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Como treinei meu cérebro para me tornar fluente em Matemática Por Edigley Alexandre 02 de janeiro de 2015 www.prof-edigleyalexandre.com

Como treinei meu cérebro para me tornar fluente em Matemática

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Como treinei meu cérebro parame tornar fluente em Matemática

Por Edigley Alexandre

02 de janeiro de 2015 www.prof-edigleyalexandre.com

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Como treinei meu cérebro para me tornar fluente em Matemática

Sabiamente Galileu Galilei escreveu em seu livro, Il Saggiatore:

A Filosofia [Ciência] está escrita neste grande livro, o Universo, que está permanentementeaberto e ao alcance do nosso olhar. Mas o livro não pode ser compreendido sem antesaprendermos a linguagem e os caracteres em que está escrito. A linguagem é a Matemática,e os caracteres são triângulos, círculos e outras figuras geométricas, sem as quais éhumanamente impossível compreender uma única palavra.

Não há citação mais adequada para iniciar uma breve história, sobre como treinei meucérebro para me tornar fluente em Matemática. Neste artigo, contarei um pouco comofoi o meu processo de aprendizado durante curso de Matemática concluído em 2007, noDME-UERN.

Ouço muitos comentários dizendo que "saber" ou "entender" Matemática é um dom oualguma palavra semelhante. Será? A Ciência que investiga o cérebro humano é tãoansiosa por respostas quanto a Ciência que procura respostas na imensidão do Universo.

Alguns estudos mostram que crianças podem nascer com habilidades matemáticas. Sãohabilidades cognitivas incomuns que com o passar de sua idade ficarão em evidência.Mesmo assim, é um futuro incerto que depende de outros fatores que podem influenciarno avanço de suas altas habilidades.

No meu caso, não fui diagnosticado com nenhuma habilidade especial em Matemática naminha infância. Talvez se tivesse sofrido uma influência maior do meio que vivia, teriadesenvolvido uma habilidade maior para tocar bateria, o que exige muito umacoordenação motora para uma criança de 8 anos.

O meu despertar para a Matemática foi tardio se comparado aos meus colegasprofessores que começaram a gostar de Matemática, desde crianças, e que se tornaramprofessores de Matemática.

O meu prazer pela Matemática surgiu na 8ª série (hoje 9º ano), quando ainda nem sabia oque era realmente Matemática, apenas era um garoto que adorada resolver equaçõesquadráticas e biquadradas.

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Duas páginas do meu caderno que usei na 8ª série

Naquele época eu nunca abri a boca para reclamar dizendo: a fórmula de Bhaskara nãoserve pra nada. Não tinha nem noção do que era aplicações matemáticas. Mas, antes dechegar a esse ponto sofri um pouco. Serei breve. Acompanhe.

Já fui reprovado Fui reprovado duas vezes (não riam). Na 2ª série (hoje 3º ano) e na 4 série (5º ano). Nãoescrevo isso com prazer, porém tive motivos inacreditáveis que levaram a este ponto eque lembro-me muito bem. Não citarei um deles para não alongar mais ainda este texto.

O segundo fator, era minha deficiência visual que começava a se agravar naquela época.A miopia forte me impedia de acompanhar as tarefas realizadas no quadro. Não tinhaóculos e não podia comprar um.

Sempre introspectivo, me escondia em algum lugar na escola e não assistia as aulas.Resultado: reprovado. Na 5ª série não sabia as quatro operações básicas.

Somente no ano seguinte, que a equipe pedagógica e meus pais detectaram o problemae assim continuei normalmente minha vida escolar.

Bons professores

A consequência de ter bons professores comprometidos com o ensino, faz toda adiferença, principalmente, durante o Ensino Fundamental onde estudamos as principaisteorias para obter uma boa base matemática.

Dizemos que uma pessoa é dotada de base matemática, quando ela detém de um

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conjunto de conhecimentos específicos que possibilitam: • Identificar a linguagem matemática (símbolos e nomenclaturas padrões);

• Interpretar a linguagem matemática em diferentes contextos;

• Dominar operações aritméticas e algébricas;

• Identificar, interpretar e dominar a Geometria no contexto aritmético e algébrico.

E assim consegui concluir o Ensino Fundamental.

Tudo deu errado

Durante o Ensino Médio aconteceu tudo de errado. Falta de professores. Professoresdescompromissados com o ensino. Foram os 3 anos mais longos da minha vida.

Para você ter uma ideia, concluí o Ensino Médio sem dominar conteúdos básicos, comopor exemplo, Intervalos. Sim, aqueles segmentos de reta com círculos abertos oufechados, para resolver sistemas de inequações ou simplesmente representar umainequação. Sem falar na Geometria.

O jeito era colocar em prática o famoso “se vire sozinho!”.

Estudar sem um orientador (assim defino um professor) é como tentar acessar páginasna internet sem ter um browser instalado no computador (que comparação tosca). É sesentir perdido.

Ingresso na universidade

Não cursar um bom Ensino Médio e não poder se preparar pagando por um cursinho,deixaram tudo mais complicado. Como já citei, tive que me virar sozinho.

Dedicava 10 horas do dia para estudar todas as matérias e ler os quatro livros exigidospara o Processo Seletivo Vocacionado (PSV), que aliás, paguei R$ 50,00 pela inscrição.Naquela época o ENEM estava começando.

Me locomovia 5 km a pé até a biblioteca no centro da cidade para estudar e pegar oslivros emprestados.

Estes pequenos esforços foram suficientes para ser aprovado no meu primeirovestibular. 26ª colocação de 45 vagas.

O “sofrimento” inicial na faculdade

Foi durante o 1º período do curso de Matemática (modalidade licenciatura, mas comgrade de bacharelado rsrs), que senti o baque. Um curso de Matemática é muito"puxado".

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Não há muito tempo para se tirar dúvidas. O ideal é que comece o curso com a basematemática completa, caso contrário terá que repetir a cadeira no semestre seguinte. Eassim aconteceu.

É a partir daqui que começou o treinamento pessoal para me tornar fluente emMatemática.

Como treinei meu cérebro para me tornar fluente em Matemática

Escrever e falar fluentemente em um idioma qualquer exige, obviamente, que domine oidioma. Dominar a grafia e todas as características de um idioma, permitem entender oque se escreve e lê. Com a Matemática não é diferente. Leia novamente a citação deGalileu.

Quando me deparei pela primeira vez com a figura de um intervalo numérico, não tinha amenor noção do que aquilo significava. Calcular uniões, interseções e demais operaçõescom intervalos era algo que eu odiava. Por que? Porque não entendia. E, geralmente, éassim: quando não conseguimos absorver um determinado conteúdo, não gostamosdele.

Mas não posso generalizar. Nem sempre o entendimento constrói fluência, pelocontrário, a fluência que constrói o entendimento.

• Leia o artigo: 5 motivos que fazem alunos odiarem as aulas de Matemática.

Segue abaixo os 3 passos que segui para recuperar, aprender e aperfeiçoar o meuconhecimento teórico em Matemática.

1º passo: Força de vontade

Antes de querer recuperar aquilo que havia deixado passar ou perdido, tive quereconhecer que também tenho minha parcela de culpa. Fiz uma autoavaliação e conseguiidentificar as minhas principais deficiências matemáticas, que me impediam dominaros conceitos e definições sequentes. Desta autoavaliação, identifiquei:

• Matemática básica (5º ano) estava ok. Não tinha problemas com os conteúdos

básicos. • Ensino Fundamental, do 6º ao 9º ano: ok.

• Por mais que tenha me saído bem no Ensino Fundamental, isso não garantiu que

me sairia bem no Ensino Médio. O conteúdo do Ensino Médio é gigantesco enunca dava tempo de estudar todo o conteúdo dado pelo professor, que, namaioria das vezes, foi negligente.

2º passo: Planejamento de estudos

Visitei a biblioteca da faculdade e peguei emprestado (e renovava a cada semana), umacoleção completa de Matemática (principalmente os de Gelson Iezzi). Sozinho, me

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dedicava horas e horas por dia, estudando cada volume da coleção, naquele silênciogostoso da biblioteca. Montei um cronograma de estudos intensivo com 2 anos de duração. Cada volume eraestudado e nunca adiantado sem entender o conteúdo anterior. Não tinha internet,vídeo aulas ou colegas pra me ajudar.

Tive que me virar sozinho. Não foi nada fácil, mas depois de 2 anos e meio, terminei deestudar os principais volumes que seriam importantes para o entendimento de cadeirascomo: Cálculo Diferencial e Integral, Álgebra Linear, etc. Estas duas as mais temidas.

3º passo: Aplicando Matemática em Matemática

Além de cumprir o cronograma que montei para estudar a Matemática correspondenteao Ensino Médio, cursava paralelamente cadeiras como: Física Teórica, Geometria Plana,Estatística, etc., que deixava as coisas ainda mais complicadas. A parte boa era que tudose encaixava quando assistia as aulas, cujo conteúdo tinha pré-requisitos, que haviaestudado e aprendido há algumas semanas.

Resultado: aquele inexperiente acadêmico de Matemática, reprovado em Matemática 1,alguns anos depois, é aluno destaque em Álgebra Linear 1 e 2. Não conto isso com muitoorgulho, pois da minha turma, só pagaram a cadeira de Álgebra Linear, eu e mais doiscolegas.

4º passo: Aprendendo ensinando

Participei de muitos grupos de estudos quando cursava Matemática na faculdade, masna época não conseguia acompanhar o ritmo, pelos motivos que já leram neste post.Depois de muitos esforços consegui dominar o que antes nunca tinha estudado ou tinhadificuldade para aprender.

Algum tempo depois, mediante a muitos estudos, me tornei monitor de Matemática 1, 2e 3, Geometria Plana, Geometria Analítica, Desenho Geométrico e Álgebra Linear 1 e 2. Eeste foi o período em que mais aprendi e desenvolvi minha fluência em Matemática,compartilhando aquilo que com muita luta consegui adquirir.

A compreensão da Matemática por meio da discussão ativa é o talismã doaprendizado. Se você pode explicar para os outros o que você aprendeu, talvez, vocêdeve entendê-los. [Barbara Oakley]

Diferentemente de outros colegas, eu sempre gostei de ajudar quem me procurava.Nunca me senti, por exemplo, o expert em Álgebra Linear, pois apenas detinha umpequeno conhecimento adquirido durante alguns meses de estudos, com um excelenteprofessor cearense. Mas confesso que meu ego se sentia massageado, quando colegascom dificuldades me procuravam pedindo uma ajudinha.

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E meu ego explodia quando, os que criticavam, os que faziam questão de ver as notasbaixas postadas na parede ao lado da sala, as notas da prova de uma determinadadisciplina; ficarem de piadinhas. Infelizmente há os que só criticam em vez de ajudar.

Lembro-me de uma pergunta de uma amiga da faculdade: o que você fez para aprendertudo isso e agora está sendo monitor? Respondi que apenas batalhei por uma coisaque realmente gostava, não apenas pelo desafio.

Aos sábados e domingos montei um grupo de estudos na faculdade, para Álgebra Linear.Caminhava 4 km até o ponto aonde esperava uma carona, para poder ir à universidade.Não guardo nada que aprendi para mim mesmo. Sempre senti um desejo em quererajudar. É por esse motivo que mantenho esse blog há 7 anos.

Concluindo

Acredito fervorosamente que qualquer pessoa pode ser fluente em Matemática, desdeque não sofra de nenhuma patologia que impeça isso. Porém, é necessário que se tenhao mínimo de consciência intelectual para identificar suas prioridades e tenha tambémmuita força de vontade para estudar, sem desanimar.

Até mesmo grandes gênios da Matemática, como Andrew Wiles, passaram por desafios,cuja a própria Matemática e uma nova linguagem teve que ser “adaptada”, com ajuda deoutros matemáticos, afim de demonstrar o Último Teorema de Fermat.

Este texto não serve como um modelo que talvez funcione com você, é apenas um poucodas minhas experiências que me ajudaram a me tornar fluente em Matemática. Nãoimagine que sou um expert da Matemática, pois não sou. Lembre-se: nem sempre oentendimento constrói a fluência, pelo contrário, a fluência que constrói oentendimento.

Caso contrário não seria um professor hoje. Não me atreveria a ensinar Matemática semdominar aquilo que irei ensinar, como vejo muitos a agirem assim. O que me faz tersucesso como professor, é me colocar no lugar dos meus alunos e mostrar que elestambém podem aprender Matemática.

É impossível compreender a Física dos movimentos, a Biologia dos seres vivos, a Químicaque nos compõem, a Informática que facilita nossas vidas, a Astronomia que todos osdias desvenda os mistérios da nossa própria existência, as engenharias e qualquer outraárea, sem dominar a linguagem que é comum a todas elas – a Matemática. Todascaminham lado a lado e já revolucionaram o mundo como o conhecemos, seja para o bemou para o mal.