trabalho infantil. O que tem sido feito para evitar isso? Ou
mesmo, por que o Governo ainda insiste em “tampar o sol com a peneira”, mostrando
números de pesquisas encomendadas por agências internacionais, como a UNESCO,
ONU, UNICEF e outras, para explicar índices de baixa qualidade nas políticas sociais
no combate à exploração do trabalho precoce?
Compreendemos que as famílias estão cientes da importância dos estudos, mas,
muitas vezes, avaliam que não podem abrir mão de mais um membro da família
ajudando no sustento da casa. Nesse impasse, o poder público e empresas privadas têm
que desempenhar papéis fundamentais para prover essa carência básica e garantir o
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acesso de crianças e adolescentes à escola, desenvolvendo estratégias que auxiliem as
famílias nesse âmbito social.
O Programa Bolsa-Escola é um exemplo de estratégia acompanhada pela
UNESCO nessa perspectiva. As ações para erradicação do trabalho precoce são
materializadas nas formulações de documentos destinados à proteção da infância e da
adolescência. Há alguns desses documentos, como a Declaração Mundial de Educação
para Todos – Conferência de Jomtien; as NEBAs5; relatórios anuais do UNICEF;
documentos específicos da UNESCO, como: Primeira Infância Melhor – PIM, realizado
no estado do Rio Grande do Sul; OIT6, programas em que a UNICEF faz parceria com o
governo e, na maioria das vezes, com empresas privadas para exclusão da taxa de
imposto de renda sobre estas.
Para se evitar as formas de trabalho precoce penoso no Brasil, foi assinado o
"Pacto Bandeirante pela Erradicação do Trabalho Infantil", em abril de 1996, elaborado
por órgãos públicos, federações de trabalhadores e empregadores, sindicatos,
cooperativas e prefeituras municipais.
Em decorrência dos fatos, os benefícios atribuídos às políticas sociais são
permeados por limitações. A perplexidade causada pela ciência dessa realidade nos faz
pensar sobre a possibilidade de exercício da cidadania, seja por meio dos programas
sociais, seja na garantia de trabalho digno e traduz dúvidas sobre a eficácia de ações que
são avaliadas na intenção de que constituam políticas permanentes de estado para que as
crianças e adolescentes deixem de ser trabalhadores precoces para serem educandos e,
de fato, receberem uma educação voltada às suas necessidades e especificidades.
5 As NEBAs para a educação básica referem-se a uma educação que objetiva satisfazer as necessidades básicas de aprendizagem, incluindo a instrução primária ou fundamental, em que a aprendizagem subseqüente deve ser baseada em compreender a educação infantil e primária ou elementar, bem como a alfabetização, cultura geral e habilidades essenciais na capacitação de jovens e adultos, em alguns lugares inclui também o ensino médio. Assim, fazem menção ao conhecimento, habilidades, atitudes e valores necessários para as pessoas sobreviverem, desenvolverem a qualidade de suas vidas e continuarem aprendendo. (Disponível em: <http://www.paulofreire.org/twiki/pub/institucional/MoacirGadotti/artigosIt0018/Significado_Desafio_1991.pdf. > Acesso em: 5 ago. 2010.
6 Fundada em 1919 com o objetivo de promover a justiça social, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) é a única das Agências do Sistema das Nações Unidas que tem estrutura tripartite, na qual os representantes dos empregadores e dos trabalhadores têm os mesmos direitos que os do governo. (Disponível em: < http://www.oitbrasil.org.br/inst/index.php > Acesso em: 18 ago. 2010).
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A Educação do e no Campo na Luta por Identidade
A proposta deste trabalho é trazer a concepção de Educação do e no Campo e
seus sujeitos, seus objetivos e, principalmente, compreender suas especificidades. Não
sendo possível desvencilhar a Educação do e no Campo dos movimentos sociais ligados
a esse espaço, o resultado dessa somatória é um princípio educativo e pedagógico que
perpetua uma especificidade da educação aos povos que vivem no e do campo
(GUHUR; SILVA, 2009).
Convidamos o leitor a se atentar para a discussão indicada, explicitando que a
população do campo se constitui de sujeitos que vivem e sobrevivem da terra. Assim:
No campo existem milhões de brasileiras e brasileiros [...] que vivem e trabalham no campo como: pequenos agricultores, quilombolas, povos indígenas, pescadores, camponeses, assentados, reassentados, ribeirinhos, povos da floresta, caipiras, lavradores, roceiros, sem-terra, agregados, caboclos, meeiros, bóias-frias entre outros (KOLLING; CEROLI, CALDART, 2002, p. 11).
Autores como Brandão (2006)7, Cecílio, Hirose e Silva (2010) reafirmam que a
Educação do e no Campo envolve esses sujeitos e constitui populações que retratam a
diversidade sócio-cultural existente no Brasil, priorizando a Educação do e no Campo
para promover o desenvolvimento local e sustentável. No entanto, as discussões sobre
educação e políticas públicas advindas da sociedade capitalista não contemplam os
interesses desses sujeitos.
Os povos do campo são identificados erroneamente, além de prevalecer, ainda,
as expressões pejorativas como: ignorante, iletrado, sem cultura, caipira, jeca-tatu,
atrasado, obrigado a lidar com o cabo da enxada e do trabalho braçal, desprovido de
qualquer contribuição à sociedade letrada, entre outros (CECÍLIO; HIROSE; SILVA,
2010). Adversos a essa concepção, percebemos que os sujeitos do campo têm muito a 7 Artigo inicialmente publicado na Revista Comunicações, da Universidade Metodista de Piracicaba - UNIMEP/SP, ano 5, nº 2, novembro de 1998, posteriormente revisado e publicado como capítulo do livro BRANDÃO, E. C., CECÍLIO, M. A. Educação: campo e cidade – territórios do saber. Maringá, PR: Massoni, 2006, ao qual fazemos referência.
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ensinar sobre sua cultura extremamente peculiar relacionada com a natureza que os
rodeia. Aliás, não é somente isso que fica evidente, mas a oposição entre o campo e a
cidade. Essas relações se comprovam com a ampliação da agroindústria e do
movimento sazonal (saída do campo para se trabalhar nas indústrias). Consideramos
também como sujeitos do campo os movimentos sociais populares, já que estes estão
ligados a uma organização de luta por uma Educação do e no Campo.
Inúmeras pesquisas e análises vêm apontando que o movimento de renovação da educação básica tem mais a ver com o movimento democrático pela igualdade, pela inserção social, pelos direitos, do que com as demandas estreitas de um mercado seletivo. A produção teórica e a consciência dos educadores (as) vêm avançando nesta direção. Entretanto, os vínculos entre educação, direitos, cidadania, tão reivindicados nas últimas décadas, ainda são equacionados prioritariamente [se] pensando na cidade. O campo, a terra, a escola do campo não são incorporados nessa ótica nem nas pesquisas nem na formulação de políticas e currículos (CALDART, 2004, p. 9).
Carece ser promovida a educação formal e digna como um objeto que
compreenda o contexto que ocorre no campo e construir, a partir desse, uma Educação
do e no Campo, subsidiada por políticas públicas nacionais, permanentes, previstas e
contempladas em leis federais, estaduais e municipais. Somente dessa forma, haverá a
superação do descompasso histórico em relação ao campo, reconhecendo-se o diferente
e o diverso, em oposição à homogeneização e tolerância a essa parcela da sociedade
(CECÍLIO, HIROSE, SILVA, 2010).
Entre os objetivos propostos nesta pesquisa, analisamos a Educação no e do
Campo como resultado relevante de uma trajetória histórica no Brasil. Para tanto, faz-
nos necessário explicitar alguns conceitos referentes ao campo de estudo da Educação
do Campo.
Para continuarmos pensando nessa modalidade de educação, salientamos alguns
conceitos. A educação sempre esteve acoplada aos interesses da classe dominante:
políticos, econômicos, religiosos e sociais. O movimento da Educação do e no Campo
não ocorreu de forma isolada. Em meados dos anos de 1940, o Brasil passou pelo
processo de redemocratização e, envoltas nesse período, estiveram as lutas dos
assalariados e posseiros, vinculados às Ligas Camponesas, ao Movimento dos
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Agricultores Sem-Terra (MASTER), passando, assim, a existir os movimentos sociais
ligados ao campo.
A quase totalidade dos movimentos populares rurais atuais no Brasil surgiu como resistência a um processo econômico e político que provocou a rápida modernização da agricultura. Os problemas vividos pela maioria da população rural, em particular os trabalhadores assalariados, os camponeses e suas famílias [...] não são devidos à ‘falta’ de desenvolvimento mas, pelo contrário, ao ‘sucesso’ do modelo modernizador (GRZYBOWSKI, 1994, p. 290).
Desse modo é que se forma, na década de 1990, o movimento nacional brasileiro
de Educação do e no Campo, sendo os movimentos sociais populares provenientes do
campo sujeitos de uma organização sócio-política de renovação pedagógica
(MUNARIM, 2008).
A história do pensamento pedagógico e das políticas de educação do campo tem nexos com os padrões de desenvolvimento sócio-econômico do meio rural, marcados por quase quatro séculos de escravidão e por acentuada concentração fundiária que levou a população trabalhadora a uma trajetória de expulsão e de expropriação, contra a qual ela desenvolveu estratégias de resistência (ANDRADE e PIERRO apud SAPELLI et. al., 2009, p. 144).
Perante tais contextos que marcaram a década de 1990, consideramos que a
trajetória da Educação do Campo não ocorreu de um fato desconexo, mas nasceu
juntamente com as lutas camponesas, na busca de uma educação pública, gratuita e de
qualidade para todos os camponeses. Neste estudo, constatamos que as políticas
educacionais que colocam a Educação como um agente de mudanças para o país ainda
não contemplam todos, pois muitas crianças e adolescentes do campo estão desprovidos
do direito a uma escola de qualidade.
Salientamos que a Educação do e no campo procura a construção de um sujeito
reflexivo, preocupado com a preservação da sua cultura. Quando nos referimos a essa
modalidade de educação, à relacionamos com as lutas sociais conectadas aos
movimentos sociais do campo, que visam ao desenvolvimento do campo na perspectiva
de abranger os trabalhadores rurais nas políticas educacionais e apontam para sua
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formação humana e de qualidade, em que o sujeito torne-se produto e produtor de sua
cultura (SAPELLI, GATTI, NAPOLI, 2009, p. 145).
Caldart (2004) ressalta que o movimento de luta pela Educação do e no Campo
proporcionou aos acampamentos e assentamentos uma educação que não segue um
padrão, pois todas as escolas que se encontram no campo não têm o mesmo processo
histórico em sua fundação. Cada qual se manifesta de acordo com sua especificidade da
luta campesina e, apesar de serem diversificadas, todas seguem as mesmas concepções
básicas dos movimentos sociais do campo - uma educação desenvolvida na prática das
escolas do campo que está ligada à reforma agrária, à pressão sobre o Estado,
arquitetada pelos movimentos sociais do campo na intenção de conquistar políticas
públicas que se adéqüem aos que trabalham e residem no campo. É preciso deixar bem
claro “[...] que o campo é espaço de vida digna e que é legítima a luta por políticas
específicas e por um projeto educativo, próprio para os seus sujeitos” (CALDART,
2005, p. 23).
A Educação do e no Campo carece de uma visão ampla não apenas como uma
adequação do espaço urbano. Em determinados casos a educação campesina ajusta-se às
diretrizes curriculares dos centros urbanos, deturpando as principais e reais necessidades
do homem do campo, pois a educação deve instrumentalizar esse homem, todavia, o
saber científico indicará o caminho, pois, “a educação tem que partir do contexto social
do sujeito, mas não pode jamais ficar restrita a ele” (SAPELLI; GATTI; NAPOLI,
2009, p.146). Apreendemos que a Educação do e no Campo é um projeto coletivo para
o qual ainda há muito que se fazer, pois “[...] a história da educação está intimamente
vinculada à consolidação de uma cultura política pública, a cultura da igualdade, do
direito a terra, ao conhecimento, ao trabalho, do direito de todos [...]” (CALDART,
2004, p. 9).
Conceituar educação rural versus campo é de grande importância, pois, em
determinados casos, a Educação do e no Campo tem sua imagem distorcida em relação
a seus conceitos, uma vez que a educação rural não atende à especificidade de uma
formação humanizadora - “[...] é bom lembrar que durante décadas nem sequer se falava
da educação do campo, era a educação rural, a escolinha rural [...]” (ARROYO, 2005, p.
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47). Constatamos o pressuposto de que a educação rural8 relaciona-se com uma
percepção positivista, mercadológica, competitiva, capitalista, que instrui o sujeito a
transformar sua força de trabalho em objetos, mercadorias, ocasionando sua
desumanização. O espaço rural sempre esteve ligado a um lugar de políticas
compensatórias, visando apenas aos projetos capitalistas, demarcando o agronegócio,
deteriorando a relação homem-natureza, sempre estando associado à local de ‘atraso’,
com pouca qualidade e inadequado para a educação. Pressupõe-se que o meio rural se
utiliza de técnicas rudimentares, conceituando-se o homem que ali vive como ‘pacato’,
avesso ao progresso e à modernização.
A educação rural, mesmo diante das lutas históricas da população campesina por direitos, é marginalizada e ressente-se da forma preterida com que ainda é lembrada com expressões diminutivas, que dão conotação, no mínimo pejorativa, tais como ‘professorinha’ e ‘escolinha rural’ (SILVA; HIROSE; CECÍLIO, 2007, p. 8).
A educação rural é vinculada a um sistema de produção, que passa a estruturar
uma sociedade desigual de preparo apenas para a mão de obra barata que atenda à
demanda imposta pelas políticas econômicas. Concluímos que “as dimensões da
problemática que envolve a escola rural atualmente são bastante extensas, considerando
que, historicamente, a educação em si sempre foi negada ao povo brasileiro, e,
especificamente, ao homem do campo” (LEITE, 2002, p.53).
É necessário conceituar a educação do campo também, pois os sujeitos desse
espaço buscam por uma pedagogia de formação humana, crítica, dialética, construtora
de sujeitos conscientes, que valorize seu meio, sua cultura e identidade, compreenda seu
trabalho como algo digno e que edifique o homem enquanto sujeito histórico e não
como objeto. Ponderamos que a Educação do e no Campo vem para preencher as
necessidades de escolarização para essas pessoas que são excluídas do conhecimento
formal. Além de ter aspectos diferenciados, essa modalidade educacional está em
constante construção e todos são aprendizes no processo de luta pela transformação
social, pois se exige do Estado uma educação pública laica, voltada para os interesses 8 A expressão rural foi empregada na época do governo Vargas para delimitar o espaço urbano e definir políticas públicas para estes espaços geográficos já compreendidos na época como diferentes.
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dos trabalhadores do campo e que englobe desde a educação infantil até o ensino
superior.
Ante as lutas para a transformação social, o homem e o campo se articulam de
maneira a criar sua práxis, pensando em uma organização concisa, crítica e que valorize
os sujeitos que são oprimidos pelo estereótipo de ‘gente atrasada’.
Como na maioria das vezes os programas e projetos são pensados por uma “elite culta em gabinetes”, sem conhecimento das realidades locais imediatas ou regionais, determinam, dos gabinetes, a carga horária, formas presenciais, formas de avaliação, horários de estudo e conteúdo programático, não condizente com as reais condições sociais e políticas dos trabalhadores do campo (BRANDÃO, 2006, p. 41).
Para tanto se faz necessário pensarmos em conteúdos escolares que englobem a
cultura dos povos, em âmbito nacional e regional, não excluindo suas identidades,
necessidades e particularidades, mas com uma ótica para o real sentido de Educação do
e no Campo. Do campo porque “o povo tem direito a uma educação pensada desde o
seu lugar e com sua participação, vinculada à sua cultura e às necessidades humanas e
sociais; [no campo porque] [...] o povo tem direito de ser educado no lugar onde vive”
(CALDART, 2002, p.26).
Consideramos importante revelar que ainda existem concepções equivocadas
quando se afirma que “[...] o campo é um espaço territorial e desprovido de
modernidade atribuída à cidade, como se houvesse um movimento inevitável de
urbanização que se contrapõe a um espaço que está morrendo, um espaço sem futuro”
(ANDRADE; PIERRO apud SAPELLI; GATTI; NAPOLI, 2009, p.146).
É importante salientar que os direitos infanto-juvenis destinados às crianças e
adolescentes do campo ainda se encontram diante do mesmo arcabouço legal/jurídico
citadino, assim como a escola e a educação que são pensadas a partir dos conceitos
neoliberais e adaptadas aos povos do campo. Dessa forma, a construção de uma Política
Pública permanente nacional para a Educação do e no Campo se estende para a luta por
leis e garantias que contemplem todos os direitos infanto-juvenis das populações desse
espaço, abrangendo, assim, a luta pelo principal agente de transformação da sociedade,
pois, no caso da concepção dos homens e mulheres do campo, pertencentes ou não ao
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Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra, a educação ainda é a base
fundamental para a luta por direitos sociais nesta sociedade marcada por classes sociais
antagônicas. A Educação do Campo, defendida por moradores das áreas rurais, deve
suprir as carências do ensino do campo, como a falta de infraestrutura e currículo,
passando a levar em consideração as necessidades específicas desses moradores e não o
preparo de estudantes para trabalhar nas cidades.
Concluímos que estudos enfáticos sobre a Educação do e no Campo farão com
que os direitos infanto-juvenis das crianças e adolescentes possam ser garantidos e
contemplados nas Políticas Públicas Nacionais, para que a barbárie do trabalho precoce
e penoso seja eliminada de nossos contextos sociais.
4. Nada Termina, Continua: considerações
A ponderação realizada durante esta pesquisa assume papel importante no debate
acadêmico sobre os direitos infanto-juvenis e Educação do e no Campo. Procurando
desvendar o cenário de produção acadêmica a respeito da Educação do Campo,
Movimentos Sociais do Campo e as políticas de Estado, trabalhamos para compreender
os direitos da infância e adolescência que se encontram no campo.
O estudo realizado constituiu-se de uma investigação ainda pouco pesquisada no
âmbito acadêmico. Assim, a produção de conhecimento e a compreensão da Educação
do Campo e dos direitos infanto-juvenis auxiliam na discussão teórica para a construção
de uma apreensão mais ampla sobre as demandas sociais da população rural/camponesa.
A Educação do Campo “é direito e não esmola”9, é pública, é direito subjetivo e
universal, portanto, dever do Estado. Não obstante, os projetos, leis e diretrizes
educacionais não podem seguir apenas parâmetros direcionados às regiões urbanas, é
preciso respeitar a diversidade cultural do povo campesino.
Apreendemos que as reivindicações por direitos são coerentes, pois no campo
existem diversos problemas educacionais que ultrapassam seus limites como: evasão
escolar, desinteresse pelo estudo, falta de infraestrutura, inadequação do currículo,
9 Trecho retirado da música “Não vou sair do campo para poder ir para a escola”, de Gilvan Santos. Disponível em: <http:// http://www.cifras.com.br/cifra/gilvan-santos/nao-vou-sair-do-campo. Acesso em: 25 jun. 2010.
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inadequação do calendário escolar, não aprovado pelas Secretarias Estaduais de
Educação por compreender um ano letivo diferenciado dos centros urbanos.
Indagamos: onde estão as políticas públicas que garantem uma educação de
qualidade para crianças, jovens e adultos do campo? Por que renegar as experiências
vivenciadas no passado, como: opressão, negação de direitos, expropriações, a fim de
fornecer elementos para a leitura do presente e ações para o futuro que visam à
solidificação do coletivo, luta por direitos, tais como cidadania e educação?
Compreendemos que o direito à Educação do e no Campo precisa se tornar
política de Estado e ter seu principal sentido e/ou objetivo pensado a partir das
particularidades dos povos do campo. Atentamos na pesquisa a um debate pouco
explorado na academia e buscamos demonstrar que a Educação do e no Campo está
crescendo e precisa ser priorizada nos programas e projetos governamentais, além de
conter sua pauta nas agendas políticas dos Movimentos Sociais do Campo. Ressaltamos
que a busca por um projeto nacional de Educação do e no Campo ligado ao Movimento
dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra – MST resulta de décadas de debates em torno de
uma prática pedagógica voltada para a educação, o direito, o trabalho e os Movimentos
Sociais do Campo.
Para que os cidadãos tenham condições de uma vida digna, o Estado necessita
ofertar políticas públicas e educacionais brasileiras, reforma da constituição para
organização educacional do país, distribuição igualitária de renda, entre outros. O país
passou e ainda passa por diversas crises econômicas e acaba se submetendo às
recomendações das agências internacionais. Diante de tais constatações, o Brasil está
muito longe de promover condições básicas de cidadania para a sociedade civil.
Consideramos que cerca de 22 milhões de crianças e adolescentes não usufruem de seus
direitos, não freqüentam a escola, estão abaixo da linha da pobreza, não têm garantia de
um sistema de saúde digno, além de contar com a corrupção de políticos
‘representantes’ do povo que servem apenas a sua própria veemência. Diante dessas
circunstâncias, evidenciamos a exclusão social e violação de direitos, destacando o
direto infanto-juvenil, que acarreta nas desigualdades sociais.
Como conseqüência ao desacato ao direito infanto-juvenil, temos as atividades
penosas e precoces, como o trabalho de crianças e adolescentes que se apresenta no
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Brasil e no mundo através de um número alarmante de crianças e adolescentes que
labutam em diversos setores opressores do mercado de trabalho, o que faz com que
esses trabalhadores precoces preocupem-se com o sustento da casa, da família e de seus
familiares, esquecendo-se em se preocupar com sua formação humana qualificada,
desalienada e emancipada.
Antunes (2004) destaca que o trabalho não é lesivo ao homem, até porque o faz
parte da história humana, em seu processo de emancipação. Todavia, o trabalho penoso
e precoce não condiz com a configuração dominante da sociedade atual.
Conseqüentemente, a crítica ao Estado é de que, mesmo com a ampliação dos dados
escolares do campo e a formação continuada para professores, aquele não preencheu as
necessidades de políticas públicas e educacionais permanentes às esquecidas populações
do campo.
E, assim, um imenso quadro de exclusão social e violação dos direitos, entre os
quais o direito à infância, se define, proporcionando as desigualdades sociais, que são
resultado intrínseco da ideologia neoliberal que é uma máquina de produzir riquezas,
porém não é capaz de distribuí-las aos seus produtores-trabalhadores. Portanto, esta
pesquisa apurou que existe dificuldade para a garantia dos direitos de crianças e
adolescentes. O trabalho precoce e penoso infanto-juvenil no processo histórico
brasileiro está formando crianças e adolescentes que estão longe dos bancos escolares, à
mercê da evasão escolar, analfabetismo e repetência.
Concluímos que para a Educação do Campo tornar-se realidade é necessário
garantir o acesso à terra e aos recursos naturais para as famílias camponesas, fortalecer
o vínculo dos professores com a escola e o Estado deve oferecer apoio aos âmbitos
pedagógicos e políticos expressos pelos povos que movimentam a Educação do Campo.
Assim, deve-se sair da zona de conforto de uma legislação que prevê o respeito às
características da população rural e lutar para se oferecer subsídios políticos,
pedagógicos, metodológicos, curriculares para que essa educação se torne realidade e
que se possa avançar na escolaridade das crianças e jovens que moram no campo,
resultando no enfraquecimento do trabalho penoso e precoce no campo.
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