SInPeMI Simpósio Internacional de Pesquisa em Museologia
Programa de Pós-Graduação Interunidadesem Museologia da Universidade de São Paulo
Curso de SociomuseologiaMário Moutinho
2013
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Nueva museologia de ayer, sociomuseologia hoy: de los procesos históricos a las
tendencias actuales
RdM. Revista de Museología: Publicación científica al servicio de la comunidad museológica, ISSN 1134-0576, Nº. 53, 2012 (Ejemplar dedicado a: Sociomuseología) , págs. 30-34
Mario Moutinho1
Quando a ideia de Nova Museologia ganhou relevância no fim da década de 70,
o contexto museológico de uma forma geral era caracterizado pelo lugar central que
ocupavam as grandes instituições, de impacto nacional e mesmo internacional,
geralmente localizadas nas capitais de cada país. Destas instituições emanava um
sentido de referência que definia os limites e lugar daquilo que deveria ser um Museu.
Tratava-se de instituições de grandes colecções onde o saber das técnicas
museológicas e das disciplinas de cada especialidade, em particular no domínio da
história da arte da arqueologia ou da etnografia, representavam o saber museológico que
se revelava como consolidado servindo ao mesmo tempo de padrão.
Quando tomaram forma outras realidades museológicas que não se reconheciam
no modelo estabelecido, ficou progressivamente evidente que este não dava conta nem
respondia às problemáticas que de forma mais ou menos consistente, um número
crescente de museus objectivamente colocava.
Geralmente tratava-se de pequenas instituições, fora das grandes cidades, que
revelavam uma articulação consciente com o meio que as envolvia ou que eram na
verdade iniciativas locais que reconheciam a museologia como uma forma e meio de
expressarem a sua compreensão dos valores da memória, do património e do
desenvolvimento local.
E dessa articulação nascia uma consciência mais clara das realidades locais, as
quais a museologia estabelecida olhava desconfiada.
Provavelmente não tanto pela própria natureza dessa nova forma de entender a
museologia mas pelo desarranjo que provocava na ordem estabelecida. Como no caso
1 Mário Moutinho é professor de Museologia, membro fundador e foi Presidente do MINOM-ICOM 2007-2011. Coordenador até 2007 do Mestrado e do Doutoramento em Museologia na Universidade Lusófona. Tem publicações na área da Sociomuseologia. É Reitor da Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias de Lisboa.
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da recusa do ICOFOM na 14 ª Conferencia de Londres do ICOM em 1983, reconhecer a
existência no seu seio de um agrupamento de ecomuseus2. Esta possibilidade implicaria
o reconhecimento não desejado dos ecomuseus, como parceiros em situação de
igualdade coma a museologia estabelecida.
E no entanto, nessa altura, já era uma realidade consolidada a existência de
instituições museológicas que se orientavam por outros padrões. São disso exemplo os
museus de vizinhança essencialmente vocacionados para a animação de bairros urbanos
hispanófonos e negros das grandes cidades norte americanas, onde era dada uma
particular importância aos problemas do urbanismo, da identidade dos moradores e do
seu bem-estar, preocupando-se com as questões de poluição, alojamento, reabilitação
social e criação artística.
Também a renovação da museologia mexicana em certa medida próxima dos
museus de vizinhança, no âmbito do projecto Casa del Museo, onde os objectivos se
expressavam pela animação e discussão sobre questões da vida quotidiana, com uma
forte implicação popular.
Na Suécia, as exposições populares organizadas com o apoio ou por iniciativa da
Riksutstälningar onde a museografia particularmente cuidada, utilizando materiais
simples é simultânea dos trabalhos de Sven Lindquist sobre a memória operária,
renovaram o interesse pela criação e remodelação de museus de empresa e dos círculos
de estudo e de um modo mais vasto, provocavam um olhar novo sobre a sociedade
sueca
Os museus de arqueologia industrial que no Reino Unido se embasavam na
capacidade das populações de se apropriarem dos métodos da arqueologia e da história
local, organizando a restauração de espaços industriais e assegurando a sua animação e
acolhimento turístico.
Os ecomuseus por seu lado, invocando-se especialmente do pensamento e acção
de Georges Henri Rivière e de Hugues de Varine, colocavam entre outros os problemas
da territorialidade, da interdisciplinaridade, e como nos casos já referidos da própria
participação das populações como atores e utilizadores das programações
ecomuseológicas, com vista ao desenvolvimento social do meio que lhes dava vida. 3
2 Cf Pierre Mayrand, Parole de Jonas essais de terminologie, Augmentés des chroniques d´un altermuséologue, Cadernos de Sociomuseologia, nº 31-2009, Universidade Lusófona, Lisboa 3 Cf.Peter Davis, Ecomuseums: A Sense of Place, 2011. Continuum International Publishing Group, London, Primeira edição 1999
3
Quando em 1984 se reuniu no Quebec o Atelier Internacional Ecomuseus - Nova
Museologia, tornou-se evidente que existia uma nova prática museológica generalizada
expressando-se de diferentes formas e emergente em numerosos países. Tal facto
explica que se tenha na ocasião posto em evidência a Declaração de Santiago do Chile a
qual tinha sido elaborada no quadro da Mesa Redonda organizada pela
UNESCO/ICOM. Se em 1972 esta declaração passou relativamente desapercebida, em
Quebec a nova realidade do panorama dos museus podia facilmente identificar-se com
os princípios então declarados.
Este processo anunciava assim na Declaração de Santiago (1972
UNESCO/ICOM) onde se considerava também:
Que o museu é uma instituição ao serviço da sociedade da qual é parte
integrante e que possui em si os elementos que lhe permitirem participar na
formação da consciência das comunidades que serve; que o museu pode
contribuir para levar essas comunidades a agir, situando a sua actividade no
quadro histórico que permite esclarecer os problemas actuais, (…) Que esta
nova concepção não implica que se acabe com os museus actuais nem que se
renuncie aos museus especializados mas que pelo contrário esta nova
concepção permitirá aos museus de se desenvolver e evoluir de maneira mais
racional e mais lógica a fim de se melhor servir a sociedade.(…) Que a
transformação das actividades do museu exige a mudança progressiva da
mentalidade dos conservadores e dos responsáveis dos museus assim como das
estruturas das quais eles dependem"4
Na verdade entre a Declaração de Santiago e o Atelier do Quebec decorreu em
pouco mais de uma década, um período particularmente rico de inovação e afirmação na
prática e no entendimento de uma Nova Museologia.
Tratava-se de reflectir e dar continuidade à reflexão de Santiago mas também e
talvez aqui esteja um dos aspectos mais importantes deste Atelier, organizar o que se
sentia ser um movimento simultâneo em numerosos países. Faltava então uma
plataforma na qual os diferentes intervenientes se podessem reunir, quebrando de certa
forma o isolamento entre si e naturalmente mais ainda face aos poderes instituídos.
4 Cf. A memória do pensamento museológico contemporâneo (Documentos e Depoimentos) org. Marcelo Araujo & Cristina Bruno, Comitê Brasileiro do ICOM, 1995
4
A criação do MINOM em 1985 de certa forma viria a consolidar este processo
pelo que pouco tempo depois foi reconhecida como Organização afiliada ao ICOM sem
contestação.5
Entre os objectivos prioritários do Atelier, devem ser mencionados a tentativa de
criação de condições de intercâmbio entre as experiências do âmbito da ecomuseologia
e de modo geral da nova museologia no mundo e o esclarecimento das suas relações
com a museologia instituída em geral. Enfim pretendia-se aprofundar e rever conceitos
e encorajando ao mesmo tempo novas práticas museológicas.
Ao longo destes anos, aquilo que numa altura se revelava como uma Nova
Museologia deixou de o ser, pelo simples facto das ideias que essa Nova Museologia
trazia, terem sido de facto assimiladas por um número crescente de museus. Pelo menos
do ponto de vista do discurso, actualmente só um Museu “politicamente incorrecto”
poderá assumir-se com indiferente à inclusão social, às questões do desenvolvimento ou
da sustentabilidade.
A questão principal reside simplesmente na prioridade que cada museu define
como seu objectivo principal. Entre trabalhar com as colecções ou trabalhar com os
desafios contemporâneos existe um vasto campo de acção que dá forma a cada Museu.
Aliás, devemos facilmente reconhecer a existência de instituições que mais ou menos
conscientemente actuam entre estes dois campos procurando colocar-se ao serviço da
sociedade e do seu desenvolvimento, tal como a actual e renovada definição de museu
do ICOM propõe.
Importa referir no entanto que a aceitação deste direito á diferença implica
naturalmente também mudanças na formação daqueles que actuam nos museus.
Trabalhar com as colecções ou trabalhar com os desafios contemporâneos, ou seja com
pessoas, não assenta em idênticas competências, pessoais, políticas e profissionais. Se
no primeiro caso estamos em presença de formações essencialmente técnicas, no
segundo caso pensamos numa abordagem essencialmente no domínio das ciências
sociais.
Esta distinção, que consideramos da maior relevância, não é no entanto assumida
pelas universidades que na maioria dos casos assentam os seus programas em conteúdos
5 Para consultar os arquivos do MINOM http://www.minom-‐icom.net/signud/
5
relacionados com as colecções que se assumem como sendo estruturantes das
formações. É disto exemplo o Referencial Europeu das Profissões Museais elaborado no
seio do ICTOP onde não se encontra se quer referenciada a profissão de museológo (!). 6
No entanto quando pensamos um programa de formação objectivando contribuir
para a formação de museólogos que possam servir uma museologia orientada para as
pessoas, fácil é reconhecer que esse novo profissional necessita de uma abordagem tão
nova quanto os desafios que deverá enfrentar, no quadro de uma redefinida
Sociomuseologia
Importa no entanto considerar que aquilo que actualmente se reconhece como
Sociomuseologia não corresponde a uma ruptura com a Nova Museologia, mas em
nosso entender é simplesmente uma reformulação assente na realidade actual da
museologia. Neste caso trata-se de uma abordagem multidisciplinar que sintetizamos
nos seguintes termos numa proposta de definição evolutiva de Sociomuseologia:
“A Sociomuseologia traduz uma parte considerável do esforço de
adequação das estruturas museológicas aos condicionalismos da sociedade
contemporânea.
A abertura do museu ao meio e a sua relação orgânica com o contexto social
que lhe dá vida, têm provocado a necessidade de elaborar e esclarecer
relações, noções e conceitos que podem dar conta deste processo.
A Sociomuseologia constitui-se assim como uma área disciplinar de ensino,
investigação e actuação que privilegia a articulação da museologia em
particular com as áreas do conhecimento das Ciências Humanas, dos Estudo
dos do Desenvolvimento, da Ciência de Serviços e do Planeamento do
Território.
6 Cf. Referencial Europeu das Profissões Museais, ICTOP, 2008. http://www.icom-portugal.org/multimedia/ICTOP_referencial_PT.pdf Director/a: Colecções e Investigação Públicos Administração, gestão e logística. Colecções e Investigação: Conservador/a, Responsável pelo Inventário, Gestor de Colecções, Restaurador/a, Assistente de Colecções, Responsável pelo Centro de Documentação, Comissário/a de Exposições, Designer de Exposições Públicos: Responsável pela Mediação e Serviço Educativo, Mediador/a, Responsável pelo Serviço de Acolhimento e Vigilância, Técnico de Acolhimento e Vigilância, Responsável pela Biblioteca/Mediateca, Responsável pelo Sítio Web Administração, Gestão e Logística: Administrador/a/Gestor/a, Responsável pela Logística e Segurança, Responsável pelos Sistemas Informáticos, Responsável pelo Marketing, Divulgação e Recolha de Fundos, Responsável pela Comunicação com os Media
6
A abordagem multidisciplinar da Sociomuseologia visa consolidar o
reconhecimento da museologia como recurso para o desenvolvimento
sustentável da humanidade, assente na igualdade de oportunidades e na
inclusão social e económica.
A Sociomuseologia assenta a sua intervenção social no património cultural e
natural, tangível e intangível da humanidade.
O que caracteriza a Sociomuseologia não é propriamente a natureza dos
seus pressupostos e dos seus objectivos, como acontece em outras áreas do
conhecimento, mas a interdisciplinaridade com que apela a áreas do
conhecimento perfeitamente consolidadas e as relaciona com a Museologia
propriamente dita”7.
Nova Museologia ou Sociomuseologia trata-se da busca de uma compreensão
das mudanças profundas da realidade dos museus. Ou seja, mais do que ambicionar a
construção de uma nova teoria museologia a questão é ter simplesmente em
consideração que os museus mudaram, pelo menos tanto quanto as sociedades onde
estão inseridos. E essas mudanças são de facto profundas.
O direito à diferença
Deixou de existir um modelo único de Museu igual à ideia de colecção, de
edifício e de público, para se assumir o museu com um lugar central dos conceitos de
património (s) território e população. Desenvolveram-se novos modelos de gestão não
hierarquizados e assumiu-se o alargamento da noção de património, e a consequente
redefinição de "objecto museológico ". Os conceitos de Ecomuseologia, de
Economuseologia, de Sociomuseologia expressam diferentes formas dos museus se
posicionarem no mundo contemporâneo.
O museu como fim versus museu como recurso.
É certo que já nos estatutos do ICOM se escreve que o museu é uma instituição
ao serviço da sociedade e do seu desenvolvimento, mas também é certo que os museus
têm estado mais ao serviço de si próprios, das suas colecções e dos objectos que os seus
donos (porque os museus têm donos -Publico ou privados) lhes atribuíram.
7 Actas do XII Atelier Internacional do MINOM, Cadernos de Sociomuseologia nº 28-2007, Universidade Lusófona, Lisboa http://revistas.ulusofona.pt/index.php/cadernosociomuseologia/article/view/510
7
Mas também é certo, que é cada vez mais frequente constatar que uma nova
geração de Museus se organizam e definem os seus programas de actividades
perspectivados, como recurso para o desenvolvimento. Preocupam-se com os problemas
do mundo em que vivem promovendo o emprego, fomentando novas formas de turismo,
revitalizando e criando indústrias e reforçando identidades. Cada dia que passa, mais os
museus procuram diferentes formas de sustentabilidade e estão atentos à promoção do
desenvolvimento humano e da coesão social e económica.
A Museologia como meio de Comunicação.
A museologia como meio de comunicação é cada vez mais entendida como um
recurso exterior ao Museu. E se assim for, teremos de considerar a distinção entre a
museografia, como tudo o que diz respeito ao Museu, da expografia entendida como
uma escrita, de algum modo inovadora, como sendo esse meio de comunicação.
Podemos fazer um paralelo: se a escrita não é apenas um recurso ao serviço dos
editores de texto, mas sim uma forma de expressão cada vez mais acessível e
democratizada a expografia também não é apenas um recurso que só tem sentido ao
serviço dos Museus.
Se o Museu reconhece e é fruto das multifacetadas redes, que lhe dão vida, terá
forçosamente que admitir a alteração do lugar de cada um ocupa neste processo e
encontrar novos rumos de comunicação que tenham em consideração que aqueles que
produzem e consomem o discurso museológico são parte do mesmo processo.
Para os Museus isto trás consequências importantes. A expografia deixando de
estar acorrentada ao serviço das colecções passa a poder ser um recurso para
desenvolver e apresentar ideias dentro e fora do Museu.
A autonomia dos públicos
O grau de autonomia de cada pessoa, que hoje caracteriza a nossa sociedade leva
os indivíduos cada vez mais, a não se submeterem tão facilmente a discursos
autoritários e padronizados.
O Museu é cada vez mais entendido pelo seu conteúdona busca de reflexão às
preocupações de cada visitante. Reconhecer a existência de um público que não precisa
de guias, nem legendas é apenas bom senso, e obriga o Museu a elaborar discursos
simultaneamente mais complexos e menos padronizados.
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Hoje em dia qualquer adolescente domina plenamente processos de
aquisição de informação mil vezes mais amplos e complexos que a geração dos seus
pais. Estamos a falar da Web e de todos os recursos ai existentes. Por que razão
alguém se contentará da geralmente pobre informação que o Museu disponibiliza
quando tem ao seu alcance um mundo de conhecimento? Hoje em dia qualquer
adolescente nos países desenvolvidos e em certa medida nos outros países, domina
plenamente processos de aquisição de informação mil vezes mais amplos e
complexos que a geração dos seus pais. E no entanto os museus obstinam-‐se a
transportar para os displays singulares ou cobrindo paredes inteiras, exatamente os
mesmos conteúdos que anteriormente apresentavam em painéis penosamente
construídos pedaço a pedaço ou, mais modernamente, diretamente impressos em
telas que depois se afixavam aos mesmos painéis. Reduzir ou não procurar utilizar os
recursos tecnológicos atuais para servir novos desafios da museologia, mas somente
para modernizar narrativas esgotadas, parece cada vez mais uma falta de atenção
para com o mundo em mudança8
Os ritmos museológicos
A ideia de exposição temporária é hoje um dado adquirido e nenhum museu que
se pretenda moderno ousaria ignorar este facto. Por outro lado a montagem de
exposições sobre problemas da actualidade, museus da sociologia, da psicologia ou da
globalização, também são uma realidade e estruturam por si sós a programação
museológica de pequenas e grandes instituições, ou de pequenos museus de comunidade
e de redes onde as exposições são essencialmente o partilhado processo de apreensão da
realidade e catalisadoras de vontades, aspirações e desejos de intervenção.
Mas se pensamos na actuação dos museus em sintonia com o mundo que os
rodeia, e que esse mundo está em permanente mudança, também os museus e as suas
exposições terão forçosamente de se renovar no mesmo ritmo da história. Em última
instância, poderemos imaginar um museu que a cada manhã propõe uma nova
exposição elaborada e montada durante a noite, tal com fazem os jornais.
8 Moutinho, Mario C. M. 2010. Os museus portugueses perante a Sociomuselogia. In 100 anos de patrimônio: memória e identidade: , 313 - 322. ISBN: 978-989-8052-20-9. Lisboa: IGESPAR
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Não sendo obrigatório terminar este texto com uma conclusão gostaríamos de
aceitar como razão da nova Museologia e/ou Sociomuseologia a definição de Museu
proposta pelo Instituto Brasileiros de Museus9
“Os museus são casas que guardam e apresentam sonhos, sentimentos,
pensamentos e intuições que ganham corpo através de imagens, cores, sons e formas.
Os museus são pontes, portas e janelas que ligam e desligam mundos, tempos, culturas e
pessoas diferentes. Os museus são conceitos e práticas em metamorfose”
MINOM-ICOM International Movement for a New Museology Based broadly on a concern for social and cultural change, MINOM brings together individuals who are dedicated to active and interactive museology. It is open to aIl approaches which make the museum an instrument for identity building and development within the community. MINOM favours cooperative relationships between users and professionals, as well as intercultural collaboration. MINOM is an international organization affiliated to ICOM (International Council of Museums). Origin MINOM was founded in 1985, in Lisbon, Portugal, during the 2nd International New Museology Workshop. This official foundation was the result of the 1st International – Ecomuseums / New Museology Workshop in Quebec (Canada) in 1984, when museologists from 15 countries adopted The Quebec Declaration as a reference point for the movement. Its ideological origins are found in the Santiago Declaration adopted in 1972 in Chile. Philosophy Help each other, learn from each other’s strategies of using heritage and museums as a tool to combat injustice, to foster development in communities, to foster dialogue. For us, these are not just words, they are part of a project of society, with more solidarity. It is a debate not about organizations or objects, but about people. What can we expect from the movement? Essentially the sharing of human experiences and techniques which too often are litt1e because of the uncertain finances and the isolation which are common to many expressions of new museology: ecomuseums, neighbourhood museums, local museums, popular and commW1Íty museums. Encouragement of innovative museum initiatives. Regional and international meetings of members and non-members. A continuous exchange of ideas on the goals of museology and museography. Communication by the simplest and most direct means. Enthusiasm shared by our members http://www.minom-icom.net/
9 http://www.museus.gov.br/museu/
26 e 27 Abril 2013 São Brás de Alportel, Museu do Trajo S. Brás de Alportel / Departamento de Museologia da Universidade Lusófona / MINOM-‐ICOM
“SMART” museologia: eSpecífica, Dimensível, viAvel, Relevante, aTempada1 Mário Moutinho
ESPECÍFICO (Specific)
relativo à espécie; especial; exclusivo; característico; MENSURÁVEL (Mesurable)
Que pode ser medido. (Medir) Calcular; considerar; percorrer com a vista; olhar com provocação
VIÁVEL (Attainable) Que pode ser percorrido, que não oferece obstáculos.
Em que podem abrir-‐se caminhos. = transitável Que pode ser feito. = exequível
Que pode viver ou sobreviver. = vivedouro RELEVANTE (Relevant)
Que releva; Que sobressai; Importante. ATEMPADO (Timely)
(particípio de atempar) Que se atempou; Que aconteceu ou foi feito a tempo ou no tempo adequado. [Agricultura] Que vingou, que criou raízes.
(Infopédia Porto: Porto Editora, 2003-‐2013)
(…) No campo da demonstração esta exposição revelou-‐se ser uma fonte de aprendizagem
daquilo que chamaríamos a posteriori de SMART expografia, entendida esta ideia de SMART como utilizada nos mais diversos meios científicos e empresariais desde os anos 80, como obrigando do ponto de vista metodológico a ter em consideração as seguintes preocupações: a sua especificidade, a possibilidade de ser avaliada, a sua viabilidade, a sua relevância e finalmente a sua adequabilidade no tempo.
Em primeiro lugar, a exposição deveria ter objetivos claramente definidos, (Specific). Na verdade os objetivos foram evoluindo numa primeira fase do trabalho, na medida em que se envolveram de forma crescente novas sensibilidades e competências profissionais e científicas. Entre o primeiro título
1 Extrato do catálogo da Exposição “Baixa em Tempo Real” Departamento de Museologia, Galeria Millennium, Lisboa, Museu da República Rio de Janeiro 01 de Fevereiro - 24 de Maio, 2013.
http://wwwbaixaemtemporeal.net
1755 Terramoto e reconstrução da cidade de Lisboa, passando por uma segunda proposta A Baixa Pombalina: os caminhos da História de Lisboa XVIII-‐XXI, Baixa Pombalina em Tempo em Real até ao título selecionado “Baixa em Tempo Real”, existem diferenças fundamentais, as quais implicariam exposições radicalmente diferentes apesar de em todas elas se priorizar a realidade cultural, social e política da Baixa na atualidade. Se nos primeiros casos se tratava de um discurso mais tradicional, já no último caso priorizava-‐se o discurso direto daqueles que de diferentes formas se relacionam com a Baixa lisboeta. Assim nesta abordagem, a documentação a recolher ou já recolhida junto dos diferentes arquivos, deixou de ocupar um lugar central para que a palavra fosse dada a quem melhor poderia dar a sua explicação, contextualização e propor leituras alternativas. Assim cada um dos videos que deveriam tratar diferentes aspetos da Baixa lisboeta deveria ser de certa forma enquadrado por um comentário ou testemunho de alguém que conhecesse cada realidade. A palavra do professor catedrático deste ponto de vista passou a ocupar exatamente o mesmo lugar da palavra do morador, do empregado ou do turista.
Em segundo lugar, a exposição deveria poder ser avaliada (Mesurable) no seu impacto imediato e distendido. No primeiro caso naturalmente que um plano de avaliação/estudo de públicos poderia expressar essa relação. Mas quanto ao impacto estendido o processo revelar-‐se-‐ ia mais complexo. Não por causa da exposição em si, mas pelo facto desta dimensão dos efeitos distendidos das exposições em geral não ser objeto de preocupação no campo dos estudos de público. Também aqui de forma dialética juntaram-‐se varias abordagens. Uma primeira tem a ver com a necessidade, para nós fundamental, de assumir que os públicos atuais detêm um grau de autonomia na recolha e seleção das suas fontes de informação infinitamente maior que as gerações anteriores. Pensar que se dá resposta à curiosidade das gerações mais novas com discursos formatados pela expografia do exibicionismo como referiu Hugues de Varine, é certamente inconsistente. Mostrar a curiosidade como se mostravam aos reis e rainhas, leões e escravos nos séculos das descobertas, podia ser nesse tempo suficiente, na medida em que essa "pré-‐museologia" se dedicava ao imediatamente visível. Mas nos tempos que correm, a compreensão faz cada vez mais parte do conhecimento. E disso muitos duvidam, tanto quanto outros valorizam. Neste sentido o alargamento da exposição ao suporte da internet poderia representar várias vantagens. De forma comum poderia incluir uma página na internet para divulgar, valorizar e dar complementos de informação como praticamente muitas exposições já fazem de forma mais ou menos completa. Mas na Exposição “Baixa em Tempo Real” isso não bastava, pelo que se entendeu que os visitantes deveriam ter acesso à totalidade dos conteúdos para sua utilização fora do espaço expositivo. E mesmo assim essa orientação só seria interessante se fosse possível fazer o download, inclusive dos vídeos (cerca de 20) originais que foram produzidos especialmente para a exposição. Uma espécie de exposição open source. A avaliação desta exposição passa pois pela reação que possa produzir entre os visitantes, tanto como naqueles que em casa em qualquer lugar do mundo, dela possam beneficiar ou com ela possam interagir.
Em terceiro lugar a exposição deveria ser viável (Attainable) tanto do ponto de vista do conhecimento disponível, como dos recursos humanos e materiais necessários para a sua implementação. Naturalmente que uma exposição produzida por um departamento de uma Universidade não conta com recursos financeiros significativos e não pode naturalmente fazer apelo a empresas externas que atuam geralmente no conforto de administrações públicas “amigas”.
Na verdade, raros são esses investimentos por vezes na ordem do milhões de Euros que são objeto de concursos públicos e transparentes. Mas isto é uma outra discussão. Esta exposição deveria conciliar a comunicação com os recursos tecnológicas necessários, que não se transformassem em obstáculos por efeito da sua difícil aquisição. Neste sentido a viagem de estudo que o departamento realizou em 2008 a São Paulo para estudar os museus desta cidade veio a revelar-‐se da maior importância. Na verdade a visita ao Museu do Futebol do Estádio do Pacaembu continha numa das suas áreas uma instalação "inspiradora" da autoria de Daniela Thomas e de Felipe Tassara. Esta instalação cria uma proximidade/intimidade com a documentação exposta, particularmente sensível. Baseada na ideia de galeria do século XVIII onde as paredes dos "Museus" eram literalmente cobertas de quadros, os autores introduziram a possibilidade de manipulação de algumas molduras com documentação fixa e
em movimento, facto que altera substancialmente a relação com o visitante. A aproximação torna-‐se obrigatória e a leitura mais próxima. Em consequência, os monitores podem ser de pequenas dimensões, evitando de forma consistente o "apelo à utilização de monitores de grandes formatos" com custos insuportáveis para a produção. A utilização deste conceito e a sua creditação foi resolvida por meio de contactos diretos com a direção do Museu a qual apresentou a nossa solicitação aos autores, que generosamente aceitaram a nossa proposta. Assim, ponderámos a definição de várias camadas de informação. Uma com um discurso proposto, outra com recursos interativos, outra física com acesso à manipulação e reordenamento da documentação selecionada e, por último, uma disponibilizada na WEB. Para cada camada procedeu-‐se ao estudo e avaliação de diferentes propostas, tendo sempre presente a necessidade de utilizar e ou adaptar os recursos tecnológicos necessários, aos recursos financeiros disponíveis.
Em quarto lugar, a exposição deveria ser relevante (Relevant) do ponto de vista social e político. Esta condição é porventura da maior importância. Sem pretendermos ser nem "o velho do Restelo" nem "iluminados" trata-‐se de ver a adequação do projeto à compreensão social que pode existir à volta do projeto. Mas aqui, de facto, todos os contactos estabelecidos tiveram em comum uma apreciação muito positiva do projeto. Por muitas razões: porque a Baixa está a mudar e é necessário entender os contornos dessa mudança, pelo o reconhecimento da Baixa como lugar onde se tem expressado a vontade popular e do poder em simultâneo ou de forma alternativa, porque os estudantes Erasmus passaram a habitar na Baixa, porque mesmo em tempos de crise a Baixa recebe grandes investimentos urbanísticos e imobiliários e muitas outras razões. Apenas uma dúvida se instalou pelo facto da classificação/registo como Património Mundial pela UNESCO ter sido abandonada de forma provisória. Se todos concordam em entender a Baixa como lugar central do Património da cidade e de Portugal, nem todos têm as mesmas prioridades. É neste conceito que julgamos podem ser consideradas todas as ações que tornaram realizável a exposição, incluindo naturalmente a procura e escolha das parcerias. Aqui a procura começou naturalmente pelas Juntas de Freguesia da Baixa, S. Nicolau e Mártires, na medida em que são as duas instâncias de poder local mais próximas da realidade destes bairros e envolvidas com a valorização da Baixa pombalina nos seus diferentes domínios. Igualmente na Universidade Lusófona fizemos apelo à Escola de Comunicação ECATI, visando envolver docentes e alunos no domínio da Multimédia e Animação Digital. Também atuamos junto das instituições que abrigam documentação essencial para o projeto e de quase todas recebemos disponibilidade, apoio e aconselhamento. Enfim, foi junto da Associação de Dinamização da Baixa Pombalina que procurámos parceria para o estabelecimento de ligações em tempo real em diferentes pontos da Baixa e dela ouvimos o seu conselho. No resto toda a equipa envolvida soube ouvir opiniões, sugestões e críticas de todos aqueles que por diferentes razões se envolveram, num momento ou noutro, na conceção da exposição.
Finalmente em quinto lugar a exposição deverá ter lugar no seu tempo kairológico ou seja no tempo próprio, atempada (Timely). E este tempo próprio tanto pode ser o tempo do desafio e mesmo do confronto como o tempo do consenso e da confirmação. No caso desta Exposição devemos referir duas ordens de consideração. Em primeiro lugar, tudo leva a crer que ela tem lugar no tempo próprio, e que de certa maneira, ela se adequa aos contornos desse tempo que é um tempo de crise e de retrocesso social e económico. Valorizar a Baixa é pois imperativo na medida em que isso contribui para a sua renovação, reafirma a Baixa como espaço multicultural, do Largo de São Domingos, aos Hostels para jovens de todo o mundo, às expressões culturais multifacetadas, coletivas e individuais, à redescoberta de itinerários de Fernando Pessoa ou da Arquitetura Pombalina.
Uma exposição que olha para o seu tempo sem esquecer as raízes. Por outro lado todo o processo criativo e de produção esteve sempre aberto ao envolvimento de alunos e docentes, não de forma subsidiária mas na convicção que o Departamento só assim cumpriria a sua missão de ensinar, investigar e demonstrar contribuindo para a formação de competências enraizadas na reflexão e no saber fazer, tendo em consideração a permanente preocupação de ligar os objetivos, o meio e a exequibilidade.
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Revista da ULHT nº 12 2008 Os museus como instituições prestadoras de serviços Mário C. Moutinho
O presente texto aborda o difícil entendimento da instituição Museu como entidade prestadora de serviços. Na realidade estamos longe de ver os museus actuarem plenamente como serviços pois a racionalidade do seu funcionamento decorre da permanente atribuição de subsídios provenientes dos orçamentos de Estado ou de entidades beneméritas. Utilizamos para tal reflexão textos nossos anteriores, onde abordamos estas questões de forma parcelar e que agora, julgamos ganharem alguma coerência se articulados com a reflexão sobre os museus vistos na sua possível, mas mal assumida, condição de prestadores de serviços.
Abordamos alguns aspectos da introdução nos museus das novas tecnologias da informação e da comunicação (NTIC) como parte deste processo. Por um lado estas tecnologias abrem portas, e alguns museus disso tiram bom proveito, mas por outro lado a sua utilização de forma redutora não dá conta do lugar que estas podem ocupar, com múltiplas vantagens do ponto de vista organizacional, de fomento da inovação, e de criação de novos conceitos de serviços mais atentos ao mundo em que vivemos.
É assim um paradoxo que a instituição MUSEU não se reconheça na generalidade como entidade prestadora de serviços apesar de se definir como “instituição permanente, sem fins lucrativos, ao serviço da sociedade e aberta ao público que adquire, conserva, estuda, expõe o património material e imaterial da humanidade para fins de estudo, educação e lazer” (ICOM 2007)
Nesta definição encontram-se aliás varias funções que decorrem de níveis de entendimento diferentes. Assim, na generalidade, adquirir (anteriormente dizia-se coleccionar) e conservar são actividades conceitualmente diferentes de estudar e expor. No primeiro caso podem ser assimiladas à produção de bens, enquanto que na segunda categoria, claramente se trata de serviços.
Assim e em resultado desta amálgama os museus estão perdendo uma oportunidade de se melhorarem e alargarem o seu desempenho utilizando os recursos e a racionalidade específicos das instituições prestadoras de serviços e em consequência ocuparem o lugar que lhes seria de direito no campo da inovação nos serviços.
É certo que também não existe um caminho único que esclareça os contornos da inovação nos serviços reconhecendo-se na literatura especializada três abordagens distintas: a perspectiva tecnologista que assenta a inovação na introdução de novos equipamentos e novas tecnologias; a perspectiva servicionista que privilegia os recursos próprios dos serviços como fonte de inovação; e a perspectiva integradora que visa a articulação entre as duas abordagens anteriormente enunciadas.
Não é fácil pois encontrar uma definição para Serviços que dê conta de todos os aspectos e que satisfaçam as possíveis e diferentes abordagens. No entanto existem algumas características que fazem até certo ponto algum consenso.
Reconhece-se que um serviço é essencialmente um produto intangível cuja produção pode ou não assentar em bens materiais. Esse produto intangível não pode ser objecto de apropriação para consumo posterior mas tem por isso a característica de ser produzido e consumido em simultâneo.
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Nos museus tradicionais, assentes na apresentação e fruição das colecções apoiadas na existência de recursos materiais como vitrinas ou novos suportes de comunicação (vídeo, som, ambientes de imersão, etc..) para as quais se conceberam espaços securisados e climatizados por meio de recursos materiais e de equipamentos próprios, o visitante não pode levar consigo a exposição, devendo por isso consumi-la durante a visita
Tudo o que o visitante pode fazer é viver a experiência registar alguns dos seus aspectos em diferentes suportes ou recolher elementos tangíveis tais como folhetos, catálogos ou objectos afins disponibilizados na loja do museus, elementos esses que são aliás fundamentais para tangibilizar e credibilizar o Museu ou a exposição.
A disponibilização da exposição ou do museu na WEB tem por agora, o mesmo valor da consulta do catálogo. Visita virtual ou leitura não substituem a experiência da descoberta e fruição da exposição por cada visitante.
Todas estas situações encontram o seu apogeu nas exposições internacionais ou mundiais e nos Museus do Marketing das Cidades onde a atracção é o Edifício do Museu muito mais, senão a razão principal da visita. Estamos a falar por exemplo do Museu Guggenheim de Bilbau e deforma mais geral dos processos Guggenheim ou mais recentemente o caso Louvre/ Abu Dhabi cuja compreensão obrigaria a equacionar outras variáveis que não decorrem propriamente da questão relativa aos Museus que é o objecto deste texto.
Importa também referir que o sector de serviços representa o essencial da economia portuguesa tanto no que diz respeito à parte que ocupa no valor acrescentado bruto (VAB) do país como em termos de emprego. Segundo o ICEP nas últimas décadas, Portugal, a exemplo dos seus parceiros europeus, desenvolveu uma economia cada vez mais baseada nos serviços. Actualmente, este sector representa 57,7%, em termos de emprego, e 71,2% do valor acrescentado bruto (VAB), enquanto o sector agrícola só absorve 11,7% do emprego e contribui apenas com 3,5% para o VAB. Os serviços tornaram-se o sector mais dinâmico e diversificado, com o comércio, os transportes e comunicações, o turismo e os serviços financeiros a apresentarem taxas de crescimento elevadas.
Fonte: http://a.icep.pt/portugal/economia.asp
Em termos Mundiais a situação é idêntica. A economia mundial está a passar por transformações profundas resultantes das comunicações globais e da inovação tecnologica, que se manifesta pela utilização na area dos serviços de mais de 50 por cento
Os serviços em Portugal -2006 %
0
20
40
60
80
VAB 71,2 25,3 3,5
Emprego 57,7 30,6 11,7
Serviços Industria,construção Energia e Água
Agricultura, Sivicultura e Pescas
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da mão-de-obra no Brasil, Rússia, Japão e Alemanha, e 75 por cento da mão-de-obra nos Estados Unidos e o Reino Unido.
Este processo tem impulsionado a introdução de novas formas de organização das empresas e das instituições não empresariais e uma crescente atenção para com as questões decorrentes das condições que viabilizam a inovação e a introdução de novas tecnologias da informação e da comunicação.
A compreensão dos serviços de uma forma integrada é actualmente o foco de atenção de uma “nova disciplina” que vem ganhando espaço em muitas universidades por todo o Mundo e da qual se espera um melhor compreensão das suas múltiplas componentes. Trata-se da “Ciência de Serviços, Gestão e Engenharia” SSME que se propõe reunir e articular de forma consistente os trabalhos em curso no domínio da informática, da engenharia industrial, da estratégia empresarial, das ciências de administração, das ciências sociais e cognitivas e das ciências jurídicas de modo a desenvolver as competências requeridas por uma economia orientada e assente cada vez mais na produção e uso de serviços.1
Neste contexto seria necessário olhar os museus na perspectiva de instituições prestadoras de serviços tendo em consideração o lugar que os serviços culturais ocupam no seio dos serviços em geral e estes, na economia no seu todo.
As quatro características correntes de Serviços
Podemos analisar as quatro características dos serviços tais como descritas por Marcos Kahtalian2, fazendo a sua leitura tendo como referência as exposições dos museus e de forma mais ampla as diferentes actividades dos Museus.
Inseparabilidade Essa característica aponta para a seguinte questão: todo serviço tem um momento em que sua produção e consumo são simultâneos, inseparáveis. Assim, ao mesmo tempo que um professo produz a sua aula, esta é consumida pelos alunos. Ao mesmo tempo que um médico produz sua consulta, o paciente a consome, como cliente do serviço. Nesses exemplos, produção e consumo são simultâneos, diferentemente de uma empresa de produtos, em que claramente existe um momento de produção e um momento de consumo.
Todo serviço realiza-se no momento em que a sua produção e seu consumo
coincidem no tempo e por isso devem ser entendidos como simultâneos e inseparáveis. Assim o momento em que o público percorre a exposição é exactamente o tempo em que a exposição é consumida. Ninguém pode comprar uma visita a uma exposição para utilizar depois de sair do espaço da própria exposição. Neste sentido o consumo da exposição está sujeito a regras próprias quer elas sejam relativas a qualquer exposição, quer sejam específicas à exposição em questão.
1 Cf. http://www.research.ibm.com/ssme/ 2 Marcos Kahtalian UniFAE Centro Universitário http://www.fae.edu/publicacoes/pdf/mkt/2.pdf
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Na verdade cada museu tem um tempo de crédito para confirmar junto de cada visitante que a opção da visita foi correcta e que a relação preço /qualidade é positiva. E isto, muito para além do facto, que por meio de diferentes mecanismos (subsídios, programas especiais, preços diferenciados, bilhetes a custo zero) esta relação poderá ser de certa forma ludibriada. O custo zero para o utilizador do serviço pode efectivamente diminuir o seu grau de exigência, mas em última instância o desencanto é uma penalização que nenhum visitante deseja e no qual assenta uma rejeição não só para com a instituição como naturalmente para com todas as instituições que possam ser semelhantes. No entanto esta questão do tempo disponível para corresponder às expectativas do visitante não parece ser uma preocupação da maior parte das administrações talvez pelo facto de cada museu abrir regularmente cada dia à mesma horas ao longo de anos. É possível repetir a visita mas tal facto não anula uma experiência falhada, como também é razoável pensar que a repetição nada trará de novo que possa alterar a primeira sensação.
Talvez por isso os museus têm necessidade de apregoar bem alto que estão em processo de renovação ou vão abrir completamente renovados ou pelo menos com novas áreas e novas exposições.
Variabilidade Serviços são variáveis. Isto é, os serviços variam e podem variar conforme
o prestador do serviço e o cliente. Esta característica tanto pode ser vista sob um prisma positivo quanto negativo. O prisma positivo da variabilidade é que ela permite a customização, a personalização, o atendimento diferenciado às expectativas de grupos de clientes. (…) O lado negativo da variabilidade é que ela torna difícil o estabelecimento de um padrão de serviço, de uma performance padronizada, imune a erros. Pode-se assumir que as exposições apresentadas pelos museus vivem
essencialmente na busca contínua do maior denominador comum. Apesar de se reconhecer progressivamente a necessidade de criar exposições para determinados públicos com algum grau de customização como por exemplo as legendas em várias línguas ou a utilização de áudio-guias que permitem um leque alargado de opções a prestação museal não busca uma customização determinada pelas necessidades do visitante único. Tal ideia é na verdade escandalosa para a comunidade museal tanto mais que o paradigma do sucesso de uma exposição é exactamente a sua capacidade de mobilizar no menor espaço de tempo o maior número de visitantes.
Estamos pois a falar de uma característica na qual cada museu tem um longo caminho a percorrer sobretudo se pensarmos que existe um contexto museal que vive da exibição a par de um outro contexto que busca seu caminho como recurso de comunicação com códigos de leitura abertos e capaz de reflectir as problemáticas do mundo em que vivemos.
Pensarmos um Museu liberto das colecções e enunciar os dados de uma expografia não fundada em objectos herdados mas sim construídos, estamos pervertendo
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a função mais tradicional do Museu e quebrando por assim dizer as expectativas que o público mais conformista pode ter do Museu.3
Aparentemente esta frustração, que parece razoável, deixa de o ser se considerarmos que paralelamente a uma “museologia das ideias” também existe um público que se afasta do Museu do museu de objectos, porque exactamente este não expressa ideias e mais ainda lhe atribui comportamentos que na verdade já estão há muito tempo profundamente alterados.
Falamos do grau de autonomia de cada pessoa, que hoje caracteriza a nossa sociedade e que leva os indivíduos cada vez mais a não se submeter tão facilmente a discursos autoritários e padronizados. Trata-se da recusa dos museus em reconhecer um novo grau de autonomia na aquisição de informações por parte dos visitantes É um facto que os museus tal como os conhecemos não têm capacidade para se renovarem todos os dias na medida em que são condicionados por vários factores • Não faz parte da sua própria imagem a ideia de renovação permanente • Os recursos expográficos tradicionais não são sustentáveis nem renováveis. • O tempo dentro do museu é quase sempre entendido como pertencendo ao passado • Ao museu não compete imiscuir-se no que se passa fora das suas paredes.
Mas se isto retracta mais ou menos fielmente o panorama da museologia pelo menos a mais instituída, também não deixa de ser verdade que por outro lado os ritmos museológicos se têm alterado ao longo do tempo. Por um lado a ideia de exposição temporária é hoje um dado adquirido (dentro naturalmente de certos limites) e nenhum museu que se pretenda moderno ousaria ignorar a exposição temporária. Aliás os próprios arquitectos já sabem que têm de prever salas para esse tipo de exposições sem o que verão os seus projectos recusados. Por outro lado a montagem de exposições sobre problemas da actualidade, museus da sociologia, da psicologia ou da globalização também são uma realidade e estruturam por si sós a programação museológica de pequenas e grandes instituições ou os pequenos museus de comunidade onde as exposições são processo de apreensão da realidade e catalisadoras de vontades, aspirações e desejos de intervenção.
Faltará pois ter em consideração que mais tarde ou mais cedo os museus terão de deixar pelo menos em parte esta obsessão pelo passado, para passar a comunicar por meio de objectos que expressam ideias e reconhecer a existência de um público que não precisa de guias, nem legendas.
Museu em que cada dia as suas exposições possam mudar de acordo com a vida de cada dia e onde cada um, leia outro jornal ou veja outra televisão, que tomou em consideração a sua memória a qual condiciona a sua percepção do mundo.
Se o Museu reconhece e é fruto da Comunidade, que lhe dá vida, terá forçosamente que admitir a alteração do lugar de cada um neste processo e encontrar novos rumos de comunicação que tenham em consideração os que produzem e consomem o discurso museológico.
De certa forma deveriam assumir-se de facto como entidades prestadoras de serviços e por consequência funcionarem como tal, ou seja, adoptarem plenamente as
3 Sobre esta questão já apresentamos algumas reflexões (2000, Notas para a palestra no I Curso de pós graduação de Museologia da USP) que têm a ver com o difícil reconhecimento do crescente grau de autonomia de cada visitante
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regras e os recursos que actualmente sustentam o desenvolvimento do sector dos serviços que cada vez mais ocupa a maior parcela da economia mundial.
Intangibilidade O serviço é intangível, isto é, não é palpável. Esta é sua mais evidente
característica. Contudo, é preciso, aqui, fazer um alerta: embora seja essencialmente intangível, todo serviço possui diversos elementos tangíveis., palpáveis, perceptíveis. (…) Dizemos mesmo que uma das técnicas de marketing de serviços é justamente tangibilizar o serviço., isto é, tornar visível o invisível, evidenciar aquilo que o serviço promete.(…) Na verdade, os elementos tangíveis do serviço, que podem mesmo ser as pessoas que nele trabalham, cumprem o papel de reduzir o nível de dúvida sobre a qualidade do serviço. É que, como se diz com frequência, todo serviço é a compra de uma promessa. (…) Neste ponto, é preciso mais um alerta: os elementos tangíveis de um serviço estão na esfera do parecer e não do ser, isto é, eles cumprem o papel da sedução, da transferência da confiança. Somente o próprio serviço é que irá validar a promessa, e então iremos não apenas parecer, mas também ser um serviço de alta qualidade.
Ora, em museologia, não existe qualquer equívoco relativamente ao carácter
intangível dos objectivos que levam o público aos museus. Ninguém que visite o Louvre tem como objectivo apropriar-se dos objectos expostos. A visita tem por objectivo mil razões que se irão ou não concretizar durante o espaço de tempo da visita. A tangibilidade do serviço é consumada num acto distinto da visita propriamente dita, que é na maior parte das vezes, a passagem pela loja do museu ou pelos comerciantes que vendem souvenirs no exterior do museu.
A questão da intangibilidade dos serviços não deve ser confundida com o reconhecimento da intervenção sobre o tangível e sobre o intangível que faz parte da prestação museal. Neste caso trata-se da natureza dos acervos susceptíveis de serem trabalhados pelos museus.
Por outro lado, o acto de parecer, o cenário, que credibiliza a proposta de venda também em museologia tem estado no centro das atenções A arquitectura dos edifícios, os uniformes dos guardas, os equipamentos electrónicos que protegem a colecção e que nos tornam actores únicos de um filme que passa numa sala escura cheia de monitores são elementos que também cumprem o papel de reduzir o nível de dúvida sobre a qualidade do serviço.
Descrevemos assim4 o carácter intangível da exposição museológica identificando-a como um instrumento de lazer:
O espaço museológico em geral, amplo, rico, recheado de coisas valiosas
ou exóticas, conduzindo o utilizador num jogo de orientação e adaptação contínuo, é a nosso ver motivação profunda do chamamento museológico. Mas
4 Museus e Sociedade, Reflexões sobre a função social do Museu, Mário C. Moutinho, Cadernos de Património nº 5, 1989 Museu Etnológico de Monte Redondo
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este chamamento tem ainda mais um atractivo, o do espectáculo camuflado. O apelo é feito em nome da cultura mas o fruto, sabe-o o público, é o evoluir num meio ritual, cheio de proibições e consentimentos, de evidências e clandestinos.
De certa maneira, visitar um museu tradicional é uma boa aventura, independentemente de esta ser estimulante ou frustrante. A diferença reside no número maior ou menor de estímulos assimilados, geralmente independentes do significado ou da compreensão que se manifesta dos objectos expostos.
É neste sentido aliás que se modernizam os museus, utilizando novas tecnologias, em particular na área da informática ou da comunicação participativa.
O objecto exposto dentro de um vitrina com a tal legenda reduzida e uma iluminação estática, ou seja o objecto passivo, tem vindo a ser progressivamente substituído pelo objecto activo o qual se movimenta e ilumina à vontade do visitante, mediante um simples carregar de botões. Se for caso disso, a legenda escrita será falada e ouvir-se-á um som evocando um contexto. Numa sala aparentemente toda às escuras, focos luminosos farão reviver o passado, exaltando volumes, contrastes e cores.
Écrans, passam montagens audiovisuais, videos debitam imagens sabiamente seleccionadas e teclados de terminais de computadores oferecem-se ao visitante, que terá assim o poder de instantaneamente fazer desfilar a informação requerida ou na maior parte das vezes já sugerida.
Nestes museus, o mundo da aventura é ainda mais evidente. O visitante sabe-se controlado pelos sistemas eletrónicos havendo mesmo casos em que a sala com os agentes de segurança face aos seus monitores, pode também ser visitada. Tem-se então a sensação de entrar na sala de controlo de Huston, assistindo ao lançamento de uma nave espacial. Se a visita for efectuada com a ajuda de um receptor individual que debita as informações em várias línguas, então de facto é-se transportado para um outro universo, quão distante do quotidiano.
É nos museus de ciência e tecnologia que o museu moderno melhor se afirma; os objectos funcionam, pode-se fazer experiências, tem-se a sensação de que tudo é explicado, e mesmo se se desejar, automaticamente impresso numa máquina super-rápida que apesar de custar milhões, trabalhou sem falha para cada um dos visitantes.
São estes museus, onde o visitante é solicitado por um maior número de estímulos, que se têm mais desenvolvido nos últimos anos, atraindo multidões de turistas, de alunos, de visitantes desejosos de mergulharem no mundo das fábulas.
Comparados com estes, os museus tradicionais de objectos passivos de pintura, de numismática, de mobiliário, de arqueologia ou mesmo contendo tudo isto e mais alguma coisa nas suas exposições, são de facto cada vez mais, os parentes pobres da museologia.
Perecibilidade
Serviços são perecíveis, isto é, não podem ser estocados. Assim, são temporais, prestados num tempo e local precisos. O que essa característica gera para o
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marketing de serviços? Uma pressão e uma necessidade de encontrar um ponto ótimo entre a oferta e a demanda do serviço. Ou seja, o grande problema é como administrar a demanda de um serviço. (…) o problema é que haverá momentos de altíssima demanda e outros de pequena demanda. Em todos eles, contudo, persistirá um alto custo fixo, que a empresa precisa procurar vender pelo menos ao nível do seu ponto de equilíbrio operacional. Assim, encontrar o ponto ótimo entre oferta e demanda é crucial em serviços para não ocorrer um problema comum em serviços, que tanto pode ser não conseguir atender o excesso de demanda (e perder clientes em função disso) quanto ter que suportar pesados custos operacionais sem a demanda correspondente.
A perecibilidade é a característica particularmente mail evidente no caso das
exposições temporárias onde a recuperação do investimento feito e eventual ganho, tem um tempo limite para ser efectuado. Neste sentido não é possível prolongar a vida da exposição sendo que o resultado é apenas aquele que for efectuado durante esse período.
Também é verdade que a perecibilidade do serviço pode por outro lado alicerçar a possibilidade de renovação e consequentemente de angariação de novos consumidores. Paradoxalmente a ideia de perecibilidade parece não afectar o Museu que se exibe ao longo dos anos e que mesmo sem público pode continuar a aguardar por um eventual visitante sem que isso pareça exercer qualquer pressão sobre a sua adormecida direcção. Neste caso, mais comum do que o bom senso justificaria, a manutenção do Museu deve-se a causas exteriores ao próprio museus mas sim ao lugar que este ocupa na estratégia da entidade que o mantém.
Num texto5 dedicado aos compromissos dos museus com a sociedade abordámos esta questão nos seguintes termos:
Aqui enquadramos os museus que acolhem as grandes exposições culturais dos tesouros reais, das retrospectivas de grandes pintores, das colecções de raridades, de aniversários ou centenários disto e daquilo. Geralmente estas exposições ou mega exposições, foram apropriadas pela grande indústria cultural, e associam para alem do poder político as grandes empresas em busca de álibis culturais para os salários mínimos ou não mínimos nos países onde (para as multinacionais) provisoriamente se instalaram e grandes novas empresas desbravando novos campos de actividade.
Nestes casos dos museus de “vernissage” das retrospectivas, e dos centenários, há que entender que a efemeridade do evento é certamente da maior relevância. Acções mobilizadoras de grandes recursos financeiros, elas traduzem a entrada da museologia na esfera da economia.
Não por se tratar de grandes investimentos, mas pelo fato de se assistir a transformação de simples “subsídios” em “capital”. Os subsídios estatais ou privados deixam de ter como destino o pagamento de consumos, mas sim o de
5 Os compromissos dos museus com a sociedade MUSA, Museus, Arqueologia & outros Patrimónios; Fórum Intermuseus do Distrito de Setúbal nº 1, 2005
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destino de entrarem num circuito no qual se mantêm e se multiplicam mediante a incorporação de trabalho alheio gerando mais valias.
E é nesta lógica que podemos entender o carácter efémero destes eventos, na medida em que para serem bens de consumo, têm de ser consumidos num duplo sentido:
Consumidos no sentido de usados Consumidos no sentido de esgotamento de tempo, de vida limitado.
Todos esses eventos, ao contrario das exposições permanentes, precisam de acabar para poderem dar lugar a outros eventos mais novos. Têm assim um tempo de vida útil durante o qual por necessidade própria ou alienada de cada visitante (do público em geral) são adquiridos. A transitoriedade, o sensacional, o espectacular, a raridade dos eventos, funcionam como precipitadores do processo de produção e de circulação na indústria cultural. Aqui a lógica dos bens produzidos sai da esfera da cultura, da cultura critica, para se compromissar com a própria lógica do “capital” através da actividade de um numero crescente de empresas criadas no exterior dos museus, para desespero de muitos!
Os museus e as novas tecnologias da informação e da comunicação
Num texto de Abdelillah Hamdouch e Esther Samuelides6, os autores caracterizam a atitude dos “prestataires de services” ou seja prestadores de serviços relativamente às novas tecnologias da informação e da comunicação (NTIC), salientando de certa forma o desfasamento entre essas empresas e as possibilidades que lhes estariam abertas se se posicionassem face ás NTIC de uma forma mais consistente, ao nível do seu envolvimento na investigação tecnológica, da capacidade de adoptarem novas formas de organização do trabalho, prevendo e antecipando as necessidades dos seus clientes. Se lermos esse texto substituindo a expressão “prestataires de services” por “museus” o resultado traduz de forma clara o comportamento da maioria dos museus um pouco por todo o lado:
Os museus não participam directamente na investigação tecnológica desenvolvida pelos empresas de equipamentos, mas utilizam essas mesmas tecnologias para criar aplicações para os seus serviços. A conquista de parte dos mercados nos crescentes sectores de serviços é na verdade condicionada pela capacidade dos próprios museus para atraírem públicos em razão da oferta de serviços com valor acrescentado por essas tecnologias.
Como o mercado é recente o sucesso das aplicações baseadas nessas tecnologias permanece incerto. Por outro lado a assimilação destas novas tecnologias nos museus é demorada e custosa.
Por isso os museus devem antecipar e prever as necessidades dos seus públicos tanto quanto o desenvolvimento e os limites das aplicações tecnológicas. Devem por isso aumentar a sua capacidade de reacção face as mudanças dos contextos em que laboram adaptando estratégias gestionárias flexíveis, as quais necessitam de grandes alterações de funcionamento internas.
Os museus devem por isso sondar os novos mercados em crescimento ligados às TIC pois os efeitos de rede favorecem os primeiros chegados. Estes novos serviços são valorizados pelos efeitos
6 Innovation, concurrence et strategies d’attraction de la demande dans les secteurs de services liés aux NTIC, Abdelillah Hamdouch, Esther Samuelides, in La nouvelle èconomie des services et innovation, Coord. Djellal, Faridah, Gallouj Faïz, ed. l’Harmattan, Paris, 2002.
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relativos à captura de novos públicos e à á sua fidelização a qual é um elemento essencial destas mudanças.
Este acesso preferencial aos públicos pode ser resultado das inovações especificas a cada serviço ou resultante de novas estratégias de gestão. Os serviços resultantes das TIC geram assim novas funções, novos modos de comunicação requerendo em consequência que os museus adquiram novas competências.
O desejo de explorar as novas oportunidades tecnológicas induz uma cooperação acrescida com os fornecedores de novas tecnologias, e o estímulo á criatividade dos próprios museus.
A análise das relações entre inovações tecnológicas, organizacionais e comerciais
e o papel de cada um destes tipos de inovação sobre o desempenho dos museus permite compreender como os museus podem estabelecer uma dinâmica de inovação contínua necessária à sua sobrevivência.
Adaptado de Nouvelle Économie dês services et innovation, Faridahy Djellal, Faïz Gallouj, l’Harmattan, Paris, 2002
Tal leitura significa por outro lado o longo caminho que será necessário percorrer
para que seja criada nos museus uma atitude favorável à lógica dos serviços e à introdução de novas tecnologias, não como resultado da simples modernização dos diversos sectores dos museus, mas como um recurso que permitirá transformar os museus da situação actual de permanentes “subsídio-dependentes” em instituições que produzem serviços para os quais existem utilizadores / clientes / públicos dispostos a adquirir de diferentes maneiras, esses mesmos serviços.
Esta nova atitude dos museus não exclui naturalmente o papel que os Estado no sentido amplo da palavra deve assumir no seio da cultura, e que na verdade ocupa ao financiar o essencial dos orçamentos dos museus. Situação essa que obviamente lhe permite de facto controlar não só a existência dos próprios museus mas também o seu discurso. Basta para tal e por exemplo analisar os procedimentos de financiamento em que assentam a atribuição de recursos financeiros ou a sua inscrição nos orçamentos globais de cada país.
O que nos preocupa é avaliar a possibilidade de os museus aprofundarem o seu lugar como espaço livre de acesso e de construção do saber, da criatividade e de consciência crítica dos cidadãos, sem dependerem quase exclusivamente dos
Introdução criação de novas tecnologias de informação e comunicação
Adaptação e melhoramento de serviços tradicionais
Criação de novos serviços
Automatização, videoconferência, gestão de colecções Segurança, Controle de climatização Museu na Web Expografia multimédia Guias Áudio/vídeo
Mudança de estratégias organizacionais E-comercio Museu virtual Integração de redes Novos recursos multimédia……
Inovação
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financiamentos (quem financia fá-lo segundo a sua própria racionalidade) mas assentarem essa sua actividade numa postura mais transparente de actuação.
Julgamos possível que os museus só têm a ganhar se assentarem a sua actuação numa atitude mais comprometida com os seus utilizadores / clientes / públicos, criando finalmente um espaço de diálogo e de troca. Esta situação contraria aquela mais corrente, onde o museu impõe o seu discurso, pela simples razão de ter obtido de alguma forma os recursos financeiros que lhe permitem, ou aos seus directores, impor os seus próprios discursos. Bibliografia Tadahiko Abe, What is Service Science? , The Fujitsu Research Institute, Economic Research Center , Tokyo, Japan (Research Report No. 246 December 2005 ) http://jp.fujitsu.com/group/fri/downloads/en/economic/publications/report/2005/246.pdf Marcos Kahtalian UniFAE Centro Universitário, Curitiba, Marketing de Serviços, http://www.fae.edu/publicacoes/pdf/mkt/2.pdf Djellal, Faridah, Gallouj Faïz, Coord. La nouvelle èconomie des services et innovation, ed. l’Harmattan, Paris, 2002.
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Boletim RPM 2011 A Memória também está em crise Mário Moutinho Presidente do MINOM-ICOM1
Todas as épocas têm os seus conceitos prediletos os quais traduzem ideias mais ou menos esclarecidas, às quais se “agarram” convicções, explicações e outras coisas que traduzem um saber velho que se mostra cada dia mais caduco e um saber novo que se constrói.
Entre a Memória que se constituía como o lugar central da lembrança óbvia e indiscutível e a Memória que é sobretudo construção e seleção, tal como pode ser ententida e como foi explicada por Hobsbawm e outros, vai a diferença que nos coloca no fio da navalha, na hora da opção, no sentido da decisão.
Como eram tranquilos os tempos em que sabíamos o que era Museu e o que não era. Nos primeiros mostravam-nos a Memória pelo menos histórica “verdadeira” de qualquer coisa ou quando a imaginação não ia tão longe mostravam-nos acervos e mais acervos, herdados, recolhidos, comprados, pilhados e oferecidos e eventualmente apresentados por ordem cronológica ou alfabética. Eram museus tranquilos, sem problemas que não fossem os de guardar, conservar e documentar. Quando narrativa existia, ela era sustentada no óbvio e no discurso da ideologia oficial.
Um museu de antropologia que mostrava como viviam os antepassados primitivos em territórios longínquos ou, mais modernamente, nas nossas aldeias de preferência transmontanas, dava gosto de fazer e tinha um público e um reconhecimento garantidos.
Museus que nos tempos de hoje se inscrevem na temática da Harmonia Social à volta da qual se reuniu a última Conferencia Geral do ICOM ou como em 2002, sob o tema “Museus & Globalização: contributo para o Dia Mundial dos Museus” o então presidente defendia que era urgente que os museus se mobilizassem de forma “a tirar proveito da nova ordem mundial” e, quem seria contra, deveriam estar atentos a “possíveis repercussões sobre o desenvolvimento cultural e sobre o respeito pelas identidades”.
Pouco lhe importava que a nova ordem mundial criasse todos os dias mais pobres ou como agora o Eurostat diz de forma eufemística “população suscetível de se situar abaixo do nível de pobreza”. Em 1992, o PNUD publicou um “Relatório Mundial sobre o Desenvolvimento Humano” dedicado à globalização, onde se lia que a distribuição do PNB no mundo, durante o período 1960-1989, significava que os Países onde habitavam os 20% da população mais rica tinham visto a sua parte do PNB mundial passar de 70.2% para 82.7%, enquanto os Países onde viviam os 20% mais pobres tinham visto a sua parte reduzir-se de 2,3% para 1,4%. E este processo mais não tem feito do que agravar-se, deixando à vista os parcos resultados obtidos nos Objetivos do Milénio.
1 O Movimento Internacional para uma Nova Museologia é uma organização afiliada ao Conselho Internacional dos Museus
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Entre a Memória do tempo das nossas vidas, ou seja, do presente que nos obriga a olhar criticamente o mundo em que vivemos e a tranquilidade do discurso oficial, como é possível que tantos museus consigam passar entre os pingos da chuva vivendo à revelia do mundo contemporâneo? Mas lá que passam, passam.
Outros porem, constroem as suas narrativas vinculadas aos desafios da humanidade, olhando à sua volta, procurando com maior ou menor sucesso serem atores de uma mudança social em favor de mais dignidade humana, de mais inclusão de mais direito de cidadania e de mais participação. Com um discurso político mais ou menos sustentado, aceitam que a realidade se imponha à ladainha das boas intenções. São narrativas de resistência que têm sustentado a ação regular ou intermitente de museus locais, de ecomuseus, de museus de comunidade e de tantos outros que procuram em particular, desde a década de 70, seguir o que se chamou ser uma nova museologia. Aqui a Memória esta mais perto do lugar, da comunidade, da família ou do grupo e é menos oficial.2
Este percurso tem agora na reedição do livro de Peter Davis, Ecomuseums: a sense of place3 a demonstração da vitalidade desta museologia. De França ao Vietname, do Japão à África do Sul, a Museologia tornou-se um recurso de comunicação com uma eficácia crescente e agora sustentada no campo mais abrangente da Sociomuseologia.4
Importa olhar com mais cuidado a rica e multifacetada política pública seguida no Brasil nos últimos anos onde a Política Nacional dos Museus é o reconhecimento, com as devidas consequências que isso acarreta, que é possivel transformar uma museologia comatosa como a que existia no Brasil, num processo social da maior envergadura.
Assim se reconheceu o direito à diferença, na medida em que se reconhecem as instituições museológicas como sendo “aquelas que disponibilizam acervos e exposições ao público, propiciando a ampliação do campo de construção identitária, a perceção crítica da realidade cultural brasileira, o estímulo a produção do conhecimento e a produção de novas oportunidades de lazer;”
E mais ainda, “aquelas instituições que desenvolvem programas, projetos e ações utilizando o património cultural como recurso educacional e de inclusão social”, assumindo assim que este entendimento de património como recurso, recentra a relação
2 Cf. http://icom.museum/fileadmin/user_upload/pdf/ICOM_News/2010-1/ENG/p8-9_2010-1.pdf 3 Ecomuseums: a sense of place, Peter Davis, Continuum, Londres, 2011 4 Cf. por exemplo Definição evolutiva de Sociomuseologia: Proposta para reflexão, Mário Moutinho, in atas do XIII Atelier Internacional do MINOM, Lisboa-Setúbal, Lisboa, Setembro 2007. http://revistas.ulusofona.pt/index.php/cadernosociomuseologia/article/viewFile/510/413 A Sociomuseologia traduz uma parte considerável do esforço de adequação das estruturas museológicas aos condicionalismos da sociedade contemporânea. A abertura do museu ao meio e a sua relação orgânica com o contexto social que lhe dá vida, têm provocado a necessidade de elaborar e esclarecer relações, noções e conceitos que podem dar conta deste processo. A Sociomuseologia constitui-se assim como uma área disciplinar de ensino, investigação e atuação que privilegia a articulação da museologia em particular com as áreas do conhecimento das Ciências Humanas, dos Estudo dos do Desenvolvimento, da Ciência de Serviços e do Planeamento do Território. A abordagem multidisciplinar da Sociomuseologia visa consolidar o reconhecimento da museologia como recurso para o desenvolvimento sustentável da humanidade, assente na igualdade de oportunidades e na inclusão social e económica. A Sociomuseologia assenta a sua intervenção social no património cultural e natural, tangível e intangível da humanidade. O que caracteriza a Sociomuseologia não é propriamente a natureza dos seus pressupostos e dos seus objetivos, como acontece em outras áreas do conhecimento, mas a interdisciplinaridade com que apela a áreas do conhecimento perfeitamente consolidadas e as relaciona com a Museologia propriamente dita.
3
3
Museologia/ Património/ Memória. É neste quadro que desenvolvem às centenas (é verdade que o Brasil é grande) iniciativas integradas nos programas públicos denominados por Pontos de Cultura e Pontos de Memória.
Os Pontos de Cultura são “iniciativas desenvolvidas pela sociedade civil tornam-se responsáveis por articular e impulsionar ações que já existem nas comunidades”. O Ponto de Cultura “não tem modelo único de instalações físicas, de programação ou atividade, é uma iniciativa que impulsiona a realização de ações envolvendo Arte e Educação, Cidadania com Cultura e Cultura com Economia Solidária.”
Os Pontos de Memória “assentam na gestão participativa e no protagonismo comunitário, apoiando o empoderamento social daqueles grupos que ainda não tiveram a oportunidade de contar suas histórias e Memórias através dos museus, incentivando a apropriação destes equipamentos pelas comunidades, de forma que se sintam representadas e valorizem a identidade local”. Os pontos de Memória visam assim “o fortalecimento de ações de reconstrução da Memória social e coletiva de comunidades, a partir do cidadão, de suas origens, suas histórias e seus valores”.5
Parece pois evidente que os Museus e a Memória podem ser fatores de coesão e por isso alguma coisa deveria mudar no nosso País, onde se tornam necessários melhoramentos das políticas culturais, face à realidade dos museus, à sociedade e à autodenominada globalização.
5 Cf por exemplo http://www.cultura.gov.br/site/2009/02/03/cultura/ ; http://www.cultura.gov.br/culturaviva/
1
Moutinho, Mario, Primo, Judite, Fronteras reales e imaginarias en los museus in:Museus del templo al laboratorio, La investigación teórica, Coord. Juan Carlos Rico Ed. Silex, Madrid, 2011 pp.321-327 Fronteiras reais e imaginárias nos Museus
Domínios há em que o Museu se mantém obstinadamente insensível às
mudanças da sociedade e por isso mesmo, vai aprofundando o fosso que separa uma
parte considerável da museologia da sociedade envolvente. São museus cheios de
fronteiras, algumas reais mas outras também imaginárias, fruto de receios e de
incompreensão que o lugar dos museus na sociedade se altera, ao mesmo ritmo da
própria sociedade.
Apesar dos museus serem objetivamente instituições prestadoras de serviços
não existe nos museus uma cultura de serviços e muito menos os recursos humanos
capazes de atuar plenamente como instituições de serviços. Não que os conceitos e
práticas de novas formas de gestão de planeamento, do marketing, da utilização das
NTIC (Novas Tecnologias de Informação e Comunicação) não estejam atualmente no
centro das atenções num número crescente de museus. A questão é que estes recursos
são colocados no essencial ao serviço da conceção de que os museus servem no
essencial para exibir as suas coleções.
A questão essencial que se coloca aos museus é a de saber se os museus são
apenas isso, ou se não têm um espaço mais amplo de atuação produzindo novos
serviços e utilizando os recursos atuais, não para os serviços tradicionais mas para
aqueles que falta ainda descobrir. Trata-se de por a Inovação não apenas ao serviço
das atividades tradicionais, mas também ao serviço de novos conceitos que de forma
crescente têm vindo a ser delineados nas últimas décadas.
Do museu integral, imaginado na Declaração de Santiago do Chile de 1972, ao
museu que renova as suas exposições todos os dias, existe cada vez mais espaço de
intervenção no qual devemos entrar, na condição de podermos passar as nossas
barreiras mentais e daqueles que nos rodeiam.
Podemos facilmente identificar alguns domínios onde essas fronteiras
persistem com maior ou menor consistência.
1-O discurso museológico mantém-se dependente das colecções
2
2-O discurso museológico não reconhece um novo grau de autonomia do
público
3-O tempo dentro do museu é quase sempre entendido como tempo passado e
mantém-se desfasado do quotidiano
4-Não faz parte da sua própria imagem de Museu a ideia de renovação
permanente
1-O discurso museológico mantém-se dependente das coleções
Sobre o primeiro ponto O discurso museológico mantém-se dependente das
coleções, julgamos que isso tem a ver particularmente com a própria origem de cada
museu que tem sempre por base uma colecção.
Apenas os museus de divulgação científica se colocam noutra situação, na
medida em que procuram expor e explicar, processos e leis, do domínio de diferentes
ciências (geralmente das ditas ciências exactas). Por isso os seus recursos expositivos
são no essencial fabricados, facto que, paradoxalmente, não parece incomodar os
setores do pensamento museológico que se reconhece nas funções tradicionais dos
museus e na ideia de raridade e de obra prima.
Michel Thevoz expressou de modo particularmente forte, uma ideia de
exposição, que subscrevemos plenamente e que de certa maneira dá embasamento à
nossa reflexão.
"Expor é ou deveria ser, trabalhar contra a ignorância, especialmente contra
a forma mais refractária da ignorância: a ideia pré - concebida, o preconceito, o
estereótipo cultural. Expor é tomar e calcular o risco de desorientar - no sentido
etimológico: (perder a orientação), perturbar a harmonia, o evidente, e o consenso,
constitutivo do lugar comum ( do banal). No entanto também é certo que uma
exposição que procuraria deliberadamente escandalizar traria, por uma perversão
inversa o mesmo resultado obscurantista que a luxúria pseudo - cultural. ... entre a
demagogia e a provocação, trata-se de encontrar o itinerário subtil da comunicação
visual."1
Então podemos admitir que a função de um museu se renovará, se este se
reconhecer como um lugar de comunicação, não acorrentado a colecções que em 1 Michel Thévoz, Esthétique et/ou anesthésie museographique, Objets Prétextes, Objects Manipulées, Neufchatel, 1984, p. 167
3
última instância determinam geralmente a sua própria programação. No entanto, se a
museologia como meio de Comunicação é cada vez mais reconhecida como uma
realidade incontornável, teremos que admitir que a museologia não é apenas o que
acontece nos Museus.
Antes pelo contrário, a museologia como meio de comunicação deverá ser
cada vez mais entendida como um recurso exterior ao Museu. E se assim for, teremos
de considerar a distinção entre a museografia, como tudo o que diz respeito ao Museu,
da expografia entendida como uma escrita, e como sendo um meio de comunicação.
Por seu lado a expografia procurará cada vez mais cortar o cordão umbilical
com a instituição museal para ser um recurso de comunicação de uso corrente,
plenamente democratizado e incluída nos programas escolares ao mesmo título que a
alfabetização, a informática ou a educação sexual.
Podemos fazer um paralelo: se a escrita não é apenas um recurso ao serviço
dos editores de texto, mas sim uma forma de expressão cada vez mais acessível e
democratizada a expografia também não é apenas um recurso que só tem sentido ao
serviço dos Museus.
2-O discurso museológico não reconhece um novo grau de autonomia do
público
Falamos por exemplo do grau de autonomia de cada visitante, que hoje
caracteriza a nossa sociedade e que leva os indivíduos cada vez mais a não se
submeterem tão facilmente a discursos autoritários e padronizados. Trata-se de um
segundo elemento que não mudou nos museus e que resumimos como a recusa dos
museus em reconhecer um novo grau de autonomia na aquisição de informações por
parte dos visitantes.
Hoje em dia qualquer adolescente nos países desenvolvidos e em certa medida
nos outros países, domina plenamente processos de aquisição de informação mil vezes
mais amplos e complexos que a geração dos seus pais. Estamos a falar da Web e de
todos os recursos aí existentes. Por que razão alguém se contentará da geralmente
pobre informação que o Museu disponibiliza quando tem ao seu alcance um mundo
de conhecimento? E no entanto, os museus obstinam-se a transportar para os displays
singulares ou cobrindo paredes inteiras, exatamente os mesmos conteúdos que eram
anteriormente apresentados em painéis penosamente construídos pedaço a pedaço ou,
4
mais modernamente, diretamente impressos em telas que depois se afixavam aos
mesmos painéis. Reduzir ou não procurar utilizar os recursos tecnológicos atuais para
servir novos desafios da museologia parece cada vez mais uma falta de atenção para
com o mundo em mudança.
Inteiramente ligado a esta questão está a compreensão do museu prestador de
serviços sobre o qual destacamos a título de exemplo duas características.
Em primeiro lugar a ideia de inseparabilidade que é certamente uma das
características mais evidentes dos Serviços e que reconhece que o momento da
produção e do consumo de cada serviço são simultâneos. No caso dos museus
falamos, naturalmente, da Exposição quer ela seja temporária ou permanente.
Na verdade cada museu tem um tempo limitado para confirmar junto de cada
visitante que a opção da visita foi correta e que corresponde as expectativas, que na
verdade são tão elevadas quanto os recursos aplicados na sua publicidade. E isto,
muito para além do facto, que por meio de diferentes mecanismos (subsídios,
programas especiais, preços diferenciados, bilhetes a custo zero) esta relação poderá
ser de certa forma ludibriada. O custo zero para o utilizador do serviço pode
efetivamente diminuir o seu grau de exigência, mas em última instância o desencanto
é uma penalização que nenhum visitante deseja e no qual assenta uma rejeição não só
para com a instituição como naturalmente para com todas as instituições que possam
ser semelhantes. No entanto esta questão do tempo disponível para corresponder às
expectativas do visitante não parece ser uma preocupação da maior parte das
administrações talvez pelo facto de cada museu abrir regularmente cada dia à mesma
hora ao longo de anos. É possível repetir a visita mas tal facto não anula uma
experiência falhada, como também é razoável pensar que a repetição nada trará de
novo que possa alterar a primeira sensação.
Nos museus tradicionais, assentes na apresentação e fruição das colecções
apoiadas na existência de recursos materiais como vitrinas ou novos suportes de
comunicação (vídeo, som, ambientes de imersão, etc..) para as quais se conceberam
espaços securisados e climatizados por meio de recursos materiais e de equipamentos
próprios, o visitante não pode levar consigo a exposição, devendo por isso consumi-la
durante a visita
Tudo o que o visitante pode fazer é viver a experiência registar alguns dos seus
aspetos em diferentes suportes ou recolher elementos tangíveis tais como folhetos,
5
catálogos ou objetos afins disponibilizados na loja do museus, elementos esses que
são aliás fundamentais para tangibilizar e credibilizar o Museu ou a exposição.
A disponibilização da exposição ou do museu na WEB tem por agora, o
mesmo valor da consulta do catálogo. Visita virtual ou leitura não substituem a
experiência da descoberta e fruição da exposição por cada visitante. Na verdade
nenhum museu toma em consideração o fator tempo como uma limitação á
compreensão do projeto expografico e nada na exposição foi determinado por esta
condicionante.
Um outro conceito que caracteriza os Serviços é o da variabilidade. A
Variabilidade significa que um serviço deve adaptar-se ao consumidor de forma a
poder responder as necessidades e as capacidades de cada indivíduo. Trata-se de falar
de atendimento personalizado por oposição a ideia corrente de exposição tamanho
único que deverá ignorar as diferenças.
Pode-se assumir que as exposições apresentadas pelos museus vivem
essencialmente na busca contínua do maior denominador comum. Apesar de se
reconhecer progressivamente a necessidade de criar exposições para determinados
públicos com algum grau de customização (legendas em várias línguas,
acessibilidades ou a utilização de áudio guias que permitem um leque alargado de
opções) a prestação museal não busca uma customização determinada pelas
necessidades do visitante único. Tal ideia é na verdade escandalosa para a
comunidade museal tanto mais que o paradigma do sucesso de uma exposição é
exatamente a sua capacidade de mobilizar no menor espaço de tempo o maior número
de visitantes. Pensar que importa responder as necessidades do visitante único, só por
si obrigaria a alterar não só os fundamentos de cada exposição mas repensar os
espaços arquitetónicos, (inclulindo os novos conceitos de ambiente inteligentes, de
paredes intertativas e todos aqueles que destes resultam), tipos de narrativas e os
recursos tecnológicos de cada exposição tendo em vista em de forma sobreposta o
tempo útil de consumo ou de fruição.
3-O tempo dentro do museu é quase sempre entendido como tempo
passado e mantém-se desfasado do quotidiano
A expografia deixando de estar acorrentada ao serviço das colecções passa a
poder ser um recurso para desenvolver e apresentar ideias dentro e fora do Museu.
6
Mas para os Museus isto trás consequências importantes e de difícil aceitação.
Reconhecemos no passado que as colecções dos museus tradicionais são compostas
por objectos e que as colecções dos Museus que buscam novos rumos, são os
problemas das comunidades que lhes dão vida.
E se assim for a expografia até aqui orientada para os objectos museológicos,
deverá pelo menos teoricamente, assumir formas diferentes, porque passa a trabalhar
com os problemas das comunidades.
Esta constatação implica por sua vez o reconhecimento de que as regras da
expografia de objetos provavelmente não coincidem com a expografia de ideias.
Porque exatamente essas ideias estão na base do processo comunicacional
devemos reconhecer um lugar próprio à memória de quem fala, de quem ouve e de
quem dialoga.
Não se expõem a memória das coisas, mas sim constrói-se um processo de
comunicação do qual é parte integrante a memória dos actores.
De objeto de coleção podemos assim passar progressivamente para a
potencialidade comunicativa da forma. E isto é tão mais certo se pensarmos com
Pierre Francastel numa epistemologia de criação imaginária. "Longe de ser um registo
mecânico de elementos sensórios, a visão prova ser uma apreensão verdadeiramente
criadora da realidade - imaginativa, inventiva, perspicaz e bela....Toda a percepção é
também pensamento, todo o raciocínio é também intuição, toda a observação é
também invenção. A forma de um objeto que vemos, contudo, não depende apenas de
sua projecção retiniana numa dado momento. Estritamente falando, a imagem é
determinada pela totalidade das experiências visuais que tivemos com aquele objeto
ou com aquele tipo de objeto durante toda a nossa vida"2
Ao libertar-nos o Museu das colecções e enunciar os dados de uma expografia
não fundada em objectos herdados mas sim construídos, estamos pervertendo a
função mais tradicional do Museu e quebrando por assim dizer as expectativas que o
público também mais tradicional pode ter do Museu.
Mas será que esse público mais tradicional do museu ainda existe ou será
apenas uma categoria uma espécie de fronteira que apenas existe na mente dos
diretores de museus.? É cada vez mais é difícil aceitar que o grau de exigência de
cada pessoa (mesmo que seja alienado) é progressivamente maior nos diferentes 2 citado em Rudolf Arnheim, Arte e Percepção Visual, Livraria Pioneira Editora, São Paulo, 1994, int,e p.40.,
7
aspetos do seu quotidiano, mas que esse grau ficaria estagnado no que diz respeito às
expectativas que tem ou pode ter sobre o lugar dos museus na sociedade
contemporânea.
4-Não faz parte da sua própria imagem de Museu a ideia de renovação
permanente
É um facto que os museus tal como os conhecemos não têm capacidade para
se renovarem todos os dias na medida em que são condicionados por vários fatores.
Sobretudo essa renovação é no essencial concebida com base nas condições de
produção atuais orientadas para a exibição de objetos herdados.
Faltará pois ter em consideração que mais tarde ou mais cedo os museus terão
de deixar esta obsessão pelo passado, para passar a comunicar por meio de objectos
que expressam ideias, utilizam plenamente os novos recursos da Tecnologia e
reconhecem a existência de um público que não precisa de guias, nem legendas.
Rejeitamos com facilidade um jornal que repetisse cada dia as notícias do dia
anterior. Mas aceitamos sem questionar que um museu mantenha a mesma exposição
durante meses ou anos.
Museu em que cada dia as suas exposições possam mudar de acordo com a
vida de cada dia e onde cada um, leia outro jornal ou veja outra televisão, que tomou
em consideração a memória certamente, mas também o olhar da curiosidade e do
desejo de aprender, voltado para o passado mas também voltado para o presente.
Museu em que cada dia as suas exposições possam mudar de acordo com a
vida de cada dia e onde cada um, leia outro jornal ou veja outra televisão, que tomou
em consideração a sua memória a qual condiciona a sua percepção do mundo.
Para ultrapassar as fronteiras reais e imaginárias nos Museus importa pois ter
em consideração: O reconhecimento que as questões do desenvolvimento social e da
Cultura são cada vez mais elementos de uma responsabilidade Social onde assenta a
intervenção museal.
O reconhecimento que todas as sociedades estão em permanente mudança pelo
que a actuação dos museus deverá assentar nessa própria mudança
O reconhecimento que os recursos humanos envolvidos nas diversas e
ampliadas funções dos museus carecem cada vez mais de formação aprofundada que
8
ultrapassa as tradicionais formações técnicas que esgotam a atuações dos museus
centrados exclusivamente sobre as suas coleções.
O reconhecimento que os museus são cada vez instituições entendidas como
entidades prestadoras de serviços, pelo que necessitam crescentemente de envolver os
conhecimentos das áreas da gestão, da inovação, do marketing, do design e das novas
tecnologias da informação e da comunicação em geral.
De certa forma falámos da necessidade dos museus ultrapassarem fronteiras
que foram construidas (e nas quais se habituaram a viver) em contextos sociais bem
diferentes daqueles em que vivemos.
Os contornos, os conceitos e as práticas dos Museus têm passado por
transformações profundas que têm colocado os Museus na Europa e no Mundo no
centro da vida económica cultural e social.
O trabalho teórico e metodológico que permite compreender estas
transformações é pois a tarefa principal de todos aqueles que vêm na Museologia um
recurso essencial de intervenção no mundo em que vivemos.
Se o Museu reconhece e é fruto da Comunidade, que lhe dá vida, terá
forçosamente que admitir a alteração do lugar de cada um neste processo e encontrar
novos rumos de comunicação que tenham em consideração os que produzem e
consomem o discurso museológico.
1
Moutinho, Mario C. M. 2010. Os museus portugueses perante a Sociomuselogia. In 100 anos de patrimônio: memória e identidade: , 313 - 322. ISBN: 978-989-8052-20-9. Lisboa: IGESPAR. Mário Moutinho
Possui graduação em Arquitetura/Urbanismo - École Nationale Superieure des Beaux Arts de Paris (1972) e Doutoramento em Antropologia Cultural - Universidade de Paris VII Jussieu (1978). Atualmente é Reitor da Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias. Atua na área da Museologia Social e do Urbanismo e Ordenamento do Território. Foi fundador e coordenador do Mestrado e do Doutoramento em Museologia da Universidade Lusófona de Lisboa. Membro fundador e dirigente do Movimento Internacional para uma Nova Museologia MINOM-ICOM. Director da Revista Cadernos de Sociomuseologia. Os museus Portugueses perante a Sociomuseologia Mário Moutinho 1
Os Museus constituem atualmente, na maioria dos países, uma parte da atividade
cultural onde se desenvolvem os desafios cada vez mais centrais das problemáticas da identidade, do lazer, da educação e da inclusão socioeconómica.
Em Portugal o fim do século XX foi certamente o período em que o pensamento museológico, a par do forte aumento do número dos museus, mais cresceu. Trata-se de iniciativas essencialmente de âmbito local com origem no associativismo e nas políticas culturais e turísticas dos municípios. Estas iniciativas correspondem a um complexo conjunto de motivações, de abordagens e de diversas formas de entender as questões patrimoniais tanto ao nível da patrimonialização como da musealização. É pois legitimo encontrar um panorama multifacetado desta museologia, a qual se apoia atualmente, por um lado no enquadramento das políticas públicas para a cultura, tanto de âmbito nacional como europeu, (POC, Programas LEADER, INTERREG etc.) e por outro lado numa crescente atenção que as universidades portuguesas têm dado à questão da qualificação dos recursos humanos. São várias as Universidade, subsidiadas e autofinanciadas, que oferecem cursos de pós graduação, de Mestrado e mais recentemente de Doutoramento em Museologia. Seguindo conceitos métodos e objetivos diversos, mas que no seu todo oferecem um vasto leque de escolha entre a museologia tradicional voltada para as coleções e a museologia mais envolvida com as questões da inclusão social e do desenvolvimento. Isoladas estão as pessoas que ainda não assumiram que a qualidade de desempenho de uma instituição, depende da qualificação do seu Capital Humano e, consequentemente, da qualidade da sua formação teórica e pratica.
No último quartel do século XX as práticas museológicas e os conceitos que lhes estão ligados sofreram alterações profundas. Este processo procurou adaptar as instituições museológicas às mutações da própria sociedade sempre no sentido de levar os museus a participarem ativamente em favor das sociedades que lhes davam e dão vida. As práticas correntemente inscritas na ideia de Nova Museologia ao longo dos anos foram incorporando novas abordagens e novos conceitos que atualmente dão corpo à Sociomuseologia, na qual se busca uma visão mais abrangente destes processos.
Isto não significa que todos os museus tenham sido sempre sensíveis aos contextos de mudança, pelo que hoje encontramos museus que se autoexcluíram dos processos de participação e na verdade vegetam lamentavelmente sem que neles se vislumbre o exercício de qualquer utilidade para com o resto da sociedade.
São museus alheios ao desenvolvimento, sorvedouros de recursos financeiros, fechados sobre as suas coleções que na maior parte dos casos se deterioram ao ritmo dos anos.
1 Este texto utiliza largamente os seguintes documentos da nossa autoria: -Museologia: Novos Enfoques / Novos Desafios, Revista Ciências em Museus, nº 4, Actas do Simpósio Internacional "O Processo de Comunicação nos Museus de Arqueologia e Etnologia", Museu de Arqueologia e Etnologia da Universidade de São Paulo, 1995, São Paulo. -A Museologia Informal, Boletim da Associação Portuguesa de Museologia, nº 3, APOM, 1996, Lisboa. -Theory and Practice of Social Museology, Stoneterior, nº46, 1997, Toquio. -Notas para apresentação do tema Museologia e Desenvolvimento, “Understanding Culture in Sustainable Development: Investing in Cultural and Natural Endowments”. World Bank, Washington, 1998. -Fronteiras reais e imaginárias nos Museus, in Museos: del templo al laboratório, Coord. Juan Carlos Rico Ediciones SILEX, Madrid, 2010, (no prlo)
2
Por isso, esses museus, reduzem geralmente a sua atividade à manutenção de uma exposição permanente sem ideias, sem rumo, de puro “exibicionismo” como diria Hugues de Varine e que por isso mesmo, envelhecem ainda mais rapidamente.
Já descrevemos2 uma possível categorização dos museus tendo em conta os seus compromissos, ou seja de fato aquilo a que estão efetivamente vinculados no seu dia a dia.
Assim temos os museus compromissados consigo próprios que a penas buscam a sobrevivência institucional, assegurando a abertura regular das portas nos horários fixados pelas tutelas. São museus que não dão problemas nem para essas mesmas tutelas nem para os seus diretores ou diretoras para quem as iniciativas devem ser permanentemente adiadas. Eventualmente um chamado serviço educativo que mostra a exposição, assegura a quase totalidade dos visitantes. Outro tipo de museus agrupa as instituições que têm por finalidade servir o poder, no ato da inauguração, nas visitas presidenciais e na justificação da existência de preocupações culturais a nível autárquico ou da administração local. “São Museus que transmitem condicionamentos culturais e políticos muitas vezes na perfeita harmonia com serviços pedagógicos bem montados, onde as teorias da aprendizagem formal e informal são sempre atualizadas. Mas também são museus onde mais que a memória se guiam pelo esquecimento. Nunca se saberia visitando a maioria dos museus Americanos que o homem negro existe na América (John Kinard, Director do Museu de Anacostia.)”3.
Uma terceira categoria refere-se aos museus compromissados com a indústria cultural, onde para desespero dos conservadores que fazem parte dos quadros e gerem minguados orçamentos, tomam o poder de um dia para o outro, por períodos mais ou menos longos, os chamados “comissários” que vêm gerir a aplicação de elevadas verbas, provenientes de grandes empresas carentes de valorização pública cultural, ou diretamente de Comissões criadas pela administração central para comemorar aniversários, centenários, ilustrar reuniões internacionais. É a museologia ao sabor da criatividade de “Empresas Culturais” atualmente assentes na utilização de novas tecnologias de informação e comunicação onde se fica na dúvida se são os recursos tecnológicos a alma da exposição ou mesmo se para lá disso a exposição tem alguma alma.
Existem também os museus clandestinos, compromissados com os seus públicos onde tudo o que se faz de inovador se faz para lá das horas de serviço, onde cada exposição é uma vitória sobre a ignorância na tentativa de passar uma mensagem, ou uma ideia. São museus que vingam à revelia das administrações ou das tutelas. Ou são mesmo museus onde as administrações têm de atuar à revelia das tutelas, pondo cada dia em risco o seu emprego.
Enfim uma outra categoria de Museu bem mais complexa de definir onde se junta um envolvimento mais profundo com o mundo contemporâneo, com mais ou menos recursos, mas que procura aliar o seu quotidiano aos seus recursos humanos, protegido por administrações ou tutelas que fazem da partilha a sua regra de conduta, que estão atentos aos novos recursos tecnológicos procurando usar estes ao serviço das ideias. Estes museus (públicos e privados) que na verdade buscam o seu caminho todos os dias existem um pouco por todo o país mas são certamente uma minoria. Ou de outra forma, são museus que vivem procurando os compromissos necessários à sua existência centrando-se sobre o essencial ao mesmo tempo que relativizam o que é marginal.
Pensando mais propriamente nos Museus Locais (bem mais de um milhar), Fernando João Moreira destacou quatro situações relacionadas com os objetivos que os fundamentam e, claro está, com as práticas que daí derivam: “O museu politicamente correto
O museu local que, dotado de alguns meios técnicos e financeiros procura salvaguardar o património local e assumir um papel de interventor ativo na promoção das bases culturais e identitárias existentes na sua área de influência, ou seja, um museu cuja atuação se cinge ao domínio cultural (…) e em cujas atividades a linguagem expositiva ocupa um papel central – o museu politicamente correto e de sucesso, o orgulho do Presidente da Câmara Municipal e o
2 Cf. Mário Moutinho., Os compromissos dos museus com a sociedade, MUSA, Museus, Arqueologia & outros Patrimónios; Fórum Intermuseus do Distrito de Setúbal nº 1, 2005 3 Iden
3
paraíso do conservador museólogo pós-moderno (o museu tradicional de nova geração em meio rural ou de sede de concelho);
O museu incompreendido ou o museu primeiros socorros
O museu local que se assume como prestador de serviços, um museu concebido para ser utilizado pelas populações consoante as suas necessidades pessoais ou coletivas, ou seja, um museu com objetivos nobres mas que, pelo seu caráter de “faz tudo”, dificilmente é tomado a sério pela comunidade e pelas instituições regulatórias – o museu incompreendido ou o museu primeiros socorros;
O museu promotor
O museu local que tem como objetivo fundamental da sua atuação a promoção do desenvolvimento local, um museu aberto a toda a participação popular e com campos de atuação variados centrados em duas dimensões principais, a interna (promoção do desenvolvimento imaterial das populações – reforço das identidades, inclusão de setores específicos da população, preservação da memória …., numa palavra, a dimensão de guarda das especificidades e da manutenção das diferenças locais) e a externa (promoção do desenvolvimento material - reforço da visibilidade local no exterior, reforço da atratividade turística, agente de animação, agente da valorização dos produtos artesanais locais através da promoção da inovação na tradição, …, numa palavra, a dimensão de agente despoletador de fatores de equidade territorial relativamente a outros espaços). Trata-se de um museu cuja diferença para o tipo anterior reside, sobretudo, na existência de parâmetros que balizam a sua ação (existência de grandes objetivos e de objetivos específicos materializados na existência de estratégias de atuação que culminam num programa de atuação – plano estratégico e operacional do museu, elaborado através da adoção de metodologias efetivamente participativas) e no facto de privilegiar as ações coletivas de base local em detrimento das ações com contornos ou objetivos mais individuais – o museu promotor”.4
Em ambas caracterizações (redutoras por natureza) podemos no entanto encontrar algumas das linhas de força que caracterizam a museologia e museus nos tempos que correm. Trata-se de assumir o direito à diferença, a crescente autonomia dos públicos e a existência de utilizadores diretos e indiretos, a crescente transformação dos ritmos da atividade museológica e a mais longínqua não menos incontornável compreensão dos museus como entidades prestadoras de serviços.
O direito à diferença
Deixou de existir um modelo único de Museu igual à ideia de coleção, de edifício e de público, para se assumir o museu com um lugar central dos conceitos de património (s) território e população.
Desenvolveram-se novos modelos de gestão não hierarquizados e assumiu-se o alargamento da noção de património, e a consequente redefinição de "objeto museológico ",
Este processo de abandono de uma ideia única de Museu é determinado pela ambiguidade desta situação, que arrasta conflitos, difíceis em muitos casos de resolver.
Os conceitos de Sociomuseologia de forma mais abrangente e alguns dos conceitos ligados à nova museologia tais como Ecomuseologia e Economuseologia, expressam diferentes formas dos museus se posicionarem no mundo contemporâneo. Partiu-se da ideia de que o museu é "uma instituição permanente, sem finalidade lucrativa, ao serviço da sociedade e do seu desenvolvimento, aberta ao público e que realiza investigações que dizem respeito aos testemunhos materiais do homem e do seu meio ambiente, adquire os mesmos, conserva-os, transmite-os e expõe-nos especialmente com intenções de estudo, da educação e de deleite”. Os museus bem comportados do ICOM!
Mas para além desses Museus designados como tal passaram também a ser reconhecidas como museus as instituições ou organizações com fins não lucrativos que exercem atividades de investigação, educativas, de formação, de documentação e outras relacionadas com os Museu ou com a museologia (Estatutos do Conselho Internacional dos Museu 1995)
4 Cf. Mário Moutinho., A qualidade em museus, nos museus em mudança. Cadernos de Sociomuseologia Nº 25 – 2006, ULHT, Lisboa, p. 66
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É cada vez mais frequente constatar que uma nova geração de Museus (mesmo aqueles que nada mudaram em relação aos pontos que referimos) se organizam e definem os seus programas de atividades e são perspetivados, como recurso para o desenvolvimento. Preocupam-se com os problemas do mundo em que vivem promovendo o emprego, fomentando novas formas de turismo, revitalizando e criando indústrias e reforçando identidades.
É certo que já nos estatutos do ICOM se fala que o museu é uma instituição ao serviço da sociedade e do seu desenvolvimento, mas também é certo que os museus têm estado mais ao serviço de si próprios, das suas coleções e dos objetos que os seus donos lhes atribuíram, porque os museus têm donos sejam eles públicos ou privados.
Mas também é certo, que é cada vez mais frequente constatar que uma nova geração de Museus se organizam e definem os seus programas de atividades perspetivados, como recurso para o desenvolvimento. Preocupam-se com os problemas do mundo em que vivem promovendo o emprego, fomentando novas formas de turismo, revitalizando e criando indústrias e reforçando identidades. Cada dia mais os museus procuram diferentes formas de sustentabilidade e estão atentos à promoção do desenvolvimento humano e da coesão social e económica A autonomia dos públicos
A museologia como meio de comunicação é cada vez mais entendida como um recurso exterior ao Museu. E se assim for, teremos de considerar a distinção entre a museografia, como tudo o que diz respeito ao Museu, da expografia entendida como uma escrita, de algum modo inovadora, como sendo esse meio de comunicação.
Podemos fazer um paralelo: se a escrita não é apenas um recurso ao serviço dos editores de texto, mas sim uma forma de expressão cada vez mais acessível e democratizada a expografia também não é apenas um recurso que só tem sentido ao serviço dos Museus
Se o Museu reconhece e é fruto das multifacetadas Redes, que lhe dá vida, terá forçosamente que admitir a alteração do lugar de cada um ocupa neste processo e encontrar novos rumos de comunicação que tenham em consideração os que produzem e consomem o discurso museológico são parte do mesmo processo.
Mas para os Museus isto trás consequências importantes e de difícil aceitação. A expografia deixando de estar acorrentada ao serviço das coleções passa a poder ser um recurso para desenvolver e apresentar ideias dentro e fora do Museu.
O grau de autonomia de cada pessoa, que hoje caracteriza a nossa sociedade leva os indivíduos cada vez mais, a não se submeterem tão facilmente a discursos autoritários e padronizados.
Primeiro, cada vez mais se exige uma informação (ou questionamento) sobre o quotidiano. O Museu é cada vez mais entendido pelo seu conteúdo, como através das preocupações do visitante. Reconhecer a existência de um público que não precisa de guias, nem legendas é apenas bom senso e obriga o Museu a elaborar discursos simultaneamente mais complexos e menos padronizados.
Hoje em dia qualquer adolescente domina plenamente processos de aquisição de informação mil vezes mais amplos e complexos que a geração dos seus pais. Estamos a falar da Web e de todos os recursos ai existentes. Por que razão alguém se contentará da geralmente pobre informação que o Museu disponibiliza quando tem ao seu alcance um mundo de conhecimento? Hoje em dia qualquer adolescente nos países desenvolvidos e em certa medida nos outros países, domina plenamente processos de aquisição de informação mil vezes mais amplos e complexos que a geração dos seus pais. Estamos a falar da Web e de todos os recursos aí existentes. Porque razão alguém se contentará da geralmente pobre informação que o Museu disponibiliza quando tem ao seu alcance um mundo de conhecimento? E no entanto os museus obstinam-se a transportar para os displays singulares ou cobrindo paredes inteiras, exatamente os mesmos conteúdos que anteriormente apresentação em painéis penosamente construídos pedaço a pedaço ou, mais modernamente, diretamente impressos em telas que depois se afixavam aos mesmos painéis. Reduzir ou não procurar utilizar os recursos tecnológicos atuais para servir novos desafios da museologia, mas somente para modernizar narrativas esgotadas, parece cada vez mais uma falta de atenção para com o mundo em mudança. Os ritmos museológicos
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A ideia de exposição temporária é hoje um dado adquirido e nenhum museu que se pretenda moderno ousaria ignorar este facto. Por outro lado a montagem de exposições sobre problemas da atualidade, museus da sociologia, da psicologia ou da globalização, também são uma realidade e estruturam por si sós a programação museológica de pequenas e grandes instituições, ou de pequenos museus de comunidade e de redes onde as exposições são essencialmente o partilhado processo de apreensão da realidade e catalisadoras de vontades, aspirações e desejos de intervenção.
Faltará pois ter em consideração que mais tarde ou mais cedo os museus terão de deixar pelo menos em parte esta obsessão pelo passado, para passar a comunicar por meio de objetos que expressam ideias e reconhecer a existência de um público que não precisa de guias, nem legendas.
Museu em que cada dia as suas exposições possam mudar de acordo com a vida de cada dia e onde cada um, leia outro jornal ou veja outra televisão, que tomou em consideração a sua memória a qual condiciona a sua perceção do mundo.
Se o Museu reconhece e é fruto da Comunidade, que lhe dá vida, terá forçosamente que admitir a alteração do lugar de cada um neste processo e encontrar novos rumos de comunicação que tenham em consideração os que produzem e consomem o discurso museológico.
Em forma de conclusão
Quer se trate de museus tradicionais que preservam e exibem as suas coleções para múltiplos fins incluindo a educação o lazer, ou quer se trate de museus sustentados conceptualmente na Sociomuseologia e por isso envolvidos com os conceitos de desenvolvimento, território, participação e inclusão social, em ambos os casos podem ser entendidos como organizações prestadoras de serviços, também configuradas com as expectativas dos seus públicos, utilizadores e beneficiários indiretos.
Os contornos, os conceitos e as práticas dos Museus têm passado por transformações profundas que têm colocado os Museus na Europa e no Mundo no centro da vida económica cultural e social.
O trabalho teórico e metodológico que permite compreender estas transformações é pois a tarefa principal de todos aqueles que vêm na Sociomuseologia um recurso essencial de intervenção no mundo em que vivemos.
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Documento Definição evolutiva de Sociomuseologia: Proposta para reflexão5 Mário Moutinho, Definição evolutiva de Sociomuseologia: Proposta para reflexão, in atas do XIII Atelier Internacional do MINOM, Lisboa-Setúbal, Lisboa, Setembro 2007. http://revistas.ulusofona.pt/index.php/cadernosociomuseologia/article/viewFile/510/413 A Sociomuseologia traduz uma parte considerável do esforço de adequação das estruturas museológicas aos condicionalismos da sociedade contemporânea. A abertura do museu ao meio e a sua relação orgânica com o contexto social que lhe dá vida, têm provocado a necessidade de elaborar e esclarecer relações, noções e conceitos que podem dar conta deste processo. A Sociomuseologia constitui-se assim como uma área disciplinar de ensino, investigação e atuação que privilegia a articulação da museologia em particular com as áreas do conhecimento das Ciências Humanas, dos Estudo dos do Desenvolvimento, da Ciência de Serviços e do Planeamento do Território. A abordagem multidisciplinar da Sociomuseologia visa consolidar o reconhecimento da museologia como recurso para o desenvolvimento sustentável da humanidade, assente na igualdade de oportunidades e na inclusão social e económica. A Sociomuseologia assenta a sua intervenção social no património cultural e natural, tangível e intangível da humanidade. O que caracteriza a Sociomuseologia não é propriamente a natureza dos seus pressupostos e dos seus objetivos, como acontece em outras áreas do conhecimento, mas a interdisciplinaridade com que apela a áreas do conhecimento perfeitamente consolidadas e as relaciona com a Museologia propriamente dita. As preocupações fundamentais da Sociomuseologia há muito que se encontram descritas em numerosos documentos elaborados dentro e fora da Museologia. A titulo de exemplo pode-se referir a Declaração de Santiago do Chile de 1972, a Declaração de Quebec (MINOM) 1984, a Convenção sobre a proteção e promoção da diversidade das expressões culturais (UNESCO), 2005, a Convenção para a salvaguarda do património imaterial (UNESCO) 2003, Convenção do Património Mundial, A Proteção do Património Mundial Cultural e Natural, UNESCO – Paris, 1972, Em todos este documentos aparece um traço de continuidade que indica claramente o alargamento das funções tradicionais da museologia e o papel que deverão assumir na sociedade contemporânea. 1- Entre essas preocupações deve ser referido o caráter global (planetário) dos problemas relacionados com a valorização e proteção do Património Cultural e Natural no quadro de uma visão nacional e internacional não só pela natureza dos problemas mas também pela necessidade de assentar politicas que ultrapassam os limites nacionais e afetam regiões ou em muitos casos dizem respeito ao próprio planeta no seu todo. Este entendimento resulta em parte da necessidade de envolver recursos humanos, financeiros e legais científicos e técnicos que ultrapassam claramente a responsabilidade local ou nacional. (Convenção do Património Mundial, A Proteção do Património Mundial Cultural e Natural, UNESCO – Paris, 1972) 2- O reconhecimento que as questões do desenvolvimento também têm vindo a ser consideradas aos níveis local, nacional e internacional não só pela natureza das questões mas também pelo caráter alargado do princípio da sustentabilidade que obviamente não só ultrapassa as fronteiras como também exige soluções globalmente sustentáveis. Neste contexto as soluções implicam abordagens multifacetadas e assentes no princípio da participação que não são específicas de um só grupo social mas que ao contrário assentam na participação e no compromisso individual e coletivo. Cultura e desenvolvimento são cada vez mais elementos de uma responsabilidade Social onde assenta a intervenção museal
3- Também é largamente reconhecido que todas as sociedades estão em permanente mudança pelo que a atuação dos museus deverá assentar nessa própria mudança sempre que procura deter um papel socialmente interveniente.
Que o museu é uma instituição a serviço da sociedade, da qual é parte integrante e que possui nele mesmo os elementos que lhe permitem participar na formação da consciência das comunidades que ele serve; que ele pode contribuir para o engajamento destas comunidades na ação, situando suas atividades em um quadro histórico que permita esclarecer os problemas atuais, isto é, ligando o passado ao presente, engajando-se nas mudanças de estrutura em curso e provocando outras mudanças no interior de suas respetivas realidades nacionais; (Mesa-Redonda de Santiago do Chile, ICOM, 1972)
4- Os museus são cada vez instituições entendidas como entidades prestadoras de serviços, pelo que necessitam crescentemente de envolver os conhecimentos das áreas da gestão da inovação, do marketing, do design e das novas tecnologias da informação e da comunicação. Estas áreas do conhecimento trazem para os museus fatores de melhoramento da qualidade da relação dos Museus com os seus públicos e/ou utilizadores para a qual se aplicam as ferramentas de avaliação da qualidade.
5 Mário Moutinho, Definição evolutiva de Sociomuseologia: Proposta para reflexão, in atas do XIII Atelier Internacional do MINOM, Lisboa-Setúbal, Lisboa, Setembro 2007. http://revistas.ulusofona.pt/index.php/cadernosociomuseologia/article/viewFile/510/413
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Estas abordagens essenciais mas efetuadas parcelarmente encontram agora numa nova área de conhecimento geralmente denominada por Ciência de Serviços, Gestão e Engenharia. (SSME). Esta área propõe-se reunir e articular de forma consistente os trabalhos em curso no domínio da informática, da engenharia industrial, da estratégia empresarial, das ciências de administração, das ciências sociais e cognitivas e das ciências jurídicas de modo a desenvolver as competências requeridas por uma economia orientada e assente cada vez mais na produção e uso de serviços. Esta área do conhecimento visa o entendimento transversal de outras áreas que por si só atingiram um desenvolvimento considerável, mas que raramente são objeto de entendimento articulado e dialético. Mais do que uma função propriamente técnica que resulta do entendimento do museu com uma instituição ao serviço dos objetos museológicos os Museus são cada vez mais entendidos como instituições prestadoras de serviços e neste sentido devendo ser compreendidas como qualquer outra atividade de Serviços. 5- A atuação dos recursos humanos envolvidos nas diversas e ampliadas funções dos museus carecem cada vez mais de formação aprofundada que ultrapassa as tradicionais formações técnicas que esgotam a atuações dos museus centrados exclusivamente sobre as suas coleções. As Curricula Guidelines for Professional Development actualmente em processo de revisão no seio do ICOM dão claramente conta multiplicidade dos campos de formação de modo a cobrir todas as áreas onde o Museu se afirma como áreas de trabalho. De forma resumida a Declaração do ICTOP de Lisboa 1994 já anunciava este novo processo de revisão da formação dos trabalhadores dos museus.
Os programas de formação museológica devem oferecer oportunidades de formação que visem o preenchimento das necessidades imediatas e das expectativas da comunidade museológica para a munir de uma programação pró-ativa em vez de uma instrução reativa; (…), Os programas de formação museológica devem preparar formandos, a todos os níveis, para desempenharem mais elevados papéis de liderança, estimulando a investigação intelectual, a interação imaginativa, e soluções corajosas para aplicar a práticas e atividades museológicas, bem como transmitindo um senso de responsabilidade ética, profissional e social; (Declaração de Lisboa, Resoluções da Comissão Internacional de Formação de Pessoal de Museus – Conferencia do ICTOP/Universidade Lusófona, 1994)
Esta proposta de definição da Sociomuseologia mais do que um puro exercício gramatical pretende na verdade chamar a tenção para toda uma vasta área de preocupações, métodos e objetivos que dão cada vez mais sentido a uma museologia cujos limites não cessam de crescer. A visão restritiva da museologia como técnica de trabalho orientada para as coleções, tem dado lugar a um novo entender e práticas museológicas orientadas para o desenvolvimento da humanidade.
E é exatamente para esta realidade, fruto da articulação de áreas do saber que cresceram por vezes fora da museologia mas que progressivamente se tornaram recursos incontornáveis para o desenvolvimento da própria Museologia, que a definição de Sociomuseologia se revela poder ser um contributo que ajuda a compreender processos e definir novos limites.
Assim entendido a Sociomuseologia assume-se como uma nova área disciplinar que resulta da articulação entre as demais áreas do saber que contribuem para o processo museológico contemporâneo. Entre o paradigma do Museu ao serviço das coleções e o paradigma do Museu ao serviço da sociedade está o lugar da Sociomuseologia