Erinias ou Fúrias
As Erínias, chamadas de Fúrias pelos romanos, eram
personificações da vingança semelhantes a Nêmesis que
punia os deuses enquanto as Erínias puniam os mortais.
Tisífone - o castigo, Megera - o rancor e Alecto - a
interminável, viviam no submundo onde torturavam as almas
pecadoras que ali chegavam depois de passar pelo veredito
de Hades.
Elas nasceram das gotas do sangue de Urano quando ele foi
castrado por Cronos. Pavorosas e cruéis, as Erínias
encarregavam-se de criar nas almas pecadoras o remorso e a
necessidade de perdão.
Tisífone era a vingadora dos assassinatos e homicidios,
principalmente aqueles praticados contra os pais,
irmãos, filhos e parentes. Açoitava os culpados
enlouquecendo-os.
Megera personificava o rancor, a inveja, a cobiça e o
ciúme. Castigava principalmente os delitos contra o
matrimônio, em especial a infidelidade. Era a Erínia que
perseguia fazendo a vítima fugir eternamente. Gritando
a todo momento nos ouvidos do criminoso, lembrava-lhe
das faltas cometidas.
Alecto, a implacável e eternamente encolerizada,
encarregava-se de castigar os delitos morais como a ira,
a cólera, a soberba etc. Era a Erínia que espalhava as
pestes e maldições. Seguindo o infrator sem parar,
ameaçava-o com fachos acesos e não o deixava dormir
em paz.
As Erínias eram divindades presentes desde as origens do
mundo e, apesar de terem poder sobre os deuses e não
estarem submetidas à autoridade de Zeus, viviam às margens
do Olimpo. Os deuses as rejeitavam, mas as toleravam. Os
homens fugiam delas. Sendo forças primitivas, atuavam como
vingadoras dos crimes e reclamavam com insistência a
punição do homicida com a morte.
Porém, visto que o castigo final dos crimes é um poder que
não corresponde aos homens por mais horríveis que sejam,
estas três irmãs se encarregavam do castigo dos criminosos,
perseguindo-os incansavelmente até mesmo no mundo dos
mortos, pois seu campo de ação não tinha limites.
As Erínias eram convocadas pela maldição lançada por alguém
que clamava vingança. Eram deusas justas, porém
implacáveis e não se deixavam abrandar por sacrifícios nem
suplícios de nenhum tipo. Não levavam em conta atenuantes
e castigavam toda ofensa contra a sociedade e a natureza,
como o perjúrio, a violação dos rituais de hospitalidade e,
sobretudo, os assassinatos e crimes contra a família.
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As Erínias são representadas normalmente como mulheres
aladas de aspecto terrível, com olhos que escorrem sangue
no lugar de lágrimas e madeixas trançadas de serpentes,
estando muitas vezes acompanhadas por muitos destes
animais. Aparecem sempre empunhando chicotes e tochas
acesas, correndo atrás dos infratores dos preceitos morais.
Quando Saturno castra Urano, psicologicamente Saturno
castra as novas idéias de Urano, uma nova ação ou direção.
Pode ser por um senso de dever, compromisso e
responsabilidade que mantém Urano sem ação ou uma
necessidade básica de segurança, unindo-se ao medo do
desconhecido que se sobreponha a qualquer iniciativa de
mudança.
As consequências da castração de Urano por Cronos são
retratadas na mitologia. Quando reprimimos ou bloqueamos
as necessidades de mudanças que surgem em nós por Urano,
nascem as Fúrias em nosso interior. Podemos ter um
profundo ressentimento contra aqueles que estão impedindo
nosso avanço ou sentimos inveja daqueles que tem liberdade
para progredir, enquanto permanecemos parados.
Se usamos a energia de Urano e seguimos nossos impulsos
uranianos para mudar e romper com as estruturas vigentes,
indo em busca de algo novo, então quem se enfurece são as
forças de Saturno. Aí descobrimos que essas Fúrias vem em
nossa direção através daqueles que se sentem ameaçados
por nossas ações rebeldes.
Tal fato não é incomum quando rompemos um
relacionamento. Quando há um rompimento sempre o motivo
está na insatisfação daquele que rompe, que sente
necessidade de mudar algo. Aquele que se sente limitado no
relacionamento acaba indo embora. Isto faz despertar as
Fúrias no outro que não aceita o final do relacionamento, o
que resulta em ameaças e outras manifestações graves.
As Fúrias despertam, como na Grécia antiga, para atormentar
e podem acontecer também em outras esferas, como nas
famílias, departamentos governamentais, onde as Fúrias são
postas em evidência contra os dissidentes ou rebeldes que
ameaçam o Estado.
Nas famílias formam-se sistemas e estruturas que organizam
suas próprias regras que, apesar de não escritas, servem
para criar limites - quem pode fazer ou dizer alguma coisa. Se
um dos membros da família começa a agir de forma a
ameaçar essa estrutura, é provável que as Fúrias sejam
lançadas contra ele.
Por exemplo, a família deseja que o filho jovem seja um
advogado. No entanto, o jovem pretende decidir sua vida e
seguir uma carreira artística. Com certeza a família irá
conspirar contra ele, lançando suas Fúrias de modo a impedí-
lo de seguir a carreira escolhida. Mas se o jovem atender aos
desejos da familia, então as Fúrias agitarão em seu interior,
por não seguir sua vontade de decidir a própria vida. Instala-
se um impasse.
Porém da castração de Urano por Cronos nasceu Vênus. Esta
parte do mito sugere que Vênus - princípio do amor, da
beleza, da harmonia, diplomacia e equilibrio - pode nascer da
tensão entre as forças saturninas e as forças uranianas. Isso
se traduz pela possibilidade de apresentar novas idéias e
alternativas de forma habilidosa e diplomática que não seja
ameaçadora para a ordem estabelecida das coisas. É
abrandar a tendência uraniana de romper abruptamente com
as coisas e a tendência saturnina de manter tudo como está.
Se Urano desenvolve um estilo venusiano - diplomático - de
fazer as coisas, pode persuadir Saturno a ter maior
flexibilidade, mantendo o melhor do passado e abrindo
espaço para novas idéias, propondo experimentar novas
coisas. Ajudado por Vênus, Urano consegue preparar Saturno
para algo novo de forma suave e ponderada. Quando
desejamos mudar algo, devemos abrir espaço para que algo
de novo aconteça. A transição se faz de forma diplomática e
venusiana.
Às vezes, o tato e a diplomacia não funcionam. O sistema
vigente pode recusar a ceder e aí não resta outra alternativa
senão desafiar diretamente o sistema vigente e enfrentar as
consequências. Em certas ocasiões, é politicamente correto
romper com certas coisas, mesmo que tenhamos de enfrentar
as Fúrias, para que possamos tomar um caminho que seja
verdadeiro para nós.
Lucia de Belo Horizonte / MG