UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA – UnB
FACULDADE DE DIREITO
JULIA ESTEVES LIMA WERBERICH - 13/0040444
ALINE RIBEIRO SILVA – 13/0004987
ANÁLISE AO ACÓRDÃO - RMS 11260 / SE – STJ
RELATOR: MINISTRO JORGE SCARTEZZINI
Disciplina: Teoria Geral do Processo 2Professor: Vallisney OliveiraTurma “B”Período: 2/2014
BRASÍLIA,Outubro de 2014.
EMENTA
PROCESSUAL CIVIL – RECURSO ORDNIÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA – TITULAR DE SERVIÇO NOTORIAL – APOSENTADORIA – PRELIMINAR – PARTICIPAÇÃO DE MAGISTRADO QUE DECLAROU SUA SUSPEIÇÃO – ART. 135, DO CPC – NULIDADE DO JULGADO – PROLAÇÃO DE NOVA DECISÃO.
1 – O juiz que, de qualquer modo, esteja vinculado à causa, por razões de ordem subjetiva, tem comprometida a sua imparcialidade e, portanto, não deve autuar no processo. As razões que comprometem, ou, pelo menos colocam em risco a imparcialidade do juiz, são as razões de impedimento e suspeição, relacionadas no Código de Processo Civil.
2 – Declarada expressa e anteriormente suspeição de um determinado desembargador (fls. 55), não pode este participar no julgamento do presente writ. O voto de apenas um magistrado que, de alguma forma, está vinculado à causa ou tenha nela algum interesse particular, macula todo o julgamento, ensejando sua nulidade e a prolação de outro, em respeito ao princípio da imparcialidade do juiz, basilar ao exercício da cidadania e da justiça.
3 – Precedente (REsp nº 84.519/MA).
4 – Recurso conhecido e, em preliminar, provido para declarar nulo o v. acórdão e determinar o retorno dos autos ao Tribunal de origem para novo julgamento, restando prejudicada a análise do mérito por esta Corte Superior.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Srs. Ministros da Quinta turma do Superior Tribunal de Justiça em, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer do recurso e, preliminarmente, dar-lhe provimento para declarar nulo o v. acórdão recorrido e determinar o retorno dos autos ao Tribunal de Origem para novo julgamento, restando prejudicada a análise do mérito por esta Corte. Votaram com o Sr. Ministro Relator os Srs. Ministros EDSON VIDIGAL, JOSÉ ARNALDO, FELIX FISCHER e GILSON DIPP.
Brasília, DF, 26 de setembro de 2000 (data do julgamento).
RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Ministro JORGE SCARTEZZINI (Relator):
Cuida –se de Recurso Ordinário em Mandado de Segurança, interposto por IVANETE GUIMARÃES ALMEIDA, com fundamento no artigo 105, II, “b”, da Constituição Federal, contra o v. acórdão de fls. 51, prolatado pelo Tribunal de Justiça
do Estado de Sergipe que, à unanimidade, denegou a ordem. A ementa do Julgado encontra-se expressa nos seguintes termos, verbis:
“MANDADO DE SEGURANÇA.
Os titulares de serviços notariais e de registro, considerados servidores públicos, estão sujeitos à aposentadoria compulsória aos setenta anos de idade. Por igual razão, aplica-se a regra se ocupantes, cumulativamente, de escrivania judicial, da qual se aposentam compulsoriamente.”
Alega a recorrente, nas suas razões, em síntese, preliminarmente, ser nulo o julgamento, porquanto dele teriam participado dois desembargadores impedidos. No mérito, sustenta, que não poderia ser aposentada compulsoriamente, pois era exercente da escrivania extrajudicial e como tal figurava na categoria de servidora notorial por delegação do Poder Público e em caráter eminentemente privado, sendo que esta categoria só pode ser extinta nos termos do art. 39, da Lei nº 8.935/94 (fls. 58/67).
Contra-Razões apresentadas às fls. 70/77.
Devidamente preparado o recurso (fls. 68) e estando o mesmo tempestivo, subiu o presente a esta Corte.
A douta Subprocuradoria-Geral da República opina pelo desprovimento do recurso (fls. 84/86), vindo-me os autos conclusos.
É o relatório.
VOTO
O Exmo Sr. Ministro JORGE SCARTEZZINI (Relator):
Sr. Presidente, o recurso merecer ser conhecido, por se encontrar tempestivo e preparado e, em preliminar, provido.
Aduz a recorrente, preliminarmente, a nulidade da decisão hostilizada, porquanto participaram de seu julgamento dois desembargadores legalmente impedidos. Sustenta que o Desembargador EPAMININDAS SILVA DE ANDRADE LIMA, autoridade tida coo coatora na segurança impetrada, figurou como integrante do Tribunal Pleno no julgamento do mandamus, o que pode-se constatar através da assinatura do mesmo ao final do acórdão, sem a devida ressalva. Igualmente, assevera que o Desembargador ALOÍSIO DE ABREU LIMA declarou-se, de ofício, suspeito para o julgamento do feito, tendo, mesmo assim, dele participado (3ª. Assinatura às fls. 55 dos autos).
Passo ao exame dos autos,
A questão é singela, devendo ser acatada a preliminar arguida.
Inicialmente, compulsando os autos verifico ter sido devidamente registrado às fls. 50 o impedimento do Desembargador Epaminondas Silva de Andrade Lima, quando do julgamento do presente writ, conforme tira de julgamento, a qual transcrevo, verbis:
“POR UNANIMIDADE, FOI DENEGADA A SEGURANÇA. IMPEDIDO DE VOTAR O EXMO. SR. DESEMBARGADOR EPAMINONDAS SILVA DE ANDRADE UMA POR SER À ÉPOCA, O PRESIDENTE DESTA EGRÉGIA CORTE, E PORTANTO, AUTORIDADE COATORA.” – grifei.
Contudo, com relação ao Desembargador Aloísio de Abreu Lima, constato que o mesmo declarou-se, de ofício, suspeito para o julgamento da causa, com fundamento no art. 135, V, do Código de Processo Civil, ao argumento de que seu “filho exerce cargo de Tabelião e Registrador do Tribunal de Justiça e é o atual Presidente da Associação dos Notários, Escrivães e Registradores do Estado de Sergipe”, dizendo-se interessado na causa (fl. 48). Ainda assim, conforme se observa das fls. 50, que consigna a presença do Desembargador na sessão, bem como das fls. 55, na qual consta sua assinatura, teve Sua Excelência participação no julgamento da lide, acarretando, portanto, a nulidade da decisão.
VICENTE GRECO FILHO, ensina-nos que:
“A imparcialidade do juiz é pressuposto de toda atividade jurisdicional. A imparcialidade pode ser examinada sob um aspecto objetivo e um aspecto subjetivo. No aspecto objetivo, a imparcialidade se traduz na equidistância prática do juiz no desenvolvimento do processo, dando às partes igualdade de tratamento.
Como consequências dessa imparcialidade objetiva, existem, por exemplo, o princípio da iniciativa de partes, que proíbe ao juiz conhecer das questões não suscitadas porque, em caso contrário, estaria beneficiando a uma das partes e o princípio de que em todos os momentos do processo as partes devem ter oportunidades processuais análogas. Todavia, para que se concretize a imparcialidade objetiva, é preciso que o juiz seja subjetivamente imparcial, isto é, que seja verdadeiramente um estranho à causa e às partes.
O juiz, que de qualquer modo esteja vinculado à causa, por razões de ordem subjetiva, tem comprometida a sua imparcialidade e, portanto, não deve autuar no processo. As razões que comprometem, ou, pelo menos colocam em risco a imparcialidade do juiz, são as razões de impedimento e suspeição, conforme relacionadas no Código”, (in, “Direito Processual Civil Brasileiro”, Ed. Saraiva, SP, 5ª edição, 1º vol, ps. 229/230) – grifei.
No mesmo sentido, esta Corte Superior, quando do julgamento do REsp nº 84.519/MA, DJU de 10.08.1998, Relator o Ilustre Ministro GARCIA VIEIRA, assim se pronunciou em caso semelhante:
“PROCESSUAL – JUIZ IMPEDIDO – NULIDADE – ‘REFORMATIO IN PEJUS’ – IMPOSSIBILIDADE.
Sendo o acórdão proferido por câmara de três membros, sendo dois deles impedidos, o julgamento é nulo. Não pode o tribunal modificar sentença afim de beneficiar o Estado que não recorreu.
Recurso provido.”
Em seu voto, Sua Excelência assevera que:
“Os desembargadores Almeida e Silva e Wagner Campos firmaram impedimento. O primeiro, com base no artigo 134, inciso IV do CPC, porque participou do julgamento como Procurador do Estado, o seu filho, advogado José Antônio Figueiredo de Almeida e Silva (fls. 79). O segundo, por motivo de foro íntimo (fls. 80/80vº). Mas mesmo assim e sem qualquer explicação participaram do julgamento proferido pela Egrégia Segunda Câmara Civil do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão, que é integrada por três desembargadores (fls. 95). Ora, se o venerado acórdão recorrido foi proferido por câmara de três membros, sendo dois deles impedidos, o julgamento é nulo mesmo tendo sido unânime. Ora, se o filho do Desembargador Almeida e Silva postulou nesse processo como advogado, inclusive contestando a presente ação (fls. 22/29), não podia ele exercer as suas funções de julgador neste processo (artigo 134, inciso IV do CPC). Se o Desembargador Wagner Campos deu-se por impedido por for íntimo (art. 135, parágrafo único do CPC), estava ele impedido de participar do julgamento. Consequentemente, nulos são os venerados acórdãos da apelação e dos embargos de declaração. Neste sentido, o Recurso Especial nº 10.049-0-PE, relator Ministro Claudio Santos, RSTJ – 50/135, julgado no dia 29/06/92m no qual a Egrégia Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça entendeu que:
“Nulo é o acordão do qual participou desembargador que se deu por suspeito.” – grifei.
Concluindo, entendo que o voto de apenas um juiz que, de alguma forma, está vinculado à causa ou tenha nela algum interesse particular, macula todo o julgamento, ensejando sua nulidade e a prolação de outro, em respeito ao princípio da imparcialidade do magistrado, basilar ao exercício da cidadania e da justiça.
Por tais fundamentos, conheço do recurso e, em preliminar, dou-lhe provimento para declarar nulo o v. acórdão recorrido e determinar o retorno dos autos ao Tribunal de origem para novo julgamento, restando prejudicada a análise do mérito por esta Corte Superior.
É como voto.
ANÁLISE DO ACÓRDÃO
O presente acórdão trata da questão de nulidade processual em decorrência de
impedimento e suspeição dos magistrados designados para o julgamento do processo
em segunda instância. No caso, dois desembargadores do Tribunal de Justiça de
Sergipe, Epaminondas Silva de Andrade Lima e Aloísio de Abreu Lima, os quais
participaram do julgamento deste processo, estariam impedidos de votar, por motivos de
ordem subjetiva e objetiva, de acordo com os dispositivos do CPC referentes à questão,
art. 134 e 135.
Em situação de impedimento se encontra o primeiro desembargador citado, em
razão de ter sido autoridade tida como coatora no Mandado de Segurança impetrado,
figurando como Presidente do Tribunal de Justiça e, o segundo, em razão de ter ele
próprio declarado, de ofício, suspeito para o julgamento da causa, com fundamento no
art. 135, V, do Código de Processo Civil, que dispõe sobre a existência de suspeição de
parcialidade do juiz em decorrência de ser interessado no julgamento da causa em favor
de uma das partes, no caso, pelo fato de ser seu filho Tabelião e registrador do Tribunal
de Justiça, bem como Presidente, na época, da Associação dos Notários Escrivães e
Registradores do Estado de Sergipe.
Ao citar-se no acórdão o entendimento de Vicente Greco Filho a respeito do
assunto, tiram-se as conclusões de que o juiz que estiver, de alguma forma, vinculado ao
processo em si ou às partes litigantes, terá prejudicada sua imparcialidade, pelas razões
de impedimento e suspeição elencadas pelo Código de Processo Civil, Artigos 134 e
135, não podendo, portanto, participar do julgamento do processo, sob o perigo de
infringir o princípio da imparcialidade dos juízes e com a consequência de torna-lo nulo.
Desta forma, o Desembargador Epaminondas estaria, de fato, impedido de julgar,
por força do Art. 134, II, CPC, por se configurar como Autoridade Coatora no presente
mandamus, e o Desembargador Aloísio de Abreu estaria em caso de suspeição, segundo
a redação do art. 135, inciso V, do CPC, pelo cargo ocupado por seu filho no Tribunal,
além de sua própria declaração de suspeição, feita de ofício.
No entanto, ainda diante da verificada situação de impedimento e suspeição de
julgamento para ambos os Desembargadores, eles proferiram seu voto acerca do caso, o
que, na realidade, não poderia ter ocorrido, pois, como formalizado pelo acórdão do
REsp 84.519/MA citado, “nulo é o acórdão do qual participou desembargador que
se deu por suspeito”.
Referência se faz à este precedente do STJ, REsp 84.519/MA, por se tratar de
processo cuja situação em muito se assemelha ao caso tratado em questão, em que,
diante de uma câmara julgadora de três membros, dois se encontravam em situação de
impedimento ou suspeição, configurando-se, portanto, nulo o julgamento, mesmo tendo
sido a decisão unânime. Evidencia-se, assim, uma posição já consolidada deste tribunal
em casos como este, de necessidade de abstenção dos magistrados no julgamento por
impedimento e/ou suspeição.
Ainda, é de se ressaltar que apenas o voto de um magistrado impedido ou suspeito
para o julgamento já seria suficiente para que fosse declarada a nulidade da decisão.
Portanto, e também diante das demais alegações feitas, não há de se esperar decisão
contrária, se não a de conhecimento do recurso pela declaração de nulidade do acórdão
do Tribunal de Justiça recorrido, com retorno dos autos a este Tribunal para novo
julgamento.
Desenvolvimento
O juiz possui o dever de reconhecer e declarar, ex officio, seu próprio impedimento
ou suspeição, havendo também, para parte, remédio processual adequado para afastar da
causa, quando este viola o dever de abstenção. Sendo exceção de impedimento e
suspeição é diretamente encaminhada ao Juiz da causa, embora seja o tribunal que as
julgue.
No caso concreto há uma hipótese de impedimento e suspeição. A suspeição
arrola hipóteses de ordem subjetiva que envolve o risco a imparcialidade do juiz, por tal
razão, não basta a mera alegação de suspeição para que o feito seja redistribuído, sendo
indispensável que a ocorrência dessa causa gerou efetivamente a parcialidade do juiz. A
exclusão do juiz suspeito ou impedido envolve a obrigação do juiz de abster-se
correspondente o direito processual da parte de recusá-lo.
A recusa da parte processa-se através do incidente de exceção de impedimento
ou suspeição, que é autuado em apenso aos autos principais, tendo efeito suspensivo
com relação ao processo. O Código de Processo Civil prevê que a exceção deve ser
protocolizada em petição e não juntamente com a contestação. Porém, a arguição posta
como preliminar da resposta do réu constitui mera irregularidade, cujos efeitos devem
ser mitigados em atenção à instrumentalidade do processo.
Apesar de a suspeição poder ser conhecida de ofício pelo juiz, não é
propriamente uma objeção, não pode ser alegada a qualquer tempo. Portanto, sobre a
suspeição opera os efeitos da preclusão. O art. 305, CPC, relata que a exceção da
suspeição deve ser oferecida no prazo de 15 dias da contados data do fato que ocasionou
a suspeição, contudo, o STJ entende de modo diverso, devendo os 15 dias ser contados a
partir do conhecimento do fato que gera a suspeição do juiz, ainda que se dê a após a
resposta.
Humberto Theodoro preceitua acerca da suspeição, “é imprescindível à lisura
e prestígio das decisões judiciais a inexistência da menor dúvida sobre os motivos de
ordem pessoal que possam influir no ânimo do julgador”. Portanto, não deve ser
violado o principio da imparcialidade, por motivos pessoais do julgador, o que
possibilita que sua decisão possa ser tendenciosa e ocasione dúvidas.
Quanto à exceção de impedimento, trazem comandos que visem à preservação
do princípio do juiz natural; hipóteses objetivas em que o juiz não pode atuar,
constituindo nulidade absoluta, atacável inclusive por ação rescisória, as decisões
proferidas por julgador impedido. Ademais não sofrendo os efeitos da preclusão, estas
são hipóteses em que o juiz não pode atuar, constituindo nulidade absoluta, atacável
inclusive por ação rescisória, as decisões proferidas por julgador impedido, art. 485, II.
Cumprindo ressaltar que, em órgãos colegiados, a nulidade do acórdão somente se
impõe se o voto do julgado impedido tiver influenciado peremptoriamente o resultado.
Segundo Pontes de Miranda é uma enumeração taxativa. Calmon de Passos,
no entanto, entende que o rol de impedimentos não é exaustivo, porque engloba toda
situação em que haja uma incompatibilidade lógica entre a função de julgar e o papel do
juiz no processo, mesmo que não prevista expressamente naqueles dispositivos.
No caso concreto, com relação ao Desembargador Aloísio de Abreu Lima, no
caso concreto, foi declarado, de ofício, suspeito para o julgamento da causa, com
fundamento no art. 135, V, CPC, ao argumento de que seu “filho exerce cargo de
Tabelião e Registrador do Tribunal de Justiça e é o atual Presidente da Associação dos
Notários, Escrivães e Registradores do Estado de Sergipe”. No que se refere ao
Desembargador Epaminondas Silva de Andrade Lima, este está impedido de votar, visto
que a época era Presidente da Corte, portanto, autoridade coatora.
O art. 135, inciso V, trás a parcialidade do juiz nos casos em que ele tiver
interesse no litígio, o que o tornará suspeito para julgar a lide. Segundo Pontes de
Miranda:
Interesse no julgamento é todo interesse próprio do juiz, ou de pessoa que
viva as suas expensas. Não importa se interesse protegido por lei. Aí, o
interesse é encarado por seu aspecto de fato, posto que possa ser material ou
moral (...) Interesse no julgamento é o da vantagem, material ou moral, que
possa tirar o juiz, com a decisão da causa em certo sentido (...) O interesse
moral pode ser o interesse na repercussão meramente ética, não somente
porque tal interesse pode corresponder direito, pretensão, ação, ou exceção.
O interesse moral pode consistir em pressão psíquica sobre o juiz, como o
interesse material. A lei não distinguiu (...). Tampouco é preciso que haja
relação de direito que ligue o juiz a alguns dos figurantes.
Sobre a suspeição do juiz por interesse no litígio conclui-se que o interesse do
juiz, assim, não pode ser confundido com o direito próprio do magistrado, pois, neste
caso ele é parte no processo e fica impedido para decidir, e não suspeito. Conforme
também o exposto por Pontes de Miranda, pode-se dizer que o interesse não é só em
questões jurídicas, podendo ocorrer também interesse moral e ético, também inclusive
interesse religioso.
É indiscutível, portanto, que, diante das hipóteses previstas pelos artigos 134 e 135
do Código de Processo Civil, das quais algumas se aplicam ao caso em questão, há
impedimento ou suspeição dos magistrados. Hipóteses essas as quais deveriam ser
respeitadas e, caso ainda haja o pronunciamento dos magistrados impedidos ou
suspeitos no processo, declarar-se-á a nulidade do processo.
Terminante se fez a posição de impedimento e suspeição dos magistrados em
relação ao processo, como bem evidenciado nos autos. No entanto, é de se pasmar que,
ainda assim, ambos participaram da audiência de julgamento, fato que não deveria ter
ocorrido, por prévia constatação dos próprios magistrados ou de seus assessores,
presumindo seu caráter ético e de respeito ao princípio da boa-fé, como representantes
do poder judiciário.
O impedimento verificado do desembargador Epaminondas decorrente de sua
posição como Autoridade Coatora é incontestável, no que, portanto, deveria ter sido
reconhecido pelo próprio magistrado anteriormente ao proferimento de seu voto no
julgamento, presumindo seu amplo conhecimento da causa em julgamento, fazendo jus
à sua posição e participação no processo. Como bem afirmado por acórdão do Superior
Tribunal de Justiça1:
1 RMS 40373 MS 2013/0001612-7; Relator: Ministro Ari Pargendler.
“A autoridade coatora desempenha duas funções no mandado de segurança: a)
uma, internamente, de natureza processual, consistente em defender o ato impugnado
pela impetração; trata-se de hipótese excepcional de legitimidade ad processum, em
que o órgão da pessoa jurídica, não o representante judicial desta, responde ao pedido
inicial; b) outra, externamente, de natureza executiva, vinculada à sua competência
administrativa; ela é quem cumpre a ordem judicial. A legitimação da autoridade
coatora deve ser aferida à base das duas funções acima descritas (...)”.
Desta forma, indubitável se mostra o impedimento do referido magistrado ao
julgamento do processo, por força do inciso II do art. 134, uma vez que se configura
como mandatário da parte pelo posto de Autoridade Coatora, nas funções destacadas
pelo acórdão supracitado. Por trecho retirado do próprio voto do relator, não há que se
falar da inexistência dessa situação de impedimento:
“Inicialmente, compulsando os autos verifico ter sido devidamente registrado às fls. 50 o impedimento do Desembargador Epaminondas Silva de Andrade Lima, quando do julgamento do presente writ, conforme tira de julgamento, a qual transcrevo, verbis:
“POR UNANIMIDADE, FOI DENEGADA A SEGURANÇA. IMPEDIDO DE VOTAR O EXMO. SR. DESEMBARGADOR EPAMINONDAS SILVA DE ANDRADE UMA POR SER À ÉPOCA, O PRESIDENTE DESTA EGRÉGIA CORTE, E PORTANTO, AUTORIDADE COATORA.” – grifei.”
Hely Lopes Meirelles, ensina do que se trata uma Autoridade Coatora, do qual
podemos reiterar a existência de impedimento de um magistrado que atua com tal, por
se envolver diretamente com a tomada de decisão sobre o Mandato de Segurança:
" Por autoridade entende-se a pessoa física investida de poder de decisão dentro da esfera de competência que lhe é atribuída pela norma legal. (...)Considera-se autoridade coatora a pessoa que ordena ou omite a prática do ato impugnado (...) Coator é a autoridade superior que pratica ou ordena concreta e especificamente a execução ou inexecução do ato impugnado e responde pelas suas consequências administrativas”.
No caso do outro magistrado, suspeito se fez o Desembargador Aloísio de Abreu
Lima, por declaração, de ofício, fundamentando-se no art. 135, V, do CPC, ao constatar-
se “interessado no julgamento da causa em favor de uma das partes”, pelos motivos
atinentes ao cargo exercido por seu filho no Tribunal, já explicitados anteriormente.
Como apresentado pelo próprio voto do Ministro Jorge Scartezzini:
“Contudo, com relação ao Desembargador Aloísio de Abreu Lima, constato que
o mesmo declarou-se, de ofício, suspeito para o julgamento da causa, com fundamento
no art. 135, V, do Código de Processo Civil, ao argumento de que seu “filho exerce
cargo de Tabelião e Registrador do Tribunal de Justiça e é o atual Presidente da
Associação dos Notários, Escrivães e Registradores do Estado de Sergipe”, dizendo-se
interessado na causa (fl. 48). Ainda assim, conforme se observa das fls. 50, que
consigna a presença do Desembargador na sessão, bem como das fls. 55, na qual
consta sua assinatura, teve Sua Excelência participação no julgamento da lide,
acarretando, portanto, a nulidade da decisão.”
Primorosa se deu a atitude do referido desembargador ao indicar sua própria
suspeição para julgamento do processo, indo de acordo com seu dever de declaração de
suspeição, disposto pela redação do art. 137 do CPC. A imparcialidade é de suma
importância no meio de qualquer atuação dos magistrados no âmbito judicial, como um
dos pressupostos fundamentais de deveres destes profissionais. Portanto, de forma a
seguir este preceito e dar a ele eficácia, determina a legislação a primordialidade de
declaração de suspeição nos casos previstos pelo art. 135 do CPC, com exceção do
Parágrafo Único, em que a declaração de suspeição pelo juiz será facultativa.
Assim, diante das considerações feitas, há de se indagar o motivo de os referidos
magistrados terem participado do julgamento, mesmo cientes de suas posições de
impedimento e suspeição no processo, sendo elas axiomáticas. É clara a redação do Art.
313 do CPC, referente ao impedimento e à suspeição de magistrados:
Art. 313. Despachando a petição, o juiz, se reconhecer o impedimento ou
a suspeição, ordenará a remessa dos autos ao seu substituto legal; em caso
contrário, dentro de 10 (dez) dias, dará as suas razões, acompanhadas de
documentos e de rol de testemunhas, se houver, ordenando a remessa dos
autos ao tribunal.
Os desembargadores mencionados violaram o conteúdo do referido dispositivo, ao
desconsiderarem a necessidade de remessa dos autos a um substituto legal. Além do
dispositivo mencionado, ambos os magistrados, em especial o Desembargador
Epaminondas, violaram o seu dever de declaração de abstenção para julgamento do
processo. Se faz de extrema importância que o magistrado se declare impedido, uma vez
que, por meio do impedimento, se pode declarar nulidade absoluta do processo; com
relação à suspeição, também se faz necessária sua declaração pelo magistrado, porém,
com menos gravidade, considerando-se que a suspeição gera apenas nulidade relativa do
processo.
Muito adjacente à essa questão, há acórdão do TJDFT, em que se declara a
indispensabilidade de asserção de nulidade do processo nos casos em que já tenha sido
reconhecida a suspeição ou impedimento do magistrado no julgamento, mas, ainda
assim, estes proferem seus votos na audiência de julgamento. Verbis2:
PROCESSO CIVIL. NULIDADE JULGAMENTO. DESEMBARGADOR. SUSPEIÇÃO RECONHECIDA DE OFÍCIO.
1.CONFORME PRECEITUA O ORDENAMENTO PROCESSUAL CIVIL, UMA VEZ RECONHECIDA A SUSPEIÇÃO DO JULGADOR, TODOS OS ATOS POR ELE PRATICADOS SÃO CONSIDERADOS NULOS.
2.O RECONHECIMENTO, POR MOTIVO DE FORO ÍNTIMO, DE IGUAL FORMA, ENSEJA O AFASTAMENTO DO MAGISTRADO DO CASO E, TRATANDO-SE DE RELATOR DE RECURSO, O FEITO DEVE SER REDISTRIBUÍDO, CONFORME PRECEITUA O REGIMENTO INTERNO DA CORTE, HIPÓTESE EM QUE, POR ÓBVIO, INDUZ ALTERAÇÃO DO QUORUM, PODENDO ATINGIR, INCLUSIVE O REVISOR.
3.CONSTATADO QUE, POR EQUÍVOCO, NÃO SE CUMPRIU A ORDEM DE REDISTRIBUIÇÃO, ENSEJANDO A QUE O DECLARADO SUSPEITO PROFERISSE O VOTO CONDUTOR DO ACÓRDÃO, DEVE-SE DECLARAR A NULIDADE, INCLUSIVE DO JULGAMENTO, DETERMINANDO-SE, POR CONSEGUINTE, A REDISTRIBUIÇÃO DO FEITO A OUTRO INTEGRANTE DA CORTE.
4.RECONHECIDA MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA, TORNANDO SEM EFEITO O V. ACÓRDÃO, FICAM PREJUDICADOS OS EMBARGOS DECLARATÓRIOS.
Cabe avaliar se tal feito, no caso concreto analisado, se deu em decorrência de
insipiência dos magistrados, o que, na realidade, tende-se a descartar logo de início, por
ser algo inadmissível diante de suas reconhecidas posições, ou então, por insipiência e
desconhecimento de funcionários responsáveis pelos trâmites formais do processo e
elaboração de despachos, ou ainda por motivos de má-fé, em uma tentativa de defraudar
o sistema legislativo.
Partindo de uma análise sensata sobre a falha ocorrida pelo julgamento do processo
por dois magistrados em caso de suspeição e impedimento, há de se considerar como
maior plausibilidade ter acontecido por motivos de obscurantismo dos funcionários
responsáveis por fazer os autos conclusos para julgamento, de forma que, deveria ter
sido feita uma prévia avaliação dos fatos que permeiam o processo como um todo, de
2 TJ-DF - Apelação Cível : APL 45194920008070001 DF 0004519-49.2000.807.0001
forma a observar a existência de necessidade de abstenção dos referidos magistrados no
julgamento.
Isso, pois, foge completamente do dever de moralidade e ética dos profissionais
judiciários terem agido de má-fé, de forma a gerar obtenção de vantagem para uma das
partes do processo, apesar de isso ser observado em alguns tribunais. É preferível
conjecturar a hipótese de que a falha tenha sido em decorrência de um descuido dos
servidores judiciais do que por falta de ética profissional. Isso, além do fato de que uma
atitude como infringe por completo o princípio da imparcialidade dos juízes, em que os
juízes não podem estar contaminados com interesses pessoais nas demandas em que
julgam, como bem afirma Cassio Scarpinella Bueno3:
“O magistrado é imparcial porque ele não tem (e não pode ter) nenhum
interesse direto, pessoal, na demanda que julga. (...) A imparcialidade repousa na ideia
de que o magistrado é “terceiro”, um verdadeiro “estranho”com relação àquilo que
julga, com relação às partes e aos sujeitos processuais envolvidos, com o objeto do
litígio”.
Desta forma, diante de todo o exposto, deve-se dignificar a decisão proferida pelo
Ministro Relator Jorge Scartezzini em seu voto, correto em declarar a nulidade do
processo e seu retorno ao tribunal de origem, para que seja reavaliado e proferido um
novo julgamento, sem a ocorrência de situações que levam os magistrados à abstenção
de processar e julgar uma causa, prezando pelo princípio da imparcialidade dos juízes.
Conclusão
A atividade jurisdicional como um todo, é deduzida a imparcialidade por parte
do juiz. Assim sendo, é possível analisar a imparcialidade do magistrado sobre dois
aspectos: subjetivo e objetivo. Ainda com relação ao aspecto subjetivo, pode-se traduzir
a neutralidade do juiz na igualdade entre as partes, tratando-as de forma idêntica.
No que se refere ao impedimento há a presunção absoluta, juris et de jure, de
parcialidade do juiz, sendo material de ordem pública, uma vez desobedecidos, tornam
vulnerável a coisa julgada, pois ensejam a ação rescisória na sentença. Como diz
Couture, os cidadãos não têm um direito adquirido quanto à sabedoria do juiz, mas têm
um direito adquirido quanto à independência, autoridade e responsabilidade do juiz.
3 (Curso Sistematizado de Direito Processual Civil – Teoria Geral do Direito Processual Civil. Ed. Saraiva, São Paulo, 2ª edição, 2008, vol. 1, pág. 118)
Contudo na suspeição há apenas presunção relativa, cabendo, na maioria das
vezes alegar motivos de foro intimo em que para este não preclui o dever de declarar-se
suspeito ou impedido. Apesar de não afetar a coisa julgada
Portanto, no caso concreto, a aplicação dos institutos do impedimento e
suspeição é consequência da importância da existência destes para a realização da
justice na prestação do serviço jurisdicional, posto que a garantia a um julgamento
imparcial consiste em direito fundamental de todos os cidadãos.
Logo, a imparcialidade deve sempre integrar parte de todo o processo
jurisdicional visando à neutralidade tanto do magistrado, quanto dos auxiliares de
justice para que possa ter a mínima garantia de um processo justo.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=103393
http://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI108543,61044-
Autoridade+coatora+no+Mandado+de+Seguranca+Legitimidade+recursal
http://lfg.jusbrasil.com.br/noticias/170155/quais-as-diferencas-existentes-entre-
impedimento-e-suspeicao-fernanda-braga
http://www.tex.pro.br/home/artigos/71-artigos-nov-2007/5701-comentarios-aos-
arts-134-a-138-do-cpc-dos-impedimentos-e-da-suspeicao
http://www.conjur.com.br/2012-mai-04/marcelo-mazzola-suspeicao-magistrado-
feita-preliminar
http://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/8377/Suspeicao-do-juiz-no-processo-
penal-nulidade-absoluta-ou-relativa