SOCIOLOGIA GERAL
Cinthia Regina nunes ReisCosme oliveiRa mouRa JnioR
SOCIOLOGIA GERAL
so lus2010
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Diretora do Centro de Educao, Cincias e Naturais - CECENPRof. andRa de aRaJo
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Proibida a reproduo desta publicao, no todo ou em parte, sem a prvia autorizao desta instituio.
Reis, Cinthia Regina Nunes.Sociologia geral / Cinthia Regina Nunes Reis,
Cosme Oliveira Moura Jnior. - So Lus: UemaNet, 2010.
148 p.: il.
1. Sociologia. 2. Ensino I. Moura Jnior, Cosme Oliveira II. Ttulo.
CDU: 316:37
UNIDADE 1
A SOCIOLOGIA COMO CINCIA .............................................. 13
O contexto do surgimento da sociologia enquanto cincia ........ 13
Consolidao da sociedade capitalista e o surgimento da
sociologia ................................................................ 14
UNIDADE 2
ESTRUTURA METODOLGICA DA SOCIOLOGIA ........................... 23
Sociologia como cincia: complexidade epistmica ................ 23
Problema social versus problema sociolgico ........................ 26
Sociologia versus Filosofia Social ....................................... 28
UNIDADE 3
PRINCIPAIS TEORIAS SOCIOLGICAS PARA ANLISE DA SOCIEDADE CONTEMPORNEA .......................................................... 31
As teorias clssicas ...................................................... 31Enfoque coletivista ................................................ 32
A sociologia de mile Durkheim ........................... 32A sociologia de Karl Marx ................................... 43
Enfoque individualista ............................................ 57A sociologia de Max Weber ................................. 57
Novos modelos de explicao sociolgica ............................ 73Escola de Frankfurt ............................................... 74
Nova Sociologia Francesa Pierre Bourdieu ............. 76Norbert Elias ................................................ 78
Escola de Chicago ................................................. 79A sociologia de Georg Simmel ............................. 80
SUMRIO
UNIDADE 4
ESTRUTURA SOCIAL: noes bsicas ................................... 87
Conceito e funo de estrutura social ............................... 87Status ................................................................. 88Papel ................................................................. 89Os aspectos que fundamentam o papel e o status ............. 90Integrao e relacionamento papel-status ...................... 90O indivduo e a estrutura social .................................. 92Tipos de estrutura social .......................................... 93
Grupos sociais ................................................ 93Organizaes ou estruturas organizacionais ............. 94Comunidades .................................................. 94Instituies .................................................... 94Categorias sociais ............................................ 94
Estratificao social ..................................................... 95Legitimao da estratificao: aceitao ....................... 97Conceito bsico para compreenso da estratificao ......... 98Sociedades abertas e fechadas ..................................100Os tipos de estratificao social .................................101
Castas ......................................................... 101Classes ........................................................ 103Estamento .................................................... 105
UNIDADE 5
INSTITUIES SOCIAIS ....................................................109
O que uma Instituio Social? ......................................109
Famlia e parentesco ...................................................111Formas de organizao das famlias .............................112O desenvolvimento da vida familiar .............................115Mudanas nos padres familiares ................................116
Economia ................................................................119O desenvolvimento da agricultura ...............................121O desenvolvimento da indstria .................................123O desenvolvimento da economia dos servios .................127
Religio ...................................................................129Recreao ...........................................................130Educao ............................................................131Poltica .............................................................132
REFERNCIAS ............................................................ 137
CONES
Orientao para estudo
Ao longo desta apostila, sero encontrados alguns cones utiliza-
dos para facilitar a comunicao com voc.
Saiba o que cada um significa.
GLOSSRIO
REFERNCIAS
ATIVIDADES
SUGESTO DE FILMES
SAIBA MAIS
APRESENTAO
A sociologia tem ocupado um papel cada vez mais importante na
anlise da sociedade contempornea. uma das cincias humanas
que estuda a sociedade, ou seja, estuda sistematicamente o
comportamento humano em seu contexto social, enquanto que o
indivduo na sua singularidade estudado pela psicologia.
A sociologia tem uma base terico-metodolgica, que serve para
estudar os fenmenos sociais, tentando explic-los, analisando
os homens em suas relaes de interdependncia. Compreende,
tambm, as diferentes sociedades e culturas, alm de esclarecer o
tamanho, a direo e o significado das mudanas sociais, sugerindo
formas de tratar os problemas sociais gerados desde o surgimento
da sociedade capitalista at os dias atuais. Como problemas atuais,
podemos citar a fome, o desemprego, o suicdio entre outros.
Esses problemas, embora sejam constantemente analisados, s
vezes, so desvinculados de sua base social, sendo interpretados
como problemas individuais e, como tais, perdem sua dimenso
social, no encontrando respostas adequadas para trat-los. A
sociologia busca justamente olhar para estes e outros problemas
que afligem a sociedade contempornea.
nessa perspectiva que iremos trabalhar neste material. Procuramos
no s demarcar uma cincia especfica, mas, sobretudo,
desvendar alguns problemas ou fenmenos que nos cercam, e no o
percebemos enquanto tais, ou seja, no pensamos neles enquanto
fenmenos sociais e cientficos.
Portanto, caro estudante, desejamos excelente leitura do material
e uma proveitosa compreenso do seu contedo enriquecendo
tanto seus conhecimentos cientficos quanto suas vidas pessoais.
Bom estudo!
PLANO DE ENSINO
DISCIPLINA: Sociologia Geral
Carga horria: 60 horas
EMENTA:
A sociologia no campo do conhecimento: origem histrica. Anlise
da realidade social. Conceitos e proposies tericas e metodol-
gicas para compreenso dos fenmenos sociais.
OBJETIVOS:
Analisar a realidade social tendo em vista a aquisio de uma postura crtica e transformadora frente aos problemas sociais
do contexto no qual est inserido;
Compreender o contexto histrico, econmico, poltico e social do surgimento da sociologia;
Localizar a sociologia no quadro cientfico; Relacionar de forma compreensiva as diferentes perspectivas
tericas da sociologia para a anlise da sociedade contempornea;
Apreender o conceito e funes da estrutura social; Compreender o conceito de instituies sociais, identificando
algumas instituies especficas.
CONTEDOS PROGRAMTICOS:
UNIDADE 1A SOCIOLOGIA COMO CINCIA
UNIDADE 2ELEMENTOS PARA ANLISE CIENTFICA: epistemologia da sociologia
UNIDADE 3PRINCIPAIS TEORIAS SOCIOLGICAS PARA ANLISE DA SOCIEDADE CONTEMPORNEA
UNIDADE 4ESTRUTURA SOCIAL
UNIDADE 5INSTITUIES SOCIAIS
METODOLOGIA:O material deve ser trabalhado de forma concatenada, uma vez que as unidades so correlacionadas. Assim, as unidades 1, 2 e 3 contemplam desde o surgimento da sociologia, sua constituio enquanto cincia, os tericos clssicos at o desenvolvimento das teorias contemporneas de explicao sociolgica; enquanto as unidades 4 e 5 trabalham as formas como as sociedades se organizam e como os indivduos esto inseridos nessa organizao.
As aulas devem ser dialogadas com a participao dos alunos.
AVALIAO:A avaliao dever acontecer no decorrer do processo de aprendizagem finalizando com trabalhos escritos e apresentados em dupla.
No decorrer das aulas dever ser observada a participao do aluno, sua interao com a aula; tambm valero nota as questes levantadas no final de cada unidade, bem como o debate sobre os filmes sugeridos.
Para finalizar dever ser elaborado um trabalho que correlacione duas ou mais unidades.
A SOCIOLOGIA COMO CINCIA
1UNIDADE
OBJETIVOS DESTA UNIDADE
Conceituar a sociologia a partir de uma anlise histrica sobre o surgimento, especializao e oficializao da disciplina enquanto cincia;
Dissertar sobre o final do sculo XIX e anos iniciais do sculo XX, tendo em vista que este perodo foi o marco fundador do surgimento (questo social) e da elaborao das bases epistemolgicas e metodolgicas da sociologia.
O CONTExTO DO SURGIMENTO DA SOCIOLOGIA ENqUANTO CINCIA
Ns, seres humanos, sempre tivemos curiosidade pelas origens
do nosso prprio comportamento, mas, durante centenas de
anos, as nossas tentativas de nos compreendermos dependeram
dos modelos de pensar transmitidos de gerao em gerao,
s vezes, seguindo os termos religiosos. Foram em termos
religiosos, por exemplo, que justificavam e explicavam, na
poca, o poder da nobreza feudal e da monarquia. Mas, a
teologia, no final do sculo XVII, paulatinamente foi deixando
de ser a forma norteadora do pensamento, cedendo lugar para
as indagaes racionais.
O emprego sistemtico da observao e da experimentao
como fonte de explorao dos fenmenos da natureza ganhava
cada vez mais espao e acumulava cada vez mais conhecimentos.
O pensamento social desse perodo tambm realizava seus voos
rumo a novas descobertas. A pressuposio de que o processo
histrico possui uma lgica passvel de ser apreendida abriu
novas pistas para investigao racional da sociedade.
FILOSOFIA1414
Vico (1668-1744) afirmava que a sociedade podia ser compreen-
dida porque, ao contrrio da natureza, ela constitui obra dos pr-
prios indivduos (apud MARTINS, 1994, p. 19).
Porm, foi no sculo XVIII que um movimento intelectual chamado
de Iluminismo nocauteou a influncia da religio, da tradio e do
dogma no pensamento intelectual, possibilitando a consolidao
da cincia como a maneira de pensar o mundo.
O estudo objetivo e sistemtico do comportamento humano e da
sociedade um desenvolvimento recente, data do incio do sculo
XIX, mais precisamente por volta de 1830. Porm, a sua formao
constituiu-se em um acontecimento complexo para o qual concor-
reu uma constelao de circunstncias histricas e intelectuais, e
determinadas intenes prticas.
CONSOLIDAO DA SOCIEDADE CAPITALISTA E O SURGIMENTO DA SOCIOLOGIA
O surgimento da sociologia confunde-se com a prpria ascenso
do modo de produo capitalista, melhor dizendo, com um novo
paradigma socioeconmico: o capitalismo como modo de vida. Este
processo tem como marcos histricos fundamentais movimentos
como o Renascimento, o Iluminismo, a Revoluo Francesa, a In-
dependncia dos Estados Unidos e a Revoluo Industrial, os quais
fizeram emergir novas relaes de trabalho, o estado laico, a cin-
cia e a razo experimental como fundamentos para compreenso
do mundo.
Estes perodos foram assolados por crises, guerras, conflitos inter-
classistas, suicdios, perda de referncias, desemprego, infanti-
cdio etc. Inserida neste turbilho de problemas sociais, que se
tornavam gradativamente globalizados (questo social), surge a
sociologia como alternativa para o controle, planejamento e re-
constituio do equilbrio e coeso social.
Questo Social - a generalizao dos problemas sociais surgidos com o advento do modo de produo capitalista: desemprego, mendicncia, fome, aumento da criminalidade, prostituio, alcoolismo, suicdio, infanticdio, surtos de epidemias etc.
SOCIOLOGIA GERAL | UNIDADE 1 1515
Esse desequilbrio foi gerado na transio do Antigo Regime
econmico para o Capitalismo enquanto modo de produo.
Assim, a Revoluo Industrial representou o triunfo da sociedade
capitalista que foi pouco a pouco concentrando mquinas,
terras e as ferramentas sob o seu controle, convertendo
boa parte dos indivduos em despossudos. Cada avano com
relao consolidao da sociedade capitalista representava a
desintegrao de costumes e instituies e a introduo de novas
formas de organizar a vida social. A utilizao da mquina na
produo no apenas destituiu o arteso dos seus instrumentos
de trabalho como imps uma severa disciplina, com novas formas
de conduta e de relaes de trabalho.
A transformao da atividade artesanal em atividade manufatureira
e, por fim, em atividade fabril desencadeou uma migrao do
campo para a cidade, assim como engajou mulheres e crianas em
jornadas de trabalho de 12 horas, sem direito a frias ou feriados e
recebendo salrios inferiores aos dos homens. Essas transformaes
impactaram o mundo ingls, sobretudo as cidades industriais
Figura 1: MONTAGEM TRANSIO ANTIGO REGIME PARA CAPITALISMOFonte: http://images.google.com.br/images?hl=ptBR&source=hp&q=revolu%C3%A7%C3%A3o%20francesa&um=1&ie=UTF-8&sa=N&tab=wi
FILOSOFIA16
que apresentaram um elevado crescimento demogrfico sem, no
entanto, ter uma estrutura de moradia, saneamento, sade etc.
A ttulo de exemplo, Manchester, que no incio do sculo XIX tinha
por volta de 70 mil habitantes, cinquenta anos depois apresentava
300 mil.
A Revoluo Industrial fez emergir o proletariado, vtima das
consequncias nefastas desse processo. Essa nova classe, no
entanto, no sofreu de forma impassvel, reagiu sob vrias formas:
destruio das mquinas, atos de sabotagem e exploso de oficinas,
roubos, crimes, at evoluir para a criao de associaes livres e
formao de sindicatos.
Com isso, o centro dos confrontos sociais deixou de ser pobres
contra ricos, para ser classe operria contra os proprietrios dos
meios de produo. A profundidade dessas transformaes colocou
a sociedade num plano de anlise, ou seja, ela passou a se constituir
como um problema, um objeto que deveria ser investigado.
Cabe ressaltar que a Revoluo Industrial foi o ponto culminante de uma
evoluo tecnolgica, econmica e social que vinha se processando
na Europa desde a Baixa Idade Mdia, com nfase nos pases onde
a Reforma Protestante tinha conseguido destronar a influncia da
Igreja Catlica: Inglaterra, Esccia, Pases Baixos, Sucia. Nos pases
fiis ao catolicismo, a Revoluo Industrial eclodiu, em geral, mais
tarde, e num esforo declarado de copiar aquilo que se fazia nos
pases mais avanados tecnologicamente: os pases protestantes.
Na Frana, as novas maneiras de produzir chocavam-se com a
monarquia absolutista, isto , com um regime de governo que
assegurava considerveis privilgios para um grupo de indivduos
improdutivos (nobreza), atrapalhando, sobretudo, a consolidao
da livre-empresa.
Por isso, a burguesia, ao tomar o poder em 1789, investiu diretamente
contra os fundamentos da sociedade feudal, procurando construir
um Estado que assegurasse e incentivasse a empresa capitalista.
Para tanto, contaram com o apoio dos trabalhadores pobres das
cidades. A burguesia que se instalara no poder no constitua um
grupo coeso quanto aos seus interesses, havia uma ala mais radical
Figura 2: os trs estados na frana pr-revolucionria Fonte: http://revistaepoca.globo.com/Revista/ Epoca/0,,ERT60632-15223-60632-3934,00.html
SOCIOLOGIA GERAL | UNIDADE 1 17
que pretendia suprimir tambm as instituies civis. Porm, o grupo
burgus, interessado apenas nas transformaes necessrias para
o livre desenvolvimento empresarial, empreendeu-se em controlar
os novos surtos revolucionrios que pretendiam modificar toda a
estrutura social. Assim, o projeto revolucionrio deveria ser superado
por outro que conduzisse organizao ou aperfeioamento da
sociedade nascente, isto , a sociedade capitalista, o que tornou
necessrio parar a radicalizao revolucionria e iniciar-se um
processo de reordenao social que possibilitasse o progresso
humano (filosofia social positivista Augusto Comte).
A sociedade capitalista nascente na Frana, no incio do sculo XIX,
carregava consigo as situaes sociais vividas pela Inglaterra no
incio da Revoluo Industrial. A partir da terceira dcada do sculo
XIX, intensificaram-se na sociedade francesa as crises econmicas
e as lutas de classe. A contestao da ordem capitalista pela classe
trabalhadora passou a ser violentamente reprimida pela burguesia,
via os aparatos do Estado.
Mesmo assim, ficava cada vez mais claro que a burguesia no
seria capaz de interromper apenas com aes repressivas aquele
estado de desorganizao social e estabelecer uma nova ordem
social estvel. Por isso, alguns pensadores acreditaram que, para
introduzir uma higiene social e reorganizar a sociedade, seria
necessrio fundar uma nova cincia.
ANTIGO REGIMEREVOLUES BURGUESAS E
INDUSTRIAISExplicaes do mundo vinculadas s interpretaes da Igreja Catlica.
Revoluo tcnico-cientfica: o cien-tificismo. As explicaes dos fen-menos naturais e sociais passam a ser baseados na razo cientfico-ex-perimental.
Escravido e no existncia de de-mocracia.
Reforma Protestante, Revoluo In-glesa, Revoluo Francesa, Indepen-dncia dos Estados Unidos.
Relaes de trabalho servis: senhor-servo; escravido.
Sistema capitalista.
Mercantilismo. Relaes de trabalho assalariadas, fim da escravido e servido.
Civilizao rural e produes manu-ais e artesanais.
Civilizao urbano-industrial.
FILOSOFIA18
Monarquias absolutistas inexistncia de participao popular.
Poder poltico-econmico passa para as mos da burguesia.
Classes sociais definidas por nasci-mento: nobreza e clero.
O Estado (poltica laica) passa a ser definido pela participao da bur-guesia, no mais pela interferncia da Igreja.
Trabalho artesanal e corporaes de ofcio.
Trabalho assalariado industrial.
Sistema de produo artesanal e ma-nufatureiro: predomnio do trabalho manual e baixa diviso das tarefas (diviso social do trabalho).
Sistema de produo industrial ou fabril em que se aplica o trabalho humano conjugado ao uso de mqui-nas, provocando o aumento da pro-dutividade.
Inexistncia de trabalho assalariado. A sociedade passa a ser definida pela riqueza: burguesia (proprietrios) e proletrios (trabalhadores).
Quadro 1: sinptico - Transio do Antigo Regime para o Capitalismo.
Assim, essa nova cincia que deveria ser
criada, tinha como objetivo uma aplicabilidade
prtica, isto , dar respostas crise social
daquele tempo. A jovem cincia assumia como
tarefa intelectual repensar o problema da
ordem social.
Dessa forma, surgiu a sociologia que deveria,
segundo Auguste Comte, orientar-se no sentido
de conhecer e estabelecer as leis imutveis
da vida social, abstendo-se de qualquer
discusso crtica. Comte denominava a nova cincia de fsica-social,
expressando o seu desejo de constru-la a partir dos modelos das
cincias fsico-naturais, seguindo o pensamento positivista.
A oficializao da sociologia (denominao atribuda por Comte)
foi, portanto, uma criao do pensamento positivista que pretendia
realizar a legitimao intelectual do novo regime, o Capitalismo.
Comte acreditava que este novo campo de estudo podia produzir
conhecimento acerca da sociedade com base em fatos cientficos,
uma vez que foi a ltima cincia a se desenvolver. A Sociologia,
para ele, deveria contribuir para o progresso da humanidade, usando seu carter cientfico para compreender, prever e controlar o comportamento humano em sociedade.
Figura 3: Auguste ComteFonte: www.suapesquisa.com/o_que_e/positivismo.htm
Positivismo uma corrente filosfica que surgiu na Frana no comeo do sculo XIX. Os principais idealizadores do positivismo foram os pensadores Augusto Comte e John Stuart Mill. Esta escola filosfica ganhou fora na Europa na segunda metade do sculo XIX e comeo do XX, perodo em que chegou ao Brasil. O positivismo defende a ideia de que o conhecimento cientfico a nica forma de conhecimento verdadeiro. De acordo com os positivistas somente pode-se afirmar que uma teoria correta se ela foi comprovada atravs de mtodos cientficos vlidos. (www.suapesquisa.com/o_que_e/positivismo.htm).
SOCIOLOGIA GERAL | UNIDADE 1 19
Nesse sentido, esta sociologia de inspirao positivista no
tinha como pretenso questionar os fundamentos da sociedade
capitalista, nem alimentar teoricamente as lutas do proletariado.
Este (filho da revoluo industrial) buscou no pensamento socialista
o referencial terico para embasar suas lutas.
Foi nesse contexto que a sociologia adquiriu outra vertente,
tornando-se, tambm, uma teoria crtica da sociedade.
A sociologia um campo de disputas pelo poder de criar discursos
que pretendem ser verdades; uma cincia terica e prtica,
pois base para a produo de polticas pblicas e polticas
internacionais. Desta forma, sociologia no puramente
filosofia ou abstrao pela abstrao, mas sim um conjunto de
conhecimentos praxeolgicos que nos atingem sem que tenhamos
conscincia de tal.
No momento de formao da sociologia, segundo Martins (1994, p. 34-94), existiam as seguintes vertentes sociolgicas em gnese:
Sociologia moralista e conservadora; pretendia amortecer os prejuzos socioeconmicos e polticos atravs de propostas conservadoras que tentavam evitar as mudanas sociais e assim manter um equilbrio da sociedade em prol do status quo;
Sociologia vinculada a lutas sociais e classes sociais exploradas: a sociologia de Saint Simon, porm esta tem pouca objetividade, apesar das propostas de superao da explorao social. De forma ampla nela se encontram as teorias marxistas;
Sociologia acadmica: relacionada a mile Durkheim, procura manter a ordem e compreender os problemas sociais anmicos e normais.
Sociologia das elites: a sociologia revolucionrio-burguesa torna-se de elite e procura sintonizar a emergente sociologia ao controle social.
FILOSOFIA20
Discorra sobre o momento histrico em que surge a
sociologia. Tente enfatizar eventos e transformaes
histricas que foram fundamentais e que influenciaram na
construo da sociologia como cincia.
OS MISERVEIS (1998)
SinopSe: os miseRveis (1998) uma adaPtao do ClssiCo RomanCe homnimo de viCtoR hugo. o filme Conta a histRia de Jean valJean (liam
neeson) que, dePois de CumPRiR 19 anos de PRiso Com tRaBalhos foRa-
dos PoR teR RouBado Comida, toRna-se emPResRio em uma Pequena Cidade.
valJean, PeRseguido Pelo PoliCial JaveRt (geoffRey Rush), foge PaRa PaRis
Com sua filha adotiva. PaRis Passava PoR ContuRBaes RevoluCionRias em
meio ao qual suRge o RomanCe entRe a filha de valJean e um Jovem Revolu-
CionRio, imPelindo valJean a se envolveR nas lutas PRoletRias.
em 1807, PaRa esCaPaR das tRoPas naPoleniCas, o Casal se tRansfeRe s
PRessas PaRa o Rio de JaneiRo, onde a famlia Real vive seu exlio de 13 anos.
na Colnia aumentam os desentendimentos entRe CaRlota e d. Joo vi.
Direo: Billie august
Gnero: dRama
elenco: liam neeson, geoffRey Rush, uma thuRman, ClaiRe danes, hans matheson.
TEMPOS MODERNOS (1936)
SinopSe: um oPeRRio de uma linha de montagem, que testou uma mquina RevoluCionRia PaRa evitaR a hoRa do almoo, levado louCuRa Pela
monotonia fRentiCa do seu tRaBalho. aPs um longo PeRodo em um
sanatRio, fiCa CuRado de sua CRise neRvosa, mas desemPRegado. ele deixa
o hosPital PaRa ComeaR sua nova vida, mas enContRa uma CRise geneRali-
zada e equivoCadamente PReso Como um agitadoR Comunista, que lideRava
uma maRCha de oPeRRios em PRotesto. simultaneamente, uma Jovem RouBa
Comida PaRa salvaR suas iRms famintas, que ainda so Bem gaRotas. elas
no tm me e o Pai delas est desemPRegado, mas o PioR ainda est PoR viR,
1
SOCIOLOGIA GERAL | UNIDADE 1 21
Pois ele moRto em um Conflito. a lei vai CuidaR das Rfs, mas, enquanto
as menoRes so levadas, a Jovem Consegue esCaPaR.
Direo: ChaRles ChaPlin
Gnero: Comdia
elenco: ChaRles ChaPlin, Paulette goddaRd, henRy BeRgman, tiny sandfoRd, ChesteR Conklin.
GIDDENS, Anthony. Sociologia. 3. ed. Lisboa: Fundao Calouste
Gulbenkian, 2000.
MARTINS, Carlos.B. O que sociologia. Col. Primeiros Passos. 38.
ed. So Paulo: Brasiliense, 1994.
TURNER, Jonathan. Sociologia: conceitos e aplicaes. So Paulo:
Makron Books, 2000.
VILA NOVA, Sebastio. Introduo sociologia. So Paulo: Atlas,
2008.
UNIDADE
2OBJETIVOS DESTA UNIDADE:
Discutir e apresentar os aspectos gerais da estrutura epistemolgica da sociologia;
Estudar e esclarecer ao estudante os principais problemas epistemolgicos e de delimitao da sociologia enquanto cincia e rea do conhecimento cientfico.
ESTRUTURA METODOLGICA DA SOCIOLOGIA
SOCIOLOGIA COMO CINCIA: a complexidade epistmica
A sociologia pode ser conceituada como o estudo sistemtico
e metdico da sociedade. Conforme Durkheim, a sociologia
seria o estudo dos fatos sociais. Por outro lado, Weber entende
que a sociologia seria o estudo das aes sociais. De modo
geral, a sociologia o estudo de fenmenos sociais: problemas
sociolgicos e problemas sociais. Mas o que so problemas
sociais e problemas sociolgicos? O que caracteriza um
fenmeno social?
importante destacar que a estrutura epistemolgica da
sociologia compe-se, como qualquer outra cincia, de sujeito,
objeto e mtodos. O que caracteriza uma cincia so formas com
que o sujeito cognoscente estabelece a relao de pesquisa ou
de estudo com o objeto do conhecimento. Nas cincias humanas,
de modo geral, a relao entre sujeito e objeto possui algumas
variveis complexas, que tornam a objetividade da elaborao
de leis gerais e universalizantes muito fluida e flexvel.
Figura 4Fonte: http://www.clickinformacao.com/fotos/curso-de-ciencias-sociais.jpg
FILOSOFIA24
Enquanto nas cincias exatas, principalmente na fsica, o cientista
pode estabelecer e elaborar leis universais concludas da pesquisa
de um objeto inanimado, como a fora gravitacional, na sociologia
esta relao torna-se muito mais complicada, para no dizer, pra-
ticamente invivel. Mas, por que razo a sociologia no estabelece
leis universais?
A resposta para tal questo reside na estrutura epistemolgica da
relao sujeito e objeto, melhor dizendo, da natureza de ambos e
acima de tudo das peculiaridades e complexidades caractersticas
do fenmeno social. A primeira resposta pode ser retirada do se-
guinte princpio da sociologia: tanto o sujeito quanto o objeto do
conhecimento so humanos, so seres ou instituies que podem
estabelecer uma relao comunicativa de troca simblica. Vejamos
no exemplo.
O socilogo, William Foote Whyte (2005), estudou um grupo de
jovens em uma gangue, tentando compreender o funcionamento e
as causas que levavam a juventude de um bairro norte-americano
a adentrarem nestes grupos sociais. Para fundamentar a pesquisa,
o autor teve que fazer entrevistas, trabalho de campo, e at certo
ponto ser aceito e estudado pelo objeto de estudo, os membros da
gangue. Neste caso, o trabalho cientfico do socilogo s foi poss-
vel porque ele dialogou e trocou informaes com o objeto, que,
de algum modo, tambm o estudava.
Desta rpida descrio, podemos retirar a seguinte inferncia: o
sucesso de uma pesquisa social requer, em muitos casos, o estabe-
lecimento de um dilogo com o objeto de estudo.
Agora pensemos no caso da fsica. Seria possvel o fsico estabele-
cer uma relao dialgica com a lei da gravidade? A lei da gravida-
de poderia questionar o fsico? Poderia no aceitar a pesquisa?
A relao sujeito e objeto na sociologia caracterizada pela dialo-
gicidade, o sujeito e objeto interagem entre si. Desta caracters-
tica temos como corolrio fundamental o carter relacional entre
socilogo e objeto de estudo. O segundo fator de complexidade
diz respeito s caractersticas humanas, principalmente, ao livre
arbtrio.
Em fevereiro de 1937, o ento jovem economista William Foote Whyte, com uma bolsa de iniciao de Harvard, decidiu estudar um bairro italiano pobre de Boston, a que deu o nome de Cornerville. Um clssico da pesquisa sociolgica, o trabalho de Whyte sobre Cornerville tem servido como modelo para a etnografia urbana h quase 70 anos. Utilizando o mtodo de observao participante, o autor revela um mundo de intrincadas relaes sociais, considerando pessoas e situaes reais. Com seu olhar profundo e detalhista, Whyte mudou a maneira de se compreender a pobreza e a vida nas grandes cidades. (http://www.zahar.com.br/imprensa/r0922.pdf)
SOCIOLOGIA GERAL | UNIDADE 2 25
O livre arbtrio uma caracterstica humana que possibilita a va-
riabilidade em relao a uma lei social geral, ou seja, por mais
que haja uma tendncia para determinado comportamento, a com-
plexidade da razo humana, conjugada com o livre arbtrio, pode
gerar um desvio norma. J no caso das leis da fsica - como a lei
da gravidade - no cabe livre arbtrio, ningum escolhe segui-la ou
transgredi-la, simplesmente a gravidade atua sobre ns como lei da
natureza universal e geral. Neste sentido:
A matria-prima da cincia natural, portanto, todo o conjunto de fatos que se repetem e tm uma constncia verdadeiramente sistmica, j que podem ser vistos, isolados e, assim, reproduzidos dentro de condies de controle razoveis, num laboratrio. [...]. em contraste com isso, as cincias sociais estudam fenmenos complexos, situados em planos de causalidades e determinao complicados. Nos eventos que constituem a matria-prima do antroplogo, do socilogo, do historiador, do cientista poltico, do economista e do psiclogo, no fcil isolar causas e motivaes exclusivas, mesmo quando o sujeito est apenas desejando realizar uma ao aparentemente inocente e basicamente simples, como o ato de comer um bolo. Pois um bolo pode ser comido porque se tem fome e pode ser comido por motivos sociais e psicolgicos: para demonstrar solidariedade a uma pessoa ou grupo, para comemorar uma certa data (DAMATTA, 1997, p.18).
Por outro lado, na sociedade, por mais imperativa que seja a norma
social, sempre h o desvio; por mais perfeita que seja a organiza-
o social, sempre cabe a transgresso. Talvez por isso Rousseau
tenha chegado concluso de que a democracia, por mais perfeita
que fosse, s poderia ser plena quando exercida por deuses ou por
anjos, pois os primeiros construiriam, supostamente, as leis univer-
sais, e os segundos seriam desprovidos de livre arbtrio.
Outro fator que torna o objeto da sociologia ainda mais complexo
que os fatos sociais no podem ser reproduzidos em laboratrio, ou
seja, so fatos nicos. Nestes termos, a matria-prima das cincias
humanas so eventos do passado, e o papel dos cientistas humanos
tentar entender tendncias por meio da reconstruo racional
das relaes causa-efeito destes eventos. De modo geral, um fe-
nmeno social nico, apesar de possuir tendncias. Deste modo:
FILOSOFIA26
O problema bsico, assim, continua: os fatos so-ciais so irreproduzveis em condies controladas e, por isso, quase sempre fazem parte do passado. So eventos a rigor histricos e apresentados de modo descritivo e narrativo, nunca na forma de uma experincia. Realmente no posso ver e certa-mente jamais verei uma expedio de troca do tipo kula, to esplendidamente descrita por Malinowsk (DAMATTA, 1997, p. 21).
Destarte, podemos concluir da complexidade dos fenmenos dois
grandes corolrios fundamentais da estrutura epistemolgica da
sociologia enquanto cincia humana: 1) a relao sujeito e objeto
relacional; 2) o fenmeno social relativo, pois varia conforme
o espao, tempo, sociedade e cultura; 3) a sociologia no traba-
lha com leis universais, mas com tendncias fenomenolgicas; 4)
o fenmeno humano flexvel, fato que no lhe retira o carter
objetivo e rigoroso, pois h mtodos para se trabalhar com as ten-
dncias fenomenolgicas.
Agora voltemos para um segundo questionamento: o papel da so-
ciologia estudar somente os problemas sociais?
PROBLEMA SOCIAL VERSUS PROBLEMA SOCIOLGICO
Muitos imaginam que a sociologia a cincia que estuda problemas
sociais para buscar solues, ou seja, estuda os problemas, assim
como um mdico patologista estuda os estados anmicos da socie-
dade para criar uma vacina e, assim, solucionar a doena e gerar
a normalidade social. No entanto, esta uma concepo muito
restrita do que sociologia que, enquanto cincia, muito mais
que o estudo de estados de anormalidade. Observe:
Parece frequente que os que no esto familiari-zados com a sociologia imaginam que esta cincia tenha como objetivo a resoluo dos problemas so-ciais, o que um equvoco. bem verdade que a so-ciologia nasceu como tentativa de buscar solues racionais, cientficas, de acordo com a pretenso de Comte, para os problemas sociais resultantes da
SOCIOLOGIA GERAL | UNIDADE 2 27
revoluo industrial e de decomposio da ordem social aristocrtica na Frana do incio do sculo XIX. Nos Estados Unidos, a sociologia foi grande-mente estimulada, nos seus primrdios pela pre-tenso anloga, embora como consequncia de outras condies sociais, de faz-la um instrumen-to para a soluo cientfica dos problemas daquela sociedade [..] (NOVA, 2008, p.42).
Todo fenmeno social um problema sociolgico, pois se origina na
sociedade e desdobra consequncias sociais. Temos como exemplo
as manifestaes populares como o bumba-meu-boi, o carnaval,
assim como a pobreza e as relaes de trabalho. importante en-
fatizar que os problemas sociolgicos no so em si fatos patolgi-
cos, ou seja, fenmenos que produzem prejuzos sociedade.
Essa ltima categoria de problemas sociolgicos so considerados
problemas sociais, que so fenmenos que geram ou tendem a ge-
rar prejuzos e estados patolgicos na sociedade. Como exemplo,
temos a pobreza, o alto nvel de criminalidade, o alto nvel de cor-
rupo, que podem gerar ou geram estados de instabilidade e de
prejuzo sociedade em geral.
Portanto, todo problema social um problema sociolgico, mas
nem todo problema sociolgico problema social, pois:
Imaginar que a sociologia seja uma cincia dos problemas sociais constitui um equvoco anlogo ao de supor que a biologia tenha como objeto de estudo apenas as manifestaes patolgicas, doen-tias, de vida.Ao socilogo interessam, antes, os problemas so-ciolgicos, quer dizer, os problemas de explicao terica do que acontece na vida social. Neste sen-tido, tanto o funcionamento fluente da famlia quanto a sua desorganizao entram no campo de interesse do socilogo (NOVA, 2008, p.43).
Fica claro que a sociologia no estuda apenas fenmenos patol-
gicos, estados de fragmentao e desintegrao do tecido social,
mas estuda tambm estados de normalidade e estabilidade. Nestes
dois grandes marcos divisrios do objeto da sociologia (desinte-
grao e estabilidade) podemos utilizar a classificao de Augusto
Comte: a sociologia esttica e a sociologia dinmica.
FILOSOFIA28
A sociologia esttica o campo da sociologia que estuda as insti-
tuies, ou seja, os aspectos contnuos das sociedades (estados de
normalidade). Enquanto a sociologia dinmica estuda processos de
mudana, que geralmente so momentos compostos por problemas
sociais advindos de questionamentos de uma antiga ordem estvel
da sociedade (lembremos da passagem do antigo regime para o
capitalismo).
A sociologia esttica estuda os fenmenos gerais da sociedade, es-
tuda a vida social em si mesma, os aspectos constantes da socieda-
de. Este modo estuda as Instituies bsicas, ou seja, instituies
necessrias para vida social: 1) a propriedade que permitem aos
homens produzirem e acumularem; 2) a famlia que educa e en-
sina os costumes e tradies aos indivduos; 3) a linguagem que
possibilita a comunicao e a troca simblica entre os indivduos
em sociedade. A sociologia dinmica estuda os processos de trans-
formao e evoluo da vida social.
SOCIOLOGIA VERSUS FILOSOFIA SOCIAL
Outra confuso que h no campo da sociologia a equiparao
desta com a filosofia, fato em si um erro epistemolgico infantil.
Primeiramente, importante enfatizar o que conhecimento cien-
tfico e o que conhecimento filosfico.
Inicialmente, o conhecimento cientfico pode ser considerado
o produto de um processo racional, sistemtico e metdico de
observao objetiva de fenmenos, fatos, processos e realidades
verificveis. Nestes termos, a cincia faz-se: racional, verificvel,
factual, experimental e objetiva. A cincia baseia-se na objetividade
(observao sistemtica de objetos) para se chegar a verdades
provisrias. As verdades so provisrias, pois a realidade mutvel e
dinmica. Desse modo a cincia acompanha os processos de mudana
e vlida at quando suas teorias no so refutadas (princpio da
falseabilidade).
SOCIOLOGIA GERAL | UNIDADE 2 29
Por outro lado, o conhecimento filosfico, apesar de racional,
sistemtico, rigoroso e lgico, no verificvel, no pode ser testado
nem verificado empiricamente:
[...] portanto, o conhecimento filosfico caracterizado pelo esforo da razo pura para questionar os problemas humanos e poder discernir entre o certo e o errado, unicamente recorrendo s luzes da prpria razo (LAKATOS, 2008, p.19).
Retomemos a sociologia. Esta rea do conhecimento uma cincia,
pois seu objeto verificvel e o produto de suas pesquisas so
testveis e falseveis, pois so empiricamente observveis. Como
exemplo, podemos citar um socilogo que pretende estudar os
comerciantes informais das ruas de uma grande cidade. Tal objeto
de estudo empiricamente observvel, com isso o pesquisador
no far um estudo a partir da introspeco, mas sim atravs de
anlises terico-empricas baseadas no fenmeno.
Por fim, fica claro que a sociologia uma cincia que tem um objeto
emprico, verificvel e falsevel, j o conhecimento filosfico
no possui tal estrutura. A anlise da Filosofia Social emite juzo
de valor, normativa, especulativa e conjectural; enquanto a
sociologia parte da observao de fatos sociais, no especulativa,
observao sistemtica de fatos e no emite juzos de valor.
Por que o conhecimento sociolgico no o mesmo que
conhecimento filosfico?
Falseabilidade (ou refuta-bilidade) um conceito
importante na filosofia da cincia (epistemologia).
Para uma assero ser refutvel ou falsevel,
em princpio ser possvel fazer uma observao ou
fazer uma experincia fsica que tente mostrar
que essa assero falsa. Por exemplo, a assero
todos os corvos so pretos poderia ser fal-sificada pela observao de um corvo vermelho.
A escola de pensamento que coloca a nfase na
importncia da Falseabi-lidade como um princpio
filosfico conhecida como a Falseabilidade.
http://pt.wikipedia.org/wiki/Falseabilidade
1
FILOSOFIA30
ILHA DAS FLORES (1989)
SinopSe: um Cido e diveRtido RetRato da meCniCa da soCiedade de Con-sumo. aComPanhando a tRaJetRia de um simPles tomate, desde a Plantao
at seR Jogado foRa, o CuRta esCanCaRa o PRoCesso de geRao de Riqueza
e as desigualdades que suRgem no meio do Caminho.
Direo: JoRge fuRtado
Gnero: doCumentRio exPeRimental
DA MATTA, Roberto. Relativizando: uma introduo antropologia
social. Rio de Janeiro: Rocco, 1987.
KUHN, Thomas S. A estrutura das revolues cientficas. So
Paulo: Perspectiva, 2005.
LAKATOS, Eva Maria e MARCONI, Marina de A. Metodologia
Cientfica. 5. Ed. So Paulo: Atlas, 2008.
SANTOS, Boaventura Sousa. Introduo a uma Cincia Ps-
Moderna. Rio de Janeiro: Graal, 1989.
William Foote White. Sociedade de esquina: a estrutura social de
uma rea urbana pobre e degradada. Rio de Janeiro: Zahar, 2005.
VILA NOVA, Sebastio. Introduo Sociologia. So Paulo:
Atlas,2008.
OBJETIVO DESTA UNIDADE:
UNIDADE
3OBJETIVO DESTA UNIDADE:
Apresentar as principais bases da sociologia clssica e suas contribuies para estruturao das anlises da sociedade contempornea, isto , sociedade capitalista;
Tratar as abordagens coletivistas (mile Durkheim e Karl Marx) e individualistas (Max Weber e George Simmel) com suas concepes dicotmicas da realidade social (indivduo-sociedade);
Discutir as teorias contemporneas que buscam superar estas antinomias e pensar conjuntamente os aspectos da realidade classicamente apreendidos como antagonistas.
PRINCIPAIS TEORIAS SOCIOLGICAS PARA ANLISE DA SOCIEDADE CONTEMPORNEA
AS TEORIAS CLSSICAS
A sociologia enquanto herdeira das tradies
filosficas conservou antinomias clssicas
desta matriz epistemolgica. Em particu-
lar, as oposies tradicionais entre idealis-
mo e materialismo, sujeito e objeto. mile
Durkheim e Karl Marx, apesar de apresenta-
rem diferenas substanciais em seus corpos
tericos, compartilham a abordagem coleti-
vista, destacando a estrutura como a unida-
de de anlise por excelncia.
Em contraposio a esse pressuposto coletivista, encontram-se
os autores que privilegiam como unidade de suas anlises as
aes subjetivas de atores individuais, pois para este grupo,
aqui representado por Weber e Simmel, a realidade individual
que compe e d sentido realidade social.
Figura 5Fonte: http://sociologiaemrede.ning.com/
FILOSOFIA32
Enfoque coletivista
A sociologia de mile Durkheim
O arcabouo metodolgico desse autor tem como unidade de
anlise as estruturas sociais. A viso de Durkheim sobre o objeto
e mtodo da sociologia foi moldada pelo pensamento positivista
francs remontando, principalmente, a Comte e Saint-Simon.
mile duRkheim
Nascimento 15 de abril de 1858
Falecimento 15 de novembro de 1917Paris, Frana
Nacionalidade FrancsOcupao Acadmico, socilogo, antroplogo, filsofo
Seu objetivo, segundo Giddens (1999), era encontrar uma resposta
aos perturbadores efeitos da vitria alem sobre a Frana em
1870-1871. A Revoluo do sculo XVIII, da qual os eventos de
1870-71 foram consequncia, acabou com o Antigo Regime, e
estabeleceu a sociedade liberal, burguesa, trazendo com ela
problemas polticos e sociais de ordem geral, que se tornaram
crnicos. O grande problema teria sido o fato da Revoluo
Francesa no ter estabelecido uma sociedade burguesa ideal,
isto , a combinao de democracia poltica com hegemonia de
uma classe capitalista dominante. Em funo disso, a histria
francesa foi caracterizada por ciclos de revoluo e restaurao,
permanecendo sempre elementos conservadores. Esse fato
marcou o pensamento durkheimiano, que se entregou no ao
problema da ordem em geral, mas de uma autoridade adequada
para a sociedade industrial moderna.
Figura 6 - mile DurkheimFonte: http://1.bp.blogspot.com/_iFoS7IfVMsg/SInoEBvZQFI/AAAAAAAAALk/-1W1jfexDM8/s400/durkheim.jpg
Saint Simon
Claude-Henri De Rouvroy, Con-de de Saint-Simon (nascido a 17 de outubro de 1760 e falecido a 19 de maio 1825, em Paris), foi um dos fundadores do cha-mado socialismo utpico. Foi um importante terico social francs que escreveu a obra Nouveau Christianisme, na qual proclamou uma fraternidade do homem que deve acompa-nhar a organizao cientfica da indstria e da sociedade. (http://www.cobra.pages.nom.br/fmp-saint-simon.html) e (Martins, 1994).
SOCIOLOGIA GERAL | UNIDADE 3 33
Durkheim aponta os fatos sociais, como o objeto de anlise, em
sua obra As Regras do Mtodo Sociolgico (1895). Esses fatos
teriam que ser definidos objetivamente, eles no poderiam
ser confundidos com os demais fatos, que caberiam a outras
cincias investigarem. Os fatos sociais que serviam de objeto
para a sociologia eram percebidos atravs de sinais exteriores,
ou seja, eles se manifestavam por meio de coisas concretas,
e teriam que ser tratados como tais. Para Durkheim os fatos
sociais so aspectos da vida social que moldam as nossas aes
enquanto indivduos.
Deste modo, o autor define fato social como manifestao de
algum fenmeno, preponderantemente coletivo, coercitivo e
exterior aos indivduos. Nesta concepo o fato social algo que
est alm do individual e acima da psicologia (entenda psicologia
como estudo individual da mente humana). Assim, o fato social
dotado de vida prpria, independente da vontade individual dos
membros da sociedade:
[...] consistem em maneiras de agir, de pensar e de sentir, exteriores ao indivduo e que so dota-das de um poder de coero em virtude do qual esses fatos se impem a ele. Por conseguinte, eles no poderiam se confundir com os fenmenos orgnicos, j que consistem em representaes e em aes; nem com os fenmenos psquicos, os quais s tm existncia na conscincia individual e atravs dela. Esses fatos constituem, portanto, uma espcie nova, e a eles que devem ser dada e reservada a qualificao de sociais (DURKHEIM, 1999, p.3-4)
esClaReCendo o ConCeito
Durkheim elenca trs caractersticas bsicas e indispensveis para
um fenmeno ser classificado enquanto fato social:
Coero externa: significa que todo fato social, para ser fato social, tem que coagir o indivduo caso ele queira ir de encontro determinao do fato. Essa coero pode ser violenta ou no, s simblica, mas que incomode, que constranja o indivduo;
Generalidade do fato: o fato deve atingir a todos, sem exceo, conforme a sua regra; e, alm disso, produto da prpria
FILOSOFIA34
coletividade. Assim, deve ser entendido como manifestao de uma totalidade social: conscincia coletiva e representaes coletivas. O fato social pblico (Durkheim, 1999);
Autnomo vontade do indivduo: o fato independe da vontade do indivduo, este tem que se submeter, uma vez que a sociedade (este ser formado por todos os indivduos, mas que vai muito alm destes) est acima dele, pois:
[...] esse fenmeno um estado do grupo, que se repete nos indivduos porque se impem a ele. Ele est em cada parte porque est no todo, o que diferente de estar no todo por estar nas partes (DURKHEIN, 1999, P.9).
Para tentar comprovar essas trs caractersticas dos fatos sociais,
segundo Durkheim:
Basta observar a maneira como so educadas as crianas. Quando reparamos nos fatos tais como so e como sempre foram, salta aos olhos que
Reconhecendo um fato social: a moda
Cada um se veste de uma maneira, num determinado momento, porque todos se vestem dessa forma. No um indivduo que origina a moda, mas a sociedade que, partindo de vrios pontos, constri um modo determinado de vestimenta, que varia conforme sexo, idade etc.
Caso queiramos ir contra o padro estabelecido, sofreremos coero direta e/ou indireta. Basta no estarmos vestidos da forma que foi designada como adequada para adentrarmos em determinados ambientes que somos prontamente barrados, como por exemplo, no podemos entrar em nenhuma repartio pblica com trajes de banho.
Em outros casos a coero indireta, atravs de olhares recriminadores, risos etc. Mesmo no tendo uma proibio expressa, na nossa sociedade, homem no usa vestido e caso algum queira experimentar essa coero social, basta sair rua trajando o referido vestido que, certamente, logo sentir os olhares, os cochichos e rizinhos que, no mnimo, incomodaro.
SOCIOLOGIA GERAL | UNIDADE 3 35
toda educao consiste num esforo contnuo para impor criana maneiras de ver, de sentir e de agir as quais ela no teria chegado espontaneamente. Desde os primeiros tempos de sua vida a coagimos a comer, dormir e a beber a horas regulares. Coagimo-la limpeza, calma, obedincia; mais tarde, coagimo-la a ter em conta os outros, a respeitar os usos, as convenincias, a trabalhar etc. etc. Se, com o tempo essa coao deixa de ser sentida porque fez nascer hbitos e tendncias internas [...] (internalizao das regras sociais) (DURKHEIM, 1978, p.89, grifo nosso).
fatos enquanto maneiRa de seR e de agiR
Os fatos sociais se manifestam, como no exemplo supracitado, nas
maneiras de fazer em cada sociedade, mas no se restringem a
isso, pois se manifestam tambm como maneiras de ser coletivas
(DURKHEIM, 1978).
Os fatos sociais, enquanto maneiras de agir, podem ser menos
consolidados, mais fluidos. Nesse caso, temos as chamadas cor-
rentes sociais, movimentos coletivos ou correntes de opinio que
nos impelem com intensidade desigual, segundo pocas e lugares,
a agirmos de determinadas maneiras. Exemplos desses fatos so
as correntes para casamento, suicdio, aumento da natalidade ou
sua reduo etc. Essas correntes variam conforme mudanas nos
contextos scio-histricos.
Os fatos sociais, enquanto maneiras de ser, tm uma forma j cris-
talizada na sociedade. Nesse caso temos as regras jurdicas, mo-
rais, os dogmas religiosos e sistemas financeiros, o sentido das vias
de comunicao etc. Exemplos desse tipo de fato social so os mo-
dos de circulao de pessoas e mercadorias, as formas de comuni-
car, de negociar, de expressar louvor etc.
exemPlifiCando
Nos anos de 1980 surgiu no mundo a AIDS. Esta doena foi aos
poucos impondo mudanas nas maneiras de agir nas relaes
sexuais, isto , a adoo do uso de preservativo tornou-se um
FILOSOFIA36
imperativo inquestionvel, uma vez que a cincia comprovou que
a nica forma de preveno da doena nas relaes sexuais
recorrer ao uso do preservativo. Mas essa mudana, j consolidada
no padro de comportamento das pessoa, ainda no foi aceita
pelos dogmas da religio catlica. Esta ainda condena qualquer
mtodo anticoncepcional, incluindo o uso do preservativo.
o mtodo RegRas Relativas oBseRvao dos fatos soCiais
A investigao dos fatos sociais deve seguir os passos j determina-
dos pelas cincias naturais, embora Durkheim reconhea a particu-
laridade do objeto das cincias sociais. Assim, o autor sugere como
a primeira regra e mais fundamental: considerar os fatos sociais
como coisas, e esclarece:
No dissemos que os fatos sociais so coisas materiais, e sim que so coisas tanto quanto as coisas materiais, embora de outra maneira. O que vem a ser coisa? A coisa ope a ideia assim como o que se conhece a partir de fora se ope ao que se conhece a partir de dentro. coisa todo objeto do conhecimento que no penetrvel inteligncia, tudo aquilo que no podemos fazer uma noo adequada, por simples procedimento de anlise mental.[...] Tratar os fatos de uma certa ordem como coisas no , portanto, classific-los nesta ou naquela categoria do real; observar diante deles uma certa atitude mental (DURKHEIM, 1999, p. XVII).
Destarte, os fatos sociais so objetos cientficos, pois se materia-
lizam, ou seja, so verificveis. Esta caracterstica separa a socio-
logia da filosofia, pois a primeira trata de um objeto verificvel e
a segunda toma as ideias como objeto de estudo. Por outro lado, a
sociologia tambm se preocupa com o que se conhece a partir de
fora (social), diferindo-se da psicologia que estuda fenmenos que
se conhece a partir de dentro (internos ao indivduo).
A segunda regra que corolrio da anterior consiste em: descartar
sistematicamente todas as pr-noes e os preconceitos que
nos paralisam quando pretendemos conhecer os fatos sociais
cientificamente. Tambm porque as coisas so tudo o que nos
dado, tudo o que se oferece (ou se impe) nossa observao,
SOCIOLOGIA GERAL | UNIDADE 3 37
algo exterior a ns. Mas esta regra no ensina ao socilogo como
este deve apoderar-se dos fatos para proceder um estudo objetivo
(DURKHEIM, 1999, p. 35).
Para tanto, o socilogo deve definir e classificar o conjunto de
fenmenos que pretende estudar, isto :
[...] definir aquilo que ir tratar para que todos saibam, incluindo ele prprio, o que est em cau-sa. Esta a primeira e mais indispensvel das con-dies para o estabelecimento de qualquer prova e de qualquer verificao (DURKHEIM, 1999, p.35).
Para cada categoria de fatos sociais s h uma nica causa, por-
tanto, uma nica explicao. Explicar um fenmeno social, para
Durkheim, procurar sua causa eficiente, identificar o fenme-
no antecedente que o produziu. Depois de achar a causa, pode-se
procurar descobrir a funo desse fenmeno na sociedade, a sua
utilidade. Se, por ventura, h vrias causas para um fenmeno, h
vrios tipos desses fenmenos.
As causas dos fenmenos sociais devem ser procuradas no meio
social, no qual eles esto acontecendo, no devem ser procuradas,
por exemplo, no passado, como a Histria faz. Para se verificar se
um fenmeno causa de outro, deve-se comparar os casos e veri-
ficar as diferentes combinaes de circunstncias que revelam que
um depende do outro: o social s pode ser explicado pelo social
(DURKHEIM, 2003, p. 112.).
aPliCao do mtodo: o estudo sobre o suicdio
Segundo Durkheim, existe para cada grupo social uma tendncia
especfica para o suicdio, que no explicada nem pela constitui-
o orgnico-psquica dos indivduos nem pela natureza do meio
fsico. Com essa constatao, ele atribui como causa fatores sociais
e, assim sendo, constitui-se enquanto um fenmeno coletivo.
De acordo com Durkheim, os indivduos tm certo nvel de inte-
grao com os seus grupos, o que ele chama de integrao social.
Nveis anormalmente baixos ou altos de integrao social poderiam
resultar num aumento das taxas de suicdio.
O Suicdio, obra escrita em 1897, considerada
modelo de pesquisa social na qual o mtodo central utilizado o uso da esta-tstica como instrumento de anlise de fenmenos
sociolgicos.
FILOSOFIA38
Os nveis baixos afetam porque a baixa integrao social, sendo
resultado de uma sociedade desorganizada, leva os indivduos a se
voltarem para o suicdio como uma ltima alternativa, ou ainda,
porque os indivduos no possuem laos sociais (vnculos sociais)
que os impeam de atentar contra sua prpria vida. Os nveis al-
tos afetam na medida em que as pessoas preferem destruir a si
prprias a viverem sob grande controle da sociedade, ou ainda,
suicidam-se para manterem um ideal coletivo ou o bem comum de
um grupo social.
Partindo da ideia de que um efeito (sinal exterior) s pode ser
fruto de uma nica causa, Durkheim comparou taxas de suicdio
e chegou concluso que havia vrios tipos de suicdio. Concluiu
tambm que estes tinham como fonte geradora causas diferen-
tes, uma vez que um mesmo antecedente (causa) no pode pro-
duzir consequncias diferentes. Portanto, para classificar os tipos
de suicdio, procurou identificar e classificar as condies sociais
(causas) que levaram aos suicdios. Com isso, classificou quatro
tipos de suicdios:
1. Suicdio anmico: a anomia um estado onde existe uma fraca
regulao social entre as normas da sociedade e o indivduo, mais
frequentemente trazidas por mudanas dramticas nas circuns-
tncias econmicas e/ou sociais. Este tipo de suicdio acontece
quando as normas sociais e leis que governam a sociedade no cor-
respondem com os objetivos de vida do indivduo, uma vez que o
indivduo no se identifica com as normas da sociedade, o suicdio
passa a ser uma alternativa de escape.
2. Suicdio fatalista: o fatalismo o estado oposto anomia, onde
a regulao social completamente instilada no indivduo; no h
esperana de mudana contra a disciplina opressiva da sociedade.
A nica forma de o indivduo ficar livre de tal estado cometer
suicdio. Durkheim viu esta razo nos escravos que cometeram sui-
cdio na antiguidade, mas viu uma relevncia mnima na sociedade
moderna.
3. Suicdio egosta: o egosmo um estado onde os laos entre o
indivduo e os outros na sociedade so fracos. Estando o indivduo
fracamente ligado sociedade, terminar sua vida ter pouco im-
SOCIOLOGIA GERAL | UNIDADE 3 39
pacto no resto da sociedade. Em outras palavras, existem poucos
laos sociais para impedir que o indivduo se mate. Esta foi a causa
vista por Durkheim entre divorciados e homens solteiros, que ten-
dem ao suicdio mais que os homens casados, uma vez que o casa-
mento para os homens gera laos sociais mais estveis e na intensi-
dade ideal; no os oprime da mesma forma como s mulheres, por
isso, para estas a relao inversamente proporcional.
4. Suicdio altrusta: o altrusmo o oposto do egosmo, onde um
indivduo est extremamente ligado sociedade, de forma que no
tem vida prpria. Indivduos que cometem suicdio baseados no al-
trusmo morrem porque acreditam que sua morte pode trazer uma
espcie de benefcio para a sociedade. Em outras palavras, quando
um indivduo est to fortemente ligado sociedade, ele cometer
suicdio independentemente de sua prpria hesitao se as normas
da sociedade o levarem a tal.
Durkheim viu isto ocorrer de duas formas diferentes:
a. quando os indivduos se veem sem utilidade para a sua socieda-de, tornando-se um peso para a mesma, eles preferem cometer suicdio, como em algumas sociedades indgenas;
b. quando os indivduos veem o seu mundo social (com seus ideais e crenas) mais importante do que a sua prpria existncia in-dividual, sacrificam a si prprios em defesa do mesmo, como os homens-bomba.
estado noRmal e PatolgiCo
Durkheim analisa a sociedade em duas perspectivas: um estado
normal e um estado anmico ou patolgico. Para definir um estado
de normalidade social, basta compreender que as relaes sociais
esto se reafirmando com os fatos sociais e acontecimentos mais
especficos. Como exemplo: o prprio suicdio altrusta que, em
certas sociedades, como a japonesa, refora a tradio social mi-
lenar do suicdio ritual.
J o patolgico pode ser exemplificado pelo suicdio egosta, pois
esse tipo de suicdio desencadeado pela perda de referncias e
desintegrao das relaes sociais. Neste caso, o suicdio no
FILOSOFIA40
fator de reforo da coeso e conscincia coletiva, mas sim de es-
facelamento destas.
duRkheim e o PRinCPio da integRao soCial
A integrao social ou coeso social a questo central que norteia
todo o pensamento sociolgico de Durkheim. Ele tinha por preten-
so encontrar a resposta de como a sociedade possvel. Em ou-
tros termos, como pode uma coleo de indivduos constituir uma
sociedade?
Durkheim marca o estudo da integrao social por meio da noo
de solidariedade, e a relao indivduo/sociedade por meio da no-
o de conscincia coletiva.
Para Durkheim, a solidariedade garante a coeso social, e, portan-
to, garante a sociedade. Ele distinguiu duas formas de solidarie-
dade: a solidariedade por semelhana, chamada de mecnica e a
solidariedade por diferenciao, chamada de orgnica. Essas duas
formas de solidariedade ocorrem conforme o tipo de organizao
social.
Solidariedade mecnica: este tipo de solidariedade acontece nas
sociedades tradicionais baseadas em laos por semelhana e pa-
rentesco, isto , nas sociedades em que os indivduos diferem pou-
co uns dos outros. A sociedade tem coeso porque seus membros
tm os mesmos sentimentos, os mesmos valores, reconhecem os
mesmos objetos como sagrados, os sentimentos so coletivos. Esse
tipo de solidariedade caracterstica das sociedades tidas como
simples ou primitivas, nas quais no h uma complexa diviso do
trabalho, os indivduos so intercambiveis.
Solidariedade orgnica: esta a forma de agregao caracterstica
da diviso social do trabalho. O termo orgnico est referindo-se
a um rgo composto por partes especializadas que se agregam
por meio da diferena de funes e objetivos comuns, sendo todos
indispensveis vida. Esta forma de solidariedade a dita racio-
nalizao pela diviso do trabalho na cidade, na fbrica e na vida
social. Impera, portanto, nas sociedades modernas, industriais.
SOCIOLOGIA GERAL | UNIDADE 3 41
A relao entre indivduo e sociedade marcada pela solidariedade,
segundo Durkheim, caracterizada pela supremacia da sociedade,
atravs da noo de conscincia coletiva que :
O conjunto das crenas e dos sentimentos comuns mdia dos membros de uma sociedade forma um sistema determinado que tem vida prpria; [...] ela independente das condies particulares em que os indivduos se encontram: eles passam, ela permanece. [...] ela no muda a cada gerao, mas liga umas s outras as geraes sucessivas. Ela , pois, bem diferente das conscincias particulares, conquanto s seja realizada nos indivduos (DURKHEIM, 1999, P. 50).
A conscincia coletiva comporta fora de maior ou menor extenso,
de acordo com o tipo de sociedade. Nas sociedades mais simples,
dominadas pela solidariedade mecnica, a conscincia coletiva
abrange a maior parte das conscincias individuais com seus
imperativos e proibies sociais. A fora desta conscincia coletiva
nessas sociedades extrema, manifestada pelo rigor dos castigos
impostos aos que violam as proibies sociais. Quanto mais forte
a conscincia coletiva, maior a indignao com o crime, isto ,
contra a violao do imperativo social. Segundo Durkheim, nas
sociedades modernas, nas quais reina a solidariedade orgnica,
haveria uma reduo da extenso da conscincia coletiva, bem
como um enfraquecimento das reaes coletivas contra a violao
das proibies e, sobretudo, haveria uma margem maior na
interpretao individual dos imperativos sociais. Os indivduos, em
muitas circunstncias, teriam a liberdade de crer, de querer e de
agir conforme suas preferncias.
Durkheim para chegar solidariedade como o elemento de coeso so-
cial, recorreu questo do direito (enquanto regras morais) como seu
sinal exterior, tendo em vista que a solidariedade no algo objetivo,
concreto, palpvel; abstrato, apenas seus efeitos so observados
e sentidos. Considerando que h duas formas de solidariedade que
variam conforme o tipo de sociedade, este autor classificou dois tipos
de direito, o direito repressivo e o direito restitutivo.
O direito repressivo (penal) impera na solidariedade mecnica,
pois o elo de solidariedade ao qual ele corresponde aquele cuja
ruptura se constitui o crime (todo ato que implica ao seu agente
FILOSOFIA42
uma reao chamada pena), na medida em que ofende a consci-
ncia moral do grupo ao qual se refere (ofende as conscincias de
cada membro), podendo abal-la ameaando a coeso social, com-
prometendo a prpria sociedade. necessrio, portanto, que seja
repreendido para a salvaguarda do grupo.
O direito restitutivo (civil, processual, comercial etc.) impera nas
sociedades em que a diviso social do trabalho complexa, ou
seja, na sociedade industrial, onde a coeso social estabelecida
pela solidariedade orgnica. Neste tipo de sociedade, o delito no
fere a conscincia coletiva, o agente apenas deixa de cumprir uma
funo determinada pela sociedade e assumida por ele, logo a re-
ao ao seu ato de restituir o que foi acordado.
Segundo Durkheim, os fatos sociais tm vida prpria.
Como a diviso do trabalho, segundo Durkheim, pode desencadear
a integrao social nas sociedades modernas?
Estabelea a relao entre conscincia coletiva e conscincia
individual, apontada por Durkheim.
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SOCIOLOGIA GERAL | UNIDADE 3 43
A VILA (2004)
SinopSe: em 1897 uma vila PaReCe seR o loCal ideal PaRa viveR: tRanquila, isolada e Com os moRadoRes vivendo em haRmonia. PoRm, este loCal PeR-
feito Passa PoR mudanas quando os haBitantes desCoBRem que o Bosque
que o CeRCam esConde uma Raa de misteRiosas e PeRigosas CRiatuRas, PoR
eles Chamados de aquelas de quem no falamos. o medo de seR a PRxi-
ma vtima destas CRiatuRas faz Com que nenhum haBitante da vila se aRRis-
que a entRaR no Bosque. aPesaR dos Constantes avisos de edWaRd WalkeR
(William huRt), o ldeR loCal, e de sua me (sigouRney WeaveR), o Jovem
luCius hunt (Joaquin Phoenix) tem um gRande deseJo de ultRaPassaR os
limites da vida Rumo ao desConheCido. luCius aPaixonado PoR ivy WalkeR
(BRyCe dallas hoWaRd), uma Jovem Cega que tamBm atRai a ateno do
desequiliBRado noah PeRCy (adRien BRody). o amoR de noah teRmina PoR
ColoCaR a vida de ivy em PeRigo, fazendo Com que veRdades seJam Revela-
das e o Caos tome Conta da vila. (httP://WWW.adoRoCinema.Com/filmes/
temPos-modeRnos/)
Direo: m. night shyamalan
Gnero: susPense
elenco: BRyCe dallas hoWaRd , Joaquin Phoenix , adRien BRody , William huRt, sigouRney WeaveR.
A sociologia de Karl Marx (1818 - 1883)
Nascimento 5 de maio de 1818
Falecimento 14 de maro de 1883Londres, Inglaterra
Nacionalidade AlemoOcupao Economista, filsofo, historiador, terico po-
ltico e jornalista
O interesse de Marx em estudar as leis do movimento capitalista
como um sistema econmico pode ter advindo, como sugere
Giddens (1998), do fracasso dos levantes ocorridos na Alemanha
em 1848, contra a estrutura econmica e social tradicional
Figura 7 - Karl MarxFonte: http://utilika.org/pubs/etc/aa/talk/marx.jpg
FILOSOFIA44
reinante. Quando comparada aos pases capitalistas avanados, a
Alemanha apresentava um atraso em termos de desenvolvimento
econmico e um baixo grau de liberalizao poltica. Era governada
pela aristocracia fundiria, sob o poder econmico dos Junker, a
burguesia nascente no detinha nenhum poder. Mas, em face s
correntes de mudana poltica que vinham ocorrendo na Europa
desde a Revoluo Francesa, os intelectuais da poca acreditavam
que estas mudanas no tardariam a atingir a Alemanha.
Imbudo nessa esperana, Marx teria comeado seus escritos como
uma antecipao da revoluo alem. Ao pens-la, considerando o
atraso alemo na sua estrutura poltica e econmica, como sugere
Giddens, Marx teria problematizado o papel do proletariado na his-
tria. Devido a essa particularidade da Alemanha frente aos outros
pases, a emancipao s poderia ocorrer de forma radical, sendo
fruto direto do proletariado:
[...] uma classe que a dissoluo de todas as classes, uma esfera da sociedade que tem um carter universal porque os seus males so univer-sais (GIDDENS apud MARX, 1998, p. 78).
Mas parece que Marx no teria prestado ateno ao fato de que
o proletariado, na Alemanha, ainda se encontrava em formao.
Consciente disso, em 1847, como sugere Giddens (1998), ele teria
reformulado, para este momento, o ator da histria. Assim, a re-
voluo iminente na Alemanha seria uma revoluo burguesa, logo
seguida da revoluo proletria. Mas a inoperncia dessa burguesia
em busca do poder e sua disposio para desperdiar suas poucas
foras em conflitos prematuros com o proletariado, j indicavam o
desfecho desse contexto, isto , o fracasso dos levantes de 1848.
Esse fracasso serviu para minar o otimismo de Marx, dos peque-
nos grupos socialistas e tambm dos liberais, que foram coagidos a
aceitar medidas que apenas criavam a iluso de democracia parla-
mentar, continuando, assim, o poder tradicional.
Esses eventos marcaram a vida de Marx e despertaram o seu inte-
resse em entender e explicar a lgica desse novo sistema, o sistema
capitalista que, na Alemanha, se instalou por meio de um processo
totalmente diferente do ocorrido nos outros pases europeus, como
sinteticamente acabamos de mostrar.
SOCIOLOGIA GERAL | UNIDADE 3 45
influnCias soBRe o Pensamento de kaRl maRx
Marx, para analisar o sistema capitalista rompeu com o pensa-
mento dominante na poca, particularmente com os economistas
clssicos e os neo-hegelianos. Ele apresentou, efetivamente, a sua
metodologia nas obras A Ideologia Alem (1845-46) e Para a crtica
da economia poltica (1859).
Marx, segundo Giddens (1998), comeou seu desenvolvimento in-
telectual a partir da perspectiva da crtica da religio, derivada
da radicalizao de Hegel. em A Ideologia Alem que Marx de-
senvolve essa crtica, travando um dilogo irnico com os neo-
hegelianos, tratando com respeito apenas Feuerbach.
Para Marx o problema central do idealismo hegeliano estava no do-
mnio do pensamento sobre o mundo real, uma vez que para Hegel
era o mundo das ideias, pensamentos e conceitos que produziam,
determinavam e dominavam o mundo real dos homens. Essa viso
era uma contraposio ao pensamento kantiano, que defendia o
pressuposto de que o conhecimento se d pela aparncia do fen-
meno apreendido pelos dos rgos do sentido.
Os novos hegelianos, em especial, F. Strauss, Max Stirner, Bruno
Bauer e Feuerbach perceberam esse problema, mas no consegui-
ram superar o sistema hegeliano por acharem que bastaria criticar
apenas um aspecto dessa filosofia, em vez de critic-la em seu
conjunto. Pautados nessa concepo, cada um deles tomou um as-
pecto da realidade e o converteu numa ideia universal, passando
a deduzir todo o real a partir desse aspecto idealizado. Esse exer-
ccio dar-se-ia pela substituio da conscincia dominante, que
continha os verdadeiros grilhes dos homens, por uma conscincia
nova revelada pelos filsofos.
Feuerbach apresentava particularidades em relao a esse grupo.
Ele teria ido mais longe na crtica ao sistema hegeliano. Sua
filosofia assentava-se numa reverso ao idealismo de Hegel, a
partir da elaborao de uma prpria verso do materialismo. Para
Feuerbach, homem tinha que ser o homem real vivendo em um
mundo material real e no um Esprito Absoluto tratado por Hegel.
A aplicao de sua teoria se deu na anlise da religio, atravs da
Os economistas clssicos representados principal-mente por Adam Smith,
David Ricardo, John Stuart Mill, entre outros,
compuseram a primei-ra escola moderna de
pensamento econmico, denominada de Econo-mia Clssica. A obra A
Riqueza das Naes de Adam Smith geralmen-te aceita como o marco
inaugural do pensamento econmico clssico. Seus
conceitos giram em torno da noo bsica de que os mercados tendem a
encontrar um equilbrio econmico a longo prazo,
ajustando-se a determi-nadas mudanas no cen-
rio econmico (http://pt.wikipedia.org/wiki/
Economia#Economia_cl.C3.A1ssica).
FILOSOFIA46
demonstrao de que o divino era um produto ilusrio do real, que
Deus era uma projeo idealizada da humanidade. Dessa forma,
a religio era uma representao simblica das aspiraes do
homem, era, em ltima instncia, uma alienao. Feuerbach,
conclui que bastaria desmistificar a religio, colocando-a em um
nvel racional, para eliminar a autoalienao.
Marx critica essa leitura, ao afirmar que Feuerbach pecou em fa-
lar de um homem em abstrato, pois, para ele, o homem um ser
histrico que se faz diferentemente em condies histricas dife-
rentes. Com essa viso, Marx elimina a noo de uma essncia
humana. Alm disso, a alienao religiosa era apenas um efeito de
outra anterior, segundo Marx, que a alienao do trabalho, esta
alienao que est na base de todas as outras. Defende ainda que
o principal no interpretar o mundo, mas transform-lo (XI Tese).
A crtica aos economistas clssicos devia-se, sobretudo, ao fato
destes aplicarem categorias relativas ao capitalismo em seus estu-
dos sobre perodos anteriores e criticava tambm a adoo de re-
presentaes idealizadas sobre a realidade objetiva, como ponto
de partida no processo de investigao. A populao, por exemplo,
no poderia funcionar como a referncia inicial da investigao
(sugerida pelos economistas clssicos), pois uma representao
catica do todo e, se submetida a um processo de anlise, produ-
ziria conceitos e abstraes simplificados.
Assim, Marx, como um intelectual da prtica revolucionria, abo-
mina a separao entre a produo das ideias e as condies sociais
e histricas nas quais essas ideias so produzidas, e seria nesse
movimento de separao que se constitui a ideologia, no sentido
marxista, isto , falseamento da realidade. A inteno prtica ou
de um projeto transformador perpassa todo o pensamento deste
autor. Para ele, a produo de um conhecimento puro, no sentido
de construo de categorias atemporais com validade universal,
no passava de abstraes inexpressivas e vazias, o pensar neces-
sariamente tem que estar relacionado historicamente.
O termo ideologia foi criado por Destutt de Tracycom significando cincia das ideias. Posteriormente, esta palavra ganharia um sentido pejorativo quando Napoleo chamou De Tracy e seus seguidores de idelogos no sentido de deformadores da realidade. No entanto, os pensadores da antiguidade clssica e da Idade Mdia j entendiam ideologia como o conjunto de ideias e opinies de uma sociedade. Karl Marx e Friedrich Engels na obra A Ideologia Alem concebem a mesma como uma cons-cincia falsa, proveniente da diviso entre o trabalho manual e o intelectual. Nessa diviso, surgiriam os idelogos ou intelectuais que passariam a operar em favor da dominao ocorri-da entre as classes sociais, por meio de idias capazes de deformar a compreen-so sobre o modo como se processam as relaes de produo. Neste senti-do, a ideologia (enquanto falsa conscincia) geraria a inverso ou a camuflagem da realidade, para os ideais ou interesses da classe domi-nante (http://pt.wikipedia.org/wiki/Ideologia).
SOCIOLOGIA GERAL | UNIDADE 3 47
oBJeto de estudo
Visando o pressuposto da transformao da realidade Marx define
como objeto de estudo as estruturas sociais, enquanto as relaes
de produo que estruturam classes sociais em conflito e distribuem
desigualmente o poder na sociedade (PRATES, 1991, p. 22). Para
ele, a compreenso do processo histrico est condicionada
compreenso da estrutura das sociedades, das foras de produo
e das relaes de produo, e no adotando como ponto de
partida as interpretaes do modo de pensar dos homens. Tais
relaes so necessrias e independentes da vontade dos homens.
So necessrias porque garantem a manuteno e a reproduo
dos homens e, consequentemente, da prpria sociedade.
O conjunto dessas relaes de produo constitui a estrutura
econmica da sociedade, a base concreta sobre a qual se ergue
a superestrutura jurdica e poltica e qual correspondem formas
de conscincias sociais determinadas. O modo de produo da
vida material condiciona o processo de vida social, poltica e
intelectual geral (Prates, 1991, p.167).
a anlise da soCiedade e PRinCiPais ConCeitos maRxistas
Marx afirmou que toda sociedade formada por dois nveis de es-
truturas distintas: a base econmica, chamada de infraestrutura,
e a superestrutura.
A Infraestrutura constituda essencialmente pelas foras e pelas
relaes de produo (pelo conjunto do equipamento tcnico e pela
organizao do trabalho utilizados no processo produtivo, bem como
pela forma da distribuio dos meios de produo e do produto);
A superestrutura constituda pelas instituies jurdicas e polti-
cas, como tambm pelos modos de pensar, pelas ideologias e filo-
sofias, que vo expressar os interesses dos que dominam o sistema
econmico, uma vez que, segundo Marx:
[...] a estrutura social e o Estado resultam con-stantemente do processo vital de indivduos deter-minados; mas no resultam daquilo que esses in-
FILOSOFIA48
divduos aparentam perante si mesmos ou perante outros e sim daquilo que so na realidade, isto , como trabalham e produzem materialmente (QUIN-TANEIRO apud MARX, 2002, p. 36).
Porque na produo da vida, os homens criam no s os produtos
materiais, mas tambm as suas representaes, ideias, sistemas
legais, processos educacionais etc.
Esta anlise da sociedade centrada no funcionamento e desenvol-
vimento do sistema econmico est pautada na Teoria Materialista
da Histria, expressa no conceito de modo de produo, o qual
variar conforme as formas e as relaes de produo adotadas
no decorrer da histria, que moldaram o desenvolvimento da vida
social, poltica e intelectual.
Para Marx, o motor do movimento histrico a contradio entre
as foras de produo (conjunto dos conhecimentos cientficos,
dos equipamentos tcnicos e da prpria organizao do trabalho)
empregadas pelos homens em cada momento da histria para a
obteno de bens necessrios para a sobrevivncia e as relaes
de produo (as relaes de propriedade e a distribuio da renda)
que expressam como os homens se organizam para produzir e
consumir essa produo em cada momento da histria.
Ordenamento jurdico,
ideologias, religio, crenas,
cultura
Estrutura econmica: relaes
de produo, relaes de
troca, meios de produo,
unidades de produo
Caractersticas sociais
SUPERESTRUTURA
INFRAESTRUTURA
Materialidade
A teoria marxista con-siderada materialista por compreender os modos de produo (relaes de pro-duo, processos produti-vos, tcnicas de produo, relaes de troca) como substrato material em que a histria acontece, em que a histria construda.
SOCIOLOGIA GERAL | UNIDADE 3 49
A contradio que caracteriza a sociedade capitalista dada pela
constante evoluo das foras produtivas, enquanto que as rela-
es de produo no se transformam no mesmo ritmo. Isso gera
uma segunda contradio ou dialtica, que , por um lado, o au-
mento cada vez maior de riqueza, e, por outro, o aumento da mi-
sria, uma vez que a riqueza gerada fica concentrada nas mos
dos proprietrios dos meios de produo e no distribuda entre
a burguesia e o proletariado, entre o capitalista e o trabalhador
(ARON, 2000, p. 131).
Assim, o carter contraditrio do capitalismo se manifesta no cres-
cimento dos meios de produo, que em vez de elevar o nvel de
vida dos trabalhadores, leva a um duplo processo de proletarizao
e pauperizao (ARON, 2000, p. 131).
Essa contradio entre aumento de riqueza e aumento de pauperi-
zao demarca a principal caracterstica da sociedade capitalista
que o seu antagonismo interno. Esse antagonismo, por sua vez,
vai se expressar no que ele denominou de luta de classes.
Para Marx, uma classe social um grupo que ocupa um lugar de-
terminado no processo de produo. Embora Marx reconhea que
existam grupos intermedirios (camponeses, artesos, profissionais
liberais etc), enfatiza que, na sociedade capitalista, encontra-se
um movimento de consolidao das relaes sociais em apenas (e
somente) duas classes: a que possui a propriedade dos meios de
produo e da organizao do trabalho, denominada por ele capi-
talista ou burguesia; e aquela que desprovida dos meios de pro-
duo, restando-lhe apenas a sua fora de trabalho, o proletariado
ou assalariado. Essas duas classes, segundo Marx, tendero atrair
para seu polo os outros grupos que compem a sociedade.
A luta de classes trabalhada por Marx na obra Manifesto Comunista
(1848) o fato mais importante da sociedade moderna, sendo
as classes os principais atores do drama histrico, na medida
em que o conflito existente entre elas relaciona-se diretamente
com a possibilidade da mudana social e, consequentemente,
com a superao das contradies existente. Esta mudana ser
desencadeada pela classe que se encontra em desvantagem, isto
, o proletariado. Mas, para que uma classe exista preciso que
FILOSOFIA50
haja uma tomada de conscincia da sua unidade e sentimento de
separao da outra classe social, haja vista que so, por princpio
antagnicas, com interesses divergentes. Em termos conceituais
preciso que a classe em si (membros de uma sociedade que
compartilham determinadas condies objetivas ou a mesma posio
no processo produtivo) se consolide enquanto uma classe para si
(classe organizada politicamente para defender conscientemente
seus interesses).
Essa tomada de conscincia, denominada por Marx de conscincia
de classe, um desdobramento da realidade social vivida, uma
vez que a realidade social que determina a conscincia dos ho-
mens e no o contrrio (oposio ao idealismo hegeliano). essa
conscincia de classe que leva formao de associaes polticas,
tais como sindicatos e partidos, que objetivam a unio solidria
entre seus membros, visando defender seus interesses (QUINTANEI-
RO, 2007, p. 44), e no caso do proletariado, visando, sobretudo,
combater seus exploradores. Cabe ressaltar que a burguesia j as-
sumira essa posio de desencadeadora da transformao (sistema
feudal para o capitalista).
Dessa forma, a sociologia de Marx uma anlise dialtica das rela-
es entre as foras produtivas materiais, os modos de produo,
os quadros sociais e a conscincia dos homens, logo uma anlise
pautada na determinao do todo social, na qual o ator principal
um ator coletivo, a classe.
Portanto, a concepo do capitalismo e da histria feita por Marx
est associada combinao dos conceitos de foras de produo,
relaes de produo, luta de classes, conscincia de classes, in-
fraestrutura e superestrutura.
E assim, Marx esboa as etapas da histria humana a partir
dos regimes econmicos, em seu termo a partir do modo de
produo (do tipo de relaes estabelecidas entre os homens que
trabalham), as quais seriam quatro, sendo as trs primeiras as que
se sucederam na histria ocidental: a antiga caracterizada pela
relao de escravido, a feudal pela servido e a burguesa pelo
assalariamento. Sendo esta o ltimo modo de produo, que se
constituiu a partir da subordinao dos trabalhadores por um grupo
SOCIOLOGIA GERAL | UNIDADE 3 51
detentor da propriedade dos meios de produo e do poder poltico,
que, seguindo a lei do desenvolvimento histrico ser sucedido,
por sua vez, pelo modo de produo socialista.
kaRl maRx: PRoduo e RePRoduo da vida mateRial
Para Marx, a essncia do capitalismo , antes de tudo, a busca pelo
lucro, ideia que ele desenvolver na sua obra principal denominada
O Capital. Mas, qual a origem do lucro?
Marx acreditava que a fonte do lucro estava no processo de pro-
duo e de troca (circulao) de mercadoria, entendida como a
unidade analtica mais simples e expresso mais elementar da ri-
queza da sociedade capitalista. Explica, tambm, como produto-
res e comerciantes lucram a partir da teoria do valor e da teoria
da mais-valia.
PRoCesso de ConstRuo do luCRo
Para Marx o lucro se concretiza na circulao da mercadoria que ,
na sua definio:
[...] um objeto externo, uma coisa que, por suas propriedades, satisfaz necessidades humanas, seja qual for a natureza, a origem delas, provenham do estmago ou da fantasia. No importa a maneira como a coisa satisfaz a necessidade humana, se diretamente, como meio de subsistncia, objeto de consumo, ou indiretamente, como meio de produo (MARX, 1998, p. 57).
A mercadoria carrega consigo um duplo valor relacionado quali-
dade e quantidade do bem. Esses valores so denominados de valor
de uso e valor de troca.
O valor de uso referente s caractersticas intrnsecas do bem,
relativas sua utilidade (o que desperta a demanda por ela). Assim,
o valor de uso de uma mercadoria importante para que ela seja
procurada no mercado, para que ela seja desejada, porm esse
valor difcil de ser quantificvel e varia conforme as pessoas, j
que os interesses e gostos so individuais.
O Capital um conjunto de livros (sendo o primeiro de1867, o nico publicado
por Karl Marx, os livros II e III foram publicados
postumamente por Engels a partir dos manuscri-
tos no terminados por Marx) que visa criticar o