UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAIBA
CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS
DEPARTAMENTO DE ECONOMIA
CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM GESTÃO PÚBLICA MUNICIPAL MODALIDADE A DISTÂNCIA
TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO
CONTROLE SOCIAL E EDUCAÇÃO:
Análise da Experiência dos Conselhos Escolares da Rede Municipal de Pedra Branca-PB
Damião Pereira de Lacerda
Pós-graduando lato sensu em Gestão Pública Municipal - UFPB
Yure Silva Lima
Professor da Universidade Estadual da Paraíba - UEPB
RESUMO
Este artigo é resultado de uma pesquisa de campo de cunho qualitativo, realizada em novembro de
2011, junto aos conselheiros da rede municipal de ensino da cidade de Pedra Branca-PB. O objetivo
deste estudo foi analisar os limites e possibilidades dos conselhos exercerem o controle social na
educação, considerando a participação política da base como pressuposto da construção de uma gestão
democrática da escola pública. O universo da pesquisa foi composto por cinco(5) colegiados existentes
na rede municipal e a amostragem foi composta por dois (2) conselheiros de cada entidade, resultando
num total de 10 sujeitos da pesquisa, os quais responderam a uma entrevista semi-estruturada
contendo três (3) eixos de questões: perfil dos conselheiros, os critérios de sua inserção e os modos de
atuação nos conselhos e sobre a dinâmica de funcionamento dos colegiados pesquisados. Os dados
foram submetidos à técnica de análise de conteúdo, que revelaram os seguintes resultados:
Considerando o grau de instrução e a participação de alguns membros nos movimentos sociais, os
conselhos apresentam um perfil sócio-cultural e político favorável à sua evolução e fortalecimento,
enquanto espaço de luta de divisão de poder e de controle social. A atuação dos conselheiros precisa se
qualificar nos debates e deliberações cumprindo as atribuições regimentais da entidade nas áreas:
administrativa, pedagógica e financeira. Para o exercício do controle social há limites e possibilidades;
quanto aos sujeitos compete a tarefa de construírem a gestão democrática da escola pública na
perspectiva da formação cidadã, ética e igualitária para todos os cidadãos brasileiros.
Palavras-chave: Gestão da Educação Pública. Controle Social. Conselhos Escolares.
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1 INTRODUÇÃO
A gestão das políticas sociais públicas na contemporaneidade vem registrando
profundas mudanças de ordem jurídico-legal e político-administrativa, notadamente, a partir
da Constituição Federal de 1988. Neste contexto, a relação entre Estado e Sociedade tem
sofrido novos contornos com a emergência de novos paradigmas de gestão redimensionando
as políticas públicas e, particularmente, as educacionais.
O princípio de gestão democrática da educação pública inscrito na Carta Magna e na
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) 9.394/96 impulsionou a sociedade
brasileira como um todo, a empreender um processo de discussões e de ações em torno da
descentralização da política educacional, com ênfase na participação da comunidade escolar –
pais-mães, alunos(as), professores(as) e funcionários(as) – na elaboração da proposta
pedagógica da escola e na formação de conselhos escolares ou equivalentes, como estratégias
de controle social e de vivências democráticas na educação.
Para Gonh (2001), os conselhos gestores representaram a maior inovação do século
XX, no entanto, a sua formalização legal e o funcionamento meramente técnico-burocrático
não bastam para produzirem impactos na reversão da crise de qualidade por qual passa a
educação brasileira.
A expectativa da sociedade civil organizada brasileira é que estes conselhos
apresentem qualidade política, com poder para influenciarem na dinâmica da gestão escolar
para além do âmbito local em nível da escola. Espera-se que estes colegiados qualifiquem
suas discussões, deliberações e encaminhamentos, na perspectiva de estabelecer relações
sociais democráticas e exercício da cidadania através do controle social democrático.
O presente trabalho tem como objetivo socializar os resultados de investigação junto
aos conselhos escolares da cidade de Pedra Branca-PB, buscando-se apreender os limites e
possibilidade destas entidades no exercício do controle social da educação pública.
Os resultados apontam que há condições objetivas para a construção de uma gestão
democrática da escola pública, e os conselhos escolares constituem espaços privilegiados para
os ensaios de novas vivências de compartilhamento de poder e de co-responsabilização
coletiva em prol de uma educação pública, democrática, laica e de qualidade social.
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Este artigo está estruturado da seguinte forma:
Além da introdução, segue a primeira parte do artigo com a seção da fundamentação
teórica que está subdividida em quatro subseções, que abordam de forma sucinta as categorias
teóricas participação e controle social enquanto pressupostos da gestão democrática, eixos que
são estudados neste trabalho. A segunda seção trata dos procedimentos metodológicos para a
realização da pesquisa de campo. Na terceira seção discute os resultados obtidos neste estudo.
2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
2.1 Participação da Sociedade Civil e Controle Social - Pressupostos da Gestão Pública
Democrática
As profundas mudanças econômicas, políticas, sociais, culturais, que vêm ocorrendo
no mundo contemporâneo, determinadas pelo modo de produção capitalista no seu novo
padrão de acumulação, afetam todos os campos da vida em sociedade produzindo alterações
substanciais nas relações entre Estado e Sociedade.
Na particularidade da realidade brasileira, a exemplo de tantos outros países, as
relações entre Estado e Sociedade têm se processado segundo a lógica da doutrina neoliberal,
traduzidas nas políticas de ajustes, na redução de gastos com as políticas públicas
configurando-se desta forma num Estado que se retrai de suas obrigações públicas.
Segundo Nogueira (2001), o cenário contemporâneo demanda urgentemente de
“política dos cidadãos”, que é a política com “muita política”, em contraposição à “pequena
política”, “política dos técnicos” ou a contrapolítica. Ou seja, as políticas públicas precisam
da participação ativa da sociedade, desde a sua formulação até a avaliação de sua execução no
sentido de verificar se estes serviços são de qualidade e se atendem às suas necessidades.
É neste contexto em se inscreve a luta por direitos à saúde, educação, segurança
pública, etc, ou seja, a luta por uma sociabilidade que garanta os direitos humanos.
Neste sentido, afirma Bravo (2006, p.77)
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(...) o compromisso tem que ser com o debate público, a participação
democrática que possibilita aos cidadãos organizados interferir e deliberar
nas questões de interesse público, em busca de proposições para resolver os
conflitos.
Na construção de uma nova institucionalidade política, de ampliação e consolidação
da esfera pública ganham visibilidade os conceitos de participação e controle social enquanto
pressupostos da gestão pública democrática.
Contudo, do ponto de vista teórico e político, a questão que se coloca neste debate é a
seguinte: que tipo de participação e controle social interessa à sociedade civil brasileira?
Embora tais conceitos sejam indissociáveis, qualificá-los é de suma importância para
uma análise crítica das possibilidades do exercício do controle social nas políticas publicas e
particularmente na área educacional.
2.2 Concepções de Participação
Participação é um dos temas mais debatidos nas ultimas décadas, notadamente no
contexto dos anos de 1980, quando várias conquistas foram efetivadas para a sociedade civil
que passou a se organizar e reivindicar direitos diversos.
Vale ressaltar que a categoria participação é carregada de múltiplas definições e
concepções a depender da conjuntura política e do paradigma teórico no qual se busca a sua
fundamentação.
Segundo Gohn (2001, p.15), várias são as tipologias clássicas de participação: liberal,
autoritária, revolucionária e democrático-radical. Destas, a primeira e a última são tendências
que estão em disputas na realidade sócio-política brasileira e, portanto, serão comentadas
abaixo:
Participação liberal: tem como pressuposto assegurar a liberdade individual,
objetivando o fortalecimento da sociedade civil para evitar a ingerência do Estado como
regulador social.
Esta concepção de participação hoje interpretada como neoliberal, é defendida pela
maioria dos governantes e estar implícita nos seus discursos e práticas que tendem a transferir
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para a sociedade a responsabilidade de buscar alternativas para minimização de problemas
locais e de atendimento às suas próprias demandas, principalmente ações sociais muitas vezes
de cunho solidário que impactem sobre as políticas publicas, como saúde, assistência social,
educação, etc.
Gutierrez e Catani (1998, p.63) tecem o seguinte comentário sobre esta tendência de
Estado mínimo:
(...) numa perspectiva estritamente conceitual, transferir a autoridade e a
responsabilidade pela gestão de um bem público para o grupo diretamente
envolvido no trabalho é uma democrática e socialmente justa desde que não
se escondam por trás o incentivo à ações de natureza corporativa, e tão
pouco a intenção por parte do Estado de se desfazer de suas obrigações para
com a população.
Depreende-se da citação acima que, na organização de um Estado que se proclama
democrático há que assegurar à sociedade o poder político de influenciar nas ações públicas
que por sua vez demanda o deslocamento de poder decisório do centro para as instâncias
locais, ou seja, descentralização política e todas as condições objetivas para que os sujeitos
locais possam desenvolver os projetos que lhes interessam. O contrário disso poderá ocorrer a
desconcentração de responsabilidades e competências, sem a devida descentralização na
perspectiva democrática.
Para Gohn (2001), a participação democrático-radical, objetiva fortalecer a Sociedade
civil para a construção de alternativas que apontem para mudanças na sociedade,
principalmente no que diz respeito aos problemas de natureza sócio-ambientais e demais
seqüelas sociais produzidas pelo capitalismo.
Na compreensão da referida autora, a verdadeira participação deve favorecer aos
diversos agentes sociais interferirem na vida social, política, econômica e cultural do país.
Estes sujeitos políticos estão expressos nos movimentos organizados da sociedade: sejam
grupos de jovens, idosos, negros, moradores de bairros, colegiados de políticas públicas, etc.
A perspectiva democrática da relação Estado e Sociedade demanda o processo de
participação popular, na qual os cidadãos-cidadãs são considerados sujeitos ativos e
construtores da vida em sociedade, comprometidos com uma sociabilidade de
desenvolvimento local e global que atenda as necessidades humanas.
Nesta mesma direção político-ideológica comunga Demo (1999, p.120), quando
afirma que “participação é essencialmente a base, a cúpula é decorrente, é um exercício de
pura delegação”. Para o autor, a participação intensiva e ativa dos sujeitos demonstra coesão
organizada e compromisso ideológico na realização conjunta de um projeto comum, o que
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pode ser considerado um critério de avaliação da qualidade política das organizações
associativas, tais como, os conselhos de gestão por exemplo.
A abordagem da participação política alia-se a outro conceito denominado de controle
social numa relação de indissociabilidade, sem a qual, um não se processa sem o outro e em
termos político-ideológicos eles se convergem numa unidade. Noutras palavras, somente é
possível o exercício democrático do controle social se somente se, houver a participação
numa perspectiva democrático-radical.
O conceito controle social assim como a participação, constitui uma categoria
polissêmica. A seguir, uma sucinta abordagem desta questão.
2.3Perspectivas do Controle Social
Assim como o conceito de “participação”, a categoria “controle social” comporta várias
acepções a depender dos interesses e posturas políticos ideológicas a ela subjacentes. Campo
(2006), aponta duas principais perspectivas deste processo social, as quais estão sucintamente
apresentadas a seguir.
A sociologia clássica aborda a concepção de controle social no entendimento de que o
Estado ou o empresariado exerce a sua pressão sobre a classe subalterna, ou seja, um poder
coercitivo sobre as massas. A outra perspectiva antagônica a esta, atribui à definição de
controle social implícito na legislação vigente (Constituição Federal, LDB, etc), referente ao
direito da sociedade participar ativamente do processo de gestão das diversas políticas sociais
públicas, com poderes para elaborar, implementar e fiscalizar as diversas ações que dizem
respeito ao interesse público, numa perspectiva de partilha de poder e de democratização das
relações sociais.
Como se pode perceber, do ponto de vista teórico e político o processo de controle
social é polarizado por duas distintas perspectivas: uma que se refere ao controle do Estado
sobre a população; e a outra que relaciona ao controle dos cidadãos sobre às ações do Estado.
O papel do Estado como instrumento de controle sobre a sociedade significava para o
pensador Thomas Hobbes, uma estratégia de segurança pública, pois, compreendia que o
homem é por natureza, competidor, desconfiado e egoísta (1979). Sendo assim, a vida em
sociedade representa uma ameaça constante e o Estado, segundo a sua visão, seria a garantia
eficaz para que os homens não se destruíssem. Defendia um Estado forte, sem pactos com a
sociedade, portanto, um Estado autoritário, absolutista, pois argumentava que “os pactos sem
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a espada não passam de palavras sem força para dar a menor segurança a ninguém”. E
reafirmava que o Estado representa: o “Deus mortal, ao qual devemos, abaixo do Deus
imortal, nossa paz e defesa” (Hobbes, 1979, p. 144).
Nesta concepção, a enunciada paz e segurança provida pela intervenção autoritária do
Estado na sociedade se efetivariam por duas vias de controle social: uma mais explícita,
externa, que na análise de Bobbio (2000), se materializa de forma verticalizada através dos
mecanismos de repressão destinados à manutenção da ordem (polícias, legislações restritivas,
tribunais), ou seja, tem uma natureza impositiva, centralizada, autoritária. A segunda via de
controle usada pelo Estado é aquela mais sutil, consentida, massificada, que se incorpora no
imaginário social, através de valores, crenças, justificativas de uma determinada ordem social,
etc, que tem como objetivo manter o status quo através da coesão social. Essa forma de
controle social é veiculada pela educação, cultura, religião, ideologia etc.
A concepção que vem sendo construída pela sociedade brasileira é aquela em que o
controle social democrático constitui um processo político, no qual encontram-se algumas
contribuições teóricas em Rosseau no seu entendimento sobre os elementos constitutivos do
que seja uma democracia, quais sejam: igualdade de participação; o político como espaço
autônomo do agir humano e a participação direta no poder.
Este ideal de participação, de construção de espaços públicos democráticos, do poder
da sociedade influenciar nas decisões da agenda governamental para uma determinada área
pública, se constitui num paradigma de controle social defendido historicamente pela
sociedade civil organizada que encontrou em Rosseau (século XVIII) as raízes filosóficas e
teóricas para se construir os fundamentos da categoria controle social.
Para aquele filósofo, o governante nada mais é que um comissário do povo, e que cabe
a este povo o direito de acompanhar, fiscalizar as ações do governo como estratégia para
evitar a corrupção, a usurpação e o predomínio do interesse privado sobre o público.
Resguardadas as devidas adequações, no tempo presente se vive algumas das
inquietações rousseaunianas. No debate atual sobre gestão pública, políticas públicas etc, uma
questão ocupa centralidade: Como assegurar, efetivar e ampliar os direitos sociais na agenda
governamental de forma transparente, ética e democrática?
Para muitos teóricos, o exercício do controle social é uma estratégia política eficaz
para assegurar que o interesse coletivo prevaleça sobre o privado, e que a base material,
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objetiva, fora da estrutura organizacional do Estado, para que este processo ganhe corpo
encontra-se nas mais variadas formas de colegiados. Os diversos conselhos atualmente
estruturados no âmbito das diversas políticas setoriais, com variados níveis de abrangência e
competências, têm um papel fundamental para a construção de uma gestão descentralizada e
participativa, com possibilidades de conquistar progressivos graus de autonomia - pois estão
respaldados juridicamente – a depender das correlações de forças e das determinações sócio-
históricas de cada contexto.
Para Campos (2006, p.112) a compreensão que se deve ter do conselho aponta para
uma tendência mais flexibilizada em que se torne “um ambiente justificado para a busca de
entendimentos em torno de programas sociais (...) pois a mais significativa dimensão do
controle social exercida pela sociedade civil, reside em sua capacidade de influir na agenda
governamental.
Nesta linha de raciocínio, o exercício do controle social da sociedade sobre o Estado
numa perspectiva democrática demanda mecanismos fortes politicamente, capazes de atuarem
com eficácia em favor da sociedade pelos menos em duas dimensões. Campos (2006), analisa
que uma dessas dimensões diz respeito à natureza técnica, ou seja, fortalecer e acionar as
instituições do próprio Estado que têm o papel de fiscalizar o cumprimento dos direitos
sociais conquistados legalmente, como por exemplo, o Ministério Público, os Tribunais e
Contas etc. A outra dimensão do controle social democrático, refere-se ao aspecto político
desse processo, quer dizer, o processo de participação ativa da sociedade em que os princípios
democráticos funcionem como balizas para o comportamento coletivo e político dos sujeitos e
forças sociais.
Sendo assim, quais são os instrumentos que podem materializar uma efetiva
participação política e o exercício do controle social, pautados nestes princípios
democráticos?
Um dos mecanismos com esta finalidade são os conselhos de direitos e de políticas
públicas setoriais. No tópico a seguir, faz-se uma discussão sobre o controle social no âmbito
da educação, tendo-se como espaços políticos de participação popular os conselhos escolares.
2.4 Controle Social na educação – a vez dos conselhos escolares
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A atual tendência de democratização das políticas públicas tendo-se como
pressupostos a participação e o controle social da sociedade, representa uma intenção de
ruptura com os tradicionais modelos burocráticos e autoritários de administração pública
prevalecentes na formação histórica e política do nosso país.
No que tange à política educacional brasileira, historicamente o paradigma de gestão
adotado foi pautado na tecnoburocracia pautada nas teorias tradicionais de administração,
segundo a qual, a gestão deve ser racionalizada, centralizada e extremamente hierarquizada,
de forma que impede qualquer espaço para uma gestão participativa e conseqüentemente as
adequações e mudanças necessárias às exigências do tempo presente (PARO, 2003,p. 64).
As últimas décadas do século XX demarcam um posicionamento político das forças
sociais organizadas da sociedade brasileira em prol da ampliação dos espaços de participação
política e nesta luta, os educadores vêm desempenhando importante papel no sentido de
construírem estratégias para a democratização das políticas públicas de educação.
Para os educadores Gustavo Luiz Gutierrez e Afrânio Mendes Catani (1998), as
tendências democratizantes na atualidade constituem um processo de superação dos
pressupostos tradicionais de administração científica e sua substituição por valores
contemporâneos que contemplem a flexibilização, tolerância às diferenças, relações mais
horizontais e práticas sociais descentralizadas e participativas.
A luta por uma gestão democrática da educação constitui um pré-requisito para a tão
sonhada eqüidade social. Segundo Gadotti (1992, p. 39), a tendência mundial é construir um
sistema educacional para o 3º milênio baseado no tripé: autonomia da escola, professores
capacitados participação popular.
No Brasil, o reconhecimento das reivindicações históricas do movimento da sociedade
e dos educadores em particular em prol da gestão democrática da educação resultou em
ganhos jurídico-legais que estão expressos em leis, planos, programas etc., o que representa
um avanço político no sentido do fortalecimento dos movimentos sociais em prol de uma
educação pública, gratuita, democrática e de qualidade, tendo-se como suporte de pressão e
controle social todo o embasamento legal conquistado nos últimos anos. A seguir, faz-se um
esboço destes referenciais jurídico-legais.
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2.4.1 Participação, Controle Social e Democracia: fundamentos legais
As temáticas sobre gestão democrática e controle social na educação vêm ocupando
centralidade nos últimos anos no cenário da política educacional brasileira. E nos debates e
propostas apresentadas em vários fóruns – desde os seminários mais localizados até as
conferências nacionais de educação – constata-se as mais diversas tendências ideológicas e
políticas, que se enquadram na perspectiva mais conservadora as quais tentam aliar propostas
de manutenção do status quo, bem como, as tendências mais progressistas que defendem a
participação popular e o controle social como pressupostos da gestão democrática.
Para Lück (1998, p.9), “nunca antes da história do Brasil a questão da educação
pública foi tão evidente na mídia, na vida política e na consciência do cidadão comum”. É
evidente que há o reconhecimento da sociedade quanto à importância da educação para o
desenvolvimento social e econômico de um país. Da mesma forma, é notória a sua
insatisfação com relação à quantidade e qualidade dos serviços educacionais públicos
prestados à população.
Dentre os vários fatores que historicamente vêm contribuindo para acarretar a situação
crítica da educação do Brasil, Farah (1995, p.73), destaca:
centralização de decisões na esfera federal- relativas à captação e
liberação de recursos para o setor, e aos conteúdos curriculares;
sistema educacional burocratizado, acarretando lentidão no processo
tomada de decisões e na gestão do sistema;
Exclusão da comunidade e dos profissionais envolvidos nas prestações
de séricos dos processos decisórios e da gestão do sistema.
Diante do quadro da crise de qualidade que a educação brasileira apresenta nos
últimos anos, a sociedade vem se mobilizando no sentido de elaborar uma agenda de
mudanças e reformas deste setor e neste contexto vários conceitos vêm tendo destaques desde
o contexto dos anos 80. Daí, várias bandeiras de lutas ganham adesão popular, tais como:
descentralização, municipalização, democratização da escola pública etc.
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Os esforços desses setores convergiram para o processo de definição da Constituição
da República Federativa do Brasil (CF), de 1988, que incorporou, no artigo 206, a gestão
democrática da educação como um de seus princípios basilares.
Esse princípio constitucional demandou a regulamentação de várias propostas na Lei
de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), de nº 9.394/96. Dentre as principais
matérias regulamentadas na referida LDB, destaca-se o seu artigo 14, onde estabelece que os
sistemas de ensino definirão as normas da gestão democrática do ensino público na educação
básica de acordo com as suas peculiaridades e conforme os seguintes princípios: “I -
participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto pedagógico da escola;
II - participação das comunidades escolar e local em conselhos escolares ou equivalentes.
E ainda, as unidades de ensino obterão progressivos graus de autonomia pedagógica e
administrativa e de gestão financeira, observada as normas gerais do direito financeiro
público, aplicadas às unidades escolares públicas (LDB/96, Art.15).
Para Demo (1997, p.19), este artigo representa: (...) o ápice do espírito flexibilizador
da lei, porque coloca nas mãos de cada escola a confiança de dar conta do recado num meio-
termo entre diretrizes gerais de cunho nacional, válidas para todos, e peculiaridades locais,
chegando até a gestão financeira de recursos.
A gestão democrática nas escolas públicas também constitui matéria do Plano
Nacional de Educação (PNE), aprovado em janeiro de 2001, que dispõe, como uma de suas
metas, a criação de conselhos escolares nos estabelecimentos oficiais que oferecem educação
infantil, ensino fundamental e ensino médio.
Esse conjunto de leis estabelece as diretrizes e normas para a organização e gestão do
sistema educacional brasileiro e orientam as ações, programas e políticas que visam garantir o
acesso, a permanência com qualidade, a gestão democrática e o financiamento da educação,
em seus diferentes níveis e modalidades.
Em cumprimento a esses dispositivos legais, os sucessivos governos, nas três esferas
jurídico-administrativas (União, Estados e Municípios) têm conduzido políticas, programas e
projetos relacionados à gestão da educação e incentivado o desenvolvimento de diferentes
experiências pedagógicas e administrativas focalizando a gestão participativa nas escolas.
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Na perspectiva da participação popular e controle social democrático, vários são os
mecanismos que a sociedade pode acionar e mobilizar para fazer valer os direitos sociais e
controlar as ações públicas de interesse da sociedade, tais como, Ministério Público, Tribunais
de Contas das diversas esferas governamentais, os espaços políticos como as Conferências de
Políticas Públicas, também os colegiados das políticas setoriais, dentre estes, os conselhos
escolares que por ser objeto deste estudo será a seguir mais sistematicamente tratado.
2.4.2 Conselhos Escolares – mecanismos de controle social?
O debate no Brasil em torno dos processos de descentralização político-administrativa
da gestão das políticas públicas setoriais como: saúde, educação, assistência social etc. tem
adquirido maior visibilidade e materialidade nas últimas décadas, como já apontado nos
tópicos anteriores deste trabalho.
Com a promulgação da Constituição de 1988, os governos das diversas esferas -
federal, estadual e municipal – foram responsabilizados a instituírem mecanismos de
participação e controle social enquanto estratégias de governança, e conseqüentemente, de
desenvolvimento local.
Dentre os vários espaços políticos de organização da sociedade civil, atualmente
construídos, para possibilitarem a participação dos atores sociais nos processos de
formulação, execução e avaliação das políticas sociais públicas encontram-se os diversos
conselhos gestores.
No Brasil, durante o século XX, as experiências com conselhos foram bem variadas
quanto a sua natureza e função. Gonh (2001, p.70) classifica-os em três modalidades:
Os criados pelo próprio poder público executivo, para mediar as
suas relações com os movimentos e com as organizações
populares (ex:conselhos comunitários criados para atuar junto à
administração municipal ao final dos anos 70);
Os populares, construídos pelos movimentos populares ou setores
organizados da sociedade civil em suas relações de negociação
com o poder público (ex: conselhos populares ao final dos anos
1970 e início dos anos 1980);
Os institucionalizados, com possibilidade de participarem da
gestão dos negócios públicos criados por leis ordinárias do poder
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legislativo, surgidos após pressões e demandas da sociedade civil
(ex: conselhos institucionalizados setorias)
Os conselhos designados como institucionalizados segundo a classificação acima,
incluso os escolares, constituem novos instrumentos de expressão, representação e
participação popular; são conquistas da sociedade civil na lutas em prol da democratização e
de ampliação da esfera pública.
Na área educacional, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB)
9.394/96, preconiza a existência de vários conselhos com papéis e finalidades específicas, os
quais funcionam nos âmbitos dos Estados e dos Municípios, a saber:
Conselho Municipal (Estadual) de Educação (CME/CEE): pode decidir sobre diversas
matérias, desde autorizar o funcionamento de escolas e de cursos até propor normas
pedagógicas e administrativas;
Conselho Municipal(Estadual) de Alimentação Escolar(COMAE/CEAE): compete
fiscalizar a aplicação dos recursos transferidos para a merenda escolar e zelar pela
qualidade dos produtos, desde a compra até a distribuição nas escolas, prestando
sempre atenção às boas práticas sanitárias e de higiene.
Conselho de Acompanhamento e Controle Social do Fundeb: acompanhamento e
controle social sobre a distribuição, a transferência e a aplicação dos recursos do
Fundo, no âmbito de cada esfera Municipal, Estadual ou Federal.
Conselhos Escolares (CEs): zelar pela manutenção da escola e participar da gestão
administrativa, pedagógica e financeira, contribuindo com as ações dos dirigentes
escolares a fim de assegurar a qualidade de ensino.
No entanto, não basta criar leis que institucionalizem estas entidades com tendências
burocráticas e de legitimação das ações públicas. Torna-se necessário criar condições
concretas para que os diversos colegiados exercitem práticas democráticas e de controle
social. Noutras palavras, é preciso
(...)criar condições que implicam, entre outras providências, em construção
cotidiana e permanente de sujeitos sócio-políticos capazes de atuar de acordo
com as necessidades desse novo que-fazer pedagógico-político, redefinição
de tempos e espaços escolares que sejam adequados à participação,
condições legais de encaminhar e colocar em práticas propostas inovadoras,
respeito aos direitos elementares dos profissionais da área de ensino (plano
de carreira, política salarial, capacitação profissional (CISESKI & ROMÃO,
1997, P.66/67).
Criar condições favoráveis para que os conselhos consigam fazer a diferença no
âmbito da política educacional remete ao que Demo (1999) denomina de qualidade política.
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Segundo o referido autor, essa qualidade política que as entidades de participação
popular precisam adquirir fundamenta-se, em quatro pilares:
1 Representatividade: expressa no processo de constituição de lideranças num
ambiente amplamente democrático, com mandato por delegação, via sufrágio
universal. O autor acima elabora seu entendimento de representatividade através do
processo eletivo apropriam-se de mandato vinculado por delegação, sendo revogável
a qualquer tempo.
2 Legitimidade: advém do “estado de direito”, o que remete a “uma sociedade que
funciona através do reconhecimento de direitos e deveres” (DEMO, 1999, P.119).
Para este autor, é no “processo constituinte”, que reside o fundamento da legitimidade.
3 Participação: esta, qualificada, demonstra coesão organizada compromisso
ideológico na realização conjunta de um projeto comum, ou seja, inspirada na
concepção democrático-radical, que já foi comentada anteriormente neste trabalho.
4 Auto-sustentação: remete-se à capacidade de alguém ou algo, suster por conta
própria (FERREIRA, 2000). Para Demo (1999, p.123), “processos participativos não
podem resumir sua qualidade política somente à face política”. Para o referido autor,
criar estratégias de sobrevivência material para o seu funcionamento significa adquirir
as condições necessárias para a sua emancipação efetiva enquanto instância autônoma.
Estas proposições em termos de referenciais para a construção de colegiados com
qualidade política, para a defesa e luta pela educação pública, democrática e com qualidade
social para todos, além de ser possível, torna-se necessária como demanda real da sociedade,
principalmente daqueles que dependem da educação pública enquanto espaço de formação
cidadã e de construção de uma sociedade melhor, mais justa e solidária.
3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Para a realização deste estudo foi adotada a pesquisa descritiva e explicativa, pois
tem a perspectiva de caracterizar e analisar as determinações políticas, econômicas, culturais
e sociais imbricadas no objeto de estudo (GIL, 1999)
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Do ponto de vista operacional, constituiu num estudo de caso, cuja abordagem foi
qualitativa sem menosprezar o quantitativo, e teve como lócus de análise o município de
Pedra Branca/PB.
Assim, o propósito desta pesquisa foi revelar a dinâmica da relação entre a aparência
e a essência do fenômeno a ser estudado. Ou seja, a investigação buscou identificar
elementos que possam analisar as possibilidades e limites dos conselhos escolares
exercerem o controle social na gestão educacional na perspectiva democrática.
Os procedimentos metodológicos adotados nesta pesquisa fundamentaram-se na
lógica dialética que apreende a realidade de forma contraditória em permanente
transformação e sendo síntese de múltiplas determinações. Para Queiroga (1991, p. 15),
“o conhecimento da realidade não é apenas a simples transposição dessa realidade para o
pensamento, mas consiste na reflexão crítica que se dá a partir de um conhecimento
acumulado e que irá resultar em uma síntese, o concreto pensado”.
Considerando o universo constituído por cinco conselhos escolares municipais, a
amostra intencional será composta por dois conselheiros de cada colegiado constituindo
um subgrupo do universo que com base nas informações disponíveis possa ser
representativo da totalidade (GIL,1999).
Com relação ao processo de coleta dos dados, foi procedido através de levantamento
e análise documental de estatutos que regulamentam o funcionamento dos conselhos
escolares, além do exame das atas das reuniões nas quais estão registradas as pautas,
discussões e deliberações coletivas e demais encaminhamentos dos colegiados.
Outro instrumento utilizado foi o roteiro de entrevista semi-estruturada com três
eixos de questões: perfil dos conselheiros (idade, escolaridade, sexo, participação em
grupos sociais); sobre a inserção e atuação dos conselheiros no colegiado e sobre sua sobre
dinâmica de funcionamento.
Os dados coletados foram submetidos à analise de conteúdo, buscando-se apreender
os significados explícitos e latentes às falas dos sujeitos, numa perspectiva interpretativa,
compreensiva e explicativa do universo pesquisado, visando a reconstrução do objeto de
estudo.
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Todas as informações coletadas serão mantidas em sigilo, bem como, o anonimato
de todos os sujeitos envolvidos nesta pesquisa. Desta forma, fica assegurado o respeito às
recomendações emanadas da Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde-MS, no
que diz respeito à ética na pesquisa.
4 DISCUTINDO OS RESULTADOS: Limites e Possibilidades dos Conselhos
Escolares de Pedra Branca-PB para o Exercício do Controle Social.
4.1 Perfil dos Sujeitos da Pesquisa
Quanto ao perfil dos (10) dez conselheiros entrevistados, destacamos: entre os
conselheiros que participam dos cinco conselhos escolares abordados, há 25% do sexo
masculino e 75% do sexo feminino, sendo que 66,7 dos entrevistados declararam ser
casados e 33, 3% solteiros.
A predominância das mulheres nos conselhos escolares decorre da cultura da
feminização na história do magistério na realidade brasileira, ou seja, a maioria dos
entrevistados são conselheiros que exercem ou o papel de professor(a), cuja função foi
ocupada majoritariamente pela mulher, bem como, as mães que representam o segmento
das famílias nos respectivos colegiados também reforçam este perfil feminino presente
nestas instâncias.
Com relação à escolaridade, nos conselhos analisados temos 58,33% com nível
médio completo; 25% com curso superior completo; 8,33% com pós-graduação; e 8,33 com
nível médio fundamental. Esta constatação de que todos os conselheiros estão além do
ensino fundamental, bem como, a verificação de que 25% deles participam de organizações
sócio-políticas como sindicatos e pastorais, apontam para as possibilidades que os conselhos
têm de ocuparem espaços de poder na gestão escolar e educacional como um todo.
O nível de escolaridade e a militância dos conselheiros em movimentos sociais são
elementos que potencializam a qualidade política dos conselhos considerando-os enquanto
espaços de relações de poder e neste sentido
Não há poder, a priori, nos conselhos escolares, mas como decorrência do
exercício da palavra, da capacidade de argumentação nas reuniões, do
nível de escolaridade dos participantes e da politização da comunidade
escolar(...) (WERLE, 2003, p.10)
17
É possível fazer uma relação do nível de escolaridade dos entrevistados com a renda
familiar, em que os dados revelaram que 75% estão na faixa salarial de 1(um) a 3 (três)
salários mínimos, isto é, acima da esmagadora massa de trabalhadores brasileiros que estão
empregados, os quais ganham apenas o salário mínimo por não possuírem graus elevados de
escolaridade, e portanto, baixa qualificação profissional.
No que se refere à idade, a maioria dos conselheiros está acima dos 40 anos (41,7%).
Este dado aponta para a necessidade de renovação dos quadros dos atores sociais que atuam
no controle social na área de educação, por meio do envolvimento de novos sujeitos – os
estudantes por exemplo - no debate acerca da participação popular nos rumos das políticas
públicas, em particular a educação, em prol do desenvolvimento local sem desconsiderar as
determinações macro no âmbito da economia, da política, do social etc.
Considerando os elementos e variáveis inscritos no perfil dos conselheiros,
apresenta–se a seguir uma análise com relação aos critérios de constituição dos
conselheiros, sobre sua atuação e dinâmica de funcionamento dos colegiados na perspectiva
da qualidade política.
4.2 Dinâmica de Funcionamento do Colegiado
A visão que os conselheiros têm sobre o colegiado do qual eles são membros foi uma
das questões que nortearam este estudo, por entender que a direção social e política destas
entidades, assim como sua dinâmica de funcionamento, dependerão das concepções que
esses sujeitos portam, dos valores ético-políticos que defendem e dos fins que almejam.
Neste sentido, os dados coletados permitem analisar que a maioria apresenta uma
visão generalista, ampla sobre os conselhos, mas conseguem apontar elementos comuns que
caracterizam as particularidades desta entidade, destacando-se a dimensão do coletivo como
característica importante da natureza destas entidades. As falas abaixo demonstram este
entendimento:
“È um colegiado com membro de todos os segmentos da comunidade
escolar com a função de fiscalizar e gerir coletivamente a escola(entrevista
2, conselho D )
“É um órgão que fiscaliza e elabora projeto de que necessita a escola”
(entrevista 2, conselho A)
18
“É um conjunto de pessoas que representa a escola, para melhorar e
fiscalizar a administração escolar, eleitos pela própria comunidade escolar”
(entrevista 1, conselho E)
Nestes e noutros depoimentos percebe-se uma recorrência da expressão “fiscalizar”
referindo ao papel dos conselhos e esta relevância não aparece com a mesma incidência
noutras funções igualmente importantes como “deliberar” e “avaliar” a política educacional
no âmbito escolar, conforme o que estabelece os artigos 2º e 3º do próprio Estatuto Padrão
dos Conselhos Municipais da cidade de Pedra Branca-PB, o qual define a finalidade destes
colegiados:
(...) colaborar na formação e assistência do educando, por meio da
aproximação entre pais, alunos, funcionários e professores, promovendo a
integração: poder público-comunidade-escola-família”(Artigo 2º)
Contribuir para a solução de problemas inerentes à vida escolar (...)
(Artigo 3º).
Prevalece na maioria dos conselhos o entendimento de que o seu papel principal é
fiscalizar a aplicação dos recursos que são transferidos para a escola a exemplo do Programa
Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) e do Programa Dinheiro Direta na escola
(PDDE).
Através da análise das atas de reuniões e dos depoimentos coletados nas entrevistas,
os temas mais discutidos nas reuniões dos conselhos que são realizadas bimestralmente são:
definição dos gastos com os recursos do PNAE e PDDE e prestações de contas: o que vai
ser comprado? Quantidades? Procedimentos de pesquisas de preço etc. Os temas discutidos
esporadicamente são: desempenho pedagógico dos alunos e outros relacionados à rotina
administrativa da escola
As atas que foram analisadas neste estudo geralmente não apresentam um desfecho
das discussões feitas. Apresentam sumariamente os assuntos discutidos e não detalham os
encaminhamentos dados, o que prejudicou a realização de uma análise mais consistente
sobre as posições político-pedagógicas assumidas pelo colegiado.
Através da observação e análise dos depoimentos dos entrevistados e das atas das
reuniões, percebe-se que a discussão em torno dos aspectos financeiros – recebimento e
aplicação dos recursos – ocupam uma centralidade nas reuniões dos conselhos, o que
acarreta a restrição do debate em torno de outras questões que também constituem
19
atribuições dos colegiados, como os problemas decorrentes nas áreas pedagógicas e
administrativas.
A construção de uma gestão democrática da educação pública e do efetivo controle
social não tem foco exclusivo na eficiência e utilização racional dos recursos, mas privilegia
todos os aspectos constitutivos da dinâmica pedagógica da escola; busca superar as práticas
centralizadoras e autoritárias que têm marcado a história da administração escolar brasileira;
procura de fato consolidar os conselhos enquanto espaços de explicitação de conflitos, de
jogo de interesses diversos, porém, sobrepondo o interesse coletivo sobre os particulares e
assumindo o grande desafio, qual seja: do exercício da cidadania e do controle social
democrático.
Tais expectativas foram demonstradas pelos entrevistados quando afirmaram que:
(...) um conselho escolar só vem somar na melhoria da educação
(entrevistado 1, conselho A)
(...) pode melhorar [a educação] porque os membros do conselho
apresentam sugestões e debate os problemas ( entrevistado 1 conselho C)
O conselho contribui para a melhoria da gestão escolar e conseqüentemente
da educação como um todo (entrevistado 2, Conselho A)
Contudo não se pode deixar de registrar as dificuldades enfrentadas cotidianamente
para se implantar novas vivências sociais, novas práticas políticas na tentativa de se romper
com o tradicional paradigma da administração patrimonialista, clientelista, tutelada por
gestores que comumente são atrelados ao poder público.
O “fazer acontecer” pode encontrar dificuldades de diversas ordens: nas próprias
condições objetivas e materiais da instituição que impede muitas vezes a implementação de
ações e decisões deliberadas pelos conselhos e que são de sua competência encaminhar
soluções.
Neste sentido, os entrevistados nesta pesquisa apontaram alguns destes limites: falta
de transporte para realizar compras da merenda noutros municípios; assumir
voluntariamente (sem remuneração) a função de conselheiro; responsabilidade com a
distribuição de recursos; lidar com as diferenças de opiniões; falta de capacitação dos
conselheiros; conciliar as várias necessidades com os poucos recursos, etc
Se por um lado há condicionantes que dificultam a dinâmica de funcionamento dos
conselhos escolares como foi apontado acima, por outro, há que se apostar nesta nova forma
de conduzir o destino da escola, no sentido de chamar a todos para tomar parte deste
20
processo tão complexo que é o processo de educação enquanto dimensão da vida em
sociedade.
Nesta perspectiva, os conselheiros abordados nesta pesquisa propuseram estratégias
para que os conselhos se fortaleçam politicamente no exercício do controle social:
assegurando espaços para reivindicações dos alunos, professores, pais ou
responsáveis e comunitários, nas questões educacionais; serem [os
conselhos] mais participativos na gestão escolar, para conhecerem as
carências da escola, desde os alunos até a direção; atuar de forma sempre
democrática e participativa; e outras sugestões nesta mesma direção. (falas
dos entrevistados)
Identificar limites e possibilidades já indica que o grupo está construindo seu
caminho e buscando sua autodeterminação, o saber-fazer coletivo.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O atual paradigma de gestão educacional, diferentemente da perspectiva tradicional
centralizadora e autoritária, está embasado nos marcos regulatórios da Constituição Federal
de 1988 (Artigo 206) e na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB)
9.394/96,(Artigo 14), pautado nos princípios de participação e controle social, ou seja, no
acompanhamento da comunidade escolar das ações, programas e projetos da educação
através das diversas modalidades e níveis de organização popular, a exemplo dos conselhos
escolares, os quais constituem os espaços de participação popular mais próximo do
cotidiano das unidades de ensino.
Espera-se que estes espaços de participação não se configurem na perspectiva
neoliberal como apenas instituições burocráticas de legitimação de decisões pré-
estabelecidas por instâncias hierarquicamente superiores ao âmbito local. A demanda social
expressa pela sociedade é que estas entidades lutem pela construção de uma gestão
democrática da educação, através de um processo de participação política, no qual se efetive
a descentralização de poder e de condições materiais e financeiras para a implementação dos
projetos educativos em respostas aos reais interesses da comunidade escolar.
Considerando-se a questão norteadora deste estudo acerca da análise das potenciais
contribuições que os conselhos escolares do município de Pedra Branca têm para se efetivar
o controle social da educação a nível local, e com base nos depoimentos dos entrevistados e
21
da análise documental foi possível inferir que há uma relevante possibilidade para o
fortalecimento destes colegiados, a partir do próprio perfil dos conselheiros que favorece
uma evolução política da entidade, principalmente no que se refere às variáveis relativas à
sua escolaridade e à inserção de alguns em sindicatos e outros movimentos sociais. Tais
aspectos podem contribuir para uma maior dinamicidade e qualidade política do colegiado;
Por outro lado, constatou-se que os conselhos precisam enfrentar um dos principais
desafios: Romper com a recorrente tendência dos colegiados em atribuir uma supremacia à
dimensão da gestão dos recursos financeiros repassados à escola em detrimento do debate
mais geral em torno, também, de outras questões prioritárias, como os desafios pedagógicos
para superar os atuais indicadores de fracasso escolar (repetência, baixo desempenho escolar
etc).
Portanto, a construção da esfera pública; a consolidação de uma escola democrática,
gratuita e de qualidade para todo(as) é uma tarefa de todos nós na atualidade.
22
Mini Currículo
Nome : Damião Pereira de Lacerda
Graduação: Bacharel em Ciências Contábeis – Universidade Estadual da Paraíba -
UEPB
Emprego Atual:
- Diretor do Departamento de Empenhos da Prefeitura Municipal de Pedra
Branca/PB
- Contador da Câmara Municipal de Pedra Branca/PB
- Contador no Escritório de Contabilidade SERVCON em Itaporanga/PB
E-mail: [email protected]
23
REFERÊNCIAS
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BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Promulgada em 5/10/1998.
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Conselho Escolar, 2009.
WERLE, Flávia Obino Correia. Conselhos Escolares: implicações na gestão da escola
pública. Rio de janeiro: DP&A, 2003
26
Perfil do Entrevistado(a)
Entrevista n º_______
1 Segmento que representa: pais ( ) alunos( ) funcionários ( ) professores ( )
2 Sexo: M ( ) F ( )
3 Estado Civil: Casado(a) ( ) solteiro(a) ( ) viúvo(a) ( ) Outros ( )
4 Idade:
Menos de 15 anos ( )
De 15 a 20 anos ( )
Mais 20 até 30 anos ( )
Mais de 30 até 40 anos ( )
Mais de 40 anos
5 Escolaridade
Ensino Fundamental: ( )completo ( ) incompleto
Ensino Médio : ( )completo ( ) incompleto
Ensino Superior ( ) ( ) incompleto
Se ainda estuda, qual o ano?_________________
6. Renda Familiar
Até um S/M ( )
Mais de 1 até 3 S/M ( )
Mais de 3 até 5 S/M ( )
Mais de 5 S/M ( )
7 Participa de algum grupo organizado de sua cidade (associações, clube de mães, de jovens,
sindicatos, etc.)? ( )sim ( ) não
Qual(is)?_____________________________________________________________________
9. Tem alguma filiação partidária? ( ) sim ( ) não
27
Roteiro de entrevista
1 o que você entende por conselho escolar?
2 De que forma você foi eleito? (indicação? eleição?)
3 Você mantém contato com seus representados? De que forma? Se não mantém, porque?
4. De que forma você é convocado para as reuniões do conselho? Toma conhecimento da pauta com
antecedência?
5 Quais os assuntos mais debatidos no conselho?
6 As decisões (deliberações) são respeitadas, encaminhadas?
7 Você acha que um conselho escolar melhora, piora ou não altera a gestão da escola (da
educação)? Porquê?
8 Quais as maiores dificuldades de ser conselheiro?
9 Como um conselho escolar poderá contribuir para a melhoria da educação?
10 Participa das reuniões dos conselhos escolares? Sim ( ) não ( )
Com qual freqüência? Mensal ( ) bimestral ( ) semestral ( )