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INSTRUMENTOS FINANCEIROS DERIVADOS
1. A técnica / relação de derivação
I. Referência aos aspectos essenciais da técnica de derivação na construção
de instrumentos financeiros [remissão para a introdução desta matéria já
feita atrás]:
- o mercado ou realidade subjacente;
- a construção da situação jurídica derivada tendo por referência o
activo subjacente;
- a função de “materialidade” do activo subjacente e da relação com
ele estabelecida.
II. Técnica de derivação, causalidade e abstração. Remissão para as
características dos instrumentos financeiros.
III. Referência às normas, revogadas do CVM (antigos arts. 252 ss.)
relativas a derivados negociados em mercado regulamentado, em particular
os futuros e as opções.
2. Conceito e características
I. Como instrumentos financeiros que são, os instrumentos financeiros
derivados partilham as características daqueles. Como característicos devem
salientar-se dois aspectos:
- o contrato é construído por referência a uma realidade subjacente [activo,
mercado], devendo notar-se que têm sempre natureza contratual, aspecto
que é acentuado na lei [CVM, art. 2];
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- a sua valorização (preço) está dependente dessa realidade subjacente; neles
se verifica com particular incidência uma efeito de alavancagem do preço;
- a sua função visa quase exclusivamente a cobertura de risco, que já atrás
assinalámos como uma das funções centrais dos instrumentos financeiros.
II. Convém aqui deixar uma nota sobre a função de cobertura de risco
desempenhada pelos instrumentos financeiros derivados, já que essa função
assume uma importante materialidade, essencial na análise da sua licitude.
Quando estamos a falar da função da cobertura de risco, pretendemos deixar
claro que deve tratar-se de um risco real, isto é, ligado a um qualquer
aspecto financeiro ou económico e não um risco meramente forjado para
efeitos de obtenção de algum resultado financeiro. Por vezes essa ligação
entre o risco e a realidade económico-financeira é muito ténue e distante,
mas deve existir em qualquer caso sob pena de não haver limites à
construção de derivados.
Deve ainda referir-se que a cobertura de risco pode ser efectuada por
qualquer técnica a tal orientada, seja através da transferência do risco, seja
através da sua dispersão.
III. Há quem também refira a especulação como função dos instrumentos
financeiros derivados, porém pensamos que não se trata de uma verdadeira
função nem ela é característica dos instrumentos financeiros derivados. Com
efeito a especulação [que visa antecipar um preço futuro e negoceia nessa
base para obter um ganho] é uma técnica de negociação de quaisquer
instrumentos financeiros, incluindo os valores mobiliários, cuja importância
deriva da sua essencialidade para se assegurar a adequada liquidez nos
mercados desses instrumentos e concorrer para a eficiência dos preços aí
formados. Vista por um outro prisma, a especulação nada mais é que o outro
lado da cobertura de risco, pois tal não será possível se ninguém assumir
esse risco. Neste sentido, ao referir a cobertura de risco, já estamos a incluir
aí a especulação.
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IV. Os derivados podem ser construídos como posições jurídicas individuais
ou serem múltiplas, com características de homogeneidade. Estão neste
último caso os derivados de bolsa [futuros e opções].
Além desse aspecto, os derivados de bolsa apresentam alguns aspectos
específicos quanto à sua negociação, de que se salientam:
- a existência de uma contraparte central;
- a margem [garantia]: inicial e ajustes diários de perdas e ganhos;
- a compensação entre posições contrárias (compra vs. venda) como
meio de saída do mercado e extinção da relação contratual.
Embora no passado tenham sido negociados derivados em bolsa portuguesa
[Bolsa de Derivados do Porto], hoje apenas são negociados na LIFE
[London International Futures Exchange] os futuros relativos a activos
portugueses.
3. Espécies de instrumentos financeiros derivados e suas classificações
I. São três as espécies ou tipos clássicos de instrumentos financeiros
derivados:
i. os contratos a prazo, que admitem dois sub-tipos:
. os contratos a prazo individualizados, também conhecidos
pelo termo em língua inglesa forward;
. os futuros;
ii. as opções;
iii. os swaps.
II. A expressão legal [CVM, art. 2/1/e] usa uma terminologia pouco
rigorosa, nomeadamente porque emprega a expressão contratos a prazo
como se eles fossem uma categoria específica de derivados, quando na
verdade todos os contratos de derivados são contratos a prazo. Nesse sentido
o texto inglês da directiva 2004/39/EC, de 30/4/2004 [MIFID – Markets in
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Financial Instruments Directive] é elucidativo por usa a palavra forward
(rate agreements), o que é clarificador, pois o forward é um contrato a
prazo.
É a lei que considera todos esses instrumentso como derivados, ao inserir
após a cláusula geral extensiva e quaisquer outros contratos derivados [“as
opções, os futuros, os swaps, os contratos a prazo e quaisquer outros
contratos derivados…”]. Esta clásula legal extensiva não pretende
acrescentar outros instrumentos financeiros derivados que não se
reconduzam a um daqueles três tipos, mas apenas estabelecer diferenciações
em função do activo subjacente, como resulta da expresssão relativos a
inserta na lei [relating to]. Esse aspecto, porém, apenas dará lugar a
classificações dentro de cada um dos tipos, não afectando a sua estrutura.
III. Também os art. 45 e 45-A do RJOIC se referem a instrumentos
financeiros derivados enquanto activos elegíveis para as carteiras dos fundos
de investimento mobiliário. Trata-se de um elenco mais amplo que o do
CVM, pois aí se incluem também, por ex., depósitos bancários [art. 45/1d].
IV. Uma primeira classificação respeita à distinção entre:
- instrumentos financeiros derivados que são valores mobiliários,
como é o caso dos warants [e que estudaremos no capítulo dos
valores mobiliários];
- instrumentos financeiros derivados que não são valores mobiliários.
V. Uma classificação a ter em contra tem como critério o local de
negociação, assim se distinguindo entre:
. derivados de bolsa;
. derivados fora de bolsa [OTC].
Esta classificação apenas se aplica aos futuros e às opções, já que os swaps
são sempre negociados fora de bolsa.
As principais características dos instrumentos derivados negociados em
bolsa respeitam:
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- à sua criação em massa e à consequente padronização e
homogeneidade das posições jurídicas, limitando-se a aderir às
cláusulas gerais estabelecidas pela entidade gestora do mercado;
- à possibilidade de resolução do contrato através de compensação /
confusão, realizando em mercado a operação inversa [compra ou
venda], regime que é possibilitado pela existência de uma
contraparte central.
VI. Uma classificação a que a lei [CVM, ART. 2/1/e, i, ii] dá particular
importância respeita ao tipo de liquidação, assim se distinguindo:
. instrumentos financeiros derivados com liquidação física [settled
physically];
. instrumentos financeiros derivados com liquidação financeira
[settled in cash].
Nos primeiros há lugar à entrega do activo subjacente no fim do prazo
contratual; nos segundos apenas dá lugar à entrega de uma diferença entre
dois preços, em regra o preço acordado no contrato e o preço do activo
subjacente numa determinada data.
A questão particular que aqui se coloca respeita aos contratos diferenciais,
na lei autonomizados como um tipo específico de instrumento financeiro
[CVM, art. 2/1/d]. Como adiante veremos, os contratos de derivados com
liquidação financeira têm sempre a natureza de contratos diferenciais. A
questão que pode colocar-se é se todos os contratos diferenciais são
contratos de derivados com liquidação financeira, questão que abordaremos
mais adiante.
Deve acrescentar-se que a tradução inserida na lei portuguesa também não é
feliz, sendo mais rigorosa a expressão inglesa constante da MIFID, financial
contracts for differences, onde fica bem saliente a natureza financeira dos
contratos em causa.
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VII. As mais importantes classificações respeitam aos activos subjacentes
ao instrumento financeiro derivado. A lei é particularmente cuidadosa na
enumeração dos activos subjacentes admitidos, aí se podendo sentir uma
certa tendência para limitar esses activos, embora sem chegar a uma
verdadeira tipicidade. Com efeito, nada impede que sejam celebrados
contratos de derivados sobre outros activos subjacentes, aí regendo o art.
405 CC, porém esses contratos já não serão instrumentos financeiros
sujeitos ao CVM e à DMIF.
Quanto ao activo subjacente podemos destacar as seguintes classificações de
instrumentos financeiros derivados:
i. derivados sobre activos financeiros, nomeadamente:
. derivados sobre valores mobiliários;
. derivados sobre índices ou outros indicadores financeiros;
derivados sobre divisas;
. derivados sobre taxas de juro [conhecidos como FRA –
forward rate agreements] ou outros tipos de rendibilidades;
. derivados sobre outros derivados financeiros;
ii. derivados sobre activos não finaceiros, nomeadamente:
. derivados sobre mercadorias;
. derivados sobre variáveis climáticas;
. derivados sobre tarifas de fretes;
. derivados sobre licenças de emissão;
. derivados sobre taxas de inflação ou sobre quaisquer outras
estatísticas económicas oficiais.
O CVM art. 2º/1/f alarga em muito o número de activos subjacentes
relevantes ao remeter para o art. 39 do Regulamento (CE) n.º 1287/2006, da
Comissão, de 10 de Agosto, já atrás referido, para lá se remetendo.
VIII. A lei refere ainda como um tipo autónomo de instrumentos
financeiros derivados, os instrumentos derivados para a transferência do
risco de crédito [CVM, art. 2/1/c]. Porém esses derivados podem
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reconduzir-se a qualquer um dos tipos base acima referidos, embora em
regra adoptem o tipo de swaps, embora se caracterizem pela sua função, a
saber, a transferência do risco de crédito.
Já sabemos que a função de cobertura de risco [e a transferência de risco é
uma forma de cobertura desse risco] é uma das funções dos instrumentos
financeiros. Aqui a lei limita-se a salientar essa função em especial.
IX. Outras classificações são possíveis, ainda que não tenham base legal,
pois é possível estabelecer outros critérios. Reina bastante confusão nessa
matéria e não devemos aqui desenvolver essa questão, pois não ceberia no
tempo e objecto da disciplina.
Nesse sentido pululam no mercado termos e gírias que em rigor não
designam novos tipos de derivados, mas apenas que contêm cláusulas
limite, como é o caso de clausulas cap [limite superior] ou floor [limite
inferior] ou collar [limite definido por uma banda / corredor entre um cap e
um floor], típicas dos forward sobre taxas de juro e que podem assumir a
natureza de opções unidas a esses contratos.
Tal como os anteriores, são frequentes os contratos de derivados que
resultam da combinação de outros instrumentos financeiros de base, e que
podemos chamar de híbridos [e que, em regra integram a classificação de
instrumentos financeiros complexos de que falamos acima] e incorporam
características muito próprias, que exigem uma particular atenção ao
contrato que as define, havendo quem nesses casos fale de derivados
exóticos. Porém, esse híbridos não permitem estabelecer uma nova
classificação, devendo o jurista estabelecer quais os contratos de base que o
compõem e depois proceder ao estabelecimento da sua estrutura e regime,
como em qualquer contrato misto.
4. Os contratos financeiros a prazo e os futuros
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I. Os contratos financeiros de compra e venda a prazo são contratos
tradicionalmente negociados em bolsa, mas sofreram uma evolução muito
significativa a partir dos anos 70 do século passado, na sequência do
chamado 1.º choque petrolífero. Até aí eram sobretudo negociadas como
operações firmes a prazo, que ainda estavam consagradas no CMVM [arts.
409 e 413], que distinguia entre operações firmes a prazo e operações a
prazo condicionais, nestas últimas se integrando as operações a prazo
liquidáveis por compensação (operações a futuro), o que era bem a mostra
do ‘atraso’ jurídico em relação a outras jurisdições e práticas negociais, mas
também revelava grandes incompreensões sobre essas operações. As
operações firmes a prazo eram assim definidas.
Nas operações firmes a prazo o comprador e o vendedor assumem a obrigação irrevogável, o primeiro, de pagar o preço, e o segundo, de entregar os valores transaccionados, na data estabelecida para a liquidação.
Estes preceitos acabaram por ser sucessivamente modificados, primeiro
quando se estabeleceu a Bolsa de Derivados do Porto e mais recentemente
com o CVM [art. 253], preceitos que foram revogados na sequência da
DMIF.
II. Em rigor o que hoje o CVM art. 2/1/e designa como contrato a prazo, já
vimos que é a tradução da palavra inglesa forward e nada mais são que
operações firmes a prazo, mas realizadas OTC, fora de mercado
regulamentado. A sua estrutura é também a dos futuros financeiros, estes
negociados em mercado regulamentado, obedecendo a um elevado grau de
padronização das posições jurídicas deles resultantes.
Assim, de acordo com a adequada interpretação do CVM art. 2/1/e, quer os
contratos a prazo quer os futuros são contratos nominados na nossa lei,
sendo a designação, em língua inglesa, forward apenas uma gíria de
mercado sem consequência jurídicas ou meramente indiciadora de que
estamos perante aquele contrato nominado na nossa lei.
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III. Pode discutir-se se em todos os casos estes contratos têm a natureza de
uma compra e venda, já que nos contratos com mera liquidação financeira
não há lugar à transmissão de qualquer bem, nem se gera a obrigação de
entregar um bem ou de pagar o preço [prestações típicas do contrato de
compra e venda, segundo o art. 879 CC], mas apenas há lugar ao pagamento
de uma diferença, sendo que nem sempre está determinada à partida a parte
que deve entregar essa diferença. A resposta a esta questão deve ser
negativa.
Efectivamente, os contratos com mera liquidação física não podem ser
considerados como de compra e venda, apesar de a prática e a gíria de
mercado quase sempre os considerar como tal. Tal deriva do facto de o
contrato de compra e venda ser tomado como estrutura de referência para a
determinação das prestações devidas pelas partes que, tal como sempre
acontece nesse contrato, vinculam as partes de modo definitivo.
Assim, podem considerar contratos a prazo e futuros com a seguinte
estrutura:
- contratos de compra e venda efectivos, que há lugar à entrega de
valores mobiliários ou bens corpóreos [em geral, mercadorias];
- contratos em que há transmissão de uma activo financeiro que não
é um valor mobiliários [v.g. uma opção];
- contratos em que o contrato de compra e venda apenas funciona
como estrutura de base para determinar a prestação, antes se
configurando como contratos de gestão do risco, em regra o risco de
preço.
IV. Refira-se, ainda, que havendo lugar à transmissão da titularidade de
algum bem ou activo [contrato com liquidação física] ela apenas opera no
fim do prazo do contrato [princípio da essencialidade do tempo nos
contratos a prazo], não vigorando aqui o disposto no art. 879 CC, que deve
considerar-se limitado aos contratos de compra e venda a contado ou à vista.
Pela mesma razão, as prestações típicas do contrato apenas são exigíveis no
fim do prazo.
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V. Os contratos a prazo e os futuros podem ser classificados de acordo com
qualquer dos critérios já acima apresentados a propósitos dos instrumentos
financeiros derivados em geral.
4. As opções financeiras
I. O contrato de opção tem uma longa tradição no direito privado. Do que
aqui se trata é apenas de opções que sejam também instrumentos financeiros
derivados. Dai a necessidade de uma primeira distinção / classificação entre:
- opções que são instrumentos financeiros, respondendo às
características destes;
- opções que não são instrumentos financeiros, previstas no CVM
art. 2/1/e e portanto um contrato nominado.
II. Polissemia: devemos distinguir entre o contrato de opção e o direito de
opção dele resultante. A lei, ao falar de opções como instrumentos
financeiros [CVM, art. 2/1/e], pretende abranger tanto uma como outra
dessas realidades.
III. O contrato de opção é um contrato a prazo de acordo com qual alguém
que alguém adquire um direito [o direito de opção] cujo exercício é feito a
prazo e de acordo com um determinado preço estipulado [preço de
exercício], podendo ter como contrapartida o pagamento de um preço, o
prémio [que, revestindo a natureza de um preço, não é devolvido mesmo
que a opção não seja exercida].
O preço de exercício é o preço fixado no contrato de opção para a compra /
transferência do activo subjacente ao contrato no fim do prazo do contrato
ou que funciona como referência para a determinação do saldo devido
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[diferença entre o preço de exercício e o preço de mercado na data
relevante].
IV. O direito de opção é um direito potestativo em que fica investido o seu
titular [podendo esse direito ser ou não exercido, caso em que caduca, como
acontece com qualquer direito], pelo que não é necessário um novo
consenso entre as partes para produzir os efeitos já estipulados no contrato
de opção e que se podem reconduzir a uma de três prestações:
i. o direito a receber um instrumento financeiro ou um bem corpório
[opção com liquidação física];
ii. o direito a celebrar um novo contrato, que pode ser de compra e
venda ou outro contrato [opções com liquidação física];
iii. o direito a uma diferença entre o preço de exercício e o preço de
mercado em data estipulada [opções com liquidação financeira].
Quanto à legislação anterior vd. o art. 254 do CVM, entretanto revogado:
Pelo contrato de opção uma das partes adquire o direito de, até ao termo do contrato ou exclusivamente nessa data:
a) Receber ou entregar o activo subjacente; oub) Transmitir ou assumir uma posição contratual a prazo; ou c) Receber ou entregar a diferença entre o preço de exercício e um
preço de referência futuro.
V. É tradicional classificar as opções quanto ao estilo, isto é, quanto ao
tempo do seu exercício em
i. opções de estilo europeu, quando o exercício do direito pode ser
feito no fim do prazo;
ii. opções de estilo americano, quando o exercício do direito pode
ocorrer ao longo de todo o prazo;
iii. opções de estilo misto, quando o exercício do direito combina os
dois estilos anteriores.
VI. Tal como para outros instrumentos financeiros derivados também
podemos distinguir entre as opções individuais [bilaterais], negociadas fora
de mercado organizado, e as opções de bolsa, padronizadas e homogéneas
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envolvendo uma multiplicidade de sujeitos [remissão para o que se disse a
propósito dos instrumentos financeiros derivados de bolsa].
As opções bilaterais, negociadas em OTC, são objecto de grande variedade,
impossível de aqui descrever, devendo atender ao que o contrato estipula.
Veja-se o que acima se disse a propósito dos instrumentos financeiros
derivados híbridos e exóticos.
VII. Principais classificações de opções, que acrescem às classificações que
atrás deixámos para os instrumentos financeiros derivados em geral:
i. opções de compra [call] e opções de venda [put] em relação ao
activo subjacente; deve porém ter em conta que nas opções com
liquidação financeira não estamos propriamente perante compras e
vendas;
ii. - opções in-the-money [quando o preço de exercício é mais
favorável que o preço do activo subjacente], opções out-of-the-
money [quando o preço de exercício é menos favorável que o preço
do activo subjacente], opções at-the-money [quando o preço de
exercício é idêntico ou similar preço do activo subjacente].
VIII. Importa ter presente a diferença ou proximidade entre as seguintes
realidades:
i. opção e warrant - quanto à sua natureza e estrutura os warrants
configuran-se como opções; tratando-se de warrants autónomos estes
são legalmente qualificados como valores mobiliários.
ii. opção e promessa – a promessa não é de exercício potestativo,
mas necessita de uma contrato definitivo para se executar;
iii. opção e direito de preferência – o exercício do direito de
preferência está dependende da vontade de terceiro.
5. Os swaps
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I. Os swaps são contratos a prazo de permuta de fluxos financeiros futuros
durante ou num período determinado, tendo por referência um activo
subjacente.
A partir da sua inclusão na lei [CVM art. 2/1/e], na sequência da
transposição da DMIF, os swaps passaram a ser contratos nominados,
apesar de já serem negociados entre nós desde início dos anos 80 do século
passado.
II. Tal como já referimos para os futuros e as opções, também nos swaps
com liquidação financeira não poderá dizer-se que estamos perante uma
verdadeira permuta, funcionando esta como estrutura usada apenas para
calcular a prestação devida.
III. Até agora, os swaps apenas são negociados fora de mercado organizado
[OTC], adequados a situações individualizadas, que em regra assumem
grande variedade e criatividade, o que leva a que os swaps sejam um dos
contratos financeiros mais usados nos dias de hoje. Deve no entanto fazer-se
referência a um certo grau de padronização que resulta dos uso internacional
das condições contratuais gerais padronizadas [master agreement] do ISDA
[International Swaps and Derivatives Association – vd. http://www.isda.org
] usadas internacionalmente.
Enquanto instrumentos financeiros derivados aplica-se aos swaps tudo o que
acima dissemos a respeito desses instrumentos.
IV. Os swaps mais frequentemente usados, atendendo ao activo subjacente
são
. swaps de taxa de juro;
. swaps de divisas [taxas de câmbio ou currency swaps];
. swaps de crédito:
. swaps de mercadorias (commodity swaps);
. swaps de acções (equity swaps).
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5. Os derivados de crédito
I. Os derivados de crédito são um derivado caracterizado pelo seu objecto,
embora em termos estruturais possam assumir uma das modalidades de base
acima referidas, nomeadamente swaps, mas também opções. Tal não é,
porém, forçoso que assim sejam, pois os contratos têm vindo a adquirir
características muito próprias. Talvez por isso, a nossa lei, na sequência da
directiva DMIF [derivative instruments for the transfer of credit risk]
refere-os de modo independente, como contratos nominados, com a
designação de instrumentos derivados para a transferência do risco de
crédito [CVM; art. 2/1/c].
Também o art. 45-A do RJOIC refere que os instrumentos derivados de
crédito incluem-se nos instrumentos financeiros derivados permitindo a
transferência de risco de crédito de um activo, independentemente dos
outros riscos associados a esse activo.
Trata-se de um instrumento que tem vindo a ganhar uma importância
enorme de há poucos anos a esta parte.
II. Podem ser definidos como contratos através dos quais uma parte
transfere para outra um determinado risco de crédito, mediante o pagamento
de um preço, caso ocorra um determinado evento futuro [evento de crédito]
previsto no contrato.
O activo subjacente que serve de referência ao risco de crédito terá a
maioria das vezes a ver com o risco de incumprimento de alguém em
cumprir as suas obrigações. O exemplo mais usado é que tem a ver com o
risco de falência de uma empresa ou de um estado, sendo neste caso o activo
subjacente a dívida soberana emitida por esse estado. Tal como qualquer
outro derivado, também este instrumento pode desempenhas as mais
diversas funções associadas aos derivados.
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III. Os CDS - credit default swaps têm sido o mais usado destes
instrumentos financeiros, estando particularmente em voga na crise
financeira actual. O mercado relativo a estes instrumentos foi criado em
1994 por vários bancos, liderados pelo JPMorgan. Há quem muito aproxime
estes intrumentos do contratos de seguro.
O objectivo de protecção do seu adquirente respeita ao incumprimento de
um crédito de um emitente, por exemplo um crédito relativo a obrigações
desse emitente, o que não impede o seu uso com objectivos exclusivos de
especulação como acontece, em geral com os derivados.
O principal risco destes produtos respeita ao risco de contraparte do seu
alienante, já que não há qualquer garantia de que o detentor da posição
vendedora [em regra empresas de seguros de dívida e hedge funds] tenha
recursos adequados em caso de falência da entidade a que se referem. O
risco de default transfere-se para o vendedor do swap, o que levanta muitos
problemas quanto à capacidade assumida por essas entidades em relação à
entidade cujo default se pretende cobrir, pois pode ser por exemplo a dívida
de um estado.
Recentemente deram que falar os CDS sobre a dívida soberana islandesa e sobre os maiores bancos islandeses [Landsbanki, Kaupthing e Glitnir]. Dada a elevadíssima alavancagem destes produtos, a existência de problemas como estes pode ser demolidora para os compradores dos CDS, nomeadamente Bancos que os tenham nas suas carteiras.
5. Os Contratos Diferenciais
I. Estes contratos são referidos no art. 2/1/d do CVM, e já acima temos
vindo a fazer algumas considerações sobre eles, tendo estabelecido
nomeadamente a sua relação com os instrumentos financeiros derivados
com liquidação financeira. Trata-se, em qualquer caso, de contratos
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legalmente nominados e por isso aqui os abordamos de modo autónomo.
Em termos de gíria de mercado e internacionalmente são sobretudo
conhecidos como CFD’s [contracts for differences] e sofreram um enorme
incremento nos tempos actuais, sendo disponibilizadas para negociação via
internet plataformas com milhares de CFD’s, negociáveis em OTC.
Embora reconhecendo a dificuldade de uma noção unitária, Ferreira de
Almeida sugere a seguinte [art. citado, p. 93]:
contrato em que é devida uma só prestação em dinheiro, igual à diferença
entre o valor de referência inicial de um bem (real ou nocional), de um
indicador de mercado ou da relação entre dois bens ou indicadores de
mercado e o valor de mercado em data futura do mesmo bem, indicador de
mercado ou relação de valores.
II. Em termos históricos, como refere Ferreira de Almeida, estes contratos
surgiram como expediente para permitir a especulação a descoberto, isto é,
a intervenção no mercado por parte de quem não dispõe de bens para
entregar ou de dinheiro para os pagar.
Devemos, porém, prevenir que nem sempre esse expediente implica a
celebração de contratos diferenciais:
- uma coisa é a celebração de contratos de bolsa a contado em que o
vendedor não tem os instrumentos a alienar, as chamadas vendas curtas ou
short selling; nesses casos os mercados dispõem de mecanismos que
permitem que essa pessoa não tenha de cumprir as obrigações assumidas
através da realização de uma operação inversão, mas que possa ser objecto
de compensação com a operação anterior antes da sua liquidação; neste
casos estamos perante duas operações a contado, que nada tema a ver com
os contratos diferenciais;
- questão distinta é a celebração de um contrato a prazo em que as
obrigações das partes não estão determinadas à partida [qualquer delas pode
ter de pagar ou de receber], mas que são determináveis através do cálculo da
diferença entre dois preços, pelo menos um dos quais é um preço futuro;
nestes casos sim, estamos perante contratos diferenciais.
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III. Podemos definir contratos diferenciais como aqueles contratos a prazo
em a prestação característica é o pagamento de uma diferença entre dois
preços ou valores, tal como estabelecidos no contrato.
O que pode variar é modo de calcular a diferença devida no fim do prazo, o
que nos remete para a estrutura de base do contrato, que pode ser uma
compra e venda, um futuro, um swap ou uma opção.
IV. Pensamos que a razão da autonomização deste tipo de contratos
enquanto instrumentos financeiros não se deve à sua estrutura o à prestação
específica, mas a problemas históricos de legalidade desses mesmo
contratos, dada a sua generalizada qualificação como tendo a natureza de
jogo e aposta. Ora a sua inclusão na lei permitiria preencher a excepção do
art. 1245 do CC, assim se assegurando a sua legalidade. Tal, porém, já
resultava da consagração legal dos contratos de derivados com liquidação
financeira, admitida no Código do Mercado de Valores Mobiliários, ainda
que com limitações [art. 418 – operações a prazo liquidáveis por
compensação], clarificado com a alteração a esse diploma introduzida pelo
DL 196/95, de 29 de Julho [arts. 418 e 419, que visou criar as melhores
condições legais para o funcionamento do mercado de futuros e opções, a
funcionar na Bolsa de Derivados do Porto]. Essa orientação manteve-se no
CVM nos arts. 253/c e 254/c, entretanto revogados com a transposição da
DMIF para a ordem interna portuguesa.
A favor daquela razão milita a atribulada história destes contratos e o facto
de lei e/ou a jurisprudência de vários países ainda recentemente ter
invalidado contratos de derivados com base na sua classificação como jogo
e aposta. Para uma perspectiva histórica aprofundada vd. o artigo do
professor Ferreira de Almeida citado na bibliografia.
V. Quanto às classificações de contratos diferenciais é habitual distinguir
dois grandes tipos [sociais]:
i. os contratos diferenciais directos [simples ou stricto sensu];
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ii. os contratos diferenciais indirectos [ou complexos].
Os contratos diferenciais directos reconduzem-se à celebração de um só
contrato a prazo de cuja estrutura resulta o estabelecimento de uma
diferença. Assim, teremos tantos subtipos quantos os dos contratos usados
para o efeito, contrato a prazo, futuro, opção ou swap, para onde se remete.
Note-se que a liquidação por diferenças pode ser uma mera opção atribuída
a uma das partes no contrato, admitindo este também liquidação física [vd.,
por ex. o CVM, art. 2/1/e/ii in fine.
Os contratos diferenciais indirectos são aqueles em que a obrigação de
pagamento de uma diferença não constitui o objecto do contrato, embora
exista a possibilidade de cumprimento por diferenças, podendo resultar da
combinação de contratos sucessivos com liquidação física, objectivamente
concatenados entre si, assim produzindo um efeito semelhante ao do
pagamento de uma diferença.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
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