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Manual de direito do consumidor volume ùnico - daniel amorim e flávio tartuce - 2014

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Manual de direito do consumidor volume ùnico - daniel amorim e flávio tartuce - 2014

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  • A EDITORA MTODO se responsabiliza pelos vcios do produto no que concerne sua edio (impresso e apresentao afim de possibilitar ao consumidor bem manuse-lo e l-lo). Os vcios relacionados atualizao da obra, aos conceitosdoutrinrios, s concepes ideolgicas e referncias indevidas so de responsabilidade do autor e/ou atualizador.Todos os direitos reservados. Nos termos da Lei que resguarda os direitos autorais, proibida a reproduo total ou parcialde qualquer forma ou por qualquer meio, eletrnico ou mecnico, inclusive atravs de processos xerogrficos, fotocpia egravao, sem permisso por escrito do autor e do editor.Impresso no Brasil Printed in Brazil

    Direitos exclusivos para o Brasil na lngua portuguesaCopyright 2014 byEDITORA MTODO LTDA.Uma editora integrante do GEN | Grupo Editorial NacionalRua Dona Brgida, 701, Vila Mariana 04111-081 So Paulo SPTel.: (11) 5080-0770 / (21) 3543-0770 Fax: (11) [email protected] | www.editorametodo.com.br

    Capa: Rafael Molotievschi Produo Digital: Geethik

    CIP Brasil. Catalogao-na-fonte.Sindicato Nacional dos Editores de Livros, RJ.T198m

    Tartuce, FlvioManual de direito do consumidor : direito material e processual / Flvio Tartuce, Daniel Amorim Assumpo Neves. 3. ed.

    Rio de Janeiro: Forense: So Paulo: MTODO, 2014.

    Inclui bibliografia ISBN: 978-85-309-5458-1

    1. Brasil. [Cdigo de Defesa do Consumidor (1990)]. 2. Defesa do consumidor - Brasil. I. Neves, Daniel AmorimAssumpo. II. Ttulo.

    11-6847. CDU: 34:366.1(81)

  • A Carlos Cesar Danese Silva, meu pai.

    10.10.194612.10.2011

    Despedida

    Na vida, h algumas poucas certezas e uma delas, sem dvida, o fato da despedida, em que ousimplesmente partiremos ou apenas nos despediremos... E o que dizer neste momento, em que todapalavra soa insuficiente, todo consolo impotente e toda tentativa de discurso menos importante

    que o conforto de um abrao?

    No h sensao melhor na hora da tristeza do que a segurana da amizade, o beijo de quem se ama eo carinho da solidariedade, pois quem parte no sente... ou sente menos do que quem fica... Dor

    mesmo s cicatriza com o blsamo do tempo no correr da vida...(Rodolfo Pamplona Filho)

    Flvio Tartuce

    Na vida voc pode ter duas espcies de irmo: aquele dado por seus pais e aquele que voc elege

    como tal e que te acolhe durante sua existncia. Tenho sorte de ter um irmo de sangue e um irmo devida. Cada qual com suas diferentes caractersticas, so pessoas fundamentais para mim, pelo que s

    tenho a agradecer. Este livro em homenagem aos meus irmos Carlinhos e Flvio Tartuce.

    Daniel

  • NOTA DOS AUTORES 3. EDIO

    Este livro chega sua terceira edio aps mais um ano de conquistas editoriais.Para esta edio, o texto foi revisado, ampliado e atualizado com as principais normas emergentes.

    Tambm constam os principais julgados proferidos no ltimo ano sobre as matrias atinentes obra,especialmente do Superior Tribunal de Justia.

    Na parte relativa ao Direito Material, foram includos mais comentrios quanto aos projetos deReforma do Cdigo de Defesa do Consumidor, em especial quanto contratao eletrnica, ao direito dearrependimento e ao superendividamento. Tambm foram includos alguns enunciados aprovados na VIJornada de Direito Civil, evento do Conselho da Justia Federal e do Superior Tribunal de Justia,realizado em maro de 2013.

    Na parte Processual constam mais comentrios ao projeto de Novo Cdigo de Processo Civil, prestesa ser votado na Cmara dos Deputados.

    Vivemos um momento de grandes transformaes sociais e legislativas em nosso Pas, o que atingediretamente o objeto deste Manual. Estamos atentos a todas essas modificaes, ano a ano, para informardevidamente o leitor.

    Bons estudos! Boas reflexes!

    So Paulo, dezembro de 2013

    Os Autores

  • APRESENTAO

    Quando os autores da presente obra se conheceram nas Arcadas do Largo de So Francisco, nosidos de 1994 no pensavam que iriam se tornar professores e autores de obras jurdicas. Por umadaquelas graciosas surpresas da vida, os caminhos de ambos se cruzaram e seguiram em paralelo, tantono aspecto pessoal quanto no profissional. Mergulhados profundamente na vida acadmica, c esto eles,assinando, a quatro mos, este livro sobre o impactante tema do Direito do Consumidor, em uma visointerdisciplinar (material e processual).

    Nesses quase 20 anos de convivncia, os autores estiveram juntos nos principais momentos de suasvidas profissionais, lecionando nos mesmos cursos preparatrios para as carreiras jurdicas, escolas deps-graduao, entidades de classe, seminrios e congressos jurdicos. Apesar de alguns desencontros,de diferentes caminhos trilhados, a vida sempre se encarregou de uni-los novamente. No aspecto pessoal,a fiel amizade perdura, desde os tempos frente da Associao Atltica XI de Agosto.

    Para comemorar todo esse tempo de rara amizade, nada melhor do que a construo de uma obra emconjunto, unindo a experincia de ambos na seara consumerista, um dos ramos jurdicos de maiorincidncia na contemporaneidade.

    O presente livro procura analisar os principais conceitos e construes que fazem parte da Lei 8.078,de 11 de setembro de 1990, nos aspectos materiais e processuais. A sua organizao segue justamente adiviso metodolgica constante naquela lei.

    Desse modo, o Captulo 1 procura situar o Cdigo de Defesa do Consumidor no ordenamento jurdiconacional, a fim de delimitar a sua forma de incidncia, com amparo especial na festejada tese do dilogodas fontes. Em continuidade, o Captulo 2 do livro aborda os princpios estruturantes da matria,retirados dos arts. 4 e 6 da Lei 8.078/1990, em uma viso terica e prtica. No Captulo 3 soestudados os elementos da relao jurdica de consumo (elementos subjetivos e objetivos), tendo comoparmetros estruturais os arts. 2 e 3 do CDC, sem prejuzo de outros comandos, caso dos seus arts. 17 e29, que tratam do conceito de consumidor por equiparao ou bystander. O Captulo 4 traz como cernede estudo a responsabilidade civil dos fornecedores de produtos e prestadores de servios, um dos temasmais importantes do Direito do Consumidor na atualidade, matria tratada entre os arts. 8 a 27 do CDC.O Captulo 5 tem por objeto a proteo contratual dos consumidores, constante dos arts. 46 ao 54, seoque traz as regras fundamentais para a realidade negocial contempornea consumerista. Tendo por objetotambm as prticas comerciais, assim como o tpico anterior, o Captulo 6 aborda a proteo dosconsumidores quanto oferta e publicidade (arts. 30 a 38). No Captulo 7, igualmente com relao sprticas comerciais, verifica-se o estudo das prticas abusivas, tendo como parmetro os arts. 30 a 42 daLei Consumerista. O importante e atual tema dos cadastros de consumidores a matria do Captulo 8,

  • com anlise da natureza dos cadastros positivos e negativos (arts. 43 e 44 do CDC), luz da melhordoutrina e da atual jurisprudncia nacional. O Captulo 9 trata de aspectos materiais da desconsideraoda personalidade jurdica. Esses nove primeiros captulos foram desenvolvidos pelo coautor FlvioTartuce.

    O Captulo 10 analisa questes da defesa individual do consumidor em juzo, com abordagem bemprxima do dia a dia do profissional da rea jurdica. O Captulo 11 aborda a tutela coletiva doconsumidor em juzo, de forma tcnica e profunda. O Captulo 12 trata da desconsiderao dapersonalidade jurdica em aspectos processuais. No Captulo 13, intitulado Ordem Pblica e TutelaProcessual do Consumidor, faz-se uma anlise indita a respeito da matria, to cara aos processualistas.Para finalizar, o Captulo 14 apresenta consideraes sobre o habeas data. Esses cinco ltimos captulosforam escritos pelo coautor Daniel Amorim Assumpo Neves.

    Esclarea-se que a obra tem a identificao seccionada dos autores na parte superior das pginas,diante de alguns distanciamentos ideolgicos dos escritores, como comum entre os civilistas eprocessualistas quando da abordagem do Direito do Consumidor. Nessa alteridade, alis, acreditam osautores, est presente a grande contribuio do livro para a cincia jurdica.

    Todos os dispositivos do Cdigo do Consumidor importantes seara material e processual sodevidamente comentados, acompanhados de posicionamentos doutrinrios e jurisprudenciais recentes,bem como da anlise de exemplos prticos, retirados das experincias dos autores, seja na advocacia, naatuao consultiva ou na docncia.

    O livro direcionado a todo o pblico jurdico: magistrados, promotores de justia, procuradores,advogados, estudantes de graduao e psgraduao, e para aqueles que se preparam para os concursospblicos e provas das carreiras jurdicas. Diante da clareza de linguagem e da forma de exposio dostemas, este trabalho tambm indicado para leigos, que tm interesse em conhecer o Direito doConsumidor nacional.

    Para a prtica, h interessantes digresses, inclusive com a anlise de decises dos JuizadosEspeciais Cveis, em que muitos advogados iniciam suas carreiras caso dos presentes autores ,especialmente lidando com a matria deste livro.

    Espera-se que a presente obra seja bem recebida pelo pblico jurdico nacional, a exemplo de outrasdos autores. Cumpre destacar que este livro tem um toque especial, pois foi construdo sobre o alicerceda amizade e do companheirismo, nascidos na Gloriosa Faculdade de Direito do Largo de So Francisco.

    Saudaes Acadmicas!So Paulo, outubro de 2011

    Os Autores

  • Nota da Editora: o Acordo Ortogrfico foi aplicado integralmente nesta obra.

  • SUMRIO

    1.a ParteDIREITO MATERIAL

    Flvio Tartuce

    1. O CDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR E SUA POSIO NO ORDENAMENTOJURDICO BRASILEIRO1.1. Primeiras palavras sobre o Cdigo de Defesa do Consumidor. O CDC e a ps-

    modernidade jurdica1.2. O Cdigo de Defesa do Consumidor como norma principiolgica. Sua posio

    hierrquica1.3. O Cdigo de Defesa do Consumidor e a teoria do dilogo das fontes1.4. O contedo do Cdigo de Defesa do Consumidor e a organizao da presente obra

    2. PRINCPIOS FUNDAMENTAIS DO CDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR2.1. Primeiras palavras sobre os princpios jurdicos2.2. Princpio do protecionismo do consumidor (art. 1 da Lei 8.078/1990)2.3. Princpio da vulnerabilidade do consumidor (art. 4, inc. I, da Lei 8.078/1990)2.4. Princpio da hipossuficincia do consumidor (art. 6, inc. VIII, da Lei 8.078/1990)2.5. Princpio da boa-f objetiva (art. 4, inc. III, da Lei 8.078/1990)2.6. Princpio da transparncia ou da confiana (arts. 4, caput, e 6, inc. III, da Lei

    8.078/1990). A tutela da informao2.7. Princpio da funo social do contrato2.8. Princpio da equivalncia negocial (art. 6, inc. II, da Lei 8.078/1990)2.9. Princpio da reparao integral dos danos (art. 6, inc. VI, da Lei 8.078/1990). Os

    danos reparveis nas relaes de consumo

    3. ELEMENTOS DA RELAO JURDICA DE CONSUMO3.1. A estrutura da relao jurdica de consumo. Viso geral

  • 3.2. Os elementos subjetivos da relao de consumo3.2.1. O fornecedor de produtos e o prestador de servios. O conceito de fornecedor

    equiparado3.2.2. O Consumidor. Teorias existentes. O consumidor equiparado ou bystander

    3.3. Elementos objetivos da relao de consumo3.3.1. Produto3.3.2. Servio

    3.4. Exemplos de outras relaes jurdicas contemporneas e o seu enquadramento comorelaes de consumo3.4.1. O contrato de transporte e a incidncia do Cdigo do Consumidor3.4.2. Os servios pblicos e o Cdigo de Defesa do Consumidor3.4.3. O condomnio edilcio e o Cdigo de Defesa do Consumidor3.4.4. A incidncia do Cdigo do Consumidor para os contratos de locao urbana3.4.5. A Lei 8.078/1990 e a Previdncia Privada Complementar3.4.6. Prestao de servios educacionais como servio de consumo3.4.7. As atividades notariais e registrais e a Lei 8.078/19903.4.8. As relaes entre advogados e clientes e o Cdigo de Defesa do Consumidor

    4. RESPONSABILIDADE CIVIL PELO CDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR4.1. A unificao da responsabilidade civil pelo Cdigo de Defesa do Consumidor. A

    responsabilidade civil objetiva e solidria como regra do Cdigo do Consumidor (risco-proveito). A responsabilidade subjetiva dos profissionais liberais como exceo

    4.2. Anlise dos casos especficos de responsabilidade civil pelo Cdigo de Defesa doConsumidor4.2.1. As quatro hipteses tratadas pela Lei 8.078/1990 em relao ao produto e ao

    servio. Vcio versus fato (defeito). Panorama geral e a questo dasolidariedade

    4.2.2. Responsabilidade civil pelo vcio do produto4.2.3. Responsabilidade civil pelo fato do produto ou defeito4.2.4. Responsabilidade civil pelo vcio do servio4.2.5. Responsabilidade civil pelo fato do servio ou defeito

    4.3. O consumidor equiparado e a responsabilidade civil. Aprofundamentos quanto ao temae confrontaes em relao ao art. 931 do Cdigo Civil

    4.4. Excludentes de responsabilidade civil pelo Cdigo de Defesa do Consumidor4.4.1. As excludentes da no colocao do produto no mercado e da ausncia de

    defeito4.4.2. A excludente da culpa ou fato exclusivo de terceiro4.4.3. A excludente da culpa ou fato exclusivo do prprio consumidor

  • 4.4.4. O enquadramento do caso fortuito e da fora maior como excludentes daresponsabilidade civil consumerista

    4.4.5. Os riscos do desenvolvimento como excludentes de responsabilidade peloCdigo de Defesa do Consumidor

    4.5. O fato concorrente do consumidor como atenuante da responsabilidade civil dosfornecedores e prestadores

    4.6. A responsabilidade civil pelo cigarro e o Cdigo de Defesa do Consumidor4.7. A responsabilidade civil pelo Cdigo de Defesa do Consumidor e o recall

    5. A PROTEO CONTRATUAL PELO CDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR5.1. O conceito contemporneo ou ps-moderno de contrato e o direito do consumidor. Os

    contratos coligados e os contratos cativos de longa durao5.2. A reviso contratual por fato superveniente no Cdigo de Defesa do Consumidor5.3. A funo social do contrato e a no vinculao das clusulas desconhecidas e

    incompreensveis (art. 46 do CDC). A interpretao mais favorvel ao consumidor(art. 47 do CDC)

    5.4. A fora vinculativa dos escritos e a boa-f objetiva nos contratos de consumo (art. 48da Lei 8.078/1990). A aplicao dos conceitos parcelares da boa-f objetiva5.4.1. Supressio e surrectio5.4.2. Tu quoque5.4.3. Exceptio doli5.4.4. Venire contra factum proprium5.4.5. Duty to mitigate the loss

    5.5. O direito de arrependimento nos contratos de consumo (art. 49 da Lei 8.078/1990)5.6. A garantia contratual do art. 50 da Lei 8.078/19905.7. As clusulas abusivas no Cdigo de Defesa do Consumidor. Anlise do rol

    exemplificativo do art. 51 da Lei 8.078/1990 e suas decorrncias5.7.1. Clusulas que impossibilitem, exonerem ou atenuem a responsabilidade do

    fornecedor por vcios de qualquer natureza dos produtos e servios ouimpliquem renncia ou disposio de direitos (art. 51, inc. I, do CDC)

    5.7.2. Clusulas que subtraiam ao consumidor a opo de reembolso da quantia jpaga (art. 51, inc. II, do CDC)

    5.7.3. Clusulas que transfiram responsabilidades a terceiros (art. 51, inc. III, doCDC)

    5.7.4. Clusulas que estabeleam obrigaes consideradas inquas, abusivas, quecoloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou que sejamincompatveis com a boa-f ou a equidade (art. 51, inc. IV, do CDC)

    5.7.5. Clusulas que estabeleam inverso do nus da prova em prejuzo doconsumidor (art. 51, inc. VI, do CDC)

  • 5.7.6. Clusulas que determinem a utilizao compulsria de arbitragem (art. 51, inc.VII, do CDC)

    5.7.7. Clusulas que imponham representante para concluir ou realizar outro negciojurdico pelo consumidor (art. 51, inc. VIII, do CDC)

    5.7.8. Clusulas que deixem ao fornecedor a opo de concluir ou no o contrato,embora obrigando o consumidor (art. 51, inc. IX, do CDC)

    5.7.9. Clusulas que permitam ao fornecedor, direta ou indiretamente, variao dopreo de maneira unilateral (art. 51, inc. X, do CDC)

    5.7.10. Clusulas que autorizem o fornecedor a cancelar o contrato unilateralmente,sem que igual direito seja conferido ao consumidor (art. 51, inc. XI, do CDC)

    5.7.11. Clusulas que obriguem o consumidor a ressarcir os custos de cobrana desua obrigao, sem que igual direito lhe seja conferido contra o fornecedor(art. 51, inc. XII, do CDC)

    5.7.12. Clusulas que autorizem o fornecedor a modificar unilateralmente o contedoou a qualidade do contrato, aps sua celebrao (art. 51, inc. XIII, do CDC)

    5.7.13. Clusulas que infrinjam ou possibilitem a violao de normas ambientais (art.51, inc. XIV, do CDC)

    5.7.14. Clusulas que estejam em desacordo com o sistema de proteo aoconsumidor (art. 51, inc. XV, do CDC)

    5.7.15. Clusulas que possibilitem a renncia do direito de indenizao porbenfeitorias necessrias (art. 51, inc. XVI, do CDC)

    5.8. Os contratos de fornecimento de crdito na Lei 8.078/1990 (art. 52) e o problema dosuperendividamento do consumidor. A nulidade absoluta da clusula de decaimento(art. 53)

    5.9. O tratamento dos contratos de adeso pelo art. 54 do Cdigo de Defesa doConsumidor

    6. A PROTEO QUANTO OFERTA E PUBLICIDADE NO CDIGO DE DEFESA DOCONSUMIDOR6.1. Panorama geral sobre a tutela da informao e o Cdigo de Defesa do Consumidor6.2. A fora vinculativa da oferta no art. 30 da Lei 8.078/19906.3. O contedo da oferta e a manuteno de sua integralidade6.4. A responsabilidade civil objetiva e solidria decorrente da oferta6.5. A publicidade no Cdigo de Defesa do Consumidor. Princpios informadores.

    Publicidades vedadas ou ilcitas6.5.1. A vedao da publicidade mascarada, clandestina, simulada ou dissimulada

    (art. 36 do CDC)6.5.2. A vedao da publicidade enganosa (art. 37, 1, do CDC)6.5.3. A vedao da publicidade abusiva (art. 37, 2, do CDC)

    6.6. O nus da prova da veracidade da informao publicitria

  • 7. O ABUSO DE DIREITO CONSUMERISTA. AS PRTICAS ABUSIVAS VEDADAS PELALEI 8.078/1990 E SUAS CONSEQUNCIAS PRTICAS7.1. Algumas palavras sobre o abuso de direito7.2. Estudo das prticas abusivas enumeradas pelo art. 39 do CDC

    7.2.1. Condicionar o fornecimento de produto ou de servio ao fornecimento de outroproduto ou servio, bem como, sem justa causa, a limites quantitativos (art. 39,inc. I, do CDC)

    7.2.2. Recusar atendimento s demandas dos consumidores, na exata medida desuas disponibilidades de estoque, e, ainda, de conformidade com os usos ecostumes (art. 39, inc. II, do CDC)

    7.2.3. Enviar ou entregar ao consumidor, sem solicitao prvia, qualquer produto, oufornecer qualquer servio (art. 39, inc. III, do CDC)

    7.2.4. Prevalecer-se da fraqueza ou ignorncia do consumidor, tendo em vista a suaidade, sade e condio social, para vender-lhe produto ou servio (art. 39,inc. IV, do CDC)

    7.2.5. Exigir do consumidor vantagem manifestamente excessiva (art. 39, inc. V, doCDC)

    7.2.6. Executar servios sem a prvia elaborao de oramento e autorizaoexpressa do consumidor, ressalvadas as decorrentes de prticas anterioresentre as partes (art. 39, inc. VI, do CDC)

    7.2.7. Repassar informao depreciativa referente a ato praticado pelo consumidorno exerccio de seus direitos (art. 39, inc. VII, do CDC)

    7.2.8. Colocar, no mercado de consumo, qualquer produto ou servio em desacordocom as normas expedidas pelos rgos oficiais competentes ou, se normasespecficas no existirem, pela Associao Brasileira de Normas Tcnicas(ABNT) ou outra entidade credenciada pelo Conselho Nacional de Metrologia,Normalizao e Qualidade Industrial CONMETRO (art. 39, inc. VIII, do CDC)

    7.2.9. Recusar a venda de bens ou a prestao de servios, diretamente a quem sedisponha a adquiri-los mediante pronto pagamento, ressalvados os casos deintermediao regulados em leis especiais (art. 39, inc. IX, do CDC)

    7.2.10. Elevar sem justa causa o preo de produtos ou servios (art. 39, inc. X, doCDC)

    7.2.11. Aplicar frmula ou ndice de reajuste diverso do legal ou contratualmenteestabelecido (art. 39, inc. XIII, do CDC)

    7.2.12. Deixar de estipular prazo para o cumprimento de sua obrigao ou deixar afixao de seu termo inicial a seu exclusivo critrio (art. 39, inc. XII, do CDC)

    7.3. A necessidade de respeito ao tabelamento oficial, sob pena de caracterizao doabuso de direito (art. 41 do CDC)

    7.4. O abuso de direito na cobrana de dvidas (art. 42, caput, do CDC). O problema docorte de servio essencial. A necessidade de prestao de informaes na cobrana(art. 42-A do CDC)

  • 7.5. A repetio de indbito no caso de cobrana abusiva (art. 42, pargrafo nico, doCDC)

    8. BANCO DE DADOS E CADASTRO DE CONSUMIDORES8.1. A natureza jurdica dos bancos de dados e cadastros e sua importante aplicabilidade

    social. Diferenas entre as categorias8.2. O contedo dos arts. 43 e 44 do Cdigo de Defesa do Consumidor e seus efeitos. A

    interpretao jurisprudencial8.2.1. A inscrio ou registro do nome dos consumidores8.2.2. A retificao ou correo dos dados8.2.3. O cancelamento da inscrio8.2.4. A reparao dos danos nos casos de inscrio indevida do nome do devedor.

    Crtica Smula 385 do STJ. Prazo para se pleitear a reparao8.2.5. O cadastro de fornecedores e prestadores e o alcance do art. 44 da Lei

    8.078/19908.3. O cadastro positivo. Breve anlise da Lei 12.414, de 9 de junho de 2011

    9. A DESCONSIDERAO DA PERSONALIDADE JURDICA NO CDIGO DE DEFESA DOCONSUMIDOR (ART. 28 DA LEI 8.078/1990). ASPECTOS MATERIAIS

    2.a ParteDIREITO PROCESSUAL

    Daniel Amorim Assumpo Neves

    10. TUTELA INDIVIDUAL DO CONSUMIDOR EM JUZO10.1. Introduo10.2. Meios de soluo dos conflitos

    10.2.1. Introduo10.2.2. Jurisdio10.2.3. Equivalentes jurisdicionais

    10.2.3.1. Autotutela10.2.3.2. Autocomposio10.2.3.3. Arbitragem

    10.3. Tutela especfica das obrigaes de fazer e no fazer10.3.1. Introduo10.3.2. Tutela jurisdicional

    10.3.2.1. Tutela jurisdicional especfica

  • 10.3.2.2. Tutela inibitria10.3.3. Procedimento previsto pelo art. 84 do CDC

    10.3.3.1. Introduo10.3.3.2. Obteno de tutela especfica ou determinao de providncias que

    assegurem o resultado prtico equivalente ao do adimplemento10.3.3.3. Converso em perdas e danos10.3.3.4. Tutela de urgncia10.3.3.5. Atipicidade dos meios executivos10.3.3.6. Multa

    10.4. Competncia10.4.1. Introduo10.4.2. Competncia da Justia10.4.3. Competncia territorial

    10.4.3.1. Clusula de eleio de foro em contrato de adeso10.4.4. Competncia do juzo

    10.5. Intervenes de terceiros10.5.1. Introduo10.5.2. Denunciao da lide

    10.5.2.1. Vedao legal10.5.2.2. Fundamentos da vedao legal

    10.5.3. Chamamento ao processo10.5.3.1. Introduo10.5.3.2. Espcie atpica de chamamento ao processo10.5.3.3. Ao diretamente proposta contra a seguradora10.5.3.4. Vedao de integrao do Instituto de Resseguros do Brasil

    10.6. Litisconsrcio alternativo e o Cdigo de Defesa do Consumidor10.7. Inverso do nus da prova

    10.7.1. nus da prova10.7.2. Regras de distribuio do nus da prova (art. 333 do CPC)10.7.3. Inverso do nus da prova

    10.7.3.1. Inverso convencional10.7.3.2. Inverso legal10.7.3.3. Inverso judicial

    10.7.4. Momento de inverso do nus da prova10.7.5. Inverso da prova e inverso do adiantamento de custas processuais

    11. TUTELA COLETIVA DO CONSUMIDOR EM JUZO

  • 11.1. Introduo11.1.1. Tutela jurisdicional coletiva11.1.2. Origem da tutela jurisdicional coletiva11.1.3. Microssistema coletivo11.1.4. Marcos legislativos

    11.2. Espcies de direitos protegidos pela tutela coletiva11.2.1. Introduo11.2.2. Direitos ou interesses?11.2.3. Direito difuso11.2.4. Direito coletivo11.2.5. Direitos individuais homogneos11.2.6. Identidades e diferenas entre os direitos coletivos lato sensu

    11.3. Competncia na tutela coletiva11.3.1. Competncia absoluta: funcional ou territorial?11.3.2. Competncia absoluta do foro11.3.3. Dano local, regional e nacional

    11.4. Legitimidade11.4.1. Espcies de legitimidade11.4.2. Cidado11.4.3. Ministrio Pblico11.4.4. Pessoas jurdicas da administrao pblica11.4.5. Associao

    11.4.5.1. Introduo11.4.5.2. Constituio h pelo menos um ano11.4.5.3. Pertinncia temtica11.4.5.4. Representao adequada (adequacy of representantion)

    11.4.6. Defensoria Pblica11.5. Relao entre a ao coletiva e a individual

    11.5.1. Introduo11.5.2. Litispendncia11.5.3. Conexo e continncia

    11.5.3.1. Conceito11.5.3.2. Identidade da causa de pedir ou pedido integral ou parcial?11.5.3.3. Ratio da conexo e a insuficincia do disposto no art. 103 do CPC11.5.3.4. Obrigatoriedade ou facultatividade na reunio de processos em razo

    da conexo

  • 11.5.3.5. Especificamente na relao entre ao coletiva e individual11.5.4. Suspenso do processo individual11.5.5. Extino do mandado de segurana individual

    11.6. Coisa julgada11.6.1. Introduo11.6.2. Coisa julgada secundum eventum probationis11.6.3. Coisa julgada secundum eventum litis11.6.4. Limitao territorial da coisa julgada

    11.7. Gratuidade11.7.1. Introduo11.7.2. Iseno de adiantamento11.7.3. Condenao em verbas de sucumbncia

    11.8. Liquidao de sentena11.8.1. Conceito de liquidez e obrigaes liquidveis11.8.2. Natureza jurdica da liquidao11.8.3. Legitimidade ativa11.8.4. Competncia11.8.5. Espcies de liquidao de sentena11.8.6. Direito difuso e coletivo11.8.7. Direito individual homogneo11.8.8. Liquidao individual das sentenas de direito difuso e coletivo

    11.9. Execuo11.9.1. Introduo

    11.9.1.1. Processo de execuo e cumprimento de sentena11.9.1.2. Execuo por sub-rogao e indireta11.9.1.3. Prescrio

    11.9.2. Legitimidade ativa11.9.3. Direitos difusos e coletivos11.9.4. Direitos individuais homogneos

    11.9.4.1. Introduo11.9.4.2. Execuo por fluid recovery11.9.4.3. Legitimidade

    11.9.5. Regime jurdico das despesas e custas processuais

    12. ASPECTOS PROCESSUAIS DA DESCONSIDERAO DA PERSONALIDADE JURDICANO CDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR

    12.1. Introduo

  • 12.2. Responsabilidade patrimonial secundria12.3. Forma procedimental da desconsiderao da personalidade jurdica12.4. A desconsiderao da personalidade jurdica12.5. Recorribilidade da deciso que desconsidera a personalidade jurdica12.6. Qualidade processual do scio meio de defesa adequado12.7. Desconsiderao da personalidade jurdica de ofcio

    13. ORDEM PBLICA E TUTELA PROCESSUAL DO CONSUMIDOR13.1. Matrias de defesa13.2. Precluso temporal13.3. Precluso consumativa13.4. Objees e natureza de ordem pblica das normas consumeristas

    14. HABEAS DATA E DIREITO DO CONSUMIDOR14.1. Introduo14.2. Direito informao e habeas data14.3. Hipteses de cabimento

    14.3.1. Introduo14.3.2. Direito informao14.3.3. Direito retificao de dados14.3.4. Anotao sobre dado verdadeiro

    14.4. Fase administrativa14.4.1. Interesse de agir14.4.2. Procedimento

    14.4.2.1. Fase pr-processual14.4.2.2. Fase processual

    14.5. Liminar14.6. Legitimidade

    14.6.1. Legitimidade ativa14.6.2. Legitimidade passiva

    14.7. Competncia14.8. Recursos

    BIBLIOGRAFIA

  • O CDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR E SUA POSIO NOORDENAMENTO JURDICO BRASILEIRO

    Sumrio: 1.1. Primeiras palavras sobre o Cdigo de Defesa do Consumidor. O CDC e a ps-modernidade jurdica 1.2. O Cdigo de Defesa do Consumidor como norma principiolgica. Sua posio hierrquica 1.3. O Cdigo deDefesa do Consumidor e a teoria do dilogo das fontes 1.4. O contedo do Cdigo de Defesa do Consumidor e aorganizao da presente obra.

    1.1. PRIMEIRAS PALAVRAS SOBRE O CDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. O CDC E A PS-MODERNIDADE JURDICA

    O Cdigo Brasileiro de Defesa do Consumidor, conhecido e denominado pelas iniciais CDC, foiinstitudo pela Lei 8.078/1990, constituindo uma tpica norma de proteo de vulnerveis. Pordeterminao da ordem constante do art. 48 das Disposies Finais e Transitrias da ConstituioFederal de 1988, de elaborao de um Cdigo do Consumidor no prazo de cento e vinte dias, formou-seuma comisso para a elaborao de um anteprojeto de lei, composta por Ada Pellegrini Grinover(coordenadora), Daniel Roberto Fink, Jos Geraldo Brito Filomeno, Kazuo Watanabe e Zelmo Denari.Tambm houve uma intensa colaborao de Antonio Herman de Vasconcellos e Benjamin, ElianaCceres, Marcelo Gomes Sodr, Maringela Sarrubo, Nelson Nery Jr. e Rgis Rodrigues Bonvicino.1

    Como norma vigente, o nosso Cdigo de Defesa do Consumidor situa-se na especialidade, segundaparte da isonomia constitucional, retirada do art. 5, caput, da CF/1988. Ademais, o contedo do CdigoConsumerista demonstra tratar-se de uma norma adaptada realidade contempornea da ps-modernidade jurdica. A expresso ps-modernidade utilizada para simbolizar o rompimento dosparadigmas construdos ao longo da modernidade, quebra ocorrida ao final do sculo XX. Maisprecisamente, parece correto dizer que o ano de 1968 um bom parmetro para se apontar o incio desseperodo, diante de protestos e movimentos em prol da liberdade e de outros valores sociais queeclodiram em todo o mundo.2 Em tais reivindicaes pode ser encontrada a origem de leiscontemporneas com preocupao social, caso do Cdigo Brasileiro de Defesa do Consumidor.

    De acordo com os ensinamentos de Eduardo Bianca Bittar, a ps-modernidade significa o estadoreflexivo da sociedade ante as suas prprias mazelas, capaz de gerar um revisionismo completo de seumodus actuandi et faciendi, especialmente considerada a condio de superao do modelo moderno deorganizao da vida e da sociedade. Nem s de superao se entende viver a ps-modernidade, pois o

  • revisionismo crtico importa em praticar a escavao dos erros do passado para a preparao de novascondies de vida. A ps-modernidade menos um estado de coisas, exatamente porque ela umacondio processante de um amadurecimento social, poltico, econmico e cultural, que haver dealargar-se por muitas dcadas at a sua consolidao. Ela no encerra a modernidade, pois, em verdade,inaugura sua mescla com os restos da modernidade.3 Nota-se que a ps-modernidade representa umasuperao parcial, e no total, da modernidade, at porque a palavra moderno faz parte da construomorfolgica do termo. Em verdade, preciso rever conceitos, e no romper com eles totalmente. Asantigas categorias so remodeladas, refeitas, mantendo-se, muitas vezes, a sua base estrutural. Isso, semdvida, vem ocorrendo com o Direito, a partir de um novo dimensionamento de antigas construes. Aps-modernidade pode figurar como uma revisitao das premissas da razo pura, por meio da anlise darealidade de conceitos que foram negados pela razo anterior, pela modernidade quadrada. Essa aconcluso de Hilton Ferreira Japiassu, merecendo destaque os seus dizeres:

    Diria que a chamada ps-modernidade aparece como uma espcie de Renascimento dos ideais banidos e cassados por nossamodernidade racionalizadora. Esta modernidade teria terminado a partir do momento em que no podemos mais falar da histria comoalgo de unitrio e quando morre o mito do Progresso. a emergncia desses ideais que seria responsvel por toda uma onda decomportamentos e de atitudes irracionais e desencantados em relao poltica e pelo crescimento do ceticismo face aos valoresfundamentais da modernidade. Estaramos dando Adeus modernidade, Razo (Feyerabend)? Quem acredita ainda que todo real racional e todo racional real (Hegel)? Que esperana podemos depositar no projeto da Razo emancipada, quando sabemos queorientou-se para a instrumentalidade e a simples produtividade? Que projeto de felicidade pessoal pode proporcionar-nos um mundocrescentemente racionalizado, calculador e burocratizado, que coloca no centro de tudo o econmico, entendido apenas como ofinanceiro submetido ao jogo cego do mercado? Como pode o homem ser feliz no interior da lgica do sistema, onde s tem valor o quefunciona segundo previses, onde seus desejos, suas paixes, necessidades e aspiraes passam a ser racionalmente administrados emanipulados pela lgica da eficcia econmica que o reduz ao papel de simples consumidor?4

    No contexto da presente obra, nota-se que o Cdigo Brasileiro de Defesa do Consumidor constituiuma tpica norma ps-moderna, no sentido de rever conceitos antigos do Direito Privado, tais como ocontrato, a responsabilidade civil e a prescrio.

    O fenmeno ps-moderno, com enfoque jurdico, pode ser identificado por vrios fatores. O primeiroa ser citado a globalizao, a ideia de unidade mundial, de um modelo geral para as cincias e para ocomportamento das pessoas. Fala-se hoje em linguagem global, em economia globalizada, em mercadouno, em doenas e epidemias mundiais e at em um Direito unificado. Quanto ao modo de agir, oocidente se aproxima do oriente, e vice-versa. A China consome o hambrguer norte-americano, e osEstados Unidos consomem o macarro chins. Alguns se alimentam de macarro com hambrguer,fundindo o oriente ao ocidente, at de forma inconsciente, em especial nos pases em desenvolvimento.No caso do CDC brasileiro, tal preocupao pode ser notada pela abertura constante do seu art. 7, queadmite a aplicao de fontes do Direito Comparado, caso dos tratados e convenes internacionais, inverbis: Os direitos previstos neste Cdigo no excluem outros decorrentes de tratados ou convenesinternacionais de que o Brasil seja signatrio, da legislao interna ordinria, de regulamentos expedidospelas autoridades administrativas competentes, bem como dos que derivem dos princpios gerais dodireito, analogia, costumes e equidade.

    A par dessa unidade mundial, como afirma Erik Jayme, os Estados no seriam mais os centros dopoder e da proteo da pessoa humana, cedendo espao, em larga margem, aos mercados. Nesse sentido,as regras de concorrncia acabariam por determinar a vida e o comportamento dos seres humanos.5 Detoda sorte, como prega o prprio doutrinador em outro texto, ao discorrer sobre a realidade do DireitoInternacional Privado, preciso que os Estados busquem, em sua integrao, para uma crescenteunificao do Direito, a conservao da identidade cultural das pessoas, para proteger e garantir a sua

  • personalidade individual.6 Em suma, segundo Erik Jayme, o Direito Internacional Privado deve levar emconsiderao, baseado em critrios de proximidade, as diferenas culturais incorporadas aos respectivosordenamentos jurdicos, prestando-se a se tornar tambm um direito fundamental ligado personalidadedos cidados.7 Nesse contexto, surge a proteo dos direitos dos consumidores, fazendo um cabo deguerra contra a excessiva proteo mercadolgica.

    Como outro ponto de reflexo a ser destacado a respeito da ps-modernidade jurdica, h aabundncia dos gneros e espcies: abundncia de sujeitos e de direitos, excesso de fatores queinfluenciam as relaes jurdicas e ecloso sucessiva de leis, entre outros. Relativamente s leis, arealidade de um Big Bang Legislativo, na qual se verifica uma exploso de normas jurdicas, comoafirma Ricardo Luis Lorenzetti.8 No caso brasileiro, convive-se com mais de 40 mil leis, a deixar oaplicador do Direito desnorteado a respeito de sua incidncia no tipo (fattispecie). Mesmo em relaoaos consumidores, em muitas situaes, h uma situao de dvida sobre qual norma jurdica deve incidirno caso concreto.

    No que concerne aos sujeitos ps-modernos, reconhece-se um pluralismo, o que intensificado pelavalorizao dos direitos humanos e das liberdades. Inmeras so as preocupaes legais em se tutelar osvulnerveis, a fim de se valorizar a pessoa humana, nos termos do que consta do art. 1, III, daConstituio Federal: consumidores, trabalhadores, mulheres sob violncia, crianas e adolescentes,jovens, idosos, indgenas, deficientes fsicos, negros. Alm de proteger sujeitos, as normas tendem atutelar valores que so colocados disposio da pessoa para a sua sadia qualidade de vida, como ocaso do meio ambiente, do Bem Ambiental. A par dessa realidade, Claudia Lima Marques ensina:

    Segundo Erik Jayme, as caractersticas da cultura ps-moderna no direito seriam o pluralismo, a comunicao, a narrao, o queJayme denomina le retour des sentiments, sendo o Leitmotiv da ps-modernidade a valorizao dos direitos humanos. Para Jayme, odireito como parte da cultura dos povos muda com a crise da ps-modernidade. O pluralismo manifesta-se na multiplicidade de fonteslegislativas a regular o mesmo fato, com a descodificao ou a imploso dos sistemas genricos normativos (Zersplieterung),manifesta-se no pluralismo de sujeitos a proteger, por vezes difusos, como o grupo de consumidores ou os que se beneficiam daproteo do meio ambiente, na pluralidade de agentes ativos de uma mesma relao, como os fornecedores que se organizam emcadeia e em relaes extremamente despersonalizadas. Pluralismo tambm na filosofia aceita atualmente, onde o dilogo quelegitima o consenso, onde os valores e princpios tm sempre uma dupla funo, o double coding, e onde os valores so muitas vezesantinmicos. Pluralismo nos direitos assegurados, nos direitos diferena e ao tratamento diferenciado aos privilgios dos espaos deexcelncia.9

    Em certo sentido, como decorrncia do pluralismo, h uma abundncia de proteo legislativa naps-modernidade, a gerar situaes de coliso entre esses direitos, conflitos estes que acabam por serresolvidos a partir da interpretao da Norma Constitucional, repouso comum da principiologia dessatutela fundamental. A demonstrar os efeitos prticos dessa preocupao de tutela, por exemplo,utilizando-se de um smbolo cotidiano, ao ir ao banco, comum a percepo de que a nica fila que anda a daqueles que tm algum tipo de prioridade. Eis aqui outra amostragem do fenmeno ps-moderno,uma vez que a exceo se torna regra, e vice-versa. Como no poderia ser diferente, a questo da tutelade vulnerveis e de proteo de conceitos que lhe so parcelares repercute na anlise do problemajurdico contemporneo.

    Na realidade ps-moderna h o duplo sentido das coisas (double sense). Nesse contexto, o certopode ser o errado, e o errado pode ser o certo; o bem pode ser o mal, e o mal pode ser o bem; o altopode ser baixo, e o baixo pode ser alto; o belo pode ser o feio, e o feio pode ser o belo; a verdade podeser uma mentira, e a mentira pode ser uma verdade; o jurdico pode ser antijurdico, e o antijurdico podeser o jurdico; a direita pode ser a esquerda, e o inverso pode ser igualmente vlido. Essas variaes

  • chocam aquela viso maniquesta que sempre imperou no Direito, particularmente a de que semprehaver um vitorioso e um derrotado nas demandas judiciais. Na realidade, aquele que se julga o vitoriosopode ser o maior derrotado.

    Algumas produes cinematogrficas da atualidade servem para demonstrar essa configurao dodouble sense, como o caso de Guerra nas Estrelas (Star Wars ), talvez o maior fenmenocinematogrfico da ps-modernidade. Anote-se que tal paralelo foi traado por Claudia Lima Marques,em aula ministrada no curso de ps-graduao lato sensu em Direito Contratual da Escola Paulista deDireito, em So Paulo, no dia 12 de maio de 2008. O tema da aula foi A teoria do dilogo das fontes e oDireito Contratual. Naquela ocasio, a jurista relacionou a evoluo do Direito srie Guerra nasEstrelas (Star Wars), escrita e dirigida por George Lucas em 1977. O primeiro episdio denominado AAmeaa Fantasma (1999); o segundo, O Ataque dos Clones (2002); o terceiro, A Vingana dos Sith(2005); o quarto, Uma Nova Esperana (1977); o quinto, O Imprio Contra-Ataca (1980); e o sexto, oRetorno de Jedi (1983). O ltimo episdio, em que um filho que representa o bem (Luke Skywalker)acaba por lutar contra o prprio pai, que representa o mal (Darth Vader, a verso malfica de AnakinSkywalker), seria a culminncia da ps-modernidade, representando o duplo sentido das coisas e a faltade definio de posies (bem x mal). Ao final, o prprio smbolo do mal (Darth Vader) quem mata oImperador, gerando a vitria definitiva do bem contra o mal.

    Ato contnuo, a realidade ps-moderna marcada pela hipercomplexidade. De acordo com AntnioJunqueira de Azevedo, o prprio direito um sistema complexo de segunda ordem .10 Nacontemporaneidade, os prosaicos exemplos de negcios e atos jurdicos entre Tcio, Caio e Mvio,comuns nas aulas de Direito Romano e de Direito Civil do passado (ou at do presente), no conseguemresolver os casos de maior complexidade, particularmente aqueles relativos a colises entre direitosconsiderados fundamentais, prprios da pessoa humana. Ademais, muitas situaes envolvendo oscontratos de consumo superam aquela antiga visualizao. A ttulo de ilustrao, imagine-se que umconsumidor brasileiro compra um produto americano acessando seu computador no Brasil, estando oprovedor da empresa vendedora localizado na Nova Zelndia. Pergunta-se: quais as leis aplicadas naespcie? Sem se pretender ingressar no mrito da questo, o exemplo demonstra quo complexas podemser as simples relaes de consumo.

    Por fim, demonstrando o caos contemporneo, Ricardo Luis Lorenzetti fala em era da desordem,que, em sntese, pode ser identificada pelos seguintes aspectos: a) enfraquecimento das fronteiras entreas esferas do pblico e do privado; b) pluralidade das fontes, seja no Direito Pblico ou no DireitoPrivado; c) proliferao de conceitos jurdicos indeterminados; d) existncia de um sistema aberto, sendopossvel uma extensa variao de julgamentos; e) grande abertura para o intrprete estabelecer ereconstruir a sua coerncia; f) mudanas constantes de posies, inclusive legislativas; g) necessidade deadequao das fontes umas s outras; h) exigncia de pautas mnimas de correo para a interpretaojurdica.11 Como no poderia ser diferente, o Cdigo de Defesa do Consumidor enquadra-seperfeitamente em tal realidade ps-moderna. Primeiro, por trazer como contedo questes de DireitoPrivado e de Direito Pblico. Segundo, por encerrar vrios conceitos indeterminados, como o de boa-f.Terceiro, por representar uma norma aberta, perfeitamente afeita a dilogos interdisciplinares, como sever (dilogo das fontes). Quarto, por encerrar a pauta mnima de proteo dos consumidores.

    1.2. O CDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR COMO NORMA PRINCIPIOLGICA. SUAPOSIO HIERRQUICA

  • O Cdigo de Defesa do Consumidor norma que tem relao direta com a terceira gerao, era oudimenso de direitos.12 Nesse contexto, comum relacionar as trs primeiras geraes, eras oudimenses com os princpios da Revoluo Francesa. Pontue-se que a referida diviso das geraes dedireitos foi idealizada pelo jurista tcheco Karel Vasak, em 1979, em exposio feita em aula inaugural noInstituto Internacional dos Direitos Humanos, em Estrasburgo, Frana.

    Os direitos de primeira gerao ou dimenso so aqueles relacionados com o princpio da liberdade.Os de segunda gerao ou dimenso, com o princpio da igualdade. Os direitos de terceira gerao oudimenso so relativos ao princpio da fraternidade. Na verdade, o Cdigo de Defesa do Consumidortem relao com todas as trs dimenses. Todavia, melhor enquadr-lo na terceira dimenso, j que aLei Consumerista visa pacificao social, na tentativa de equilibrar a dspar relao existente entrefornecedores e prestadores.

    Na atualidade, j se fala em outras duas outras geraes ou dimenses de direitos. A quarta dimensoestaria sincronizada com a proteo do patrimnio gentico (DNA), com a intimidade biolgica. Por fim,a quinta dimenso seria aquela relativa ao mundo digital ou ciberntico, com o Direito Eletrnico ouDigital. No se ignore que a relao de consumo tambm pode enquadrar as duas ltimas dimenses.Vejamos, de forma detalhada:

    1 Gerao: Princpio da Liberdade.2 Gerao: Princpio da Igualdade.3 Gerao: Princpio da Fraternidade (pacificao social). Aqui melhor se enquadraria o Cdigo de Defesa do Consumidor.4 Gerao: Proteo do patrimnio gentico.5 Gerao: Proteo de direitos no mundo digital.

    Pois bem, o Cdigo de Defesa do Consumidor tido pela doutrina como uma norma principiolgica,diante da proteo constitucional dos consumidores, que consta, especialmente, do art. 5, XXXII, daConstituio Federal de 1988, ao enunciar que o Estado promover, na forma da lei, a defesa doconsumidor. A propsito dessa questo, precisas so as lies de Luiz Antonio Rizzatto Nunes:

    A Lei n. 8.078 norma de ordem pblica e de interesse social, geral e principiolgica, o que significa dizer que prevalente sobretodas as demais normas especiais anteriores que com ela colidirem. As normas gerais principiolgicas, pelos motivos que apresentamosno incio deste trabalho ao demonstrar o valor superior dos princpios, tm prevalncia sobre as normas gerais e especiaisanteriores.13

    Destaque-se que, do mesmo modo, a respeito do carter de norma principiolgica, opinam NelsonNery Jr. e Rosa Maria de Andrade Nery, expondo pela prevalncia contnua do Cdigo Consumeristasobre as demais normas, eis que as leis especiais setorizadas (v.g., seguros, bancos, calados,transportes, servios, automveis, alimentos etc.) devem disciplinar suas respectivas matrias emconsonncia e em obedincia aos princpios fundamentais do CDC.14

    Diante de tais premissas, pode-se dizer que o Cdigo de Defesa do Consumidor tem eficciasupralegal, ou seja, est em um ponto hierrquico intermedirio entre a Constituio Federal de 1988 eas leis ordinrias. Para tal deduo jurdica, pode ser utilizada a simbologia do sistema piramidal,atribuda a Hans Kelsen.15 Vejamos:

  • Como exemplo dessa concluso, pode ser citado o problema relativo Conveno de Varsvia e Conveno de Montreal, tratados internacionais dos quais o Brasil signatrio e que preveem tarifaode indenizao no transporte areo internacional, nos casos de cancelamento e atraso de voos, bem comode extravio de bagagem. Deve ficar claro que tais tratados internacionais no so convenes de direitoshumanos, no tendo a fora de emendas Constituio, como consta do art. 5, 3, da ConstituioFederal, na redao dada pela Emenda Constitucional 45/2004.

    Ora, tais convenes internacionais colidem com o princpio da reparao integral dos danos,retirado do art. 6, VI, da Lei 8.078/1990, que reconhece como direito bsico do consumidor a efetivareparao dos danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos, afastando qualquerpossibilidade de tabelamento ou tarifao de indenizao em desfavor dos consumidores. Diante dacitada posio intermediria ou supralegal do Cdigo de Defesa do Consumidor, a norma consumeristadeve prevalecer sobre as citadas fontes internacionais.

    Em complemento, para a efetiva incidncia do CDC ao transporte areo, merece destaque aargumentao desenvolvida por Marco Fbio Morsello, no sentido de que a norma consumerista sempredeve prevalecer, por seu carter mais especial, tendo o que ele denomina como segmentao horizontal.De outra forma, sustenta que a matria consumerista agrupada pela funo e no pelo objeto.16

    Ademais, no se pode esquecer que as fontes do Direito Internacional Pblico, caso das citadasconvenes, no podem entrar em conflito com as normas internas de ordem pblica, como o caso doCdigo Consumerista. Nessa linha, preceitua o art. 17 da Lei de Introduo s Normas do DireitoBrasileiro que As leis, atos e sentenas de outro pas, bem como quaisquer declaraes de vontade, notero eficcia no Brasil, quando ofenderem a soberania nacional, a ordem pblica e os bons costumes.

    A prevalncia do Cdigo de Defesa do Consumidor sobre a Conveno de Varsvia vem sendoaplicada h tempos pelos Tribunais Superiores. De incio, vejamos deciso do Supremo TribunalFederal, de maro de 2009:

    Recurso extraordinrio. Danos morais decorrentes de atraso ocorrido em voo internacional. Aplicao do Cdigo de Defesa doConsumidor. Matria infraconstitucional. No conhecimento. 1. O princpio da defesa do consumidor se aplica a todo o captuloconstitucional da atividade econmica. 2. Afastam-se as normas especiais do Cdigo Brasileiro da Aeronutica e da Conveno deVarsvia quando implicarem retrocesso social ou vilipndio aos direitos assegurados pelo Cdigo de Defesa do Consumidor. 3. Nocabe discutir, na instncia extraordinria, sobre a correta aplicao do Cdigo de Defesa do Consumidor ou sobre a incidncia, no casoconcreto, de especficas normas de consumo veiculadas em legislao especial sobre o transporte areo internacional. Ofensa indireta Constituio da Repblica. 4. Recurso no conhecido (STF RE 351.750-3/RJ Primeira Turma Rel. Min. Carlos Britto j.17.03.2009 DJE 25.09.2009, p. 69).

    No tem sido diferente a concluso do Superior Tribunal de Justia, em inmeros julgados. Por todos,

  • entre os mais recentes:

    Processual civil. Embargos de declarao no agravo regimental no agravo de instrumento. Seguro. Ao regressiva.Responsabilidade civil. Indenizao. Clculo. Conveno de Varsvia. Inaplicabilidade. Cdigo de Defesa do Consumidor. Incidncia.Multa. Pargrafo nico, art. 538 do CPC. Embargos rejeitados (STJ EDcl-AgRg-Ag 804.618/SP Quarta Turma Rel. Min. AldirGuimares Passarinho Junior j. 14.12.2010 DJE 17.12.2010).

    Agravo regimental no agravo de instrumento. Transporte areo internacional. Extravio de bagagem. Cdigo de Defesa doConsumidor. Prevalncia. Conveno de Varsvia. Quantum indenizatrio. Reduo. Impossibilidade. Dissdio no configurado. 1. Ajurisprudncia dominante desta Corte Superior se orienta no sentido de prevalncia das normas do CDC, em detrimento das normasinsertas na Conveno de Varsvia, aos casos de extravio de bagagem, em transporte areo internacional. 2. No que concerne caracterizao do dissenso pretoriano para reduo do quantum indenizatrio, impende ressaltar que as circunstncias que levam oTribunal de origem a fixar o valor da indenizao por danos morais so de carter personalssimo e levam em conta questessubjetivas, o que dificulta ou mesmo impossibilita a comparao, de forma objetiva, para efeito de configurao da divergncia, comoutras decises assemelhadas. 3. Agravo regimental a que se nega provimento (STJ AgRg-Ag 1.278.321/SP Terceira Turma Rel. Des. Conv. Vasco Della Giustina j. 18.11.2010 DJE 25.11.2010).

    Agravo regimental. Recurso especial. Extravio de bagagem. Indenizao ampla. Cdigo de Defesa do Consumidor. 1. firme ajurisprudncia desta Corte no sentido de que, aps a edio do Cdigo de Defesa do Consumidor, no mais prevalece a tarifaoprevista na Conveno de Varsvia. Incidncia do princpio da ampla reparao. Precedentes. 2. Agravo regimental desprovido (STJ AgRg-REsp 262.687/SP Quarta Turma Rel. Min. Fernando Gonalves j. 15.12.2009 DJE 22.02.2010).

    Por todos os argumentos expostos, a concluso deve ser a mesma em casos envolvendo a maisrecente Conveno de Montreal, que, do mesmo modo, limita a indenizao no transporte areointernacional, na linha da tese desenvolvida pelo magistrado e jurista Marco Fbio Morsello, outroracitada. Essa, alis, j vem sendo a concluso dos nossos Tribunais:

    Agravo regimental no agravo de instrumento. Transporte areo internacional. Atraso de voo. Cdigo de Defesa do Consumidor.Convenes internacionais. Responsabilidade objetiva. Riscos inerentes atividade. Fundamento inatacado. Smula 283 do STF.Quantum indenizatrio. Reduo. Impossibilidade. Dissdio no configurado. 1. A jurisprudncia dominante desta Corte Superior seorienta no sentido de prevalncia das normas do CDC, em detrimento das Convenes Internacionais, como a Conveno de Montreal,precedida pela Conveno de Varsvia, aos casos de atraso de voo, em transporte areo internacional. 2. O Tribunal de origemfundamentou sua deciso na responsabilidade objetiva da empresa area, tendo em vista que os riscos so inerentes prpria atividadedesenvolvida, no podendo ser reconhecido o caso fortuito como causa excludente da responsabilizao. Tais argumentos, porm, noforam atacados pela agravante, o que atrai, por analogia, a incidncia da Smula 283 do STF. 3. No que concerne caracterizao dodissenso pretoriano para reduo do quantum indenizatrio, impende ressaltar que as circunstncias que levam o Tribunal de origem afixar o valor da indenizao por danos morais so de carter personalssimo e levam em conta questes subjetivas, o que dificulta oumesmo impossibilita a comparao, de forma objetiva, para efeito de configurao da divergncia, com outras decises assemelhadas.4. Agravo regimental a que se nega provimento (STJ AgRg no Ag 1.343.941/RJ Terceira Turma Rel. Des. Conv. Vasco DellaGiustina j. 18.11.2010 DJe 25.11.2010).

    Ao de indenizao. Extravio de bagagem. Relao regida pelo CDC. Danos materiais e morais. Cabimento. Quantum. Oextravio de bagagem enseja indenizao por danos morais e pelo valor gasto na aquisio de roupas e objetos de uso pessoal. Deve aindenizao por danos materiais em casos de extravio de bagagem, em viagens internacionais, equivaler a todo o prejuzo sofrido,devendo ser integral, ampla, no tarifada, no se aplicando o Pacto de Varsvia, nem a Conveno de Montreal, mas o Cdigo deDefesa do Consumidor. evidente o dano moral do viajante que perde sua bagagem, sofrendo constrangimentos, angstias e aflies.O quantum da indenizao por danos morais deve ser fixado com prudente arbtrio, para que no haja enriquecimento custa doempobrecimento alheio, mas tambm para que o valor no seja irrisrio (TJMG Apelao cvel 7886810-67.2007.8.13.0024, BeloHorizonte Nona Cmara Cvel Rel. Des. Pedro Bernardes j. 25.01.2011 DJEMG 07.02.2011).

    Responsabilidade civil. Danos materiais e morais. Transporte areo internacional. Pacote turstico referente a reservas de hotel epassagem area, saindo de So Paulo com destino a Miami, com conexo em Atlanta. Atraso e perda de voo de conexo por culpa dacompanhia area r. O autor e sua famlia tiveram que dormir no aeroporto e voltar ao Brasil com recursos prprios. Ausncia deamparo material. Aplicabilidade do CDC e no aplicabilidade da Conveno de Montreal. Presentes os pressupostos indenizao.Danos materiais comprovados. Danos morais corretamente fixados. Devido o quantum arbitrado. Adequao Sentena de parcial

  • procedncia confirmada. Ratificao do julgado. Hiptese em que, estando a r. sentena suficientemente motivada, houve a anlisecorreta dos fundamentos de fato e de direito apresentados pelas partes, dando-se causa o deslinde justo e necessrio Aplicabilidadedo art. 252, do RI do TJSP. Sentena mantida. Recurso no provido (TJSP Apelao cvel 0281135-07.2010.8.26.0000 Acrdon. 4852799, So Paulo Trigsima Oitava Cmara de Direito Privado Rel. Des. Spencer Almeida Ferreira j. 24.11.2010 DJESP11.01.2011).

    Visualizada a posio do CDC no ordenamento jurdico nacional, bem como as concrees prticasdesse posicionamento, vejamos o estudo da aclamada teoria do dilogo das fontes.

    1.3. O CDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR E A TEORIA DO DILOGO DAS FONTES

    Tema fundamental para a compreenso do campo de incidncia do Cdigo de Defesa do Consumidorrefere-se sua interao em relao s demais leis, notadamente em relao ao vigente Cdigo Civil.

    Como notrio, prevalecia, na vigncia do Cdigo Civil de 1916, a ideia de que o Cdigo de Defesado Consumidor constituiria um microssistema jurdico autoaplicvel e autossuficiente, totalmente isoladodas demais normas.17 Assim, naquela outrora vigente realidade, havendo uma relao de consumo, seriaaplicado o Cdigo de Defesa do Consumidor e no o Cdigo Civil. Por outra via, presente uma relaocivil, incidiria o Cdigo Civil e no o CDC. Assim era ensinada a disciplina de Direito do Consumidorna dcada de noventa e na primeira dcada do sculo XXI.

    Porm, essa concepo foi superada com o surgimento do Cdigo Civil de 2002 e da teoria dodilogo das fontes. Tal tese foi desenvolvida na Alemanha por Erik Jayme, professor da Universidade deHeidelberg, e trazida ao Brasil pela notvel Claudia Lima Marques, da Universidade Federal do RioGrande do Sul. A essncia da teoria de que as normas jurdicas no se excluem supostamente porquepertencentes a ramos jurdicos distintos , mas se complementam. No Brasil, a principal incidncia dateoria se d justamente na interao entre o CDC e o CC/2002, em matrias como a responsabilidadecivil e o Direito Contratual. Do ponto de vista legal, a tese est baseada no art. 7 do CDC, que adota ummodelo aberto de interao legislativa. Repise-se que, de acordo com tal comando, os direitos previstosno CDC no excluem outros decorrentes de tratados ou convenes internacionais de que o Brasil sejasignatrio, da legislao interna ordinria, de regulamentos expedidos pelas autoridades administrativascompetentes, bem como dos que derivem dos princpios gerais do direito, analogia, costumes e equidade.Nesse contexto, possvel que a norma mais favorvel ao consumidor esteja fora da prpria LeiConsumerista, podendo o intrprete fazer a opo por esse preceito especfico.

    Uma das principais justificativas que podem surgir para a incidncia refere-se sua funcionalidade. cedio que vivemos um momento de exploso de leis, um Big Bang legislativo, como simbolizouRicardo Lorenzetti. O mundo ps-moderno e globalizado, complexo e abundante por natureza, convivecom uma quantidade enorme de normas jurdicas, a deixar o aplicador do Direito at desnorteado.Repise-se a convivncia com a era da desordem, conforme expe o mesmo Lorenzetti.18 O dilogo dasfontes serve como leme nessa tempestade de complexidade.

    Desse modo, diante do pluralismo ps-moderno, com inmeras fontes legais, surge a necessidade decoordenao entre as leis que fazem parte do mesmo ordenamento jurdico.19 A expresso felizjustamente pela adequao realidade social da ps-modernidade. Ao justificar o dilogo das fontes,esclarece Claudia Lima Marques que A bela expresso de Erik Jayme, hoje consagrada no Brasil,alerta-nos de que os tempos ps-modernos no mais permitem esse tipo de clareza ou monossoluo. Asoluo sistemtica ps-moderna, em um momento posterior descodificao, tpica e microrrecodificao, procura uma eficincia no s hierrquica, mas funcional do sistema plural e

  • complexo de nosso direito contemporneo, deve ser mais fluida, mais flexvel, tratar diferentemente osdiferentes, a permitir maior mobilidade e fineza de distino. Nestes tempos, a superao de paradigmas substituda pela convivncia dos paradigmas.20

    Como ensina a prpria jurista, h um dilogo diante de influncias recprocas, com a possibilidadede aplicao concomitante das duas normas ao mesmo tempo e ao mesmo caso, de forma complementarou subsidiria. H, assim, uma soluo que flexvel e aberta, de interpenetrao ou de busca, nosistema, da norma que seja mais favorvel ao vulnervel.21 Ainda, como afirma a doutrinadora em outraobra, O uso da expresso do mestre dilogo das fontes uma tentativa de expressar a necessidade deuma aplicao coerente das leis de direito privado, coexistentes no sistema. a denominada coernciaderivada ou restaurada (cohrence drive ou restaure ), que, em um momento posterior descodificao, tpica e microrrecodificao, procura uma eficincia no s hierrquica, masfuncional do sistema plural e complexo de nosso direito contemporneo, a evitar a antinomia, aincompatibilidade ou a no coerncia.22

    A possibilitar tal interao no que concerne s relaes obrigacionais, sabe-se que houve umaaproximao principiolgica entre o CDC e o CC/2002 no que tange aos contratos. Essa aproximaoprincipiolgica se deu pelos princpios sociais contratuais, que j estavam presentes na LeiConsumerista e foram transpostos para a codificao privada, quais sejam os princpios da autonomiaprivada, da boa-f objetiva e da funo social dos contratos. Nesse sentido e no campo doutrinrio, na IIIJornada de Direito Civil, evento promovido pelo Conselho da Justia Federal e pelo Superior Tribunalde Justia no ano de 2002, aprovou-se o Enunciado n. 167, in verbis: Com o advento do Cdigo Civilde 2002, houve forte aproximao principiolgica entre esse Cdigo e o Cdigo de Defesa doConsumidor, no que respeita regulao contratual, uma vez que ambos so incorporadores de uma novateoria geral dos contratos.

    Por isso, os defensores dos consumidores, como o presente autor, no devem temer o Cdigo Civil de2002, como temiam o Cdigo Civil de 1916, norma essencialmente individualista e egostica. Como oCdigo Civil de 2002 pode servir tambm para a tutela efetiva dos consumidores, como se ver, supera-se, ento, no que tange aos contratos, a ideia de que o Cdigo Consumerista seria um microssistemajurdico, totalmente isolado do Cdigo Civil de 2002.

    Simbologicamente, pode-se dizer que, pela teoria do dilogo das fontes, supera-se a interpretaoinsular do Direito, segundo a qual cada ramo do conhecimento jurdico representaria uma ilha (smbolocriado por Jos Fernando Simo). O Direito passa a ser visualizado, assim, como um sistema solar(interpretao sistemtica e planetria), em que os planetas so os Cdigos, os satlites so osestatutos prprios (caso do CDC) e o Sol a Constituio Federal, irradiando seus raios solares seusprincpios por todo o sistema (figura de Ricardo Luis Lorenzetti). Vejamos tais visualizaes, de formaesquematizada:

  • Dilogo das Fontes

    Deve ficar claro, contudo, e de antemo, que, apesar do termo Cdigo, o CDC no tem um papelcentral no Direito Privado, como tem o Cdigo Civil Brasileiro. Isso porque os conceitos fundamentaisprivados constam da codificao privada, e no da Lei Consumerista. A ttulo de exemplo, o CDC tratada prescrio e da decadncia, dos contratos de consumo e da responsabilidade civil consumerista.Todavia, os conceitos estruturantes de tais institutos constam do Cdigo Civil de 2002, como se ver napresente obra.

    Pois bem, Claudia Lima Marques demonstra trs dilogos possveis a partir da teoria exposta:23

    a) Havendo aplicao simultnea das duas leis, se uma lei servir de base conceitual para a outra, estar presente o dilogosistemtico de coerncia. Exemplo: os conceitos dos contratos de espcie podem ser retirados do Cdigo Civil, mesmosendo o contrato de consumo, caso de uma compra e venda (art. 481 do CC).

    b) Se o caso for de aplicao coordenada de duas leis, uma norma pode completar a outra, de forma direta (dilogo decomplementaridade) ou indireta (dilogo de subsidiariedade). O exemplo tpico ocorre com os contratos de consumoque tambm so de adeso. Em relao s clusulas abusivas, pode ser invocada a proteo dos consumidoresconstante do art. 51 do CDC e, ainda, a proteo dos aderentes constante do art. 424 do CC.

    c) Os dilogos de influncias recprocas sistemticas esto presentes quando os conceitos estruturais de uma determinadalei sofrem influncias da outra. Assim, o conceito de consumidor pode sofrer influncias do prprio Cdigo Civil.Como afirma a prpria Claudia Lima Marques, a influncia do sistema especial no geral e do geral no especial, umdilogo de doubl sens (dilogo de coordenao e adaptao sistemtica).

    Analisadas tais premissas fundamentais, interessante trazer colao, com os devidos comentrios,alguns julgados nacionais que aplicaram a teoria do dilogo das fontes, propondo uma interao entre oCdigo Civil de 2002 e o Cdigo de Defesa do Consumidor. De imediato, da recente jurisprudncia doSuperior Tribunal de Justia, colaciona-se a seguinte ementa:

    Ao civil pblica. Contrato de arrendamento mercantil leasing. Clusula de seguro. Abusividade. Inocorrncia. 1. No se pode

  • interpretar o Cdigo de Defesa do Consumidor de modo a tornar qualquer encargo contratual atribudo ao consumidor como abusivo,sem observar que as relaes contratuais se estabelecem, igualmente, atravs de regras de direito civil. 2. O CDC no exclui aprincipiologia dos contratos de direito civil. Entre as normas consumeristas e as regras gerais dos contratos, insertas no Cdigo Civil elegislao extravagante, deve haver complementao e no excluso. o que a doutrina chama de Dilogo das Fontes. 3. Ante anatureza do contrato de arrendamento mercantil ou leasing, em que pese a empresa arrendante figurar como proprietria do bem, oarrendatrio possui o dever de conservar o bem arrendado, para que ao final da avena, exercendo o seu direito, prorrogue o contrato,compre ou devolva o bem. 4. A clusula que obriga o arrendatrio a contratar seguro em nome da arrendante no abusiva, poisaquele possui dever de conservao do bem, usufruindo da coisa como se dono fosse, suportando, em razo disso, riscos e encargosinerentes a sua obrigao. O seguro, nessas circunstncias, garantia para o cumprimento da avena, protegendo o patrimnio doarrendante, bem como o indivduo de infortnios. 5. Rejeita-se, contudo, a venda casada, podendo o seguro ser realizado em qualquerseguradora de livre escolha do interessado 6. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extenso, provido (STJ REsp1.060.515/DF Quarta Turma Rel. Des. Conv. Honildo Amaral de Mello Castro j. 04.05.2010 DJe 24.05.2010).

    Ainda no plano do STJ, anote-se que aquela jurisprudncia superior j debateu, com base no dilogodas fontes, a incidncia ou no do prazo geral de prescrio do Cdigo Civil na situao envolvendo otabagismo, por ser o prazo maior mais favorvel ao consumidor. Destaque-se que o tema ainda seraprofundado na presente obra. No presente momento, colaciona-se apenas a ementa do julgado, pelameno expressa teoria:

    Consumidor e civil. Art. 7 do CDC. Aplicao da lei mais favorvel. Dilogo de fontes. Relativizao do princpio daespecialidade. Responsabilidade civil. Tabagismo. Relao de consumo. Ao indenizatria. Prescrio. Prazo. O mandamentoconstitucional de proteo do consumidor deve ser cumprido por todo o sistema jurdico, em dilogo de fontes, e no somente porintermdio do CDC. Assim, e nos termos do art. 7 do CDC, sempre que uma lei garantir algum direito para o consumidor, ela poderse somar ao microssistema do CDC, incorporando-se na tutela especial e tendo a mesma preferncia no trato da relao de consumo.Diante disso, conclui-se pela inaplicabilidade do prazo prescricional do art. 27 do CDC hiptese dos autos, devendo incidir aprescrio vintenria do art. 177 do CC/1916, por ser mais favorvel ao consumidor. Recente deciso da 2 Seo, porm, pacificou oentendimento quanto incidncia na espcie do prazo prescricional de 5 anos previsto no art. 27 do CDC, que deve prevalecer, com aressalva do entendimento pessoal da Relatora. Recursos especiais providos (STJ REsp 1009591/RS Terceira Turma Rel. Min.Nancy Andrighi , j. 13.04.2010 DJe 23.08.2010).

    Da mesma maneira, concretizando a teoria e limitando os juros cobrados em carto de crdito,deciso do Tribunal de Justia da Bahia, entre tantas ementas que se repetem:

    Consumidor. Carto de crdito. Juros abusivos. Cdigo de Defesa do Consumidor. Juros: estipulao usurria pecuniria ou real.Trata-se de crime previsto na Lei 1.521/1951, art. 4. Limitao prevista na Lei 4.595/1964 e nas normas do Conselho MonetrioNacional, regulao vigorante, ainda que depois da revogao do art. 192 da CF/1988, pela Emenda Constitucional 40, de 2003.Manuteno da razoabilidade e limitao de prtica de juros pelo art. 161 do CTN combinando com 406 e 591 do CC/2002. A clusulageral da boa-f est presente tanto no Cdigo de Defesa do Consumidor (arts. 4, III, e 51, IV, e 1, do CDC) como no Cdigo Civilde 2002 (arts. 113, 187 e 422, do CC/2002), que devem atuar em dilogo (dilogo das fontes, na expresso de Erik Jayme) e sob a luzda Constituio e dos direitos fundamentais para proteger os direitos dos consumidores (art. 7 do CDC). Relembre-se, aqui, portanto,o Enunciado de n. 25 da Jornada de Direito Civil, organizada pelo STJ em 2002, que afirma: a clusula geral contida no art. 422 donovo Cdigo Civil impe ao juiz interpretar e, quando necessrio, suprir e corrigir o contrato segundo a boa-f objetiva, entendida comoexigncia de comportamento legal dos contratantes. Recurso improcedente (TJBA Recurso 0204106-62.2007.805.0001-1 Segunda Turma Recursal Rel. Juza Nicia Olga Andrade de Souza Dantas DJBA 25.01.2010).

    Do Tribunal do Rio Grande do Norte, da mesma maneira tentando uma aproximao conceitual entreos dois Cdigos, colaciona-se:

    Civil. CDC. Processo Civil. Apelao cvel. Juzo de admissibilidade positivo. Ao de indenizao por danos morais. Contrato depromessa de compra e venda de imvel. Notificao cartorria. Cobrana indevida. Prestao de servios. Relao de consumoconfigurada. Incidncia do Cdigo Civil. Dilogo das fontes. Responsabilidade objetiva. Vcio de qualidade. Dano moral. configurado.Dano honra. Abalo sade. Quantum indenizatrio excessivo. Reduo. Minorao da condenao em honorrios advocatcios.Recurso conhecido e provido em parte (TJRN Acrdo 2009.010644-0, Natal Terceira Cmara Cvel Rel. Juza Conv. Maria

  • Neize de Andrade Fernandes DJRN 03.12.2009, p. 39).

    Tratando da coexistncia entre as leis, enunciado fundamental da teoria do dilogo das fontes,destaque-se deciso do Tribunal do Rio Grande do Sul:

    Embargos de declarao. Ensino particular. Desnecessidade de debater todos os argumentos das partes. Aplicao do Cdigo deDefesa do Consumidor. Dilogo das fontes. 1. Formada a convico pelo julgador que j encontrou motivao suficiente para alicerarsua deciso, e fundamentada nesse sentido, consideram-se afastadas teses, normas ou argumentos porventura esgrimidos em sentidosdiversos. 2. Em matria de consumidor vige um mtodo de superao das antinomias chamado de dilogo das fontes, segundo o qual odiploma consumerista coexiste com as demais fontes de direito como o Cdigo Civil e Leis esparsas. Embargos desacolhidos (TJRS Embargos de Declarao 70027747146, Caxias do Sul Sexta Cmara Cvel Rel. Des. Lige Puricelli Pires j. 18.12.2008 DOERS 05.02.2009, p. 43).

    Por fim, sem prejuzo de inmeros outros julgados que utilizaram a teoria do dilogo das fontes,merecem relevo os seguintes acrdos do Tribunal de So Paulo, do mesmo modo buscando umacomplementaridade entre o CC/2002 e o CDC:

    Civil. Compromisso de compra e venda de imvel. Transao. Carta de crdito. Relao de consumo. Lei 8.078/1990. Dilogodas fontes. Abusividade das condies consignadas em carta de crdito. Validade do instrumento quanto ao reconhecimento de dvida.Processual civil. Honorrios. Princpio da sucumbncia e da causalidade. Arbitramento em conformidade com o disposto no art. 20, 3 do CPC. Recurso desprovido (TJSP Apelao com reviso 293.227.4/4 Acrdo 3233316, So Paulo Segunda Cmara deDireito Privado Rel. Des. Boris Padron Kauffmann j. 09.09.2008 DJESP 01.10.2008).

    Responsabilidade civil. Defeito em construo. Contrato de empreitada mista. Responsabilidade objetiva do empreiteiro. Anliseconjunta do CC e CDC. Dilogo das fontes. Sentena mantida. Recurso improvido (TJSP Apelao com reviso 281.083.4/3 Acrdo 3196517, Bauru Oitava Cmara de Direito Privado Rel. Des. Caetano Lagrasta j. 21.08.2008, DJESP 09.09.2008).

    Responsabilidade civil por vcios de construo. Desconformidade entre o projeto e a obra. Paredes de espessura inferior sconstantes do projeto, que provocam alteraes acsticas e de temperatura nas unidades autnomas. Responsabilidade daincorporadora e construtora pela correta execuo do empreendimento. Vinculao da incorporadora e construtora execuo dasbenfeitorias prometidas, que integram o preo. Desvalorizao do empreendimento. Indenizao pelos vcios de construo e pelasdesconformidades com o projeto original e a oferta aos adquirentes das unidades. Inocorrncia de prescrio ou decadncia dapretenso ou direito indenizao. Incidncia do prazo prescricional de solidez da obra do Cdigo Civil. Dilogo das fontes com oCdigo de Defesa do Consumidor. Ao procedente. Recurso improvido (TJSP Apelao cvel 407.157.4/8 Acrdo 2635077,Piracicaba Quarta Cmara de Direito Privado Rel. Des. Francisco Loureiro j. 29.05.2008 DJESP 20.06.2008).

    Superadas tais ilustraes, deve ficar bem claro que a teoria do dilogo das fontes realidadeinafastvel do Direito do Consumidor no Brasil. Sendo assim, tal premissa terica, por diversas vezes,ser utilizada como linha de argumentao na presente obra. De toda sorte, cumpre destacar que a teoriado dilogo das fontes surge para substituir e superar os critrios clssicos de soluo das antinomiasjurdicas (hierrquico, da especialidade e cronolgico). Realmente, esse ser o seu papel no futuro. Nomomento, ainda possvel conciliar tais critrios com a aclamada tese.

    1.4. O CONTEDO DO CDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR E A ORGANIZAO DAPRESENTE OBRA

    Este livro procura analisar os principais conceitos e construes que constam da Lei 8.078, de 11 desetembro de 1990, conhecido como Cdigo de Defesa do Consumidor em seus aspectos materiais eprocessuais. A sua organizao segue justamente a diviso metodolgica constante naquela lei.

    Desse modo, superada a presente introduo, o Captulo 2 desta obra aborda os princpios

  • estruturantes do Cdigo Brasileiro de Direito do Consumidor, retirados dos arts. 4 e 6 da Lei8.078/1990.

    Em continuidade, no Captulo 3 so estudados os elementos da relao jurdica de consumo(elementos subjetivos e objetivos), tendo como parmetros estruturais os arts. 2 e 3 do CDC, semprejuzo de outros comandos, caso dos seus arts. 17 e 29, que tratam do conceito do consumidor porequiparao ou bystander.

    No Captulo 4, o cerne do estudo a responsabilidade civil dos fornecedores de produtos eprestadores de servios, um dos temas mais importantes do Direito do Consumidor na atualidade, matriatratada entre os arts. 8 a 27.

    O Captulo 5 tem por objeto a proteo contratual dos consumidores, constante dos arts. 46 a 54,captulo que tambm traz regras fundamentais para a realidade contempornea consumerista.

    Tendo por objeto tambm as prticas comerciais, assim como o tpico anterior, o Captulo 6 abordaa proteo dos consumidores quanto oferta e publicidade, com enfoque terico e prtico (arts. 30 a 38).

    No Captulo 7, ainda com relao s prticas comerciais, verifica-se o estudo das prticas abusivas,tendo como parmetro os arts. 30 a 42-A da Lei Consumerista.

    O importante e atual tema dos cadastros de consumidores a matria do Captulo 8 deste livro, comanlise da natureza dos cadastros positivos e negativos (arts. 43 e 44 do CDC), luz da melhor doutrinae da atual jurisprudncia. O Captulo 9 trata de aspectos materiais da desconsiderao da personalidadejurdica tratada pelo CDC.

    Esses nove primeiros captulos foram desenvolvidos pelo presente autor.O Captulo 10 analisa questes da defesa individual do consumidor em juzo. O Captulo 11 aborda a

    tutela coletiva do consumidor. O Captulo 12 trata de aspectos processuais relativos desconsideraoda personalidade jurdica. No Captulo 13, o tema a Ordem Pblica e o Direito do Consumidor. Porfim, o Captulo 14 encerra o tema do habeas data na tica do CDC. Os cinco ltimos captulos foramescritos pelo coautor Daniel Amorim Assumpo Neves.

    Vejamos, ento, todos esses institutos, de forma sucessiva e aprofundada.

  • ________1 Conforme se extrai da obra Cdigo de Defesa do Consumidor. Comentado pelos autores do Anteprojeto, de autoria de Ada

    Pellegrini Grinover e outros (8. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitria, 2004. p. 1).2 BITTAR, Eduardo C. B. O direito na ps-modernidade. Rio de Janeiro: Forense Universitria, 2005. p. 97-100.3 BITTAR, Eduardo C. B. O direito na ps-modernidade, cit., p. 108.4 JAPIASSU, Hilton Ferreira. A crise da razo no ocidente. Disponvel em: . Acesso em: 17 mar. 2009.5 JAYME, Erik. O direito internacional privado do novo milnio: a proteo da pessoa humana em face da globalizao. Trad. Claudia Lima

    Marques e Ndia de Arajo. In: MARQUES, Claudia Lima; ARAJO, Ndia de (Coord.). O novo direito internacional. Estudos emhomenagem a Erik Jayme. Rio de Janeiro: Renovar, 2005. p. 4.

    6 JAYME, Erik. Il diritto internazionale privato estense. Revista di Diritto Internazionale Privato e Processuale. Estrato. Diretta daFausto Pocar, Tullio Treves, Sergio M. Carbone, Andrea Giardina, Riccardo Luzzatto, Franco Mosconi, Padova: Cedam, ano XXXII, n. 1,Gennaio/Marzo 1996. p. 18.

    7 JAYME, Erik. Il diritto internazionale privato estense, cit., p. 18.8 Ver: LORENZETTI, Ricardo Luis. Fundamentos do direito privado. Trad. Vera Maria Jacob Fradera. So Paulo: RT, 1998. p. 44;

    LORENZETTI, Ricardo Luis. Teoria da deciso judicial. Fundamentos de direito. Trad. Bruno Miragem. Notas e reviso da traduoClaudia Lima Marques. So Paulo: RT, 2009. p. 43.

    9 MARQUES, Claudia Lima. Comentrios ao Cdigo de Defesa do Consumidor. So Paulo: RT, 2004. p. 26, nota n. 3. Trata-se daintroduo obra coletiva escrita em coautoria com Antonio Herman de V. Benjamin e Bruno Miragem, em que a doutrinadora expe ateoria do dilogo das fontes.

    10 AZEVEDO, Antonio Junqueira de. Parecer. O direito como sistema complexo e de 2 ordem; sua autonomia. Ato nulo e ato ilcito.Diferena de esprito entre responsabilidade civil e penal. Necessidade de prejuzo para haver direito a indenizao na responsabilidadecivil. Estudos e pareceres de direito privado. So Paulo: Saraiva, 2004. p. 26-27.

    11 LORENZETTI, Ricardo Luis. Teoria da deciso judicial. Fundamentos de direito, cit., p. 359-360.12 Sobre o tema: BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. So Paulo: Campus, 2004.13 RIZZATTO NUNES, Luiz Antonio. Comentrios ao Cdigo de Defesa do Consumidor. 3. ed. So Paulo: Saraiva, 2007. p. 91.14 NERY JR., Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Cdigo Civil Anotado. 2. ed. So Paulo: RT, 2003. p. 906.15 KELSEN, Hans. Teoria pura do Direito. 8. ed. So Paulo: Martins Fontes, 2009.16 MORSELLO, Marco Fbio. Responsabilidade civil no transporte areo. So Paulo: Atlas, 2006. p. 419.17 Nesse sentido, por exemplo: RIZZATTO NUNES, Luiz Antonio. Comentrios ao Cdigo de Defesa do Consumidor, cit., p. 93-94.18 Todos os referenciais tericos do jurista argentino constam em: LORENZETTI, Ricardo Luis. Teoria da deciso judicial, cit.19 MARQUES, Claudia Lima; BENJAMIN, Antonio Herman; MIRAGEM, Bruno. Comentrios ao Cdigo de Defesa do Consumidor.

    2. ed. So Paulo: RT, 2005. p. 26.20 MARQUES, Claudia Lima; BENJAMIN, Antonio Herman; BESSA, Leonardo Roscoe. Manual de direito do consumidor. So Paulo:

    RT, 2008. p. 89.21 MARQUES, Claudia Lima; BENJAMIN, Antonio Herman; MIRAGEM, Bruno. Comentrios ao Cdigo de Defesa do Consumidor,

    cit., p. 29.22 MARQUES, Claudia Lima. Manual de direito do consumidor, cit., p. 87.23 MARQUES, Claudia Lima; BENJAMIN, Antonio Herman; BESSA, Leonardo Roscoe. Manual de Direito do Consumidor, cit., p. 91.

  • PRINCPIOS FUNDAMENTAIS DO CDIGO DE DEFESA DOCONSUMIDOR

    Sumrio: 2.1. Primeiras palavras sobre os princpios jurdicos 2.2. Princpio do protecionismo do consumidor (art.1 da Lei 8.078/1990) 2.3. Princpio da vulnerabilidade do consumidor (art. 4, inc. I, da Lei 8.078/1990) 2.4.Princpio da hipossuficincia do consumidor (art. 6, inc. VIII, da Lei 8.078/1990) 2.5. Princpio da boa-f objetiva (art.4, inc. III, da Lei 8.078/1990) 2.6. Princpio da transparncia ou da confiana (arts. 4, caput, e 6, inc. III, da Lei8.078/1990). A tutela da informao 2.7. Princpio da funo social do contrato 2.8. Princpio da equivalncianegocial (art. 6, inc. II, da Lei 8.078/1990) 2.9. Princpio da reparao integral dos danos (art. 6, inc. VI, da Lei8.078/1990). Os danos reparveis nas relaes de consumo.

    2.1. PRIMEIRAS PALAVRAS SOBRE OS PRINCPIOS JURDICOS

    O estudo dos princpios consagrados pelo Cdigo de Defesa do Consumidor um dos pontos departida para a compreenso do sistema adotado pela Lei Consumerista como norma protetiva dosvulnerveis negociais. Como notrio, a Lei 8.078/1990 adotou um sistema aberto de proteo, baseadoem conceitos legais indeterminados e construes vagas, que possibilitam uma melhor adequao dospreceitos s circunstncias do caso concreto.

    Nesse contexto, interessante fazer a devida confrontao princiolgica entre o CDC e o CdigoCivil, at porque muitos dos conceitos que constam da codificao privada de 2002 encontram suasrazes na Lei 8.078/1990. Certo que, diante de diferenas principiolgicas histricas e polticas, oCdigo de Defesa do Consumidor encontrava-se muito distante do Cdigo Civil de 1916, realidade essaalterada a partir da vigncia do Cdigo Civil de 2002, como foi exposto no captulo introdutrio destaobra.

    O Cdigo Civil de 1916 era uma norma essencialmente agrarista, patrimonialista e egosta, que noprotegia qualquer parte vulnervel da relao jurdica estabelecida. Na verdade, como expe RodolfoPamplona Filho em suas palestras, o Cdigo Civil de 1916 era norma estruturada apenas para o amparode uma figura jurdica: o fazendeiro casado. Por outra via, o Cdigo Civil de 2002, alm de proteger oaderente contratual como parte mais fraca da relao (arts. 423 e 424), consagra muitos preceitos jprevistos na lei protetiva, tais como a vedao do abuso de direito e da onerosidade excessiva, avalorizao da boa-f objetiva e da tutela da confiana, a responsabilidade objetiva fundada no risco, aproibio do enriquecimento sem causa, entre outros.

    Diante da aproximao das duas leis, como foi demonstrado no Captulo 1 desta obra, Claudia Lima

  • Marques, a partir dos ensinamentos de Erik Jayme, prope dilogos de interao entre o Cdigo deDefesa do Consumidor e o atual Cdigo Civil, buscando estabelecer premissas para um dilogosistemtico de coerncia, de complementaridade e de subsidiariedade, de coordenao e adaptaosistemtica.1 Nesse contexto de balizamento, Claudia Lima Marques leciona que o novo Cdigo Civilbrasileiro, Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (a seguir CC/2002), traz ao direito privado brasileirogeral os mesmos princpios j presentes no Cdigo de Defesa do Consumidor (como a funo social doscontratos, a boa-f objetiva etc.).2 Isso porque a convergncia de princpios entre o CDC e o CC/2002 a base da inexistncia principiolgica de conflitos possveis entre estas duas leis que, com igualdade eequidade, visam a harmonia nas relaes civis em geral e nas de consumo ou especiais. Como ensina aMin. Eliana Calmon: O Cdigo de Defesa do Consumidor diploma legislativo que j se amolda aosnovos postulados, inscritos como princpios ticos, tais como a boa-f, lealdade, cooperao, equilbrioe harmonia das relaes.3

    Justamente por isso, repise-se que, quando da III Jornada de Direito Civil, promovida peloConselho da Justia Federal e pelo Superior Tribunal de Justia em dezembro de 2004, foi aprovado oEnunciado n. 167, com teor muito prximo ao texto acima transcrito. Conforme proposta do magistradoparaibano Wladimir Alcibades Marinho Falco Cunha, o enunciado doutrinrio aponta que, com oadvento do Cdigo Civil de 2002, houve forte aproximao principiolgica desse Cdigo em relao aoCdigo de Defesa do Consumidor no que respeita regulao contratual, eis que ambos soincorporadores de uma nova teoria geral dos contratos. Das justificativas apresentadas pelo jovemjurista, merece destaque o seguinte trecho:

    Entretanto pode-se dizer que, at o advento do Cdigo Civil de 2002, somente o Cdigo de Defesa do Consumidor encampavaessa nova concepo contratual, ou seja, somente o CDC intervinha diretamente no contedo material dos contratos. Entretanto, oCdigo Civil de 2002 passou tambm a incorporar esse carter cogente no trato das relaes contratuais, intervindo diretamente nocontedo material dos contratos, em especial atravs dos prprios novos princpios contratuais da funo social, da boa-f objetiva e daequivalncia material. Assim, a corporificao legislativa de uma atualizada teoria geral dos contratos protagonizada pelo CDC tevesua continuidade com o advento do Cdigo Civil de 2002, o qual, a exemplo daquele, encontra-se carregado de novos princpiosjurdicos contratuais e clusulas gerais, todos hbeis a proteo do consumidor mais fraco nas relaes contratuais comuns, sempre emconexo axiolgica, valorativa, entre dita norma e a Constituio Federal e seus princpios constitucionais. Cdigo de Defesa doConsumidor e o Cdigo Civil de 2002 so, pois, normas representantes de uma nova concepo de contrato e, como tal, possuempontos de confluncia em termos de teoria contratual, em especial no que respeita aos princpios informadores de uma e de outranorma (III Jornada de Direito Civil. Conselho da Justia Federal. Org. Min. Ruy Rosado de Aguiar. Braslia: CJF, 2005).4

    Na mesma perspectiva, Luiz Edson Fachin, em artigo publicado em Portugal, menciona a existnciade um approach entre o novo Cdigo Civil brasileiro e o Cdigo de Defesa do Consumidor.5 De acordocom essa realidade, a compreenso dos princpios do CDC significa tambm, indiretamente, a percepodos regramentos bsicos do Cdigo Civil de 2002. Com tal estudo, portanto, o estudioso do Direito temcondies de compreender a sistemtica de duas leis ao mesmo tempo, o que justifica a elaborao dopresente captulo, do ponto de vista tcnico e metodolgico. Em suma, o estudo dos princpios jurdicospossibilita uma viso panormica do sistema jurdico, em uma antecipao de todas as abordagens queseguiro neste trabalho.

    No se pode esquecer, ato contnuo, da importncia do estudo dos princpios jurdicos, que soregramentos bsicos aplicveis a uma determinada categoria ou ramo do conhecimento. Os princpios soabstrados das normas, dos costumes, da doutrina, da jurisprudncia e de aspectos polticos, econmicose sociais. Reconhece-se, desde Rubens Limongi Frana, a fora normativa dos princpios, bem como,mais recentemente, a sua posio constitucional e incidncia imediata.6

    No aspecto conceitual, interessante a construo de Miguel Reale, para quem Os princpios so

  • verdades fundantes de um sistema de conhecimento, como tais admitidas, por serem evidentes ou porterem sido comprovadas, mas tambm por motivos de ordem prtica de carter operacional, isto , comopressupostos exigidos pelas necessidades da pesquisa e da praxis.7 Entre os consumeristas, cumpredestacar a viso de Nelson Nery Jr. e Rosa Maria de Andrade Nery, os quais lecionam que os princpiosso regras de conduta que norteiam o juiz na interpretao da norma, do ato ou negcio jurdico. Osprincpios gerais de direito no se encontram positivados no sistema normativo. So regras estticas quecarecem de concreo. Tm como funo principal auxiliar o juiz no preenchimento das lacunas.8

    De toda sorte, alerte-se que os princpios no so aplicados apenas em casos de lacunas da lei, deforma meramente subsidiria, mas tambm de forma imediata, para corrigir normas injustas emdeterminadas situaes. Em muitas concrees envolvendo entes privados inclusive fornecedores econsumidores , os princpios tm incidncia imediata, como se ver na presente obra. Na esteira dessasltimas concluses, no se pode esquecer que, muitas vezes, os princpios encontram-se expressos nasnormas jurdicas, mas no necessariamente. No caso do Cdigo do Consumidor, muitos dos princpios aseguir demonstrados podem ser retirados dos arts. 1, 4 e 6 da Lei 8.078/1990. Todavia, existemprincpios que so implcitos ao sistema protetivo, caso do princpio da funo social dos contratos.

    Conforme notcia vinculada por mensagem eletrnica enviada pelo Instituto Brasileiro de Poltica deDireito do Consumidor (BRASILCON), a importncia vital dos princpios consumeristas para todo oDireito foi reconhecida pela International Law Association (ILA-Londres), um dos principais fruns deDireito Internacional do mundo, quando da realizao do 75. Congresso de Direito Internacional,realizado em Sfia (Bulgria), nos dias 26 a 30 de agosto de 2012. Na ocasio, foi elaborada aDeclarao de Sfia sobre o Desenvolvimento de Princpios Internacionais de Proteo doConsumidor, com a edio dos seguintes regramentos fundamentais a respeito da matria: a) Princpioda vulnerabilidade os consumidores so vulnerveis frente aos contratos de massa e padronizados, emespecial no que concerne informao e ao poder de negociao; b) Princpio da proteo maisfavorvel ao consumidor desejvel, em Direito Internacional Privado, desenvolver standards eaplicar normas que permitam aos consumidores beneficiarem-se da proteo mais favorvel aoconsumidor; c) Princpio da justia contratual as regras e o regulamento dos contratos de consumodevem ser efetivos e assegurar transparncia e justia contratual; d) Princpio do crdito responsvel crdito responsvel impe responsabilidade a todos os envolvidos no fornecimento de crdito aoconsumidor, inclusive fornecedores, corretores, agentes e consultores; e) Princpio da participao dosgrupos e associaes de consumidores grupos e associaes de consumidores devem participarativamente na elaborao e na regulao da proteo do consumidor.

    Como se ver, os princpios expostos pela presente obra esto muito prximos dos editados naqueleimportante evento internacional. Vejamos, ento, o seu estudo, de forma pontual.

    2.2. PRINCPIO DO PROTECIONISMO DO CONSUMIDOR (ART. 1 DA LEI 8.078/1990)

    Do texto legal, o princpio do protecionismo do consumidor pode ser retirado do art. 1 da Lei8.078/1990, segundo o qual o Cdigo Consumerista estabelece normas de ordem pblica e interessesocial, nos termos do art. 5, inc. XXXII, e do art. 170, inc. V da Constituio Federal, alm do art. 48 desuas Disposies Transitrias. No se pode esquecer que, conforme o segundo comando constitucionalcitado, a proteo dos consumidores um dos fundamentos da ordem econmica brasileira.

    A natureza de norma de ordem pblica e interesse social justifica plenamente o teor da Lei

  • 12.291/2010, que torna obrigatria a exibio de um exemplar do Cdigo de Defesa do Consumidor emtodos os estabelecimentos comerciais do Pas, sob pena de imposio de multa no valor de R$ 1.064,10(hum mil e sessenta e quatro reais e dez centavos). Na verdade, mais do que isso, diante de sua inegvelimportncia para a sociedade, o Direito do Consumidor deveria ser matria obrigatria na grade doensino mdio nas escolas do Brasil. Por bvio, deve ser ainda disciplina autnoma e compulsria nasfaculdades de Direito, o que no ocorre, muitas vezes.9

    O princpio do protecionismo do consumidor enfeixa algumas consequncias prticas que nopodem ser esquecidas.

    A primeira consequncia que as regras da Lei 8.078/1990 no podem ser afastadas por convenoentre as partes, sob pena de nulidade absoluta. Como fundamento para essa concluso, pode ser citada apreviso do art. 51, inc. XV, do prprio CDC, segundo o qual so nulas de pleno direito as clusulasabusivas que estejam em desacordo com o sistema de proteo do consumidor. O tema ainda seraprofundado no Captulo 5 deste livro, que trata da proteo contratual.

    Como segunda consequncia, cabe sempre a interveno do Min