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Braslia2010
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Volume 1
O governo Lula segundo seus ministros
Patrus AnaniasJuca FerreiraCelso Amorim
Guilherme CasselOrlando Silva
volume 1 (1a5).indb 1 23/12/2010 12:41:29
Presidncia da Repblica
Secretaria de Assuntos Estratgicos
Ministro Samuel Pinheiro Guimares
Presidncia da RepblicaSecretaria de Assuntos Estratgicos
Presidncia da Repblica
Secretaria de Assuntos Estratgicos
Esplanada dos Ministrios, Bl. O 7o, 8o e 9o andares
70052-900 Braslia, DF
Telefone: (61) 3411.4617
Site: www.sae.gov.br Volume 1Braslia, 2010
palestras proferidas entre
8/4/2010 e 27/5/2010
O governo Lula segundo seus ministros
Patrus AnaniasJuca FerreiraCelso Amorim
Guilherme CasselOrlando Silva
volume 1 (1a5).indb 2 23/12/2010 12:41:29
Presidncia da RepblicaSecretaria de Assuntos Estratgicos
Volume 1Braslia, 2010
palestras proferidas entre
8/4/2010 e 27/5/2010
O governo Lula segundo seus ministros
Patrus AnaniasJuca FerreiraCelso Amorim
Guilherme CasselOrlando Silva
volume 1 (1a5).indb 3 23/12/2010 12:41:29
Governo FederalPresidncia da RepblicaSecretaria de Assuntos EstratgicosBloco O 7, 8 e 9 andaresCEP: 70052-900 Braslia, DFhttp://www.sae.gov.br
Coordenao EditorialWalter Sotomayor
Projeto Grfico e DiagramaoRafael W. BragaBruno Schrmann
Produo EditorialAdrienne MouraGabriela CamposJuara Santiago PedreiraKaren Camargo CrippaLuis ViolinMaria Ceclia Costa Perez Raul OliveiraSarah Pontes
Fotografia da capaPatrick Grosner
C568
Brasil. Presidncia da Repblica. Secretaria de Assuntos Estratgicos.
O governo Lula segundo seus ministros. volume 1 Braslia: Presidncia da Repblica, Secretaria de Assuntos Estratgicos - SAE, 2010.
224 p.
1. Polticas Pblicas 2. Desenvolvimento Social 3. Cultura 4. Poltica Externa 5. Desenvolvimento Agrrio 6. Esportes Brasil. I Presidncia da Repblica, Secretaria de Assuntos Estratgicos.
CDD - 350
Ficha catalogrfica
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Sumrio
Patrus ananias 7Desenvolvimento Social e Combate Fome
Juca Ferreira 49Cultura
celso amorim 105Poltica Externa
Guilherme cassel 149Desenvolvimento Agrrio
orlando silva 191Esportes
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palestra proferida em 4/2/2010
Palestra do ministro
Patrus AnaniasDesenvolvimento Social
e Combate Fome
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Patrus Ananias
1952 Nasce, em 26 de janeiro, em Bocaiva (MG)
1976 Forma-se em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais
1979 Professor da PUC-MG, nas disciplinas Direito e Legislao Social na Escola de Servio Social e Direito do Trabalho
1982 Ingressa, por concurso pblico, como consultor da Assembleia Legislativa de Minas Gerais, aprovado em primeiro lugar
1979-1983 Atuao profissional como advogado, especialmente nas reas de Direito do Trabalho e Direito Previdencirio, sendo consultor jurdico dos sindicatos dos professores, jornalistas e assistentes sociais
1984 Assume a cadeira de Introduo ao Estudo do Direito, tambm na PUC-MG
1988 Eleito Vereador de Belo Horizonte (MG) pelo PT. Em 1990 foi o relator da Lei Orgnica do Municpio de Belo Horizonte. De 1991 a 1992, preside a Comisso de Legislao e Justia da Cmara Municipal de Belo Horizonte
1992 Eleito Prefeito de Belo Horizonte (MG)
1996 Eleito Membro da Academia Mineira de Letras
2000 Especializao em Poder Legislativo pela Escola do Legislativo da Assemblia Legislativa de Minas Gerais e Instituto de Estudos Continuados da Pontifcia Universidade Catlica de Minas Gerais (PUC-MG)
1997-2001 Retorna atividade docente na PUC-MG
2001 Torna-se mestre em Direito Processual pela PUC-MG
2001 Doutorando em Filosofia pela Universidad Complutense de Madrid
2002 Eleito o Deputado Federal (PT-MG) mais votado na histria de Minas Gerais
2004 Assume o Ministrio do Desenvolvimento Social e Combate Fome, onde permanece ate 2010
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9Palestra do ministro
Patrus Ananias
Comearemos por um breve panorama histrico da ques-to social do Brasil, que se caracteriza pela enorme d-vida social. Comea l nas capitanias hereditrias penso que
no devemos esquec-las. Na minha avaliao e na de alguns
historiadores, a comea a relao promscua entre o pblico e
o privado no Brasil. Os donatrios tinham benefcios e, mais
que isso, poderes pblicos. Podiam, por exemplo, condenar
morte escravos, ndios e pees, pela legislao da poca. E as
pessoas mais gradas (notveis) podiam ser deportadas, sofrer
a pena do degredo por at dez anos. Ao mesmo tempo,
os donatrios auferiam lucros privados. Comea a
tambm o problema da concentrao da terra no
Brasil. Depois das capitanias hereditrias, vieram as
sesmarias, aquelas extenses enormes de terra. Vin-
culado s sesmarias, o problema do coronelismo,
um poder dentro do Estado, sempre com essa
relao, com esse comprometimento do p-
blico, a privatizao do Estado brasileiro,
o problema da escravido, que tambm
muito srio.
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CiClo de palestras desenvolvimento soCial e Combate fome10
Para se ter uma ideia, quando foi abolida a escravido, pou-
co antes de 13 de maio de 1888, o que se discutia era se os
senhores de escravos seriam ou no indenizados pela perda
da sua propriedade. No foram indenizados, mas os escravos
foram jogados na rua da amargura. Nenhum direito social,
nenhuma poltica de incluso, nenhum acesso terra, como
queria Joaquim Nabuco bom lembr-lo neste ano em que
comemoramos o centenrio da sua morte. Joaquim Nabuco
pretendia que se fizesse a abolio com poltica de incluso,
at mesmo com reforma agrria, j naquele tempo. Isso no
foi feito.
A questo do genocdio indgena deixou uma herana pesada
do ponto de vista social, da excluso, da pobreza, da misria.
As manifestaes que Euclides da Cunha chamou de revoltas
sertanejas expressam muito isso, o Brasil pobre e esquecido
do interior. Os cabanos do Par, os balaios do Maranho, os
sabinos na Bahia. Numa perspectiva mais urbana, os praiei-
ros, em Pernambuco, e Canudos, na Bahia, que teve o seu
historiador as outras no tiveram. Ningum sabe exatamen-
te o que aconteceu com os cabanos do Par, o nvel da violn-
cia, da represso, de mortes etc.
A poltica social do Brasil, durante muitos anos, foi feita
por meio da filantropia. Da Igreja Catlica, especialmente.
Depois vieram outras igrejas crists no catlicas, espritas,
e as pessoas de bom corao, pessoas boas que acolhiam os
mais pobres. Tivemos algumas leis anteriores, nos anos 1920,
como a Lei de Eloy Chaves, e o surgimento do movimento
de algumas categorias profissionais de trabalhadores, como
os ferrovirios, mas a questo social emerge efetivamente no
Brasil depois da Revoluo de 1930.
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palestra do ministro patrus ananias 11
A primeira Constituio do Brasil que incorporou o tema dos
Direitos Sociais foi a de 1934. Tivemos, no perodo Getlio
Vargas, do Estado Novo, em 1943, a CLT, a Consolidao
das Leis do Trabalho. A CLT incorporou os trabalhadores
urbanos. No foram includos os trabalhadores rurais nem
os trabalhadores informais. Ficaram tambm margem da
proteo legal pessoas desempregadas, subempregadas, os po-
bres, os excludos, idosos, pessoas com deficincia, famlias e
crianas em situao de maior carncia.
O Estatuto do Trabalhador Rural de 1963, ainda no per-
odo do governo de Joo Goulart, e foi sendo implantado aos
poucos. Tivemos tambm outros fatores relevantes, nos anos
1960 e 1970, durante a ditadura. Mas vou dar um depoimen-
to para vocs terem uma ideia da extenso do problema social
no Brasil. Fui criado no interior de Minas. Meu pai era um
fazendeiro, com uma extraordinria vocao para no ganhar
dinheiro. Me lembro bem, pois passei parte da minha infn-
cia na roa, e depois sempre estive l nas frias. Durante toda
a minha vida, tive uma relao forte com o meio rural, com os
trabalhadores rurais, com a agricultura familiar.
Na minha infncia e no incio da minha adolescncia, os tra-
balhadores rurais no tinham direitos. Eles tinham que se
subordinar a um contrato de adeso. Via de regra, era um
contrato verbal, no escrito. Os trabalhadores rurais se sub-
metiam s condies impostas pelo empregador, sem garantia
legal de salrio mnimo, de jornada mxima de trabalho, de
hora extra, repouso semanal remunerado, frias, nenhuma
cobertura, nenhuma garantia previdenciria para a famlia
em caso de morte ou de doena do trabalhador; todos ficavam
expostos caridade, boa vontade das pessoas.
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CiClo de palestras desenvolvimento soCial e Combate fome12
Isso comea a mudar nos anos 1960, a partir do Estatuto do
Trabalhador Rural. Depois, na ditadura, houve o incio da
Previdncia Rural, inicialmente com o Funrural, que garantia
meio salrio mnimo para os trabalhadores rurais idosos que
no podiam mais trabalhar. Depois do Funrural, veio o Pro-
Rural, que aumentou para um salrio.
Um momento importante na histria dos direitos sociais, dos
direitos dos pobres no Brasil, foi a Constituio em vigor,
de 5 de outubro de 1988, precedida de um processo bonito.
Quem participou, e eu participei intensamente, no esquece
jamais. Em 1986, 1987, at a promulgao da Constituio,
em outubro de 1988, o Brasil todo viveu momentos de muita
participao popular, de mobilizao de empresrios, traba-
lhadores urbanos e rurais, indgenas, negros, afrodescenden-
tes, o movimento ligado s crianas, jovens e portadores de
deficincia. Isso levou a Constituio de 1988 a dar um passo
impor tante frente, consolidou o passado, os direitos traba-
lhistas, inclu indo os trabalhadores rurais, e as conquistas no
campo da Previdncia Social. Abriu a perspectiva, ainda no
realizada, da seguridade social referenciada na Sade, na Pre-
vidncia Social e na Assistncia Social. A Assis tncia Social,
portanto, entra no campo das polticas pbli cas, lana um
olhar mais atento para as comunidades indgenas, quilombo-
las, famlias, crianas e adolescentes pobres, idosos, pessoas
com deficincia.
Na esteira da Constituinte, tivemos algumas leis importantes,
civilizatrias, como a legislao do Sistema nico de Sade, o
SUS; o Estatuto da Criana e do Adolescente, o ECA; e logo
depois a Loas, a Lei Orgnica da Assis tncia Social. Depois
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palestra do ministro patrus ananias 13
vem um perodo em que as coisas pararam, que foi a hegemo-
nia avassaladora, desumanizadora, do projeto neoliberal.
Como mencionado, no modelo da seguridade social incor-
porado pela Constituio, os benefcios e servios so assegu-
rados e passam a ser concebidos como direitos de cidadania e,
em alguns casos, dever do Estado, tambm com a participao
da sociedade. Mencionamos algumas normas que se desdo-
braram. No nosso caso especfico, a Lei Orgnica da Assistn-
cia Social, de 1993, que se desdobra em 2004 com a Poltica
Nacional de Assistncia Social isso j no nosso Ministrio,
no Governo Lula. O Ministrio do Desenvolvimento Social e
Combate Fome (MDS) foi implantado em janeiro de 2004.
Com a norma operacional bsica do Sistema nico de Assis-
tncia Social, um pouco antes, tivemos o Estatuto da Criana
e do Adolescente e, em 2003, o Estatuto do Idoso.
Vejam que um perodo longo entre 1993, quando veio a
Loas, e 2003, quando tivemos o Estatuto do Idoso. No hou-
ve nenhuma lei social relevante nesse perodo. Isso quer dizer
que h um corte, um desdobramento da Constituio. Mostra
o que foi, do ponto de vista dos pobres, do ponto de vista so-
cial, a hegemonia perversa do neoliberalismo.
O Ministrio do Desenvolvimento Social e Combate Fome
(MDS) foi criado em janeiro de 2004. Festejamos, com pouca
gente, mas muita alegria, os nossos seis anos, em 23 de janei-
ro de 2010. Voltados para essas populaes mais vulnerveis,
integramos trs reas j existentes. Havia o Ministrio da As-
sistncia Social, que foi para o Ministrio do Desenvolvimento
Social e Combate Fome; assim como a Secretaria Nacional
de Assistncia Social e, posteriormente, o Ministrio Extraor-
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CiClo de palestras desenvolvimento soCial e Combate fome14
dinrio de Segurana Alimentar. Os Programas Fome Zero e
Bolsa Famlia, at ento ligados diretamente Presidncia da
Repblica, tambm foram incorporados pelo MDS.
O Programa Bolsa Famlia surgira um pouco antes, em ou-
tubro de 2003, tambm por fora legal inicialmente uma
medida provisria, que depois virou lei. Ento, foram esta-
belecidas trs secretarias finalsticas: a Secretaria Nacional de
Assistncia Social, a Secretaria Nacional de Segurana Ali-
mentar e Nutricional e a Secretaria Nacional de Renda de
Cidadania, que cuida mais diretamente do Programa Bolsa
Famlia. E criamos mais duas secretarias: a Secretaria de Ar-
ticulao Institucional e Parcerias, agora chamada Secretaria
de Articulao para a Incluso Produtiva, para dar mais n-
fase a uma grande prioridade nossa no momento, as polticas
de capacitao profissional e qualificao, para preparar os
beneficirios dos nossos programas, especialmente do Bolsa
Famlia, para as oportunidades de trabalho, emprego e renda
que surgem e crescem no Brasil com as obras de programas
como PAC, Minha Casa Minha Vida, o desenvolvimento do
turismo. E a Secretaria de Avaliao e Gesto da Informao,
uma opo que fizemos desde o incio e que tem dado bons
resultados, pelo fato de nossas polticas serem monitoradas,
avaliadas. Trabalhamos com resultados. Monitoramento,
prazos, metas, procedimentos etc.
A evoluo do oramento do nosso Ministrio significativa.
Porm, o que algumas pessoas consideram muito no to
grande se observarmos o tamanho da dvida social brasileira,
o nvel das desigualdades e injustias sociais. Mas significa-
tivo e mostra que, de fato, a partir do governo do presidente
Lula, e especialmente a partir da criao do Ministrio, os
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palestra do ministro patrus ananias 15
recursos destinados aos pobres passaram a ser cada vez mais
significativos, evidenciando que a questo social, a questo
dos pobres, dos trabalhadores de baixa renda, da agricultura
familiar, passou a ser cada vez mais prioritria.
Tivemos recursos de R$ 11,4 bilhes, em 2003; R$ 14,3 bi-
lhes, em 2004; e chegamos a R$ 33 bilhes, em 2009. Espe-
ramos que no haja contingenciamento este ano, at porque
um ano difcil, de prazos curtos, graas ao calendrio eleitoral.
Nosso oramento para 2010 de R$ 38,9 bilhes. significa-
tivo, forte, alm da questo do direito para os pobres. Mostra
tambm a mudana: o Estado brasileiro est sendo desprivati-
zado. Os pobres esto sendo includos, considerados, na divi-
so do bolo nacional.
Na Secretaria Nacional de Assistncia Social, estamos conso-
lidando um Sistema nico da Assistncia Social (Suas). Vale
dizer, estamos colocando as aes da assistncia social no cam-
po das polticas pblicas, no campo dos direitos, dos deveres,
superando definitivamente o assistencialismo, o clientelismo,
os pobres de cada um ou o quem indica. As pessoas en-
tram e saem dos programas segundo critrios objetivos, le-
gais. Quem tem direito tem direito. Entra, alcana melhor
condio e sai.
Temos, dentro do Suas, um programa com recursos superiores
ao Bolsa Famlia: o Benefcio de Prestao Continuada, pago
s pessoas de mais de 65 anos, s pessoas com deficincia e s
incapacitadas para o trabalho. A linha de entrada rigorosa,
corresponde a um quarto do salrio mnimo. A pessoa pode
receber o benefcio caso tenha renda inferior a um quarto do
salrio mnimo, mas o benefcio, para os padres do Brasil e
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CiClo de palestras desenvolvimento soCial e Combate fome16
do mundo, hoje, em termos de polticas sociais, significa-
tivo, corresponde ao salrio mnimo. E, no caso das pessoas
idosas, com base no Estatuto do Idoso, podem ser pagos at
dois benefcios a pessoas de uma mesma famlia.
Estamos atendendo a aproximadamente 3,4 milhes de pes-
soas, e o valor do benefcio significativo. No ano passado,
os recursos estiveram na casa de R$ 18 bilhes. E isso justo.
Ser idoso e deficiente j difcil. Mas ser idoso, deficiente e
pobre, sem recursos, sem dinheiro, muito pior. Ento,
um programa que tem impacto enorme.
O Programa de Ateno Integral Famlia, o Paif, se materia-
liza na prtica por meio dos Centros de Referncia de Assistn-
cia Social, os Cras. Temos, no Suas, a Proteo Social Bsica,
que atende pobreza nas situaes ordinrias, do dia-a-dia, e
temos a Proteo Social Especial, que trabalha situaes mais
especficas, mais difceis: explorao sexual de crianas e ado-
lescentes; o trabalho das crianas, por meio do nosso Progra-
ma de Erradicao do Trabalho Infantil; famlias em situao
de desconstituio familiar, de sofrimento, problemas graves
de violncia domstica, alcoolismo, drogas etc.
O Cras atende dentro da Rede de Proteo Social Bsica. E
h os irmos dos Cras, os Creas, os Centros de Referncia
Especializados de Assistncia Social, que atendem s situaes
mais delicadas. Ambos so equipamentos usamos tambm o
nome de Casas das Famlias implantados nas comunidades
pobres. Portanto, interagem diretamente com o Bolsa Fa-
mlia, com o trabalho de psiclogos e assistentes sociais, que
desenvolvem atividade de acolhimento e acompanhamento
dessas famlias. Especialmente no caso dos Creas, interagem
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palestra do ministro patrus ananias 17
com nosso Programa Sentinela, de preveno e combate ex-
plorao sexual de crianas e adolescentes.
Os Cras vm desenvolvendo tambm atividades de capacitao
profissional, alfabetizao, incluso digital, incluso produ-
tiva, desenvolvimento dos talentos e potencialidades das pes-
soas, famlias e comunidades. s vezes, o atendimento mais
comunitrio, sobretudo quando se trata, por exemplo, de
populaes indgenas, quilombolas, tradicionais, ribeirinhas
populaes que tm uma constituio histrico-cultural
que vai alm da famlia, em uma dimenso mais comunitria.
Ontem tomei conhecimento de um avano extraordinrio. Foi
feito um acerto, um pacto, uma poltica integrando a assistn-
cia social com o Bolsa Famlia para que os Cras e, em situaes
especiais, os Creas tambm acompanhem diretamente as fa-
mlias. Por exemplo, dirigimos o Bolsa Famlia condiciona-
lidade escolar. A criana tem de estar na escola. Mas s vezes
ela no est na escola porque perten ce a uma famlia sofrida.
Ela no est indo aula porque a famlia no tem condies,
mesmo, h desconstituio familiar, alcoolismo, perdas, mor-
te do pai, da me. Em vez de pura e simplesmente cortar o
benefcio, o que estamos fazendo? Os Cras vo ter o desafio de
procurar essas famlias, identificar os problemas que esto vi-
vendo. Essa integrao dos Centros de Referncia de Assistn-
cia Social com o Bolsa Famlia cada vez mais estreita, o que
mostra que o Bolsa Famlia est inserido nesta Rede Nacional
de Proteo e Promoo Social.
Ainda vinculado ao Bolsa Famlia, temos o Projovem Ado-
lescente, um programa recente, que substituiu o chamado
Agente Jovem. Estamos alcanando 600 mil adolescentes de
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CiClo de palestras desenvolvimento soCial e Combate fome18
16 e 17 anos, trabalhamos especialmente com adolescentes
egressos do sistema socioeducativo, ou seja, jovens que tm
algum tipo de conflito com a lei, e adolescentes do Bolsa Fa-
mlia. Aumentamos para 17 anos a faixa etria para receber o
benefcio varivel escolar. mais uma ao integrada com o
Bolsa Famlia. Esses adolescentes vo escola, mas tambm
tm atividades no contraturno da jornada escolar: atividades
pedaggicas, recursos de leitura, atividades esportivas, cul-
turais, atividades comunitrias. Ento, o esforo que todos
devemos fazer hoje talvez seja o grande desafio nacional, para
impedir que esses adolescentes tomem o caminho da morte,
da violncia, do crime, do alcoolismo, das drogas, e possam
encontrar o caminho da vida, ser pessoas corretas, acertadas
consigo mesmas e com a sociedade.
O Programa de Erradicao do Trabalho Infantil (Peti) se in-
tegra cada vez mais aos Centros de Referncia Especializados
de Assistncia Social (Creas) e com o Bolsa Famlia. um
trabalho para evitar que crianas e adolescentes sejam subme-
tidos a trabalho precoce, com prejuzo da atividade escolar.
Vamos agora a outro brao do nosso Ministrio: o Sistema
Nacional de Segurana Alimentar e Nutricional (Sisan). Na
verdade, ele est ligado quela poltica emblemtica lanada
pelo governo ainda em 2003, o Fome Zero. importante
lembrar que o Fome Zero no uma pol tica especfica. Ele
rene todas as aes, todas as polticas pblicas, aes gover-
namentais e no-governamentais que visam erradicar a fome
e a desnutrio no Brasil. E aqui uma notcia boa, que me
aquece o corao todos os dias: estamos acabando com a fome
no Brasil. O Fome Zero vitorioso. Estamos zerando a fome
extrema; temos ainda problemas graves de desnutrio, de
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palestra do ministro patrus ananias 19
insegurana alimentar. Aquela fome endmica que conheci
no Norte de Minas, no Vale do Jequitinhonha, e que todos
recentemente vimos em cenas dramticas na televiso, aque-
las multides nas estradas, nas ruas do Nordeste, clamando
por um prato de comida, at mesmo invadindo armazns.
No passado, eram criadas aquelas frentes de trabalho sem ne-
nhum critrio, sem nenhuma dimenso de poltica pblica;
isso no existe mais no Brasil.
Os personagens da obra Vidas Secas, de Graciliano Ramos, os
retirantes, os Fabianos, as Sinhs Vitrias; os personagens
aventureiros, os Bentinhos que tinham os olhos negros para-
dos de fome, naquela tragdia denunciada pelo Josu de Cas-
tro quanto a casos como esses, estamos virando a pgina, e
no pouca coisa, muita. bom e d um nimo danado para
continuarmos trabalhando.
Em 2003, foi reconstitudo o Consea, o Conselho Nacio-
nal de Segurana Alimentar e Nutricional, no plano nacio-
nal, com representantes governamentais e da sociedade civil.
O Consea se reproduz nos estados e municpios. Em 2006,
tivemos a aprovao da Losan, a Lei Orgnica de Segurana
Alimentar e Nutricional. Aqui quero prestar uma homena-
gem ao Congresso Nacional e lembrar que alguns objetivos,
algumas metas passam a pertencer Nao, so parte do pro-
jeto nacional. A Losan foi aprovada no Congresso Nacional no
ano eleitoral de 2006. Mostra que o Pas est convencido, na
sua grande maioria, de que a fome, a desnutrio, a pobreza
extrema so inaceitveis. Recentemente, foi aprovado tambm
no Congresso Nacio nal o Projeto de Emenda Constitucional
que incorpora na Constituio, nos direitos fundamentais, o
direito alimentao, superando a viso, ainda presente no
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CiClo de palestras desenvolvimento soCial e Combate fome20
Brasil, de que comida, alimentao, no direito. No dar o
peixe. Dar o peixe dar comida, garantir que a pessoa tenha
condio para pescar, o primeiro momento para que a pes-
soa possa chegar ao rio. Se no, ningum chega.
O programa de maior envergadura que temos no Minis trio,
de maior impacto social, na rea de Segu rana Alimentar, o
Programa de Aquisio de Alimentos da Agricultura Familiar
(PAA), tambm conhecido como Compra Direta. Ele est di-
retamente vinculado aoPronaf, Programa Nacional de Forta-
lecimento da Agricultura Familiar, com recursos agora de R$
15 bilhes, da safra 2009/2010. Vinculado ao Ministrio do
Desenvolvimento Agrrio (MDA), o PAA trabalha com agri-
cultores pronafianos. Ainda no um programa universal,
mas o estamos ampliando.
Compramos dos pequenos produtores por um preo justo de
mercado, fazendo um contraponto ao perversa dos atra-
vessadores, dos especuladores e de quem quer ganhar dinhei-
ro especulando com a fome. Com isso, garantimos condies
para que as famlias permaneam no campo, gerando em-
prego, trabalho, dignidade. Com a compra desses alimentos,
atendemos pessoas e famlias em situaes de vulnerabilidade
alimentar, especialmente crianas e pessoas idosas. Por isso
dizemos que um programa que sintetiza bem o Fome Zero.
estruturante numa ponta, gera trabalho, emprego, uma
dimenso emancipatria; e atende quem precisa aqui e agora,
na outra ponta.
Estamos integrando o PAA com outras polticas, como os equi-
pamentos que estamos implantando Restaurantes Populares,
em cidades com mais de 2 mil habitantes; as Cozinhas Comu-
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palestra do ministro patrus ananias 21
nitrias, que so restaurantes populares menores, com maior
participao comunitria; os Bancos de Alimentos, que guar-
dam alimentos, comprados do PAA ou de doao; as Feiras e
Mercados, que possibilitam, por meio de instalaes mais am-
pliadas, a relao direta produtor-consumidor. Estamos tam-
bm desenvolvendo programas de agricultura urbana, hortas
e lavouras comunitrias, programas de educao alimentar,
sempre nessa linha de melhorar as condies de alimentao.
Outro programa importante na regio mais seca do Brasil so
as cisternas, uma tecnologia brasileira de captao da gua das
chuvas. Possibilita-se assim que as famlias que moram no Se-
mirido tenham gua para consumo interno, para preparar os
alimentos, para higiene e at para pequenas atividades agr-
colas, como hortas familiares, e para a criao de pequenos
animais. Tenho visitado essas cisternas nos sertes do Brasil.
Na Bahia, encontrei uma senhora que me deu uma respos-
ta que nunca vou esquecer. Perguntei para ela: Qual o me-
lhor benefcio que a cisterna trouxe para a senhora?. E ela
respondeu: Posso ficar mais tempo perto dos meus filhos.
Quem conhece a realidade do serto do Brasil, do Semirido,
sabe que um sofrimento. s vezes voc tem que buscar gua
a duas, trs lguas de distncia, em cacimba, e a gua suja.
Via muito isso na minha infncia. E as mulheres so podero-
sas, elas tm uma fora impressionante. Elas pem uma ro-
dilha na cabea para acomodar aquela lata de querosene, que
a gente comprava antigamente para colocar no lampio, na
lamparina, aquelas latas de 18 litros, um peso danado, e vo
andando. No seguram a lata, no. um show de equilbrio. E
fico pensando: que estrago na estrutura da pessoa! Carregar
uma lata, um peso daqueles! E aquela mulher no falou que
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no estava carregando mais lata, no falou nada disso. Falou
de ter mais tempo para seus filhos.
Agora chegamos ao Bolsa Famlia. Fiz questo de deixar mais
para o fim exatamente para irmos construindo a ideia de que
o Bolsa Famlia est bem ancorado. Quem vai aos Restauran-
tes Populares, s Cozinhas Comunitrias, normalmente, na
grande maioria dos casos, so os beneficirios do Programa
Bolsa Famlia. Essas polticas, da Segurana Alimentar e da
Assistncia Social, convergem para o Bolsa Famlia. So um
conjunto de aes que possibilitam o desenvolvimento das
potencialidades das pessoas, famlias e comunidades pobres.
O Bolsa Famlia foi criado em outubro de 2003, institudo
por lei federal. um eixo estratgico para integrao de po-
lticas e aes da Rede de Proteo e Promoo Social e pro-
move direitos bsicos: direito humano alimentao, aces-
so a servios de sade, educao e assistncia social. O Bolsa
Famlia trabalha com famlias que tenham uma renda de at
R$ 140 como renda mensal familiar por pessoa. Uma famlia
que ganha at R$ 700 e que tenha cinco pessoas est dentro
do Bolsa Famlia. Portanto, vamos quebrar um preconceito,
um equvoco que muita gente comete: o Bolsa Famlia no
trabalha s com indigentes ou miserveis. Temos, no pro-
grama, um nmero representativo de famlias trabalhadoras
pobres, trabalhadores de baixa renda. E a o benefcio entra
como complemento de renda para essas famlias.
So hoje em torno de 15,5 milhes de famlias pobres atendi-
das em todos os municpios do Brasil, nos 5.564 municpios
desta grande Ptria brasileira. Em 2009, foram R$ 11,4 bi-
lhes, o que corresponde a 0,4% do PIB. Vamos injetar R$
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13 bilhes em 2010. um programa com um custo baixo de
operao: apenas 5% do oramento do programa; ele chega
diretamente s pessoas. uma operao que fazemos com a
Caixa Econmica Federal: o beneficirio tem um carto, vai
l e recebe, e pagamos especialmente para as mes: 92% dos
benefcios chegam para as mes. O homem s recebe quando
ele a nica referncia familiar. E as pesquisas mostram os
homens que perdoem que as mulheres tm um compromis-
so familiar maior. Quando a coisa aperta, os meninos ficam
com a me, na maioria dos casos. Os homens tendem a sumir
(isso feio para ns). E no s entre os pobres, no, em
todo canto.
O Bolsa Famlia trabalha com condicionalidades, a lei exige.
um preceito constitucional. Pela Constituio, toda criana
entre 6 e 15 anos (agora a partir dos 4 anos) tem que estar na
escola. No s exigncia famlia. H o outro lado, tam-
bm. mo dupla. A lei possibilita que as famlias pobres
possam reivindicar do poder pblico seja no plano muni-
cipal, estadual ou nacional servios de boa qualidade, edu-
cao pblica de qualidade, servio de sade de qualidade.
No s obrigao deles pr os filhos na escola, dever do
Estado oferecer esse servio de qualidade. importante dizer
que estamos acompanhando, monitorando esse processo das
condicionalidades.
Mencionamos a integrao com os Cras e o acompanhamento
feito, sobretudo quando as crianas no esto comparecendo
escola. E no h desligamento automtico quando as condi-
cionalidades no so cumpridas. um processo gradual. Tem
advertncia, depois bloqueio, suspenso e, em ltima instn-
cia, o cancelamento do benefcio. E quero enfatizar que no
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queremos desligar ningum. Queremos que as crianas este-
jam na escola. Da essa integrao positiva do Bolsa Famlia
com outros programas do Ministrio, e tambm do Minist-
rio da Educao, especialmente agora, esse acompanhamento
pelos Cras.
O Bolsa Famlia varia de R$ 22 a R$ 200. O benefcio m-
dio de R$ 94. Trabalhamos em dois nveis. Famlias mui-
to pobres, com renda familiar por pessoa de at R$ 70, tm
direito a um benefcio fixo que corresponde hoje a R$ 68.
E trabalhamos com famlias pobres. Famlia pobre aquela
que tem renda mensal familiar per capita de at R$ 140. Essas
famlias no recebem o benefcio fixo, de R$ 68. Elas tm
direito ao benefcio varivel. claro que as famlias muito
pobres tambm recebem, alm do fixo, o varivel. S que a
famlia pobre recebe o fixo, independentemente de ter filhos,
independentemente de ter criana na escola. Se tiver, entra o
varivel tambm.
O benefcio varivel se coloca em dois nveis: R$ 22 por
criana de 6 a 15 anos que esteja frequentando a escola, at o
limite mximo de trs. Portanto, pode chegar a R$ 66. Morre
aqui a acusao que fazem ao Bolsa Famlia de que estimula a
natalidade inconsequente. E h o benefcio varivel jovem de
R$ 33 por adolescente de 16 e 17 anos, at o limite mximo de
dois, portanto, alcanando R$ 66. Se somarmos o fixo de R$
68 com o limite mximo dos dois variveis, R$ 66 e R$ 66, d
R$ 200. Fechamos a conta.
Impactos imediatos na melhoria das condies de vida das po-
pulaes pobres: a promoo da segurana alimentar e nutri-
cional; a superao da fome; o empoderamento dos mais po-
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bres para o consumo (para o pobre, ter um armazm bom);
o empoderamento das mulheres (como vimos, o benefcio
pago especialmente a elas); reduo do risco do trabalho de
crianas (com a integrao com o Programa de Erradicao do
Trabalho Infantil); reduo da desnutrio infantil temos
uma pesquisa de dois anos atrs, que me deu uma alegria enor-
me: 93% das crianas vinculadas s famlias que recebem o
Bolsa Famlia tm pelo menos trs refeies dirias e apresen-
tam melhoria significativa na condio alimentar, com frutas,
verduras e carne. Para os pobres, falar em carne e leite tem
fora, porque no algo to acessvel. Devemos mencionar
ainda o acesso a produtos de consumo bsico, que melhoram
a condio de vida e autoestima. Para o desespero de alguns,
os beneficirios do Bolsa Famlia esto comprando geladei-
ra, fogo e liquidificador, coisas fundamentais para garantir
a segurana alimentar. Um jornalista escreveu um artigo inti-
tulado Bolsa Geladeira, tentando desqualificar o programa,
dizendo: Um programa que est garantindo geladeira. No
so mais pessoas pobres. revoltante.
H outro impacto importante: os pobres esto comprando. Esse
fato deve ser visto em relao com a educao e a sade. Al-
guns resultados so comprovados, como a reduo da pobre-
za e da desigualdade so 19 milhes de famlias pobres que
saram da misria extrema desde 2003 e a dinamizao das
economias locais. O dinheiro do Bolsa Famlia, do BPC e da
Agricultura Familiar circula. Os pobres, como disse o presi-
dente Lula, no guardam dinheiro. Eles melhoram suas casas
e condies de vida; compram comida, roupa, material escolar
para as crianas, bens bsicos para a dignidade familiar, como
eletrodomsticos fundamentais. Isso implica o aquecimento
do comrcio. O comrcio vendendo mais, compra mais da in-
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dstria e da agricultura. Um dos motivos pelos quais o presi-
dente Lula determinou o aumento do Bolsa Famlia em plena
crise econmica internacional foi esse. De um lado est a sua
sensibilidade extraordinria para os pobres, seu compromis-
so permanente com a incluso; do outro, a intuio poltica.
As polticas sociais, entre outros motivos, cumpriram, e esto
cumprindo, papel funda mental para que o Brasil esteja saindo
de cabea erguida dessa grave crise econmica internacional.
Alm da dimenso humanitria, tica e moral, garantir acesso
a bens e servios bsicos e direito vida tem tambm a di-
menso prtica, e com isso estamos vencendo um preconcei-
to histrico no Brasil: a ideia de que ou econmico ou
social. Ou o Pas cresce ou distribui renda. Distributivismo,
no. Uma coisa complementa a outra. Uma coisa necessria
outra: o social dando apoio economia. O Pas cresce por-
que os pobres esto entrando no mercado de consumo.
A reduo da dependncia das famlias em situao de traba-
lho escravo causa outro desespero em setores mais conserva-
dores do Brasil. Est desaparecendo gente para trabalhar.
Claro! Para trabalho escravo, no queremos mesmo no. Tem
que pagar melhor, ter carteira assinada, pagar salrio mnimo,
tem que recolher Fundo de Garantia por Tempo de Servio.
Fui convidado para proferir uma palestra na Organizao In-
ternacional do Trabalho. um reconhecimento do que es-
tamos fazendo no Brasil. Eles esto colocando o Brasil como
modelo de respeito aos direitos trabalhistas. Um trabalhador
desempregado que recebe o benefcio preserva sua dignidade
de trabalhador. E eles querem trabalho decente.
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Oferecemos aos trabalhadores o mnimo poder de barganha:
o Bolsa Famlia integrado a outras aes, especialmente o Ca-
dastro nico, referncia para outras polticas sociais; o pro-
grama Brasil Alfabetizado; agora a Tarifa Social de Energia; o
Programa Minha Casa Minha Vida; a incluso financeira, cha-
mada bancarizao dos beneficirios do Bolsa Famlia. A ban-
carizao no um fim em si, ela visa ao passo seguinte, que
ampliar cada vez mais o microcrdito, alm de formar micro e
pequenos empreendedores, estimular o cooperativismo. Te-
mos uma experincia positiva com o Banco do Nordeste, por
meio do Grande Amigo, e agora o Prximo Passo, aes de
capacitao profissional para os beneficirios do Bolsa Famlia
para as oportunidades de trabalho e emprego que esto cres-
cendo no Brasil com o PAC e outros investimentos.
Uma informao rpida sobre o Planseq, Plano Setorial de
Qualificao: tem o Planseq de Construo Civil e o Planseq
Turismo. E empresas privadas e pblicas esto capacitando
para suas aes no Pas, com recursos prprios, os benefici-
rios do Bolsa Famlia.
Um dado importante: se considerarmos o BPC e o Bolsa
Famlia, as transferncias totalizam R$ 30 bilhes. Portan-
to, mais de 90% do oramento do Ministrio. Cerca de 1%
do PIB. Nas regies mais pobres, essa proporo cresce. No
Nordeste, as transferncias representam 3% do PIB regional.
Enfatizo alguns dados em relao reduo da pobreza: 19,4
milhes de brasileiros e brasileiras saram da extrema pobreza
desde 2003, segundo a Fundao Getlio Vargas.
O Coeficiente de Gini 2001-2007 passou de 0,593 para
0,552, segundo pesquisa do Ipea. H uma pesquisa do Ipea
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mostrando que, segundo a Pnad 2007 (Pesquisa Nacional
por Amostra de Domiclios, do IBGE), a taxa anual de cresci-
mento da renda dos dez por cento mais pobres da populao,
no perodo 2001-2007, prxima da China e maior que a
de 99% dos pases.
Em 1990, o Brasil assumiu o compromisso internacional
de reduzir a fome para um quarto e a pobreza pela metade
at 2015, quando ser dado o balano universal das metas e
objetivos do milnio. Em 2006, j tnhamos cumprido esse
compromisso. Repactuamos perante o mundo e perante ns
mesmos. At 2015, vamos erradicar a fome e reduzir a po-
breza extrema para um quarto. Uma pesquisa recente do Ipea
colocou outra perspectiva. Se continuarmos com as polticas
sociais, ampliando, consolidando, aperfeioando e mobili-
zando mais recursos, mobilizando mais os governos estaduais
e municipais e a sociedade civil, at 2017 podemos vencer a
pobreza extrema do Brasil. E, em 2022, a gente dever co-
memorar os 200 anos da Independncia com um Brasil sem
fome, sem desnutrio, sem pobreza extrema, caminhando a
passos largos para uma sociedade cada vez mais igualitria, que
assegure a todos os nossos patrcios os mesmos direitos e opor-
tunidades. Traduzindo na prtica o Hino Nacional brasileiro:
Dos filhos deste solo s me gentil. De todos e de todas.
Falamos da reduo da desigualdade, do impacto do Bolsa Fa-
mlia, das polticas sociais no enfrentamento da crise. im-
portante lembrar tambm a manuteno da poltica de valo-
rizao do salrio mnimo. Quando comeamos no governo
do presidente Lula, nosso sonho era colocar o salrio mni-
mo em US$ 100. Agora, j estamos nos aproximando dos U$
300.
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Podemos mencionar a extenso do seguro desemprego, a exis-
tncia de uma ampla rede de proteo e promoo social, o
papel dessa rede na superao da crise e o aumento do mer-
cado interno. Diferentemente de outras crises, segundo pes-
quisa do Ipea de agosto de 2009, a pobreza e a desigualdade
continuaram caindo nas seis principais regies metropolitanas
do Brasil, em plena crise econmica internacional.
Restam alguns desafios, j que ainda temos um alto nmero
de pessoas na situao de pobreza. Ainda existem, no Bra-
sil, por volta de 30 milhes de seres humanos em situao
de pobreza. A taxa de desigualdade continua vergonhosa. Es-
tamos entre os pases que apresentam os piores indicadores
sociais do mundo, apesar do extraordinrio avano dos l-
timos anos, especialmente nesse perodo do nosso governo.
preciso lembrar a herana que recebemos e, ainda, a desi-
gualdade social e a concentrao da renda. A concentrao da
terra no Brasil continua alta, e vamos ter que enfrentar isso
futuramente, para criar um pas que possibilite vida digna e
decente para todos.
Nesse sentido, colocam-se desafios como manter a estabili-
dade econmica. J fui um pouco tolerante com a inflao.
Cheguei a pensar no passado: quem sabe com uma inflao-
zinha de 8%, 9%, o Pas cresce mais? No d. J pensaram
se houvesse inflao no Brasil? Em uma semana o benefcio
do Bolsa Famlia sumiria sem men cionar o BPC, os progra-
mas de apoio agricultura familiar, a revalorizao do salrio
mnimo. Portanto, estabilidade econmica fundamental.
s continuar mais alguns anos o processo histrico: estabili-
dade, crescimento econmico, rigorosas polticas de distri-
buio de renda, de incluso e justia social. Incluir cada vez
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mais a questo ambiental. Agora estou convencido de que a
questo ambiental no pode ser colocada nem como contra-
ponto, ou isso ou aquilo. Tem que ser e. No me esqueo
do texto que li uma vez, de Alceu Amoroso de Lima, pessoa
que marcou meu pensamento. Ele dizia: temos que superar a
disjuntiva ou pela conjuntiva e. Econmico e ambiental
e social. Mudamos o patamar do social quando comeamos a
falar de desenvolvimento social. Agora est na hora de come-
ar a falar tambm de desenvolvimento ambiental.
Finalmente, outros desafios que enfrentamos:
1) Fortalecer a capacidade de gesto do Estado. No h pol tica
social eficaz com Estado fraco. Quem viabiliza a poltica social
o Estado, com a participao, sim, da sociedade civil, dos em-
presrios. Queremos e fazemos parcerias com as igrejas, com as
organizaes no-governamentais, mas quem define mesmo
o Estado. As polticas sociais do Brasil esto mudando a cara do
Pas por alguns motivos. Entre eles, primeiro, o valor dos re-
cursos; segundo, o Estado que faz. Volta e meia recebo repre-
sentantes de outros pases que j chegam querendo saber como
que os empresrios participam. Os empresrios participam e
ajudam como parceiros. Mas quem puxa o Estado, ele que
determina as prioridades. A articulao federativa um grande
desafio. No fcil trabalhar com estados e municpios diferen-
tes. Vai dos municpios de So Paulo aos municpios pequenos
do Vale do Jequitinhonha ou da Amaznia. um desafio im-
portante integrar o Pas inteiro.
2) Aperfeioar os mecanismos de controle e fiscalizao.
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3) Fomentar a participao da sociedade civil, parcerias com
empresrios, responsabilidade social, igrejas, universidades,
pesquisas. Parcerias queremos, mas sempre com a diretiva do
poder pblico e, na mesma linha, os mecanismos de partici-
pao popular.
4) Garantir a continuidade do financiamento pblico das
polticas sociais. Sem dinheiro no se faz poltica social. Tem
que haver prestao de contas, tem que haver transparncia,
resultados, monitoramento, mas tem que existir dinheiro
para promover, consolidar e integrar cada vez mais as po-
lticas sociais. Promover convergncias. As polticas sociais
no podem ficar distantes umas das outras. Nesse sentido, o
conceito de territrio enunciador. Integrar as polticas so-
ciais nos territrios. Cada um com a sua especificidade, mas
convergindo sempre. O ser humano no divisvel. Metade
de mim estuda. Metade de mim tem sade. Outra metade de
mim pobre. No! Uma criana na escola no aprende sem
ter sade. Ningum tem sade se no tiver assegurado o di-
reito alimentao adequada com gua potvel, saneamento
bsico, moradia, e assim por diante. O desenvolvimento do
ser humano integral e por isso as polticas sociais devem se
articular para promover essa ascenso das pessoas, famlias e
comunidades pobres.
E que Deus continue abenoando a nossa caminhada, porque
estamos no caminho certo. agora, para no haver retroces-
so, e a gente abrir cada vez mais o compasso. Muito obrigado.
Prsio Davison (Ipea) O senhor fez referncia aos efeitos be-nficos do Bolsa Famlia, numa abordagem ampla de benefcios, e penso sobre um aspecto que talvez fosse importante ressaltar:
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que, embora o Bolsa Famlia tenha uma vocao, na sua des-tinao, criana na escola, no sentido alimentar, ele tem um benefcio fundamental ao seu irmo menor, s vezes de pouca e tenra idade. Segundo a medicina, at os dois anos de idade a nutrio fundamental para a formao do crebro e, portanto, para a capacidade inte lectual e a capacidade de se integrar, de ser produtivo na sociedade. Ento, h um efeito que no se mede no primeiro momento: da criana na escola ou do benefcio di-reto. O benefcio quela criana que tem famlia, alimen tao e a garantia de uma formao para ser um cida do com plenas condies de participao na sociedade ser medido em um pra-zo mais longo.
Bom, a questo que o Prsio coloca mais uma contribui-
o ao que falamos aqui, sobre a importncia da alimentao
j a partir da infncia. Uma criana que no devidamente
alimentada nos primeiros anos da sua vida, segundo estudos
neurolgicos, tem grandes possibilidades de ter sequelas, at
de aprendizado, de desenvolvimento mental, psquico e emo-
cional, e as funes bsicas para o aprendizado ficam com-
prometidas. Refora a ideia de que a alimentao no uma
questo de filantropia, uma questo de direito, diz respeito
vida.
Mrcio Wohlers (Ipea) Gostaria de parabenizar a transfor-mao de uma secretaria na integrao produtiva. Sei que j h um convnio em andamento com a Petrobras, de formao de tcnicos que ajudem a formar outros profissionais que a Petro-bras vai contratar localmente. Ento, acho que a extenso dessa parceria com mais empresas estatais, no s a Petrobras, pode-ria ser exemplo para que at algumas empresas grandes, como Vale do Rio Doce, fizessem o mesmo. Tivemos muitas experin-
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cias de arranjos produtivos locais. Tornou-se uma palavra da moda dez anos atrs. Mas essa questo com as grandes empresas algo novo, que complementa o arranjo produtivo local. E com as grandes empresas que tm viso e necessidade de formao de mo-de-obra local isso seria muito importante. Ento, o que o Ipea puder fazer por essa oportunidade de integrao produtiva e de formao de tcnicos, estamos disposio.
Se bem entendi a sua questo, Mrcio, estamos trabalhando
com algumas empresas. Alm do caso da Petrobras no Pro-
minp (Programa de Mobilizao da Indstria Nacional de
Petrleo e Gs Natural), que voc mencionou, h algumas
outras empresas, como a do Norberto Odebrecht, que fez um
convnio conosco se comprometendo a qualificar, com re-
cursos prprios, beneficirios do Bolsa Famlia em todas as
obras que ela esteja realizando no Brasil. J implementamos
em duas, a meta alcanar trs, ou seja, todas. A primeira
foi na obra da hidreltrica do Rio Madeira, em Rondnia.
Estamos buscando tambm outras parcerias, como por exem-
plo o Planseq, o Plano Setorial de Qualificao Profissional.
Temos trabalhado muito tambm com a Cmara Brasileira da
Indstria. Eles no esto aportando recursos, mas esto tra-
balhando, procurando sensibilizar as empresas para que elas
absorvam os beneficirios que esto sendo treinados e quali-
ficados.
Mrcio Wohlers Mas elas gastam esse dinheiro de responsabi-lidade social com marketing, fazendo as suas fundaes, algumas at fazem algo de bom; estou dizendo isso porque a minha rea mais telecomunicaes. Ento elas pem uns postos de inclu-so digital, mas isso mais ligado rea fim das empresas, para aparecerem mais no mercado, mas com a prpria rea fim. E se
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o Ministrio, por exemplo, desse outro selo, um prmio? Acho que estou chovendo no molhado.
No, no est chovendo no molhado. Trabalhamos muito
isso, agora quero colocar um depoimento tambm aqui, at
para que vocs considerem o assunto. Acho que o Minist-
rio e dentro do Ministrio, claro, o Bolsa Famlia um
caso singular de gesto que merece um estudo opera com
pouco mais do que 1,4 mil funcionrios, sendo a metade ter-
ceirizada, para atender mais de 60 milhes de pessoas pobres
em todos os municpios do Brasil, operando o oramento que
apresentamos aqui. Mil e quatrocentos o que tem a Secre-
taria de Assistncia Social de Belo Horizonte. A Secretaria de
Assistncia Social do Rio de Janeiro tem o dobro. Mil e qua-
trocentros destemidos. Ento somos claros e objetivos, temos
muito respeito, queremos parceria com as empresas, mas o
tempo que temos para ficar tentando converter empresrio ao
bem pblico pequeno. At porque acho que a primeira res-
ponsabilidade social de um empresrio social cumprir a lei.
Cumprir a legislao trabalhista, previdenciria, ambiental,
tributria, depois vamos conversar. Algumas empresas, como
disse aqui, tm nos procurado para uma conversa sria, querem
fazer um convnio. Vamos capacitar? Tudo bem. Pelejamos
muito mesmo. Fazemos um trabalho evanglico com eles.
Sandro Pereira Silva (Ipea) Ministro, ao fim de sua fala, o senhor colocou a questo da articulao de polticas pblicas como um desafio para avanar na qualificao das polticas so-ciais no Brasil. H quase dois anos, o governo federal vem lan-ando uma proposta de trabalho nessa rea de articulao de polticas pblicas que tida, talvez, como um programa ousado, que o Programa Territrios da Cidadania, que o senhor citou
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um pouco rapidamente. Queria saber duas questes. Primeiro, dentro do seu Ministrio, qual est sendo o esforo das vrias secretarias de trabalhar em conjunto com os rgos do governo, os vrios ministrios, nessa questo de articulao de polticas pblicas? E a outra questo como o senhor, integrante do pri-meiro escalo do governo, a Casa Civil (que coordena o pro-grama com a metodologia do MDA) e o prprio governo esto vendo o avano metodolgico desse programa, e a aceitao das vrias foras polticas dentro do governo.
O Sandro apresentou uma questo muito interessante sobre
os Territrios da Cidadania. No sei se exatamente essa a
questo que voc coloca, temos uma experincia, que mais
na rea rural, coordenada pelo Ministrio do Desenvolvi-
mento Agrrio, mas o Ministrio que aporta mais recursos
o do Desenvolvimento Social e Combate Fome. Vejo um
grande desafio em termos do Territrios da Cidadania nas
regies metropolitanas, na rea da periferia, nas reas pobres
das cidades maiores, das grandes capitais, regies metropoli-
tanas, onde as polticas sociais enfrentam maiores dificulda-
des, porque elas confrontam as foras diluidoras da morte,
do crime, da desconstituio dos valores familiares, comu-
nitrios. um desafio que temos hoje, comeamos, avana-
mos com o Pronasci, o Programa Nacional de Segurana e
Cidadania, que vem integrando aes, os nossos Cras e outras
aes do Ministrio; mas vejo que tem um desafio maior de
integrarmos essas aes. Aqui vou desenvolver um pouco o
que o Sandro levantou, nessa linha da integrao. Creio que a
questo dos territrios das periferias das grandes cidades pode
ser um grande passo agora. Mesmo nas regies mais carentes
e nas regies mais conflagradas pela violncia, pelo crime, te-
mos ali a presena do Estado. Tem um destacamento policial,
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tem uma delegacia de polcia, eventualmente at a presena
das Foras Armadas. Tem escola, um posto de sade, a Sade
da Famlia, o Cras, o Creas, os equipamentos culturais, es-
portivos; porm, esses equipamentos, esses agentes e gestores
pblicos no se comunicam para se contrapor de forma orde-
nada s foras diluidoras da violncia, do crime, da descons-
tituio das foras comunitrias. Esse um desafio, fazer que
esses equipamentos pblicos, sejam municipais, estaduais ou
nacionais, se integrem; que os gestores pblicos ali presen-
tes conversem, interajam, para construir aes integradas que
promovam a comunidade e que criem uma relao mais direta
e, a partir dessa interao dos agentes pblicos, interagir com
os agentes comunitrios que em todo canto tambm tm as
foras da vida. H, ainda, as igrejas, os movimentos sociais,
os movimentos de jovens, os jovens que fazem esse trabalho
belssimo de enfrentamento da violncia, do rap, do hip hop;
temos que buscar esses jovens, esses movimentos de jovens e
movimentos de mulheres, de mes, para congregar e fazer um
trabalho mais enunciador. Penso, Sandro, que a criao do
nosso Ministrio foi um passo importante nesse sentido. In-
tegramos, pelo menos aqui, assistncia social, segurana ali-
mentar e nutricional, Bolsa Famlia e transferncia de renda;
e agora temos uma nfase maior nas polticas de capacitao
profissional. No sei se foi por a que voc quis colocar a sua
questo. Se no foi, a gente fica com o dilogo assim meio
truncado, mas com o compromisso de continu-lo.
Helder Ferreira (Ipea) O Ministrio est de parabns pela capacidade de execuo oramentria neste perodo todo, e a minha pergunta nesse sentido. No MDS, quais os principais entraves para execuo, ou seja, dentro de uma preocupao de reforma do Estado, o que precisa ser aprimorado para facili-
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tar, para aperfeioar a gesto e o relacionamento com estados e municpios, o que pode ser feito para aprimorar a gesto do Estado?
Os entraves para a execuo so muitos, viu, Helder. Mas
estamos avanando. isso que falei aqui. O Ministrio do
Desenvolvimento Social e Combate Fome, no por mri-
to meu, mas por mrito das pessoas que l trabalham, mere-
ce um estudo srio de gesto. Nosso Ministrio um pouco
como um besouro, porque algumas pessoas j me disseram
que o besouro no deveria voar, ele voa desafiando todas as
leis da Fsica. O nosso Ministrio tambm no deveria dar
certo. Mil e quatrocentos para 60 milhes, presente em to-
dos os municpios do Brasil, um pouco demais. Ento,
uma experincia extraordinria, e batemos no peito todos os
anos para no dizermos que somos os melhores, digo que
estamos sempre entre os dois, trs melhores da execuo or-
amentria de todos os anos. O desafio este: aperfeioar as
relaes federativas. difcil acertar com os estados e mu-
nicpios que so diferenciados, uns tm maior compromisso
social, maior compromisso tico, outros nem tanto. Enfim,
h alguns desafios, mas acho que estamos avanando muito.
Recentemente, o Ministrio do Planejamento colocou o nos-
so Ministrio tambm como o caso de melhor experincia na
Esplanada em termos de gesto.
Nabil Moura Kadri (Sae) Ministro, gostaria de fazer uma pergunta a respeito dos desafios do Ministrio daqui em dian-te quanto s polticas sociais do governo. Conforme sua fala no incio, temos um desafio grande de reduo das desigualdades de riqueza, no s das de renda. Tambm conforme a sua fala, segundo a questo da poupana das famlias mais pobres, quais
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CiClo de palestras desenvolvimento soCial e Combate fome38
so os desafios que o senhor v e as possibilidades de atuao de um Ministrio como o MDS na reduo das desigualdades de riqueza, no s das de renda, tendo em vista que a propenso marginal poupana da populao mais pobre baixa? Se eles no tm condies de fazer a poupana por si mesmos, qual o papel de um Ministrio como MDS na reduo das desigualda-des de riqueza e no apenas de renda?
O Nabil formulou uma questo que outras pessoas tambm
fazem, que a da desigualdade na distribuio da riqueza.
Penso que o Ministrio representa um grande avano, como
falei aqui, porque historicamente o dinheiro pblico no Bra-
sil foi sempre privatizado, ele sempre pertenceu aos ricos. Vi
muita gente falar comigo, e falam at hoje: Esse dinheiro
que vocs esto gastando na rea social muito, esse dinhei-
ro tem que ir para a rea econmica, para gerar empregos.
a velha lgica que diz que o que produz justia social o
crescimento econmico. Se fosse assim, o Brasil seria um pas
justo hoje, crescemos muito no sculo XX, no distribumos
riqueza. Penso que temos alguns desafios, temos de fazer no
Brasil, sim, uma reforma tributria vinculada aos princpios
da justia tributria. Quem pode mais paga mais. Quem pode
menos paga menos. Quem no pode no paga, recebe, para
contribuir no futuro. Porm, isso no depende s do gover-
no, isso tem que ser um pacto. Qualquer reforma tributria
um sufoco no Congresso Nacional, imagina uma reforma
tributria que incida realmente, de maneira mais vigorosa,
na propriedade. Porque defendo historicamente, sempre de-
fendi, dois princpios bsicos: um deles, alis, que faz parte
da minha formao crist, o princpio da condio social
da propriedade do grupo. O direito de propriedade leg-
timo, civilizatrio, o mercado importante, mas no pode
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palestra do ministro patrus ananias 39
ser desorganizado. Vimos que o mercado precisa ser discipli-
nado. O direito de propriedade e a livre iniciativa, boas em
princpio, no podem ser divorciadas, dissociadas, do bem
comum, do interesse pblico, do interesse coletivo, do bem
maior da sociedade. Ento, o direito propriedade abusi-
vo voc ter hoje, por exemplo, propriedades especulativas,
propriedades que no produzem, seja na rea rural, seja na
rea urbana isso me parece inaceitvel, no sculo XXI, com
as exigncias sociais e ambientais que temos. Que a sociedade
tem. Fico pensando que daqui a cem anos os nossos netos e
bisnetos vo falar o que falamos hoje dos antigos senhores de
escravos que queriam ser indenizados. Imagino que os nossos
bisnetos, tataranetos, vo falar assim: Olha, que coisa engra-
ada, no tempo deles as pessoas tinham o direito de ter uma
propriedade que no trazia nenhum benefcio pblico. Voc
ter terra que no traz benefcio pblico um atraso. Os pases
capitalistas mais desenvolvidos j resolveram isso no comeo
do sculo passado. O princpio da funo social da proprie-
dade e do lucro est hoje consolidado nos pases do chamado
capitalismo mais desenvolvido.
Outra questo a do lucro. Tem que ter lucro, sim, se no
tiver lucro no tem expanso empresarial, no gera empre-
gos, no incorpora novas tecnologias. O modelo estatizante
fracassou. Agora, o lucro tem que ter limite tambm, e no
razovel que o empresrio rico vincule a empresa para ter
os benefcios empresariais no seu patrimnio. Ento, ele pe
na empresa o seu avio particular, o seu iate particular, a sua
fazenda particular, as suas casas, os seus apartamentos, e no
paga imposto sobre isso. Considero injusto. Claro que no
vamos fazer isso fora. A democracia um valor fundamen-
tal, temos que constru-la pelo dilogo e colocar represen-
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CiClo de palestras desenvolvimento soCial e Combate fome40
tantes no Congresso Nacional, no Poder Judicirio mas se-
guindo essa nova dimenso. No se trata de socialismo, mas
de um capitalismo atento s necessidades maiores do interesse
do Pas.
Melissa Andrade (Ipc-Ig) Qual a relao entre as po-lticas sociais no Brasil e a comunidade internacional?
Acho que bastante significativo na experincia brasileira
justamente assumir a poltica social no nvel mais alto
de governo, o que um exemplo at para outro pases,
especialmente no contexto africano, onde existe uma
ortodoxia muito forte. O Estado no assume a poltica
social como prioridade. Assim, acho que isso o que se
destaca dentro da experincia brasileira. Ao mesmo tem-
po, creio que existem experincias interessantes na co-
munidade internacional, como, por exemplo, no caso
do Chile, onde existe uma base de dados extremamente
avanada, diria que em alguns casos at mais avanada do
que a base de dados brasileira. Existem algumas experi-
ncias interessantes, como no caso da ndia e da frica
do Sul, onde h programas de emprego pblico que esto
criando um dilogo com os programas de transferncia
de renda. Ento, a minha pergunta no somente no
sentido do que que o Brasil tem compartilhado com
a comunidade internacional, mas em termos do que a
comunidade internacional tem promovido de polticas
inovadoras e em que medida e que tipo de lies o Brasil
tambm tem que extrair delas para poder avanar nas suas
prprias polticas sociais.
Melissa coloca a questo da relao internacional. Temos uma
relao forte com o plano internacional. Melissa, estamos at
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palestra do ministro patrus ananias 41
mesmo aprendendo. Tnhamos uma forte relao de opor-
tunidades com o Mxico; com o Chile, que voc mencionou,
temos at hoje uma boa cooperao nessa parte de resultados,
de monitoramento, de avaliao. A implantao da nossa Se-
cretaria de Avaliao e Gesto da Informao teve grande par-
ticipao na nossa cooperao com o Chile; temos fortes rela-
es com organismos internacionais, como o Banco Mundial,
os organismos da ONU: FAO (Organizao das Naes Uni-
das para a Alimentao e Agricultura), Unesco (Organizao
das Naes Unidas para a Cincia, Educao e Cultura), e
Pnud o Programa das Naes Unidas para o Desenvolvi-
mento. Voc mencionou a ndia e a frica do Sul: temos um
programa especfico para esses pases, no contexto do Ibas.
Estamos trabalhando muito com os pases da frica. Alguns
pases da Amrica do Sul esto investindo, mas temos difi-
culdade com alguns. Por exemplo, no conseguimos acertar
um acordo de colaborao social com a Venezuela, nem mui-
to profundo com a Argentina gostaria disso, porque eles
tm certo preconceito com o Bolsa Famlia, eles acham que
os nossos programas so ditados pelo Banco Mundial, pelo
Fundo Monetrio Internacional. Com o Uruguai, por exem-
plo, temos uma relao tima. O Uruguai est implantando o
Bolsa Famlia. Ento, o Brasil tem uma opo muito prpria.
singular a opo do Brasil. Isso que o presidente Lula con-
seguiu fazer, colocar as polticas sociais em lei, algo admi-
rvel, porque a tradio na Amrica Latina do populismo,
que um pouco a dos nossos pases irmos que no vou citar
aqui, e h um esforo grande na frica. Agora isso, pas que
se interessa tem que pr dinheiro, de alguma forma. Estamos
em uma tentativa de colaborao sofrida com o Haiti. isso,
estamos pelejando. P na estrada.
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CiClo de palestras desenvolvimento soCial e Combate fome42
Lus Csar Loureiro de Azevedo (Ipea) De certa forma, o Brasil adotou uma atitude bastante corajosa tendo o Benefcio de Prestao Continuada, que um benefcio assistencial, com o piso na mesma referncia do sistema trabalhista, o salrio mni-mo. Em pouqussimos lugares do mundo existe isso. at normal que esses benefcios de cunho social tenham um valor menor que o trabalhista. Ento, j se comea a constatar certa reao con-servadora a essa posio adotada pelo Brasil, fazendo-se este tipo de crtica: Est querendo inventar coisa, no mundo inteiro isso muito diferente do que estamos fazendo aqui. Gostaria de saber o que o Ministrio est fazendo para articular, vamos di-zer, de forma convincente, uma defesa para a manuteno dessa poltica no Brasil?
Lus Csar, acho que voc colocou um assunto importantssi-
mo. Ontem, discuti isso com o pessoal do Ministrio. Vamos
ter de enfrentar a questo do BPC (Benefcio de Prestao
Conti nuada), sim. E o setor conservador est em cima. Se
somarmos com a renda mensal vitalcia, vai dar R$ 22, R$
23 bilhes. Estamos trabalhando a focalizao cada vez maior,
vamos discutir tambm como estamos discutindo o Bolsa Fa-
mlia. razovel integrar o BPC, pensando-o em outro mo-
delo por exemplo, devendo sempre manter vinculado ao
salrio mnimo, ao reajuste do salrio mnimo. A reao
muito forte. De um lado, temos uma atitude meio ousada,
para no falar outra coisa, do Poder Judicirio, que est am-
pliando muito. Eles esto definindo a linha de pobreza deles,
o que uma temeridade, porque daqui a pouco explode. E,
na outra ponta, os setores mais conservadores, monetaristas,
tambm doidos para tirar o BPC da histria. um desafio
para ns.
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palestra do ministro patrus ananias 43
Antnio Jorge Ramalho (Sae) Antes de mais nada, minis-tro, parabns pela palestra, alis, pelo trabalho que vem sendo feito. J na apresentao do senhor, a instrumentalizao do processo educacional. Educao cidad. Os incentivos do Es-tado execuo dessas polticas servem tambm para conscien-tizar o cidado dos seus direitos, dos seus deveres, e assim por diante. Nesse sentido, o senhor termina falando sobre a questo ambiental. Gostaria que o senhor elaborasse algumas questes fundamentais, como: em que medida esses programas trazem e motivam o papel da educao ambiental? A preocupao com isso sei que existe, programa de catadores de lixo, por exemplo. Existe alguma preocupao de tornar as pessoas conscientes de sua responsabilidade j na concepo do programa ou no? Em segundo lugar, a questo da formao profissional. Em que medida o senhor enxerga esses programas tambm como instru-mentos de educao das pessoas, no s para a cidadania, no s para conscientizao de seus direitos e deveres, mas tambm para uma ao mais ativa, no sentido de se tornarem autno-mas, independentes, quanto aos problemas futuros?
Gonzalo Enriquez (Sae) Em primeiro lugar, gostaria de pa-rabenizar o ministro pela sua apresentao, pelo trabalho que tem sido feito at agora, os dados so incontestveis. Nesse sen-tido, o avano das polticas pblicas no combate pobreza e fome fundamental para continuar esse ciclo de expanso co-letiva, econmica e social. Do ponto de vista dos desafios, para mim fica uma questo, e acredito que a sua explanao seja fundamental. Fala-se muito da porta de sada na verdade, como o senhor havia falado em outras oportunidades, a porta de entrada a outras oportunidades que so fundamentalmen-te de transformar todo esse conjunto de seres humanos, que j so produtivos, que no vivem do assistencialismo, e trabalham
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CiClo de palestras desenvolvimento soCial e Combate fome44
certamente; novas oportunidades de trabalho para faixas sociais que ainda no esto incorporadas nesses setores. Lembro de ter ouvido em outras ocasies que a superao da pobreza no passa apenas pelo salrio e as condies econmicas, passa tambm por todo um conjunto de oportunidades que necessrio gerar e oferecer de forma estrutural e at de forma regional. Ento, novas possibilidades devem ir nesse sentido. Gostaria de ouvir seu comentrio sobre esse tema.
Glauce Maria da Costa Campello (Ipea) Pergunto em que medida o governo considera a possibilidade de transformar o Bolsa Famlia efetiva mente num direito, como o Benefcio de Prestao Conti nuada, compondo a um sistema de garantia de renda? E gostaria ainda de saber se se considera a possibilidade de criar uma regra de reajuste dos benefcios, a fim de salva-guardar essa poltica.
Fabio Veras (Ipc-Ig) A minha pergunta um pouco como a da minha colega do Ipea, basicamente pensar no futuro do Bol-sa Famlia. O programa nasce como uma reforma no sistema j existente de transferncia de renda, e fico pensando se no seria o momento de dar um passo mais adiante na perspectiva de re-duo da desigualdade no Brasil e propor algo mais audacioso e que revele todas as transferncias que o Estado brasileiro faz para as famlias e para as famlias com crianas. Vemos ata-ques sistemticos ao Bolsa Famlia, por induzir a preguia, por desvio da finalidade precpua do programa, e esquecemos que a nossa classe mdia, os meus pais, por exemplo, descontavam do imposto de renda o que eles gastavam com a minha educao no ensino privado. Esquecemos que existe tambm o salrio-famlia que os trabalhadores do setor formal, de baixo salrio, mas que
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palestra do ministro patrus ananias 45
podem ser de famlias, recebem. Pergunto se no seria este o mo-mento de a gente no s olhar para a transferncia, mas olhar tambm para os impostos que financiam as transferncias e para as outras transferncias que no tm um carter assistencial, mas que tambm so vinculadas criana, e fazer uma grande re-forma e mostrar o que o Estado subsidia s crianas de todos os brasileiros. E, nessa perspectiva, fazer uma reforma, algo, por exemplo, que o Uruguai acabou de fazer. Juntou-se o benefcio previdencirio que j existia com o benefcio assistencial que o programa Panes implementou em 2005, fazendo uma grande reforma, estruturando algo que passa a ser uma poltica, uma perna da proteo social, que dessa maneira se livra dos ataques sistemticos, por exemplo, de possvel uso poltico do programa ou de gerar efeitos desnecessrios. Ento, a minha pergunta nesse sentido, se h uma reflexo no Ministrio sobre transfor-mar o Bolsa Famlia realmente num outro critrio da proteo social, junto com o BPC, numa perspectiva de um direito que seja universal, que seja para todos, mas que corrija desigualda-des, ou seja, os pobres continuam recebendo benefcios maiores. Se colocarmos na ponta dos lpis, no sei at que ponto a classe mdia brasileira no recebe benefcios maiores para seus filhos, mas essa uma conta que acho que ningum est com vontade poltica de fazer.
Agora vou responder a algumas perguntas que seguiram a
mesma linha, em relao ao Bolsa Famlia, os seus desafios
daqui para a frente. Temos uma discusso muito boa nos mi-
nistrios sobre isso. Essa ideia de que os programas sociais
tendem a acabar. Os pases mais desenvolvidos do mundo, do
ponto de vista social por exemplo, os pases escandinavos
continuam investindo, e muito, na rea social. Na medida em
que as pessoas, as famlias, as comunidades pobres vo melho-
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CiClo de palestras desenvolvimento soCial e Combate fome46
rando as condies de vida, os problemas sociais tambm vo
se integrando, vo interagindo, vo se universalizando, vo se
aperfeioando e vo acompanhando a ascenso das famlias,
das comunidades, na perspectiva que para mim muito cara,
de uma sociedade que assegure efetivamente, de fato e de di-
reito, para todas as pessoas, desde o ventre materno, um pata-
mar rigorosamente comum de direitos e oportunidades. Que
todos tenham rigorosamente as mesmas chances diante da
vida. Quero deixar claro aqui o nosso trabalho no Ministrio:
no estamos l, esses 1,4 mil bravos que esto carregando esse
Ministrio e fazendo esse trabalho esplndido, no estamos l
s para acabar com a misria extrema no. O que nos motiva
o nosso olhar mais altaneiro, mais ousado, para frente, uma
sociedade igualitria, democrtica, que respeite e promova os
direitos humanos, mas que afirme, de forma vigorosa tam-
bm, os direitos sociais, econmicos, culturais, a dignidade
da pessoa humana e a expanso da vida. Nesse sentido, esta-
mos discutindo muito as perspectivas do Bolsa Famlia por
exemplo, vamos mant-lo vinculado linha da pobreza ou va-
mos avanar na perspectiva da desigualdade social? Indepen-
dentemente da renda, os 20% mais pobres vo receber um
benefcio at que o Pas atinja um patamar decente de relaes
humanas, de igualdade. claro, no se trata ainda de uma
igualdade retilnea, igualdade de direitos, de oportunidades,
de chances na vida. A questo do trabalho tambm. Porta de
sada uma expresso horrorosa, porque l em Bocaiuva, o
pessoal fala que a porta de sada serventia da casa, para a
pessoa incmoda, desagradvel. Os pobres ficaram 500 anos
excludos, 500 anos na escravido, sofrendo a concentrao
da terra. A, de repente, as pessoas falam assim: Quando que
essa gentinha vai sair da? Esses incmodos, esses chatos, no
querem progredir na vida. Lembro quando lanamos o Bol-
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palestra do ministro patrus ananias 47
sa Famlia, vocs lembram disso: Eles vo tomar cachaa com
esse dinheiro. Hoje, a gente faz as pesquisas e o dinheiro est
chegando l para as crianas, elas esto comendo, esto mo-
rando melhor, esto melhorando de vida.
Ana Paula Calil (Sae) Na sua viso sobre o papel do Minis-trio, caso se consiga desenvolver o Pas do jeito esperamos para daqui a vinte anos, qual seria a evoluo natural do Ministrio do Desenvolvimento Social?
No estou pensando em acabar com o Ministrio no. Tem
muita gente que acha que o Ministrio passageiro. Fizemos
aqui um simpsio de desenvolvimento internacional, voc
v o que a Sucia continua investindo hoje na rea social. A
igualdade de direitos e oportunidades exige uma vigilncia
permanente porque o ser humano gosta de puxar um pou-
quinho para si, ento o Estado tem que estar sempre presente.
Jos Maria Reganhan (Dirur/Ipea) A minha pergunta refere-se ao que poderia ser um desafio para o futuro e decorre de uma informao que recebi por e-mail. Como preparar as famlias para sarem com opes de trabalho e de renda dos programas sociais do governo, no s o Bolsa Famlia? Recebi um e-mail informando que 500 mulheres capacitadas em um curso de cos-tureiras pelo CID Txtil no quiseram registrar em carteira de trabalho as ofertas de emprego das empresas associadas. Soube que essas mulheres trabalhariam sem ser registradas para no perderem acesso ao Bolsa Famlia.
O trabalho d dignidade s pessoas, d autoestima, seguran-
a, pelo trabalho que nos inserimos na vida social, pelo
trabalho que aportamos a nossa contribuio para o bem co-
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CiClo de palestras desenvolvimento soCial e Combate fome48
mum. O trabalho um valor fundamental alis, acho que
devemos dissociar o trabalho de remunerao. O trabalho
tem uma dignidade em si, o ser humano se orgulha em traba-
lhar. Essa uma dimenso importante. Mas h outra dimen-
so, Jos Maria, que o seguinte: no Bolsa Famlia existe um
conjunto de famlias que so muito pobres, gente que nunca
teve chance na vida. Pessoas que no passado no tiveram os
direitos e as oportunidades bsicos. Temos ainda no Bra-
sil, hoje, 11% de analfabetos. Imagina uma pessoa analfabeta
hoje: ter muita dificuldade para trabalhar. Pessoa que nun-
ca trabalhou, que est desempregada h muito tempo, pessoa
que perdeu a autoestima, famlias em processo de descons-
tituio. Agora, trabalhamos tambm com trabalhadores de
baixa renda. Quanto questo do trabalho, o prximo passo
a relao com as empresas. Estamos dando grande priori-
dade ao trabalho, mas algum lembrou aqui de outra dimen-
so: no podemos nos reduzir apenas ao valor econmico.
At separo o trabalho do econmico. A emancipao das fa-
mlias precisa de uma dimenso mais cidad. Queremos for-
mar trabalhadores, mas tambm cidados e cidads. Pessoas
que tenham uma insero na vida social. Pessoas que tenham
um olhar mais alentado para o futuro, sobre a vida, sobre si
mesmos. Queremos tambm alargar a conscincia, a mente e
o corao das pessoas com as quais estamos trabalhando.
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Palestra do ministro
Juca FerreiraCultura
palestra proferida em 11/2/2010
volume 1 (1a5).indb 49 23/12/2010 12:41:31
Juca Ferreira
1949 Nasce em 31 de janeiro, em Salvador - Bahia.
1968 presidente da Unio Brasileira dos Estudantes Secundaristas (UBES).
1974-1978 Estudou Lnguas Latinas na Universidade de Estolcomo - Sucia.
1978-1980 Concluiu Licenciatura em Sociologia do Desenvolvimento Institut D Estude du Developpement Economique et Social - Universit Paris 1 Sorbone.
1981-1989 Assessor especial da Fundao Cultural do Estado da Bahia
1991-1992 Participa da construo de um dos primeiros projetos de arte-educao do Brasil, o Projeto Ax, voltado para crianas e adolescentes em situao de risco social.
1993-1996 Secretrio municipal de Meio Ambiente, em Salvador.
1993-1996 Vereador do municpio de Salvador.
1993-1995 Presidente da Associao Nacional de Municpios e Meio Ambiente (ANAMMA).
1997-2002 Diretor da Fundao Movimento OndAzul, entidade ambientalista fundada por Gilberto Gil.
2000-2002 Vereador do municpio de Salvador.
2003-2008 Secretrio-executivo do Ministrio da Cultura.
2008 Ministro de Estado da Cultura.
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Palestra do ministro
Juca Ferreira
uma alegria estar aqui para falar da compreenso do Mi-nistrio da Cultura, da maneira como ns estamos tra-tando a cultura brasileira e a relao do Estado brasileiro com
a Cultura.
Primeiramente, quero falar da viso estratgica da cultura.
Esse conceito de estratgia do mundo militar e migrou para
o mundo da poltica, e da poltica migrou para o mundo dos
negcios e agora est migrando para as polticas sociais. Ou
seja, um conceito que vem se consolidando pelo carter or-
ganizativo, da possibilidade de voc compreender conjuntos
complexos a partir de objetivos muito claros. Evi-
dentemente, cada dimenso adapta o conceito de
estratgia para o universo especfico. Antonio Gra-
msci produziu textos sobre estratgia em que faz a
diferena entre estratgias do mundo militar e do
mundo da poltica; e os empresrios tambm,
para o mundo dos negcios, so obrigados a
adaptar o conceito; e eu vou tentar desen-
volver a viso a partir do mundo da cultu-
ra, que uma dimenso importante.
51
complexos a partir de objetivos muito claros. Evi-
dentemente, cada dimenso adapta o conceito de
estratgia para o universo especfico. Antonio Gra-
msci produziu textos sobre estratgia em que faz a
diferena entre estratgias do mundo militar e do
mundo da poltica; e os empresrios tambm,
para o mundo dos negcios, so obrigados a
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CiClo de palestras Cultura52
Quando chegamos ao Ministrio da Cultura, encontramos
uma realidade assustadora. O Estado no tinha uma com-
preenso clara do seu papel em relao ao mundo cultural e
quanto produo simblica brasileira. Havia at uma ideia
de transferir essa responsabilidade completamente para a rea
privada, para o mundo empresarial. Como se isso fosse pos-
svel em um pas com a dimenso do Brasil, com uma rique-
za cultural como a nossa, reconhecida no mundo todo como
uma das maiores diversidades culturais do mundo. O Estado
brasileiro insistiu em ignorar, durante muito tempo, a im-
portncia social, a importncia de projeto de qualidade de
vida, a importncia para o desenvolvimento, considerando
que hoje est entre as trs maiores economias do mundo, a
que mais cresce e a que mais emprega.
O principal slogan do Ministrio, Cultura um bom neg-cio, reflete bem a lgica de como era encaminhada a questo
cultural na poca. O Iphan (Instituto do Patrimnio Hist-
rico e Artstico Nacional), uma instituio que j foi, junto
com as Foras Armadas e o Itamaraty, considerada a melhor
burocracia do Estado brasileiro, a mais eficiente, a mais efi-
caz, tinha mais de vinte anos que no tinha um concurso se-
quer. Isso era reflexo do encaminhamento para essa estratgia
de se ver livre da relao com o mundo simblico, o mundo
da produo cul tural, toda essa complexidade que compe o
mundo da cultura. Isso no um equvoco governamental,
no um erro ao acaso.
Na verdade, a relao do Estado com a cultura muito difcil.
Historicamente, em todos os lugares do mundo, uma rela-
o complexa. uma questo vital para a formao da Nao,
o desenvolvimento da sociedade, os vnculos sociais e a econo-
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palestra do ministro JuCa ferreira 53
mia. Mas, ao mesmo tempo, ela tem uma complexidade e uma
sutileza. Frequentemente, se caminha na direo da iseno
e do distanciamento ou na direo do intervencionismo, do
excesso de presena do Estado na produo cultural, muitas
vezes at definindo correntes estticas como prioritrias, iso-
lando reas do pensamento crtico. A histria est cheia desses
exemplos, e o Brasil viveu durante muito tempo sob a gide
dessa desconfiana da produo cultural e dos seus agentes.
O Estado brasileiro est construindo sua legitimidade. His-
toricamente, sua margem de legitimidade foi muito pequena,
de pouco reconhecimento por parte da sociedade de que ele
um ente que produz qualidade de vida, que sensvel aos
interesses da sociedade, que capaz de absorver as demandas
e transform-las em processos de construo e de fortaleci-
mento do conjunto dos que formam a sociedade.
Essa baixa legitimidade do Estado tem a ver tambm com a tra-
dio de autoritarismo. Desde que foi proclamada a Repblica
no Brasil, tivemos muitos anos de autoritarismo, de instabi-
lidade, de regimes que no tiveram a capacidade, de fato, de
criar vnculos slidos com a sociedade, de gerar um controle
social do Estado por parte do conjunto social a no ser neste
ltimo perodo da Repblica, em que estamos construindo de
fato mecanismos mais profundos a partir da Constituio de
1988. A sociedade brasileira convocada de quatro em quatro
anos para votar, mas no tem muita identidade com as polticas
que so desenvolvidas, a no ser em momentos excepcionais.
Assim, coloca-se uma tarefa importante para este momento
de construo da democracia, que alargar a legitimidade do
Estado brasileiro. S se fortalece o Estado na medida em que
este conta com a compreenso, por parte das maiorias sociais,
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CiClo de palestras Cultura54
de que ele um agente de construo, de qualidade de vida, de
fortalecimento da Nao e dos vnculos sociais.
Essas consideraes preliminares so importantes porque
esta discusso estratgica no Brasil. Estratgica na medida
em que est no ncleo central de um conceito de desenvolvi-
mento para o Pas. No h possibilidade de pensar no Brasil
apenas na circulao de mercadorias, no desenvolvimento da
capacidade produtiva do Pas, na satisfao das demandas mais
elementares de sobrevivncia, no aumento do poder aquisi-
tivo, na habitao. evidente que esse conjunto que com-
pe as necessidades bsicas mais reconhecidas pela sociedade
fundamental. No existe possibilidade de fortalecer, de se
desenvolver, se no gerarmos reduo da desigualdade social
no Brasil. Aumentar o poder aquisitivo por meio do aumento
da capacidade produtiva da sociedade e do esforo do Estado
em distribuir melhor essa renda uma instncia que j est na
conscincia da cidadania, j faz parte da demanda social, de
um programa de cidadania.
A questo cultural sempre ficou um pouco margem. O mi-
nistro Gilberto Gil dizia que o Estado brasileiro tratava a cul-
tura como se fosse a cereja do bolo. Na hora d
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