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ISAURA MARIA LONGO
IDENTIDADE DAS UNIVERSIDADES COMUNITÁRIAS NO CONTEXTO
DAS POLÍTICAS EDUCACIONAIS PARA ENSINO SUPERIOR
ITAJAÍ (SC) 2019
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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ Vice-Reitoria de Pesquisa, Pós-Graduação e Inovação
Programa de Pós-Graduação em Educação – PPGE Curso de Doutorado em Educação
ISAURA MARIA LONGO
IDENTIDADE DAS UNIVERSIDADES COMUNITÁRIAS NO CONTEXTO
DAS POLÍTICAS EDUCACIONAIS PARA ENSINO SUPERIOR
Tese apresentada ao colegiado do PPGE como requisito parcial à obtenção do grau de Doutor em Educação – área de concentração: Educação – Políticas para Educação Básica e Superior. Orientadora Professora Dra. Regina Célia Linhares Hostins.
ITAJAÍ (SC) 2019
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ISAURA MARIA LONGO
Tese avaliada e aprovada pela Comissão Examinadora e referendada pelo Colegiado do PPGE como requisito parcial à obtenção do grau de Doutor(a) em Educação.
______________________________ DRA. VALÉRIA SILVA FERREIRA
COORDENADORA
Apresentada perante a Banca Examinadora composta pelos Professores:
_________________________________________________ DRA. REGINA CÉLIA LINHARES HOSTINS (UNIVALI)
PRESIDENTE E ORIENTADORA
___________________________________________________ DRA. VALÉRIA SILVA FERREIRA (UNIVALI)
MEMBRO
______________________________________________________ DR. JÚLIO CESAR GODOY BERTOLIN (UPF)
MEMBRO EXTERNO
___________________________________________________ DR. TRISTAN MCCOWAN (LONDON)
MEMBRO EXTERNO
Itajaí-SC, 24 de abril de 2019.
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AGRADECIMENTOS
À professora Regina Célia Linhares Hostins, minha querida orientadora, pelas
importantes contribuições a este trabalho e pelo incentivo na realização de uma tese a respeito
do modelo comunitário de universidade. Mas, antes de tudo, minha gratidão pela amizade linda
que cultivamos.
Ao professor Tristan McCowan, do Institute of Education (UCL/Londres), pelas
valiosas orientações a respeito dos rumos teórico-metodológicos da tese.
Aos professores Júlio César Godoy Bertolin da universidade de Passo Fundo e Valéria
Silva Ferreira da Universidade do Vale do Itajaí pelas significativas contribuições durante a
banca de qualificação do projeto da tese.
Aos professores entrevistados durante a pesquisa, pelo tempo, reflexões e pontos de
vista comigo compartilhados.
À Universidade do Vale do Itajaí, especialmente à Vice-Reitoria de Pesquisa, Pós-
Graduação e Inovação, pelo apoio por meio do programa de Bolsa de Estudo e incentivo à
pesquisa.
Ao meu querido amigo André Luiz Vailati, pelo incondicional apoio aos dias que
exigiram a minha ausência da extensão e por compartilhar momentos de incertezas e desafios.
Às minhas queridas amigas Ana Cristina B. Cardoso e Cláudia Beatriz B. da Cruz por
me apoiarem nos momentos de pedido de socorro.
Aos colegas, professores e funcionários do Programa de Pós-Graduação em Educação,
pela sempre prestativa acolhida.
Aos colegas e alunos da Escola de Artes, Comunicação e Hospitalidade, especialmente
ao coordenador Hans Peter Behling, pelo apoio nos momentos de angústia.
Aos meus bolsistas dos projetos de extensão dos quais fui coordenadora pelo suporte às
ações de extensão e ao empenho em ajudar.
Ao Gilberto, meu companheiro, pela acolhida afetiva e pela disponibilidade em ser um
facilitador nesse processo tão intenso. Crescemos juntos.
Aos meus filhos, Rodolfo e Nathalia e à minha neta Amanda, por compreender a minha
ausência e alimentarem meu coração de amor e carinho.
À minha família, por entender minhas ausências ao longo dos desafiadores anos do
doutorado.
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PARA INICIAR….
Por ocasião da minha qualificação, o professor Tristan perguntou: Mas onde fica o
pesquisador visto que ele faz parte desse universo?
E agora respondo:
Nasci numa cidadezinha chamada Vacaria, no Rio Grande do Sul. Filha mais velha de
Isauro e Umbellina, tinha que dar o exemplo de comportamento às minhas cinco irmãs. De
família humilde, presenciei e senti as dificuldades de ter à mesa pouco o que comer. Assisti
meu pai sair muito cedo para o trabalho e voltar depois que o sol se punha com suas mãos sujas
de graxa e seu rosto tomado pelo cansado. Vi minha mãe cuidar da casa e esfregar as roupas na
água gelada do inverno. Nesses anos, ouvi meu pai falar “Minha filha, nunca deixe seu nome
sujo na praça. Nunca prometa o que não pode cumprir. Honre o nome do teu pai e da tua mãe.
Honestidade não se compra, minha filha, se pratica. Dia após dia valores como, perseverança,
dignidade, honestidade, luta, resignação, esperança eram alimentados com exemplos de meu
pai e de minha mãe. E esses valores internalizei e cultivei como lastros que sedimentam minha
forma de viver no mundo.
E novamente as palavras de meu pai ecoaram em meus pensamentos “Minha filha, se
quiser ter alguma coisa, faça. Não espere pelos outros. ” Cheguei à universidade, numa
universidade comunitária. Ali estudei, me formei e três anos depois passei a ser docente. Há
quarenta anos, vivo dentro de uma universidade comunitária. Nela cresci como pessoa e como
profissional, me transformei, mudei. A cada semestre mutações, turbulências, inseguranças.
Convivi com milhares de estudantes. Jovens que alimentam meu propósito de estar
aqui. Alimentam a certeza de que eu posso, de alguma maneira, fazer diferença em suas vidas
e de que suas vidas em muito transformam a minha, num ato de cumplicidade e amor. Sentir e
pensar são ingredientes fundamentais para que a aprendizagem se realize e o conhecimento
liberte.
Pois então, lhes digo, que perseverança, dignidade, honestidade, e esperança são os
pilares de minha identidade. Essência de minha existência.
Quanto à minha função, estou aqui para fazer diferença, cultivando e perseguindo a
utopia de um mundo melhor por meio do meu trabalho como docente. E com meu trabalho me
distinguo, me diferencio e singularizo.
Fruto de encontros que vivi, aqui tenho meus amigos, minha família compartilhando
momento tão significativo em minha vida, com os quais dividi em algum momento o caminho
do conhecimento e dos sonhos.
Então, lhes digo, que engravidarei meu coração tantas vezes quantas o mundo me
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permitir para poder sentir e viver momentos tão emocionantes como esse. Que as nossas
palavras e nossas ações façam diferença na vida das pessoas. Porque essa vida só tem sentido
se for para fazer o bem.
Isaura M. Longo
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O flete do pensamento cavalga noites escuras Gasta estrada, gasta tempo,
Mas não perde as ferraduras. (Wilson Paim)
Dedico esta tese aos que encontram no conhecimento uma forma de felicidade.
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RESUMO Este trabalho, vinculado ao grupo de pesquisa Observatório de Políticas Educacionais do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade do Vale do Itajaí, é resultado de estudo multicaso envolvendo quatro instituições de ensino superior e tem por objetivo compreender o processo e as características que envolvem a constituição identitária das Universidades Comunitárias do sul do Brasil, considerando o contexto mutante das políticas para o ensino superior nas últimas décadas. O modelo de universidade comunitária passou a ser implantado no Brasil, a partir da década de 1960, pela sociedade civil e pelo poder público local, por ser reconhecido como fator de desenvolvimento das regiões desatendidas pelo poder público na oferta de educação superior. Com a Lei Nº 12.881, de 13 de novembro de 2013, o Estado brasileiro reconheceu as instituições de ensino superior como comunitárias, diferenciando-as de instituições privadas e com fins lucrativos. Esta medida cria um fato novo na história dessas universidades e no contexto das políticas de educação superior brasileira, indicando a relevância do desenvolvimento de investigações que busquem compreender, não só o momento histórico, neste contexto de reformas educacionais, mas também a forma como tais instituições atuam na construção de sua identidade institucional. Buscou-se em McCowan (2016), um modelo teórico-metodológico para compreender a “anatomia" dessas instituições, considerando as dimensões valor, função e interação e as influências que sofrem em virtude da comoditização e desagregação decorrentes das políticas neoliberais. A abordagem da Teoria Organizacional a partir dos estudos de Albert e Wetthen (1985), também contribuiu para a análise no que tange ao conceito de identidade organizacional. As Universidades foram selecionadas com base nos seguintes critérios: universidades laicas, reconhecidas como comunitárias (de acordo com a Lei Nº 12.881/2013), com, no mínimo, quatro mestrados e dois doutorados implantados, credenciadas no sistema federal e com maior número de alunos. A pesquisa foi conduzida simultaneamente em duas frentes de investigação: 1. Pesquisa documental para exame dos documentos do MEC e das universidades investigadas (documentos que avaliam e disciplinam o ensino superior no país, PDI, PPI, Planejamento Estratégico, Materiais institucionais e de divulgação); 2. Pesquisa de campo para entrevistas com os gestores das instituições que compõem a amostra. Os resultados do estudo indicaram que as universidades comunitárias investigadas trazem em seus discursos, tanto dos gestores, dos seus PDIs como campanhas institucionais a convicção de sua existência como instituições que nasceram para produzir conhecimento voltado para o bem público, com alto valor instrumental, tendo consciência da indissolubilidade do ensino, pesquisa e extensão, com ampla inserção social. Por outro lado, se debatem com as ameaças do mundo globalizado, no qual os processos de mercantilização e desagregação pressionam-nas a transformarem a educação superior em mero bem de consumo, regido pelo lucro desenfreado da política neoliberal, no entanto, não são suficientes, ainda, a ponto de comprometer a missão comunitária dessas instituições, essência de sua identidade. Palavras-chave: Política educacional. Universidades Comunitárias. Identidade Institucional. Identidade Organizacional.
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ABSTRACT This work, which is linked to the research group Observatory of Educational Policies, of the Postgraduate Program in Education of the University of Vale do Itajaí, is the result of a multicase study involving four higher education institutions. It aims to understand the process and characteristics of identity construction by Citizenship Universities – Universidades Comunitárias in the South of Brazil, considering the changing context of policies for higher education that have occurred in recent decades. The citizenship university model began to be implemented in Brazil in the 1960s, by civil society and the local public authorities, as they began to recognize higher education as a factor required for development for regions neglected by the public authorities. They were democratically created with the involvement of the local community, aiming at promoting expanded access to higher education in non-metropolitan regions, and responding to local industry needs. With Law 12881 of November 13, 2013, the Brazilian State recognized these higher education institutions as citizenship universities, differentiating them from private and for-profit institutions. This measure led to a new era in the history of these universities and in the context of Brazilian higher education policies, hence the importance of research that seeks to understand not only the historical context of these educational reforms, but also how these institutions construct their institutional identity. We looked to McCowan (2016) for a theoretical-methodological framework from which to understand the "anatomy" of these institutions, considering the dimensions of value, function, and interaction, and the influences they undergo as a result of the commoditization and disaggregation prompted by the neoliberal policies. Organizational theory, based on the studies of Albert and Wetthen (1985), also contributed to the analysis in relation to the concept of organizational identity. The universities examined in this research were selected based on the following criteria: secular universities, recognized as citizenship universities (according to Law 12881 of 2013), with an offer of at least four Master's degrees and two Doctoral degrees accredited by the federal system, and with a high number of students. The research involved two simultaneous lines of investigation: 1. Document-based research to examine the MEC documents and universities investigated (documents that evaluate and discipline higher education in the country, IDP, IPP, Strategic Planning, Institutional and Disclosure Materials); 2. Field research involving interviews with the managers of the institutions that made up the sample. The results of the study indicated that the citizenship universities investigated convey, through the discourses of their managers, their IDPs, and their institutional campaigns, a conviction that they exist to produce knowledge aimed at the public good, with high instrumental value, close ties between teaching, research and extension, and broad social insertion. On the other hand, these institutions struggle to deal with the threats posed by a globalized world, in which the processes of commodification and disintegration propel them to turn higher education into a mere consumer good, governed by the unbridled greed for profit of the neoliberal policies. However, these challenges are not so great as to undermine the community-focused mission of these institutions, which is the essence of their identity. Keywords: Educational policy. Citizenship Universities. Universidades Comunitárias. Institutional Identity. Organizational Identity.
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LISTA DE FIGURAS
Figura 1 - Anatomia da universidade.............................................................................. 40
Figura 2 - Dimensões da identidade organizacional....................................................... 41
Figura 3 - Relação entre dimensões de análise, características das UCs e dilemas.......... 43
Figura 4 - Critérios de seleção das universidades comunitárias...................................... 47
Figura 5 - Principais marcos da trajetória das universidades comunitárias – 1960-
2013................................................................................................................................
58
Figura 6 - Vertentes influenciadoras nas dimensões Valor – Função – Interação............ 82
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LISTA DE QUADROS
Quadro 1 - Características das IES Públicas, Comunitárias e Privadas.......................... 45
Quadro 2 - Características das Esferas Pública, Comunal e Privada............................... 46
Quadro 3 - Perfil das Universidades Comunitárias da Amostra...................................... 48
Quadro 4 - Ciclo Plano de Desenvolvimento Institucional............................................ 52
Quadro 5 - Sítios Institucionais Veiculados na Plataforma Digital YouTube.................. 53
Quadro 6 - Missão das Universidades Comunitárias...................................................... 88
Quadro 7 - Princípios e Valores das Universidades Comunitárias................................. 92
Quadro 8 - Visão das Universidades Comunitárias Estudadas....................................... 94
Quadro 9 - Principais Atividades de Ensino, Pesquisa e Extensão das Universidades
Comunitárias..................................................................................................................
111
Quadro 10 - Principais Atividades de Pesquisa das Universidades Comunitárias.......... 131
Quadro 11 - Rankings e Avaliações das Universidades Comunitárias entre 2017-2018 136
Quadro 12 - Principais Atividades de Extensão das Universidades Comunitárias......... 149
Quadro 13 - Certificações e Premiações Recebidas pelas Universidades Comunitárias
- 2017-2018....................................................................................................................
155
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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ABRUC Associação Brasileira das Universidades Comunitárias ACAFE Associação Catarinense das Fundações Educacionais ACG Avaliação dos Cursos de Graduação ADIN Ação Direta de Inconstitucionalidade BM Banco Mundial CAD Comitê de Ajuda ao Desenvolvimento CAPES Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior CEFET Centro Federal de Educação Tecnológica CNPq Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico COMUNG Consórcio das Universidades Comunitárias Gaúchas CPC Conceito Preliminar de Curso CRUB Conselho de Reitores das Universidades Brasileiras EBSCO Publishing Service Selection Page ENADE Exame Nacional do Desempenho dos Estudantes
FEEVALE Federação de Estabelecimentos de Ensino Superior em Novo Hamburgo
FORPROEX Fórum de Pró-Reitores de Extensão das Instituições Públicas de Educação Superior Brasileiras
FUMDES Fundo de Apoio à Manutenção e ao Desenvolvimento da Educação Superior
GATS General Agreement on Trade and Service
ICES Instituições Comunitárias de Educação Superior IES Instituição de Ensino Superior IGC Índice Geral de Cursos
INEP Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira
LDBEN Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional MEC Ministério da Educação MOOCs Massive Open Online Courses ODAEE Organização das Américas para a Excelência Educativa OEA Organização dos Estados Americanos OECD Organização Para a Cooperação e Desenvolvimento da Economia OI Identidade Organizacional OMC Organização Mundial do Comércio OMT Organização Mundial do Trabalho ONU Organização das Nações Unidas PDI Projeto de Desenvolvimento Institucional PPC Projeto Pedagógico dos Cursos PPI Projeto Pedagógico Institucional PUCPR Pontifícia Universidade Católica do Paraná PUCRS Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul RUF Ranking Universitário da Folha
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SINAES Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior SciELO Scientific Electronic Library Online STF Supremo Tribunal Federal UCPEL Universidade Católica de Pelotas UCS Universidade de Caxias do Sul UNC Universidade do Contestado UNESC Universidade do Extremo Sul Catarinense
UNESCO Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura
UNIARP Universidade Alto Vale do Rio do Peixe UNICRUZ Universidade de Cruz Alta UNIJUI Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul UNIPLAC Universidade do Planalto Catarinense UNISC Universidade Integrada de Santa Catarina UNISINOS Universidade do Vale do Rio dos Sinos UNISUL Universidade do Sul de Santa Catarina UNIVALI Universidade do Vale do Itajaí UNIVILLE Universidade da Região de Joinville UNOCHAPECO Universidade Comunitária da Região de Chapecó UNOESC Universidade do Oeste de Santa Catarina UPF Universidade de Passo Fundo URCAMP Universidade da Região da Campanha URI Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões
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SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO..........................................................................................................
1.1 Contextualização do tema.........................................................................................
1.2 Estudos realizados....................................................................................................
2 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS.............................................................
2.1 Abordagem teórico-metodológica.............................................................................
2.2 Contextualização da pesquisa....................................................................................
2.3 Procedimentos de coleta e análise dos dados..............................................................
3 A CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE DAS UNIVERSIDADES
COMUNITÁRIAS: AVANÇOS E DILEMAS NO CONTEXTO DAS
POLÍTICAS EDUCACIONAIS PARA O ENSINO SUPERIOR..............................
3.1 A identidade das universidades comunitárias: da gênese à legitimação......................
4 ANATOMIA DAS UNIVERSIDADES COMUNITÁRIAS: VALOR, FUNÇÃO,
INTERAÇÃO.................................................................................................................
4.1 VALOR: o bem público como razão da existência da universidade
comunitária.....................................................................................................................
4.2 FUNÇÃO: o papel da universidade comunitária na produção, armazenamento e
disseminação do conhecimento........................................................................................
4.3 INTERAÇÃO: o elo entre a universidade comunitária e a sociedade.......................
5 A COMUNICAÇÃO DAS UNIVERSIDADES COMUNITÁRIAS: UM
DESAFIO A ENFRENTAR..........................................................................................
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS.....................................................................................
7 REFERÊNCIAS..........................................................................................................
APÊNDICES..................................................................................................................
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26
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38
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57
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83
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220
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1 INTRODUÇÃO
1.1 Contextualização do tema
A universidade representa uma das instituições mais características e indispensáveis da
sociedade moderna. Seu papel é plural e diverso. Sendo fruto de artefato social, deve ser
compreendida como produto da história humana. Demarcada pela própria temporalidade, essa
história se constitui em meio a confluências e conflitos entre os mais variados estratos sociais.
Isso dito, entende-se que a universidade “é uma produção social e histórica, cuja função social
não está dada por uma definição natural” (CAMPOS, 2012). Sua trajetória traduz uma história
milenar, que se origina no fim o século XII, na Europa. Ela nasce das corporações de estudantes
e professores e chega ao controle dos Estados nacionais e dos grandes conglomerados
empresariais do século XXI. No Brasil, as experiências universitárias tardaram a ganhar
materialidade, somente no século XIX foram estabelecidas escolas de ensino superior. A rigor,
tais experiências manifestaram a cultura de escolas ou faculdades, que, por meio de decretos ou
leis, foram reunidas instituições isoladas em torno do nome "universidade” (CAMPOS, 2012,
p. 1).
Ao longo do tempo, como resultado da própria ação de diferentes grupos envolvidos
com essa instituição, múltiplos sentidos e significados têm sido atribuídos à universidade.
Embora haja semelhanças, elas possuem configurações e concepções diferentes significativas.
“Por tais metamorfoses já é possível postular a dificuldade para se chegar a uma definição
uníssona do papel social da universidade” (CAMPOS, 2012, p. 1). Esse cenário conduz ao
enfrentamento de uma crise localizada no âmago de sua existência: uma crise de sua identidade
institucional, o que leva a dilemas e contradições em sua atuação (SANTOS, 2004). Se a
identidade diz respeito à forma como alguém se define e como é definida por outros, e se a
universidade não possui uma representação inequívoca de sua existência, então se instaura aí
uma fértil reflexão acerca de suas funções e características identitárias.
Santos (2004) afirma que uma pluralidade de ameaças de ordem externa e interna como
o elitismo, o corporativismo e a inércia contribuíram para acelerar a crise institucional das
universidades, sobretudo a partir do início da década de 1990. Porém, dois fatores podem ser
destacados: o desinvestimento do Estado e a globalização mercantil da universidade. Nos
últimos trinta anos, as universidades, em grande parte dos países, foram atingidas por uma crise
institucional, em decorrência da perda de prioridade do bem público universitário nas políticas
públicas e da consequente redução dos recursos financeiros. Quando o Estado decidiu reduzir
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seu compromisso com as universidades e a educação em geral, tornando-os bens públicos não
exclusivos garantidos pelo Estado, a universidade teve sua crise institucional agravada. Junte-
se a isso a imposição de outros modelos de governança tidos como mais eficientes, baseados
em critérios de eficácia de natureza empresarial assentados em um modelo de desenvolvimento
econômico neoliberal.
Observa-se que o processo de construção da universidade e sua consequente evolução,
vem passando por diferentes fases, as quais retratam o pensamento da época. Vários legados
foram deixados, e a universidade brasileira, ainda de pouca tradição, comparativamente às do
exterior e da própria América Latina, se defronta com uma série de desafios que precisam ser
superados.
Este estudo, vinculado ao grupo de pesquisa Observatório de Políticas Educacionais do
Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade do Vale do Itajaí (SC), nasceu como
recorte da pesquisa “Identidade e Imagem das universidades comunitárias do Sul do Brasil”
(CHAMADA UNIVERSAL– MCTI/CNPq Nº 14/2014). Desenvolvida no período 2014-2018,
essa pesquisa foi uma proposta de estudo em rede que articulou conhecimentos e processos de
investigação nos campos da Educação, das Políticas Públicas e da Comunicação e teve como
objetivo analisar a interface identidade e imagem institucional de Universidades Comunitárias
do sul do Brasil. O estudo foi conduzido simultaneamente em quatro frentes de investigação:
Pesquisa documental, Pesquisa de campo, Seminários Redes Grupos de Pesquisa em âmbito
nacional e internacional e Grupos focais denominados Seminários Redes Comunitárias
envolvendo a comunidade interna e externa das instituições da amostra1.
Neste caso, a pesquisa tem como objeto de estudo as políticas educacionais e o modelo
de universidade comunitária, especificamente a construção da identidade institucional das
Universidades Comunitárias do sul do Brasil. Há várias décadas essas instituições vêm
construindo sua trajetória no campo do ensino superior brasileiro, em meio a batalhas pelo seu
reconhecimento e identificação como instituição pública não estatal. Em face da ampla
mudança nas políticas educacionais, notadamente a partir da reforma do Estado e da Educação,
na década de 1990, esse modelo de universidade se transformou em fértil ambiente para
pesquisas na tentativa de compreender os processos que se entrelaçam na construção de sua
identidade.
1 Pesquisadores de quatro universidades do sul do Brasil junto com professor Dr. Tristan McCowan University of London – MA in Education and International Development participaram do estudo. O processo foi coordenado pela professora Dra. Regina Celia Linhares Hostins e pelo professor Dr. Hans Peder Behling e foi concluído em dezembro de 2018.
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A educação superior brasileira, até a metade da década de 1960, era formada,
basicamente, por instituições públicas e confessionais (Católicas, Metodista, Luterana) estas de
caráter religioso e sem fins lucrativos. É a partir dessa época que o modelo de universidade
comunitária passa a ser implantado pela sociedade civil e pelo poder público local nas regiões
desatendidas pelo poder público federal e estadual. No Rio Grande do Sul e em Santa Catarina,
as instituições comunitárias, em sua maioria, nasceram em espaços onde houve ausência do
Estado na educação superior, estando enraizadas na história da colonização e da organização
social dos imigrantes e seus descendentes (PINTO, 2009a).
Essas instituições existem em vários Estados do Brasil, com forte atuação, no entanto,
no sul do país. De acordo com dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais
Anísio Teixeira, em 2017, existiam 2.448 instituições de educação superior no Brasil, das quais
2.152 são da iniciativa privada. Existem 199 universidades, 106 delas são públicas e 93 são
privadas (INEP, 2017). As 23 Universidades Comunitárias do Rio Grande do Sul e de Santa
Catarina representam quase 10% do total de universidades do país.
Dois grupos de universidades denominam-se “comunitárias: as confessionais e as não-
confessionais ou laicas. Aquelas entendidas como comunitárias lato sensu, cuja origem vincula-
se a entidades religiosas. Estas chamadas de comunitárias stricto sensu, são instituições sem
vínculo religioso, criadas pela própria comunidade ou pela sociedade civil, sem alinhamento
político ou ideológico de qualquer natureza (PINTO, 2009a). O termo “laico” tem sua origem
etimológica no grego laikós que significa “do povo”.
As instituições comunitárias no Sul se organizam em duas associações: COMUNG e
ACAFE. Conforme sítio, o COMUNG - Consórcio das Universidades Comunitárias Gaúchas,
congrega 15 instituições de educação superior do Rio Grande do Sul, sendo 12 universidades e
3 Centros universitários. Suas afiliadas congregam mais de 40 campi universitários, abrangem
mais de 380 municípios em suas áreas de influência e possuem em torno de 120 mil alunos de
graduação e pós-graduação, constituindo o maior sistema de educação superior em atuação no
estado2. A ACAFE - Associação Catarinense das Fundações Educacionais congrega 16
instituições de educação superior de Santa Catarina, sendo 11 Universidades e 5 Centros
Universitários3. Estas associações há muitos anos postulam um reconhecimento oficial como
entidades comunitárias de interesse público, para permitir sua participação na destinação de
recursos orçamentários e em editais reservados para instituições públicas, diferenciando-as
oficialmente das instituições privadas com fins lucrativos (VILELLA, 2014). Em Protocolo de
2 COMUNG. Disponível em: https://comung.org.br/. Acesso em: 14 set. 2016. 3 ACAFE. Disponível em: http://new.acafe.org.br/. Acesso em: 14 set. 2016.
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Ação Conjunta as instituições definem como
universidades públicas não estatais, públicas pela lógica de seu funcionamento vinculado aos interesses do conjunto da sociedade e não regido pelo lucro, configurando-se como organizações não-governamentais de origem e interesse comunitário, desvinculadas de grupos familiares, políticos, religiosos, empresariais ou sindicais (COMUNG, 1994, p. 4).
Conforme a Associação Brasileira das Universidades Comunitárias - ABRUC, estas
instituições não têm fins lucrativos, portanto os recursos gerados ou recebidos são integralmente
aplicados em suas atividades e são constituídas como instituições públicas não-estatais.
Também não pertencem a investidores, sendo mantidas por comunidades, igrejas,
congregações, podendo ser confessionais ou não. As Instituições Comunitárias de Ensino
Superior (ICES) têm, pois, um compromisso com a sociedade na qual estão inseridas, buscando
atender às necessidades da comunidade (BITTENCOURT, 2014).
Múltiplos estudos sobre a identidade comunitária foram produzidos, especialmente
diante da dicotomia público/privado (TRAMONTIN; BRAGA, 1988; BITTAR, 1999;
VANNUCCHI, 2011; LONGHI; FRANCO; ROCHA, 2009; PINTO, 2009a; 2009b;
SCHMIDT, 2010; SAMPAIO, 2013; FIOREZE, 2017). As universidades comunitárias não se
enquadram nem no modelo público, tampouco no modelo privado (BITTAR, 1999). Elas
representam um modelo alternativo, ou seja, não sendo pública, no sentido estatal, nem privada
no sentido estrito, empresarial, elas são públicas não estatais (VANNUCCHI, 2011). O caráter
comunitário destas instituições foi utilizado como elemento de distinção conceitual, bem como
de argumento político na luta por um tratamento diferenciado pelos órgãos encarregados da
política de ensino superior, tanto estadual como nacional (NEVES, 1995). Para Frantz (2006,
p. 138-139)
a noção do comum, quando se materializa em ações sociais, desperta identidade, mobiliza interações e pode levar à construção de compromissos e responsabilidades, pode fundar processos sociais e alianças políticas. Assim, é um conceito que contém a ideia de ação, de agregação de sujeitos, de integração de interesses, de associação de forças, de viabilização de potencialidades.
Vannucchi (2011) reitera que as universidades comunitárias, desde o início, estiveram
comprometidas com a sociedade e não com o lucro; entendidas por seus fundadores enquanto
um serviço público e não como negócio particular. Em documento, o COMUNG reafirma seu
caráter comunitário como decorrente de sua
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origem na vontade e no esforço da comunidade, da articulação e comprometimento com a comunidade regional, da sua inserção na história do povo da região, da sua gestão democrática e transparente, da sua autogestão pela comunidade acadêmica com a participação institucionalizada do poder público e de entidades representativas da sociedade civil nos órgãos colegiados e pela sua política de extensão universitária à comunidade (COMUNG, 1994, p. 5).
Durante décadas, essas instituições foram buscando mecanismos que possibilitassem o
seu reconhecimento junto aos órgãos públicos e de fomento da educação, sendo atribuída a elas,
no decorrer do processo, diferentes denominações. A busca pela definição de um conceito de
universidade comunitária contém uma posição política e a necessidade de ter firmada uma
identidade própria, para assim estabelecer relações políticas e de cooperação com o Estado e a
sociedade (FRANTZ, 2006).
Entre as décadas de 1980 e 1990, o setor privado de ensino superior vivia o auge de sua
expansão e almejava garantir o acesso às verbas governamentais (BITTAR, 2001). No entanto,
a geração de reformas educacionais implantadas a partir de 1990, provocou um forte
redirecionamento da universidade brasileira. Neste período a economia brasileira alinhou-se a
agências internacionais como o Banco Mundial, a Organização para a Cooperação e
Desenvolvimento da Economia (OECD), a Organização Mundial do Trabalho (OMT), cujas
políticas e avaliações são focadas nos termos neoliberais. Isso envolve a promoção de alianças
em prol da transformação das “formas do estado” (SHAW, 1997, p. 497) do fluxo livre de
capital à epidemia das privatizações, flexibilizações e avaliações.
Neste contexto o Brasil, que se consagrava como uma economia emergente, mas com
altos níveis de desigualdade social, direcionou as políticas governamentais a serviço da
economia global. Isso resultou na inclusão da educação no mercado internacional com o uso
generalizado de procedimentos e valores capitalistas competitivos na gestão das instituições de
ensino. A educação superior, em particular, passa a ser considerada como um serviço
comercialmente lucrativo (SOUZA; OLIVEIRA, 2003).
Sob essa concepção dominante, na década de 1990, a reforma universitária foi
implantada, produzindo radicais mudanças na educação superior. A Lei de Diretrizes e Bases
da Educação Nacional – LDB, Lei nº. 9.394/96 e as regulamentações que a sucederam,
facilitaram as possibilidades de mercantilização do ensino, da pesquisa e da extensão no ensino
superior. Ela rompeu com o modelo de universidade pública e abriu o campo para o setor
privado possibilitando a diversificação institucional – faculdades, centros universitários,
institutos – e a diversificação das fontes de financiamento. Trata-se de uma maneira particular
de governança, de tornar a educação superior “mais favorável para à estratégia de acumulação
19
global” (ROBERTSON et al., 2006, p. 233).
No entanto, para Frantz (2006) a universidade é uma organização complexa em sentido
e significados históricos, não pode ser conduzida por visões simplistas e utilitárias, submissa
aos interesses do mercado, como se fosse um negócio, ou servindo como um simples
instrumento de políticas de governos. “A instrumentalização do fazer universitário em favor da
lógica do mercado ou de interesses de grupos reduz o seu sentido maior” (FRANTZ, 2006, p.
121). Por outro lado, a universidade não pode desconhecer a realidade de que ela sofre também
as consequências do mercado. O grande desafio da comunidade universitária é exatamente
reconhecer essa realidade e, por meio da gestão universitária, administrar complexas dimensões
culturais, políticas, sociais, econômicas garantindo que esse processo não se reduza a uma
simples operação de funções técnicas.
Neste contexto de reformas e de afrouxamento e permeabilidade das fronteiras entre
público e privado, as Universidades Comunitárias já estabelecidas e consolidadas no Brasil
passaram a ocupar um lugar no limbo: não se caracterizavam como instituições de direito
público, nem como corporações da iniciativa privada e seus recursos não advinham nem de
fontes governamentais, nem de aplicações financeiras em mercados de capitais.
Em 2013, após décadas na luta em busca de sua existência efetiva, o governo brasileiro
passou a reconhecer essas instituições como uma modalidade distinta das universidades
privadas. Com a Lei Nº 12.881, de 13 de novembro de 2013, o Estado brasileiro estabeleceu
um marco legal que define, qualifica, e especifica prerrogativas e finalidades das Instituições
Comunitárias de Educação Superior – ICES, reconhecendo-as como comunitárias, o que lhes
permite a participação na destinação de recursos orçamentários e em editais reservados para
instituições públicas, diferenciando-as de instituições privadas e com fins lucrativos (BRASIL,
2013).
Esta medida cria um novo fato na história dessas universidades e no contexto da
educação superior brasileira indicando a relevância e a necessidade do desenvolvimento de
investigações que evidenciem, esclareçam e ajudem a compreender não só o momento histórico
neste contexto de reformas educacionais, mas também a forma como tais instituições atuam na
construção de sua identidade institucional e nas respectivas leituras feitas pelos seus públicos
na significação da sua imagem institucional. Na fronteira entre o “não-lugar ou limbo” e o
marco histórico instituído com a criação da Lei nº 12.881 existe um profícuo espaço para
investigações e indagações a respeito dos traços que definem a identidade das universidades
comunitárias, pois longe está a solução para a crise existencial que afeta estas instituições em
suas bases financeiras e identitárias.
20
Conforme Bittar (2001) ainda há muito para se explorar no que tange à compreensão e
análise das especificidades e características das universidades comunitárias. A preocupação
com o tema da identidade continua latente, como uma necessidade quase vital para essas
universidades que expressam, por meio de seus dirigentes, uma urgência em se verem
respeitadas pela sociedade e reconhecidas pelos seus serviços educacionais.
Mas como se define uma Universidade Comunitária? Na busca por uma resposta, várias
referências na área da educação podem ser citadas as quais tentam descrever e caracterizar a
essência dessas instituições como também os seus traços distintivos por meio de descrições de
sua história, dos fatos que marcaram a gênese “comunitária” requerida pelas associações que
as representavam, o seu papel junto as comunidades regionais, da singularidade de sua gestão
(TRAMONTIN; BRAGA, 1988; BITTAR, 1999; LONGHI, 2000; FRANTZ, 2006;
PEGORARO, 2008; PINTO, 2009; SCHMIDT; CAMPIS, 2009; BITTENCOURT, 2014). Em
geral esses estudos abordam o conflito existente na sua origem, que circula entre: o público e
privado, a natureza privada (porém sem fins lucrativos), o conflito entre a assistência e a
necessidade da provisão de recursos para manter a sua existência, entre ser uma organização ou
uma instituição.
Para além dos estudos na área da educação, foram identificadas em outras searas um
arcabouço que pode contemplar alguns parâmetros definidores da identidade dessas
instituições. Alguns estudos encontrados se debruçam sobre identidade organizacional,
principalmente na área das Ciências Sociais Aplicadas. O objeto de estudo são as universidades
e isso leva aos trabalhos de MacDonald (2013), Glynn, Lockwood e Raffaelli (2006), Gioia et
al. (2010), Stensaker (2015); Dumay, Draelants e Dahan (2015) os quais encontram no conceito
de identidade organizacional uma oportunidade para investigar as razões que levam à
continuidade ou às mudanças das características das instituições universitárias no contexto
atual.
Para Vannucchi (2011, p. 37) a identidade da universidade comunitária “não se
concretiza nem se confirma por uma ou várias definições a ela atribuídas”. Não importa qual
seja a definição escolhida, é necessário que esta reflita a consciência identitária da instituição.
Para o autor as universidades comunitárias nasceram de vozes que queriam se fazer ouvir e
participar da construção de um espaço de educação amplo e democrático. São iniciativas da
sociedade civil, sem fins lucrativos, não apoiam sua existência e interesses no capital, por isso
não podem ser confundidas com a sociedade empresária. Também não devem ser entendidas
como uma iniciativa de privatização do espaço da educação, mas “como um esforço pela
construção de novos e ampliados espaços públicos de educação. É uma iniciativa que não
21
nasceu do poder público-estatal, mas no espaço da ampliação da esfera pública” (FRANTZ,
2006, p. 151). Nesse universo, instauram-se as dificuldades e os desafios da sustentabilidade
das suas atividades de ensino, pesquisa e extensão.
Com a admissão legal e a ampliação desordenada de entidades mantenedoras e de
instituições com fins lucrativos, a partir dos anos 1990, esse modelo de instituição, interessado
em promover um trabalho de inclusão de pessoas no ensino superior e sem o propósito do lucro,
começa a enfrentar limites. Sua sobrevivência depende do pagamento de mensalidades
efetuadas por seus estudantes. Na medida em que isso não acontece e que o Estado não cumpre
com suas obrigações de repassar recursos de programas de financiamento, se veem obrigadas a
recorrer a bancos para manter o seu funcionamento e manutenção, ficando à mercê das
imposições do mercado (CAMPIS, 2003). Para complicar, as instituições empresariais,
universitárias ou não, adotam uma postura ofensiva no mercado de competitividade e
funcionam com critérios de organização menos acadêmica e mais empresarial, sobrepondo a
organização administrativa à acadêmica e introjetando uma nova forma de governo que se opõe
à concepção clássica de universidade (CAREGNATO, 2004).
Chauí (2003a) tem discutido, com base no caso brasileiro, a identidade da universidade,
entendendo que ela se desloca da condição de instituição social para a de organização. Como
instituição visaria sua função na sociedade numa perspectiva universalista. Como organização,
volta-se para o eficientismo interno, ficando marcada por um caráter instrumental e efêmero.
Na linguagem corrente, usam-se as terminologias organizações e instituições como sinônimos
para identificar agrupamentos sociais nas suas mais diferentes tipologias (empresas públicas ou
quando se refere a uma organização, escolas, universidades, ONGs, órgão públicos). No
entanto, Bernardes (1988), usando a Sociologia como referência, destaca algumas
características para diferenciar tais termos: uma organização deve ter a função de produzir
bens, prestar serviços à sociedade, atender necessidades de seus próprios participantes, possuir
uma estrutura formada por pessoas colaborativas com o intuito de transformar insumos em bens
e serviços, bem como ser perene no tempo. Já uma instituição deve atender a certa necessidade
básica da sociedade, ter uma estrutura formada por pessoas que apresentem um conjunto de
crenças, valores, ideias e comportamentos comuns e que respeitem certas normas e
procedimentos. Alguns elementos entre os conceitos se entrelaçam, porém, a universidade tem
a tarefa de pensar a sociedade da qual é fruto, o que dá a ela um grande traço distintivo (CHAUÍ,
2003a).
Para McCowan (2016) a combinação entre incentivo ao lucro e a desassociação das
múltiplas funções da universidade são fatores que prejudicam sua capacidade de proporcionar
22
ensino, pesquisa e participação comunitária voltado ao interesse público. Deste modo, “o valor
subjacente da universidade se move para o benefício instrumental, em vez de intrínseco e (lucro
líquido), e suas funções tornam-se fragmentadas e incapazes de reforçar-se mutuamente
(MCCOWAN, 2016, p. 520).
Essas novas configurações de cenários econômicos, políticos e sociais trazem, então,
novas indagações que abalam antigas certezas do papel dessas instituições na sociedade,
pressionando para diferentes performances. Em um mundo de mudanças, no qual a identidade
passa a ser compreendida como “algo evasivo, pouco estruturado, alvo a ser continuamente
inventado, expresso e suprimido ao mesmo tempo – um elemento contraditório” (PIMENTA;
LOPES; CORRÊA, 2010, p. 63), o conflito é inevitável.
Para Bauman (2005), a velocidade e intensidade das mudanças presentes no ambiente
institucional afetam significativamente os processos de identificação. Referindo-se ao contexto
atual, o autor, caracteriza-o como uma época líquido-moderna, em que o mundo se reparte em
fragmentos mal coordenados. Nele “a construção da identidade deixaria de ser uma condição
“natural”, um processo inequívoco, estável e definido, transformando-se em uma tarefa árdua
a ser cumprida, uma busca constante por novas identificações” (FERNANDES; MARQUES;
CARRIERI, 2010, p. 46).
Hall (1997) afirma que as identidades são “mutantes” e podem ser vistas como “figuras
discursivas”, ou seja, seriam efeitos tanto dos discursos do pensamento, quanto dos processos
que estruturam a modernidade. Essas colocações conduzem à ideia da existência de múltiplas
identidades.
Pratt e Foreman (2000) afirmam que as organizações podem ter múltiplas identidades
quando há concepções diferentes sobre o que é central, distintivo e permanente em suas
características. Do mesmo modo que psicólogos e sociólogos afirmam que o indivíduo tem
múltiplas identidades, as organizações têm sido concebidas como tendo vários “eus”. Gioia,
Schultz e Corley (2000) reiteram a afirmação de que não há uma identidade, mas várias
identidades em uma mesma organização, assim como não há uma única cultura, mas várias.
Hall (1997) enfatiza que a identidade não é estável ou fixa, mas social e historicamente
construída, ficando sujeita a contradições, revisões e mudanças. Considerando esta visão, a
questão da identidade para as universidades comunitárias se torna delicada, pois coloca em foco
o equilíbrio entre o que é estável e o que é fluído. Como lidar com a mudança, mantendo as
características que determinam o núcleo de sua identidade? (GIOIA, 1998; SILVA;
VERGARA, 2002).
Assim, em face do contexto de mudanças das políticas educacionais para o ensino
23
superior no Brasil nas últimas décadas, da trajetória das universidades comunitárias e dos
estudos que evidenciam os dilemas vividos por este modelo de universidade nesse contexto,
desenvolveu-se a presente pesquisa. Esta foi orientada pela seguinte questão-problema: Como
a universidades comunitárias constroem e consolidam sua identidade considerando o
contexto mutante das políticas para o ensino superior nas últimas décadas? Essa pergunta
conduz ao objetivo geral de compreender o processo e as características que envolvem a
constituição identitária das Universidades Comunitárias do sul do Brasil, considerando o
contexto mutante das políticas para o ensino superior nas últimas décadas. Como
desdobramento, buscar-se-á: (1) identificar os principais marcos históricos de constituição da
identidade que norteiam as Universidades Comunitárias no contexto das políticas educacionais
para o ensino superior no Brasil; (2) analisar os traços identitários característicos das
universidades comunitárias, a partir das dimensões valor, função, interação, observando os
dilemas enfrentados por estas instituições no que tange às políticas neoliberais; (3) identificar
o modo como as universidades comunitárias manifestam/comunicam sua identidade aos seus
públicos.
Em face dos objetivos e da pergunta que direcionam este estudo, a tese defendida é que
os contrastes entre o caráter institucional e o organizacional, entre servir à comunidade e
sobreviver à concorrência, entre respeitar a sua gênese e ceder às imposições do mercado são
influenciadores na construção da identidade das universidades comunitárias, no entanto, não
são suficientes a ponto de comprometer a missão comunitária dessas instituições, essência de
sua identidade.
A defesa dessa tese e o ato de refletir sobre o que nela está envolvido traz algumas
contribuições para a discussão na área da educação superior e os modelos de universidade. As
universidades comunitárias são instituições de ensino superior e como tal e por sua gênese vão
muito além de transformar insumos em bens e serviços. Porém, ao se deparar com uma política
neoliberal, na qual a educação é vista como um bem de consumo, ou uma marca, sendo tratada
como qualquer mercadoria e bem de capital, sujeita às mesmas técnicas de gestão e estratégias
de negócios, se veem forçadas a refletir sobre novos tipos de tomada de decisão, novos
resultados e novos interesses, pois “nesse mundo dos negócios, os acionistas, os investidores e
os valores do mercado de ações – rentabilidade é o que conta na análise final” (BALL, 2014, p.
222). Cumpre papel importante, nesse cenário, o gerencialismo, responsável por destruir os
sistemas éticos-profissionais que prevaleciam nas instituições de ensino, os quais passam a ser
substituídos por sistemas empresariais competitivos (BALL, 2005). Ao se propor estudar como
as universidades comunitárias se configuram, se organizam e se definem em sua identidade
24
seria observar como essas instituições vêm se legitimando no campo da educação superior e
como vêm enfrentando as intempéries provocadas pelo mundo globalizado.
As universidades comunitárias do sul do Brasil vêm influenciando o contexto da
educação como um modelo de organização que se consolidou no ensino superior. As
Instituições de Ensino Superior (IES) que formam especificamente o COMUNG (RS) e a
ACAFE (SC) representam juntas uma rede de educação, ciência e tecnologia que abrange quase
todos os municípios dos dois Estados. Integrado por 31 instituições de ensino e com 18.000
professores e mais de 16 mil funcionários, esse sistema contabiliza junto mais de 330.000
universitários matriculados em cursos de graduação e pós-graduação e oferece 4.400 cursos de
graduação e pós-graduação, constituindo-se um dos maiores sistemas de educação superior em
atuação no Sul do Brasil (COMUNG, 2016; ACAFE, 2016). Dada a abrangência e os impactos
socioeconômicos gerados por essas instituições nas regiões onde atuam, o tema universidade
comunitária constitui uma provocação ao debate atual sobre o ensino superior e o papel da
universidade na sociedade. Constitui também um desafio a sua conceituação, a sua definição, a
sua caracterização no sentido de poder orientar este debate e as próprias políticas públicas que
as afetam (FRANTZ, 2006).
Compreender a Universidade Comunitária é igualmente compreender sua interlocução
com o conjunto dos sistemas educativos, com os sistemas econômico, social, cultural em nível
local e global. No contexto brasileiro, desde a década de 1990, a ideologia neoliberal vem
apoiando a menor intervenção do Estado nas produções de políticas4 de cunho universal, na
qual distingue-se a educação superior. A acentuada expansão de Instituições de Educação
Superior, com ênfase no ensino privado, a descentralização, a diversificação e a flexibilização
dos modelos institucionais, a avaliação do ensino superior ancorada em conceitos de qualidade
isomórficos e orientados para a tomada de decisão e o controle de qualidade foram algumas as
mudanças que passaram a influenciar o cenário da educação superior orquestradas pelas
orientações do Banco Mundial (MOROSINI; FRANCO, 2006). Não imunes às mudanças, as
universidades comunitárias também são afetadas pelas novas políticas, o que implica a presença
de conflitos identitários ao longo do processo. Assim, refletir sobre os traços que caracterizam
essas instituições e o seu papel como universidades à luz das incertezas por que passa a
educação superior, torna-se um argumento plausível para considerar a relevância do estudo.
4 Neste contexto, pode-se considerar as políticas como mediações que, após grandes embates, conflitos, acordos, interpretações, são codificadas e materializadas em documentos complexos produzidos por autoridades públicas; e, posteriormente, decodificadas e interpretadas, com igual complexidade, pelos atores envolvidos, os quais atribuem significados de acordo com suas histórias e experiências (BALL, 1994; REZENDE; BAPTISTA, 2015).
25
Há muito tempo, estudos tendo a universidade como tema vêm sendo realizados. No
contexto brasileiro, há inúmeros entre os quais pode-se destacar: Chauí (1999) e Dias Sobrinho
(2005). No âmago do debate, as diversas concepções, a razão da sua existência, o seu papel na
sociedade e seus múltiplos modelos levantam questionamentos que continuam a provocar
reflexões pertinentes e necessárias, principalmente no contexto da economia global. Neste
estudo, essa preocupação também se manifesta, assim como os estudos de Bittar (1999),
Schmidt (2010; 2017) na medida em que se busca entender os contornos que definem as
instituições chamadas universidades comunitárias e os elementos que as constituem.
Do ponto de vista teórico-metodológico, este estudo buscou em McCowan (2016; 2017;
2018) o referencial para analisar o modelo de universidade estruturado pelas comunitárias. O
autor propõe uma estrutura considerando três dimensões que diferenciam as instituições em
seus comportamentos: valor, função, interação, os quais contribuíram para identificar as
mudanças que vêm ocorrendo nas universidades comunitárias ao longo do tempo, tanto no que
se refere à sua função, quanto às suas relações com a sociedade.
Como já foi mencionado anteriormente, ao estudar as características constituintes da
“anatomia” da universidade, o autor propõe considerar três dimensões, as quais podem servir
de referência para diferenciar as instituições em seus comportamentos, são elas: valor, função,
interação. O que faz esse trabalho então: promove a aplicabilidade dessa teoria, a qual serve de
baliza para encontrar os ingredientes que constroem a identidade das universidades
comunitárias e tensionamentos com o mercado. Talvez resida aí uma boa razão para argumentar
favoravelmente à continuidade desse estudo.
Indo um pouco adiante, percebeu-se a necessidade de refinar um dos conceito-chave
desse estudo: identidade (ALBERT; WHETTEN, 1985; FERNANDES; MARQUES;
CARRIERI, 2009). Entendido como um conceito promissor e novo para pesquisar tanto a
continuidade quanto as mudanças que vêm ocorrendo nas instituições de ensino superior em
virtude da dinâmica externa atual, o conceito de identidade organizacional contribuiu para
analisar as universidades como instituições, em um momento em que forças buscam
transformá-las em organizações, bem como uma maneira de estabelecer uma conexão mais
próxima entre o mundo universitário e o mundo empresarial. A universidade não é apenas
sistemas técnicos ou produtivos, mas é um sistema social - como tal, é dotada de uma identidade
específica, e em processos de transformação deve fortalecer a sua identidade (identidade
organizacional) e utilizá-la como alavanca estratégica (DUMAY; DRAELANTS; DAHAN,
2015).
Esta tese está estruturada em capítulos. Na primeira parte apresenta-se introdução,
26
definindo-se o tema e a problemática que orientaram o desenvolvimento da pesquisa, os
objetivos pretendidos, a justificativa do estudo e os estudos relativos à identidade
organizacional, alguns especificamente voltados à universidade. O segundo capítulo trata da
metodologia utilizada para o desenvolvimento da pesquisa: a abordagem teórico-metodológica,
a contextualização da pesquisa e os procedimentos utilizados na coleta e na análise dos dados.
No terceiro capítulo, são desenvolvidas as análises relativas às a construção da identidade das
universidades comunitárias, seus avanços e dilemas, no contexto das políticas educacionais para
o ensino superior. Dois aspectos serão abordados: a história dessas instituições e as políticas
educacionais para o ensino superior que promoveram o surgimento e o reconhecimento das
universidades comunitárias no Brasil, a partir da década de 1960 ao início do século XXI.; no
quarto capítulo, são tecidas análises a partir das dimensões valor, função e interação como
pilares da anatomia das universidades, considerando o conflito entre o servir e o performar em
resposta às políticas nacionais de ensino superior. No quinto capítulo, são apontadas as
considerações finais, bem como reflexões e sugestões para estudos futuros. Por último,
apresentam-se as referências, anexos e apêndices.
1.2 Estudos realizados
Com o propósito de levantar os estudos já realizados sobre identidade das universidades
comunitárias, foi realizada uma busca nas principais bases de dados disponíveis como SciELO
- Scientific Electronic, Library Online; EBSCO Publishing Service Selection Page e o Portal
de Periódicos, da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), o
banco de teses e dissertações da CAPES, a Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações
(BDTD). Estas bases de dados foram escolhidas por sua relevância e por reunirem bancos de
dados de periódicos, teses e dissertações. Assim, para esta investigação, foram utilizados os
seguintes termos: - ensino superior e universidades comunitárias; identidade e universidades; -
identidade e universidades comunitárias; identidade institucional e universidades comunitárias;
-identidade organizacional e universidades e a forma em inglês organizational identity and
higher education. Para abranger maior número de trabalhos, não foi delimitado período de
tempo.
Ao acessar o Banco de teses e dissertações da CAPES, 2.417 trabalhos foram listados a
partir da utilização dos elementos de busca “ensino superior AND universidades comunitárias”.
A pesquisa foi refinada, delimitando-se a área de conhecimento para Ciências Humanas, área
de concentração Educação, só teses. Obteve-se um resultado de 204 ocorrências. Ao fazer o
27
rastreamento, observou-se que os focos eram diversos como estudo do currículo, modalidades
de avaliação, perfil de professores e alunos, apesar disso, 13 trabalhos foram pré-selecionados,
pois faziam menção à construção do modelo das universidades comunitárias, ao seu histórico e
também às características dessas instituições.
Em relação aos termos “identidade AND universidades comunitárias”, foram
identificados 402 trabalhos e aplicando refinamento, selecionando somente teses,
permaneceram 67 trabalhos, no entanto, poucos, apenas seis se relacionavam, parcialmente, ao
tema pesquisado. Ampliando a pesquisa aos buscadores “identidade organizacional AND
universidades comunitárias, foram encontrados 501 trabalhos. No refinamento para as áreas de
Ciências Sociais Aplicadas e Educação, Administração, 111 estudos foram listados, dos quais
somente cinco tinham relação direta com o foco da pesquisa. Na plataforma EBSCO foram
encontrados 36 estudos, dos quais 12 poderiam dar suporte a esta pesquisa no que se refere à
identidade organizacional das universidades.
Há um bom volume de trabalhos realizados sobre ensino superior e universidades
comunitárias, mas a maioria deles apenas tangenciava o foco desta pesquisa: identidade.
Observou-se a existência de 13 estudos que trazem como elementos centrais os termos
identidade e universidades comunitárias, principalmente na área de Ciências Humanas. Grande
parte dos estudos sobre identidade organizacional são realizados nas Ciências Sociais
Aplicadas, notadamente na administração.
Entre os trabalhos encontrados na área da Educação situa-se a tese de Bittar (1999) com
o título Universidade Comunitária: uma identidade em construção em que buscou analisar a
concepção de universidade comunitária. Seu estudo a partir da análise de documentos e
publicações das instituições, buscou conhecer na percepção de reitores e professores, até que
ponto a identidade desse modelo de universidade estava realmente construída. A autora
examinou a formação histórica do segmento, bem como itens requeridos pelas universidades
comunitárias como a presença da confessionalidade, a denominação ‘público não-estatal’, o
significado da extensão universitária com inserção na comunidade e as características da gestão
universitária. Seus achados evidenciaram a ambiguidade do conceito “universidade
comunitária” a “qual pretende ser um ‘espaço ímpar’ denominado como “público não-estatal”.
Pegoraro (2008), em sua tese, analisa a questão do terceiro setor e a educação superior
no Brasil. Por meio de entrevistas e análise de documentos, discute o compromisso social das
fundações universitárias em Santa Catarina, tomando como objeto de estudo a Universidade do
Contestado. Considerando a trajetória histórica de cada instituição, adota a gestão democrática,
a inovação e excelência, a identidade institucional e relevância social como princípios
28
importantes para a construção de alguns modelos de universidades, especialmente as
constituídas por organizações da sociedade civil, socialmente relevantes.
Pinto (2009a), defendendo a tese de que as universidades comunitárias gaúchas
contribuem com uma educação socialmente responsável, por meio da articulação e da
indissociabilidade de suas funções, bem como da relação e da interação que estabelecem com
as comunidades de seu entorno, a autora buscou compreender como os gestores de universidade
comunitária gaúcha percebem se traduzir, nas atividades nelas desenvolvidas, preocupação com
uma educação socialmente responsável em sua instituição. Utilizou-se de várias fontes de
evidência, coletadas a partir de entrevistas – gestores; de documentos institucionais – relatórios
e balanços sociais de 2000 a 2007 e Projeto Político-Pedagógico Institucional –, e de
observações in loco. O estudo considerou que a UNISC é uma universidade socialmente
responsável, preocupada em contribuir com o desenvolvimento sustentável de sua região e que
vem encontrando um equilíbrio entre as ações direcionadas a seu público interno e aquelas
direcionadas ao público externo.
Silva (2012) traz um estudo sobre a ABRUC – Associação Brasileira das Universidades
Comunitárias apresentando as ações desenvolvidas por esta entidade na educação superior do
Brasil no período de 1995 a 2007. O autor fez uma análise documental com base nas legislações,
documentos e publicações da entidade, bem como realização de entrevista. O resultado
demonstrou avanços na fixação e aceitação do conceito de comunitária e do espaço público não
estatal. A ABRUC, ainda que dentro do corporativismo próprio do associativismo, possibilitou
avanços na criação de um espaço democrático para as IESs comunitárias, confessionais e laicas,
seja para o relacionamento e defesa de interesses comuns, seja para a questão de destinação de
verba pública.
Castro (2013) busca, em sua tese, compreender as características das universidades
comunitárias que justifiquem sua existência e crescimento, bem como contribuir para a
consolidação de uma identidade própria que as diferencia dos demais segmentos do subsistema
de educação superior brasileiro. Conclui a autora que além do ensino, produzem pesquisas e
dedicam importante esforço para partilhar o conhecimento e as artes com as comunidades, por
meio da extensão. A importância das Universidades Comunitárias se dá, destacadamente, pelo
seu reconhecimento como uma nova categoria jurídica: um espaço configurado como “público
não estatal” inserido entre os setores público e privado empresarial.
Fioreze (2017) analisa o modelo das universidades comunitárias regionais do Rio
Grande do Sul buscando compreender quais são os principais tensionamentos entre o público e
o privado vivenciados pelas universidades comunitárias no atual contexto, bem como
29
identificar os desdobramentos de tais tensões na configuração dessas instituições. Os dados
consistiram em entrevistas com representantes das IES e análise de documentos nacionais e
institucionais. A tese demonstrou que as universidades comunitárias compõem um modelo
institucional peculiar, que, em meio a um contexto permeado por contradições e
tensionamentos, mostra-se tendente ao equilíbrio dentro de uma feição eminentemente híbrida,
a qual configura composições entre público e privado que, ao mesmo tempo em que podem lhe
fornecer plasticidade para se mover com agilidade frente aos desafios que emergem do
capitalismo acadêmico, também podem consubstanciar resiliência para preservar a ideia de
educação superior como bem público.
Além desses estudos de tese, outros trabalhos tangenciam a temática sobre identidade
das universidades comunitárias. Longhi (2000) realiza uma síntese das principais características
desse modelo, suas formas de resistência e o seu esforço em busca do atendimento às demandas
educacionais e sociais, pautado pela busca da melhor competência acadêmica.
Frantz (2006) busca caracterizar a universidade comunitária como uma instituição de
natureza pública não estatal, permitindo a sua identificação como um novo modelo de
organização e funcionamento de ensino superior, no Brasil. Morosini e Franco (2006), por sua
vez, analisam características de sustentabilidade na universidade comunitária - UC (não estatal
orientada para a região), segundo seus gestores, objetivando identificar políticas institucionais,
mudanças no caráter comunitário e traçar perspectivas. Os resultados apontaram características
de expansão, diversificação de áreas e de financiamento e estímulo acadêmico. Observou-se
também que as UCs diferem quanto ao fortalecimento do grupo central e à cultura empresarial.
Fernandes (2008) faz uma revisão sobre a caracterização das Instituições de Ensino
Superior – IES no Brasil, com foco na conceituação de universidade comunitária e evidencia a
ambiguidade dos conceitos de universidade comunitária em oposição ao de universidade
particular, notadamente na ótica dos estudantes. Gumbowsky (2013) apresenta aspectos da
evolução dessas instituições e discute o conflito entre o seu compromisso original de fomentar
o desenvolvimento regional, transitando por um período de mercantilização do ensino superior
e, mais recentemente, convivendo com políticas públicas que ampliam o acesso ao ensino
superior gratuito.
Bittencourt et al. (2014), analisam o novo cenário da educação superior brasileira, com
especial enfoque nas IES integrantes da Associação Brasileira de Universidades Comunitárias
(ABRUC). Os resultados obtidos, justificam a valorização dessas instituições que operam e
contribuem para a consolidação dos cursos superiores no Brasil.
Rosa-Castro, Marques Júnior e Marques (2014) buscam caracterizar as Universidades
30
Comunitárias no setor da Educação Superior Brasileira, sob o olhar dos gestores, considerando
o tripé ensino/pesquisa/extensão, assim como, Venanzi e Sandano (2014), que analisam missão
e prestação de serviços à comunidade na busca de uma consolidação de uma identidade própria
que auxilie essas universidades a desempenhar com eficiência a missão educacional a que se
propõem.
Luckmann, Cimadon e Bernart (2015) aprofundam o debate sobre o modelo
comunitário em duas dimensões: a social e a jurídica: (1) A primeira vincula-se a dimensão de
natureza pública construída por esse modelo ao longo da história, a qual extrapola as dimensões
do público-estatal e do privado presentes nos modelos de educação superior vigentes. Isso pôde
ser constatado na forma como as ICES foram criadas, como constituíram seu patrimônio, como
organizam sua gestão, como aplicam e destinam seus recursos financeiros e patrimoniais, como
ocorre a participação da sociedade civil nos conselhos da instituição e, sobretudo, na prestação
de contas à sociedade; (2) a segunda se refere à participação das ICES nas políticas de regulação
e supervisão do ensino superior, e sua restrita participação nas políticas de fomento. Parte dos
programas de fomento é destinada exclusivamente às IFES (Programa de Apoio a Planos de
Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (REUNI), Programa de Apoio à
Extensão Universitária (ProExt), Programa de Acessibilidade na Educação Superior (Inluir),
entre outros. Para os autores, o Estado precisa construir as condições políticas de uma presença
mais orgânica junto às instituições comunitárias, caso contrário, corre-se o risco de vermos uma
experiência bem-sucedida de educação superior se perder com o tempo.
Paim e Yamaguchi (2016) buscaram evidenciar e avaliar as percepções da comunidade
organizada acerca da interação regional das Instituições Comunitárias de Ensino Superior -
ICES catarinenses. O estudo apontou que para as ICES serem protagonistas do
desenvolvimento regional, precisam proporcionar um relacionamento cooperativo com os
órgãos representativos dos municípios e da região, bem como com as entidades de classe da
comunidade organizada.
Tendo em vista a proposta desta pesquisa, esses trabalhos apontam elementos que
fortalecem o posicionamento adotado no estudo, em relação ao problema e a tese defendidos.
Estudos que visam o entendimento do conceito de universidade comunitária, de natureza
pública não estatal, que discutem o modelo comunitário de educação superior no contexto do
ensino superior brasileiro, que buscam compreender os tensionamentos entre o público e o
privado vivenciados por essas instituições, trazem argumentos que destacam os dilemas vividos
entre os propósitos fundacionais das universidades comunitárias e a sua luta para sobreviver às
pressões no mercado competitivo.
31
Além do conhecimento produzido sobre o tema na área da educação, o estudo
bibliométrico permitiu identificar importantes pesquisas, notadamente no campo da
administração sobre os conceitos: identidade organizacional/institucional.
O tema sobre identidade organizacional se intensificou a partir da década de 1980. Nos
Estados Unidos, o estudo passou a conquistar espaço com a publicação de um artigo intitulado
Organizacional Identity, Universidade de Illinois, desenvolvido por Albert e Whetten em 1985.
No Brasil, esse tema começou a ser estudado, com mais intensidade, a partir de 1995, com os
trabalhos de Wood Jr. e Caldas (1995) (CRÉDICO, 2003).
Albert e Whetten (1985) tomaram da Psicologia e da Sociologia alguns estudos a
respeito do conceito de identidade individual para o nível organizacional de análise,
estabelecendo alguns critérios para observação. Os autores caracterizam a identidade
organizacional como uma questão de “autorreflexão”, em que os membros da organização, ao
compartilhar suas crenças acerca dos atributos da identidade, respondem à questão: “Quem
somos nós como organização?” Para os autores, a identidade nas organizações tem por base
três características: a centralidade - o que é considerado pelos membros como a essência da
organização; a distintividade - o que faz a organização se diferenciar/distinguir de outras; e a
permanência /continuidade temporal - que se refere à manutenção e à estabilidade de
determinadas características ao longo do tempo.
As organizações, assim como os indivíduos, decidem quem elas são ao empregar algum
esquema de classificação e ao se localizar dentro deste esquema. Quanto ao critério de caráter
central da identidade de uma organização tem que ser uma declaração que a distingua em
relação a algo importante e essencial, considerando o que é central para ela, a partir de um certo
propósito (ALBERT; WHETTEN, 1985).
Gioia (1998), acrescenta elementos a essa discussão destacando que, assim como os
indivíduos, as organizações mantêm sua identidade ao interagir com outras organizações,
utilizando o processo de comparação ao longo do tempo. E ressalta ainda que, as organizações,
tanto quanto os grupos de indivíduos, procuram parecer similares a um determinado grupo de
outras organizações, enquanto, ao mesmo tempo, procuram se distinguir desse grupo de
referência. A ideia de que a identidade seria então relacional e comparativa também seria
aplicada às organizações. Para Albert e Wetthen (1985) as organizações, igualmente, se
empenham em manter a continuidade dos conceitos sobre si mesmos ao longo do tempo,
investindo na consistência de seus valores e ações, mas também buscando manter certa
adaptabilidade em tempos de mudanças rápidas.
Para Scott e Lane (2000), a identidade organizacional compreende o processo, atividade
32
e acontecimento por meio do qual a organização torna-se específica na mente de seus
integrantes. Segundo Albert e Wetthen (1985) esse processo, se manifestaria por meio das
crenças partilhadas pelos membros da organização sobre o entendimento do que seria central,
distintivo e duradouro na organização. Para Machado (2003), a identidade organizacional é
construída dia após dia, conforme os membros vão internalizando a crença de que a organização
da qual fazem parte é a mesma que era ontem, simbolizando sua existência temporal.
A identidade organizacional também forma uma estreita relação com a cultura
(MACHADO, 2005), na medida em que os significados atribuídos aos símbolos, rituais,
cerimônias, histórias os quais são compartilhados pelos membros da organização, ajudam a
orientar a percepção sobre a essência dessa organização. O foco da identidade, portanto, se fixa
em como as pessoas desenvolvem uma compreensão coletiva de “quem somos nós como
organização”, construindo os sentidos sobre “o que é a organização” (FERNANDES;
MARQUES; CARRIERI, 2009).
Ao longo do tempo, diferentes definições e abordagens foram adicionadas ao conceito
de Albert e Wetthen (1985), surgindo algumas dimensões antagônicas sobre o conceito de
identidade organizacional (FERNANDES, MARQUES; CARRIERI, 2009). Para os autores,
ora o conceito é tomado numa perspectiva objetiva, como variável passível de ser manipulada,
ora é entendida de forma subjetiva, a partir das percepções dos indivíduos sobre “o que é
organização”. Nessa perspectiva, a identidade organizacional pode ser conceituada como a
“metáfora que exprime as percepções das pessoas acerca da essência de quem somos nós como
organização” (FERNANDES; MARQUES; CARRIERI, 2009, p. 689).
Uma revisão bibliográfica realizada por Ravasi e Canato (2013) revelou que levou mais
de dez anos para que estudos empíricos sobre identidade organizacional começassem a aparecer
nas principais revistas da área, depois do trabalho de Albert e Whetten (1985). Os autores
analisaram os artigos empíricos que compreendiam o período entre 1985 e 2011 publicados nas
mais conceituadas revistas internacionais como: Academy of Management Journal,
Administrative Science Quarterly, British Journal of Management, Human Relations, Journal
of Management, Journal of Management Studies, Journal of Organizational Behavior,
Organization Science, Organization Studies, Strategic Management Journal e Strategic
Organization.
Ravasi e Canato (2013) classificam os estudos empíricos sobre identidade
organizacional em três grandes ondas que refletem o modo de pesquisar o conceito. A primeira
onda, de 1991 a 2000, é da Identidade Organizacional - IO como uma “explicação inesperada”.
Nessa onda, os estudos tinham como foco a investigação do gerenciamento de problemas,
33
mudanças estratégicas ou respostas para a degradação de imagens organizacionais. A segunda
onda, entre 2000 a 2002, contempla análises realizadas ao nível do indivíduo, com pesquisas
que investigavam vários antecedentes da identificação dos indivíduos com a organização. Esses
estudos demonstram como uma identidade coletivamente percebida e coerente com os valores
pessoais dos membros tende a favorecer o forte apego dos indivíduos à organização. A terceira
onda, de 2002 a 2011, estuda a IO como objeto de pesquisa explícito, reunindo estudos sobre
construções e processos. As investigações tendem a construir as teorias baseadas em um único
estudo de caso, relativo a um prolongado período de tempo ou concentrando-se em eventos
organizacionais especiais, tais como fundações, fusões ou reestruturação (RAVASI; CANATO,
2013).
Bauer e Mesquita (2007) observaram que os trabalhos sobre identidade, na literatura
internacional, seguem diversos caminhos epistemológicos e que abordam tanto o nível coletivo
(ou imagem organizacional), quanto o nível mais subjetivo, da identidade social e identificação.
Na literatura nacional, a produção sobre o tema tem se voltado para estudos na organização, e
não da organização, assim as análises predominam sobre a identidade dos indivíduos inseridos
nas estruturas organizacionais. Embora haja distinção entre as concepções, em se tratando de
identidade organizacional, alguns aspectos da identidade pessoal, da identidade no trabalho e
da identidade social acabam sendo mencionados, demonstrando certa complementaridade entre
os fenômenos (MACHADO; KOPITTKE, 2002). Isso porque qualquer estudo sobre identidade
se fundamenta a partir do comportamento dos indivíduos ou dos grupos, isto é, do
comportamento humano nas organizações (BAUER; MESQUITA, 2007).
Segundo levantamento realizado por Crédico (2003) nos Anais do ENANPAD e na
RAE – Revista de Administração de Empresas, no período de 1987 a 2002, os primeiros
trabalhos realizados no Brasil sobre identidade organizacional iniciaram na década de 1990 com
três estudos teóricos de Wood Jr e Caldas (1995), Caldas e Wood Jr (1997) e Campos (2002).
A partir de 2001, várias pesquisas empíricas realizadas em organizações brasileiras que
passavam por grandes mudanças, principalmente estatais que foram privatizadas, do ramo de
telecomunicações se apresentaram tais como Machado-da-Silva e Nogueira (2001), Carrieri
(2002), Cesar e Machado-da-Silva (2002), Rodrigues e Child (2002) e Silva e Vergara (2002).
Crédico também constatou que os autores brasileiros empregam basicamente o conceito
clássico de identidade organizacional definido por Albert e Whetten (1985), os conceitos da
Teoria da Identidade Social, de Cultura Organizacional e do Interacionismo Simbólico.
Miranda, Pessanha e Moreira (2009), tomando a cultura como elemento constituinte da
IO buscam compreender a construção identitária da organização, a partir de sua cultura e
34
imagem. Por meio da percepção dos informantes internos, os autores verificam alguns traços
culturais que auxiliaram na compreensão dos parâmetros de definição da identidade
organizacional, conforme propostos por Albert e Whetten (1985). Nessa perspectiva, o sistema
de gestão da qualidade foi elemento que se destacou como característica simultaneamente
central, distintiva e duradoura da organização.
Os pesquisadores Beyda e Macedo-Soares (2010) em levantamento bibliográfico de
artigos sobre identidade organizacional produzidos no Brasil a partir de 2004 e publicados nos
Anais dos encontros da EnANPAD, EnEO, EnGPR e nos periódicos da RAE-e, RAC-e,
RAUSP, BAR, Organização & Sociedade e Cadernos Ebape, afirmam que é possível perceber
a terceira onda nas pesquisas empíricas sobre Identidade Organizacional, relatada por Ravasi e
Canata (2013). Entre 2004 e 2009, com objetivo de compreender o fenômeno, as pesquisas
empíricas enfocam a identidade organizacional como um objeto de pesquisa explícito. Essas
pesquisas são elaboradas com diferentes propósitos tais como: verificar como a identidade
organizacional se comporta em situações de mudança (NOGUEIRA, 2007; CARASSAI,
FONSECA, 2009), estudar a construção da identidade organizacional (MACHADO, 2005;
MIRANDA; PESSANHA; MOREIRA, 2009), ou relacionar a Identidade Organizacional com
outras abordagens como cultura (MACHADO, 2005) ou imagem (MIRANDA; PESSANHA;
MOREIRA, 2009).
Machado (2014), ao estudar a formação da identidade organizacional de um campus
universitário federal, buscou examinar, em sua dissertação, o processo, a partir do que os
membros dessa instituição entendiam e incorporavam aquilo que representava a essência da
organização, do que a distinguia e do que a tornava única no contexto de sua atuação e do que
permanecia nela ao longo do tempo. Os achados de Albert e Wetthen (1985) serviram de base
para analisar os significados compartilhados pelos membros ao que era central, distintivo e
duradouro no contexto do Campus. A autora conclui que a organização vem formando sua
identidade ao longo de um processo que compreende seis momentos distintos do
desenvolvimento do Campus: (1) sua criação; (2) a instalação; (3); o início do seu
desenvolvimento; (4) a criação dos cursos; (5) a mudança de local; (6) a expansão das atividades
de ensino. Verificou que, em cada um desses momentos, vários acontecimentos influenciaram
na construção da identidade, bem como foram constatados alguns fatores críticos na definição
e consolidação de sua identidade.
Borba (2018) em seu estudo intitulado Imagem e identidade da Universidade do Vale
do Itajaí buscou identificar a imagem e a identidade dessa instituição comunitária. Para o
construto identidade, a pesquisa empírica envolveu entrevistas com dois gestores da
35
Universidade e triangulação com o Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI). O resultado
apontou que a identidade é constituída de cinco categorias quais sejam Definição de instituição
comunitária, Posicionamento, Inserção regional, Estratégias e Reconhecimento. Já para o
construto da imagem, foi utilizado o Método de Configuração da Imagem (MCI), desenvolvido
por Schuler e De Toni (2007) e envolveu entrevistas com 30 alunos, 30 funcionários e 30
membros da comunidade de Itajaí na fase qualitativa exploratória e uma pesquisa do tipo survey
para toda a população na fase quantitativa e descritiva. Os resultados apontaram como
formadoras da imagem da Universidade do Vale do Itajaí, nove dimensões e 13 atributos, a
saber: Dimensão Top of Mind: atributos “Universidade”, “Qualidade” e “Referência”;
Dimensão Afetiva: “Carinho”; Dimensão Emocional: “Estrutura” e “Estacionamento”;
Dimensão Racional: “Contribuir com a Sociedade” e “Aprendizado”; Dimensão Sensorial:
“Arquitetura”; Dimensão Simbólica: “Fundamento”; Dimensão Visionária: “Crescimento”;
Dimensão Axiológica: “Respeito”; e Dimensão de Pontos de Comparação: “Melhor”.
Apesar de trilharem caminhos teóricos distintos, os estudos da área de Ciências
Humanas e os estudos das Ciências Sociais Aplicadas sobre identidade acabam se encontrando
em determinados momentos na medida em que buscam analisar e caracterizar a formação das
identidades de instituições e organizações por suas semelhanças, diferenças, aspectos
duradouros e por influência do contexto histórico. Muitas pesquisas analisam a identidade
tomando como referência a teoria da identidade institucional (Albert; Wetthen, 1985) ao utilizar
as categorias de centralidade, distintividade e durabilidade, mas também usam o contexto
histórico para fazer a análise (Gioia et al., 2010; Machado, 2005). Esses afirmam que a
identidade organizacional tem uma relação estreita com a cultura, na medida em que a
percepção das pessoas sobre a essência da organização é permeada por significados atribuídos
às formas de expressões culturais, como histórias, mitos, rituais, símbolos que são
compartilhados por seus membros.
Ainda em busca de estudos sobre identidade organizacional das universidades, foi
realizada uma pesquisa na Plataforma de base de dados EBSCO. Foram encontrados trinta e
seis trabalhos a partir da utilização das palavras-chave organizational identity AND higher
education, destes, oito estudos poderiam contribuir para esta pesquisa.
Stensaker (2015) ao buscar compreender a dinâmica da universidade, argumenta que a
identidade organizacional é um conceito promissor e relativamente novo para pesquisar tanto a
continuidade quanto as mudanças que vêm ocorrendo nas instituições de ensino superior.
Demonstra a relevância do conceito, identificando e descrevendo vários usos da identidade
organizacional dentro das universidades. A identidade organizacional é um conceito que pode
36
ser usado para analisar as universidades como instituições, em um momento em que forças
fortes buscam transformá-las em organizações. A afirmação é de que existem possíveis elos
entre imagem, integração, inovação e interpretação que precisam ser explorados, sugerindo que
a mudança e a continuidade talvez estejam conectadas de maneiras altamente complexas. A
identidade organizacional é um conceito que representa uma promessa considerável nesta
situação, devido à sua maneira de conectar o passado e o futuro, a tradição e a modernidade.
Assim, a identidade organizacional é um conceito que pode destacar valores e normas
importantes da universidade em uma época em que as conotações mais positivas dos rótulos
tradicionais que as caracterizam foram perdidas.
Em trabalho intitulado Identidade organizacional: uma revisão da literatura de 1972 a
2014, Dumay, Draelants e Dahan (2015) analisaram 120 estudos empíricos, reconhecendo a
existência de uma literatura rica, mas dispersa, em termos teóricos, epistemológicos e
metodológicos sobre o uso do conceito de identidade organizacional para entender as
transformações atuais por que passa a universidade. Foram identificadas seis principais
categorias de pesquisa de acordo com as distinções clássicas encontradas na literatura de
identidade organizacional propostas por Hatch e Schultz (2002) e Glynn (2008). Para Hatch e
Schultz (2002) a identidade organizacional é um processo de diálogo e comparação entre
imagens externas da organização (hetero-definições) e sua cultura interna (auto-definições), ela
é construída na interseção de dois processos, um espelhando e refletindo e outro, autoexpressão
e autoapresentação. Espelhamento: indivíduos valorizados fora da organização têm
representações dela e, assim, mantêm um espelho para os que estão por dentro. Refletindo: a
imagem refletida no espelho oferecido por outros não pode deixar de afetar a forma como os
atores da organização percebem e se definem. Sua interpretação interna depende da cultura
organizacional e da compreensão da identidade coletiva disponível dentro da organização.
Autoexpressão: ao longo do tempo, as organizações, como os indivíduos, constituem suas
identidades através de suas próprias narrativas, discussões internas e debates sedimentados na
cultura organizacional. Autoapresentação: as imagens da organização são projetadas para seu
público, deliberada e estrategicamente ou não.
Para construir a tipologia de estudos sobre a identidade organizacional das
universidades, os autores cruzaram os quatro elementos do processo de construção identitária
estabelecidos por Hatch e Schultz (2002) (Espelhamento, Refletindo, Autoexpressão,
autoapresentação) com a classificação proposta por Glynn (2008) dos três principais tipos de
definição de identidade organizacional (essencialista, estratégica, neo-institucional). O primeiro
deles, que segue na linha da definição inicial de Albert e Whetten (1985), baseia-se em uma
37
visão essencialista. Se concentram em identificar e enumerar os aspectos essenciais, distintivos
e duradouros que definiriam a "essência" da organização. O segundo enfoca a forma como a
identidade é utilizada como um recurso estratégico, oferecendo vantagens competitivas e
funcionando como uma bússola para os membros da organização quando tomam decisões e
escolhas estratégicas. A terceira definição, de natureza institucional e relacional, mostra um
maior contraste com a primeira e está menos preocupada em buscar a natureza ou atributos
únicos das organizações do que com o estudo dos processos de construção de posições dentro
de um campo organizacional. Quando a pesquisa se baseia na dinâmica externa (processos de
espelhamento e auto-apresentação), as abordagens estratégicas dominam (40 estudos fora dos
64 identificados), no caso da dinâmica de identidade interna (refletida e autoexpressão) que
representam um número menor de estudos, as abordagens essencialistas estão melhor
representadas (22 artigos dos 35 identificados).
Ao se fazer recortes em uma pesquisa, busca-se garimpar fontes que de alguma forma
ajudem a elucidar os fenômenos que se apresentam na realidade, os quais merecem ser
investigados. Este é um deles: investigar a construção da identidade das universidades
comunitárias e seus conflitos à luz das políticas educacionais para o ensino superior, o que
requer critérios minuciosos no garimpo por estudos já realizados sobre esse universo.
O levantamento de estudos realizados na área de Ciências Sociais e Humanas e na área
da Teoria das Organizações demonstrou importantes referenciais em pesquisas sobre o tema
identidade das universidades, especificamente, das universidades comunitárias e deu
indicativos das potencialidades do aprofundamento desse tema desde outras perspectivas
analíticas, principalmente as que possibilitem discutir os embates e dilemas em torno dos temas:
identidade institucional e identidade organizacional. Então, encontrou-se nesse universo um
terreno fértil para a discussão nessa tese, daí é que se propõe, por meio do referencial teórico
proposto por McCowan (2016) discutir os componentes da anatomia das universidades e por
Albert e Whetten (1985) os componentes que constituem a identidade organizacional.
Buscou-se encontrar, nesses estudos, subsídios que contribuissem para a compreensão
daquilo que marca a identidade do modelo de instituição chamado universidades comunitárias.
Outros estudos, no meio do trajeto, serviram de suporte para a análise da empiria e
fortalecimento na construção deste conhecimento e elucidação dessa tese.
38
2 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Este capítulo tem como finalidade evidenciar a abordagem teórico-metodológica (2.1)
escolhida para este estudo; a contextualização da pesquisa (2.2), e os procedimentos de coleta
e análise dos dados (2.3).
2.1 Abordagem teórico-metodológica
Ao tomar identidade como “uma produção psíquica complexa e que assume numerosas
dimensões e estratos, em virtude de nossas experiências pessoais e dos grupos de que fazemos
parte” (FREITAS, 2010, p. 13); ao considerar o processo de construção identitária dinâmico e
que se alicerça em bases históricas e sociais, derivando daí múltiplas identidades “conforme o
nível de identificação de um indivíduo em relação ao seu grupo e de ambos em relação à
organização” (SARAIVA et al., 2010, p. 19); este estudo concentra seus esforços de pesquisa
na construção da identidade das universidades comunitárias, sendo desenvolvido na linha de
pesquisa Políticas para Educação Básica e Superior, no grupo de Pesquisa Observatório de
Políticas Educacionais do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade do Vale
do Itajaí. Levando em consideração o contexto brasileiro, no escopo das reformas e políticas
educacionais, e a existência de um modelo alternativo e diferenciado de universidade presente
no sul do Brasil denominado universidade comunitária, este trabalho, como já foi mencionado,
busca compreender o processo e as características de constituição da identidade dessas
instituições, focalizando os desafios que estas encontram no contexto das políticas públicas
voltadas ao ensino superior no Brasil.
Para estudar o processo de construção da identidade das universidades comunitárias e
os elementos que as caracterizam, parte-se do pressuposto de que existem várias realidades
subjetivas que variam em sua forma e conteúdo entre indivíduos, grupos e culturas. O ser
humano não é passivo, ao contrário, interpreta o mundo em que vive continuamente e a
realidade muda por causa das observações e dos pontos de vista dos atores estudados.
(OLIVEIRA, 2011; SAMPIERO; COLLADO; LUCIO, 2013). Portanto, optou-se pela
abordagem qualitativa por se entender que o estudo da experiência humana deve ser feito
considerando que as pessoas interagem, interpretam e constroem sentidos. Nessa perspectiva
Stake (2011, p. 30) afirma que na pesquisa qualitativa, o [...] pesquisador é um instrumento ao
observar ações e contextos e, com frequência, ao desempenhar intencionalmente uma função
subjetiva no estudo, utilizando sua experiência pessoal em fazer interpretações”.
39
No universo de metodologias inseridas na abordagem qualitativa optou-se pela
metodologia de estudo multicaso para desenvolver a investigação. O estudo de casos diz
respeito à replicação e não amostragem, isto é, não permite generalização dos resultados para
toda população, mas a possibilidade de previsão de resultados similares ou contrários aos
esperados (YIN, 2005). Conforme Boyd e Westfall (1987, p. 73), o estudo de multicasos tem
se mostrado conveniente na identificação de três fatores: “fatores comuns a todos os casos no
grupo escolhido; fatores não-comuns a todos, mas apenas a alguns subgrupos; fatores únicos
em caso específico”.
Nesse sentido, o emprego do método multicaso, nesta pesquisa, permitiu a compreensão
do processo de construção da identidade institucional das universidades comunitárias
selecionadas a partir da análise dos discursos de seus gestores, bem como dos documentos
oficiais que nortearam as políticas educacionais voltadas a essas instituições e documentos
produzidos por elas, como os Planos de Desenvolvimento Institucional (PDI). Considera-se que
mesmo sendo classificadas como comunitárias, as quatro universidades estudadas apresentam
experiências que se assemelham e também não comuns que foram sendo construídas de modo
específico, de acordo, com sua história, condições sociais e pessoas que dela foram partícipes.
Como referenciais orientadores das análises estão os estudos de McCowan (2016; 2017)
ao se referir às características que definem uma universidade e de Albert e Wheten (1985), ao
propor um modelo de análise da identidade organizacional.
McCowan (2016; 2017) sugere alguns ingredientes substanciais para a análise de
características constituintes da “anatomia” da universidade, os quais podem contribuir para
identificar as mudanças que vêm ocorrendo nas universidades comunitárias ao longo do tempo
tanto no que se refere ao conhecimento, quanto às suas relações com a sociedade. O autor
propõe uma estrutura considerando três dimensões que diferenciam as instituições em seus
comportamentos: valor, função, interação. A figura 1 ilustra essa proposta.
40
Figura 1 - Anatomia da universidade
Fonte: Elaborado pela autora a partir de McCowan (2016; 2017; 2018)
A dimensão valor refere-se à razão da existência da universidade, do porquê do ensino
superior. Dois eixos são considerados ao valor atribuído à universidade: o valor intrínseco (o
conhecimento gerado vale por si mesmo sem qualquer justificativa) e o valor instrumental (o
conhecimento servindo a objetivos individuais e sociais e interesses econômicos, políticos ou
culturais (MCCOWAN, 2016, p. 550). A dimensão função relaciona-se à variedade de
atividades e papéis que a universidade cumpre. Diz respeito ao papel da universidade em termos
de armazenamento, transmissão, produção ou aplicação de conhecimento. A dimensão
interação refere-se às formas como a universidade se relaciona com a sociedade externa, isto
é, a facilidade ou dificuldade com que o fluxo de atores e ideias acontece, ao quanto suas portas
estão abertas ou fechadas para traduzir e comunicar o conhecimento produzido a parceiros
externos e à comunidade. “Todas essas dimensões de porosidade podem ser vistas em diferentes
escalas: em relação às comunidades locais, ao nacional e ao global, vinculando-as a debates
sobre internacionalização” (MCCOWAN, 2016, p. 511). Este quadro analítico serviu de
referência para avaliar os possíveis dilemas que as universidades comunitárias vêm enfrentando
quanto à construção de sua identidade e a relação desta com as políticas educacionais para o
ensino superior.
Agregando-se a este arcabouço, os elementos propostos por Albert e Whetten (1985),
Ashforth e Mael (1996) e Carrieri (2002) e que sustentam a identidade organizacional também
41
serviram de apoio para as análises sobre a identidade de tais instituições, quais sejam: o que
lhes é central (características vistas como a essência da instituição), o que lhes é distintivo
(elementos que distinguiriam uma instituição das outras com quais poderia ser comparada) e o
que lhes é duradouro (características estáveis no tempo). A figura 2 ilustra esses elementos.
Figura 2 - Dimensões da identidade organizacional
Fonte: Elaborado pela autora a partir de Albert e Whetten (1985)
Todos esses aspectos integrantes da identidade organizacional são interdependentes e
sua análise se daria em conjunto sendo descritos pela linguagem por meio de discursos e
narrativas. Também estariam materializados na missão, nos objetivos organizacionais
estratégicos, nas proposições ideológicas presentes nas culturas, nos valores organizacionais
(NOGUEIRA; MACHADO-DA-SILVA, 2003). Vista assim, a identidade toma uma dimensão
subjetiva, concebida como um processo de construção social que resulta na percepção dos
indivíduos sobre os atributos centrais, distintivos e duradouros da organização (ALBERT;
WHETTEN, 1985; CARRIERI, 2001; HATCH; SCHULTZ, 2002). Sendo as universidades
comunitárias consideradas um modelo de instituição de ensino superior que vêm se forjando ao
longo de décadas, considera-se que como tais, traços centrais, distintivos e duradouros possam
ser ressaltados em sua construção identitária.
Para a análise das dimensões valor, função, interação e sua relação com os conflitos por
que passam as universidades comunitárias, partir-se-á de alguns traços identitários ou
característicos dessas instituições preconizados e reiterados em estudos realizados sobre as
instituições comunitárias. A Lei 12.881/2013, cujo texto contempla a definição, a qualificação,
as prerrogativas e as finalidades das instituições comunitárias também é referência para a
seleção das características que marcam a identidade das instituições comunitárias.
Entre os traços distintivos dessas instituições aludidas por diversos autores identificados
42
na revisão de literatura estão as seguintes: (I) Quanto à iniciativa de criação. A origem dessas
instituições se deu por organizações da sociedade civil e do poder público local/regional. (II)
Quanto à responsabilidade pela manutenção e forma de constituição. Associações ou fundações
da sociedade civil são responsáveis por sua manutenção. A entidade mantenedora é que tem a
personalidade jurídica (pessoa jurídica de direito privado) e cabe-lhe prover os recursos
necessários para o funcionamento da instituição de ensino. (III) Quanto à natureza e finalidade.
Pública não estatal. As universidades comunitárias gozam de significativa autonomia
administrativa e científica, isso porque não pertencem a proprietários individuais nem ao
Estado. (IV) Quanto à destinação dos recursos econômicos. Os recursos angariados destinam-
se à manutenção e qualificação dos serviços prestados, portanto, sem fins lucrativos. (V) Quanto
à forma de escolha dos dirigentes (autogestão). A direção das universidades comunitárias é
exercida por professores do seu quadro docente. Em certas instituições há eleição direta, em
outras são nomeados pela mantenedora. (VI) Gestão com caráter público. Os cidadãos são
tratados de forma isonômica, sem privilégios ou distinção. (VII) Inserção comunitária.
Compromisso com a extensão que se materializa pela atenção dada às necessidades do contexto
social das comunidades regionais. (VIII) Participação e transparência. Participação ativa dos
diversos segmentos da sociedade nas decisões e acesso às informações sobre temas acadêmicos
e financeiros (FIOREZE; MCCOWAN, 2018; SCHMIDT, 2017; VANNUCCHI, 2011;
LONGHI; FRANCO; ROCHA, 2009; CRUZ, 2008; FRANTZ, 2006; SAMPAIO, 2000;
BITTAR, 1999).
A partir dos estudos realizados até aqui, foi possível criar uma figura demonstrativa das
dimensões de análise (valor, função, interação) relacionadas às características/atributos das
universidades comunitárias e às possíveis ameaças. A figura 3 traz os detalhes.
43
Figura 3 - Relação entre dimensões de análise, características das UCs e dilemas
Fonte: Elaborado pela autora a partir de McCowan (2016; 2017; 2018) e Albert e Whetten (1985)
Cada uma das dimensões será tratada, considerando as razões de existência dessas
instituições, bem como os dilemas decorrentes das políticas educacionais para o ensino
superior.
2.2 Contextualização da pesquisa
Em 2014, foi aprovado junto ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e
Tecnológico (CNPq) o projeto de pesquisa intitulado Identidade institucional versus imagem
institucional das universidades comunitárias no sul do Brasil, período 2014-2018, tendo como
coordenadores a Dra. Regina Celia Linhares Hostins, professora do Programa de Pós-
Graduação em Educação da Universidade do Vale do Itajaí e o Dr. Hans Peder Behling,
professor do Programa de Pós-Graduação em Administração da mesma universidade. Trata-se
de uma proposta de investigação em rede que articula conhecimentos e processos de
investigação nos campos da Educação, das Políticas Públicas e da Comunicação e que tem o
propósito de analisar a interface: Identidade e Imagem institucional de Universidades
Comunitárias, do sul do Brasil” (CHAMADA UNIVERSAL– MCTI/CNPq Nº 14/2014).
Considerando a importância atual de articulação da produção científica em contextos de redes
colaborativas intra e inter áreas do conhecimento, a pesquisa envolve pesquisadores de quatro
44
universidades do sul brasileiro e também do Prof. Dr. Tristan McCowan da University College
of London.
A pesquisa sobre a construção da identidade e da imagem dessas instituições vem sendo
conduzida simultaneamente em quatro frentes de investigação: 1. Pesquisa documental para
exame dos documentos do MEC e das universidades investigada (documentos que avaliam e
disciplinam o ensino superior no país, PDI, PPI, Planejamento Estratégico, Materiais
institucionais e de divulgação). 2. Pesquisa de campo para entrevistas com os gestores das
instituições que compõem a amostra; 3. Seminários Redes Grupos de Pesquisa em âmbito
nacional e internacional, neste caso, já com a realização de seis encontros e 4. Grupos focais
denominados Seminários Redes Comunitárias envolvendo a comunidade interna (professores,
técnico-administrativos, alunos) e externa (representantes da sociedade) das instituições que
compõem a amostra.
O projeto de pesquisa citado considera que identidade e imagem constituem duas formas
relevantes de perceber a construção do perfil das universidades. Vistas como complementares
e orientadoras do comportamento dos diferentes públicos que se relacionam com essas
instituições, essas duas facetas se constituem dois assuntos críticos na vida das universidades.
(RUÃO, 2005). Dada a amplitude e complexidade teórica desses dois universos (identidade e
imagem), esta pesquisa representa um recorte desse projeto maior e se alia ao interesse de
aprofundar os estudos sobre as universidades comunitárias, um modelo que se distingue dos
demais modelos consolidados no país, considerando os aspectos relativos à identidade. Estudos
sobre imagem dessas instituições já estão em andamento e serão contemplados posteriormente.
O ensino superior brasileiro é heterogêneo e diversificado. O INEP – Instituto Nacional
de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira – refere às instituições de educação
superior brasileiras como sendo organizadas em a) Universidades (públicas ou privadas); b)
Universidades Especializadas; c) Centros Universitários; d) Centros Universitários
Especializados; e) Faculdades Integradas e Faculdades; f) Institutos Superiores ou Escolas
Superiores; g) Centros de Educação Tecnológica (INEP, 2017). Tanto o setor público quanto o
setor privado são compostos por segmentos de universidades e faculdades com características
distintas e peculiares. Schmidt (2017, p. 47) apresenta, de forma detalhada, as características
dos modelos de Instituições de Ensino Superior brasileiro, quais sejam, públicas, comunitárias
e privadas. O quadro 1 ilustra descritivamente as distinções.
45
Quadro 1 - Características das IES Públicas, Comunitárias e Privadas Características IES públicas IES comunitárias IES privadas
(particulares)
Iniciativa de criação Governo federal,
estadual ou municipal
Entidades e lideranças da
sociedade civil
Grupo privado (empresarial ou
familiar)
Responsabilidade pela manutenção
União, estados ou municípios
Entidades da sociedade civil e entes do poder público local
Grupo privado (empresarial ou
familiar
Natureza e finalidade Pública estatal Pública não estatal Privada
Destinação dos
resultados econômicos
Reinvestimento na universidade
Reinvestimento na universidade
Apropriação privada
Forma de escolha dos dirigentes
Nas IES, nomeação pelo Presidente da
República a partir de lista tríplice
Eleição (em certas instituições) ou nomeação pela
mantenedora (em outras)
Nomeação pela mantenedora
Tipo de pessoa jurídica
Pessoa jurídica de direito público
Pessoa jurídica de direito privado
Pessoa jurídica de direito privado
Forma de constituição
Autarquia ou fundação pública
Mantida por associação ou
fundação
Mantida por sociedade empresária
(anônima ou limitada)
Amparo na Constituição Federal
Art. 206, 207 e 211 Art. 205 e 213 At. 205 e 209
Fonte: Schmidt (2017, p. 47)
Três esferas são contempladas nesses modelos: Estado, comunidade (sociedade civil) e
mercado. Importa reconhecer uma esfera nem estatal nem privada, na qual se encontram as
universidades comunitárias, as quais se constituem um universo próprio, distinto do governo e
dos entes privados. A tríade público/comunitário/privado faz sentido à luz da tripartição
Estado/comunidade/mercado, cada qual cumprindo um papel específico que toma contornos
diferentes em função das condições sociais. Schmidt (2017), baseando-se nos apontamentos de
Etzioni (2007; 2001; 2001a), Sandel (2008) e Parsons (2003), elaborou um quadro ilustrativo
das características das esferas pública, comunal e privada, que passa a ser reproduzido a seguir,
dada a pertinência de elucidar tais conceitos no momento de contextualizar o perfil das
universidades estudadas.
46
Quadro 2 - Características das Esferas Pública, Comunal e Privada Características Esfera pública Esfera Comunal Esfera privada
Âmbito social Estado Comunidade/sociedade
civil Mercado
Setor econômico Setor público Terceiro setor Setor privado
Finalidade Bem público Bem comum Bem individual
Princípios Lei e força Moral e costume Auto interesse e razão
individual
Valores centrais Legalidade e ordem Cooperação e
confiança Competição e busca do
lucro
Poder predominante Coercitivo Normativo Econômico
Forma de gestão Hierárquica Autogestionária Hierárquica
Organizações típicas Órgãos públicos e empresas estatais
Organizações da sociedade civil
Empresas privadas
Fonte: Schmidt (2017), com base em Etzioni (2007; 2001; 2001a); Sandel (2008) e Parsons (2003)
Schmidt (2017) faz algumas observações quanto à convivência dessa tripartição. Para o
autor, todas as esferas são importantes, legítimas e necessárias à sociedade, elencar as
diferenças são significa estabelecer hierarquia entre elas. Nenhuma esfera consegue cumprir
suficientemente os papéis das outras, as quais estão amplamente interligadas nas sociedades
contemporâneas. E nesse universo, “as políticas públicas se realizam na presença de complexas
redes de agentes comunitários, estatais e privados” (SCHMIDT, 2017, p. 71).
Sob a denominação “universidades comunitárias”, agrupam-se várias instituições: as
comunitárias confessionais (entendidas como comunitárias lato sensu, ligadas a valores morais
e religiosos os quais encontram-se presentes na educação que oferecem à sociedade) e as
comunitárias não-confessionais ou laicas (ou comunitárias stricto sensu) (FRANTZ, 2006). No
caso desse estudo optou-se pelas universidades comunitárias laicas, ou seja, instituições criadas
pela própria comunidade em que estão inseridas ou pela sociedade civil.
Atualmente a ABRUC reúne 68 Instituições Comunitárias de Educação Superior
associadas entre universidades, centros universitários e faculdades. Para este estudo delimitou-
se como população, o universo composto pelas Universidades Comunitárias do sul do Brasil,
constituído por onze Universidades Comunitárias no Rio Grande do Sul, uma no Paraná e nove
em Santa Catarina.
Entre as universidades no Rio Grande do Sul estão: (1) UCS (Caxias do Sul); (2) UNISC
(Santa Cruz do Sul); (3) URCAMP (Bagé); (4) FEEVALE (Novo Hamburgo); (5) PUCRS
(Porto Alegre); (6) UCPEL (Pelotas); (7) UNICRUZ (Cruz Alta); (8) UNIJUI (Ijuí); (9)
UNISINOS (São Leopoldo); (10) UPF (Passo Fundo); (11) URI (Erechim). No Paraná há
47
apenas uma (1) PUCPR (Curitiba). E em Santa Catarina existem as seguintes: (1) UNC
(Concórdia); (2) UNESC (Criciúma); (3) UNIPLAC (Lages); (4) UNIVILLE (Joinville); (5)
UNOESC (Joaçaba); (6) UNIARP (Caçador); (7) UNISUL (Tubarão); (8) UNIVALI (Itajaí);
(9) UNOCHAPECO (Chapecó).
Deste universo, participaram do estudo quatro instituições: duas do Estado do Rio
Grande do Sul (RS) e duas do Estado de Santa Catarina (SC). No Paraná não existem
Universidades Comunitárias laicas. As Universidades foram selecionadas com base nos
seguintes critérios: ser Universidades do sul do Brasil, ser universidade laica, reconhecida como
comunitária (de acordo com a Lei No 12.881, de 13 de novembro de 2013), com no mínimo
quatro mestrados e dois doutorados implantados, credenciada no Sistema Federal de Ensino,
com maior número de alunos e que exerçam atividades de ensino, pesquisa e extensão. A figura
4 traz o recorte da amostra.
Figura 4 - Critérios de seleção das universidades comunitárias
Fonte: Elaborado pela autora
De acordo com a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) na Ação Direta de
Inconstitucionalidade (ADIN) n. 2501/DF, é inconstitucional a vinculação de Instituições de
Ensino Superior mantidas pela iniciativa privada aos sistemas estaduais de ensino, devendo
essas IES se submeter ao regramento federal. A decisão do STF se aplica indistintamente a
todas as Instituições de Ensino Superior não-públicas e seus cursos superiores ofertados.
Somente as IES que fazem parte do Sistema Federal de Ensino estão aptas a requerer a
qualificação de ICES. Além disso, para obter a qualificação de Instituição Comunitária de
Educação Superior, as IES devem cumprir os requisitos previstos na Lei 12.881/2013, bem
como na Portaria MEC nº 863, de 3 de outubro de 2014 (BRASIL, 2014a), publicada em 6 de
48
outubro de 2014, que regulamenta o procedimento para qualificação das IES. As IES que
protocolaram pedido de migração passam a se sujeitar a competência do Ministério da
Educação (MEC) de regulação, supervisão e avaliação (MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO,
2018). Portanto, as universidades que fazem parte dessa mostra fazem parte do Sistema Federal
de Educação.
As universidades que fazem parte da amostra estão identificadas com as seguintes
denominações: UNI1, UNI2, UNI3 e UNI4. No quadro 3, são apresentadas algumas
informações abrangentes sobre cada uma delas.
Quadro 3 - Perfil das Universidades Comunitárias da Amostra
Fonte: Dados coligidos pela autora a partir dos PDIs, Relatórios de Responsabilidade Social e Sítios eletrônicos – Período 2016-2018.
UNI1
Criada em 1967, a UNI1 é uma Instituição Comunitária de Educação Superior (ICES),
com atuação direta na região nordeste do estado do Rio Grande do Sul. Tem como mantenedora
uma Fundação e é uma entidade jurídica de Direito Privado. É afiliada ao Consórcio das
Universidades Comunitárias Gaúchas - COMUNG; à Associação Brasileira das Universidades
Comunitárias - ABRUC; ao Conselho de Reitores das Universidades Brasileiras - CRUB; e ao
Fórum das Instituições de Ensino Superior Gaúchas. Oferece setenta e sete cursos de graduação,
dezesseis Mestrados e oito Doutorados. Tem em seu quadro novecentos e setenta e sete
professores titulados (86% com título de mestre e doutor). Em meio século de atividades, a
UNI1 marcou a vida de mais de 100 mil pessoas, que contribuem com o seu conhecimento para
o progresso da região e do país.
49
A UNI1 mantém unidades em oito cidades, atingindo diretamente uma população de
mais de 1 milhão de habitantes. Seu Campus-Sede fica em um polo de desenvolvimento
industrial com reconhecimento nacional. As demais unidades universitárias estão localizadas
nas cidades do Noroeste do Rio Grande do Sul.
UNI2
A UNI2 é uma Instituição Comunitária de Educação Superior (ICES), foi criada em
1968 e atua na região Norte do Rio Grande do Sul. Tem como mantenedora uma Fundação e é
administrada pelos próprios professores, independente das pressões e interferências político-
partidárias. Oferece 60 cursos de graduação, que recebem aproximadamente 22 mil alunos.
Nessas cinco décadas, formou mais 75 mil profissionais. Na pós-graduação, conta com quinze
cursos de mestrados, seis doutorados. São oferecidos mais de cinquenta cursos de
especialização em diferentes áreas do conhecimento, além dos cursos de extensão, seminários,
palestras e outros eventos, que contam com a participação das comunidades acadêmica e geral.
A UNI2 é uma instituição multicampi constituída pela sede administrativa e mais seis campi.
Em função da descentralização e do desenvolvimento das atividades acadêmicas em outros
municípios, expandiu-se significativamente a área de abrangência, que compreende mais de
100 municípios das regiões Norte e Noroeste do estado do Rio Grande do Sul, nos quais a
população é estimada em, aproximadamente, um milhão de habitantes.
UNI3
O ano de 1964 é considerado o marco inicial da evolução da UNI3, localizada no litoral
centro-norte de Santa Catarina. Esta tem como mantenedora uma Fundação e oferece cem
cursos superiores atendendo a mais de vinte e quatro mil alunos. Na pós-graduação são
oferecidos cerca de trinta e cinco cursos de especialização, onze mestrados e seis doutorados.
A UNI3 é uma instituição multicampi constituída pela sede administrativa e por mais oito
campi, localizados em diversos municípios. Sua estrutura multicampi e sua política de atuação
permitem atender a comunidade em toda a sua área de abrangência.
UNI4
A UNI4, localizada no sul de Santa Catarina, tem como sua mantenedora uma Fundação
Educacional, cuja origem remonta o ano de 1968. Esta região é considerada o centro político-
econômico social e cultural das microrregiões da Amrec - Associação dos Municípios da
Região Carbonífera - e da Amesc - Associação dos Municípios do Extremo Sul Catarinense.
50
Ambas são constituídas de 27 municípios e 608.754 habitantes. A UNI4 atende em torno de
treze mil alunos, oferecendo cinquenta cursos de graduação. Na pós-graduação são ofertados
trinta e dois cursos de especialização, sete mestrados e dois doutorados.
Todas essas universidades são mantidas por uma fundação. No Brasil, há uma exigência
legal quanto à existência de entidade mantenedora e de entidade mantida em instituições de
educação superior privadas. Os recursos necessários para o funcionamento da instituição de
ensino cabem à entidade mantenedora, pois é ela que tem personalidade jurídica, sendo os atos
jurídicos realizados em seu nome. Caso as atividades da associação ou fundação se encerrem,
o seu patrimônio será destinado a uma instituição congênere (comunitária ou pública)
(SCHMIDT, 2017).
Outra característica que marca a identidade dessas universidades é a composição dos
colegiados superiores, com a presença de representantes dos professores, técnicos
administrativos, estudantes e da comunidade regional. Para Schmidt (2017, p. 50) “a
transparência é viabilizada pelo acesso regular a informações sobre temas acadêmicos e sobre
a situação financeira tanto aos membros da mantenedora quanto aos integrantes da comunidade
acadêmica.”
Todas as universidades investigadas apesar de denominarem comunitárias e
compartilharem atributos essenciais, também se distinguem de outros modelos de instituições
superiores, assim como se distinguem entre si, dada a sua imersão na comunidade regional.
Como universidades, agregam uma diversidade de campos do saber, tendo como características
a autonomia acadêmica, didática, administrativa e de gestão (PAULA, 2003). Mas, em que
medida suas histórias se assemelham? Seus dilemas se parecem? Como vêm se dando a
construção de sua identidade e como vêm enfrentando as turbulências no cenário das políticas
públicas para o ensino superior dada a sua vocação para o bem público e as pressões exercidas
pelo mercado? Eis algumas perguntas que orientam esse estudo.
2.3 Procedimentos de coleta e análise dos dados
Em setembro de 2016, esta pesquisa foi aprovada pela Comissão Nacional de Ética em
Pesquisa (CONEP) do Conselho Nacional de Saúde/MS (CNS), pelo Comitê de Ética da
UNIVALI (CEP/UNIVALI), sob número CAAE 57090116.2.0000.0120, e também pelos
comitês de ética de todas as instituições coparticipantes, os quais têm a responsabilidade de
acompanhar e avaliar as propostas de pesquisa que envolvam seres humanos, animais ou
aspectos de biossegurança, estando de acordo com as prerrogativas éticas exigidas na Resolução
51
CNS 466/12.
Para a coleta de dados de um estudo multicaso, é importante utilizar várias fontes de
evidência, criar um banco de dados e manter o encadeamento das evidências (YIN, 2005). Para
tanto, para esta investigação várias fontes de evidência foram utilizadas, coletadas a partir de
entrevistas e de documentos oficiais e institucionais, bem como das observações da
investigadora. Esse processo é chamado por Stake (1998) de triangulação de dados e seus
métodos incluem, especialmente, observação, entrevista e análise de documentos pertinentes
ao caso.
Quanto aos procedimentos técnicos, esta pesquisa caracteriza-se como documental e de
campo. A análise documental envolve a leitura e estudo de publicações pertinentes ao caso,
tornam-se um instrumento útil e seguro no trabalho de análise para o pesquisador. Dados podem
constituir-se em expressivos expedientes de argumentação, porque conferem à pesquisa
facticidade, proximidade concreta, visibilidade (DEMO, 2000, p. 86). Assim, para se atingir os
objetivos propostos nessa pesquisa procedeu-se à consulta (1) ao portal do MEC/INEP,
identificando e selecionando os documentos que regulam, avaliam e disciplinam o ensino
superior no país, notadamente o credenciamento e o recredenciamento de universidades; (2) ao
portal do MEC, especificamente à Lei nº 12.881, de 13 de novembro de 2013, que dispõe sobre
a definição, qualificação, prerrogativas e finalidades das Instituições Comunitárias de Educação
Superior – ICES; (3) aos portais das Universidades Comunitárias que compõem a amostra, nos
quais foram selecionados textos sobre o PDI (Plano de desenvolvimento institucional), ao PPI
(Projeto Pedagógico Institucional); (4) às campanhas institucionais veiculadas em diversas
mídias; (5) a documentos físicos a serem coletados com as próprias Universidades
Comunitárias que compõem a amostra.
Em 1996, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº 9.394/96 determinou
uma série de ações sistêmicas a serem executadas por parte das instituições de educação
superior. No decorrer dos anos de consolidação da Lei, surge o Plano Nacional da Educação
que traz metas em caráter decenal para o ensino superior, culminando na promulgação do
Decreto 3860/2001 que determina a instituição legal do Plano de Desenvolvimento Institucional
(PDI). Esse documento se desenvolveu com maior preponderância a partir da Lei Federal n°
10.861 com a instituição do Sistema Nacional de Avalição da Educação Superior – SINAES
(BRASIL, 2004). O SINAES tem como principal objetivo melhorar a qualidade da educação
superior brasileira e utiliza vários instrumentos para mensurar a qualidade do ensino. A partir
de então, o PDI é uma ferramenta obrigatória para que a instituição seja avaliada pelo Ministério
da Educação (MEC), passando a ser um referencial orientador da qualidade institucional,
52
tornando-se instrumento norteador dos processos de avaliação, planejamento e gestão das
instituições.
Para Francisco et al. (2012, p. 87), o PDI orienta as ações da instituição as quais
consolidam a sua identidade, determinando as habilidades necessárias para promover uma
resposta rápida aos ensejos do segmento da educação superior no Brasil, com ênfase em
aspectos quantitativos e qualitativos. Com o Decreto 5773/06, o Documento incorporou pontos
relevantes do Projeto Pedagógico Institucional (PPI), além de consolidar os objetivos
institucionais, a área de atuação acadêmica e um retrato sistemático de sua epistemologia.
(FRANCISCO et al., 2012; ARAÚJO et al., 2018). Ainda para Francisco et al. (2012), a
utilização desse arcabouço documental pode ajudar a suprir possíveis deficiências e evitar a
crise de identidade, pois tais registros representariam o retrato e o posicionamento institucional
na perspectiva de suas atividades. Assim, para este estudo, fazem parte dessa amostra os PDIs
das quatro universidades comunitárias selecionadas, sendo apresentados no quadro 4.
Quadro 4 - Ciclo Plano de Desenvolvimento Institucional
Fonte: Planos de Desenvolvimento Institucional disponibilizados pelas universidades
Dada a relevância em termos de planejamento estratégico que o Plano de
Desenvolvimento Institucional vem adquirindo desde a sua implantação nas instituições de
ensino superior, este documento é rica fonte materializada em discurso que orienta as ações
dessas universidades e que, por sua vez, apontam indícios que consolidam seu posicionamento
dentro das bases estruturantes de sua identidade. Entre os capítulos do PDI examinados no
estudo estão “Perfil Institucional”, “Projeto Pedagógico Institucional”, “Políticas de Ensino”,
“políticas de Pesquisa”, “Políticas de Extensão” e “Políticas de Gestão”.
Além dos documentos citados, também compõem o universo de documentos analisados
os Relatórios de Responsabilidade Social/Balanço Social das quatro universidades comunitárias
estudadas, produzidos entre os anos de 2015 e 2018, disponibilizados nas páginas da internet
dessas instituições. O termo Responsabilidade Social ganhou força no Brasil ao ser incluído
53
como uma das dez dimensões de avaliação das IES no Sistema Nacional de Avaliação da
Educação Superior (Sinaes), instituído pela Lei n° 10.861, de 14 de abril de 2004, e
regulamentado pela Portaria n° 2.051, de 9 de julho de 2004.
Esses documentos foram acrescidos aos demais pois a Responsabilidade Social
Universitária compreende a “capacidade que tem a universidade de difundir e colocar em
prática um conjunto de princípios e valores, por meio de quatro processos essenciais: gestão,
docência, pesquisa e extensão, comprometendo-se assim, do ponto de vista social, com a
comunidade universitária e com o próprio país” (BERTO, 2011, p. 23).
A investigação também integrou como fonte documental as campanhas institucionais
dessas universidades veiculadas nas mídias digitais, especificamente, na plataforma Youtube.
Essas universidades têm uma série de entrevistas, reportagens, documentários que contemplam
múltiplos aspectos de suas atividades junto ao ensino, pesquisa e extensão, mas para o propósito
dessa pesquisa, utilizou-se como critério de busca e seleção dos discursos institucionais, o termo
“Vídeo institucional”. Para cada universidade foram selecionados dois vídeos veiculados entre
os anos de 2015 e 2018. Após assistir a cada um deles, os discursos foram transcritos e
analisados à luz do referencial teórico que dá suporte a esta pesquisa. Não foi feita interpretação
semiótica das imagens, pois não é foco desse estudo. O quadro 5 traz detalhes da coleta.
Quadro 5 - Sítios Institucionais Veiculados na Plataforma Digital YouTube Universidade Comunitária Endereço sítio no YouTube
Ano de publicação
Tempo de duração
Número de visualizações
UNI1
VÍDEO1. https://www.youtube.com/watch?v=TDbH0J4d9Jo&t=55s VÍDEO 2 https://www.youtube.com/watch?v=pieGspJQaF8&t=51s
2015
2018
06:10
04:04
72
1.340
UNI2 VÍDEO 1 https://www.youtube.com/watch?v=Etft2MP4q3U&t=7s VÍDEO 2 https://www.youtube.com/watch?v=JYjcHyEA_Wk&t=22s
2015
2018
07:38
04:42
2.334
898
UNI3
VÍDEO 1 https://www.youtube.com/watch?v=Ii0UT7G9_Y4&t=145s VÍDEO 2 https://www.youtube.com/watch?v=_6l27TjGSEU&t=11s
2016
2018
06:59
02:33
106
146.884
UNI4
VÍDEO 1 https://www.youtube.com/watch?v=Aqt_VZmAE28 VÍDEO 2 https://www.youtube.com/watch?v=kbY3gJ_ZguQ&t=86s VÍDEO 3 https://www.youtube.com/watch?v=QiPWeffHjMQ
2017
2018
2018
01:00
07:36
01:00
372
894
59.336
Fonte: Organizado pela autora, a partir dos dados coligidos.
Ao se entender que a identidade de uma organização reflete a forma pela qual os seus
membros a constroem e a percebem coletivamente e por se constituir pelo conjunto de
54
representações que os seus integrantes formulam sobre o significado desta organização,
reconhece-se a importância do fortalecimento de sua identidade. Tendo em vista esta questão,
observa-se um movimento das instituições no sentido de intensificar as ações de comunicação
institucional, os quais passam a empregar elementos básicos da cultura organizacional, como
rituais, símbolos, mitos, cerimônias e histórias, para traduzir e disseminar os aspectos
fundamentais desejáveis para a construção de uma identidade coletiva (DUTTON;
DUKERICH; HARQUAIL, 1994; CARASSAI; FONSECA, 2009).
Para Argenti (2014, p. 89) a identidade de uma organização “é a manifestação visual de
sua realidade”, transmitida por meio do nome, logomarca, lema, produtos, serviços, instalações,
material impresso e visual, uniformes e todas as peças exibidas e divulgadas, criadas pela
organização e comunicadas aos seus diferentes públicos. Estes diferentes públicos formam
percepções baseadas nas mensagens que as organizações enviam de forma tangível. Se um dos
propósitos desta pesquisa é identificar o modo como as universidades comunitárias comunicam
a sua identidade, considerou-se pertinente investigar em seu discurso oficial (PDIs, Campanhas
institucionais, Entrevistas dos gestores) traços que demonstrem seu valor, sua função e sua
forma de se relacionar com a sociedade.
Outra frente de investigação se deu por pesquisa de campo. Gonsalves (2001, p. 67)
afirma que a pesquisa de campo pretende buscar a informação diretamente com a população
pesquisada e que ela exige do pesquisador um encontro mais direto. Com a finalidade de
examinar os discursos predominantemente utilizados pelas Universidades Comunitárias do sul
do Brasil ao atuarem na construção de suas respectivas identidades institucionais em resposta
às políticas nacionais de ensino superior, como instrumento de coleta de dados primários foi
realizada entrevista semiestruturada individual (gravadas) junto aos gestores destas instituições
(apêndice A).
Foram entrevistados os Reitores das quatro universidades comunitárias selecionadas,
escolhidos por se entender que são pessoas que detêm os conhecimentos gerais e específicos
sobre essas instituições, bem como por serem vistos como mediadores fundamentais dos
processos que envolvem as decisões estratégicas da universidade, sejam elas em suas dimensões
político financeira e pedagógica. Os gestores foram identificados com os códigos R1, R2, R3 e
R4 a fim de resguardar as suas identidades.
As entrevistas foram agendadas e ocorreram entre os meses de julho e dezembro de
2016. Foi solicitado aos entrevistados que assinassem o Termo de Anuência de instituição para
coleta de dados de pesquisa envolvendo seres humanos (apêndice D), o Termo de
Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) (apêndice B), permitindo o uso do conteúdo das
55
entrevistas nesse trabalho sem identificação dos respondentes. Também foi assinada Declaração
autorizando a pesquisadora a frequentar a instituição para realização da coleta de dados, bem
como a instituição a fornecer os dados pertinentes à investigação (apêndice C). As entrevistas
tiveram uma duração média de 60 minutos.
A análise dos dados documentais e de campo foi realizada por meio da Análise de
Conteúdo que viabilizou o estudo sistemático de dados oriundos de perguntas realizadas nas
entrevistas e outros tipos de dados coligidos da pesquisa documental. A análise de conteúdo é
um processo de busca de compreensão do real, que ocorre através da interpretação de textos
que tenham vínculo com esse real. Portanto, este tipo de análise revelou-se uma possibilidade
de construir o conteúdo, tanto o explícito como o latente, de textos escritos (RAMOS, 1999, p.
51).
Os objetivos da análise de conteúdo referem-se à inferência e à interpretação, para além
de uma descrição crítica, aprofundada e detalhada dos dados, pois se pretendeu, com esse tipo
de análise, avançar para além de um estudo meramente exploratório (MORAES, 1999). Este
tipo de metodologia de análise de dados não se limita ao conteúdo manifesto encontrado, pois
toda a leitura é também uma interpretação, transcendendo uma análise meramente objetiva e
quantitativa, centrando sua preocupação nos elementos qualitativos do conteúdo analisado.
A análise de conteúdo realizada foi composta de quatro etapas distintas, sugeridas por
Engers (2000). A primeira etapa manifesta-se por uma leitura compreensiva, com o intuito de
haver a impregnação dos conteúdos, “[...] caracterizando-se esta atividade por um ‘ir e vir’ entre
a leitura das entrevistas e a dos aspectos teóricos analisados, para poder compreender os
conteúdos latentes [...]” (ENGERS, 2000, p. 140). Na segunda etapa, realizou-se uma análise
vertical das entrevistas, “[...] buscando demarcar aspectos relevantes das falas de cada um dos
participantes” (ENGERS, 2000, p. 140). Nessa etapa, foi executada a análise de cada uma das
questões das entrevistas, marcando as palavras-chave ou expressões de significado de cada uma
delas. A terceira constituiu-se por uma análise horizontal das entrevistas, tendo como eixo
norteador cada uma das palavras-chave ou expressões de significado de cada uma das questões
do instrumento de pesquisa para todos os entrevistados. A quarta e última etapa se constituiu
no momento da síntese, em que foi criada uma matriz interpretativa. A partir daí, emergiram as
categorias extraídas das entrevistas tendo em vista as palavras-chave. Tais categorias foram
elencadas porque emergiram nos diferentes segmentos ou entrevistas, por se “encontrarem
numa mesma direção” (ENGERS, 2000, p. 140).
Ao se pensar os critérios metodológicos para execução desta pesquisa, múltiplos
aspectos foram considerados com o intuito de compreender a empiria que se relaciona com o
56
objeto foco deste estudo, as universidades comunitárias. Buscou-se um constante diálogo entre
a empiria e a teoria, articulando as vozes dos atores, os discursos estratégicos e as reflexões
teóricas no sentido de elucidar a trajetória dessas instituições participantes do conjunto de
universidades que caracterizam o ensino superior brasileiro.
57
3. A CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE DAS UNIVERSIDADES COMUNITÁRIAS:
AVANÇOS E DILEMAS NO CONTEXTO DAS POLÍTICAS EDUCACIONAIS PARA
O ENSINO SUPERIOR
Que a universidade não dê razão ao mercado se e quando ele se
impõe como razão da sociedade. Que a universidade não seja um motor da globalização da economia de mercado, mas sim da
globalização da dignidade humana. (DIAS SOBRINHO, 2005, p. 172)
3.1 A identidade das universidades comunitárias: da gênese à legitimação
O objetivo desse capítulo é identificar os principais marcos históricos de constituição
da identidade das Universidades Comunitárias no contexto das políticas educacionais para o
ensino superior no Brasil. Considera-se que a construção de uma sólida instituição educacional
é um processo longo e complexo que envolve diferentes segmentos, desde o poder público a
setores organizados da sociedade civil. Assim vem acontecendo com as universidades
comunitárias, as quais vêm forjando sua identidade há mais de 60 anos5, numa luta por
reconhecimento.
As universidades em geral vêm enfrentando, desde sua gênese, múltiplos obstáculos que
se colocam contrários à sua vocação de promover o bem público. Neste caminho, a adoção de
políticas neoliberais para o ensino superior, recomendadas pelo Banco Mundial, desencadearam
processos de mercantilização, privatização, precarização, desconstrução da educação superior,
tornando-se termos cada vez mais usuais para qualificar este setor (MINTO, 2006). Neste
contexto, encontram-se as universidades comunitárias, as quais vêm sofrendo os efeitos das
políticas públicas voltadas à mercantilização da educação e das oscilações econômicas
provocadas pela globalização.
Inseridas em um contexto sócio econômico e histórico-cultural, as universidades
comunitárias enfrentam muitas tensões na busca de uma identidade que as torne singular. Em
cada uma das etapas do processo, a presença de interesses divergentes pelos definidores das
políticas, vem tornando o caminho sinuoso e os obstáculos crescentes. Nesta seção, são
analisados alguns dos conflitos enfrentados pelas universidades comunitárias no caminho de
construção de seu DNA. Para ilustrar a trajetória, apresenta-se na figura 5 os marcos de
surgimento, consolidação, diversificação e legitimação deste modelo de universidade, os quais
5 BITTAR (1999); PEGORARO (2008); PINTO (2009); SILVA (2012); CASTRO (2013); FIOREZE (2017); LONGHI (2000); FRANTZ (2006); FERNANDES (2008); MOROSINI; FRANCO (2006); BAUER; MESQUITA (2007); RAVAS; CANATO (2013); ALBERT; WETHEEN (1985); CARASSAI; FONSECA (2009); MACHADO (2014); STENSAKER (2015); DUMAY; DRAELANTS; DAHAN (2015), entre outros.
58
serão detalhados no decorrer do capítulo.6
Figura 5 - Principais marcos da trajetória das universidades comunitárias – 1960-2013
Fonte: Elaborado pela autora, com base nos documentos analisados
A maioria das universidades comunitárias no sul do Brasil foram criadas entre as
décadas de 1940 e 1970, período em que o país passava por processo de modernização nos
campos social, político e econômico. Foram estruturadas em pleno Estado desenvolvimentista,
viabilizadas pela capacidade de organização das comunidades regionais apoiadas pelo poder
público local (SCHMIDT, 2017). Foi para além de atender às necessidades regionais que,
principalmente nas zonas de imigração italiana e alemã do Rio Grande do Sul e Santa Catarina,
surgiram muitas universidades comunitárias, entre elas, as selecionadas como objeto de estudo
deste trabalho.
Ao longo das décadas de 1950, 1960 e 1970, várias universidades estabeleceram-se em
polos regionais. Porém, antes do aparecimento das grandes instituições, outras experiências
comunitárias já faziam parte da vida dos imigrantes como escolas, igrejas, corais, clubes
6 A partir deste capítulo serão introduzidas, nas discussões, as vozes dos gestores entrevistados (identificados pelos códigos R1, R2, R3 e R4) e recortes dos documentos institucionais selecionados para este estudo, identificados pelos códigos (UNI1, UNI2, UNI3, UNI4). Sua presença será reconhecida por fonte em itálico.
59
esportivos, cooperativas, os quais evidenciavam a formação de um expressivo capital social
comunitário (SCHMIDT; CAMPIS, 2009).
Ao fazer referência ao seu perfil institucional a UNI1, afirma no seu PDI que desde a
década de 50, do século XX, em função das necessidades de desenvolvimento social e
econômico, a comunidade pleiteava a instalação de cursos de nível superior. Para suprir esta
carência, diferentes entidades da comunidade obtiveram autorização para a criação de
faculdades (PDI UNI1 2017-2021, p. 9). Com discurso semelhante, a UNI2 declara que desde
sua origem, a universidade demonstrou intenção de assumir um compromisso com o
desenvolvimento da região (PDI UNI2, p. 14). Reafirmando o compromisso com a coletividade
regional a UNI4 completa que foi instituída pelo Poder Público Municipal, concretizando um
desejo que nasceu da participação comunitária na busca coletiva pelo atendimento às
necessidades regionais (PDI UNI4, p. 11). Nessa mesma perspectiva, a UNI3, ao apresentar
sua história afirma que essa teve origem.
[..] em uma ampla campanha de mobilização popular em defesa da interiorização do ensino superior no Estado de Santa Catarina na década de 1960 — período em que ainda não havia a oferta de cursos universitários fora da capital catarinense. Este fato define o código genético da Instituição como Universidade Comunitária (PDI UNI3, p. 29).
Constituindo-se em um modelo próprio de educação superior brasileira, as
universidades comunitárias são fruto da mobilização de comunidades regionais que buscavam
suprir a carência de educação de nível superior pela ausência do Estado em prover esse serviço.
Preocupada em alavancar o desenvolvimento socioeconômico e cultural de suas comunidades,
e com o objetivo de promover atividades de formação de recursos humanos, de produção
intelectual e de atividades de qualificação científica, necessárias ao desenvolvimento das
regiões, a sociedade civil se organizou e se mobilizou pela instalação de escolas superiores, por
meio de associações e fundações, inicialmente sob forma de faculdades ou centros de ensino
superior. Não eram iniciativas de caráter privado, com perspectiva capitalista, e sim, públicas,
porém não estatais (VANNUCCHI, 2011).
A universidade comunitária não surge por acaso, mas como tentativa de concretização
das aspirações educacionais de grupos (confessionais ou não) que manifestam segmentos vivos
da sociedade. “Não é um projeto criado em gabinete, nem fruto de especulação teórica, mas
resulta da experiência concreta de algumas instituições” (TRAMONTIN; BRAGA, 1988, p.
18). Para Schimdt (2009, p. 22) “instituições comunitárias não derivam de relações e interesses
de algumas poucas pessoas. Elas pressupõem relações e interesses largamente compartilhados”.
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Uma das lideranças universitárias entrevistadas assim comentou: (...) a universidade
comunitária é uma instituição que procura atender às demandas da comunidade, da sociedade.
Ela também ao mesmo tempo precisa ser promotora do desenvolvimento e tem que impulsionar
a economia da região (R1, 2016).
Com o intuito de resolver carências regionais específicas, surgiram as universidades
comunitárias, as quais se propunham gerar o desenvolvimento de pesquisas e de tecnologias
com foco local. Vannucchi (2011) salienta que, desde o início, esse tipo de universidade foi
entendida por seus fundadores como um serviço público e não como negócio particular, sempre
comprometida com a sociedade e não com o lucro. Afirma um dos gestores
Ela (a universidade comunitária) não tem dono. Os nossos regimentos do estatuto dizem que se um dia ela deixar de operar, isso volta para a prefeitura, porque foi quem criou a instituição. Se não for a prefeitura, outra unidade congênita, com as mesmas características filantrópicas de educação sem fins lucrativos e que deseja continuar com os projetos da universidade, vai dar continuidade. Isso está muito claro no nosso estatuto (R4, 2016).
Evidencia-se no discurso, a consciência dos gestores quanto à identidade legal e
normativa da instituição. Cientes dos fatos que marcaram a história dessas instituições no que
tange aos marcos legais e seus estatutos, seus gestores e os documentos oficiais enfatizam os
atributos essenciais dessas instituições, entre eles o forte caráter regional, não visar lucro,
destinar seu patrimônio, em caso de extinção, a uma instituição pública ou congênere e o
compromisso com uma gestão baseada na transparência administrativa, o que se revela em seus
estatutos e regulamentos. Essas são características essências da identidade do modelo
comunitário de educação superior que abrangem o que é legítimo em termos organizacionais
(ALBERT; WHETTEN, 1985).
Para Carrieri et al. (2010, p. 24), assim como os indivíduos têm uma identidade, as
organizações7, neste caso, as universidades comunitárias, também constroem uma identidade.
Diferentemente de um conceito tido como estável, autônomo e permanente em seus primórdios,
7 Etzioni (1976, p. 9) define as organizações como unidades sociais “intencionalmente construídas e reconstruídas, a fim de atingir objetivos específicos”. Segundo o autor, a sociedade moderna é preponderantemente uma sociedade de organizações. Para Andrade (2002), as universidades devem ser estudadas como um tipo específico de organização complexa cujas características exigem que a adoção de modelos ou critérios de gestão deva ocorrer de forma diferente do que sucede em outras organizações. O Relatório da UNESCO para a educação do século XXI (DELORS et al., 1999), consolida algumas perspectivas da universidade como organização e de sua complexidade, ao especificar os vários papéis que ela desenvolve, dentre os quais destacam-se: (a) ser o lugar onde se aprende e fonte de saber; acompanhar a evolução do mercado de trabalho; (b) ser o lugar de cultura e de estudo aberto a todos; (c) ser o lugar de fazer a cooperação internacional; (d) ser o lugar onde se produz e se socializa o conhecimento. Para Schmidt (2017, p. 205) “organizações e instituições são meios de ação comum dos sujeitos, estruturadas em torno de regras que lhes conferem coerência e permanência.”
61
para esses autores, a identidade traz em sua concepção “uma dimensão social, coletiva e
processual de construção”. Observa-se que na construção da identidade das universidades
comunitárias há como alicerce um forte enraizamento coletivo. Sua trajetória é marcada por
vários fatos históricos impulsionados por desejos e necessidades advindos da comunidade. E,
em prol do bem público e na busca do desenvolvimento regional, as entidades foram pouco a
pouco tomando corpo, espalhando seus tentáculos em regiões desassistidas pelo poder público.
Tem-se aí, uma marca da essência de sua identidade: a regionalização, fruto de um processo
lento, mas contínuo.
Mantidas por fundações educacionais criadas por associações comunitárias, as
universidades comunitárias iniciam suas atividades sob a forma de pequenas faculdades, como
é o caso do RS, ou pelo poder público municipal, como é o caso de SC. Mais tarde, já nos anos
de 1980 e 1990, muitas delas transformam-se em universidades (LÜCKMANN; CIMADON;
BERNART, 2015). Afirma um dos gestores
A UNI4 foi criada em 1968 em um movimento da comunidade. Eles se revoltaram após a criação da UFSC e da UDESC em Florianópolis, e aí a região se mobilizou, e foi brigar e foi atrás do prefeito, foi atrás de uma possibilidade que tinha para criar sua instituição de ensino superior aqui na região, justamente para os filhos deles também poderem fazer universidade aqui e não precisar todo mundo se deslocar. Nem tinha vaga para todo mundo na capital, então foi uma resposta da comunidade. Ela nasceu já de um anseio, de uma luta comunitária (R4, 2016).
Observa-se como elemento integrador da gênese dessas instituições, a sua inserção
social. A característica constitutiva de uma instituição sem fins lucrativos é beneficiar a
sociedade, sendo seu mérito atribuído ao potencial de resultado das ações levadas a cabo no
ambiente social. Nesse sentido, a UNI1 se posiciona como instituição, em permanente diálogo
com a sociedade. Seus interesses são os da coletividade (UNI1 PDI, p. 10).
Independentemente da ação dos governos federal ou estadual, muitas fundações
educacionais foram criadas a partir da década de 1960, algumas com o aval dos municípios,
como é o caso do Estado de Santa Catarina, com estrutura administrativa e financeira próprias.
Essa iniciativa, além de atender aos anseios locais quanto à ampliação do número de vagas no
ensino superior, encontrava respaldo da legislação da época. Assim comenta um gestor
A UNI4 48 anos de existência, foi criada por lei municipal na década de 60, em 68. Nós ficamos 29 anos como quatro escolas isoladas. Na década de 90, teve aquele movimento todo do Estado para transformar em universidade e a gente também fez o movimento, porque tinha 9 cursos só de graduação. Era
62
só aquele espaço, só aqueles bloquinhos pequenos lá, e eu já estava aqui. Eu estou aqui como professor há 30 anos, como aluno há 35 (R4, 2016).
A maioria das universidades comunitárias surgiu antes do advento da Lei de Diretrizes
e Bases de 1961 e da Lei 5.540, da Reforma Universitária, de 1968. A Lei de Diretrizes e Bases
n. 4.024/61 de 1961 - em seu artigo 107, concedeu estímulo às fundações educacionais ao
mencionar que:
O poder público estimulará a colaboração popular em favor das fundações e instituições culturais e educativas de qualquer espécie, grau ou nível sem finalidades lucrativas, e facultará aos contribuintes do imposto de renda a redução dos auxílios ou doações comprovadamente feitas a tais entidades (BRASIL, 1961).
Promulgada após um período de 14 anos de tramitação no Congresso Nacional, a Lei
de Diretrizes e Bases n. 4.024 de 1961 possibilitou certa flexibilidade na sua implementação,
no entanto, na prática, reforçou o modelo tradicional de instituições de ensino superior vigente
no país. Sua preocupação maior ainda se voltava para o ensino, deixando de lado a pesquisa.
Em termos organizacionais, as faculdades isoladas permaneceram, e a universidade continuou
composta por simples justaposição de escolas profissionais. A nova Lei fortaleceu ainda mais
a centralização do sistema de educação superior, ampliando os poderes do Conselho Federal de
Educação, agora com autonomia para autorizar e fiscalizar novos cursos de graduação e
deliberar sobre o currículo mínimo de cada curso superior. O novo na Lei ficou por conta da
participação estudantil nos colegiados (OLIVEN, 2002).
Para Durham (2003, p. 203) a LDB de 1961 “foi uma vitória dos setores privatistas e
conservadores, e constituiu, em grande escala, uma preservação do sistema existente. A lei e
suas complementações praticamente preservaram o status quo e se preocuparam basicamente
em estabelecer mecanismos de controle de expansão do ensino superior e do conteúdo do
ensino. O Conselho Nacional de Educação foi reestruturado e passou a contar com
representantes do setor público e privado. Entre suas atribuições a autorização para criação de
novos cursos e instituições no setor federal e privado e a fixação dos currículos dos cursos
superiores. Com tal poder de decisão, o Conselho passou a ser alvo das pressões exercidas pelo
setor privado, em defesa de seus interesses (DURHAM, 2003).
Paradoxalmente a essa inércia formal do sistema universitário, nos anos 1960, a
universidade brasileira vivia um momento de grande vitalidade com a participação da
comunidade acadêmica se deu além dos muros da universidade. Fóruns acadêmicos, como as
63
reuniões da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), revistas especializadas,
professores e pesquisadores universitários defendiam a modernização institucional na busca por
um novo ensino superior, mais nacional e democrático, voltado para a pesquisa, aos moldes do
modelo de Humboldt, da Alemanha, ou o norte-americano (OLIVEN, 2002).
Em 1964, com a tomada do poder pelos militares, as universidades passaram a ter
interferência direta do governo federal. Atividades de professores e alunos consideradas de
caráter “subversivo” foram coibidas. E a reforma universitária passou a ser debatida
exclusivamente nos gabinetes da burocracia estatal. Passados alguns anos, em 1968, porém, o
Congresso Nacional aprovou a Lei da Reforma Universitária (Lei nº 5540/68) que, além de
propor várias mudanças funcionais e organizacionais, estabeleceu a indissociabilidade das
atividades de ensino, pesquisa e extensão, o regime de tempo integral e a dedicação exclusiva
dos professores, criando condições para o desenvolvimento da pós-graduação e possibilitando
a profissionalização dos docentes (SANTOS; CERQUEIRA, 2009).
Cabe salientar que a opção do setor público por universidades que aliassem o ensino à
pesquisa aumentou os custos do ensino público, o que freou a sua capacidade de expansão,
abrindo espaço para o setor privado atender a demanda não absorvida pelo Estado. Apesar de a
Reforma de 1968 exigir o estabelecimento de um modelo único de ensino superior com a
indissociabilidade do ensino e da pesquisa, na prática, a expansão do sistema se deu mediante
a proliferação de instituições isoladas e poucas universidades conseguiram efetivamente
instituir a produção científica (MARTINS, 2002).
Passados alguns anos, em 1968, a Lei Federal n° 5.540/68, da Reforma Universitária,
no seu artigo 2°, dispõe que “o ensino superior indissociável da pesquisa será ministrado em
universidades e, excepcionalmente, em estabelecimentos isolados, organizados como
instituições de direito público ou privado”. Frente a esse contexto, começaram a se delinear as
primeiras iniciativas com vistas à criação de instituições de ensino superior isoladas em Santa
Catarina e no Rio Grande do Sul. Esse processo teve como consequências a interiorização da
oferta de ensino superior; a democratização das oportunidades de acesso a cursos superiores de
formação profissional; a formação de quadros vocacionados para o atendimento das
necessidades locais; a constituição de um corpo de professores capacitado, selecionado segundo
os critérios exigidos pelo Conselho Federal de Educação e a instalação de uma infraestrutura
de ensino qualificada (GUMBOWSKY, 2013).
Para Schmidt (2010), o fato de as universidades comunitárias gaúchas e catarinenses
terem sido criadas entre as décadas de 1940 e 1970, impede que seja estabelecido vínculos com
o projeto político neoliberal, que se ampliou a partir da década de 1980. As universidades
64
comunitárias regionais “foram estruturadas em plena vigência do Estado desenvolvimentista,
suprindo a lacuna de educação superior nas regiões interioranas por iniciativa da sociedade civil
e do poder local, e nada tem a ver com as reformas de caráter neoliberal implementadas décadas
mais tarde” (SCHMIDT, 2010, p. 29). Assim, essas instituições preservaram seu caráter de
fornecer à população ensino de qualidade, mantendo sua vocação ao promover o bem público,
sem qualquer intenção de almejar lucro, como as instituições empresariais.
Na década de 1970, o Brasil vivia o chamado “milagre econômico”. Como resultado
desse amplo desenvolvimento, a classe média cresceu e novas oportunidades no setor produtivo
surgiram, novos hábitos de consumo foram adquiridos, aumentando, assim, a demanda pelo
ensino superior, o que provocou providenciais recursos e orçamentos federais destinados à
educação. Ao contrário de alguns países da América Latina, no Brasil, a repressão política
promoveu o ensino superior, tanto público quanto privado. O número de matrículas, em cerca
de vinte anos, passou de 101.691 (em 1960), para 1.377.286 (em 1980) (DURHAM, 1998).
A expansão da educação superior nas décadas 1970 e 1980 teve como pano de fundo o
financiamento das universidades não públicas, especialmente no que se refere às confessionais.
Até a década de 1970, essas instituições recebiam verbas governamentais para o
desenvolvimento de suas atividades. Por terem ideologia diferente e não quererem ser
equiparadas às outras Instituições de Ensino Superior do setor privado particular, as
universidades comunitárias uniram forças em torno de seus interesses, objetivos e princípios
comuns, numa luta por reconhecimento e legitimação. Nesse período, foram criadas a maioria
das universidades federais, sendo estas instaladas em cidades de médio porte, além do
estabelecimento de vários campi em cidades do interior.
A partir do reconhecimento da Universidade (1989), há um período de expansão. Novos campi e cursos de graduação são implantados em resposta às aspirações das comunidades instaladas nas áreas de abrangência da Instituição, que, aos poucos, também passam a ser beneficiadas por projetos de pesquisa e extensão. A década de 1990 representa um momento de significativa expansão da universidade, verificada na implantação de novos campi e cursos de graduação, pós-graduação stricto sensu e educação básica em alguns municípios e no desenvolvimento de projetos de extensão, parcerias com o poder público e iniciativas voltadas à internacionalização (PDI UNI3, p. 30).
É nesta década também, que se verifica um processo de regionalização do ensino
superior. Para Marques e Cepêda (2012), a interiorização provocou a expansão das IES, ou pela
implantação de campi de IES já existentes em regiões menos desenvolvidas ou pela criação de
novas IES para facilitar o acesso ao ensino superior. “Sem acesso ao ensino superior em seus
65
locais de origem, os estudantes interioranos ou suas famílias teriam que arcar com as despesas
para poderem estudar na Capital ou em outros grandes centros urbanos” (MARQUES;
CEPÊDA, 2012, p. 173). Esse processo veio suprir a crescente demanda por educação terciária,
em nível local, de estudantes advindos de pequenas e médias cidades localizadas no interior.
Esse movimento contribuiu para minimizar as desigualdades socioeconômicas e fortalecer as
economias regionais.
Ao ser perguntado quanto à importância da presença da universidade comunitária em
sua região, um dos gestores respondeu
Então, há sessenta anos um grupo de pessoas de liderança da comunidade pensou em interiorizar cursos de nível superior. [...] Então, desde 1956, época em que tínhamos apenas cursos isolados mantidos pela sociedade pró Universidade, ou pelo Consórcio Universitário Católico, dois grupos que existiam na época, já se tinha o propósito de oferecer uma formação que poderia ser traduzida como desenvolvimento. Isto fomentou a cidade. Se hoje nós temos aqui um polo educacional, um polo médico excepcional, com um crescimento enorme, se temos aqui um comércio e uma área da construção civil e imobiliária de crescimento excepcional, se deve exatamente a essas iniciativas lá do passado que foram se consolidando ao longo do tempo. Então o fato de existir uma universidade comunitária significa a vontade dos líderes da época de buscar o desenvolvimento da região. Então, isso acabou tornando a cidade referência no ensino superior e, consequentemente, no crescimento regional porque, na medida em que vinham os alunos de fora, a rede hoteleira ganhava, a indústria da construção civil ganhava, ou seja, o comércio ganhava, porque tudo estava em torno da universidade (R2, 2016).
Observa-se, nesta fala, a ênfase dada pelo gestor à importância da instituição para o
desenvolvimento regional. Durante anos, a instituição vem sendo socialmente construída e
institucionalmente sustentada, edificada pela ação de diferentes atores (REED, 1998), com o
objetivo de mudar a realidade, oferecendo uma formação profissional que atendesse aos anseios
de desenvolvimento regional. O resgate de fatos históricos e as suas consequências na atual
condição de crescimento do entorno da região, reiteram a crença do gestor sobre a influência
promissora da universidade em diferentes campos do conhecimento e a contribuição disso para
a comunidade. Assim, de modo ativo e crítico, a universidade vai influenciando no processo de
desenvolvimento nos espaços da cultura, da política, da economia, da tecnologia (FRANTZ,
2006). Aos poucos vai se modelando como comunitária, num processo social e relacional, cuja
construção resulta na percepção dos indivíduos sobre os atributos centrais e duradouros da
organização (CUCHE, 1999), neste caso, na percepção do gestor evidencia-se na ênfase dada
ao fato de que “tudo estava em torno da universidade”.
A partir da produção do saber, cumpre ela seu papel; nascem suas funções. Não é uma
66
inserção desvinculada de um projeto de sociedade, uma presença neutra. Pode e deve a
universidade ajudar a construir as condições do desenvolvimento da região na qual está
localizada.
Apesar da Lei n° 5.540/68 dirigir-se às Instituições Federais de Ensino Superior (IFES),
ela também atingiu o setor privado. Este cenário pressionou o aumento de vagas, provocando a
criação de inúmeras faculdades isoladas na periferia das grandes metrópoles e nas cidades de
porte médio do interior dos estados mais desenvolvidos. Com anuência do Estado, chega-se em
1980, com mais da metade dos alunos de terceiro grau matriculada em estabelecimentos
isolados de ensino superior, sendo 86% em faculdades privadas (OLIVEN, 2002).
Aparentemente, o setor público não se preparou para esse momento do ensino superior.
Por outro lado, o setor privado foi capaz de absorvê-lo. Com a oferta de cursos de baixo custo
e exigências acadêmicas menores, tanto para o ingresso como para o prosseguimento dos
estudos até a pós-graduação. As instituições privadas de ensino superior tornaram-se um grande
negócio. A despreocupação com a qualidade do ensino e a necessidade imediata de um diploma
por grande percentual da sociedade oportunizaram aos empresários, donos de instituições
privadas, ganhar muito dinheiro (SANTOS; CERQUEIRA, 2009). Em 1960, 56,7% das
matrículas no ensino superior vinculavam-se ao sistema público e 44% ao sistema privado. Já
em 1980, as matrículas no ensino público caíram (35,7%), havendo um aumento no setor
privado (64,3%) (DURHAM, 2003; SANTOS; CERQUEIRA, 2009). Esse cenário indicia um
surto expansionista no ensino superior liderado pelas “empresas educacionais” as quais
encontram espaço para sua ampliação.
Se, por um lado, o processo de interiorização do ensino superior trouxe múltiplos
benefícios como a ampliação e o fortalecimento do mercado de trabalho dos munícipios
interioranos, com a possibilidade de fixação de mão de obra altamente qualificada, a
dinamização da economia local e expansão do mercado consumidor do interior e a instalação
de equipamentos educacionais de nível mais sofisticado, por outro, também fomentou o
aparecimento de instituições privadas que viam aí uma oportunidade de lucrar com a oferta de
cursos com baixa qualidade.
Para Calderón (2000), até o período do início da grande reforma universitária, em 1968,
a universidade ou era gratuita ou paga, mas, caso cobrasse pelos serviços educacionais, não
poderia ter fins lucrativos. Na mesma época, havia grande pressão por vagas nas universidades,
o que, segundo Martins (1981, p. 94) “foi contornado através de uma avalanche de autorizações
para a abertura de novas escolas e ao mesmo tempo a permissão para as instituições já existentes
aumentarem suas vagas sem atender a grandes exigências burocráticas.” Esse fenômeno
67
provoca o surgimento de novos estabelecimentos isolados com caráter de instituições mercantis
– com status de escolas integradas, de faculdades, centros universitários, caracterizados como
ensino de massa. Afirma Martins (1981, p. 80)
[...] a esmagadora maioria dessas instituições privadas que surgiram após o ano de 1968 se constituíram como empresas privadas capitalistas, ou seja, estavam voltadas para a procura de rentabilidade, utilizando a área educacional como um campo fértil para investimentos [...] com a finalidade de obtenção de lucro e de acumulação de capital.
Entre os anos de 1970 e 1979, as matrículas do setor privado quase quadruplicaram, de
425.478 estudantes em 1970, o país passa a 1.311.799 em 1979, respondendo por 50,5% das
matrículas no início da década de 1970, chegando ao seu final com mais de 64%. É nesse
período também que as instituições sofrem mudanças consideráveis em seus perfis e a
hegemonia dos cursos de educação superior privada passa dos grupos confessionais para os
empresariais, os quais optam pela oferta de cursos bacharelescos, em instituições isoladas de
ensino superior (VIEIRA; NOGUEIRA, 2017).
Esse movimento de expansão, fez com que, a partir da década de 1980, alguns
segmentos da sociedade civil implementassem ações de apoio às instituições comunitárias.
Inicia-se assim a etapa de consolidação desse modelo de universidade. A denominação
universidade comunitária passou a ser amplamente divulgada, o que tornou necessária a
demarcação de traços que caracterizassem seu perfil e sua identidade. Vários representantes de
universidades comunitárias (confessionais e laicas) reuniram-se no sul do Brasil com o objetivo
de “refletir sobre os traços comuns entre elas, que justificariam a denominação de
“comunitárias” (VANNUCCHI, 2011, p. 17). Moura, ao prefaciar a obra “As universidades
comunitárias: um modelo alternativo”, de Tramontin e Braga (1988, p. 10) reitera a necessidade
de “clarificar a identidade destas universidades historicamente compromissadas com a
qualidade do serviço que prestam e o meio social. Por assumir em suas atividades uma ampla
inserção social e especial dimensão pública, as instituições congregadas reivindicavam de
forma regular a concessão de recursos governamentais para suas entidades. Em 1985, mais
precisamente, foi aprovado um manifesto em prol dessas IES em reunião realizada pelo
Conselho de Reitores das Universidades Brasileiras – CRUB, para que elas recebessem verbas
do governo para desenvolvimento de suas atividades educacionais.
Em 1988, reitores de vinte universidades (das quais dezesseis eram confessionais
católicas, uma metodista e três laicas) se reuniram para refletir sobre seus ideais comuns e,
igualmente, influenciar o Congresso Nacional a incluir o termo “escolas comunitárias” no texto
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que daria origem, posteriormente, à nova Constituição do Brasil. Essas articulações foram
muito importantes para as instituições denominadas comunitárias, uma vez que, nesse período,
meados da década de 1990, o setor privado, em franca expansão no Brasil, objetivava ter acesso
às verbas governamentais destinadas à educação. Grande número de instituições foram
reconhecidas como universidades, principalmente aquelas pertencentes ao segmento
estritamente particular (ou empresarial) (PINTO, 2009a). Convém mencionar (CALDERÓN,
2000, p. 63) “que essas transformações estão vinculadas estritamente ao aumento de vantagens
competitivas do mercado”. As universidades que, em suas origens, foram estabelecimentos
isolados ou faculdades integradas, já continham enraizado seu caráter mercantil.
A luta pelo reconhecimento expresso do modelo comunitário, defendido por vários
organismos nacionais e pela pressão exercida por representantes do setor privado,
principalmente pelas universidades confessionais, culminou na inclusão, ao artigo 213 da nova
Constituição Federal de 1988, nos seguintes termos:
Os recursos públicos serão destinados às escolas públicas, podendo ser dirigidos a escolas comunitárias, confessionais ou filantrópicas, definidas em lei, que: I - Comprovem finalidade não-lucrativa e apliquem seus excedentes financeiros em educação; II - Assegurem a destinação de seu patrimônio a outra escola comunitária, filantrópica ou confessional, ou ao Poder Público, no caso de encerramento de suas atividades. § 1º - Os recursos de que trata este artigo poderão ser destinados a bolsas de estudo para o ensino fundamental e médio, na forma da lei, para os que demonstrarem insuficiência de recursos, quando houver falta de vagas e cursos regulares da rede pública na localidade da residência do educando, ficando o Poder Público obrigado a investir prioritariamente na expansão de sua rede na localidade (BRASIL, 1988).
A elaboração da Nova Constituição reiterou o espaço da iniciativa privada na educação
bem como, reconheceu a existência de instituições nomeadamente comunitárias. A aprovação
deste artigo garantiu o repasse de recursos públicos para a educação e o acesso a verbas públicas
para as universidades comunitárias, confessionais ou filantrópicas. A Constituição também
estabeleceu o princípio da autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira
e patrimonial das universidades, isto estimulou a transformação na organização acadêmica das
IES privadas, que deixaram de ser faculdades isoladas e se transformaram em universidades.
Com autonomia, processos como abertura e fechamento de cursos ou alteração no número de
vagas foram desburocratizados (SAMPAIO, 2000). Ao descrever seu perfil institucional, a
UNI3 declara A partir do reconhecimento da Universidade, há um período de expansão. Novos
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campi e cursos de graduação são implantados em resposta às aspirações das comunidades
instaladas nas áreas de abrangência da Instituição, que, aos poucos, também passam a ser
beneficiadas por projetos de extensão e pesquisa (PDI UNI3, 2017, p. 30).
A participação institucionalizada das universidades comunitárias no orçamento
governamental estimulou a realização, em 1991, do 1 º Fórum de Reitores das Universidades
Comunitárias do Brasil. E, em 1995, nasce a Associação Brasileira das Universidades
Comunitárias – ABRUC (BITTAR, 1999) associação civil, sem fins lucrativos, com o objetivo
de promover, consolidar e defender o conceito de Universidade Comunitária (e, mais tarde,
também de Centros Universitários Comunitários). A ABRUC deu continuidade aos debates
para consolidar o uso do termo “comunitário” entre as Instituições de Ensino Superior por meio
da promoção de seminários nacionais das Universidades comunitárias que aconteceram entre
1995 e 1996. A década de 1990 representa um momento de significativa expansão da UNI3,
verificada na implantação de novos campi e cursos de graduação, pós-graduação stricto sensu
e educação básica em alguns municípios e no desenvolvimento de projetos de extensão,
parcerias com o poder público e iniciativas voltadas à internacionalização (PDI/UNI3, 2017,
p. 30).
Assim, em 1996, o termo “comunitário” também é incluído no texto da nova Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDBEN (Lei nº 9.394/96). Vista como marco
regulatório para as universidades e tendo como base os princípios da Constituição de 1988, a
nova lei é o instrumento legal que melhor expressa os parâmetros e a lógica de reestruturação
da educação superior nos anos 90.
Com relação às universidades comunitárias, a LDBEN/96 distingue as instituições
privadas como atividade educacional, como se pode observar no texto da lei:
Art. 20. As instituições privadas de ensino se enquadrarão nas seguintes categorias: I – Particulares em sentido estrito, assim entendidas as que são instituídas e mantidas por uma ou mais pessoas físicas ou jurídicas de direito privado que não apresentem as características dos incisos abaixo; II – Comunitárias, assim entendidas as que são instituídas por grupos de pessoas físicas ou por uma ou mais pessoas jurídicas, inclusive cooperativas de professores e alunos que incluam na sua entidade mantenedora representantes da comunidade; III – Confessionais, assim entendidas as que são instituídas por grupos de pessoas físicas ou por uma ou mais pessoas jurídicas que atendem a orientação confessional e ideologia específicas e ao disposto no inciso anterior; IV – Filantrópicas, na forma da lei (BRASIL, 1996).
Para Schmidt (2017), no entanto, sua redação não foi favorável às comunitárias, na
70
medida em que as considerou uma modalidade de instituições privadas. No art. 19, a lei
estabelece apenas duas categorias de instituições de ensino: públicas e privadas. O art. 20
explicita as modalidades de instituições privadas: I – particulares, II – comunitárias, III –
confessionais e IV filantrópicas. As comunitárias, portanto, não conseguiram fazer valer sua
especificidade nesse importante documento legal da educação. Essa classificação é fonte de
confusão no entendimento ´dos conceitos entre o que é comunitário e o que privado no Brasil.
Estudos como os de Gadotti (1995); Bittar (1999); Longhi (2000); Frantz (2006);
Fernandes (2008); Schmidt (2010); Sampaio (2013) discutem a dicotomia público versus
privado como um dos entraves do aclaramento da identidade das instituições comunitárias. Ao
entender a educação como um bem social, como direito público, o papel do Estado com relação
a ela parece óbvio. Porém, por terem nascido da iniciativa da sociedade civil, mesmo tendo
compromisso público, as IES comunitárias estão enquadradas na categoria privada. Schmidt e
Campis (2009, p. 18) explicitam a necessidade de entender que a ideia de público é mais
abrangente do que o estatal, afirmando que existem duas formas do público se organizar: como
público estatal e o público não-estatal. Os autores complementam
A legislação existente não conhece uma figura jurídica apropriada às comunitárias. A dicotomia público versus privado manifesta-se na existência de apenas duas pessoas jurídicas: a de direito público e a de direito privado. Como decorrência dessa simplificação legal, os agentes públicos costumam tratar as comunitárias, que são de direito privado, como organizações privadas (SCHMIDT; CAMPIS, 2009, p. 33).
Essa problemática fica evidente nas vozes de seus gestores quando anunciam a
dificuldade que as universidades comunitárias têm em comunicar seu caráter comunitário. Tem
que reverter a percepção de que comunitária não significa pública. Ela tem função pública,
mas não é estatal. Para definição: “o que que é universidade comunitária?” É uma
universidade pública, mas não estatal, ela é de direito privado e tem o papel de prestar serviços
à comunidade, público (R1). Há certa dificuldade de tornar claro o conceito, apesar de
inúmeras campanhas realizadas pelos departamentos de comunicação. Boa parte da
comunidade que é atendida e desfruta dos serviços talvez não sabe que ela é comunitária. Se
soubesse melhor, poderia fidelizar mais a sua vinda para a instituição. Não temos uma perfeita
socialização da visão de comunitária (R2). Segundo um dos gestores, torna-se um grande
desafio para essas instituições ultrapassar o equívoco do imaginário coletivo de considerar que
os serviços prestados devem ser gratuitos, é um pouco da confusão do público que nós temos,
né. É de todos então eu posso me beneficiar, não preciso pagar (R1). De certa maneira, essa
71
confusão também é evidenciada nas publicações dos serviços ofertados por tais instituições.
Nas estatísticas noticiadas, ora os dados das nossas atividades estão computados junto às
privadas, ora estão relacionados junto a documentos públicos municipais pela nossa
natureza originária. Então se pegarmos o senso, nós estamos em todas as áreas (R2).
Todas essas vozes presentes no texto até aqui delineado trazem a preocupação de seus
anunciantes com relação aos elementos definidores da identidade das universidades
comunitárias. Albert e Whetten (1985), ao fazer referência à identidade nas organizações,
afirmam que a identidade organizacional é resultante de um conjunto de afirmativas sobre os
atributos centrais, distintivos e duradouros da organização. A centralidade diz respeito aos
atributos fundamentais da organização, seu sistema interno de crenças, normas, valores, que
constroem o sentido do que é a organização e do que ela representa para a comunidade; a
distintividade se relacionaria com o que distingue a organização das demais, diferencia do
grupo; e os atributos de durabilidade estariam atrelados à estabilidade da identidade ao longo
do tempo, o que permitiria manter o vínculo entre o presente, passado e futuro. Para Nogueira
e Machado-da-Silva (2003), esses aspectos seriam interdependentes e estariam expressos na
missão, nos objetivos, na ideologia, nos valores e nas estratégias organizacionais. Talvez se
possa levantar neste momento uma reflexão quanto a um dos aspectos que marcam os atributos
centrais dessas instituições, qual seja, a sua natureza, origem e finalidade e o conflito que aqui
se instaura, bem como aqueles que fazem referência ao que a distingue de outros modelos.
Por sua gênese, as comunitárias destacam-se pela alta inserção nas comunidades
regionais, atendendo demandas do poder público local e regional, em grande parte, de forma
gratuita. É uma iniciativa que não nasceu no núcleo do poder público-estatal, mas na sua
periferia, isto é, no espaço da ampliação da esfera pública, experiência fundadora de uma
natureza pública não estatal. Se a centralidade diz respeito aos atributos fundamentais de uma
organização, ao que lhe é legítimo, observa-se um certo impasse quanto ao conceito pública
não estatal. Nas palavras de Frantz (2006, p. 134)
O marco jurídico da sociedade brasileira reconhece e define diferentes níveis e categorias de instituições de ensino superior: universidades estatais e universidades privadas, sendo estas, particulares, em sentido estrito, confessionais, comunitárias e filantrópicas, conforme os Art. 19 e 20 da Lei nº 9.394. Portanto, a noção do privado, aqui, não se confunde, necessariamente, com a de propriedade privada. Em dimensão mais ampla, contrapõe-se à natureza jurídica estatal.
Parece então que o fato de originariamente ser de natureza pública, porém, constituir-se
72
como pessoa jurídica de direito privado, gera grande confusão sobre este traço que deveria
caracterizá-la como comunitária. Afirma R1 Tem que reverter essa percepção de que
comunitária não significa pública. Ela tem função pública, mas não é estatal. Ela é pública,
mas não estatal. Ela é de direito privado e tem o papel de prestar serviços à comunidade,
público. No entanto, apesar das controvérsias, “a identidade público não estatal é um aspecto
marcante do discurso das comunitárias gaúchas e catarinenses, reafirmando insistentemente nos
documentos das instituições e entidades representativas ao longo das últimas décadas”
(SCHMIDT, 2017, p. 42). Não se caracteriza apenas como elemento acessório. No discurso, o
caráter comunitário se manifesta pela inserção da instituição na comunidade regional, nas
relações permanentes com a sociedade civil e o poder público local, na participação ativa de
integrantes da comunidade nas decisões e na gestão democrática.
Para Schmidt (2010, p. 30), apesar do Plano Nacional de Educação (Lei 10.172, de
9/01/2001), elaborado com base na LDB/96 as diretrizes de, “oferecer apoio e incentivo
governamental para as instituições comunitárias sem fins lucrativos, preferencialmente aquelas
situadas em localidades não atendidas pelo Poder Público, levando em consideração a avaliação
do custo e a qualidade do ensino oferecido.”, pouca relevância foi dada ao modelo comunitário
e, na prática, pouco aconteceu.
Em 1995, no governo de Fernando Henrique Cardoso, foi aprovado o Plano Diretor da
Reforma do Aparelho de Estado. Nele a categoria público não estatal foi utilizada na lógica da
minimização do Estado. Essa reforma possibilitou a criação de dois mecanismos legais que
constituem o atual marco do público não estatal do país: a Lei das Organizações Sociais (Lei nº
9.637, de 15/05/1998), destinada à privatização de atividades exercidas pelo Estado, o que vem
de encontro às características das comunitárias; e a Lei das Organizações da Sociedade Civil de
Interesse Público – OSCIPs (Lei nº 9.790, de 23/03/1999). Esta última exclui explicitamente,
no art. 2º, “as escolas privadas dedicadas ao ensino formal não gratuito e suas mantenedoras”,
assim como “as instituições hospitalares privadas não gratuitas e suas mantenedoras”
(SCHMIDT, 2010, p. 31).
Segundo Cunha (2007, p. 816), a LDB de 1996 “reconheceu, pela primeira vez na
legislação brasileira, a possibilidade de lucro para as instituições privadas de ensino: as
particulares, no sentido estrito, definidas, implicitamente, por oposição às instituições privadas
sem fins lucrativos (comunitárias, confessionais e filantrópicas)”. A LDBEN/96 facilitou a
entrada no setor, o que contribuiu ainda mais para o aceleramento e crescimento do ensino
superior privado durante a década de 90 (CRUZ, 2008). Vários decretos publicados
posteriormente tiveram efeitos significativos no setor privado. Uma maior diversificação nos
73
formatos institucionais ocorreu, e as IES passaram a ser classificadas como institutos
superiores, faculdades, faculdades integradas, centros universitários ou universidades, cada
qual com distintas prerrogativas e níveis de autonomia. As novas normativas permitiram
também a criação de instituições privadas com fins lucrativos ao lado das já tradicionais
privadas sem fins lucrativos (comunitárias, confessionais e filantrópicas) e das públicas estatais
(FIOREZE, 2017). As instituições privadas organizadas como empresas lucrativas (particulares
em sentido estrito) passam de 39% do total das matrículas do setor privado, em 1997, para 52%,
em 2002, ganhando muito espaço frente às instituições privadas sem fins lucrativos (PINTO,
2004, p. 740). Ao assumirem a forma legal “com finalidade lucrativa”, as entidades
mantenedoras adquirem o direito de transformar as instituições de ensino superior (as mantidas)
em mercadorias, tornando-as passíveis de serem vendidas e compradas no mercado
(SAMPAIO, 2012).
Para Morosini e Franco (2006), a década de 90 foi marcada por importantes mudanças
nas IES brasileiras. Sob orientações de organizações internacionais como Banco Mundial,
Organização Mundial do Comércio (OMC), Organização das Nações Unidas para a Educação,
a Ciência e a Cultura (UNESCO), as políticas públicas para o ensino superior investiram em
ações que incentivaram a redução do papel do Estado, priorizando o ensino privado; bem como
a “expansão do Sistema de Educação Superior (SES); descentralização, diversificação e
flexibilização do SES; avaliação da ES ancorada em conceitos de qualidade isomórficos e
orientados para a tomada de decisão e o controle de qualidade” (MOROSINI; FRANCO, 2006,
p. 56).
No final da década de 1990, a mercantilização do ensino superior se acentua e inicia-se
assim o marco de diversificação da oferta do ensino superior. O processo de globalização e de
disseminação das tecnologias de informação, por meio da oferta direta de cursos (presenciais e
a distância), da produção de materiais instrucionais (livros, apostilas e softwares), do
nascimento de consultorias empresariais faz com que as instituições lucrativas na área da
educação se transformassem em um grande negócio, sendo um dos segmentos que apresentou
maior taxa de crescimento e lucro (CARVALHO, 2013, p. 766).
Passados alguns anos, já na década de 2000, algumas alterações aconteceram na Lei
9.394/96. O inciso II do Artigo 20 desta lei sofreu duas alterações, a primeira em 2005 e a
segunda em 2009, cujas redações passaram a ter os seguintes termos:
II – Comunitárias, assim entendidas as que são instituídas por grupos de pessoas físicas ou por uma ou mais pessoas jurídicas, inclusive cooperativas
74
de pais, professores e alunos, que incluam em sua entidade mantenedora representantes da comunidade; (Alteração efetuada por meio da Lei 11.183, de 5 de outubro de 2005) (BRASIL, 2005c). II – Comunitárias, assim entendidas as que são instituídas por grupos de pessoas físicas ou por uma ou mais pessoas jurídicas, inclusive cooperativas educacionais, sem fins lucrativos, que incluam na sua entidade mantenedora representantes da comunidade; (Alteração efetuada pela Lei Nº 12.020, de 27 de agosto de 2009) (BRASIL, 2009).
Amparadas em termos legais, incluindo a utilização de recursos públicos, as instituições
comunitárias, confessionais e filantrópicas colocam-se num patamar diferenciado dentro do
setor privado do ensino, ganhando com isto condições especiais para suas atividades. A
introdução do critério diferenciador entre as instituições particulares em sentido estrito e, as
demais, incluindo as comunitárias, confessionais e filantrópicas, explicitado pela expressão
“sem fins lucrativos” para este segundo grupo é a alteração mais significativa no processo
(SILVA, 2012). Essa década (2000) assinala a consolidação da Universidade, com
participação e o êxito da maioria expressiva de seus cursos nos processos de avaliação externa,
notadamente a partir de 2004, com a vigência do Sinaes (PDI/UNI3, 2017, p. 31). Pouco a
pouco, por conquistas sociais e políticas, as universidades comunitárias vão se legitimando e
distinguindo-se de outras instituições de ensino superior, tornando a organização única
(ALBERT; WETTHEN, 1985).
Na primeira década de 2000, muitas articulações vinham sendo realizadas com intensos
debates nos Ministérios da Educação e da Justiça por representantes das Universidades
Comunitárias com o intuito de definir o perfil dessas instituições de educação superior e de
garantir seu processo de legitimação. Todos os gestores participantes desta pesquisa tiveram
participação intensa nas negociações.
RS e SC já conheciam as universidades comunitárias, mas o modelo tinha que ser levado para o Brasil. [...]. Buscamos apoio da CMBB e da OAB. Então foi criada a Frente Parlamentar em defesa das comunitários com 247 inscritos na bancada. [...] então começou a dar corpo e a relatoria ficou por conta de dois senadores de Santa Catarina. Visitamos os parlamentares de Santa Catarina e do Rio Grande do Sul. Visitamos todas as bancadas. Fomos a todas as lideranças. O projeto passou na câmara e foi para o Senado. O projeto foi aprovado com vetos (R2, 2016).
Em 2008, as associações, gaúcha COMUNG e catarinense ACAFE, propunham ao
Governo Federal e ao Congresso Nacional um projeto de lei específico para as instituições
comunitárias. UNI4 e UNI3 lutando juntas. Primeiras a migrar para o sistema federal (MEC).
Luta pelo reconhecimento dos direitos. Realização de campanhas e abaixo-assinados para
75
enviar aos deputados pedindo a aprovação da lei. Envio de e mails para alunos (R4, 2016).
Outro gestor enfatiza o grande envolvimento no processo de formulação da lei. A nossa
universidade teve grande envolvimento, auxiliando a ABRUC no sentido de fomentar e
provocar manifestações junto aos deputados e senadores. O marco regulatório das
universidades comunitárias era necessário (R3, 2016). Em sua primeira versão intitulou-se
Projeto de Lei das Instituições Comunitárias, incluindo nesse conjunto universidades, escolas,
hospitais, emissoras e demais organizações comunitárias.
Para Saraiva e Duarte (2010, p. 113) “a construção identitária é constituída pelo
conjunto de representações que seus integrantes formulam sobre o significado da organização,
que se baseia no objetivo, valores e crenças consideradas importantes”. Os objetivos das
universidades comunitárias estão relacionados à promoção de ações junto à sociedade, e a
“identificação do indivíduo com a organização acontece quando o indivíduo reconhece valores
na organização semelhantes ao dele” (SARAIVA; DUARTE, 2010, p. 114). A adesão de
políticos, associações de classe e comunidade à proposta de criação de uma identidade própria
para as instituições comunitárias demonstra a presença de um processo de identificação com os
objetivos dessas instituições, o que os impulsiona a reconhece-las como legítimas.
Em 2009, a Associação Brasileira das Universidades Comunitárias – ABRUC
mobilizou todas as entidades representativas das universidades comunitárias brasileira,
incluindo a Associação Nacional de Educação Católica do Brasil – ANEC e a Associação
Brasileira de Instituições Educacionais Evangélicas – ABIEE objetivando unificar o discurso
em favor de um marco legal para que o Estado e a sociedade brasileira reconheçam essas
instituições com características distintas das privadas e sejam reconhecidas como públicas não
estatais. Finalmente, em 2010, foi entregue pela Frente Parlamentar de Apoio às Universidades
Comunitárias à Câmara dos Deputados o projeto de Lei n. 7.639/2010, intitulado Projeto de Lei
das Instituições comunitárias de Educação Superior, o qual se configura como marco
regulatório para o setor.
Após tramitar por várias instâncias e ser aprovado por unanimidade em todas as
comissões permanentes, o projeto torna-se lei. Em 12 de novembro de 2013, a Lei 12.881 é
publicada no Diário Oficial da União dispõe sobre a definição, qualificação, prerrogativas e
finalidades das instituições comunitárias e vem assinada por pela Presidente Dilma Roussef e
os ministros Guido Mantega, Aloisio Mercadante, Miriam Belchior e Luis Inacio Adams. Essa
Lei representa uma nova era para as universidades comunitárias, ampliando os espaços de
cooperação entre o poder público e as organizações criadas pelas comunidades no setor da
educação superior. Sua aprovação é “o reconhecimento legal das especificidades que tornam as
76
instituições comunitárias um modelo específico” (SCHMIDT, 2017, p. 59). Afirma um
entrevistado A lei é importante pois reconhece que existe um modelo de universidade
comunitária que não é federal, que não é estatal e nem municipal. Existe um modelo por
iniciativa da comunidade (R1, 2016). Até o advento desta norma jurídica, as universidades
comunitárias encontravam-se no espaço genérico das IES privadas, mesmo com o amplo
processo de inserção local e regional. A Lei assume um papel fundamental no reforço da
identidade do modelo comunitário de educação superior no Brasil. Tudo isso implica em
perceber que não há como refletir sobre identidade, sem considerar a existência de um outro,
ou de diferentes tipos de outros (nesse caso, os outros tipos de instituição) que possuam algum
elemento de relevância para a construção dos traços que as distingam (SILVA; VERGARA,
2002).
Entre as características básicas para a qualificação das Universidades Comunitárias
estão: constituir-se na forma de associação ou fundação de direito privado, adotar práticas de
gestão que coíbam privilégios, ter patrimônio pertencente à sociedade civil ou ao poder público,
não distribuir sua renda, ofertar serviços gratuitos, aplicar recursos nas suas atividades e
desenvolvimento permanente de ações comunitárias, prestar contas publicamente, prever a
participação de representantes dos docentes, estudantes e funcionários em órgãos colegiados,
além da apresentação de relatório de responsabilidade social (Lei 12.881/13 - Artigos 3º e 4º).
Desde sua origem, esses atributos já eram requisitados pelas instituições de caráter
comunitário. Observa-se, portanto, a permanência/persistência tanto dos traços centrais quanto
dos traços distintivos da identidade dessas universidades. “A estabilidade, implícita nesse
elemento, cria nos indivíduos um nível de certeza sobre as práticas da organização que confere
horizontes historicamente definidos para as suas ações” (SARAIVA; DUARTE, 2010, p. 113).
Ou seja, há um alto grau de credibilidade institucional, reforçada por um processo de construção
sedimentado/enraizado em convicções sólidas e que levam à legitimação das práticas
organizacionais.
As ICES classificadas também possuem as seguintes prerrogativas
Artigo 2º: I - ter acesso aos editais de órgãos governamentais de fomento direcionados às instituições públicas; II - receber recursos orçamentários do poder público para o desenvolvimento de atividades de interesse público; IV - ser alternativa na oferta de serviços públicos nos casos em que não são proporcionados diretamente por entidades públicas estatais; V - oferecer de forma conjunta com órgãos públicos estatais, mediante parceria, serviços de interesse público, de modo a bem aproveitar recursos físicos e humanos existentes nas instituições comunitárias, evitar a multiplicação de estruturas e assegurar o bom uso dos recursos públicos (BRASIL, 2013).
77
Em 06 de outubro de 2014, foi publicada no Diário Oficial da União a Portaria MEC n.
863, de 03 de outubro de 2014 (BRASIL, 2014a), que “Regulamenta o procedimento para
qualificação das Instituições de Educação Superior como Instituições Comunitárias de
Educação Superior, nos termos da Lei n. 12.881, de 12 de novembro de 2013” (BRASIL, 2013).
O sonho da consolidação da instituição comunitária ocorreu com efetividade no ordenamento
jurídico brasileiro a partir da Lei e sua posterior regulamentação, podendo cumprir com maior
segurança seus fins institucionais (CIMADON; CIMADON, 2015).
Entre os avanços alcançados pela nova Lei, está o caráter inovador no que concerne a
distinção entre as instituições comunitárias das instituições privadas (particulares) da educação
superior, estabelecendo a tripartição entre públicas (estatais), comunitárias e privadas. Essa
norma também remove alguns obstáculos quanto à transferência de recursos públicos a essas
instituições, geralmente contestados no âmbito legal, promovendo maior cooperação entre o
poder público e as comunitárias. Outra novidade está na possibilidade, agora oficial, dessas
instituições prestarem serviços gratuitos, por meio do repasse de recursos pelo poder público.
Assim, o dinheiro público pode ser repassado para as instituições públicas estatais e
comunitárias. Para Schmidt (2017, p. 61) o reconhecimento do modelo comunitário “serve de
inspiração para a formulação de um marco legal abrangente do terceiro setor”. Desta forma, as
entidades da sociedade civil passam a ser percebidas como parceiras públicas, distanciando-se
das instituições caracteristicamente privadas.
As leis são instrumentos de luta política para transformação social. Para os gestores, a
Lei 12.881/2013 é fruto de muito trabalho pelo reconhecimento de uma instituição que há muito
já existia e cujo intento era promover o bem social no seu entorno. Foi importante porque nós
já somos comunitária de fato, mas agora somos de direito. Ter uma lei que diga isso é
importante (R4, 2016). Porém, nenhuma lei modifica de forma mágica uma situação. A
dicotomia público/privado está profundamente enraizada na cultura administrativa, o que
demandará tempo até que as novas normas sejam incorporadas ao modus operandis dos órgãos
de educação e da máquina pública. A voz do entrevistado (R4, 2016) anuncia a dificuldade A
lei dá acesso aos recursos públicos por meio de editais (compra de equipamentos, incentivo à
pesquisa, instalação). Mas, já se passaram três anos e nada disso aconteceu até agora.
A descrição das vozes dos gestores quanto à legitimação das comunitárias denuncia que
não basta existir a lei. Ela deve ser cumprida, no entanto, o processo de seu cumprimento, às
vezes, encontra algumas resistências. Se se considerar que a identidade organizacional é algo
construído socialmente, de modo relacional, então ela deve ser considerada como fluída,
contínua, adaptativa. Afirma R2,
78
Quando ela (a universidade) foi criada, a realidade era outra. Ela foi criada por uma necessidade, serviu, principalmente, na formação profissional, mas talvez, em razão da concorrência, ela acabou meio que desvirtuando dos seus propósitos, mas vejo como como uma instituição vinculada à comunidade (R2, 2016).
Ou seja, longe está de ter acabado a modelagem dessas instituições, a cada conquista,
um novo desafio se lhes apresenta, o processo é ininterrupto, com diferentes arranjos no
caminho (SILVA; VERGARA, 2002). A nova economia global trouxe mudanças de largo
alcance para as instituições de ensino superior, seja qual for o modelo de universidade. A
palavra de ordem do discurso preconiza um ensino que se adapte à competitividade do mercado
internacional e que as universidades se abram aos financiamentos empresariais, às pesquisas
práticas, utilitárias e à produtividade (GHIRALDELLI, 1996). Observa-se, assim, que, ao
mesmo tempo em que reafirmam sua essência, as universidades comunitárias se deparam com
um mundo globalizado onde as mudanças se aceleram, a diversidade cultural se amplia e novas
estratégias de adaptação se fazem urgentemente necessárias.
O receio de fragmentar-se, de dissolver-se no global e ficar à deriva de políticas
neoliberais, reafirma a necessidade dessas instituições de marcar os seus contornos, de se firmar
como um modelo comunitário fortalecido por suas referências de origem, quais sejam: de serem
criadas e mantidas pelas comunidades, orientadas para as necessidades da coletividade, não
pela lógica do mercado e serem prestadoras de serviços de interesse público. Também entre os
traços que as singularizam está o seu caráter público não estatal. Na cultura política e na ordem
legal brasileiras prevalece ainda a tendência reducionista de identificar o público com o estatal.
O público é mais abrangente que o estatal e o comunitário é uma das formas do público. Caso
as estruturas sócio-político-econômicas evoluam nesse sentido, essas instituições podem vir a
ter uma potência política expressiva, pois “reúnem condições para proporcionar ao país
relevantes contribuições ao compartilhar com o Estado e com as organizações da sociedade
civil a tarefa de oferecer serviços públicos de qualidade” (SCHMIDT, 2010, p. 10).
Outro traço que distingue essas universidades das instituições públicas e das privadas é
sua autonomia no plano decisório e financeiro em relação ao Estado. É o que faz delas
instituições não estatais. Embora mantenham relação permanente com entes públicos e muitas
acolham representantes governamentais em suas instâncias deliberativas, essas instituições não
são sustentadas pelo Estado, não há dependência econômica nesta relação. Também não há
intenção de que isso aconteça, porém, o fato de serem reconhecidas oficialmente como um
modelo de universidade amplia as possibilidades de participação em editais que deem acesso
79
aos recursos públicos (SCHMIDT, 2010).
Nas vozes de seus gestores, evidencia-se a grande preocupação com a sobrevivência
financeira e com os encaminhamentos dados às políticas educacionais atreladas a um viés
neoliberal.
O modelo das universidades comunitárias regionais é anterior aos modelos propagados
pelas reformas de caráter neoliberal implementadas a partir da década de 1980, pois foram
estruturadas em plena vigência do Estado desenvolvimentista, suprindo a lacuna de educação
superior nas regiões interioranas por iniciativa da sociedade civil e do poder local. Apesar da
existência de um cenário gerador de incertezas, muitas das universidades comunitárias mantêm-
se fiéis à sua natureza e ter reconhecida oficialmente a sua existência dá a elas um fôlego maior
para continuar a sua trajetória.
O reconhecimento da existência das universidades comunitárias pode ser visto como
um avanço na definição do novo modelo de Estado, que possibilite a cooperação entre os entes
estatais, a sociedade civil e as organizações privadas. E cabe a esta pesquisa e a tantas outras
desenvolvidas no meio acadêmico elucidar e aprofundar as múltiplas abordagens que modelam
a anatomia das instituições de ensino superior e os seus conflitos identitários. Partindo dessa
premissa, o capítulo seguinte abordará os caminhos conflituosos por que passam essas
instituições. À luz das considerações de McCowan (2016) e de Albert e Wetthen (1985), passar-
se-á a analisar a anatomia das universidades comunitárias e sua relação entre o bem público e
o bem de consumo.
80
4 ANATOMIA DAS UNIVERSIDADES COMUNITÁRIAS: VALOR, FUNÇÃO,
INTERAÇÃO
Dada a conjuntura econômica e social atual, segundo a qual a educação é redefinida pela
lógica do mercado por meio das reformas neoliberais, percebe-se que as universidades
comunitárias vêm atravessando múltiplos conflitos, sejam eles relacionados à questão de
autonomia, de currículo, de relação social, de sustentabilidade financeira, e, inclua-se nesse rol,
certa crise de identidade. Assim, buscar caracterizar, conceituar esse modelo de instituição de
ensino superior e as políticas públicas com relação a elas no sentido de poder orientar o debate,
constitui-se grande desafio. Com base nas entrevistas realizadas com os gestores das
universidades e nas análises dos documentos institucionais, especificamente, Planos de
Desenvolvimento Institucional e Relatórios de Responsabilidade Social, buscar-se-á, a partir de
três dimensões – valor – função – interação - modelo teórico proposto por McCowan (2016;
2017) e a partir do entendimento do conceito de identidade organizacional proposto por Albert
e Whetten (185) promover uma reflexão sobre os elementos que constituem a identidade das
universidades comunitárias e, em que medida, as políticas neoliberais afetam essa construção.
Para McCowan (2016), nas últimas décadas, as agências internacionais de
desenvolvimento têm mostrado grande interesse pelo ensino superior, haja vista a alocação de
recursos pelas agências de desenvolvimento: 20% dos fundos do Banco Mundial, 34% de ajuda
à educação dos países do Comitê de Ajuda ao Desenvolvimento (CAD) com a oferta de bolsas
de estudo para estudar em países de alta renda.Vários motivos estariam contribuindo para essa
mudança de ótica, entre eles a percepção do aumento do valor do conhecimento como fator de
competitividade econômica, a alta taxa de retorno, em diferentes níveis, a capacidade de
impulsionar o desenvolvimento tecnológico pela pesquisa e as mudanças da economia política
global.
O reconhecimento de que o ensino superior tem papel fundamental na consecução dos
Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODSs) levou a Organização das Nações Unidas
(ONU) a incluir como meta “até 2030 garantir acesso igual para todas as mulheres e homens a
educação técnica, vocacional e terciária acessível e de qualidade, incluindo a universidade"
(Nações Unidas Brasil, 2015).
Segundo o autor, esse interesse crescente pelo ensino superior é bem-vindo, no entanto,
as formas de intervenção propostas e as razões que as sustentam nem sempre são claras. É
preciso verificar os impactos que os diferentes tipos de ensino superior podem acarretar na
sociedade, pois ainda faltam evidências empíricas que sustentem as alegações sobre a
81
contribuição do ensino superior para o desenvolvimento.
McCowan (2016) afirma que há certa fragilidade conceitual e teórica sobre o que é a
universidade e para que ela serve. Na tentativa de avaliar a natureza mutável das universidades,
o autor propõe então um modelo teórico. Para o autor (2016) a dicotomia público/privado não
dá conta de explicar os atributos que caracterizam uma universidade. Assim, para compreender
as características dessa instituição, sua relação com a sociedade e seu potencial de contribuição
para o desenvolvimento, o autor propõe um modelo sustentado em três dimensões – valor,
função, interação – para a análise de características constituintes da “anatomia” da
universidade (MCCOWAN, 2016). Esse quadro tridimensional ofereceu subsídios para
compreender os elementos constituintes da identidade das instituições comunitárias, seus
propósitos, suas práticas, seus vínculos com a sociedade externa e a inter-relação entre esses
elementos. Ao tornar transparente essa compreensão, foi possível analisar, com mais
propriedade, os dilemas que essas instituições vêm enfrentando quanto à sua existência.
Há uma inter-relação entre as três dimensões. Se o conhecimento for tomado com valor
instrumental, a hipótese de uma relação interativa mais porosa com o mundo exterior é
aceitável, ao mesmo tempo em que suas funções se entrelaçam com atividades que refletem
maior preocupação com a comunidade local, o que poderia ser ilustrado com a existência de
um hospital universitário ou cursos de educação para adultos, por exemplo. Do mesmo modo,
caso seja dado ao conhecimento um valor intrínseco, com estímulo a ações de arquivamento ou
mera interpretação do conhecimento, a relação com a comunidade teria uma baixa porosidade
(MCCOWAN, 2016).
O autor defende que esses três ingredientes valor, função e interação sofrem efeitos
devastadores pelo surgimento de atividades empresariais nas instituições de ensino superior,
pela redução de custos e a maximização dos lucros por meio da separação das atividades
executadas por essas instituições. Dois processos contribuiriam para gerar uma instabilidade
identitária nas universidades: a comoditização (Commodification) e a desagregação
(Unbundling) (MCCOWAN, 2016; 2017).
O processo de comoditização/mercantilização se caracteriza pela conversão das
funções da universidade em produtos e serviços para venda voltados à lucratividade. “Refere-
se ao processo através do qual o conhecimento que poderia ser livremente transmitido e
adquirido - seja por meio de atividades relacionadas ao ensino, pesquisa ou envolvimento da
comunidade - é organizado e disponibilizado com o objetivo de gerar renda e potencialmente
lucrativo” (MCCOWAN, 2016, p. 515, tradução nossa). Já o processo de desagregação se
manifestaria por meio da separação das funções da universidade em unidades individuais,
82
formalizada pelo conjunto de produtos vendidos como pacotes, tendo como influência o
desenvolvimento de novos modos de entrega, em particular os Massive Open Online Courses
(MOOCs) – Cursos on line abertos massivos. “O desagregamento, portanto, refere-se ao
processo de vender aos consumidores apenas as partes da experiência universitária que eles
querem ou podem pagar”8 (MCCOWAN, 2016, p. 516, tradução nossa). A figura 6 traz as duas
vertentes influenciadoras neste processo.
Figura 6 - Vertentes influenciadoras nas dimensões Valor – Função – Interação
Fonte: Elaborado pela autora, com base em Mccowan (2016)
Esses dois processos têm relevância nesse estudo na medida em que podem ser vistos
como influenciadores/estimuladores na mudança de conduta ou no comportamento que vêm
tomando as universidades comunitárias. Assim eles serão retomados por ocasião da análise das
dimensões Valor, Função, Interação.
Schmidt (2017) descreve em detalhes as características das universidades comunitárias,
além de vários outros autores já mencionados. Baseando-se nesses estudos, elencou-se aquelas
características que reiteradamente foram citadas, as quais serviram de referência para a análise.
Para contemplar o conjunto de traços centrais, distintivos e duradouros da identidade
organizacional, os estudos de Albert e Whetten (1985) se mostraram pertinentes. Retoma-se os
dados apresentados anteriormente na figura 3, na qual se apresenta a relação entre esses
8 Unbundling, therefore, refers to the process of selling to consumers only those parts of the university experience that they want or can afford (MCCOWAN, 2016, p. 516).
83
elementos.
Figura 3 - Relação dimensões de análise, características das UCs e dilemas
Fonte: Elaborado pela autora com base em Schmidt (2017; Albert e Whetten (1985)
4.1 VALOR: O bem público como razão de existência da universidade comunitária
O conhecimento é uma parte inerente do patrimônio comum da humanidade. Assim, ao
considerar a necessidade de garantir o desenvolvimento sustentável em um mundo cada vez
mais interdependente, conhecimento e educação podem ser vistos como bens comuns mundiais.
Entendida como um bem público e direito social, “a educação tem como finalidade
essencial a formação de sujeitos e, por consequência, o aprofundamento da cidadania e da
democratização da sociedade” (DIAS SOBRINHO, 2013, p. 109). Neste caso, o conceito de
bem público é interpretado como princípio, como um valor moral que “sobrepõe a dignidade
humana aos interesses, inclinações e circunstâncias individuais” (DIAS SOBRINHO, 2013, p.
109). Respeitar a dignidade humana condiz ao princípio de compreender o outro como fim e
não como simplesmente um meio, o que se contrapõe ao individualismo cujo entendimento é
de que o outro é mero meio para servir aos interesses próprios. Respeitar a dignidade humana
é fazer prevalecer o bem comum sobre as conveniências individuais. Essencial para a formação
84
de cidadãos conscientes, a educação como bem público concebe profissionais qualificados e
éticos que passam a atuar como principais atores do fortalecimento econômico e
desenvolvimento de uma nação (DIAS SOBRINHO, 2013).
Bens comuns seriam aqueles que, “independentemente de qualquer origem, pública ou
privada, caracterizam-se por um destino comum vinculante, sendo necessários para a
concretização dos direitos fundamentais de todas as pessoas” (MARELLA, 2012). Pode-se
definir bem comum como “uma associação solidária de pessoas que é mais do que o bem dos
indivíduos em seu conjunto. É o bem que consiste em ser uma comunidade, ou seja, “é o bem
concretizado nas relações mútuas nas quais e pelas quais os seres humanos alcançam seu bem-
estar” (DENEULIN; TOWNSEND, 2007, p. 23). Assim, o bem comum seria inerente às
relações existentes entre os integrantes de uma sociedade unidos entre si em uma vontade
coletiva, a qual enfatiza o processo participativo, que é em si um bem comum. Nessa
perspectiva, parece que a noção de bem comum ultrapassa os limites do conceito de bem
público. A noção de bem comum vai além do conceito mais instrumental do bem público, em
que o bem-estar humano se assenta nos parâmetros de uma teoria socioeconômica
individualista.
Para Silva (2002, p. 661), público significa “o que é comum, pertence a todos, é o povo,
pelo que, opondo-se a privado, se mostra que não pertence nem se refere ao indivíduo ou ao
particular.” A esfera pública envolve questões da coletividade, que vão além do indivíduo, da
família e de grupos específicos. Schmidt e Campis (2009) afirmam que o público se manifesta
em duas modalidades: público estatal e público não estatal. “O estatal, por definição, tem (deve
ter) finalidades exclusivamente públicas. Todavia, o público é mais abrangente que o estatal.”
(SCHMIDT; CAMPIS, 2009, p. 18). Estatal refere-se às organizações que pertencem à esfera
do Estado em seus diferentes níveis, compreendendo os diferentes poderes políticos –
Executivo, Legislativo e Judiciário – no plano federal, estadual e municipal, e empresas e
órgãos a eles vinculados. Em sociedades complexas, além das entidades estatais, “o público
inclui uma gama de organizações e instituições que prestam serviços de interesse coletivo, ou
seja, são públicas não estatais” (SCHMIDT; CAMPIS, 2009, p. 18).
Está-se elucidando o entendimento de bem comum e bem público, porque eles são
componentes inerentes à gênese das instituições objeto desse estudo. Comunitário é aquilo que
é comum à comunidade, o que é coletivo, o que é de todos os membros da comunidade.”.
(SCHMIDT; CAMPIS, 2009, p. 19). O termo comunidade normalmente associa-se a
características como comunhão, laços sociais fortes, integração, interesse público. “O
comunitário distingue-se do estatal e do privado: não pertence ao Estado, nem a grupos
85
particulares. Pelas suas finalidades e modus operandi é uma das formas do público, abrangendo
as instituições e organizações voltadas à coletividade” (SCHMIDT; CAMPIS, 2009, p. 19).
Segundo o princípio do bem público, o sistema educativo não pode amparar as práticas
tão somente mercantilistas e de acumulação de lucros, a educação não pode ser vista como
mercadoria. Por serem parte essencial do direito que todos têm à vida digna e saudável, os bens
públicos precisam ser universalmente acessíveis e não podem ser tomados como mercadoria.
(LOCATELLI, 2017; MCCOWAN, 2015; DIAS SOBRINHO, 2013). A afirmação desse
princípio, que parece caminhar na contramão da crescente mercantilização, atinge todas as
instituições educativas, as quais têm funções e finalidades públicas que não deveriam ser
negligenciadas. Para Dias Sobrinho (2013, p. 110) “os fins da educação com sentido público
referem-se à formação de indivíduos sociais, cuja construção pessoal integral se insere no plano
mais amplo da construção da sociedade e, em termos universais, da dignificação da
humanidade.” Assim, discutir a educação como bem público e comum implica reconhecer a
grande responsabilidade que as Instituições de Educação Superior têm na formação ética,
científica e moral de cidadãos comprometidos com a construção de uma sociedade mais
inclusiva e justa (LOCATELLI, 2017; MCCOWAN, 2017).
Estando as universidades comunitárias envolvidas nesta seara, como instituições de
ensino superior, suas concepções e práticas precisam ser expostas à reflexão, ao debate e à
crítica como caminho em busca do entendimento de sua constituição identitária. Daí, a proposta
de McCowan (2016) parecer bastante pertinente na busca por possíveis respostas. Para
McCowan (2016), a dimensão valor refere-se à razão da existência da universidade, do porquê
do ensino superior. Dois eixos são considerados ao valor atribuído à universidade: o valor
intrínseco e o valor instrumental. No caso do valor intrínseco, o conhecimento vale por si
mesmo sem qualquer justificativa. O conhecimento gerado, armazenado e transmitido pela
universidade pode ser percebido intrinsecamente valioso, valendo a pena em si mesmo sem
qualquer justificativa adicional. Por sua vez, o conhecimento com valor instrumental serviria
a objetivos individuais e sociais e interesses econômicos, políticos ou culturais. Nessa
dimensão, seria considerado o benefício privado ou público dos bens produzidos pelo ensino
superior, assim como a sua abrangência, se em nível local, nacional ou mundial. Esses dois
eixos não são mutuamente excludentes, pois “podemos considerar que existe um valor
intrínseco na promoção da compreensão humana das estruturas profundas da linguagem, ao
mesmo tempo que valoriza sua contribuição para o desenvolvimento de computadores
programação” (MCCOWAN, 2016, p. 510, tradução nossa). Assim, o conhecimento produzido
pela universidade pode ser fundamental tanto para os resultados individuais, em termos de
86
realização de objetivos de vida, quanto para o fortalecimento da atividade instrumental.
A produção e a disseminação de conhecimentos, bem como a vivência de valores
fundamentais da vida constituem a matéria prima da formação humana. A universidade, sendo
uma instituição de educação cuja finalidade principal é a formação do ser humano em suas
distintas dimensões, justifica a sua existência ao cumprir sua responsabilidade social na
produção e socialização de conhecimentos. Para Dias Sobrinho (2015, p. 584) “À universidade
compete a missão de formar pessoas com alto sentido cultural, moral e político de cidadania e
de contribuir, em sua esfera de possibilidades e em seus limites, para a solução de problemas
da coletividade”. Ainda para este autor, a universidade tem a função de formar indivíduos-
cidadãos dotados de valores cívicos, conhecimentos cientificamente relevantes e socialmente
pertinentes. “Sem sentido vital e valência social, não mereceria existir uma instituição criada e
mantida pela sociedade para o bem de todos” (DIAS SOBRINHO, 2015, p. 582).
A universidade é um dos espaços da convivência plural da sociedade. Tem múltiplas e
contraditórias demandas disputadas por seus diferentes atores, que, por meio da crítica
fundamentada em conhecimentos, defendem seus valores em permanente diálogo (DIAS
SOBRINHO, 2015). Por isso mesmo, para McCowan (2017, p. 8) “nenhuma universidade
jamais terá um conjunto unitário de valores: sempre haverá alguma diversidade de perspectiva”,
em virtude dos diferentes grupos que ali convivem compostos por gestores, professores,
funcionários, acadêmicos que, por sua vez, se conectam com a comunidade externa. Apesar
dessa diversidade, o autor aponta para a existência de três elementos que podem ser observados
na dimensão valor: a individualização, que corresponderia às escolhas individuais em relação
ao que é aprendido, aquilo que ele considera como valor para agregar à sua vida; o bem público,
entendida como um bem público, a universidade deve estimular o engajamento e o debate
coletivo; e a ação afirmativa, que se relaciona às questões de igualdade e justiça social. Ao
fazer referência a cada um desses elementos, o autor descreve as possíveis implicações
negativas que os processos de comoditização e desagregação podem provocar na formação
integral do indivíduo.
Uma vez que todos têm necessidade vital de formação e esta se dá pela educação, cabe
à universidade a responsabilidade de “formar cidadãos portadores de sólidos conhecimentos e
conscientes de suas responsabilidades nos processos de construção econômica, ética e política
da sociedade” (DIAS SOBRINHO, 2015, p. 586). Ao entender a educação e o conhecimento
como bens públicos e direitos humanos essenciais, as universidades comunitárias assumem o
caráter de instituição que não negligenciam nem sonegam ao cidadão o direito à sua formação
integral pela mediação dos conhecimentos. Nessa linha de raciocínio, o conhecimento tem valor
87
público e social. Percebido assim, não é mera engrenagem da otimização de lucros e nem a
universidade simples espaço de reprodução de produtos comercializáveis (DIAS SOBRINHO,
2015).
Tais colocações reforçam os ingredientes presentes na concepção de valor instrumental
denominado por MCCowan (2016) e elucidados nas vozes dos gestores das universidades,
objeto desse estudo. Ao comentar sobre o papel da universidade, um dos gestores afirma que a
universidade é uma empresa que gera um produto e que precisa de resultados (R1), no entanto,
é uma empresa diferente cuja compreensão extrapola o simples fato de eliminar cursos de
licenciatura, por exemplo, só porque estes estão dando prejuízo. A lógica é outra, a percepção
da função da universidade é outra, Se fôssemos buscar só resultados, nós fecharíamos metade
dos cursos, [...] Os resultados estão a serviço de uma causa maior, que é a formação de
professores, formar recursos para todas as áreas e não só aquelas que dão resultado ou lucro
(R1). Apesar de admitir, que a universidade tem características de uma empresa, ela não deve
e nem pode seguir os caminhos de uma organização empresarial, seu papel vai além da
prestação de serviço como mero produto de troca.
O valor instrumental do conhecimento também marca presença no discurso do Plano de
Desenvolvimento Institucional – PDI - das universidades pesquisadas. Elaborado para um
período de cinco anos e com caráter normativo, esse documento posiciona os aspectos que
confirmam o compromisso institucional com a educação superior, bem como identifica a
relação da instituição com a sociedade, por meio de sua missão e dos pressupostos que elucidam
as contribuições da instituição com a formação intelectual da sociedade (FRANCISCO et al.,
2012).
O espírito da instituição, a sua ideologia, o seu propósito, o verdadeiro motivo de sua
existência é traduzido na missão, visão e objetivos, os quais oferecem o direcionamento e o que
ela quer do futuro. A missão, para Tachizawa e Rezende (2000, p. 39), “é a razão de ser da
organização, a que ela serve, qual a justificativa de sua existência para a sociedade, ou seja,
qual a sua função social”. Com função orientadora e delimitadora da ação institucional, a missão
compromete crenças, expectativas, conceitos e recursos, deixando claro o alcance das operações
da organização e o que ela pode oferecer para aqueles que se envolvem em suas atividades
(TACHIZAWA; REZENDE, 2000). Ambas estão estritamente relacionadas às questões
estratégicas da instituição, principalmente no sentido de consolidar a sua identidade
institucional (FRANCISCO, 2012).
Para Vannucchi (2011, p. 35) “o melhor retrato de uma universidade comunitária deverá
ser contemplado no seu Projeto Político-Pedagógico e no Plano de Desenvolvimento
88
Institucional”. Nos PDIs das universidades estudadas, a missão de cada uma delas fica explícita
nas primeiras páginas do documento. Assim se apresentam no quadro 6.
Quadro 6 - Missão das Universidades Comunitárias UNIVERSIDADE COMUNITÁRIA
MISSÃO
UNI1
“Produzir, sistematizar e socializar conhecimento com qualidade e relevância para o desenvolvimento sustentável.” (PDI 2017-2021, p. 13).
UNI2
“Produzir e difundir conhecimentos que promovam a melhoria da qualidade de vida e formar cidadãos competentes, com postura crítica, ética e humanística, preparados para atuarem como agentes de transformação social.” (PDI 2017-2021, p. 15).
UNI3
“Produzir e socializar o conhecimento pelo ensino, pesquisa e extensão, estabelecendo parcerias solidárias com a comunidade, em busca de soluções coletivas para problemas locais e globais, visando à formação do cidadão crítico e ético.” (PDI 2017-2021, p. 38).
UNI4
“Promover, por meio do ensino, da pesquisa e extensão, o desenvolvimento regional para melhorar a qualidade do ambiente de vida.” (PDI 2018-2022, p. 13).
Fonte: Elaborado pela autora a partir dos PDIs das instituições
Observa-se a preocupação latente das instituições com a produção do conhecimento
voltada à formação de um cidadão com postura crítica frente à realidade, evidenciando em seus
propósitos e razão de ser, um valor instrumental, como conceitua McCowan (2016) ao definir
o porquê do ensino superior: o conhecimento deve servir para o indivíduo, para a sociedade e
para tornar o mundo mais igualitário. Ao afirmar que sua missão é Produzir e socializar o
conhecimento [...] visando à formação do cidadão crítico e ético, a UNI3 reitera as palavras da
UNI2 quando esta define como missão Produzir e difundir conhecimentos que promovam a
melhoria da qualidade de vida e formar cidadãos competentes, com postura crítica, ética e
humanística (UNI2). Essas instituições deixam evidente em seus discursos a sua preocupação
com a formação e qualificação de seus cidadãos, seja para o trabalho, para a política, para a
cultura. Essa postura também se apresenta no texto da UNI1 quando coloca que é sua missão
Produzir, sistematizar e socializar conhecimento com qualidade e relevância para o
desenvolvimento sustentável. Quando a UNI4 apresenta que sua missão é Promover, por meio
do ensino, da pesquisa e extensão, o desenvolvimento regional para melhorar a qualidade do
ambiente de vida, fica explícito que esta instituição produz conhecimento voltado à
preocupação com a qualidade de vida do cidadão, em seu sentido mais amplo. Dessa forma,
essas instituições preconizam a ideia de que a universidade “deve ser um lugar onde o ser
89
humano possa cultivar a capacidade de olhar criticamente a sua atuação, para qualificá-lo a
realizar-se em todas as dimensões de sua existência” (FRANTZ, 2006, p. 124). Cabe, assim, à
universidade, interpretar o mundo e produzir conhecimento, formando cidadãos conscientes das
transformações por que passa a sociedade e ética e moralmente responsáveis.
Dias Sobrinho (2015, p. 585) afirma que “a universidade é uma instituição da sociedade
cuja missão essencial consiste em dar forma e conteúdo à construção da vida das pessoas e, ao
mesmo tempo, contribuir para solucionar os problemas do conjunto da população”. Vannucchi
(2011, p. 40), ao se referir à missão das universidades comunitárias, considera que os membros
participantes de uma instituição dessa natureza ali estão motivados por suas convicções e por
um ‘sentimento de comunidade’, “não são meros agentes acadêmicos trabalhando para a
comunidade, porque aprenderam a trabalhar com a comunidade e, mais ainda, como
comunidade” (VANNUCCHI, 2011, p. 40). Observa-se nas palavras de Vannucchi, a presença
de um processo de identificação com as crenças, a missão e os valores da instituição daqueles
que participam da organização, o que leva à formação da identidade. Este é um processo
construído ao longo de uma trajetória, o qual vai sendo incorporado pelo indivíduo por meio de
informações, gestos, linguagens, ritos e normas estabelecidas (SILVA; VERGARA, 2002).
Uma vez que a representação da organização se expressa por meio de comportamentos,
simbolismos e comunicação, a idealização e a fantasia também fazem parte desse processo e
podem explicar a tendência das pessoas se identificarem com as organizações quando estas
possibilitam a conexão com seus atributos e desejos pessoais (MACHADO; KOPITTKE,
2002). Afirma R4 a universidade é reconhecida pelas pessoas, pela comunidade regional, é
um motivo de orgulho. A gente escuta isso, vê escrito isso. A questão do orgulho que a região
tem de ter a UNI como a sua universidade, a sua instituição. Para Dutton, Dukerich e Harquail
(1994), o processo de construção da identidade organizacional é entendido como o
entrelaçamento psicológico das pessoas com a organização, reconhecendo, assim, na sua
identidade, a identidade organizacional. Ou seja, há uma mediação entre a identidade pessoal e
a identidade organizacional, mediante a identificação.
Voltado para o bem público e com orientações acentuadamente igualitárias, o
conhecimento gerado na instituição está direcionado para o interesse da comunidade, “[...] é
uma universidade da comunidade [...] e para comunidade” (VANNUCCHI, 2011, p. 36). A [...]
universidade comunitária é uma instituição que procura atender às demandas da comunidade,
da sociedade, ela também, ao mesmo tempo, precisa ser promotora do desenvolvimento, ela
tem que impulsionar [...] (R1, 2016). Isso exige o desenvolvimento efetivo das funções ensino,
pesquisa e engajamento público, e, este último, com alto grau de porosidade entre os atores e
90
com grande fluxo de ideias (MCCOWAN, 2016). Afirma um entrevistado Universidade
comunitária é aquela que tem esse envolvimento, engajamento com as coisas das comunidades
em torno (R2, 2016). Outro reitera [...] é a universidade que tem a identidade vinculada com
essa região, que tem um compromisso com essa região, que é reconhecida pelas pessoas, pela
comunidade regional, [...] (R4, 2016). Outro gestor confirma A universidade deu base para
formação de recursos humanos [...]. Deu suporte para que as pessoas se desenvolvessem. [...]
Eles vêm porque temos um programa que é bom pra eles. Buscam a formação. Enfim, aqui
têm espaços de interação, convívio, aprendizado, um novo aprendizado (R3, 2016). Assim, o
valor instrumental dado ao conhecimento evidencia que a produção deste deve ser importante
tanto para o indivíduo, quanto para a coletividade, interferindo significativamente na realidade
social (MCCOWAN, 2016). Para Vannucchi (2011) é missão das comunitárias produzir
conhecimentos significativos para a sociedade, transformar os acadêmicos em cidadãos
conscientes e profissionais íntegros e intervir positivamente na sociedade.
A convicção de que o conhecimento gerado na instituição deve estar direcionado para
o bem público também se manifesta na missão dessas instituições. Isso pode ser observado em
suas missões como, produzir e socializar o conhecimento [...] em busca de soluções coletivas
para problemas locais e globais [...] (PDI-UNI3), ou nas palavras da UNI4 promover [...] o
desenvolvimento regional para melhorar a qualidade do ambiente de vida (PDI-UNI4). A
UNI2, por sua vez, proclama a missão de Produzir e difundir conhecimentos que promovam a
melhoria da qualidade de vida [...] para atuarem como agentes de transformação social. A
UNI1 propõe como missão Produzir, sistematizar e socializar conhecimento com [...]
relevância para o desenvolvimento sustentável. Expressões como “socializar conhecimento”,
“soluções coletivas”, “problemas locais e globais”, “desenvolvimento regional”, “agentes de
transformação social” deixam transparecer o intensão dessas universidades em se conectar com
a comunidade, resolvendo os problemas oriundos das transformações sociais. A par de sua
natureza comunitária e regional, a UNI1 busca, em sua atuação, assumir o conhecimento como
patrimônio social e a educação como bem público (PDI UNI1, p. 39). Para Vannucchi (2011,
p. 42) a vitalidade de uma universidade autenticamente comunitária “deve ser medida pelo nível
de fidelidade à sua missão. Sem isso, seu perfil identitário se esvai e rui por completo sua
autoconsciência institucional”.
Para que a Universidade possa cumprir com sua função social, “precisa sair de seus
muros e buscar a sua inserção na sociedade mais ampla, analisando, discutindo e equacionando
os diferentes problemas existentes, promovendo, assim, a contextualização da realidade”
(ARAUJO et al., 1998, p. 178). Reafirma um entrevistado por sermos uma instituição
91
comunitária; essa é a nossa diferença; essa é a nossa missão; esse é o nosso compromisso;
esse é o nosso papel social; nossa grande relevância social (R4, 2016). Assim, para Bordigon
(2017), o conhecimento não se dá exclusivamente por fórmulas acadêmicas, mas é fruto das
relações sociais e passa a ser visto como “produção coletiva dos homens que surge de sua
atuação na vida real, por intermédio de suas relações com a natureza, com os outros e com ele
próprio” (ARAUJO et al., 1998, p. 179). Para além de serem essenciais ao indivíduo, os
conhecimentos são essenciais aos processos de condução da vida, à construção das sociedades.
Os saberes e as técnicas precisam ser pertinentes ao bem-estar coletivo e cumprem seu sentido
público na medida em que a sociedade e o Estado buscam efetivar os seus propósitos (DIAS
SOBRINHO, 2015).
Em trabalho intitulado Universidade comunitária: uma identidade em construção Bittar
(1999) já trazia nas vozes de seus entrevistados e em documentos analisados a visão
instrumental do conhecimento. À época já era manifestada a preocupação com a formação
integral do homem, na busca de seu bem-estar físico, social e espiritual, a valorização do
homem crítico e comprometido consigo mesmo e com os outros, o respeito à diversidade, a
percepção de que o homem é um agente de transformação, o interesse na solução de problemas
da comunidade, a organização participativa. Na visão dos entrevistados, “a universidade
comunitária deve ter como missão: a produção e a socialização do conhecimento; o atendimento
às demandas específicas da população que se encontra “distante da universidade” e a agilidade
com que ela atende essas demandas (BITTAR, 1999, p. 137). Assim, as universidades
comunitárias, apesar de quase duas décadas terem se passado, após estudo de Bittar, parecem
sustentar-se em fortes pilares no que tange ao valor instrumental dado ao conhecimento, este
voltado à construção do indivíduo, à coletividade e à justiça social.
Ao se falar em fortes pilares, e fazer referência aos PDIs das universidades comunitárias,
há de se mencionar a presença dos valores que estas instituições apontam do que seja importante
para o cumprimento de sua missão. São eles que norteiam as práticas e determinam a direção
na qual a instituição acredita ser certa e efetiva para seu desenvolvimento. A seguir, apresenta-
se o quadro 7 que ilustra princípios e valores das universidades locus desse estudo.
92
Quadro 7 - Princípios e Valores das Universidades Comunitárias UNIVERSIDADE COMUNITÁRIA
PRINCÍPIOS E VALORES
UNI1
Respeito à pessoa; Responsabilidade social; Qualificação institucional; Prevalência do interesse institucional; Inovação; Inserção local e global; Gestão democrática; Compromisso com o meio ambiente; Autonomia; Sustentabilidade. (PDI 2017-2021, p. 14).
UNI2
Respeito ao pluralismo de ideias; Compromisso social com o desenvolvimento regional e global; Produção e uso da tecnologia a serviço da humanização; Ética no relacionamento; Formação e profissionalização de vanguarda. (PDI 2017-2021, p. 15).
UNI3
Promoção da formação integral do homem; Qualidade educativa Universalidade de campos de conhecimento; Indissociabilidade entre ensino, pesquisa, extensão; Gestão democrática; Responsabilidade Social universitária; Inovação; Sustentabilidade acadêmico-financeira (PDI, 2017-2021, p. 33-47).
UNI4
Excelência na formação integral do cidadão; Universalidade de campos de conhecimento; Flexibilidade de métodos e concepções pedagógicas; Equilíbrio nas dimensões acadêmicas; Inserção na comunidade; Gestão democrática, participativa, transparente e descentralizada; Valorização e capacitação dos profissionais; Compromisso socioambiental; Respeito à biodiversidade, à diversidade étnico-ideológico-cultural e aos valores humanos (PDI 2018-2022, p. 15).
Fonte: Elaborado pela autora a partir dos PDIs da Universidades estudadas
Princípios e Valores também são marcadores da identidade, então, pode-se evidenciar,
nos documentos, traços que definem o(s) papel(eis) dessas instituições no ensino superior ao
perseguirem o “Respeito à pessoa”, a “Promoção da formação integral do homem”, a
“Excelência na formação integral do cidadão”, o “Respeito à biodiversidade, à diversidade
étnico-ideológico-cultural e aos valores humanos”, o “Respeito ao pluralismo de ideias”, a
“Ética no relacionamento”, a “Formação e profissionalização de vanguarda”, a
“Universalidade de campos de conhecimento” e a “Valorização e capacitação dos
profissionais”. Todas essas referências voltam-se à razão da existência dessa instituição
secular: o valor dado à produção do conhecimento. Numa visão holística e plurissignificativa
da formação do homem, os Princípios e Valores elencados, de certa forma, reiteram as palavras
de Chauí (2001, p. 187-188) quando esta afirma que
A universidade é uma instituição social que aspira à universalidade e que tem a sociedade como seu princípio e sua referência normativa e valorativa, a qual se percebe inserida na divisão social e política e busca definir uma universalidade (imaginada ou desejada) que lhe permita responder às contradições impostas por esta divisão.
93
Esta citação conduz ao papel que a universidade deve exercer em termos de produção,
transmissão e armazenamento do conhecimento, ou seja, à sua função. Estes itens são
contemplados pela presença de expressão como “Indissociabilidade entre ensino, pesquisa,
extensão”, “Equilíbrio nas dimensões acadêmicas”, “Produção e uso da tecnologia a serviço
da humanização”, “Inovação”. Esses aspectos serão retomados no item 4.1.2 com maior
profundidade ao abordar a segunda dimensão: a função da universidade.
Ao se extrair das primeiras páginas de seus PDIs a missão, os Princípios e os Valores
defendidos por estas instituições, constata-se que a universidade é uma instituição ímpar, dada
a alta densidade de capacidade de administração, criação e disseminação de conhecimento
(ESCRIGAS; LOBERA, 2009, p. 7). Sua missão vincula-se a objetivos nobres, e o papel
desempenhado por essas instituições de ensino e pesquisa com compromisso social tende a
seguir o caminho oposto a uma organização de caráter essencialmente empresarial. Portanto,
como mencionam Bertolin e Dalmolin (2014, p. 141), “a missão de uma universidade é muito
mais ampla do que o objeto econômico, abrange notadamente as dimensões sociais, culturais e
ambientais que, em muitos momentos, conflitam com a lógica do mercado”.
A tríade Missão-Visão-Valores nasce nas organizações a partir de observações do
ambiente organizacional, bem como de reuniões de caráter estratégico que delimitam o ponto
de chegada e os recursos que serão utilizados para tal finalidade. Essa tríade compõe a
identidade de uma organização social. Se a missão se refere ao que a organização faz e a sua
razão de existência, a visão, assemelhando-se a uma meta, em sentido de maior alcance, evoca
o lugar aonde ela pretende chegar. Entretanto, metas são para ser cumpridas em prazos
determinados, as visões são para serem perseguidas com persistência por todas as pessoas que
corporificam a organização (SCORSOLINI-COMIN, 2012). No contexto organizacional, a
visão apresenta-se na parte do Planejamento Estratégico em que define o que espera ser/realizar,
orientando os colaboradores para o futuro, porém não se distanciando da realidade. Visão
sempre é um elemento de futuro, algo ainda a ser realizado. Em seus PDIs, as universidades
comunitárias da amostra também explicitam sua Visão, quais sejam:
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Quadro 8 - Visão das Universidades Comunitárias Estudadas UNIVERSIDADE COMUNITÁRIA
VISÃO
UNI1
Ser indispensável para o desenvolvimento sustentado no conhecimento. (PDI 2017-2021, p. 13).
UNI2
Consolidar-se como universidade comunitária regional, pública não estatal, de excelência, por meio do reconhecimento de sua qualidade, valores acadêmicos, seu compromisso social e suas ações inovadoras e sustentáveis. (PDI 2017-2021, p.68).
UNI3
Ser reconhecida como Universidade de excelência na atividade de ensino, no desenvolvimento e divulgação de pesquisas e na gestão criativa e empreendedora de projetos sociais. (PDI 2017-2021, p. 38).
UNI4
Ser reconhecida como uma Universidade Comunitária, de excelência na formação profissional e ética do cidadão, na produção de conhecimentos científicos e tecnológicos, com compromisso socioambiental. (PDI 2018-2022, p. 14).
Fonte: Elaborado pela autora a partir dos PDIs da Universidades estudadas
A leitura atenta do texto que expressa a Visão do que essas universidades desejam ser
ou fazer, observa-se uma grande recorrência ao uso de expressões como “Consolidar-se/ ser
reconhecida como “Universidade Comunitária”, “Universidade Comunitária regional”,
“pública não estatal”. “Esses termos reiteram pontos centrais da gênese identitária dessas
instituições: ser comunitária, regional, pública não estatal. Ou seja, trata-se de iniciativas da
sociedade civil, sem fins lucrativos, cuja lógica se apoia na vida da comunidade e que
“nasceram como expressões de vozes e vontades que querem se fazer ouvir e participar da
construção de um espaço de educação, socialmente mais amplo e democrático” (FRANTZ,
2018, p. 2).
Repetidas vezes também aparece a expressão “excelência”: Esse termo está explícito
na Visão da UNI2, UNI3 e UNI4. Mas excelência em quê? “na atividade de ensino”, “no
desenvolvimento e divulgação de pesquisas e na gestão criativa e empreendedora de projetos
sociais”, “na produção de conhecimentos científicos e tecnológicos”, “na formação
profissional e ética do cidadão”. Termos como “ensino”, “pesquisa”, “projetos sociais”
conduzem ao tripé ensino, pesquisa e extensão, que, neste caso, não se restringe apenas a uma
questão conceitual ou legislativa, mas, substancialmente, epistemológica, paradigmática e
político-pedagógica (CESAR, 2013). Ou seja, as visões definidas reiteram o papel fundamental
da universidade na produção, armazenamento e transmissão do conhecimento e seu
envolvimento com a sociedade. Mas o que é ser reconhecida como “Universidade Comunitária
de excelência”? A indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão é um dos parâmetros
tomado como referência do padrão de qualidade acadêmica nessas instituições. Ao ser
95
questionado qual ou quais motivos levariam um estudante procurar a UNI1, R1 respondeu
É evidentemente pela qualidade da instituição. [...] Qualidade dos cursos, estudar em um universo universitário que tem possibilidades de interação por muitas áreas. Há possibilidade de fazer pesquisa, se tornar um pesquisador e isso é um diferencial, [...] do universo acadêmico mais amplo. Acho que são ainda diferenciais que nós possuímos, todo o ambiente e estrutura que nós temos, estrutura e laboratórios. Todo o convívio, todos os espaços que o aluno encontra aqui (R1, 2016).
O respondente R4 comenta: Eles escolhem a nossa universidade por ser uma
universidade [...] pela qualidade das nossas atividades, dos nossos cursos de graduação, pela
história de qualidade que nós temos na instituição. Nós temos um nome, uma marca bastante
forte aqui nessa região. Em suas vozes, os gestores reconhecem o potencial de suas instituições
e argumentam em prol da qualidade oferecida.
Ainda em seus PDIs, a presença da expressão “excelência” é marcante. Ao se referir às
suas Linhas estratégicas, Objetivos e Metas, a UNI2 declara
A linha estratégica Excelência acadêmica e pedagogia universitária se consubstancia, especialmente, na observância da missão institucional e na atenção aos valores acadêmicos históricos. Uma instituição comunitária, para além da coerência com a ideia de universidade, que possui compromisso e responsabilidade social, mas que também é engajada no desafio de desenvolvimento socioeconômico e cultural de sua região de abrangência, deve priorizar, permanentemente, a busca pela qualidade nos processos de produção e transmissão do conhecimento (PDI 2017-2021, p. 64).
Interessante observar que a busca pela excelência na qualidade nos processos de
produção e transmissão do conhecimento nunca perde de vista o propósito central da instituição,
ou seja, sua missão e suas origens. O alinhamento e uniformização na forma de registrar os
objetivos da instituição, suas metas e atitudes são imprescindíveis quando se fala em qualidade.
Com o intuito de atingir a “excelência” naquilo que oferta, muitos objetivos e metas são
propostos nos PDIs, expressos por verbos como qualificar, consolidar, fortalecer, ampliar,
melhorar, elevar, investir, aprimorar, promover, desenvolver, modernizar, fortalecer, cujo
campo semântico fortalece o caminho da qualidade. Leite (2005, p. 9) pergunta: Quem decide
qual é o marco da excelência ou da qualidade de uma universidade? A qualidade da
universidade poderia ser compreendida no seu marco institucional, quando esta é o que diz ser
e faz (oferece) o que promete; poderia ser compreendida na visão dos estudantes e seus pais,
quando obtêm o que dela esperam para sua formação; e poderia ser compreendida na visão da
96
sociedade, quando esta encontra ressonância na instituição. Para a autora, a qualidade não é
algo abstrato: o padrão de qualidade pode atingir o nível de excelência definido e desejado por
ela própria e sua comunidade. A qualidade “Não é atribuída por um Ranking, por uma nota ou
conceito, seja ela proveniente da avaliação que for” (LEITE, 2005, p. 9). Eis que em seu
depoimento R4 declara
Se vêm agora avaliações externas e nos identificam e nos mostram que nós estamos tendo esses indicadores, inclusive em âmbito nacional, nós não fizemos para dar respostas pra eles. Nós fizemos para dar resposta à comunidade. É à comunidade que devemos o nosso respeito, nossa admiração e nosso trabalho, nosso envolvimento. Então, isso hoje está muito claro para nós (R4, 2016).
O gestor é enfático ao demonstrar a quem se dirige o trabalho da universidade. Acredita
na qualidade dos serviços que presta à comunidade e entende que os indicadores avaliativos
institucionalizados apenas fazem parte do processo das políticas públicas. O que importa
mesmo é o “respeito”, a “admiração”, o “envolvimento” com a comunidade, concretizados pelo
trabalho que realiza com dedicação e pela qualidade do que oferece à comunidade. Para Leite
(2005, p. 9) a qualidade de uma instituição “pode, e deve, ser definida por aqueles sujeitos que
a fazem ser do jeito que ela é, que lhe dão uma cara, que podem definir seu perfil e o seu papel.”
Essa declaração conduz a refletir sobre identidade. Dutton e Dukerich (1991, apud
NOGUEIRA, 2010, p. 131) afirmam que o conceito de identidade organizacional (o que se crê
ser central, distintivo e duradouro) e o conceito de imagem externa construída (o que se crê que
seja a percepção dos não integrantes a respeito da organização) “influenciam a conexão
cognitiva que os indivíduos mantêm com ela e os tipos de comportamento que adotam.” Ou
seja, segundo esses autores “quando os autoconceitos contêm os mesmos atributos da
identidade organizacional ocorre a conexão cognitiva denominada identificação”. Nesse
sentido, R4 identifica-se com os atributos que a universidade possui e àquilo que ela se propõe
a oferecer, isto é, “seu autoconceito possui muitas das mesmas características que crê definam
a organização como um grupo social” (DUTTON; DUKERICH, 1991, apud NOGUEIRA,
2010, p. 131). Assim, uma vez tendo identificação positiva com os atributos da universidade,
R4 tende a ressaltá-los em atitudes e sentimentos pessoais.
Há de se fazer menção aos verbos utilizados para apresentar a Visão “Ser reconhecida”,
“Consolidar-se”, “Ser indispensável”, eles indiciam “o quanto ainda se pode e se deve crescer
ou, em outras palavras, o quanto ainda se deve trabalhar para atingir aquilo que se pretende,
objetivamente ou não” (SCORSOLINI-COMIN, 2012, p. 330). Como afirmado anteriormente,
97
a visão se diferencia de uma meta na medida em que não se delimita em termos temporais.
Trata-se de uma intenção que deve ser fortemente incorporada ao trabalho e perseguida por
todos os membros da organização.
Observa-se que alguns Princípios e Valores vinculam-se à interação, traço que é
requisitado pelas instituições comunitárias como lhes sendo o grande diferencial identitário em
sua gênese e atuação. Termos como “Compromisso social com o desenvolvimento regional e
global”, “Inserção local e global”, “Responsabilidade Social universitária”, “Inserção na
comunidade” e “Compromisso socioambiental” “Autonomia”, “Sustentabilidade acadêmico-
financeira”, “Gestão democrática participativa, transparente e descentralizada” reafirmam a
missão dessas instituições, a qual só parece ter legitimidade “na medida em que envolve um
verdadeiro compromisso com as reais necessidades e aspirações da população docente, discente
e comunitária a quem deve servir em múltiplas instâncias” (SANTOS, 2016, p. 212). Afirma
um dos gestores: Ela (a universidade comunitária) tem que estar voltada para o mundo. Ela
tem que ter um processo de interação global no sentido internacional. Conhecimento ele se
produz em todos os cantos do mundo, mas ela tem que trazer para onde ela está inserida de
fato, para que ela possa contribuir com a região (R1, 2016). Ao mesmo tempo em que se atrela
aos interesses da Nação também atende às necessidades regionais, as quais são bastante
complexas e importantes para a geração de novos saberes, “úteis para o progresso social,
político, econômico, ético, moral e cultural de todos os sujeitos sociais” (SANTOS, 2016, p.
212).
A análise da Missão, da Visão e dos Valores das universidades comunitárias em questão,
permitiu identificar semelhanças no modo de construir esses aspectos, até uma certa
uniformização do dizer, com exceção da UNI1 que apresenta uma forma de demonstrar a Visão
mais concisa, qual seja “Ser indispensável para o desenvolvimento sustentado no
conhecimento.” De modo bastante abrangente é colocado o suporte a ser perseguido pela
instituição “desenvolvimento sustentado no conhecimento”, há que se inferir daí o papel
intrínseco à universidade, ou seja, sua atuação imprescindível nas mudanças decorrentes do
conhecimento na sociedade. Essa interpretação vai ao encontro da Visão da UNI2, UNI3 e
UNI4.
Ao buscar definir sua Missão, sua Visão e seus Valores, essas instituições deixam
transparecer alguns elementos constituintes de sua identidade organizacional. Sua descrição e
entrelaçamento servem de parâmetros os quais indicam as áreas, as atividades, os programas, a
região, os públicos-alvo, os parceiros nos quais a instituição deve concentrar-se, o que se
configura um grande desafio para essas universidades, considerando os processos de
98
mercantilização e desagregação por que passa a educação mundial (MCCOWAN, 2016; 2018).
Mas, antes de mais nada, cabe alertar que esses conceitos não são impessoais ou simplesmente
técnicos (FERREIRA, 2016; SCORSOLINI-COMIN, 2012; FLORES, 2005), eles estão
conectados às pessoas que tratam com eles, refletindo suas aspirações, expectativas,
motivações, vontades e caminho de vida de cada uma delas.
Mas......
Apesar de estarem conscientes de sua razão de existir, não estariam as universidades
comunitárias sofrendo uma erosão em sua missão em virtude das mudanças por que passa o
mundo em suas bases econômico-sociais? Não estaria o conhecimento sendo produzido mais
pelo critério de valor utilitário que pelo significado humano formativo?
Dias Sobrinho (2005, p. 169) ao fazer algumas reflexões sobre o conhecimento, afirma
que “grande parte do controle social é feita mediante o controle do conhecimento, em suas
dimensões de produção, distribuição e consumo.” Quem controla o conhecimento? Quem
produz e distribui? Quem o consome? Num mundo cada vez mais concorrencial, o
conhecimento e a capacidade de aprender e de aplicar passaram a ser moeda de troca e
potencializaram a competitividade global. Assim, a educação superior adquiriu enorme
importância como produtora de fontes de riqueza, geradora e disseminadora de conhecimentos,
principalmente, como insumo econômico de relevância estratégica para alimentar a
competitividade dos indivíduos e das empresas. Como reflexo, a educação superior teria
diminuído a sua autonomia de pensamento, capacidade crítica e de compreensão global da
história humana, abdicando, desse modo, de sua função de intermediação entre o indivíduo, a
sociedade civil e o Estado (DIAS SOBRINHO, 2005). Para Dias Sobrinho (2005, p. 167) “as
universidades de hoje perderam muito da utopia social dos anos de 1960 e de 1970, que lhes
atribuía um papel central na democratização das sociedades e na diminuição das
desigualdades.” Será que estaria aí um dos grandes dilemas das universidades comunitárias?
Para Frantz (2006) a universidade deve incorporar todas as dimensões da vida, deve ser
um lugar onde o homem possa cultivar a memória da humanidade, bem como a capacidade de
olhar criticamente a sua atuação. Para o autor, “cabe à universidade interpretar o mundo, o seu
movimento; cabe a ela produzir conhecimento a respeito das consequências desse movimento”
(FRANTZ, 2006, p. 124). Entendidas como construções históricas e políticas, as universidades
incorporam em seu conceito a complexidade das práticas e das ideias da sociedade, extraídas
da dinâmica da realidade social que, por si só, são contraditórias.
Sendo, portanto, complexa em seus sentidos e significados históricos, a universidade
não pode se submeter aos interesses do mercado, como se fosse um negócio, deixando-se
99
conduzir por visões simplistas e utilitaristas ou servindo como mero instrumento de políticas
de governos. Em favor da superação dessas contradições, a universidade, pelas funções que
exerce por meio do ensino, da pesquisa e da extensão é um campo de luta contra o desequilíbrio
social que ameaça a humanidade (FRANTZ, 2006). Reiterando esse conceito, um dos gestores
comenta
É, temos aqui na região instituições com ações em bolsa de valores, a base está nos Estados Unidos. Então, o resultado disso vai para um fundo de investimento. Quem investe nas ações quer resultados. Depois são vendidas e assim por diante. O resultado é o lucro. O papel nosso é totalmente diferente em relação a isso, por isso comunitária. O termo comunitário é que o resultado fica aqui, daquilo que se propõe, daquilo que se gera, daquilo que se vislumbra, daquilo que se busca lá fora, mas se traz para a comunidade (R1, 2016).
Observa-se a preocupação por parte do gestor em permanecer fiel a um dos propósitos
da instituição. Para R1 o papel da universidade comunitária vai além de colocar ações na bolsa
de valores e ter como resultado o lucro. Seu compromisso é com a comunidade. Reafirma o
significado do termo que a instituição carrega em seu nome “comunitária”. Ao tecer
considerações sobre as noções de público, comunitário e privado, Schmidt declara
Comunitário deriva do latim communis (comum) e communitas (comunidade. Comunidade designa a forma de vida social caracterizada por relações personalizadas, de coesão social, de compromisso moral e de continuidade no tempo, distinta das formas marcadas pela impessoalidade, anonimato e contratualidade. [...] Comunitário diz respeito ao que é comum a um coletivo ou a um público; é o terreno do bem comum (SCHMIDT, 2017, p. 77).
Ao descrever os traços identitários dessas instituições, Vannucchi (2011, p. 50)
complementa que a comunitária “não possui finalidade econômica, não busca a remuneração
do capital investido, não distribui dividendos, não tem outro proprietário senão a própria
comunidade [...]”. Este extrato, retirado da fala de R4, é comprovação disso:
Por nossa característica comunitária, e só uma comunitária poderia fazer isso: nós, ao invés de fechar os cursos de licenciatura, negociamos com todos os cursos da universidade. [...] Nossos cursos de licenciatura estavam com um pingo de alunos pagantes. Nós argumentamos que era fundamental manter as licenciaturas. Elas foram responsáveis pela criação, aqui, da instituição mesmo, pela formação dos professores. É preciso garantir boa formação para que os alunos depois também tenham um bom nível na universidade. Porque tudo isso tem uma relação, não tem como separar essa conexão (R4, 2016).
100
Parecendo compartilhar de dilema semelhante, comenta R1
Nós temos a compreensão do qual é o papel da universidade, do que ela de fato faz, quando, por exemplo, mantém as licenciaturas, em nome de uma causa que muitas vezes não é percebida, porque na lógica empresarial é assim “Ah, tá dando prejuízo, então fecha. Pronto!”. Se fôssemos buscar só resultados, nós fecharíamos metade dos cursos. Mas, aí, vai fazer o quê com o resultado? Investir neles próprios? Os resultados estão a serviço de uma causa maior, que é a formação de professores, formar recursos para todas as áreas e não só aquelas que dão resultado. Então, essa percepção do papel da universidade é uma das maiores dificuldades que nós enfrentamos (R1, 2016).
Mais do que ilustrativos, os depoimentos de R4 e R1 trazem a essência do que é ser
comunitário, denominação que as universidades em estudo carregam como marca de sua
identidade. Seus gestores entendem que os conhecimentos produzidos nas humanidades, apesar
de não ter valor imediato de mercado, merecem atenção e são de interesse público, daí a decisão
de assumir a permanência dos cursos de licenciatura, mesmo sendo estes deficitários, dividindo
o ônus com toda a instituição. Essa forma de proceder se distancia do entendimento de que
somente os conhecimentos “úteis” e aplicáveis, conectados à indústria e ao comércio, são
motores de desenvolvimento e, portanto, merecem prestígio e financiamento (ALTBACH,
2008). A compreensão de que a pesquisa em humanidades é importante propulsora na formação
de profissionais qualificados e cidadãos responsáveis impacta na construção do conhecimento
como bem comum e coletivo. Assim é, que se materializa o conceito de comunitário.
Para Chauí (2003a), a universidade é uma instituição social e como tal convive com a
presença de opiniões, atitudes e projetos conflitantes que exprimem as contradições da
sociedade. Como instituição social aspira à universalidade, ou seja, tem a sociedade como seu
princípio e sua referência normativa e valorativa. A relação entre a universidade e a sociedade
é que explica o seu surgimento. A instituição se percebe inserida na vida social e política e
busca definir uma universalidade que lhe permita responder às contradições, impostas pela
realidade. Há o reconhecimento público de sua legitimidade e de suas atribuições o que lhe
confere autonomia preconizada por normas e valores próprios.
Nas últimas décadas, contudo, a universidade vem remodelando sua identidade,
adaptando-se às transformações do mundo, deixando de ser, nesse processo, uma instituição
social para ser uma organização social. A reforma do Estado realizada nos últimos governos,
designando a educação como um setor de serviços não exclusivos do Estado, fez com que ela
deixasse de ser concebida como um direito e passasse a ser considerada um serviço, deixasse
de ser um serviço público e passasse a ser um serviço que pode ser privado ou privatizado. Uma
101
organização social define-se por uma prática social determinada por conjunto de meios
administrativos para obtenção de um objetivo particular, sendo regida pelas ideias de gestão,
planejamento, previsão, controle e êxito. Uma organização social não discute ou questiona sua
existência, seu lugar no interior das lutas de classe. O que para a instituição social universitária
é fundamental, para a organização não passa de um dado de fato. “Seu alvo não é responder às
contradições, mas vencer a competição com seus supostos iguais” (CHAUÍ, 2003a, p. 6). Diante
das palavras de Chauí, há de se perguntar: estariam as universidades comunitárias sofrendo os
impactos das transformações mundiais a ponto de “perderem” sua identidade como instituições
sociais voltadas ao bem comum? Estariam as universidades comunitárias sendo pressionadas a
estabelecer uma mera conexão linear entre conhecimento e progresso, descartando seus
objetivos humanísticos e culturais? Longe de permanecerem imunes às mudanças da realidade,
as universidades comunitárias vêm enfrentando, sim, algumas tensões, o que provoca certa
instabilidade e incertezas quanto à sua razão de existir.
Apesar de tudo, há de se destacar o crescimento que a universidade brasileira teve ao
longo de sua existência, principalmente, nos últimos cinquenta anos. Os dados são
significativos em relação ao número de cursos de graduação, da qualificação docente em nível
de mestrado e doutorado, aos cursos de pós-graduação, aos grupos de pesquisa, a expansão para
o interior do estado. Contudo, a avalanche neoliberal na economia, na reforma do Estado e na
concepção do conhecimento e do ensino superior como bem privado, quase-mercadoria
passaram a condicionar uma nova configuração de universidade em nosso país. O descontrolado
processo de expansão da universidade privada, em especial a com fins lucrativos; o aumento da
diferenciação institucional e a adoção de modelos gerenciais ou empresariais de administração
universitária e a retirada do Estado da manutenção do setor educacional, são apenas algumas
decorrências das profundas mudanças na economia pós-fordista e na organização do Estado
pós-moderno. (CHAUÍ, 2001; DOURADO, 2002; CUNHA, 2004; SGUISSARDI, 2006).
Tal política vem negligenciando o papel social da educação superior como espaço de
investigação, discussão e difusão de projetos que têm como norte a garantia dos direitos sociais,
resultando num intenso processo de massificação e privatização da educação superior no Brasil.
Orquestrados pela redução significativa de insumos financeiros destinados à educação,
instrumentos legais como a LDB e o PNE estimulam um sistema nacional de avaliação que
conduz as IES
à condição de instituições operacionais por meio de testes estandardizados que metamorfoseiam as instituições, alteram a lógica do trabalho acadêmico,
102
redirecionam a estrutura e os projetos acadêmicos, balizados por políticas de gerenciamento cartorial, ao sabor das exigências do mercado, naturalizando, desse modo, a privatização do ensino superior (DOURADO, 2002, p. 246).
A educação, assim, passa a ser vista pelos setores hegemônicos da economia e da
política como um poderoso provedor das competências e habilidades exigidas pela demanda de
produção e de trabalho requeridas pelo mercado e, do valor social, migra-se para o valor
comercial. O conhecimento vai perdendo paulatinamente “sua histórica densidade de
significação humana associada à liberdade, à emancipação pessoal e ao bem coletivo, e mais e
mais é subsumido pela ideologia do interesse individual e do lucro ilimitado” (DIAS
SOBRINHO, 2015, p. 589). A universidade fragiliza a sua função social ao deixar de ser um
“lugar institucional privilegiado de elaboração de uma cultura comum que integra nela mesma
o debate e a reflexão, e sem a qual a ideia mesma de um espaço público político ficaria vã”
(FREITAG, 1995, p. 33).
Nesse cenário, organismos internacionais passaram a atuar como importantes
interlocutores multilaterais nas políticas educacionais no Brasil. A partir da década de 1980, o
Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), as agências da Organização das Nações
Unidas (ONU) e, especialmente, o Banco Mundial revigoraram a sua atuação no país e
difundiram, em seus documentos, novas orientações para a articulação entre educação e
produção do conhecimento, por meio do binômio privatização e mercantilização da educação.
Entre as ações podem ser citadas a redução do papel do Estado, com ênfase no ensino privado;
expansão, descentralização, diversificação e flexibilização do Sistema de Educação Superior
(SES), avaliação da ES ancorada em conceitos de qualidade isomórficos e orientados para a
tomada de decisão e o controle de qualidade (MOROSINI; FRANCO, 2006; CUNHA, 2007).
Nos anos 1990, por meio de vários processos, mas, principalmente da reforma do
Estado, a gestão de Fernando Henrique Cardoso reorienta as políticas públicas educacionais,
promovendo alterações substanciais nos padrões de intervenção estatal, as quais alinham-se em
total consonância aos organismos multilaterais. Tais ações expressam-se no processo que
resultou na aprovação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9.394/96)
(MINTO, 2005; DOURADO, 2002). A nova Lei reconhecia a possibilidade de lucro para as
instituições privadas de ensino, principalmente, particulares, no sentido estrito, por oposição às
instituições sem fins lucrativos (comunitárias, confessionais e filantrópicas (CUNHA, 2007).
Na composição desse cenário em que se considera a universidade uma instituição cuja
responsabilidade social não pode ser negligenciada e onde a geração de conhecimento deve ser
compartilhada a fim de promover o bem público, encontra-se, na contramão, a promoção de
103
políticas públicas nacional e internacional para o ensino superior que descaracterizam as
funções primárias da universidade, ou seja, o ensino, a pesquisa e a extensão. Descrever, mesmo
que de modo sintético, alguns ingredientes que compõem o cenário de incertezas no qual se
encontram as universidades, especialmente, as universidades comunitárias, pode, de algum
modo, ajudar a compreender um pouco os dilemas por que passam as universidades em geral
e, em particular as universidades comunitárias.
Para Frantz (2006, p. 120) “a universidade deve ser um campo de luta, pela função do
ensino, da pesquisa e da extensão, em favor da superação dessas contradições”. Ao reconhecer
que as novas estruturas de produção e trabalho se transformam e carregam consigo inseguranças
e necessidades de atualização permanente, as universidades comunitárias sentem-se
pressionadas a reinventar sua forma de administrar complexas dimensões culturais, políticas,
sociais, de forma a não perder de vista suas funções primordiais, não reduzindo sua existência
a simples operação de funções técnicas. Porém, ao considerar os ingredientes que compõem a
sua anatomia, quais sejam valor, função e interação, observa-se que essas instituições vêm
sendo influenciadas por dois grandes processos: a comoditização (Commodification) e a
desagregação (Unbundling) (MCCOWAN, 2016).
A comoditização diz respeito ao processo de conversão de serviços ou produtos em
insumos lucrativos. Neste caso, o conhecimento, que antes era livremente transmitido e
adquirido por meio de atividades de ensino, pesquisa e extensão, passa a ser organizado,
embalado e disponibilizado com o objetivo de gerar renda e lucratividade (McCowan, 2016).
A desagregação corresponderia ao processo pelo qual “os produtos anteriormente vendidos em
conjunto são separados em suas partes constituintes” (McCowan, 2018, p. 464), ou seja, é o
processo de separação das funções da universidade em unidades individuais ou conjunto de
produtos vendidos como pacotes. Para o autor, esses dois processos são resultado do surgimento
de atividades empresariais em instituições de ensino superior, bem como a busca por redução
de custos e maximização dos lucros (MCCOWAN, 2016).
Assim, parece que os termos comoditização e mercantilização podem ser tomados como
sinônimos, uma vez que
Por mercantilização do ensino superior designa-se ao processo em que o desenvolvimento dos fins e dos meios do ensino superior, tanto no âmbito estatal como no privado, sofre uma reorientação de acordo com os princípios e a lógica do mercado e sob a qual o ensino superior progressivamente perde o estatuto de bem público e assume a condição de serviço privado e comercial (LANGA, 2012, p. 28).
104
Ao perder o estatuto de bem público e assumir a condição de serviço comercial, a
mercantilização estabelece uma relação com o mercado em que prevalece o princípio da
competição. Neste sentido, o sistema de ensino superior é reestruturado em função da lógica da
competição nesse mercado (LANGA, 2012; MAMDANI, 2007; HARBOUR, 2006) e o valor
(um dos ingredientes que definem a anatomia das universidades) assume características
instrumentais, mas, diferentemente daquele em que o conhecimento produzido e transmitido se
volta à construção do indivíduo, à coletividade e à justiça social, este passa a atender à demanda
de um cliente externo, o qual esperará receber os benefícios decorrentes de seus investimentos,
direcionando suas compras aos itens que lhe trouxer maior dividendos. Numa ilusão de ótica,
parecerá que as atividades desenvolvidas na universidade e o mercado estão sintonizados na
busca de soluções para as necessidades da sociedade, porém, a oferta não está orquestrada pela
necessidade, mas pela demanda, esta, por sua vez, depende do poder de compra. Assim,
Passamos, portanto, de uma noção de valor instrumental para uma de valor de troca. O conhecimento nessa concepção é valorizado não pelos benefícios que pode trazer diretamente, mas pelo valor que pode obter no mercado e que pode ser usado para comprar outros bens desejados. A universidade, por sua vez, é incentivada a criar e disseminar não os tipos de conhecimento que trarão maior benefício para a sociedade, mas aqueles que trarão a maior receita em relação ao custo9 (MCCOWAN, 2016, p. 515, tradução nossa).
Considerando-se que a informação e o conhecimento são, na atualidade, os mais
importantes insumos do paradigma produtivo, alguns dados merecem relevância. No cenário
mundial, os países agrupados na Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento
Econômico (OCDE) respondem por 60% da produção mundial, 80% dos recursos econômicos
e 95% das tecnologias e produção científica. Esses números demonstram que, apenas 150
milhões, dos seis bilhões de habitantes participam de atividades científicas, concentrando-se
90% nos sete países mais industrializados (DIAS SOBRINHO, 2005). O que isso significa? “A
divisão internacional entre os que produzem e controlam o uso dos conhecimentos e, na outra
ponta, aqueles que não têm meios para produzir conhecimentos e muito menos podem receber
seus benefícios” (DIAS SOBRINHO, 2005, p. 165). Isso implica dizer que aqueles que têm o
poder do conhecimento como capital de base, também têm o poder de criar leis que garantam a
proteção de sua posse e seus benefícios. Indo além, “têm também a competência de definir
9 We move, therefore, from a notion of instrumental value to one of exchange value. Knowledge in this conception is valued not for the benefits that it can bring directly, but for the value that it can obtain on the market, and which can be used to purchase other desired goods. The university in turn is incentivised to create and disseminate not the kinds of knowledge that will bring the greatest benefit to society, but those which will bring the greatest revenue in relation to cost (MCCOWAN, 2016, p. 515).
105
quais são os conhecimentos que têm valor – especialmente no sentido de valor de mercado”
(DIAS SOBRINHO, 2005, p. 165).
No Brasil, como já foi mencionado, foi a partir da década de 1990 que o sistema de
ensino superior começou a vivenciar uma grande transformação no que tange às opções para os
cidadãos clientes-consumidores no campo acadêmico-universitário O cenário das universidades
viu-se consideravelmente alterado com a entrada das universidades particulares e/ou mercantis
geridas como empresas educacionais, com explícitos fins lucrativos, as quais ofereciam
produtos e serviços de acordo com a demanda do mercado (CALDERÓN, 2000).
Durham (2003), em estudo realizado sobre O ensino Superior no Brasil: público e
privado apresenta dados relativos ao crescimento de instituições de ensino superior públicas e
privadas no Brasil entre os anos de 1970 e 2000. As instituições privadas de ensino superior
haviam se tornado, de fato, um grande negócio. A lucratividade dos empreendimentos atraiu
um novo conjunto de empresários, sem compromissos anteriores com a educação. Há um
crescimento vertiginoso de instituições que passam a oferecer ensino superior, em 1970 as
instituições privadas somavam 478; já em 2000, passaram a somar 1004. O setor privado passou
a ser governado pelo mercado. A expansão deste segmento do setor privado chamado de
empresarial se orientou para a satisfação imediata da demanda social, ou seja, na obtenção do
diploma. Esta tendência é reforçada na sociedade brasileira, que associa diploma de ensino
superior ao acesso a uma profissão regulamentada e assegura a seus portadores certos
privilégios no mercado de trabalho (DURHAM, 2003). Neste contexto, a preocupação reside
na qualidade da formação oferecida por esses estabelecimentos que têm como motivação o
lucro, tornando a educação e, consequentemente, o conhecimento como mera mercadoria de
troca.
Dias Sobrinho (2013), alerta para uma diferença fundamental entre educação-bem
público e educação-mercadoria. Por educação-bem público entende-se a busca pelo
aprofundamento do bem comum, considerando valores como equidade, igualdade democrática
e social; já, por educação-mercadoria entende-se aquela que prioriza o desenvolvimento de uma
sociedade competitiva e individualista, com seu foco no lucro do empresário. A busca por
resultado econômico também é próprio das empresas estatais e das entidades não
governamentais, assim, o que distingue o setor privado não é a busca pelo lucro, mas a
“apropriação individual ou particular do lucro, ou seja, o usufruto do resultado produzido pela
empresa por parte do proprietário”. Isso significa dizer que o crescimento da educação no setor
privado no país permitiu a apropriação do lucro para fins pessoais, e que o dono da empresa
desfrutasse de seus ganhos da forma que preferisse, até arriscando seu capital em novos
106
empreendimentos e bolsas de valores (SCHMIDT, 2017). Essa atitude se afasta
consideravelmente de ações cujo fortalecimento é essencial para a democracia. Rumo contrário
tomam as universidades comunitárias, as quais visam a prestação de educação de qualidade a
todos e, cujos recursos obtidos destinam-se à manutenção e qualificação dos serviços prestados.
Quanto à gestão dos recursos econômicos, seguem-se as seguintes premissas:
(i) em existindo superávit, todo ele é reinvestido na própria instituição; (ii) não há nenhuma distribuição de qualquer parcela do seu patrimônio ou de suas rendas, ou seja, não há qualquer apropriação privada de excedentes gerados; (iii) os dirigentes não recebem qualquer recompensa ou bonificação econômica por resultados positivos alcançados (SCHMIDT, 2017, p. 49).
Nesses aspectos, essas instituições se assemelham às públicas e não às instituições
privadas. Há um tratamento isomórfico a todos os cidadãos na prestação de serviços. Não há
privilégios. Todos os membros da comunidade acadêmica têm iguais direitos.
Há décadas, a defesa da educação superior como bem público vem sofrendo severos
golpes. Várias estratégias de reforma da educação superior com o objetivo principal de diminuir
a responsabilidade e a participação do financiamento público e alimentar a expansão das
empresas privadas mercantilistas foram formuladas e colocadas em prática com apoio
ideológico e financeiro de organismos multilaterais. Argumentos como: universidades são
inoperantes, corporativistas, onerosas, não atendem às necessidades da indústria e da sociedade
ecoam nas vozes dos defensores da privatização e da mercantilização, com a anuência dos
governos.
Ao se referir às universidades comunitárias Bertolin e Dalmolin (2014, p. 152)
comentam que “o contexto de transformações e mercantilização demanda às universidades
comunitárias mudanças no sentido do desenvolvimento de uma boa governança, mais efetiva e
ágil, que viabilize a qualidade acadêmica sem comprometer a sustentabilidade econômica.” No
entanto, como alertam os autores, essas mudanças exigem profunda reflexão sobre as
características que regem a lógica do mercado na educação superior, principalmente, no que
tange às universidades comunitárias, cuja concepção de educação como bem público faz parte
de sua história e de seus valores acadêmicos, o que a coloca na contramão da lógica do mercado
(BERTOLIN; DALMOLIN, 2014). Os desafios que os sistemas educacionais enfrentam devem
buscar soluções inovadoras e sustentáveis baseadas no princípio do desenvolvimento pleno do
ser humano (LOCATELLI, 2017).
Apesar de não estar isenta de contradições, uma sociedade que cultiva os valores sociais
e se mobiliza em torno do bem comum tende a ser mais coesa e fortalecida. Há de se reconhecer,
107
então, o importante papel das instituições de nível superior na formação humana ao pensar o
conhecimento e a sua influência na construção do viver bem em sociedade. Como princípio,
em sua concepção de universidade comunitária, está intrínseca a noção de bem comum. Como
função, volta-se para o bem público. Cabe salientar que já em sua denominação, a opção pelo
termo comunitário tem significado histórico e “contém a noção de identidade, de
responsabilidade coletiva e de cooperação” (FRANTZ, 2006, p. 151). Engloba também
experiência histórica de organização dos espaços econômicos, sociais, culturais, principalmente
dos espaços da educação na formação de uma sociedade que prioriza o bem comum (FRANTZ,
2006). Isso conduz ao entendimento de uma instituição que concebe a educação como bem
público e oferece os seus serviços para o bem público (LOCATELLI, 2017).
Uma universidade não está fora, separada, mas está dentro da tessitura complexa e
contraditória da sociedade. Nada, neste tempo, pode ser pensado sem que sejam levadas em
conta as características atuais da globalização e a mercantilização do conhecimento,
características estas retratadas e materializadas nas visíveis transformações no sistema de
educação superior brasileiro. Este cenário reforça a tese da negação do conhecimento como
bem público e de sua afirmação como bem de consumo. Mas, ao se refletir sobre o valor dado
ao conhecimento pelas instituições de ensino superior, especificamente, as universidades
comunitárias, e os possíveis dilemas “existenciais” e identitários que estas enfrentam nesse
universo, há de se considerar uma atitude/identidade de resistência às mudanças provocadas
pela globalização. Ao resgatar os elementos integrantes da construção da identidade dessas
universidades, talvez se possa inferir que na forte presença da memória coletiva, na origem
desta “comunidade”, “criada por atores em situações desvalorizadas que procurariam resistir
para sobreviverem, com base em princípios diferentes ou mesmo opostos aos princípios das
instituições da sociedade” (CASTELLS, 1999 apud FERNANDES; MARQUES; CARRIERI,
2010, p. 45), estaria o cerne de sua existência, a incansável luta na busca por uma educação
promotora do bem comum, assim como o cerne de sua resistência àquilo que vem de encontro
à sua missão: construir uma sociedade mais humana, igualitária e inclusiva. Comunitário é
aquilo que é comum à comunidade, o que é coletivo, o que é de todos os membros da
comunidade” (SCHMIDT; CAMPIS, 2009, p. 19). Eis um traço central de sua identidade.
Muito se pode discursar sobre a anatomia das universidades, considerando o valor dado
ao conhecimento, no entanto, outros aspectos da anatomia das universidades comunitárias
também podem elucidar como sua identidade está se constituindo, considerando as mutações
no âmbito da educação. Para que isso aconteça, dar-se-á continuidade ao estudo sobre as
características dessas universidades à luz de outro componente sugerido por McCowan (2016):
108
a sua função na produção, armazenamento e disseminação do conhecimento.
4.2 Função: o papel da universidade comunitária na produção, armazenamento e
disseminação do conhecimento
A presença ativa e crítica da universidade nos espaços da cultura, da política, da
economia, da tecnologia, certamente, influencia no processo de desenvolvimento de uma
sociedade. Sua inserção não está desvinculada de um projeto de sociedade, sua presença não é
neutra. Sendo assim, uma universidade deve ajudar a construir as condições necessárias para a
promoção do bem comum, talvez um de seus papéis mais relevantes na construção do
conhecimento e no cumprimento de suas funções. McCowan (2016) afirma que a função da
universidade tem a ver com a variedade de atividades concretas realizadas pela instituição e aos
papéis que a instituição cumpre. A função diz respeito ao papel da universidade em termos de
produção ou aplicação, armazenamento, transmissão de conhecimento. Assim, o propósito
é analisar a anatomia das universidades comunitárias considerando alguns aspectos das
atividades realizadas por essas instituições em ensino, pesquisa ensino, pesquisa e engajamento
social.
Para Moraes (2013) ensino, pesquisa e extensão compreendem os três níveis
constitutivos da realidade universitária. Aparentemente, cada um conteria linguagem, método,
lógica, fronteiras separadas. Se vistos de forma fragmentada, representariam cada qual uma
realidade unidimensional, com objetos de estudo independentes na forma de observar a
realidade e de construir o conhecimento. Se compreendidos assim, as ações de extensão seriam
desvinculadas do ensino e da pesquisa, e o educador estaria divorciado do educando e do
contexto das políticas educacionais que regem cada um dos níveis da realidade acadêmica. Por
outro lado, se compreendidos a partir de uma dimensão epistemológica transdisciplinar e da
complexidade constitutiva da realidade, ensino, pesquisa e extensão se entrelaçariam e
estimulariam o nascimento de “processos dialógicos e interdependentes, nutridos por uma
causalidade circular retroativa ou recursiva e por processos em sinergia” (MORAES, 2013, p.
14). Essa sinergia pressupõe a existência de processos dinâmicos, flexíveis, abertos ao
inesperado, capazes de transformar a realidade pessoal, profissional e social de todos aqueles
que participam do processo educacional.
Ensino, pesquisa e extensão constituem as três funções básicas da universidade
brasileira dos dias atuais. Este princípio foi estabelecido como dever para as Universidades, no
artigo 207 da Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 1988). Isto é, de acordo com a
109
Constituição, ele deve estar, necessariamente, presente na formação promovida e ofertada por
essas instituições, sua implantação não é opcional. Conforme prescreve o Artigo 43 da Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional – Lei Federal nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, a
educação superior tem por finalidade incentivar o trabalho de pesquisa e investigação científica
(Inciso III), comunicar o saber através do ensino (Inciso IV) e promover a extensão aberta à
participação da população (Inciso VII), entre outras questões (BRASIL, 1996). Essa
prerrogativa foi reforçada e ampliada no Plano Nacional de Educação (BRASIL, 2014b), o qual
prevê, inclusive para as instituições de ensino superior, intercâmbios e processos de
internacionalização tanto na pesquisa quanto no ensino e na extensão.
Ensino, pesquisa e extensão “devem ser equivalentes entre si e merecer igualdade em
tratamento por parte das Instituições de Educação Superior (IES), pois, ao contrário, estarão
violando os supracitados preceitos” (SANTOS, 2016, p. 216). Para UNI2, o desafio está em
associar essas dimensões a um processo integral “voltado para uma formação de alta
qualidade profissional, humanista, ética, cidadã e crítica de seus estudantes, mantendo o foco
na vocação comunitária que constitui a instituição” (PDI/UNI2, 2017, p. 35). Sendo
compreendido como princípio, a UNI1 considera que sua efetivação se dá pela “realização de
projetos coletivos, na interlocução com o mundo do trabalho, na aproximação da
Universidade com a sociedade, constituindo o significado social do trabalho acadêmico”
(PDI/UNI1, 2017, p. 21).
Diante da demonstração da relevância do entrelaçamento desses três pilares fundantes
da universidade presentes nas vozes de seus gestores e nos documentos oficiais, parece que a
proposição de McCowan (2016) de analisar a anatomia das universidades considerando as
dimensões valor, função e interação se torna ainda mais pertinente a este estudo, principalmente
quando enfatiza a função desta instituição quanto à produção, transmissão e armazenamento do
conhecimento.
Na busca pela qualidade da educação superior, a associação das atividades de ensino,
pesquisa e extensão é bem-vinda. Santos (2016, p. 2017) afirma que
A extensão propicia a complementação da formação acadêmica de docentes e discentes universitários, dada nas atividades de ensino e pesquisa científica, alicerçadas com a aplicação prática dos conhecimentos. Assim, forma-se um ciclo permanente [...] de maneira que as três atividades tornam-se complementares e dependentes, atuando então de forma sistêmica.
Visando entender o sentido e a diferença entre ensino, pesquisa e extensão, Frantz e
Silva (2002, p. 217) abordam, de modo mais objetivo, essas unidades de análise. Assim definem
110
a) ensino: procura articular as ciências existentes, conhecer seus produtos e formar profissionais. Legitima-se no espaço social pela quantidade e qualidade dos diplomas concedidos; b) pesquisa: almeja construir novos, confirmar ou contestar conhecimentos existentes. Legitima-se junto à sociedade pela produção de tecnologias úteis a ela e pela orientação científica na resolução dos seus problemas; c) extensão: tem a função de estabelecer conexões entre os interesses do ensino e da pesquisa científica com os interesses sociais. Legitima-se pela presença de agentes universitários nos setores sociais, executando ações de serviços, assistências, projetos culturais etc.
Entende-se que, no cumprimento de suas funções sócio educativas, as universidades
integram e articulam de forma sistêmica esse trinômio. Parece, assim, que, no âmbito das
universidades brasileiras, esse tripé se apresenta como “uma de suas maiores virtudes e
expressão de compromisso social” (SANTOS, 2016, p. 218) já que seu exercício é considerado
fator de excelência na educação superior, a qual, volta-se à formação acadêmica e profissional
daqueles que dela participam.
Para Vannucchi (2011, p. 41), as universidades comunitárias têm convicção de que sua
missão só atingirá todo processo político-pedagógico caso esta se manifeste “como luz
predominante nas atividades acadêmicas; na prática da pesquisa, [...] no exercício da extensão
e em todos os procedimentos comunitários da instituição”. Comenta um dos gestores a nossa
missão é uma missão muito clara, educar por meio do ensino de pesquisa-extensão, para
promover a sustentabilidade e a melhoria do ambiente de vida (R4, 2016). A indissolubilidade
deste trinômio na construção da identidade dessas instituições está longe de ser mera obrigação
imposta por legislação. Esse traço faz parte do que lhe é essencial, e também do que lhe torna
diferente de outras instituições, (ALBERT; WETTHEN, 1985), como afirma R4 por sermos
uma instituição comunitária; essa é a nossa diferença; essa é a nossa missão; esse é o nosso
compromisso; esse é o nosso papel social; nossa grande relevância social está por aí (R4,
2016).
A indissolubilidade entre ensino, pesquisa e extensão também é evidenciada na missão
das instituições locus desse estudo. Em suas missões, as expressões produzir, sistematizar e
socializar conhecimento (PDI/UNI1, 2017) e produzir e difundir conhecimentos fazem
referência à tríade ensino, pesquisa, extensão. Duas das instituições analisadas evidenciam
explicitamente os termos em seus textos: Produzir e socializar o conhecimento pelo ensino,
pesquisa e extensão (PDI/UNI3, 2017) e Promover, por meio do ensino, da pesquisa e
extensão, o desenvolvimento regional (PDI/UNI4, 2017). É na missão que se percebe o motivo
da existência dessas instituições, ou seja, quem são, para quem elas fazem e como fazem. E,
111
conforme a acepção de Santos (2005, p. 64-65), “no século XXI só há universidade quando há
formação graduada e pós-graduada, pesquisa e extensão. Sem qualquer destes, há ensino
superior, não há universidade”. Assim, o princípio da indissociabilidade tem na Universidade
seu sentido mais intrínseco.
Ao analisar os PPIs das universidades em estudo, essas concepções ficam mais
evidentes. Para UNI4 A indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão oportuniza uma
visão sistêmica para o planejamento, desenvolvimento e avaliação curricular, tendo em vista
ser um princípio fundamental para a articulação teoria e prática (PPI UNI4, p. 80). Para
assegurar o preceito constitucional, os documentos reafirmam que esses três pilares devem ser
equivalentes e merecer igualdade em tratamento por parte da instituição.
Observa-se que os discursos se assemelham em um esforço de descrever as qualidades
da instituição. Esta é uma forma de dar consistência e sentido ao trabalho realizado nas
dimensões de ensino, pesquisa e extensão. Com o intuito de evidenciar a presença efetiva dessas
funções nas universidades comunitárias, foi-se aos seus documentos oficiais e extraiu-se
algumas informações, as quais são descritas no quadro 9. Salienta-se que tanto os PDIs, inclui-
se PPIs como Relatórios/Balanços de Responsabilidade Social trazem muito mais informações
com riqueza de detalhes, as quais comprovam as diferenciadas ações dessas instituições no que
concerne às atividades de ensino, pesquisa e extensão.
Quadro 9 - Principais Atividades de Ensino, Pesquisa e Extensão das Universidades Comunitárias ATIVIDADES DE ENSINO
UNI1 UNI2 UNI3 UNI4 38 mil alunos 77 Cursos de Graduação (Bacharelado, Licenciatura, Tecnólogo) 160 opções de ingresso 977 Professores titulados (88% com título de mestre e doutor) 1000 funcionários EaD:18 Cursos virtuais em diferentes áreas do conhecimento CETEC – Centro Tecnológico - Escola de ensino médio e cursos técnicos UNTI – Universidade Terceira Idade 880 alunos - 50 turmas em atividades Programa de atendimento ao estudante PROGRAMA DE IDIOMAS PROGRAMA DE INTERNACIONALIZAÇÃO Formação Continuada para professores e funcionários Comissão Própria de
17.500 mil alunos 60 cursos de graduação (Bacharelado, Licenciatura, Tecnólogo) 150 opções de ingresso 904 professores de Ensino Superior (50,55% Me.; 32,74% Dr.) 1258 funcionários EaD: disciplinas em diversos cursos CEMI – Centro de Ensino Médio Integrado Centro de Referência e Atenção ao Idoso Programa de atendimento ao estudante PROGRAMA DE IDIOMAS UNINCLUI - Programa de inclusão da pessoa com deficiência – PROGRAMA DE INTERNACIONALIZAÇÃO Formação Continuada para professores e funcionários Comissão Própria de Avaliação – CPA
24 mil alunos 100 cursos de graduação (Bacharelado, Licenciatura, Tecnólogo) 150 opções de ingresso 1277 professores (nível superior e ed. Básica) 1359 funcionários EaD: 9 Cursos de Graduação a Distância Programa de Educação de Jovens e Adultos Colégio de Aplicação – Ensino Fundamental e Médio Programa de atendimento ao estudante PROGRAMA DE IDIOMAS PROGRAMA DE INTERNACIONALIZAÇÃO UNIFORMA - Formação Continuada para professores e funcionários Formação continuada para funcionários – AGORA - Programa de investimento em Qualidade de Vida no Trabalho –
14 mil alunos 50 Cursos de graduação (Bacharelado, Licenciatura, Tecnólogo) 130 opções de ingresso 730 docentes (20,97% doutores e 41,94 % mestres) 696 funcionários EaD: 7 Cursos de Graduação 231 alunos Colégio de Aplicação - Ensino Fundamental e Médio Programa de Educação de Jovens e Adultos ÂNIMA e VIVER BEM Formação Continuada para professores e funcionários Programa de atendimento ao estudante PROGRAMA DE IDIOMAS PROGRAMA DE INTERNACIONALIZAÇÃO Comissão Própria de Avaliação – CPA INFRAESTRUTURA 1 Campus
112
ATIVIDADES DE ENSINO UNI1 UNI2 UNI3 UNI4
Avaliação – CPA INFRAESTRUTURA: Multicampi: 8 Unidades em 8 cidades 805 laboratórios 759 salas 11 bibliotecas 759 salas 11 biblioteca
INFRAESTRUTURA Multicampi: 7 Campi em 7 cidades 22 anfiteatros e auditórios 176 salas para ensino prático-experimental 300 laboratórios 150 clínicas 10 bibliotecas
Comissão Própria de Avaliação – CPA INFRAESTRUTURA: Multicampi: 9 Campi 532 salas de aula 315 laboratórios 17 auditórios 8 bibliotecas
170 salas de aula 2 bibliotecas 78 laboratórios 5 auditórios
ATIVIDADES DE PESQUISA UNI1 UNI2 UNI3 UNI4
11 Cursos de Doutorados 17 Cursos de Mestrados 70 Cursos de Especialização 93 Grupos de Pesquisa cadastrados no CNPq; 331 Linhas de pesquisa 269 Bolsas de Pós-Graduação 219 Bolsas de Iniciação Científica e Tecnológica 21 Núcleos de Inovação e Desenvolvimento Parque de Ciência, Tecnologia e Inovação Incubadora Tecnológica e Startups 110 Registros de patentes no Instituto Nacional de Propriedade Intelectual – INPI Instituto de Biotecnologia, Instituto de Pesquisas Clínicas para estudos Multicêntricos; Instituto de Materiais Cerâmicos; Instituto de saneamento ambiental; Instituto Memória Histórica e Cultural; Instituto de Pesquisas econômicas e sociais EDITORA: Publicação de mais de 1.200 títulos PUBLICAÇÕES: 10 revistas acadêmicas Participação programas de financiamento: FIES, PROUNI Comitê de Ética em Pesquisa
6 Cursos de Doutorado 15 Cursos de Mestrado 57 Cursos de Especialização 322 projetos de pesquisa 90 Grupos de Pesquisa cadastrados no CNPq; Mais de 200 Linhas de Pesquisa Mais de 200 Bolsas de Iniciação Científica e Tecnológica Incubadora Tecnológica e Startups Parque Científico e Tecnológico do Planalto Médio Parque de Geração Solar Fotovoltaica Museu Histórico, de Artes Visuais e Zoobotânico EDITORA: Publicação de mais de 800 títulos PUBLICAÇÕES: 12 revistas acadêmicas Participação Programas de financiamento: FIES, PROUNI Comitê de Ética em Pesquisa
6 Cursos de Doutorado 11 Cursos de Mestrado 35 Cursos de Especialização 24 Cursos de especialização EAD 311 projetos de pesquisa 101 grupos de pesquisa cadastrados no CNPq; Mais de 400 bolsas de Bolsas de Iniciação Científica e Tecnológica Incubadora Tecnológica de Cooperativas Populares – ITCP UNIINOVA – Núcleo de Inovação e Tecnologia ITE – Incubadora Tecnológica Empresarial CERUMA(R) - Parceiro Propriedade Intelectual Instituto de Pesquisas Sociais Museu Oceanográfico EDITORA: Publicação de mais de 160 títulos PUBLICAÇÕES: 5 revistas acadêmicas Participação Programas de financiamento: FIES, PROUNI, FUMDES Comitê de Ética em Pesquisa
2 Cursos de Doutorado 7 Cursos de Mestrado 28 cursos de Especialização 379 projetos de pesquisa 121 grupos de pesquisa cadastrados no CNPq Mais de 200 bolsas de Iniciação Científica IPARQUE – Parque Científico e Tecnológico IPAT- Instituto de Pesquisas Ambientais e Tecnológicas IDT – Instituto de Engenharia e Tecnologia IALI – Instituto de Alimentos IPESE – Instituto de Pesquisa Socioeconômica Aplicada ITEC IN – Incubadora Tecnológica de Ideias e Negócios Incubadora Tecnológica e Startups Planetário Museu de Zoologia - Centro de referência na pesquisa científica, na educação ambiental e no turismo cultural Museu Tecnológico Museu Mineralógico EDITORA: Publicação de mais de 100 títulos entre 2013-2018 Participação Programas de financiamento: FIES, PROUNI, FUNDES Comitê de Ética em Pesquisa
ATIVIDADES DE EXTENSÃO UNI1 UNI2 UNI3 UNI4 Mais de 90 projetos de extensão em diferentes áreas: saúde, meio ambiente, social, educação Mais de 700.000 pessoas beneficiadas (2016 – 2018) Hospital Geral 280 bolsas de extensão Sistema Educativo de RÁDIO E TV CETEL – Centro de Teledifusão educativa. O canal 15 da NET e 27 na TV Aberta foram fechados em 2017, após 20 anos de existência. Tinha parceria com a TV Futura. - 3 emissoras de rádio em
Mais de 80 projetos de extensão em diferentes áreas: saúde, meio ambiente, social, educação Mais de 650.000 pessoas beneficiadas (2016 e 2018) Hospital Veterinário 210 bolsas de extensão Sistema Educativo de Rádio e TV Afiliada do Canal Futura Cursos acreditados pelo Sistema de Acreditação Regional de Cursos de Graduação do Mercosul (Arcusul) CONVÊNIOS INTERNACIONAIS, com
Mais de 70 projetos de extensão em diversas áreas: saúde, meio ambiente, social, educação 600.000 pessoas beneficiadas (2017-2018) Hospital Universitário, conveniado com o SUS 265 bolsas de extensão Ecomuseu – espaço cultural que atua no resgate e valorização dos costumes e da história das comunidades litorâneas de Santa Catarina Sistema Educativo de Rádio e TV Afiliada do Canal Futura. Coral e Grupo de dança
Mais 110 projetos de Extensão em diversas áreas: saúde, meio ambiente, social, educação 300 mil pessoas beneficiadas (2017-2018) Hospital Universitário 298 Bolsas de Extensão Sistema Educativo de TV Coral e Grupo de dança Fomento a grupos artísticos PARCERIAS com diversos setores empresariais, órgãos governamentais e associações INTERCÂMBIOS - 48
113
ATIVIDADES DE ENSINO UNI1 UNI2 UNI3 UNI4
funcionamento em diferentes campi da região. Fomento a grupos artísticos Coral e Grupo de dança PARCERIAS com diversos setores empresariais, órgãos governamentais e associações INTERCÂMBIOS: 203 acordos bilaterais com instituições de 28 países
62 universidades de 18 países Coral e Grupo de dança Fomento a grupos artísticos PARCERIAS com diversos setores empresariais, órgãos governamentais e associações INTERCÂMBIOS com universidades do país e do exterior, instituições científicas, entidades e órgãos governamentais
PARCERIAS com diversos setores empresariais, órgãos governamentais e associações INTERCÂMBIOS. – 140 convênios firmados com Universidades estrangeiras, instituições científicas, entidades e órgãos governamentais
acordos com 20 países, instituições científicas, entidades e órgãos governamentais
Fonte: Dados coligidos pela autora a partir dos PDIs, Relatórios de Responsabilidade Social e Sítios eletrônicos – Período de referência 2017-2018
Ao se fazer uma leitura atenta dos dados apresentados, observa-se a dimensão e
abrangência de cada uma das universidades comunitárias estudadas. Os números levam a
refletir sobre a influência da presença dessas instituições no contexto sócio-econômico-cultural
de cada região em que estão inseridas, ao mesmo tempo, que projetam o impacto na formação
profissional e humana daqueles que por elas são atingidos.
No capítulo 3, momento em que se buscou compreender a construção da identidade
dessas instituições, desde sua gênese até a sua legitimação, evidenciou-se que, historicamente,
na década de 1960, as comunidades do interior do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
pleiteavam a instalação de cursos de nível superior. O que se observa, a partir do quadro 08, é
que, nestas cinco décadas de existência, essas instituições vêm construindo uma trajetória de
consolidação, de melhoria e reconhecimento do seu trabalho pelas comunidades interna e
externa. Comenta R1 Daquilo que era, a universidade cresceu com sucesso o case da UNI1, é
um case de sucesso. E cresceu junto com a cidade, com a região, a cidade cresceu junto com a
universidade (R1, 2016).
Como Universidades Comunitárias expandiram suas ações, com novos cursos de
graduação e pós-graduação em diferentes áreas, articuladas com a pesquisa e a extensão,
empreendendo programas e projetos para concretizar a sua missão institucional. Ao
completarem cinquenta anos de existência, em meio a avanços e conflitos motivados pelo
contexto econômico e pelas políticas públicas, chegam ao século XXI com sua identidade
reconhecida e legitimada.
Analisando o conjunto de informações no quadro 9, observa-se semelhanças nos
projetos de aplicação sistêmica do trinômio ensino-pesquisa-extensão de modo que tais funções
parecem complementar-se mutuamente nas quatro instituições. Se forem contabilizados em
dados gerais, observa-se que no ensino, são quase 100 mil alunos atingidos diretamente, são
mais de 290 cursos de graduação oferecidos àqueles que buscam a formação profissional, isto
114
demonstra a capacidade dessas instituições de armazenamento e transmissão de conhecimentos
de valor científico. A oferta de quase 300 cursos de pós-graduação, os quais têm como objetivo
a pesquisa e a construção de novos conhecimentos, traduz um trabalho voltado à inovação e
criação de novas tecnologias úteis à sociedade. Por intermédio das múltiplas atividades de
extensão, essas universidades promovem a socialização e a democratização do conhecimento
científico junto à comunidade, beneficiando mais de 750.000 pessoas em um ano e abrangendo
as mais diferentes áreas de atuação. Assim, “forma-se um ciclo permanente onde a pesquisa
aprimora e produz novos conhecimentos, os quais são difundidos pelo ensino e pela extensão,
de maneira que as três atividades se tornam complementares e dependentes, atuando então de
forma sistêmica” (SANTOS, 2016, p. 217).
Prever a indissociabilidade com a pesquisa e a extensão, do ponto de vista do ensino,
não significa meramente concebê-lo como um espaço orgânico no qual se desenvolvem a
recriação e o acesso aos conhecimentos produzidos. Essa indivisibilidade implica, também,
esmerar-se por uma formação que se volte para a autonomia, na qual os estudantes sejam
envolvidos em atividades de pesquisa e incentivados a modelar solução para os novos
problemas. Implica, igualmente, manter uma conexão contínua e recíproca entre a instituição
e a sociedade, “transversalizando o olhar dos Projetos Pedagógicos (PPI/UNI2, 2017, p. 35).
Mas como essa indissociabilidade pode acontecer? Rays (2003) aponta alguns
pressupostos necessários, entre eles: que o Projeto Pedagógico dos Cursos (PPC) aponte para
uma atitude investigativa, reflexiva e problematizadora de docentes e discentes; que a matriz
curricular e a organização pedagógica dos cursos considere as Diretrizes Curriculares
Nacionais, a missão e o PPI da instituição, olhando para os avanços técnico-científicos, para as
questões da cidadania, da ética e da diversidade sociocultural; que o ensino da graduação e pós-
graduação, a pesquisa e a extensão busque a intersecção curricular e o relacionamento com a
sociedade, por meio de um caminho de mão dupla; que a gestão do PPC se paute
prioritariamente nas ações acadêmicas, entre elas as atividades Curriculares Complementares,
os estágios, os Trabalhos de Conclusão de Curso, os projetos integrados. Ao analisar os
documentos dessas universidades, constatou-se que seus PPIs vão muito além do que propõe
Rays. Itens como currículo, avaliação de aprendizagem, metodologia de ensino, acessibilidade
e inclusão, valorização docente, gestão do processo pedagógico, estágios curriculares, educação
a distância e internacionalização são apenas alguns ingredientes que norteiam o trabalho de
construção da política10 de ensino dessas instituições.
10 Como políticas entende-se “a compilação dos fundamentos, objetivos e das diretrizes; dos princípios e pressupostos que estabelecem a lógica de funcionamento dos diversos processos institucionais. A partir delas são
115
No contexto da Educação Superior, a ação de ensinar vai muito além da tarefa de “passar
conteúdos”. Ensinar requer o esforço de instaurar condições de aprendizagem que leve em conta
a gênese do conteúdo, bem como a criação de estratégias metodológicas de aprendizagem,
formando conceitos com o propósito de resolver situações concretas da vida prática
(LIBÂNEO, 2009). Ensinar, portanto, implica promover e ampliar o desenvolvimento das
aprendizagens, oferecendo ferramentas para pensar cientificamente, operar com conceitos e
mobilizar procedimentos lógicos de pensamento. (PPI/UNI2, 2017, p. 42). Ciente de seus
princípios filosóficos, técnico-metodológicos norteadores de suas práticas acadêmicas, a UNI3
orienta suas ações, da concepção de ensino ao uso dos resultados das avaliações, considerando
a excelência na produção técnica e científica; a excelência no processo de ensino/aprendizagem
nos diferentes níveis de ensino; a interação com a comunidade local e regional e; a integração
dos processos de gestão administrativa, acadêmica e pedagógica.
A UNI3 desenvolve um processo educacional sustentado em uma ação pedagógica
dinâmica, baseada no diálogo, compartilhada e construída com base na vivência e na
interação dos sujeitos da aprendizagem com a cultura (PPI/UNI3, 2017, p. 88-90). Visto dessa
forma, o processo de ensinar teria a capacidade de estimular a curiosidade e alimentar uma
inquietação que levaria a um aprendizado constante e infinito. E com mais relevância, “pode
levar a uma compreensão mais profunda do tema através do processo de lidar com um problema
específico e avaliar a complexidade e a natureza contestada dos temas políticos em geral”
(MCCOWAN, 2006, p. 145).
Ao fazer referência à política institucional para o ensino e aprendizagem em seus
Projetos Pedagógicos Institucionais, as universidades comunitárias concebem a ação de ensinar
como um processo pedagógico interativo, intencional, no qual o acadêmico tem um papel ativo
no processo de aprendizagem. A UNI1 se propõe a desenvolver um conhecimento amplo, que
situe o sujeito no mundo e o habilite a interagir profissional, científica e eticamente com a
sociedade (PPI/UNI1, 2017, p. 25); a UNI2 assume que um processo acadêmico de ensino-
aprendizagem precisa transformar o saber científico em conteúdos formativos, tendo em
consideração os saberes discentes, os instrumentos de mediação e os contextos educativos do
ensino, da pesquisa e da extensão; a UNI3 a UNI4 por sua vez defende o saber universalmente
elaborado [...], a fim de favorecer a construção de novos conhecimentos, com a articulação
entre teoria e prática, respeitando os diferentes métodos e concepções pedagógicas.
(PPI/UNI4, 2017, p. 34). Observa-se que a política institucional para o processo pedagógico,
indicadas regras, conceitos e especialmente instrumentos expressando os parâmetros para o planejamento e o acompanhamento das ações da Instituição, em seus diferentes níveis” (PPI/UNI1, 2017, p. 25).
116
portanto, persegue um compromisso com a formação integral do aluno, voltada para a
realização plena do ser humano, tendo este um envolvimento ativo com o conhecimento e com
as práticas sociais.
Ao rastrear as informações sobre essas universidades, na dimensão Ensino, no quadro
9, pode-se inferir que a existência de mais de 280 Cursos (Bacharelado, Licenciatura,
Tecnólogo) em diferentes áreas do conhecimento (Ciências da vida, Ciências Extas e
engenharias, Humanidades, Ciências Sociais, Ciências Jurídicas, Artes e Arquitetura), a
presença de programas voltados à Educação Básica, bem como de projetos voltados à educação
de Jovens e Adultos e à Terceira Idade, a oferta de cursos na modalidade EAD, o
desenvolvimento de Programas de idiomas, o aprimoramento do corpo docente e técnico-
administrativo, por meio de programas de formação continuada reiteram o compromisso dessas
instituições com a formação integral do homem e ao atendimento aos princípios estabelecidos
para o processo de ensinar para a formação de um homem livre e uma sociedade democrática.
Em sua trajetória, entre os anos de 1960 e 2013, vários marcos pontuaram a caminhada
de legitimação das universidades comunitárias. Durante esse caminho que se inicia com o
processo de interiorização do ensino até o seu reconhecimento legítimo, consagrado por lei,
observa-se expressivos avanços na construção da identidade dessas instituições.
Mas...
Livres de estarem imunes às intempéries dos jogos políticos, econômicos e sociais, em
nível local e/ou global, essas instituições vêm sofrendo com as turbulências geradas pelas
mudanças que se aceleram no mundo da educação superior provocadas por políticas de caráter
neoliberal, exigindo delas novas estratégias de adaptação no quesito ensino.
Leite (2006) ao analisar os impactos e as mudanças da avaliação nas universidades
públicas, comunitárias, confessionais e privadas do Brasil, da Argentina e do Uruguai, entre os
anos de 1996 e 2000, constatou várias evidências de mudanças ameaçadoras nas IES, as quais
mantinham alguma relação com o momento de ordenação capitalista global. A primeira
evidência percebida foi o redesenho capitalista das universidades, entendido como “uma
espécie de performance institucional marcada pela comoditização do conhecimento, da ciência
e da tecnologia, produzida pela nova gestão que favorece a comercialização privada e as
operações com lucro nos campi” (LEITE, 2002). Essa perspectiva de análise corrobora com a
tese de McCowan (2016) quando este apresenta os processos de Comoditização e Desagregação
como grandes geradores da instabilidade identitária por que passam as universidades, neste caso
específico, as universidades comunitárias.
Entre as características desse novo desenho de universidade apresentam-se as seguintes:
117
(a) avaliações classificatórias - estabelecem um sistema competitivo entre as IES com
avaliações produzidas por agências externas às universidades; (b) capitalismo acadêmico e
professores empreendedores – docentes e pesquisadores buscam no mercado recursos para a
pesquisa, são empreendedores de si próprios e de sua produção intelectual; os modelos de
avaliação privilegiam a produtividade docente, o quantitativo de livros e artigos publicados
consolidam o capitalismo acadêmico; (c) gestão de caráter “gerencialista” – decisões centrais
levam a medidas de contenção de despesas: cortes nos cargos, nos salários ou nas vagas
docentes, a avaliação por méritos afeta as decisões; (d) universidades empreendedoras –
atitudes incisivas de instituições privadas sobre o mercado do conhecimento; observam-se
parcerias para formação de incubadoras empresariais; venda de produtos patenteados; parques
tecnológicos, escritórios de negócios no campus; (e) mercado no campus – liberação de espaços
da instituição para a instalação de lojas de serviços de toda espécie, dentre elas, as agências de
diferentes bancos privados; (f) decisões de fora para dentro das instituições – decisões
autoritárias tomadas em face de políticas públicas do governo central, especialmente sobre a
avaliação classificatória e acreditação; (g) instalação de campi fora de sede – expansão de
campi em diferentes locais, com clientela potencial; oferta de cursos presenciais e virtuais;
educação a distância e convênios com outras instituições (LEITE, 2006).
O ciclo de reformas está em andamento. A educação superior expande-se em direção ao
mercado e o estado tenta diminuir os seus custos. Ainda conforme Leite (2002) fazem parte do
elenco das características dessas reformas, intensificadas pela Lei de Diretrizes e Bases da
Educação de 1996 (Lei nº 9.394/96) os seguintes itens: (a) diversificação da missão das
instituições: Universidades (ensino, pesquisa, extensão, pós-graduação), Centros Universitários
(ensino preferencial e pesquisa), Institutos Superiores, Faculdades Integradas e Escolas
Superiores; (b) aumento do número de instituições privadas em progressão acelerada; (c)
ampliação do número de matrículas e de cursos; (d) flexibilização da oferta curricular –
introdução de cursos sequenciais – curta duração; (e) diversificação do financiamento, abertura
para serviços e convênios; (f) avaliação intensiva, em diferentes modalidades, sob o controle
do estado desde 1996, Sistema de avaliação pública (Provão, Exame Nacional de Cursos,
seguido de ranking nacional, ENEM), avaliação das Condições de oferta, avaliação externa por
especialistas, entre outras.
Para a autora este redesenho possibilitou a emergência de novos modelos institucionais,
entre eles: (a) um denominado universidade liberal híbrida, que atuaria em nível local e
nacional e se caracterizaria como “uma instituição tradicional que sempre foi autônoma do
mercado, mas que passou a sobrepor critérios de mercado às suas tradicionais funções e
118
atividades, após processos de avaliação homogeneizadores que produziram o redesenho de suas
prioridades, atividades e funções” (LEITE, 2006, p. 179); (b) um segundo modelo denominado
universidades globais, as quais lançam seus produtos na Internet e outras mídias de circulação
internacional, arregimentando grande número de alunos ao redor do mundo, com
regulamentação dos serviços educativos de educação superior pela Organização Mundial do
Comércio (OMC) e pelo General Agreement on Trade and Service (GATS) e que não
reconhecem a legislação de outros países que não aquele de sua origem (c) a universidade
empreendedora caracterizadas por ação empreendedora coletiva as quais convivem com o risco
de empreender as inovações em busca de uma transformação planejada; (d) modelo de
universidade empresarial, a qual admite acionistas, lucros, gestão igual à de empresas privadas;
orientação do conhecimento voltada para aprendizagem aplicada, demanda em procura de
ganhos, orientação para o mercado, qualidade dos insumos, clientes e consumidores; (e) modelo
de universidade corporativa, instituições vinculadas a grandes corporações multinacionais, nas
quais o aprendizado está associado ao desempenho, à capacidade de trabalhar de forma mais
produtiva e criativa dentro do contexto da empresa. Essas instituições têm um perfil de
treinamento, baseiam-se em procedimentos, no ciclo curto (LEITE, 2002).
Se se considerar as características do desenho da nova universidade apontadas por Leite
como predominantes do novo modelo, e uni-las aos efeitos da aprovação da LDB de 1996 em
todas as suas consequências, então pode-se dizer que algumas dessas características estão
presentes no comportamento institucional das universidades comunitárias. Em seus
documentos institucionais (PDIs, Relatórios de Responsabilidade Social e peças audiovisuais
divulgadas na internet) a exaltação dos seus conceitos nos rankings, números expressivos de
produção científica, investimentos em inovação com criação de Parques Tecnológicos e
desenvolvimento de incubadoras são apresentados em detalhes à comunidade. A estrutura
multicampi e a oferta de cursos presenciais, educação a distância, a redução de pessoal e
convênios com outras instituições também estão o rol das ofertas das comunitárias. Aliadas a
essas decisões, entra no cenário a implementação de políticas para ingresso em cursos EaD e a
intensificação da comunicação de seus cursos com uma linguagem mais mercadológica. Parece
que há um movimento das comunitárias no sentido de “sobrepor critérios de mercado às suas
tradicionais funções e atividades, após processos de avaliação homogeneizadores que
produziram o redesenho de suas prioridades, atividades e funções” (LEITE, 2006, p. 179). Essas
mudanças dariam um contorno de universidade ao que Leite denominou de universidade liberal
híbrida. Seriam essas novas investidas contraditórias à missão dessas instituições a ponto de
descaracterizá-las como comunitárias? Talvez. Considerando que as universidades
119
comunitárias entendem a educação como um bem público e comum, são instituições não
lucrativas, pertencentes à sociedade civil, as quais defendem a indissociabilidade do ensino, da
pesquisa e da extensão, esse movimento de mudança estaria imerso nas comunidades com o
intuito de promover o desenvolvimento social e econômico regional, ao mesmo tempo que
atenderia as demandas dessas comunidade que, apesar de local, encontra-se inserida em todas
as instâncias nacional e global. Esse é o discurso que percorre os PDIs.
Interessante observar que o surgimento desses novos modelos de instituições provoca
nova forma de comunicação com os diferentes públicos. Enquanto as universidades históricas
e tradicionais restringem suas estratégias de marketing ao que Levitt (1985) chamou de produto
genérico (ao produto em si), ou seja, os cursos que estão sendo oferecidos no mercado; as novas
universidades de caráter mercantil, tendem a mostrar, em suas estratégias mercadológicas,
“outros elementos ou qualidades distantes do produto em si, os mesmos que muitas vezes
ganham maior destaque que o principal produto oferecido pela universidade: o próprio curso”
(CALDERÓN, 2000, p. 66). Assim, a oferta de novos ingredientes como uma sala de
musculação, um salão de beleza, convênios com “grandes” empresas, um instituto de idiomas,
uma praça de alimentação passa a ganhar mais notoriedade do que o próprio curso ofertado pela
universidade. Essa estratégia amplia o produto para além do que é solicitado ou esperado pelo
cliente, acrescentando-se algo novo ao produto, o que acaba funcionando como mecanismo de
captura de novos “clientes”.
Todas essas mudanças criam um novo cenário na educação superior do Brasil. O
aumento substancial de novas instituições, principalmente de instituições privadas, com
consequente aumento no número de matrículas, indica que a educação superior no Brasil é um
bom negócio.11 A rede privada ofertou 92,4% do total de vagas em cursos de graduação em
2017. A rede pública correspondeu a 7,6% das vagas ofertadas pelas instituições de educação
superior. Em 2017, 3, 2 milhões de alunos ingressaram em cursos de educação superior de
graduação. Desse total, 81,7% em instituições privadas (MEC, 2016).
Calderón (2000), ao observar o comportamento das universidades particulares no
munícipio de São Paulo, constatou que o crescimento do número de instituições promoveu o
surgimento de um “mercado de oferta”, no qual passou-se a produzir a partir das exigências do
mercado, principalmente, a partir “do que os consumidores querem, dentro de um contexto de
11 Conforme Censo da Educação Superior (2017), há no Brasil 2.448 instituições de Educação Superior (universidade, Centro universitário, faculdade, Institutos federais, Cefet, das quais 1152 são privadas, correspondendo a 87,9% do total. Apenas 296 instituições são públicas (municipais, estaduais, federais), correspondendo a 12,1%. (Ministério da Educação, 2016). Disponível em: http://portal.inep.gov.br/web/guest/censo-da-educacao-superior. Acesso em: 13 jan. 2019.
120
acirrada concorrência por clientes em potencial, de excesso de produtos para um número de
consumidores que, embora crescente, não consomem todas as vagas e serviços oferecidos pelas
universidades particulares” (CALDERÓN, 2000, p. 66). Passados dezesseis anos, essa
realidade ainda se faz sentir também nas universidades comunitárias. Em depoimento, R1
manifesta sua preocupação
Nós tivemos um histórico até então de que a universidade automaticamente era comprada, entre aspas, automaticamente. Vinha o aluno, automaticamente... (Ela, a universidade) não precisava vender-se, mostrar-se. E isso nós perdemos. Nos últimos anos, o cenário, esse paradigma, o modelo foi superado, ou seja, ruiu. Hoje nós temos que fazer um movimento contrário. Hoje nós temos que sair e mostrar que nós somos uma universidade, ou seja, não é automático esse processo (R1, 2016).
Reaparece, aqui, as discussões de McCowan (2016; 2017) sobre a influência dos
processos de comoditização/mercantilização e desagregação nas funções da universidade, quais
sejam ensino, pesquisa e extensão. A institucionalização do mercado faz proliferar uma ampla
diversificação de produtos e serviços educacionais, como também uma acentuada diferenciação
entre as universidades com os mais variados perfis e missões institucionais que interagem no
mercado de ensino. Isso tudo gera um novo movimento que caracteriza o chamado “mercado
de oferta” em contraposição ao “mercado de demanda” (CALDERÓN, 2000).
Ao voltar ao quadro 9, o qual traz um panorama das universidades comunitárias
pesquisadas, constata-se a oferta de inúmeros produtos àqueles que pretendem ter acesso ao
conhecimento. No quesito Ensino, a soma dos cursos de graduação ofertados chega à casa de
300 formatos entre Bacharelados, licenciaturas, tecnólogos em diferentes áreas do
conhecimento, com mais de 140 opções de ingresso, em diferentes modalidades – presencial e
a distância. Tem-se opções de ensino para todo tipo de público: jovens, idosos, crianças,
adolescentes. Talvez isso se justifique pela busca de adaptação aos novos tempos, cujos
mercado e protagonistas estão em constante modificação, e a possibilidade de estabelecer
vantagem competitiva duradoura não exista mais. Para Tachizawa e Andrade (1999, p. 22),
“nenhuma instituição de ensino superior, enfim, pode se dar ao luxo de descansar sobre seus
louros; cada qual tem de inovar incessantemente para poder competir e sobreviver”. O
“mercado de oferta” exige que essas instituições estejam atentas às demandas do mercado,
oferecendo novos produtos e aprimorando aqueles que já oferecem.
Para McCowan (2018) a expansão contínua do ensino superior traz seus desafios e
conduz ao processo de desagregação, o qual tem sido alavancado essencialmente por
motivações financeiras e liderado pelo setor com fins lucrativos, mas tem também motivações
121
pedagógicas por meio da ênfase na personalização e na empregabilidade. “Este processo
envolve a separação da instituição em seus papéis constituintes e atividades diferentes, e o corte
de funções percebidas como supérfluas, permitindo ao cliente comprar apenas os elementos
desejados” (MCCOWAN, 2018, p. 465).
McCowan aponta alguns riscos que o processo de desagregação pode provocar nas
funções das universidades, como já foi mencionado, entre eles estão a dissociabilidade entre
ensino, pesquisa e extensão; a redução da capacidade das instituições de promover o bem
público e a igualdade de oportunidades; e a ameaça ao que o autor denomina de
hiperporosidade, ou seja, a perda de espaço para reflexão profunda sobre a produção do
conhecimento e, consequente, perda de autonomia para realização de atividades de ensino e
pesquisa.
Para explicar a desagregação, McCowan parte do princípio de que os produtos são
comumente vendidos em pacotes, distinguindo dois tipos de processo e “entrega”: (1º) “os
produtos distintos que, anteriormente, foram vendidos juntos, passam a ser distribuídos
separadamente.” Exemplo: da compra de um CD (Compact Disk) com várias músicas, para a
compra de faixas individuais, ou transmissão sem custo direto; (2º) modelo “no-frills”, “no
qual o produto básico é vendido na sua forma mais barata, sem extras e ornamentos.” Exemplo:
oferta de passagens aéreas de baixo custo, com a retirada de refeições, subsídio de bagagem,
reduzindo os custos das empresas aéreas significativamente, deslocando as companhias aéreas
tradicionais para rotas de curta distância. “Em muitos casos, os consumidores correram para
essas novas opções, pois estão dispostos a sacrificar o conforto e a conveniência adicionais pelo
preço muito reduzido, ou são capazes de comprar os produtos desejados com maior precisão
sem itens indesejados” (MCCOWAN, 2018, p. 468). E como esses fenômenos se apresentam
no ensino superior?
Para McCowan (2018) várias são as formas de desagregação, as quais se manifestam
em diferentes níveis, desde sistemas de Educação Superior, passando por Instituições, Cursos
e chegando aos Quadros Acadêmicos. Entre essas manifestações se apresentam o crescimento
de instituições com foco só no ensino, a terceirização de serviços nas universidades como
refeições, limpeza, suporte acadêmico, a redução da proporção de funcionários permanentes, o
surgimento de vários polos para substituir os campi, o que fragiliza a ideia de universidade
como “lugar”, com alunos estudando a distância em qualquer parte do mundo. O autor apresenta
como exemplos o sucesso da Universidade Aberta na Grã-Bretanha, a Universidade Aberta
Nacional Indira Gandhi na Índia e a Universidade Aberta Allama Iqbal, no Paquistão, com
números expressivos em milhões de estudantes.
122
Como consequência, esse cenário leva a mudanças dos papéis daqueles que frequentam
a academia. Macfarlane (2011, p. 59) evidencia a substituição do acadêmico de tempo integral
por “para-acadêmicos”, intitulados “conselheiros de habilidades, desenvolvedores
educacionais, tecnólogos de aprendizado e gerentes de pesquisa.” O crescimento de professores
não permanentes e a evolução das Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs), as quais
facilitaram a transmissão de palestras para inúmeros estudantes em diferentes e distantes locais,
estimularam o surgimento de um grupo suplementar de “tutores” os quais passam a mediar o
processo pedagógico, atendendo às necessidades dos estudantes. “Esta tendência
inevitavelmente sinalizaria o fim do professor universitário, no papel mais famoso promovido
por Wilhelm von Humboldt, como aquele que se envolve na busca do conhecimento e
simultaneamente orienta os alunos em sua própria busca” (MCCOWAN, 2018, p. 470).
No modelo de ensino superior “no-frills”, instituições, em sua maioria com fins
lucrativos, oferecem cursos mais baratos com diplomas a baixo custo, no período noturno, a
uma população de adultos que trabalha durante o dia e que lutava pelo acesso ao ensino superior.
Essas circunstâncias fragilizam a interação pedagógica e restringem a possibilidade de
vivenciar experiências mais amplas no meio acadêmico. No Brasil, com a expansão do setor
privado, muitos cursos noturnos de baixo curso foram abertos desde o final da década de 1990,
dispersos por cidades nos centros comerciais, com limitados recursos de biblioteca e estudo
autônomo. “A desagregação, portanto, sinaliza o fim do programa de estudo, no qual os
acadêmicos direcionam a aprendizagem através de um processo de seleção e sequenciamento
do conteúdo do conhecimento” (MCCOWAN, 2018, p. 470). Para o autor, os MOOCs seriam
a manifestação mais evidente do processo de desagregação. Talvez resida nesse item, entre
tantos outros, uma das maiores preocupações desse pesquisador no que tange às funções da
universidade.
O panorama da educação superior vem se transformando significativamente,
principalmente, pelo crescente interesse por parte de governos, instituições educacionais e
empresas por cursos on line abertos e massivos. Embora os MOOCs tenham se tornado uma
relevante plataforma para aumentar a acessibilidade à educação superior e à inovação da
educação on line, eles também geram preocupações. Sobretudo, por questões pedagógicas,
como acentua McCowan, no que diz respeito à garantia de qualidade e baixas taxas de
finalização, bem como de certificação e reconhecimento da aprendizagem.
As preocupações de McCowan encontram ressonância nas afirmações de Bates (2012)
quando este afirma que os MOOCs envolvem essencialmente estudo individual e que a falta de
interações pessoais e de discussões ao vivo dificulta uma resposta plena às necessidades
123
individuais dos estudantes; métodos didáticos tidos como antiquados, os quais, em sua maioria,
baseiam-se na transmissão da informação, trabalhos corrigidos por computador e avaliação por
pares. Segundo Bates (2012), alguns mitos estão associados à propagação dessa modalidade de
ensino: (i) a de que os MOOCs aumentam o acesso ao ensino superior nos países em
desenvolvimento; (ii) a de que usam novas pedagogias de ensino; (iii) a de que o acesso a um
grande número de informações vai melhorar o ensino; e (iv) a de que os computadores
personalizam o ensino. Para o pesquisador “qualquer tentativa de tornar o conhecimento de
alguns dos principais especialistas do mundo disponível para qualquer pessoa gratuitamente é
um excelente empreendimento. Se apenas parasse ali” (BATES, 2012).
Ao analisar os apontamentos de McCowan (2017; 2018) sobre ensino superior e
desagregação e a evolução do ensino a distância no Brasil, algumas intersecções e inferências
podem ser estabelecidas ao observar o comportamento das universidades comunitárias.
No Brasil, como já se mencionou, a promulgação da Lei de Diretrizes e Bases (LDB no.
9.394/1996), no artigo 80, cujo caput dispõe que “o Poder Público incentivará o
desenvolvimento e a veiculação de programas de ensino a distância, em todos os níveis e
modalidades de ensino, e de educação continuada.” Com isso, abre-se espaço para a oferta de
cursos na modalidade a distância, em especial em nível superior (GOMES, 2013). Porém, essa
modalidade educacional somente foi regulamentada em 2005 pelo Decreto n° 5.622, que traz
em seu Art 1º a seguinte conceituação:
Art 1o. Para os fins deste Decreto, caracteriza-se a Educação a Distância como modalidade educacional na qual a mediação didático-pedagógica nos processos de ensino e aprendizagem ocorre com a utilização de meios e tecnologias de informação e comunicação, com estudantes e professores desenvolvendo atividades educativas em lugares ou tempos diversos (BRASIL, 2005a).
Várias iniciativas privadas e decretos governamentais foram responsáveis pela criação
e desenvolvimento da Educação a Distância (EaD) no Brasil. Em sua trajetória a EaD passou
pela era do correio, do rádio e da televisão e hoje chega à era da internet, acompanhando as
mudanças tecnológicas no país. Em cada época, sucessivos governos a têm aplicado “como
uma forma economicamente viável de ampliação do acesso para superar a defasagem
educacional latente em diversas regiões do país” (GOMES, 2013, p. 14). Utilizada para ampliar
consideravelmente o número de alunos, baratear os custos e maximizar os lucros, a EaD tem
representado papel importante na expansão do ensino superior privado brasileiro (GOMES,
20013).
Frente à sua impotência em ofertar para população um número satisfatório de
124
universidades federais capaz de absorver uma quantidade razoável da demanda de alunos
existentes, o governo vem criando alternativas para contemplar o maior número possível de
indivíduos. Assim, políticas de estímulo ao alargamento da capacidade de oferecimento dos
cursos superiores passam a ser centrais, e incentivos como o Programa Universidade para todos
(Prouni), o Plano de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni) e a criação
da Universidade Aberta do Brasil (UAB), em 2005, surgem como possibilidade de aumentar a
oferta de ensino superior. Essas iniciativas, deram à Educação a Distância novas perspectivas
no sentido de se consolidar como política pública à medida que seu oferecimento e regulação
vão se institucionalizando (BORGES; JESUS; SILVA, 2013).
Some-se a elas o surgimento de três organizações que também impulsionaram a
expansão dessa modalidade no Brasil, quais sejam: a Associação Brasileira de Teleducação -
ABT, o Instituto de Pesquisas Avançadas em Educação - IPAE e a Associação Brasileira de
Educação a Distância - ABED (ALVES, 2009). A ABED foi criada em 1995 por um grupo de
educadores que tinham interesse em tecnologias de aprendizagem e em Educação a Distância e
é considerada uma sociedade científica sem fins lucrativos e tem como missão: "Contribuir para
o desenvolvimento do conceito, métodos e técnicas que promovam a educação aberta flexível
e a distância" (ABED, 2019). No sítio da ABED (2019), vários catálogos são oferecidos com
um rol de mais de 300 fornecedores de produtos e serviços para educação a distância, bem como
um catálogo com mais de 2.300 profissionais de diversas áreas do conhecimento, muitos com
nível de mestrado e doutorado, oferecendo seus serviços em educação a distância.
Em 2017, o último Censo do Ensino Superior no Brasil, divulgado pelo Instituto
Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), do Ministério da
Educação (MEC), revelou um crescimento das matrículas no nível superior de ensino,
principalmente no setor privado. As matrículas, neste setor, cresceram de 3,9 milhões em 2007
para 6,2 milhões em 2017, em contrapartida, o crescimento por via do setor público foi de 1,3
milhão para 2,1 milhões nesse mesmo período. O setor privado, atualmente, responde por
75,3% das matrículas. O Ensino a Distância se destaca nesse palco. Em 2007, 85% das
matrículas eram presenciais, e apenas 15% no EaD; em 2017, a presença de ingressantes no
EaD já corresponde a um terço das matrículas. Para Neves (2019) “tudo leva a crer que, nos
próximos dez anos, a contribuição do EaD para a expansão do ensino superior no país será ainda
maior.” E acredita que “num futuro próximo, os sistemas de ensino superior partirão cada vez
mais para uma oferta de cursos híbridos, combinando disciplinas presenciais com outras através
da modalidade a distância.” Para os gestores das universidades comunitárias essa expansão vem
criando alguns dilemas quanto ao oferecimento desta modalidade. Afirma R4,
125
Nós estamos exatamente agora discutindo educação a distância. Nós vamos fazer educação a distância porque realmente não tem muita saída. Não tem. Nós vamos ter que fazer educação a distância. Agora temos uma (faculdade) reconhecida e estamos criando mais nove cursos. Vamos criar sete polos. Mas a questão é: qual é o nosso diferencial? Como é que nós vamos garantir a nossa marca e a nossa história de 48 anos nesses cursos? Nós não podemos banalizar como têm muitos fazendo. Nós temos que mostrar que nós podemos fazer uma educação a distância sim, com muito mais responsabilidade, muito mais qualidade. Então, isso sempre vem nas nossas discussões. (R4, 2016).
O tom da fala conduz a uma certa contrariedade à oferta dessa modalidade de ensino.
Afirmações como Nós vamos fazer educação a distância porque realmente não tem muita
saída. Não tem. Estamos criando mais nove cursos. Vamos criar sete polos. Revela a submissão
às regras de um mercado que se apresenta como uma realidade indiscutível, impositiva e gera
preocupações, principalmente com a manutenção da qualidade de ensino ofertado. É certo que
a EaD, mediada por tecnologias comunicacionais, diminui de fato as fronteiras físicas e
revoluciona a noção de espaço, tempo e aprendizagem, mas também apresenta suas limitações.
Não basta ter acesso a uma rede, um domínio mínimo sobre o uso das tecnologias é necessário,
além de conhecimento prévio que o permita ao estudante relacionar conteúdos com os recursos
disponibilizados nas plataformas de ensino. Por isso a pertinência das preocupações colocas
pelo gestor com relação à necessidade constante de se pensar os caminhos que a EaD precisa
percorrer para alcançar uma formação pautada em qualidade de ensino.
Igualmente preocupado se mostra R2, em seu depoimento.
Nós devemos estar hoje, na graduação com dezesseis mil alunos. Já estivemos com dezoito, dezenove mil na graduação, mais pós-graduação e o ensino médio. Nós chegamos a quase vinte e dois mil alunos. Então houve uma redução muito grande neste período. Algo que nós estamos ainda absorvendo para ver como vamos estabilizar. Temos percebido a redução muito grande de alunos nos campi. Campi que nós tínhamos aí setecentos, oitocentos alunos, hoje estamos com duzentos e cinquenta, trezentos. Então houve uma redução muito grande porque lá também teve concorrência. O EaD em algumas situações, ele tem tirado o aluno da sala de aula e não consegue dar a qualidade que promete. Então o aluno sai iludido, porque paga menos e estuda quando quer, mas, na verdade, é um engodo enorme, enorme (R2, 2016).
Há duas preocupações visíveis na fala do gestor: redução do número de alunos
frequentadores da universidade e a oferta de cursos EaD a baixo custo. A primeira motivada
pelo aumento do número de instituições privadas Na região nós temos várias instituições. [...]
têm várias faculdades isoladas, [...] Nós temos, aqui, na cidade, hoje, acho que dezessete ou
dezoito cursos superiores. A concorrência, ela é muito grande (R2, 2016). E a segunda, pela
126
oferta de cursos EaD, o EaD tem tirado o alunado da sala e não consegue dar a qualidade
que promete, o aluno sai iludido, porque paga menos e estuda quando quer, (R2, 2016) o que
também vem motivando a evasão do alunado.
Lisoni e Loyolla (2004) ao comparar os custos entre educação Presencial e a Distância
constataram que os custos de implantação e operação de cursos presenciais são superiores aos
de cursos a Distância, sendo estes economicamente mais viáveis quando a intenção é buscar o
equilíbrio entre oferta e demanda. Assim, fatores como a necessidade de incluir mais pessoas
em cursos superiores imposta pelo mundo do conhecimento, a demanda crescente por educação
em nível superior, e a escassez de recursos para tais atendimentos, atrelados aos incentivos de
ações do setor privado e decisões tomadas no âmbito das políticas públicas, se apresentam em
terreno fértil para o aumento da prática da educação a distância no Brasil, tornando o cenário
cada vez mais difícil para as universidades comunitárias, as quais oferecem mais de 90% de
seus cursos na modalidade presencial. R4 comenta
Tem muitas (instituições) cedendo (ao mercado). E, aí, cedendo, entra numa lógica, como que eu vou dizer, numa lógica, numa série de diminuição das suas funções como universidade. Porque a lógica, lá, é pelo menor custo, pelo menor preço, pela pressa, por um monte de coisas. E isso é muito perigoso. Se quisessem destruir o próprio planeta, elas iam entrar nessa lógica doida. (R4, 2016).
Em sua fala faz uma analogia interessante com o canto da sereia. [...] A gente não pode
cair também nesse outro extremo [...] que nem Ulisses lá, o canto da sereia, e achar que aquilo
é são mil maravilhas, porque é sedutor aquilo que está sendo dito ali fora. Ou seja, o gestor
está ciente de que não é tão simples assim fazer mudanças em modelos de ensino. Todos
requerem muito planejamento e boa execução para que efetivamente possam surtir bons
resultados.
E continua R2 [...] os outros cursos da cidade, enfim, as demais instituições, elas fazem
o que nós fazemos também. Como é que nós vamos nos diferenciar? O dilema se estabelece
quando a realidade bate à porta e coloca em risco a própria existência da instituição. No final
do primeiro semestre de 2018, os polos de ensino EaD somavam 15.394 unidades. O número
representa um crescimento de 133% em relação a 2017 (ABED, 2018). Entre os fatores
responsáveis pelo crescimento está a edição do Decreto nº 9.057, em maio de 2017 (BRASIL,
2017), que regulamentou a modalidade de ensino, mas flexibilizou as exigências para a
implantação dos polos. Com o Decreto, as IES passaram a poder implantar cursos a distância
sem a obrigação de oferecer cursos presenciais.
127
Esse cenário expansionista foi impulsionado também, em parte, pela publicação, no
final de 2018, da Portaria nº 1.428, que dispõe sobre a oferta, por IES, de disciplinas na
modalidade a distância em cursos de graduação presencial e da Portaria nº 275, que dispõe sobre
os programas de pós-graduação stricto sensu na modalidade a distância. E então ecoa
novamente a pergunta: Como é que nós vamos nos diferenciar? Como as universidades
comunitárias podem se posicionar frente a mudanças tão agressivas e velozes que adentram o
universo da educação presencial e fomentam a educação a distância? Ao fazer-se esse
questionamento, é visível a preocupação do gestor com a possível perda dos traços que
caracterizam a instituição e que a tornam singular. Essa situação traz à tona, novamente,
algumas reflexões sobre identidade organizacional.
Bretas Pereira (1988, p. 20), afirma que “O caráter ou identidade é a marca que a
diferencia de todas as outras. Somente ao tornar-se infundida de valor, a organização adquire
uma identidade”. Assim, o que torna uma organização única e ímpar são suas maneiras
peculiares de agir e de acreditar, por meio da sua cultura organizacional a qual indica a relação
dos valores e crenças. Consciente da natureza comunitária de sua instituição, consciente da
natureza do valor instrumental dado ao conhecimento e da característica indissociabilidade das
funções ensino, pesquisa e extensão, o gestor vê ameaçadas tais singularidades, na medida em
que se sente pressionado a oferecer um produto que pode se assemelhar a tantos outros no
mercado, dada a concorrência de instituições privadas que competem com base no menor preço
das mensalidades.
A preocupação dos gestores é pertinente. É notória a complexidade dos indicadores de
qualidade dessa modalidade de ensino cuja proposta precisa estar integrada ao Plano de
Desenvolvimento Institucional e à comunidade. O compromisso institucional na formação dos
profissionais coloca-se como prioridade quando a questão é a qualidade de ensino que se deseja
oferecer, compromisso este expresso em itens como concepção de educação e currículo no
processo de ensino e aprendizagem; sistemas de comunicação; material didático; forma de
avaliação; equipe multidisciplinar; infraestrutura de apoio; gestão acadêmico administrativa e
sustentabilidade financeira.
Observando o quadro 9 e retornando aos PDIs das universidades comunitárias, vê-se
um movimento no sentido de adaptar-se às novas políticas públicas para a EaD, por meio do
oferecimento de EaD, ao mesmo tempo em que todas elas buscam garantir a qualidade que
sempre lhes foi cara. Para UNI1 a utilização de ambientes de aprendizagem na modalidade a
distância surge como oportunidade de criação de outros espaços formativos, rompendo com
modelos tradicionais de ensino e de aprendizagem, centralizados no professor (UNI1, PPI,
128
2017-2021, p. 32). Para isso, a Universidade disponibiliza o serviço de Assessoria à Educação
a Distância, que tem por objetivo construir, apoiar e ampliar a cultura de EaD na Instituição.
E continua
A concepção é de uma educação atualizada e inovadora; um sistema de comunicação amplo e adequado; um currículo e material didático qualificado para a modalidade; avaliação adequada que leve em consideração o processo de aprendizagem; apoio de uma equipe multidisciplinar; infraestrutura de apoio; gestão acadêmico-administrativa, além de mecanismos que garantam a sustentabilidade financeira (UNI1, PPI, 2017-2021, p. 32).
Para UNI2 a EaD é uma modalidade de ensino que não substitui a presencial. Constitui-
se numa alternativa pedagógica, comprometida com o processo de formação humana, para
ampliar as possibilidades de acesso ao saber científico. Para sua efetivação, a UNI2 planeja
ampliar a oferta de cursos de graduação, extensão e pós-graduação, tanto nos formatos a
distância quanto nos híbridos (UNI2/PPI, 2017, p. 106). Entre as políticas que norteiam as ações
da UNI4 relativas à implementação da EaD estão as seguintes: fortalecimento da cultura
institucional de EaD em todos os níveis de atuação da IES, comprometimento com a qualidade
nos projetos em EaD, ampliação do acesso aos cursos de educação superior, formação
continuada dos profissionais na EaD, gestão colaborativa da EaD e disponibilização de recursos
e infraestrutura tecnológica e profissional (UNI4/PPI, 2017, p. 80). Tais políticas se veem
descritas com muita semelhança no PPI da UNI3. Incluam-se na lista: ampliação de parcerias
internas e externas para a oferta de cursos e serviços em educação a distância, adequação e
aprimoramento dos processos administrativos e acadêmicos da instituição para atendimento às
especificidades da EaD.
Ao descrever o modelo de EaD projetado, a UNI3 informa que este segue um desenho
híbrido, ou seja, vídeo aulas são disponibilizadas em conjunto com o uso de materiais
impressos, com alguns encontros presenciais.
Talvez o que chame a atenção da modalidade EaD seja a quantidade de alunos que são
atendidos por um único professor ou tutor. E como se dá o monitoramento do processo de
aprendizagem deste estudante? É possível acompanhar o desenvolvimento das habilidades e
competências desse alunado?
Oferecer um ensino com custos mais acessíveis, com menos tempo na universidade,
mais flexibilidade curricular “são apenas sinais dos tempos”, afirma Neves (2019). O acesso ao
conhecimento não está mais necessariamente restrito a uma sala de aula com um professor
presencial, mas se dá também por meio de diferentes canais.” Neves ainda argumenta que o
129
fato de ser um curso presencial não lhe garante qualidade. Caso o país queira, efetivamente,
cumprir o que está posto na meta 12 do Plano Nacional de Educação (PNE): chegar a 33% de
jovens entre 18 e 24 anos, no ensino superior, até 2024, deverá expandir com qualidade a oferta
deste nível, e “o ensino a distância pode ser um instrumento importante para esse fim, desde
que a sua qualidade seja assegurada” (NEVES, 2019).
Para Rocha (2019) para se tornar um concorrente não basta mudar de modelo presencial
para híbrido, ou 100% EaD para híbrido. Deve-se ter o cuidado com a seleção e qualificação
do corpo técnico e dos professores, o investimento em marketing digital integrado com políticas
de captação e manutenção do estudante, investimento em flexibilização da oferta baseada em
fatores de riscos regionais e culturais, investimento na infra tecnológico-digital dos polos, oferta
de mestrado e doutorado a distância regionais, pelos polos. Enfim, parece que, tão importante
quanto a decisão de mudar de modelo, é pensar no tipo de “pacote” será oferecido ao potencial
“cliente” (MCCOWAN, 2018).
Essas questões levam a reflexões sobre a EaD no ensino superior dentro do que seriam
suas possibilidades e seus limites de seu uso. Teriam as universidades comunitárias capacidade
para promover a expansão do ensino superior em quantidade e qualidade que a modernidade
exige? Seus PPIs descrevem suas políticas de expansão em EaD, apresentam suas metas e
objetivos, mas estariam elas preparadas para sofrer alterações no que tange à defesa da tese da
indissociabilidade do ensino, pesquisa e extensão? Novos tempos, novas adaptações, novas
identidades? Há uma lógica na expansão do ensino superior brasileiro, claramente privatista,
quantitativista e concentrada em determinadas áreas do conhecimento. A EaD não está,
obviamente, alheia a esse fenômeno. Apesar das potencialidades encontradas nessa nova
modalidade educacional, é pertinente refletir se a sua ampliação representa de fato um caminho
para democratização do ensino superior e consequente formação crítica do cidadão (DIAS
SOBRINHO, 2005; NASCIMENTO; CARNIELLI, 2007; COSTA; COCHI, 2013; VIEIRA;
SILVA; VIEIRA, 2017).
Buscou-se ilustrar, por meio da contextualização da EaD, um dos dilemas por que
passam as universidades comunitárias no que tange a uma de suas funções, o ensino. A EaD e
seus desdobramentos, atrelada às políticas públicas para o ensino superior, talvez seja,
atualmente, um dos fenômenos que mais represente os processos de mercantilização e
desagregação, nos quais o desenvolvimento dos fins e dos meios da educação superior se
reorienta conforme os princípios e a lógica do mercado, e sob os quais “a educação, gradativa
e progressivamente, perde o status de bem público e assume a condição de serviço comercial”
(BERTOLIN, 2011, p. 237).
130
Longe de esgotar as aflições dessas instituições, ainda aparecem no cenário
preocupações ligadas à internacionalização, movimento este em resposta aos inúmeros desafios
advindos do processo de globalização e que passou a ser reconhecida como um diferencial de
qualidade e de competitividade na oferta do ensino superior. Programas de internacionalização
no campus (IaH) e/ou de internacionalização de currículos (IoC) objetivam expor todos os
alunos de uma instituição a um currículo que contemple a orientação internacional e
multicultural, não mais se prendendo à função pesquisa, exclusivamente, mas estendendo-se à
função ensino. Todos os PDIs analisados trazem as políticas voltadas a esse universo e
descrevem seus objetivos e esforços investidos nessa dimensão. Este é outro item que merece
estudo e detalhamento em momento oportuno.
Outro componente importante da tríade é a pesquisa. Talvez a função universalmente
reconhecida da universidade, porque estabelece estreita relação com a formação humana e com
o desenvolvimento da sociedade, seja a construção de conhecimentos. Para Vannucchi (2011,
p. 53), “pesquisa é questionamento sistemático e criativo da realidade. É espírito investigativo
crítico em qualquer ação pedagógica; É a curiosidade consequente e coerente de quem assume
postura de reflexão construtiva e propositiva em face a realidade.” Vista assim, a pesquisa
pressupõe a busca sistemática do saber, alcançada pela desconstrução dos conhecimentos, como
caminho necessário para a construção de algo novo.
Para que uma instituição possa ser reconhecida oficialmente como “universidade”, a
produção de conhecimentos sistemática e em alto nível é uma entre tantas das exigências legais.
A legislação nacional, ao estabelecer os parâmetros fundamentais da uma universidade, indica
como divisor de águas entre ela e as demais instituições de ensino superior, a indissociabilidade
entre ensino, pesquisa e a extensão, “pilar da universidade como construtora do saber, de um
saber que transforma e que se comunica, que se irradia” (LIMA, 2009, p. 93). Entre as
condições, critérios e indicadores que devem atender uma Universidade, também figuram:
produção científica e intelectual consolidada, linhas e grupos de pesquisa definidos, patamares
de tempo integral e de formação dos docentes em nível de pós-graduação stricto sensu, com
destaque para o doutorado (Decreto nº 2.207, de 15 de abril de 1997) (DIAS SOBRINHO,
1998). Portanto, as exigências para trazer no nome a denominação “universidade” são muitas
e, se aplicam, portanto, às universidades comunitárias.
Ao analisar os elementos que sustentam a missão das instituições comunitárias em
estudo, ficou evidente o grau de relevância atribuído à pesquisa por essas instituições:
“Produzir, sistematizar e socializar conhecimento [...]” (PDI/UNI1), “Produzir e difundir
conhecimentos que promovam a melhoria da qualidade de vida [...] (PDI/UNI2); “Produzir e
131
socializar o conhecimento pelo ensino, pesquisa e extensão[...]” (PDI/UNI3); “Promover, por
meio do ensino, da pesquisa e extensão, o desenvolvimento regional para melhorar a qualidade
[...]” (PDI/UIN4). A expressão “produzir conhecimento” se apresenta enfaticamente, o que
traduz a convicção de que “sem o cultivo da atividade científica e do pensamento crítico em
qualquer ação pedagógica, não conseguirá gerar conhecimento, nem provocar avanços
tecnológicos, nem formar profissionais competentes e socialmente comprometidos”
(VANNUCCHI, 2011, p. 54). A busca pelo conhecimento, assim, parece indissociável à
concepção que essas instituições têm sobre seu papel como universidades comunitárias.
A pesquisa é “um processo de construção do saber que objetiva a produção e/ou a
ampliação do conhecimento científico e tecnológico” (PPI/UNI4, 2017, p. 43), processo este
fundamentado nas ações da pós-graduação e que se difunde nas ações de ensino e nas ações da
extensão, sedimentando a indissociabilidade entre os três elementos. Em seu PPI, a UNI2
defende que a qualidade do ensino universitário depende da prática investigativa da instituição.
Considerando a velocidade com que o conhecimento se transforma, sem a pesquisa, o ensino
acadêmico perderia o seu caráter formativo, tornando-se meramente informativo. Este já é um
argumento suficiente que compromete a universidade a estimular a formação de grupos de
pesquisa, compostos por docentes e discentes, nas mais diferentes áreas do conhecimento, a fim
de promover a reflexão sistemática e racional da realidade, bem como desenvolver
competências em busca de respostas que superem os desafios em torno das diferentes
problemáticas presentes na sociedade (PPI/UNI2, 2017).
Ao fazer uma fotografia do quesito Pesquisa, presente no quadro 10 constata-se um
volume substancial de ações das universidades comunitárias com o intuito de promover a
construção do conhecimento, principalmente voltadas ao desenvolvimento onde estão inseridas.
Quadro 10 – Principais Atividades de Pesquisa das Universidades Comunitárias
ATIVIDADES DE PESQUISA – UNIVERSIDADES COMUNITÁRIAS UNI1 UNI2 UNI3 UNI4 11 Cursos de Doutorados
17 Cursos de Mestrados
70 Cursos de Especialização
93 Grupos de Pesquisa cadastrados no CNPq;
331 Linhas de pesquisa
269 Bolsas de Pós-Graduação
219 Bolsas de Iniciação Científica e Tecnológica
21 Núcleos de Inovação e Desenvolvimento
Parque de Ciência, Tecnologia e Inovação
Incubadora Tecnológica e Startups
6 Cursos de Doutorado
15 Cursos de Mestrado
57 Cursos de Especialização
322 projetos de pesquisa
90 Grupos de Pesquisa cadastrados no CNPq;
Mais de 200 Linhas de Pesquisa
Mais de 200 Bolsas de Iniciação Científica e Tecnológica
Incubadora Tecnológica e Startups
Parque Científico e Tecnológico do Planalto
6 Cursos de Doutorado
11 Cursos de Mestrado
35 Cursos de Especialização
24 Cursos de especialização EAD
311 projetos de pesquisa
101 grupos de pesquisa cadastrados no CNPq;
Mais de 400 bolsas de Bolsas de Iniciação Científica e Tecnológica
Incubadora Tecnológica de Cooperativas Populares – ITCP
UNIINOVA – Núcleo de
2 Cursos de Doutorado
7 Cursos de Mestrado
28 cursos de Especialização
379 projetos de pesquisa
121 grupos de pesquisa cadastrados no CNPq
Mais de 200 bolsas de Iniciação Científica
IPARQUE – Parque Científico e Tecnológico
IPAT- Instituto de Pesquisas Ambientais e Tecnológicas
IDT – Instituto de Engenharia e Tecnologia
IALI – Instituto de Alimentos
132
ATIVIDADES DE PESQUISA – UNIVERSIDADES COMUNITÁRIAS UNI1 UNI2 UNI3 UNI4 110 Registros de patentes no Instituto Nacional de Propriedade Intelectual – INPI
Instituto de Biotecnologia, Instituto de Pesquisas Clínicas para estudos Multicêntricos; Instituto de Materiais Cerâmicos; Instituto de saneamento ambiental; Instituto Memória Histórica e Cultural; Instituto de Pesquisas econômicas e sociais
EDITORA: Publicação de mais de 1.200 títulos
PUBLICAÇÕES: 10 revistas acadêmicas
Participação programas de financiamento: FIES, PROUNI
Comitê de Ética em Pesquisa
Médio
Parque de Geração Solar Fotovoltaica
Museu Histórico, de Artes Visuais e Zoobotânico
EDITORA: Publicação de mais de 800 títulos
PUBLICAÇÕES: 12 revistas acadêmicas
Participação Programas de financiamento: FIES, PROUNI
Comitê de Ética em Pesquisa
Inovação e Tecnologia
ITE – Incubadora Tecnológica Empresarial
CERUMA(R) - Parceiro Propriedade Intelectual
Instituto de Pesquisas Sociais
Museu Oceanográfico
EDITORA: Publicação de mais de 160 títulos
PUBLICAÇÕES: 5 revistas acadêmicas
Participação Programas de financiamento: FIES, PROUNI, FUMDES
Comitê de Ética em Pesquisa
IPESE – Instituto de Pesquisa Socioeconômica Aplicada
ITEC IN – Incubadora Tecnológica de Ideias e Negócios
Incubadora Tecnológica e Startups
Planetário
Museu de Zoologia - Centro de referência na pesquisa científica, na educação ambiental e no turismo cultural
Museu Tecnológico
Museu Mineralógico
EDITORA: Publicação de mais de 100 títulos entre 2013-2018
Participação Programas de financiamento: FIES, PROUNI, FUNDES
Comitê de Ética em Pesquisa
Fonte: Dados coligidos pela autora a partir dos PDIs, Relatórios de Responsabilidade Social e Sítios eletrônicos – Período de referência 2017-2018
Junto às ações de ensino, esse universo de pesquisa, alavancado pelo envolvimento de
centenas de pesquisadores e jovens estudantes transforma-se numa potencial força motriz na
busca de soluções para problemas de toda natureza que, por ventura, aquela comunidade possa
ter. Ao se referir à pesquisa, R2 afirma
A universidade sempre se caracterizou por fazer pesquisa. [...] Nós tínhamos em 2010, um doutorado. Hoje nós estamos com seis. E isto significa que esta ciência que é praticada aqui, ela não está escondida. Ela está à disposição da comunidade. [...] Na época, nós tínhamos sete programas de mestrado. Hoje nós temos dezesseis. Olha o que nós crescemos. Crescemos para quê? Para dizer que nós crescemos? Não. Crescemos exatamente para mostrar o nosso potencial” (R2, 2016).
As palavras do gestor são avalizadas no PPI da instituição, quando afirma:
Especialmente numa universidade que se classifica como comunitária, as ações de pesquisa
devem surgir das questões dessa comunidade e seus resultados devem traduzir-se em práticas
de inovação e iniciativas de extensão universitária (PPI/UNI2, 2017, p. 60). Ao se entrelaçar
os discursos, evidencia-se, mais uma vez, a tese de que a universidade leva o conhecimento à
comunidade por meio de ações de ensino e extensão, as quais se constituem fontes de pesquisa,
retroalimentando desta forma o ensino. O ensino e a extensão são geradores de novas pesquisas
na medida em que identificam necessidades e novos anseios na comunidade.
Dias Sobrinho (1998) comenta que a pesquisa normalmente é identificada como um
133
trabalho de uma elite de cientistas que produz o avanço científico e tecnológico de alto nível, o
qual deve responder às mais importantes demandas de setores da sociedade, principalmente, ao
desenvolvimento do sistema industrial avançado, apesar de não ser a única definição sobre
pesquisa, afirma que ainda é a mais propagada. Porém, o autor acrescenta que há muitas
instituições com forte vínculo regional que desenvolvem investigações com qualidade e
relevância social, cuja natureza é outra. “Refiro-me àquele tipo de pesquisa que se realiza como
construção do conhecimento com forte sentido de pertinência” (DIAS SOBRINHO, 1998, p.
23). Igualmente o autor se refere à reconstrução de saberes com forte inserção local e a chama
de “pesquisa necessária” do ponto de vista social, para distingui-la da “alta pesquisa”. Para o
autor, ensinar e produzir conhecimentos, numa instituição educativa vai além do simples
treinamento e aplicação. Diz respeito “ao compromisso social dessa instituição, à sua função
pública” (DIAS SOBRINHO, 1998, p. 24). Isso remete à concepção de que o ensino e a
pesquisa devem estar intimamente ligados aos valores da própria sociedade que lhes serve de
referência. Ensino e pesquisa devem ter significação social, devem ter pertinência, isto é,
precisam estar enraizados no terreno das aspirações e contradições públicas” (DIAS
SOBRINHO, 1998, p. 24).
Ao fazer referência à política voltada à pesquisa, a UNI3 tem como um de seus objetivos
promover a produção e a disseminação do conhecimento, por meio do fomento à produção
científica e tecnológica docente e discente e do investimento em parcerias que consolidem a
pesquisa, a formação de recursos humanos e a cultura (PPI/UNI3, 2017). Esse objetivo
também é compartilhado pelas outras universidades e permeia o discurso de seus PPIs. Para
que esse objetivo se concretize programas institucionais de apoio à pesquisa e ações de inter-
relação entre pesquisa e ensino, do ensino médio à pós-graduação são fomentados pelas
instituições os quais estimulam o desenvolvimento da pesquisa e promovem a construção e a
disseminação de conhecimento (PPI/UNI3, 2017, p. 111). A concretização da associação entre
ensino, pesquisa e extensão não é trabalho fácil e não se realiza apenas no professor ou no
estudante: é tarefa institucional, a qual requer uma estrutura organizativa, “voltada para a
superação da fragmentação que marca o modelo usualmente adotado pelas instituições
educacionais, materializado na divisão social do trabalho entre os que decidem e os que
executam, originário do modelo empresarial burocrático e tecnicista” (MAZZILLI, 2011, p.
218).
Vários pré-requisitos se apresentam como condição sine qua non para a consecução da
associação entre ensino, pesquisa e extensão, entre eles estão: elaboração de projetos
institucionais que apresentem as diretrizes e orientem as ações previstas para sua realização;
134
projetos coletivos de trabalho, interligando ações acadêmicas e administrativas; práticas de
avaliação institucional considerando todo o trabalho realizado pela universidade; modelos de
gestão que possibilitem a participação de todos os segmentos no processo de decisão e de
avaliação do trabalho acadêmico; corpo docente com sólida formação científica e pedagógica,
organicamente vinculada ao projeto da universidade; e condições materiais para a realização do
projeto pretendido (MAZZILLI, 2011). Essa breve descrição das condições mínimas
necessárias para promover o entrelaçamento da tríade que sustenta a instituição como
universidade, dá a dimensão das superações que as universidades comunitárias vêm
enfrentando nessa caminhada de mais de 50 anos na construção de sua identidade.
Outras ações sedimentam o objetivo de promover a produção e a disseminação do
conhecimento, descritas pela UNI4, como o fortalecimento do ambiente institucional para o
desenvolvimento da pesquisa, para isso investe na ampliação e atualização da infraestrutura,
estimula o surgimento de grupos e redes interinstitucionais de pesquisa, apoia o processo de
formação e qualificação de novos pesquisadores (UNI4, PPI, 2017). Ao fazer referência aos
seus programas de incentivo à pesquisa, R4 comenta
Cada programa de mestrado e doutorado nosso tem 12 horas/aula de pro estrito. Eles [os professores] têm o recurso todo ano para poder investir na sua pesquisa para apresentar trabalho, para gastar com material. O que eles precisam, todos eles têm. [...] Nós temos cerca de 160 grupos de pesquisa cadastrados no CNPq aqui dentro da universidade, hoje, e temos quase 70 financiados pela universidade. Tem política que inclui até alguns horistas também [...] se tem mínimo de 16 horas, eles também podem participar de alguns programas de pesquisa (R4, 2016).
Assim, com o apoio de seus gestores, a universidade comunitária, de modo proativo,
preserva e aprofunda as suas atividades de pesquisa, orientando e gerenciando os programas de
Bolsas de Estudo, buscando fontes financiadoras como CNPq, Finep, Capes e fundações
estaduais de apoio à pesquisa (Fapesp). No elenco de programas de incentivo oferecidos pela
UNI3, por exemplo, encontram-se os seguintes: Programa de Bolsas de Iniciação Científica
(Probic); Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (Pibic); Programa de Bolsas
de Pesquisa do Artigo 170 da Constituição Estadual; Programa Institucional de Bolsas de
Iniciação Científica do ensino Médio (PIBIC-EM); Artigo 171 – Fundo de apoio à Manutenção
e ao Desenvolvimento da Educação Superior do Governo do Estado de Santa Catarina;
Programa de Pesquisa Voluntária; Programa Institucional de Bolsas de Iniciação em
Desenvolvimento Tecnológico e Iniciação (PIBITI/CNPq); Programa Institucional de
Desenvolvimento Tecnológico e Inovação (Proinova). Observa-se que alguns programas de
135
incentivo estão vinculados ao governo do Estado onde se situa a universidade, o que demonstra,
em parte, a preocupação por parte do poder público em alavancar e fortalecer as atividades
voltadas à formação de bons profissionais, bem como fomentar a produção de novos
conhecimentos que se traduzam em novas frentes de inovação para o Estado. Iniciativas de
parcerias com o Estado de origem também ocorrem nas outras universidades em estudo.
Para Demo (2006) não há como falar em universidade sem pesquisa, esta deve se dar
em um processo que perpassa toda a vida acadêmica. Conforme o autor, a pesquisa
É um princípio científico e educativo que faz parte do processo emancipatório. [...] Sem ela não há como falar de universidade, se a compreendermos como descoberta e criação. Somente para ensinar, não se faz necessária essa instituição e jamais se deveria atribuir esse nome a entidades que apenas oferecem aulas (DEMO, 2006, p. 36).
Oportunizada por trabalhos de iniciação científica, por monografias de conclusão de
curso, pela participação crescente de professores e acadêmicos em projetos e programas
desenvolvidos pelos departamentos e áreas do conhecimento da universidade, a pesquisa
garante “o suporte às atividades de ensino e de extensão, consolida grupos e redes, sustenta a
pós-graduação e a produção intelectual, realimenta e qualifica a extensão universitária”
(WAHLBRINCK; PACHECO, 2016, p. 20).
Os programas em nível nacional também são oferecidos por todas as universidades. Em
2017, foram ofertadas mais de mil e seiscentas (1600) Bolsas de Estudo, nos Programas de
pesquisa dessas universidades. São docentes e discentes que recebem auxílio para desenvolver
suas atividades em cerca de quatrocentos (400) grupos de pesquisa, ancorados em torno de mil
(1000) linhas de pesquisa. Esse cenário, certamente, vai impactar positivamente na
transformação da realidade no entorno dessas instituições. Por sua forte conexão com a região
onde estão instaladas, essas universidades desencadeiam um processo de desenvolvimento
técnico-científico de alto valor agregado. Junte-se a isso, os Institutos de pesquisa, os quais têm
contribuído eficazmente para a solução de problemas no campo educacional, empresarial e na
conservação e preservação ambiental (LIMA, 2009). Esse panorama conduz as universidades
comunitárias a fazer parte de um seleto rol de instituições avaliadas por diferentes entidades
(públicas e privadas) credenciadas, as quais julgam o trabalho realizado por elas, considerando
vários indicadores como pesquisa, internacionalização, inovação, ensino e mercado. Ao visitar
os PDIs e os Relatórios de Responsabilidade Social, foi possível colher uma série de
informações sobre os lugares que ocupam nos rankings nacionais e internacionais. O quadro 11
apresenta o resultado da participação entre 2017 e 2018.
136
Quadro 11 - Rankings e Avaliações das Universidades Comunitárias entre 2017-2018 UC RANKINGS/AVALIAÇÕES UNI1
- 42ª entre as públicas e privadas do país. - Ranking Universitário da Folha (RUF) (2017 e 2018) - 2ª em Inovação entre as Universidades Comunitárias e Privadas do país (posição que se mantém) - Ranking Universitário da Folha (RUF)12. (2016-2018) - 5ª em Pesquisa, entre as 84 instituições de ensino superior comunitárias e privadas do país. (2018) - 20ª no ranking das universidades mais empreendedoras no Brasil, entre as 55 instituições de Ensino Superior avaliadas pela Emerge. (2018) - 1º lugar no ranking entre as universidades comunitárias e privadas mais empreendedoras, e 3º lugar na totalidade das instituições gaúchas avaliadas pela Emerge. (2018) - 75 cursos de graduação estrelados pelo Guia do Estudante da Editora Abril (2018) Índice Geral de Cursos - IGC13 - 2017, 2016 e 2015: conceito 3
UNI2
- 71ª melhor entre as públicas e privadas do país. - Ranking Universitário da Folha (RUF) (2017 e 2018) - 4ª melhor entre as instituições privadas do Rio Grande do Sul - Ranking Universitário da Folha (RUF) (2018) - 11ª melhor entre as IES públicas e privadas do Rio Grande do Sul - Ranking Universitário da Folha (RUF) (2018) - 1º lugar Cursos de Agronomia e Medicina Veterinária oferecidos pelas IES privadas do Rio Grande do Sul - 8º lugar Curso Agronomia no ranking nacional entre todas as IES privadas do Brasil. - 56 cursos de graduação estrelados pelo Guia de Estudante da Editora Abril14 (2017) - 57 cursos de graduação estrelados pelo Gui de Estudante da Editora Abril (2018) Índice Geral de Cursos – IGC -2017, 2016 e 2015: conceito 3
UNI3
- 74ª melhor entre as públicas e privadas do país. - Ranking Universitário da Folha (RUF) (2017) - 75ª melhor entre as públicas e privadas do país. - Ranking Universitário da Folha (RUF) (2018) - 18ª melhor universidade brasileira entre as não públicas Ranking Universitário da Folha (RUF) (2018) - 1º lugar melhor Curso de Turismo e Hotelaria de Santa Catarina Ranking Universitário da Folha (RUF) (2018) - 51 cursos de graduação estrelados pelo Guia de Estudante da Editora Abril (2018) - 29ª posição entre públicas e privadas brasileiras (IGC/ MEC) (2018) - 6ª posição entre as instituições sem fins lucrativos (IGC/MEC) (2018) - 1ª posição Melhor universidade não pública de Santa Catarina – (IGC) (2018) - Está entre as 81 melhores universidades da América Latina - Times Higher Education (THE)15. - 32ª no ranking geral entre as instituições brasileiras e a 7ª entre as não-estatais (Times Higher Education) (2017) - 3ª melhor organização para trabalhar, no ranking das Grandes Empresas, em Santa Catarina (consultoria Great Place to Work (GPTW)(2017) - 10ª colocada entre todas as IES do Sul do Brasil e a 4ª não-pública (Times Higher Education) (2017) Índice Geral de Cursos – IGC 2018: conceito 4 2017: conceito 3
UNI4
- 76ª melhor entre as públicas e privadas do país. - Ranking Universitário da Folha (RUF) (2017) - 87ª melhor entre as públicas e privadas do país. - Ranking Universitário da Folha (RUF) (2018) - 2ª melhor instituição entre as Universidades Comunitárias de Santa Catarina (IGC/MEC) (2017) - 18 cursos de graduação estrelados pelo Guia de Estudante da Editora Abril (2017 e 2018) - 18ª melhor Universidade do país entre as instituições não públicas do país (RUF) 2017 - 1ª posição entre as IES não públicas em Santa Catarina, no quesito pesquisa (RUF) 7ª melhor IES do Brasil (2017) - 62ª melhor em pesquisa do país entre as instituições públicas e não públicas (RUF) (2017) - No quesito internacionalização, a Universidade saltou do 35º lugar no ranking nacional das instituições não públicas em 2016 para a 11º posição (2017) - 2ª melhor IES Empreendedora do Brasil, entre as não públicas (Índice das Universidades Empreendedoras). Estudo realizado pela Brasil Júnior, com apoio da consultoria McKinsey, divulgado na Revista Pequenas Empresas & Grandes Negócios (2016) Índice Geral de Cursos – IGC 2018 e 2017: conceito 3
Fonte: Dados coligidos pela autora a partir dos PDIs e dos Relatórios de Responsabilidade Social das universidades comunitárias. Período 2017-2018
12 O RUF - Ranking Universitário Folha - é uma avaliação anual do ensino superior do Brasil feita pela Folha desde 2012. Há dois produtos principais: o ranking de universidades e os rankings de cursos. No ranking de universidades estão classificadas as 196 universidades brasileiras, públicas e privadas, a partir de cinco indicadores: pesquisa, internacionalização, inovação, ensino e mercado. No ranking de cursos é possível encontrar a avaliação de cada um dos 40 cursos de graduação com mais ingressantes no Brasil de acordo com o último Censo da Educação Superior disponível, a partir de dois indicadores: ensino e mercado. Nos rankings de cursos são avaliadas universidades, centros universitários e faculdades (Fonte: https://ruf.folha.uol.com.br/2018/o-ruf/). 13 O índice Geral de Cursos Avaliados da Instituição – (IGC) é um indicador de qualidade que avalia as Instituições de Educação Superior (Fonte: http://portal.inep.gov.br/indice-geral-de-cursos-igc-). 14 O Guia de Estudante da Editora Abril é uma pesquisa feita, basicamente, com professores e coordenadores de curso. Eles emitem conceitos que permitem classificar os cursos em bons (três estrelas), muito bons (quatro estrelas) e excelentes (cinco estrelas) (Fonte: https://guiadoestudante.abril.com.br/universidades/entenda-a-avaliacao-de-cursos-2017-do-guia-do-estudante/). 15 O Times Higher Education um dos rankings mais respeitados do mundo. Junto com o QS Ranking e o Academic Ranking of World Universities, é uma das mais importantes classificações educacionais do mundo. O ranking avalia universidades fortes em pesquisa do redor do mundo e baseia-se nos principais critérios que guiam uma instituição: ensino, pesquisa, transferência de conhecimento e visão internacional. São usados 13 indicadores no intuito de deixar a relação entre as universidades a mais justa possível (Fonte: https://www.lae-edu.com.br/lae-responde-times-higher-education).
137
Observa-se que as universidades comunitárias estão sendo avaliadas por diversas
entidades credenciadas a lhes aferir notas e conceitos, partindo de determinados indicadores de
qualidade, entre eles pesquisa, internacionalização, inovação, ensino e mercado. Os indicadores
apontam posição em nível internacional, nacional e estadual, contemplando instituições
públicas e privadas, bem como universidades, centros universitários e faculdades. A UNI1 se
destaca nos quesitos pesquisa e empreendedorismo, mantendo a 42ª posição no Ranking
universitário da Folha – RUF, por dois anos seguidos; a UNI1 se destaca no cenário estadual,
apresentando suas boas performances em relação às instituições privadas. Sobre novas
estratégias de se fazer perceber nesse mercado, R2 comenta
Então, nós vamos fazer uma comunicação institucional. Ela acaba não sendo percebida. Então nos últimos tempos nós já estamos fazendo assim: o curso de Direito, que a OAB recomenda. A Agronomia ganhou o prêmio “Os
melhores da terra”. Esse prêmio nós ganhamos da Revista Granja no mês passado. Esse prêmio é um prêmio que nos insere no cenário do agronegócio nacional. [...] E esse ano nós fomos agraciados e isso tem um peso enorme. Tem um peso grande (R2, 2016).
A UNI3 está entre as 81 melhores universidades da América Latina e - 32ª no ranking
geral entre as instituições brasileiras e a 7ª entre as não estatais; a UNI4 se destaca em pesquisa
e internacionalização, sendo que neste último quesito, saltou do 35º lugar no ranking nacional
das instituições não públicas em 2016 para a 11º posição (2017). Todas as universidades têm
cursos com estrelas, conquistadas por avaliações realizadas por professores e coordenadores de
curso, bem como se submetem à avaliação do INEP, o qual lança o Índice Geral de Cursos, a
partir de indicadores de qualidade. O panorama da pesquisa nas universidades comunitárias
parece estar bem representado no que tange às suas colocações frente às suas competidoras.
Seguindo as tendências da atualidade, essas universidades vêm empreendendo grandes
esforços na área da inovação. A inovação, juntamente com a pesquisa, é indispensável para a
disseminação do conhecimento, agregação de valor ao processo de formação dos estudantes e
ampliação da competitividade das organizações (PPI/UNI1, 2017, p. 36). A inovação hoje está
presente na sociedade, em todas as áreas e segmentos. Para Audi (2017, p. 75), “inovador não
é quem tem boas ideias, inovador é quem tem a capacidade de, com uma boa ideia nas mãos,
transformar o mundo a seu redor, agregando valor, seja econômico, social ou pessoal.” Dessa
forma, não basta ter uma boa ideia, é preciso aplicá-la, e tal forma que se possa, por meio de
processos, conceitos e produtos criar o novo e transformar o mundo, a fim de melhorá-lo. Parece
que essa concepção de inovação vem ao encontro da concepção de valor que as universidades
138
comunitárias dão ao conhecimento, isto é, o conhecimento só tem sentido se percebido como
bem comum.
Assim, algumas políticas institucionais para a inovação podem ser citadas como: a
articulação da inovação no âmbito dos processos de ensino, pesquisa e extensão; interação com
ecossistemas nacionais e internacionais de inovação e empreendedorismo; incentivo ao
desenvolvimento de ambientes que estimulem a criatividade e a inovação; promoção de cultura
interna em vista da geração de ideias criativas, do aprendizado, da experimentação, da
proatividade, da aceitação do risco, do aprendizado de falhas, bem como da competitividade,
entre outras (PPI/UNI1, 2017, p. 37).
Para que uma universidade tenha características inovadoras, ela precisa romper com
certezas, dogmas e regularidades que marcaram seu passado. “A inovação nesse sentido se
constituiria como um rompimento com visões hegemônicas da modernidade reguladora. Nessa
circunstância, as inovações podem ser assim chamadas, quando favorecem novas articulações
entre o ser, o saber e o agir emancipatório” (LEITE, 2005, p. 8).
Continuando a elencar, a UNI4 descreve entre seus objetivos para a política de Inovação
os seguintes: contribuir para a formação de melhores profissionais e seres humanos, por meio
da excelência em ensino, pesquisa e extensão, promovendo o desenvolvimento regional
sustentável; desenvolver novos produtos, serviços, processos e tecnologias, com vistas ao
patenteamento, a comercialização de seus resultados e a transferência de tecnologias; difundir
e valorizar os conhecimentos adquiridos e experiências vivenciadas no processo de inovação;
estimular a criação de novos negócios, por meio da pré-incubação ou incubação; subsidiar as
atividades da instituição visando a sustentabilidade econômica (PPI/UNI4, 2017, p. 56). Com
o intuito de atingir tais objetivos, essas universidades vêm se movimentando no sentido de
instalar Núcleos de Inovação Tecnológica e criação de Parques Tecnólogos, bem como de
ampliar as ações voltadas às empresas Incubadoras (LIMA, 2009).
Orgulhoso de seu feito, R2 afirma: Nós inauguramos o parque tecnológico, e isso foi
um acontecimento. [...] Eu me empolgo demais ao falar da universidade, principalmente do
parque. Eu vejo o parque como a grande redenção da universidade pela área tecnológica.
Porque laboratório nós sempre tivemos. Em todos os cursos têm laboratórios. Mas nunca
tivemos um espaço próprio focado na inovação. E estamos apostando nisso (R2, 2016). Ao
falar sobre a sustentabilidade financeira, R4 mencionou que 10% do sustento da instituição
advinha da prestação de serviços do Parque Científico Tecnológico, daí a importância e a
necessidade de investir mais na área de inovação (R4, 2016). Todas as universidades estudadas
têm seus Núcleos de Inovação Tecnológica, “o que representa verdadeiros berçários dos novos
139
e futuros empreendimentos das economias regionais e, consequentemente, da estadual” (LIMA,
2009, p. 98). Afirma R3: Nós não podemos ser um museu. Nós temos que ser vanguarda, e
para ser vanguarda em uma sala de aula e pegar essa meninada precisa estar afinado (R3,
2016). Observa-se, nas universidades, o surgimento de um novo modelo de ambientes de
geração de riqueza e crescimento econômico e social: os Parques Científicos, Tecnológicos ou
de Pesquisa. Caracterizados por serem instituições híbridas, que abrigam novos
empreendimentos de base tecnológica, como incubadoras, aceleradoras, espaços de coworking
e living labs e por gerarem intervenções de impacto onde se situam, os parques parecem ter
grande significado de conquista aos gestores e parecem representar uma alavanca aos
empreendimentos da instituição e, consequentemente, reflete na melhoria da qualidade de vida das
pessoas (AUDY, 2017).
Ainda em pesquisa, observou-se que essas universidades estão em conformidade com
os princípios da ética e das orientações dos órgãos legisladores no que tange à realização de
pesquisas com seres humanos e com animais, tendo todas em sua gestão um Comitê de Ética
(CEP) que avalia cada projeto encaminhado aos Programas de Pós-Graduação. Para manter seu
compromisso com a produção e a socialização do conhecimento, várias publicações
institucionais (periódicos, livros, anais, revistas) são disponibilizadas de forma gratuita em seus
portais. Os periódicos de divulgação científica institucionais encontram-se classificados nos
níveis de melhor qualidade (A e B), conforme classificação CAPES.
Difícil negar os impactos sociais e econômicos, na sociedade, do trabalho realizado
pelas universidades comunitárias em pesquisa. Em busca de respostas para superar as múltiplas
problemáticas advindas da realidade, pesquisadores desenvolvem competências e reflexões
sistemáticas a fim de produzir conhecimentos que possibilitem construir uma sociedade mais
justa e democrática, na qual o bem comum se sobrepõe aos anseios individualistas.
Mas....
A pesquisa também sofre os reveses da realidade que ora se apresenta na educação
superior. Entendida como uma dimensão da universidade, indissociável do ensino e da extensão
e que objetiva a produção do conhecimento científico, a pesquisa também tem enfrentado
grandes desafios no mundo da globalização. No Brasil, supostas soluções trazidas pelas
reformas, introduzidas pelo poder executivo, prometiam amenizar as crises dentro das
universidades. Muitas mudanças aconteceram, a mais reconhecida diz respeito à avaliação
(SGUISSARDI, 2006).
O crescimento de instituições privadas em todo país, favorecido pela flexibilidade da
LDB/1996, e pela nova roupagem dada ao ensino, que passou a atender o mundo globalizado e
140
em constante transformação, requeria a constituição de um perfil eficiente e capaz de dar conta
das demandas do mercado. Apresenta-se aí, a nova configuração da universidade “que passa
constituir espaços de produtividade, mantendo características como eficiência e eficácia,
atingindo patamares de competitividade através de padrões de mensuração de resultados, com
vista à qualidade” (TENÓRIO; ANDRADE, 2009, p. 49). Essa competição é garantida pela
combinação entre desempenho e financiamento, os quais tornam-se critérios para alocação de
recursos e remunerações diferenciadas dentro de sistemas de ensino que até a pouco
trabalhavam com a noção de remunerações isonômicas (SOUZA; OLIVEIRA, 2003).
Nesse contexto, a avaliação aparece como elemento formal de regulação estatal, ao
mesmo tempo que permite garantir as finalidades utilitaristas de educação, na qual a
universidade passa a ser vista como uma prestadora de serviços à sociedade e não apenas como
um espaço de disseminação de conhecimento e pesquisa. A construção do “cidadão produtivo”
requerida pela nova ordem, instiga mudanças da base curricular, novas posturas metodológicas,
além de uma nova estrutura de organização e gestão institucional.
Em virtude da explosão do ensino privado e da diversificação, e com o pretexto de
manter a qualidade do ensino superior ofertado, instauram-se padrões e mecanismos de
controle, como a ampliação da avaliação de credenciamentos e reconhecimentos de instituições
e cursos e exames nacionais (FRANCO; LONGHI, 2011). “Neste desafio está embutido o da
gestão trilhar o caminho da interlocução para identificar os padrões essenciais no exercício da
autonomia sem incidir na lógica regulatória que privilegia a técnica e o mercado em detrimento
do homem” (FRANCO; LOGHI, 2011, p. 8). A avaliação, como um organizador qualificado,
“por si só não leva consigo a força da mudança, mas como um instrumento de controle pode
carregar o redesenho capitalista da universidade” (LEITE, 2005, p. 9).
As avaliações em larga escala se articulam a um conceito “que consiste numa sequência
periódica e ininterrupta de processos ou atividades de levantamento, tratamento e difusão de
resultados” (WAISELFISZ, 1993, p. 6). Porém, discutir seus dados, confrontá-los com outras
referências e práticas é fundamental, “pois elementos quantitativos não produzem avaliação, ou
seja, só há avaliação quando o qualitativo emergir do quantitativo” (ESQUINSANI, 2010, p.
133). Para a autora, os dados não podem ser apenas sínteses estatísticas nacionais e estaduais,
distanciados e abstratos. A discussão sobre o que emerge deve ser mais profunda, para que os
“processos e resultados possam ser reconhecidos e desdobrados localmente em seus
significados”, (ESQUINSANI, 2010, p. 133), envolvendo educadores, gestores educacionais e
a comunidade em geral.
Observa-se que as universidades comunitárias estão sendo avaliadas por diversas
141
entidades credenciadas a lhes aferir notas e conceitos, partindo de determinados indicadores de
qualidade, entre eles pesquisa, internacionalização, inovação, ensino e mercado. Os indicadores
apontam posição em nível internacional, nacional e estadual, contemplando instituições
públicas e privadas, bem como universidades, centros universitários e faculdades. Essas
avaliações servem de parâmetro de produtividade ou resultado, ou como demonstração de
qualidade, ou ainda para promoção ou inspeção (BALL, 2004). A performatividade, objetifica
e mercantiliza o trabalho com conhecimento e se concretiza por meio de reuniões de avaliação,
elaboração de relatórios, publicações periódicas dos resultados. As informações são coletadas,
registradas e publicadas com frequência na forma de rankings, os quais, de alguma forma,
traduzem a submissão da comunidade acadêmica a julgamentos, mensurações, comparações e
metas. “Em essência, performatividade é uma luta pela visibilidade” (BALL, 2005, p. 548).
Nesse cenário, a avaliação é partícipe do quadro do redesenho, contribuindo com os
rankings nacionais que ganham destaque na imprensa e mostram ao país aquelas instituições
que estão com ótimos conceitos, quanto aquelas que poderão ser fechadas em virtude das baixas
notas. Embora, para alguns, as listas de classificação pareçam contribuir para a transparência
das informações e a responsabilização das instituições e venham responder à crescente demanda
por informações relativamente simples, acessíveis e bem apresentadas sobre a “qualidade” de
instituições de educação superior; para outros, a aplicação de um conjunto limitado de critérios,
considerando o forte desejo das instituições de estar entre as melhores, estimula a
homogeneização de instituições de educação superior (LEITE, 2002). “As avaliações geradoras
de ranking, que se baseiam em exames, não levam em consideração aspectos importantíssimos
de uma instituição de educação superior, tais como compromisso social, valores acadêmicos e
interação com a comunidade” (BERTOLIN, 2014, p.144). Para Nóvoa (2014) as universidades
estão se tornando instituições cada vez mais iguais na sociedade, dirigidas da mesma maneira
que outras empresas, submetidas aos mesmos critérios de indicadores e produtividade, às
mesmas lógicas de eficiência do mercado, o que as fragiliza e as descaracteriza.
Sendo as universidades comunitárias integrantes do sistema, não poderiam ficar imunes
às dezenas de processos de regulação e avaliação impostas a elas. Observa-se, a partir do quadro
11, a participação efetiva dessas instituições nos processos de avaliação em nível internacional,
nacional e estadual. Submetidas a sistemas de indicadores desenvolvidos pela Unesco,
Comissão Europeia e pela OCDE, os quais têm servido de parâmetro para as avaliações,
medições e monitoramento do desempenho de sistemas educacionais baseado em aspectos de
entradas, processo e saídas (BERTOLIN, 2009), as universidades se veem pressionadas por
exames de verificação da qualidade do ensino de graduação, avaliação das condições de ensino,
142
visitas dos especialistas, credenciamento institucional, reconhecimento de cursos, projeto
pedagógico da instituição, os quais passaram a afetar os limites do trabalho da academia e a
levar a exaustão os processos burocráticos.
O Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (SINAES), contemplando a
Avaliação Institucional, a Avaliação dos Cursos de Graduação (ACG), o Exame Nacional do
Desempenho dos Estudantes (ENADE), o Conceito Preliminar de Curso (CPC) para cursos e o
Índice Geral de Cursos (IGC), são alguns dos indicadores que permitiram a geração de um
espírito de competitividade entre as instituições.
Os rankings gerados a partir desses exames não incluem o capital cultural dos alunos,
sendo este considerado um fator determinante no desempenho em provas e exames
(BOURDIEU, 1979 apud BERTOLIN; DALMOLIN, 2014, p. 144). Assim, “os rankings são
instrumentos de baixa confiabilidade, que podem gerar uma percepção injusta acerca da real
qualidade das universidades comunitárias, em comparação com uma faculdade com fins
lucrativos (BERTOLIN; DALMOLIN, 2014, p. 144). Dessa forma, o desafio está em encontrar
mecanismos que promovam a adoção de estratégias institucionais que garantam a credibilidade
no sistema avaliativo. A avaliação é um processo que deveria ser capaz de atender não apenas
o aspecto formal da regulação, mas a possibilidade de autoconhecimento, emancipação e
fortalecimento da autonomia das instituições universitárias.
Acrescente-se a esse cenário, o credenciamento de novas instituições não universitárias
e com fins lucrativos, as quais não precisam investir em pesquisa, o que possibilita a cobrança
de mensalidades mais baixas, uma vez que o custo de manutenção é inferior ao de uma
universidade comunitária. Por não investir em pesquisa, essas novas instituições não se veem
obrigadas em ter em seus quadros de profissionais, docentes titulados e tão pouco oferecer-lhes
um plano de carreira, isso, por si só, já reduz em 40% a folha de pagamento de uma faculdade
em relação a uma universidade (HADDAD; GRACIANO, 2004).
Tudo isso gerou “uma espécie de “competição predatória” por alunos, o que obrigou as
universidades comunitárias a realizarem cortes ou, até mesmo, extinguirem cursos, importantes
ações e atividades de interesse social” (BERTOLIN; DALMOLIN 2014, p. 144). Comenta R1
Há um equívoco da política do próprio governo federal, liberando e achando que
pulverizando, abrindo faculdades para tudo que é canto do país, estatisticamente elevaria a
qualidade. Isso não se concretiza. Por que? Porque é o mesmo público que está sendo
disputado (R1, 2016).
As novas faculdades e centros universitários têm autonomia para criar cursos, o que
facilita a autorização de novos cursos, os quais, dificilmente, são negados pelo MEC em seus
143
processos de regulação. E acrescenta
Então estamos lançando cursos tecnólogos, licenciaturas em uns preços bem mais acessíveis para que o professor possa estudar, então não a razão para não o fazer. Pelo ponto de vista financeiro, estamos criando condições, dando financiamentos. [...] Só que a nossa margem que nos dá resultado vai diminuindo. Então você perde o poder de investimento. O que acontece, você enfraquece a instituição. Você não tem mais recursos, dinheiro para investir na instituição, você acaba se fragilizando (R1, 2016).
Ressurgem aqui as preocupações de McCowan (2016; 2018) no que tange aos processos
de comoditização/mercantilização e de desagregação das funções da universidade.
Essa concorrência gera certa instabilidade nas instituições comunitárias, uma vez que
sentem dificuldades em manter sua sustentabilidade econômico-financeira; seus padrões de
qualidade acadêmica e suas ações sociais junto à comunidade, gerando cortes de horas de
atividades de pesquisa e extensão, extinção de ações comunitárias e demissões do corpo docente
(BERTOLIN; DALMOLIN, 2014, p. 144). Ao comentar sobre suas dificuldades, R1 comenta
[...] Esse ano nós perdemos alunos, mas em número de alunos nós somos a maior. Temos menos pós-graduação do que nossas co-irmãs. Não estou falando da federal, né, estou falando entre as privadas e as comunitárias. Então nós estamos sempre em terceiro lugar, normalmente, assim, entre as quinze. Mas em tamanho, em número de alunos até então nós sempre fomos a maior universidade e temos estrutura também grande. Atuamos nos nove campi, né, então são setenta municípios que a universidade atende [...] (R1, 2016).
Retornando aos depoimentos dos gestores, R4 pergunta, Como é que nós vamos garantir
a nossa marca16? Como é que nós vamos nos diferenciar? Talvez se possa buscar uma resposta
na argumentação apresentada por Bertolin e Dalmolin (2014), quando os autores defendem a
tese de que a educação superior é um bem posicional. Explica-se:
Na teoria econômica, bem posicional é um bem ou serviço cujo valor, ao menos em parte, é determinado pela atração que gera em outros agentes. O valor do bem posicional depende do nível de exclusividade, isto é, do fato de que nem todos têm acesso a este bem. Quanto mais exclusivo, mais status e, por conseguinte, mais capacidade de se diferenciar e obter reconhecimento dos outros (BERTOLIN; DALMOLIN, 2014, p. 151).
Valores simbólicos como tradição e prestígio de uma instituição poderiam proporcionar
16 No âmbito da administração mercadológica, o termo “marca” significa não apenas um ativo estratégico, mas, também, a fonte principal de vantagem competitiva para uma empresa (BERTOLIN; DALMOLIN, 2014, p. 152).
144
ao aluno uma vantagem competitiva em situações como procura por bons empregos, destaque
acadêmico ou social, assim, “uma universidade com tradição tende a ser a preferida e escolhida
pelos alunos” (BERTOLIN; DALMOLIN, 2014, p. 151).
Quando questionados sobre quais razões levavam o aluno a procurar aquela
universidade, R2 comentou
Vou usar o que é jargão: tradição. A história da universidade. Quem quer qualidade procura a nossa universidade. [...] Aquilo que a universidade tem de qualidade, atrai por si só. O nome dela. A maioria dos nossos estudantes são filhos de quem fez a formação conosco. Então, aí mais um significado de ter uma instituição funcionando há tantos anos com qualidade, comprometida. Então vem de pai para filho, como a gente diz, né. Muitos dos nossos professores, os pais foram professores ou estudaram aqui. Então, tem todo um sentimento que envolve isso que é muito caro para todos nós (R2, 2016).
Usando argumento semelhante, ao falar sobre a consolidação da marca, R3 afirma: Esse
aspecto da consolidação, acho que tem a ver com a história, a gente tem um mérito muito
grande em face da tradição e do que foi feito aqui anteriormente. E continua
Então aquela necessidade que se teve na época de fazer com que os filhos não precisassem sair ou não poderiam sair, até porque muitos trabalhavam e ajudavam em casa, aquilo marcou e acho que ajudou a consolidar o nome institucional, porque muitas gerações passaram por isso. E agora nós estamos já com os netos daquelas gerações. Então é interessante porque isso dá toda uma trajetória de informação. Então para que ir estudar fora se seu pai, seu irmão estudaram aqui e se deram bem? Para que ir estudar na universidade federal, ou em São Paulo se todos os seus irmãos, seus primos, toda a sua família estudou aqui e se deu bem, isso é um suporte, podemos dizer, da escolha (R3, 2016).
Identifica-se, nas vozes dos gestores, um reconhecimento da comunidade da excelência
acadêmica das funções exercidas pelas universidades. O sentimento de pertencimento é
alimentado pela credibilidade dos serviços educacionais que ela transmite de pai para filho, seus
valores, suas crenças. Isso arregimenta a conquista de novos integrantes na academia, bem
como estimula o interesse por governos, associações e empresas em firmar parcerias e
desenvolver projetos, “proporcionando oportunidades de obtenção de benefícios e
financiamentos, bem como recursos para investimento em qualidade, pesquisa e extensão.”
(BERTOLIN; DALMOLIN, 2014, p. 151). R4 reafirma essa percepção ao afirmar
Eles escolhem a nossa universidade por ser uma universidade, porque têm outras instituições que não são universidade na região. Pela qualidade das
145
nossas atividades, dos nossos cursos de graduação, pela história de qualidade que nós temos na instituição. Nós temos um nome, uma marca bastante forte aqui nessa região. Escolhem pela estrutura da universidade, não tenho dúvida, que eles se encantam quando vêm aqui (R4, 2016).
Percebe-se que a identidade das universidades em foco é construída gradativamente nas
relações cotidianas e que se consolida ao longo do tempo. A instituição passa a ser um ponto
de referência identitária, uma vez que os indivíduos percebem-se diferente dos demais e de
grupos sociais com os quais se relacionam, isto é, “o processo de constituição da identidade
organizacional passa pela coesão em torno dos objetivos das organizações, que se mantêm os
mesmos, ainda que as organizações tenham se modificado significativamente desde a sua
fundação” (SARAIVA; DUARTE, 2010, p. 122-123). Resgata-se nesse momento, o que Albert
e Whetten (1985) consideram duradouro nos traços que caracterizam a identidade
organizacional de uma instituição: os quais (os traços) circunscrevem-se
aos aspectos temporais relacionados à perpetuidade tanto dos traços centrais quanto dos distintivos da identidade organizacional. A estabilidade, implícita nesse elemento, cria nos indivíduos um nível de certeza sobre as práticas da organização que confere horizontes historicamente definidos para as suas ações (SARAIVA; DUARTE, 2010, p. 113).
Para Bertolin e Dalmolin (2014, p. 151) “o que gera “prestígio” e mantém a tradição de
uma universidade são seus diferenciais relacionados a cursos stricto-sensu e ações de interesse
da comunidade.” Dois motivos levam as faculdades com fins lucrativos a não se interessar por
atividades de pesquisa e extensão: a não obrigatoriedade legal para executar tais atividades e a
não atratividade pelo alto custo e pouco retorno financeiro. Aqui está, portanto, um diferencial
identitário e competitivo das universidades comunitárias: o investimento em pesquisa e
extensão, o que se caracteriza como bem posicional.
Neste sentido, com vistas a preservar o reconhecimento e a tradição ou, nas palavras do mercado, para manter a marca, o diferencial competitivo e, por conseguinte, a sustentabilidade econômica no longo prazo, é essencial que as universidades comunitárias continuem valorizando e investindo o máximo possível em pesquisa e extensão (BERTOLIN; DALMOLIN, 2014, p. 152).
Essa afirmação entra eco nas palavras de R1 ao falar dos motivos sobre as ações que a
universidade executa para se diferenciar nesse ambiente tão competitivo.
Mostramos que somos diferentes pela qualidade, qualidade dos cursos. Mostrar que há uma diferença que agrega valor no sentido. Estudar em um
146
universo universitário que tem possibilidades de interação por muitas áreas. Então, há possibilidade de fazer pesquisa, se tornar um pesquisador e isso é um diferencial, da pesquisa, da iniciação cientifica, da pós-graduação, do universo acadêmico mais amplo (R1, 2016).
Para que as universidades comunitárias mantenham sua tradição e a sua sustentabilidade
econômica em longo prazo, investimentos em pós-graduação stricto sensu, em pesquisa e
extensão é ponto fundamental, essa é a defesa de Bertolin (2014), aliada ao argumento de que
“cortar gastos em programas e cursos simplesmente porque não produzem retorno financeiro
imediato pode ser um grande equívoco” (BERTOLIN; DALMOLIN, 2014, p. 152).
Volta-se, assim, ao ponto inicial que desencadeou a reflexão dessas dimensões: as
funções da universidade. Está-se falando sobre um dos traços identitários que consolidam o
modelo da universidade comunitária: a indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão.
Notadamente, em muitos aspectos, essas universidades se assemelham em seus propósitos e
suas características no que se refere ao ensino e à pesquisa. Isso, possivelmente, não será
diferente no que tange à extensão. É nesse terceiro elemento que a identidade e a missão das
universidades comunitárias ganham contornos mais claros e reafirmam a sua gênese (BITTAR,
1999; LONGHI, 2000; FRANTZ, 2006).
Sendo o terceiro elemento da tríade, a extensão universitária é a promotora da integração
entre a universidade e a comunidade na qual está inserida. “É uma espécie de ponte permanente
entre a universidade e os diversos setores da sociedade” (SANTOS, 2012, p. 12). Opera como
uma “via de duas mãos, em que a Universidade leva conhecimentos e/ou assistência à
comunidade, e recebe dela influxos positivos como retroalimentação tais como suas reais
necessidades, seus anseios, aspirações e também aprendendo com o saber dessas comunidades”
(WAHLBRINCK; PACHECO, 2015, p. 66).
Se a extensão é uma via de mão dupla, há de se entender a existência de uma troca de
conhecimentos, ou seja, a existência de um processo que possibilita o aprendizado por parte da
comunidade, assim como a universidade também aprende com a própria comunidade sobre a
cultura e valores dessa comunidade. “É uma forma de a universidade socializar e democratizar
o saber científico, de modo a este não se traduzir em privilégio apenas da minoria da população
(universitária), mas difundido também à comunidade não acadêmica, consoante os próprios
interesses dessa mesma comunidade (SANTOS, 2012, p. 14).
A extensão universitária configura-se como uma atividade prática educativa, cultural e
científica, por meio da qual articula-se o Ensino e a Pesquisa de forma indissolúvel, viabilizando
uma relação transformadora entre universidade e sociedade. É por meio de uma práxis dialética
147
de produção/reprodução crítica do conhecimento que a extensão chega até a sociedade, ela (a
práxis) quem faz o papel de mediadora entre universidade-sociedade-universidade.
(WAHLBRINCK; PACHECO, 2015). Ainda para essas autoras não se faz extensão
universitária sem planejamento próprio e sistemático. Dessa forma, dois instrumentos seriam
componentes essenciais para que se passe do discurso à ação concreta: O Plano de
Desenvolvimento Institucional e os Projetos Político-Pedagógicos dos cursos de graduação e
de pós-graduação (WAHLBRINCK; PACHECO, 2015).
Estas colocações levam a refletir sobre a terceira dimensão proposta por McCowan
(2016) ao apresentar a anatomia das universidades: a interação.
4.3 Interação: o elo entre a universidade comunitária e a sociedade
“O conhecimento não se estende do que se julga sabedor até aqueles que se julga não saberem;
conhecimento se constitui nas relações homem-mundo, relações de transformação, e se
aperfeiçoa na problematização crítica destas relações” (FREIRE, 2006, p. 36).
Para McCowan (2016), a dimensão interação refere-se às formas como a universidade
se relaciona com a sociedade externa, com relação à facilidade ou à dificuldade com que o fluxo
de atores e ideias acontece, ao quanto suas portas estão abertas ou fechadas para traduzir e
comunicar o conhecimento produzido a parceiros externos e à comunidade. Essa interação, ou
grau de porosidade, nas palavras do autor, que se estabelece com a comunidade pode se dar em
escala local, nacional e global. Por interação, portanto, entender-se-ia a noção de extensão
universitária praticada no Brasil, ou seja, o modo de relação que existe entre a universidade
(pública, comunitária, privada) e a comunidade em que se insere, o mecanismo que serve de
ponte entre a instituição e os diversos setores da sociedade civil capitalista (SANTOS, 2016).
Portanto, faz-se, neste momento, uma interpretação da teoria de McCowan (2016),
estabelecendo-se uma equivalência entre a denominação Interação expressa pelo autor e a
denominação Extensão, uma das funções da universidade brasileira, por entender que as
referências conceituais caminham na mesma direção, ou seja, fazem menção aos elos que a
universidade estabelece com a comunidade e às suas múltiplas formas de concretização.
De acordo com a proposição do O Fórum de Pró-Reitores de Extensão das Instituições
Públicas de Educação Superior Brasileiras - FORPROEX, elaborada em 1987, e reiterada em
documentos seguintes, inclusive no Plano Nacional de Extensão Universitária, de 1999, e no
148
documento Política Nacional de Extensão Universitária, de 2012:
A extensão é uma via de mão-dupla, com trânsito assegurado à comunidade acadêmica, que encontrará, na sociedade, a oportunidade de elaboração da práxis de um conhecimento acadêmico. No retorno à universidade, docentes e discentes trarão um aprendizado que, submetido à reflexão teórica, será acrescido àquele conhecimento. Este fluxo, que estabelece a troca de saberes sistematizados/acadêmico e popular, terá como consequência: a produção de conhecimento resultante do confronto com a realidade brasileira e regional; e a democratização do conhecimento acadêmico e a participação efetiva da comunidade na atuação da universidade (FORPROEX, 2012).
Ressalte-se que como prática acadêmica, a extensão distingue-se das atividades de
ensino e pesquisa por constituir um processo metodológico que indaga pela relevância social
do ensino e que procura, por meio da pesquisa científica, referências objetivas aos problemas
reais que envolvem a sociedade como um todo. Em 2004, o Sistema Nacional de Avaliação do
Ensino Superior (SINAES) orienta que a extensão deve primar pela integração com o ensino e
a pesquisa, ressaltando a necessidade da transferência do conhecimento produzido pelas IES e
a sua interferência no desenvolvimento regional e nacional. Também defende que “as políticas
de extensão devem cumprir os preceitos estabelecidos pela missão da instituição, considerando
a importância social de suas ações para o desenvolvimento e promoção da cidadania”
(CARBONARI; PEREIRA, 2007, p. 24). Ainda conforme esses autores, a extensão está
relacionada ao processo de integração da universidade com a região, da vinculação entre o
ensino e a pesquisa atrelada às necessidades sociais, enfim, a extensão está associada às
transformações, bem como da própria universidade (CARBONARI; PEREIRA, 2007).
Parece que essa concepção de extensão/interação vem ao encontro dos anseios das
universidades comunitárias, forjados já em seu nascimento. Já na descrição do Perfil
Institucional a denominação “universidade comunitária” traz seu forte caráter regional e a noção
de comunidade em sua origem, em seus objetivos e em sua forma de gestão (PDI/UNI1;
PDI/UNI2, 2017). Ao revisitar a missão dessas instituições, vai-se perceber a ênfase dada à
socialização do conhecimento, ao usar explicitamente termos que se referem a esse universo
“socializar o conhecimento pelo ensino, pesquisa e extensão”, “difundir conhecimentos que
promovam a melhoria da qualidade de vida”, “promover, por meio do ensino, pesquisa e
extensão, o desenvolvimento regional”. Ao fazer referência à sua política de extensão, a UNI1
afirma
A extensão é uma das três funções da universidade, compreendida no conjunto das atividades que socializam com a comunidade o conhecimento
149
produzido e sistematizado na Instituição. Por outro lado, a Universidade deve se beneficiar da interação com a sociedade, com a retroalimentação dos seus processos. A Extensão é o elo entre Universidade e a sociedade (PPI/UNI1, 2017, p. 35).
Essa concepção é reiterada na voz do gestor R4 quando comenta sobre os projetos de
extensão e pesquisa.
Esses projetos de extensão e de pesquisa, nos próprios cursos de graduação... Então, tudo o que a gente faz, nós pensamos em fazer o melhor para a nossa comunidade, que é aquela que dá sentindo a nossa existência. É para essa comunidade que nós temos que dar respostas. [...] A comunidade que deve o nosso respeito, nossa admiração e nosso trabalho, nosso envolvimento. Então, isso hoje está muito claro para nós (R4, 2016).
Para UNI3, a extensão é compreendida como um processo acadêmico-pedagógico, que
promove o intercâmbio de saberes entre a Universidade e a comunidade, com o
desenvolvimento de atividades que contribuam na formação profissional e cidadã dos
acadêmicos e no desenvolvimento regional (PPI/UNI3, 2017, p. 117). Nesse sentido, a extensão
busca desenvolver ações nas quais participem a comunidade externa, com interação entre
acadêmicos e professores, com o objetivo de proporcionar a vivência dos valores essenciais ao
exercício da cidadania e a reflexão sobre o conhecimento produzido na universidade. Assim, é
que se entende a extensão como uma dimensão do fazer acadêmico, um processo didático-
pedagógico articulado ao ensino e à pesquisa (PPI/UNI3, 2017, p. 118).
Percebe-se que os discursos se alinham em uma mesma direção, e, para além dos
discursos, essa concepção vê-se refletida em ações concretas realizadas por essas instituições
conforme quadro 12.
Quadro 12 - Principais Atividades de Extensão das Universidades Comunitárias ATIVIDADES DE EXTENSÃO – UNIVERSIDADES COMUNITÁRIAS
UNI1 UNI2 UNI3 UNI4 Mais de 90 projetos de extensão em diferentes áreas: saúde, meio ambiente, social, educação
Mais de 700.000 pessoas beneficiadas (2016 – 2018)
Hospital Geral
280 bolsas de extensão
Sistema Educativo de RÁDIO E TV
CETEL – Centro de Teledifusão educativa. O canal 15 da NET e 27 na TV Aberta foram fechados em 2017, após 20 anos de existência. Tinha parceria
Mais de 80 projetos de extensão em diferentes áreas: saúde, meio ambiente, social, educação
Mais de 650.000 pessoas beneficiadas (2016 e 2018)
Hospital Veterinário
210 bolsas de extensão
Sistema Educativo de Rádio e TV Afiliada do Canal Futura
Cursos acreditados pelo Sistema de Acreditação Regional de Cursos de Graduação do Mercosul
Mais de 70 projetos de extensão em diversas áreas: saúde, meio ambiente, social, educação
600.000 pessoas beneficiadas (2017-2018)
Hospital Universitário, conveniado com o SUS
265 bolsas de extensão
Ecomuseu – espaço cultural que atua no resgate e valorização dos costumes e da história das comunidades litorâneas de Santa Catarina
Sistema Educativo de Rádio e TV Afiliada do Canal
Mais 110 projetos de Extensão em diversas áreas: saúde, meio ambiente, social, educação
300 mil pessoas beneficiadas (2017-2018)
Hospital Universitário
298 Bolsas de Extensão
Sistema Educativo de TV
Coral e Grupo de dança
Fomento a grupos artísticos
PARCERIAS com diversos setores empresariais, órgãos governamentais e
150
ATIVIDADES DE EXTENSÃO – UNIVERSIDADES COMUNITÁRIAS UNI1 UNI2 UNI3 UNI4 com a TV Futura.
- 3 emissoras de rádio em funcionamento em diferentes campi da região.
Fomento a grupos artísticos
Coral e Grupo de dança
PARCERIAS com diversos setores empresariais, órgãos governamentais e associações
INTERCÂMBIOS: 203 acordos bilaterais com instituições de 28 países
(Arcusul)
CONVÊNIOS INTERNACIONAIS, com 62 universidades de 18 países
Coral e Grupo de dança
Fomento a grupos artísticos
PARCERIAS com diversos setores empresariais, órgãos governamentais e associações
INTERCÂMBIOS com universidades do país e do exterior, instituições científicas, entidades e órgãos governamentais
Futura.
Coral e Grupo de dança
PARCERIAS com diversos setores empresariais, órgãos governamentais e associações
INTERCÂMBIOS. – 140 convênios firmados com Universidades estrangeiras, instituições científicas, entidades e órgãos governamentais
associações
INTERCÂMBIOS - 48 acordos com 20 países, instituições científicas, entidades e órgãos governamentais
Fonte: Dados coligidos pela autora a partir dos PDIs, Relatórios de Responsabilidade Social e Sítios eletrônicos – Período de referência 2017-2018
Assim, é que se tem o volume de atividades descritas no quadro 12: o rol de mais de
300 projetos de extensão com cerca de dois milhões e trezentas mil pessoas atingidas entre
2016-2018; a presença de hospitais com atendimento em várias especialidades na área da saúde;
os museus em suas diferentes áreas de especificidades, a implantação de um sistema educativo
de rádio e TV divulgando informação de interesse local e regional, lazer e entretenimento,
privilegiando aspectos culturais e educativos; e as dezenas de parcerias com os diversos
segmentos da sociedade e convênios internacionais demonstram o grau de inserção e conexão
dessas instituições na comunidade e no mundo.
Para Vannucchi (2011, p. 51) “toda universidade comunitária é um projeto, um destino
comum e ao mesmo tempo singular”. Há uma identificação nos princípios dessas universidades,
o que as leva a compor uma identidade com traços que se assemelham nas suas convicções. Em
nível macro, entre si, há uma alta correspondência de traços que se assemelham, ou seja, se o
ponto de partida é identificar o perfil desse modelo de universidade e sua existência plena a
partir dos dados de que esta pesquisa dispõe, então, sim, é possível afirmar que todas essas
instituições trazem em seu DNA, em sua essência, elementos que as caracterizam como se
denominam: universidades comunitárias. E a indissociabilidade entre ensino, pesquisa e
extensão é um dos traços centrais.
Mas, se as mesmas instituições fossem analisadas no seu micro universo, ou seja, a partir
de suas especificidades, então passa-se a entender as palavras de Albert e Wetthen (1985)
quando afirmam que não há, qualquer tipo de lista universal de aspectos centrais da
organização, uma vez que isso depende do que é importante para aquele contexto
organizacional, isto é, cada universidade comunitária vai atuar, levando em consideração as
151
necessidades de seu entorno, as peculiaridades que a circundam e fará as intervenções possíveis
para atender às necessidades daquele universo social. As preocupações fundantes com os
problemas sociais e econômicos são semelhantes, porém a forma de interagir e buscar soluções
aos problemas são diferentes na medida em que cada realidade se apresenta de modo diferente.
Assim é que as universidades comunitárias desse estudo se diferenciam e requisitam para si
como traço essencial e distintivo: a sua alta inserção comunitária.
Em cinco décadas de existência e de efetiva participação no projeto de desenvolvimento
regional, essas instituições provocaram grandes mudanças socioeconômicas nas regiões onde
estão inseridas, pela articulação com os vários municípios ao seu entorno e com parcerias
firmadas com os diversos segmentos da sociedade. Dessa forma, essas universidades
caracterizam-se como instituições regionais “por estar em constante diálogo com a comunidade,
atendendo às suas necessidades e constituindo-se em fator de integração a partir de cada
realidade, buscando um projeto coletivo de desenvolvimento e um crescimento harmônico da
região em que atuam” (LAUXEN, 2006, p. 238). Saliente-se que não só as demandas locais são
atendidas, as macros dimensões – nacional e global – também são monitoradas e
acompanhadas, afinal o fenômeno da globalização aí está para compor esse cenário e nele
interferir.
Em seus PDIs, todas as universidades enfatizam a sua inserção comunitária. Ao fazer
referência ao seu envolvimento com a comunidade regional, UNI3 afirma
A UNI3 acompanha o desenvolvimento socioeconômico do estado e contribui para seu fortalecimento, pois sua constituição histórica, como instituição de natureza comunitária e sua organização física e geográfica favorecem o trabalho de inserção regional. Desde a origem da Instituição em 1964, o perfil institucional é regido por valores como o “compromisso social com o desenvolvimento regional e global” (PDI/UNI3, 2017, p. 72).
Salienta-se que esses valores estão explícitos nos ordenamentos jurídicos como o
Estatuto e o Regimento Geral e orientam o projeto institucional, político e pedagógico das
instituições. Composta por nove campi, a UNI3 atua na região de abrangência dos municípios
localizados ao longo do litoral centro-oeste catarinense, atingindo mais de dois milhões de
pessoas. Suas atividades são desenvolvidas em estreita relação com os principais segmentos da
economia regional, notadamente nas áreas da pesca, das atividades portuárias e da indústria
naval, do turismo e da gastronomia, da indústria têxtil e do vestuário e da construção civil
(PDI/UNI3, 2017, p. 73). Pesquisas, projetos de extensão, estágios supervisionados, visitas
técnicas e diferentes atividades sociais desenvolvidas nesses segmentos e outros como gestão,
152
saúde e educação resultam em relatórios, artigos científicos, produções técnico-científicas as
quais apontam soluções e alternativas de desenvolvimento econômico e social,
sustentabilidade, gestão, inovação e prospecção para mercados potenciais (PDI/UNI3, 2017).
Afirmam Gumbowsky e Siqueira (2013, p. 6) que “tanto maior será a contribuição da
universidade para a sociedade quanto for a sua inserção regional.” Neste sentido, além da sua
condição de Universidade, a instituição deve assumir características de universidade regional,
articulando-se com os vários municípios ao seu entorno (LAUXEN, 2006).
A UNI4 orienta suas linhas de pesquisa para a educação, saúde, meio ambiente, ciência,
tecnologia e inovação voltadas para a solução de problemas próximos à sua área de atuação.
Situada na região sul de Santa Catarina, compreende mais de 45 municípios e é polo industrial
em diversos setores, como confecção, cerâmico, metalomecânico, extração de carvão mineral
e construção civil, esta instituição fortalece seus vínculos com a comunidade por meio dos 113
projetos de extensão e quase trezentas bolsas de extensão distribuídas aos acadêmicos
(PDI/UNI4, 2017, p. 22).
Com oito campi espalhados pelo estado do Rio Grande do sul, a UNI1 compreende 70
municípios da região nordeste deste estado. Esse conjunto de municípios apresenta alto grau de
industrialização, intensa atividade turística e gastronômica, bem como representa um polo
agroindustrial com núcleos agrícolas e de extração e transformação mineral (PPI/UNI1, 2017).
Nesse contexto, a UNI1 mostra sua força e inserção para contribuir com a comunidade,
garantindo a formação de profissionais dotados de valores, de competências; investigativos e
inovadores; capazes de fazer diferença em seu local e em seu tempo (PDI/UNI1, 2017, p. 18).
Para que se efetive tal concepção, na UNI1 os principais programas de pesquisa acontecem no
campo social, econômico, antropológico, da biotecnologia, da engenharia, entre outros.
Com uma sede administrativa e mais seis campi, a UNI2 é centro propulsor das
transformações sociais, econômicas e culturais das regiões Norte e Noroeste do estado,
atingindo mais de 100 municípios. Sua forte atuação nos setores de saúde, educação, turismo,
tecnologia da informação e agroindustrialização faz com que se destaque pela
representatividade na área médica, cultural e tecnológica (PPI/UNI2, 2017). Interessante frisar
que em um de seus slogans, essa universidade se coloca como “A universidade da nossa
comunidade” reiterando a sua conexão com a região.
Esta alta inserção regional acontece porque há uma predisposição tanto por parte das
universidades quanto por parte da sociedade em firmar parcerias.
Complementarmente à formação qualificada de recursos humanos para
153
acompanhar os avanços sociais e globais — ao mesmo tempo em que deles se beneficia para promover o aperfeiçoamento do sistema educacional e propagar o conhecimento científico —, a inserção regional da UNI3 revela-se também no enfoque e na abrangência de suas pesquisas e produções técnico científicas e nas suas atividade de extensão e prestação de serviços, nas diferentes áreas do conhecimento, por meio de parcerias institucionais e interinstitucionais (PPI, UNI3, 2017, p. 73).
Há uma ligação orgânica com a região, que se dá não apenas pela troca de conhecimento
com diversos setores produtivos da sociedade ou pela formação de profissionais para atuar
localmente, mas também pela participação de membros da comunidade na governança
institucional e pelo amplo uso dos serviços e instalações universitárias pela comunidade
(FIOREZE; MCCOWAN, 2018).
Em parcerias firmadas com o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e
Tecnológico (CNPq), Governos Nacional, Estadual e Municipal e inúmeras organizações da
iniciativa privada, essas universidades comunitárias incentivam a iniciação científica e as
atividades de extensão de seus acadêmicos por meio de Programas de Bolsas de Ensino,
Pesquisa e Extensão que propiciam grande troca de conhecimento na busca da melhoria da
qualidade de vida dos cidadãos.
Talvez a forma mais explícita de revelar a intersecção entre essas universidades e seus
stakeholders espalhados pela comunidade externa esteja colocada de forma transparente nos
seus Relatórios de Responsabilidade Social/Balanço Social. Este documento apresenta à
sociedade, a síntese das ações de responsabilidade social desenvolvidas pela instituição,
evidenciando indicadores de qualidade e números associados a cinco dimensões de atuação:
institucional: acadêmica, social, socioambiental e cultural, o compromisso institucional e o
esforço de centenas de profissionais docentes e administrativos envolvidos na superação das
metas da instituição.
Ao analisar o Relatório de Responsabilidade Social dessas instituições, encontra-se a
descrição detalhada das atividades desenvolvidas com a participação da comunidade acadêmica
(alunos, professores, funcionários, egressos) em parceria com a comunidade regional no
desenvolvimento de ações voltadas à resolução de problemas sociais, educacionais, de saúde,
econômicos, envolvendo todas as áreas do conhecimento. Assim é que
a responsabilidade social apresenta-se como eixo transversal à atuação da UNI1 e o esforço continuado em prol da melhoria da qualidade das atividades acadêmicas toma sentido e é ampliado com a participação direta da Instituição no cotidiano da sociedade, atuando como agente constitutivo da identidade regional e do projeto de nação que busca construir (PDI/UNI1, 2017, p. 39).
154
Os números registrados em atendimento à comunidade (mais de 700.000) entre 2017 e
2018, os programas e ações desenvolvidos com e para a comunidade acadêmica e a
comunidade externa, os mais de 200 acordos bilaterais com 28 países, são exemplos que
conferem à UNI1 o título de universidade comunitária. Para Ribeiro (2012, p. 87) “as
experiências de responsabilidade social universitária devem estar relacionadas à extensão
universitária, como um compromisso social e uma forma de estabelecer um diálogo dinâmico
entre a instituição e a sociedade, desenvolvendo nela um sentimento de pertença social.”
Situação semelhante se revela com o trabalho realizado pela UNI3 em Responsabilidade
Social,
a qual desenvolve seus programas e projetos voltados à elevação da qualidade de vida e do desenvolvimento econômico e social do país – sobretudo das regiões nas quais se encontra inserida, conforme explicitado na sua missão, visão e valores e nos múltiplos projetos, ações e iniciativas que desenvolve com o ensino, a pesquisa, a extensão e a cultura (PPI/UNI3, 2017, p. 134).
Para Pereira (2003) a verdadeira responsabilidade social vai além do cumprimento das
exigências legais, ela deve, antes de mais nada, contribuir para uma sociedade mais justa e
humanitária. Parece que este preceito é defendido na seguinte afirmação presente no PPI da
UNI3 A atuação social da Universidade é um processo de mão dupla. Embora seu caráter
comunitário a vincule naturalmente às necessidades da sociedade de seu entorno, ela acaba
por acumular importante expertise ao abraçar, como desafios seus, as muitas demandas e
necessidades sociais (PPI/UNI3, 2017, p. 134). O entendimento é de que, para além de atender
às necessidades locais, esta universidade comunitária enfatiza seus propósitos: desenvolver
ações capazes de promover a inclusão de todos em prol de um bem comum. Para tanto, algumas
ações e benefícios são oferecidos de forma permanente em diversas áreas como: Defesa e
promoção dos Direitos Humanos e Igualdade ético-racial, Desenvolvimento Econômico e
Social, Diversidade, Inclusão Social, Meio ambiente, Memória e Patrimônio Cultural, Produção
artística, Promoção da saúde. Em termos tangíveis, pode-se dizer que foram mais de 600.000
atendimentos entre 2017-2018; porém, medir o quão tudo isso afeta a qualidade de vida da
comunidade se revela quase em uma missão impossível (UNI3/Relatório de Responsabilidade
Socioambiental 2017).
Este trabalho de Extensão e Responsabilidade Social desenvolvido por essas
instituições, com alta inserção junto à comunidade, conferiu-lhes reconhecimento pelas
organizações responsáveis por certificar suas ações, as quais foram autenticadas por
155
certificados, títulos e prêmios. O quadro 13 apresenta as certificações e premiações recebidas
pelas universidades comunitárias foco deste estudo.
Quadro 13 - Certificações e Premiações Recebidas pelas Universidades Comunitárias - 2017-2018
UC PREMIAÇÕES/CERTIFICAÇÕES
UNI1
- Prêmio Sapientiae de Excelência Educativa, outorgada pela Organização das américas para a Excelência Educativa (ODAEE) (2017) - Certificação de Nível II de Excelência em Gestão da Acreditação Hospitalar (2017) - Certificação de Serviço de Referência para Atenção Integral às Pessoas em Situação de Violência Sexual – Hospital Geral (2018) - Prêmio Caxias do Sul, distinção da Câmara Municipal de Vereadores de Caxias do Sul (2018) - Incubadora Tecnológica de Caxias do Sul recebe certificado do Centro de Referência para Apoio a Novos Empreendimentos – CERNE1 (2018) - Prêmio Capes de Tese entregue a pesquisadores da instituição. (2018)
UNI2
- Premiação Selo de Qualidade OAB Recomenda ao Curso de Direito pelo quinto ano consecutivo por cooperar para a melhoria da qualidade de ensino jurídico no Brasil. (2017) - Prêmio/Medalha de Responsabilidade Social, concedido pela Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul na categoria Instituições de Ensino Superior pela atuação em prol do bem social e da preservação do meio ambiente (2018) - 6º Prêmio de Responsabilidade Social, promovido pelo Sindicato do Ensino Privado Sinepe/RS
UNI3
- Prêmio Fritz Müller por projeto desenvolvido com mulheres agricultoras promovido pela Fundação do Meio Ambiente (Fatma), de Santa Catarina (2017) - 1º lugar projeto GraduaSUS "Concurso de Experiências Significativas en Promoción de la Salud en la Región de las Américas”, promovido pela Organização Pan-Americana de Saúde (OPS) e pela Organização Mundial de Saúde (OMS) (2017) - Prêmio Empresa Cidadã da Associação dos Dirigentes de Vendas e Marketing do Brasil, em Santa Catarina (ADVB/SC) - 3º ano consecutivo, na categoria preservação ambiental (2018) - Certificação Selo Social por ter cumprido com os Objetivos do Desenvolvimento sustentável (ODSs, ONU) - 10º ano consecutivo (2017) - Certificação de Responsabilidade Social promovida pelo legislativo catarinense em reconhecimento às ações desenvolvidas em prol do bem-estar da sociedade e da preservação ambiental (2017 -2018) - Prêmio Top of Mind de Santa Catarina, evento alicerçado em pesquisa do Instituto Mapa e promovido pela NSC Comunicação - 6º ano consecutivo. (2018) - Prêmio IMPAR de Universidade Mais Lembrada na Foz do Itajaí. O prêmio é resultado da pesquisa Ímpar – Índice das Marcas de Preferência e Afinidade Regional 2018, realizada pelo grupo RIC/Record em parceria com o Ibope. (2018) - Certificação de Responsabilidade Social 2018, e o Troféu Responsabilidade Social – Destaque Santa Catarina, na categoria "organização sem fins lucrativos". Esta foi a oitava edição da certificação de responsabilidade social. Ao todo, foram 162 inscrições, 69 empresas e instituições certificadas e seis ganhadores do troféu Destaque Santa Catarina. (2018) - Prêmio Capes de Tese entregue a pesquisadores da instituição. (2018) - Certificação do Great Place to Work (GPTW), com nota 80 (2017).17
UNI4
- Prêmio Melhores Práticas em APLs de Base Mineral 2017. Iniciativa da Rede APLmineral com o apoio do Ministérios de Minas Energia e de Ciência, Tecnologia e Inovação e do Centro de Tecnologia Mineral - reconhecimento às práticas inéditas realizadas no âmbito da cadeia produtiva do setor mineral. (2017) - Troféu Mérito Regional de Saúde, reconhecimento promovido pela - Agência de Desenvolvimento Regional e Gerência Regional de Saúde, com intuito de melhorar as boas práticas na saúde pública. (2017) Prêmio Destaque Içarense e Rinconense por suas atividades de ensino, pesquisa e extensão (2017) - Moção de Aplausos da Alesc (Assembleia Legislativa do Estado de Santa Catarina) pelos 20 anos de atividades da Instituição como Universidade Comunitária (2017) - Diploma do Mérito - CREA/SC (Conselho Regional de Engenharia e Agronomia de Santa Catarina) reconhecimento por contribuir para o aprimoramento técnico das profissões que compõem o Sistema Confea (Conselho Federal de Engenharia e Agronomia) / CREA, - Reconhecimento da Câmara de Vereadores ao trabalho realizado pela Equipe Multi-Institucional, que tem a participação de 53 entidades, busca o desenvolvimento da região, por meio de trabalhos voluntários - Certificado de Responsabilidade Social – Destaque SC 2017 (Assembleia Legislativa de Santa Catarina) pelo destaque em práticas de responsabilidade socioambiental - Prêmio IMPAR na categoria Faculdade ou Universidade. O prêmio é resultado da pesquisa Ímpar – Índice das Marcas de Preferência e Afinidade Regional 2018, realizada pelo grupo RIC/Record em parceria com o Ibope. (2018) - Prêmio Sócrates como Melhor Instituição Regional, concedido pela European Business Asssembly, em Oxford, no Reino Unido (2018), pelo reconhecimento aos indicadores de excelência no ensino, na pesquisa, na extensão, na pós-graduação e na internacionalização e gestão (2018)
Fonte: Dados coligidos pela autora a partir dos documentos institucionais analisados.
17 A certificação Great Place to Work (GPTW) é uma avaliação identifica as melhores empresas para trabalhar e baseia-se no preenchimento da pesquisa Trust Index, que mede, nacionalmente, o que os funcionários dizem sobre as organizações em que trabalham. Disponível em: https://www.univali.br/noticias/Paginas/fundacao-univali-recebe-certificacao-do-great-place-to-work.aspx. Acesso em: 12 dez. 2018.
156
A gama de certificações concedidas às universidades comunitárias em foco evidencia
que as comunidades locais e regionais assumem a responsabilidade social não como um
apêndice que, muitas vezes, se materializa em ações pontuais, mas como elemento fundante de
um projeto de universidade e de sociedade que almejam construir. Ao rastrear seus PDIs/PPIs,
observou-se que este reconhecimento é fruto de um conjunto de diretrizes introduzido nas áreas
do ensino, da pesquisa e da extensão, que dispõe sobre políticas e metodologias voltadas às
questões que envolvem a responsabilidade para com a promoção dos direitos humanos e sociais
de todos os participantes envolvidos no processo.
Observa-se, no quadro 13, as certificações consecutivas na área da responsabilidade
social representadas pelo Selo Social concedido pela comunidade local às instituições. Entre as
certificações, pode-se exemplificar aquela recebida, pela 10ª vez, pela UNI3 (Certificação Selo
Social por ter cumprido com os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODSs, ONU) - 10º
ano consecutivo (2017), em reconhecimento por suas ações nas áreas de: Boa saúde e bem-
estar; Educação de qualidade; Igualdade de gênero; Emprego digno e crescimento econômico;
Indústria, inovação e infraestrutura; Redução das desigualdades; Consumo e produção
responsáveis; Combate às alterações climáticas; Vida debaixo d'água; Vida sobre a terra; Paz,
justiça e instituições fortes; e Parcerias em prol das metas dos Objetivos de Desenvolvimento
Sustentável (ODSs).
Em 2018, a UNI3 recebeu o Selo Social por 75 projetos e ações que beneficiaram cerca
de 354.240 pessoas. As atividades, à época, contemplaram os 17 Objetivos Desenvolvimento
do Milênio (ODS), que são: Erradicação da pobreza; Fome zero e agricultura sustentável; Saúde
e bem-estar; Educação de qualidade; Igualdade de gênero; Água potável e saneamento; Energia
acessível e limpa; Trabalho decente e crescimento econômico; Indústria, inovação e
infraestrutura; Redução das desigualdades; Cidades e comunidades sustentáveis; Consumo e
produção sustentáveis; Ação contra a mudança global do clima; Vida na água; Vida terrestre;
Paz, justiça e instituições eficazes; Parcerias e meios de implementação. Parece que esse cenário
consegue ilustrar a interação entre as universidades comunitárias e a sociedade na perspectiva
de sua contribuição para o bem público, e potencialmente para a construção do bem público.
Também ilustra que o desenvolvimento local se dá pelo elo orgânico entre instituições e
comunidade, promovendo avanços por meio da responsabilidade social (FIOREZE;
MCCOWAN, 2018).
As práticas de responsabilidade socioambiental desenvolvidas, pela UNI4, na região em
que atua, foram reconhecidas pela Alesc (Assembleia Legislativa de Santa Catarina) com o
157
Certificado de Responsabilidade Social – Destaque SC 2017. O objetivo da Assembleia e de
outras 12 entidades envolvidas na organização da premiação é valorizar e estimular as empresas
e instituições a incorporarem a sustentabilidade na sua gestão. Assim comenta R4
O prêmio (que ganhamos) agora, Conexões, que valoriza e gera resultado. O certificado da Associação Brasileira de Recursos Humanos – ABRH, que concede o prêmio Ser Humano SC à nossa universidade, na categoria quesito sócio ambientais. Agora ganhamos o prêmio, mandamos o projeto, através do Anima, projeto coordenado por um professor, e aí fomos reconhecidos lá (R4, 2016).
Observa-se que há uma recompensa em receber premiações. O gestor cita vários deles
como reconhecimento do trabalho realizado pela instituição. Ser reconhecido fora da área de
atuação é um aspecto positivo para a instituição, pois parece reforçar a excelência da
universidade em questões de extensão. Premiação semelhante recebe a UNI2, pela atuação em
prol do bem social e da preservação do meio ambiente (Prêmio/Medalha de Responsabilidade
Social, concedido pela Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul na categoria Instituições
de Ensino Superior) (2018).
Citar algumas das ações de reconhecimento a essas instituições por suas atividades junto
à comunidade ou descrever um rol de certificações em determinado período do tempo em um
quadro é, talvez, minimizar toda teia de relações entre aqueles que alimentam o complexo
universo de contatos e inúmeros caminhos trilhados em parceria na busca por uma sociedade
mais justa e igualitária. A relação entre as universidades comunitárias, no que tange à extensão,
se estende para além da compreensão tradicional de disseminação de conhecimento, prestação
de serviço e difusão cultural, é “concebida como uma práxis transformadora, um mecanismo
que a universidade dispõe para cumprir sua responsabilidade social” (RIBEIRO, 2012, p. 86).
Portanto, as ações de extensão executadas pelas instituições comunitárias em foco parecem
estar condizentes com a sua missão e a sua visão, ou seja, estão alinhadas a uma política
propositiva em relação às ações humanitárias do ponto de vista da responsabilidade social
universitária (RIBEIRO, 2012).
Mas...
Assim como o valor do conhecimento, o ensino e a pesquisa, ingredientes essenciais da
anatomia das universidades, parecem se fragilizar, em virtude de políticas públicas que
fomentam a expansão e diversificação de um sistema educativo alimentado por preceitos
privatistas, o processo de interação entre universidade e sociedade também é minado pela
mercantilização, globalização e desagregação.
158
Para McCowan (2016) a forma como a universidade interage com a sociedade também
define o quanto suas portas estão abertas ou fechadas para comunicar o conhecimento
produzido a parceiros externos e à comunidade. Algumas universidades são mais flexíveis do
que outras com relação ao fluxo de ideias e participação de atores em suas atividades, nas
palavras do autor algumas são mais “porosas” do que outras. A porosidade inbound (entrada)
corresponderia à disposição da instituição em conversar e trazer para dentro de seus muros
ideias e atores da sociedade, sendo receptiva aos conhecimentos produzidos pelos setores
externos a ela; a porosidade outbound (saída) diria respeito aos conhecimentos produzidos pelas
universidades e à atitude ativa destas em comunicá-los à sociedade. Esse caminho de mão dupla
entre universidade e sociedade é desejável, uma vez que atribui maior importância ao trabalho
realizado pela universidade e aumenta a participação de segmentos mais amplos na definição
das ações prioritárias a serem executadas pela universidade.
Porém, o autor chama a atenção para a ocorrência da hiperporosidade, ou seja, quando
as fronteiras entre a universidade e a sociedade se tornam muito permeáveis, isto é, mais do que
porosas e começam a desaparecer, e os perigos que podem surgir provocados pela
desagregação. Entre eles a perda de espaço para a reflexão profunda sobre os fenômenos da
sociedade e a produção do conhecimento intrinsecamente valioso, valendo a pena em si mesmo,
sem qualquer justificativa adicional e a perda de autonomia para a realização de suas atividades
de ensino e pesquisa. E aqui valem as palavras de Nóvoa (2018) “as universidades são
instituições indispensáveis para proteger o trabalho que ainda não tem valor comercial, para
proteger o trabalho que nós muitas vezes ainda não sabemos para que serve. É essa inutilidade
que vai dar origem às grandes utilidades do futuro.”
Na dimensão interação, vê-se um movimento progressivo de abertura dos modelos de
universidade de baixa porosidade como os medievais e Humboldtianos para um modelo de
universidade com média porosidade, cujo conhecimento passa a ter valor instrumental, voltado
ao bem público e ao interesse da comunidade; até chegar ao modelo de universidade que
igualmente atribui valor instrumental (troca) ao conhecimento, mas com fins comerciais,
ocasionando a alta porosidade, Dada essa categorização, se poderia dizer que as universidades
comunitárias estariam no universo da média porosidade, ao qual o autor denomina de modelo
de desenvolvimento da instituição (the developmental model of institution).
As características deste modelo são que os cursos ministrados são direcionados para áreas em que as sociedades precisam de recursos humanos, a pesquisa é direcionada para áreas de necessidade aplicadas, e os acadêmicos são encorajados a prestar serviços de assessoria ao governo e às comunidades.
159
O acesso também se torna uma questão chave no modelo de desenvolvimento, com as universidades abrindo suas portas para uma proporção mais ampla da população.[...] a principal característica agora é relevância, aplicabilidade e impacto no desenvolvimento 18 (MCCOWAN, 2016, p. 513, tradução nossa).
Um modelo de universidade com tais características, exigiria, segundo o autor, a
aplicabilidade plena das funções de ensino, pesquisa e engajamento público, cuja interação se
daria em níveis mais elevados de porosidade nos dois sentidos da relação universidade-
sociedade (MCCOWAN, 2016). Este estudo tem constatado que as universidades comunitárias
trazem na essência de seus traços identitários o nascimento na comunidade e a sua vida voltada
para a comunidade. Seu discurso não é retórico. Suas atividades de extensão refletem o seu
engajamento junto à comunidade e seu entendimento sobre o valor do conhecimento como bem
comum.
Porém, essas instituições vêm sofrendo uma série de influências motivadas pela
mercantilização e pela desagregação da educação superior: seja pelos mecanismos de expansão
do ensino superior, seja pela diversidade de instituições a oferecer cursos de graduação, seja
pelas políticas públicas de acesso tanto de alunos quanto de professores à universidade; seja
pelos processos de regulamentação governamentais. Esse cenário pode levar a hiperporosidade.
Ao comentar sobre o modelo de universidade, R1 afirma
O modelo está em crise. O modelo de universidade, e não só o modelo das comunitárias, a universidade como um todo. Passando por um processo de revisão total e quem não se atualizar dança, quebra. Ela tem que virar mais empresas. Se não virarem mais empresas, elas quebram, infelizmente. A lógica de mercado faz elas ruírem, não interessa o tamanho. Elas precisam virar um pouco esse jogo né? (R1, 2016).
Parece que afirmações como “quem não se atualizar dança, quebra” ou “A lógica do
mercado faz elas ruírem” denunciam as pressões que levam ao processo de conversão das
funções da universidade em produtos e serviços para venda, voltados à lucratividade. Isso
significa adotar estratégias, estratégias de gestão dentro de um modelo como se fosse uma
empresa, abrir mão do seu ideal (R1, 2016).
O entendimento é de que o mercado está ditando as leis, pressionando as universidades
comunitárias a tomarem decisões que vão de encontro à sua missão. Estaria aqui ilustrada a
18 The characteristics of this model are that taught courses are directed towards areas in which societies are in need of human resource, research is directed towards applied areas of need, and academics are encouraged to provide advisory services to government and communities. Access also becomes a key issue in the developmental model, with universities opening their doors to a broader proportion of the population; the key feature now is relevance, applicability, and developmental impact (MCCOWAN, 2016, p. 513).
160
hiperporosidade, na via de duas mãos, diminuem os caminhos de intersecção e aumentam os
distanciamentos, com a pressão maior de um dos lados. Assim, “com a mercantilização da
educação superior, a adoção de modelos empresariais de gestão passou a fazer parte das
alternativas estratégicas de algumas universidades” (BERTOLIN; DALMOLIN, 2014, p. 149).
As universidades de caráter empresarial são muito competitivas e, em nome da lucratividade,
enfatizam a avaliação de resultados e são extremamente adaptáveis ao meio, o que leva a
educação a se transformar em um mero bem de consumo.
Pergunta então o entrevistador “Isso não contribuiria para a desconstrução da ideia de
comunitária?” Ao que R1 respondeu
É, isso também faz perder um pouco, por que aí, qual é a diferença? O aluno ou o cliente pensa assim “Bom, na outra eu pago menos, pagando menos pra mim está ótimo, melhor, né? O diploma vale igual. Eu quero exercer minha profissão, e aí? Quero diploma para viabilizar, né? O professor que quer ganhar “tanto por cento” no plano dele só. O que que interessa se qualificar como um professor? “Quero diploma”. Lá na instituição X, as pós-graduações que os professores fazem, a grande maioria, é para subir no plano, ganhar lá 5% ou 10%. A lógica não é para aprender uma nova dinâmica e agregar valor, ter uma formação mais sólida para dar conta dos processos pedagógicos. A lógica não é essa, tanto é que, a maioria faz EAD por nem R$ 200 reais, porque a lógica ela é para isso (R1, 2016).
Várias atitudes se contrapõem aos princípios das universidades comunitárias quanto aos
procedimentos adotados tanto por alunos, professores e pelas instituições que oferecem o
serviço. Nas instituições mercantis, o aluno é cliente que paga (pouco) por uma educação
(produto) imediata, em cursos de curta duração, cuja escolha programática se limita a conteúdos
que sejam imediatamente aplicáveis e relevantes ao trabalho, e a maioria dos cursos se orienta
para os negócios. Nelas, atividades de pesquisa são pouco incentivadas e há pouca expectativa
de serviço à comunidade (RYAN, 2001).
A pergunta Qual é a diferença? Leva a inferir as preocupações do gestor: se a
universidade ceder às pressões do mercado, o que vai diferenciá-la de outras instituições? Por
outro lado, se a universidade não fizer algumas mudanças, ela pode sucumbir? Mas se ceder,
também corre o risco de perder a identidade. Comenta R2 Nós temos instituições comunitárias
aqui do estado, não é o caso da nossa, que têm uma visão quase que empresarial da sua
atividade. Eu não critico esse aspecto porque tem que estar presente, mas nós não podemos
perder os nossos vínculos comunitários. A fonte de tensões parece ser a sustentabilidade
institucional pelo embate entre a dupla natureza das universidades comunitárias, ou seja, o seu
caráter público não estatal, com a oferta de serviço à comunidade e o caráter de sua inserção no
161
mundo competitivo em luta pela sobrevivência. Sob tal tensão,
algumas IES se aproximam do modelo heterônomo, adotando um empreendedorismo reativo às investidas da globalização; outras captam tenuamente a influência da globalização, devido à forte ligação com o local que toma todo o olhar. Outras ainda estão atentas às repercussões da globalização, sem deixar de priorizar os valores locais e a comunidade (MOROSINI; FRANCO, 2006, p. 67).
Políticas públicas como a desobrigação de vincular as instituições da obediência ao
princípio da indissociabilidade de ensino, pesquisa e extensão, assim como da obrigação das
entidades mantenedoras de publicar demonstrativos financeiros certificados por auditores
independentes, levaram ao crescimento do modelo de instituição empresarial/mercantil ou
“neoprofissional” como denomina Sguissardi (2004). Estaria ocorrendo a transição da
universidade com autonomia, como as privadas, e sem autonomia, como as federais, para uma
universidade heterônoma e competitiva. O modelo de heteronomia “significa o poder de setores
externos — estado e indústria — na definição da missão, da agenda e dos produtos da
universidade. É o mercado aumentando sua capacidade para impor sua própria lógica e
interesses” (SGUISSARDI, 2004, p. 34).
Como já se comentou, a sustentabilidade econômica dessas instituições é um fator que
as torna vulnerável nesse cenário competitivo, principalmente quando a implementação de
algumas políticas públicas prioriza entidades com fins lucrativos. Explica-se: a baixa ou alta
porosidade/permeabilidade também diz respeito ao acesso de alunos e professores ao universo
acadêmico, ou seja, até que ponto estão as universidades abertas a uma ampla gama de alunos
ou, contrariamente, restringem a sua entrada (MCCOWAN, 2016).
Com o propósito de garantir o acesso ao ensino superior dos estudantes de baixa renda
por meio do preenchimento de vagas nas instituições privadas, foi instituído, em 2005, o
Programa Universidade para Todos (PROUNI), através da Lei nº 11.096/2005 (BRASIL,
2005b). O programa atendeu à demanda de acesso ao Ensino Superior gratuito e da
determinação do Plano Nacional de Educação de aumentar a taxa de escolarização dos jovens
de 18 a 24 anos para 30% até o final da primeira década dos anos 2000. Para Pereira e Tavares
Júnior (2012), dois atores sociais foram beneficiados com a oferta de bolsas de gratuidade nos
cursos superiores de graduação e sequenciais de formação: os alunos aptos a ocuparem essas
vagas, e as IES privadas que, além de preencherem um grande número de vagas ociosas,
também conquistaram isenção fiscal. “O que o Prouni faz é aumentar as isenções fiscais para
IES privadas que, com poucas exceções, não prestam contas de como as usam, remuneram de
162
forma ilegal seus sócios, não têm transparência na concessão de bolsas e maquiam balanços”
(VALENTE; HELENE, 2004). O programa, assim, “é uma medida de impacto popular,
privatista e de baixo custo orçamentário” (CATANI; HEY; GILIOLI, 2006, p. 137).
O programa começou a disponibilizar as bolsas no ano de 2005 e até o ano de 2011
assim se apresentavam os dados: entre os bolsistas, 49% estão matriculados em IES privadas
com fins lucrativos, 28% em IES que se configuram como entidades beneficentes de assistência
social e 23% em instituições privadas de Ensino Superior sem fins lucrativos (PEREIRA;
TAVARES JÚNIOR, 2013, p. 107). Essa política expansionista, aliada à outra anterior, que
incluiu as instituições de cunho privatista na educação superior (LDB de 1996), proporcionando
um crescimento de 120% no número de instituições, motivado pelas altas taxas de retorno
econômico (BITTAR; OLIVEIRA; MOROSINI, 2008), criaram um cenário complicado para
as universidades comunitárias. Assim é que se coloca R1
A Lei da Filantropia19 [...] e a Lei do PROUNI foram altamente prejudiciais sobre o ponto de vista financeiro para instituição. [...] Sob o ponto de vista de sustentabilidade, nossa, é prejudicial, porque nós usávamos os recursos na saúde. Não podemos mais usar, no hospital, por exemplo. Nós devemos cobrir com a mensalidade do aluno e antes era usado na filantropia. [...] Então, de 2005 para cá, a partir da lei, isso para nós foi altamente corrosivo no ponto de vista da sustentabilidade. Nós tivemos que adaptar toda a instituição para buscar aqui o sustento. [...] Tinha recursos para investir. Esse dinheiro agora faz falta, esse dinheiro é dado em bolsa. [...] A lei do PROUNI afetou de uma forma significativa o modelo comunitário. Não tem mais dinheiro...[...] ela (a universidade) era muito mais ativa na comunidade antes, porque ela tinha muito mais recursos para fazer.[...] Quando entra essa lei, ela tende a retirar todos os serviços e jogar para bolsas, esses recursos e com isso ela se retrai e se afasta da comunidade. [...] Valeria teses do que significou essa transição...isso afetou muito. E, aí, as comunitárias perderam parte da sua identidade da relação com a comunidade, e esse é um ponto central. Não tenha dúvida quanto a isso (R1, 2016).
Percebe-se a ênfase que o gestor dá nas implicações negativas que a Lei do PROUNI
gerou no âmbito da oferta de serviços da universidade à população. Segundo ele, a
obrigatoriedade de canalizar os recursos somente para bolsas de estudo restringiu o poder de
integração com a comunidade, abalando um dos grandes pilares da missão das comunitárias: a
extensão. Em tempos anteriores à Lei, era possível atender às demandas da comunidade, e a
19 BRASIL. LEI Nº 12.101, DE 27 DE NOVEMBRO DE 2009. Dispõe sobre a certificação das entidades beneficentes de assistência social; regula os procedimentos de isenção de contribuições para a seguridade social; altera a Lei no 8.742, de 7 de dezembro de 1993; revoga dispositivos das Leis nos 8.212, de 24 de julho de 1991, 9.429, de 26 de dezembro de 1996, 9.732, de 11 de dezembro de 1998, 10.684, de 30 de maio de 2003, e da Medida Provisória no 2.187-13, de 24 de agosto de 2001; e dá outras providências.
163
interação entre universidade e comunidade se dava de forma mais harmônica. Já não é mais
assim. Quando perguntado sobre a definição de instituição comunitária e a sua relação com a
comunidade e região, comenta R3 sobre a Lei do PROUNI
A lei do PROUNI estabeleceu a preponderância dos recursos. A lei do PROUNI estava ligada à filantropia, aquela lei estabeleceu o que é preponderante. Nosso hospital, por exemplo, durante muito tempo nós utilizamos as despesas do hospital na filantropia e não podemos mais usar. O que a saúde precisa ter para ser considerada beneficente e filantrópica? O hospital precisa atender mais de 60% por dia pelo SUS. Nós atendemos 72%. Mas como a nossa atividade maior é a educação, nós só podemos comprovar através da educação, através de bolsas. O desapego da situação de fato com a situação de direito, a situação de direito não fotografou bem a situação de fato. [...] Então esse conceito de comunitária, com a abrangência que ela tem de prestação de serviço à comunidade, ela, de certa forma, sofre um pouco, e a tendência a sofrer mais os impactos por força da lei (R3, 2016).
Novamente, percebe-se que o gestor, ao analisar a aplicação da lei, critica vários de seus
aspectos a situação de direito não fotografou bem a situação de fato e exemplifica com
atividades que a universidade pratica, por exemplo, na área da saúde, no hospital20, as quais não
são reconhecidas porque não são da atividade fim (educação). As crises advêm das mais
variadas vertentes, e o gestor, ou a equipe gestora é desafiada a encontrar alternativas para
desvencilhar a instituição das fragilidades decorrentes das circunstâncias em que são
submetidas. “A instituição está sujeita à influência direta e/ou indireta de vários fatores que
imputam novas condições de sobrevivência em um mercado competitivo” (DILLY, 2011, p. 6).
Não saber administrar essa crise de identidade pode desequilibrar a instituição em diversas
dimensões: a credibilidade, a confiabilidade, a reputação, afetando seus públicos e serviços,
depondo contra a instituição (DILLY, 2011). Declara R1 Todas (comunitárias) que passaram
por crises já estão dando a volta, mas 90% delas já trazem algumas ações de caráter
empresarial (R1, 2016).
Com a nova Lei, os recursos tornaram-se escassos, o que leva a um movimento das
comunitárias de firmar mais e mais parcerias para se fortalecerem e fortalecer a conexão entre
as atividades que são realizadas na academia e o entendimento sobre o que a comunidade
precisa e deseja. Comenta R1 Nós estamos fazendo hoje muitas ações, muitas ações. Nós
fizemos um movimento em relação aos empresários, em relação as entidades, muitos
20 Em 2018, o hospital passou a ser administrado por uma instituição da área da saúde porque legalmente tem mais condições de receber verbas públicas. Disponível em: http://g1.globo.com/sc/santa-catarina/videos/v/univali-nao-vai-mais-administrar-hospital-infantil-pequeno-anjo/7077503/. Acesso em: 26 fev. 2019.
164
convênios, parcerias e ações conjuntas, então nisso nós estamos fazendo um movimento
muito forte (R1, 2016). O entendimento de tudo isso recai sobre a noção de porosidade,
entendida, neste caso, como as consequências negativas das pressões/das infiltrações das
políticas públicas sobre a instituição, desestabilizando a dinâmica interna de suas ações. A
interação, a “conversa”, dessa forma, se dá de forma assimétrica. Por outro lado, eventos dessa
natureza estimulam as comunitárias a buscar novas estratégias de sustentabilidade.
Além disso, ao propor uma política dessa natureza, o estado transferiu a tarefa de
expansão do ensino superior a todas instituições sem medir as consequências para muitas delas.
E pior, ao incluir todas as instituições, sejam elas sem fins lucrativos ou com fins lucrativos e
incluir todas as categorias, sejam elas universidades, centros universitários ou faculdades, no
programa de distribuição de bolsas, estimulou a mercantilização do ensino, a precariedade da
qualidade e ampliou o processo de desagregação da educação ofertada.
A adesão ao PROUNI restabelece parte da desoneração fiscal, o que permite às IES
lucrativas permanecerem tendo acesso a recursos públicos indiretos e a usufruírem dos
mercados financeiros (CARVALHO, 2013). O crescimento do segmento tem sido bastante
significativo, tanto na modalidade presencial como a distância. Mais ainda, investimento em
pesquisa e formação de pesquisadores não são de interesse das instituições de pequeno porte, o
que pode implicar negativamente na formação dos estudantes beneficiados pelo PROUNI, os
quais não teriam acesso a esses benefícios, diminuindo as condições de igualdade de formação
entre eles e outros estudantes no mundo do trabalho (DIAS SOBRINHO, 2010).
E complementa o autor
As políticas de expansão da escolaridade e, particularmente, de ampliação das matrículas na educação superior constituem aspectos que deveriam ser considerados importantes não simplesmente do ponto de vista dos interesses econômicos, mas, sobretudo, da democratização da sociedade e do aprofundamento da justiça social (DIAS SOBRINHO, 2010, p. 1232).
Apesar de existirem alguns defensores da desagregação sob a alegação de que ela
permite a expansão do ensino superior com financiamento sustentável e com maior eficiência,
incentivando a entrada de novos provedores no mercado, bem como permite capacitar os
alunos, desenvolvendo competências necessárias ao mercado do trabalho, a análise que vem
sendo realizada a partir das dimensões valor, função e interação indicia algumas implicações
preocupantes, entre elas: uma inclinação no pêndulo em que o valor do conhecimento passa a
assumir o papel de bem de consumo, afastando-se da concepção de bem público; o
enfraquecimento das concepções de aprendizagem com investimentos em modelos que
165
reduzem as possibilidades de uma formação holística e plena do estudante por meio da
intersecção entre as funções da universidade tais ensino, pesquisa e extensão; e a necessidade
de manter um espaço distinto e alguma autonomia para as atividades de ensino e pesquisa nas
instituições, evitando, assim, a hiperporosidade (MCCOWAN, 2018).
Esse processo conduz a outras dinâmicas mais amplas. Segundo o autor leva à
individuação, ou seja, “ela estimula uma maior adaptabilidade do aprendizado em relação a
metas, necessidades e estilos de vida individuais”; como também à economização, isto é,
“coloca o econômico no centro da imagem, tanto em termos de custo-eficiência do processo
educacional, quanto em termos de resultados entendidos como maximização do salário e da
produção” (MCCOWAN, 2018, p. 478). Como consequência, aumenta a inserção de
trabalhadores em empregos corporativos, com o desenvolvimento de novos produtos para o
mercado, “em vez de promover a compreensão humana, conscientização e igualdade social.”
(MCCOWAN, 2018, p. 478).
Apresentou-se durante essa reflexão, uma analogia feita por McCowan (2018) na qual
o pesquisador compara a oferta do ensino superior a pacotes de serviços, categorizando-os em
pacote atrelado, pacote de conveniência e pacote tipo inter-relacionado, sendo este último
aquele em que os componentes são “interdependentes e mutuamente reforçadores”, ou seja,
todos os elementos são necessários para a formação integral do estudante, sendo considerado,
portanto, o mais adequado. No pacote inter-relacionado, todas as funções da universidade, até
aqui explicitadas, seriam contempladas, promovendo a plena formação do estudante, seria
aquele que evitaria a desagregação. O depoimento de R4 talvez possa ilustrar o entendimento
de que não se está oferecendo o pacote atrelado ou o pacote de conveniência. Afirma o gestor
[...] Com o avanço do próprio capitalismo, então, não tenho dúvida de que ela (a universidade) tem que estabelecer um diálogo com a sociedade. E quando eu falo em mercado, eu prefiro falar “o mundo do trabalho”, porque quando se fala em mercado, as pessoas reduzem o mercado a empresas, a trabalhar em empresas e fábricas. Mas o mercado que nós formamos não é apenas para empresas e fábricas. Nós formamos para o mundo do trabalho, nós formamos para as organizações sociais, nós formamos para os envolvimentos sociais, enfim, para a vida (R4, 2016).
Assim, apesar dos conflitos que as universidades comunitárias vêm enfrentando
oriundos das mais diferentes vertentes sejam elas do âmbito governamental ou de mercado, em
nível local, nacional ou global, as quais impulsionam os processos de comoditização e
desagregação, parece que a defesa em seu discurso e em suas ações em prol da
indissociabilidade das funções ensino, pesquisa e extensão encontra eco em outras vozes e
166
permanece como grande pilar de sua missão como comunitária. Afirma McCowan (2018, p.
477) “em termos da instituição como um todo, a evidência empírica é inconclusiva, mas há, no
entanto, razões para manter a confiança na coexistência mutuamente benéfica do ensino, da
pesquisa e do envolvimento da comunidade.”
Se interação diz respeito ao fluxo de ideias e atores entre a universidade e a sociedade
(McCowan, 2016), então, há de se considerar também o tipo de gestão, a sua dinâmica
colegiada, com alto grau de democratização no fluxo de seus processos, presente nas
universidades comunitárias. Várias dessas instituições elegem sua direção por meio do voto
direto de seus professores, estudantes, técnicos administrativos e representantes da comunidade
regional, constituindo exemplos avançados de democracia participativa, descentralização e
transparência. Ao falar sobre o processo eleitoral do conselho universitário, R4 comenta [...]
A gente abre o edital. Daí os conselhos divulgam para a comunidade dos professores convidando aqueles que querem representá-los. Eles querem ser representantes dos seus pares no Conselho. Cada um desses faz a sua campanha. E aí se vota e se manda para o Conselho Universitário. Assim são os funcionários também. [...] Então, essas são características para mim de uma universidade comunitária. Todas as eleições são colegiadas, somos executivos, então as decisões são colegiadas, as regras, as leis, o legislativo, são essas comissões (R4, 2016).
Nem todas as instituições têm o seu sistema de votação direto, muitas delas têm seus
representantes indicados por seus pares. A participação ativa de diversos segmentos nas
decisões, assegurada pela composição dos colegiados superiores da universidade compostos
por representantes da comunidade interna e externa, e a transparência, viabilizada pelo acesso
às informações sobre temas acadêmicos e situação financeira, são marcas salientes dessas
instituições.
Por ocasião dos debates sobre o marco legal das instituições comunitárias, que culminou
na Lei 12.881/2013, predominou o entendimento de que a autonomia de cada instituição deveria
ser respeitada, sendo inapropriada alguma forma de imposição legal (SCHIMDT, 2017). Ao
falar sobre processo de representação R2 afirma Digo e afirmo o seguinte, na seguinte medida:
todos os cargos são eletivos, coordenador de curso, eleito. Diretor de curso, eleito. Reitor e
vice-reitores, eleitos (R2, 2016). Em seus PDIs, as instituições detalham com preciosidade toda
a estrutura organizacional, a qual contempla os órgãos deliberativos e administrativos, cada um
com suas competências, atribuições e composições específicas, bem como salientam a
autonomia da universidade em relação à sua Mantenedora (Fundação).
Assim como a colegialidade pode ser considerada uma forma democrática e desejável
167
de participação das comunidades interna e externa nas decisões da universidade, ela também
pode representar certo entrave nos processos que necessitam de maior agilidade. Ao falar sobre
os órgãos deliberativos, R2 comenta
E nós respeitamos isso. De certo modo, isso nos dá um pouquinho de demora na decisão, por ter que respeitar as diversas instâncias. Mas de resto, a decisão, ela é colegiada. Não tem uma coisa assim “ah quem decide é o reitor”, “quem contrata ou distrata”. Não, não é assim. Observa, observa a regra. Quer dizer então que nós temos esse cuidado aqui, né, de respeitar as esferas decisórias (R2, 2016).
Una-se a esse comentário, a voz de R4
Temos essa característica de muito debate e muita discussão, muita transparência. Às vezes, as coisas emperram um pouquinho e demoram mais pra sair. É mais difícil avançarmos em algumas coisas, demora mais. Precisa de mais argumentos, mais convencimentos, mais tempo para que as pessoas comecem a assimilar (R4, 2016).
Esses comentários vão desencadear outra reflexão que se encaminha para a governança
dessas universidades. Ao revisitar o quadro 9, difícil não surgir questionamentos quanto às
formas de administração ou gerenciamento desses universos, os quais se revelam em números
tão grandiosos e, que, ao mesmo tempo, são tão singulares, dada a sua inserção regional. Os
inúmeros processos implicados, as centenas de milhares de pessoas envolvidas, aliados a
cenários cada vez mais complexos, reflexo da globalização, são ingredientes que desafiam essas
instituições, principalmente com relação à sua gestão. Para Longhi, Franco e Rocha (2009, p.
7) a gestão da educação superior “é expressão de formas relacionais presentes na IES e entre
instituição/Sistema de Educação Superior/interlocutores, no plano de políticas e/ou de práticas
ligadas aos processos de tomada de decisão no desenvolvimento de ações.” Dessa forma, a
configuração da gestão estaria ligada às concepções sobre universidade e suas finalidades
referentes à pesquisa/ensino/extensão, assim como aos princípios organizacionais que norteiam
os processos decisórios e as relações em nível local, nacional e global (FRANCO; MOROSINI,
2005). Um dos gestores, ao fazer referência à gestão, comenta
Nós temos que profissionalizar a gestão das instituições. Se nós conseguirmos alinhar uma gestão profissional nas comunitárias, sem que elas percam a sua essência de oferecer um serviço educacional de qualidade, uma formação de qualidade, uma pesquisa de qualidade, um resultado efetivo para as demandas que vêm do mercado, onde elas estão inseridas. Eu vejo que nós podemos avançar de forma muito mais célere no cenário educacional,
168
proporcionado, além da formação, ganhos excepcionais em termos (R2, 2016).
O gestor manifesta duas preocupações: “alinhar uma gestão profissional” e “não perder
a essência de ser uma instituição comunitária”. Dada a configuração do cenário da educação
superior, incrementada com as questões do público e do privado e das fontes de financiamento,
a convergência de três fatores desafiam a gestão dessas instituições: qualidade-autonomia,
limites da expansão e sobrevivência institucional (FRANCO, 2007). Alinhar uma gestão
profissional se refere ao desafio de encontrar um “caminho da interlocução para identificar os
padrões essenciais no exercício da autonomia sem incidir na lógica regulatória que privilegia a
técnica e o mercado em detrimento do homem” (FRANCO; MOROSINI, 2012, p. 44). Alinhar
uma gestão profissional significa manter a autonomia frente aos desafios advindos das políticas
e práticas de gestão da educação brasileira, as quais precisam considerar critérios como
relevância, pertinência, exequibilidade, inclusão e participação, e cuja implicação recai
diretamente na regulação e transparência de gestão (FRANCO; MOROSINI, 2012). Significa
também perseguir a expansão de ensino/pesquisa/extensão, desencadeando ganhos
excepcionais em termos de novas patentes, novas invenções, novos descobrimentos, enfim em
todas as áreas de conhecimento (R2, 2016).
Alinhar uma gestão profissional, neste discurso, representa as preocupações do gestor
com a qualidade e a autonomia da instituição, encontrar estratégias para a saúde financeira,
aprimorar as estratégias de relacionamento com os stakeholders. Alinhar também significa,
apesar dos problemas no que se refere às questões que surgem da dicotomia público/privado,
apesar das escassas fontes de financiamento, não perder de vista a essência comunitária da
instituição, e tentar resolver os impasses sem que eles se tornam obstáculos intransponíveis.
Alinhar significa oferecer um serviço educacional de qualidade, uma formação de qualidade,
uma pesquisa de qualidade, um resultado efetivo para as demandas que vêm do mercado, onde
elas estão inseridas. Alinhar é estar em sintonia para com aquela que realmente seria o motivo
de sua existência: a comunidade local.
Consideradas organizações complexas, principalmente por executar tarefas múltiplas
que envolvem diferentes dimensões como ensino, pesquisa e extensão, as quais requerem
metodologias de trabalho que lhes são próprias, as universidades têm uma dinâmica diferente
daquela desenvolvida por outras organizações (TAVARES FILHO; BERNARDES, 2005).
“Estas diferenças específicas da universidade demandam um modelo de gestão distinto
daqueles desenvolvidos e implementados em empresas de bens de consumo” (BERTOLIN;
169
DALMOLIN; 2014, p. 149), dadas às incertezas na definição de objetivos e serviços contidas
nos processos de realização dos serviços oferecidos. Assim, ao buscar uma gestão com base
nos modelos de estruturas organizacionais empresariais, talvez essas instituições não encontrem
amparo para tomadas de decisão que deem conta de seu universo, sendo, portanto, ineficazes
(PRATES, 2002; BERTOLIN; BERTOLIN, 2014).
Contudo, mudanças como o crescimento da modalidade de ensino a distância, a crise
nas licenciaturas, o ingresso de grandes players internacionais no segmento da educação
superior, ditou a necessidade de reposicionamento estratégico para a manutenção no setor.
Assim, o planejamento estratégico tem sido uma ferramenta importante de gestão,
principalmente para essas instituições que possuem uma estrutura autogestionada e sem fins
lucrativos (DALPIAZ; KELM, 2017).
Ao mesmo tempo em que buscam preservar os fortes elementos culturais e a sua
dinâmica colegiada, se sentem pressionadas a se reposicionem “de modo a gerar um equilíbrio
entre qualidade da educação, fortalecimento de valores, competitividade e sustentabilidade”
(DALPIAZ; KELM, 2017, p. 2), o que, muitas vezes, implica mudanças estruturais e de
comportamento. Assim, “profissionalizar a gestão” implica enfrentar os desafios que marcam
o segmento comunitário e, que, por disputar o mesmo público alvo com o segmento
empresarial, precisa igualmente ser competitivo sob pena de comprometer sua sustentabilidade
(DALPIAZ; KELM, 2017). O planejamento estratégico deve possibilitar o reposicionamento
necessário, funcionando como ferramenta flexível, sem que permita a perda das características
identitárias peculiares dessas instituições de ensino superior. (DALPIAZ; KELM, 2017).
Ao se remeter à gestão universitária, Prates (2002, p. 9-10) afirma
a gestão de universidades deve, portanto, se pautar pela busca de consensos, pela flexibilidade administrativa e por decisões estratégicas. Qualquer modelo de autonomia administrativo-financeira de universidades que não se paute pelo modelo acima descrito estará fadado ao insucesso institucional.
Para o autor, na universidade, as decisões devem ser negociadas, diferentes interesses e
ideologias devem ser percebidos como recursos motivadores para o intercâmbio científico, o
debate e a pluralidade de ideias (PRATES, 2002). Nesse debate, cabem algumas reflexões de
CHAUÍ (1999) sobre o comportamento de universidades as quais denomina “Operacionais”,
fazendo a distinção entre instituições e organizações. A universidade é uma instituição social e
como tal, aspira à universalidade, o que significa dizer que a sociedade é referência normativa
e valorativa. Discutir ou questionar sua função, sua própria existência, seu lugar no interior da
170
luta de classes está no seu papel (CHAUÍ, 1999). “A instituição percebe inserida na divisão
social e política e busca definir uma universalidade (ou imaginária ou desejável) que lhe permita
responder às contradições impostas pela divisão” (CHAUÍ, 1999, p. 3). Diferentemente, a
organização, funde-se à particularidade, e tem apenas a si como referência, num processo
competitivo com outras organizações que com ela se assemelham em objetivos. “A organização
pretende gerir seu espaço e tempo particulares aceitando como dado bruto sua inserção num
dos polos da divisão social, e seu alvo não é responder às contradições, e sim vencer a
competição com seus supostos iguais” (CHAUÍ, 1999, p. 3). É regida pelas ideias de gestão,
planejamento, previsão, controle e êxito. Nesse universo, expressões como “qualidade
universitária”, “avaliação universitária” e “flexibilização da universidade” conferem a ideia de
determinada autonomia institucional, o que para a autora não se confirma.
Ao ponderar as considerações de Prates (2002) e Chauí (1999), o debate sobre a gestão
da educação superior parece requerer mais espaço em que nele se amplie os conceitos
relacionados a novas formas de gestão. Há de se ter certos cuidados, pois “estudos
internacionais indicam que a emergência do modelo empresarial de gestão dos serviços
públicos, incluindo a educação superior, resultou em perda de confiança nas instituições e
exigências de mais responsabilidade” (BERTOLIN; DALMOLIN, 2014, p. 150). Por outro
lado, estudo de Clark (2006) apresentaram evidências de que “as universidades podem se
adaptar a um estilo inovador de boa governança e, paralelamente, manterem suas funções
acadêmicas e valores de colegialidade” (CLARK apud BERTOLIN; DALMOLIN, 2014, p.
150).
Na tentativa de entender o contexto das mudanças e buscar novos horizontes, a UNI3,
em seu PDI, apresenta um estudo sobre as estratégias e sistemas utilizados para o
redimensionamento do planejamento e desenvolvimento institucional para 2017-2021, até
chegar ao mapa estratégico do Plano de Desenvolvimento Institucional e do Planejamento
Estratégico, o qual apresenta os caminhos escolhidos pela Instituição para cumprir sua missão
e alcançar sua visão.
A configuração do mapa leva em conta as características da Instituição como Universidade Comunitária, cuja natureza tem na sustentabilidade financeira o aporte à realização das suas atividades fins. O que significa dizer que os recursos econômico-financeiros são revertidos para o capital social e os processos acadêmicos e administrativos e possibilitam seu crescimento e desenvolvimento (PPI/UNI3, 2017, p. 47).
Várias dimensões são contempladas: Capital Social. Processos, Crescimento e
171
Desenvolvimento, Sustentabilidade Financeira. A elaboração do planejamento tomou como
referência “as características que constituem a identidade como uma Instituição comunitária e
seu reconhecimento pela comunidade, sobretudo em relação à oferta de ensino de qualidade, ao
desenvolvimento de pesquisas e à gestão criativa de projetos sociais” (PPI/UNI3, 2017, p. 48).
Argumentos semelhantes são utilizados por todas as outras comunitárias em seus PDIs.
Em seus planejamentos estratégicos, os objetivos traçados por estas universidades
privilegiam o aprimoramento, a ampliação, a consolidação, o fortalecimento, a otimização, a
modernização e o desenvolvimento institucional sustentável. Para chegar a eles, destacam seus
diferenciais em relação à gestão acadêmica, ao corpo docente qualificado, à infraestrutura
consolidada e ao posicionamento do egresso no mercado de trabalho. Os conceitos 4 e 5 obtidos
na avaliação realizada pelo MEC em seus cursos e os conceitos 4 e 5 obtidos na avaliação dos
programas de pós-graduação feita pela Capes, também são citados como evidência dos
diferenciais de qualidade e a coerência das ações institucionais em relação à missão, valores e
objetivos institucionais.
Nesse capítulo, percorreu-se um caminho de análise da configuração das universidades
comunitárias, partindo-se das dimensões Valor, Função e Interação, estabelecendo uma relação
com as características singulares dessas instituições e os conflitos provenientes de processos
como a comoditização e a desagregação do ensino superior, motivados por políticas neoliberais.
Observou-se que políticas de expansão e diversificação da educação superior vão incidir em
ações que propiciam a proliferação de instituições com fins lucrativos, as quais colocam em
risco a qualidade dos serviços oferecidos e se constituem em ameaças às universidades
comunitárias. Observou-se a luta das comunitárias em manter o princípio da indissociabilidade
entre ensino/pesquisa/extensão e os desafios impostos à gestão dessas instituições dado o
cenário da concorrência imposta pela mercantilização do conhecimento. As vozes dos gestores
e os documentos reiteram a natureza comunitária dessas universidades e demonstram uma
atitude persistente/resistente de manter em sua identidade o valor do conhecimento
intrinsicamente ligado à tríade ensino/pesquisa/extensão, com forte inserção social.
O capítulo 5 intitulado A comunicação das universidades comunitárias: um desafio
a enfrentar traz algumas reflexões sobre a percepção dos gestores quanto à forma de
comunicação que essas instituições assumem ao se comunicar com seus públicos, alguns
apontamentos sobre os discursos institucional divulgados na mídia e os desafios que surgem
nesse universo.
172
5 A COMUNICAÇÃO DAS UNIVERSIDADES COMUNITÁRIAS: UM DESAFIO A
ENFRENTAR
Este capítulo tem por objetivo identificar o modo como as universidades comunitárias
comunicam sua identidade aos seus públicos. Ao se considerar as abordagens de Albert e
Whetten (1985), Caldas e Wood Júnior (1997) e de Nogueira (2000a) depreende-se uma visão
de identidade organizacional como auto conceito, tomando-se como referência duas dimensões:
uma delas é a forma como seus membros internos, principalmente seus gestores, de modo
compartilhado, a percebem, correspondendo a uma percepção de si mesma ou autopercepção
ou auto imagem; a outra é a forma pela qual a organização é percebida, a sua imagem externa,
por aqueles com quem ela interage. Assim, faz parte da identidade, a percepção dos dirigentes
sobre a organização, ou seja, a forma como a organização se vê; e como imagem, a percepção
da sociedade sobre a organização, ou seja, a forma como o público externo a vê. O foco desta
investigação recai sobre uma das partes componentes da identidade, qual seja, como as
universidades comunitárias se percebem, procurando responder à pergunta "Quem nós
somos?"; ou seja, a consciência de si, a partir da análise de seus atributos centrais, distintivos e
duradouros (ALBERT, WHETTEN, 1985), bem como das dimensões Valor, Função e
Interação (MCCOWAN, 2016; 2017; 2018). Não se está desconsiderando a importância de
como a sociedade percebe a instituição, apenas está sendo feito um recorte de pesquisa, já que
este estudo faz parte de um grande projeto intitulado Identidade e Imagens das Universidades
Comunitárias do sul do Brasil, o qual tem várias frentes de trabalho.
Retomando então alguns aspectos sobre a construção da identidade e a relevância da
linguagem nesse universo, toma-se como referência o estudo de Borzeix e Linhart (1996), sobre
o modo como as identidades coletivas são (re)construídas, reafirmadas ou abandonadas nas
organizações por influência da palavra, a qual assume expressiva importância como
instrumento de gestão. Para as autoras, a comunicação na organização atua como estratégia dos
gestores para que os saberes e conhecimentos informais sejam padronizados e oficializados. A
palavra em si não é criadora de identidade, no entanto, serve como veículo que conduz ao
processo de formação da identidade, uma vez que é por meio dela que os indivíduos se
expressam e se posicionam, de modo convergente ou não (BORZEIX: LINHART, 1996).
Quem são os atores construtores dos discursos ora analisados nesse estudo? Os gestores
da alta administração, as comissões organizadoras e escritoras dos PDIs das instituições foco
do trabalho, cujo expediente é formado por reitores, vice-reitores, diretores, gerentes,
coordenadores, ou seja, colaboradores integrantes da administração dessas instituições. Ao
173
entender que o discurso produzido traz certa visão de mundo impregnada por valores, crenças,
mitos e representações sociais cujos significados são comumente compartilhados pelos atores
organizacionais (SARAIVA et al., 2010), interpreta-se que “a linguagem não é um meio neutro
que se torne fácil e livremente a propriedade intencional do falante, mas que ela está povoada
de intenções de outrem” (BAKHTIN, 1998 [1934/35], p. 100). Ou seja, a linguagem se mostra
como uma zona de tensões entre vozes de outrem, socio ideologicamente situadas; “todas as
palavras e formas que povoam a linguagem são vozes sociais e históricas” (1998 [1934/35], p.
106). E onde se manifesta concretamente a linguagem? Na comunicação. Neste caso, na
comunicação organizacional/corporativa: o meio que a organização/instituição usa para se
comunicar com seus públicos e que consiste em diversos elementos, como marcas, produtos e
serviços, divulgações pela mídia, anúncios de propaganda, patrocínios, eventos, relatórios,
balanços financeiros, página na Internet, entre outros (FROEMMING, 2008, p. 33).
Para dar continuidade ao estudo com o intuito de compreender a constituição da
identidade das universidades comunitárias vai-se caminhar para além dos discursos dos gestores
e dos PDIs, vai-se visitar algumas campanhas institucionais veiculadas na Internet, por estas
universidades, via site YouTube21, entre os anos de 2015 e 2018. Os vídeos têm duração entre
um a sete minutos. Todas as universidades comunitárias deste estudo utilizam-se de várias redes
sociais, ou seja, espaços virtuais de comunicação para se relacionar com seus stakeholders por
meio de envio de mensagens, divulgação de produtos/serviços e partilha de conteúdos, entre
elas estão Facebook, Instagram, Whatsapp, Twitter, LinkdIn e YouTube. Explora-se, nesse
contexto, o que se chama de Marketing Digital, uso da internet como meio para estabelecer uma
relação mais próxima com o aluno/cliente (REEDY; SCHULLO; ZIMMERMAN, 2001).
Para Kunsch (2006), a comunicação tem que ser percebida como parte inerente à
natureza das organizações. As organizações “são formadas por pessoas que se comunicam entre
si e que, por meio de processos interativos, viabilizam o sistema funcional para sobrevivência
e consecução dos objetivos organizacionais num contexto de diversidades e de transações
complexas” (KUNSCH, 2006, p. 167). Assim, sem comunicação, as organizações não
existiriam. A comunicação organizacional está diretamente ligada ao planejamento e aos
processos de gestão que determinam as estratégias da organização. Se, anteriormente, o foco
estava na transmissão da mensagem, hoje se observa muito mais a formação do significado, da
informação e do conhecimento (MARCHIORI; VILAÇA, 2011). Corroborando com esse
21 YouTube é o nome dado a um site de compartilhamento de vídeos enviados pelos usuários por meio da internet. Os canais são criados pelos próprios usuários, por meio dos quais podem compartilhar vídeos sobre os mais variados temas (BURGESS; GREEN, 2009).
174
posicionamento, Foreman e Argenti (2005) afirmam que a comunicação organizacional só se
realizará se for reconhecida e sustentada pela alta administração como uma área estratégica para
a gestão, devendo estar alinhada aos objetivos e metas propostas para execução. Assumir esse
lugar requer que a área de comunicação esteja envolvida no processo de tomada de decisão, o
que tem sido um dos grandes desafios das organizações nos dias de hoje.
Os vídeos trazem em sua composição uma série de imagens que retratam os espaços, as
pessoas, as ações, enfim, elementos que constituem a vida da e na universidade e na região
onde estão inseridas. Normalmente, há um texto de caráter descritivo, cuja locução é feita em
OFF, com voz masculina e, sobrepostas às imagens, aparecem informações as quais são
apresentadas por meio de legendas. Apesar de se entender a importância que a composição das
imagens assume em termos de produção textual visual, não é intuito, neste trabalho, fazer um
exame semiótico das imagens que compõem os vídeos. Ao analisar as campanhas institucionais
das universidades comunitárias, identifica-se explicitamente na construção do discurso a
referência à sua missão, ao seu propósito, à sua abrangência, à busca pela excelência. É a
instituição dizendo como ela é. Textos como
A UNI1 é uma instituição comunitária de ensino superior. [...] Reconhecida como a universidade comunitária da Serra, a UNI1 se mantém em permanente processo de qualificação, compromisso que envolve toda a comunidade universitária. [...] Uma Universidade que se renova a cada dia, porque a busca pelo conhecimento não cessa nunca.” (Vídeo 1, UNI1, 2015). A UNI1 é uma universidade comunitária de ensino superior, que tem como missão produzir, sistematizar e socializar o conhecimento com qualidade e relevância para o desenvolvimento sustentável (Vídeo 2, UNI1, 2018).
são ilustrativos e reforçam o posicionamento da instituição no contexto da educação superior.
Já em campanhas apresentadas na plataforma YouTube sobre a Uni2 os seguintes textos foram
divulgados
A Missão da UNI2 é produzir e difundir conhecimentos para melhoria da qualidade de vida da comunidade. Para isso, busca formar cidadãos preparados e competentes com postura crítica, ética e humanista que atue como agentes transformadores na sociedade. [...] De natureza comunitária e filantrópica desde o início seu objetivo foi produzir conhecimento, promover a inovação tecnológica e o desenvolvimento regional. [...] Um conjunto de possibilidades que busca preparar os alunos para enfrentar os desafios do mundo contemporâneo e para atender as demandas da comunidade. [...] Uma instituição voltada aos interesses da vida em comunidade. Um lugar onde o conhecimento construído de forma coletiva e com ações buscando excelência tecnológica e qualificação profissional. Mas acima de tudo essa é uma instituição que privilegia a formação ética e humanista, capaz de transformar a realidade social (VÍDEO 1, UNI2, 2015).
175
Em 2018, por ocasião de completar 50 anos de existência, a UNI2 lançou outro vídeo
institucional, no qual reitera o seu posicionamento: Com meio século de história, a UNI2
mantém em suas raízes no ensino de excelência, incentivo à pesquisa e extensão e a constante
busca pela inovação tecnológica. [...] Uma instituição que prioriza a formação ética e
humanista, que produz e difunde o conhecimento. Busca a excelência e tem dentro do seu
campus a grande inspiração. Como se evidencia, os textos veiculados nessa rede social
reproduzem as informações contidas nos PDIs, com o propósito de associar a marca (nome da
instituição) à razão de sua existência. Essas expressões também traduzem os discursos de seus
gestores, como se vem observando desde o Capítulo 3, por ocasião da descrição da trajetória
dessas instituições desde sua gênese até a sua legitimação e no Capítulo 4, por ocasião da análise
de suas funções.
Ao assistir aos vídeos da UNI3, novamente encontra-se a denominação universidade
comunitária com a presença do slogan “UNI3 universidade de verdade” (Vídeo 1, UNI3,
2016). Talvez aqui, a intenção da instituição se manifestasse no sentido da mostrar à
comunidade o quanto ela tem a oferecer em comparação a outras instituições que se fazem
presentes no seu entorno (faculdades, Centros universitários, escolas técnicas), as quais
chamam para si qualidades que somente uma universidade comunitária poderia oferecer. O
mesmo texto informa que
A UNI3 mais do que uma universidade comunitária é um ponto de encontro onde pessoas de todo o mundo compartilham seus sonhos e ideais, pessoas que sabem que o ensino de qualidade só ampliará a chance de um futuro promissor, um ambiente ético, rico em cultura, atento à informação do jovem como um cidadão crítico para um desenvolvimento cada vez mais sustentável (Vídeo 1, UNI3, 2016).
Dois anos mais tarde, uma nova peça de divulgação é lançada pela UNI3, nela contém
o seguinte:
Movidos pelo conhecimento, é nossa missão, nossa vocação, nossa razão de existir. Movidos pelo conhecimento é nossa eterna busca pelo aprender, entender e acima de tudo inovar. Somos a UNI3. Uma das melhores instituições de ensino da América Latina, uma universidade em transformação (Vídeo 2, UNI3, 2018).
Na análise dos vídeos produzidos pela UNI4, encontrou-se o seguinte teor
Você tem ideia do que faz uma universidade? Universidade é conhecimento. É formação acadêmica, pesquisa, inovação, integração, debate.
176
Solidariedade. Inclusão social, digital, real. É desenvolvimento de ideias e de tecnologia. [...] Um lugar construído de forma coletiva. Uma espécie de protótipo do amanhã. Universidade é experiência, uma experiência de vida. E uma experiência viva. Viva a UNI4. Há cinquenta anos a nossa universidade (Vídeo 3, UNI4, 2018).
Importante mencionar que, para comprovar tais posicionamentos, o narrador elenca as
cidades de abrangência da instituição, o número de cursos de graduação e pós-graduação
ofertados, a infraestrutura enumerando a quantidade de salas e laboratórios, o número de
projetos de extensão e atendimentos realizados junto à comunidade, a presença de professores
qualificados, informações estas que também aparecem legendadas sobre as imagens. A ênfase
na apresentação de dados numéricos parece cumprir o papel de comprovação das afirmações
contundentes sobre o valor do conhecimento e das experiências vivas para a universidade.
Ao analisar algumas campanhas de marketing institucional destas universidades,
observou-se que muitos aspectos de produção textual se assemelham, ou seja, enfatizam a
excelência na busca do conhecimento, a tradição e contemporaneidade, a inovação, o
envolvimento com a comunidade, os destaques e rankings nacionais e internacionais, a
abrangência da infraestrutura. Também pôde-se observar a presença reiterada de um discurso
que prioriza a missão e os valores preconizados por essas instituições. Há um esforço em
reafirmar o conhecimento visto e exercitado como instrumento de geração de saberes, promotor
de mudanças, que se origina na universidade, que a retroalimenta e que atende às necessidades
da comunidade, transformando realidades na busca de uma vida melhor.
Talvez os slogans utilizados nessas campanhas sejam os principais mensageiros dessa
visão, tais como “O conhecimento ilumina” (UNI1, 2015); “Conhecimento é a nossa natureza”
(UNI2, 2017); “Movidos pelo conhecimento” (UNI3, 2018). Constata-se, portanto, que os
discursos veiculados são bastante semelhantes e defendem os atributos centrais, digamos,
únicos, singulares dessas instituições, entre eles o de se voltar ao bem público, como
componente de sua identidade. Vannucchi (2011, p. 32) reafirma que “maneira coletiva e
pública com a qual toda reflexão crítica e todo o conhecimento científico e cultural que nela se
produzem constituem um valor realmente democrático [...]”. Portanto, a percepção é a de que
as universidades comunitárias se esforçam para demonstrar, por meio de diferentes canais de
comunicação, o alto valor que atribuem ao conhecimento como bem público, valor de sua
existência.
Está-se analisando os atributos componentes da identidade das universidades
comunitárias a partir dos depoimentos de seus gestores e seus documentos
oficiais/institucionais – PDIs, Relatórios de Responsabilidade Social e vídeos institucionais.
177
Mas como esses atributos são comunicados aos seus públicos? Laux, Silveira e Perfeito (2003)
ao estudar as estratégias e ações de marketing adotadas pelas IES participantes do Sistema
ACAFE, observaram que seus materiais de comunicação com o mercado (existentes em maior
profusão), seguem uma mesma linha que privilegia, principalmente, o histórico da instituição e
o rol de cursos ofertados, com pouca ou nenhuma diferenciação entre esses materiais. Segundo
os autores, “não há, assim, um embasamento mais científico centrado na diferenciação e no
valor agregado substanciais, mas, com maior preponderância, em desenvolvimento gráfico das
peças de maneira a torná-las atrativas para o aluno-cliente” (LAUX; SILVEIRA; PERFEITO,
2003, p. 9).
Voltando aos depoimentos dos gestores, ao ser questionado sobre como a universidade
comunicava aos seus públicos a sua identidade como comunitária, R1 afirmou
é uma dificuldade se comunicar. Nós e todas as universidades comunitárias do Estado temos dificuldade em mostrar esse diferencial. [...] Historicamente, há uma dificuldade a tal ponto que o aluno, às vezes, não percebe a diferença entre estudar numa faculdade ou num centro universitário ou em uma universidade comunitária. [...] então há uma falha na comunicação, essa é uma fraqueza (R1, 2016).
R2 em suas palavras confirma a fragilidade de fazer com que seus públicos
compreendam a dimensão de ser comunitária
a informação de que somos uma universidade comunitária se dá de uma forma muito frágil. Ela não é consistente. Não existe uma programação para fazer a comunicação, isto está mais na palavra do gestor, do reitor, do vice-reitor, eventualmente do diretor, eventualmente do professor. Eu falo eventualmente porque nós não temos uma prática de estar a todo instante dizendo para nosso aluno “Olha, nós somos uma comunitária, nós somos uma universidade comunitária”. Eu procuro, nas minhas manifestações oficiais registrar, “a UNI2 é uma instituição comunitária e filantrópica...” Ou seja, procuro fazer um discurso um pouquinho mais amplo para reafirmar a nossa condição, mas essa não é uma regra geral (R2, 2016).
Ainda com base na avaliação das fragilidades na comunicação da identidade
comunitária, o entrevistado R3 destaca que, inúmeras campanhas, inclusive de cunho
interinstitucional no sul do Brasil, entre os estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul foram
criadas com o slogan “Quem faz comunitária, faz bem.”. O intuito da campanha foi massificar
a ideia de que o trabalho comunitário traz retorno para a comunidade, faz bem para a sociedade,
nós queremos cada vez mais nos envolver com a comunidade e também queremos que ela
reconheça as nossas atividades e ações. No entanto, apesar do esforço coletivo, há pouco
178
retorno ainda no que concerne a estratégias de mídia voltadas ao fortalecimento da identidade
como universidade comunitária. Este entendimento é reiterado nos achados de Borba (2018) ao
entrevistar gestores da Universidade do Vale do Itajaí (SC) com o intuito de identificar a
imagem e a identidade desta instituição. Um dos entrevistados comenta Atualmente, a gente
tem trabalhado com várias frentes em termos de campanha. Mas eu acho que a gente ainda
peca numa campanha institucional com maior tempo de mídia, que é para exatamente
consolidar esta identidade de universidade comunitária (BORBA, 2018, p. 67).
Para Girard e Almeida (2009), o processo comunicativo sofre influência de práticas
culturais e de construções simbólicas, as quais são inerentes à organização. Entendida assim, a
comunicação, então, tem a qualidade de sustentar o que é distintivo daquela instituição, por
meio da divulgação de ações eficazes que realmente consigam demonstrar o que é singular
naquela universidade. Talvez, os departamentos de comunicação dessas instituições devam usar
novas estratégias para reafirmar sua identidade institucional. R2, ao se posicionar quanto à
comunicação de sua instituição, comenta Talvez a instituição nunca tenha se dado conta da
necessidade de comunicar esse aspecto. Ela sempre foi como é hoje. Ela não mudou. Ela foi
criada e ela se mantém no formato que ela foi criada. [...] Mas agora é que a gente sente a
necessidade de afirmar essa condição de comunitária. Percebe-se um entrelaçamento de
elementos culturais, práticas que vêm sendo executadas ao longo do tempo e que não eram
ameaçadas por pressões externas. No entanto, as mudanças globais trouxeram a necessidade de
reforçar a identidade para que esta possa servir de alavanca competitiva neste espaço de
combate. E continua Em 2010, nós já tínhamos umas concorrências muito fortes na cidade.
Então quando nós assumimos, a nossa preocupação era de nos afirmar como instituição da
cidade, porque havia outras de fora. Então, temos um predicado que ninguém nos tira, somos
comunitários, então “UNI2 a universidade da nossa comunidade”.
Percebe-se na fala dos gestores certa angústia quanto ao fato de a comunidade (tanto
interna, quanto externa) não compreender a dimensão do que caracterizaria uma instituição
comunitária, apesar de seus atributos serem tão mencionados nos canais formais de
comunicação. Estaria este problema de comunicação atrelado à forma como a mensagem é
comunicada ou à pouca clareza do entendimento do conceito do que seria uma “universidade
comunitária? Talvez aos dois.
Pertinente, neste momento, fazer referência aos usos e funções da linguagem. Ao
rastrear os vídeos selecionados, constatou-se que a linguagem utilizada é referencial, ou seja,
traz um caráter prioritariamente informativo, cujo foco recai na terceira pessoa do discurso, ou
seja, fala-se sobre “ela” (a universidade), o que ela é, o que faz, o que tem, mas de uma maneira
179
bastante impessoal, distante daquele com quem fala (o interlocutor). Há grande volume de
material informativo, números, dados sobre a atuação da instituição, os quais parecem ter a
função de comprovar o envolvimento com a comunidade, o volume de produção científica, o
impacto regional, apresentados como se fossem relatórios de fiscalização. Apesar de alguns
elementos de caráter persuasivo se fazerem presentes (uso da segunda pessoa do discurso (sua
universidade, nossa universidade), adjetivações (a melhor universidade), eles não se mostram
em número suficiente para que a função conativa da linguagem predomine (CHALHUB, 1999).
Com exceção de um vídeo (UNI4, 2018), cujo texto é narrado em primeira pessoa (como se a
própria universidade estivesse falando), todos os outros se assemelham no modo de apresentar
a instituição. Entende-se que essas universidades têm consciência de si, sabem o que são e o
que querem dizer, mas, talvez, ainda não saibam como dizer. Argenti (2014, p. 90) comenta
que, com a crescente globalização e comoditização dos produtos, “a identidade e a imagem de
uma organização podem se tornar o único traço distintivo entre uma empresa e outra.” Em
virtude das semelhanças entre os produtos em todo mundo, os consumidores fazem cada vez
mais distinções com base em outras noções que não aquelas do produto em si, o que transforma
fatores como identidade e imagem em diferenciais significativos.
Entende-se que as universidades em estudo desejam realçar os atributos do modelo de
universidade que representam, as comunitárias, afinal foram reconhecidas como tais pela Lei
Nº 12.881 de novembro de 2013, mas o fazem apresentando um discurso linear, que se iguala,
como se todas dissessem a mesma coisa, do mesmo modo. Comenta R2 Nós precisamos
mostrar para a sociedade quem nós somos. E o que nós fazemos. E nós somos muito tímidos
nisso (R2, 2016). A institucionalização de universidades de caráter mercantil, a partir da década
de 1990, no Brasil, acirrou a competição no mercado de ensino superior e motivou um
comportamento mais agressivo quanto ao uso de propagandas nesse setor. Na tentativa de
ganhar mais espaço, as universidades mercantis valeram-se de todos os recursos disponíveis na
área de publicidade e marketing. Um levantamento feito em 1998, na cidade de São Paulo,
mostrou que entre os 15 maiores anunciantes de outdoor encontravam-se cinco instituições de
ensino privadas, o que demonstra a importância dada por essas instituições à publicidade
(CALDERÓN, 2000). Ao pensar sobre as campanhas institucionais das universidades
comunitárias foco deste estudo, parece que a constatação de Levitt (1985) faz sentido, ou seja,
que as universidades tradicionais tendem a restringir suas estratégias de marketing ao produto
em si, aos cursos que estão sendo oferecidos no mercado. Como já se constatou nas páginas
anteriores desta pesquisa, observa-se nos depoimentos dos gestores grande insatisfação quanto
às campanhas de comunicação realizadas pelas instituições, os quais percebem certa
180
ineficiência no sentido de deixar clara à comunidade as singularidades da identidade da
instituição como comunitária, bem como produzir efeito atrativo sobre aqueles a quem se
direciona a mensagem. “Mas voltando especificamente ao ponto, nós comunicamos ainda
muito mal.”, afirma R2 (2016), demonstrando certa frustração.
Para Argenti (2014), a identidade corporativa deve trazer uma visão inspiradora, uma
marca cuidadosamente elaborada, que abranja os principais valores, filosofias e objetivos da
instituição. Para isso, o autor sugere a utilização de narrativas ou de uma história em episódios.
“A comunicação será mais eficaz se as organizações se basearem em uma [...] história
corporativa sustentável como fonte de inspiração para todos os programas de comunicação
internos e externos. Histórias dificilmente podem ser imitadas, e elas favorecem a consciência
em todas as mensagens corporativas” (RIEL, 2000, p. 163). A história corporativa deve
representar todo o discurso institucional, sendo coerente e consistente com a cultura e
comportamento organizacional.
Para obter informações sobre a organização e a história que está sendo contada, as
pessoas baseiam-se em artigos de publicações, anúncios de televisão, mídias digitais, mas
principalmente em conversas com outras pessoas como família, amigos, colegas de trabalho,
assim como com colaboradores da organização (ARGENTI, 2014). Ao ser perguntado sobre os
motivos que levariam um jovem a escolher aquela universidade, R3 comentou
Eu acho que é um misto de várias coisas. Primeiro, a indução familiar ou do próprio aluno em querer fazer um curso para realização pessoal. [...] Segundo, eu não sei como está isso, nos últimos anos, mas quando se fazia pesquisa de vestibular junto aos alunos e se perguntava qual tinha sido a fonte que o fez vir para a universidade, um percentual muito significativo dizia que era o boca a boca. Então, acho que esse elemento, essa índole é uma coisa que ajuda bastante. Lógico que as campanhas ampliam, comunicam. Mas não adianta fazer uma campanha de uma instituição que não tenha os predicados de condições, de professores, de estrutura, de qualidade e tal, pois eu acho que a campanha se esvazia (R3, 2016).
Os predicados da instituição são confirmados no compartilhamento informal de ideias
(boca a boca), comentários, opiniões e informações entre pessoas. Esse tipo de comunicação
interpessoal acaba assumindo grande impacto no comportamento dos consumidores, e por
consequência, na reputação corporativa, por influenciar nas suas opiniões e atitudes com relação
à organização e àquilo que ela oferece (IKEDA, 1997; BLACKWELL; MINIARD; ENGEL,
2005).
Falar em reputação, é falar sobre as expectativas que os stakeholders têm da organização
e da percepção que eles formam sobre o cumprimento dessas expectativas (ARTONI; DARÉ,
181
2008). Assim, ao fazer o comentário sobre o que motivava o aluno a escolher aquela instituição,
respondendo que era o “boca-a-boca” ou mesmo a “índole”, o gestor se referia aos atributos
que faziam parte da reputação daquela universidade, quais sejam, a credibilidade, a qualidade,
a confiança e a responsabilidade (FOMBRUN, 1996), avalizados pelo intercâmbio de relatos
de experiências positivas com aquela instituição.
A reputação é construída ao longo dos anos e tem como base as ações e comportamentos
da organização, o que lhe dá um caráter de estabilidade. Para Rindova (1997), essa estabilidade
faz da reputação um ativo valioso porque ela protege as empresas de reações negativas, quando
um evento desfavorável acontece. Dessa maneira, mesmo que a organização vivencie uma crise,
abalando a sua imagem no curto prazo, se ela possui uma reputação forte, conseguirá
administrar melhor a crise em virtude dos relacionamentos sustentados em ações e
comportamentos que geram confiança, respeito e credibilidade (RINDOVA, 1997). Cabe
lembrar que a construção da reputação é demorada e requer coerência de atitudes no tempo e
nas diversas situações vivenciadas por aqueles que se relacionam com a organização. No relato
de R2, isso pode ser constatado
Aquilo que a universidade tem de qualidade, atrai por si só, o nome da universidade, por exemplo. A maioria dos nossos estudantes são filhos de quem fez a formação conosco. Então, aí mais um significado de ter uma instituição funcionando há tantos anos com qualidade, comprometida. [...] Então vem de pai para filho, como a gente diz, né. Muitos dos nossos professores, os pais foram professores ou estudaram aqui. Então, tem todo um sentimento que envolve isso que é muito caro para todos nós (R2, 2016).
Expressões como A maioria dos nossos estudantes são filhos de quem fez a formação
conosco ou aí mais um significado de ter uma instituição funcionando há tantos anos com
qualidade, comprometida. [...] Então vem de pai para filho trazem elementos singulares da
vivência daquela comunidade com a instituição e demonstram que a preferência se dá pelo
compromisso da instituição em manter a qualidade nos serviços que oferece. Essa reputação
que a universidade tem não pode ser copiada e muito menos vendida, daí a sua relevância como
contingente estratégico. Ela é a prova de que a empresa cumpre as promessas estabelecidas em
sua marca, gerando confiança, estima e respeito em seus públicos de relacionamento (NUNES;
ALMEIDA, 2008). Essa reputação corporativa está conectada com os resultados coletivos
positivos que os seus públicos-alvo percebem das ações da instituição, o que demonstra a
habilidade da organização em gerar valor aos seus stakeholders ao longo do tempo.
(FOMBRUN; RINDOVA, 1998).
182
A palavra “tradição” utilizada pelos gestores quando questionados sobre as motivações
que levavam os estudantes a escolher aquela instituição traz consigo o sentido de reputação.
Vou usar o que é jargão. Tradição. A história da UNI2. Quem quer qualidade procura a UNI.
(R2, 2016). Esse aspecto da consolidação, acho que tem a ver com a história. A gente tem um
mérito muito grande em face da tradição e do que foi feito aqui anteriormente (R3, 2016).
Eles procuram a UNI4 pela qualidade das nossas atividades, dos nossos cursos de graduação,
pela história de qualidade que nós temos na instituição, nós temos um nome, uma marca
bastante forte aqui nessa região. Entra em cena um dos traços do conjunto que determina a
identidade organizacional, segundo Albert e Whetten (1985): a durabilidade. Esta diz respeito
aos aspectos temporais relacionados à perenidade tanto ao que é central quanto ao que é
distintivo da identidade da universidade, ou seja, a história construída durante os mais de
cinquenta anos dessas instituições junto à comunidade oferecendo uma formação profissional
que atende aos anseios da população, está viva nos discursos que se sucedem de geração a
geração. Esses discursos são alimentados por argumentos que ressaltam os princípios
comunitários, bem como as virtudes que distinguem essas instituições de outras, como a
qualidade de educação que oferece. Assim, a “identidade é afetada pela cultura organizacional
e por outros sistemas de significado com os quais ela interage” (SARAIVA; DUARTE, 2010,
p. 113), é a cultura munindo o simbolismo com o qual as imagens são construídas e
comunicadas (MACHADO, 2003).
Isso tudo gera um grau expressivo de pertencimento, pois “a construção de fortes
associações emocionais entre uma organização e seus clientes aumenta a identificação com a
organização e, portanto, a probabilidade da compra de produtos” (NUNES; ALMEIDA, 2008,
p. 2). Todos os gestores, quando perguntados sobre a história da instituição, em algum momento
incluíram-se nela. Conta o gestor R4
Eu cheguei aqui tinha só uns bloquinhos. Desde aluno de graduação, no curso de Educação Física que eu fiz, era atleta. [...] Depois comecei a me envolver muito com educação, me chamaram para ser coordenador pedagógico da Secretaria de Educação do município, e uns anos depois comecei a fazer pós-graduação e me convidaram para dar aula na universidade. Daí comecei em 1986 aqui na instituição como professor, então, 31 anos eu estou como professor. [...] A minha vida é a UNI4. Em 1997, fomos transformados em universidade. Há 19 anos que estamos aí como universidade (R4, 2016).
Para Saraiva e Duarte (2010) as identificações por parte do indivíduo também estão
ligadas ao trabalho que realiza e ao contexto em que atua. Hall (1997) comenta que a
identificação é construída juntamente com reconhecimento de objetivos, origens e
183
características comuns entre indivíduos e organização. Eu comecei como aluno em 1977. Em
1981 comecei a dar aula antes de me formar, em Administração Rural. Depois me formei em
1982. Em 1986, eu fiz concurso para Direito. Aí, entrei no Direito como professor. Eu
conheço muito da nossa história (R2, 2016). Evidencia-se, nas declarações, uma identificação
dos gestores com os valores e o trabalho que desempenham junto às instituições.
Descreve R1
Estou aqui há vinte e três anos. Eu sou da Filosofia. Dois anos depois que eu entrei na universidade, já assumi uma chefia de departamento. Depois fui por quase três vezes diretor de centro e eu só larguei a direção porque assumir a pró-reitoria. [...] Então eu sempre fui demandado para mediar conflitos na gestão. Eu sou o mediador. As dificuldades existem, né, inclusive os cabelos branquearam, né? E enfim, então de fato, é um peso enorme, uma responsabilidade enorme. [...] Daquilo que era, a universidade cresceu com sucesso, o case da UNI1, é um case de sucesso. E cresceu junto com a cidade, com a região, a cidade cresceu junto com a universidade (R1, 2016).
A permanência desses gestores, por longo tempo, se dedicando em diferentes instâncias
e participando dos processos de transformação nessas universidades, alimenta o sentimento de
pertença, os quais comungam com os ideais e as ações promovidas pelas instituições junto à
sociedade. Isso é, de certa maneira, uma forma de manifestação da identidade organizacional.
Assim é, que em seus discursos, os gestores reforçam a todo instante as características de ser a
sua universidade comunitária. Destacam as qualidades, as virtudes, o envolvimento com a
comunidade, a história, as lutas, a reputação do local onde trabalham. E buscam comunicar tudo
isso, utilizando-se das mais variadas formas, sem, contudo, perceberam grande retorno de seus
esforços. Talvez, mais investimento em traços distintivos como a reputação pudesse comunicar
melhor suas principais forças como comunitárias.
Vários motivos têm levado as empresas a repensarem suas estratégias de relacionamento
com seus públicos: a globalização dos mercados; a saturação e a fragmentação da mídia; o
crescimento da opinião pública e uma inevitável comoditização de produtos e serviços que
dificulta a diferenciação. Nesse universo, a reputação é um recurso que se torna cada vez mais
importante na criação e manutenção de vantagem competitiva nas organizações (GARDBERG;
FOMBRUN, 2002). Para isso, “estabelecer uma política de comunicação consistente e que
transmita a identidade e os valores da empresa contribui, sobremaneira, para construir e
sustentar uma reputação forte” (NUNES; ALMEIDA, 2008, p. 3). Mais do que contribuir para
a visibilidade da organização, a comunicação organizacional “constrói sentido e significados
que levam a um maior ou menor grau de admiração, respeito, simpatia e confiança por parte de
seus públicos” (NUNES; ALMEIDA, 2008, p. 3).
184
Wiedmann e Prauschke (2006) afirmam que a comunicação organizacional pode ser
utilizada para se estreitar o relacionamento com os stakeholders, na medida em que tem a
capacidade de alinhar as expectativas e demandas dos diversos grupos. Partindo dessa premissa,
talvez, é que os gestores, manifestam seus desejos de alinhar os discursos. Para tanto descrevem
algumas ações de comunicação interna e externa.
Tem o Tour UNI4 que acontece todos os meses. Os funcionários estão, às vezes dez anos aqui dentro e não conhecem a universidade. Eles vem de manhã, se inscrevem, são recebidos com café da manhã, e naquele dia, eles passam conhecendo a universidade, todos os lugares, passam o dia inteiro eles vão conhecer tudo. Almoçam, tomam café da tarde para encerramento. Então, eles não podem mais dizer que eles não sabem. Então, os feedbacks são muito interessantes no sentido de eles sentirem a universidade, de conhecer a instituição e de se comprometerem com ela, de se comprometerem com o outro também. Criamos o Anima. Nós dispensamos meia hora de trabalho, todos os funcionários, aqueles que podem sair naquele momento, dos setores para fazer ginastica laboral, yoga, natação, academia de graça O Anima também veio com objetivo de se desenvolver o sentimento de pertença. A gente precisa desenvolver o sentimento de pertença. Todos eles têm que se sentir integrantes dela (R4, 2016).
Ciente da necessidade de criar mecanismos eficientes de comunicação, o gestor
desenvolveu alguns programas que possibilitaram a integração entre universidade e
comunidade interna, mas não só. Seu propósito também era criar nesta comunidade o
sentimento de pertencimento e satisfação em trabalhar naquele espaço, Então, os feedbacks são
muito interessantes no sentido de eles sentirem a universidade, de conhecer a instituição e
de se comprometerem com ela, levando-os a respeitar e a admirar o trabalho realizado pela
instituição. Ao falar da relação entre gestão e comunicação, R4 defende
São decisões, são concepções que a gente tem de gestão. São escolhas. [...]Então, é essa coisa de as pessoas se comprometerem com o projeto institucional é ele que tem que estar acima de tudo. Não é com uma pessoa, com um gestor, com outro gestor, é com a instituição. E pra isso, a gente precisa do diálogo. Ter atenção com eles e fazer o que a gente pode para eles se sentirem bem, para eles se sentirem parte das decisões da instituição (R4, 2016).
O esforço do gestor vem no sentido de polinizar uma noção clara do que é uma
universidade comunitária e o que ela faz, alinhando os discursos, os quais serão polinizados
positivamente junto à comunidade tanto interna quanto externa. Além disso, alguns estudos
indicam que empresas que têm reputação forte e positiva sustentam seus processos de
185
comunicação num conjunto de dimensões proposto por Fombrun e Riel (2004), quais sejam
transparência, autenticidade, consistência, visibilidade e distintividade. Em depoimento, R4 diz
Nós temos o Papo Aberto da reitoria com os funcionários. Todo semestre, então, os funcionários enchem o auditório, e aí a gente tá lá, toda a reitoria tá lá. [...] Eles são sinceros. Se a gente tá ali, a gente tá ali pra construir junto alguma coisa, pra melhorar. [...] É a transparência, é muito tranquilo isso com eles, porque não tem nada o que esconder (R2, 2016).
Parece que há certa predisposição do gestor em manter um canal aberto com o público
interno, na tentativa de criar uma relação transparente, sem grandes atritos. Ao se comunicar
mais e melhor com seus colaboradores, garantindo um processo de transparência, a instituição
aumenta o grau de confiança dos seus grupos de relacionamento, os quais depositam
credibilidade nas ações e propósitos da organização (FOMBRUN; RIEL, 2004). A
transparência, consiste, portanto, em uma ferramenta eficiente no gerenciamento de crises
quando múltiplos pontos de vista entram em jogo no conflito. A autenticidade gera certo apelo
emocional, confere um caráter de verdade ao discurso, pois sustenta-se nas crenças e valores da
instituição (OLIVEIRA, 2008). São decisões, são concepções que a gente tem de gestão. São
escolhas. [...] Então, é essa coisa de as pessoas se comprometerem com o projeto institucional
é ele que tem que estar acima de tudo. O gestor legitima tais princípios e, por meio do diálogo,
busca endossá-los junto aos colaboradores.
A consistência do discurso organizacional é garantida pela legitimidade conferida pela
coerência entre as ações e as informações divulgadas (FOMBRUN; RIEL, 2004). Para tanto, a
instituição deve valer-se de estratégias de comunicação e assim o fazem as universidades
comunitárias.
Nós optamos em mostrar o que estamos fazendo sem dizer “Olha, aqui tá a
universidade porque a universidade é o supra sumo.” Não. Não estamos fazendo isso. Porém, isso não chega a todas as pessoas. Nós não temos uma comunicação de massa. Isso que eu tô te falando, se refere aos dois jornais da cidade. Aparece na nossa TV Aparece na nossa rádio. Ok. Mas é muito pouco. Porque a nossa rádio, a nossa TV, não têm uma grande audiência (R2, 2016).
Parece que a preocupação do gestor reside em apresentar a universidade sem o cunho
mercadológico, mas por meio das ações e projetos que ela desenvolve junto à comunidade com
o intuito de reforçar a sua identidade como comunitária. Porém, ao mesmo tempo que considera
pertinente essa estratégia, também constata que ela não chega de forma abrangente nos
diferentes públicos, pois os meios de que dispõe atingem pequeno público. Então, nós
186
precisaríamos ter algo mais massivo pra chegar nesse ponto de querer mostrar quem nós
somos. E ao mesmo tempo, distinguir-se das outras instituições que não são comunitárias. Ao
comentar sobre sua participação junto ao Comung, o gestor afirma
O Comung tem este compromisso de fazer essa comunicação. Nós fechamos agora uma parceria com a Rádio Gaúcha[...] através do nosso departamento de marketing. Mas nós queremos o quê. Patrocinar um programa na Rádio Gaúcha, que fale de educação e faça referência a uma universidade comunitária. A rádio não vai estar fazendo propaganda da universidade, mas a universidade vai levar informações para o programa. Essa rádio tem uma audiência em todo o Estado (R2, 2016).
A estratégia de comunicação da UNI4 também se apoia na apresentação dos feitos da
universidade em pesquisa, em ensino, vinculando a divulgação a informações de caráter
referencial, sem que haja elementos que sugiram um tom persuasivo. Ao falar sobre como a
universidade se comunica com seus públicos, R4 comentou
Nós temos, por exemplo, um espaço toda semana chamado Café Consciência na Associação Comercial. Toda semana, nós estamos lá comunicando uma produção cientifica dos nossos grupos de pesquisa. Isso é divulgado para toda a cidade, por causa da nossa vocação comunitária. Nós temos um espaço em todos os jornais da cidade. Tem um mundo de artigos publicados. Então, tem todos os releases. São inúmeros os artigos que eu já escrevi dizendo que é uma comunitária, porque se diferencia (R4, 2016).
São muitas as informações nas mídias sobre as atividades executadas pela instituição.
Nós geramos muitas notícias na comunidade. Isso é uma coisa constante. Na página de
esportes, vários atletas foram bancados pela universidade. Essa é uma forma de mostrar o que
nós fazemos (R2, 2016). Os esforços de divulgação buscam familiarizar entre os públicos de
interesse os resultados satisfatórios do trabalho realizado pela instituição. A visibilidade, neste
caso, pode gerar o reconhecimento para a instituição (FOMBRUN; RIEL, 2004). E este está
atrelado à frequência com que são disponibilizadas informações em diferentes mídias. Observa-
se que para atingir este reconhecimento, as universidades lançam mão de coletivas de imprensa,
participação em eventos, divulgação de trabalhos em congressos, artigos publicados em revistas
e campanhas publicitárias. Estas últimas, parecem apresentadas de maneira muito tímida.
Ao analisar as defesas das estratégias utilizadas junto à mídia, observa-se certo cuidado
dos gestores em não transformar a universidade em mero produto que passa a ser escolhido
porque apenas oferece determinadas vantagens. Está-se falando de uma instituição que prima
187
pelo conhecimento como bem público, cujo ensino e pesquisa são percebidos como
experiências ímpares para aquele que deseja uma formação profissional fortalecida pelos laços
com a comunidade, A rádio não vai estar fazendo propaganda da universidade, mas a
universidade vai levar informações para o programa. Precisa-se, sim, divulgar as ações da
instituição, mas sem o cunho mercadológico, sem transformar a educação em bem de consumo.
Porém, a competitividade e a comoditização na educação superior ampliaram a
necessidade de um posicionamento que possibilite distinguir a organização na mente de seus
stakeholders (OLIVEIRA, 2008). Num contexto de competição, a informação torna-se
realmente crítica, porque, segundo Amaral (2009) a educação superior possui três
características simultâneas: é um bem de experiência – a avaliação de suas qualidades só poderá
acontecer depois de o estudante ter frequentado grande parte do curso; é uma compra rara – em
muitos casos o estudante só frequenta um curso durante a vida; e o custo de evasão é muito alto
– abandonar o curso é difícil em virtude do custo e tempo já investidos. Essas características da
educação superior atreladas à expansão de novas instituições não universitárias e com fins
lucrativos, estimulou a competição e a busca pelo mesmo público-alvo: os alunos. Talvez, por
não precisarem investir em pesquisa e extensão, o que aumenta os custos de manutenção, como
folha de pagamento, essas instituições de ensino tenham condições de destinar mais recursos
para o setor de publicidade junto à mídia, incrementando, assim, a sua forma de se comunicar
com os diversos públicos, tornando o mercado mais agressivo (BERTOLIN; DALMOLIN,
2014). Essa inferência, encaminha o raciocínio para as constatações de McCowan (2018). Na
medida em que a instituição procura reduzir os custos e maximizar os lucros por meio da
separação de suas atividades, aí se instala a desagregação, como resultado do surgimento de
atividades empresariais.
No quadro 12, observa-se que a UNI3 recebeu premiação - Prêmio Top of Mind22 de
Santa Catarina (2018), pelo sexto ano consecutivo. Essa é uma forma de constatar a importância
dada pela gestão à comunicação Um dos nossos propósitos de gestão é a comunicação, porque
sabemos que a comunicação é complicada (R3, 2016). Em virtude dessa complexidade, a
universidade precisa construir sua história, “criando links emocionais entre seus grupos de
relacionamento” (OLIVEIRA, 2009, p. 14) e escolher estratégias eficientes de comunicação, a
22 Top of Mind é um termo em inglês utilizado na área do marketing empresarial como uma maneira de qualificar as marcas que são mais populares na mente dos consumidores. Na prática, a pesquisa acontece com entrevistados que, sem indução, nomeiam uma marca ou produto específico, ao serem perguntados sobre empresas que se recordam dentro de certa categoria de produtos. Disponível em: http://flipzh.clicrbs.com.br/jornal-digital/pub/gruporbs/index2//?numero=12325&code=1530873234072#page/2. Acesso em: 15 fev. 2019.
188
fim de desenvolver uma marca forte e memorável. Comunicar seus traços distintivos, talvez
seja uma maneira de personalizar a sua existência, potencializando suas vantagens competitivas
(ALBERT; WHETTEN, 1985).
O processo comunicacional precisa ser compreendido em sua complexidade durante as
trocas simbólicas, informacionais e de bens culturais. A viabilização da comunicação exige
informação, credibilidade dos interlocutores, meios e instrumentos adequados, assim, “a análise
dos processos de relacionamentos torna-se imprescindível quando se pretende inovar, criando
melhorias que impactem a vida da população” (DUARTE, 2007, p. 64). Não basta ter ciência
de que as relações mudaram e que a competição no universo da educação superior tornou-se
mais acirrada, isso requer novas formas de comunicação. Nós temos que profissionalizar a
gestão das instituições (R2, 2016). Os gestores desejam que a comunicação seja eficiente e
eficaz. Isso requer o constante monitoramento para apreender as necessidades e potenciais
mudanças nas estratégias de comunicação. No entanto, ao percorrer os PDIs das universidades,
pouco espaço, nesse documento, foi destinado à comunicação institucional. Ao descrever
aspectos sobre Planejamento e Governança estratégica, a UNI2 apontou que o objetivo neste
item é aprimorar o marketing e a comunicação institucional (UNI2/PPI, 2017, p. 66). Já, a
UNI3 descreve em detalhes as suas metas no campo da comunicação com a sociedade,
apontando objetivos e descrevendo ações, de modo mais objetivo (UNI3/PPI, 2017, p. 157-
159). Talvez a equipe gestora devesse reavaliar a presença desse ingrediente em seus
documentos e dar a ele lugar de destaque.
Assim, percebeu-se que, nas campanhas de marketing das universidades comunitárias,
há a presença reiterada de um discurso que prioriza a missão e os valores preconizados por essas
instituições, muitos dos predicados da instituição são compartilhados de modo informal (boca
a boca), o que acaba impactando na reputação da universidade e há um forte sentimento de
pertença por parte de seus gestores presente em seus discursos. Em contrapartida, o fraco
investimento em campanhas eficazes de comunicação que demonstrem esse potente esforço de
atuação junto à sociedade, compromete o entendimento de sua denominação como comunitária.
A comunicação institucional é uma das responsáveis pela construção da identidade da
organização, por isso mesmo deveria ser compreendida como fundamental nos processos de
relacionamento entre os diversos públicos com os quais a universidade interage, assumindo um
papel relevante nas estratégias de gestão dessas instituições. As preocupações dos gestores são
pertinentes com relação à comunicação e representam um grande desafio para as universidades
comunitárias.
189
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
As universidades vêm enfrentando múltiplos obstáculos que se colocam contrários à a
proposta de promover o bem público. A adoção de políticas neoliberais para o ensino superior,
recomendadas pelo Banco Mundial, desencadeou processos de mercantilização, privatização,
precarização, tornando-se estas palavras comuns para qualificar este setor. Neste contexto,
encontram-se as universidades comunitárias, as quais vêm sofrendo os efeitos das políticas
públicas voltadas à mercantilização da educação e das oscilações econômicas provocadas pela
globalização. Inseridas em um contexto sócio econômico e histórico-cultural, as universidades
comunitárias enfrentam muitas tensões na busca de uma identidade que as torne singular.
Esta pesquisa teve como objetivo compreender o processo e as características que
envolvem a constituição identitária das Universidades Comunitárias do sul do Brasil,
considerando o contexto mutante das políticas para o ensino superior nas últimas décadas.
Como desdobramento, buscou-se identificar os principais marcos históricos de constituição da
identidade que norteiam as Universidades Comunitárias no contexto das políticas educacionais
para o ensino superior no Brasil; analisar os traços identitários característicos das universidades
comunitárias, a partir das dimensões valor, função, interação, observando os dilemas
enfrentados por estas instituições no que tange às políticas neoliberais; e identificar o modo
como as universidades comunitárias manifestam/comunicam sua identidade aos seus públicos.
A análise que se estabeleceu entre a empiria e a teoria sugere alguns encaminhamentos
pertinentes aos objetivos perseguidos.
Há mais de cinco décadas, em meio a lutas pelo seu reconhecimento e identificação
como instituição pública não estatal, as universidades comunitárias vêm construindo sua
trajetória no campo do ensino superior brasileiro. Em face da ampla mudança nas políticas
educacionais, notadamente a partir da reforma do Estado e da Educação, na década de 1990,
esse modelo de universidade vem se deparando com uma política neoliberal, na qual a educação
é vista como um bem de consumo, sendo tratada como mercadoria e bem de capital, sujeita às
mesmas estratégias de gestão do mundo dos negócios. Esse cenário gerou alguns conflitos no
que diz respeito aos contrastes entre o caráter institucional e o organizacional, entre servir à
comunidade e sobreviver à concorrência, entre respeitar a sua gênese ou ceder às imposições
do mercado, os quais estariam influenciando a constituição de sua identidade. A análise do
contexto à luz de uma abordagem teórico-metodológica a partir dos estudos de McCowan
(2016; 2017; 2018) e de Albert e Whetten (1985) traz algumas contribuições.
Em sua trajetória, entre os anos de 1960 e 2013, vários marcos pontuaram a árdua
190
caminhada até a legitimação das universidades comunitárias, com a aprovação da Lei nº
12.881/2013 que dispõe sobre a definição e finalidades dessas instituições. Durante esse
caminho que se inicia com o processo de interiorização do ensino como projeto de
desenvolvimento regional, passando para a fase da consolidação, com o reconhecimento da
existência das universidades comunitárias na Constituição de 1988 (Art. 213), seguindo em
direção à multiplicação da abertura de novos campi, marcando a diversificação e, finalmente,
o seu reconhecimento legítimo, consagrado pela Lei Nº 12.881/2013 que estabeleceu a
tripartição das Instituições de Ensino Superior em públicas, comunitárias e privadas, observa-
se a conquista de muitos avanços na construção da identidade dessas instituições, fruto das
incessantes reivindicações de seus gestores como reitores, vice-reitores, professores,
funcionários, das associações que as representam como COMUNG (RS) e ACAFE (SC), de
integrantes da sociedade civil, de representantes junto aos órgãos municipais, estaduais e
federais. Em cada uma das etapas do processo, a presença de interesses divergentes pelos
definidores das políticas, vem tornando o caminho sinuoso e os obstáculos crescentes.
Apesar de terem percorrido um caminho que as levou ao reconhecimento de sua legítima
existência, as decisões no âmbito das políticas públicas constituíram-se em muitos entraves,
principalmente com a promulgação de leis que abriram espaço para o setor privado (4.024/61;
5.540/68), estimulando a proliferação de instituições isoladas. Se, por um lado, o processo de
interiorização do ensino superior trouxe múltiplos benefícios como a ampliação e o
fortalecimento do mercado de trabalho e a dinamização da economia local, por outro, também
fomentou o aparecimento de instituições privadas que viam aí uma oportunidade de lucrar com
a oferta de cursos com baixa qualidade. A Constituição de 1988 e a LDB de 1996 reiteraram o
espaço da iniciativa privada na educação. O estabelecimento de apenas duas categorias de
instituição de ensino – públicas e privadas (particulares, comunitárias, confessionais,
filantrópicas) pela Lei 9.394/96, fez nascer alguns conflitos quanto à identidade dessas
instituições. Até o advento da Lei 12.881/2013, as universidades comunitárias encontravam-se
no espaço genérico das IES privadas, e a Lei assumiu um papel fundamental no reforço da
identidade do modelo comunitário de educação superior.
No processo de construção de uma identidade reconhecida e sólida, um conjunto de
benefícios às universidades comunitárias, propiciado pela nova lei, principalmente pelo acesso
aos editais de órgãos governamentais e o recebimento de recursos orçamentários do poder
público para desenvolver atividades de interesse público, foi conquistado. Ao mesmo tempo, a
presença de elementos de regulação do Estado sobre o modelo comunitário oferece ainda
dificuldades de acesso de várias instituições às benesses da nova lei, bem como a presença de
191
certa resistência e morosidade no processo de seu cumprimento no que tange à liberação de
recursos públicos para essas instituições.
Na análise da anatomia das universidades comunitárias, alguns traços identitários
característicos desse modelo de universidade foram definidos, a partir das dimensões valor,
função e interação, bem como algumas tensões enfrentadas por essas instituições no que tange
às políticas neoliberais, com a presença de processos como comoditização e desagregação.
A dimensão valor refere-se à razão da existência da universidade. Ao entender a
educação e o conhecimento como bens públicos e direitos humanos essenciais, as universidades
comunitárias assumem o caráter de instituição que não negligencia nem sonega ao cidadão o
direito à sua formação integral pela mediação dos conhecimentos. Nessa linha de raciocínio, o
conhecimento tem valor público e social, não é mero mecanismo de otimização de lucros, e
nem a universidade simples espaço de reprodução de produtos comercializáveis. Nesse caso, o
conhecimento é tomado em seu valor instrumental e serve tanto para resultados individuais, em
termos de realização de objetivos de vida, quanto para benefício público, cujo alvo volta-se para
a coletividade, na busca de um mundo mais igualitário.
A análise da Missão, da Visão e dos Valores dessas instituições permitiu identificar
semelhanças no modo de construir esses aspectos, até uma certa uniformização do dizer e
deixam transparecer alguns elementos constituintes de sua identidade organizacional. Sua
descrição e entrelaçamento servem de parâmetros os quais indicam as áreas, as atividades, os
programas, a região, os públicos-alvo, os parceiros nos quais a instituição deve concentrar-se,
o que se configura um grande desafio para essas universidades, considerando os processos de
mercantilização e desagregação por que passa a educação mundial. Alerta-se que esses
conceitos não são impessoais ou simplesmente técnicos, eles estão conectados às pessoas que
tratam com eles, refletindo suas aspirações, expectativas, motivações, envolvidos em um
discurso que intermedia as relações entre a comunidade interna e externa e que reflete aspectos
culturais organizacionais.
A universidade é uma instituição social e como tal convive com a presença de opiniões,
atitudes e projetos conflitantes que exprimem as contradições da sociedade. No entanto, nas
últimas décadas, a universidade vem remodelando sua identidade, adaptando-se às
transformações do mundo, deixando de ser, nesse processo, uma instituição social para ser uma
organização social a qual define-se por uma prática regida pelas ideias de gestão, planejamento,
previsão, controle e êxito. Uma organização social não discute ou questiona sua existência, seu
lugar no interior das lutas de classe. Complexas em seus sentidos e significados históricos, as
universidades comunitárias buscam permanecer fiéis aos seus propósitos, lutando para não se
192
submeter aos interesses do mercado. Seus gestores entendem que os conhecimentos produzidos
nas humanidades, apesar de não ter valor imediato de mercado merecem atenção e são de
interesse público, daí a decisão de assumir a permanência dos cursos de licenciatura, mesmo
sendo estes deficitários, dividindo o ônus com toda a instituição. Essa forma de proceder se
distancia do entendimento de que somente os conhecimentos úteis e aplicáveis, conectados ao
mercado, são propulsores de desenvolvimento e, portanto, merecem destaque. A compreensão
de que a pesquisa em humanidades é importante na formação de profissionais qualificados e
cidadãos responsáveis impacta na construção do conhecimento como bem comum e coletivo.
Esse é um processo vai de encontro aos princípios da comoditização. Assim é, que se
materializa o conceito de comunitário, carregando a marca da sua identidade.
A função diz respeito ao papel da universidade em termos de produção, armazenamento
e transmissão de conhecimento e se materializa por meio do ensino, da pesquisa e da extensão,
princípio estabelecido como dever para as Universidades, no artigo 207 da Constituição Federal
de 1988 (BRASIL, 1988). A indissolubilidade deste trinômio na construção da identidade das
universidades comunitárias está longe de ser mera obrigação imposta por legislação. Parece que
o preceito de aplicação sistêmica do trinômio ensino-pesquisa-extensão na busca pela qualidade
da educação superior nessas instituições se manifesta de forma quase igualitária de modo que
tais funções pareçam complementar-se mutuamente. Mas, livres de estarem imunes às
intempéries dos jogos políticos, econômicos e sociais, em nível local e/ou global, novas
estratégias de adaptação em suas funções estão sendo exigidas.
A educação superior expande-se em direção ao mercado e o estado tenta diminuir os
seus custos. Entre as características desse novo desenho de universidade apresentam-se
avaliações classificatórias, capitalismo acadêmico, professores empreendedores, gestão de
caráter gerencialista, além da diversificação da missão das instituições, do aumento do número
de instituições privadas em progressão acelerada; da ampliação do número de matrículas e de
cursos; da flexibilização da oferta curricular, da diversificação do financiamento, da avaliação
intensiva, em diferentes modalidades, seguido de rankings nacionais e internacionais. Esse
redesenho possibilitou a emergência de novos modelos institucionais, de caráter empresarial,
cuja orientação do conhecimento volta-se para o mercado e, de certa forma, pressionou as
universidades comunitárias a buscar novas formas de governança.
Se se considerar as características do desenho da nova universidade em todas as suas
consequências, então pode-se dizer que algumas dessas características estão presentes no
comportamento institucional das universidades comunitárias. Em seus documentos
institucionais, a exaltação dos seus conceitos nos rankings, números expressivos de produção
193
científica, investimentos em inovação com criação de Parques Tecnológicos e desenvolvimento
de incubadoras são apresentados em detalhes à comunidade. A estrutura multicampi e a ampla
oferta de cursos presenciais, educação a distância, a redução de pessoal e convênios com outras
instituições também estão o rol das mudanças que vêm ocorrendo nas comunitárias.
Aliada a essas decisões, entra no cenário, a implementação de políticas para ingresso
em cursos EaD. Utilizada para ampliar o número de alunos, baratear os custos e maximizar os
lucros, a EaD tem representado papel importante na expansão do ensino superior privado
brasileiro. Essa é uma estratégia que começa a tomar corpo nas universidades comunitárias,
apesar de depoimentos contrários à sua implementação, mas o risco de comprometer a
sustentabilidade das instituições está fazendo com que estas ofereçam cursos de graduação e
pós-graduação em currículos flexíveis ou totalmente à distância, a custos mais baixos,
facilitando o acesso de alunos. A EaD e seus desdobramentos, atrelada às políticas públicas
para o ensino superior, talvez seja, atualmente, um dos fenômenos que mais represente os
processos de mercantilização e desagregação, nos quais o desenvolvimento dos fins e dos meios
da educação superior se reorienta conforme os princípios e a lógica do mercado.
Una-se a essas implicações, os padrões e mecanismos de controle, como a ampliação da
avaliação de credenciamentos e reconhecimentos de instituições e cursos e exames nacionais.
Nesse cenário, a avaliação é partícipe do quadro do redesenho das universidades, contribuindo
com os rankings nacionais que ganham destaque na imprensa e estimulando a homogeneização
de instituições de educação superior. Submetidas a sistemas de indicadores, as universidades se
veem pressionadas a atender múltiplos aspectos formais de regulação, e, para garantir a sua
credibilidade, adotam estratégias de produtividade que extrapolam os limites do trabalho da
academia, levando os processos burocráticos à exaustão. Acrescente-se a esse cenário, o
credenciamento de novas instituições não universitárias e com fins lucrativos, as quais não
precisam investir em pesquisa, o que possibilita a cobrança de mensalidades mais baixas, uma
vez que o custo de manutenção é inferior ao de uma universidade comunitária. Tudo isso
estimulou uma competição acirrada entre as instituições de ensino superior, obrigando as
universidades comunitárias a realizarem cortes, extinguirem cursos e atividades de interesse da
comunidade.
Parece que há um movimento das comunitárias no sentido de aplicar critérios de
mercado às suas tradicionais funções e atividades, o que, talvez, sejam investidas contraditórias
à missão dessas instituições a ponto de descaracterizá-las como comunitárias. Porém,
considerando que as universidades comunitárias entendem a educação como um bem público e
comum, são instituições não lucrativas, pertencentes à sociedade civil, e defendem a
194
indissociabilidade do ensino, da pesquisa e da extensão, esse movimento de mudança estaria
imerso nas comunidades com o intuito de promover o desenvolvimento social e econômico
regional, o que a distanciaria de um caráter totalmente mercantil. Ao mesmo tempo em que são
pressionadas a acompanhar as transformações em nível global, não se descolam das demandas
da comunidade onde estão inseridas, promovendo extensão e pesquisa em prol desta.
A função interação/extensão refere-se às formas como a universidade se relaciona com
a comunidade externa, com relação a facilidade ou dificuldade de comunicação do
conhecimento produzido a parceiros externos à universidade. A extensão universitária é a
promotora da integração entre a universidade e a comunidade na qual está inserida, operando
como uma via de mão dupla. A concepção interação/extensão vem ao encontro dos anseios das
universidades comunitárias, forjados já em seu nascimento. A denominação “universidade
comunitária” traz seu forte caráter regional, e a noção de comunidade em sua origem, em seus
objetivos e em sua forma de gestão.
Em cinco décadas de existência e de efetiva participação no projeto de desenvolvimento
regional, essas instituições provocaram grandes mudanças socioeconômicas nas regiões onde
estão inseridas. A gama de certificações concedidas às universidades comunitárias em foco
evidencia que as comunidades locais e regionais assumem a responsabilidade social não como
um apêndice que, muitas vezes, se materializa em ações pontuais, mas como elemento fundante
de um projeto de universidade e de sociedade que almejam construir.
Porém, quando as fronteiras entre a universidade e a sociedade se tornam muito
permeáveis, há riscos de desagregação, provocados pela hiperporosidade, na via de duas mãos,
diminuem os caminhos de intersecção e aumentam os distanciamentos, com a pressão maior de
um dos lados. Políticas públicas como a desobrigação de vincular as instituições da obediência
ao princípio da indissociabilidade de ensino, pesquisa e extensão, assim como da obrigação das
entidades mantenedoras de publicar demonstrativos financeiros certificados por auditores
independentes, levaram ao crescimento do modelo de instituição empresarial/mercantil,
constituindo-se em ameaça à sustentabilidade das universidades comunitárias, tornando-as
vulneráveis nesse cenário competitivo.
A baixa ou alta porosidade/permeabilidade também diz respeito ao acesso de alunos e
professores ao universo acadêmico. Com o propósito de garantir o acesso ao ensino superior
dos estudantes de baixa renda por meio do preenchimento de vagas nas instituições privadas,
foi instituído, em 2005, o Programa Universidade para Todos (PROUNI), através da Lei nº
11.096/2005 (BRASIL, 2005b). Dois atores sociais foram beneficiados com a oferta de bolsas
de gratuidade nos cursos superiores de graduação e sequenciais de formação: os alunos aptos a
195
ocuparem essas vagas, e as IES privadas que, além de preencherem um grande número de vagas
ociosas, também conquistaram isenção fiscal. Essa política expansionista e a obrigatoriedade
de canalizar os recursos somente para bolsas de estudo restringiu o poder de integração com a
comunidade, criando um cenário complicado para as universidades comunitárias.
O Estado transferiu a tarefa de expansão do ensino superior a todas instituições sem
medir as consequências para muitas delas. Ao incluir todas as instituições, sejam elas com ou
sem fins lucrativos e de todas as categorias, no programa de distribuição de bolsas, estimulou a
mercantilização do ensino, a precariedade da qualidade e ampliou o processo de desagregação
da educação ofertada. Se no passado, as instituições comunitárias se valiam de isenções fiscais
para desenvolver projetos e ações sociais junto à comunidade, com a nova Lei, os recursos
tornaram-se escassos, o que levou a um movimento das comunitárias de firmar mais parcerias
para se fortalecerem e fortalecer a conexão entre as atividades que são realizadas na academia
e sobre o que a comunidade precisa e deseja. O entendimento de tudo isso recai sobre a noção
de porosidade, neste caso, as consequências negativas das pressões/das infiltrações das políticas
públicas sobre as instituições comunitárias, desestabilizando a dinâmica interna de suas ações.
A interação, dessa forma, se dá de forma assimétrica.
A interação também diz respeito à gestão, que, nesse caso, refere-se à dinâmica
colegiada das universidades comunitárias, com alto grau de democratização no fluxo de seus
processos. Assim como a colegialidade pode ser considerada uma forma desejável de
participação das comunidades interna e externa nas decisões da universidade, ela também pode
representar certo entrave nos processos que necessitam maior agilidade. Ao mesmo tempo em
que buscam preservar os fortes elementos culturais e a sua dinâmica colegiada, se sentem
pressionadas a se reposicionem na tentativa de gerar equilíbrio entre qualidade da educação,
fortalecimento de valores, competitividade e sustentabilidade.
Expressões como “alinhar uma gestão profissional” e “não perder a essência de ser
uma instituição comunitária” revelam a preocupação de seus gestores em manter a autonomia
frente aos desafios advindos das políticas e práticas de gestão da educação brasileira e cuja
implicação recai diretamente na regulação e transparência da gestão das universidades
comunitárias. Também significam, apesar dos problemas no que se refere às questões que
surgem da dicotomia público/privado, apesar das escassas fontes de financiamento, não perder
de vista a essência comunitária da instituição, e tentar resolver os impasses sem que eles se
tornam obstáculos intransponíveis. Alinhar é estar em sintonia para com aquela que realmente
seria o motivo de sua existência: a comunidade local.
No entanto, uma universidade não vive isolada, ela é parte da tessitura complexa da
196
sociedade. Nenhuma reflexão que tenha a educação superior como foco pode desconsiderar as
características atuais da globalização e da mercantilização do conhecimento, características
estas materializadas nas visíveis mudanças no sistema de educação superior brasileiro. Apesar
de se perceber, nas vozes dos gestores e nos registros dos documentos analisados, uma atitude
de resistência às mudanças que vêm ocorrendo na área da educação, provocadas pela
globalização, parece haver uma avalanche de políticas internacionais, de reformas políticas
brasileiras, de decisões no mundo financeiro, de omissão do Estado no resguardo dos direitos
do cidadão que, pouco a pouco, vai mimando o ideário comunitário e seus princípios voltados
aos bem comum.
A análise da anatomia das universidades comunitárias permitiu observar a luta dessas
universidades em manter o princípio da indissociabilidade entre ensino/pesquisa/extensão e os
desafios impostos à sua gestão dado o cenário da concorrência imposta pela mercantilização do
conhecimento. Historicamente, sabe-se que o trabalho realizado nas universidades se volta à
pesquisa, muito mais do que ao ensino e à extensão. Manter a tríade (uma das exigências legais)
faz com que as universidades comunitárias tenham que dispor de recursos vultosos em capital
humano, em infraestrutura, em intervenções junto à comunidade local. Isso tudo as coloca em
desvantagem quando comparadas a instituições cujo compromisso se limita a oferecer
atividades de ensino apenas. Por outro lado, é a nutrição da indissociabilidade entre
ensino/pesquisa/extensão um dos fatores que torna a educação nas universidades comunitárias
singular. Seu fortalecimento se dá no incentivo à pesquisa voltada à busca de solução aos
problemas locais, advindos dos contatos estabelecidos com a sociedade e retroalimentado com
os referenciais teóricos capturados em dimensão global.
Esse estudo também permitiu constatar que políticas de expansão e diversificação da
educação superior, principalmente, do ensino superior privado, constituem ameaças às
universidades comunitárias. Apesar de haver a necessidade de expandir o ensino superior no
Brasil para expansão do acesso, promoção da inclusão social e disseminação do conhecimento,
a forma como esse processo vem acontecendo deixa dúvidas quanto à qualidade do serviço
oferecido e os seus reais objetivos de aplicação. Com um discurso pautado na privatização, as
políticas educacionais têm sido decisivas para a criação de um mercado educacional,
introduzindo, de modo efetivo, a educação no setor de serviços a serem negociados como mero
produto de troca. Princípios neoliberais como flexibilidade, racionalidade, produtividade e
competitividade passam a alimentar a proposta de um novo modelo de governança,
transformando a educação superior em negócio altamente lucrativo.
Nesse estudo também buscou-se identificar o modo como essas instituições a
197
comunicam aos seus diferentes públicos. Ao analisar algumas campanhas de marketing
institucional destas universidades, observou-se que elas enfatizam a excelência na busca do
conhecimento, a tradição e contemporaneidade, a inovação, o envolvimento com a comunidade,
os destaques e rankings nacionais e internacionais, a abrangência da infraestrutura. Também
pôde-se observar a presença reiterada de um discurso que prioriza a missão e os valores
preconizados por essas instituições. Para os gestores, muitos dos predicados da instituição são
compartilhados de modo informal (boca a boca) por comentários, opiniões e intercâmbio de
relatos de experiências positivas com aquela instituição, o que acaba impactando na reputação
da universidade, avalizada por atributos como credibilidade, qualidade, confiança e
responsabilidade.
A permanência desses gestores, por longo tempo, nessas universidades, alimenta o
sentimento de pertença, os quais comungam com os ideais e as ações promovidas pelas
instituições junto à sociedade. Em suas estratégias de comunicação tanto interna quanto externa,
buscam elucidar o conceito de “universidade comunitária”, utilizando-se dos mais variados
canais de comunicação, sem, contudo, perceberem grande retorno de seus esforços. Muito do
que se veicula se assemelha a campanhas institucionais de outras universidades privadas, o que
contribui para a incompreensão do sentido do que seja comunitário. Talvez, mais investimento
em traços distintivos como a reputação e o uso de narrativas singulares e inspiradoras pudessem
comunicar melhor suas principais forças como comunitárias.
Quanto à defesa das estratégias utilizadas junto à mídia, observou-se certo cuidado em
não transformar a universidade em mero produto vantajoso. Está-se falando de uma instituição
que prima pelo conhecimento como bem público, cujo ensino e pesquisa são percebidos como
experiências ímpares para aquele que deseja uma formação profissional fortalecida pelos laços
com a comunidade. Mas, há a necessidade de repensar as estratégias de relacionamento com
seus públicos, pois em um contexto de competição, a informação torna-se realmente crítica. A
saturação e a fragmentação da mídia; o crescimento da opinião pública e a comoditização de
produtos e serviços, aliadas à globalização dos mercados, estão dificultando as diferenças entre
as instituições. Dar visibilidade às ações junto à comunidade, investindo mais em campanhas
de comunicação pode se constituir em uma estratégia eficaz.
Com o intuito de compreender como as universidades comunitárias constroem e
consolidam sua identidade, concebeu-se uma visão de identidade organizacional como
resultante de um conjunto de afirmativas sobre seus atributos centrais, distintivos e duradouros
(ALBERT; WHETTEN, 1985). Entre os atributos centrais encontram-se a convicção de que o
conhecimento gerado na instituição deve estar direcionado para o bem público e para o bem
198
comum, sendo tomado em seu valor instrumental, a indissociabilidade entre
ensino/pesquisa/extensão e o forte enraizamento coletivo, o que marca outro traço central de
sua identidade: a sua inserção social. As vozes dos gestores e as redações dos documentos
oficiais enfatizam as características distintivas, entre elas o forte caráter regional, não visar
lucro, ser pública não estatal, destinar seu patrimônio, em caso de extinção, a uma instituição
pública ou congênere e o compromisso com uma gestão baseada na colegialidade e na
transparência administrativa. A durabilidade diz respeito aos aspectos temporais relacionados
à perenidade tanto ao que é central quanto ao que é distintivo da identidade da universidade. A
palavra “tradição”, que traz consigo o sentido de reputação, e as histórias construídas durante
os mais de cinquenta anos dessas instituições, junto à comunidade, estão vivas nos discursos
que se sucedem de geração a geração. Esses discursos são alimentados por argumentos que
ressaltam os princípios comunitários, bem como as virtudes que distinguem essas instituições
de outras, como a qualidade de educação que oferecem.
Observou-se, reiteradamente, nas palavras dos entrevistados, um discurso de resistência
àquilo que possa vir de encontro à missão dessas instituições. Mas indaga-se: e na prática como
isso se dá? Como ou até quando se poderá resistir a um discurso globalizado cada vez mais
agressivo que busca inculcar novos valores, atitudes e prioridades, projetando e forjando uma
nova ou diferente identidade institucional? Como resistir diante de um projeto identitário de
universidade que vai na contramão do que as instituições comunitárias preconizam?
Pressionadas por um mercado altamente competitivo e por políticas públicas que incentivam a
expansão e diversificação da concorrência, o que compromete a sua sobrevivência, como
resistir à avalanche de ofertas de produtos e serviços terceirizados na área da educação que
minimizam os custos da instituição e prometem bons rendimentos a curto prazo?
Se a formação e o conhecimento forem tomados como mercadoria, os fins alimentarão
competências e habilidades que poderão estimular a competitividade e a maximização de
lucros, se tomados como bens públicos, orientar-se-ão por valores como justiça social,
equidade, democracia e respeito. Nesse contexto de ambiguidades, encontram-se de um lado os
ideais históricos da universidade (busca do conhecimento, liberdade de pensamento e de
expressão, pluralismo de ideias, a conjunção ensino, pesquisa, extensão) e, por outro, os ideais
econômicos de produtividade, eficiência e resultados, sustentados pelos princípios do
neoliberalismo. Conforme afirmou-se, nas primeiras páginas deste estudo, a universidade é
fruto de uma construção social e histórica, atravessada de contradições, não está isenta das lutas
por espaços e ideias que adentram o jogo do poder, que tem a força de materializar o tipo de
humanidade a que se quer fazer parte. Assim, parece que os ideais históricos das universidades
199
comunitárias e o vínculo que elas têm com a comunidade, marcas identidade institucional,
então, se mostram como fortes elementos de resistência às mudanças impostas pelo mercado.
Mas até quando?
Quanto às limitações enfrentadas no estudo, a abrangência da dimensão Funções
apresentou-se como uma delas, uma vez que, para este item três elementos se faziam presentes
– ensino, pesquisa e extensão, cada qual com inúmeras possibilidades de investigação como
currículo, acessibilidade, produção docente, gestão do processo pedagógico,
internacionalização, os quais são também ingredientes importantes da construção da identidade
das universidades comunitárias e que, igualmente, sofrem com as turbulências geradas pelas
mudanças que se aceleram no mundo da educação superior provocadas por políticas de caráter
neoliberal.
Ao estudar as universidades comunitárias, esta pesquisa considerou alguns aspectos em
cada uma das dimensões Valor, Funções, Interação, dentro do contexto das políticas públicas
voltadas à educação superior. Se considerarmos a abrangência, por exemplo, das funções da
universidade no que se refere ao ensino, poder-se-ia aprofundar uma análise voltada aos
programas de formação continuada, às formas de acesso, às modalidades de ensino; quanto à
pesquisa, seria possível analisar os grupos e linhas de pesquisa, a expansão de parques e
incubadoras tecnológicas; e à extensão, e poderia abordar as relações com os diversos
stakeholders com os quais a instituição se relaciona. Cada uma das dimensões apontadas,
poderia gerar múltiplas investigações. Outra sugestão de estudo poderia contemplar uma análise
comparativa entre instituições públicas e privadas, considerando aspectos centrais, distintivos
e duradouros na construção da identidade dessas instituições. Estas são algumas investidas que
poderiam desencadear investigações científicas na busca pelo conhecimento da identidade dos
diferentes modelos de universidade, não só das comunitárias.
Finalmente, os resultados do estudo indicam que as universidades comunitárias
investigadas trazem em seus discursos a convicção de sua existência como instituições que
nasceram para produzir conhecimento voltado para o bem público, com alto valor instrumental,
tendo consciência da indissolubilidade do ensino, pesquisa e extensão, com ampla inserção
social. Por outro lado, se debatem com as ameaças do mundo globalizado, no qual os processos
de mercantilização e desagregação pressionam-nas a transformarem a educação superior mero
bem de consumo, regido pelo lucro desenfreado da política neoliberal, no entanto, não são
suficientes, ainda, a ponto de comprometer a missão comunitária dessas instituições, essência
de sua identidade.
200
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APÊNDICES
APÊNDICE A – INSTRUMENTO DE COLETA DE DADOS
ROTEIRO ENTREVISTA COM REITORES 1. Para o senhor, o que é uma universidade comunitária?
2. Qual a importância de se ter uma universidade comunitária na região?
3. Como a sua universidade se encaixa nessa definição?
4. Como a sua universidade comunica isso aos seus públicos?
5. Existem campanhas direcionadas ao posicionamento de universidade comunitária?
a. Caso existam, quais?
b. Caso não existam, por quê?
6. Em 2013, foi aprovada a lei número 12.881, que dispõe sobre a definição, qualificação,
prerrogativas e finalidades das Instituições Comunitárias de Educação Superior – ICES.
Qual o envolvimento de sua instituição neste processo?
7. Como o senhor avalia as implicações da lei na consolidação da identidade de sua
universidade?
8. Quais são os principais atores (professores, funcionários, mídia, etc...) na construção da
identidade de sua universidade?
9. Quais as estratégias/ações usadas pela universidade na construção de sua identidade?
10. O que poderia ser feito para melhorar a imagem da sua universidade como comunitária?
11. Em sua opinião, que razões levam o aluno a escolher a sua universidade?
12. O Senhor considera que a comunidade reconhece sua universidade como comunitária?
13. Quais os fatores que contribuem para isso?
14. Fale um pouco sobre a história da sua universidade comunitária.
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APÊNDICE B - TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO (TCLE)
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ
Vice-Reitoria de Pós-Graduação, Pesquisa, Extensão e Cultura Programa de Pós-Graduação em Educação
www.univali.br/ppge • e-mail: [email protected] Fone: (47) 3341 7516 - fone/Fax: (47) 3341 7822
Rua Uruguai, 458 - Bloco F - 4° piso CEP: 88302-901 Itajaí - SC.
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO (TCLE)
Universidade xxxxx Prof. Dr. MD Reitor A sua universidade está sendo convidada para participar em uma pesquisa. Após ser esclarecido sobre as informações a seguir, no caso de aceitar fazer parte do estudo, rubrique todas as folhas e assine ao final deste documento. Este documento está em duas vias. Uma delas é sua e a outra é do pesquisador responsável. Em caso de recusa a sua universidade não será penalizada de forma alguma. Informações sobre a pesquisa: TÍTULO: IDENTIDADE INSTITUCIONAL E IMAGEM INSTITUCIONAL DAS UNIVERSIDADES COMUNITÁRIAS NO SUL DO BRASIL (financiada pelo CNPq)
Pesquisadores responsáveis: Profa. Dra. Regina Célia Linhares Hostins – Universidade do Vale do Itajaí - Univali http://lattes.cnpq.br/3614416302948755 Telefone para contato: (47) 3341-7516 E-mail: [email protected] Prof. Dr. Hans Peder Behling – Univali http://lattes.cnpq.br/7579158270075083 Telefone para contato: (47) 3341- 7928 E-mail: [email protected] Pesquisadores participantes: Isaura Maria Longo – Univali http://lattes.cnpq.br/1672286659904274 Telefone para contato: (47) 9947-9171 Nilda Stecanela – Universidade de Caxias do Sul - UCS http://lattes.cnpq.br/7861875052634037 Telefone para contato: Cristina Fioreze – Universidade de Passo Fundo - UPF http://lattes.cnpq.br/0042420942779752 Telefone par contato: Michelle Sprandel da Silva Perusin – Univali http://lattes.cnpq.br/2588723820178588 Telefone para contato: (47) 3341-7543 Giovana Cristina Pavei – Univali http://lattes.cnpq.br/8195624286682014 Telefone para contato: (47) 3341-7543
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João Francisco de Borba – Univali http://lattes.cnpq.br/8923219961217015 Telefone para contato: (47) 3341- 7553 Tristan McCowan – Universidade de Londres Senior Lecturer em Educação e Desenvolvimento Internacional no Departamento de Humanidades e Ciências Sociais – Institute of Education- University of London Este estudo tem como objetivo geral analisar a interface: Identidade e Imagem institucional de Universidades Comunitárias, no sul do Brasil; e como objetivos específicos: - Identificar os indicadores, regras e diretrizes que norteiam a constituição das Universidades Comunitárias; -Examinar os discursos predominantemente utilizados pelas Universidades Comunitárias do sul do Brasil ao atuarem na construção de suas respectivas identidades institucionais em resposta às políticas nacionais de ensino superior; - Analisar os fatores socioculturais, históricos e contextuais que influenciam nas leituras e significações da comunidade interna (professores, técnico-administrativos, alunos) e externa (representantes da sociedade) a respeito da imagem institucional das Universidades Comunitárias no sul do Brasil; -Constituir uma rede internacional de estudos e pesquisas sobre modelos diferenciados de universidade. As Universidades foram selecionadas com base nos seguintes critérios: universidades laicas, reconhecidas como comunitárias (de acordo com a Lei No 12.881, de 13 de novembro de 2013), com no mínimo quatro mestrados e dois doutorados implantados, credenciadas no sistema federal e com maior número de alunos. A pesquisa será conduzida simultaneamente em quatro frentes de investigação: 1. Pesquisa documental para exame dos documentos do MEC e das universidades investigada (documentos que avaliam e disciplinam o ensino superior no país, PDI, PPI, Planejamento Estratégico, Materiais institucionais e de divulgação). 2. Pesquisa de campo para entrevistas com os gestores das instituições que compõem a amostra; 3. Seminários Redes Grupos de Pesquisa em âmbito nacional e internacional: dois seminários presenciais previstos para outubro de 2016 e julho de 2017; dois seminários por Skype, com a participação de aproximadamente 20 pesquisadores. 4. Seminários Redes Comunitárias envolvendo a comunidade interna (professores, técnico-administrativos, alunos) e externa (representantes da sociedade) das instituições que compõem a amostra. As discussões serão desencadeadas por eixos, prevendo uma plenária com explanação do objetivo, discussão em grupo das temáticas/respostas e volta à plenária para as considerações. Serão quatro seminários (um em cada IES), com previsão de 40 pessoas (10 de cada segmento: professores, funcionários, alunos, externo). A sua universidade está sendo convidada a participar da investigação porque atende aos critérios definidos. Convém ressaltar que a participação não é obrigatória, sendo que a qualquer momento a universidade poderá desistir e retirar seu consentimento.
A participação da sua universidade consistirá em: permitir acesso aos documentos institucionais, tais como PDI, PPI, Planejamento Estratégico, Materiais institucionais e de divulgação; conceder entrevistas e organizar com os pesquisadores os seminários envolvendo a comunidade interna e externa. Os pesquisadores se comprometem a assegurar a confidencialidade das informações, mantendo anonimato absoluto sobre a identidade e sigilo das informações que possam ferir a imagem da instituição. A recusa não trará nenhum prejuízo à instituição. Os principais riscos decorrentes da pesquisa estão relacionados a possíveis erros de interpretação de informações relacionadas à instituição. Para amenizar tais riscos, os pesquisadores se comprometem a manter a fidedignidade aos documentos e aos depoimentos coligidos. Caso ocorra qualquer tipo de desconforto, a instituição poderá interromper a sua participação. Além
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disso, os pesquisadores estarão sempre presentes para sanar eventuais dúvidas, bem como para dar o suporte necessário para minimizar possíveis desconfortos durante a realização da pesquisa. O processo não causará nenhum dano à sua instituição, pois asseguramos o sigilo de sua participação. Serão tomados todos os cuidados para garantir um tratamento ético aos participantes. As dúvidas que possam surgir, antes e durante a pesquisa, serão respondidas pelos pesquisadores. Esclarecemos, ainda, que esta pesquisa não prevê qualquer gasto aos participantes e não será disponibilizada nenhuma compensação financeira adicional. O desenvolvimento da pesquisa e seus resultados trarão benefícios institucionais, entre eles destacam-se o melhor entendimento do processo de construção da identidade das ICES (Universidades Comunitárias de Ensino Superior) e o respectivo reconhecimento de sua imagem perante os seus públicos. Os dados coletados durante o estudo serão analisados e apresentados sob a forma de artigos e/ou capítulos de livros, divulgados por meio de reuniões científicas, com a garantia de anonimato dos participantes. Ao assinar este Termo, o(a) Senhor(a) autoriza a participação desta universidade nas atividades da referida Pesquisa, declarando estar ciente e concordar com as informações expostas anteriormente, no que se referem aos objetivos, riscos e benefícios decorrentes do trabalho a ser desenvolvido. O(a) Senhor(a) receberá uma cópia deste termo onde consta o endereço e o telefone dos pesquisadores, podendo tirar suas dúvidas sobre o projeto e sobre sua participação agora, ou a qualquer momento. Nome da instituição: xxxxxxxxxxx Nome completo do responsável legal: Prof. Dr. Assinatura: _________________________________________ Data: ___ / ___ / 2016 Nome e endereço completo dos pesquisadores: Profa. Dra. Regina Célia Linhares Hostins - http://lattes.cnpq.br/3614416302948755 Universidade do Vale do Itajaí Programa de Pós-Graduação em Educação Rua Uruguai, 458 Centro - Itajaí - SC CEP: 88302-901 Telefone para contato: (47) 3341-7516 E-mail: [email protected] Prof. Dr. Hans Peder Behling – http://lattes.cnpq.br/7579158270075083 Universidade do Vale do Itajaí Programa de Pós-Graduação em Administração Rua Uruguai, 458 Centro - Itajaí - SC CEP: 88302-901 Telefone para contato: (47) 3341- 7928 E-mail: [email protected] Essa pesquisa está sendo encaminhada ao Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, caso persistam dúvidas, sugestões e/ou denúncias após os esclarecimentos do pesquisador o comitê está disponível para atender lhe.
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CEP/UNIVALI Rua Uruguai, n. 458 Centro Itajaí. Bloco F6, andar térreo. Horário de atendimento: Das 8h às 12h e das 13h30 às 17h30 Telefone: 47- 33417738 E-mail: [email protected]
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APÊNDICE C – AUTORIZAÇÃO PARA REALIZAÇÃO DA COLETA DE DADOS
AUTORIZAÇÃO A Universidade xxxxxxxxxxxx autoriza a realização da pesquisa com o Título: IDENTIDADE INSTITUCIONAL E IMAGEM INSTITUCIONAL DAS UNIVERSIDADES COMUNITÁRIAS NO SUL DO BRASIL, subsidiada pelo CNPq e vinculada ao Programa de Pós-Graduação em Educação da UNIVALI, cujos pesquisadores responsáveis são Profa. Dra. Regina Célia Linhares Hostins e Prof. Dr. Hans Peder Behling. Autoriza também os pesquisadores citados e seu grupo de pesquisa a frequentar a instituição para a realização das coletas de dados, bem como autoriza a instituição a fornecer os dados que forem solicitados. Os pesquisadores estarão disponíveis para esclarecimentos e dúvidas a respeito da pesquisa. ___________________, _____ de _____________ de 2016. _________________________________
Assinatura e Carimbo
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APÊNDICE D – TERMO DE ANUÊNCIA DE INSTITUIÇÃO PARA COLETA DE
DADOS DE PESQUISA ENVOLVENDO SERES HUMANOS
TERMO DE ANUÊNCIA DE INSTITUIÇÃO PARA COLETA DE DADOS DE PESQUISA ENVOLVENDO SERES HUMANOS
Declaro que conheço e cumprirei os requisitos da Res. CNS 466/12 e suas complementares e como esta instituição tem condições para o desenvolvimento do projeto de pesquisa IDENTIDADE INSTITUCIONAL E IMAGEM INSTITUCIONAL DAS UNIVERSIDADES COMUNITÁRIAS NO SUL DO BRASIL, autorizo sua execução pelos pesquisadores Profa. Dra. Regina Célia Linhares Hostins, Prof. Dr. Hans Peder Behling e sua equipe de trabalho. Nome da instituição: xxxxxxxxxxxxxxxxxx Nome completo do Responsável legal: xxxxxxxxxxxx Cargo: Reitor Data: _____/______/2016
__________________________________________ Assinatura e carimbo