Fundamentos de Epidemiologia Clínica
Medidas de Freqüência de Doenças
Carlos de Andrade
Epidemiologia: estratégias e aplicações
Paradigma central:
Padrões de ocorrência de doença nas populações podem ser analisados sistematicamente para permitir o entendimento das causas e o controle das mesmas.
Epidemiologia: estratégias e aplicações
Requisito fundamental:
Medidas válidas da freqüência das doenças e dos fatores que podem influenciá-las
Relação com a Saúde Pública, a clínica e a patologia
Epidemiologia: estratégias e aplicações
Objetivo:
medir a frequência com a qual os problemas de saúde ocorrem nas populações humanas
Epidemiologia: estratégias e aplicações
Questões:
Como a doença varia no tempo?
Como o lugar em que a população vive afeta o padrão de ocorrência da doença?
Como as características das pessoas na população afetam este padrão?
Relação entre população e indivíduos
• Estudos epidemiológicos agregam dados de experiências de saúde individuais para generalizar os achados para a população da qual os indivíduos provêm
• Achados de estudos epidemiológicos são aplicáveis diretamente a populações e indiretamente a indivíduos
Incidência
Número de casos novos em determinado período em uma população
Conceitos: Incidência e Prevalência
Incidência
Ex:
quatro milhões de casos novos de AIDS no mundo em 2005
Conceitos: Incidência e Prevalência
Incidência
frequência de casos novos de um problema de saúde em um determinado período de tempo, oriundos de uma população sob risco de adoecimento no início da observação
Conceitos: Incidência e Prevalência
Medidas de Incidência
• obtidas nos estudos de seguimento (longitudinais)
• população sob risco de adoecimento no início da observação
• relacionadas à dimensão do tempo
Conceitos: Incidência e Prevalência
Maneiras de medir a Incidência
Número de casos incidentes (I)
Simples, adimensional
Conceitos: Incidência e Prevalência
Maneiras de medir a Incidência
Número de casos incidentes (I)
Ex:
1500 casos de sarampo de 1980 a 2000 no Brasil
Conceitos: Incidência e Prevalência
Maneiras de medir a Incidência
Número de casos incidentes (I)
Problema:
Não permite comparações da incidência de populações ou períodos diferentes
Solução:????
Conceitos: Incidência e Prevalência
Adaptado de Rothman (2008)
Maneiras de medir a Incidência
Solução:
Utilizar medidas de incidência expressas como frequência relativa (taxa de incidência e incidência acumulada)
Conceitos: Incidência e Prevalência
Caso novo (incidente)
definido a partir de evidências clínicas laboratoriais ou epidemiológicas, de acordo com critérios pré-definidos
Conceitos: Incidência e Prevalência
Prevalência
número de casos (novos e antigos) em determinado momento em uma população
Conceitos: Incidência e Prevalência
Prevalência
Ex: 39 milhões de pessoas portadoras do HIV no mundo em 2005
Conceitos: Incidência e Prevalência
Geralmente empregados como sinônimo das respectivas taxas
Números absolutos: planejamento
Números relativos: estudos analíticos
Conceitos: Incidência e Prevalência
Conceitos: Razões, taxas e proporções
RazãoDivisão de uma quantidade por outra
Numerador e denominador podem ser de naturezas distintas
Freqüentemente utilizada em epidemiologia para sumarizar a divisão de uma razão por outra
Ex.: Razão de chances (odds)
Conceitos: Razões, taxas e proporções
TaxaTipo de razão
Variação de um fenômeno por unidade de uma outra variável (tempo)
Expressão de velocidade média de um fenômeno.
Ex.:
Taxa de mortalidade (absoluta) = No óbitos / ano
Conceitos: Razões, taxas e proporções
Proporção
Razão na qual o numerador está contido no denominador
Varia apenas de 0 a 1 (ou 0 a 100%)
Ex.:
Mortalidade proporcional =
número de óbitos por doenças cardiovasculares /
número de óbitos por todas as causas
Medidas de incidência: Incidência acumulada e taxa de incidência
Numerador:
• Número de casos novos de um agravo em determinado período em uma determinada população
Denominador:
• Número de invidíduos no início do período de observação (população inicial)
A escolha do denominador a ser utilizado depende do tipo de estudo e dos dados disponíveis
Medidas de incidência:
Incidência acumulada ou proporção de incidência
Número de casos novos em determinado período
População no início do período
Incidência Acumulada
Numerador:
Número de casos novos de um agravo em determinado período em uma determinada população
Denominador:
Número de indivíduos sob risco no início do período de observação (população inicial)
Incidência Acumulada
• Proporção, varia entre 0 e 1.
• Expressão direta do risco de ocorrência do evento no período (probabilidade)
• Aplicável apenas para coortes fixas (populações fechadas)
Sinônimos:
Proporção de incidência, Incidência cumulativa e taxa de ataque (em surtos ou epidemias)
Taxa de incidência: Definição
• Numerador:
• Número de casos novos de um agravo em determinado período em uma determinada população
• Denominador:
Somatório do tempo em que os indivíduos estiveram sob risco de desenvolver a doença (tempos de observação)
• Unidade: pessoa-tempo
Sinônimos:
Densidade de incidência, Incidência pessoa-tempo
• A forma de calcular o denominador depende do contexto e dos dados disponíveis.
Pessoa-tempo: definição
Período durante o qual um indivíduo esteve exposto ao risco de adoecimento e, caso viesse a adoecer, seria considerado caso novo ou incidente:
– Expressão da experiência individual de exposição ao risco de adoecimento, referida a unidade de tempo (mês, ano, etc)
– Somando-se as experiências individuais obtém-se o total de pessoas-tempo gerado por uma população, ao longo do tempo em que se desenvolve o estudo
Pessoa-tempo: exemplos
• UMA pessoa acompanhada durante um ano sem desenvolver uma doença:
UMA PESSOA-ANO
• DUAS pessoas acompanhadas durante seis meses cada, sem desenvolver uma doença, contribuem individualmente cada com MEIA PESSOA-ANO. Somando-se as contribuições individuais temos UMA PESSOA-ANO
Medidas de incidência:
• Taxa de incidência ou densidade de incidência ou incidência pessoa-tempo
Número de casos casos novos em determinado período
Tempo no qual a população esteve sob risco de desenvolver a doença
Tempo da população =
soma dos tempos de observação de cada indivíduo
Medidas de incidência:
Populações:
• Fechadas (coorte fixa)
Nenhum membro novo é incorporado ao longo do tempo
Diminui ao longo do tempo (morte)
• Abertas (população dinâmica)
Membros novos são incorporado ao longo do tempo (natalidade ou imigração)
Diminui ao longo do tempo (morte ou emigração)
Medidas de incidência:
Populações:
• Estável (estacionária)
Tamanho e estruturas etária e de gênero mantidas
Perdas (censura)
Interrupção do seguimento de um indivíduo por qualquer motivo que não seja o adoecimento pela doença em questão
Não adoecimento também é censura
• Imagine: Uma população fechada. Todos recrutados no mesmo momento. Ausência de perdas.
Calcule a incidência acumulada de doença no período de 2 anos.
Qual é o risco de adoecer nesta população, nesse período?
Qual é o risco de adoecer nesta população, nesse período?
5/10 = 0,5 ou 50 %
• Imagine agora: Uma coorte com recrutamento por um ano e algumas perdas.
• Calcule a incidência acumulada de doença no período de dois anos.
• Qual é o risco de adoecer no período? 50%?
• É correto calcular da mesma forma que no exemplo anterior?
• A mesma coorte. Na segunda figura, o tempo zero é o início do acompanhamento (follow-up)
• As técnicas tradicionais para se estimar a incidência acumulada na presença de censuras (indivíduos que são acompanhados por menos tempo porque são recrutados tardiamente, óbitos por outras causas, perdas de seguimento) são:
tábua de vida clássica
e
método de Kaplan-Meier
• A probabilidade acumulada do evento num intervalo de tempo é dada pela proporção de novos eventos no período em relação à população inicial, corrigida pelas perdas.
Tábua de vida clássica
• Por convenção, subtrai-se do denominador metade das perdas do período.
• Incid. Acumulada
= 5/(10 - 0,5 x 4)= 5/8 = 0,625 ou 62,5 %
Tábua de vida clássica
Em cada período,
Probabilidade de Sobrevida = 1 – Incidência acumulada
Incidência acumulada em dois períodos consecutivos ( 2 I 0 )
2 I 0 = 1 - (2 S 1 )( 1 S 0),
Onde 1 S 0 é a probabilidade de sobrevida entre t0 e t1 e
2 S 1 é a probabilidade de sobrevida de t1 a t2, dado que o sujeito sobreviveu até t1.
Tábua de vida clássica
Método de Kaplan-Meier
• Envolve o cálculo da probabilidade de cada evento no momento da sua ocorrência
• O denominador é a população sob risco no momento de ocorrência de cada evento
• Como na tábua de vida, essas são probabilidades condicionais, isto é, dependem de estar sob risco no momento de ocorrência de cada evento.
Método de Kaplan-Meier
Reproduzido de Szklo, 2000.
Curva de Kaplan-Meier
Reproduzido de Szklo, 2000
• No exemplo anterior: a população de uma cidade.
• Numa população dinâmica, estável ou com taxa de crescimento constante, a população no meio do período estima o número de pessoas sob risco ao longo do período.
• O total de pessoa-tempo é o produto do número médio de pessoas sob risco pelo tempo de acompanhamento (geralmente 1 ano).
Taxa de incidência : Cálculo
Taxa de incidência : Cálculo
Taxa de incidência : Cálculo
Outro exemplo:
Nos anos de 2001 a 2003, foram notificados 500 casos de dengue no município X. Qual é a taxa de incidência nesse período, considerando que a população estimada em 1º julho de 2002 (meio do período) era de 150.000 habitantes?
Total pessoa-tempo no período de 2001 a 2003
150.000 x 3= 450.000 pessoas-ano
Taxa de incidência de dengue = 500/450.000 = 0,00111 =
111 casos/100.000 habitantes-ano
Agora a população de um estudo: Uma coorte com recrutamento por 1 ano, seguimento por até 2 anos e algumas perdas.
Calcule a taxa de incidência da doença no período
5 = 5 = 0,43 ou 43
137 pessoas-mês 11,4 pessoas-ano 100 pessoas-ano
x
x
Taxa de incidência : Cálculo
Taxa de incidência : Aplicações
Medidas utilizadas no monitoramento das infecções hospitalares
Densidade de incidência de infecção hospitalar globalNúmero de infecções hospitalares / 1000 pacientes-dia
Densidade de incidência de infecções associadas a dispositivosNúmero de infecções hospitalares/ 1000 pacientes-dia
Densidade de incidência de infecção associada a cateter venoso central (CVC)
Número de infecções de corrente sangüínea associadas a CVC/ 1000 cateteres-dia (pacientes-dia em uso de CVC)
Taxa de incidência : Aplicações
Taxa de incidência: Considerações
• O valor da taxa de incidência depende da unidade de tempo utilizada (0 a infinito). Não é interpretável sem as respectivas unidades.
• O uso de pessoa-tempo como denominador permite lidar com situações em que há perdas ou quando não se pode seguir toda a coorte sob risco para observar o evento investigado.
• Usando pessoa-tempo, o período de seguimento não tem que ser o mesmo para todos os indivíduos estudados. O total de pessoa-tempo de um grupo é igual à soma do tempo de observação de cada indivíduo do grupo.
Taxa de incidência: Considerações
• A mortalidade pode ser entendida como caso particular da incidência quando o evento de interesse é a morte
• Mortalidade por causa básica X: óbitos nos quais X foi causa básica
• Mortalidade com X: óbitos nos quais X foi causa básica e óbitos associados a X
• A letalidade expressa a frequência de óbitos por uma doença X, entre os indivíduos que apresentam X
• A mortalidade por uma doença é função da sua incidência e da sua letalidade
Taxa de incidência: Considerações
Quando calcula-se a taxa de incidência, assume-se que:
• A taxa de incidência das pessoas que entram no estudo em diferentes momentos é a mesma
• A taxa de incidência entre aqueles que saem do estudo (perdas) é a mesma dos que estão em observação
• A doença ocorre igualmente ao longo do tempo (taxa constante)
Uma pessoa por 50 anos = 50 pessoas por um ano
Para interpretar os resultados é importante saber o tempo médio de observação da população.
Taxa de incidência: Considerações
INTERVALO
Medidas de incidência: Considerações
Medidas de incidência: Considerações
Características necessárias à análise de sobrevida e pessoa-tempo (assunções)
Prevalência
número de casos (novos e antigos) em determinado momento em uma população
Conceitos: Incidência e Prevalência
Prevalência
Ex: 39 milhões de pessoas portadoras do HIV no mundo em 2005
Conceitos: Incidência e Prevalência
Casos prevalentes
pessoas que adoeceram em algum momento do passado mais ou menos remoto e que estão vivos quando realiza-se a observação
Conceito: Prevalência
Prevalência
• Taxa de prevalência instantânea ou pontual (proporção)
número de casos (novos e antigos) do agravo no instante t
população sob risco no instante t
P t = C t / N t = (N t – N’ t)/ N t
N t: tamanho da população estudada no instante t
N’ t: parcela de indivíduos livres da doença no instante t
Prevalência
• Chance de prevalência
CP t = P t / (1 – P t)
onde
P t: casos
1- P t: indivíduos não doentes
Prevalência
• Taxa de Prevalência de período (proporção)
número de casos (novos e antigos) do agravo no período
população sob risco no período
Prevalência
Fatores determinantes da prevalência
• duração e incidência
Ex:Doenças infecciosas agudas: dengue e meningite
(alta incidência com duração curta)
Doenças crônicas
(baixa incidência com duração longa)
Prevalência - Aplicações
• A taxa de prevalência de um agravo avalia a proporção da população que apresenta o agravo em um determinado momento
• O número de casos prevalentes de uma determinada condição dá a dimensão do problema a ser enfrentado.
Prevalência - Aplicações
• Medida importante para o planejamento de intervenções, especialmente em doenças crônicas ou incuráveis, nas quais o número de portadores da doença define uma população-alvo para ações de saúde.
Ex.:
Prevalência de diabetes na população adulta no Brasil
Prevalência - Aplicações
Nas doenças infecciosas é comum determinar a proporção de indivíduos que já tiveram contato com um determinado agente.
Ex.:
prevalência de anticorpos para hepatite B entre doadores de sangue;
prevalência de anticorpos para dengue em uma cidade (soroprevalência)
Prevalência - Aplicações
Muito utilizada nos estudos descritivos.
É a medida de freqüência que pode ser calculada a partir de estudos seccionais ou transversais (inquéritos, censos)
Prevalência - Aplicações
Limitações para o estudo das causas das doenças:
É influenciada pela incidência mas também pela duração média da doença.
A duração da doença, é função da taxa de cura e da taxa de mortalidade entre os doentes.
Prevalência - AplicaçõesLimitações para o estudo das causas das doenças
(cont):
Doenças com alta incidência e alta letalidade, podem apresentar prevalências baixas.
Doenças com baixa incidência, mas com longa duração podem ter prevalências altas.
Nos estudos de prevalência, não é possível determinar se a exposição precedeu a doença, já que as medidas de exposição e do desfecho são feitas simultaneamente.
Relação entre Incidência e Prevalência
Relação entre Incidência e Prevalência
Relação entre Incidência e Prevalência
TI (N – P) Δ t = TI’ P Δ t
TI: taxa de incidência
TI’: taxa de resolução da doença, ou taxa de incidência relativa à evolução da doença
Relação entre Incidência e Prevalência
Assumindo ausência de migração
TI’ = 1/D, onde D= duração média da doença
TI (N – P) Δ t = P Δ t / D ou
TI / D = P / (N - P) ou TI /D = CP
Caso Pt seja baixa ( < 0,1), N-P ≈ N
P t ≈ I D
Numerador: Quem são os casos?
As medidas de freqüência são muito influenciadas por
critérios de definição de caso
fontes de informação utilizadas
métodos diagnósticos utilizados
Numerador: Quem são os casos?
Todo estudo precisa de definição operacional do evento estudado
Critérios diagnósticos
Explicitação da fonte dos casos: registros de doenças, dados de prontuários, formulários de pesquisa
As informações sobre freqüência das doenças nas populações em geral também são vinculadas a definições operacionais.
Numerador: Quem são os casos?
Exemplos
Definição de caso suspeito de sarampo
Todo paciente que, independente da idade e situação vacinal, apresentar febre e exantema maculopapular, acompanhados de um ou mais dos seguintes sinais e sintomas: tosse e/ou coriza e/ou conjuntivite.
Numerador: Quem são os casos?
Exemplos
Definição de doença cardiovascular na coorte de Framingham
Eventos cardiovasculares ateroscleróticos foram definidos por ocorrência de IAM, insuficiência coronariana, morte por doença coronariana, angina do peito, AVE aterotrombótico, claudicação intermitente ou óbito por doença cardiovascular. Dados obtidos dos registros médicos do estudo.
Denominador: Quem é a população ?
• É importante conhecer bem a população de onde derivam os casos para calcular corretamente as taxas
• Em estudos com grandes populações, a existência de dados demográficos confiáveis é fundamental
Denominador: Quem é a população ?
• Todos os indicadores de saúde do país são profundamente dependentes de dados sobre a população
• O denominador de uma taxa de incidência deve conter apenas os indivíduos sob risco para o evento em questão.
Exemplo: Incidência de câncer de colo do útero
Denominador: população do sexo feminino
Algumas taxas, razões e proporçõesmais utilizadas em Epidemiologia
• Taxas de Mortalidade Geral e Específicas
Número de óbitos (/10.000 ou 100.000)
População
• Mortalidade Proporcional (%)
Número de óbitos por determinada causa
Número de óbitos por todas as causas
Algumas taxas, razões e proporçõesmais utilizadas em Epidemiologia
• Taxa de Letalidade(%)
Número de óbitos por uma doença
Número de óbitos indivíduos portadores da doença
Taxa de Ataque (caso especial da incidência acumulada, utilizado em surtos delimitados)
Número de casos novos da doença (%)
População sob risco
Algumas taxas, razões e proporçõesmais utilizadas em Epidemiologia
• Taxa de Mortalidade Infantil (/1000)
Número de óbitos em menores de 1 ano
Número de nascidos vivos
• Taxa de Mortalidade Materna(/100.000)
Número de óbitos por causas relacionadas à gravidez, parto e puerpério
Número de nascidos vivos
Exercícios