PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC/SP
TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO
O REGIONALISMO NA POLÍTICA EXTERNA BRASILEIRA NO SÉCULO XXI: A
INFRAESTRUTURA FÍSICA NA ESTRATÉGIA DE INTEGRAÇÃO
MOISÉS COSTA CONA
SÃO PAULO
2011
MOISÉS COSTA CONA
O REGIONALISMO NA POLÍTICA EXTERNA BRASILEIRA NO SÉCULO XXI: A
INFRAESTRUTURA FÍSICA NA ESTRATÉGIA DE INTEGRAÇÃO
TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO PARA A OBTENÇÃO DO DIPLOMA DE BACHAREL EM RELAÇÕES INTERNACIONAIS PELA PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO.
ORIENTADOR: Profa. Dra. FLAVIA DE
CAMPOS MELLO
SÃO PAULO
2011
1
Aos meus pais, Juan e Tânia, pelos esforços e apoio incondicional em todas as etapas dessa graduação.
2
RESUMO
Este trabalho apresenta as perspectivas do projeto regional na América do Sul e o papel do Brasil nesse processo, enfatizando a política externa brasileira durante a primeira década do século XXI. Nesse sentido, busca-se analisar como os projetos de infraestrutura (transporte, telecomunicações e energia), sobretudo no âmbito da Iniciativa para a Integração da Infraestrutura Regional Sul-Americana (IIRSA), se apresentam na pauta da política externa brasileira, destacando as suas características e avanços para a integração autônoma da América do Sul, considerando ainda a crescente projeção da liderança diplomática e econômica do Brasil.
Palavras-chave: integração regional; política externa; infraestrutura; IIRSA.
3
ABSTRACT
This work presents the perspectives of the regional project in South America and Brazilian role in this process, focusing on the Brazilian foreign policy during the first decade of the 21st century. In this sense, we seek to analyze how the infrastructure projects (transport, telecommunications and energy), specially under the Initiative for the Integration of the Regional Infrastructure of South America (IIRSA), are presented in the Brazilian foreign policy agenda, highlighting its features and enhancements to the autonomous integration of South America, and considering the increasing projection of the Brazilian diplomatic and economic leadership.
Key-words: regional integration; foreign policy; infrastructure; IIRSA.
4
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ..................................................................................................................... 10
1. A PLATAFORMA SUL-AMERICANA PARA A INSERÇÃO INTERNACIONAL
BRASILEIRA ........................................................................................................................ 13
1.1. A prioridade atribuída à America do Sul ......................................................................... 17
1.2. A ampliação da agenda regional e a emergência do regionalismo pós-liberal sul-
americano ................................................................................................................................ 20
2. A MOLDURA POLÍTICO-DIPLOMÁTICA DA INTEGRAÇÃO DA
INFRAESTRUTURA NA AMÉRICA DO SUL ................................................................ 28
2.1. Características estruturais da América do Sul .................................................................. 29
2.2. A conjuntura diplomática do lançamento da Iniciativa para a Integração da Infraestrutura
Regional Sul-Americana (IIRSA) ........................................................................................... 35
2.3. A definição de uma agenda regional consensuada ........................................................... 39
3. A ATUAÇÃO ESTRATÉGICA DO BRASIL NA INTEGRAÇÃO DA
INFRAESTRUTURA FÍSICA REGIONAL ...................................................................... 49
3.1. A convergência entre o planejamento brasileiro de desenvolvimento territorial e a
IIRSA ...................................................................................................................................... 50
3.2. O desafio do desenvolvimento socioambiental sustentável ............................................. 54
3.3. O financiamento público aos projetos de infraestrutura regional e o papel do BNDES .. 56
3.4. Motivações e incentivos à participação do setor privado brasileiro ma integração da
infraestrutura regional ............................................................................................................. 60
3.5. A Unasul e o COSIPLAN: novos mecanismos institucionais da integração da
infraestrutura ........................................................................................................................... 66
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................................... 68
ANEXOS ................................................................................................................................ 715
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................................ 73
6
LISTA DE SIGLAS
AIC – Agenda de Implementação Consensuada
ALADI – Associação Latino-americana de Integração
BID – Banco Interamericano de Desenvolvimento
BNDES – Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social
CAF – Corporação Andina de Fomento
CAN – Comunidade Andina de Nações
CASA – Comunidade Sul-Americana de Nações
CCR - Convênio de Pagamentos e Créditos Recíprocos
CCT – Comitê de Coordenação Técnica
CDE – Comitê de Direção Executiva
CEPAL – Comissão Econômica das Nações Unidas para a América Latina e o Caribe
COSIPLAN – Conselho de Infraestrutura e Planejamento
EID – Eixos de Integração e Desenvolvimento
FOCEM – Fundo para a Convergência Estrutural do Mercosul
FONPLATA – Fundo Financeiro para o Desenvolvimento da Bacia do Prata
GTE – Grupos Técnicos Temáticos
IIRSA – Iniciativa para a Integração da Infraestrutura da América do Sul
IFM – Instituições Financeiras Multilaterais
IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
MERCOSUL – Mercado Comum do Sul
7
MC – Ministério das Comunicações
MDIC – Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior
MME – Ministério das Minas e Energia
MPOG – Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão
MRE – Ministério das Relações Exteriores
MTE – Ministério do Trabalho e Emprego
PAC – Programa de Aceleração do Crescimento
PPA – Plano Plurianual
PPP – Parceria Público-Privado
PSI – Projetos Setoriais Integrados
UNASUL – União das Nações Sul-Americanas
8
LISTA DE TABELAS
Tabela 1. Reservas e demanda futura de gás natural na América do Sul ................................ 32
Tabela 2. Composição setorial/subsetorial da Carteira de Projetos IIRSA ............................. 41
Tabela 3. Projetos da Agenda de Implementação Consensuada 2005-2010 ........................... 45
Tabela 4. Projetos da IIRSA no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) .......... 53
Tabela 5. Projetos financiados pelo BNDES na América do Sul – Exportação de serviços de
engenharia e outros ................................................................................................................. 62
Tabela 6. Desembolsos do BNDES Exim para a área de infraestrutura no exterior................ 64
9
INTRODUÇÃO
A ampliação da agenda externa brasileira durante os oito anos de mandato do
presidente Luiz Inácio Lula da Silva acompanhou, no início do século XXI, importantes
modificações estruturais no sistema econômico e político internacional, as quais estiveram
pautadas num acelerado crescimento econômico entre 2003 e 2007; na crise financeira de
2008; e na recuperação econômica pós-crise dos países em desenvolvimento.
Nesse cenário em mudanças, abordar as relações entre o Brasil e a América do Sul e os
seus compromissos sul-americanos é imprescindível para o debate sobre a inserção
internacional brasileira, pois, ao mesmo tempo em que intensificava suas relações comerciais
e financeiras com potências emergentes, o Brasil assumia a liderança diplomática e política
dos processos de integração na região. O Ministro das Relações Exteriores do governo Lula,
Celso Amorim, refere-se à integração sul-americana como um bloco “que não é homogêneo,
que tem suas turbulências, mas que tem condição de formar uma grande unidade com
capacidade de negociar” (BRASIL, 2007).
A política externa brasileira na primeira década do século XXI evidenciou sua
motivação em acelerar os processos de integração regionais vigentes e expressos na América
do Sul, de modo a proporcionar condições para o desenvolvimento de todos os países da
região. Apesar de a prioridade conferida à região não representar uma completa novidade na
agenda de política externa do país, o regionalismo expresso durante os dois mandatos da
presidência de Lula se afastou daquele com propósitos estritamente comerciais, característicos
do período de transição liberalizante dos anos 1990.
A revisão crítica das políticas econômicas que foram adotadas na América do Sul é
apontada como conseqüência, sobretudo, do deslocamento para a esquerda que ocorreu nos
governos de diversos países da região (IPEA, 2010). Nesse sentido, as novas prioridades da
agenda regional se afastam daquelas categorias tradicionais de integração econômica
orientadas para a integração comercial.
Esse trabalho apresenta uma perspectiva sobre a revisão das estratégias de
desenvolvimento que têm lugar na América do Sul e como a integração de infraestrutura,
apesar de seus avanços modestos até o momento, passou a compor a agenda da diplomacia
brasileira e da elite econômica com maior destaque na primeira década do século XXI.
10
No primeiro capítulo, realizamos uma revisão bibliográfica sobre a condução da
política externa brasileira durante a primeira década do século XXI, por meio de artigos de
centros de pesquisas governamentais e acadêmicos e de documentos e declarações do governo
diplomático brasileiro. Por sua análise, percebemos que a crescente projeção da liderança
diplomática e econômica do Brasil a nível global não causou descuido com seu entorno
geográfico. É na América do Sul que o Brasil encontra sua plataforma para inserção
internacional como potência emergente, uma vez que é preponderante em questão de
território, população, recursos naturais, indústria e avanço tecnológico (BARBOSA, 2008).
A construção de um espaço próprio sul-americano que é enfatizada com Lula leva-nos
a questionar de que forma o Brasil vê esse novo regionalismo; quais fatores condicionam essa
visão; como são administradas as relações bilaterais na região em temas de conflitos de
interesses; e quais os temas da agenda da integração regional foram tomados pelo Brasil como
prioritários para o desenvolvimento político, social e econômico da região.
Na sequência, apresentamos o cenário atual dos processos de integração na América
do Sul, os quais têm se afastado cada vez mais dos modelos tradicionais de integração
econômica orientada para a integração comercial. Essa análise será articulada com o gradual
processo de ressurgimento dos nacionalismos econômicos para o desenvolvimento em quase
todos os países da região. As resistências em aprofundar a liberalização preferencial ganharam
solidez e o Mercosul e a Comunidade Andina de Nações (CAN), como esquemas de
integração intrarregional, passaram a ser questionados por seu caráter exclusivamente
comercial. Os mecanismos institucionais criados no âmbito do Mercosul mostraram-se pouco
adequados para atender os interesses do Brasil, visto que temas não-comerciais e não-
econômicos passaram a ter maior prioridade na agenda e, a maior aproximação com os países
da região exigiu a criação de uma nova pauta para discutir a coordenação de políticas para o
aproveitamento dos recursos naturais existentes e para o combate ao crime transnacional
(BARBOSA, 2008). Nesse sentido, os temas de defesa e segurança, energia e infraestrutura
emergem na agenda de política externa para a região.
Nos marcos dos objetivos propostos por esse regionalismo denominado pós-liberal
(VEIGA; RIOS, 2008), no segundo capítulo, discutimos alguns problemas de insuficiência de
infraestrutura na região e a criação da Iniciativa de Integração de Infraestrutura Regional da
América do Sul (IIRSA). Desencadeada a partir da I Reunião de Presidentes da América do
11
Sul realizada em Brasília, em 2000, a IIRSA é uma iniciativa dos doze países sul-americanos
que visa à promoção do desenvolvimento da infraestrutura de transporte, telecomunicações e
energia em âmbito regional, disponibilizando as bases para uma maior integração comercial e
social sul-americana. Assim, ademais de sua estrutura técnica, apresentaremos os marcos
institucionais e diplomáticos em que a política externa brasileira esteve envolvida no processo
de criação da IIRSA.
Por fim, no terceiro capítulo analisamos a articulação entre os projetos e iniciativas
para a integração de infraestrutura propostos e em andamento na América do Sul com as
respostas da política externa brasileira em questões como financiamento; os marcos
regulatórios para a participação do setor privado; as negociações em âmbito diplomático e
econômico; a internalização da agenda de integração física consensuada; e os programas de
preocupação socioambiental. Em que medida tais recursos proporcionados pelo
posicionamento brasileiro conseguem promover o avanço da integração de infraestrutura?
Qual a prioridade dada e como essas questões foram negociadas em âmbito doméstico e
regional durante o governo Lula? Apresentaremos, assim, uma perspectiva sobre a evolução
da importância da agenda de integração regional de infraestrutura no século XXI,
considerando também os fatores e recursos econômicos e financeiros brasileiros direcionados
para esses projetos, de modo a identificar o grau de efetividade da prioridade conferida à
América do Sul e ao tema de infraestrutura.
12
1 A PLATAFORMA SUL-AMERICANA PARA A INSERÇÃO INTERNACIONAL
BRASILEIRA
A primeira década do século XXI foi marcada por aceleradas transformações no
sistema econômico e político global, as quais têm permitido alterações também nas posições
relativas de determinados Estados nacionais no sistema internacional. O posicionamento do
Brasil nesse contexto tem impulsionado reflexões sobre os elementos externos e internos aos
países que vêm proporcionando a ampliação relativa de suas capacidades de influenciar
determinadas deliberações globais, em diversos temas (IPEA, 2011).
A condução da política externa durante o governo Luiz Inácio Lula da Silva (2003-
2010) diversificou e ampliou a participação da diplomacia brasileira em diversas arenas
institucionais internacionais, com especial empenho durante os momentos de crise e
instabilidade política e econômica.1 Ademais da participação nos fóruns internacionais, o
Brasil buscou articular suas ações com outras economias emergentes e investir no processo de
integração da América do Sul, por meio de mecanismos institucionais para a concertação
entre todos os Estados da região.
Embora já sejam perceptíveis alterações na inserção internacional do Brasil durante a
administração de Fernando Henrique Cardoso, é durante o governo Lula que a consolidação
de uma estratégia que poderia ser batizada de “autonomia pela diversificação”2, com ênfase na
cooperação Sul-Sul, busca estabelecer um equilíbrio com os países do Norte. Essa maior
articulação comercial e política com os países que compõem esse eixo Sul-Sul para o
desenvolvimento mundial – Ásia, África e América do Sul – consiste em um estilo próprio de
cooperação horizontal com ações que visam estabelecer os intercâmbios de conhecimento,
1 O Brasil liderou a missão de paz no Haiti, organizada pela Organização das Nações Unidas (ONU); teve papel ativo nas negociações econômicas multilaterais no âmbito do G-20 comercial, da Rodada Doha e do G-20 financeiro; buscou um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU; e teve atuação ativa na COP15 das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima.
2 VIGEVANI; CEPALUNI. A política externa de Lula da Silva: a estratégia da autonomia pela diversificação. 2007.
13
lealdades políticas e sociais entre os países em desenvolvimento (HIRST; LIMA; PINHEIRO,
2010). Em 2006, na Argélia, o presidente Lula afirmou que:
A relação Sul-Sul não apenas é possível como necessária. O Sul não é um conjunto amorfo de países subdesenvolvidos e dependentes que nada têm a oferecer senão matérias-primas para os países ricos. (...) Juntos podemos ser mais fortes e não apenas aumentar o nosso comércio, mas participar com mais força dos foros econômicos e políticos em que se discutem as grandes questões de interesse da humanidade, como a OMC e a ONU. Agora, uma relação mais intensa, mais criativa e mais forte entre os países do Sul não implica esvaziar as relações com os países desenvolvidos, que são também importantes para todos nós. Vamos fazer como os desenvolvidos: aproveitar todas as oportunidades e fazer da nossa união a nossa força. (LULA, 2006).
Assim, um maior protagonismo internacional do país conduziu a ajustes e mudanças
na agenda de política externa brasileira durante a primeira década do século XXI, pois, novas
prioridades foram estabelecidas de acordo com os objetivos de inserção internacional do país.
Com a ênfase na cooperação Sul-Sul, a América do Sul deixou de ser vista apenas como
mercado cativo para ser o espaço legitimador de atuações maiores, como as participações no
G-20 comercial e no G-20 financeiro. Nesse novo contexto, o Brasil pôde reduzir sua
vulnerabilidade externa e atuar na execução de ações voltadas ao desenvolvimento econômico
e social. No plano doméstico, o abandono do modelo de substituição de importações se
consolida e a sociedade brasileira apresenta ter chegado a um consenso sobre a idéia de
desenvolver uma economia internacionalmente competitiva. Sobre esse aspecto, Bueno e
Cervo (2011) apontam que, em contraste ao paradigma estritamente neoliberal da política
externa brasileira3 (CERVO, 2008), emerge no governo de Fernando Henrique Cardoso, e se
consolida no governo Lula, o Estado logístico.
Logístico é aquele Estado que não se reduz a prestar serviços, como fazia à época do desenvolvimentismo, nem a assistir passivamente às forças do mercado e do poder hegemônico, como se portava à época do neoliberalismo. Logístico porque recupera o planejamento estratégico do desenvolvimento e exerce a função de apoio e legitimação das iniciativas de outros atores econômicos e sociais, aos quais repassa responsabilidades e poder (BUENO, CERVO, 2011, p. 529).
Os autores identificam, assim, que os fatores que contribuíram para a consolidação do
Estado logístico brasileiro, no governo Lula, estão ligados ao avançado nível de organização
dos agentes econômicos e sociais, o que possibilitou a função de coordenação do Estado – o
3 Para os autores, o Estado normal (ou neoliberal) é aquele cujo papel consistia em arrastar as sociedades para o desenvolvimento, e no qual a integração regional seria um meio para alcançá-lo, contudo, não há aspiração por parte dessas sociedades nesse processo.
14
qual passa por um momento de estabilidade política e econômica - guiado pelos interesses
nacionais. E “ao colocar a estratégia a serviço do desenvolvimento (...), especialmente ao
recuperar a autonomia decisória na esfera política e ao voltar-se para o reforço do núcleo duro
da economia nacional” (BUENO, CERVO, 2011, p. 530), é que surge o Estado logístico, com
uma conduta diferente daquela do Estado neoliberal.
Nesse sentido, Hirst, Lima e Pinheiro (2010) destacam que, apesar das críticas
oposicionistas que denunciam o caráter partidário da política externa do governo Lula, o
Brasil “alargou como nunca sua ancoragem institucional com base na mobilização de
múltiplas agências do Estado com agendas externas próprias ou complementares às linhas de
ação do Itamaraty” e, desse modo, proporcionou o alargamento da agenda de temas e de
atores envolvidos (tanto burocráticos, como sociais) na formulação das ações internacionais
do Brasil. As autoras frisam que a política externa passou a ter uma base societal com a qual
não contava em outros momentos da história diplomática do país.
Esse empenho brasileiro para o adensamento da cooperação internacional,
especialmente no âmbito Sul-Sul, em consonância com o novo panorama econômico do país,
permitiu que o Brasil passasse a ser um “doador” internacional no que se refere à promoção
do desenvolvimento. Tanto no âmbito global, quanto no regional, o Brasil passou a ser
demandado por políticas de cooperação técnica, ligadas às áreas de agricultura, saúde,
educação, ciência e tecnologia, defesa, energia e cultura, o que condicionou à multiplicidade
de agências e atores envolvidos nas relações internacionais do país (HIRST, LIMA,
PINHEIRO, 2010, p. 3). Destaca-se a atuação do Ministério da Agricultura, por meio da
presença da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA) em países africanos e
sul-americanos; do Ministério da Saúde e seus órgãos relacionados; e do Ministério do
Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, essencial para o diálogo entre o governo e
as ações de empresas brasileiras no exterior. Ademais da própria atuação do Ministério das
Relações Exteriores, Hirst, Lima e Pinheiro apontam a atuação internacional de movimentos
sociais e organizações não-governamentais, de governos subnacionais, do Congresso
Nacional e do próprio Presidente da República - a chamada “diplomacia presidencial.”
Bueno e Cervo (2011) afirmam que, pelas mudanças na ordem internacional ocorridas
de Cardoso a Lula, a política externa brasileira acompanhou o movimento dos países
emergentes em busca de democratizar a globalização. Essa articulação pró-ativa exigiu
15
esforços do Estado para negociações, sustento dos interesses nacionais e alianças estratégicas
com outros países emergentes em defesa da redistribuição de poder nas relações
internacionais, adicionando o componente moral para o combate à pobreza e à fome.
Em suma, as mudanças percebidas na política externa brasileira na primeira década do
século XXI foram marcadas por diretrizes que contribuíram pela busca de maior equilíbrio
internacional, atenuando o unilateralismo. Consequentemente, se tornava essencial que o
Brasil estabelecesse seu papel nesse novo contexto internacional, com maior peso e
protagonismo nas negociações econômicas internacionais, o que foi feito por meio do
fortalecimento das relações bilaterais e multilaterais.
Vigevani e Cepaluni (2007) identificam os principais desdobramentos dessas diretrizes
de política externa. Em primeiro lugar, o aprofundamento da prioridade à América do Sul,
traduzido pela criação e institucionalização da Comunidade Sul-Americana de Nações (Casa)
– posteriormente rebatizada de União das Nações Sul-Americanas (Unasul). Em segundo
lugar, houve a intensificação das relações diplomáticas e econômicas com outros países
emergentes, como Rússia, Índia, China e, mais recentemente, África do Sul - constituindo o
chamado BRICS. Em terceiro lugar, houve a participação de destaque do país nas negociações
da Rodada Doha da Organização Mundial do Comércio (OMC), em 2008. Em quarto lugar, e
apesar da ênfase na cooperação Sul-Sul, o Brasil não deixou de manter relações amistosas
com os demais países ricos, inclusive com os Estados Unidos. Em quinto lugar, o Brasil
também estreitou seu relacionamento com os países da África. Em sexto lugar, buscando
determinar um novo posicionamento brasileiro na ordem multilateral, um dos principais
objetivos da política externa do governo Lula foi a reforma do Conselho de Segurança da
ONU, visando um lugar de membro permanente para o Brasil. E, por fim, a agenda de
políticas sociais voltou à compor a pauta de política externa, com o objetivo de promover
maior equilíbrio entre Estados e populações.
1.1 A prioridade atribuída à América do Sul na PEB do governo Lula
16
As tentativas de promover a transformação das fronteiras de separação em fronteiras
de cooperação na América do Sul, datadas desde a diplomacia do Barão de Rio Branco,
adquiriram máxima expressão no governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (ZUGAIB,
2006), pois, além do interesse por avançar na construção de um projeto comunitário sul-
americano, Hirst, Lima e Soares (2010), destacam que o governo Lula buscou projetar a
presença brasileira como um fator de estabilidade democrática na região.
Em seu discurso de posse, Lula declarou que:
A grande prioridade da política externa durante o meu governo será a construção de uma América do Sul politicamente estável, próspera e unida, com base em ideais democráticos e de justiça social. Para isso é essencial uma ação decidida de revitalização do Mercosul, enfraquecido pelas crises de cada um de seus membros e por visões muitas vezes estreitas e egoístas do significado de integração. O Mercosul, assim como a integração da América do Sul em seu conjunta, é sobretudo um projeto político. Mas esse projeto repousa em alicerces econômico-comerciais que precisam ser urgentemente reparados e reforçados. Cuidaremos também das dimensões social, cultural e científico-tecnológica do processo de integração. Estimularemos empreendimentos conjuntos e fomentaremos um vivo intercâmbio intelectual e artístico entre os países sul-americanos. Apoiaremos os arranjos institucionais necessários, para que possa florescer uma verdadeira identidade do Mercosul e da América do Sul.4
Além de ser a área de maior interesse para a política externa do governo Lula, Hirst
(2009) destaca que esta também representa a de maior sensibilidade para o país. Nesse
sentido, a autora expõe que são quatro os fatores que determinam os vínculos do Brasil com
os seus vizinhos sul-americanos: i) a projeção da estabilidade democrática brasileira; ii) a
irradiação dos interesses econômicos do país; iii) a afirmação do Brasil como poder regional
no sistema internacional; e iv) a especificidade dos laços bilaterais que se constroem em cada
país em particular.
A diplomacia brasileira do governo Lula já avaliava que a integração regional requer
tanto vontade e coordenação política, quanto uma aproximação concreta, em termos
econômicos, sociais e dos próprios indivíduos.5 Contudo, a presença da China e a expansão
4 SILVA, Luiz Inácio Lula da. Discurso Inaugural, proferido na Sessão de Posse no Congresso Nacional. Brasília, Congresso Nacional, em 01 jan. 2003. Disponível em: <http://www.mre.gov.br>. Acessado em 15 set. 2011.
5 BRASIL. Ministério das Relações Exteriores. Repertório de política externa.17
dos laços econômicos dos países sul-americanos com os países asiáticos se apresentam como
desafios para os formuladores da política externa brasileira. A posição brasileira, sobretudo
durante o primeiro mandato de Lula, foi proativa, não escondendo sua intenção de exercer
uma liderança efetiva, que seria a base para uma estratégia de poder regional, que projetaria o
Brasil no exterior (BARBOSA, 2008). Contudo,
em virtude da reação negativa que essa atitude despertou na vizinhança e do ativismo cada vez mais incômodo de Chávez, o governo brasileiro modificou seu discurso público, sem, no entanto, abandonar o papel protagônico da política externa sul-americana. Agora, apresenta-se como um ator de equilíbrio e moderação para a região (BARBOSA, 2008).
Nesse sentido, o argumento brasileiro que sustentou as iniciativas de integração
regional foi da necessidade de organizações intergovernamentais regionais que estruturassem
a institucionalidade requerida para a criação de mecanismos de coordenação e o
estabelecimento de projetos de cooperação.
Por um lado, considerou-se que a integração regional não poderia ficar restrita ao
âmbito do Mercosul, tanto por sua abrangência geográfica limitada à Bacia do Prata, como
por seu caráter principalmente comercial. Por outro lado, a integração latino-americana e
caribenha, embora considerada importante para o Brasil, foi percebida, em virtude do grande
número de países envolvidos, como mais complexa, e cujos objetivos iniciais deveriam ser
modestos. A preferência por priorizar a região sul-americana se deu pela percepção de que as
relações com o entorno geográfico imediato ao território brasileiro e a coordenação política de
projetos concretos de integração seriam viáveis em âmbito sul-americano. Nesse sentido, no
final da administração Cardoso, foi anunciada a assinatura de um Acordo de Livre Comércio
entre o Mercosul e a Comunidade Andina de Nações (CAN), o qual o governo Lula manteve
as negociações e, por fim, foi firmado em dezembro de 2003.
Outro elemento importante para enfatizar a prioridade da política externa brasileira
para com seus vizinhos foi a I Reunião de Presidentes Sul-Americanos, realizada em 2000,
em Brasília, e da qual resultaria a Iniciativa para a Integração da Infraestrutura Regional Sul-
Americana (IIRSA).
Historicamente, em termos das relações bilaterais, a parceria do governo brasileiro
com a Argentina é estratégica para a articulação da cooperação e integração regional. Suas
relações foram afetadas pela desvalorização do real em 1999 e pela crise econômica e social
18
da Argentina entre 2001 e 2002 (BUENO; CERVO, 2011). Ademais dos contenciosos
comerciais envolvendo a exportação de manufaturados brasileiros à Argentina, dificultando
sua reindustrialização, os governos de Lula e Néstor Kirchner apresentavam divergências de
visões também em relação ao Mercosul. Como aponta Cervo (2008), para o presidente
argentino, a superação das assimetrias internas do bloco viria em primeiro lugar, enquanto
para o presidente brasileiro, o foco seria a integração de todo o subcontinente sul-americano.
Nas palavras de Cervo, “um desejava aprofundar o Mercosul e realizar em seu seio os
objetivos da recuperação econômica, outro, utilizá-lo para promover interesses regionais e
globais, tanto econômicos quanto políticos.”
Contudo, como destacam Hirst, Lima e Pinheiro (2010), o maior envolvimento
brasileiro e seu papel mediador em crises locais na América do Sul, tal como na Venezuela,
em 20036, na Bolívia, em 20037 e 20068, e no Equador, em 20049, atrelado às atividades
comerciais e de investimentos crescentes com seus vizinhos sul-americanos, não significou a
aceitação automática na América do Sul da liderança brasileira. Os maiores exemplos disso
consistem na falta de apoio da Argentina e da Colômbia à postulação brasileira a um assento
permanente no Conselho de Segurança das Nações Unidas e nas dificuldades impostas ao
Brasil em temas bilaterais – como é o caso da atuação da Odebrecht no Equador, da
nacionalização das instalações da Petrobrás pelo governo Morales na Bolívia, e das
reivindicações do governo Lugo, no Paraguai, para a renegociação dos termos do Tratado de
Itaipu.
6 No início de 2003, uma grande greve organizada pela oposição do governo Chávez atingiu o setor petrolífero venezuelano, responsável por 80% dos investimentos do país. O Brasil encaminhou ajuda ao país vizinho e propôs a criação de um Grupo de Países Amigos da Venezuela, que reuniu também Estados Unidos, Espanha, Portugal, Chile e México.
7 Em 2003, uma série de manifestações populares e conflitos envolvendo sindicatos, plantadores de coca, cidadãos comuns e o governo do presidente boliviano Gonzalo Sanches de Lozada, tomou as ruas do país após o governo declarar sua intenção em vender as reservas de gás natural do país para os Estados Unidos através de um porto chileno.
8 Com a aprovação da Lei dos Hidrocarbonetos, em 2005, houve novo impulso do movimento para a nacionalização das reservas de gás natural da Bolívia.
9 Em dezembro de 2004, teve início uma crise no Equador após o presidente Lucio Gutiérrez reestruturar a Suprema Corte de Justiça do país, demitindo 27 dos 31 juízes, somente semanas depois de a Corte ter apoiado os esforços da oposição de tirá-lo do cargo por acusações de corrupção. Com a reestruturação, o ex-presidente Adbalá Bucaram teve sérias acusações de corrupção derrubadas, permitindo seu retorno do exílio e causando revolta da população que protestou nas ruas.
19
Nesse sentido, a intenção da diplomacia brasileira durante o governo Lula para a
América do Sul alcançou resultados relevantes para a promoção da integração sul-americana.
Em primeiro lugar, foi criada a Casa, em dezembro de 2004. Em segundo lugar, foi criada
também a IIRSA e houve o estabelecimento de uma Agenda de Implementação Consensuada.
Em terceiro lugar, substituindo a Casa, houve a criação da Unasul e a assinatura de seu tratado
constitutivo em maio de 2008. Em quarto lugar, ocorreu a institucionalidade da Unasul como
ferramenta para a solução de controvérsias e tensões na região, tais como as que ocorreram
entre a Venezuela e a Colômbia10. Em quinto lugar, foram criados conselhos setoriais no
âmbito da Unasul11, visando debater e a articular de políticas em âmbito regional. Por fim,
houve ainda a eleição do primeiro Secretário-Geral da Unasul12, em maio de 2010.
1.2 A ampliação da agenda regional e a emergência do regionalismo pós-liberal sul-
americano
Em distintos contextos econômicos e políticos, os objetivos dos projetos de integração
regional modificaram-se ao longo do tempo. Deos e Wegner (2010) sintetizam que, nos anos
1960 e 1970, na América Latina, entendia-se que a integração deveria ser base para a
superação dos obstáculos estruturais do processo de industrialização, minimizando as
vulnerabilidades externas dos países.
A formulação das estratégias de inserção internacional dos países está fortemente
ligada a condicionantes externos - aqueles relacionados à evolução econômica e política
internacional – e domésticos. O abandono do paradigma livre-cambista na América do Sul,
impulsionado pela ascensão de líderes políticos de esquerda em diversos governos nacionais
na região, inclusive no Brasil, a partir dos últimos anos do século XX, traçou novos contornos
10 Uma crise entre os dois países se intensificou depois que a Colômbia levou à Organização dos Estados Americanos (OEA) denúncias de que a Venezuela abrigava guerrilheiros das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) e do Exército de Libertação Nacional (ELN). As acusações levaram o presidente venezuelano, Hugo Cháves, a romper relações diplomáticas com Bogotá.
11 Atualmente, a UNASUL conta com sete conselhos setoriais para tratar de assuntos relacionados a energia; saúde; defesa; infraestrutura e planejamento; desenvolvimento social; tráfico de drogas; e educação, cultura, ciência, tecnologia e inovação.
12 O primeiro secretário-geral da UNASUL foi o ex-presidente da Argentina, Néstor Kirchner.20
para o conceito de integração econômica regional, no qual a promoção do desenvolvimento e
a busca de mecanismos políticos mais abrangentes de concertação entre os Estados
procuravam desvincular o modelo comercial de integração característico dos anos 1990.
Saraiva (2010) indica que as iniciativas de integração regional mais tradicionais na
América do Sul, o Mercosul e a CAN, “vão cedendo espaços para modelos mais cooperativos
que se afastam das categorias tradicionais de integração econômica orientadas para a
integração comercial.” A autora continua e aponta que, devido ao fato dessas iniciativas
buscarem uma melhor inserção das economias nacionais no sistema econômico internacional,
ficaram conhecidas como o “regionalismo aberto”, sendo orientadas para a obtenção de uma
economia de mercado mais aberta e com expectativas de articulação com outros países para a
construção de uma economia de escala competitiva internacionalmente.
O próprio Mercosul, hoje, parece ter um futuro incerto. Por um lado, Souto Maior
(2006) afirma que a falta de instituições adequadas faz com que desavenças de natureza
protecionista, principalmente entre os dois maiores parceiros do bloco – Brasil e Argentina –
tornem-se assuntos politicamente sensíveis. Por outro lado, há também as assimetrias
estruturais13 entre os dois sócios maiores e os dois menores – Paraguai e Uruguai -, porém,
não há, no bloco, mecanismos compensatórios eficazes para lidar com as insatisfações de
parte destes últimos.
Segundo dados do Banco Mundial, em 2008, Paraguai e Uruguai representavam
menos de 4% da população e 3% do PIB do bloco.14 O Brasil, em contraste, representava
cerca de 80% da população e 75% do PIB. Essas assimetrias que, segundo estudo do Instituto
de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), não têm sido reduzidas de forma significativa,
“determinam em parte a capacidade de os Estados-membros do Mercosul se beneficiarem da
maior integração econômica.” No mesmo estudo, o IPEA identifica que, a partir de 2003, o
processo de integração do bloco sub-regional tem sido retomado a partir de uma nova
perspectiva, na qual se procura conferir maior visibilidade às dimensões social e político-
institucional da integração, não se restringindo apenas aos aspectos comerciais.
13 Assimetrias estruturais são aquelas que se originam de discrepâncias na dimensão econômica, na posição geográfica, na dotação de fatores, no acesso à infraestrutura regional, na qualidade institucional e no nível de desenvolvimento dos Estados-membros (IPEA, 2010).
14 Medido em paridade de poder de compra (PPP, na sigla em inglês).21
Embora, em seus primeiros anos, o Mercosul tenha sido bem sucedido em promover
maior intercâmbio comercial, suas contribuições ficaram muito aquém das expectativas
econômicas existentes para a integração. Como afirma Kfuri, nesse contexto, um novo
modelo de regionalismo que ampliará a agenda de integração sul-americana surge com um
caráter multidimensional, procurando atender também a demandas sociais, culturais, políticas
e infraestruturais. Veiga e Ríos (2008) definem um processo de revisão crítica das políticas
econômicas adotas na região nos anos 1990, o qual é desenvolvido por alguns países da região
em graus distintos:
Emerge, através de iniciativas bastante heterogêneas como a Unasul e a ALBA, um regionalismo pós-liberal na região, que pretende expressar, no campo das relações intra-regionais, uma nova ordem de prioridades e uma nova agenda diretamente relacionada ao deslocamento para a esquerda do eixo de poder político em diversos países da região. (VEIGA, RÍOS, 2008, p. 2)
Como os autores apontam, o contexto de uma tendência liberalizante nos países da
América do Sul começou a ser alterado a partir de sucessivas crises das economias
emergentes nos últimos anos do século XX, tal como ocorreu no Brasil, em 1999, com a
desvalorização cambial, e com a Argentina, em 2001. Esse novo regionalismo abriu espaço
para discussões sobre os impactos distributivos do comércio e a questão das assimetrias,
sendo os principais exemplos desse novo regionalismo a ativa participação do Brasil nesses
processos, a criação da Unasul e o relançamento do Mercosul, em 2003 (KFURI, 2010).
Embora as vitórias das forças de esquerdas nos principais países do continente e o
acelerado crescimento das economias da região entre 2001 e 2008 tenham fortalecido os
processos de integração da América do Sul, a crise de 2008 mudou o cenário regional e
evidenciou as dificuldades e limitações fiscais e financeiras dos países em proceder com os
projetos econômicos e sociais planejados anteriormente. As grandes dificuldades em realizar
um projeto sul-americano se mostraram relacionadas a quatro principais fatores. Primeiro, as
economias sul-americanas são, essencialmente, primário-exportadoras e há pouca integração
entre elas. Segundo, as assimetrias e desigualdades nacionais e sociais são significativas. Em
terceiro lugar, falta uma infraestrutura de âmbito continental que possibilitasse maior
interação e integração. E, por fim, os objetivos regionais não são caracterizados como
permanentes o que impossibilita uma estratégia regional em longo prazo (IPEA, 2010).
22
Nesse sentido, a Unasul, como afirma Saraiva (2010), tem um perfil diferente das
demais iniciativas para a integração da América do Sul e se aproxima mais de um instrumento
de governança regional. Sendo a herdeira a iniciativa brasileira que, em 2004, em Cuzco,
levou à criação da Comunidade Sul-Americana, “a partir da eleição de Lula, a diplomacia
brasileira concentrou esforços mais diretos na sua institucionalização.” Dois anos após sua
criação, durante a cúpula de 2006, na Bolívia, Lula enfatizou a importância de haver o
comprometimento dos países sul-americanos para a integração energética e para o
fortalecimento das políticas sociais na região, além de debater pontos sobre a livre circulação
de pessoas na região e sobre a proteção ao meio ambiente (KFURI, 2010). Foi no ano
seguinte, na cúpula realizada na Isla Margarita, na Venezuela, que os presidentes
concordaram em alterar o nome da instituição para Unasul. Na mesma reunião na Venezuela,
ocorreu também a I Cúpula Energética Sul-Americana, da qual participaram nove dos doze
chefes de Estado e de governo da região, os quais acordaram na criação de um Conselho
Energético, visando a articulação de estratégias e ações no setor para a América do Sul
(KFURI, 2010).
O Mercosul, por sua vez relançado, abandonou aos poucos a idéia de um bloco
puramente comercial, mas estendeu sua preocupação com a integração física e social dos
países., de modo que novos órgãos para tratar temas como de direitos humanos, democracia e
questões sociais foram criados.
O Tratado de Assunção, em seu Art. 6º, ao criar o Mercosul, mencionava que os seus
Estados-membros reconheciam a existência de “diferenças pontuais no ritmo de liberalização
comercial” para Uruguai e Paraguai, contudo, o que se concedeu a essas economias durante
todo o processo de constituição e de consolidação do bloco foi uma maior flexibilidade em
relação aos compromissos assumidos. Até 2003, não constava na pauta do bloco o tratamento
dessas assimetrias por meio de políticas positivas.15 Ao tentarem revitalizar o bloco, os
presidentes dos Estados-membros identificam que o enfrentamento dessas assimetrias era
condição essencial para o sucesso do Mercosul e, a partir de então, nas declarações conjuntas
dos presidentes dos Estados-membros do Mercosul, a temática foi introduzida. Em um
terceiro momento, em 2004, o discurso passa a tratar da redução de assimetrias e, em 2007, o
15 São denominadas políticas positivas aquelas que buscam a redução das assimetrias por meio da intervenção ativa dos Estados, mediante a elaboração de políticas e de programas e ações que diminuam as disparidades produtivas e socioeconômicas entre os países membros do bloco (IPEA, 2010).
23
termo é substituído por superação de assimetrias (IPEA, 2010). No âmbito do Mercosul,
surgirá, em 2005, o Fundo de Convergência Estrutural do Mercosul (FOCEM), cuja atuação
prioriza as áreas em que as disparidades entre os Estados-membros são maiores e cuja
redução das diferenças entre os sócios é indispensável para equacionar as assimetrias. Essas
áreas são: infraestrutura física, estrutura produtiva, índices sociais dos Estados-membros e
fortalecimento institucional do bloco.
Anualmente, devem ser depositados no FOCEM US$100 milhões, dos quais 70%
devem ser aportados pelo Brasil, 27% pela Argentina; 2% pelo Uruguai; e 1% pelo Paraguai.
Para ser consonante aos objetivos do bloco, Paraguai e Uruguai têm o direito de utilizar até
48% e 32% anuais dos recursos do fundo, respectivamente. Brasil e argentina podem sacar até
10% anualmente, para investir em projetos que mitiguem as assimetrias entre os parceiros do
Mercosul.
Assim, é visível a introdução de temas econômicos não comerciais, tais como a
integração energética e de infraestrutura física; a cooperação financeira; investimentos; e
temas sociais e culturais, na agenda de integração entre os países sul-americanos (ALVES,
2008). O que se percebe, contudo, não é uma reversão brusca das políticas de abertura
características dos anos 1990, mas sim inflexões na direção de políticas mais protecionistas e
atitudes mais cautelosas em relação à liberalização unilateral (VEIGA, RIOS, 2008, p. 6).
A perspectiva do governo brasileiro quanto à nova agenda de integração de
infraestrutura é visível na formulação co Ministro das Relações Exteriores do governo Lula,
Celso Amorim:
De 2003 para cá, concluímos o acordo entre o Mercosul e a Comunidade Andina de Nações (CAN) e concebemos e impulsionamos diversos projetos para a integração da infraestrutura, em transportes, comunicações e energia. Essa integração física (...) constitui parte essencial do projeto de desenvolvimento do próprio Brasil. A aprovação, por exemplo, de financiamento do BNDES no valor de US$ 400 milhões para a ligação rodoviária do Acre ao Pacífico, via Peru, tem significado histórico e econômico sem precedentes, não apenas para a integração regional, como também para o progresso do Oeste brasileiro. (AMORIM, 2005, p. 2)
Nesse sentido, a Unasul surge como uma “síntese do novo conceito de América do
Sul” e que, segundo Veiga e Rios (2008), não é incompatível com os acordos sub-regionais
existentes - o Mercosul e a CAN. A Unasul surge como “o vetor da expansão geográfica e da
24
expansão temática dos acordos sub-regionais”, mas que não impede que esses acordos
avancem em seus objetivos de constituição de uniões aduaneiras. No entanto, o que os autores
identificam é o desaparecimento da “convergência liberal”, que vigorou entre os países da
América do Sul durante os anos 1990, e a adoção de diferentes estratégias de inserção
internacional, nas quais as agendas de interesses não são convergentes.
Por um lado, há países que buscam ampliar sua integração à economia internacional e
as negociações com os Estados Unidos, protegendo os investimentos estrangeiros – como é o
caso do Chile. Por outro lado, Venezuela e Bolívia possuem maior preocupação em rever as
políticas de proteção aos investimentos estrangeiros. A Argentina, por sua vez, fortaleceu seu
posicionamento protecionista em âmbito comercial, especialmente impondo barreiras
tarifárias às exportações brasileiras que afetavam sua indústria. A maior economia da região,
o Brasil, nas negociações internacionais, assumiu postura ofensiva no debate sobre a
liberalização do comércio agrícola. Assim, a viabilidade de uma integração econômica é
questionável, pois não somente o Mercosul possui problemas internos entre seus sócios (desde
o protecionismo argentino, até as assimetrias reclamadas por Uruguai e Paraguai), mas a CAN
também carece de falta de vontade política e vulnerabilidade externa para levar adiante sua
integração. A aproximação entre os dois blocos evidenciaria mais assimetrias, principalmente
no que tange à economia brasileira em relação às demais, tornando a integração econômica da
região um objetivo complexo e distante.
A criação da Unasul dá origem a um ambicioso plano de cooperação e, ainda que de
forma superficial, seu tratado constitutivo abrange quase todas as esferas da integração e
ainda deixa margem para que novos mecanismos e propostas sejam adicionados ao processo
de integração regional. A prioridade do diálogo político da organização é refletida pelo
principio da unanimidade entre os Estados-membros na tomada de decisões (BUENO;
CERVO, 2011). Em sua estrutura, têm destaque o Conselho de Chefes de Estado, o Conselho
de Ministros de Relações Exteriores e o Conselho de Delegados.
Em sentido econômico, a Unasul se propõe a discutir e coordenar a implementação de
projetos que promovam a integração produtiva, energética e de infraestrutura. Conjuntamente
com o tratado constitutivo da organização, surge uma nova instituição: o Conselho Energético
(o qual terá origem na I Cúpula Energética Sul-Americana, na Isla Margarita, na Venezuela),
25
partindo da percepção de que, para a região, a questão energética é um pilar essencial para o
desenvolvimento.
Outras instituições relacionadas à Unasul tomar forma em novas reuniões
presidenciais e ministeriais, como o Conselho de Saúde Sul-Americano e o Conselho de
Defesa, demonstrando uma forte tendência na regionalização de setores que anteriormente
estavam sob a égide de regimes internacionais. Ainda, destaca-se o Conselho de Infraestrutura
e Planejamento (COSIPLAN), cujo estatuto foi aprovado na I Reunião Ordinária de Ministros
do Conselho, em 2010, em Quito, e ao qual a IIRSA será subordinada, segundo o Plano de
Ação Estratégico 2012-2022 do Conselho.
Em sentido geopolítico, embora não tenha o objetivo de ser uma aliança militar, a
organização confere ênfase à segurança regional, de modo a afastar da região a interferência
de potências mundiais e organismos multilaterais internacionais (BUENO; CERVO, 2011).
Há ainda a proposta de consolidação do Banco do Sul – fortemente apoiada pelo
Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) -, visando reduzir a
atuação e influência do Fundo Monetário Internacional (FMI), do Banco Mundial e do Banco
Interamericano de Desenvolvimento (BID) na região.
Assim, apesar dos ambiciosos planos traçados em seu tratado constitutivo, para muitas
propostas no âmbito da Unasul há pouca previsão de como ocorrerão. Por seu caráter
intergovernamental, a Unasul carecer de mecanismos adequados para internalização de
normas, subordinando sua eficácia às regras dos seus Estados-membros, uma vez que a
entrada em vigor das normas da organização depende da internalização dessas por todos os
membros.
Desse modo, pode-se dizer que o novo regionalismo sul-americano expresso pela
Unasul é antes de tudo a tentativa de criar medidas de confianças entre os países, preparando
o cenário na América do Sul para uma futura – e talvez distante – integração, uma vez que,
enquanto fórum político, esta tem a capacidade de estabelecer o diálogo entre os doze Estados
da região. O que se percebe não é que as esferas econômica e jurídica foram relegadas, mas
sim condicionada ao diálogo político. Contudo, mesmo nesse cenário, os Estados precisam
visualizar ganhos para que os processos de integração fossem adiante. E, no capítulo 3,
26
analisaremos com mais atenção os interesses e ações da diplomacia brasileira na consolidação
da integração da infraestrutura física regional.
2 A MOLDURA POLÍTICO-DIPLOMÁTICA DA INTEGRAÇÃO DA
INFRAESTRUTURA NA AMÉRICA DO SUL
27
No passado, os governos dos países sul-americanos, especialmente o Brasil, baseavam
o planejamento da infraestrutura física nacional e regional nas suas preocupações de natureza
geopolítica e em objetivos nacionais estratégicos para a segurança territorial. Os projetos
considerados prioritários até então eram aqueles cujas contribuições estivessem relacionadas à
ocupação de territórios, à consolidação da presença nacional em determinado entorno
geográfico e à autossuficiência econômica. Eliana Zugaib (2006) destaca que, por essas
motivações, os governos recorriam a políticas centralizadas de planejamento e de
investimentos, o que resultou, de um lado, no surgimento de pólos de desenvolvimento
econômico, e de outro, em investimentos ineficientes em infraestrutura, com impactos
socioambientais negativos.
Como destacado no capítulo anterior, objetivos políticos e diplomáticos da integração,
como o aumento do poder de negociação e a representação regional, foram consolidados na
América do Sul atendendo às exigências de uma nova ordem no sistema internacional, que
emergia ao final do século XX, sem, contudo, abandonar os esforços pela integração
econômica. Iglesias (2006) menciona que os avanços nessa direção se apresentam por meio de
duas estratégias. Primeiro, o aperfeiçoamento das zonas de livre comércio na região e,
segundo, pela integração dos sistemas de energia, transporte e telecomunicações, tendo como
base as experiências bilaterais, regionais e subregionais existentes.
Por meio de relatórios e publicações produzidos por instituições regionais, tais como o
Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), a Corporação Andina de Fomento (CAF) e
a Comissão Econômica para América Latina e Caribe (CEPAL), e das informações
disponibilizadas no banco de dados digital da IIRSA, buscamos definir o cenário de
emergência da IIRSA e quais as respostas a Iniciativa propôs para a conjuntura da
infraestrutura regional vigente até então, com especial ênfase aos interesses brasileiros
expressos no direcionamento de suas ações.
2.1 Características da infraestrutura física da América do Sul
A atual situação da infraestrutura na América do Sul apresenta um quadro
relativamente deficiente em comparação a estruturas existentes em outros países em
desenvolvimento. A situação não é de homogeneidade nem entre os setores e os subsetores da
28
infraestrutra física, nem, é claro, entre os países da região. Moreira (2005), em sua análise
sobre os fundamentos econômicos da IIRSA, define com precisão o relativo atraso sul-
americano e a isso acrescenta o fato de que a infraestrutura da região não foi concebida para o
comércio intrarregional e, por esse motivo, os custos de transporte no comércio são altos e se
apresentam como uma barreira efetiva à integração dos mercados nacionais.
Apesar das iniciativas de integração das economias sul-americanas durante o século
XX, os volumes de comércio intrarregional ainda são baixos em relação aos que poderiam se
esperar entre vizinhos com economias relativamente abertas e convênios comerciais
preferenciais.
Conforme apresentam os relatórios de planejamento e de atividades da IIRSA, a
América do Sul é, por um lado, uma região rica em recursos naturais, com matriz
agroindustrial diversificada. Por outro lado, ela abrange um território cuja densidade
demográfica não é uniforme em toda sua extensão, havendo grandes vazios entre os núcleos
de concentração populacional - cidades como Buenos Aires, Bogotá, Lima, Rio de Janeiro e
São Paulo.
Os problemas de infraestrutura nas diversas regiões da América do Sul são variados e,
segundo se afirma no documento de definição da carteira de projetos da IIRSA, em alguns
casos, seria necessária a melhoria nos serviços de infraestrutura existentes pelo aumento da
demanda e, em outros, seria necessário trabalhar para integrar áreas isoladas.
Resumidamente, o documento identifica algumas das principais restrições à
infraestrutura de integração no território sul-americano que, somadas aos aspectos relatados
no estudo Un nuevo impulso a la integración de la infraestructura regional en América del
Sur, do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), desenvolvido em 2000, apresenta a
conjuntura regional que desperta o interesse dos países sul-americanos em estabelecer não
somente a cooperação para a realização dos projetos de infraestrutura, mas também o
estabelecimento da conectividade entre suas economias e sociedades.
Com as iniciativas de zonas de livre comércio desenvolvidas na década de 1990,
houve certo crescimento do comércio intrarregional, se constituindo, assim, no principal fator
de evidenciou a insuficiência das conexões de infraestrutura de transporte, além de mostrar as
possibilidades de integração no setor energético (IGLESIAS, 2008).
29
Para setor de transportes, Moreira (2005) destaca que a infraestrutura não é propícia
para o comércio interregional, mas sim, tendo em vista a exportação de bens intensivos em
recursos naturais, é notável que a infraestrutura de transporte foi definida para o comércio
extrarregional, basicamente com a Europa. As barreiras geográficas, tais como os Andes, a
Amazônia e os grandes rios que cortam o subcontinente, e a ausência de estímulos para a
criação de uma infraestrutura funcional durante o processo de substituição de importações –
no qual vigoravam políticas fortemente protecionistas – contribuíram para um cenário
deficiente no setor de transporte rodoviário, apresentando problemas de capacidade
insuficiente em alguns trechos, além de cruzamentos urbanos congestionados; problemas de
segurança viária; baixa proporção entre o número de vias pavimentadas e o número de
estradas existentes; estado das pistas, acostamentos e sinalização que demandam expressiva
manutenção; além de requisitos de habilitação díspares entre os países, assimetrias tributárias
e custos substanciais nas passagens de fronteira.
Por sua vez, a rede ferroviária apresenta restrições para a operação de trens de grande
porte; diferenças de bitolas e gabaritos entre os países; a velocidade permitida para a
circulação é considerada baixa, assim como os investimentos na modalidade; além da falta de
integração dessa rede com os demais modais de transporte. O mesmo relatório aponta que a
participação do segmento ferroviário nos fluxos internacionais é relativamente baixa, tendo
em vista que as ferrovias sul-americanas foram concebidas, em sua maioria, para o transporte
interno. A rede ferroviária sul-americana foi construída, em sua grande parte, durante a
primeira metade do século XX e, nesses dias, carece de problemas relacionados ao
financiamento e à gestão.
Os aeroportos dos países da América do Sul apresentam problemas de capacidade
insuficiente em determinados terminais, falta de equipamentos que garantam a confiabilidade
e a segurança operacional e requisitos de habilitação de aeronaves díspares.
Por fim, os portos e as demais vias navegáveis da América do Sul demandam medidas
e correções que assegurem a boa navegabilidade, entre elas a maior conexão com os modais
terrestres. Há ainda uma forte regulamentação de segurança que impõe custos excessivos ao
modal e também a demora na aplicação de tratados de transporte fluvial na região.
30
O setor de energia na América do Sul tem-se mostrado como um ponto sensível para
as relações diplomáticas, pois, as restrições identificadas para a integração evidenciam
situações de concentração excessiva em certas fontes de fornecimento, deficiências em
capacidade de geração de energia, deficiências de infraestrutura de transmissão de energia em
países exportadores e importadores e diferenças em tarifação de recursos energéticos. Em um
estudo da CEPAL sobre as experiências da América Latina em infraestrutura, Santiago (2011)
afirma que os elementos que levaram os países da região a introduzir um processo de reforma
energética – em particular, sobre a energia elétrica – estão relacionados à necessidade de
investimento na expansão dos sistemas; ao desenvolvimento dos mercados de capital internos;
à necessidade de introduzir competitividade nos segmentos ou mercados nos quais é possível;
e à recuperação da eficiência dos sistemas elétricos. Nesse sentido, as modificações na
indústria elétrica implicaram na reestruturação dos segmentos da cadeia ligados à geração, à
transmissão e à distribuição de energia; no surgimento de novos atores; e em uma nova
estrutura institucional.
Em relação ao mercado de gás natural, em geral, os países da América Latina e do
Caribe não são atores significativos internacionais, representando cerca de 4% das reservas
mundiais. No entanto, na região, a Venezuela concentra 69% da oferta disponível de gás
natural, enquanto a Argentina e o Brasil concentram 35% e 27%, respectivamente, da
demanda da América do Sul. Como afirma Santiago (2011), atualmente, a busca pelo avanço
na integração nesse segmento, depois da experiência frustrada com o Mercosul e com a CAN,
está fixada no lançamento da UNASUL, com vistas a garantir condições de
autoabastecimento e de potencial de exportação para outras regiões.
Com a oferta concentrada em poucos países, a criação de uma instituição para a
promoção da integração gasífera não foi sustentada, e as interconexões bilaterais firmadas
intensificaram o sentimento de desconfiança entre os países. O principal exemplo dessa
conjuntura foi a nacionalização das reservas de gás bolivianas pelo governo de Evo Morales,
em 2006, o que implicaria no aumento dos impostos deste produto e ameaças de expropriação
da infraestrutura produtiva das empresas estrangeiras instaladas no pais, entre elas a brasileira
Petrobrás.
31
Segundo dados apresentados pela CEPAL, a oferta de gás natural na América do Sul,
em 2008, era estimada em 279 TCF16, enquanto a demanda projetada para o período entre
2008 e 2020 seria de apenas 104 TCF (Tabela 1).
Tabela 1. Reservas e demanda futura de gás natural na América do Sul
Países Oferta em 2008 (TCF) Demanda para 2008-2020 (TCF)
Argentina 17 37
Bolívia 22 2
Brasil 23 28
Colômbia 4 6
Chile 1 7
Equador 3 1
Peru 17 4
Venezuela 192 19
Total 279 104
Fonte: Gas Energy (GAS SUMMIT, 2008). Elaboração: Santiago (2008).
O Brasil tem clara capacidade na exploração e na produção de petróleo e gás -
representada basicamente pela Petrobrás - porém, suas reservas, disponíveis no momento,
especialmente de gás, são insuficientes. Como menciona Iglesias (2006), a discussão sobre a
ampliação da rede de gasodutos nas primeiras proposições da IIRSA é fundamental para os
interesses de abastecimento do Brasil.
Ademais, os interesses brasileiros na integração da rede de transportes e de energia na
região não estão limitados aos impactos diretos no comércio. O país possui as principais
empresas da América do Sul da área de serviços de engenharia, de fabricação de
equipamentos e de materiais para construção, e conta com um forte setor produtor de bens de
capitais. E, ainda, como afirma Iglesias (2006), essas empresas “tienen en los proyectos
16 Trilhão de pés cúbicos. 1 TCF equivale a 28,3 bilhões de metros cúbicos.32
regionales una alternativa para las restricciones a la inversión pública y privada que existen en
el mercado doméstico.”
O setor de telecomunicação nos países sul-americanos também apresenta níveis de
infraestrutura insuficientes, incluindo acesso limitado a tecnologias da informação e da
comunicação em regiões rurais e diferenças regulatórias entre os países. Apesar disso, houve
significativos níveis de crescimento na maioria dos países da região, contribuindo para uma
melhora na cobertura telefônica e de internet em relação ao cenário que predominou em
décadas anteriores.
Até esse momento, o desenvolvimento das telecomunicações na América do Sul tem
ocorrido de forma heterogênea entre os países. Como aponta o relatório de Santiago (2011),
em relação ao acesso à internet:
A provisão de serviços de internet é uma das áreas mais novas no negócio de telecomunicações, cujo desenvolvimento em nível mundial teve início em 1990. Diferentemente dos países desenvolvidos, o nível de conectividade à internet nos países da região no final da década passada era praticamente inexistente, alcançando uma densidade média de apenas 1,29 conexão a cada 100 habitantes. Entretanto, nos primeiros anos da década 2000, produziu-se um crescimento importante nas conexões, o que implicou a melhora da densidade de internet, alcançando um nível de 5,16 em 2006 (SANTIAGO, 2011).
A modernização e a relativa expansão dos serviços de telecomunicação na América do
Sul encontram como um de seus fatores a privatização das empresas desse setor nos países da
região17, atrelado à redução progressiva do custo da tecnologia, devido aos avanços
computacionais e de informática que permitiram o aumento da capacidade de transmissão das
redes já existentes e a automatização de muitos processos. Ainda, segundo Santiago, dados da
primeira metade dos anos 1990 evidenciam que as empresas de telefonia fixa da região já
haviam digitalizado e automatizado aproximadamente 100% de suas redes,
independentemente do tipo de propriedade da empresa.
Diante desse contexto, quais as dificuldades mais evidentes para uma iniciativa de
integração da infraestrutura regional? Iglesias (2006) aponta que, tendo em vista os interesses
brasileiros em relação à construção das obras de infraestrutura de integração, o problema
17 O processo de privatização não implicou em melhoras significativas para o desenvolvimento da indústria da telecomunicação em todos os países da região. Como aponta Santiago (2011), no caso da Venezuela, o Estado não desenvolveu políticas concorrenciais sob o argumento de permitir a expansão da rede, o que gerou um monopólio que estagnou os avanços no setor.
33
central são as restrições existentes ao aumento do endividamento do setor público e a
dificuldade de constituir garantias adequadas para o financiamento quando a obra planejada é
realizada por empresas privadas. Ainda, quando tratamos da operação de um projeto de
infraestrutura, seja pelo setor privado somente ou por meio de uma Parceria Público-Privada
(PPP), além da dificuldade em constituir garantias para o financiamento da construção, é
necessário considerar também os riscos relacionados à regulação da operação, como as
intervenções reguladoras e as mudanças nos contratos pelos governos locais, os quais podem
provocar alterações expressivas na rentabilidade do projeto.
Por fim, uma característica sobressalente da integração sul-americana no século XXI
tem sido a institucionalização dos projetos transfronteiriços de infraestrutura, com evidente
enfoque na superação de barreiras de coordenação técnica, legal, administrativa e financeira,
por meio da incorporação do tema aos planos nacionais de desenvolvimento e pela definição
de uma nova agenda das relações econômicas na América do Sul.
Na sequência, se realiza uma breve apresentação dos avanços regionais na construção
de uma infraestrutura física sul-americana no âmbito do projeto IIRSA, a iniciativa mais
importante na atualidade que trata do tema e cujo objetivo é o desenvolvimento da
infraestrutura regional de transporte, energia e telecomunicações em um marco de
competitividade, sustentabilidade ambiental, qualidade social e institucional.
2.2 A conjuntura diplomática do lançamento da Iniciativa para a Integração da
Infraestrutura Regional Sul-Americana (IIRSA)
O início do século XXI para a América do Sul esteve marcado pelo fortalecimento e a
consolidação de suas instituições democráticas, pela valorização da estabilidade política, pelo
compromisso com os direitos humanos e com a proteção ao meio ambiente, pela superação de
injustiças sociais e pelo desenvolvimento de suas populações18. Esses aspectos possibilitaram
um ambiente de cooperação que, ademais das tensões diplomáticas existentes, permitiu a
18 COMUNICADO DE BRASÍLIA, 2000.34
adesão dos países ao princípio de solução pacífica e negociada de controvérsias. Os
comprometimentos com o crescimento de suas economias e com a promoção de um
desenvolvimento sustentável constituíram, assim, nos dois pilares fundamentais para o
aprofundamento dos processos de integração regionais.
A IIRSA teve origem com a I Reunião de Presidentes Sul-Americanos, em Brasília,
em 2000. Na oportunidade, os presidentes dos doze países sul-americanos19 se reuniram e
assinaram acordo para a realização de ações conjuntas que pudessem impulsionar a
aproximação política, social e econômica do continente, tendo como principal foco a
modernização da infraestrutura regional para a integração física. O Comunicado de Brasília,
resultado desse encontro pioneiro na história da América do Sul, declara que:
Los Presidentes coincidieron en la evaluación de que la estabilidad política, el crecimiento económico y la promoción de la justicia social, en cada uno de los doce países de América del Sur, dependerán en buena medida de la ampliación y de la profundización de la cooperación y del sentido de solidaridad existente en el ámbito regional y del fortalecimiento y de la expansión de la red de intereses recíprocos. Identificaron, en ese sentido, una seria de temas cuyo tratamiento podrá beneficiarse de un enfoque especifico de cooperación suramericana: democracia; comercio; infraestructura de integración; drogas ilícitas y delitos conexos; información, conocimiento y tecnología (COMUNIDADO DE BRASÍLIA, 2000).
Assim, apesar do Comunicado de Brasília abranger também temas como a
democracia, o comércio, o tráfico de drogas ilícitas e ciência e tecnologia, foi sobre a
infraestrutura física que se alcançaram acordos mais amplos, imediatos e operacionais. Em
parte, pode-se dizer que esse resultado foi fruto de trabalhos desenvolvidos previamente e que
contaram com ativa participação do governo brasileiro.
A pedido do governo brasileiro, o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID),
com suporte da Corporação Andina de Fomento (CAF) e do Fundo para o Desenvolvimento
da Bacia do Prata (FONPLATA), elaborou um Plano de Ação a Integração da Infraestrutura
Regional da América do Sul, o qual teve por base estudos, como o já citado Un nuevo impulso
a la integración de la infraestrutura regional en América del Sur (BID, 2000) e Infrastructure
for Sustainable Development and Integration of South America, de Eliezer Batista da Silva
19 Estiveram presentes os Presidentes do Brasil, Fernando Henrique Cardoso; da Argentina, Fernando de La Rúa; da Bolívia, Hugo Bánzer Suárez; do Chile, Ricardo Lagos Escobar; da Colômbia, Andrés Pastrana Arango; do Equador, Gustavo Noboa; da Guiana, Bharrat Jagdeo; do Paraguai, Luis Angel González Macchi; do Peru, Alberto Fujimori; do Suriname, Runaldo Ronald Venetiaan; do Uruguai, Jorge Batlle Ibañez; e da Venezuela, Hugo Chávez.
35
(1996). Com suas propostas para ampliar e modernizar a infraestrutura física da América do
Sul nas áreas de transporte, telecomunicações e energia, o objetivo do Plano de Ação era
configurar Eixos de Integração e Desenvolvimento para o futuro espaço econômico ampliado
da região, com especial atenção à situação dos países que enfrentam dificuldades geográficas
de acesso marítimo aos mercados internacionais. O lançamento político da IIRSA incluiu
também um cronograma de ações, que teria inicio com a convocatória de uma reunião a nível
ministerial para consolidar uma visão regional integrada sobre as linhas de ações necessárias.
Assim, os Ministros de Transporte, Telecomunicações e Energia dos doze países se
reuniram em dezembro de 2000, em Montevidéu. Nessa reunião, foram definidas as diretrizes
fundamentais sobre os distintos órgãos institucionais da IIRSA, o calendário dos trabalhos a
serem executados dentro dos Eixos de Integração e Desenvolvimento e dos Processos
Setoriais Integrados aprovados.
A IIRSA, como um mecanismo institucional de coordenação de ações
intergovernamentais dos doze países sul-americanos, tem o objetivo de construir uma agenda
comum para impulsionar projetos de integração de infraestrutura de transportes, energia e
comunicações. Sua criação, em 2000, responderia a um forte consenso dos doze países na
busca pela promoção da competitividade e da sustentabilidade econômica crescente, para que
a região alcance, de forma independente, um padrão de desenvolvimento estável, eficiente e
equitativo (IIRSA, 2010, p. 11).
A IIRSA propõe desenvolver e integrar a infraestrutura da região por meio de
determinadas linhas de ação. A primeira delas consiste no fortalecimento das capacidades
nacionais de investimentos e a coordenação entre os países. A segunda, promover a
harmonização em contexto institucional e regulatório de infraestrutura. E, em terceiro lugar,
identificar e desenvolver um conjunto de projetos que estimulem a participação do setor
privado (IGLESIAS, 2008).
Concebida como um projeto regional capitaneado por instituições financeiras
multilaterais, a IIRSA representou, por um lado, uma tentativa dos governos na busca por
aproveitar a maior agilidade e flexibilidade destas agências, para driblar restrições
orçamentárias e legais internas aos Estados. Por outro lado, com demasiada influência nos
36
projetos, as decisões dessas agências oscilam de acordo com seus interesses próprios na
região20.
Como apontado anteriormente, os avanços em matéria técnica para a criação de um
projeto sul-americana para a integração de infraestrutura foram alavancados por iniciativa do
governo brasileiro. Contudo, o contexto político sul-americano em que foi feito o
Comunicado de Brasília permitiu a consolidação dessas expectativas. A consolidação da
democracia eleitoral foi um feito sem precedentes na região. Naquele momento, os doze
governos sul-americanos haviam sido democraticamente eleitos nos anos 1990 e, buscando
fortalecimento diante de possibilidades de futuras ameaças ao regime democrático, os países
da América do Sul apresentaram respostas coletivas para a defesa dos princípios
democráticos.
No caso do Mercosul, isso se deu pela Declaração Presidencial sobre o Compromisso
Democrático, em 1996, por parte dos quatro membros do bloco (Argentina, Brasil, Paraguai e
Uruguai) e pelo Protocolo de Adesão de Bolívia e Chile. Mais tarde, em 1998, os seis países
subscreveram o Protocolo de Ushuaia sobre o Compromisso Democrático. Por meio desses
instrumentos, os países reconheceram a vigência de instituições democráticas como condição
indispensável para a existência e o desenvolvimento dos processos de integração, sendo que
toda alteração da ordem democrática consistiria em um obstáculo inaceitável para a
continuidade do processo de integração regional (IIRSA, 2010).
Por sua vez, a CAN produziu, em 1998, a Declaração do Conselho Presidencial
Andino, na qual se estabeleceu que o bloco se constitui por uma comunidade de nações
democráticas e que tem entre seus objetivos principais o desenvolvimento da democracia e o
respeito aos direitos humanos e liberdades fundamentais. Entre 1998 e 2000, os mandatários
dos países andinos também subscreveram o Protocolo Adicional ao Acordo de Cartagena,
denominado Compromisso da Comunidade Andina pela Democracia, o qual destaca como
condição essencial para a cooperação andina e para a integração, a vigências de instituições
democráticas (IIRSA, 2010).
Assim, inspirados nesses dois protocolos, os presidentes sul-americanos manifestaram,
em Brasília, que a manutenção do estado de direitos e o respeito ao regime democrático em
20 Considera-se, ainda, que os Estados Unidos são o maior acionista do BID, com peso de 30% no total de votos nas decisões do BID.
37
cada um dos doze países constituem compromissos compartidos e seriam essenciais para a
continuidade dos encontros regionais. Nesse sentido, a região fez progressos notáveis na
direção de uma área de paz e de um ambiente de cooperação e amizade entre os governos.
Ainda que o Comunicado de Brasília tenha acordado que a região era uma zona de
paz, a iniciativa, contudo, somente foi formalizado pouco depois, com a Declaração sobre
Zona de Paz Sul-Americana, em Guayaquil, em 2002. A ideia do Comunicado de Brasília de
que a América do Sul pode apresentar-se no cenário internacional como um ator importante
exigiu, assim, o desenvolvimento de um forte multilateralismo que fosse capaz de responder
às mudanças internacionais, visando o equilíbrio entre os direitos e os compromissos dos
países pelo desenvolvimento.
Desde a I Reunião de Presidentes Sul-Americanos em Brasília, em dez anos de
vigência da Iniciativa, foram realizadas doze cúpulas sul-americanas nas quais foi possível o
progresso para o lançamento da União de Nações Sul-Americanas (Unasul) – sob a qual
foram realizadas as últimas seis das doze reuniões presidenciais mencionais. Em 2002, a II
Reunião de Presidentes Sul-Americanos ocorreu em Guayaquil, no Equador, e a III Reunião,
em 2004, em Cuzco, no Peru. Foi na III Reunião de Presidentes Sul-Americanos que o ideal
da integração regional pôde ultrapassar o plano teórico, ingressando em um plano de ação
(ZUGAIB, 2008). Naquele momento, se assumiu o compromisso de impulsionar a
implementação de 31 projetos prioritários de infraestrutura física da IIRSA.
A partir do ano seguinte, os presidentes dos países da América do Sul passaram a se
reunir sob a égide da Comunidade Sul-Americana de Nações (Casa), primeiro em Brasília, e,
em seguida, na cidade de Cochabamba, na Bolívia, em 2006. Em 2007, foi realizada a I
Cúpula Energética Sul-Americana, na e Isla Margarita, na Venezuela. As reuniões
presidenciais foram adquirindo um crescente formato institucional que culminou na
aprovação do Tratado Constitutivo da Unasul, em Brasília, em maio de 2008. Sob a Unasul,
em 2008, os chefes e chefas de Estado se reuniram em Brasília (Brasil), Santiago (Chile) e na
Costa do Sauípe (Brasil); em 2009, em Quito (Equador) e Bariloche (Argentina); e, em 2010,
em Los Cardales (Argentina) e Georgetown (Guiana)
A partir de 2009, e com a consolidação crescente da Unasul, se inaugurou um novo
capítulo institucional. Primeiro, porque a integração física regional está, agora, dentro de uma
38
agenda mais ampla e que, necessariamente, exigirá interação com outras frentes de processos,
tanto em ordem política, como social, econômica e social. A Unasul tem delegado estas
responsabilidades aos respectivos conselhos que foram criados na instituição, entre eles o
Conselho de Infraestrutura e Planejamento (COSIPLAN), o qual será estudado no capítulo 3.
2.3 A definição de uma agenda regional consensuada
Ao longo de seus dez anos de trabalho, a IIRSA se constituiu em um dos principais
fóruns em que os doze países da região se viam representados para discutir o planejamento da
infraestrutura do território sul-americano. Pela primeira vez, a América do Sul atuou unida
para a definição de uma carteira de projetos de infraestrutura nos setores de transporte,
energia e telecomunicações. O propósito desta seção é ilustrar o trabalho realizado na IIRSA
para a identificação e seleção de projetos de integração, assim como os esforços em
harmonizar regulamentações que tenham impacto sobre a viabilidade dos mesmos. Ao mesmo
tempo, buscamos levantar quais são os fatores que tornaram possível o avanço no diálogo e na
cooperação intergovernamental.
A IIRSA se organiza em quatro níveis de decisão: O Comitê de Direção Executiva
(CDE), as Coordenações Nacionais (CN), os Grupos Técnicos Executivos (GTE) e o Comitê
de Coordenação Técnica (CCT).
As diretrizes e prioridades estabelecidas pelos governos são transmitidas à Iniciativa
por meio de um conselho de Ministros de Planejamento e de Infraestrutura, os quais compõem
o CDE. O órgão atua em matéria de coordenação de planos de investimentos, marcos
regulatórios, regulamentação institucional e financiamento. Igualmente, é responsável por
validar as propostas técnicas dos GTE e do CCT. As reuniões co CDE também têm
acontecido ininterruptamente, desde 2000, quando os Ministros de Transporte,
Telecomunicações e Energia dos doze países se encontraram em Montevidéu.
As CNs são responsáveis pela execução local do plano de ação da Iniciativa, mediante
a articulação de atividades com os diversos setores do governo nacional e atores relevantes da
sociedade. A Coordenação Nacional da IIRSA no Brasil é exercida pela Secretaria de
39
Planejamento e Investimentos Estratégicos (SPI) do Ministério do Planejamento, Orçamentos
e Gestão (MPOG)21.
A coordenação dos trabalhos e dos Grupos Técnicos (GTE, responsáveis pela
execução dos trabalhos) é responsabilidade das agências financeiras multilaterais (BID, CAF
e FONPLATA), que formam o Comitê de Coordenação Técnica (CCT). Além de encaminhar
projetos para análise para o CDE, o CCT é responsável também pela contratação de estudos e
consultorias para orientar a tomada de decisões dos governos sobre os projetos e avanços do
processo de integração física.
A estrutura institucional da IIRSA permitiu encarar uma das dificuldades para que a
Iniciativa avançasse. A interação dos representantes dos doze governos sul-americanos, com o
apoio técnico e logístico dos organismos regional, permitiu a coordenação exitosa de
múltiplos atores envolvidos no processo. Ademais desses procedimentos de interação, foi
necessário o estabelecimento de enfoques, conceitos e metodologias que facilitassem os
entendimentos sobre uma agenda complexa. Essa complexidade era derivada do caráter
multinacional, multissetorial e multidisciplinar da IIRSA.
O Plano de Ação revisado em Montevidéu previa seu desenvolvimento seria realizado
levando em consideração os Eixos de Integração e Desenvolvimentos (EIDs),
complementados com os Processos Setoriais de Integração (PSIs). Em relação ao
aperfeiçoamento da visão da IIRSA, podemos identificar três etapas bem definidas em sua
história. A primeira se estendeu desde 2000 até o fim de 2003, e foi marcada pela proposta e
discussão dos EIDs e dos PSIs, assim como na preparação das Visões de Negócios22 de cada
Eixo e no planejamento inicial dos projetos. Politicamente, esse foi um período importante
que possibilitou a identificação das sensibilidades nacionais.
Entre 2003 e 2004 pôs-se em andamento o esforço em construir consensos entre os
países em torno de uma carteira comum de projetos prioritários. Com base nas experiências
21 A Coordenação Nacional da IIRSA foi atribuída à SPI pelo Decreto de 17/09/2011, que cria a Comissão Interministerial para a Integração da Infraestrutura Regional da América do Sul. Essa Comissão é integrada por um representante dos seguintes Ministérios: do Planejamento, Orçamento e Gestão; das Relações Exteriores; dos Transportes; das Comunicações; e de Minas e Energia.
22 A Visão de Negócios de cada EID consistiu na análise do território, das atividades econômicas, dos aspectos sociais e ambientais, e dos projetos identificados como necessários e seus impactos na integração regional.
40
dos estudos metodológicos, a partir de 2005 se definiu uma segunda etapa cujo objetivo foi
produzir um salto de qualidade no planejamento territorial. Nesse momento, buscou-se
articular a infraestrutura com outras dimensões do desenvolvimento territorial, visando as
oportunidades produtivas, a preservação do patrimônio natural, considerando os impactos
sociais. Os pilares desse processo sempre fora os conceitos de Eixos de Integração e
Desenvolvimentos e os Processos Setoriais de Integração.
Um EID é um faixa territorial multinacional, um espaço geoeconômico, que inclui
certa dotação de recursos naturais, concentração populacional, áreas produtivas e serviços
logísticos. Por sua vez, um PSI tem por objetivo identificar os obstáculos de natureza
normativa e institucional que impedem o desenvolvimento e a operação da infraestrutura
básica na região, propondo ações para sua superação. Inicialmente foram propostos 12 EIDs
que, apôs discussões, foram redefinidos em 10, a partir da identificação de fluxos econômicos
atuais e potenciais, seguindo as lógicas do regionalismo aberto, da geoeconomia de facilitação
de fluxos e da formação de corredores voltados para fora da América do Sul (IPEA, 2011).
Os dez EIDs apresentados na reunião da CDE, em Santiago, em 2003, foram:
Eixo do Amazonas, cuja área se estende desde os portos do Pacífico na
Colômbia, no Peru e no Equador, até os portos brasileiros de Manaus, Belém e
Macapá;
Eixo Andino, que consiste em uma faixa desde a Bolívia, passando por
Colômbia, Equador, Peru e Venezuela, e incorpora os dois principais
corredores viais norte-sul que interligam as cidades dos cinco países;
Eixo Andino do Sul, cujo desenvolvimento foi relativamente menor, sendo
concebido, inicialmente, pela faixa fronteiriça entre a Argentina e o Chile;
Eixo de Capricórnio, cuja área abrange o entorno do trópico de mesmo nome,
envolvendo a Argentina, a Bolívia, o Brasil, o Chile e o Paraguai, tendo em
seus extremos importantes instalações portuárias, tanto no Oceano Pacífico,
quanto no Atlântico;
41
Eixo do Escudo Guianense, abrangendo a Guiana, o Suriname, a Venezuela e
regiões dos estados do norte brasileiro, ou seja, regiões com baixa densidade
populacional e alta concentração de povos indígenas;
Eixo da Hidrovia Paraguai-Paraná, definido como uma área de influência que
comporta territórios da Argentina, Bolívia, Brasil, Paraguai e Uruguai – todos
eles vinculados de modo direto aos rios Paraguai, Paraná, Tietê e Uruguai;
Eixo Interoceânico Central, que consiste em uma faixa que abrange os portos
do sul do Peru, no Oceano Pacífico, passando por regiões do Chile, Bolívia e
Paraguai, até os portos no Atlântico no sudeste brasileiro;
Eixo Mercosul-Chile, que vincula os principais centros econômicos, cidades e
portos dos territórios de Argentina, Brasil, Chile, Paraguai e Uruguai;
Eixo Peru-Brasil-Bolívia, que congrega a zona da tríplice fronteira desses
países, ligando regiões amazônicas aos portos peruanos no Oceano Pacífico;
Eixo do Sul, que abrange uma pequena faixa entre os portos do sul chileno, no
Oceano Pacífico, e os portos do sul argentino, no Oceano Atlântico.
Em relação aos PSIs, o Plano de Ação de Montevidéu estabeleceu seis deles:
instrumentos de financiamento de projetos de integração física regional; integração
energética; facilitação de passos de fronteiras; tecnologias da informação e da comunicação
(TICs); sistemas operativos de transporte aéreo; sistemas operativos de transporte marítimo; e
sistemas operativos de transportes multimodais.
Após a etapa de definição dos eixos de atuação da IIRSA, passou-se para uma fase de
ordenamento da Carteira de Projetos, que ocorreu entre os anos de 2003 e 2004 e foi realizado
por diversos GTEs. Essa etapa construiu consensos sobre a importância relativa dos grupos de
projetos que foram definidos para cada EID, uma vez que houve vinculação direta da
infraestrutura física necessária com as características produtivas, sociais e ambientais dos
territórios envolvidos. Desse modo, um primeiro resultado tangível que detectamos ao
analisar o processo de desenvolvimento da Iniciativa é a constituição, entre 2003 e 2004, da
primeira Carteira de Projetos IIRSA, resultado de profundo debate e reuniões periódicas entre
os chefes de Estado e seus ministros e esforços das equipes técnicas em detectar os aspectos e
42
as obras específicas que seriam necessárias para o desenvolvimento econômico das regiões do
continente.
Tabela 2. Composição setorial/subsetorial da Carteira de Projetos IIRSA
SETOR E SUBSETOR
Transporte Energia Telecomunicações
ProjetosInvestimentos(em milhões de
US$)Projetos
Investimentos(em milhões de
US$)Projetos
Investimentos(em milhões de
US$)
Aéreo 24 2.690,3 - - - -
Rodoviário 207 32.991,1 - - - -
Ferroviário 61 12.746,9 - - - -
Fluvial 74 2.837,4 - - - -
Marítimo 31 3.391,2 - - - -
Multimodal 15 439,7 - - - -
Passos de fronteira
39 293,5 - - - -
SETOR E SUBSETOR
Transporte Energia Telecomunicações
ProjetosInvestimentos(em milhões de
US$)Projetos
Investimentos(em milhões de
US$)Projetos
Investimentos(em milhões de
US$)
Harmonização regulatória energética
- - 1 380,4 - -
Geração de energia
- - 27 28.433,3 - -
Interconexão energética
- - 36 11.870,7 - -
Interconexão de comunicações
- - - - 9 44,7
TOTAL 451 55.390,1 64 40.684,4 9 44,7
43
FONTE: IIRSA, Carteira de Projetos 2010
Conforme demonstra a Tabela 2, a Carteira de Projetos IIRSA apresenta um elevado
número de projetos concentrados no setor de transporte e, especialmente, no subsetor
rodoviário. Por sua vez ainda que em menor número, os projetos do setor de energia
representam 12% do total de projetos da Carteira, porém, 42% dos investimentos estimados
(e, dentro desse setor, merece destaque o subsetor de geração de energia, com quase 30% do
total dos investimentos estimados da Carteira).
Cabe ainda mencionar que, na Carteira de Projetos IIRSA, predomina os projetos de
âmbito nacional (estes alcançam um total de 443 projetos, correspondendo a 83% do total de
projetos da Carteira). Em seguida, figuram os projetos de âmbito binacional (78 projetos que
correspondem a 15%) e multinacional (13 projetos que correspondem a 2%). Assim mesmo,
esses projetos de âmbito nacional estão, em sua maioria, ligados com o melhoramento das
infraestrutura de integração entre os países. Tratando-se especificamente do Brasil, esse
aspecto será estudado mais a fundo no capítulo 3. A Carteira de Projetos IIRSA passou por
sucessivas mudanças, nas quais foram se agregaram novos projetos23. Assim mesmo, em
2004, na III Reunião de Presidentes Sul-Americanos, em Cuzco, os governos aprovaram a
Agenda de Implementação Consensuada (AIC) 2005-2010, visando concentrar esforços para a
execução de 31 projetos considerados estratégicos em uma perspectiva regional. A seleção
dos projetos da AIC 2005-2010 surgiu, assim, de um processo de decisão interno de cada país
e de negociação e consenso entre os governos da região. Ao mesmo tempo em que a
integração da infraestrutura física era uma tarefa de longo prazo, a AIC buscou eleger projetos
cujo resultado concreto pudesse ser enxergado em curto prazo, para que seus impactos
estimulassem a mobilização e as expectativas políticas e sociais em torno da Iniciativa.
Tabela 3. Projetos da Agenda de Implementação Consensuada 2005-2010
Nº Projetos EID/PSI Milhões de Países Status
23 Em 2003, a Carteira de Projetos IIRSA conformava 335 projetos para a integração da infraestrutura regional, com investimentos estimados em US$ 37,4 bilhões. Em 2010, a Carteira já era composta por 524 projetos, cujo investimento estimado era de US$ 96,1 bilhões.
44
US$
1Duplicação da Rodovia 14 entre Paso de los Libres e Gualeguaychú
Mercosul-Chile
780,0 AR (BR) Execução
2Adequação do Corredor Río Branco-Montevidéu-Colonia-Nueva Palmira
Mercosul-Chile
234,0UY (AR-
BR)Execução
3Construção da Ponte Internacional Jaguarão-Río Branco0
Mercosul-Chile
35,0 BR-UYPré-
execução
4Duplicação do Trecho Palhoça-Osório (Rodovia Mercosul)
Mercosul-Chile
700,00BR (AR-
UY)Execução
5Projetos Ferroviário Los Andes-Mendoza (Ferrovia Transandina Central)
Mercosul-Chile
5.100,00 AR-CHPré-
execução
6Rodovia Internacional 60-CH (setor Valparaíso-Los Andes)
Mercosul-Chile
286,0 CH (AR) Execução
7 Gasoduto do Nordeste ArgentinoMercosul-
Chile1.000,0 AR (BO) Execução
8Construção da Ponte Binacional Salvador Mazza-Yacuiba e Centro de Fronteira
Capricórnio 23,0 AR-BOPré-
execução
9Nova Ponte Puerto Presidente Franco-Porto Meira, com Centro de Fronteira Paraguai-Brasil
Capricórnio 80,0 PY-BRPré-
execução
10Construção da Rodovia Pailón-San José-Puerto Suárez
Interocêanico Central
477,0BO (BR- CH-PE)
Execução
Nº Projetos EID/PSIMilhões de
US$Países Status
11Anel Ferroviário de São Paulo (Trechos Norte e Sul)
Interoceânico Central
850,0 BRPré-
execução
12Passagem de Fronteira Infante Rivarola-Cañada-Oruro
Interoceânico Centraç
2,0 BO-PY Execução
13Construção da Rodovia Cañada Oruro-Villamontes-Tarija-Estación Abaroa (1ª Etapa)
Interoceânico Central
49,0 BO (PY) Execução
14 Rodovia Toledo-PisigaInteroceânico Central
95,0 BO (CH) Execução
15Pavimentação e melhoramento da Rodovia Iquique-Colchane
Interoceânico Central
42,0 CH (BO) Execução
16 Recuperação do Trecho El Sillar Interoceâni 120,0 BO (CH, Pré-
45
co Central PE) execução
17Centro Binacional de Atendimento de Fronteira Desaguadero
Andino 7,5 BO-PEPré-
execução
18Passagem de Fronteira Cúcuta-San Antonio Del Táchira
Andino 2,0 CO-VE Perfil
19Melhoramento da Navegabilidade do Rio Meta
Andino 108,0 CO-VE Execução
20Corredor viário Tumaco-Pasto-Mocoa-Puerto Asis
Amazonas 373,0 CO Execução
21Rodovia Paita-Tarapoto-Yurimaguas, Portos e Centros Logísticos
Amazonas 681,2 PE (BR) Execução
22Rodovia Lima-Tingo María-Pucallpa, Portos e Centros Logísticos
Amazonas 1.351,3 PE (BR) Execução
23 Porto Francisco de Orellana Amazonas 105,3 EQPré-
execução
24Pavimentação Iñapari-Porto Maldonado-Inambari, Inambari-Juliaca/Inambari-Cuzco
Peru-Brasil-Bolívia
1.384,3 PE (BR) Execução
25 Ponte sobre o rio AcrePeru-
Brasil-Bolivia
12,0 BR-PE Concluído
26Rodovia Boa Vista-Bonfim-Lethem-Georgetown (1ª Etapa: estudos)
Escudo das Guianas
3,3 GY-BR Execução
Nº Projetos EID/PSIMilhões de
US$Países Status
27 Ponte sobre o rio TakutuEscudo das
Guianas10,0 GY-BR Concluído
28Rodovia Venezuela (Ciudad Guayana)-Guiana (Georgetown)-Suriname (Paramaribo) (1ª Etapa)
Escudo das Guianas
0,8 VE-GY-SU Perfil
29Melhoramentos na Vi Nieuw Nickerie-Paramaribo-Albina e Travessia Internacional sobre o rio Marowjine
Escudo das Guianas
105,0 SU-GY Execução
30Exportação por Envios Postais para Pequenas e Médicas Empresas
TICs 5,0 Regional Execução
31Implementação do Acordo de Roaming na América do Sul
TICs 1,3 Regional Execução
46
FONTE: IIRSA. Carteira de Projetos 2010.
Nota: Entre parêntesis identifica-se o(s) país(es) vizinho(s) influenciado(s) pelo projeto.
Esse espaço regional de coordenação criado pela IIRSA fomentou a cooperação entre
os países, sendo o principal exemplo o projeto da AIC Exportação por Envios Postais para
Pequenas e Médias Empresas, que busca promover a inserção dessas empresas no mercado
internacional por meio de um processo de exportação simplificado e com custos reduzidos
usando da plataforma logística dos correios nacional. Em um primeiro momento, foi feita a
adaptação da experiência brasileira do programa “Exporta Fácil” que, desde seu lançamento,
em 1999, proporcionou um aumento de 15% da base exportadora, sendo utilizado por cerca
de 25 mil empresas, exportando para mais de 190 países mais de 800 tipos de produtos.
A importância estratégica da AIC e da seleção de projetos que a formaram consistiram
em um “ponto de ruptura” na implementação da Iniciativa, uma vez que, segundo o Relatório
de Avaliação da AIC24, esta (i) propôs o estabelecimento de uma agenda de implementação
consensuada dos projetos IIRSA que, além de se tornar um marco simbólico e político desta
nova etapa da Iniciativa, permitiu acelerar a obtenção de resultados concretos em projetos de
alto impacto para a integração física continental; (ii) definiu um conjunto limitado de projetos,
o que ampliou a possibilidade de sua execução, já que facilitaria o estabelecimento de
prioridades por parte dos governos; e (iii) buscou estabelecer prioridades nos planos e
orçamentos nacionais, assim como nas atividades das agências financeiras, na estruturação de
esquemas de Parceria Público-Privada e na atração do setor privado para os projetos da
IIRSA.
Em suma, a organização institucional adotada para a IIRSA tem sido eficaz para a
construção de consensos políticos, assim como para reduzir as falhas de coordenação entre os
governos sul-americanos em relação aos temas da integração física. Sem dúvidas, como todo
processo institucional, a IIRSA ainda apresenta limitações a superar, no entanto, é indiscutível
seu caráter inovador e sua força operacional para a identificação das necessidades da região.
24 Relatório de Avaliação da Agenda de Implementação Consensuada2005-2010. p. 14.47
3 A ATUAÇÃO ESTRATÉGICA DO BRASIL NA INTEGRAÇÃO DA
INFRAESTRUTURA FÍSICA REGIONAL
A ideia de avançar na questão de investimentos em infraestrutura e na integração dos
sistemas de infraestrutura da região não é nova para a diplomacia brasileira que,
historicamente, a vê como parte necessária do processo de integração econômica e da
expansão do comércio exterior brasileiro sobre a América do Sul (IGLESIAS, 2008).
As ações desenvolvidas pelo governo brasileiro se mostraram fundamentais para a
evolução das etapas pelas quais a IIRSA passou, considerando desde a proposição de estudos
técnicos, a convocação de reuniões entre líderes dos doze países sul-americanos, as propostas
48
organizacionais da IIRSA e o relacionamento com as instituições financeiras multilaterais
(IMF) que apóiam formalmente a Iniciativa: BID, CAF e FONPLATA.
Os investimentos efetuados no âmbito da IIRSA têm um impacto substancial nas
economias da região e contribuem para elevar os níveis de competitividade e de
desenvolvimento social, criando novas oportunidades para as populações (IIRSA, 2010). O
reflexo do objetivo fundamental de melhor a infraestrutura física que conecta os países sul-
americanos consistem em implicações sociais importantes. Uma infraestrutura melhor é uma
ferramenta para a geração de novas oportunidades para as populações nas áreas mais pobres e
isoladas, facilitando sua integração à economia regional.
Neste capítulo, buscamos apresentar em que medida a diplomacia brasileira logrou a
internalizar dos aspectos fundamentais da IIRSA nos programas de desenvolvimento
econômico e social brasileiro e como buscou orientar os mecanismos institucionais do Estado
e a sociedade brasileira para a realização dos projetos e idéias da Iniciativa. No primeiro
momento, analisamos a inclusão de obras da Carteira de Projetos IIRSA na pauta de projetos
de infraestrutura nacionais e como a conjuntura regional também foi essencial para a
definição de projetos de infraestrutura nacionais não orientados à integração. Logo após,
expomos breves considerações sobre as questões sociais e ambientais, postas como alvos de
desenvolvimento da IIRSA. Em seguida, destacamos o apoio do financiamento público aos
projetos de infraestrutura regional como modo de alavancar a atuação das grandes empresas
brasileiras das áreas de serviços de engenharia e fabricantes de materiais e equipamentos para
construção na América do Sul. Por fim, apresentaremos brevemente a nova configuração da
agenda de integração da infraestrutura física regional e a atuação do Brasil já no governo de
Dilma Rousseff.
3.1 A convergência entre o planejamento brasileiro de desenvolvimento territorial e a
IIRSA
49
A construção de um espaço sul-americano integrado não consistia em uma estratégia
bem definida para o regionalismo aberto característico dos anos 1990. Mudanças efetivas,
contudo, ocorreram a partir de 2000, quando os doze presidentes sul-americanos se reuniram
em Brasília e as discussões em torno da construção de um projeto sul-americano de integração
física tiveram como resultado a criação da IIRSA.
A IIRSA, com um mandato inicial de dez anos, se constituiu em um mecanismo
institucional de coordenação das ações intergovernamentais dos países sul-americanos,
inspirada no princípio de que a integração da infraestrutura regional promoveria a criação de
um espaço privilegiado de cooperação para o desenvolvimento socioeconômico sustentável.
Em cumprimento ao Comunicado de Brasília, os ministros de Transporte, Energia e
Telecomunicações dos doze países elaboraram um plano de ação para a integração de
infraestrutura regional, no qual ganhou ênfase os Eixos de Integração e Desenvolvimento
(EIDs), baseados na aplicação da Metodologia de Planejamento Territorial Indicativo.
Iglesias (2008) defende a ideia de que o investimento em infraestrutura e a integração
dos sistemas de infraestrutura da região são, para a diplomacia brasileira, uma das partes
necessárias para o processo de integração econômica e expansão das exportações brasileiras
no continente. Motivada pela relativa ausência de conexões em termos de transportes e de
comunicações, a própria IIRSA foi resultado de ideias originadas da diplomacia e dos
funcionários da área de planejamento do governo brasileiro. E, de igual modo, o autor aponta,
que o lançamento da Comunidade Sul-Americana de Nações, com forte ênfase na integração
de infraestrutura, contou com a ação mais pró-ativa do governo brasileiro.
O conceito de Eixos de Integração e Desenvolvimento, desenvolvido a partir das
idéias de Eliezer Batista, ex-presidente da Companhia Vale do Rio Doce e ex-ministro de
Minas e Energias durante o governo de João Goulart, descritas no livro Infraestrutura para o
Desenvolvimento Social e Integração na América do Sul, foi um dos subsídios para a
elaboração do Plano Purianual (PPA) do governo federal para os períodos de 1996-1999 e
2000-2003 (IPEA, 2011), que resultou em uma carteira de oportunidades para os
investimentos públicos e privados, ações coordenadas com diversos setores de infraestrutura e
também projetos e ações de desenvolvimento social, ambiental e de informação25 (IGLESIAS,
25 Em 1997, o governo brasileiro contratou diversos estudos para a identificação dos eixos de integração e desenvolvimento no Brasil. Esses estudos revisaram a rede de infraestrutura econômica do país com o objetivo de verificar as regiões onde havia desequilíbrios entre a demanda e a oferta de
50
2008). Para Couto (2006), a IIRSA representaria, assim, a tentativa brasileira de expandir esta
metodologia de planejamento territorial para toda a região.
Como Zugaib aponta:
Há uma correlação entre os princípios básicos que fundamentam os eixos de integração e desenvolvimento nacional e aqueles traçados para alcançar a integração em escala continental. Esses princípios básicos norteiam a escolha dos projetos de infraestrutura que mais contribuem para aumentar a eficiência e a sustentabilidade do desenvolvimento econômico (ZUGAIB, 2006).
E, ainda, para José Paulo Silveira:
Um eixo de desenvolvimento não é um corredor de transportes, mas um espaço geoeconômico, onde existem demandas e oportunidades que devem ser satisfeitas mediante ações integradas. Tais ações devem ser realizadas nos campos da infraestrutura econômica (transportes, energia, telecomunicações, recursos hídricos), desenvolvimento social (educação, saúde, moradia), informação e conhecimento (qualificação profissional, desenvolvimento tecnológico, difusão e acesso à informação), além de gestão ambiental (SILVEIRA, 2001).26
Nesse sentido, Tavares de Araujo (2009) afirma que os projetos da IIRSA foram
escolhidos através de cinco parâmetros principais, os quais sejam: a adequação dos
investimentos aos ecossistemas de cada região; os impactos transnacionais; a
complementariedade entre os projetos organizados em torno de um projeto âncora; as
sinergias resultantes da interação direta e indireta entre os eixos; e a geração de oportunidades
de emprego e renda para os habitantes locais.
O autor destaca ainda que 60% dos projetos da Carteira de Projetos IIRSA “são
empreendimentos nacionais cujos impactos afetam os países vizinhos, em virtude dos critérios
de seleção referidos anteriormente.” Grande parte dos demais projetos consiste em operações
binacionais para a construção de pontes, túneis, passagens de fronteira, transmissão de
energia, eclusas, hidrovias, ferrovias e rodovias. O Brasil, por exemplo, está envolvido
diretamente em apenas seis dos projetos identificados na AIC, contudo, executa também
outros 34 projetos da IIRSA por meio do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC),
conforme relata a Tabela 4. Segundo Tavares de Araújo, isso se deve ao fato do PAC somente
diversos componentes dessa infraestrutura.
26 MINISTÉRIO DO PLANEJAMENTO. “Eixos da América do Sul impulsionarão desenvolvimento”. 08/10/2011.
51
ter sido lançado em janeiro de 2007, de modo que esses projetos adicionais não consistiam em
projetos prioritários em 2004, quando foi consensuada a agenda de 31 projetos prioritários da
IIRSA.
O PAC organizou seus projetos e ações em três setores: infraestrutura logística,
infraestrutura energética e infraestrutura social e urbana. Sua principal ênfase é na conclusão
de projetos já em execução e na recuperação da infraestrutura existente. Para o período de
2007 a 2010, o PAC tinha investimentos estimados na ordem de US$ 252 bilhões. Mais de
50% do total de investimentos estimados do PAC seria destinado a projetos de infraestrutura
energética, basicamente na área de petróleo e gás natural e na geração de energia. Os projetos
de infraestrutura social e urbana representavam 34% desse total, e as obras logísticas
aproximadamente 12%. Essa atuação em projetos de energia reflete, em primeiro lugar, a
preocupação brasileira de que o crescimento econômico e a falta de investimentos na geração
de energia produzissem uma crise elétrica semelhante a que ocorreu em 2001. Em segundo
lugar, esta preocupação também foi estimulada pela crise com a Bolívia, buscando fontes
domésticas de gás. Em terceiro lugar, há uma necessidade crescente de investimentos na
exploração de petróleo no país (IGLESIAS, 2008).
Essa necessidade de investimentos na infraestrutura doméstica não se apresenta como
uma contradição à infraestrutura de conexão que o Brasil desenvolve com seus vizinhos no
âmbito da IIRSA. Considerando os projetos de logística, os dois eixos de atuação – doméstico
e regional – podem ser complementares. O crescente investimento do PAC concentrado no
setor de energia resulta, em parte, das próprias dificuldades da integração energética na região
– obrigando a Petrobrás a focar em seus projetos de geração de energia hidroelétrica no Brasil
(IGLESIAS, 2008).
Tabela 4. Projetos da IIRSA no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC)
Rodovias e Pontes
FerroviasPortos e
AeroportosHidrovias Energia Total
Amazonas 2 - 1 - - 3
52
Capricórnio 2 2 1 - - 5
Escudo Guianense 2 - - - - 2
Hidrovias Paraguai-Paraná - 1 - 2 - 3
Interoceânico Central 3 - 1 - - 5
Mercosul-Chile 9 - 6 - - 15
Peru-Brasil-Bolívia - - - - 2 2
Total 18 3 9 2 2 34
Fonte: Ministério do Planejamento. Elaboração: TAVARES DE ARAUJO (2009).
Pelos dados apresentado na Tabela 4, identificamos que o PAC confere importância
especial ao Eixo de Capricórnio (o qual abrange também Argentina, Paraguai, Bolívia e
Chile) e ao Eixo Mercosul-Chile, sendo que cinco projetos, de um total de sete nos quais o
Brasil participa no Eixo de Capricórnio, estão incluído do PAC. O principal foco brasileiro
nesse eixo consiste em obras do setor de transporte no estado do Paraná, tais como o aumento
da capacidade do Porto de Paranaguá, a construção do anel viário de Curitiba e a construção
de uma nova ponte na fronteira do país com o Paraguai, para descongestionar o fluxo da Ponte
da Amizade.
Em relação ao Eixo Mercosul-Chile, dos 24 projetos da IIRSA em que há participação
brasileira, 15 estão incluídos no PAC e também consistem, essencialmente, em obras do setor
de transporte (como rodovias, portos e aeroportos), tais como o trecho sul do anel viário de
São Paulo, adaptações nos aeroportos de Campinas e Guarulhos e no porto de Itajaí.
3.2 O desafio do desenvolvimento socioambiental sustentável
O tema da sustentabilidade ambiental tem permeado as instituições, as políticas
públicas e as opiniões de diversos atores locais na América do Sul. No Brasil, os EIDs da
IIRSA cruzam áreas onde estão concentradas as maiores reservas naturais do país, em matéria
de minérios, recursos energéticos e biodiversidade. Assim, ainda que a região amazônica não
53
seja a área do país onde estão localizados os fluxos de comércio e populacionais mais densos,
torna-se estratégica a discussão sobre as ações que o governo brasileiro tem empreendido na
região em questão de infraestrutura de integração regional.
Dos quatro EIDs que recortam a Amazônia, três tem sua expansão rumo ao Pacífico
(Eixo Andino, Eixo Amazônico e Eixo Peru-Brasil-Bolívia), e apenas um rumo ao Caribe
(Eixo do Escudo Guianense), o que evidencia o fato de que a integração regional da
infraestrutura física liderada pelo Brasil possui objetivos estratégicos de inserção econômica
internacional, alcançando com precisão os portos do Pacífico no Peru, no Equador e na
Colômbia (SENHORAS & GUZZI, 2009).
No eixo do escudo das Guianas, o objetivo econômico das obras se divide entre o escoamento de produtos oriundos da Zona Franca de Manaus com destino anos mercados consumidores da América do Norte e Europa, por meio do Mar do Caribe, e a utilização de recursos naturais e o aproveitamento do potencial hidrelétrico. Na projeção entre a Amazônia e o Pacífico, os eixos Peru-Brasil-Bolívia, Amazônico e Andino buscam dois objetivos geoeconômicos (...) a expansão do continente rumo ao Oceano Pacífico por meio da cooperação interestatal logística em transportes fluviais e rodoviários para o escoamento de commodities agrícolas e minerais [e] (...) a busca pela construção de redes energéticas desde essas regiões, findando abastecer as áreas centrais industrializadas do continente (SENHORAS & GUZZI, 2009).
No entanto, especialmente na região amazônica, onde os impactos dos projetos da
IIRSA afetam comunidades indígenas, populações tradicionais e ribeirinhas em 137 Unidades
de Conservação, a Iniciativa apresenta um risco potencial negativo em virtude das “ricas
zonas de biodiversidade e história pré-colombiana”, provocando o aumento de conflitos
sociais - ocasionados pelas migrações, grilagem, conflitos de terra e concentração fundiária ao
longo das redes logísticas e transporte – e ambientais – com o aceleramento do desmatamento
direto induzido pela construção de usinas hidrelétricas, rodovias, ferrovias e instalações de
fibras óticas, entre outras obras de infraestrutura, além da expansão da fronteira agrícola.
A afirmação de Senhoras e Guzzi (2009) é que falta à IIRSA e também aos projetos da
Iniciativa que incorporaram os Planos Plurianuais brasileiros uma “concepção estratégica da
gestão ampliada do meio ambiente”, pois têm se evidenciado limitações quanto ao
monitoramento dos impactos ambientais dos projetos (especialmente aqueles ligados à
integração da Amazônia e do Pacífico) e a falta de consideração sobre a conservação
54
histórico-cultural e ambiental das localidades por onde perpassam as redes logísticas e
energéticas, fazendo as promessas de desenvolvimento, geração de emprego e
competitividade somente um mote do governo.
Especialmente a geração de energia hidrelétrica na Amazônia é complexa devido aos
impactos socioambientais das usinas. O Complexo Hidrelétrico do Rio Madeira, por exemplo,
incluso no Eixo Peru-Brasil-Bolívia, cuja construção está a cargo do consórcio formado pela
empresa estatal Furnas e pela construtora Odebrecht, orçada em US$ 12, 5 bilhões, é
composto por quatro hidrelétricas, sendo duas delas localizadas em Rondônia (usinas de Santo
Antônio e Jirau), próximas à fronteira com a Bolívia.27 Juntas, essas duas hidrelétricas têm
previsão de inundação de uma área de 529 km², o que acarretará no deslocamento da
população diretamente afetada, dando início a um processo de ocupações desordenadas.
Já nos estudos de impacto ambiental das represas de Santo Antônio e Jirau, foram
identificados impactos que afetariam os peixes, a fauna, a flora e a ameaça de propagação de
uma série de doenças tropicais entre a população, não somente no Brasil, mas no Peru e na
Bolívia também. Essa população, que geralmente já se encontra em precárias condições
econômicas e sociais, cria expectativas fomentadas pelo governo de geração de emprego,
contudo, com o início das obras, o que se percebe é o início de conflitos entre a população
local e os trabalhadores que se direcionam para a região em caráter temporário, pois esse
deslocamento afeta a demanda regional de bens, de serviços públicos, de habitações, ademais
do acúmulo de resíduos sólidos. Assim, as áreas protegidas passam a apresentar um alto grau
de vulnerabilidade por parte de novas atividades econômicas não-sustentáveis e necessidade
de migrações, principalmente em relação ao aumento da atividade madeireira e ao avanço do
desmatamento.
Desse modo, os projetos de infraestrutura para a integração da região amazônica
brasileira com seus vizinhos do norte apresentam um caráter estratégico para esse conjunto de
países, contudo, as estratégias para sua implementação nem sempre são as mais adequadas
socialmente e ambientalmente tendo em vista as comunidades locais impactadas pelas obras.
O que se observa nesse aspecto (e que será melhor definido na seção seguinte), é um forte
27 As outras duas represas que compõe o Complexo Hidrelétrico do Rio Madeira são a Cachuela Esperanza, localizada em território boliviano e que se encontra em fase de estudos, e a Guajará-Mirim, também em fase de estudos iniciais, está localizada em águas binacionais Brasil-Bolívia (IIRSA, 2009).
55
lobby de grandes grupos privados nacionais que executam as diversas obras de energia
elétrica e transporte rodoviário que passam por territórios ricos em biodiversidade ou por
reservas indígenas (no caso da Amazônia), o que compromete o desenvolvimento ambiental e
social sustentável em detrimento da ampliação do capital de um grupo seleto (SENHORAS &
GUZZI, 2009).
3.3 Motivações e incentivos à participação do setor privado brasileiro na integração da
infraestrutura regional
Esta seção tem como objetivo avaliar em que medida o movimento de investimentos
diretos realizados pelas empresas construtoras brasileiras em âmbito regional para os projetos
de infraestrutura tem contribuído para o processo de integração regional, apresentando
também as percepções do setor privado brasileiro composto pelas empresas exportadoras e
usuários da infraestrutura e dos serviços logística na região. Assim, claramente percebe-se
uma clivagem de posicionamento do setor privado brasileiro. De um lado, aponta-se à
“razoável distância entre as agendas dos setores público e privado no que tange à integração
física e logística da América do Sul” (SENNES; MENDES 2008), quando tratamos das
empresas usuárias da infraestrutura, e, de outro, a participação ativa das construtoras brasileira
na implantação da infraestrutura de transportes e energia (SARTI & HIRATUKA, 2001;
IGLESIAS, 2008; ANTUNES, 2007).
Iglesias (2008) aponta que o interesse brasileiro na integração da rede de transporte e
de energia não se limita somente à abertura de corredores de exportação. O Brasil é o país da
região que possui as grandes empresas da área de serviços de engenharia e conta com os
setores industriais de bens de capital e de equipamentos e materiais de construção
relativamente desenvolvidos, sendo os projetos regionais a grande alternativa que as empresas
brasileiras de serviços de engenharia e de equipamentos e materiais de construção para
contornarem as restrições ao investimento público e privado que existem no mercado
doméstico.
56
Em seu estudo sobre os interesses brasileiros na integração de infraestrutura na
América do Sul, Iglesias mapeou as principais multinacionais brasileiras e identificou que
dessas, sete estão relacionadas ao setor de serviços de engenharia, construção e materiais de
construção; três são empresas de engenharia e construção (Odebrecht, Andrade Gutierrez e
Queiroz Galvão); duas atuam no ramo do cimento (Votorantim e Camargo Correa) e outras
duas atuam na área de insumos para a construção (Gerdau e Tigre).
Sarti e Hiratuka (2011) utilizam o nível de distribuição geográfica de seus
investimentos para avaliar a importância dos países da região nas estratégias de
internacionalização das empresas brasileiras. Dados levantados por um estudo da Fundação
Dom Cabral, em conjunto com a Columbia University, em 2007, apresentam o índice de
distribuição regional dos investimentos das vinte maiores multinacionais brasileiras. Entre as
empresas já citadas anteriormente, percebe-se grande concentração de atuação das seguintes
empresas na América Latina: Andrade Gutierrez (88%), Tigre (86%), Gerdau (73%),
Camargo Corrêa (67%), Odebrecht (58%) e Votorantim (25%).
As empreiteiras brasileiras têm participado ativamente da implantação da
infraestrutura de transporte e energia na América do Sul, e são referências nos planos
tecnológico, financeiro e de gestão empresarial. Segundo aponta Antunes (2007), em estudo
da CEPAL, a construção de infraestrutura pelas empresas brasileiras tem também a vantagem
de contar com o apoio do BNDES (ponto que será analisado na próxima seção). Essas ações
empresariais em países da região contribuem também para a expansão dos mercados de
consumo para produtos brasileiros, uma vez que, para obter financiamento público, exige-se
uma cota mínima de produtos nacionais nas obras no exterior.
As obras da IIRSA representaram uma importante oportunidade para as construtoras
brasileiras no exterior e, desde os anos 1990, já havia uma estreita relação entre as
empreiteiras brasileiras e o corpo diplomático do país28. A Odebrecht, a Andrade Gutierrez, a
Queiroz Galvão e a Camargo Corrêa estão envolvidas no ambicioso projeto da Rodovia
Interoceânica, a qual, quando concluída, terá 2.586 km, e ligará os portos de Ilo e Matarani,
no sul do Peru, ao Oceano Atlântico, no Brasil.
28 FOLHA DE S. PAULO. Diplomacia brasileira ajudou empreiteiras.18/09/2011.57
A Odebrecht também participa de outros projetos no Peru, tais como uma rodovia de
955 km que o Porto de Paita, no Oceano Pacífico, ao Porto de Yurimaguas, no Rio Huallaga;
na Argentina (gasodutos) e Venezuela. A Andrade Gutierrez presta serviços de construção no
Peru (túneis, usinas, portos), na Bolívia (trechos rodoviários), no Equador (oleodutos, pontes,
rodovias) e na Colômbia (ferrovias).
Em relatório sobre a integração regional e a IIRSA, por meio de entrevistas com
representantes do setor privado e público, a Prospectiva Consultoria identificou “uma
perspectiva negativa quando abordado o tema da convergência entre os acordos de integração
regional e as prioridades do setor privado” e que “embora haja alguma interlocução com o
setor privado, esta é limitada”, uma vez que o governo estabelece maior diálogo com as
grandes empreiteiras nacional, é receptivo à identificação das necessidades das demais
empresas, porém não converte esse conhecimento em ações. Converge com os resultados
desse estudo, a análise que Iglesias faz junto a representantes empresariais e que aponta certa
preocupação sobre a estratégia da IIRSA concentrar seus projetos de transporte no setor
rodoviário, tendo em vista que este não é o modal de transporte de cargo mais eficiente e
barato – além, é claro, das estradas serem indutoras de um processo de desmatamento.
A IIRSA, por se constituir em um projeto de integração física, ou se infraestrutura
hard, não congrega aspectos de integração regulatória (infraestrutura soft) para os serviços de
logística que utilizarão da estrutura de transportes construída. Segundo o mesmo estudo da
Prospectiva Consultoria, isso se deve ao fato da dificuldade de mobilização dos atores e
instâncias envolvidos nas questões regulatórias, sendo mais rentável em curto prazo, menos
propenso a gerar oposição política e mais fácil a mobilização de interesses de grupos privados
específicos – as construtoras.
Vitte (2009) afirma que, além das construtoras brasileiras, há grandes empresas
interessadas também em promover outros projetos da Carteira IIRSA, como os empresários
do agronegócio, especialmente as empresas dos setores de alimentos e grãos (como a Cargill,
a Louis Dreyfus, a Archer Daniels Midland e a Bunge) e de sementes transgênicas (como a
Monsanto) interessados nos projetos hidroviários, principalmente as obras de hidrovia
Paraguai-Paraná. O principal objetivo desses empresários é a redução dos custos para que
suas cargas cheguem aos portos do Pacífico, no Chile ou no Peru.
58
Ademais, Couto (2008) destaca o papel ativo de três das grandes empreiteiras
brasileiras na integração da infraestrutura da América do Sul: a Odebrecht, a Camargo Correa
e a Andrade Gutierrez. Essas empresas se constituíam em holdings e diversificaram seus
negócios, inclusive na América do Sul.
Além da área de engenharia, a Odebrecht é o maior grupo petroquímico da América ao controlar a empresa Braskem, e prevê investimentos bilionários nos próximos anos em sua subsidiária ETH Bioenergia, voltada para a produção de etanol da cana-de-açúcar. Já a Camargo Correa tem sua própria fábrica de cimento e controla a Alpargatas Calçados (Havaianas, Rainha, Topper, Timberland e Mizuno), é acionista da Siderúrgica Usinminas, da concessionária de energia do estado de São Paulo CPFL e ainda da Companhia de Concessões Rodoviárias, controladora da Dutra (RJ-SP) e no Paraná, totalizando 1452 km em concessões rodoviárias. A Andrade Gutierrez não fica atrás: também é acionista da Companhia de Concessões Rodoviárias; da prestadora de serviços de energia Light; controla a empresa de telecomunicações Telemar (que engloba também a Oi Celulares) e terá a concessão do aeroporto de Quito, no Equador, ainda em construção (COUTO, 2008).
Ainda, é importante destaca o papel do Grupo Eletrobrás nos projetos de construção de
complexos hidrelétricos e hidroviários na região, os quais favorecem as principais empresas
mineradoras na região da Amazônia, cujos principais gastos decorrer dos custos com energia
elétrica. A Petrobrás, após a abertura de seu capital, também tem expandido sua atuação na
América do Sul.
Segundo Couto (2008), a IIRSA e seu foco em construir rodovias, portos e
hidrelétricas nos países da América do Sul consiste, assim, na reprodução, em escala regional,
do modelo de infraestrutura que essas grandes empresas já desenvolveram no Brasil em
décadas anteriores.
3.4 O financiamento público aos projetos de infraestrutura regional e o papel do BNDES
A América do Sul se constitui em um dos principais destinos das exportações
brasileiras de bens e serviços com alto valor agregado, ademais de ser também uma das
prioridades da política externa brasileira para a integração física e econômica da região, em
59
setores como transporte e energia. O apoio com financiamento público foi importante para a
internacionalização das empresas brasileiras de serviços de engenharia no passado e
atualmente ainda é muito relevante (IGLESIAS, 2008). Como instituição pública a serviço
dos interesses comerciais e econômicos brasileiros, Alves (2005) afirma que o BNDES
adquiriu aspectos institucionais próprios, diferentemente das instituições privadas que prezam
pelas garantias aos seus recursos, pela viabilidade e pelo retorno financeiro de seus
empréstimos.
Um banco como o BNDES pode suportar financiamento de longo prazo em condições
competitivas. Na segunda metade dos anos 1990, estruturou um sistema de financiamento à
exportação, com diversas linhas e condições. Convocado pelo governo brasileiro para
financiar os projetos de caráter integracionista na América do Sul, os recursos do banco têm
sido aplicados para fomentar as exportações de produtos e serviços brasileiros para os
vizinhos, não apoiando, necessariamente, os projetos de integração regional.
A partir de 2003, o BNDES incorporou em sua missão o objetivo estratégico de atuar
como órgão financiador da integração da América do Sul, financiando as exportações de bens
e serviços brasileiros, os investimentos diretos brasileiros e a integração da infraestrutura
regional (DEOS & WEGNER, 2010). As operações do BNDES para o financiamento das
obras de infraestrutura no exterior são concebidas como operações de exportação de serviços
de engenharia, na modalidade de financiamento pós-embarque e, no caso desses serviços, para
que o financiamento seja realizado, é necessário o cumprimento de certos requisitos.
Basicamente, as exportações brasileiras de bens a serem incorporados ao projeto devem ser
de, no mínimo, 35% do valor do financiamento (IGLESIAS, 2008).
Nesse sentido, o Convênio de Pagamentos e Créditos Recíprocos (CCR) da
Associação Latino-Americana de Integração (ALADI) tem cumprido um importante papel na
viabilização de financiamento aos investimentos necessários. Em termos gerais, o CCR é um
mecanismo subscrito pelos bancos centrais de doze países da América Latina29 e, por meio
dele, são cursados e compensados os pagamentos derivados do comércio intrarregional. Os
financiamentos aos projetos de infraestrutura cursados no âmbito do CCR consistem,
essencialmente, no apoio do governo brasileiro às exportações de bens e serviços para países
29 Argentina, Bolívia, Brasil, Colômbia, Chile, Equador, México, Paraguai, Peru, República Dominicana, Uruguai e Venezuela.
60
da América do Sul. O CCR se apresenta como um fator relevante nessa estruturação de
garantias dos financiamentos brasileiros para a região, uma vez que, segundo dados
publicados na Revista BNDES, 72% dos US$ 3 bilhões desembolsados pelo BNDES em
financiamentos para países da América do Sul, entre 1997 e 2007, contaram com o CCR
como instrumento mitigador de riscos. A relevância do BNDES no processo de integração
regional da América do Sul é visível em virtude de sua capacidade de investimento e por suas
relações com o BID e com a CAF, sendo uma das formas que o governo brasileiro tem
utilizados nos últimos anos para ampliar a influência do país na região, uma vez que a atuação
da instituição deixou de limitar-se somente ao território nacional (SILVA, 2004).
Como aponta o mesmo estudo, em 2007, o Brasil foi credor do CCR com todos os
países, à exceção do Chile, sendo o principal fator a utilização do convênio pelo Brasil para
operações de exportações financiadas. Sendo uma importante fonte de financiamento para
projetos de infraestrutura na região, o governo brasileiro dispõe de linhas de financiamento
através do próprio BNDES e do Proex Financiamento, operado pelo Banco do Brasil. Em
2007, segundo o BNDES, 99% dos US$ 490 milhões liberados pelo banco em financiamentos
para a América Latina destinaram-se a projetos de infraestrutura, sendo que, 92% foram
cursado no CCR.
Entre 1997 e 2007, o Equador foi o país sul-americano que mais utilizou o CCR em
suas operações com o BNDES – 99% do total -, seguido por Paraguai (94$), Bolívia (88%),
Argentina (81%) e Peru (77%). A Venezuela, contudo, que apresenta baixo índice de
utilização do CRR no período analisado (somente 28%), atingiu, em 2007, 100% de utilização
nas suas operações com o BNDES.
No que se refere ao BNDES, sua carteira de operações destinadas a projetos de infraestrutura na América do Sul tem crescido fortemente, somando cerca de US$ 11 bilhões entre operações contratadas e em perspectiva, para investimentos da ordem de US$ 24 bilhões em projetos para construção de rodovias, pontes, hidrelétricas, gasodutos, linhas de transmissão, aeroportos, hidrovias, portos, ferrovias e sistemas de transporte urbano (metrô e ônibus) (RÜTTIMANN & KOBLITZ, 2008).
Na Tabela 5, apresentamos os projetos de infraestrutura que são financiados pelo
BNDES.
61
Tabela 5. Projetos financiados pelo BNDES na América do Sul – Exportação de serviços
de engenharia e outros
País/Projetos Financiamento em US$
ARGENTINA 516.000.000
TGS – Gasoduto San Martín 200.000.000
TGN – Gasoduto Norte 37.000.000
Albanesi – Gasodutos 279.000.000
CHILE 208.000.000
Ampliação do Metrô de Santiago 208.000.000
COLÔMBIA 28.000.000
Transmilenio 28.000.000
País/Projetos Financiamento em US$
EQUADOR 511.565.000
Aviões Embraer para TAME 61.600.000
Hidroelétrica San Francisco 242.965.000
Irrigação Manabi 113.000.000
Irrigação Tabacundo 64.000.000
Rodovia Iteroceânica 30.000.000
PARAGUAI 77.000.000
Rota 10 77.000.000
URUGUAI 29.000.000
Linha de transmissão UTE 3.000.000
Irrigação Maldonado 26.000.000
VENEZUELA 326.400.000
Hidroelétrica La Vueltosa 121.000.000
Linha 4 – Metrô de Caracas 107.500.000
62
Linha 3 – Metrô de Caracas 78.000.000
Modernização Prod. Maíz y Ganado / Fondafa II
19.900.000
Total 1.695.965.000
FONTE: BNDES (2005).
Como é possível observar na Tabela 5, nem todos os projetos financiados pelo
BNDES consistem em projetos para a integração da infraestrutura entre os países da América
do Sul. O banco tem financiado também projetos específicos de infraestrutura em seus
vizinhos, tais como as obras no metrô de Caracas e no metrô de Santiago, os quais não
pertencem à Carteira de Projetos IIRSA.
Em 2003, o BNDES, em parceria com a CAF, apresentou durante o I Seminário
Internacional de Co-Financiamento BNDES/CAF, realizado no Rio de Janeiro, 22 projetos a
serem executados no âmbito da IIRSA. Entre esses projetos destacavam-se obras com grandes
impactos socioambientais, como o Complexo do Rio Madeira, no Brasil; a Hidrovia Paraná-
Paraguai, na Argentina; e o Terminal Portuário de Nueva Palmira, no Uruguai. Mais tarde, em
2005, foi assinado um memorando de entendimento que estabeleceu os mecanismos de
cooperação entre as duas instituições, visando o fomento e a atuação conjunta em
financiamento de projetos orientados para a integração regional. Como exemplo, no Eixo
Andino, o BNDES financia obras no trecho rodoviário Cuchu-Ingenio-Santa Bárbara (que
liga Peru e Bolívia) com desembolsos da ordem de US$ 89,9 milhões, enquanto a CAF aporta
US$ 175 milhões. Outras obras rodoviárias que visam aprimorar a conexão entre os
departamentos bolivianos e interligam a Bolívia à Argentina também são financiadas em
parceria pelo BNDES e pela CAF (DEOS & WEGNER, 2010).
Em 2008, o BNDES analisou 10 projetos de exportação de serviços de engenharia na
América do Sul, sendo que desses, somente quatro pertenciam à Carteira de Projetos IIRSA e
somente um integrava a AIC. Os projetos com financiamento já aprovados e em análise
concentravam-se na área de energia (tais como gasodutos e hidroelétricas) e, na visão de
Iglesias (2008), essa fato pode estar relacionado com o know-how das empresas brasileiras
nesse tipo de projetos já realizados no Brasil e em outros países.
63
Tabela 6. Desembolsos do BNDES Exim para a área de infraestrutura no exterior
Setor 2004 2005 2006 2007 2008
Água e saneamento - - - - 1.095
Engenharia e construção 227.990 292.152 180.322 599.766 917.846
Eletricidade e gás 542 1.427 334 14.754 41
Informações e comunicações - - - 95.210 -
Telecomunicações - 495 - - -
Total Exim - infraestrutura 228.532 294.074 180.656 709.730 918.982
Fonte: BNDES (DEOS et al., 2009).
Ainda que o BNDES não esteja financiando diretamente os projetos de integração, o
banco tem ampliado significativamente os seus desembolsos para a América do Sul. Em 2010,
por exemplo, foram destinados US$ 1,1 bilhão na linha pós-embarque para apoiar as
exportações de bens e serviços brasileiros destinados à região – recurso cinco vezes maior do
que em 2001, que foram da ordem de US$ 184 milhões. A participação do BNDES no
financiamento dos projetos de infraestrutura regional está condicionada, assim, à utilização de
bens de capital brasileiros, porém, a lógica dos projetos de integração financiados pelo banco
não estão em conformidade com os aqueles definidos na Carteira de Projetos IIRSA. Para
Iglesias:
BNDES trabaja en un horizonte de más corto plazo, financiando proyectos que maduran inmediatamente en mayores exportaciones de maquinaria y bienes de capital brasileños (ejemplo, vagones de subtes), mientras que los proyectos de IIRSA generarían mayores exportaciones solo cuando las rutas estén terminadas, los mercados ganados y las redes de distribución establecidas (IGLESIAS, 2008. p. 176).
O BID, por sua vez, buscou estabelecer maior interação com o BNDES para o
financiamento dos projetos de infraestrutura, tais como estradas, ferrovias e hidrovias que
ligam o Brasil aos seus vizinhos. O primeiro exemplo disso foi a busca pela parceria para a
finalização de uma rodovia ligando o estado de Roraima a Georgetown, na Guiana, num
projeto estimado em US$ 150 milhões. A Guiana, por ser um dos países mais pobres do 64
continente, teria acesso a financiamentos com prazo e juros privilegiados dentro do BID.
Contudo, pela Guiana possuir baixa capacidade para contrair endividamento, o BNDES
entraria financiando as construtoras brasileiras que desenvolveriam a obra. A expectativa do
BID é de que, se bem sucedida essa parceria, as duas instituições financeiras poderiam
replicar suas ações em outros projetos de infraestrutura na região – sendo que, há alguns anos,
o BID elegeu uma carteira de 510 projetos prioritários na IIRSA, num investimento estimado
em US$ 74,5 bilhões. O principal risco, contudo, que incide sobre esse e outros projetos de
infraestrutura e que podem acarretar na falta de interesse das empresas brasileiras em serem
financiadas, é se eles são economicamente viáveis e capazes de gerar receita que sirva de
garantia ao empréstimo30.
Assim, é possível afirmar que a recente articulação entre os países sul-americanos em
torno do fomento à infraestrutura regional proporcionou um movimento importante por parte
do BNDES, dinamizando a internacionalização das empresas brasileiras apoiadas pelo banco
e ampliando as parcerias do banco brasileiro com as IMF em prol da execução dos projetos da
Carteira IIRSA.
3.5 A Unasul e o COSIPLAN: novos mecanismos institucionais para a agenda da
integração da infraestrutura
A I Reunião de Presidente Sul-Americanos em Brasília, realizada em setembro de
2000, como assinalado até aqui, foi um marco para que a América do Sul estivesse na
centralidade da política externa brasileira na primeira década do século XXI. A criação da
União das Nações Sul-Americanas, em maio de 2008, com a assinatura de seu tratado
constitutivo, representou um novo marco para o processo de integração. Esta seção tem o
objetivo de apresentar brevemente a nova dinâmica na qual se organiza o IIRSA, conformada
às estruturas da Unasul, levando em consideração o protagonismo brasileiro na proposição das
duas instâncias.
30 VALOR ECONÔMICO. “BID quer parceria com BNDES para a infraestrutura”. 12 jul. 2010.65
Após a assinatura do Tratado Constitutivo da Unasul, a IIRSA passou a ser vista como
o “braço” de infraestrutura da nova organização, porém, a formalização deste entendimento
somente ocorreu em junho de 2010, quando a presidência pro tempore equatoriana da Unasul
convocou, pela primeira vez, o Conselho Sul-Americano de Infraestrutura e Planejamento
(COSIPLAN) (IPEA, 2011). Por meio da decisão que criou o COSIPLAN, o Comitê de
Direção Executiva (CDE) da IIRSA foi incorporado ao Conselho, cujo principal papel passou
a ser a obtenção de respaldo político para as atividades e projetos que gerem desenvolvimento
econômico e social na região – refletindo a postura do Brasil em fortalecer os debates no
âmbito da Unasul, aprofundando a busca por alternativas em nível político e não apenas
técnico para a questão do financiamento.
A primeira reunião do Comitê Coordenador do COSIPLAN foi realizada no Rio de
Janeiro, em abril de 2011. Na ocasião, a Ministra do Planejamento, Orçamento e Gestão,
Miriam Belquior31, reunida com a Secretária-Geral da Unasul, María Emma Mejía, com os
Coordenadores Nacionais dos países sul-americanos e com representantes das instituições
multilaterais envolvidas na IIRSA (BID, CAF, FONPLATA e CEPAL), inaugurou uma nova
etapa de discussões para a integração da infraestrutura física da região. Visando alcançar os
objetivos propostos, o COSIPLAN apresentou seu primeiro Plano de Ação Estratégico (PAE)
para o período 2012-2022, na qual apresentou intenções de aperfeiçoar as metodologias e
ferramentas para executar e concluir projetos; incorporar mecanismos de participação social; e
concentrar sua atenção no financiamento de projetos de alto impacto na região. Na ocasião
dessa reunião, o início dos trabalhos do COSIPLAN foi realizado sob a presidência pro
tempore do Brasil.
Passando a receber diretrizes políticas dos países da Unasul e reduzindo a influência
das IMF, a IIRSA transformada em um foro técnico do COSIPLAN, passou a ser responsável
pelo acervo catalogado de projetos da Iniciativa, porém, por ter iniciado suas atividades
recentemente, anão houve, até o momento, a definição de projetos de infraestrutura
prioritários pelo COSIPLAN. A questão do financiamento às obras de infraestrutura, assim, é
vista com expectativa positiva, uma vez que poderá ser tratada de modo mais bem
estruturado, mas que, ao mesmo tempo, necessita de respostas efetivas em curto prazo
(VALOR ECONÔMICO, 2011)
31 MINISTÉRIO DO PLANEJAMENTO. Miriam Belquior participa de reunião do COSIPLAN. 28/04/11.
66
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A integração sul-americana tem vivido seu momento mais favorável nas últimas duas
décadas. Primeiro, a abertura dos mercados permitiu a ampliação do comércio intrarregional,
traduzida especialmente pelos dois principais blocos da região, o Mercosul e a CAN. Com
essas iniciativas foi possível o desenvolvimento de uma malha de acordos regionais que
proporcionou um ambiente com maior espaço para a cooperação regional e, além disso,
evidenciou os principais gargalos da infraestrutura regional. Segundo, a política externa do
Brasil, a maior economia da região, atribuiu à América do Sul sua zona de atuação prioritária,
com a qual reuniria esforços para atingir objetivos estratégicos de inserção internacional, os
quais não ficariam restritos ao caráter comercial. Isso permitiu a emergência de uma nova
definição estrutural da integração regional, expressa pela Unasul.
Não obstante, o caráter intergovernamental da Unasul evidencia uma baixa
institucionalidade do órgão, quando analisamos sua força para que seus Estados-membros
internalizem as suas regras, sendo conseqüências também da diversidade de interesses e de
tensões políticas na região. É justamente essa dificuldade que faz da Unasul um fórum de
concertação política que busca a estabilidade regional como requisito para avançar na
integração. Assim, a aproximação política é pressuposto de aproximação econômica, social e
cultural, uma vez que a estabilidade política também é responsável por uma maior atração de
capitais para os países da região.
67
Se a inserção competitiva do Brasil no mercado internacional passa, em um primeiro
momento, pela integração sul-americana, não é mero acaso o grande investimento da
diplomacia brasileira e de outras instituições governamentais, como o BNDES e o próprio
presidente Luiz Inácio Lula da Silva – por meio da “diplomacia presidencial” -, em estreitar
as relações com os países vizinhos.
Pela avaliação da diplomacia brasileira, os dez anos de existência da IIRSA foram
úteis para o diagnóstico das necessidades de infraestrutura física na região, para o
desenvolvimento de metodologias adequadas e a criação de uma carteira de projetos
consensuada (PEREIRA, 2011). No entanto, as insuficiências em questão de financiamento de
longo prazo foram as principais causas dos entraves para a realização das obras de
infraestrutura. Apesar da atuação financiadora do BNDES para que as empresas brasileiras
tivessem maior presença na região, a Iniciativa careceu de mecanismos que estimulassem o
setor privado a se envolver nos projetos – seja pelos riscos de regulação das operações e
interferências dos governos sul-americanos, seja pela falta de retornos financeiros em curto
prazo para os executores das obras.
Ainda não é possível determinar a direção que a integração da infraestrutura física
regional tomará sob a égide do COSIPLAN, considerando que o órgão, cujo estatuto somente
foi aprovado em 2010, realizou apenas duas reuniões de seu Comitê Coordenador.
Sob o enfoque de projetos de desenvolvimento nacional e regional, identificamos que
o desencontro entre essas duas agendas, no Brasil, é menor do que nos demais países sul-
americanos. A Carteira de Projetos IIRSA foi fundamental para a definição de projetos
também no âmbito do PAC, ao menos no setor de transportes. No setor energético, o Brasil,
identificando entraves para o diálogo cooperativo nesse tema em âmbito regional, tem
desenvolvido projetos de geração de energia independentemente das prioridades regionais.
Em termos econômicos para o Brasil, buscamos mostrar que a IIRSA apresentou forte
ênfase na abertura de mercados para as empresas dos grandes setores da econômica,
principalmente as de serviços de engenharia e construção. É por meio dessas empresas que o
governo brasileiro tem executado suas estratégias de inserção de bens produzidos no Brasil
nos mercados sul-americanos, sobretudo quanto as obras de infraestrutura são financiadas
pelo BNDES.
68
No território brasileiro, os eixos da IIRSA cruzam zonas onde estão localizadas as
maiores concentrações de recursos naturais nacionais, o que implica em fortes debates entre
os setores público e privado contra ambientalistas e defensores do desenvolvimento social e
econômico sustentável – que, aliás, foi um dos pilares da criação da Iniciativa. Quanto à
Amazônia brasileira, em vista da articulação de diversos eixos da IIRSA, esta será impactada
pela instalação de grandes projetos de infraestrutura, de modo que os efeitos sociais e
ambientais acentuem cada vez mais a desigualdade entre as populações. Os benefícios da
integração física regional são inquestionáveis para as economias dos países sul-americanos,
contudo, não é verdadeira a afirmação de que todos sairão como vencedores desse processo.
Nesse sentido, as instituições criadas para promover essa integração ainda terão que articular
medidas e programas para dirimir os impactos negativos na sociedade e no meio ambiente.
Assim, para que a idéia de integração da infraestrutura física regional seja realmente
internalizada no Brasil, tal como proposto nos Eixos de Integração e Desenvolvido no âmbito
da IIRSA, faz-se necessário que as discussões e percepções dessa iniciativa não estejam
limitadas àqueles ministérios que compuseram a Coordenadoria Nacional da IIRSA (MPOG,
MRE, MTE, MC, MME), mas sim, sejam articuladas também com o Ministério do
Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, com o Ministério do Meio Ambiente, com
governos sub-nacionais e com a sociedade empresarial, visando uma iniciativa de
planejamento e integração territorial regional efetiva para confrontar os padrões de
desigualdade vigentes na América do Sul – tanto entre os países, como entre regiões do
Brasil.
69
ANEXO A – IIRSA: Eixos de Integração e Desenvolvimento
FONTE: IIRSA. Carteira de Projetos 2010.70
ANEXO B – IIRSA: Projetos da Agenda de Implementação Consensuada 2005-2010
FONTE: IIRSA. Agenda de Implementação Consensuada 2005-2010.
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