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CLAUDETE TEREZINHA TRAPP

A INFLUNCIA DAS ESPECIFICIDADES DAS ORGANIZAES PBLICAS NA IMPLEMENTAO DA GESTO DE PROCESSOS

Dissertao apresentada Escola Brasileira de Administrao Pblica e de Empresas para obteno do grau de mestre.

Orientador: Joaquim Rubens Fontes Filho

Rio de Janeiro 2011

CLAUDETE TEREZINHA TRAPP

A INFLUNCIA DAS ESPECIFICIDADES DAS ORGANIZAES PBLICAS NA IMPLEMENTAO DA GESTO DE PROCESSOS

Dissertao apresentada Escola Brasileira de Administrao Pblica e de Empresas para obteno do grau de mestre.

E aprovado em 11/08/2011 Pela comisso organizadora

________________________________________ Prof. Dr. Joaquim Rubens Fontes Filho Orientador

______________________________________________ Profa. Dra. Isabel de S Affonso da Costa

______________________________________________ Prof. Dr. Roberto da Costa Pimenta

Dedico esta dissertao s minhas filhas, Brbara e Valesca, minhas joias mais preciosas!

AGRADECIMENTOS

A Deus, por me amparar nos momentos difceis, me dar fora interior para superar as dificuldades, mostrar o caminho nas horas incertas e suprir as minhas necessidades. Polcia Federal, por meio da Diretoria Tcnico-Cientfica, e ao Programa Nacional de Segurana Pblica com Cidadania (Pronasci), que viabilizaram os recursos para a realizao deste Mestrado em Administrao Pblica. Ao meu orientador, por me guiar no caminho da cincia, acreditar em mim e me incentivar em todos os momentos. Aos especialistas em Gesto de Processos, que fizeram parte desta pesquisa como entrevistados, pois sem eles este trabalho no atingiria o seu objetivo. Aos meus amigos e profissionais que, desde a elaborao do Pr-projeto, at a reviso final desta dissertao, sempre se dispuseram a ajudar, dedicando-me horas preciosas de seus dias em detrimento de seus interesses particulares. A todos os colegas, professores e funcionrios da Escola Brasileira de Administrao Pblica e de Empresas da Fundao Getlio Vargas, pelo convvio e aprendizado. Aos meus superiores e colegas de trabalho na Polcia Federal, que me apoiaram durante todo o perodo do curso e da elaborao desta Dissertao. A minha famlia, que amo muito, pelo carinho, pacincia, compreenso e incentivo.

RESUMOEste estudo objetivou identificar de que forma as especificidades das organizaes pblicas influenciam a implementao da Gesto de Processos em seu mbito. Para isso foi realizada uma anlise de referenciais tericos com a finalidade de delinear, principalmente, questes relevantes para entender as diferenas entre a administrao pblica e a privada e que impactam na implementao da Gesto de Processos naquelas organizaes, e de subsidiar a elaborao de um roteiro de entrevistas estruturado. A partir dessa etapa, foi efetuada uma pesquisa de campo constituda por oito entrevistas com especialistas brasileiros de destaque no mundo acadmico nos quadros de empresas ou instituies que atuam com Gesto por Processos, em consultorias nessa rea e/ou profissionais com certificao internacional em processos, bem como com experincia na implantao da Gesto de Processos em organizaes da Administrao Pblica Direta Federal. O resultado dessas entrevistas foi analisado, consolidado e examinado luz da posio dos autores do referencial terico. Na percepo dos especialistas consultados nesta pesquisa, a menor maturidade apresentada pelas organizaes pblicas, relacionada medio de resultados e ao acompanhamento do desempenho, prejudica a tangilibilizao dos resultados decorrentes da adoo da Gesto de Processos. Em consequncia, as pessoas envolvidas tm dificuldade em perceber os ganhos que podem dela obter, situao que complica sobremaneira a possibilidade de movimentos de mobilizao e o prprio comprometimento para a implementao da Gesto de Processos. Alm disso, os entrevistados consideram que a postura e o perfil dos servidores pblicos, aliados a outras especificidades das organizaes pblicas - tais como estabilidade na carreira; falta de mecanismos de reconhecimento e recompensa e de avaliao de desempenho criteriosa; cultura de documentao e controle excessivos e as disfunes da burocracia; e a descontinuidade na gesto devido a influncias polticas - tambm podem prejudicar o engajamento, a motivao das pessoas para essa gesto e a identificao e implementao de melhorias contnuas nos processos organizacionais, atividades intrnsecas da Gesto de Processos. Palavras-chave: Especificidades das organizaes pblicas. Gesto de Processos. Diferenas. Pblica. Privada. Gesto. Administrao.

ABSTRACT

This study aimed to identify how the specific characteristics of public organizations influences the implementation of Business Process Management in its scope. This study was conducted under a theoretical analysis in order to delineate especial issues that are relevant to understand the differences between the public and private administrations and the impact of that difference both in the implementation of Business Process Management for those

organizations, and to support the development of a set of structured interviews. From this point, a field survey was done by interviewing eight Brazilian experts on Business Process Management who have highlighted academic status on the subject, are a staff member of companies or institutions that work with Business Process Management, who works as a Business Process Management consultant and/or are a Certified Business Process Professional, as well as experience in implementation of Process Management in organizations of Public Federal Direct Administration. The results of those interviews were analyzed, consolidated and examined by the authors considered as theoretical references. In the perception of the interviewed experts, the lower maturity shown by the public organizations, related to the measurement and monitoring of business process performance undermines the results that can be achieved by the adoption of Business Process Management and consequently, people do not realize the gains that they can get through it, hindering the ability to mobilize them and committing them to the implementation of Business Process Management. Moreover, the posture and profile of its own servers, along with other specifics of public organizations - stability of the public employees, lack of recognition and reward mechanisms and performance evaluation criteria, culture of excessive documentation and control and the dysfunctions of bureaucracy and also discontinuity in management - do not contribute to the engagement and motivation to the management of people and may hinder the identification and implementation of continuous improvements in the organizational processes, intrinsic activity of Business Process Management. Keywords: Specific characteristics of public organizations. Business Process Management. Differences. Public. Private. Management. Administration.

LISTA DE QUADROS

Quadro 1 - Atributos da administrao pblica em relao privada ...................................... 31 Quadro 2 - Caractersticas de organizaes dos setores pblico e privado .............................. 36 Quadro 3 - Hipteses de contrastes entre organizaes pblicas e privadas ............................ 37 Quadro 4 - Caractersticas de organizaes dos setores pblico e privado .............................. 39 Quadro 5 - Sntese das principais consideraes dos autores citadas no referencial terico, sobre a diferenciao entre Gesto Pblica e Privada .............................................................. 47 Quadro 6 - Caractersticas dos sujeitos da pesquisa ................................................................. 50 Quadro 7 - Fatores de Sucesso da Gesto de Processos ........................................................... 59 Quadro 8 - Fatores de fracasso da Gesto de Processos ........................................................... 62 Quadro 9 - Caracterstica ou especificidade das organizaes pblicas .................................. 65 Quadro 10 - Diferenas que impactam na implementao da Gesto de Processos no setor pblico em comparao com o setor privado ........................................................................... 78 Quadro 11 - Quadro preliminar das especificidades do setor pblico em relao ao privado que interferem na implementao da Gesto de Processos ...................................................... 80 Quadro 12 - Especificidades do setor pblico em relao ao privado que interferem na implementao da Gesto de Processos ................................................................................... 81 Quadro 13 - Consolidao das especificidades das organizaes pblicas que influenciam a implementao da Gesto de Processos ................................................................................... 90

SUMRIO

1.

INTRODUO .................................................................................................................. 9 1.1 1.2 1.3 Contextualizao do problema investigado .................................................................. 9 Objetivo e delimitao do estudo .............................................................................. 13 Definies dos termos ............................................................................................... 13 Gesto de Processos .................................................................................................. 16 Gesto de Processos no contexto da administrao pblica brasileira ...................... 21 Gesto pblica: especificidades em relao gesto privada .................................... 26 Tipo de Pesquisa ....................................................................................................... 48 Seleo dos Sujeitos da Pesquisa .............................................................................. 49 Coleta e tratamento dos dados .................................................................................... 51 Detalhamento das questes - blocos B e C................................................................ 57 Questo B.I ............................................................................................................ 57 Questo C.I ............................................................................................................ 58 Questo C.II ........................................................................................................... 61 Questo C.III.......................................................................................................... 64 Questo C.IV ......................................................................................................... 73 Questo C.V ........................................................................................................... 76 Detalhamento das questes bloco D ....................................................................... 79 Questo D.I ............................................................................................................ 80 Questo D.II........................................................................................................... 83 Questo D.III ......................................................................................................... 85 Questo D.IV ......................................................................................................... 86 Consolidao anlise geral dos dados frente ao objetivo da pesquisa ................... 88

2.

REFERENCIAL TERICO ............................................................................................. 16 2.1 2.2 2.3

3.

METODOLOGIA ............................................................................................................ 48 3.1 3.2 3.3

4.

ANLISE DOS DADOS ................................................................................................. 56 4.1 4.1.1 4.1.2 4.1.3 4.1.4 4.1.5 4.1.6 4.2 4.2.1 4.2.2 4.2.3 4.2.4 4.3

5.

CONCLUSO .................................................................................................................. 94

APNDICE A - Roteiro das Entrevistas ................................................................................ 102 APNDICE B - Resumo das respostas dos especialistas s questes dos Blocos B - C - D . 105

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1.1.1

INTRODUOContextualizao do problema investigado

A administrao pblica brasileira regida pelos princpios que esto elencados no artigo 37 da Constituio da Repblica Federativa do Brasil. Os princpios que originalmente integravam o texto constitucional eram os da legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade. Porm, em 1998, foi includo um novo princpio ao rol dos j existentes, o princpio da eficincia, por meio da Emenda Constitucional n 19, de 04/06/1998. Eficincia, conforme Meirelles (1996, p. 90-91 apud VASCONCELOS, 2009):(...) o que se impe a todo agente pblico de realizar suas atribuies com presteza, perfeio e rendimento funcional. o mais moderno princpio da funo administrativa, que j no se contenta em ser desempenhada apenas com legalidade, exigindo resultados positivos para o servio pblico e satisfatrio atendimento das necessidades da comunidade e de seus membros.

Portanto, a eficincia, eficcia e efetividade no setor pblico, so exigncias da nova tendncia mundial, o que impe uma urgente reorganizao do Estado. Em virtude dessa realidade, segundo Catelli e Santos (2004, p. 423), surgiu o (...) governo empreendedor voltado para o cidado como cliente, buscando padres otimizados de eficincia e eficcia numa gesto pblica por resultados, orientada por processos de avaliao contnua e de legitimao pela sociedade. A gesto pblica orientada para resultados, alm de outros aspectos, visa satisfao das partes interessadas (stakeholders) nesses servios e deve buscar o incremento de sua comunicao com os membros da sociedade para propiciar melhorias constantes no planejamento, execuo e controle das aes governamentais. Todas as organizaes, tanto privadas como pblicas, tm como objetivo o alcance de algum tipo de retorno perante os investimentos realizados. As organizaes privadas buscam proporcionar a distribuio de lucros aos investidores. Nas pblicas, o retorno esperado traduz-se no atendimento s expectativas e necessidades dos diversos stakeholders, como por exemplo: viabilizar educao, sade e segurana aos membros da sociedade; preservar o meio-ambiente e diminuir desigualdades sociais e regionais. Independente do tipo de retorno esperado, os esforos das organizaes estaro voltados para

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a sua maximizao. Para tanto, esto disponveis diversos instrumentos de gesto. Neste trabalho ser enfatizada a Gesto de Processos - ferramenta que vem sendo amplamente difundida na tentativa dos gestores de otimizar resultados. As discusses atuais sobre modernizao da gesto, especialmente no setor pblico, tm adquirido maior importncia, devido, principalmente, necessidade de superao dos graves problemas econmicos e sociais contemporneos. Conforme Bueno e Oliveira (2002), sinteticamente, a modernizao da administrao pblica tem como objetivos: melhorar a qualidade da prestao de servios sociedade, aprimorar o controle social, combater o patrimonialismo e o clientelismo, fazer mais ao menor custo possvel e valorizar o servidor pblico. Tais autores ressaltam que esse ltimo talvez seja o objetivo-chave a ser perseguido por qualquer projeto de modernizao, pois a qualidade profissional dos servidores e sua motivao so condies necessrias para se alcanar todos os outros objetivos. Os gestores pblicos vm percebendo que preciso planejar estrategicamente as aes para que seja possvel produzir os resultados futuros esperados pelas diversas partes interessadas e que no suficiente fazer o melhor se esse melhor no corresponder a um produto de qualidade, sob o ponto de vista do cliente/cidado. A preocupao com a modernizao e o aperfeioamento da gesto, com destaque para a Gesto de Processos est presente em aes do Governo Federal Brasileiro. Entre tais aes, pode-se destacar a instituio do Programa Nacional de Gesto Pblica e Desburocratizao (GesPblica), pelo Decreto n 5.378 de 23/02/2005, que resultado da evoluo histrica de diversas iniciativas do Governo Federal para a promoo da gesto pblica de excelncia, com vistas a contribuir para a qualidade dos servios pblicos prestados ao cidado e para o aumento da competitividade do Pas. Para tanto, o GesPblica vem disseminando o Modelo de Excelncia em Gesto Pblica (MEGP). Esse modelo viabiliza a entidades e rgos pblicos identificar oportunidades de melhoria e implementar ciclos contnuos de avaliao de seus sistemas de gesto. a representao de um sistema de gesto que visa aumentar a eficincia, a eficcia e a efetividade das aes executadas. constitudo por elementos integrados, que orientam a adoo de prticas de excelncia em gesto com o objetivo de levar as organizaes pblicas brasileiras a padres elevados de desempenho e de qualidade em gesto (SEGES, 2009a). Entre as ferramentas de gesto adotadas pelo GesPblica est a Gesto de Processos.

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Esse programa prev a Gesto de Processos como uma das ferramentas a serem utilizadas pelos gestores pblicos para a simplificao de processos e normas e a otimizao dos fluxos de trabalho, eliminando procedimentos que no agregam valor ao servio prestado pelas instituies e, por consequncia, pelo Estado. Conforme o Guia de Gesto de Processos do GesPblica (SEGES, 2009d), a moderna gesto pblica considera processos como um conjunto de decises que transformam insumos em valores gerados ao cliente/cidado, ampliando a ideia de processos como meros fluxos operacionais e destacando o compromisso das instituies em tomarem decises com o fim de satisfazer as necessidades desse cliente. Nesse contexto, inmeras instituies pblicas aderiram s propostas do GesPblica, ou seja, optaram pela avaliao e melhoria continuada da gesto pblica como um compromisso firmado com a sociedade. A busca pela excelncia certamente ir colaborar para a sua eficincia, eficcia e efetividade de forma a alcanar o melhor padro possvel para o desempenho de suas atribuies. Porm, independente da adeso ao GesPblica, para atingir essa eficincia, eficcia e efetividade no atendimento e na prestao de servios e modernizar a sua gesto, as organizaes pblicas vm buscando solues, a exemplo de elaborao de Planejamento Estratgico, implementao da Gesto de Projetos e da Gesto de Processos. Em relao Gesto de Processos, Paim (2007, p.3) cita uma srie de estudos e publicaes que evidenciam o aumento da demanda por parte das organizaes por conceitos, ferramentas e tecnologias que dependem da definio e entendimento da gesto de processos e acrescenta que essa alta demanda reforada pela percepo da utilidade prtica do tema Gesto de Processos por parte das organizaes pblicas e privadas de todos os setores da economia. Os ganhos de sua implementao podem ser mais facilmente percebidos pelos clientes/cidados, pois a Gesto de Processos se prope a impactar diretamente a qualidade do atendimento, dos produtos e dos servios a eles prestados. Portanto, a busca constante em prover servios de qualidade e que atendam s expectativas dos clientes/cidados passa pela necessidade da administrao pblica de tomar decises para minimizar problemas, tais como: demora no atendimento e na entrega de produtos e servios, filas e falta de informaes. Nesse momento que fica aparente a importncia da Gesto de Processos para viabilizar o

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atendimento qualitativo ao cliente/cidado, pois um dos principais objetivos desse modelo de gesto aperfeioar os fluxos de trabalho da instituio com o objetivo de agregar mais valor a todos os interessados. Uma das premissas de um moderno modelo de Gesto de Processos identificar as expectativas e os valores finais esperados pelos clientes/cidados, bem como as necessidades de melhorias para, a partir da, modelar, simplificar e aperfeioar os processos que geram e entregam servios e produtos queles clientes (SEGES, 2009d). Alm disso, podem ser citados Ministrios, tais como, da Justia, Fazenda e Educao, que vm adotando a Gesto de Processos como uma das iniciativas voltadas para a modernizao da gesto de unidades componentes de sua arquitetura organizacional. Hoje, partilhar da viso que percebe a Gesto de Processos como o caminho possvel para a construo de um governo presente nos processos sociais seja pela eficincia dos seus atos, seja pela transparncia da sua administrao significa grandes oportunidades de aperfeioar continuamente o controle administrativo, a economicidade e o controle social das aes de gesto pblica. Porm, necessrio observar que os quadros conceituais que esto na origem da gesto de processos e fazem parte das tradies da engenharia de produo so a administrao cientfica, o sistema Toyota de Produo, o Controle da Qualidade Total, a Reengenharia e a Teoria das Restries (PAIM et al., 2009, p.37). Tal situao demonstra que o mtodo foi inicialmente desenvolvido com nfase no setor privado. Em seus estudos sobre Planejamento Estratgico, Pfeiffer (2000) destaca que as diferenas entre as caractersticas dos setores pblicos e privados so marcantes e, neste sentido, no recomenda a utilizao de mtodos ou instrumentos de gesto, sem adaptaes, diretamente de um setor para o outro, situao que se aplica quando da implementao da Gesto de Processos em uma instituio. Tal como Pfeiffer (2000), Allison (2002), Rainey; Backoff e Levine (1976), Boyne (2002), Motta (2007), Zwicker, Fettke, Loos (2010), Miranda, Macieira e Paim (2004), tambm apontam caractersticas que demonstram as diferenas entre as organizaes pblicas e privadas. Essas especificidades sero detalhadas adiante, no subttulo 2.3. pblica: especificidades em relao gesto privada. As ponderaes anteriores fizeram surgir o problema investigado neste estudo: de que forma as especificidades das organizaes pblicas influenciam a implementao da Gesto de Gesto

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Processos em seu mbito?

1.2

Objetivo e delimitao do estudo

Este trabalho teve por objetivo identificar de que forma as especificidades das organizaes pblicas influenciam a implementao da Gesto de Processos em seu mbito a partir da anlise de referenciais tericos e da opinio de especialistas, por meio da realizao de pesquisa de campo - entrevistas com especialistas brasileiros na rea de Gesto de Processos e dotados de experincia na implementao da Gesto de Processos em instituies do setor pblico e privado. O objeto da presente pesquisa foram as organizaes pblicas, mais especificamente, da Administrao Pblica Direta Federal. Rainey; Backoff e Levine (1976) fazem algumas ponderaes que se aplicam a esta pesquisa. Ponderam que, idealmente, uma investigao como esta (grande pesquisa de literatura comparando as organizaes pblicas e privadas) implicaria em duas etapas: (1) definir claramente o conceito de organizaes do setor pblico e do privado, que deveria indicar as diferenas essenciais e uma linha clara entre elas; e (2) especificar toda a gama de variaes dessas organizaes, que emprica e logicamente relacionada com a definio dessas diferenas. Os mesmos autores consideram que o sucesso na primeira etapa impossvel e que tal dificuldade complica o problema, porm destacam que uma srie de outros autores que possuem essa opinio, no entanto, avanam com a segunda etapa. Ainda segundo Rainey; Backoff e Levine (1976), mesmo que nenhuma organizao tenha todos os atributos bsicos, parece razovel falar de organizaes pblicas, tpicas de governo, e de organizaes privadas, tpicas de negcios. Para fins deste trabalho, considerar-se-o como sinnimos os termos gesto e administrao.

1.3

Definies dos termos

Com o intuito de proporcionar uma equalizao conceitual, a seguir so listados alguns termos-chave para o trabalho, acompanhados do significado a ser entendido neste estudo. a. Business Process Management (BPM) ou Gesto de Processos de Negcios ou Gesto por Processos: uma abordagem de gesto disciplinada para identificar, desenhar, executar,

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documentar, monitorar, controlar e melhorar os processos de uma instituio, automatizados ou no, para criar valor, alcanar os resultados pretendidos consistentes e alinhados com as suas metas estratgicas, criam valor e permitem que uma organizao cumpra seus objetivos de negcio com mais agilidade. Pode ser entendida como a aplicao de diferentes conceitos e teorias voltadas melhor organizao e gerenciamento dos processos das organizaes, sejam elas pblicas ou privadas. Esses conceitos envolvem repercusso dos direcionamentos estratgicos para os processos, projet-los, controlar sua execuo, bem como identificar e implantar tecnologias de apoio, e, de forma geral, trazer para as organizaes a cultura de prover avanos ou ganhos de desempenho atravs da melhoria de seus processos, sejam elas radicais ou incrementais (ABPMP, 2009). b. Eficcia: produo de um efeito, fazer o que deve ser feito, atingir os objetivos. c. Eficincia: capacidade de produzir mais com menos, com racionalizao, produtividade, qualidade. d. Efetividade: produzir um efeito verificvel, real, incontestvel. E, alm disso, sob a tica da gesto, engloba os dois anteriores, a eficincia e a eficcia. e. Especificidade: caracterstica, que caracteriza ou distingue. f. Implementao: pr em prtica, em execuo, implantao, assegurar a realizao de algo. g. Organizao pblica: tambm denominada rgo pblico. Unidade com atribuio especfica dentro da organizao do Estado. Composta por agentes pblicos que a dirigem e compem e voltada para o cumprimento de uma atividade estatal. Os rgos pblicos formam a estrutura do Estado, porm no possuem personalidade jurdica, uma vez que so parte de uma estrutura maior, essa sim detentora de personalidade. No tem vontade prpria e devem cumprir as finalidades dentro da competncia funcional que lhes foi determinada pela organizao estatal. Neste captulo, foi apresentada a contextualizao do problema investigado, o objetivo, a delimitao e os termos-chaves da pesquisa. Tambm foi demonstrada a relevncia do trabalho proposto para a gesto das organizaes pblicas e ao cliente/cidado. Alm disso, descreve brevemente os captulos que compem esta dissertao: Captulo 1 - Introduo: expe os argumentos que evidenciam a importncia desta pesquisa gesto das organizaes pblicas e ao cliente/cidado, anuncia o problema no qual se baseia este estudo, define o objetivo proposto e alguns termos-chave a fim de clarificar os resultados

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pretendidos. Captulo 2 - Referencial Terico: apresenta a literatura estudada relacionada pesquisa de forma a delinear o estado da arte no tema e, principalmente, as questes que podem ser identificadas a partir dessa literatura, como relevantes para entender as diferenas da administrao pblica e privada e que impactam na implementao da Gesto de Processos nas organizaes pblicas. Captulo 3 - Metodologia: apresenta os tipos de pesquisa utilizados, a forma como foram obtidos os dados para elucidao do problema e os procedimentos adotados para o tratamento desses dados. Captulo 4 - Anlise dos dados: detalha as questes do roteiro de entrevista, apresenta a anlise e a consolidao das informaes obtidas com os especialistas entrevistados, comparando essas informaes com as obtidas na reviso bibliogrfica. Captulo 5 - Concluso: apresenta a resposta questo investigada, decorrente da interpretao dos resultados obtidos e indica desdobramentos para futuras pesquisas.

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2.

REFERENCIAL TERICO

Este captulo apresenta a literatura estudada de forma a delinear o estado da arte sobre temas relacionados pesquisa, principalmente, as questes identificadas a partir dessa literatura, como relevantes para entender as diferenas entre a administrao pblica e a privada e que podem interferir na implementao da Gesto de Processos nas organizaes do setor pblico. Inicialmente foi abordado o tema Gesto de Processos. Em seguida, a Gesto de Processos contextualizada no mbito das aes de modernizao da administrao pblica brasileira contempornea. Finalmente, so apresentadas informaes de diversos autores relativas s especificidades (semelhanas, diferenas) das organizaes do setor pblico em relao s do privado, suas principais implicaes na gesto, necessidade de adaptao de instrumentos de gesto quando de sua utilizao de um setor para outro de maneira geral, alm de, especificamente, quanto Gesto de Processos.

2.1

Gesto de Processos

A Gesto de Processos teve sua origem em concepes da engenharia e reengenharia de processos, gesto da qualidade, gesto de operaes, modelagem de processos de negcio e de sistemas de informaes de processos. reconhecida como um pilar das abordagens contemporneas de gesto, pois a anlise dos processos de negcio leva compreenso das razes da organizao (ROSEMANN, 2006). A expresso Gesto de Processos - Business Process Management (BPM) - passou a ser mais utilizada no final de 1990, principalmente j no incio do sculo XXI, e, segundo Paim et al. (2009, p. 123) A divergncia do entendimento desse conceito tem sido frequentemente relatada na literatura. Paim (2007), aps uma ampla e extensa pesquisa de reviso bibliogrfica definiu Gesto de Processos como um conjunto de tarefas necessrias para realizar essa Gesto, e o dividiu em trs grupos, a saber: a) projetar ou conceber processos; b) gerir processos no dia-a-dia; e promover aprendizado sobre processos. Conforme Barros (2009), a Engenharia de Processos a rea do conhecimento cujo objetivo estudar os processos presentes nas organizaes propondo uma abordagem que foca o olhar sobre os processos, ao contrrio da abordagem funcional tradicional em que as organizaes,

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em sua maioria, esto estruturadas - reas de Recursos Humanos, Marketing, Vendas, Contabilidade, entre outras. Ainda segundo esse autor, a literatura comumente utiliza os termos Gesto de Processos ou Gesto de Processos de Negcio como sinnimo de Engenharia de Processos. No mbito do seu trabalho o termo Gesto de Processos foi utilizado de forma mais restritiva, no sentido de fazer a gesto com foco a partir dos processos. Processo pode ser entendido simplesmente como um conjunto de atividades que visam produzir um resultado de valor ao cliente (HAMMER, 1994). Alm disso, no h produto ou servio sem um processo que suporte sua produo ou prestao, respectivamente (GONALVES, 2000), e todo trabalho realizado nas organizaes, tanto pblicas como privadas, faz parte de algum processo (GRAHAM; LEBARON, 1994 apud GONALVES, 2000). Numa concepo mais frequente, processo qualquer atividade ou conjunto de atividades que toma um input, adiciona valor a ele e fornece um output a um cliente, e, de maneira mais formal, um processo um grupo de atividades realizadas numa sequncia lgica com o objetivo de produzir um bem ou um servio que tem valor para um grupo especfico de clientes (HAMMER; CHAMPY, 1994 apud GONALVES, 2000, p.7). Tal ideia de processo como um fluxo de trabalho com inputs e outputs claramente definidos e tarefas sequenciais dependentes umas das outras vem da tradio da engenharia. Os inputs podem ser materiais, equipamentos e outros bens tangveis, mas tambm podem ser informaes e conhecimento. Nessa viso, os processos tambm tm incio e fim bem determinados, abordagem caracterstica dos adeptos do aperfeioamento de processos (HARRINGTON, 1991 apud GONALVES, 2000). Davenport (1993 apud BARROS, 2009, p.22) explica que os processos atravessam as diversas reas funcionais da estrutura da organizao e podem ser entendidos como a ordenao de atividades de trabalho atravs do tempo e do espao, com um incio, um fim e um conjunto claramente definido de entradas e de sadas. Paim (2002, 2007) amplia o conceito de processos como sendo uma estruturaocoordenao-disposio lgico-temporal de aes e recursos com objetivo de gerar um ou mais resultados para a organizao. Podem estar em diferentes nveis de abstrao e detalhamento e relacionados a atividades gerenciais, finalsticas e de apoio. Os processos so definidos por Paim et al. (2009, p.103) como objetos de controle e

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melhoria, mas tambm permitem que a organizao os utilize como base de registro do aprendizado sobre como atua, atuou ou atuar em seu ambiente ou contexto organizacional. Os autores destacam o carter dinmico dos processos - so a organizao em movimento, estruturados para a ao, qual seja, gerar e entregar valor. Assim, Gesto de Processos (BPM) pode ser entendida como uma prtica holstica de gesto empresarial e que requer o entendimento e o envolvimento da alta administrao, a definio clara de papis, a existncia de processos de deciso como parte da Governana de Processos, metodologias, sistema de informaes de processos, colaboradores com perfil e capacitao adequada e cultura receptiva para a Gesto de Processos (ROSEMANN, 2006). Nesse contexto, para garantir a coordenao das iniciativas de processos entre as diversas unidades funcionais e buscar o alinhamento entre a estratgia organizacional e os esforos de processos surge a Governana de Processos (KORHONEN, 2007). Segundo Barros (2009), a Governana de Processos tem por objetivo organizar e ordenar a Gesto de Processos nas organizaes a fim de viabiliz-la como um elemento de gesto organizacional capaz de contribuir para o aumento da performance dos processos e, consequentemente, da organizao. Ainda segundo o autor, a ausncia de uma Governana de Processos, ou uma governana desestruturada diminui, ou at mesmo, impossibilita os retornos que podem ser alcanados por meio da Gesto de Processos. Um elemento primordial para ser alcanada uma boa Governana de Processos, a Estrutura de Governana, que tem a responsabilidade de definir e posicionar a estrutura organizacional que contempla os responsveis pela Gesto de Processos na organizao (BARROS, 2009). Harmon (2008) destaca a importncia da distino entre os termos gesto e governana. Segundo ele, a gesto refere-se s tarefas realizadas para a execuo do trabalho. A governana a organizao da gesto e se refere a metas, princpios, estrutura organizacional com definio de responsabilidades e direitos de decises, polticas e regras que definem o limite de atuao dos gestores. Portanto, tem-se a Governana de Processos como a gesto da Gesto de Processos na organizao, ou seja, essa Governana orienta e coordena a gesto dos processos na organizao e vem marcando presena cada vez mais constante em eventos de processos e em discusses e publicaes de sites especializados, demonstrado que o interesse pelo assunto vem crescendo no seio da comunidade de processos (KIRCHMER, 2005).

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A partir de seus estudos, Barros (2009), apresentou o conjunto de elementos relacionados com a Governana de Processos, a seguir relacionados: papeis e responsabilidades, padres, tarefas, estrutura, objetivos, mecanismos de controle e mecanismos de avaliao. Segundo aquele autor, o elemento estrutura da Governana de Processos dispe sobre a organizao e a hierarquia dos papis relacionados com a Gesto de Processos na estrutura da organizao e formado pelos seguintes fatores: Escritrio de Processos, Comit de Processos, Grupo Gestor de Processos, Grupo Gestor de Projetos e Estrutura Funcional de Governana. O Escritrio de Processos um ponto central dessa Estrutura de Governana e a sua implantao como unidade organizacional com responsabilidades sobre a Gesto de Processos colocada como fator relevante para o sucesso dessa gesto (PAIM et al., 2007). Paim et al. (2007) acrescentam que o escopo de abrangncia do Escritrio de Processos, ou seja, a quantidade de tarefas sob sua responsabilidade, bem como quais os papis definidos para a Gesto de Processos que devem ou no estar subordinados ao Escritrio e qual a sua posio hierrquica na organizao, so aspectos em aberto, devendo ser ajustados caso a caso. O Escritrio de Processos surge como uma proposta para responder necessidade de institucionalizar a Gesto de Processos e torn-la, efetivamente, parte do cotidiano das tarefas e da cultura da organizao. Alm disso, esse escritrio visa criao de um espao comum, com viso compartilhada dos processos da organizao, e a apoiar cada uma das partes na gesto de seus processos e no alcance de resultados globais. Ou seja, a unidade que auxilia a promover a articulao da gesto dos processos organizacionais e focaliza sua ateno para garantir que as prticas e a lgica da Gesto de Processos continuem internalizadas e atualizadas na organizao (PAIM et al., 2008). O detalhamento de cada Escritrio de Processos a ser institudo deve levar em conta as especificidades de cada organizao e, logo, tende a ser nico e particular para sua realidade (Paim et. al., 2008). Portanto, reforada a afirmao de que o escopo de abrangncia do Escritrio de Processos, os papis definidos para a Gesto de Processos a ele subordinados e a sua posio hierrquica so aspectos que devero ser ajustados caso a caso. Tregear; Jesus e Macieira (2010) corroboram com essa ideia de que os detalhes de cada escritrio devero ser moldados de acordo com a especificidade da organizao, pois ao proporem trs pilares genricos para o desenvolvimento das competncias no Escritrio de

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Processos, quais sejam: a) Modelo de Referncia de Escritrio de Processos; b) Implementao em Ondas; c) Programa de Desenvolvimento de Competncias em BPM, afirmam que tais pilares foram desenhados para promover o desenvolvimento progressivo de um escritrio de processos, definindo os seus servios e as competncias em BPM de toda a organizao, ressaltando, porm, que os detalhes de atuao devem variar entre organizaes especficas. Esse escritrio pode ser essencialmente normativo e focar no projeto-desenho do trabalho, com vis de levantamento, melhoria e implantao de novos processos. () pode avanar sobre a coordenao e o controle das atividades e sobre a alocao de recursos que ocorrem no dia-a-dia das organizaes (Paim et. al., 2009, p. 265). Um Escritrio de Processos vital para atribuir um olhar sistmico, inovador e efetivo Gesto de Processos. Por meio desse escritrio, possvel organizao tornar perenes suas aes de processos, estimulando e verificando sua utilizao como instrumento contnuo de melhoria e de apoio ao alcance dos resultados esperados e satisfao das partes interessadas. A Association of Business Process Management Professionals - ABPMP (2009: 30-33), apresenta um rol de fatores-chave de sucesso de BPM, no seu Guia BPM CBOK 1. Esse Guia enfatiza que esforos bem sucedidos de Gesto de Processos tipicamente envolvem a considerao de vrios fatores, incluindo prticas organizacionais, de gerenciamento, de processo e tecnolgicas. A seguir apresentada uma sntese desses fatores. 1. Alinhamento de estratgia, cadeia de valor e processo de negcio. Organizaes mais bem sucedidas na implementao de BPM dedicam ateno especial a esses fatores. BPM repousa em estratgias-chave que estabelecem a direo principal da organizao, geralmente em termos de proposies de valor para produtos e servios entregues aos clientes. A estratgia conduz as metas - geralmente expressas em objetivos operacionais e metas financeiras - e unidades da organizao como a base para planos de ao e tticas de negcios. 2. Metas. As metas de processos devem proporcionar o alinhamento dos processos de negcio com a estratgia organizacional. 3. Patrocnio executivo e governana. Organizaes maduras em Gesto de Processos

1 O BPM CBOK um corpo comum de conhecimentos sobre BPM, projetado pela ABPMP para auxiliar profissionais de BPM fornecendo uma viso abrangente das questes, melhores prticas e lies aprendidas sobre o tema. uma associao internacional desses profissionais, sem fins lucrativos, independente de fornecedores, dedicada promoo dos conceitos e prticas de BPM. Maiores informaes em http://www.abpmp-br.org.

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tipicamente designam responsabilidade de liderana executiva para supervisionar o desempenho de processos considerados chave, medido com a prestao de contas, a qual incide sobre essa liderana executiva e reportada para toda a organizao. Para descobrir e gerenciar processos-chave importante ter disciplina para a utilizao de metodologias para documentar, armazenar, gerenciar e melhorar continuamente esses processos, principalmente aqueles que compem as cadeias de valor. 4. Propriedade do processo. Reconhecer o papel de dono de processo essencial para o sucesso na implementao da Gesto de Processos. Ele responsvel pelo processo ao longo de todos os departamentos funcionais. O sucesso desse papel depende de sua autoridade para controlar o oramento e tomar decises que afetam o desenvolvimento, manuteno e melhoria do processo. 5. Mtricas, medies e monitoramento. Para gerenciar necessrio medir o desempenho do processo em termos da variedade de possveis mtricas relacionadas para saber quo bem os processos atendem seus objetivos estabelecidos. A medio e o monitoramento de processos fornecem um feedback essencial ao desenho do processo, seu desempenho e conformidade. As mtricas incluem, entre outros aspectos, crescimento de vendas, reduo ou conteno de custos, tempo de ciclo e satisfao ou reteno de clientes. O alcance efetivo desses fatores-chave de sucesso BPM em criar valor para uma organizao e seus clientes depende tanto de prticas organizacionais quanto de domnio de conceitos e habilidades por pessoas com responsabilidade por prestar contas da gesto dos processos da organizao.

2.2

Gesto de Processos no contexto da administrao pblica brasileira

A Gesto de Processos, em sntese, na administrao pblica(...) mobilizar servidores para aumentar o valor de seus processos atravs de melhorias e inovaes. Mobilizar: criar uma cultura de inovao e criatividade que inspire todo gestor a pensar em como aumentar o valor pblico de seus processos a partir de um melhor uso dos ativos pblicos! Orientar para viso de valor pblico: dotar gestores de ferramentas para entender o que o cidado/cliente valoriza e analisar oportunidades para entregar este valor. Melhorias e inovaes: capacitar gestores para conduzir projetos de inovao e ciclos de melhoria contnua que transformem ideias em novos processos com novos sistemas, competncias, polticas, regras, controles, infra-estrutura, etc. (ELOGROUP, 2011, p. 23).

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Segundo Moore (2011) apud ELOgroup (2011) a viso de valor pblico uma forma de estmulo ao debate sobre como melhorar os servios da administrao pblica, entendendo quais os benefcios e custos envolvidos. Uma das tendncias que vm sendo adotadas pelo setor pblico brasileiro para agilizar seus procedimentos e aprimorar os produtos e servios prestados ao cliente/cidado a Gesto de Processos. Nessa forma de gesto, uma organizao pblica considerada um grande processo cuja misso atender s necessidades do cidado/usurio, mediante a prestao de servios, gerados a partir de insumos, recursos e informaes recebidos de fornecedores, e processados por servidores pblicos com o uso de recursos materiais, tcnicos e gerenciais (IPEA, 1996). O aperfeioamento do ciclo da gesto - desde o dimensionamento de recursos disponveis, planejamento, alocao de recursos e implementao das aes, at a anlise e avaliao dos resultados e dos impactos dessas aes - permite a tomada de deciso qualificada em nvel estratgico. Por isso, governos nacionais e subnacionais tm investido na definio e no aprimoramento de instrumentos de gesto inovadores e orientados para resultados (SEGES, 2009b). Ainda segundo esse documento, est em curso, no Brasil, um novo ciclo de desenvolvimento iniciado h pouco mais de uma dcada que exige um Estado cada vez mais gil na identificao de demandas, eficaz no desenho de solues e efetivo na implementao de polticas. Esse novo desenho da atuao estatal impe a melhoria da gesto pblica, que significa desenvolver capacidades e instrumentos para subsidiar as decises, analisar riscos, informar e qualificar o processo decisrio, trabalhar de forma proativa e coordenada e incorporar metodologias, ferramentas e prticas modernas e alinhadas s necessidades e realidades da administrao pblica. Significa atuar na dimenso da gesto das organizaes pblicas, contribuindo para a construo de um modelo de atuao em bases integradas e cooperativas, orientado para resultados e com foco no cidado. Alm disso, quanto ao monitoramento da gesto pblica, h atualmente iniciativas para melhorar a coordenao dos atores e o acompanhamento de indicadores de desempenho e de resultado (SEGES, 2009b). Um dos marcos do movimento rumo modernizao da gesto pblica brasileira foi o Plano Plurianual (PPA 2000-2003), denominado Avana Brasil, que trouxe mudanas de impacto no sistema de planejamento e oramento federais, assim como na gesto pblica. A recuperao

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da estabilidade da moeda e o processo de ajuste fiscal, iniciado em 1994, com o Plano Real, formou o entendimento de que se impunha um choque gerencial na administrao pblica brasileira. Decidiu-se, ento, transformar o plano em instrumento de gesto, orientando a administrao pblica para resultados (ARIEL et al., 2002). Esses autores ainda explicitam que a gesto orientada para resultados cria percepes de ganhos e perdas. Perdem as estruturas da organizao, cujo poder aparentemente ameaado pela transparncia da gesto e ganham os segmentos da sociedade beneficirios dos programas e os gestores de alto nvel da administrao pblica, que so avaliados em funo dos resultados percebidos pela sociedade em geral (ARIEL et al., 2002). Portanto, a comunicao com a sociedade e a busca por entender qual o impacto (outcome) dos servios pblicos prestados e se tais servios atendem ou no a expectativa dos usurios/clientes assumem um papel de destaque para viabilizar melhorias constantes e transformaes da gesto pblica, bem como, constituem fator de motivao e feedback aos gerentes. Corroborando com essas ideias e em relao verificao do impacto dos servios pblicos causado aos usurios (TROSA, 2001, p. 181) comenta que tal avaliao proporciona Saber se o que se faz tem sentido... O impacto pode ser instrumento decisivo de gerenciamento () e um indicador que permite saber se a ao est no bom caminho (...). Algumas etapas a serem seguidas para a mensurao de desempenho e avaliao dos impactos citadas por essa autora so: utilizar informaes quantitativas e qualitativas; dar palavra aos usurios e distinguir os indicadores quantitativos e qualitativos e interpret-los (TROSA, 2001). Alm disso, essa avaliao importante fonte de informaes para retroalimentar o planejamento das aes das organizaes pblicas, para a melhoria dessa nova forma de gesto com foco nos resultados e voltada para os cidados/usurios. Pois, segundo Matus (1996:14) Negar o planejamento negar a possibilidade de escolher o futuro, aceit-lo seja ele qual for. Portanto, utilizar essas informaes de anlise do atendimento ou no das expectativas das partes interessadas ser novo input para o planejamento das aes das organizaes pblicas, para que essas sejam direcionadas ao aperfeioamento de seus produtos e servios, atribuindo-lhes maior utilidade e efetividade. Consistindo, assim, num ciclo de avaliar, redefinir, replanejar as aes futuras para que as aes executadas e os servios e produtos possam cada vez mais satisfazer os clientes/usurios/cidados.

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Nesse contexto, foi institudo, em 2005, o Programa Nacional de Gesto Pblica e Desburocratizao (GesPblica), que um programa do Governo Federal vinculado ao Ministrio do Planejamento, Oramento e Gesto (MPOG), voltado para a avaliao da gesto e a melhoria contnua das organizaes pblicas. Conforme informaes do documento Mapeamento Bibliogrfico e do Estado da Arte sobre Indicadores de Gesto (SEGES, 2009c), o GesPblica adotou o Modelo de Excelncia em Gesto Pblica (MEGP) que orienta as organizaes pblicas na busca de transformaes no mbito da gesto e na avaliao do seu desempenho. Esse modelo formado por oito critrios que se dividem em quatro principais blocos, a saber: a. bloco I: foco no planejamento e constitudo de quatro critrios: Liderana, Estratgia e Plano, Cidados e Sociedade; b. c. d. bloco II: foco na execuo e constitudo de dois critrios: Processos e Pessoas; bloco III: foco no controle e constitudo de um critrio: Resultados; e bloco IV: foco na fase de inteligncia da organizao constitudo de um critrio: Informaes e Conhecimento. O MEGP utiliza o Instrumento de Avaliao de Desempenho da Gesto Pblica (IAGP) que define itens para autoavaliao e anlise. Cada avaliao percorre um ciclo de aprendizagem assim estabelecido: definio das prticas de gesto; implementao - ciclo de controle; avaliao das prticas e dos padres; e inovao e refinamento da prtica. Especificamente quanto ao critrio Processos, o GesPblica tem por objetivo examinar como a organizao gerencia, analisa e melhora os seus processos finalsticos e os de apoio. Alm disso, o MEGP possui um sistema de pontuao que determina o estgio de maturidade da gesto da organizao nas seguintes dimenses: a. processos gerenciais, em que so avaliados os fatores: enfoque - adequao aos requisitos

definidos e capacidade de antecipar aos fatos; aplicao - implementao das prticas e continuidade delas; aprendizado - aperfeioamento decorrente de processos de melhorias; e integrao - relao harmnica e cooperativa das estratgias, objetivos e reas da organizao; b. resultados organizacionais, em que so avaliados os fatores: relevncia - importncia do

resultado para a organizao; tendncia - resultados ao longo prazo; e nvel atual grau de atendimento aos requisitos das partes interessadas e comparao com o desempenho de outras organizaes. Para atingir seus objetivos, o GesPblica desenvolve e dissemina ferramentas de gesto que

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tem como objetivo dar apoio ao gerenciamento e gesto do conhecimento, alm de estimular o mapeamento, a disseminao e a incorporao de boas prticas na gesto. Entre tais ferramentas disseminada a Gesto de Processos, que, segundo o GesPblica :instrumento que orienta a modelagem e a gesto de processos voltados ao alcance de resultados. A descrio envolve a reflexo acerca de caractersticas de validade dos produtos e servios prestados, de referncias (normas e conhecimentos) observadas, de recursos consumidos e dos insumos necessrios tomada de deciso com qualidade pelas pessoas e pelas instituies pblicas. (SEGES, 2009d, p.1)

O GesPblica (BRASIL, 2009d) disponibiliza um Guia de Gesto de Processos com orientaes para a modelagem de processos. Alm desse instrumento, foi elaborado o Guia d Simplificao Administrativa para auxiliar as organizaes pblicas interessadas em simplificar seus processos e normas, eliminando exigncias de rotinas que geram fluxos desconexos na tramitao de documentos que no agregam valor ao servio prestado pela organizao e, por consequncia, pelo Estado. Evidenciando o esforo contnuo para atualizar o prprio MEGP de forma a incorporar todo o conhecimento especfico brasileiro em gesto pblica e a integrar as abordagens metodolgicas do GesPblica, reduzindo esforos e potencializando resultados e seus impactos, desde fevereiro de 2011, encontra-se em andamento um processo de reviso daquele modelo. Essa reviso foi percebida como necessria, pois o momento atual do contexto brasileiro exibe um conjunto de prioridades, tais como a necessidade de elevar os nveis de atendimento ao cidado, de introduzir melhorias em processos estruturantes e de compartilhar boas prticas relacionadas s pessoas que formam as organizaes. Assim, o GesPblica pode ter papel fundamental em tal dinmica, uma vez que suas estratgias, modelos e procedimentos incorporem as atuais necessidades. Portanto, iniciativas como essas, vm demonstrando o esforo do poder pblico brasileiro no sentido de elaborar e aperfeioar continuamente modelos de excelncia em gesto, buscando adaptar modelos tpicos de empresas privadas para adequ-los ao setor pblico e ao contexto atual. Tal contexto, de modernizao da gesto pblica, evidencia a necessidade de criao e aprimoramento contnuo de instrumentos que subsidiem a implementao de novas prticas de gesto, adaptadas a esse setor.

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2.3

Gesto pblica: especificidades em relao gesto privada

Segundo Rainey; Backoff e Levine (1976), atualmente, a confuso ou a convergncia entre os setores privado e pblico tem sido frequentemente observada, devido a dois fenmenos principais interligados. Primeiro, h uma mistura de atividades governamentais e no governamentais, que observvel na regulamentao de vrias atividades pelo governo, e em vrias empresas mistas que operam, assim como empresas pblicas e de prestao de servios governamentais, por contrato com empresas privadas. Esses autores acrescentam que essa confuso" certamente dificulta a delimitao dos setores, mas apontam que a verdadeira questo o que fazer com ela. Uma distino pode ser desfocada e ainda assim ser significativa. Alm disso, citam que outros autores apontam a dificuldade de diferenciao clara, porm continuam listando diferenas importantes entre organizaes pblicas e privadas. Allison (2002), em seu artigo cujo debate em torno das semelhanas e diferenas entre a gesto de organizaes pblicas e privadas, apresenta que as categorias agora prevalecentes nas discusses sobre gesto pblica - gesto estratgica, de pessoal e financeira e controle so principalmente derivadas do contexto da gesto privada, porm que a adaptao desses conceitos para os problemas que os gestores pblicos enfrentam ainda no est clara. Esse autor comenta que em contraste aos milhares de casos em que a literatura acadmica descreve os problemas enfrentados pelos gestores privados e as suas prticas na soluo desses problemas, estudos de caso a partir da perspectiva de um gestor pblico esto apenas iniciando. Acrescenta que essa escassez de dados sobre o fenmeno inibe a pesquisa emprica sistemtica sobre as semelhanas e diferenas entre gesto pblica e privada, deixando o campo para uma mistura de reflexo sobre a experincia pessoal e a especulao. Na sequncia, Allison (2002: 398-399) apresenta um quadro com as funes gerais de gesto formuladas a partir da literatura sobre administrao from Barnard to Drucker e que seriam semelhantes nos setores pblico e privado, ressaltando que o desafio dos gestores de ambos setores concentra-se na capacidade de integrar todos esses elementos de forma a alcanar resultados para a organizao. Essas funes gerais so apresentadas a seguir (traduo livre).

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Funes Gerais de Gesto - Similaridades entre Gesto Pblica e Privada: Estratgia 1. Estabelecer objetivos e prioridades para a organizao. 2. Elaborar planos operacionais para atingir esses objetivos. Gerenciar componentes internos 3. Organizao e pessoal, que engloba estabelecer a estrutura - unidades e posies com autoridade e responsabilidades atribudas - e os procedimentos para a coordenao das atividades e encaixar as pessoas certas nos cargos-chave. 4. Gesto de pessoal (capital humano). 5. Controle do desempenho. Gerenciar componentes externos 6. Lidar com as diversas unidades da organizao sujeitas a alguma autoridade comum - outras unidades dentro da organizao maior. 7. Lidar com organizaes independentes - de outros ramos, de outros nveis de governos, grupos de interesse, etc. 8. Lidar com a imprensa ou com o pblico cuja ao, concordncia ou aprovao so necessrias. Entretanto, Allison (2002) destaca que as funes generalistas em que gesto gesto, as quais ostentam rtulos idnticos, assumem um significado muito diferente em definies pblicas e privadas. E, acrescenta, citando Larry Lynn, que um poderoso elemento de prova no debate entre aqueles que enfatizam semelhanas e aqueles que sublinham diferenas a concluso quase unnime dos indivduos que foram gerentes gerais em ambas as reas, pblica e privada: todos eles julgam a gesto pblica diferente da privada, e mais difcil! Ao apresentar essa concluso, o autor cita vrios gestores de alto escalo que exerceram essa funo em organizaes tanto pblicas como privadas e remete a publicaes nas quais esses manifestaram a sua opinio em relao ao assunto. Em sua reviso sobre o assunto gesto pblica e privada so diferentes, incluindo estudos sobre as opinies daqueles gestores e o pensamento de acadmicos, Allison (2002) identificou trs listas interessantes que, segundo ele, resumem a situao atual sobre as diferenas entre a gesto pblica e a privada: a) uma elaborada por John Dunlop; b) uma por Hal Rainey, Robert Levine Backoff e Charles Levine - grande pesquisa de literatura comparando as organizaes pblicas e privadas (Public Administration Review); e c) uma por Richard E. Neustadt

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preparada para a National Academy of Public Administrations Panel on Presidential Management; que esto apresentadas a seguir. a) John T. Dunlop - minuta no publicada (vero de 1979) contendo uma comparao impressionista da gesto pblica e privada, apontando os seguintes contrastes entre elas: 1. Perspectiva de Tempo. Gestores pblicos tendem a ter horizontes de tempo relativamente curtos, ditados por necessidades e pela agenda polticas, enquanto gestores privados parecem ter uma perspectiva mais longa de tempo, orientada para a evoluo do mercado, inovaes e investimentos tecnolgicos, e para construir e estruturar a organizao. 2. Durao. O tempo de servio dos gestores pblicos relativamente curto, enquanto gestores privados normalmente tm um tempo maior nos cargos de chefia (na mesma posio e na mesma empresa). Um dos elementos reconhecidos de gesto privada a responsabilidade de treinar um sucessor ou vrios possveis candidatos, enquanto tal conceito praticamente desconhecido na gesto pblica, e, at mesmo considerada perigosa, pois poderia promover um sucessor. 3. Medio de Desempenho. Acordos em relao a padres e medio de desempenho na gesto pblica so praticamente inexistentes, enquanto, no setor privado, h inmeros testes de desempenho sobre retorno financeiro, participao no mercado, medidas de desempenho para remunerao de executivos, que esto bem estabelecidos e muitas vezes explcitos para uma posio especfica de gesto durante um perodo preestabelecido. 4. Limitaes de pessoal. Na administrao pblica, as disposies de convenes coletivas e outros regulamentos complicam a contratao, transferncia e demisso ou dispensa de pessoal para atingir os objetivos de gesto. Em comparao, os gestores das empresas privadas possuem consideravelmente maior amplitude na gesto dos seus subordinados, mesmo em negociaes coletivas. Eles tm muito mais autoridade para dirigir os funcionrios de sua organizao. 5. Equidade e eficincia. Na gesto pblica a nfase em promover a equidade entre as diferentes regies/circunscries, enquanto na privada na eficincia e na competitividade. 6. Processos pblicos versus processos privados. A gesto governamental tende a ser mais exposta e aberta ao pblico, enquanto a gesto empresarial mais fechada, seus processos so mais internos e menos expostos opinio pblica. 7. Papel da imprensa e da mdia. A gesto pblica tem de enfrentar a mdia regularmente, suas decises so frequentemente antecipadas pela imprensa. J as decises da gesto privada so

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reportadas pela mdia com menos frequncia, e a imprensa tem muito menos impacto no tempo e contedo das decises. 8. Persuaso e direo. No governo, os gestores muitas vezes procuram mediar decises em resposta a uma ampla variedade de presses e muitas vezes devem promover coalizes entre grupos internos e externos para sobreviver. Em contrapartida, a gesto privada procede muito mais por direcionamentos ou outorga de ordens dos gestores superiores aos subordinados, com risco de poucas contradies. Gestores governamentais consideram-se como suscetveis a muitos superiores, enquanto gestores privados atendem a uma autoridade superior. 9. Impacto legislativo e judicirio. Gestores pblicos esto frequentemente sujeitos a exames minuciosos por parte de grupos de fiscalizao legislativa ou mesmo ordens judiciais, o que no comum na gesto privada. Esse controle muitas vezes restringe a liberdade de ao executiva e administrativa. 10. Objetivos. Resultados esperados (bottom line). Gestores pblicos raramente tm objetivos claramente definidos, enquanto que na gesto privada os objetivos so lucro, performance de mercado, sobrevivncia. b) Rainey; Backoff e Levine (1976) - os autores, aps abordarem vrios problemas relativos definio e classificao de organizaes pblicas e privadas, recorrerem a uma gama considervel de literatura que aborda um nmero amplo de distines possveis entre organizaes pblicas e privadas e de sua gesto. A seguir apresentado o resumo dos pontos de consenso identificados pelos autores na literatura, como proposies a respeito dos atributos de uma organizao pblica, em relao aos de uma privada. I. Fatores Ambientais Tpico I. 1. Grau de exposio ao mercado Atributo da administrao pblica em relao privada I.1.a. Menos exposio ao mercado resulta em menos incentivos para reduo de custos, eficincia operacional e desempenho efetivo. I.1.b. Menos exposio ao mercado resulta em menor eficincia no atendimento s preferncias do consumidor/cliente. I.1.c. Menor exposio do mercado significa menor disponibilidade de indicadores de mercado e informaes (preos, lucros, etc.)

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I. Fatores Ambientais Tpico Atributo da administrao pblica em relao privada e na esfera na tomada de especificaes formal e uma

I. 2. Restries legais e I.2.a. Mais restries de procedimentos formais (judicirio, legislativo operacional (menos autonomia dos gestores e hierarquia) decises). I.2.b. Maior tendncia proliferao de formais e controles. I. 2.c. Mais fontes externas com influncia maior fragmentao dessas fontes. I. 3. Influncias polticas

I. 3.a. Maior diversidade e intensidade de influncias informais externas sobre decises (negociao, opinio pblica, reaes de grupos de interesse). I.3.b. Maior necessidade de apoio dos "crculos" - grupos de cidado/clientes, autoridades formais simpatizantes, etc.

II. Transaes Organizao-Ambiente Tpico II. 1. Coercitividade (natureza inevitvel de muitas atividades governamentais: coercitivas e monopolistas) II. 2. Amplitude do impacto Atributo da administrao pblica em relao privada II.1.a. O mais provvel que a participao em consumo e financiamento dos servios do governo inevitvel ou obrigatrio (o governo tem poder nico de aplicar sanes e medidas coercivas). II.2.a. Impacto mais amplo, maior significado simblico das aes dos administradores pblicos (alcance mais vasto, a exemplo de pblico de interesse). II.3.a. Maior controle pblico/social dos funcionrios pblicos e suas aes. II.4.a. Maiores expectativas da sociedade no sentido de que os funcionrios pblicos atuem com mais imparcialidade, transparncia, responsabilidade e honestidade.

II. 3. Controle pblico/social

II. 4. Expectativas singulares em relao ao setor pblico

III Estrutura e Processos Internos Tpico Atributo da administrao pblica em relao privada

III.1.Complexidade de III.1.a. Maior diversidade de objetivos e critrios. objetivos, avaliao e critrios III. 1. b. Maior impreciso e intangibilidade dos objetivos e de deciso critrios. III. 1. c. Maior tendncia de metas serem conflitantes, mais conflitos de escolha (trade-offs).

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III Estrutura e Processos Internos Tpico Atributo da administrao pblica em relao privada

III.2.Relaes de autoridade e III. 2.a. Menos autonomia e flexibilidade de deciso por o papel do administrador parte dos administradores pblicos. III. 2.b. Autoridade mais fraca e fragmentada sobre os subordinados e nveis mais baixos (1. Subordinados podem ignorar, apelar para autoridades alternativas. 2. Restries do sistema de mrito). III.2.c. Grande relutncia em delegar, mais nveis de reviso, e uma maior utilizao da regulamentao formal (devido dificuldade de fiscalizao e delegao, resultante de III. 1. b.: maior impreciso e intangibilidade dos objetivos e critrios.) III.2.d. Papel mais poltico e sujeito a exposies dos gestores de alto escalo. III.3.Desempenho Organizacional III. 3.a. Maior cautela, rigidez. Menos inovao. III.3.b. Rotatividade mais frequente de lderes devido s eleies e nomeaes polticas resulta em maior perturbao da execuo dos planos (descontinuidade). as III. 4.a. Maior dificuldade na elaborao de incentivos para desempenho eficaz e eficiente. III. 4.b. Menor valorizao de incentivos pecunirios pelos empregados.

III. 4. Incentivos e estruturas de incentivos

III. 5. Caractersticas pessoais III. 5.a. Variaes no perfil e necessidades, como maior dos trabalhadores dominao e flexibilidade e maior necessidade de realizao, por parte dos gestores governamentais. III. 5.b. Menor satisfao com o trabalho e menor comprometimento organizacional. Obs.: III. 5.a. e III.5.b representam os resultados de estudos empricos, ao invs de consenso entre autores.Quadro 1 - Atributos da administrao pblica em relao privada Fonte: Rainey; Backoff e Levine (1976), traduo livre

A continuidade da investigao das proposies apresentadas, segundo Rainey; Backoff e Levine (1976), pode fornecer resultados relevantes para compreenso geral das organizaes, como, por exemplo, os efeitos de diferentes restries ambientais sobre os processos organizacionais e de desempenho e de diferentes sistemas de incentivo.

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Alm disso, esses autores observam que tais proposies - importantes distines entre gesto pblica e privada - tm implicaes para a gesto. E, que algumas das proposies listadas acima podem ser aplicadas a alguns dos elementos que Murray (1975) declara como comuns a toda a gesto, independente de ser pblica ou privada. Ele comenta que a gesto implica sempre o seguinte: a definio de fins e objetivos, planejamento, organizao, seleo de gerentes, gesto e motivao pessoas, e controle e medio dos resultados. Porm, segundo Rainey; Backoff e Levine (1976) os pontos de consenso na literatura sugerem que pode haver distines dentro dessas categorias que devem continuar a ser consideradas: 1. Propsitos, objetivos e planejamento. Gestores pblicos podem ter menos flexibilidade e autonomia na definio de objetivos, os objetivos podem ser mais diversos e mais difceis de especificar, o planejamento pode envolver um conjunto mais complexo de influncias e o planejamento de longo prazo pode ser mais difcil. 2. Seleo, gesto e motivao. Pode haver maior dificuldade na capacidade do gestor pblico para selecionar e controlar subordinados. Ele pode precisar considerar um conjunto diferente de necessidades dos funcionrios e problemas de motivao, que tambm deve ser considerado nas decises de seleo. 3. Controle e medio dos resultados. Alm da maior dificuldade de medir resultados, o gestor pblico pode ter mais dificuldade de atingir resultados e desempenho eficiente. Assim, aqueles autores concluem que h fortes indcios da existncia de restries e procedimentos exclusivos, de acordo com cada contexto de atuao, nessas amplas categorias de processos que caracterizam a gesto de modo generalizado. Rainey; Backoff e Levine (1976) observam que as implicaes das diferenas supracitadas no campo educacional destacam ainda mais a importncia dessas divergncias. Alm de um treinamento genrico em gesto, que estaria praticamente restrito a cursos sobre teoria da organizao e para treinar habilidades na rea, a preparao ideal para a gesto nos dois tipos de organizaes necessitaria de nfases diferentes, tais como: em oramento governamental e anlise de polticas pblicas e de direito administrativo em vez de direito empresarial. Os autores concluem que h indcios de uma srie de diferenas importantes entre organizaes pblicas e privadas que no podem ser ignoradas nas consideraes de gesto, pesquisa, formao e prtica. Alm disso, enfatizam que h razes para continuar as comparaes entre os setores pblicos e privados, o que no significa rejeitar os esforos de compreenso genrica das organizaes e de sua gesto, mas esforo para complementar

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esses estudos. c) Richard E. Neustadt - aponta seis diferenas entre os presidentes dos Estados Unidos e os Chief Executive Office CEO (presidentes) de grandes empresas: 1. Horizonte temporal. O CEO olha para frente - uma dcada ou mais, enquanto o presidente no mais de quatro anos. 2. Autoridade na organizao. O CEO est sujeito fiscalizao por um conselho de administrao e pode ser despedido. A autoridade do presidente compartilhada com o Congresso. 3. Sistema de carreira. Nas organizaes privadas as nomeaes dos cargos-chaves so realizadas observado um sistema de encarreiramento, as pessoas nomeadas possuem, normalmente, conhecimento e experincia na prpria empresa ou em outras similares, enquanto que na organizao pblica muitas das pessoas chave so nomeadas na administrao do Presidente, sem observar um sistema de carreira. 4. Relaes com a mdia. O CEO geralmente fala imprensa em circunstncias excepcionais. muito menos visvel do que o Presidente. 5. Medio do desempenho. O CEO espera avaliar seus subordinados e ser avaliado pela rentabilidade esperada e acordada previamente. O Presidente avaliado por uma srie de medidas diferentes, subjetivas, at pelo seu comportamento em pblico. 6. Implementao. O CEO no s escolhe uma estratgia, mas organiza, d a direo, supervisiona, controla e replaneja, se necessrio, a sua implementao. O Presidente raramente intervm em atividades de execuo. Aps a promulgao da Constituio Federal Brasileira de 1988,com a redemocratizao, a inspirao neoliberal e as referncias das inovaes oriundas de pases mais avanados, os movimentos de reforma procuravam centrar-se nas especificidades das diversas organizaes pblicas, semelhana das mudanas na rea privada. A perspectiva bsica era a eficincia e capacidade de resposta da administrao pblica e melhora da gerncia pblica. () Reduzir o tamanho do Estado e modernizar a administrao pblica tornaram-se pontos importantes de uma nova agenda poltica. Ao contrrio das experincias anteriores, essa modernizao se inspirou fortemente nos modelos de gesto privada, considerados superiores e mais eficazes. Assim, as principais mudanas seriam transferir funes estatais para a rea privada e as restantes seriam administradas com formas o mais prximo possvel das praticadas nas empresas privadas. () Em grande parte, essas reformas colocavam em causa a prpria viabilidade da administrao pblica como condutora de eficincia ou de eficcia na gesto de servios e na ao redistributiva. Os novos modelos procuram transformar e introduzir na gesto pblica o estilo privado. Ao imitar a gesto privada, as propostas contemporneas assumem a singularidade do cliente e suas demandas como fundamentais na gesto pblica. Por presumirem a validade universal do management e, portanto, sua aplicabilidade igualmente

34 s organizaes pblicas e privadas, vem a reforma como uma simples questo de modernizao gerencial. (MOTTA, 2007, p. 92-93).

Ao referenciar aquele mesmo perodo ps-Constituio, Pfeiffer (2000), em seu artigo sobre uma nova abordagem do Planejamento Estratgico na esfera da Administrao Direta, descreve-o como um dos instrumentos de apoio modernizao gerencial, desenvolvido para lidar adequadamente com processos dinmicos de mudanas e transformaes. Acrescenta que esse mtodo de planejamento foi inicialmente desenvolvido para isso no setor privado, e que as caractersticas dos setores privado e pblico so to diferentes que no recomendvel transferir o mtodo diretamente de um setor para o outro. Ele destaca que imprescindvel que sejam feitas adaptaes, as quais devem considerar as necessidades especficas de cada setor. O autor considera o carter poltico, inerente administrao ou s organizaes pblicas, um dos maiores desafios a ser superado para uma aplicao adequada do Planejamento Estratgico. Para que esse instrumento possa ser aplicado no setor pblico com tanto xito como em empresas privadas, algumas condies prvias favorveis so requeridas, situaes essas, que se aplicam a qualquer mtodo ou modelo de gesto da iniciativa privada a ser utilizado no setor pblico:alm da bvia condio da vontade poltica para iniciar um processo de transformao nas organizaes, importante que o processo disponha de uma liderana competente, de preferncia composta por representantes de organizaes pblicas e privadas. Tambm so necessrios recursos mnimos, sensibilidade social e um forte sentido comum. (PFEIFFER, 2000, p. 10, grifo nosso).

Apesar de iniciativas de modernizao da gesto pblica como as citadas anteriormente, Motta (2007) ressalta que o personalismo elitista, ainda presente na administrao pblica brasileira, concorre para o enfraquecimento substancial das organizaes, as quais existem em funo das pessoas que as dirigem. Segundo o autor, a mudana de tais dirigentes transforma profundamente polticas e compromissos institucionais, particularmente no setor pblico, cujos gestores, normalmente prepostos de lderes polticos, tendem a inserir suas opes pessoais como fator de diferenciao. Assim, o que foi racionalmente institudo desprezado, bem como opes e conquistas de seus antecessores. A justificativa para a descontinuidade a inovao, porm essas aes resultam mais em garantir acesso a novos grupos de poder e ressaltar a liderana

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de uma pessoa e menos em modernizar a gesto. Esse personalismo fragiliza as organizaes pblicas, tornando-as altamente vulnerveis e dependentes da pessoa de um nico dirigente. Motta (2007), de maneira geral, continua enfatizando que a administrao pblica ainda dominada por grupos que visam garantir os interesses e a proteo mtua de seus integrantes, mesmo com a modernizao. So inseridos em rgos administrativos por meios formais pela ocupao de cargos de direo, e informais, por meio de redes de apoio e de interao ligadas por laos de lealdade. Utiliza-se de recursos pblicos para reforar a lealdade poltica de base e preservar a liderana sobre determinados setores da comunidade. Como a lealdade aos membros do grupo maior do que instituio pblica, tais grupos so capazes de manter a coalizo a qualquer custo, inclusive a expensas do aumento dos gastos governamentais. Assim, acrescenta Motta (2007), na administrao pblica brasileira, apesar do progresso em muitas instncias de governo, as formas de ao obedecem menos a razes tcnico-racionais e mais a critrios de loteamento poltico, para manter coalizes de poder e para atender os objetivos de grupos preferenciais, provocando, muitas vezes, a descontinuidade de projetos que visam modernizar e profissionalizar as aes e decises na gesto do setor pblico. Pfeiffer (2000) tambm considera que esse carter poltico, inerente administrao pblica, pode ser considerado um dos maiores desafios a ser superado para uma aplicao adequada de Planejamento Estratgico. Esse autor comenta que procedimentos administrativos complicados tambm dificultam um gerenciamento gil e eficiente. Por isso, avaliar com cuidado as condies existentes de uma organizao pblica muito importante antes de implementar novos modelos e instrumentos de gesto. Pfeiffer continua ponderando que tais pr-condies tambm so necessrias numa empresa privada, mas nela geralmente as estruturas hierrquicas e a misso so mais claramente definidas. O autor afirma que nos dois casos difcil, e, sem dvida, mais difcil no setor pblico, dadas suas especificidades (Quadro 2, a seguir) encontrar a vontade e a disposio de mudar estruturas, procedimentos, hbitos e comportamentos. Entretanto, sem essa disposio, os instrumentos de planejamento e gerenciamento no conseguiro cumprir o seu propsito. Em relao s caractersticas de cada setor, Pfeiffer (2000) tambm identificou algumas diferenas significativas entre os setores privado e pblico, conforme demonstrado no Quadro 2, abaixo. Essas caractersticas/especificidades indicam a necessidade de adaptao dos instrumentos de gerenciamento que tem xito no setor privado ao serem utilizados no setor

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pblico. Ele ressalta que a caracterizao de cada setor genrica e mostra apenas a sua tendncia. Caracterstica Misso Setor privado limitada (a determinados produtos e/ou servios) definida pela direo ou pelos proprietrios baseada na misso e na anlise do ambiente coerente com as prprias possibilidades funcional linhas claras de deciso relativamente simples limitada ao campo de operao da empresa relao definida atravs de compra ou contrato realizar lucro cumprir misso tem de ser eficiente dinmica Setor pblico baseada na misso e na anlise do ambiente coerente com as prprias possibilidades determinada pela poltica ampla e no especfica muitas vezes incoerente com os recursos disponveis parcialmente funcional superposio de funes e poltica complexa ampla e diversificada relaes mal definidas cliente no visto como tal servir ao pbico servir poltica informalmente no precisa ser eficiente geralmente lenta e burocrtica

Viso

Organizao

Clientela

Propsito de atuao Forma de atuao

Quadro 2 - Caractersticas de organizaes dos setores pblico e privado Fonte: Pfeiffer (2000, p. 11)

Boyne (2002), ao revisar os argumentos tericos sobre as diferenas entre as empresas privadas e rgos pblicos, tambm observa que a adoo de modelos do setor privado tem sido vista com muito ceticismo nas literaturas sobre a administrao e gesto pblica. O autor acrescenta ainda que, em suma, as organizaes pblicas e privadas so consideradas amplamente diferentes em uma variedade de aspectos importantes e que essas diferenas agem como barreiras transferncia de tcnicas de gesto do setor privado ao setor pblico. As principais hipteses de contrastes entre organizaes pblicas e privadas citadas por Boyne esto resumidas no Quadro 3.

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Meio Ambiente H1: Os gestores pblicos trabalham em um ambiente mais complexo H2: As organizaes pblicas esto mais abertas a influncias ambientais H3: O ambiente de organismos pblicos menos estvel H4: Os gestores pblicos enfrentam presses competitivas menos intensas Objetivos H5: Os objetivos das organizaes pblicas so distintos H6: Os gestores pblicos so obrigados a exercer um maior nmero de objetivos H7: Os objetivos dos rgos pblicos so mais vagos Estruturas H8: As organizaes pblicas so mais burocrticas H9: Mais burocracia est presente na tomada de decises pelas organizaes pblicas H10: Os gerentes de agncias pblicas tm menos autonomia em relao aos rgos superiores Valores H11: Os gestores do setor pblico so menos materialistas H12: A motivao para servir o interesse pblico maior no setor pblico H13: Os gestores pblicos tm comprometimento organizacional mais fracoQuadro 3 - Hipteses de contrastes entre organizaes pblicas e privadas Fonte: Boyne (2002), traduo livre

Na concluso de seu trabalho, Boyne (2002) anota que a viso dominante em polticas pblicas e na literatura da administrao que as organizaes pblicas e privadas so to diferentes que as tcnicas de gesto no podem ser exportadas com sucesso de um setor para outro, em funo de diferenas em ambientes organizacionais, objetivos, estruturas e valores de gesto. Essas variveis representam um conjunto de contingncias que exigem abordagens diferentes para a gesto em rgos pblicos e empresas privadas.

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No entanto, o autor ressalta que as evidncias que apoiam as divergncias profundas entre o a gesto pblica e a privada limitada. Assim, os gestores pblicos ao derivar lies do setor privado, o primeiro passo determinar mais claramente as determinantes de desempenho em empresas privadas. Essas consideraes referentes s especificidades das organizaes pblicas em relao s privadas e suas implicaes nos instrumentos e modelos para a modernizao da gesto pblica, citadas pelos diversos autores, tambm se aplicam implementao da Gesto de Processos nas organizaes desse setor. Portanto, quando for implementada em uma organizao pblica, importante que sejam ponderadas as caractersticas e especificidades desse setor para que tal mudana tenha possibilidade de alcanar sucesso e efetividade. No caso da Gesto de Processos, independente das caractersticas individuais de cada setor (pblico e privado), a sua funo bsica implementar melhorias que tornem os processos organizacionais mais efetivos, contribuindo para o alcance dos objetivos da organizao e atendimento das necessidades dos interessados. Neste contexto, vem sendo atribuda cada vez maior relevncia para a Gesto de Processos nas organizaes, tanto nas privadas como pblicas. Porm, em sua implementao nas organizaes do setor pblico necessrio que sejam consideradas as suas particularidades, pois conforme observado por Paim et al. (2009), as origens conceituais da Gesto de Processos fazem parte das tradies da engenharia de produo, revelando que essa forma de gerir foi inicialmente concebida com foco no setor privado. Zwicker, Fettke e Loos (2010) ao abordarem as especificidades da Gesto de Processos na administrao pblica, afirmam que os princpios burocrticos das aes administrativas que afetam diretamente processos de governo constituem as principais diferenas entre a administrao pblica e a privada. Nesse contexto, aqueles autores elaboraram um quadro comparativo entre princpios e caractersticas do setor pblico com os do privado (Quadro 4). Caracterstica Objetivo Setor privado Maximizao do lucro Setor pblico Cumprimento das tarefas/atividades pblicas (ligando princpios de bem-estar e econmicos)

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Caracterstica

Setor privado

Setor pblico

Legalidade das aes Aes essencialmente ilimitadas, Aes essencialmente limitadas a porm alinhadas viso e leis e regulamentos (princpio da objetivos da organizao legalidade) Controle Posio de mercado Estrutura organizacional Requisitos de documentao Segmento de clientes Gama de produtos Mercado - organizao econmica Ambiente competitivo No estabelecida uma estrutura, individual a cada organizao Sem exigncia explcita de documentao Quase sempre heterogneo Quase sempre heterogneo Legitimao poltica Ambiente no competitivo (caractersticas de monoplio) Estrutura hierrquica rgida, possuindo linhas claras de autoridade Todas as decises e ocorrncias devem ser documentadas para efeito de controle Heterogneo Heterogneo

Quadro 4 - Caractersticas de organizaes dos setores pblico e privado Fonte: Zwicker, Fettke e Loos (2010), traduo livre

Segundo Lenk, Traunmller e Wimmer (2002) apud Zwicker, Fettke, Loos (2010), os princpios e caractersticas vlidos para o setor pblico so condies especiais a serem observadas pelas autoridades para a realizao das atividades no mbito das organizaes desse setor. Portanto, para Zwicker, Fettke e Loos (2010), uma ao economicamente ineficiente no pode ser vista como dficit na gesto ou no cumprimento de tarefas pblicas, pois as aes e servios pblicos so definidos pela integrao entre os objetivos polticos e a legislao (ex.: leis, normas, regulamentos). Alm disso, na implementao e melhorias nos processos do governo para a produo e prestao de servios pblicos, devem ser observadas as intenes especficas (de uma poltica pblica, por exemplo), a legislao aplicvel e o bem-estar social. Esses autores concluem que as especificidades das organizaes pblicas parecem influenciar a implementao de BPM em seu mbito e continuam a discusso do tema com base em seis fatores de BPM que consideram fundamentais quais sejam: alinhamento estratgico, governana, mtodos, tecnologia da informao, pessoas e cultura, conforme detalhamento a seguir.

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Fator: Alinhamento Estratgico O alinhamento estratgico estabelece uma relao entre a estratgia de uma organizao e os processos de negcio. Ele suporta o alinhamento operacional dos processos do governo para os objetivos estratgicos da administrao. Assim, o alinhamento estratgico especialmente influenciado por objetivos polticos e pela ligao de aes para propsitos especficos, leis e bem-estar social. Estratgias e objetivos da administrao pblica so dedues de objetivos polticos e, ao mesmo tempo, devem ser ligados ao bem-estar comum. A definio dos processos precisa estar em conformidade com as orientaes politicamente legitimadas e precisa seguir as leis, instrues e normas de administrao. Como consequncia do exerccio crescente de orientao para o servio, as normas legais, bem como a multiplicidade e heterogeneidade de stakeholders, especialmente os cidados e as empresas com seus diferentes interesses, precisam ser consideradas durante o design dos processos. Alm disso, a heterogeneidade do portflio de servios e o fato de que uma organizao horizontal e verticalmente segmentada exige uma avaliao caso a caso o alinhamento dos processos no sentido dos objetivos, pois todos os servios e unidades organizacionais no podem ser analisados ou compreendidos por uma nica geral abordagem. Para avaliar a estratgia e a realizao dos objetivos, os resultados precisam ser medidos. Frequentemente, os resultados do processo de medio nas administraes pblicas so difceis de serem obtidos porque no existem indicadores geralmente aceitos. A falta de um mercado para os servios pblicos no ameniza o problema da avaliao de resultados do processo de acordo com princpios econmicos. Medidas elaboradas para o setor privado no so suficientes, j que visam maximizao do lucro de uma organizao e no consideram a maximizao do bem-estar. Fator: Governana Liderana e controle sistemtico de BPM por meio de orientaes e decises estabelecidas e processos relevantes. Como resultado das diretrizes legais e da estrutura hierrquica da administrao pblica, este fator possui necessidades excepcionalmente elevadas. Atribuir papis e responsabilidades, muitas vezes, segue orientaes claras, devido s normas jurdicas e suprime uma grande flexibilidade. Por exemplo, existem disposies especiais na Alemanha para a privacidade dos dados no setor social, que permite apenas o acesso a determinados funcionrios incumbidos de dados pessoais. Assim, mudanas na organizao so problemticas.

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Para estabelecer normas para o BPM, normas administrativas devem ser consideradas. O monitoramento da obedincia s regras de BPM por pessoas responsveis um desafio. Identificar as mtricas adequadas muitas vezes um problema. Esses responsveis tm de assegurar uma medio de capacidade de BPM de acordo com as normas de BPM e, alm disso, tm que valorizar a obedincia s regras e condies adicionais. As decises de liderana e controle sistemticos de BPM necessitam ser ligados s normas centrais e pessoas responsveis na hierarquia do governo. Por um lado, isso necessrio devido hierarquia, por outro, existe uma organizao descentralizada para a realizao de tarefas, uma razo do elevado nvel de diviso do trabalho. Assim, instncias superordenadas para a liderana e o controle sistemticos so necessrios. Fator: Mtodos Segundo Zwicker, Fettke, Loos (2010) ao citarem Palkovits, Wimmer (2003), a literatura descreve vrios mtodos para realizar e apoiar BPM em geral. No entanto, vrios mtodos so especialmente alinhados com a administrao pblica ou governo eletrnico. Durante a concepo de um processo, as normas jurdicas podem ser facilmente usadas para justificar decises de projeto. Da mesma forma, a alta complexidade dos processos de governo e as estruturas organizacionais na administrao pblica requerem mtodos especiais e ferramentas para modelagem de processos. A alta concentrao de decises na administrao pblica exige a continuidade dos processos manuais. Uma implementao eletrnica dos processos, muitas vezes tem de ser reduzida a um suporte eletrnico de processos manuais. Alm disso, a necessidade de documentao de todas as decises e ocorrncias tem que ser considerado durante o processo de implementao de BPM, atravs de tcnicas correspondentes e de sistemas. Fator: Tecnologia da Informao A tecnologia da informao necessria para realizar as abordagens de BPM. Exigncias de informaes tecnolgicas especiais surgem para a gesto de processos. H uma infinidade de requisitos de informao tecnolgica resultantes das exigncias polticas ou orientaes jurdicas. Fator: Pessoas As pessoas representam um componente importante na implementao de um BPM eficiente. Na administrao pblica muitas vezes no existe um elevado nvel de diviso do trabalho e especializao, de modo que o conhecimento do processo muitas vezes concentrado em

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apenas alguns funcionrios, o que implica nas seguintes consequncias: primeiro, a pesquisa do conhecimento do processo requer um envolvimento significativo de funcionrios a fim de determinar as etapas do processo em detalhe, caso contrrio, o processo real (as is) dificilmente pode ser identificado. Segundo, as aes de melhoria sero, muitas vezes, estritamente limitadas ou iro requerer treinamento especial, devido falta das competncias necessrias. O novo processo (to be) pode no ser implementado com sucesso. Em terceiro lugar, muitas vezes difcil identificar as pessoas responsveis adequadas para tais processos, o que devido organizao descentralizada da administrao pblica. Em razo das estruturas da administrao pblica o conhecimento dos mtodos e tecnologias de BPM pouco desenvolvido. Assim, em comparao com o setor privado, mtodos intensivos para o desenvolvimento de conhecimento necessrio sobre BPM tm de ser introduzidos. A implementao de BPM em organizaes pblicas complicada pelo fato de que os responsveis tm de estar convencidos de que um nvel mais elevado de orientao para processos seria til gesto. Fator: Cultura Este fator inclui a capacidade de resposta s mudanas de processos, valores e crenas de processos, bem como a fora de liderana em matria de BPM. Quanto a esse aspecto, h inmeras particularidades do setor pblico em comparao com o setor privado. No entanto, a cultura organizacional vista como um todo: a cultura organizacional considerada como uma quantidade de pressupostos compartilhados por um grupo de pessoas. A cultura organizacional da administrao pblica especialmente afetada por uma cultura de hierarquia. Em razo da estrutura hierrquica organizacional, pode-se supor que a maturidade da cultura organizacional da administrao pblica geralmente bastante baixa. Assim, os mtodos para a melhoria da maturidade do processo devem considerar a cultura organizacional. Miranda, Macieira e Paim (2004) ao proporem uma metodologia para projetos de modernizao administrativa em organizaes pblicas tendo como arcabouo conceitual as reas de atuao da Engenharia de Produo, principalmen