PROGRAMA DE QUALIDADE NA PRODUÇÃO DE LEITE DE BÚFALAS
Silvia de Paula Livramento Melício1, André Luís Ferreira Lima2, Maria Regina
Barbieri de Carvalho3, Humberto Tonhati3
1. INTRODUÇÃO
Atualmente os consumidores vêm se tornando mais atentos aos produtos que
compram, apresentando-se mais seletivos e demonstrando se suas necessidades,
desejos e expectativas, quanto ao produto, são satisfeitas. Em média, o consumidor
dá uma maior importância ao gosto, saúde, tradição, novidade (evolução) e inovação
(serviço). Nos próximos anos os consumidores serão mais e mais exigentes na
escolha dos alimentos, e esta escolha será a síntese do gosto, saúde e serviço
(CONSALVO, 1997). Sabe-se que uma dieta adequada associada a bons hábitos de
vida são importantes prevenção de várias doenças, por isso, a composição desta dieta
deve conter alimentos tidos como funcionais.
Heasman e Mellentin (2004) e Milner (1999) utilizaram o termo funcional para
descrever alimentos e componentes alimentares que promovam efeitos benéficos
associados ao seu valor nutritivo. O leite e seus derivados podem ser caracterizados
como alimentos funcionais, pois, além de seu valor nutritivo, alguns estudos
mostraram a contribuição destes na prevenção e tratamento de algumas doenças.
Vale ainda citar, que o leite é considerado como o mais nobre dos alimentos devido à
sua composição peculiar sendo composto por água, carboidrato (lactose), gordura,
proteína, minerais e vitaminas.
Tendo em vista que o fator determinante na qualidade do leite é a composição
que ele possui, pode-se considerar o leite bubalino como um ótimo alimento, pois, os
teores de constituintes como proteína, gordura, lactose, sólidos totais, vitaminas e sais
minerais presentes no leite desta espécie são bastante elevados. Devido à sua
composição, o rendimento do leite bubalino para obtenção de derivados nos laticínios,
chega a ser 40% superior, comparado ao rendimento do leite bovino (NASCIMENTO e
CARVALHO, 1993).
GLASS,(2000), afirma que os criadores estão buscando informações sobre
este animal e formando novos rebanhos devido a incentivos como o preço pago pelo
litro de leite de búfala para o produtor, que as vezes, chega a ser o triplo do valor pago
pelo leite bovino. Este fato, torna atrativa a exploração da atividade leiteira devido ao
retorno comercial proporcionado aos criadores, já que, o leite desses animais é
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destinado quase na sua totalidade, à produção de queijo tipo "mozzarella", que tem
mercado assegurado com preços compensatórios (MACEDO, 2001).
Como conseqüência, o rebanho bubalino brasileiro demonstrou acentuado
crescimento nas últimas décadas, tendendo à estabilização em aproximadamente 3
milhões de cabeças (A.B.C.B., 2004), o que lhe confere atualmente a posição de maior
rebanho das Américas.
Analisando-se então, o panorama atual da pecuária leiteira bubalina no Brasil,
torna-se imprescindível a adoção de programas de qualidade que enfoquem da forma
mais abrangente possível, todos os aspectos dentro do sistema de produção do leite,
desde dentro das fazendas, com o manejo correto na criação, controle zootécnico dos
animais e medidas sanitárias preventivas, até os laticínios, fazendo uso de técnicas
que permitam o conhecimento e controle da qualidade do leite a ser beneficiado,
assim como, dos derivados lácteos obtidos. Para tanto, faz-se necessário o
conhecimento de fatores que interfirem direta e indiretamente na quantidade e
qualidade do leite produzido pelas búfalas e também estudos aprofundado de todos os
aspectos físico-químicos e microbiológicos do leite, de modo a permitir o controle de
qualidade nas plataformas de recebimento de leite.
2. FATORES QUE AFETAM A PRODUÇÃO E COMPOSIÇÃO DO LEITE
A quantidade e a qualidade do leite produzido, sofrem variações por influência
direta de vários fatores. WALSTRA e JENNES (1987) por conveniência, distinguem
três tipos de fatores responsáveis por estas variações: genéticos (espécies, raças e
indivíduos), fisiológicos (estágio da lactação, idade e estado de saúde) e ambientais
( alimentação, clima, manejo). Estes autores também afirmam que os fatores
fisiológicos vêm determinados, por sua vez, pelos outros dois fatores.
Existem grandes diferenças entre o leite das várias espécies de mamíferos e
entre as diferentes raças de uma mesma espécie. Segundo PRATA (2001), todas as
espécies apresentam os mesmos componentes gerais, sendo que, a variação ocorre
nas proporções destes componentes.
A raça, entretanto, é considerada um dos fatores mais importantes quando
avaliadas a produção e composição do leite. Segundo OLIVEIRA et al. (2004), existe
uma relativa uniformidade na composição do leite quando se comparam animais de
uma mesma raça submetidos a dietas semelhantes. Contudo, os valores médios
variam consideravelmente entre animais de diferentes raças. No Brasil, dentre as
raças de búfalos existentes, as que mais se destacam são a Murrah, Jafarabadi, e
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Mediterrâneo. A raça Murrah é a com maior aptidão leiteira na Índia e no Paquistão
(COKRILL, 1974), no Brasil esta raça é amplamente criada, sendo considerada a mais
importante e eficiente produtora de leite e gordura (SAMPAIO NETO, et al. 2001).
O fator individual, ou seja, a individualidade ou qualidades inerentes a cada
indivíduo possui grande influência na produção leiteira. Um indivíduo pode se destacar
quanto a sua produção dentro do rebanho e até mesmo da raça. A idade do animal
influi mais na quantidade do leite produzido do que na composição.
O estágio de lactação influi, principalmente, sobre a composição do leite. O
colostro tem sua composição consideravelmente distinta do leite normal. No início da
lactação, os valores de gordura, extrato seco desengordurado (ESD) e proteína são
altos, durante o pico esses valores são menores e são alterados gradativamente até o
final da lactação. (FACTORS, 2003). Já FURTADO (1980) encontrou um aumento
progressivo do teor de gordura em 5 meses de lactação, concordando com a
afirmação de FERRARA e INTRIERI (1975), de que, a porcentagem de gordura é
influenciada de modo altamente específico pelo estágio de lactação.
A produção de leite aumenta gradativamente até o segundo ou terceiro mês
após o parto e após diminui até o final da lactação (TONHATI et al., 1998). A produção
média de leite por animal pode variar de 4 a 10 litros dependendo do tipo de manejo.
Em relação ao número de lactações, a produção diária aumenta até a terceira lactação
e permanece aproximadamente a mesma até a nona lactação (FAO, 1991). Segundo
DOMINGUES (1969), da primeira a quinta lactação verifica-se um grande aumento no
teor de gordura ocorrendo uma ligeira estabilização nas próximas lactações.
Vários autores como UNRIKAR e DESHPANDE (1985), AGARWAL et al..
(1987), MARQUES (1991) e TONHATI et al.(2000), relataram também significativa
influência na produção e composição do leite exercida por fatores ambientais como
ano, ordem e estação do parto dos animais. Segundo DUARTE et al., (2001) existe
alta correlação genética entre as produções de gordura e proteína com a produção de
leite, indicando que alterações em uma destas características ocasionará mudanças
nas outras.
O estado de saúde e a alimentação exercem grande influência sobre a
produção e a qualidade do leite, pois, se o animal for acometido de alguma doença ou,
se a dieta fornecida não lhe atender às exigências nutricionais necessárias, todo seu
metabolismo do animal fica comprometido, acarretando em diminuição na produção e
principalmente, sobre os níveis de gordura e proteína do leite. (FACTORS, 2003).
As condições climáticas, quando não extremas, exercem um efeito pequeno na
composição do leite; altas temperaturas ambientes (>300C) dão lugar a um maior
conteúdo de gordura, a menos nitrogênio e a um baixo conteúdo de lactose. Quando
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em temperaturas abaixo de zero, tanto o conteúdo de gordura quanto o de nitrogênio
são maiores (WALSTRA e JENNESS, 1987).
3. CARACTERÍSTICAS DO LEITE
O leite de búfala apresenta características muito próprias que permitem sua
fácil identificação sob o ponto de vista físico-químico e sensorial. Seu sabor é peculiar,
ligeiramente adocicado e é sempre muito mais branco quando comparado ao leite
bovino, devido à ausência quase total de caroteno (pro-vit. A) em sua gordura. Possui
acentuadas diferenças em relação ao leite de vaca, devido à presença de maior
porcentagem de seus constituintes, principalmente, gordura e proteína, os quais, são
responsáveis pelas características físicas (estrutura, cor, sabor) do leite e dos seus
derivados (BRITO e DIAS, 1998), além de serem os componentes de maiores valores
econômicos para os laticínios (MADALENA, 1986).
Os valores encontrados a respeito da composição do leite de búfala são muito
variados, o que é normal considerando-se os diversos fatores que agem sobre a
mesma. Têm especial importância na composição do leite às condições de clima,
alimentação, raça e manejo; assim, quando se observa a composição ditada por
diferentes autores, grandes disparidades podem ser encontradas, devido justamente
aos fatores enumerados. Sabe-se, por exemplo, que as grandes produtoras de leite
apresentam quase sempre um menor teor de gordura no produto. Observam-se
igualmente diferenças negligenciáveis na evolução do período de lactação do animal
(BENEVIDES, 1999).
3.1. Principais constituintes do leite
Gordura
A gordura do leite é composta por uma mistura complexa de lipídios. Os termos
gordura e lipídios são comumente utilizados como sinônimos, sendo as gorduras
compostas geralmente por uma mistura de triglicerídios (formado por éster do glicerol
com três ácidos graxos), enquanto que os lipídios não têm que apresentar esta
composição (WALSTRA e JENNES, 1987). Os triglicerídios do leite compreendem de
96 a 98% do total dos lipídios (KENNELLY, 1996) e os outros 2 a 4% são fosfolipídios,
esteróis, carotenóides, vitaminas lipossolúveis (A,D, E, K) e traços de ácidos graxos
livres.
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A gordura é o mais variável e um dos mais importantes componentes do leite,
oscilando, em média, entre 5,5 e 8,5 % nos bubalinos ( TONHATI et al.. 2000;
SINDHU e SINGHAL 1988; DUARTE et al. 2001; ROSATI E VAN VLECK, 2002),
valores estes, mais elevados que os encontrados no leite de vaca (FERRARA e
INTRIERI, 1975). Para esta espécie, os lipídios são constituídos de glóbulos maiores
em relação ao leite bovino e se encontram em dispersão e instáveis, e por este motivo,
é a única substância extraível do leite sem a modificação dos outros constituintes
(CAVALIERE et al., 1994). Apesar de bastante alta, a porcentagem de matéria gorda
no leite de búfala é variável em função das raças e das regiões onde se encontram os
animais. As diversas fases da lactação alteram o percentual de gordura, aumentando
gradativamente com o transcorrer da mesma (FONSECA, 1987).
A composição de ácidos graxos presentes na gordura do leite de búfalas esta
disposta na Tabela 1. A gordura do leite de búfala durante o período de lactação
apresenta em torno de 64% de ácidos graxos saturados (AGS), com predominância de
ácidos graxos de cadeia longa como palmítico (C16:0) e esteárico (C18:0). Para os
ácidos graxos saturados de cadeia curta e média (C6-C14), o ácido graxo merístico
(C14:0) é encontrado em maior concentração, o caprílico (C8:0) apresenta a menor
porcentagem seguida do capróico (C6:0) e cáprico (C10:0). Os ácidos graxos
insaturados representam aproximadamente 36% da gordura do leite de búfala, e o
ácido graxo predominante é o oleico (C18:1n9c) seguido do linoleico e palmitoleico.
A quantidade de colesterol média no leite de búfala durante a lactação foi de
0,026mg.g-1 com um valor mínimo de 0,01mg.g-1 e máximo de 0,06mg.g-1. São
escassos os trabalhos que reportam a porcentagem de colesterol do leite de búfalas.
Os resultados apresentados por PRASAD e PANDITA (1990) mostram valores
maiores de colesterol quando comparado ao leite bovino. As quantidades de ácidos
graxos saturados e insaturados apresentam certa variação durante os meses de
lactação conforme se pode observar na Figura 1.
Ácidos Graxos % Desvio padrão
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C6:0 capróico 0,99 0,27
C8:0 caprílico 0,55 0,12
C10:0 cáprico 1,06 0,17
C12:0 laurico 1,74 0,43
C14:0 merístico 8,66 1,82
C15:0 pentadecanoico 1,25 0,11
C16:0 palmítico 32,58 2,46
C17:0 heptadecanoico 0,73 0,12
C18:0 esteárico 16,67 0,01
C20:0 araquidico 0,30 0,57
C14:1 miristoleico 0,38 0,46
C16:1 palmitoleico 1,82 0,11
C17:1 cis 10 heptadecanoico 0,24 0,06
C18:1n9 oleico 29,97 3,27
C18:2n6 linoleico 2,30 0,10
C18:3n3 linoleico 0,32 0,08
C20:1n9 cis-11 eicosenoico 0,31 0,43
Ácidos graxos insaturados (AGI) 35,69 3,02
Ácidos graxos saturados (AGS) 64,35 2,96
Colesterol 0,026 mg.g-1 0,01
Tabela 1 - Composição de ácidos graxos e do colesterol na gordura do leite de búfalas durante
o período de lactação.
Figura 1 - Variação de àcidos graxos saturados e insaturados no leite de búfala durante os
meses de lactação.
Proteína
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O leite de búfala pode ser considerado bastante rico em proteína (média de
4,2% de proteína total). Em 100g de nitrogênio do leite, 89 a 96% são constituídos de
nitrogênio protéico (NP), representado pela caseína e proteínas do soro. O restante (4
a 11%), denominado de nitrogênio não protéico (NNP) é composto por aminoácidos
livres, uréia, ácido úrico, creatina e produtos do metabolismo do corpo do animal
(CARVALHO & HÜHN, 1979).
A caseína é a principal proteína do leite constituindo cerca de 77 a 79% da
fração protéica enquanto que as proteínas do soro constituem de 21 a 23 % (DE
FRANCISIS & DI PALO, 1994). Devido à alta quantidade de caseína no leite desta
espécie, ele torna-se um alimento de digestão mais difícil, por isso em países como a
Indía, é distribuído para o consumo humano na forma diluída (BUSANI, 1989).
Alguns pesquisadores brasileiros (MACEDO et al., 1997; TONHATI et al., 1998
e TONHATI et al., 2000) encontraram porcentagens de proteína variando entre 3,6 a
4,36%, resultados estes semelhantes aos encontrados por DUARTE et al. (2001) que
obtiveram valores médios de 4,20 ± 0,29%. BENEVIDES et al. (2001), encontraram
valores mínimo e máximo de proteínas iguais a 2,73 e 4,78% respectivamente, sendo
o valor médio diário de 3,57%.
Na Tabela 2, pode-se observar a composição média protéica do leite bubalino
durante a lactação.
Componente (%) Média Desvio Padrão %PB %PV
Proteína Bruta (PB) 4,31 0,11 100 -
Proteína Verdadeira (PV) 4,04 0,49 92,81 100
Caseína (C) 3,39 0,46 78,65 83,91
Proteína do Soro (PS) 0,61 0,06 14,15 15,10
Nitrogênio não Protéico (NNP) 0,28 0,06 6,93 7,00
Tabela 2 - Perfil nitrogenado médio observado do leite de búfala durante o período de lactação
Pelos valores determinados 92,81% do nitrogênio total correspondeu à proteína
verdadeira (PV) e 6,93% à fração nitrogenada não protéica (NNP). Do mesmo modo,
da proteína verdadeira (PV), 83,91% corresponde à fração caseína, importante na
obtenção de derivados lácteos e, 15,10% corresponde as demais proteínas
remanescentes no soro (PS) após a precipitação das caseínas. Na Figura 2 está
descrito o comportamento do perfil nitrogenado do leite de búfala no decorrer dos
meses de lactação.
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Figura 2 – Comportamento do perfil nitrogenado do leite de búfala durante os meses de
lactação.
Lactose, Extrato Seco Total (Sólidos Totais), Extrato Seco Desengordurado
(Sólidos Desengordurados) e Cinzas
A lactose é o principal açúcar do leite, servindo de base para a obtenção dos
derivados por meio da fermentação. Em bubalinos, os teores de lactose apresentam
valores entre 4,83 e 5,48% (SINDHU e SINGHAL 1998, DUARTE et al., 2001).
O extrato seco total e o extrato seco desengordurado estão relacionados com
as quantidades de nutrientes totais do leite. O extrato seco total constitui todos os
componentes do leite com exceção da água. Já o extrato seco desengordurado é
representado pelos mesmos componentes dos sólidos totais, excluindo-se os teores
de gordura, ou seja, são as proteínas, lactose, vitaminas e minerais.
No Brasil, a população não possui o hábito de beber leite de búfala em seu
estado natural, mesmo porque, seu alto teor de sólidos totais torna-o preferido para o
preparo de produtos lácteos de alta qualidade (FERREIRA et al., 1995), destinando a
maior parte da produção do leite produzido para esta finalidade. HÜHN et al (1991)
relata ainda que este proporciona maior rendimento nos produtos acabados, bem
como reforça o valor nutritivo da matéria prima como alimento.
Devido aos elevados teores de gordura os valores de extrato seco total
também são elevados. FARIA (1997) estudando as características físico-químicas de
diferentes rebanhos durante 9 meses de lactação, encontrou valores médios de EST e
ESD para búfalas da raça Murrah iguais a 16,74% e 9,87%. NADER FILHO et al.
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(1996) encontraram valores aproximados de extrato seco total e desengordurado, que
variaram entre 15,05 a 16,23%, e 9,32 a 10,24%, respectivamente. BENEVIDES et al.,
(2001) encontraram valores inferiores de EST no leite bubalino da raça Murrah iguais a
13,92% com um mínimo de 12,52 e 15,61% respectivamente. DARSHAN et al (1991)
relataram que os sólidos totais contidos no leite de búfalas foram afetados
significativamente com o estágio da lactação, mas não com a ordem da lactação.
Para o teor de cinzas em leite de búfalas, os valores encontrados estão em
torno de 0,65 a 0,8 %.
Os teores de ESD, Carboidratos (lactose) e cinzas, assim como a produção de
leite , variam em função dos meses de lactação, conforme demonstrado na Figura 3.
Figura 3 - Valores médios da produção de leite(Kg) e porcentagens de ESD, cinzas e
carboidratos durante os meses de lactação.
3.2. Características físico-químicas
A análise das características físico-químicas do leite bubalino é uma importante
ferramenta a ser utilizada nas plataformas de recepção dos laticínios, pois os
resultados destas análises permitem não só avaliar a integridade da matéria prima,
mas também ajudam na identificação de eventuais fraudes, como por exemplo a
adição de sal, água ou a mistura de leite bovino ao leite bubalino visando aumentar o
volume do produto , já que no Brasil, o que determina o valor pago pelo leite entregue
nos laticínios é apenas a quantidade. Dentre as várias análises físico-químicas
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realizadas nas plataformas de recepção, destacam-se a acidez, a densidade, o ponto
de crioscopia e o teor de cloretos do leite.
Para a acidez, os valores são mais elevados que os encontrados no leite de
bovinos, devido à caseína, que por conter dezenas de aminoácidos com
características anfotéricas, agem como ácido na titulação. A maioria dos autores
encontraram valores de acidez superiores à 18ºD, portanto acima dos padrões
regulamentados para o leite de vaca, porém, BENEVIDES et al. (2001) encontraram
valores de acidez titulável inferiores aos citados no leite de búfala da raça Murrah, o
valor médio diário foi de 14,18 oD. Somente em 1994 foi publicado no Diário Oficial da
União o valor para acidez titulável no leite de búfalas, compreendendo entre 14 e 23o
D. Trabalhando com rebanhos de diferentes raças, TONHATI et al.(1998), encontraram
valores para acidez titulável no leite com variação entre 15,7º e 19,01ºD.
Quanto à densidade os valores encontrados são similares ao do leite bovino.
ISEPON et al.., (1984), encontraram valores médios iguais a 1,0335 g/mL. Em 1996,
NADER FILHO et al., encontraram valor ainda superior a este no primeiro mês de
lactação igual a 1,0367, sendo a média para acidez no período de 9 meses de
lactação igual a 1,0337. Comparando a densidade do leite de diferentes raças,
TONHATI et al.(1998) obtiveram uma variação de densidade entre 1,0320 e 1,0374
g/mL.
Com relação ao ponto de crioscopia, TONHATI et al.(1998) encontraram
variações, para diferentes raças, com valores entre -0,552ºC e -0,512ºC.NADER
FILHO et al.. (1984,1986) verificaram que o leite de búfala apresenta valores acima
dos padrões estipulados para leite de vaca, com valores entre –0,52ºC e –0,54ºC.
Os teores de cloretos são importantes por indicarem alterações do produto
relacionadas à ocorrência de mastite, presença de colostro e ordenha de animais em
estágios iniciais e finais de lactação, assim como a existência de possíveis fraudes
(AMARAL et al.., 1995). Trabalhando com búfalas, este autor encontrou valores
médios para este íon entre 0,10% e 0,14%. Estes valores encontram-se abaixo do
limite de 0,16%, estipulado para leite bovino pelo Ministério da Agricultura em 1981,
indicando que a técnica de detecção de cloretos em bubalinos é bastante confiável e
de fácil execução na rotina de inspeção nos laticínios, com o intuito de detectar a
presença de leite mastítico ou fraudado.
4. INFLUÊNCIA DA CONTAGEM DE CÉLULAS SOMÁTICAS NA
PRODUÇÃO E QUALIDADE DO LEITE BUBALINO
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A mastite é considerada a doença que maior prejuízo provoca à pecuária leiteira,
pois, ela causa a diminuição da produção de leite, aumento dos tratamentos clínicos,
aumento de mão-de-obra e descarte prematuro das vacas (SHOOK 1989). Em
rebanhos bubalinos do estado de São Paulo, a presença de mastite subclínica e
clínica, representa 1,5% e 18,77%, respectivamente das búfalas em produção de leite
(COSTA, 2000), levando a uma diminuição na produção e qualidade do leite. SCHUTZ
(1994) mostrou em seu trabalho que a contagem de células somáticas pode indicar a
incidência de mastite, já que, a correlação genética entre as duas características tem
sido estimada entre 0,6 e 0,8.
Testes para a detecção de mastite devem ser ajustados para rebanhos bubalinos
na intenção de melhorar a qualidade higiênica do leite, assim como promover a
qualidade dos produtos lácteos oferecidos no mercado (CERÓN-MUÑOZ et al. 2002).
Estes mesmos autores, em um estudo com rebanhos bubalinos, verificaram que
aumentos na CCS ocasionam queda na produção de leite e nos teores de
constituintes, principalmente a lactose, o que causa perdas econômicas para
produtores e para a industria. A redução na produção de leite destes animais pode ser
atribuída à destruição do tecido secretor pela ação dos microorganismos na glândula
mamária e pela migração de leucócitos para o interior da glândula (PHILPOT;
NICKERSON citado por PEREIRA et al., 2001).
O método da CCS serve para avaliar a saúde do úbere por detectar o aumento de
leucócitos no leite sendo que, do total de CCS, os leucócitos correspondem de 75% a
98%, o restante são oriundas das células epiteliais provenientes da descamação que
ocorre no tecido de revestimento da glândula mamária (RIBAS, 1994).
Os principais métodos de CCS utilizados para vacas leiteiras são o microscópico
direto e o eletrônico (Fossomatic Counter e Somacount) (GREER et al.., 1976;
NATIONAL MASTITIS COUNCIL, 1968; PHIPPS, 1966; SCHMIDT, 1975; BENTLEY
INSTRUMENTS SOMACOUNT 300).
Em face a atual situação em que se encontra o rebanho nacional, a Contagem
de Células Somáticas (CCS) deve ser utilizada como uma técnica preventiva, no
sentido de minimizar a incidência de mastite nos rebanhos leiteiros bubalinos.
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