UUNNIIVVEERRSSIIDDAADDEE FFEEDDEERRAALL DDAA BBAAHHIIAA -- UUFFBBAA PPRROOGGRRAAMMAA DDEE PPÓÓSS--GGRRAADDUUAAÇÇÃÃOO EEMM DDIIRREEIITTOO
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DDAASS NNOOVVAASS RREELLAAÇÇÕÕEESS DDEE TTRRAABBAALLHHOO
LLUUCCIIAANNAA MMOOUURRAA AARRAAÚÚJJOO CCAARRDDOOSSOO PPOONNTTEESS
Salvador 2010
1
LLUUCCIIAANNAA MMOOUURRAA AARRAAÚÚJJOO CCAARRDDOOSSOO PPOONNTTEESS
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DDAASS NNOOVVAASS RREELLAAÇÇÕÕEESS DDEE TTRRAABBAALLHHOO Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Direito da Universidade Federal da Bahia como requisito parcial para a obtenção do grau de Mestre em Direito.
Orientador: Prof. Dr. Luiz de Pinho Pedreira da Silva.
Salvador 2010
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EEMM FFAACCEE DDAASS NNOOVVAASS RREELLAAÇÇÕÕEESS DDEE TTRRAABBAALLHHOO Dissertação ____________ como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre
em Direito, pela Universidade Federal da Bahia, pela seguinte banca examinadora:
____________________________________________
Professor Dr. Luiz de Pinho Pedreira da Silva
Orientador
____________________________________________
Professor(a) Dr(a)
____________________________________________
Professor Dr(a)
Salvador 2010
3
DDEEDDIICCAATTÓÓRRIIAA
A DEUS, por permitir a concretização de mais um sonho. A Géfer, pelo exemplo de companheirismo e dedicação ao
trabalho e à família.
4
AAGGRRAADDEECCIIMMEENNTTOOSS
Agradeço, primeiramente, a Deus pela oportunidade de crescimento pessoal e
profissional.
À minha família pela confiança, torcida e acima de tudo compreensão nos
momentos de reclusão.
Agradeço em especial a Géfer, meus filhos e Lourdes, por caminharem ao meu
lado, oferecendo-me todo o suporte emocional necessário.
Aos profissionais brilhantes que me direcionaram na fase inicial desta
caminhada de aprendizado e descobertas: Ruy Hermann Araújo Medeiros e
Ana Palmira Bittencourt Santos Cassimiro.
A todos os professores de mestrado da UFBA, com especial carinho, ao meu
orientador, professor Dr. Luiz de Pinho Pedreira da Silva, exemplo de
sabedoria, fonte inesgotável de conhecimento, e ao Professor Dr. Rodolfo
Mario Pamplona Veiga Filho, pela valorosa contribuição no aprimoramento da
pesquisa.
Aos funcionários das bibliotecas da UFBA, UESB, UCSAL, FAINOR, FTC, em
especial aos funcionários da Secretaria do Programa de Pós-Graduação da
UFBA, Srª. Luíza Luz de Castro e Sr. Jovino Ferreira Costa Filho.
À amiga de todas as horas, Maria Soledade Soares Cruzes.
5
"[...] se alguma nação não adotar condições humanas de trabalho, esta omissão constitui um obstáculo aos esforços de outras nações que desejem melhorar as condições dos trabalhadores em seus próprios países.”
Constituição da OIT
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RREESSUUMMOO
“O Direito do Trabalho e sua função protetiva na contemporaneidade: da necessidade de (re)definição em face das novas relações de trabalho” evidencia a atual crise do Direito do Trabalho em seu aspecto finalístico de proteção ao trabalhador hipossuficiente, trazendo como objetivo central a proposta de redefinição de paradigmas clássicos deste ramo jurídico, no intento de, sob uma perspectiva contemporânea, neoconstitucionalista do Direito, estender a proteção às novas relações de trabalho surgidas no século XXI, a fim de resgatar a dignidade do trabalhador hipossuficiente, independente da forma como exerce a atividade laboral, o que extrapola a tradicional proteção ao trabalhador subordinado. Assim, inicia-se o primeiro capítulo apresentando a visão tradicional do Direito do Trabalho, tendo como base investigativa a análise do percurso das relações de trabalho desde a origem do capitalismo até a contemporaneidade, com enfoque na sua função protetiva. A partir daí, investe-se na análise da crise da relação de emprego, apontando as deficiências em seu aspecto finalístico, salientando, para tanto, a necessidade de (re)adequar o trabalho ao sistema jurídico vigente, sob inspiração da teoria neoconstitucionalista do Direito, que direciona o Direito do Trabalho a mudanças, a fim de atender à necessidade imperiosa de efetivação dos direitos fundamentais sociais. Em seguida, reserva-se capítulo especial à análise das relações de trabalho surgidas no contexto contemporâneo e das relações de emprego com nova roupagem. O intento é arrematar o trabalho de pesquisa com a proposta de reestruturação do Direito do Trabalho, concentrando em um só código todas as relações de trabalho, organizadas segundo a forma como a atividade será desenvolvida (regime de subordinação, coordenação e autonomia), defendendo, entretanto, a garantia de tutela protetiva mínima a todos os trabalhadores hipossuficientes socioeconomicamente, inspirada na concepção axiológica da Constituição.
Palavras-Chave: Contemporaneidade; Direito do Trabalho; Função protetiva;
Hipossuficiência; Relação de trabalho.
7
AABBSSTTRRAACCTT
“The Labor Law and its protective role in contemporary society: the necessity of (re)definition in face of new labor relations” emphasizes the current crisis in Labor Law in its final aspect of protection of the hyposufficient worker, bringing as central aim the proposal of redefinition of classic paradigms in this field of Law. Such redefinition has the intention of extending, under a contemporary and neoconstitutionalist perspective of Law, the protection of new labor relations that have arisen in the 21st century, in order to rescue the dignity of the hyposufficient worker, irrespective of how he exercises the laboral activity, which overcomes the traditional protection of the subordinate worker. Thereby, the first chapter begins by presenting the traditional view of Labor Law, based on investigative analysis of the course of labor relations from the beginning of the capitalism to contemporaneity, focusing on its protective function. Therewith, it invests in the analysis of the employment relations crisis, pointing out the deficiencies in its final aspect and emphasizing, for that, the necessity of (re)adapting the work to the current juridical system, inspired by the neoconstitutionalist theory of Law, which directs Labor Law to changes, in order to meet the imperious need for enforcement of fundamental social rights. Afterwards, a special chapter is reserved for analysis of the new labor relations arising in the contemporary context, as well as old employment relations with a new vesture, whose intent is to finish up the research work with the proposal of restructuring the Labor Law, in a way to concentrate on a single code all labor relations, organized according to how the activity will be developed (system of subordination, coordination and autonomy), defending, however, the guarantee of minimal protection to every social-economically hyposufficient worker, inspired by the axiological concept of Constitution.
Keywords: Contemporaneity; Labor Law; Protective Role; Hyposufficiency; Labor
Relation.
8
LLIISSTTAA DDEE AABBRREEVVIIAATTUURRAASS EE SSIIGGLLAASS
Ampl. - ampliada
Art. - artigo
Atual. - atualizado(a)
Aum. - aumentado(a)
CC - Código Civil
CF/88 - Constituição Federal de 1988
CONPEDI - Conselho Nacional de Pesquisa e Pós-Graduaçõ
em Direito
Coord. - Coordenador(a)
CLT - Consolidação das Leis Trabalhistas
DJ - Diário da Justiça
DJMG - Diário da Justiça de Minas Gerais
DJU - Diário da Justiça da União
Dr. - Doutor
EC. - Emenda Constitucional
Ed. - Edição
FGTS - Fundo de Garantia por Tempo de Serviço
IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IBOPE - Instituto Brasileiro de Opinião Pública e
Estatística
Inc. - Inciso
IPEA - Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
MI - Mandado de Injunção
OEA - Organização dos Estados Americanos
OIT - Organização Internacional do Trabalho
ONU - Organização das Nações Unidas
Org. - Organizador
PIDESC - Pacto Internacional dos Direitos Econômicos,
Sociais e Culturais
PME - Pesquisa Mensal de Emprego
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PNAD - Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio
R. - Região
Reimpr. - Reimpressão
Rel. - Relator(a)
Rev. - Revisado(a)
RO - Recurso Ordinário
SOBRATT - Sociedade Brasileira de Teletrabalho e
teleatividades
STF - Supremo Tribunal Federal
STJ - Superior Tribunal de Justiça
T - Turma
TIC - Tecnologias da Informação e da Comunicação
TRT - Tribunal Regional do Trabalho
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SSUUMMÁÁRRIIOO
RESUMO ……………………………………………………………………………….. VI
ABSTRACT …………………………………………………………………………… VII
LISTA DE ABREVIATURA E SIGLAS …………………………………………….. VIII
1 INTRODUÇÃO .................................................................................................. 013
2 O CAPITALISMO, O DIREITO DO TRABALHO E SUA FUNÇÃO
PROTETIVA TRADICIONAL ............................................................................... 016
2.1 SURGIMENTO E EVOLUÇÃO DO CAPITALISMO: UMA ABORDAGEM
HISTÓRICA DA INSERÇÃO/EXCLUSÃO DO TRABALHADOR NO
CONTEXTO LABORAL ........................................................................................ 016
2.2 O DIREITO DO TRABALHO E SUA FUNÇÃO PROTETIVA TRADICIONAL:
DA NECESSIDADE DE (RE)DEFINIÇÃO............................................................. 022
2.2.1 O Direito do Trabalho em sua perspectiva evolutiva .............................. 026
2.2.1.1 Direito do Trabalho no contexto internacional ......................................... 026
2.2.1.2 Direito do Trabalho no Brasil .................................................................... 028
2.2.2 As fontes heterônomas do Direito do Trabalho vigentes no Brasil e a
tutela dos direitos do trabalhador .................................................................... 031
2.3 DIREITO DO TRABALHO NO CAPITALISMO MODERNO – CRISE OU
RENOVAÇAO? .................................................................................................... 035
3 A CRISE DA RELAÇÃO DE EMPREGO E A NECESSIDADE DE
(RE)ADEQUAR O TRABALHO AO CONTEXTO JURÍDICO ............................. 046
3.1 DISTINÇAO ENTRE RELAÇÃO DE TRABALHO E RELAÇÃO DE
EMPREGO E SUA REPERCUSSÃO JURÍDICA ................................................. 047
3.2 RELAÇAO DE EMPREGO E CONTRATO DE TRABALHO TÍPICO: UMA
BREVE ANÁLISE DA NATUREZA JURÍDICA DO VÍNCULO EMPREGATÍCIO
E SEUS ELEMENTOS CARACTERIZADORES .................................................. 050
11
3.2.1 Da natureza jurídica do vínculo empregatício ........................................ 050
3.2.2 Dos elementos caracterizadores do vínculo empregatício ................... 057
3.3 A CRISE DA RELAÇÃO DE EMPREGO: PRECARIZAÇÃO,
TERCEIRIZAÇÃO E FLEXIBILIZAÇÃO ............................................................... 068
4 O NEOCONSTITUCIONALISMO E SUA REPERCUSSÃO NO DIREITO
DO TRABALHO: POR UMA NECESSIDADE DE CONTEXTUALIZAÇÃO ....... 075
4.1 O NEOCONSTITUCIONALISMO NO SISTEMA JURÍDICO BRASILEIRO .. 075
4.2 A NOVA INTERPRETAÇÃO CONSTITUCIONAL ......................................... 078
4.3 NEOCONSTITUCIONALISMO E O DIREITO DO TRABALHO ..................... 081
5 O SURGIMENTO DE NOVAS RELAÇÕES DE TRABALHO E A
DIFICULDADE DE INSERÇÃO NO SISTEMA DE PROTEÇÃO JURÍDICA
PÁTRIO................................................................................................................. 089
5.1 NOVAS RELAÇÕES CONTEMPORÂNEAS DE TRABALHO ....................... 089
5.1.1 Teletrabalho ............................................................................................... 090
5.1.2 Trabalho em domicílio .............................................................................. 093
5.1.3 Trabalho agregado (caminhoneiro agregado) ........................................ 095
5.1.4 Representação comercial ......................................................................... 097
5.2 VELHAS RELAÇÕES DE TRABALHO SOB NOVA ROUPAGEM E A
PRECARIZAÇÃO DO SISTEMA DE PROTEÇÃO JURÍDICA ............................. 099
5.3 COMO PROTEGER O TRABALHADOR HIPOSSUFICIENTE SITUADO NA
ZONA FRONTEIRIÇA ENTRE TRABALHO SUBORDINADO E TRABALHO
AUTÔNOMO ......................................................................................................... 104
6 POR UMA PROPOSTA DE (RE)DEFINIÇÃO DO DIREITO DO TRABALHO
EM FACE DA REESTRUTURAÇÃO DAS RELAÇÕES DE TRABALHO .......... 108
6.1 O TRABALHO DECENTE SEGUNDO A OIT ................................................ 108
6.2 DA OBSERVÂNCIA DO PRINCÍPIO DA DIGNIDADE HUMANA DO
TRABALHADOR .................................................................................................. 112
6.3 PROPOSTA DE REFORMA DA ORDEM TRABALHISTA BRASILEIRA ...... 117
6.3.1 A Constituição Federal como referência ................................................ 119
6.3.2 Pela criação de um Código do Trabalho e suas especificidades ........ 121
12
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS.............................................................................. 126
REFERÊNCIAS ................................................................................................... 129
13
1 INTRODUÇÃO
O modo de produção capitalista tem passado por uma fase de profunda modificação
no século XXI, motivada pela necessidade de concorrência e alta produtividade,
impulsionando o surgimento de técnicas de produção e formas de organização das
relações interempresariais, o que altera substancialmente as relações entre capital e
trabalho.
Vive-se a 3ª Revolução Industrial, denominada por alguns estudiosos de Revolução
Tecnológica. A informação torna-se o centro das atenções no Capitalismo Moderno,
rompendo barreiras, violando os espaços geográficos e sociais, em busca da força
de trabalho apta a preencher o espaço predominante do setor terciário (há quem
diga quaternário).
As consequências dessa Revolução se evidenciam nas relações do trabalho
contemporâneas, revelando o surgimento de funções até então desconhecidas, que
requerem novas formas de contratação no plano jurídico, tendente à minimização
das forças interventivas do Estado e apostando sua carga negocial nas forças
sociais, conclamando os agentes políticos e sociais a participarem desta nova fase
de regulação das relações laborais.
A vetusta forma de intervenção estatal já não mais dá conta de gerir as relações
laborais em sua integralidade, subdivididas em sociedade formal (trabalhadores
regularmente contratados e inseridos no contexto jurídico) e informal (trabalhadores
excluídos pela ausência de regulamentação própria, desempregados, trabalhadores
informais). A sociedade informal acaba sendo relegada à orfandade em matéria de
proteção jurídica.
É preciso combater este mundo paralelo de segregação e exclusão social. É preciso
buscar o equilíbrio entre o capital e o trabalho, com resgate à dignidade humana,
sem, contudo, privar os avanços da livre iniciativa. É preciso construir um novo
projeto de organização social, sem que para isto seja necessário afastar por
14
completo a participação do Estado. Não se trata de defender a desregulamentação
tampouco a flexibilização descomedida!
A situação requer ousadia e coragem para que sejam mobilizados todos os
segmentos políticos e sociais em prol de uma sociedade livre, justa e solidária. É
chegado o momento de somar forças, a fim de evitar que as conquistas históricas no
âmbito trabalhista desçam pelo ralo da globalização. Inovar para efetivar é a ordem
do dia.
O Direito do Trabalho tem importante participação nesse contexto revolucionário.
Precisa, entretanto, romper com os velhos paradigmas, abrir-se ao novo, ser eficaz.
Um “novo” Direito do Trabalho deve emergir gradativamente, atento à concepção
axiológica da Constituição, cujo movimento integrativo funciona em prol da
revitalização dos direitos fundamentais.
Neste sentido, propõe-se, no capítulo segundo desta dissertação, apresentar a visão
tradicional do Direito do Trabalho e sua função protetiva, traçando um quadro
paralelo da evolução do capitalismo, segundo o qual serão analisadas as relações
de trabalho desde o surgimento da atividade laboral na Antiguidade até os dias
atuais, a fim de situar este ramo jurídico no contexto histórico-jurídico
contemporâneo.
No capítulo terceiro e quarto, apresentar-se-á a crise da relação de emprego,
pontuando os aspectos da precarização, terceirização e flexibilização, evidenciando,
outrossim, a real necessidade de redefinição de paradigmas do Direito do Trabalho,
com base na concepção axiológica da Constituição, marcando a influência
neoconstitucionalista do século XXI no Direito do Trabalho.
Avança-se para o capítulo quinto revelando novas relações de trabalho
contemporâneas (e mesmo nova roupagem das velhas relações de emprego) e sua
condição de hipossuficiência, cujo intento será denunciar a precariedade do sistema
de proteção jurídica atinente a estas relações laborais, sugerindo a viabilidade de
expansão protecionista do Estado com regulamentação das relações de trabalho
que se situam em zonas cinzentas, entre o trabalho subordinado e o autônomo, em
15
face da necessidade de garantia das condições mínimas de trabalho a todo e
qualquer tipo de relação de trabalho, independente de sua relação de subordinação,
coordenação ou autonomia.
Finalmente, alcança-se o capítulo sexto, no qual se propõe um redimensionamento
do Direito do Trabalho pátrio, inspirado na internacionalização dos direitos humanos,
na observação dos requisitos básicos para se atingir um trabalho decente, conforme
recomendações da OIT e na proposta de criação de um código trabalhista pátrio,
que regulamente as relações de trabalho de acordo com a forma como as atividades
devam ser desenvolvidas, restando garantida a tutela das condições mínimas a
todos os trabalhadores, indistintamente, em atendimento ao princípio da dignidade
do trabalhador.
16
2 O CAPITALISMO, O DIREITO DO TRABALHO E SUA FUNÇÃO PROTETIVA
TRADICIONAL
A visão tradicional do Direito do Trabalho será tratada neste capítulo, tendo como
base investigativa o modo de produção capitalista, desde a origem até a fase
contemporânea, buscando, dentro de uma abordagem histórico-social, contextualizar
a inserção do trabalhador e analisar como tem atuado o Direito do Trabalho em sua
finalidade precípua, qual seja, a proteção jurídica do trabalhador em face das
mazelas do sistema capitalista.
2.1 SURGIMENTO E EVOLUÇÃO DO CAPITALISMO: UMA ABORDAGEM
HISTÓRICA DA INSERÇÃO/EXCLUSÃO DO TRABALHADOR NO CONTEXTO
LABORAL
Só é possível analisar a relação de trabalho juridicamente livre a partir do século XIX
com a Revolução Industrial, que abrandou a predominante exploração da mão-de-
obra escrava e servil e fez surgir uma nova categoria de trabalhadores – os
assalariados.
No período que precedeu a Revolução Industrial, “predominou a escravidão, que fez
do trabalhador simplesmente uma coisa, sem possibilidade sequer de se equiparar a
sujeito de direito”, conforme acentua Amauri Mascaro Nascimento (2001, p. 37).
Isto se deve ao fato de que, na Antiguidade, o trabalho fora desenvolvido
principalmente por escravos e pelos povos vencidos em guerra. Na Idade Média,
regida pelo sistema feudal, embora a sociedade se compusesse de três classes
(eclesiástica, militar e servil), a única produtiva era a dos camponeses, que supria as
necessidades de sacerdotes e guerreiros, mediante trabalho agrícola desenvolvido
nos feudos. A vida econômica era impulsionada pelo sistema de trocas. Cada aldeia
ou feudo produzia o que necessitava, sendo praticamente autossuficiente.
17
Há estudiosos que diferenciam tais períodos, considerando a escravidão apenas no
período romano e a servidão, no feudal. Note-se que, lato sensu, em ambos a figura
do trabalhador como homem livre é ignorada, sendo, portanto, em última análise,
considerado escravo. Neste aspecto, acertada a delimitação apresentada por Arion
Sayão Romita (2003, p. 217) ao configurar a relação de trabalho escravo em Roma
como sendo baseada em um direito real: “o escravo era coisa – res – objeto de
propriedade do dominus”, e na Idade Média, por força da vassalagem, uma relação
de trabalho servil, pois “pressupõe um direito pessoal, gerando uma relação de
fidelidade mediante prestações em benefício do senhor feudal, com direito a
proteção e assistência”.
Leo Huberman, em sua obra “História da riqueza do homem”, chama a atenção para
o fato de que as condições caracterizadoras do sistema feudal variavam muito de
lugar para lugar, mas reforça o aspecto característico do trabalho servil:
Os camponeses eram mais ou menos dependentes. Acreditavam os senhores que existiam para servi-los. Jamais se pensou em termos de igualdade entre senhor e servo. O servo trabalhava a terra e o senhor manejava o servo. E no que se relacionava ao senhor, este pouca diferença via entre o servo e qualquer cabeça de gado de sua propriedade. (1986, p. 7-8)
O historiador Prosper Boissonnade, por sua vez, sintetizou o tratamento reservado
ao trabalhador naquela sociedade:
O sistema feudal, em última análise, repousava sobre uma organização que, em troca de proteção, frequentemente ilusória, deixava as classes trabalhadoras à mercê das classes parasitárias, e concedia a terra não a quem cultivava, mas aos capazes de dela se apoderarem. (BOISSONNADE, 1927, p.146 apud HUBERMAN, 1986, p.15)
No período que sucedeu o século XII, a economia feudal (autossuficiente) cedeu
espaço para a economia monetária (de mercado), com a formação do comércio e a
invenção da moeda. A terra, fonte de riqueza do homem feudal, fora substituída pelo
dinheiro. O trabalhador, outrora inserido num sistema de divisão social estática, viu a
possibilidade remota de prosperar mediante o trabalho, passando a receber dinheiro
com a venda da colheita sobressalente, embora não fosse ainda um homem livre.
Surgiram a classe média (comerciantes) e a distribuição dos trabalhadores entre o
campo (produção agrícola) e a cidade (produção industrial e comércio).
18
Os séculos XIII e XIV destacaram-se como embrionários para o surgimento do
trabalho assalariado livre, quando o senhor feudal, percebendo que o trabalho
escravo já não mais produzia como antes, adotou nova modalidade de produção: o
aluguel da mão-de-obra mediante pagamento de salários.
Nas cidades, por seu turno, as indústrias começaram a despontar. As mercadorias
feitas para consumo interno passaram a ser produzidas para a venda no mercado
externo, o que impulsionou o surgimento dos artesãos profissionais e das
corporações de ofício, compostas por aprendizes, jornaleiros (ou companheiros) e
mestres.
Neste diapasão, relevante o registro de Amauri Mascaro Nascimento a respeito da
organização das corporações de ofício e sua relação com os trabalhadores da
época:
[...] Cada corporação tinha um estatuto com algumas normas disciplinando as relações de trabalho. [...] Os mestres eram os proprietários de oficinas que chegavam a essa condição depois de aprovados, segundo os regulamentos da corporação, na confecção de uma “obra mestra”. Equivalem aos empregadores de hoje. Os companheiros eram trabalhadores livres que ganhavam salários dos mestres. Os aprendizes eram menores que recebiam dos mestres os ensinamentos metódicos de um ofício ou profissão. A clientela das oficinas eram (era) os poucos habitantes de uma cidade e de seus arredores. As corporações mantinham com os trabalhadores uma relação de tipo bastante autoritário e que se destinava mais à realização dos seus interesses do que à proteção dos trabalhadores. (2001, p. 38). (correção nossa)
O avanço para o século XV marcou o colapso das corporações e o desaparecimento
dos artesões independentes da Idade Média. Chega-se ao século XVI, caracterizado
pelo expansionismo marítimo e mercantil, quando o trabalho assalariado começou a
ganhar espaço. Vale ressaltar que o trabalhador se liberta do senhor feudal e do
mestre, mas se torna totalmente dependente do capitalista, figura do cenário
econômico, cuja participação no sistema de produção fora definida por Leo
Huberman da seguinte forma:
No sistema de corporações, que surgira com a economia urbana, o capitalista tinha apenas um pequeno papel. Com o sistema de produção doméstica, surgido com a economia nacional, o capital passou a ter papel importante. Era necessário muito dinheiro para comprar a matéria-prima
19
para muitos trabalhadores. Era necessário muito organizar a distribuição dessa matéria-prima e sua venda como produto acabado, mais tarde. Era o homem do dinheiro, o capitalista, que se tornava orientador, o diretor do sistema de produção doméstica. (1986, p. 114)
Finalmente desponta o século XVIII. A Revolução Industrial, em sua primeira fase,
apresenta-se como elemento motriz de profundas e irreversíveis alterações
econômicas e sociais:
De um lado, porque o avanço tecnológico propiciou a produção em larga escala e a
concorrência de mercado, impulsionando o crescimento das indústrias e a
urbanização da sociedade industrial.
Do outro lado, por evidenciar uma nova face da exploração do trabalho, com a
marginalização da questão social, revelada pelo aumento abusivo da demanda de
energia do trabalhador (sem qualquer intervenção estatal) e da privação de
vantagens, acentuando a já precária condição de trabalho, cuja insatisfação
desencadeou a formação de uma consciência coletiva, motivada pela concentração
de operários nas fábricas e pela necessidade de autodefesa de uma classe, não
mais de um aglomerado de trabalhadores.
Desponta, nessa época, o Direito do Trabalho, cuja finalidade protetiva dos
trabalhadores passa a ser marca de toda a sua evolução. Costuma-se, entretanto,
dividir a Revolução Industrial em três fases distintas, conforme demonstra José
Augusto Rodrigues Pinto (2003, p. 23-25): 1ª Revolução Industrial, já evidenciada
anteriormente; 2ª Revolução Industrial, caracterizada pela mecanização do trabalho
rural e pela migração da mão-de-obra das indústrias para o setor terciário (prestação
de serviço); e, finalmente, 3ª Revolução Industrial, denominada por alguns
historiadores como a Revolução Tecnológica, caracterizada pela influência da
tecnologia de ponta sobre a economia do emprego, fase que se estende do final do
século XX até os dias atuais.
Esta última Revolução, segundo José Augusto Rodrigues Pinto (2003, p. 24),
evidencia mais uma migração do trabalhador, que se desloca do setor terciário para
20
o pouco conhecido “setor quaternário”, este comandado pelo conhecimento e pela
“mão-de-obra do colarinho de silício”, impulsionado pela robótica e pela informática.
Assim, contextualizando a evolução do trabalhador no cenário econômico, tem-se
que, segundo sistematização apresentada por Marcio Pochmann (1999, p. 25), o
capitalismo, que se iniciou no século XVI e perdura até os dias atuais, passou por
três períodos distintos.
Em sua formação, recebeu a denominação de Capitalismo Comercial ou fase pré-
capitalista, período caracterizado pelas expansões marítimas europeias e por um
ciclo de exploração de produtos não encontrados em solo europeu, tais como ouro,
prata, especiarias e matéria-prima.
Os objetivos principais da expansão territorial e da exploração mercantil foram
enriquecimento e acúmulo de capital, sendo características dessa fase inicial a
busca pelo lucro, o uso de mão-de-obra assalariada, a moeda como substituta do
sistema de trocas, as relações bancárias, o fortalecimento do poder da burguesia e
as desigualdades sociais.
A partir do século XVIII, surgiu o Capitalismo Industrial. Período de mudança
significativa no sistema de produção europeu, no qual as máquinas substituíram a
mão-de-obra, sempre em função da maior lucratividade do empresário. Suas marcas
características foram: desemprego, baixos salários e péssimas condições de
trabalho enfrentadas pelos trabalhadores.
Finalmente, no século XX, o capitalismo avançou para seu terceiro e atual período,
cujo desenvolvimento se volta para a globalização, o sistema bancário e as grandes
corporações financeiras. Denominado por alguns estudiosos de Capitalismo
Monopolista-Financeiro ou, simplesmente, Capitalismo Moderno, é marcado pelas
grandes produções realizadas em diversas partes do mundo, rompendo fronteiras
em busca da redução de custos.
Percebe-se que o capitalismo mudou a geografia econômica e a configuração
interna das atividades produtivas, embora tenha mantido inalterada a lógica do
21
sistema, qual seja: quem trabalha vende sua força de trabalho, independente do tipo
de atividade exercida (manual, intelectual), gerando mais-valia.
Neste sentido, eis a ideologia que tem movido a máquina capitalista desde os
primórdios e perdura até os dias atuais, pronunciada por Karl Marx em 18651 e
destacado por Ricardo Antunes (2004, p. 90):
Ao comprar a força de trabalho do operário e ao pagar seu valor, o capitalista adquire, como qualquer outro comprador, o direito de consumir ou usar a mercadoria que comprou. A força de trabalho de um homem é consumida, ou usada, fazendo-o trabalhar, assim como se consome ou se usa uma máquina fazendo-a funcionar. Portanto, ao comprar o valor diário, ou semanal, da força de trabalho do operário, o capitalista adquire o direito de servir-se dela ou de fazê-la funcionar durante todo o dia ou toda a semana.
No entanto, vale ressaltar que o Humanismo no século XIX despertou a questão
social no embate entre o capital e o trabalho, trazendo à tona a necessidade de luta
pela garantia da dignidade humana do trabalhador operário, que vivia em condições
desumanas em torno de sua atividade laborativa, atrelado a uma jornada extenuante
de trabalho, com remuneração irrisória e sem qualquer amparo em casos de
acidente de trabalho.
Portanto, é nos moldes de indignidade do trabalhador que surge o Direito do
Trabalho, cuja finalidade precípua é torná-lo sujeito de direito, amparado em suas
condições mínimas de trabalho. Neste sentido, o Direito do Trabalho se consolida
movido pela necessidade estatal de proteção ao trabalhador, mediante normas
imperativas, em detrimento da desigualdade fática vivenciada no embate entre o
trabalho e o capital.
Não será outra a razão de se propor a (re)definição do Direito do Trabalho, cujo
fundamento se alicerça na necessidade de ampliação da tutela protetiva a todo
trabalhador hipossuficiente, independente da forma de prestação do serviço ser
subordinada ou não.
1 Fragmento de informe pronunciado por Marx em junho de 1865 nas sessões do Conselho Geral da Associação Internacional dos Trabalhadores, publicado pela primeira vez em folheto à parte em Londres (1898), com o título de Valor, Preço e Lucro, apresentado em coleção “Trabalho e Emancipação”, como uma coletânea de textos e fragmentos de Marx e Engels.
22
2.2 O DIREITO DO TRABALHO E SUA FUNÇÃO PROTETIVA TRADICIONAL: DA
NECESSIDADE DE (RE)DEFINIÇÃO
O Direito do Trabalho, segundo Ives Gandra Martins Filho, significa “[...] o ramo do
Direito que disciplina as relações de trabalho, tanto individuais como coletivas”.
(2009, p. 28)
Ora, tomando como base interpretativa tal definição, aparentemente simplória, tem-
se que o Direito do Trabalho, à luz de uma compreensão semântica, é um ramo
jurídico que regulamenta e protege todo trabalhador em sua relação laboral, focado
na tutela de seus direitos em sentido amplo. Isto implicaria dizer que se encontra
albergado pelo manto protetivo do Estado todo e qualquer trabalhador em plena
atividade laborativa, independente da forma de contratação (cooperado, autônomo,
avulso, eventual, empregado).
Ledo engano. Ao contrário do que se possa evidenciar, não é este o entendimento
majoritário da doutrina pátria e dos demais países capitalistas do mundo globalizado.
A denominação “Direito do Trabalho”, no ordenamento jurídico brasileiro, sofre
restrição interpretativa, limitando-se à regulamentação e proteção de uma categoria
distintiva de trabalhadores – os subordinados – e, por conseguinte, de uma relação
específica de trabalho – a relação de emprego.
Assim, apresentar uma definição que enquadre naturalmente os aspectos
caracterizadores deste ramo do Direito não é uma tarefa fácil, mesmo porque se
encontra envolto numa variedade de denominações recebidas ao longo da história,
nas diversas partes do mundo.
A título de ilustração, Orlando Gomes e Élson Gottschalk (2006, p. 18-19), no “Curso
de Direito do Trabalho” 2, apresenta várias denominações e os respectivos países
que as adotam: Direito social3 (Espanha); Direito Corporativo (Itália); Direito
2 Versão atualizada por José Augusto Rodrigues Pinto e Otávio Augusto Reis. 3 No Brasil, esta denominação é defendida por Cesarino Júnior.
23
Industrial (França); Direito Operário (México); Direito do Trabalho (Alemanha e
Brasil).
Tomando como base a denominação Direito do Trabalho, adotada no Brasil, a
doutrina pátria tem admitido três teorias distintas: a) teoria subjetivista – centrada
nos tipos de trabalhadores inseridos no Direito do Trabalho; b) Teoria objetivista –
focada no objeto (matéria) de que se ocupa este ramo jurídico; c) Teoria mista –
referente tanto às pessoas como à matéria do Direito do Trabalho.
A predileção pela denominação “Direito do Trabalho” no Brasil fora influenciada pelo
contexto europeu do século XVIII, moldado por uma sociedade industrial
caracterizada especificamente pelo trabalho assalariado, cujo interesse, embora
ainda não centrado nos direitos de melhoria das condições de trabalho como ora os
conhecemos, fora motivado “pelas necessidades de coibir os abusos perpetrados
contra o proletariado e, mais diretamente, a exploração do trabalho dos menores e
das mulheres”, conforme acentua Amauri Mascaro Nascimento, (2001, p. 41)
Importante salientar que, naquele período, as condições de trabalho eram ditadas
especificamente pelo patrão, que visava exclusivamente ao lucro, restando ao
operariado o acatamento de tais imposições. Nesse contexto, toda a família acabava
sendo sacrificada, uma vez que as mulheres e os menores, as chamadas “meias
forças” 4, eram operários preferenciais na indústria, por tratar-se de mão-de-obra
mais barata.
É o que revela Leo Huberman, em “História da riqueza do Homem”, ao registrar
quão ambiciosos eram os capitalistas e a forma com que tratavam os trabalhadores
naquela época:
Pagavam os menores salários possíveis. Buscavam o máximo de força do trabalho pelo mínimo necessário para pagá-las. Como mulheres e crianças podiam cuidar das máquinas e receber menos que os homens, deram-lhes trabalho, enquanto o homem ficava em casa, freqüentemente sem ocupação. A princípio, os donos de fábricas compravam o trabalho das crianças pobres, nos orfanatos; mais tarde, como os salários do pai operário e da mãe operária não eram suficientes para manter a família, também as crianças que tinham casa foram obrigadas a trabalhar nas fábricas e minas.
4 Expressão utilizada por Orlando Gomes e Élson Gottschalk. (2006, p.1)
24
Os horrores do industrialismo se revelam melhor pelos registros do trabalho infantil naquela época. (1986, p. 178)
Como visto, o trabalhador assalariado (empregado) era a única categoria no
contexto da relação de trabalho daquela época. Por esta razão, perpetuou-se, entre
os doutrinadores, a coerente denominação “Direito do Trabalho” como sendo o ramo
jurídico que disciplina a relação de trabalho subordinado, independente da
concepção subjetivista, objetivista ou mista adotada.
Vale ressaltar que, por conta da limitação subjetivista e objetivista envolta na
definição do Direito do Trabalho, tem sido predominante a tendência de
doutrinadores em adotar a concepção mista, como o faz Maurício Godinho Delgado,
que assim define o Direito do Trabalho:
O Direito Material do Trabalho compreende o Direito Individual do trabalho e o Direito Coletivo – e que tende a ser chamado, simplesmente, de Direito do Trabalho, no sentido lato -, pode finalmente, ser definido como: complexo de princípios, regras e institutos jurídicos que regulam a relação empregatícia de trabalho e outras relações normativamente especificadas, englobando, também, os institutos, regras e princípios jurídicos concernentes às relações coletivas entre trabalhadores e tomadores de serviço, em especial através de suas associações coletivas. (2006, p. 52)
Assim também se posiciona Amauri Mascaro Nascimento ao definir o Direito do
Trabalho:
[...] o ramo da ciência do direito que tem por objeto as normas, as instituições jurídicas e os princípios que disciplinam as relações de trabalho subordinado, determinam os seus sujeitos e as organizações destinadas à proteção desse trabalho em sua estrutura e atividade. (2001, p. 56-57)
Partindo, entretanto, para uma viagem panorâmica da relação laboral no tempo e no
espaço, Amauri Mascaro Nascimento destaca as primeiras leis ordinárias, à época,
propensas à formação do Direito do Trabalho:
Na Inglaterra, a “Lei de Peel” (1802), de proteção aos menores nas fábricas, limitando a 12 horas a sua jornada diária de trabalho; na França, lei proibindo o trabalho de menores de 8 anos (1814); na Alemanha, lei proibindo o trabalho de menores de 9 anos (1939) e as leis sociais de Bismarck (1833); na Itália, leis de proteção ao trabalho da mulher e do menor (1886). (2001, p. 41)
25
Curioso observar que o Direito vigente no século XIX era o Direito Civil, segundo o
qual, sob a égide liberal-individualista, os sujeitos da clássica relação trabalhista
(empregado e empregador) eram tratados de igual para igual, vinculados a uma
relação contratual bilateral. Esta relação de paridade só se alterou quando o
empregado passou a tomar consciência de que a sua vontade somente produzia
efeitos no âmbito restrito da relação bilateral (empregado/empregador), enquanto o
empregador era um ser coletivo, cuja vontade repercutia não só no ambiente de
trabalho, como também no âmbito comunitário.
Eis a formação embrionária do Direito do Trabalho, resultado da luta de base da
classe trabalhadora – ainda tímida – em contraposição ao ser coletivo empresarial,
impulsionado por movimentos sociais em prol dos interesses da coletividade obreira.
Esta foi a realidade evidenciada nos países europeus. Mas, vale salientar, conforme
Maurício Godinho Delgado (2006, p. 94), que nos primórdios evolucionistas do
Direito do Trabalho, as leis trabalhistas “não deram consistência à formação de um
ramo jurídico especializado, não se traduzindo, ainda, como um conjunto sistemático
de normas”.
Neste sentido, esclarecedoras são as palavras do doutrinador espanhol Manuel
Carlos Palomeque:
O Direito do Trabalho é, desde logo, uma categoria cultural fruto do sistema capitalista industrial. Não é, portanto, a resposta normativa ao conflito sociolaboral ou de trabalho em geral, na medida em que todas as sociedades históricas conheceram o trabalho como fonte de conflitos sociais sem que, por isso, possa registrar no seio o nascimento daquele sistema normativo, mas propriamente a reacção ante o conflito industrial, o conflito entre o capital e o trabalho assalariado na sociedade capitalista industrial [...]. (2001, p. 17)
Assim, a fim de sustentar a proposta de (re)definição do Direito do Trabalho,
moldando-o à realidade vigente, em prol da tutela de direitos mínimos de todo e
qualquer trabalhador sob condição de hipossuficiência em sua relação laboral,
necessário se faz observar alguns aspectos tidos como imprescindíveis para análise
e consideração do que se propõe.
Abordar-se-ão, nos tópicos seguintes, a evolução histórica do Direito do Trabalho,
suas principais fontes heterônomas e como tem sido a tutela dos direitos do
26
trabalhador. Por fim, encerra-se o capítulo com breve análise do Direito do Trabalho
sob o enfoque do Capitalismo Moderno.
2.2.1 O Direito do Trabalho em sua perspectiva evolutiva
Não seria possível propor uma (re)definição do Direito do Trabalho, sem que se
contextualize o período de crise (ou renovação?) do Direito do Trabalho vivido nos
tempos atuais. Para tanto, crucial conhecer, ainda que brevemente, o histórico
evolutivo deste ramo jurídico, de atuação imprescindível na evolução das relações
sociais, a fim de que se possam cotejar as razões que justifiquem a (re)definição
proposta inicialmente.
Para tanto, será adotada a periodização apresentada por Mauricio Godinho Delgado,
por duas razões distintas: a primeira, por não destoar por completo da clássica
apresentada por Granizo e Rothvoss (1935, p. 24-27 apud DELGADO, 2006, p. 92-
93); a segunda por trazer uma abordagem explicativa da substância do Direito do
Trabalho no contexto evolutivo evidenciado.
2.2.1.1 Direito do Trabalho no contexto internacional
Maurício Godinho Delgado (2006, p. 94-99) destaca quatro fases evolutivas do
Direito do Trabalho. A primeira delas denomina-se “manifestações incipientes ou
esparsas” (1802 a 1848). A segunda recebe o rótulo de “sistematização e
consolidação” (1848 até 1919). A terceira marca o período de “institucionalização do
Direito do Trabalho” (1919 a 1945) e, finalmente, a quarta e última fase evidencia a
“crise e transição do Direito do Trabalho” (1979/1980 aos dias atuais). Cada uma
delas possui um marco delimitatório que evidencia a evolução deste ramo jurídico, a
saber:
27
a) Manifestações incipientes ou esparsas – período em que não se fala ainda em um
ramo jurídico próprio e autônomo, por inexistência da união operária coesa e
atuante. Fase marcada por leis esparsas, de caráter humanitário, dirigidas a reduzir
a superexploração capitalista sobre mulheres e menores. Em especial, destaca-se o
Peel’s Act Inglês (1802), voltado a fixar certas restrições à utilização do trabalho de
“menores”.
b) Sistematização e Consolidação – período marcado pelas primeiras manifestações
coletivas da classe trabalhadora como sujeito coletivo típico em resistência à ordem
institucional vigente e primeiras reivindicações dos trabalhadores urbanos. Têm-se
como marcos, nesta fase, o Manifesto comunista (Marx e Engels), o Movimento
Cartista na Inglaterra e a Revolução Francesa de 1848. São frutos correspondentes,
à época, o reconhecimento do direito à associação e greve (lembrando que,
anteriormente a este período, a associação de trabalhadores era considerada um
ato criminoso) e a fixação de jornada de trabalho em dez horas diárias.
c) Institucionalização do Direito do Trabalho – Período de ouro do Direito do
Trabalho, iniciado após a Primeira Guerra Mundial. Fase em que este ramo jurídico
definitivamente se torna autônomo, com a sua constitucionalização e
internacionalização, e se correlacionam duas dinâmicas próprias – a produção
autônoma de normas jurídicas, com atuação coletiva dos trabalhadores, mediante
negociação coletiva; e a produção estatal heterônoma, concretizada com a atuação
estatal.
Destacam-se como marcos a Constituição do México (1917) e a de Weimar, na
Alemanha (1919), – que evidenciam a hegemonia do Estado de Bem-Estar Social,
com incorporação de normas jurídicas, diretrizes gerais de valorização do trabalho e
princípios como da dignidade da pessoa humana e da justiça social – e a criação da
Organização Internacional do Trabalho (OIT) também em 1919.
d) Crise e Transição do Direito do Trabalho – fase de forte tendência à
desregulamentação das regras trabalhistas ou à crescente flexibilização de tais
normas em alguns países capitalistas, a exemplo do Brasil. Período marcado pela
conjugação de fatores que contribuíram para o seu declínio, a começar pela crise do
28
Petróleo (1973/74), que abalou o sistema econômico, com repercussão no mercado
de trabalho, colocando em xeque a atuação protetiva do Estado, em plena crise
fiscal.
A revolução tecnológica também soma parcela de contribuição neste período crítico
da história do Direito do Trabalho, por desencadear, de um lado, a redução dos
postos de trabalho em diversos segmentos econômicos, e de outro, por favorecer o
surgimento de novas formas de relação do trabalho, alterando o clássico sistema de
contratação empregatícia (teletrabalho, trabalho em domicílio, trabalho por tempo
parcial).
Por fim, outro fator relevante neste contexto refere-se ao fortalecimento da política
de desregulamentação do Estado do Bem-Estar Social, impulsionado pela
reestruturação do modelo clássico de gestão empresarial, cujo foco encontra-se na
descentralização administrativa e na repartição de competências interempresariais
(surgimento da terceirização).
Embora Maurício Godinho Delgado risque este último período com a sombra negra
da crise no contexto internacional, tendente a marcar a ruptura definitiva do Direito
do Trabalho em sua íntima relação com as questões sociais (desregulamentação),
termina por revelar uma situação menos caótica no cenário nacional, apontando este
período como sendo de “transição para um Direito do Trabalho renovado” no Brasil,
caracterizado pela flexibilização das normas trabalhistas.
2.2.1.2 Direito do Trabalho no Brasil
No Brasil, consoante registra Amauri Mascaro Nascimento (2001, p. 45), além da
influência sofrida pelas transformações ocorridas na Europa Ocidental, alguns
fatores internos motivaram a elaboração das primeiras leis trabalhistas, em que se
destacam: o movimento operário de imigrantes com inspiração anarquista,
resultando inúmeras greves (1900); o surto industrial (1919) e a política trabalhista
de Getúlio Vargas (1930).
29
Importante salientar que o Brasil destoava em muito da realidade da maioria dos
países capitalistas ocidentais, partindo da premissa de que se tratava de um país de
formação colonial, cuja economia essencialmente agrícola era regida por relações
escravistas de trabalho, situação que perdurou até fins do século XIX. Desta forma,
só há que se falar em relação de emprego e surgimento das primeiras leis
trabalhistas no Brasil após a promulgação da Lei Áurea (1888), embora alguns
doutrinadores, como Orlando Gomes e Élson Gottschalk, reputem este período
ainda como “fase pré-histórica” (2006, p. 6).
A evolução histórica do Direito do Trabalho, no Brasil, segue marcada por três
períodos distintos, tendo sido adotada mais uma vez a periodização apresentada por
Maurício Godinho Delgado (2006, p. 105-117):
a) Manifestações incipientes ou esparsas (1888 a 1930) – as relações empregatícias
centram no segmento agrícola cafeeiro de São Paulo e na emergente
industrialização surgida em São Paulo e Rio de Janeiro. Neste período, houve um
movimento operário marcado por forte influência anarquista liderada pelos
imigrantes. Por outro lado, predominou no Estado uma concepção liberal não
intervencionista, caracterizada, outrossim, pela descentralização política regional
(República Velha).
b) Institucionalização do Direito do Trabalho (1930 a 1945) – período de forte
intervenção administrativa e legislativa do Estado (centralizador e autoritário),
marcado pela repressão a manifestações autônomas do operariado, seguido de um
abrangente modelo de organização do sistema justrabalhista, diretamente
controlado pelo Estado, incorporadas neste as questões sociais.
São frutos desse período: criação do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio
(1930), do Departamento Nacional do Trabalho (1931), implantação de modelo
sindical oficial corporativista (1931), criação das Comissões Mistas de Conciliação e
das Juntas de Conciliação e Julgamento (1932), ambas parte do Poder Executivo à
época, e, finalmente, a criação da Justiça do Trabalho (1939). Tal modelo
justrabalhista estruturou a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT - 1943).
30
Note-se que, ao contrário do que aconteceu com a maioria dos países da Europa
ocidental, em que a sistematização e consolidação do Direito do Trabalho foram
impulsionadas pelo embate entre a sociedade civil e o Estado, fortalecendo o
movimento coletivo dos trabalhadores, no Brasil, a forte influência corporativa e
autoritária do Estado perdurou por longo período, revelando um Direito do Trabalho
resultante da vontade soberana do Estado e não da luta e amadurecimento da
classe trabalhadora. Daí a formação de um sindicalismo enfraquecido e pouco
representativo, inclusive com pouca repercussão, mesmo na fase de
redemocratização do país (1945).
c) crise e transição do Direito do Trabalho (1988 até os dias atuais) – fase marcada
pela tentativa de superação do modelo justrabalhista autoritário-corporativo, a
começar pelo não-intervenção do Estado na estrutura sindical e pelo incentivo
jurídico à negociação coletiva autônoma, com participação decisiva da sociedade
civil. Por outro lado, influências internacionais, dada a forte tendência à flexibilização
dos direitos historicamente conquistados pelos trabalhadores.
No entanto, concorda-se com a opinião de Mauricio Godinho Delgado (2006, p. 114-
115), quando afirma que esta não passa de uma fase de transição, melhor dizendo,
“de superação democrática das linhas centrais do antigo modelo autoritário-
corporativo”, já que, para ele, ainda não foram instauradas e consolidadas práticas e
instituições democráticas no sistema justrabalhista incorporado pela Carta
Constitucional de 1988, embora se deva salientar que nem todas as instituições lá
previstas sejam democráticas, a exemplo da vedação de se criar mais de uma
organização sindical na mesma base territorial (artigo 8º, inciso II, da Constituição
Federal).
É bom que se frise, outrossim, que todas as Constituições brasileiras previram
normas de Direito do Trabalho, desde a Constituição de 1934, sendo esta, inclusive,
a única que admitiu o pluralismo sindical, autorizando mais de um sindicato na
mesma categoria (profissional ou econômica), tão almejado em tempos modernos.
Embora o constituinte de 1988 não tenha se inspirado na Constituição de 1934, no
que tange à aceitação do pluralismo sindical, apresenta uma constituição inovadora
31
em vários aspectos, com destaque para a inclusão de direitos sociais e garantias
fundamentais, com a implantação do Estado Democrático de Direito.
No campo do Direito do Trabalho, incorpora princípios e direitos constitucionais
trabalhistas, como a isonomia de direitos referentes aos trabalhadores urbanos e
rurais e a valorização do direito coletivo, ao reconhecer a negociação coletiva
(acordo e convenção coletiva) como meio de solução pacífica dos conflitos laborais.
Relevante salientar que nestes vinte e dois anos de promulgação da Constituição
Federal (1988) muito se tem a comemorar, em especial, o rompimento da influência
autoritária do Regime Militar, com a implantação do Estado Democrático de Direito.
Mas muito há para ser feito até se alcançar (se alcançar...) o ideal democrático.
E, neste sentido, muitas críticas despontam no cenário atual referente aos institutos,
princípios e normas constitucionais, que, sem sombra de dúvida, são uma realidade
na medida em que foram positivados pelo ordenamento jurídico pátrio. Porém, para
serem efetivados, requerem a participação ativa da população e a luta constante
para que se atinja a tão sonhada sociedade livre, justa e igualitária.
2.2.2 As fontes heterônomas do Direito do Trabalho vigentes no Brasil e a
tutela dos direitos do trabalhador
No capítulo em curso, reserva-se especial atenção à análise das fontes heterônomas
do Direito do Trabalho 5, retomando a ideia precípua de proposta de (re)definição
deste ramo jurídico, por considerar tal aspecto relevante para fins de observar se a
tutela dos direitos do trabalhador, no âmbito do Direito Individual, tem sido
efetivamente alcançada.
5 Segundo esclarece Maurício Godinho Delgado (2006, p. 143), fontes heterônomas seriam as regras cuja produção não se caracteriza pela imediata participação dos destinatários principais das mesmas regras jurídicas, sendo, em geral, as regras de direta origem estatal.
32
Importante que se registre, a título de delimitação de pesquisa, que não se
intenciona neste trabalho o aprofundamento do Direito Coletivo do Trabalho, embora
se reconheça sua crescente importância no contexto laboral pátrio. Parte-se da
premissa de que, em se afirmando a crise do Direito do Trabalho, por omissão
tutelar de um número expressivo de categorias de trabalhadores excluído do seu
manto protetivo, necessário o apontamento das razões que justifiquem a propositura
da mudança de paradigmas ao final apresentada.
Como anteriormente afirmado, as fontes heterônomas, no contexto contemporâneo,
ainda são consideradas as principais fontes normativas deste ramo jurídico,
malgrado se tenha conhecimento de que as autônomas (oriundas da autonomia
coletiva) se encontram em franca expansão na ordem jurídica laboral, por força de
inovações trazidas pela Constituição Federal de 1988.
Embora se possa reconhecer que o Direito do Trabalho no Brasil sofre um atraso
evolutivo de décadas em relação aos avanços percebidos nos países europeus, é
possível registrar um número expressivo de leis vigentes no país, cuja finalidade tem
sido o de garantir melhorias de condição de vida aos trabalhadores.
Destaque especial para a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT/1943),
Constituição da República Federativa do Brasil (CF/1988) e algumas leis
infraconstitucionais pós-Constituição Cidadã/88. Uma breve análise de tais normas
servirá como suporte para a reflexão atual acerca da crise (ou renovação?) do
Direito do Trabalho no Brasil.
A mais antiga das fontes heterônomas do Direito do Trabalho no Brasil ainda vigente
e a que mais concentra dispositivos em torno do Direito dos Trabalhadores
(empregados) é a Consolidação das Leis dos Trabalhadores (CLT), promulgada pelo
Decreto-Lei nº 5.452 de 1º de maio de 1943. Trata-se, como o próprio nome já
indica, da sistematização de leis trabalhistas esparsas vigentes à época da sua
aprovação, que se aplica até hoje a todos os empregados, indistintamente,
independente da natureza da atividade (técnica, manual ou intelectual).
33
Ressalta-se que a CLT, embora tenha sido um marco evolutivo na história do Direito
do Trabalho brasileiro e passe por paulatinas modificações, atualmente tem sido
considerada obsoleta, por não mais acompanhar a evolução legislativa e social dos
tempos modernos, principalmente no que diz respeito às normas sobre direito
coletivo, cujo ranço corporativista da política autoritária da década de 1930 ainda
vigora, dada a pouca valorização voltada à organização sindical, ao contrário do que
ocorreu com a Constituição Federal de 1988, objeto de análise subsequente.
A Constituição da República Federativa do Brasil (1988) desponta como um marco
inovador, como anteriormente evidenciado, por adotar como diretriz o
constitucionalismo social, mediante inclusão expressa de princípios fundamentais e
direitos sociais, na formação do Estado Democrático de Direito, inovando inclusive
na regulamentação de novos direitos do trabalhador (individual, coletivo e
processual), erigindo-os à categoria de direitos constitucionais trabalhistas.
Entretanto, há que se registrarem as pesadas críticas direcionadas à tão inovadora
Constituição, pois, apesar de se entender que as normas definidoras dos direitos e
garantias fundamentais tenham aplicação imediata, consoante art. 5º, LXXVIII, §1º, –
nas quais os direitos dos trabalhadores encontram-se inseridos6 – muitos dos seus
dispositivos requerem aprovação de leis complementares e ordinárias, restando
mitigada sua eficácia 7, ficando a mercê da disponibilidade legislativa, o que faz com
que tais normas sejam consideradas de aplicabilidade restritiva, resultando, assim,
numa inconstitucionalidade.
Ilustrando, no contexto das normas constitucionais trabalhistas, destaca-se, por
exemplo, o artigo 7º, inciso I, que dispõe sobre a proteção da relação de emprego
contra despedida arbitrária ou sem justa causa, que deverá ter previsão, em lei
complementar, referente à indenização compensatória e outros direitos, não
antecipadamente previstos pela Constituição.
6 Título II – Dos Direitos e Garantias Fundamentais; capítulo II – Dos Direitos Sociais da Constituição Federal de 1988. 7 Tércio Sampaio Ferraz Júnior (2003, p. 486) distingue efetividade de eficácia da seguinte forma: a) efetividade entende-se a observância verificada, a aplicação e a obediência ocorridas. Segundo ele, a norma efetiva é a norma observada em larga extensão; b) eficácia é termo relacionado com as condições de aplicação e obediência.
34
O mesmo ocorre quando se refere à proteção do trabalhador em face da automação
(art. 7º, inciso XXVII), aviso prévio proporcional (art. 7º, inciso XXI), entre outros,
todos dependentes de norma complementar ou ordinária, afetando, na opinião de
alguns estudiosos, a eficácia e, por conseguinte, sua efetividade, pela ausência de
regulamentação específica.
Neste sentido, são providenciais as palavras de Tércio Sampaio Ferraz Júnior (2003,
p. 486-487):
[...] a importância crescente do Estado social no seio do constitucionalismo forçou um recrudescimento da questão da eficácia, posto que a atribuição ao Estado de responsabilidades expressas na conformação adequada da sociedade impôs o crescimento progressivo do número de normas programáticas e, em conseqüência, a reflexão inevitável sabre (sobre) a chamada eficácia técnica, isto é, a possibilidade de a norma produzir seus efeitos jurídicos, donde a conhecida distinção entre auto-executoriedade e não-auto-executoriedade. Aqui claramente, a questão da eficácia se define por um problema de constatar-se a existência ou inexistência de condições técnicas de possibilidade e não de efetividade verificada. (correção nossa)
E mais adiante reforça:
[...] Afinal, há de se admitir que a ausência de condições técnicas (normas não-auto-executáveis) pode gerar para o Estado um descumprimento de suas funções sociais, portanto, uma certa ineficácia parcial no sentido de inefetividade parcial de suas normas. Por sua vez, tal inefetividade parcial repercutiria, de certa forma, numa possível paralisia do Estado, o que se tornaria, então, condição social de uma ineficácia técnica. (FERRAZ JUNIOR, 2003, p. 487)
Outra análise digna de nota diz respeito à participação efetiva dos trabalhadores.
Neste aspecto, a Constituição Federal/88 rompe com o paradigma corporativista do
Estado, proibindo qualquer interferência ou intervenção do Estado na organização
sindical (CF, artigo 8º, I), democratizando o sistema de gestão trabalhista vigorante,
ao criar condições favoráveis à ampla participação dos grupos sociais 8, mediante
formas autônomas de exercício do poder, como também abrindo espaço para a
efetiva atuação dos sindicatos, com o reconhecimento das convenções e acordos
coletivos, nos moldes do artigo 7º, XXVI e alguns outros incisos (VI, XIII, XIV).
8 Maurício Godinho Delgado (2006, p. 124) destaca como elemento renovador também da nova Constituição “a visão coletiva dos problemas, em anteposição à visão individualista preponderante, oriunda do velho Direito Civil”.
35
No entanto, críticas também são apontadas no contexto da estrutura e dinâmica
sindicais, com destaques para a manutenção da contribuição sindical obrigatória (art.
8º, IV) e da unicidade territorial sindical 9 (art. 8º, IV), como já evidenciado
anteriormente, o que acaba por ameaçar o novo perfil democrático de gestão
trabalhista.
Em síntese, o que se delineia no panorama pós-constituição de 1988 é um quadro
de antinomias, evidenciando, por um lado, um conjunto de normas e institutos
inovadores, que tendem à implantação de uma sociedade livre, justa e igualitária,
atinente aos direitos sociais; e, por outro, a manutenção de instrumentos e práticas
autoritárias, pois ainda há resquícios do modelo corporativista, quando se depara
com a preponderância do direito individual sobre o coletivo, a supremacia da solução
estatal dos conflitos, a manutenção da unicidade sindical, elementos que acabam
por limitar as normas e institutos atuais e comprometer o Estado Democrático de
Direito.
Por fim, dando seguimento à breve análise das principais fontes primárias do Direito
do Trabalho vigentes no Brasil, oportuno se faz evidenciar que o Direito do Trabalho
não se encontra adstrito à regulamentação prevista pela CLT e pela Constituição
Federal. Existe um aparato de leis esparsas que estão sendo promulgadas após o
advento da Constituição Federal de 1988, com destaque para temas já
regulamentados como: o Direito de Greve (Lei 7.783/89); o salário mínimo (Lei nº
7.789/89); o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (Lei nº 7.839/89 alterada pela
Lei nº 8.036/90), o trabalho da mulher (Lei nº 7.855/99). Muitas outras leis
trabalhistas existem no ordenamento jurídico, embora não tenham sido citadas neste
texto, dado o escopo apenas de ilustrar os avanços já obtidos em matéria de
regulamentações atinentes ao Direito do Trabalho no Brasil. Apesar disto, se
reconhece que críticas e aperfeiçoamentos são passíveis em qualquer destas
regulamentações ora expostas.
9 A despeito de a Constituição Federal de 1934 ter inovado ao admitir o pluralismo sindical.
36
2.3 DIREITO DO TRABALHO NO CAPITALISMO MODERNO – CRISE OU
RENOVAÇAO?
Tomando como base a definição apresentada no início do capítulo e a subsequente
evolução histórica do Direito do Trabalho, é possível traçar alguns comentários
acerca da atual situação deste ramo jurídico no Brasil e no mundo, ante as
transformações no contexto capitalista moderno, malgrado se considere muito cedo
arriscar qualquer definição no cenário justrabalhista atual. Neste sentido, estaria o
Direito do Trabalho em crise ou em fase de renovação?
Em se tratando de salientar as profundas transformações ocorridas no cenário
capitalista atual, pertinente considerar a reflexão apresentada por Márcio Pochmann,
em “O mundo do trabalho em mudança” (1999, p. 15), quando denuncia de forma
veemente:
[...] se observarmos o período em que estamos vivendo, sobretudo os principais atores sociais, identificamos, do ponto de vista do capital, naqueles que detêm os meios de produção, um momento de profunda incerteza em relação a quais são as novas fontes de investimento. Deve-se investir em novas plantas produtivas, em novas tecnologias, ou deve-se investir os recursos disponíveis no mercado financeiro, na compra e ações, na compra de outras empresas? Qualquer decisão errada significa a falência ou até a possibilidade de inviabilizar o negócio, a empresa. Ao mesmo tempo, se observarmos sob o ponto de vista dos governos, constataremos uma profunda instabilidade. [...] É um momento, então, de profunda instabilidade dos governos, e por que não dizer, um momento de profunda insegurança do ponto de vista do trabalho. Essa insegurança diz respeito à possibilidade de emprego, ocupação, renda e condições futuras de inserção na sociedade [...].
Neste mister, Maurício Godinho Delgado reforça tal entendimento ao afirmar que, em
pleno século XXI, vive-se a quarta fase do Direito do Trabalho (crise e transição) 10,
iniciada no final do século XX, consubstanciada por uma série de fatores a seguir
apontados:
10 Orlando Gomes e Élson Gottschalk evidenciam, na obra “Curso de Direito do Trabalho” (2006, p. 4-6), cinco fases distintas: 1º período – fins do século XVIII até Manifesto Comunista (1848); 2º período – a partir de 1848 (Manifesto Comunista); 3º período – a partir de 1891 (Encíclica De Rerum Novarum e a Conferência de Berlim); 4º período – fim da 1º Guerra e Tratado de Versalhes; 5º período – fim do século XX (3ª. Revolução Industrial ou Revolução Tecnológica).
37
[...] De um lado, uma crise econômica, iniciada alguns anos antes, entre 1973/74 (a chamada crise do petróleo), [...] acentuando a concorrência interempresarial e as taxas de desocupação no mercado de trabalho. A par disso, agravava o déficit fiscal do Estado, colocando em questão seu papel de provedor de políticas sociais intensas e generalizantes. De outro lado, um processo de profunda renovação tecnológica, capitaneado pela microeletrônica, robotização e microinformática. Tais avanços da tecnologia agravavam a redução dos postos de trabalho em diversos segmentos econômicos, em especial na indústria, chegando a causar a ilusão de uma próxima sociedade sem trabalho. Além disso, criavam ou acentuavam formas de prestação laborativa (como o teletrabalho e o escritório em casa – home-office), que pareciam estranhas ao tradicional sistema de contratação e controle empregatícios. Em meio a esse quadro, ganha prestígio a reestruturação das estratégias e modelos clássicos de gestão empresarial, em torno dos quais se construíram as normas justrabalhistas. Advoga-se em favor da descentralização administrativa e da radical repartição de competências interempresariais, cindindo-se matrizes tradicionais de atuação do Direito do Trabalho. (2006, p. 97-98)
Considerando os fatores anteriormente evidenciados, é coerente afirmar que o
Direito do Trabalho, no Brasil e no mundo, tem sofrido um engessamento, nos
moldes como têm sido interpretadas, literalmente, suas normas, princípios e
institutos, por proteger apenas os envolvidos na relação de emprego, condição esta
que destoa da realidade atual, relegando aos “desmandos” da livre iniciativa uma
gama enorme de trabalhadores hipossuficientes, que não se enquadram na clássica
categoria de empregados formalmente contratados.
A título de informação, dados estatísticos do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE), com base na Pesquisa Mensal de Emprego (PME) do mês de
julho/2009, estimam em 23,2 milhões a população economicamente ativa no Brasil 11. Neste contexto, o percentual de trabalhadores com carteira de trabalho assinada
no setor privado (exclusive trabalhadores domésticos, militares, funcionários públicos
estatutários e outros) é de apenas 45,1%; trabalhadores sem carteira de trabalho
assinada no setor privado (exclusive trabalhadores domésticos, militares,
funcionários públicos estatutários e outros) é de 12,6%; militares ou funcionários
públicos estatutários é de 7,5%; e trabalhadores por conta própria perfazem um
percentual de 18,7% da população ocupada.
11 Dados colhidos nas seis regiões metropolitanas abrangidas pela pesquisa (São Paulo, Recife, Belo Horizonte, Salvador, Rio de Janeiro, Porto Alegre).
38
Detalhe: grande parte desta mão-de-obra excluída do setor formal acaba migrando
para a informalidade, predominando, em regra, aqueles de baixa escolaridade, o que
evidencia a precarização do trabalho, uma vez que as empresas têm priorizado a
contratação formal dos trabalhadores qualificados, reforçando, assim, o contingente
de hipossuficientes não albergados pela CLT e desconsiderados pelo Direito do
Trabalho, como autônomos, “parassubordinados”, eventuais.
Não se pode olvidar, é certo, que a relação de emprego, desde os primórdios do
capitalismo industrial, ainda tem sido a principal modalidade de prestação de
trabalho 12, sob o ponto de vista econômico e social. No entanto, várias décadas se
passaram desde a Consolidação das leis do Trabalho (1943), a promulgação da
Carta Magna (1988) e as inúmeras transformações de ordem política, social e
econômica, as quais, indubitavelmente, vêm interferindo diretamente no mundo do
trabalho.
Aliás, Amauri Mascaro Nascimento revela de forma sintética o panorama atual de
transformações evidenciadas nas relações de trabalho da sociedade dita “pós-
industrial” da seguinte forma:
Assistimos às transformações do mundo das relações de trabalho numa sociedade que produz mais com pouca mão-de-obra. A tecnologia mostrou o seu lado cruel: a substituição do trabalho humano pelo software; a desnecessidade, cada vez maior, de um quadro numeroso de empregados para obter os mesmos resultados com redução da demanda de trabalhadores entre 25% e 35% da força de trabalho; a informatização e a robótica como principais fatores de crescimento da produtividade; o aumento do desemprego e do subemprego em escala mundial; o avanço da sociedade de serviços maior do que a sociedade industrial; novas profissões; sofisticados meios de trabalho, uma realidade bem diferente daquela na qual o direito do trabalho nasceu. (2001, p. 43)
Como visto, a substituição da mão-de-obra humana pelas máquinas, oriunda da
revolução tecnológica, desencadeia um número cada vez mais crescente de
desemprego e subemprego. Por outro lado, o deslocamento do trabalhador da zona
rural para a zona urbana e do setor industrial urbano para o setor de serviços tem
alterado consideravelmente o perfil do trabalhador, gerando uma infinidade de novas
12 De acordo com os dados estatísticos do IBGE apresentados no texto acima, o contingente percentual de empregados atinge a ordem de 57,7% (45,1% com carteira assinada, 12,6% sem carteira assinada).
39
profissões, carentes de regulamentação especifica e que não encontram guarida na
regulamentação do trabalho subordinado (CLT).
Prudente observar que a Carta Magna não restringe trabalho a emprego. Existe, no
conjunto de normas e princípios constitucionais, uma série de preceitos relativos ao
trabalho tomado em seu sentido amplo, como os valores sociais do trabalho (artigo
1º, IV), o trabalho como um direito social (artigo 6º), e algumas normas cuja
aplicação é taxativamente voltada para a relação de emprego, a exemplo da
proteção da relação de emprego contra despedida arbitrária (artigo 7º, inciso I),
seguro-desemprego nos casos de desemprego involuntário (artigo 7º, inciso II) e
política de pleno emprego como princípio da ordem econômica e financeira (artigo
170, inciso VIII).
Portanto, há uma necessidade de se discutir a atual abrangência interpretativa no
que se refere à aplicação do Direito do Trabalho no Brasil, centrando-a numa
interpretação sistêmica, à luz da concepção do Direito Constitucional do Trabalho, a
fim de inserir tanto os trabalhadores informais, como as novas formas contratuais
surgidas pós-revolução tecnológica, garantindo aos trabalhadores, na condição de
categoria fundamental, um “patamar mínimo existencial”, definido por Nelson
Mannrich (2000, p. 571) como sendo “o conjunto dos direitos e garantias
fundamentais dos trabalhadores”.
Em se tratando do trabalho informal, pertinente a reflexão feita pelo sociólogo José
Pastore (2004, p. 2), em entrevista concedida ao Jornal Zero Hora (Porto Alegre), ao
falar sobre a necessidade de modernização da legislação trabalhista, por tratar-se de
uma legislação “tamanho único”. Segundo ele, “há necessidade de criar uma
legislação para esse mundo desprotegido, para os mais vulneráveis: as mulheres, os
trabalhadores rurais, os jovens, as pessoas de meia-idade”, grupo de trabalhadores
que, segundo ele, fazem parte do “mundo do trabalho, trabalhando informalmente,
precariamente, esporadicamente”, excluídos do “mundo de emprego”. Aponta, desta
forma, para a necessidade da “criação de novas modalidades de proteção para
aqueles que não têm nada”, sugerindo “uma legislação cuja proteção não está
atrelada ao emprego, mas às pessoas”.
40
Neste sentido, Sergio Pinto Martins (2007, p. 17) declara como fundamento do
Direito do Trabalho “melhorar as condições de trabalho dos obreiros e também suas
situações sociais, [...] podendo, por meio de seu salário, ter uma vida digna para que
possa desempenhar seu papel na sociedade”. Isto explica o porquê de os valores
sociais do trabalho e a dignidade da pessoa humana serem erigidos, no texto
constitucional, à condição de fundamentos do Estado Democrático de Direito. E não
é à toa que o Direito ao Trabalho e os demais direitos dos trabalhadores, insculpidos
no título ‘Direitos e Garantias Fundamentais’ – capítulo II (Dos Direitos Sociais, artigo
6º e 7º) –, são considerados cláusulas pétreas, não podendo ser modificados sequer
por emendas constitucionais, conforme preceitua o artigo 60, parágrafo 4º, inciso IV
da Constituição Federal.
Tais princípios e normas têm a finalidade precípua de garantir um patamar
existencial mínimo ao trabalhador. Neste diapasão, Maurício Godinho Delgado
apropria-se do termo “patamar civilizatório mínimo” para considerá-lo como sendo:
[...] direitos revestidos de indisponibilidade absoluta [...] imantada por uma tutela de interesse público [...] que a sociedade democrática não concebe ver reduzido em qualquer segmento econômico-profissional, sob pena de se afrontarem a própria dignidade da pessoa humana e a valorização mínima deferível ao trabalho. (2006, p. 117)
Entretanto, há de se considerar a ressalva apresentada sobre patamares mínimos
pelo próprio Nelson Mannrich, em artigo integrado na obra ‘Temas Relevantes de
Direito Material e Processual do Trabalho’:
O conceito de patamares mínimos é variável no tempo e no espaço, pois vincula-se não apenas a valores, mutáveis conforme a época, mas à própria economia e, neste caso, depende de como cada Estado reage aos desafios da globalização e desenvolve mecanismos de defesas contra o mercado, com proteções e direitos mais ou menos cristalizados. Daí porque a experiência de outros países pode não ser aplicável de forma necessária em nosso meio. (2000, p. 570-571)
Revendo a abordagem feita logo no início deste capítulo, note-se que, no primeiro
momento em que a definição do Direito do Trabalho fora aqui aventada, adotou-se
uma postura crítica, por não haver uma sintonia semântica entre a nomenclatura e a
categoria efetivamente tutelada. Agora, em consideração às fases mais avançadas
de transição (ou crise?) do Direito do Trabalho, nunca uma definição foi tão
41
adequada, pois, em tempos de globalização e seus reflexos no mundo do trabalho,
urge a necessidade de tutelar todos os trabalhadores indistintamente, vinculados a
uma relação laboral (subordinada ou não), desde que hipossuficientes.
Assim, resgatando-se a definição inicial adotada por Ives Gandra Martins Filho
(2009, p. 28), aparentemente superficial e frágil, é possível constatar quão atual e
ampliativo se apresenta: “[...] o ramo do Direito que disciplina as relações de
trabalho, tanto individuais como coletivas”.
No auge da maior crise do sistema econômico capitalista pós-1929, em pleno século
XXI, torna-se inevitável concluir que a relação laboral típica tem perdido espaço para
novas modalidades de contratação, em decorrência do surgimento de formas de
apropriação do trabalho por conta de outrem (trabalho temporário, terceirizado,
cooperado, parassubordinado), além de se registrar uma crescente ocupação de
mão-de-obra informal no Brasil, como visto, que deve ser combatida a todo custo,
sob pena de precarização do trabalho, desconstrução do quadro evolutivo de
conquistas do trabalhador hipossuficiente e consequente desobediência ao princípio
da dignidade do trabalhador.
Por outro lado, é inevitável a constatação de que este ramo tem avançado em outras
relações de trabalho que não envolvem especificamente o trabalhador subordinado,
outrora rotulado, frise-se, como a única categoria de trabalhadores hipossuficientes
(por exemplo, o trabalhador avulso13).
Inclusive é possível identificar algumas espécies do próprio gênero empregatício
que, em vez de se enquadrar na tutela específica regulamentada pela CLT e pela
Constituição Federal, possui regulamentação jurídica específica, como os
trabalhadores domésticos (que sofrem restrição de direitos constitucionais quando
comparados aos empregados), os rurais, os estagiários, tema que será retomado em
capítulo específico.
13 O trabalhador avulso é equiparado ao trabalhador subordinado (empregado) no que tange à igualdade de direitos segundo determinação constitucional (art. 7º, inciso XXXIV).
42
Este quadro expansionista fora observado inclusive por José Augusto Rodrigues
Pinto e Otávio Augusto Reis, em atualização à obra de Orlando Gomes e Élson
Gottschalk (2006, p. 20). Embora enfáticos quando afirmam ser o objeto do Direito
do Trabalho “a regulamentação do trabalho subordinado, esteja o trabalhador na
empresa ou fora dela”, opinião a qual respeitosamente se refuta, não se furtam,
entretanto, de admitir o alargamento do Direito do Trabalho, acentuando:
[...] o expansionismo do Direito do Trabalho manifesta-se através de tendência de alargamento de suas fronteiras, quanto às pessoas que deve reger. Esta tendência contemporânea se explica essencialmente pelo fato de ser o Direito do Trabalho uma legislação de proteção aos economicamente débeis. Assim, tende a aplicar-se a pessoas que não concluíram um contrato de trabalho em sentido estrito, como ocorre, entre nós, com os pequenos empreiteiros; a pessoas que não concluíram nem mesmo um contrato de trabalho, como acontece no caso dos aprendizes e na imposição de mão-de-obra, e, em certos casos, aos trabalhadores independentes, tais como os a domicílio; os avulsos; os trabalhadores temporários; os parceiros rurais; os agentes de seguro; os representantes de comércio, conforme a legislação de alguns países. (GOMES; GOTTSCHALK, 2006, p. 33)
Direciona-se, neste sentido, a ampliação da competência material da Justiça do
Trabalho, por força das modificações trazidas pela Emenda Constitucional nº 45, de
30 de dezembro de 2004, a qual dispõe sobre a reforma do Poder Judiciário e
modifica o artigo 114 da Constituição Federal 14, no sentido de determinar que
litígios que envolvem a relação de trabalho sejam processados e julgados por esta
justiça especializada, não mais se restringindo às controvérsias envolvendo
empregados e empregadores15.
Este tema, inicialmente, dividiu doutrinadores de renome em quatro correntes
distintas, conforme exposição sintética apresentada por Jorge Luiz Souto Maior16
14 Art. 114. Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar: I - as ações oriundas da relação de trabalho, abrangidos os entes de direito público externo e da administração pública direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios; [...] VI as ações de indenização por dano moral ou patrimonial, decorrentes da relação de trabalho; [...] IX outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho, na forma da lei. 15 Há que se registrar que, em Constituições anteriores à de 1988, admitia-se como competência da Justiça Laboral a inclusão de outras relações de trabalho, desde que reguladas por lei especial, a exemplo da Constituição de 1946 (art.123) e de 1967 (art. 134). 16 Para a primeira corrente, tudo que envolva trabalho, independe da natureza das pessoas envolvidas (natural ou jurídica) ou da forma da prestação do serviço, está, agora, sob a competência da Justiça do Trabalho.
43
(2005, p. 1-2). No entanto, a consciência crescente da necessidade de efetivação de
direitos no contexto da realidade social fez predominar a corrente atual que insere
na competência da Justiça do Trabalho toda e qualquer forma de relação de trabalho
(subordinado, autônomo, “parassubordinado”), abandonando o antigo critério
subjetivo de fixação de competência para adotar o critério objetivo (ex ratione
materiae).
Resta, por fim, refutar a remanescente controvérsia acerca dos litígios que envolvem
relação de consumo como sendo de competência da Justiça do Trabalho; ficam
aqueles reservados à Justiça especializada consumerista e, na sua inexistência, à
Justiça Comum, por serem distintas as relações. Para tanto, necessário se faz
caracterizar os sujeitos de cada relação, o que se fará com base nos
esclarecimentos revelados por Otávio Calvet:
Percebe-se, assim, que entre o trabalhador e o usuário final existe uma outra pessoa, o tomador dos serviços, que usa da energia do trabalhador para impulsionar sua atividade empresarial, buscando no usuário final o pagamento pelo fornecimento do produto ou da prestação do serviço. Numa relação de trabalho, portanto, nunca pode aparecer como tomador do serviço o usuário final, este mero cliente consumidor, mas sempre alguém que, utilizando do labor adquirido pela relação de trabalho, realiza sua função social perante os usuários finais. (2005, p. 55-57)
Se é possível admitir a confusão entre as figuras do trabalhador e do fornecedor de
serviços 17 (trabalhador autônomo, por exemplo), não existe, por outro lado, qualquer
semelhança entre o consumidor e o tomador de serviço. Aquele, conforme artigo 2º
do Código de Defesa do Consumidor, “adquire ou utiliza produto ou serviço como
A segunda corrente vai na mesma linha, apenas excluindo a tutela para os prestadores de serviços pessoas jurídicas. Admite, portanto, o processamento na Justiça de Trabalho de conflitos que envolvem relação de consumo, mesmo sem o critério da hipossuficiência do prestador ou da continuidade na relação. A terceira, mais restritiva, além de exigir a pessoalidade na prestação de serviço, ainda estabelece, como pressuposto da competência da Justiça do Trabalho, que o prestador de serviço esteja sob dependência econômica do tomador dos seus serviços ou que haja, pelo menos, uma continuidade nesta prestação. A quarta corrente recusa à expressão "relação de trabalho", trazida no inciso I, qualquer caráter inovador com relação ao que já constava do mesmo artigo 114 antes da edição da EC 45, ou seja, que continuariam na competência da Justiça do Trabalho apenas os conflitos decorrentes da relação de emprego. 17 CDC, Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.
44
destinatário final”, cujo pleito judicial versará sobre direitos e obrigações oriundos da
relação de consumo, sendo considerado hipossuficiente na relação em que se
encontra envolvido; o tomador de serviço, por sua vez, detentor do poder diretivo e
econômico, encontra-se envolto em matéria atinente a direitos e obrigações
trabalhistas, jamais sendo tratado como hipossuficiente em qualquer das relações,
aspecto digno de reflexão.
Ainda sobre a ampliação da competência da Justiça do Trabalho, pertinente registrar
que as ações de interesse dos servidores vinculados por típica relação estatutária ou
de caráter jurídico-administrativo (artigo 114, inciso I, da Constituição Federal) é a
única exceção de relação do trabalho não pertinente à Justiça do Trabalho. Isto se
deve ao fato de que tal dispositivo encontra-se suspenso, por força de liminar
concedida pela Suprema Corte, com efeito ex tunc, em ação direta de
inconstitucionalidade 18.
Ressalte-se, no entanto, que independente da ampliação material da Justiça do
Trabalho, prevista na Emenda Constitucional nº 45, os litígios oriundos de relação
trabalhista terão como base de aplicação o direito material previsto na CLT e
legislação complementar no que tange à relação de emprego e, no que se refere à
relação de trabalho, sentido amplo, o Código Civil e legislação especial correlata,
restando prejudicados os casos dos trabalhadores informais e “parassubordinados”,
carentes de legislação específica, que acabam por se enquadrar na regulamentação
do artigo 593 do Código Civil 19, cujo tratamento reduz (quando não exclui) direitos
trabalhistas historicamente conquistados.
Neste mister, pertinente refletir sobre o capítulo constitucional que regulamenta os
direitos do trabalhador (II - Dos Direitos Sociais) à luz do princípio da isonomia. Sob
a égide deste princípio, deverá receber tratamento isonômico toda categoria de
trabalhadores (lato sensu) – urbanos e rurais. Inclusive o legislador fora enfático ao
evidenciar quais direitos constitucionais foram exclusivamente voltados para a
18 ADIN nº 3.395-6 de 27 de janeiro de 2005. 19 CC, art. 593. A prestação de serviço, que não estiver sujeita às leis trabalhistas ou a lei especial, reger-se-á pelas disposições deste Capítulo (Código Civil, Capítulo VII – Da Prestação de Serviço).
45
proteção específica do empregado e seus correlatos, conforme o artigo 7º, inciso I,
II, XIII, XIV, XVIII, XXVI, XXVIII, XXXIV 20.
No entanto, o que parece ser um dispositivo claro, tornou-se celeuma no âmbito
doutrinário e jurisprudencial, uma vez que o supracitado artigo, ao dispor sobre
direitos dos trabalhadores (urbanos e rurais), gerou a clássica predominância no
entendimento de que os direitos ali positivados se dirijam especificamente aos
empregados, não se aplicando tais dispositivos aos trabalhadores em geral, como
deveria ser.
Malgrado existam interpretações divergentes na doutrina e jurisprudência pátria em
torno dos direitos constitucionais trabalhistas, imperioso atentar para o fato de que a
Constituição Federal, como norma suprema do ordenamento jurídico, precisa
regulamentar os direitos mínimos dos trabalhadores como categoria fundamental.
Neste sentido, entende-se que os demais dispositivos constitucionais encontram-se
previstos de forma generalizada a todos os trabalhadores, em respeito ao
fundamento constitucional da dignidade da pessoa humana (art. 1ª, III, da
Constituição Republicana), do princípio da isonomia e da valorização social do
trabalho (art. 170, caput, da Constituição Republicana de 1988), embora na prática 20 CF, art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: I – relação de emprego protegida contra despedida arbitrária ou sem justa causa, nos termos de lei complementar, que preverá indenização compensatória, dentre outros direitos; II – seguro-desemprego, em caso de desemprego voluntário [...] XIII – duração do trabalho normal não superior a oito horas diárias e quarenta e quatro semanais, facultada a compensação de horários e a redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva. XIV – jornada de seis horas para o trabalho realizado em turnos ininterruptos de revezamento, salvo negociação coletiva; [...] XXIV – igualdade de direitos entre o trabalhador com vínculo empregatício permanente e o trabalhador avulso. [...] XVIII – licença à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com a duração de cento e vinte dias; [...] XXVI – reconhecimento das convenções e acordos coletivos de trabalho; [...] XVIII - seguro contra acidente de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa; XXXIV – Igualdade de direitos entre o trabalhador com vínculo empregatício permanente e o trabalhador avulso;
46
tais direitos pareçam distantes da realidade dos trabalhadores brasileiros não
subordinados.
Registre-se que não se está aqui propondo o resgate da intervenção estatal vivida
nas décadas de 30, tampouco o completo afastamento do Estado no que se refere
às relações laborais. “Nem tanto ao mar, nem tanto a terra”. O que se defende é
uma política de atuação estatal nos limites da garantia dos direitos fundamentais, de
modo que o patamar mínimo dos trabalhadores esteja assegurado.
Não se pode perder o foco da análise, qual seja, a característica finalística do Direito
do Trabalho. Sabe-se que este ramo jurídico, conforme já declarado anteriormente e
expressamente previsto no artigo 7º da Constituição Federal (in fine), visa
precipuamente à melhoria das condições sociais do trabalhador em sua relação
laboral, mediante obediência aos princípios e direitos previstos (ou negociados),
permitindo inclusive a criação de novos direitos que alcancem tais melhorias. Resta,
portanto, inquestionável o grau de interferência nas relações sociais e pessoais do
trabalhador.
Vai-se mais longe ao afirmar que o trabalho tem participação indispensável na
consolidação do Estado social. Isto acentua a função integradora do trabalho na
sociedade e a necessidade de atualização do objeto e da legislação do Direito do
Trabalho em tempos de transição. Assim, lança-se como proposta de modernização
do Direito do Trabalho brasileiro – cujas alterações se efetivarão a longo prazo – a
completa reestruturação deste ramo jurídico, com a elaboração de um Código do
Trabalhador (CT), com inserção de toda regulamentação trabalhista vigente,
passando a CLT a regular as relações de trabalho subordinado e a ocupar apenas
um tópico específico deste pretenso Código.
Neste contexto, reforça-se o papel da Constituição Federal como regulamentador
das relações de trabalho, em seu sentido genérico, fazendo valer os direitos
fundamentais trabalhistas como patamar mínimo a todos os trabalhadores
(independente da sua forma de contratação ou natureza laborativa), inspirado na
orientação da OIT voltado para a defesa do trabalho digno. É o que se pretende
aprofundar no último capítulo deste trabalho.
47
3 A CRISE DA RELAÇÃO DE EMPREGO E A NECESSIDADE DE (RE)ADEQUAR
O TRABALHO AO CONTEXTO JURÍDICO
Após análise da visão tradicional do Direito do Trabalho e sua função protetiva, e
revelada a visão panorâmica deste ramo jurídico no contexto capitalista moderno,
dá-se seguimento ao trabalho, partindo-se para a missão de denunciar a crise da
relação de emprego, segundo a análise da natureza do vínculo empregatício e seus
elementos caracterizadores, não sem antes apresentar um quadro distintivo entre
relação de trabalho e relação de emprego, cuja abordagem pretende revelar que o
trabalhador, em plena atividade laboral, pode submeter-se a regimes jurídicos
distintos no ordenamento pátrio, a depender da relação laboral em que se encontra
inserido, e qual a repercussão jurídica deste tratamento diferenciado.
3.1 DISTINÇAO ENTRE RELAÇÃO DE TRABALHO E RELAÇÃO DE EMPREGO E
SUA REPERCUSSÃO JURÍDICA
Por muito tempo utilizou-se a expressão “relação de trabalho” como sendo sinônima
de “relação de emprego”, tornando-se um jargão no contexto jurídico trabalhista.
Respeitáveis doutrinadores adotaram abertamente tal “analogia” 21, como o fez
Maurício Godinho Delgado, em seu ‘Curso de Direito do Trabalho’, ao enfatizar, em
capítulo específico sobre a caracterização da relação de emprego:
[...] deve o leitor atentar para o fato de que, muitas vezes, está-se utilizando a expressão relação de trabalho (ou contrato de trabalho) com o objetivo estrito de se referir às figuras técnico-jurídicas da relação empregatícia ou contrato empregatício. (2006, p. 287)
Trata-se de engano digno de nota, uma vez que, ao analisar detidamente a
semântica das palavras, em seu contexto, tem-se que o sentido toma proporções
21 Termo usado pelos gregos antigos para expressar similaridade em relações proporcionais. Nas disciplinas sociais e políticas, as analogias servem para esclarecer termos não conhecidos, em função do que é mais familiar. (Enciclopédia Barsa, 1994, p. 26c).
48
totalmente distintas do enunciado, evidência destacada inclusive pelo próprio autor
em comento, quando esclarece o significado especifico de cada expressão:
[...] A ciência do Direito enxerga clara distinção entre relação de trabalho e relação de emprego. A primeira expressão tem caráter genérico: refere-se a todas as relações jurídicas caracterizadas por terem sua prestação essencial centrada em uma obrigação de fazer consubstanciada em labor humano. Refere-se, pois, a toda modalidade de contratação de trabalho humano modernamente admissível. A expressão relação de trabalho englobaria, desse modo, a relação de emprego, a relação de trabalho autônomo,a relação de trabalho eventual, de trabalho avulso e outras modalidades de pactuação de prestação de labor [...]. Traduz, portanto, o gênero a que se acomodam todas as formas de pactuação de prestação de trabalho existentes no mundo jurídico atual. (DELGADO, 2006, p. 285-286)
E mais adiante revela incisivamente:
A relação de emprego, entretanto, é, do ponto de vista técnico-jurídico, apenas uma das modalidades específicas de relação de trabalho juridicamente configuradas. Corresponde a um tipo legal próprio e específico, inconfundível com as demais modalidades de relação de trabalho ora vigorantes. (DELGADO, 2006, p. 286)
Em assim sendo, se a relação de emprego, nas palavras de Maurício Godinho
Delgado, é “um tipo legal próprio e específico, inconfundível com as demais
modalidades de relação de trabalho”, não é possível considerar tais expressões
como sendo sinônimas, sob pena de gerar distorções em seu sentido real, não
obstante seja veemente a defesa do Ilustre doutrinador ao considerar “meramente
acadêmica e formalista a insistência em se recusar validade teórica às expressões
tradicionais [...]”. (2006, p. 287)
Neste sentido, clarividente a definição apresentada por Arion Sayão Romita no que
concerne à relação de trabalho em sentido lato:
A relação jurídica que existe sempre em que um trabalhador se obriga à prestação de trabalho em proveito de outrem pode ser denominada relação de trabalho. Conceito amplo, como se vê, abrangendo as formas de trabalho desinteressado (gratuito, isto é, não oneroso) e também de trabalho prestado em regime de autonomia, mediante remuneração. (1975, p. 30 apud ALVES, 2004, p. 51)
A preocupação em distinguir as relações laborais tem tido uma razão especial: se se
equiparar a relação de trabalho com a relação de emprego, considerando-as como
49
expressões sinônimas, os efeitos de ambos os institutos certamente se tornariam
coincidentes, o que em regra não se admite no sistema jurídico pátrio. Para a
relação de emprego, tem-se o Direito do Trabalho; para a relação de trabalho, tem-
se, ironicamente, o Direito Civil, com regulação específica nos contratos.
Esclarecendo... Quando o assunto é a proteção legal de qualquer das relações de
trabalho, é cediço que o Direito do Trabalho centra sua regulamentação basilar
(institutos, normas e princípios) apenas na relação de emprego, excluindo as demais
relações de trabalho. Como outrora justificado, tal predileção se deve ao fato de que,
ao longo dos últimos séculos, a relação de trabalho predominante sempre fora a
empregatícia.
A repercussão distintiva não termina aí. Como anteriormente registrado, no sistema
jurídico pátrio a proteção do trabalhador ocorre de forma diferenciada, por ramos
específicos do Direito, evidenciando a incompletude do Direito do Trabalho no trato
com o sujeito de direito a que se destinaria, em tempos de tutela da dignidade
humana e do valor social do trabalho.
Percebe-se, outrossim, que o tratamento jurídico reservado ao trabalhador
subordinado frente ao empregador é protecionista, cuja desigualdade formal se
justifica pela condição de hipossuficiente daquele; já o trabalhador regido pelo
Código Civil tem tratamento igualitário frente ao tomador de serviço, sendo ignorada
a sua provável condição de hipossuficiência.
Por estes motivos é bom que se frise: toda relação de emprego implica numa
relação de trabalho, mas nem toda relação de trabalho pode ser enquadrada como
sendo uma relação de emprego. Pois, se assim fosse, algumas relações de trabalho
tidas como fronteiriças da relação de emprego poderiam se equiparar em proteção
ao trabalhador, o que não ocorre, como são as hipóteses dos representantes
comercias, dos cooperados, dos trabalhadores em domicílio, dos trabalhadores
intelectuais, igualmente hipossuficientes.
Logo, prudente adotar a expressão “relação de emprego” quando se referir a
situações trabalhistas específicas envolvendo empregado e empregador; e “relação
50
de trabalho” quando se pretender abordar qualquer das modalidades de trabalho
desenvolvida pelo homem, em sentido genérico, incluindo o trabalho autônomo,
voluntário, eventual, entre outros, a fim de que se possa identificar o regulamento
que acolhe cada tipo de trabalhador.
Há que se ressaltar, porém, que esta situação distintiva vem sendo criticada em
tempos de reestruturação do sistema produtivo. Isto se deve ao fato de que, com o
surgimento de modalidades de contratação, estas tem se mostrado carentes de
proteção jurídica, forçando, assim, a ruptura de paradigmas em defesa da garantia
constitucional de melhoria das condições sociais dos trabalhadores em sua realidade
laboral.
Espera-se, deste modo, que o Direito do Trabalho, inspirado na influência
neoconstitucionalista do direito (sobre tal influência se reserva o próximo capítulo de
análise), se torne adequado para atender todos os que buscam proteção por força
da hipossuficiência na venda de sua força de trabalho (manual, intelectual),
independente da clássica distinção entre trabalhador e empregado.
Neste sentido, reservam-se, ao texto constitucional, normas e princípios gerais
diretivos a todas as categorias de trabalhadores, buscando melhoria de condições
sócio-laborais, fundamentado na eficácia dos direitos fundamentais em prol da
dignidade do trabalhador. Este, frise-se, é o objetivo central desta dissertação.
Prudente ressaltar que a própria subordinação clássica, outrora revelada como
principal requisito de caracterização da relação de emprego, tem-se tornado
elemento frágil para configurar a relação laboral própria regida pelo Direito do
Trabalho. Por esta razão, reservar-se-á, a seguir, tópico específico para análise dos
pressupostos caracterizadores da relação de emprego, à luz da análise contextual
da relação contratual firmada, a fim de que se possa refletir acerca da verdadeira
atuação do Direito do Trabalho no contexto contemporâneo.
51
3.2 RELAÇAO DE EMPREGO E CONTRATO DE TRABALHO TÍPICO: UMA BREVE
ANÁLISE DA NATUREZA JURÍDICA DO VÍNCULO EMPREGATÍCIO E SEUS
ELEMENTOS CARACTERIZADORES
Uma vez feita a distinção entre relação de trabalho e relação de emprego, a fim de
situar, no contexto atual, a tutela jurídica reservada a cada um destes ramos
juslaborais distintos, intenta-se centrar um pouco mais na relação de emprego,
destacando sua natureza jurídica e seus elementos caracterizadores, por se tratar
da relação laboral predominante no cenário jurídico pátrio, a fim de que se possa
evidenciar, ao final, a atual crise por que tem passado esta relação em específico.
3.2.1 Da natureza jurídica do vínculo empregatício
Quando se procura definir a relação de emprego segundo seus elementos
caracterizadores, tem-se de pronto uma primeira dificuldade. Há uma tendência
natural na ordem juslaboral de se confundir relação de emprego e contrato de
trabalho. Não há unanimidade entre os doutrinadores neste sentido. “Quem estuda o
contrato individual de emprego, no Brasil, defronta-se com dois conceitos: um,
correto, da doutrina; outro, incorreto, da legislação”. São palavras de José Augusto
Rodrigues Pinto22 (2003, p. 161).
No mesmo sentido proclama Amauri Mascaro Nascimento:
Inicialmente, é preciso advertir que não há uniformidade na denominação que os autores dão ao vínculo jurídico, que tem como partes, de um lado, o empregado, e de outro lado, o empregador. Nem mesmo a nossa lei se definiu, nela sendo encontrada tanto a expressão contrato individual de
22 Para José Augusto Rodrigues Pinto (2003, p. 161), a definição doutrinária de contrato individual de emprego é o ajuste tácito ou expresso que faculta ao empregador utilizar a energia pessoal e permanente do empregado, mediante subordinação e retribuição, para a realização dos fins de sua empresa. Critica, por sua vez, a definição apontada pela CLT, art. 442, considerando-a imprestável, sob o argumento de ser ela redundante, pois todo contrato expressa uma relação jurídica, reforçando o argumento ao considerar que há respeitável corrente no Direito do Trabalho de opinião anticontratualista.
52
trabalho como relação de emprego, no que não está só. Em outras leis também podem ser encontradas ambas as expressões (2001, p. 145)
Tal indefinição doutrinária, como visto, origina-se da própria imprecisão legislativa a
respeito do tema, uma vez que, na mais específica fonte heterônoma do Direito do
Trabalho (CLT), o vínculo empregatício encontra-se regulamentado pelo contrato de
trabalho (Título IV, Capítulo I), que é definido como sendo “o acordo tácito ou
expresso, correspondente à relação de emprego” (art. 442). Surge assim a grande
dúvida: seria o vínculo empregatício um acordo contratual ou uma relação jurídica de
emprego?
Há quem sustente, na doutrina, serem as expressões sinônimas, no mesmo sentido
do legislador, como Arnaldo Süssekind (apud NASCIMENTO, 2001, p. 149). No
entanto, é comum encontrar doutrinadores adeptos a duas teorias doutrinárias
antagônicas, que justificam a natureza jurídica do vínculo empregatício com
argumentos próprios: a contratualista e a anticontratualista.
Segundo Maurício Godinho Delgado, tais teorias se apresentam predominantes em
determinado período histórico:
A pesquisa sobre a correta natureza jurídica do fenômeno da relação empregatícia percorreu caminho sinuoso entre os juristas. Inicialmente, preponderou a tendência civilista de subordinar a nova e emergente figura do Direito às figuras clássicas e tradicionais do contratualismo do Direito Civil (“teorias contratualistas tradicionais”). [...] Em seguida, já no século XX, surge a tendência de se procurar romper com qualquer traço teórico de origem civilista – e, portanto, qualquer traço teórico de origem contratual. Para este fim construiu-se caminho próprio e distintivo de elaboração teórica, com nítido caráter de resposta e antítese às proposições civilistas anteriores (“teorias da relação de trabalho e institucionalistas”). Finalmente, chega-se a uma síntese teórica mais equilibrada e complexa, hábil a apreender não só os elementos aproximativos, mas também os diferenciadores de relação de emprego perante o conjunto de relações e institutos próximos e perante o universo jurídico conceitual existente (“teoria contratualista moderna”). (2006, p. 308)
Os defensores da teoria contratualista 23, pioneira na consideração da natureza
jurídica da relação entre empregado e empregador, centram-se no acordo de
23 Encontram-se inseridos nesta corrente contratualista: Amauri Mascaro Nascimento (2001, p. 149), Maurício Godinho Delgado (2006, p. 314), José Augusto Rodrigues Pinto (2003, p. 167-168).
53
vontade dos pactuantes para considerar o vínculo empregatício como sendo oriundo
de um contrato (negócio jurídico), herança do Direito Civil, do qual o Direito do
Trabalho se origina, muito embora a corrente contratualista moderna reconheça ser
este um contrato de características próprias, com forte interferência estatal, o que
acaba por limitar a autonomia da vontade das partes.
É o que afirma Maurício Godinho Delgado, ao apontar as características específicas
do contrato de emprego em distinção ao contrato clássico:
O contrato surgido não é, entretanto, figura assimilável a qualquer das figuras contratuais clássicas ao universo teórico do Direito Civil. Nesse quadro, embora o gênero próximo seja o contratual, existe uma diferença específica a distanciar o contrato empregatício do conjunto das figuras contratuais civilistas. É que se trata, no presente caso, de relação contratual específica, distinta e ímpar. Trata-se de relação contratual que tem por objeto uma obrigação de fazer (obligatio faciendi) prestada com não eventualidade, onerosamente, de modo subordinado e em caráter de pessoalidade (intuitu personae) no que tange ao prestador do trabalho [...]. (2006, p. 315)
Prudente ressaltar que os doutrinadores da corrente anticontratualista – a seguir
apresentada – sustentam que a limitação da autonomia da vontade, por intervenção
normativa estatal, atinge frontalmente a liberdade das partes, o que desconfigura a
natureza contratual do vínculo, por ferir seu elemento distintivo.
Alguns doutrinadores, como Luiza Riva Sanseverino (1976, p. 115) e Maurício
Godinho Delgado (2006, p. 314), rebatem esta argumentação alegando que a
vontade, como particularização da liberdade, embora sofra limitação quando se trata
de definição do conteúdo do vínculo empregatício, é imprescindível para a definição
da pactuação (formação da relação). Tal raciocínio se justifica em razão da completa
ausência de liberdade na vinculação dos trabalhadores que precederam a fase
capitalista, marcados pela servidão ou escravidão.
Admitindo-se a natureza contratual do vínculo empregatício, embora sob a ênfase da
mitigação da autonomia plena dos pactuantes, há quem sustente, inclusive, tratar-se
de contrato de adesão, como o faz Orlando Gomes e Élson Gottschalk (2006, p.
54
146)24, por considerar que “os direitos e obrigações de empregados e empregadores
derivam, na sua maioria, de fontes independentes e superiores à sua vontade”, ou
seja, o empregado não participa ativamente da elaboração das cláusulas
contratuais, apenas aderem àquelas expostas pelo empregador, e este, por sua vez,
celebra com base nas normas cogentes estatal.
José Augusto Rodrigues Pinto (2003, p. 167) também o rotula como contrato de
adesão, mas faz uma ressalva digna de nota. Para ele, a adesão neste caso se
caracteriza não pela predominância “da vontade de um contratante às regras pré-
firmadas pelo outro, mas da vontade de ambos às regras legais”.
No sentido antagônico, encontram-se os defensores da corrente anticontratualista
(teoria da relação de trabalho e a teoria institucionalista), que negam a autonomia da
vontade dos pactuantes como elemento definidor da relação jurídica.
A primeira teoria considera a empresa como uma comunidade de trabalho, cujas
metas são atingidas pela prestação de serviços, o que faz incorporar o trabalhador
(subordinado) a esta comunidade. Desta forma, a prestação de serviço (fato-
trabalho) passa a ser o elemento gerador de direitos e obrigações, independente da
vontade das partes. No Brasil, em tese, esta teoria não encontra respaldo, por se
admitir como serviço efetivo o período em que o trabalhador encontra-se à
disposição do empregador, aguardando ordens (CLT, artigo 4º) 25.
A segunda teoria considera a empresa uma instituição regida por uma situação
estatutária, na qual são previstas as condições de trabalho, sem qualquer discussão
contratual entre empregado e empregador, muito embora se atribua ao empregador
o poder disciplinar. Esta teoria também não encontra abrigo no Direito trabalhista
pátrio conforme evidencia o já supracitado artigo 444 da Consolidação das Leis do
Trabalho (CLT).
24 Segundo Orlando Gomes e Élson Gottschalk (2006, p. 146), “o processo de admissão do empregado difere, atualmente, do modo ordinário por que se contrai um vínculo contratual, revestindo frequentemente a forma de adesão”. 25 CLT, art. 4º. Considera-se como de serviço efetivo o período em que o empregado esteja à disposição do empregador, aguardando ou executando ordens, salvo disposição especial expressamente consignada.
55
Ante as teorias explicativas da natureza jurídica da relação de emprego
anteriormente apresentadas, a que mais se aproxima do contexto legal pátrio é
aquela que a define como sendo um contrato de adesão, por considerar que
indubitavelmente a relação de emprego nasce de um pacto laboral, embora sob forte
intervenção estatal, não só na regulamentação do vínculo desde sua gênese até a
extinção (intervencionismo normativo voltado para a proteção dos direitos
fundamentais do empregado), como também na permissividade legal de
interferência sindical nas negociações coletivas. Neste aspecto, melhor seria
substituir o termo enigmático “correspondente” do artigo 442 da CLT para
“constitutivo” da relação de emprego.
Entretanto vale refletir sobre o tema com cautela, despido de dogmatismos
característicos de períodos históricos precedentes, a fim de reconhecer tratar-se de
uma figura híbrida, quiçá uma novidade normativa dos tempos contemporâneos. Isto
porque não se pode negar que, no sistema normativo trabalhista pátrio, o vínculo
empregatício em regra se origina de um negócio jurídico, cujo objeto distintivo em
relação a outros contratos típicos é o trabalho subordinado remunerado, prestado
pelo empregado em atendimento às necessidades do empregador e do próprio
empregado (direitos fundamentais).
Ora, como ao empregado ainda não é dada a oportunidade de discutir as cláusulas
contratuais a serem obedecidas (relação de desigualdade fática e jurídico-formal),
ficando a cargo do empregador (poder diretivo), do Estado (intervenção normativa
mínima) e do sindicato representativo da categoria, entende-se que o empregado se
incorpora a esta “comunidade laboral”, sob “condições regulamentadoras de
trabalho”, para cumprir os fins objetivados por aquela. Aqui se percebe uma sutil
identificação com as teorias anticontratualistas.
Por outro lado, ainda sob análise da teoria contratualista, tem-se que a autonomia
das partes, elemento formador da relação empregatícia, não pode mais ser
sustentada, pois, diferentemente da liberdade plena e da vontade caracterizadora
dos contratos típicos do Direito Civil (relação de igualdade entre os pactuantes,
embora com necessidades distintas), no contrato de emprego as partes encontram-
se vulneráveis, convencionando, por mera necessidade de inserção social,
56
participação no contexto consumeirista moderno, a despeito da vontade de formação
do vínculo e do cumprimento do pacto26.
Insiste-se em afirmar, portanto, que hodiernamente não cabe mais argumentar a
autonomia da vontade como elemento característico da vinculação laboral em razão
da liberdade do trabalhador, em detrimento da submissão plena vivida pelos
trabalhadores servis e escravos, pois, partindo para uma análise mais depurada
sobre o quadro evolutivo de tal liberdade, vê-se que o trabalhador nunca fora livre –
inicialmente, foi dominado pelo senhor feudal, passou pelo senhor escravocrata,
chegou ao domínio dos capitalistas, que perdura até os dias atuais.
Ilustra bem este quadro de vulnerabilidade social a declaração feita por Marcio
Pochmann (1999, p. 9):
Neste final de século, a mundialização das economias emerge no curso de políticas neoliberais que atuam contra a produção e o trabalho. As medidas de desregulamentação do mercado de trabalho e de flexibilização dos contratos conformam um quadro geral de fogo cruzado contra o trabalho. Predominam políticas governamentais favoráveis à valorização financeira do capital, com medidas deflacionistas para os preços e redução do Estado. Por conta disso, a constituição de um dique capaz de conter e reverter as tendências de desemprego, precarização e exclusão representa um dos principais desafios deste final de século.
No entanto, embora não se possa mais afirmar ser a autonomia da vontade o
elemento caracterizador da relação de emprego, dada a vulnerabilidade das partes
envolvidas e da forte intervenção estatal, não se pode negar que tal vínculo se
forma, em regra, pelas vias contratuais. Buscando amparo na legislação trabalhista,
encontram-se, no artigo 444 cominado com o artigo 8º da CLT, disposições
esclarecedoras neste sentido:
Art. 444. As relações contratuais de trabalho podem ser objeto de livre estipulação das partes interessadas em tudo quanto não contravenha às disposições de proteção ao trabalho, aos contratos coletivos que lhes sejam aplicáveis e às decisões das autoridades competentes.
26 Com a melhoria da qualidade de vida pós-revolução científica e tecnológica, os trabalhadores almejam investir melhor seu tempo no aprimoramento pessoal e no lazer, embora sejam obrigados a trabalhar por força da inevitável dependência econômica, marcante na era do consumo exacerbado. Os empregadores, por sua vez, sob alegação de elevados custos na contratação de empregados, têm reduzido cada vez mais o quadro de trabalhadores subordinados, investindo em tecnologia ou na terceirizando de serviços.
57
Art. 8º. As autoridades administrativas e a Justiça do Trabalho, na falta de disposições legais ou contratuais, decidirão, conforme o caso, pela jurisprudência, por analogia, por equidade e outros princípios e normas gerais de direito, principalmente do direito do trabalho, e, ainda, de acordo com os usos e costumes, o direito comparado, mas sempre de maneira que nenhum interesse de classe ou particular prevaleça sobre o interesse público.
Logo, conclui-se por distinta a definição de relação de emprego e contrato de
trabalho, sendo este, em regra, o fato gerador da relação empregatícia, por meio do
qual se vinculam empregado e empregador, segundo ditames legais cogentes.
Desta forma, com o fim de sanar o problema da imprecisão técnica, sugere-se, ao
definir contrato individual de trabalho (CLT, art. 442), a substituição do termo
“corresponde” pela expressão “que constitui a”, de maneira que a redação final se
apresente da seguinte forma: “Contrato individual de trabalho é o acordo tácito ou
expresso que constitui a relação de emprego”.
Aliás, o momento é oportuno para se esclarecer que o termo “contrato de trabalho” é
semanticamente inadequado por envolver todo tipo de atividade laboral (remunerada
ou não), cujas distinções já foram discutidas em tópico anterior. Melhor seria adotar
a terminologia “contrato de emprego”, para distinguir o vínculo empregatício formal
dos demais vínculos trabalhistas.
3.2.2 Dos elementos caracterizadores do vínculo empregatício
Sabe-se que a relação de emprego é um fenômeno sócio-jurídico e, como tal,
implica considerar um conjunto de elementos sociais e jurídicos dentro de um
contexto espacial e temporal, cuja conexão gera a relação em apreço. Todavia, a
seguinte reflexão se torna inevitável: Seria, então, a simples caracterização dos
sujeitos ou da prestação do serviço suficiente para definir a relação empregatícia?
Obviamente tal resposta será negativa, pois não é possível considerar qualquer dos
elementos caracterizadores do vínculo empregatício isoladamente, em sua unicidade
(sujeitos envolvidos ou tipo de prestação laboral). Sobre este aspecto, afirma
Maurício Godinho Delgado:
58
[...] a relação empregatícia, enquanto fenômeno sociojurídico, resulta da síntese de um diversificado conjunto de fatores (ou elementos) reunidos em um dado contexto social ou interpessoal. [...] o fenômeno sociojurídico da relação de emprego deriva da conjugação de certos elementos inarredáveis (elementos fático-jurídico), sem os quais não se configura a mencionada relação. [...] Esses elementos ocorrem no mundo dos fatos, existindo independentemente do Direito (devendo, por isso, ser tidos como elementos fáticos). Em face de sua relevância sociojurídica, são eles porém captados pelo Direito, que lhes confere efeitos compatíveis (por isso devendo, em conseqüência, ser chamados de elementos fático-jurídicos). (2006, p. 290) (grifos conforme o original)
Atento a esta circunstância, Maurício Godinho Delgado, em seu “Curso de Direito do
Trabalho” (2006, p. 290-305), reúne cinco elementos jurídico-formais constitutivos da
relação de emprego, sem os quais, segundo a maioria dos autores, não há que se
considerar válida tal relação. São eles: prestação de trabalho por pessoa física a
outrem, com pessoalidade, não-eventualidade, onerosidade e sob subordinação. Em
apertada síntese, discorre-se sobre cada um dos elementos a seguir.
A exigência de se admitir o empregado como sendo apenas pessoa física27 deve-se
ao fato de que o Direito do Trabalho, ao tutelar o indivíduo, em sua relação jurídico-
trabalhista, tem como alvo bens jurídicos fundamentais, inseridos na Carta
constitucional (art. 5º, caput c/c art.6º, caput), diretamente relacionados com a
pessoa do trabalhador, quais sejam: vida, liberdade, igualdade, segurança,
integridade física e moral, saúde, lazer.
Logo, pode-se concluir que tais bens não se estendem à pessoa jurídica, uma vez
que esta, a priori, não se encontra sob proteção legal trabalhista, admitindo-se que o
empregador possa ser tanto pessoa física quanto jurídica.
Seguindo a linha de análise dos requisitos jurídicos da relação de emprego, tem-se
que a proteção trabalhista se volta à pessoa do trabalhador (empregado) que firmou
o contrato e cumpriu com o pactuado, tornando-se, assim, sujeito titular do direito.
Por esta razão, não se admite, na relação empregatícia, a fungibilidade subjetiva
intermitente na prestação do trabalho (substituição por outro trabalhador). 27 CLT, art. 3º. Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador [...]. (grifo nosso)
59
Em outros termos, a relação empregatícia pactuada deve ser intuitu personae com
relação ao prestador de serviço (empregado), cuja obrigação não se estende ou
transmite a herdeiros ou sucessores, por força de extinção do contrato28. É o que
afirma Orlando Gomes:
Em princípio a morte de uma das partes não constitui causa de dissolução do contrato. A regra mors omnia solvit 29 não tem aplicação no direito contratual, senão excepcionalmente nos contratos “intuitu personae” quando morre a parte cujas qualidades personalíssimas foram determinantes de sua realização. Nos demais casos, as obrigações do contrato transmitem-se aos herdeiros do finado. (2001, p.189)
Por óbvio, a substituição temporária do trabalhador, na função por ele exercida, não
tem o mesmo condão do que fora anteriormente analisado; em casos específicos,
sendo admissível por o trabalhador originalmente contratado encontrar-se com suas
atividades suspensas ou interrompidas, em gozo de direitos trabalhistas que lhe são
assegurados (férias, licença para tratamento de saúde, faltas legais permitidas).
Assim, a pessoalidade é uma característica que vincula o empregado à relação
empregatícia, uma vez que o trabalho deverá ser desenvolvido pelo próprio
trabalhador contratado, nos moldes do que fora pactuado, sob pena de
descaracterização desta relação. Inclusive, quando se trata de definir o empregador,
a CLT, artigo 2º, declara, como uma das prerrogativas deste, o poder de direção da
prestação de serviço que deve ser personalizada, conforme se depreende do artigo
em epígrafe: “Considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que,
assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação
pessoal de serviço” (grifo nosso)
28 Em caso de morte de um dos contratantes na relação laboral, Orlando Gomes (2001, p.189) chama a atenção para a impropriedade técnica de utilizar a nomenclatura resolução ou resilição do contrato, e explica o porquê: “Entre as causas de extinção de contratos, a morte de um dos contratantes ocupa lugar à parte. Sua inclusão nos outros modos de dissolução não tem realmente cabimento. Não é possível afirmar-se que resolve o contrato. Sem dúvida, impossibilita sua execução, ou faz cessá-la definitivamente, mas, a rigor, não pode ser considerada inexecução involuntária, porque seus efeitos não se igualam aos do caso fortuito. Não se justifica, também, enquadrá-la entre as causas de resilição, como procede a doutrina francesa, pois a resilição se caracteriza por ser conseqüência de manifestação da vontade de um ou dos dois contratantes. 29 Provérbio jurídico romano que significa: “a morte tudo resolve”.
60
De outro modo, em havendo substituição por outro trabalhador, nasce, para este
último, uma nova relação jurídica, tornando-se legalmente titular de direitos, quando
se enquadrar em qualquer das seguintes hipóteses: cargo em comissão (artigo 450
da CLT)30, contratação por tempo determinado com prorrogações (artigo 451 da
CLT)31, contratação temporária (Lei nº 6.019 de 21 de janeiro de 1974) 32 ou Súmula
do Tribunal Superior do Trabalho, n. 159, I33.
Visto sob o ângulo oposto, a pessoalidade não se aplica como requisito
caracterizador da relação empregatícia, no que tange à figura do empregador.
Admite-se a sua substituição sem modificar a proteção ao empregado, em casos de
alteração subjetiva contratual (artigo 448 da CLT)34. Encontra-se prevista no
ordenamento jurídico, inclusive, a despersonalização da pessoa jurídica do
empregador para se garantir efetividade na tutela dos direitos do trabalhador, o que
demonstra a predominância pela impessoalidade em se tratando da figura do
empregador.
Outro requisito destacado na relação de emprego é o que regula a prestação do
trabalho em sua constância temporal. Neste sentido, o fator tempo é crucial para se
estabelecerem dois aspectos distintos: a) a duração do contrato, com fito em fixar
permanência indeterminada no emprego, sob a égide do princípio da continuidade
30 CLT, art. 450. Ao empregado chamado a ocupar, em comissão, interinamente, ou em substituição eventual ou temporária, cargo diverso do que exercer na empresa, serão garantidas a contagem do tempo naquele serviço, bem como volta ao cargo anterior. 31 CLT, art. 451. O contrato de trabalho por prazo determinado que, tácita ou expressamente, for prorrogado mais de uma vez passará a vigorar sem determinação do prazo. 32 Lei 6.019, art. 12 - Ficam assegurados ao trabalhador temporário os seguintes direitos: a) remuneração equivalente à percebida pelos empregados de mesma categoria da empresa tomadora ou cliente calculados à base horária, garantida, em qualquer hipótese, a percepção do salário mínimo regional; b) jornada de oito horas, remuneradas as horas extraordinárias não excedentes de duas, com acréscimo de 20% (vinte por cento); c) férias proporcionais, nos termos do artigo 25 da Lei nº 5107, de 13 de setembro de 1966; d) repouso semanal remunerado; e) adicional por trabalho noturno; f) indenização por dispensa sem justa causa ou término normal do contrato, correspondente a 1/12 (um doze avos) do pagamento recebido; g) seguro contra acidente do trabalho; h) proteção previdenciária nos termos do disposto na Lei Orgânica da Previdência Social, com as alterações introduzidas pela Lei nº 5.890, de 8 de junho de 1973. 33 TST, Súmula n. 159, I – Enquanto perdurar a substituição que não tenha caráter meramente eventual, inclusive nas férias, o empregado substituto fará jus ao salário contratual do substituto. 34 CLT, art. 448. A mudança na propriedade ou na estrutura jurídica da empresa não afetará os contratos de trabalho dos respectivos empregados.
61
da relação empregatícia; b) a caracterização do requisito da continuidade exigida na
prestação do serviço (não eventualidade para alguns doutrinadores).
Sobre o primeiro aspecto, destaca-se a importância desta forma de contratação
tanto do ponto de vista jurídico como socioeconômico, pois, em atendimento ao valor
social do trabalho como fundamento do Estado Democrático de Direito, parte-se da
premissa de que o trabalhador precisa ter segurança da continuidade de sua
atividade laboral, para fins de manutenção da sobrevivência e inserção social.
Daí a razão de se preferir o contrato individual do trabalho por tempo indeterminado
na ordem laboral pátria, tratando os contatos por tempo determinado como
exceções, voltados à contratação temporária de empregados especializados ou para
atendimento a situações especiais da empresa.
Infelizmente, a reestruturação do sistema produtivo contemporâneo tem minado as
bases deste princípio e sua correspondente segurança, dada a tendência crescente
de contratação por terceirização, fortemente marcada por prestações de serviços de
curta duração, cuja extinção contratual se dá ao término de cada atividade efetivada.
Sobre este aspecto, se rediscutirá em capítulo seguinte ao tratar da crise do
emprego.
O segundo aspecto relativo ao tempo diz respeito à exigência, para efeito de
configuração da relação empregatícia, de que a prestação da atividade seja
desenvolvida de forma contínua, ou seja, não eventual (art. 3º da CLT e art. 1º da
Lei nº 5.859/72)35. Isto se justifica pelo fato de que a legislação que regulamenta a
relação empregatícia não admite o trabalho eventual. Há exclusão protetiva neste
sentido, por faltar-lhe um dos elementos fático-juridicos evidenciados no início deste
tópico, embora seja inevitável constatar que esses trabalhadores sejam igualmente
subordinados e hipossuficientes.
35 CLT, art. 3º. Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviço de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário. (grifo nosso) Lei nº 5.859/72, art. 1º. Ao empregado doméstico, assim considerado aquele que presta serviços de natureza contínua e de finalidade não lucrativa à pessoa ou à família, no âmbito residencial destas, aplica-se o disposto nesta Lei. (grifo nosso)
62
Não se pretende, neste espaço, aprofundar as teorias informadoras da noção de
eventualidade 36. Interessa, entretanto, evidenciar que, em tese, tal requisito
encontra-se condicionado à natureza da atividade a ser desenvolvida, voltada, em
regra, para a atividade-fim da empresa (teoria dos fins do empreendimento) 37, o que
exige “fluidez temporal sistemática” em seu exercício.
Vale salientar, entretanto, que determinadas atividades empregatícias, malgrado a
natureza contínua do serviço a ser prestado, passam a ser desenvolvidas, na
contemporaneidade, de forma fragmentada, em atendimento à necessidade
precípua do tomador do serviço de auferir lucros ou reduzir custos (nos casos de
contratação de trabalhadores domésticos). Ocorre o que muitos doutrinadores
chamam de precarização do trabalho, tema que será resgatado no próximo tópico
quando se tratar da crise do emprego.
É o que, ilustrativamente, tem ocorrido com frequência no âmbito das relações
familiares, cujas atividades domésticas, outrora desenvolvidas diariamente, passam
a ter ocorrência de forma esparsa, surgindo no cenário a categoria dos diaristas
(trabalhadores autônomos), excluídos do núcleo de proteção trabalhista por força da
ausência de subordinação e da eventualidade com que prestam seus serviços38.
36 Neste aspecto, Maurício Godinho Delgado (2006, p. 294) aponta quatro teorias distintas informadoras da noção de eventualidade: teoria da descontinuidade, teoria do evento, teoria dos fins do empreendimento e teoria da fixação jurídica. 37 Maurício Godinho Delgado (2006, p. 296) define tal teoria como sendo aquela em que considera eventual o trabalhador chamado a realizar tarefa não inserida nos fins normais da empresa, o que a caracteriza, em última instância, como sendo esporádica e de estreita duração. 38 Como exemplo, são colacionadas jurisprudências colhidas no TRT da 15ª e 10ª região, relacionadas ao reconhecimento do vínculo empregatício de diarista e seus critérios de julgamento: EMENTA: FAXINEIRA – DIARISTA – VÍNCULO EMPREGATÍCIO COMO EMPREGADA DOMÉSTICA – NÃO-CARACTERIZACÃO – Faxineira que trabalha, como diarista, em residência particular, duas vezes por semana, com liberdade para prestar serviços em outras residências, e, até, para escolher dia e horário de trabalho, não se constitui como empregada doméstica, para efeito de aplicação da Lei nº 5.859/72, qualificando-se, antes, como verdadeira prestadora autônoma de serviço. Ausência dos requisitos da não-eventualidade e da subordinação, qual seja este último o principal elemento da relação de emprego. (TRT 15ª R. – RO 14.617/2000 – Rel. Juiz Luiz Antônio Lazarim – DOESP 28.01.2002) EMENTA: DIARISTA – VÍNCULO EMPREGATÍCIO – A Lei nº 5.859/72, que regula o trabalho doméstico, estabelece como um dos pressupostos para a configuração da relação de emprego a continuidade na prestação de serviços, não se podendo considerar doméstica a diarista que presta serviços em residência, como passadeira e faxineira, e lá comparece dois dias na semana, por assim atender interesse e disponibilidade próprios. Recurso conhecido e provido. (TRT 10ª R. – ROPS 4136/2001 – 3ª T. – Relª Des. Márcia Mazoni Cúrcio Ribeiro – DJU 29.09.2006)
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Partindo para o penúltimo elemento jurídico-formal constitutivo da relação de
emprego, observa-se que a onerosidade apresenta-se como um conectivo entre o
trabalhador e o processo produtivo, razão pela qual se excluem da caracterização de
empregado todo trabalhador que desenvolve atividade não remuneratória, do tipo
voluntário, filantrópico, comunitário, ou seja, ausente a contraprestação onerosa.
Outro aspecto digno de nota no que tange à onerosidade diz respeito ao fato de que,
visando ao aumento da eficiência e controle de qualidade dos seus produtos,
voltados para as exigências do mercado competitivo contemporâneo, as empresas
têm buscado a reformulação de suas estruturas produtivas, impondo mudanças
também no perfil dos trabalhadores, deles se exigindo maior grau de escolaridade,
aptidão para trabalhar em equipe, diversificação de conhecimento, ao contrário da
tradicional especialização exigida ao trabalhador.
Malgrado se registrem tais modificações em função da melhoria de qualidade da
mão-de-obra laboral, o mesmo não se pode esperar da contraprestação oferecida
pelo empregador, que resiste em aumentar proporcionalmente os salários do
trabalhador. Entretanto, em tempos de constitucionalização dos direitos, aposta-se
numa atuação mais enfática dos sindicatos, principais representantes sociais dos
trabalhadores, no sentido de luta por melhoria das condições de trabalho e
remuneração dos trabalhadores, em prol da dignidade da pessoa humana, capazes
de suprir as necessidades básicas do trabalhador e de sua família, consoante o art.
7º, inciso IV da Constituição Federal 39.
Finalmente, atinge-se o ponto de maior relevo do trabalho, uma vez que a
subordinação é tratada na doutrina pátria e no Direito Comparado, de forma
unânime, como sendo o principal elemento jurídico-formal constitutivo da relação de
emprego. Isto se justifica porque, apesar da necessidade de se atentar para o
conjunto dos cinco elementos jurídicos que configuram a relação empregatícia
(serviço prestado por pessoa física, intuitu personae, onerosidade, não
eventualidade, subordinação jurídica), este tem sido considerado o único que não se
39 CF, art. 7º, IV – Salário mínimo, fixado em lei, nacionalmente unificado, capaz de atender a suas necessidades vitais básicas e às de sua família com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, com reajustes periódicos que lhe preservem o poder aquisitivo, sendo vedada sua vinculação para qualquer fim.
64
encontra presente nas outras relações de trabalho, o que o torna distintivo por
excelência.
Tomando como base a definição apresentada por Maurício Godinho Delgado (2006,
p. 302), a subordinação seria a “situação jurídica derivada do contrato de trabalho40,
pela qual o empregado comprometer-se-ia a acolher o poder de direção empresarial
no modo de realização de sua prestação de serviços”. Ainda sobre definição da
subordinação, Amauri Mascaro Nascimento (2001, p. 164) esclarece ser “uma
situação em que se encontra o trabalhador, decorrente da limitação contratual da
autonomia de sua vontade, para o fim de transferir ao empregador o poder de
direção sobre as atividades que desempenhará”.
Percebe-se, de imediato, que há uma coincidência no trato da subordinação voltada
a um critério objetivo. Este, aliás, tem sido a marca representativa da maioria das
definições apresentadas na doutrina, inclusive alienígena41, o que leva ao
entendimento de que o requisito a ser observado centra-se na ideia de submissão
do modo de realização da prestação de serviço do empregado para com o
empregador, e não da submissão da pessoa do empregado, “um matiz que es
manifestación del deseo de desligar la persona del trabajador, que conserva su
libertad plena, del trabajo que presta”, segundo ênfase de Mario de La Cueva (1980,
p. 203).
Malgrado a doutrina pátria e alienígena entenda ser a subordinação “jurídica” o
elemento caracterizador da relação de emprego, voltado para a submissão do modo
de realização a ser desempenhada pelo empregado, alguns pontos obscuros ainda
40 Sugere-se cautela ao vincular a subordinação ao contrato de trabalho, pois ao mesmo tempo em que possa existir um contrato vinculante desta relação (tácito ou expresso), poderá existir um contrato totalmente distinto com o fito de burlar a lei, camuflando uma verdadeira relação empregatícia. 41 Mario de La Cueva, em seu manual ‘El Novo Derecho Mexicano Del Trabajo’ (1980, p.203) demonstra a preocupação do legislador mexicano em definir o termo “subordinação”, relatando que na Lei de 1931, art. 17, o contrato de trabalho era definido como sendo “aquel por virtud del cual uma persona se obliga a prestar a outra, bajo su dirección y dependencia, um servicio personal mediante uma retribución convenida”. Já a Lei de 1970 expressa que “el trabajo protegido por la Ley es el subordinado”, cuja exposição de motivos esclarece ser a subordinação “la relación jurídica que se crea entre El trabajador y El patrono, em virtud de la cual está obligado el primero, en la prestación de sus servicios, a cumplir sus obligaciones y las instrucciones dadas por el segundo para el mejor desarrollo de las actividades de la empresa”.
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não foram esclarecidos, com destaque para a indefinição da natureza jurídica de tal
elemento.
A confusão semântica referenciada em outros capítulos mais uma vez vem à tona.
Segundo o artigo 3º da CLT, empregado é “toda pessoa física que prestar serviços
de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante
salário” (grifo nosso). Ora, o texto legal fala de “dependência”, a doutrina adota o
termo “subordinação jurídica”, com inferência na interpretação paralela do que vem a
ser empregador, também definido em lei (art. 2º, CLT): “empresa, individual ou
coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige
a prestação pessoal de serviço” (grifo nosso).
Neste sentido, denuncia Amauri Mascaro Nascimento (2001, p. 165):
Divergem os autores quanto ao modo como a subordinação é concebida. Para alguns, a subordinação é de natureza hierárquica, sendo considerada uma situação em que se encontra o trabalhador por se achar inserido numa organização de trabalho de outrem. Para outros, a subordinação é de natureza econômica; a dependência econômica, criticada porque nem todo dependente econômico é empregado, como filho em relação ao pai que o mantém. Para outros, a subordinação é técnica, significando que o empregado depende tecnicamente do empregador, tese que recebe a crítica de que os tecnocratas não dependem do empregador, este é que na verdade depende daqueles. Para outros a subordinação é jurídica, significando a situação contratual do trabalhador em decorrência da qual está sujeito a receber ordens, tese que vem recebendo maior aceitação.
Não se pode negar, a esta altura, que exista uma ordem de hierarquia entre
empregado e empregador, restando, ao primeiro, submissão de seu trabalho ao
comando do segundo. Vale, neste sentido, refletir acerca dos fatores que equilibram
esta relação tão díspar, cujos interesses se apresentam de forma completamente
distinta.
Em tempos de constitucionalização do Direito, em que se deve reconhecer o caráter
vinculativo e obrigatório das normas constitucionais no direito positivado, para efeito
de efetividade normativa, as normas do direito infraconstitucional (em específico o
Direito do Trabalho) encontram-se vinculadas aos ditames da Constituição,
acompanhando sua concepção axiológica.
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Neste sentido, partindo do fundamento constitucional que evidencia os valores
sociais do trabalho, imprescindível o resgate da classificação jurídica que reconhece
na relação de emprego três tipos de dependência do empregado para o
enquadramento da relação de emprego, já relatada anteriormente, em fragmento de
Amauri Mascaro Nascimento (2001, p. 165). São elas: técnica (operacional),
econômica e social.
Para efeito de atualização terminológica, adotar-se-á o termo dependência
operacional como substitutiva da dependência técnica. Por conseguinte, entende-se
que o empregado possui dependência operacional, na medida em que, embora
tenha domínio técnico voltado para a sua atuação (conhecimento especializado),
deve integrar-se aos comandos operacionais gerais advindos do empregador
(organizador dos meios de produção), que detém a tecnologia e a integralidade da
operacionalização da empresa.
Frise-se: o empregado é parte integrante da engrenagem produtiva, de onde advém
sua subordinação técnica, daí se justifica sua submissão em acolher o poder de
direção empresarial no modo de realização de sua prestação de serviços, nele
incluso o poder diretivo, regulamentar, fiscalizatório e disciplinar42.
A dependência econômica revela-se outro elemento que deve ser considerar quando
se trata da caracterização da relação de emprego. Isto porque, ao contrário do que
se argumenta, em regra, o empregado depende exclusiva ou principalmente desta
fonte de renda para atender sua necessidade de consumo, ainda que o salário
supere os limites de sobrevivência do trabalhador e de sua família. Em outras
palavras, o trabalhador vende sua força de trabalho em prol de uma remuneração
42 Mauricio Godinho Delgado (2006, p. 631) em sucinta explanação define: a) poder diretivo (ou poder organizativo) – conjunto de prerrogativas tendencialmente concentradas no empregador dirigidas à organização da estrutura e espaço empresariais internos, inclusive o processo de trabalho adotado no estabelecimento e na empresa, com a especificação e orientação cotidianas no que tange à prestação de serviços; b) Poder regulamentar – conjunto de prerrogativas tendencialmente concentradas no empregador dirigidas à fixação de regras gerais a serem observadas no âmbito do estabelecimento e da empresa (p. 632); c) Poder fiscalizatório – (ou poder de controle) – conjunto de prerrogativas dirigidas a propiciar o acompanhamento contínuo da prestação de trabalho e a própria vigilância efetivada ao longo do espaço empresarial interno (p.634); d) Poder disciplinar – conjunto de prerrogativas concentradas no empregador dirigidas a propiciar a imposição de sanções aos empregados em face do descumprimento por esses de suas obrigações contratuais (p.636).
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que passa a se incorporar no seu patrimônio, sendo o veículo, inclusive, de sua
inserção social.
Além do mais, em análise depurada sobre a condição do empregador, outros fatores
denunciam a dependência econômica do empregado, cuja poder do empregador se
acentua em razão do domínio dos meios de produção, quando se compromete a
assumir os riscos da atividade econômica e a fornecer os instrumentos de trabalho.
Note-se que tal obrigação não deve ser suportada pelo trabalhador, sob pena de
descaracterização da relação de emprego.
Outro tipo de dependência que precisa ser resgatada com o fito de reforçar o grau
de subordinação do empregado e sua condição de hipossuficiência diz respeito a
sua dependência social, uma vez que o trabalho, ao longo da história, tem-se
revelado importante instrumento de inserção ou exclusão social, como já revelado
em capítulo anterior.
O fato de o trabalhador encontrar-se afastado do mercado de trabalho ou nele
inserido revela o seu grau de integração para com a sociedade. Não se pode ignorar
que, em tempos de globalização e de consumo em massa, estar desempregado ou
exercer atividade informal retira do trabalhador, em regra, seu potencial de consumo
e o afasta das condições mínimas de vida com qualidade, retirando-lhe alguns
direitos e garantias somente assegurados quando formalmente vinculados a uma
relação empregatícia, como, por exemplo, recebimento de 13º salário, gozo de férias
remuneradas, licença-maternidade com remuneração, acesso à previdência social,
seguro-desemprego.
Voltando à questão da definição da subordinação jurídica, por fim, afirmam os
doutrinadores anteriormente citados ser este o elemento apontado como o de maior
conformação do tipo legal da relação empregatícia. Ora, buscando elementos no
texto de lei – que define o perfil do empregado e do empregador – e na realidade
vivenciada pelos Tribunais do Trabalho, em litígios relacionados ao reconhecimento
da relação de emprego, para efeitos de tutela dos direitos do empregado, propõe-se
uma (re)definição distinta daquela anteriormente apresentada.
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Isto porque, data venia, tomando cuidado para não parecer arrogância dos sentidos,
se se considerar o empregado como sendo somente aquele que se ajusta ao molde
previsto no artigo 3º da Consolidação das Leis do Trabalho, é possível, então, definir
subordinação jurídica como sendo o dever de observância dos pressupostos
jurídicos característicos da relação de emprego, quais sejam: prestação de serviço
personalizado, por pessoa física, de natureza não eventual, sob dependência do
empregador, mediante salário.
Neste caso a subordinação jurídica englobaria todos os outros elementos da relação
de emprego previstos no artigo 3º da Consolidação das leis do Trabalho (CLT),
considerando como elemento de maior relevância, entretanto, a dependência do
empregado em relação ao poder diretivo do empregador, o que implica admitir que o
vínculo empregatício só será reconhecido na medida em que o trabalhador
comprovar que se enquadra ao perfil determinado em lei, atendendo aos requisitos
ali previstos, ficando inclusive em segundo plano o contrato firmado com o tomador
de serviço, caso seja distinto da realidade fática, em atendimento ao princípio da
primazia da realidade 43.
Isto é o que se depreende do julgado do TRT da 19ª Região, a seguir colacionado:
EMENTA: ESTÁGIO – PRIMAZIA DA REALIDADE – Malgrado haja colação de documentação que dê aparência de convênio regular para estágio profissionalizante, restou configurado o vínculo empregatício entre as partes, uma vez desrespeitados os requisitos da Lei 6.494/77. Exsurge que a realidade dos fatos demonstra prestação de serviços na forma do art. 3º da CLT, com a existência dos elementos afetos à relação de emprego. Recurso conhecido e improvido. (TRT 19ª R., RO 01540.2000.006.19.00.3, Rel. Juiz Severino Rodrigues – DJ. 22.01.2002)
Sendo assim, entende-se que, em se tratando de proteção jurídica voltada ao
empregado, sugere-se que, para sua efetiva tutela, deva-se impor observância em
específico da relação existente entre a atividade prestada e o tomador de serviço,
cunhando-a de subordinada, quando tal atividade, para ser executada, requeira, em 43 Segundo Américo Plá Rodriguez (1996, p. 217), este princípio significa que em caso de discordância entre o que ocorre na prática e o que surge de documentos e acordos se deve dar preferência ao primeiro, isto é, ao que sucede no terreno dos fatos. Seguindo esta linha de raciocínio, Luiz de Pinho Pedreira da Silva (1999, p. 210) esclarece que tal princípio, longe de possuir a função de captar o sentido de normas jurídicas, serve para determinar como estas devem ser aplicadas quando existe divórcio entre os elementos formais e os reais do contrato de trabalho, apontando no rumo destes últimos.
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sua essência, a atuação efetiva do empregador em seu poder diretivo (orientação,
fiscalização, punitivo).
Do exposto, imprescindível a percepção de que, para distinguir relação de emprego
das demais relações de trabalho, devem-se encontrar claramente integrados todos
os requisitos fático-jurídicos supramencionados, segundo os quais se incidirão as
normas protetivas do Direito do Trabalho.
3.3 A CRISE DA RELAÇAO DE EMPREGO: PRECARIZAÇÃO, TERCEIRIZAÇÃO E
FLEXIBILIZAÇÃO
Pretende-se, neste tópico, pontuar a crise do emprego, marcada especialmente por
três fenômenos distintos que se correlacionam: precarização do trabalho
assalariado, terceirização e flexibilização das normas trabalhistas.
Para que se possa entender de fato a crise do emprego e, por que não dizer, por
extensão, a transitoriedade das relações de trabalho, mister partir do ponto central,
qual seja, a análise da situação atual dos trabalhadores subordinados. Neste
contexto, importante destacar que a chamada relação de emprego formal tem como
base um contrato de trabalho, cujos direitos nele definidos são resultantes da luta
histórica dos trabalhadores, o que se pretende a todo custo preservar.
Ocorre que esta relação de trabalho, que prevaleceu por séculos como a principal
forma de vinculação laboral, hoje se torna uma raridade, um privilégio de poucos,
dadas as deformações que vem sofrendo ao longo do processo intenso de
globalização da economia, colocando-se em evidência os fenômenos da
precarização, terceirização e flexibilização das normas trabalhistas.
70
Especialistas da área como Paul Singer (1999, p. 32) 44 têm anunciado a “destruição
da relação padrão de emprego” por força da precarização do trabalho subordinado e
justificam o caos apontando como um dos fatores de peso para este processo
destrutivo a terceirização crescente no país e no mundo inteiro.
Desta forma, anuncia:
[...] terceirizam, despedem blocos inteiros de trabalhadores não essenciais à empresa, que não trabalham na atividade considerada prioritária e recontratam outros blocos de trabalhadores numa base de prestadores de serviço, pagando a eles apenas pelo serviço prestado, ou seja, em condições nitidamente inferiores à remuneração do chamado emprego formal ou emprego padrão. (SINGER, 1999, p.33)
Como visto, a subcontratação de serviços por empresas terceirizadas para
cumprimento de atividades específicas, sob alegação de redução de custos, tem-se
revelado uma forte tendência contemporânea que evidencia a crise do emprego,
uma vez que tais atividades eram tipicamente inseridas na dinâmica da empresa
matriz e desenvolvidas pelos seus próprios empregados.
É o que ocorre, por exemplo, com empresas do ramo de confecções ou
automobilístico, que subcontrata empresas de menor porte para o fornecimento de
peças que, posteriormente, vão se agregar à montagem final na empresa matriz,
sem a necessidade de manutenção de um número significativo de empregados,
reduzindo sobremaneira os custos e alterando os vínculos laborais – de empregado
para trabalhador eventual, terceirizado, autônomo –, cujas perdas trabalhistas são
incalculáveis sob o ângulo dos prestadores de serviço.
Ironicamente, ainda há que se comemorar quando estes trabalhadores são
recontratados, pois, em sua maioria, têm sido recolocados no mercado sem qualquer
vínculo formal, engrossando a estatística dos trabalhadores informais. Paul Singer,
neste aspecto, anuncia a crise das relações de trabalho, revelando um drama de
44 Assim declara o economista ao tratar sobre “A crise das relações de trabalho”, em uma conferência proferida durante o Seminário “Trabalho e Existência”, ocorrida em 13 de novembro de 1997, na PUC Minas.
71
maior intensidade, ao denunciar o grau de corrosão que o trabalho informal45 tem
gerado no âmbito das relações de trabalho:
[...] além desse processo de privatização, de substituição do trabalho assalariado formal por vários tipos de relações informais, sendo destas a compra de serviços a predominante, há também muito trabalho subcontratado por pequenas empresas que, por sua vez, não registram os trabalhadores. Há uma infusão maior do trabalho doméstico, enfim, há muitas formas que o trabalho chamado informal tem assumido. (SINGER, 1999, p. 33)
Tais alterações, no âmbito das tradicionais relações de emprego, resultam da
necessidade de reestruturação das empresas no mercado capitalista contemporâneo
e atingem não só os empregados, como também o próprio núcleo administrativo das
empresas que, de médio e grande porte, tendem a ser substituídas (incorporadas)
por multinacionais. Assim é que muitas empresas, nos mais variados segmentos
econômicos (telefonia, rede hoteleira, empresas do ramo alimentício), têm passado
pelo processo de fusão ou são adquiridas por outras de maior porte, movimento que
toma impulso pela competitividade e busca incessante de lucro.
Inclusive não é raro acontecer de estas mesmas empresas, após o processo de
fusão ou aquisição, serem descartadas (novamente vendidas ou extintas), por serem
consideradas, em última instância, pouco lucrativas. Até mesmo as empresas
estatais têm sofrido, ao longo de décadas, o processo de privatização, o que
demonstra que os efeitos da globalização da economia não perdoam quem passa
pelo seu caminho.
Com o trabalhador a situação não tem sido menos caótica. A relativa segurança e
estabilidade, outrora experimentada pelos empregados tipicamente vinculados a um
contrato por tempo indeterminado, transformam-se, atualmente, em instabilidade
constante. Os trabalhadores, na concepção capitalista, ainda são concebidos como
meras peças de uso e descarte, haja vista a considerável reserva de mão-de-obra à
disposição no mercado, o que reforça o poder de barganha dos empregadores, que
se restringem ao pagamento de uma remuneração mínima. Daí a necessidade de se
45 Entende-se por trabalho informal aquele desempenhado por pessoas que trabalham sem carteira assinada, com rendas abaixo do padrão, em condições de trabalho precárias, de forma irregular ou com prazo limitado.
72
estender a tutela jurídica a todos os trabalhadores, não se restringindo ao
empregado formal, justificada pela necessidade de se manter um padrão mínimo de
qualidade em matéria de contratação laboral.
Interessante registrar que, ao serem transformadas em empresas de grande porte
(multinacional/transnacional), adotam a estrutura de empresa-rede46, com tendência
a se descentralizar, criando em seu subsistema uma rede de pequenas e médias
empresas-satélites (as chamadas filiais), franqueadas, que rompem fronteiras
nacionais e se espalham por diversos países 47, tendo como principal alvo os
trabalhadores informais, subcontratados a preço vil, se considerada a remuneração
dos altos executivos que compõem a cúpula laboral.
Enquadra-se perfeitamente neste perfil as multinacionais acolhidas pelo Brasil,
especialmente na região Nordeste, atraídas pelos incentivos fiscais, que incorporam
à economia capitalista numeroso contingente de trabalhadores miseráveis,
desqualificados, que aceitam toda espécie de subcontratação para obter parcas
rendas mensais, restando violados os direitos trabalhistas historicamente
conquistados e mitigado o Estado do bem-estar social 48.
Vale salientar que tais empresas têm prazo de funcionamento nestes locais
estrategicamente escolhidos para implementação de suas atividades. Uma vez
vencido o prazo de vigência do incentivo fiscal, as empresa levantam acampamento
para outros locais, em busca de exploração de mão-de-obra barata, com baixíssimos
investimentos, deixando para trás um rastro de desemprego e miséria. Esta é a
marca característica da precarização do trabalho assalariado.
46 Expressão adotada por Paul Singer, em texto intitulado “A crise das relações de trabalho” (1999, p. 35) 47 Como exemplo, destaca-se a Benetton, empresa voltada para o ramo da confecção, que subcontrata diversas fábricas menores, que se tornam lojas franqueadas em quase todos os países, já tendo atingido o montante de 40 mil empresas, segundo informa Paul Singer (1999, p. 35). 48 Marcio Pochmann (1999, p. 23) chama a atenção para o fato de que houve um tempo em que os empregos foram regulares, de jornada plena e salários adequados e hoje vive-se um período em que o que mais se expande são empregos parciais, com jornada reduzida, salários comprimidos e grande parte das pessoas não tem acesso aos mecanismos de previdência social e de seguridade social em geral.
73
Outro ponto importante que se deve chamar a atenção, quando se trata de refletir a
crise do emprego, está associado ao processo de flexibilização das normas
trabalhistas, cujas consequências são sentidas diretamente pelo trabalhador. Neste
sentido, providenciais as palavras de Amauri Mascaro Nascimento (2001, p. 63-64),
que assim esclarece:
Na Europa, com reflexos no Brasil, uma diretriz fundada na concepção econômica é conhecida como flexibilização do direito do trabalho, proposta segundo a qual os imperativos econômicos devem justificar a postergação de direitos dos trabalhadores como meio necessário para o desenvolvimento, condição para a melhoria da situação dos assalariados, sustentando a conveniência da valorização de novas concepções sobre os velhos institutos, como os contratos por prazo determinado, que devem ser admitidos sem preconceito na medida em que atendam melhor à adequação da mão-de-obra na empresa por períodos específicos, ao contrário do antigo contrato por prazo indeterminado; a maior facilidade para dispensa dos trabalhadores, contrariamente às dificuldades opostas pela estabilidade definitiva; o módulo anual com um número total de horas normais por ano, diversamente do módulo diário, para que seja permitida compensação do número de horas normais anuais, evitando-se, assim, gastos com horas extras desde que respeitado o total normal anual etc. (grifos conforme o original)
Conforme explicação de Cássio de Mesquita Barros Júnior (1996, p. 1034),
flexibilização das normas significa, então, “a possibilidade de oferecer mecanismos
jurídicos que permitam às empresas ajustes da produção, do emprego e das
condições de trabalho tendo em vista as flutuações rápidas e contínuas do sistema
econômico”.
Como se pode perceber, visando à competitividade e ao lucro que movem as
relações de mercado, as empresas procuram de todas as formas se adequar às
intempéries do sistema econômico, lançando mão de recursos jurídicos que
viabilizem adequações em torno das mudanças vivenciadas. Neste sentido,
competitividade e produtividade são o combustível que move esta engrenagem.
Infelizmente o que se vê é mais uma vez o trabalhador “cortando da própria carne”
para não sofrer o pesadelo do desemprego e sua consequente exclusão social, uma
vez que, estando integrado ao sistema de produção, acaba sofrendo os impactos da
reestruturação.
É sabido que embora outras Constituições brasileiras tenham previsto a participação
direta dos sindicatos, em nenhum momento da história o sindicalismo fora tão
74
evidenciado como na Constituição Federal de 1988 em seu mister de tentar segurar
as rédeas do desemprego e garantir as condições mínimas aos trabalhadores.
Assim, espera-se dos sindicatos uma participação ativa e bem sucessiva no destino
dos trabalhadores, mas é importante que se volte não só para a defesa dos
empregados formalmente contratados, mas também para os desempregados e
trabalhadores informais, superando velhos paradigmas que já se tornam obsoletos
na contemporaneidade – como o binômio patrão/empregado.
Neste sentido, mais uma vez providenciais os ensinamentos do economista e ex-
sindicalista Paul Singer (1999, p. 44), que adota o termo “neo-sindicalismo”,
apontando o que se espera da nova forma de comportamento do sindicato
contemporâneo:
[...] Ele tem de se estruturar em amplas organizações que tenham sim, como um de seus objetivos, a defesa dos trabalhadores que ainda possuem emprego formal [...], mas que, ao mesmo tempo, tenham solidariedade para com os que perderam o emprego, os trabalhadores informais, os desempregados, e assim por diante. Temos de inventar um sindicato capaz de organizar o conjunto dos trabalhadores.
O que se espera, de fato, é que o trabalhador seja tratado com dignidade em sua
atuação laboral, independente do mecanismo protetivo utilizado, quer seja por força
da intervenção estatal normativa, quer seja pelo reforço dado pelos sindicatos em
negociação coletiva, principalmente quando se trata de trabalhador em situação de
vulnerabilidade social e econômica (empregado informal, trabalhador informal,
autônomo em situação de hipossuficiência).
75
4 O NEOCONSTITUCIONALISMO E SUA REPERCUSSÃO NO DIREITO DO
TRABALHO: POR UMA NECESSIDADE DE CONTEXTUALIZAÇÃO
O objetivo deste capítulo é introduzir a reflexão acerca da eficácia do Direito do
Trabalho no âmbito das relações individuais, consoante a nova concepção do Direito
Neoconstitucionalista, cuja teoria tem sido abraçada por um número representativo
de doutrinadores, como Luis Roberto Barroso (2005, p. 1-43), Ricardo Maurício
Freire Soares (2009, p. 188-194), Dirley da Cunha Júnior (2008, p. 33-36).
Neste sentido, impulsionada por uma breve abordagem do que seja o
neoconstitucionalismo no sistema jurídico pátrio, adentra-se na análise contextual
das influências desta nova teoria jurídica no Direito Individual do Trabalho, a fim de
que se possa preparar o solo para a semeadura das ideias do porvir.
4.1 O NEOCONSTITUCIONALISMO NO SISTEMA JURÍDICO BRASILEIRO
O novo Direito Constitucional ou neoconstitucionalismo surge no cenário europeu
pós-guerra (segunda metade do séc. XX), especialmente na Alemanha (1949) e
Itália (década de 60)49, influenciando vários países como o Brasil. Traz como
característica principal o reconhecimento da força normativa à Constituição, o que
implica dizer que as normas constitucionais passam a ser dotadas de
imperatividade, fazendo repercutir o caráter vinculativo e obrigatório de suas
disposições no direito positivado, impulsionando mudança de paradigmas em todo o
ordenamento jurídico.
Luis Roberto Barroso (2003, p. 326), ao tratar do tema em outra obra, esclarece que
“o pós-positivismo não surge com o ímpeto da desconstrução, mas como uma
superação do conhecimento convencional”. Segundo este autor, tal teoria “guarda
49 Informações colhidas em texto de Luís Roberto Barroso, intitulado “Neoconstitucionalismo e constitucionalização do Direito: o triunfo tardio do Direito Constitucional no Brasil”. (2005, p. 2-3)
76
deferência relativa ao ordenamento positivo, reintroduzindo as ideias de justiça e
legitimidade”.
Outro constitucionalista que trata do assunto é Dirley da Cunha Júnior (2008, p. 33),
que traz nota esclarecedora quanto ao seu objetivo central:
O neoconstitucionalismo ou o novo direito constitucional como também é conhecido, destaca-se, nesse contexto, como uma nova teoria jurídica a justificar a mudança de paradigma, de Estado Legislativo de Direito, para Estado Constitucional de Direito, consolidando a passagem da Lei e do Princípio da Legalidade para a periferia do sistema jurídico e o trânsito da Constituição e do Princípio da Constitucionalidade para o centro de todo o sistema, em face do reconhecimento da Constituição como verdadeira norma jurídica, com força vinculante e obrigatória, dotada de supremacia e intensa carga valorativa. (grifos conforme o original)
Vive-se a era da constitucionalização do Direito, período em que as normas de
cunho infraconstitucional se inserem na ordem constitucional. Paralelo a este
fenômeno, vive-se o sentido inverso, quando se evidencia a necessidade de
compatibilização de normas dos diversos ramos jurídicos com os princípios e
normas constitucionais, para que se lhes atribuam validade, sendo aqui
considerados tanto a forma de elaboração como o seu conteúdo.
Esta mudança estrutural que subordina a legalidade e a validade normativa
infraconstitucional à Constituição toma proporções mais amplas, ao impor um novo
viés interpretativo na contemporaneidade, cujo sentido e alcance da norma devem
estar em consonância com a matriz axiológica constitucional, o que se verá em
tópico subsequente.
Desta forma, conclui-se que a Lei Maior passa a servir de parâmetro não só para
validar a ordem infraconstitucional, como também para nortear a interpretação das
normas no sistema jurídico, inserindo em seu texto valores ligados à efetividade dos
direitos fundamentais50.
50 José Afonso da Silva (2000, p. 469) declara que “a garantia das garantias consiste na eficácia e aplicabilidade imediata das normas constitucionais”. Para ele, “os direitos, liberdades e prerrogativa [...] caracterizados como direitos fundamentais, só cumprem sua finalidade se as normas que os expressem tiverem efetividade”.
77
No Brasil, esta influência tem seu marco na Constituição Federal de 1988, quando
se instaura o Estado Democrático de Direito, ancorado pela nova concepção
principiológica. Nesse aspecto, a dignidade da pessoa humana passa a ser
deslocada para o centro da normatividade constitucional, como um dos principais
fundamentos do Estado de Direito51, sendo amparada por vários outros princípios
que se voltam para a proteção dos direitos fundamentais (igualdade, liberdade,
solidariedade).
Constata-se, assim, que a tese da dogmática constitucional principiológica delineia
seus contornos no sistema jurídico pátrio. Circunstância reveladora de que a Carta
Magna não só alcança a supremacia formal, como vem conquistando a supremacia
material, referenciada pela valoração axiológica e revitalização dos direitos
fundamentais.
Outro aspecto digno de nota refere-se à tendência contemporânea de superação do
positivismo. Fala-se em pós-positivismo, a exemplo de Ricardo Maurício Freire
Soares (2009, p.188-189)52, para salientar a transposição dos direitos meramente
formais para o alcance e aplicabilidade, com o objetivo de atingir a justiça social.
Já não atende mais às expectativas o tecnicismo jurídico, melhor dizendo, a
observância da vigência e validade da norma, como observa Dirley da Cunha Júnior
(2008, p. 142)53. Necessário se faz dar-lhe concretude, buscar sua eficácia jurídica
não só mediante a subsunção da realidade fática à regra, como também por adoção
a princípios 54 que, dotados de abertura e indeterminação linguística, harmonizam ou
ponderam valores e interesses em conflito, não solucionados pela subsunção.
51 Paralelo à dignidade da pessoa humana, a Constituição Federal de 1988 apresenta outros fundamentos do Estado democrático de Direito, como a soberania, a cidadania, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e o pluralismo político (Constituição Federal, art. 1º, incisos I, II, IV e V, respectivamente). 52 Para Ricardo Maurício Freire Soares (2009, p.188-189), o pós-positivismo refere-se a um momento de reflexão do conhecimento jurídico, voltado a formular novas propostas de fundamentação e legitimação do Direito, a fim de permitir a compreensão de suas múltiplas dimensões (normativa, fática e valorativa) e a realização ordenada da justiça no âmbito das relações concretas. 53 A título de esclarecimento, Dirley da Cunha Júnior (2008, p.142) define vigência como sendo “a qualidade de uma norma regularmente promulgada e publicada”. A validade da norma, por seu turno, significa a “conformidade dela com o texto constitucional”. 54 Paulo Ricardo Schier (2005, p. 10) evidencia o atual papel dos princípios na fase contemporânea do direito, afirmando que estes “passam a caracterizar o próprio ‘coração das Constituições’,
78
Seguindo esta linha de raciocínio, não faz mais sentido considerar a norma
constitucional como um valor meramente programático (direcionado ao legislador),
passível da vontade do legislador ordinário para sua completude55. Pelo contrário, a
teoria constitucional pós-positivista caminha para exigir eficácia direta e imediata no
que tange aos direitos fundamentais, com vistas a garantir condições de existência
mínima aos cidadãos56. É o que dispõe o art. 5º, §1º da Constituição Federal.
Assim, retomando a análise do caráter vinculativo e obrigatório das disposições
contidas no texto constitucional, evidencia-se a necessidade de impor uma atuação
efetiva do Poder Legislativo e Executivo no trato da aplicabilidade imediata dos
direitos fundamentais, cuja inércia poderá ser suprimida pelo Poder Judiciário, por
intermédio de mecanismos jurídicos apropriados e devidamente previstos em lei,
quais sejam: mandado de injunção, ação direta de inconstitucionalidade por omissão
e arguição de descumprimento de preceito fundamental.
Logo, conclui-se que os direitos fundamentais, dada a sua condição peculiar de
garantir o mínimo existencial, impõem um tratamento diferenciado ao Estado, no
sentido de exigir sua aplicabilidade imediata e de forma efetiva. Tal entendimento
hodiernamente começa a repercutir no Direito do Trabalho, por se tratar de um ramo
jurídico voltado para a proteção das condições mínimas do trabalhador, em seu
contexto socioeconômico. Este tema será analisado em tópico subsequente.
4.2 A NOVA INTERPRETAÇÃO CONSTITUCIONAL
iluminando a leitura de todas as questões da dogmática jurídica, que devem passar pelo necessário processo de filtragem constitucional axiológica”. 55 José Afonso da Silva (2000, p. 469) afirma que a existência de normas definidoras de direitos fundamentais, por si só, “estabelece uma ordem aos aplicadores da Constituição no sentido de que o princípio é o da eficácia plena e aplicabilidade imediata [...], de tal sorte que só em situação de absoluta impossibilidade se há de decidir pela necessidade de normatividade ulterior de aplicação”. 56 Dirley da Cunha Júnior (2008, p. 169) é enfático ao afirmar que “se a Constituição é, toda ela, norma jurídica, todos os direitos nela contemplados têm aplicabilidade direta, vinculando tanto o Judiciário, quanto o Executivo e o Legislativo”.
79
Como já afirmado anteriormente, o neoconstitucionalismo não só influencia a
validade da norma jurídica infraconstitucional, como também a sua interpretação,
que deve ser permeada por uma concepção axiológica.
Traçando um quadro comparativo, tem-se que, na modernidade, o direito era
compreendido como um conjunto de normas, que ao serem positivadas, lhes era
atribuída validade jurídica. Costumava o julgador, no exercício da subsunção,
interpretar as normas jurídicas atentando para o significado e o conteúdo do texto
normativo, a fim de concretizá-lo, ou seja, dar aplicabilidade ao caso concreto,
lançando mão de variados métodos interpretativos, tais como: gramatical (atento à
literalidade do texto), sistemático (considerando a norma jurídica dentro de um
sistema), histórico (tomando como base o fluxo da história e a evolução dos
costumes), teleológico (buscando a finalidade da norma).
No pós-positivismo, por seu turno, a exigência de validade normativa persiste,
porém, com nova roupagem. Segundo Luis Roberto Barroso (2005, p.13), a
realização concreta da supremacia formal e axiológica da Constituição passa a
requisitar diferentes técnicas e possibilidades interpretativas, considerando no
contexto a leitura da norma infraconstitucional voltada para o alcance e sentido dos
valores e fins constitucionais, como já evidenciado.
Neste diapasão, a Constituição revela sua supremacia não apenas por representar
um sistema próprio, dotado de ordem, unidade e harmonia, mas se estende em sua
importância ao servir como parâmetro interpretativo a todos os demais ramos do
Direito. Ocorre o que na doutrina é chamada de “filtragem constitucional”, segundo
Paulo Ricardo Schier (2005, p. 2), fenômeno que “pressupõe a preeminência
normativa da Constituição, projetando-a para uma específica concepção da
Constituição enquanto sistema aberto de regras e princípios”.
Isto, nas palavras de Paulo Ricardo Schier (2005, p. 2), “permite pensar o Direito
Constitucional em sua perspectiva jurídico-normativa em diálogo com as realidades
sociais, política e econômica”, cujo objetivo é a concretização dos valores
constitucionais e sua eficácia, mediante garantia de condições mínimas de
dignidade.
80
Providenciais, neste sentido, as palavras de Peter Häberle (2002, p. 34):
“Constituição é [...] um espelho da publicidade e da realidade. Ela não é, porém,
apenas o espelho. Ela é, se se permite uma metáfora, a própria fonte de luz. Ela
tem, portanto, uma função diretiva eminente”.
Neste sentido, toda a sistemática de interpretação, na contemporaneidade, tende a
se voltar para a concepção de “sociedade aberta dos intérpretes constitucionais”,
defendida por Peter Häberle. Referido autor critica a interpretação constitucional
clássica por considerá-la vinculada a uma “sociedade fechada”, concentrada apenas
na interpretação monopolizada dos juízes57 (2002, p. 12-15 e 42-43).
Assim, propõe, em sua teoria, a substituição desta “sociedade fechada” por uma
“sociedade aberta dos intérpretes da Constituição”, segundo a qual o juiz deverá
interpretá-la em parceria com as demais forças da comunidade política (órgãos
estatais, instituições públicas, cidadãos e grupos ativos)58. Tal assertiva toma fôlego
no fragmento a seguir:
A análise até aqui desenvolvida demonstra que a interpretação constitucional não é um “evento exclusivamente estatal”, seja do ponto de vista teórico, seja do ponto de vista prático. A esse processo tem acesso potencialmente todas as forças da comunidade política. O cidadão que formula um recurso constitucional é interprete da Constituição tal como o partido político que propõe um conflito entre órgãos ou contra o qual se instaura um processo de proibição de funcionamento. Até pouco tempo imperava a idéia de que o processo de interpretação constitucional estava reduzido aos órgãos estatais ou aos participantes diretos do processo. [...] Os grupos mencionados e o próprio indivíduo podem ser considerados intérpretes constitucionais indiretos ou a longo prazo. A conformação da realidade da Constituição torna-se também parte da interpretação das normas constitucionais pertinentes a essa realidade. (HÄBERLE, 2002, p. 23-24)
Esta nova teoria de interpretação, influenciada pela teoria democrática, tem sido
recepcionada no Brasil, pois encontra consonância com o atual Estado Democrático
de Direito, implantado com a Constituição Federal de 1988. Vale salientar, porém,
57 Peter Häberle (2002, p. 24) chama a atenção para o fato de que sua teoria não refuta a importância da atividade desenvolvida pelos entes estatais, mas insere a concepção de que a interpretação constitucional é uma “atividade” que diz respeito a todos. 58 Peter Häberle (2002, p. 33) justifica a legitimação das forças pluralistas da sociedade para participar da interpretação constitucional no fato de que essas forças apresentam um “pedaço da publicidade e da realidade da Constituição”. Neste sentido, para ele estas forças não podem ser tomadas como fatos brutos, mas como elementos que se colocam dentro do quadro da Constituição.
81
segundo advertência do próprio Peter Häberle (2002, p. 14), que a responsabilidade
da jurisdição constitucional resta mantida, pois é ela quem deverá proferir a última
palavra sobre a interpretação.
As inovações não param por aí. Ainda em se tratando da nova postura do intérprete
pós-moderno, em casos de termos vagos ou lacuna da lei, lhe é permitido certo grau
de discricionariedade, cuja resposta constitucional adequada se produz mediante
análise das circunstâncias que envolvem o caso concreto. Em situações de conflitos
de ordem principiológica constitucional, tem-se adotado a técnica da ponderação,
mediante concessões recíprocas, a fim de se preservar os interesses ao máximo.
Assim, as cláusulas gerais (contendo conceitos jurídicos indeterminados), os
princípios e a possível colisão entre estes são realidades que devem ser
preenchidas pelo intérprete, levando em conta seu aspecto axiológico referenciado
pela Constituição. O que se pretende neste contexto é buscar maior eficácia do
direito posto, ir além da mera subsunção. Frise-se: na pós-modernidade não se
abandona o direito positivado, mas se atribui a este uma carga axiológica voltada à
realidade em que se encontra inserida.
Neste sentido, há que se refutar a omissão do Poder Legislativo e Executivo no que
se refere à ausência de previsão legal e à não-aplicação das normas de direitos
fundamentais, pois tais hipóteses caracterizam a inconstitucionalidade por omissão
desses órgãos. Ao Poder Judiciário, por sua vez, não se admite a inércia sob
alegação de ausência de previsão normativa, uma vez que a exigência
constitucional contida no art. 5ª, §1º, da Constituição Federal, impõe a garantia da
eficácia dos direitos fundamentais, ainda que para isto seja necessário preencher
lacunas da lei, valendo-se dos mecanismos fornecidos pelo sistema jurídico pátrio,
contidos no artigo 4º da Lei de Introdução ao Código Civil.
4.3 NEOCONSTITUCIONALISMO E O DIREITO DO TRABALHO
82
Quando se tratou da constitucionalização do direito infraconstitucional, em tópico
anterior, vinculou-se a validade das normas jurídicas contemporâneas, nos diversos
ramos jurídicos, à conformidade das normas e princípios constitucionais, atento à
forma e conteúdo. Percebe-se, no contexto, que o primado da legalidade59 vem
cedendo espaço para o da validade constitucional, o que reflete uma transição
paradigmática, com tendência à ruptura de conceitos e institutos clássicos, cuja
dinâmica teve início com a incorporação de variados temas infraconstitucionais à Lei
Maior.
Neste sentido, em momentos distintos do texto, a própria Constituição destaca os
interesses dos trabalhadores e das classes econômicas, adotando ora uma postura
protecionista (rol elencado no art. 7º da Constituição), ora autoritária (criação e
funcionamento dos sindicatos, com vedação do pluralismo sindical na mesma base
territorial). Isto reflete a intensa influência Constitucionalista no Direito do Trabalho.
Vale registrar que os direitos de natureza trabalhista, contidos na Carta Magna,
recebem o invólucro de cláusula pétrea60, o que evidencia a importância que
ocupam no Estado Democrático de Direito, sendo terminantemente vedada sua
modificação por emendas constitucionais.
Outro aspecto digno de nota trata-se da expressa menção feita já no preâmbulo da
Constituição Federal de 1988, cujo objetivo centra-se no exercício de direitos sociais
e individuais, ou seja, na aplicabilidade de tais direitos, rompendo com o paradigma
da mera positivação deles. Reforça tal entendimento, por fim, a disposição expressa
como um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito, qual seja, a
observância aos valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, como mecanismo de
alcance de uma sociedade livre, justa e igualitária.
Arrisca-se afirmar, no contexto, que talvez seja este o ramo jurídico que revele maior
influência do neoconstitucionalismo, na medida em que, sob a égide da dignidade da 59 A lei, pensando contemporaneamente, não pode se estagnar apenas como manifestação conjuntural do sistema jurídico, como mero registro das conquistas sociais e suas peculiaridades. Deve-se romper o dogma da legalidade formal e buscar a concretude e eficácia da norma, apostando na ponderação como caminho para sanar conflitos de interesses contrapostos. Esta parece ser a fórmula da equidade. 60 Constituição Federal, art. 60, §4º, inciso IV consoante com art. 7º.
83
pessoa humana do trabalhador, lança mão de todo um aparato heterônomo estatal
(regras, princípios) e de mecanismos de normatização autônoma (convenção,
acordo e contrato coletivo), instrumentos que valorizam o exercício direto do poder
social do povo61, ainda que por representação sindical, voltados para a eficácia das
normas laborais, cujo direito fora concedido, outrora, apenas por instrumentos
políticos clássicos como o plebiscito, o referendum e a ação popular.
Reforça-se aqui a tese defendida por Peter Häberle (2002, p. 37) para entender qual
o limite de participação do povo como “força produtiva de interpretação”
constitucional pós-positivista:
“Povo” não é apenas um referencial quantitativo que se manifesta no dia da eleição e que, enquanto tal, confere legitimidade democrática ao processo de decisão. Povo é também um elemento pluralista para a interpretação que se faz presente de forma legitimadora no processo constitucional: como partido político, como opinião científica, como grupo de interesse, como cidadão. A sua competência objetiva para a interpretação constitucional é um direito da cidadania [...].
Outro aspecto que se apresenta bastante evidenciado no Direito do Trabalho diz
respeito à dogmática principiológica, cujos princípios têm relevância crucial no trato
das relações laborais entre particulares, com destaque para o da proteção, da
irrenunciabilidade de direitos, da norma mais favorável, da primazia da realidade.
Todos estes princípios tidos como específicos do ramo juslaboral estão diretamente
ligados à dignidade da pessoa humana, como fundamento do Estado Democrático
de Direito. É o que preceitua o art. 8º da Consolidação dos Direitos do Trabalhador
(CLT), em consonância com o art. 1º da Constituição Federal62.
É comum, inclusive, os profissionais do ramo laboral ouvirem, diuturnamente, críticas
relacionadas ao tratamento jurídico diferenciado entre as partes envolvidas neste
ramo, tendente sempre à proteção de um dos interessados 63 – o trabalhador –,
61 Neste sentido, a Constituição Federal, em seu artigo 2º, declara que “Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”. 62 Dispõe a CLT, art. 8º: “As autoridades administrativas e a Justiça do Trabalho, na falta de disposições legais ou contratuais, decidirão, conforme o caso, pela jurisprudência, por analogia, por equidade e outros princípios e normas gerais de direito, principalmente do direito do trabalho e, ainda, de acordo com os usos e costumes, o direito comparado, mas sempre de maneira que nenhum interesse de classe ou particular prevaleça sobre o interesse público”. 63 Conforme salienta Américo Plá Rodrigues (1996, p. 28), “o princípio de proteção se refere ao critério fundamental que orienta o Direito do Trabalho pois este, ao invés de inspirar-se num propósito
84
considerado hipossuficiente na ordem social, restando recorrente a praxe de
considerar “vilão” aquele que integra o contexto da ordem econômica – empregador
ou tomador de serviço.
Em análise mais apurada, tem-se que o Direito do Trabalho, de fato, ampara
preferencialmente o trabalhador. Mas o faz, segundo ensinamento de Rodolfo
Pamplona Filho (2002, p. 261), para alcançar uma igualdade substancial entre os
atores sociais, cujo fundamento encontra-se nas origens do Direito do Trabalho, que
“surgiu como reação à exploração desenfreada do trabalho humano”.
Neste sentido, retomam-se os ensinamentos de Américo Plá Rodrigues (1996, p. 28)
para enfocar o objetivo central do princípio de proteção:
Enquanto no direito comum uma constante preocupação parece assegurar a igualdade jurídica entre os contratantes, no Direito do Trabalho a preocupação central parece ser a de uma das partes com o objetivo de, mediante essa proteção, alcançar-se uma igualdade substancial e verdadeira entre as partes.
Em outros termos, busca-se na isonomia material uma forma de concretude da
dignidade da pessoa humana, com fundamento na justiça social, valendo-se da
máxima de Rui Barbosa (2004, p. 39), que belissimamente apregoa:
A regra da igualdade não consiste senão em quinhoar desigualmente os desiguais, na medida em que se desigualam. Nesta desigualdade social, proporcionada à desigualdade natural, é que se acha a verdadeira lei da igualdade. O mais são desvarios da inveja, do orgulho, ou da loucura. Tratar com desigualdade a iguais, ou a desiguais com igualdade, seria desigualdade flagrante, e não igualdade real. Os apetites humanos conceberam inverter a norma universal da criação, pretendendo, não dar a cada um, na razão do que vale, mas atribuir o mesmo a todos, como se todos equivalessem.
Como se pode perceber, o Direito do Trabalho não tem se furtado a esta influência
pós-positivista, por ter como objeto central a tutela de um dos direitos de maior
relevância no rol dos direitos fundamentais sociais – o trabalho (art. 6º, caput, da
Constituição Federal) e seus valores sociais (art. 1º, inciso IV da Constituição
Federal) – tema de grande repercussão na vida do cidadão. de igualdade, responde ao objetivo de estabelecer um amparo preferencial a uma das partes: o trabalhador”.
85
Vale revelar, neste diapasão, outro aspecto que marca a forte influência
constitucionalista no Direito do Trabalho contemporâneo, a publicização do Direito
Laboral, marcada pelas constantes intervenções estatais nas relações entre
trabalhador e tomador de serviço/empregador (dirigismo contratual, por exemplo),
sob o argumento da proteção do trabalhador em sua dignidade, considerado, como
já dito, hipossuficiente 64.
Em se tratando das normas definidoras de direitos fundamentais, no âmbito das
relações laborais, adota-se o entendimento defendido por Luís Roberto Barroso
(2005, p. 16), que segue predominante na doutrina pátria quanto a sua aplicabilidade
direta e imediata, cuja concretude deve-se dar mediante análise caso a caso, com
ponderação entre princípios constitucionais (da livre iniciativa e da autonomia da
vontade) de um lado e, do outro, o direito fundamental em questão (trabalho, saúde,
integridade física e moral, liberdade de crença religiosa ou convicção filosófica ou
política).
Intensifica tal tese o posicionamento de Flávia Piovesan (2010, p. 11) ao tratar da
concepção contemporânea dos direitos humanos, evidenciando sua indivisibilidade,
o que declara:
[...] em face da indivisibilidade dos direitos humanos, há de ser definitivamente afastada a equivocada noção de que uma classe de direitos (a dos direitos civis e políticos) merece inteiro reconhecimento e respeito, enquanto outra classe de direitos (a dos direitos sociais, econômicos e culturais), ao revés, não merece qualquer observância. Sob a ótica normativa internacional, está definitivamente superada a concepção de que os direitos sociais, econômicos e culturais não são direitos legais. A idéia de não acionabilidade dos direitos sociais é meramente ideológica e não científica. São eles autênticos e verdadeiros direitos fundamentais, acionáveis, exigíveis e demandam séria e responsável observância. Por isso, devem ser reivindicados como direitos e não como caridade, generosidade ou compaixão.
Retomando o entendimento de Luís Roberto Barroso (2005, p. 16), este aponta,
inclusive, alguns fatores que devem ser observados ante a ponderação entre a
autonomia da vontade versus direito fundamental:
64 Luiz de Pinho Pedreira da Silva (1999, p. 29) ao tratar do princípio de proteção no Direito do Trabalho, define-o como sendo “aquele em virtude do qual o Direito do Trabalho, reconhecendo a desigualdade de fato entre os sujeitos da relação jurídica de trabalho, promove a atenuação da inferioridade econômica, hierárquica e intelectual dos trabalhadores”.
86
a) a igualdade ou desigualdade material entre as partes (e.g., se uma multinacional renuncia contratualmente a um direito, tal situação é diversa daquela em que um trabalhador humilde faça o mesmo); b) a manifesta injustiça ou falta de razoabilidade do critério (e.g., escola que não admite filhos de pais divorciados); c) preferência para valores existenciais sobre os patrimoniais; d) risco para a dignidade da pessoa humana (e.g., ninguém pode se sujeitar a sanções corporais).
Ainda em se tratando da publicização do Direito Laboral como característica
denunciadora da influência neoconstitucionalista, chama a atenção o fato de que,
mesmo em havendo uma tendência crescente à flexibilização das normas laborais,
reservando aos diretamente envolvidos os desígnios da sua própria relação jurídica,
sob representação dos sindicatos das respectivas categorias, por trás desta
discricionariedade está a permissibilidade constitucional, com limites expressos de
atuação desses órgãos representativos.
Vale salientar que, embora se perceba toda uma aura positiva em relação ao efetivo
exercício dos direitos fundamentais na órbita das relações laborais, por influência da
nova teoria pós-moderna, tendente à validade constitucional do Direito, reconhece-
se que mudanças estruturais ocorrem lentamente e são encontradas resistências
acirradas ao longo de sua evolução.
Como título de ilustração, registra-se a evolução interpretativa do Supremo Tribunal
Federal (STF) no tratamento reservado ao direito fundamental de greve dos
servidores públicos. Em 2005, o Tribunal Pleno dessa Corte Suprema negou
aplicabilidade imediata de determinados direitos de defesa, relativos ao direito
fundamental de greve, aos servidores públicos de Goiás (disposto no art. 37, inciso
VII da Constituição Federal), em julgamento de Mandado de Injunção nº 438/2005,
correlacionado com o disposto no art. 5º, LXXI da Carta Magna, no qual se decidiu
que tais direitos dependiam, para sua efetividade, de intermediação legislativa. É o
que se observa da ementa seguinte:
EMENTA: Mandado de injunção. Direito de greve - Constituição, art. 37, VII. 2. Legitimado este sindicato a requerer mandado de injunção, com vistas a ser possibilitado o exercício não só de direito constitucional próprio, como dos integrantes da categoria que representa, inviabilizado por falta de norma regulamentadora. Precedente no mandado de injunção n. 347-5-SC. 3. Sindicato da área de educação de estado-membro. Legitimidade ativa. 4. Reconhecimento de mora do Congresso Nacional, quanto à elaboração da lei complementar a que se refere o art. 37, VII, da Constituição.
87
Comunicação ao Congresso Nacional e ao Presidente da República. 5. Não é admissível, todavia, o mandado de injunção como sucedâneo do mandado de segurança, em ordem a anulação de ato judicial ou administrativo que respeite ao Direito Constitucional cujo exercício pende de regulamentação. Nesse sentido, não cabe mandado de injunção para impugnar ato judicial que haja declarado a ilegalidade de greve no serviço público, nem por essa mesma via é de ser reconhecida a legitimidade da greve. Constituição, art. 5., LXXI. 6. Mandado de injunção conhecido, em parte, e, nessa parte, deferido, para o fim acima indicado. (STF, MI 438/GO, acórdão do Tribunal Pleno, Rel. Min. Néri da Silveira, publicada no DJU, de 16 de junho de 1995).
Há de se salientar que tal decisão, além de não tutelar o direito de greve, violou o
princípio constitucional da isonomia, uma vez que trabalhadores integrantes da
iniciativa privada (não servidores públicos) gozam do direito de greve sem restrições,
direito este considerado como de aplicabilidade imediata, consoante Constituição
Federal (art. 9º) 65. O servidor público, embora exerça serviço ou atividade de
natureza essencial, o que exige tratamento diferenciado, dada a necessidade de
atendimento de interesse público (Constituição Federal, art. 9º, §1º), vem sofrendo
restrição em seu direito, por força da exigência de lei complementar, ainda
inexistente até os dias atuais (Constituição Federal, art. 37, VII)66.
Em julgamento de outro mandado de injunção (nº 708), ocorrido em 2007, com
semelhante objeto de tutela (garantia do exercício do direito de greve aos servidores
públicos previsto no art. 37, VII da Constituição Federal), o Tribunal Pleno do
Supremo Tribunal Federal, conhecendo o mandado de injunção, decidiu, por
maioria, em favor do sindicato dos trabalhadores em educação do município de João
Pessoa (SINTEM), propondo como solução para a omissão legislativa a aplicação,
no que coubesse, da Lei nº 7.783/89, que dispõe sobre o exercício do direito de
greve na iniciativa privada, alterando, enfim, o resultado contido no julgamento do
Mandado de Injunção nº 438/2005, anteriormente relatado.
Segue ementa do julgado em questão (MI 708/DF), a partir do qual se reconhece a
evolução da garantia fundamental do mandado de injunção e do mister interpretativo
no trato do direito fundamental de greve, cuja eficácia se aplica erga omnes:
65 CF, art. 9º. “É assegurado o direito de greve, competindo aos trabalhadores decidir sobre a oportunidade de exercê-lo e sobre os interesses que devem por meio dele defender”. 66 CF, art. 37, inciso VII - “o direito de greve será exercido nos termos e nos limites definidos em lei específica”.
88
EMENTA: Mandado de injunção. Garantia fundamental (CF, art. 5º, inciso LXXI). Direito de greve dos servidores públicos civis (CF, art. 37, inciso VII). Evolução do tema na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF). Definição dos parâmetros de competência constitucional para apreciação no âmbito da Justiça Federal e da Justiça Estadual até a edição da legislação específica pertinente, nos termos do art. 37, VII, da CF. Em observância aos ditames da segurança jurídica e à evolução jurisprudencial na interpretação da omissão legislativa sobre o direito de greve dos servidores públicos civis, fixação do prazo de 60 (sessenta) dias para que o Congresso Nacional legisle sobre a matéria. Mandado de injunção deferido para determinar a aplicação das leis nº 7.701/1988 e 7.783/1989. (STF, MI 708/DF. Acórdão do Tribunal Pleno. Rel. Min.Gilmar Mendes. Publicado no DJU, de 31 de outubro de 2008).
Note-se que a sequência dos julgados supracitados evidencia um avanço na
interpretação apresentada pela Suprema Corte. De início, como afirma em relatório
do MI 708/07, buscou-se uma flexibilização à interpretação constitucional, conferindo
maior abrangência à garantia fundamental do mandado de Injunção.
A partir de uma série de precedentes, o Supremo Tribunal Federal passou a admitir
soluções ditas “normativas” para a decisão judicial, inspiradas em soluções advindas
no Direito comparado (Alemanha e Itália), como alternativa legítima de tornar a
proteção judicial efetiva, em consonância com o art. 5º, XXXV, cominado com o §1º,
da Constituição Federal. Neste sentido, determinou a aplicação da Lei nº 7.783/1989
para garantir o direito de greve dos servidores públicos, afastando o risco iminente
de consolidação de típica omissão judicial quanto à matéria. Como se pode
observar, as mudanças são nítidas, embora delongue certo tempo para se
concretizá-las, por força das resistências culturais e políticas.
89
5 O SURGIMENTO DE NOVAS RELAÇÕES DE TRABALHO E A DIFICULDADE
DE INSERÇÃO NO SISTEMA DE PROTEÇÃO JURÍDICA PÁTRIO
O desenvolvimento de um tópico com abordagem específica sobre novas relações
de trabalho torna-se indispensável para que se possa evidenciar, atualmente, quão
diversificadas estão as formas de prestação de serviço e se elas têm sido tuteladas
no âmbito jurídico. Vale ressaltar que se adota a teoria protecionista neste trabalho,
razão pela qual se defende a tutela do trabalhador hipossuficiente, independente da
forma de atuação laboral, cujo respaldo jurídico ganha sintonia com a vertente
axiológica constitucional exposta no capítulo anterior.
A 3ª Revolução Industrial marca uma era de desenvolvimento de novas tecnologias,
com a intensificação do comércio, fazendo deslocar o centro das atividades
produtivas da indústria para o setor de prestação de serviços. Neste aspecto, a
sociedade contemporânea tem abraçado várias profissões, outrora desconhecidas, o
que faz com que se tornem diversificadas as relações de trabalho, carecendo, por
conseguinte, de proteção jurídica até então inexistente.
Encontra-se inserido neste contexto o teletrabalho, o trabalho a domicílio, o trabalho
agregado (desenvolvido por caminhoneiros agregados), a representação comercial,
entre outros. Pretende-se, nos próximos tópicos, discorrer sobre a peculiaridade de
cada um deles, apontando a forma como a doutrina e a jurisprudência têm reservado
tratamento jurídico a estas novas relações laborais.
5.1 NOVAS RELAÇÕES CONTEMPORÂNEAS DE TRABALHO
Propõe-se destacar neste tópico uma breve demonstração das relações de trabalho
surgidas no contexto contemporâneo e como elas têm sido acolhidas no
ordenamento jurídico pátrio, considerando a possibilidade do seu enquadramento
numa relação de trabalho subordinado, autônomo, ou mesmo em uma zona
fronteiriça.
90
5.1.1 Teletrabalho
O teletrabalho desponta no cenário trabalhista contemporâneo como a prestação
laboral, fruto dos avanços da cibernética, voltada para atividades que empregam
equipamentos e recursos tecnológicos de informação e comunicação. É definido
pela OIT como “a forma de trabalho efetuada em lugar distante do escritório central
e/ou do centro de produção, que permita a separação física e que implique o uso de
uma nova tecnologia facilitadora da comunicação”.67
Inspirada neste conceito, a Sociedade Brasileira de Teletrabalho e Teleatividades
(SOBRATT) destaca que o teletrabalho, também denominado trabalho remoto ou
trabalho a distância, é executado com o apoio de equipamentos e recursos
tecnológicos de informação e comunicação (computadores, telefonia fixa e celular) e
toda tecnologia que permite receber e transmitir informações (arquivos de texto,
imagem ou som relacionado à atividade laboral).
Em 2008, a SOBRATT realizou um trabalho de cruzamento de pesquisas de
diferentes instituições (PNAD/IBGE, TIC Domicílios, TIC Empresas, Painel
IBOPE/NetRatings), o que permitiu estimar, no Brasil, aproximadamente 10 milhões
e seiscentos mil teletrabalhadores (o que perfaz um total aproximado de 5% da
população brasileira), considerando trabalhadores formais, informais, empregados,
autônomos, em tempo integral ou parcial, complementar ou eventual, inseridos numa
faixa etária que vai dos 18 (dezoito) aos 60 (sessenta) anos.
Neste aspecto, o teletrabalho pode ser realizado por trabalhadores de variadas
profissões, desde que, como visto, o serviço possa ser prestado efetivamente a
distância, a saber: vendedores, corretores de seguro, assessores de imprensa,
jornalistas, arquitetos, blogueiros, técnicos de suporte de computador e rede on-line,
67 Um estudo detalhado foi realizado pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), em 2001, e está disponível em inglês na página internacional com o nome Promoting Decent Work: the high road to teleworking. Informação colhida do site da Sociedade Brasileira de Teletrabalho e Teleatividades (SOBRATT) (2009).
91
como evidencia Alexandre Agra Belmonte (2007, p. 17), em artigo intitulado
‘Problemas jurídicos do teletrabalho’. 68
Em tese, esta forma de contratação é atrativa por trazer benefícios recíprocos para
ambos os envolvidos na relação laboral: para o empregador ou tomador de serviço é
possível reduzir custos com pessoal; já para o trabalhador, há uma tendência de
aumento da produção, o que gera maior rentabilidade financeira, bem como a
redução da carga de estresse, atenuada pela ausência pessoal do empregador na
fiscalização da atividade laboral diária, tendo como resultado melhores condições de
trabalho, com equilíbrio significativo entre o trabalho e a vida social e familiar do
trabalhador.
Malgrado as vantagens evidenciadas no parágrafo anterior, não se pode atribuir
apenas aspectos positivos a esta nova relação de trabalho. Isto porque, conforme
alerta Alexandre Agra Belmonte (2007, p. 17), “se, por um lado, mundializa a
produção e promove uma concorrência global no preço da mão-de-obra, por outro
precariza as condições de trabalho dos prestadores menos qualificados e dificulta a
observância da proteção trabalhista”.
Neste sentido, Marcio Pochmann (2001, p. 51-52), ao tratar de ‘tendências das
ocupações profissionais’, alerta:
Em geral, as perspectivas dos estudos realizados tende a fazer maior referência às possibilidades de expansão das ocupações profissionais que utilizam maior informação e das atividades multifuncionais, sobretudo aquelas sustentadas por exigências crescentes de maior escolaridade e qualificação profissional. Nesse sentido, os perfis ocupacionais para o início do próximo século tenderiam a estar associados diretamente à crescente capacitação tecnológica. Mas o cenário em construção para o mundo do trabalho parece refletir muito mais as mutações marcadas por maior insegurança e competição. Novos conhecimentos científicos e tecnológicos estariam associados às exigências empresariais de contratação de empregados com polivalência multifuncional e maior capacidade motivadora e habilidades laborais no
68 Alexandre Agra Belmonte (2007, p. 17) aponta, no contexto, algumas espécies de teletrabalho: a) Fixo ou telecommuting, a domicílio ou em centros, realizado fora da sede em um ou mais dias da semana. Caracteriza-se pelo envio de dados de ponto fixo – home-office ou posto de serviço, com utilização da Internet e equipamentos de apoio (computador com acesso à Internet, scanner, câmera); b) Móvel ou teleworking, assim entendido o trabalho permanentemente realizado fora da empresa. Caracteriza-se pelo envio de dados de pontos variáveis, com utilização da Internet e/ou equipamentos de conexão a longa distância: scanner, celular. Pager, PDA, notebook, palmtop, correio eletrônico.
92
exercício do trabalho. Esses requisitos profissionais, indispensáveis ao ingresso e à permanência no mercado de trabalho em transformação, seriam passíveis de atendimento somente por meio de um maior nível educacional dos trabalhadores. [...]
Vale ressaltar que, na ordem trabalhista pátria, não há lei que regulamente este tipo
de relação laboral. Quando muito, admite a CLT, por via indireta, o trabalho
subordinado desenvolvido em domicílio (espécie de teletrabalho), desde que fique
caracterizada a relação de emprego (art. 6º).69
Interessante observar, neste diapasão, que o teletrabalho possui característica
bastante peculiar, uma vez que a prestação laborativa, conforme salienta Amauri
Cesar Alves (2004, p. 123), “pode se dar no domicílio do prestador dos serviços, em
um escritório, de modo ambulante ou no local que determinar o contratante, dentre
outros”. O que admite a possibilidade de esta atividade laboral configurar tanto uma
relação de subordinação, como uma relação autônoma de trabalho e, por que não
dizer, uma relação de coordenação laboral, por alguns doutrinadores, rotulada como
“parassubordinação”.
Para se configurar a relação de emprego, necessária a supervisão do empregador
em relação ao tempo e execução da atividade específica, desenvolvida de forma
contínua e pessoal pelo empregado, fiscalizada, por exemplo, através de prestação
de contas periódicas, do cumprimento de metas estabelecidas previamente e
avaliação da produção. Importa que estejam presentes os requisitos do art. 3º da
CLT.70
Tal situação difere-se daquela realizada pelo trabalhador autônomo, que desenvolve
serviço com plena liberdade de organização da atividade, assumindo os riscos do
empreendimento (despesa com o funcionamento e manutenção dos equipamentos),
estabelecendo o preço e vinculando-se ao tomador de serviço sem exclusividade.
Também se distingue da relação de coordenação caracterizada pelos chamados
“parassubordinados”, que desenvolvem suas atividades de forma continuada, com 69 CLT, art. 6º. Não se distingue entre o trabalho realizado no estabelecimento do empregador e o executado no domicílio do empregado, desde que esteja caracterizada a relação de emprego. 70 CLT, art. 3º - Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário.
93
pessoalidade, embora de forma coordenada voltada para a atividade-fim do
tomador, ou seja, com observância de diretrizes oriundas do tomador de serviço,
mas com liberdade para desenvolvê-la no tempo, local e organização própria do
prestador de serviço.
Na Itália, tal tese é reforçada pelo Accordo Interconfederale de 20 de junho de 1997,
citado por Amauri Cesar Alves (2004, p. 123), que, ao tratar de trabalho
subordinado, no setor de comércio, destaca o reconhecimento pelas partes
pactuantes de que há teletrabalho subordinado, parassubordinado e autônomo. Para
este autor, “a prestação laborativa pode configurar um contrato de trabalho; o
trabalho a domicílio; um contrato de empreitada ou de prestação livre de serviço;
uma para-representação comercial”.
Conforme a Carta Europeia para o Teletrabalho, trata-se de
um novo modo de organização e gestão do trabalho, que tem o potencial de contribuir significativamente à melhora da qualidade de vida, a práticas de trabalho sustentáveis e à igualdade de participação por parte dos cidadãos de todos os níveis, sendo tal atividade um componente chave da Sociedade da Informação, que pode afetar e beneficiar a um amplo conjunto de atividades econômicas, grandes organizações, pequenas e médias empresas, microempresas e autônomos, como também à operação e prestação de serviços públicos e a efetividade do processo político.71
O que se pretende evidenciar é que, independente da forma configuradora da
relação do teletrabalho (por subordinação, “por coordenação”, autônoma), o
trabalhador que desenvolve tal atividade precisa ter proteção jurídica laboral em face
da automação – consoante art. 7º, XXVII da Constituição Federal –, devendo ter
garantidas as condições mínimas no desempenho de suas atividades, com fito na
efetividade dos direitos fundamentais do trabalhador, principalmente quando
comprovada sua situação de hipossuficiência social ou econômica.
5.1.2 Trabalho em domicílio
71 Informação fornecida por Manuel Martin Pino Estrada, em artigo intitulado “Horas extras e sobreaviso no teletrabalho” (2008).
94
Conforme já evidenciado no tópico anterior, o trabalho em domicílio é uma espécie
do gênero “teletrabalho”. O artigo 6º da Consolidação das Leis do Trabalho faz
referência ao trabalho em domicílio, igualando sua proteção jurídica ao trabalho
realizado no estabelecimento do empregador, “desde que esteja caracterizada a
relação de emprego”.
Mister observar, neste contexto, que a CLT passa a admitir a subordinação jurídica
mitigada, uma vez que o trabalhador distancia-se do controle presencial e direto do
tomador de serviço (empregador), tendo liberdade para administrar seu próprio
trabalho em matéria de horário, participação (ou não) de auxiliares, modo de
produção (quantidade e qualidade das peças produzidas), assumindo, entretanto, a
obrigação de entrega do produto ou serviço a ser desenvolvido a distância.
Mais uma vez ressalta-se que esta nova modalidade de relação laboral permite que
a atividade se enquadre nas várias formas de atuação (por subordinação, por
coordenação ou autônoma), vindo a se distinguir pelos elementos característicos de
cada uma delas (vide tópico 4.1.1). Assim, ao se desenvolver atividade laboral
contínua, em domicílio, de forma pessoal, sob controle pré-determinado do
empregador quanto à determinação da quantidade e qualidade de produção diária,
configura-se a hipótese de trabalho em domicílio subordinado.
Neste sentido, colaciona-se a jurisprudência do TRT, 2ª região, a respeito da
caracterização da relação de emprego em domicílio:
EMENTA: RELAÇÃO DE EMPREGO. TRABALHO EM DOMICÍLIO. Comprovado nos autos que o trabalho, embora realizado no domicílio da demandante, além de exclusivo era controlado e mensurado pela produção diariamente entregue, e que tais serviços eram indispensáveis à atividade empresarial da ré, forçoso reconhecer-se a relação de emprego vindicada. (TRT 2ª R., 6ª T., RO - Record 2990163080 SP 02990163080, Rel.: Maria Aparecida Duenhas, Publicado em 30/06/2000)
Por seu turno, em havendo atividade voltada para o desenvolvimento de produto ou
serviço, de modo continuado, por conta alheia, sem que o trabalhador assuma os
riscos do empreendimento (a cargo do tomador de serviços), tem-se a
caracterização de trabalho coordenado (ou parassubordinação). Esta hipótese ainda
é considerada para alguns autores como uma situação complexa, cujo
95
enquadramento acaba por ocorrer de forma pouco representativa. É o que se
evidencia com a jurisprudência abaixo:
EMENTA: TRABALHO A DOMICÍLIO E TRABALHO AUTÔNOMO. No campo da ciência jurídica existem figuras situadas nas chamadas "zonas grises", cujo enquadramento apresenta-se complexo, ensejando certa dificuldade. É o que freqüentemente se dá quando se discute o enquadramento de trabalhador a domicílio como autônomo ou subordinado. Comprovado, porém, que a reclamante assumia os serviços de "descascadeira de alho" quando quisesse, podendo repassar os trabalhos a terceiro, sem se sujeitar a qualquer sanção disciplinar, não estando sujeita a comparecimento à empresa ou a qualquer outra fiscalização do empregador, a relação jurídica não se enquadra nos moldes do art. 3o. da CLT. (TRT 3ª R., 2ª T., RO - 523/01, Rel.: Alice Monteiro de Barros, DJMG 28/03/2001)
E, finalmente, o trabalho realizado por conta própria, no qual o trabalhador assume
integralmente os riscos do empreendimento, põe-se em contato direto com o
consumidor e regula os preços do produto ou serviço oferecido, está-se diante de
uma situação de trabalho em domicílio autônomo. Colaciona-se, neste aspecto,
jurisprudência do TRT, 16ª região:
EMENTA: TRABALHO A DOMICÍLIO. VÍNCULO EMPREGATÍCIO. INEXISTÊNCIA. O trabalho a domicílio pode ser executado de forma autônoma ou em caráter subordinado. Para a distinção entre uma e outra hipótese mister analisar a existência dos elementos configuradores da relação de trabalho, principalmente da subordinação e da alteridade. Não tendo a reclamante demonstrado que o risco da produção era inteiramente do reclamado nem que cumpria ordens preventivas e sucessivas, sem nenhuma margem de discricionariedade, mantém-se a sentença que julgou improcedente a reclamação trabalhista, porque não provado o vínculo empregatício. Recurso conhecido e improvido. (TRT 16ª R, RO - 01164-2005-002-16-00-2, Rel.: Américo Bedê Freire, Publicado em: 14/02/2007)
Como visto nos excertos acima, não se pode, de imediato, rotular uma relação de
trabalho em domicílio como sendo necessariamente de subordinação. Necessário
analisar cada situação específica, ponderando elementos existentes na relação, a
fim de configurar a natureza jurídica do teletrabalho como sendo de subordinação,
coordenação ou autônoma, o que será evidenciado pelo modo de prestação do
serviço.
5.1.3 Trabalho agregado (caminhoneiros agregados)
96
Outra espécie de relação de trabalho em franca expansão, atualmente, tem sido a
contratação de caminhoneiros “agregados” por empresas transportadoras. Tais
empresas tendem a firmar vínculo de natureza civil de locação do transporte com o
trabalhador, sendo este proprietário do veículo, para prestação de serviço, o que, em
tese, configura uma relação de trabalho autônomo. Para tanto, necessário que o
motorista arque com as despesas de combustível e de manutenção do veículo,
estando sujeito apenas à observância de parâmetros previamente definidos em
contrato de locação.
Ocorre, porém, em alguns casos, um desvirtuamento do contrato de natureza civil,
quando a empresa contratante passa a para estabelecer rotas, horários, dias de
trabalho, com determinação, inclusive, da quantidade de mercadoria a ser
transportada, entre outras exigências. É o que se pode observar com as
jurisprudências a seguir:
EMENTA: RELAÇÃO DE EMPREGO – CARRETEIRO. Fica configurada a relação de emprego quando o motorista, ainda que proprietário de seu próprio veículo, presta serviço no transporte de leite, com horário a cumprir, local certo para a entrega do leite, rota predeterminada pela empresa, trabalho prestado em todos os dias da semana e pagamento efetuado quinzenalmente. (TRT 3ª R., 4ª T., RO 3.694/94. Rel.: Juiz Luiz Ronan Neves Koury. DJMG 04.06.94) EMENTA: RELAÇÃO DE EMPREGO. MOTORISTA QUE PRESTA SERVIÇOS COM VEÍCULO PRÓPRIO. Não é suficiente para a descaracterização da relação de emprego a circunstância de o motorista prestar serviços utilizando veículo próprio. Trabalhando com exclusividade, em horário certo, sob fiscalização e subordinação, sem liberdade e, até, possibilidade material de prestar serviços a outros, o motorista é empregado e, não, trabalhador autônomo, absorvido que foi a autonomia pela reclamada para a satisfação de necessidades ligadas a suas atividades essenciais. (TRT 3ª R., 1ª T., RO 3.221/85. Rel. Juiz Manoel Mendes de Freitas. DJMG 24.01.86)
Nestes casos, o que aparentemente configuraria uma relação de trabalho autônomo,
transforma-se numa relação de trabalho subordinada, com a incorporação do
trabalhador à estrutura da empresa contratante, submetendo-o às diretrizes comuns
a todos os que exercem a atividade de transporte de cargas, o que requer a
proteção jurídica trabalhista nos moldes da relação de emprego.
Amauri Cesar Alves (2004, p. 128) chama a atenção para a hipótese de
coordenação das atividades pelo dono da carga a ser transportada:
97
[...] Casos outros há em que a subordinação não é tão patente, sendo diluída na relação e deixando transparecer apenas coordenação de tarefas, o que caracteriza parassubordinação. Ora, se um motorista carreteiro vende sua força produtiva – ainda que receba sob o epíteto de “aluguel de cavalo mecânico” – com pessoalidade, não-eventualidade, mesmo que não haja controle rígido e normas expressas, haverá, regra geral, coordenação das atividades pelo dono da carga a ser transportada, devendo haver proteção jurídico-trabalhista ao trabalhador.
Como já pontuado em momentos anteriores deste trabalho, no ordenamento jurídico,
não há uma legislação específica para acolher os trabalhadores que se localizam
nas zonas fronteiriças entre o trabalho subordinado e o autônomo. É o que se
constata em relação à prestação de serviço coordenado por motoristas agregados.
Mais uma vez, portanto, reforça-se a necessidade de mudança de paradigmas para
inserir no contexto jurídico uma nova regulamentação (trabalho parassubordinado ou
de coordenação) que possa tutelar trabalhadores situados na “zona cinzenta”,
garantindo-lhes condições mínimas de trabalho e direitos que resguardem a
dignidade humana.
5.1.4 Representação comercial
Finalmente, a representação comercial também desponta no cenário nacional como
motivadora de uma relação de trabalho cuja configuração se mostra nebulosa. Isto
porque malgrado se constitua numa atividade de intermediação de negócios entre as
empresas, sendo, em regra, um trabalho autônomo (segundo contrato de
representação comercial regulado pela Lei nº 4.886/1965 e alterada pela Lei
8.420/1992), em muitos casos é possível detectar de maneira clara o vínculo
empregatício.
Ao se intermediar um negócio, o representante comercial não vende nem compra
mercadorias, apenas presta serviço, angariando pedidos em benefício da empresa
contratante. Esclarece Maurício Godinho Delgado (2006, p. 595) que “esse
profissional não presta serviço mediante contrato de prestação de serviço, fazendo-o
98
através de um contrato típico específico, regulado pela Lei n 4.886, de 1965 (com
alteração da Lei n. 4.420/92) e, mais recentemente, novo CCB”. De todo modo, por
se tratar de uma relação predominantemente autônoma 72, o contrato de
representação comercial passa a exercer uma função essencial, o de regular as
obrigações dos contratantes, constituindo lei entre as partes e sendo válidas todas
as cláusulas que não infringirem a lei.
Para se configurar, entretanto, uma relação de trabalho autônoma, necessário que o
contrato de trabalho incorpore os elementos obrigatórios previstos no artigo 27 e
alíneas da Lei nº 4.886/1965, sob pena de caracterizar uma possível relação de
emprego 73.
Tal precaução é recomendável pelo fato de que a lei, ao tratar de relação de
trabalho autônomo, por vezes, lança mão de elementos que, em regra, são
caracterizadores de uma autêntica relação subordinada, como a não-eventualidade,
a exclusividade (em alguns casos), indeterminação do prazo contratual, restrição
(eventual) das zonas de exercício com exclusividade (vide nota de rodapé nº 6).
Por esta razão, Paulo Emílio Ribeiro de Vilhena (1999, p. 497) fala em “zona gris”,
tratando-se mais uma vez de uma tênue linha divisória que separa o representante
comercial autônomo (contrato regido pela lei nº 4.886/1965) do vendedor
subordinado (contrato regido pela CLT, art. 2º e 3º).
Neste sentido, em havendo ingerências do representado no sentido de restrições de
poder do representante comercial, ou mesmo a previsão de sanções disciplinares,
72 A Lei 4.886/1965 (alterada pela Lei 8.420/1992) traz em seu artigo 1° o conceito de representante comercial autônomo: “a pessoa física ou jurídica, sem relação de emprego que desempenha em caráter não eventual, por conta de uma ou mais pessoas, a mediação para realização de negócios mercantis, agenciando propostas ou pedidos, para, transmiti-los aos representados, praticando ou não atos relacionados com a execução dos negócios”. 73 Entre as exigências, registram-se: a) condições e requisitos gerais da representação; b) indicação genérica ou específica dos produtos ou artigos objeto da representação; c) prazo certo ou indeterminado da representação; d) indicação das zonas onde será exercida, bem como da permissibilidade ou não da representada poder negociar, naquele local, diretamente; e) garantia total, parcial, por prazo certo ou determinado de exclusividade de zona ou setor de zona; f) retribuição, época do pagamento e recebimento ou não, pelo representado, dos valores respectivos; g) hipótese de restrição da zona concedida com exclusividade; h) obrigações e responsabilidade das partes; i) exercício exclusivo ou não em favor do representado; j) indenização devida ao Representante pela rescisão do contrato, fora dos casos previstos no art. 34.
99
resta configurada a relação de emprego pela subordinação evidenciada. É o que se
confere na jurisprudência acostada a seguir:
EMENTA: Representante comercial. Relação de emprego x contrato de representação comercial. Ao que se infere do art. 3º da CLT e do disposto na Lei nº 4.886/65 (com as alterações inseridas pela Lei nº 8.420/92), os contratos de emprego e de representação comercial possuem elementos comuns, sendo tormentosa para o intérprete e o julgador a tarefa de diferenciá-los. Há vínculo de emprego a ser reconhecido quando dos elementos de convicção dos autos emerge a demonstração de que o relacionamento entre as partes manteve-se segundo as normas de verdadeiro contrato de trabalho. (TRT 3ª R, 1ª T, RO nº 7661/2001, Relª. Denise Alves Horta, DJMG 29.8.20010)
Ao se referir à zona fronteiriça detectada na presente relação de trabalho,
acrescenta Maurício Godinho:
O operador jurídico, porém, em tais situações fronteiriças deve examinar, topicamente, os elementos que compõem a relação sociojurídica efetiva, para apreender se está diante de uma relação civil/comercial ou de uma meramente empregatícia. Trata-se, na verdade, de um exame da matéria fática, que deve ser efetivada a partir das provas trazidas a juízo e das presunções incidentes sobre o tema. Duas grandes pesquisas sobrelevam-se nesse contexto: a pesquisa sobre a existência (ou não) da pessoalidade e a pesquisa sobre a existência (ou não) da subordinação. (DELGADO, 2006, p. 597)
Neste sentido, vale ressaltar que, a fim de configurar a representação comercial
autônoma, mister que o representante comercial assuma os riscos e resultados da
sua atuação, com plenos poderes no desempenho de suas atividades, restando
afastada a imposição repetida e contínua de ordens do representado (tomador de
serviço) e as sanções disciplinares, ou seja, deve estar ausente qualquer tipo de
ingerência do representado na maneira como o trabalhador irá desempenhar suas
funções, limitando-se aquele a receber os pedidos e pagas as comissões
respectivas.
5.2 VELHAS RELAÇÕES DE TRABALHO SOB NOVA ROUPAGEM E A
PRECARIZAÇÃO DO SISTEMA DE PROTEÇÃO JURÍDICA
100
Do exposto no tópico anterior, não se pode ignorar que a relação de emprego vem
perdendo espaço para outras relações de trabalho, algumas delas subordinadas ao
poder diretivo do tomador de serviço, outras sob a suposta coordenação deste e, por
fim, não menos digno de proteção, algumas categorias revestidas de autonomia na
prestação de serviço, que, sob a égide do princípio da isonomia, em seu sentido
ampliativo, merecem o amparo da ordem trabalhista pátria.
Neste aspecto, pontua Maurício Godinho Delgado, ao afirmar que:
Todo Direito, como instrumento de regulação de instituições e relações humanas, atende a fins preestabelecidos em determinado contexto histórico. [...] Todo Direito é, por isso, teleológico, finalístico, na proporção em que incorpora e realiza um conjunto de valores socialmente considerados relevantes. (2006, p. 58)
Logo, em se tratando do Direito do Trabalho, entende-se que este ramo jurídico
possui uma função integradora, na medida em que se volta para regular as relações
laborais que envolvem, em sua essência, o trabalhador e o tomador de serviço, em
um contexto situado entre o capital e o trabalho. Não é outra a razão de se justificar
a intervenção jurídica estatal no ramo trabalhista, malgrado se trate de uma relação
de interesse predominantemente privado.
Reforça tal entendimento a conceituação apresentada por Maurício Godinho
Delgado (2006, p. 61-62), ao apontar a função civilizatória e democrática como
própria do Direito do Trabalho. Segundo esse autor, tal função se justifica por ser
este ramo jurídico um dos instrumentos mais relevantes de inserção na sociedade
econômica de parte significativa dos segmentos sociais despossuídos de riqueza
material acumulada e, que, por isso mesmo, vivem, essencialmente, de seu próprio
trabalho. E enfatiza: “é um dos principais mecanismos de controle e atenuação das
distorções socioeconômicas inevitáveis do mercado e sistema capitalista”.
Observa-se, porém, uma transitividade paradigmática no que tange à intervenção
protetiva do Estado, voltada ao trabalhador em sua relação laboral. Como já
apontado em vários momentos desta pesquisa, o emprego já não mais ocupa o
centro gravitacional das relações de trabalho. Ainda que concentre um grande
contingente de trabalhadores, para que faça jus aos direitos e garantias laborais
101
celetistas, mister que se enquadre no perfil do empregado, devendo preencher os
cinco elementos fático-jurídicos destacados por Maurício Godinho Delgado (2006, p.
305): ser pessoa física, cujo trabalho se desenvolve com pessoalidade, de forma
contínua e onerosa, subordinado, contudo, ao empregador.
Curioso destacar o fato de que, no Brasil, alguns trabalhadores atendem
prontamente a todos os requisitos supramencionados (em específico exercem
atividade sob subordinação jurídica), mas possuem uma regulação própria, fora da
CLT. São os chamados trabalhadores subordinados em regimes diferenciados.
Nesta categoria estão incluídos os aprendizes74, empregados domésticos75,
trabalhadores rurais76.
Há também, no Brasil, circunstância excepcional em que há prestação subordinada
de serviço, mas outros requisitos não se incorporam à relação empregatícia. Em
regra, em tais hipóteses, por não serem contempladas por uma regulamentação
própria, como naquelas anteriormente destacadas, costuma a doutrina e
jurisprudência envidar esforços para integrá-las à proteção do Direito do Trabalho,
considerando o trabalhador como empregado atípico, ou excluí-las definitivamente
da proteção justrabalhista, considerando-o, em última instância, trabalhador
autônomo.
74 Existem duas modalidades de aprendizagem: uma escolar e outra empresarial, sendo que apenas a segunda modalidade há relação de emprego envolvendo o trabalhador estudante e a empresa para quem presta serviço. Justifica sua inserção no regime diferenciado, porque traz como peculiaridade a obrigação do empregador de submeter o empregado à formação metódica do ofício ou ocupação para o qual foi contratado. Esta última modalidade encontra-se regida pela CLT, com alterações introduzidas pela Lei nº 10.097/2000, cujo contrato deverá preencher determinadas formalidades previstas em lei. 75 Os empregados domésticos, a despeito de exercerem um trabalho subordinado, salvo na condição de diaristas, possuem uma regulamentação própria, porque a estes não se aplicam todos os preceitos da CLT, por força das excludentes tratadas no art. 7º, parágrafo único da Constituição Federal. Encontram-se regidos pela Lei nº 5.859/72 com acréscimos da Lei nº 10.208/2001, que incluiu o direito ao FGTS e seguro-desemprego. 76 Os Trabalhadores rurais, embora na maioria dos casos atendam aos requisitos empregatícios, são tratados pela nomenclatura genérica de trabalhadores e encontram-se regidos pela Lei nº 5.889/73. Vale ressaltar que ainda em se tratando de trabalhador rural, existe um rol dos excluído da Lei Rural supracitada, como bem destaca Dirceu Galdino e Aparecido Lopes (1995, p. 51): domésticos, parceiros, meeiros, arrendatários, empreiteiros, oleiros, carvoeiros, empregados de mineração, trabalhadores parentes dos pequenos proprietários rurais e industriários. Veja que o trabalhador rural doméstico não se encontra regido nem pela CLT nem pela própria lei Rural, ficando a cargo da Lei do empregado doméstico.
102
Neste ínterim, há quem insira os “trabalhadores parassubordinados” 77, como
pertencentes à zona cinzenta entre o trabalhador subordinado e o autônomo, tema
que tem despertado o interesse de doutrinadores pátrios em obras específicas como
Amauri Cesar Alves (2004, p. 136), Otávio Pinto e Silva (2004, p.102-135), Dennis
Veloso Amanthéa (2008, p. 41-89), embora se reconheça que o tratamento no Brasil
encontra-se ainda em fase embrionária.
A título de esclarecimento, destacam-se como integrantes da primeira hipótese os
denominados “empregados atípicos”, inclusos nesta categoria os trabalhadores
avulsos78 e temporários79. São rotulados de empregados atípicos porque, apesar de
possuírem os requisitos caracterizadores da relação de emprego, não os integram
em sua totalidade, apresentando outras características que se afastam da
configuração típica. Esses trabalhadores são recepcionados pela regulamentação
celetista.
Na segunda hipótese, destacam-se os trabalhadores eventuais80, servidores
administrativos das entidades estatais de Direito Público81, cooperados82 e os
77 O trabalho parassubordinado tem sua origem na Itália, e configura relações de trabalho de natureza contínua, não subordinativa, nos quais os trabalhadores desenvolvem atividades que se enquadrem nas necessidades organizacionais da empresa. Ainda não se encontra regulamentado no Brasil, embora a doutrina já tenha se encarregado se debruçar sobre tal tema com o fito de importar tal instituto para a ordem jurídica laboral pátria. 78 Segundo Maurício Godinho Delgado (2006, p. 341), o obreiro chamado avulso corresponde à modalidade de trabalhador eventual, que oferta sua força de trabalho, por curtos períodos de tempo, a distintos tomadores, sem se fixar especificamente a qualquer deles. Na doutrina pátria, tem-se como elemento distintivo entre avulso e eventual a circunstância de que aquele oferta sua força de trabalho por intermediação do sindicato, atualmente por atuação do órgão de gestão de mão-de-obra (instituído pela Lei 8.630/93). Aqui se abrem parênteses para acrescentar que não mais existe no Brasil a figura do avulso sindical, segundo afirmação de Washington Luiz de Trindade (1998, p.138), e sim avulsos cadastrados. Embora a doutrina não o considere inserto na relação de emprego, a Constituição estabeleceu aos trabalhadores avulsos igualdade de direitos em relação ao trabalhador subordinado típico, segundo art. 7º, inciso XXXIV da Constituição Federal de 1988. 79 Segundo a Lei nº 6.019/74, que regulamenta o trabalho temporário no Brasil, “é aquele prestado por pessoa física a uma empresa, para atender à necessidade transitória de substituição de seu pessoal regular e permanente ou à acréscimo extraordinário de serviços”. Neste sentido, a contratação do trabalhador se dá por interposição de outra empresa (empresa de trabalho temporário), que, por conseguinte, se responsabilizam pela remuneração e assistência ao trabalhador temporário, em tese. Desta forma, entende-se como categoria distinta da relação empregatícia propriamente dita, razão pela qual se insere na categorização de empregado atípico. Sobre a relação de trabalho temporário, a autora desta dissertação apresentou artigo no Congresso Nacional de Pós-Graduação em Direito (CONPEDI), intitulado “Contrato de trabalho a termo: empregabilidade ou precarização?“, no qual traça distinção entre os diversos contratos a termo e provoca reflexão a respeito da verdadeira função integradora desta nova categoria de trabalho – se se volta para a empregabilidade ou precarização do emprego (PONTES, 2009, p. 7393-7404). 80 Foge aos padrões típicos de empregado por faltar-lhes a continuidade da prestação laboral, ou seja, prestam serviço a outrem ocasionalmente (termo atribuído por Amauri Mascaro Nascimento
103
trabalhadores que se situam em uma zona fronteiriça entre os subordinados e os
autônomos (por alguns denominados de “trabalhadores parassubordinados”).
Sabe-se que há uma razão nítida em configurar o trabalhador nesta ou naquela
relação de trabalho, como já evidenciado em capítulo que distingue tais relações
laborais, por demonstrar a diferença de tratamento jurídico reservada a cada uma
das hipóteses previstas, com guarida no Código Civil (trabalhadores autônomos), na
Consolidação das Leis do Trabalho (empregados típicos) ou em leis esparsas.
Ocorre, porém, que, pesar da previsão legal para a maioria das hipóteses
apresentadas, nem todos os trabalhadores exercem suas atividades sob proteção
normativa do Estado, ou seja, na forma como os trabalhadores são inseridos em sua
relação de trabalho pode ou não haver proteção jurídica, a depender da forma como
o trabalho é exercido, o que nem sempre corresponde às circunstâncias reais.
Isto se atribui ao fato de que, na ordem jurídica laboral pátria, tradicionalmente se
costuma enquadrar o trabalhador em duas classificações distintas: trabalho
subordinado ou autônomo, apesar de já ter sido demonstrado que em alguns casos
o mesmo trabalhador pode se inserir em qualquer uma das hipóteses. O tratamento
distintivo como tem sido apresentado no ordenamento jurídico pátrio vem recebendo
pesadas criticas por alguns doutrinadores, por entenderem que nem sempre tais
distinções são nítidas.
(1997, p. 314), o que acaba por gerar o entendimento de que seus serviços, em regra de curta duração, não coincidem com os fins almejados pela atividade empresarial, fato que, por si só, afasta o trabalhador da tutela protetiva do Direito do Trabalho, limitando-se a receber o preço contratado pelo serviço, embora tais serviços se desenvolvam mediante subordinação. Neste aspecto, registra-se que no âmbito previdenciário, a Lei 8.212/91, art. 12, inciso V, alínea “g”, considera o trabalhador eventual contribuinte individual, conferindo-lhe a condição de segurado obrigatório da previdência social. 81 Maurício Godinho Delgado (2006, p.322) destaca este tipo de relação de trabalho como excludente da proteção celetista, haja vista tratar-se de trabalhadores cujo vínculo contratual é de natureza pública, com regulamentação própria. Neste sentido, a Constituição Federal de 1988 estatuiu o regime jurídico único (antigo art. 39, atualmente alterado pela Emenda Constitucional 19 de 04/06/1998 que incentiva a dualidade de regimes na contratação de servidores públicos). Esclarece-se, neste sentido, que no sistema de contratação do servidor público também se admite a figura do servidor empregado que se enquadra na regulamentação celetista. 82 A lei nº 8.949/94 acrescenta parágrafo ao art. 442 da Consolidação das Leis do Trabalho, no qual declara a inexistência de vínculo empregatício entre as cooperativas e seus associados e entre os associados e os tomadores de serviços. Há doutrinadores, como Maurício Godinho Delgado (2006, p. 329) que consideram tal hipótese não como sendo excludente legal absoluta, embora haja expressa menção legal a este respeito (CLT, art. 442), mas consideram-no como simples presunção relativa de ausência de vínculo de emprego, caso exista efetiva relação cooperativista envolvendo o trabalhador e o tomador de serviço.
104
Como consequência, acaba por excluir direitos específicos do trabalhador em sua
atuação laborativa, por se enquadrar num suposto tipo legal configurativo que, na
prática, não corresponde à realidade. Eis a configuração de hipossuficiência
socioeconômica do trabalhador, que independe da relação de trabalho em que se
insira.
No tópico anterior, que tratou das novas relações de trabalho, é nítida a constatação
de que, em algumas hipóteses evidenciadas, a figura do trabalhador poderia se
caracterizar ora como subordinado, ora como autônomo e mesmo em algumas
circunstâncias não se enquadrar especificamente em nenhuma das opções jurídicas
destacadas, por exercerem atividades por coordenação, ainda não regulamentada
no Brasil.
É o caso exemplificativo dos empregados domésticos, motorista de taxi, trabalhador
rural e, por que não dizer, o trabalhador que exerce atividades em domicílio. São as
figuras laborais híbridas 83 que merecem especial atenção da ordem jurídica
trabalhista.
5.3 COMO PROTEGER O TRABALHADOR HIPOSSUFICIENTE SITUADO NA
ZONA FRONTEIRIÇA ENTRE TRABALHO SUBORDINADO E TRABALHO
AUTÔNOMO
A relação de emprego, como visto em capítulos anteriores, não mais representa a
única forma de relação laboral disponível no mercado de trabalho. O que implica em
dizer que outras relações passam a dividir com o trabalho subordinado o espaço de
produção capitalista, sem, contudo, ter-lhes assegurada a proteção jurídica prevista
na CLT e na Constituição Federal, em seu art. 7º.
83 O trabalhador que desenvolve atividade de natureza doméstica poderá ser empregado ou diarista. O motorista de táxi, por sua vez, poderá ser empregado doméstico, exercer atividade de coordenação ou ser totalmente autônomo.
105
Isto ocorre devido à dificuldade de enquadramento de tais relações fáticas a uma
relação jurídica específica, por se situarem em ‘zonas grizes’ do Direito do Trabalho,
ou seja, não se inserem numa relação de subordinação nem propriamente
autônoma, embora se reconheça a condição de hipossuficiência de muitos destes
trabalhadores.
Eis a razão de se declarar a crise do Direito do Trabalho em sua função protetiva,
circunstância esta enfatizada por Anna Maria Grieco, citada por Amauri César (1983,
p. 14 apud ALVES, 2004, p. 86):
Já não há dúvida que o direito do trabalho surgido e historicamente afirmado como droit ouvriet ou, de qualquer modo, direito das classes economicamente mais fracas, tenha perdido, no curso de sua evolução, parte da ligação com sua própria função originária: os seus contornos que deveriam delimitar, no plano finalístico, um sistema de proteção a favor somente das classes subalternas, vieram aos poucos, se alterando, até incluir sujeitos pertencentes a categorias sociais já privilegiadas e excluindo, ao mesmo tempo, sujeitos que merecem ampla proteção.
A declaração de Anna Maria Grieco revela uma situação distorcida no Direito do
Trabalho atual, qual seja, a de atribuir ampla proteção a trabalhadores que, embora
tidos como subordinados, gozam de boas condições sócio-financeiras, ao passo que
outros trabalhadores, hipossuficientes, ficam carentes da devida proteção.
Neste aspecto, motivada pela necessidade de preenchimento da lacuna de proteção
voltada aos trabalhadores situados nesta zona nebulosa, a doutrina nacional já
aponta defensores de uma suposta regulamentação jurídica do trabalho coordenado
ou parassubordinado, inspirados estes no modelo jurídico italiano denominado
“parassubordinação”.
A parassubordinação, segundo esclarece Otávio Pinto e Silva (2004, p. 102),
desenvolveu-se pela doutrina italiana, voltada para “relações de trabalho de
natureza contínua, nas quais os trabalhadores desenvolvem atividades que se
enquadram nas necessidades organizacionais dos tomadores de seus serviços, tudo
conforme estipulado e contrato, visando colaborar para os fins do empreendimento”.
106
Dentre os doutrinadores pátrios que defendem tal teoria doutrinária destaca-se Arion
Sayão Romita, que prenuncia,
A prestação de serviços de natureza continuativa e pessoal, na atualidade, dá ensejo a um novo tipo: ao lado do trabalho em que o prestador de serviços não assume os riscos do empreendimento e daquele em que a autonomia organizativa prevalece, surge o trabalho coordenado. Com a crise da subordinação, emergem novas formas nas quais o trabalho associado reduz o protecionismo dispensado ao trabalhado, superando a dicotomia tradicional (trabalho subordinado/trabalho autônomo), em favor de um tertium genus, qual seja, o trabalho coordenado, sob a influência de uma realidade social cada vez mais complexa e problemática, como resposta a situações contratuais ambíguas, nas quais o traço decisivo se afigura como necessidade de propiciar uma ocupação ou oportunidade de obtenção de renda ou fonte de sustento. (2003, p. 119)
Adverte, porém, Dennis Veloso Amanthéa (2008, p. 93-94) que tal instituto deve ser
implementado, no Brasil, mediante criação de lei específica, como forma de se
combater desvirtuamento e superar eventual resistência:
A forma mais coerente de implementação da parassubordinação no Brasil, sem sobra de dúvida, seria a produção de um texto legislativo capaz de inserir entre as leis trabalhistas uma que tratasse especificamente do instituto, haja vista que o maior problema a se enfrentar no caso de os juristas apenas começarem a interpretar de forma diversa o art. 3º da Consolidação das Leis do Trabalho, é a resistência a esta nova tendência, e como tal estagnarem o instituto ou este galgar degraus a passos lentos.
Interessante registrar que, embora se perceba um certo grau de interesse da
doutrina pátria no sentido de importação deste instituto para implantação no
ordenamento jurídico pátrio, esclarece Luiz de Pinho Pedreira (2006, p. 343-344)
que este tipo especial de trabalho autônomo - “Colaboração coordenada e
continuativa (co.co.co)84 – voltado originariamente para disciplinar o trabalho dos
agentes e representantes comerciais, já se encontra modificado na Itália85,
avançando para uma nova modalidade de relação laboral ensejando o contrato de
trabalho a projeto, embora Sferrazza e Lunardon, citados por Luiz de Pinho Pedreira
84 Segundo atualização apontada por Dennis Veloso Amanthéa (2008, p. 73), a relação passou a ser apelidada de co.co.pro, para significar contrato de colaboração coordenada continuativa na modalidade de trabalho a projeto, “reordenando o que representava a relação parassubordinada para se alinhar ao que se chama de “trabalho a projeto”. 85 Segundo Dennis Veloso Amanthéa (2008, p. 73), a alteração legislativa ficou conhecida como “Reforma Biagi” ou ainda “Lei Biagi”, em homenagem ao funcionário do Ministério do Trabalho da Itália, professor universitário Marco Biagi, morto aos 52 anos (2002) com dois tiros, cuja autoria do crime foi atribuída a um grupo terrorista de esquerda conhecido como “Brigada Vermelha”, sob o argumento de o professor ter regulamentado a exploração dos trabalhadores assalariados (SIC).
107
(2006, p. 345), sustentem a coexistência deste novo instituto com a já clássica
parassubordinação italiana.
Independente dos avanços já alcançados por tal instituto na Direito laboral italiano
vale ressaltar que a jurisprudência brasileira tem reconhecido sua existência, ainda
que timidamente, e almeja sua inserção na ordem pátria, como se pode observar
nos julgados a seguir colacionados:
EMENTA: RELAÇÃO DE EMPREGO E TRABALHO AUTÔNOMO. A contraposição trabalho subordinado e trabalho autônomo exauriu sua função histórica e os atuais fenômenos de transformação dos processos produtivos e das modalidades de atividade humana reclamam também do Direito do Trabalho uma resposta à evolução desta nova realidade. A doutrina mais atenta já sugere uma nova tipologia (trabalho coordenado ou trabalho autônomo) com tutela adequada, mas inferior àquela prevista para o trabalho subordinado e superior àquela prevista para o trabalho autônomo. Enquanto continuam as discussões sobre esse terceiro gênero, a dicotomia codicista trabalho subordinado e trabalho autônomo ainda persiste em nosso ordenamento jurídico, levando a jurisprudência a se apegar a critérios práticos para definir a relação concreta. Logo, comprovado, na hipótese em exame, que a prestação de serviços não se desenvolveu com pessoalidade, tampouco sob a direção funcional e disciplinar do empregador, a relação estabelecida está fora da égide do Direito do Trabalho.” (TRT 3ª R., 2ª T., RO 17303/1999, Rel.: Juíza Alice Monteiro de Barros. DJMG em 26.04.2000) “PARASSUBORDINAÇÃO - JORNALISTA CORRESPONDENTE - NATUREZA JURÍDICA DO CONTRATO RELACIONADO COM A PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. Encontra-se sob o manto da legislação trabalhista, porquanto presentes os pressupostos do art. 3º. da CLT, a pessoa física que prestou pessoalmente os serviços de correspondente jornalístico, onerosamente. Ao exercer a atividade relacionada com a busca de notícias, bem como com a respectiva redação de informações e comentários sobre o fato jornalístico, o profissional inseriu-se no eixo em torno do qual gravita a atividade empresarial, de modo que, simultaneamente, como que se forças cinéticas, a não eventualidade e a subordinação, esta última ainda que de maneira mais tênue, se atritaram e legitimaram a caracterização da relação empregatícia.[...] As novas e modernas formas de prestação de serviços avançam sobre o determinismo do art. 3º. da CLT, e alargam o conceito da subordinação jurídica, que, a par de possuir diversos matizes, já admite a variação periférica da parassubordinação, isto é, do trabalho coordenado, cooperativo, prestado extramuros, distante da sua original concepção clássica de subsunção direta do tomador de serviços. O veio da integração objetiva do trabalhador num sistema de trocas coordenadas de necessidades, cria a figura da parassubordinação e não da para-autonomia. Se a região é de densa nebulosidade, isto é, de verdadeiro fog jurídico, a atração da relação jurídica realiza-se para dentro da CLT e não para dentro do Código Civil, que pouco valoriza e dignifica o trabalho do homem, que é muito livre para contratar, mas muito pouco livre para ajustar de maneira justa as cláusulas deste contrato”. (grifos acrescidos).” (TRT 3ª R., 4ª T., RO 00073/2005, Rel.: Juiz Luiz Otávio Linhares Renault. DJMG em 01.10.2005).
108
6 POR UMA PROPOSTA DE (RE)DEFINIÇÃO DO DIREITO DO TRABALHO EM
FACE DA REESTRUTURAÇÃO DAS RELAÇÕES DE TRABALHO
Este capítulo elege como ponto central a seguinte reflexão: em tempos de
efetividade dos direitos fundamentais em que o trabalho se insere, seria possível
admitir que o Direito do Trabalho ampare apenas o trabalhador enquadrado na
relação de emprego, desconsiderando aqueles outros trabalhadores inseridos numa
relação de trabalho distinta da empregatícia?
Com vistas nesta reflexão, atinge-se o encerramento desta pesquisa, que teve como
eixo central a proposta de reorganização da ordem trabalhista pátria, com
abrangência na Constituição Federal de 1988 e, especificamente, no Direito do
Trabalho, tendo como fonte inspiradora as diretrizes estratégicas da Organização
Internacional do Trabalho. É o que se apresenta a seguir.
6.1 O TRABALHO DECENTE SEGUNDO A OIT
A Organização Internacional do Trabalho (OIT) 86 é um organismo internacional
criado pelo Tratado de Versalhes (1919), destinado à realização da justiça social
entre os povos, com sede em Genebra, ao qual podem filiar-se todos os países-
membros da Organização das Nações Unidas (ONU). É a única das Agências do
Sistema das Nações Unidas que tem estrutura tripartite, na qual os representantes
dos empregadores e dos trabalhadores têm os mesmos direitos que os do governo.
A Organização Internacional do Trabalho é composta pelos seguintes órgãos:
Conferência Geral, Conselho Administrativo, Repartição Internacional do Trabalho
(Secretariado).
A Conferência Geral é o fórum internacional, formado por representantes dos
Estados-membros (atualmente com 183 Estados), que ocorre anualmente em
86 Informações colhidas no site oficial da OIT no Brasil: conheça a OIT>estrutura.
109
Genebra (junho), com o objetivo de discutir temas diversos do trabalho, adotar e
revisar normas internacionais do trabalho, aprovar as políticas gerais e o programa
de trabalho e orçamento da OIT, financiado pelos Estados-Membros.
O Conselho Administrativo é órgão colegiado que exerce a administração da OIT,
formado por membros do governo, dos trabalhadores e dos empregadores
representantes dos países de maior importância industrial. Este conselho executivo
se reúne três vezes ao ano, em Genebra, e é responsável pela elaboração e
controle de execução das políticas e programas da OIT, pela eleição do diretor geral
e pela elaboração de uma proposta de programa e orçamento bienal.
A Repartição Internacional do Trabalho possui um diretor-geral, designado pelo
Conselho de Administração, responsável, perante este, pelo bom funcionamento da
Repartição e pela realização de todos os trabalhos que lhe forem confiados. A
Repartição Internacional do Trabalho terá por funções a centralização e a
distribuição de todas as informações referentes à regulamentação internacional da
condição dos trabalhadores e do regime do trabalho e, em particular, o estudo das
questões que lhe compete submeter às discussões da Conferência para conclusão
das convenções internacionais, assim como a realização de todos os inquéritos
especiais prescritos pela Conferência ou pelo Conselho de Administração.
A estrutura da OIT inclui uma rede de cinco escritórios regionais e vinte e seis
escritórios de área – entre eles o do Brasil – além de doze equipes técnicas
multidisciplinares de apoio a esses escritórios e onze correspondentes nacionais que
sustentam, de forma parcialmente descentralizada, a execução e administração dos
programas, projetos e atividades de cooperação técnica e de reuniões regionais,
sub-regionais e nacionais.
A OIT se revela como uma das principais defensoras das melhorias das condições
de trabalho no mundo. Já em 1944, à luz dos efeitos da Grande Depressão a da
Segunda Guerra Mundial, adotou a Declaração da Filadélfia como anexo da sua
Constituição, que acabou servindo de modelo para a Carta das Nações Unidas e
para a Declaração Universal dos Direitos Humanos.
110
Em 1998, foi adotada a Declaração da OIT sobre os princípios e direitos
fundamentais no trabalho e seu seguimento. Assim, tornam-se objetivos estratégicos
da OIT87: a) a promoção dos princípios fundamentais e direitos no trabalho através
de um sistema de supervisão e de aplicação de normas; b) a promoção das
melhores oportunidades de emprego/renda para mulheres e homens em condições
de livre escolha, de não discriminação e de dignidade; c) o aumento da abrangência
e a eficácia da proteção social; d) o fortalecimento do tripartismo e o diálogo social.
A partir deste documento, os Estados-membros, inclusive o Brasil, assumem o
compromisso de não só respeitar, como também promover e realizar normas
voltadas para: a eliminação de todas as formas de trabalho forçado e obrigatório
(Convenção 29 e 105); a abolição efetiva do trabalho infantil (Convenção 138 e 182);
a eliminação da discriminação em matéria de emprego e ocupação (Convenção 100
e 111) e a liberdade de associação e sindical, bem como o reconhecimento efetivo
do direito de negociação coletiva (Convenção 87 e 98).
Mas o que se entende por trabalho decente? Estaria este qualificativo do trabalho
diretamente relacionado à dignidade da pessoa do trabalhador?
O conceito de trabalho decente vem se desenvolvendo desde 1999, com aplicações
práticas por meio dos planos nacionais de trabalho decente, apesar de ainda não
existirem indicadores precisos para sua medição. Não existe uma definição pronta
sobre o que seria “trabalho decente”, mas o relatório elaborado pela reunião
tripartida de peritos sobre a medição do trabalho decente88, ocorrida em Genebra,
em setembro de 2008, aponta os principais elementos para a sua qualificação:
a) O trabalho decente engloba todos os trabalhadores, mulheres e homens,
trabalhadores da economia formal e informal, trabalhadores por conta própria
e trabalhadores domésticos, assim como os assalariados e os empregadores.
Isto se deve à preocupação em considerar a situação de trabalho envolvendo
todos os trabalhadores, independente da sua forma de atuação.
87 Os objetivos estratégicos encontram-se no site oficial da OIT no Brasil> conheça a OIT. 88 Refere-se ao documento de debate para la Reunión tripartita de expertos sobre la medición del trabajo decente, elaborado em Genebra (2008).
111
b) Envolto com a mesma preocupação, os indicadores de trabalho decente
devem ser conceitualmente pertinentes a todos os países em qualquer fase
de desenvolvimento ou devem formular-se de modo que resultem pertinentes
para todos os países.
c) Estão excluídas da concepção de trabalho decente as situações laborais que
apresentam condições de trabalho desumanas ou abusivas, sendo tais
trabalhadores considerados os mais vulneráveis e passíveis de maior
proteção.
d) Como forma de alcançar o trabalho decente, a OIT se preocupa com as
condições de vida dos trabalhadores e suas famílias, não se restringindo à
observação do trabalho produtivo e remunerado, e ao ambiente de trabalho.
Fundamenta tal preocupação o entendimento de que, segundo Declaração da
Filadélfia89, “a pobreza, em qualquer lugar, constitui um perigo para a
prosperidade de todos”.
Neste sentido, traçam como principais objetivos ao combate à pobreza: estender as
medidas de seguridade social para garantir o ingresso básico aos que necessitam e
prestar assistência médica completa; proteger a infância e a maternidade; ministrar
alimentos, moradia e meios de entretenimento e cultura adequados; garantir iguais
oportunidades de educação e profissional.
A OIT centra sua atuação, atualmente, em quatro objetivos estratégicos: promoção
dos Direitos Fundamentais no Trabalho, o emprego, a proteção social e o diálogo
social. Tais objetivos se voltam para a redução da exclusão social, cujo trabalho é
desenvolvido em parceria com os Estados-membros e as organizações de
trabalhadores e empresários. Assim, além de ter como objetivo central a promoção
do emprego, a OIT faz recomendações para que se incentive, mediante o diálogo
social, a criação de postos de trabalho com preocupação na qualidade dos
empregos, considerando indispensável a existência de sistemas econômicos e
89 A Declaração de Filadélfia encontra-se anexa à Declaração referente aos fins e objetivos da Organização Internacional do Trabalho.
112
sociais que protejam os trabalhadores contra as situações de vulnerabilidade no
trabalho, nelas inseridas garantias como a seguridade social.
Importante salientar que, malgrado a OIT tenha centrado inicialmente sua atenção
nas necessidades dos trabalhadores assalariados, hoje reconhece que merece
proteção também outros trabalhadores que se encontram à margem do mercado de
trabalho estruturado, como os assalariados informais, os trabalhadores por conta
própria e os trabalhadores em domicílio.
No contexto de promoção do “Trabalho Decente”, a OIT Brasil oferece cooperação
técnica aos programas prioritários e reformas sociais do governo brasileiro, incluindo
o Plano Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo, Fome Zero, Primeiro
Emprego e diversos programas governamentais e não governamentais de
erradicação e prevenção do trabalho infantil, de combate à exploração sexual de
menores; de promoção de igualdade de gênero e raça para a redução da pobreza,
da geração de empregos, de fortalecimento do diálogo social e de programas de
proteção social.
6.2 DA OBSERVÂNCIA DO PRINCÍPIO DA DIGNIDADE HUMANA DO
TRABALHADOR
A indiferença aos valores éticos associada ao poder destrutivo do nazismo
(Alemanha) e fascismo (Itália), justificados em nome da lei, desencadeou a crise do
positivismo jurídico e fez surgir, ao final da Segunda Guerra Mundial, o interesse
pela reaproximação da ética e do Direito, mediante normatização de princípios,
tendo como eixo central o princípio da dignidade da pessoa humana. Assim, vive-se,
na contemporaneidade, o movimento de internacionalização dos direitos humanos,
iniciado no pós-guerra, cujo objetivo tem sido o de reconstrução destes direitos,
destroçados pelas atrocidades cometidas durante os regimes políticos
supramencionados.
113
Neste sentido, a Declaração Universal de 1948 inaugura a concepção
contemporânea de direitos humanos90, resgatando o valor da pessoa humana, com
fundamento na sua dignidade. Com ênfase na universalidade e indivisibilidade dos
direitos humanos91, a Declaração tem propiciado a formação de um sistema
internacional de proteção destes direitos, inseridos nos diversos sistemas jurídicos,
por tratados internacionais, sendo compartilhado pelos Estados-membros.
Impulsiona este movimento de internacionalização, a ideia de que não se deve
reduzir ao domínio do Estado a proteção dos direitos humanos, pois, como assevera
Flávia Piovesan (2010, p. 5), trata-se de tema de legítimo interesse internacional,
não mais se concebendo o tratamento dos nacionais pelo Estado como um
“problema de jurisdição doméstica”.
Ocorre que a internacionalização dos direitos humanos com registro na Declaração
Universal dos Direitos Humanos (1948), por si só, não seria suficiente para
assegurar a proteção de tais direitos. Neste aspecto, tornou-se necessária a
juridicização da Declaração Universal, sob forma de tratado internacional, tornando-
se juridicamente obrigatória e vinculante a todos os Estados-membros. Uma das
formas de concretização deste ideal foi a elaboração do Pacto Internacional dos
Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (PIDESC - 1966), que, em seu art. 6º, 7º e
8º, versam sobre direito ao trabalho livre e condições de trabalho justas, igualitárias
e favoráveis, em consonância com o art. XXIII da Declaração Universal de 194892.
90 A Declaração de Direitos Humanos de Viena, de 1993, reitera a concepção contemporânea dos direitos humanos ao inserir em seu art. 5º que: “Todos os direitos humanos são universais, indivisíveis interdependentes e inter-relacionados. A comunidade internacional deve tratar os direitos humanos de forma global, justa e eqüitativa, em pé de igualdade e com a mesma ênfase. Embora particularidades nacionais e regionais devam ser levadas em consideração, assim como diversos contextos históricos, culturais e religiosos, é dever dos Estados promover e proteger todos os direitos humanos e liberdades fundamentais, sejam quais forme seus sistemas políticos, econômicos e culturais”. 91 Flávia Piovesan ao tratar da universalidade evidencia que todo ser humano tem uma dignidade que lhe é inerente, o que a torna incondicionada, ou seja, não depende de nenhum outro critério senão ser humano; já ao se referir à universalidade, esclarece que os direitos humanos compõem uma unidade indivisível, interdependente e inter-relacionada, capaz de conjugar o catálogo de direitos civis e políticos com o catálogo de direitos sociais, econômicos e culturais, e quando um deles é violado, os demais também o são. 92 Declaração de 1948 – art. 23º 1 – Toda a pessoa tem direito ao trabalho, à livre escolha do trabalho, a condições eqüitativas e satisfatórias de trabalho e à proteção contra o desemprego. 2 – Todos têm direito, sem discriminação alguma, a salário igual por trabalho igual.
114
Endossa o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, outro
mecanismo jurídico internacional – o Protocolo de San Salvador –, que entrou em
vigor em 1999 e também prevê dispositivos voltados para o âmbito dos direitos
humanos trabalhistas. Refere-se a um tratado internacional, vinculado a
Organização dos Estados Americanos (OEA) que reforça os deveres jurídicos dos
Estados-membros no que concerne aos direitos sociais, buscando reforçar a
tentativa de efetividade dos direitos humanos. De acordo com este Protocolo, cabe
ao estado-membro investir ao máximo em recursos para se alcançar a plena
efetividade dos direitos econômicos, sociais e culturais.
O artigo 6º, desse Pacto, que trata do Direito ao Trabalho Pacto, assim declara:
1. Toda pessoa tem direito ao trabalho, o que inclui a oportunidade de obter os meios para levar uma vida digna e decorosa por meio do desempenho de uma atividade lícita, livremente escolhida ou aceita. 2. Os Estados Partes comprometem-se a adotar medidas que garantam plena efetividade do direito ao trabalho, especialmente as referentes à consecução do pleno emprego, à orientação vocacional e ao desenvolvimento de projetos de treinamento técnico-profissional, particularmente os destinados aos deficientes. Os Estados Partes comprometem-se também a executar e a fortalecer programas que coadjuvem um adequado atendimento da família, a fim de que a mulher tenha real possibilidade de exercer o direito ao trabalho.
Em oportunidades anteriores, neste trabalho, já se salientou o avanço indiscutível
trazido pela Constituição de 1988 com intuito de regular matéria de cunho
eminentemente trabalhista, insculpido, em especial, nos artigo 7º a 10, seus incisos
e parágrafos. Também no artigo 5º da Carta Maior, é possível destacar outros
direitos e garantias individuais que se estendem à proteção do trabalhador, o que
traz maior efetividade às normas desta natureza.
Mas os avanços não param por aí. A Constituição de 1988 traz em seu bojo
normativo princípios protetivos que alcançam o trabalhador não só em sua relação
laboral (da não-discriminação em consonância com o princípio geral da isonomia),
3 – Quem trabalha tem direito a uma remuneração equitativa e satisfatória, que lhe permita e à sua família uma existência conforme com a dignidade humana, e completada, se possível, por todos os outros meios de protecção social. 4 – Toda a pessoa tem o direito de fundar com outras pessoas sindicatos e de se filiar em sindicatos para a defesa dos seus interesses. Art. 24º Toda a pessoa tem direito ao repouso e aos lazeres e, especialmente, a uma limitação razoável da duração do trabalho e a férias periódicas pagas.
115
como também se volta à proteção de direitos subjetivos do trabalhador, com respeito
a sua dignidade, preservando-lhe, neste aspecto, a imagem, a honra e a intimidade,
restando assegurado o direito à indenização por dano material ou moral decorrente
de sua violação.
Como se pode constatar, o trabalhador, perante a Lei Maior, evolui de mera peça de
produção econômica a ser humano que exerce atividade remunerada. Tal
circunstância limita o poder diretivo do empregador/tomador de serviços e a atitude
dos demais colegas de trabalho contra abusos historicamente cometidos, impondo-
lhes o respeito à integridade física e moral do trabalhador.
Assim, não se admite mais que o trabalhador seja discriminado com base em suas
características físicas, sofra qualquer tipo de tratamento desrespeitoso e humilhante,
ou seja vítima de assédio (moral ou sexual) em seu ambiente de trabalho, em razão
da prestação de serviço subordinado que exerça, pois, uma vez violados direitos
fundamentais, se atribui responsabilidade civil e penal aos agressores, por
configuração de atos atentatórios à dignidade do trabalhador.
Neste aspecto, é enfático Eduardo C. B. Bittar (2005, p. 300-301):
[...] independente do conceito de dignidade própria que cada um possua (dignidade desde dentro), todo indivíduo é, germinalmente, dela merecedor, bem como agente qualificado para demandá-la do Estado e do outro (dignidade desde fora), pelo simples fato de ser pessoa, independente de condicionamentos sociais, políticos, étnicos, raciais etc.
Ao se referir à dignidade desde dentro, no fragmento acima, esclarece-se que
Eduardo Bittar toma como parâmetro a distinção apresentada por Fábio Konder
Comparato (1999, p. 44), que declara,
A dignitas é um atributo que se confere ao indivíduo desde fora e desde dentro. A dignidade tem a ver com o que se confere ao outro (experiência desde fora), bem como o que se confere a si mesmo (experiência desde dentro). A primeira tem a ver com o que se faz, o que se confere, o que se oferta (instrumentos, mecanismos, modos de comunicação, tratamentos, investimentos, esclarecimentos, processos informativos e educativos...) para que a pessoa seja dignificada. A segunda tem a ver com o que se percebe como sendo a dignidade pessoal, com uma certa auto-aceitação ou valorização-de-si, com um desejo de expansão de si, para que as
116
potencialidades de sua personalidade despontem, floresçam, emergindo em direção à superfície.
Quando se evidencia a preocupação da OIT em incentivar em todos os países do
mundo uma política voltada para o desenvolvimento do trabalho decente, esta não
deve ser tomada em seu contexto isolado, ou seja, apenas no que tange à prestação
do serviço em si, mas deve considerá-lo intrinsecamente relacionado com o
progresso econômico e social. Logo, formação e aprendizado permanente, lazer,
seguridade social, assistência à saúde são fatores que incentivam a melhoria das
condições de trabalho e repercutem diretamente na dignidade do trabalhador.
Vale ressaltar, do excerto acima, que, embora a dignidade se revele como direito em
si (o que por si só já é suficiente), sua observância se dá quando há efetividade dos
direitos fundamentais. Neste sentido, acolhem-se as palavras de José João Abrantes
(2005, p. 189), que ao tratar do aspecto finalístico do Direito do Trabalho e da
dignidade da pessoa humana, assevera:
A dignidade da pessoa humana, garantida pelos direitos fundamentais, é o cerne da ordem de valores estabelecida pela Constituição, que, como tal, deverá valer para todos os ramos de direito, designadamente para o Direito do Trabalho; por isso, não podem os direitos fundamentais do trabalhador – enquanto expressão da sua dignidade, (também) enquanto pessoa e enquanto cidadão – ser totalmente sacrificados à liberdade de empresa. - grifo conforme o original.
O artigo 170 da Constituição Federal é enfático ao determinar que a ordem
econômica funda-se na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tendo
por fim assegurar, a todos, existência digna, conforme os ditames da justiça social.
Mas o que significa esta expressão tão utilizada pelos estudiosos do Direito? Seria
sinônima de “valor social” prescrito no art. 1º, IV da Constituição Federal de 1988?
Wilson Steinmetz e Leila Beatriz Zilles Schuch (2006, p. 192-193) apresentam
distinção entre os termos. Segundo eles, os “valores sociais do trabalho” referem-se
a um princípio fundamental da República Federativa do Brasil, enquanto que a
“valorização do trabalho humano” constitui um fundamento da ordem econômica,
posto ao lado da livre iniciativa (art. 170, caput, da Constituição Federal).
117
Ao especularem sobre os valores sociais do trabalho, anotam como sendo a
autonomia da pessoa, liberdade (sobretudo de escolhas), bem-estar (material e
espiritual), riqueza, integração social, coesão social, entre outros. Já em se tratando
da valorização do trabalho humano esclarecem:
[...] A ordem econômica, que deve “assegurar a todos existência digna”, tem por premissa orientadora a valorização do trabalho humano. Isso significa que o Estado, quando intervém na atividade econômica, seja direta ou indiretamente, deve tomar e impor, a si mesmo e aos particulares, medidas que promovam a valorização do trabalho humano e, por oposição, combatam as práticas de desvalorização, subvalorização e precarização do trabalho. Em suma, o Estado deve atuar, normativa e faticamente, para dignificar o trabalho humano, para que ele, de fato, seja um meio para a conquista do bem-estar (pessoal e coletivo), da riqueza, da integração e coesão sociais. (2006, p. 193)
Vale dizer que tanto o art. 1º, IV quanto o artigo 170 da Constituição Federal visam
assegurar em toda e qualquer circunstância a dignidade do trabalhador, alcançando
assim a justiça social.
6.3 PROPOSTA DE REFORMA DA ORDEM TRABALHISTA BRASILEIRA
É inegável a influência da globalização econômica nos desígnios do trabalho
humano. Entretanto, não se pode estabelecer com precisão o grau de interferência,
tampouco se seus efeitos serão benéficos ou maléficos para a sociedade sem
fronteiras vivida no século XXI. Sabe-se que a lógica de funcionamento das
multinacionais (empresas-rede) e de sua cadeia produtiva atinge não só a
distribuição regional de ocupação do trabalhador como interfere diretamente na
geração e qualidade de emprego.
Neste sentido, economistas e estudiosos de áreas afins apresentam tendências
pessimistas, na contemporaneidade, constando como principais projeções a redução
da geração de empregos qualificados e formais por investimentos diretos, cuja
preferência se volta para a exploração da mão-de-obra barata e de baixa
qualificação e a intensificação da flexibilização da mão-de-obra, como forma de
118
redução dos custos finais da produção. Perfila-se um quadro caótico para o século
XXI, com a iminente desestruturação do mercado de trabalho.
Pretende-se, neste capítulo, apresentar uma proposta de reforma da ordem
trabalhista brasileira, cujo fundamento se inspira na necessidade de (re)inserção do
trabalhador em sua relação de trabalho, considerando-o não mais como mera peça
da engrenagem produtiva, mas, sim, como recurso humano da produção capitalista,
que deve ser respeitado em sua dignidade.
Eis a justificativa para se propor uma reforma tão profunda que, deveras, irá
repercutir em todo o sistema jurídico pátrio, pois se projeta não só na valorização do
homem em sua relação do trabalho, como na sua atuação como cidadão, e na
formação de uma sociedade livre, justa e solidária, reservando aos iguais um
tratamento igualitário e aos desiguais, tratamento distinto, em busca da justiça
social. Neste sentido, enfatiza João José Abrantes:
O Direito do Trabalho deverá ter por preocupação essencial a tutela dos direitos de cidadania no âmbito da relação de trabalho, garantindo, por exemplo, os direitos do trabalhador à não sujeição a formas de controlo de actividade contrárias à sua dignidade, à intimidade da vida privada, à não discriminação, à liberdade ideológica e de expressão, etc. (crases conforme o original) (2005, p. 191)
No Brasil, cujo sistema econômico é o neoliberal, não se pode impedir os avanços
da livre iniciativa, mesmo porque esta representa um dos fundamentos do Estado
Democrático de Direito. No entanto, não se pode permitir que os impulsos
desenfreados do capitalismo moderno abalem os alicerces da democracia, atingindo
a cidadania e a dignidade da pessoa humana. Logo, conclui-se que o maior desafio
do Estado, na contemporaneidade, é integrar empresas e trabalhadores no âmbito
da formalidade, visando o desenvolvimento econômico e a inclusão social.
Para tanto, propõe-se um redimensionamento do Direito do Trabalho, nele
incorporando todas as formas de trabalho oneroso, com previsão de normas,
princípios e institutos aptos a se alcançar a efetividade dos direitos dos
trabalhadores em seu contexto laboral, tendo como base normativa a Constituição
119
Federal de 1988, que se voltará para a tutela do trabalhador em suas condições
mínimas de existência.
Este também tem sido o entendimento defendido por Otávio Pinto e Silva (2004, p.
154), ao declarar que:
As normas sobre o trabalho humano devem estar todas sistematizadas, reunindo não somente o trabalho subordinado em suas diferentes formas, mas também o trabalho autônomo e o parassubordinado. As normas regulamentadoras das relações individuais de trabalho devem estar em consubstanciadas em diferentes modalidades contratuais, de tal modo que formem um conjunto capaz de propiciar soluções articuladas para a administração da questão de pessoal nas empresas.
Propõe-se, com as reformas acima sugeridas, deslocar o campo de concentração
das normas mais favoráveis ao trabalhador do âmbito estatal para o da negociação
coletiva, instigando a participação dos principais envolvidos na relação a fim de
atuarem em busca de melhorias em suas condições de trabalho, em consonância
com o pluralismo político. Ao Estado se reserva a guarida dos direitos fundamentais
em sua essência, vedando qualquer ato atentatório à dignidade do trabalhador.
Assim não há que se temer que a negociação coletiva venha a reduzir ou até mesmo
retirar, do contexto jurídico, direitos trabalhistas conquistados arduamente. Isto
porque como se verá a seguir, a Constituição Federal se posicionará em nível
hierárquico superior às normas infraconstitucionais, cuidando para que as condições
mínimas de trabalho decente sejam asseguradas.
6.3.1 A Constituição Federal como referência
O Direito do Trabalho surge em função da proteção do empregado contra a
exploração desenfreada do capitalismo. A consolidação deste ramo no cenário
jurídico, como visto, resultou de conquistas alcançadas por intensas lutas de
trabalhadores e da intervenção do Estado em prol da melhoria das condições de
trabalho. Com a implantação do Estado Democrático de Direito, o trabalho se erigiu
120
a um direito social, tornando-se um dos principais meios de acesso aos direitos
fundamentais do cidadão.
Ocorre que a intensificação do processo de internacionalização da economia, no fim
do século XXI – leia-se globalização –, levou o Estado de Bem-Estar Social a uma
crise jamais vista na história, cuja falência resultou na marginalização de uma
parcela significativa da população, surgindo no contexto o sem-terra, o sem-teto, o
sem-emprego.
Os noticiários econômicos dão ênfase à regressão da taxa de assalariados em
detrimento da elevação da taxa de ocupação, vinculada à geração de postos de
trabalho precários. É tempo de crise e da necessidade de superação deste quadro
caótico. É tempo de revitalização dos direitos fundamentais, cuja base encontra-se
alicerçada nos objetivos estratégicos da OIT.
É notória a constatação de que a mera previsão legal de direitos trabalhistas não
tem sido suficiente para a efetiva proteção dos trabalhadores. Impulsionado pela
onda reparatória da contemporaneidade, o Direito do Trabalho tem a difícil missão
de superar o mero formalismo jurídico, buscando a efetividade dos direitos
fundamentais do trabalhador, previstos na Constituição Federal de 1988, segundo
uma perspectiva que valorize o trabalho em sua dimensão econômica e social.
Por esta razão, a Constituição Federal de 1988 passa a atuar como elemento central
e norteador desta mudança de paradigma, contribuindo significativamente para a
aplicabilidade dos direitos fundamentais trabalhistas, na medida em que prevê
normas, princípios e garantias especificamente voltados para a melhoria de
condições laborais do trabalhador.
Sabe-se que a Constituição regula matéria sobre Direito do Trabalho em vários
dispositivos, em especial o art. 6º e 7º. Ocorre, no entanto, que, em análise apurada,
vários destes dispositivos se voltam à tutela específica do trabalho subordinado, o
que revela ausência de integração constitucional das demais categorias de
trabalhadores.
121
Com o intento de abarcar todas as categorias, mister o enxugamento constitucional
com intervenção estatal mínima voltada para as condições essenciais de um
trabalho decente, nos moldes inspiradores da OIT. Não se trata de defender a
mudança estrutural da Constituição, alterando os direitos do trabalhador
subordinado, mesmo porque estes estão sob o manto protetivo da cláusula pétrea.
O que não impede, no contexto, de modificá-los fazendo infiltrar normas de caráter
geral sobre todas as relações de trabalho, mantendo intacta sua essência, qual seja,
a proteção do trabalhador em condição de hipossuficiência.
Neste sentido, tendo em vista as diretrizes evocadas na Constituição da
Organização Internacional do Trabalho93, propõe-se alteração à Constituição
Federal, mediante emenda Constitucional94, voltada para atenção à melhoria das
condições básicas de trabalho, extensiva a toda categoria de trabalhador,
tangenciando para os seguintes temas: regulamentação das horas de trabalho,
fixação de uma duração máxima do dia e da semana de trabalho, recrutamento da
mão-de-obra, luta contra o desemprego, garantia de um salário que assegure
condições de existência convenientes, proteção dos trabalhadores contra as
moléstias graves ou profissionais e os acidentes do trabalho, proteção das crianças,
dos adolescentes e das mulheres, pensões de velhice e de invalidez, defesa dos
interesses dos trabalhadores empregados no estrangeiro, afirmação do princípio
"para igual trabalho, mesmo salário", afirmação do princípio de liberdade sindical,
organização do ensino profissional e técnico.
6.3.2 Pela criação de um Código do Trabalho e suas especificidades
Muitos estudiosos têm chamado atenção para a tendência de diversificação das
relações de trabalho e para a consequente necessidade de regulamentação de
referidos vínculos, como foi feito ao longo desta pesquisa, com o fito de buscar
93 Diretrizes colhidas no Preâmbulo da Constituição da Organização Internacional do Trabalho, Preâmbulo. 94 Há quem defenda a aplicação dos direitos constitucionais trabalhistas por intermédio da interpretação jurisprudencial, como é o caso de Flávia Moreira Guimarães Pessoa (2009, p. 116), embora reconheça que a tradição jurídica brasileira não seja de construção jurisprudencial de direitos.
122
proteção jurídica em prol do equilíbrio entre o capital e o trabalho, na sociedade
contemporânea.
Neste sentido, observa-se que, embora sejam inúmeras as normas trabalhistas
vigentes voltadas para a regulamentação de distintas relações jurídicas laborais,
percebe-se que esta ebulição de normas se lança desordenadamente no sistema
jurídico, deixando escapar, entretanto, em muitas circunstâncias, um número
significativo de trabalhadores, oriundos de categorias em formação no mercado
globalizado, frutos da reestruturação produtiva.
Até mesmo a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), que trata especificamente
da proteção do trabalho subordinado (empregado), não consegue abarcar, em seu
modelo organizacional, todas as normas protetivas atinentes à categoria em apreço.
A título de constatação, observam-se as normas esparsas que regulam o trabalho
rural (Lei nº 5.889/73 alterada pela Lei n.º 11.718 de 20.06.2008), trabalho
doméstico (Lei nº 5.859, de 11.12.1972 alterada pela Lei n.º 11.324, de 19.07.2006),
ambos considerados empregados, embora excluídos da CLT.
Com o intento de reorganizar este quadro caótico, propõe-se a sistematização das
normas laborais no ordenamento jurídico pátrio, integrando-as em um único Código
do Trabalho, a exemplo do que fez o Direito do Trabalho português. Neste sentido,
Maria do Rosário Palma Ramalho (2005, p. 90-91) relata como tem ocorrido a
reforma laboral no sistema português e o que tem motivado esta mudança:
Desencadeada por iniciativa do XIV Governo Constitucional, com os trabalhos de compilação e sistematização das leis laborais, entre Março de 2000 e Maio de 2002, a reforma laboral em curso teve o seu ponto alto, já na legislatura do XV Governo Constitucional, com a elaboração e a aprovação do Código do Trabalho, pela L. Nº 99/2003, de 27 de Agosto. Como é indicado na Exposição de Motivos que antecedeu a Proposta de Lei relativa ao Código do Trabalho, o Código tem um duplo objectivo: um objectivo de concatenação e sistematização dos principais diplomas laborais existentes; e um objectivo reformador do Direito do Trabalho com vista à sua adaptação aos desafios da Economia moderna e às novas formas de organização das empresas, em busca do aumento da produtividade e da competitividade (em suma, um objectivo de flexibilização do Direito Laboral).
123
Apesar de se tomar como base a estrutura codificada do Direito laboral português, a
proposta aqui toma proporções mais amplas, por tentar centralizar todas as relações
de trabalho em um único código, distribuindo os trabalhadores por categorias,
segundo critério distintivo de intervenção do tomador de serviço na atividade a ser
desenvolvida. Desta forma, sugere-se a divisão das relações de trabalho em três
categorias distintas a serem codificadas: trabalho por subordinação, trabalho por
coordenação e trabalho autônomo.
O trabalho por subordinação ensejaria, em sua essência, a sujeição da atividade do
trabalhador ao poder diretivo do tomador de serviço, devendo aquele cumprir todas
as determinações deste, desde que não contrárias à lei. O trabalho por coordenação
(a ser regulamentado pela legislação pátria) implicaria na prestação laboral exercida
pelo trabalhador em colaboração com o tomador de serviço, devendo, para tanto
haver uma coligação funcional entre a prestação laboral do trabalhador e a
atividade-fim do tomador de serviço. Finalmente, o trabalho autônomo resultaria na
prestação de serviço em conformidade com as condições previstas em contrato.
Ressalte-se que o critério objetivo adotado passaria a incidir sobre a forma
interventiva do tomador em relação à atividade a ser desenvolvida e não mais a
natureza em si da prestação de serviço (doméstico, rural, técnico). Logo, infere-se,
em tese, que o trabalhador poderá se integrar a mais de uma relação de trabalho,
sendo o contrato laboral que definirá em qual das categorias estaria inserido,
submetendo-se à regulamentação jurídica específica.
Neste aspecto, evoca-se a necessidade de ampliação da função precípua do Direito
do Trabalho não mais vocacionada para a proteção exclusiva do trabalhador
subordinado, mas direcionada para todos os trabalhadores em situação de
hipossuficiência, sem que isto repercuta negativamente no desenvolvimento da
Economia. Tal redimensionamento terá o objetivo de atrair para a ordem trabalhista
pátria todos os microssistemas laborais existentes95, desde o que rege o trabalho
95 Neste sentido, compartilha-se, em parte, com a opinião de Tarso Genro (1996, p. 3) ao sugerir uma mudança conceitual do Direito do Trabalho, enquadrando novas tutelas laborais, nelas inseridas: a prestação autônoma; a tutela laboral para remuneração dos serviços sem qualificação (limpeza, atividades manuais subsidiárias nas empresas altamente qualificadas, cozinha, prestações domésticas de todos os tipos), cujo valor mínimo deve ser pautado pelo Estado; tutela laboral
124
subordinado até o trabalho autônomo, o que deslocaria da seara civil as relações de
trabalho nela contida (locador ou prestador de serviços, trabalhador eventual,
empreiteiro, cooperado).
Justifica-se o deslocamento das regulamentações trabalhistas contidas no Código
Civil para o sistema laboral pátrio, por não mais se admitir que o trabalhador
autônomo seja confundido com o particular em sua relação de trabalho. Mitiga-se a
clássica ideia de que o trabalhador autônomo negocia sua força de trabalho com o
tomador de serviço em situação de paridade, por força da complexidade da relação.
O que aparentemente demonstra uma relação de reciprocidade, de “troca de
interesses”, em acertada observação revela que a prestação de serviço
desenvolvida pelo trabalhador (ainda que autônomo), dificilmente se equipara ao
lucro previsto pelo tomador de serviço. Enquanto o prestador de serviço vende sua
força produtiva, o tomador de serviço adquire-na onerosamente para confecção do
produto final, que se lança ao mercado para ser consumido pelo próprio prestador
de serviço, na condição de consumidor, evidenciando-se a superioridade do tomador
de serviço na relação laboral e social.
Por outro lado, justifica-se, também, a necessidade de criação de uma
regulamentação específica voltada para a inserção dos trabalhadores vinculados por
uma relação de coordenação, localizados em zona cinzenta, afastados de proteção
por não se enquadrarem nos já tradicionais critérios da subordinação ou da
autonomia. Embora exista corrente que defenda a extensão da proteção do
trabalhador subordinado a esta categoria órfã de regulamentação (como visto), não
se filia a ela por entender distintas as formas de vinculação de referidos
trabalhadores na forma de realização da atividade e no modo como estes
trabalhadores são direcionados pelos seus tomadores de serviço – o que requer
cautela diante da tentação de englobar todos numa mesma relação jurídica.
coletiva, que vise socializar os postos de trabalho com a reorganização, gradação e redução da jornada laboral nos setores diretamente atingidos pela revolução da microeletrônica, da informática e da digitalização.
125
Por fim, não se pretende sugerir a criação de um número infinito de normas
infraconstitucionais que atendam a todas as circunstâncias específicas do
trabalhador, mas centrar-se na ideia de um conjunto de normas laborais que
prevejam proteção de direitos básicos e mecanismos de garantia desses direitos
(disposições gerais), a partir dos quais os sindicatos passarão a buscar melhoria em
prol dos trabalhadores inseridos nas três categorias supracitadas: trabalho
subordinado, trabalho coordenado e trabalho autônomo.
Neste aspecto, concorda-se com a crítica feita por Otávio Pinto e Silva (2004, p. 141)
que aponta como defeito do sistema trabalhista atual o excessivo intervencionismo
estatal no campo das relações individuais de trabalho. Coerente sua colocação
quando ressalta que os excessos normativos acabam sendo “responsáveis por uma
parafernália de normas jurídicas que muitas vezes restam descumpridas”. Por esta
razão, reforça-se a tese de enxugamento das normas infraconstitucionais para um
regime de direitos e garantias básicas, distribuídos por categorias de atividades
laborais a serem desenvolvidas, ficando sob custódia dos sindicatos as conquistas
trabalhistas a serem alcançadas em negociação coletiva.
De tudo o que se propôs em matéria de reflexão relacionada ao Direito do Trabalho
na contemporaneidade e suas novas relações de trabalho, não se pode esquecer
que, ainda que se deposite esperanças no futuro equilibrado das relações laborais,
cuja atuação dos sindicatos há de ser imprescindível, compete irrenunciavelmente
ao Direito do Trabalho o mister de proteger o trabalhador em sua condição de
hipossuficiência, visando, em qualquer contexto histórico, melhorias nas condições
de trabalho e sociais, em prol da dignificação do homem trabalhador.
126
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS
É chegado o momento de apresentar, sinteticamente, as considerações finais
colhidas ao longo da pesquisa, o que, de maneira nenhuma, significa o
encerramento da longa jornada de estudos, debates e reflexões a respeito da
proposta inicialmente defendida.
A ideia de fazer um estudo voltado para a redefinição do Direito do Trabalho,
inserindo as novas relações de trabalho contemporâneas, com o objetivo de garantir
a eficácia protetiva, no contexto jurídico neoconstitucionalista, é uma tarefa difícil e
de longa duração, por diversas razões:
Primeiro, porque se discute a crise do Direito do Trabalho por não mais atender
satisfatoriamente sua função primordial, qual seja, a tutela dos direitos do
trabalhador hipossuficiente, historicamente conquistados, o que evidencia a
necessidade de resgate desta função que representa o alicerce e a razão de
existência do Direito do Trabalho.
Segundo, porque, embora seja o emprego a modalidade de trabalho predominante
no atual contexto laboral, descortina-se uma nova realidade, modificada pelo
surgimento das novas relações de trabalho, algumas delas ainda não
regulamentadas, cujos trabalhadores clamam pelo reconhecimento jurídico e por um
tratamento digno, num contexto capitalista globalizado.
Terceiro, porque a proeminência do Direito Constitucional, como elemento norteador
no trato jurídico das relações contemporâneas, impulsiona mudanças no viés
interpretativo e consequente ruptura de paradigmas, em razão da revitalização dos
direitos fundamentais e da exigência em concretizá-los, o que acaba por influenciar
este ramo jurídico.
Finalmente, pela necessidade de resgate dos valores éticos, a fim de se atingir uma
justiça social atenta ao solidarismo, à função social do direito e à dignidade da
pessoa humana.
127
Estes, aliás, foram aspectos tratados ao longo da pesquisa e que revelaram a
relevância e atualidade do tema, diante da necessidade de restabelecimento do
Direito do Trabalho em prol do equilíbrio das relações trabalhistas. Importante,
inclusive, o registro de que não se pretende, em absoluto, esgotar o assunto, e, sim,
apresentar uma contribuição a fim de levantar reflexões acerca da perspectiva de
engajamento deste ramo jurídico no contexto socioeconômico contemporâneo.
Neste aspecto, crucial ao Direito do Trabalho sua redefinição no papel de regulador
das relações de conflito trabalhista, voltando seus objetivos para a correção, na
contemporaneidade, das imperfeições do mercado, buscando harmonia entre os
interesses da livre iniciativa e o respeito à dignidade da pessoa humana. Logo, o
combate à exploração massificada da força do trabalho humano torna-se um mister,
dando um sentido social ao trabalho, legitimando-o na nova ordem econômica.
Isto implica dizer que o Direito do Trabalho, por excelência, deve estar apto a tutelar
os direitos mínimos dos trabalhadores em condição de vulnerabilidade em sua
relação laboral, incorporando os novos contratos e relações trabalhistas surgidas no
mercado de trabalho atual (avulsos, estagiários, teletrabalhador, trabalhador em
domicílio, representante comercial, entre outros).
É notório que o trabalhador tem vencido barreiras em sua evolução histórica, mas,
atualmente, tem uma missão árdua, quiçá a principal das suas batalhas: ser
considerado não mais como uma mera peça laboral, inserida no contexto da
produção, lutar para ser respeitado em sua dignidade, o que implica em impor limites
de atuação dos detentores do modo de produção (tomadores de serviço), exigindo
do Estado tutela específica em prol da sua integridade física e moral.
É preciso reestruturar as formas jurídicas de regulação do mercado, a fim de
proteger o trabalho subordinado, incorporando o reconhecimento do trabalho por
coordenação e a valorização do trabalho autônomo, sem, contudo, atingir a
produtividade e a estabilidade econômica. O trabalho constitui elemento de
indiscutível repercussão social, por força do seu poder integrador ou excludente,
razão pela qual não se podem ignorar determinadas categorias de trabalhadores por
mera presunção de autonomia, reservando-lhe uma regulamentação obsoleta,
128
centrada na relação de igualdade do Direito Civil, mesmo porque a indefinição de
novos contratos de trabalho e profissões modernas tem gerado uma sobrecarga do
Poder Judiciário Trabalhista, acionado para a resolução da lide para enquadrar o
trabalhador à regulamentação especifica de sua atividade laboral.
Propõe-se, assim, a redefinição do Direito do Trabalho, mediante a incorporação de
institutos e princípios que alcancem todos os trabalhadores hipossuficientes, e a
criação de um código do Trabalho que regule as atividades segundo a forma como
os sujeitos se vinculam na relação de trabalho, dividida em atividade por
subordinação, coordenação e autônoma, cuja lei constitucional se volta para regular
as condições mínimas de um trabalho decente, em atendimento às diretrizes
traçadas pela OIT, da qual o Brasil é Estado-Membro.
É importante registrar que a modernização do Direito do Trabalho tende a repercutir
no âmbito das relações individuais do trabalho, mas se reconhece sua crescente
ênfase no âmbito das relações coletivas de trabalho, no qual envolverá a
participação de todos os atores sociais (trabalhadores, empresários, sociedade e
Estado), com fundamento no pluralismo político.
De toda sorte, fica uma advertência: não se pode mais admitir o tratamento
discriminatório dos trabalhadores, impulsionado pela marginalização do mercado
capitalista. Não se pode mais admitir a divisão entre incluídos e excluídos, formais e
informais, quando todos os trabalhadores labutam pela sobrevivência e merecem ser
tratados com dignidade em sua relação laboral. Neste mister, cabe ao Direito do
Trabalho a difícil missão de revitalizar o equilíbrio das relações entre capital e
trabalho.
129
REFERÊNCIAS
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130
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Ficha Catalográfica (Elaborada por Sônia Iraína Roque CRB-/1203)
P813d Pontes, Luciana Moura Araújo Cardoso
O Direito do Trabalho e sua função protetiva na contemporaneidade: da necessidade de (re)definição em face das novas relações de trabalho. / Luciana Moura Araújo Cardoso Pontes. - 2010.
137f.
Dissertação (mestrado) - Universidade Federal da Bahia. Faculdade de Direito. Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu – Mestrado em Direito Privado e Econômico, Salvador, 2010.
Orientador: Prof. Dr. Luiz de Pinho Pedreira da Silva
1. Contemporaneidade. 2. Direito do Trabalho. 3. Função Protetiva. 4. Hipossuficiência. 5. Relação de Trabalho. I. Universidade Federal da Bahia. Faculdade de Direito. II. Silva, Luiz de Pinho Pedreira da. III. Título.
CDU 349.2(81)