MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE PIAUÍAgente de Transformação Social
Promotoria de Justiça de Jerumenha
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DA VARA ÚNICA DA
COMARCA DE JERUMENHA - PIAUÍ
“(...) Já é momento de o Poder Judiciário acabar com a
desfaçatez de alguns péssimos administradores. Não
se pode mais admitir que a ´Lei de Gérson´ (aquela de
sempre levar vantagem em tudo, mesmo que
indevidamente) ou que o ´jeitinho brasileiro´
prevaleçam sobre os princípios da legalidade,
impessoalidade, moralidade e economicidade na
Administração da coisa pública, sob pena de o Poder
Judiciário contribuir para o sentimento de
impunidade que assola o nosso País” (Trecho da
Ementa da Apelação Cível nº 1.0000.00.307816-9/000
do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, que teve como
Relatora a Desembargadora Maria Elza)
AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATOS DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA
C U M U L A D A C O M P E D I D O D E R E S S A R C I M E N T O A O E R Á R I O E
INDISPONIBILIDADE DOS BENS
O Ministério Público do Estado do Piauí, por meio do Promotor de Justiça,
no exercício de suas atribuições constitucionais e legais, vem, com fundamento nos
arts. 37, caput, e incisos V, e 129, inciso III, da Constituição Federal, artigo 25, inciso
IV, alínea b, da Lei n° 8.625/93, inciso IV, 2° e 5°, todos da Lei n/ 7.347/85 e outros
dispositivos de lei atinentes à matéria, vem, perante Vossa Excelência, propor a
presente, com pedido liminar de medida inaudita pars, em face de:
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE PIAUÍAgente de Transformação Social
Promotoria de Justiça de Jerumenha
ELVIRA BORGES DA MOTA ANDRADE, brasileira, casada, natural de Jerumenha,
nascida em 14/03/1962, flha de Benedito Ferreira da Mota e Amélia Boges da Mota,
R.G. 625.401 SSP-PI, CPF 398.038.213-34, endereço sito à Avenida Manuel Rosado,
233,Centro, Canavieira, Piauí;
JAELSON FRANCIS E SILVA AMORIM, brasileiro, casado, flho de Maria dos
Anjos Silva e Amorim e Jailson de Sousa Amorim, nascido em 23/12/1990, R.G.
2916.270 SSP-PI, CPF 040.337.693-80, residente na rua Francisco Urquiza Machado,
636, Floriano, Piauí;
RAYLAN MOREIRA DA FONSECA, brasileiro, casado, flho de Eliane Martins de
Araújo Fonseca, nacido em 17/12/1987, R.G. 50156683/PI, CPF 02279004305, residente
na rua Ondina Carvalho, 00122, bairro Irapuá II, Floriano, Piauí;
1. DO OBJETO DA PRESENTE AÇÃO
Tem por objeto a presente ação de improbidade administrativa condenar os
requeridos, a primeira, Prefeita do municipio de Canavieira, quando do exercício
fnanceiro de 2015, o segundo e terceiro requeridos, sócios/proprietários do
estabelecimento empresarial I-9 EMPREENDIMENTOS LTDA que auferiu R$
207.905,00 (duzentos e sete mil e novecentos e cinco reais), entre os periodos de
01/01/2015 e 30/06/2015, com prejuízo ao erário e violação aos princípios da
administração pública.
2. DOS DOCUMENTOS QUE ACOMPANHAM A INICIAL
Acompanham a inicial o procedimento preparatório 1.27.002.000309/2015-75
oriundo do Ministério Público Federal instaurado após representação de particular.
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE PIAUÍAgente de Transformação Social
Promotoria de Justiça de JerumenhaAlém deste há cópias dos processos licitatórios com indevida dispensa de
licitação, que causou o prejuizo ao erário de R$ 207.905,00 (duzentos e sete mil e
novecentos e cinco reais).
Segue em anexo, o procedimento ministerial com dois volumes, totalizando
322 páginas.
3.0 DOS ATOS DE IMPROBIDADE PRATICADOS PELOS REQUERIDOS
Conforme resta provado nos autos, a primeira requerida era Prefeita da
cidade de Canavieira -Piauí, mandato 2013-2016, quando dispensou de forma
irregular a concorrência para a prestação de serviços, com base em suposta urgência,
conforme documento de fs. 10 destes autos.
T a l urgência restou fabricada EM TODOS procedimentos licitatórios
constantes a partir de fs. 37.
A teratologia é tanta, não bastasse a urgência fabricada para a realização de
festas, numa cidade pobre como Canaviera, restou caracterizada que tal “urgência”
destinou-se a justifcar a contratação da empresa I9 Empreendimentos pertencente
ao segundo e terceiro requeridos.
Ressalte-se que o segundo requerido JAELSON FRANCIS E SILVA
AMORIM É CASADO com Uyra Jane Borges Mota Andrade, flha da primeira
requerida.
Às fs. 38/39 tem-se os expedientes da primeira requerida, Elvina Borges
Mota Andrade, acerca da necessidade de se contratar “empresa para fornecimento de
banda, apresentação de grupo musical com representação exclusiva para atender as
necessidades do municipio de canavieira na execução de evento cultural (festejos) do povoado
Campo grande deste municipio”. A empresa, por óbvio, pertece aos segundos
requeridos.
Também há contratação da empresa dos segundos requeridos para “prestação
de serviços de limpeza pública”, fs. 119.
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Promotoria de Justiça de Jerumenha Iniciou-se, a partir de fs. 40, vários processos administrativos de
inexigibilidade de licitação, todos acostados aos autos.
Em todos os processos licitatórios há “parecer jurídico”, fs. 41 e 56/57
avaliando como inexigível a licitação eis que a contratação de profssional de
qualquer setor artistico desde que consagrado pela crítica especializada ou pela
opinião pública.
Ao longos seis meses que a referida empresa restou benefciado junto ao
municipio foram contratados “artistas especializados” e “consagrados pela opinião
pública” como “Ilmar Sanfoneiro”, fs. 48, “Maurinho do Acordeon” e “Caninana
do Forró”, fs. 81.
O primeiro contrato haurido de tal processo administrativo encontra-se às fs.
45/47, com a mais diversas especifcidades possíveis: fornecimento de banda, fs. 45,
prestação de serviços de locação de som, banheiros quimicos, iluminação e camarim,
fs. 50.
Assim segue-se sucessivamente, ao longo de seis meses, com processos
administrativos montados, com urgência fabricada, como o contrato administrativo
080/2015, fs. 61, contrato 089/2015, fs., contrato 090/2015, fs. 50/57, contrato
034/2015, fs. 156/162, contrato 023/2015, fs 198/201.
Perceba-se que todos os objetos dos contratos mencionados NÃO SÃO
OBJETOS do OBJETIVO SOCIAL da empresa I9 EMPREENDIMENTOS,
conforme contrato social de fs. 189.
Ao longo dos meses de janeiro a junho de 2015 foram pagos R$ 207.905,00
(duzentos e sete mil, novecentos e cinco reais), conforme NOTAS EMPENHO de fs
27.
Há claro prejuizo ao erário e expressa violação aos principios regentes da
administração pública.
6.0 DO DIREITO
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE PIAUÍAgente de Transformação Social
Promotoria de Justiça de Jerumenha A probidade administrativa, considerada uma forma de moralidade
administrativa, consiste no dever de servir à Administração com honestidade,
procedendo no exercício das suas funções, sem aproveitar os poderes ou facilidades
deles decorrentes em proveito pessoal ou de outrem a quem queira favorecer .
(Marcelo Caetano, apud José Afonso da Silva, Curso de Direito Constitucional Positivo.
9ª ed., São Paulo: Malheiros, p. 571).
A Constituição Federal, considerando a gravidade dos atos de improbidade
administrativa, estabeleceu no seu art. 37, § 4º, severas sanções destinadas a impedir
e coibir condutas dessa natureza. Segundo o referido dispositivo legal os atos de
improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda
da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na
forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível.
Francisco Bilac Moreira Pinto, cujas lições ainda nos são úteis, comentou a Lei
3.502/58 – que, sob a égide da Constituição Federal de 1946, dispunha sobre as
sanções nos casos de enriquecimento ilícito nos cargos públicos -, e no capítulo
destinado a importância da ética no Estado Moderno assinalou que “a única espécie
de teoria que pode fornecer critérios e obrigações na esfera política - a esfera
primária do poder físico - será a que se baseie em um válido sistema de ética, cuja
observância constitua uma obrigação moral. (...) O uso do poder para atingir os fns
desejados torna legítimos todos os meios, quaisquer que sejam as circunstâncias, e
sua única limitação será a de um outro poder que se lhe anteponha (fazendo menção
à necessidade de um código de ética). (...)O abuso de poder deve ser temido pelos
homens e o poder exercido regularmente é a base da civilização. O Poder sem base
moral é o fagelo da humanidade. O Poder, fundado na moral, representa o maior
servidor da humanidade”. (Enriquecimento Ilícito no Exercício de Cargos Públicos. Rio de
Janeiro: Forense, 1960, pp. 65-68).
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Promotoria de Justiça de Jerumenha Atualmente a matéria é regida pela Lei nº 8.429/92, que reafrma os princípios
administrativos previstos no caput do art. 37 da CF e especifca os atos de
improbidade administrativa, cominando as sanções aplicáveis aos mesmos.
Segundo preceitua o art. 10 da 8429/92:
“Art.10. constitui ato de improbidade administrativa que
causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa
ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio,
apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens
ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei.”
No presente caso, fcaram explicitados os comportamentos deliberados dos
requeridos quanto a totalidade de condutas acima descritas, praticadas tanto na
modalidade comissiva quanto omissiva.
Fartamente comprovados os atos, especialmente pelas provas carreadas pelo
procedimentos licitatórios em anexo, COM URGÊNCIA FABRICADA PARA
BENEFICIAR O SEGUNDO REQUERIDO, GENRO DA PRIMEIRA
REQUERIDA, não se pode afastar o prejuízo ao erário decorrente da ilicitude
perpetrada pelos demandados.
Ocorreu, também, na presente hipótese, a incidência do artigo 11, caput da
Lei n. 8.429/92, segundo o qual constitui ato de improbidade administrativa que
atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que
viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às
instituições.
Aliado a tal norma, o art. 4º da Lei 8429/92 determina que os agentes públicos
de qualquer nível ou hierarquia são obrigados a velar pela estrita observância dos
princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade no trato dos
assuntos que lhe são afetos. Marino Pazzaglini Filho, comentando esse dispositivo,
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Promotoria de Justiça de Jerumenhachega a dizer que “o art. 4º dispõe sobre o dever de zelo e obediência aos princípios
da Administração Pública, de cuja inobservância resultam as espécies de
improbidade ditadas pelo art. 11(...) (Improbidade Administrativa – Aspectos Jurídicos da
Defesa do Patrimônio Público. 3a ed., São Paulo: Atlas, p. 50)”.
Trata-se de normas de encerramento, nas quais se subsumem quaisquer
condutas ímprobas que violem os princípios do Direito Administrativo brasileiro
consubstanciados, na modalidade comentada, pelo desrespeito aos deveres de
honestidade e lealdade às instituições. Nesse sentido, Marcelo Figueiredo afrma:
“Para nós, o agente público que atende aos deveres de honestidade e lealdade acata o
princípio da moralidade administrativa. É dizer, honestidade e lealdade são
conceitos jurídicos complementares ou face da mesma moeda”.(Probidade
Administrativa. 4ª ed., São Paulo, Malheiros, p.105).
Como observado, não foram atendidos os deveres de honestidade e lealdade
e, por consequência, desacatado o dever de probidade. Em outras palavras, foi
desrespeitada a tão conclamada moralidade administrativa, que é, nas palavras de
Maurice Hauriou, um “dever de boa administração”, concretizada na atuação
voltada aos valores éticos, destinados ao satisfatório exercício da função pública.
Segundo essa linha de raciocínio, Maria Sylvia Zanella Di Pietro leciona que
para se constatar a violação ao princípio da moralidade “não é preciso penetrar na
intenção do agente, porque do próprio objeto resulta a imoralidade. Isto ocorre
quando o conteúdo de determinado ato contrariar o senso comum de honestidade,
retidão, equilíbrio, justiça, respeito à dignidade do ser humano, à boa fé, ao
trabalho. à ética das instituições.”(Discricionariedade Administrativa na Constituição de
1988. São Paulo, Atlas, p.119).
Devidamente provadas, as condutas das acusadas manifestam-se como típico
ato de improbidade enquadrado nos arts. 9º, 10 e 11 da Lei nº 8.429/92. O
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Promotoria de Justiça de Jerumenhaenriquecimento indevido confessado pelas acionadas, auferido com a fagrante
violação do princípio da moralidade, desencadeou o prejuízo ao erário.
Não restam dúvidas que, embora pudessem desconhecer com exatidão os
preceitos do direito positivo, os requeridos deveriam pautar suas condutas no trato
da coisa pública com zelo, honestidade e lealdade, enfm, de acordo com princípios
éticos, pois violá-los equivale violar o próprio Direito.
7.0 DA LESIVIDADE E DO PREJUIZO AO ERÁRIO
Curial ressaltar que o prejuízo erário se materializa com a lesividade não só
aos cofres públicos, como à credibilidade do ente estatal em geral. Nem se diga,
pois, como fzeram os requerentes, ue não houve prejuízo e que os serviços foram
prestados.
Como corretamente anotou o Min. Milton Pereira em voto proferido no
Superior Tribunal de Justiça:
"a escusar-se a responsabilidade do administrador público,
pela salvaguarda de que o empregado, em contraprestação,
prestou serviços, será construir um estranho indene de
impunidade em favor do agente político que praticou ato
manifestamente contra a lei - nexo causal das obrigações da
relação de trabalho nascida de ato ilegal - criando-se inusitada
convalidação dos efeitos de ato nulo. Será estimular o ímprobo
a agir porque, a fnal, aquela contraprestação o resguardará
contra ação de responsabilidade civil" (cf. voto proferido no
Resp. n. 34.272.0-RJ, julgado em 12-5-93 pelo STJ; v., ainda,
votos do mesmo Ministro, proferidos nos Resps. ns. 18.693-RJ e
20.316-1).
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Promotoria de Justiça de Jerumenha Já se antecipando à alegação, maxima venia concessa, descabida, de que, em tais
casos, em face da prestação dos serviços pelos funcionários ou pela empresa
ilegalmente contratados, não haveria prejuízo ao patrimônio público e,
consequentemente, não seria possível se imputar ato de improbidade ao
administrador pois, em havendo devolução do dinheiro dispendido, ocorreria
enriquecimento ilícito por parte da Administração que se locupletaria dos serviços
prestados, é curial rememorar as lições de Hugo Nigro Mazzilli:
"É preciso deixar claro que está em questão um princípio: pode
o administrador contratar impunemente, sem concurso, fazer
tabula rasa da lei, e fcar tudo por isso mesmo? Pode cometer
tais ilegalidades gritantes e mandar a conta para os cofres
públicos?
Se o administrador puder fazê-lo, poderá contratar
impunemente seus apaniguados para ardorosamente
labutarem em sinecuras ou fazerem obras que terceiros
poderiam fazer melhor e mais barato para o erário.”
Em matéria de dinheiros públicos, "quem gastar, tem que gastar de acordo
com a lei" - é o que corretamente anotou Batista Ramos (Considerações sobre:
parecer prévio, princípio da legalidade, competência para julgamento, e m Revista
do Tribunal de Contas da União 5(8):41-54).
Assim, aduzem Sérgio Ferraz e Lúcia Valle Figueiredo:
"quem gastar em desacordo com a lei, há de fazê-lo por sua
conta, risco e perigos. Pois, impugnada a despesa, a quantia
gasta irregularmente terá de retornar ao Erário Público. Não
caberá a invocação, assaz de vezes realizada, de
enriquecimento ilícito da Administração. Ter-se-ia esta,
consoante essa linha de argumentação, benefciado com a obra,
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Promotoria de Justiça de Jerumenhaserviço e fornecimento, e, ainda mais, com o recolhimento do
responsável ou responsáveis pela despesa considerada ilegal"
(Dispensa e Inexigibilidade de licitação, 3ª ed., Malheiros, p.
93).
Arrematam Sérgio Ferraz e Lúcia Valle Figueiredo, cuidando de caso análogo:
"A presunção de lesividade desses atos ilegais é fácil de intuir.
Se o ordenamento jurídico obriga o procedimento licitatório,
para o cumprimento da isonomia e da moralidade da
administração, o esquivar-se a esse procedimento constitui
inequívoca lesão à coletividade. Será esta ressarcida pela
devolução do dispêndio à revelia do procedimento legal.
Aquele que praticou os atos terá agido por sua conta, riscos e
perigos. Ainda que pronta a obra, entregue o fornecimento ou
prestado o serviço, se impassível de convalidação o ato
praticado, impõe-se a devolução. Não estaremos diante do
chamado enriquecimento sem causa. Isso porque o prestador
do serviço, o fornecedor ou executor da obra serão indenizados,
na medida em que tiverem agido de boa-fé. Entretanto, a
autoridade superior que determinou a execução sem as cautelas
legais, provada sua culpa (o erro inescusável ou o
desconhecimento da lei), deverá, caso se negue a pagar
espontaneamente, em ação regressiva indenizar o Erário por
sua conta ilícita. O patrimônio enriquecido, o da comunidade
e nunca o da Administração (pois esta é a própria
comunidade), não o terá sido com ausência de título jurídico.
Mas, sim, em decorrência de uma lesão aos seus valores
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Promotoria de Justiça de Jerumenha fundamentais, como o da moralidade administrativa. Compete
à parte, e não à Administração, a prova de que o dano,
decorrente da presunção de lesividade, é menor do que a
reposição integral" (op. cit., p. 107/8)." (grifo meu).
Este entendimento já se tornou assente na construção pretoriana pátria em
sede de ação popular, sendo, como vimos acima, o fundamento de tais julgados,
plenamente aproveitável para ações civis públicas que tenham o mesmo objeto.
A 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal, analisando a questão, em sede de
recurso extraordinário (Rextr. n° 160.381-SP, rel. Min. Marco Aurélio; RTJ 153/1022),
por unanimidade, manifestou-se da seguinte maneira:
"Ação Popular. Procedência.Pressupostos. Na maioria das
vezes, a lesividade ao erário público decorre da própria
ilegalidade do ato praticado. Assim o é quando dá-se a
contratação, por município, de serviços que poderiam ser
prestados por servidores, sem a feitura de licitação e sem que o
ato administrativo tenha sido precedido da necessária
justifcativa.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Marco Aurélio: Neste processo discute-se o
acerto, ou não, de acórdão proferido, em embargos infringentes
pela Oitava Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo,
em ação popular. Os recorrentes apontam que tal decisão, no
que implicaria desprezo ao requisito da lesividade, confita com
a norma inserta no inciso LXXIII do artigo 5° da Constituição
Federal, além de distanciar-se da jurisprudência desta Corte,
revelada no julgamento dos recursos extraordinários n° s 75.857
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Promotoria de Justiça de Jerumenhae 92.326. Discorre-se sobre o caráter indispensável da
demonstração da lesão.
(...)
O Sr. Ministro Marco Aurélio:
(...) Diante destas premissas, forçoso é concluir que a decisão
que implicou o restabelecimento da procedência do pedido
formulado na ação popular, declarada pelo Juízo, não merece
qualquer crítica. Com profundidade, contém análise da melhor
doutrina e dos fatos envolvidos.A conclusão sobre a lesividade
ao erário público decorre até mesmo do princípio da
razoabilidade.
Sem o certame, com a contratação direta, demonstra a prática
que, na maioria das vezes, a contratação se faz por preço mais
elevado do que o normal, visto que afastada a salutar
concorrência. Daí haver sido afrmado que a ilegalidade indica,
na espécie, a ocorrência de lesão.
(...)Dir-se-á que se serviços foram prestados, houve a justa
remuneração. Não se sabe, entretanto, se realizada a
concorrência, haveria proposta inferior, em termos valorativos,
para a prestação dos mesmos serviços.
A lesão também está aí. Na dispensa indevida da licitação. "
ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. PRINCÍPIOS REGENTES.
No âmbito de um Estado Democrático de Direito, a atuação do gestor público
está subordinada à observância de princípios normativos, destinados a balizar o
exercício de suas atividades, para, conseguintemente, garantir a satisfação do
interesse público.
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE PIAUÍAgente de Transformação Social
Promotoria de Justiça de JerumenhaNeste panorama, exsugem os princípios da Administração Pública, isto é, os
postulados fundamentais que inspiram todo o modo de agir dos agentes públicos, no
exercício de suas funções.
A Lei fundamental vigente elencou os cânones basilares da atuação
administrativa (art. 37, caput, CRFB/881) e serviu de plataforma para a estruturação
de outros preceitos, de natureza legal ou doutrinária, todos voltados para a
regulamentação do comportamento do gestor público, com vistas a salvaguardar os
interesses da coletividade.
Por mandamento constitucional, os agentes públicos, sob pena de
responsabilidade pessoal, sujeitam-se, entre outros, aos princípios da legalidade,
impessoalidade e moralidade.
O princípio da legalidade estabelece a autolimitação do Estado aos preceitos
normativos, vinculando a atuação dos agentes públicos às imposições legais. Eis a lapidar
conclusão do mestre Celso Antônio Bandeira de Mello:
“O princípio da legalidade implica subordinação completa do
administrador à lei. Todos os agentes públicos, desde o que
lhe ocupe a cúspide até o mais modesto dele, devem ser
instrumentos de fel e dócil realização das fnalidades
normativas2.
Parafraseando a clássica comparação de Hely Lopes Meirelles, enquanto os
indivíduos no campo privado podem fazer tudo o que a lei não veda, o
administrador público só pode atuar onde a lei autoriza.
1 Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do DistritoFederal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade eefciência e, também, ao seguinte: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
2 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Revista de Direito Público n.º 90, p. 57/58.
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Promotoria de Justiça de Jerumenha O princípio da moralidade, por sua vez, impõe que oadministrador público não
dispense padrões éticos no exercício de suas atividades funcionais, velando, pois,
pela honestidade e boa-fé no desempenho de suas atribuições. Discorrendo sobre a
moralidade administrativa, o professor José Augusto Delgado assevera:
o valor jurídico do ato administrativo não pode ser afastado
de seu valor moral, implicando isso um policiamento ético na
administração. A motivação e o modo de agir do agente
público submetem-no a controles, especialmente ante o
princípio da moralidade administrativa. Ações maliciosas ou
imprudentes devem ser reprimidas. A doutrina há de buscar
alcance largo ao princípio da moralidade3.
Enfm, o princípio da impessoalidade se materializa a partir de duas facetas,
uma calcada na igualdade de tratamento a ser dispensada a todos os administrados
em situação jurídica idêntica, e outra plasmada na obrigação imposta ao Poder
Público de voltar-se exclusivamente para o interesse público. A respeito da matéria,
mais uma vez vale a colação dos ensinamentos de Celso Antônio Bandeira de Mello
sobre o tema:
“Nele se traduz a idéia de que a Administração tem que tratar a
todos os administrados sem discriminações, benéfcas ou
detrimentosas. Nem favoritismos nem perseguições são
toleráveis. Simpatias ou animosidades pessoais, políticas ou
ideológicas não podem interferir na atuação administrativa e
3 DELGADO, José Augusto, O princípio da moralidade administrativa e a Constituição Federal de 1988, in RT 680/38,junho de 1992, apud Fábio Osório Medina, Improbidade Administrativa, 2.ª ed. , Porto Alegre, Síntese, 1998, p.144
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Promotoria de Justiça de Jerumenhamuito menos interesses sectários, de facções ou grupos de
qualquer espécie4.”
Na mesma perspectiva, são as lições de Mário Pazzaglini Filho:
Administrar é um exercício institucional e não pessoal. A
conduta Administrativa deve ser objetiva, imune ao
intersubjetivismo e aos liames de índole pessoal, dos quais
são exemplos o nepotismo, o favorecimento, o clientelismo e a
utilização da máquina administrativa como promoção pessoal.
Pautada na lei, a conduta administrativa deve ser geral e
abstrata, jamais focalizada em pessoas ou grupos. Sua
fnalidade é a realização do bem comum, síntese tradutora dos
objetivos fundamentais do Estado Brasileiro. (...) Também é a
impessoalidade afetada pelo princípio republicano que impõe
ao Administrador o dever de, como mero gestor da res
pública, não fazer seu ou de alguns aquilo que é de todos. A
prevalência do interesse social sobre eventuais anelos
individuais ou grupais reclama uma conduta administrativa
impessoal.5
Neste contexto, pode se afrmar que a atividade administrativa está
umbilicalmente atrelada aos interesses de ordem pública, cabendo, pois, ao gestor da
máquina administrativa dar cumprimento à lei, sem descurar-se da moral, sempre
com os olhos voltados para o interesse da coletividade.
4 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 4ª edição. Editora Malheiros. SãoPaulo. 1993. P. 58
5 FILHO, Mário Pazzaglini, Improbidade Administrativa, 2.ª ed. , São Paulo, Atlas, 1997, p. 50/51.
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Promotoria de Justiça de Jerumenha O interesse público, portanto, é indisponível, cabendo ao administrador
público tão-só velar pela sua satisfação, protegendo-o contra ingerências espúrias e
em descompasso com o bem comum.
Nesse azimute, o mestre Celso Antonio Bandeira de Melo arremata:
[...] Em suma, o necessário — parece-nos — é encarecer que na
administração os bens e os interesses não se acham entregues
à livre disposição da vontade do administrador. Antes, para
este, coloca-se a obrigação, o dever de curá-los nos termos da
fnalidade a que estão adstritos. É a ordem legal que dispõe
sobre ela6.
8.0 DO PEDIDO LIMINAR DE INDISPONIBILIDADE DOS BENS
Justifca-se a concessão de medida liminar, quando presentes os requisitos do
fumus bonis juris e o periculum in mora.
Para Vicente Greco Filho (cit. Filho, Marino Pazzaglini e outros,
IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – Aspectos Jurídicos da Defesa do Patrimônio
Público, 2ª Edição, Atlas), o fumus bonis juris está calcado em um “juízo de
probabilidade” quanto ao resultado favorável da ação principal. Já o periculum in
mora, na lição do renomado jurista, consiste “no estado de perigo no qual se encontra
o pedido principal, a demora” na verdadeira acepção do brocardo latino.
Fábio Medina Osório com um entendimento mais fexível da abrangência do
periculum in mora, acolhido pelas normas processuais pátrias, entende que este
requisito “emerge, via de regra, dos próprios termos da inicial, da gravidade dos
fatos, do montante, em tese dos prejuízos causados ao erário” (IMPROBIDADE6 MELLO, Celso Antônio Bandeira de Curso de Direito Administrativo. 16 ed. São Paulo: Malheiros, 2003. pp.
64-65.
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Promotoria de Justiça de JerumenhaADMINISTRATIVA – Observações sobre a Lei nº 8.429/92 – 2ª Edição Ampliada e
Atualizada).
Os fatos ora apurados não deixam dúvidas quanto à lesão causada ao erário,
fruto da atitude inconsequente e ímproba dos requeridos.
A indisponibilidade de bens signifca a impossibilidade de alienação dos
mesmos, visando garantir a execução da sentença de mérito que condenar as
acionadas ao ressarcimento de danos provocados ao patrimônio público, dentre
outras sanções cabíveis.
Diante das considerações acima esposadas e em consonância com o artigo 7º
da Lei nº 8.429/92, de acordo com o qual “quando o ato de improbidade causar lesão
ao patrimônio público ou ensejar enriquecimento ilícito, caberá à autoridade
administrativa responsável pelo inquérito representar ao Ministério Público, para a
indisponibilidade dos bens do indiciado”, requer o Ministério Público a concessão de
MEDIDA LIMINAR de INDISPONIBILIDADE DE BENS dos REQUERIDOS
ELVIRA BORGES DA MOTA ANDRADE, JAELSON FRANCIS E SILVA
AMORIM e RAYLAN MOREIRA DA FONSECA com a consequente expedição de
ofícios aos cartórios de Registros de Imóveis desta comarca de JERUMENHA e de
CANAVIEIRA, ALÉM DAS COMARCA DE TERESINA, FLORIANO, PICOS E
PARNAIBA determinando a averbação, nas matrículas dos imóveis, da
INALIENABILIDADE DOS BENS OU DIREITOS, porventura existentes, em nome
dos acionados; e, em face da possibilidade de existirem outros bens imóveis fora da
circunscrição deste município, bem como outros bens não sujeitos a registro
imobiliário, requerendo também seja ofciado à Receita Federal a fm de que forneça
cópia da última DECLARAÇÃO DE BENS E RENDIMENTOS dos acionados, a fm
de que, nos limites do permissivo legal, sejam alcançados pela medida acautelatória.
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Promotoria de Justiça de Jerumenha Requeiro também seja realizado BLOQUEIO, POR MEIO DO SISTEMA
BACEN JUD, de quaisquer ativos, até os limites mencionados, devendo acaso
encontrados, ser bloqueados dos requeridos:
i) ELVIRA BORGES DA MOTA ANDRADE e JAELSON FRANCIS E SILVA
AMORIM e RAYLAN MOREIRA DA FONSECA, os valores de R$
207.905,00 (duzentos e sete mil novecentos e cinco reais).
9.0 DA DESNECESSIDADE DA NOTIFICAÇÃO PRÉVIA
Desnecessária a notifcação prévia prevista no artigo 17, §§ 7° a 10, da Lei n.°
8.429/92, com a redação dada pela Medida Provisória n.° 2.225/01, pois esta não foi
convertida em lei no prazo legal. Também não foi recepcionada pela Emenda
Constitucional n.° 32/01, que acrescentou o disposto no artigo 62, inciso I, alínea “b”
da Constituição Federal.
Observe-se que a Medida Provisória supracitada é de 04 de setembro de 2.001.
Sete dias depois entrou vigor a Emenda Constitucional n.° 32/01, que trouxe nova
redação ao dispositivo constitucional, vedando expressamente as Medidas
Provisórias sobre as matérias de Direito Processual Civil (artigo 62, inciso 1, alínea
“b” da Constituição Federal).
É sabido que, a Medida Provisória n.° 2.225/01 não foi convertida em seu
interregno temporal e sem a respectiva conversão, perdeu a sua efcácia, não mais
podendo sê-lo por força da vedação constitucional (art. 62, inciso I, alínea “b” da
Constituição Federal).
Requeiro, pois, não seja aplicado o artigo 17, §§ 7° a 10, em razão da
inconstitucionalidade formal dos referidos dispositivos, pelas razões acima
mencionadas, não devendo os requeridos serem notifcados a apresentarem a defesa
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Promotoria de Justiça de Jerumenhaprévia, sendo os mesmos diretamente citados para apresentarem contestação, no
prazo legal, sob pena de revelia.
10.0 DOS PEDIDOS
Diante do exposto, o Ministério Público do Estado do Piauí requer,
liminarmente, de Vossa Excelência:
a) A concessão de antecipação da tutela, em relação dos requeridos,
como medida liminar, para determinar a averbação em todos os Cartórios de
Registros imobiliários desta Comarca, além das comarcas de Floriano, Picos, Teresina
e Parnaíba, a determinação de indisponibilidade dos bens, ativos, móveis, imóveis,
semoventes, e demais valores, relativo a ELVIRA BORGES DA MOTA ANDRADE,
e JAELSON FRANCIS E SILVA AMORIM e RAYLAN MOREIRA DA FONSECA,
até os valores de R$ 207.905,00 (duzentos e sete mil novecentos e cinco reais).
b) seja a presente autuada e processada na forma e no rito preconizado
na Lei nº 7.347/85, tendo como parte integrante o procedimento instaurado neste
Parquet sob o Inquérito Civil Público nº 06/2018.
c) seja o autor dispensado do pagamento de custas, emolumentos e
outros encargos, desde logo, à vista do disposto no art. 18 da Lei n. 7.347/85.
d) seja determinada a citação dos requeridos, já qualifcados na
exordial, para, querendo, contestar o presente pedido, no prazo de 15 dias.
e) seja ao fnal os pedidos contidos nesta ação julgado totalmente
procedentes declarando a responsabilidade dos requeridos, sendo todos
condenados nas sanções do artigo 10 da Lei 8429/93, com ressarcimento ao erário
nos valores acima esmiuçados.
f) Subsidiariamente, caso, assim V. Exa. entenda, requeiro a condenação
dos requeridos por ofensa aos princípios da Administração Pública, artigo 11 da Lei
8429/92.
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE PIAUÍAgente de Transformação Social
Promotoria de Justiça de Jerumenhaf) seja o requerido condenado ao pagamento de custas e demais
despesas processuais.
Dá-se a causa o valor de R$ 1.000,00 (fns fscais).
Jerumenha, 03 de Março de 2018
Márcio Giorgi Carcará Rocha
Promotor de Justiça