UNIVERSIDADE ESTADUAL DE GOIÁS
UNIDADE DE CIÊNCIAS SÓCIO-ECONÔMICAS E HUMANAS
FACULDADE DE LETRAS
IVAN DE MENDONÇA FILHO
PRECONCEITO RACIAL NO CONTEXTO DE SALA DE AULA: uma análise das
práticas discursivas de professores de língua
Anápolis
2009
IVAN DE MENDONÇA FILHO
PRECONCEITO RACIAL NO CONTEXTO DE SALA DE AULA: uma análise das
práticas discursivas de professores de língua
Artigo apresentado ao Curso de Letras da Universidade Estadual de Goiás a fim de obtenção do grau de
licenciado em Letras – Português e Inglês pela referida
Universidade
Orientadora: Profa. Doutoranda Ivonete Bueno dos Santos
Anápolis
2009
RESUMO
O presente artigo objetiva analisar através do discurso de 03 (três) profissionais de língua materna e/ou
estrangeira, no ensino médio público regular brasileiro, a representação que eles têm sobre a
diversidade/preconceito racial, no contexto de sala de aula. O pressuposto teórico do trabalho é pautado pelos
estudos de Moita Lopes (2006; 2008), Munanga (1988; 2003), Brandão (1994), Maingueneau (1997), entre
outros os quais fundamentam a base teórica do presente estudo, bem como com algumas contribuições da Análise do Discurso de vertente francesa. A geração dos dados analisados neste artigo adveio de um questionário
realizado com 03 (três) professores de língua. Trata-se de uma abordagem de pesquisa de caráter qualitativo de
base dedutiva e interpretativa. O estudo revela que os professores em suas práticas discursivas apresentam um
discurso, em alguns casos voltados para a questão do preconceito, não abordando a questão da diversidade racial
em sala de aula, constata-se também que tais profissionais ainda não se encontram preparados, equipados de
conhecimentos necessários para abordarem tal assunto em sala de aula.
PALAVRAS-CHAVE: Diversidade. Discurso. Preconceito Racial. Práticas discursivas.
ABSTRACT
This article aims to analyze through the speech of 03 (three) mother/foreign tongue professionals, in
regular public high schools of Brazil, the representation they have on the racial diversity/ prejudice in the context
of the classroom. The theoretical assumption of the work is guided by studies of Moita Lopes (2006, 2008),
Munanga (1988, 2003), Brandão (1994), Maingueneau (1997), among others which underlie the theoretical basis
of this study, as well as some contributions of discourse analysis of the French side. The generation of data analyzed in this article has come from a questionnaire conducted with 03 (three) language teachers. This is an
approach to qualitative study of deductive and interpretive basis. The study reveals that teachers in their
discursive practices present a speech, in some cases facing the issue of prejudice, not addressing the issue of
racial diversity in the classroom, there is also that these professionals are not yet prepared, equipped knowledge
needed to talk to this subject in the classroom.
KEY-WORDS: Diversity. Discourse. Racial Prejudice. Discursive Practices.
FOLHA DE APROVAÇÃO
Título: PRECONCEITO RACIAL NO CONTEXTO DE SALA DE AULA: uma análise das
práticas discursivas de professores de língua
Acadêmico: Ivan de Mendonça Filho
Data: Anápolis, ____ de _________________ de 2009.
Profa. Ms. Ivonete Bueno dos Santos
Professora Orientadora
Profa. Ms. Eliane Anderi
Professora convidada
“Ninguém nasce odiando outra
pessoa pela cor de sua pele, ou por
sua origem, ou sua religião. Para
odiar, as pessoas precisam
aprender, e se elas aprendem a
odiar, podem ser ensinadas a
amar, pois o amor chega mais
naturalmente ao coração humano
do que seu oposto.”
(Nelson Mandela)
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO........................................................................................................... 07
1 UM BREVE PERCURSO SOBRE OS FATOS E FUNDAMENTOS
HISTÓRICOS DO PERÍODO ESCRAVOCRATA NO BRASIL.........................
08
1.1 Contexto histórico da escravidão............................................................................
08
1.2 Influência do período escravocrata na atualidade................................................... 10
2 O QUE É PRECONCEITO RACIAL?..................................................................
10
2.1 Conceituações e terminologias acerca do preconceito (racial)...............................
11
3 RACISMO NA INSTITUIÇÃO ESCOLA............................................................
13
3.1 O papel da escola no combate à discriminação racial.............................................
13
3.2 O discurso do professor frente ao tema do preconceito racial................................
14
4 ANÁLISE DO DISCURSO DOS DOCENTES FRENTE AO TEMA DA
DIVERSIDADE/PRECONCEITO RACIAL...........................................................
16
4.1 Metodologia de pesquisa.........................................................................................
16
4.2 Apresentação e Análise dos dados constituídos...................................................... 17
4.3 Questão 02............................................................................................................... 17
4.4 Questão 04............................................................................................................... 19
4.5 Questões 07 e 08.....................................................................................................
20
5 TENTANDO CONCLUIR......................................................................................
22
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS......................................................................
23
ANEXOS......................................................................................................................
26
2
INTRODUÇÃO
Abrigamos uma multidão de preconceitos se não
nos decidimos a duvidar, alguma vez, de todas as
coisas em que encontremos a menor suspeita de incerteza. (René Descartes)
Vive-se, na atualidade, em um mundo, onde questões identitárias não deveriam ser
mais motivos para a promoção de atitudes de cunho discriminatório, contudo observa-se que o
que realmente ocorre é o inverso. Na qual, situações de atos discriminatórios, pelos diferentes
fatores vêem ocorrendo cada vez mais em nossa sociedade e com maior frequência. As
batalhas levantadas por práticas identitárias mostram a complexidade das relações sociais em
uma “modernidade líquida” (BAUMAN, 2003) em que a vinculação entre identidade e
diferenças/diversidades, entre similitude e alteridade estabelecem ações políticas. Assim,
nota-se que é de fundamental importância que os condutores1 dos diferentes contextos sociais
existentes na sociedade moderna promovam debates voltados para temas sociais tais como, a
diversidade e o preconceito racial, para que assim haja maior esclarecimento por parte desta
sociedade.
Dessa forma, considerando o professor como um condutor discursivo, por possuir um
discurso que tem relevância social para o âmbito escolar, o presente artigo almeja investigar
as práticas discursivas2 de três profissionais educadores do ensino médio regular brasileiro,
mais especificamente do professor de língua materna/estrangeira do 3º ano, acerca da temática
da diversidade racial, em sala de aula. Por considerar que “as salas de aula de língua,
diferentemente dos outros tipos de salas de aulas, constituem espaços sociais caracterizados, (...) por
processos de construções dos significados, no sentido de que o que se faz, essencialmente, nesses
contextos é aprender a usar a linguagem para agir no mundo social.” (MOITA LOPES, 2006, p. 199)
Com isso, a presente pesquisa objetiva investigar através do discurso destes
professores, a representação3 que eles têm sobre a diversidade/preconceito racial, bem como,
1 Considera-se que o condutor discursivo seja o sujeito que transmite um discurso, pois a palavra (discurso) é
dirigida a um interlocutor. (MOITA LOPES, 2006) 2 Conforme demonstrado por Maingueneau (1997) o conceito de prática discursiva envolve dois elementos: o de
formação discursiva e o de comunidade discursiva, em linhas gerais tal expressão remonta a idéia foucaultiniana
de que a prática discursiva é um sistema instaurador do enunciado como acontecimento.
3 O conceito de representação é direcionado em diferentes vertentes do campo das ciências, tem-se no presente
artigo a delimitação do conceito ao considerar que a representação é “toda atividade de um indivíduo que se
passa num período caracterizado por sua presença contínua diante de um grupo particular de observadores e que
tem sobre estes alguma influência” (GOFFMAN, 1999 apud FELICE FILHO, 2007).
3
analisar a forma pela qual este professor aborda o conhecimento da diversidade racial, em
suas práticas discursivas, na sala de aula e, observar se os profissionais de língua adotam os
postulados da Lei de Diretrizes e Bases (LDB) para abordagem do tema estudado. Tem-se tal
fato, por considerar que em decorrência dos aspectos históricos da sociedade brasileira, em
relação à escravidão, esta acarretou ao longo do tempo, a criação de estereótipos frente à
figura do negro, ocasionando assim, as situações de cunho discriminatório. E sendo a escola
uma nítida representação da sociedade, percebe-se que promovendo uma análise das práticas
discursivas dos condutores deste contexto social, ou seja, os professores, é possível obter uma
visão da ocorrência do tema da diversidade/preconceito racial, na sociedade de modo geral.
O desenvolvimento da pesquisa dar-se-á através do arcabouço teórico, de determinada
área da lingüística, através de alguns conceitos advindos da Análise do Discurso em sua linha
francesa (doravante, AD), bem como para algumas áreas que são relevantes para o tema
proposto, tais como: a sociologia e a antropologia. Adota-se uma abordagem qualitativa de
cunho interpretativo e de caráter etnográfico, em que foram realizados questionários com os
sujeitos envolvidos na pesquisa. Através da análise dos dados constituídos, juntamente com a
teoria estudada, tentaremos demonstrar a forma pela qual estes professores propagam os seus
discursos frente ao tema estudado, para que assim possamos constatar a ocorrência ou não de
um “discurso discriminatório”, no contexto escolar.
1 UM BREVE PERCURSO SOBRE OS FATOS E FUNDAMENTOS HISTÓRICOS
DO PERÍODO ESCRAVOCRATA NO BRASIL
1.1 Contexto histórico da escravidão
Através da história, tem-se demonstrado que desde os primórdios a sociedade
brasileira viveu por diferentes períodos de segregação racial. Períodos estes, que tiveram
início com o processo colonizatório aqui existente, o qual se principiou com os indígenas que
habitam a região inicialmente colonizada no país, contudo por aspectos culturais, não se
viabilizou a continuidade da manipulação social que os índios sofriam, recorrendo-se assim,
para os habitantes do continente africano.
A justificativa utilizada pelos colonizadores para a prática do ato de captura dos
africanos, conforme demonstra Munanga (1988) se deu em razão da procura de mão-de-obra
barata, em virtude da descoberta de novas terras e, bem como, por a África possuir aspectos
sociais e culturais diversos do continente europeu, sendo que o africano possuía condições
4
sócio-históricas e econômicas que eram consideravelmente inferiores as do continente
europeu. E como o continente africano vivia um período conflituoso, ocasionando guerras e,
tendo a Europa a necessidade de demanda de mão-de-obra barata, iniciou-se assim, o período
de captura escravocrata e, muitas vezes, até mesmo de acordos firmados entre os governos de
países europeus e africanos para a entrega dos negros (DIÉGUES JÚNIOR, 1980).
Além deste caráter econômico e político dado como justificativa pelos colonizadores
europeus, há também o aspecto impregnado na mentalidade social de “supremacia branca”,
que também foi uma das justificativas apresentadas para o processo escravocrata ocasionado
no mundo. A idéia de superioridade que os brancos (europeus) possuíam formou-se através da
junção do pensamento de diferentes contextos, como por exemplo, o âmbito científico,
religioso e político da época, ou seja, meados do século XV. Pode-se comprovar tal idéia
através do discurso apresentado pelo antropólogo Kabengele Munanga ao mostrar que os
europeus da época acreditavam em uma nivelação humana, a qual tinha-se que:
Em um nível pouco mais alto que o índio vem o negro, vivendo ora no
primeiro grau de estupidez, ora no segundo, ou seja, planejando as coisas
pela metade, não formando uma sociedade estável, olhando os astros com admiração e celebrando algumas festas sazonais na aparição de certas
estrelas. Evidentemente, no topo desta escala evolutiva vem o branco
europeu. (1988, p. 18).
Assim, tem-se que os europeus acreditavam desde os primórdios que eram
“superiores” as outras culturas, dentre os diversos fatores, destaca-se que essa superioridade
que acreditavam possuir era em decorrência do caráter civilizatório que possuíam,
demonstrando mediante tal fator que até mesmo os índios eram inferiores aos negros. Diante
do processo de escravização do negro, deu-se início, consequentemente, a desvalorização não
somente da pessoa, mas de tudo o que estava relacionado com ela, como sua língua, crença,
comportamento; sua cultura negra de modo geral. Ocasionando assim, a tentativa do
“embranquecimento do negro” (MUNANGA, 1988, p. 27). Tentativa esta, que ocasionou
conflitos sócio-existenciais na população negra deste país, a qual teve a cultura de seus
ancestrais africanos, largamente devastada, em razão da influência branca. Sendo que esta
pode ser demonstrada de modo direto, através do controle que o branco exercia sobre o negro,
principalmente na época colonozatória, com algumas nuances de domínio na atualidade,
ainda. Bem como, de forma indireta, em decorrência da influência branca nos diferentes
contextos sociais vivenciados pelo negro.
5
1.2 Influência do período escravocrata na atualidade
Como é notório na sociedade brasileira, a escravidão ocasionada no país, por
aproximadamente 04 (quatro) séculos de história, trouxe consideráveis consequências para a
imagem do negro, estabelecendo assim, uma dicotomia de visão social, em que a sociedade
possui dos negros e estes daquela. Podendo ser afirmado, a consequente aparição de
malefícios na questão identitária do negro neste país. Sendo que como principal malefício faz-
se necessário destacar a discriminação pela questão racial que a população negra ainda sofre
no Brasil.
Em decorrência desta prejudicialidade que a escravidão trouxe para a sociedade e
principalmente para o negro, constantemente vê-se a promoção de ações sociais positivadas
para uma tentativa do combate à discriminação racial. Como exemplo de tais ações é possível
citar algumas políticas públicas, como a criação do Projeto de Cotas Raciais em Universidade
Públicas e criação de ONG´s específicas para a discussão deste tema. Contudo, como ação
positivada para o combate da discriminação racial destaca-se, com notoriedade, a criação de
uma Lei específica para o combate ao racismo, demonstrando a lesividade da conduta
discriminatória. A Lei nº 7.716/1989, também denominado de Lei Anti-Racismo, foi e
continua sendo aliada à promoção do combate a discriminação por questões raciais, conforme
é demonstrado pelo artigo 1º da referida Lei, que foi alterado pela redação da Lei nº 9.459/97,
que trata que os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia,
religião, serão punidos, conforme os aspectos legais.
Através da criação de legislação específica para tratar desta questão, de discriminação
racial, tentou-se diminuir a incidência de atos segregadistas, contudo mesmo sendo a
igualdade um princípio social básico e, constante na Constituição Federal de 1988, em seu
artigo 5º, ao demonstrar que todos são iguais perante a lei, independentemente de qualquer
distinção. Diferença essa, que pode ser interpretada como a de cunho racial, sexual (gênero),
religioso e entre outras. Ainda, observa-se na sociedade brasileira constantes atos de
discriminação racial, nos diferentes âmbitos sociais vivenciados por uma pessoa, tais como o
familiar, religioso, empregatício, escolar e dentre outros.
2 O QUE É PRECONCEITO RACIAL?
O medo é um preconceito dos nervos. E um
preconceito, desfaz-se – basta simples reflexão. (Machado de Assis)
6
2.1 Conceituações e terminologias acerca do preconceito (racial)
A idéia de diversidade, largamente difundida na sociedade atual, pauta-se no ideal da
diferença, o qual demonstra a luta pelos movimentos sociais em ter os direitos das minorias
(mulheres, deficientes físicos, homossexuais, negros, entre outros) assegurados. Entretanto,
mesmo o Brasil sendo um país com vasta pluralidade étnica (MENEZES, 2002), ainda é
fortemente marcado pelos constantes atos discriminatórios praticados. Discriminação essa,
fundamentada pela questão étnica e racial. Para se entender a questão do preconceito faz-se
necessário compreender algumas terminologias que englobam tal assunto, tais como, a
diferenciação entre o conceito de raça e etnia. Tal compreensão é necessária para se assimilar
a ocorrência da questão do preconceito e, assim, tentar promover uma explicação para esta
ação. Carneiro (1998, p.15) afirma que:
Etnia é referente a étnico, conceito que engloba a idéia de nação, povo e
raça: diz respeito a um grupo físico, com traços físicos e culturais comuns, cujos membros se identificam como grupo, ou seja, sentem que pertencem a
um mesmo grupo.
Através deste conceito, compreende-se que o termo etnia engloba o termo raça, que,
segundo Wieviorka (2007), baseia-se em traços hereditários. Participando desta mesma idéia,
Rassi et al (2004) especificam o termo raça delimitando-se ao aspecto biológico, não estando
relacionados os aspectos sócio-culturais. Demonstrando que para a espécie humana a
classificação mais comum, se baseia em três tipos de raças: a negra, a amarela e a branca.
Em uma linha antropológica dos estudos da raça e etnia, o pesquisador Diégues Júnior
(1980) apresentou outros tipos étnicos (raciais) existentes no Brasil, que se formaram em
decorrência da miscigenação existente no país, tais como o mulato (procedente da etnia
branca e negra), o crioulo (procedente da etnia negra e negra) e o pardo (procedente do
cruzamento secundário entre mulato e mulato, na qual tem-se a predominância da cor morena
– tendendo à escura).4
4 Em decorrência da gama de conceitos e definições acerca da diferença de raça e etnia, o presente artigo
delimitou ao que, majoritariamente, é aplicado pelos teóricos da área no sentido de que o conteúdo de raça é
morfo-biológico e o e etnia é sócio-cultural. Contudo, em decorrência de movimentos contemporâneos observa-
se que tais conceitos se interligam com considerável frequência. Demonstrando que a pratica do racismo não
ocorre somente pelo aspecto biológico (raça), mas sim, pelo aspecto sócio-cultural (etnia), conforme fora
demonstrado por Munanga (2003).
7
A partir do entendimento dos referidos termos é possível estabelecer uma
compreensão acerca do termo preconceito:
O preconceito está pautado em um forte componente emocional que faz com
que os sujeitos se distanciem da razão. O afeto que se liga ao preconceito é
uma fé irracional, algo vivido como crença, com poucas possibilidades de
modificação. O preconceito difere do juízo provisório, já que este último é passível de reformulação quando os fatos objetivos demonstram sua
incoerência, enquanto os preconceitos permanecem inalterados, mesmo após
comprovações contrárias (HELLER apud MENEZES, 2002, online).
Por meio deste conceito, tem-se que o sentimento de preconceito (o que se exterioriza
através de ações discriminatórias), se estabelece não somente por uma conceituação
previamente formulada por um sujeito em decorrência de outro. No aspecto do preconceito
racial, em decorrência de um sujeito negro - ou mesmo, um sujeito miscigenado
(ROSENFELD, 1993), tal sentimento discriminatório se inicia, também, através de um
estigma que o negro leva consigo, conforme demonstra Menezes, (2002):
Os sujeitos que possuem tal crença constroem conceitos próprios, marcados
por estereótipos, que são os fios condutores para a disseminação do
preconceito, pois se encontram em consonância com os interesses do grupo dominante, que utiliza seus aparelhos ideológicos para difundir a imagem
depreciativa do negro. (...) Esses estereótipos dão origem ao estigma que
vem sinalizar suspeita, ódio e intolerância dirigidos a determinado grupo, inviabilizando a sua inclusão social.
Esses estereótipos que são construídos em torno da pessoa do negro, fazem com que
mesmo sofra a exteriorização do sentimento de preconceito, que é o ato discriminatório. A
discriminação pautada em torno da raça (racismo) “possui algumas nuances no modo como é
praticada nos diferentes âmbitos sociais” (WIEVIORKA, 2007, p. 30), contudo é baseada em
um mesmo princípio, a idealização de superioridade da raça branca em relação à raça negra.
E esse ideal de superioridade que foi largamente propagado no imaginário social, em
muitos casos, faz com que haja a negação do próprio negro pela sua cultura, em decorrência
da tentativa de (des) culturalização, que o branco faz sobre a pessoa do negro e este aceita
passivamente tal ato, conforme é demonstrado por Rosenfeld (1993), que de modo geral, o
individuo negro em um âmbito social predominantemente branco, para ser aceito, se torna
branco. Ou seja, passa a ter um comportamento sócio-cultural (étnico) assemelhado ao do
branco, sendo assim, considerado, também, como uma pessoa de raça branca.
8
3 RACISMO NA INSTITUIÇÃO ESCOLA
3.1 O papel da escola no combate à discriminação racial
O ser humano, como um ser social, está inserido em diferentes âmbitos da sociedade.
Considera-se que o primeiro contato social que uma pessoa tem é o seu contexto familiar e, a
partir de tal campo social é que se inicia a construção e a participação nos mais diversos
âmbitos. Tais como: o contexto religioso, o empregatício, o escolar e entre outros. Sendo que
cada âmbito social possui determina função que se interligam, formando assim o pensamento
social que o homem possui. Dentre todos os âmbitos sociais, destaca-se como o de relevância
o escolar, por ser este o ambiente considerado como uma superestrutura, onde sua formação
se dá com base em outras composições sociais. E a partir de tal organização, vê-se que a
escola foi estruturada para funções sociais (MENEZES, 2002).
Tem-se também que a instituição escolar é uma representação do mundo exteriorizado,
ou seja, a sociedade de modo geral. Considera-se que a escola seja uma reprodução da
sociedade, por se ter em um mesmo local, pessoas de diferentes culturas, raças, religiões, de
diferentes ideologias e, que até certo ponto, são de modo coercitivo, sujeitas a viverem
naquele âmbito social conjuntamente.
Desta forma, observa-se que a instituição escolar, na figura de seus representantes,
possui o papel de disseminar o caráter social do ensino, ou seja, abordar temas de cunho
social durante o processo de aprendizagem de seus participantes, pois conforme demonstrou
Moita Lopes (2006, p. 37), ao ressaltar a importância da instituição escola na formação
(educacional e comportamental) de uma pessoa:
Considerando a relevância da escola na vida dos indivíduos, ainda que, por
nenhuma outra razão, pelo menos em termos da quantidade de tempo que
passam/passaram na escola, pode-se argumentar que as práticas discursivas nesse contexto desempenham um papel importante no desenvolvimento de
sua conscientização sobre suas identidades e a dos outros.
Comprovando assim, que a escola ajuda a construir a identidade5 da pessoa que a
integra, fazendo com que se tenha a promoção dos aspectos igualitários ou, o inverso,
aumente o caráter da discriminação; dependendo de como é passado para os participantes
5 Entende-se por identidade as características que marcam o indivíduo como único e distinto, podendo ser
especificamente conceituada de identidade pessoal. Em outro pólo, tem-se o conceito de identidade social, a qual
envolve o tipo de interação apoiado em categorias sociais e agrupamentos de pessoas, destacando aquilo que
temos em comum com outros de posições sociais semelhantes. (KLEIMAN, 2006)
9
desta estrutura social o discurso da diversidade. Demonstrando com isso, a importância do
discurso empregado pelo professor, ou mesmo pelos dirigentes escolares, na tentativa de
promoção da não-discriminação.
No entanto, percebe-se que a sociedade brasileira está consolidada em aspectos de
discriminação racial. Consequentemente, tal situação se reflete no âmbito escolar, conforme é
notório em pesquisas do gênero (RASSI et al , 2004), ao demonstrarem que o preconceito
racial que ocorre no âmbito escolar é em decorrência de estigmas internalizados em outros
contextos sociais, principalmente o familiar. Assim, é possível perceber nestas pesquisas, que
a discriminação racial inicia-se desde as séries iniciais e estende-se em todo o percurso
escolar do aluno.
Mediante isto, vê-se que além de ajudar na construção de uma identidade de
conscientização pela não discriminação, a escola ainda traz consigo o papel de combater “as
identidades discriminatórias” que poderiam ter sido construídas nos outros contextos sociais,
evidenciando assim, que o processo de construção identitária “é resultado de um processo
dialético entre o que é de caráter individual e cultural, uma produção sócio-histórica, um
processo criado e recriado continuamente. É pelo olhar do outro que me constituo como
sujeito” (MENEZES, 2002).
Contudo, o sujeito, enquanto um ser que vive e permanece em sociedade, tem suas
identidades construídas através do modo a que se vinculam a um discurso, podendo ser seu
próprio discurso e o dos outros. Sendo um ser multi-identitário (MOITA LOPES, 2006).
A escola, como uma representação social relevante e, por a discriminação racial ser
um fato constatado em tal ambiente, a Lei de Diretrizes e Bases (LDB) da educação no Brasil,
em seu artigo 3º, inciso IV, faz menção a questão da diversidade em sala de aula ao
demonstrar que o ensino deve ser ministrado pautando-se no princípio da igualdade, do
respeito à liberdade e com apreço à tolerância. Colocando então, a instituição escolar, na
figura de seus representantes, principalmente o professor, como o disseminador, do princípio
da equidade no contexto escolar.
3.2 O discurso do professor frente ao tema do preconceito racial
O âmbito escolar, conforme é configurado em grande parte da sociedade brasileira
possui um método tradicional, sob o qual se dá destaque à figura do professor, ou seja, o
regente do ensino. Desta forma, tem-se que este possui “domínio discursivo” frente aos seus
interlocutores. Pois, conforme é demonstrado por Foucault apud Brandão (1994, p. 37) o
10
discurso é o espaço em que saber e poder se articulam, pois quem fala, fala de algum lugar, a
partir de um direito reconhecido institucionalmente. Esse discurso, que passa por verdadeiro,
que veicula saber, é gerador de poder.
Assim, AD em sua linha francesa de estudo (a qual é o fundamento teórico –
linguístico do presente artigo), considera que o discurso se dá de forma institucional, o qual
segundo Foucault (1969, p. 146), “é um conjunto de enunciados que se remetem a uma
mesma formação discursiva (FD)”, sendo que essa FD possui regras próprias, as quais
constituíram, assim, o discurso.
Em tal linha de pensamento, Brandão (1994, p. 44) demonstra o “discurso escolar” ao
retratar que:
(...) no interior de uma instituição escolar há “o lugar” do diretor, do
professor, do aluno, cada um marcado por propriedade diferenciais. No
discurso, as relações entre esses lugares, objetivamente definíveis, acham-se
representadas por uma série de “formações imaginárias” que designam o lugar que destinador e destinatário atribuem si mesmo e ao outro (...).
Demonstrando que o professor, como destinador e condutor do discurso, possui
marcante relevância na transmissão de seu discurso ao seu destinatário, por este agregar o
“valor verdade” ao que seu emissor do discurso institucional lhe transmite.
Conforme conceitua Maingueneau (1997, p.13), “(...) a AD relaciona-se com textos
produzidos: nos quais se cristalizam conflitos históricos, sociais, etc.;” assim, constata-se que
o discurso, mas especificamente, da diversidade racial, é cristalizado em nossa sociedade
brasileira através de práticas discursivas focalizadas na negatividade, ou seja, constantemente
vê-se o negro como um ser inferiorizado. Sendo que essa inferiorização se dá através da
formação discursiva do sujeito do discurso, que na pesquisa em tela, este sujeito é o professor.
Ao conceituar formação discursiva, demonstra Maingueaneu (1997, p. 14) “que é um
conjunto e regras anônimas, históricas, sempre determinadas no tempo e no espaço que
definiram em uma época dada, e para uma área social, (...)”, mostrando assim que o discurso
do sujeito se forma através de diferentes contextos, como o histórico e sociológico, entre
outros. Assim, levando em consideração a idéia do socioconstrucionismo adotada por
Foucault, o qual considera o discurso como uma construção social, tendo a escola
fundamental importância nesta construção (MOITA LOPES, 2006, p. 31).
Com isso, tem-se que o profissional educador, através de sua prática discursiva, possui
o potencial de ajudar a construir os ideais sociais, de igualdade e tolerância às diversidades,
11
especialmente a racial, por possuir a representatividade necessária, no âmbito social em que
faz parte, para tal ação.
4 ANÁLISE DO DISCURSO DOS DOCENTES FRENTE AO TEMA DA
DIVERSIDADE/PRECONCEITO RACIAL
4.1 Metodologia de pesquisa
O professor, visto como, um emissor discursivo no âmbito social o qual possui
relevância, ou seja, o ambiente escolar, é um sujeito capaz de ajudar na construção identitária
dos receptores de seu discurso (MOITA LOPES, 2006) – os alunos. Assim, observa-se a
importância de analisar o discurso do profissional educador frente ao tema da diversidade,
especificando-se para a questão da diversidade racial, pois conforme fora demonstrado por
Moita Lopes (2006, p. 197-198):
As pessoas ocupam, assim, posições diferentes nas construções do discurso a partir de como estão situadas nas práticas discursivas. Desse modo, nessas
práticas em sala de aula, por exemplo, os participantes estão posicionados de
formas diferentes no exercício do poder, o que possibilita ao professor a determinação dos tópicos interacionais (...) tendo suas identidades sociais
construídas (...).
Tem-se assim, que o professor possui a função de mediação na construção da
identidade social do receptor de seu discurso, para aquele contexto social específico, a sala de
aula. Desta forma, observa-se que o profissional educador é capaz de promover, através de
seu discurso, uma política racial igualitária, ajudando assim a disseminar a consciência de
igualdade racial nos diferentes contextos sociais dos receptores de seu discurso.
Desta forma, sendo este o objeto de estudo do presente artigo (a análise do discurso do
professor acerca do tema da diversidade racial), o qual pautou-se em uma pesquisa de cunho
dedutivo interpretativo, assumindo um caráter etnográfico, caracterizando-se, quanto a sua
metodologia, de forma qualitativa, em que se utilizaram aspectos dos estudos
fenomenológicos para a compreensão dos significados ou fenômenos estudados, tomando por
base a análise das práticas discursivas do professor.
Os participantes deste estudo foram os profissionais da área de língua materna e/ou
estrangeira do 3º (terceiro) Ano do Ensino Médio regular brasileiro, de três escolas públicas
da cidade de Anápolis-GO, delimitando-se ao número de 03 (três) participantes.
12
Os procedimentos adotados para a obtenção dos dados ocorreram através de uma
observação inicial da prática docente dos participantes; realização de um questionário
composto com 10 (dez) questões, as quais foram respondidas por estes. Quanto aos
procedimentos metodológicos, estes basearem-se na revisão bibliográfica de literatura
relacionada com a temática pesquisada; a efetivação da constituição de dados mediante a
utilização dos procedimentos, sistematização e a análise dos dados.
4.2 Apresentação e Análise dos dados constituídos
Os questionários da presente pesquisa foram realizados em três momentos distintos,
em decorrência de se ter três participantes pesquisados, sendo estes participantes aqui
denominados por (P1) professor 01; (P2) professor 02 e (P3) professor 03. O P1 é do sexo
masculino, com faixa etária aproximada de 20 anos e leciona a disciplina de língua inglesa no
3º ano do ensino médio há aproximadamente 06 (seis) meses. A P2 é do sexo feminino, com
faixa etária dos 30 anos e leciona há 07 (sete) anos a disciplina de língua portuguesa para o 3º
ano do ensino médio. E a P3 é do sexo feminino, com faixa etária de 40 anos, lecionando há
06 (seis) anos a disciplina de língua inglesa para o 3º ano do ensino médio.
Ressalta-se que o foco do questionário é a análise da prática discursiva frente à
temática da diversidade racial, para que assim fosse possível a análise do discurso do
profissional educador de língua materna/estrangeira acerca da temática alvo. Desta forma,
dentre as 10 (dez) questões contidas no questionário, apresentaremos a análise de 04 (quatro)
que se pressupõem relevantes para a análise de acordo com os objetivos propostos para este
estudo.
Assim, vejamos as respostas dadas as quatro questões selecionadas do questionário
realizado.
4.3 Questão 02: O que você entende por diversidade social? Justifique.
P1: A gama de fatores sócio-histórico-culturais e religiosos que compõem um indivíduo e,
juntos esses fatores ao indivíduo; este (após sua “formação”) é único e, ao mesmo tempo,
procura ajustar-se à sociedade. Isso compõe a diversidade social - as diferenças entre
indivíduos ou grupos sociais.
P2: Entendo que são diferenças existentes entre as classes sociais: econômica, raça, sexo,
credo, escolaridade, etc. É toda essa heterogeneidade que penso ser inevitável e que
infelizmente nunca acabará.
13
P3: É a presença de várias raças; culturas e classes sociais em uma mesma realidade.
Nos depoimentos acima é possível perceber a consonância de representação dos
professores com o conceito de diversidade adotado, o qual remonta, em um âmbito geral, a
idéia básica de diferença, neste sentido, tem-se que a diversidade social remete-se as
diferenças existentes em uma mesma sociedade (PINTO, 1999). Diferenças essas, que
englobam os mais variados campos sociais, como o contexto religioso, escolar, econômico,
cultural, entre outros. Assim, estabelecendo um paralelo entre a idéia de diversidade social,
que é basicamente, a imagem de diferenças presentes na sociedade, observa-se que as
respostas dos 03 (três) participantes da pesquisa estão em conformidade, em alguns pontos,
com o pensamento apresentado, acerca de diversidade social, pois mediante os discursos
apresentados, tem-se que a diversidade é um fator de diferença existente na sociedade.
Contudo, percebem-se distinções terminológicas utilizadas entre eles, nas referidas respostas.
Tal fato ocorre entre as práticas discursivas apresentadas pela P2 e pela P3. Ambas as
professoras utilizam do termo “classe social”, mas com sentido e efeito diversos. A P2
utilizou tal expressão de modo global, ou seja, abrangeu na referida expressão, as diferentes
formas de diversidade existentes em uma sociedade. Já a P3, de modo diverso, utilizou a
expressão “classe social”, especificamente, remontando somente à questão econômica.
Ressalta-se, ainda, para a resposta apresentada da P2 ao fazer uso dos léxicos
“inevitável” e “infelizmente”. Deve-se destacar tal fato, pois com a afirmação apresentada
evidencia-se que a professora apresenta um juízo de valor referente ao tema da diversidade.
Sendo que sua resposta apresentou uma certa dubiedade, conforme a passagem: “É toda essa
heterogeneidade que penso ser inevitável e que infelizmente nunca acabará”, no sentido de
que a diversidade, ao mesmo tempo em que é algo benéfico, como um aspecto de
heterogeneidade social, é algo maléfico e por isso não terá fim. Através de tal análise, tem-se
que a P2 remeteu a sua resposta para a questão do preconceito e, não somente da diversidade.
E através disto, percebe-se que a mesma possui um discurso o qual tem a visão do estereótipo
da não mutabilidade dos atos discriminatórios.
Assim, “discurso transmitido contém em si, como parte da visão de mundo que
vincula, um sistema de valores, isto é, estereótipos dos comportamento humanos que são
valorizados positiva ou negativamente. Ele veicula os tabus comportamentais” (FIORIN.
2003, p. 55). Desta forma, tem-se que a P2 ao apresentar tal discurso de não-mutabilidade do
14
preconceito, vê-se que esta tem um estereótipo que a sociedade anteriormente colocou acerca
da questão da diversidade/preconceito.
Contudo, sendo o professor um “propagador discursivo” no âmbito social que possui
relevância (a escola), este deve constantemente, apresentar um discurso focado na
heterogeneidade, ou seja, focado na diversidade, acreditando na mutabilidade dos atos
discriminatórios, pois o professor como sujeito que contribui na formação indeditária do
outro, conforme demonstrado por Moita Lopes (2006. p. 198), que “o discurso tem papel
central como força mediadora dos processos de construção de nossas identidades sociais, já
que o que somos é construído a partir do papel que representamos um para o outro por meio
da palavra”. Assim, observa-se a importância da figura do professor nesse processo
identitário.
4.4 Questão 04: Qual a sua opinião sobre o preconceito racial?
P1: Creio que a questão “preconceito racial” instala-se de fato, na questão relação de poder
e não em questões raciais, como parece-nos. Ps. Atualmente.
P2: É algo ruim mas que está presente na cabeça de muitas pessoas ainda e que vai ser
mudado lentamente.
P3: Ele é real, existe! Infelizmente.
Analisando a respostas, acima identificadas, dos professores, observa-se que o P1 está
em consonância com o pensamento do antropólogo Anatol Rosenfeld (1993), ao acreditar que
o preconceito racial no Brasil, não ocorre, unicamente, pela questão “cor/ raça” do indivíduo,
mas principalmente pela questão econômica, que foi citada como “relação de poder” pelo
professor. Percebe-se tal fato através da afirmação feita pelo referido teórico ao retratar que
“preconceitos de classe e cor são ligados de forma praticamente inseparável”. Tal
consonância, não se faz presente em relação às respostas das professoras P2 e P3, pois
mediante a afirmação de ambas, não foi citada a questão econômica e, bem como, observa-se
que ao utilizarem os termos “lentamente” (P2) e “infelizmente” (P3) há a empregabilidade de
um discurso negativista e, que mediante tais afirmações evidencia-se a consolidação de
aspectos raciais discriminatórios, bem como pela falta de preparo educacional dos
profissionais da atualidade para abordarem o presente assunto (diversidade racial) no contexto
escolar, conforme fora demonstrado por Menezes (2002, online):
15
É possível observar que há uma falta de intervenção por parte dos educadores em tal problemática. Alguns fatores que estariam implicados em
tais questões seriam: (...) falta de preparo dos professores para lidar com a
questão racial em sala de aula, desencadeando a difusão da discriminação
racial.
Demonstrando dessa forma, que pela falta de preparo dos profissionais educadores da
atualidade para tratarem do referido tema em sala de aula, há certa passividade em relação à
questão da diversidade/preconceito. A qual, pela falta de preparo há a aceitabilidade, em
muitos casos, da prática racista no contexto de sala de aula.
4.5 Questão 07: Enquanto profissional a área de educação, o que fez, ou faria, para
contornar uma situação discriminatória entre os alunos em sala de aula?
P1: Teria um diálogo franco com os dois sujeitos e lhes proporia a realização de um trabalho
– com essa temática – que mobilizasse a sala de aula através de reflexão. Seria uma idéia,
mas aposto no diálogo como a arma mais forte que um tem em mãos.
P2: Todo ano trabalho o dia Mundial da Consciência Negra. Trabalho filme, artigos que
abordam o tema e constantemente abordo o assunto durante as aulas.
P3: Eu tentaria conversar com meus alunos e explicaria que na verdade não exige ninguém
melhor ou pior. Todos nós temos limitações e qualidades.
Questão 08: Você acha que o professor (a) deve abordar esta temática em sala de aula
com seus alunos? Se sim, como seria?
P1: Sim. Com textos, discussões, debates, filmes, reflexões. Isso dependeria do alunado em
questão e outros fatores como as condições da escola e posições dos autores.
P2: Obviamente. A escola ainda é o melhor lugar para se mostrar que o preconceito é um
mal que devemos combater sempre.
P3: Sim. Através de diálogos com os alunos; leitura de textos que abordem o assunto,
seguidas de debates.
Reportando-se para as afirmações apresentadas pelos professores de língua em ambas
as questões acima referidas, é possível promover um paralelo entre estas e o pensamento
socioconstrucionista da Análise do Discurso (MOITA LOPES, 2006), pois através das
práticas discursivas dos referidos profissionais percebe-se que todos focaram-na para o
“diálogo”, como uma forma de combate ou modo de se tratar o tema da
16
diversidade/preconceito racial em sala de aula. O socioconstrucionismo da AD pauta-se no
ideal, conforme apresentado por Moita Lopes (2006, p.196), de que “tanto o discurso como as
identidades sociais são construídas socialmente”, demonstrando que através do diálogo,
conforme fora afirmado por, P1, P2 e P3, é possível que o professor ajude a construir a
identidade de seu aluno. Identidade essa pautada em uma máxima pela não discriminação,
mediante a propagação de seu discurso.
Ressalta-se o depoimento dado pela P2, na questão 08, ao mencionar a escola como
melhor lugar para se trabalhar o combate ao preconceito. Através de tal afirmação observa-se
a concordância do pensamento da referida professora com Moita Lopes (2008, p. 125), por
este demonstrar que:
A escola é uma agência importante na constituição de quem somos e seus
discursos podem legitimar outras narrativas para a vida social menos
limitadas/aprisionadas e mais criativas para nossas histórias e orientadas por
um sentido de justiça social.
Portanto, constata-se a importância da escola na formação identitária do sujeito, em
decorrência de ser a escola um dos primeiros contatos sociais que o indivíduo tem, sendo que
tal contexto, na maioria das vezes, permanece por vários anos da vida deste mesmo sujeito. E
também por ser a escola uma representação nítida da sociedade de modo geral, pois, como
mencionado anteriormente, a sala aula tem-se a presença de diferentes culturas, raças,
ideologias.
Embora percebe-se que os participantes em suas respostas anteriores apresentem-se
despreparados e em situação de passividade para abordagem do tema estudado. Conclui-se
que, nestas últimas duas questões apresentadas, eles apresentam contradições discursivas em
relação às outras declarações apresentadas, bem como, trazem colocações evidenciando que a
instituição escolar é uma representação da sociedade, a sala de aula também é um ambiente
em que se têm práticas de discriminação, conforme fora demonstrado por Munanga (1988,
p.14) ao retratar que todos os preconceitos e discriminações que permeiam a sociedade
brasileira são encontrados na escola, cujo papel deve ser o de preparar futuros cidadãos para a
diversidade, lutando contra todo o tipo de preconceito. Com isso, tem-se que a escola, na
figura do profissional educador possui a função de propagar um discurso pela não-
discriminação, pois ao se abordar este tema em sala de aula, o sujeito aluno, será capaz de
(re)transmiti-lo nos outros contextos sociais que faça parte.
17
As contradições discursivas apresentadas nas práticas discursivas dos professores
ressaltam mais uma vez as lacunas formativas existentes na constituição do sujeito professor,
pois conforme eles relatam, a escola é o lugar de tratar deste tema, mas nas declarações
anteriores eles demonstram passividade e dificuldades em abordar a questão da
diversidade/preconceito racial em sala de aula, desse modo, confirmam a falta de preparo e
conhecimento para discussão, com vista ao combate de atos discriminatórios.
5 TENTANDO CONCLUIR...
Por considerar que o tema deste artigo ainda necessita de vasta pesquisa na área das
ciências humanas, este é o motivo que se intitulou a parte final deste estudo, como uma
tentativa de concluir, desvencilhando de uma conduta tradicional que se é feita ao se
enveredar à conclusão de um trabalho.
Através dos dados de pesquisa constituídos e analisados é possível constatar que os
professores, participantes deste estudo, possuem um discurso dicotômico relacionado com o
tema da diversidade racial, no sentido de que estes consideram a diversidade como um fator
positivo para a sala de aula, no âmbito da heterogeneidade, como diferença, contudo tem-se a
prevalência em seu discurso do aspecto negativista desta, por considerar que em consequência
de tal diversidade tem-se a ocorrência dos atos discriminatórios, ou seja, o preconceito.
Assim, é possível perceber através das práticas discursivas destes profissionais, um discurso
de cunho negativo, demonstrando com isso, a carga valorativa que os referidos profissionais
transmitem aos seus receptores discursivos, para aquele âmbito social, ou seja, os seus alunos.
E, aqueles transmitindo um discurso negativista, pela não-mutabilidade dos atos
discriminatórios, fazem com que receptores de tal discurso sejam influenciados, pois a sala de
aula, na figura do professor, exerce influência na definição de como aprendemos a nos
representar e representar o outro, conforme demonstrado por Moita Lopes (2006).
Há ainda, o fato de que mesmo a LDB, que em seus postulados, aconselha que a
educação seja um processo baseado no princípio da equidade, o qual deve-se respeitar a
liberdade, bem como a diferença, percebe-se a não aplicabilidade deste respeito à diversidade
ao observar nos discursos dos sujeitos pesquisados situações de passividade as práticas
discriminatórias já ocorridas no seu contexto de sala de aula, bem como pela questão do não-
conhecimento que estes profissionais apresentaram para abordar e tratar de tal assunto com os
alunos.
18
Contudo, o não-conhecimento adequado dos professores para tratarem da questão do
preconceito racial em sala de aula, pode ser visto como um aspecto de inércia dos diferentes
contextos sociais, mas, em destaque do contexto escolar em seus diferentes níveis.
Ressaltando, para o âmbito acadêmico, nos cursos de formação de professores, ou seja, os
cursos de licenciaturas, os quais não dão uma formação adequada aos seus participantes para
abordarem tal assunto em sua prática profissional, conforme fora mencionado por Menezes
(2002).
Mediante os fatos apresentados e estudados, é possível, então, concluir que a questão
do preconceito racial, no contexto de sala de aula, pode e deve ser discutido, por meio de um
discurso voltado para a diversidade, entendendo esta, como diferença e, não voltado para o
preconceito. E, um aspecto que pode ajudar em tal combate de atos raciais discriminatórios, e
consonância com o pensamento de Gomes (2007), é a atuação governamental para inserir no
âmbito escolar projetos político-pedagógicos de questões de cunho racial, para que assim,
possa ter tais projetos como eixos das práticas pedagógicas e assim, incluí-las no currículo
escolar.
A princípio, acredita-se que uma reforma no currículo e também das práticas deva ser
levada a sério o quanto antes. Seria necessário um trabalho com os professores e é nesse ponto
que concordamos com Clandinim & Connelly (1990), quando dizem que só é possível
imaginar reforma no currículo da escola através da reforma no currículo para a
educação/formação dos professores, no espaço institucional que proporciona discussões
verticalizadas a respeito das diferenças presentes. Acredita-se que esse tipo de ação
promoverá um conhecimento de si e do outro em prol da reconstrução das relações raciais
desgastadas pelas diferenças ou divergências étnicas.
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19
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20
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WIEVIORKA, M. O racismo, uma introdução. São Paulo: Perspectiva, 2007.
21
ANEXOS
22
Questionário para pesquisa. Pesquisador: Ivan de Mendonça Filho6
O presente questionário tem cunho, exclusivamente, científico. Com fundamento na
confecção de um artigo científico7 para o Curso de Letras da Universidade Estadual de Goiás.
As informações aqui obtidas serão analisadas, não se empregando juízo de valores, nem a
divulgação de quem as responderam8.
1- Há quanto tempo você leciona para o 3º Ano do Ensino Médio?
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2- O que você entende por diversidade social? Justifique.
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________________________________________________________________________
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________________________________________________________________________
3- Dentre os tipos de diversidades existentes, quais você conhece? (Cite no mínimo 03).
E dentre estes qual você considera de maior relevância social para ser discutida? Por
quê?
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4- Qual a sua opinião sobre o preconceito racial?
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5- Você já presenciou algum tipo de preconceito racial em sala de aula? Como foi?
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6- Em alguma situação de sua vida você percebeu que teve algum tipo de preconceito
racial?
6 Aluno do 4º ano de Letras – Port. Inglês da UEG; 7 Confecção de Artigo Científico como requisito da disciplina de TCC; 8 Não é necessário que o questionário contenha o nome de quem o respondeu
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________________________________________________________________________
________________________________________________________________________
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7- Enquanto profissional da área de educação, o que fez, ou faria, para contornar uma
situação discriminatória entre os alunos em sala de aula?
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________________________________________________________________________
8- Você acha que o professor (a) deve abordar esta temática em sala de aula com seus
alunos? Se sim, como seria?
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9- Qual a sua opinião a respeito das cotas para os negros (as) na universidade?
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10 - De qual raça/cor você se classifica?
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