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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
OPRESSÃO E LUTA NA PAULICEIA DOS ANOS 20 E 30
MARCELO TAVARES DOS SANTOS
SÃO PAULO2010
UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
OPRESSÃO E LUTA NA PAULICEIA DOS ANOS 20 E 30
Trabalho apresentado na disciplina Indústria, Desenvolvimento Econômica e Projeto Nacional no Brasil, sob a orientação da Prof. Dr. Alexandre de
Freitas Barbosa
SÃO PAULO2010
Sumário
Introdução.............................................................................................................................3
Desenvolvimento..................................................................................................................4
Considerações finais.............................................................................................................9
Referências.........................................................................................................................10
Introdução
Neste excerto será elucidada a situação social da classe trabalhadora paulistana nas segunda
e terceira décadas do século XX.
O tema foi escolhido em virtude de fazer intrínseca relação com o de desenvolvimento da
industrialização no Brasil, pois São Paulo representa o centro sobrepujante desse processo.
O presente estudo poderá contribuir àqueles interessados em adquirir conhecimento sobre a
convivência entre industriais e empregados no período supra citado.
De pronto, mostraremos um panorama geral da urbe à época. Posteriormente, haverá o
desenvolvimento do referido assunto. Finalizaremos com as nossas considerações.
Desenvolvimento
Da fazenda à indústria
Nas últimas três décadas dos Oitocentos é que houve uma sensível aparição das indústrias
por aqui, sob a forma de pequenos estabelecimentos, onde os setores indumentário e gráfico
ganham relevo. Citamos as províncias de Rio de Janeiro, Bahia e, um pouco depois, São Paulo. Os
sul-americanos baseavam-se na produção de matérias-primas, com custo e retorno lucrativo em
patamares bem mais inferiores com relação aos produtos das nações mais avançadas. A transação
comercial era feita com a Inglaterra, mormente.
O racionalismo capitalista vai se propagando pelo solo tupiniquim, tornando incompatível a
existência do escravo, cada vez sendo objeto mais caro que o imigrante assalariado. Os primeiros
europeus que pra cá aportaram, por volta de meados desse século, não tinham vida muito diferente
da do negro. Eram vistos com inferioridade em comparação com os trabalhadores livres que na terra
“brasilis” havia. Entrementes, os primeiros proletários daqui eram, homens e mulheres pobres e
menores órfãos, destinados às fábricas. Com a superexploração, os primeiros conflitos de classes
capitalistas emergiam.
Nessa nação pioneira da industrialização, há pouco mais de um século antes, já existiam os
primeiros teares mecânicos, trazendo nova divisão de trabalho e simplificação progressiva do
esforço manual na produção. Em nosso primeiro surto, os britânicos já estavam na segunda fase da
Revolução Industrial, substituindo a energia hidráulica pela tecnologia a vapor e, até mesmo, com o
uso da eletricidade.
Além dos capitalistas ingleses que aqui investiam, a acumulação de capital com a exploração
do café propiciou o aparecimento duma burguesia industrial e urbana nacional. Ferramentas e
máquinas de produção usadas começaram a ser importadas para produzir bens de consumo não
duráveis.
Na virada do século, o investimento em setores de infraestrutura, como transporte e energia
era cada vez mais necessário. Bancos já surgem, visando o financiamento aos projetos de expansão
dos negócios empresariais. Cada vez mais, o Brasil estava inserido no mercado mundial, mas de
forma muito dependente, como sempre.
Após a Primeira Grande Guerra ficou claro que a Pauliceia saia da condição provinciana
para se tornar a mais industrializada da nação. A consequente imigração foi importante. Essa nova
forma de aglomeração populacional propicia uma forma mais eficiente para os mercados
consumidor e de trabalho.
Os grandes prédios que já estavam, começaram a ter uma nova companhia: as edificações
industriais exigentes de grandes espaços. A mutação do antigo para o moderno era flagrado nas
derrubadas ou mudanças dos prédios com representação histórica, como o Convento dos
Franciscanos, em 1934.
Cerca de sessenta mil prédios em 1919 passaram para um número quatro vezes maior em
vinte e cinco anos, alcançando um raio de aproximados quinze quilômetros de distância do centro.
Os problemas também se intensificaram: trânsito, higiene, estética. Aumentou-se o contraste
entre as áreas mais abastadas, residenciais, com áreas verdes, próximas da Avenida Paulista, tais
como, Pacaembu e Higienópolis; e as inferiores, em conjunto com as indústrias, fábricas e oficinas.
As edificações mais recentes levantadas no fim dos Oitocentos, deixaram de chamar tanta atenção
diante dos novíssimos arranha-céus, influenciados pela arquitetura dos países de capitalismo
avançado. Parques, praças e jardins públicos começaram a ser planejados. Rios precisaram ser
canalizados, como o Tietê e Tamanduateí, para atender a nova demanda e diminuírem as constantes
crises de abastecimento, sobretudo, nos períodos de estiagem.
Em virtude do descontrole do poder público sobre a cidade, os problemas ambientais graves
surgiram, como a poluição dos rios que a atravessam, e sonora.
As relações comerciais apresentaram grande incremento com o Mercado Municipal, além de
feiras, ambulantes. Em 1937, o número de indústrias era de, mais ou menos, três mil, sendo que oito
anos depois, ele praticamente triplicou. Os ramos têxtil, madeireiro, mecânico e alimentício se
destacavam.
Nos anos 30, o pavimento começou a tornar-se marca da cidade, através da abertura de
túneis, viadutos e pontes, bem como o prolongamento de novas vias, como a Nove de Julho, a fim
de melhorarem a circulação dos veículos automotores. Facilitaram a expansão de novos bairros
próximos a circunscrição central. Outrossim, os suburbanos começaram a irradiar-se, distantes em
até trinta quilômetros do núcleo, sem planejamentos e interligações.
Os bondes deixaram de ser usados no começo dos 20, com o aparecimento dos primeiros
ônibus, que paulatinamente foram aumentando sua capacidade, conforto e áreas de circulação.
Interessante observar que houve também a expansão duma zona hortifrutigranjeira nas
cidades vizinhas, como Guarulhos e Cotia, produzindo legumes, leite, frutas.
Cabe também a fundação de universidades, como a de São Paulo e a Pontifícia Católica.
Uma parte considerável da intelectualidade nacional aqui estava, por exemplo, Mário de Andrade,
Alcântara Machado, Sérgio Buarque de Holanda, Guilherme de Almeida. Imponentes monumentos
e igrejas são planejados. Anterior ao período trabalhado, já havia a Pinacoteca e a Sociedade de
Cultura Artística.
Para ajudar a transformar São Paulo numa cidade mundial, além dos europeus, vieram os
sírios, situados na Santa Ifigênia, os japoneses, na Liberdade; e os judeus, no Bom Retiro.
Trouxeram, além de inúmeras práticas, como as religiosas e gastronômicas, objetos de sua nação de
origem para comércio.
A vida dos sobreviventes
Segundo o “Recenseamento Operário da Capital”, realizado em 1927, pelo Departamento de
Ordem Política e Social (DOPS), na cidade de São Paulo, havia aproximadamente 204.000
operários, onde 55.000 eram autônomos, exercendo atividades como pedreiros, carpinteiros,
pintores, eletricistas, jornaleiros e motoristas de veículos à tração animal. Existiam cerca 3.500
estabelecimentos industriais e comerciais, com diversas atividades: construção, mecânica, vestuário,
bebidas, metais, bares, telefonia, transporte e limpeza pública. Esses trabalhadores eram em geral
imigrantes e seus descendentes, aglutinados em bairros operários, populosos, pobres e sem higiene,
situados na parte baixa, ao contrário dos bairros ricos, vivido pela elite, inclusive por industriais, na
parte alta da urbe.
As terras dos bairros da várzea, bem mais baratas, eram adquiridas pelos empresários, onde
fixavam seus estabelecimento juntamente com o proletariado. Na parte leste: Brás, Moóca, Belém,
Pari; próximo ao centro: Barra Funda, Bom Retiro, Bela Vista; ademais, havia em outras áreas mais
distantes: Lapa, Ipiranga, Penha. Apresentavam pequeno comércio. As habitações eram precárias,
ausentes de luz e ventilação, tetos baixos. A maioria dos trabalhadores eram inquilinos de casas com
três cômodos. Uma parcela significativa vivia em cortiços e porões, mais baratos. Havia casas sem
saneamento básico. Não era de se estranhar o surgimento de patologias como sarampo, disenteria,
tuberculose. A média dos moradores por habitação superava o número de cinco. As edificações,
muitas vezes construídas pelos próprios industriais, situadas em locais indignos, eram de baixa
qualidade e de custo, o que tornava aos construtores um negócio altamente lucrativo. Evidente era o
descaso público, apesar das proposições expertas para melhorias das condições de higiene das
habitações e do transporte público, que poderia ajudar no saneamento físico e moral, bem como
rebaixar o nível das tensões sociais, apresentadas através da criminalidade, por exemplo.
Na década de 20, era normal o desrespeito a legislação em relação ao regime de oito horas
diárias e também à proibição de empregar menores de doze anos. Nos anos 30, o salário médio de
um homem era de 200 mil-réis. As mulheres para perceberem o mesmo valor, tinham que trabalhar
mais horas diárias. Os trabalhadores do ramo têxtil eram mal pagos. Ferroviários, metalúrgicos,
desenhistas, escrivães, tipógrafos, telegrafistas ganhavam um pouco mais que a maioria. As classes
mais humildes alimentavam-se mal e vestiam-se de forma precária, gastando mais da metade com
esses itens. As famílias operárias possuíam poucas peças, as quais se destinavam mormente para o
trabalho. Os alimentos eram comprados em feiras, preços menores e pagamento à vista, pelos
menos pobres; aqueles de pior situação, adquiriam junto às vendas, com pagamento a prazo. O
dispêndio com a moradia era alto, podendo representar um quarto da renda familiar.
A Escola Livre de Sociologia e Política fez diversas pesquisas sobre os salários, habitação,
vestuário e alimentação a fim de conhecer o padrão de vida do trabalhador comum. Flagrantemente,
estavam recolhendo informações aos industriais e comerciantes. Era importante, à época, destinar o
conhecimento científico para melhorar a formação do caráter e da raça. As classes mais baixas eram
consideradas ignorantes, descuidadas em relação à higiene básica. Necessidade de educação era
assinalada, que enfatizasse, entre outros aspectos, a eugenia. Criou-se o Parque Infantil Pedro II,
para uma recreação sã das crianças, a fim de formá-las com bons valores. Outras formas, como
jogos recreativos e bibliotecas, foram criadas para estimular a solidariedade e a comunicação entre
aqueles que se encontrariam em condições mais vulneráveis aos hábitos prejudiciais.
O Instituto de Higiene, constatou que os alimentos ricos em proteínas e cálcio (carnes, ovos,
leite) eram menos adquiridos por causa dos preços mais elevados, enquanto que a nutrição dos
energéticos (pão, arroz, massas) era superior. Em caso de doenças, procurava-se a Santa Casa e
outras associações beneficentes. Poucas instituições para atender crianças, como hospitais e creches.
A Liga Paulista de Higiene Mental defendia maior seleção sobre a imigração, onde poderia
haver perturbados, com alcoolismo, psicose e sífilis, por exemplo. Defendia o surgimento de postos
que fariam exames mental e físico. Ressaltavam a importância de leis que regulamentavam a
jornada diária de oito horas e o direito a férias, a fim da manutenção do equilíbrio psíquico e da
predisposição para o labor.
Esses estudos concluíram a miserabilidade do padrão de vida urbano-industrial. Além de
proporem a criação de restaurantes populares, ressaltavam a parte educacional, apresentando os
malefícios duma nutrição inapropriada. Vivendo nessas condições subumanas, o humilde
trabalhador é visto com desconfiança, pois o ambiente animalesco em que vive é capaz de suscitar o
ódio, a delinquência, a doença, a degeneração da raça. Explicações nas fábricas e associações, além
do rádio, houve. Dessa forma, para os pesquisadores e sanitaristas, o trabalhador melhorava sua
saúde, produziria mais, aumentava seu ganho, bem como ajudaria no desenvolvimento do país.
Sugestões como distribuição de leite, aumento dos centros de saúde e de educação, proteção à
mulher grávida também através de leis.
Em seus momentos de lazer, os trabalhadores divertiam-se com o futebol, cinema, teatro
amador, bailes, casas de jogos. Procissões, quermesses e festas religiosas eram também comuns.
Visando estabelecer maior domínio sobre os operários, houve o incremento de participação dos
magnatas nas áreas populares. O ócio era visto com desconfiança, pois poderia trazer a indisciplina
ao trabalho. Tal presença, poderia ocorrer através de respaldo financeiro a times de futebol e a
instituições de caridade. A estimulação católica, através do Centro Operário Metropolitano (COM),
fornecia diversões salutares, como conferências educativas, evitando os hábitos perniciosos.
Apesar de tudo, a maior parte proletariada sabia ler e escrever, permitindo o acesso a
folhetins, jornais, livros anarquistas ou comunistas. Havia presença de instrução pública para seus
filhos, com ênfase ao ensino primário. A evasão era alta. Foram abertas escolas noturnas e técnicas,
sendo estas com pretensão formar trabalhadores especializados, disciplinados, visando o maior
lucro dos capitalistas, que também ofereciam cursos gratuitos. A Igreja participava oferecendo
centros educacionais aos mais necessitados, a fim de dogmatizá-los conforme o seu anseio
religioso. Como forma de resistência, sindicatos e outras associações operárias fizeram por existir
centros de aprendizagem e de cultura, conscientizando-os acerca das condições adversas em que
viviam.
A Igreja aproxima-se ainda mais do operário, quando começa a defender o aumento das suas
condições de vida., propondo uma sindicalização católica. Atua de forma assistencial ao oferecer
serviço médico e de creche aos mais explorados. Oferecia os valores cristãos de piedade e caridade
diante dum mundo materialista desagregador.
A imprensa do proletariado foi de extrema importância para sua mobilização contra os
capitalistas, através da conscientização e da denúncia, permitindo o surgimento duma identidade
operária como classe. Casos de violências sexuais contra trabalhadoras por parte dos superiores
eram divulgadas. Possuíam orientações diversas, tais como, comunista, anarquista, sindicalista.
Memorizam as propostas dos operários. Jornada diária acima do permitido sem aumento salarial,
acidentes de trabalho, atividades culturais aspirando ao aumento de consciência social, eram
relatadas. Com muita inteligência, atentaram-se, de forma crítica, à interferência oficial nas relações
de trabalho durante a Era Vargas, bem como as ações “caridosas” de seus opressores, visando maior
controle sobre os trabalhadores. Nas atividades culturais e esportivas era evidente tal tentativa,
restando aos trabalhadores também organizarem suas próprios associações recreativas, escolas,
federações e competições. Existiram publicações em língua italiana, pois o proletariado era formado
em grande parte por imigrantes e seus descendentes, com destaque para as notícias antifascistas. É
possível verificar a performance ativa dos sindicatos em garantir decência às suas categorias. O 1º
de maio era um dia para protestar contra o rebaixamento dos salários, pouca higiene nos ambientes
profissional e caseiro, desqualificação profissional, sindicalização presa ao Estado, desemprego.
Tais inóspitas situações deveriam levar à luta política.
Em fins da década de 30, com a valorização das zonas centrais, o operariado vê-se obrigado
a ocupar áreas cada vez mais periféricas, com serviços e construções ainda mais rudimentares.
Considerações finais
À luz do ora exposto, fica evidente a transformação radical em que a Pauliceia sofreu. Um
crescimento econômico rápido foi capaz de gerar grande contraste social.
Para a elite econômica e seus técnicos-cientistas, a tensão poderia ser amenizada através de
ações eugênicas. As aguras dos trabalhadores eram quantificadas em frios e entendiantes dados. De
nada entendiam, por isso suas opiniões nada valiam. Parece-nos que não eram vistos como seres
humanos, mas somente como peças duma máquina. Tal crescimento desordenado e exploratório
fora planejado.
O que devia ser transmitido dos “ilustres pensadores” aos humildes tinha que ter utilidade
prática para o trabalho. É pertinente salientar a participação da Igreja, preocupada, mediante seu
proselitismo, em atrair as “almas desgarradas”, inibindo transformações social que poderiam
prejudicá-la. Escolas técnicas, hábitos de alimentação e lazer, visavam estabelecer maior disciplina
sobre os degenerados moral e fisicamente. O controle capitalista não pode existir somente na
relação direta de trabalho, deve ir muito além. Obviamente, o Estado burguês estava, e ainda está,
em conluio com os ricos empresários.
A solidariedade entre a classe trabalhadora não era bem vista pelos defensores do sistema
opressivo que procuraram desestruturá-la. Mesmo assim, greves e paralisações foram feitas. Os
sindicatos e jornais faziam eminente papel, demonstrando a consciência social do proletariado.
Libertou-se o servo das antigas classes, mas o transformou em operário, enjaulando-o nas
miseráveis habitações urbanas. Nos dias de hoje, o mesmo sistema perverso de dominação continua
a existir, não mais com os imigrantes d´além-mar, mas, mormente, com os nordestinos.
Referências
BRUNO, Ernani Silva. História e tradições da cidade de São Paulo. São Paulo: Hucitec, vol. 3, 1991
DECCA, Maria Auxiliadora Guzzo. A vida fora das fábricas: cotidiano operário em São Paulo
(1920/1934). Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987.
HARDMAN, Foot; VICTOR, Leonardi. História da indústria e do trabalho no Brasil. São
Paulo: Ática, 1991.