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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
AVM FACULDADE INTEGRADA
O estudo dos elementos psicomotores na facilitação do desenvolvimento da criança, com o olhar da Terapia
Ocupacional
Por: Angela Regina Brasil
Orientador Profª Me Fátima Alves
Rio de Janeiro 2014
DOCUMENTO PROTEGID
O PELA
LEI D
E DIR
EITO A
UTORAL
DOCUMENTO PROTEGID
O PELA
LEI D
E DIR
EITO AUTORAL
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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
AVM FACULDADE INTEGRADA
O estudo dos elementos psicomotores na facilitação do desenvolvimento da criança, com o olhar da Terapia
Ocupacional
Apresentação de monografia à AVM Faculdade Integrada como requisito parcial para obtenção do grau de especialista em Psicomotricidade.
Por: Angela Regina Brasil
Rio de Janeiro 2014
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AGRADECIMENTO
Agradeço a Deus pelas dificuldades em meu caminho, pois sem elas não haveria mérito nas conquistas e depois aos meus filhos Haroldo, Alvaro e Arnaldo. Minha neta Mariana, minha nora Michele e demais pessoas que estiveram sempre presentes.
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DEDICATÓRIA
Dedico aos meus pacientes que me mostraram da necessidade em evoluir na busca de conhecimento específico para melhor desempenhar a Terapia Ocupacional em minha clínica com eles, onde pudemos compartilhar e usufruir desta experiência. “Nesse sentido visamos coordenar intimamente olho e mão, sentimento e pensamento, corpo e psique, primeiro passo para a realização do todo específico que deverá vir a ser a personalidade de cada indivíduo sadio. Na busca de conseguir esta coordenação, fazemos apelo às atividades que envolvam a função criadora existente mais ou menos adormecida, dentro de todo indivíduo”. (Nise da Silveira, Casa das Palmeiras).
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RESUMO
O objetivo do estudo dos elementos psicomotores na facilitação do desenvolvimento da criança, com um olhar da terapia ocupacional em entender que os elementos que compõem a psicomotricidade cursam com a organização e o desenvolvimento cognitivo, motor e afetivo da criança. Sabe-se ainda quanto o movimentar livre no espaço é fundamental neste desenvolvimento físico, intelectual e emocional de uma criança, também se sabe o quanto à movimentação livre pela imaterialidade e no “espaço” subjetivo, é o que estabelece uma relação de significado na existência de uma pessoa, e mais, o quanto essas duas questões devem se misturar e serem compartilhados pelo terapeuta ocupacional na busca de uma relação de significado na existência de uma criança, e o quanto essas duas visões devem se relacionar harmonizando-se. Palavras-chave: Psicomotricidade, movimento, desenvolvimento, terapia ocupacional .
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METODOLOGIA
A metodologia empregada foi com enfoque teórico e através de informações em consultas bibliográficas, como em livros e artigos da internet. Foram colhidos dados necessários à psicomotricidade e terapia ocupacional, para compor este trabalho monográfico.
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SUMÁRIO INTRODUÇÃO ............................................................8 CAPÍTULO I PSICOMOTRICIDADE..................................................10 CAPÍTULO II A RELAÇÃO DO CORPO E O MOVIMENTO..............26 CAPÍTULO III TERAPIA OCUPACIONAL..........................................35 CONCLUSÃO.............................................................46 BIBLIOGRAFIA...........................................................48 ÍNDICE........................................................................50
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INTRODUÇÃO
Os elementos que compõem a psicomotricidade cursam com a organização
e o desenvolvimento cognitivo e motor da criança, como poderemos observar ao
longo do primeiro capítulo, pode ser definida como uma ciência que tem como
objetivo de estudo o homem através do seu corpo em movimento e em relação ao
seu mundo interno e externo, bem como suas possibilidades de perceber, atuar,
agir com o outro, com os objetos e consigo mesmo. A psicomotricidade é um termo
empregado para uma concepção de movimento organizado e integrado, em função
das experiências vividas pelo sujeito cuja ação é resultante de sua individualidade,
sua linguagem e sua socialização.
A partir das afirmações acima é possível entender que a psicomotricidade
envolve toda a ação realizada pelo indivíduo, que represente suas necessidades e
permitem sua relação com os demais. É a integração psiquismo-motricidade.
De uma maneira estática, a motricidade pode ser definida como resultado da ação
do sistema nervoso sobre a musculatura, como resposta à estimulação sensorial.
Enquanto que o psiquismo poderia ser considerado como o conjunto de
sensações, percepções, imagens, pensamentos, afeto, etc.
A mobilidade deve ser compreendida em sua evolução, a partir dos movimentos
reflexos e incoordenados, até os movimentos coordenados que têm finalidade e
gestos, de valor simbólico.
Cada elemento da motricidade deve ser considerado no conjunto e na
história que lhe dá significação. Por isso mesmo, a psicomotricidade deve ser
compreendida em sua integridade, partindo de fenômenos que envolvem o desejar
e o querer.
É possível, através de uma ação terapêutica, a partir dos movimentos
espontâneos da criança e das atitudes corporais, favorecer a gênese da imagem
do corpo, núcleo central da personalidade, que terá sua importância descrita no
segundo capítulo. Sabe-se quanto o movimento livre no espaço é fundamental no
desenvolvimento físico, intelectual e emocional de uma pessoa, mas, por outro
lado, também se sabe o quanto a movimentação livre pela imaterialidade e no
“espaço” subjetivo, é o que realmente estabelece uma relação de significado na
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existência de uma pessoa, e mais, como essas duas questões devem se misturar,
harmonizando a vida.
A estruturação do espaço resulta do estabelecimento de relações significativas
entre o indivíduo e o meio que o cerca. Do mesmo modo que o tempo existencial,
do tempo vivido, também o espaço geometrizado é outra coisa diferente do espaço
experimentado, ao qual são atribuídas qualificações específicas. Desde que
fatores subjetivos compõem nossas noções de tempo e de espaço, compreender-
se-á que distorções desses fatores conduzam a uma psicopatologia do tempo e a
uma psicopatologia do espaço.
O terapeuta ocupacional, ao analisar a atividade, pode identificar as áreas
em que são necessárias adaptações e graduações, dependendo da capacidade
funcional da criança. O objetivo terapêutico ocupacional, que será abordado no
terceiro capítulo, é traçado para que haja acesso pela emoção à execução
motivada por estímulos do próprio movimento, da execução de tarefas
ocupacionais sonoras, táteis, cores, formas e integradas com as atividades de vida
diária. Neste caso, investigamos as possibilidades e estímulos que o espaço por si
só, oferece à criança segundo a fase do seu desenvolvimento emocional cognitivo
e físico.
Além dos conceitos de imagem corporal e esquema corporal, a
psicomotricidade vai entender que este corpo se organiza através de outras
funções importantes como a lateralidade, a equilibração, a noção de espaço, a
noção de tempo, a praxia global, a praxia fina e a respiração, que também são
conceitos e não se manifestam de forma isolada nos fazeres. Consideraremos que
a imagem e o esquema corporal são funções psicomotoras primárias, enquanto
que as demais são denominadas de secundárias.
É a mediação da imagem corporal com o esquema corporal que todas as
funções psicomotoras podem se estabelecer, através de uma estruturação
corporal. Quando se tem a imagem e o esquema corporais bem estruturados, as
outras funções podem se organizar. Será desenvolvido através de três capítulos.
O primeiro capítulo descreverá sobre a psicomotricidade, o segundo capítulo falará
sobre o corpo e o terceiro mostrará sobre a terapia ocupacional.
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CAPÍTULO I
Psicomotricidade
A psicomotricidade é um termo empregado para uma concepção de
movimento organizado, em função das experiências vividas pelo sujeito cuja ação
é resultante de sua individualidade, sua linguagem e sua socialização. Portanto
sua definição é: “a ciência que tem como objetivo de estudo o homem através do
seu corpo em movimento e em relação ao seu mundo interno e externo, bem como
suas possibilidades de perceber, atuar, agir com o outro, com os objetos e consigo
mesmo” (Almeida, 2010 p17).
A noção da psicomotricidade se situa na junção entre a concepção
neurofisiológica, a psicológica e a psicanalítica logo, o pensamento psicomotor é
escrito como: “todo o movimento é indissociável do psiquismo que o produz e
implica desse fato a personalidade total”. Inversamente o psiquismo, nos seus
diferentes aspectos (intelectual, afetivo, de relacionamento etc.), é indissociável
dos movimentos que condicionam ainda seu desenvolvimento.
Dessa forma, o corpo se desconstitui enquanto corpo orgânico e torna-se
representação significante. Tais significados atravessam a relação do sujeito com
o corpo e com a imagem do seu corpo. Assim sendo, não se pode ignorar o papel
social na construção do EU do indivíduo. É o olhar do outro que aprova ou reprova,
e, a partir dessa dinâmica, é que se constitui o relacionamento da criança consigo
mesma e com seu corpo.
Em 1951, Le Boulch (2001) no artigo “L’Éducation Physique Fonotionnelles”
escreve: “eu distinguia dois problemas em educação física: um deles ligado aos
fatores de execução, centrado no rendimento mecânico do movimento, e outro,
ligado ao nível de controle e de comando que eu chamei psicomotor”. Para o autor,
o sistema nervoso central é o suporte das funções mentais, é ele que controla e
coordena todos os sistemas do corpo, inclusive as ações psicomotoras durante
todo o período de maturação do esquema corporal. No entanto, assinalar que isto
é valido para as crianças consideradas normais. Acrescenta dizendo: “A partir dos
movimentos espontâneos da criança e das atitudes corporais, é possível, através
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de uma ação educativa, favorecer a gênese da imagem do corpo, núcleo central
da personalidade”.
O movimento aparece, pois, como uma das formas do pensamento: “ele é
ao mesmo tempo simultaneamente um produto do psiquismo e um fator de
construção e de modelagem do mesmo” (Idem).
Portanto entende-se que, o movimento é de fundamental importância no
desenvolvimento físico, intelectual e emocional da criança. Ele permite à criança
explorar o mundo exterior através de experiências concretas sobre as quais são
construídas as noções básicas para o desenvolvimento intelectual. É importante
que a criança viva o concreto. É a exploração que desenvolve na criança a
consciência de si mesma e do mundo exterior. A criança se desenvolve desde os
primeiros dias de vida, de maneira contínua (Sanchez et al. 2003).
A harmonia do desenvolvimento com todos os seus componentes são tão
importantes quanto à aquisição de tantas performances numa determinada idade.
O importante não é a criança realizar uma corrida de obstáculos, o mais rápido
possível, mas sim desenvolver seu corpo e sua mente de maneira equilibrada. A
partir do momento em que certas aquisições, como a linguagem, por exemplo, se
desenvolvem rapidamente, os processos em outras áreas estacionam, é preciso
compreender que a criança não pode centrar seus esforços em todos os aspectos
ao mesmo tempo (op.cit).
A psicomotricidade existe nos menores gestos e em todas as atividades
que desenvolve a motricidade da criança, visando ao conhecimento e ao domínio
do seu próprio corpo. Cada criança é única e o esquema do desenvolvimento é
comum a todas elas, mas as diferenças de caráter, as possibilidades físicas, o
meio e o ambiente familiar explicam que com a mesma idade, crianças
perfeitamente normais, possam comportar-se de maneiras diferentes. A criança
que progrediu inicialmente muito rápido pode reduzir o seu ritmo e ser alcançada
por aquela que parecia atrasada alguns meses antes.
O importante é que as etapas das pessoas tem que ser vividas, desde o
embrião até o seu crescimento. É pensar que cada criança é diferente das outras.
A inteligência tem que experimentar, está dentro de cada um. Tem que buscar
alternativa para fazer de alguma forma, de ter a possibilidade em ver e sentir o que
é bom e ruim, o momento mais importante para o desenvolvimento da criança é o
engatinhar porque é a coordenação motora inicial, é o deslocamento corporal.
Alves (2007, p17) afirma:
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Em Costallat (2002), Na busca de uma melhor organização do corpo e das
funções psicomotoras utilizam-se os elementos que irão surgindo conforme a
maturação do sistema nervoso central. A percepção é a capacidade de reconhecer
e compreender estímulos; é o meio que se dispõe o indivíduo para organizar a
estimulação que o ambiente lhe dirige. Depende dos estímulos sensoriais como a
coordenação visomotora que é a habilidade de coordenar a visão com movimento
dos corpos, é observada a partir do recém-nato em postura RTCA. A figura fundo é
a capacidade de discriminar algo em relação a um grupo, destacar o que tem
significado, é fundamental para o desenvolvimento da linguagem e para o
desenvolvimento das aprendizagens.
Constância de percepção é a capacidade de nomear e reconhecer as várias
formas que exprimem o mesmo objeto, um objeto da mesma classificação mesmo
que mude sua forma, por exemplo, o objeto cadeira. Uma cadeira sempre será
uma cadeira, no entanto, pode ser de madeira, colorida etc. É a complexidade do
pensamento que para ser bem desenvolvida devem ser progressivas, começando
das mais simples para as mais complexas.
A posição espacial, o corpo é a referência, eu me posiciono, eu estou em
cima, eu estou em baixo, esta noção é importante para evitar o espelhamento. Na
relação espacial, o meio é a referência, relação com o meio e os objetos, como
exemplo, a mesa está entre a parede e a cadeira (ALVES, 2007 p.70). A postura
consiste numa relação estável entre o sujeito e o meio, o que resulta numa
estabilização espacial.
Memória, instrumento básico para o processo da percepção. É uma função
orgânica. A aprendizagem ocorre pelo acionamento da memória. Toda sensação é
gerada pelo movimento. Este se realiza pela ação conjunta de muitos músculos
sobre a base de uma eficiente atividade postural. O movimento está associado ao
desejo e nele se integram à percepção, a sensação e o pensamento. Não há
parada de movimento no mundo orgânico.
Memória é a codificação de tudo que aconteceu antes, é o processo
dinâmico de aquisição, retenção e evocação de informações. Vem através de
ações e de diversas formas de estímulos.
Segundo Alves (2004), estruturação espaço-temporal é a capacidade de
avaliar tempo e espaço, interagindo real e convencionalmente. É importante para
uma adaptação favorável do indivíduo. Permite movimentar-se, reconhecer-se no
espaço dar sequencia aos gestos, localizar partes do corpo e situá-las no espaço,
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coordenar suas atividades e organizar sua vida cotidiana. O tempo é subjetivo, a
aquisição e internalização desta função também são subjetivas.
A criança percebe o seu corpo por meio de todos os sentidos. Esse corpo
ocupa um espaço no ambiente em função do tempo, capta imagens, se recebe
sons, sente cheiros e sabores, dor, calor e movimenta-se.
É a imagem de si mesmo que se constrói igual na forma que as demais
estruturas mentais pela associação dos elementos cada vez mais coordenados e
complexos.
De acordo com Le Boulch (2001) “a adequação das reações gestuais e posturais
espontâneas às condições atuais, sem intervenção da reflexão, supõe o uso da
função de ajustamento, cuja amplitude traduz mais ou menos a grande
plasticidade das estruturas nervosas que devemos manter além da idade madura”.
Portanto, a organização espacial passa a ser a orientação, a estruturação do
mundo externo, referindo-se primeiro ao EU referencial, depois a outros objetos e
pessoas. Toda nossa percepção de mundo é espacial onde o corpo é o termo de
referência, essa organização não se aprende, descobre-se através das vivências.
Então, o movimento do corpo através de atividades afetivas, psicomotoras e
sócio-psicomotoras, constitui-se um fator de equilíbrio na vida das pessoas,
expresso na interação entre o espírito e o corpo, a afetividade e a energia, o
individuo e o grupo promovendo a totalidade do ser humano.
Organização temporal é a capacidade de situar-se em função de sucessões
de acontecimentos e duração de intervalos. São noções abstratas e difíceis de
serem adequadas pelas crianças.
O ritmo está presente em todas as atividades humanas, tanto físicas como
intelectuais, é o principal palco da atividade tônica motora. Facilita a consciência
corporal e por seu intermédio, a criança equilibra os processos de assimilação,
acomodação e adaptação na sua aprendizagem. Interfere na forma de andar, falar
e nos gestos.
É a maneira como se realiza os gestos na vida diária. Cada um tem seu
ritmo, na psicomotricidade as atividades rítmicas favorecem a exploração de outras
formas de consciência corporal. O movimento espontâneo só acontece quando o
individuo tem a conscientização corporal. A falta de ritmo motor ocasiona uma
incoordenação na realização dos movimentos.
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1.2 Desenvolvimento cognitivo
Em Le Boulch (2001) encontraremos que “a representação mental permite a
relação entre significante e significado, permite a passagem do símbolo e do signo
ao objeto que o designa”. Esse jogo entre significante e significado corresponde ao
jogo da função simbólica; “não é uma função psicomotora, mas pode ser treinada e
educada durante a atividade psicomotora”.
Segundo Le Boulch (2001), entende-se por cognição o ato ou o processo
de conhecimento. As aptidões do processo de conhecimento são sinônimas de
aptidões cognitivas que, podem ser notadas quando os bebês demonstram
aprender rapidamente, já na primeira semana, identificar a mãe pela voz e por seu
cheiro. “Desde o nascimento, os bebês procuram à interação social e a formação
de vínculos afetivos”.
O autor se refere à noção de equilíbrio definida por Piaget que diz: “O
mecanismo de regulação entre o sujeito e seu meio permitindo o jogo da
adaptação implica dois processos complementares e concomitantes: a
assimilação e a acomodação”. A assimilação é a integração do exterior às estruturas próprias do sujeito. A acomodação é a transformação das estruturas próprias em função das variáveis do meio exterior. O que chamamos de ajustamento é o aspecto que toma a acomodação logo que dá a resposta motora às solicitações do meio. A organização perceptiva representa um dos aspectos do processo de assimilação quando se dá à tomada de informação a partir dos receptores sensoriais. A educação psicomotora pode contribuir especificamente nestes dois campos funcionais (LE BOULCH, 2001 p28).
A educação não é um processo isolado dos demais processos sociais, mas
um processo inclusivo, ou melhor, uma dimensão dos outros processos, a
acomodação é encontrada em todas as circunstancias da vida social, na família,
escola, grupos econômicos entre povos e países.
Conceituando-se aprendizagem como uma mudança relativamente
permanente no comportamento, a observação de uma criança torna evidentes
quais os conhecimentos que revela por reflexos e quais outros que constituem
produto de sua aprendizagem. Ao sugar o seio materno e ao chorar, a criança está
desenvolvendo reflexos, mas estes reflexos transformam-se em comportamentos
apreendidos quando demonstram bem-estar com o estômago cheio ou quando
usam o choro para obter o que precisam ou desejam. A criança, assim, nasce com
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a habilidade para aprender, mas a aprendizagem, em si, ocorre com a experiência.
Todos os bebês aprendem com o que veem, ouvem, cheiram, provam e tocam,
transformando essas ações sensoriais a partir do repertório de seus
conhecimentos inatos. A aprendizagem, portanto, é uma forma de adaptação ao
ambiente, é o poder de tomada de consciência das necessidades postas pelo
social para que se construam os conhecimentos a partir do repertório que se
possui (Antunes, 1999 p23).
O desenvolvimento da inteligência é muito diferente da aquisição de novos
hábitos ou de nova informação. Para que a inteligência da criança se desenvolva
tem que ser ativa num meio ambiente geral.
Mas, a aprendizagem na infância possui limitações impostas pela
maturidade; por mais que a mãe insista, uma criança não aprenderá a andar antes
que seus membros estejam prontos para suportá-la. Certas competências
motoras, sensoriais e neurológicas devem estar biologicamente prontas antes que
a aprendizagem a elas relacionada possa acontecer. A maturação, portanto, não
depende da aprendizagem, mas constitui condição necessária para que a
aprendizagem possa acontecer (op.cit).
Quando os limites da maturação se superam, as crianças estão prontas
para aprender e essa aprendizagem pode se manifestar de formas diferentes. Ao
contrário do desenvolvimento, a aprendizagem requer uma experiência especial. A
fonte das coisas aprendidas é, em parte, o meio físico (real) ou social (inclusive
simbólico). A inteligência é o instrumento geral da cognição e os resultados da
aprendizagem nos fornecem os conteúdos de todas as coisas que conhecemos de
coisas físicas, de pessoas, de expressões verbais, de conteúdos de livros.
A habituação ou aprendizagem mecânica é o processo através do qual a
exposição repetida de um estímulo específico resulta em uma resposta voltada
àquele estímulo (FONSECA, 2008). Essa é a forma mais simples de aprendizagem
conhecida e leva o bebê a associar sons e imagens ao universo de seus
conhecimentos. É quando aprende o som da palavra da mãe, diferenciando-a de
outras mulheres (LE BOULCH, 2001 p51).
Segundo Fonseca (2008), o condicionamento clássico corresponde à
resposta automática a um estímulo que originalmente não provocaria essa
resposta. Uma das mais tradicionais demonstrações de condicionamento clássico
ocorre com as emoções. A criança aprende a ter medo de objetos que seus pais
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usam para assustá-la. Esses condicionamentos se manifestam desde algumas
horas após o nascimento e perduram por toda a vida.
O condicionamento operante é uma forma de aprendizagem em que uma
resposta continua a ser dada, face às respostas positivas. A criança que sorri para
obter a atenção da mãe apresenta um claro exemplo desse condicionamento
operante (Idem).
A aprendizagem significativa ou complexa pode ser alcançada pela
combinação dessas outras formas ou ainda pela transformação que fazem do
repertório de conhecimentos que possuem, face às informações que recebem.
Manifesta-se na criança quando consegue êxito na solução de problemas. Afirma-
se que a aprendizagem significativa expressa o comportamento inteligente da
criança e, portanto é uma aprendizagem direcionada para algumas metas e é
adaptativa, o que significa que é usada para resolver problemas (Idem).
Da mesma forma como, desde o nascimento, a criança desenvolve
diferentes formas de aprendizagem, também desenvolve diferentes tipos de
memorizações. Assim como desenvolve a inteligência linguística, lógico-
matemática, espacial, musical e outras, desenvolvem também formas específicas
de memorização, cada uma dessas formas ligadas a cada inteligência (LE
BOULCH, 2001).
A inteligência se desenvolve de dentro para fora, assim, o que se tem a
fazer é promover e nutrir esse crescimento pela criação de oportunidades
adequadas e não pelo ensino explicito do que fazer e do que saber.
A aprendizagem e a memória são estímulo às inteligências e se processam
através de estágios diferenciados. Para Piaget apud Rappaport (2001), o
desenvolvimento tem alguns aspectos que são previsíveis e universais, ou seja,
acredita que todos passam pelas mesmas etapas do desenvolvimento. Desenvolve
critérios que considera possíveis de acontecer em todos os humanos. Contudo,
considera a construção individual do conhecimento, e isto, depende da ação sobre
e com o objeto, e o meio onde se está inserido.
Para Jean Piaget apud Rappaport (2001), o primeiro estágio do
desenvolvimento cognitivo de uma criança é o estágio sensório-motor. Um período
em que os bebês aprendem sobre si mesmos e seu mundo através de seu próprio
desenvolvimento sensorial e da atividade motora. Durante os primeiros dois anos,
as crianças que respondem basicamente através de reflexos e de comportamentos
aleatórios passam a organizar suas atividades em relação ao ambiente, a
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coordenar informações a partir de seus sentidos e a progredir na aprendizagem,
na habituação e nos condicionamentos para a aprendizagem significativa,
descobrindo aos poucos que os livros e as figuras não são simples objetos, mas
representam símbolos do mundo real. Nessa fase, desenvolvem conceitos
cognitivos importantes como o da permanência do objeto ou a percepção de que
um objeto ou uma pessoa continua a existir mesmo quando fora do campo da sua
visão. Esse domínio é essencial para a compreensão do tempo, do espaço e dos
objetos e assim dispara a inteligência espacial.
Tudo isso começa pela ação. É essencial criar um clima de expectativas
positivas em relação às crianças de forma que elas encorajadas a ter confiança
nas suas próprias possibilidades de experimentar, descobrir, expressar-se,
ultrapassar seus medos, ter iniciativa.
Outro conceito importante que emerge durante esse período é o
reconhecimento de que alguns eventos causam outros e que apertando um
boneco de borracha o mesmo emite um som qualquer. As inteligências no cérebro
das crianças de dez meses começam a se diferenciar, mas suas habilidades de
representação nessa fase são muito limitadas e a percepção de que palavras e
números são símbolos somente floresce com o vigor no estágio pré-operacional
(Idem).
Entre 3 e 6 anos de idade, as crianças estão no segundo estágio, período
pré-operacional, no qual podem pensar em símbolos, mas ainda não podem usar a
lógica. Podem imaginar objetos, pessoas ou eventos independentemente de sua
presença física, usando representações mentais. Este estágio é caracterizado pelo
desenvolvimento da linguagem e outras formas de representação. O raciocínio é
pré-lógico, ou seja, a criança inicia a construção da relação causa e efeito, bem
como das simbolizações. É a chamada idade dos porquês e do faz de conta. É
nesta fase que a criança começa a mostrar o quanto e como está aprendendo.
Devido à sua maior agilidade motora para realizar tarefas e atividades, e também a
sua linguagem verbal estar mais refinada ela vai se apresentando mais rápida nas
respostas aos comandos apresentados pelos adultos.
Nessa fase pré-operacional, as crianças diferenciam-se intelectualmente
das mais velhas por serem centralizadoras, irreversíveis, antitransformadoras,
transdutivas e egocêntricas e os estímulos propiciados devem levar em conta
essas características, ainda que diferindo bastante de criança para criança e
conforme sua maior proximidade ou distância dos seis anos.
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Embora uma criança de três anos não apresente um desenvolvimento físico
tão rápido quanto o de um bebê, as marcas de lápis na parede mostram sensível
crescimento e uma perda de robustez em troca de uma aparência geralmente mais
esguia e atlética. À medida que os músculos abdominais se desenvolvem, troncos,
braços e pernas se alongam. Esse desenvolvimento físico é acompanhado com
rápido desenvolvimento motor grosso (saltar, correr, rolar) e também com igual
desenvolvimento motor fino (copiar, abotoar, amarrar). A inteligência pictórica se
expande e a criança adora desenhar e precisa fazê-lo e essa expansão é
acompanhada por expressivo desenvolvimento da memória levando a criança a
explorar sua historicidade e caminhar célere em busca de sua
individualidade.(Rappaport, 2001).
Portanto, devem ter em seu tempo diário espaços para as brincadeiras e
atenção familiar. Sobrecarregar os pequenos com excessos de atividades, pode
trazer sérios problemas psicológicos e cognitivos, mesmo com seu cérebro
estando no seu auge da aprendizagem global, necessita de outras atividades, o
brincar faz parte do desenvolvimento infantil e as atividades psicomotoras
(afetivas, cognitivas e motoras) estão presentes nas brincadeiras.
No estágio das operações concretas, as crianças nessa idade, ou mais
especificamente dos 7 aos 11 anos, estão no estágio de desenvolvimento cognitivo
das operações concretas. A criança começa a construir conceitos e desenvolve
habilidades do pensamento lógico para solucionar problemas concretos, ainda não
faz abstrações (RAPPAPORT, 2001).
Mostram-se bem menos egocêntricas e podem aplicar em suas ações
princípios lógicos a situações concretas. O leque das múltiplas inteligências já está
plenamente aberto e a criança usa seu pensamento e suas reflexões para resolver
problemas. Lida bem melhor com os conceitos de grandeza e com os números;
compreende os conceitos de tempo e de espaço; distingue a realidade da fantasia;
classifica eventos ou objetos e já pode olhar os eventos de diferentes habilidades
operatórias. Ainda no é adulta e, portanto tem dificuldades em compreender em
termos hipotéticos. Seu pensamento abstrato, aquilo que representa o mais alto
nível da hierarquia cognitiva ainda não foi alcançado (Idem).
A fase dos 6 aos 12 anos, como as anteriores, é essencialíssima, mas por
motivos diferentes. Nesse período da vida é que se estrutura o autoconceito
(noção de quem somos e o que fazemos) e é quando se organiza mentalmente
uma autoimagem negativa ou positiva, pois é na construção da autoimagem, onde
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permanece muito tempo depois da infância, e começa a se definir os jovens que
apresentam um olhar de encantamento ou de tédio para com a orquestra da vida.
Nesta fase o adolescente constrói o pensamento abstrato e conceptual lógico.
Consegue criar hipóteses possíveis e diferentes pontos de vista sobre determinada
situação problema e torna-se capaz de pensar cientificamente (RAPPAPORT,
2001).
O passo seguinte do autoconceito é a autodefinição, que se desenvolve
progressivamente comparando o que é e o que gostaríamos de ser. Nessa fase,
os programas de alfabetização emocional precisam explorar os recursos para que
o futuro adolescente expanda sua autocompreensão, desenvolva padrões de
comportamento socialmente aceitáveis, perceba a pluralidade cultural, explore sua
automotivação e descubra competências para a comunicação interpessoal. Então
começa a ver as divergências do mundo na microssociedade onde vive e aprende
a conviver, dirige suas ações na busca e construção de um modelo ideal e assume
a tolerância, que é o alicerce da empatia, para perceber a identidade integral do
outro (Idem).
O estágio da habilidade operatória, que se entende por uma aptidão ou
capacidade cognitiva e apreciativa específica, possibilita a compreensão e a
intervenção do indivíduo nos fenômenos sociais e culturais e que ajude a construir
conexões. Assim, quem compara duas coisas e estabelece padrões de identidade
e de diferenças está demonstrando o uso de uma habilidade, da mesma forma
como todo aquele que observa, relata, classifica, critica, sintetiza e muitas outras.
Não existe um limite finito para os verbos de ação que caracterizem as múltiplas
habilidades que podem ser despertadas (Idem).
O inicio da adolescência é abrupto e dramático e o seu término, gradativo,
até idade adulta.
1.3 Desenvolvimento motor
A função muscular traduz o primeiro modo de expressão do embrião. O tono, manifestação palpável da energia biológica, caracteriza a cada instante o dinamismo do organismo. Esta função se manifesta antes dele ser capaz de responder a um estimulo sensorial externo; o sistema motor é capaz de desencadear e manter sua própria atividade sem necessidade de um estímulo sensorial (LE BOULCH, 2001).
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Durante a vida fetal, a criança está em simbiose com o corpo da mãe e as
exigências metabólicas de seu crescimento são garantidas conforme as suas
necessidades. Segundo Le Boulch (2001), o desenvolvimento motor é o processo
de mudança no comportamento motor, o qual está relacionado com a idade do
indivíduo. O foco na relação entre a idade e o comportamento motor torna o estudo
do desenvolvimento único sob outros pontos de vista. O desenvolvimento motor
inclui mudanças relacionadas à idade tanto na postura quanto no movimento, dois
ingredientes básicos do comportamento motor.
O desenvolvimento motor durante a primeira infância é considerado o
período do nascimento até a criança ser capaz de ficar de pé e andar.
Tipicamente, a primeira infância dura aproximadamente um ano.
A psicomotricidade ocupa um lugar importante no desenvolvimento infantil,
sobretudo na primeira infância, onde se reconhece que existe uma grande
interdependência entre os desenvolvimentos motores, afetivos e intelectuais. A
psicomotricidade é a ação do SNC que cria uma consciência no individuo sobre os
movimentos que realiza através dos padrões motores, como a velocidade, o
espaço e o tempo.
O recém-nascido oscila entre um estado de necessidade, que eleva o tono
muscular e dá origem às descargas musculares impulsivas e aos gritos e um
estado de prazer que o leva à diminuição do tono.
O equilíbrio deste comportamento tônico-emocional traduz a unidade do ser e é função de atenção do meio em relação à criança. Embora esta fase da vida não se torne consciente, é muito importante, já que as experiências corporais vividas ficam registradas, graças a uma verdadeira memória corporal, forma mais primitiva do inconsciente (LE BOULCH, 2001).
A postura fletida dos recém-nascidos dá lugar à postura estendida da
posição ereta. Com o passar do tempo, os bebês adquirem habilidades
locomotoras: primeiro rolando, depois se rastejando e engatinhando, então
andando com apoio, até finalmente alcançar a importante marca da locomoção
independente. (LE BOULCH,2001)
No primeiro trimestre: alinhamento da cabeça, quando o bebê é colocado
na posição prona, os braços e as pernas enrolam-se sob o tronco, fazendo com
que, desse modo, o peso do bebê vá em direção à cintura escapular. Embora essa
postura flexora inicial coloque a criança em uma posição que dificulta seus
movimentos, o bebê pode desenvolver uma das mais importantes e básicas
22
habilidades, a de levantar e girar a cabeça de um lado para o outro. Esse é o
primeiro movimento ativo da criança contra a gravidade e é realizado usando uma
combinação de músculos que estendem e giram o pescoço. Esse é o principal
ganho do primeiro trimestre.
A psicomotricidade, como estimulação aos movimentos da criança, tem
também, como meta motivar a capacidade sensitiva através das sensações e
relações entre o corpo e o exterior, isto é, o outro e as coisas à sua volta.
A atividade sensório-motora não se desenvolve só a partir dos estímulos externos, senão também a partir das informações proprioceptivas, labirínticas e articulares. Estas informações são a fonte de origem das reações de equilíbrio e dos primeiros ajustamentos posturais, cuja coordenação exige a intervenção do arqui-cerebelo. É lógico que a organização tônica, responsável pelo ajustamento postural, seja origem de uma forma de consciência que se superpõe à consciência vegetativa inicial (LE BOULCH, 2001).
Segundo trimestre: empurrando e sentando, esse segundo trimestre é
marcado por grandes processos no combate à força da gravidade. O bebê começa
com a capacidade de manter a cabeça alinhada em relação ao corpo e avança até
a habilidade de sentar sozinho por curtos períodos de tempo e de empurrar as
mãos e os joelhos. Essas posturas são à base de realizações posteriores, mas,
independentemente disso, permitem uma grande série de interações com o mundo
em sua volta. Sentar e levantar-se com as mãos e com os joelhos são importantes
marcos no caminho da independência física (Idem).
É cultivar a capacidade perceptiva através do conhecimento dos
movimentos e da resposta corporal. Fazer com que as crianças possam descobrir
e expressar suas capacidades, através da ação criativa e da expressão da
emoção.
No terceiro trimestre: movimento constante, durante o terceiro trimestre o
bebê torna-se móvel e desenvolve a habilidade de movimentar-se pelo ambiente.
A exploração torna-se uma atividade dominante. O impulso para mover-se contra a
força da gravidade parece fortalecer-se, de modo que, no final do terceiro
trimestre, os bebês são capazes de puxar-se para levantar. O mundo está à sua
espera para ser descoberto (Idem).
O quarto trimestre: finalmente andando. Quando o bebê está acordado, as
posições prona e supina tornaram-se posturas transitórias. A criança fica pouco
tempo nessas posturas, as quais são vistas principalmente transmitindo postos de
estabilidade em direção a posturas mais altas (LE BOULCH, 2001).
23
Ampliar e valorizar a identidade própria e a autoestima dentro da pluralidade
grupal. Criar segurança e expressar-se através de diversas formas como um ser
valoroso, único e exclusivo, também são os princípios da psicomotricidade.
A postura de gatas é a base para engatinhar. Esse padrão locomotor
abrange a ação alternada de braços e pernas opostas na mobilidade anterior.
Alguns bebês tornam-se engatinhadores muito habilidosos e preferem essa forma
de locomoção por meses. Mesmo o início da marcha não evitará a preferência de
algumas crianças pelo engatinhar (ALVES, 2004).
O engatinhar plantígrado torna-se parte do repertório da criança. Essa
forma de locomoção envolve o engatinhar com os braços e pernas estendidas,
com os pés em postura plantígrada. O engatinhar plantígrado é o próximo passo
na gradual elevação do tronco contra a força da gravidade. A extensão completa
dos membros superiores conduzida pela postura de gatas e agora a extensão dos
membros inferiores levam a uma posição de engatinhar plantígrado (Idem).
A posição de pé é a postura preferida pela maioria das crianças no quarto
trimestre. Mover-se para a posição em pé apoiando-se nos móveis leva a percorrer
a borda dos móveis enquanto segura-se. Durante as primeiras tentativas de
locomover-se, a criança pode estar na ponta dos pés, com pouco ou nenhum
contato dos calcanhares com o chão. O bebê anda em uma postura de pés mais
aplainados enquanto usa passos exageradamente posteriores na tentativa de
manter o equilíbrio. O padrão de marcha ainda é imaturo, com a tendência à flexão
lateral de tronco para avançar a perna em vez de usar um padrão maduro de
transferência de peso. Os braços são mantidos em proteção superior, o que ajuda
a manter a estabilidade e o controle. A criança tem grande dificuldade com o
equilíbrio ao tentar carregar um brinquedo em uma mão. Uma criança nessa idade
achará impossível usar as duas mãos para carregar um objeto por causa da
necessidade do uso das extremidades superiores para estabilização (ALVES,
2004).
De acordo com a autora, um notável aumento na estabilidade e no controle
ocorre no final do primeiro ano. “As posições de proteção superior e apoio externo
são menos necessárias, a criança consegue carregar brinquedos mais facilmente
enquanto anda, consegue abaixar-se para recuperar um brinquedo do chão sem
apoio externo e pode tentar levantar-se na ponta dos pés para alcançar um objeto
no alto” (ALVES, 2004).
24
O desenvolvimento motor durante a infância vai dos dois aos seis anos,
durante esta fase leva ao alcance da criança novas habilidades, mas não
necessariamente a novos padrões de movimento. Acredita-se que a criança tenha
adquirido todos os padrões de movimento fundamentais e que, a partir de então,
esteja aprendendo a colocá-los em uso em atividades significativas (Idem).
Neste período, a criança encontra-se na fase dos movimentos fundamentais, que
devem ser expostas a uma diversidade de experiências motoras que propiciem
adquirir os padrões fundamentais de movimento.
No desenvolvimento das habilidades locomotoras, a criança continua a
praticar e a refinar muitas das habilidades motoras adquiridas durante o primeiro
ano de vida. A posição em pé torna-se mais ereta. O agachar pode ser feito por
períodos mais longos, embora uma larga base de apoio possa ser usada. Subir
escadas com as mãos e com os joelhos torna-se uma tarefa mais fácil, e muitas
crianças divertem-se pulando (ALVES, 2004).
O correr é geralmente adquirido entre os dois e os quatro anos. O correr
difere do andar, especialmente por causa da fase de voo, durante a qual não há
apoio do corpo.
O pular desenvolve-se primeiro como a habilidade de descer pulando de
lugares mais altos, além disso, a forma dos movimentos usados para pular torna-
se mais eficiente (FONSECA, 2008).
O saltar com uma só perna parece ser uma extensão da habilidade de
equilibrar-se enquanto de pé em uma só perna, então saltar com uma perna só é
definido como a elevação do corpo do chão com a subsequente aterrissagem
usando um único pé (Idem).
O andar saltitante é um padrão complexo de locomoção que envolve um
passo e um salto em uma perna, seguido de um passo e um salto da outra perna
(Idem).
Outras habilidades fundamentais da infância é arremessar e bater, são
duas habilidades adicionais que se submetem às mudanças do desenvolvimento
durante a primeira infância. Embora o arremessar seja uma habilidade tipicamente
adquirida durante o primeiro ano de vida, o arremessar com habilidade ainda está
em desenvolvimento durante a infância, a distancia do arremesso e o aumento
desta é atribuído a padrões de movimento que aplicam força com mais eficiência
ao arremessar (Idem).
25
O agarrar e o chutar são duas habilidades adicionais que vem sendo
estudadas sob uma perspectiva de desenvolvimento, pois, o agarrar começa a se
desenvolver por volta dos três anos de idade. A criança inicialmente mantém os
braços estendidos na frente do corpo sem ajustá-los à direção ou à velocidade do
objeto a ser pego. Chutar requer equilíbrio em um pé enquanto a força é
transferida a um objeto, como uma bola de futebol. No início do desenvolvimento
dessa habilidade, há pouco balanço posterior ou desvio (finalização) preparatório
na perna que chuta (FONSECA, 2008).
“As teorias contemporâneas não se fundamentam tanto no SNC como a
causa do desenvolvimento motor. Outros sistemas do corpo, como o sistema
musculoesquelético e o sistema cardiorrespiratório, também são supostos a
desempenharem papéis no processo de desenvolvimento motor” (ALVES, 2007).
Além disso, o ambiente representa uma significativa fonte de mudanças
sistemáticas que influenciam o desenvolvimento motor.
Ao contrário de uma simples e única causa de mudança, a teoria dos
sistemas reconhece causas múltiplas e complexas do desenvolvimento. Embora
um fator possa ser identificado como um catalisador para mudanças reconhece-se
agora que nenhum agente sozinho seja a causa do desenvolvimento motor
(ANTUNES, 2001).
Desse modo, torna-se importante conhecer e identificar as características
de desenvolvimento motor das crianças para que a intervenção seja segura e
objetiva, conforme as etapas de vida e as necessidades das mesmas. Uma
educação motora realiza de forma eficaz, ou seja, quando é percebido e
promovido, estes estímulos vem auxiliar o individuo, futuramente, a alcançar a sua
autonomia corporal como um todo.
Todos os sistemas parecem submeter-se constantemente a mudanças,
sendo, portanto dinâmicos. Entende-se que seja a interação desses sistemas
dinâmicos que promovem o desenvolvimento das habilidades motoras.
Alves (2005) classifica em etapas o desenvolvimento corporal, a saber: 1º
etapa - Corpo vivido (até três anos de idade); 2º etapa - Corpo percebido ou
descoberto (de três a sete anos); 3º etapa - Corpo representado (de sete a doze
anos).
26
CAPÍTULO II
A relação do corpo e o movimento.
O movimento é à base de todo o desenvolvimento do ser humano. É
através dele que a criança atua no meio em que vive e conhece o mundo
associando as experiências concretas sobre as quais são construídas as noções
básicas para o desenvolvimento intelectual. É a exploração que desenvolve na
criança a consciência de si mesma e do mundo exterior.
“O esquema corporal não é um conceito inicial ou uma entidade biológica
ou física, mas o resultado e a condição da justa relação entre o indivíduo e o
próprio ambiente” (WALLON apud ALVES, 2007 p47).
É o fortalecimento de uma pratica que possibilita a construção do individuo,
em termos de pensamento, ação e emoção, facilitando sua inserção no meio
social.
Segundo Almeida (2004), à medida que os objetos e fenômenos do mundo
entram em contato com nosso corpo, nós os sentimos, os percebemos, tomamos
conhecimento deles. Cada pessoa, ao longo de sua vida, recebe um repertório de
estímulos bem variados e próprios da sua vida ocupacional. Ao estar em ação, o
próprio sujeito modifica o seu corpo. O sujeito produz a ação e é provocado pela
própria ação para sua modificação. A cada repertório de estímulos, um novo
esquema corporal se engendra.
As estruturações são organizações transitórias, voláteis do corpo, para que
ele esteja na forma de um sistema auto-regulável, a fim de possibilitar a vida e as
ocupações. Quando falamos de estruturações estamos falando de uma estrutura
na ação, de uma estrutura-ação, um corpo que se produz na medida em que
produz o mundo.
É um aprendizado que ocorre à medida que o indivíduo vive a
psicomotricidade no contexto sociogrupal, sentindo-se produtivo porque “faz”,
podendo se organizar e reorganizar em questões não só na área de trabalho como
27
na vida ativa, escolar, mas também na sua vida pessoal. Pode-se entender a
psicomotricidade através da tríade corpo, espaço e tempo.
Segundo Le Boulch (2001), apreender a imagem do corpo como conteúdo é
colocar-se do ponto de vista do corpo como fonte de pulsões e vetor de trocas
relacionais. A etapa do corpo percebido corresponde à organização do esquema
corporal. Antes deste período, este conceito não tem fundamento, na medida em
que descreve uma atividade perceptiva cujo desenvolvimento só será possível
depois que a função de interiorização atingir a maturação.
A representação mental do corpo o converte em um objeto do espaço que
será à base da descentralização. Mas esta imagem verbalizada e orientada é uma
simples imagem reprodutora, estática portanto, constituída pela associação
estreita entre os dados visuais e cinestésicos.
A criança descobriu sua dominância, verbalizou-a e chega assim a um
corpo orientado que lhe servirá de padrão para situar os objetos colocados no
espaço circundante. A orientação dos objetos faz-se em função da posição atual
do corpo da criança.
Le Boulch (2001), considera ainda que a imagem do corpo não é uma
função, mas um conceito útil no plano teórico, na medida em que serve de guia
para compreender melhor o desenvolvimento psicomotor através das diversas
etapas. Esta estrutura, que é o centro do sentimento de maior ou menor
disponibilidade que temos de nosso corpo e no centro da relação vivida universo-
objeto, passa por uma sucessão de estados de equilíbrio, nenhum dos quais
traduzidos de maneira exata por este vocábulo empregado isoladamente. Na
medida em que esta palavra expressa o nível de organização alcançado pelas
diferentes funções psicomotores durante as etapas de desenvolvimento, há razão
para se pensar que o mesmo conceito não possa traduzir realidades tão
diferentes.
Almeida (2004) acrescenta que duas ocupações jamais estimulam da
mesma forma dois corpos, pois estes corpos dependem das suas estruturações
anteriores para serem estimulados. Estas estruturações anteriores são frutos de
suas ocupações pretéritas. As ocupações não só formam as estruturações do
corpo, mas sua forma própria de sentir e agir no mundo.
Para atuarmos no mundo, com ele nos relacionamos, dependemos diretamente
das sensações e percepções que nosso corpo pode captar. É através delas que
fazemos cálculos, interpretamos como agir, que mundo está à nossa frente. Só
28
que este mundo é um mundo efeito de nossas estruturações corporais, que criam
uma maneira própria de perceber o mundo, e esta maneira própria de perceber o
mundo é feito de nossas ocupações. Logo, cada ocupação inaugura mundos.
A estruturação do corpo não cessa, porque nunca paramos de nos ocupar,
nunca paramos de nos relacionar. Nunca paramos de produzir novos mundos-
próprios, o mundo-próprio está no tempo, no devir.(Uexküll, s.d. b apud
Almeida,2004 p39).
Segundo Costallat (2002), o movimento aparece, pois como uma das
formas do pensamento: como ele, é ao mesmo tempo e simultaneamente um
produto do psiquismo e um fator de construção e de modelagem do mesmo.
Parece mesmo que o movimento é a primeira forma do pensamento, aquele que
condiciona o aparecimento do pensamento abstrato. Isto é verdadeiro na evolução
das espécies na evolução de toda criança.
O movimento é o pensamento em ação. Talvez fosse mais justo dizer que o
pensamento é o movimento sem ato, uma espécie de sublimação do movimento
reduzido a sua abstração.
Já Le Boulch (2001) pensa que é pela bagagem hereditária e pelas suas
características próprias de reação que a criança pode ser compreendida. Segundo
o autor é através do vínculo que a criança se une ao seu meio. Para desenvolver
as potencialidades que existem no humano desde o seu nascimento,
complementa, não depende apenas da manutenção dos processos orgânicos, mas
sim principalmente do intercambio, isto é, as trocas afetivas e emocionais com
outras pessoas.
Dentro desse pensamento, entende-se que a psicomotricidade é a
manifestação do invisível de maneira visível. É uma ciência que tem como objeto
de estudo o homem através do seu corpo em movimento em relação ao seu
mundo interno e externo. É a otimização corporal dos potenciais neuro, psico-
cognitivo funcionais, sujeitos as leis de desenvolvimento e maturação,
manifestados pela dimensão simbólico corporal própria, original e especial do ser
humano.
Segundo Le Boulch (2001), as experiências psicomotoras serão igualmente
marcadas pelas relações afetivas do prazer e do desprazer que as acompanham.
Assim se forma, além do esquema corporal racional e racionalizante, uma imagem
do corpo, libidinosa e irracional que servirá de suporte aos fantasmas e à
afetividade profunda.
29
Entende-se então, que o esquema corporal realmente só é percebido e
criado a partir do movimento. Ele não é anatômico, é funcional.
Segundo os autores é possível atingir através da motricidade, a
organização psíquica geral, tanto intelectual quanto afetiva. É percorrer um
caminho com o desejo de “fazer”, de querer fazer, de saber fazer e de poder fazer.
2.1 Esquema e Imagem corporal.
O corpo é algo que tem a função de estabelecer relações com o mundo, de estar em ação. Ao transformar a vida material, criando um mundo no qual ele estabelece relações e vive, ao produzir o mundo da cultura que é esse mundo do artifício, o próprio corpo se artificializa na produção da vida material. Nestas produções do mundo e do corpo, pensamos num sistema sem-sujeito, onde não é o corpo que simplesmente faz o mundo, nem o mundo que faz o corpo; tudo vai se constituindo; no fazer, o corpo se faz. (Marcus V.M. de Almeida, 2004 p.10).
Para darmos continuidade aos estudos desse trabalho, falaremos do corpo
e a representação individual que formamos dele, a noção de esquema e imagem
corporal.
Em PAILLARD (2001), o termo Imagem Corporal vem sendo usado
frequentemente de maneira permutável com a terminologia Esquema do Corpo,
em estudos neurológicos e psicológicos, onde ocorrem também resistências a
determinadas definições e muitas confusões metodológicas e conceituais.
O esquema corporal é tido como a "experiência imediata de uma unidade
do corpo, (...) percebida, porém é mais do que uma percepção, (...) chamamos de
esquema de nosso corpo", ou mesmo, segundo Head apud Schilder (1999), que o
denomina como modelo postural do corpo. O aludido é a imagem tridimensional
que todo sujeito tem do seu próprio corpo, não abordando sob a ótica de uma
mera sensação ou imaginação, mas da apercepção corporal, mesmo que a
informação tenha chegado através do sentido.
A imagem que pode ser visual, motora, auditiva, tátil, entre outras, não pode
ser analisada separadamente os itens ou adotar para cada estrutura um padrão
único para a avaliação de alteração em todas as estruturas.
30
Segundo Ramos (2002), a criança percebe seu próprio corpo por meio de
todos os sentidos, estando o seu corpo ocupando um espaço no ambiente em
função do tempo, captando assim imagens, recebendo sons, sentindo cheiros e
sabores, dor e calor, movimentando-se. O corpo é o seu centro, o seu referencial,
para si mesma, para o espaço que ocupa e na relação com o outro. A noção do
corpo está no centro do sentimento de mais ou menos disponibilidade e adaptação
que temos de nosso corpo e está no centro da relação entre o vivido e o universo.
É nosso espelho afetivo-somático ante uma imagem de nós mesmos, do outro e
dos objetos.
A noção de esquema corporal é considerada por vários autores, entre os
quais destaco Schilder (1968), apud Fonseca (2008), como uma noção de âmbito
neurofisiológico, que pode ser entendida como a imagem mental do corpo
registrada no âmbito cerebral, mais exatamente no âmbito parietal. Por se situar
em um plano mais neurofuncional, envolvendo a integração neurológica de
posturas e de programas motores em interação com a percepção espacial de
objetos, pois se trata de um subsistema necessário à realização da ação, assim
em função da integração das percepções e da elaboração das respectivas praxias.
Tal noção, talvez a mais usada entre nós, tem, no entanto, o grande inconveniente
de o termo “esquema” não traduzir a noção de plasticidade e de disponibilidade
que este conceito contém.
O esquema corporal é uma aquisição lenta e paulatina. Desenvolve-se
desde antes do nascimento, se incrementa em forma notável desde este até o
terceiro ano de vida e, logo, continua em permanente evolução adaptativa pelo
resto da existência do individuo. Se estrutura sobre a base dos componentes
neurológicos em desenvolvimento e maturação onde se liga fundamentalmente, as
percepções exteroceptivas, proprioceptivas e interoceptivas. Que permitem
estabelecer, em um momento inicial a consciência sobre localização espacial total,
a capacidade e o funcionamento de uma determinada parte do corpo, a
consciência inicial sobre a magnitude do esforço necessário para realizar uma
determinada ação, e a consciência sobre a posição do corpo e suas partes no
espaço durante esta ação (BARRETO, 2002).
A imagem do corpo, por sua vez, segundo Schilder citado por Fonseca
(2008), expressa uma relação permanente com a história psicomotora (motora,
afetiva e cognitiva) do indivíduo, estruturando-se e reestruturando-se
continuamente, através da inter-relação e da interação integrada das esferas do
31
comportamento humano, assim: esfera libidinal — esfera fisiológica — esfera
sociológica — imagem do corpo, numa relação permanente.
Na esfera fisiológica, Schilder por Fonseca (2008) considera as relações
entre a psicotonia e a visuocinesiologia, referindo-se aos alicerces da atitude
(postura bípede), ao papel da dor e à história corporal do indivíduo, isto é, à sua
experiência anterior armazenada.Na esfera libidinal, o autor recua às concepções
freudianas da personalidade, inter-relacionando as interferências sensoriais,
erógenas e libidinais, em uma síntese integrada das relações entre o corpo e o
mundo, dando ênfase à expressão “o corpo incorpora o mundo”. É neste equilíbrio
em comunicação que, segundo este autor, se organiza a estrutura individual da
personalidade.
Na esfera social (ou sociológica), Schilsder citado por Fonseca(2008)
equaciona toda a fenomenologia do investimento corporal na relação e inter-
relação social, isto é, o corpo surge como o instrumento de relação e interação
com o outro.
Note-se como no âmbito desta última esfera e em uma perspectiva já
interdisciplinar, para Fonseca (2008), a imagem do corpo tem origem na imagem
do corpo dos outros: para Wallon, no chamado diálogo corporal, entre a mãe e o
recém –nascido, e para Piaget, na imitação inteligente da criança.
2.2 Corporeidade
Ao falarmos de corporeidade pensamos logo em Edgard Morin, que nos
norteia neste caminho. Segundo Morin (1999), o pensamento complexo nos
permite compreender que a corporeidade humana é uma emergência do processo
de evolução que conduziu, como nos aponta Morin, a physis., o bios., e a esfera
antropossocial a sucessivos aumentos no grau de complexidade dos
sistemas/organizações, a começar com a formação dos átomos, chegando, em
nosso planeta, onde se dá a evolução das espécies, à emergência da espécie
humana que é detentora de espírito (mente) e consciência. Podemos compreender
que a corporeidade guarda a herança de todo este processo evolutivo.
32
Desta forma, a corporeidade, à luz do pensamento complexo, permite
compreendermos o ser humano como ser complexo, estando todas as qualidades
e dimensões pertencentes ao humano enraizadas em seu corpo. É através do
corpo que podemos identificar a individualidade, a existência e o ser, os quais
remetem à organização. Assim, a corporeidade constitui-se das dimensões: física
(estrutura orgânico-biofísica-motora organizadora de todas as dimensões
humanas), emocional-afetiva (instintopulsão-afeto), mental-espiritual (cognição,
razão, pensamento, ideia, consciência) e a sócio-históricocultural (valores, hábitos,
costumes, sentidos, significados, simbolismos). Todas essas dimensões estão
indissociadas na totalidade do ser humano, constituindo sua corporeidade. É neste
sentido que buscamos a compreensão da complexidade humana, tanto em nível
individual quanto em nível social (op.cit).
Segundo Fonseca (2001), é por meio da atividade motora que a criança vai
construindo um mundo mental cada vez mais complexo, não apenas em conteúdo,
mas também em estrutura. O mundo mental da criança, devido às ações e
interações com o mundo natural e social, acaba por apresentar essas realidades
por meio de sensações e imagens dentro de seu corpo e de seu cérebro. Primeiro,
pela interação das outras pessoas, que atuam como mediatizadoras entre a
criança e o mundo; depois, pelos sucessos e insucessos da sua ação, ela vai
adquirindo experiências que virão a ser determinantes no seu desenvolvimento.
Vale ressaltar nos contextos atuais que em diversos livros que tratam do tema
desenvolvimento infantil, exemplos são dados, mas não encontramos receitas
prontas que indiquem os itens que devemos seguir. O que está ocorrendo,
segundo algumas publicações em revistas e jornais, é a numerosa procura por
soluções alternativas, onde as crianças possam gastar sua energia. Um exemplo
conhecido é aquele que, quanto mais atividades a criança abranger (inglês,
natação entre outras), melhor será seu desempenho. Atividades extras, são
extremamente produtivas, todavia não englobam tudo.Às vezes, as crianças
conseguem dar conta de todos os seus afazeres, apenas não possuem tempo
para a tarefa principal desta fase, que é o brincar, pois seguem horários até para a
diversão.
Já um objeto-brinquedo artesanal como o ioiô, com seu vaivém, mostra-se surpreendente e até sugere extravagâncias do sem-sentido. Esse brinquedo teve origem na Antiguidade. Há aproximadamente três mil anos, na China, já havia ioiôs de marfim. Na Grécia, eles eram conhecidos há dois mil e quinhentos anos, sendo feitos de pedra. Depois, nas cortes europeias, foram enfeitados
33
com joias e atrativas formas geométricas. No século XVI foram utilizados como arma para caçar, à maneira dos bumerangues australianos. No século XIX, as crianças filipinas brincavam de ioiô, mostrando notável destreza. Nas primeiras décadas do século XX o uso deste brinquedo disseminou-se pela Europa, chegou aos Estados Unidos e, dali em diante, se espalhou por muitos países. (apud Levin, 2007. ps23e24).
Tendo em vista a tendência atual Levin (2007), esclarece que a partir da
segunda metade do século XX ocorre uma mudança drástica e de alcance mundial
na produção industrial de brinquedos: começa a hegemonia do material plástico,
acompanhado os processos tecnológicos de industrialização no mundo inteiro.
Uma vez superada uma série de dificuldades de ordem técnica, o plástico foi
substituindo paulatinamente argila, a massa de pão, o pano, o papel, a folha de
flandres e a madeira, tornando-se material básico para a variedade de tipos,
formas e cores de brinquedos. Bonecas, bonecos, soldadinhos, animais, carros e
todo tipo de figuras de plástico espalharam-se pelo mundo.(op.cit).
A produção industrial em série ganha impulso inusitado, mudando a relação
entre a oferta de brinquedos e a demanda infantil. O mundo industrial, em
constante transformação, modifica o mundo da criança e oferece-lhe a
possibilidade de reproduzir fielmente, em miniatura, o mundo dos adultos. O
material plástico facilita a reprodução e a imitação de modelos em pouco tempo e
com custo muito baixo.(Idem).
A diferença entre um brinquedo de plástico e outro mais artesanal não
consiste apenas na materialidade do objeto-brinquedo, mas principalmente no
suporte representacional, uma vez que ele faz parte da representação. O material
plástico, cada vez mais refinado e elaborado, começa a determinar as brincadeiras
e atividades das crianças, mitigando impensadamente o impulso inventivo que lhes
é característico.
Continua Levin em suas considerações, que aos poucos, o brinquedo vira
um meio privilegiado para as aquisições que, supostamente , a criança deveria
almejar e obter. O brinquedo torna-se o resultado de testes minuciosos e de
conhecimentos cientificamente verificados para o correto desenvolvimento das
diversas atitudes corporais, motoras e cognitivas.
Depois de tão alto grau de aperfeiçoamento, o objeto-brinquedo acaba por
brincar sozinho; com efeito, ele se torna protagonista de uma brincadeira solitária
34
que é autossuficiente, não sendo necessário que a criança brinque. Para que ela
iria brincar, se o brinquedo brinca sozinho?
Logo, a criança é privada do prazer de brincar inventando, de criar
encenando ao acaso, ficando então fixa, imóvel, estática, enquanto o objeto é que
se movimenta, age, fala, canta, brinca e faz por ela.
Assim, hoje nos deparamos com bonecos que fazem de tudo: dormem,
falam, cantam, dançam,e até comem e fazem xixi. Cavalinhos que relincham,
galopam e se movimentam em uma única ação coordenada. Cachorrinhos que,
quando puxados pela coleira, latem, abanam o rabo e as orelhas, abrem a boca,
mexem o focinho, pulam e simulam o ato de urinar. A hiper-realidade dos
brinquedos chega às raias do sinistro. Tamanha é a semelhança que a fronteira
entre o objeto verdadeiro e a imitação se apaga, esvaindo-se.(Idem).
Em mais uma de suas considerações Levin (2007), nos faz pensar que a
euforia das crianças é motivada pelo objeto-produto e não vínculo que, por meio
dele, elas possam estabelecer com o outro. Os adultos sentem-se bem porque
compram produtos e brinquedos mas não têm tempo para brincar com as crianças.
Nesse espaço individual de contemplação sem brincadeiras nem representações,
o elemento autenticamente infantil se dilui na solidão material da coisa-brinquedo
que poderíamos considerar a primeira propriedade privada moderna: o brinquedo
da grande “aldeia global”.
35
CAPÍTULO III
TERAPIA OCUPACIONAL
Estabelecendo uma relação com os conceitos anteriormente descritos,
nesta parte daremos o enfoque da atuação terapêutica ocupacional para a
facilitação do desenvolvimento da criança.
Com a perspectiva da atuação terapêutica ocupacional para facilitar o
desenvolvimento da criança, é que nos valemos de alguns conceitos da
psicomotricidade. Buscando estimular a participação das crianças em
contextos sócio-educacionais com o intuito de promover o exercício
participativo dela no seu desenvolvimento como um todo.
A literatura aponta que esta prática tem trazido resultados positivos para
o desenvolvimento da criança. Monteiro (2001) constatou que as crianças têm
uma aceleração no desenvolvimento da linguagem, maior incorporação das
regras sociais e diminuição de comportamentos agressivos quando estão
assistidas cuidadosamente nas suas necessidades psicomotoras.
Os profissionais da área da saúde, que atuam com crianças
nesta faixa etária devem desenvolver seu trabalho em constante
parceria com outros profissionais, como por exemplo, os da
educação, para viabilizar a construção de sistemas que
colaborem com as crianças em todo âmbito de sua vida
ocupacional (BALEOTTI, 2006).
Na intervenção terapêutica ocupacional junto à criança, podemos utilizar
conteúdos da psicomotricidade como um processo que visa estimular o
desenvolvimento das habilidades físicas, intelectuais, emocionais e sociais.
36
Com a psicomotricidade podemos atuar sobre todos os mediadores que
a criança deve dominar para tornar-se não somente apta para tarefas diárias,
ou ser alfabetizada, mas também se tornar mais atenta, capaz de raciocinar,
criticar, descobrir-se na criatividade e na motivação. Nesse sentido, podemos
atuar nas seguintes áreas do desenvolvimento: condutas motoras de base
(equilíbrio, coordenação dinâmica geral e coordenação óculo-manual);
condutas perceptivomotoras ligadas à consciência (propriocepção,
lateralidade); condutas perceptivomotoras ligadas à consciência e a memória
(organização espaço – temporal e ritmo), afirma Baleotti (2006).
Para Le Boulch (2001), a educação psicomotora leva a criança a tomar
consciência de seu corpo e da lateralidade, a situar-se no espaço, a dominar o
tempo, a adquirir habitualmente a coordenação de seus gestos e movimentos.
Salienta que a educação psicomotora deve ser praticada desde a mais tenra
idade. Se conduzida com perseverança, permite prevenir inadaptações difíceis
de corrigir quando já estruturadas.
Antes de aprender a matemática, o português, os ensinamentos formais,
o corpo tem que estar organizado, com todos os elementos psicomotores
estruturados. Para Oliveira (2004) “Uma criança que não consegue organizar
seu corpo no tempo e no espaço, não conseguirá sentar-se numa cadeira,
concentrar-se, segurar num lápis com firmeza e reproduzir num papel o que
elaborou em pensamento”.
Os conceitos básicos da aprendizagem são experimentados
primeiramente no corpo do sujeito para que depois possam ser representados.
É extremamente importante o oferecimento de vivências psicomotoras
adequadas às crianças para que seu corpo vivido haja positivamente no
processo de aprendizagem de conceitos formais e informais (GORETTI, 2003).
Segundo Oliveira (2004), “os numerosos malefícios na maturação
psicoafetiva da criança influencia o seu desenvolvimento”. Compromete sua
marcha, sua linguagem, a digestão, tem frequentes infecções, distúrbios de
comportamento, ou seja, desadaptações.
É neste contexto que, a Terapia Ocupacional juntamente com a
psicomotricidade tem sua importância especial, pois proporciona a criança o
resgate de sua dimensão ocupacional. Pela manutenção da ação, da criação,
da expressão e da transformação a partir de seus hábitos cotidianos, de suas
37
condições físicas, afetivas e sociais, tornando-a assim, não só o alvo, mas
também o sujeito da ação terapêutica, (OLIVEIRA, 2004).
Neste sentido, que o conceito de atividades psicomotoras em terapia
ocupacional é um constructo, uma mediação de relações múltiplas. Podem
atuar ajudando o organizar da criança no tempo e no espaço, auxiliando no
processo da comunicação e linguagem verbal, gestual, sonora e simbólica,
portanto, entendemos que é um conceito aberto. (Idem).
As atividades constroem as experiências e na situação vivida, segundo a
história e as práticas sociais, os valores culturais vão se formando de maneira
particular e plural, podendo configurar-se como instrumento de emancipação
ou de alienação. Os objetivos e o manejo das atividades psicomotoras é que
levam a obtenção de emancipação e cidadania. (Idem)
Oliveira (2004, Vayer 1984) escreve: “Todas as experiências da criança
(o prazer e a dor, o sucesso ou o fracasso) são sempre vividos corporalmente”.
Se acrescentarmos valores sociais a esse corpo, ele ganhará significados,
sentimentos e valores, que serão absolutamente pessoais.
Oliveira (2004) escreve a necessidade da criança dizendo: “Ela precisa
ter suas próprias experiências e não se guiar pelas do adulto, pois é pela sua
prática pessoal, pela sua exploração que se ajusta, domina, descobre e
compreende o meio”. Mas, cabe lembrar que a criança dispõe de uma memória
do corpo que está carregada de afeto e que suas experiências futuras,
dependem das anteriores, portanto, tornamos a frisar a importância do adulto
na condução da criança favorecendo a sua autonomia.
3.1 As atividades do Terapeuta Ocupacional.
Essa evolução da Práxis por toda a história nos explica as
distorções de entendimento que foram surgindo entre a Terapia
Ocupacional e a praxiterapia. Embora uma seja ciência e a
outra, uma técnica, hoje podemos ampliar nossa aprendizagem
38
e nosso entendimento de que a “Terapia Ocupacional não é
praxiterapia, mas praxiterapia é Terapia Ocupacional” para a
práxis que significa a atividade humana que produz objetos.
Essa atividade é vista sem caráter estritamente utilitário,
inferindo pelo significado adotado na linguagem comum.
(Pedral, 2008 p231).
Nesta parte traçaremos um perfil do terapeuta ocupacional no que se
refere a sua prática com base na história da terapia ocupacional, mostra que na
prática o terapeuta ocupacional ao analisar a atividade, pode identificar as
áreas em que são necessárias adaptações e graduações, dependendo da
capacidade funcional do cliente, além de aprender o potencial intrínseco à
atividade. (PEDRAL, 2008).
Conhecer a patologia é essencial para selecionar a atividade, uma vez
que as necessidades do cliente mudam em cada caso e a aplicação da
atividade como recurso terapêutico é a ferramenta mais básica de prática
terapêutica ocupacional, permitindo ao terapeuta se basear nela para a
avaliação e para o tratamento do cliente. Deve-se ter um conhecimento vasto e
uma gama ampla de atividades, uma vez que os interesses e os déficits são
variados. (Cavalcante, 2007)
Segundo Pedretti e Early (2005), no contexto de tratamento, o ambiente
onde ocorre o tratamento, tem dimensões temporais e ambientais que afetam
tanto o terapeuta quanto a pessoa que recebe os serviços de terapia. Conhecer
as características de cada contexto de tratamento e antecipar de que forma o
contexto irá afetar o desempenho, prepara o terapeuta para atender melhor às
necessidades do cliente. Um terapeuta experiente pode orientar o paciente,
questionando-o cuidadosamente em busca de metas significativas e possíveis.
A sensibilidade às necessidades exclusivas de cada indivíduo em cada
ambiente de tratamento é crítica.
Segundo Francisco (2001), o terapeuta parte do pressuposto que
ninguém melhor do que o cliente para determinar os caminhos a percorrer para
retomar uma vida saudável, o estado de saúde. Tal fato advém da crença num
homem que é único. A saúde é concebida como um estágio de equilíbrio na
39
relação do homem com seu ambiente; a doença, portanto, decorre do
desequilíbrio nessa relação. Nessa concepção, a “saúde é um estado de
completo bem-estar físico, mental e social e não apenas a ausência de afecção
ou doença”.
O autor reintera que, o processo é centrado na relação terapêutica,
tornando-se esta relação o instrumento do terapeuta ocupacional. Busca-se
criar um ambiente acolhedor, onde o cliente possa descobrir-se e encontrar-se
com o outro. O cliente traz a sua maneira de viver, a história de suas
aprendizagens e o clima afetivo no que tem realizado. Cabe ao terapeuta à
tarefa de tomar essa relação como medida, ser o facilitador para a
aprendizagem de novas formas, oferecendo um modelo de relação, em que
seja possível aprender, ensaiar, errar, ensinar, realizar naquele momento
aquilo que em outro espaço não teve lugar. A atividade também é
compreendida como um outro, concreto e com linguagem própria, linguagem
que o cliente em ocasiões deverá escutar. Possibilita-se, assim, o
reconhecimento desse caminho de idas e vindas, caminho no qual não mais
ocupará um lugar passivo, ao contrário, um novo caminho.
3.2 Análise de atividade.
Estabelecendo uma relação com os conceitos anteriormente descritos,
nesta parte daremos o enfoque na análise de atividade ocupacional que se
refere ao ser humano e sua necessidade inata de fazer coisas, criar, tentar,
arrumar, trocar, construir, mudar conforme sua necessidade, aprender, ensinar
e outras mil formas de fazer. Enfim, vive, experimenta, erra, experimenta
novamente, soluciona problemas, cria outros, toma decisões (até mesmo a de
não fazer nada) e espera respostas. Viver é a sua ocupação. (CAVALCANTE,
2007).
Considerando a necessidade inata do ser humano em se ocupar e as
diversas aplicações da palavra ocupação passamos a rever algumas destas,
40
poderemos encontrar em Cavalcante (2007), que ocupações são coisas
rotineiras e familiares em que às pessoas se envolvem e que fazem ao longo
de suas vidas para preencher seu tempo e lhes trazer significado. Envolve
habilidade mental, dimensão física, sempre tem um grau de significado
pessoal, um contexto temporal, psíquico, social, simbólico, cultural, étnico e/ou
espiritual. Reflete as características únicas da pessoa.
Para Cavalcante (2007), na Terapia Ocupacional, é ensinada a
criação de situações, utilizando como instrumento esse “fazer”,
para manter ou melhorar as condições de saúde do cliente.
Para a American Occupational Therapy Association (AOTA), o
Terapeuta Ocupacional é o profissional que, por meio do
uso da atividade, oferece ao cliente oportunidades para uma
ação efetiva. Essas atividades têm um propósito, uma vez
que auxiliam e são construídas sobre as habilidades do
cliente.
No aspecto geral Cavalcante (2007), ainda menciona que a análise de
atividade pode ser considerado um passo no processo de avaliação e
tratamento de terapia ocupacional durante o qual a aceitação do cliente e os
problemas ou potenciais problemas são identificados mais especificamente. O
desempenho do cliente é observado no contexto em que se dá a atividade,
para identificar quais aspectos precisam ser reforçados e quais precisam ser
inibidos. A análise de atividade pode ser construída por observação e
perguntas que podem ser feitas durante a atividade para avaliar não só a
capacidade funcional, mas também os desejos e as intenções do cliente. A
aplicação da atividade como recurso terapêutico é a ferramenta mais básica de
prática terapêutica ocupacional, permitindo ao terapeuta se basear nela para a
avaliação e para o tratamento do cliente. A análise da atividade não é a
identificação somente das partes que compõem uma atividade, mas de quais
os efeitos que são gerados no cliente ao desempenharem tal atividade. Não se
analisa só a habilidade, mas também os hábitos, os papéis que ela ocupa, a
41
motivação, a competência, o comportamento e a interação com o meio. Até
mesmo uma brincadeira pode ser analisada quando se observa o
comportamento da criança, como ele soluciona os problemas e resolve os
impasses, como organiza e estrutura a brincadeira.
Segundo Pedral (2008), no caso das crianças, elas trazem como objeto
concreto o seu fazer puro e simples. O seu real fazer, evolutivo, é sempre o
reflexo de como essa criança se comporta na aquisição de conteúdos e na
apropriação de conceitos pertinentes à sua fase.
Para Pedral (2008), falar em recursos terapêuticos no contexto da
terapia ocupacional é referir-se à atividade em si. É interagir de forma ativa o
tempo todo com ela, com os materiais, ferramentas, e com o objeto concreto,
numa “relação de reconhecimento” entre o paciente e o terapeuta ocupacional.
Considerando que o paciente é um indivíduo incompleto, e um ser em
movimento, que pensa, concluímos que ele necessita planejar, levantar dados
e informações para encontrar respostas. Ao sujeito é inerente buscar em seu
meio, em suas relações, a construção da sua realidade a partir do que é, do
que conhece. E é neste processo de conhecimento que o paciente poderá criar
e recriar o universo de suas relações. (op. cit.).
Sendo o “recurso” um meio para facilitar ou mediar à transformação do
sujeito, fica fácil compreender que as formas expressivas e criativas
representam um caminho mais rico em conteúdo. São elas que, por sua
complexidade, facilitam a manifestação da realidade do sujeito, ou melhor, de
sua essência.(PEDRAL,2008).
3.3 O fazer desse corpo.
“Você sabia que pode ver com os dedos”? É claro que
você pode ver com os olhos, mas os seus dedos lhe contam
muitas coisas que os olhos não contam. Os dedos dizem, por
exemplo, que as coisas são quentes ou frias, duras ou moles,
42
ásperas ou lisas. Você pode assim tocar e fazer coisas. Isso
nos ajuda a descobrir o mundo e como nos sentimos em
relação a ele. “A sua arte conta o que você sente, vê e sabe.”
(D”Amico apud Battisti, 2001 p85)
No texto do Battisti (2001), temos uma representação valiosa dessa
capacidade associativa da mente humana, uma vez que, em suas palavras, há
mais do que uma apologia do sentido do tato, como forma de perceber o
mundo, temos uma verdadeira explicação do que é sinestesia, ou seja, a
associação de mais de uma modalidade sensorial. Temos o tato aperfeiçoando
a visão, e, também, a audição, pois ao”contar”, ao sussurrar à mente as coisas
que os olhos não podem ver, o tato se coloca metaforicamente como voz a
estimular a mente.
A exploração livre dos objetos e do espaço, mas antes de falarmos dos
aspectos práticos dessa exploração, Battisti (2001) nos leva a refletir sobre o
conceito de espaço de movimentação livre, marca fundamental do ser-no-
mundo, principalmente no modo explorador, um conceito de Kurt Lewin, um dos
mestres da psicologia social:
O espaço de movimento livre de uma pessoa ou de um grupo social pode
ser representado como uma região topológica, rodeada de outras regiões que
não são acessíveis. A acessibilidade das regiões é obstada sobretudo por dois
fatores. Um é a falta de capacidade, por exemplo, falta de perícia ou
inteligência. O outro é a proibição social ou qualquer espécie de interdição que
funcione como uma “barreira” dinâmica entre a pessoa e seu objetivo. A criança
pode ser capaz de colher uma maçã, mas a mãe pode ter-lho proibido”.
(Lewin,1963 apud Battisti, 2001.).
Essa afirmação do autor acima, corrobora com as restrições que
impediram, no início das grandes navegações, o homem de ir além dos limites
cartográficos. E nos auxilia também na reafirmação das ideias de que o nosso
trabalho pode e deve ser na direção de possibilitar múltiplas operações
associativas na mente da criança, facilitar o desenvolvimento de capacidades e
ampliar a sua participação ou pré-sença em várias mundaneidades.(op. cit.).
43
Portanto reintera o autor, que o processo que aqui denominamos de
exploração livre dos objetos e do espaço, é, na verdade, uma oferta generosa
de tempo de adaptação e familiarização com o setting terapêutico
ocupacional.É um tempo para o reconhecimento, por parte da criança, através
dos sentidos, dos caracteres que constituem o setting, para que posteriormente
ela possa usá-los na construção das metáforas, por consequência, da trama de
uma fábula, e por fim, da criatividade.Também podemos deduzir que esse
modo de ser no setting, ou seja, explorador, significa uma permissão interna do
cliente em consonância com uma permissão externa dada pelo terapeuta
ocupacional. Para os quais o terapeuta deverá responder com o modo de ser
facilitador, ajudando a criança a se desinterditar pelo fortalecimento do
domínio, da aprendizagem e da motivação em ser-aí-no-setting. Nesses casos,
uma exploração orientada dos objetos e do espaço pode conter a característica
facilitadora do ser terapeuta ocupacional.
Para Battisti (2001), facilitar é tornar factível, trazer às mãos, oferecer a
manualidade ou o manual de algo, apresentar um modelo para que um
determinado objeto venha a ser executado.
Dentre vários modelos que podem ser oferecidos com o objetivo de
orientar a criança dentro do setting terapêutico ocupacional, apontamos duas
possibilidades: um primeiro e possível modelo é trabalhar com a criança
usando uma lista de verificação de propriedades ou traços adjetivos dos
objetos, que ela desenvolve com a ajuda do terapeuta ocupacional,
assinalando, por exemplo, as propriedades de um fio de lã e comparando-as
com as de um fio de sisal, exercitando,assim, as semelhanças e
dessemelhanças entre eles.(op. cit.).
Um segundo meio, e muito simples, mas que aguça a curiosidade da
criança, e, portanto, estimula a sua motivação, é o uso de charadas a serem
decifradas por ela. O ato de decifrar ou decodificar, por si só, já estabelece
inúmeras associações, além de distinguir algumas das propriedades já
mencionadas. A representação de um objetivo do setting pode assumir o
seguinte formato: Objeto = Aspecto do objeto + Quem produz o objeto. Fica,
por exemplo, algo parecido dom : X = Sou redondo, feito de borracha, feito pelo
44
homem e sustento um automóvel ou ainda: X = Sou redonda, feita de borracha,
feita pelo homem, pulo de mão em mão e de pé em pé. (Battisti,2001).
Segundo Pedral (2008), no início do processo a criança estará livre para
explorar o espaço e dentro do contexto da atividade. Contexto significa
encadeamento de ideias, composição, contextura. No caso do cliente solicitar
uma determinada atividade, a contextualização do processo é do terapeuta,
que será o mediador da relação e o responsável por essa etapa. O uso
inadequado dos materiais/ferramentas não traz nenhum benefício, pelo
contrário, pode incorrer na frustração ou na manutenção de disfunções em
áreas lesadas, seja física ou psiquicamente.
O autor ainda descreve que para escolher, desenvolver, contextualizar e
aplicar uma atividade, é necessário considerarmos sua complexidade e as
etapas que a compõe. Então, tarefas são detalhamentos, fragmentos de uma
atividade, assim, uma determinada atividade como colagem é composta por
várias tarefas anteriores, e/ou etapas, que necessitam de igual atenção e
análise. A partir de nossas atitudes como observadores, temos que a relação
de simplicidade ou complexidade da atividade está intimamente ligada ao
aspecto sequencial de tarefas. A forma dada à atividade representa o curso de
etapas simples ou de tarefas com muitas fases inter-relacionadas, com
diversos níveis de dificuldades, que devem ser cumpridos. O terapeuta não
deve apresentar muitos brinquedos ou materiais simultaneamente a uma
criança, pois a dispersão pode prejudicar o processo de observação da relação
com a atividade. A imaginação e a criatividade fazem parte do tratamento e,
por isso, os matérias sempre devem estar adequadamente disponíveis quando
o terapeuta trabalhar com iniciativas.
A brincadeira oferece às crianças uma ampla estrutura básica para
mudanças das necessidades e tomada de consciência: ações na esfera
imaginativa, criação das intenções voluntárias, formação de planos da vida
real, motivações intrínsecas e oportunidade de interação com o outro, que, sem
dúvida contribuirão para o seu desenvolvimento.(PEDRAL 2008).
Para Alves (2007 p115), o jogo integra os aspectos motores, cognitivos,
afetivos e sociais. [...] A psicomotricidade pode ajudar e muito, através de
45
exercícios preparatórios. Como exemplifica Alves, exercícios de esquema
corporal: mímica, observando os movimentos realizados identificar algo;
esculturas, esculpir seu próprio corpo; adivinhação, - que fica em cima do
pescoço? Ou, que fica entre os olhos e a boca? ; nomear partes do corpo de
bonecos; desenhar uma figura humana.
O mesmo autor descreve como outra atividade exercícios de lateralidade:
colocar mãos sobre o contorno de mãos desenhadas na parede, direita sobre
direita, esquerda sobre esquerda, entre outros. Exercícios de coordenação
dinâmica global: rolar no chão,engatinhar passando sobre obstáculos, andar
correr,pular,dançar, entre outros. Exercícios visomanual ou fina, exercícios
gerais como: montar quebra-cabeça, modelar com massa ou argila, entre
outros; exercícios específicos: recortar com o dedo, recortar com tesoura,
contornar, entre outros.
O conhecimento e a criatividade do terapeuta ocupacional são
certamente, colocadas a serviço do contexto terapêutico, mas serve também
para incitar a criança a participar plenamente da terapia e desenvolver sua
própria imaginação. Como vemos, a intervenção é função da orientação dada à
terapia e, então, é da atitude do terapeuta ocupacional, que solicitará a
colaboração ativa da criança.
Com base no estudo dos elementos psicomotores na facilitação do
desenvolvimento da criança, com olhar da terapia ocupacional, sendo
importante ressaltar que esta facilitação estará vinculada aos anseios do
setting terapêutico e só se aplacará na medida de sua utilização consciente e
respeitoso ao mundo da criança.
46
CONCLUSÃO
Através de uma ação terapêutica ocupacional valendo-se dos elementos
da psicomotricidade que favorece uma integração sensória motora, a
intervenção se dará a partir dos movimentos espontâneos da criança e das
atitudes corporal sendo um norteador da gênese da imagem do corpo, núcleo
central da personalidade. Diante deste panorama da concepção de um
movimento que organiza e integra as funções vividas pela criança cuja ação é
resultante de sua individualidade, sua linguagem e sua socialização,
inauguram-se mundos que lhe fortalecerá por toda sua existência deixando
impresso em seus registros o fazer humano.
O terapeuta ocupacional, ao analisar a atividade, pode identificar as áreas
em que são necessárias adaptações e graduações, dependendo da
capacidade funcional da criança. O objetivo terapêutico ocupacional é traçado
para que haja acesso pela emoção à execução motivada por estímulos do
próprio movimento, da execução de tarefas ocupacionais sonoras, táteis, cores,
formas e integradas com as atividades de vida diária. Neste caso, investigamos
as possibilidades e estímulos que o espaço por si só, oferece à criança
segundo a fase do seu desenvolvimento emocional cognitivo e físico.
O brincar, por ser o território de atividade próprio da infância, é mais
adequado para ajudar a criança nas atividades significativas para ela responder
à sua necessidade de agir da maneira mais apropriada, e é uma modalidade
terapêutica completa em si, que favorece o desenvolvimento das atitudes e das
habilidades. Como vemos, a orientação é função dada à terapia e, então, é da
atitude do terapeuta ocupacional, que solicitará a colaboração ativa da criança.
A imaginação do terapeuta é, certamente, colocada a serviço do contexto
47
terapêutico, mas serve também para incitar a criança a participar plenamente
da terapia e desenvolver sua própria imaginação.
O processo terapêutico repousa, em grande parte, na atitude do
terapeuta.
Sendo assim, podemos entender que os elementos que compõem a
psicomotricidade são relevantes na organização deste corpo, buscando novas
estruturações de perceber e de agir no mundo, considerando que o homem é
um ser essencialmente ocupacional.
48
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50
ÍNDICE
Folha de rosto 2
Agradecimento 3
Dedicatória 4
Resumo 5
Metodologia 6
Sumário 7
Introdução 8
Capítulo I
Psicomotricidade 10
1.1 Elementos da Psicomotricidade 12
1.2 Desenvolvimento Cognitivo 13
1.3 Desenvolvimento Motor 20
Capítulo II
A Relação do Corpo e o Movimento 26
2.1 Esquema e Imagem Corporal 29
2.2 Corporeidade 31
Capítulo III
Terapia Ocupacional 35
3.1 As Atividades do Terapeuta Ocupacional 37
3.2 Análise de Atividade 39
3.3 O Fazer Desse Corpo 41
Conclusão 46
Bibliografia 48
Índice 50