RENATA LANZA
CONJUNÇÕES ENTRE ESCOLA E CINEMA:
pesquisa-intervenção em duas escolas da Rede Municipal de Ensino de Campinas
CAMPINAS 2015
iii
iv
v
vii
RESUMO
Esta pesquisa implica intervenções com a arte cinematográfica em escolas da Rede
Municipal de Ensino de Campinas, envolvendo alunos dos anos finais do ensino
fundamental (6°, 7° e 8° anos) com o propósito de estabelecer um encontro entre a
Educação e o Cinema como Arte na Escola, bem como as possíveis ressonâncias
desse encontro para os seres envolvidos. Para tanto, objetivou-se articular a prática
escolar com as práticas socioculturais do ver, do criar e inventar filmes. Articulações
que chamamos de Práticas Exploratórias. Assim, o leque de ações dessa intervenção
baseou-se numa constante alteração entre o ver, o explorar, o experimentar, o criar, o
inventar e o aprender com a criação cinematográfica. Para pensar as dimensões
possíveis do Cinema como Arte no campo da Educação, enquanto potencializador de
gestos de criação, saberes e aprendizagens para si e para os outros, recorreu-se a
diversos autores, dentre eles, Alain Bergala, Adriana Fresquet e Milton de Almeida. O
método de pesquisa-intervenção foi a inspiração metodológica para entender a atuação
da pesquisadora enquanto professora de Matemática em um plano de experimentação
de cinema na escola. Crê-se que trabalhar com cinema nessa perspectiva é operar na
transversalidade de um plano de experimentação, "trans"formando professores e
alunos pela / para arte, criação e invenção de saberes e conhecimentos.
Palavras-chave: educação; cinema; criação; pesquisa; intervenção.
ix
ABSTRACT
This research implied on interventions through cinematic art in Campinas Municipal
public schools, and involved elementary schools’ students (6th, 7th grades and 8th). It
had the purpose of promoting an encounter between education and cinema as an art at
school and the possible consequences of this encounter for the participants. In order to
do so, this research aimed to articulate the school practices with the socio-cultural
practices of seeing, creating and inventing movies. These articulations are denominated
Exploratory Practices. Therefore, the different actions of this intervention were based on
a constant variation of seeing, exploring, experimenting, creating, inventing and learning
through cinematic creation. In order to reflect about the possible dimensions of cinema
as an art in Education field, gestures of creation, as knowledge and learning enhancer
to the students themselves and to other people, we based our research in many
authors, such as Alain Bergala, Adriana Fresquet and Milton de Almeida. Research-
intervention method was the methodological inspiration to comprehend our practice as a
Math teacher in a cinema experiment at school. We believe that using cinema in this
perspective means to operate transversally in an experimental stage, “trans”forming
teachers and students for/through art, creation and invention of knowledge.
Key-words: education; cinema; creation; research; intervention.
xi
Acreditar no mundo é o que mais nos falta; nós
perdemos completamente o mundo, nos desapossaram
dele. Acreditar no mundo significa principalmente
suscitar acontecimentos, mesmo pequenos, que
escapem ao controle, ou engendrar novos espaços-
tempos, mesmo de superfície ou volume reduzidos.
Gilles Deleuze
xiii
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO .......................................................................................................... .1
1. PENSAMENTO SOBRE CINEMA E EDUCAÇÃO ................................................. 9
2. ENCONTRO ENTRE ESCOLA E CINEMA ......................................................... 23
2.1 Hipótese de alteridade centrada na criação ................................................... 25
2.2 Cinema como arte ......................................................................................... .27
3. PESQUISA-INTERVENÇÃO.. .............................................................................. 35
4. A EDUCAÇÃO VISUAL E FILMES-ENSAIO ........................................................ 43
5. AÇÕES DA INTERVENÇÃO............... ................................................................. 47
6. A POTÊNCIA DO GESTO DE CRIAÇÃO ............................................................ 59
7. AS PRÁTICAS EXPLORATÓRIAS E SUAS TRANSVERSALIDADES ............... 67
7.1. Práticas exploratórias do ver filmes ............................................................... 73
7.2. Práticas exploratórias de enquadramento ..................................................... 77
7.3. Práticas exploratórias de filmagens ............................................................... 79
7.4. Práticas exploratórias de ver com olhos fechados ........................................ 83
7.5. Práticas exploratórias de roteiro .................................................................... 85
7.6. Práticas exploratórias de edição ................................................................... 86
7.7. Outras práticas ............................................................................................. 87
7.8. Para além das práticas exploratórias ............................................................ 89
8. POR UM SABER-FAZER CINEMA NA ESCOLA ................................................. 93
REFERÊNCIAS ........................................................................................................ 99
ANEXO I - Autorização para uso da imagem e som da voz ................................... 104
ANEXO II - Lista de filmes ...................................................................................... 105
ANEXO III - Cronograma das atividades... ............................................................. 106
ANEXO IV - Decoupage dos filmes-ensaio ............................................................ 109
ANEXO V - Desenhos dos pássaros ...................................................................... 111
ANEXO VI - Derivas com Mapas ........................................................................... 112
ANEXO VII - Roteiro "Um dia de escola" ............................................................... 113
ANEXO VIII - Algumas ideias de filmagens ............................................................ 114
ANEXO IX - Caderno de campo ............................................................................. 115
xv
AGRADECIMENTOS
Em primeiro lugar, quero expressar minha gratidão aos meus alunos que contribuíram
para o desenvolvimento dessa pesquisa.
Quero expressar também meus sinceros agradecimentos aos colegas de trabalho e às
equipes gestoras das escolas Vicente Ráo e Carmelina de Castro Rinco onde pude
encontrar, nas horas de maior conflito, afeto, respeito e atenção.
À equipe do Museu da Imagem e do Som - MIS, que disponibilizou o local para as
ações com os alunos.
Ao Professor Doutor Carlos Eduardo Albuquerque Miranda pela atenção,
recomendações e orientação durante a pesquisa.
Ao Professor Doutor Wencesláo Machado de Oliveira Jr que propiciou o contato muito
enriquecedor com as imagens e com a bibliografia.
Às Professoras Doutoras Adriana Fresquet, Alik Wunder e Inês Teixeira e ao Professor
Doutor Antônio Carlos Amorim, integrantes da banca de defesa da tese.
Aos membros do grupo de pesquisa OLHO, pela amizade, atenção e apoio para a
realização deste trabalho.
Amplio meus agradecimentos à Professora Ms. Sheyla Pinto da Silva, com quem
aprendi a ampliar a potência de existir e de agir e à Professora Ms. Maria Aparecida
Lopes, por seus ensinamentos.
Agradeço também à minha família pelo suporte e incentivo, sempre manifestados.
1
Introdução
Imagine que você está num escritório... Uma bela estenógrafa que você já viu antes entra na sala adentro... Você a observa... Ela tira as luvas, abre a bolsa e despeja o conteúdo sobre a mesa... Duas moedas de dez centavos e uma de um – além de uma caixa de fósforos de papelão. Ela deixa a moeda de um centavo sobre a mesa, guarda as de dez de volta na bolsa e leva as luvas até o aquecedor... Bem, nesse instante, seu telefone toca. Ela atende, diz alô, escuta e diz claramente: ‘Eu nunca na vida tive um par de luvas pretas’ e desliga o telefone... Você de repente dá uma olhada à sua volta e percebe que há outro homem no escritório, observando cada movimento de tal moça... "Continua", diz Boxley, sorrindo. “O que acontece depois? Não sei, Stahr responde. Só estava criando umas imagens (FIELD, 2009, p. 27).
Para Moletta (2009), quando somos tocados por algo do mundo com o
qual interagimos, surge em nossa mente uma imagem de tal forma que necessitamos
dizer algo sobre ela, investigá-la, conhecê-la. Esta imagem, que pode estar em
qualquer tempo ou qualquer espaço, é a fagulha, o estopim que pode desencadear um
incêndio de grandes proporções. Poderá ser chamada de inspiração e nos fará refletir
sobre o meio em que vivemos. Inicia-se, pois, o processo de criação. Algumas imagens
geram outras imagens, direta ou indiretamente relacionadas às primeiras. São Imagens
Agentes.
Para Almeida, imagens agentes são:
Imagens de catástrofes, imagens fantásticas, imagens violentas e ensanguentadas, imagens de ambientes aristocráticos, nobres, burgueses, plenos de decoração maravilhosa, imagens de extraterrestres, afrescos em movimento do cinema. Não somente essas, mas todas as imagens que vemos no cinema, devido ao tamanho enormecido e os planos de aproximação, o close, por exemplo, em que aparecem na tela são também formas fantásticas. [...] Ritualizam, em imagens agentes, visuais e sonoras, as imagens e locais que o espectador-fiel deve recordar ao cogitar o passado, o presente e o futuro da sua vida (ALMEIDA, 1999, p.56).
Em lembranças de infância, recordo que o meu amor pelo cinema
começou muito cedo, quando meus pais me apresentaram uma câmera e um projetor.
Meu pai era o “cineasta” do cotidiano. Filmava as festas da família como os
aniversários, as festas de fim de ano, os banhos de mangueira no quintal e as viagens.
Filmava tudo de forma experimental, brincando e improvisando com a câmera, criando
2
livremente as imagens. Aquelas imagens em movimento, com pessoas e lugares do
meu pequeno mundo, eram momentos de muito riso e magia. Lembro-me também de
estar no papel de uma cineasta, registrando cenas dos aniversários e datas festivas
com aquele olhar de fascínio e amor pelas imagens, fixadas em um filme como se a
câmera fosse uma parte de meu corpo ligada aos olhos. Por essa lente, eu via o
mundo.
Desde muito cedo, as imagens em movimento me encantavam. Gostava
de assistir à Sessão da Tarde e a filmes junto com os meus pais. A cada dia, ficava
mais encantada pela fábrica de sonhos, de aventuras, de conhecimentos e de
emoções que descobria com as imagens em movimento. Elas davam asas à minha
imaginação.
Lembro-me de quando vi pela primeira vez o filme "Alice no País das
Maravilhas", em que a personagem vive em um mundo emocionante onde todos os
seus sonhos são possíveis. Não mais como espectadora, mas, na perspectiva de uma
possível cineasta, ficava intrigada: quais e como foram os processos de criação
capazes de construir aquele mundo mágico, para o qual nos transportava? É essa
máquina de sonhos que carregamos dentro de nós e que é a forma mais pura e
deslumbrante de energia em forma de lembranças, em que se conecta essa pesquisa.
Meu interesse pelas imagens sempre foi grande e aumentou ainda mais a
partir das experiências vivenciadas no período de agosto de 2006 a julho de 2009 no
Projeto de Pesquisa “Trabalho integrado na escola pública: participação política-
pedagógica”, financiado pela FAPESP, desenvolvido pela UNICAMP na Escola
Municipal de Ensino Fundamental “Prof. Vicente Ráo”. Este projeto teve como objetivo
geral construir novas formas de conceber a prática política-pedagógica da organização
escolar, transformando as relações de trabalho no âmbito interno da escola pública,
bem como entre a unidade escolar e os órgãos centrais da educação. Na
concretização dessa pesquisa, foram organizados sete subprojetos: "Subprojeto
Planejamento Participativo: caminho da gestão democrática”; “Subprojeto Ação
Integrada da Supervisão Educacional e da Coordenação Pedagógica com a Equipe de
Gestão da Unidade Educacional”; “Subprojeto Jogos da Amizade”; “Subprojeto
3
Laboratório Interativo de Ciências”; “Subprojeto A Inclusão e o Trabalho Integrado na
Escola Pública”; “Subprojeto A Construção de Ciclos de Desenvolvimento Humano: um
novo olhar, novos desafios” e o “Subprojeto Registros em Vídeo no Cotidiano Escolar",
do qual participei desde o início dos trabalhos, pois acreditava que isso poderia suprir
minha insatisfação com a rotina das tarefas regradas a serem cumpridas no magistério,
que limitavam a criação e a invenção, assim como o trabalho do professor.
Durante a pesquisa, observamos que as experiências vivenciadas no
cotidiano escolar por alguns não eram socializadas pelo conjunto dos professores.
Ensinamentos significativos, tanto pelos acertos como pelos erros, acabavam sendo
apreendidos apenas por aqueles que vivenciavam as experiências, quando acontecia.
Pois, na escola (atual), há poucos espaços que abrem possibilidades para pensar
composições outras. Assim como não há muitas oportunidades para trocas de
experiências didático-pedagógicas positivas, intrigantes e que coloquem em movimento
o pensar as relações de construção de saberes, nos vários espaços e tempos em que
estas relações ocorrem. O cotidiano grila dos educadores territórios de criação e
debates sobre a sua prática e, em especial, sobre o significado desta no percurso da
escola.
Ao percebermos que o educador é privado de criar sua ação pedagógica,
propomos que o "Subprojeto Registros em Vídeos no Cotidiano Escolar" realizasse
registros das experiências no âmbito da unidade escolar para estimular o debate entre
os educadores sobre suas experiências intra e extra sala de aula. Ao término do
projeto, percebemos que o vídeo tornou-se, na dinâmica da escola e principalmente
das pessoas que estavam envolvidas, um instrumento importante para o debate sobre
as práticas e sobre o fazer pedagógico.
No início do projeto, a equipe do "Subprojeto Registros em Vídeo" foi
responsável pelas filmagens das ações dos educadores na escola a partir da
solicitação destes. Mas, para que o registro em vídeo pudesse ser melhor integrado à
vida escolar, incentivamos os próprios educadores da unidade a se tornarem
responsáveis pelas gravações e edições de suas ações para que pudessem
4
compreender sua prática1. Ao término desse projeto de pesquisa, percebi os limites da
função do registro em vídeo na escola e fiquei cada vez mais convencida da potência
de se criar e inventar com as imagens. Assim, ao término deste projeto, comecei à
busca, pela compreensão de como o trabalho com a imagem poderia ser desenvolvido
de modo a atender as minhas expectativas de criar e inventar na escola.
Por conseguinte, iniciei meus estudos sobre a imagem no Laboratório de
Estudos Audiovisuais do Grupo OLHO da Faculdade de Educação da UNICAMP,
ingressando no GEIE – Grupo de Estudos Imagem e Educação2. Os estudos
desenvolvidos levaram-me a pensar sobre as possibilidades de fazer cinema na
escola. Por meio desse grupo, conheci a Rede Kino3 no início de sua formação em
2009. A Rede Kino congrega pessoas e instituições visando compartilhar experiências
de cinema e educação escolar. Com o intuito de pesquisar novos pensamentos
espaciais a partir das e com as imagens, desde agosto de 2011, ingressei no Projeto
de Pesquisa Imagens, Geografias e Educação, coordenado pelo Professor Doutor
Wencesláo Machado de Oliveira Júnior4, da faculdade de Educação da Unicamp e
também integrante do Grupo OLHO.
Outro incentivo para estudar o cinema foram as discussões sobre o
Projeto de Lei nº 185/08, de autoria do Senador Cristóvão Buarque, sobre a exibição
1 A sistematização do trabalho do ‘Subprojeto’ e do projeto como um todo foi publicada em forma de livro
(GANZELI, 2011). O subprojeto Registro em Vídeo no Cotidiano Escolar figura no capítulo 6 do livro. 2 O Grupo de Estudos de Imagem e Educação (GEIE), coordenado pelo Professor Doutor Carlos
Miranda, nasceu em 2008 com alunos e ex-alunos de graduação e pós-graduação da Unicamp. Junto com esses alunos e ex-alunos, o grupo agrega professores de escolas de Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio da região metropolitana de Campinas. Esse grupo agrega também realizadores do mundo do cinema e produtores de vídeo. 3 A ideia da Rede Kino nasceu com o objetivo de congregar pessoas e instituições para compartilhar
experiências e somar esforços no intuito de viabilizar ações conjuntas de projetos que aproximem o cinema e educação. A Rede Kino, Rede Latino-Americana de Educação, Cinema e Audiovisual, materializou-se em 8 de agosto de 2009, quando um grupo de professores, pesquisadores, produtores, estudantes e representantes de organizações do âmbito do cinema e do audiovisual se reuniram na Faculdade de Educação da UFMG, em Belo Horizonte. 4 Integrante do projeto “Imagens, Geografias e Educação” (CNPq 477376/2011-8), que envolve
pesquisadores de dez universidades brasileiras. Em resumo, esse projeto propõe o estudo e a criação visual e audiovisual de obras que venham a potencializar novas maneiras de imaginar o espaço (MASSEY, 2008), bem como novos percursos educativos onde as imagens ganhem outros sentidos e forças.
5
do cinema nacional nas escolas, protocolado em 12 de maio de 2008, aprovado no
Congresso Nacional, sancionado pela Presidenta da República Dilma Rousseff em 26
de junho de 2014 como Lei n° 13.006 e publicada no Diário da união em 27 de junho
de 2014, inserindo o parágrafo 8º ao artigo 26 da Lei 9.394 de Diretrizes e Bases da
Educação que determinando a obrigatoriedade da exibição de filmes de produção
nacional na escola.
O longo tempo de tramitação da lei abriu espaços para discussões acerca
da inserção do cinema nacional nas escolas. Essas discussões giravam em torno da
produção nacional de filmes e da possibilidade de formar plateia, embora houvesse
desafios como a falta de tempo curricular, de preparação dos professores e de
infraestrutura. Essas discussões possibilitaram-me pensar não somente a abordagem
do cinema na escola para o cumprimento de uma lei, mas com a perspectiva de propor
uma experiência estética e política abordada no capítulo das práticas exploratórias e
suas transversalidades.
A vivência e os estudos sobre o cinema na educação possibilitaram
pensar e sonhar em como fazer cinema na escola pública. Minha utopia era dar
oportunidade aos alunos, à escola e a mim mesma, experiências que estimulassem a
diversidade das singularidades por meio da criação com as imagens em movimento e
possibilitassem traçar uma outra aprendizagem possível.
Tal perspectiva levou-me ao estudo de autores e de referenciais teóricos
que propiciaram pensar sobre diversas dimensões do campo da educação: a
necessidade de uma educação dos olhos, do olhar, dos ouvidos, da escuta de nossas
paixões e sensibilidades perceptivas, dimensões essas que possibilitassem ao ser um
mergulho na capacidade de admiração, de espanto e de alumbramento, assim como
na capacidade imaginativa, que gesta e descobre muitos mundos dentro do mundo.
Imagens nos fazem pensar e sentir, possibilitando-nos sensações que permitem novas
interfaces na movimentação dos pensamentos e dos sentidos.
Com a evolução da tecnologia, a cada ano, as imagens estão mais
presentes em inúmeros espaços, inclusive na escola como recursos didáticos. Todavia,
a escola, cujo objetivo principal é transmitir o conhecimento acumulado pela
6
humanidade, o faz ainda por meio de informações e de ilustrações, de conteúdos
prontos e acabados, despotencializando assim o uso da imagem para o processo de
criação e invenção.
Em meus sonhos, imaginei práticas pedagógicas com imagens e sons em
movimento que estimulassem sensações, sentimentos, emoções e paixões; e que
estas pudessem fazer parte do processo de aprendizagem para alargar os limites da
imaginação e do pensamento dos nossos alunos. Não defendo, porém, uma prática
que vise à ruptura entre o pensamento e a sensibilidade. Pelo contrário, defendo a
conexão, a união entre um sentimento que pensa e, por sua vez, um pensamento que
sente para criar e inventar.
Para que a criação e a invenção de imagens acontecessem na escola,
seria necessário promover encontros entre educação e cinema. Encontros que
provocassem possíveis conexões de aprendizagem. Este foi um dos principais desafios
do trabalho em questão, desafio para contaminar a escola em que atuava. Minha
proposta inicial baseava-se na conjunção entre educação e cinema, com as possíveis
conexões de sentimentos que permitissem a “educação das paixões”, que dessem
oportunidade a uma aprendizagem que não terminasse na aquisição de um saber, mas
que se constituísse em um processo de aprendizagem que fosse continuamente
construído e reconstruído, colocando para todos a necessidade de pensar práticas
educativas que não fazem parte das práticas habituais da escola. Dessa forma, pensei
em uma intervenção pedagógica que propiciasse novos percursos, mais potentes,
através do processo de criação com imagens na escola.
Sendo assim, esta pesquisa visa abordar as possibilidades de uma
intervenção pedagógica a partir da criação da arte cinematográfica em Escolas da
Rede Municipal de Ensino Fundamental da cidade de Campinas, com o objetivo de
explorar potencialidades da arte cinematográfica para que ocorram aprendizagens. A
preocupação maior foi articular uma prática de criação, recriação e invenção do ato de
ver e fazer cinema no ambiente escolar. Idealizou-se realizar as ações dessa
intervenção em um ateliê, que daria mais liberdade para se expressar. O objetivo, por
meio desta intervenção, foi defender a potência do gesto de criação, centrada na
7
hipótese da alteridade, incentivando os alunos a olharem o mundo através da câmera
para que os olhares se multipliquem e se realizem. A hipótese de alteridade constitui-
se em compreender a experiência de ser o outro. Nessa perspectiva, pode-se pensar
na escola como o lugar de encontro de diferentes experiências estéticas com a
potência criadora, que abarca as dúvidas e questões a respeito do mundo.
Para desenvolver esta pesquisa, estruturei o texto da seguinte forma. Na
Introdução, me posicionei na primeira pessoa do singular, por se tratar de um trajeto
pessoal em relação às lembranças das imagens que fazem parte de minha vida. O
primeiro capítulo compreende o pensamento sobre cinema e educação, abordando
aspectos relativos ao estudo sobre este tema. O segundo capítulo aborda o encontro
entre a escola e o cinema, a hipótese da alteridade centrada na criação e o cinema
como arte. O terceiro capítulo trata da pesquisa intervenção, apresenta o cenário e a
caracterização dos participantes da pesquisa. O quarto capítulo aborda a educação
visual e os filmes-ensaio. O quinto capítulo apresenta as ações da intervenção. O
capítulo sexto aborda a potência do gesto de criação. No sétimo capítulo são
apresentadas as práticas exploratórias e suas transversalidades. No oitavo capítulo
compartilho reflexões e expectativas por um saber-fazer na escola com o cinema. E,
nos anexos apresento a autorização de uso de imagem e som de voz, lista de filmes
vistos, cronograma das ações, decoupage dos filmes-ensaios, desenhos, roteiros e
caderno de campo.
9
1- Pensamento sobre cinema e educação
É simples, o ser humano produz obras; pois bem, a gente faz com elas o que tem que ser feito: a gente se serve delas.
Serge Daney
A produção de imagens em práticas educativas em geral e para as
práticas escolares é documentada pela disciplina Iconologia Didática (FERNÈ, 2004).
Pode-se dizer, a partir dessa perspectiva, que educação e produção de imagens são
práticas sociais em intersecção. Fernè enumera alguns pontos de referência histórica
dessa intersecção: a progressiva legitimação e afirmação do uso da imagem por parte
da Igreja, desde o final da Idade Média, como instrumento de catequese voltada,
sobretudo, para a população iletrada; o desenvolvimento das técnicas de impressão,
em madeira e depois em metal, que coloca em circulação, a partir do início do século
XVI, diversas formas de ilustração científica e didática para divulgação do
conhecimento; o surgimento no Século XVII do primeiro livro ilustrado para infância, o
livro de Orbis Sensualium Pictus de Jean Amós Comenius.
Para Miranda (2011), “Orbis Pictus”, concebido em Sárospatak, na
Hungria, em 1657 e publicado em 1658, em Nuremberg, é o primeiro livro didático
ilustrado e a primeira cartilha do mundo cristão ocidental. Foi utilizado na Europa
reformista durante mais de dois séculos após sua publicação. Esta obra e sua história
desmistificam a ideia de que o uso da imagem na educação escolar e na produção de
conteúdos (seja algo pensado - tenha sido algo pensado) apenas na moderna
sociedade industrial e aponta para a necessidade de pensar a imagem, a
aprendizagem e o conhecimento como uma articulação histórica, que tem uma
dimensão histórica material.
10
Ainda, segundo Miranda (2011), a necessidade do uso de imagens nas
práticas educativas foi apontada por Comenius em Didática Magna, obra pela qual este
autor tornou-se e permaneceu conhecido. Afirma o teólogo-pedagogo morávio:
Para aprender tudo com mais facilidade deve-se utilizar o maior número de sentidos. [...] Devem estar juntos sempre o ouvido com a vista e a língua com a mão. Não somente se deve recitar aquilo que se deve saber para que os ouvidos o recolham, mas desenhando-o também para que se imprima na imaginação pelos olhos. Tudo que aprendam, saibam expressá-lo com a língua e representá-lo com a mão, de modo que não deixe nada sem que tenha impressionado suficientemente os ouvidos, olhos, entendimento e memória. Para este fim, será bom que tudo o que se costuma tratar na sala esteja nas paredes, quer sejam teoremas e regras, quer imagens ou emblemas das disciplinas que se estuda (COMENIUS, 2002, p.46 apud Miranda, 2011; grifo meu).
A história de Orbis Pictus revela que:
Comenius é uma grande inspiração para a escola e para a didática da sociedade burguesa em seus valores de universalização da educação, de utilitarismo do conhecimento e de disciplinadora das diversas classes e grupos sociais. Sem dúvida, as grandes metáforas que inspiraram Comenius são a concepção mecânica de natureza e a organização da oficina dos artesãos. Porém, mais que isso, Comenius talvez tenha sido o primeiro educador a colocar em livro uma iconologia didática em prol da educação escolar. Procedimento que até então fora apenas utilizado para a educação dos fiéis católicos em afrescos pintados em igrejas e em livros de intelectuais que tinham como mecenas nobres e reis. A idealização de uma educação pela imagem para diversos grupos e classes sociais é, de fato, um empreendimento da sociedade burguesa. Em sua origem encontramos Comenius e "Orbis Pictus" (MIRANDA, 2011, p.2 ).
Embora o vetor da prática social de criar imagens na educação seja “criar
para a educação” e não criar “na educação”, Comenius ainda dimensiona a criação por
parte do professor. Ele próprio foi o autor de seus livros de ensino e participou da
criação das imagens de Orbis Pictus. Feitas em xilogravuras, por diversos artesões em
países diferentes, as imagens de Orbis Pictus foram encomendadas pelo próprio autor.
Fernè (2004), a partir desta iconologia científica e didática de Comenius,
traça um longo percurso da imagem na educação e da educação pelas imagens.
Aborda o surgimento da educação, da leitura e da escrita a partir de imagens na Itália,
o aparecimento do livro didático padronizado na sociedade industrial; o uso de
quadrinhos na educação em livros paradidáticos e encerra a sua obra abordando o
documentário, a animação e a televisão educativa. Neste percurso, Fernè consegue
11
comprovar a presença da imagem na educação desde o século XVII. No entanto,
escapa ao autor que a produção de imagens deixou de ser uma tarefa do
educador/professor e que a produção de imagens para a educação se transforma em
um nicho de mercado afastando a escola da dinâmica cultural da produção de
imagens. O cinema entra nessa história quando o mercado de imagens para a
educação já está consolidado. Em grande parte, o cinema acompanha e recria a
separação entre imagem educativa e imagem não educativa.
Franco (2011) afirma que também no Brasil a proposta de desenvolver
uma cultura cinematográfica no ambiente escolar não é recente. Desde os anos 1920,
há o reconhecimento de que a influência do cinema é forte e decisiva. Segundo a
autora, foi nesta década que educadores, pais e instituições religiosas começaram a se
preocupar com a moral e os costumes que difundiam-se através dos filmes e do
cinema. Para ela, duas publicações do início da década de 1930 serviram de base para
os projetos de integração do cinema à educação brasileira. Foram elas: “Cinema e
Educação” e “Cinema contra cinema”. Os dois livros comentam a necessidade de se
integrar o cinema a qualquer projeto de educação para o desenvolvimento e o
progresso do país e oferecem detalhados passos para a construção de serviços de
cinematografia educativa.
Em 1937, foi criado o Instituto Nacional de Cinema Educativo (INCE)
dentro do Ministério de Educação e Saúde. Edgard Roquette Pinto foi nomeado como
diretor e Humberto Mauro como diretor técnico. Em cerca de trinta anos de efetiva
atividade (de 1937 a 1966), o INCE deixou uma produção de mais 500 filmes sobre as
mais variadas temáticas e nos mais variados formatos.
A produção de cinema para educação acompanha a própria história do
cinema. No Brasil não foi diferente, embora as fragilidades das propostas de cinema na
educação acompanhem as próprias fragilidades do sistema educacional brasileiro,
tanto em relação ao acesso, quanto em relação à permanência das crianças e dos
jovens na escola. Pode-se acrescentar a estas fragilidades a desigualdade nas
condições de trabalho, na oferta e acesso a todos os tipos de recursos educativos e na
formação de professores.
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Apesar do manifesto interesse do cinema na educação e da educação
pelo cinema, até bem pouco tempo o cinema estava restrito a um pequeno círculo
intelectual que pensava sobre educação e a programas governamentais de forma
pontual e transitória.
A partir da década de 1980, segundo Almeida (1999), surgiram várias
propostas sistematizadas para orientar o professor a trabalhar com o cinema na escola.
Tais propostas procuraram trabalhar o cinema não apenas em relação ao ‘conteúdo’ da
história, mas também em relação aos elementos de performance (a construção do
personagem e diálogos), linguagem (a montagem e os planos) e composição cênica
(figurino, cenário, trilha sonora e fotografia).
Bruzzo (1995), em sua pesquisa de doutorado sobre Série
Apontamentos5, apresenta três dados importantes sobre a relação entre cinema e
educação. Primeiro, há um grande investimento em subsidiar os professores no uso do
cinema em sala de aula, pois foram publicados mais de 350 cadernos da Série
Apontamentos, cada um dedicado a um filme. Segundo, o reconhecimento de que a
presença do filme na escola aponta para a necessidade de introduzir as linguagens
audiovisuais na reflexão e na prática pedagógica. E, terceiro, a percepção de que os
filmes agenciam uma forma de aprendizagem própria, ou seja, de que o próprio cinema
educa seu espectador. Este último aspecto, que é amplamente reconhecido pela
historiografia do cinema, era, até então, e em grande parte ainda é, desconsiderado na
educação.
Recentemente, trabalhos importantes sobre cinema e educação foram
publicados no Brasil: na Revista Educação & Realidade, o Dossiê Cinema e Educação,
publicado em 2008; a Série Salto para o Futuro: Cinema e Educação, um espaço em
aberto, publicada em 2009; a publicação em dois volumes do livro Dossiê Cinema e
Educação - uma relação sob a hipótese de alteridade, de Alain Bergala, em 2008;
5 Publicação da FDE - Fundação para o Desenvolvimento da Educação - órgão da Secretaria de
Educação do Estado de Estado Paulo - SEE-SP, cujo objetivo era subsidiar o trabalho dos professores com o cinema em sala de aula.
13
Cinema e Educação: reflexões e experiências com professores e estudantes de
educação básica, dentro e "fora" da escola, em 2013.
O que se pode observar nestas recentes publicações é, por um lado, a
ênfase na formação e proposição de produção de audiovisuais, de imagens, de vídeo e
de cinema na educação escolar e, por outro, uma diversidade de abordagens teórico-
metodológicas e de desdobramentos temáticos em torno dos trabalhos sobre cinema e
educação.
No “Dossiê Cinema e Educação” da Revista Realidade & Educação,
Fabiana Marcello (2008), organizadora do Dossiê, enaltece a sutileza e o alcance dos
trabalhos publicados que, segundo ela, reúnem "contribuições das mais diversas,
elementos de estética, aportes metodológicos, análises de filmes, experiências
pedagógicas em cinema e educação, retomada de conceitos e aspectos históricos,
discussões sobre o ato de ver, sobre o ‘real’, sobre a infância, a juventude, sobre anjos
e demônios” (p.10). Sobre os efeitos do Dossiê, a partir da diversidade de olhares,
Fabiana Marcelo (2008) enfaticamente afirma: "Quando se fala em ‘entender’, em
conexão com o cinema, não se pode esquecer que estamos lidando com imagens na
qualidade de fruto e de gesto criacional. De fato, isso implica em conceber ‘entender’
não mais como busca de respostas, mas como movimento contínuo de formulações de
perguntas - sempre contingentes e conjunturais. Tal como no cinema. A cada olhar,
uma imagem diferente” (p.10).
“Salto para o Futuro: Cinema e Educação, um espaço em aberto”
apresenta procedimentos da linguagem audiovisual, discute a ideologia na própria
construção da linguagem audiovisual e finaliza com a proposição de que a apropriação
da linguagem audiovisual pode ser feita por meio da realização de oficinas. Na
apresentação da Série, Laura Coutinho (2009) afirma: "o cinema propõe outras formas
de percepção e, portanto, de construção de subjetividades. Cada um constrói a sua
própria percepção e pode expressá-la em ambientes que favoreçam a troca de pontos
de vista. Ao conhecer o ponto de vista do outro, o meu será, com certeza, enriquecido”.
Os livros “Dossiê Cinema e Educação - uma relação sob a hipótese de
alteridade de Alain Bergala”, organizados por Adriana Fresquet, têm como eixo central
14
o livro L' hipothèse cinema - Petit traité de transmission du cinema à l’ecole at ailleurs
(BERGALA, Alain, 2008). A hipótese-cinema, apresentada por Bergala, possui
resumidamente dois aspectos: o cinema como arte, como alteridade e em constante
tensão com a instituição escolar, e a passagem ao ato, à realização em cinema, à
criação (em contraposição à crítica cinematográfica na escola). Para Bergala, a escola
tem o papel de possibilitar o momento de encontro da criança e dos adolescentes com
o cinema (e não obrigá-la a aprender fazer cinema). Este papel envolve quatro
resoluções: 1. Organizar a possibilidade do encontro da criança e do adolescente com
filmes que eles terão cada vez menos chances de encontrar em espaços fora da
escola; 2. Tornar-se o professor “passador”6, aquele que promove, pela convicção e
paixão que tem pela arte, a iniciação do aluno à arte cinematográfica; 3. Aprender a
frequentar filmes, ver e rever, ver em fragmentos, perceber os procedimentos fílmicos
como gestos poéticos; e 4. Tecer laços entre os filmes e abordá-los como pertencendo
a uma corrente de obras, como uma obra em um fluxo cultural de uma cinematografia e
do próprio cinema. Bergala ainda aborda a dimensão do prazer em assistir filmes,
afirmando a existência de diferentes prazeres, posicionando-se, porém, em relação ao
prazer da arte.
O livro Cinema e Educação: reflexões e experiências com professores e
estudantes de educação básica, dentro e "fora" da escola (2013), apresenta reflexões
sobre experiências de cinema e educação, pontes e caminhos "entre" a realidade e a
imaginação, o porquê de se criar cinema na escola pública, a potência pedagógica do
cinema como gesto de criação e de alteridade, bem como iniciativas de introdução à
experiência do cinema com professores e estudantes de educação básica dentro e fora
da escola. Enfim, experiências para “aprender e desaprender”, construir e desconstruir
as certezas do mundo reinventando a si e ao outro.
Estas obras, em primeiro lugar, apresentam uma trajetória apontada por
Almeida que o trabalho com o cinema no campo da educação não precisa mais ser
6 BERGALA 2008, cita uma expressao de Serge Daney que o professor deve virar um "passador" (passeur).
.
15
abordado como filme educativo e / ou como ilustração didática de conteúdos escolares.
O cinema vem ganhando estatuto próprio dentro da educação na medida em que
possibilita uma forma de aprendizagem própria, ou seja, o cinema educa seu
espectador.
Em segundo lugar, chama a atenção a singularidade que o objeto de
estudo cinema e educação proporciona, sob a perspectiva da especificidade do
cinema. Laura Coutinho, na apresentação de “Salto para o Futuro Cinema e
Educação”, remete-nos à construção de subjetividades, proporcionadas pelo cinema, a
partir da percepção que cada espectador tem de um filme e frente à possibilidade de
troca destes pontos de vista. O “Dossiê Cinema e Educação” e o "Cinema e
Educação: reflexões e experiências com professores e estudantes de educação básica,
dentro e 'fora' da escola", organizados por Adriana Fresquet, permitem ver a escola
como possibilidade de ser um lugar de troca em que cada olhar pode se manifestar e
se enriquecer. Em síntese, entender o trabalho com cinema na educação é, também,
fazer parte de um movimento de deslocamentos e desvios, movimento este que se faz
em direção à formulação de novas perguntas, em novas contingências e conjunturas.
Porém, trabalhar com a imagem na educação escolar tem um desafio
maior, pois, segundo Almeida (1994):
Parece que a escola está em constante desatualização, que é sublinhada pela separação entre a cultura e a educação. A cultura localizada em um saber-fazer e a escola num saber-usar, e neste saber usar restrito desqualifica-se o educador, que vai ser sempre um instrumentista desatualizado (ALMEIDA, 1994, p.8; grifo meu).
E, mais adiante:
Os filmes (como também outras obras artísticas) são produções da cultura: obedecem a condições de produção, contingências de mercado, mas não a objetivos pedagógicos, didáticos ou a seriações artificiais. Sua utilização na educação é importante porque trazem para a escola aquilo que ela se nega a ser e que poderia transformá-la em algo vívido e fundamental: Participante ativa e criativa dos movimentos da cultura, e não repetidora e divulgadora de conhecimentos massificados, muitas vezes já deteriorados, defasados e inadequados para educação de uma pessoa que já está imersa e vive na cultura aparentemente caótica da sociedade moderna. A escola e não menos a de primeiro e segundo graus é parte da cultura, porém, a parte mais conservadora e desatualizada dessa cultura, o que lhe confere baixo poder político e alta exposição manipulatória. O estudo das imagens e sons da sociedade moderna pode ser um momento para a educação fazer-se cultura e, talvez, poder (ALMEIDA, 1999, p.49-50).
16
Os trabalhos recentes anteriormente citados sinalizam para diversas
possibilidades de, na educação, se fazer cultura, de participar da cultura em seu saber-
fazer. A opção da pesquisa presente foi arriscar produzir e criar imagens e sons em
movimento na escola; olhar para o cinema como arte, entendendo a arte como
exceção à cultura como regra, mesmo esta do saber-fazer.
Ao perceber que a produção de imagens para a educação é uma parte de
um programa de educação visual do qual o cinema hoje também faz parte, considerou-
se, a partir da experiência, que a imagem provoca estranhamentos. Não era a imagem
didática ou a imagem pedagógica. Não era o estudo da imagem para crianças e
adolescentes ensinando-os a olharem o que os encantava. Era a possibilidade de criar
junto com eles, apesar da necessidade de se fazer algumas negociações com a
escola.
Neste sentido, percebe-se que outros trabalhos, no momento de escrita
do roteiro da pesquisa, tornaram-se parceiros de percurso. Realizou-se então um
levantamento das dissertações e teses publicadas no banco de teses da Capes desde
2010 até dezembro de 2014. Neste levantamento foram utilizados descritores "cinema
e educação" e encontrados 43 registros na área da Educação.
Identificou-se duas perspectivas distintas para que fossem realizadas
essas pesquisas: uma, do fazer cinema para a educação e, outra, do fazer cinema na
educação. Na primeira perspectiva, enfoca-se o cinema como um agente de
comunicação ou de transmissão de conteúdos; e, na segunda, enfatiza-se o cinema
como forma de expressão e criação cinematográfica. Das 43 pesquisas, 28 de
mestrado acadêmico, duas de mestrado profissional e nove de doutorado abordam "o
fazer cinema para a Educação". Apenas quatro de mestrado acadêmico abordam "o
fazer cinema na educação", conforme a tabela:
Pesquisa de mestrado sobre o Cinema para a Educação
Autor e título da pesquisa Universidade
ALBUQUERQUE, Ana Paula Trindade de. Gravando! Universidade Federal da Bahia
17
O cinema documentário no cenário educativo: perspectivas para uma educação audiovisual.
ALMEIDA, Marcelo Ribeiro de. Educação, escola e modernidade avançada através das lentes do cinema.
Universidade Estadual de Campinas
ALMEIDA, Ricardo Normanha Ribeiro de. Modo de produzir - modo de trabalhar: relações de produção e trabalho no cinema da boca do lixo.
Universidade Estadual de Campinas
AZEVEDO, Evelyn Fernandes. O cinema na escolarização de jovens e adultos: um estudo sobre os modos de apropriação do cinema pelas educadoras da EJA.
Universidade Federal da Paraíba e João Pessoa
BIEGING, Patrícia. Da busca de popularidade às práticas de bullying: crianças e produção de sentidos a partir de artefatos midiáticos.
Universidade Federal de Santa Catarina
BITTENCOURT, Rosania Maria Silvano. Meninos e meninas: uma análise do menino maluquinho, o filme, sob o olhar do gênero.
Universidade do Extremo Sul Catarinense
BONNEAU, Ana Paula Buzetto. Em cena: professores diante da violência na escola pelas lentes do cinema.
Universidade Federal da Paraíba e João Pessoa
CARRERA, Vanessa Mendes. Contribuições do uso do cinema para o ensino de ciências: tendências entre 1997 e 2009.
Universidade de São Paulo
CHRISTOFOLETTI, Rafael. Dissertação fílmica: cinema, loucura e resistência.
Universidade Est. Paulista Júlio de Mesquita Filho de Rio Claro
CONDORELLI, Antonino. Dersu Uzala: hibridação homem-natureza.
Universidade Federal do Rio Grande do Norte
DORNELLES, Luciano do Amaral. Pedagogia da dor: sobre o esporte, a vitória e a derrota na arena.
Universidade Luterana do Brasil
FARINA, Barbara Cristina. Processos de estigmatização e contornos da deficiência: olhar para o cinema, olhar para as (im)possibilidades de ser.
Universidade Federal do Rio Grande do Sul
FRANCO, Renata Rosa. O cinema como (im)possibilidade formativa: uma discussão a partir da perspectiva de Adorno.
Universidade Federal de Goiás
GARCIA, Rafael Wionoscky. Tempos modernos: relações entre as narrativas de alunos de EJA e a cultura do tempo escolar.
Universidade Federal de Santa Catarina
GOMES, Iara de Oliveira. Narrativas fílmicas na educação para a velhice.
Universidade Estadual de Maringá
IRES, Isabelle de Araujo. Poesia visual e ensino: Vivência em suportes distintos.
Universidade Federal de Campina Grande
LENK, Erika. Carlitos: história de vida e obra de Charles Chaplin.
Universidade Estadual de Campinas
PILGER, Jeanete Maria. Condições contemporâneas de trabalho: representações de empregabilidade no cinema.
Universidade Luterana do Brasil
PINTO, Beatriz Sampaio. O quarto de Petra - estabilidade instável do/no cenário fílmico.
Universidade Estadual de Campinas
PORTO, Rodrigo Robert. Sobre formas de se aprender com o cinema: um estudo a partir da agenda - diário de Leandro Konder.
Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro
REBECA, Elaine Simões Romual. Cinema na sala de aula: proposições para uma exploração estética de filmes por professores.
Universidade do Vale do Itajaí
RIGHI, Daniel. O cine educativo de João Penteado: Universidade de São Paulo
18
iniciativa pedagógica de um anarquista durante a era Vargas.
SEIBERT, Lisli. Juventude e cinema: travessias, viagens e transformação na construção do sujeito ético.
Universidade Luterana do Brasil
SILVA, Fernanda Lira da. Experiência audiovisual e infância: em busca do que escapa ao primeiro olhar.
Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho de Rio Claro
SILVA, Josineide Alves da. O uso escolar do filme no currículo do estado de São Paulo.
Universidade do Oeste Paulista
SILVA, Michele Juliana de Carli Anselmo da. A revista brasileira de educação: apropriações do discurso acerca dos temas da infância e da história da infância (1995 a 2010).
Universidade Estadual de Maringá
SOUZA, Sávio José di Giorgi Ferreira de. O educere ad educare da educação integral em cena, contracena e crítica.
Universidade Tuiuti do Paraná
VIEGAS, Magda Luciana da Rosa. Mosaicos da infância no cinema.
Universidade Luterana do Brasil
Pesquisa de mestrado profissional de Cinema para a Educação
Autor e título da pesquisa
Universidade
FARIA, Ana Constancia Macedo. O cinema e a concepção de ciências por estudantes do ensino médio.
Universidade de Brasília
SANTOS, Eliane Gonçalves dos. A história da ciência no cinema: contribuições para a problematização da concepção de natureza da ciência.
Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões
Pesquisa de doutorado o Cinema para a Educação
BALESTRIN, Patrícia Abel. O corpo rifado. Universidade Federal do Rio Grande do Sul
COSTA, Alan Victor Pimenta de Almeida Pales. A cor da romã .
Universidade Estadual de Campinas
FIGUEIREDO, Haroldo Moraes de. Vigilanti cura: uma educação cinematográfica nos colégios católicos de Pernambuco na década de 1950.
Universidade Federal de Pernambuco
JESUS, Rosane Meire Vieira de. Comunicação da experiência fílmica e experiência pedagógica da comunicação.
Universidade Federal da Bahia
JUNIOR, Donald Hugh de Barros Kerr. Cartografias da (trans)formação docente: uma experiência estética com o cinema.
Universidade do Vale do Rio dos Sinos
MEDEIROS, Sérgio Augusto Leal de. Imagens educativas do cinema/ possibilidades cinematográficas da educação.
Universidade Federal de Juiz de Fora
SANTOS, Luciane Mulazani dos. A representação na história em modo de endereçamento para a educação matemática.
Universidade Federal do Paraná
SILVA, Josirley Maria Menezes da. Jardim do silêncio Universidade Estadual de
19
- poéticas. Campinas
SILVA, Marcus Flávio Alexandre da. Estética e audiovisual no Ceará: uma aproximação crítica à luz da ontologia marxiana.
Universidade Federal do Ceará
Pesquisa de Mestrado sobre o Cinema na Educação
Autor e título da pesquisa
Universidade
FARIA, Nelson Vieira da Fonseca. A linguagem cinematográfica na escola: o processo de produção de filmes na sala de aula como pratica pedagógica.
Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho. Presidente Prudente
LEITE, Gisela Pascale de Camargo. Linguagem cinematográfica no currículo.
Universidade Federal do Rio de Janeiro
SILVA, Alessandra Collaco da. Arte, mídia e cinema na escola: um ensinar que (me) ensina!
Universidade Federal de Santa Catarina
SILVA, Maira Norton. Relações entre técnica e criatividade no ensino do cinema e do audiovisual.
Universidade Federal Fluminense
Na perspectiva do Cinema para a Educação, observa-se que o cinema é
usado na sala de aula como ilustração de conteúdos das disciplinas e também com o
objetivo de provocar uma reflexão, uma análise a partir do filme. Assim, ora o cinema é
utilizado para se fazer uma análise sociocultural de algum aspecto focalizado no filme
ou para analisar o comportamento de um personagem, como, por exemplo, promover
uma reflexão sobre a questão de gênero, estimulando o olhar dos alunos sobre as
relações de gênero e sexualidade no intuito de se perceber a visão de mundo e suas
relações socioculturais. Ora, o cinema é utilizado em sua função educativa e formativa;
ou simplesmente como recurso didático, com o intuito de verificar sua eficiência dentro
do processo de ensino-aprendizagem e importância da inserção de tecnologia
audiovisual no âmbito escolar. É utilizado ainda como suporte importante na motivação
da apreensão de um conteúdo de forma lúdica, visando despertar no aluno o interesse
pela busca de novos saberes.
Por sua vez, na perspectiva do fazer cinema na educação, o cinema é
utilizado na escola de maneira a permitir ao aluno experiências relacionadas com a
criação cinematográfica e não apenas na perspectiva do "ver" como explicitado acima.
Assim, neste caso, ele é utilizado para desenvolver a criatividade, a sensibilidade do
20
aluno, destacando a importância da técnica e da imaginação para o caráter
transformador da arte tendo como objetivo possibilitar relacionar-se com o mundo de
outra forma. Ora, oficinas de cinema são realizadas na escola como possibilidades de
inserção curricular para trabalhar o cinema e sua articulação com a arte e a mídia na
sala de aula; ora o cinema é utilizado, por exemplo, para viabilizar uma aprendizagem
em arte a partir do emprego da linguagem cinematográfica nas várias fases da
produção de filmes, desde a sua concepção até a exibição do produto final; ora propõe-
se utilizar o cinema como forma de criação sob a hipótese de alteridade artística, como
é a pesquisa de mestrado "Linguagem cinematográfica no currículo da educação
básica: uma experiência de introdução ao cinema na escola", de autoria de Gisela
Pascale de Camargo Leite, 2012, na UFRJ.
No estudo de Leite (2012), a autora faz um recorte que visa repensar a
antiga relação escolar de cinema em interface com uma visão de currículo como
política cultural em sociedade a partir da experiência de introdução de práticas de
criação cinematográfica na escola. Esse estudo parte do pressuposto de que uma
iniciação à arte cinematográfica na educação básica pode operar a linguagem em
constituição na escola de forma estrangeira às condições hegemônicas de ensino
numa relação de atribuição e produção de sentidos como uma questão de
conhecimento, poder e cultura inerentes à construção de um currículo contemporâneo.
Pode-se dizer então, que as pesquisas na perspectiva do cinema para a
educação são fundamentadas na "pedagogia do ver". De outro modo, esta pesquisa
sobre o cinema na escola está fundamentada na "pedagogia do fazer". Este trabalho
de pesquisa, então, insere-se nesta última perspectiva, na medida em que se concebe
o cinema como arte indagando a potência gesto de criação centrada na hipótese de
alteridade possibilitando pensar questões sobre o mundo e sobre os possíveis elos
entre os sujeitos.
Na análise das pesquisas sobre cinema e educação, embora se possa
perceber que os trabalhos problematizem a importância da dimensão artística do
cinema e o seu potencial para uma prática educativa humanista e dialógica, não se
trabalha o cinema em uma dimensão dos afetos e dos efeitos produzidos nos alunos
21
durante a produção de um filme ou mesmo quando assistem a películas visando uma
prática educativa que atravesse e produza efeitos intensivos capazes de promover
modos de viver em suas singularidades e multiplicidades. Dessa forma, a proposta da
potência do gesto de criação centrada na hipótese de alteridade aponta que a
experiência com o cinema na escola pode construir um outro caminho para a
Educação. Acredita-se ainda que o cinema no território escolar possibilita uma
formação, podendo conversar em diversas frequências de saberes, aproximar a prática
educacional do que está ausente ou mesmo proibido do fazer pedagógico e submeter
às coisas do mundo aos alunos.
A criação do cinema na escola possibilita experimentar um trabalho
escolar diferente daquele da rotina que tomou conta das relações de ensino, uma vez
que, nas escolas, ações próprias e criação de caminhos múltiplos, com objetivos mais
amplos de aprendizagem, que tornem os alunos autores, estão muito distantes das
práticas escolares, que se caracterizam por uma rotina construída pela definição e
cumprimento de metas, mensuradas, pelos sistemas de avaliação de larga escala que,
cerceiam em grande parte a suposta autonomia do aluno e do professor. Mas, é
possível resistir e existir. Criar, inventar e fabular caminhos diferentes daqueles da
rotina escolar, construindo encontros que incutem confiança em cada um dos alunos,
que não se feche entre os muros da escola, mas que se abra para o mundo.
23
2- Encontro escola e cinema
Talvez tenhamos que aprender a nos apresentar na sala de aula com uma cara humana, isto é, palpitante e expressiva, que não se endureça na autoridade. Talvez tenhamos que pronunciar na sala de aula uma palavra humana, isto é, insegura e balbuciante, que não se solidifique na verdade. Talvez tenhamos que redescobrir o segredo de uma relação pedagógica humana, isto é, frágil e atenta, que não passe pela propriedade (LARROSA, 2010. p.165).
Ainda que a cada ano, com o desenvolvimento das tecnologias digitais,
as imagens estejam cada vez mais presentes em inúmeros espaços e nas mais
diferentes situações sociais do nosso cotidiano, isso não ocorre na mesma proporção e
intensidade nas práticas educativas e materiais escolares. Sendo assim, a escola,
historicamente constituída, tem como objetivo principal transmitir o conhecimento
acumulado pela humanidade, ainda por meio de informações, comunicação e
ilustrações de conteúdos, quer seja oralmente ou através da escrita, ou das imagens,
uma vez que trabalha com a representação de conteúdos. Dessa forma, a
representação se contrapõe com o criar e o recriar saberes.
Para que a imagem possa estar na escola como forma de alteridade, esta
precisaria se desapegar da premissa da condição informativa, comunicativa e
ilustrativa centrada em conteúdos e conhecimentos formais, que gera clausuras no que
tange às potencialidades do ato de pensar e de aprender.
Em função de variáveis possíveis das imagens e do cinema na escola,
perguntas e questionamentos povoavam os pensamentos e passaram a nortear o
traçado dessa pesquisa. Seria possível estabelecer encontros entre a Educação e o
Cinema como arte? Seria possível aprender com o cinema e, se sim, como isto se
daria? Quais seriam os dispositivos necessários para desenvolver essa experiência?
Como se processaria a participação do aluno e quais seriam os reflexos desta
intervenção no processo de aprendizagem? A criação cinematográfica no âmbito
escolar teria força suficiente para transformar algumas formas habituais de pensar e de
agir dos alunos? Se sim, como se expressaria? Como se constituiria o gesto criativo
centrado na hipótese de alteridade proporcionada pela experiência cinematográfica?
24
Estas e outras tantas indagações compunham a possibilidade de construção de um
argumento para este trabalho.
Minha hipótese era que o desapego da reprodução do conhecimento
possibilitaria um território aberto para a elaboração sobre questões de estar no mundo.
Propiciar diferentes experimentações que possibilitassem colocar as próprias variáveis
do movimento de intervenção na escola em estado de variação contínua para criar
espaços que se constituiriam em deslocamentos de criação, recriação e invenção que
favoreceriam múltiplas dimensões do aprender. A utopia de fazer cinema como arte na
escola colocava a necessidade de se pensar práticas educativas que formulassem
novas questões em relação ao mundo.
Dessa forma, fez-se necessário então, a construção e desconstrução de
aprendizagens e das formas com as quais a escola se apropria dos conhecimentos e
saberes das ciências e das artes. Para tal, seria preciso uma definição de
conhecimento ocupada com os múltiplos saberes indispensáveis para a participação
social, política e cultural das pessoas envolvidas no processo educativo.
Pode-se pensar que o conhecimento se forma a partir de conjunções.
Aquele que cria começa de um encontro com o outro, ou seja, em parte apropria-se de
outro pensamento, pois ninguém cria a partir do nada. Exatamente no momento em
que se trabalham outras ideias, evidencia-se o ato criador.
Para Bachelard (2001), todo conhecimento é provisório. Pode-se pensar
então que o conhecimento não seria mais fundamentado sobre o absoluto, mas sobre
as mudanças. Pode-se com isso imaginar o conhecimento como um movimento
incessante e constante de aprender, desaprender e reaprender, que possibilite formular
questões, sendo permanentemente construídas, desconstruídas e reconstruídas. A
educação e o conhecimento são processos, visto que o homem é um ser inacabado,
em contínua ação de aprendizagem e de construção do conhecimento. Uma postura de
construção do mundo (ou de mundos) é, fundamentalmente, uma interface aberta à
interação, à revisão de posições e a mudanças na própria visão do que seja realidade.
25
Como uma sociedade em constante mudança mantém ainda uma escola
com práticas educativas baseadas na transmissão das certezas do conhecimento
acumulado? O desafio, portanto, era transformar certezas em hipóteses.
Ressalta-se que a educação escolar não é apenas uma ação individual
ou coletiva. Ela se faz como prática social. Na escola, lugar desta prática, conforme se
pode compreender durante a pesquisa, quase não há oportunidades para questionar
pensamentos universais arraigados e produzir conhecimentos capazes de desfazer as
relações estabelecidas entre os sujeitos; conceber novas ideias, novas possibilidades,
calar as respostas e fazer emergir novos questionamentos. A experiência e a criação
são aplainadas no cotidiano escolar.
Sendo assim, as práticas sociais juntamente com a hipótese de alteridade
e o potencial do gesto de criação emergiriam do encontro entre a Educação e o
Cinema e seriam os principais desafios deste trabalho, desafios que contaminaram a
escola.
2.1 Hipótese da alteridade centrada na criação
O estudo de Alain Bergala sobre alteridade, encontrado no livro, "A
hipótese cinema: pequeno tratado de transmissão do cinema dentro e fora da escola"
(2008) trata de uma prática do cinema centrada na criação, de modo que a arte
cinematográfica adquira um potencial educativo que possibilita gestos de criação e não
somente ver e analisar filmes. Sendo assim, para que esta prática possa se realizar, é
fundamental estabelecer um território propício para pensar, desvendar sensações,
experimentar e criar. Embora o território das unidades escolares seja árido para pensar
e valorizar sensações e experiências, Bergala (2008, p. 29) defende que as
experimentações são possíveis dentro dessa perspectiva da criação quando o cinema
é pensado como obra de arte capaz de provocar o ato criativo:
A arte, para seguir sendo arte, deve continuar sendo uma ferramenta de anarquia, de escândalo, de desordem. A arte, por definição, semeia desconcerto na instituição. [...] A arte não deve ser nem a propriedade nem o limite vedado de um professor especializado. Ela deve ser uma experiência de
26
outra natureza na escola, que daquele do curso institucionalizado, tanto para os alunos quanto para os professores. (BERGALA, 2008, p. 33-34).
O cinema como arte na escola entra como exceção, face à regra da
cultura. Bergala, conhecendo este conflito, propõe que o cinema seja, na instituição
escolar, uma hipótese de alteridade, ou seja, um encontro com elementos de desordem
e desconforto em relação aos hábitos cotidianos. Sendo assim, os filmes-arte na escola
possibilitam ao aluno um confronto com uma forma de pensar o novo. Bergala
sugestiona:
[...] Tinha a convicção de que, nos anos vindouros, seria preciso dar prioridade à abordagem do cinema como arte (criação do novo), e não àquela, canônica, do cinema como vetor de sentido e de ideologia (reiteração do já dito e do já conhecido). [...] (BERGALA, 2008 p. 34).
O objetivo desta pesquisa era tomar o cinema como arte na escola dentro
da proposta de alteridade. A alteridade do cinema está em relação com o uso que se
faz desta prática social nas instituições escolares. Os planos de ensino que incluem
cinema transformam um filme em recurso didático para apresentação e reforço de um
conteúdo. Assim, como abordado anteriormente, filmes são vistos e empregados como
ilustrações e informações de conteúdos e temas escolares e não pela forma como a
obra aborda o tema. Neste sentido, o cinema não possibilitaria aprendizagem ou
experiências pedagógicas como campo de possibilidades. Além disso, filmes que
fogem aos conteúdos programáticos são proibidos ou considerados inadequados.
Sendo assim, uma intervenção do cinema como arte na escola é desviante, posto que,
atravessa de diversas maneiras, a tradição escolar.
Para Bergala (2008), deve-se cuidar do pragmatismo pedagógico:
Na pedagogia das artes existem os grandes princípios gerais e generosos: reduzir as desigualdades, revelar nas crianças outras qualidades de intuição e de sensibilidade, desenvolver o espírito crítico, etc. [...]. Na base, no que diz respeito à experiência pedagógica concreta, há o discurso dos que estão ligados à prática e se chocam cada dia com a realidade, encurralados entre as resistências da hierarquia e as dificuldades encontradas na sala de aula, que cada qual tenta resolver pragmaticamente, com mais ou menos gratificações pessoais e profissionais. O que mais faz falta, na área da pedagogia da arte, é um pensamento entre estas duas posições, um pensamento tático que esteja convencido dos grandes princípios [...] e que esteja atento para as dificuldades [...] (BERGALA, 2008, pp.26-27; grifo meu).
27
O conceito de intervir, na perspectiva da pesquisa-intervenção, gera
agenciamentos que fogem às certezas das determinações e, assim, pode ser desviada
do pragmatismo, indicando uma experiência que provoque pensamento e ação
desacomodando certezas.
2.2 O cinema como arte
Cinema como arte é aquele que pode demonstrar e indicar uma
experiência viva que explora a sensibilidade, para produzir novas formas e cores e
provocar pensamento e ação. Afirma Tarkovski:
O espectador está em busca de uma experiência viva, pois o cinema, como nenhuma outra arte, amplia, enriquece e concentra a experiência de uma pessoa e não apenas a enriquece, mas a torna mais longa, significativamente mais longa. É esse o poder do cinema: ‘estrelas’, roteiros e diversão não têm nada a ver com ele (TARKOVSKI, 1998, p.72).
Desejava-se a presença de um elemento provocador da imaginação e do
pensamento, que proporcionasse experiências e contribuísse para que ocorresse o
estranhamento nas vivências, seja do ponto de vista do aluno, seja do ponto de vista
da educadora. Um elemento que proporcionasse a percepção da alteridade, com a
construção de outros olhares sobre as relações.
A atração pelo cinema como arte na educação está em fazer emergir
novos olhares. Fresquet afirma:
Apostar na possibilidade do cinema se constituir em agente de uma nova educação, que permita aos professores e alunos uma aprendizagem estética, sensibilizar o intelecto, desvendar sensações e afetos para olhar para si e para o mundo (FRESQUET, 2007, p 26).
Por sua vez, Bergala (2008) afirma:
[...] A arte não se ensina, ela se encontra, se experimenta, ela se transmite por outras vias além do discurso do próprio saber, às vezes mesmo sem discurso algum (BERGALA, 2008, p. 33-34).
O conceito de cinema como arte, desenvolvido por Alain Bergala,
descreve a arte como um encontro com a alteridade e traça um paralelo entre cultura e
arte. Para ele, o cinema na escola não se ensina, se encontra, se experimenta. Nessa
28
perspectiva, a introdução do cinema na escola atravessa sentimentos e, assim sendo,
substitui práticas escolares habituais.
Ainda se pode falar do encontro com a alteridade, visto que o cinema é
utilizado na escola, mas não foi produzido para esse fim. Dessa forma, os professores,
ao incluírem o cinema nos planos de ensino, precisam considerar os filmes como
recursos didáticos que possibilitem a criação de algo novo e não o reforço de um
conteúdo. Neste sentido, os filmes em sala de aula proporcionam caminhar além dos
conteúdos escolares, porque o cinema tem a sua própria especificidade, e esta não se
constitui exatamente como um rol de conteúdos a serem ensinados.
Para Almeida:
Os filmes (como também outras obras artísticas) são produções da cultura: obedecem a condições de produção, contingências de mercado, mas não a objetivos pedagógicos, didáticos ou a seriações artificiais. Sua utilização na educação é importante porque trazem para a escola aquilo que ela se nega a ser e que poderia transformá-la em algo vívido e fundamental: Participante ativa e criativa dos movimentos da cultura, e não repetidora e divulgadora de conhecimentos, massificados, muitas vezes já deteriorados, defasados (ALMEIDA, 1999, p.48).
Aposta-se na ideia do cinema na escola como desencadeador de uma
aprendizagem que supere os limites da cultura massificadora, além de propiciar ir além
dos conteúdos da matriz curricular e aproximar a escola do que está ausente ou
distante do fazer pedagógico.
Para Bruzzo:
O cinema, em todos os graus de ensino bem como nas diversas disciplinas, vem atender ao objetivo precípuo da educação de hoje, de tornar cada vez menor a refração entre o que a escola ensina e o que a vida mostra (BRUZZO, 1995, p.91).
Nesta perspectiva, o cinema funciona como uma forma de questionar e
movimentar saberes. A questão não é somente educativa. Reconhece-se que o cinema
como arte na escola propõe variações, distorções, com a intenção de afetar a rotina do
olhar, bem como de repensar a escola e o mundo. Ou seja, ao capturar o espectador, o
cinema o convida a abordar questões sobre o mundo. Sendo assim, arrisca-se em
compreender o mundo, em modos de dizer sobre o mundo, em imaginar e pensar
outros mundos. É preciso deslocar-se do lugar comum, porque a arte cinematográfica
tem a intenção de afetar o sensível.
29
Para Bergala (2008):
A arte, para permanecer arte, deve permanecer um fermento de anarquia, de escândalo, de desordem. A arte é por definição um elemento perturbador dentro da instituição. Ela não pode ser concebida pelo aluno sem a experiência do “fazer” e sem o contato com o artista, o profissional, entendido como corpo “estranho” à escola, como elemento felizmente perturbador de seu sistema de valores, de comportamento e de suas normas relacionais. A arte não deve ser nem a propriedade, nem a reserva de mercado de um professor especialista (BERGALA, 2008, p.30).
Sendo assim, a experiência de fazer cinema não precisa estar vinculada a
uma matéria, ou a um professor, mas é importante que envolva a escola e as pessoas
da comunidade que trabalham com o cinema, o que permite, dessa forma, sair do viés
dominante da regra.
Ainda, para Bergala (2008),
Jean Luc Godard, no autorretrato cinematográfico intitulado J-L G/J-L G, sussurra: “Porque se existe a regra, existe a exceção. Existe a cultura, que é de regra, e existe a exceção, que é a arte. Todos falam da regra, computadores, t-shirts, televisão, ninguém fala da exceção, isso não se diz. Isso se escreve Flaubert, Dostoievski, isso se compõe Gershwin, Mozart, isso se pinta Cézanne, Vermeer, isso se filma Antonioni, Vigo (BERGALA, 2008, p. 34).
Godard, no início da década de 1960, inventa um novo estilo
cinematográfico: com imagens e sons deslocados. Na obra desse cineasta, as cenas
não possuem associações entre si para ter sentido. Para Almeida (1999), os intervalos
entre as cenas são significativos, isto é, “a interpretação deve partir do caos aparente
da imagem, e encarar o mistério dos intervalos significantes”.
Dessa forma, os filmes de Godard com imagens e sons deslocados
ampliam o campo de visão do que se vê. Para Miranda (2010), os intervalos
significativos abrem possibilidades de criar, imaginar e construir significados próprios.
Dessa forma, a obra de Godard que mantém cenas deslocadas possibilita
pensar e produzir pensamentos e consequentemente aprendizagens. Assim, amplia o
campo de visão sobre o mundo, o que permite produzir cenas que ainda não existem.
E, consequentemente, possibilita pensar e aprender. Mas também pode apresentar o
novo. Durante a intervenção não foram apresentados os filmes de Godard, mas sim
filmes que mantém as cenas deslocadas à maneira de Godard para que evidenciassem
a proposta do cinema como arte.
30
Para Almeida, o diálogo entre educação e cultura assim se explicita:
Como sujeitos separados, a educação e a cultura falam de si e entre si coisas distintas. A educação, para dentro de suas paredes, organizadas por série, etapas, fases, especialidades, traz a cultura – ciência, artes – oficial ou oficiosa embalada pela pergunta: é adequada para que nível? Tradicionalmente os conteúdos da escola já vêm pré-selecionados – aprende-se tal coisa em tal série, em tal curso, para alunos de tal idade, de tal formação; os programas curriculares, os livros didáticos e a própria formação do educador resolvem este assunto com um mínimo de conflito e um máximo de naturalidade, naturalidade esta referenciada pelos cursos universitários pelos quais passaram; portanto gerada na inércia intelectual, na tradição escolar, na cultura universitária. A cultura das artes e das ciências [...] leva em conta a tradição e o aprendizado técnicos, mas não os níveis, os programas rígidos, a divisão etária, a tradição escolar dos pré-requisitos. A cultura produz e também se reproduz, faz nascer, renascer o conhecimento, as sabedorias, mostra novamente o antigo, demostra o novo, o saber-fazer dos homens. É sempre contemporânea do presente, até mesmo quando expõe o velho, a cultura que já foi. Ela se expõe, ao mesmo tempo, para a produção e consumo, independente da faixa etária, formação, pré-requisitos. Deixa-se ver, ouvir, falar, comer, mexer, usar por consumidores de diferentes idades culturais e gosto (ALMEIDA, 1994, p.13-14).
Os filmes na escola, não deveriam ser vistos e operados como
conhecimento objetivo, teórico, mas, sim, como criação e invenção. Para tal, dentro da
escola, poderia haver, além do tempo da lição, um tempo do cinema, território da
criação e invenção. Porém, fazer cinema na escola não é apenas reunir cenas para um
filme, mas pensar cada cena com uma estética, que possibilite deixar fluir a imaginação
e mexer com as sensações.
Vale destacar que, para Bergala, a partir de sua experiência como
assessor nas escolas francesas, as práticas escolares envolvendo a criação
cinematográfica são operativamente muito simples, tendo em vista que a tecnologia
digital possibilita colocar à disposição de alunos filmes e fragmentos de filmes,
convidando-os a fazerem, conceitual e tecnicamente, associações e analogias, assim
como estabelecer semelhanças e diferenças entre as imagens. Nessas condições,
professores e alunos podem observar, pensar, realizar, criar, recriar e inventar filmes.
Dessa forma, a ideia de fazer cinema na escola não é mais uma voz ou
um texto ao qual se atribuam saberes, e muito menos é exclusiva do professor, mas
está na observação, no encontro e na circulação de fragmentos, que são
imprescindíveis para a criação.
31
Na escola, como já foi dito, os filmes ainda são vistos como ilustração dos
conteúdos. Não como fontes de aprendizagem ou experiências escolares em si
mesmas. Ressaltando que, filmes que fogem do conteúdo programático são proibidos
(as vezes são fonte para lazer e preenchimento de buracos nas faltas dos professores).
As instituições escolares têm a tendência de evitar ou amortecer novas práticas
pedagógicas para legitimar as práticas escolares habituais. Assim, o cinema como arte
na escola entra enquanto elemento proibido, mas, assim que ganha visibilidade, é
aprisionado para assegurar que suas práticas pedagógicas habituais sejam mantidas.
Todavia, Bergala (2008) defende que a arte, se quiser ser arte, constitui um elemento
de anarquia e de desordem. Levar o cinema à escola faz sentido na medida em que
possibilita que o diferente apareça no contexto escolar.
Para Fresquet (2013):
O cinema provoca o devir da escola, prevê uma "outra escola", renovando-se pelo exercício que só a alteridade permite. Eu diria que o cinema inclina a escola para frente, mas também para trás, para os lados, ele a deixa de pernas para o ar mais uma vez; basicamente, ele a desestabiliza (FRESQUET,2013, p.17).
Uma intervenção pedagógica, que enfocasse o cinema como arte, em
uma relação de estranhamento, de alteridade, agenciando outras possibilidades de
conjunção e encontros entre Cinema e Educação, foi a proposta escolhida para que a
cultura cinematográfica possibilitasse ao aluno criar e que essa criação fosse potente
para abrir novos meios de ver o mundo. Bergala salienta que fazer filmes é, nas suas
palavras, “um gesto de criação”.
Segundo a proposta de Bergala, para a realização do cinema como arte
na escola, é preciso ver, analisar, realizar e criar filmes. Analisar filmes e analisar a
criação: tais análises têm um caráter transitivo, não sendo um fim em si mesmo, mas
uma passagem para o ato de criação. Realizar curtas-metragens no contexto escolar,
para o autor, não deve confundir-se com o objetivo de se criar um filme objeto, como
um produto, mas como uma experiência de uma ação, como processo.
Bergala menciona que existe uma distinção entre uma análise fílmica
clássica e uma análise de criação. Na análise clássica, decodifica-se o filme, realizando
uma leitura interpretativa do mesmo. Na análise da criação, que tem um caráter
32
transitivo, constitui-se como a primeira experiência da passagem ao ato, ou seja, a
tentativa de retorno ao momento no qual quem filma ainda não fez escolhas definitivas.
A respeito de criar filmes, Bergala afirma que a criação cinematográfica
compreende três operações: a eleição (escolher), a disposição (posicionar) e o ataque
(decidir), que devem ser pensadas antes das operações técnicas. Estas três operações
não podem ser pensadas cronologicamente, pois elas se fazem em conexões durante
as filmagens.
A experiência de realização de filmes na escola traz uma dúvida para
Bergala: a criação na escola se confronta efetivamente com o cinema. A experiência da
passagem do ver para o ato de criação é, em sua teoria, insubstituível, por suscitar um
saber não acessível apenas pela análise dos filmes, mas por vivenciar também as
emoções do criador de um filme.
Nos filmes, uma história é contada não apenas por meio de palavras, mas
também por imagens, sons e outros recursos que, às vezes, não são percebidos por
quem vê o filme, mas que contribuem para despertar emoções. Ver e analisar os
elementos que compõem uma obra fílmica e o papel que esses elementos
desempenham permite perceber que a relação entre som e imagem acontece sob
linhas de atravessamento, subvertendo os limites do já estabelecido, fazendo emergir
outras interpretações que, por sua vez, implicam pensar as imagens de um lugar
heterogêneo, transpassado por muitas coisas mutáveis que permitem escapar das
ideias preestabelecidas.
Assim, assistindo a um filme, vê-se que uma história é contada por meio
de imagens, por palavras, sons e outros recursos que nem sempre o espectador vê. O
exercício de ver pode conter variações, porque existem diferentes tipos de filmes.
Alguns podem driblar preconceitos sensoriais propondo formas inovadoras de
apresentar as imagens. Outros seguem trilhas já traçadas e, portanto, mais óbvias da
realidade. Isso não significa, porém, que não ofereçam uma experiência interessante.
Pode-se dizer que, quanto mais o espectador é envolvido com um filme, mais as
sensações e sentidos são despertados.
33
Logo, para apropriar-se da arte cinematográfica e desvendar seus
mecanismos, é imprescindível formar repertório, colocando em pauta as emoções do
criador do filme. Para tal, torna-se importante a constituição de um acervo fílmico na
escola e o incentivo à ida ao cinema para que professores e alunos estabeleçam
vínculos com essa arte. Entretanto, somente o acesso a filmes não basta. A escola
precisa apresentar filmes que estejam fora do circuito comercial, pois, se não
apresentam filmes diferentes aos alunos, estes não os assistirão em lugar nenhum.
Com esse referencial teórico, faz-se a transposição dessa proposta para a
prática escolar, sendo postas as seguintes questões: Pode o cinema na escola
apresentar-se como processo criativo? Que tipo de aprendizagem emerge desse
processo? Qual a abrangência do gesto de criação?
Acredita-se que é possível identificar nessa pesquisa-intervenção de fazer
cinema na escola, expressões múltiplas e singulares de aprender e agenciar o fazer,
por meio dos gestos de criação ou, pelo menos, dos germes destes gestos.
35
3- Pesquisa-intervenção
A proposta metodológica que possibilitou o desenvolvimento desta
pesquisa não se deu a priori, mas depois de estudos com pesquisadores do grupo
OLHO que integram o projeto "Imagens, Geografias e Educação", especialmente com
a leitura e estudo do livro "Pistas do método da cartografia: pesquisa-intervenção e
produção de subjetividade" organizada por Passos, Kastrup e Escóssia (2009). Essa
obra, apresenta oito pistas para o método cartográfico a partir do conceito de
cartografia apresentado por Gilles Deleuze e Félix Guattari na Introdução de Mil Platôs.
Embora as pistas tenham sido escritas de modo independente, elas estão interligadas,
mas de modo que possam ser lidas na sequência que aprouver ao leitor. As oito pistas
não formam uma totalidade, mas um conjunto de linhas em conexão e de referências
sem predeterminar regras, protocolos ou procedimentos.
Com esse estudo, encontram-se nas pistas os caminhos que
possibilitaram traçar a criação cinematográfica na escola, permitindo uma configuração
dizível da trajetória, neste processo de intervenção.
Para Passos e Barros (2009), a pesquisa-intervenção é um método que,
ao contrário de propor aplicar regras, sugere pistas que funcionam como referências
para uma atitude de abertura ao que vai sendo produzido e de calibragem do caminhar
no próprio percurso da pesquisa – o hódos-metá, caminhar que traça no percurso as
metas da pesquisa.
Um projeto de pesquisa que adota a pesquisa-intervenção como método
investigativo tem como cenário o plano da experiência. Para Passos e Barros:
[...] plano da experiência, acompanhando os efeitos (sobre o objeto, o pesquisador e a produção do conhecimento) do próprio percurso da investigação. Considerando que objeto, sujeito e conhecimento são efeitos coemergentes do processo de pesquisar, não se pode orientar a pesquisa pelo que se suporia saber de antemão acerca da realidade: o know what da pesquisa. Mergulhados na experiência do pesquisar, não havendo nenhuma garantia ou ponto de referência exterior a esse plano, apoiamos a investigação no seu modo de fazer: o know how da pesquisa. O ponto de apoio é a experiência entendida como um saber-fazer [...] (PASSOS e BARROS, 2009, p. 18).
36
Uma das pistas dessa metodologia pressupõe intervir em campo
produzindo e não apenas coletando dados, visto que somente a coleta de dados não
possibilitaria determinar a totalidade dos procedimentos metodológicos. Elege-se essa
abordagem para a pesquisa devido à possibilidade de imersão na experiência que
agencia sujeito e objeto, teoria e prática. Experiência entendida como um saber-fazer,
isto é, um saber que emerge do fazer. Tal experiência acontece em um momento em
que o saber-fazer e fazer-saber são concomitantes, ou seja, compreenderia tanto o
saber na experiência quanto a experiência do saber.
Nessa perspectiva, a pesquisa não se processa como uma investigação
realizada somente por um único pesquisador, mas pertence a todos os envolvidos no
processo de intervenção. Nesse método de pesquisa, são importantes a interação e a
abstenção de níveis hierárquicos entre os colaboradores.
O plano da experiência ressalta a importância da vivência. Como
interventores desse plano, acompanha-se a criação favorecendo processos múltiplos e
singulares. Para realizar essa intervenção, a abordagem teórica e metodológica da
pesquisa é a qualitativa. Para o referencial teórico de nossa experiência, ou seja, do
saber que emerge do fazer, delineia-se um caminho de pesquisa com a proposta da
Hipótese de Alteridade desenvolvida por Alain Bergala.
De acordo com o estudo de Passos et al., (2009) foi definida a
apresentação e a organização desta pesquisa. Para a organização da estrutura do
texto, foi trabalhada a ideia de clareiras que alojaram as potências das imagens. Estas
conduzem a um cenário denominado ateliê, território da criação e da invenção, com o
intuito de que aprendizagens fluíssem em outros tempos, para além do horário e
espaço da sala de aula nas escolas.
Com esse objetivo, a pesquisa foi realizada em duas escolas da rede
municipal de ensino de Campinas, tendo sido planejados 30 encontros anuais, no
contra turno dos alunos, horário oposto às aulas, durante o período de fevereiro de
37
2010 a dezembro de 2011 na escola “Prof. Vicente Ráo” e de fevereiro de 2012 a
dezembro de 2014 na escola "Carmelina de Castro Rinco".7
A escola “Prof. Vicente Ráo” está localizada na região sul da cidade de
Campinas, em um bairro próximo à região central, com boa infraestrutura, habitado por
pessoas da classe trabalhadora que procuram garantir o sustento e melhores
condições de vida para a família. Produtos eletrônicos como computador com internet,
celular, DVD e televisão fazem parte do cotidiano dos alunos. Apenas uma pequena
parcela dos alunos frequenta o cinema com seus familiares. Em 2010, a escola
atendeu 617 alunos e em 2011, 627 alunos na faixa etária de seis a quatorze anos.
Possui espaço físico amplo constituído de prédio escolar com 10 salas de aulas,
biblioteca, refeitório, laboratório de Ciências, sala de informática e vídeo, além de
quadra polidesportiva, campo de futebol, teatro de arena e árvores que favorecem um
clima agradável para o ambiente escolar. Os equipamentos eletrônicos da escola se
constituem de três Projetores multimídia (data show), quatro máquinas fotográficas,
duas filmadora HD e um tripé para filmagem.
A escola "Carmelina de Castro Rinco" está localizada em uma área
periférica na região sudoeste da cidade, com pronunciado fluxo migratório de pessoas
vindas de diferentes regiões do Brasil, em um bairro habitado por pessoas da classe
trabalhadora que moram em casas populares ou moradias de estrutura física
deficitária. Produtos eletrônicos como rádio, televisão e celular fazem parte do
cotidiano dos alunos. Mas, apenas uma pequena parcela destes possui computador
com internet em casa. Muitos foram ao cinema pela primeira vez com a escola. Em
2012, a escola atendeu 374 alunos; em 2013, 331; e em 2014, 326 alunos na faixa
etária de seis a quatorze anos. Possui espaço físico constituído de prédio escolar com
08 salas de aulas, um espaço anexo com três salas de aulas, parquinho, biblioteca,
quadra polidesportiva, refeitório, pequeno espaço livre próximo à quadra, uma sala de
informática e vídeo com 20 computadores e uma televisão de 42 polegadas. Os
7 A justificativa para a mudança de escola deve-se somente à situação da carreira docente no Município
de Campinas. Durante a pesquisa a professora-pesquisadora mudou de escola em virtude de ser professora efetiva em uma rede municipal que prevê, no seu estatuto, a troca de unidade escolar dos professores para atender a demanda escolar do município.
38
equipamentos eletrônicos da escola se constituem de dois Projetores multimídia (data
show), quatro máquinas fotográficas, duas filmadora HD e um tripé para filmagem.
A oportunidade de participar do ateliê foi apresentada em 2010, para os
alunos do 7º ano da escola "Prof. Vicente Ráo", e em 2011 o mesmo grupo de alunos
deu continuidade às ações da intervenção que foram realizadas às quartas-feiras das
14 às16 horas. Em 2012, apresentou-se a pesquisa-intervenção para os alunos do 6º
ano da escola "Carmelina de Castro Rinco" e, durante os anos de 2013 e 2014, o
mesmo grupo de alunos deu continuidade às ações da intervenção realizadas às
quintas-feiras das 11 às 13 horas.
A proposta de fazer cinema nas escolas foi apresentada perguntando-se
diretamente aos alunos, meninos e meninas de 11, 12 e 13 anos, se gostariam de
participar da intervenção. Os interessados levantaram os braços e pegaram as
autorizações para os responsáveis assinarem. Em uma das escolas, uma menina,
deficiente visual de nascimento, nessa pesquisa denominada Petra, não levantou o
braço, mas perguntou se poderia participar dos encontros. Essa pergunta deixou os
alunos um pouco espantados e logo um menino da sala questionou como ela poderia
fazer cinema se não enxergava. Prontamente, a menina respondeu que a família dela
tinha o hábito de assistir a filmes e que ela os acompanhava ouvindo o som. Por isso,
poderia participar dos encontros com o cinema. Houve um grande silêncio, mas viam-
se muitos olhinhos brilhantes e felizes pela menina disposta a trilhar desafios que
possibilitariam outros caminhos a seguir.
Com a ciência e autorização das equipes gestoras e a devida autorização
dos pais, treze alunos da escola Prof. Vicente Ráo participaram dos encontros e quinze
alunos da escola Carmelina de Castro Rinco. Embora apenas um pequeno grupo tenha
participado das atividades, optou-se por deixar que a adesão fosse, ainda assim,
voluntária, visto que a possibilidade de escolha poderia também ser entendida como
um meio de aprendizagem.
Desafio aceito, inicia-se as ações da intervenção em um encontro
semanal de duas horas, realizadas sempre com equipes de 3 e 4 alunos. A frequência
aos encontros foi relativamente alta, apesar das atividades terem ocorrido no contra
39
turno das aulas. Normalmente, os alunos apresentam dificuldades para estarem
presentes na escola em atividades realizadas em horário oposto às aulas, porque
envolvem outras variáveis como mudança na rotina da família, deslocamentos, choque
de horários com outros compromissos para além da escola, dentre outros fatores. Mas,
do total de 28 participantes, apenas dois alunos da Escola Carmelina de Castro Rinco
não participaram dos 30 encontros propostos, um por motivo de mudança de bairro e o
outro por mudança de cidade.
As experiências do ateliê foram realizadas em uma sala multiuso, mas
também realizou-se encontros ora na sala de informática, ora no pátio, ora na
biblioteca e em outros espaços fora da escola. Realizar os encontros no ateliê tornou-
se uma experiência prazerosa, constatada no interesse, no entrosamento e na
assiduidade dos alunos.
O leque de ações, descritas no cronograma (Anexo III), que permitiu essa
intervenção propiciou uma constante alteração entre o ver, o explorar, o experimentar,
o criar, o inventar e também o aprender com a criação cinematográfica. Para tanto,
foram elaborados um “plano da experiência” com a "criação de filmes-ensaio", a
“presença do cineasta na escola", a “visita ao Museu da Imagem e do Som – MIS” e as
Práticas Exploratórias, nas quais se propôs colocar os alunos em contato com
situações em que pudessem pôr em movimento seus pensamentos, suas percepções e
visões de mundos. A expectativa inicial era de que todos que participassem dessa
intervenção entrassem em um movimento em que pudessem explorar algumas das
possibilidades do ensaio cinematográfico e, depois, seguissem seus próprios caminhos
levando algo novo consigo. Sendo assim, no início da intervenção, esperava-se que as
ações desenvolvidas fossem "trans”8 formadoras para todos os envolvidos. Para que
isso ocorresse, realiza-se atividades que permitiram que durante o processo de criação
houvesse a alternância de vozes dos partícipes e que os encontros no ver e no criar
8 O prefixo "trans" está para uma transversalidade. Para Guattari, 2004, " A transversalidade é uma
dimensão que pretende superar os dois impasses, quais sejam o de uma verticalidade pura e de uma simples horizontalidade, a transversalidade tende a se realizar quando ocorre uma comunicação máxima entre os diferentes níveis e, sobretudo, nos diferentes sentidos" (GUATTARI, 2004, p.111).
40
com a arte cinematográfica possibilitassem a construção, desconstrução e discussão
de saberes.
Vale ressaltar que encontro pode ser entendido como um ponto em que
certa situação comum cede lugar a uma configuração ou entendimento diferente.
Dessa forma, nos encontros, não se demarcou exatamente tudo o que aconteceria,
uma vez que um encontro sempre pode sair dos parâmetros estabelecidos de início e
abrir novos territórios para outras formas de expressão tal como nossa experiência no
ateliê pôde demonstrar.
As dinâmicas geradas nesses encontros apontaram para a necessidade
de se pensar e agir de modo desconectado da lógica individualista que nos é
geralmente imposta, de forma que explorasse um mundo melhor para si e para os
outros. As ações da intervenção permitiram a inclusão de diferentes formas e maneiras
de ver e sentir o mundo. Por sua vez, as ações desenvolvidas não podem ser
entendidas como uma forma de se efetivar mudanças apontando direções, visto que,
valendo-se da transversalidade, da transgressão, da transmutação, do transbordar e de
outras ideias e pensamentos transitórios, elas agem contra a ordem de uma única e
absoluta verdade. Sendo assim, não objetivou-se que os alunos realizassem suas
criações cinematográficas segundo uma estética e uma lógica veiculada, inclusive pela
mídia, mas sim que desenvolvessem processos de aprendizagens e suas possíveis
interações.
Essa pesquisa se converteu em um texto e em filmes-ensaio realizados
durante a intervenção. Como recursos metodológicos foi utilizado o caderno de campo
com as escritas das ideias e ações realizadas em cada encontro e a organização do
material visual, fotografias e filmes, aqui denominados dispositivos imagéticos9. Das
209 fotografias e 82 filmes-ensaio produzidos, optou-se por selecionar para análise
dessa pesquisa, 15 filmes-ensaios, que correspondem às imagens mais debatidas e
comentadas entre os integrantes da pesquisa. Na escrita desse texto os nomes dos
9 As imagens analisadas nessa pesquisa podem ser acessadas no blog:
http://escolaecinema.blospot.com.br
41
alunos e professores foram trocados para preservar suas identidades. A organização e
escrita do material foram realizadas com intenção de termos um conjunto das
experiências da Hipótese da Alteridade centrada na Criação.
43
4- A educação visual e filmes-ensaio
Sobre o contato com as imagens, pode-se dizer que o espectador está
inserido em uma Educação Visual. Segundo Miranda:
A educação visual e a educação visual da memória, nos mostra que vivemos, histórica e socialmente, imersos em um processo de educação cultural, estética e política e que as produções artísticas (literatura, cinema, arquitetura, pintura, fotografia...) de nossa época, ao afetarem nossa inteligibilidade de mundo, evidenciam a existência de um 'fantástico' programa de educação que, sem ter intencionalidade objetiva, impressiona e fixa, em nossa memória, não apenas imagens, mas também as formas como imaginamos o real (MIRANDA & SCORSI, 2005, p. 13).
Propor que algo participe da educação, assinala Miranda (2005), “é
mostrar que determinado entendimento, sentimento ou julgamento não é natural, ou
seja, aprende-se a tê-los. No caso das imagens, é dizer que vemos porque
aprendemos a olhar” (MIRANDA, 2005, p.35). Para este autor, a “leitura” de mundo por
meio das imagens coloca em evidência um programa de Educação Visual que está
inserido em um processo de construção do olhar. Seus significados e entendimentos
somente são compartilhados e compreendidos porque foi-se ensinados a reconhecê-
los.
Para Almeida, (2011) quando se fala em Educação Visual, refere-se à
ideia de um olhar que é educável ou suscetível de receber uma educação:
Educável é mais amplo, não escolar, e sim cultural. A cultura, se eu quiser pensar assim, educa. [...] quando penso em educação visual penso em algo que faz parte da cultura, como a educação do paladar, do olfato, da audição, do tato, da inteligência… qualquer uma dessas educações são partes menores de algo maior e abrangente a que chamamos cultura (ALMEIDA, 2011).
Foi possível observar, na prática de ver as imagens gravadas, que as
filmagens reproduziam registros com forte influência do estilo de filmes comerciais,
principalmente nos veiculados na televisão, o que nos revela que o pensamento
permanece prisioneiro de uma cultura massificadora. A este propósito, Miranda (1996,
28) afirma que: “Engana-se aquele que acredita numa leitura linear e verdadeira das
imagens e sons produzidos em nossa sociedade”. Em outras palavras, a linearidade
nas imagens e sons não determina uma única forma de ver e pensar, mesmo que se
busque aprisionar o ser em uma leitura hegemônica de mundo. Embora induzido a uma
44
interpretação, o espectador sempre pode sentir e pensar de forma aleatória e episódica
desde que seja apoiado e forçado a fazer isso.
Libertar-nos da cultura massificada e hegemônica é, portanto, criar rotas
de fuga, porque só se pensa quando se é forçado. Destarte, o pensamento discorre
somente quando é coagido ou forçado a pensar, ou seja, quando existe algo para ser
pensado, e o que existe para ser pensado é o impensável, ou o não pensado. O aluno
Marcelo, forçado a pensar na produção de um filme, diz: “eu gosto de participar das
ações do grupo de cinema, porque pude ver como um filme é feito”. Todavia, apesar da
dificuldade, conclui: “é bastante difícil, mas mesmo assim eu gosto”.
O pensamento nos força a criar, a experimentar. E, se o pensamento é
impulsionado pela busca do criar e experimentar, não é um pensamento ordenado,
mas pensamentos desordenados. Dessa forma, há linhas quebradas, linhas de
rupturas. Então, é necessário encontrar uma rota de fuga, para transbordar, fazer
vazar. Mas, para tal, é preciso dar a pensar e movimentar o pensamento. Para a aluna
Elaine, “aqui eu posso colocar em ação a minha imaginação”. O que move o
pensamento é um traçado, que induz a percorrer novos caminhos, novos modos de
imaginar, de idear, de sentir, que são, muitas vezes, incompatíveis com os
pensamentos impostos pela sociedade. Essa intervenção procurou criar rotas de fuga e
alcançar ações em um plano de experimentação com os alunos, em situações de
interação, para que estes pudessem ver, criar, analisar e pensar sobre os diferentes
filmes, permitir, enfim, que os alunos pensassem sobre a construção das imagens
veiculadas na TV, no cinema e em suas próprias produções, os filmes-ensaio.
Assim, como dizem Passos e Barros (2009), é necessário explorar teórica
e empiricamente o território estudado. Nessa perspectiva, as ações da intervenção
foram as de descobrir, explorar e experimentar o mundo para que os alunos pudessem
ver e criar filmes-ensaios.
Ensaios são formas de buscas. Uma vez que o ser está sempre à procura
de algo que satisfaça uma necessidade ou um desejo, ensaio é uma expressão
inacabada, pois quem o faz está continuamente experimentando, errando, aprendendo
e, sendo assim, constituindo-se como errante. É muito provável, portanto que, quando
45
se tentar caracterizar ensaio de maneira precisa, perder-se a essência da liberdade.
Essa forma foi criada para que o ser seja livre para experimentar. Por meio do ensaio,
registra-se a imperfeição com gestos de busca e, dessa busca, pode surgir um ensaio
sem sucesso ou a base para se criar algo maior. Mas, mesmo neste último caso, não
se abandona o erro ou a imperfeição. É o caso do ensaio criado por uma das equipes
desta pesquisa que tinha a intenção de filmar um ponto da escola onde, segundo eles,
tudo acontecia: as aventuras, as sabotagens, os acertos de conta, os namoros.
Todavia, no momento da filmagem, nada aconteceu e, mesmo diante da expectativa
frustrada, fizeram a experimentação de filmar o ponto por um minuto.
Para Machado (2003):
É com Jean-Luc Godard que o cinema-ensaio chega à sua expressão máxima. Para esse notável cineasta franco-suíço, pouco importa se a imagem com que ele trabalha é captada diretamente do mundo visível “natural” ou é simulada com atores e cenários artificiais, se ela foi produzida pelo próprio cineasta ou simplesmente apropriada por ele, depois de haver sido criada em outros contextos e para outras finalidades, se ela é apresentada tal e qual a câmera a captou com seus recursos técnicos ou foi imensamente processada no momento posterior à captação por recursos eletrônicos. A única coisa que realmente importa é o que o cineasta faz com esses materiais, como constrói com eles uma reflexão densa sobre o mundo, como transforma todos esses materiais brutos e inertes em experiência de vida e pensamento (MACHADO, 2003, p.72 ).
Nos filmes-ensaio, as imagens não contam uma história, não se amoldam
no sentido convencional de cinema. São experiências inventadas de formas e
conteúdos. Filma-se uma experimentação permanente da liberdade de criação.
Ressalta-se que com esta concepção de ensaio traçou-se as ações da intervenção
com o cinema na escola.
47
5- Ações de intervenção
A partir da proposta de Bergala, traçou-se três planos de experimentação:
(1) "filmar o Minuto Lumière", (2) a “presença do cineasta na escola", e (3) a “visita ao
Museu da Imagem e do Som – MIS”. Outros planos de experimentação da intervenção
podem ser acompanhados no capítulo das Práticas Exploratórias. Vale salientar que
Bergala faz uma proposta aberta sobre a criação cinematográfica, cabendo a cada
professor dar oportunidade aos alunos formas singulares de fazer cinema, as quais
tornam-se possíveis na perspectiva do cinema como hipótese de alteridade. Sendo
assim, o plano de "filmar o Minuto Lumière", “a presença do cineasta na escola” e
“visita ao MIS” são experiências de criação bastante estreitas à proposta de Bergala.
Seguindo os passos deste autor, uma das ações da intervenção foi a
apresentação de uma série de filmes dos Irmãos Lumière, realizados em 1895, com o
cinematógrafo, câmera fixa que permite filmar aproximadamente 52 segundos, com
imagens em movimento em preto e branco. Depois, foram apresentados alguns
vídeos, produzidos, atualmente, com a câmera estática, na mesma perspectiva dos
Irmãos Lumière, com a intencionalidade de fazer-se uma análise fílmica da criação, tal
como proposto por Bergala. A este respeito, Godard (2006, p. 243), nos revela: “eu já
fazia filmes antes de fazê-los. Certamente aprendi mais vendo filmes do que fazendo”.
Durante a intervenção, assistiu-se também filmes e trechos de filmes. Nas
palavras de Norma, uma menina integrante do grupo, “em casa, a gente assiste aos
filmes e esquece; aqui na escola, a gente vê, conversa e o filme fica na cabeça”. Já
para Eduardo, "eu gosto de ver e ouvir as opiniões dos colegas sobre os filmes, às
vezes eles viram coisas que eu não vi".
Esses depoimentos mostram outra forma de aprender, pois, assistindo a
um filme, desloca-se o olhar, conforme combinam-se os elementos sonoros e visuais, o
que possibilita a aprendizagem de uma outra linguagem e uma outra perspectiva de
aprender. Assistir um filme, portanto, é uma experiência estética, sendo este um dos
movimentos encontrados no processo de ver e analisar as imagens, intrinsecamente
presentes no movimento de fazê-las, a partir da constante construção e reconstrução
do conhecimento.
48
Seguindo os passos de Bergala, uma outra ação realizada durante a
intervenção foi fazer a experiência de filmar com uma câmera fixa durante cerca de um
minuto algo da realidade com as características que tinham as máquinas dos irmãos
Louis e Auguste Lumière, que filmavam com películas de 17 metros e duração de
aproximadamente 52 segundos. Essa experiência de Bergala, divulgada no Brasil por
Fresquet, constitui-se em:
[...] rodar um plano é colocar-se no coração do ato cinematográfico e descobrir que a potência do cinema está no ato de captar um minuto do mundo, que nos surpreende e que jamais se repetirá. Essa experiência do imaginário sobre a sétima arte desenvolve a sensibilidade de quem produz e de quem assiste a esse minuto acerca das imagens, tornando-os capazes de ver um mundo novo, para além das formas que se estabelecem tão logo o universo cinematográfico lhes é apresentado (FRESQUET, 2012, p.7).
Nessa mesma perspectiva, uma das ações da intervenção foi filmar como
os irmãos Lumière, filmando por um minuto, sem movimento de câmera e sem ativar o
zoom. Optou-se nessa experimentação por deixar o tema livre, visto que já havia a
limitação do tempo e a filmagem deveria compreender as três operações propostas por
Bergala: escolha, posição e ataque.
Nessa proposta do Minuto Lumière, Bergala leva em conta as condições
objetivas reais, presentes na criação cinematográfica. As condições de “escuta” do real
garantem que a filmagem não seja apenas uma simulação técnica do ato de filmar,
uma vez que esta depende também da percepção no tocante à luz, às matérias, aos
ritmos internos de deslocamento dos possíveis atores, ao som, enfim, em relação a
tudo que depende do sensível mais do que do sentido, da significação (BERGALA,
2008, p. 199). Ou seja, mesmo que as novas tecnologias digitais ofereçam todos os
recursos para a criação de um filme, a aprendizagem não se limita somente à técnica,
mas envolve também questões de escolhas sensoriais, visuais e sonoras dos planos a
serem filmados pelos alunos.
Para Bergala (2008),
Estou cada vez mais convencido de que não existe por um lado uma pedagogia do espectador que seria forçosamente limitada, por natureza, à “leitura”, à decriptagem, à formação do espírito crítico e, de outro, uma pedagogia da passagem ao ato. Pode haver uma pedagogia centrada na criação tanto quando se assiste filmes como quando se os realiza. Evidentemente, é essa pedagogia generalizada
49
da criação que seria preciso conseguir implementar numa educação para o cinema como arte. Olhar um quadro colocando-se as emoções de criador, não é a mesma coisa que olhar o quadro se limitando às emoções do espectador (BERGALA,2008, p. 34).
Ao finalizar a filmagem do minuto Lumière, Petra, aluna com deficiência
visual, comentou que “o importante é saber ouvir, não a palavra, mas a voz”. Esse
depoimento sugere que, na criação cinematográfica, as condições de “escuta” do real
garantem de fato que a filmagem não seja apenas uma simulação técnica do ato de
filmar, uma vez que esta depende também das escolhas sensoriais. No caso de Petra,
escolhas sonoras especificamente, da escuta sensível, da percepção sobretudo no
tocante ao som, enfim, “em relação a tudo que depende do sensível mais do que do
sentido, da significação” (p. 199). Desta forma, a criação é importante porque permite
que sensações como a escuta, o tato, a visão entrem em sincronia com a produção de
imagens.
Fresquet (2012) considera que a aproximação da arte cinematográfica
com a escola possibilita reconfigurar a aprendizagem e suas relações, mudar a rotina
das atividades e do uso do espaço-tempo escolar, viabilizando um trabalho coletivo e
criativo, quebrando a fronteira da escola com o mundo das artes.
Na perspectiva da hipótese de alteridade, em que o mundo das artes
entra na escola, como sugerido por Bergala, deve-se considerar a presença de
pessoas externas à ela para falar de cinema. Para Bergala, seria o "passeur" ou
passador e para essa intervenção considerou-se o intercessor.
Os intercessores mobilizaram bastante os alunos, quando provocados ou
forçados a agir. A presença de pessoas externas na escola constituiu-se como
mobilizadora do pensamento, uma vez que possibilitou questionarem e deslocarem
ideias prontas e definidas.
Nessa perspectiva, para intervir com o cinema na escola "Prof. Vicente
Ráo", contou-se com quatro estagiários do curso de Pedagogia da UNICAMP como
intercessores, que participaram de doze encontros realizados no segundo semestre de
2010, apresentando para o grupo de alunos dessa intervenção os conhecimentos
adquiridos sobre imagens na disciplina de "Escola e Cultura".
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Em um dos encontros em que se filmava o pátio da escola, com os
intercessores, um menino do grupo comentou sobre o ninho do pássaro João de Barro,
na árvore da entrada da escola e todos, curiosos, dirigiram-se para ver o ninho. Um
dos meninos comentou que ele tinha dois pássaros em casa, pois amava os pássaros,
e sugeriu que fossem realizadas filmagens com esses animais. Nesse momento,
ocorreu uma forte tensão, um embate entre o desejo de filmar os pássaros e o grupo
de intercessores que tinham o desejo de apresentar o que estavam aprendendo na
Universidade. Nesse embate, as palavras da aluna Eliane foram decisivas: "nós
aprendemos a usar a filmadora e queremos fazer um filme com pássaros porque eles
fazem parte da escola, assim como os professores e alunos". Nesse momento, os
alunos olharam pela janela as árvores do pátio com o desejo de procurar pássaros.
Assim, decidiu-se capturar as imagens dos pássaros na escola, dos pássaros e as
árvores, dos pássaros e o céu, dos pássaros e os alunos.
Nesse movimento contagiante de filmar os pássaros, surgiu outra tensão
quando uma das intercessoras, Sofia, propôs a apresentação das palavras narradas
por Ruth Rocha de Mil pássaros pelo céu e sugeriu aos alunos deitarem no chão para
ouvir a narração do CD e imaginar o ambiente onde acontece a história dos mil
pássaros. A princípio, o grupo de alunos não queria deitar no chão, visto que não é
uma prática escolar habitual, mas, mesmo resistentes, aceitaram o desafio de ouvir,
deitados, as palavras cantadas. Ao final, meninos e meninas maravilhados com a nova
experiência vivenciada puderam falar o que haviam imaginado: Eduardo tinha visto
pássaros, árvores, flores. Roberto viu o céu e mil pássaros; e assim se sucederam
bonitos relatos. Animada com as narrações, Sofia propôs que desenhassem o que
haviam escutado e imaginado. Momento de outra tensão, pois cinco meninos disseram
que não iriam desenhar. Sofia insistiu e eles disseram que não sabiam desenhar. A
intercessora insistiu novamente para que eles desenhassem e quem não soubesse
desenhar poderia começar fazendo um esboço ou ensaio. Nessa proposta, os alunos
aceitaram o desafio e desenharam o que haviam imaginado. Assim ficava cada vez
mais forte o desejo de observar, capturar as imagens e por fim realizar o filme-ensaio
pássaros.
51
Outra intervenção com intercessor realizada na escola Prof. Vicente Ráo,
durante 6 encontros no primeiro semestre de 2011, contou com a presença do cineasta
Flávio Carnielli. No primeiro encontro ele disse que a melhor maneira dele se
apresentar seria por meio das imagens dos seus filmes e mostrou trechos de alguns de
seus filmes e o seu curta metragem "Encontro". Carnielli comentou que "filmar
possibilita criar mundos diferentes como: fazer uma vassoura voar, uma pessoa voar,
ou mesmo um aluno voar. Como também existe a possibilidade de ser uma outra
pessoa". Nesse encontro, falou também sobre a rotina das filmagens, as diferentes
possibilidades de enquadramentos e como fazer um roteiro de um filme.
Em outro encontro com Carnielli sobre possibilidades de filmagens, o
cineasta incentivou os alunos a realizarem seus próprios filmes. Um dos meninos,
João, sentindo-se provocado, disse: "surgiu um monte de ideias para filmar". E,
Susana, também mostrando-se muito interessada pelo encontro com o novo disse: "eu
vi um monte de coisas que não sabia com o Carnielli". Observou-se que criar mundos
era algo estranho para os alunos. Embora seja comum para crianças e adolescentes
criarem mundos, os alunos não reconheciam que assim o faziam. Na escola há muitos
mundos escondidos, submersos pelos deveres de formação de professores e gestores.
Quando alguém que faz cinema diz que cria mundos, o mundo passa a ser plural e o
encontro do olhar com a realidade através da câmera ganha potência de novo, de
criação, de devires. Os pássaros, ou a vassoura voadora, “começam” da escola. Falar
da escola é falar de pássaros ou da vassoura que voa. Foi exatamente o cinema que
trouxe esta ideia, ou melhor, foi o cinema que conectou variáveis da realidade da
escola possibilitando a criação de desarranjos no modo de falar sobre ela.
Nesse movimento, uma das meninas do grupo, Sandra, comentou:
"conhecer uma pessoa que faz filmes é incrível. Eu estou muito animada e confiante
para fazer meu filme". O ânimo adveio da presença do próprio autor junto com sua
obra. A distância entre Sandra e o cinema foi modulada pela interseção do cineasta
que arrastou o fazer cinema, algo inicialmente tão distante, para junto de Sandra.
No movimento de um outro encontro com Carnielli, iniciou-se a conversa
sobre um morador de rua, conhecido como Andarilho, que frequentemente ia à escola
52
buscar latinhas de alumínio para vender. Os alunos chegaram dizendo que haviam
cumprimentado o Andarilho e que iriam arrumar latinhas para que ele vendesse. Um
dos alunos sugeriu que sua equipe de filmagem fizesse um documentário sobre a
história dele. Prontamente, todos os quatro integrantes da equipe gostaram da ideia e
dos desafios que surgiam para fazer um documentário. Mas, essa equipe questionava
se a direção da escola e os pais iriam permitir que se realizassem as filmagens e
também se o próprio Andarilho aceitaria o convite, assim como quais seriam as
possibilidades de conhecer o local onde ele morava ou dormia.
Com o intuito de dar continuidade ao desejo de realizar o documentário,
deu-se o primeiro passo solicitando a autorização da direção, dos pais ou responsáveis
e do próprio Andarilho para capturar as imagens.
Com a autorização concedida, visitou-se o local onde ele
costumeiramente dormia, a antiga estação do Veículo Leve sobre Trilhos - VLT, com a
intenção de conhecer um pouco da história de vida dele.
Com suas palavras, ele contou:
Eu vim do Paraná, tinha casa e família, mas eu perdi meu emprego e minha mulher me mandou para fora de casa. Como não tinha trabalho não podia pagar aluguel, mas como morava aqui perto eu sabia que a estação estava abandonada, então, eu escolhi esse lugar para fixar minha moradia nesse momento. Mas eu não quero ficar aqui a minha vida toda. Eu quero, com o dinheiro que ganho vendendo as latinhas que encontro, comprar um carrinho de madeira para carregar o material reciclado e, quem sabe, alugar um quarto no centro. Porque eu acho muito triste passar as noites aqui na estação, principalmente quando faz frio. Estão vendo esse buraco embaixo da plataforma? (indica com a mão esquerda o espaço embaixo da plataforma). Então, à noite, quando esfria, eu entro aqui e durmo tranquilo, porque estou num lugar quente e também porque ninguém sabe que eu estou aqui escondido (Transcrição do áudio gravado em 04 de maio de 2011).
Esse depoimento reafirmou a vontade de realizar as filmagens e
agendou-se a filmagem para a semana seguinte Porém, chegado o dia marcado, ele
não foi encontrado. Os alunos não desistiram e partiram a procura do Andarilho,
próximo à antiga estação do VLT, onde havia muito mato e mais adiante estavam
sendo construídos três prédios. Os pedreiros que trabalhavam nessa construção
começaram a gesticular e a gritar. Pensou-se que eles estavam brincando para chamar
atenção e não se deu importância aos gritos. Mas, os gritos aumentavam. Tensão.
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Todos os pedreiros, agora na cobertura do prédio, começaram a apontar os braços em
direção à antiga estação. Pensou-se que era alguém tentando arrombar os carros que
estavam com os equipamentos de filmagem. Mas, era a polícia que, de moto,
procurava quem havia deixado os carros ali. Sem saber o que acontecia, iniciou-se
uma correria. Carnielli viu os policiais e disse: "não corram, podem atirar". Então, a
equipe de filmagem deparou-se com dois policiais que perguntaram: "de onde vocês
são? O que estão fazendo aqui?" Respondem: "somos da escola do bairro e estamos
fazendo um trabalho de escola". "Aqui não é um local seguro para fazerem trabalho de
escola. Voltem imediatamente para a escola e não voltem mais aqui".
Impossibilitados de retornar à antiga estação do VLT e sem conseguir
encontrar o Andarilho, não seria mais possível dar continuidade ao filme. Então, com a
imprevista ausência, foram longas as conversas para redefinição dos caminhos de
novas filmagens, já que os alunos permaneciam com o desejo de concluírem o
documentário. A alternativa encontrada foi gravar e editar falas que indicavam a
procura pelo andarilho tendo como imagem apenas um fundo preto, outra imagem com
a foto do local onde ele costumeiramente dormia e a inclusão dos dados de uma
reportagem do jornal Correio Popular de Campinas sobre as mortes de moradores de
rua em 2011. Essas foram finalmente as cenas que compuseram o filme-ensaio
“Amigo10”.
Na escola Carmelina, a ação com o intercessor contou com um integrante
do grupo de pesquisa OLHO, Caio Gusmão, realizador de intervenções artísticas para
apresentar o conceito Internacional Situacionista e as experiências relacionadas a esse
conceito que visam questionar a alienação, a não participação, a passividade da
sociedade, sugerindo derivas, situações que criem pensamentos para a vida e uma
participação ativa dos indivíduos em todos os campos sociais. Gusmão provocou os
alunos com os conceitos de cartografia e de devir de Gilles Deleuze e Felix Guattari e
propôs a realização de uma atividade no Parque das Águas (parque para lazer na
10
A intenção de realizarmos um filme com o Andarilho aproximou-nos dele e por isso o víamos como um amigo.
54
cidade de Campinas), entregando mapas que deveriam ser empregados pelos alunos
para se orientarem num parque municipal. Os alunos não sabiam que o mapa não era
o daquele parque. Os processos de estranhamento e de busca por outros referenciais
de orientação espacial por parte dos alunos foram registrados e apresentados no vídeo
DERIVA-S que, possibilitou derivas da cartografia e da imagem, para além das
dimensões, já instituídas, de comunicar e informar.
A presença dos intercessores na escola possibilitaram que se aprendesse
por alteridade ao fazer com o outro e não fazendo como o outro. Salienta-se que a
presença de pessoas externas a escola incentivaram os alunos a buscarem novas
possibilidades com as filmagens e a proporem temas de filmagem, sem vergonha de
falar ou errar. Pode-se citar um aluno muito tímido do grupo que corajosamente fez a
proposição de realizar um filme-ensaio sobre o tema Ação Cidadã para a Mostra de
Cinema Estudantil. Esse aluno propôs, elaborou o roteiro e encenou "Um dia de
escola". Esse ensaio mostra o corredor da entrada dos alunos para a sala de aula com
dois alunos, um com as mãos vazias, o outro carregando o material escolar que acaba
caindo. O aluno que estava junto não ajuda o outro e ri, mas chega uma colega para
ajudar a recolher o material. Ao comentar sobre a realização das imagens, o aluno
autor comentou que a sua intenção foi a de que o gesto se multiplicasse e que um dia
as pessoas fossem mais solidárias.
Seguindo ainda os passos de Bergala, durante a intervenção ocorreram
visitas ao Museu da Imagem e do Som - MIS em Campinas, para diferentes encontros
com as imagens, o que propiciou aprendizagens diversas, e, por isso, considera-se o
museu também como um intercessor nessa intervenção.
Nos encontros que ocorreram no MIS, os alunos puderam assistir filmes,
participar da Mostra de Cinema Estudantil, das oficinas de fotografia e explorar o
acervo do Museu, que é constituído por um dos mais significativos conjuntos de fotos,
filmes, negativos, vídeos, slides, discos, fitas e objetos sobre a história social e cultural
da cidade de Campinas e região, apresentados em cinco diferentes linguagens:
Audiovisual (cinema e vídeo), Fotografia, Música, Tecnologia e Biblioteca.
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Dentro do grupo de alunos que foi ao museu, nenhum conhecia o local,
situado no centro da cidade. Por isso, num primeiro momento ficaram encantados com
a beleza da construção antiga e com o acervo disponível. Esse encantamento, os
fizeram explorar minuciosamente os dois andares do prédio.
Em uma das visitas, foi realizada uma oficina de fotografia que abordou,
além das noções básicas da máquina fotográfica, o olhar fotográfico, permitindo aos
alunos encontrarem uma forma de se expressar por meio da imagem. Nesse encontro,
o fotógrafo Rafael Jorge apresentou suas fotos e disse: "quando eu olho e penso em
apertar o botão da máquina fotográfica, foco e procuro sentir as sensações que a
imagem oferece. Porém, eu aprendi a fotografar, fotografando, por isso, sugiro que
fotografem o MIS". Assim, os alunos foram instigados a fotografar, realizando
enquadramentos que possibilitassem observar o museu a partir de seus pequenos
detalhes, de suas peculiaridades, de maneiras diferentes das habituais, a partir das
sensações que a imagem lhes oferecia. Percebeu-se que os alunos foram criteriosos
na escolha dos enquadramentos ao fotografarem o teto do museu, objetos antigos,
quadros, equipamentos fotográficos, evidenciando os detalhes, o que revela a busca
de uma sensação oferecida pela imagem obtida a partir, de um enquadramento,
resultado de um pensar intuitivo provocado pela busca não apenas de imagens, mas
também de sensações. Um dos meninos que participou do encontro fotografou uma
máquina fotográfica antiga, que estava atrás de um vidro, pois a foto permitia ver a sua
própria imagem refletida nele. O pensamento lógico-discursivo parece estar a serviço
do pensamento intuitivo na operação com a câmera, pois o ato de fotografar é
motivado pela sensação prazerosa do reflexo e não apenas pelo desejo de registrar e
mostrar o que é visto pelos olhos.
Lúcia, uma menina que participou desse encontro, fotografou uma caixa
de madeira com os escritos, "frágil e sonhos" porque para ela "as imagens são como
sonhos". Mas, a imagem da caixa foi tomada por outras dimensões para além de
querer dizer o que se pensa. A angulação da câmera emprestou um movimento
crescente de baixo para cima pela deformação própria da perspectiva. O acento da
imagem não está apenas no que foi “dito”, mas como foi “dito”. Buscar sensações é
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algo estranho à escola, pois conecta variáveis minoritárias da realidade escolar,
práticas não habituais no cotidiano escolar.
E, claro, a ida ao MIS possibilitou assistir aos filmes selecionados para
Mostra de Cinema Estudantil organizado pelas Secretaria da Educação e da Cultura.
Esses encontros foram muito gratificantes e permitiram aprendizagens
diversas para todos os envolvidos, possibilitaram que se aprendesse por alteridade,
percorrendo outros territórios, flanando por outros espaços e tempos.
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Fotografias realizadas no MIS.
Fonte: Acervo da pesquisa (2012)
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6- A potência do gesto de criação
No ato de criar, emergem as tensões, algumas relacionadas à própria
organização escolar (excesso de burocracia para realizar atividades, a questão do
permitido e do proibido, resistências a iniciativas não convencionais de ensino e
aprendizagem, entre outros). Outras, relacionadas ao próprio ato de criar, que coloca o
criador diante de questionamentos a respeito dos valores. Uma criação nasce de uma
experiência provocadora, pois ao mesmo tempo em que se inventa, transforma
também aquele que inventa. A invenção oferece deslocamentos e escolhas que se
descobrem no próprio percurso.
Entrementes, qual a potência do gesto de criação? Como se
desencadearia a potência do gesto de criação? Pode o cinema na escola apresentar-
se como este gesto? Quais os dispositivos necessários para desenvolvê-lo? Como se
processaria a participação do aluno e quais seriam os reflexos dessa intervenção no
processo de aprendizagem dos alunos? A criação cinematográfica no âmbito escolar
teria força suficiente para mudar a maneira de pensar e de agir do aluno e do
professor? Se sim, como se expressaria?
Essas inquietações, dúvidas e tensões foram inerentes ao trabalho. A
criação com as imagens surge a partir de um desejo de criar novos modos de
existência. Identificado esse desejo, surgem ideias que fazem emergir os gestos de
criação sobre os seres, as coisas, o mundo. Trata-se, portanto, de um exercício não
somente em que os sujeitos se expressam, mas da possibilidade de que as coisas
também possam se expressar. Elementos aparentemente dispersos podem se
encontrar, se afastar e ainda assim vislumbrar novos olhares.
Uma vez que se é atravessado por acontecimentos múltiplos, um gesto
de criação pode aglutinar uma complexa rede de pensamentos, de sentimentos e de
sensações, de forma a se entrelaçarem ideias, desejos, paixões e sensações que
aguçam a sensibilidade, não apenas do ver e do ouvir, mas que outros elementos
sensoriais como o quase olfato, o quase tato e o quase paladar também estejam
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presentes. Por isso, na captura das imagens, todos esses elementos aparecem nas
três operações mentais apontadas por Bergala (eleição, disposição e ataque) e as
influenciam. Ou seja, na captura das imagens, são feitas escolhas, posiciona-se o
foco/olhar e tomam-se decisões, em interação múltipla de pensamentos, sentimentos e
sensações.
Ao analisar os registros do caderno de campo sobre a captura das
imagens, constata-se que houve uma preocupação dos alunos com relação ao
processo de criação nas três operações, tanto em relação à eleição, como à disposição
e ao ataque. Pode-se perceber que, muitas vezes, elas estão inter-relacionadas ao
longo do processo. Essa preocupação pode ser vista através de inúmeros vestígios
que revelam o cuidado dos alunos com o criar. Às vezes, nota-se que são apenas
germes da criação, todavia, foram estes vestígios e germes que impulsionaram o criar.
Na situação das filmagens do Andarilho, já comentada e agora retomada
sob outra perspectiva, o aluno Pedro, sensibilizado pela história do morador de rua,
conhecido como Andarilho, que, todas as tardes buscava latinhas no portão da escola
para vender na cooperativa de reciclagem do bairro, escolheu fazer um filme sobre o
mesmo. Os colegas da equipe de Pedro, uma vez também sensibilizados, dispuseram-
se e se organizar para então colocar a ideia em prática. Primeiramente, conversaram
com o Andarilho sobre o desejo e a disposição e solicitaram sua autorização para
iniciar as filmagens.
Foi conversado também com a direção da escola e com os pais dos
alunos envolvidos, sobre a proposta de fazer um filme sobre o Andarilho do bairro. A
equipe de Pedro, movida pelo mesmo desejo, foi ao lugar onde o Andarilho
costumeiramente ficava com o intuito de fazer uma visita informal e conhecer de perto
o local. Estavam todos animados para realizar as filmagens, porém, o
Andarilho desapareceu. Foi procurado pelo bairro, mas não conseguiram encontrá-lo.
Os alunos estavam desconsolados e não conseguiam esquecer o homem, agora
considerado um amigo. Então, Pedro disse: "Eu não consigo esquecer a imagem, a
fala, os conselhos e o jeito dele. Tudo ficou grudado na minha cabeça e, por isso, eu
ainda continuo com a vontade de fazer o documentário". Ficaram todos espantados. A
61
equipe de Pedro também tinha o desejo de continuar com as gravações. Então, mesmo
com a ausência do Andarilho, elaborou-se um roteiro de filmagem resultando
finalmente no filme-ensaio "Um amigo".
Na experiência com a equipe de Pedro percebeu-se que, embora o gesto
de criação tenha sentido somente para quem o faz, esse gesto pode multiplicar-se e
envolver outros. A ideia original de Pedro, ou seja, a escolha em filmar o Andarilho,
envolveu os integrantes da equipe e, conforme os acontecimentos ocorriam,
pensamentos, sensações e sentimentos se entrelaçavam, levando a buscas de
alternativas que possibilitassem a concretização da ideia original.
No processo de criação da equipe de Pedro, o gesto de criação resultou
de um movimento no interior do processo criativo. Durante a intervenção, verifica-se
que, enquanto criava-se, aconteciam fenômenos múltiplos: a ausência do Andarilho, a
frustração dos alunos, a busca de outras ações que pudessem enfim concretizar o
desejo inicial. Assim, procedeu-se um movimento de operações simultâneas, mutáveis,
mutantes. Portanto, diante da impossibilidade de concretizar o filme, novas escolhas
tiveram que ser feitas.
Compreende-se, assim que a criação requer um conjunto de elementos e
de operações caracterizado como uma série de ideias que ocorrem paralela e
simultaneamente no transcorrer da criação, procedimentos mentais necessários antes
de suas operações técnicas. Durante a criação, há uma relação tensa entre limite (a
ausência do Andarilho) e liberdade (a busca de outras possibilidades) que induzem a
utilizar a matéria necessária para a concretização de uma ideia. Os limites interpostos
podem assim se movimentar pela necessidade e pelo desejo em concretizar uma ideia
a partir da liberdade da criação. Foi o que a equipe de Pedro vivenciou.
Outro gesto de criação encontrado durante a experimentação tratava de
transportar-se para novos modos, novas formas e novas configurações do mundo.
Elaboram-se, então, hipóteses sobre as coisas e o mundo. Nesse sentido, enquanto
realizavam-se as filmagens dos pássaros da escola, uma das alunas foi até o
bebedouro e imaginou que a torneira jorrando água poderia ser uma cachoeira. Decidiu
filmar a cena, ensaiando em um diferente tom de voz.
62
Nesse ensaio, "Quedas", vê-se uma torneira jorrando água e ouve-se a
aluna dizer "cachoeira". Essa disjunção entre imagem (torneira pingando) e palavra
(cachoeira) assinala para a multiplicidade dos modos de criar para quantas forem as
possibilidades para as criações ou invenções segundo nossas escolhas pessoais.
Nota-se que, diante da imagem da água jorrando da torneira, a aluna traçou uma linha
de fuga reinventando a imagem e transpondo-a para a imagem de uma cachoeira, o
novo. Feita a escolha de filmar "A cachoeira", outras operações entram em jogo, a
disposição, o ataque. A aluna se esforça para convencer que a água jorrando era de
uma cachoeira. Dispõe a câmera a partir do alto e mostra: "olha, gente", a água caindo
no concreto, o qual constitui a "pedra da cachoeira", tateia a corrente da água que jorra
para expressar a ideia de que era a queda da água gelada de uma cachoeira, joga
folhas que são levadas pela "correnteza" da água e tateia também a pedra onde caem
a água e as folhas. Enfim, a aluna simula ações para criar a imagem de uma cachoeira
conforme sua visão de mundo "cachoeira: água gelada jorrando, levando folhas que
caem sobre as pedras". Quem vê pode se convencer que de fato estaria diante de uma
cachoeira. Ou, que a torneira pingando poderia provocar outras possibilidades,
transformando essas imagens em outras e transportando-se para outros mundos.
O processo de criação também se constitui em um processo de escolhas
de junção e disjunção de situações. No ensaio "Deriva-S", que se constitui de imagens
de alunos em um parque, com sobreposição de mapas, de palavras e de textos rápidos
com o objetivo de provocar estranhamentos e tensão para quem vê, busca-se articular
defeitos para transcender os sentidos e reinventar uma lógica poética e visual. Para a
construção desse ensaio, utilizaram-se hibridismos digitais, com ruídos e desvios da
imagem na imagem, realizando aproximações múltiplas e divergentes. Essa
experiência, que tinha o propósito de capturar imagens de um parque com mapas de
outro local, possibilitou derivas, junção e disjunção de situações produzindo linhas de
fuga para a obtenção do filme-ensaio com imagens deformadas, rasuradas, deslocadas
e descontraídas.
Em outra situação, uma menina queria filmar a aula de Educação Física,
porque para ela essas aulas proporcionavam os momentos mais legais da escola. A
63
particularidade desse episódio foi a intensidade de luz ocasionada pelo sol, uma vez
que a quadra da escola não é coberta.
Nessa experimentação, pode-se constatar o gesto de criação a partir da
perspectiva da construção de um ideal de verdade artística. No ensaio "Brincar",
apresenta-se a cena de uma grande roda com um grupo de crianças correndo em volta
de outro grupo de crianças agachadas. No processo de captura da imagem, as alunas
comentam sobre a claridade da mesma e se a filmagem iria ficar boa, ao que uma
delas diz que achava que sim e que depois ficaria bom. Analisando esse fazer das
alunas, constata-se que a verdade artística para elas adveio da própria obra, ou seja,
do desejo delas de criar a cena do brincar, não se importando se a claridade da cena
incomodaria ou não a quem iria assistir. Isto porque o ato de criar é algo singular,
embora a compreensão do mesmo, por sua vez, deva ser no plural. Cada obra contém
a sua própria verdade, que se concretiza a partir das tramas da sua construção, sendo
este resultado de um processo vivenciado. Sendo assim, a verdade deve ser
relativizada, porque advém de uma criação peculiar e subjetiva. Uma verdade tem
sentido somente para quem a faz. Dessa forma, é algo singular.
Salienta-se também que os gestos de criação acontecem na medida em
que imagens do pensamento são experimentadas para a criação de um desejo. Dessa
forma, não pode-se precisar com absoluta certeza se a ideia original de fato se
concretizará, visto que no decorrer do processo de criação podem ocorrer imprevistos
podendo interferir no resultado final e alterar a ideia inicial.
Para a busca da ação, tentativas com acertos e erros podem ocorrer.
Todavia, cabe salientar que o erro, ao longo de todo o percurso, não pode ser
considerado simplesmente erro, mas pode ser visto como outra possibilidade, como
aconteceu na ocasião em que um dos alunos, incomodado com o lixo jogado no chão
na hora do intervalo, decidiu fazer uma filmagem sobre esse tema. Nesse filme-ensaio,
denominado “Chão”, curiosamente, pode-se constatar que tudo que deu errado foi o
que teve mais valor. A intenção do aluno era filmar o chão sujo, que muito o
incomodava, porém, ao enquadrar o chão, viu que não havia uma imagem em
64
movimento, não havia uma ação no quadro. Assim, pediu à sua equipe de filmagem
que passasse na frente da filmadora com o objetivo de dar um movimento à cena.
O interessante neste ensaio foi a precariedade da cena, visto que esta
não apresenta a perfeição de uma produção, mas o que deveria ser feito. Para quem
assiste o ensaio, os vestígios imperfeitos da busca de um movimento para a imagem
chamam mais a atenção do que a cena propriamente dita. Vê-se no movimento de
dentro a tentativa de fazer outra coisa e, portanto, claramente os vestígios do gesto de
criação.
Outra observação sobre o gesto de criação refere-se ao modo como as
imagens são capturadas pelos alunos. Observa-se que muitas delas reproduziam
cenas com forte influência do estilo de filmes comerciais, veiculados na televisão,
revelando o aprisionamento do imaginário em uma cultura massificadora. Porém, ao
capturar uma imagem, existe a busca do gesto de criação. Pode-se citar a intenção de
se fazer um filme para apresentar na Mostra de Cinema Estudantil, realizada pela
Secretaria Municipal de Educação da cidade de Campinas, cujo tema seria "ações
cidadãs".
Um grupo de meninas decidiu fazer um roteiro baseado no seguinte
conflito: uma menina, deficiente visual, é derrubada por outra que estava com seu
grupo de amigas. Na cena seguinte, quem a derrubou cai e a menina deficiente visual,
mesmo sem ver, tenta ajudá-la. Logo após, percebe-se que se inicia uma amizade. No
final, a menina que escreveu o roteiro, deficiente visual de nascimento, deixa uma
mensagem para que as pessoas ajudem, quando necessário, as pessoas com
deficiência visual. Nesse ensaio, tem-se uma típica história linear (começo, meio e fim),
a dicotomia bem e mal, o bem vencendo e a finalização com uma mensagem sobre
ajudar as pessoas com deficiência visual. No depoimento sobre essa criação, a aluna
Petra, que é deficiente visual, diz: "Infelizmente, existem muitos obstáculos para os que
não veem, por isso precisamos dos olhos de quem vê. Eu fiquei muito feliz em poder
dizer no filme o que não tenho coragem de dizer pessoalmente para as pessoas".
As imagens desse ensaio, bem como outras imagens realizadas durante
a intervenção, fazem parte da cultura visual dos alunos e foi uma experiência única e
65
singular para cada participante da intervenção. Essa experiência, apesar da forte
imitação dos filmes comerciais, explicita que o gesto de criação ocorre também pela
repetição, mas, por ser um ato singular, pode também produzir diferença.
Em relação ao Filme-ensaio "Vi Vendo" o fora do quadro ou o que não foi
filmado enriqueceu o que o foi filmado permitindo um debate sobre as imagens
gravadas e consequentemente estabeleceu uma relação de troca com os integrantes
da ação. Sem a possibilidade de estabelecer uma relação de troca, fica-se aprisionado
em si, não interagindo com o outro. Vale ressaltar que a criação no contexto escolar
são processos de aprendizagens e não somente a busca de um produto final.
Ainda pode-se dizer que o gesto de criação com as imagens não resulta
somente do olhar e gravar a realidade, visto que a câmera é cega. Ao gravar, somos
agenciados pelo ouvir e pelo ver. Nas imagens do filme-ensaio "Quer ver? Escuta",
realizado por uma aluna com deficiência visual, no qual se apresenta uma cena com
árvores ao fundo e, com um giro de câmera, apresenta-se a imagem e o som da água
descendo de um canal de concreto, observa-se que este ensaio foi agenciado
exclusivamente a partir da escuta do som da água, tendo em vista a impossibilidade de
criar a cena pela captura visual da imagem.
Outra situação de que nossos gestos são fruto do agenciamento pelo som
ocorreu no ensaio já comentado "Chão". Nota-se que a fala de quem filma incita os
colegas a entrarem em ação. Sendo assim, afirma-se que a vontade da fala aparece
também como gesto de criação. Salienta-se que o som, vozes e discurso, que
agenciaram o gesto de criação, foram elementos importantes para a intervenção. Para
Pasolini (1990), a análise linguística da palavra resulta de extrema importância
enquanto elemento constituinte dos signos. Segundo este autor, mais que qualquer
outro meio, o cinema é o mais próximo da “língua escrita da realidade”, devido à
interação entre diferentes linguagens, o que garante a máxima continuidade da
realidade. Sendo assim, o cinema deve ser analisado como um sistema complexo de
signos que interagem. Ou seja, expressa uma interação de imagens, cor, sons,
rumores e vozes.
66
Ainda segundo Pasolini (1990, p. 126), “as primeiras lembranças da vida
são lembranças visuais”. Ele afirma que os objetos e os lugares nas suas primeiras
imagens condensavam, em torno de si, um mundo de lembranças que evocam
“discurso das coisas”, e que esse discurso enunciado pelas primeiras imagens é
“essencialmente pedagógico”, visto que elas ensinarão "num discurso inarticulado, fixo
e incontestável " sobre o lugar que se nasce, de onde se vem e a maneira como se
concebe a vida.
Então, o mundo das imagens, está permeado pelos discursos das
pessoas, do espaço e das coisas. Os gestos, bem como os discursos, são situações de
interações que possibilitam que se identifiquem e se compreendam as imagens. Sendo
assim, pode-se dizer que as múltiplas formas de fazer e expressar as imagens educam
o nosso olhar. Segundo Oliveira, as imagens “não só nos dizem de nosso mundo, mas
também nos educam a ler este mundo a partir delas” (2009, p. 20).
Já para Almeida (1994), a inteligibilidade de mundo advém pelas imagens
e, especialmente, pelas imagens e sons criados no cinema e na televisão. Sendo
assim, as interpretações e as experiências subjetivas das imagens evidenciam formas
de agir, de ver, compreender, de estar no mundo.
Analisar os gestos de criação possibilita observar o nascimento das
ideias, a formulação de hipóteses e o desenvolvimento de novas formas de sentir,
pensar, ver e ampliar a própria experiência. Permite descobrir a própria capacidade de
aprender e utilizar as forças criativas que existe em cada um, para abrir o campo da
percepção e o uso das sensações, destacando modos de criar sobre os
acontecimentos, possibilitando que singularidades também se expressem para além do
padrão hegemônico de pensar .
67
7- As práticas exploratórias e suas transversalidades
As práticas exploratórias desenvolvidas partem do pressuposto de que
fazer cinema na escola é um processo que se opera por transversalidades. Para
Guattari (1964), o conceito de transversalidade11 prepara a definição do método
cartográfico em que o trabalho da análise é a um só tempo o de descrever, de intervir e
de criar efeitos-subjetividade.
Para Barros e Passos (2009, p. 27), “operar na transversalidade é
considerar esse plano em que a realidade toda se comunica. [...] A tecedura desse
plano não se faz de maneira só vertical ou horizontal, mas também transversalmente”.
Isto é, a comunicação se dá não apenas nas operações dos dois eixos hegemônicos
de organização do socius (o eixo vertical, em que se organiza a diferença
hierarquicamente, e o eixo horizontal, em que se organizam os iguais de maneira
corporativa). Na operação da organização hegemônica majoritária do socius, ocorre a
forma da conexão entre variáveis menores em oposição às variáveis maiores. Por
outro lado, há outra operação, transversal, que conecta devires minoritários, a
chamada operação transversal. Dessa forma, esses dois modos de operar, majoritário
e minoritário, dentro de um sistema de coordenadas, opera transversalmente e cria a
diferenciação do socius.
Nessa perspectiva, será possível articular os diferentes saberes, incluindo
o científico, o popular, os pessoais e os de preocupação social. Sendo assim,
abandona-se o disjuntivo "ou" e adota-se o conjuntivo "e" nos pensamentos e ações da
intervenção.
Para tal, o plano da experiência com as imagens leva a pensar sobre as
reverberações que estas trazem e possibilita inventar, criar deslocamentos e expandir
11
Guattari (1964), propõe o conceito de transversalidade para problematizar os limites do setting clínico, definindo esse conceito como um aumento dos quanta comunicacionais intra e intergrupos em uma instituição.
68
sentidos. Trata-se de explorar múltiplas possibilidades e fazer disso um conjunto de
práticas que levantem hipóteses sobre o mundo, permitindo tomadas de decisões.
Esse mergulho nas experiências com as imagens permite que
descobertas, criações e invenções sejam incorporadas ao cotidiano do fazer
pedagógico e didático, possibilitando novas práticas pedagógicas.
O cinema toca pelo afeto. Segundo Oliveira (2005) há tensões e
sobressaltos, negações e tédios, vazios de sentidos que também permeiam o estar
diante da tela em que apresentam-se luzes, sombras e cores, as quais chegam como
formas, sentidos e afetos... o espectador é afetado e, por isso o cinema permite olhares
diferenciados e diversificados para as coisas do mundo, possibilita o surgimento de
espaços e tempos para que se possa negar a si mesmo e inspirar novas maneiras de
ver, ouvir e sentir.
Gallo (2000) afirma que educação não deve se limitar à transmissão de
conhecimentos e informações, uma vez que isso não garante um relacionamento pleno
e autêntico com a realidade nem uma postura crítica frente à vida e à sociedade. A
formação do aluno jamais acontecerá pela assimilação de discursos, mas por um
processo micro social em que este é levado a assumir posturas de liberdade, respeito e
responsabilidade, ao mesmo tempo em que percebe estas práticas nas pessoas com
as quais se relaciona.
Ainda segundo Gallo, pode-se apontar a proposta dos filósofos franceses
Gilles Deleuze e Felix Guattari para compreender esse processo. O conceito de rizoma
é apresentado como um tipo de caule que se ramifica formando inúmeras raízes
emaranhadas que se entrelaçam em um conjunto complexo no qual todos os
elementos se remetem uns aos outros e também para fora do próprio conjunto. Esse
conjunto, paradigma rizomático, é regido por seis princípios básicos: princípio de
conexão, de heterogeneidade, de multiplicidade, de ruptura a-significante, de
cartografia, de decalcomania. No paradigma rizomático, pode-se considerar que
existem múltiplas possibilidades de conexões, aproximações, cortes, percepções,
permitindo um trânsito entre os inúmeros campos do saber, ou seja, permitindo
conexões em vários sentidos, sem hierarquizações e sem direção predefinidas.
69
Neste paradigma, conexões possibilitam um exercício do pensamento
com movimentos, paradas, acelerações, recuos e outros movimentos. A intervenção
com o cinema ativou e impregnou a escola, possibilitando transitar por novos jeitos de
ser e estar no mundo. Nessa perspectiva, a aprendizagem também é favorecida pelas
conexões e múltiplas variáveis, na medida em que possibilita que qualquer ponto pode
ser ou estar conectado a qualquer outro, criando novos estímulos e novos arranjos no
ambiente escolar.
Enquanto pesquisa-intervenção, pretendeu-se expressar o desejo de criar
algo diferente para a prática escolar, que alterasse a hierarquia hegemônica,
fundamentada nos eixos vertical e horizontal, fazendo emergir expressões singulares,
pessoais, um mundo heterogêneo operando na transversalidade.
A intervenção está aberta à multiplicidade de visões, por isso a aposta na
potência do plano de experimentação, em que se dará a oportunidade para que todos
se expressem. Tal escolha acontece em um campo preparado e receptivo para as
discussões e à criação, envolvendo alunos pela perspectiva da abertura ao diálogo e
trocas de experiências.
A criação envolve passar por situações que apontam linhas de fuga para
possibilitar novos percursos e devires. Sendo assim, a criação está sujeita a novas
direções, desvios necessários para todo o processo, e, nesse percurso, deve-se
encontrar novas experiências que permitam outras aprendizagens.
O que se quer fazer e como se pode fazer se constrói sem a ideia de uma
diretriz curricular. Sendo assim, prefere-se lidar com a ideia transdisciplinar do
conhecimento, que propicie aprendizagens pautadas por caminhos da criação e da
invenção.
Segue-se em busca de outras formas de olhar e ouvir os alunos no fluxo
de suas experiências de vida, deixando-se afetar pelos encontros produzidos na
escola, permitindo a proliferação de composições, de sentidos e territórios.
Com o propósito de estabelecer um encontro entre a Educação e o
Cinema como Arte na Escola, objetivou-se articular a prática escolar com as práticas
socioculturais do ver, do criar e do inventar filmes. Articulações chamadas de Práticas
70
Exploratórias. Desde o início da pesquisa, foram propostas intervenções que
possibilitassem vivências com a Arte Cinematográfica, baseando-se numa constante
alteração entre o ver, o explorar, o experimentar, o criar, o inventar e o aprender com a
criação cinematográfica. Essas práticas exploratórias propiciaram encontros,
desencontros e desafios para explorar mundo(s).
O plano de experimentação referente à passagem do fazer foi analisado
apontando as propostas de Bergala (2008). Por sua vez, as práticas exploratórias,
objeto de análise neste capítulo, constituem-se em uma intervenção que propôs
colocar os alunos em situações que pudessem pôr em movimento seus pensamentos,
percepções e visões de mundos na intensa busca de experimentar a arte
cinematográfica e, consequentemente, de explorar o mundo. Apesar dos pontos em
comum em relação aos planos de experimentação, o objetivo era entender o
movimento realizado pelos alunos ao experimentarem a arte cinematográfica em seus
desdobramentos.
Para que as práticas exploratórias se realizassem, muitos obstáculos
precisavam ser superados na escola, o que constituía uma constante tensão durante a
pesquisa. Dentre os desafios, um dos principais era ter espaço e tempo que
permitissem a intervenção com filmes. Para tanto, seria preciso conseguir a permissão
da direção escolar para disponibilizar um local, um ateliê para desenvolvimento das
atividades, ou mesmo autorização para utilizar os diferentes espaços da escola, sem
precisar justificar as razões do desenvolvimento das atividades fora do ambiente
habitual da sala de aula.
Além de superar as limitações organizacionais, também era necessário
transpor os lugares comuns arraigados de que os filmes são vistos na escola apenas
para reforçar um conteúdo escolar. Acrescenta-se ainda o desafio de inicialmente criar
imagens sem se utilizar da escrita. Segundo Lévy apud Gallo:
As tecnologias intelectuais desempenham um papel fundamental nos processos cognitivos, mesmo nos mais cotidianos; para perceber isto, basta pensar no lugar ocupado pela escrita nas sociedades desenvolvidas contemporâneas. Estas tecnologias estruturam profundamente nosso uso das faculdades de percepção, de manipulação e de imaginação (LÉVY apud GALLO, 1995, p.228).
71
A escrita tende a dominar as práticas escolares. O conhecimento está
preponderantemente escrito e sua transmissão se faz por seu intermédio.
Tradicionalmente, as disciplinas usam a escrita, mas para trabalhar com a criação
cinematográfica seria necessário libertar-se deste modelo. Ao menos em um primeiro
momento, é necessário pensar através e com as imagens.
Esses desafios agenciam a presença das imagens no ambiente escolar
provocando atritos que permitem operar na transversalidade, um dos objetivos desta
pesquisa-intervenção. Como afirmam Passos e Barros (2009):
[...] A natureza política do método cartográfico diz respeito ao modo como se intervém sobre a operação de organização da realidade a partir dos eixos horizontal e vertical. Grosso modo, podemos dizer que a operação de organização hegemônica / majoritária do socius se dá na forma da conexão entre variáveis menores em oposição às variáveis maiores. Por outro lado, há outra operação, dita operação transversal, que conecta devires minoritários. Esses dois modos de operar (majoritário e minoritário) podem ser pensados a partir da distinção entre um sistema de coordenadas que organizam a realidade segundo um metro-padrão e uma operação de transversalidade que cria a diferenciação do socius (PASSOS e BARROS, 2009, p.28).
Ainda, segundo Passos e Barros (2009), a operação de organização
hegemônica do socius se faz pela oposição entre eixos vertical e horizontal
(coordenadas hegemônicas), realizando um sistema de rebatimento e superposição
das variáveis maiores para a constituição de um metro-padrão que equalize a
realidade. Pode-se fazer o exercício de pensar a escola de Educação Básica segundo
esta sistematização. Na escola, há uma equivalência funcional entre hierarquia,
competição, repetição, pensamento lógico-discursivo, rotina, certezas, nivelamento,
constituindo as variáveis maiores (dispositivos do eixo vertical) que se rebatem umas
sobre as outras, gerando uma existência ideal em oposição à qual se definem
autonomia, colaboração, criação, pensamento intuitivo, eventualidade, o acidental,
constituindo as variáveis menores (dispositivos do eixo horizontal).
Realiza-se assim uma operação que hierarquiza, opondo as diferenças, e
as homogeneíza, seja pela criação de um ideal pelo rebatimento das variáveis maiores
entre si, seja pela identificação e sujeição dos diferentes sobre o ideal (autonomia
submetida à hierarquia, cooperação para aprimorar desempenho em exames
competitivos, delimitação da criação de modelos, pensamento intuitivo restrito à
72
validação da lógica formal). Eventualidades são exceções da rotina, dúvidas são
restritas aos conteúdos, o acidental deve ser evitado pelo nivelamento.
Este exercício permite ver que fragmentos do socius da escola (variáveis)
podem se conectar provocando desarranjos no sistema de organização da realidade.
Neste caso, segundo Passos e Barros (2009) as variáveis menores se tornam um meio
de um devir minoritário dotado de potência de diferenciação.
Os desafios na escola de Educação Básica, a organização espaço-
temporal da escola, a centralidade da escrita (e, por conseguinte, do pensamento
lógico-discursivo) e a imagem subsidiária de conteúdos curriculares constituem-se e
perpetuam-se pela operação de um sistema que cria o quadrante através dos eixos
vertical (variáveis maiores) e horizontal (variáveis menores). As práticas exploratórias
foram tentativas de proporcionar conexões de desarranjos em busca de
"trans"formações, e colocar as imagens em lugar de destaque na aprendizagem
operando de maneira transversal.
73
7. 1 Práticas exploratórias do ver filmes
As práticas do ver referem-se a uma das passagens sugerida por Bergala.
Essa prática inicia-se com a própria história do cinema de esculpir com a luz imagens
em movimento apresentando cinco vídeos da série dos irmãos Lumière, realizados em
1895, com imagens em preto e branco. Depois, foram apresentados três vídeos,
produzidos, atualmente, na mesma perspectiva dos irmãos Lumière, com a câmera
estática.
Durante a mostra da série de imagens dos Lumière, a cada filme
apresentado, os alunos observaram e descreveram oralmente, em detalhes, o que
haviam visto. "Que legal, estavam todos vestidos com roupas de antigamente para as
filmagens", observou Eduardo. "Não, essas eram as roupas que eles usavam mesmo",
contra argumentou José. "Parece que todos os homens tinham bigode" complementou
Roberto. "Volta o filme, eu vi um fantasma nas filmagens", notou Elaine; "Não! era um
homem abrindo a janela mesmo" refutou Jorge. Das descrições relatadas, observa-se
que as mesmas são extremamente minuciosas, denotando a capacidade de percepção
do ver, de comparar, do relacionar, enfim da inter-relação das imagens.
Ver o filme "A chegada de um trem à estação de La Ciotat" permitiu que
eles percebessem que filmar requer pensar as imagens em movimento e a existência
de imagens enquadradas ou que estejam fora do enquadramento. Isto é, perceberam
que o enquadramento escolhido pelo cineasta tinha, além das ações da cena, a
possibilidade de se pensar o que acontecia fora do campo/enquadramento. Para
Sandra, "quem filmou, simplesmente, esperava o trem". Já para Eduardo, "quem filmou
escolheu a melhor posição para gravar a chegada do trem". Por sua vez, para Norma,
"parece que tudo foi pensado antes de gravar". É curioso constatar também que os
alunos perceberam que os enquadramentos precisam ser pensados de forma que
possibilitem ter imagens em movimento, o que mostra a necessidade de se fazer
escolhas que apresentem uma ação. No Filme "The Play", que apresenta três
jogadores em uma mesa de um bar jogando baralho e um garçom, Sandra comenta
74
que "existe o movimento das mãos mexendo nas cartas do baralho e também a ação
da entrada e saída do garçom".
Nas práticas exploratórias do ver, também assiste-se às produções dos
alunos. Nessas práticas, assistiu-se a diferentes imagens do mundo dos alunos: Aulas
de Educação Física, Chão da Escola, Intervalo das Aulas, Cozinha da Escola, dentre
outras. Ao analisar a exibição das imagens, percebe-se que os alunos observaram
atentamente as imagens cinematográficas projetadas na tela. Após a exibição dos
filmes, faziam a decoupage fílmica. Isto é, nesse momento, olhava-se o material
produzido e lhes era solicitado que anotassem as ações e objetos de cada filme. Na
escrita, solicitava-se que escrevessem do jeito mais rápido possível, e, quem quisesse,
poderia assistir novamente aos filmes. Salientava-se que o importante era a percepção
dos detalhes das cenas. Essa prática permitiu que os alunos percebessem que, em
apenas um minuto de filmagem, podia-se ver muita coisa. Eles observavam que cada
plano filmado é um trecho de um filme e compreenderam que existe o primeiro plano e
o segundo plano (ou plano de fundo), a possibilidade da disjunção de imagens e a
quebra do enquadramento central delas.
Nesse movimento de ver e rever as imagens, os alunos notaram que uma
menina da equipe optou por filmar a cozinha da escola, pois queria mostrar para os
colegas o que tem dentro dela, visto que os alunos tem acesso somente ao refeitório e
não podem ultrapassar seus limites. A menina, decidida a filmá-la em seu interior,
pediu permissão para a diretora e para a chefe da cozinha para captar as imagens.
Elas se mostraram espantadas com o pedido, mas com o argumento que se queria
mostrar o que está sempre escondido, concordaram que se realizassem as filmagens.
Ao entrar na cozinha, a aluna mostrou deslumbramento e queria filmar de forma a
mostrar mais de um detalhe. Por isso, pensou em um enquadramento em que fosse
possível ver dois acontecimentos dentro da cena: no primeiro plano, uma merendeira
lavando uma grande panela e, no segundo, outra lavando pratos. Os alunos ficaram
entusiasmados com esse tipo de enquadramento e queriam fazer novas
experimentações de planos e ângulos. Neste movimento, copiar e compartilhar são
variáveis que se combinam (para um - num) gesto criativo, não se pode dizer que um
75
aprende com a experiência do outro, mas pode-se dizer que se aprende na experiência
do outro. A produção de cada aluno constrói um movimento cooperativo, mesmo com a
presença do espírito competitivo que cada um traz de sua experiência social.
Nas práticas exploratórias do ver, assistiu-se também ao filme
documentário "Edifício Master", do cineasta Eduardo Coutinho, que se constitui em
entrevistas com moradores do edifício que dá nome ao filme. Nesse documentário,
cada morador conta um pouco da sua história de vida. Realizou-se, a seguir, uma roda
de conversa sobre o filme e sobre como poderia ser realizado um documentário com
entrevistas na escola. Assim, os alunos entrevistaram a merendeira com o propósito
de conhecer o ponto de vista dela a respeito do funcionamento do refeitório. Apesar
das dificuldades encontradas para elaborar as perguntas e filmar a entrevista, percebe-
se, mesmo de forma simples, os cuidados que os alunos tiveram com a filmagem: a
escolha das perguntas, o posicionamento e desenvoltura da aluna diante da câmera, o
tempo reservado para as respostas da entrevistada, revelando certo preparo para
realização da filmagem. Sendo assim, diferentes aprendizagens podem ser
constatadas como: hipótese sobre uma entrevista no cinema, uso da linguagem em
relação ao contexto e o próprio propósito da entrevista. Experimentando documentar,
os alunos puderam entender o documentário de Eduardo Coutinho, como também,
outra dimensão da arte cinematográfica na escola, a pluralidade de singularidades que
atravessam a produção de uma obra, bem como a suposta objetividade da câmera,
que registra a realidade e pode ser colocada em cheque na experiência de produzir
este “registro”. Verificou-se também, as diversas opiniões de como filmar, o que
perguntar e as formas de interagir com a merendeira, revelando dúvidas sob as
certezas dos alunos sobre o documentar. A isso soma-se a aceitação de que cada um
tem uma concepção diferente sobre uma produção, o que provocou atritos entre os
alunos, justamente pela determinação de que uma obra deveria ser “coletiva”. Porém, é
justamente este atrito que faz emergir o eventual, o acidental e a intuição na rotina de
uma produção previamente planejada.
Ainda nas práticas exploratórias do ver, com o intuito de pensar as
edições das imagens e entender as possibilidades de montagem de um filme, um dos
76
filmes escolhidos foi "Efeito Kuleshov", do cineasta Lev Vladimirovich Kuleshov, que
consiste na edição de vídeo na qual o cineasta apresenta um mesmo rosto
intercalando imagens que mudam o significado que o espectador atribui ao rosto: prato
de sopa, criança dentro de um caixão e, em seguida, uma mulher num sofá. Esperava-
se que os alunos percebessem que a impressão que o espectador tem do rosto,
exibido entre as apresentações dessas três imagens, seja diferente apesar de ser o
mesmo. Kuleshov trabalha com o efeito da montagem na significação que o espectador
constrói para si mesmo. Norma, seduzida pelo efeito da montagem, interpretou que o
rosto do homem apresentado "chorou, riu" conforme a cena. Mas, para Eduardo, "O
rosto do homem não se alterou". A repetição das imagens gera um gesto criativo
através da conversa sobre o filme.
Com o mesmo intuito, foi-lhes apresentado outro curta-metragem, "Ilha
das flores", de Jorge Furtado, cuja edição foi feita a partir de cortes abruptos das
imagens, inserção de efeitos sonoros e visuais que possibilitaram aos alunos entender
outra forma de editar um filme. Para Elaine, "apesar de ter imagens que passam
rapidamente, eu consegui ver o caminho que o tomate percorreu do campo até o lixo".
Assistiu-se, também, à Aula Multimídia - Kdenlive, tutorial para edição do
Software Livre do sistema Linux, como forma de introduzir os alunos no programa de
edição disponível nos computadores das escolas municipais de Campinas. Pedro, ao
ver o tutorial, disse: "parece fácil fazer uma edição, mas fazer uma edição é difícil".
Para Jorge, o vídeo foi bem explicativo e sugeriu: "quando formos fazer a edição,
damos pause no vídeo e fazemos igual". Mas este igual não é igual no sentido da
repetição, pois os modelos estarão a serviço de um gesto criativo mobilizado pelos
desejos de criar uma obra autoral. Diante da tecnologia, a aprendizagem de modelos
com a finalidade de criação serve a um movimento de autonomia e não de obediência.
Salienta-se que pensar o cinema na escola não é propor um único caminho possível,
mas propor que o ato de ver seja estético e político.
Nessa perspectiva estética e política, se configuram práticas do ver que
contemplam o cumprimento da Lei n° 13.006, de autoria do Senador Cristóvão
Buarque, publicada no Diário da União, em 27 de junho de 2014, que cita: "a exibição
77
de filmes de produção nacional constituirá componente curricular complementar
integrado à proposta pedagógica da escola, sendo a sua exibição obrigatória por, no
mínimo, 2 (duas) horas mensais".
Apesar da a Lei 13.006 obrigar a exibição dos filmes brasileiros nas
escolas, pode-se reafirmar a aprendizagem com o cinema não somente na perspectiva
de cumpri-la, mas em uma proposta que permita o movimento de autonomia,
considerando necessário, conforme Teixeira e Soares:
[...] despertá-los para o fascínio de sua magia, combatendo todas as formas de massificação de narrativas, contra todo o colonialismo de qualquer sistema de signos que se procure impor (TEIXEIRA & SOARES, 2003, p.14).
Sendo assim, a abordagem do cinema na escola não fica aprisionada ao
mero cumprimento da lei. A escola pode resistir à submissão passiva do seu fazer
político-pedagógico e criar espaços que favoreçam o aluno a pensar, a debater e a
criar.
7. 2 Práticas exploratórias de enquadramento
As práticas exploratórias de enquadrar iniciaram-se com exercícios de
enquadramento, utilizando-se uma cartolina com um pequeno furo retangular como se
fosse o visor da câmera. Pediu-se para que os alunos enquadrassem algo da sala de
aula. Os exercícios de enquadramento possibilitam a eles perceberem que, mudando a
posição do “visor”, podem olhar um objeto de diferentes formas. Pois, olhar um objeto
torna-se ver um campo visual explicitamente demarcado. Realizaram enquadramentos
em diferentes ângulos: ora sentados, ora em pé, ora em cima da cadeira, ora
agachados no chão, ora de baixo para cima, ora de cima para baixo, entre outros. Essa
prática permitiu-lhes observar, explorar e experimentar diferentes formas de ver a
escola, realizando enquadramentos de objetos que passavam despercebidos na rotina
escolar. Mas, conduzidos por um novo olhar, passam a perceber o que não lhes era
invisível até então.
78
O ver na escola obedece a uma rígida hierarquia que naturaliza o olhar.
Ver é uma ação subjugada ao processo de classificação do que é importante e
adequado para o nível em que cada um está. O olhar é reprimido em sua subjetividade
e o ver, destituído do valor de observação. Explorar imagens enquadradas conecta o
olhar através da câmera, procedimento cinematográfico. Por outro lado, as práticas
científicas de conhecimento realizam uma criação consciente da distância entre o eu e
o mundo exterior.
Enquadramentos.
Fonte: Acervo da pesquisa (2012)
79
7.3 Práticas exploratórias de filmagens
Essa prática iniciou-se como uma experimentação. Num primeiro
momento, os alunos foram contaminados pelo desejo de mexer na câmera e realizar
alguma filmagem. Um deles, então, filmou o colega que abre e fecha uma pesada porta
do laboratório de ciências da escola. Na eventual e acidental proposta dentro do
projeto, filmar envolveu enquadramento de uma imagem em movimento para a
composição de uma cena. Um bom ponto de partida para um trabalho que se preocupa
com as variáveis minoritárias que constituem a equalização da realidade escolar. Pré-
requisitos, ordenamentos lógicos e sequenciados de ensino dizem respeito às variáveis
maiores de nivelamento que agenciam a escola. A questão não é se foi uma boa
escolha ou não começar com esta filmagem, mas se este foi um bom encontro ou não.
Porém, foi um bom encontro.
Após essa experiência, seguiram-se as práticas exploratórias do Minuto
Lumière, durante as quais foram diversas as percepções e os comentários sobre as
filmagens. Durante estas, os alunos perceberam que é preciso experimentar diferentes
ângulos e enquadramentos para realizar as filmagens que haviam imaginado. Alguns
perceberam que suas filmagens estavam muito claras ou que o som não estava
audível. Então, refizeram suas experiências utilizando diferentes formas de usar a luz e
o som durante as filmagens. Hipóteses de filmagem conectam processos mentais e
emocionais de desenvolvimento e aprendizagem. Os estudos de alfabetização e
letramento já se encontram bem avançados em relação à estrita e à leitura. Este
trabalho não tem por objetivo abordar este aspecto, no entanto, vale o registro do
conceito de hipótese para a linguagem do cinema. Inferiu-se, a partir das falas que
acompanham as atividades de gravação dos Minutos Lumière, que os movimentos nos
alunos sugerem a possibilidade de investigações sobre a aprendizagem da percepção
dos sentidos. Será que seria possível falar em hipóteses de visão? E, se isso é válido,
poderiam estender para hipóteses de audição, tato, paladar e olfato? Estas hipóteses
seriam, no atual momento de equalização da realidade escolar, variáveis menores
interessantes a serem exploradas.
80
Essa primeira experiência possibilitou que os alunos realizassem a seguir
filmagens de três planos. Durante essa experimentação, constatou-se a curiosidade e
o interesse deles em descobrir e explorar outras formas de filmar. Por exemplo, no
ensaio “Pássaros”, a aluna Sandra, mostrando-se curiosa, disse: "Eu sempre quis
saber como seria voar como os pássaros. Tá, eu sei, eu não posso voar, mas eu
poderia filmar como um pássaro. Eu gosto muito dos pássaros". Nesse movimento de
experimentar diferentes formas de capturar as imagens, foram realizadas diferentes
experimentações com a câmera na mão e iniciou-se a conversa sobre como editar as
imagens.
Nessa prática, os alunos puderam explorar e experimentar outras
possibilidades de filmar. Para Sandra, "aprendi a gostar de filmar, filmando". Para
Marcelo, "filmar na escola me fez querer filmar embaixo do sol" em uma menção sobre
as ações de intervenção serem desenvolvidas fora da sala de aula. As filmagens
abriram outros caminhos, possibilitando mudanças nas práticas pedagógicas habituais
na escola.
"Chão" " Brincar"
81
"Onde tudo acontece. Nada" "Dois olhares para a cozinha"
"Queda" "Um Amigo"
"Pássaros" " ViVendo"
82
"Um dia de escola" "Deriva S"
"Quer ver? Escuta"
Imagens paralisadas dos filmes-ensaio disponível em http://escolaecinema.blogspot.com.br
Fonte: Acervo da pesquisa (2014)
83
7.4 Práticas exploratórias de ver com olhos fechados
A presença de Petra, a aluna com deficiência visual que voluntariamente
quis fazer parte da intervenção com o cinema, como relatado anteriormente, foi um
encontro que proporcionou a ideia de uma prática exploratória diferente, uma prática
exploratória de ver com os olhos fechados. Os alunos se colocaram no lugar de uma
pessoa cega para explorar os sentidos sem a visão.
A inclusão de alunos deficientes na educação básica está em curso, mas
diversos obstáculos acumulam dificuldades destes em permanecer e desfrutar do que
a escola oferece. Um deles é o pensamento que opõe o normal ao deficiente. Forma
de pensar pré-conceitual. Nesta oposição, os alunos sofrem o agenciamento do
sistema que opera na constituição do metro-padrão que hierarquiza as diferenças e
que promove a identificação e sujeição dos “diferentes” do ideal. O ideal é ver. Ser
cego é ser diferente, por deficiência. Na oposição entre normal e deficiente, a diferença
se afirma como identificação de incapacidade, de "ser escolar inferior". Mas, no âmbito
das variáveis menores, do fazer cinema como arte na escola, ser cego é ser diferente.
Mas, existe o cinema e a fotografia feitos pelos cegos e deficientes. Existem fotografia
e cinema deficientes? O âmbito destas práticas sociais, interesse destes realizadores,
está nas diferenças que eles podem nos trazer e não na deficiência de suas obras. As
práticas de ver com os olhos fechados que traz situações de privação para quem
enxerga têm como objetivo pensar no que a cegueira traz de diferença ou de novo
para os que enxergam e não a identificação dos limites, das dificuldades e da
deficiência.
Na realização da prática de ver com os olhos fechados, o primeiro
momento constitui-se com todos os alunos com vendas nos olhos e, num segundo
momento, um aluno fica com os olhos vendados e o outro passa a guiá-lo. Após
terminar as atividades, as duplas irão inverter os papéis, isto é, quem foi guia passa a
ser guiado.
Realiza-se também outra atividade com vendas nos olhos para ouvir o
poema Elefante, de Carlos Drummond de Andrade, recitado pelo ator Paulo Autran.
84
Após ouvirem o poema, os alunos sentam em duplas e apenas um componente ficou
com a venda nos olhos. Este tinha que responder para o colega a pergunta escrita no
quadro negro: o elefante do poema é mesmo um elefante, ou ele representa uma figura
ou alguma outra coisa? Após responderem, as duplas invertem os papéis. Nesta
atividade a aluna Petra diz: "pensem que o que vocês estão experimentando hoje eu
vivo todos os dias, mas, apesar de não enxergar, eu consigo fazer quase tudo o que
uma pessoa que vê faz".
Petra está agenciada pela operação de hierarquização. Sua preocupação
é se equiparar a quem é normal. Ela afirma ter os mesmo direitos por ser igual aos
“normais”. Seus vídeos, no entanto, revelam um sentimento de autopiedade, pois sua
preocupação é mostrar as dificuldades de que sofre na escola por ser cega. Seu apelo
por uma sociedade mais fraterna não é por ela ser igual, nem diferente, mas por ser
deficiente e injustiçada. Sua manifestação de superioridade e autossuficiência, apesar
de ser cega faz tudo o que os outros podem fazer, nasce da tensão criada quando os
colegas estão “cegos” e manifestam suas dificuldades. É quando ela afirma que vive
isso todos os dias. Talvez não tenha-se conseguido fazer ver a Petra sua dimensão de
ser diferente e não deficiente. Talvez Petra tenha sido mais importante para a
intervenção do que a intervenção para Petra, pois ela trouxe a possibilidade de pensar
a diferença a partir da deficiência.
Após essa primeira experiência, tem-se uma outra na sala de vídeo, onde
um componente da dupla continua com a venda e o outro será o guia do colega que
está com os olhos vendados. É importante lembrar que o guia deveria avisar e também
proteger o colega de riscos com a rampa, com a escada, com buracos ou objetos pelo
chão e avisá-lo onde tem paredes e portas. Na sala de vídeo, todos colocaram as
vendas para assistir Perfeito, a animação em curta-metragem com audiodescrição,
sobre um boneco de madeira tentando criar uma companhia perfeita.
Uma das meninas do grupo disse que no começo achou bem difícil ficar
com a venda nos olhos e que se sentia como se estivesse caindo em um buraco
grande. Mas, logo depois afirmou que se acostumou e ouviu com atenção o filme.
Outra menina disse que tinha ficado com tontura e muito medo, mas que Petra a
85
tranquilizou e ela havia conseguido superá-los, embora não tivesse conseguido prestar
atenção nas falas do filme. Para um dos meninos do grupo, a experiência com a venda
nos olhos possibilitou perceber melhor o som do ambiente e disse que havia
conseguido visualizar o filme na sua cabeça. Porém, quando viu o filme sem a venda,
percebeu que o que havia imaginado era bem diferente do que havia visto e talvez por
isso preferia ficar com o filme que havia imaginado.
Petra contaminou o grupo de alunos ao afirmar sua diferença. Porém, ela
trouxe um modo de filmar diferente para seus colegas, filmar a partir dos sons do
ambiente. Além disso, a prática exploratória permitiu desenvolver experiências motoras
de andar explorando ambientes amplos ou estreitos, pisos lisos ou ásperos, frios ou
quentes, secos ou molhados. Também permitiu o uso do tato e toda a habilidade
auditiva, entre outras possibilidades.
Ações com vendas nos olhos
FONTE: Acervo da pesquisa (2012)
7.5 Práticas exploratórias de roteiro
As primeiras experiências de filmar foram realizadas sem um roteiro de
filmagem. Com a multiplicidade de ideias que surgiam, fez-se necessário a escrita de
roteiros, como maneira de indicar os caminhos das filmagens. Roteiro é uma peça
escrita que quer ser imagem, ou seja, fazem com que as palavras se tornem imagens.
86
Porém, em uma filmagem, acontecimentos de todo tipo levam as capturas das imagens
em diferentes direções. Sendo assim, ressalta-se que, na elaboração de um filme, o
roteiro é um caminho para guiar as ações das filmagens.
Nessa perspectiva, os alunos idealizaram um roteiro dos encontros que
aconteciam ao pé de uma árvore no pátio da escola, para as capturas de imagens
sobre as fofocas, as brigas, os namoros, a pausa para o lanche ou o descanso.
Quando chegaram ao local, nada do previsto aconteceu. Improvisaram um roteiro
subindo na árvore, e percebendo, assim, durante as filmagens a importância do roteiro
como forma de organizar as ideias. Dependendo da situação ele pode ser seguido ou
não. Dessa forma, mesmo sem seguir o planejado, captaram as imagens e concluíram
o filme-ensaio: "Onde tudo acontece. Nada."
7.6 Práticas exploratórias de edição
Essa prática inicia-se com a visualização de filmes e com os alunos
revendo as imagens e discutindo como compô-las para fazer a edição de um filme. Ao
iniciar a edição, percebem que esse momento é de experimentação, visto que existem
diferentes possibilidades de composição. Como se pôde constatar, os alunos
conseguiram perceber que a edição de um filme inicia-se na cabeça, porque imagina-
se as cores, os cortes, o plano-sequência e, parafraseando Tarkovski, cineasta russo,
como esculpir o tempo.
Para a aluna Sandra, fazer a edição foi muito difícil: "eu não conseguia
escolher qual cena incluir, que imagem eu deveria excluir, quando faria o corte da
cena, trabalhar com som e imagem é muito difícil".
Realizar a primeira edição do filme com os alunos foi um grande desafio,
porque, além das dificuldades técnicas para usar o programa de edição do computador
da escola, eles tiveram dificuldade para escolher as cenas que iriam incluir ou excluir
no filme, além das dúvidas sobre qual seria a sequência das imagens. As dificuldades
encontradas na escolha das cenas demonstram a força da equalização da realidade
escolar que cria uma equivalência funcional entre as variáveis maiores gerando a
87
existência de um ideal que homogeneíza as formas de pensar e sentimento pela
identificação e sujeição dos diferentes do ideal. Assim é que a autonomia é submetida
à hierarquia, a cooperação aprimora desempenho em exames competitivos, a criação é
delimitada a modelos, o pensamento intuitivo é restrito à validação da lógica formal,
eventualidades são exceções da rotina, dúvidas são restritas ao conteúdo e o acidental
deve ser evitado pelo nivelamento.
O início do trabalho de edição tem o peso de finalização de um projeto de
produção. Por se tratar de uma operação que envolve escolhas, exige um
amadurecimento da faculdade de discernimento. Viu-se que os alunos encontram
dificuldades em hierarquizar suas preferências (no uso da autonomia), em compartilhar
seus sentimentos (fazer uso da cooperação). O pensamento tem dificuldade em operar
com o acidental e com o eventual e o pensamento intuitivo na sua relação com os
aparelhos tecnológicos no ambiente escolar. Sem o certo e o errado que balizam o
nivelamento, a hierarquia e a rotina, as dúvidas obstruem a ação e a criação.
Todavia, nas edições seguintes, os alunos passaram a dominar com
tranquilidade o programa de edição. Por um lado, editar imagens se trata de uma
prática cultural que, cada vez mais, faz parte da sociedade atual tendo em vista as
facilidades oferecidas pelas novas tecnologias digitais. Por outro lado, os alunos
passaram a editar com mais facilidade devido à possibilidade de desenvolver ações
pedagógicas que operam na transversalidade, o que possibilita o desenvolvimento da
autonomia do aluno, além do interesse despertado nos alunos.
7.7 Outras Práticas As práticas exploratórias foram marcadas pela liberdade de criar e
inventar, dirigindo-se cada vez mais além, permitindo que o ato de filmar mudasse o
foco do olhar e, consequentemente, mudasse o tema das filmagens. Foram-se
impondo outros olhares, fortalecendo ações exploratórias, que saltaram os limites da
escola; foram-se propondo vídeos realizados fora do contexto escolar e vídeos
88
realizados com aparelhos celulares. Ressalta-se que o uso de celular é proibido dentro
escola, de acordo com a Lei municipal Nº 13.954, de 24 de novembro de 2010. É
importante salientar que o uso de dispositivos "proibidos" faz com que os alunos
capturem imagens que provoquem deslocamentos em relação aos modos costumeiros
de se fazer imagens. Esses deslocamentos fazem com que as imagens sejam
"errantes". Porém, pensa-se que a proibição impede a autonomia dos alunos e, com o
objetivo de dar oportunidade à livre captação das imagens, foi solicitado à direção, aos
pais e responsáveis dos alunos autorização para o uso livre do celular durante a
intervenção.
Nesse movimento, foi criado um cenário favorável para adoção efetiva
desse dispositivo móvel nas escolas. Como exemplo, pode-se citar a produção de
imagens feitas pelos alunos durante a pesquisa-intervenção. Como exemplos dessas
situações errantes, os alunos filmaram diferentes cenas, como meninos dançando; uso
do celular, aparelho proibido no contexto escolar; filmagens com situações engraçadas
ou ridículas para si ou para os outros assistirem. Dentre as diferentes cenas filmadas,
duas de performance dos alunos chamaram a atenção dos integrantes da intervenção.
Um foi da dança do "Harlem Shake"12 e, a outra, ao serem vistos pela diretora da
escola, simularam uma demonstração de ordem para sair da sala de aula, onde
estavam. Tais imagens apresentam uma experiência estética, mas também política por
questionar a norma vigente.
Outras experiências se sucederam, nas quais os alunos de forma
autônoma e independe passaram a fazer outras filmagens a partir de seu interesse em
filmar dentro e mesmos fora dos muros da escola. As práticas exploratórias de filmar
na escola "trans"formavam o foco do olhar e, consequentemente, mudavam o tema das
filmagens, impondo outros olhares. A intervenção com o cinema na escola fortaleceu
práticas exploratórias que começavam a saltar os limites da escola.
12
Harlem Shake, hit da Internet que obteve grande número de acessos em Fevereiro de 2013 (Shake em inglês
significa se requebrar).
89
Imagens paralisadas dos vídeos errantes disponível em http://escolaecinema.blogspot.com.br
Fonte: Acervo da pesquisa (2014)
7.8 Para além das práticas exploratórias
Buscas de forma sensível de olhar o fazer-saber e o saber-fazer na
escola, considerando o outro como ponto de partida para a troca de experiências e
ideias. Ninguém é igual a ninguém, cada pessoa é um ser único que se constitui pelas
marcas que imprime nas suas ações, nos seus pensamentos e no seu modo de viver
na relação com o outro. Confronta-se com a parcialidade, com a falta, mas, por outro
90
lado, com a incompletude que resta. Ao invés de mal estar, deixa a alegria das
imagens do outro.
Assim, a cada nova experiência um pouco de cada um e um pouco dos
outros permanece em cada sujeito. Dos encontros realizados nunca se volta da mesma
maneira, porque proporcionaram um movimento novo, como um filme que provoca
experiências de alteridade. Ou seja, como um “outro” que instiga e provoca
experiências ampliando outros olhares. A partir destas aproximações, arriscar
conjuntamente com meninos e meninas uma experiência que não se sabia como fazer,
no entanto, descobriu-se, juntos, que o cinema na escola não requer conhecimentos
prévios, mas o desejo da descoberta.
Nessa descoberta, os verbos transmitir ou ensinar são trocados pelos
verbos impregnar, contagiar, contaminar, possibilitando situações em que o professor
corre os mesmos riscos dos alunos. Assim, inverte‐se a ordem das coisas, pois se
ultrapassa a explicação para um fazer em conjunto.
Assim, sugere-se que se crie um ambiente de autonomia para o aluno
com a intervenção do professor para despertar a percepção da imagem, da luz, do
som, do espaço, como também as percepções dos afetos. Propiciando encontros com
surpresas, incertezas e riscos em uma relação que potencializa o olhar nos olhos do
outro, revelando um mundo para ser descoberto e explorado.
Por mais que se possa realizar as três operações sugeridas por
BERGALA de eleger, dispor e atacar, sempre haverá algo que resiste e que foge a
qualquer lógica, visto que o criar provoca tensão ao explorar-se o novo.
Compreendendo assim que a criação caminha por universos e por isso mesmo
contribui para perceber particularidades e questionamentos.
Assim, diante das diferentes possibilidades de criação, sensibiliza no
filme-ensaio "Quer Ver? Escuta" a cena em meio ao verde das árvores agenciada pelo
som. Nesta cena, quem captura a imagem após alguns segundos procura pelo som da
água descendo para uma lagoa. Parece uma cena como outra qualquer em meio ao
verde, mas o que chama a atenção é a percepção sensorial em detectar os sons,
subtraindo dessas imagens capturadas, além do olhar, outras maneiras de conhecer e
91
explorar o mundo. Para Wunder (2008), as reflexões de um artista no filme "Janela da
Alma" de João Jardim e Walter Carvalho, mostra que: "o visível é um campo bem
menos homogêneo do que habitualmente nos damos conta. [...] Os olhos ouvem e os
ouvidos olham".
Nesse movimento, aprendeu-se a escutar, sensibilizar o ouvido, escutar o
som do ambiente. Experimenta-se que pode-se fechar os olhos e selecionar o que se
vê, mas não consegue-se fechar os ouvidos. Assim, amplia-se a escuta e a vontade de
explorar "novos olhares" sobre o som.
Filmar é como experimentar o mundo, colocando nas capturas das
imagens e sons as experiências vividas, misturando tudo. E, enquanto elas se
misturam, dizem o que ocorre, e às vezes podem anunciar o que ocorrerá. Este saber
fazer não foi ensinado, foi experienciado.
Assim, conquistam-se e criam-se espaços de buscas para novas
indagações e possibilidades. E, a cada encontro, novas descobertas e explorações,
valorizando a criação de cada um com a proposta de também revisitar as imagens
gravadas pelo outro sugerindo que a experiência de alteridade é essencial para
reconhecer a diversidade presente no mundo
93
8- Por um saber-fazer cinema na escola
Uma vez que as imagens têm a vocação de relembrar o que constitui os
sujeitos e que, muitas vezes, ficam esquecidas nos dias que se dissipam, enquanto
imagens agentes, elas chamam e evocam constelações de afetos, despertando novos
territórios dos possíveis. Várias imagens têm essa voz que chama. Muitas destas
imagens ouvem. As imagens que ouvem são aquelas com as quais se conversa e,
através das quais, se redescobre o que longamente já estava em cada um e, muitas
vezes, não tinha nome. Com a escuta, essas imagens ganham cada vez mais espaço.
E, assim, pouco a pouco, aprende-se a ouvir as infinitas vozes do mundo. Como
salienta Petra, "o importante é saber ouvir, não a palavra, mas a voz".
A realização da série de filmes-ensaio, numa ótica de uma educação dos
olhos, dos ouvidos, da escuta das paixões e sensibilidades perceptivas, deu
oportunidade aos alunos de fazerem experiências singulares e múltiplas por meio do
processo de criação com as imagens em movimento. Experiências que lhes
viabilizaram percursos de descobertas e de aprendizagens, possibilitados pelo
mergulho na capacidade de admiração, de espanto e de alumbramento, assim como
na capacidade imaginativa, que gesta e descobre muitos mundos dentro do mundo.
Por isso, João diz, "não achava que dava para aprender assistindo e fazendo filmes.
Mas, mesmo assim, fui ficando, principalmente porque aqui eu posso usar e falar todas
as minhas ideias”. Por sua vez, Marcelo expressa: "Eu quero filmar os pássaros porque
eu amo os pássaros".
Todavia, a mentalidade predominantemente mecanicista e cientificista, na
qual se pauta fundamentalmente a escola, reduz o território em que se contemplam as
imagens e ouvem-se as infinitas vozes do mundo. As imagens na escola são somente
informação, ilustração, representação de um conteúdo didático. Um olhar sensível, tal
como o expresso na fala de Marcelo, que mostra que a realidade não se reduz aos
momentos em que a história se amesquinha. É possível, nesta proposta, contrapor-se
a uma educação que instrumentaliza o conhecimento e, por consequência, à existência
94
desse tipo de educação que impondo as lógicas do poder e do capital, não possibilita a
diversidade das singularidades.
O olhar sensível valoriza, portanto, mais o afeto do que o raciocínio
lógico-discursivo; mais a imaginação que as informações; mais a intimidade dos vários
mundos existentes em cada um, do que a utilidade e a funcionalidade do sujeito; mais
a centelha intuitiva, do que a produção técnica.
Foi com esse olhar que a pesquisa-intervenção se deu na escola. Como
demonstrado na análise nos gestos de criação, bem como na análise das práticas
exploratórias, vários foram os percursos traçados por nossos alunos criadores para
conduzir um olhar sensível nos seus filmes. Como se constatou, nas ações de
observar, explorar, interagir, analisar, entre outras manifestações do pensar que foram
experimentadas para a composição das imagens.
Além de permitir a busca pelo olhar sensível, a intervenção do cinema
como arte na escola envolveu ações que possibilitaram aprendizagens, criando um
território aberto para a elaboração de questões sobre estar no mundo, que propiciaram
um estado de variação contínua, para criar novos tempos e espaços que favoreceram
as múltiplas dimensões do aprender.
“Em geral, as aprendizagens variam em intensidade afetiva, importância, valorização social, transcendência. Aprendemos com os outros, experiências sociais, fundamentalmente naquelas mais intensas afetivamente... Porém, é necessário e não menos importante desaprender conceitos, significados, atitudes, valores historicamente apropriados, às vezes nem totalmente conscientes... O sentido aqui sugerido não é o de borrar ou apagar, mas perceber sua marca e as pegadas que deixou, no tempo e no espaço da nossa história de vida e reaprender síntese pessoal, produto de aprendizagens e desaprendizagens" (FRESQUET, 2007,p.51).
Para Miranda, aprender é situar-se na realidade e no mundo para
continuar a aventura em busca do conhecimento e da participação social (MIRANDA,
1996, p. 63). A aprendizagem, para Kastrup é um conceito que:
[...] não é aquele que aborda o mundo por meio de hábitos cristalizados, mas o que consegue permanecer sempre em processo de aprendizagem. O processo de aprendizagem permanente pode, então, igualmente, ser dito de desaprendizagem permanente. Em sentido último, aprender é experimentar incessantemente, é fugir ao controle da representação. É também, nesse mesmo sentido, impedir que a aprendizagem forme hábitos cristalizados (KASTRUP, 1999, p. 151).
95
Assim, nas práticas experimentadas, tentou-se buscar também um
aprendizado que não terminasse na aquisição de um saber, mas se constituísse em
um processo a ser incessantemente recomeçado. Objetivou-se um aprender que
permitisse liberar todo pensamento das regras, das ideias prontas e das
representações. Tanto que a aluna Susana conclui: “aqui eu posso colocar em ação a
minha imaginação”.
Nessa perspectiva, não se aprende sem começar a desaprender de si
mesmo e dos preconceitos anteriores. Ou seja, é preciso aprender a “se abrir às
multiplicidades que nos atravessam”; entregar-se às forças que nos atravessam;
aumentar a potência de ser e de agir. Aprender não é reproduzir, mas criar e inventar o
que ainda não existe. Sendo assim, o aprender é a constante formulação da criação ou
da invenção.
Para Gallo (2003), o processo educativo seria necessariamente singular,
voltado para a formação de uma subjetividade autônoma, completamente distinta
daquela resultante do processo de subjetivação de massa que hoje vê-se como
resultante das diferentes pedagogias em exercício. Sendo assim, um ambiente de
ideias e práticas plurais, como pretendeu essa pesquisa, não poderia ser realizado
com o controle da educação pelo Estado. Surge a necessidade de operar na
transversalidade. Viu-se que neste movimento a aprendizagem assumiria uma
dimensão cada vez menos hierarquizada, possibilitando a autonomia do aluno e a sua
efetiva participação, uma vez que permite uma prática do saber-pensar coadunada
com o saber-fazer, que catalisa o ato de sair da condição de espectadores para serem
autores das imagens, permitindo-lhes participarem ativamente da sua criação.
Nessa abordagem, o aluno pôde manifestar e expressar suas ideias e
pensamentos. Possibilitou-se pensar localmente, mas, ao mesmo tempo, estabelecer
vínculos entre temas locais e globais. Aprender a lidar com contradições: "ser e não
ser", "é e não é". Perceber que os opostos se completam e podem criar novos
sentidos. Seguir em busca de outras possibilidades para olhar e ouvir os fluxos das
experiências de vida, deixando-se afetar pelos encontros produzidos na escola. Nota-
se que, quanto maiores foram as possibilidades de encontros e de interações, maiores
96
foram as formas de adquirir um novo olhar sobre si e sobre o mundo, e maiores as de
seguir seus próprios caminhos, tornando a experiência mais atraente e mais
interessante.
Pode-se também falar que a intervenção propiciou o acesso aos alunos
da escola pública, que por falta de oportunidade ou hábito, não conhecem ou não
frequentam o cinema, a ampliação de oportunidades dos tempos e espaços dentro da
escola e a valorização das interações possíveis no contexto escolar. As dinâmicas
apontaram para a necessidade de se pensar e agir de modo desconectado da lógica
individualista, geralmente imposta, e a pensar e agir em equipe. Por sua vez, as ações
desenvolvidas não podem ser entendidas como uma forma de se efetivar mudanças
apontando direções, visto que, valendo-se da transversalidade, da transcendência, da
transgressão, da transmutação, do transbordar e de outras ideias e pensamentos
transitórios, agem contra a ordem de uma única e absoluta verdade.
Desde o início da intervenção, esperava-se que as ações desenvolvidas
fossem "trans”formadoras para todos os envolvidos. Para que isso ocorresse, realiza-
se atividades que possibilitaram que, durante o processo de criação, houvesse a
alternância de vozes dos participantes e que os encontros com a arte cinematográfica
propiciassem uma forma de experimentar cada passo do processo de produção de um
filme: fotografar, filmar, trabalhar em equipe, roteirizar, editar, preparando o aluno para
ser autônomo em um mundo cuja existência seja mais digna, mais irmanada e criadora
com – o som dos pássaros, a luz no chão, a fresta na janela, o tato na pedra, o cheiro
das flores, o jorrar da água, o encontro com o amigo.
Embrenhar-se pelo território das imagens e sons para criar imagens em
movimento, sons, enquadramentos e tantas outras possibilidades de criação .
Este criar, porém, foi marcado por expectativas frustradas, e muitas
dúvidas. O ser professor era cometer erros e alguns acertos. Questionar-se. Não obter
respostas. Conheceu-se o silêncio e o estar só. O conflito e a crise se instalam.
Ansiava-se partilhar. Nessa busca encontram-se outros. E, ao trocar experiências, foi-
se entendendo que poderia trabalhar em conjunto para compor novos horizontes e
97
outras formas de dizer, mas sabendo-se também a hora certa de silenciar e escutar o
outro.
O criar e o filmar necessitam do outro, daquele que possibilita
desvencilhar das formas habituais questionando o vivido. Necessita do outro para
enfrentar os problemas com mais disposição, não existindo acontecimento negativo
que consiga derrubar essa intenção. Somente o outro será capaz de remeter a uma
nova maneira de capturar imagens que atravessaram vidas. Remete-se ao pressuposto
de quanto o outro foi essencial, e quanto essa relação foi importante para a criação.
Sendo assim, a realização de um filme não resulta de um trabalho
isolado, mas, sim da partilha dos conhecimentos de cada um, percebendo-se as
experiências e entendendo-se que, individualmente ou em equipe, têm-se diferentes
olhares.
Olhares relacionados com desejos, intenções e conflitos humanos. Deste
modo, permite-se discutir a alteridade tendo como cerne as trocas de experiências com
os integrantes do grupo, pensando e propondo temas, tendo como embasamento as
realidades experienciadas. Encontra-se o sentir e os sentidos seus e dos outros:
ouvindo e pontuando, juntando as imagens e o som, visualiza-se a forma do filme.
Surge uma imagem outra e dentro dela outras diferentes formas de cada um se
expressar.
Juntando as imagens, compondo o outro na captura das imagens. na
tentativa de não se limitar pelas dúvidas e frustrações. Contribui-se para reconhecer o
outro e não deixar-se interferir por ideias preconcebidas. Assim, contribuiu-se para se
ter um olhar e uma escuta sensível, delineando possibilidades de se fazer cinema na
escola.
99
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FILMOGRAFIA
A la Veneza - Georgina R.M. Contreras (2007)
Arrival in Aix-les-Bains - Auguste e Louis Lumière (1895)
Arrival of a train at La Ciotat - Auguste e Louis Lumière (1895)
Aula multimídia sobre Kdenlive: o editor de vídeo do Linux (2010)
Efeito Kuleshov - Lev Kuleshov (1920)
Edifício Master - Eduardo Coutinho (2002)
Ilha das Flores - Jorge Furtado (1989)
La sortie de la Usine - Auguste e Louis Lumière (1895)
Le jardiner - Auguste e Louis Lumière (1895)
Perfeito - Maurício Bartok (2009)
O encontro (2010)
The Play - Auguste e Louis Lumière (1895)
Un Esercizio di Stile - Davide Pannullo (2008)
Vacaciones - Festival de cine de Bolsillo (2009)
SITES:
http://www.cinead.org
http://escolaecinema.blogspot.com.br
http://www.futura.org.br/
http://www.geoimagens.net
http://redekino.com.br
https://www.youtube.com/user/cinepublicobrasil
105
ANEXO I
Autorização para uso da imagem e som da voz Eu, abaixo assinado, autorizo o uso da imagem, som da voz, de meu(a) filho(a), além
de qualquer material entre fotos e documentos por ele(a) apresentados, para serem utilizadas
pela EMEF xxxxxxxxxxxxxxxxx , Rua xxxxxxxxxxxx, n.º xx, xxxxxxxxxxx , CEP xxxxx-xxx,
Campinas, para uso exclusivo de divulgação científica dos trabalhos escolares e/ou para
formação de acervo histórico da escola.
A presente autorização abrange os usos acima indicados tanto em mídia impressa
(livros, catálogos, revista, jornal, entre outros) como também em mídia eletrônica (filmes para
televisão aberta e/ou fechada, internet, DVD, cinema, documentários para cinema, televisão e
outros espaços de exibição, programas para rádio, podcast entre outros).
Por esta ser a expressão da minha vontade declaro que autorizo o uso acima descrito
sem que nada haja a ser reclamado a título de direitos conexos a estas imagens ou som de
voz, ou a qualquer outro, e assino a presente autorização.
Nome do responsável por extenso:
_____________________________________________________________________
Nome do aluno por extenso
_____________________________________________________________________
Assinatura:
_____________________________________________________________________
Campinas, ____ de ________________ de ________
107
ANEXO II
Lista de Filmes vistos durante a pesquisa-intervenção.
Acidente - Cao Guimarães e Pablo Lobato (2002)
A gente é para o que nasce - Roberto Berliner (2004)
A la Veneza - Georgina R.M. Contreras (2007)
Arrival in Aix-les-Bains - Auguste e Louis Lumière (1895)
Arrival of a train at la Ciotat - Auguste e Louis Lumière (1895)
As cores das flores - Vídeo promocional da ONCE (2010)
Aula multimídia sobre Kdenlive: o editor de vídeo do Linux (2010)
Edifício Master - Eduardo Coutinho (2002)
Efeito Kuleshov - Lev Kuleshov (1920)
Estamira - Marcos Prata (2007)
Ilha das Flores - Jorge Furtado (1989)
Janela da Alma - João Jardim, Walter Carvalho (2001)
Jogo de Cena - Eduardo Coutinho (2007)
La sortie de la Usine - Auguste e Louis Lumière (1895)
Le jardiner - Auguste e Louis Lumière (1895)
No estranho planeta dos seres audiovisuais - Paulo Caruso e Theodoro Poppovik (2008)
O Encontro - Flávio Carnielli (2010)
O homem com a câmera - Dziga Vertov (1929)
O Homem do futuro - Cláudio Torres (2011)
O sanduíche - Jorge Furtado (1999)
Perfeito - Maurício Bartok (2009)
Sonhos - Akira Kurosawa (1990)
The Play - Auguste e Louis Lumière (1895)
Un Esercizio di Stile - Davide Pannullo (2008)
Vacaciones - Festival de cine de Bolsillo (2009)
109
ANEXO III
Encontros na escola Prof. Vicente Ráo - 2010
1º Experimentações com a câmera digital.
2º Assim começou o cinema: Apresentação dos Vídeos Minuto Lumière. Descrição oral das cenas.
3º Experimentar capturar um minuto com a câmera parada.
4º Ver e descrever as cenas capturadas.
5º Filme: O sanduíche de Jorge Furtado. Debate.
6º Experimentar com as imagens em movimento.
7º Apresentação da imagens capturadas. Debate.
8º Filmagens da cozinha da escola.
9º Experimentando diferentes planos e ângulos com câmera digital.
10º Decoupage fílmica. Descrição das cenas.
11º Analisar 1º plano e depois 2º plano das filmagens.
12º Escrita do roteiro para a entrevista com as merendeiras.
13º Filmagem entrevista com as merendeiras.
14º Edição das imagens.
15º Filme: Edifício Máster de Eduardo Coutinho.
16º Refilmagem entrevista com as merendeiras.
17º Decoupage fílmica. Descrição das cenas.
18º
Trechos do filme: Sonhos - O jardim das
pessegueiras de Akira Kurosawa. Roda de
conversa.
19º Visita ao Bosque dos Jequitibás. Filmagens.
20º Ver as filmagens realizadas no Bosque. Árvores, pássaros, animais, calçada, rua, bicicleta, pessoas. Debate.
21º Filmagens das árvores e pássaros em diferentes ângulos.
22º Possibilidades de filmagens de árvores e pássaros; pássaros e o céu;pássaros e a terra.
23º Revendo as filmagens.
24º Palavras cantadas: Mil pássaros pelo céu de Ruth Rocha.
25º Desenhos e histórias de pássaros.
26º Filmagens com os pássaros.
27º Assistir: Aula multimídia sobre Kdenlive. ntativa de editar as imagens.
28º Edição.
29º Edição.
30º Apresentação do filme-ensaio "Pássaros" .
Encontros na escola Prof. Vicente Ráo - 2011
1º Trechos do filme: Sonhos-Corvos de Akira
Kurosawa. Debate.
2º Experimentando com a câmera digital.
3º Encontro com Flávio Carnielli. Debate.
4º Experimentacoes cinematográficas com Carnielli.
5º Filme: Estamira de Marcos Prata. Debate.
6º Filmar uma ação cidadã.
7º Debate sobre possíveis temas de filmagens.
8º Filmagens.
9º Reunião direção e pais de alunos as intervenções com o cinema na escola.
10º Conversa com Andarilho sobre as possibilidade de realizar um documentário.
11º Elaboração de roteiro e perguntas para a visita ao Andarilho na antiga estação do VLT.
12º Ida ao VLT e roda de conversa sobre viver na rua.
13º Elaborando roteiro de filmagens.
14º Ida ao VLT. Repensando roteiro de filmagem.
15º Ver: Ilha das Flores de Jorge Furtado. Debate.
16º Conversa sobre possíveis filmagens.
17º Ida ao VLT para encontrar para filmar e fotografar.
18º Conversa sobre as possíveis filmagens.
19º Escrever um roteiro de filmagem sobre o Andarilho.
20º Busca de fotos e reportagens sobre moradores de rua.
21º Gravação do áudio para o ensaio Andarilho.
22º Edição da imagem e som.
23º Ver o Filme-ensaio Andarilho e roda de conversa.
24º Assistir ao Episódio 1 - Verdade. No Estranho Planeta dos Seres Audiovisuais de Paulo Caruso, Theodoro Poppovik. Roda de conversa.
25º Visita ao MIS para Mostra de Filmes.
26º Experimentacoes com a câmera digital.
27º Experimentacoes de filmagens com máquina fotográfica e celular.
28º Vendo as imagens gravadas.
29º Ensaio fotográfico do grupo de cinema.
30º Reunião com os pais ou responsáveis sobre a intervenção com o cinema.
110
Encontros na escola Carmelina de Castro Rinco - 2012
1º Experimentações com a câmera digital.
2º Assim começou o cinema: Apresentação da série Minuto Lumière. Descrição das cenas.
3º Experimentações com a câmera parada por um minuto. Explorando as imagens e os sons da escola.
4º Assistindo as imagens gravadas. Descrição das cenas e roda de conversa.
5º Conversa sobre as propostas de filmagens
6º Atividade com venda nos olhos e roda de conversa.
7º Experimentando filmar agenciados pelo som. Selecionando sons e enquadrando o som.
8º Assistir as imagens. Decoupage fílmica. Descrição das cenas.
9º Observando 1º plano, 2º plano, os ângulos de filmagens e o som.
10º Filme: As cores das flores e roda de conversa.
11º Filmagens.
12º Escrita do roteiro.
13º Filmagens do filme-ensaio ViVendo.
14º Vendo as cenas gravada.
15º Conversa sobre um mundo mais solidário.
16º Pensando a edição. Assistimos o Efeito Kuleshov e Ilha das Flores de Jorge Furtado.
17º Ver: Aula multimídia sobre Kdenlive de José Antônio Klaes Roig. Tentativa de edição.
18º Experimentando o editor de vídeo Kdenlive.
19º Assistir ViVendo.
20º Assistir ao Episódio 1- Verdade. No Estranho Planeta dos Seres Audiovisuais de Paulo Caruso e Theodoro Poppovik. Debate.
21º Cenas do filme: A pessoa é para o que nasce de Roberto Berliner.
22º Trechos do filme: Acidente de Cao Guimarães e planejamento de filmagens.
23º Encontro com Caio Gusmão.
24º Filmagens no Parque das Águas.
25º Edição das imagens do Parque das Águas.
26º Encontro com Caio Gusmão. Derivas. Debate.
27º Filme-ensaio Quer ver? Escuta. Debate.
28º Ida ao MIS para a Mostra de cinema estudantil.
29º Filme: O homem com a câmera de Dziga Vertov. Debate.
30º Roda de conversa sobre a continuidade da intervenção com o cinema na escola
Encontros na escola Carmelina de Castro Rinco - 2013
1º Trecho do filme: Sonhos - Corvo de Akira
Kurosawa e roda de conversa.
2º Roda de conversa sobre possibilidades de filmagens.
3º Roteiro de filmagem e escrita coletiva do roteiro de filmagem.
4º Filmagens de cantar na escola.
5º Filmagens com olhos de cão, gato, morcego, passarinho.
6º Filmagens um dia de escola azul.
7º Edição das imagens.
8º Assistindo. Roda de conversa.
9º Filme: Janela da Alma de João Jardim e Walter Carvalho e roda de Conversa.
10º Filmagens.
11º Filmagens com três planos.
12º Edição das filmagens.
13º Edição de filmagens.
14º Vendo as imagens e roda de conversa.
15º Trechos do filme: Sonhos - O jardim das pessegueiras de Akira Kurosawa e roda de conversa.
16º Proposta de filmagens: Filmar como pássaro, como um robô, como um gato.
17º Filmagens.
18º Edição.
19º Assistir e Roda de conversa.
20º Filme: O Homem do futuro de Cláudio Torres
21º Encontro com a fotografia no MIS.
22º Conversa sobre a oficina de fotografia.
23º Montando painel no pátio da escola com as fotos realizadas no MIS.
24º Vídeos errantes realizados na escola e roda de conversa.
25º Vídeos errantes realizados fora da escola e roda de conversa.
26º Filme: O Sanduíche de Jorge Furtado e roda de conversa.
27º Organização das imagens realizadas na escola.
28º Conversa sobre possibilidades de filmagens.
29º Ida ao MIS para a Mostra de cinema Estudantil.
30º Trecho do filme: Sonhos - O vilarejo dos moinhos Akira Kurosawa. Debate.
111
Encontros na escola Carmelina de Castro
Rinco - 2014
1º
Assistir ao Episódio 2 - Realidade. No Estranho
Planeta dos Seres Audiovisuais de Paulo Caruso e
Theodoro Poppovik. Roda de conversa
2º Conversa sobre imagens capturadas na intervenção
3º Vendo filmes-ensaio "Chão" e descrição das cenas
4º Vendo filmes-ensaio "Brincadeira" e descrição das
cenas
5º Vendo filmes-ensaio "Onde tudo acontece.Nada." e
descrição das cenas
6º Vendo filmes-ensaio "Dois Olhares para a cozinha" e
descrição das cenas
7º Vendo filme-ensaio "Quedas" e descrição das cenas
8º Vendo filme-ensaio "Amigo" e descrição das cenas
9º Vendo filme-ensaio "Quer ver?Escuta" e "ViVendo"
e descrição das cenas
10º Visita a exposição “Um Museu Feito para Nós, por
Nós” no MIS.
11º Vendo "Um dia de escola" e descrição das cenas
12º Vendo "Deriva-S" e descrição das cenas
13º Revendo as fotografias da intervenção
14º Vendo vídeos errantes e descrevendo as cenas
15º Vendo vídeos errantes realizados fora da escola e
descrição das cenas.
16º Organização das imagens realizadas
17º Conversa sobre disponibilizar as imagens na internet
18º Criação do Blog
19º Inserção dos filmes-ensaio no you tube e blog
20º Apresentação do blog. Roda de conversa
21º
Assistir ao Episódio 5 - Experimentais . No Estranho
Planeta dos Seres Audiovisuais, série de
televisão brasileira de Paulo Caruso e Theodoro
Poppovik. Roda de conversa
22º
Assistir ao Episódio 12 - Sonoro. No Estranho
Planeta dos Seres Audiovisuais de Paulo Caruso e
Theodoro Poppovik. Debate.
23º Vendo trechos do filme Jogo de Cena de Eduardo
Coutinho.
24º Ida ao MIS assistir a Mostra Luta
25º Ensaio fotográfico do grupo de alunos que
participaram da pesquisa- intervenção
26º Edição das fotos
27º Montagem do painel de fotos
28º Apresentação da pesquisa para o grupo de alunos
29º Reunião com os pais ou responsáveis dos alunos que
participam da intervenção
30º Confraternização
113
ANEXO IV
Decoupage dos filmes-ensaio 1 "Chão"
Imagens Dispositivo Áudio
Pedaço do chão com folhas, garrafa jogadas. Meninos passando. Galhos e pedras caindo.
Filmadora Som ambiente. Burburinho de crianças. - Não ficaria bom...? - Será que alguém vai passar aqui? - Eu. - Passa lá Tiago. Passa lá... alguém, por favor passa lá... Tiago. Risadas.
2 "Brincar"
Imagens Dispositivo Áudio
Quadra de esporte. Uma grande roda de crianças. Um grupo agachado e outro grupo correndo em volta da roda.
Filmadora Burburinho de crianças ao fundo. - Deixa quieto, não mexe. -Acho que vai dar o tempo. -Tá o maior claro - Não, depois fica bom. É por causa ... da configuração. - Um minuto é 60, né? - É.
3 "Onde tudo acontece. Nada"
Imagens Dispositivo Áudio
Dois meninos subindo em uma árvore.
Filmadora Burburinho ao fundo.
4 "Dois olhares para a cozinha"
Imagens Dispositivo Áudio
Primeiro plano Mulher lavando uma panela grande. Segundo plano Mulher lavando pratos.
Filmadora Som ambiente de água jorrando da torneira. Ruído de panelas batendo. Burburinho de crianças.
5 "Quedas"
Imagens Dispositivo Áudio
Máquina fotográfica
Cachoeira. Gente fina. Pele bem lisinha. Agora deixa eu ir.
6 "Um amigo"
Imagens Dispositivo Áudio
Tela preta. Imagem da plataforma da antiga estação do VLT- Veiculo sobre Trilhos. Escrita sobre reportagem do Correio Popular.
Filmadora Som ambiente. Burburinho. - Viu o Andarilho que esta sempre aqui perto da escola pegando latinha? - Eu vi mês passado. - Eu vi semana passada. - E você, quando viu ele? - Você lembra dele? - Não.
114
- Alguém mais viu? (Todos respondem). - Não. Não. Não. não. - Hoje estamos aqui para procurar nosso amigo. Estamos preocupados, porque faz duas semanas que você não vem na escola pegar para pegar as latinhas que a gente separou para você vender. A gente já olhou por tudo e não conseguimos te encontrar. Olhamos até embaixo da plataforma, onde você disse que dorme, que descansa, que pensa na vida, mas não encontramos você. Esperamos que você esteja bem...
7 "Pássaros".
Imagens Dispositivo Áudio
Máquina
fotográfica
Palavras cantadas de Ruth Rocha
8 "ViVendo"
Imagens Dispositivo Áudio
Quadra da ESCOLA Filmadora Som ambiente.
- Olha lá, vou derrubar.
- Ai! Nossa, você quer ajuda?
- Sim obrigada.
Mensagem: Quando você vir um deficiente visual na
rua. Ajude-o. Nos precisamos de vocês.
9 " Um dia de Escola"
Imagens Dispositivo Áudio
Corredor da entrada das salas de
aulas.
Máquina
fotográfica
Som ambiente.
10 "Deriva -S"
Imagens Dispositivo Áudio
Parque das Águas. Máquina
fotográfica
Som ambiente. Barulho do vento. Burburinho.
- Porque ela deu um mapa diferente da gente? Era
para gente imaginar.
- Vamos fugir...
11 "Ensaio.Quer ver? Escuta"
Imagens Dispositivo Áudio
Visão do alto de árvores.
Embaixo visão de um pequeno
córrego. Água descendo. lagoa.
Uma menina desligando uma
maquina fotográfica.
Máquina
fotográfica
Som ambiente. Barulho do vento batendo nas folhas
das arvores. Uma bengala batendo na madeira. Água
descendo o canal da lagoa. Vozes ao fundo.
115
ANEXO V
117
ANEXO VI
119
ANEXO VII
121
ANEXO VIII
123
ANEXO IX
124
125
126
127
128
129
130
131
132
133
134
135
136