ESCOLA SUPERIOR DE GUERRA
AMARO VIEIRA FERREIRA
EMPREGO DAS FORÇAS ARMADAS NA SEGURANÇA PÚBLICA:
QUESTÕES JURÍDICAS E PECULIARIDADES DA ATUAÇÃO NO
CONTEXTO DO SISFRON
Rio de Janeiro
2012
AMARO VIEIRA FERREIRA
EMPREGO DAS FORÇAS ARMADAS NA SEGURANÇA PÚBLICA:
QUESTÕES JURÍDICAS E PECULIARIDADES DA ATUAÇÃO NO
CONTEXTO DO SISFRON
Trabalho de Conclusão de Curso – Monografia apresentada ao Departamento de Estudos da Escola Superior de Guerra como requisito à obtenção do diploma do Curso de Altos Estudos de Política e Estratégia. Orientador: Cel. R/1 JUARIS Weiss Gonçalves.
Rio de Janeiro 2012
C2012 ESG Este trabalho, nos termos de legislação que resguarda os direitos autorais, é considerado propriedade da ESCOLA SUPERIOR DE GUERRA (ESG). É permitido a transcrição parcial de textos do trabalho, ou mencioná-los, para comentários e citações, desde que sem propósitos comerciais e que seja feita a referência bibliográfica completa. Os conceitos expressos neste trabalho são de responsabilidade do autor e não expressam qualquer orientação institucional da ESG. _________________________________
Amaro Vieira Ferreira
Biblioteca General Cordeiro de Farias
Ferreira, Amaro Vieira
Emprego das Forças Armadas na Segurança Pública: questões jurídicas e peculiaridades da atuação no contexto do SISFRON(EMD 1/90)-Delegado de Polícia Federal/ Amaro Vieira Ferreira. Rio de Janeiro: ESG, 2012.
55 f.: il.
Orientador: Cel R/1 Juaris Weiss Gonçalves Trabalho de Conclusão de Curso – Monografia apresentada ao
Departamento de Estudos da Escola Superior de Guerra como requisito à obtenção do diploma do Curso de Altos Estudos de Política e Estratégia (CAEPE), 2012.
1.Forças Armadas. 2.Poder de polícia. 3.Operações de Garantia da Lei
e da Ordem. 4.SISFRON.
5
A minha querida esposa Márcia e aos
meus filhos Bruno e Damaris minha
gratidão pela compreensão, dedicação,
carinho e incentivo, sempre presentes
em todos os momentos da vida.
RESUMO
FERREIRA, Amaro Vieira. Emprego das Forças Armadas na Segurança Pública:
Questões Jurídicas e Peculiaridades da Atuação no Contexto do SISFRON (EMD-
1/90)- Delegado de Polícia Federal Amaro Vieira Ferreira. Rio de Janeiro, 2012. 54 f.
O objetivo deste trabalho é analisar diversos aspectos de atuações diferenciadas
das Forças Armadas que, cada vez mais, têm sido usadas para a execução do papel
que deveria ser exercido de modo autônomo e eficiente pelos órgãos de segurança
pública dos Estados para o combate direto ao crime. Será dado destaque aos
trabalhos realizados nas fronteiras secas do país, no contexto do Sistema de
Monitoramento de Fronteiras (SISFRON). Primeiramente serão apresentados os
conceitos de poder de polícia, segurança pública e de defesa para que seja possível
o estudo aprofundado da legislação, doutrina e história das competências e missões
constitucionais dos órgãos de segurança pública e Forças Armadas, sendo feitas
maiores explicações sobre a importância da Polícia Federal e suas limitações. Em
segundo momento, discute-se a insuficiência do combate à criminalidade e
possibilidade de uso político desta atuação diferenciada das Forças Armadas, haja
vista a realidade, as necessidades e os interesses envolvidos nos Estados e, de
forma mais específica, nas fronteiras do país. Por último, são analisadas as razões
que justificam este uso das Forças Armadas e é sugerido que deve haver maiores
investimentos na segurança pública. Uma solução proposta é a de criação de uma
Polícia Federal Ostensiva cujo objetivo seria a atuação junto às polícias militares em
áreas de fronteira e outras de peculiar interesse da União.
Palavras-chave:1.Forças Armadas. 2.Poder de Polícia. 3.Operações de Garantia da
Lei e da Ordem. 4. SISFRON.
ABSTRACT
The objective of this study is to analyze various aspects of differentiated
performances of the Armed Forces who, more and more, have been used to
implement the role that should be exercised autonomously and efficiently by public
security organs of the states to direct combat of crime. Emphasis will be placed on
works done in the land borders of the country, in the context of Border Monitoring
System (Sisfron). First, we present the concepts of police power, public safety and
defense to make possible the detailed study of the legislation, doctrine and history of
constitutional competencies and missions of public safety agencies and the armed
forces being done more explanation about the importance of Federal Police and its
limitations. In second stage, we discuss the insufficiency of combating crime and the
possibility of political use of this differentiated performance of the Armed Forces,
given the realities, needs and interests involved in the States and, more specifically,
on the borders of the country. Finally, we analyze the reasons for this use of the
Armed Forces and it is suggested that should be greater investment in public safety.
One proposed solution is the creation of a Ostensive Federal Police whose goal is to
work together with the military police in border areas and in other peculiar interest of
the Union.
Keywords: 1. Armed Forces 2. Police Power 3.Operations to Assurance Law and
Order 4.Sisfron.
6
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 7 2 DO PODER DE POLÍCIA ..................................................................................... 10 3 SEGURANÇA PÚBLICA E DEFESA NACIONAL ................................................ 13 3.1 SEGURANÇA PÚBLICA ....................................................................................... 13 3.2 DEFESA NACIONAL ............................................................................................ 15 4 MISSÃO CONSTITUCIONAL DOS ÓRGÃOS DE SEGURANÇA PÚBLICA ...... 16 4.1 PRESENÇA E ATUAÇÃO DA POLÍCIA FEDERAL ............................................... 19 4.2 INEXISTÊNCIA DE UMA POLÍCIA FEDERAL OSTENSIVA ................................. 21 5 MISSÃO CONSTITUCIONAL DAS FORÇAS ARMADAS ................................... 23 6 NOVA MISSÃO DAS FORÇAS ARMADAS PÓS-GUERRA FRIA ....................... 32 7 FORÇAS ARMADAS NA SEGURANÇA PÚBLICA ............................................. 34 8 DA INSUFICIÊNCIA DO COMBATE À CRIMINALIDADE E USO POLITICO
DAS FORÇAS ARMADAS ................................................................................... 41 9 DA FAIXA DE FRONTEIRA TERRESTRE BRASILEIRA .................................... 44 10 DO PRINCIPIO DA EFICIÊNCIA E O EMPREGO DAS FORÇAS ARMADAS
COM PODER DE POLÍCIA NO CONTEXTO DO SISFRON ................................ 47 10.1 PRINCÍPIO DA EFICIÊNCIA ................................................................................. 47 10.1 SISTEMA INTEGRADO DE MONITORAMENTO DE FRONTEIRAS ................... 48 11 CONCLUSÃO ....................................................................................................... 50 REFERÊNCIAS .................................................................................................... 53
7
1 INTRODUÇÃO
Nos últimos tempos tem-se verificado reiterados apelos de autoridades
públicas e da sociedade em geral, clamando pelo emprego das Forças Armadas no
papel que deveria ser exercido de modo autônomo e eficiente pelas forças de
segurança pública dos Estados. As justificativas dos pedidos, em regra, convergem
para o reconhecimento da insuficiência e ineficácia do combate que tem sido
promovido pelas forças policiais.
Com um olhar ainda que desatento é possível perceber a realidade dessa
escalada vertiginosa da violência e criminalidade, principalmente nos grandes
centros urbanos, assim como a realidade da alegada insuficiência das atuações dos
órgãos de segurança pública na garantia da ordem interna. É possível atribuir esse
resultado a ausência de estruturas sociais consistes e inclusivas e de investimentos
públicos nas questões de segurança.
O artigo 144 da Constituição Federal de 1988 dispõe que o provimento da
segurança pública é dever da organização estatal, direito e responsabilidade de
todos. Aponta que seu exercício destina-se à preservação da ordem pública e da
incolumidade das pessoas e do patrimônio e arrola os órgãos encarregados de
exercê-la: polícia federal, polícia rodoviária federal, polícia ferroviária federal, policias
civis, policias militares e corpos de bombeiros militares1. Destaca-se que desse rol
não constam as Forças Armadas.
A República Federativa do Brasil é formada pela união indissolúvel dos
Estados e Municípios e do Distrito Federal, constituindo-se em Estado Democrático
de Direito2 com autonomia política administrativa dos entes federados e respectivas
competências estabelecidas em constituição rígida, resultando dessa organização
estatal uma partilha interna de atribuições em três níveis de governo – Federal,
Estadual e Municipal – sem supremacia de um nível sobre o outro.
A representação do Estado Brasileiro em sua soberania nas relações
externas compete à União Federal3. Internamente, a União, os Estados membros,
Distrito Federal e Municípios, são entes autônomos, pessoas jurídicas de direito
público interno com competências e atribuições específicas fixadas na Constituição
1 BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil.1988, Artigo 144.
2 BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil.1988, Artigos 1º, 18, 25 e 29.
3 BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil.1988, Artigo 21.
8
Federal. Ressalvadas situações excepcionais, igualmente previstas no comando
constitucional, a regra é a não intervenção da União Federal nos Estados e
Municípios, assim como dos Estados nos Municípios.4
As Forças Armadas são compostas pela Marinha, Exército e Aeronáutica e
destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por
iniciativas de qualquer destes, da lei e da ordem5 é o que reza o artigo 142 da
Constituição Federal. Dessa leitura extraímos que o papel das Forças Armadas não
está voltado à realização da segurança pública, nem à execução de atividades que
seriam típicas das forças policiais elencadas no artigo 144 da Constituição Federal e
que, atuação nessa área, pode ocorrer em situação excepcional e temporária, dentro
da concepção de atuação para garantia da lei e da ordem.
No presente trabalho pretendemos avaliar, à luz da legislação e da doutrina
jurídica, se o emprego das Forças Armadas em situações não excepcionais, em
missões de segurança pública, na realização de ações típicas das forças policiais,
possui lastro legal; se pode caracterizar desvirtuamento de função com potencial
reflexo negativo à missão principal das Forças Armadas e se existe a possibilidade
de uso político desse emprego. Almejamos aferir, sob o mesmo prisma, se na faixa
de fronteira existe situação diferenciada que recomende, por força do princípio da
eficiência6 e considerando o contexto do Sistema Integrado de Monitoramento de
Fronteiras (SISFRON), o emprego das Forças Armadas com poder de polícia para
atuar ostensivamente no combate direto aos delitos transfronteiriços, inclusive
isoladamente.
Não constitui objeto deste trabalho o aprofundamento na análise jurídica e
doutrinaria do emprego das Forças Armadas em situações claras de não-
normalidade institucional e que implicam decretação de exceção: Intervenção
Federal, Estado de Sítio e ou de Defesa. Nosso estudo limita-se às situações de
emprego das Forças Armadas em missão de garantia da lei e da ordem e segurança
pública em conjunturas afirmativas da normalidade institucional, nestas incluindo o
emprego das Forças na faixa de fronteira.
Inicialmente, abordaremos o poder de polícia e seus limites. Passaremos ao
estudo das expressões segurança pública e defesa para então ingressarmos na
4 BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil. 1988, Artigos 34 e 35.
5 BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil. 1988, Artigo 142.
6 BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil. 1988, Artigo 37.
9
verificação da legislação e doutrina jurídica referente à competência e missão
constitucional dos órgãos de segurança pública e das Forças Armadas; destas,
inclusive nas constituições ao longo do tempo. Seguiremos com a análise mais
específica em relação ao seu emprego nas áreas de atribuição das policias
estaduais em operações de garantia da garantia da lei e da ordem, assim como a
realidade da insuficiência do combate à criminalidade e da possibilidade de uso
político do emprego das Forças Armadas. Em último plano procederemos à análise
da situação peculiar da faixa de fronteira terrestre brasileira, dos interesses e
necessidades presentes e possibilidade de atuações integradas no contexto do
Sistema Integrado de Monitoramento de Fronteiras SISFRON sob a ótica do
principio da eficiência e apresentaremos as conclusões a que chegamos.
10
2 DO PODER DE POLÍCIA
O ser humano, mesmo vivendo isoladamente, constantemente precisa ou
deseja algo maior para seu conforto ou comodidade, tais como alimentos, roupas,
ferramentas, companhia, abrigo e proteção. Vivendo em sociedade de igual forma
continua precisando desses itens e de outros identificados como de interesse não
individuais, mas do grupo social em que convive, tais como estradas, escolas,
hospitais e segurança. Entretanto, qualquer ação, seja individual ou coletiva, embora
tenha por escopo a satisfação de necessidades, realização de interesses e alcance
de objetivos, pode trazer implicações no direito alheio, ensejando ocorrência de
conflitos. Há necessidades que não estão afetas apenas a alguns grupos, mas a
uma coletividade indeterminada, cujo atendimento nem sempre é possível ser
provido apenas por ações e custeios individuais ou de grupos, sendo necessário
para tanto que se tenha uma organização que receba poderes para agir de modo,
atendê-las. Essa organização é o Estado quem detendo vários poderes para tanto,
deve agir de modo a atender as necessidades públicas, fazendo-o através da
administração dos serviços públicos, é o que diz Luiz Celso de Barros(1986)7.
Cabe ao Estado, através de seus órgãos, instituições e serviços
competentes, ajudar, controlar, disciplinar, regular as atuações individuais ou
coletivas, interferindo na vida dos administrados, limitando o uso, gozo e disposição
da propriedade e das liberdades, fazendo-as convergir para o bem comum, de modo
que sejam garantidos a todos o exercício do direito individual, sem prejuízo do direito
alheio, proporcionando a existência da harmonia e da paz social, que se resume na
chamada ordem pública. O instrumento que confere aos administradores poder para
essa ação estatal é o poder de polícia.
Segundo Hely Lopes Meirelles (1999) o poder de polícia é o mecanismo de
frenagem de que dispõe a Administração Pública para conter os abusos do direito
individual “8. Por esse mecanismo o Estado interfere no campo de domínio
particular, limita ou mesmo impede atividade que se revele nociva ou inconveniente
ao bem estar geral, tratando-se de direito, não o elimina, apenas disciplina formas de
7 BARROS, Luiz Celso. Ciência das Finanças. Jalovi. Bauru: 1986. p.17.
8 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 23ª ed. São Paulo: Malheiros, 1999,
p.115.
11
seu exercício. O Código Tributário Nacional nos apresenta a definição legal do poder
de polícia nos seguintes termos:
Art. 78. Considera-se poder de polícia atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranquilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos. (Redação dada pelo Ato Complementar nº 31, de 28.12.1966). Parágrafo único. Considera-se regular o exercício do poder de polícia quando desempenhado pelo órgão competente nos limites da lei aplicável, com observância do processo legal e, tratando-se de atividade que a lei tenha como discricionária, sem abuso ou desvio de poder.
9
Segundo Moreira (2011) não se confunde o poder de polícia com a atividade
de segurança pública. O poder de polícia é a atividade administrativa, consistente no
poder de restringir e condicionar o exercício dos direitos individuais em nome do
interesse coletivo, sendo este exercido por todos os órgãos da Administração
Pública, obedecendo às normas de caráter administrativos10.Assim, quando o poder
público municipal expede um ato administrativo estabelecendo que nos finais de
semana fica proibido o trânsito de veículos em determinada rua, isso em prol do
lazer da sociedade e benefício de todos, está fazendo uso do poder de polícia. Já a
atividade policial ou atividade de segurança pública é exercida pelos órgãos
enumerados no art. 144 da Constituição: polícias federal, rodoviária federal,
ferroviária federal, militar e civil, que possuem atribuições restritas e que, além da
submissão às normas administrativas, devem obediência às normas penais e
processuais penais, estando suas ações subordinadas ao Poder Judiciário e ao
controle do Ministério Público.
Claro que o ideal seria que todos obedecessem às regras estabelecidas no
interesse da coletividade, mas isso não ocorre, daí a importância das instituições
policiais que tem por função precípua fazer cumprir as normas legais, podendo
inclusive valer-se de força física para, em nome do Estado, reprimir o infrator. Se
não fosse desse modo, as normas perderiam a sua razão de existir, pois se o Estado
não contasse com instituições policiais capazes de fazer valer o seu poder de polícia
9 BRASIL, Lei nº 5.172, de 25/10/1966, que dispõe sobre o Sistema Tributário Nacional e institui
normas gerais de direito tributário aplicáveis à União, Estados e Municípios. Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L5172Compilado.htm>. Acesso em: maio/2012. 10
MOREIRA, Alexandre Magno Fernandes. Poder de Polícia. 2011. Disponível em: http://www.lfg.com.br/public_html/article.php?story=20110124112142478. Acesso em: 24/jul/2012.
12
normativo, a norma ficaria esvaziada, igual a um corpo sem alma, comprometendo
o convívio social (OLIVEIRA, 2008).11
O ordenamento jurídico é que determina quem poderá exercer o poder de
polícia. Para que a atuação do agente público no exercício do poder de polícia seja
legítima, é necessário que este seja legalmente competente e atue dentro dos
limites estabelecidos pela lei, inclusive quanto à observância do devido processo
legal e, mesmo se tratando de atividade discricionária, que o exerça sem abuso ou
desvio de poder.
A Constituição Federal, de modo geral estabelece as competências para o
exercício do poder de polícia. As funções atribuídas ao Estado são múltiplas e em
relação a cada uma delas, confere poderes aos serviços públicos para execução de
seus fins, ou seja, promover atendimento das necessidades públicas.
No campo da segurança pública, para cumprir sua missão o Estado deve
manter organizadas forças que estejam voltadas para a preservação da ordem
pública suficiente para proporcionar ao administrado, dentro dos limites da lei, a
situação necessária ao desenvolvimento de suas atividades e convivência com os
demais integrantes da sociedade.
Qualquer atuação de qualquer Agente Público deve obediência aos
princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. O
princípio da eficiência é aquele que orienta o agente público a obter os melhores
benefícios, os melhores resultados, com o menor custo possível e encontra-se
inserido nesse rol por força do disposto no art. 37, caput, da Constituição Federal.12
11OLIVEIRA, Fernando José Aguiar. Artigo: Poder de polícia não se restringe a instituições policiais. 2008.
Consultor Jurídico. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2008-jul-
06/poder_policia_nao_resume_instituicao_policial?imprimir=1> Acesso em: 30 jul 2012. 12
UNESP, Paulo Tadeu Rodrigues. Dissertação: Responsabilidade do Estado por atos das Forças Policiais.
Disponívelem:<http://www.athena.biblioteca.unesp.br/exlibris/bd/bfr/33004072068P9/2000/rosa_ptr_me_fran.p
df>. Acessado em: 20 jun. 2012.
13
3 SEGURANÇA PÚBLICA E DEFESA NACIONAL
3.1 SEGURANÇA PÚBLICA
Segundo Câmara (2000), segurança não é algo concreto, é apenas um
estado de espírito, uma sensação resultante das informações captadas pelos
sentidos e informadas ao cérebro. Como uma sensação, um sentimento, pode sofrer
influência de fatores de diversas formas e origens e não é algo que possa ser
medido com exatidão, uma vez que resulta, em última análise, em sensações que
balizam um estado de espírito13.
Segundo o Manual Básico da Escola Superior de Guerra – Volume I –
Elementos Fundamentais (2009),“segurança é a sensação de garantia necessária e
indispensável a uma sociedade e a cada um de seus integrantes, contra ameaças
de qualquer natureza”14. Por essa leitura verificamos que basta a ocorrência de
estímulo suficiente para provocar sentimento de ausência de proteção, de vivência
de situação de risco pessoal ou de perigo, seja ela real ou imaginária, para que
tenhamos caracterizada uma situação de insegurança.
Assim, concordamos com os ensinamentos de Câmara (2000) na afirmativa
de que tudo o que puder ameaçar a tranquilidade do homem, individualmente ou
coletivamente, que em sua visão tenha potencial de dificultar ou impedir sua
proteção e causar-lhe temor ou desconforto, são fontes geradoras de conflitos e
constituem razões de insegurança.
Segundo o Manual Básico da Escola Superior de Guerra – Volume I –
Elementos Fundamentais (2009), as chamadas razões de insegurança podem
assumir várias modalidades, resultantes de fontes diversas:
Elas podem assumir várias modalidades. Resultam, às vezes, da escassez de recursos essenciais à satisfação de necessidades básicas da população. Podem provir, também, da falta de compatibilização entre as demandas de setores sociais que desejam incentivos diversos e o seu atendimento, bem como de distorções políticas e psicossociais que impedem a participação de segmentos da sociedade no processo político global e na evolução cultural. Essas razões de insegurança pode, ainda, resultar de ameaças à soberania, à integridade patrimonial ou territorial da Nação. Por vezes, assumem formas bastante sutis como, por exemplo, aquelas advindas da intromissão indevida de culturas externas que agridem a identidade cultural
13 CÂMARA, Paulo Sette. Polícia e Segurança Pública. Defesa Social e Segurança Pública, Porto
Alegre, 2000, Disponível em: <http://www.policiaeseguranca.com.br/defesa_soc.htm>. Acesso em: jun. 2012. 14
BRASIL. ESG – Escola Superior de Guerra Manual Básico: Elementos Fundamentais. – Rio de Janeiro. 2009, p. 59.
14
nacional (Manual Básico da Escola Superior de Guerra – Volume I – Elementos Fundamentais (2009. p. 59).
O mesmo manual desdobra a segurança em níveis: “individual, comunitário,
nacional e coletivo”15, levando em consideração a abrangência e responsabilidade
de todos em relação aos atos e medidas adotadas no trato dos fatores perturbadores
para obter ou manter as condições que proporcionam estado adequado de
segurança.
A conceituação de segurança pública abrange a segurança do homem como
ser individual e ser social. Entretanto, a insegurança individual, assim como a social
podem atingir níveis de generalização e gravidade tal que pode colocar em risco os
objetivos fundamentais, transformando-se em importantes fatores de instabilidade
para a nação e, nesse caso, é considerada fragilizadora da segurança nacional.
As instituições responsáveis pela execução das atividades de Segurança
Pública atuam no sentido de inibir, neutralizar ou reprimir a prática de atos
antissociais, mediante aplicação do poder de polícia, assegurando a proteção
coletiva e, por extensão, dos bens e serviços públicos e, abrangem os níveis
individual e comunitário.16
Já a conceituação de segurança coletiva esta relacionada à ideia de poder
da nação e da possibilidade de seu fortalecimento através de apoios estabelecidos
com outras nações, tendo por escopo a mitigação de áreas de possíveis atritos e
uma ampliação das possibilidades de alcance e preservação de objetivos de
interesse comuns.
3.2 DEFESA NACIONAL
Conforme vimos no último parágrafo a conceituação de segurança nacional
e coletiva vão além dos níveis individual e social, pois considera também as
ameaças oriundas do ambiente externo à nação e aquelas relacionadas à
preservação dos Objetivos Fundamentais do Estado. Enquanto a segurança pública
é mantida mediante aplicação do poder de polícia, uma pequena parcela do poder
15BRASIL. ESG – Escola Superior de Guerra Manual Básico: Elementos Fundamentais. – Rio de
Janeiro. 2009, p. 60 16
CÂMARA, Paulo Sette. Polícia e Segurança Pública. Defesa Social e Segurança Pública, Belém do Pará, 2000, Disponível em: <http://www.policiaeseguranca.com.br/defesa_soc.htm>. Acesso em: 17 jun. 2012.
15
nacional, a segurança nacional envolve a aplicação plena do poder nacional, como
um todo. Conforme o Manual Básico da Escola Superior de Guerra – Volume I –
Elementos Fundamentais (2009) a defesa se localiza no trato das ameaças à
segurança nacional e abrange todo o universo antagônico, onde ocorrem atitudes
que são ou poderão ser lesivas aos Objetivos Fundamentais. As ameaças podem se
constituir em antagonismos de origem externa e demandam acompanhamento
constante do ambiente internacional. As medidas adotadas serão preventivas ou
coercitivas, em diferentes graus e níveis, com ênfase na Expressão Militar. Assim
se desenvolve a conceituação apresentada:
Defesa Nacional é o conjunto de atitudes, medidas e ações do Estado, com ênfase na Expressão Militar, para defesa do território, da soberania e dos interesses nacional contra ameaças preponderantemente externas, potencias e manifestas.
17
A segurança coletiva é proporcionada por ações que se incluem em um
sistema de defesa fortalecido pelo apoio de outro Estado ou grupo de Estados em
conjugação de interesses, viabilizando atuação de modo a afastar as agressões
mitigadoras da segurança nacional dos participantes, resultando no aumento de
suas capacidades dissuasórias.
17BRASIL. ESG – Escola Superior de Guerra Manual Básico: Elementos Fundamentais. – Rio de Janeiro. 2009, p. 64.
16
4 MISSÃO CONSTITUCIONAL DOS ÓRGÃOS DE SEGURANÇA PÚBLICA
A Constituição Federal de 1988 estabeleceu como direitos fundamentais de
todos brasileiros o direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade18 sendo que o constituinte elevou o tema segurança ao nível
constitucional. Assim, a missão dos órgãos de segurança pública encontra-se
delineada no artigo 144 da Constituição Federal. Esse dispositivo integra o Capítulo
III que, por sua vez, finaliza o assunto que é objeto do Título V e que trata da “Da
Defesa do Estado e Das Instituições Democráticas".
Conforme comando constitucional, a segurança pública é dever do Estado,
direito e responsabilidade de todos e que é exercida para a preservação da ordem
pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio. A própria constituição
relacionou os órgãos encarregados dessa missão: no âmbito federal, a Polícia
Federal, Polícia Rodoviária Federal e Polícia Ferroviária Federal e no âmbito
estadual, as policias civis, militares e corpos de bombeiros militares19. Destaca-se
que deste rol não constam as Forças Armadas.
Segundo estabelecido constitucionalmente, a atividade de polícia ostensiva
deve ser desempenhada pelas polícias militares estaduais (Artigo 144 §5º da CF). O
patrulhamento ostensivo das rodovias e ferrovias federais deve ser realizado,
respectivamente, pela Polícia Rodoviária Federal e pela Polícia Ferroviária Federal,
(Artigo 144, §ª 2º e 3º).
A polícia ostensiva é aquela que exerce suas funções atuando de modo
amplamente visível e de modo que se obtenha o efeito preventivo inibidor da pratica
de infrações; opera normalmente com policiais fardados, dotados de equipamentos e
recursos que possibilitam ampla percepção de suas presenças nas áreas de atuação
induzindo ao observador entendimento de repressão pronta e imediata na hipótese
de eventual prática de conduta com potencial ofensivo à ordem pública ou a paz
social, provocando efeito dissuasório inibidor de condutas contrárias à ordem, ao
tempo em que atua de modo imediato, repressivamente, em relação às infrações
verificadas20.
18BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil.1988, Artigo 5º, caput.
19BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil. 988, Artigo 144.
20UNESP. ROSA, Paulo Tadeu Rodrigues. Responsabilidade do Estado por Atos das Forças Policiais.
Franca. 2000. Disponível
17
Desse modo, quando as polícias militares estaduais ou policia rodoviária
federal realizam vistorias em veículos que circulam por vias públicas, exercem poder
de polícia preventivo, eis que, mesmo sem o conhecimento efetivo da ocorrência de
algum delito, nos limites da lei, restringem liberdades individuais em prol do
interesse maior, coibir a ocorrência da infração.
Ocorrendo o delito, cabe à polícia judiciária, por meio da investigação
policial, apurar a realidade dos fatos. A investigação policial é realizada pelas
polícias civis dos estados e pela polícia federal no âmbito federal, sendo conduzida
no bojo do inquérito policial, de modo autônomo e obedecendo as regras do código
de processo penal brasileiro, sob controle externo do ministério público e tendo por
fim último a coleta de provas da materialidade da ocorrência do delito e de sua
autoria, ensejando futura responsabilização do infrator, pelo Estado.
O texto constitucional prevê que apenas na condição de excepcionalidade e
para preservar ou prontamente restabelecer, em locais restritos e determinados, a
ordem pública ou a paz social, ameaçadas por grave e iminente instabilidade
institucional, pode o Presidente da República, lastreado nos termos do artigo 136 da
Constituição Federal, ouvidos o Conselho da República e o Conselho de Defesa
Nacional, decretar estado de defesa, impondo restrição de diversos direitos21. Ainda,
na hipótese de comprovada ineficácia dessa medida, poderá, ouvidos o Conselho da
República e o Conselho de Defesa Nacional, solicitar ao Congresso Nacional
autorização para decretar o estado de sítio, restringindo ainda mais os direitos de
comunicações, liberdade e propriedade.
O esforço do constituinte ao relacionar os órgãos responsáveis pelo
exercício da atividade de segurança pública não foi suficiente para impedir a
ocorrência de confrontos e divergências jurídicas doutrinárias, dentre elas o tema
aqui em estudo, qual seja o emprego das Forças Armadas na execução de
atividades típicas das forças policiais.
Diz o texto constitucional:
Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos: I – polícia federal; II – polícia rodoviária federal;
em:<http://www.athena.biblioteca.unesp.br/exlibris/bd/bfr/33004072068P9/2000/rosa_ptr_me_fran.pdf>. Acesso em: 21 jun. 2012. 21
BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil, 1988, Artigo 136 e seus parágrafos.
18
III – polícia ferroviária federal IV – polícias civis V – polícias militares e corpos de bombeiros militares. § 1º A polícia federal, instituída por lei como órgão permanente, organizado e mantido pela União e estruturado em carreira, destina-se a: ... II - prevenir e reprimir o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o contrabando e o descaminho, sem prejuízo da ação fazendária e de outros órgãos públicos nas respectivas áreas de competência; III - exercer as funções de polícia marítima, aeroportuária e de fronteiras; IV - exercer, com exclusividade, as funções de polícia judiciária da União. ... § 3º A policia rodoviária federal...destina-se, na forma da lei, ao patrulhamento ostensivo das rodovias federal; ... § 4º às polícias civis..., incumbem, ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares; § 5º Ás polícias militares cabem a polícia ostensiva e a preservação da ordem pública... § 6º As polícias militares [...], forças auxiliares e reserva do Exército...
22
O foco de nosso estudo estará voltado para a segurança nas fronteiras. Da
leitura do texto reproduzido resta cristalino que compete à Polícia Federal exercer,
com exclusividade, as funções de polícia judiciária da União e que o policiamento
ostensivo e preventivo pela manutenção da ordem pública é atribuição das polícias
militares dos respectivos Estados da Federação. Veremos adiante que a União não
dispõe de uma polícia ostensiva para atuar nos moldes das polícias militares
estaduais no patrulhamento ostensivo preventivo.
A exclusividade confiada à Polícia Federal na condição de polícia judiciária
da união constitui um limitador das atividades em relação às polícias judiciárias dos
estados e traduz que o legislador, com essa medida, pretendeu delimitar as áreas
de atuação da Polícia Federal e Policiais Civis.
Observamos que o inciso III do artigo 144 da Constituição Federal de 1988
atribui à Polícia Federal o exercício das funções de “polícia marítima, aeroportuária e
de fronteiras”, o que demonstra de modo inequívoco sua atribuição para atuação na
área de fronteira na prevenção e repressão ao tráfico ilícito de entorpecente e
drogas afins, o contrabando e o descaminho, sem prejuízo da ação fazendária e de
outros órgãos públicos nas respectivas áreas de competência.
22 BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil, 1988, Artigo 144 e seus parágrafos.
19
4.2 PRESENÇA E ATUAÇÃO DA POLÍCIA FEDERAL
O relatório de gestão apresentado pelo Departamento de Polícia Federal aos
órgãos de controle interno, pertinente ao exercício 2011, serve para dimensionar a
presença e a atuação da Polícia Federal no Brasil e no exterior. Segundo o relatório
mencionado a Polícia Federal está presente em todos os estados brasileiros através
de 27 Superintendências instaladas nas respectivas capitais, 97 Delegacia sem
municípios de importância estratégica, 15 Delegacias Especiais de policiamento
marítimo, fluvial e lacustre e 18 Postos Avançados. Também se faz presente no
exterior com 10 Escritórios de Ligação sediados na Argentina, Canadá, Colômbia,
EUA, França, Guiana, França, Guiné Bissau, Inglaterra e Japão, 12 Adidâncias
policiais sediadas na África do Sul, Argentina, Bolívia, Colômbia, Paraguai, Uruguai,
Suriname, França, Portugal, Itália, Estados Unidos e Peru.23
Do mesmo relatório consta a “Demonstração da força de trabalho à
disposição da unidade jurisdicionada” sendo consignado o quantitativo de
14.423.462 Servidores, situação apurada em 31/12/2011 e, em outro trecho, são
elencadas as atribuições da Polícia Federal nos seguintes termos:
Mais especificamente a Polícia Federal deve “apurar infrações penais contra a ordem política e social ou em detrimento de bens, serviços e interesses da União ou de suas entidades autárquicas e empresas públicas, assim como outras infrações cuja prática tenha repercussão interestadual ou internacional e exija repressão uniforme, segundo se dispuser em lei; prevenir e reprimir o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o contrabando e o descaminho, sem prejuízo da ação fazendária e de outros órgãos públicos nas respectivas áreas de competência; exercer as funções de polícia marítima, aeroportuária e de fronteiras; e exercer, com exclusividade, as funções de polícia judiciária da União.” (art. 144, Parágrafo §1º, inciso I, Constituição Federal). Dessa forma, a Polícia Federal apura os crimes contra o meio ambiente, contra a ordem tributária, contra o Sistema Financeiro de Habitação, contra a Previdência Social, contra os serviços postais, contra a organização do trabalho, contra os índios, contra os direitos humanos, os crimes eleitorais, de genocídio, de tráfico ilícito de drogas, dentre outros. Cabe, ainda, à Polícia Federal as seguintes atribuições: Controle Migratório (Lei nº6.815/1980 - Estatuto do Estrangeiro), Controle de Armas (Lei nº 10.826/2003 -SINARM);Controle de Empresas de Segurança Privada (Lei nº 7.102/1983 e Lei nº 9.017/1995); Controle de Precursores Químicos - que possam ser utilizados no preparo de substâncias entorpecentes (Lei nº 10.357/2001); Segurança de Dignitários - oficiais e autoridades estrangeiras (Lei nº 4.483/1964); Identificação Criminal e Civil (Lei nº 4.483/1964);
23 BRASIL. Departamento de Polícia Federal. Prestação de contas ordinária anual relatório de gestão do
exercício de 2011. Disponível em:
<http://www.dpf.gov.br/acessoainformacao/plano_gestao_2011/SEDE_parte1.pdf>. Acesso em: 01/08/2012.
20
Segurança ao Patrimônio da União coibindo turbação ou esbulho possessório (Lei nº 10.683/2003), Serviço de Estatística Criminal (Código de Processo Penal), Controle de Conflitos Fundiários (Decreto nº 5.834/2004), Representação Externa – INTERPOL (Lei nº 4.483/1964), e de Proteção à Testemunhas (Lei 9.807/1999).
Verificamos que o rol de atividades e atribuições do órgão é bastante
extenso e em análise sumária do relatório parcialmente reproduzido, é possível
inferir desproporcionalidade entre meios disponibilizados para execução e tarefas a
serem cumpridas, o que nos permite afirmar a insuficiência de recursos e
investimentos essenciais ao desempenho das missões.
A título de exemplo e confirmando essa tese, destacamos o trecho relativo
às fronteiras, conforme item 4.11.3 do Relatório de Atividades – 1º Trimestre de 2012
da Auditoria do Tribunal de Contas da União, realizada no Sistema Nacional de
Políticas Públicas Sobre Drogas (SISNAD) a respeito da avaliação das ações de
repressão ao tráfico de drogas na fronteira do País, verifica-se a constatação de
deficiências de infraestrutura e carência de equipamentos nas delegacias da Polícia
Federal da região de fronteira, demonstrando clara insuficiência de recursos e meios
para fazer frente às atividades afetas a esta Polícia Judiciária da União.
(...) O Tribunal realizou auditoria para avaliar as principais ações de Governo na repressão ao tráfico ilícito de drogas. No que se refere a essas ações, o principal objeto de análise do trabalho foi a Polícia Federal, tendo em vista a competência constitucional que lhe é atribuída de exercer a função de polícia de fronteira – principal fonte de entrada de drogas ilícitas no território nacional. A fiscalização do TCU constatou quantidade insuficiente de policiais na região de fronteira, alta rotatividade de policiais nessas unidades, problemas de infraestrutura nas delegacias, carência de equipamentos e de capacitação, bem como a pouca interação entre as forças policiais. (...) A auditoria verificou que em Ponta Porã /MS as condições de trabalho oferecidas aos servidores são muito ruins, tendo sido observados pontos de alagamento, infiltrações e goteiras, além do comprometimento de instalações elétricas, com sérios riscos de acidentes. O relatório também mostra que em Tabatinga/AM, onde o combate é feito basicamente nos rios, a delegacia não possui embarcações em condições adequadas e compatíveis com as necessidades do trabalho. Além dos problemas de infraestrutura, a fiscalização revelou que faltam equipamentos importantes para o trabalho de repressão ao tráfico de drogas, como binóculos de visão noturna, rastreadores, caminhonetes com tração nas quatro rodas, coletes balísticos e aparelhos de comunicação via satélite. Verificou-se, também, que a insuficiência de coletes balísticos e de aparelhos de comunicação via satélite comprometem a segurança dos policiais. O TCU recomendou ao Departamento de Polícia Federal (DPF) que proporcione a infraestrutura necessária para as delegacias de fronteira, bem como que realize estudo para levantar essas necessidades de infraestrutura e equipamentos das unidades de fronteira com a finalidade de garantir a efetividade e a tempestividade das ações, além da segurança dos
21
policiais.(Acórdão nº 360/Plenário, de 15.2.2012, TC nº 021.180/2010-5 e TC nº 033.434/2010-7, Relator: Ministro Aroldo Cedraz, Unidade Técnica: Seprog)
24
4.3 INEXISTÊNCIA DE UMA POLÍCIA FEDERAL OSTENSIVA.
A atuação da Polícia Federal na condição de polícia judiciária e investigativa
da União ocorre nos moldes das atuações das polícias civis dos estados, no
exercício das funções de polícia judiciária e apuração das infrações penais e não se
confunde com o papel exercido pelas polícias militares estaduais.
As policiais militares estaduais, conforme antes abordado, são responsáveis
pelo patrulhamento ostensivo e operam no exercício poder de polícia preventivo de
modo a inibir a prática de infrações, atuando normalmente de modo amplamente
visível, com policiais fardados e utilizando recursos que traduzem ação repressiva
imediata diante de eventual hipótese de infração, coibindo desse modo, desde o seu
nascedouro, ações que potencialmente lesivas à ordem pública.
No âmbito federal, a exceção da polícia rodoviária federal e da polícia
ferroviária federal, não existe previsão constitucional de uma polícia específica para
o policiamento preventivo ostensivo de manutenção da ordem pública nos moldes
das policiais militares estaduais.
É possível deduzir que essa ausência de previsão constitucional para uma
polícia federal ostensiva, deu-se em razão do legislador constituinte ter levado em
conta a autonomia dos entes federados e distribuição de responsabilidades e
competências. Aos Estados da federação compete à garantia da segurança pública
e no pacto federativo, a regra constitucionalmente estabelecida, é a de não
intervenção da União Federal nos Estados e Municípios. A tese é igualmente
ratificada pela regra que estabelece a possibilidade do emprego das Forças Armada
sem ações de garantia da lei e da ordem somente em situações excepcionais, em
locais restritos e determinados, em resposta às ameaças que violam a ordem
jurídica estabelecida e garantia dos poderes constituídos, ou seja, em situações que
fogem à rotina da normalidade.
24BRASIL. Tribunal de Contas da União. Relatório Anual de Atividades: 2011 / Tribunal de Contas da União. –
Brasília: TCU, Secretaria de Planejamento e Gestão, 2012. Disponível em: <http://portal2.tcu.gov.br.> Acesso
em: 21/08/2012.
22
No ano de 2004 foi criada a Força Nacional de Segurança Pública (FNSP).
Porém esta, na realidade, não se trata de composição de uma força policial
propriamente dita, mas de um programa de cooperação federativa que agrupa
policiais e bombeiros oriundos dos Estados e do Distrito Federal por indicação das
respectivas unidades da federação. A adesão a esse programa é voluntaria e o
efetivo composto destina-se ao emprego em situações emergenciais e localizadas,
no campo da segurança pública. A decisão pelo emprego se dá à partir do pedido
oficial do governador da unidade federativa que deseja a atuação em sua área para
conter atos que atentam contra a lei e a ordem e que ameacem sair do controle das
forças de segurança local.
A criação de tal programa revela a necessidade do preenchimento de uma
lacuna entre as policias militares estaduais e as Forças Armadas com vista à
atuação no policiamento ostensivo em todo território nacional.
As atuações ocorrem apenas nos limites da área de responsabilidade da
unidade solicitante e a composição do efetivo para esse emprego depende do
deslocamento de policiais de outras unidades federadas, situação que traduz
dificuldades na manutenção prolongada dos tais afastamentos e alta dependência
de recursos para logística e custeio dos mesmos, o que inviabiliza atuação duradora
e profícua em todo território nacional.
23
5 MISSÃO CONSTITUCIONAL DAS FORÇAS ARMADAS
Nossas constituições sempre reservaram às Forças Armadas uma posição
de destaque. Desde a primeira constituição de 1824, que criou a monarquia imperial,
a missão das Forças Armadas, detém posição especial no ordenamento jurídico; foi
dedicado um capítulo com seis artigos nos quais foram traçadas linhas mestras de
atuação da “Força Militar” e da obrigação de todos os brasileiros pegarem armas,
para sustentar a Independência e a integridade do Império, defendê-lo dos seus
inimigos externos, ou internos.25
Ao longo do tempo a competência das Forças Armadas não sofreu
alterações significativas, seu emprego histórico sempre esteve relacionado à Defesa
da Pátria em relação ao exterior e à manutenção das leis no interior Estado.
Com a proclamação da República em 1889, através do Decreto nº 1, de 15
de novembro daquele ano o então governo provisório ao estabelecer a forma de
Governo da Nação Brasileira – República Federativa – colocou sob responsabilidade
dos governos dos estados federados a manutenção da ordem e da segurança
pública, assim como da defesa e garantia da liberdade e dos direitos dos cidadãos,
mas em caráter suplementar, apesar da autonomia dos estados, estabeleceu a
intervenção do Governo Provisório mediante emprego das Forças Armadas, onde a
ordem pública estivesse perturbada e faltassem ao Governo local os meios eficazes
para reprimir as desordens e assegurar a paz e tranquilidade públicas:
Art 5º - Os Governos dos Estados federados adotarão com urgência todas as providências necessárias para a manutenção da ordem e da segurança pública, defesa e garantia da liberdade e dos direitos dos cidadãos quer nacionais quer estrangeiros. Art 6º - Em qualquer dos Estados, onde a ordem pública for perturbada e onde faltem ao Governo local meios eficazes para reprimir as desordens e assegurar a paz e tranquilidade públicas, efetuará o Governo Provisório a intervenção necessária para, com o apoio da força pública, assegurar o livre exercício dos direitos dos cidadãos e a livre ação das autoridades constituídas.
26
Juridicamente, com a edição do Decreto nº 1, de 15 de novembro de 1989, a
instituição do federalismo e o estabelecimento da autonomia dos Estados federados,
25 BRASIL, Constituição Política do Império do Brasil, 1824, Artigos 145 a 150, Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao24.htm>. Acesso em: 21 jun. 2012. 26
BRASIL. Decreto nº 1, de 15 De Novembro de 1889. Disponível em:<http://www.soleis.adv.br/leishistoricas.htm>. Acesso em: 22 jun. 2012.
24
antes mesmo da promulgação da primeira Constituição Republicana (1891),
consagrou-se a previsão da intervenção da União nos Estados membros com o
emprego das Forças Armadas para recuperar a ordem pública e assegurar o livre
exercício dos direitos dos cidadãos e restabelecer a livre ação das autoridades
constituídas.
A Constituição 1891 trouxe como preâmbulo os seguintes termos: “Nós, os
representantes do povo brasileiro, reunidos em Congresso Constituinte, para
organizar um regime livre e democrático, estabelecemos, decretamos e
promulgamos a seguinte: ...” Pela leitura deste prólogo é possível aquilatar o espírito
liberal e de representatividade desta constituição. Nesta houve a consagração da
democracia, o fortalecimento da forma republicana de governo com ampliação da
autonomia dos estados federados e, em seu artigo 14, ratificou-se a missão
constitucional das forças armadas ao estabelecer que estas seriam destinadas à
defesa da Pátria no exterior e à manutenção das leis no interior e, ainda, na
segunda parte do dispositivo, deixou-se patente a obrigação de sustentar as
instituições constitucionais. Os poderes legislativo, executivo e judiciário foram
apontados como órgãos de soberania nacional e, no artigo 6º vedou-se a
intervenção do governo federal nos negócios peculiares dos Estados, ressalvando-
se, porém, dentre outros motivos, a intervenção para o restabelecimento da ordem e
da tranquilidade, à requisição dos respectivos Governos27.
Após a Revolução de 1930 com o término da República Velha o Brasil
retornou à normalidade do sistema com a Constituição da República dos Estados
Unidos do Brasil, de 16 de julho de 1934; nesta carta ratificou-se a diretriz de não
intervenção da União a não ser em casos excepcionais, dentre elas para assegurar
a observância dos princípios constitucionais e a execução das leis federais28 e foi
mantido lugar de destaque das Forças Armadas em sua missão em defender a pátria
e garantir os poderes constitucionais, a lei e a ordem:
Art 162 - As forças armadas são instituições nacionais permanentes, e, dentro da lei, essencialmente obedientes aos seus superiores hierárquicos.
27BRASIL. Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil de 1891. Artigos 6º, 14 e
15.Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/Constituicao91.htm>. Acesso em: 22 jun. 2012. 28
BRASIL. Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil de 1934. Artigos 12, V. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/Constituicao34.htm>. Acesso em: 22 jun. 2012.
25
Destinam-se a defender a Pátria e garantir os Poderes constitucionais, e, ordem e a lei
29.
Houve retorno à tradição centralizadora da União, pois restou estabelecido
no artigo 5º sua competência privativa para organizar a defesa, a polícia, a
segurança das fronteiras, as forças armadas e ficou definida no Artigo 9º, a previsão
de atuação conjunta da União e dos Estados, mediante celebração de acordos,
inclusive para prevenção e repressão da criminalidade:
Art 9º - É facultado à União e aos Estados celebrar acordos para a melhor coordenação e desenvolvimento dos respectivos serviços, e, especialmente, para a uniformização de leis, regras ou práticas, arrecadação de impostos, prevenção e repressão da criminalidade e permuta de informações
30.
Do mesmo texto constitucional em seu artigo 167, verifica-se passo
importante no processo de militarização das policias estaduais uma vez que estas
foram colocadas na condição de reservas do Exército, quando mobilizadas ou a
serviço da União:
Art 167 - As polícias militares são consideradas reservas do Exército, e gozarão das mesmas vantagens a este atribuídas, quando mobilizadas ou a serviço da União
31.
O período da República Velha (1889 a 1930) foi marcado por diversos
conflitos armados: Revolta da Armada (1893-1894); Revolução Federalista (1893-
1895); Guerra de Canudos (1893-1897);Revolta da Vacina(1904); Revolta da
Chibata (1910); Guerra do Contestado (1912-1916); Sedição de Juazeiro (1914);
Greves Operárias (1917-1919); Revolta dos Dezoito do Forte(1922); Revolução
Libertadora(1923); e Revolução de 193032, as principais. Portanto, foi o período de
intensa agitação, sendo marcante a presença dos militares no poder ou da busca
deste:
29BRASIL. Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil de 1934. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/Constituicao34.htm>. Acesso em: 22 jun. 2012. 30
BRASIL. Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil de 1934. Artigo 9º.Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/Constituicao34.htm>. Acesso em: 22 jun. 2012. 31
BRASIL. Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil de 1934. Artigo 167.Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/Constituicao34.htm>. Acesso em: 22 jun. 2012. 32
HISTÓRIA DO BRASIL.NET. República Velha, resumo, a política durante a República, principais momentos históricos. Disponível em:<http://www.historiadobrasil.net/republica>. Acesso em: 23 jun. 2012.
26
Surgiu neste período o tenentismo, que foi um movimento de caráter político-militar, liderado por tenentes, que faziam oposição ao governo oligárquico. Defendiam a moralidade política e mudanças no sistema eleitoral (implantação do voto secreto) e transformações no ensino público do país. A Coluna Prestes e a Revolta dos 18 do Forte de Copacabana foram dois exemplos do movimento tenentista.
33
A Constituição de 1934 teve seu ocaso com o advento do golpe de estado e
a ascensão de Getúlio Vargas no poder, inaugurando o Estado Novo.
A Revolução de 1930. Ao perder as eleições, os rio-grandenses se rebelaram, em 3 de outubro, sob o comando do tenente-coronel Pedro Aurélio de Góes Monteiro, que marchou para São Paulo. As Forças Armadas depuseram o presidente da República na chamada Revolução Liberal, em 24 de outubro de 1930. Formaram, então, uma Junta Militar com os generais Augusto Tasso Fragoso, João de Deus Menna Barreto e o contra-almirante José Isaías de Noronha. Terminava aí a República Velha. Getúlio Vargas foi declarado o novo presidente do Brasil. Prof.Ms. Fabio Augusto de Oliveira Santos.
34
O Estado novo foi implantado por Getúlio Vargas com o apoio das Forças
Armadas, sob a justificativa da existência de uma nova ameaça de golpe comunista
no Brasil. Foi então outorgada Constituição de 1937 redigida sob cunho totalitarista
na qual foram ampliados os poderes do Presidente da República, dando-lhe o
direito de intervir nos poderes Legislativo e Judiciário, e de indicar os governadores
estaduais e que colocava o país em estado permanente de emergência. Vejamos as
justificativas apresentadas em seu preâmbulo:
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA DOS ESTADOS UNIDOS DO BRASIL, ATENDENDO às legitimas aspirações do povo brasileiro à paz política e social, profundamente perturbada por conhecidos fatores de desordem, resultantes da crescente agravação dos dissídios partidários, que, uma, notória propaganda demagógica procura desnaturar em luta de classes, e da extremação, de conflitos ideológicos, tendentes, pelo seu desenvolvimento natural, resolver-se em termos de violência, colocando a Nação sob a funesta iminência da guerra civil; ATENDENDO ao estado de apreensão criado no País pela infiltração comunista, que se torna dia a dia mais extensa e mais profunda, exigindo remédios, de caráter radical e permanente; ATENDENDO a que, sob as instituições anteriores, não dispunha, o Estado de meios normais de preservação e de defesa da paz, da segurança e do bem-estar do povo;
33HISTÓRIA DO BRASIL REPÚBLICA. República Velha, República da Espada, presidência civil,
Política dos governadores, café-com-leite, divisões, Aliança Liberal, coronelismo, Revolução de 30. Disponível em: <http://www.suapesquisa.com/republica>. Acesso em:22 jun. 2012. 34
SANTOS, Fabio Augusto de Oliveira. República Velha na História do Brasil. Disponível em: <http://www.slideshare.net/professorfabio/republica-velha-resumo-9025994>. Acesso em: 22 jun. 2012
27
Com o apoio das forças armadas e cedendo às inspirações da opinião nacional, umas e outras justificadamente apreensivas diante dos perigos que ameaçam a nossa unidade e da rapidez com que se vem processando a decomposição das nossas instituições civis e políticas; Resolve assegurar à Nação a sua unidade, o respeito à sua honra e à sua independência, e ao povo brasileiro, sob um regime de paz política e social, as condições necessárias à sua segurança, ao seu bem-estar e à sua prosperidade, decretando a seguinte Constituição, que se cumprirá desde hoje em todo o Pais:
35
Da leitura do preâmbulo da constituição de 1937 já se vê que as Forças
Armadas ganharam um papel de destaque. Foram alocadas especificamente no
capítulo “Da Defesa do Estado” (artigo 161) prevendo o artigo 166 que em caso de
ameaça externa, iminência de perturbações internas ou mesmo existências de
concerto, plano ou conspiração, tendente a perturbar a paz pública, colocar em
perigo a estrutura das instituições, a segurança do Estado ou dos cidadãos, poderia
o Presidente da República declarar em todo o território nacional, ou na porção do
território particularmente ameaçado, o estado de emergência36, viabilizando assim a
intervenção com emprego das Forças Armadas. Permaneceu a diretriz de
militarização das forças policiais dos Estados e sua utilização como reserva do
Exército37.
Com o fim do Estado Novo, o cenário político nacional se rearticulou para o
retorno à normalidade democrática sendo promulgada a Constituição de 1946 na
qual o constituinte reforçou a autonomia dos Estados limitando os casos de
intervenção da União (Artigo 7º). A atuação das Forças Armadas foi regulada pelos
artigos 176 a 183, permanecendo a missão precípua a de “defender a Pátria e a
garantir os poderes constitucionais, a lei e a ordem”38.
As polícias militares dos Estados, territórios e Distrito Federal, ganharam
foro constitucional nos termos do artigo 183 e ficaram com responsabilidade
35 BRASIL, Constituição dos Estados Unidos do Brasil de 1937. Preâmbulo. Disponível
em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao37.htm>. Acesso em: 23 jun. 2012. 36
BRASIL, Constituição dos Estados Unidos do Brasil de 1937. Artigos 166 e 161. Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao37.htm>. Acesso em: 23 jun. 2012. 37
BRASIL, Constituição dos Estados Unidos do Brasil de 1937. Art. 15, inciso XXVI. Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao37.htm>. Acessado em: 23 jun. 2012. 38
BRASIL. Constituição dos Estados Unidos do Brasil de 1946. Art. 177. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao46.htm>. Acesso em: 24 jun. 2012.
28
expressa de prover a segurança interna e a manutenção da ordem, mas
permaneceram no rol de forças auxiliares, reservas do Exército39.
Após o chamado golpe militar de 1964, inaugurou-se o período da história
política brasileira que veio a ser denominado regime militar no qual ocorreu nova
ruptura do regime democrático, tida como uma revolução por alguns autores e
contrarrevolução por outros quando foi outorgada a Constituição de 1967. Nesta,
apesar de continuar a tripartição de poderes, executivo, legislativo e judiciário, houve
centralização dos poderes no chefe do executivo federal e a missão das Forças
Armadas permaneceu a de prover a defesa da pátria e a garantia dos poderes
constituídos, da lei e da ordem40.
A Constituição de 1967 foi alterada pelo Ato Complementar nº 40, de 1968 e
conforme redação dada as polícias militares continuaram na condição de
responsáveis pela manutenção da ordem e segurança interna nos Estados, nos
Territórios e no Distrito Federal e os bombeiros militares foram incluídos na condição
de forças auxiliares do Exército, sendo estabelecido que os respectivos integrantes
não poderiam perceber retribuição superior à fixada para o correspondente posto ou
graduação do Exército, ratificando desse modo a vinculação e militarização das
forças de segurança pública estaduais41.Do artigo 10 constou a previsão de
intervenção da União nos Estados para “por termo a grave perturbação da ordem ou
ameaça de sua irrupção”.42
A Emenda Constitucional nº 1 de 17 de outubro de 1969 pode ser
considerada como verdadeira manifestação de novo poder constituinte originário
outorgada pela Junta Militar e que ampliou os poderes do Presidente da República
para decretar recesso ao legislativo estadual e municipal e assumiras funções
destes poderes; intervir nos estados e municípios mesmo sem respeitar as
limitações constitucionais; suspender os direitos políticos de qualquer cidadão
brasileiro; cassar mandatos de deputados federais, estaduais e vereadores; dentre
39 BRASIL. Constituição dos Estados Unidos do Brasil de 1946. Art. 183. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao46.htm>. Acesso em: 24 jun. 2012. 40
BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil, 1967. Artigo 13, §4º com a redação dada pelo Ato Complementar nº 40, de 1968. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituiaçao67.htm>. Acesso em: 24 jun. 2012. 41
BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil, 1967. Artigos 92 a 94. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituiçao67.htm>. Acesso em: 24 jun. 2012. 42
BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil, 1967. Artigos 8º e 10. Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituiçao67.htm>. Acesso em: 24 jun. 2012.
29
outros, permitiu a suspensão do direito de habeas corpus nos casos de crime
político, crimes contra ordem econômica, segurança nacional e economia popular; e
impôs censura prévia para jornais, revistas, livros, peças de teatro e músicas. Nesse
contexto, as Forças Armadas figuraram como essenciais para execução da política da
segurança nacional e continuou a previsão de sua missão no campo da defesa da
pátria, da garantia dos poderes constituídos, da lei e da ordem. As policias militares
permaneceram com a responsabilidade de garantir a manutenção da ordem pública
nos Estados, nos Territórios e no Distrito Federal e continuaram, assim como e os
corpos de bombeiros militares, na condição de forças auxiliares, reserva do exército43.
A Emenda Constitucional nº 11, de 1978 ao conceder ao Presidente da
República poderes para determinar medidas coercitivas que tivessem por objetivo
preservar ou, prontamente, restabelecer a ordem pública, em tese autorizou o
emprego das Forças Armadas em tais situações, sem a necessidade da decretação
de estado de sítio ou de emergência. Entretanto, observa-se a necessidade da
existência de condições autorizativas das medidas, seus limites temporais e sua
excepcionalidade:
Art. 155 - O Presidente da república, para preservar ou, prontamente, restabelecer, em locais determinados e restritos a ordem pública ou a paz social, ameaçadas ou atingidas por calamidades ou graves perturbações que não justifiquem a decretação dos estados de sítio ou de emergência, poderá determinar medidas coercitivas autorizadas nos limites fixados por § 2º do artigo 156, desde que não excedam o prazo de 60 (sessenta) dias, podendo ser prorrogado uma vez e por igual período.(Redação dada pela Emenda Constitucional nº 11, de 1978)
44
Na Constituição atual, o constituinte de 1988 disciplinou a missão das
Forças Armadas no Capitulo II do Título V que trata “Da Defesa do Estado e Das
Instituições Democráticas” e especificamente no Artigo 142 definiu que as Forças
Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, são
instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia
e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República, e destinam-
se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de
43BRASIL. Emenda constitucional nº 1, de 17 de outubro de 1969. Artigo 13 §4ºe Artigo. 90.
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/Emendas/Emc_anterior1988/emc01-69.htm>. Acesso em: 24 jun. 2012. 44
BRASIL. Emenda constitucional nº 11, de19678. Artigo 1º, que modifica o Art.155 da EC nº 1. Disponívelem:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/Emendas/Emc_anterior1988/emc11-78.htm#art1>. Acesso em: 24 jun. 2012.
30
qualquer destes, da lei e da ordem”45. O próprio texto constitucional em seu
parágrafo primeiro remete à Lei Complementar o estabelecimento normas gerais a
serem adotadas na organização, no preparo e no emprego das Forças Armadas.
Nesse sentido restou publicada a Lei Complementar nº 97, de 09 de junho de 1999,
a qual veio a ser modificada pela Lei Complementar nº 117, de 02 de setembro de
2004, que disciplina o emprego das tropas federais, como medida excepcional, nas
operações de garantia dos poderes constitucionais, da lei e da ordem.
Ainda no campo constitucional, como inovação da Constituição chamada
cidadã, tornou possível a iniciativa de qualquer dos poderes para provocar o
emprego das Forças Armadas. Portanto, deixou de existir aquela centralização da
iniciativa apenas no Presidente da República como constava das constituições
imediatamente anteriores.
Dessa leitura podemos extrair que a missão primária das Forças Armadas é
a defesa da Pátria e a garantia dos poderes constitucionais. Entende-se que a
defesa da pátria compreende a proteção da soberania nacional, a proteção do
território brasileiro contra agressões estrangeiras, sejam elas efetivas ou potenciais.
A garantia dos poderes constitucionais compreende a defesa internadas instituições
democráticas, da federação, da república, dos poderes executivo, legislativo e
judiciário, garantindo o exercício de suas atribuições legais de modo independente e
harmônico, livres de quaisquer pressões.
A atuação na garantia da lei é da ordem, tem natureza secundária,
excepcional, dependente de justificativas e iniciativas. Segundo José Afonso da Silva
(1992):
Só subsidiariamente e eventualmente lhes incumbe a defesa da lei e da ordem, porque essa defesa é de competência primária das forças de segurança pública, que compreendem a polícia federal e as policias civis e militar dos Estados e do Distrito Federal. Sua interferência na defesa da lei e da ordem depende, além do mais, de convocação dos legitimados representantes de qualquer dos poderes federais: Presidente da Mesa do Congresso Nacional, Presidente da República ou Presidente do Supremo Tribunal Federal. Ministro não é poder constitucional. Juiz de Direito não é poder constitucional. São simples membros dos poderes e não os representam. Portanto, a atuação das Forças Armadas convocada por Juiz de direito ou por Juiz Federal, ou mesmo por algum Ministro do Superior
45 BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil, 1988, Artigo 142, com redação da pela
emenda Constitucional nº 18 de 1998. Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constitui%C3%A7ao.htm>. Acesso em: 21 jun. 2012.
31
Tribunal de Justiça ou até mesmo do Ministro do Supremo Tribunal Federal, é inconstitucional e arbitrária, porque esta autoridade por mais importante que seja, não representa qualquer dos poderes constitucionais federais.
46
Conclui-se que o legislador constituinte, atribuiu ao Presidente da República
a responsabilidade do emprego das Forças Armadas na garantia da lei e da ordem
e a concebeu apenas em situações ímpares, nas quais restem evidenciadas
ausência, a incapacidade ou a insuficiência operativa dos órgãos de segurança
pública no restabelecimento da ordem.
46 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 8ª Ed. Malheiros. São Paulo. 1992.
32
6 NOVA MISSÃO DAS FORÇAS ARMADAS PÓS-GUERRA FRIA
Segundo Maria Helena de Castro Santos (2004)47desde o fim da Segunda
Guerra Mundial, o papel das Forças Armadas na América Latina tem sido definido
pela grande potência ocidental e seu bloco militar aliado, a OTAN. Nessa
concepção, durante a Guerra Fria, cabia aos países latino-americanos a
incumbência de lutar contra o comunismo dentro de suas fronteiras, enquanto os
Estados Unidos defenderiam o hemisfério ocidental contra possíveis agressões
externas do bloco soviético.
Na visão da autora, com o ocaso da Guerra Fria viu-se que a hipótese de
guerra global ou de guerra subversiva interna não era mais plausível e a
probabilidade de conflito seria regional. Entretanto, na América Latina, esse tipo de
guerra apresenta baixa probabilidade de acontecer e especialmente com o Brasil,
que esteve envolvido em conflito armado com país vizinho há mais de cem anos,
essa hipótese se aproxima do zero.
Sustenta ainda que em face do desaparecimento do perigo comunista,
houve redefinição da ordem internacional, globalização e intensificação dos
variados processos de integração transnacional que traduziram mudanças nos
conceitos de segurança e defesa, nos âmbitos internacional, regional e nacional.
Na mesma direção aponta Adriana Marques (2003)48ao sustentar que no
começo dos anos 1990 os militares brasileiros foram privados de velhos inimigos,
passando a figurar como novas ameaças o narcotráfico, terrorismo, crime
organizado transnacional, tráfico de armas, devastação ambiental, corridas
armamentistas regionais, conflitos étnicos, correntes migratórias internacionais,
desrespeito aos direitos humanos e proliferação de armas nucleares, químicas e
biológicas de destruição em massa. Considera que à partir destas inquietações,
buscam-se novas formas de pensar o papel das Forças Armadas na sociedade
brasileira e sua funcionalidade no combate às modernas ameaças:
Os militares brasileiros foram privados de dois velhos inimigos no começo dos anos 1990. Por um lado, com o fim da União Soviética em 1992, o comunismo não poderia mais ser apontado como ameaça à “segurança
47SANTOS Maria Helena de Castro. Artigo: A nova missão das forças armadas latino-americanas no mundo pós-
guerra fria: o caso do Brasil. 2004. Disponível em:<http://www.scielo.br/pdf/rbcsoc/v19n54/a07v1954.pdf>.
Acesso em: 11/08/2012.
48 MARQUES Adriana. A. Concepções estratégicas brasileira no contexto internacional. Do pós-Guerra Fria.
Revista Sociologia e Polícia. Curitiba, nº 20; junho 2003. Disponível em:
<http://www.scielo.br/pdf/rsocp/n20/n20a7.pdf>. Acesso em: 13/08/2012.
33
nacional”, o que veio a decretar a total obsolescência dos fundamentos estratégicos da Doutrina de Segurança Nacional como parâmetro para a organização da defesa nacional. Por outro, o processo de aproximação com a Argentina eliminava a possibilidade de um conflito armado entre os dois países que havia condicionado a concentração das unidades militares brasileiras nas fronteiras Sul-Sudeste do país. Além disso, os temas considerados – pelas potências ocidentais – como novas ameaças à segurança internacional após o fim da União Soviética – narcotráfico, terrorismo, crime organizado transnacional, tráfico de armas, devastação ambiental, corridas armamentistas regionais, conflitos étnicos, correntes migratórias internacionais, desrespeito aos direitos humanos e proliferação de armas nucleares, químicas e biológicas de destruição em massa – consolidavam a substituição do conflito Leste-Oeste pelas tensões Norte-Sul. (MARQUES, 2003)
O pensar de Graciela de Conti Pagliai (2006)49 converge igualmente para o
mesmo ponto ao apontar diferenciação da motivação da formação dos mecanismos
de segurança nos anos 40 em relação aos temas atuais:
As demandas atuais não são as mesmas que motivaram a formação dos mecanismos de segurança nos anos 40. Questões como combate ao narcotráfico, ao crime organizado e ao tráfico ilícito de armas despontam atualmente na agenda, especialmente ao se considerar uma política entre o Brasil e os países andinos. Esses problemas, além de afetar a segurança nacional, produzem reflexos para a segurança humana e pública. Muito mais do que a necessidade de ação militar são questões que precisam ser combatidas com políticas públicas de erradicação das desigualdades sociais, que geram um quadro de pobreza extrema e que permitem a propagação de crimes conexos como a corrupção e lavagem de dinheiro. (PAGLIAI, 2006)
Concordamos que na atualidade, diferentemente do que ocorria no passado,
há discussão de assuntos de defesa envolvendo as questões antes relegadas ao
trato apenas da área de segurança pública, tais como o avanço da criminalidade, a
atuação de organizações criminosas, o narcotráfico, o tráfico de seres humanos, o
contrabando de armas e munições, os delitos ambientais, os conflitos éticos, o
respeito aos direitos humanos dentre outros, inclusive a preocupação com as ditas
ações de não guerra. Porém, debitamos essa mudança de foco não à definição
imposta por qualquer agente externo, mas, exclusivamente à evolução autônoma do
pensar da sociedade na identificação das ameaças presentes e na busca de modos
eficientes para sua superação.
49PAGLIAI, Graciela de Conti. Artigo. Segurança hemisférica: uma discussão sobre a validade e atualidade de
seus mecanismos institucionais. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/rbpi/v49n1/a02v49n1.pdf.> Acesso
em: 13/08/2012.
34
7 FORÇAS ARMADAS NA SEGURANÇA PÚBLICA
Conforme vimos anteriormente a atuação das Forças Armadas na segurança
pública é pautada no artigo 142 da Constituição Federal e a regra estabelecida pelo
artigo 34 do mesmo Diploma é a não intervenção. Entretanto, vimos também que
constitucionalmente, para garantia da lei e da ordem, apenas em situações
incomuns nas quais restem evidenciadas a ausência, a incapacidade ou a
insuficiência operativa dos órgãos de segurança pública é que poderá ocorrer a
intervenção com o emprego das Forças Armadas.
Vimos ainda que o próprio texto constitucional remeteu à Lei Complementar
o estabelecimento de normas gerais a serem adotadas na organização, no preparo e
no emprego das Forças Armadas.
As normas gerais relativas ao emprego das Forças Armadas na preservação
da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, foram
estabelecidas pela Lei Complementar nº 69, de 23 de julho de 1991, a qual
posteriormente foi revogada na totalidade, pela Lei Complementar nº 97 de 09 de
junho de 1999, mas, esta primeira já estabelecia que somente após esgotados os
instrumentos relacionados no art. 144 da Constituição Federal é que ocorreria a
atuação das Forças Armadas, por decisão e responsabilidade do Presidente da
República. Seja por iniciativa própria ou em atendimento a pedido manifestado por
qualquer dos poderes constitucionais, através do Presidente do Supremo Tribunal
Federal ou do Presidente do Senado Federal ou do Presidente da Câmara dos
Deputados, nos âmbito de suas respectivas áreas50.
A Lei Complementar nº 97 de 09 de junho de 1999 revogou a anterior e
definiu novas atribuições subsidiárias a serem cumpridas pelas Forças Armadas,
sem comprometimento de sua destinação constitucional.
Art. 1º As Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem.
50 BRASIL. Lei Complementar nº 69/1991. Dispõe sobre as normas gerais para a organização, o preparo e o
emprego das Forças Armadas. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/lcp69.htm.>
Acesso em: 15/08/2012.
35
Parágrafo único. Sem comprometimento de sua destinação constitucional, cabe também às Forças Armadas o cumprimento das atribuições subsidiárias explicitadas nesta Lei Complementar.
De modo geral o emprego das Forças Armadas foi disciplinado pelo artigo 15
da Lei Complementar nº 97 de 1999, sendo estabelecido em seu § 2º que por ato do
Presidente da República seriam baixadas diretrizes de atuação das Forças Armadas
na garantia da lei e da ordem.
Os paradigmas delimitadores dessa atuação foram estabelecidos pelo
Decreto nº 3.897, de 24 de agosto de 2001 que em seu artigo 3º concedeu às
Forças Armadas, quando em operações de garantia da lei e da ordem, o mesmo
poder de polícia constitucionalmente e legalmente concedido às policiais militares
para desenvolver ações de sua competência, ou seja, poder para atuação como
polícia ostensiva, preventiva ou repressiva:
Art. 3º Na hipótese de emprego das Forças Armadas para a garantia da lei e da ordem, objetivando a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, porque esgotados os instrumentos a isso previstos no art. 144 da Constituição, lhes incumbirá, sempre que se faça necessário, desenvolver as ações de polícia ostensiva, como as demais, de natureza preventiva ou repressiva, que se incluem na competência, constitucional e legal, das Polícias Militares, observados os termos e limites impostos, a estas últimas, pelo ordenamento jurídico. Parágrafo único. Consideram-se esgotados os meios previstos no art. 144 da Constituição, inclusive no que concerne às Polícias Militares, quando, em determinado momento, indisponíveis, inexistentes, ou insuficientes ao desempenho regular de sua missão constitucional.
Interessante observar que dentre os lastros apresentados para emissão do
Decreto nº 3.897, de 24 de agosto de 2001, figurou o Parecer Advocacia Geral da
União nº GM-025, de 10 de agosto de 2001 que aprovou o Parecer nº
AGU/TH/02/2001, de 29 de julho de 2001. A leitura deste traduz que tal documento
foi elaborado em caráter de urgência para atender situação cujo emprego das
Forças Armadas já era uma realidade em curso, mesmo sem a decretação de
intervenção, estado de sítio ou de emergência. Vejamos:
Em cumprimento a determinação verbal de Vossa Excelência, submeto-lhe - com a urgência recomendada - o presente trabalho, a ter por objeto a atuação, emergencial, temporária, das Forças Armadas, na garantia da lei e da ordem pública. .... E, no mundo dos fatos, as recentes atuações das Forças Armadas em Estados nos quais o efetivo de suas Polícias Militares então em atividade se
36
evidenciou insuficiente à garantia da ordem pública, à preservação da ordem pública, circunstância que levou seus Governadores a solicitar o auxílio de tropas federais. Tropas federais que, por óbvio, ali foram para preservar a ordem pública (prevenindo sua violação, e restaurando-a, se for o caso), a incolumidade das pessoas e a do patrimônio (público, e privado). Tropas federais que, decerto, se destinaram a - emergencial e temporariamente - desempenhar as atividades constitucionalmente conferidas às polícias militares, como se policiais militares fossem os seus integrantes. Do contrário, bem pouco prestante seria sua solicitada presença; até porque, vale se repita, as demais polícias elencadas no art. 144 da Carta têm competências específicas e que não se confundem com a deferida às Polícias Militares, sendo-lhes, pois, defeso desenvolver as ações a estas previstas. (LIMA, 2001)
51
A situação emergencial também é identificada pelas manchetes dos
noticiários da época tais como do Jornal Folha de São Paulo com a matéria
publicada no dia 27/07/2001 sob o título “FHC diz que não hesitará em usar Exército
durante greves”.52Estavam em curso greves das policiais estaduais em diversos
Estados traduzindo situação incomum e evidenciando ausência, incapacidade ou
insuficiência operativa dos órgãos de segurança pública, situação que, em tese,
autorizava a intervenção federal com o emprego das Forças Armadas.
A doutrina diverge quanto a regularidade do emprego das Forças Armadas
nas questões de segurança interna sem que ocorra a decretação de intervenção
federal. O assunto comporta divergentes correntes de pensamento jurídico.
De um lado temos os que entendem que o emprego das Forças Armadas
nos Estados-membros somente pode ocorrer no contexto de uma intervenção
federal, do estado de defesa ou do estado de sítio, ou seja, estritamente nas
hipóteses estabelecidas na constituição. Sustentam ainda que as Forças Armadas
só podem ser convocadas em circunstâncias extremas, não se admitindo sua
utilização no combate de caráter permanente da violência urbana. Nessa linha
apontamos o professor José Afonso da Silva, citado em linhas anteriores, quando da
abordagem da missão constitucional das Forças Armadas (item 3.4):
A Constituição vigente abre as Forças Armadas (...) de tal sorte que sua missão essencial é a defesa da Pátria e a garantia dos poderes constitucionais, o que vale dizer, por um lado, defesa das instituições democráticas, pois a isso corresponde a garantia dos poderes
51 LIMA, Thereza Helena S. de Miranda. Parecer nº AGU/TH/02/2001, de 29/07/2001. Disponível em:
<http://www.agu.gov.br/sistemas/site/PaginasInternas/NormasInternas/AtoDetalhado.aspx?idAto=8417>. Acesso
em: 14/08/2012. 52
PARAGUASSU, Lisandra e LIMA Sandro. Matéria Jornalística. FHC diz que não hesitará em usar Exército
durante greves. Jornal Folha de São Paulo. Disponível em:
<http://www1.folha.uol.com.br/folha/cotidiano/ult95u33788.shtml>. Acesso em: 14/08/2012.
37
constitucionais, que, nos termos da Constituição, emanam do povo (art. 1º, parágrafo único). Só subsidiariamente e eventualmente lhes incumbe a defesa da lei e da ordem, porque essa defesa é de competência primária das forças de segurança pública, que compreendem a polícia federal e as polícias civil e militar dos Estados e do Distrito Federal.
53
Para outros, até as competências subsidiárias criadas pela Lei
Complementar nº 97 de 1999 são questionáveis, uma vez que o artigo 142, § 1º da
Constituição Federal de 1988, dispõe “Lei Complementar estabelecerá as normas
gerais a serem adotadas na organização, no preparo e no emprego das Forças
Armadas”, e, como se vê, não se referiu à criação de atribuições outras. Portanto,
teriam elas nascido com vício da inconstitucionalidade. Nessa ótica o preceito legal
em comento seria arbitrário, uma vez que sua criação só poderia se dar por
Emenda Constitucional.
Também há os que afirmam a flagrante inconstitucionalidade do Decreto nº
3.897, de 24 de agosto de 2001. Assim diz João Rodrigues Arruda (2007):
Como se constituinte fosse, o presidente da República conferiu poder às Forças Armadas, “sempre que se faça necessário, desenvolver as ações de polícia(...) que se incluem na competência (...) das Polícias Militares”. ... A inconstitucionalidade é flagrante. No mais, o decreto passeia pelo óbvio, repetindo os termos da Constituição e da Lei Complementar. Semeia mais dúvidas do que certezas. Chega a deixar dependente da anuência do governador do Estado o emprego da Polícia Militar, sob o controle operacional do comando militar federal.(ARRUDA, 2007)
54
Entretanto, de outro lado, temos os que adotam por fundamento o princípio
da máxima eficiência da norma constitucional e entendem que o poder de polícia é
inerente a existência do Estado e está subentendido ou implícito na missão
constitucional das Forças Armadas.
Nessa linha encontramos Augusto César Martins de Oliveira (2010):
A Constituição Federal de 1988 incumbe às Forças Armadas em seu Art. 142, à defesa da pátria e à garantia dos poderes constitucionais como missões essenciais, sendo facultado o seu emprego para garantir a lei e a ordem interna do País. A decisão por este emprego caberá ao presidente da República, por sua própria iniciativa ou (...) essa determinação dependerá, principalmente, da personalidade da autoridade responsável pela decisão, que poderá ser influenciada pelo momento político vivido e pela pressão da mídia sobre a opinião pública.
53 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 8 ed. Malheiros. São Paulo. 1992
54 ARRUDA, João Rodrigues. O uso político das forças armadas e outras questões militares. Mauad. Rio de
Janeiro: 2007.
38
O Decreto-Lei nº 3.897, de 24 de agosto de 2001, no seu artigo 2° caput, sanou qualquer dúvida, quando prescreveu que é de competência exclusiva do presidente da República a decisão de emprego das Forças Armadas na garantia da lei e da ordem, atendendo o pedido dos governadores... (OLIVEIRA, 2010)
55
Para BARROSO(2007)56, as possibilidades de intervenções pontuais das
Forças Armadas no interesse e a pedido do próprio estado ou mesmo interesse
específico da União, diferem significativamente das intervenções efetivadas em
situações que compreendem a preservação do equilíbrio federativo ou à defesa da
ordem democrática: intervenção federal, Estado de defesa e Estado de sítio.
Classifica como ilusória e equivocada a ideia de que os entes federativos
possam desenvolver suas competências de modo estanque, sem contato uns com
os outros, diz que basta considerar a realidade dos entes federativos existirem sobre
um mesmo território. O ente central não dispõe de um território diverso daquele dos
Estados-membros, de modo que o desenvolvimento de suas competências dar-se-á,
necessariamente, no mesmo espaço físico comum.
Argumenta que essa situação de dependência caracteriza o federalismo
brasileiro como cooperativo e neste, o relacionamento entre os entes é
indispensável e a distribuição de competências ocorreu em conformidade com o
princípio da predominância do interesse. Assim, compete a União tratar de questões
de interesse nacional e aos Estados as matérias de interesse regional.
No que se refere à segurança pública, observa que a distribuição de
competência ocorreu segundo o interesse. Por exemplo, compete à União realizar o
policiamento ostensivo nas rodovias e ferrovias federais que cruzam diversos
estados, assim como lhe compete apurar as ocorrências de delitos que geram
repercussão interestadual ou internacional. É competência dos Estados cuidarem do
policiamento ostensivo nas cidades, nas rodovias e ferrovias estaduais, bem como a
apuração de transgressões cujas repercussões em tese são restritas às suas
fronteiras. Porém, na visão do autor, essa distribuição de competências e atribuições
não impedem a ações da União em assuntos de segurança nos quais haja
predominância do interesse nacional, cita como exemplo, a segurança em eventos
55 OLIVEIRA, Augusto Cesar Martins de. Artigo. O amparo legal do emprego das forças armadas na segurança
pública. Artigo 28/11/2010. Agora Jornal do Sul. Disponível em:
<http://www.jornalagora.com.br/site/content/noticias/detalhe.php?e=5&n=4376>. Acesso em: 15/08/2012.
56 BARROSO, Luís Roberto. Parecer nº 02/2007. Forças Armadas e Ações de Segurança Pública: Possibilidade
e limites à Luz da Constituição. 2007. Revista de Direito - Volume 62 - Pareceres - Pág.360 a 382. Disponível
em: <http://www.rj.gov.br/web/pge/exibeConteudo?article-id=749530>. Acesso em: 16/08/2012.
39
oficiais nos quais estejam presentes representantes de outras nações. Sustenta
também a possibilidade de realização de acordos, convênios, entre o Governo
Estadual e o Governo Federal demonstrando o mecanismo federativo cooperativo
acolhido pela Constituição Federal de 1988:
Art. 241. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios disciplinarão por meio de lei os consórcios públicos e os convênios de cooperação entre os entes federados, autorizando a gestão associada de serviços públicos, bem como a transferência total ou parcial de encargos, serviços, pessoal e bens essenciais à continuidade dos serviços transferidos.(Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
Apesar dos questionamentos, a Lei Complementar nº 97/99 continua a
figurar como principal fonte do poder de polícia das Forças Armadas na atuação da
garantia da lei e da ordem e o referido dispositivo legal, ao longo do tempo, foi
alterado pelas leis complementares nºs 117 de 2004 e 136 de 2010.
A primeira alteração efetivada pela Lei Complementar nº 117 de 2004 por
intermédio da inclusão do artigo 17-A, concedeu poder de polícia ao Exército
Brasileiro para atuar por meio de ações preventivas e repressivas, na faixa de
fronteira terrestre, contra delitos transfronteiriços e ambientais, isoladamente ou em
coordenação com outros órgãos do Poder Executivo.
Art. 17A. Cabe ao Exército, além de outras ações pertinentes, como atribuições subsidiárias particulares: (Incluído pela Lei Complementar nº 117, de 2004) ... IV – atuar, por meio de ações preventivas e repressivas, na faixa de fronteira terrestre, contra delitos transfronteiriços e ambientais, isoladamente ou em coordenação com outros órgãos do Poder Executivo, executando, dentre outras, as ações de: (Incluído pela Lei Complementar nº 117, de 2004)(Revogado pela Lei Complementar nº 136, de 2010). a) patrulhamento; (Incluído pela Lei Complementar nº 117, de 2004) b) revista de pessoas, de veículos terrestres, de embarcações e de aeronaves; e (Incluído pela Lei Complementar nº 117, de 2004) c) prisões em flagrante delito. (Incluído pela Lei Complementar nº 117, de 2004)
A segunda alteração efetivada pela Lei Complementar nº 136 de 2010,
revogou o inciso IV do artigo 17-A e por intermédio da inclusão do artigo 16-A,
ampliou as atribuições subsidiárias das Forças Armadas e estendeu o poder de
polícia a Marinha do Brasil e a Força Aérea. Assim podendo atuar, preservadas as
competências exclusivas das polícias judiciárias, por meio de ações preventivas e
repressivas, na faixa de fronteira terrestre, no mar e nas águas interiores,
independentemente da posse, da propriedade, da finalidade ou de qualquer
40
gravame que sobre ela recaia, contra delitos transfronteiriços e ambientais.
Isoladamente ou em coordenação com outros órgãos do Poder Executivo.
Art. 16-A. Cabe às Forças Armadas, além de outras ações pertinentes, também como atribuições subsidiárias, preservadas as competências exclusivas das polícias judiciárias, atuar, por meio de ações preventivas e repressivas, na faixa de fronteira terrestre, no mar e nas águas interiores, independentemente da posse, da propriedade, da finalidade ou de qualquer gravame que sobre ela recaia, contra delitos transfronteiriços e ambientais, isoladamente ou em coordenação com outros órgãos do Poder Executivo, executando, dentre outras, as ações de: (Incluído pela Lei Complementar nº 136, de 2010). I - patrulhamento; (Incluído pela Lei Complementar nº 136, de 2010). II - revista de pessoas, de veículos terrestres, de embarcações e de aeronaves; e (Incluído pela Lei Complementar nº 136, de 2010). III - prisões em flagrante delito. (Incluído pela Lei Complementar nº 136, de 2010).
41
8 DA INSUFICIÊNCIA DO COMBATE À CRIMINALIDADEE O USO POLÍTICO DAS FORÇAS ARMADAS
A redação atual do Artigo 15, §§ 2º e 3 º da Lei Complementar nº 97/99, que
dispõe sobre as normas gerais para a organização, o preparo e o emprego das
Forças Armadas, figura como hipótese do emprego das Forças Armadas nas ações
de segurança pública para garantia da lei e da ordem, por iniciativa de quaisquer
dos poderes constitucionais e sem a necessidade de decretação de medidas de
exceção constitucional.
Esse dispositivo legal, em seu parágrafo 2º, estabelece a possibilidade de
atuação das Forças Armadas na hipótese do esgotamento dos instrumentos
destinados à preservação da ordem pública, previstos no artigo 144 da Constituição
Federal. Segue-se o parágrafo 3º que define quando se consideram esgotados tais
instrumentos, dispondo que assim se consideram quando o chefe do executivo
formalmente os reconhecer como indisponíveis, inexistentes ou insuficientes ao
desempenho regular de sua missão constitucional:
§ 2o A atuação das Forças Armadas, na garantia da lei e da ordem, por iniciativa de quaisquer dos poderes constitucionais, ocorrerá de acordo com as diretrizes baixadas em ato do Presidente da República, após esgotados os instrumentos destinados à preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, relacionados no art. 144 da Constituição Federal. § 3o Consideram-se esgotados os instrumentos relacionados no art. 144 da Constituição Federal quando, em determinado momento, forem eles formalmente reconhecidos pelo respectivo Chefe do Poder Executivo Federal ou Estadual como indisponíveis, inexistentes ou insuficientes ao desempenho regular de sua missão constitucional. (Incluído pela Lei Complementar nº 117, de 2004)
O termo insuficiente permite concluir que mesmo existindo, estando
disponíveis e ativas as forças de segurança pública estadual, mesmo antes de seu
efetivo esgotamento, em tese, basta ao chefe do executivo reconhecer formalmente
a incompletude do combate à criminalidade realizado pelos órgãos de sua
segurança estadual para satisfazer as condições de emprego das Forças Armadas.
Pleitear e assim obter o emprego das Forças Armadas, se houver o convencimento
e a decisão do Chefe do Executivo Federal.
Ora, essa situação, a nosso ver, coloca as Forças Armadas na condição de
forças complementares, auxiliares das forças de segurança públicas estaduais e
quebra aquele viés de recurso derradeiro e extremo, que deveria ser buscado e
42
empregado apenas em situações últimas, anômalas e realmente excepcionais.
Nessa ótica, resta clara a possibilidade do uso político de uma medida
constitucional, que foi prevista orginalmente para aplicação em situações de real
exceção.
A responsabilidade pela segurança pública é dos Estados-membros.
Portanto, cabe ao chefe do executivo estadual viabilizar a implantação de políticas
públicas eficientes, dotar os organismos policiais de condições que lhes permitam
assumir a responsabilidade da ordem pública e da aplicação da lei com eficácia.
Entretanto, nos últimos anos o que tem se observado é a banalização do emprego
das Forças Armadas para enfrentar problemas policiais.
Nesse sentido encontramos a manifestação de ARRUDA (2007):
O chefe do executivo estadual não consegue administrar com eficiência a polícia de sua responsabilidade e a solução que encontra, é a solução política. Busca a decisão pelo emprego das Forças Armadas: “diante de qualquer agravamento nesse campo, as Forças Armadas são lembradas como curinga num jogo de cartas.”
A segurança pública é um serviço que deve ser provido com qualidade pelo
Estado tendo como destinatário o particular, assim como a comunidade.
Considerando que a constituição também estabeleceu a segurança é
responsabilidade de todos, nessa prestação de serviço o Estado deve buscar o
envolvimento e participação interativa da sociedade visando atingir o equilíbrio e a
harmonia desejada em benefício da coletividade. Nesse viés as ações de segurança
pública não se resumem e não se confundem com o mero emprego do poder militar
através de intervenções bruscas e aplicações de técnicas de choque e guerra,
medidas típicas da formação e treinamento de soldados vocacionados para a defesa
externa.
As Forças Armadas sempre exerceram papel relevante para o país, inclusive
como instrumentos de projeção da política externa brasileira ao lado da diplomacia.
Empenhá-las no enfrentamento de um “inimigo interno” ao invés de prover de
meios eficazes os órgãos constitucionalmente previstos para tanto, por certo as tira
de foco e as desvia de sua finalidade, disso resultando o enfraquecimento do próprio
Estado (ROCHA, 2007).
Assim, entendemos que a banalização do uso das Forças Armadas
mediante o emprego, em situações não excepcionais, na realização de ações típicas
da atividade policial, além de caracterizar um desvirtuamento de sua missão
43
principal, reforça a mentalidade de uma segurança pública de combate a um inimigo
e distancia-se das concepções do que deveria ser entendido como um serviço
estatal de qualidade e que precisa, conforme já dito anteriormente, manter-se em
sintonia e interação com a sociedade.
44
9 DA FAIXA DE FRONTEIRA TERRESTRE BRASILEIRA
A Constituição de 1988 em seu artigo 20, parágrafo 2º, define como faixa de
fronteira a área de até cento e cinquenta quilômetros de largura, ao longo das
fronteiras terrestres de nosso país, bem como estabelece que essa faixa territorial é
considerada fundamental para defesa do território nacional e sua ocupação e
utilização serão reguladas em lei. O legislador constituinte apontou sua importância
e a nosso ver, com muito acerto, a tratou de modo diferenciado, classificando-a
como essencial a defesa da pátria.
O Brasil é o maior pais da América do Sul e seu território se estende por
cerca de 47% da porção centro-oriental do continente. A leste é banhado pelo
oceano Atlântico. Só as fronteiras terrestres representam cerca de 68% de toda
extensão dos limites territoriais brasileiros e divisam com 10 países do continente,
totalizando 16.886Km de fronteiras distribuídas em 11 estados da federação e 710
municípios, destes 122 são limítrofes a países vizinhos, restando 588 não
limítrofes57.
As definições de nossas fronteiras, em geral, guardam as características
naturais da paisagem, como rios, lagos, montanhas, serras e picos elevados.Com
exceção do Chile e do Equador, os demais países da América do Sul fazem
fronteira com o Brasil: ao norte divisamos com Suriname, Guiana, Venezuela e ao
território Francês, a Guiana Francesa; a noroeste, divisamos com a Colômbia; a
oeste com o Peru e Bolívia; ao sudoeste, com o Paraguai e Argentina e ao sul com
o Uruguai. A conjugação da extensão da linha de fronteira com a faixa de fronteira
de 150Km, delimita uma área de cerca de dois milhões de quilômetros quadrados.
Essa imensa faixa territorial, constitucionalmente classificada como de
interesse à defesa da pátria, na atualidade, principalmente na região amazônica, é
caracterizada pela ausência do Estado. O general Jeannot Jansen Filho, do
comando da 8ª Região Militar do Exército do Brasileiro, em matéria jornalística que
tivera como título: “A ausência do Estado na região fronteiriça favorece crimes”
(2008), apontou os principais desafios enfrentados na região amazônica e a
classificou como áreas que não estão ocupadas pelos órgãos competentes do Brasil,
57Infografia Gazeta do Povo. Disponível em:
http://www.portalsaodomingos.com.br/admin/plugins/gerenciador/files/sem_protecao_240712.jpg. Acesso em
19/08/12.
45
referindo-se aos quase 1.220 quilômetros ao norte do estado do Pará, na fronteira
com a Guiana e o Suriname:
[...] assim se refere o comandante da 8ª Região Militar, general Jeannot Jansen Filho, aos quase 1.220 quilômetros ao norte do estado do Pará, na fronteira com a Guiana e o Suriname. Segundo o general, a ausência do Estado na região tem favorecido, “de forma inegável”, a prática de crimes como o tráfico de minério, de pessoas, armas e drogas, entre outras atividades ilícitas. “Essas áreas são o que chamamos de um espaço não-ocupado pelos órgãos competentes do Brasil” [...]
58
A mesma autoridade relatou que 279 soldados guardavam as três unidades
militares responsáveis pela vigilância de toda a fronteira norte da Amazônia Oriental
e que se estende do Amapá ao norte do Pará. Em outro trecho, comentou que o
contingente integral do Exército na Amazônia Oriental é de cerca de 11 mil homens e
que não basta enviar mais soldados se não houver recursos para mantê-los.
Sustentou que faltam equipamentos, tais como embarcações, motores de popa,
helicópteros e material de comunicação para realização da tarefa de vigiar a fronteira
e ao término confirma que a solução dos problemas de vigilância na fronteira não é
simples.
A mesma dificuldade é reportada pelo general Augusto Heleno Pereira,
quando comandante Militar da Amazônia (2009):
A ausência do Estado é flagrante, principalmente nas áreas de fronteira da Amazônia. “O que já foi percebido não só por mim, mas por todos os que visitam a Amazônia, é a ausência flagrante do Estado brasileiro, principalmente nas áreas de fronteira, onde muitas vezes a única presença física efetiva é do Exército”, afirmou. Em um balanço do trabalho na região nos últimos dois anos, o general salientou que a região sempre foi cobiçada por sua riqueza natural. “Conseguimos avanços fundamentais para que a Amazônia não seja vista como um país amigo. A Amazônia é Brasil e precisamos ter isso na cabeça. Não restam dúvidas de que a Amazônia é cobiçada”, disse: “Seria ingênuo pensar que só os brasileiros pensaram em aproveitar os recursos naturais da região. Acho que temos o direito e o dever de aproveitar esses recursos em prol do povo brasileiro, dentro da política de desenvolvimento sustentável”, acrescentou o general.
59
Pelas amostras ofertadas nas manifestações reproduzidas percebe-se que
de fato a faixa de fronteira terrestre possui características peculiares e de difícil
fiscalização conforme restou caracterizado em relação as áreas da região
58RODRIGUES, Alex. Agencia Brasil. Matéria. Ausência do Estado em região fronteiriça favorece crimes.
Disponível em: <http://agenciabrasil.ebc.com.br/noticia/2008-04-19/ausencia-do-estado-em-regiao-fronteirica-
favorece-crimes-diz-general>. Acesso em: ago.2012. 59
RIZZOLOT. Matéria Jornalística. General Heleno alerta para “flagrante” ausência do Estado nas fronteiras.
Disponível em: <http://rizzolot.wordpress.com/2009/04/02/general-heleno-alerta-para-“flagrante”-ausencia-do-
estado-nas-fronteiras/>. Acesso em: ago.2012.
46
amazônica.
De outro lado, há de se considerar que cada Estado-membro detentor de
áreas territoriais inclusas na faixa de fronteira, define suas políticas e ações de
segurança pública, assim como em outros campos de sua competência, levando em
conta os interesses locais e estes nem sempre guardam harmonia com os
interesses da União. Certo é que coexistem em relação a um mesmo espaço físico,
as demandas dos Estados-membros no interesse da segurança pública e as
necessidades da União, com vistas à garantia da defesa da pátria.
Na lição de Garcia (2009) a defesa da pátria compreende atividades de
caráter dissuasório e de combate que objetivam preservar, principalmente, a
integridade territorial, a soberania e sua independência. A atuação das Forças
Armadas na garantia das fronteiras e na repressão ao inimigo externo “são
atribuições que emergem de sua própria razão de existir”.60
As áreas de fronteira terrestre brasileira contam com uma malha rodoviária
de aproximadamente 23.415Km em regiões permeadas de vulnerabilidades que
inviabilizam eficácia de fiscalização tradicional. Mostram-se potencialmente porosa
a todo o tipo de ameaça inclusive externa, dentre elas infiltração criminosa,
contrabandistas, traficantes de armas, drogas e pessoas e até mesmo guerrilheiros
oriundos de países vizinhos instáveis e que podem adentrar o território nacional na
busca de refúgio ou mesmo formação de base de atuação.
Nesse cenário resta sobejamente evidenciada não apenas a insuficiência,
indisponibilidade ou a inexistência dos instrumentos relacionados no art. 144 da
Constituição Federal, mas também a predominância do interesse da União com vista
à questão permanente de Defesa Nacional, situação que recomenda atuação
diferenciada das Forças Armadas, inclusive nas questões típicas de segurança
pública, em conjunto ou isoladamente.
60GARCIA, Emerson. Artigo. As forças armadas e a garantia da lei e da ordem. Revista Brasileira de Direito
Constitucional – RBDC nº 13 – jan/jun. 2000.
47
10 DO PRINCIPIO DA EFICIÊNCIA E O EMPREGO DAS FORÇAS ARMADASCOM PODER DE POLÍCIA NO CONTEXTO DO SISFRON
10.1 PRINCÍPIO DA EFICIÊNCIA
Toda a Administração Pública, não importando se direta, indireta, federal,
estadual ou municipal, deve obediência aos princípios estabelecidos no artigo 37 da
Constituição Federal de 1988: legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e
eficiência. Este último foi introduzido recentemente pela Emenda Constitucional nº
19, de 04 de Junho de 1998 e tem o condão de impor a todo administrador público o
dever de buscar a melhor maneira de aplicar os recursos administrativos disponíveis
de modo a atender melhor as necessidades da sociedade e ao menor custo.
Segundo Freitas (2004) é o princípio que o obriga todo administrador
público a trabalhar tendo como parâmetro a busca da melhor atuação.61Nas palavras
do professor Hely Lopes Meirelles(1999)o principio da eficiência é aquele que impõe
ao agente público o dever de realizar suas atribuições com presteza, perfeição e
rendimento funcional.62
No decorrer do estudo explicitamos que os órgãos policiais que possuem
atribuições específicas conforme disposto no artigo 144 da Constituição Federal e
que podem ter missões convergentes na faixa de fronteira são: Polícia Federal,
Polícia Rodoviária Federal, Polícia Ferroviária Federal, Polícia Militar e a Polícia
Civil.
Em parágrafo anterior deixamos caracterizada a atuação da Polícia Federal
nas funções de polícia judiciária da União e abordamos a inexistência de uma polícia
federal ostensiva e especialmente destinada ao exercício, em âmbito nacional, do
policiamento preventivo nos moldes das polícias militares dos Estados-membros.
Ressaltamos as respectivas missões dos demais órgãos: Polícia Rodoviária
Federal no patrulhamento ostensivo das rodovias federais; Polícia Civil no exercício
da Polícia Judiciária Estadual; e à Polícia Militar no patrulhamento ostensivo e na
preservação da ordem pública, dentro de suas áreas de competência.
61FREITAS, Juarez. O controle dos atos administrativos e os princípios fundamentais. 3 Ed. São Paulo:
Malheiros. 2004, p. 73. 62
MEIRELES Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 24. Ed. São Paulo: Malheiros, 1999, p 89.
48
Quando da abordagem das características que qualificam de modo
diferenciado as questões de segurança nas regiões de fronteira, verificamos que a
segurança interna não pode ser considerada apenas de interesse regional, ou seja,
dos Estados-membros, uma vez que remanesce o interesse da União em face da
necessidade da garantia da proteção e defesa do território nacional.
Sustentamos o entendimento de que a inexistência, insuficiência ou mesmo
ineficácia da segurança pública nessa região implica na fragilização da própria de
defesa da pátria e que se aplica a visão ampliada de defesa e emprego das Forças
Armadas, considerando questões na normalidade relegadas apenas ao trato dos
meios policiais.
Vimos que a faixa de fronteira terrestre, de dimensão continental, é
caracterizada pela “ausência do Estado” mostrando-se permeada de
vulnerabilidades e ameaças, inclusive externa, restando claras situações diversas
que traduzem significativa e constante insuficiência operativa das atuações dos
órgãos de segurança pública e seus reflexos negativos à Defesa Nacional.
Diante dessa coexistência de interesses, circunstâncias, disponibilidades e
necessidades diversas, entendemos que o emprego das Forças Armadas com
poderes para atuação no combate direto aos delitos transfronteiriços, nos termos do
que dispõe o Artigo 16-A da Lei Complementar nº 97 de 1999 (incluído pela Lei
Complementar nº 136/2010), atende ao princípio constitucional da eficiência. A
justificativa encontra-se na possibilidade de atuação eficaz das Forças Armadas nas
ocasiões em que figurar como única presença estatal nas regiões caracterizadas
pela ausência do Estado.
10.2 SISTEMA INTEGRADO DE MONITORAMENTO DE FRONTEIRAS
Trata-se de projeto tendo por objetivo o desenvolvimento de ações
integradas de modo a aumentar a capacidade de vigilância e monitoramento efetivo
de toda a extensão da fronteira terrestre brasileira. Pretende-se, mediante uso de
tecnologias, inclusive por satélite e rede de sensores, radares e visores óticos
detectar, localizar, identificar, acompanhar e realizar comunicações táticas e de
reconhecimento, com suporte logístico integrado a centro de comando e controle
para checar ocorrências de eventos de interesse de segurança e à defesa nacional.
Coletar, analisar e difundir dados de inteligência que se mostrem de interesse às
49
questões de segurança e que permitirão decisões qualificadas e melhor apoio às
atuações operacionais de ações repressivas eficazes realizadas em conjunto com
outros órgãos, tais como a Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal, Receita
Federal, ANVISA IBAMA e de outros órgãos governamentais, inclusive da segurança
dos Estados-membros.
Nas palavras de Carlos Newton (2012)63 o Sistema Integrado de
Monitoramento de Fronteiras (SISFRON), configura-se como o mais ambicioso e
completo projeto brasileiro de defesa destinado a institucionalizar e operacionalizar
políticas de proteção de todas as áreas de fronteiras do País.
O Ministro da Defesa Celso Amorim (2012) ao se referir à Operação Ágata 5,
uma ação realizada no contexto do SISFRON, disse estimar que tais as ações
pertinentes ao programa de fato modifiquem a realidade e traduza efetiva a
presença do Estado brasileiro nas regiões de fronteiras, conforme se faz necessário,
com reflexos positivos para sociedade através do aumento da qualidade da defesa
e melhoria da sensação de segurança mediante redução da criminalidade.64
Destacamos a atuação das Forças Armadas com poder de polícia no
contexto do SISFRON por entender que na concepção deste programa se aplicam,
em sua plenitude, além do princípio da máxima eficiência, os preceitos da
predominância do interesse nacional, do federalismo cooperativo e uma visão de
defesa que tende a considerar questões tradicionalmente relegadas apenas ao trato
da área de segurança pública, mas que, na atualidade, adquiriram formatações
tradutoras de reflexos negativos á própria Defesa Nacional.
63 NEWTON, Carlos. Matéria. Indústria da Defesa. Revista ADESG nº 267, junho 2012, p. 7-8.
64 BRASIL. Ministério da Defesa. 2012. Ágata 5: Sisfron vai aumentar possibilidade de fiscalização na fronteira
brasileira. Disponível em: <https://www.defesa.gov.br/index.php/noticias-do-md/2455266-09082012-defesa-
agata-5-sisfron-vai-aumentar-possibilidade-de-fiscalizacao-na-fronteira-brasileira.html>.Acesso em: 20/08/2012.
50
12 CONCLUSÃO
Reconhecemos que permanece a divergência doutrinária quanto à
constitucionalidade do parágrafo único do artigo 1º da Lei Complementar nº 97/99
que criou as atribuições subsidiárias das Forças Armadas e a dissensão reside na
interpretação do Artigo 142, § único da Constituição Federal de 1988, que, de fato,
não faz qualquer menção à criação de atribuições outras. Tal situação permite
concluir que as atribuições subsidiárias das Forças Armadas só poderiam ser
criadas por Emenda Constitucional, evento não ocorrido, o que as tornam, em tese,
inconstitucionais.
Reconhecemos que não restou pacificada a discussão doutrinária quanto à
constitucionalidade do Decreto nº 3.897, de 24 de agosto de 2001 que autorizou o
emprego das Forças Armadas com poder de polícia nas situações de normalidade
institucional, sem a decretação de medida de exceção constitucional. A desarmonia
doutrinária encontra-se lastreada na compreensão dos limites do poder regulamentar
do Presidente da República. Não poderia ele, como se constituinte fosse, conferir
poder de polícia às Forças Armadas para desenvolver ações que a própria
Constituição conferiu competência às polícias militares estaduais.
Assim, apesar de não restarem suficientemente claras e pacificadas as
situações legitimadoras do emprego das Forças Armadas no combate direto à
criminalidade, em ações típicas das forças de segurança pública; adotamos a tese
do princípio da máxima eficiência da norma constitucional e as argumentações
daqueles que entendem que o poder de polícia é inerente à existência do Estado e
desse modo encontra-se subentendido ou implícito na missão constitucional das
Forças Armadas; abraçamos a argumentação quanto ao federalismo cooperativo
assim como a fundamentação em relação ao princípio da predominância de
interesses, para concluir pela existência de lastro legal para o emprego das Forças
Armadas nas intervenções pontuais de interesse e a pedido dos entes federados ou
mesmo no interesse da União, porém dentro da concepção de cooperação ou
acordo estabelecido entres as partes envolvidas. Entretanto, nesse aspecto,
vislumbramos a possibilidade do uso político e desvirtuamento desse emprego, dada
a subjetividade do reconhecimento da caracterização de insuficiência operativa dos
instrumentos de segurança pública, nos termos da legislação infraconstitucional
vigente, condição autorizativa legal para a tomada de decisão pelo emprego das
51
Forças. Na hipótese deste desvio de finalidade, por certo, restará prejuízo à
principal missão das Forças Armadas e consequentemente própria à Defesa
Nacional.
Em relação à faixa fronteira brasileira, concluímos de fato tratar-se de região
peculiar e que demanda tratamento diferenciado. Pois, caracterizada pela acentuada
ausência dos órgãos estatais. Permeada de vulnerabilidades que inviabilizam
eficácia de uma fiscalização tradicional, mostra-se porosa a várias ameaças,
inclusive externa, infiltração criminosa na pratica de contrabando, trafico de armas e
drogas, delitos ambientais, dentre outras. E, até mesmo, de ingresso de possíveis
guerrilheiros de países vizinhos instáveis que podem buscar o território brasileiro no
intento de estabelecer refúgio. Assim, coexistem na região interesses da União
assim como dos Estados-membros, incidentes nos assuntos tradicionalmente
tratados apenas da segurança pública, mas que, naquela região, também traduzem
fragilização à Defesa Nacional.
Nesse cenário, concluímos que enquanto permanecerem as peculiaridades
e condições tradutoras da insuficiência operativa ou mesmo ausência dos órgãos de
segurança pública nas regiões da faixa de fronteira, o emprego das Forças Armadas
com poder de polícia para atuar inclusive isoladamente por meio de ações
preventivas e repressivas contra delitos transfronteiriços e ambientais, é medida
necessária e que se justifica em sua plenitude à luz do princípio da eficiência.
Assim concluímos, por considerar que as Forças Armadas, na atualidade,
são os recursos existentes nas áreas de fronteiras; possuem capilaridade e
presença em diversos lugares nos quais os demais órgãos estatais, federal ou
estadual, estão ausentes; portanto, figuram como única representação estatal e
nessa condição são demandadas a agir inclusive no combate à criminalidade e tal
combate interessa à defesa da pátria, assim como à segurança pública. Prevalece,
nesse caso, o interesse da União, o que por si só, a nosso ver, já autoriza a ação
suplementar das Forças Armadas. E, o administrador público tem o dever de cumprir
o comando do princípio constitucional da eficiência, ou seja, tem que empregar da
melhor forma os meios disponíveis.
Por fim, considerando a atuação das Forças Armadas na faixa de fronteira,
dentro do contexto do projeto do Sistema de Monitoramento das Fronteiras
(SISFRON), especialmente em suas diretrizes integradoras dos diversos órgãos e
que permite difusão de conhecimentos para decisões convergentes e qualificadas,
52
além do apoio à atuação operacional na realização de ações preventivas e
repressivas eficazes, seja em conjunto ou mesmo isoladamente, pelas mesmas
razões elencadas no parágrafo anterior, concluímos que tais ações nesse contexto
se justificam em sua plenitude e possuem lastro legal.
Resultou desse estudo, convicção quanto à necessidade de melhoria dos
investimentos nos órgãos de segurança pública em todos os níveis. E ainda, no
âmbito do executivo federal da criação de uma polícia ostensiva que possa,
solidariamente às policiais militares estaduais, atuar nas áreas de fronteira e em
outras, porventura identificadas de peculiar interesse da União, para realizar o
patrulhamento preventivo e repressivo imediato, como medida de incremento à
segurança coletiva.
A nosso ver, o emprego das Forças Armadas nas questões de segurança
pública deve retornar à condição de exceção, como sempre foi. Seu emprego, por
mais frequente que seja e por mais que preparados estejam os atuadores, não
resolve os problemas da insuficiência dos órgãos policiais; estes, são decorrentes da
ausência de estruturas sociais consistes e inclusivas e de investimentos nas
questões de segurança; o constante emprego das Forças Armadas no
enfrentamento de tais situações as desvia de sua atividade precípua e, por certo
redunda em seu enfraquecimento e, consequentemente, da defesa da pátria.
53
REFERÊNCIAS
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BARROS, Luiz Celso. Ciência das Finanças. Bauru: Jalovi, 1986.
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54
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