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Emoções César Schirmer dos Santos [email protected] Departamento de Filosofia – UFSM 2016

Emoções

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Page 1: Emoções

EmoçõesCésar Schirmer dos Santos

[email protected]

Departamento de Filosofia – UFSM

2016

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“‘Emoção: Agitação ou distúrbio da mente; estado mental

veemente ou excitado.’ Também é uma governante poderosa e

irracional.”

– Fala do Criminologista do filme Rocky Horror Picture Show

Agito, distúrbio, excitação, irracionalidade

Page 3: Emoções

A importância das emoçõesAlegria, autorrealização… as emoções positivas fazem a vida valer

a pena.

Vergonha, desespero… as emoções negativas tornam a vida um

inferno.

As emoções dão qualidade e significado às nossas existências.

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Principais tipos de teorias filosóficas sobre as emoções1. Emoções são redutíveis a sentimentos;

2. Emoções são redutíveis a desejos;

3. Emoções são redutíveis a juízos cognitivos e avaliativos

(crenças).

Cf. Ben-Ze’Ev, Aaron. 2004. “Emotions are not mere judgements”. Philosophy and

Phenomenological Research 68 (2): 450–57, p. 450.

Page 5: Emoções

Emoções como sentimentosNo cotidiano, emoções são sinônimos de sentimentos.

David Hume: somos escravos das paixões.

Adam Smith fundamenta as emoções sociais na simpatia.

Cf. Ben-Ze’Ev, Aaron. 2004. “Emotions are not mere judgements”. Philosophy and

Phenomenological Research 68 (2): 450–57, p. 450.

Page 6: Emoções

David HumeAs emoções são centrais para o caráter e para a ação, pois a razão

é uma escrava das paixões.

Podemos distinguir uma emoção de outra pelo sentimento

peculiar de cada uma.

Page 7: Emoções

Adam Smith sobre as emoções sociaisAltruísmo emocional.

Nos colocamos na pele dos outros.

Simpatia.

Cf. Smith, Adam. 2002. Teoria dos sentimentos morais. Traduzido por Lia Luft e

Eunice Ostrensky. São Paulo: Martins Fontes, 1ª parte, seção 1, capítulo 1.

Page 8: Emoções

Altruísmo emocionalMesmo os mais egoístas têm emoções altruístas.

Piedade, compaixão.

Cf. Smith, Adam. 2002. Teoria dos sentimentos morais. Traduzido por Lia Luft e

Eunice Ostrensky. São Paulo: Martins Fontes, 1ª parte, seção 1, capítulo 1.

Page 9: Emoções

Nos colocamos na pele dos outrosNão temos experiência direta do que os outros sentem

(empirismo).

Imaginamos o que os outros sentem.

As variedades dos outros.

Cf. Smith, Adam. 2002. Teoria dos sentimentos morais. Traduzido por Lia Luft e

Eunice Ostrensky. São Paulo: Martins Fontes, 1ª parte, seção 1, capítulo 1.

Page 10: Emoções

Imaginamos o que os outros sentemOperação automática, irrefletida, involuntária.

O imaginado difere no grau, mas não na natureza, daquilo que é

sentido pelo outro.

Recolher um membro, proteger a cabeça… Nossas reações

corporais se explicam pelas emoções que imaginamos ser

sentidas pelo outro.

Cf. Smith, Adam. 2002. Teoria dos sentimentos morais. Traduzido por Lia Luft e

Eunice Ostrensky. São Paulo: Martins Fontes, 1ª parte, seção 1, capítulo 1.

Page 11: Emoções

As variedades dos outrosPessoas vivas, incluindo adultos, crianças, normais e loucos.

Pessoas fictícias da literatura, teatro e cinema.

Pessoas mortas.

Animais em geral, plantas.

A natureza como um todo, o cosmo.

Cf. Smith, Adam. 2002. Teoria dos sentimentos morais. Traduzido por Lia Luft e

Eunice Ostrensky. São Paulo: Martins Fontes, 1ª parte, seção 1, capítulo 1.

Page 12: Emoções

Simpatia“… nossa solidariedade com qualquer paixão.”

Automática para com emoções positivas (como o riso, a alegria).

Condicionada para com emoções negativas (como a raiva e a

fúria).

Cf. Smith, Adam. 2002. Teoria dos sentimentos morais. Traduzido por Lia Luft e

Eunice Ostrensky. São Paulo: Martins Fontes, 1ª parte, seção 1, capítulo 1.

Page 13: Emoções

Simpatia com emoções positivasRiso, alegria.

Instantânea, imediata.

Cf. Smith, Adam. 2002. Teoria dos sentimentos morais. Traduzido por Lia Luft e

Eunice Ostrensky. São Paulo: Martins Fontes, 1ª parte, seção 1, capítulo 1.

Page 14: Emoções

Simpatia com emoções negativasRaiva, fúria, ódio.

Condicionada ao conhecimento das causas, pois depende de nos

colocarmos no lugar do outro.

Cf. Smith, Adam. 2002. Teoria dos sentimentos morais. Traduzido por Lia Luft e

Eunice Ostrensky. São Paulo: Martins Fontes, 1ª parte, seção 1, capítulo 1.

Page 15: Emoções

Emoções como desejosHá uma tradição que frisa o vínculo entre emoções e desejos.

Este vínculo seria até mesmo etimológico, pois o termo emoção

tem parentesco com os termos movimento, motivo, comoção.

Nesta tradição, as emoções estão aí para nos levar à ação. Ou seja,

as emoções têm um papel prático.

É a tradição de Spinoza e Damásio – e também do Descartes da

Sexta Meditação.

Cf. Ben-Ze’Ev, Aaron. 2004. “Emotions are not mere judgements”. Philosophy and

Phenomenological Research 68 (2): 450–57, p. 450.

Page 16: Emoções

Emoções como desejosDescartes, Spinoza, Damásio

Utilidade, conatus, finalidade

Page 17: Emoções

Finalidade das emoções na modernidadeNas teorias de Descartes (Sexta Meditação), Spinoza e Damásio,

as emoções têm como finalidade a autopreservação e o bem-estar

do organismo.

Darwin e Freud estão nas vizinhanças.

Page 18: Emoções

Regulação da vidaEmoções são mecanismos básicos de regulação da vida.

Emoções são biologicamente mais antigas do que os sentimentos.

Cf. Damásio, António R. 2004. Em busca de Espinosa: prazer e dor na ciência dos

sentimentos. Traduzido por Laura Teixeira Motta. São Paulo: Companhia das Letras, p.

35.

Page 19: Emoções

Expressões do estado da vida“… os sentimentos são a expressão do florescimento ou do

sofrimento humano, na mente e no corpo. … Os sentimentos

podem ser, e geralmente são, revelações do estado da vida dentro

do organismo. … a maior parte dos sentimentos são expressões de

uma luta contínua para atingir o equilíbrio …”

Damásio, António R. 2004. Em busca de Espinosa: prazer e dor na ciência dos

sentimentos. Traduzido por Laura Teixeira Motta. São Paulo: Companhia das Letras, p.

15, grifo do autor.

Page 20: Emoções

Conatus, homeostasiaHomeostasia: (boa) regulação da vida. Conatus.

Cf. Damásio, António R. 2004. Em busca de Espinosa: prazer e dor na ciência dos

sentimentos. Traduzido por Laura Teixeira Motta. São Paulo: Companhia das Letras, p.

37–42.

Page 21: Emoções

Homeostasia e avaliação da qualidade de vidaReações homeostáticas são maneiras de avaliar as condições

internas e externas.

Cf. Damásio, António R. 2004. Em busca de Espinosa: prazer e dor na ciência dos

sentimentos. Traduzido por Laura Teixeira Motta. São Paulo: Companhia das Letras, p.

43.

Page 22: Emoções

Homeostasia Spinoza chama essas reações de apetites; quando acompanhados

de consciência, são desejos – conatus.

Nossos mecanismos automáticos de reação não buscam apenas a

sobrevivência. O Graal das emoções é a vida boa.

Cf. Damásio, António R. 2004. Em busca de Espinosa: prazer e dor na ciência dos

sentimentos. Traduzido por Laura Teixeira Motta. São Paulo: Companhia das Letras, p.

43.

Page 23: Emoções

Bem-estar: real, aparenteManipulamos sentimentos com drogas, alimentos, sexo, práticas

sociais, exercícios físicos, tudo o que tenha como meta o

bem-estar.

Digamos que uma dor esteja aí para sinalizar um perigo à

sobrevivência individual ou coletiva. Anestesiá-la é buscar o

próprio bem-estar, não a autopreservação.

Damásio: manipulação dos mapas cerebrais do próprio corpo.

Page 24: Emoções

Descartes, As Paixões da AlmaAs Paixões da Alma, de Descartes, marcam o início do processo

moderno de investigação da alma como algo natural, no sentido

de vinculado ao corpo.

Esse longo processo só finda no século 19, quando a alma é

finalmente surrupiada dos teólogos pelos médicos.

Cf. Hacking, Ian. Múltipla Personalidade e as Ciências da Memória. Rio de Janeiro: José

Olympio, 2000.

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Bento de SpinozaPara Spinoza, as emoções sinalizam um aumento ou diminuição

da capacidade de cada um de preservar a própria vida. As

emoções têm importância ética, pois uma vida boa é durável e

segura (o ideal de Hobbes). Entender o mundo gera emoções

positivas, pois aumenta o poder de autopreservação.

Emoções negativas que se originam do acaso e da ignorância. As

emoções não marcam nenhum conflito entre o corpo e a alma,

pois corpo e alma são dois aspectos de uma única realidade.

Page 26: Emoções

Spinoza leitor de DescartesNas Paixões da Alma, Descartes acerta no projeto, pois o

caminho para entender as emoções é investigar a união

mente-corpo.

Mas erra nos pressupostos: dualismo, livre-arbítrio.

Page 27: Emoções

O que Spinoza herda de DescartesEmoções têm fundamento no corpo.

Início da naturalização dos sentimentos.

Início da laicização das emoções. É o filósofo, em vez do padre,

quem entende de emoções. Nos antigos (Aristóteles, estoicos) as

emoções fazem parte da esfera moral.

Page 28: Emoções

Spinoza sobre dois modos de conhecerPosso conhecer algo pelo intelecto, o que é conhecer algo pelas

causas suficientes para sua produção, ou posso conhecer algo

pelo seu efeito no meu corpo, o que é conhecer por associação de

ideias.

A emoção é um sinal do efeito positivo ou negativo de algo sobre

meu corpo.

(Spinoza antecipa em parte a teoria James-Lange.)

Page 29: Emoções

Desejo como potênciaDe afirmar a vida

De produzir efeitos

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Flutuação do ânimoAfetos básicos: alegria, tristeza

Alegria: para cima

Amor: alegria + a ideia de algo (Spinoza, Ética 3, DA 6)

Tristeza: para baixo

Ódio: tristeza + a ideia de algo

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ConatusTendência ou disposição ao movimento

Esforço para perseverar no ser

Apetite, vontade

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Spinoza sobre o conatus“Cada coisa, o quanto está em suas forças, esforça-se para

perseverar em seu ser.” (3p6)

“O esforço pelo qual cada coisa se esforça para perseverar em seu

ser não é nada além da essência atual da própria coisa.” (3p7)

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Damásio sobre o conatusSeres vivos são naturalmente aptos a regular a própria vida e

buscar a sobrevivência.

A busca de maior perfeição como alegria.

Tendências e esforços inconscientes.

Cf. Damásio, António R. 2004. Em busca de Espinosa: prazer e dor na ciência dos

sentimentos. Traduzido por Laura Teixeira Motta. São Paulo: Companhia das Letras, p.

21.

Page 34: Emoções

AfetosModificações do corpo que favorecem/prejudicam esse corpo,

junto com a ideia dessas modificações (Spinoza, Ética 3def3).

Afetos são psicofísicos.

Os encontros do nosso corpo com outros corpos correspondem,

na alma, a expressões emocionais do aumento/diminuição da

potência de agir.

O afeto vivido no corpo é representado como ideia na mente.

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Lógica associativa dos afetosPor contiguidade (na memória)

Por temporalização

Transferência por semelhança

Por identificação

Pelas modalidades metafísicas

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Associação afetiva por contiguidade (na memória)Se a alma foi afetada simultaneamente por A e B, ao ser

posteriormente afetada (via percepção ou memória) apenas por

A ou por B, também será afetada (via memória) pelo outro.

A consciência se prende a associações de fundo inconsciente.

Elimina o livre-arbítrio, pois não escolhemos as associações se

formam (3p2e).

Page 37: Emoções

Um universo emocionalmente carregadoOs objetos sempre se dão à consciência vinculados a

alegria/tristeza, gerando amor/ódio.

Page 38: Emoções

Associação afetiva por temporalizaçãoSe a alma percebeu A em associação com alegria/tristeza, então a

alma lembra de A com alegria/tristeza.

A ausência de A não modifica o afeto.

Caráter alucinatório dos afetos.

Torna o passado e o futuro tão emocionalmente carregados

quanto o presente.

Page 39: Emoções

Transferência por semelhançaSe a alma imagina que A é semelhante a B, e a alma sente

alegria/tristeza com A, então a alma sente a respectiva

alegria/tristeza com B.

Ambivalência: se a alma ama A e odeia B, e C é num aspecto

semelhante a A, noutro semelhante a B, então a alma ama e odeia

C.

Page 40: Emoções

Por identificaçãoSe amo/odeio A, amo/odeio todos os que identifico como do

mesmo tipo que A.

Contágio emocional: se A ama/odeia B, e eu me tomo por

semelhante a A, então amo/odeio B.

Page 41: Emoções

Pelas modalidades metafísicasNecessidade, possibilidade, contingência.

Reação emocional maior quando imaginamos que a ação de

alguém é fruto do livre-arbítrio (3p49e).

Page 42: Emoções

Emoções e outros corpos – possibilidadesAumento da potência para agir com atividade

Aumento da potência para agir com passividade

Redução da potência para agir com passividade

Bove, Laurent. 2010. Espinosa e a psicologia social: ensaios de ontologia política e

antropogênese. Vários tradutores. Belo Horizonte: Autêntica.

Page 43: Emoções

Aumento da potência com atividadeAumento da potência via ideias adequadas.

O resultado é alegria, pois se dá atividade intelectual em vez de

passividade corporal.

Page 44: Emoções

Aumento da potência com passividadeAumento da potência corporal via encontro feliz com outro

corpo.

O resultado é alegria, por aumento da potência relativamente ao

momento imediatamente anterior.

Page 45: Emoções

Redução da potência de agir com passividadeImpotência, passividade, tristeza: outros corpos diminuindo a

potência de agir do meu corpo.

Falsidade: ideias da imaginação em vez de ideias da razão.

Page 46: Emoções

A composição do indivíduoCorpos são feitos de corpos. Chegamos a um indivíduo quando

um corpo opera de modo a buscar se autopreservar e aumentar

seu poder (conatus).

Indivíduos suprapessoais

Indivíduos subpessoais

Page 47: Emoções

Indivíduos suprapessoais: a sociedadeAlianças. Venho a fazer parte de um indivíduo mais complexo, o

qual converge para o mesmo efeito que é útil para minha

sobrevivência. Alegria coletiva.

Conflitos e confrontos. Outros indivíduos, os quais se dirigem a

efeitos contrários à minha sobrevivência, entram em choque

comigo. Eu mesmo posso estar subdividido. Tristeza coletiva.

Ciências sociais como física do choque entre os corpos.

Page 48: Emoções

A força dos afetos“Um afeto não pode ser coibido nem suprimido a não ser por um

afeto contrário e mais forte do que o afeto a ser coibido.” (4p7)

Enfrentar uma emoção negativa e irracional com outra positiva e

racional mais forte.

Page 49: Emoções

Emoções como crençasUma abordagem bastante comum das emoções, na segunda

metade do século XX, as reduzia ou assimilava a crenças

racionais sobre desejos.

Abordagem cognitiva

Page 50: Emoções

Abordagem cognitivaUma boa parte das teorias contemporâneas trata das emoções em

termos cognitivos.

Por exemplo, minha raiva de alguém supõe minha crença que

essa pessoa fez algo errado. Sem essa crença, não se explica

minha raiva.

Os estoicos defendiam uma teoria das emoções nessa linha.

Page 51: Emoções

Emoções como juízosNo livro Upheavals of thought, de 2001, Martha Nussbaum

defende um neo-estoicismo sobre as emoções.

Emoções são juízos de valor com aspectos cognitivos. Esses

juízos são condições suficientes para haver as emoções.

Cf. Ben-Ze’Ev, Aaron. 2004. “Emotions are not mere judgements”. Philosophical and

Phenomenological Research 68 (2): 450–57, p. 451.

Page 52: Emoções

Um exemplo de emoção como crençaQuero ir na sessão das 20h de cinema.

Agora são 19h30, e levo uns vinte e poucos minutos para chegar

lá.

Assim sendo, tenho que sair agora – significando: Quero sair

agora, pois esta crença é suficiente para este desejo.

Page 53: Emoções

AmokPalavra malaia, designa homicídios coletivos cometidos por

homens que perderam um amor, dinheiro ou honra.

Durante o ato, o homem está fora de si, sob o domínio da fúria.

Antes do ato, o homem delibera friamente sobre o que fazer.

Cf. Pinker, Steven. 1998. Como a mente funciona. Traduzido por Laura Teixeira Motta.

2oed. São Paulo: Companhia das Letras, p. 383–384.

Page 54: Emoções

A razão antes da fúriaAntes do ato, o homem em estado de amoque…

… reflete sobre sua situação;

… planeja cuidadosamente seu atentado.

Ideias, não paixões, nem a química do cérebro, precedem o

furioso ato homicida.

Cf. Pinker, Steven. 1998. Como a mente funciona. Traduzido por Laura Teixeira Motta.

2oed. São Paulo: Companhia das Letras, p. 383–384.

Page 55: Emoções

Emoções resistentes a razõesO problema é que, em alguns casos, crenças parecem não ser

nem necessárias nem suficientes para emoções.

Uma criança tem medo do escuro, daí sua mãe explica que não

há nada a temer. A criança entende a explicação, e a aceita, mas

continua sentindo medo do escuro.

Acrasia

Page 56: Emoções

Acrasia O problema desse modelo, como mostrou Donald Davidson, é

que somos acráticos, temos vontade fraca.

Acrasia: ver que um caminho é preferível, concordar que esse

caminho é preferível, mas seguir por outro caminho.

Page 57: Emoções

Emoções como crenças e acrasiaNo caso do raciocínio querer-ir-ao-cinema-sair-agora, podemos

aceitar suas premissas, podemos aceitar sua conclusão, podemos

aceitar que as premissas são suficientes para sustentar a

conclusão, e ainda assim podemos ficar paradinhos.

Isso indica muitas coisas.

Uma delas é que talvez não devamos reduzir emoções a crenças.

Page 58: Emoções

Dimensões das emoçõesAvaliativa – Intencional – Temporal – Modal – Intensidade –

Polaridade – Expressão comportamental – Disponibilidade à

avaliação racional – A fronteira entre a natureza e a cultura – A

direção de ajuste – Passividade

Page 59: Emoções

Dimensão avaliativa das emoçõesEmoções têm um aspecto avaliativo. Se alguém me elogia e eu

me sinto feliz, a felicidade que sinto é fruto de uma avaliação do

elogio como algo bom ou positivo para mim. Do mesmo modo,

se alguém me ofende, a raiva que sinto é fruto da avaliação do

insulto como algo negativo para mim.

Assim sendo, em uma emoção há uma avaliação (positiva,

negativa) de como a situação fica (boa, ruim) após certo evento.

Page 60: Emoções

Como opera a avaliação emocional?Modelo judicativo: uma emoção é um juízo avaliativo pelo qual a

pessoa é plenamente responsável, tanto do ponto de vista

epistêmico quanto do ponto de vista ético.

Modelo instintivo: a nível subpessoal, uma percepção acarreta

uma avaliação de risco ou segurança, o que acarreta uma resposta

comportamental estereotipada. Esse processo não é disparado

por um juízo, mas pode ser modificado por um juízo.

Page 61: Emoções

Emoções salientam aspectosUm aspecto do objeto apresenta-se como ameaçador, o que

dispara mecanismos subpessoais de autodefesa, e o sentimento

de medo.

No caso das emoções mais básicas, aquelas encontráveis em

todas as culturas, a atenção ao aspecto é automática, não requer

consciência. É obra do Sistema 1, não do Sistema 2.

Page 62: Emoções

A racionalidade pura não é suficiente para a açãoA noção de racionalidade se associa às noções de coerência e

consistência na esfera das crenças, e à noção de otimização dos

resultados na esfera da ação.

No entanto, essas são noções negativas, no sentido de que elas

servem para criticar as falhas de uma crença ou de um plano de

ação, mas são insuficientes enquanto guias positivos para a

fixação de uma crença ou um plano de ação.

Page 63: Emoções

Redução da quantidade de alternativas a escolherVárias são as crenças coerentes e consistentes que podemos ter.

Por quais optar?

Vários são os planos de ação que otimizam os resultados. Qual

seguir?

A quantidade de alternativas a considerar pode ser infinita, e

infinito pode ser o tempo requerido para escolher através da

mera racionalidade.

Page 64: Emoções

Máquinas versus animaisEsse é um problema para máquinas, mas não para animais, pois

somos dotados de emoções.

As emoções dirigem e restringem nossa atenção, reduzindo

consideravelmente a quantidade de alternativas a levar em conta.

Disso resulta que somos capazes de escolher em uma quantidade

de tempo finita.

Page 65: Emoções

Dimensão intencional das emoçõesO objeto, se houver, da emoção.

O objeto focado na emoção, não o objeto que causa a emoção.

Page 66: Emoções

Dimensão intencional das emoções e causalidadeÉ preciso diferenciar o objeto e a causa de uma emoção.

Uma mãe pode estar irritada com seu filho (o objeto da irritação)

não porque seu filho tenha causado a irritação, mas porque a

privação de sono causou a irritação.

Page 67: Emoções

Emoções sem dimensão intencional Há emoções que têm um objeto, como a inveja e o remorso, e há

emoções que podem ou não ter um objeto, como a tristeza.

Page 68: Emoções

Ontologia do objeto intencional da emoçãoO objeto intencional de uma emoção é aquilo que a torna

inteligível.

Pode ser uma coisa existente ou inexistente.

Os fervorosos seguidores de falsos ídolos são fanáticos, apenas da

inexistência dos seus deuses.

Page 69: Emoções

Objetos intencionais e definições de emoçõesO tipo de objeto intencional de uma emoção é fundamental para

defini-la.

O ciúme é o ódio a outro que possui algo que você ama e é de

usufruto exclusivo, o amor é a alegria ligada à ideia do objeto que

te faz sentir melhor do que você estava antes etc.

Page 70: Emoções

Objetos intencionais e emoções apropriadasO objeto intencional explica quando e porque uma emoção é

inapropriada.

Ter medo da própria sombra parece inapropriado, pois se trata

de um objeto inofensivo.

Page 71: Emoções

Dimensão temporal das emoçõesHá emoções necessariamente vinculadas ao passado, presente ou

futuro.

Esperança, desespero: vinculação com o futuro.

Page 72: Emoções

Dimensão modal das emoçõesHá emoções vinculadas ao caráter necessário ou contingente de

um evento.

Sentimos mais raiva quando achamos que a pessoa que nos

ofendeu podia ter feito diferente do que se sabemos que a pessoa

não teria podido ter agido de outro modo.

Page 73: Emoções

Intensidade das emoçõesUma emoção pode ser forte, ou fraca.

Reprovamos os outros por sentir a emoção certa na intensidade

errada (A. Smith).

Page 74: Emoções

Polaridade das emoçõesUma emoção pode ser polaridade positiva (alegria, prazer) ou

negativa (tristeza, dor).

Page 75: Emoções

Expressão comportamental das emoçõesAs emoções compartilhadas em várias culturas são fáceis de ler

no comportamento e difíceis de ser fingidas.

Page 76: Emoções

Disponibilidade à avaliação racionalUma emoção expressa no comportamento e transparente para S

pode ser avaliada racionalmente por S.

A psicanálise se ocupa de emoções indisponíveis à avaliação

racional. Suas técnicas buscam a transparência e a expressão no

comportamento.

Page 77: Emoções

Transparência/opacidade das emoçõesUma emoção é transparente para S se S é capaz de lê-la através

do comportamento ou outro indício. Uma emoção é opaca, caso

contrário.

S pode ser o próprio sujeito que sofre a emoção ou outra pessoa.

A psicanálise investiga as emoções opacas perturbadoras, suas

causas e seus tratamentos.

Page 78: Emoções

Relativismo cultural ou emoções universais?A pesquisa de Ekman nos dá razões para crer que há um

pequeno número de emoções que são reconhecidas por todas as

pessoas em todas as culturas.

No entanto, muitas emoções são típicas de uma cultura, e

algumas estão muitíssimo bem localizadas na geografia e na

história.

Page 79: Emoções

Direção de ajusteUma crença tem uma direção de ajuste da-mente-ao-mundo, pois

a mente tem que se ajustar ao mundo.

Um desejo, no entanto, tem uma direção de ajuste do-mundo-

à-mente, pois o mundo tem que se adequar ao desejo.

Assim sendo, crenças são objetivas, enquanto desejos são

projetivos.

Page 80: Emoções

O problema de EutifronUma visão cognitivista das emoções as assimila às crenças, não

aos desejos.

Assim sendo, voltamos ao problema de Eutifron, e é preciso que

o objeto da emoção seja objetivamente bom ou mau, louvável ou

reprovável.

Page 81: Emoções

Objetividade e projetividadeObjetividade: querer porque é bom.

Projetividade: é bom porque é desejado.

Assim sendo, na visão cognitivista, o desejável tem que ser

objetivamente desejável, e o indesejável tem que ser

objetivamente indesejável.

Page 82: Emoções

Passividade Há um elemento de passividade em ao menos algumas emoções.

Nisso, as emoções são parecidas com as sensações. Não posso

escolher as sensações que tenho, e (ao menos em parte) não

posso escolher as emoções que tenho.

Não se observa o mesmo tipo de passividade nas crenças, pois

tenho que buscar crer no que é verdade, e ter crenças coerentes.

Page 83: Emoções

Questões filosóficas sobre as emoçõesQuestões ontológicas

Questões éticas e políticas

Questões epistemológicas

Page 84: Emoções

Questões ontológicasDiferentes teorias das emoções propõem diferentes ontologias

das emoções, o que leva a disputas ontológicas sobre o que as

emoções são, se é que elas são alguma coisa.

Page 85: Emoções

Ontologia das emoções. Emoções podem ser:Processos fisiológicos

Percepções de processos fisiológicos

Comportamentos

Juízos avaliativos (automáticos ou pessoais)

Fatos sociais

(Talvez todas as anteriores.)

Page 86: Emoções

Tipos de entesSubstâncias

Propriedades

Eventos, incluindo fatos

Processos

Page 87: Emoções

Uma emoção é uma substância?Alguns povos transformaram emoções em divindades. Vênus, por

exemplo.

Substância: ente capaz de sobreviver à mudança (ganho ou perda

de propriedades).

Emoções parecem ser mudanças de substâncias, não substâncias.

Substâncias são indivíduos. Emoções parecem ser ocorrências

(tokens) ou tipos (types) de mudanças que se dão em indivíduos.

Page 88: Emoções

Uma emoção é uma propriedade?Propriedade: ente que (na leitura imanentista das propriedades)

é ou (na leitura transcendentista das propriedades) se manifesta

espaçotemporalmente em (imanentismo) ou através de

(transcendentismo) outro ente.

Emoções como propriedades. De quais entes? Animais. Mas

talvez máquinas possam vir a ter emoções. Então, emoções como

propriedades de indivíduos dotados de certos tipos de almas.

Page 89: Emoções

Uma emoção é um evento? Um evento é um indivíduo quadridimensional, isto é, localizado

no espaço-tempo.

Há tipos de eventos: shows de rock, choros, euforias etc.

Fatos podem ser entendidos como eventos. Fato: que estou

alegre, que tenho esperança etc.

Page 90: Emoções

Uma emoção é um processo?Processo: evento estruturado em etapas.

Etapa anterior é condição necessária de etapa posterior. Nascer,

adolescer, morrer etc.

Page 91: Emoções

Problema ontológico e motivação (questão de método)As emoções são tão complexas que é difícil, e talvez pouco

iluminador, simplesmente dizer que uma emoção é uma

propriedade, um evento ou um processo.

Talvez o melhor ponto de partida seja motivar a classificação

ontológica da emoção.

O poder explicativo é uma boa motivação.

Page 92: Emoções

Proposta de metodologiaDistinguir entre níveis de explicação.

Uma explicação é um porquê. Explicações diferentes podem

conviver sem conflito, desde que pertençam a diferentes extratos

explicativos.

Modelo proposto: os três níveis explicativos de David Marr.

Page 93: Emoções

Marr, David. 1982. Vision. New York: W.H.Freeman & Co.Ao lado, a capa da reedição de 2010.

Page 94: Emoções

Níveis de explicaçãoNível computacional/semântico (finalidade, objetivo)

Nível algorítmico/sintático (esquema

input-processamento-output)

Nível físico (implementação, realização)

Page 95: Emoções

McClamrock, Ron. 1991. “Marr’s three levels: A re-evaluation”. Minds and Machines 1 (2): 185–96. doi:10.1007/BF00361036, p. 189.

Page 96: Emoções

Emoções no nível computacional/semânticoQual o objetivo das emoções?

Que estratégia pode ser adotada para se chegar ao objetivo?

Por que emoções são apropriadas para chegar ao objetivo?

Page 97: Emoções

Qual o objetivo ou finalidade das emoções?Antigos versus modernos

Alguns modernos notáveis

Bem-estar aparente

Page 98: Emoções

Meta das emoções na antiguidade e na modernidadeFilosofia antiga: autorrealização, felicidade, florescimento

(Aristóteles, Ét. Nic.; obras de P. Hadot sobre a filosofia antiga).

Filosofia moderna: autopreservação, conatus, instinto de

sobrevivência, realização do desejo.

Page 99: Emoções

Nível algorítmico/sintáticoOs processos que permitem a realização da meta.

Um comportamento de fuga, por exemplo, é um meio de realizar

a meta da autopreservação em uma situação de perigo que não

pode ser enfrentado sem risco injustificado à integridade do

organismo.

Esquema input-processamento-output.

Page 100: Emoções

Emoções no nível algorítmico/sintáticoComo a estratégia de chegar ao objetivo da autopreservação via

emoções pode ser implementada?

Quais os inputs que produzem emoções? Quais os outputs de um

computação emocional? Qual o algoritmo que transforma os

inputs em outputs?

Page 101: Emoções

Esquema input-processamento-outputInput: um evento externo ou interno manifestado no próprio

corpo. Ver uma cobra, por exemplo.

Processamento: arranjos fisiológicos para realizar um esquema

estereotipado e automático de resposta. Taquicardia, por

exemplo.

Output: comportamento de fuga ou luta. Correr na direção

contrária àquela da cobra, por exemplo.

Page 102: Emoções

Damásio sobre emoções e sentimentosEmoção é diferente de sentimento.

Emoção é expressão corporal pública.

Sentimento é evento mental privado.

A emoção é filogeneticamente anterior ao sentimento.

Cf. Damásio, António R. 2004. Em busca de Espinosa: prazer e dor na ciência dos

sentimentos. Traduzido por Laura Teixeira Motta. São Paulo: Companhia das Letras.

Page 103: Emoções

Fundamento da distinção entre emoção e sentimentoA impossibilidade de exprimir uma emoção acarreta a

incapacidade de ter o sentimento correspondente, mas alguns

doentes incapacitados de certos sentimentos ainda podem

exprimir as emoções correspondentes.

Cf. Damásio, António R. 2004. Em busca de Espinosa: prazer e dor na ciência dos

sentimentos. Traduzido por Laura Teixeira Motta. São Paulo: Companhia das Letras, p.

13–14.

Page 104: Emoções

Processo emoção-sentimento“As emoções ocorrem no teatro do corpo. Os sentimentos

ocorrem no teatro da mente.” (Damásio 2004, 35)

Emoção: parte inicial, pública. Ações, movimentos manifestados

no corpo, no rosto, na voz, em comportamentos.

Page 105: Emoções

A mente como ideia do corpo“O objeto da ideia que constitui a mente humana é o corpo, ou

seja, um modo certo da extensão, existente em ato, e nada outro.”

(Spinoza, Ética 2p13)

Há princípios naturais por detrás das manifestações paralelas da

mente e do corpo. Mapeamentos cerebrais do corpo.

Cf. Damásio, António R. 2004. Em busca de Espinosa: prazer e dor na ciência dos

sentimentos. Traduzido por Laura Teixeira Motta. São Paulo: Companhia das Letras, p.

21.

Page 106: Emoções

Damásio sobre os sentimentos Sentimentos são o fechamento privado do processo que se inicia

publicamente com a emoção.

Invisíveis para o público, tal como as imagens mentais. Privados.

Sentimentos são o pano de fundo da mente – a tonalidade afetiva

de cada momento.

Cf. Damásio, António R. 2004. Em busca de Espinosa: prazer e dor na ciência dos

sentimentos. Traduzido por Laura Teixeira Motta. São Paulo: Companhia das Letras, p.

35.

Page 107: Emoções

Emoções precedem sentimentosNunca se observa um sentimento antes da respectiva emoção.

O que está escondido em nós, o sentimento, é o efeito da emoção

– não é a causa da emoção.

Sentimentos são sombras de emoções.

Cf. Damásio, António R. 2004. Em busca de Espinosa: prazer e dor na ciência dos

sentimentos. Traduzido por Laura Teixeira Motta. São Paulo: Companhia das Letras, p.

36–37.

Page 108: Emoções

Biologia evolutivaEmoções são evolutivamente anteriores a sentimentos. Emoções

são mais antigas do que cérebros.

Comportamentos de prazer e dor são evolutivamente anteriores

às experiências (sentimentos) de prazer e dor. A experiência de

prazer ou dor não é condição necessária do comportamento de

prazer ou dor.

Cf. Damásio, António R. 2004. Em busca de Espinosa: prazer e dor na ciência dos

sentimentos. Traduzido por Laura Teixeira Motta. São Paulo: Companhia das Letras, p.

37–41.

Page 109: Emoções

Alguns comportamentos emotivos de seres muitíssimo simplesPulsões, fome e sede.

Motivações.

Comportamentos exploratórios, lúdicos e sexuais.

Cf. Damásio, António R. 2004. Em busca de Espinosa: prazer e dor na ciência dos

sentimentos. Traduzido por Laura Teixeira Motta. São Paulo: Companhia das Letras, p.

41.

Page 110: Emoções

Entre os genes e o aprendizadoReações mais simples são cortesia do genoma, reações mais

complexas exigem aprendizado.

A finalidade de todas essas reações é regular a vida.

Homeostasia: (boa) regulação da vida – conatus.

Cf. Damásio, António R. 2004. Em busca de Espinosa: prazer e dor na ciência dos

sentimentos. Traduzido por Laura Teixeira Motta. São Paulo: Companhia das Letras, p.

37–42.

Page 111: Emoções

Emoções no nível físico da implementaçãoComo podem ser implementados fisicamente a computação da

autopreservação via emoções e o algoritmo que transforma

inputs em outputs?

Page 112: Emoções

Lesões cerebrais e ciência dos sentimentosPesquisa das emoções a partir de doenças neurológicas. Lesões

afetam input, processamento ou output.

Por exemplo, lesões que impossibilitam sentir vergonha ou

compaixão, mantendo intacta a capacidade de sentir alegria,

tristeza ou medo. Ou lesões que impossibilitam sentir medo,

mantendo intacta a capacidade de sentir compaixão ou vergonha.

Page 113: Emoções

De Damásio, António R. 2004. Em busca de Espinosa: prazer e dor na ciência dos sentimentos. Traduzido por Laura Teixeira Motta. São Paulo: Companhia das Letras, p. 168.

Page 114: Emoções

Hipóteses de DamásioLesões em certos setores do cérebro impossibilitam certas

emoções.

Diferentes setores cerebrais se ocupam de diferentes

sentimentos.

Cf. Damásio, António R. 2004. Em busca de Espinosa: prazer e dor na ciência dos

sentimentos. Traduzido por Laura Teixeira Motta. São Paulo: Companhia das Letras, p.

13.

Page 115: Emoções

Nível físicoA mídia, o hardware.

A mídia das emoções é diferente em seres sem córtex e em seres

com córtex (A. Damásio).

Como o organismo realiza a meta.

Processamento subpessoal de informação e cumprimento de

comportamento esperado, por exemplo.

Page 116: Emoções

Uma emoção explicada em três níveis: medoNível da finalidade: o medo é uma emoção que, a partir de dicas

ambientais ou sinestésicas avaliadas como perigosas, dispara

comportamentos de fuga ou luta para autopreservação.

Nível do input-processamento-output: percepção → avaliação

como perigo → fuga ou luta.

Nível físico: um evento de fuga ou luta singular, localizado no

espaço-tempo.

Page 117: Emoções

Questões éticasComo reduzir a proporção de obsoletas emoções

neolíticas/primatas/mamíferas/animais negativas operando na

minha vida hipster e urbana? (Exemplo: medo e raiva dos de fora

do meu grupo.)

Emoções são um obstáculo para a racionalidade? Ou será que as

emoções proporcionam um tipo de avaliação que é irrealizável

em tempo finito pela razão pura?

Page 118: Emoções

Emoções na política: o grande paradoxoAs pessoas com a vida mais destruída pelas políticas

conservadoras são as mais propensas a votar com os

conservadores.

Por quê?

Page 119: Emoções

O conatus e o conservadorismoNos EUA, há correlação entre votar pela desregulamentação

ambiental e ou morrer mais cedo, ou ter menos qualidade de

vida por causa da brutal poluição industrial literalmente no

quintal de casa.

Exatamente as pessoas que mais precisam de imunidades

(direitos) são aquelas que votam pela desregulamentação. O

resultado é o autossacrifício em nome do capitalismo.

Page 120: Emoções

Conservadorismo mataNos EUA, há mais mães adolescentes, mais divórcios, piores

condições de saúde, mais obesidade, mais mortes violentas, mais

bebês abaixo do peso e menos matrículas escolares nos estados

mais conservadores.

As pessoas dos estados mais conservadores dos EUA vivem, em

média, cinco anos menos do que as pessoas dos estados mais

liberais e progressistas.

Cf. Rich, Nathaniel. 2016. “Inside the sacrifice zone”. The New York Review of Books.

https://blendle.com/i/new-york-review-of-books/inside-the-sacrifice-zone/bnl-nybooks-

20161021-86816.

Page 121: Emoções

Poluição e conatus nos EUAQuanto mais conservador você é, mais provável é que você esteja

exposto à poluição.

Poluição ou mata, ou reduz a expectativa de vida, ou diminui a

qualidade de vida. Uma pessoa que vê a poluição como um

sacrifício exigido pelo capitalismo (não é) toma decisões a partir

dessa visão contraria seu próprio conatus.

Cf. Rich, Nathaniel. 2016. “Inside the sacrifice zone”. The New York Review of Books.

https://blendle.com/i/new-york-review-of-books/inside-the-sacrifice-zone/bnl-nybooks-

20161021-86816.

Page 122: Emoções

Empresas e meio ambienteEstudos da Organização para a Cooperação Econômica e

Desenvolvimento (OECD) mostram, conclusivamente, que a

regulamentação ambiental gera empregos. Ainda assim, sem

bases igualmente sólidas, conservadores do Tea Party preferem

acreditar no contrário.

Cf. Rich, Nathaniel. 2016. “Inside the sacrifice zone”. The New York Review of Books.

https://blendle.com/i/new-york-review-of-books/inside-the-sacrifice-zone/bnl-nybooks-

20161021-86816.

Page 123: Emoções

Qualidade de vida dos conservadores dos EUAQuanto mais conservador você é, pior é sua vida, e mais provável

é que você morra mais cedo do que os outros.

Cf. Rich, Nathaniel. 2016. “Inside the sacrifice zone”. The New York Review of Books.

https://blendle.com/i/new-york-review-of-books/inside-the-sacrifice-zone/bnl-nybooks-

20161021-86816.

Page 124: Emoções

O grande paradoxoAs pessoas com a vida mais destruída pelas políticas

conservadoras são as mais propensas a votar com os

conservadores.

Cf. Rich, Nathaniel. 2016. “Inside the sacrifice zone”. The New York Review of Books.

https://blendle.com/i/new-york-review-of-books/inside-the-sacrifice-zone/bnl-nybooks-

20161021-86816.

Page 125: Emoções

Tea PartyMisoginia

Homofobia

Desregulamentação ambiental

Racismo, xenofobia, islamofobia

Page 126: Emoções

Como prever se o eleitor vai de Trump?Simples. Basta descobrir se ele é hostil às mulheres em geral.

Ressentimento contra pessoas do sexo feminino é um indicador

seguro de preferência por voto em Trump, contra Hillary.

Cf. Nelson, Libby. 2016. “Hostility toward women is one of the strongest predictors of

Trump support”. Vox. novembro 1.

http://www.vox.com/2016/11/1/13480416/trump-supporters-sexism.

Page 127: Emoções

Eleitores do Tea PartyNos EUA, os eleitores típicos do Tea Party são homens, brancos,

velhos, cristãos, com baixa escolaridade.

Eles sabem que estão atrás dos outros brancos na escala social, e

esperam ser os próximos a ter a riqueza, sucesso e dignidade dos

outros brancos.

Page 128: Emoções

Inveja “A Inveja é o Ódio enquanto afeta o homem de tal maneira que

se entristece com a felicidade do outro, e, inversamente,

regozija-se com o mal do outro.”

Spinoza, Ética 3, DA 33.

Page 129: Emoções

“Injustiça”Mas daí eles veem que mulheres, pessoas de outras etnias,

pessoas mais novas, pessoas de outras religiões, pessoas com mais

escolaridade os ultrapassam.

E se sentem injustiçados.

Page 130: Emoções

Menos que genteMesmo animais, mesmo o meio ambiente recebe mais atenção

do que eles.

Isso os faz sentir-se muitíssimo diminuídos.

Page 131: Emoções

Valores Além disso, eles são criticados por causa da interpretação estreita

dos valores cristãos. A essa interpretação eles vinculam

sentimentos identitários valiosíssimos.

São esses valores que os fazem discriminar mulheres, pessoas de

outras etnias, pessoas de outras religiões, pessoas com outras

orientações sexuais.

Mas eles querem ser valorizados, mesmo desprezando os outros.

Page 132: Emoções

Voto emocional O resultado dessa conturbada sopa biográfica é o voto não no

próprio interesse econômico, mas no próprio interesse

emocional.

Isto é, o voto que propõe colocar mulheres, pessoas de outras

etnias e pessoas de outras religiões lá atrás.

Mesmo quando esse voto leva a menos qualidade de vida para si

mesmo.

Page 133: Emoções

Alvos emocionaisOs outros que estavam atrás e os ultrapassam são tratados como

os culpados pela sua vida ruim e curta dos brancos cristãos de

baixa escolaridade, não as empresas e políticos que deles se

aproveitam. Quem tem discurso contra esses outros leva o voto,

ainda que esse voto diminua o tempo e a qualidade de vida do

eleitor.

Cf. Rich, Nathaniel. 2016. “Inside the sacrifice zone”. The New York Review of Books.

https://blendle.com/i/new-york-review-of-books/inside-the-sacrifice-zone/bnl-nybooks-

20161021-86816.

Page 134: Emoções

Questões epistemológicasO conhecimento das nossas próprias emoções é uma questão

problemática, pois, apesar de parecer que estamos

imediatamente cientes das nossas próprias emoções, nada tem

mais poder de nos levar ao autoengano do que nossas próprias

emoções.

Page 135: Emoções

As múltiplas fontes do autoconhecimento emocionalAutodetecção, introspecção

Autoformatação, autoconstituição

Autoexpressão, comportamento

Inferência teórica, descoberta via terapia

Cf. Schwitzgebel, Eric. 2012. “Introspection, what?” In Introspection and consciousness,

organizado por Declan Smithies e Daniel Stoljar, p. 29–48. Oxford: Oxford University

Press, p. 36–37.

Page 136: Emoções

Autodetecção (propriocepção) e inferência teórica Sentimento da posição do próprio corpo: se vejo uma cobra e

sinto meu corpo parado, então não tenho medo.

Sentimento de impulsos: se vejo uma cobra e não sinto vontade

de fugir, então não tenho medo.

Cf. Schwitzgebel, Eric. 2012. “Introspection, what?” In Introspection and consciousness,

organizado por Declan Smithies e Daniel Stoljar, p. 29–48. Oxford: Oxford University

Press, p. 36–37.

Page 137: Emoções

Autoformatação e autoexpressão Digo que não tenho medo de cobras. Isso ajuda a formatar meu

sentimento.

Cf. Schwitzgebel, Eric. 2012. “Introspection, what?” In Introspection and consciousness,

organizado por Declan Smithies e Daniel Stoljar, p. 29–48. Oxford: Oxford University

Press, p. 36–37.

Page 138: Emoções

História da filosofia das emoçõesOs clássicos

A pesquisa contemporânea

Page 139: Emoções

Os clássicosNão há nada de surpreendente no fato de que alguns dos mais

importantes filósofos clássicos (Platão, Aristóteles, Hobbes,

Descartes, Spinoza, Hume) tenham proposto teorias muito bem

delineadas das emoções, nas quais as emoções são concebidas

como respostas a certos tipos de eventos que despertam interesse

ou preocupação no sujeito, provocando mudanças corporais e

motivando comportamentos característicos.

Page 140: Emoções

Teorias clássicasFilosofia antiga: Platão, Aristóteles, estoicos.

Filosofia moderna: Descartes, Spinoza, Hume, Adam Smith

Page 141: Emoções

Platão O que normalmente se diz, sobre a teoria das emoções de Platão,

é o seguinte:

Platão tinha uma teoria tripartite da alma. Partes intelectual,

desejante e emotiva. Essa teoria se mostra instável e

problemática.

O caso é um pouco mais complicado…

Page 142: Emoções

Annas, Julia. 2012. Platão. Traduzido por Marcio de Paula S. Hack. Porto Alegre: L&PM, p. 72.

Page 143: Emoções

Aristóteles Para Aristóteles, as emoções são de grande importância para o

bem viver e o bem agir, pois essas duas coisas resultam do sentir

as emoções certas, na proporção certa, nas circunstâncias certas.

Page 144: Emoções

EstoicosPara os estoicos, as emoções são juízos de valor sobre as coisas.

Esses juízos de valor são fontes de sofrimento.

De modo que, se pudéssemos extinguir as emoções (se

pudéssemos deixar de fazer tais juízos avaliativos…), nos

tornaríamos indiferentes, e felizes.

Page 145: Emoções

Terapia estoicaAo ver seu filho, você julga que ele estará aí amanhã para

alegrá-lo. Esse juízo é o amor.

Você tem que se habituar a pensar que não está no teu poder

fazer com que seu filho esteja por perto amanhã. Você tem que

desaprender a amá-lo.

Assim, você será feliz.

Page 146: Emoções

A pesquisa contemporâneaApós um período de negligência, a investigação das emoções tem

prosperado nos nossos dias, e filósofos podem fazer pesquisas

frutíferas sobre o tema a partir de interações com investigadores

da psicologia, neurologia, biologia e economia.

Page 147: Emoções

As emoções e a vida mental – alguns modelosTeoria do senso comum

Teoria James-Lange

Teoria composicional

Atomismo emocional

Teoria do contínuo emocional

Teoria da base biológica

Page 148: Emoções

Teoria do senso comum das emoçõesPara o senso comum, uma emoção é um tipo de sentimento que

se diferencia qualitativamente das sensações (incluindo

propriocepção).

Emoções têm valor ético. Posso me ofender caso outro não

manifeste a emoção apropriada no grau apropriado no contexto

apropriado (A. Smith).

Page 149: Emoções

Teoria James-Lange das emoçõesAtribuída a William James e Carl G. Lange

Emoções são nossa consciência de mudanças nas condições

fisiológicas relacionadas a funções motoras ou fisiológicas do

corpo.

Essa teoria tem Descartes, na Sexta Meditação, como precursor.

Além de Spinoza.

Page 150: Emoções

Exemplos da teoria James-LangeAo perceber alguém em perigo, várias respostas corporais se

iniciam em mim, e o medo é minha consciência dessas respostas

corporais.

Meu corpo responde à falta de açúcar, e a fome é minha

consciência dessa mudança corporal.

Meu corpo responde à falta de água, e a sede é minha

consciência dessa mudança corporal.

Page 151: Emoções

Insuficiência da teoria James-Lange Apesar do poder explicativo dessa teoria, em alguns casos ela não

é suficiente para distinguir entre uma emoção e outra.

Se tudo o que temos é nossa resposta corporal – por exemplo, a

taquicardia – então pode ser que eu esteja apaixonado, ou

apavorado.

Page 152: Emoções

Teoria James-Lange e contextoAo que parece, também precisamos de elementos contextuais

para diferenciar as emoções umas das outras.

Mas, se é assim, não é suficiente descrever uma emoção como

consciência apenas da resposta corporal.

Page 153: Emoções

Teoria James-Lange e contágio emocionalUm elemento contextual importante parece ser as emoções

sentidas pelos outros ao redor.

Novamente, isso indica que não é suficiente descrever uma

emoção como a consciência apenas da resposta corporal.

Page 154: Emoções

Goldie e a teoria James-Lange das emoçõesHá, no entanto, uma nova proposta, com vista ao retorno à teoria

da emoção como consciência da resposta corporal.

Peter Goldie propõe que se considere as respostas corporais

como carregadas de conteúdo intencional.

Assim sendo, as respostas corporais se ligam a contextos.

Emoções são nossa consciência dos nossos estados corporais

carregados de significado contextual.

Page 155: Emoções

Teoria composicionalDescartes e Spinoza defendem que há um número pequeno e

limitado de emoções básicas.

As outras emoções são compostas a partir das emoções básicas

mais outros elementos (p. ex. objeto, tempo, modalidade

metafísica).

Page 156: Emoções

Atomismo emocionalCada emoção é simples e primitiva, em vez de composta por

outros elementos (outros estados ou eventos mentais, outros

objetos).

Page 157: Emoções

Teoria do contínuo emocionalAs emoções formam um contínuo analisável em diversas

dimensões (p. ex. objeto, tempo, modalidade metafísica, nível de

excitação, intensidade, prazer ou dor).

Esse contínuo não pode ser fragmentado em partes, eventos ou

processos discretos.

Page 158: Emoções

Teoria biológica das emoçõesProcessos fisiológicos são condições necessárias de emoções.

Descartes, Sexta Meditação, como precursor.

As emoções mais básicas são respostas estereotipadas a

necessidades fisiológicas, de acasalamento, de abrigo e proteção

contra predadores e de sociabilidade.

Sistemas biológicos subpessoais orientam o organismo para a

satisfação de necessidades básicas como evitar predadores,

defender-se, buscar alimentos e cuidar da prole.

Page 159: Emoções

Ecletismo metodológicoNo momento, não temos nenhuma razão para preferir um

modelo explicativo em detrimento de outro.

Isso nos abre a oportunidade para o ecletismo justificado com

respeito às teorias das emoções.

Page 160: Emoções

AgradecimentosAos alunos da disciplina de Filosofia da Mente do Curso de

Bacharelado em Filosofia da Universidade Federal de Santa

Maria do segundo semestre de 2016. Estas aulas foram

preparadas para vocês, e foram reformuladas a partir do

generoso retorno de vocês.

Page 161: Emoções

Uma versão atualizada destes slides está disponível aqui.