1
Brasil Eficiente (versão 5.0) mar31-2010
REFORMA DA REFORMA: A ESTRUTURA TRIBUTÁRIA
“DEZ, DEZ, DEZ”
Paulo Rabello de Castro *
“Se quiser me taxar
Me mando pra outro Continente
Quero igualdade e liberdade...
...é Carnaval!”
Trecho do samba-enredo de 2010 da
Mocidade Independente de Pe. Miguel
*Ao Cookie, por haver mais virtude no silêncio de um cão do que no falatório de sábios. O autor é presidente do Instituto Atlântico e membro da Academia Internacional de Direito e Economia. Nos Anexos e Apêndices, colaborou o professor Augusto Cattoni Z. De Boehtlingk. Quadros elaborados por Thiago Biscuola.
2
Indice
Pag.
Prefácio 3
I . Por que Reformar a Reforma? 4
II . Momento Certo para Desafiar a Babel Fiscal 15
III . A Reforma Tributária Requer Eficiência nos Gastos 18
IV . Reforma Tributária Começa por Eleger Objetivos e Meta 25
V . Nova Estrutura Fiscal na Ótica do Crescimento Acelerado 30
VI . Arquitetura do Sistema Tributário para o Brasil Eficiente 34
VII . O País Pós-reforma: Vantagens e Resultados Duradouros 46
VIII. Reforma Contra as Extremas Desigualdades de Renda 49
IX . Reforma Tributária como Fator de Dinamismo Regional 54
X . Arquitetura Tributária para o Novo Século 61
Anexos
1 . Brasil: A longa experiência de não reformar nada 67
2 . Reforma tributária convencional: a proposta Mantega-Appy 83
3 . Eficiência do setor público: uma avaliação quantitativa 86
Apêndices
1 . Canadá: um sistema com experiência positiva de IVA duplo 100
2 . Política tributária, aposentadorias e política fiscal: os
exemplos díspares da Argentina e Chile 111
3 . Austrália, India e México: três exemplos de utilização do IVA 127
Referências 140
3
PREFÁCIO
Desde a grande reformulação fiscal conduzida por Campos-Bulhões1, na
década de 60 – há, portanto, meio século – o Brasil já passou por tantas
versões frustradas de reforma tributária, que até a expressão ou intenção de
reformar se desgastou. O brasileiro, especialmente o jovem-adulto, que apenas
se aproxima da sua madurez financeira, em geral ignora o que é, ou como
seria, uma “reforma tributária”. Mesmo assim, o interesse por se conquistar um
sistema fiscal com menos impostos e menos gastança inútil ou ineficiente, por
parte de governos, é uma percepção que aparece constantemente nas
pesquisas de opinião2, citada entre as principais reivindicações de cidadãos de
todas as faixas etárias e sociais e de todas as regiões do País. Mesmo sem
saber muito bem, mas percebendo, intuindo, o brasileiro reivindica a “sua”
reforma tributária. Mas qual delas, entre tantas e tão profusas propostas
oficiais, sugestões oficiosas e palpites informais?
1 Roberto de Oliveira Campos e Octavio Gouvea de Bulhões foram, respectivamente, os
ministros do Planejamento e da Fazenda do Governo do Gal. Humberto de Alencar Castelo Branco, entre abril/1964 e março/1967. Em apenas três anos, deixaram obra institucional para os trinta anos seguintes.
2 Pesquisa de opinião pública conduzida pelo CNI/Ibope ao fim de nov/2009 e publicada em
07/dez/09, mostrava que, apesar da aprovação maciça ao governo Lula (72%), em três áreas específicas - segurança pública, saúde e impostos -, o saldo liquido entre aprovação e desaprovação era NEGATIVO. No caso de impostos, com um negativo de -16%. È bem verdade, também, que a percepção negativa vem diminuindo em pesquisas sucessivas, desde o pior resultado (-47%), em jul/06 até os -16% recentes, possivelmente pelo alivio dos seguidos e expressivos aumentos da renda salarial desde então, o que escamoteia a mordida da tributação escondida nos preços e faz acomodar o pensamento mais crítico.
4
I
POR QUE REFORMAR A REFORMA?
Para se conquistar uma nova estrutura tributária no Brasil, será preciso
reformar a reforma. Não obstante, o que restou, ao final de tantas décadas
seguidas de frustração da cidadania, foi uma história de tentativas e esforços: o
Poder Executivo, o Congresso Nacional e a Receita Federal têm buscado, por
anos a fio – e, por vezes, até com sucesso – reformar a tributação naquilo que
lhes pareceu “politicamente” viável de ser votado e aprovado, ainda que a
audácia e a modernidade pedissem muito mais.
Essas mini-reformas, persistentes e continuadas, positivas e
simplificadoras em sua grande maioria, deram sobrevida ao sistema vigente3.
Mas não conseguiram desempenar a estrutura impositiva: o edifício tributário
brasileiro foi escorado para não tombar sob seu próprio peso: é até seguro de
se continuar nele habitando, mas permanece irremediavelmente inclinado para
o lado do Erário, em detrimento do Cidadão, a ponto de não parar um único
copo em cima da mesa que não escorregue para a mão do Fisco.
Reformar a reforma significa, portanto, migrar para uma nova estrutura
fiscal, atualizada para estes tempos de comunicação hiper-veloz e de
movimentação fácil de pessoas e capitais. Enfim, uma arquitetura tributária
moderna, que (1) garanta conforto financeiro4 e segurança jurídica aos
Cidadãos brasileiros, que hoje se veem como habitantes de uma comunidade
global, dando, por seu turno, (2) previsibilidade ao Erário, (3) funcionalidade e
força aos governos e, principalmente, (4) poder de competição duradouro ao
3O Super Simples (lei 9317 de 05/12/96) estabeleceu para a microempresa (ME) a faculdade de pagar vários tributos federais por uma só transação. Em 14/12/2006, aprovou-se o Simples Nacional (SN), que inclui o ICMS e o ISS, para MEs e EPP (Pequeno Porte), embora vedando a aplicação da vantagem num sem-número de casos. Oito tributos são aglutinados no SN.
4 A lição, pasmem, vem de Adam Smith, em 1776. “Todo tributo deve ser lançado no momento,
ou da maneira que for mais conveniente ao contribuinte para o pagar.” SMITH (1965), p.778.
5
País, como produtor e exportador significativo de bens e serviços,
diversificados e inovadores.
Estes quatro pilares estruturais da reforma tributária, adequados ao
século em curso, apoiam o arco central do pacto político tácito da Nação ou, se
quisermos, a expressão essencialmente moderna da “agenda do
desenvolvimento”: O ESTADO EFICIENTE. 5
Resgatar a Eficiência do Estado, tanto no tributar quanto no gastar,
se tornou dever primário dos poderes públicos, tanto quanto direito
fundamental do Cidadão, a ser incluído, em letras de forma, em qualquer
lista de “direitos humanos”.
Não exagero nada no que afirmo. Em quase três décadas de
incontrolado delírio, os poderosos deste País implodiram a capacidade de
investir do Estado, enquanto transferiam aos mais pobres, e à socapa, o
grosso da carga tributária, para ser por estes arcada, através de um
“sistema paralelo” de tributos escondidos, aos quais deram, por infinita
desfaçatez, o nome de batismo de ”contribuições sociais”. E dizer que tal
ofensa fora cometida, repetida e indultada pelos tribunais do País, em pleno
regime de retomada da democracia formal e representativa, apenas denuncia
que a raiz do nosso descaminho tributário permanece afundada no barro mole
do senil sistema político.
Basta enxergar os fatos estatísticos dos últimos trinta anos de
descaminho da tributação no Brasil, ociosamente apontado e denunciado por
tantos, entre as melhores e mais isentas cabeças de especialistas e patriotas
brasileiros. Os fatos são inequívocos e irretorquíveis.
5 Abordando os avanços administrativos do Judiciário, o arrojado Gilmar Mendes, presidente do STF, diz que “...a caminhada será menos sofrida se todo o Estado brasileiro houver por bem atuar de forma integrada, proativa e, assim, eficiente (meu grifo), num concerto harmônico, no centro do qual estará o bem-estar do cidadão brasileiro.” FOLHA DE SÃO PAULO, 28/03/10, p.A3.
6
Primeiro: INEFICIÊNCIA AO GASTAR E INVESTIR DO ESTADO BRASILEIRO
Ao fim dos anos 70, e durante toda a década de 80, enfiado numa forte
crise externa de pagamentos, que agravou o melancólico fim do autoritarismo
político, o setor público brasileiro vai perdendo sua CAPACIDADE DE
INVESTIR e ganhando capacidade de INFLACIONAR. Em seguida, ao ser
politicamente crucificado pela mega-inflação, já na década de 90, o
paquidérmico Estado brasileiro, a fim de dominar o processo inflacionário,
transfere ao Cidadão-contribuinte o ônus integral da estabilização dos preços,
ao remeter às nuvens a CARGA TRIBUTÁRIA, numa clara “substituição” de
mesmo sujeito passivo, pois apenas faz a troca de uma inflação desmedida
por mais tributos escorchantes, pagos pela mesma população.
A carga tributária total, que inclui a parcela deficitária da execução
orçamentária, se aproxima hoje dos 40% do PIB e, assim mesmo, o Estado
gastador ainda não conseguiu recuperar inteiramente a sua CAPACIDADE DE
INVESTIMENTO. É este o estado atual das coisas. Objetivo nacional para os
próximos anos? Este deve ser um só: o Estado brasileiro deve parar de
tergiversar e começar a agir, preparando sua própria grande transformação, ao
se tornar um Estado Eficiente.
O próximo programa de governo deve conter os meios práticos que
estruturem O CAMINHO DE VOLTA, do ciclo de desestruturação fiscal e
monetária ocorrido nas últimas décadas do século findo. O Cidadão brasileiro
do século 21 exige REDUÇÃO GRADUAL DA CARGA TRIBUTÁRIA E FIRME
RETOMADA DO INVESTIMENTO PÚBLICO, como sendo as manifestações
inequívocas da nova parceria do Estado com os contribuintes sacrificados. Tais
esforços e empenho político serão a medida da EFICIÊNCIA requerida, desta
vez, não mais aos tributados, mas sim, aos entes tributantes, sendo esta a
única definição plausível de ESTADO FORTE, UM ESTADO QUE INVISTA
MAIS, EMBORA PESANDO MENOS AO CIDADÃO.
O QUADRO I mostra, com dados reais, desde a década de 60, de onde
viemos (a antiga ordem tributária), aonde fomos parar (o inferno tributário),
onde estamos estancados (a ineficiência do Estado) e para onde queremos e
precisamos ir nesta década (o “Brasil Eficiente”).
7
QUADRO I – BRASIL: INVESTIMENTO PÚBLICO E CARGA TRIBUTÁRIA
0%
1%
2%
3%
4%
5%
6%
18 19 20 21 22 23 24 25 26 27 28 29 30 31 32 33 34 35 36
Carga tributária / PIB (%)
Inve
stim
ento
pú
blic
o/ P
IB
1965
1967
1966
1969
1968
2006
20052003
2002
1999
20001983
1978
1982
1994
1971
2008
2009
Anos 60
Anos 70
Anos 80
Anos 90Anos 00
Alvo 2020 ( 30 com 5)
Fonte: IBGE, BACEN, apud Ideias Consultoria. Ver Akihiro Ikeda e Antonio Delfim Netto in MARTINS (2008) p. 44
Elaboração:RC Consultores
Segundo: INEQUIDADE AO TRIBUTAR MAIS QUEM MENOS PODE PAGAR
A decorrência clara e inevitável de se tributar por um sistema dual em
que “contribuições sociais” foram sendo empilhadas na formação do custo de
toda a produção brasileira – a chamada TRIBUTAÇÃO ESCONDIDA6 – acabou
resultando num odioso agravamento da incidência desta taxação de tipo
regressivo (isto é, os menos ricos pagam relativamente mais tributos) recaindo
sobre a base da pirâmide econômica. Dos anos 90, em que o nefasto “sistema
dual” (impostos normais + contribuições “anômalas”7 ) começou a ser
implantado, até os dias recentes, as classes de renda mais baixa vêm sofrendo
agravamento contínuo da taxação escondida nos preços dos produtos. Os
programas de transferência direta de renda aos mais pobres, via alargamento
dos benefícios da previdência não contributiva (especialmente, mas não
apenas, no meio rural), bem como do Bolsa-Família e outras bondades oficiais,
6 Os maiores especialistas batem nessa tecla como núcleo central da grande distorção do
sistema atual, entre os quais, o economista Fernando Rezende e o jurista Ricardo Lobo Torres.
7 “Sistema dual” é expressão tomada emprestado de REZENDE (2007) p.83 e “contribuições anômalas” é da lavra de Lobo Torres in MARTINS (2008) p.87.
8
nada mais fazem do que repor parcialmente, pelo bolso dos contribuintes, o
que o Estado-tirano confisca, desta vez bem escondido, através dos tributos
maus, incidentes no preço das mercadorias, inclusive as mais sobrevivenciais.
Então, afinal, que justiça distributiva é esta? Até quando será tolerada a
manipulação da renda do mais pobre e do menos informado?
O QUADRO II mostra de modo indisfarçado o agravamento da
iniquidade fiscal praticada pelo sistema dual de tributos escondidos.
QUADRO II – BRASIL: TRIBUTOS DE BOA* E MÁ** QUALIDADE, SOBRE
BENS E SERVIÇOS. PARTICIPAÇÃO RELATIVA NA CARGA, 1988 – 2009.
0
0,1
0,2
0,3
0,4
0,5
0,6
0,7
0,8
0,9
1
88 90 92 94 96 98 00 02 04 06 08
Co
mo
fra
ção
da
carg
a so
bre
ben
s e
serv
iço
s
Valor adicionado*
Má qualidade**
Fonte: Instituto Brasileiro de Pesquisa Tributária (IBPT); apud REZENDE(2007).
*Impostos sobre valor adicionado como :ICMS e IPI;**Tributos cumulativos (ISS, IOF e CPMF) e contribuições híbridas ( PIS e Cofins)
A “nova” reforma tributária não pode compactuar com o que ficou velho e
torto. Se insistimos em pactuar com a mediocridade, reforma boa e útil não
teremos. Deve a verdadeira reforma tributária, pelo contrário, ser uma
REFORMA ABRANGENTE8, tendo como propósito primordial responder a
8 A “reforma abrangente” é tema insistente nos escritos de Fernando Rezende. REZENDE
(2007) p.19. Já o grande tributarista Everardo Maciel defende tese diferente,MACIEL (2007).
9
duas questões, e nada mais. Primeiro, devemos optar, sinceramente, entre o
tributo-fertilizante e o tributo-veneno: continuaremos a intoxicar as atividades
econômicas nacionais com a carga tributária possivelmente mais distorcida do
planeta? 9 Sim ou não?
Em seguida, devemos responder à segunda grande questão: como
haveremos de enfrentar, com coragem e clareza, a alternativa entre “agir já” ou
“deixar tudo como está”, legando aos mais jovens a herança do desequilíbrio
fiscal crônico que estamos acumulando para nossos filhos e netos?
O Brasil coleciona perdas de oportunidades históricas há muito tempo.
Temos cinco séculos de atribulação tributária para narrar. Ao fim do Período
Colonial, pagamos a derrama fiscal da Coroa Portuguesa com a cabeça e os
ossos do herói-mártir Tiradentes. Agora, ao ensejo da aproximação do
bicentenário da Independência política do País, em 2022, bem farão os
brasileiros se buscarem, com absoluta determinação, a “normalidade” tributária,
através de uma estrutura impositiva realmente condizente com o potencial
competitivo de sua economia.
Mas esse grande objetivo ainda não está prestes a acontecer. Não antes
de brotar na própria sociedade, nos empresários e nos consumidores, um novo
senso de urgência em torno do padecimento fiscal em que nossas vidas estão
metidas. O tema de uma verdadeira reforma tributária, abrangente e
simplificadora, tem sido palco de embustes sucessivos do poder público que,
escudado nos argumentos recorrentes de relevância e urgência para suas
tópicas intervenções em busca do auto-interesse, tem soterrado uma proposta
após outra, inclusive a mais recente, de 2008, que até virtudes de avanço
continha. As variadas razões para os recorrentes fracassos no
encaminhamento de propostas sucessivas de reforma dos tributos convergem,
todas, para a falta de real motivação política dos governos: qualquer reforma
que os obrigue a encarar o desafio de ganhos de eficiência na gestão
pública, pelo lado da despesa corrente – condição necessária ao sucesso
9 Não há exagero de expressão na afirmativa. Recentes comparações entre países colocam o
Brasil como campeão mundial de nocividade tributária, não só pelo peso da carga, relativo ao nivel da renda média, como principalmente pela multiplicidade de “maus tributos”.
10
do projeto - não interessa, em princípio, aos inquilinos do poder
instituído.
Por seu turno, a população permanece mal informada, quando não
completamente desinformada, sobre o que é a carga tributária verdadeira e
total, e o que ela representa como sobrecusto administrativo e gerencial na
formação dos preços de todos os bens e serviços produzidos no País, o que
gera profundas distorções não-competitivas na indústria nacional, engessando
e tumultuando as relações de emprego, fabricando imprevidência
previdenciária, e perpetuando o “bolsa-família fiscal” que é pago mensalmente
a municípios financeiramente inviáveis10.
A situação vigente é também muito bem representada pelas prateleiras
cheias dos contabilistas e contadores, hoje entupidas de livros-fiscais, muitos
repetidos e inúteis, de seus milhões de clientes-empresas no Brasil, a maioria
deles bitributados ou tri-tributados pelos mesmos fatos geradores que os
obrigam a virar campeões de repactuação de tributos impagáveis, apenas
resgatados pelas leis de renegociação de passivos tributários11.
Criou-se no Brasil, com as repactuações sucessivas de tributos, uma
nova forma de relação de subordinação e subalternidade entre o Estado todo-
poderoso, inacessivel a críticas, que proclama seus éditos, lá do alto do Olimpo
de sua “magnanimidade”, e o Contribuinte achacado, perpétuo “devedor fiscal”,
que permanecerá legalmente manietado em sua “condicional” tributária, como
um servo pós-moderno12.
10
As atuais regras da partilha fiscal, especialmente a municípios, criam permanente incentivo à propagação de entes federativos financeiramente nanicos e atrelados às benesses de Brasília.
11 A partir dos anos 90, sucederam-se leis de repactuação de passivos tributários, conhecidas
por siglas como REFIS (lei 9.964 de 10/04/00) e PAES (lei 10.684 de 30/05/03) até a mais recente lei repactuação, de 2009.
12 Além das repactuações federais, os estados também passam a oferecer renegociações
legais de seus tributos. Por seu turno, a União e entes federativos são contumazes devedores de precatórios.
11
QUADRO III – BRASIL: CARGA TRIBUTÁRIA TOTAL, 1991-2009
(Como % do PIB)
Carga tributária / PIB (%)
15%
20%
25%
30%
35%
40%
91 92 93 94 95 96 97 98 99 00 01 02 03 04 05 06 07 08 09
Fonte: IBPT, IBGE, BACEN
A ignorância da população brasileira sobre o peso da carga tributária é
quase completa. Compulsando os dados coletados pelo mais novo estudo
comparativo entre sistemas tributários na América Latina, o Brasil aparece
como um “ponto fóra da curva”, pois aqui se tributa muito além da carga média
impositiva praticada na região, e através de uma multiplicidade de categorias
tributárias sem paralelo entre os vizinhos, menos ainda se cometermos a
temeridade de comparar a atual estrutura tributária brasileira aos outros BRICs,
ou a países emergentes e mais dinâmicos da Ásia, como Cingapura, Malásia
ou Indonésia.
12
QUADRO IV – PAÍSES E REGIÕES: CARGA TRIBUTÁRIA DIRETA,
INDIRETA E PREVIDENCIÁRIA (2005).
14,9 16,214,2
75
8,811
6,1
11,812,6
4,6
7,2 9,9
14,7 11
11,7
0,8
11,6
9,5
7,2
15,4
3,3
3,1
6,8
0
5
10
15
20
25
30
35
40
45
OCDE UE(15) EUA Sul e Oesteda Ásia
AmericaLatina
Argentina Brasil Uruguai
Taxas Diretas Taxas Indiretas Previdência Social
36,2
25
37,4
26,8
1815
25,6
40,4
Fonte da tabela: BERNARDI (2008) Fonte dos Dados: Cálculos dos autores baseados em contas nacionais.
QUADRO V – AMÉRICA LATINA: RECEITA FISCAL E RENDA PER CAPITA
0
5
10
15
20
25
30
35
40
0 1000 2000 3000 4000 5000 6000 7000 8000
PIB per capita (US$)
Re
ceit
a f
isca
l (%
PIB
)
Bo
Ni
Hn
Py Ec
Gt
Co
Es
PeRd
América Latina
Br
Pa
Cr
Ve
Cl
Uy
Mx
Ar
Fonte: CEPAL (2005) in BERNARDI (2008) p. 25
13
O discurso político oficial, dentro e fora do Poder Executivo federal,
permanece concentrado em justificar o aumento constante da carga tributária
nacional, apenas para se gastar mais, sob os disfarces retóricos mais
desemcabulados. Na sociedade civil, por seu turno, o antigo protesto refluiu
para um nivel de complacência fiscal sem precedentes, e não comumente
observado em outras comunidades de contribuintes.
Tal prodígio político de acomodação de inconformidades só se tornou
possivel por causa de um truque: a aplicação de um sistema altamente
regressivo de taxação indireta – ou seja, tributação escondida nos preços dos
bens e serviços, onde os mais pobres acabam pagando proporcionalmente
mais, sem sabê-lo – conjugado ao uso repetido e massificado de
nomenclaturas tributárias de inclinação “social”, como Contribuição Social,
Programa de Integração Social, Fundo de Desenvolvimento Social, meras
plumagens de taxações nada comprometidas com a produtividade fiscal e,
muito menos, com qualquer finalidade social.
Nenhuma transparência tributária parece interessar à máquina pública.
O controle do nivel da arrecadação, tal como hoje praticado, tem como alvo
permanente e solitário a cobertura dos gastos programados no vasto e sempre
crescente rol de despesas correntes, até em detrimento da formação bruta de
capital.
A reforma tributária, na versão estatista, se encarada sob a ótica dos
tradicionais e conservadores donos do poder formal, sempre virá cheia de boas
intenções, mas recheada de puro veneno, por ser útil apenas aos que atrelam
sua visão de mundo ao monocórdio discurso do “fortalecimento do poder do
Estado”, inobstante os efeitos deletérios da progressiva escalada tributária
sobre os incentivos para poupar dos indivíduos e sobre a capacidade de
investir pelo setor produtivo da sociedade.
O argumento pró-estatista sucumbirá, afinal, antes que tarde demais,
pela ameaça de iminente fragilização da sociedade civil como sustentadora da
máquina do Estado. Sem sociedade forte, e nesta ordem de precedência,
jamais acontecerá o almejado “Estado forte”. Nem a longo prazo teremos
chance de lá chegar, se for pela alternativa do totalitarismo centralizador, como
14
em certos países, até economicamente dinâmicos, porém afastados do
perímetro da democracia direta e representativa.
O Brasil vive, nesta quadra de sua vivência política democrática, a opção
entre o caminho da equidade tributária, ainda não de todo conquistada, e a
senda do totalitarismo, tropicalizado pelo discurso de bondades, típico dos
populismos latino-americanos. Esta decisão coletiva, a ser em breve tomada no
Brasil, se materializará no formato da estrutura tributária com que haveremos
de moldar as relações de facto entre Estado e Sociedade, no século que inicia.
O embate político sobre a tributação no Brasil será, na essência, entre o deixar
respirar e fazer progredir a Democracia fiscal, ou então, deixá-la sufocar lenta e
gradualmente, pelo avanço da carga total de tributos, sempre a pretexto de
“amamentar” a força e o poder do Estado pai-de-todos.
15
II
MOMENTO CERTO PARA DESAFIAR A BABEL FISCAL
A recente inversão do quadrante de euforia do ciclo econômico global
traz de volta a ameaça de inflação e desaceleração em nivel global (embora os
brasileiros não queiramos enxergar isso de frente, por enquanto). A crise
financeira mundial iniciada em 2008 mostrará, mais uma vez, que a taxa de
crescimento possível da economia brasileira, com a nossa atual estrutura
tributária, fiscal e previdenciária, não conseguirá superar, de modo sustentado,
o patamar de 4% ao ano - que os economistas costumam chamar de “taxa de
crescimento do produto potencial”. A razão para tal limitação é que a carga de
tributos, agravada pela fome do Estado por abocanhar fatias crescentes da
renda nacional, impede que o setor privado invista o suficiente para crescer
mais, como ficou demonstrado no Quadro I.
O dinamismo perdido pela economia brasileira na década de 70 ainda
não foi, de fato, recuperado, como mostra o Quadro VI abaixo. Continuamos
patinando, historicamente, desde a intensa desaceleração da economia
brasileira ocorrida após os choques do petróleo e da dívida externa, nos anos
70 e 80.
16
QUADRO VI - BRASIL: CRESCIMENTO DO PIB, MÉDIAS DECENAIS, 1910 – 2010, PROJEÇÕES 2020
Crescimento Real do PIB - Média Móvel de 10 Anos
1%
3%
5%
7%
9%
11%
1910 1920 1930 1940 1950 1960 1970 1980 1990 2000 2010 2020
Alvo6.0%
Média até 1980 = 5,8% ao ano
2º Choque de Petróleo
Média até 1988 - 2007 2,5% ao ano
Perda de Vitalidade
Fonte: IBGE, IPEADATA; Elaboração: RC Consultores
O quadrante recessivo brasileiro do fim do século anterior se projetou
como uma tendência aparentemente duradoura até os anos atuais. E por quê?
Pela estrutura fiscal onerosa e regressiva, implantada na Constituição federal
de 1988. Esta é, afinal, a torre inclinada que abriga a Babel tributária do Brasil.
O Plano Real, a partir de 1994, em nada mudou a estrutura fiscal vigente. Pelo
contrário, a pressão fiscal por mais gastos “sociais”, contida nos comandos
constitucionais, só fez acentuar o viés arrecadador do Estado e produziu a
maior corrente centrípeta de recursos financeiros de que se tem notícia para
dentro dos cofres públicos.
Passados apenas dez anos de promulgação da Carta de 1988, a carga
tributária total brasileira já havia saltado da média de 24 para cerca de 30% do
PIB, havendo acrescentado seis pontos percentuais aos encargos tributários da
cidadania, um feito sem paralelo na história fiscal mundial, mesmo se
comparada a outros países momentaneamente pressionados por guerras
externas, destruições naturais ou confisco de invasores.
17
QUADRO VII – BRASIL: “CRUZ TRIBUTÁRIA”, CARGA EM ALTA E PIB EM
BAIXA, TRAJETÓRIAS SUAVIZADAS, 1994 – 2006.
1
2
3
4
5
1994 1996 1998 2000 2002 2004 2006
26
28
30
32
34
36
38CRESCIMENTO, EM %* CARGA TRIBUTÁRIA, EM %
*Média móvel suavizada
Fonte: BACEN, IBGE
O País precisa, agora, de uma reforma tributária para valer, aquela que,
de fato, fertilize o terreno produtivo nacional, elevando a capacidade brasileira
de competir mundialmente, facilitando a integração regional do líder econômico
da América do Sul e aumentando, afinal, o “produto potencial” do País para
uma faixa de 6% ao ano. Tal estrutura tributária, que seria o “fertilizante” do
desenvovimento nacional acelerado, conteria certos atributos:
Primeiro, mirar-se nos sistemas mais competitivos do mundo, naqueles
países que podem nos ensinar algo sobre simplicidade e eficácia em matéria
de impostos.
Segundo, abandonar qualquer pretensão de reforma gradualista,
desenhando-se, logo no primeiro ano do novo governo, a nova estrutura a ser
adotada, ainda que sua implantação deva ocorrer passo a passo, todos de olho
no único interesse legítimo a ser atendido, o do Cidadão-contribuinte, pois
este é quem concretiza a relação tributária, ao ser constrangido a abdicar de
uma parte significativa de sua renda em favor do financiamento não oneroso e
não inflacionário da máquina pública.
18
III
A REFORMA TRIBUTÁRIA REQUER EFICIÊNCIA NOS GASTOS
A definição clara dos objetivos centrais de uma reforma tributária,
fertilizante do crescimento sustentado e acelerado, se resume no seguinte:
(1) atenção à concorrência externa
(2) prioridade efetiva ao interesse do Cidadão-contribuinte.
A nova estrutura deve emergir de PRINCÍPIOS NORTEADORES
reconhecidamente compatíveis com tais objetivos. São conceitos pré-jurídicos,
válidos em qualquer situação ou circunstância.
Os cinco princípios de uma tributação socialmente equilibrada são:
1) Abrangência
2) Transparência
3) Simplicidade
4) Eficácia
5) Neutralidade
Quanto ao teste de Abrangência, o exemplo que se pode dar para o
Brasil é muito óbvio: a reforma tributária que, simultaneamente, não passar por
uma radical revisão da previdência social brasileira e, desde logo, não atacar o
alto custo financeiro da rolagem da dívida pública – portanto, encarando de
frente os grandes itens atuais da DESPESA CORRENTE PÚBLICA - estará
deixando de avaliar a quase totalidade das fontes permanentes de pressão
por maiores tributos do atual sistema. Por princípio da Abrangência,
entendemos uma nova estrutura fiscal que busque seu ordenamento legal tanto
pela simplificação dos tributos quanto, especialmente, pela efetiva contenção
da despesa total de custeio, não podendo a proposta de reforma se limitar a
19
um “reempacotamento” de impostos, pois o interesse do legislador deve nascer
do estímulo ao redesenho do próprio gasto público, para cuja cobertura se
arrecadam tributos.
O Quadro VIII abaixo dá uma dimensão exata do desafio de reformar
com um olho nos tributos e outro nos gastos de custeio. Mediante eficaz
ordenamento dos controles nos grandes itens de gastos, como ressaltado no
Quadro, tornar-se-á politicamente viável a implantação da nova estrutura fiscal.
QUADRO VIII – BRASIL: DESPESAS DA UNIÃO, POR MAGNITUDE,
VALORES ACUMULADOS DE 2003 a 2009, EM MOEDA CORRENTE.
Por Ministérios e Tamanho da Despesa R$ Bilhões % PIB
1- Total de Pequenas Despesas
(até 0,4% do PIB)394,3 2,32
Integração Nacional 65 0,38
DS e Combate à Fome 63,4 0,37
Agricultura 46,4 0,27
Justiça 42,3 0,25
Cidades 39,2 0,23
Ciência e Tecnologia 29,4 0,17
Desenvolvimento Agrário 27,7 0,16
Gabinete da Presidência da República 22 0,13
Orçamento e Gestão 18,7 0,12
Relações Exteriores 11,5 0,07
Indústria e Comércio 11,3 0,07
Meio-Ambiente 8,8 0,05
Comunicações 8,6 0,05
2- Total de Despesas Intermediárias
(entre 0,4% e 2% do PIB)1155,7 6,82
Saúde 306,1 1,81Defesa 263,5 1,55Educação 227,5 1,34Trabalho 196,2 1,16Minas e Energia 91,6 0,54Transporte 70,8 0,42
3- Total de Grandes Despesas
(superior a 2% do PIB)3645,6 21,51
Serviço da Dívida 1.596.5 9,42Previdência (INSS) 1131,7 6,68Trans. para Estados e Municípios 917,4 5,41
4- Total Executivo (1+2+3) 5195,6 30,65
5- Total Legislativo + Judiciário + MP 236,1 1,4
8- Total Geral das Despesas (4+5+6+7) (*) 5431,7 32,05
(*) Não considerando R$ 2.542,3 bilhões de renegociação de dívida
Fonte: Ministério da Fazenda; Elaboração: Ricardo Bergamini
20
Os gastos totais da Previdência Social obrigatória – do regime geral
(INSS) e dos servidores públicos - em números redondos, têm representado,
na última década, cerca de 30% do dispêndio público, enquanto os encargos
com os juros da dívida mobiliária, pelo menos, outros 20%. Logo, o
enfrentamento dos vícios da estrutura tributária atual requer que se ataquem
esses 50% do gasto total que não correspondem ao dispêndio direto com os
serviços convencionais do Estado, ou seja, com o custeio da chamada
“máquina pública”.
QUADRO IX – BRASIL: GASTO PÚBLICO*, DISTRIBUIÇÃO ESQUEMÁTICA
* Gasto engloba os três níveis de Governo e a Previdência Social
21
Quadro X – BRASIL: ENCARGOS FINANCEIROS DO SETOR PÚBLICO
Encargos financeiros do setor público / Despesa total (%)
0%
5%
10%
15%
20%
25%
30%
95 96 97 98 99 00 01 02 03 04 05 06 07 08 09
Fonte: BACEN
Em seguida, uma reforma para valer requer a aplicação do princípio da
Transparência, algo que só se alcançará se as regras da nova estrutura
tributária forem de fácil entendimento por parte da população contribuinte.
A multiplicidade de regras contidas na proposta de reforma tributária do
governo, de 2008 – chamêmo-la de “proposta Mantega-Appy” (ver o Anexo 2)
com tantas páginas de novos comandos constitucionais, corresponde ao
oposto do que se imaginaria como algo transparente e claro à compreensão do
cidadão comum.
Um desafio aos proponentes de qualquer reforma eficaz é conseguir explicá-la
em menos de dez minutos de apresentação na TV, ao grosso da população
brasileira, em cuja exposição seriam mostrados os vícios da estrutura atual, os
porquês da mudança necessária e as vantagens da reforma apresentada.
A proposta Mantega-Appy resulta complexa demais, e até menos
transparente do que o já opaco sistema atual. Em grande medida, isso
acontece por um vício de todas as propostas recentes do Poder Executivo, em
que se busca acomodar e contemplar todos os interesses supostamente
afetados na Câmara dos Deputados e no Senado Federal, resultando numa
22
verdadeira colcha de retalhos, acrescida por complicadas fórmulas de partilha
de receitas fiscais, oferecidas como gesto de boa vontade política a um sem-
número de representantes de interesses paroquiais, regionais e locais, cuja
finalidade social efetiva é nula, embora vestida de nomes e expressões que
abusam do “social”, do “regional” e do “desenvolvimento tal ou qual”. O mau
encaminhamento dos debates e da votação da partilha das futuras receitas
parafiscais do “pré-sal” é exemplo categórico do desvirtuamento dos objetivos
sociais de uma tributação, quando deliberada pelos parlamentares brasileiros.
A transparência na apropriação e repartição dos recursos arrecadados
exigiria também um choque de simplificação, que é o terceiro princípio
norteador de uma verdadeira reforma. Simplicidade requer, mais uma vez, o
exercício de limitar o poder de tributar e a capacidade de repartir
equitativamente as receitas fiscais entre as diversas esferas de governo. Cada
esfera da Federação brasileira deveria, em seu âmbito, tentar cuidar de si
mesma (princípio da subsidiariedade), pelo autofinanciamento de suas
atividades estaduais ou locais, deixando ao Executivo Federal apenas as
tarefas públicas indelegáveis que, mesmo assim, são muitas e bastantes
dispendiosas. A Federação brasileira, uma vez redefinida para a modernidade,
além de refrear seu apetite tributário, deverá mirar metas orçamentárias
simplificadas, de modo a permitir um recuo programado e gradual da carga
tributária de todo o setor público, como percentagem do PIB.
Para reduzir a carga exorbitante que recai sobre o contribuinte brasileiro,
é necessário explicitar mais dois princípios finalísticos, em geral esquecidos
nas propostas debatidas pelo Congresso Nacional, que aperfeiçoam a lista dos
cinco princípios norteadores da boa reforma. Os princípios adicionais são os da
Eficácia e o da Neutralidade.
Por Eficácia, se entende a estrutura tributária que não só compete com
as mais eficientes congêneres dos países concorrentes, mas também aquela
que consegue atingir a arrecadação adequada com o mínimo de custo
administrativo de arrecadação, quer para o fisco, quer para o contribuinte.
Mas a eficácia não pode colidir com o princípio da Neutralidade, este último
23
sendo o critério que implica em reduzir ao máximo as distorções alocativas
causadas pelo ato de tributar.
O caso do imposto sobre as movimentações financeiras é exemplar,
pois embora sendo um tributo razoavelmente eficaz pelo baixo custo de sua
arrecadação, o chamado “imposto do cheque” provocou fortes distorções
alocativas dos fatores de produção, por ser um tributo arrecadado em cascata,
sobre a circulação financeira. Quando eliminado no Brasil, foi substituído
parcialmente pelo IOF – Imposto sobre Operações Financeiras – que também
tem provocado distorções semelhantes nas operações de crédito, já oneradas
pelo alto juro cobrado aos mutuários. Portanto, Eficácia e Neutralidade
precisam caminhar juntas para compor as características finais de uma reforma
“fertilizante” do crescimento e da maior equidade social.
De acordo com o estudo Paying Taxes (2009) (Pagando Impostos)13, o
Brasil é o país onde mais se gasta tempo com as obrigações tributárias: são
2.600 horas por ano. Trata-se de um recorde mundial. Na outra ponta, em
nações como Emirados Árabes Unidos, Cingapura, Luxemburgo, Suíça e Nova
Zelândia, a média de emprego de tempo, administrando e pagando impostos, é
de 70 horas anuais.
A pesquisa também revelou que, na comparação com outros países
BRIC, o Brasil está pessimamente posicionado. Os indianos, por exemplo,
gastam 271 horas por ano, o que deixa a Índia no mesmo patamar de
desenvolvimento do grupo G8 (254 horas) e da Europa (257 horas). O Brasil,
solitário no topo do ranking do desperdício de horas e recursos do cidadão-
contribuinte, impõe um custo extraordinário á matriz produtiva. O governo
deveria ser obrigado a acompanhar o custo de emprego de horas na
prestação das obrigações fiscais individualizadas, inclusive as
accessórias, e incluir tal custo, transformado em valor presumido, como
parte do imposto pago pelo contribuinte.
13 Pesquisa conduzida mundialmente pela empresa de auditoria PricewaterhouseCoopers. PRICE (2009).
24
Concluindo, o País tornar-se-á eficiente quando conseguir não só
racionalizar melhor o emprego direto da tributação sob a forma de gastos
públicos úteis e justificáveis, como também pelo maior respeito ao tempo
e recursos despendidos pelos contribuintes no cumprimento de suas
obrigações fiscais diretas e accessórias. Aferir permanentemente esta
eficiência pública é uma das principais ferramentas do bom governante.
Quadro XI – PAÍSES: HORAS GASTAS PAGANDO TRIBUTOS POR ANO
Horas gastas por ano com o pagamento de impostos
0
500
1.000
1.500
2.000
2.500
3.000
Brazil
Venez
uela
Ecuad
or
Argen
tina
Poland
Lao P
DRNep
al
Domin
ican
Republic
Bangla
desh
Timor-L
este
Benin
Indones
ia
Alban
ia
Ghana
Eritre
a
Mad
agas
car
Papua
New G
uinea
Austria
Haiti
Fiji
Grenad
a
Palau
Kuwait
Jord
an
Hong Kong, C
hina
Switzer
land
2.600
Fonte: PRICE (2009)
Quadro XII – PAÍSES: GRAU DE DISTORÇÃO DO SISTEMA TRIBUTÁRIO
Índice de nocividade do sistema tributário*
0
1
2
3
4
5
6
7
Bah
rain
Om
an
Kuw
ait
Cyp
rus
Tuni
sia
Par
agua
y
El S
alva
dor
Indi
a
Mal
ta
Hond
uras
Mac
edon
ia, F
YR
Cze
ch R
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lic
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u
New
Zea
land
Alb
ania
Gha
na
Can
ada
Pan
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Jor
dan
Eth
iopia
Bulg
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Sen
egal
Kaz
akhs
tan
Moza
mbiq
ue
Ser
bia
Jap
an
Sur
inam
e
Fin
land
Cam
eroo
n
Chad
Turk
ey
Boliv
ia
Den
mar
k
Bra
zil
*Efeito de distorção econômica provocada nas decisões de investimento e relações de trabalho (7 = neutro / não nocivo e 0 = totalmente nocivo). Fonte: World Economic Forum, apud MARTINS (2008) p.46. Elaboração Ideias Consultoria.
25
IV
REFORMA TRIBUTÁRIA COMEÇA POR ELEGER OBJETIVOS E META
Para ser sobretudo simples e simplificadora, e mirar-se na concorrência
dos melhores sistemas existentes, atendendo às limitações do bolso do
contribuinte brasileiro, a desejável estrutura tributária depende do refreamento
do gasto público total, nos três níveis de governo. O quadro comparativo de
países de nossa região sul-americana projeta luz sobre o objetivo central de
uma reforma no Brasil: controlar a carga total e limitar o gasto corrente. O
Brasil se tornou, de fato, um ponto fora da curva de comportamento regional.
Embora se admita que alguns países da região ainda tenham pela frente um
provável aumento da carga fiscal e dos gastos públicos como proporção de seu
PIB, o Brasil apresenta, por outro lado, situação inversa a todos os demais na
região, figurando como um caso diferente e único, pois é um país que, ainda no
estágio emergente de desenvolvimento e renda, já apresentava uma carga
desproporcionalmente elevada, comparável a países maduros, desenvolvidos e
de população muito mais velha. Enfim, fiscalmente, O BRASIL JÁ É UM
VELHO, pois gasta muito em termos correntes, enquanto investe muito pouco
na formação de capital público.
Quadro XIII – ÁMERICA LATINA: PAÍSES DA REGIÃO, POR NÍVEIS DE
CARGA TRIBUTÁRIA, 1990 - 2005
1990 2000 2005Média
(1990-2005)Alta Taxação(> 28% do PIB)
Brasil 30,5 32,5 37,4 31
Média Taxação¹(18 a 28% do PIB) 18,2 20,8 23,1 20,7
Baixa Taxação²(12 a 18% do PIB) 11,3 15 17 14,6
Muito Baixa Taxação³(até 12% do PIB) 7,7 10,1 11,7 9,6
¹ Países: Argentina, Chile Costa Rica
³ Países: Paraguai, Equador, Venezuela, Guatemala, Haití
² Países: Honduras, Colômbia, Panamá, Nicarágua, R. Dominicana, Perú, Bolívia, México, El Salvador
Fonte: BERNARDI (2008) p.23; Elaboração: RC Consultores
26
META TRIBUTÁRIA
Para ser competitiva, nossa carga tributária deve retornar, e ficar
limitada, ao nivel de 30% do PIB. ESTA É A META QUE PROPOMOS, num
ambiente de equilíbrio orçamentário, ou seja, tendo como objetivo
legalmente estabelecido o empate entre receitas e despesas nominais.
A limitação percentual da carga tributária em 30% deve ser estabelecida
como um “limite” dinâmico, num regime semelhante, e com equipe com
cabedal técnico equivalente, ao atual Comitê de Política Monetária, que vigia a
meta de inflação no País. Controlar receitas e gastos fiscais ao nivel proposto
de 30% do PIB representa um desafio plenamente alcançável ao longo dos
próximos dez anos, na medida em que a carga atual de tributos venha a ser
gradualmente refreada e contida em sua taxa de expansão, ao passo que o
crescimento do País vai avançando. O cálculo implícito nesta desoneração
efetiva é que a arrecadação tributária adicional – também chamada de
“taxação incremental ou marginal” (diferente do conceito da taxação média) -,
ano a ano, pelos próximos dez anos, se torne inferior à média verificada nos
dez anos passados.
Como ALVOS ANUAIS, propomos a REDUÇÃO DE UM PONTO
PERCENTUAL por ano na carga fiscal média, medida e controlada pelo
lado da despesa pública total, em relação ao PIB daquele mesmo ano.
Com isso, a carga fiscal média, que hoje raspa em 40% do PIB (no
conceito de despesa total, não de tributos) passaria a regredir
anualmente, em cerca de 1 ponto percentual ao ano, a partir de 2011 (ano
ideal para o início do processo reducionista), até se estabilizar ao nível
de 30% do PIB, máximo a ser tolerado, por lei, a partir de 2020.
Por ser um processo gradualista e envolvendo a aceleração simultânea
do crescimento econômico, tal ajuste se daria sem traumas nem sustos, não
27
pressionando de modo ponderável os orçamentos federal, estaduais e
municipais. Tampouco ocorreria qualquer descontinuidade dos compromissos
financeiros da Previdência Social Brasileira.
QUADRO XIII – BRASIL: PROGRAMA DE REDUÇÃO PERCENTUAL
(% PIB) DA RECEITA E DESPESA PÚBLICAS TOTAIS, 2011-2020.
0%
10%
20%
30%
40%
50%
60%
70%
80%
90%
100%
2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019 2020
PIB
Carga tributária Déficit Nominal Parcela apropriada pelos contribuintes
Fonte: IBPT, BACEN
É importante repetir que o sistema tributário brasileiro, mais do que
qualquer outro no mundo, está intimamente ligado ao regime previdenciário e
às regras de repartição fiscal constitucional, bem como ao peso dos encargos
financeiros decorrentes do desenho da política monetária pré- e pós-
estabilização. No Brasil, há consenso de que se paga impostos demais, - (é o
“Brasil, País dos Impostos!”) - com uma carga tributária de mais de 35% do
PIB. Não é de espantar que a sociedade almeje uma reforma tributária. É
impossível, no entanto, fazer reforma do sistema tributário, sem concomitantes
reformulações previdenciária e fiscal.
OBJETIVOS CENTRAIS DA REFORMA
Os grandes objetivos da nova estrutura tributária-previdenciária-fiscal,
são cinco:
28
• Simplificação e redução radical do valor e do custo de recolher
tributos (direito à eficiência pública)
• Fomento à poupança previdenciária pela constituição de um
pecúlio individual no regime geral da Previdência Social para os
contribuintes optantes do novo sistema (direito à poupança
individual)
• Nova estrutura impositiva no padrão de economias avançadas
(direito à paridade concorrencial)
• Proteção do Cidadão-contribuinte diante do Estado, através de um
Código de Defesa do Contribuinte (proteção contra os abusos
burocráticos do Estado)
• Equidade e absoluta transparência na incidência de tributos
(justiça distributiva)
OBJETIVOS PRÁTICOS DA REFORMA
Alcançar-se-ão tais objetivos com as seguintes medidas práticas e integradas
de reformulação de receitas e despesas fiscais e parafiscais:
• Reformulação da Previdência Social. O tamanho deste problema
no contexto fiscal brasileiro e sua tendência explosiva fazem com
que a reforma deva começar por aí
• Aglutinação do maior número possível de tributos federais e
federativos existentes
• Exposição da carga dos tributos à vista dos contribuintes com
total transparência
• Contribuição universal ao Fisco. Conscientizar o Cidadão de que
ele é quem SEMPRE financia o Estado, tendo, portanto, direito ao
tratamento respeitoso e equitativo, direito à orientação tributária,
precedente à cominação de punições por infração, bem como
direito amplo de defesa como contribuinte
• Meta legal explícita de gastos e de arrecadação, com previsão no
orçamento plurianual, e meta de execução de um Orçamento
Nominal Equilibrado.
29
REFORMA TRIBUTÁRIA EM RESUMO
Nossa proposta de reforma tributária se apoia em TRÊS PILARES:
• Renda arrecadada deve ser igual à renda transferida, portanto o
imposto de renda deve equivaler ao total anual das transferências
a título previdenciário. O novo IR seria integralmente dedicado a
financiar a previdência social obrigatória, em ambos os regimes,
geral e especial (servidores civis e militares);
• IVA duplo, de “modelo canadense”, dotado de arrecadação federal
e federativa (estados e municípios) incidente sobre o consumo de
bens e serviços, e destinado a sustentar as máquinas públicas
nos três niveis de governo;
• Sistema tributário complementar, admitindo-se apenas os tributos
sobre a propriedade predial e sua transmissão, a taxação fundiária
e automotiva, além dos tributos regulatórios convencionais e de
“royalties” de extrações minerais.
A iniciativa desta REFORMA DA REFORMA deve ser do Executivo Federal,
através do PRESIDENTE DA REPÚBLICA, em seu primeiro ano de mandato.
No Brasil, o Legislativo não tem o poder político, nem interesse prático, de
propor reformas profundas, mas necessárias. As presunções de “direitos
adquiridos” em matéria de gastos públicos tornam o atual poder legislativo
impermeável à mudança por iniciativa própria. O Judiciário pode colaborar no
processo, mas carece de iniciativa legal para tal.
30
V
NOVA ESTRUTURA FISCAL NA ÓTICA DO CRESCIMENTO ACELERADO
Um breve exercício aritmético explica a vantagem econômica da
estrutura aqui proposta. Supondo que o PIB venha a crescer a 6 % ao ano
(taxa viável, diante do estímulo e expectativa gerados por uma reforma
tributária radical), este terá seu valor saltando de 100 unidades monetárias, no
ano 1, para 106, no ano 2. Acrescentar-se-ão, pois, seis unidades de produção
tributável ao fluxo da economia no primeiro ano do programa e, assim,
sucessivamente, nos anos seguintes, até o ano 10.
Enquanto isso, a carga tributária média no ano 1, se for igual, por
suposição, a 40% do PIB, propiciará uma arrecadação tributária de 40
unidades e, de acordo com o programa de redução gradativa da carga fiscal,
passará a 39% do PIB no ano 2, a 38% no ano 3, até cair para 30% no ano 10.
No ano 2, portanto, a carga fiscal conterá 41,34 unidades de arrecadação (ou
seja, 39% de 106). Percebe-se, de imediato, que o aumento da tributação, em
termos absolutos, continuará acontecendo, em todos os anos do programa,
mesmo diante de sua redução em termos relativos.
O programa fiscal não envolve, portanto, qualquer tipo de redução
de gastos ou de arrecadação. Verificamos, facilmente, não haver nenhum
“sacrifício” de tributação, nem tampouco qualquer corte raso de gastos
públicos a título de ajuste fiscal. As receitas e despesas fiscais continuarão
crescendo em termos nominais. No entanto, crescerão, em média, um pouco
menos do que a expansão do PIB, ou seja, a renda avançará mais rápido,
enquanto a carga fiscal estiver refluindo do patamar de 40 para o de 30% do
PIB.
31
Quadro XIV – BRASIL: PROGRAMA DE REDUÇÃO DA CARGA FISCAL
(RECEITAS E DESPESAS) COM EXPANSÃO DO PIB A 6% aa, 2010- 2020.
100
110
120
130
140
150
160
170
180
190
2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019 2020
PIB Carga Despesas
Fonte: BACEN, IBGE e IBPT
O programa é compatível com um aumento real e persistente dos salários
públicos e dos benefícios sociais, embora em ritmo inferior aos 6% de expansão
anual do PIB total.
Ainda mais: esta 1,34 unidade de arrecadação tributária acrescentada à receita
fiscal no ano 1 do programa representará uma carga tributária MUITO MAIS BAIXA,
de percentagem bastante inferior aos 40% verificados na partida. Como assim? É
porque 1,34 unidade de aumento marginal de arrecadação no ano 1 passará a
representar apenas 22% das 6 unidades de acréscimo ao PIB, também no ano 1.
Estes 22% de tributação marginal ou incremental são a proporção representativa do
peso adicional da tributação após a reforma. OU SEJA, O PESO DA TRIBUTAÇÃO
CAIRÁ, NA MARGEM, AO LONGO DOS DEZ ANOS DO PROGRAMA, E ISSO
CONSTITUI RAZÃO TÉCNICA SUFICIENTE PARA SE AFIRMAR QUE TAL
“ECONOMIA” DE CARGA FISCAL (TRATA-SE DO “CROWDING IN”, NO JARGÃO
ESPECIALIZADO) SERÁ CAPAZ DE CRIAR NOVO CICLO DE INVESTIMENTOS
NA ECONOMIA PRIVADA.
A nova estrutura tributária, ao ser implantado gradualmente, aliviará o peso
fiscal sofrido pelo contribuinte em relação à estrutura anterior. Tal ocorre porque os
acréscimos na arrecadação tributária, no programa decenal, serão sempre inferiores
32
à carga fiscal média (isto é, 22% de carga marginal são inferiores a 39% de carga
média, no ano 2 do programa, e assim, sucessivamente). Concluindo: como a carga
tributária marginal começará com apenas 22% de peso, a carga tributária média
cairá continuamente ao longo da década, sem sacrifício dos compromissos legais de
despesas do setor público, desde que estas permaneçam refreadas e sejam
mantidas afastadas de seu habitual expansionismo.
Obviamente, o PIB do Brasil só poderá crescer a 6% ao ano, sustentadamente,
por dez anos, se o governo permanecer vigilante no combate aos acréscimos da
carga tributária marginal. A razão é simples. O governo sempre investe de modo
menos eficiente do que o setor privado. Por isso, quando a carga tributária de um
País é crescente (é o chamado “crowding out”, pela apropriação que se faz de
recursos do setor privado) o potencial de investimento no segmento empresarial é
prejudicado, já que este é quem detém a capacidade original de formar capital
através de seus lucros acumulados. O desvio de potencial de investimentos acabará
redundando no avanço dos gastos correntes do Estado, pois este normalmente
deixa de formar capital para despender em custeio corrente.
A ocorrência de uma carga tributária marginal crescente no País ao longo
das últimas duas décadas foi a forma involuntária pela qual se “contratou” a
menor expansão do crescimento do PIB. Paradoxalmente, o avanço da carga
tributária marginal também “encomendou” a diminuição da base de incidência
da arrecadação fiscal nos anos seguintes. A carga tributária deletéria ao
crescimento é uma espécie de parasita invasiva, que se espalha sobre a copa da
árvore que a abriga, diminuindo a força desta para, afinal, matá-la e, em seguida, a
si própria.
O contrário também é verdadeiro. Ao coibir uma carga exagerada de tributos, o
país não perde arrecadação. Antes, pelo contrário, fomenta a receita fiscal anos à
frente, pois “contrata” mais crescimento, no dia de amanhã, para colher mais
arrecadação, depois de amanhã. Este é o sentido virtuoso da “matemática” de
resultados esperados a partir da implantação da nova estrutura tributária brasileira.
Na faixa atual em que se encontra o Brasil, com encargos fiscais e
parafiscais da ordem de 40% do PIB, constataremos que uma carga tributária
percentualmente decrescente provocará aumento no ritmo de expansão do
33
PIB, enquanto gerará mais arrecadação, tanto em termos absolutos, quanto
relativamente ao padrão anterior, ao longo da década de implantação do
programa.
Além disso, na medida em que a carga tributária total vier a se aproximar da
meta proposta de 30% do PIB, o peso dos tributos na economia se estabilizará,
podendo continuar a crescer, a partir daí, no mesmo ritmo do PIB, ou seja, em
até 6% ao ano. Logo após o período decenal de reestruturação dos gastos
públicos, no novo programa fiscal, o ritmo de arrecadação e das despesas públicas
poderá voltar a evoluir na mesma cadência do PIB total, propiciando, então, ainda
maior aceleração potencial dos investimentos públicos de 2020 em diante.
QUADRO XV – BRASIL: NOVA ESTRUTURA TRIBUTÁRIA*
Aglutinados
IOF+ IPI+ PIS+ Cofins + CIDE
Finalidade
Ente tributário
Aglutinados
CPE* Empregado
ICMS + ISS
CPP ( patronal)
Federal
Estadual
Municipal
INSS
IR PJ + IRPF
Previdência Máquina Federal Máquina Federativa
IVA Federal + Regulatórios
(Partilha IVA)
IVA federativo + IPVA
* Torna-se pecúlio individual
(Partilha IVA) IPTU+ITR+ITBI
34
VI
ARQUITETURA DO SISTEMA TRIBUTÁRIO PARA O BRASIL EFICIENTE
O Brasil já atingiu nivel de maturidade tributária pelo montante da
arrecadação fiscal e parafiscal que realiza anualmente. Porém, não é maduro
do ponto de vista da EFICÁCIA DA SUA MÁQUINA ARRECADADORA NEM
TAMPOUCO NA APLICAÇÃO EFICIENTE DESTA RECEITA. Portanto, o
sentido da reforma no Brasil diverge da habitual prescrição dos especialistas,
em outras nações emergentes, nas quais se reconhece a pressão potencial por
novos aumentos de arrecadação a fim de cobrir melhor as carências de certos
financiamentos sociais, como previdência e saúde pública.
Normalmente, os países em estágio de pressão fiscal latente têm uma
carga tributária em torno de 20% do PIB, ou mesmo inferior a isso. O Brasil,
como sabemos, já atingiu nada menos que o dobro dessa percentagem,
havendo inclusive ultrapassado, em carga fiscal, a proporção de países em
estágio econômico muito mais avançado, como os EUA.
A prescrição da boa política fiscal no Brasil é, portanto, a de
SIMPLIFICAR TRIBUTOS, REDUZINDO SUA CARGA PERCENTUAL, e pari
passu, CONTER AS DESPESAS NO LIMITE DA ARRECADAÇÃO (DEFICIT
NOMINAL ZERO).
A nova estrutura tributária será adequada na medida em que possa ser
objeto de uma explicação simples e objetiva para o grande público. O Cidadão-
contribuinte deve ser capaz de entender e, inclusive, conseguir repetir com
certo desembaraço as ideias centrais da reforma. E o governante só estará
liderando a reforma “certa” para o País neste novo século14 - que exige leveza
e exatidão, como parâmetros fundamentais da vida pós-moderna – se passar
14
Assim ensinava Italo Calvino, em suas “Seis Propostas Para o Próximo Milênio” CALVINO (1990).
35
no teste de “explicar a reforma tributária num programa de dez minutos pela
televisão”.
Nossa proposta tem como meta central ESTABILIZAR EM 30% A
RELAÇÃO ENTRE CARGA TRIBUTÁRIA (E GASTOS TOTAIS) DO SETOR
PÚBLICO E A ATIVIDADE PRODUTIVA NACIONAL. 15 O horizonte desta meta
central é o ano de 2020. A nova estrutura precisa ser apresentada ao
Congresso Nacional para ser discutida e aprovada ainda em 2011, para entrar
em vigor, e ser implantada gradualmente, a partir do ano seguinte.
O método de abordagem política passa por reconhecer todos os
avanços até aqui conseguidos, absorvendo-os na nova estrutura, como o
Simples Nacional. O mínimo de mudanças aqui proposto ao nivel
constitucional também facilitará a mais rápida aceitação da proposta. O objetivo
deve ser o de “desconstitucionalizar” o capítulo tributário da Carta de 88,
tornando-o mais leve e flexivel às exigências adaptativas deste século (cf.
Calvino). Neste sentido, distanciamo-nos da proposta Mantega-Appy de 2008,
que nos oferece um texto reconstitucionalizante, introduzindo na Carta regras
de partilha minuciosamente ociosas e tantos outros comandos subsidiários que
jamais deveriam povoar o texto de uma lei suprema.
Apesar de suas distorções alocativas e distributivas, há interessantes
coincidências na “matemática” da atual estrutura tributária. Tais coincidências
muito facilitarão a exposição política do tema, ensejando ao público uma fácil
apreensão do que se pretende fazer e aonde se quer chegar na nova estrutura.
Como a carga atual atinge cerca de 36% do PIB, a meta de trazer esta carga
para 30%, até 2020, se torna perfeitamente viável, desde que mantenhamos as
três “fatias” de apropriação desta receita total relativamente intactas.
As três fatias da nova estrutura são:
1- Tributos Federais sobre a Renda Auferida
15 Há uma aparente relação, primeiro positiva e, em seguida, negativa, entre aumentos de gastos públicos e crescimento potencial do PIB, como uma forma de U invertido, cujo ponto máximo é por volta de 30% do PIB, conforme estudos apresentados em AFONSO (2006). Esta relação “ótima” entre gasto público e crescimento do PIB é apresentada na Fig.4 do Apêndice 3, (p.93 abaixo), onde fica claro que, ao nivel de 30%, o potencial de crescimento é de 6%a.a.
36
2- Tributos Federais da Circulação e da Regulação Econômicas
3- Tributos da Federação (estados e municípios)
Com esta estrutura simples temos condição de realizar a reforma. Mais
ainda. Por uma coincidência aritmética, as três fatias, individualmente,
conservam uma dimensão não muito distante de 10% do PIB, cuja proporção
facilita o estabelecimento de metas de arrecadação para cada uma delas.
Podemos chamar a proposta como sendo uma ESTRUTURA DEZ-DEZ-DEZ,
ou seja, 10% do PIB para cada fatia de arrecadação fiscal.
Tudo isso é bem fácil de entender. Fica, também, simples de compreender
como a carga tributária total, ao final da década, se distribuirá entre essas três
fatias, de modo equitativo, somando 30% do PIB.
Primeiro bloco de 10% do PIB: arrecadação federal, exclusiva, sobre
qualquer renda auferida
Finalidade: financiar a Previdência Social
À tributação sobre toda e qualquer renda auferida, seja ela de pessoas
físicas ou jurídicas, corresponderá a responsabilidade de recolher ao Erário um
dízimo anual, ou seja, 10%, seja ele decorrente de salários e outros proventos
do trabalho, de juros e lucros, bem como de aluguéis.
Se considerarmos que a Contribuição patronal ao INSS, de 4% do PIB, é
uma forma de tributação sobre a renda (do trabalho), ao somarmos este
percentual aos 4,1% arrecadados a título de IRPJ + CSLL, chegaremos ao
nivel de 8,1% do PIB, que corresponde ao total da arrecadação direta feita por
pessoas jurídicas no Brasil, um percentual mais expressivo do que o obtido em
qualquer outro país latino-americano.
Quando acrescentado ao total anterior a arrecadação do IRPF (imposto
de renda da pessoa fisica) na razão de 3,5% do PIB, alcançamos a cifra de
11,6%, que, hoje, inclusive ultrapassa a arrecadação-alvo de 10% do PIB. Há
espaço, portanto, para uma REDUÇÃO GRADUAL DE ALÍQUOTAS, nessas
categorias tributárias, durante a aplicação do programa.
37
Em resumo16:
Nova estrutura tributária: Primeiro Bloco (tributos federais exclusivos)
A Contribuição Social sobre o Lucro Liquido (CSLL) é aglutinada ao Imposto
de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ)
A arrecadação do novo IRPJ, aglutinado, passa a ser de âmbito federal
exclusivo, não compartilhada
A mesma regra de exclusividade se aplica à arrecadação do Imposto de
Renda da Pessoa Física
A compensação a estados e municípios se fará no âmbito dos tributos federais
sobre o consumo, que passarão a ser compartilhados (hoje não o são)
A Contribuição Patronal para a Previdência (CPP) passa a ter um novo fato
gerador: “Lucro Bruto menos Investimentos” no período (deixando, assim, de
incidir sobre a folha de pagamentos e criando FORTE estímulo às inversões
produtivas das empresas! ) 17
16Pró-memória: arrecadação em 2009
Tributos sobre a Renda, recolhidos por Empresas
IRPJ + CSLL = 4,1% do PIB
CPP (Empresa) ao INSS = 4,0%
Sub-total: = 8,1%
Tributos sobre a Renda de Pessoas Físicas
IRPF = 3,5%
TRIBUTOS TOTAIS SOBRE RENDAS AUFERIDAS = 11,6%
17 Esta nova base tributária corresponde ao chamado “flat tax” proposto por Robert Hall e Alvin Rabushka, da Hoover Institution, por sua simplicidade de aplicação e incentivo explícito ao investimento empresarial, o que fomentará a empregabilidade e ampliará a base de sustentação dos benefícios previdenciários ao longo do tempo, sendo fórmula, portanto, ideal para a consecução da meta de crescimento aqui proposta. Ver HALL(1995).
38
FINALIDADE PREVIDENCIÁRIA DA ARRECADAÇÃO FEDERAL EXCLUSIVA
No estágio final do programa, em 2020, o gasto federal com a
Previdência Social, em ambos os regimes (geral e especial), estará circunscrito
a 10% do PIB (hoje alcança quase 12%). Ao mesmo tempo em que se
reformulará a Previdência Social para conter gradualmente o dispêndio
previdenciário na faixa de 10% do PIB, o governo arrecadará, anualmente, 10%
do PIB para financiar esta despesa, tendo como fato gerador a renda daqueles
que trabalham ou que recebem quaisquer rendimentos do capital. A tributação
sobre a renda deixaria de ser objeto de partilha constitucional, sendo
compensada aos estados e municípios de outro modo, na repartição do IVA
federal.
O debate anual sobre o financiamento da Previdência Social no
Congresso deverá passar por esta relação direta entre os que trabalham,
pagando tributos sobre suas rendas, e os que não trabalham enquanto
auferem proventos de aposentadoria ou pensão. Este é o sentido político
desta proposta de vincular a tributação da renda ao financiamento do
sistema público previdenciário, causando a necessária discussão política
entre o desejo geral de compensar os beneficiários da Previdência da
melhor forma possivel e, por outro lado, fixar de alíquotas de tributação
de renda que sejam apenas suficientes para bancar tal generosidade.
Segundo bloco de 10% do PIB: tributos da circulação e da regulação
econômicas
Finalidade: financiar as iniciativas ordinárias do poder público federal
(máquina pública)
No momento, nenhum brasileiro é capaz de identificar com clareza para
onde vão os recursos arrecadados em qualquer nivel da administração pública.
É a Babel tributária, em desafio permanente aos princípios da democracia.
Além disso, incidem de modo cavernoso - porque indireto e opaco – os tributos
39
de “má qualidade”, como assim os definiu, criticamente, o tributarista Fernando
Rezende18.
Além de provocarem evidentes e comprovadas distorções alocativas, os
tributos de “má qualidade” são onerosos no seu recolhimento e deletérios à
competitividade nacional. O mesmo poder federal que os inventou deve, agora,
“desinventá-los” como, aliás, parcial e timidamente, estava proposto na
fracassada reforma Mantega-Appy de 2008.
A aglutinação dos tributos de “má qualidade” – IPI, PIS, COFINS,
CIDE, IOF - num único tributo federal do tipo IVA, partilhado com estados
e municípios, é a proposta que encampamos. Os ganhos para os
contribuintes, em tempo e recursos administrativos, serão enormes, mormente
se o regime de arrecadação deste novo IVA-federal funcionar de modo
acoplado ao ICMS estadual e ao ISS municipal, determinando as incidências
destes, desta forma abarcando toda a circulação econômica do País. Grosso
modo, assim opera o regime canadense de dupla imposição indireta (federal e
provincial) sobre bens e serviços, conforme se explica no Apêndice 1.
Eis a atual distribuição dos pesos desses tributos neste segundo bloco,
que também é federal, mas será compartilhado com estados e municípios.
Como vemos, também esta carga federal se aproxima bastante de 10% do PIB,
quando somada aos tributos de natureza regulatória, que também serão
revistos sob os princípios da Eficácia e da Neutralidade.
18
REZENDE (2007) p. 51.
40
Em resumo19:
Segundo Bloco: IVA de âmbito federal, compartilhado com estados e
municípios
Serão aglutinados num único IVA-federal todos os tributos de “má qualidade”
(IPI, IOF, PIS, COFINS e CIDE)
Esta arrecadação federal, que hoje não é compartilhada (à exceção do IPI),
passará a sê-lo
Tributos de natureza regulatória (II e IEx) serão tolerados na nova estrutura
À primeira vista, esta segunda fatia parece muito “apertada” para
financiar todas as ações do Executivo federal, especialmente quando aqui
incluídas as despesas com encargos financeiros da dívida federal e o
compartilhamento de receitas através de fundos de participação. Entretanto,
são nada mais que 10% do PIB nacional, representando, portanto, uma
espécie de “taxa de administração” adequada e suficiente, desde que a gestão
pública se mantenha módica e, sobretudo, EFICIENTE.
19
Pró-memória: arrecadação em 2009
Tributos federais de “Má Qualidade”
IPI = 1,4% (% do PIB)
Cofins + PIS = 5,0%
Sub-Total = 6,4%
Tributos de natureza Regulatória
IOF = 1,7%
Cide = 0,3%
Importação = 0,5%
Outros = 1,0%
Sub-Total = 3,6%
TRIBUTOS FEDERAIS DE CIRCULAÇÃO E
REGULAÇÃO = 10 % DO PIB
41
A BUSCA DO PARÂMETRO DE MÁXIMA EFICIÊNCIA PÚBLICA É
ESSENCIAL NA UTILIZAÇÃO CRITERIOSA DOS RECURSOS DESSA
SEGUNDA FATIA DA TRIBUTAÇÃO GERAL. OS CIDADÃOS DEVEM
FISCALIZAR O EMPREGO DESTA VERBA ENORME E SABER COMO ELA
SE DISTRIBUI.
Como apresentado ao início, duas grandes verbas caracterizam o gasto
público federal corrente: pessoal e encargos financeiros, cada uma com
cerca de 5% do PIB. (Não mencionamos aqui a maior verba de todas, a
previdência geral e a especial dos servidores, por já haver sido tratada à parte
no bloco anterior).
Os encargos financeiros já representaram sozinhos quase 10% do PIB,
por pouco não inviabilizando a capacidade do País em continuar honrando
seus pagamentos. Com a gradativa redução de juros reais, embora muito lenta,
torna-se possivel vislumbrar a acomodação da verba de encargos financeiros
na segunda fatia, pelo esforço permanente de geração de um “superavit fiscal
primário” para este fim. Mesmo assim, parte desse encargo é rolado no
mercado, pela assunção de dívida nova, quando não financiado diretamente
pela emissão de moeda nacional.
A missão que pareceria impossivel nesta segunda fatia – financiar todas
as ações e compromissos federais (exclusive Previdência) - se torna viável
quando nos recordamos que:
• os encargos financeiros podem e devem baixar ao nivel máximo de 3%
do PIB nesta década através de uma gestão mais independente da
dívida pública
• significativas arrecadações de “royalties” e de participações especiais,
pela União, na exploração de petróleo, acrescidas aos dividendos sobre
aplicações do fundo soberano, comporão fonte nova e crescente de
recursos nesta fatia
• distribuição mais eficiente dos serviços básicos (educação, segurança,
saúde) entre as três esferas de governo pode e deve resultar em
enorme economia de recursos.
42
Estes três itens representam um potencial de economia não inferior a
5% do PIB anual, durante a primeira década de implantação do programa.
Portanto, é como se a União partisse de um patamar de 15% do PIB para
realizar suas ações e pagar seus compromissos, além de compartilhar os
recursos de fundos estaduais e municipais. É viável.
Terceira fatia de 10% do PIB: tributos da Federação (estados e
municípios)
Finalidade: financiar as ações dos entes federativos estaduais e
municipais
Trata-se de uma proposta prática pois preserva o atual equilíbrio de
forças entre a Federação (estados e municipios) e a União. Ao longo dos
últimos anos, a União apropria e gasta cerca de dois terços da carga fiscal, ai
incluindo a previdência social, enquanto a Federação fica com o outro terço.
Tal distribuição é preservada exatamente entre as três fatias sugeridas, no
esquema “Dez, Dez, Dez”.
A Federação tem o desafio de simplificar e consolidar a legislação do
ICMS – o grande imposto sobre valor adicionado, criado de modo pioneiro no
Brasil pela dupla Campos-Bulhões – e avançar também na harmonização da
incidência do ISS, conjugado ao ICMS.
43
Em resumo20:
Terceiro Bloco: Tributos federativos (estados e municípios)
ICMS harmonizado com a cobrança do IVA - Federal e partilhado com
municípios
ISS conjugado ao ICMS
Municípios arrecadam os impostos relativos à propriedade e sua
transmissão
Estados e municípios complementam suas receitas com rendas de
royalties e participações especiais.
O esforço das unidades federativas deve ser da mesma intensidade do
programa reformista lançado no âmbito federal. O ”exemplo que vem de cima”
deve servir para estimular a boa criatividade e elevar a eficiência do gasto
corrente em nivel local, desafio em tudo equivalente ao que será enfrentado no
plano federal.
Embora sem entrar em detalhes operacionais, a arquitetura política da
nova estrutura tributária, no âmbito federativo, será negociada e detalhada
pelos parlamentares na Câmara e no Senado, simultaneamente à aprovação
das alterações destinadas ao âmbito federal. Assim, ficará mais simples
acoplar as duas fatias do bolo fiscal ao se implementar um IVA-federal que
20 Pró-memória: arrecadação em 2009
ESTADOS
ICMS = 7,3% (% do PIB)
Outros estaduais = 1,3%
Sub-total dos Estados = 8,6%
MUNICÍPÍOS
ISS + outros municipais = 1,8%
TOTAL DA FEDERAÇÃO =10,3%
44
discipline e harmonize a incidência do ICMS estadual, e se possivel também,
do ISS municipal, ao estilo da dupla incidência praticada no Canadá21.
Providências Complementares na Reforma Previdenciária
O legislador reformador também deverá assegurar que:
1- As receitas anuais de origem previdenciária de pessoas físicas na força
de trabalho (com receitas atualmente estimadas em 2% do PIB) serão
apartadas das receitas fiscais regulares e comporão um PECÚLIO
INDIVIDUAL administrado pelo Fundo Gestor a ser criado em âmbito
federal. O governo federal poderá ter acesso a tais receitas, inclusive e
principalmente para financiar a infraestrutura, tomando emprestado ao
Fundo Gestor, pela emissão de dívida federal de longo prazo.
2- A contribuição patronal ao INSS (CPP) se somará, no âmbito do IR
Empresas, para o financiamento exclusivo da previdência social, do
mesmo modo que o CSLL (este será fundido ao IR pessoa jurídica). As
alíquotas do novo IRPJ e da CPP refletirão, portanto, o custo efetivo de
a sociedade financiar a previdência social obrigatória. A arrecadação do
IR pessoa física complementará o esforço dos que trabalham em
suportar uma das estruturas previdenciárias mais pesadas do mundo.
Em vista de ser um imposto dedicado, o novo IR deixará de ser objeto
de partilha com estados e municípios, sofrendo com isso a modificação
constitucional correspondente.
3- As máquinas federal e da Federação serão custeadas por um IVA duplo,
do tipo “canadense”, composto de duas parcelas aplicadas juntas ao
preço das mercadorias e serviços, de modo explícito, para informação
do consumidor sobre quanto custa financiar cada nivel dos orçamentos
públicos. O IVA-federal custerá a máquina do governo federal, enquanto
21
Ver no Apêndice 1 uma descrição do sistema canadense de duplo IVA.
45
o ICMS (na nova forma de um IVA-federativo) custeará, as máquinas
estaduais e municipais. O compartilhamento federativo atual passará a
se dar, de modo mais direto e simples, no próprio ato da arrecadação
desse novo e duplo IVA .
4- Alguns tributos regulatórios poderão desaparecer – caso da CIDE – ou
serão contingenciados para não ter arrecadação que ultrapasse a carga
máxima total de 10% do PIB na fatia compartilhável da arrecadação
federal. Da mesma forma, os impostos sobre a propriedade imobiliária e
automotiva, que complementam a arrecadação municipal e estadual,
respectivamente, balizarão as alíquotas do duplo IVA, para que a carga
total de custeio das máquinas federativas não ultrapassem seus 10% do
PIB.
46
VII
O PAÍS PÓS-REFORMA: VANTAGENS E RESULTADOS DURADOUROS
Mediante a aplicação do programa de desoneração tributária, será
possível manter um nível de arrecadação e de gasto público crescentes.
Contudo, o PIB simulado pela nova estrutura fiscal elevará o bem-estar geral a
um nível significativamente maior do que na situação de permanência do
status quo.
QUADRO XVI – BRASIL: EVOLUÇÃO DAS PROJEÇÕES DE PIB E
RECEITA FISCAL EM DOIS CENÁRIOS, COM E SEM REFORMA
TRIBUTÁRIA, 2010- 2020
PIB e Receita Fiscal: 2010-2020R$ bilhões, a preços de 2009
1000
2000
3000
4000
5000
6000
7000
09 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 201000
1400
1800
2200
2600
3000
PIB com Reforma(cresce 6% ao ano)
PIB sem Reforma(cresce 3,2% ao ano)
Arrecadação com Reforma
(carga atinge 30% do PIB) Arrecadação sem Reforma
(carga atinge 39% do PIB)
PIB
Arrecadação
Fonte: IBGE, IBPT; Projeção RC Consultores
A nova estrutura tributária é, portanto, uma vigorosa ferramenta
econômica de criação de valor, de geração de riqueza e de maior bem-
estar.
O conceito de “fertilização” é essencial no julgamento de uma reforma
fiscal. Se a proposta se mostrar incapaz de deflagrar, desde o primeiro
47
momento, o interesse e a emoção do público, não produzirá o essencial, que é
a mobilização de novas iniciativas econômicas, ou seja, mais decisões de
investimento e, de outro lado, mais equidade na distribuição dos ônus fiscais.
Para fertilizar a economia e fazê-la crescer, o programa fiscal deve
compreender um orçamento-meta para os tributos que compõem a carga
tributária.
Ainda resta ser introduzido o conceito de programação fiscal
plurianual, através do orçamento-meta, assim caracterizado dentro da Lei de
Diretrizes Orçamentárias (LDO). Através da disciplina de programação
orçamentária, serão estabelecidos os limites de dispêndios e de tributação para
os três níveis do governo e para a Previdência Social, com base na meta de
redução da carga total para 30% do PIB, nos próximos dez anos, e sua
manutenção nesse nivel a partir daí.
Com tal composição tributária, e um orçamento-meta plurianual para seu
fiel cumprimento, o Brasil estaria, finalmente, em condição de ser considerado
um país plenamente integrado à competição internacional do século 21,
merecendo a confirmação de sua condição “investment grade”, em termos de
qualidade do crédito soberano de longo prazo. A implantação da Reforma
Tributária traria, sobretudo, a almejada aceleração do crescimento, para a
média de 6% ao ano. Com isso, em 2020, o PIB do Brasil, a preços de 2009,
alcançaria a cifra de R$ 5,9 trilhões (contra R$ 3,1 trilhões em 2009), e a carga
tributária, uma vez limitada a 30% do PIB, arrecadaria um total de R$ 1,8 trilhão
(contra R$1,1 trilhão em 2009). A renda per capita anual saltaria de R$ 16,4 mil
para R$28,5 mil, o que significará quase DOBRAR EM UMA DÉCADA!
Mais importante, porém, será a mudança transformadora na “cara”
do País. Ao invés de um país ainda lento, pesado, com máquina pública
obesa e ineficiente, com uma Previdência Social cada vez mais deficitária
e sem pecúlio próprio, teremos um país com uma taxa de investimento
total se aproximando de 25% do PIB, com maior distribuição de renda, a
partir de muito maior número de empregos produtivos. Tudo isso será
obtido sem redução do quantitativo de arrecadação pelos três níveis de
governo.
48
Através das discussões sobre a reforma tributária, estará sendo
consolidada a transformação do País no horizonte 2020. Se a sociedade lutar
por transformar sua “cruz tributária” num fardo menos pesado, estará também
garantindo um futuro completamente diferente para as futuras gerações de
brasileiros.
QUADRO XVII – BRASIL 2011- 2020: A “CRUZ TRIBUTÁRIA” INVERTIDA
PIB e Carga fiscal: 2011-2020
2500
3000
3500
4000
4500
5000
5500
6000
09 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20
PIB
(R
$ b
ilhõ
es)
30%
31%
32%
33%
34%
35%
36%
Car
ga
Tri
bu
tári
a (%
PIB
)Carga tributária % PIB PIB a preços de 2009
Início da reforma
Fonte: IBGE, IBPT; Projeção RC Consultores
49
VIII
REFORMA CONTRA AS EXTREMAS DESIGUALDADES DE RENDA
As extremas desigualdades de renda pessoal e familiar, como ainda hoje
verificadas no Brasil, não só ofendem aos princípios democráticos como menos
ainda colaboram para o crescimento acelerado. Uma estrutura tributária
ajustada aos interesses nacionais não pode conviver com uma realidade social
infensa à equidade, mesmo admitidas as desigualdades naturais, as de
oportunidades e as oriundas de sorte ou circunstância.
O paradoxo brasileiro, bem típico de comunidades com expressivas
assimetrias de informação no corte transversal de sua população, decorre do
sistema tributário atual. Este não tem colaborado para mitigar as desigualdades
extremas de renda pessoal. O peso da tributação indireta no País é enorme: de
ICMS, de ISS e de tributos de “má qualidade”, estes últimos caracterizados
pela multiplicação de categorias exóticas, nomeadamente, o IPI, COFINS, PIS,
CIDE, IOF e CPMF (esta, em boa hora extinta, mas ameaçando retornar). Os
brasileiros acabaram se conformando com uma estrutura de tributos que
AGRAVA A FORTE DESIGUALDADE DE RENDA PESSOAL E FAMILIAR.
Estudos recentes22 apontam a absoluta REGRESSIVIDADE do sistema
atual. Temos uma estrutura de tributos baseada em incidências indiretas sobre
o consumo, inclusive de alimentos e remédios, que pesam tanto mais nos
orçamentos quanto mais pobre for a família do brasileiro. Numa dessas
pesquisas, embora realizada sobre uma base de dados de 1996, pelo IPEA,
órgão de planejamento e estudos do próprio governo federal, aponta-se a
assombrosa carga tributária INDIRETA de 26,5% sobre a renda líquida de
famílias com menos de 2 salários mínimos da época.
A explicação para tal distorção está na maior concentração dos gastos
em consumo pelos mais pobres e a forte taxação de alimentos e remédios,
entre outros. Enquanto isso, a faixa de renda máxima, acima de 30 mínimos,
22
Ver FECOMERCIO (2006).
50
era tributada indiretamente em apenas 7,3% da sua renda líquida. Alimentos e
gastos em saúde suprimiam, via tributos, nada menos do que 8,8% da renda
líquida dos mais pobres, enquanto cortavam apenas 1,7% do rendimento dos
mais ricos.
Média Até 2sm 5 a 6 sm 10 a 15 sm Mais de 30sm
São Paulo 9,25 25,77 13,34 10,4 7,28
Curitiba 11 30 16,23 12,21 9,07
Belém 10,84 30,07 15,93 9,89 7,07
Fortaleza 10,43 26,32 16,01 11,24 5,73
Total das Áreas** 9,87 26,48 13,98 10,47 7,34
*Percentual sobre a renda disponível** Média total ponderada
QUADRO - XVIII CARGA TRIBUTÁRIA INDIRETA POR FAIXA DE RENDA(EM SALÁRIOS-MÍNIMOS) %*
Fonte: POF / IBGE (1996) – Elaboração: VIANNA (2000)
A tributação direta (IR, INSS, IPTU etc) incidente sobre a renda dos mais
ricos, nem de longe compensava a carga majorada dos tributos indiretos sobre
os mais pobres. Na pesquisa de 1996, esta tributação direta apresentava um
peso entre 1,7% da renda bruta na faixa inferior a 2 salários mínimos, contra
10,6% na faixa superior a 30 mínimos. De lá para cá, muito pouco mudou,
senão para demonstrar que a distorção distributiva foi se agravando, como se
constatou em pesquisa mais recente conduzida por especialistas de São Paulo
para FECOMERCIO.23
23
Entre os quais se destaca a ordenação feita pela professora Maria Helena Zockun.
51
QUADRO XIX – BRASIL: CARGA TRIBUTÁRIA DIRETA E INDIRETA, POR
CLASSES DE RENDA, EM SALÁRIOS-MÍNIMOS (1996)
0
5
10
15
20
25
30
Até 2 2 a 3 3 a 5 5 a 6 6 a 8 8 a 10 10 a 15 15 a 20 20 a 30 + de 30
Carga tributária direta e indireta sobre renda, segundo classes de renda em salários-mínimos para o total das áreas
Tributo indireto Tributo direto
Fonte: POF / IBGE (1996) – Elaboração: VIANNA (2000)
Não deixa de ser paradoxal que as mesmas contribuições ditas “sociais”,
votadas em regime democrático na Carta de 88, para supostamente aliviar as
desigualdades através de programas de distribuição de renda, tenham se
convertido nas lanças da tributação indireta, a perfurar o bolso dos mais
pobres, acentuando a iniquidade fiscal. Inibir, ou melhor, eliminar tais
categorias tributárias anômalas é obra cidadã e urgente. As duas
administrações voltadas para o “social”, desde o lançamento do plano Real em
1994, deixaram de alcançar tal objetivo reformista.
A nova estrutura tributária aqui proposta, busca mitigar tais anomalias,
ao se propor excluir, de uma só vez, o IPI, a COFINS, o PIS e a CIDE. Porém,
é imperativo reconhecer que tal eliminação de categorias diversas não produz
o efeito final de desonerar completamente os preços sobre os quais incidirá o
imposto substituto que, portanto, continuará pesando, embora menos do que
antes, nos orçamentos dos mais pobres. Ao transferir alíquotas dessas
categorias excluídas de tributos ao âmbito de um único imposto, o IVA-federal,
52
algum ganho se pode até almejar, porém ainda pequeno, se a alíquota deste
IVA refletir todo o peso dos tributos eliminados. O ganho será, inicialmente, por
efeito de aumento da eficiência em sua incidência e supressão dos efeitos de
cascata.
Se quisermos, e devemos querer, diminuir o fosso da desigualdade
tributária camuflada de “social”, algumas providências complementares são
requeridas nesta reforma tributária.
MEDIDAS REFORMISTAS E REDISTRIBUTIVAS DA RENDA PESSOAL
1- Isentar por completo uma cesta básica pré-definida, composta de
itens da alimentação e medicamentos, que traria um ganho
estimado de até 8% na faixa de renda até 2 salários mínimos.
2- Investimento integral da contribuição previdenciária ao INSS
(parcela do trabalhador) através da constituição de uma conta
individual de participante ativo, mediante a qual cada contribuinte
do INSS adquirirá quotas do Fundo gestor de recursos da
Previdência Social, a ser criado conforme reza o artigo 68 da Lei de
Responsabilidade Fiscal. Isso corresponderá a uma desoneração
parafiscal da ordem de 2% do PIB, equivalendo a cerca de 8% da
renda de até 10 salários mínimos, uma vez que o tributo
previdenciário se converterá em pecúlio individual do trabalhador.
3- Manutenção, com revisão periódica, das transferências
assistenciais como Bolsa-familia que, continuarão assim,
compensando, pelo menos em parte, o ônus relativo da tributação
indireta sobre o orçamento das familias mais pobres. O Bolsa-
família opera como um “imposto de renda negativo”24. De modo
24
Conceito elaborado por Milton Friedman e outros professores, nos anos 70, na Universidade de Chicago.
53
semelhante, o novo subsídio à casa própria popular, contido no
programa federal “Minha Casa, Minha Vida”, contém mecanismo
de compensação de rendas, mediante estímulo à formação de
poupança imobiliária familiar, nas camadas de menor renda
asssalariada, destarte propiciando uma redistribuição não só de
renda corrente, como também de riqueza.
4- Por último, e mais importante, o IVA-federal deve ser dotado de um
mecanismo periódico, previsto em lei, de aferição de consecução
dos grandes objetivos previstos na reforma, de modo que estes
“não se percam no tempo”. Como um desses grandes objetivos é
o de tornar a tributação indireta, a cada ano, mais módica, a
alíquota do IVA-federal pode ser CADENTE ao longo do tempo,
uma vez compensada pela crescente distribuição de “royalties” e
participações especiais, a serem apropriadas pelos governos
federativos e pelos cidadãos, via fundos de destinações diversas.
O recebimento de royalties pelas unidades federativas será
condicionado a um programa de redução de alíquotas dos tributos
indiretos.
As medidas REFORMISTAS DE CARÁTER REDISTRIBUTIVO,
necessárias ao alcance de maior equidade na incidência dos tributos
indiretos, são absolutamente prioritárias a fim de tornar a nova estrutura
tributária um sucesso inquestionável do ponto de vista do avanço social.
54
IX
REFORMA TRIBUTÁRIA COMO FATOR DE DINAMISMO REGIONAL
Estados e municípios prezam sua autonomia política na Federação.
Carregam, contudo, uma inclinação comodista pela dependência financeira que
cultivam das verbas tributárias da União. O compartilhamento de arrecadações,
enquanto instrumento de simplificação de procedimentos e incidências, não
guarda vícios de origem. Mas acabou se tornando, ao longo da sua prática no
Brasil, uma prerrogativa constitucional quase petrificada. Os Fundos de
Participação de Estados e Municípios, respectivamente FPE e FPM, criados
para organizar a partilha de certos tributos federais, deveriam se restringir à
sua natureza suplementar das receitas próprias das unidades federativas, até
para justificar a condição de maioridade política de que se revestem estados e
municípios.
Quadro XX – BRASIL: RECEITAS FEDERAIS TRANSFERIDAS A ESTADOS
E MUNICIPÍOS, EM % DA RECEITA TOTAL*
5%
6%
7%
8%
9%
10%
11%
95 96 97 98 99 00 01 02 03 04 05 06 07 08 09
Fonte: BACEN. *Inclui transferências totais.
55
Na prática, porém, estabeleceu-se um forte vínculo de dependência à
partilha federal. Apenas um minguado número de municípios, que concentram
em seus territórios considerável atividade econômica tributável, poderia ser
considerado financeiramente maduro – um claro sinal disso sendo medido por
seu baixo potencial de endividamento no mercado e presumida incapacidade
de emissão de obrigações de dívida municipal.
Este mercado de títulos “sub-soberanos” hoje não existe. A restrição ao
endividamento de estados e municípios nasceu da própria experiência negativa
de quase falência de muitos deles, cuja dívida terminou por ser objeto de
“federalização” na sequência do plano Real, quando, em 1995, a dívida de
estados e municípios que estava em poder do mercado começou a ser trocada
por papéis de emissão do Tesouro Naciona, através de vários programas
atrelados ao saneamento das finanças das unidades federativas.
A boa notícia é que, de lá para cá, a disciplina fiscal tem sido
aperfeiçoada. A lei de Responsabilidade Fiscal foi decisiva no sentido de impor
maior prudência orçamentária, ao estabelecer barreiras quantitativas
absolutamente claras aos niveis máximos de endividamento estadual e
municipal. O resultado é que vários estados e diversos municípios readquiriram
capacidade de endividamento. Alguns poucos, inclusive, voltaram até a ser
captadores no mercado, embora de modo incipiente25.
LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL
Fato é que a União se vem tornando, residualmente, o ente que mais
tem contribuído para a persistência de um deficit fiscal residual ao nivel do
setor público como um todo. “Casa de ferreiro, espeto de pau”, diz muito bem o
ditado, quando nos lembra que, frequentemente, deixamos de cumprir, com
zelo semelhante, as regras que aos outros impomos.
A União, por seu turno, contina sofrendo contínua pressão para ser a
fonte inesgotável de solução para todos os apertos financeiros de estados e
municípios, o que coloca a estes na confortável posição de obstruir o processo 25
Enquanto não for definitivamente superada a dívida oriunda de Precatórios, os entes federativos
padecerão de falta de credibiladade.
56
legislativo federal, até conseguirem certas benesses sob forma de emendas
parlamentares. Há que se reconhecer duas realidades inegáveis. Primeiro,
houve melhoria generalizada dos comportamentos financeiros dos entes
públicos sub-soberanos, independentemente das bandeiras partidárias que os
administram, o que mostra ser a origem de bons e maus administradores, em
geral, desvinculada de qualquer inclinação ideológica. Isso é boa constatação.
O desempenho fiscal do setor público só ficará melhor ainda, no entanto,
quando a lei de Responsabilidade Fiscal for aplicada integralmente, até à
União.26
Segundo, a gestão orçamentária prudencial, especialmente no plano das
finanças públicas, vem ganhando espaço como conceito a ser seguido pelos
poderes públicos, até com prêmios conferidos aos gestores locais que mais se
destacam pela excelência de sua administração fiscal e financeira. Embora
processo lento, deveria este ser justamente incentivado e estimulado numa
reforma tributária, através de critérios oficiais, sempre flexíveis e adaptativos no
tempo, que premiem a melhor gestão municipal por uma distribuição horizontal
de recursos algo mais generosa. Para quem acha ser isso impossivel, não é.
Critérios ponderados por desempenho são frequentes em países federativos.
REVISÃO DOS CRITÉRIOS DE PARTILHA FEDERATIVA
Respeitando suas respectivas idiossincrasias, países tão diferentes ( e tão
similares, a seu turno) como Alemanha, Austrália, Canadá e India, apresentam
soluções modernas de compartilhamento flexível de receitas fiscais, que
buscam equilibrar, dentro das respectivas federações, seus direitos (à partilha
de recursos) com seus deveres (de prestação de serviços públicos) no plano
vertical, e na distribuição horizontal, ou seja, entre os entes de mesmo nível,
critérios que mesclam a equidade (que protege os mais débeis ou pobres) mas
também premia os mais EFICIENTES27.
26
Sobre uma análise crítica definitiva da LC no.101/2000, é preciso consultar o ensinamento seguro do mestre Diogo de Figueiredo Moreira Neto em MOREIRA NETO (2001).
27 Sobre a experiência reformista de diversos países, ver Apêndices 1, 2 e 3.
57
O equilíbrio federativo é condição essencial à unidade política da Nação
a longo prazo, sendo intolerável cogitar que determinadas regiões do nosso
País fiquem à margem do dinamismo que hoje retomamos nacionalmente pela
superação de vícios e restrições orçamentárias do passado recente. Todos têm
direito ao progresso, até porque nosso território é abençoado, talvez como
nenhuma outra nação, inclusive os Estados Unidos, com uma distribuição tão
equitativa e tão variada de “riquezas”, seja por virtude da natureza ou por
talentos humanos, estes por toda parte. E mais. Esta abundância imensa é
caracteristica de toda a América do Sul, indistintamente. Somos, portanto, um
grupo privilegiado de nações, em busca de mais organização e menos
corrupção.
Este reconhecimento de nossos “dons iniciais” (o “endowment”) é
importante para situarmos os termos certos de uma partilha federativa na
reforma tributária, que nunca deverá chegar a ponto de sacrificar os objetivos
nacionais em prol de um rígido e petrificado comando constitucional em favor
de estados e municípios.
A partilha tributária existe, enfim, para equilibrar até certo ponto o
alcance de uma estrutura de serviços essenciais a todos os brasileiros. E tal
objetivo deve ser objeto de apreciação periódica pela sociedade através de
seus representantes. Para vincular adequadamente o recurso fiscal
compartilhado ao objetivo de eficiência no gasto público em qualquer nivel de
governo, a primeira e essencial providência é que a fonte tributária da partilha
fiscal não se espalhe a um sem-número de categorias de tributos.
CONCENTRAÇÃO DA PARTILHA NO IVA
ESTA FONTE DE PARTILHA DEVE SER, PRIMORDIALMENTE, O
IMPOSTO DA CIRCULAÇÃO ECONÔMICA, independente do nome que tenha.
Aqui o reconhecemos, combinadamente, como IVA-federal, ICMS estadual e
ISS local.
58
Nossa proposta é que incida este tributo com duas alíquotas (uma delas
sendo a do IVA-federal e a outra, federativa, de estados e municipios) sobre a
venda de bens e serviços, e de forma tão uniforme (poucas alíquotas, não
díspares) e geral (abrangente) quanto seja possivel, à exceção do rol isento de
primeiras necessidades já mencionada antes. Além do ganho radical de
simplificação administrativa e do “choque” de transparência impositiva, os
contribuintes poderão finalmente enxergar, se quiserem, quem recebe o quê, e
para qual fim. Isso representará a elevação de nosso regime tributário a um
estágio não apenas de respeito formal à legalidade fiscal, mas sim, a uma nova
experiência de liberdade política de fato, como expressão da cidadania no
século da informação.
A atual rigidez da partilha constitucional, sua impraticável complexidade
de regras, a multiplicidade de incidências e de exceções às incidências, como
ocorre com as atuais nefastas contribuições sociais, nos levam à inevitável
conclusão que o atual regime se presta à manipulação política, pelos
detentores do poder, através das verbas que transitam opacamente por
orçamentos totalmente indecifráveis, independentemente do esforço que
organizações civis façam para dotar o cidadão de informação inteligível. A
estrutura tributária hiper-compartilhada que está incorrigivelmente torta. A
simplificação deve ser, portanto, absoluta, para ser eficaz.
A proposta aqui esboçada, além das vantagens simplificadoras que traz,
guarda neutralidade frente aos grandes quantitativos da partilha vertical, isto é,
na distribuição da União para os estados e municípios e, destes, entre si, nos
seus respectivos territórios.
Com efeito, o produto da arrecadação do imposto de renda, que se
propõe aqui exclusivamente federal e não compartilhável, tem uma dimensão
bastante semelhante à verba, hoje não partilhada, das contribuições sociais
cuja arrecadação, uma vez fundida no novo IVA-federal, compensará a não-
partilha do IR. Não há que se cogitar, por isso, de riscos de queda de
arrecadação ou mesmo de dificuldades operacionais, decorrentes da nova
estrutura. Pelo contrário, com ela tudo se simplifica e se visibiliza.
59
Os entes municipais que, ainda assim, persistirem aquém de um
mínimo de autofinanciamento em bases locais, - e é importante, a esta altura,
lembrar que o imposto sobre a propriedade urbana representará uma
ponderável fonte de recursos locais, à qual se poderia cogitar de conceder,
nesta reforma, a competência municipal ao ITR (imposto territorial rural) – se
comprovadamente incapazes de pagar suas contas essenciais, devem ser
absorvidos por vizinhos que o consigam.
COMO TRATAR ROYALTIES E PARTICIPAÇÕES ESPECIAIS
Na partilha do futuro, pós-reforma, atenção especial deve ser dada
também aos efeitos da nova lei federal que regulará a repartição da exploração
do pré-sal. Esta será uma nova e significativa fonte de partilha. Mais um motivo
para se lhe dar tratamento menos rígido e mais equitativo, uma vez que esta
bonança nasce como prospecto inesperado para seus supostos beneficiários
territoriais. É fundamental que toda a “família” brasileira tenha acesso a ganhos
desta natureza. E os terá, na medida em que a União abocanhe a fatia mais
expressiva da renda extra do petróleo para fazer, a partir daí, uma
redistribuição segundo critérios legais. O grosso dessa distribuição deve ficar
com as gerações futuras, através da cobertura do Fundo gestor da Previdência
Social, conforme comando da lei de Responsabilidade Fiscal. O contribuinte
fiscal também deve ser agraciado com uma concomitante redução de alíquota
tributária da taxação federal indireta (IVA-federal), como se propõe neste
estudo.
GUERRA FISCAL E INCENTIVOS: COMO FAZER
Os estados da Federação também expressam sua angústia de
crescimento quando buscam atrair e capturar a localização de empresas-
chave, seja por valor adicionado, seja por ampliação do seu mercado de
trabalho, ou até por sinergias com outros ramos da indústria, numa dada
região. “Guerra fiscal” é a expressão caricata dessa acirrada concorrência
através da concessão de incentivos tributários. Isenções ou reduções
60
tributárias, autorizadas por um estado ou município, não podem ser, em plano
liminar, coibidas sob pena de violar a autonomia federativa. O que fazer, então,
para restringir a prática hiper-competitiva sem inibir o princípio da autonomia
federativa?
Começamos por afirmar que um ente federativo disposto a incorrer em
“despesa tributária” tampouco revela necessidade premente de recolher uma
fração desproporcionalmente favorável na partilha do FPE ou FPM. A razão
parece óbvia, pois se este abdica de tributo é porque tem meios suficientes
para manter sua estrutura sem ajuda adicional da repartição federativa.
Mecanismo de aferição destas “despesas tributárias”, realizadas pelas
unidades federativas ao longo do tempo, e controladas, em volume e
destinação, por um orgão técnico federal como, por hipótese, o IPEA (Instituto
de Pesquisas Econômicas Aplicadas) teria por finalidade específica a aplicação
de um coeficiente de “deságio” na partilha federativa, no ano seguin à
verificação, sobre aqueles entes, estados ou municípios, mais ativos na
concessão de reduções e isenções tributárias. Desta forma, ficaria preservado
o direito de cada ente federativo à sua própria política impositiva, o que é
normal numa federação, resguardando-se, por outro lado, o interesse de
harmonização coletiva da Nação.
61
X
ARQUITETURA TRIBUTÁRIA PARA O NOVO SÉCULO
Toda ciência funciona como uma caixa, repleta de pequenos e grandes
compartimentos estanques. Em cada nicho, vão sendo guardados os
“achados”, que constituem as peças do quebra-cabeças do conhecimento
científico em dado campo de investigação. Para fazer a ciência avançar,
entretanto, devemos nos esforçar para “pensar fora da caixa”, numa clara
alusão à eventual superioridade metodológica de se tentar questionar a
arrumação original das peças do mosaico científico, para daí evoluir até algo
conceitualmente novo e que, obviamente, faça sentido, incorporando assim,
uma dimensão intelectiva ainda não experimentada à vida humana.
Na prática da arquitetura, ou aliás, em qualquer processo construtivo
que envolva ciência e arte, é essencial avançar com critérios de
funcionalidade, simplicidade e beleza. Se esses conceitos forem transportados
à ciência tributária, que tampouco deixa de ser uma “arte” ( isto é, a arte de se
convencer e conduzir uma comunidade a bancar as realizações do Estado)
verificaremos quão distantes nos temos colocado do que é simples, belo e
funcional, na atual estrutura tributária nacional. Não obstante, é dessa busca
que tratamos como nosso objetivo final numa reforma tributária: retomar a
simplicidade do ato de tributar, e se possivel, com funcionalidade e beleza. Daí
a inspiração, também, desta proposta de uma “reforma da reforma”. Quando o
pensamento científico se complica e não avança mais, é preciso buscar algo
“fora da caixa”, por definição, de modo inovador, para não deixar que uma
reforma tributária apenas repita os mesmos desacertos de outras experiências
frustradas.
Ao introduzirem, nos aparentemente “rústicos” anos 60, diversas
reformas simultâneas e deflagradoras da modernidade econômica, nos campos
monetário, tributário e orçamentário, administrativo, trabalhista e financeiro, a
dupla “Roberto Campos - Octavio Gouveia de Bulhões”, além de seus notáveis
62
colaboradores, tinha absoluta consciência do desafio de pensar fora da caixa.
O teste de valor das inovações então introduzidas em tantos campos
distintos – a ponto de a elas podermos nos referir como “reformas
institucionais”, pois ai estavam o novo Banco Central do Brasil, o Código
Tributário, a lei orçamentária, a lei administrativa pública, a lei bancária, entre
tantas outras – se revela não só por alta resistência ao desgaste do meio
século decorrido desde então, como, principalmente, pela inabilidade crônica
das gerações subsequntes de se servirem dos ombros desses gigantes, como
dissera um dia Issac Newton, para dai enxergar e projetar mais longe as
instituições econômicas deles herdadas.
Ao seu tempo, nos anos 60, o ICM – um conceito inovador de valor
adicionado – ainda era motivo de certo espanto e dúvida, firmando-se como
vencedor à medida que mais países o adotavam. O Brasil teve coragem de
inovar naquele momento. Foi pioneiro. Passado, agora, mais de meio século,
para avançar é insuficiente apenas tentar a reforma da casa velha e encardida
pelo tempo. É fundamental buscarmos a reforma da reforma, armados com os
conceitos que nos projetam ao século da informação e da mobilidade em todos
os sentidos. A beleza da nova construção, - alguém perguntará que beleza há
em armar um quebra-cabeças tributário – está, sim, em conformar as vontades
de milhões de cidadãos em torno de um sacrifício de renda ( o tributo) que se
assim justifica e passa a ser melhor aceito se a comunidade conseguir
vislumbrar as efetivas relações de causa-e-efeito entre a arrecadação e o gasto
público, entre a contribuição pessoal e a retribuição social.
Esse tipo de vínculo de legitimação política do tributo praticamente
se perdeu na estrutura tributária vigente. Ela contém um grau de complicação
(não confundir com complexidade!) que, per se, a deslegitima. A busca da
Simplificação se torna, por isso, crucial. E daí a crítica sincera ao formato da
proposta de reforma de 2008, ora em tramitação lenta, por não haver
conseguido se desvencilhar do velho para propor o novo, e ao tentar acomodar
todos os interesses federativos em sucessivas e minuciosas partilhas de
categorias tributárias decadentes. Como na arquitetura de ferro, cimento e
areia, o novo edifício tributário brasileiro tem que ser projetado com arrojo,
única razão de se propor uma reforma que esse termo justifique. Arrojo e
63
abrangência, como já argumentamos antes, são características indispensáveis
para se tentar despertar, no corpo econômico coletivo, os mesmos impulsos de
acumular e investir que se observara na população brasileira entre os anos 60
e 70, quando o Brasil se casou com uma auto-percepção de sucesso e, por
algum tempo, chegou a ocupar o pódio de nação com maior taxa de
crescimento econômico no mundo.
Aqueles, como notamos, eram outros tempos, mais “rústicos”, embora
não menos brilhantes. Servem hoje, se tanto, como estímulo e referência ao
reformador “in vitro” do século 21, já que a complexidade, ai sim, das relações
produtivas e sociais hodiernas, nos exigem muito maior atenção às sutilezas do
quebra-cabeças atual. Os múltiplos encaixes de milhares de peças do tabuleiro
tributário abrem à sociedade brasileira tantas e tão variadas opções que uma
parte considerável do desafio coletivo se converte na tarefa de eleger e
construir apenas um desses caminhos!
Indelegável, como sempre, e insubstituível, é o papel da liderança
política. O momento de propor e fazer a reforma acontecer é quando brota a
planta da esperança no jardim da democracia. Esta esperança está
personificada no líder, que conduzirá o projeto de reforma à sua realização.
Este capital político vale pelo tempo de uma primavera de governo, quando o
que foi plantado tem chance de frutificar.
O Brasil deste início de século repete certas características capazes de
lhe despertar certa confiança no sucesso coletivo, tal como a detinha quando a
taxa decenal de crescimento ultrapassava a marca de 10% ao ano. A meta de
crescer 6%, ora projetada para a próxima década e sugerida neste estudo, não
é substancialmente diferente dos 10% então alcançados nos anos 70, pela
diferença entre o que a população brasileira antes crescia, percentualmente,
sobre o que cresce agora. Portanto, cabe perguntar: se não for pela expansão
da população, por onde o Brasil crescerá desta vez? De onde virá o impulso
necessário à expansão?
A resposta está, mais uma vez, na demografia favorável e na geografia
econômica do País, nesta e nas décadas vindouras. Desde 2000, o Brasil vem
acolhendo sucessivas levas de jovens-adultos (por exemplo, na faixa de 20 a
64
24 anos) que chegam à idade de se colocar no mercado de trabalho. São cerca
de dezoito milhões no presente quinquênio. É a geração mais numerosa de
jovens-adultos de toda história demográfica brasileira, esta que agora chega ao
mercado e à sua maioridade jurídica. Em seguida, pelos próximos três a quatro
quinquênios, ainda observaremos a entrada de outras volumosas levas de
milhões de rapazes e moças, perfazendo, de 2000 a 2030, algo como 100
milhões de pessoas. É deste novo conjunto de jovens trabalhadores que
surgirá (ou não) o Brasil Eficiente que buscamos. Trata-se de um conjunto de
forças de crescimento que associa o efeito do número crescente de novas
pessoas aptas a trabalhar, com a eventual produtividade que deles se consiga,
seja pela escolaridade formal ou pelo treinamento superveniente no trabalho.
Nos anos 50 e 60, a economia do desenvolvimento acelerado se deu por
absorção de milhões de pessoas que, ao se deslocarem do meio rural, se
urbanizavam nos grandes centros e passavam a interagir naqueles mercados
de trabalho e consumo. A expansão ocorreu por aumento de produtividade
mas, sobretudo, pela matemática dos coelhos, ou seja, mais gente chegando e
se empregando. A modernização institucional de então, especialmente a
tributária, dotou o País não só de novos ordenamentos na alocação de
recursos públicos, pelo lado da despesa corrente, como propiciou recursos não
inflacionários para os pesados investmentos de infraestrutura conduzidos pelo
Estado, via ampliação das bases de incidência dos impostos. Aí nasceu o
moderno Imposto de Renda brasileiro e o ICM, nosso imposto de valor
adicionado, ainda sem o S.
A conjugação, portanto, da inovação tributária com a demografia
favorável, por seu dinamismo, gerou a fagulha de progresso que acelerou a
acumulação de capital através dos setores público e privado. O mesmo pode
ocorrer de novo, pois há uma nova onda demográfica, de jovens nascidos nos
anos 70, 80 e 90, anos de crise, que agora chegam para ajudar a virar o jogo.
Mas esta onda pode “encher”, frustrando o surfe dos anos de aceleração de
investimentos e progresso, caso não seja fomentada por uma verdadeira
reviravolta institucional, â frente da qual está a questão da atualização das
bases impositivas do País.
65
Evidentemente, para aderir ao esforço de um programa de aceleração
do crescimento, o brasileiro, especialmente o mais jovem, precisa “enxergar” à
frente. O enxergar leva à participação. O sistema tributário pode contribuir para
focalizar esta visão. O regime previdenciário, para esse fim, é decisivo, pois
lida com as expectativas de futuro.
Daí nossa proposta partir, desde logo, do campo previdenciário, ao
recomendarmos apartar-se, em conta individual de investimento, a parcela de
contribuição do empregado ou autônomo que, por opção, migrará para o novo
sistema de acumulação previdenciária, mantido num Fundo gestor público.
Dele o governo poderá tomar emprestado, para investir na infraestrutura
necessária, fazendo este brasileiro se inserir como participante do capital do
futuro, que irá se fazendo presente pelos investimentos realizados com tal
verba. A carga tributária, por outro lado, cairá, na medida em que a parcela
previdenciária individual migre da arrecadação inominada e compulsória para a
conta de investimento personalizada.
Paralelamente, o Imposto de Renda será calibrado para honrar os
compromissos previdenciários já acumulados e que irão vencendo nas
próximas décadas. Este imposto, incidente sobre as pessoas ativas, sejam
físicas ou jurídicas, vinculará o esforço de quem trabalha ao ócio dos que
alcançaram tal direito. Na nova estrutura tributária, o volume e o sucesso dos
negócios modularão o tamanho do ócio, como assim deve ser numa sociedade
aberta, que faz as suas contas para todos enxergarem.
A diversidade dos serviços públicos e o tamanho da máquina dos
governos serão também regulados pela capacidade de consumir da sociedade.
O duplo tributo (federal e federativo) sobre o valor adicionado na produção e as
eventuais rendas provenientes de extração mineral deverão balizar o
orçamento público nas três esferas de governo.
A estes tributos simplificados se somará o imposto sobre a propriedade
imobiliária, que tem grande potencial de evolução, aliás em evidente vantagem
de eficiência fiscal sobre o outro decadente tributo, alcunhado de “grandes
fortunas”. A propriedade imobiliária, hoje ainda largamente irregular no País e,
portanto, não tributada, poderá se tornar uma decisiva base impositiva local, na
66
medida em que o Brasil encare o desafio de titularizar as posses pacíficas,
usucapíveis e não lesivas ao ambiente. A regularização fundiária e a titulação
plena das propriedades, especialmente em favelas, onde os mais pobres se
organizam para viver, bem como pela formação do patrimônio mobiliário da
nova previdência social, além do conjunto de mecanismos formadores da
poupança pessoal e empresarial, todos esses instrumentos, se
engenhosamente fomentados por uma reforma tributária pensada e arquitetada
fora da caixa do saber convencional, propiciarão a catalização dos elementos
integradores da cidadania econômica, fazendo acontecer o que, hoje, é apenas
sonho na vida de muitos brasileiros.
Esse será o Brasil Eficiente que temos nestas páginas projetado.
67
Anexo 1
BRASIL: A LONGA EXPERIÊNCIA DE NÃO REFORMAR NADA
Se a história moderna da tributação no Brasil tivesse que ser resumida
para quem nunca esteve no País e nada compreendesse de nossos hábitos ou
modo de ser, a narrativa poderia ser organizada em seis “capítulos”, com títulos
sugestivos das idas e vindas, das várias frustrações, após seguidas tentativas
de reforma do sistema tributário brasileiro, desde o arcabouço original de 1965,
bem como dos muitos interlúdios de projetos ensaiados e afinal abortados no
Congresso Nacional. Os capítulos dessa antologia seriam, assim,
cronologicamente divididos:
1. Auge e Declínio: 1965-1985
2. Constituinte Destituinte: 1986 – 1988
3. Esperando Godot na Revisão: 1989 – 1993
4. Escalada ao Bolso do “João”: 1994 – 2002
5. Nada a Fazer I – “o Começo”: 2003 – 2007
6. Nada a Fazer II - “o Fim”: 2008 -...
1965 a 1985 – Auge e Declínio
Pode-se afirmar que a edição do Código Tributário Nacional (lei 5172,
de 1966), na esteira da Emenda Constitucional no. 18, de 1965, representa o
marco e o momento de transição do País arcaico para uma estrutura moderna
de tributação. Singelo e retilíneo, despojado de excessos ou rodeios, como
toda arquitetura clássica, feita para resistir ao tempo, o Código (CTN) se
apoiou em apenas duas vigas mestras. No seu Livro Primeiro, sinteticamente
definiu o Sistema Tributário Nacional e como se distribuiriam as
68
competências para tributar, bem como a partilha vertical (entre os três niveis
federativos) e horizontal (dentro de cada nivel da Federação) da arrecadação
de cada tributo. E, no Livro Segundo, o Código deixou sua contribuição mais
perene, ao instituir as Normas Gerais do Direito Tributário.
Esta simplicidade eficiente e transparente deu sobrevida ao CTN,
passadas quase cinco décadas, até os dias de hoje. E dele provém o resíduo
de segurança jurídica ao afligido contribuinte nacional. Diversas categorias
tributárias lá consagradas já tiveram sua extinção decretada. Porém, as
categorias mais resilientes, como o Imposto sobre a Renda (IR), o Imposto
sobre Circulação de Mercadorias (então ICM, hoje ICMS) e os Impostos
sobre a Propriedade e sua Transmissão (IPTU/ITR/ITBI) têm demonstrado
serem as três pilastras de sustentação de um sistema tributário feito para durar
e com vocação para o respeito aos princípios básicos da equidade social
verdadeira e da capacidade contributiva verificável.
O sistema de 1965, constitucionalizado em 1967/69, teve um rápido
auge de “eficiência fiscal” ao cooperar na materialização de um período de
crescimento extraordinário do País, entre o fim dos 60 e os anos 70, o
chamado “milagre econômico”. E talvez, por isso mesmo, o sistema começou a
ser pressionado ao ensejo das sucessivas crises financeiras que abalaram o
mundo e pegaram o Brasil desprotegido de uma independência energética,
sim, porém desprovido de algo muito mais importante, da capacidade de dizer
“não” ao gasto público inflacionário em tempos de crise. Esta incapacidade,
obviamente, se pode atribuir ao próprio autoritarismo do regime político, que
baseava sua legitimidade na promessa do rápido avanço da renda per capita (a
mesma equação chinesa de manutenção do poder dos tempos atuais...).
Já em 1982, imerso na crise do petróleo, o Brasil recessivo não tinha
mais discurso para segurar os militares no poder. É esse o momento em que o
próprio regime castrense, em ocaso, lança as bases da justificativa social
para o mau tributo, ao editar o Decreto-Lei nº1940, de 1982, ano de extrema
crise econômica, tanto aqui, como na vizinha Argentina, e em toda a região
latino-americana. Este DL é o que cria o FINSOCIAL – Fundo de
Investimento Social, que promete, em seu art.1º., “...custear investimentos de
69
caráter assistencial em alimentação, habitação popular, saúde, educação,
justiça e amparo ao pequeno agricultor”.
Estavam, portanto, ai semeadas, em pleno regime de exceção,
ideologicamente de direita, as linhas do discurso do “tudo pelo social” que
serviria para justificar o assédio vergonhoso ao bolso do contribuinte,
continuado na transição para o regime democrático (Sarney) e, em seguida,
conduzido e implantado pelas autodenominadas “forças de centro e de
esquerda” a partir de 1989. Na realidade, o que tece as semelhanças amargas
entre todas essas experiências é a pedestre necessidade de amealhar
recursos financeiros para o sustento da máquina pública, seja a que título for.
O desequilíbrio fiscal nascido de crises internas e externas, não
adequadamente sanado pela prudência do governante sensato e corajoso,
fatalmente desembocará no apelo populista ao “imposto pró-social”, cuja
aplicação, é bom que se diga, JAMAIS encontrará o caminho do pobre ou do
mais carente, recaindo a carga tributária injusta e casuística justamente em
cima dos ombros mais arqueados da classe trabalhadora. O FINSOCIAL foi
exatamente isso: sendo taxação sobre a renda bruta das empresas, estas
transferiram de imediato o encargo, embutindo-o nos preços de tudo que se
compra neste país. Pagaram os que menos podiam. E ainda pagam.
Enquanto isso, minguava justamente o apoio oficial prometido à
alimentação, habitação, saúde, educação e justiça. O mau caminho estava
traçado pelo mau tributo. Os políticos e seus partidos se puseram
imediatamente de acordo com a “solução” encaminhada. E haveriam de
consagrar o esbulho da prosperidade do povo na pira democrática da
Constituição cidadã de 1988.
1986 – 1988: Constituinte Destitutinte
O que entrara como contrabando na estrutura tributária de 1965, passou
a parasita verdejante na Constituição Federal de 1988 (CF88). No seu
70
art.149, a CF88 alçou as chamadas contribuições sociais à altura de espécie
tributária formal. Em suma, na lição definitiva do mestre Ives Gandra28, nada
sobrou que ainda merecesse a vírgula da dúvida sobre a natureza impositiva
do“..único tipo de contribuição social regulado pelos arts.149, 154, I, e 195”.
Estes são, portanto, os artigos constitucionais que enveneraram de vez o
sistema tributário antecedente, ao liberar o Estado brasileiro, em particular a
União, e privativamente, a chegar ao limite impositivo que bem entendesse,
amparada na escusa genérica do fazer pelo “social”. Não por outro motivo, o
sóbrio doutrinador pátrio, Ricardo Lobo Torres, se refere a esta contribuição
como “exótica” e “anômala”.
Nada obstante, a arrecadação das tais contribuições sociais vicejou, pois
que apartadas da partilha federativa. A esta incidência escondida sobre os
preços em geral se pode, com certeza, atribuir a significativa piora na carga
tributária dos brasileiros mais pobres ao longo de toda a década de 90.
ENQUANTO ISSO NA REFORMA AMERICANA....
O novo momento internacional, a meados do anos 80, no entanto,
deixava para trás a crise da virada da década anterior e o preço do petróleo
começava a refluir a um patamar historicamente normal. Nos EUA, ocorria a
volta vigorosa ao crescimento econômico e a administração do presidente
Ronald Reagan (1981-1988) via, então, condições de avançar na proposta de
uma reforma do Imposto de Renda, que lá representa o esteio da
arrecadação federal. Em 25 de maio de 1985, o presidente americano enviou
ao seu Congresso um projeto que alterava substancialmente as alíquotas
tributárias do IR, tanto das pessoas físicas quanto jurídicas.
Na pessoa física, a proposta de Ronald Reagan foi reduzir de 14 faixas
de incidência (que progrediam de 11% até 50% sobre a renda pessoal) para
apenas três (15, 25 e 35%). E, no âmbito das pessoas jurídicas, o imposto que
28
MARTINS (2008).
71
recaia sobre o lucro das empresas teria sua alíquota máxima reduzida de 46
para 33%, mas com ampliação da base contributiva e redução das hipóteses
de redução ou isenção legal29.
Reagan e seus assessores tinham ideias e propostas claras sobre o
que queriam alcançar e como chegariam lá. Esse é o traço essencial e
distintivo de qualquer proposta de reforma tributária que vá enfrentar o
embate de um Congresso democrático. Reagan queria abrir espaço para o
crescimento, mesmo em sacrifício de algum distributivismo na base da
pirâmide social que, mesmo assim, foi realizado. Em compensação, deixou ele
claro que preferia reduzir a carga marginal do imposto de renda na pessoa
física, compensando a eventual perda de arrecadação com algum aumento na
pessoa jurídica30.
O TAX REFORM ACT norte-americano foi finalmente aprovado em
outubro de 1986, havendo portanto, levado menos de 18 meses em
tramitação na Câmara e no Senado dos EUA. No Brasil, esses fatos passaram
largamente despercebidos, pois o País ainda mantinha confiança na eficácia
dos sucessivos congelamentos gerais de preços e salários como “método” de
controlar a inflação brasileira, ao passo que o eleitorado local tinha seu foco
voltado para eleger um novo Congresso Constituinte.
Interessante notar que o texto final do Tax Reform Act traz a marca
registrada da simplificação do imposto de renda americano, já que as
alíquotas propostas por Reagan para indivíduos, em número de três, acabaram
sendo reduzidas, no Congresso americano, a apenas duas, de 15 e 28%,
aplicando-se apenas um excedente de mais 5% a partir de determinada faixa
de renda. O grande interesse do Congresso americano era buscar o chamado
“Orçamento Equilibrado”, algo que iria ser alcançado, anos mais tarde, na
administração de um democrata, Bill Clinton.
29
A reforma America é descrita em detalhes por IBAÑEZ (1998)
30 De fato, a fatia do imposto de renda da pessoa física recolhida pelos percentis mais ricos dos contribuintes americanos se elevou consideravelmente: no percentil dos 1% mais ricos, subiu de 17,9% em 1981 para 24,7% em 1990; já no percentil dos 50% de renda mais baixa, caiu de 7,4% em 198, para 5,7% em 1990. Ver a tabela completa em HALL (1995) p.45.
72
É desnecessário ressaltar a importância da sinalização positiva dada
pela reforma tributária de Reagan, não só aos cidadãos e investidores
americanos, como para o resto do mundo, em relação à efetiva disposição dos
americanos de superar os soviéticos no então embate ideológico-financeiro
entre os “dois mundos”, o capitalista de mercado e o socialista, de rígido plano
central. Curioso lembrar também que, paralelamente ao choque de
racionalidade no campo tributário, duas medidas de superação de limitações
econômicas já haviam sido tomadas por Reagan. A primeira, e talvez, decisiva,
fora a reformulação da Previdência Social (o “U.S. Social Security”), que
então apontava para um deficit explosivo. Corrigida essa tendência, mesmo em
ambiente recessivo, ao início dos 80, Reagan logo atacou a questão paralela
do que chamou de “Guerra à Gastança” dentro do próprio governo federal.
Reagan teve a coragem de nomear uma Comissão independente, composta
por empresários, e por estes financiada que, em dois anos, entre 1982 e 1983,
vasculhou as contas do governo federal americano, inclusive no delicado item
de “Defesa”, apontando onde e como cortar o DESPERDÍCIO generalizado,
sem prejuízo da qualidade da gestão pública. Esta comissão, a GRACE
COMMISSION31, presidida pelo empresário J. Peter Grace, entregou ao
presidente Reagan um relatório completo da gastança federal e os meios de
corrigi-la, em janeiro de 1984, quase ao fim do seu primeiro mandato.
No campo monetário, Paul Volcker, então nomeado para presidir o
FEDERAL RESERVE SYSTEM também agia com destemor a críticas que
vinham, sobretudo, do próprio meio empresarial, por ter elevado os juros a
limites nunca dantes cogitados. Mas fato é que, ao cabo da faxina geral,
dolorosa, a economia americana havia se preparado para dar um salto
extraordinário na década seguinte, aliás muito bem aproveitada pelo presidente
Bill Clinton e, especialmente, pelo astuto Alan Greenspan, que então substituira
Volcker em 1987, já desgastado por tanta pancadaria financeira nos mercados.
Greenspan viria a se tornar o “queridinho” do mercado financeiro e
carinhosamente apelidado de “Maestro”. Mas os verdadeiros maestros haviam
31
Esta Comissão reunida sem um tostão de custo para o governo, mobilizou, entre outros, 161 dirigentes máximos de empresas privadas, que trabalharam em nada menos que 36 grupos-tarefa, empregando US$ 75 milhões em moeda da época. GRACE (1984).
73
sido outros... A obra reformadora de Reagan seria, infelizmente, comprometida,
anos mais tarde, neste século, pelo filho de seu sucessor na presidência, o
destrambelhado George W. Bush.
Essa algo extensa e pouco conhecida história, paralela a nossas
vissicitudes paroquiais dos anos 80, é para lembrar que, enquanto pensávamos
estar “abafando” com nossas excentricidades tributárias e de política
econômica “heterodoxa”, cozinhadas no fogo alto do discurso do “social
tupiniquim”, iniciativas distintas estavam acontecendo em outros lugares, e
influindo muito mais, mundo afora.
Não se diga, porém, que estivemos totalmente desatentos ao resto do
mundo. Brotaria aqui uma crescente percepção da disfuncionalidade do nosso
sistema tributário, bem como da previdência social a ele associada. Numa
iniciativa quase quixotesca, tivemos a oportunidade de apresentar à grande
mídia uma proposta, então considerada inviável que, no entanto, acabou por
despertar interesse e debate: a ideia de simplificar radicalmente o IR brasileiro,
ao trazer suas então 16 alíquotas de incidência, cobradas às pessoas físicas,
para uma única faixa, “fixada em 10% sobre toda e qualquer renda, sem
isenção e com verificação de sinais exteriores de riqueza”32. A conta simples
era que, pelo alargamento da base contributiva, com mais gente pagando e
menos isenções, e a melhoria da vontade de pagar pelo nivel módico da
alíquota – chamada de “imposto camisa 10”, numa alusão futebolística – se
obteria um claro aumento da arrecadação final. A provocação aparentemente
pegou.
A proposta terminou encontrando eco na própria Receita Federal
brasileira que, com certeza, mais embalada pelo exemplo americano do que
pela nossa sugestão, conseguiu simplificar sobremaneira a incidência do IR no
Brasil, havendo passado a adotar apenas duas alíquotas na pessoa física, de
15 e 25%. Houve espanto geral na época, dado o alto grau de novidade
daquela iniciativa.
32 Esta proposta acompanha o espírito da “flat tax americana” , HALL (1995).
74
O resultado obtido, em termos de arrecadação, foi o de se esperar:
crescimento significativo da base impositiva e aumento da receita do
imposto. Infelizmente, com essa meia-reforma tributária, feita de retalhos, sem
discurso político em seu apoio e sempre distraída da simultânea disciplina nos
gastos públicos, e pior, em ambiente adverso, de absoluta irracionalidade
econômica (lembrar que, nesse breve período, de 1986 a 1990, sofremos nada
menos que quatro decretos de congelamento de preços) não se conseguiu
sensibilizar os congressistas constituintes para uma reforma verdadeira, apesar
de a sociedade haver se mobilizado para apresentar duas propostas completas
à Sub-Comissão que cuidou da questão na Assembléia Constituinte, uma delas
– do IASP/ABDF – liderada e bem defendida por Ives Gandra da Silva Martins,
e a outra, do IPEA, Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, do próprio
governo.
Como ainda amargamente recordado, Ives nos conta que, após serem
apreciadas na Comissão de Sistematização da Constituinte, tiveram essas
propostas da sociedade civil “...notável ‘contribuição de pioria’ dos demais
constituintes, preocupados mais em aumentar receitas do que em proteger o
direito dos contribuintes, fazer justiça fiscal e promover o desenvolvimento
nacional ... de tal forma que hoje é mais um ‘desistema’ que um ‘sistema
tributário’ ”33. Dai também a conclusão inevitável: a Constituinte destituiu a
sociedade brasileira do seu mais importante importante instrumento de
progresso com equidade: o sistema tributário.
1989- 1993: Esperando Godot na Revisão
A Constituição Federal de 1988 havia agravado a viabilidade, já precária,
do financiamento não-inflacionário da máquina e dos compromissos financeiros
do governo federal. Ao premiar estados e municípios com significativos
aumentos nas respectivas partilhas de fundos constitucionais (FPE e FPM),
33
MARTINS (2008), p.22
75
além de ampliar a base do ICM pela conversão, a este, da arrecadação dos
então extintos impostos “únicos” federais sobre minerais, energia elétrica e
combustíveis, a CF88 passou à União e aos seus contribuintes a conta política
da “pacificação democrática” do País.
O jurista Ary Oswaldo Mattos Filho, coordenador geral do primoroso e
rico trabalho da COMISSÃO EXECUTIVA DA REFORMA FISCAL, que se
reuniu entre fevereiro e agosto de 1992, por iniciativa do então ministro da
Fazenda, Marcílio Marques Moreira, assim se referiu, no intróito dos dois
volumes da obra coletiva da sua Reforma Fiscal34: “ A constatação inicial
mostrava cruamente que (os membros executivos da Comissão) só estávamos
sendo capazes de discutir alternativas abrangentes e duras de reforma fiscal
porque o Estado falira inapelavelmente (grifo nosso), tendo esgotado os
meios de financiamento para a proposta de desenvolvimento que vinha sendo
intensamente utilizado por várias décadas.”
O destino melancólico da proposta da “Comissão”, chamemo-la assim
em homenagem aos grandes nomes que a compuseram e aos muitos e
notórios especialistas que a ela deram seu suporte de conhecimentos35,
apenas comprova que, dos porões da ”política de troca-troca” praticada no
País, só se pode esperar a mais completa desconsideração ao trabalho
intelectual, em particular se for de qualidade que ofusque a opacidade reinante.
A proposta de Ary Oswaldo ficou esperando Godot.
Na proposta da Comissão, no entanto, que se enviara direto aos
arquivos do Congresso Nacional, se aninhavam lições importantes e
atualíssimas. É sempre bom recordar o ambiente da época: logo antes do
impeachment do presidente Collor, que promovera o pedido de proposta à
Comissão Ary Oswaldo, poucos meses antes do seu afastamento, talvez como
tábua de salvação midiática ao vexaminoso desenrolar do seu “plano” de
liquidar a inflação com um único tiro.
34
MATTOS FILHO (1993), p.3.
35 Entre outros, ressalto Carlos Alberto Longo, Osmundo Rebouças, Sérgio da Costa Werlang, Augusto
Jefferson Lemos e José Teófilo Oliveira.
76
As lições da Comissão foram expressivas. Primeiro, por lembrar que não
se começa uma reforma tributária que também não proponha, simultanea ou
até previamente, a revisão do campo da despesa pública, pois é sempre no
gasto que nasce a pressão pelo imposto.
Em segundo lugar, lembrando que se deve colocar a estrutura tributária
em “esferas especializadas” de arrecadação, isso tanto quanto possivel, dai
brotando a noção de que o imposto de renda é, por excelência, uma
arrecadação privativa da esfera federal, enquanto a extração tributária do
consumo (ou da circulação) tem a vocação de pertencer ao nivel dos estados
federados, enquanto aos municípios cabe explorar, com vantagem, os tributos
de conotação territorial e predial, pois pertencerem “ao local”.
Em terceiro lugar, a Comissão firmou convicção em torno do IVA de
destino, e isso pioneiramente, por entender assim a maneira de melhor lidar
com a natural competição fiscal na federação brasileira. E, por último, entre as
lições essenciais de uma boa reforma, absorveu as recomendações do
saudoso guerreiro por uma previdência social previdente, Francisco E. Barreto
de Oliveira, o “Chico Previdência”, que há muito nos deixou, e órfãos de sua
obsessão sadia por um sistema previdenciário baseado na capitalização das
contribuições e organizado em torno de uma OPÇÃO voluntária dos
participantes em a ele aderirem.
Por opção, entende-se o direito inalienável de um cidadão eleger o
”prato previdenciário que comerá”, isto é, ter e exercer o direito de selecionar,
ainda que obrigatório na inscrição, o modo de participação que melhor atenda
ao participante. O que soa como direito óbvio, nem nos dias de hoje é praticado
em nosso País, deixando ainda mais triste, onde estiver, o caro amigo que por
isso tanto se bateu em vida.
Tais revéses pessoais foram vividos por todos os que nos envolvemos
na esperança da janela revisional da CF88, que se abriu com uma planta de
floração única, em 1993, apenas para se ter essa solitária chance de
germinação tragicamente desperdiçada. Os que nos empenhamos na
frustrante Revisão Constitucional de 1993, diretamente ou através de ilustres
e abnegados parlamentares, nada obtivemos como resultado. Pelo dep.
77
Eduardo Mascarenhas, grande brasileiro, morto precocemente como parece
ser hábito entre os melhores, tivemos no Instituto Atlântico a possibilidade de
encaminhar centenas de alterações tributárias constitucionais, que à época
refletiam nossa convicção do que precisava ser feito. Do seu lado, Ives Gandra
Martins veio também com emenda semelhante, apoiada em diversas e
relevantes entidades civis. Nada conseguiu. Na votação revisional, o que
contou mesmo foi a emergência, como sempre. À altura de março de 1994, o
governo Itamar Franco precisava calçar as finanças do futuro plano de
estabilização econômica que gestaria a nova moeda, o Real. Por isso, o
produto da Revisão foi apenas o Fundo Social de Emergência, que deu um
ponto de apoio financeiro às medidas que seriam, em seguida, tomadas no
campo para anunciar o novo plano de estabilização.
Enquanto isso, na virada dos anos 80 para 90, vários países se
empenhavam em coibir o deficit público, mediante reformas abrangentes,
também vinculadas ao combate à inflação alta. O Brasil era nisso um crônico
retardatário. Outros países se mexiam com mais empenho e ordem mental
coletiva. Este foi o caso do México, mas também do Canadá, cuja reforma
tributária, conduzida pelo engenhoso ministro de finanças da época, Michael
Wilson, introduziu o conceito do IVA duplo, de incidência paralela pelo governo
federal e pelas províncias.
Esta fórmula de IVA-duplo abriga uma solução para estruturas nacionais
pesadas em termos de gastos públicos, especialmente em nações organizadas
em sistemas federativos, com governos justapostos em diversos níveis como
no Brasil e no Canadá. A introdução do IVA-duplo ofereceu aos canadenses o
caminho possivel para acomodar o financiamento conjunto das máquinas
administrativas federal e provincial, ao mesmo tempo em que as colocou frente
a frente, obrigando as províncias a fazer com o governo nacional a calibragem
de suas respectivas responsabilidades na gestão de serviços públicos.
Ao interagir pessoalmente com Michael Wilson, em diversas
oportunidades na década de 90, logo após sua saída do governo canadense,
percebi que ali estaria o “destino” do nosso sistema de compartilhamento de
impostos, no momento em que finalmente a política brasileira resolvesse tratar
78
a sério a federação na reforma tributária. Só não tinha ideia de quanto iria
demorar...
Permanecemos, na prática, muito longe do avanço permanente, pois o
Brasil é enfeitiçado pelas soluções de toque mágico. Nesse particular, nada
mais encantador que o viço de um só remédio de cura para todos: o imposto
único, de uma só alíquota e de cobrança automática sobre as movimentações
financeiras. O respeitado professor Marcos Cintra, do alto de sua cátedra, se
convenceu disso e partiu em defesa nacional da ideia. O resultado foi a adoção
do conceito, só com um detalhe: SER MAIS UMA ESPÉCIE TRIBUTÁRIA, e
não a que iria finalmente substituir com vantagem todas as demais. A
Comissão de Ary Oswaldo propunha, por exemplo, que o PIS e a COFINS,
então cobrados a 2,65% em cascata, viessem a ser trocados por 0,25% de um
imposto monofásico sobre toda a movimentação financeira, enxergando aí,
mais por esperança do que por experiência, a superioridade de um sobre o
outros. Ficamos, afinal, com ambos, sob o nome odioso de CPMF –
CONTRIBUIÇÃO PROVISÓRIA SOBRE A MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA,
que só seria extinta muitos anos mais tarde, por um descuido dos poderosos,
em memorável votação conduzida por parlamentares lúcidos, em 31/12/2007.
1994 – 2002: Escalada ao bolso do “João”
O País emerge da reforma econômica do plano Real, em julho de 1994,
ainda mais sedento por recursos tributários, pois o financiamento não
inflacionário dos orçamentos públicos, em todos os niveis, passaria a exigir
mais arrecadação ou mais endividamento, nunca mais emissões de moeda.
Como o endividamento havia sido, em boa hora, também cerceado, só sobraria
aos dirigentes a escalada tributária.
O “Avança Brasil” da era FHC, do virtuoso presidente Fernando
Henrique Cardoso, entre importantes contribuições que trouxe, também
ensejou formidável avanço da carga fiscal, o maior de todos os tempos
modernos. Com um pormenor: a carga aumentou enquanto o investimento
79
público fraquejava. O país ficou correndo atrás de pagar obrigações passadas,
mas como governos nunca pagam nada e, sim, o povo, diversos pacotes foram
emitidos, especialmente ao ensejo do agravamento das condições externas, de
1997 (crise asiática) até 2001 (crise do apagão brasileiro e do monumental
calote argentino).
Esses tropeços externos quase consumiram todo o período do governo
FHC, corroendo por completo suas bases propositivas de uma reforma
tributária. Contudo, é bom reconhecer que três anos se passaram, entre 1994 e
1997, antes de o governo FHC ser colhido pela trombada financeira vinda de
fora. Para efeito de comparação, uma breve lista de reformas institucionais
pode ser cotejada entre a antiga gestão econômica do período Castello Branco
(1964 – 67) que nos trouxe o sistema tributário de 1965, e o tempo despendido
com a estabilização da economia brasileira entre 1994 e 97. Foram dois
tempos bem diferentes; menos, talvez, pela alegada força do autoritarismo, já
que aos gestores do plano Real tampouco faltaria apoio parlamentar. Só que,
por alguma razão, faltou. A PEC 175/95, da reforma tributária do governo FHC,
relatada pelo operoso parlamentar Mussa Demes, não teve destino melhor que
as anteriormente tentadas. Foi para arquivo.
O governo FHC não entregou os pontos imediatamente. Sua equipe era
totalmente sensível ao tema da tributação disfuncional e onerosa ao
contribuinte. Mas não tinha consigo o arcabouço de um novo sistema, nem os
cordéis políticos para encaminhar e votar tal reforma de modo vitorioso.
Pragmaticamente, votou outras coisas, dando sobrevida, involuntariamente, à
construção de “puxadinhos” tributários.
O que fez a gestão de FHC, contendo despesas, talvez tenha sido maior
do que na modelagem de uma tributação menos torta. Primeiro, arrepiou para o
lado das estatais, impondo-lhes ponto final ao desperdício, ao acelerar o
programa nacional de privatizações. Em seguida, limitou o enorme regabofe
estadual, pela liquidação de bancos estaduais e disciplinamento das
instituições federais então quase insolventes como Banco do Brasil e
Caixa Federal.
80
FHC tambám partiu para o enfrentamento do mais espinhoso problema,
o previdenciário, editando medida oportuna de restrição à aposentadoria
precoce, ao impor o “fator previdenciário” de ajuste, que agora, de novo, se
busca extinguir. Mas ficou aquém de reformar a previdência social como
deveria. E, para completar o arcabouço de controle do dispêndio, limitou
severamente o endividamento dos entes federados através da Lei de
Responsabilidade Fiscal, principal obra institucional de seu governo, ainda
que a crítica do sempre preciso professor Celso Martone36, grande economista
brasileiro, enverede corretamente por apontar a incompletude dessa lei, que
não buscou tanto a “eficiência” do gestor e a produtividade do gasto público,
quanto apenas perseguiu a confirmação da capacidade financeira do estado ou
município em honrar dívidas.
Mas a gestão de FHC não parou por aí. Pelo lado das receitas, realizou
alguns rearranjos dignos de nota. O mais importante, provavelmente, foi a
introdução de um objetivo de simplificação do custo administrativo da tributação
da pequena empresa através do SIMPLES. As pequenas e médias empresas
passaram a ser enxergadas com alguma piedade. E os parlamentares, no
Congresso Nacional, sempre de olho no voto tanto quanto na receita fiscal,
viram uma equação favorável de custo (em receitas) contra benefício (em
satisfação e em votos). A legislação do Simples saiu e, em seguida, vem sendo
aperfeiçoada na administração Lula.
Finalmente, cabe ressaltar o programa de sobrevida tributária, uma
espécie de UTI empresarial, criada pela Receita Federal, em éditos
sucessivoscom que se repactuaram as cobranças e dívidas fiscais de uma
população inteira de empresas em dificuldades. Para não lembrar, no
agronegócio, da maior repactuação coletiva de créditos agrícolas,
renegociados por lei federal na década de 90, e com sucessivas renegociações
posteriores, levadas a cabo em diferentes legislaturas, a última tendo sido na
administração Lula. Para completar, uma lista dessas não poderia fechar sem
menção honrosa ao esforço bem sucedido de desonerar as exportações 36
A lei de Responsabilidade Fiscal é a LC no. 101/2000. Ver MARTINS (2008), p. 129 e seguintes. Ver também a rica contribuição de Carlos Maurício e Marcos Nóbrega, em FIGUEIREDO (2006).
81
brasileiras, pelo que ficou conhecido como “Lei Kandir” (LC 87/1996), em
apreço ao também economista e parlamentar.
2003 – 2007: Nada a Fazer I – “ O Começo”
Como num título de filme em série, o “Nada a Fazer I” parece
caracterizar o pragmatismo da administração Lula quando o esforço a ser
empreendido pelo Planalto é para reconstruir o prédio da fiscalidade brasileira.
Trata-se de uma administração movida pelo termômetro da opinião das ruas, e
esta nunca esteve, aparentemente, tão feliz quanto agora, com o crédito farto
que encobre a mordida fiscal e ainda deixa uma soprada de alívio. O debate da
reforma tributária refluiu, portanto, do centro do noticiário para dentro dos
gabinetes fechados de especialistas e para pequenos auditórios de
empresários “mal humorados”.
Não é dizer que o presidente Lula não tenha tocado na árida questão.
Não só o fez mas, por justiça, é certo mencionar, tentou até duas vezes. Em
2003, com sua PEC 42/2003, sob a batuta política de Antonio Palocci, como
ministro da Fazenda. Pouco se conseguiu e, de perfil estrutural, basicamente
nada. Portanto, nada a fazer, até que nova chance “de gol” surgisse. Isso só
veio a alcançar Lula a meio caminho de seu segundo mandato, em 2008.
2008 - ... Nada a Fazer II – “O Fim”
A PEC 233/2008 está bem resumida no apenso próprio em que a
descrevemos neste estudo37. Já não se trata de analisar fatos, mas algo
vivenciado em dias recentes e, portanto, ainda carregado com as tintas das
percepções não bem aplainadas pelo tempo. Mas, por cima das críticas que a
nova PEC carrega, e nós mesmos a fazemos, é importante sublinhar que ela 37
Ver Anexo 2.
82
traça, com alguma sutileza, a marca de um fim: é o final do “nada a fazer”. Ao
tentar buscar a aglutinação de tributos exóticos e anômalos, como bem os
denomina o mestre Ricardo Lobo Torres, a nova PEC, de iniciativa lulista, tenta
também dar um fim à carreira medonha do PIS, da COFINS, da CIDE, e até do
Salário-educação. Por outro lado, a PEC 233 tem o mérito de avançar na idiea
de um moderno IVA-federal, na busca, embora preambular, de algo realmente
novo para o nosso cambaleante sistema tributário.
Este novo, que representa o fim do velho, não o encontraremos,
contudo, na marcha para trás representada pela frustrante ressurreição da
taxação sobre as “Grandes Fortunas”38. Se fosse assim bem fácil, já se teriam,
em outras partes do mundo, constituído esta excentricidade como viga-mestra
de sistemas bem mais progressistas que o nosso, em matéria de colocar os
ricos a pagar impostos proporcionalmente mais agressivos. Não parece ser o
nosso caso.
O trágico é que continuamos mais dispostos a jogar para a platéia,
brandindo títulos de apelo emocional, tal como foi, um dia, o fundo de
“investimento social” para os militares, e, nos dias de hoje, a “grande fortuna
taxável”, lembrada no provisório texto do III Programa Nacional de Direitos
Humanos. Será que a próxima reforma seria para ver os ricos abatidos e
coados num liquidificador, imagem para produzir jorros de contentamento a
certos estamentos de uma elite política equivocada?
Mas são equívocos superáveis. Os que temos o Brasil como bandeira
permanente, não podemos perder nosso tempo precioso cometendo erros
previsíveis e repetidos. É preferível que nos dediquemos a perseguir erros
novos, em estruturas erigidas com a perpectiva da prosperidade coletiva e um
porvir de maior claridade pela acumulação dos conhecimentos essenciais ao
avanço.
38
A propósito do despropósito do Imposto sobre GRANDES FORTUNAS, ver a excelente análise de Rogério Gandra e Soraya Locatelli em MARTINS (2008) p.137 e seguintes.
83
Anexo 2
REFORMA TRIBUTÁRIA CONVENCIONAL:A PROPOSTA MANTEGA-APPY
1. A Presidência da República encaminhou ao Congresso Nacional, por meio
da Mensagem nº 81, de 28 fev. 2008, proposta de emenda à Constituição
alterando o sistema Tributário Nacional (STN).
2. Os objetivos principais da proposta39 são: simplificar o sistema tributário
nacional; avançar no processo de desoneração tributária; e eliminar distorções
prejudiciais ao crescimento da economia brasileira e à competitividade de
nossas empresas, principalmente no tocante à chamada “guerra fiscal entre os
Estados.
3. A proposta pretende instituir novo modelo desenvolvimento regional para
enfrentamento das desigualdades regionais. Substituirá com grandes
vantagens a utilização da “guerra fiscal” como instrumento de desenvolvimento
ou atração de investimentos. Dentro da nova política de desenvolvimento
regional, será criado o Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional (FNDR).
4. Introduz a proposta uma série de mudanças na estrutura de tributos da
União e dos Estados, dentre as quais se destacam:
a) criação de um imposto sobre operações com bens e prestações de serviços,
denominado de imposto sobre o valor adicionado federal (IVA-F);
b) em consequência, extingue dos seguintes tributos: Contribuição para o
financiamento da Seguridade Social (Cofins); Contribuição para o Programa de
Integração Social (PIS); e Contribuição de intervenção no domínio econômico
relativa às atividades de importação ou comercialização de petróleo e seus
derivados, gás natural e seus derivados e álcool combustível (CIDE-
39
Exposição de Motivos (EM) nº 16/MF, de 26 fev. 2008, do Ministro da Fazenda
84
combustível); c) incorporação da Contribuição social sobre o lucro líquido
(CSLL) ao imposto de renda das pessoas jurídicas (IRPJ), dois tributos com a
mesma base (o lucro das empresas);
d) desoneração da folha de pagamento (eliminação da contribuição social do
salário-educação e reduções gradativas da contribuição patronal);
e) criação de novo ICMS (imposto sobre operações relativas à circulação de
mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e
intermunicipal e de comunicação), a ser regido pelo art. 155-A a ser incluído na
CF(o atual ICMS é regido pelo art. 155, II).
5. O atual ICMS apresenta um quadro de grande complexidade da legislação.
Cada um dos Estados mantém a sua própria regulamentação. São 27
diferentes legislações a serem observadas pelos contribuintes. A grande
diversidade de alíquotas e de benefícios fiscais agrava o cenário, caracterizado
pela denominada “guerra fiscal”.
6. O novo ICMS será instituído por uma lei única nacional (lei complementar) e
não mais por 27 leis das unidades federadas. A regulamentação também será
unificada por órgão colegiado dos Estados e do Distrito Federal (novo Confaz).
No geral, as alíquotas serão limitadas àquelas definidas pelo Senado Federal.
7. Nas operações e prestações interestaduais, o imposto pertencerá
preponderantemente ao Estado de destino da mercadoria ou serviço; o Estado
de origem terá direito à incidência de 2%.
8. O IVA é uma prática utilizada por praticamente todos os países
desenvolvidos e, também, há mais de dez anos, pelo Uruguai, Chile, Argentina
e Bolívia. No modelo ideal, o IVA deveria incorporar, além dos tributos previstos
na proposta da Mensagem nº 81 (item 4, ´b´), também o IPI, o ICMS e o ISS.
9. A proposta de reforma tributária tem pontos muito positivos. Mas a chance
de ser aprovada é próxima a zero. Há importantes aperfeiçoamentos a serem
feitos na proposta de reforma. Um deles é o detalhamento da reforma, que
85
deveria ser remetido a leis complementares e ordinárias, além de
regulamentações administrativas.
10. A proposta de reforma de 2008 não se destina propriamente à redução da
carga fiscal. Não simplifica a tributação nem procura mitigar os efeitos
regressivos dos tributos indiretos. Não traz em seu bojo um “pacto de
reconciliação com o contribuinte”. Há quem afirme, inclusive, que o IVA-F abre
caminho para o aumento da carga tributária. Terá uma base demasiadamente
ampla. Certamente suas alíquotas serão fixadas de modo a assegurar maior
arrecadação. Não terá importantes limites constitucionais, como alerta Hugo de
Brito Machado, presidente do Instituto Cearense de Estudos Tributários40. Já o
novo ICMS terá um regramento complexo, além de complicado regime jurídico
das alíquotas, com possibilidade de serem reduzidas ou aumentadas pelo
Confaz, como também nos alerta, corretamente, o nobre jurista Hugo Machado.
11. O sistema tributário brasileiro, desde a reforma dos anos 1960, sofreu
grandes modificações. O sistema tornou-se pior, em virtude da crise crônica do
ICMS e da expansão desproporcional das contribuições sociais. Mas o sistema
também se tornou melhor pelo gradual aperfeiçoamento da administração
tributária, transformada numa das mais modernas do mundo, convertida em
referência internacional. Os regimes simplificados (lucro presumido e Simples)
se expandiram. Uma reforma tributária eficaz deve focalizar os problemas
principais, buscar soluções normativas, se possivel infra-constitucionais, e
estabelecer sua implantação gradual. Todas as recentes emendas
constitucionais, no âmbito tributário, somente nos convenceram da
possibilidade infinita de se conseguir piorar uma determinada situação. Estas
lições práticas e objetivas nos são lembradas por Everardo Maciel, ex-
secretário da Receita Federal e jurista responsável pelos significativos avanços
na administração tributária nacional41.
40
“Reforma tributária”. O Povo, Fortaleza, 26 mar. 2008, p. 4.
41 MACIEL (2007), p. A 3.
86
Anexo 3
Eficiência do Setor Público: Uma Avaliação Quantitativa42
Tornou-se evidente para a estabilidade e para o crescimento
econômicos bem como para a prosperidade da população a importância do uso
eficiente de recursos públicos e de políticas fiscais sábias. Este fenômeno
ocorreu concomitantemente com limites macroeconômicos que limitaram o
aumento de gastos. Além do mais, a globalização fez com que o capital e os
contribuintes ficassem mais móveis, o que exerce mais pressão sobre a base
de receita de governos. O aumento da transparência em todo o mundo influiu
na pressão popular para o uso de recursos de forma mais eficiente.43
Há algum tempo, estuda-se a eficiência de gastos públicos e computam-
se escores e se dá um ranking aplicando-se técnicas de avaliação. Uma
análise econométrica mostrou que renda mais alta, competência do
funcionalismo público, nível de educação e segurança dos direitos de
propriedade são fatores positivos na prevenção de ineficiências do setor
público.
Os índices são conhecidos como “Performance do Setor Público” (PSP)
e “Eficiência do Setor Público” (ESP) para analisar o desempenho e a eficiência
42 Este Anexo busca resumir de modo livre o estudo pioneiro, “Public Sector Efficiency: Evidence for New EU Member States and Emerging Markets”, citado como AFONSO (2006), cujo maior mérito é o de conseguir quantificar e expressar uma medida de eficiência na gestão do setor público, de modo semelhante ao estimado na alocação de recursos no setor privado. Tem especial valor o fato de o Brasil ter sido incluído na pesquisa. Ressalve-se que o período pesquisado foi exogenamente desfavorável ao desempenho do setor público brasileiro, o que não desqualifica o alerta dos resultados comparativos, apontando o alto grau de ineficiência do nosso setor governamental. Outro importante mérito da pesquisa é indicar que niveis de gasto público superiores a 30% do PIB são provavelmente negativos para a otimização do crescimento da economia. Eventuais equívocos de interpretação nesta versão são de nossa total responsabilidade. Os autores são, respectivamente, da Universidade Técnica de Lisboa e do Banco Central Europeu; do Banco Central Europeu; e do Banco Inter-Americano de Desenvolvimento. Agradecemos ao professor Ulysses Gamboa, da Associação Comercial de São Paulo, por nos chamar atenção à importância deste trabalho.
43 Tanzi, Vito e Schuknecht, Ludger, Public Spending in the 20th Century A Global Perspective, Public Choice, Springer The Netherlands, Vol. 108, Números 1-2, Julho 2001. http://www.springerlink.com/content/gk877274881113k3/fulltext.pdf?page=1
87
do setor público em gastos públicos. Uma análise desses índices PSP e ESP
demonstra que países com setores públicos “magros” e gastos públicos da
ordem de 30% tendem a serem mais eficientes. Os escores dos países mais
eficientes são duas vezes mais altos que os dos países com pior performance.
Os indicadores compostos de performance e de eficiência do setor público
incluem informações administrativas, sobre os sistemas educacional e de
saúde, dados sobre distribuição de renda e estabilidade econômica, bem como
resultados de desempenho econômico.
Começou-se a utilizar a técnica de “Análise do Envelope de Dados”
(DEA, na sigla em inglês) para examinar os gastos. Este método foi criado e
usado originalmente para empresas e mais tarde para “Unidades de Tomadas
de Decisão” (DMU, na sigla em inglês) de organizações filantrópicas ou
governamentais, de hospitais, universidades, governos locais ou de países. Tal
análise mostra que certos países estão mais próximos da teórica fronteira de
eficiência de produção possível. Eles são: Cingapura, Tailândia, Chipre e
Coréia.44 Pela perspective de recursos utilizados (input), o país com escore
mais alto usa 1/3 dos recursos do país na lanterna da lista para atingir certo
escore de performance do setor público. Os resultados para a média dos
países indicam que países poderiam usar aproximadamente 45% menos
recursos para atingir os mesmos resultados se fossem totalmente eficientes. A
média dos escores de resultados atingidos (output) indica que os países
estejam produzindo apenas 2/3 do seriam capazes se estivessem na fronteira
da eficiência.
A análise indica que segurança do direito de propriedade, PIB per capita,
competência do funcionalismo, e o nível educacional da população afetam de
forma positiva a eficiência dos gastos. Devido a uma significativa correlação,
entretanto, as duas variáveis competência/educação são significativas em
regressões separadas, mas as duas outras variáveis são robustas em todas as
especificações, ou seja, O PIB e PIB per capita são sempre importantes.
Abertura ao comercio internacional, confiança em políticos e transparência do
44 A Irlanda pertencia a este grupo, mas a análise fora feita antes do estouro da bolha, e, com certeza, a situação deste país mudou substancialmente.
88
sistema político não demonstraram ter influência significativa na eficiência de
gastos.45
O país D pode ser considerado ineficiente no sentido em que seu
desempenho é pior que o país C. Este consegue resultados melhores com
menos despesa. Um raciocínio semelhante se aplica ao país B. Por outro lado,
os países A ou C não se mostram tão ineficientes quando se usa o mesmo
critério.
Esta análise pressupõe que a ineficiência em gastos se deve
unicamente a insumos arbitrários: a política de gastos governamentais. Eles
não levam em conta a presença de fatores “ambientais”, conhecidos também
por fatores não arbitrários ou exógenos. Mas tais fatores podem ter um papel
relevante quando se determina a heterogeneidade de países, o que pode
influenciar sua performance e eficiência.
45 A análise Tobit usa todas as informações, tanto as que estão no limite e as que estão um pouco acima, para estimar uma linha de regressão. Prefere-se este tipo de análise a outras técnicas alternativas que estimam apenas as observações acima do limite.
C
89
O conceito de eficiência está ao centro do estudo das políticas fiscal e
tributária de governos. Acredita-se que essas atividades devam gerar o máximo
de benefícios potenciais a população. Quando a ineficiência leva ao desperdiço
de recursos, governos devem ser castigados. Para medir eficiência, em geral é
necessário: a) estimar custos; b) estimar produção; e c) comparar esses dois
dados. Quando se aplica este conceito aos gastos de governos, poder-se-ia
afirmar que gastos públicos são eficientes quando, visto a quantia gasta, ele
produz o maior benefício possível para a população. Já os custos dependem
da fonte da receita: a) peso da máquina de governo; b) alto custo da
administração da arrecadação; e c) o tamanho da sonegação. Assim, o custo
para a economia de cada centavo marginal arrecadado em imposto pode
exceder de forma significativa o centavo arrecadado pelo governo.46 O
pressuposto de uma curva de oferta para a receita de impostos não é viável.
O eixo horizontal mostra o valor monetário ou orçamentário de gastos
públicos e a receita em impostos para cobri-los. Em teoria, mais gastos
públicos deveriam trazer mais benefícios para a população. Assim, a curva tem
uma inclinação positiva. O benefício marginal de cada centavo adicional gasto
deve ser inferior à medida que mais centavos são gastos. A curva, portanto,
46 Afonso, António; Schuknecht, Ludger; e Tanzi, Vitor, Op. Cit., Becker, Gary S. e Mulligan, Casey B., Deadweight Costs and the Size of Government, Universidade de Chicago, Agosto de 1998.
90
que reflete os benefícios totais é um côncavo para baixo, ou seja, o segundo
derivativo é negativo. A curva OVB da figura 1 mostra este fenômeno. À
medida que mais dinheiro é arrecadado, a arrecadação de cada centavo
adicional se torna mais cara. A curva OSC, portanto, mostra o custo total da
arrecadação está para cima, ou seja, o segundo derivativo é positivo.
Num nível de gastos públicos igual a OR, as duas curvas são iguais, o
que significa que o custo verdadeiro de cada centavo gasto é exatamente igual
ao benefício criado por este gasto. Antes do ponto R, aumentar a receita e os
gastos públicos aumenta também os benefícios líquidos, que são medidos pela
distância vertical entre as duas curvas. Além do ponto R, o custo marginal da
imposição excede os benefícios marginais dos gastos. VS é a maior distância
vertical entre as duas curvas. O nível máximo, ou mais eficiente, portanto, de
gastos públicos é OR.47
Os países examinados para a análise de eficiência são: dez membros
recentes da União Européia (Chipre, República Tcheca, Estônia, Hungria,
Látvia, Lituânia, Malta, Polônia, Eslováquia e Eslovênia); dois membros
“recentíssimos” que na época do estudo ainda pleiteavam sua candidatura
(Bulgária e Romênia); dois membros antigos que tiveram que recuperar a
defasagem em relação aos mais antigos depois de entrar para a UE (Grécia,
Irlanda e Portugal); e, por fim, nove países emergentes (Brasil, Chile, Coréia,
Maurício, México, Cingapura, África do Sul, Tailândia e Turquia).
Evidentemente, é bom sempre ter em mente que o cenário mudou nesses
últimos anos e que, inclusive, a situação do Brasil ele é diferente em 2010 do
que ela era no início da década. O Brasil ficou melhor, mas, como se verá,
ainda há um longo caminho a percorrer, como fica evidente nas tabelas abaixo.
47 Afonso, António; Schuknecht, Ludger; e Tanzi, Vitor, Op. Cit.
91
PaísGasto total*
Cons. do governo*
Tranfs. e subsídios*
Juros* Investimento* Educação** Saúde***
Brasil 46,6 19,5 17,1 8,2 1,9 4,6 3,3Bulgária 38,6 17,3 15,2 3,2 3,4 3,4 4Chile 24,4 12,6 7,9 1,2 2,7 3,8 2,4Chipre 40 18 11 3,3 3 5,6 2,5República Tcheca
40,6 22,7 15 1,2 3,4 4 6,2
Estônia 36,4 19,7 10,7 0,3 4,1 6,2 4,4Grécia 48,6 16,8 17 7,2 3,8 3,7 5,1Hungria 50,2 22,4 15 4,6 3,8 4,8 5,3Irlanda 33 14,8 9,3 1,7 3,8 4,4 4,9Coréia 24,4 12,7 5,4 3,8 2,4Letônia 36,6 21,4 12,7 0,9 1,3 5,8 3,5Lituânia 33,3 20,3 11,1 1,5 2,6 5,9 4,5Malta 45 20,7 14,5 3,8 4,4 4,8 6,2Maurício 24,7 12,9 3,8 7,5 3,8 2,1México 25,3 11,7 5,2 4,6 3,8 4,6 2,6Polônia 43,2 17,9 17,9 2,8 3,3 5,1 4,2Portugal 46,2 20,7 14,3 3,1 3,7 5,7 6,2Romênia 33,7 15,7 13,7 2,3 1,9 3,4 3,8Cingapura 21 11,4 8,7 0,8 1,4Eslováquia 43,8 20 14,2 3,5 2,9 4,1 5,2Eslovênia 42,1 20,2 18,6 2,3 2,9 6África do Sul 26,3 18,4 4,5 2,7 5,7 3,6Tailândia 17,8 11,2 7,7 5,3 2,3Turquia 42,7 13,8 21,3 4,6 3,5 4Média 36 17,2 13,1 3,9 3,7 4,6 4Max 50,2 22,7 18,6 21,3 7,7 6,2 6,2Min 17,8 11,2 5,2 0,3 1,3 3,4 1,4Novos membros UE
41,1 20,3 14,1 2,4 3,2 5,2 4,8
Países Bálticos 35,4 20,5 11,5 0,9 2,7 6 4,1
Outros novos UE
43,5 20,3 15,2 3,1 3,4 4,7 5,1
NIC Asiáticos 21 11,8 8,7 0,8 6,6 4,6 2Outros NIC 32,8 15,2 11,8 6,1 3,5 4,1 3,2OECD 1990s**** 46,5 19,8 15,1 3 5,4 6,2
**** Fonte: Public Sector Efficiency: Evidence for New EU Member States and Emerging Markets, António Afonso, Ludger Schuknecht and Vito Tanzi.
Tabela - 1 Gastos públicos por países em % do PIB
* Média entre 1999-03; Fonte: FMI (WEO) e AMECO
** Média entre 1999-01; Fonte: Banco Mundial, WDI 2003
*** Média entre 1999-02; Fonte: Banco Mundial, WDI 2003
A tabela 1 ilustra os gastos totais e a composição desses gastos nos
países pesquisados no período 1999-2003. O Brasil com 46,6% está quase no
topo da lista. Apenas a Grécia (48,6%) e a Hungria (50,2%) gastam mais que o
Brasil.48 O gasto de Singapura é de 21% e o do Chile, de 24,4%. A média é de
36%. O Brasil não gasta pouco, mas, evidentemente, não gasta de forma
eficiente.
48 A Grécia foi analisada antes da atual crise orçamentária. Já se pressentia, no entanto, que os gastos eram excessivos.
92
Figura 3 – Gastos do Governo e PIB per capita
Fonte: Banco Mundial, WDI; Elaboração: AFONSO (2005).
AUS – Austrália; AUT – Áustria; BEL – Bélgica; BGR – Bulgária; BRA – Brasil; CAN –Canadá; CHL Chile; CYP – Chipre; CZE – Republica Tcheca; DEN – Dinamarca; EST – Estônia; FIN – Finlândia; FRA – França;GER – Alemanha; GRC – Grécia; HUN – Hungria; ICE – Islândia; IRL – Irlanda; ITA – Itália; JAP – Japão;KOR – Coréia; LTU – Lituânia; LVA – Letônia; MEX – México; MLT – Malta; MUS – Mauricio; NDL –Holanda; NOR – Noruega; NZE - Nova Zelândia; POL – Polônia; PRT –Portugal; ROM – Romênia; SGP –Singapura; SPA – Espanha; SVK - Eslováquia; SVN – Eslovênia; SWE – Suécia; SWZ – Suíça; THA– Tailândia; TUR – Turquia; UK – Reino Unido; US – EUA; ZAF – África do Sul.
Uma pergunta que não quer calar é se um grande setor público prejudica
o crescimento econômico. A pergunta oposta é válida também: setor público
pequeno demais é prejudicial ao desenvolvimento de serviços básicos e de
uma necessária rede social. No caso do Brasil, a primeira pergunta é mais
relevante, mas esta questão é empírica e não há respostas fáceis como fica
evidente na figura 4. No caso brasileiro, até um passado muito recente, o
crescimento econômico foi baixo, tanto em comparação aos demais países
latino-americanos como aos demais BRIC.49 Mas, sem dúvida, houve
crescimento robusto em países que gastam pouco e a priorização em gastos
públicos produtivos ajudam a explicar este fenômeno. O crescimento em
países bálticos, por exemplo, até 2008, foi admirável.
49 O Brasil ainda cresce menos que a China e a Índia. De fato, ele apresentou uma pequena queda do PIB em 2009, enquanto no caso da Rússia a recessão foi mais uma forte queda.
93
Figura 4 – Gastos Públicos e Crescimento Econômico
Fonte: Banco Mundial; Elaboração: AFONSO (2005). Ver nome dos países na figura 3.
A melhor curva para expressar a relação estatística de provável
causalidade (de sinal negativo, ou seja, causalidade inversa) entre nivel de
gasto público e a taxa de crescimento econômico, conforme mostrado no
gráfico 4, seria em forma de “U” de cabeça para baixo. Como na figura, na linha
tracejada em “U” invertido, o topo da curva está apontando um gasto público de
“nivel ótimo”, isto é, nem pouco nem demais, em cerca de 30% do PIB. Mais
ainda: não por coincidência, quando os gastos estão contidos na faixa de 30%
do PIB, o crescimento econômico tem potencial de alcançar a média de 6%a.a.
No caso do Brasil, uma análise demonstra que depois que os gastos
começaram a aumentar nos ano 1990, o crescimento econômico estagnou.
A META DE GASTO PÚBLICO NÃO SUPERIOR A 30% DO PIB, A
SER ALCANÇADA ATÉ 2020, CONSTITUI UMA EVIDÊNCIA ESTATÍSTICA
INTERNACIONAL. ESTA META PODE NOS VIABILIZAR O CRESCIMENTO
DE 6% a.a. Os países que controlam seus gastos governamentais nessa faixa
94
ótima conseguem prover as necessárias redes de proteção social básica às
suas populações sem prejudicar os incentivos a investir, e otimizando o
desempenho da economia produtiva ao nivel de 6%.
PaísAdminis-
traçãoCapital
HumanoSaúde
Distri- buição
Esta- bilidade
Perfor. Econômica
Brasil 0,88 0,80 0,96 0,63 0,43 0,77 0,75Bulgária 0,80 1,09 0,99 1,17 0,06 0,31 0,74Chile 1,12 0,86 1,03 0,69 0,92 1,02 0,94Chipre 1,12 1,04 1,59 1,54 1,33República Tcheca
1,00 1,14 1,02 1,19 0,74 0,74 0,97
Estônia 1,25 1,11 0,99 1,00 0,57 0,88 0,97Grécia 0,95 1,04 1,04 1,07 1,67 0,76 1,09Hungria 1,09 1,16 1,00 1,21 0,97 0,88 1,05Irlanda 1,17 1,11 1,03 1,02 1,64 1,47 1,24Coréia 1,04 1,08 1,01 1,09 1,00 1,60 1,14Letônia 1,03 0,98 0,98 1,08 0,76 0,88 0,95Lituânia 0,98 1,12 1,00 1,08 0,37 0,84 0,90Malta 1,11 1,03 1,04 1,45 1,12 1,15Maurício 0,91 0,86 1,00 1,40 1,08 1,05México 0,80 0,71 1,00 0,75 0,38 1,41 0,84Polônia 0,92 1,08 1,01 1,09 0,83 0,81 0,96Portugal 1,11 0,88 1,03 0,98 1,30 0,91 1,04Romênia 0,63 1,13 0,98 1,10 0,18 0,63 0,78Cingapura 1,39 1,16 1,05 0,92 2,94 1,71 1,53Eslováquia 0,95 1,07 1,01 1,28 1,09 0,77 1,03Eslovênia 1,07 1,13 1,03 1,14 1,35 0,99 1,12África do Sul 1,00 0,66 0,80 0,65 1,23 0,50 0,81Tailândia 1,03 0,99 0,97 0,93 0,94 1,54 1,07Turquia 0,77 0,75 0,97 0,93 0,17 0,82 0,74Média 1,00 1,00 1,00 1,00 1,00 1,00 1,00Max 1,39 1,16 1,05 1,28 2,94 1,71 1,53Min 0,63 0,66 0,80 0,63 0,06 0,31 0,74Novos membros UE
0,99 1,06 1,00 1,09 0,74 0,86 0,96
Países Bálticos
1,06 1,10 1,02 1,14 0,93 0,95 1,03
Outros novos UE
0,95 1,05 1,00 1,08 0,66 0,82 0,93
NIC Asiáticos 1,11 1,00 1,00 0,93 1,76 1,44 1,21
Outros NIC 0,97 0,91 0,98 0,87 0,96 1,08 0,98
Tabela - 2 Indicadores de Performance do Setor Público 2001-2003 (PSP)
Indicadores de Oportunidade Indicadores "Musgraveanos"Perfomance total do Setor Público
(pesos iguais)
Fonte: AFONSO (2006).
Os países que se saíram melhor nesta comparação são Singapura,
Chipre e Irlanda (antes da crise de 2008-2009). Outros países asiáticos e Malta
95
têm um escore alto também, mas Portugal e Grécia têm um desempenho
medíocre. Na lanterna da lista estão Bulgária, Turquia e Brasil.
PaísAdminis-
traçãoCapital
HumanoSaúde
Distri- buição
Esta- bilidade
Perfor. Econômica
Brasil 0.78 0.81 1.15 0.48 0.33 0.59 0.69Bulgária 0.79 1.49 1.00 1.01 0.06 0.29 0.77Chile 1.53 1.04 1.70 1.15 1.37 1.51 1.38Chipre 0.92 1.66 1.44 1.39 1.08República Tcheca
0.76 1.31 0.66 1.04 0.66 0.66 0.85
Estônia 1.09 0.83 0.91 1.21 0.57 0.87 0.91Grécia 0.97 1.32 0.83 0.83 1.23 0.56 0.96Hungria 0.83 1.12 0.75 1.05 0.70 0.63 0.85Irlanda 1.36 1.18 0.84 1.44 1.79 1.61 1.37Coréia 1.40 1.31 1.72 1.47 2.36 1.65Letônia 0.82 0.79 1.14 1.11 0.75 0.87 0.91Lituânia 0.83 0.88 0.90 1.27 0.40 0.90 0.86Malta 0.92 0.99 0.68 1.16 0.90 0.78Maurício 1.21 1.04 1.91 2.04 1.58 1.56México 1.18 0.72 1.52 1.90 0.55 2.01 1.31Polônia 0.89 0.98 0.97 0.80 0.69 0.68 0.83Portugal 0.92 0.71 0.66 0.90 1.01 0.71 0.82Romênia 0.69 1.53 1.03 1.05 0.20 0.68 0.86Cingapura 2.09 2.90 1.38 5.05 2.94 2.39Eslováquia 0.82 1.23 0.77 1.18 0.90 0.64 0.92Eslovênia 0.91 0.68 0.81 1.15 0.84 0.88África do Sul 0.93 0.54 0.89 1.69 0.68 0.95Tailândia 1.58 0.86 1.68 1.91 3.11 1.83Turquia 0.96 0.99 0.98 0.15 0.69 0.63Média 1.06 1.03 1.16 1.03 1.14 1.15 1.09Max 2.09 1.53 2.90 1.90 5.05 3.11 2.39Min 0.69 0.54 0.66 0.48 0.06 0.29 0.63Novos membros UE
0.87 1.05 0.87 1.04 0.64 0.77 0.84
Países Bálticos
0.86 1.00 0.78 1.16 0.75 0.81 0.83
Outros novos UE
0.88 1.07 0.91 1.00 0.59 0.76 0.84
NIC Asiáticos 1.63 0.95 2.16 1.38 3.00 2.54 1.93
Outros NIC 1.10 0.95 1.32 0.96 1.11 1.29 1.13
Tabela - 3 Indicadores de Performance do Setor Público 2001-2003 (PSP)
Perfomance total do Setor Público
(pesos iguais)
Indicadores de Oportunidade Indicadores "Musgraveanos"
Fonte: AFONSO (2006).
A tabela indica que mais gastos públicos freqüentemente têm retornos
menores em relação à melhor eficiência e correspondem a um escore entre 0,8
96
e 0,9, onde está o Brasil. Países com um menor setor público têm um escore
PSE mais alto que os países que estão na média e, sem dúvida nenhuma,
países que têm um grande setor público. Isto se aplicaria a países emergentes
da Ásia bem como a Maurício.
VRS TE Rank VRS TE Rank CRS TEBrasil 0,381 22 0,488 22 0,219Bulgária 0,461 14 0,483 23 0,262Chile 0,73 4 0,615 17 0,529Chipre 0,489 11 0,867 3 0,454República Tcheca
0,439 15 0,637 13 0,329
Estônia 0,489 12 0,632 14 0,364Grécia 0,369 23 0,713 8 0,307Hungria 0,355 24 0,687 9 0,287Irlanda 0,576 8 0,813 4 0,517Coréia 0,749 3 0,743 6 0,639Letônia 0,486 13 0,624 16 0,357Lituânia 0,535 9 0,588 18 0,37Malta 0,408 19 0,753 5 0,35Maurício 0,721 5 0,686 10 0,583México 0,703 6 0,551 19 0,456Polônia 0,412 18 0,627 15 0,304Portugal 0,385 21 0,678 11 0,308Romênia 0,528 10 0,509 21 0,316Cingapura 1000 1 1000 1 1000Eslováquia 0,406 20 0,674 12 0,322Eslovênia 0,431 16 0,731 7 0,364África do Sul 0,676 7 0,529 20 0,421Tailândia 1.000 1 1.000 1 0,822Turquia 0,416 17 0,482 24 0,236Média 0,548 0,671 0,422Mínimo 0,355 0,482 0,219Desvio padrão 0,186 0,144 0,186
Tabela - 4 Resultados DEA: Um Recurso, Um Resultado
País
VRS TE - retornos variáveis de escala
Recursos direcionados Resultados direcionados
Fonte: AFONSO (2006).
Os resultados confirmam em grande parte a abordagem de resultados
“macro” anteriores para determinar a eficiência do setor público. Singapura e
Tailândia obtiveram os melhores escores, seguidos por Coréia, Chile e
Maurício. Os últimos colocados foram Brasil, Grécia e Hungria. Pela
perspectiva de resultados, o país que se sai melhores usa 1/3 dos insumos que
o país com pior resultado para atingir um determinado escore de PSP. Um
97
resultado médio de produção de 0,55 sugere a possibilidade que, para o nível
de produção alcançado, o país poderia usar 45% menos de recursos. Por esta
mesma perspectiva, o país que obteve o melhor resultado alcança duas vezes
mais produção que o país menos eficiente com o mesmo insumo. O resultado
de produção de 0,67 implica que, na média, para o nível de recursos que estão
utilizando, os países alcançam apenas 2/3 da produção que alcançariam se
fossem eficientes.
Figura 6 – Fronteira Possível de Produção Teórica: um Recurso, um Resultado
Fonte: FMI (WEO) Elaboração:AFONSO (2006).
Esta figura representa a fronteira possível de produção associada com
os resultados DEA acima. Ela mostra como é grande a diferença entre a
maioria dos países e os mais eficientes. Há, entretanto, grandes diferenças
entre os melhores, médios e piores resultados dentro da fronteira possível de
produção.
98
Score Rank Score Rank Score RankBrasil 0.381 22 0.488 22 0.69 23Bulgária 0.461 14 0.483 23 0.77 22Chile 0.73 4 0.615 17 1.38 5Chipre 0.489 11 0.867 3 1.08 8
República Tcheca 0.439 15 0.637 13 0.85 17
Estônia 0.489 12 0.632 14 0.91 12Grécia 0.369 23 0.713 8 0.96 9Hungria 0.355 24 0.687 9 0.85 17Irlanda 0.576 8 0.813 4 1.37 6Coréia 0.749 3 0.743 6 1.65 3Letônia 0.486 13 0.624 16 0.91 12Lituânia 0.535 9 0.588 18 0.86 15Malta 0.408 19 0.753 5 0.78 21Maurício 0.721 5 0.686 10 1.56 4México 0.703 6 0.551 19 1.31 7Polônia 0.412 18 0.627 15 0.83 19Portugal 0.385 21 0.678 11 0.82 20Romênia 0.528 10 0.509 21 0.86 15Cingapura 1 1 1 1 2.39 1Eslováquia 0.406 20 0.674 12 0.92 11Eslovênia 0.431 16 0.731 7 0.88 14África do Sul 0.676 7 0.529 20 0.95 10Tailândia 1 1 1 1 1.83 2Turquia 0.416 17 0.482 24 0.63 24Correlação Score Rank Score RankDEA recurso-PSE 0.91 0.77 - -DEA resultado-PSE - - 0.71 0.56
Análise DEAPerformance do
Setor Público (PSE)
Tabela - 6 Comparação dos resultados em vários métodos
País Recursos direc. Resultados direc.
Fonte: AFONSO (2006)
Comentou-se neste estudo a eficiência do setor público. Ficou evidente
que um setor público “enxuto” e taxas de gastos na faixa de 30% do PIB
tendem a ser mais eficientes. O desempenho do setor dos países mais
eficientes é mais de duas vezes superior que o de países menos eficientes.
Ademais, uma análise econométrica indica que alto nível educacional,
funcionalismo competente e honesto, e segurança do direito de propriedade
dão um impulso extra à eficiência de gastos.
Outra conclusão é que, entre vários países, a posição do Brasil não é
boa. Isso não se deve à falta de recursos, mas à falta de eficiência nos gastos
e ao fato de o país não ter um nível educacional adequado e de
99
freqüentemente questionar o direito da propriedade privada. Ademais, esse
nível de gasto exige uma alta carga tributária. Como essa análise foi feita com
dados de uma década atrás, a situação do Brasil não é tão negativa como a
apresentada, mas falta ainda muito a ser realizado para que o Brasil entre num
patamar de países eficientes com seu gasto público. Aumentar constantemente
os impostos não é solução, porque cobrar muitos tributos torna o país pouco
competitivo num momento em que a competição internacional é um fato do
mundo globalizado. Estar bem neste quesito é fundamental para a
prosperidade do país.
100
Apêndice 1
Canadá: um sistema com experiência positiva de IVA duplo
O Canadá tem uma robusta economia de mercado com um PIB de
US$1,3 trilhão, baseada em mineração, agricultura, energia e serviços. Um dos
fatores que explicam a prosperidade do país é que população, sendo pouco
numerosa, é relativamente jovem, bem educada e treinada, além de atrair levas
de imigrantes, o que lhe confere dinamismo adicional. São 33 milhões de
habitantes, apenas equivalentes aos das regiões metropolitanas de São Paulo
e do Rio de Janeiro. Assim o PIB per capita é de mais de US$38 mil. O Canadá
faz parte da OCDE e do G-7, e sempre teve uma participação ativa nas
Organizações das Nações Unidas (ONU) com uma política externa baseada no
multilateralismo.
Os canadenses se autodefinem mais por aquilo que dizem que são –
americanos – do que pelo que são. De fato, esses americanos do norte não
são agressivos, violentos, imperialistas, mas são multiculturais e têm um
sistema de saúde pública, embora caro, impecável e acessível a todos. A
identidade nacional canadense é difícil de ser explicada numa só linha em face
do grande número de imigrantes que o país vem acolhendo. Contrariamente
aos Estados Unidos, que são um melting pot (panela de sopa) com seus
imigrantes que acabam ao longo dos anos se tornando “americanos”, o Canadá
seria mais um salad bowl (tigela de salada), onde os vários elementos
convivem num mesmo ambiente sem se misturar tanto.
Um país que venceu o deficit crônico
O país passou pela crise do estouro da bolha relativamente ileso. Seus
bancos, com tradição de serem conservadores em relação às práticas de
concessão de empréstimos e de dotados de alta capitalização, saíram da crise
101
de 2008 entre os mais fortes do mundo. O país teve sólido crescimento de
2003 a 2008, aproveitando a notável maré de consumo dos vizinhos, mas
apresentou déficit fiscal em 2009, depois de mais de uma década de seguidos
superávits.
Déficit fiscal não fora novidade antes de 2009 e apenas com a
reforma tributária do final dos anos 1980 esse crônico problema foi
seriamente enfrentado50. O arrojado primeiro ministro Progressista
Conservador Brian Mulroney (1984-1993) quebrou o domínio do Partido Liberal
do Canadá na política nacional e governou numa época de grandes mudanças
estruturais da política econômica. Foi o período das mais profundas
transformações na economia do Canadá desde a Segunda Guerra Mundial.51 O
governo de Mulroney coincidiu com os de Ronald Reagan nos Estados Unidos
e de Margareth Thatcher no Reino Unido. Mulroney compartilhava as filosofias
política e econômica dos dois outros líderes mundiais. A principal mudança foi
representada pelos acordos de livre comércio, primeiro com os Estados Unidos
em 1988 (Free Trade Agreement), e depois estendido ao México em 1992-94
(North American Free Trade Agreement).52 Muitos dos princípios que
50 O nome do partido, Progressista Conservador, parece uma contradição em termos, como o Partido Revolucionário Institucional do México. Mas os Tories, como são conhecidos a exemplo de seu homólogo britânico, é um partido com longa atuação no país. O Primeiro Ministro mais respeitado do Partido Progressista Conservador é John Diefenbaker que serviu de 1957 a 1963.
51 O Canadá foi governado principalmente pelo Partido Liberal do Canadá, com pouca alternância no poder, quando o Partido Progressista Conservador chegou ao poder. Os primeiros ministros Liberais mais respeitados foram Wilfrid Laurier (1896-1911), William Lyon Mackenzie King (1921-1926 e 1936-1930), Louis St. Laurent (1948-1957), Lester Bowles Pearson (1963-1968) e Pierre Trudeau (1968-1979 e 1980-1984). A população tem, no entanto, pouca simpatia pelos Tories. Os Tories estão no poder desde 2006. O PLC é um partido de certa forma semelhante ao PMDB. É comum a formação de “Governo de Minoria”, ou seja, um governo no qual nenhum partido tenha obtido a maioria dos votos, e portanto, das cadeiras no Parlamento.
52 Oitenta por cento do comercio internacional do Canadá é com os Estados Unidos, com quem compartilha a maior fronteira aberta do mundo. Depois dos EUA, os principais parceiros comerciais são a Reino Unido e o Japão. O Canadá tem um substancial superávit com os Estados Unidos, dos quais é o principal fornecedor de energia (petróleo, gás, urânio e eletricidade).
102
nortearam esses acordos de livre comercio serviram de inspiração para a
criação da Organização Mundial de Comercio (OMC).
Mulroney adotou novas leis sobre competitividade e falência, bem como
a desregulamentação de certos setores da economia, como transporte,
telecomunicações e serviços financeiros.
Modernizar a tributação para crescer e exportar mais
Não foi surpresa quando, como parte de uma ampla reforma tributária,
o Imposto sobre Mercadorias e Serviços, GST na sigla em inglês, foi
introduzido no Canadá, em 1991, por Mulroney e pelo arquiteto das reformas
estruturais, o Ministro das Finanças Michael Wilson. Este tributo, da
modalidade de incidência sobre o Valor Agregado, cobrado em vários níveis,
substituiu o Imposto de Venda de Manufaturados (MST, na sigla em inglês) de
13,5% cobrado no atacado e o Imposto Federal sobre Telecomunicações de
11%.
Mulroney afirmava que o IVA teve que ser implementado porque o antigo
imposto prejudicava a capacidade exportadora do setor manufatureiro. A
introdução do GST gerou muita oposição popular e política, mas foi a primeira
etapa da reforma tributária de Mulroney, que, além da liberação do comércio
exterior, também modernizou os impostos de pessoas físicas e jurídicas.
Reduzindo a indexação à inflação do imposto de renda depois de 1985 e com o
objetivo de dar benefícios sociais a famílias com o novo sistema tributário,
Wilson estabeleceu os fundamentos dos programas de redução do déficit que
seus sucessores Liberais adotaram, em meados dos anos 90 reduzindo o
déficit fiscal do país de forma significativa.53 No governo seguinte, do Liberal
53
Hale, Geoffrey, The Politics of Taxation in Canada, “The Mulroney Legacy – Tax Reform, Free Trade and the Deficit Trap”, University of Toronto Press, 2002.
103
Jean Chrétien, o ministro das finanças Paul Martin, conseguiu praticamente
acabar, ao longo dos anos 1990, com o déficit crônico.54
O GST evita o efeito cascata, no sentido em que os provedores de bens
e serviços podem solicitar créditos fiscais para evitar que o mesmo produto
seja taxado várias vezes. Assim, o GST é essencialmente pago pelo
consumidor final. Praticamente todos os bens e serviços são taxados. As
poucas exceções são alimentos, aluguel residencial e serviços médicos e
financeiros. Bens de exportação são isentos (“alíquota zero”) e pessoas de
baixa renda recebem restituições quando declaram o imposto de renda, e isso
representa uma engenhosa maneira de contornar o argumento de que o GST
tem caracteristica de imposto regressivo (= os consumidores menos afluentes
pagam proporcionalmente mais).
Lutas políticas para aprovar a reforma
Voltando aos esforços iniciais de Mulroney até conseguir aprovar o GST,
é interessante lembrar em se apegou a Oposição para contestar o novo tributo.
O fato de o IVA não ser cobrado sobre bens exportados foi percebido como
capaz de encarecer a vida dos canadenses, por terem que pagar uma alíquota
mais elevada de GST para compensar a isenção aos exportadores. Isso
aumentou a oposição social e política ao GST, a ponto de certos membros
Tories terem abandonado o caucus (cúpula) do partido do primeiro ministro. O
Senado, dominado pelo Partido Liberal, se recusou a passar a lei do GST.
Mulroney foi obrigado a usar um casuísmo legal, pouco empregado, para
aumentar o número de senadores e conseguir obter a maioria na Câmara
54 A relação de Chrétien com Martin lembra a de Tony Blair com Gordon Brown, no sentido que o ministro das finanças resolveu os problemas do país, mas estava de olho no cargo de primeiro ministro. Martin chegou ao poder através da perda da liderança do partido por Chrétien, perdeu a eleição seguinte; talvez seja esse o destino de Gordon Brown.
104
Alta.55 A minoria Liberal adotou táticas de obstrução, mas o GST acabou sendo
aprovado com uma alíquota de 7% e entrou em vigor em 1 de janeiro de 1991.
A oposição popular e política ao novo imposto não diminuiu, apesar das
tentativas do governo de explicar que o GST substituía um imposto “invisível”
para consumidores por ser cobrado de atacadistas e que, no fim, tornaria o
Canadá mais competitivo. O governo afirmou que, numa economia de mercado
como a canadense, a substituição do imposto sobre a indústria – esse era uma
espécie de IPI – acabaria tendo alguma influência sobre os preços, o que não
foi percebido claramente pela população.
A mudança para um imposto sobre o consumo, no estilo europeu,
ajudou a economia do Canadá a se tornar mais eficiente e competitiva com
preços mais baixos para a exportação. O GST ajudou a enfrentar o problema
de déficit fiscal do país, mas seu efeito em relação a baratear os preços de
produtos exportados, entretanto, é modesto, visto que o câmbio sempre pesou
mais nas trocas internacionais, em particular com os Estados Unidos. Mas, o
GST tornou o sistema tributário canadense mais transparente e menos
distorcido. Em 1991, quando o GST entrou em vigor, todas as províncias
canadenses, com exceção de Alberta, já cobravam um imposto indireto de
venda, de âmbito provincial.56
Por razões políticas, a alíquota do imposto federal GST foi reduzida
várias vezes. Primeiro, foi o atual primeiro-ministro Stephen Harper do Partido
Progressista Conservador, eleito em 2006, que a reduziu em 1 ponto
55
O Senado canadense é outro tópico controverso visto que os senadores são indicados. Há pedidos para que o sistema de escolha de senadores seja mudado.
56 Até hoje, a Província de Alberta não cobra IVA provincial. Alberta é uma espécie de “Texas canadense” com um forte setor petrolífero e de gado. Aliás, o petróleo canadense é bem pesado e é proveniente das “tar sands” de Athabasca, as areias betuminosas. Os royalties, não compartilhadas com o resto do país, que recebe pelo petróleo e gás são suficientes.
105
percentual para 6% em julho daquele ano, cumprindo promessa de
campanha.57 O GST foi reduzido novamente, em janeiro 2008, para 5%.
Transparência do imposto GST
A notoriedade do GST no Canadá se deve a uma obscura provisão
constitucional. A legislação de outros países estipula que os preços devam ser
postados com o IVA embutido para que consumidores não se dêem conta de
quanto estão pagando em imposto. No Canadá, isso não é possível visto que
os preços obedecem à legislação provincial. Assim, as províncias optaram
para que preços não incluam o GST, com exceção de gasolina, taxis e
poucas outras coisas, para poder “culpar o poder federal” pelo imposto.
Isso é mais um capítulo da constante “competição” das províncias com o
governo federal. Isto é, especialmente, o caso na província de Quebec.58 O
Brasil deveria seguir o exemplo canadense para que brasileiros estejam
cientes de quanto pagam em impostos, postando os tributos de modo
destacado dos preços.
Cobrança harmonizada com os estados
57 Stephen Harper é o primeiro Tory após Brian Mulroney e Kim Campbell que o substituiu no final do mandato quando líder do partido. A falta de apoio a Mulroney levou à sua derrota na eleição de líder de partido.
58 Sempre foi feito um esforço especial para acomodar os desejos desta província francófona.
Vários primeiros ministros foram do Quebec, como St. Laurent, Pierre Trudeau, Brian Mulroney, Jean Chrétien e Paul Martin. Mesmo assim, houve dois referenda sobre a separação do Quebec do Canadá, um nos anos 1980 e outro em 1995. Este último foi derrotado por menos de 1% dos votos. A independência, ou “soberania” do Quebec ainda é um sonho alimentado por vários políticos, embora um de seus maiores defensores, Lucien Bouchard, tenha recentemente admitido que a soberania não aconteceria tão cedo. Este movimento, no entanto, permanece um sério risco para o país.
106
Outro aspecto em que o sistema tributário brasileiro poderia acompanhar
o modelo canadense é que o IVA seja federal e federativo. No caso do Canadá,
o imposto federal e o provincial são cobrados separadamente, ou seja, quando
se compra um bem, paga-se o GST federal e depois o IVA provincial, tudo na
mesma fatura. Não é um processo complicado. No caso das províncias
atlânticas, Novo Brunswick, Terra Nova e Labrador e Nova Escócia, foi criado,
em acordo com o Governo Federal, um “imposto harmonizado” que reúne o
imposto de vendas provincial e federal.59 Nessas províncias, a alíquota do
imposto harmonizado é de 15% e ele é arrecadado pela Receita Federal
canadense, Revenue Canada, que transfere as respectivas partilhas às
províncias. Depois das reduções do GST, o imposto harmonizado foi diminuído
respectivamente para 14% e 13%. Depois da implementação do imposto
harmonizado, os preços finais ao consumidor apresentaram quedas
observáveis.
Há planos para as províncias de Ontário e de Colômbia Britânica
também adotarem um imposto harmonizado, que funcionaria nos moldes do
aplicado nas províncias atlânticas. Não resta dúvida que tal sistema de
cobrança “harmonizada” é mais eficiente, além de promover mais
investimentos e emprego, sendo menos oneroso para o contribuinte.60
Esta harmonização é um elemento de simplificação também
defendido neste trabalho, e que poderia também ser um modelo para o
Brasil. Certas regiões, da Amazônia legal ao Nordeste, poderiam reduzir a
máquina arrecadadora e seus custos aplicando um único IVA, arrecadado pelo
governo federal e, em seguida, transferido em parte aos estados e municípios
para baratear o custo da sua administração e evitar sonegação.
59 Terra Nova e Labrador representa uma única província depois que o território do Labrador foi incorporado.
60 Harmonized Sales Tax to Boost Investment, Job Creation, Press Release, Gabinete do Premiê, Colombia Britânica, 2009. http://www2.news.gov.bc.ca/news_releases_2009-2013/2009PREM0017-000141.htm; Ontario Budget and Harmonized Sales Tax information, http://www.fin.gov.on.ca/en/budget/ontariobudgets/2009/.
107
O desafio de modernizar o sistema previdenciário
O calcanhar de Aquiles do sistema tributário canadense refere-se às
aposentadorias e pensões, o Canadian Pension Plan (CPP) e a Old Age
Security (OAS). O CPP foi criado pelo Primeiro Ministro Lester B. Pearson em
1966. Naquela época, as taxas de contribuição foram estabelecidas em 1,8%
da renda bruta de um empregado com um limite máximo de contribuição. Já
nos anos 1990, esta baixa taxa não era mais suficiente para acompanhar o
envelhecimento da população.61 Assim, a taxa de contribuição, tanto para
empregado como empregador, outra novidade, subiu para 9,9% em 2003.
O grande problema continua sendo a diminuição da população
economicamente ativa, como nos casos da Europa ou do Japão. Esta é uma
das razões por que o Canadá expande sua característica “multicultural” e
mantém uma política liberal de imigração. Contrariamente à Austrália, o
Canadá incentiva imigração da Índia, da China, do Haiti e da América Latina.62
Vancouver recebeu muitos chineses de Hong Kong quando a ex-colônia
britânica passou para o controle de Beijin. A imigração do Haiti é encorajada
pela Província de Quebec supostamente porque ambos são de língua francesa.
No caso de refugiados políticos ou econômicos, o país dá até ajuda financeira
para que eles se estabeleçam em suas novas cidades e em suas atividades
profissionais. O país precisa do trabalho dos imigrantes para manter a
solvência do CPP.
Esses dois programas, o CPP e o OAS, desembolsam aproximadamente
C$60 bilhões ao ano.63 Eles são complementados por aposentadorias e
poupanças privadas. As aposentadorias privadas são fornecidas por
empregadores ou dependem de planos individuais do Registered Retirement
Savings Plan. Todos os benefícios desses programas, públicos ou privados,
são sujeitos à imposição de imposto de renda. O CPP é um programa que
recebe contribuições segundo a renda dos trabalhadores. O plano é 61 Canadian Pension Plan. http://www.canadapensionplan.info/
62 Veja, “Bonjour, Quebec”, 98, 3 de março de 2010, pp. 98-99. Este autor, por exemplo, adotou a cidadania canadense em 1995.
63 Atualmente, C$1 = US$0,90.
108
administrado pelo governo federal e se aplica a todas as províncias, com
exceção do Quebec, que administra o Quebec Retirement Plan, espelho do
CPP.
O CPP (e o QPP) baseia-se numa “base constante” com a taxa de
contribuição invariável por 75 anos. Ele acumula um fundo de reserva
suficiente para estabilizar ao longo do tempo as receitas e as despesas,
bem como a taxa de financiamento. Em outras palavras, os ativos do CPP
são por si só insuficientes para pagar os futuros benefícios acumulados até o
presente, mas ainda são suficientes para evitar que as novas contribuições
aumentem por enquanto. O plano é sustentável, mas, dada a natureza
indefinida de futuros governos, ele não é típico de planos de pensão públicos
ou privados. Um estudo do atuário do CPP publicado em 2007 afirma, porém,
que este método de financiamento é “robusto e apropriado” em face das
“presunções razoáveis” das futuras condições.64 O chefe-atuário submete um
relatório ao Parlamento a cada três anos sobre o financiamento do Plano.
Outra característica que merece ser copiada no Brasil: os orçamentos
previdenciários permanentes e as revisões atuariais periódicas.
O rendimento do fundo de aposentadorias, o CPP, é mostrado na tabela
abaixo; ele é variável ao longo dos anos:65
Data Valor Líquido de
Ativos∗ (C$bilhões)
Taxa de Retorno
Anual (%)
Mar 2003 55,6 -1,1
Mar 2004 $70,5 bilhões 10,3%
64 Optimal Funding of the Canada Pension Plan: Actuarial Study. Office of the Superintendent of Financial Institutions Canada. 20 Abril de 2007. http://www.osfi- bsif.gc.ca/app/DocRepository/1/eng/oca/studies/Optimal_Funding_CPP_e.pdf
65 CPP Investment Board, Financial Highlights, Dezembro 2009. http://www.cppib.ca/Results/Financial_Highlights/default.html
∗ Dólar canadense
109
Mar 2005 $81,3 bilhões 8,5%
Mar 2006 $98 bilhões 15,5%
Mar 2007 $116 bilhões 12,9%
Mar 2008 $122,7 bilhões -0,29%
Mar 2009 $105,5 bilhões -18,6%
Mar 2010
(proj.)
$116,6 bilhões 7,6%
À medida que condições demográficas e econômicas mudem, mudarão
também as características do sistema de aposentadoria para manter sua
sustentabilidade. Assim, o sistema previdenciário canadense é considerado
híbrido, entre o lastro integral de ativos (“fully funded”), e os que arrecadam o
que gastam no mesmo ano, do tipo “pay as you go” (regime adotado no Brasil)
ou “PayGo”, como é conhecido no Canadá. O regime de financiamento parcial
(partial funding) está entre essas duas abordagens. É reconhecido que
qualquer nível de financiamento, para ser considerado benéfico, deva levar em
conta um aumento da poupança nacional.
Uma grande reforma, em 1997, levou a uma mudança gradual do
financiamento do CPP de PayGo para financiamento parcial, chamado de
financiamento constante. A reforma de 1997 e, em particular, o financiamento
constante, resultaram em que a sustentabilidade financeira do CPP, segundo o
governo, fosse garantida para gerações presentes e futuras. As finanças do
CPP devem continuar melhorando ao longo do tempo com o crescimento de
ativos, da relação ativos/despesas e com a taxa de investimento. O superávit
da taxa legal sobre o financiamento estável que existe desde 2003 foi positivo
para a estabilidade financeira do CPP. Esta margem permite absorver parte do
impacto de experiências adversas que possam ocorrer no futuro. Como é de se
esperar que o retorno real de investimentos continue a superar o crescimento
verdadeiro de ganhos totais e a taxa legal seja mantida em patamar mais alto
que a do financiamento constante, o grau de suporte do Fundo deve aumentar.
110
Fica claro que a imigração e a reforma permitiram este resultado; porém,
como as futuras gerações de imigrantes se aproveitarão também dos
benefícios do CPP, é importante manter políticas tributária e fiscal
responsáveis, o que parece ter se tornado o caso do Canadá.
111
Apêndice 2
Política Tributária, Aposentadorias e Política Fiscal: os exemplos dispares
da Argentina e Chile
I. Argentina: uma experiência em retrocesso
Serão examinadas neste capítulo a situação tributária, a política fiscal e
a previdência na Argentina desde a reforma do Presidente Carlos Saul Menem,
o segundo civil após a ditadura militar que governou o país no final dos anos
1970 e início de 1980. O governo federal da Argentina cobra o Imposto sobre
Valor Agregado (IVA), outros tributos sobre certos bens, sobre comércio
exterior e sobre folha de pagamento, e o imposto de renda. Há, porém,
transferência para governos provinciais e para a previdência social. Essa
partilha, que deixou os impostos sobre o comercio no âmbito federal e os
impostos sobre o consumo sendo divididos pelos governos federal e
provinciais, obedece à Constituição e data do século XIX. Ou seja, a tradição
antiga continua válida e merece ainda ser imitada, em pleno século 21. Mas
nem tudo na experiência recente está à altura da tradição passada daquele
país.
O IVA está no centro da reforma tributária de 1989, que ocorreu depois
da posse de Menem como Presidente da República e a de Domingo Cavallo
como Ministro da Economia. A base tributária foi sendo expandida ao longo dos
anos, bem como as alíquotas respectivas. Inicialmente, estavam excluídos de
IVA alimentos, produtos petrolíferos, gás natural, recursos naturais, bens de
papel, produtos publicados, certos bens de capital e a maioria dos serviços. Em
1990, esta lista foi reduzida, mas estendida a produtos transferidos ao setor
privado através de um ambicioso programa de privatização. A taxa aumentou
de 15% para 16%, depois de uma breve redução para 13%. A reforma de 1990
deixou quatro impostos a nível provincial: sobre propriedade, sobre veículos,
112
sobre vendas de produtos e serviços, e imposto sobre selos. A administração
dos dois primeiros ficou a cargo do órgão da receita provincial.
Apesar do aumento da base, o incremento das alíquotas do imposto
tornou-se contumaz quando mudanças do IVA foram sendo progressivamente
introduzidas. A taxa subiu para 18% em 1992 e uma sobrecarga temporária de
mais três pontos foi introduzida em 1995 para combater a Crise Tequila. Esta
sobrecarga tornou-se permanente em 1996.
O resultado dessas medidas, em conjunto com a melhora da
administração do recolhimento tributário, foi que a arrecadação total quase
triplicou entre 1990 e 1995, atingindo 6,8% do PIB. O objetivo das medidas era
aumentar a receita do governo, mas elas melhoraram também o perfil do
sistema tributário, com a eliminação de uma miríade de outros impostos de
consumo e a otimização dos que permaneceram sobre itens especiais, como
carros e peças de automóvel, petróleo e cigarro e álcool.66
A reforma tributária de Menem e Cavallo introduziu novidades também
na imposição direta com uma redução dos impostos de renda das pessoas
jurídica e física, sob influência do que ocorrera com a reforma tributária nos
Estados Unidos, em 1986, sob administração Reagan, que reduziu a carga
tributária de empresas e indivíduos, e simplificou o sistema tributário. Na
Argentina, as alíquotas para empresas domésticas e estrangeiras foram
reduzidas em 1990 de 33% para 20% e de 45% para 36%, respectivamente.
Mais tarde, o tratamento de firmas foi unificado para não depender de sua
origem: fixou-se em 30% em 1992 e, posteriormente, foi aumentado para 33%
em 1996. O conceito de “receita mundial” na definição da base tributada foi
introduzido. A alíquota máxima para pessoas físicas foi reduzida de 35% para
30%, como também as alíquotas de imposição de oito para seis. Mudanças na
base tributada para pessoas físicas estavam relacionadas a limites de isenções
médicas. 66 Bès, Martin, Tax Systems and Tax Reforms in Latin America, “Argentina”, ed. V. Tanzi, Department of Public Economics of the University of Pavia. http://mpra.ub.uni-muenchen.de/5223/, MPRA Paper No. 5223, posted 07. Novembro 2007.
113
A taxação de bens de pessoas jurídicas e físicas foi também alterada.
Por um lado, o imposto sobre ganhos de capital, bem como o sobre o valor do
patrimônio de pessoas jurídicas e físicas, foi eliminado, mas, por outro, o
imposto sobre ativos brutos de empresas foi introduzido com uma alíquota de
1%. O objetivo deste tributo era enfrentar a evasão de imposto de empresas
quando pagamentos feitos sobre rendimentos brutos podiam ser abatidos do
imposto de renda; mas pagamentos além desse valor não geravam um crédito
para empresas. O imposto sobre contas correntes (a nossa CPMF) foi reduzido
de 0,007% para 0,003%, mas seu pagamento deixou de ser creditado para
pagar outros impostos.
À exceção do aumento do IVA e de alguns ajustes isolados no imposto
de renda para reduzir certas isenções, as reformas fundamentais do sistema
tributário argentino já haviam sido completadas até o final de 1992. A política
tributária, porém, foi cada vez mais utilizada entre 1992 e 1995 para melhorar
seletivamente a competitividade de certos setores que enfrentavam
dificuldades devido ao sistema de câmbio fixo. Por exemplo, o imposto federal
sobre selos foi eliminado como foi o imposto sobre rendimentos brutos para
aqueles setores que enfrentavam queda de preço no mercado internacional de
seus produtos, ou seja, a maioria das commodities e dos produtos
industrializados produzidos no país.67
Algumas modificações adicionais do sistema tributário argentino foram
feitas em 1998. A mais significativa entre elas foi a introdução de um regime
tributário simplificado para apertar a fiscalização de pequenos e médios
empresários e de profissionais liberais. O IVA, o imposto de renda e o da
previdência foram unificados num único tributo chamado de “monotributo”, algo
equivalente ao nosso Simples. O pagamento era efetuado mensalmente
segundo quatro parâmetros: vendas anuais brutas, preço unitário de serviços,
tamanho físico da empresa, e uso de energia. O monotributo foi uma maneira
pragmática de apertar a arrecadação do setor informal da economia, mas ele
incentivou a sonegação de atividades econômicas além de certo patamar.68
67 Ibid.
68 Refere-se a este problema como “anões fiscais”.
114
O governo que assumiu em dezembro de 1999, de Fernando de La Rua,
enfrentou um déficit fiscal insustentável, exacerbado pela desvalorização no
Brasil daquele ano. O déficit do governo federal argentino foi de US$7,1 bilhões
em 1999, mas seria de US$11 bilhões, 3,9% do PIB, se a receita das
privatizações não fosse contabilizada. O governo, porém, se comprometeu a
manter o Conselho Monetário e a Convertibilidad adotada por Menem. A
necessidade de relançar a economia foi limitada pela falta de recursos para
financiar uma política fiscal expansionista. Medidas para gerar receitas foram
introduzidas sob um programa do FMI cujo objetivo foi aumentar receitas para
reduzir desequilíbrios das contas do governo em 1,8% do PIB.
Conseqüentemente, mais medidas tributárias foram adotadas, naquele
momento difícil, no imposto de renda da pessoa física para reduzir deduções e
aumentar alíquotas, além de uma sobrecarga emergencial. Um aumento do
imposto sobre o patrimônio foi decretado. Mudanças em tributos indiretos
incluíram novos impostos sobre consumo bem como a equalização das taxas
de gasolina e alguma extensão da base do IVA. Essas medidas foram
eventualmente complementadas por cortes de despesas públicas, como
redução de salários do funcionalismo e de pensões em termos nominais.
Cavallo foi nomeado, mais uma vez, Ministro da Economia em março 2001
por de la Rua numa indicação de desespero com a crise econômica que se
avistava dentro do contexto da Convertibilidad. De la Rua decretou o Corralito,
uma restrição a saques de dinheiro aplicados em prazos fixos, contas correntes
e poupança. Um imposto sobre operações financeiras foi adotado um mês
depois, em abril, inicialmente com uma taxa de 0,25% de uma base do valor
bruto de transações de débitos e créditos. A taxa subiu para 0,4% em maio
2001; esse aumento foi creditado ao IVA e outros impostos. Um terceiro
aumento para 0,6% ocorreu em agosto daquele ano. Isenções e reduções do
imposto sobre gasolina foram eliminadas também em agosto. Isso não evitou
que a economia entrasse em colapso. No início de dezembro do mesmo ano,
instalou-se uma grande crise política e constitucional no país.
A partir de 21 de dezembro 2001, a Argentina teve vários presidentes
sucessivos. Como o vice de de La Rua, Carlos Alvarez, já renunciara em
115
outubro de 2000, a situação ficou complicada quando de la Rua fugiu de
helicóptero da Casa Rosada, não sem antes decretar o Corralito, uma restrição
a saques de dinheiro aplicados em prazos fixos, contas correntes e poupança;
houve, em conseqüência, corrida aos bancos. Com a saída de la Rua, Ramon
Puerta tomou posse, mas renunciou rapidamente; este foi sucedido por
Eduardo Camaño, presidente da Câmara de Deputados. Para dar maior
legitimidade ao novo governo, a Assembléia Legislativa, órgão composto pelo
Senado e a Câmara, indicou para presidente o Governador Adolfo Rodriguez
de Saá, da Província de San Luis. Sua equipe econômica manteve a
Convertibilidad, mas deu o calote da dívida pública de US$93 bilhões.
A equipe econômica de Saá criou um plano heterodoxo para lidar com a
crise econômica. Para preservar a Convertibilidad, foi criado um plano de
“Terceira Moeda”, não conversível chamado de Argentino que coexistiria com o
peso conversível e o dólar americano. O Argentino só circularia em espécie;
cheques, notas promissórias e outros instrumentos poderiam ser apenas
denominados em peso ou em dólar, mas não em Argentino. Este seria
garantido por um fundo administrado pelo governo federal. A meta deste plano
era contrabalançar as tendências inflacionárias. Martín Redrado, que seria
exonerado como presidente do Banco Central da República Argentina (BCRA)
pela Presidente Cristina Rodriguez de Kirchner no início de 2010, era um
grande defensor do Argentino. Devido à falta de apoio político ao Governo Saá,
o plano nunca foi implementado. Sem o apoio de seu próprio partido,
Rodriguez de Saá renunciou e, depois da Convenção da Assembléia
Legislativa, Eduardo Duhalde, senador de Buenos Aires, foi indicado para a
Presidência.
Em janeiro de 2002, o Governo Duhalde jogou a toalha e abandonou a
Convertibilidad.69 Tudo isso acompanhado por uma forte desvalorização da
69 Mussa, Michael, Argentina and the Fund: From Triumph to Tragedy, Peterson Institute of International Economics, Washington, D.C., 2002. http://www.piie.com/publications/newsreleases/newsrelease.cfm?id=81, Blustein, Paul, And the Money Kept Rolling In (and Out) – W all Street, the IMF, and the Bankrupting of Argentina, PublicAffairs, Perseus Books Group, 2002. http://www.publicaffairsbooks.com/publicaffairsbooks-cgi-bin/display?book=1586482459
116
moeda. O objetivo era evitar a saída de dinheiro do sistema bancário e o
colapso do sistema.
Um consenso emergiu na Argentina sobre a necessidade de se evitar a “orgia”
de dívida dos anos 1990, quando a dívida cresceu de US$55,1 bilhões para
US$144,3 bilhões entre 1990 e 2001. Depois do colapso do início de 2002,
Buenos Aires solicitou recursos significativos do FMI. Mas a nova equipe
econômica indicou que não sacaria o dinheiro e decidiu alternativamente
solicitar um programa para a rolagem da dívida no momento de maturidade. A
principal razão desta mudança foi a falta de acordo entre as autoridades do
país e o FMI sobre as políticas a serem adotadas. Isso estava consistente com
a mudança de paradigma sobre programas de ajuda multilaterais que a nova
administração americana estava prometendo desde 2001. O resultado foi que a
Argentina era a única grande economia que enfrentava uma grande crise sem
ajuda multilateral.
O sistema tributário não foi muito afetado, apesar da reintrodução de
impostos de exportação de commodities. A arrecadação de impostos ficou
estagnada em 2002 com o colapso de 10,9% do PIB e da inflação de 41%. A
equipe econômica resistiu às tentativas de adoção de choques econômicos
adicionais, inclusive na política tributária. As faixas de imposto não foram
reajustadas pela inflação e as empresas não puderam indexar a taxa de
depreciação. Os avanços em termos de arrecadação compensaram, em parte,
os efeitos das perdas de 2001 e 2002. O resultado foi um aumento significativo
da arrecadação de impostos que se deveu a uma robusta recuperação
econômica de 9% do PIB real e a taxa inflacionária de 7,4% entre 2003 e 2005.
Duhalde foi sucedido por Nestor Kirchner e este por sua esposa, Cristina
Fernandez de Kirchner. O Casal K conseguiu a proeza de promover um grande
retrocesso, em particular a atual presidente, que reestatizou o sistema
previdenciário em outubro 2008. Este foi um verdadeiro terremoto que
ameaçou repercutir em toda a América Latina. A mudança repentina das regras
do jogo no campo previdenciário trouxe de volta o fantasma da insegurança
jurídica que ronda a região, o conseqüente aumento do risco-país e o fim dos
investimentos estrangeiros na Argentina. Isso, depois do calote da dívida do
início da década. Trata-se de um coquetel perigoso em plena crise financeira
117
mundial que pode causar muitos danos não só à economia argentina, mas
também à economia dos demais países do subcontinente.
A presidente argentina encontrou nos planos da previdência privada uma
possível via de financiamento de seu projeto político da ordem de US$30,6
bilhões e financiar uma política fiscal irresponsável. Essa cifra corresponde ao
total da carteira de fundos gerida pelas Administradoras de Fundos de
Aposentadoria e de Pensão (AFJP), fruto da economia de 9,5 milhões de
trabalhadores, que passarão a engrossar o sistema público de repartição
composto atualmente por 4,5 milhões de afiliados, sem qualquer garantia que
um dia verão seu dinheiro. De acordo com dados oficiais recolhidos pela revista
América Economia, as Administradoras de Fondos de Jubilaciones y Pensiones
(AFJP) acumularam prejuízos de 20% durante o último ano, o que poderia
colocar em risco o pagamento das pensões de valor mínimo. Esses mesmos
administradores de fundos, contudo, lembram que, desde 1996, os planos de
pensão privados geraram uma rentabilidade média superior a 7%. Trata-se de
uma cifra que os especialistas não acreditam em ver novamente se a
estatização for aprovada. Por outro lado, acredita-se que haverá
conseqüências nefastas para a economia do país.70
Após apenas um dia do polêmico anúncio feito na Argentina, os
mercados reagiram à noticia com uma forte queda na bolsa de Buenos Aires. A
bolsa argentina, todavia, não caiu sozinha. Esse novo Efeito Tango — isto é, o
contágio da instabilidade argentina — teve grande repercussão também na
Espanha, aonde o principal indicador do país, o índice Ibex 35, chegou a cair
13,48%, o dobro da média das bolsas européias. Isto se explica pelo fato de
que as principais companhias listadas na bolsa espanhola estão muito
expostas na América Latina, o que se traduziu em fortes quedas em suas
principais empresas. A conseqüência direta dessa desconfiança é o aumento
do risco-país, que disparou 44% na semana em que Kirchner anunciou suas
intenções.
70
América Economia, “A Discórdia da Aposentadoria”, 27 de novembro de 2008. http://www.americaeconomia.com.br/184112-A-discordia-da-aposentadoria.note.aspx
118
Voltou-se a se falar em reforma do sistema tributário argentino, cujo
primeiro elemento seria impedir que a solvência fiscal fosse prejudicada por
qualquer “melhora” do sistema tributário.71 Os tomadores de decisões políticas
com freqüência negligenciam a solvência fiscal o que levava à instabilidade
macroeconômica e à dívida insustentável e acabavam em colapso econômico e
calote da dívida. A política tributária deve internalizar o grau de informalidade
com que certos setores da economia operam e adotar respostas pragmáticas
em tal ambiente. Além disso, a política tributária precisa de incentivos
automáticos e transparentes para promover o crescimento. Transferência de
receitas para outros entes do governo é um elemento importante, mas tem de
se levar em conta sua pouca capacidade de administração dos recursos em
relação ao órgão federal, bem como as dificuldades inerentes de descentralizar
a administração de impostos
O paradoxo argentino é que, desde Menem, todos os presidentes eram do
mesmo partido, o Justicialista, ou Peronista. Apesar de não pertencerem à
mesma facção, houve certa estabilidade aparente. Todos esses presidentes,
no entanto, só estavam de acordo no que se refere ao aumento de gastos
públicos e à adoção de políticas populistas, cujo resultado sempre foi o calote.
Essa, enfim, é a raiz do crônico desastre argentino: não ser fiel às suas
melhores tradições, mas estar sempre preparada para repetir o pior, em
matéria de política econômica.
II. Chile: uma boa experiência em marcha
O Chile tem boas políticas públicas e sólidas instituições financeiras que
permitiram ao país ter a classificação mais alta de bônus soberano na América
Latina. A OCDE convidou o Chile para se tornar membro em 2009, o que deve
71 Bès, Op. Cit.
119
ocorrer depois de um período de observação de dois anos. O comercio exterior
responde por 40% de seu PIB e as commodities representam 75% de suas
exportações. O cobre é responsável por um terço da receita do governo. O
Chile assinou 57 acordos de livre comercio com vários parceiros, além do
Mercosul, os Estados Unidos, a União Européia, o México, a Índia, a China e a
Coréia do Sul. Nos anos 1990, o país era visto como paradigma de reforma
econômica não apenas para a América Latina. Entre 1991 e 1998, seu
crescimento foi de 8% em média, mas nesse ultimo ano, caiu pela metade
devido ao aperto da política monetária para limitar o déficit em conta corrente e
a diminuição de exportações.
Nesta década, o crescimento continuou superando a média latino-
americana, graças ao bom ritmo dos investimentos, inclusive e principalmente
estrangeiros. Os investimentos externos diretos atingiram US$17 bilhões em
2008, mas caíram para US$7 bilhões em 2009. Para enfrentar a crise mundial,
o governo chileno adotou uma política fiscal anticíclica financiada por seu fundo
soberano, de aproximadamente US$20 bilhões, acumulado em tempos de
bonança, graças ao alto preço do cobre, permitindo assim, cobrir déficits fiscais
em tempos de vacas magras. Este fundo é mantido no exterior, separado das
reservas do Banco Central.
O Chile caracterizou-se nesses últimos quinze anos pelo aperto da política
fiscal. Suas receitas são provenientes da exportação de cobre e assim o país é
altamente dependente de mercados externos e do preço internacional de
commodities, como ficou evidente nas crises financeiras asiática e russa dos
anos 1990, que causaram a recessão de 1999. O segundo ano ruim para as
contas do governo foi 2002, quando ocorreu uma queda de 0,1% do PIB. Mais
uma vez, os culpados foram os choques externos, sendo um deles por
“vizinhança”, a crise da Argentina, e outro, por efeito de crise externa, trazendo
para baixo o preço do cobre. Com exceção desses dois anos, 1999 e 2002, o
120
Chile produziu superávits substanciais que foram o instrumento para a redução
da sua dívida, de 47,3% do PIB para 7,5%.72
As principais receitas do governo provêem do Imposto sobre o Valor
Agregado (IVA), do imposto de renda para pessoas físicas e jurídicas, da
exportação de cobre e de contribuições sociais. Os ganhos com a exportação
da indústria do cobre, em parte, de novo, sob controle privado depois da
estatização do Governo Allende, são a segunda maior fonte de receita após os
impostos de renda. Os impostos e as contribuições sociais ficaram
relativamente estáveis em termos do PIB, desde 1990, mas a receita com o
cobre variou bastante dependendo do preço no mercado internacional. Quanto
às contribuições sociais, as da previdência representam uma fonte apenas
secundária de receita fiscal, o que não é surpresa visto que todos os fundos de
pensão do país, com exceção dos das Forças Armadas e dos da Polícia, estão
em mãos privadas.
Os gastos do governo chileno estão em três categorias principais:
funcionalismo (5,3% do PIB), subsídios e transferências (4,6% do PIB) e
aposentadorias (4,8% do PIB). Em relação a este terceiro item, deve-se
ressaltar o desequilíbrio entre as contribuições e os gastos desde 1990. O
déficit da previdência, de aproximadamente entre 3% e 4% do PIB ao ano, se
deve à transição de um regime de repartição simples que arrecada o que gasta
no mesmo ano (“pay as you go”) ao esquema com lastro integral em
ativos (“Fully funded”) introduzido em 1981.73 Embora houvesse ocorrido a
transferência de um sistema ao outro, privado, o antigo ainda era, e é, um fardo
para as contas públicas. Os custos são, principalmente, as aposentadorias
ainda pagas aos trabalhadores que se aposentaram antes ou, mesmo, depois
da reforma sob o sistema pay as you go, além dos benefícios adquiridos por
72
Cominetta, Matteo, Tax Systems and Tax Reforms in Latin America, Luigi Bernardi, Alberto Barreix, Anna Marenzi, Paola Profeta, editores, Routledge International Studies in Money and Banking, Routledge, 2007.
73 Arenas de Mesa, A. (2000) El Sistema de Pensiones en Chile: Principales Resultados y Desafios Pendientes, CEPAL, Santiago de Chile, Chile.
121
trabalhadores que contribuíram sob o antigo sistema e, finalmente, as
aposentadorias com lastro integral pagas a militares e policiais.74
Desde a sua Independência, a principal fonte de receita para os governos
da região foi a tributação de transações externas.75 Esta situação que se
aplicou ao Chile (e ao Brasil e à Argentina), mudou abruptamente depois da
Primeira Guerra Mundial com a recessão e a queda dos preços das principais
exportações chilenas – nitrato e cobre – e, conseqüentemente, da receita do
governo. Então, tornou-se necessário desenvolver um sistema de arrecadação
tributária moderno. No caso do Chile, este processo chegou a um marco
histórico em 1972 – um ano antes do golpe militar – com a criação do Servicio
de Impuestos Internos (SII), que hoje é responsável pela gestão da
arrecadação de impostos no país. Dois anos depois, portanto, já no governo
ditatorial de Pinochet, duas leis substituíram o sistema obsoleto baseado em
transações internacionais por um moderno baseado em tributação de renda e
consumo, determinando assim o sistema que perdura até hoje.
O sistema após 1974 ficou baseado em cinco pilares: imposto de renda de
pessoas jurídicas ou imposto corporativo; imposto de renda unificado e
progressivo para pessoas físicas residentes; imposto geral sobre consumo e
serviços (IVA) e vários impostos (excise taxes) sobre consumo de certos
produtos específicos (tabaco, álcool e combustível). O sistema atual
corresponde em geral àquele desenvolvido em 1974; ele é, portanto fruto do
regime militar. A única grande intervenção posterior àquela foi a de 1990 que
correspondeu à volta do regime democrático. Havia a necessidade de lidar com
novas preocupações sociais e, portanto, financiar um ambicioso programa de
expansão de atenção social. Isso se traduziu em gastos fiscais adicionais da
ordem de 3% do PIB entre 1991 e 1993.76 Para tanto, várias medidas foram
tomadas pelo governo de Patrício Aylwin: aumento de 10 para 15% da alíquota
74 Ibid., Cogley, Timothy, On the Transition to a Fully Funded Social Security System, FRBSF Economic Letter, Research Department, Federal Reserve Bank of San Francisco, San Francisco, 98-08, Março 1998. http://www.frbsf.org/econrsrch/wklyltr/wklyltr98/el98-08.html 75 Bulmer-Thomas, Victor, The Economic History of Latin America since Independence, Cambridge Latin American Studies, 2003. 76 Boylan, Delia, Preemtive Strike – Central Bank Reform in Chile’s Transition from Authoritarian Rule, The City University of New York, 1998.
122
mais baixa de imposto de renda de pessoas físicas; mudança do lucro
presumido como base para grandes contribuintes; aumento do imposto de
renda de pessoas físicas de média e alta renda; um aumento do IVA de 16%
para 18%. Houve significativo aumento de receitas fiscais entre 1990 e 1993.
As receitas de impostos diretos aumentaram 46%, sobretudo em conseqüência
de maiores impostos para pessoas jurídicas, que aumentaram de 1,8% para
3,2% do PIB, ou seja, um aumento de 77%.
Em compensação, os efeitos do aumento do imposto de pessoas físicas
foram pequenos. De fato, em termos relativos o imposto de pessoas físicas é
comparativamente baixo no Chile. Os impostos indiretos, no entanto,
aumentaram de 11,6 para 13,5% do PIB. À primeira vista, os impostos indiretos
aumentaram bem menos que os impostos diretos. Porém, em relação ao PIB,
tanto os impostos indiretos como os diretos aumentaram 1,9% do PIB.
As contribuições sociais não foram afetadas pela reforma de 1990 e
permaneceram estáveis. Os efeitos dos aumentos tributários do IVA e dos
impostos de pessoas jurídicas ficaram evidentes e a pressão fiscal atingiu seu
pico. Nos anos seguintes o aumento de impostos foi parcialmente compensado
pela queda brutal de tarifas de importação e de outras formas de tributos sobre
transações internacionais. Em 1993, receitas relativas ao comercio
internacional equivaliam a 2,3% do PIB. Este número baixou para 0,4% onze
anos depois, equivalente a uma redução de 82%. A queda da alíquota sobre as
importações, calculada como a relação entre as receitas das taxas de
importação e o valor total das importações, foi semelhante, caindo de 16,7%
para 5,8% no período entre 1985 e 2000, uma redução de 65%.77 O abandono
do modelo de desenvolvimento de substituição de importações e a liberalização
do comercio exterior determinaram essas diminuição.
A queda das receitas do comercio exterior foi compensada por aumentos do
IVA. O nível de imposição indireta voltou ao que era antes da reforma. A
pressão fiscal diminuiu e estabilizou-se a carga tributária em 18% do PIB,
excluindo as contribuições sociais. A taxação direta, no entanto, ficou em níveis
77
Tanzi, Vito, Public Spending in the 20th Century, Cambridge University Press, 2000.
123
mais altos que antes da reforma. O resultado é que o peso dos impostos
diretos, em relação aos indiretos, cresceu apenas marginalmente. Em 1990,
eles geravam, respectivamente, 26% e 74% de todas as receitas, excluindo as
contribuições sociais. Em 2004, esses números eram respectivamente 34,5% e
65,5%.
Desde os anos 1980, intervenções tributárias semelhantes ocorreram em
toda a América Latina, que enfrentava a crise da dívida externa, inflação
astronômica e gastos descontrolados. Com a consolidação do Consenso de
Washington, a eficácia do sistema tributário passou a figurar na agenda de
todos os governos da região, que se esforçavam para reduzir as distorções de
seus regimes de impostos e simplificar suas estruturas. Com essa meta em
mente, todas as alíquotas do IR para pessoa física foram bastante reduzidas.
Em 1986, a mais alta alíquota era em média de 49,5%, sendo reduzida para
28,8% em 2004.78 O Chile não escapou à essa regra: sua maior alíquota foi
reduzida de 50% para 45%, 43% e finalmente 40% em 1997, 2002 e 2003,
respectivamente79.
Depois da bem sucedida transição democrática, da estabilização do
ambiente macroeconômico, da forte redução da dívida pública e da
compensação da perda de receita com a liberalização comercial, o Chile pôde
enfrentar o novo milênio preparado para melhorar a eficiência de seu regime
tributário.80 Depois de profunda pesquisa, foram identificadas falhas no sistema
corrente e propostas de intervenções para enfrentá-las: simplificação do
sistema, redução de elementos de distorções, redução do custo e luta à
sonegação.81 As principais propostas para se atingir essas metas eram:
78
Sabaini,Juan Carlos Gómez e Cestrangolo, Oscar, La Tributatión Directa en América Latina y Los Desafíos a la Imposición sobre la Renta, Cepal – Serie Macroeconomica del Desarrollo N°60, Publicación de las Nataciones Unidas, BBC Brasil, “Brasil tem maior carga tributária da América Latina, diz Cepal”, 2005. 79 Jiménez, Juan Pablo; Sabaini, Juan Carlos Gómez; e Podestá, Andrea edrs. Evasión y equidad en América Latina, Cepal, 2010. http://www.eclac.cl/ilpes/noticias/paginas/5/38375/Evasi%C3%B3n_y_equidad_final_02-02-2010.pdf
80 Bernardi, Luigi; Barreix, Alberto; Marenzi, Anna; e Profeta, Paola, eds., Tax Systems and Tax Reforms in Latin America, Routledge, Taylor and Francis Group, 2008.
81 Ibid.
124
eliminação de várias isenções e privilégios do imposto pago por empresas e do
IVA; unificação da alíquota do imposto de pessoas jurídicas; substituição do
complexo esquema de incentivos à poupança por um sistema misto de
exclusão de todos os lucros retidos da base de cálculo do imposto das
empresas; redução da alíquota mais alta do Programa de Incentivo Tributário
(PIT); e plano de luta contra a sonegação. A julgar pelas recentes intervenções,
essas propostas tiveram certa influência.
Foi dada muita atenção à minimização de custos em relação a tempo e
a dinheiro gastos pelo contribuinte. A simplificação da arrecadação veio com
a informatização do sistema tributário que no Chile atingiu um grau mais
elevado de que em qualquer outro país da OCDE.82 Por exemplo, desde 2001,
o IR da pessoa física é pago online. Esta medida objetivava a lutar contra a
sonegação e, em junho de 2001, foi lançado o Plan de Lucha Contra la Evasión
Tributária. Seu objetivo declarado era diminuir até 2005 a taxa de evasão
estimada, de 24% para 20%. Para tanto, leis foram modificadas, especialmente
o Código de Processo Tributário e a lei sobre o IVA, para dar mais poderes ao
SII. As penas por evasão foram aumentadas. Os resultados foram um grande
sucesso: a evasão do IRPF caiu para 19,8% ou 15,6%, segundo a metodologia
de cálculo que estima esse valor evadido em termos de PIB. Simultaneamente,
a evasão do IVA caiu de 19,4% do PIB para 14,3%.
A privatização do sistema de previdência criou um grande “déficit de
seguridade social”, com um sistema capaz de garantir pensões apenas para
trabalhadores que contribuem continuamente. Assim, trabalhadores informais,
sobretudo mulheres e trabalhadores pouco capacitados, corriam o risco de
caírem abaixo do nível de pobreza quando se aposentassem. Se contribuíssem
menos de 20 anos, eles não teriam direito às pensões mínimas garantidas pelo
Estado. Ademais, há outros problemas: a concentração de mercado faz com
que os três maiores fundos privados de aposentadoria (AFP) alcancem apenas
82 Barraza Luengo, Fernando, Desarrollo de los Sistemas Informaticos y sus Aplicaciones, Servicio de Impuestos Internos, Centro Interamericano de Administraciones Tributarias – CIAT, 2000. http://www.sii.cl/aprenda_sobre_impuestos/estudios/tributarios21.htm
125
75% do mercado do trabalho; os trabalhadores são obrigados a contribuir; os
custos do sistema são altos (2,4% dos salários); e altos custos de marketing.
As AFP têm alto lucro, o que cria problemas políticos e sociais.83 A Presidente
Michelle Bachelet nomeou uma comissão de especialistas, em março 2006,
para investigar possíveis intervenções para enfrentar esses problemas.84 Em
resumo, a comissão sugere que seja eliminada a cláusula de contribuição
mínima de 20 anos para dar direito a pensão; que a idade de pensão seja de
65 anos para homens e mulheres – atualmente, as mulheres podem se
aposentar aos 60 anos; abrir o mercado de AFP a bancos, permitindo a
separação de fundos de pensão e serviços de gestão de contas; e, finalmente,
permitir que novos trabalhadores (220.000 ao ano) possam ter acesso a AFP
mais barata através de leilões feitos pelo órgão do governo que supervisiona as
aposentadorias. Essas propostas estão sendo debatidas pelos partidos
políticos e pelo novo governo conservador que tomou posse em 2010.
O Chile investiu muita energia e recursos para reduzir distorções, custos de
arrecadação e administrativos do sistema tributário. Os resultados foram
positivos. O Chile tem um sistema tributário simples que gera altos retornos no
contexto da América Latina, com custos relativamente baixos e poucas
distorções. Além do mais, graças a esses elementos e a uma luta constante
contra a sonegação, é o país latino-americano com uma evasão fiscal mais
baixa. Mas, a predominância de impostos indiretos e a quase isenção de
imposto de renda para pessoa física, torna o sistema chileno regressivo. Outro
ponto de preocupação é o desequilíbrio que a seguridade social produzirá nas
próximas décadas.
O Chile, contudo, com sólidos fundamentos fiscais e macroeconômicos, alto
crescimento econômico e uma receita eficiente pode, sem dúvida, enfrentar
esses problemas, que são mais políticos que econômicos. O novo governo de
Sebastián Piñera que toma posse em 2010, se comprometeu a dar especial
atenção ao combate à pobreza e a acabar com a pobreza extrema até 2014,
83
Hidalgo, Manuel Jesus, No Chile, Aposentadoria sem Alegria, Revista ADUSP, Junho 2003. http://www.adusp.org.br/revista/30/r30a02.pdf.
84 O relatório da comissão: www.consejoreformaprevisional.cl
126
quando termina seu governo. Será criado um Ministério de Desenvolvimento
Social que ficará localizado no Palácio Presidencial de la Moneda. Não se sabe
ainda como será o novo governo, mas tudo indica que o estado do bem-estar
social criado pelos quatro presidentes da Concertación não será desmantelado.
127
Apêndice 3
Austrália, Índia e México: três exemplos de utilização do IVA
I. Austrália: Exemplo de IVA nacional, com redistribuição federativa.
A Austrália está em posição de dar inveja. Sua economia produz um PIB
per capita semelhante aos das maiores economias européias e ao do Canadá,
país, aliás, com que tem muito em comum, com exceção do clima – ex-colônia
britânica, pequena população, grande território e economia baseada em
commodities e energia.
A reforma tributária australiana do Governo John Howard introduziu em
2000 o “Imposto sobre Mercadorias e Serviços” (Goods and Services Tax
(GST, na sigla em inglês, como no Canadá). Este tributo na realidade é um
imposto sobre o valor agregado que incide sobre a venda de mercadorias e
serviços. Howard, líder do Partido Liberal, prometeu durante a campanha de
1996 que nunca adotaria o GST e venceu por grande maioria.85 Na eleição de
1998, porém, Howard propôs o GST, em substituição de todos os impostos de
venda, que incidiria sobre todos os produtos e serviços. A coalizão de Howard
obteve 49,2% dos votos, mas manteve uma maioria dos assentos na Câmara
Baixa. Assim, considerou sua vitória como “um mandato para o GST”. Sem
maioria no Senado, e devido à oposição do Partido Trabalhista, o governo se
viu obrigado a depender de pequenos partidos para aprovar a reforma
tributária.
Parte da barganha política foi que toda receita obtida pelo GST seria
distribuída aos estados, embora arrecadado pelo governo federal. Assim, o
governo federal negociou com os estados e territórios que os vários tributos,
impostos e taxas estaduais seriam eliminados ao longo do tempo, e o déficit
orçamentário conseqüente seria compensado pela receita do GST, esta
distribuída pelo governo com assessoria da Commonwealth Grants
Commission (Comissão Federal de Concessões) a estados e territórios. Os
85
PM defends his credibility PM, 25 August 2004.
128
termos de referência dessas transferências são decididos pelo governo depois
de consulta à Comissão.86 Além disso, o imposto de renda de pessoas físicas e
jurídicas federal foi reduzido para compensar o GST.
Depois de vários pequenos partidos exigirem ampliação da lista de
isenções, a reforma tributária australiana foi aprovada em julho de 1999.
Turistas que visitam a Austrália têm direito a restituição de GST depois de
deixarem o país se comprarem mercadorias e serviços de mais de C$300,00 e
dinheiro gasto com hospedagem. Este instrumento não é particular da
Austrália; ele foi adotado na maior parte de países que adotaram o IVA –
nenhum quis prejudicar o turismo, que seja o caso da Austrália, do México, do
Canadá, ou da França, da Itália ou do Reino Unido.
O GST australiano, contrariamente ao do Canadá, é um imposto
unicamente federal, mas sua recita é compartilhada com os estados. A
Constituição australiana proíbe os estados de cobrarem impostos sobre
consumo ou sobre vendas.
Até então, a Austrália tinha um imposto de vendas no atacado,
Wholesale Sales Tax, WST, na sigla em inglês, que incidia sobre mercadorias
vendidas no atacado. Este tributo fora implementado nos anos 1930, quando a
economia do país era baseada em produtos básicos. Ao longo dos anos, e
como a maioria das economias de países adiantados, a oferta de serviços
começou a ter um peso maior que a de produtos básicos. O GST eliminou a
vantagem que provedores de serviços tinham em relação aos provedores de
mercadorias.
A taxa cobrada pelo GST é 10% em todos os produtos e serviços com
exceção daqueles que têm isenção, e de mercadorias e serviços sobre os
quais incide um input tax, que é uma taxa cobrada para seu fornecimento,
semelhante a um imposto. É longa a lista de isenções. Serviços de saúde,
educação e alimentos têm uma alíquota zero de GST, bem como uma doação
86 Commowealth Grants Commission. http://www.cgc.gov.au/
129
de terra federal (“crown land”), algumas vendas de certas terras agrícolas,
serviços de água, esgoto e drenagem, e carros para pessoas deficientes.
É comum queixas de estados de não receberem transferências
suficientes, contrariamente ao que manda a lei. Essas queixas são, em geral,
respondidas com acusações que os governos estaduais não reduziram seus
impostos suficientemente. Isso levou a campanhas com acusações da
oposição e respostas do governo que, em certos momentos, foram bastante
acirradas.87 Houve estudos indicando que o GST teria um impacto negativo no
mercado imobiliário com uma queda de 8% do preço de casas novas e uma
redução de 12% da demanda. Mas, a partir de 2002, o mercado imobiliário
retornou a níveis anteriores ao GST, chegando até a ultrapassá-los em 2007,
em particular em Melbourne e Sydney.88
A arrecadação total do governo em 2006 aumentou para C$248 bilhões,
C$15,4 bilhões superior à de 2005 e além da previsão do governo. O governo
federal transferiu C$9,3 bilhões sem incluir créditos para input tax e restituições
de imposto de renda. Esses pagamentos foram 25% superiores aos do ano
anterior. O governo federal conseguiu aproximadamente C$39,6 bilhões em
GST arrecadados pelos governos e os transferiu integralmente.89
A grande inovação da Austrália para o IVA foi a forma de partilha dos
recursos com estados e territórios. A alocação é feita pelo governo depois de
consulta a um órgão independente, a Commonwealth Grants Commission. Esta
forma de partilha contrasta com a do Canadá, onde são as próprias províncias
que são responsáveis pela arrecadação. A instituição de tal agência foi
interessante e pode servir de exemplo se o IVA brasileiro não for federativo,
além de federal.
87
http://www.abc.net.au/worldtoday/content/2006/s1605569.htm
88 "Background and General Economic Impact of a GST on the Real Estate Industry". Curtin University of Technology, Sydney. http://espace.lis.curtin.edu.au/archive/00000292/01/pinto_dtp_gst_real_estate.pdf. Retrieved May 21 2006.
89 Commissioner of Taxation, Annual Report 2005-2006. http://www.ato.gov.au/content/downloads/n0995_AR_2006_07_w.pdf
130
II. Índia: A dificuldade de uma reforma atender múltiplos propósitos.
Contrariamente à Austrália, a Índia acompanha o caso do Canadá em
que o Imposto sobre o Valor Agregado é cobrado a nível federal e federativo.90
O Imposto sobre Valor Agregado foi introduzido na Índia em abril 2005, mas
nem todos os estados o adotaram. Apenas 20, entre 28, subscreveram ao IVA,
sendo que um o adotara um ano antes. A Constituição indiana, no entanto,
estipula que apenas os estados podem determinar a taxa de impostos,
inclusive a do IVA. Esta disposição da Constituição indiana é o oposto da que
se encontra na Constituição australiana, que proíbe a estados e territórios de
arrecadarem impostos. Apesar de um sistema de IVA ter sido considerado o
melhor tipo de imposto de consumo para a Índia desde o início dos anos 1990,
tal reforma implicaria sérios problemas para as finanças dos estados. Além
disso, implementar o IVA no contexto das reformas econômicas em andamento
seria um paradoxo no contexto do federalismo indiano. De um lado, as
reformas levaram à descentralização da política fiscal, o que obriga mais
descentralização da política tributária para manter a contabilidade fiscal. Do
outro, implementar o IVA e assim torná-la um mercado único integrado levaria
à perda de recursos pelos estados e reduziria a autonomia deles com maior
centralização.91
Ademais, por razões políticas, o modelo do IVA defendido pelo governo
indiano é imperfeito porque é contrário à premissa básica do tributo em
remover as distorções do movimento de mercadorias e serviços entre os
estados e à uniformidade da estrutura tributária. Impostos locais e estaduais
não foram integrados ao IVA. Além disso, não há dispositivo de concessão de
90
The Management Accountant, Official Organ of The Institute of Cost and Works Accountants of India, Volume 40 No. 5 May 2005. http://myicwai.com/manacc/may05.pdf
91 Sharma, Chachal Kumar, Consumption Tax Trends 2008: VAT?GST and Excise Rates, OECD, 2008. 112-13. http://books.google.co.in/books?id=SR6ZSokt6TwC&pg=PA115&lpg=PA115&dq#v=onepage&q=&f=false
131
créditos fiscais para comércio entre estados, o que prejudica a essência do
tributo, ou seja, a remoção de distorções no movimento de mercadorias entre
estados.92
Ademais, o mais importante requisito para o sucesso do IVA é a
eliminação da Taxa de Vendas Central (CST, na sigla em inglês), que foi
adiada. A CST é cobrada na origem por estados exportadores de mercadorias
e serviços; os consumidores localizados em estados importadores pagam a
incidência da CST. A CST cria barreiras para a integração do mercado indiano
e tem um impacto em cascata do custo de produção. O fato de não haver
crédito fiscal em vendas e transferências interestaduais afeta o fluxo de
mercadorias.93
Portanto, o IVA não acabou com as distorções do sistema indiano. O
sucesso deste tributo depende da conformidade voluntária, visto que o valor do
IVA é estimado pelos próprios usuários, ou seja, a empresa que o cobra.
Assim, é necessário manter uma prestação de contas, emitir faturas de
imposto, e fazer declaração de renda.
O oposto parece estar ocorrendo no estado de Andhra Pradesh, onde se
encontra a cidade de Hyderabad; por esta região ser bastante adiantada, vários
aspectos de alta tecnologia foram utilizados para a cobrança do IVA.94 Andhra
Pradesh não é um caso único, embora concentre a indústria de alta tecnologia
que tanto tem ajudado a Índia. Andhra Pradesh é um estado que depende de
produtos agrícolas, mas que concentra a indústria de software do país. Hoje,
há um grande esforço para se adotar práticas de e-government na região.95
92 Ibib.
93 Ibid.
94 Meesala, M.Appalayya, Leadership in Governance the VAT Implementation Model of Andhra Pradesh, Deccan School of Management, Nampally, Hyerabad. http://www.thefreelibrary.com/Leadership+in+Governance+the+VAT+Implementation+Model+of+Andhra...-a01073954281 AP Value Added Tax Act – 2005, Diário Oficial de Andhra Pradesh, No.6, Hyderabad, Monday, 28 Março 2005. http://www.pdicai.org/vatap/APVATACT_2005.pdf 95 O e-government, ou governo eletrônico, está cada vez mais na agenda de países adiantados. O e-government permite economizar recursos e tempo nas atividades de governos de prover serviços. No Brasil, a Prefeitura do Rio de Janeiro e de São Paulo já participaram de conferências e seminários sobre o assunto. A Coréia do Sul é particularmente adiantada nesse assunto. http://www.softwareag.com/br/Solutions/government/e-Government/default.asp,
132
Este caso é emblemático da Índia onde empresas ainda são administradas de
forma tradicional, ou seja, com muita transação em dinheiro vivo, o que requer
mais transparência, contabilidade e honestidade. Setores informais dominam o
mercado e a esperança de maior conformidade e de menos evasão ainda
permanece uma ambição distante. Isso é refletido no alto percentual de
empresas que não cumprem as leis (14%), de não declaração fraudulenta de
restituição de créditos (35%) e de não declaração de renda (20%). Estima-se
que 70% das empresas não paguem qualquer IVA. Ademais, a lista de
produtos isentos de IVA é bem substancial.
Solicitar fraudulentamente créditos de IVA é uma prática desenfreada
para os chamados pequenos produtos que circulam rapidamente (os “Fast
Moving Consumer Goods”). Trata-se de mercadorias de consumo duráveis, de
remédios e de fertilizantes. As margens nesses setores são pequenas (de 2% a
5%).96
Isso serve de alerta caso o IVA seja introduzido no Brasil. Até em países
com alto nível de conformidade com as obrigações tributárias, como o Canadá,
alguma fraude parece inevitável. No caso da Índia, o problema é exacerbado,
em particular nos estados menos adiantados. Além do mais, no caso da Índia,
este imposto federal e federativo não é transparente e não houve simplificação
do sistema.
III. México: Um caso de reformas sucessivas, com rendas de
petróleo.
O México tem uma economia de mercado, um PIB de US$1,4 trilhão e
uma indústria e agricultura que misturam aspectos modernos com antiquados;
em geral, esses setores são dominados pelo setor privado. Administrações 95http://www.itec.al.gov.br/arquivos/apresentacoes/e-government-politica-e-estrategias-de-governo-eletronico-na-uniao-e-nos-estados-i-cati-roberio-santos.pdf/view
96 London Business School, Fast Moving Consumer Goods(FMCG), http://www.london.edu/assets/documents/theschool/SubjectGuide_FastMovingConsumerGoods_v3_JAN09_AF.pdf
133
recentes aumentaram a privatização de portos e aeroportos, ferrovias, geração
elétrica, distribuição de gás natural. O petróleo, contudo, permanece estatal.97
A distribuição de renda ainda é bastante desigual, mas o comércio exterior com
os Estados e Canadá, que triplicou depois da adoção do NAFTA em 199, não
foi afetado negativamente por isso. O México assinou, ademais, vários tratados
de livre comercio, inclusive com Brasil, União Européia e Japão. Noventa por
cento de seu comercio exterior provem de tratados de livre comercio. O México
é membro da OCDE e da APEC, a Área de Cooperação Econômica do
Pacífico-Ásia, que inclui a maioria dos países que beiram o Oceano Pacífico.
Em 2007, no seu primeiro ano de governo, o atual presidente, Felipe
Calderón, conseguiu apoio político para promover reformas tributária e
previdenciária. É essencial aproveitar o primeiro ano do mandato para fazer
essas reformas polêmicas. No ano seguinte, foram passadas uma reforma do
setor energético e outra fiscal em 2009. A crise do estouro da bolha muito
afetou o país com uma queda de 7% de seu PIB em 2009 com a redução da
demanda para suas exportações e dos preços de seus ativos. O PIB deve se
recuperar em 2010.
A reforma da previdência afeta os três milhões de funcionários públicos
do país, ou seja, 10% da população que não tem seguridade social. São os
trabalhadores do ISSSTE, o Instituto de Seguridad y Servicios Sociales de los
Trabajadores del Estado, cujos membros são principalmente professores.
Calderón conseguiu o apoio de vários setores da sociedade, inclusive os
sindicatos. Esta reforma foi bem sucedida. Todos os principais elementos do
novo sistema, incluindo a criação de contas de poupança individuais, de um
fundo de pensão público gerado pelo administrador PENSIONISSSTE, e o
pagamento de bônus de reconhecimento de contribuições prévias ao ISSSTE
foram elaborados há ano, pelo Ministério das Finanças, mas só agora
adotados. Esta reforma demonstrou a habilidade de Calderón em negociar com
o Congresso, onde não tem maioria, e com o PRI, Partido Revolucionário
97
Qualquer debate de privatização da Pemex é controverso.
134
Institucional.98 (Como seu antecessor, Calderón pertence ao Partido de Ação
Nacional, PAN.)
No curto prazo, a reforma do ISSSTE não deve afetar significativamente
as finanças públicas. No médio e longo prazo, ela deixa evidente a obrigação
do Estado com os funcionários públicos. Todos os membros atuais de ISSSTE
receberão bônus generosos por contribuições prévias, garantindo assim uma
alta pensão de aposentadoria sob o novo sistema individual. No longo prazo,
esta reforma relacionará futuros benefícios à quantia de acumulação de
poupança pessoal. Esta mudança deve incentivar futuros funcionários a
trabalharem mais para acumular fundos necessários para receberem uma
pensão adequada. A atual idade de aposentadoria de 54 anos provavelmente
aumentará mesmo sem que a nova idade de aposentadoria seja incorporada à
lei. O problema agora é lidar com a outra metade da população mexicana que
permanece fora do sistema de seguridade social. O principal objetivo desta
reforma foi aliviar as pressões fiscais causadas pelos desequilíbrios do sistema
de seguridade social entre as contribuições e os pagamentos obrigatórios, e
garantir ao mesmo tempo a viabilidade financeira do próprio sistema de
pensão.99
O próximo passo, é a reforma fiscal cujo objetivo é preservar a
estabilidade fiscal com o aumento da base da arrecadação e diversificação das
fontes da receita de impostos. No momento, 10% de toda receita fiscal vem da
Pemex, a petrolífera mexicana Petróleo Mexicano. Mas, esta receita deve
diminuir com a futura queda de produção. Ademais, a redução na dependência
fiscal na Pemex permitirá à empresa redirecionar sua receita à exploração e a
outros investimentos necessários. Detalhes da reforma indicam que ela deve
se basear em quatro pilares fundamentais:
98 Latintelligence – Analysis on Latin America, 02 de abril de 2007. http://www.latintelligence.com/2007/04/02/mexicos-social-security-reform/
99 The Economist, “Fiscal Reform is Coming soon”, 5 de junho de 2007. http://www.economist.com/agenda/displaystory.cfm?story_id=9283097&source=login_payBarrier
135
1) Aumentar a transparência e a eficiência dos gastos públicos;
2) Aumentar a receita com a diversificação de suas fontes;
3) Um novo “federalismo fiscal” que restabeleceria as relações entre
os estados e o governo federal; e
4) Melhora da administração do sistema de arrecadação para torná-lo
mais justo e para evitar a evasão fiscal.100
Obter apoio político para esta reforma deve ser mais difícil que para a da
previdência. Para conseguir apoio da oposição, o governo do PAN foi obrigado
a desistir da expansão do IVA, pelo menos inicialmente. A administração
anterior, de Vicente Fox, propusera eliminar algumas isenções, mas incluir
remédios e alimentos, o que levou à derrota da proposta. Calderón, por outro
lado, contempla várias opções:
• Fim de regimes especiais de imposto e de isenções do IR federal.
Trata-se de benefícios fiscais usados por indivíduos e empresas para
abater várias despesas de seus pagamentos, e no caso dos grandes
contribuintes, evitarem pagar a alíquota mais alta de 28%;
• Maior enfoque na obrigatoriedade de pagamento. O esforço dos últimos
anos contra a sonegação foi bem sucedido e deve ser mantido e
ampliado. Para o governo, o fato de mais mexicanos estarem abrindo
contas em banco indica que a informalidade está diminuindo, e isso
abre espaço para maior arrecadação;
• Adoção de um novo imposto de vendas de 2% com a receita destinada
a estados e municípios. Isso ajudaria estes entes a aumentarem sua
capacidade de arrecadação e a torná-los menos dependentes em
transferências federais. Esta medida já foi endossada pela Associação
de Governadores;
• Maior supervisão de gastos. Governos estaduais e municipais terão de
prestar contas sobre a eficiência de seus gastos com relatórios
100 Ibid.
136
obrigatórios a suas assembléias. Medidas serão introduzidas para
avaliar a eficiência de gastos federais.
Segundo o governo, os ajustes fiscais destinavam-se a aumentar a
arrecadação do governo federal em três pontos percentuais sobre os atuais
11,5% do PIB – o segundo mais baixo na América Latina depois da Guatemala
– até o fim de 2012, último ano do mandato de Calderón. Se o governo incluir a
extensão do IVA, o aumento da receita com impostos seria significativo. O
governo, porém, deve reduzir a taxa do IVA dos atuais 15% e iniciar medidas
de redução de pobreza para compensar pessoas de baixa renda do impacto
negativo do imposto sobre alimentos e remédios.101
Esse plano foi bastante afetado pela recessão de 2009 de -7,1%. O
superávit de 2006 se tornou um déficit em 2009, mas a falta de ação pode levar
a mais uma substancial queda do PIB.
O sistema tributário do México contempla quatro fontes de receita: imposto
de renda, IVA, impostos locais e imposto sobre propriedade. O governo federal
também cobra impostos de consumo de álcool e cigarros, bem como um
imposto de produção do setor de mineração. Os contribuintes são divididos em
quatro grupos: empresas residentes; empresas não residentes; indivíduos
residentes; e indivíduos que pagam impostos apenas sobre renda com origem
no México. Organizações filantrópicas, embora não paguem impostos, são
obrigadas a fazer declarações anuais.
Desde 2001, a alíquota de imposto para pessoas jurídicas foi reduzida em
1% a cada ano até atingir 32% em 2005, assim as alíquotas em 2002 e 2003
foram de 35% e 34% respectivamente. Com exceção de ganhos com ações
negociadas em bolsa do México, as alíquotas para ganhos de capital são as
mesmas que as do IRPJ. Não incide imposto sobre pagamentos de dividendos
101 Ibid.
137
de empresas mexicanas a não residentes, mas incide de 10% a 15% sobre
renda de juros e receita com royalties, 10%.
O IVA tem uma alíquota normal de 15% e outra especial de 10% para as
áreas ao longo da fronteira americana onde operam as maquilladoras.
Inicialmente, alimentos e remédios estavam isentos, mas Vicente Fox mudou
este ponto. Isenções de IVA incluem vendas de animais, legumes e frutas de
uso não industrial, tratores, fertilizantes e pesticidas, aluguel de máquinas
agrícolas, frete internacional e viagens aéreas de passageiros, serviço de
celular pré-pago, de bip, carros a gás e comercio estratégico em instalações
seladas na fronteira. Há também um imposto de 5% sobre itens de luxo.
A intenção do Presidente Calderón ao apresentar a reforma tributária de
2008 era ter um plano “tecnicamente sólido e politicamente viável”. Portanto,
ela não era muito ambiciosa.102 Com esta reforma apresentada ao Congresso
em junho de 2007, em seu primeiro ano de mandato, houve a introdução por
um período de transição de um novo imposto para pessoa jurídica, a
Contribución Empresarial de Tasa Única. Este imposto entrou em vigor em
2009 com uma alíquota de 16,5% e um aumento previsto para 17,5% em 2010
até chegar a 19% nos anos seguintes. Esta taxa (flat tax) de 19% seria um
imposto mínimo para as empresas e uma alternativa ao IRPJ de 28%. Ou seja,
as empresas teriam que pagar os 28% menos as deduções cabíveis, ou o 19%
flat. O imposto de 2% sobre os ativos das empresas seria eliminado.
Houve também um novo regime fiscal para a Pemex que deve reduzir o
imposto implícito pago pela empresa ao governo, acarretando um corte de
imposto de US$2,7 bilhões em 2008 e até US$5,4 bilhões em quatro anos.
Essas medidas devem liberar recursos para a Pemex investir para enfrentar o
declínio de produção. O novo imposto sobre a gasolina, de 5,5%, será usado
para transferir recursos para estados e municípios.103
102
The Economist Intelligence, “Unit Mexico’s Economy: a Modest Tax Reform”, 21 de junho de 2007. http://viewswire.eiu.com/index.asp?layout=VWArticleVW3&article_id=1812302166&rf=0
103 KPMG, 2007 Mexican Tax Reform, KPMG in México. http://www.kpmg.com.mx/publicaciones/libreria/mexico/ft-cartainformativa07ING.pdf
138
As empresas foram as principais afetadas pela reforma tributária. Esses
dois elementos da reforma tributária – a flat tax e a eliminação do imposto de
2% sobre ativos de empresas – foram apresentados como partes de um único
elemento, mas a introdução da taxa de 19% pode ser vista como um passo
para eventualmente eliminar o tradicional e mais complexo sistema do IRPJ.
Com uma taxa única como alternativa, e não uma substituição, seria possível
evitar controvérsias políticas no curto prazo. Além do mais, é um elemento de
simplificação. O novo imposto gerou resistências do setor corporativo por
aumentar substancialmente a taxa efetiva de imposto pago por empresas. O
plano foi criticado também por não permitir que gastos trabalhistas sejam
deduzidos. Mas o plano inclui incentivos trabalhistas que neutralizam esse
efeito.
A reforma, segundo The Economist, é uma tentativa complicada, porém,
inteligente de eliminar regimes fiscais especiais e isenções tributárias, sem
gerar polêmica política, e eventualmente tornando o sistema mais justo para
todos.104 Estimativas do governo indicam que o novo sistema tributário
aumentou a arrecadação federal em 1,5% do PIB – 1,3% graças ao CETU e
0,3% graças à maior eficiência fiscal. Até 2012, estima-se que o aumento será
de 2,8% do PIB – 1,8% do CETU e 1 % de maior eficiência.105
Para combater a informalidade, foi introduzida uma taxa de 2% sobre
depósitos bancários além de 20 mil pesos (US$1860) para fazer com que
setores informais entrem para economia formal. Esses 2% seriam creditados
para o IRPJ.
Como em outros países, a introdução do IVA no México foi polêmica e o
debate político ainda não está decidido.
104
Ibid.
105 Latin Business Chronicle, Tax Reform: Mexico Marks the Path, 22 de outubro de 2007. http://www.latinbusinesschronicle.com/app/article.aspx?id=1687
139
Conclusão
O imposto sobre o valor agregado tornou-se comum em vários países
apesar de forte oposição política e popular à sua adoção. Foi sempre visto
como um aumento da carga tributária, o que não parece ter sido efetivamnte o
caso. Sua taxa varia, mas sua essência, não. O IVA pode ser duplo, ou seja,
federal e federativo, ou apenas nacional. Na primeira categoria estão Canadá e
Índia; na segunda, Argentina, Chile, México e Austrália. O IVA foi sempre
introduzido em substituição a vários outros impostos, e, assim, simplificou o
sistema tributário.
A introdução do IVA no Brasil pode ser um elemento de clareza,
simplificação e justiça no sistema tributário brasileiro. Mas, se vier a passar o
que aconteceu em outros países, sua adoção não será fácil. Por isso, é
necessário explicar bem suas vantagens e os impostos que seriam eliminados
com sua introdução. Mas é imprescindível, para isso, que a mudança ocorra no
primeiro ano do mandato do próximo presidente. Senão ela, simplesmente, não
ocorrerá.
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