VALIDAÇÃO DO QUESTIONÁRIO DE BEM-ESTAR ESPIRITUAL: RESULTADOS
PRELIMINARES PARA O CONTEXTO BRASILEIRO
Karina Dohms (Colégio Marista Assunção)
Tárcia Rita Davoglio (PUCRS)
Carla da Conceição Lettnin (CAp/UFRGS)
RESUMO: O bem-estar espiritual (BEE) é um construto dinâmico e multifatorial, que se reflete
na qualidade das relações interpessoais, sofrendo influências da cultura na qual o indivíduo se
insere. Tendo em vista essas características, as pesquisas atuais sobre BEE tem priorizado a
utilização de medidas padronizadas. O presente estudo, de cunho quantitativo, tem como principal
objetivo iniciar o processo de validação do Questionário de Bem-estar Espiritual de Gomez e
Fisher (2003; Spiritual Well-being Questionnaire, SWBQ), para a população brasileira, a partir da
adaptação da versão já validada em Portugal. O questionário possui 20 itens respondidos em uma
escala do tipo Likert de cinco níveis, que avaliam quatro domínios: pessoal, comunitário, ambiental
e transcendental. Participaram deste estudo 176 discentes, com idades entre 14 e 18 anos,
estudantes do Ensino Médio de uma escola federal da rede pública de Porto Alegre/RS. A versão
utilizada baseou-se na escala já traduzida/adaptada para o Português de Portugal, demandando
apenas por ajustes ortográficos e gramaticais ao Português do Brasil, sem necessidade de
alterações semânticas. As análises preliminares dos dados quantitativos coletados até o momento,
com a amostra brasileira, evidenciaram que a versão brasileira do instrumento (SWBQb) apresenta
boa consistência interna global dos itens e das dimensões. A análise fatorial exploratória confirmou
a estrutura interna de quatro fatores para o instrumento, similar a encontrada nos estudos
internacionais, sugerindo a dimensão Transcendental do bem-estar espiritual como sendo a mais
sólida e consistente. A análise dos dados coletados apontou que, independentemente do
agrupamento dos itens apresentados para amostras portuguesas e brasileiras, os resultados médios
encontrados nas dimensões do BEE não sofreram diferenças significativas. Os resultados
preliminares desse estudo são promissores e indicam a relevância da continuidade do processo de
validação do instrumento visando a sua utilização em pesquisas sobre bem-estar espiritual no
contexto brasileiro.
Palavras-chave: Bem-Estar Espiritual; Avaliação; Evidências psicométricas.
Introdução
Frente aos atuais desafios encontrados na Educação, em especial na educação básica, que
vem sofrendo com a desvalorização da profissão docente, a falta de recursos humanos, financeiros
e materiais, aumento da violência, carência de estrutura física adequada e baixos salários dos
trabalhadores, surge a demanda pela ênfase nos aspectos espirituais do ser humano. A presente
pesquisa, portanto, aborda a dimensão espiritual do construto bem-estar, a qual se reflete na
qualidade das relações interpessoais, podendo sofrer influências da cultura na qual o indivíduo está
inserido.
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EdUECE - Livro 303997
O conceito de bem-estar espiritual está atrelado às relações com os outros, consigo mesmo
e com o transcendente e, também, faz menção às emoções. Um incremento na dimensão espiritual
pode proporcionar à pessoa um olhar para si (autoconhecimento), sua essência, sua fé, seus valores,
na constante busca de sentido e significado da vida, levando ao reconhecimento do outro. Segundo
Fisher (1999) o bem-estar espiritual deve ser entendido como uma forma, dinâmica, de estar que
reflete na qualidade das relações que cada pessoa estabelece nos domínios da existência humana:
pessoal, comunitário, ambiental e transcendental.
Com base nesse conceito, este estudo tem como objetivo apresentar resultados preliminares
do processo de validação do Questionário de Bem-estar Espiritual, denominado SWBQ, por
Gomez e Fisher (2003), para uma amostra brasileira (SWBQb), a partir da adaptação portuguesa
(SWBQp) de Gouveia, Marques e Pais Ribeiro (2009), bem como apontar os resultados
encontrados sobre essa variável e suas dimensões a partir da coleta de dados. O Questionário de
Bem-estar Espiritual (SWBQb) consiste em um questionário de autopreenchimento com 20 itens,
redigidos de forma positiva, que avaliam os quatro domínios propostos por Fisher (1999), a partir
do conceito de bem-estar espiritual, anteriormente exposto.
Referencial teórico
Estudos abordando a temática do bem-estar estão cada vez mais em evidência, a maioria
apoiando-se nos pressupostos da Psicologia Positiva. Segundo Snyder e Lopez (2009), a Psicologia
Positiva está direcionada para a identificação e compreensão de qualidades e virtudes humanas, e
ao auxílio, no sentido de que as pessoas tenham vidas mais felizes e produtivas. Nesse sentido, a
Psicologia Positiva vislumbra que o futuro do ser humano é fazer-se melhor, pois é capaz de
transformar sua vida, se quiser, investindo na busca de sentido, no amor, na alegria e na
espiritualidade com vistas na saúde e bem-estar.
Gouveia, Marques e Pais Ribeiro (2009, p. 286) destacam que a investigação a respeito da
Espiritualidade relacionada à saúde “conduziu a emergência do conceito de Bem-estar Espiritual
(BEE) e espelha a importância crescente atribuída à dimensão espiritual para o bem-estar”.
Não é difícil perceber que, ao longo da história da humanidade, a espiritualidade esteve
sempre presente, seja através dos cultos religiosos, das celebrações em agradecimento, por
exemplo, a colheita e a chuva (entre outras), seja nos valores humanos como a persistência, a
perseverança, a esperança, e tantas outras situações de vida. Porém, as dificuldades encontradas
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EdUECE - Livro 303998
para tratar sobre o tema foram surgindo gradativamente com o avanço das pesquisas científicas,
as quais trouxeram consigo uma gama de resultados comprováveis.
Portal (2007, p. 288) ressalta a necessidade do aprofundamento nos estudos relacionados à
espiritualidade e suas implicações, bem como o investimento na Educação mais ampla,
valorizando a complexidade do processo de formação do ser humano, em uma abordagem centrada
em um ser “de inteireza (autoformação – mente, corpo, coração, espírito), orientando-o individual
e coletivamente no exercício de ampliação de sua própria consciência com significativas
repercussões para uma vida mais plena, digna de qualidade”. A autora destaca a importância e
necessidade de maior investimento nas dimensões constitutivas do ser – considerando o sujeito um
ser social que é, físico, racional, emocional e espiritual – e salienta o mérito de uma cultura
educacional ‘verdadeiramente integral’, capaz de reconhecer a inseparabilidade do corpo, mente,
coração e do espírito.
Pesquisas com docentes universitários (PORTAL, 2007, 2008) evidenciaram que a
dimensão do bem-estar menos desenvolvida, aquela com menor investimento e atenção dos
participantes, foi a espiritual. Esses resultados não surpreendem, uma vez que no mundo atual,
vive-se uma correria que automatiza muitas ações, as preocupações já estão focadas no amanhã e
as cobranças laborais são cada vez maiores, deixando as pessoas mais centradas na dimensão
produtiva e racional. No entanto, é importante que haja equilíbrio, oportunidades e tempo para
dedicar-se aos assuntos relacionados às demais dimensões, pois todas são inseparáveis e
interdependentes, e quando há desequilíbrio nos investimentos pessoais – dessas dimensões
constitutivas do ser humano –, pode desencadear mal-estar, que em níveis elevados pode levar ao
adoecimento.
Jesus (2004) ressalta que crianças, jovens e adultos, por conta de processos inadequados,
estão cada vez mais doentes, pois, a falta de capacidade do sujeito frente às exigências que lhe são
impostas geram mal-estar. Elevar o bem-estar, especialmente associado ao desenvolvimento da
espiritualidade, converte-se, então, em um desafio para a sociedade atual. Mosquera e Stobäus
(2012) acreditam que não há uma idade final para o desenvolvimento espiritual do ser humano,
visto que a construção da espiritualidade acompanha a construção de si mesmo e o reconhecimento
da sua integralidade.
Moraes (2005) lembra que, atualmente, também se testemunham as carências humanas, de
conhecimento, educação, qualidade de vida, sobretudo, de afetividade e de espiritualidade.
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Segundo Snyder e Lopez (2009), diversos psicólogos positivos levam em consideração a hipótese
de que nossa busca pelo sagrado aprimora o entendimento mais profundo de si mesmo e da própria
vida, bem como, esses caminhos, podem levar ao bem-estar ou estar associado a ele, levando
conforme Mahoney et al. (2005), aos verdadeiros benefícios da espiritualidade na vida humana: o
propósito e sentido.
O ser humano em sua inteireza pressupõe que todos estes aspectos estejam presentes em
cada relação estabelecida, das mais superficiais às mais sólidas. A afetividade, razão,
espiritualidade estarão envolvidas dinamicamente em cada vivência, sendo impossível separar,
compartimentar, categorizar o ser humano na sua interação com o(s) outro(s) e/ou com o meio.
Considerando, assim, que o reconhecer-se ocorre durante toda a vida, é vital buscar
equilibrar essas dimensões que constituem cada ser humano como inteiro. Geralmente, o que
ocorre é que em determinadas situações de vida se está focado e/ou investindo mais em uma
dimensão do que nas outras. E aqui emerge o maior desafio, o de buscar sempre um
aprofundamento para reconhecer a própria essência, aprimorando as percepções pessoais, na
tentativa de contemplar-se como um ser integral. Por isso, não há uma idade ou tempo
determinado, pois o sujeito é um constante vir a ser, fazer, sentir, refletir, conhecer e elucidar.
Do ponto de vista científico, a investigação do bem-estar espiritual pressupõe o uso de
ferramentas adequadas e de estudos sistemáticos que permitam melhor compreender esse processo
de evolução do ser humano e suas manifestações e invariâncias através das culturas. Nessa
perspectiva, os estudos realizados por Fisher (1999, 2010, 2012) e Gomez e Fisher (2003, 2005)
levaram ao desenvolvimento do Spiritual Well-being Questionnaire (SWBQ). O SWBQ foi
construído a partir de revisões da literatura sobre o tema e de estudos qualitativos prévios,
permitindo a confirmação do modelo estrutural de quatro fatores para o bem-estar espiritual, os
quais refletem os principais domínios da existência humana.
Gouveia, Pais Ribeiro e Marques (2012, p.141) destacam que Fisher propõe o conceito de
Bem-estar Espiritual, como sendo
uma forma de estar dinâmica que se reflete na qualidade das relações que o indivíduo
estabelece em quatro domínios da existência humana, isto é, consigo próprio (domínio
pessoal), com os outros (comunitário), com o ambiente (ambiental) e com algo ou alguém
que transcende o domínio humano (transcendental).
Gouveia, Marques e Pais Ribeiro (2009, p. 286), destacam que o domínio pessoal refere-
se à forma como a pessoa se relaciona consigo, com respeito ao significado, propósito e valores
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de vida. Pressupõe o desenvolvimento de autoconhecimento e consciência sobre si mesma,
relacionados com a identidade e a autoestima. O domínio comunitário refere-se à qualidade e
profundidade das relações interpessoais relacionadas à moralidade, cultura e religião, incluindo
sentimentos de amor, justiça, esperança e fé na humanidade. O domínio ambiental consiste nas
relações com o mundo físico e biológico (cuidar e proteger), sendo expresso por meio da admiração
e de sentimentos de união com a natureza. E o domínio transcendental refere-se à própria relação
com algo ou alguma coisa para além do que é humano, “nomeadamente uma força cósmica, uma
realidade transcendente, ou Deus, e se expressa através do culto e adoração relativamente à fonte
de mistério do universo”.
Os quatro diferentes domínios podem se desenvolver interativamente, pois, o efeito
combinado descreve o bem-estar espiritual global do indivíduo. Gouveia, Pais Ribeiro e Marques
(2012) ainda lembram que as concepções a respeito deste conceito podem ser influenciadas por
fatores culturais que se expressam entre culturas ou dentro de uma mesma cultura. Segundo os
autores, o bem-estar espiritual, pode, então, apresentar variações significativas entre grupos
distintos, levando a necessidade de testar os instrumentos (pesquisa) que buscam avaliá-lo,
considerando diferentes sistemas de crenças e valores de culturas diferentes.
No entanto, instrumentos de medida, como o SWBQ, utilizados na pesquisa científica
exigem que suas propriedades psicométricas sejam testadas com diferentes amostras e em
diferentes contextos para que os resultados obtidos possam ser generalizados. O SWBQ vem sendo
utilizado em estudos transculturais em diversos países, tendo a sua consistência interna e validade
fatorial global confirmadas (GOUVEIA et al., 2009; GOUVEIA et al., 2012). A versão original,
SWBQ, apresentou consistência interna global de 0,88 em diferentes subamostras, com alfa
variando de 0,76 a 0,95 (GOMEZ e FISHER, 2003, 2005). Já a versão portuguesa (SWBQp),
obtida por meio do processo de tradução-retradução e testada em uma amostra de 452
participantes, obteve consistência interna global de 0,88, com as dimensões apresentando
variações de alfa entre 0,74 e 0,89 (GOUVEIA et al., 2009), e 0,91 para uma amostra específica
de praticantes de atividades físicas de inspiração oriental (GOUVEIA et al., 2012).
A seguir serão apresentados resultados preliminares do processo de validação do
Questionário de Bem-estar Espiritual, SWBQ, de Gomez e Fisher (2003) para a uma amostra
brasileira, a partir da adaptação portuguesa, SWBQp, de Gouveia e colaboradores (2009). A versão
brasileira do Questionário de Bem-estar Espiritual (SWBQb) avaliou os quatro domínios já
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reconhecidos pela estrutural fatorial do instrumento: pessoal, comunitário, ambiental e
transcendental.
Materiais e Método
Participaram deste estudo 176 discentes, com idades entre 14 e 18 anos, estudantes do
Ensino Médio de uma escola federal da rede pública de Porto Alegre/RS. Destes estudantes, 58
(33%) frequentavam o primeiro ano, 58 (33%) o segundo ano e 60 estudantes (34%) o terceiro ano
do Ensino Médio, sendo 95 estudantes mulheres (54% do total) e 81 homens (46% do total).
Todos os estudantes receberam o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido e de
Assentimento (TCLEA), devolvendo uma cópia assinada por seus responsáveis autorizando sua
participação no estudo. Esta pesquisa foi aprovada pela Comissão de pesquisa da Faculdade de
Educação da PUCRS (n. 89/2013) e está inscrito e aprovado na Plataforma Brasil (n.
16844813.5.0000.5336).
Os participantes do estudo responderam ao Questionário de Bem-estar Espiritual, versão
brasileira (SWBQb), a partir da versão portuguesa adaptada e validada por Gouveia, Pais Ribeiro
e Marques (2009), que possui 20 itens, respondidos em uma escala do tipo Likert com 5 níveis (1-
“muito pouco” até 5- “muitíssimo”), avaliando quatro domínios: pessoal, comunitário, ambiental
e transcendental. O instrumento foi aplicado no final do ano de 2013, como parte de uma pesquisa
mais ampla sobre o bem-estar institucional, na qual se propõe investigar os níveis de bem-estar de
docentes, discentes, gestores e funcionários em duas Instituições de Ensino.
A consistência interna para o SWBQb foi obtida por meio do coeficiente alfa de Crombach
e a estrutura interna testada pela análise fatorial exploratória. O objetivo da análise fatorial
exploratória é permitir a confirmação da estrutura fatorial de um determinado instrumento de
pesquisa, através da determinação das variáveis latentes que melhor representam o conjunto de
variáveis observadas, estas por sua vez, quando apresentam variância em comum constituem um
mesmo fator (BROWN, 2006).
Resultados e discussão preliminares
A versão para o português do Brasil, SWBQb, demandou apenas pela revisão
gramatical/ortográfica dos itens da versão portuguesa (SWBQp), considerando a substancial
similaridade semântica entre as versões. Assim, durante o teste piloto, foi possível evidenciar a
necessidade de adaptar a escrita dos itens e das instruções. Por exemplo, a frase “Em que medida
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você se sente a desenvolver” foi substituída para a população brasileira, por: “Em que medida você
sente que está desenvolvendo”.
A versão brasileira (SWBQb), utilizada neste estudo, manteve os 20 itens do questionário
da versão portuguesa (SWBQp), já incluindo a modificação linguística do item 9, sugerida por
Gouveia e colaboradores (2012). Porém, o item 8 foi apresentado pelos autores portugueses, na
versão disponibilizada para este estudo, com o seguinte texto “a confiança entre as pessoas”, ao
invés de incorporar a modificação sugerida por Gouveia e colaboradores (2012), ou seja, “relação
de confiança com os outros”.
De acordo com o modelo conceitual de Fisher, a qualidade das relações em uma das
dimensões do bem-estar espiritual contribui, simultaneamente, para o aprofundamento e a
complexificação das relações nas demais dimensões, evidenciando a natureza correlacionada do
construto (GOUVEIA, MARQUES e PAIS RIBEIRO, 2009). A análise fatorial exploratória
realizada utilizou, portanto, a rotação oblíqua Promax. A medida de Kaiser-Meyer-Olkin verificou
a adequação amostral para a análise (KMO = 0,853), revelando que os quatro fatores atenderam
ao critério de autovalor (>1), explicando 66,95% da variância total. A consistência interna da
escala na amostra brasileira testada evidenciou α= 0,90, demonstrando elevada consistência interna
dos itens. Entre os fatores, sem a exclusão de nenhum item, os resultados atuais apontam que a
dimensão Comunitária é a que apresenta menor consistência interna (0,78), seguida pela Pessoal
(0,86) e Ambiental (0,86). A dimensão Transcendental foi a que obteve maior consistência interna
entre as demais (0,91).
A Tabela 1, apresenta os resultados da análise fatorial para a SWBQb, com as cargas
fatoriais correspondentes a cada item, a qual reproduziu o modelo estrutural de quatro dimensões,
com apenas três itens (5, 8, 17) apresentando variações em relação ao modelo teórico já validado
para a escala. As cargas fatoriais variaram de 0,27 (item 8) a 0,96 (item 10). Duas dimensões, a
dimensão Ambiental (itens 4, 7, 10, 12 e 20) e a dimensão Transcendental (itens 2, 6, 11, 13 e 15)
não evidenciaram alterações na amostra brasileira testada em relação ao modelo estrutural, o que
não se observou nas demais dimensões. Desse modo, a dimensão Pessoal ficou composta por cinco
itens (14, 16, 18, 9 e 17) e a dimensão Comunitária reteve apenas 5 itens (1, 3, 5, 19 e 8). Porém o
item 17 carregou também na dimensão Comunitária com pouca diferença na carga fatorial
apresentada na dimensão Pessoal (0,50 e 0,46 respectivamente). Além disso, o item 8, nesta
amostra, localizou-se na dimensão Comunitária (0,27) como no modelo estrutural, contudo,
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carregou também na dimensão Pessoal (0,26), sendo o item da escala com menor carga fatorial. Já
o item 5, que deveria estar pelo modelo estrutural localizado na dimensão Pessoal, nessa amostra,
compõe a dimensão Comunitária. Entende-se que alguns itens, de fato, podem estar
correlacionados com as duas dimensões, sendo esta indefinição não incompatível com a descrição
das dimensões.
O estudo realizado por Gouveia, Marques e Pais Ribeiro (2009) já indicava as dimensões
Pessoal e Comunitária como as de menor consistência e a Transcendental como sendo a mais
sólida. Também ressaltam os autores, que a qualidade das relações estabelecidas em uma dimensão
do BEE estará simultaneamente contribuindo para o desenvolvimento e aprofundamento das
relações nas demais dimensões.
No entanto, os estudos portugueses (GOUVEIA et al., 2009; GOUVEIA et al., 2012) já
haviam assinalado algumas incongruências com o item 8, sugerindo, inclusive, a exclusão do
mesmo. Neste estudo, embora a carga fatorial apresentada seja inferior ao valor
convencionalmente aceito para reter um item (0,40), salienta-se que a correlação item-total da
escala se manteria praticamente inalterada com a exclusão do item 8, permanecendo α=0,90. Por
outro lado, a exclusão do item 8 produziria pequena elevação na consistência item-total da
dimensão Comunitária, de 0,78 para α=0,80.
Ainda com relação à consistência interna dos fatores, os resultados atuais apontam que a
retirada do item 17 da dimensão Pessoal diminuiria a correlação item-total de 0,86 para α=0,83.
Se o item 17 fosse incluído na dimensão Comunitária a consistência interna desta dimensão
aumentaria de 0,78 para α=0,83. Com isso, apesar da indefinição fatorial deste item neste estudo,
ele parece ajustar-se melhor à dimensão Comunitária, como proposto no modelo estrutural já
conhecido. Nota-se, contudo, a necessidade de observar como o item se apresenta em novas
análises com amostras brasileiras mais robustas. Apesar dessa variação do posicionamento de
alguns itens na composição dos fatores encontrada entre os modelos apresentados por Portugal e
nesta amostra do Brasil, o cálculo das médias das dimensões que compõem o BEE não demonstrou
diferenças relevantes neste estudo.
Conforme apontado na tabela 2, a dimensão Pessoal é aquela de maior investimento, em
ambos os modelos, atingindo no modelo português Mpt= 3,38 (dp= 0,92) e no modelo brasileiro
Mbr= 3,38 (dp= 0,98), na sequencia encontra-se a dimensão Comunitária Mpt= 3,32 (dp = 0,88) e
Mbr= 3,32 (dp= 0,81), seguido das dimensões Ambiental e Transcendental, que apresentaram os
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mesmos itens, sendo, respectivamente, M= 3,15 (dp= 0,95) e M= 2,53 (dp= 1,16). A amostra de
estudantes pesquisada, independente do modelo avaliado, está desenvolvendo o seu bem-estar
espiritual na ordem de M= 3,09 (dp= 0,73). Como já citado anteriormente, Gouveia, Pais Ribeiro
e Marques (2012) afirmam que a cultura pode influenciar esses resultados, demonstrando a
necessidade de investigação sobre os princípios norteadores do trabalho pedagógico desenvolvido
na instituição, os valores formativos oriundos das famílias e da comunidade em que o sujeito está
inserido. É prudente salientar que esses são resultados preliminares e necessitam de estudos mais
aprofundados, com análises confirmatórias, para validá-los.
Considerações finais
Nas análises fatoriais exploratórias são esperadas algumas variações dos itens na
composição dos fatores latentes de um instrumento de medida, devido a própria natureza desse
tipo de análise, que pressupõe que os itens se agrupem livremente. Tais alterações devem, porém,
reproduzir-se em diferentes amostras para que possam ser consideradas para fins de interpretação
com base em aspectos transculturais. Além disso, a exclusão de algum item de uma escala deve
ser considerada apenas depois do modelo ter sido suficientemente testado no contexto em que o
instrumento será utilizado, por meio de amostras robustas e diversificadas.
Os resultados psicométricos encontrados até o momento para o SWBQb, ainda que
incipientes e obtidos com uma amostra preliminar, confirmam a invariância fatorial do modelo,
através das culturas. Corroborando a validação portuguesa do SWBQ, este estudo brasileiro sugere
que a dimensão Transcendental do bem-estar espiritual, testado por meio do SWBQb evidencia-
se como a mais sólida e a Comunitária e a Pessoal demonstram-se as menos consistentes em termos
de cargas fatoriais e invariância dos itens.
Os resultados preliminares, embora promissores, demandam pela continuidade do processo
de validação do SWBQb, com a ampliação do tamanho amostral e a realização de análises
estatísticas mais aprofundadas para o modelo estrutural, sendo já previstas análises fatoriais
confirmatórias. Salienta-se, assim, a relevância da continuidade do processo de validação do
instrumento visando a sua utilização em pesquisas sobre bem-estar espiritual no contexto
brasileiro.
Referências
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ANEXOS
Tabela 1 - Resultados da Análise Fatorial Exploratória* para o SWBQb para amostra de
estudantes brasileiros ( n=176)
Item Dimensão
Transcendental
Dimensão
Pessoal
Dimensão
Ambiental
Dimensão
Comunitária
Modelo
Estrutural
SWBQ**
Itens 2,6,11,
13,15
Itens 5,9,
14,16,18,17
Itens 4,7,
10,12,20
Itens 1, 3,
5, 19, 8
Item 11 0,95
Item 2 0,94
Item 13 0,79
item15 0,78
Item 6 0,78
Item 14
Item 16
Item 18
Item 9
Item 17
0,82
0,81
0,80
0,55
0,50
0,46
Item 10
Item 4
Item 20
Item 7
Item 12
0,96
0,79
0,71
0,71
0,66
Item 1 0,78
Item 3
Item 5
Item 19
074
0,69
0,53
Item 8 0,26 0,27 Nota: *Extração pelo método de componentes principais com rotação promax. Dimensões apresentadas pela ordem
de relevância na extração.** Modelo estrutural por análise fatorial confirmatória para SWBQp (GOLVEIA ET AL,
2012). Fonte: SPSS Statistics 17 (Windows & Mac).
Didática e Prática de Ensino na relação com a Sociedade
EdUECE - Livro 3031007
Tabela 2 – Médias e desvios padrão do BEE para as dimensões do modelo fatorial do SWBQ,
de acordo com a variação da posição dos itens (n=176)
Variáveis
Modelo estrutural
original
Modelo do estudo
brasileiro*
M DP M DP
BEE global 3,09 0,73 3,09 0,73
Dimensão pessoal 3,38 0,92 3,38 0,98
Dimensão comunitária 3,32 0,88 3,32 0,81
Dimensão ambiental 3,15 0,95 3,15 0,95
Dimensão transcendental 2,53 1,16 2,53 1,16 *Modelo brasileiro apresenta diferenças na composição da dimensão Pessoal e Dimensão Comunitária em relação
ao modelo estrutural original. Fonte: SPSS Statistics 17 (Windows & Mac).
Didática e Prática de Ensino na relação com a Sociedade
EdUECE - Livro 3031008